Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1/14.1TVLSB.L1-1
Relator: MANUEL RIBEIRO MARQUES
Descritores: CLAUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
BOA-FÉ
EXERCÍCIO DO DIREITO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/29/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEENTE
Sumário: 1.Dos arts 635º, n.º 4, e 639º, n.º 1,do CPC, resulta não só que as conclusões devem configurar um resumo das alegações, mas também que não devem conter matéria que não tenha expressão nas alegações-
2.As cláusulas contratuais gerais caracterizam-se não só pela pré-formulação (ou elaboração prévia), mas também pela sua generalidade e imodificabilidade.
3.A suppressio traduz uma situação do direito que não tendo sido exercido durante um determinado lapso de tempo, não possa mais sê-lo por, de outra forma, se contrariar a boa- fé, independentemente da existência ou inexistência de culpa por parte do titular não-exercente.
4.Podendo a autora, a todo o tempo, denunciar os contratos de agenciamento de estações de correio, ofende de forma clamorosa as regras da boa- fé, a manutenção pela mesma, durante os 6 anos da vigência inicial dos contratos, do cumprimento das sua normas, assim como do cumprimento da nova tabela de comissões imposta pela contraparte com efeitos a partir de 1/05/2006, com a qual, objectivamente aquela se conformou, ao não exercitar durante aquele período e bem assim após a renovação dos contratos por mais dois anos (até 30 de Dezembro de 2012), o direito à declaração de nulidade da cláusula contratual ao abrigo da qual foi alterada a tabela de comissões, fazendo-o apenas, como que em retaliação, após o termo dos contratos por iniciativa da contraparte.

(Sumário elaborado pelo Relator)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:



I. ……., Lda instaurou a presente acção declarativa de processo comum contra …..- Correios de ..., S.A., pedindo:

1º-a.-seja excluída do contrato a cláusula 5ª n.º 6, nos termos do art.º 7° da LCCG, subsistindo o contrato singular;
ou, caso assim não se entenda,
b.-seja declarado nulo [o contrato], por contrário ao principio da boa-fé, por proibido, nos termos do art.º 15° e 16° da LCCG, devendo proceder-se á sua redução, nos termos dos art. s 13° e 14° do mesmo diploma;
ou, caso assim também não se entenda,
c.-seja declarado nulo [o contrato] nos termos gerais de direito por ter sido a sua inclusão e accionamento abusivos e contrários ao principio da boa­fé.
2º-deve, em consequência, ser a Ré condenada a pagar a comissão de 20% para todas as vendas de serviços e produtos de correio desde 01.05.2006. até Dezembro de 2011, conforme o estipulado no contrato negociado, no valor de € 641 .526,12 e os ulteriores até ao final do contrato, a fixar em liquidação de sentença;
3º-deve ser a Ré condenada a pagar á autora a quantia de € 45.600,00, respeitante ao incentivo da ... Mundial;
4º-deve ser a Ré condenada a indemnizar a A. em € 50.000,00 por conta dos danos alegados nos artigos 95° a 103° da petição inicial.
Alegou para tanto e em síntese que no ano de 2004 a Ré delineou um programa de parcerias que visava adaptar a rede de estações de correios ao novo mercado, mantendo um desígnio lucrativo e minimizando os custos, tendo ainda estabelecido uma parceria comercial com a seguradora ...-Mundial no sentido de os respectivos produtos e serviços serem comercializados nas estações dos correios; que a Ré publicitou a implementação da rede de parcerias através de uma brochura que junta, na qual se mencionava que o parceiro receberia 20% no que respeitava à venda de serviços e produtos de correio; que a Ré convidou alguns funcionários para se tornarem agentes de estações, passando a exercer a actividade através de uma sociedade e assumindo eles a qualidade de gerentes; que foi nesse enquadramento que foi constituída a autora em 13/09/2004; que a A. iniciou a exploração de duas estações, que indica; que a A veio a assinar dois contratos, um para cada uma das estações, denominados " Acordos de parceria - contratos de agenciamento de estação de correio" a 04.01.2005; que na data da outorga dos contratos verificou estar incluída no contrato a cláusula 5ª n.º 6 em que se dizia que" as comissões referidas na alínea a) do número um da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, desde que a alteração seja comunicada à segunda contratante com a antecedência mínima de 60 (sessenta) dias relativamente á sua entrada em vigor "; que tal cláusula não constava da brochura e na versão originária; que no referido dia teve lugar uma reunião de emergência em que a A manifestou á Ré o seu desagrado pelo facto de ser aposta no contrato a referida cláusula sem discussão negocial prévia com os parceiros; que a representante da Ré declarou que a referida cláusula não se aplicava; que como foi garantido que a cláusula não se aplicava e sujeita às pressões do momento, a A manteve a sua vontade negocial; que no dia da assinatura do contrato a Ré comunicou que a referida alteração produziria efeitos a partir de 01.05.2006 e que o valor dos serviços de correspondência ocasional passaria a ser pago: vendas até €7.500,00 – 20%; vendas entre €7.500,00 e €15.000,00 – 10%; vendas superiores a €15.000,00 – 5%; que a cláusula 5ª, n.º 6 foi aposto em todos os contratos, unilateralmente e sem possibilidade de negociação; que as comissões a receber por parte da A eram uma condição essencial para a celebração do contrato; que a Ré não comunicou a cláusula por meio próprio nem em tempo útil, pelo que deve ser considerada excluída, a não se entender assim, a cláusula é nula por contrária á boa-fé; que a inclusão da cláusula foi abusiva e forçada no momento da assinatura do contrato; que com base na brochura a A tinha legítimas expectativas de que a comissão de 20% se mantivesse na execução do contrato; que deve a Ré ressarcir a A da diferença de comissões, no valor de € 641.526,12; que no contrato previa-se a venda de produtos de seguros ...-Mundial nas suas estações, estabelecendo-se que "durante os três primeiros anos de actividade a segunda contratante e, no caso em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a € 950,00, a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00"; que a Ré apenas pagou 12 meses, nada tendo pago nos restantes 24 meses, pelo que deve pagar a quantia de €45.600,00; que a fixação de um comissionamento regressivo, levou a um desânimo dos quadros dirigentes da A, reflectindo-se na produtividade das duas estações de correios, originando uma diminuição da facturação, nos termos que indica, o que constitui a Ré na obrigação de indemnizar a A num valor não inferior a € 50.000,00.

A ré contestou, tendo alegado que o ponto 6 da cláusula 5ª não se encontrava incluído na brochura nem na versão originária do contrato, fornecida para análise, discussão e aprovação, mas que no dia 30 de Dezembro de 2004 enviou, por correio electrónico, a todos os parceiros, incluindo para o sócio­-gerente da A, a versão final dos contratos, a assinar no dia 4 de Janeiro, sendo falso que apenas tenha tido conhecimento do mesmo na data da assinatura; que a A formulou um juízo critico sobre a cláusula e manteve a sua vontade negocial; que a A não demonstra que lhe foi recusada qualquer possibilidade de negociação, demonstra e confessa que não apresentou qualquer proposta de alteração desta cláusula e que apesar de não lhe agradar o conteúdo da mesma, conformou-se e manteve a vontade negocial, assinando, sem reservas, os contratos; que a cláusula em referência não está sujeita ao regime das cláusulas contratuais gerais; que desde que a A teve conhecimento da versão final dos contratos até ao momento da entrada em vigor da nova tabela, nunca encetou qualquer diligência no sentido de modificar ou simplesmente excluir a cláusula 5ª n.º 6; que foi a lógica do interesse público inerente à actividade dos ... que esteve na génese da inclusão no contrato da referida cláusula, a qual deve ser entendida e interpretada como uma válvula de escape ou correctora das parcerias, sujeitas às directrizes impostas pela entidade reguladora; que a A passou a oferecer condições diferenciadoras às oferecidas pela Ré e a prestação de outros serviços, contactando clientes do serviço postal contratualizado, para passarem para o serviço postal não contratualizado, o que se constata no crescimento exponencial do volume de negócios das estações de correios e recolha de correio ao domicilio, serviço que nunca fez parte do modelo de negócio e que era oferecido de forma gratuita; que tal prática sempre seria necessária a autorização da ré, que não ocorreu, sendo uma prática desleal; que daí resultou a necessidade da autora lançar mão da cláusula 5ª, n.º 6, de forma a manter o equilíbrio contratual; que os contratos vieram a terminar a 30 de Dezembro de 2012, por oposição à renovação operada pela Ré; que durante a vigência do contrato a A conformou-se com a tabela de comissões que lhe era aplicada, aceitando as comissões que eram pagas; que a invocação pela A da nulidade da cláusula constitui abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, tendo criado a confiança de que não iria adoptar qualquer conduta que viesse contrariar o por si previamente assumido; que nem todos os produtos e serviços eram taxados a 20%, alguns dos produtos que eram taxados a 20% continuam a sê-lo; a nova tabela de comissionamento não teve reflexo na actividade dos parceiros e nos montantes por si auferidos, tendo em conta os modelos de avaliação; que a suspensão do incentivo da ...-Mundial se ficou a dever ao facto de não serem cumpridos os objectivos, de que a A tinha conhecimento; que a descida dos valores da facturação apenas tem lugar a partir de 2009, 3 anos após a aplicação da nova tabela, não havendo um nexo de causalidade entre a conduta da Ré e a quebra de facturação, que resulta da crise económica e da adesão cada vez maior a meios alternativos de comunicação, mormente electrónicos.

A ré deduziu ainda reconvenção.

A autora replicou, tendo alegado, além do mais, que teve conhecimento da alteração da cláusula 5ª cinco dias antes da assinatura do contrato, tendo o mail chegado ao conhecimento do representante da A no dia seguinte, 31.12.2004; que a antecedência exigida pelo art.º 5° n.º 2 da LCCG não foi cumprido; que no dia da assinatura do contrato foi dito que a alteração resultava de uma imposição do regulador ( ICP - ANACOM) e nunca seria para aplicar, o que provocou um erro no declarante, a aqui A, provocado por dolo; que a Ré está vinculada ao negócio nos termos em que o quiserem celebrar, ou seja, com as percentagens que foram estipuladas na fase pré-negocial e não as que foram comunicadas em 2006.

Pelo despacho de fls. 1053/1056 não se admitiu a reconvenção.

Foi proferido despacho saneador, com delimitação do objecto do litígio e fixação dos temas da prova.

Realizado o julgamento foi proferida a sentença, na qual se decidiu julgar a acção totalmente improcedente por não provada e em consequência absolver a Ré de tudo o peticionado.

