Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
| ||
| Relator: | MANUELA ESPADANEIRA LOPES | ||
| Descritores: | RECLAMAÇÃO DA NOTA JUSTIFICATIVA DE CUSTAS DE PARTE DEPÓSITO DO VALOR DA NOTA RECLAMAÇÃO DE NOVA NOTA JUSTIFICATIVA FALTA DE DEPÓSITO INDEFERIMENTO LIMINAR | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/14/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | I – A reclamação da nota justificativa e discriminativa das custas de parte está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota, o qual tem como objectivo garantir o pagamento das custas e moderar e razoabilizar o regime processual das reclamações, de forma a evitar o seu uso dilatório. II – Deduzindo as AA. reclamação à nova nota apresentada pelos RR. na sequência da declaração de nulidade da nota anteriormente trazida aos autos pelos mesmos, não se justifica o depósito da totalidade do valor da nova nota, quando ainda continua depositada à ordem do processo a quantia que foi depositada na sequência da reclamação deduzida pela mesma parte à nota anterior que veio a ser declarada nula. III - A reclamação contra a nova nota justificativa das custas de parte não deve ser liminarmente indeferida, com o fundamento na falta do depósito do valor da nota, quando a quantia que ainda se encontra depositada nos termos referidos em II- garante o pagamento das custas de parte. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa: * I. RELATÓRIO Sociedade Agrícola 1…, S.A e Sociedade Agrícola, 2…, S.A., intentaram acção declarativa com processo ordinário contra JA, APA, JPA e AB, FV, JR e Associados, SROC, JR, SROC, peticionando que os RR. sejam condenados a pagarem a cada uma das Autoras a quantia de 360.750,00 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal, bem como o valor correspondente às despesas que invocam nos artigos 204º a 207º da petição inicial, a liquidar em execução de sentença. Os RR. contestaram e após a realização da audiência final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os RR. do pedido. Em 30-01-2019 as apelantes recorreram (recurso em separado Apenso B - ref.ª Citius 21711556) do despacho proferido em 08.01.2019 que indeferiu a pretensão das mesmas quanto à realização e alcance de prova pericial (ref.ª citius 382789326-07.01.2019-processo principal). Por sentença proferida em 09.11.2019 (ref.ª Citius 3891535319 de 02.09.2019 processo principal) a acção foi julgada improcedente. Após recurso das apelantes para este TRL foi proferido, em 08.09.2020, Acórdão que julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença de primeira instância. Em 13.10.2020, na sequência do determinado neste TRL, foi proferido despacho de admissão do recurso intentado em 30.01.2019 (ref.ª citius 399483319). Em 15.07.2021 o recurso interposto em 30-01-2019 foi julgado improcedente por decisão sumária do relator, decisão essa sobre a qual recaiu conferência, tendo a mesma sido confirmada por Acórdão de 23.11.2021. As apelantes recorreram de revista do Acórdão desta Relação que confirmou a sentença e, em 19.10.2021, o STJ proferiu Acórdão (ref. citius 10411003 - processo principal) que negou a revista e confirmou o decidido pelo TRL. O acórdão do STJ foi notificado em 20.10.2021, tendo, em 29.10.2021, os RR. JA, APA, JPA apresentado nota discriminativa e justificativa de custas de parte, no valor total de €9.672,00. Em 05.11.2021 a R. AB, FV, JR e Associados, Sroc, apresentou também nota discriminativa e justificativa de custas de parte no mesmo valor. Em 17.11.2021 as AA. apresentaram reclamação das notas e em 19.01.2022 foi proferido o seguinte Despacho: “Uma vez que as questões suscitadas na reclamação em epígrafe pressupõem a apreciação do seu mérito, antes do mais, notifique a autora para efetuar o depósito dos valores correspondentes às notas justificativas de que pretende reclamar, sob pena de indeferimento liminar (n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais)”. Em 31.01.2022, as AA. juntaram duas notas comprovativas de depósito no valor de €9.672,00 cada uma. Em 18.02.2022 foi proferido despacho que considerou as notas discriminativas e justificativas apresentadas pelos RR. tempestivas e julgou improcedente a reclamação apresentada às mesmas pelas AA. Estas interpuseram recurso deste despacho, tendo, por decisão sumária deste Tribunal