Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5752/17.6T8OER.L1-2
Relator: ARLINDO CRUA
Descritores: EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
ACTA DA REUNIÃO DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
COLIGAÇÃO PASSIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/04/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - a acta de reunião da assembleia de condóminos em que se encontram fixadas as contribuições a pagar ao condomínio constitui efectivo documento particular que se constitui em título executivo por disposição especial da lei – cf., o  artº. 703º, nº. 1, alín, d), do Cód. de Processo Civil e no nº. 1, do artº. 6º, do DL nº. 268/94, de 25/10;

II – neste caso, o título é a própria acta, e esta não se confunde certamente com a causa de pedir que lhe subjaz, traduzida nos factos constitutivos da obrigação exequenda, de que faz parte o enunciado estatuto dos condóminos, as obrigações daí decorrentes de tal titularidade e a vinculação ao pagamento das contribuições e demais despesas deliberadas;

III - o artº. 56º, nº. 1, alín. b), do Cód. de Processo Civil, admite a coligação passiva de devedores, desde que obrigados no mesmo título e não se verifiquem as circunstâncias impeditivas da cumulação inicial de execuções, elencadas no citado nº. 1, do artº. 709º, do mesmo diploma;

IV - no âmbito do processo executivo, e desde que um dos pedidos não se baseie ou funde em decisão judicial a executar nos autos de acção declarativa – cf., artº. 709º, nº. 1, alín. d), ex vi do nº. 1, do artº. 56º, ambos do Cód. de Processo Civil -, o recurso à coligação depende da verificação cumulativa dos pressupostos decorrentes da articulação dos artigos 56º e 709º, nº. 1;

V - no caso em apreciação, tendo em atenção o título executivo em que se traduz a acta de reunião da assembleia de condóminos, constata-se encontrarem-se totalmente preenchidos ou verificados, em termos cumulativos, os requisitos ou pressupostos de admissibilidade da coligação e, especificamente, da coligação de devedores ou coligação passiva;

VI – efectivamente, é a mesma a espécie de acção executiva dos pedidos cumulados (pagamento de quantia certa), as obrigações são líquidas, a cada um dos pedidos, individualmente considerado, corresponde a forma de processo executivo comum, o tribunal é absolutamente competente para o conhecimento dos mesmos e a execução tem por base ou fundamento, quanto a todos os pedidos, o mesmo título;

VII – o conceito de grave inconveniente, enunciado no nº. 4, do artº. 37º, do Cód. de Processo Civil, deve ser preenchido casuisticamente, na ponderação das dificuldades que se prognostiquem ou antevejam na cumulação de execuções, o que deve ser articulado, concatenado e sopesado com as vantagens processuais que tal cumulação sempre proporciona;

VIII - mesmo aceitando-se a aplicabilidade de tal normativo no âmbito da execução, e ponderando-se, em concreto, a verificação ou ocorrência das invocadas dificuldades, nunca estas se configurariam com a natureza ou amplitude de grave inconveniente, ou seja, que relativamente a pelo menos uma das fases do processo executivo, a tramitação num único processo dos plúrimos pedidos executivos (apenas em número de 3) fosse susceptível de causar aquele juízo de inconveniência qualificado ou potenciado, susceptível de aconselhar a ordenada separação.

Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
               
I – RELATÓRIO

1 Condomínio do Edifício T... – Torre ..., instaurou acção executiva, sob a forma de processo comum sumário, contra:
§ MV... e mulher MB..., residentes na Rua de S..., …, Porto;
§ PJ... e mulher MFJ..., residentes na Praceta do A..., nº. ..., ...º Esquerdo, Q…;
§ JR... e mulher MGR..., residentes na Rua São João de Deus, Lote 143-A, Laveiras, Q…,
peticionando o pagamento da quantia total liquidada de 3.846,31 €.
Alegou o seguinte (transcreve-se, no essencial, o requerimento executivo):
Coligação Passiva:
A presente acção executiva é interposta contra vários executados litisconsortes, nos termos do disposto no art. 56º do CPC.
Causa de Pedir:
Nos dias 25.3.2017, reuniram em assembleia-geral ordinária os condóminos do Edifício T... – Torre ..., sito em A..., concelho de Portimão, prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão sob o nº 13..., em regime de propriedade horizontal, sito no concelho de Portimão e freguesia de A....
Entre outros pontos da ordem de trabalhos constantes na acta nº 36, ponto 2º da ordem de trabalhos, que corporizou as deliberações tomadas na assembleia supra mencionada, foi deliberado pelo condomínio exequente os valores das contribuições em dívida pelos condóminos devedores e referentes ao orçamento aprovado, ora executados na presente acção executiva, cujos montantes se encontram explanados no teor vertido no doc. nº 1 bem como, nos anexos que a complementa, e que se juntam para os legais efeitos.
Os executados apesar de devidamente interpelados até à data ainda não procederam ao pagamento devido das suas contribuições condominiais que infra se descrevem, com referência à contribuição devida com reporte para o teor vertido na acta nº 36.
Logo, dando-se por totalmente transcrito o teor das actas acima identificadas, ora procede-se à identificação do montante global das dívidas de cada executado, porquanto, remetendo ainda para o teor dos títulos executivos cujos factos constam dos mesmos.
Posto isto:
Quanto aos primeiros executados (MV... e MB...):
Os 1ºs executados foram donos e legitimos proprietários de 1/12, em regime de compropriedade, da fracção autónoma, sita no Edifício exequente, que a seguir se descreve:
1. Fracção autónoma designada pela letra “AAB/Junho”, correspondente ao apartamento 8.../Junho, com uso exclusivo contratualizado para o mês de Junho;
Assim sendo, devem os executados ao exequente, pelos montantes das suas contribuições em falta com este, as quantias que infra se descriminam, de forma líquida, aprovados pela AG, relativamente às fracções em dívida a que pertencem, respectivamente, e que ainda não foram postos à disposição do exequente:
1. Apartamento 805/06 – € 10,25 – Obras de 2004; € 71,97 – Ano de 2004; €93,17 – Ano de 2005; € 32,44 – Obras de 2005; € 100,81 – Ano de 2006; € 10,95 - Orçam. Contadores; € 95,45 – Ano de 2007; € 70,87 – Ano de 2008 e € 80,39 – Ano de 2009.
Ao montante acima indicado acresce, ainda, ao executado proceder ao pagamento de honorários do advogado que seja a propôr acção executiva e representar o exequente nos demais actos processuais, nos termos da deliberação constante no ponto 2º da ordem de trabalhos constante no doc. Nº 1.
Para tanto, fixam-se, presentemente, sem prejuízo de ulterior pedido, os honorários do mandatário subscritor em € 200,00, acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, correspondendo a € 246,00.
A dívida condominial acima indicada devida ao exequente pelos executados perfaz o montante global de € 812,34 ao qual acrescem juros moratórios à taxa legal em vigor, desde a citação até ao integral pagamento.
Quanto aos segundos executados (PJ... e MFJ...):
Os 2os executados foram donos e legítimos possuidores de 1/12, em regime de compropriedade, da seguinte fracção autónoma, sita no Edifício exequente, que a seguir se descreve:
1. Fracção autónoma designada pela letra “AAB/Setembro”, correspondente ao apartamento 8..., com uso exclusivo contratualizado para o mês de Setembro;
Assim sendo, deve a executada ao exequente, pelos montantes das suas contribuições em falta com este, os montantes que infra se descriminam, de forma líquida, aprovados pela AG, relativamente às fracções em dívida a que pertencem, respectivamente, e que ainda não foram postos à disposição do exequente:
1. Apartamento 805/09 – € 727,89 – Conta Orçamentos anos de 1995/2002; Orçamento de Pintura - € 56,11; Orçamento Electrificação - € 54.87: € 71,96 – Ano de 2003; € 18,20 – Orçam. Obras de 2003; € 10,25 – Orçam. Obras de 2004; € 71,97 – Ano de 2004; € 93,17 – Ano de 2005; € 32,44 - Orç. Obras de 2005; € 100,81 – Ano de 2006; € 10,81 – Orç Contadores; € 95,45 – Ano de 2007; € 70,87 – Ano de 2008; € 80,39 – Ano de 2009.
Ao montante acima indicado acresce, ainda, ao executado proceder ao pagamento de honorários do advogado que seja a propôr acção executiva e representar o exequente nos demais actos processuais, nos termos da deliberação constante no ponto 2º da ordem de trabalhos constante no doc. Nº 1.
Para tanto, fixam-se, presentemente, sem prejuízo de ulterior pedido, os honorários do mandatário subscritor em € 250,00, acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, correspondendo a € 307,50.
A dívida condominial acima indicada devida ao exequente pelo executado perfaz o montante global de € 1.802,87 ao qual acrescem juros moratórios à taxa legal em vigor, desde a citação até ao integral pagamento.
Quanto aos terceiros executados (JR... Carpenter Robson e MGR...):
Os 3ºs executados foram donos e legítimos possuidores de 1/12, em regime de compropriedade, da seguinte fracção autónoma, sita no Edifício exequente, que a seguir se descreve:
1. Fracção autónoma designada pelas letras “AAB/Outubro”, correspondente ao apartamento 8..., com uso exclusivo contratualizado para o mês de Outubro;
Assim sendo, deve a executada ao exequente, pelos montantes das suas contribuições em falta com este, os montantes que infra se descriminam, de forma líquida, aprovados pelas AG’s, relativamente à fracção em dívida a que pertence, respectivamente, e que ainda não foram postos à disposição do exequente:
1. Apartamento 805/10 – € 298,41 – Conta Corrente de 1999 a 2002; € 56,11 - Obras de Pintura; € 54,87 - Orçam. Electrificação; € 71,96 – Ano de 2003; € 18,20 – Orç. Obras de 2003; € 10,25 – Orç. Obras de 2004; € 71,97 – Ano de 2004; € 93,17 – Ano de 2005; € 32,44 – Orç. Obras de 2005; € 100,81 – Ano de 2006; €10,99 – Orç. Contador; € 95,45 - Ano de 2007; € 70,87 – Ano de 2008.
