Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2552/12.3TJLSB.L1-7
Relator: ANA RESENDE
Descritores: CRÉDITO AO CONSUMO
JUROS REMUNERATÓRIOS
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/23/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. O regime previsto no art.º 2 do DL 269/98 não opera de modo automático, devendo o juiz verificar se não ocorrem, de forma evidente, exceções dilatórias ou se o pedido não é manifestamente improcedente.
2. Se o pedido formulado contrariar jurisprudência uniformizada, deverá concluir-se que é manifestamente improcedente.
3. A doutrina do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 7/2009 é aplicável aos contratos de crédito pessoal celebrados após a entrada em vigor do DL 133/2009, de 2 de junho.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

            I – Relatório
1. B…, antes designado B…, veio intentar contra ÁLVARO …, a presente ação com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos do DL 269/98, de 1 de setembro, pedindo a condenação do mesmo a pagar as importâncias de 2.365,41€, 1.639,50€ e 1.339,14€, acrescidas de 479,07€ ( 218,47€ + 209,09€ + 51,51€) de juros vencidos até 11 de abril de 2012, e 19,16€ ( 8,74€ + 8,36€ + 2,06€)  de imposto de selo sobre os juros vencidos e ainda os juros que sobre as ditas quantias se vencerem, às taxas anuais de 13,76%, de 19% e 39%, respetivamente, desde 12 de abril até integral pagamento, bem como o imposto de selo, à taxa de 4%, que sobre os juros recair.
2. Alega para tanto, que no âmbito da sua atividade comercial concedeu crédito pessoal direto, sob a forma de um contrato de mútuo, “contrato de mútuo n.º  ..., por escrito particular de 16 de março de 2010, tendo assim emprestado a quantia de 2.236,40€, com juros à taxa nominal inicial de 8,994% ao ano, indexada à Euribor a 90 dias, devendo a importância do empréstimo e os juros referidos, bem como a comissão de gestão, o imposto de selo de abertura de crédito e o prémio do seguro de vida, serem pagos em 60 prestações, mensais e sucessivas, com vencimento a primeira em 10 de abril de 2010, sem prejuízo de o número de prestações poder ser superior ou inferior em função do acréscimo ou decréscimo da taxa de juro inicialmente acordada em função da variação da taxa Euribor.
Conforme o acordado, a falta de pagamento de três ou mais prestações sucessivas na data do respetivo vencimento implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações, tendo estas o valor constante do contrato, ou seja 47,61€, cada, mais se acordando que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual ajustada ao presente – 9,76%, acrescida de 4 pontos percentuais, ou seja a taxa anual de 13,76%.
Por o R. não podia cumprir o contrato, e face às atualizações da taxa Euribor, o prazo do contrato foi alargado primeiro para 73 prestações e depois 75 prestações, sendo o valor da 74.ª prestação de 40,50€ e a 75.ª de última prestação, 16,41€.
O R. não pagou a 17.ª prestação e seguintes, num total de 59, comunicando o A. àquele, a perda do benefício do prazo contratual.
No exercício da sua atividade comercial o A. concedeu ao R., por contrato de 28 de dezembro de 2006, crédito pessoal direto, sob a forma de contrato de mútuo, contrato de crédito pessoal n.º ..., emprestando a importância de 4.200,00€, com juros à taxa nominal de 15% ao ano, devendo a importância do empréstimo e os juros referidos, bem como a comissão de gestão, o imposto de selo e o prémio de seguro, serem pagos em 60 prestações, mensais e sucessivas, com vencimento, a primeira em 10 de fevereiro de 2007 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes.
Ficou acordado que a falta de pagamento de qualquer das referidas prestações na data do respetivo vencimento implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações, tendo estas o valor constante do contrato, isto é, 112,83€, mais sendo acordado que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual ajustada – 15%, acrescida de 4 pontos percentuais, ou seja um juro à taxa anual de 19%.
Por não poder cumprir o contrato, o R solicitou o alargamento do prazo de reembolso para 84 prestações, passando o valor mensal para 54,65€, cada a partir da 44.ª prestação, com data de vencimento em 10 de setembro de 2010.
O R. não pagou a 55.ª prestação e seguintes, num total de 30, vencida a primeira em 10 de agosto de 2011, vencendo-se então todas, no montante cada uma de 54,65€.
