Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ARLINDO CRUA | ||
Descritores: | SECÇÃO ESPECIALIZADA DE EXECUÇÃO INDEFERIMENTO LIMINAR DEVER DE GESTÃO PROCESSUAL PRINCÍPIO DE ADEQUAÇÃO FORMAL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/22/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I – Estando-se perante decisão executável, proferida pelos tribunais portugueses, o princípio geral decorrente do nº. 1, do art.º 85º, do Cód. de Processo Civil, impõe que o requerimento executivo inicial seja apresentado no processo (declarativo) em que aquela foi prolatada, correndo a execução nos próprios autos declarativos, ainda que tramitada de forma autónoma; II - todavia, existindo, nos termos da lei da organização judiciária, secção especializada de execução naquela área onde foi proferida a sentença exequenda, o processo já não prosseguirá nos autos declarativos, devendo este remeter cópia da sentença exequenda, do requerimento executivo inicial e dos eventuais documentos que o acompanhem àquela secção especializada – o nº. 2, do mesmo art.º 85º; III - caso o exequente, de forma indevida, apresente o requerimento executivo inicial na secção especializada de execução, ao invés de apresentá-lo no processo onde foi prolatada a sentença exequenda, em desrespeito do estatuído no nº. 1, do art.º 85º, tal não configura excepção dilatória inominada insuprível, conducente ao indeferimento liminar do requerimento inicial executivo; IV - o que se justifica, entre outras razões, pela circunstância daquele art.º 85º não tratar de questões de competência ou de repartição da função jurisdicional, mas antes de determinação do processo no qual a execução deve ser tramitada; V - acresce que aquela solução, desde logo, revela-se extremada e maculada por um formalismo excessivo, pois, sendo certo que o prescrito no citado nº. 1, do art.º 85º tem por subjacentes razões de economia/celeridade processual estabelecidas a favor do exequente, sempre seria destituído de lógica jurídica que, apresentando este o requerimento executivo directamente no tribunal de execução (que é, efectivamente, o competente para a acção executiva), tal revertesse contra si; VI - por outro lado, na procura de uma solução ou compromisso equilibrado, e no apelo ao Dever de Gestão Processual e Princípio da Adequação Formal – artigos 6º e 547º, ambos do Cód. de Processo Civil -, bem como ao Princípio da Economia Processual, antes se impõe e justifica que o tribunal da secção especializada de execução deva prosseguir com esta, em virtude da sua natural competência ; VII – - sem prejuízo de, no cumprimento do nº. 2, do mesmo normativo, dever remeter ao processo em que a sentença exequenda foi prolatada o requerimento inicial executivo apresentado pelo exequente (e documentos que o acompanhem), serem retiradas cópias deste requerimento (e documentos acompanhantes) e da sentença exequenda, que passarão a integrar a execução, propriamente dita, prosseguindo com os autos executivos (cuja pendência deve ser comunicada aos autos declarativos onde a sentença exequenda foi proferida). Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do art.º 663º, do Cód. de Processo Civil | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]: I – RELATÓRIO 1 – M…, residente na Rua do …, instaurou, em 09/10/2014, acção executiva, sob a forma de processo ordinário, contra: - J… e A…, residentes na …, peticionando o pagamento da quantia total liquidada de 237.587,25€, correspondente ao capital de 197.989,38€, acrescido de juros moratórios no montante de 39.597,87€. Consta do requerimento executivo o seguinte: “Por sentença proferida em 13.7.2009, no Proc. nº 5555/06.3TVLSB, do 8º Juízo Cível de Lisboa 3ª secção, transitada em julgado em 14.9.2009, foi considerado provado nomeadamente o seguinte: a) que por escritura de trespasse de 17.12.1982, o estabelecimento comercial instalado no nº … ou loja direita, da …, em Lisboa, inscrito na matriz da freguesia do Coração de Jesus sob o art.º 545, foi trespassado a favor de J… e M..., em comum e partes iguais para ambos; b) que M… cedeu a exploração do referido estabelecimento a Y…, mediante o pagamento anual de €31.800 mais IVA; c) que as despesas com rendas, água, electricidade, seguros e ordenados do pessoal foram pagos por M... Como J… e M… eram comproprietários do estabelecimento e o mesmo era gerido por M…, na ausência do J…, este tinha direito a que fossem prestadas contas, o que sucedeu. Assim, o tribunal considerou que as contas tinham sido prestadas e que as receitas, no período compreendido entre 1983 e 2006, foram de €121.564,43 e as despesas de €517.543,20, ou seja, foi apurado um saldo a favor devedor, a favor de M…, no valor de €395.978,77. Como o estabelecimento pertencia a ambos, em partes iguais, deve J… a M…, a sua metade, isto é, a quantia de €197.989,38. A este valor acrescem juros de mora, dos últimos cinco anos, no valor anual de € 7.919,57, à taxa legal de 4% ao ano, nos termos dos art.ºs 559º, 804º, 805º e 310º d) do Código Civil, o que perfaz um total de juros de €39.597,87. A sentença constitui título executivo, nos termos do art.ºs 703º e 704º do Cód. Proc. Civil”. Consta, ainda, na exposição dos factos que “os executados são casados no regime da comunhão de adquiridos, pelo que a mulher é co-responsável pelas dívidas em que incorreu o marido, no exercício do comércio e em benefício do casal, nos termos do art.º 1691º d) do Código Civil”. 2 – Em 30/10/2014, o Sr. Agente de Execução apresentou requerimento dirigido ao Sr., Juiz de Execução, com o seguinte teor: “PAULO GALVÃO TELES, Agente de Execução, designado nos autos acima referenciados, expõe e requer a V. Exa., o seguinte: O Processo acima identificado para pagamento de quantia certa foi distribuído na espécie " Execução Ordinária". A referida execução tem por base um título executivo que é uma sentença. Nos termos do artigo 550º, nº 2 alínea, a) do Código de Processo Civil, a espécie é sumária. Assim, requer a V. Exa. se digne ordenar o que tiver por conveniente. P. Deferimento”. 3 – Após a prática de vários actos executivos, em 05/12/2022, foi proferida a seguinte DECISÃO: “Conforme informação supra esta execução foi instaurada directamente nos Juízos de Execução de Lisboa, quando se pretende executar uma sentença. Dispõe o artº. 85º, nº 1, do Cód. Proc. Civil: «Na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha, entretanto, subido em recurso, casos em que corre no traslado». A execução da sentença nos próprios autos da ação declarativa (nos termos estabelecidos nos artigos 85.º e 626.º) foi uma das inovações da reforma do processo civil de 2013. Agora, a execução de sentença corre, em regra, no próprio processo onde foi proferida (artigo 85º, nº 1); tal não sucederá, se existir tribunal com competência especializada de execução (artigo 85º, nº 2). Todavia, mesmo no caso acabado de referir, determina o artigo 85.º, n.º 2 que a execução é instaurada no processo onde foi proferida a sentença que se pretende executar e só em momento ulterior passará a ser tramitada pelo tribunal com competência especializada de execução. Estabelece o art.º 1º, nº 2, al. b), da Portaria nº 282/2013, de 29/08, que o exequente deve enviar/entregar o “requerimento de execução da decisão judicial condenatória constante do anexo II da presente portaria, da qual faz parte integrante”. No art.º 2º, desse diploma legal, estatui-se sobre os termos de apresentação eletrónica: “1 - O requerimento executivo é apresentado por mandatário judicial através do preenchimento e submissão do formulário eletrónico de requerimento executivo constante do sítio eletrónico http://citius.tribunaisnet.mj.pt, nos termos do artigo 132.º do Código de Processo Civil e de acordo com os procedimentos e instruções aí constantes, ao qual se anexam os documentos que o devem acompanhar”. No art.º 4º da referida Portaria regulam-se os “Termos de apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória” do seguinte modo: “1 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória é efetuada nos termos previstos para as demais peças processuais no Código de Processo Civil e na portaria que regula a tramitação eletrónica dos processos judiciais, com as especificidades previstas nos números seguintes. 2 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória por via eletrónica deve ser efetuada através do preenchimento do formulário específico constante no sistema informático de suporte à atividade dos tribunais. 3 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória em suporte físico é dirigida ao tribunal que proferiu a decisão em 1.ª instância, e efetuada por qualquer dos meios legalmente previstos, utilizando o modelo de requerimento que consta do anexo II do presente diploma. 4 - O exequente deve indicar, no requerimento de execução da decisão judicial condenatória, a decisão judicial que pretende executar, estando dispensado de juntar cópia ou certidão da mesma. 5 - À execução da decisão judicial condenatória aplica--se, com as necessárias adaptações, o disposto nas secções anteriores, considerando -se o requerimento de execução de decisão judicial condenatória apresentado apenas na data de pagamento das quantias previstas no n.º 6 do artigo 724.º do Código de Processo Civil, quando sejam devidas. 6 - Quando a parte pretenda executar pedidos com finalidade diversa, é designado apenas um agente de execução para a realização das diligências de execução”. Além disso, não é admissível a sanação do erro cometido pelo Exequente, pois tal frustraria o novo regime jurídico estabelecido para a execução de sentença, o objetivo estabelecido pelo legislador de que a sentença seja executada no próprio processo (ao menos num momento inicial), por forma a vincar a continuidade entre a ação declarativa e a execução e a sublinhar a importância do caso julgado. Em síntese, ainda que na Comarca de Lisboa existam Secções de Execução (i. e., tribunal de competência especializada executiva), face ao estabelecido no novo Código de Processo Civil, não é legalmente admissível que uma ação executiva baseada em sentença seja diretamente instaurada numa Secção de Execução, ao arrepio do estabelecido no artigo 85º do referido Código. Tal situação configura uma exceção dilatória inominada insuprível que conduz ao indeferimento liminar do requerimento executivo (Vid. Neste sentido Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, in “A Acção Executiva Anotada e Comentada”, 2ª ed., anotação ao art.º 85º, p. 55). Pelo exposto, rejeita-se o requerimento executivo (artigos 85º, 576º, nºs 1 e 2, 577º, 578º, 626º, 726º, nº 2, alínea b) e 734º, do Código de Processo Civil). Condena-se o Exequente a pagar as custas (artigo 527º, nº 1, do Código de Processo Civil). Notifique, e, transitado em julgado, conclua nos apensos”. 