Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANTÓNIO SANTOS | ||
Descritores: | DIREITO DE PREFERÊNCIA MUNICÍPIO VENDA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/26/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 5.1. – Para que um Município possa exercer o direito de preferência que lhe confere o art.º 58º,nº1, do DL n.º 307/2009, de 23 de Outubro [REGIME JURÍDICO DA REABILITAÇÃO URBANA], carece de alegar e demonstrar [porque não tem o Município o referido direito de preferência apenas e tão somente pelas suas vestes de autoridade, munida do seu ius imperii], designadamente, que: i) A fração objecto do contrato preferível se situava em área de reabilitação urbana; ii) A mesma fração, no entendimento do autor/Município, deve ser objeto de intervenção no âmbito de uma operação de reabilitação urbana; iii) O autor/Município, na declaração de preferência comunicada ao réu vendedor, informa que o imóvel a adquirir/preferir destina-se a ser objeto de intervenção no âmbito da operação de reabilitação urbana, nela também discriminando a intervenção de que o imóvel carece e o prazo dentro do qual pretende executá-la; 5.2. – Ainda que o Réu obrigado venha a efectuar/concretizar a venda do imóvel a terceiro ainda antes do decurso do prazo de que dispõe o autor Município para exercer o direito de preferência, violando assim este último, tal não isenta o Autor de na acção de preferência fundamentar o direito arrogado nos termos exigidos pelo art.º 58.º, n.ºs 1 e 3, do RJRU; 5.3. - Nada impede que o titular do direito de preferência, quando confrontado por duas compras e vendas autónomas e violadoras , ambas, do referido direito, possa exercer o respectivo direito de preferência sobre qualquer uma delas [claro está, desde que recorrendo à faculdade adjectiva do art.º 554º, do CPC] , e isto porque o preferente adquire em qualquer dos dois casos o imóvel substituindo-se ao comprador que adquiriu legitimamente a coisa do anterior proprietário vendedor, e , ademais, a circunstância de, após a primeira transmissão - e antes ainda da acção de preferência ser proposta -, o comprador ter alienado o imóvel a terceiro, não determina a extinção do direito de preferência [pois isso seria a negação dos direitos de sequela e de prevalência que são características essenciais dos direitos reais]; | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | 1.- Relatório MUNICÍPIO DE SINTRA intentou ação de preferência com processo comum contra A B [ ……..LDA ], e C, Pedindo que, uma vez julgada a acção procedente por provada: i) Seja declarado o direito de preferência do Autor sobre a fração descrita na Conservatória de Registo Predial de Queluz sob o n. º ... e inscrita na respetiva matriz com o artigo ...; ii) Sejam os 2.º e 3.º Réus condenados a proceder ao cancelamento das inscrições a seu favor; iii) Seja o 1.º Réu condenado a celebrar a escritura pública de compra e venda com o autor município e referente à referida fração. 1.1. - Para o efeito, alegou o MUNICÍPIO DE SINTRA, autor, em síntese, que: - Em 11-06-2019 o 3º réu C apresentou – fazendo-o na qualidade de proprietário da fração autónoma designada pelas letras AC, descrita na Conservatória do Registo predial de Queluz sob o n.º ... e inscrita na respetiva matriz com o artigo ... -, um requerimento de informação sobre o exercício do direito de preferência nos serviços do Autor, informando da venda da referida fração AC pelo preço de €75.000,00; - Para “responder” à referida informação, indagou e verificou então o Autor que o imóvel em apreço se encontrava inserido na área de reabilitação urbana de Massamá e Monte Abraão, o que lhe conferia a possibilidade do exercício do direito de preferência, e , consequentemente, decidiu/resolveu exercer o referido direito de preferência ; - Para o referido efeito, procedeu de seguida o autor à emissão de uma certidão a confirmar o exercício do direito de preferência e comunicou também por email o 1.º Réu informando-o que a referida certidão estava pronta para ser levantada, e, posteriormente, voltou a enviar-lhe um novo e-mail a tentar diligenciar pela marcação da competente escritura; - Não obstante, não respondeu o referido réu aos emails do autor, e não procedeu também ao levantamento da certidão, sendo que, já em Setembro de 2019, veio o Autor a tomar conhecimento da celebração da escritura entre o 1.º e 2.º Réus, a qual veio de resto a ser outorgada no exacto dia em que fora apresentado (em 11-06-2019) o requerimento de informação no Município com vista ao exercício pelo mesmo do direito de preferência ; - Ainda em Setembro de 2019, constatou também o autor que o imóvel em questão fora de resto já objecto de uma segunda alienação, e sem que tenha a mesma sido também sujeita a informação perante os serviços municipais, ou seja, verificou que o imóvel tinha sido alvo de transmissão por duas vezes, a primeira em 11/06/2019, e a segunda em 11/07/2019 através de escritura realizada entre A e B, respetivamente 2.º e 3.º Reús ; - Assistindo assim ao Autor o direito de preferência [nos termos dos artigos 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10 e artº 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5] tendo por objecto o imóvel acima descrito, deve consequentemente operar-se/decretar-se a transmissão da respectiva propriedade a seu favor. 1.2. - Regularmente citados, contestaram todos os RR, em articulados separados [o A e o C, por um lado, e a Ré B, por outro], deduzindo todos no essencial apenas defesa por impugnação motivada. Assim, os RR A e o C, além de afirmarem a inexistência do direito de preferência da Autora - considerando não verificados os requisitos do n.º 3 do art.º 58.º do RJRU -, invocam que não comunicou o autor ao 1º réu e pela forma legalmente prescrita a intenção de exercer a preferência, como condicionou o conhecimento da sua resposta ao levantamento de certidão e pagamento de emolumentos. Já a Ré B e para concluir outrossim pela improcedência da presente ação, aduz que deverá ser considerada com estando de boa fé, nos termos e para os efeitos dos n.ºs 1 e 3 do art.º 291.º do CC, a que acresce que o direito de preferência resultante do art.º 58.º do DL 307/2009, de 23-10, define os requisitos para o exercício desse direito, sendo que o Autor não soube cumprir as regras a que estava adstrito, nomeadamente as constantes do n.º 3 do art.º 58.º do referido diploma. 1.3. - Respondendo o Autor MUNICÍPIO DE SINTRA aos articulados dos RR (na sequência de despacho proferido nos autos), foi realizada uma AUDIÊNCIA PRÉVIA [ com os objectivos previstos nas als. a), d), e), f) e g), todas do art.º 591.º do CPC], e , não sendo alcançada a conciliação das partes, no decurso daquela fixou-se o valor da acção e proferiu-se despacho que saneou o processo, fixando-se outrossim o objeto do litigio e elencado os temas da prova , tudo sem reclamações. 1.4. - Por fim, procedeu-se à AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO de acordo com o legal formalismo (em 29/11/2021) e, conclusos os autos para o efeito, foi de imediato proferida a competente SENTENÇA, sendo o respectivo comando decisório do seguinte teor: “ (…) V. Decisão Face ao exposto decide-se: I - Julgar a presente ação improcedente, por não provada, e em consequência absolvo os Réus dos pedidos contra eles formulados. Custas pelo Autor. Notifique e registe. Sintra, 15-06-2022” 1.5. - Porque da sentença identificada em 1.4. discorda o autor MUNICÍPIO DE SINTRA, da mesma e de imediato interpôs o mesmo o competente recurso de apelação, que admitido foi aduzindo nele o recorrente as seguintes conclusões: 1. Além de erros na apreciação da matéria de facto, na sentença recorrida foram cometidos erros na aplicação do direito atinente, impondo-se, por isso, decisão diametralmente oposta. 2. O tribunal a quo andou, desde logo, mal em considerar não provados os factos constantes das alíneas a) e b). 3. A testemunha RC, no seu depoimento, após confirmar que foram efetuadas tentativas de contacto para comunicar ao primeiro R. que o Recorrente pretendia exercer o direito de preferência, referiu expressamente que o Município de Sintra fez essa comunicação via-email, com vista a solicitar os documentos necessários para a outorga da escritura pública (localização: 20211129100020, 00:05:45.1 a 00:13:26.9). Factualidade essa que foi confirmada pela testemunha MP (localização: 20211129102539, 00:19:45.7 a 00:21:11.7), pelo que, tendo sido feita prova da matéria constante na alínea a) dos factos não provados, impunha-se que o Tribunal a quo julgasse a mesma como provada. 4. A testemunha RC, referiu também no seu depoimento que foram efetuadas tentativas de contacto telefónico com o primeiro R. (localização: 20211129100020, 00:07:16.3a 00:07:34.3), pelo que, se impunha igualmente que o Tribunal a quo tivesse julgado provada a matéria vertida na alínea b) dos factos não provados. 5. A testemunha RC. esclareceu no seu depoimento que o A. teve interesse em exercer o direito de preferência porque pretendia destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso (localização: 20211129100020, 00:01:41.6 a 00:01:53.6). Assim sendo, deveria o Tribunal de Primeira Instância ter incluído na matéria de facto a seguinte matéria: - O Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso. 6. A testemunha RC deixou igualmente claro que, por razões imputáveis ao primeiro R., o Recorrente nunca conseguiu aceder ao interior do imóvel (localização: 20211129100020, 00:02:03.7 a 00:04:20.4, 00:05:20.0, 00:09:06.6), pelo que, deveria constar do elenco da matéria provada a seguinte factualidade: - O Autor nunca conseguiu aceder ao interior do imóvel identificado em 1 porque o primeiro R. nunca respondeu às tentativas de contacto que lhe foram dirigidas pelo Autor. 7. O tribunal ad quem, atenta a prova identificada, deverá julgar provada a matéria constante das alíneas a) e b) dos factos não provados e incluir na factualidade provada igualmente a seguinte matéria: - O Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso; - O Autor nunca conseguiu aceder ao interior do imóvel identificado em 1 porque o primeiro R. nunca respondeu às tentativas de contacto que lhe foram dirigidas pelo Autor. 