Inconformada com essa decisão, a autora interpôs recurso de apelação, tendo nas respectivas alegações formulado as seguintes conclusões:
1.-A Apelante pugna pela revogação total da decisão recorrida, por entender que o Tribunal “a quo” apreciou incorrectamente a matéria de facto dada como não provada.
2.-A Apelante discorda da decisão proferida pelo Tribunal “a quo” por considerar que da matéria dada como provada e da sua fundamentação deveria ter resultado decisão oposta aquela que foi proferida.
3.-Não pode a Apelante aceitar os factos dados como não provados em função dos elementos contabilísticos carreados para os autos, nomeadamente os pagamento efectuados a título de comissões pela própria Apelada.
4.-Resultou provado que a Apelante nunca teve forma de influenciar directamente o conteúdo do contrato final (cfr. ponto 3.2.1, 3.2.2, 3.2.3, 3.2.4, 3.2.5 e 3.2.6 da fundamentação de facto da decisão ora recorrido).
5.-O contrato em causa foi imposto aos parceiros e á aqui Apelante não sendo nunca possível a sua alteração à luz dos princípios da liberdade de celebração contratual.
6.-As alterações da cláusula 5ª prejudicaram indubitavelmente a Apelante.
7.-O contrato celebrado foi predisposto unilateralmente pela Apelada.
8.-Decidindo como decidiu o MM Juiz “ a quo” fez uma deficiente análise da matéria dada como provada e violou o disposto no artigo 413º e 607, nº 3 do CPC.
9.-O contrato celebrado entre as partes assenta na LCCG.
10.-Deve ser este o regime aplicado ao contrato celebrado.
11.-A negociação foi feita ao abrigo da LCCG.
12.-Não existiu bilateralidade e mutabilidade das cláusulas do contrato.
13.-Não existiram negociações entre as partes a vigência do contrato.
14.-Não existiu fase negociatória.
15.-Não houve possibilidade de fixação casuística do contrato.
16.-A Apelante iniciou a exploração das estações sem contrato assinado.
17.-A LCCG assenta na estandardização e imutabilidade das cláusulas contratuais e pressupõe que exista um clausulado previamente fixo.
18.-Ao considerar que se aplica a LCCG a sentença recorrida inquina por não ter condenado a Apelada, sentença essa que deverá ser substituída por outra que condene a Apelada.
19.-Terá que ser considerada nula a clausula do contrato, nomeadamente a clausula 5ª, nº 5 e nº 6, e a Apelada condenada no pedido que resulta da declaração de nulidade destas cláusulas.
20.-A cláusula deve ser considerada nula nos termos do artigo 19º alínea h) da LCCG.
21.-O artigo 19º alínea h) visa impedir a predisposição de cláusula da qual resulte um decréscimo da prestação devida á contra parte, razão pela qual faz expressa referencia á ausência de compensação prevista.
22.-Só faria sentido falar em compensação quando é inquestionável que a possibilidade de modificação da prestação está já formulada no sentido de representar, necessariamente, uma desvantagem para a contra parte.
23.-Este foi o caso da cláusula 5º nº 6 do contrato celebrado ao estabelecer que a tabela de comissões podia ser alterada pela Apelada.
24.-Em face disto a clausula 5º nº 6, veio a ser considerada nula, ao abrigo do previsto na alínea h) do artigo 19º da LCCG.
25.-A cláusula 5º nº 5 do contrato, que estabelecia objectivos a respeitar pelos parceiros para atribuição do incentivo ... Mundial, deve ser considerada nula por violação dos deveres de informação e comunicação da mesma.
26.-A Apelante passou ao lado da existência desta cláusula a consequentemente deveria dar como certo que a mesma pretendia invocar a falta de comunicação e informação desta cláusula.
27.-Os objectivos ... Mundial nunca foram comunicados à Apelante.
28.-Ficou provado a falta de comunicação e informação da cláusula 5º nº 5 do contrato.
29.-Facto que origina a nulidade da cláusula por violação dos direitos de informação, não podendo esta ser considerada válida e a Apelada condenada ao pagamento do incentivo em falta.
30.-Deve ser revogada a sentença proferida e alterada por outra que condena a Apelada ao pagamento á Apelante do incentivo ... Mundial.
31.-A sentença faz assim uma deficiente análise da prova produzida no que concerne à diminuição dos rendimentos da Apelante, pelo que deverá ser alterada por outra que considere que a alteração das comissões originou uma diminuição dos rendimentos da Apelante.
32.-Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V.Exas. terá a decisão recorrida de ser revogada, e substituída por outra em que a ora Apelada seja integralmente condenada nos pedidos formulados pela Apelante, com todas as consequências legais.

O réu apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:
1.-A factualidade constante dos pontos 3.3.2 e 3.3.3 (não provados) da sentença, trata-se de factualidade objectiva, tendo tido a Recorrente a competente oportunidade de produzir prova sobre essa matéria.
2.-Não tendo sido produzida qualquer prova sobre esta matéria (nem invocando a Recorrente sequer qualquer prova nesse sentido) não poderá agora pretender que essa factualidade seja dada como provada, alicerçando essa alteração em factos não dados como provados e raciocínios presuntivos manifestamente errados.
3.-O acórdão recorrido não se encontra ferido da nulidade prevista alínea c) do n.º 1 do artigo 615° do C.P.C.
4.-O acórdão recorrido está devidamente fundamentado, quer sob o ponto de vista fáctico quer sob o ponto de vista jurídico e que, além disso, a decisão está em consonância com a respectiva fundamentação: dela constam os factos e as razões de direito em que o Tribunal alicerçou a sua decisão e esta aparece como consequência lógica daquela fundamentação.
5.-O acórdão proferido não incorreu em qualquer contradição, apenas concluiu ao contrário do pretendido pela Recorrente.
6.-Confunde a Recorrente a circunstância de ser considerado aplicável o regime das Clausulas Contratuais gerais a determinado clausulado com a circunstância de ser considerada nula e excluída de um contrato uma determinada cláusula.
7.-Para que sejam consideradas nulas as cláusulas de determinado contrato, é necessário que tenham sido violados determinados valores jurídicos consagrados no regime das CCG.
8.-E, ainda assim, poderá tal "exclusão" ceder perante a verificação de uma situação de abuso de direito, tal como a que se deu por verificada nos presentes autos.
9.-Não existe qualquer contradição na sentença recorrida ao considerar a aplicabilidade do Regime das Clausulas Contratuais Gerais à cláusula 5ª n.º6 e concluir, após a devida análise da factualidade apurada, que não é de excluir a referida cláusula, pois apesar da nulidade que veio a ser declarada à mesma, esta cede perante o abuso de direito que se verificou com a invocação dessa nulidade.
10.-A recorrente nada transpõe para as suas conclusões de recurso quanto à violação  de dever de comunicação da cláusula 5ª, n.º 6, pelo que está esta matéria afastada da análise do Tribunal ad quem, atenta a delimitação do objecto do recurso por via das conclusões.
11.-Pese embora, não se concordar com a aplicabilidade ao presente contrato do Regime das Clausulas Contratuais Gerais, não houve qualquer violação dos deveres de comunicação e informação como alegado pela recorrente.
12.-Ficou demonstrado que a Recorrente teve conhecimento do teor da cláusula 5ª, n.º 6 do contrato de parceria antes de o assinar, e mesmo tendo mostrado desagrado com o seu teor, acabou por aceitar o contrato, conformando-se com o seu conteúdo.
13.-A própria Recorrente, aceita esta factualidade, invocando que o seu sócio gerente era livre de contratar e fê-lo por assim quis e que o mesmo estava esclarecido quanto ao teor da cláusula in casu.
14.-Foi este o raciocínio lógico adoptado pelo Tribunal a quo, que fundamentou de forma clara e coerente a sua decisão, não incorrendo em qualquer contradição, ao contrário do invocado pela Recorrente, apesar de, ainda assim, nenhuma conclusão e/ou pedido de alteração efectuar quanto a esta matéria.
15.-A verificação de abuso de direito pressupõe a verificação de um direito na esfera jurídica neste caso da Recorrente.
16.-A recorrente sempre manifestou a sua aceitação do clausulado do contrato, cumprindo-o nos termos contratados e aceitando a sua execução nesses precisos termos.
17.-Face à conduta assumida pela recorrente durante a vigência deste contrato e nos anos subsequentes à sua resolução, a circunstância de esta vir apenas agora invocar a nulidade de uma das cláusulas do contrato que celebrou com a Recorrida consubstancia um notório caso de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
18.-Foi este o entendimento do MMO Juiz do Tribunal a quo, que ao assim decidir não perpetrou qualquer erro de julgamento e muito menos qualquer contradição entre os fundamentos que aduziu e a sua decisão.
19.-Tal como decidido pelo Mrnº. Juiz do Tribunal a quo, nenhuma prova foi efectuada pela Recorrente que permitisse ao Tribunal a aferir que o accionamento da cláusula, 5ª, n.º 6 tivesse violado qualquer interesse da A., nomeadamente, não tendo sido alegado, nem demonstrado, qualquer facto concretizador de uma desequilíbrio desproporcional entre a situação existente antes da alteração das comissões e após a alteração das comissões.
20.-Nenhum facto foi dado como provado, quanto a qualquer relação entre um pretenso decréscimo das comissões auferidas pela Recorrente a título de correspondência ocasional e a aplicação da nova tabela.
21.-A contrario, ficou demonstrado que a Recorrente se conformou com o accionamento da clausula 5ª, n.º 6, tendo auferido por mais de 5 (cinco) anos as comissões resultantes da aplicação da nova tabela, sem nunca ter levantado ou suscitado qualquer oposição.
22.-Invoca a Recorrente de forma inovatória nestes autos, que a cláusula 5ª, n.º 5 também é nula por violação dos deveres de comunicação da mesma ao abrigo das regras da Lei das Clausulas Contratuais Gerais.
23.-Contrariamente ao que alega a Recorrente, o incentivo da ... Mundial não foi pela ora Recorrida suspenso de forma inesperada e muito menos injustificada, encontrando-se, antes, tal suspensão perfeitamente legitimada pelo Acordo de Parceria assinado concretamente pela cláusula 5ª, n.º 5, onde se previa a possibilidade de tal suspensão no caso de não serem cumpridos os objectivos que lhe forem definidos.
24.-E como resulta da factualidade apurada, dúvidas não restam de que foram definidos objectivos à Recorrente os quais não foram cumpridos por esta.
25.-Tal como resulta da factualidade carreada para os temas da prova, apenas quanto à cláusula 5ª, n.º6 foi invocada a sua falta de informação e comunicação, razão pela qual apenas foram questionados os factos necessários para inquinar ou dar como verdadeira tal alegação.
26.-Não tendo nunca a Recorrente invocado a nulidade da cláusula 5ª, n.º5 dos contratos, por entender que a mesma não foi lhe foi comunicada, não pode vir agora fazê-lo.
27.-De facto, a procedência da tese da recorrente (o que apenas se concebe em prol de exercício de raciocínio jurídico) configuraria uma autêntica decisão surpresa, proibida pelos mais elementares princípios de direito, desde logo, pelo art. 264. C.P.C.
28.-A Recorrente, por via do seu gerente, teve conhecimento do teor do contrato a assinar (incluindo a clausula em questão que não sofreu qualquer alteração nas minutas de contrato) com a antecedência suficiente para tomar conhecimento de todo o seu teor, sem qualquer excepção.
29.-As conclusões do recurso pretendem ser um enunciado sintético dos fundamentos por que se pede a revogação da decisão impugnada.
30.-As conclusões de recurso da Recorrente identificadas com os números 20. a 24. Não se tratam de quaisquer conclusões/enunciados sintéticos, pois contêm alegações que não foram em ponto algum das correspondentes alegações invocadas, nem tão pouco sequer invocadas pela Recorrente nos articulados.
31.-Constam das conclusões factualidades falsas, como facilmente se constata do ponto 24., em que a Recorrente invoca que a cláusula 5ª, n.º 6 do contrato foi declarada nula ao abrigo do da alínea h), do art. 19° da LCCG, e da conclusão 28., não tendo ficado provado a "falta de comunicação e informação da cláusula 5°, n. °5 do contrato", como resulta da leitura dos factos dados por provado na sentença recorrida.
32.-A inserção de conclusões que nenhuma correspondência têm com os fundamentos constantes da alegação e nalguns pontos não têm sequer a ver com o presente processo, não corresponde a nenhuma das situações apontadas no art. 639°, n.º 3, não podendo ser alvo de aperfeiçoamento, mas simplesmente de desconsideração por esse Tribunal, o que expressamente se requer.
33.-A entender-se que deverá a recorrente vir suprir as deficiências das suas conclusões, estar-se-á a dar a esta a possibilidade de alegar quando não o fez no momento próprio, em manifesta violação da igualdade das partes e do princípio do dispositivo.
34.-Deverão ser consideradas nulas as conclusões constantes dos pontos 20., 21, 22., 23., 24. e 28. das conclusões constantes das alegações da Recorrente.
35.-Não é aplicável in casu a nulidade prevista no artigo 19°, alínea h) da LCCG, desde logo porque a clausula 5ª. n.º 6, estabelece que a tabela de comissões pode ser alterada pela Recorrente, mas não estabelece, de qualquer forma ou impõe, que tal alteração a ser observada, represente uma descida da prestação inicialmente acordada com a contraparte.
36.-Deverá ser mantido a sentença recorrida, com a consequente absolvição integral da Recorrida dos montantes indemnizatórios peticionados pela Recorrente.
- DA AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
37.-À cautela, prevenida a procedência das questões suscitadas pela Recorrente, requer-se seja alterada a decisão do Tribunal a quo, que considerou ser de aplicar aos contratos, in casu, e especificamente à clausula 5ª, n.º 6, a Lei das Clausulas Contratuais Gerais.
38.-Ao contrário do defendido na sentença recorrida, a cláusula em crise nos presentes autos deverá obrigatoriamente seguir as regras e o regime constantes do Código Civil, não podendo ser analisada e apreciada ao abrigo do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais.
39.-As cláusulas contratuais gerais pressupõem que a referida pré-formulação do clausulado seja feita por escrito.
40.-O Regime das Cláusulas Contratuais configura e consubstancia um desvio ao princípio fundamental da liberdade de forma que se encontra descrito e plasmado no artigo 219.° do Código Civil.
41.-O Regime das Cláusulas Contratuais Gerais está pensado para proteger o cliente individual e não, para os casos em que é ele próprio um prestador de serviços, como é e deve ser qualificada a recorrente, pois que pela via do contrato celebrado com a ora recorrida "sucedeu" na pessoa daquela na prestação dos serviços públicos de comunicação e distribuição postal.
42.-Atenta a natureza concreta do negócio, surge como evidente que um contrato como este pressupõe uma negociação isoladamente considerada ao abrigo das regras gerais do Código Civil e não uma "negociação" feita por um proponente ao abrigo do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais.
43.-A vocação do projecto de que a ora Recorrente lançou mão não encontra apoio no conceito de "contratação em massa", atendendo, desde logo, à amostragem propriamente dita.
44.-A cláusula 5ª, n.º 6, não foi formulada para ser aplicável a uma quantidade indeterminada de sujeitos, sem análise ou negociação casuística.
45.-O caso dos presentes autos não pode, pois, ser observado como uma contratação em série, devendo antes sim ver-se como contrato individualmente celebrado, ao abrigo das regras gerais do Código Civil: trata-se, portanto, de um processo negocial típico e isoladamente considerado por força da parificação e equivalência de qualquer das partes: Recorrente e recorrida.
46.-Tal como ficou provado, a Apelada iniciou a exploração das Estações de Baguim do Monte e do Coronado sem assinatura de qualquer documento, algo que é, desde logo, indicativo do facto de inexistir aqui qualquer sujeição ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais.
47.-É o próprio Tribunal e até a Recorrente (vide conclusão 16. das suas alegações de recurso) que dão relevo à circunstância de, no momento em que as estações dos correios foram transmitidas, não ter sido assinado qualquer documento.
48.-O Regime das Cláusulas Contratuais Gerais assenta na estandardização e imutabilidade dos clausulados contratuais, o que por natureza lógica pressupõe que haja a elaboração, por parte do proponente, de um clausulado previamente fixado, sendo pressuposto a sua "formalização" num documento escrito, cabendo à contraparte apenas a faculdade de o aceitar: através da aposição da sua assinatura.
49.-Deve, portanto, em caso de procedência do recurso da recorrente (o que não se concede), ser a presente ampliação considerada procedente e ser proferido acórdão que declare não ser de aplicar aos contratos em causa e particularmente à cláusula 5°, nº 6 dos mesmos a LCCG, mantendo-se a absolvição da Recorrida também com este fundamento.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*