3 – Inconformada com o decidido, a Exequente interpôs recurso de apelação, em 19/01/2023, por referência à decisão prolatada. Apresentou, em conformidade, a Recorrente as seguintes CONCLUSÕES: “A) O presente Recurso é interposto nos termos dos art.ºs 637º, 638º nº 1 e 7, 639º, 644º nº 1 a) e 645º nº 1 al) a), do CPC e como tal, através da leitura das disposições combinadas dos art.ºs 638º, nº 1 e 644º, nº 1, alínea a), é de 30 dias o prazo do recurso, pelo que a presente apelação é tempestiva, não sendo claramente enquadrável nos termos do artigo 644 n.º 2 o prazo de 15 dias. B) Como tal, configura-se como uma decisão final, natureza que determina o seu enquadramento na alínea a) do nº 1 do art.º 644º e a subtrai do âmbito da previsão do nº 2 da mesma norma onde se contemplam apenas decisões interlocutórias, sendo em relação a estas – e às proferidas em processos urgentes - que o legislador, no art.º 638º, nº 1, ao fazer as remissões que dele constam, o prazo de 30 dias que fixou, como regra, para a interposição de recurso. C) Assim, o presente recurso de apelação é tempestivo, pelo que a revista não pode deixar de proceder. D) Na sua sentença o Tribunal a quo entendeu que nos termos do artigo 85º n. º1 do CPC, na execução de decisão proferida por tribunais portugueses o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha entretanto subido em recurso, caso em que corre no traslado. E) Entendendo ainda que do n.º 2 deste preceito resulta ainda que, quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com carácter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que a acompanham. F) Considerando a fim, que face ao estabelecido no Código de Processo Civil, não é legalmente admissível que uma acção executiva baseada em sentença condenatória seja diretamente instaurada numa Secção de Execução, contrariando o estatuído, expressamente, no art.º 85º n.ºs 1 e 2 do CPC. G) Determinando ainda que, esta exceção dilatória inominada, que se afigura insuprível, determina o indeferimento liminar do requerimento executivo, rejeitando-o, portanto, nos termos dos artigos 85.º, 576.º, n.º 1 e 2, 577.º, 578.º, 626.º, 726.º n.º 2 al. b) e 734.º do Código de Processo Civil. H) A Exequente, ora Recorrente, deduziu ação executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo sumário, contra os Executados, dando como título executivo uma sentença proferida no processo n.º 5555/06.3TVLSB, que correu termos no 8º Juízo Cível de Lisboa. I) O referido processo seguiu os seus termos, para além do próprio requerimento executivo, desde embargos de executado, embargos de terceiro, várias penhoras dos agentes de execução, tendo mais recentemente sido requerido com sucesso pela Exequente o Pedido de substituição do Agente de Execução. J) Ou seja, nos presentes autos verificaram-se vários incidentes, que se traduzem em esforço, trabalho e dedicação de todos os intervenientes, não se compreendendo em primeiro lugar a decisão do Tribunal a quo, que desmerece os anos (8!) em que o presente processo tramitou no referido Juízo. K) E para o que nos interessa, os embargos de executado (2232/14.5T8LSB-B) onde foi proferida a sentença do Tribunal a quo, são especialmente relevantes no que agora se discute, já que nos mesmos os Executados deduziram embargos de em que referem, em súmula, que a sentença em causa não é título executivo e que a executada é parte ilegítima na ação. L) Já a Exequente, defendeu a natureza da sentença dada à execução como título executivo e contestou a ilegitimidade suscitada em face da natureza comercial da dívida e do proveito comum do casal. M) Considerando-se habilitado para o efeito, e fazendo uso do disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, o Tribunal proferiu decisão de fundo onde, muito embora considere que uma sentença de prestação de contas é título executivo, conclui que neste caso não o é porque não foi deduzida reconvenção pela aqui exequente e ali Ré, no âmbito daquela ação especial concluindo, assim, pela falta de título executivo e julgando prejudicada a apreciação da suscitada ilegitimidade da executada/embargante. N) Ou seja, desde logo, o presente Tribunal considerou ser competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia, referindo ainda que “Inexistem nulidades que anulem todo o processo.”, crf - sentença de 10/01/2017. O) No entanto, o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu douto aresto com o n.º de Processo 2232/14.5T8LSB-B.L1, chegou à conclusão contrária, que de facto a sentença dada à execução era e é título executivo, revogou portanto a decisão proferida pelo Tribunal a Quo, ordenando e bem que a execução prossiga os seus termos seus termos processuais até final. P) No, entanto e como não poderia deixar de ser, não pode a Recorrente deixar de relembrar o Tribunal a Quo da sentença suprarreferida, já que o mesmo considerou-se a si próprio competente, referindo claramente a inexistência de qualquer nulidade da qual o processo enfermasse. Q) Tendo o mesmo transitado em julgado, sem que nenhuma parte pusesse em questão o referido trânsito R) Como tal não pode de todo o mesmo Tribunal, passados quase 6 anos, pronunciar-se favoravelmente no que diz respeito a uma exceção dilatória, quando o deveria ter feito, caso entendesse na sentença de 2017. S) Não o fez, tendo decidido de forma contrária, ou seja, que os presentes autos não padeciam de qualquer enfermidade que significasse a nulidade do processo. T) Naturalmente, não pode deixar de ser mencionado o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, do Supremo Tribunal de Justiça, de 27/11/1991, com o n.º de Processo 002964 ao decidir que; “O despacho a conhecer de determinada questão relativa à competência em razão da matéria do tribunal, não sendo objeto de recurso, constitui caso julgado em relação à questão concreta de competência que nela tenha sido decidida.” U) De facto, a Exequente recorreu da referida sentença, no entanto nada foi mencionado no que diz respeito à competência ou nulidade de que os presentes autos padecem, logo é claro que a mesma transitou em julgado. V) Ora, no caso presente, o Tribunal a Quo decidiu que era competente e que os autos não padeciam de qualquer nulidade, e desta decisão não foi interposto recurso pelas por qualquer uma das partes. X) Assim, tendo havido decisão expressa pelo Tribunal, que não foi impugnada, a decisão transitou em julgado, pelo que não pode, agora, ser posta em causa. Y) Desta forma, a pretensão do Tribunal a Quo não pode ser atendida, já que devia ter tido em conta o que foi decidido pelo mesmo em 2017. Z) Verificando-se de forma gritante dois pressupostos, desde logo a exceção de caso Julgado, que impunha ao Tribunal uma decisão que não considerasse a nulidade dos presentes casos. AA) E a conduta displicente do mesmo, que nem sequer se informou minimamente do estado dos autos, e da forma como os mesmos foram conduzidos ao longo dos anos. AB) Assim, deve o Tribunal ad quem, revogar a sentença recorrida, julgando-se verificada a exceção de caso julgado no que concerne ao conteúdo da mesma, ao declarar que os presentes autos padeceriam de uma exceção dilatória inominada insuprível que conduz ao indeferimento liminar do requerimento executivo. AC) No que não se concede, e só em dever de patrocínio se equacione, caso o Tribunal considere que a presente exceção de caso julgado não se verifica, a argumentação e leitura ao Artigo 85.º do CPC também deve ser desconsiderada, ao considerar que vedado estava à exequente intentar a execução prima facie dirigida diretamente a Secção Especializada de Execução, antes obrigada estava a exequente em apresentar o requerimento executivo no processo em que foi proferida a sentença/título executivo. AD) Começando pela análise da Lei adjetiva aplicável, máxime pelos art.ºs 703º e 85º, ambos do CPC, recorda-se que de acordo com o primeiro podem à Execução servir de base as sentenças condenatórias, nos termos da alínea a), do nº 1, do art.º 703º, sendo que, a tal ocorrer, rezam os nºs 1 e 2, do segundo dispositivo que: Artigo 85.º Competência para a execução fundada em sentença 1 - Na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, excepto quando o processo tenha, entretanto, subido em recurso, casos em que corre no traslado 2 - Quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com carácter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham 3 – (…). AE) Por sua vez, decorre dos artºs 64º, alínea o), 90º,nº1, alínea g), e Mapa III, anexo, do Regime da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais aprovado pelo DL n.º 49/2014, de 27 de Março, que regulamenta a Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), que sendo criado o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, dele faz parte a Secção de Instância de Execução de Lisboa, integrando ele juízos de execução, quais juízos de competência especializada art.ºs 80º,nº2, 81º,nº1 e 3,alínea j) e 129º,nº1, todos da Lei da Organização do Sistema Judiciário. AF) Devendo in casu, os atos processuais a praticar por escrito pelas partes ser apresentados em juízo por transmissão eletrónica de dados , nos termos da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto cfr. art.ºs 132º e 144, nº 1, ambos do CPC , e regulamentando a Portaria nº 282/2013, de 29/08, diversos aspetos das ações executivas cíveis, designadamente no tocante à apresentação do requerimento executivo e aos termos de apresentação do requerimento nas execuções de decisão judicial condenatória, art.ºs 1º e 2º, da Portaria nº 282/2013, de 29/08, determina o último diploma referido que o requerimento de execução da decisão judicial condenatória obedecerá ao modelo constante do anexo II da portaria e da qual faz parte integrante. AG) E nos presentes autos os intervenientes no processo agiram de acordo com estes pressupostos, de forma a que os autos prosseguissem ( e assim prosseguiram), durante 8 anos. AH) E de facto, a Recorrente, devendo intentar a execução através de requerimento executivo apresentado no processo em que foi a sentença exequenda proferida, não o fez, cfr. art.º 85º, nº 1, do CPC. AI) Mas aqui chegados, será que, e no que respeita à prolação da decisão recorrida, AJ) Seria a mesma inevitável (exceção dilatória inominada insuprível que conduz ao indeferimento liminar do requerimento executivo), não existindo outra forma/meio – menos extremado no momento da decisão do Tribunal a quo? AK) Parece-nos manifestamente que sim. AL) Estando o presente fundamento na esteira doutrinária de José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, 4ª edição, Almedina, págs. 193 e 194. AM) Assim, certo é que o artigo 85.