8. Esta alteração na matéria de facto implica consequentemente a total procedência da ação, no entanto, mesmo que improcedesse o recurso relativo à matéria de facto, ainda assim, atenta a matéria considerada provada pelo Tribunal a quo, sempre se imporia concluir que aquele tribunal em julgar improcedente a ação. 9. Uma vez realizada a comunicação para preferência, porque existe uma probabilidade de o preferente querer exercer o seu direito, impõe-se ao obrigado à preferência, em obediência ao princípio da boa-fé que aguarde a resposta do preferente, abstendo-se, até lá, de realizar quaisquer atos que possam prejudicar ou inutilizar o efeito útil do exercício do direito de preferência, o que não sucedeu no caso concreto, porquanto, o primeiro R. procedeu à venda do imóvel na data em que realizou a comunicação para preferência! 10. Tem sido entendido pela doutrina e jurisprudência, que se o obrigado à preferência não der cumprimento a este dever (de não alienar a terceiro até que o preferente se pronuncie sobre a sua intenção ou seja atingido tal prazo), embora não haja violação da obrigação de comunicar, na medida em que, esta obrigação foi efetivamente cumprida, e também não haja violação da obrigação de alienar ao preferente pois esta obrigação, de facto, ainda não se constituiu, haverá sempre uma violação do princípio da boa-fé, que lhe impunha que o obrigado à preferência não alienasse o bem a um terceiro até que o preferente se pronunciasse sobre a sua intenção, ou se esgotasse o prazo estabelecido para o efeito. 11. Resulta demonstrado nestes autos que o primeiro R. procedeu à venda do imóvel em causa nos presentes autos, no dia em que dirigiu ao Recorrente a comunicação para preferência, pelo que, dúvidas não existem de que actuou em clara violação do princípio da boa-fé, prejudicando em absoluto o efeito útil de qualquer declaração do Município de Sintra. 12. Nestes casos, é manifesto que o preferente tem direito a ser colocado na situação em que estaria se o obrigado à preferência tivesse atuado de boa-fé (abstendo-se de proceder à venda a terceiros), podendo lançar mão da ação de preferência para, dessa forma, exercer o direito que lhe assistia, no entanto, ao decidir nos termos constantes da sentença, o Tribunal a quo decidiu premiar o comportamento culposo levado a cabo pelo primeiro R., o qual, actuou deforma clamorosamente ofensiva do sentimento jurídico socialmente dominante, isto é, longe do interesse social e por forma a exceder manifestamente os limites resultantes da boa-fé, dos bons costumes ou do fim económico-social do direito. 13. o Tribunal a quo ao decidir no sentido constante na decisão recorrida, proferiu sentença escandalosa e intoleravelmente ofensiva do sentimento comum de Justiça, prevalecente na comunidade, que, por isso, repudia o comportamento levado a cabo pelo primeiro R., na medida em que, recompensou uma atuação violadora da lei e da boa-fé, enquanto atuação diligente, zelosa e leal, correspondente aos legítimos interesses da contraparte, honesta, conscienciosa e correta a fim de não prejudicar os legítimos interesses a contraparte, e não alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável poderia tolerar, o que não pode merecer o acolhimento do Erudito Tribunal da Relação de Lisboa, devendo, por isso, a presente ação ser julgada procedente. 14. Não merece igualmente acolhimento o argumento posteriormente utilizado pelo Tribunal a quo, antevendo o fracasso do seu primeiro argumento, segundo o qual, mesmo que se entendesse que a venda anterior ao termo do prazo concedido ao Recorrente para exercer o direito de preferência consubstancia uma violação do direito de preferência, ainda assim tal não isentaria o Recorrente de, nesta ação, fundamentar a preferência nos termos exigidos pelo artigo 58.º n.º 3 do RJRU, o que (segundo entendeu aquele Tribunal) não fez. 15. Nos artigos 6.º e 7.º da petição inicial que deu origem aos presentes autos, o A. referiu expressamente que tinha sido decidido exercer o direito de preferência, porque havia o propósito de prosseguir o projeto de arrendamento jovem; através de requerimento de 26 de março de 2020 – refª. 35252560 – apresentado ao abrigo do artigo 3.º n.º 4 do Código de Processo Civil, o Recorrente esclareceu ainda que em 8 de abril de 2019, a Assembleia Municipal de Sintra, ao abrigo do n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei 307/2008, de 23 de outubro, alterado e republicado pela Lei n.º 32/2012, de 14 de agosto, sob a proposta n.º 229/-P/2019, aprovou a Delimitação das Áreas de Reabilitação Urbana de Massamá-Monte Abraão, legislação que foi publicada na 2ª série do Diário da República de 07/05/2019; que é objetivo do Município de Sintra reforçar a bolsa de imóveis da autarquia, com vista a prosseguir com o “ Projeto Arrendamento Jovem”, projeto esse que é do conhecimento público, na medida em que, tem sido amplamente divulgado pela comunicação social; e esclareceu ainda que era precisamente para levar a cabo esse objetivo, e porque a fração em causa era adequada ao arrendamento jovem, que o Município decidiu exercer o seu direito de preferência, pelo que, resulta claramente da análise dos autos que existe um projecto de interesse público para a fração alienada, isto é, que o Município de Sintra exerceu o direito de preferência porque entendeu que o imóvel em causa nos presentes autos devia ser objeto de intervenção no âmbito do projeto de arrendamento jovem. 16. Não pode o Tribunal deixar de ter em conta que, conforme resulta da prova documental junta aos autos, concretamente, do Relatório de Avaliação – SM – N.º 26417/2019, bem como do depoimento da testemunha RC, o primeiro R. nunca permitiu que o Recorrente acedesse ao interior da fração, e, portanto, dúvidas não existem de que ao decidir como decidiu – ao defender que o A. não cumpriu o ónus de nesta ação fundamentar a preferência nos termos exigidos pelo artigo 58.º n.º 3 do RJRU – o tribunal a quo premiou, uma vez mais, um comportamento contrário à lei e à boa-fé, pois, resultando dos autos que o primeiro R. nunca permitiu que o Recorrente acedesse ao interior do imóvel, é de mediana compreensão que, o ora recorrido impediu o A. de apreciar o estado da fração, e, apesar disso, exerceu o direito de preferência, entendimento que, pelas razões expostas não pode ser acolhido por este Erudito Tribunal de Primeira Instância, porquanto, não poderá o primeiro R. beneficiar de uma conduta contrária à lei e à boa-fé, sob pena de se alcançar uma solução absolutamente contrária à JUSTIÇA! 17. Tendo ficado demonstrado que o primeiro R. procedeu à venda do imóvel em causa nestes autos no mesmo dia em que dirigiu ao Recorrente a comunicação a que alude o artigo 416.º do Código Civil, impõe-se, desde logo a total procedência da ação! 18. Mesmo que improcedessem os argumentos acima invocados, sempre se impunha retirar consequências da violação do direito de preferência por banda do segundo R., pois, o pedido constante da alínea a) do petitório, atenta a sua redação, tanto se dirige à primeira, como a segunda venda, e ainda porque o A. procedeu ao depósito do preço, isto é, depositou o montante de € 75.000,00, devendo tal depósito ser extensivo à segunda transação. 19. A sentença violou, assim, o disposto no artigo 416.º e 1410.º do Código Civil, e o artigo 58.º do RJRU. NESTES TERMOS, e nos demais de direito que V. Exas. douta e superiormente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, por via dele, ser revogada a douta sentença recorrida e, em consequência, ser a ação julgada totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se a recorrente dos pedidos formulados, como, aliás, é de DIREITO E DE JUSTIÇA 1.6. - Tendo os apelados A e C, apresentado contra-alegações, nestas vieram impetrar a total improcedência do recurso interposto pelo autor, quer em termos de facto quer de direito, considerando que a decisão recorrida merece ser mantida. Para tanto, CONCLUIRAM os apelados nos seguintes termos: 1. A impugnação da matéria de facto feita pelo Apelante recorre ao exercício de transcrição de excertos de depoimentos absolutamente descontextualizados, em termos que deturpam a boa análise da prova como feita pelo Tribunal “a quo” cuja decisão se deve manter, na íntegra. COM EFEITO: 2. A testemunha RC [depoimento do dia 29.11.2021, com início às 10:07:12 e fim às 10:25:38, ficheiro áudio com a ref. 20211129100712_4293933_2871276] afirmou, ao minuto 14:36 bem como ao minuto 16:56 das suas declarações (supratranscritas) que, in casu, o email a pedir documentação e a diligenciar pela marcação da escritura não tinha sido enviado. 3. A testemunha MP [depoimento do dia 29.11.2021, com início às 10:25:40 e fim às 10:50:16,ficheiro áudio com a ref.20211129102539_4293933_2871276] afirmou que não é responsável por esse email, mais explicando que ele ocorre numa fase posterior à homologação da Câmara e das suas funções neste tipo de procedimentos, pelo que, da sua parte, apenas sabia ter existido um email a comunicar a emissão da certidão e uma tentativa de contacto para agendamento da visita ao imóvel. – cf. minutos 14:42, 14:45 e 15:25 do seu depoimento (supratranscrito). 4. Pelo que, como está bom de ver, a decisão do Tribunal “a quo” em elencar na matéria não provada a alínea a), foi consequência lógica da ausência de prova. 5. A testemunha RC [depoimento do dia 29.11.2021, com início às 10:07:12 e fim às 10:25:38, ficheiro áudio com a ref.20211129100712_4293933_2871276], ao minuto 08:08, revelou ainda não saber se conseguiram chegar à fala com o proprietário. 6. E assim, uma vez mais, é evidente a “ausência de prova concludente e consistente” quanto ao facto tido por não provado na alínea b) da douta sentença do Tribunal “a quo”. 