O A. emitiu ainda em favor do R. um cartão de crédito, ao abrigo de um contrato, contrato de adesão ao cartão de crédito Banco ... n.º  ..., celebrado em 28 de dezembro de 2006, tendo rescindido com o mesmo, com efeitos a partir de 6 de março de 2012, conforme comunicação remetida ao R. em 20 de fevereiro de 2012.
À data da rescisão do contrato, em consequência de pagamentos que o A. suportou com referência a despesas feitas pelo R., e que este liquidou através da utilização do cartão de crédito, a importância em dívida por este último era de 1.339,14€, sobre a referida importância incidindo juros de mora à taxa de 3,25% ao mês, ou seja 39% ao ano.
3. Citado o R não veio contestar.
4. Foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, e em conformidade:
1) declarou nula e de nenhum efeito a alínea b) da cláusula 7.ª das “condições Gerais” do contrato de mútuo n.º  ..., porque contrária à boa fé e em consequência proibida ao abrigo do disposto nos artigos 12.º e 15.º do DL 446/85, de 25.10.
2) considerou manifestamente improcedente o pedido do A.
Quanto ao pedido relativo ao contrato de mútuo n.º  ...
2.1.quanto a juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas Condições Específicas, para além da componente do capital emprestado, relativamente às prestações 18.ª até à 75.ª;
2.2. quanto a juros de mora relativos às prestações 18.ª até à 75.ª, contados desde a data do vencimento da 1.ª prestação não paga, em 10.08.2011.
Quanto ao pedido relativo ao contrato de mútuo n.º ...
2.3. quanto a juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação, para além da componente do capital emprestado, relativamente às prestações 56.ª até à 84.ª.
2.4. quanto a juros de mora relativos às prestações 56.ª até à 84.ª, contados desde a data do vencimento da 1.ª prestação não paga, em 10.08.2011.
3. Condenou o R. a pagar ao A. as seguintes quantias:
Quanto ao pedido relativo ao contrato de mútuo n.º  ...:
3.1. o montante de 283,50€ de capital, correspondente ao somatório do valor das prestações 17.º até à 23.ª, inclusive, no valor unitário de 40,50€, vencida cada uma, respetivamente, no dia 10 de cada mês, entre 10/08/2011 e 10/02/2012 (€ 40,50 x 7 prestações);
3.2. Juros de mora, sobre o montante de € 40,50, correspondente ao valor de cada uma das prestações referidas 3.1 desde a data do vencimento respetivo até efetivo e integral pagamento, calculados com base nas seguinte taxas de juros anuais, incluindo cláusula penal:
- à taxa anual de 13,82% (9,82% + 4%), desde 10/08/2011 até 30/10/2011)
- à taxa anual de 13,87% (9,87% + 4%), desde 01/11/2011 até 31/01/2012;
- à taxa anual de 13,76% (9,76% + 4%), desde 01/02/2012 até efetivo e integral pagamento.
3.3. O montante total correspondente apenas ao valor do capital integrante das 58 prestações (18ª até à 75ª) que se venceram, de imediato e por antecipação, em 07/03/2012;
3.4. Juros de mora sobre o montante global do capital correspondente às 58 prestações, da 18ª até à 75ª, calculados à taxa anual de 13,76% (9,76% + 4%), desde 07/03/2012 até efetivo e integral pagamento.
3.5. O montante que for devido a título de imposto de selo sobre os juros, à taxa anual de 4%.
Quanto ao pedido relativo ao contrato de mútuo n.º ...:
3.6. O montante de € 54,56, de capital, correspondentes à 55ª prestação vencida e não paga na data de 10/08/2011, acrescida de juros de mora à taxa anual de 19% (15% + 4%) desde 10/08/2011 até efetivo e integral pagamento;
3.7. O montante de capital correspondente apenas ao somatório da parte integrante do capital de cada uma das prestações que se venceram, por antecipação em relação ao prazo de vencimento previsto no contrato, na data de 10/08/2011, isto é, as prestações 56ª até à 84ª, acrescido de juros de mora à taxa anual de 19% (15% + 4%), desde 10/08/2011 até efetivo e integral pagamento.
3.8. O montante que for devido a título de imposto de selo sobre os juros, à taxa anual de 4%.
Quanto ao contrato de adesão ao cartão de crédito Banco ... n.º  ...:
3.9. O montante de € 1.339,14, de capital;
3.10. € 51,51 de juros de mora vencidos, sobre o montante de € 1.339,14, contados desde 06/03/2012 até 11/04/2012, à taxa mensal de 3,25% (ou seja, à taxa anual de 39%), e juros vincendos à mesma taxa, desde 12/04/2012 até efetivo e integral pagamento;
3.11. € 2,06 de imposto de selo à taxa anual de 4% sobre os referidos juros vencidos, mais o imposto que for devido sobre os juros vincendos.
