Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JORGE ALMEIDA ESTEVES | ||
Descritores: | CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA REMUNERAÇÃO NEXO DE CAUSALIDADE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/24/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I- No âmbito de um contrato de mediação imobiliária, o direito à remuneração prevista depende do efetivo exercício de uma atividade por parte do mediador tendente ao negócio visado pelo contrato e que essa atividade seja causa adequada da celebração do negócio que, a final, venha a ser celebrado entre os vendedores (contratantes naquele contrato) e o comprador com quem foi celebrado o negócio mediado. II- Se o negócio foi celebrado com um comprador apresentado pela mediadora, em que existiram negociações promovidas por aquela, mas que no final se goraram por as partes não terem chegado a acordo, não existe o direito à remuneração se, sendo o contrato celebrado sem a cláusula de exclusividade, ocorrer a quebra do nexo de causalidade adequada entre a atividade da mediadora e o negócio concretamente efetuado. III- Verifica-se a quebra dessa causalidade quando ocorrem circunstâncias que foram determinantes para o negócio, nomeadamente o facto de o comprador ter sido encaminhado para os vendedores por via de outra empresa de mediação imobiliária que também estava a mediar o negócio, os vendedores terem providenciado, por si próprios, pela obtenção, junto das entidade públicas, de documentos fundamentais que determinaram a revisão e alteração da área do imóvel e aquela mediadora ter aceitado reduzir a sua remuneração a fim de facilitar o negócio. IV- Foi em função destas circunstâncias que se obteve o consenso necessário a que ambas as partes formassem a vontade de contratar, tendo os vendedores conseguido um acréscimo monetário de cerca de 255.000€ relativamente ao negócio que se gorou e que havia sido mediado pela autora, o que constitui um montante bastante elevado. IV- Nestas circunstâncias há que concluir que o negócio celebrado é exclusivamente imputável à atividade da segunda mediadora, a quem foi paga a comissão, não tendo a autora direito à remuneração acordada no contrato de mediação e nem sequer à partilha da comissão que foi paga. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes que compõem este Coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Autora recorrente: A Réus recorridos: B, C, D e E A autora instaurou ação de condenação sob a forma comum de declaração peticionando a condenação solidária dos réus a pagarem-lhe a quantia de €107.500,00, acrescida de IVA à taxa legal, bem como de juros de mora vencidos desde março de 2018 e juros vincendos até efetivo pagamento. Para fundamentar a ação a autora invocou ser empresária em nome individual, desenvolvendo a sua atividade no sector da mediação imobiliária. No âmbito dessa sua atividade celebrou com os réus, em 04-04-2017 um contrato de mediação imobiliária tendo por objeto a venda de um imóvel de que os réus eram proprietários, denominado “Vivenda J”, sito na Parede, pelo preço de três milhões de euros, tendo como contrapartida uma comissão de 5% do valor final de venda, acrescida de IVA. Em cumprimento desse contrato, um colaborador da autora contactou o representante legal da sociedade JDD, S.A. para lhe apresentar o imóvel, tendo-se seguido diversas negociações e reuniões que visaram a aproximação do preço, até que na última reunião, apesar da diferença ter diminuído, manteve-se o impasse quanto ao valor a pagar, pelo que entendeu que se tinha frustrado o negócio. Algum tempo depois veio a ter conhecimento da venda efetuada pelos réus à referida sociedade JDD, S.A., tendo, para o efeito, os réus constituído uma sociedade para a qual entraram com o imóvel, a título de prestação acessória em espécie, tendo a constituição da sociedade visado apenas simular uma venda, seguindo-se a alienação do imóvel pela sociedade à mencionada JDD, S.A., pelo preço de €2.150.000,00, que era o pretendido pelos vendedores. Entende, por isso, ter direito à comissão acordada pela mediação imobiliária pois praticou todos os atos próprios da mediação, tendo a sociedade criada pelos réus sido constituída com o único propósito de evitar o pagamento da comissão que ascenderia ao valor do pedido, acrescido de juros de mora. Os réus contestaram dizendo que celebraram o contrato de mediação imobiliária com a autora em regime de não exclusividade, tendo, inclusive, contactado outras mediadoras imobiliárias, sendo que o alegado na p.i. a respeito dos procedimentos para retificação da área do imóvel e consultas à Câmara Municipal, ao contrário do que esta afirma, não foram efetuados pela autora. No mais, reconheceram ter a autora apresentado um interessado na compra do imóvel, de nome CD, e que, na sequência de diversas reuniões e de propostas que foram apresentadas, não foi conseguido chegar a qualquer entendimento concreto, sendo a última proposta apresentada por este de €1.950.000,00, o que não foi por si aceite por o valor mínimo aceitável pelos réus ser de €2.150.000,00. Negam, por outro lado, terem visado evitar o pagamento da comissão imobiliária, porquanto, não só esta foi paga à mediadora imobiliária que, posteriormente, encontrou a compradora como foi esta quem diligenciou pela concretização do negócio, tendo a venda acabado por ser feita pelo preço de €2.125.000,00, à sociedade JDD, S.A. e não à pessoa apresentada pela autora. Alegaram ainda que a sociedade que vendeu o imóvel foi por si constituída com vista a um planeamento fiscal e gestão do imóvel e não para evitar qualquer pagamento que fosse devido à autora, tendo sido informados por agências imobiliárias que tal facilitaria a concretização da venda. Deduziram, ainda, incidente de intervenção principal provocada da sociedade imobiliária que interveio na celebração do negócio e que surge identificada na escritura pública de compra e venda por entenderem que, em caso de procedência da ação, assiste-lhes direito à restituição do por si liquidado sob pena de terem de liquidar duas comissões. Foi admitida a intervenção principal provocada da sociedade MPMI, ldª, a qual, devidamente citada, não interveio nos autos. Foi dispensada a realização da audiência prévia e foi proferido despacho saneador tabelar que julgou verificados os pressupostos processuais. Enunciaram-se o objeto do litígio e os temas da prova. Realizou-se a audiência final tendo sido proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu os réus do pedido. * Inconformada com o decidido, apelou a autora, tendo apresentado alegações e as seguintes conclusões: A. O presente recurso interposto da sentença proferida nos presentes autos, a qual, julgando a ação improcedente, absolveu os RR. do pedido deduzido. B. A sentença em crise é, salvo o devido respeito, desprovida de qualquer fundamento suporte legal. C. Na verdade, nunca poderá a decisão de direito subsistir, uma vez que os próprios elementos de facto que o Tribunal considerou demonstrados são claramente suficientes para conduzir a uma solução diversa, razão pela qual a mesma deverá ser alterada de modo a que condene as RR nos pedidos contra si formulados. D. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação da lei, pois, de acordo com o Regime Jurídico da Mediação Imobiliária, os factos provados permitem dar como existente o direito da Autora à remuneração acordada com os RR, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida e condenar os RR no pedido formulado. E. A questão central que se coloca nos presentes autos e que cumpre descortinar é a de saber se a A. tem direito à retribuição que foi acordada entre as Partes no Contrato de Mediação Imobiliária celebrado entre a A. e os os RR. em 04 de abril de 2017, direito esse decorrerá da efetiva existência de um nexo causal entre a sua atividade de mediação e o evento de que depende a sua remuneração, ou seja, a celebração do contrato pretendido pelo RR., o qual se consubstanciou, a final, na compra e venda do imóvel. F. E a resposta a tal questão é necessariamente positiva, pois dúvidas não remanescem quanto ao facto da atividade da A. ter sido idoneamente determinante na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido pelos RR., ou seja, a venda do imóvel à sociedade JDD S.A. G. Efetivamente, foi a A que: vi) Desenvolveu uma atividade concreta com o objetivo de angariar um interessado para a celebração do negócio visado (compra / venda); vii) Efetivamente angariou a compradora do imóvel – a sociedade JDD S.A.; viii) Efetivamente apresentou a compradora aos RR.; ix) Promoveu amplas e profícuas negociações entre as Partes; x) Permitiu, através da sua atividade, que o negócio pretendido, a compra e venda do imóvel, viesse a ser concluído pelas Partes. H. Numa palavra, sem a atividade da A. jamais o negócio visado se teria realizado, tendo esta contribuído de forma decisiva para a respetiva conclusão, factos que lhe conferem confere o direito à remuneração contratualmente estabelecida. I. Com efeito, na sentença proferida e para o que aqui releva, o Tribunal deu como provada a seguinte factualidade. J. Os RR pretendiam proceder à venda do imóvel denominado “Vivenda J” e, com esse objetivo, celebraram com a A. em 04 de abril de 2017 um contrato de mediação imobiliária (“CMI”), nos termos do documento junto com a p.i.. K. De acordo com tal contrato, a A. obrigou-se perante os RR. a diligenciar no sentido de procurar um destinatário para a aquisição do identificado imóvel, pelo preço de €3.000.000,00. L. Tendo sido ainda estabelecido em tal contrato que, pelos serviços a prestar, os réus obrigavam-se a pagar à autora, a título de remuneração, a quantia de 5% sobre o valor final de venda, acrescida de IVA. M. A A., por si e através dos respetivos colaboradores, iniciou a procura de um destinatário para a realização do negócio visado, tendo o colaborador da autora – Sr. CI – contactado em Maio/Junho de 2017 o Senhor JAD, legal representante da sociedade JDD, S.A., com o intuito de lhe apresentar o imóvel e verificar o seu interesse na respetiva aquisição. N. Tal contacto foi motivado pelo facto da JDD, S.A. se dedicar à promoção imobiliária e por virtude da A. já ter mediado recentemente a venda àquela sociedade de três terrenos contíguos ao imóvel em apreço. O. Nessa sequência e por via de tal contacto foram então mantidas diversas conversas entre o colaborador da A. - CI - e os dois representantes da futura compradora – JDD S.A. -, sobre as características do imóvel, sendo que nessa altura - junho de 2017 – foi efetuada uma visita conjunta à propriedade com o objetivo de conhecer o estado físico e o potencial da mesma. P. Seguidamente, (final de junho / princípio de julho de 2017) foram mantidas diversas conversas entre as Partes e mediadas pelo Senhor CI, que culminaram com uma primeira reunião ocorrida nos escritórios da Recorrente em que estiveram presentes todas as Partes e em que não se logrou alcançar um consenso quanto ao preço. Q. Ainda assim, atento o interesse mantido pela JDD S.A. na aquisição do terreno, o colaborador da A. – CI – promoveu uma segunda reunião entre as Partes, ocorrida no dia no dia 14 de agosto de 2017 nos escritórios da A. com o objetivo de aproximar as respetivas vontades e de viabilizar a realização do negócio. R. Não obstante a múltipla troca de impressões e discussão mantida, as Partes não chegaram a alcançar um acordo naquela altura, acordo esse que só veio a ser alcançado posteriormente e que culminou com a aquisição do imóvel em março de 2018. S. Entretanto, o Sr. CD transmitiu ao Sr. CI que a sua representada estaria na disponibilidade de pagar 1.750.000,00€ pelo terreno, adiantando ainda que a escritura e pagamento da totalidade do preço poderia ser realizado nessa mesma semana. T. Tal proposta foi de imediato comunicada aos RR. pelo Sr. CI através de email remetido em 25 de setembro de 2017. U. Atenta tal evolução, o Sr. CI promoveu mais uma reunião entre todos os intervenientes e /ou seus representantes, a qual veio a ocorrer nos escritórios da A. no dia 09 de outubro de 2017, tendo o representante da JDD S.A., apresentado uma proposta para a aquisição do terreno de 1.950.000,00€, tendo os RR. indicado que o valor mínimo que pretendiam para a realização do negócio seria de 2.300.000,00€. V. Três dias depois de tal reunião os RR. constituíram uma sociedade anónima denominada J. SA em que eram os únicos accionistas, tendo entregado nessa mesma data à sociedade o identificado imóvel, a título de prestação gratuita e acessória, atribuindo para este efeito um valor de 2 milhões de euros. W. Já em 06 de março de 2018, por escritura publica celebrada no Notário LAB, a referida sociedade, representada pela R. C, vendeu à sociedade JDD S.A. (neste ato representada pelos seus administradores CD e JD) o identificado imóvel pelo valor de 2.125.000,00 Euros. X. E estes são efetivamente os factos com a efetiva relevância para a discussão da causa e que têm de servir de base para a elaboração da sentença, pois revelam, de forma inequívoca que, independentemente doutros factos ocorridos em momento posterior, verificou-se um nexo causal entre a atividade da Recorrente e a conclusão do negócio, Y. Com efeito, dos factos provados resulta que foi a A., por intermédio do seu colaborador CI, que: i) procurou comprador para o imóvel, ii) apresentou o Imóvel à sociedade JDD, SA, iii) apresentou a JDD, S.A. aos Recorridos, iv) promoveu e mediou as reuniões mantidas entre os Recorridos e a compradora, v) “negociou” o preço e condições de venda entre as Partes, vi) permitiu que o negócio final, ou seja, a celebração do contrato de compra e venda se concretizasse. Z. Conclui-se assim que se não fosse a atividade da Recorrente o negócio jamais se teria concretizado, verificando-se a existência de uma relação de causalidade entre os actos de promoção e mediação levados a cabo pela mediadora, ora Recorrente, e a concretização do negócio visado no CMI, factos que, conferem o direito da A. em exigir aos RR. a remuneração contratualmente prevista. AA. No contrato de mediação imobiliária celebrado entre as Partes ficou acordado que a “a mediadora obriga-se, em nome do Segundo Contratante, a procurar destinatário para a realização do negócio de: venda (…) “ BB. Dos pontos 12 a 19 dos factos provados resulta ter sido a Recorrente quem procurou, encontrou, angariou e apresentou aos Recorridos a sociedade que veio a adquirir o imóvel. CC. Compradora esta, cuja vontade em celebrar o negócio visado e celebrado a final foi unicamente determinada pela atividade empreendida pela Recorrente, DD. Pelo que foram observados todos os requisitos contratualmente estabelecidos para que o direito ao recebimento da remuneração por parte da Mediadora se verificasse. EE. As atividades descritas foram decisivas e determinantes para a realização do negócio visado e que veio a ser concluído entre as Partes em março de 2018. FF. E não se diga sequer que o negócio se concluiu por via de atos praticados entretanto por terceiros, pois, independentemente da data ou até mesmo das condições em que o negócio foi realizado, a verdade é que a vontade de contratar por parte da JDD SA. foi motivada e determinada, em exclusivo, pela atividade desenvolvida pela A. GG. Tal como resulta da própria sentença (final da página 13 e principio da página 14), os compradores eram (e são) “(…) construtores e investidores imobiliários conhecidos na zona (…)”, sendo igualmente mencionado naquele segmento da decisão que “(…) sendo o depoimento dos primeiros (JD e CD) esclarecedores de terem afinal, mantido interesse no negócio e usado de bluff quando CD disse expressamente na reunião de 09 de outubro de 2017 que não subia qualquer preço(…)” HH. Daqui se conclui toda a certeza que o bluff entretanto usado pelos representantes da Compradora decorreu da experiência dos representantes da sociedade adquirente neste tipo de negociações e teve como único intuito e objetivo melhorar as condições da aquisição do terreno. II. A sociedade adquirente nunca perdeu ou suspendeu a sua vontade em adquirir o imóvel, vontade essa que, conforme fica demonstrado, foi a consequência da atividade empreendida pela Recorrente. JJ. A negociação / determinação da oferta do preço final entretanto apresentada para a aquisição do imóvel em