Ao montante acima indicado acresce, ainda, ao executado proceder ao pagamento de honorários do advogado que seja a propôr acção executiva e representar o exequente nos demais actos processuais, nos termos da deliberação constante no ponto 2º da ordem de trabalhos constante no doc. Nº 1.
Para tanto, fixam-se, presentemente, sem prejuízo de ulterior pedido, os honorários do mandatário subscritor em € 200,00, acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, correspondendo a € 246,00.
A dívida condominial acima indicada devida ao exequente pelo executado perfaz o montante global de € 1231,50 ao qual acrescem juros moratórios à taxa legal em vigor, desde a citação até ao integral pagamento.
Todos os executados:
O exequente encontra-se ainda desprovido dos montantes supra mencionados nos parágrafos anteriores, no total global de € 3.846,31, acrescidos dos respectivos juros moratórios desde a citação até integral pagamento, apesar de ter interpelado os executados para procederem ao seu pagamento, o que estes não fizeram, causando assim prejuízos patrimoniais àquele.
A acta nº 36, doc. nº 1, é titulo executivo de acordo com o art. 6º nº 1 do DL 268/94 de 25.10”.
A execução foi instaurada em 22/12/2017.
2 – Em tais autos, no dia 06/04/2018, foi proferido o seguinte DESPACHO:
Compulsados os presentes autos que tramitam sob a forma sumária (sem sujeição a prévio despacho liminar) verifica-se que o Condomínio do Edifício T... – Torre ..., no A..., instaurou a presente execução para pagamento de quantia certa, com base em acta da respectiva assembleia de condóminos, contra diversos condóminos.
O art.º 56.º, 1, b), do CPC admite a coligação passiva de devedores, desde que obrigados no mesmo título e não se verifiquem as circunstâncias impeditivas da cumulação inicial de execuções previstas no art.º 709.º, 1 do CPC.
É entendimento deste tribunal que a acta da assembleia de condóminos não se enquadra na previsão do art.º 709.º, 1, do CPC, na medida em que a vinculação dos condóminos ao pagamento das obrigações de condomínio não resulta propriamente da acta da assembleia de condóminos ou da deliberação nela documentada, mas sim do seu estatuto de condóminos, mais concretamente da titularidade de uma situação jurídica que, essa sim, os vincula ao pagamento das contribuições que sejam validamente deliberadas e documentadas em acta.
Por outro lado, ainda que assim não se entenda, a junção num único processo de execuções distintas quanto aos sujeitos passivos, obrigações correspondentemente devidas e património pelas quais respondem, pela multiplicação de sujeitos e actos processuais sem relação entre si, cria sérias e óbvias dificuldades de gestão do processo, sendo ainda potenciadora de erros e omissões na realização dos actos processuais e das diligências executivas.
Pelo que fica dito, nos termos do art.º 726º, n.º 4, 6º, 2 e 37º, 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 551º, n.º 1 e 3 do mesmo código, convida-se o Exequente a esclarecer qual das execuções pretende fazer prosseguir, em virtude da inadmissibilidade da cumulação de execuções efectuada no requerimento executivo.
Por razões de agilização processual e ao abrigo do disposto no artigo 734º do CPC desde já se consigna que em qualquer um dos casos, o exequente não dispõe de título executivo quanto ao montante peticionado a título de despesas judiciais e com honorários de advogados.
Notifique, incluindo o Sr. Agente de Execução que, sem prejuízo do acabado de referir, deverá informar os autos quanto à citação do executado PJ..., com junção do respectivo comprovativo”.
Tal despacho foi notificado ao Exequente por comunicação electrónica datada de 09/04/2018.
3 – Inconformado com o decidido, o Exequente Condomínio do Edifício T... – Torre ..., interpôs recurso de apelação, em 14/05/2018, por referência à decisão prolatada.
Apresentou, em conformidade, o Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
“1. Vem o presente recurso de apelação interposto do despacho proferido nos autos com data de 6.4.2018, pelo qual, em súmula, entendeu o Tribunal a quo entendeu não ser de admitir a coligação passiva porque tal situação cria sérias e óbvias dificuldades de gestão do processo, sendo ainda potenciadora de erros e omissões na realização dos actos processuais e das diligências executivas.
Posto isto, Venerandos Desembargadores,
2. Entende o recorrente que, in casu, é admissível a coligação passiva no processo executivo, desde que não se verifiquem as circunstâncias impeditivas previstas no art.709º do CPC, e nos termos previstos no art. 56º do CPC.
3. Entendemos que o Tribunal a quo que não se verificam as condições previstas no art. 709º do CPC, o que decorre do teor do despacho recorrido.
4. Não são identificadas situações que possam verificar as situações indicadas pelo Tribunal a quo a fim de não admitir a coligação passiva de executados.
5. Ademais os executados têm um título executivo comum que é a acta do condomínio.
6. Atento o Douto Aresto proferido pelo TRP no âmbito do processo nº 9490/11.5TBVNG.P1, em que foi relator o Dr. TELES DE MENEZES, detendo pois o seguinte sumário: “É admissível a coligação de executados condóminos pelas contribuições em dívida ao condomínio, quando forem formulados vários pedidos, a execução tenha por base, quanto a todos, o mesmo título, constituído pela acta da reunião da correspondente assembleia, e a obrigação exequenda seja líquida ou a respectiva liquidação dependa de simples cálculo aritmético.”.
7. Motivos pelos quais, entende o recorrente que, a decisão impugnada, padece de erro ao afrontar o disposto no art. 56º do CPC”.
Conclui, no sentido da procedência do recurso, revogando-se a decisão recorrida e determinando-se o prosseguimento dos presentes autos em coligação passiva contra os demais Executados.
4 – Não constam dos autos terem sido apresentadas quaisquer contra-alegações pelos Recorridos/Executados.
5 – O recurso foi admitido por despacho de fls. 32, datado de 20/06/2018.
6 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
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II ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação do Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pelo Recorrente Exequente, delimitado pelo teor das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se em aferir acerca da (i)legalidade da coligação de executados (coligação passiva de devedores) constante do requerimento inicial executivo.

