Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | GABRIELA DE FÁTIMA MARQUES | ||
Descritores: | PERSI EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA CONHECIMENTO OFICIOSO PER TÍTULO EXECUTIVO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/20/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. Verificando-se a legibilidade do credor e do crédito para efeitos de aplicação do PERSI, pode o Tribunal aferir do seu cumprimento perante a credora, conhecendo oficiosamente de tal excepção dilatória inominada verificando-se tal ausência. II. Dada a natureza de excepção dilatória de conhecimento oficioso haverá que aplicar o previsto no nº 2 do art.º 573º do CPC, ou seja, não ocorre quanto a tal excepção o efeito preclusivo, pelo que a circunstância de ter sido suscitada em requerimento autónomo, já após os articulados, em nada releva, uma vez que está subtraída ao prazo concedido para apresentação da defesa. III. As limitações decorrentes do PERSI impõem-se ao cessionário do crédito, pelo que não pode o exequente escudar-se no facto de não revestir a natureza de entidade financeira. IV. Verificando-se o incumprimento do plano de recuperação nos moldes previstos no art.º 218.º do CIRE, os créditos recuperam a sua situação originária, pois só o cumprimento do plano exonera o devedor da totalidade das dívidas remanescentes. V. Tal como resulta do requerimento executivo, também entendemos que é de aderir à tese que nega à sentença homologatória do plano de recuperação a natureza de título executivo, pelo que, mantendo-se o crédito originário é igualmente de cumprir previamente o PERSI. (Sumário elaborado pela relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório: F… e J… vieram, por apenso à execução (a 29/03/2023, inicialmente separados, mas em que foi nestes autos ordenada a junção) que lhe foi movida por Parvalorem, S.A., deduzir oposição à execução mediante embargos de executado invocando diversas nulidades, relacionadas, no essencial, com o pedido de apoio judiciário e regras tributárias. Admitida liminarmente a oposição deduzida, foi ordenado o cumprimento do disposto no artigo 732.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. A exequente apresentou contestação, argumentado, em síntese, que não estamos perante uma execução fiscal, nem o código de processo civil tem um regime idêntico ao do direito fiscal, que permita suspender a venda de imóveis que constituam a habitação própria e permanente, afirmando ainda que desconhece se actualmente as frações em causa são ou não habitação própria permanente. Conclui pela improcedência dos embargos. Com data de 21/10/2023, foi proferido o seguinte despacho: ”Considerando que os autos reúnem os elementos necessários à prolação de uma decisão de mérito, notifique as partes para, em 10 dias, se pronunciarem no sentido de saber se têm algo a opor a que seja proferido despacho de saneamento dos autos com dispensa de audiência prévia, com a advertência de que, nada sendo dito no referido prazo, interpretará o Tribunal o silêncio das partes como aceitação.”. Após vicissitudes relacionadas com a substituição de patrono nomeado aos embargantes, por Requerimento, de 19/03/2024, invocaram os Executados a falta de integração no PERSI, requerendo a sua absolvição da instância. Notificada do despacho do Tribunal a quo, de 10/04/2024, pelo qual foi determinada a notificação da Exequente para, em 10 dias, esclarecer se deu cumprimento ao PERSI e, na afirmativa, para o comprovar documentalmente - carta, comprovativo da entrega/recebimento- a Embargada não procedeu à junção do comprovativo da integração dos Executados, enquanto clientes bancários (consumidores) no PERSI, argumentado que não é aplicável tal regime. No saneador, por verificação da excepção dilatória de ausência de integração obrigatória dos executados no PERSI, absolveram-se os mesmos da instância executiva e declarou-se extinta a execução. Inconformada veio a embargada recorrer formulando as seguintes conclusões: «A) A Parvalorem, SA, exequente, não é uma instituição financeira. 2. A Parvalorem, SA, não é uma instituição financeira nem uma instituição de crédito. Assim, não está sujeita ao Regime Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), um regime criado exclusivamente para instituições de crédito. 3. O PERSI é aplicável apenas a entidades financeiras reguladas pelo Banco de Portugal, obrigadas a seguir normas de proteção ao consumidor e de transparência no tratamento de crédito. 4. O Decreto-Lei n.