apreço, certamente não dependeu ou sequer foi influenciada por quem quer que seja, nomeadamente pela intervenção de qualquer mediador. KK. Ora, analisada tal factualidade e confrontando a mesma com o conteúdo do contrato de mediação imobiliária celebrado, nomeadamente a cláusula primeira e a clausula quarta, verifica-se que a Recorrente cumpriu a integralidade das obrigações a que se encontrava adstrita e das quais fazia depender o seu direito à remuneração convencionada. LL. A atividade da Recorrente foi efetivamente determinante e contribuiu de forma decisiva para a celebração do negócio e para a vontade dos compradores em adquirir o imóvel, podendo-se concluir que se não fosse a atividade desenvolvida pela Autora jamais o negócio se teria realizado. MM. Por outro lado, o facto do negócio ter sido efetivamente realizado por uma entidade vendedora diferente - a J. S.A - e por um preço superior ao que tinha sido transmitido pela Recorrente aos Recorridos na sequência da última reunião datada de 09 de outubro de 2017, em nada belisca ou torna inexigível o direito à remuneração da Autora. NN. Aliás, o hiato de tempo decorrido entre outubro (última reunião das Partes) e dezembro (data da celebração do contrato promessa) serviu apenas para que os representantes da Compradora, que sempre mantiveram interesse no negócio e fizeram bluf (cfr. pág. 14), conseguissem melhorar as respetivas condições de aquisição. OO. O próprio Tribunal a quo veio efetivamente a entender que a Autora cumpriu as obrigações a que se obrigou no contrato de mediação imobiliária, contudo, ao contrário do que seria lógico e decorrente da lei e do contrato, não concluiu pelo direito da A. em receber a respetiva remuneração, PP. Deixando assim de atender ao contratualmente estabelecido, ao que se encontra legalmente previsto, e ao sentido da jurisprudência dominante para casos análogos. QQ. A ser assim e atendendo ao disposto no contrato celebrado e ao que se encontra estatuído no art.º 19 da Lei n.º 15/2013, de 08.02, torna-se manifesto que a sentença produzida e da qual agora se recorre, fez uma incorrecta interpretação e aplicação do direito aplicável, em violação do disposto no art.º 19º da Lei nº 15/2013, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida e condenar os RR no pedido formulado. RR. Na verdade, dos factos supra elencados resulta que foi a atividade desenvolvida pela Autora que conduziu à celebração do negócio visado, sendo certo que o negócio em causa foi o resultado direto desse atividade, o que, em consequência, torna devida a remuneração acordada. SS. Pelo que, deverá assim considerar-se que a Autora cumpriu todas as obrigações da qual dependia o seu direito à remuneração convencionada e, em consequência, revogar a decisão proferida e ser a mesma substituída por outra que condene os RR. no pedido formulado. TT. Finalmente, para os devidos efeitos, dá-se aqui por reproduzido tudo o que foi alegado nos articulados apresentados, devendo este Venerando Tribunal decidir nos exactos termos requeridos na Petição Inicial apresentada. NESTES TERMOS, e nos mais de Direito que os Venerandos Juízes Desembargadores, doutamente, suprirão, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, por provado, revogando-se a decisão recorrida e, em consequência, serem os RR. condenados no pedido formulado na Petição Inicial. Os réus recorridos contra-alegaram, pugnando pela manutenção do decidido, concluindo da seguinte forma: A. A Recorrente alega que na sentença recorrida verifica-se uma errada interpretação e aplicação da lei porquanto a factualidade provada concretamente a constante dos artigos 1 a 47, deveria ter conduzido a uma decisão distinta, o que não se aceita, por falta de sustentação factual e legal. B. A Recorrente entende que o Tribunal a quo deveria ter concluído pelo seu direito ao pagamento da remuneração devida pela conclusão do negócio, o que os Recorridos não aceitam porquanto entendem que não se verificam os requisitos legais que permitem tal conclusão, resultando desde logo demonstrado, da factualidade provada e inclusivamente transcrita pela Recorrente, o principal de todo quanto alegado e contraria o requerido isto é, que “(…) as partes não lograram alcançar, naquela altura, o pretendido acordo para a compra/venda do imóvel”.(cfr. artigo 26, 38, 39 transcritos). C. Não se pode concluir, assim e desde logo, pela existência de um nexo de causalidade entre o trabalho da Recorrente e a conclusão do negócio uma vez que da matéria provada resulta precisamente a quebra desse pretendido e exigível nexo de causalidade. D. Conclui-se também que a celebração do negócio não resultou das negociações da Recorrente, tendo sido celebrado por condições distintas das por si obtidas e ainda após o reconhecimento pela própria Recorrente da falta de acordo quanto às condições concretas do negócio (cfr. artigos 38 e 39 da matéria de facto provada), e a promoção do imóvel por outras mediadoras, admissível na medida em que o contrato de mediação existente foi celebrado segundo a modalidade sem exclusividade. E. Foi assim na sequência de propostas apresentadas e obtidas pela mediadora MP, Lda. que veio a tornar-se possível a concretização do negócio. F. É absolutamente fundamental atender não apenas ao conteúdo dos contratos de mediação, mas também aos requisitos e condições para que o mesmo implique e exija o cumprimento de uma obrigação de pagamento de remuneração, o que se traduz com a devida conclusão e perfeição do negócio. G. Sendo manifesto que a Recorrente não conseguiu o acordo das partes, é evidente que não se verifica o exigível nexo de causalidade que confere o direito a remuneração do mediador, tendo andado bem o tribunal a quo, devendo por isso manter-se a decisão proferida. H. Por outro lado, o nexo de causalidade entre a atividade de mediação e o direito à remuneração não se afere pela possibilidade de realização de negócios em abstrato, devendo ser apreciado à luz do negócio concreto que veio a ser realizado, tendo ficado sobejamente demonstrado que o negócio que veio a ser efetivamente realizado assentou em pressupostos e condições completamente diferentes. I. Deste modo, a modificação superveniente das características do imóvel, a alteração da vontade das partes contratantes quanto ao preço e o próprio decurso do tempo, que se verificou relativamente ao negócio efetivamente concretizado, mediado pela Interveniente, permitem concluir que se tratou de um negócio diferente, inovatório relativamente ao negócio que se frustrou, e que ainda que tivesse por base o mesmo imóvel, não confere direito à remuneração à Autora ora Recorrente. J. Assim, em consonância ficou também demonstrado que a sociedade J, S.A. foi constituída pelos Recorridos tendo em vista, essencialmente, por se tratarem de vários comproprietários de imóvel, e terem sido juridicamente aconselhados a faze-lo por diversas vantagens, entre elas, numa lógica de planeamento fiscal e gestão de imóvel, ao que acresce o facto de outras agencias de mediação imobiliária que conheciam e promoviam o imóvel os terem aconselhado a faze-lo por alguns interessados preferirem adquiri o imóvel inserido numa sociedade” (artigos 66 e 57 da matéria de facto provada, propositadamente esta não transcrita pela recorrente!), improcedendo também nesta matéria as conclusões da Recorrente, não correspondendo à verdade o teor dos vertidos nos artigos 47 a final, onde se incluem conclusões da recorrente, de facto e de direto, na medida em que a sociedade não visou permitir à recorridos “fugir à comissão”, tanto que concretizaram tal pagamento à mediadora que efectivamente logrou obter a conclusão do negócio, por um valor (não despiciente) €175.000,00 superior ao conseguido pela Recorrente. K. Ainda que assim não se entendesse sempre teria que se atender ao facto de não poderem os Recorridos ser obrigados a pagar à Recorrente qualquer remuneração já que quem vendeu o imóvel não foram os Recorridos, mas a sociedade J, S.A. sem qualquer contrato celebrado com a Recorrente, não se tendo obrigado a nenhum pagamento. Termos sempre doutamente supridos pelo Venerando Tribunal “ad quem”, em que deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se, na íntegra, a douta sentença proferida. FUNDAMENTAÇÃO Colhidos os vistos cumpre decidir. Objeto do Recurso O objeto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (art.