7. No que concerne ao facto pretendido aditar, que “o Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso”, não se percebe em que medida se trata de facto essencial ou que sequer impunha a procedência da ação – o que o Apelante também não explica. 8. Por fim, a testemunha RC [no seu depoimento do dia 29.11.2021, com início às 10:07:12e fim às 10:25:38, ficheiro áudio com a ref.20211129100712_4293933_2871276] apenas assevera, ao minuto 05:36, que a Câmara tentou contactar o proprietário para agendar visita, mas que isso não foi possível, não sabendo pormenores quanto aos contactos alegadamente ocorridos (que não foram feitos por si) nem os motivos pelo qual se frustraram as tentativas. 9. O que aliás ninguém sabia. 10. Pelo que, logicamente, não se fez prova de que “o Autor nunca conseguiu aceder ao interior do imóvel identificado em 1 porque o primeiro R. nunca respondeu às tentativas de contacto que lhe foram dirigidas pelo Autor”, que por isso mesmo não pode ser aditado à matéria provada. 11. O tribunal “a quo” fez uma correta apreciação da matéria de facto, respeitando as regras materiais e processuais nesse julgamento, tendo decidido de acordo com a prova produzida. 12. Por outro lado, também carece de fundamento o recurso na matéria de Direito. Vejamos: 13. O Apelante exerceu o seu direito de preferência ainda antes de saber que o imóvel já havia sido transacionado, em termos que não cumpriram os pressupostos materiais e formais legalmente exigidos. 14. Assim, a sua declaração jamais seria apta a produzir qualquer efeito jurídico. 15. Por seu turno, o Município também não cumpriu, nesta ação, o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito, como previstos no art.º 58.º/3 do DL 307/2009 (RJRU). 16. Não basta, ao contrário do que entende o Apelante, que se trate de um imóvel inserido numa área de Reabilitação Urbana (ARU) e que seja suscetível de prosseguir o objetivo de arrendamento jovem, como decorre do quadro normativo que atribui aos Municípios o direito de preferência e, em especial, da definição que aí é feita de “Reabilitação Urbana” – cf. art. 2.º, al. j) do RJRU. 17. O Apelante teria que ter concretizado a intervenção que o imóvel carecia e que o Município se propunha realizar em certo prazo. O que nunca fez. 18. Acresce que o Apelante apenas peticionou a condenação do Primeiro Réu na celebração da escritura, numa estratégia processual que assumiu sem rodeios no artigo 27.º da sua petição inicial, onde se pode ler: “ […] não obstante a ação de preferência se concretizar em redor da primeira transmissão […]”. 19. Pelo que não poderia o Tribunal “a quo” retirar consequências jurídicas da transação posterior, em que foi alienante o segundo Réu e adquirente a Terceira Ré. 20. Pois que a única transação “atacada” por via da presente ação judicial, foi a primeira. 21. Ainda que assim não fosse, o direito de preferência sobre a segunda transação já teria caducado, posto que o Apelante apenas procedeu ao depósito de 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros). 22. E assim, tendo a segunda escritura sido celebrada pelo valor de 115.000,00€ (cento e quinze mil euros), nunca o depósito de 75.000,00€ se poderia considerar “extensível à segunda transaçã”, sob pena de se retirar qualquer efeito útil à existência do depósito. 23. Ante o exposto, deve soçobrar o presente recurso, mantendo-se na íntegra a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, que decidiu de acordo com a prova produzida e em estrito respeito pelo quadro normativo aplicável. Nestes termos e nos mais de Direito que doutamente serão supridos por V.Exas., deve o recurso ser julgado improcedente mantendo-se a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, assim se fazendo a mais elementar e costumada JUSTIÇA. 1.7. – Outrossim a Ré B veio contra-alegar, pugnando pela confirmação do julgado, o que justificou aduzindo as seguintes conclusões: a) Veio o recorrente, questionar o tribunal a quopor não julgar como provado os seguintes fatos: a) que posteriormente ao email referido em 6. o Autor tenha enviado novo email e tentado diligenciar pela marcação da escritura. b) Que o Autor tenha tentado ligar para o número de telefone do Autor constate do requerimento, sem sucesso. b) Alegou para tanto que a testemunha RC, concretizou uma comunicação via mail, ao Réu C, com vista a solicitar documentos para a outorga da escritura de compra e venda, solicitando para tanto documentos; c) bem andou o tribunal ao firmar a convicção na ausência de prova que pudessem dar como provados os factos em causa, dado que a mencionada testemunha não teve um discurso claro, e que permita ao tribunal tirar qualquer conclusão sobre os fatos que prestou depoimento, verificando-se a falta de certezas por parte da testemunha RC sobre o que efetivamente foi ou não feito no procedimento sobre o pedido de direito de preferência junto do município. No entanto foi clara ao afirmar que não sabe se existiu ou não uma comunicação telefónica, e tudo o que anteriormente referiu a este propósito não são mais que conclusões do procedimento junto do município que não sabe e não consegue aplicar ao caso concreto dos presentes autos. d) A testemunha foi respondendo em termos genéricos sobre o procedimento do Município e nunca sobre o caso concreto, pelo que a pretensão da aqui apelante que sejam dados como provados estes factos, padece claramente de prova que permita essa conclusão. e) Não foi por razões imputáveis ao primeiro R., que o Recorrente não comunicou, nada ficou claro do depoimento desta testemunha, tampouco conclusão diversa se pode retirar do depoimento da testemunha MP, dado que a mesma testemunha apenas teve conhecimento também dos procedimentos gerais do Município e não daquilo que em concreto se passou no procedimento sobre o direito de preferência em causa nestes autos, fica claro e inequívoco que inexistiu qualquer ato ou diligência por parte da Câmara com vista ao contato com o vendedor posteriormente ao mail enviado. f) Pelo que inexiste qualquer base de prova testemunhal que leve à procedência da pretensão da autora aqui recorrente, no sentido de dar como provados os factos em causa, os quais, e bem, foram considerados não provados. g) Sobre a matéria de direito, vêm desde logo inquinadas as alegações feitas pela recorrente Município de Sintra, dado que assenta em factos que consideram poder ser dados como provados, dada a prova produzida, o que se tem de rejeitar imperativamente. h) persiste ainda o recorrente na equivocada ideia que o sentido da decisão proferida deveria ser diverso, apresentando para tanto uma visão simplista do direito de preferência aqui em causa, bem como do procedimento e requisitos do mesmo, os quais, como bem fundamentou a sentença recorrida, não foram cumpridos. i) Ficou sobejamente demonstrado de toda a factualidade trazida aos autos não foram cumpridos os requisitos e pressupostos a que o recorrente estava obrigado para o bom exercício do direito de preferência no respeitante à primeira venda do imóvel, que afinal de contas, circunscreveu o pedido que deduziu contra os réus e em consequência o escopo da decisão a proferir; j) Olvida a recorrente que o direito de preferência atribuído ao município nos presentes autos, não é absoluto, mas sim dependente de pressupostos legais que não foram cumpridos. k) O direito de preferência não obedece apenas aos normativos que invoca agora a recorrente entender violados, designadamente o artigo 416.º e 1410.º, ambos do Código Civil, e o artigo 58.º do RJRU, mas também da Lei n.º 307/2009, de 23 de Outubro, ou o Decreto n.º 862/76. l) O direito de preferência, como bem é enunciado na douta sentença recorrida: “o direito de preferência, para ser validamente exercido, tem de obedecer vinculadamente à discriminação exigida por lei, pois só com esta discriminação é possível afirmar qual o interesse publico subjacente à concessão deste direito de preferência.”. Nada disso foi feito pelo município aqui recorrente, pelo que nenhum interesse público foi demonstrado nos autos ou no procedimento interno do município; m) O procedimento camarário para o bom exercício de um qualquer direito de preferência terá sempre que respeitar: comunicação sob forma legalmente prescrita para o efeito – carta registada com aviso de recepção, cfr. art.º 7.º do Decreto n.º 862/76 e comunicação de dia, hora e local para a escritura, a realizar num prazo máximo de 90 dias, cfr. art.º 8.º do Decreto n.º 862/76; n) Ora o município fez depender o conhecimento de uma eventual pretensão de exercício de direito de preferência de um levantamento de uma certidão e pagamento de um emolumento adicional. Pelo que, independentemente das circunstâncias em que o Primeiro R. deu conhecimento ao Município de Sintra, sempre estaria esse exercício dependente de requisitos de forma que não foram cumpridos, e que igualmente levariam à improcedência do mesmo, dada a invalidade do exercício do direito pela aqui recorrente, pela ausência de fundamentação nos termos do n.º 3 do artigo 58.º do RJRU. o) Pelo que flagrantemente fenece qualquer pretensão da recorrente no exercício do direito de preferência respeitante à primeira venda. p) Sobre a segunda transação, e sem nos repetirmos sobre os requisitos e formalidades do exercício do direito de preferência, que aqui se dão por reproduzidos porque igualmente aplicáveis, sempre se diz que nunca foi intenção do Município recorrente exercer qualquer preferência nesta venda. q) Bem justifica e esclarece a Mm. Juiz na douta sentença recorrida que, independentemente da violação da preferência pelo 2.º Réu, nunca o Autor, aqui recorrente pretendeu exercer qualquer preferência relativa a essa segunda transação e apenas por referência à primeira transação. r) O pedido é claro e esclarecedor, dirigindo ao Primeiro Réu, e primeiro vendedor a condenação a celebrar escritura de compra e venda, e não aos demais Réus. s) Acresce que, e corroborando este entendimento, apenas procedeu o recorrente ao depósito do preço da primeira venda e não da segunda venda. t) Como bem esclarece a douta sentença recorrida, fenece qualquer pretensão de anulação da segunda venda, dado que o pedido não foi deduzido para esta venda (n.