da Relação de Lisboa proferida em 30.12.2022, sido considerado que as notas eram intempestivas e como tal nulas e que “a parte deveria apresentar nova nota actualizada”. Em 20.01.2023, os RR. JPA e outros apresentaram requerimento com o seguinte teor: «(…) 1. Mediante requerimento introduzido nos autos principais no dia 20-1-2023, os ora Req.tes apresentaram a nova Nota Discriminativa e Justificativa das Custas de Parte, conforme determinado na douta decisão singular proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa no dia 30-1-22022, no apenso “C” (…)» Com este requerimento juntaram nota discriminativa e justificativa no valor total de €9.774,00. Em 07.02.2023, as AA. apresentaram reclamação à nota apresentada pelos RR., terminando: “Em conclusão: Requer-se a reforma da nota discriminativa e justificativa apresentada pelos Réus, nos termos do artigo 31º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais, e do artigo 33º, nº 4, da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril e que o Senhor Juiz as mande reformar, de harmonia com as disposições legais, nomeadamente o artigo 25º, nºs 1 e 2, alínea d) e 26º, nºs 3 e 5 do Regulamento das Custas Processuais e artigo 32º, nº 2 da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril, o que se requer. Subsidiariamente e sem prescindir Considerando a hipótese o Tribunal considerar não haver lugar à reforma da conta, as Autoras vêm reclamar da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, uma vez que estas não respeitam os pressupostos e exigências legais. Deve, assim, a nota discriminativa e justificativa de custas de parte ser reformulada, por não estar de acordo com as disposições legais, nomeadamente o artigo 25º, nºs 1 e 2, alínea d) e 26º, nºs 3 e 5 do Regulamento das Custas Processuais, e artigo 32º, nº 2 da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril, o que se requer. Junta: DUC e comprovativo do pagamento de taxa de justiça.” Com esta reclamação juntaram comprovativo do pagamento da taxa de justiça no valor de €25,50. Em 13.02.2023, os RR. JPA e outros apresentaram requerimento, sustentando que a reclamação deveria ser indeferida liminarmente – por ter sido apresentada no 3º dia útil seguinte ao termo do prazo sem que os AA. tivessem pago a multa a que alude o art.º 139º nº 5 do CPC e por as AA. não terem procedido ao “depósito da totalidade do valor na Nota (€9.774,00. Art.ºs 26º- A nº 2 do RCP e 33º nº 2 da Portaria nº 419-A/2009)”. Em 27.02.2023 as AA. apresentaram o seguinte requerimento: “Sociedade Agrícola 1…, S.A. e Sociedade Agrícola 2…, S.A., Autoras nos autos à margem identificados, notificadas do requerimento apresentado por JPA, vêm dizer o seguinte: - As notas discriminativas e justificativas de custas de parte exigem notificação aos mandatários e às partes, pelo que a reclamação apresentada pelas Autoras e a que o Réu respondeu, se deve considerar tempestiva. - Em 31/1/2022, as Autoras procederam ao depósito de €19.744,00, razão pela qual não se compreende que o Réu venha afirmar que não procederam ao depósito prévio”. Em 28.02.2023, os RR. JPA e outros apresentaram requerimento, concluindo que se deve considerar incumprido pelas AA. “disposto nos art.ºs 26º-A nº 2 do RCP e 33º nº 2 da Portaria nº 419-A/2009”. Em 29.03.2023 foi proferido Despacho nos seguintes termos: “Atenta a data do trânsito em julgado da decisão sumária do Tribunal da Relação de Lisboa, proferida no Apenso C, que julgou intempestivas as notas justificativas e discriminativas de custas de parte apresentadas pelos réus JPA e Outros (ref.ª 30687139) e pela ré AB, FV, JR e Associados, SROC (ref.ª 30744635), julgo tempestiva a nota apresentada nos autos em 20 de janeiro último pelos Réus JPA e Outros, no valor de €9.774,00, o que se consigna. Notifique. * Requerimento de 7 de fevereiro de 2023 (…) Em síntese, a declaração de nulidade, por intempestividade, do Tribunal da Relação de Lisboa das notas justificativas e discriminativas de custas de parte apresentadas pelos réus JPA e Outros (ref.ª 30687139) e pela ré AB, FV, JR e Associados, SROC (ref.