º 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida. Assim, em face das conclusões apresentadas pela recorrente, a questão a apreciar é a seguinte: se, em face da atuação da autora em cumprimento do contrato de mediação imobiliária, em regime de não exclusividade, celebrado com os réus, lhe assiste o direito à remuneração acordada apesar de o imóvel ter sido vendido por preço diferente, superior ao obtido pela autora, por intermédio de outra imobiliária, a quem os réus pagaram a comissão. *** FUNDAMENTAÇÃO Factualidade tida em consideração pela 1ª Instância Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1. A autora A é uma empresária em nome individual, desenvolvendo a sua atividade no sector da mediação imobiliária, detendo, para este efeito, a respetiva licença AMI com o n.º 9904, emitida pelo Instituto dos Mercados Públicos, Imobiliário e da Construção. 2. No quadro da atividade que desenvolve, a autora presta aos seus clientes, entre outros, serviços de captação, angariação e procura de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis. 3. Os réus B, c, D e E, por sua vez, eram, à data de Abril de 2017, os únicos proprietários e legítimos possuidores do prédio urbano destinado a habitação, denominado “Vivenda J”, sito na freguesia da Parede, encontrando-se a aquisição do imóvel registada em seu favor, sem determinação de parte ou direito, por dissolução da comunhão conjugal e sucessão. 4. Neste contexto, sendo intenção dos réus proceder à venda do imóvel referido em 3., entre a autora e os réus foram estabelecidas negociações no sentido desta prestar aqueles os serviços de mediação que vieram a ser referidos no contrato, para que a projetada intenção de venda efetivamente se concretizasse. 5. Em consequência de tais negociações, vieram então as partes a celebrar em 04-04-2017, um contrato de mediação imobiliária (“CMI”), nos termos do documento junto com a p.i.. 6. De acordo com o referido contrato, nomeadamente segundo as cláusulas 1.ª e 2.ª, obrigou-se autora, perante os réus, a diligenciar no sentido de procurar interessado para a aquisição do identificado imóvel, pelo preço de €3.000.000,00. 7. Adicionalmente, determinaram ainda as partes contratantes, por intermédio da respetiva cláusula 4.ª do CMI, que, pelos serviços a prestar, os réus obrigavam-se a pagar à autora, a título de remuneração, a quantia de 5% sobre o valor final de venda, acrescida de IVA. 8. Nessa mesma disposição contratual, foi ainda estabelecido que o pagamento da mencionada remuneração obedeceria às seguintes condições: i) 50% a pagar após a celebração do contrato promessa de compra e venda do imóvel; ii) 50% a pagar na data da celebração da escritura ou conclusão do negócio. 9. Foi ainda fixado pelas partes no CMI, através da cláusula 7.ª, que o respetivo prazo de vigência perduraria por 120 dias, renovando-se automaticamente os respetivos efeitos, por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes. 10. Concluído o prazo inicialmente determinado e, bem assim, as respetivas renovações sem que se tenha verificado a denúncia por qualquer uma das partes, os respectivos efeitos contratuais foram sendo sucessivamente renovados. 11. Foi neste contexto, que a autora, por si e através dos respetivos colaboradores, iniciou a prestação dos serviços a que se vinculou, ou seja, procurar destinatário para a realização do negócio visado. 12. Para este efeito, o colaborador da autora – Sr. CI – contactou em Maio/Junho de 2017 JAD, legal representante da sociedade JDD, S.A., com o intuito de lhe apresentar o imóvel. 13. E isto porque, dedicando-se a JDD, S.A. à promoção imobiliária e já tendo a autora, através do referido colaborador e filho da autora, CI, mediado recentemente a venda àquela sociedade de três terrenos contíguos ao imóvel referido em 3. (através do sistema de partilha com a sociedade de mediação imobiliária PF, Lda.), entendeu promover o referido contacto e, nessa sequência, apresentar o imóvel angariado no sentido de verificar o eventual interesse da JDD, S.A. na sua aquisição. 14. Nesta sequência, foram então mantidas algumas conversas entre CI e os dois representantes da JDD, S.A. sobre o imóvel, respetivas características e condições de aquisição, tendo nessa altura (junho de 2017), sido efetuada uma visita conjunta à propriedade no sentido de conhecer o seu estado físico e respetivas potencialidades. 15. Sucede que, apresentado o negócio e o imóvel à JDD, S.A. e apesar do interesse manifestado na sua aquisição, o respetivo representante – CD – desde logo indicou que o preço solicitado seria demasiado alto em função da viabilidade e do índice de construção que, em abstrato, se encontrava previsto no Plano Diretor Municipal de Cascais. 16. O representante da JDD, S.A. apresentava algumas reservas quanto ao preço, por virtude do facto de, em momento anterior e com a participação da autora enquanto mediadora, ter adquirido três terrenos contíguos ao imóvel por um preço inferior àquele que era agora solicitado. 17. Ainda assim, demonstrou o representante da JDD, S.A. interesse em negociar, desde que o preço fosse devidamente ajustado. 18. Foi então promovida pela autora uma primeira reunião entre CD – representante da JDD, S.A. – e a ré A – em representação dos réus –, a qual ocorreu nos escritórios da autora, sitos em Carcavelos, em data não concretizada mas situada em finais de junho ou princípios de julho de 2017. 19. Apesar de terem sido mantidas conversações entre as partes e CI e ter sido tentado aproximar as vontades dos intervenientes, verificando-se um significativo distanciamento entre o preço que a JDD, S.A. pretendia pagar e o preço que os réus pretendiam receber, não chegaram as partes a qualquer entendimento. 20. No que respeita ao imóvel, à luz do Plano Diretor Municipal de Cascais – PDM – este apresentava uma viabilidade de construção significativa – entre um índice 0,5 e 1,00 da área total do terreno – situação que, em abstrato, permitiria aí construir um ou mais edifícios, com uma área bruta total entre 2.000m2 e 4.000m2, uma vez que, àquela data, a área total do terreno indicada na caderneta e certidão predial era de 4.000m2. 21. E era precisamente tal expetativa e eventual possibilidade construtiva que determinava e influenciaria não apenas o potencial interesse de promotores construtores no negócio, mas também o respetivo preço. 22. Acresce que de toda a documentação existente, nomeadamente da descrição predial, caderneta predial e do próprio CMI celebrado (cfr. cláusula 2.ª), resultava que o imóvel dispunha “formal e documentalmente” de uma área total de terreno 4000m2 (3541m2 de área descoberta e 459m2 de área coberta). 23. Por virtude do terreno apresentar, na realidade, uma área com maior dimensão, os réus, pelos seus meios e com o auxílio de terceiros procederam à respetiva medição, o que veio a culminar na respetiva retificação “de áreas” passando este, de acordo com a nova caderneta predial emitida em setembro de 2017, a dispor de uma área total de terreno de 4561,60m2, ou seja, verificou-se uma ampliação em 561 m2. 24. Entretanto, face ao interesse que mantido por CD, enquanto representante da sociedade JDD, S.A., na aquisição do terreno, promoveu o funcionário e filho da autora, CI, uma segunda reunião entre as partes no sentido de verificar a possibilidade de encontrar uma plataforma de acordo que, na essência, viabilizasse a realização do negócio. 25. A referida reunião ocorreu efetivamente no dia 14-08-2017, nos escritórios da autora, estando presentes a própria autora, o Sr. CD, em representação da sociedade J. Dias & Dias, S.A., as rés C e D, por si e em representação dos restantes réus, o Sr. CI e ainda o Sr. CF, procurador dos réus e seu contabilista. 26. Sucede que, apesar de ampla troca de impressões e discussão mantida sobre as características e condições do negócio, a verdade é que, face à manutenção da distância existente nas posições assumidas quanto ao preço, as partes não lograram alcançar, naquela altura, o pretendido acordo para a compra / venda do imóvel. 