O que implica, in casu, a análise da seguinte questão:
1) Da causa de pedir e do título executivo no âmbito do processo de execução;
2) Da apreciação do instituto da coligação no âmbito do processo de execução.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

A –
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A factualidade a considerar é a que resulta do iter processual supra exposto.
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B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Estatuindo acerca da legitimidade do exequente e do executado, prescreve o artº. 53º, do Cód. de Processo Civil [2], que:
1 - A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.
2 - Se o título for ao portador, será a execução promovida pelo portador do título”.
O artº. 56º do mesmo diploma prevê acerca da coligação, enunciando que:
“1 - Quando não se verifiquem as circunstâncias impeditivas previstas no n.º 1 do artigo 709.º, é permitido:
a) A vários credores coligados demandar o mesmo devedor ou vários devedores litisconsortes;
b) A um ou vários credores litisconsortes, ou a vários credores coligados, demandar vários devedores coligados desde que obrigados no mesmo título;
c) A um ou vários credores litisconsortes, ou a vários credores coligados, demandar vários devedores coligados, titulares de quinhões no mesmo património autónomo ou de direitos relativos ao mesmo bem indiviso sobre os quais se faça incidir a penhora.
2 - Não obsta à cumulação a circunstância de ser ilíquida alguma das quantias, desde que a liquidação dependa unicamente de operações aritméticas.
3 - É aplicável à coligação o disposto nos n.os 2 a 5 do artigo 709.º para a cumulação de execuções”.
Por sua vez, o citado nº. 1, do artº. 709º, prevendo acerca da cumulação de execuções fundadas em títulos diferentes, enuncia ser “permitido ao credor, ou a vários credores litisconsortes, cumular execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, contra o mesmo devedor, ou contra vários devedores litisconsortes, salvo quando:
a) Ocorrer incompetência absoluta do tribunal para alguma das execuções;
b) As execuções tiverem fins diferentes;
c) A alguma das execuções corresponder processo especial diferente do processo que deva ser empregado quanto às outras, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 37.º;
d) A execução da decisão judicial corra nos próprios autos”.
Refira-se, ainda, o prescrito no nº. 1, do artº. 703º, que enuncia as espécies de títulos executivos, dispondo que “à execução apenas podem servir de base:
a) As sentenças condenatórias;
b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;
c) Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo;
d) Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva”.

No caso sub júdice a decisão Recorrida/Apelada defende, no essencial, que:
§ a acta da assembleia de condóminos não se enquadra na previsão do art.º 709.º, 1, do CPC, na medida em que a vinculação dos condóminos ao pagamento das obrigações de condomínio não resulta propriamente da acta da assembleia de condóminos ou da deliberação nela documentada;
§ resultando antes do seu estatuto de condóminos, mais concretamente da titularidade de uma situação jurídica que, essa sim, os vincula ao pagamento das contribuições que sejam validamente deliberadas e documentadas em acta;
§ por outro lado, ainda que assim não se entendesse, a junção num único processo de execuções distintas quanto aos sujeitos passivos, obrigações correspondentemente devidas e património pelas quais respondem, pela multiplicação de sujeitos e actos processuais sem relação entre si, cria sérias e óbvias dificuldades de gestão do processo, sendo ainda potenciadora de erros e omissões na realização dos actos processuais e das diligências executivas;
§ pelo que, consequentemente, por apelo ao prescrito nos artigos 726º, n.º 4, 6º, 2 e 37º, 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 551º, n.º 1 e 3 do mesmo código, convidou o Exequente a esclarecer qual das execuções pretende fazer prosseguir, em virtude da inadmissibilidade da cumulação de execuções efectuada no requerimento executivo.

Ora, conforme expressamente refere a decisão apelada, o transcrito artº. 56º, nº. 1, alín. b), do Cód. de Processo Civil, admite a coligação passiva de devedores, desde que obrigados no mesmo título e não se verifiquem as circunstâncias impeditivas da cumulação inicial de execuções, elencadas no citado nº. 1, do artº. 709º, do mesmo diploma.
Assim, questiona-se: é admissível no caso concreto a coligação passiva dos executados devedores ?
Obrigam-se estes no mesmo título, de forma a preencher o requisito previsto na alínea b), do nº. 1, do artº. 56º, do Cód. de Processo Civil ?
Ocorre alguma circunstância impeditiva, enunciada no nº. 1, do artº. 709º, do mesmo diploma, atenta a remissão efectuada por aquele normativo, que obvie a coligação passiva de devedores a que recorreu o Exequente ?