º do Código de Processo Civil, não trata, em qualquer um dos seus dois primeiros números, de questões de competência, que é como quem diz, da repartição da função jurisdicional por diferentes tribunais. AN) Do que trata é de determinar o processo no qual a execução é tramitada e o que deve ser feito quando competente para a execução seja um juízo diverso daquele onde a decisão exequenda foi proferida, especializado em execução. AO) De facto , a decisão a quo, ao enveredar pela qualificação do vicio/erro da Recorrente como consubstanciando forçosamente uma exceção dilatória, não suprível, lança mão de uma solução no mínimo extremada, nada consentânea com a própria ratio legis do art.º 85º, nº 1, do CPC, máxime quando é o requerimento executivo apresentado/dirigido diretamente pelo credor a juízo de execução, e o qual é, para todos os efeitos e nos termos da lei de organização judiciária, o competente para a execução, desconsiderando totalmente os oitos anos em que os autos estiveram dispostos e fizeram sentir os seus termos no presente Juízo, sem que a suposta exceção dilatória fosse sequer mencionada. AP) Como tal, a decisão sem dúvida drástica do Tribunal a quo peca também por não ter em conta o princípio basilar do Dever de Gestão Processual AQ) Não foi também tido em conta o princípio da Adequação Formal. AR) Posto isto, de facto o Tribunal a quo deveria ter apreciado os presentes autos de forma bem diversa, tendo em conta a própria evolução do das normas jurídicas e interpretação das mesmas para um pendor atual e de acordo com a realidade dos factos, e , bem assim, para a atribuição de um protagonismo ao inquisitório em detrimento do dispositivo, à verdade material em desfavor da meramente formal, em suma, tudo em razão do fim de se alcançar um efetivo e verdadeiro “processo justo.”, nos termos dos artigos 6.º e 547.º do Código de Processo Civil; ARTº 6º Dever de Gestão Processual Cumpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir activamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável. ARTº 547º Adequação Formal O juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo. AS) Como tal, salvo melhor entendimento a Recorrente tem absoluta razão ao referir que a decisão do Tribunal a Quo de indeferir liminarmente o presente requerimento executivo não seria de todo inevitável, devendo sim ordenar que a execução prosseguisse em razão do disposto no nº 2, do art.º 85º do CPC”. Conclui, no sentido da procedência do recurso e, consequentemente, “revogada a decisão recorrida, prosseguindo a execução os seus termos mediante remessaº ao processo em que a sentença que constitui título executivo foi proferida, extraindo desta as competentes cópias, as quais passarão a integrar a execução propriamente dita, prosseguindo os seus termos até final”. 4 – Não constam dos autos terem sido apresentadas contra-alegações. 5 – O recurso foi admitido por despacho datado de 22/03/2023, como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo. 6 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir. ** II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Prescrevem os nºs. 1 e 2, do art.º 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que: “1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”. Por sua vez, na esteira do prescrito no n.º 4 do art.º 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação da Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pela Recorrente Exequente, delimitado pelo teor das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se em aferir o seguinte: => Verifica-se a excepção dilatória de caso julgado relativamente à sentença datada de 10/01/2017? – Conclusões D) a AB); => na execução de sentença, tendo o requerimento executivo sido apresentado directamente na secção especializada de execução, quando o deveria ter sido no processo onde foi proferida a sentença exequenda, tal configura excepção dilatória inominada insuprível, conducente ao indeferimento liminar do requerimento executivo? ou, em alternativa, => na adopção do dever de gestão processual e do princípio da adequação formal, justificar-se-á a adopção de diferenciada solução processual, capaz de aproveitar os actos processuais praticados ? – Conclusões AC) a AS). ** III - FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A factualidade a considerar é a que resulta do iter processual supra exposto. ** B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A - Da excepção dilatória de caso julgado Referencia a Exequente Apelante ter deduzido “ação executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo sumário, contra os Executados, dando como título executivo uma sentença proferida no processo n.º 5555/06.3TVLSB, que correu termos no 8º Juízo Cível de Lisboa”. Acrescenta que tal processo executivo seguiu os seus ulteriores termos, para além do próprio requerimento inicial, “desde embargos de executado, embargos de terceiro, várias penhoras dos agentes de execução, tendo mais recentemente sido requerido com sucesso pela Exequente o Pedido de substituição do Agente de Execução”, verificando-se, deste modo, “vários incidentes, que se traduzem em esforço, trabalho e dedicação de todos os intervenientes, não se compreendendo em primeiro lugar a decisão do Tribunal a quo, que desmerece os anos (8!) em que o presente processo tramitou no referido Juízo”. Nomeadamente, nos embargos de executado, onde foi prolatada a decisão recorrida, “os Executados deduziram embargos de em que referem, em súmula, que a sentença em causa não é título executivo e que a executada é parte ilegítima na ação”, tendo a Exequente defendido “a natureza da sentença dada à execução como título executivo e contestou a ilegitimidade suscitada em face da natureza comercial da dívida e do proveito comum do casal”. Ora, considerando-se “habilitado para o efeito, e fazendo uso do disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, o Tribunal proferiu decisão de fundo onde, muito embora considere que uma sentença de prestação de contas é título executivo, conclui que neste caso não o é porque não foi deduzida reconvenção pela aqui exequente e ali Ré, no âmbito daquela ação especial concluindo, assim, pela falta de título executivo e julgando prejudicada a apreciação da suscitada ilegitimidade da executada/embargante”. Assim, e desde logo, “o presente Tribunal considerou ser competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia, referindo ainda que “Inexistem nulidades que anulem todo o processo.”, crf - sentença de 10/01/2017”. Todavia, “o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu douto aresto com o n.º de Processo 2232/14.5T8LSB-B.L1, chegou à conclusão contrária, que de facto a sentença dada à execução era e é título executivo, revogou portanto a decisão proferida pelo Tribunal a Quo, ordenando e bem que a execução prossiga os seus termos seus termos processuais até final”. Deste modo, não pode a ora Recorrente “deixar de relembrar o Tribunal a Quo da sentença suprarreferida, já que o mesmo considerou-se a si próprio competente, referindo claramente a inexistência de qualquer nulidade da qual o processo enfermasse”. Ou seja, tal decisão transitou em julgado, pelo que não pode o mesmo Tribunal, “passados quase 6 anos, pronunciar-se favoravelmente no que diz respeito a uma exceção dilatória, quando o deveria ter feito, caso entendesse na sentença de 2017”. O que não fez, isto é, decidiu “de forma contrária, ou seja, que os presentes autos não padeciam de qualquer enfermidade que significasse a nulidade do processo”. Não podendo, ainda, deixar de mencionar-se “o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, do Supremo Tribunal de Justiça, de 27/11/1991, com o n.º de Processo 002964 ao decidir que; “O despacho a conhecer de determinada questão relativa à competência em razão da matéria do tribunal, não sendo objeto de recurso, constitui caso julgado em relação à questão concreta de competência que nela tenha sido decidida.”. Ora, a Exequente recorreu efetivamente de tal decisão, mas nada mencionou relativamente à competência ou nulidade que os presentes autos eventualmente padecessem, pelo que, nesta parte, a mesma transitou em julgado, ou seja, na parte em que o “Tribunal a Quo decidiu que era competente e que os autos não padeciam de qualquer nulidade, e desta decisão não foi interposto recurso pelas por qualquer uma das partes”, não podendo ser a mesma agora colocada em causa. Desta forma, considera verificarem-se dois diferenciados pressupostos: ”desde logo a exceção de caso Julgado, que impunha ao Tribunal uma decisão que não considerasse a nulidade dos presentes casos” e, por outro, uma “conduta displicente do mesmo, que nem sequer se informou minimamente do estado dos autos, e da forma como os mesmos foram conduzidos ao longo dos anos”. Pelo que, conclui, deve o presente Tribunal “revogar a sentença recorrida, julgando-se verificada a exceção de caso julgado no que concerne ao conteúdo da mesma, ao declarar que os presentes autos padeceriam de uma exceção dilatória inominada insuprível que conduz ao indeferimento liminar do requerimento executivo”. Apreciando: No âmbito dos efeitos da sentença, e prevendo acerca do valor da sentença transitada em julgado, estatui o nº. 1, do art.º 619º, do Cód. de Processo Civil, que “transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702º”. Prescrevendo acerca do caso julgado formal, refere o art.º 620º, do mesmo diploma, que: “1 – As sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo. 2 – Excluem-se do disposto no número anterior os despachos previstos no artigo 630º”. Acresce o art.