º 227/2012 define que o PERSI se aplica apenas a instituições de crédito, excluindo entidades cessionárias de créditos (como a Parvalorem) que adquirem créditos, mas não exercem operações de crédito directamente. 5. Exigir o cumprimento do PERSI a entidades não financeiras seria uma interpretação extensiva da lei, contrariando o princípio da interpretação restritiva para obrigações não explicitamente previstas. 6. As instituições financeiras, sob supervisão do Banco de Portugal, operam com obrigações específicas de proteção ao consumidor. Entidades como cessionárias de créditos, não supervisionadas, não têm o mesmo enquadramento jurídico. 7. As Cessionárias como a Parvalorem adquirem créditos por cessão e não têm vínculo directo com os devedores, diferindo das instituições financeiras, que possuem um relacionamento continuado com os clientes. 8. O PERSI foi criado para promover a estabilidade do sistema financeiro, visa proteger consumidores no âmbito de contratos com entidades reguladas, algo que não se aplica a cessionárias. 9. Obrigar entidades não financeiras a implementar o PERSI geraria uma carga administrativa incompatível com a sua estrutura e finalidade, que é essencialmente comercial. 10. O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (13/01/2022) confirma que entidades como a Parvalorem não estão obrigadas ao PERSI por não serem instituições de crédito. B) O incumprimento e vencimento das obrigações do contrato executado, é muito anterior à entrada em vigor do DL nº 227/2012 de 25/10 referente ao regime do PERSI 11. O incumprimento do contrato ocorreu em 29/12/2010, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 227/2012, que estabeleceu o PERSI. 12. O PERSI foi instituído em janeiro de 2013 e não possui cláusulas de aplicação retroactiva. 13. A retroactividade das leis é excepcional e deve ser expressamente prevista na lei, sendo contrária à Constituição Portuguesa a aplicação de normas retroactivamente, salvo previsão explícita. 14. A aplicação retroactiva do PERSI iria contra a proteção da confiança e a segurança jurídica, pois as partes contratantes devem poder contar com a legislação vigente na data do incumprimento. 15. O PERSI foi concebido para facilitar a regularização extrajudicial de contratos em incumprimento após a sua entrada em vigor, não para ajustar situações de incumprimento anteriores. 16. Em Direito Contratual, a legislação aplicável ao incumprimento de um contrato é a que estava em vigor na data da celebração do contrato. Assim, o incumprimento de 2010 deve ser analisado com base na legislação de então, não no PERSI. 17. Aplicar o PERSI retroactivamente alteraria indevidamente as condições originais do contrato, impondo novas obrigações sem o consentimento das partes. 18. Contratos com incumprimento anterior a 2013 não devem estar sujeitos ao PERSI, a Decisão do Tribunal da Relação de Évora de 24/02/2022 confirma que não há obrigação de integrar o devedor no PERSI nesses casos. C) Natureza e Finalidade do PER em Relação ao PERSI 19. A execução iniciou-se devido ao incumprimento de um Plano Especial de Revitalização (PER) homologado judicialmente, no qual os devedores se comprometeram a pagar a dívida em prestações específicas. 20. O PER é um processo judicial regulado pelo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) e destina-se a reestruturar as obrigações de empresas ou devedores em dificuldades, sendo mais formal que o PERSI, que é extrajudicial e destinado a consumidores. 21. Após homologação judicial, o PER é vinculativo para todas as partes, e o incumprimento do plano deve ser tratado conforme o CIRE, não se aplicando o PERSI, que é um regime específico para negociações extrajudiciais. 22. Este artigo permite que, em caso de incumprimento de um PER, o credor execute a dívida total judicialmente, dispensando a utilização do PERSI, que não regula planos de recuperação formalmente homologados. 23. O PER, ao ser judicialmente homologado, torna-se um título executivo e tem precedência sobre o PERSI, que é apenas aplicável em situações de incumprimento sem processo judicial de reestruturação. 24. Dado que o incumprimento ocorre no âmbito de um PER homologado, o regime aplicável é o do CIRE. 25. Não há necessidade de recorrer ao PERSI, pois o título executivo do PER e o regime do CIRE já proporcionam os mecanismos legais para a execução da dívida. 26. Este regime específico, uma vez homologado judicialmente, prevalece sobre a necessidade de qualquer tentativa extrajudicial de regularização da situação de incumprimento, como o previsto no PERSI, sendo desnecessária e inaplicável a submissão do devedor ao regime do PERSI para efeitos de execução.” Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29 de maio de 2017 (Proc. n.º4460/15.2T8PRT.P1): D) A excepção dilatória inominada decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI não é de conhecimento oficioso 27. As excepções dilatórias, incluindo a referente ao PERSI, dependem de alegação detalhada das partes. No caso em questão, os embargantes não apresentaram factos (suficientes) para fundamentar a excepção dilatória referente ao PERSI. 28. O Tribunal não deve analisar a excepção dilatória inominada do PERSI de forma oficiosa, pois não se trata de matéria de ordem pública ou de interesse colectivo. O PERSI é um regime extrajudicial, aplicável apenas se alegado e provado pelas partes. 29. Cabe ao embargante demonstrar concretamente a ausência de integração no PERSI. Sem essa alegação, o Tribunal não tem o dever de investigar essa questão. 30. Em Portugal, o princípio do dispositivo estipula que são as partes que devem apresentar os factos e provas. O Tribunal limita-se a apreciar o que é trazido ao processo, sem investigação independente em matérias que não sejam de ordem pública. 31. O PERSI é uma questão contratual, e o incumprimento não é de ordem pública. Assim, o Tribunal não tem obrigação, nem deve averiguar autonomamente a aplicação do PERSI. 32. A jurisprudência confirma que a excepção dilatória de integração no PERSI não é de conhecimento oficioso. O Tribunal só intervém se houver uma alegação detalhada e factos específicos para justificar a análise da excepção. 33. A legislação e os tribunais indicam que, sem factos específicos e uma alegação concreta sobre a não integração no PERSI, o Tribunal não está obrigado a avaliar essa excepção.». Os embargantes, ora recorridos, apresentaram contra alegações, com as seguintes conclusões: «A. Interpôs a Embargada recurso da douta sentença que absolveu os Executados da instância executiva, e, em consequência, declarou extinta a execução, condenando a Embargada/Exequente no pagamento de custas. B. Considerando a Recorrente que a sentença a quo carece de razão, por vários motivos, que elenca, inexistindo razões que levem à extinção da instância executiva, o que carece de fundamento. C. Entendendo a Recorrente que a Embargada por não ser uma instituição financeira, não está abrangida pelos procedimentos decorrentes do PERSI, que o incumprimento e vencimento das obrigações do contrato executado nos autos é muito anterior à entrega em vigor do regime jurídico do PERSI, que o incumprimento se reporta a um PER e que por isso não há lugar ao PERSI e, por fim, que a excepção dilatória inominada não é de conhecimento oficioso. D. A presente acção executiva tem por objecto dois créditos bancários, resultantes do alegado incumprimento dos contratos de mútuo com hipoteca celebrados entre a instituição de crédito denominada "BPN - Banco Português de Negócios, S.A." e os Executados, ora Recorridos, através dos quais esta instituição bancária mutuou aos Executados, determinadas quantias de capital sobre certas condições exaradas nas escrituras e documentos complementares, as quais constituem o título executivo. E. Os Recorridos deduziram Oposição à Execução, tendo invocado diversas nulidades, e, por Requerimento, de 19/03/2024, com a Ref.ª Citius 25281048, junto a este apenso, invocaram os Executados a falta de integração no PERSI, requerendo a sua absolvição da instância F. Notificada do douto despacho do Tribunal a quo, de 10/04/2024, pelo qual foi determinada a notificação da Exequente para, em 10 dias, esclarecer se deu cumprimento ao PERSI e, na afirmativa, para o comprovar documentalmente-carta, comprovativo da entrega/recebimento, a Embargada não procedeu à junção do comprovativo da integração dos Executados, enquanto clientes bancários (consumidores) no PERSI. G. Tendo o Tribunal a quo considerado verificada a excepção dilatória inominada que impede ab initio a instauração de acção executiva para a efectiva satisfação do crédito do exequente, o que determina a absolvição da instância executiva dos executados, invocando que a exequente não logrou provar as devidas comunicações, pelo contrário, alegou não ter obrigação de o fazer, uma vez que não é uma instituição de crédito. H. Consideram os Recorridos que a sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer reparo, tendo a Mm.