Vejamos.

- DA CAUSA DE PEDIR  E DO TÍTULO EXECUTIVO NO ÂMBITO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Nas palavras de José Lebre de Freitas [3]o acertamento é o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando «o fim e os limites da ação executiva» (art. 10-5), isto é, o tipo de ação (…) e o seu objecto, assim como a legitimidade, ativa e passiva, para ela (art. 53-1), e, sem prejuízo de poder ter que ser complementado (arts. 714 a 716), em face dele se verificando se a obrigação é certa, líquida e exigível (art. 713)”.
Ora, na configuração do título como causa de pedir na acção executiva, a causa de pedir deixaria “de ser o facto jurídico de que resulta a pretensão do exequente (art. 581-4) para passar a ser o próprio título executivo (que, como vimos, dela constitui prova ou acertamento)”.
Todavia, “não constituindo o título executivo um ato ou facto jurídico, esta construção não se harmoniza com o conceito de causa de pedir”, sendo que “a recusa da identificação do título com a causa de pedir é largamente dominante na jurisprudência[4].
E, acrescenta o mesmo autor [5], “o título executivo ganha a relevância especial que a lei lhe atribui da circunstância de oferecer a segurança mínima reputada suficiente quanto à existência do direito de crédito que se pretende executar”.
Nas palavras de Antunes Varela [6], “o título executivo reside no documento e não no acto documentado, por ser na força probatória do escrito, atentas as formalidades para ele exigidas, que radica a eficácia executiva do título (quer o acto documentado subsista, quer não)”.
Exemplificativamente, refere-se no douto aresto do STJ de 02/12/2013 [7] que “a causa de pedir é o acto ou facto jurídico, simples ou complexo, mas sempre concreto – in casu uma sequência de negociações havidas entre o Autor e os Réus, com vista á aquisição de imóveis, que se frustraram no seu objectivo principal – de onde emerge o direito que aquele Autor, aqui Recorrido, pretende fazer valer nesta acção, traduzido do direito de crédito do Autor sobre os Réus, cfr Manuel de Andrade, Noções Fundamentais de Processo Civil, 1976, 111; Antunes Varela Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, 244/246; Ac Stj de 3 de Junho de 2004 (Relator Salvador da Costa) e de 6 de Julho de 2004 (Relator Araújo de barros), in www.dgsi.pt.
E, acrescenta-se, de forma concludente, em aresto do mesmo Alto Tribunal, datado de 10/12/2013 [8] que “na execução a causa de pedir não é o próprio título executivo, mas antes os factos constitutivos da obrigação exequenda reflectidos naquele: o título executivo terá de representar o acto jurídico pelo qual o executado reconhece uma obrigação para com o exequente” (sublinhado nosso) [9].

Ora, in casu, a acta de reunião da assembleia de condóminos em que se encontram fixadas as contribuições a pagar ao condomínio constitui efectivo documento particular que se constitui em título executivo por disposição especial da lei – cf., o transcrito artº. 703º, nº. 1, alín, d).
É o que resulta, nomeadamente, do prescrito no nº. 1, do artº. 6º, do DL nº. 268/94, de 25/10, ao estatuir que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte(sublinhado nosso), acrescentando o nº. 2, do mesmo normativo incumbir ao administrador o dever de “instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior”.
Deste modo, a acta da reunião da assembleia de condóminos, como documento escrito representativo de uma declaração, impõe a conclusão “de que o título executivo extrajudicial ou judicial impróprio é um documento, que constitui prova plena para fins executivos, e que a declaração nele representada tem por objecto o facto constitutivo do direito de crédito ou é, ela própria, este mesmo facto”.
Pelo que, acrescenta-se, “o título executivo extrajudicial constitui documento probatório da declaração de vontade constitutiva de uma obrigação ou duma declaração directa ou indirectamente probatória do facto constitutivo duma obrigação e é este seu valor probatório que leva a atribuir-lhe exequibilidade[10] .
Ora, assim sendo, afirme-se, desde já, não se lograr entender a pertinência do 1º argumento aduzido na decisão apelada, ao afirmar que a acta da assembleia de condóminos não se enquadra na previsão do artº. 709º, nº. 1. O título é a própria acta, e esta não se confunde certamente com a causa de pedir que lhe subjaz, traduzida nos factos constitutivos da obrigação exequenda, de que faz parte o enunciado estatuto dos condóminos, as obrigações daí decorrentes de tal titularidade e a vinculação ao pagamento das contribuições e demais despesas deliberadas. 