II.-As questões a decidir resumem-se, essencialmente, a saber:
- se é caso de rejeitar o recurso sobre a matéria de facto;
- se a sentença é nula;
se à cláusula 5ª, ponto 6 dos contratos de "Agenciamento de Estação de Correio” se aplica o regime das cláusulas contratuais gerais;
- se a invocação da nulidade da referida cláusula pela autora configura uma situação de abuso de direito;
- se a autora tem direito ao valor da comissão/incentivo pela comercialização dos produtos e serviços ....
*

III.-Factos considerados provados em 1ª instância:

3.-Factos considerados provados documentalmente ou por acordo:
3.1.1.-A Ré é a empresa concessionária do serviço público de comunicação postal nacional.
3.1.2.-No ano de 2004 a Ré delineou um programa de parcerias que visava adaptar a rede de estações de correios ao novo mercado, mantendo um desígnio lucrativo e minimizando os custos.
3.1.3.-Com esse propósito concebeu um projecto de rede de estações de correios e estabeleceu uma parceria comercial com a Seguradora ... ­Mundial, no sentido de comercializar os produtos e serviços desta nas estações de correios.
3.1.4.-Para efeitos de publicidade e angariação, divulgou o projecto de implementação da rede de parcerias através da brochura junta por cópia a fls. 46-53 e 57 -64, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.

3.1.5.-Na referida brochura consta:

a) como fundamentos do projecto ( fls. 49):
• a capitalização do potencial humano dos ... e da sua relação local
•a promoção e incentivo do espírito empreendedor
•o aumento das vendas através da coincidência de interesses entre os parceiros/mais vendas, mais comissões
• adaptação da rede a uma nova realidade de mercado.
b. que" o projecto tem por base a reunião de interesses de três" parceiros ": ...; ...-Mundial e Parceiro e que " estão criadas as condições para facilitar a criação de negócio individual com risco limitado". (fls. 50)
c. que" o modelo de negócio proposto protege o " parceiro" e que" a minimização do risco do negócio é conseguida através de:
•vinculo contratual com ... não cessa (licença sem vencimento até um máximo de 3 anos)
•aumento da carteira de produtos disponível
•inexistência de investimento inicial
•apoio logístico, comercial e formação de ambos os parceiros (... e F-M)
•negócio da EC já estabelecido (arranque com base de clientes existente) (fls. 51)
d. o " exemplo prático de uma EC parceria com facturação anual de € 150.000,00: - serviços e produtos de correio - [comissão] 20%.

3.1.6.-No instrumento junto por cópia a fls. 70-78 e que constitui a minuta de um " Contrato de agenciamento de estação de correio ", facultada para análise e discussão, a cláusula 5ª tinha o seguinte teor:
1.-Pela prestação dos serviços objecto do presente contrato, a Primeira contratante pagará mensalmente à segunda contratante:
a)As comissões e contrapartidas definidas para os serviços postais previstos no anexo ... ao presente contrato;
b)As comissões e contrapartidas definidas para os produtos e serviços ... - Mundial previstos no Anexo ... ao presente contrato.
2.-Durante os três primeiros anos de actividade da segunda contratante e, no caso em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a 950,00 euros a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00.
3.-Caso a segunda contratante ultrapasse os objectivos de venda dos produtos e serviços ... Mundial que lhe forem definidos, a primeira contratante pagará uma comissão adicional de valor equivalente a 50% da diferença entre o valor das comissões correspondentes ao objectivo definido e as comissões correspondentes á produção efectiva.
4.-O incentivo adicional estabelecido no número anterior terá como limite máximo o montante das comissões correspondentes aos objectivos definidos.
5.-Caso a segunda contratante não cumpra os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.

3.1.7.-O então trabalhador da Ré, Helder Queijo, foi convidado pela Ré a ser agente de estação de correios.
3.1.8.-A Ré autorizou que tal actividade fosse exercida por uma sociedade comercial, desde que o trabalhador assumisse o cargo de gerente.
3.1.9.-Nesta sequência, foi constituída e, pela ap. 01/20040901, matriculada a A., tendo por objecto" agenciamento de estações de correios. Agência comercial nas áreas da informática, artes gráficas, equipamento de escritório e telecomunicações" e sendo designado gerente Helder ………, á data trabalhador dos ..., em licença sem vencimento.
3.1.10.-Em Setembro de 2004 a Autora iniciou a exploração das Estações de S ... de Coronado e de Baguim do Monte.
3.1.11.-A 30 de Dezembro de 2004, pelas 18H32, a Ré enviou para a Loja ... Coronado o mail de fls. 738, enviando em anexo o " Contrato de agenciamento de estações de correio" relativo à EC de São ... de Coronado junto por cópia a fls. 739-751.
3.1.12.-A 30 de Dezembro de 2004, pelas 18H29, a Ré enviou para a EC Baguim do Monte o mail de fls. 752, enviando em anexo, respectivamente, o " Contrato de agenciamento de estações de correio ", relativo à EC de Baguim do Monte junto por cópia a fls. 753-765.