27. Face ao que antecede, a par com as diligências encetadas junto da sociedade JDD, S.A. para promoção e venda do imóvel, o colaborador da autora CI estabeleceu ainda contactos diversos com outras entidades com o objetivo de potenciar a venda do imóvel nos termos e segundo o contrato de mediação celebrado. 28. Entretanto, no dia 07-09-2017 e na sequência de algumas comunicações que vinham sendo trocadas relativamente a propostas apresentadas por outras entidades interessadas no negócio, a ré C remeteu a CI um email contendo a nova caderneta predial e da qual já resultava a retificação de áreas do terreno, passando assim tal documento a indicar que o mesmo dispunha “formalmente” de uma área total de 4561,60 m2, ou seja, uma área superior em cerca de 12% ao que estava previamente documentado. 29. Ora, munido de tal caderneta predial, CI contactou novamente CD no sentido deste analisar esta nova realidade e de, nessa sequência, reformular a sua posição quanto ao preço a oferecer pela aquisição do imóvel. 30. Na sequência de tal conversa o mencionado CD veio, entretanto, a reformular a proposta da sua representada, tendo transmitido a CI que estaria na disponibilidade de fixar o preço em €1.750.000,00, podendo a escritura e respetivo pagamento ser realizado no decurso daquela mesma semana. 31. Tal proposta foi de imediato comunicada por CI à ré C, através de email àquela enviado no dia 25-09-2017 e cujo conteúdo observava o seguinte teor: “Cara C (…) Acabo de receber um feedback do cliente que esteve reunido nos nossos escritórios o Sr. CD, da construtora JDD que nos apresentou uma proposta de aquisição nos seguintes moldes: Oferta do valor de compra por 1.750.000€ Pagamento imediato a marcar escritura ainda esta semana (…) Aguardo resposta”. 32. Em reação a tal comunicação, a ré C responde nesse mesmo dia e pela mesma via a CI, transmitindo que: “Boa tarde CI, Recebi a sua mensagem, vou falar com os meus irmãos. Também vamos marcar uma reunião na Câmara”. 33. Sem prejuízo da proposta apresentada e sabendo CI de antemão que os réus pretendiam um valor mais elevado pelo imóvel, manteve estes diversos contactos com CD com o objetivo de lhe demonstrar que, efetivamente, para que o negócio fosse concluído seria necessário incrementar o preço proposto. 34. Em decorrência de tais conversas, transmitiu então o CD ao CI que estaria disponível para renegociar os termos da proposta apresentada, demonstrando, para o efeito, a sua vontade em reunir com os réus, sendo que nesta sequência, o CI transmitiu via email à ré C e ao procurador dos réus – CF – a vontade de CD em renegociar o respetivo valor. 35. É assim neste contexto, que em 07-10-2019 o funcionário da autora CI remete a CF – procurador dos réus para este negócio –uma mensagem via whatsapp por intermédio da qual informa que: “Bom dia amigo CF, o CD está disposto a negociar nos termos apresentados. Para tal agendei com ele reunião Segunda Feira às 10hra. no meu escritório. Preciso de confirmação da vossa Parte. Cumprimentos”. 36. Em resposta a tal mensagem, o identificado procurador dos réus responde a CI, indicando que: “Boa tarde CI. Confirmei com a B e a C, e segunda feira lá estaremos para a reunião”. 37. Na sequência de tais contactos, foi então mantida na data agendada – segunda feira, 09-10-2017 – uma reunião, nos escritórios da autora, estando presentes a própria autora, o Sr. CI, o Sr. CD, em representação da sociedade JDD, S.A., as rés B e C e ainda o Sr. CF na qualidade de procurador dos réus. 38. No decurso de tal reunião, CD, enquanto representante da JDD, S.A., apresentou então uma oferta de €1.950.000,00 para a aquisição do imóvel, sendo certo que os réus, reagindo a tal proposta, indicaram que o valor mínimo que exigiam para que o negócio se concretizasse seria de €2.300.000,00. 39. Atenta tal posição, a autora e o filho CI não insistiram mais pela concretização do negócio com este cliente e tentaram encontrar outras alternativas e potenciais clientes para que o negócio visado se concretizasse. 40. Nesse sentido, por virtude da comercialização do imóvel estar a ser dificultada pela inexistência de verdadeiras garantias quanto à respetiva viabilidade de construção, propôs o mencionado CI aos réus submeter à Câmara de Cascais um Pedido de Informação Prévia (PIP), o qual permitiria saber e garantir a efetiva edificabilidade do terreno. 41. Situação que, a verificar-se, conferiria uma maior probabilidade de venda e de incremento do respetivo preço. 42. Contudo, nenhuma resposta obteve por parte dos réus. 43. Por escritura notarial celebrada no dia 13-10-2017 no Notário PNR, os réus constituíram entre si uma sociedade comercial anónima com a firma J, S.A., designando a ré C como administradora única da sociedade. 44. Os réus eram efetivamente os únicos acionistas da identificada sociedade, sendo certo que, nos termos do artigo 9.ª do respetivo pacto social os réus obrigaram-se a entrar para a sociedade, a título de prestação acessória a realizar em espécie, a título definitivo e gratuito, o prédio que constitui objeto do CMI, no caso, o prédio referido em 3. 45. A ré C atuou neste ato notarial com uma dupla função, ou seja, atuou por si – enquanto proprietária – e ainda na qualidade de administradora única da sociedade J, S.A. 46. Através desta escritura, os réus entregaram o prédio referido em 3. à sociedade J, S.A., a título de prestação acessória gratuita, atribuindo para este efeito um valor de €2.000.000,00. 47. Por escritura notarial celebrada no dia 06-03-2018 no Notário de LAB foi declarado pela ré C, na qualidade de administradora única e em representação da J, S.A., vender o prédio referido em 3. à sociedade JDD, S.A., no acto representada por JAD e CD, na qualidade de presidente e vice-presidente e em representação da sociedade, pelo preço de €2.125.000,00, já recebido, tendo os representantes da compradora dito aceitarem esse contrato. 48. Mais declararam os outorgantes na escritura que nesse negócio houve intervenção de mediador imobiliário, no caso, a Interveniente Principal Passiva MPMI, Lda., titular de licença AMI nº XXX, tendo sido advertidos das consequências penais aplicáveis no caso de terem prestado falsas declarações. 49. O CMI celebrado entre a autora e os réus foi sem obediência ao regime da exclusividade. 50. Foram os réus e os seus mandatários, acompanhados por um arquitecto que lhes foi indicado por uma outra agência de mediação imobiliária, a LSGI, Lda., que executaram os procedimentos necessários à revisão e alteração das áreas do imóvel, bem como providenciaram pelo levantamento topográfico que foi entregue à Autoridade Tributária. 51. Na sequência da falta de acordo quanto à concretização do negócio, expressamente manifestada por CD na reunião de 09-10-2017, os réus continuaram a promover o imóvel através, nomeadamente, de outras agências imobiliárias. 52. Nessa sequência, a interveniente principal MPMI. Lda. (que integra a rede REMAX) entrou em contacto com a ré B, dando-lhe a conhecer um potencial interessado. 53. A interveniente MPMI. Lda, por email 16-10-2017 dirigido a ré B, comunicou-lhe uma proposta do seu cliente que aí identificou como JDD ou ARQ, no valor de € 1.950.000,00, com um valor variável de €150.000,00 se o índice de construção fosse igual ou superior a 0,6%. 54. Posteriormente, por intermédio do mesmo agente imobiliário da interveniente, e por email de 14-12-2017, foi formalizada uma nova proposta da JDD, S.A. fixando-a em €2.125.000,00, sendo €600.000,00 pagos no contrato-promessa de compra e venda a realizar nesse mês. 55. No seguimento da escritura, procedeu a J, S.A. ao pagamento à MPMI Lda. da comissão de intermediação no valor de €50.000,00, com IVA incluído, no seguimento da interveniente ter aceite reduzir o valor da sua comissão. 56. A sociedade J, S.A. foi constituída pelos réus tendo em vista, essencialmente, por se tratarem de vários comproprietários de imóvel, e terem sido juridicamente aconselhados a fazê-lo por diversas vantagens, entre elas, numa lógica de planeamento fiscal e gestão do imóvel. 