- DA APRECIAÇÃO DO INSTITUTO DA COLIGAÇÃO NO ÂMBITO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Como norma geral aplicável à coligação de autores e de réus, estatui o artº. 36º ser “permitida a coligação de autores contra um ou vários réus e é permitido a um autor demandar conjuntamente vários réus, por pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência.
2 - É igualmente lícita a coligação quando, sendo embora diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas.
3 - É admitida a coligação quando os pedidos deduzidos contra os vários réus se baseiam na invocação da obrigação cartular, quanto a uns, e da respetiva relação subjacente, quanto a outros”.
O normativo seguinte – 37º - enuncia acerca dos obstáculos à coligação, prescrevendo que:
“1 - A coligação não é admissível quando aos pedidos correspondam formas de processo diferentes ou a cumulação possa ofender regras de competência internacional ou em razão da matéria ou da hierarquia.
2 - Quando aos pedidos correspondam formas de processo que, embora diversas, não sigam uma tramitação manifestamente incompatível, pode o juiz autorizar a cumulação, sempre que nela haja interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para a justa composição do litígio.
3 - Incumbe ao juiz, na situação prevista no número anterior, adaptar o processado à cumulação autorizada.
4 - Se o tribunal, oficiosamente ou a requerimento de algum dos réus, entender que, não obstante a verificação dos requisitos da coligação, há inconveniente grave em que as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, determina, em despacho fundamentado, a notificação do autor para indicar, no prazo fixado, qual o pedido ou os pedidos que continuam a ser apreciados no processo, sob cominação de, não o fazendo, ser o réu absolvido da instância quanto a todos eles, aplicando-se o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo seguinte.
5 - No caso previsto no número anterior, se as novas ações forem propostas dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado do despacho que ordenou a separação, os efeitos civis da propositura da ação e da citação do réu retrotraem-se à data em que estes factos se produziram no primeiro processo”.
Como espécie de pluralidade de partes, “o que distingue a coligação do litisconsórcio é, essencialmente, o seguinte: na coligação, há pluralidade de partes e pluralidade correspondente de relações materiais controvertidas; no litisconsórcio, há pluralidade de partes, mas unicidade da relação controvertida. Acresce que a coligação tem sempre carácter voluntário, ao passo que o litisconsórcio ora pode ser voluntário, ora necessário”.
Na coligação são exigidos dois tipos de requisitos. Por um lado, “requisitos objectivos, que radicam numa determinada espécie de conexão ou afinidade entre as pretensões deduzidas. Por outro lado, temos requisitos de índole processual, porquanto a lei estabelece certos obstáculos à coligação, precisamente com base em critérios processuais”, estando os requisitos objectivos enunciados no transcrito artº. 36º, enquanto que os processuais contêm-se no nº. 1 do igualmente transcrito artº. 37º [11] [12].

Já no âmbito do processo executivo, e desde que um dos pedidos não se baseie ou funde em decisão judicial a executar nos autos de acção declarativa – cf., artº. 709º, nº. 1, alín. d), ex vi do nº. 1, do artº. 56º -, o recurso à coligação depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos, decorrentes da articulação dos transcritos artigos 56º e 709º, nº. 1:
- “a espécie de acção executiva decorrente de cada um dos pedidos deve ser a mesma (pagamento de quantia certa, entrega de coisa certa ou prestação de facto), a menos que todos se baseiem numa mesma sentença (arts. 709-1-b e 710, ex vi art. 56-1)”;
- tendo a execução por finalidade o “pagamento de quantia certa, as várias obrigações devem ser líquidas ou liquidáveis por simples cálculo aritmético (art. 56-2)”;
- o tribunal da execução deve “ser competente internacionalmente e em razão da matéria e da hierarquia para a apreciação de todos os pedidos, ainda que o não o seja em razão do valor ou do território (art. 709-1-a ex vi art. 56-1)”;
- relativamente a cada um dos pedidos, individualmente considerado, “deve ter de ser apreciado em processo executivo comum, ou no mesmo processo executivo especial que caberia para a apreciação dos outros pedidos, não interessando, para o efeito, se se tratar de execução de sentença, a forma de processo declarativo em que ela tenha sido proferida, e sem prejuízo de o juiz poder autorizar a cumulação, adequando a forma processual às necessidades do caso concreto (art. 709-1-c ex vi art. 56-1)”;
-  nas situações de coligação passiva (tal como ocorre in casu), “é ainda necessário que a execução tenha por base, quanto a todos os pedidos, o mesmo título (art. 56-1-b) ou que os devedores sejam titulares de quinhões no mesmo património autónomo (ex.: herança) ou de direitos relativos ao mesmo bem indiviso (ex.: compropriedade), quando um ou outro sejam objecto de penhora (art. 56-1-c)[13].
Pelo que, ocorrendo situação de coligação ilegal, por não verificação de alguns dos requisitos ou pressupostos enunciados, e salvo os caos em que exista incompetência absoluta do tribunal ou inadequação da forma de processo, relativamente a algum ou a todos os pedidos [14], “o juiz, havendo lugar a despacho liminar, profere despacho de aperfeiçoamento, convidando o exequente – ou exequentes – a que escolha o pedido relativamente ao qual pretende que o processo prossiga, e só no caso de ele não o fazer absolverá o executado da instância (arts. 38 e 726, nºs. 4 e 5)[15] [16].