ª 30744635) implica, necessariamente, que as quantias depositadas como conditio sine qua non das respetivas reclamações não produzam efeitos, designadamente para a reclamação de uma nova nota justificativa apresentada, de valor diverso, sem que, para tanto, a parte expressamente invocasse que pretendia fazer valer parte daquela importância para esse efeito. Ante o exposto, por falta do depósito da totalidade do valor das notas em apreço, não admito a reclamação apresentada pela Autora em 7 de fevereiro de 2023. Notifique. (…)” * É deste despacho que as AA. recorrem, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: A) Considerando a declaração das Autoras constante do requerimento apresentado em 27 de Fevereiro de 2023 e o depósito de €19.344,00, por si efectuado em 31 de Janeiro de 2021 à ordem do presente processo, deve considerar-se cumprida a condição estabelecida pelo artigo 26º-A, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais, dispensando-se as Autoras de proceder a novo depósito de €9.744,00, como condição prévia para a apresentação de reclamação das notas justificativas e discriminativas de custas de parte. B) Na verdade, as finalidades daquela norma de moderar e razoabilizar o regime processual de reclamações e recursos, de forma a evitar o seu uso dilatório e de garantir a pagamento das custas de parte, já se encontram amplamente realizadas pelas Autoras, através dos depósito e declaração acima mencionadas. C) Ainda que as reclamações em questão, a anterior e a actual, não se confundam, o esclarecimento das Autoras de que consideravam o depósito pré-existente como válido para a actual reclamação significa uma renúncia implícita ao levantamento das quantias necessárias ao preenchimento da condição estabelecida pelo artigo 26º-A, nº 2, do RCP. D) O despacho recorrido, ao considerar que uma declaração das Autoras no sentido de que pretendia fazer valer a importância para cumprimento da obrigação de prévio depósito seria bastante para cumprimento da condição estabelecida no artigo 26º-A, nº 2 do RCP, se concomitante com a apresentação da reclamação, é excessivamente formal e estabelece uma sanção desproporcionada, iníqua e não equitativa para a não concomitância entre a declaração e a apresentação da reclamação, a qual não está estabelecida naquela disposição e viola o princípio constitucional da proporcionalidade na restrição do direito de acesso ao direito e aos tribunais. E) Impõe-se que o tribunal recorrido faça uma interpretação do artigo 26º-A, nº 2, do RCP que o permita dispensar as Autoras de novo depósito, por tal exigência se mostrar, nas circunstâncias concretas em análise, excessivamente onerosa e arbitrária. F) Deve, assim, a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que, recebendo a reclamação apresentada pelas Autoras, aprecie os argumentos invocados e conheça do mérito dos mesmos, decidindo nos termos peticionados. Terminaram peticionando que a decisão recorrida seja revogada. * Os recorridos contra-alegaram, CONCLUINDO: a) Não existe nenhum depósito de €19.344,00, mas, isso sim, dois depósitos, cada um no valor de €9.672,00, constituídos como condição de duas reclamações distintas contra duas Notas Justificativas autonomamente apresentadas por diferentes R.R.; b) Aquando da reclamação contra a Nota Justificativa apresentada pelos ora Recorridos, as Recorrentes não procederam ao depósito do valor total em causa (€9.774,00) e nada declararam quanto ao destino dos dois depósitos tornados ineficazes em consequência da douta decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-10-2022; c) A declaração das Recorrentes constante do requerimento apresentado em 27-2-2023 é manifestamente intempestiva e jamais teria a virtualidade de mobilizar a favor dos ora Recorridos parte do depósito constituído para garantia do pagamento de custas de parte devidas à co-R. “AB, FV, JR e Associados, Sroc”; d) O depósito que havia sido constituído para garantia das custas de parte devidas aos ora Rec.dos é inferior ao valor total da Nota Justificativa actualizada por estes apresentada; e) A douta decisão recorrida fez correcta interpretação e aplicação da lei. Terminou peticionando que seja negado provimento ao recurso. * O recurso foi admitido como apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo. * Foram colhidos os Vistos dos Exmºs Adjuntos. * II– OBJECTO DO RECURSO É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo Código). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido. Assim, em face das conclusões apresentadas pelas apelantes, importa decidir se a falta de depósito da totalidade do valor da nova nota justificativa e discriminativa das custas de parte é fundamento para a rejeição liminar da reclamação deduzida pelas Recorrentes. * III-FUNDAMENTAÇÃO A) De Facto Com relevo para a decisão da causa e atentos os elementos que constam dos autos, encontram-se provados os factos constantes do relatório que antecede e que aqui se dão por integralmente reproduzidos. * B) De Direito Dispõe o n.º 4 do artigo 529.º do Código do Processo Civil que “[a]s custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.” Por sua vez, e ao que aos autos importa, estabelece o artigo 25º do Regulamento das Custas Processuais que as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa onde devem constar, entre outros elementos, “a indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º” (cfr. alínea d) do nº 2). Notificada da nota justificativa, a contraparte, no prazo de 10 dias, pode reclamar da mesma – art.º 26º-A, nº1, do RCP -, estabelecendo o nº 2 deste mesmo normativo: “A reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota”. A exigência do prévio depósito do valor da nota, como condição para a apreciação da reclamação, já constava no art.º 33º, nº 2 da Portaria 419-A, de 17.04. O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 280/2017, de 06.06.2017, aderindo aos fundamentos dos mencionados Acórdãos nºs 189/2016 e 653/2016, veio a «julgar inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma constante do artigo 33º, n.º 2, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril», que determinava que a “reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota”, por violação da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, constante do artigo 165º, n.º 1, al. b), em conjugação com o n.º 1 do artigo 20º, ambos da Constituição da República Portuguesa. Posteriormente, suprindo-se esta apontada inconstitucionalidade orgânica, veio a ser aditado pela Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, ao Regulamento das Custas Processuais, um novo artigo 26.º-A, que no seu nº 2 estabeleceu que “a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota.” Este preceito passou a regular o procedimento de reclamação da nota justificativa e discriminativa das custas de parte, nos mesmos termos que já constavam do nº 2 do artigo 33º da Portaria supra citada, na redacção dada pela Portaria nº 82/12, normativo que foi declarado ferido de inconstitucionalidade orgânica pelo citado Acórdão do Tribunal Constitucional. Com a introdução efectuada pela Lei 27/2019 deixou de se colocar a questão da inconstitucionalidade orgânica, mas não terminou a problemática relativa à conformidade com a Constituição da exigência legal do prévio depósito do valor reclamado pela parte credora de custas de parte. O Tribunal Constitucional já foi chamado a apreciar esta questão em diversos acórdãos, concluindo pela constitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais, aditada pela Lei nº 27/2019, de 28/03, nos termos da qual a reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota – cfr, entre outros, os acórdãos nºs 370/2020 (Publicação: Diário da República n.º 192/2020, Série II de 2020-10-01, página 205 e 462/2020 da 1.ª secção. Como se diz na decisão recorrida, tem sido este, efectivamente, o entendimento predominante na jurisprudência – cfr Acs do TRL de 8.10.2020, proc. 93/13.0TCFUN.1.L2-2 e de 15.09.2020, proc. 249/19.2T8FNC.L1-7, do TRP de 26.01.2016, proc. 8043/06.4TBVNG.P1, de 9.11.2020, proc. 413/14.0TBOAZ.P1, de 22.02.2021, proc. 937/16.5T8PNF-A.P1, de 21.10.2021, proc. 330/14.4TBVNG-F.P1 e Ac. de 7.02.2022, proc.1455/17.0T8MTS-B.P1, do TRE de 8.10.2015, proc.681/14.8T8PTM-D.E1, de 27.02.2020, proc. 502/14.1T8PTG.E1, de 14.01.2021, proc. 738/03.0TBSTR.E1 e de 14.10.2021, proc.6050/19.6T8STB-A.E1, todos acessíveis em www.dgsi.pt. No caso dos autos importa atentar no seguinte: As apelantes recorreram de revista do Acórdão desta Relação que confirmou a sentença proferida nos autos e, em 19.10.2021, o STJ proferiu Acórdão (ref.