º 621º, acerca do alcance do caso julgado, que “a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique”. Tornando-se a sentença definitiva, por já não ser susceptível de recurso, impugnação ou reclamação, “forma-se então o caso julgado, só formal (com efeitos apenas no processo concreto) quando a sentença tenha sido de absolvição da instância e simultaneamente formal e material (com efeitos dentro e fora do processo) quando tenha sido de mérito”. Traduzindo-se a sentença como decisão de mérito, acerca da relação material em controvérsia, produz, fora do processo o efeito de caso julgado material: “a conformação das situações jurídicas substantivas por ela reconhecidas como constituídas impõe-se, com referência à data da sentença, nos planos substantivo e processual (….), distinguindo-se, neste, o efeito negativo da inadmissibilidade duma segunda ação (proibição de repetição: excepção de caso julgado) e o efeito positivo da constituição da decisão proferida em pressuposto indiscutível de outras decisões de mérito (proibição de contradição: autoridade de caso julgado)”. Assim, com “o caso julgado condenatório precludem definitivamente todos os meios de defesa invocáveis contra a pretensão deduzida”, e com “o caso julgado absolutório precludem todas as razões de sustentação da pretensão deduzida, que não encontraram acolhimento na decisão proferida. Fala-se de efeito preclusivo do caso julgado para caracterizar esta inadmissibilidade de qualquer ulterior indagação sobre a relação material controvertida”. O que é aplicável não só à sentença proferida com julgamento da matéria de facto, como ainda ao próprio saneador-sentença [2]. Transitada em julgado a sentença, ou seja, passando a mesma a deter o carácter ou qualidade de imutabilidade, a sua força obrigatória “desdobra-se numa dupla eficácia, designada por efeito negativo do caso julgado e efeito positivo do caso julgado”. Assim, “o efeito negativo do caso julgado consiste numa proibição de repetição de nova decisão sobre a mesma pretensão, por via da exceção dilatória de caso julgado, regulada em especial nos artigos 577º, al. i), segunda parte, 580º e 581º. Classicamente corresponde-lhe o brocardo non bis in idem. O efeito positivo ou autoridade do caso consiste na vinculação das partes e do tribunal a uma decisão anterior (…). Classicamente, corresponde-lhe o brocardo judicata pro veritate habetur”. Deste modo, enquanto “o efeito negativo do caso julgado leva a que apenas uma decisão possa ser produzida sobre um mesmo objecto processual, mediante a exclusão do poder jurisdicional para a produção de uma segunda decisão, o efeito positivo admite a produção de decisões de mérito sobre objectos processuais materialmente conexos, na condição da prevalência do sentido decisório da primeira decisão” [3]. Nas palavras de Teixeira de Sousa [4], “a exceção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior”. Pelo que, “quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de ação, a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição do processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior”. Pelo que, respeitada a identidade dos sujeitos, “a autoridade de caso julgado decorrente de decisão proferida em anterior ação pode funcionar independentemente da verificação do restante condicionalismo de que depende a exceção de caso julgado (art.º 581º), em situações em que a questão anteriormente decidida não possa voltar a ser discutida entre os mesmos sujeitos (…), abarcando, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado (…). Seguro é que tal mecanismo, que visa evitar contradições decisórias entre os mesmos sujeitos, não poderá ser invocado em ação que corra entre sujeitos diversos na perspectiva da sua qualidade jurídica” [5]. Conforme enunciámos, por oposição ao caso julgado material, o caso julgado formal “restringe-se às decisões que apreciam matéria de direito adjectivo, produzindo efeitos limitados ao próprio processo (…). Despacho que recai sobre a relação processual é todo aquele que, em qualquer momento do processo, aprecia e decide uma questão que não seja de mérito” [6], pelo que não é apenas “o que se pronuncia sobre os elementos subjectivos e objectivos da instância (…) e a regularidade da sua constituição (…), mas também todo aquele que, em qualquer momento do processo, decide uma questão que não é de mérito” [7]. Exposto o presente enquadramento, avancemos, desde já, que a Apelante parece incorrer em erro de avaliação e entendimento, ao aludir à existência da aludida excepção dilatória de caso julgado. Com efeito, tal como a mesma afirme e reconhece, no aludido saneador sentença prolatado em 10/01/2017 (posteriormente revogado), no que concerne à aludida competência do tribunal e consignação de inexistência de nulidades, apenas foi efectuado um juízo de genérica apreciação ou ponderação, e não a apreciação em concreto de determinada excepção, nomeadamente no que respeita à (in)competência do tribunal, ou nulidade. Ademais, conforme melhor analisaremos infra, a suscitada e apreciada questão de excepção dilatória inominada, fonte do recurso ora em apreciação, também não se reporta a qualquer situação ou norma de competência, pois não está em equação a determinação do tribunal onde deverá tramitar a acção, mas antes a determinação do processo no qual a execução deverá ser tramitada. O que sempre frustraria a argumentação de que já teria ocorrido conhecimento, com efeitos de caso julgado formal, da excepção de incompetência do tribunal. Efectivamente, conforme se aduz no douto Acórdão da RG de 27/04/2017 – Relatora: Maria dos Anjos Nogueira, Processo nº. 1752/12.0TJVNF.G1, in www.dgsi.pt -, “a contradição de caso julgados, seja material ou simplesmente formal, exige uma relação de identidade – ou ao menos de prejudicialidade – entre o objecto das decisões passadas em julgado, Dito doutro modo: é necessário – no tocante especificamente aos casos julgados formais – que as duas decisões, proferidas no mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual (art.º 625 nº 2 do CPC)”. Pelo que, importa, desde logo, ter em conta “que “o despacho saneador não constitui caso julgado formal quando se limita à declaração genérica sobre a inexistência de excepções ou nulidades, sem efectuar uma apreciação concreta destas” – cfr. Ac. do STJ de 11.5.99, in CJ/Acs. do STJ, Ano VII, tomo II, 199, pág. 85. A contrario, constituirá caso julgado formal, o despacho que, ao declarar as partes legítimas, o faz pronunciando-se sobre este determinado ponto concreto, aduzindo fundamentação relativa a tal – cfr. Ac. STJ de 6.7.2000, in CJ Acs STJ , Ano VIII, tomo II, 2000, pág. 143. Assim, no que concerne à declaração tabelar ou genérica sobre os pressupostos processuais, tem sido entendimento pacífico que esta não faz caso julgado formal, de resto como decorre do artigo 595.º, n.º 3, primeira parte, do Código de Processo Civil: No caso previsto na alínea a) do n.º 1, o despacho constitui, logo que transite, caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas. Na verdade, quando o tribunal se limita a uma mera enunciação de pressupostos processuais não conhece de qualquer questão concreta e determinada; portanto não podem considerar-se resolvidas e arrumadas as questões que tenham sido suscitadas nos autos; essas questões ficam em aberto. Como tal, não há caso julgado sobre elas – neste sentido José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, anotado, Vol. III, 3.ª ed., Coimbra, p. 200; cfr. também RLJ 82.º, pp. 112 e 347; no mesmo sentido, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1979. p. 185, e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra, 1985, p. 393 e ss. Já Lopes do Rego, in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. I, Coimbra, 2004, p. 442, diz, a este respeito, o seguinte: “estabelece-se claramente que o despacho saneador (artigo 510.º, n.º 3) só adquire força de caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas – generalizando-se deste modo a solução que, em sede de competência, constava do artigo 104.º, n.º 2, do CPC, na redacção anterior à reforma; e caducando, consequentemente a solução afirmada no âmbito da legitimidade, pelo Assento do STJ de 1/2/63”. De resto, não se conhece nenhuma nota dissonante na doutrina e mesmo na jurisprudência quanto a esta questão” (sublinhado nosso). Em idêntico sentido, mencionemos, ainda, o douto aresto do mesmo Tribunal da RG de 15/12/2022 – Relatora: Maria Cristina Cerdeira, Processo nº. 2978/20.9T8VNF.G1, in www.dgsi.pt -, no qual se exarou que “vem sendo pacificamente defendido na doutrina e na jurisprudência que se o juiz referir genericamente que se verificam determinados pressupostos, dos constantes no artº. 577º do NCPC (por ex., a competência, a capacidade, a legitimidade ou os requisitos da coligação do artº. 36º do mesmo Código) ou outros (por ex., os que tornam admissível a reconvenção, ou o pedido genérico: respectivamente, art.ºs 266º, nº. 2 e 556º, nº. 1 do NCPC), o despacho saneador não constitui, nessa parte, caso julgado formal, pelo que continua a ser possível a apreciação duma questão concreta de que resulte que o pressuposto genericamente referido afinal não ocorre ou que há nulidade (cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., pág. 657). Ou seja, o caso julgado apenas se forma relativamente a questões ou excepções dilatórias que tenham sido concretamente apreciadas e nos limites dessa apreciação, não valendo como tal a mera declaração genérica sobre a ausência de alguma ou da generalidade das excepções dilatórias (v.g. “o tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia; as partes são dotadas de personalidade e de capacidade judiciárias e são legítimas; nada obsta à apreciação do mérito da causa …”) – cfr. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pág. 696; acórdão da RL de 10/09/2020, proc. nº. 2671/14.1T8LSB, disponível em www.dgsi.pt) (sublinhado nosso). Ora, in casu, tendo-se o Tribunal, no saneador sentença proferido, limitado a uma genérica declaração quanto à sua competência, bem como quanto à inexistência de nulidades susceptíveis de anularem todo o processado, tal despacho não constitui, nessa parte, caso julgado formal, contrariamente ao ora sustentado pela Recorrente, pelo que sempre seria possível efectuar num outro momento processual – como efectivamente foi - a concreta apreciação quanto à existência da aludida excepção dilatória inominada. Ou seja, e concretizando, aquela declaração genérica (e ainda que, reiteramos, in casu não se trate de uma questão atinente à (in)competência do tribunal) não vinculou o subsequente julgador, no sentido de que o labor judicante deste não se pode ter como prejudicado por aquele despacho tabelar, genérico e formal. Donde, sem carência de ulterior argumentação, improcede, neste segmento, a pretensão recursória suscitada. B - Da excepção dilatória inominada conducente ao indeferimento liminar do requerimento executivo Entende, ainda, a Recorrente dever ser desconsiderada a leitura efectuada ao art.º 85º, do Cód. de Processo Civil. Assim após transcrevê-lo e referenciar decorrer “dos art.ºs 64º, alínea o), 90º,nº1, alínea g), e Mapa III, anexo, do Regime da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais aprovado pelo DL n.