Ora, no caso em apreciação, tendo em atenção o título executivo em que se traduz a acta de reunião da assembleia de credores, constata-se encontrarem-se totalmente preenchidos ou verificados, em termos cumulativos, os requisitos ou pressupostos de admissibilidade da coligação e, especificamente, da coligação de devedores ou coligação passiva.
Com efeito, é a mesma a espécie de acção executiva dos pedidos cumulados (pagamento de quantia certa), as obrigações são líquidas, a cada um dos pedidos, individualmente considerado, corresponde a forma de processo executivo comum, o tribunal é absolutamente competente para o conhecimento dos mesmos e a execução tem por base ou fundamento, quanto a todos os pedidos, o mesmo título.
Pelo que, prima facie, concluindo-se pelo preenchimento da totalidade dos pressupostos ou requisitos de admissibilidade legal de recurso à coligação passiva (de devedores ou obrigados), a decisão deveria ser a de prosseguimento da execução.
Refira-se, acerca de situação idêntica à ora em análise, o disposto no douto Acórdão da RP de 21/03/2013 (referenciado nas alegações recursórias) [17], no sentido de que “a contribuição dos condóminos nas despesas comuns do condomínio representa um “débito proporcional”, por parte de todos os interessados, ao qual todos os condóminos são obrigados pelo próprio facto de terem uma quota no condomínio. E, advindo tais obrigações (citado art.º 1424.º) da natureza real do instituto da propriedade horizontal, é permitido ao credor demandar vários devedores coligados, como ocorre no caso em apreço, desde que obrigados no mesmo título.
Estamos perante uma unidade do título executivo, que é o mesmo para todos os obrigados /executados, e que é requisito essencial da admissibilidade da coligação passiva em processo de execução”.
Pelo que, consequentemente, sumariou-se ser “admissível a coligação de executados condóminos pelas contribuições em dívida ao condomínio, quando forem formulados vários pedidos, a execução tenha por base, quanto a todos, o mesmo título, constituído pela acta da reunião da correspondente assembleia, e a obrigação exequenda seja líquida ou a respectiva liquidação dependa de simples cálculo aritmético”.
Em idêntico sentido, pronunciou-se o douto aresto da mesma Relação de 10/01/2013 [18], no qual se sumariou que “as actas das reuniões das assembleias de condóminos constituem títulos executivos quando deliberem sobre o montante de contribuições devidas ao condomínio, já apuradas ou futuras, desde que sejam certas, líquidas e exigíveis.
II - O condomínio pode demandar, na mesma execução, vários condóminos que se encontrem em incumprimento (sublinhado nosso).

Todavia, o despacho apelado, recorrendo igualmente ao disposto no nº. 4 do artº. 37º, entendeu que, não obstante a verificação daqueles requisitos de admissibilidade, considerou que a junção num único processo de execuções distintas quanto aos sujeitos passivos, obrigações correspondentemente devidas e património pelas quais respondem, pela multiplicação de sujeitos e actos processuais sem relação entre si, cria sérias e óbvias dificuldades de gestão do processo, sendo ainda potenciadora de erros e omissões na realização dos actos processuais e das diligências executivas.
Ou seja, por similitude de razões ou fundamentos, considerou preenchido, no âmbito da acção executiva, o conceito de grave inconveniente legalmente previsto para a instrução, discussão e julgamento em conjunto das várias causas coligadas no âmbito da acção declarativa.
Será este normativo, nomeadamente na parte em que prevê tal obstáculo à coligação, aplicável em sede de processo executivo ?
E, na afirmativa, verifica-se no caso concreto em apreciação o enunciado grave inconveniente em que aos vários devedores/executados, obrigados no mesmo título, sejam demandados na mesma execução ?
Nomeadamente, a diferenciação dos patrimónios e actos processuais executandos, próprios da tramitação do processo executivo, estando em causa a identidade de três executados (e respectivos cônjuges), coloca sérias dificuldades de gestão dos autos executivos, de forma a potenciar a ocorrência de erros e omissões na realização das diligências executivas ?
O já transcrito nº. 4 do artº. 37º “atribui ao juiz o poder de determinar o processamento separado dos vários pedidos”, exigindo a “verificação de inconveniente grave na instrução, discussão e julgamento conjuntos”, não sendo necessário “que o inconveniente se reporte às 3 fases, bastando que, com gravidade suficiente, se verifique relativamente a uma delas”.
Acresce que, “envolvendo o juízo sobre a conveniência da separação apreciação técnica, mas não liberdade de escolha da solução a adoptar, a qual é vinculada pela conclusão desse juízo, não se trata de poder discricionário[19] e, como tal, é sindicável em termos recursórios.
O normativo em equação consagra, assim, a possibilidade de, embora verificados os respectivos requisitos da coligação, esta acabar por não ser admitida, operando-se então a separação dos vários pedidos.
E, compreende-se que o conceito de grave inconveniente deva ser preenchido casuisticamente, na ponderação das dificuldades que se prognostiquem ou antevejam na cumulação de execuções, o que deve ser articulado, concatenado e sopesado com as vantagens processuais que tal cumulação sempre proporciona.
Ora, mesmo aceitando-se a aplicabilidade de tal normativo no âmbito da execução, desde logo por força do prescrito no nº. 1, do artº. 551º [20], atendendo aos valores em execução, ao número dos devedores executados e ao património alegadamente exigível executar para satisfazer a demanda executiva apresentada, não se nos afigura justificar-se a ordenada separação de pedidos deduzidos, pois não é crível considerar a potencial ocorrência das aduzidas sérias e óbvias dificuldades de gestão do processo, susceptíveis de causar erros ou omissões no cumprimento das diligências executivas.
E, acrescente-se, mesmo a ponderar-se, em concreto, a verificação ou ocorrência das invocadas dificuldades, nunca estas se configurariam com a natureza ou amplitude de grave inconveniente, ou seja, que relativamente a pelo menos uma das fases do processo executivo, a tramitação num único processo dos plúrimos pedidos executivos (apenas em número de 3) fosse susceptível de causar aquele juízo de inconveniência qualificado ou potenciado, susceptível de aconselhar a ordenada separação.
Ademais, conforme vertido em douto aresto desta Relação de 24/05/2012 [21], “onde hoje o art 31º/4 [correspondente ao vigente artº. 37º, nº. 4] fala de «inconveniente grave», falava o CPC de 1939 - & único do seu art 30º - de «ser preferível».
Do que se conclui ser hoje o legislador mais exigente nesta obstaculização à coligação do que o era então, o que bem se compreende na medida em que se imporá hoje, mais do que nessa altura, que se recorra a medidas de economia processual, como é indubitável que o é a figura da coligação”.