ª citius 10411003-processo principal) que negou a revista e confirmou o decidido pelo TRL. O acórdão do STJ foi notificado em 20.10.2021, tendo, em 29.10.2021, os RR. JA, APA, JPA apresentado nota discriminativa e justificativa de custas de parte, no valor total de €9.672,00. Em 05.11.2021 a R. AB, FV, JR e Associados, Sroc, apresentou também nota discriminativa e justificativa de custas de parte no mesmo valor. Em 17.11.2021 as AA. apresentaram reclamação das notas e em 19.01.2022 foi determinada a notificação das autoras para efectuarem o depósito dos valores correspondentes às notas justificativas de que pretendiam reclamar, sob pena de indeferimento liminar. Em 31.01.2022, as AA. juntaram duas notas comprovativas de depósito no valor de € 9.672,00 cada uma. Em 18.02.2022 foi proferido despacho que considerou as notas discriminativas e justificativas apresentadas pelos RR. tempestivas e julgou improcedente a reclamação apresentada às mesmas pelas AA. Estas interpuseram recurso deste despacho, tendo, por decisão sumária do TRL, proferida em 30.12.2022, sido considerado que as notas eram intempestivas e como tal nulas e que “a parte deveria apresentar nova nota actualizada”. Nesta sequência, em 20.01.2023, os RR. JA, APA, JPA apresentaram nota discriminativa e justificativa no valor total de €9.774,00. Em 07.02.2023, as AA. apresentaram reclamação à nota apresentada pelos RR., reclamação essa que não se fez acompanhar do depósito da quantia ora constante da nota de custas de parte. Como se diz no Ac. do Tribunal Constitucional nº 153/2022, a norma segundo a qual a admissibilidade da reclamação das notas justificativas depende do depósito integral do seu valor dirige-se “a prosseguir um fim legítimo e constitucionalmente solvente: garantir que o custeamento do processo corra efetivamente por conta de quem lhe deu causa e não por conta do Estado e da comunidade; e, por outro lado, moderar e razoabilizar, quanto às custas de parte, o regime processual de reclamações e recursos, de forma a evitar o seu uso dilatório.”. E continua o mesmo acórdão: “Na jurisprudência deste Tribunal (Acórdãos n.ºs 370/2020, 461/2020, 462/2020, 726/2020 e 56/2021) aquele juízo de não inconstitucionalidade assentou na consideração dos demais «mecanismos de controlo interno», consagrados nas demais normas do regime jurídico das custas de parte, e que evitariam que o valor apresentado pela parte vencedora a título de custas de parte pudesse ser desproporcionado ou imprevisível. No fundo, se a ratio constitucionalmente solvente da norma do n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP é evitar que, «que a coberto de uma reclamação de custas de parte a parte vencida possa adiar o pagamento do montante devido à parte vencedora, por outro lado não estará no espectro dessa mesma ratio que a parte vencedora possa aproveitar-se dessa norma para peticionar montantes inexigíveis e que obrigarão a sacrifícios da parte contrária, ou até mesmo que lhe seja permitido evitar o efeito cominatório da reclamação, atenta a falta de capacidade da parte vencida em depositar tais quantias» (EDUARDO PEIXOTO GOMES, “Limitações na reclamação de custas de parte”, Ab Instantia, ano I, n.º 2, 2013, p. 259). Desde logo, porque as quatro parcelas que compõem o valor de custas de parte (taxa de justiça; encargos ou despesas; honorários do mandatário; honorários do agente de execução — n.º 1 do artigo 25.º do RCP) estão normativamente balizadas, o que evitará que a parte sucumbente seja surpreendida por valores imprevisíveis e, por outro lado, impedirá que a parte vencedora, por lapso grosseiro ou por conduta malévola, reivindique montantes arbitrários. No que concerne à taxa de justiça, ela é normativamente fixada por referência ao valor e à complexidade da causa, nos termos do disposto nos artigos 5.º e seguintes do RCP; os encargos estão delimitados nos artigos 16.º e seguintes do RCP; os honorários do mandatário estão circunscritos a «50 /prct. do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário judicial» (cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo 26.º do RCP); por fim, os honorários do agente de execução são normativamente fixados no artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto (na redação que lhe foi conferida, por último, pela Portaria n.