º 49/2014, de 27 de Março, que regulamenta a Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), que sendo criado o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, dele faz parte a Secção de Instância de Execução de Lisboa, integrando ele juízos de execução, quais juízos de competência especializada artºs 80º,nº2, 81º,nº1 e 3,alínea j) e 129º,nº1, todos da Lei da Organização do Sistema Judiciário”, bem como dever, no caso concreto ser os actos processuais praticados “por escrito pelas partes ser apresentados em juízo por transmissão eletrónica de dados , nos termos da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto cfr. art.ºs 132º e 144, nº 1, ambos do CPC , e regulamentando a Portaria nº 282/2013, de 29/08, diversos aspetos das ações executivas cíveis, designadamente no tocante à apresentação do requerimento executivo e aos termos de apresentação do requerimento nas execuções de decisão judicial condenatória, art.ºs 1º e 2º, da Portaria nº 282/2013, de 29/08, determina o último diploma referido que o requerimento de execução da decisão judicial condenatória obedecerá ao modelo constante do anexo II da portaria e da qual faz parte integrante”, reconhece que “a Recorrente, devendo intentar a execução através de requerimento executivo apresentado no processo em que foi a sentença exequenda proferida, não o fez, cfr. art.º 85º, nº 1 do CPC”. Todavia, questiona se a decisão proferida seria inevitável, ou se existia uma outra forma ou meio, menos extremado, de resolver tal desvio processual, o que responde de forma afirmativa, pois, desde logo, entende ser certo “que o artigo 85.º do Código de Processo Civil, não trata, em qualquer um dos seus dois primeiros números, de questões de competência, que é como quem diz, da repartição da função jurisdicional por diferentes tribunais”, antes procedendo à determinação do “processo no qual a execução é tramitada e o que deve ser feito quando competente para a execução seja um juízo diverso daquele onde a decisão exequenda foi proferida, especializado em execução”. Assim considera que a decisão apelada, “ao enveredar pela qualificação do vicio/erro da Recorrente como consubstanciando forçosamente uma exceção dilatória, não suprível, lança mão de uma solução no mínimo extremada, nada consentânea com a própria ratio legis do art.º 85º, nº 1 do CPC, máxime quando é o requerimento executivo apresentado/dirigido diretamente pelo credor a juízo de execução, e o qual é, para todos os efeitos e nos termos da lei de organização judiciária, o competente para a execução, desconsiderando totalmente os oitos anos em que os autos estiveram dispostos e fizeram sentir os seus termos no presente Juízo, sem que a suposta exceção dilatória fosse sequer mencionada”. Pelo que, aduz, tal decisão acabou por não ter “em conta o princípio basilar do Dever de Gestão Processual”, bem como “o princípio da Adequação Formal”, invocando o prescrito nos artigos 6º e 547º, ambos do Cód. de Processo Civil. Donde, conclui, “a decisão do Tribunal a Quo de indeferir liminarmente o presente requerimento executivo não seria de todo inevitável, devendo sim ordenar que a execução prosseguisse em razão do disposto no nº 2, do artº 85º do CPC”. Analisemos. B1 – Do enquadramento legislativo Configurando-se a sentença condenatória como título executivo – art.º 703º, nº. 1, alín. a), do Cód. de Processo Civil -, estatuem os nºs. 1 e 2, do art.º 85º, do mesmo diploma, sob a epígrafe competência para a execução fundada em sentença, que: “1 - Na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha, entretanto, subido em recurso, casos em que corre no traslado. 2 - Quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham”. Por sua vez, a Portaria nº. 282/2013, de 29/08, que veio regulamentar vários aspectos das acções executivas cíveis, entre os quais os termos de apresentação do requerimento nas execuções de decisão judicial condenatória – a alínea b), do nº. 1, do art.º 1º -, referencia, no que especificamente a estas concerne, que: “1 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória é efetuada nos termos previstos para as demais peças processuais no Código de Processo Civil e na portaria que regula a tramitação eletrónica dos processos judiciais, com as especificidades previstas nos números seguintes. 2 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória por via eletrónica deve ser efetuada através do preenchimento do formulário específico constante no sistema informático de suporte à atividade dos tribunais. 3 - A apresentação do requerimento de execução da decisão judicial condenatória em suporte físico é dirigida ao tribunal que proferiu a decisão em 1.ª instância, e efetuada por qualquer dos meios legalmente previstos, utilizando o modelo de requerimento que consta do anexo II do presente diploma. 4 - O exequente deve indicar, no requerimento de execução da decisão judicial condenatória, a decisão judicial que pretende executar, estando dispensado de juntar cópia ou certidão da mesma. 5 - À execução da decisão judicial condenatória aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nas secções anteriores, considerando-se o requerimento de execução de decisão judicial condenatória apresentado apenas na data de pagamento das quantias previstas no n.º 6 do artigo 724.º do Código de Processo Civil, quando sejam devidas. 6 - Quando a parte pretenda executar pedidos com finalidade diversa, é designado apenas um agente de execução para a realização das diligências de execução” – o artº. 4º. Acrescenta, ainda, o nº. 1, do art.º 2º, do mesmo diploma, prevendo acerca dos termos de apresentação electrónica, que “o requerimento executivo é apresentado por mandatário judicial através do preenchimento e submissão do formulário eletrónico de requerimento executivo constante do sítio eletrónico http://citius.tribunaisnet.mj.pt, nos termos do artigo 132.º do Código de Processo Civil e de acordo com os procedimentos e instruções aí constantes, ao qual se anexam os documentos que o devem acompanhar”. Ora, sendo este o quadro legal elementar, e reportando-nos à questão essencial em apreciação no caso sub judice, qual a solução legalmente pertinente para as situações que que o exequente, pretendendo instaurar execução fundada em sentença, instaura-a directamente na secção especializada de execução, segundo os termos da lei de organização judiciária, em vez de apresentar o requerimento executivo no processo em que a sentença exequenda foi prolatada ? Vejamos. B2 – Do enquadramento doutrinário Referenciam José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, 4ª Edição, Almedina, pág. 193 e 194 – que o nº. 1, do art.º 85º, do CPC, “não encerra uma norma de competência. Respeita à determinação, já não do tribunal, mas sim do processo no qual a execução é tramitada, estabelecendo a regra de que o é nos autos da ação em que a decisão (na 1ª. Instância) foi proferida”. Por sua vez, o nº. 2, do mesmo normativo, “também não trata da competência para a execução, mas da remessa, ao tribunal competente para a execução de sentença, de certos elementos (o que se justifica pela circunstância de não ter sido esse o tribunal que proferiu a sentença), tendo, porém, implícitas as determinações das normas da LOSJ que se ocupam da competência para a execução da decisão (sentença ou outra de conteúdo condenatório: art.ºs 703-1-a e 705-1) proferida por tribunal português em acção proposta na 1.ª instância (art.ºs 111-2, 112-3, 113-2, 128-3, 129, 130-2-c e 131, todos da LOSJ)”. Assim, tais execuções “são instauradas nos autos da ação declarativa ou no translado (n.º 1), mas subsequentemente processadas, em separado, no juízo de execução (n.º 2). No entanto, tal como as que são processadas no tribunal que proferiu a decisão exequenda, são consideradas como «executadas no próprio processo» para o efeito do art.º 550-2-a”. Acrescentam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa – Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, pág. 111 – que “nos casos em que, de acordo com a LOSJ, a competência para a execução seja atribuída a um tribunal diverso daquele que proferiu a sentença (juízo especializado de execução), exigindo-se, embora, que o impulso processual ocorra nos autos declarativos, a lei determina que se extraia cópia da sentença, do requerimento executivo e dos eventuais documentos que o acompanham, sendo o processo de execução autuado com base nesse expediente”. Acrescentam tratar-se tal imposição “de um pormenor de natureza formal, pouco relevante para a eficácia da ação executiva, servindo essencialmente para traduzir a ideia de que à sentença condenatória se segue, sem hiatos, a execução coerciva, à semelhança do que já esteve previsto relativamente às ações de despejo cuja fase executiva surgia enxertada na ação declarativa”. Confirmando tal entendimento, referencia Marco Carvalho Gonçalves – Lições de Processo Civil Executivo, 3ª Edição, Almedina, 2019, pág. 196 – que na situação descrita no nº. 2 do art.º 85º, “a secretaria do tribunal onde correu ou corre termos o processo declarativo deve, com carácter de urgência, remeter uma cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham para o juízo de execução competente”. O que vale por dizer “que o requerimento executivo deve ser apresentado junto do tribunal onde correu ou corre termos o processo declarativo e não diretamente junto do juízo de execução que será competente para a tramitação da execução, pois que caberá ao tribunal onde foi proferida a sentença remeter ao juízo de execução a cópia da sentença, do requerimento executivo e dos documentos que o acompanham”. Por sua vez, Rui Pinto – Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, pág. 231 a 233 – referencia que o nº. 1, do art.º 85º traduz a “expressão de algum sincretismo processual na execução de sentença proferida por tribunais nacionais, por meio da dedução do requerimento executivo nos próprios autos da ação declarativa”. Pelo que, na concretização de tal sincretismo, “o artigo reconduz a determinação da competência territorial na execução de sentença nacional a um princípio de coincidência: a sentença nacional é sempre executada na comarca onde foi proferida”, sendo tramitada “de forma autónoma, no mesmo tribunal proferiu a condenação, ao qual o requerimento executivo deverá ser dirigido, segundo os requisitos do artigo 4º da Portaria n.º 282/2013, de 29 de Agosto, incluindo o modelo do respectivo Anexo II. Será esse tribunal que tramitará a execução até ao seu termo, salvo se existir juízo de execução na respectiva comarca. Efetivamente, se existir juízo de execução na comarca (cf. artigos 81º., n.º 3, al. j) e 129º da Lei nº. 62/2013, de 26 de agosto e o Mapa III anexo ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março) o n.º 2 dita que a execução é remetida para o juízo de execução (...). Portanto, começando por ser executada nos próprios autos (n.