4. Absolveu o R. do demais pedido pelo A.
5. Inconformado, veio o A. interpor recurso de apelação, formulando nas suas alegações, as seguintes conclusões:
- A sentença recorrida violou, atento a matéria de facto provada nos autos, o disposto no artigo 20º do Decreto-Lei 133/2009, de 2 de junho, isto com referência ao primeiro contrato referido nos autos.
- O Acórdão do S.T.J. nº 7/2009, não é Lei no País e, aliás, é inaplicável a sua orientação aos contratos celebrados após a entrada em vigor do dito Decreto-Lei 133/2009, de 2 de junho, cujo artigo 33º, nº 1, alínea a) expressamente revogou o Decreto-Lei 359/91, de 21 de setembro.
- O dito acórdão não é aliás Assento.
- O artigo 2º do Código Civil foi revogado pelo nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei 239-A/95, de 12 de dezembro.
- Atento também natureza do processo em causa – processo especial – e o facto de o R., regularmente citado, não ter contestado, deveria o Senhor Juiz “a quo” ter de imediato conferido força executiva à petição inicial, não havendo nem podendo assim pronunciar-se sobre quaisquer outras questões, face ao disposto no artigo 2º do regime aprovado pelo Decreto-Lei 259/98, de 1 de setembro, preceito que a sentença recorrida violou.
- Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso e, por via dele, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por acórdão que condene o R, ora recorrido, na totalidade do pedido.
            6. Cumpre apreciar e decidir.
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            II –  Enquadramento facto - jurídico
Presente que o objeto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formulado, importando em conformidade decidir as questões[1] nas mesmas colocadas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, a apreciar está saber se como pretende o Recorrente, estava vedado ao tribunal a quo pronunciar-se, nos termos em que o fez sobre o pedido formulado, face à ausência de contestação, antes devendo limitar-se a conferir força executiva à petição inicial.
Conhecendo.
Não se questiona que na situação sob análise se está no âmbito do processo especial previsto no DL 269/98, de 1 de setembro, e não perante uma ação declarativa comum, necessário se torna, atender ao disposto no art.º 2, do Anexo àquele diploma legal, que na previsão das regras próprias e especiais que rege tal processo, consigna, para o caso de o réu não contestar, que o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram de forma evidente, exceções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente.
Assim, e no caso de não estar em causa qualquer exceção dilatória, apenas não deverá ser conferida força executiva à petição, se a pretensão do autor for, de forma ostensiva, indiscutível, improcedente, porque a lei não comporta a pretensão deduzida, ou os factos apurados, face ao direito aplicável não a justificam[2].
Na situação sob análise, tendo em conta o factualismo relevante, constante do “relatório”, e para o qual expressamente se remete, suscita-se a questão se saber se podia, ou não, o Mmo juiz quo, pronunciar-se, como o fez, afastando a satisfação do pagamento dos juros remuneratórios, peticionados nos presente autos relativamente a dois contratos de créditos a consumidores, celebrados à luz do DL 359/91, de 21 de setembro, bem como do DL 133/2009, de 2 de junho que o veio revogar[3], substituindo-o.
Ora, relativamente ao contrato de crédito pessoal n.º ..., de 28 de dezembro de 2006, na medida da condenação, e quanto à procedência parcial do pedido, na desconsideração dos juros remuneratórios na satisfação das prestações devidas, relevantemente, estriba-se o entendimento vertido na sentença, que incluindo tais prestações, como contraprestação da cedência do capital, durante a vigência do empréstimo, juros remuneratórios, o vencimento das prestações que se efetivou com o não pagamento da 55.ª prestação, só se verifica quanto ao capital e não também quanto aqueles juros.
Tomou-se assim posição, em termos de uma discussão que se vinha desenvolvendo, acolhendo-se o sentido que com vencimento antecipado da obrigação de restituição de capital deixa de correr o prazo a que respeitavam os juros remuneratórios convencionados, sendo assim inexigíveis os que nasceriam até ao final do contrato, e que se venceriam no caso da inexistência de tal vencimento antecipado de todas as prestações.