º 1 do art.º 609.º CPC), e tampouco foi depositado o preço da mesma. u) Pelo que deverá improceder na totalidade o recurso pretendido pelo Autor, aqui recorrente; v) E o demais, SEMPRE EM DOUTÍSSIMO SUPRIMENTO. ASSIM SE FAZENDO MAIS INTEIRA JUSTIÇA! * Thema decidendum 1.8. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso ] das alegações dos recorrentes (cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir no presente Ac. são as seguintes: I - Se importa in casu introduzir alterações na decisão do tribunal a quo proferida sobre a matéria de facto, e em razão de competente impugnação deduzida pelo recorrente; II - Se deve a sentença apelada ser revogada, quer: a) Em razão da alteração da decisão do tribunal a quoproferida sobre a matéria de facto, e no seguimento da procedência da pertinente impugnação deduzida pelo recorrente; b) Porque, ainda que sem alterações na decisão de facto, certo é que decorre da factualidade na mesma inserida a verificação/prova dos factos constitutivos do direito pelo Autor MUNICÍPIO invocado. * 2. - Motivação de Facto Pelo tribunal a quo foi fixada, na sentença apelada, a seguinte factualidade: A) PROVADA 2.1 - No dia 11-06-2019 C apresentou nos serviços do Município um requerimento para informação sobre o exercício do direito de preferência na alienação de imóveis, referente à fração descrita na Conservatória de Registo Predial de Queluz sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., pelo preço de €75.000,00. 2.2. - Em face do referido requerimento o Autor iniciou a apreciação dos elementos essenciais a aferir do seu interesse em preferir. 2.3. - O imóvel em questão – fração AC do prédio sito na Av. Azedo Gnecco, Massamá, em regime de propriedade horizontal e descrito na Conservatória de Registo Predial de Queluz sob o n.º ... – encontra-se dentro da Área de Reabilitação Urbana de Massamá e Monte Abraão. 2.4. - Após relatório de Avaliação realizado pela Comissão de Avaliação do Autor o Exmo. Sr. Presidente da Câmara, por despacho de 19-06-2019 decidiu exercer o direito de preferência. 2.5. - Em 24-06-2019 foi emitida certidão, certificando que, no seguimento do pedido efetuado através do requerimento número novecentos e cinquenta e um, de onze de junho do corrente ano, em nome de C, e em face dos elementos existentes neste Município, nos termos do despacho do Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Municipal, …, de dezanove de junho de dois mil e dezanove, foi decidido exercer o direito de preferência na alienação da fração autónoma AC, correspondente ao 5.º andar frente, (….)”. 2.6. - Em 27-06-2019 o Autor enviou ao 1.º Réu o email constante de fls. 16, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, com o seguinte teor: “(…) Informa-se que o seu pedido relativo a informação sobre o exercício do direito de preferência na alienação de imóveis – inscrito na matriz predial urbana, com o processo 9697/2019 encontra-se para levantamento no Gabinete de Apoio ao Munícipe de Sintra. Mais se informa que terá de efectuar o pagamento de taxa adicional no valor de €3,70. Se pretender informações sobre o pedido poderá solicitar um atendimento online ou contactar o Gabinete de Apoio ao Munícipe. (…) ” . 2.7. - Por escritura pública de compra e venda realizada no dia 11 de Junho de 2019 no Cartório Notarial sito na Rua …, Santiago do Cacém, C declarou vender a A e MF, que declararam comprar, pelo preço de €75.000,00, a fração autónoma designada pela letra AC, correspondente ao 5.º andar frente do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Av. Azedo Gneco, Massamá, inscrito na Conservatória de Registo Predial de Queluz sob o n.º … da freguesia de Massamá. 2.8. - Por contrato de compra e venda, datado de 09-07-2019, com termo de autenticação da mesma data, A declarou vender a B, representada no acto pela sócio gerente VN, que declarou comprar a mesma fração autónoma referida em 2.7. 2.9. - As aquisições referidas em 2.7. e 2.8 encontram-se inscritas na respetiva descrição predial através das Aps. 1178 de 11-06-2019 e Ap. 4222 de 11-07-2019. 2.10. - Da transação referida em 2.8 não foi preenchido e enviado ao Autor formulário /informação sobre direito de preferência. B) NÃO PROVADA 2.11. - Posteriormente ao email referido em 2.6. o Autor enviou novo email e tentou diligenciar pela marcação da escritura. 2.12. - O Autor tentou ligar para o número de telefone do Autor. * 3.- Da impugnação da decisão do tribunal a quo proferida sobre a matéria de facto. Analisadas as alegações e conclusões do apelante MUNICÍPIO DE SINTRA, e no que à decisão relativa à matéria de facto proferida pelo tribunal a quodiz respeito, inquestionável é que impugna o recorrente diversas respostas/julgamentos da primeira instância no tocante a vários/concretos pontos de facto integrantes da referida decisão, considerando para tanto terem sido todos eles incorrectamente julgados [designadamente os itens de facto n.ºs 2.11 e 2.12, ambos julgados não provados] . Por outra banda, tendo presente o conteúdo das apontadas peças recursórias, impõe-se reconhecer, observou e cumpriu o apelante MUNICÍPIO DE SINTRA todas as regras/ónus processuais a que alude o art.º 640º, nº1, do CPC, quer indicando os concretos pontos de facto que considera como tendo sido incorrectamente julgados, quer precisando quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa da recorrida, quer, finalmente, indicando também quais as diferentes respostas que deveria o tribunal a quo ter proferido. E, ademais, porque gravados os depoimentos das testemunhas pelo apelante indicados/invocados – como fundamento do erro na apreciação da prova -, procedeu o mesmo, outrossim, à indicação, com exactidão, das passagens da gravação efectuada e nas quais ancora a ratio da impugnação deduzida. Destarte, na sequência do exposto, nada obsta, portanto, a que proceda este Tribunal da Relação à análise do “mérito” da solicitada/impetrada alteração das respostas aos pontos de facto impugnados pelo recorrente MUNICÍPIO DE SINTRA. No âmbito da sindicância do mérito da impugnação de facto, importará ainda aferir da pertinência de serem aditados à decisão de facto dois “novos”, nos termos e ao abrigo do disposto na alínea c), do nº 2, do art.º 662º, do CPC. 3.1. – Do ponto de facto nº 2.11. (…) Em face da valia (claramente diminuta) da prova testemunhal acima escalpelizada e pelo autor indicada, manifestamente não se vislumbra existir qualquer erro de julgamento da primeira instância, razão porque o ponto de facto nº 2.11 não merece ser reconduzido ao elenco dos factos provados. Destarte, a impugnação do apelante Município dirigida para o ponto de facto nº 2.11 improcede. * 3.2. – Do ponto de facto nº 2.12. (…) Em suma, e em face do exposto, não têm (longe disso) (…) os depoimentos prestados (…) o valor suficiente para conduzir este Tribunal da Relação a modificar, no sentido pretendido pelo apelante MUNICÍPIO DE SINTRA, a resposta conferida ao ponto de facto nº 2.12. * 3.3. – Da almejada introdução no elenco dos factos provados de dois “novos” pontos de facto. Ainda no âmbito da impugnação da decisão de facto, impetra o apelante Município que – ainda com base na prova testemunhal atrás identificada - ao elenco dos factos provados sejam aditados dois novos factos , rezando os mesmos que: i) “ O Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso ” e ii) “ O Autor nunca conseguiu aceder ao interior do imóvel identificado em 2.1 porque o primeiro R. nunca respondeu às tentativas de contacto que lhe foram dirigidas pelo Autor ”. Em rigor, reclama o apelante que o tribunal ad quem lance mão dos poderes que lhe são conferidos pelo nº 2, alínea c), do art.º 662º, do CPC - os quais, de resto, devem ser exercidos ex officio, não estando sequer dependentes de uma qualquer solicitação requerida por uma qualquer das partes em sede de instância recursória -, reconduzindo ao rol dos Factos provados alguns dos que alegou nos seus articulados - indicando-os -, sendo que outros alegadamente resultaram da instrução da causa. Neste conspecto, recorda-se, diz-nos a citada disposição legal adjectiva que a Relação deve, mesmo oficiosamente “Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”. Deficiência existirá, diz-nos ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES (5), quando determinado ponto da matéria de facto ou algum seu segmento não tenha sido objecto de resposta positiva ou negativa, sendo que, a existir o referido vício e sem necessidade de a parte interessada na sua reparação o solicitar, e caso à disposição da segunda instância constem todos os elementos do processo que permitam (nos termos do nº 1, do art.º 662º, do CPC) a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, deve então o tribunal da Relação suprir de imediato o referido vício. (6) Ora, em sede do pretérito CPC [anterior ao aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho], e quando da elaboração no processo do despacho a que aludia o respectivo artº 511º, já o legislador advertia expressis verbis que em sede de selecção da matéria de facto, assente e controvertida, exigia-se que o juiz equacionasse todas as várias soluções plausíveis da questão de direito. Tal equivale a dizer que, aquando da fixação da base instrutória, impunha-se que o juiz se debruçasse sobre toda a matéria de facto articulada e , do respectivo conjunto/globalidade, reconduzisse à base instrutória da causa todos os factos relevantes para a decisão da causa, fazendo-o segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, isto é, devia aquela (base factual) adaptar-se a todas as referidas soluções em lugar de se cingir apenas a uma só, designadamente à perfilhada pelo juiz, estando-lhe vedado enveredar por um qualquer pré-julgamento [sob pena de obstar a que o tribunal de recurso, ao perfilhar uma diversa interpretação/solução, não dispor dos elementos que lhe permitam aplicar o direito nos termos que lhe pareçam os mais adequados] . (7) Isto dito, e analisando a factualidade que o Autor/apelante entende que justifica integrar o elenco dos factos provados, certo é que foi parte dela pelo referido Autor alegada na petição (vg. no seu art.