º 1 do artigo 85º), depois da remessa para o juízo de execução a sentença passa a ser executada em separado”. Todavia, caso o exequente deduza “diretamente o requerimento executivo logo no juízo de execução, tal não obsta à sua receção pela secretaria e à admissão pelo tribunal. Efetivamente, nem o juízo de execução é incompetente para tramitar a execução, nem a irregularidade constitui nulidade processual, à luz do critério do artigo 195º, nº. 1”. Pelo que, após criticar o juízo defendido no aresto da RP de 01/02/2016 (de que falaremos infra), acrescenta que “a utilização dos instrumentos «clássicos» de interpretação das normas (cf. artigo 9.º CC) sempre levaria a concluir que o fito do «sincretismo» assente nos artigos 85.º n.º 1 e 626º n.º 1 é a economia processual a favor do exequente, e, não, a favor da lei ; além do mais, a colocação direta da execução de sentença no juízo de execução não causa dano, processual ou substantivo, ao executado” (sublinhado nosso). Por fim, em sentido diferenciado, tal como citado na decisão sob sindicância, pronunciaram-se Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo – A Acção Executiva Anotada e Comentada, pág. 57 e 58 -, referindo que “devendo a sentença ser executada nos próprios autos, vem sucedendo, com alguma frequência, que o exequente, em desrespeito pelo estatuído no nº. 1, em vez de remeter o requerimento executivo para a ação declarativa onde foi proferida a sentença, intenta a ação executiva diretamente na secção de execução. Poder-se-á argumentar que, existindo na comarca secção com competência especializada executiva, o requerimento executivo poderia ser aproveitado, convidando-se apenas o exequente a integrar no processo os elementos em falta”. Todavia, acrescentam que “aceitar a referida prática, seria frustrar os objetivos legislativos no sentido de assegurar que a execução da sentença corra sempre nos próprios autos, transmitindo a ideia de que não se trata de um novo processo, dessa forma procurando assegurar o respeito pelo caso julgado”. Donde, concluem entenderem que se “trata de uma exceção dilatória inominada não suprível, devendo o requerimento executivo ser liminarmente indeferido”. B3 – Do enquadramento jurisprudencial Perfilhando entendimento idêntico ao sustentado na decisão recorrida, podemos enunciar os seguintes arestos (todos in www.dgsi.pt ): - da RP de 01/02/2016 – Relator: Caimoto Jácome, Processo nº. 12613/15.1T8PRT.P1 -, que referencia impor “o nº 2, do art.º 85º, do CPC, que a execução de sentença é instaurada no processo onde foi proferida a decisão judicial que se pretende executar e apenas em momento ulterior passará a ser tramitada pelo tribunal com competência especializada de execução”. Todavia, indagando previamente se tal lapso pode ser colmatado, “requerendo ao Tribunal onde foi proferido a sentença dada à execução a cópia da mesma, com a indicação da data do respectivo trânsito em julgado”, acaba por concluir que “o formalismo sequencial decorrente do estatuído no art.º 85º, nºs 1 e 2, do CPC, não pode ser, no caso concreto, postergado com apelo aos enunciados princípios da oficiosidade (inquisitório), da cooperação e adequação formal. Na verdade, o princípio da economia processual ou o da prevalência das razões de mérito sobre as razões de forma não foi levado ao extremo de conduzir à sanação de nulidades processuais ou de excepções dilatórias insupríveis. Acresce um outro, e não menos importante, motivo, qual seja o apontado na decisão recorrida no sentido de que o errado (ou desadequado) tratamento informático da informação relativa aos processos poderá conduzir à inoperacionalidade do sistema informático citius. Deve, em suma, manter-se o despacho de indeferimento liminar do requerimento executivo atento o disposto nos art.ºs 85º, 576º, nºs 1 e 2, 577º, 578º, 626º, 726º, nº 2, alínea b), do CPC” ; - desta Relação de Lisboa de 07/06/2018 – Relatora: Octávia Viegas, Processo nº. 13487/17.3T8LSB.L1-8 -, no qual se sumariou que “baseando-se a execução em sentença de homologação de pagamento proferida em processo judicial é nesse processo que deve ser apresentado o requerimento executivo (art.º 85, nº1, do CPC Sendo apresentado requerimento executivo nos juízos de execução acompanhado de certidão da decisão, há lugar à sua rejeição”. O presente aresto, no seu juízo fundante, trata fundamentalmente o normativo do artº. 85º do Cód. de Processo Civil como uma questão de definição de competência, e não de determinação do processo no qual a execução é tramitada. Apreciando o enquadramento do art.º 85º, do CPC, mas sem definir claramente uma posição quanto à questão em controvérsia, podemos referenciar os seguintes arestos (in www.dgsi.pt ): - da RP de 27/06/2018 – Relatora: Maria Cecília Agante, Processo n.º 6084/15.0T8LOU.1.P1 -, no qual se sumariou que “a execução de sentença é instaurada no processo onde foi proferida a decisão judicial que se pretende executar e apenas em momento ulterior passará a ser tramitada pelo tribunal com competência especializada de execução. II - Assim, apesar da instância central do tribunal Judicial da Comarca do Porto ter juízos com competência especializada executiva, a ação executiva baseada em sentença condenatória não pode ser diretamente instaurada no juízo de execução”. O presente aresto reporta-se a situação em que o requerimento executivo foi devidamente apresentado no processo onde a sentença exequenda foi proferida, que mereceu despacho de indeferimento liminar, declarando materialmente incompetente o juízo central cível, por tal competência estar deferida à secção de execução. O que mereceu juízo de revogação da decisão recorrida. Todavia, o Acórdão não retira ilações quanto à situação ora em controvérsia, isto é, qual a solução a adoptar caso o requerimento executivo fosse apresentado directamente no juízo de execução; - da RC de 08/05/2018 – Relator: António Carvalho Martins, Processo n.º 74/12.1TBPNI.1.C1 -, no qual se sumariou que “ o nº 1 do art.º 85º CPC (competência para a execução fundada em sentença) não encerra uma norma de competência, respeitando, antes , à determinação, já não do tribunal, mas sim do processo no qual a execução é tramitada, estabelecendo a regra de que o é nos autos da ação em que a decisão (na 1.ª instância) foi proferida. Esta regra só cede, por natural impossibilidade, no caso de estar pendente recurso que tivesse implicado a subida dos autos a tribunal superior, dando-se então a execução com base no traslado, isto é, em certidão do processo emitida para fins de execução (cf art.º 649-1). 2. - O n.º 2 do art.º 85 CPC não trata da competência para a execução, mas da remessa, ao tribunal competente para a execução de sentença, de certos elementos. 3.- No âmbito da LOSJ, os tribunais de competência territorial alargada da propriedade intelectual, da concorrência, regulação e supervisão e marítimo (art.ºs 111-2, 112-3 e 113-2 da LOSJ), bem como as secções de trabalho (art.º 126-1-m LOSJ) e as de comércio (art.º 128-3 LOSJ), e ainda as secções de família e menores, quanto aos alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges (art.º 122-1-f LOSJ), executam as decisões por eles proferidas. 4.- As decisões proferidas pela secção cível da instância central, bem como pela secção de competência genérica da instância local, só não são executadas pela secção de execução da instância central (art.ºs 129-3 e 130-1-d da LOSJ) se esta não existir na comarca, caso este em que a execução corre na secção cível da instância central se o valor da execução for superior a 50.000€ (art.º 117-1-b LOSJ) e na secção de competência genérica da instância local se o valor da execução for igualou inferior a essa quantia (art.º 130-1-d LOSJ)”. Trata-se de situação de execução de sentença homologatória do mapa de partilha, reivindicando-se o pagamento coercivo de tornas devidas, tendo o requerimento executivo sido apresentado no processo do juízo de família e menores onde a sentença exequenda foi prolatada. Contrariando a decisão recorrida que havia entendido ser o Juízo de Família e Menores incompetente, em razão da matéria, para a instaurada execução, por entender que tal competência pertencia ao Juízo de Execução, revogou-a, determinando a normal tramitação dos autos no Tribunal de 1ª instância, “com o prosseguimento da execução, por ser o materialmente competente; por conseguinte, e nos termos do n.º 2 da supra dita norma legal, “procedendo à remessa da execução fundada na sua sentença, à secção especializada de execução - Juízo de Execução em Alcobaça”. Também neste aresto não se cuidou de apurar (nem tinha de o ser) qual seria a solução caso o requerimento executivo tivesse sido apresentado na secção especializada de execução, ainda que, procedendo à citação do juízo defendido no já referenciado Acórdão da RP de 01/02/2016, se tenha referenciado que “face ao estabelecido no NCPC, não é legalmente admissível que uma acção executiva baseada em sentença condenatória seja directamente instaurada numa Secção de Execução, contrariando o estatuído, expressamente, no art.º 85.º, n.ºs 1 e 2, do NCPC. O formalismo sequencial decorrente do estatuído no art.º 85.º, n.ºs 1 e 2, do NCPC, não pode ser, no caso concreto, postergado com apelo, sequer, a enunciados princípios da oficiosidade (inquisitório), da cooperação, adequação formal ou economia processual”. O que é indiciador de partilha do entendimento adoptado na decisão sob sindicância. Adoptando entendimento claramente divergente com o acolhido na decisão apelada, podemos enunciar os seguintes arestos (todos in www.dgsi.pt ): - da RP de 08/03/2019 – Relator: João Diogo Rodrigues, Processo nº. 6292/06.4TBVNG-B.P1 -, relativamente a execução proveniente de tornas devidas por partilha efectuada em inventário, a qual foi devidamente homologada por decisão transitada em julgado. Sumariou-se neste aresto que “o artigo 85.