3.1.13.-No Anexo em referência ( pontos 3.1.11. e 3.1.12. ) a Cláusula 5ª- tinha o seguinte teor:
1)-Pela prestação dos serviços objecto do presente contrato, a Primeira contratante pagará mensalmente à segunda contratante, no dia 20 de cada mês:
a. As comissões e contrapartidas definidas para os serviços postais previstos no anexo I ao presente contrato, relativas ao mês anterior;
b. As comissões e contrapartidas definidas para os produtos e serviços ... - Mundial previstos no Anexo /I ao presente contrato, relativas ao mês anterior.
2)-Durante os três primeiros anos de actividade da segunda contratante e, no caso, em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a 950,00 euros a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00.
3)-Caso a segunda contratante ultrapasse os objectivos de venda dos produtos e serviços ... Mundial que lhe forem definidos, a primeira contratante pagará uma comissão adicional de valor equivalente a 50% da diferença entre o valor das comissões correspondentes ao objectivo definido e as comissões correspondentes á produção efectiva.
4)-O incentivo adicional estabelecido no número anterior terá como limite máximo o montante das comissões correspondentes aos objectivos definidos.
5)-Caso a segunda contratante não cumpra os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.
6)-As comissões referidas na alínea a) do número da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente á sua entrada em vigor.
7)-As comissões referidas na alínea b) do número um da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, para os contratos novos e para as renovações dos contratos vigentes, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente à sua entrada em vigor.
8)-A primeira contratante apurará os valores devidos á segunda contratante e emitirá a factura correspondente, mediante o sistema de auto­facturação, nos termos do disposto no ert. ° 35°, número 11, alíneas a) e b) do CIVA

3.1.14.-A 04.01.2005. a Ré, na qualidade de primeira contratante e a A. na qualidade de segunda contratante, subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 81-133, relativo à Estação de São ... de Coronado, constituído por:
1.-"Contrato de Agenciamento de Estação de Correio" ( fls. 82-94);
2.-" Anexo I - Lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões" ( fls. 95-99;
3.-" Anexo II - Lista de produtos ...- Mundial a comercializar e respectivas comissões ( fls. 100-101);
4.-" Anexo III - Contrato de comodato de instalações e equipamentos" ( fls.102-106);
5.-" Anexo IV - Listagem de património" ( fls. 107-122);
6.-" Anexo V - Modelo operativo de Gestão das estações de Correio em Regime de parceria" (fls. 123-133).

3.1.15.-A 04.01.2005. a Ré, na qualidade de primeira contratante e a A. na qualidade de segunda contratante, subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 81-133, relativo à Estação de baguim do Monte, constituído por:
1.-" Contrato de Agenciamento de Estação de Correio " - Estação de Baguim do Monte (fls. 147-159);
2.-" Anexo I - Lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões" (fls. 160-164);
3.-" Anexo II - Lista de produtos ...- Mundial a comercializar e respectivas comissões (fls. 165-166);
4.-" Anexo III - Contrato de comodato de instalações e equipamentos" - Estação de Baguim do Monte (fls. 167-171);
5.-" Anexo IV - Listagem de património" - Estação de baguim do Monte (fls. 172-180);
6.-" Anexo V - Modelo operativo de Gestão das estações de Correio em Regime de parceria" ( fls. 161-170 e que passará a constar a fls. 181- 190).

3.1.16.-Na cláusula 5ª dos instrumentos referidos no número 1 dos pontos 3.1.14. e 3.1.15. supra, ficou consignado:
1)-Pela prestação dos serviços objecto do presente contrato, a Primeira contratante pagará mensalmente à segunda contratante, no dia 20 de cada mês:
a) As comissões e contrapartidas definidas para os serviços postais previstos no anexo I ao presente contrato, relativas ao mês anterior;
b)As comissões e contrapartidas definidas para os produtos e serviços ... - Mundial previstos no Anexo /I ao presente contrato, relativas ao mês anterior.
2)-Durante os três primeiros anos de actividade da segunda contratante e, no caso, em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a 950,00 euros a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00.
3)-Caso a segunda contratante ultrapasse os objectivos de venda dos produtos e serviços ... Mundial que lhe forem definidos, a primeira contratante pagará uma comissão adicional de valor equivalente a 50% da diferença entre o valor das comissões correspondentes ao objectivo definido e as comissões correspondentes á produção efectiva.
4)-O incentivo adicional estabelecido no número anterior terá como limite máximo o montante das comissões correspondentes aos objectivos definidos.
5)-Caso a segunda contratante não cumpra os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.
6)-As comissões referidas na alínea a) do número um da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente á sua entrada em vigor.
7)-As comissões referidas na alínea b) do número um da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, para os contratos novos e para as renovações dos contratos vigentes, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente à sua entrada em vigor.
8)-A primeira contratante apurará os valores devidos á segunda contratante e emitirá a factura correspondente, mediante o sistema de auto-facturação, nos termos do disposto no art.º 35°, número 11, alíneas a) e b) do CIVA.

3.1.17.-No Anexo I - Lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões" (ponto 3.1.14. e 3.1.15.), a comissão a pagar ao parceiro pela correspondência ocasional era de 20% sobre o valor da operação.
3.1.18.-No referido dia 04.01.2005. estavam presentes os parceiros, o Presidente do Conselho de Administração dos ..., o Sr. Carlos …………. e a comunicação social.
3.1.19.-A Ré apenas pagou a comissão para os produtos e serviços ... - Mundial previstos, referida na cláusula 5ª n. ° 1 alínea b) e 2 , em 12 meses.

3.1.20.-A Ré enviou á A. / EC Coronado, que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 833, acompanhada do Anexo que constitui fls. 834-836, carta aquela datada de 21.02.2006. e com o seguinte teor:
" O Conselho de Administração dos ... deliberou aprovar a nova tabela de comissões, referentes aos produtos/serviços comercializados pelas Lojas de parceria, que passará a aplicar-se a todos os contratos vigentes.
Assim, considerando o n.º 6, da cláusula 5ª do Contrato de Agenciamento de estações de Correio, a nova tabela de comissões entrará em vigor a 01 de maio de 2006.
Em anexo segue a nova lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões - Anexo I do Contrato de Agenciamento de estações de Correio - que a partir de 01 de maio de 2006, substituirá a que vigor actualmente. ".

3.1.21.-A Ré enviou à A. / EC Baguim do Monte, que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 838, acompanhada do Anexo que constitui fls. 839-841, carta aquela datada de 21.02.2006. e com o seguinte teor:
" O Conselho de Administração dos ... deliberou aprovar a nova tabela de comissões, referentes aos produtos/serviços comercializados pelas Lojas de parceria, que passará a aplicar-se a todos os contratos vigentes.
Assim, considerando o n.º 6, da cláusula 5ª do Contrato de Agenciamento de estações de Correio, a nova tabela de comissões entrará em vigor a 01 de maio de 2006.
Em anexo segue a nova lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões - Anexo I do Contrato de Agenciamento de estações de Correio - que a partir de 01 de maio de 2006, substituirá a que vigor actualmente."

3.1.22.-Na nova tabela de comissões e que constitui fls. 834-836 e fls. 839-841, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, consta que a comissão da correspondência ocasional passaria a ser uma percentagem da receita líquida mensal da loja nos seguintes termos:
•20% até € 7.500,00;
•10% mais € 7.500,01 até €15.000,00;
•5% mais €15.000,00.

3.1.23.-A Ré opôs-se à renovação dos acordos referidos nos pontos 3.1.14. e 3.1.15.-supra, tendo os mesmos cessado a 31.12.2012.

3.1.24.-A Ré endereçou à A. / EC Coronado, a carta junta por cópia a fls. 958, datada de 29.04.2005., com o seguinte teor:
" Decorridos já alguns meses após o início da Parceria há que efectuar um balanço, nomeadamente, sobre os resultados da comercialização de produtos ... Mundial.
No caso específico da EC Coronado, verifica-se que os resultados alcançados se traduzem em comissões inferiores a 50% dos objectivos traçados.
Tendo em consideração que os primeiros seis meses foram de implementação e ajustes diversos, quer por parte da ... que por parte dos parceiros, far-se-á nova avaliação de resultados no final do próximo mês de Setembro, momento em que, esperemos tenha atingido um mínimo de 50% do seu objectivo em comissões, caso contrário será avaliada a manutenção do incentivo de € 950,00, como estipulado no n.º 5 do art.º 5º do contrato.
Esperamos que este alerta sirva de incentivo à obtenção de melhores resultados, para que não haja necessidade de dar cumprimento ao indicado no parágrafo anterior."

3.1.25.-A Ré endereçou à A. / EC Baguim do Monte, a carta junta por cópia a fls. 959, datada de 02.05.05. com o seguinte teor
" Decorridos 6 meses após o início da Parceria há que efectuar um balanço, nomeadamente, sobre os resultados da comercialização de produtos ... Mundial.
No caso específico da EC Baguim do Monte, de Setembro de 2004 a Fevereiro de 2005, inclusive, tinha como objectivo atingir 322,15 euros mensais de comissões, ou seja, 1.932,87 no semestre, no entanto apenas realizou 63,16, o equivalente a 3,3% do objectivo.
Tendo em consideração que os primeiros seis meses foram de implementação e ajustes diversos, quer por parte da ... que por parte dos parceiros, far-se-á nova avaliação de resultados após o 1º ano de inicio da Parceria, momento em que, se não tiver atingido 50% do seu objectivo em comissões, ou seja, 1.932,87 Eur, será analisada a manutenção do incentivo de € 950,00, como estipulado no n. o 5 do art. o 50 do contrato.
Esperamos que este alerta sirva de incentivo à obtenção de melhores resultados, para que não haja necessidade de dar cumprimento ao indicado no parágrafo anterior."

3.1.26.-A Ré endereçou à A. / EC Baguim do Monte, a carta junta por cópia a fls. 960, datada de 28.07.2005. com o seguinte teor
" Decorridos 3 meses após o último balanço sobre os resultados da comercialização de produtos ...-Mundial, impõe-se novo balanço.
No caso da EC Baguim do Monte, verificamos que desde o início da parceria até Junho de 2005, inclusive, tinha como objectivo atingir 3.221,45 euros em comissões, tendo alcançado 194,15 Eur, o equivalente a 6% do objectivo. Como concordará, este valor está abaixo das expectativas da ... Mundial, dos ... e esperamos do próprio Parceiro.
Tal como já havíamos comunicado, no final do próximo mês de Agosto, faremos nova avaliação dos resultados, momento em que, se não tiver atingido 50% do seus objectivo em comissões, deixará de ser pago o incentivo referido no n.º 2 do art.º 5º do contrato, como estipulado no n. º 5 do art.º 5º do mesmo contrato.
(. .. )".
*

3.2.- Da instrução da causa resultou provado:

3.2.1.-A Autora tomou conhecimento do teor da cláusula 5ª n.º 6 no dia 31.12.2004. e na sequência dos mails referidos nos pontos 3.1.11. e 3.1.12.
3.2.2.-No dia 04.01.2005., em reunião ocorrida algum tempo antes da hora designada para a assinatura dos contratos, o sócio-gerente da Autora manifestou o seu desagrado à responsável pelo projecto, pelo facto de ser aposta no contrato a referida cláusula.
3.2.3.-Na referida reunião, a Dr.ª D…., representante da Ré (...), transmitiu que a introdução do referido n.º 6 na cláusula 5ª, era uma imposição da Administração da Ré face a reticências colocadas pelo regulador ( ICP - ANACOM).
3.2.4.-E que a cláusula não iria ser colocada em prática.
3.2.5.-A correspondência ocasional constituía a parcela mais elevada da receita das estações de correio.
3.2.6.-O n.º 6 da cláusula 5ª em referência nos autos, foi aposto em todos os contratos de " Agenciamento de Estação de Correio".
3.2.7.-Nos anos de 2006 a 2011 as estações de São ... de Coronado e Baguim do Monte tiveram uma receita de valor não concretamente apurado.
3.2.8.-A Ré pagou á A. as seguintes comissões liquidas (descontados os  custos de exploração de cada uma das estações).