ª Juiz a quo feito uma correcta e livre apreciação das provas levadas a juízo, como lhe compete, fazendo uma correcta interpretação e aplicação do Direito. I. Carece de fundamento o entendimento da Recorrente de que a Embargada, não é uma instituição financeira, não estando abrangida pelos procedimentos do PERSI. J. Sendo inadmissível o entendimento da Recorrente, de que, uma vez cedidos os créditos pelas instituições bancárias, a outras entidades que não se encontrem habilitadas para efetuar operações de crédito em Portugal, nos termos do RGICSF, deixam de se verificar as obrigações resultantes do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro. K. Entendimento que é contrário à lei, aliás, nos termos da alínea c) do art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, atenta a falta de integração dos Executados no PERSI, encontrava-se o "BPN - Banco Português de Negócios, S.A." também impedido de ceder os créditos a terceiros, o que se veio a verificar, pelo que a cessão de créditos realizada pela Exequente nem podia ter sido concretizada. L. Estando prevista no art.º 18.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 227/2012, a possibilidade de a instituição de crédito ceder o crédito a outra instituição bancária, a qual fica obrigada a prosseguir com o PERSI, retomando este procedimento na fase em que o mesmo se encontrava à data da cessão do crédito ou da transmissão da posição contratual. M. Quando a Recorrente celebrou o contrato de cessão de créditos com o BPN – Banco Português de Negócios, S.A., o Decreto-Lei n.º 227/2012 já se encontrava em vigor, bem sabendo ambas as instituições das obrigações decorrentes dos mesmos e que têm de ser cumpridas, sob pena dos créditos serem “judicialmente incobráveis”, cabendo à Recorrente certificar-se de que haviam sido cumpridas as exigências legais decorrentes do PERSI, relativamente aos créditos que pretendia adquirir. N. Conforme alegou no Requerimento Executivo, a Recorrente sabe que os contratos foram resolvidos por carta enviada pelo BPN – Banco Português de Negócios, S.A. aos Executados, a 9 de Julho de 2013, e que, nessa data, a instituição bancária encontrava-se obrigada a integrar os Executados no PERSI. O. A entidade cessionária de créditos bancários não é a parte mais frágil da relação tripartida, entre banco, cliente bancário (consumidor) e entidade cessionária. P. Não tendo sequer o cliente bancário feito parte das negociações do contrato de cessão de crédito, desconhecendo os termos e condições do mesmo, pelo que é à Recorrente que cabe certificar-se do que estava a adquirir, de que haviam sido cumpridas as exigências legais decorrentes do PERSI, que podem determinar ou não a possibilidade de cobrança coerciva do crédito. Q. Estando os Recorridos em crer que não são as entidades cessionárias quem carece de protecção e complacência, pois têm prefeito conhecimento da lei e detêm os meios necessários para verificar o que estão a comprar, tal como verificam outros documentos referentes aos créditos que adquirem, têm o dever de verificar se foi cumprido o previsto no Decreto-Lei n.º 227/2012. R. Não podendo ser admissível que venha a entidade cessionária do crédito invocar que não se encontra sujeita às obrigações idênticas às instituições bancárias, e que não tem qualquer ligação contratual directa com o devedor original, quando aquela sabia o que estava a adquirir e quis fazê-lo, sob pena de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium. S. Carece, igualmente, de fundamento a alegação de que o incumprimento dos Executados é muito anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, tal como foi alegado pela Recorrente no Requerimento Executivo, os contratos de mútuo bancário foram resolvidos pelo BPN – Banco Português de Negócios, S.A. por carta registada datada de 9 de Julho de 2013. T. Ora, o referido Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, entrou em vigor no dia 1 de janeiro de 2013, conforme disposto no artigo 40.º do referido diploma, pelo que quando a instituição bancária resolveu os contratos, já estava obrigada a cumprir com o disposto no referido diploma legal. U. Não se verificando qualquer aplicação retroactiva de normas legais, o que carece em absoluto de fundamento. V. A Recorrente alega ainda que o incumprimento teve origem no âmbito do incumprimento de um PER aprovado e homologado judicialmente, pelo que não exige o cumprimento do PERSI, o que carece de fundamento, sendo os títulos executivos que servem de base à presente ação executiva as escrituras outorgadas entre os Executados e o BPN - Banco Português de Negócios, S.A., conforme alegou no Requerimento Executivo. W. A Recorrente alega também que a exceção dilatória inominada decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI depende de circunstâncias factuais, que não foram alegadas, nem circunstanciadas pelos Embargantes, pelo que não tem o Tribunal que fazer a indagação oficiosa relativamente às mesmas, não sendo de conhecimento oficioso. X. Não se compreendendo a alegação da Recorrente, pois, conforme referido, foram os Executados, ora Recorridos, quem invocou a falta da integração no PERSI e requereu ao Tribunal que fosse a Exequente notificada para juntar aos autos prova do cumprimento do ónus de integração no PERSI, em data anterior à resolução dos contratos objecto dos autos, conforme Requerimento apresentado pelos Executados no presente apenso de Oposição à Execução, a 19/03/2024, com a Ref.