º do Código de Processo Civil, não trata, em qualquer um dos seus dois primeiros números, de questões de competência. II - Em matéria executiva, compete aos juízos de família e menores a execução por alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges, a execução por alimentos devidos a menores ou maiores e a execução das decisões relativas a multas, custas e indemnizações. III - Por sua vez, fora destas hipóteses, compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil, estando delas excluídos os processos atribuídos aos juízos de família e menores. IV - Quando se pretenda executar uma decisão judicial proferida por um juízo de família e menores, diversa das já elencadas (em 2), o requerimento executivo é apresentado no juízo que proferiu a decisão exequenda, mas este deve, com caráter de urgência, remeter ao juízo de execução competente, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanharam”. Entendeu-se, assim, inexistir lugar à rejeição do requerimento executivo, antes se determinando a “remessa dos referidos elementos ao juízo de execução competente para o prosseguimento da execução”. Ou seja, num juízo de revogação da decisão recorrida, que havia rejeitado o requerimento executivo e determinado a extinção da execução, determinou-se que, “com caráter de urgência, se remeta ao juízo de execução competente cópia da decisão exequenda, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham” ; - da RE de 13/02/2020 – Relatora: Cristina Dá Mesquita, Processo nº. 2167/16.7T8SLV.E1 -, apreciando situação semelhante à ora em equação, em que a execução de sentença foi instaurada directamente da secção de execução, e não no processo onde a mesma foi proferida. Também neste aresto foi considerada verificada excepção dilatória inominada, insusceptível de ser suprida, conducente ao indeferimento liminar do requerimento executivo. Entendeu-se que sendo o requerimento executivo apresentado indevidamente junto da secção especializada de execução, “não se justificaria a decisão proferida pelo tribunal a quo, pois esta, salvo o devido respeito, peca por um formalismo excessivo. Subjacente ao normativo constante do art.º 85.º, n.º 2, do CPC está uma razão de economia/celeridade processual e estabelecida a favor do exequente: o exequente, querendo executar uma sentença/decisão condenatória, terá apenas que apresentar um requerimento executivo junto do tribunal que proferiu a decisão condenatória, sendo este que tratará, «com a máxima urgência», de remeter à secção especializada de execução (quando a haja) todo o expediente constituído por cópia da sentença, requerimento executivo e documentos que o acompanham. Ou seja, as razões de economia/celeridade processual subjacentes à norma em apreço estão manifestamente pensadas em função do exequente, ao qual bastará apresentar um requerimento executivo junto do tribunal que proferiu a decisão condenatória. Por conseguinte, não faria sentido que o facto de ele apresentar o requerimento executivo diretamente no tribunal de execução, revertesse contra ele, até porque o tribunal de execução é aquele que é competente para a ação executiva”. Donde, o juízo de revogação da decisão recorrida, determinando-se o prosseguimento da execução nos termos previstos no art.º 855º, do Cód. de Processo Civil; - desta RL de 10/09/2020 – Relator: António Santos, Processo nº. 1599/20.0T8FNC.L1-6 -, reportado a situação igualmente semelhante à ocorrida nos presentes autos. Indaga-se, neste aresto, acerca da inevitabilidade da prolação da decisão recorrida, ou se existia uma outra forma ou meio – menos extremado – de ultrapassar o erro da exequente ao apresentar o requerimento executivo da secção especializada de execução. Seguidamente, após enunciar as duas posições em confronto, citando antecedentes arestos, enuncia que a decisão apelada, “ao enveredar pela qualificação do vicio/erro da apelante como consubstanciando forçosamente uma excepção dilatória, não suprível, lança mão de uma solução/decisão extremada, nada consentânea com a real patologia adjectiva de que se reveste o incumprimento do disposto no art.º 85º,nº1, do CPC, máxime quando é o requerimento executivo apresentado/dirigido diretamente pelo credor a juízo de execução, e o qual é, para todos os efeitos e nos termos da lei de organização judiciária, o competente para a execução”. Donde, o acompanhar do sufragado no antecedente aresto da RE, que perfilha, “no sentido de que o indeferimento liminar do requerimento executivo peca por um formalismo excessivo”. Justifica, ainda, tal opção, na invocação do Dever de Gestão Processual e Princípio da Adequação Formal – artigos 6º e 547º, ambos do Cód. de Processo Civil -, citando a Exposição de motivos inserta na Proposta de Lei nº. 113/XII (2ª), na justificação de aprovação do actual Cód. de Processo Civil. Nesta, “é o legislador claro em afirmar que “A celeridade processual, indispensável à legitimação dos tribunais perante a comunidade e instrumento indispensável à realização de uma das fundamentais dimensões do direito fundamental de acesso à justiça, passa necessariamente por uma nova cultura judiciária, envolvendo todos os participantes no processo, para a qual deverá contribuir decisivamente um novo modelo de processo civil, simples e flexível, despojado de injustificados formalismos e floreados adjectivos, centrado decisivamente na análise e resolução das questões essenciais ligadas ao mérito da causa. A consagração de um modelo deste tipo contribuirá decisivamente para inviabilizar e desvalorizar comportamentos processuais arcaicos, assentes na velha praxis de que as formalidades devem prevalecer sobre a substância do litígio e dificultar, condicionar ou distorcer a decisão de mérito”. Considera, assim, que a decisão apelada mostra-se “impregnada de excesso de formalismo, o qual como vimos supra tem vindo – e bem - paulatinamente [em cada reforma adjectiva] a ser abolido pelo legislador, sendo que, tem o mesmo legislador e concomitantemente atribuído cada vez maiores poderes de gestão e adequação processual ao juiz. Destarte, em consonância com os referidos poderes, não era assim a decisão apelada de pronúncia inevitável, antes se justificava que o tribunal a quo prosseguisse com a execução, porque para todos os efeitos o competente, sem prejuízo de, em razão do disposto no nº 2, do art.º 85º do CPC, remeter ao processo em que a sentença exequível foi proferida o expediente coercivo apresentado pela exequente, extraindo do mesmo as competentes cópias [ as quais passarão a integrar a execução propriamente dita ] e prosseguindo com a execução [ o que outrossim deverá ser comunicado ao processo em que a sentença exequível foi proferida ]” (sublinhado parcialmente nosso). Condensando tal entendimento no sumário elaborado, consta deste que: “4.1. – Nos termos e por força do disposto no nº 1 e 2, do artigo n.º 85º, do Código de Processo Civil, o requerimento executivo cujo título coercivo corresponda a uma sentença proferida por tribunal português, deve ser apresentado/incorporado no processo em que aquela foi proferida, e ainda que para a execução seja competente uma secção especializada de execução. 4.2. – A inobservância do referido em 4.1., ou seja, a apresentação pelo exequente do requerimento executivo dirigido directamente a juízo/secção especializada de execução, não integra, em rigor, a verificação de uma excepção dilatória insuprível, obrigando forçosamente ao indeferimento liminar do requerimento inicial executivo. 4.3. – O referido em 4.2. justifica-se porque, em rigor, o artigo 85.º do Código de Processo Civil, não trata, em qualquer um dos seus dois primeiros números, de questões de competência, que é como quem diz, da repartição da função jurisdicional por diferentes tribunais. Do que trata é de determinar o processo no qual a execução é tramitada e o que deve ser feito quando competente para a execução seja um juízo diverso daquele onde a decisão exequenda foi proferida, especializado em execução. 4.4. – Perante o exposto em 4.2. e 4.3 , e em obediência ao DEVER DE GESTÃO PROCESSUAL e, bem assim, de acordo com o principio de ADEQUAÇÃO FORMAL, e , verificando-se patologia referida em 4.2., deve - em razão do disposto no nº 2, do art.º 85º do CPC – o Juiz remeter ao processo em que a sentença exequível foi proferida o expediente coercivo apresentado pela exequente, extraindo do mesmo as competentes cópias [ as quais passarão a integrar a execução propriamente dita ] e prosseguindo com a execução [ o que outrossim deverá ser comunicado ao processo em que a sentença exequível foi proferida ]” ; - da RP de 23/05/2022 – Relatora: Fernanda Almeida, Processo nº. 1658/21.2T8OAZ-A.P1 -, o qual cita e adopta, na sua plenitude, o juízo exposto no antecedente aresto da RL de 10/09/2020, o qual transcreve, sumariando que “na execução fundada em decisão judicial portuguesa, se o exequente deduzir diretamente o requerimento executivo logo no juízo de execução (não respeitando o disposto no art.º 81.º CPC), isso não obsta à sua receção pela secretaria e à admissão pelo tribunal, posto que nem o juízo de execução é incompetente para tramitar a execução, nem a irregularidade constitui nulidade processual, à luz do critério do art.º 195.º, n.º1 CPC”. B4 – Da posição adoptada e da análise do caso concreto Na ponderação da argumentação exposta, cremos que a última posição jurisprudencial citada mostra-se mais adequada e pertinente, respeitando, ainda, o Dever de Gestão Processual que incumbe ao julgador nos termos do art.º 6º, do Cód. de Processo Civil, o Princípio da Adequação Formal inscrito no art.º 547º, do mesmo diploma, e ainda o Princípio de Economia e Aproveitamento dos actos processuais. Estatuindo acerca do dever de gestão processual, estatui o art.º 6º, do Cód. de Processo Civil, que: “1 - Cumpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável. 2 - O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo”. Refere o art.º 547º, do mesmo diploma, a propósito do princípio da adequação formal, que “o juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo”. João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa – Manual de Processo Civil, Vol. I, AAFDL, pág. 92 a 94 -, referenciam que a gestão processual “visa diminuir os custos, o tempo e a complexidade do procedimento e traduz-se num aspecto substancial – a condução do processo – e num aspecto instrumental – a adequação formal (art. 547º.)”. Assim, neste aspecto instrumental, e de forma a obter a simplificação ou agilização, “o juiz deve adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo (art.º 547.º). Portanto, o juiz pode alterar a tramitação legal da causa - tanto prescindindo da realização de certos actos estabelecidos na lei, como impondo a prática de actos não previstos na lei - e pode ainda modificar o conteúdo e a forma dos actos". Aduzem, ainda, relativamente à aplicação de tal princípio no âmbito do processo executivo – Idem, Vol. II, pág. 444 -, que as especificidades deste “implicam que as possibilidades de aplicação do dever de gestão processual (art.º 6º, nº. 1) e de adequação formal (art.º 547º) nesse processo são bastante mais restritas do que aquelas que se oferecem no processo declarativo”, sendo que o processo executivo “tem um objecto muito menos variado do que o processo declarativo e a sua tramitação é bastante mais rígida do que a do processo declarativo”. Todavia, ressalvam, “não se pode excluir a aplicação daqueles deveres no processo de execução”. Lopes do Rego – Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª Edição, 2004, Almedina, pág. 261 e 264 -, em anotação ao então vigente art.