  Comissões liquidas  
Ano BaguimdoS....de
  Monte Coronado 
2006 € 48.928,67€ 90.249,52 
2007 € 46.236,35€ 45.500,89 
2008 € 45.074,57€ 45.484,25 
2009 € 41.025,02€ 35.397,32 
2010 € 29.108,59€ 24.839,11 
2011 € 30.480,90€ 25.054,25 

3.2.9.-Foram fixados para a EC de Baquirn do Monte e para a Estação de S.... de Coronado os objectivos de venda de produtos ...-Mundial, definidos a fls. 962, que a Autora conhecia.
3.2.10.-Entre Setembro de 2004 e Junho de 2005, na estação de Baguim do Monte e entre Dezembro de 2004 e Junho de 2005, na estação de S. ... de Coronado, a A. realizou os valores constantes do mapa de fls. 962 e cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
*

3.3.-Da instrução da causa não resultou provado que:
3.3.1.-No dia da assinatura do contrato a Ré comunicou à Autora que alteração deliberada pelo Conselho de Administração seria para produzir efeitos a partir de 01.05.2006.
3.3.2.-A alteração da tabela de comissões e, nomeadamente, a alteração da comissão da correspondência ocasional ( pontos 3.1.20., 3.2.21. e 3.1.22. ) levou ao desânimo dos quadros dirigentes da Autora, nomeadamente no seu sócio gerente.
 3.3.3.-E reflectiu-se na produtividade e na facturação das duas estações de correio.
*

3.4.-Por documento ( fls. 769-787 e 791-832) e acordo devem ainda considerar-se provados os seguintes factos:

3.4.1.-A aqui A. coligada com outros intentou procedimento cautelar comum contra a Ré, distribuído sob o n.? 2869/06.6TVLSB á então 1ª Vara Cível de Lisboa, pedindo fosse a mesma intimada a:
a) abster-se de manter em vigor a aplicação de uma nova tabela de comissões, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada" correspondência ocasionai";
b) a repristinar a aplicação da anterior tabela de comissões que constitui o anexo I aos contratos de agência celebrados com os requerentes, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada " correspondência ocasional.
3.4.2. Nos referidos autos, a 29.07.2006., foi proferida a decisão de fls. 769- 787, que julgou totalmente improcedente o pedido.

3.4.3.-Da referida decisão foi interposto recurso, tendo o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, a 12.12.2006. proferido o Acórdão fotocopiado a fls. 791-832, que manteve a decisão recorrida.
*

IV.-Do mérito da apelação:

Da impugnação da matéria de facto:

O tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:
-No dia da assinatura do contrato a Ré comunicou à Autora que alteração deliberada pelo Conselho de Administração seria para produzir efeitos a partir de 01.05.2006.
-A alteração da tabela de comissões e, nomeadamente, a alteração da comissão da correspondência ocasional ( pontos 3.1.20., 3.2.21. e 3.1.22. ) levou ao desânimo dos quadros dirigentes da Autora, nomeadamente no seu sócio gerente.
-E reflectiu-se na produtividade e na facturação das duas estações de correio.

E na sua motivação exarou que:
 “O tribunal não considerou provada a factualidade descrita com base nos seguintes fundamentos:
-ponto 3.3.1. Não foi produzida qualquer prova desta factualidade.
-pontos 3.3.2. e 3.3.3. - Não foi produzida qualquer prova de que a alteração da tabela de comissões e, nomeadamente, a alteração da comissão da correspondência ocasional ( pontos 3.1.20., 3.1.21. e 3.1.22. ) levou ao desânimo dos quadros dirigentes da Autora, nomeadamente no seu sócio gerente e que tal alteração se reflectiu na produtividade e na receita de cada uma das estações.
Note-se que não está em questão saber se houve uma diminuição das comissões, mas outras realidades”.

E na sentença, em sede considerações de direito, acrescentou que entre 2006 e 2011 as comissões líquidas auferidas pela autora diminuíram, mas “não ficou provado que a diminuição das comissões ao longo do tempo, tenha resultado da alteração do comissionamento, tanto mais quanto a A. não alegou as comissões que auferiu pela correspondência ocasional ao longo dos referidos anos de 2006 a 2011”.

No corpo alegatório a apelante discorda da valoração da prova assim efectuada, referindo que a correspondência ocasional representava para a apelante receitas de cerca de 80% da receita global das estações; que fruto das alterações das comissões viu reduzido o seu rendimento em cerca de 50% (fls. 21 das alegações); que a alteração que a apelada fez nas comissões reduziu necessariamente as receitas da apelante (fls. 22 das alegações); que se fosse aplicada a taxa fixa de 20% inicialmente estabelecida o comissionamento pela comercialização dos produtos seria exponencialmente maior (fls. 23 das alegações), pelo que os rendimentos da apelante diminuíram em função da alteração das comissões (fls. 24 das alegações).

Refere, ainda, que não poderia ter sido dada como não provado que:
-A alteração da tabela de comissões e a alteração da comissão da correspondência ocasional levou ao desânimo dos quadros dirigentes da Autora, nomeadamente no seu sócio gerente;
-E que tal alteração não se reflectiu na produtividade e na facturação das duas estações de correio (fls. 21 das alegações).

Porém, nas conclusões a apelante, limitou-se a referir não poder aceitar a decisão que considerou os factos como não provados, em função dos elementos contabilísticos carreados para os autos, nomeadamente os pagamentos efectuados a título de comissões pela própria apelada (conclusões 1ª e 3ª), propugnando que se dê como provado que a alteração das comissões originou uma diminuição dos rendimentos da apelante (conclusão 31).

Assim, o objecto do recurso sobre a impugnação da matéria de facto reconduz-se unicamente a este facto.

Acontece que no corpo alegatório não consta a alusão a qualquer meio probatório constante do processo que impunha decisão diversa da impugnada, aparecendo a referência aos elementos contabilísticos apenas na conclusão 3ª.

Não tendo este elemento de prova sido referenciado no corpo alegatório, deve o mesmo ser desconsiderado pelo Tribunal da Relação, por a conclusão conter matéria nova.

Isso mesmo flui da interpretação dos arts 635º, n.º 4, e 639º, n.º 1,do CPC, donde resulta não só que as conclusões devem configurar um resumo das alegações, mas também que não devem conter matéria que não tenha expressão nas alegações – neste sentido cfr. António Abrantes Geraldes (cfr. Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, pág. 85).

Desconsiderada a conclusão 3ª, verifica-se que a apelante não especificou os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham que se considerasse o facto como provado.

Ademais, o cumprimento do ónus plasmado no art. 640º, n.º 1, al. b) do CPC não se basta com uma mera referência genérica a um meio de prova (no caso, à prova documental), impondo-se, à luz de um critério de rigor, a especificação dos mesmos, quando, como no caso, foram juntos aos autos centenas de documentos.

Rejeita-se, por isso, nos termos da citada disposição legal, o recurso sobre a decisão relativa à matéria de facto.

Da questão de direito:
Nos autos estava em causa a questão de saber se a cláusula 5ª, ponto 6, dos contratos celebrados dia 4/01/2005 entre a autora e a ré constitui uma cláusula contratual geral e sendo-o, se a mesma é válida.

Nesta matéria apurou-se que:
-Antes da assinatura dos contratos de Agenciamento de Estação de Correio, no dia 30 de Dezembro de 2004, a Ré enviou para a Loja ... Coronado e para a EC Baguim do Monte os mails de fls. 738 e 752, enviando em anexo o " Contrato de agenciamento de estações de correio".

-A Cláusula 5ª- tinha o seguinte teor:

1)-Pela prestação dos serviços objecto do presente contrato, a Primeira contratante pagará mensalmente à segunda contratante, no dia 20 de cada mês:
a.As comissões e contrapartidas definidas para os serviços postais previstos no anexo I ao presente contrato, relativas ao mês anterior;
b.As comissões e contrapartidas definidas para os produtos e serviços ... - Mundial previstos no Anexo /I ao presente contrato, relativas ao mês anterior.
2)-Durante os três primeiros anos de actividade da segunda contratante e, no caso, em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a 950,00 euros a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00.
3)-Caso a segunda contratante ultrapasse os objectivos de venda dos produtos e serviços ... Mundial que lhe forem definidos, a primeira contratante pagará uma comissão adicional de valor equivalente a 50% da diferença entre o valor das comissões correspondentes ao objectivo definido e as comissões correspondentes á produção efectiva.
4)-O incentivo adicional estabelecido no número anterior terá como limite máximo o montante das comissões correspondentes aos objectivos definidos.
5)-Caso a segunda contratante não cumpra os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.
6)-As comissões referidas na alínea a) do número da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente á sua entrada em vigor.
7)-As comissões referidas na alínea b) do número um da presente cláusula poderão ser alteradas pela primeira contratante, para os contratos novos e para as renovações dos contratos vigentes, desde que a alteração seja comunicada á segunda contratante com a antecedência mínima de 60 dias relativamente à sua entrada em vigor.
8)-A primeira contratante apurará os valores devidos á segunda contratante e emitirá a factura correspondente, mediante o sistema de auto­facturação, nos termos do disposto no ert. ° 35°, número 11, alíneas a) e b) do CIVA
-No Anexo I - Lista de produtos ... a comercializar e respectivas comissões", a comissão a pagar ao parceiro pela correspondência ocasional era de 20% sobre o valor da operação.
-A Autora tomou conhecimento do teor da cláusula 5ª n.º 6 no dia 31.12.2004.
-No referido dia 04.01.2005, em reunião ocorrida algum tempo antes da hora designada para a assinatura dos contratos, o sócio-gerente da Autora manifestou o seu desagrado à responsável pelo projecto, pelo facto de ser aposta no contrato a referida cláusula.
-Na referida reunião, a Dr.ª Dionísia Ferreira, representante da Ré (...), transmitiu que a introdução do referido n.º 6 na cláusula 5ª, era uma imposição da Administração da Ré face a reticências colocadas pelo regulador ( ICP - ANACOM), e que a cláusula não iria ser colocada em prática.
-O n.º 6 da cláusula 5ª em referência nos autos, foi aposto em todos os contratos de " Agenciamento de Estação de Correio".