ª Citius 25281048. Y. Não tendo o Tribunal feito qualquer indagação oficiosa, o que carece de fundamento. Z. Não obstante, ainda que o tivesse feito, entendem os Recorrentes que, atendendo a que está em causa uma condição de procedibilidade da acção, decorrente de obrigação legal imposta à instituição bancária, pode o Tribunal verificar do cumprimento de tal pressuposto, nos termos do disposto nos artigos 578.º e n.º 2 do art.º 608.º do Código de Processo Civil, tratando-se de uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso. AA. Atento o exposto, não merece qualquer censura a douta sentença proferida, devendo por isso ser confirmada.». Admitido o recurso neste tribunal e colhidos os vistos, cumpre decidir. * Questões a decidir: O objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do CPC), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida. Importa assim, no caso concreto apreciar o seguinte: - Não sendo a embargada uma Instituição Financeira aferir se está ou não abrangida pelos procedimentos decorrentes do regime do PERSI. - Se verificado o incumprimento e vencimento das obrigações do contrato executado nos autos em data anterior à entrada em vigor do DL nº 227/2012 de 25/10 referente ao regime do PERSI, tal determinaria a sua inaplicabilidade. - Caso a obrigação e incumprimento alegado na execução se reporte ao PER homologado, não há que dar cumprimento ao disposto no PERSI, mas, antes ao previsto no CIRE, tendo sido cumprido o disposto no art.º 218º do mesmo diploma. - Estava o Tribunal impedido de indagar oficiosamente pela verificação das circunstâncias que determinariam a verificação da excepção dilatória inominada decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI. * II. Fundamentação: No Tribunal recorrido não foram elencados os factos que presidiram à decisão da excepção que determinou a procedência dos embargos, pelo que com relevo para a decisão haverá que considerar que: - Com data de 7/5/2022, a exequente apresentou requerimento executivo em que alegou o seguinte: “A exequente adquiriu por escritura de cessão de créditos, que se protesta juntar, diversos créditos, incluindo as respectivas garantias e demais acessórios, sem quaisquer reservas ou excepções, onde se inclui o crédito abaixo referido e que agora se executa. A mencionada cessão de créditos respeitou todos os requisitos e procedimentos legais, sendo que os devedores, após notificação, não apresentaram qualquer oposição. I - Da escritura pública de mútuo com hipoteca celebrada no dia 29 de Outubro de 2009 destinada à aquisição de habitação própria e permanente Ora, no dia 29 de Outubro de 2009, foi celebrado, entre o cedente da aqui exequente (anteriormente denominado "BPN - Banco Português de Negócios, S.A.") e os Executados, um contrato de mútuo com hipoteca através do qual o primeiro concedeu aos segundos um empréstimo no montante de € 70.000,00 (setenta mil euros), nos termos e condições previstas no contrato cuja cópia se junta como documento n.º 1 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. O mencionado empréstimo foi concedido pelo prazo de 324 (trezentos e vinte e quatro) meses. Para garantia do cumprimento de todas e quaisquer obrigações ou responsabilidades decorrentes do contrato celebrado, os Executados constituíram duas hipotecas voluntárias sobre: a) a fracção autónoma, destinada a habitação, designada pela letra “H”, (…) e b) a fracção autónoma, destinada a habitação, designada pela letra “A”, (…) Acontece que os Executados não procederam ao pagamento das prestações vencidas a partir de Dezembro de 2010. Por esse motivo, por carta datada de 9 de Julho de 2013, o Exequente procedeu à resolução do contrato, declarando antecipadamente vencido o crédito (cfr. cópia das cartas que se juntam como documento n.