º 14º), isto por um lado e, por outro, outra terá (ainda segundo o autor/apelante) resultado da instrução da causa, consubstanciando pelo menos factualidade que complementa e/ou concretiza factualidade efectivamente alegada na petição e resposta. Por outra banda, nada obriga a considerá-la com toda a segurança como sendo não ESSENCIAL (nos termos do nº1, do art.º 5º, do CPC), ou seja, como sendo de todo e manifestamente inócua e inútil para a decisão da causa e à luz de todas as mais variadas soluções plausíveis da subjacente questão de direito. Por último, na dúvida e ad cautelam - de modo a que não se ponha em causa o desiderato sempre desejável de a justa composição do litigio vir a ocorrer em prazo razoável -, e , constando dos autos [ o que não implica necessariamente a anulação da decisão proferida pelo tribunal a quo sobre a matéria de facto e, consequentemente, a repetição do julgamento ] todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto [ cfr. art.º 662º,nº 2 alínea c), do CPC ], importa que o tribunal ad quem não seja demasiado exigente e rigoroso em sede de cumprimento do dever plasmado na aludida disposição legal. Tudo visto e ponderado, temos assim por adequado [ em razão do entendimento perfilhado pelo Autor no tocante à solução da questão de direito ] que a factualidade pelo apelante indicada nas alegações recursórias ( em sede de impugnação da decisão de facto ) seja objecto de julgamento de facto por este tribunal da Relação, e sem prejuízo de, aquando da respectiva subsunção ao direito aplicável, venha a mesma a revelar-se incapaz para efeitos de alteração do julgado. Aqui chegados, e começando pelo “facto” atinente ao interesse do autor em exercer o direito de preferência [“O Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso”], a verdade é que não se mostra também ele amparado por qualquer depoimento testemunhal, quer de RC , quer sobretudo de MP. (…) Em face do acabado de expor, não pode portanto ser atendida a pretensão do recorrente no sentido de se dever incluir no elenco dos factos provados um novo, com a seguinte redação “O Autor teve interesse em exercer o direito de preferência para destinar o imóvel a arrendamento jovem no âmbito do programa que tinha em curso”. Restando o facto atinente ao acesso pelo autor ao interior do imóvel identificado em 2.1, (…) Assim, quanto ao referido ponto de facto, resta reconduzir ao elenco dos factos provados uma resposta restritiva, a saber, que: “O Autor, por razões não apuradas, não chegou a aceder ao interior do imóvel identificado em 2.1”. Em conclusão, a impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo procede parcialmente. *** 4.- Se deve a sentença apelada ser revogada, por pretenso error in judicando em sede de verificação dos factos constitutivos do direito pelo A/apelante invocado. Recordando, a acção pelo apelante MUNICÍPIO DE SINTRA intentada [com vista ao exercício do direito, potestativo, de preferência (8)] contra os ora apelados foi julgada totalmente improcedente, o que sucedeu com fundamento, no essencial, nos seguintes pressupostos: Primus - Tendo o autor/Município na acção intentada por desiderato exercer o direito de preferência em relação a compra e venda de imóvel outorgada em 11 de Junho de 2019 (entre o 3º Réu C, como vendedor, e o 1º Réu A, como comprador), certo é que o referido direito de preferência só poderia fundamentar-se no disposto no art.º 58º, nº 1, do DL n.º 307/2009, de 23 de Outubro [REGIME JURÍDICO DA REABILITAÇÃO URBANA] , rezando ele que “A entidade gestora tem preferência nas transmissões a título oneroso, entre particulares, de terrenos, edifícios ou frações situados em área de reabilitação urbana ”; Secundus - Para o exercer, e como respectivos pressupostos constitutivos do direito potestativo invocado, cabia assim ao autor/Município alegar e demonstrar [ porque não tem o Município um direito de preferência apenas e tão somente pelas suas vestes de autoridade, munida do seu ius imperii , antes está ele vinculado à verificação de determinados pressupostos e requisitos que têm de ser discriminados sob pena de ser inviável a sua sindicância ], designadamente, que : i)A fração objecto da transacção entre os acima identificados RR outorgada se situava em área de reabilitação urbana; ii) A mesma fração, no entendimento do autor/Município, deve ser objeto de intervenção no âmbito da operação de reabilitação urbana; iii) O autor/Município, na declaração de preferência comunicada ao réu vendedor, informa que o imóvel a adquirir/preferir se destina a ser objeto de intervenção no âmbito da operação de reabilitação urbana, tendo discriminado a intervenção de que o imóvel carece e o prazo dentro do qual pretende executá-la; Tertius - Não obstante o referido em secundus, acontece que in casu não alegou e provou o autor/Município ter observado devidamente dois dos pressupostos/requisitos do direito potestativo do qual se arroga titular, designadamente os identificados em ii) e iii) , não tendo em rigor o mesmo Município exercido validamente o direito de preferência em relação à primeira transação de 11 de Junho de 2019, quer do ponto de vista material – não observando os requisitos de fundamentação do art.º 58.º, n.º 3, do RJRU - quer do ponto de vista formal, uma vez que sendo uma declaração reptícia, a lei exige que a comunicação seja pessoal através de carta registada com aviso de receção ; Quartus – Sendo verdade que o Réu A veio a efectuar/concretizar a venda do imóvel a terceiro ainda antes do decurso do prazo de que dispunha o autor Município para exercer o direito de preferência, violando assim este último, tal não isentava o Autor de nesta ação fundamentar a preferência nos termos exigidos pelo art.º 58.º, n.º 3, do RJRU, ónus esse que a Autora não cumpriu e o qual é vinculado/vinculativo ; Quintus – Sendo pacífico que em relação à segunda venda (a de 09-07-2019, em que o Réu A declarou vender a B, a mesma fração autónoma referida em 2.7 ) , obrigado estava o 2.º Réu em cumprir o dever de comunicação imposto ao vinculado à preferência, transmitindo «o projeto de venda e as cláusulas do respetivo contrato”, o que não fez, violando assim a preferência, certo é que da referida violação não resulta e não pode resultar qualquer ganho na presente acção para o autor Município ; Sextus – O referido em quintus decorre de duas circunstâncias, a saber: i) a primeira, porque o pedido formulado pelo Autor é que “seja o 1.º Réu condenado a celebrar a escritura publica de compra e venda com o Autor relativa à fração identificada nos autos”, ou seja, nenhum pedido é feito no pressuposto da violação do direito de preferência na segunda transação, e nenhuma consequência é retirada dessa omissão de comunicação para a preferência; ii) a segunda, porque querendo o autor Município prevalecer-se, ainda que à cautela, da omissão de comunicação para a preferência e em relação à segunda transação, deveria não só ter formulado pedido em conformidade, como ainda depositado – uma vez mais à cautela – o valor dessa mesma transação, o que não fez. Conhecidos os fundamentos que subjazem/amparam a decisão vertida na sentença recorrida, sabemos (em razão das conclusões recursórias acima descritas) já também que a fundamentar a apelação do autor Município se mostram alinhadas razões de facto e de direito, sendo que, as primeiras, mostram-se por este tribunal já escalpelizadas (em 3.1. a 3.3.) e, no essencial, não se descortina que a alteração da decisão de facto (nos termos indicados em 3.3.) decidida por este tribunal seja capaz de, por si só [porque manifestamente irrelevante e inócua], de alterar o julgado. Restando as razões de direito pelo apelante invocadas, temos para nós que não se mostram igualmente as mesmas, à luz das mais variadas soluções plausíveis da questão de direito, “competentes” para infirmar a decisão recorrida, antes tudo aponta para o acerto e validade dos fundamentos/pressupostos [em nº de 6, acima identificados] utilizados pelo Primeiro Grau para julgar a acção como improcedente. Vejamos, em termos sucintos, as razões que nos levam a desatender as conclusões recursórias do Município/apelante, e antes em sufragar a judiciosa fundamentação de direito plasmada na sentença recorrida. Para começar, importa recordar que o autor/apelante, na sua petição inicial, e a amparar o direito de preferência do qual se arroga titular, invoca dois NORMATIVOS diversos, sendo um o do artigo 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10 e, o outro, o do art.º 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5. Já o tribunal a quo, em sede de fundamentação de direito da sentença recorrida, apenas alude expressamente [nada dizendo no tocante à possibilidade/viabilidade de o Município poder ancorar a sua pretensão no 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5 ] à pertinência de a pretensão do autor se poder escudar no artigo 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10, mas, porque prima facie não observados os necessários pressupostos/requisitos em termos materiais e formais, conclui pela inevitabilidade de a acção ter necessariamente que improceder. Por último, mais exactamente em sede de instância recursória, constata-se que apelante e apelados esgrimem essencialmente razões de facto e de direito (a fundamentar, respectivamente, a alteração e a manutenção do julgado) relacionadas apenas com a aplicabilidade in casu da norma do artigo 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10, não se debruçando de todo sobre a possibilidade de o Município poder ancorar a sua pretensão no 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5. Tendo presente o disposto no art.º 5º, n.