57. A que acresce o facto de outras agências de mediação imobiliária que conheciam e promoviam o imóvel os terem aconselhado a fazê-lo por alguns dos interessados preferirem adquirir o imóvel inserido numa sociedade. * Foram considerados não provados os seguintes factos: A. O Sr. CD, mantendo o interesse na aquisição do imóvel, solicitou à representante dos réus para falar com os restantes irmãos e, nessa sequência, indicar qual o valor mínimo pelo qual venderiam o imóvel no sentido de verificar a possibilidade do negócio ser concretizado. B. Atento o impasse decorrentes de 09-10-2017, envidou ainda CI todos os esforços no sentido de encontrar um ponto de encontro entre as partes por forma a viabilizar o negócio, não logrando conseguir o pretendido acordo – pelo menos assim o pensou naquela altura. C. O Sr. CD demonstrou naquele momento alguma frustração pela não aceitação da proposta que apresentou, tendo transmitido logo após a reunião a CI que o negócio seria para “esquecer e que nunca mais queria ouvir falar deste terreno, pois não tinha qualquer interesse…”. D. Apesar de CI ter apresentado, entretanto aos réus diversas sugestões para incrementar o potencial de venda do terreno / imóvel e de ter envidado diversas tentativas de contacto telefónico, nenhuma resposta lhe foi apresentada…. mantendo-se assim, durante um período significativo, em silêncio. E. A constituição da sociedade J S.A. pelos réus teve como único e exclusivo intuito a descaracterização do cumprimento das obrigações a que a autora se vinculara perante os réus através do CMI e a consequente “eventual” aplicação do CMI à transação. Fundamentação jurídica O contrato de mediação imobiliária acha-se regulado pela Lei nº 15/2013, de 08.02, a qual entrou em vigor em 01.03.2013 (artigo 45º/1) e revogou o Decreto-Lei nº 211/2004, de 20.08. Tal diploma legal teve em vista a conformação com a disciplina constante do Decreto-Lei nº 92/2010, de 26/07, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva nº 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (artigo 1º/1). Sobre o que seja mediação imobiliária diz-se no artigo 2º/1 que consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis. No caso dos autos não se levanta qualquer dúvida quanto ao facto de autora e os réus terem celebrado um contrato de mediação imobiliária. A questão que se levanta é a de saber se a autora recorrente tem direito a receber a remuneração relativa à celebração do negócio que veio efetivamente a ser celebrado. Relativamente à remuneração do mediador imobiliário, estabelece-se o artigo 19º/1 e 2 da Lei 15/2013 que: 1 — A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. 2 — É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel. A decisão recorrida fundamentou da seguinte forma a conclusão de que não assistia à autora recorrente o direito à comissão pretendida: “Resulta, assim, que o negócio de compra e venda, que teve como antecedente um contrato-promessa de compra e venda celebrado em Dezembro de 2017, foi realizado por um valor que não corresponde ao que havia sido objecto de negociação e de proposta efectuada pela referida sociedade de €1.950.000,00, na reunião mantida com os réus e mediada pela autora, no dia 09-10-2017, sendo certo que, na altura, não foi aceite pelos réus esse valor por pretendiam que a venda se realizasse por € 2.300.000,00. Na sequência da falta de acordo quanto à concretização do negócio, expressamente manifestada por CD na reunião de 09-10-2017, os réus continuaram a promover o imóvel através, nomeadamente, de outras agências imobiliárias, nas quais se incluiu a interveniente. Esta, no seguimento de diligências que promoveu no âmbito da sua actividade de mediação, logrou a apresentação de uma proposta pela sociedade JDD, S.A., no valor de €2.125.000,00, sendo €600.000,00 pagos no contrato-promessa de compra e venda, acabando o contrato-promessa e, ulteriormente, a escritura pública de compra e venda do imóvel por ser celebrada por esse valor final. Verifica-se, assim, por um lado demonstrado ter a autora cumprido as obrigações a que se obrigou no contrato de mediação imobiliária celebrado com os réus de encontrar um interessado para o imóvel, tendo sido quem angariou o cliente, no caso a sociedade JDD, S.A., que veio, a final, a adquirir o imóvel objecto do contrato de mediação. Constata-se, contudo, que no seguimento das diligências e da mediação promovida pela autora não chegou a haver um acordo de vontades entre as partes no que se refere à celebração do negócio, designadamente, por não ter sido alcançado um acordo, nos termos do art.ºs 405.º e 406.º do CC, quanto a todos os pontos ou aspectos do negócio, em concreto, quanto ao preço, uma vez que nunca houve uma aceitação da proposta então apresentada pelo interessado que permitisse concluir pela formação de um contrato, nos termos do art.ºs 224.º e 232.º do CC. Esse acordo apenas ocorreu, no seguimento da intervenção e da mediação promovida pela mediadora interveniente nos autos que, sem prejuízo de ter ficado demonstrado não ter sido quem primeiro angariou o interessado, logrou essa aproximação de vontades, tendo sido apresentada através desta uma proposta pela JDD, S.A., num valor superior (no caso uma diferença de €175.000,00) que acabou por ser aceite pela sociedade – e já não os réus – titular do imóvel, sendo certo que mesmo em relação ao preço pretendido por estes verificou-se igualmente uma redução (no caso uma diferença igualmente de €175.000,00). Assim, sem prejuízo da comissão pedida ou cobrada por cada uma das mediadoras imobiliárias ser distinta (num caso 5% e noutro cerca de 2%), tais valores (no caso da autora, com referência ao valor de venda, a comissão seria de €106.250,00, enquanto a interveniente cobrou, já com IVA, apenas €50.000,00), só por si, não justificam a diferença de preço entre o que foi a proposta malograda e o preço que foi acordado, pelo que se conclui que, materialmente, o negócio que foi celebrado e que se consubstanciou na compra e venda entre as sociedades J, S.A. e JDD, S.A. do imóvel em causa nos autos, não foi o mesmo que era visado e que foi objecto da mediação desenvolvida pela autora. A circunstância do negócio celebrado não corresponder ao que foi mediado pela autora e em relação ao qual se demonstrou não ter chegado a haver acordo, e tendo presente que no caso não existia qualquer regime de exclusividade na mediação, leva-nos a concluir que, não obstante a prática de actos de mediação pela autora e o cumprimento da obrigação de meios a que se vinculara, não se verifica a condição ou álea de que dependia o reconhecimento do direito à remuneração, porquanto, estando, nos termos que constam do contrato e que coincidem com o disposto no art.º 19.º da Lei n.º 15/2013, de 08-02, definido que a remuneração apenas é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado, não se tendo concretizado o negócio nos termos em que foram propostos aquando da intervenção da autora como mediadora não se verificam os pressupostos para o reconhecimento do direito à comissão. Com efeito, não tendo havido essa coincidência ou, pelo menos, uma cabal demonstração de se tratar do mesmo negócio, em termos de contexto temporal e quanto às condições essenciais do negócio, como foi o caso no que se refere à aproximação e acordo quanto ao preço de venda, e provando-se, inclusive, ter havido um desinteresse das partes na celebração do negócio pelos valores indicados na última reunião mediada pela autora, que levaram, inclusive, a autora a procurar novas vias de melhorar o preço, algo que só foi conseguido pela interveniente, não se pode concluir como demonstrado o nexo de causalidade entre a actividade do mediador e a celebração do negócio”. Quanto à questão de não ser reconhecido à autora o direito a parte da comissão que foi paga à interveniente, na sentença recorrida disse-se o seguinte: “Ora, no caso presente, tendo já concluído que em relação à actividade desenvolvida pela autora essa relação de causalidade não se verifica – atendendo às diferenças entre o negócio visado pela actividade de mediação desenvolvida pela autora, nomeadamente, em relação ao preço, e o negócio que foi efectivamente