Na sentença recorrida entendeu-se que:
 “(…) Perante esta factualidade, o ponto 6 da cláusula 5ª tem de ser considerada uma cláusula contratual geral, na medida em que, entre a data em que foi dado conhecimento da sua inclusão no contrato - 30.12.2004. - e a data da assinatura do contrato - 04.01.2005. -, não se mostra tenha ocorrido qualquer processo negocial, não tendo sido dado à A. a possibilidade de participar activamente na discussão do conteúdo da cláusula e na decisão de a incorporar no contrato, antes tendo sido colocada perante a posição de aceitar, ou não, o clausulado, tal como ele foi apresentado.
Refira-se que no dia 04.01.2005., algum tempo antes da hora designada para a assinatura dos contratos, teve lugar uma reunião, em que o sócio-gerente da Autora manifestou o seu desagrado à responsável pelo projecto, pelo facto de ser aposta no contrato a referida cláusula. Mas tal facto não significa, de forma alguma, qualquer processo negocial, já que não ficou provada qualquer abertura da Ré para retirar ou, ao menos, alterar, a referida cláusula.
Naquele momento, a A. só tinha duas opções: ou assinava o contrato, aceitando a inclusão daquela cláusula, ou não assinava, o que é típico das cláusulas contratuais gerais.
É absolutamente irrelevante que entre a data da assinatura do contrato e a data em que a Ré alterou a tabela de comissões, a A. não tenha sugerido qualquer alteração à referida cláusula, já incluída no contrato.
De referir ainda que a referida cláusula não se integra em nenhuma das excepções referidas no art.. 3°, sendo irrelevante a lógica que presidiu à inclusão da referida cláusula no contrato.
Também são irrelevantes as razões da alteração da tabela de comissões, que não está aqui em causa. Neste ponto importa referir que estamos no domínio do controlo do conteúdo da cláusula e não no domínio do controlo do exercício do direito outorgado pela cláusula. Aquele é prévio e o último não está em causa nos autos.
Em face do exposto mostram-se verificadas as três características das ccg: incidência colectiva (reprodução do mesmo conteúdo no conjunto dos contratos celebrados), pré-elaboração e rigidez”.

A apelante aceitou, naturalmente, que nos encontramos perante uma cláusula contratual geral, mas a apelada ampliou o objecto do recurso, para a hipótese de procederem as questões suscitadas no recurso pela apelante, requerendo que se considere que a cláusula 5ª, n.º 6, não constitui uma cláusula contratual geral.

Refere que:
-As cláusulas contratuais gerais pressupõem que a referida pré-formulação do clausulado seja feita por escrito.
-O Regime das Cláusulas Contratuais Gerais está pensado para proteger o cliente individual e não, para os casos em que é ele próprio um prestador de serviços, como é e deve ser qualificada a recorrente, pois que pela via do contrato celebrado com a ora recorrida "sucedeu" na pessoa daquela na prestação dos serviços públicos de comunicação e distribuição postal.
-Atenta a natureza concreta do negócio, surge como evidente que um contrato como este pressupõe uma negociação isoladamente considerada ao abrigo das regras gerais do Código Civil e não uma "negociação" feita por um proponente ao abrigo do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais.
-A cláusula 5ª, n.º 6, não foi formulada para ser aplicável a uma quantidade indeterminada de sujeitos, sem análise ou negociação casuística, sendo que a vocação do projecto de que a ora Recorrente lançou mão não encontra apoio no conceito de "contratação em massa", atendendo, desde logo, à amostragem propriamente dita.
-O Regime das Cláusulas Contratuais Gerais assenta na estandardização e imutabilidade dos clausulados contratuais, o que por natureza lógica pressupõe que haja a elaboração, por parte do proponente, de um clausulado previamente fixado, sendo pressuposto a sua "formalização" num documento escrito, cabendo à contraparte apenas a faculdade de o aceitar: através da aposição da sua assinatura.
-Deve, portanto, em caso de procedência do recurso da recorrente (o que não se concede), ser a presente ampliação considerada procedente e ser proferido acórdão que declare não ser de aplicar aos contratos em causa e particularmente à cláusula 5°, nº 6 dos mesmos, mantendo-se a absolvição da Recorrida também com este fundamento.
Não assiste, a nosso ver, razão ao apelado.
A cláusula 5ª, ponto 6 foi predisposta unilateralmente pela apelada para todos os que, à semelhança da autora, celebraram contratos de " Agenciamento de Estação de Correio", ou seja, dirigiu-se a diversos parceiros negociais daquela, ainda que tivesse sido concebida para inclusão num número definido de contratos.
E, tendo a autora alegado que essa cláusula não resultou de negociação prévia entre as partes, competia à ré demonstrar o contrário – art. 1º, n.º 3, da LCCG aprovada pelo D. Lei n.º 446/85, de 25/10.
De resto, provou-se que perante o desagrado do legal representante da autora quanto à inserção nos contratos de tal cláusula, a representante da Ré (...), transmitiu que a introdução do referido n.º 6 na cláusula 5ª, era uma imposição da Administração da Ré face a reticências colocadas pelo regulador ( ICP - ANACOM).
A cláusula reveste pois as características das cláusulas contratuais gerais: pré-formulação, generalidade e imodificabilidade
Por outro lado, a LCCG compreende sujeitos jurídicos que não são consumidores, sendo, pois, mais abrangente – cfr. art. 1º, n.º 2, e 17º.
E não se provou que a cláusula em questão tenha sido imposta ou expressamente aprovada pela Autoridade Reguladora das Comunicações Postais e Electrónicas (ANACOM)
Está, por isso, sujeita ao regime das cláusulas contratuais gerais, como se entendeu, a nosso ver bem, na sentença recorrida – vide arts. 1º, n.º 2, e 4º da LCCG (DL 446/85 de 25/10).

Na sentença entendeu-se ainda que a cláusula 5ª, n.º 6, foi comunicada à autora com a antecedência devida, não devendo ser excluída dos contratos, mas que a mesma é nula.

Assim, exarou-se; além do mais, na sentença que:

“A cláusula em apreço atribui á Ré do poder de, unilateralmente e sem negociação com os parceiros, alterar a comissão, que constitui a prestação a seu ( da Ré ) cargo.
A cláusula, em si mesma considerada ou abstractamente considerada, desprendida de um concreto exercício, rompe, de forma significativa, o equilíbrio contratual, porquanto atribuiu à Ré o poder exclusivo e unilateral de alterar as comissões que constituem a sua prestação.
Dir-se-á que tal alteração tanto pode traduzir uma revisão em alta, como uma revisão em baixa das comissões. E se revir em alta, nenhum problema haverá, mas se revir em baixa e se o fizer de forma significativa, já poderá constituir um problema.
Porém, não só isso não afasta o facto de a A. ficar á mercê da Ré, como é deslocar a questão para o exercício do direito que é conferido, quando a análise que cabe levar a cabo neste momento é apenas e tão só sobre o conteúdo e não sobre o exercício.
Poder-se-á ainda dizer que o sistema jurídico contém limites ao exercício do direito conferido pela cláusula e que a mesma não vive isolada na ordem jurídica.
Concretamente e desde lodo o art.º 762° n.º 2 do CC dispõe que no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé, ou seja, devem ser tidos em consideração os interesses da contraparte.
Por outro lado, o art.º 400º n.º 1 do CC prevê que a determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes ou a terceiro; em qualquer dos casos deve ser feita segundo juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados.
Porém, volta a colocar-se a mesma questão: está-se a deslocar o problema para o exercício, quando o que está em causa é apreciar o conteúdo.
Aliás e quanto ao conteúdo, importa verificar que a cláusula não esclarece o momento em que a Ré poderia proceder á alteração das comissões, os motivos da alteração, os limites mínimos de redução das comissões e bem assim o tipo de produtos que sofreriam uma diminuição da comissão. Dito de outra forma: a cláusula ontem uma amplíssima margem de indeterminabilidade, sujeitando, em abstracto, a contraparte à possibilidade de arbítrio por parte da predisponente.
*

Em face do exposto, o n.º 6 da cláusula 5ª viola a cláusula geral da boa fé ínsita nos art.vs 15° e 16° da LCCG, pelo que a mesma é nula nos termos do disposto no art.º 12° da LCCG”.

A apelante nas suas alegações afirma concordar com este entendimento, mas nas suas conclusões refere que a cláusula é nula nos termos do art. 19º al. h) da LCCG (conclusões 20º a 24º) e contrapõe que após o enquadramento jurídico das cláusulas do contrato na LCCG, não poderia existir outra solução que fosse a da condenação da apelada no pedido, existindo contradição entre os fundamentos e a decisão, sendo a sentença nula.

Quanto às conclusões 20º a 24º devem as mesmas ser desconsideradas pela Relação, pois que abordam matéria nova, já que no corpo alegatório não se fez qualquer alusão à mesma.

No que toca à nulidade da sentença, dispõe o art. 615º, n.º 1 al. c) do CPC que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.

Ora, como refere a apelada, a apelante nem sequer identifica onde se situa a contradição apontada à sentença.

Nesta considerou-se que a cláusula 5ª, n.º 6, se encontra sujeita ao regime das cláusulas contratuais gerais, sendo nula, nos termos do art. 12º da LCCG, mas que a invocação desse vício pela autora configura uma situação de abuso de direito, o que paralisa os efeitos daquela nulidade, decorrendo daí a improcedência dos pedidos formulados em 1, 2 e 4 do petitório.

Esta conclusão, de acordo com o raciocínio seguido na sentença, não se mostra contraditória com as considerações expendidas em sede fundamentação dessa decisão.

Não ocorre, por isso, a arguida nulidade da sentença, podendo apenas ocorrer erro de julgamento.

Se a conclusão assim extraída pelo tribunal a quo dos factos que considerou provados se mostra conforme com as normas legais aplicáveis é questão que se prende com o eventual erro de julgamento, de que adiante conheceremos.

A sentença não enferma pois da nulidade apontada.

Da questão do abuso de direito (na invocação da nulidade da cláusula 5ª, n.º 6, dos contratos):

Na sentença exarou-se que:

Dispõe o art.º 334º do CC:
" É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".
(…)
Uma das categorias de " actos abusivos " é formada pela supressio.
Há supressio quando uma posição jurídica, não tendo sido exercida durante certo tempo, não mais possa sê-lo por, de outra forma, se atentar contra a boa-fé; ocorreria, pois, uma supressão de certas faculdades jurídicas, pela conjugação do tempo com a boa-fé.
(…)
A supressio acolhe-se na tutela da confiança - ao não exercer o seu direito durante um período significativo de tempo, o seu titular - conhecedor do seu direito e com possibilidade de o exercer - iria facultar, ao agente, uma situação de confiança em que tal exercício não mais teria lugar.
Assim, o exercício de um direito será abusivo se, durante um período significativo de tempo, se verifica uma dada situação, que dá a alguém um direito e essa pessoa, conhecedora do seu direito e com possibilidade de o exercer, nada faz durante esse tempo todo, de tal forma que cria na outra parte a confiança de que esse direito já não será exercido.
(…)
No Ac. do 8T J de 02.06.2015., consultável in www.dgsi.pt/jstj pelo processo n.? 8969/09.3TBC8C.L 1.81, refere-se:
" No caso da "supressio", enquanto forma de protecção do beneficiário confiante inacção, inércia ou omissão do exercício de um direito por parte do seu titular a sua objectiva e concreta caracterização determina para além da constatação factual do não exercício prolongado do direito, outros factores que permitam suportar razoavelmente uma confiança do beneficiário no não exercício do direito, não sendo de deixar de ter em conta uma avaliação no sentido de que o exercício tardio direito acarretou maiores desvantagens do que as que decorreriam do seu exercício atempado. "
E no Ac. do STJ de 11.12.2013., consultável in www.dgsi.pt/jstj pelo proc. 629/1 0.9TTBRG.P2.81, refere que a caracterização da supressio demanda a verificação de outros elementos complementares (circunstâncias colaterais,) que, para além do não-exercício prolongado do direito, melhor alicercem a confiança do beneficiário, a saber: uma situação de confiança; uma justificação para essa confiança ( baseada na conduta circunstancial do titular do direito, a contraparte convence-se, justificadamente, que o direito já não será exercido); um investimento de confiança e a imputação da confiança ao não-exercente (a contraparte, convicta e movida por essa confiança, tomou medidas ou passou a actuar em conformidade, causando-lhe o exercício tardio do direito maiores desvantagens do que o seu exercício atempado. A omissão do titular do direito, por via desse nexo de imputação da confiança, constituiu-se assim numa situação que torna, ética e socialmente aceitável/ajustado, o seu sacrifício).
Está provado que:
- a cláusula em análise nos autos foi introduzida nos contratos celebrados entre a A e a Ré a 04.01.2005. (pontos 3.1.14. e 3.1.15.);
- por carta de 21.02.2006. a Ré comunicou à A a alteração da tabela de comissões referida no ponto 3.1.22. e que altera, nomeadamente, o valor da comissão devida pela correspondência ocasional ( pontos 3.1.20. e 3.1.21. );
- em data não apurada, a aqui A coligada com outros intentou procedimento cautelar comum contra a Ré, distribuído sob o n.º 2869/06.6TVLSB á então 1a Vara Cível de Lisboa, pedindo fosse a mesma intimada a:
a) abster-se de manter em vigor a aplicação de uma nova tabela de comissões, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada" correspondência ocasionai";
b) a repristinar a aplicação da anterior tabela de comissões que constitui o anexo I aos contratos de agência celebrados com os requerentes, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada " correspondência ocasional ( ponto 3.4.1. );
- nos referidos autos, a 29.07.2006., foi proferida a decisão de fls. 769-787, que julgou totalmente improcedente o pedido ( ponto 3.4.2.)
- da referida decisão foi interposto recurso, tendo o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, a 12.12.2006. proferido o Acordão fotocopiado a fls. 791-832, que manteve a decisão recorrida.
Não foi alegado que a aqui A, na sequência do referido acórdão e antes desta acção, tenha interposto alguma acção, a questionar a cláusula em apreço.
Está provado no ponto 3.2.8. que entre 2006 e 2011 foram pagas á A as comissões referidas ali referidas, sendo certo que a partir de maio de 2006 tais comissões foram pagas ao abrigo da nova tabela.
Não foi alegado que a aqui A, alguma vez, tenha colocado alguma reserva ao recebimento de tais comissões, pagas á luz tabela introduzida em Fevereiro de 2006, desde Maio de 2006.
Está provado que a Ré opôs-se á renovação dos contratos relativos às duas estações, tendo os mesmos cessado a 31.12.2012.
Não foi alegado qualquer facto impeditivo da propositura da acção até ao momento da cessação do contrato.
Perante o quadro factual referido verifica-se que:
-entre a assinatura dos contratos e a propositura da presente acção, a 31.12.2013., decorreram quase 9 anos;
-durante o referido período, em 2006 e na sequência da introdução da nova tabela, a A suscitou a apreciação judicial da cláusula 5a n.º 6, mediante o procedimento cautelar referido supra;
-entre a data do acórdão proferido no procedimento cautelar - 12.12.2006. - e a propositura da presente acção - 31.12.2013. - medearam 7 anos, o que não pode deixar de ser considerado um não exercício prolongado;
-o não exercício do direito de impugnar a cláusula 5ª n.º 6 durante o referido período de tempo, o facto de não ter sido alegado que a aqui A, alguma vez, tenha colocado alguma reserva ao recebimento das comissões pagas á luz tabela introduzida em Maio de 2006, com base na cláusula em apreço, mantendo-se o contrato a ser executado normalmente e como se nada se passasse durante todo o referido período, é de molde a criar na Ré, justificadamente, a confiança de que a cláusula não voltará a ser impugnada.
De referir ainda que qualquer das partes podia denunciar o contrato para 30.12.2010. (cláusula 13 n.º 1 e 2 ) e a Ré podia denunciar o contrato a qualquer momento (mesmo antes de 30.12.2010.) desde que observada a antecedência de 180 dias relativamente á data em que pretendesse que a denúncia produzisse efeito.( cláusula 13 n.º 3)
Muito embora pudesse denunciar o contrato para 30.12.2010., a A não o fez. E muito embora a Ré o pudesse denunciar a qualquer momento, só o veio a fazer, ao abrigo da clausula 13 n.º 1, para o termo do prazo da renovação.
Esta factualidade evidencia que foi criada uma situação de confiança na não impugnação da cláusula, como o investimento de confiança na manutenção do vinculo, tal como ele foi delineado.
E o facto de após o Ac. da RL não ter sido intentada qualquer acção a impugnar a cláusula e o facto de a A ter recebido as comissões de acordo com a cláusula e tabela introduzida ao abrigo da mesma, nunca terem sido objecto de qualquer reserva justificam plenamente a confiança criada.
Dir-se-á que ao longo do tempo a Ré foi ficando "sossegada" quanto á questão da impugnação da cláusula, sossego plenamente justificado pelas circunstâncias já referidas.
Note-se que a presente acção só foi interposta após a cessação do contrato, ou seja, quando a Ré já não podia fazer uso da faculdade conferida pela cláusula 13 n.º 3.
Note-se finalmente que quanto mais tempo o contrato se mantivesse em vigor (e importa recordar que a Ré o podia denunciar a todo o tempo) mais gravosa se tornava a sua responsabilidade.
Em face do exposto, evidencia-se que a invocação da nulidade da cláusula 5ª n.º 6 no referido quadro de circunstâncias se revela manifestamente abusivo de acordo com o principio geral da boa fé e como tal a supra reconhecida nulidade da referida cláusula fica paralisada nos seus efeitos”.

Nas suas conclusões diz a apelante que sendo a cláusula nula tem de se condenar a ré no pedido que resulta dessa declaração de nulidade (conclusão 19ª).

Esta afirmação parece conter implicitamente a ideia da licitude da arguição da nulidade da cláusula 5ª, n.º 6, dos contratos, ou seja, da não verificação do abuso de direito.

Estipula o art. 334º, do C. Civil, que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

A figura do abuso do direito surge, assim, como um modo de adaptar o direito à evolução da vida, servindo como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam, por forma considerada justa pela consciência social, em determinado momento histórico, ou obstando a que, observada a estrutura formal do poder conferido por lei, se excedam manifestamente os limites que devem ser observados, tendo em conta a boa fé e o sentimento de justiça em si mesmo – cfr. Ac. STJ de 12/06/2012, in www.dgsi.pt.

Duas das manifestações do abuso de direito, que, em tese, podem estar presentes no caso em apreciação, são a proibição do venire contra factum proprium e a suppressio.

Na modalidade de “venire contra factum proprium”, o abuso de direito caracteriza-se pelo exercício de uma posição jurídica em contradição com uma conduta antes assumida ou proclamada pelo agente.

Como considera o Prof. Meneses Cordeiro (in ROA 1998, vol II, pag. 964), “podem apontar-se quatro pressupostos da protecção da confiança através do venire:
1.º-uma situação de confiança, traduzida na boa fé própria da pessoa que acredite numa conduta alheia (no factum proprium);
2.º-uma justificação para essa confiança, ou seja, que essa confiança na estabilidade do factum proprium seja plausível e, portanto, sem desacerto dos deveres de indagação razoáveis;
3.º-um investimento de confiança, traduzido no facto de ter havido por parte do confiante o desenvolvimento de uma actividade na base do factum proprium, de tal modo que a destruição dessa actividade (pelo venire) e o regresso à situação anterior se traduzam numa injustiça clara (sublinhados nossos);
4.º-uma imputação da confiança à pessoa atingida pela protecção dada ao confiante, ou seja, que essa confiança (no factum proprium) lhe seja de algum modo recondutível”.

Deste modo, para que se possa dar por criada uma situação objectiva de confiança torna-se necessário que alguém pratique um facto – o factum proprium – que, em abstracto, seja apto a determinar em outrem uma expectativa da adopção, no futuro, de um comportamento coerente ou consequente com o primeiro e que, em concreto, gere efectivamente uma tal convicção.

No que tange à suppressio, esta traduz a situação do direito que, não tendo sido, em certas circunstâncias, exercido durante um determinado lapso de tempo, não possa mais sê-lo por, de outra forma, se contrariar a boa fé – Cfr. Meneses Cordeiro, Da Boa Fé No Direito Civil, II volume, pag. 797.

Para tanto é desnecessária a existência de culpa por parte do titular não-exercente (pags. 811/812).

Na supressio, comparativamente com o venire contra factum proprium, o tempo tem uma projecção de maior relevo: apenas pela sua continuidade pode, o não exercício, suscitar expectativas sociais de que essa auto-representação se mantem. A supressio pode, pois, considerar-se uma forma de proscrever os comportamentos contraditórios (pags. 813/814).

 “A chave da supressio está, pois, na alteração registada na esfera da contraparte, perante o não-exercício.
Protege-se a confiança desta, em que não haverá mais exercícios; a bitola pode ser procurada no sentido que o destinatário normal daria ao não exercício – art. 236º/1” – pag. 820.

No caso em apreciação apurou-se, além do mais, que:

-A 04.01.2005. a Ré, na qualidade de primeira contratante e a A. na qualidade de segunda contratante, subscreveram os dois contratos de “Agenciamento de Estação de Correio" em causa nos autos;
-Na cláusula 13ª, n.ºs 1 a 3, dos contratos estabeleceu-se que estes produziam efeitos a partir de 30 de Dezembro de 2004 e vigoravam pelo prazo de seis anos, sucessiva e automaticamente renovável por períodos de dois anos, podendo a segunda outorgante (ora autora), a qualquer momento, durante a vigência do presente contrato, proceder à sua denúncia, mediante comunicação por carta registada com aviso de recepção dirigida à Primeira Contratante, com a antecedência mínima de (180) cento e oitenta dias, relativamente à data em que se pretende que a invocada denúncia produza efeitos;
-Por carta de 21/02/2006 a Ré comunicou á A., que a partir de 1 de Maio de 2006 entrava em vigor uma nova tabela de comissões;
-A A. coligada com outros intentou procedimento cautelar comum contra a Ré, distribuído sob o n.º2869/06.6TVLSB á então 1ª Vara Cível de Lisboa, pedindo fosse a mesma intimada a:
a) abster-se de manter em vigor a aplicação de uma nova tabela de comissões, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada" correspondência ocasional";
b) a repristinar a aplicação da anterior tabela de comissões que constitui o anexo I aos contratos de agência celebrados com os requerentes, pelo menos na parte relativa aos produtos e serviços a que respeita a rubrica denominada "correspondência ocasional”.
-Nos referidos autos, a 29.07.2006., foi proferida a decisão de fls. 769-787, que julgou totalmente improcedente o pedido.
-Da referida decisão foi interposto recurso, tendo o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, a 12.12.2006. proferido o Acórdão fotocopiado a fls. 791-832, que manteve a decisão recorrida.
-Ao abrigo da nova tabela, a ré foi pagando à autora comissões líquidas decorrentes da execução dos contratos;
-A Ré opôs-se à renovação dos contratos, tendo os mesmos cessado a 31.12.2012.