º 3, do CPC [“ O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito”], e porque como há muito ensinava ANSELMO DE CASTRO (9), a propósito do princípio do conhecimento oficioso do direito ,que se traduz ele “ no dever que impende sobre o juiz de examinar a causa sobre todos os pontos de vista jurídico possíveis, movendo-se nesse domínio com toda a liberdade e sem adstrição às razões de direito invocadas pelas partes, não obstante lhes ser aconselhável a respectiva adução”, pertinente é portanto iniciar a abordagem do objecto da apelação aferindo da possibilidade de o thema decidenduum poder integrar o tatbestand do art.º 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5 [sobretudo tendo presente também a decisão proferida por este Tribunal da Relação de Lisboa, em recente Acórdão de 12/1/2023 (10) - Acórdão que, em relação a factualidade que apresenta contornos algo semelhantes à dos presentes autos, considerou/decidiu assistir ao Município o Direito de preferência com fundamento prima facie nos art.ºs 58º do DL 307/2009, de 23 de outubro e 155º do DL 80/2015, de 14 de Maio, e isto não obstante da factualidade assente resultar provado apenas que “O prédio onde se situa a fracção em causa nos autos encontra-se situado na Área de Reabilitação Urbana de Algueirão-Mem Martins/ Rio de Mouro” , e que “ No despacho do Presidente da Câmara Municipal de Sintra proferido a 28 de junho de 2019, pode ler-se o seguinte: “Exercer o direito de preferência (arrendamento jovem)” - , e o disposto no art.º 8º, nº 3, do CC]. E começando, certo é que o nº 1, do art.º 155º, do DL n.º 80/2015, de 14 de Maio [diploma que APROVA A REVISÃO DO REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL, desenvolvendo as bases da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo, definindo o regime de coordenação dos âmbitos nacional, regional, intermunicipal e municipal do sistema de gestão territorial, o regime geral de uso do solo e o regime de elaboração, aprovação, execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial – art.º 1º], reza que “ Sem prejuízo do previsto no regime jurídico da reabilitação urbana, os municípios têm o direito de exercer preferência nas transmissões de prédios, realizadas ao abrigo do direito privado e a título oneroso, no âmbito de execução de planos de pormenor ou de unidades de execução, designadamente para reabilitação, regeneração ou restruturação da propriedade”. Já o art.º 101º, nº1, do referido DL n.º 80/2015 , revela-nos que o “Plano de pormenor”, é aquele que “ desenvolve e concretiza em detalhe as propostas de ocupação de qualquer área do território municipal, estabelecendo regras sobre a implantação das infraestruturas e o desenho dos espaços de utilização coletiva, a implantação, a volumetria e as regras para a edificação e a disciplina da sua integração na paisagem, a localização e a inserção urbanística dos equipamentos de utilização coletiva e a organização espacial das demais atividades de interesse geral ”. Ou seja, o plano de pormenor trata-se de um instrumento sujeito a deliberação Municipal, sendo determinante para o processo de planeamento, e o qual desenvolve e concretiza as propostas de ocupação de qualquer área do território municipal, sendo ele aplicado a áreas de intervenção previamente definidas, podendo adaptar a modalidade de “reabilitação urbana ”, e sendo constituído por diversas peças, designadamente por um Programa de execução das ações previstas – art.ºs 102º a 107º do DL n.º 80/2015. Por sua vez, as “unidades de execução”, consubstanciam procedimentos – da iniciativa dos interessados, de cooperação e de imposição administrativa – que visam a execução de planos territoriais ( neles se incluindo os planos municipais ), sendo delimitados pela câmara Municipal, por iniciativa própria ou a requerimento dos proprietários interessados, e que , consistindo na fixação em planta cadastral dos limites físicos da área a sujeitar a intervenção urbanística, acompanhada da identificação de todos os prédios abrangidos, são “ delimitados de modo a assegurar um desenvolvimento urbano harmonioso e a justa repartição de benefícios e encargos pelos proprietários abrangidos, devendo integrar as áreas a afetar a espaços públicos, a infraestruturas ou a equipamentos previstos nos programas e nos planos territoriais” – Art.ºs 146º a 148º, do DL n.º 80/2015. Com pertinência para a questão decidenda, avisado é igualmente atentar que, nos termos do art.º 8, nºs 1, 2 e 3, do DL n.º 80/2015 , “ Os programas e os planos territoriais identificam os interesses públicos prosseguidos, justificando os critérios utilizados na sua identificação e hierarquização”, “asseguram a harmonização dos vários interesses públicos com expressão territorial, tendo em conta as estratégias de desenvolvimento económico e social, bem como a sustentabilidade e a solidariedade intra e intergeracional na ocupação e utilização do território, assegurando a qualidade de vida e um equilibrado desenvolvimento socio económico às gerações presentes e futuras”, e “devem estabelecer as medidas de tutela dos interesses públicos prosseguidos e explicitar os respectivos efeitos, designadamente quando essas medidas condicionem a ação territorial de entidades públicas ou particulares”. Em face de tudo o acabado de expor, e interpretando conjugadamente as disposições legais supra citadas do DL n.º 80/2015, é nossa convicção que não permite de todo a factualidade assente subsumir o direito do qual se arroga o apelante/Município titular no âmbito do referido diploma legal, maxime não permite concluir que o direito de preferência que através da presente acção visa salvaguardar e concretizar mostra-se suportado e escudado no artº 155º, do REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL, sendo o mesmo a respectiva norma legal habilitante . É que, não estando em causa um facto notório (art.º 5º, nº 2, do art.º 5º, do CPC), certo é que não decorre de todo da factualidade [de resto igualmente não alegada sequer] que integra a motivação de facto, que a fração AC identificada em 2.2. integra um prédio que se encontra abrangido/sujeito a execução de plano de pormenor ou de unidade de execução, designadamente para efeitos de reabilitação, regeneração ou restruturação da propriedade, logo, pode ser objecto do exercício do direito potestativo por parte do Município de Sintra. Destarte, estando em causa um direito de preferência que é legal, estando, portanto, tipificado na lei, lei que identifica o seu alcance e fundamento, e lei que consubstancia uma norma excepcional, logo, não comporta aplicação analógica, temos assim que não serve o art.º 155º, do REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL, de fundamento pertinente e capaz de alterar o julgado. Acresce que, estando em causa a utilização de efectivo instrumento público - de prossecução de uma política urbanística - de execução de plano municipal [plano que deve explicitar, de forma clara, os fundamentos das respetivas previsões, indicações e determinações], pacifico é que a respectiva utilização pelo Município está sujeita ao principio da “tipicidade” ou do numerus clausus , não podendo pecar por “excesso” ou por utilização indevida , não olvidando ainda a sujeição de toda a actividade administrativa ao princípio da legalidade , qual verdadeira “ garantia do cidadão contra arbítrio do administrador ” (11) [ cfr. art.ºs 1º, 8º, nº 1, 75º, 146º, nº 1, e 155º, nº 1, todos do REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL ]. Vejamos, então, já de seguida, da viabilidade de a pretensão do autor se poder escudar no artigo 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10, sendo que, no âmbito da instância recursória, é precisamente com fundamento nesta última disposição legal que vem o autor/Município insistir assistir-lhe o direito de preferência em relação à compra e venda de imóvel outorgada em 11 de Junho de 2019, direito que, considera, foi-lhe – erradamente - pelo Primeiro Grau negado . Ora Bem. Diz-nos o art.º 58º, nº 1, do DL n.º 307/2009, de 23 de Outubro (11) [“A entidade gestora tem preferência nas transmissões a título oneroso, entre particulares, de terrenos, edifícios ou frações situados em área de reabilitação urbana”], sendo que, como decorre do art.º 10º, n.º 1, alínea a), do referido diploma legal, o Município pode revestir a qualidade de entidade gestora”. Ou seja, e em rigor, o direito de preferência pelo autor/apelante invocado é legal, estando tipificado na lei , lei que igualmente clarifica e informa qual o seu fundamento, sendo a respectiva norma legal habilitante a do art.º 58º, nº 1, do RJRU, isto é , arroga-se o autor titular de preferência porque em causa está uma transmissão a título oneroso, entre particulares, de fraçção situada em área de reabilitação urbana, que o mesmo é dizer [de acordo com a definição constante da alínea b) do artigo 2.º do RJRU] situada em “a área territorialmente delimitada que, em virtude da insuficiência, degradação ou obsolescência dos edifícios, das infraestruturas, dos equipamentos de utilização coletiva e dos espaços urbanos e verdes de utilização coletiva, designadamente no que se refere às suas condições de uso, solidez, segurança, estética ou salubridade, justifique uma intervenção integrada, através de uma operação de reabilitação urbana aprovada em instrumento próprio ou em plano e pormenor de reabilitação urbana ” . Depois, rezando o nº 3, do art.º 58º, do RJRU, que “ O direito de preferência previsto no n.º 1 apenas pode ser exercido caso a entidade gestora entenda que o imóvel deve ser objeto de intervenção no âmbito da operação de reabilitação urbana, discriminando na declaração de preferência, nomeadamente, a intervenção de que o imóvel carece e o prazo dentro do qual pretende executá-la ”, pacífico é também que , como bem nota o Primeiro Grau, para exercer o direito potestativo invocado, sobre o autor/Município recaia o ónus de alegar e demonstrar [porque factos constitutivos do direito em causa] a verificação dos respectivos pressupostos e requisitos, designadamente os plasmados no referido nº 3, do artº 58º, do RJRU. Mais exactamente, para que o direito de preferência possa ser exercido pela entidade gestora/Município, não basta que o imóvel em questão esteja enquadrado em ARU [o que decorre do item de facto nº 2.3., estando ele dentro da Área de Reabilitação Urbana de Massamá e Monte Abraão], sendo igualmente necessário que o mesmo esteja inserido numa concreta operação de reabilitação urbana ( ORU ), tal como o refere expressis verbis o n.