º 239/2020, de 12 de outubro). Deste modo, as normas vigentes permitem às partes litigantes prever, face ao valor e complexidade da causa, o montante em que podem vir a ser condenadas a título de custas de parte; e a sua apresentação pela parte vencedora está expressamente regulada — pelo que, sempre que o credor de custas de parte cumpra as normas, sempre se chegará a um valor razoável e antecipável pela parte sucumbente. Por outro lado, levou-se em linha de conta, naqueles arestos, que o regime jurídico vigente admite ao tribunal rever oficiosamente a conta de custas, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 31.º do RCP. No fundo, porque «Para efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31.º» (nos termos do n.º 4 do artigo 26.º-A do RCP), entendeu-se ser possível um controlo judicial dos montantes apresentados pela(s) parte(s) vencedora(s), que prevenirá a oneração da parte vencida da obrigação de pagamento de valores injustificados. Em consequência, entendeu este Tribunal que a obrigação de depósito integral do valor da nota justificativa como condição de admissão da reclamação não constitui uma restrição desproporcionada ao direito de acesso ao direito e à justiça, já que os «mecanismos de controlo interno» sempre impediriam que o valor a depositar se revelasse manifestamente oneroso ou arbitrário. (…) O pressuposto da conformidade constitucional daqueloutra norma é, pois, a idoneidade do sistema normativo para impedir que da sua aplicação resulte o condicionamento da tutela jurisdicional ao depósito de valores arbitrários e manifestamente desproporcionados — «a predeterminação normativa do valor máximo admissível das custas de parte num dado processo e a necessidade de dar conhecimento simultâneo ao tribunal e à parte vencida da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, abrindo a possibilidade de uma reforma oficiosa da nota apresentada» (Acórdão n.º 678/2014).” No caso analisado no citado acórdão, na dimensão normativa sindicada, decidiu-se julgar “inconstitucional, por violação do direito de acesso aos tribunais e à justiça, consagrado no n.º 1 do artigo 20.º da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, a norma contida no n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais (RCP), aditada pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março na interpretação segundo a qual o tribunal não pode dispensar o depósito do valor integral do valor das notas justificativas quando o considere excessivamente oneroso ou arbitrário”. In casu, verifica-se que se encontra ainda depositada à ordem dos autos a quantia de €19.344,00. Desta €9.672,00 respeitavam ao valor constante da nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada inicialmente pelos ora apelados e outros €9.672,00 ao valor da nota discriminativa e justificativa apresentada pela R. AB, FV, JR e Associados, Sroc, que após a declaração e nulidade da nota anteriormente por si apresentada não juntou aos autos nova nota de custas de parte. Considerando os fundamentos invocados pelo Tribunal Constitucional no acórdão imediatamente supra citado, não pode deixar de se concluir que sujeitar a admissibilidade da reclamação da nota justificativa ora apresentada a novo depósito da quantia de € 9.774,00 constitui uma decisão desproporcionada e excessiva. Dito de outro modo, o pagamento das custas de parte encontra-se já garantido pelos depósitos anteriormente efectuados à ordem dos autos destinados a garantir o pagamento das aludidas custas, pelo que não se justifica o depósito novamente do valor da nota justificativa, enquanto pressuposto de admissibilidade da reclamação contra a mesma. É certo que as AA./reclamantes, aquando da apresentação da nova reclamação, nada declararam no sentido que os depósitos anteriores fossem considerados para efeitos desta, mas não é menos verdade que as quantias se mantém depositadas à ordem dos autos e o foram para garantir o pagamento das custas de parte. Nesta medida, terá de proceder a apelação, revogando-se a decisão proferida, a qual deverá ser substituída por outra que admita e conheça da reclamação apresentada pelas AA./Recorrentes à nota de custas de parte apresentada pelos RR. * IV. DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, revogar a decisão recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que admita e conheça da reclamação apresentada pelas AA./Recorrentes à nota de custas de parte apresentada pelos RR. Custas pelos Recorridos – art.º 527º, nº 1, do C.P.Civil. Registe e Notifique. Lx, 14/11/2023 Manuela Espadaneira Lopes Nuno Teixeira Paula Cardoso |