concretizado – consideramos que não se mostra lógico, por esta via da repartição ou fundado na concausalidade, reconhecer um direito a parte da remuneração, designadamente, e eventualmente afectando a comissão já paga à interveniente que foi chamada aos autos e que nada consta saber da prévia actuação da autora. Com efeito, apenas se concluíssemos que ambas as mediadoras concorreram causalmente para a celebração do mesmo negócio é que se poderia ajuizar da possibilidade de repartição da comissão, sendo certo que, tendo nós concluído que essa causalidade não existia em relação à actuação da autora, não se mostra coerente nem juridicamente defensável que se possa considerar existir a concausalidade invocada pela autora na medida em que esta, apesar de ter na base uma actividade de angariação e mediação, tem sempre no outro extremo da relação de causalidade de ter a celebração do negócio visado e aqui, conforme concluímos, o negócio não foi o mesmo”. Consideramos que a decisão recorrida está bem fundamentada e não merece reparo, estando em consonância com a doutrina e a jurisprudência que respeitam à questão em causa e que é a de saber em que termos tem o mediador imobiliário direito à remuneração, vulgo comissão, pela atividade que desenvolveu em cumprimento do contrato de mediação. Efetivamente, a doutrina e a jurisprudência fazem apelo à verificação de um nexo de causalidade adequada entre a atividade de mediação e a celebração do contrato visado, devendo o mediador provar, na ação que intenta com vista a obter o pagamento da remuneração, ter realizado os atos necessários e determinantes para a concretização do negócio, em especial nos casos em que, como no caso sub juditio, está afastada a presunção que pode resultar do facto de ter gozado do regime de exclusividade. No acórdão desta Relação (e desta 6ª secção, Desembargadora Ana de Azeredo Coelho) de 25.02.2021[1], decidiu-se o seguinte, assim sumariado: “II) A remuneração é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, importando estabelecer um nexo causal entre a actividade do Autor e a concretização do negócio, ou seja, se o comprador efectivo chegou ao negócio por via da actividade desenvolvida pelo mediador. III) Embora oriunda de um ramo diverso, a doutrina da causalidade adequada oferece o enquadramento para a apreciação do nexo causal que seja a um tempo suficiente robusto para não se reconduzir à condição sine qua non, conseguindo do mesmo passo não desprezar a actividade que, isolada ou em conjunto com outras, possibilitou o negócio. IV) Assim, não é necessária a continuidade do nexo causal e também não é indispensável que o mediador tenha colaborado até ao final das negociações, bastando que tenha conduzido as partes ao ponto em que a conclusão do contrato surge como possível, nomeadamente pela continuidade do interesse contratual gerado com intervenção do mediador”. E Maria de Fátima Ribeiro[2] entende que “a verificação da existência de um nexo de causalidade entre a actividade desenvolvida pelo mediador e a conclusão do contrato parece ser o requisito que mais dúvidas coloca, quando de trata de determinar a existência do direito do mediador à remuneração. Desde logo, cabe apurar em que consiste e como se identifica esse nexo causal. O critério determinante deverá ser o da ligação psicológica entre a actividade do mediador e a vontade de o terceiro concluir um contrato com o comitente - e a afirmação dessa ligação não deve ser posta em causa pelo lapso temporal entretanto decorrido entre o exercício da actividade e a conclusão do contrato, nem pelos factos ocorridos nesse período de tempo, v. g., a intervenção de um novo mediador. Cabe salientar que não está em causa o contributo do mediador para a formação da vontade do comitente. Ou seja, o facto de o mediador ter aconselhado o comitente, determinando a celebração do contrato, não é suficiente para fazer nascer o direito à remuneração; para tal, será sempre necessário que a vontade do terceiro tenha sido determinada pela actuação do mediador. Salienta-se que este entendimento não é, contudo, pacífico: para alguns Autores, a mera indicação de um terceiro interessado na celebração do negócio em causa - que venha, efectivamente, a celebrar o negócio -, nos termos pretendidos, pode justificar o direito à remuneração, a menos que do contrato se retire que o mediador se obrigou a negociar o contrato pretendido pelo comitente. Parece é que, neste caso, o mediador deverá sempre estabelecer o contacto entre o comitente e o terceiro interessado [“pôr em contacto” as partes do eventual futuro negócio], para que, depois, estes prossigam eventualmente as necessárias negociações. Dada a essencialidade da verificação deste nexo causal entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio para a constituição do direito à remuneração do mediador, este não terá direito à remuneração se o negócio pretendido pelo comitente vier a ser concluído, mas com um terceiro que não foi “angariado” pelo mediador, não tendo a respectiva actividade de mediação sido causal na conclusão deste negócio [de modo a integrar-se de forma idoneamente determinada na cadeia dos factos que lhe deram origem. E é, naturalmente, ao mediador que cabe fazer a prova deste facto, por se tratar de um facto constitutivo do seu direito”. E finalmente, temos a nossa mais alta instância judicial, o STJ, que no acórdão de 23.04.2020[3], decidiu o seguinte, assim sumariado: “IV - No contrato de mediação imobiliária, a atividade do mediador consiste essencialmente na angariação de interessados para a celebração do negócio visado, podendo a obrigação assumida pelo mediador revestir a natureza de uma obrigação de resultado, se a obrigação do mediador consistir na obtenção de um interessado, ou de meios, se tal obrigação for apenas a de diligenciar no sentido de encontrar interessados no contrato desejado pelo cliente. V - O cumprimento desta obrigação de obter/procurar interessado na realização do negócio visado pelo contrato de mediação, por si só, não atribui ao mediador o direito à remuneração contratualmente prevista, sendo necessário que a atividade do mediador tenha contribuído para a concretização do negócio em causa, ou seja, que se verifique um nexo causal entre a sua atividade e o contrato a final celebrado, aferindo-se o cumprimento do mediador pela existência desse nexo de causalidade adequada. VI - Incumbe, assim, à mediadora, nos termos do art.º 342.º, n.º 1, do CC, o ónus de alegação e prova dos elementos constitutivos do direito à remuneração e do nexo de causalidade adequada entre a atividade do mediador e a celebração do negócio visado pelo cliente”. Como se constata do acima citado, a doutrina e a jurisprudência recorrem, para determinar o direito do mediador à remuneração acordada, à teoria da causalidade adequada para estabelecer a relação entre a atividade da mediadora e o negócio que, a final, foi efetivamente celebrado. Tal teoria, que é essencialmente do âmbito do direito penal e, no âmbito do direito civil, da responsabilidade civil, tem várias formulações doutrinárias, mas que podemos definir da seguinte forma: existirá nexo de causalidade adequada entre um evento e a respetiva consequência danosa se os danos forem previsíveis para qualquer pessoa de conhecimentos médios colocada na situação ex ante à ação, segundo o juízo de prognose póstuma. Aplicando essa teoria à atividade de mediação imobiliária, para que haja tal nexo de causalidade tem de haver efetiva atividade da mediadora e essa atividade tem de ser causalmente adequada ao resultado que se veio a verificar, no sentido de esse resultado ser previsível segundo o referido juízo de prognose póstuma. Mas esta teoria, que formulamos de maneira genérica, tem várias nuances, nomeadamente quando se verifica o que se designa por quebra do nexo de causalidade. Essa situação ocorre quando estamos perante um evento que possa ser causalmente adequado a um determinado resultado, mas, por circunstância posteriores, imprevisíveis e alheias ao autor do evento, esse resultado vem a verificar-se em virtude de uma outra causa. É o caso típico de alguém que dá uma facada a outrem, este é