Daqui decorre que a autora podia denunciar os contratos a todo o tempo e que a ré apenas o podia fazer findo o prazo inicial da sua vigência (este terminou a 30/12/2010).

Deriva ainda que desde Dezembro de 2006 a autora sabia da improcedência definitiva da pretensão por si deduzida em sede cautelar, visando obstar à aplicação da nova tabela de comissões e manter em vigor a anterior.

Apesar de estar ciente de tal, não propôs acção tendente à declaração de nulidade da cláusula contratual ao abrigo da qual foi alterado o valor das comissões.

Os contratos continuaram, por isso, em execução, com a aplicação da nova tabela de comissões.

E foi neste quadro contratual e de inércia da autora em propor acção de invalidade da dita cláusula que os contratos se renovaram a 30/12/2010 por mais dois anos.

Essa conduta omissiva da autora (factum proprium), que perdurou por mais de 4 anos, isto é, entre Dezembro de 2006 e Dezembro de 2010, era apta a gerar na ré uma situação objectiva de confiança da adopção por aquela, no futuro, de um comportamento coerente ou consequente com o primeiro, ou seja, de que não exerceria o direito à declaração de nulidade da cláusula contratual que permitia a alteração do valor das comissões, tanto mais que não denunciou os mesmos.

Porventura por essa razão, a ré também não denunciou os contratos para o final da sua vigência inicial (30/12/2010), tendo operado a renovação automática dos mesmos pelo período de mais dois anos (terminaram dia 30/12/2012).

A autora foi mantendo em execução os contratos celebrados com a ré, auferindo desta as comissões devidas ao abrigo da nova tabela e decorridos 7 anos, já após a cessação dos contratos, vem impugnar os mesmos, sustentando serem-lhe devidas comissões de valor superior.

Podendo a autora, a todo o tempo, denunciar os contratos de agenciamento de estações de correio, ofende de forma clamorosa as regras da boa fé, a manutenção pela mesma, durante os 6 anos da vigência inicial dos contratos, do cumprimento das sua normas, assim como do cumprimento da nova tabela de comissões imposta pela contraparte com efeitos a partir de 1/05/2006, com a qual, objectivamente se conformou, ao não exercitar durante aquele período e bem assim após a renovação dos contratos por mais dois anos (até 30 de Dezembro de 2012), o direito à declaração de nulidade da cláusula contratual ao abrigo da qual foi alterada a tabela de comissões, fazendo-o apenas, como que em retaliação, após o termo dos contratos por iniciativa da contraparte (ré apelada) e decorridos mais de 6 anos após o início da nova tabela de comissões.

A actuação da autora/apelante, é pois abusiva, como se considerou na sentença recorrida.

Assim sendo, improcede, neste ponto, a apelação.

Quanto ao pedido formulado sob o n.º 3 (condenação da ré no pagamento da quantia de € 45.600,00, respeitante ao incentivo da ... Mundial):
Na p.i. a autora alegou que nos contratos previa-se a venda de produtos de seguros ...-Mundial nas suas estações, estabelecendo-se que "durante os três primeiros anos de actividade a segunda contratante e, no caso em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a € 950,00, a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00"; e que a Ré apenas pagou 12 meses, nada tendo pago nos restantes 24 meses, pelo que deve pagar a quantia de € 45.600,00.

Na sentença recorrida entendeu-se que:

“- Da comissão" ..." –
Relativamente a esta questão, ficou provado - ponto 3.1.16. - que na cláusula 5ª dos instrumentos referidos no número 1 dos pontos 3.1.14. e 3.1.15. supra, ficou consignado:
Pela prestação dos serviços objecto do presente contrato, a Primeira contratante pagará mensalmente à segunda contratante, no dia 20 de cada mês:
(. . .)
As comissões e contrapartidas definidas para os produtos e serviços ... - Mundial previstos no Anexo /I ao presente contrato, relativas ao mês anterior.
Durante os três primeiros anos de actividade da segunda contratante e, no caso, em que o valor mensal das comissões previstas na alínea b) do número anterior for inferior a 950,00 euros a ... assegura ao agente uma comissão adicional correspondente à diferença entre o valor das comissões referidas na alínea b) e a quantia de € 950,00.
(. . .)
(. . .)
Caso a segunda contratante não cumpra os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.
(. . .)
Resulta da cláusula em apreço que a Ré se obrigou a pagar á A uma comissão pela venda de produtos ....
Mas além disso a Ré obrigou-se, relativamente a cada uma das estações, a, durante os três primeiros anos de actividade da A. a pagar, mensalmente, a diferença entre o valor das comissões devidas pela comercialização de produtos ..., apuradas em cada mês e a quantia de € 950,00.
Está provado - ponto 3.1.19. - que a Ré apenas pagou a comissão para os produtos e serviços ... - Mundial previstos, referida na cláusula 5ª n. ª 1 alínea b) e 2, em 12 meses.
O que com este facto se pretende afirmar é que a Ré apenas pagou a diferença entre as comissões apuradas e a quantia de € 950,00 durante 12 meses, tendo deixado de o fazer entretanto, de tal modo que a A pede a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 45.000,00 e que corresponde á quantia de € 950,00 x 24 meses x 2 estações.
Sucede que ficou estipulado no n.º 5 da cláusula 5ª que caso a autora não cumprisse os objectivos que lhe forem definidos, a ... reserva-se o direito de não efectuar o pagamento da quantia prevista no número 2 da presente cláusula.
Na interpretação desta cláusula deve entender-se que, na falta de qualquer indicação, o cumprimento dos objectivos deveria ser 100%
Está provado - ponto 3.2.9. - que foram fixados para a EC de Baguim do Monte e para a Estação de S. ... de Coronado os objectivos de venda de produtos ...-Mundial, definidos a fls. 962, que a Autora conhecia.
Está ainda provado - ponto 3.2.10. - que entre Setembro de 2004 e Junho de 2005, na estação de Baguim do Monte e entre Dezembro de 2004 e Junho de 2005, na estação de S. ... de Coronado, a A realizou os valores constantes do mapa de fls. 962 e cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
O que se verifica do quadro em referência é que a A, em nenhum das referidas estações cumpriu os objectivos a 100%.
Neste conspecto, o facto de a Ré ter deixado de pagar a diferença entre as comissões apuradas e a quantia de € 950,00, é licita á luz do contrato e dos factos.
E desta forma, o pedido de condenação da Ré a pagar a quantia de € 45.600,00 deve ser julgado improcedente”.

Nas conclusões de recurso diz a apelante que:

-A cláusula 5º nº 5 do contrato, que estabelecia objectivos a respeitar pelos parceiros para atribuição do incentivo ... Mundial, deve ser considerada nula por violação dos deveres de informação e comunicação da mesma.
-A Apelante passou ao lado da existência desta cláusula a consequentemente deveria dar como certo que a mesma pretendia invocar a falta de comunicação e informação desta cláusula.
-Os objectivos ... Mundial nunca foram comunicados à Apelante.
-Ficou provado a falta de comunicação e informação da cláusula 5º nº 5 do contrato.
-Facto que origina a nulidade da cláusula por violação dos direitos de informação, não podendo esta ser considerada válida e a Apelada condenada ao pagamento do incentivo em falta.

Vejamos.

De acordo com as regras gerais do ónus de prova constantes do art. 342.º, do C.C., cabia à apelante alegar e demonstrar que a cláusula 5ª, n.º 5, ora impugnada, havia sido elaborada pela apelada para uma generalidade de contratos, competindo então à contraparte a alegação e prova de que essa cláusula resultou de negociação entre as partes, em conformidade com o estatuído no art. 1º, n.º 3, da LCCG, onde se estabelece que “o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”.

Esta norma inverte o ónus da prova do carácter negociado (ou não) de uma cláusula de um contrato para o contraente que a invoque – cfr. Ana Prata, Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, 2010, Almedina, pag. 180.

Como se expendeu no Acórdão do STJ, de 10/05/2007 (relator João Bernardo; acessível in www.dgsi.pt), a razão de ser daquele ónus é compreensível:Em todas as cláusulas contratuais, a parte a quem não agradasse o respectivo cumprimento, invocava que as cláusulas dum contrato que lhe não convinham haviam sido redigidas, sem negociação prévia e com características de indeterminação e, só por aí, atirava para cima da contraparte ónus de prova terríveis, cominados com o afastamento das mesmas cláusulas. Na prática, um modo fácil de não cumprir, legalmente, contratos”.

Acontece que na p.i. a autora se limitou a alegar que a cláusula 5ª, ponto 6, não tinha sido negociada, nada referindo sobre o ponto 5 dessa cláusula.

A autora jamais, até apresentar as alegações de recurso de apelação, suscitou no processo, a questão daquela cláusula ser uma cláusula contratual geral.

Sendo assim, e para além da apelante não ter demonstrado encontrarmo-nos em presença de uma cláusula contratual geral (e provou-se que essa cláusula foi discutida entre as partes – vide ponto 3.1.6.), a questão da aplicação da LCCG ao ponto 5 da cláusula 5ª não pode sequer ser conhecida por esta Relação, tanto mais que nem sequer foi apreciada em 1ª instância.

Por outra via, ao contrário do alegado pela autora, provou-se que esta tinha conhecimento dos objectivos estabelecidos para as vendas dos produtos e serviços ....

E, em face do contratualmente estabelecido entre as partes, o pagamento da quantia de €950,00 por parte da ré dependia da demonstração pela autora, enquanto facto constitutivo do seu direito (art. 342º, n.º 1, do C. Civil), de que as comissões mensais prevista na cláusula 5ª, n.º 1 al. b) e n.º 2 dos contratos, por si recebidas no período de Setembro de 2005 a Agosto de 2007 (24 meses) pela comercialização dos produtos e serviços ..., foi mensalmente (ou pelo menos em alguns meses) inferior à quantia de €950,00, caso em que teria direito ao recebimento da diferença entre aqueles valores e esta quantia.

Provado esse facto, competiria então à ré, enquanto facto extintivo do direito da autora, a demonstração de que esta não tinha logrado cumprir os objectivos traçados, pois que nesta eventualidade o n.º 5 da cláusula 5ª dos contratos conferia à ré o direito ao não pagamento daquele diferencial.

Acontece que a autora não provou ter auferido comissões mensais inferiores a €950,00 pela venda dos produtos e serviços ... no período de Setembro 2005 a Agosto 2007.

Por falta de prova deste facto, constitutivo do seu direito, improcede também nesta parte a apelação.

Concluímos, assim, pela improcedência, in totum, da apelação.
***

VI.-Decisão:

Pelo acima exposto, decide-se:
1.Julgar a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida;
2.Custas pela apelante;
3.Notifique.

Lisboa, 29 de Novembro de 2016

(Manuel Ribeiro Marques - Relator)
(Pedro Brighton - 1º Adjunto)
(Teresa Sousa Henriques – 2ª Adjunta)