º 3 do citado artigo 58.º, sendo que, uma ORU, como decorre da definição constante da alínea h) do artigo 2.º do RJRU, trata-se de «o conjunto articulado de intervenções visando, de forma integrada, a reabilitação urbana de uma determinada área», podendo (agora nos termos do artigo 8.º do mencionado diploma legal) a ORU ser simples ou sistemática. De resto, da globalidade do regulamentado no RJRU decorre com segurança que à delimitação de uma ARU mostra-se forçosamente associada à aprovação de uma ORU - que poderá ser aprovada em simultâneo ou com diferimento temporal, sendo o instituto do Direito de preferência mero (a par de outros ) instrumento de execução – em sede de REABILITAÇÃO URBANA - de ORU no âmbito da prossecução pelo Município da sua política urbanística – cfr. art.º 2º,alíneas b),h), j) e k) ; art.º 7º, nº 1, alíneas a) e b) ; art.º 15º, e art.º 54º, nº 1, alínea d), todos do RJRU . Dito de uma outra forma e concretizando [nos termos utilizados no douto Acórdão do Tribunal de Contas (12) nº 08/2020 (13)] “para que o direito de preferência previsto no artigo 58.º, n.º 1 do RJRU possa ser exercido, não basta que o imóvel se situe em Área de Reabilitação Urbana (ARU) e que esteja inserido numa operação de reabilitação urbana (ORU) em curso”, sendo que, “ Tratando-se… de uma ORU simples,…, tal direito de preferência apenas teria cobertura legal caso estivesse em causa uma intervenção de reabilitação no respetivo património edificado, concretamente nos prédios que incluem as frações a adquirir …”. Neste conspecto, importa não olvidar que estando em causa o exercício de um direito legal de preferência, sabido é que as razões que por regra o justificam mostram-se sempre relacionadas com interesses de ordem pública, os quais os particulares não podem frustrar, isto por um lado e, por outro, compreensível é também que as normas que regulam as relações jurídicas em que se inserem os mesmos direitos legais de preferência tenham carácter imperativo (14), a ponto de v.g não existindo base legal para o exercício dum direito de preferência na aquisição de imóveis por uma autarquia, se dever concluir que [por força do disposto no artigo 42.º, n.º 6, al. a) da Lei de Enquadramento Orçamental (15)] o facto gerador da correspondente despesa ( que é o da invocação do exercício do direito de preferência ) carece de base legal, ficando a faltar um pressuposto para que a Câmara Municipal possa sequer deliberar validamente quando autoriza a subjacente despesa, a que acresce que, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 59.º do Regime Jurídico das Autarquias Locais (16), são nulas “As deliberações de qualquer órgão das autarquias locais que determinem ou autorizem a realização de despesas não permitidas por lei ”. (17) Ou seja, como bem avisa AGOSTINHO GUEDES (18), no âmbito das preferências legais, como o é a “nossa”, assiste-se à presença de reflexos de uma ordem pública económica de protecção e de uma ordem pública de direcção, com a singularidade de, no caso da preferência, a sua realização ser conseguida através da atribuição de direitos a particulares colocados em situações jurídicas típicas (…), cujo exercício depende, em cada caso, do modo como cada titular concreto os avalia no contexto dos seus interesses privados”, sendo que, “para além dos pressupostos descritos abstractamente nos art.ºs 414º e seguintes do Código Civil, a constituição de direitos de preferência legais pode depender ainda de certos condicionalismos previstos nas normas que criam esses direitos”. Destarte, no seguimento do exposto, e arrogando-se um Município em acção por si intentada como sendo titular de um direito legal de preferência, é óbvio que ao autor/Município recai o ónus de alegar e provar todos os respectivos pressupostos, maxime do ponto de vista material, porque todos eles consubstanciam claramente factos constitutivos do direito de preferência invocado (19), logo, na referida parte [de acordo com as regras de repartição do ónus de prova previstas no art.º 342º, nº 1, do CC , incumbindo-lhe o ónus de alegar e provar a subjacente causa de pedir], mostra-se assim a decisão recorrida isenta de censura quando na mesma se diz que não logrou o autor cumprir/observar na acção o que lhe competia . É que, na verdade, não permite de todo a factualidade provada concluir que estando é certo o imóvel/fracção dos autos enquadrado em ARU ( como está ), está também o mesmo inserido numa concreta operação de reabilitação urbana ( ORU ), devendo ser objeto de intervenção no âmbito da aludida operação de reabilitação [justificando-se assim o direito de preferência, ou seja, de direito potestativo se trata que não é pelo legislador atribuído ao Município sem mais (“a se”, bastando a vontade de exercer o direito, mas sem que exista nenhuma finalidade especial subjacente), mas apenas enquanto instrumento de execução de política urbanística (também vontade de exercer o direito , é verdade, mas com uma especial/típica finalidade), em suma, com vista a atingir-se concreto OBJECTIVO - cfr. artºs 3º e 54º, ambos do RJRU - , sendo de resto o preâmbulo do referido diploma legal claro em expressar que “ A reabilitação urbana assume-se hoje como uma componente indispensável da política das cidades e da política de habitação, na medida em que nela convergem os objectivos de requalificação e revitalização das cidades, em particular das suas áreas mais degradadas, e de qualificação do parque habitacional, procurando-se um funcionamento globalmente mais harmonioso e sustentável das cidades e a garantia, para todos, de uma habitação condigna.]. É vero que no próprio dia da informação sobre o exercício do direito de preferência apresentada ao autor Município em 1-06-2019 , veio o réu C a outorgar com A e MF uma escritura de compra e venda da fração autónoma objecto do direito de preferência, o que equivale a dizer que incorre o mesmo réu C no mesmo dia na violação do dever essencial que incide sobre o obrigado à preferência e o qual se traduz no dever de não celebrar o contrato preferível com terceiro. Não obstante, da violação da obrigação de não contratar que recai sobre o réu C [e ao assumir, ao invés, uma conduta positiva ao celebrar o contrato preferível em detrimento do direito do Município preferente] , o que resulta [cfr. art.º 1410º, nº 1, do CC , ex vi do artigo 1380º n.º 4 do Código Civil ] é tão somente a faculdade/direito do preferente preterido de lançar mão de imediato da acção de preferência [acção cuja causa de pedir engloba sempre a transmissão da propriedade da coisa (20)] , acção em que - para proceder - tem sempre o demandante de alegar e demonstrar a existência do direito do qual se arroga titular (art.º 342º, nº 1, do CC). Em suma, da aludida violação não decorre, longe disso, a dispensa do supra aludido ónus de alegação e prova quanto à existência do direito de preferência maxime sob o ponto de vista material [mais exactamente dos factos dos quais depende a existência do direito], apenas se podendo aceitar a dispensabilidade de alegar e provar o cumprimento dos requisitos formais atinentes ao exercício do direito de preferência, designadamente o envio da declaração reptícia de preferência, maximese durante o período/prazo em que o titular do direito de preferência a deve proferir e enviar, vem a ser confrontado com a alienação a terceiro da coisa objecto do contrato preferível [dir-se-á que se a violação do direito de preferência é consumada, acaba por revelar-se já inútil qualquer posterior manifestação de vontade de exercício do direito de preferência]. Em razão do acabado de expor, mostra-se destituída de aceitabilidade e pertinente ponderação a crítica que o apelante dirige ao tribunal a quo e no sentido de que ao decidir nos termos constantes da sentença, “decidiu premiar o comportamento culposo levado a cabo pelo primeiro R.”, proferindo “sentença escandalosa e intoleravelmente ofensiva do sentimento comum de Justiça, prevalecente na comunidade”. Por último, e neste caso de forma mais manifesta, mostra-se igualmente desprovida de qualquer fundamento legal a conclusão recursória dirigida para a procedência da acção mesmo no tocante ao contrato preferível outorgado em 09-07-2019 [o indicado no item de facto nº 2.8.], desde logo porque se através da acção de preferência tem o titular lesado a faculdade de se colocar na posição do terceiro adquirente, como se o contrato tivesse sido concluído consigo desde o início, então é óbvio que com referência à compra e venda outorgada entre C… e a B, Lda, obrigado estava [e no pressuposto que direito de preferência é exercido contra o último adquirent] o autor Município em proceder ao depósito [nos termos do art.º 141º, nº 1, do CC] do montante de 115.000,00€, que foi o preço pago pelo comprador A [cfr. teor da escritura junta aos autos no reqtº Refª 38831440 e de 11/5/2021]. É que, como é consabido, o direito legal de preferência apenas confere ao respectivo titular a faculdade de, em igualdade de condições, se substituir a qualquer adquirente da coisa sobre que aquele incida, o que equivale a dizer que o seu “significado radica na obtenção de um bem, tanto por tanto” e que “a preferência, para ser exercida, implica uma predisposição do preferente para assumir todo o contexto da relação jurídica que subsiste e, na qual, apenas muda um polo subjectivo ”. (21) Logo, e em face do disposto no artigo 1410.º, n.