transportado para o hospital numa ambulância e, nesse percurso, ocorre um acidente que provoca ferimentos na pessoa que havia sido agredida, os quais vêm a determinar a sua morte. Nesta situação, mesmo que a facada seja causa adequada da morte, o resultado não é imputável ao seu autor. Como se referiu supra, no contrato de mediação e para determinar o direito à remuneração, é necessário que a atividade do mediador seja causa adequada do negócio que, no final, vier a ser efetivamente concretizado. No caso em apreço temos que a autora desenvolveu toda uma atividade tendente à celebração do negócio com a entidade com quem o mesmo veio a ser concretizado. No entanto, verifica-se que no caso concreto, por um lado, as negociações promovidas pela autora goraram-se, pois as partes não chegaram a acordo quanto ao preço, e, por outro lado, ocorreram factos relevantes que levam a considerar que existiu uma quebra do nexo de causalidade entre a atividade da autora e o negócio que foi celebrado, que leva à necessariamente a que tenhamos de concluir, como se fez na decisão recorrida, que o negócio não pode ser imputado à atividade da autora. Tais factos são os seguintes: - o negócio foi concluído por mais 175.000€ do que o valor mais elevado que havia sido obtido pela autora; - para a concretização do mesmo pelo valor de 2.125.000€ foram determinantes os documentos que os réus, por sua iniciativa e labor, obtiveram, tendo nomeadamente executado os procedimentos necessários à revisão e alteração das áreas do imóvel, bem como providenciaram pelo levantamento topográfico que foi entregue à Autoridade Tributária; - o comprador contactou autonomamente a interveniente MPMI, Lda., que veio a contactar os réus e a encetar negociações entre eles e o comprador com vista à concretização do negócio. - nessas negociações foram relevantes os novos documentos obtidos pelos réus respeitantes à certificação das áreas do imóvel; - foi por causa dessas negociações e ainda pelo facto de a interveniente ter aceitado reduzir a sua comissão que os réus e o comprador aceitaram celebrar o negócio pelo valor de 2.125.000€. Para os réus, a diferença monetária entre aquilo que foi obtido pela autora e o negócio que veio a ser efetuado ascende a cerca de 255.000€ (175.000€ do acréscimo do preço e o restante pela redução da comissão da mediadora[4]), valor que, como é evidente, não é de forma alguma despiciendo, muito antes pelo contrário. Como vemos, existiram circunstâncias relevantíssimas que levaram à conclusão do negócio pela forma como ele veio a ser efetivamente celebrado, tendo a interveniente tido um papel fundamental em todo este processo, em especial por ter aceitado reduzir a sua comissão, coisa que a autora nem sequer congeminou fazer para facilitar o negócio na altura em que o seu colaborador interveio nas negociações. Faltou à autora aquele rasgo negocial que permitiria o consenso entre as partes. Quem teve esse rasgo foi a interveniente, que, com os documentos que os réus obtiveram, conseguiu a almejada aproximação de valores, contribuindo ela própria para esse desiderato através da redução da sua remuneração, o que acabou por fazer toda diferença. Acresce que se verifica que a autora não cumpriu as obrigações que para ela resultavam da cl. 5ª do contrato de mediação. Esta cláusula estabelece que “1- No âmbito do presente contrato, a mediadora, na qualidade de mandatária sem representação, obriga-se a prestar os serviços conducentes à obtenção da documentação e de informação necessários à concretização do negócio visado pela mediação. 2- A remuneração pelos serviços considera-se incluída no montante acordado na cláusula 4ª e só será devida nos termos aí descritos”. Como se constata dos factos provados, houve documentos relevantes – e das circunstâncias das negociações intermediadas pelo colaborador da autora resultava que este sabia que tais documentos eram importantes para o comprador – que foram obtidos pelos réus, sem qualquer tipo de intervenção da autora e após as negociações se terem gorado. Cabe agora perguntar como teste último da referida quebra do nexo de causalidade: o negócio teria acontecido, mesmo que não tivesse existido a prévia atividade da autora? A resposta só pode ser afirmativa, pois o comprador surgiu aos réus por via de outra imobiliária, o que era perfeitamente legítimo uma vez que o contrato de mediação não previa a exclusividade, e o que se seguiu foi uma negociação que teve contornos distintos, que foram decisivos para a formação vontade mútua de concretização do negócio, em especial por causa dos novos documentos obtidos pelos réus e pela conduta da imobiliária, que reduziu a sua remuneração, de forma acentuada, a fim de facilitar a venda. Está, pois, verificada a quebra do nexo de causalidade entre a atividade da autora e o negócio que veio a ser efetuado, que não só é diferente daquele que havia sido obtido pela autora, como também resultou, de forma determinante, de circunstâncias alheias à atividade da autora. Repare-se que a situação em apreço é completamente distinta daquela a que se referem os acórdãos que foram citados pela autora, em especial nos que acima se referiram. Nesses acórdãos, na situação de facto sub juditio não existiu nada de relevante entre a atividade da mediadora e a concretização do negócio. O que ocorreu foi simplesmente a continuação das negociações entre as partes, em regra sem intervenção de qualquer outra empresa de mediação imobiliária, tendentes à conclusão do negócio, em especial no que respeita ao preço final. Nessas situações é evidente que não houve a tal quebra do nexo de causalidade entre a atividade da mediadora e o negócio a final celebrado, sendo devida a comissão acordada. Neste caso não foi, como acima se disse, isso que aconteceu. Quanto à possibilidade de a autora partilhar a comissão que foi paga à interveniente, concordamos na íntegra com o afirmado na sentença. O negócio que foi celebrado é totalmente imputável à interveniente, pelo que remunerar a autora por tal negócio constituiria um autêntico enriquecimento sem causa. As conclusões de recurso da recorrente improcedem in totum uma vez que se centram exclusivamente na conduta da autora e, para além do mais, fazem uma errada apreciação dessa conduta, e desvalorizam de forma incompreensível a conduta da interveniente. Não podemos, de todo, concordar com o afirmado nas conclusões Y, Z, CC, EE, FF e LL. Ao contrário do aí afirmado, o negócio que concretamente veio a ser celebrado não é imputável à atividade da autora pelas razões acima expostas. Acresce que a recorrente invoca nas alegações uma realidade de facto que não só não se provou, como se provou o contrário. Não se provou que tivesse existido “bluff” por parte do comprador quando, na sequência de se ter gorado o negócio nos termos promovidos pela autora, disse que já não estava interessado na compra do imóvel. Provou-se antes que, efetivamente, não houve interesse em contratar naqueles termos, quer pelo comprador, quer pelos réus, que não estavam interessados na melhor proposta que foi obtida pela atividade da autora, e que o interesse no negócio renasceu por via das novas condições que foram criadas e relativamente às quais a autora é alheia. O recurso deve, pois, ser considerado totalmente improcedente, confirmando-se na íntegra a decisão recorrida. *** DECISÃO Face ao exposto, acordam os Juízes que compõem este coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o recurso improcedente. Custas pela recorrente (art.º 527º/1 e 2 do CPC). Notifique. Lisboa, 24 de Novembro de 2022 Jorge Almeida Esteves Teresa Soares Octávia Viegas _______________________________________________________ [1] Proferido no procº nº 28111/17.6T8.LSB.L1-6, in www.dgsi.pt e citado pela recorrente. [2] In O contrato de mediação, Scientia Ivridica, n.º 331 (2013), pp. 78-79. [3] Proferido no procº nº 308/16.3T8PTM.E1.S2, in www.dgsi.pt e citado na decisão recorrida. [4] Os réus pagaram à interveniente a quantia de 50.000€, com IVA incluído, ao passo que teriam de pagar à autora, nos termos do contrato de mediação e pelo mesmo negócio, a quantia de 130.687,5€ (106.250€ acrescido de 23% de IVA). |