Sem prejuízo da argumentação acolhida em sede da decisão sob recurso, temos que esta orientação, assenta no que deve ser entendido por juro remuneratório, apela para o disposto no art.º 781, do CC, e na respetiva conformação do clausulado no acordo celebrado, e na decorrente e válida configuração da prestação do devedor, perante o seu incumprimento.
Sendo certo que vinha igualmente sendo defendido, de forma diversa, na consideração da estipulação contratual válida, verificada a existência de um contrato de mútuo no âmbito de concessão de crédito ao consumo, com o estabelecimento de juros enquanto forma de remuneração de capital, a antecipação do cumprimento por incumprimento contratual do mutuário não inutilizaria a obrigação do devedor satisfazer os juros remuneratórios de acordo com o contratualmente estabelecido, veio entretanto a ser proferido o Acórdão Uniformizador Jurisprudência de 25 de março de 2009[4], no qual se consignou, No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas prestações ao abrigo da cláusula de redação conforme ao art.º 781 do CC, não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados.
Ora[5], temos que os acórdãos uniformizadores de jurisprudência, embora não sendo rigorosamente vinculativos, representam jurisprudência qualificada, e pese embora possam ser meramente persuasivos ou mutuáveis para o Supremo Tribunal de Justiça, já para as instâncias, e enquanto se mantiver a sua vigência, a sua componente vinculativa é acentuada[6].
Na verdade, como é sabido no caso do tribunal se afastar na apreciação do caso concreto da jurisprudência uniformizada, independentemente do valor da causa, ou da sucumbência, é sempre admissível o recurso, nos termos do art.º 678, n.º 2, c), do CPC, disposição esta que reforça, embora de modo indireto, a obediência aos acórdãos de uniformização de jurisprudência, traduzindo-se também num fator marcadamente inibidor da adoção de entendimentos que possam, em termos objetivos, desrespeitar tais arestos[7].
Dessa forma, se o pedido formulado contrariar tal jurisprudência, deverá concluir-se que é manifestamente improcedente, verificando-se uma das exceções previstas na 2.ª parte do art.º 2, do Regime Anexo ao DL 269/98, de 1.9, e assim, a falta de contestação não tem efeito cominatório estabelecido na 1ª parte do referido preceito legal, competindo ao juiz conhecer do mérito do pedido[8].
Aqui chegados, estando em causa um contrato de mútuo oneroso, bancário, ou comercial, liquidável em prestações, conforme o configurado nos autos, encurtado que se mostre o período em que o capital é disponibilizado ao devedor, no caso da Recorrente, enquanto credora, pretender reavê-lo, de imediato e na totalidade, perante o incumprimento do Recorrido, devedor, como o fez, não lhe assiste o direito a receber juros remuneratórios, como foi decidido na sentença sob recurso.
Avulta saber, se quanto ao contrato n.º  ..., de 16 de março de 2010, podem ser aplicadas as considerações enunciadas, tendo em conta o ensinamento do acórdão uniformizados referenciado, e a reconhecida força que o mesmo detém.
Não desconhecendo a existência de entendimento diverso[9], diga-se, e adiantando, que se afigura que também quanto a tal contrato deverá ser observado o ensinamento do acórdão uniformizador[10], dessa forma, manifestamente improcedente a pretensão formulada pelo Recorrente no concerne ao pedido de serem atendidos, e assim satisfeitos, os juros remuneratórios, por não integrarem as prestações vencidas para efeitos da sua exigibilidade em caso de perda do benefício do prazo, nos termos do art.º 781, do CC, bem como do art.º 20 do DL 133/2009, de 2 de junho, já referenciado.
Com efeito, em termos breves, importa salientar que o disposto neste último preceito legal visou, sobretudo, regular os pressupostos do exercício do direito do credor a invocar a perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato[11], nada sendo estabelecido no concerne ao montante das prestações a atender, remetendo, em conformidade, implicitamente, para o disposto no art.º 781, do CC, e desse modo para a interpretação realizada pelo acórdão uniformizador, maxime em termos da inviabilidade de ressarcimento de juros remuneratórios no caso do vencimento automático, ainda que perante uma estipulação desse teor efetuada no acordado, como resulta da fundamentação daquele aresto[12].
Assim, e no que ao contrato em causa respeita, o vencimento antecipado das prestações vincendas deverá restringir-se à parcela de capital ainda por satisfazer, ficando necessariamente excluídos o demais que apenas seria devido se fosse mantido o prazo de vencimento das restantes prestações.