º 1, do Código Civil, e como condição ou pressuposto do efectivo exercício da acção de preferência, sobre o autor incidia igualmente o ónus de proceder ao depósito do “preço devido” [ou o beneficio económico conseguido pelo sujeito passivo da obrigação de preferência, e isto porque o preferente limita-se a exercer um direito de adquirir certo bem com prioridade sobre terceiros pagando o preço livremente aceite pelo sujeito passivo (22)] no tocante à segunda venda [depositando, se não a totalidade do preço, pelo menos a diferença entre o depósito efectivamente realizado nos autos e o valor de €115.000,00, valor este último correspondente ao preço usado pelo legislador no art.º 1410º, nº 1, do CC, e plasmado na escritura preferida de 09-07-2019], só assim podendo o mesmo substituir-se ao adquirente, em igualdade de condições . Tudo visto e ponderado, não obstante nada impedir que o titular do direito de preferência, quando confrontado por duas compras e vendas autónomas e violadoras , ambas, do referido direito, possa exercer o respectivo direito de preferência sobre qualquer uma delas [ claro está, desde que recorrendo à faculdade adjectiva do art.º 554º, do CPC], e isto porque o preferente adquire em qualquer dos casos o imóvel substituindo-se ao comprador que adquiriu legitimamente a coisa do anterior proprietário vendedor, e , ademais, a circunstância de, após a primeira transmissão - e antes ainda da acção de preferência ser proposta -, o comprador ter alienado o imóvel a terceiro, não determina a extinção do direito de preferência [pois isso seria a negação dos direitos de sequela e de prevalência que são características essenciais dos direitos reais (23)], certo é que in casu ( e pelas razões aduzidas pelo Primeiro Grau , relacionadas com a extinção, por caducidade ,do direito de preferir ) também não poderia a acção proceder no tocante à segunda venda, ainda que eventualmente também ela “violadora” do Direito de Preferência do autor. (24) Neste conspecto, sempre se adianta todavia que para a procedência da acção no tocante à primeira venda não estava sequer o autor Município de alegar/provar assistir-lhe igualmente o direito de preferência no tocante à segunda venda, e isto porque, como é entendimento consensual na doutrina e jurisprudência, “o ganho de causa pelo preferente na respectiva acção tem como efeito a substituição do adquirente pelo titular do direito de preferir, substituição essa que opera com eficácia retroactiva à data da celebração do contrato entre sujeito passivo e adquirente, tudo se passando como se o contrato tivesse sido originalmente celebrado entre aquele e o titular da prelação”, ou seja, os efeitos da sentença quanto à transmissão da coisa operam ex tunc . (25) Em conclusão, perante tudo o acabado de expor, a apelação do Município de Sintra improcede in totum, pois que, o Direito de Preferência do qual se arroga titular, não encontra amparo legal – e em face da factualidade provada - , quer no artigo 58.º do Decreto-Lei nº 307/2009, de 23/10, quer no 155.º do Decreto-Lei 80/2015, de 14/5, logo, bem andou o Primeiro Grau em julgar a acção como improcedente. * 5 - Concluindo (cfr. nº 7, do art.º 663, do CPC): 5.1. – Para que um Município possa exercer o direito de preferência que lhe confere o art.º 58º, nº 1, do DL n.º 307/2009, de 23 de Outubro [REGIME JURÍDICO DA REABILITAÇÃO URBANA], carece de alegar e demonstrar [porque não tem o Município o referido direito de preferência apenas e tão somente pelas suas vestes de autoridade, munida do seu ius imperii] , designadamente, que : i) A fração objecto do contrato preferível se situava em área de reabilitação urbana; ii) A mesma fração, no entendimento do autor/Município, deve ser objeto de intervenção no âmbito de uma operação de reabilitação urbana; iii) O autor/Município, na declaração de preferência comunicada ao réu vendedor, informa que o imóvel a adquirir/preferir destina-se a ser objeto de intervenção no âmbito da operação de reabilitação urbana, nela também discriminando a intervenção de que o imóvel carece e o prazo dentro do qual pretende executá-la; 5.2. – Ainda que o Réu obrigado venha a efectuar/concretizar a venda do imóvel a terceiro ainda antes do decurso do prazo de que dispõe o autor Município para exercer o direito de preferência, violando assim este último, tal não isenta o Autor de na acção de preferência fundamentar o direito arrogado nos termos exigidos pelo art.º 58.º, n.ºs 1 e 3, do RJRU; 5.3. - Nada impede que o titular do direito de preferência, quando confrontado por duas compras e vendas autónomas e violadoras , ambas, do referido direito, possa exercer o respectivo direito de preferência sobre qualquer uma delas [claro está, desde que recorrendo à faculdade adjectiva do art.º 554º, do CPC] , e isto porque o preferente adquire em qualquer dos dois casos o imóvel substituindo-se ao comprador que adquiriu legitimamente a coisa do anterior proprietário vendedor, e, ademais, a circunstância de, após a primeira transmissão - e antes ainda da acção de preferência ser proposta -, o comprador ter alienado o imóvel a terceiro, não determina a extinção do direito de preferência [pois isso seria a negação dos direitos de sequela e de prevalência que são características essenciais dos direitos reais]; *** 6. - Decisão Em face de tudo o supra exposto, acordam os Juízes na 6ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Lisboa, em, não concedendo provimento ao recurso interposto por MUNICÍPIO DE SINTRA: 6.1. - Introduzir alterações na decisão de facto proferida pela primeira instância; 6.2 - Manter, ainda assim, a sentença apelada, sendo a acção julgada improcedente * As custas na acção e na apelação são a suportar pelo Autor apelante. *** LISBOA, 26/1/2023 António Manuel Fernandes dos Santos Ana de Azeredo Coelho Eduardo Petersen Silva _______________________________________________________ (1) Cfr. Ac. do STJ de 2/11/2020, proferido no Proc. Nº 2168/17.8T8PNF.P1.S1 e em www.dgsi.pt. (2) Cfr. de entre muitos outros os Acs. do STJ de 2/12/2013, proferido no Proc. Nº 1420/06.2TVLSB.L1.S1, de 24/1/2012, proferido no Proc. nº 1156/2002.L1.S1, e de 3/11/2020, proferido no Proc. nº 13148/18.6T8LSB-B.L1.S1, todos em www.dgsi.pt. (3) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2010, 3ª Edição, pág. 309. (4) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, ibidem, pág. 318. (5) Cfr. Em Recursos em Processo Civil, Novo Regime 2010, Almedina, pág.s 332/333. (6) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES , ibidem. (7) Cfr. v.g. ABÍLIO NETO, em CPC ANOTADO, 13ª EDIÇÃO, Ediforum, nota ao artº 511º . (8) Cfr. v.g. o Professor MANUEL HENRIQUE MESQUITA, in “ Obrigações Reais e Ónus Reais”, TESES, Almedina, 1990, págs. 210 e segs.. (9) Em Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, 1982 , págs. 155/156. (10) Proferido no Processo nº 19496/19.0T8SNT.Li, 8ª Secção, e em www.dgsi.pt. (11) Cfr. ROGÉRIO EHRHARDT SOARES, Princípio da Legalidade e Administração Constitutiva, em Boletim da Faculdade de Direito, vol. LVII, 1981, páp. 169 . (12) Doravante indicado apenas por RJRU ( REGIME JURÍDICO DA REABILITAÇÃO URBANA). (13) Tribunal que tem precisamente a competência material essencial de “ Fiscalizar previamente a legalidade e o cabimento orçamental dos actos e contratos de qualquer natureza que sejam geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e responsabilidades, diretos ou indiretos, para as entidades referidas no n.º 1 e nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 2.º, bem como para as entidades, de qualquer natureza, criadas pelo Estado ou por quaisquer outras entidades públicas para desempenhar funções administrativas originariamente a cargo da Administração Pública, com encargos suportados por financiamento direto ou indireto, incluindo a constituição de garantias, da entidade que os criou ” – cfr. artigo 5.º, n.º 1. al. c), da LOPTC - LEI DE ORGANIZAÇÃO E PROCESSO DO TRIBUNAL DE CONTAS. (14) Da Secção 1ª S/SS, datado de 06/02/2020 e proferido no Processo nº 3033/2019, sendo Relator o Conselheiro FERNANDO OLIVEIRA SILVA e acessível em https://www.tcontas.pt/pt-pt/ProdutosTC/acordaos/1sss/Documents/2020/ac08-2020-1sss.pdf. (15) Cfr. P. LIMA/A.VARELA, em CC Anotado, vols. I e II, apud CARLOS LACERDA BARATA, em Da Obrigação de Preferência, contributo para o estudo do art.º 416º, do CC, Coimbra Editora, 1990, pág. 141, nota 336. (16) Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, na redação da Lei n.º 41/2014, de 10 de julho, entretanto revogada pela Lei n.º 151/2015, de 11 de Setembro, correspondendo ao artº 42º da primeira o actual art.º 52º da segunda; (17) Aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro ,com as sucessivas alterações, as últimas das quais introduzidas pela Lei n.º 66/2020, de 04 de Novembro; (18) Cfr. Acórdão do Tribunal de Contas identificado na antecedente nota 14; (19) Em O Exercício Do Direito de Preferência, TESES, PORTO 2006, Pág. 74/75 e 353. (20) Cfr. designadamente HENRIQUE MESQUITA, em Direito de Preferência, CJ XI 1986, 5, 50, CARLOS LACERDA BARATA, ibidem, pág. 157 e segs. e Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11/12/2007, Proferido no Processo nº 160/04, e em www.dgsi.pt. (21) Cfr. CARLOS LACERDA BARATA, ibidem, págs. 153/155. (22) Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18/2/2014, Proferido no Processo nº 316/11.0TBVZL.C1, e em www.dgsi.pt. (23) Cfr. AGOSTINHO GUEDES, ibidem , pág. 656. (24) Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17/11/2005, Proferido no Processo nº 7145/2005-8, e em www.dgsi.pt. (25) Para AGOSTINHO GUEDES [ ibidem, pág 678/679 ], porém, na hipótese de o direito de preferência ser exercido contra o último adquirente , e de acordo com as regras da preferência, “ não deveria haver dúvidas que o preço devido pelo preferente é o correspondente à primeira alienação, por ser essa que corresponde à decisão do sujeito passivo, pressuposto do direito potestativo do preferente, e é essa também a solução que se insere na lógica substitutiva ou sub-rogatória do exercício do direito de prioridade”. (26) Cfr. AGOSTINHO GUEDES, ibidem, pág. 666. |