Pelo que, sem outras delongas, no reconhecimento do preenchimento dos requisitos da coligação passiva (de devedores), enunciados no artº. 56º, e não se verificado obstáculos á mesma, o juízo só pode ser de procedência da apelação.
Determinando, consequentemente, a revogação do despacho apelado, o qual deverá ser substituído por outro que, salvo se outra razão obstar a tal, determine o prosseguimento dos ulteriores termos da presente execução.
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Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo o Apelante obtido vencimento, e inexistindo decaimento dos Apelados, as custas da apelação serão a cargo de quem, a final, for responsável pelas custas da execução.
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IV. DECISÃO

Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) Julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo Apelante/Exequente Condomínio do Edifício T... – Torre ...;
b) Em consequência, revoga-se o despacho recorrido/apelado, o qual deverá ser substituído por outro que determine o prosseguimento dos ulteriores termos da presente execução.
c) Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo o Apelante obtido vencimento, e inexistindo decaimento dos Apelados, as custas da apelação serão a cargo de quem, a final, for responsável pelas custas da execução.
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Lisboa, 04 de Outubro de 2018
Arlindo Crua - Relator
António Moreira – 1º Adjunto
Magda Geraldes – 2ª Adjunta (em substituição)

[1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
[2] As disposições legais infra citadas, salvo expressa menção em contrário, reportam-se ao presente diploma.
[3] A Ação Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª Edição, Coimbra Editora, pág. 43.
[4] Idem, pág. 90 e 91.
[5] A Ação Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª Edição, Gestlegal, pág. 47 e 48.
[6] Manual de Processo Civil, 1984, pág. 74 ; e RLJ , Ano 121º, pág. 147 e 148.
[7] Relatora: Ana Paula Boularot, Processo nº. 3178/10.1TBBRG.G1.S1, in www.dgsi.pt .
[8] Relatora: Ana Paula Boularot, Processo nº. 2319/10.3TBOAZ-A.P1.S1, in www.dgsi.pt , citando Lebre de Freitas, A Acção Executiva, Depois Da Reforma Da Reforma, 5ª edição, Lebre de Freitas, João Redinha, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume, 1º, 1999, 92/93.
[9] Nas palavras do douto aresto do STJ de 19/02/2009 – Processo nº. 07B4427 -, o título executivo é “o invólucro sem o qual não é possível executar a pretensão ou o direito que está dentro. Sem invólucro não há execução, embora aquilo que vai realizar-se coativamente não seja o invólucro mas o que está dentro dele”.
[10] Lebre de Freitas, ob. cit., Gestlegal, pág. 84 e 86.
[11] Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2ª Edição, Almedina, pág. 83 e 84.
[12] Ary Elias da Costa e outros - Código de Processo Civil Anotado e Comentado, 1º Volume, Athena Porto 1972, pág. 451 -, aduzem existir “coligação quando sejam diferentes as prestações que cada um dos exequentes pede ao seu executado, ou quando a vários executados são pedidas diferentes prestações pelo mesmo exequente”.
[13] Lebre de Freitas, ob. cit., Gestlegal, pág. 167 a 169.
[14] Situação em que ocorre despacho de indeferimento parcial ou total.
[15] Lebre de Freitas, ob. cit., Gestlegal, pág. 170.
[16] Cf., ainda, acerca dos efeitos da coligação ilegal, José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, Coimbra Editora, pág. 119.
[17] Relator: Teles de Menezes, Processo nº. 9490/11.5TBVNG.P1, in www.dgsi.pt .
[18] Relatora: Teresa Santos, Processo nº. 7855/11.1TBMAI.P1, in www.dgsi.pt .
[19] Idem, pág. 67.
[20] Solução que, confessamos, se nos afigura controversa, atenta a especialidade da norma contida no artº. 56º, aplicável apenas no âmbito das execuções. Pelo que sempre se poderia argumentar que os obstáculos á coligação, no âmbito da acção executiva, são os aí previstos, e não outros, nomeadamente os enunciados no artº. 37º e, como tal, o obstáculo supletivo ou acrescido, previsto no equacionado nº. 4, não seria aplicável às execuções.
[21] Relatora: Teresa Albuquerque, Processo nº. 1154/12.9T2SNT.L1-2, in www.dgsi.pt .