Não se configura assim que o novo regime legal que, aliás, se evidencia como visando alargar a proteção do consumidor aderente[13] tenha vindo alterar aquele que serviu de base ao acórdão uniformizador.
Refira-se ex abundantis que na invocação do que de modo expresso se fez clausular em termos da satisfação de juros remuneratórios no âmbito do vencimento imediato[14], patenteando-se estarmos perante um contrato de adesão, que tal exigência relativa à disponibilidade de um capital por um período de tempo que ainda não decorreu, e não vencido, traduzir-se-ia numa clausula penal, que como na situação sob análise, importaria numa duplicação não assinalada, e assim não percetível pelo consumidor aderente, consubstanciando-se num caso de clausula desproporcional, enfermando de nulidade, ou igualmente viciada por permitir o credor que pudesse obter a antecipação de uma contraprestação de uma prestação que o mesmo não vai realizar, artigos 19, n.º1 c), 20, 22, n.º1, l) e 12, do DL 446/85, de 25 de outubro.
Inexistindo outras questões a conhecer, improcedem, e na totalidade, as conclusões formuladas.
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III – DECISÃO
Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença sob recurso.
           Custas pela Apelante.

Lisboa, 23 de abril de 2013.

Ana Resende
Dina Monteiro
Luís Espírito Santo
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[1] O Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está sujeito às razões jurídicas por aquelas invocadas, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do CPC.
[2] Cfr. Salvador da Costa, Processo Geral Simplificado. A Injunção e as Conexas Ação e Execução, pag. 90.
[3] Conforme o disposto no art.º 33.
[4] Publicado no Diário da República, 1ª série, de 5 de maio de 2009.
[5] Na sequência de reapreciação, já antes efetuada, de entendimento diverso, precedentemente perfilhado.
[6] Cfr. Ac. STJ de 14.05.2009, in www.dgsi.pt.
[7] Cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil – Novo Regime, pag. 43.
[8] Cfr. Neste sentido Acórdãos desta Relação e secção de 15.12.2009 e 2.02.2010.
[9] Cfr Ac. RL de 12.07.2012, in www.dgsi.pt.
[10] Cfr. Ac. RL de 11.09.2012, de 6.11. 2012, e de 6.12.2012, todos in www.dgsi.pt.
[11] Consigna-se no Preâmbulo do DL 133/2009, Na linha do disposto nos artigos 934.º a 936.º do Código Civil, estabelecem-se regras aplicáveis ai incumprimento do consumidor no pagamento de prestações, impedindo-se que, de imediato, o credor possa invocar a perda do benefício do prazo ou a resolução do contrato.
[12] Nomeadamente, colhem-se, os seguintes aspetos: a obrigação de juros remuneratórios só se vai vencendo na medida em que o tempo a faz nascer pela disponibilidade do capital, no caso do mutuante, perante o pagamento de uma prestação, encurtar o período de tempo pelo qual disponibiliza o capital, e pretender recuperá-lo, só recebe o capital emprestado e a remuneração do empréstimo através dos juros, até ao momento que o recuperar, não podendo assim receber juros remuneratórios do mutuário faltoso, pois tais juros não se venceram, e consequentemente não existem, pelo que se o mutuante optar pela perceção dos juros remuneratórios convencionados, terá que aguardar pelo decurso do tempo previsto para a duração do contrato, não fazendo uso da faculdade prevista no art.º 781, do CC, por referência à lei ou a cláusula de teor idêntico inserida no contrato. Prevalecendo o vencimento imediato, o mutuante é ressarcido tão só dos juros moratórios, de acordo com as taxas e cláusula penal estabelecidas. Assim, o art.º 871, bem como a cláusula que para o mesmo remeta ou reproduza, reporta-se apenas ao capital emprestado, e não aos juros remuneratórios, mesmo que estes estejam incorporados nas sucessivas prestações, justificando-se o regime legal com a perda de confiança que advém ao mutuante quanto à futura satisfação do capital, perante o incumprimento da obrigação de pagamento das respetivas prestações.
[13] Cfr. Ac. RL de 25.10.2012, in www.dgsi.pt, que neste segmento de perto se segue, referindo, nomeadamente o afastamento da regra do art.º 1147, do CC, pelo art.º 19, n.º1.
[14] Cláusula 7:ª, alínea b) das Condições Gerais.