º 265º-A (antecedente do actual 547º), referencia estabelecer aquele normativo um novo princípio, “destinado a introduzir alguma flexibilidade na tramitação ou marcha do processo, permitindo adequá-la integralmente a possíveis especificidades ou peculiaridades da relação controvertida ou à cumulação de vários objetos processuais a que correspondam formas procedimentais diversas, visando ultrapassar - através do estabelecimento de uma tramitação "sucedânea" - possíveis inadequações ou desadaptações da formas legal e abstratamente instituídas, no âmbito de qualquer tipo de processo. Acentua-se com a consagração deste princípio - que se substitui ao do estrito e rígido respeito pela legalidade das formas processuais - o carácter funcional ou instrumental do processamento ou tramitação, que não pode ser perspectivado como encerrando um fim em si mesmo, mas antes entendido como visando a realização de objectivos substanciais: a justa composição do litígio, alcançada com respeito integral pelos princípios essenciais estruturantes do processo civil, nomeadamente os da igualdade das partes e do contraditório”. E, citando aresto da RL, referencia-se que “o princípio da adequação formal deve permitir ao juiz a correcção ou o suprimento de uma (errónea) qualificação jurídica do meio processual ou impugnatório erradamente utilizado pela parte (…)”. Por fim, ajuizando acerca da adequação formal, referencia José Lebre de Freitas – Introdução ao Processo Civil Conceito e Princípios Gerais à Luz do Novo Código, 4ª Edição, Gestlegal, 2017, pág. 230 a 233 – dever o juiz, oficiosamente, “quando a forma legal não for a que melhor se adeque às especificidades do caso concreto, adaptar a tramitação abstratamente prevista na lei, designadamente determinando a prática dos atos que melhor se ajustem ao fim do processo. É assim desde a revisão do CPC de 1961 efetuada em 1995-1996 (art.º 265-A, por ela introduzido), da qual resultou, em paralelismo com o que, no plano dos atos processuais singulares, estatui - e estatuía já anteriormente - a norma do atual art.º 131-1, a substituição pelo princípio da adequação formal do rígido princípio da legalidade das formas processuais da legislação anterior. O CPC de 2013 veio dar nova redação ao preceito que o estatui (agora no art.º 547) e integrá-lo no princípio da gestão processual. A exigência de normas processuais abertas, em adaptação da tipicidade das formas processuais, decorre da variedade de contornos dos casos concretos, que podem aconselhar, quer a simplificação da sequência, quer a inclusão, nela, de atos não previstos na forma processual legal”. Por outro lado, cabe igualmente ao julgador, ainda como manifestação do mesmo princípio, “adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir - o que o art.º 547 do CPC de 2013 refere. Aqui, tal como na adequação da forma do processo, o princípio da economia processual e o da gestão processual interpenetram-se (supra, n," II.10.3). Entre as normas dos art.ºs 265-1 e 265-A do CPC de 1961 e as dos art.ºs. 6-1 e 547 do CPC de 2013 são assinaláveis, além da integração da adequação formal no âmbito da gestão processual, uma importante diferença: a adequação formal não tem só lugar quando a tramitação legal não se adeque (em absoluto) ao caso concreto; deve ter também lugar quando, embora adequada, outra haja que melhor se lhe adeque. Limite incontornável ao exercício do poder de adequação formal constituem, no entanto, os princípios enformadores do processo civil”. Aqui chegados, é tempo de retirar conclusões e aplicá-las ao caso concreto sob sindicância. Do exposto, e tendo por subjacente a posição adoptada, devemos enunciar e concluir o seguinte: - estando-se perante decisão executável, proferida pelos tribunais portugueses, o princípio geral decorrente do nº. 1, do art.º 85º, do Cód. de Processo Civil, impõe que o requerimento executivo inicial seja apresentado no processo (declarativo) em que aquela foi prolatada, correndo a execução nos próprios autos declarativos, ainda que tramitada de forma autónoma; - todavia, existindo, nos termos da lei da organização judiciária, secção especializada de execução naquela área onde foi proferida a sentença exequenda, o processo já não prosseguirá nos autos declarativos, devendo este remeter cópia da sentença exequenda, do requerimento executivo inicial e dos eventuais documentos que o acompanhem àquela secção especializada – o nº. 2, do mesmo art.º 85º; - caso o exequente, de forma indevida, apresente o requerimento executivo inicial na secção especializada de execução, ao invés de apresentá-lo no processo onde foi prolatada a sentença exequenda, em desrespeito do estatuído no nº. 1, do art.º 85º, tal não configura excepção dilatória inominada insuprível, conducente ao indeferimento liminar do requerimento inicial executivo; - o que se justifica, entre outras razões, pela circunstância daquele art.º 85º não tratar de questões de competência ou de repartição da função jurisdicional, mas antes de determinação do processo no qual a execução deve ser tramitada; - acresce que aquela solução, desde logo, revela-se extremada e maculada por um formalismo excessivo, pois, sendo certo que o prescrito no citado nº. 1, do art.º 85º tem por subjacente razões de economia/celeridade processual estabelecidas a favor do exequente, sempre seria destituído de lógica jurídica que, apresentando este o requerimento executivo directamente no tribunal de execução (que é, efectivamente, o competente para a acção executiva), tal revertesse contra si; - por outro lado, na procura de uma solução ou compromisso equilibrado, e no apelo ao Dever de Gestão Processual e Princípio da Adequação Formal – artigos 6º e 547º, ambos do Cód. de Processo Civil -, bem como ao Princípio da Economia Processual, antes se impõe e justifica que o tribunal da secção especializada de execução deva prosseguir com esta, em virtude da sua natural competência ; - sem prejuízo de, no cumprimento do nº. 2, do mesmo normativo, dever remeter ao processo em que a sentença exequenda foi prolatada o requerimento inicial executivo apresentado pelo exequente (e documentos que o acompanhem), serem retiradas cópias deste requerimento (e documentos acompanhantes) e da sentença exequenda, que passarão a integrar a execução, propriamente dita, prosseguindo com os autos executivos (cuja pendência deve ser comunicada aos autos declarativos onde a sentença exequenda foi proferida) ; - ora, no caso concreto, para além das aludidas razões, não é de desprezível valoração o facto de estarmos perante execução pendente há mais de 8 anos (!), com vários apensos, sendo inclusive que o despacho apelado foi proferido no âmbito de deduzida oposição á execução mediante embargos; - pelo que, neste circunstancialismo, fazer agora cessar a operacionalidade do decidido, só por que, decorrido tal tempo, se constatou que o requerimento executivo inicial não foi primariamente apresentado nos autos declarativos onde foi proferida a sentença exequenda, sempre se configuraria como um incompreensível e irrazoável desperdiçar dos actos processuais praticados ao longo de tais anos ; - obrigando, consequentemente, a Exequente a apresentar novo requerimento executivo, agora no processo fonte da sentença exequenda, que, juntamente com cópia desta, seria logo remetido à secção de execução onde já tramitam os presentes autos! - o que, salvaguardado o devido respeito por posição contrária, não poderia deixar de revelar-se destituído de sentido e razoabilidade. Por todo o exposto, decide-se: => num juízo de procedência, neste segmento, da pretensão recursória, determinar a revogação da decisão recorrida/apelada; => a qual se substitui por outra que, ponderando o estádio dos autos executivos (e respectivos apensos), determina que se remeta ao processo declarativo onde foi proferida a sentença exequenda – Processo nº. 5555/06.3TVLSB, da 2ª Secção, do 8º Juízo Cível de Lisboa -, cópia do requerimento executivo apresentado e documentos que o acompanham (concomitantemente, informando acerca da pendência da presente execução), solicitando a remessa aos autos executivos de cópia da sentença exequenda; => devendo, consequentemente, os autos executivos (e respectivos apensos) prosseguirem os seus ulteriores termos. * Nos quadros do art.º 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, obtendo a Recorrente/Exequente vencimento na pretensão apelatória apresentada e não tendo os Recorridos/Executados apresentado contra-alegações, as custas da presente apelação serão suportadas pela(s) parte(s) vencida(s) a final. *** IV. DECISÃO Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em: a) julgar procedente o recurso de apelação interposto pela Recorrente/Apelante/Exequente M…, em que figuram como Recorridos/Apelados/Executados J… e A…; b) consequentemente, determinar a revogação da decisão recorrida/apelada; c) a qual se substitui por outra que, ponderando o estádio dos autos executivos (e respectivos apensos), determina que se remeta ao processo declarativo onde foi proferida a sentença exequenda – Processo nº. 5555/06.3TVLSB, da 2ª Secção, do 8º Juízo Cível de Lisboa -, cópia do requerimento executivo apresentado e documentos que o acompanham (concomitantemente, informando acerca da pendência da presente execução), solicitando a remessa aos autos executivos de cópia da sentença exequenda; d) determinar, consequentemente, o prosseguimento dos ulteriores termos dos autos executivos (e respectivos apensos); e) Nos quadros do art.º 527º, n.ºs 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, obtendo a Recorrente/Exequente vencimento na pretensão apelatória apresentada e não tendo os Recorridos/Executados apresentado contra-alegações, as custas da presente apelação serão suportadas pela(s) parte(s) vencida(s) a final. -------- Lisboa, 22 de Junho de 2023 Arlindo Crua António Moreira Carlos Gabriel Castelo Branco _______________________________________________________ [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original. [2] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 748 a 750. [3] Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, 2018, pág. 185 e 186. [4] O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material, BMJ, nº. 325, pág. 49 e segs.. [5] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2019 Reimpressão, pág. 743. [6] Idem, pág. 745. [7] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., pág. 753. |