º 2 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais). Na mencionada comunicação, o cedente informou os Executados de que deveriam proceder ao pagamento de todos os valores em dívida (capital, juros, impostos e despesas), cujo montante global ascendia, naquela data, a € 77.446,75 (setenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos). Mais informou de que deveriam proceder ao pagamento, até ao dia 26 de Julho de 2013, sob pena da instauração do respectivo processo de execução. Porém, os Executados não procederam ao pagamento do montante em dívida na sua data de vencimento, nem o fizeram posteriormente, apesar das diversas interpelações nesse sentido, o que levou a que fossem executados no âmbito da execução 22392/13.1t2snt, que correu termos no Juízo de Execução de Sintra - Juiz 3. No entanto, tal execução foi extinta a atendendo a que os executados se apresentaram a PER que correu termos 3902/15.6T8SNT. A ora exequente reclamou créditos e foi-lhe reconhecido um crédito no montante de 124.762,02€. No âmbito de tal PER foi aprovado e homologado judicialmente um plano de pagamentos, sendo que os executados se comprometiam a pagar o crédito da ora exequente, em 314 prestações mensais, com carência de capital durante os primeiros 12 meses desde a data de transito em julgado da sentença homologatória. Assim, atento o incumprimento, a ora exequente enviou carta aos executados, nos termos do disposto no art.º 218º do CIRE, interpelando-os para regularizar, no prazo de 15 dias, a situação de mora, sendo certo que os devedores não o fez continuando em incumprimento. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 106.213,60€, sendo 76.505,75€ referente a capital e 29.707,85€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. II - Da escritura pública de mútuo com hipoteca celebrada no dia 29 de Outubro de 2009 destinada a multifinalidades Igualmente no dia 29 de Outubro de 2009, foi celebrado, entre o cedente da exequente e os Executados, um contrato de mútuo com hipoteca através do qual o primeiro concedeu aos segundos um empréstimo no montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), nos termos e condições previstas no contrato cuja cópia se junta como documento n.º 3 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. O mencionado empréstimo foi concedido pelo prazo de 324 (trezentos e vinte e quatro) meses. Para garantia do cumprimento de quaisquer obrigações ou responsabilidades decorrentes do contrato celebrado, os Executados constituíram duas hipotecas voluntárias sobre: a) a fracção autónoma, destinada a habitação, designada pela letra “H”, (…); e b) a fracção autónoma, destinada a habitação, designada pela letra “A”, (…). Acontece que os Executados não procederam ao pagamento das prestações vencidas a partir de Dezembro de 2010. Por esse motivo, por carta datada de 9 de Julho de 2013, o Exequente procedeu à resolução do contrato, declarando antecipadamente vencido o crédito (cfr. cópia das cartas que se juntam como documento n.º 4 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais). Na mencionada comunicação, o Exequente informou os Executados de que deveriam proceder ao pagamento de todos os valores em dívida (capital, juros, impostos e despesas), cujo montante global ascendia, naquela data, a € 32.811,50 (trinta e dois mil, oitocentos e onze euros e cinquenta cêntimos). Mais informou de que deveriam proceder ao pagamento, junto do Exequente, até ao dia 26 de Julho de 2013, sob pena da instauração do respectivo processo de execução. Porém, os Executados não procederam ao pagamento do montante em dívida na sua data de vencimento, nem o fizeram posteriormente, apesar das diversas interpelações nesse sentido. Porém, os Executados não procederam ao pagamento do montante em dívida na sua data de vencimento, nem o fizeram posteriormente, apesar das diversas interpelações nesse sentido, o que levou a que fossem executados no âmbito da execução 22392/13.1t2snt, que correu termos no Juízo de Execução de Sintra - Juiz 3. No entanto, tal execução foi extinta a atendendo a que os executados se apresentaram a PER que correu termos 3902/15.6t8snt. A ora exequente reclamou créditos e foi-lhe reconhecido um crédito no montante de 124.762,02€ No âmbito de tal PER foi aprovado e homologado judicialmente um plano de pagamentos, sendo que os executados se comprometiam a pagar o crédito da ora exequente, em 314 prestações mensais, com carência de capital durante os primeiros 12 meses desde a data de transito em julgado da sentença homologatória. Assim, atento o incumprimento, a ora exequente enviou carta aos executados, nos termos do disposto no art.º 218º do CIRE, interpelando-os para regularizar, no prazo de 15 dias, a situação de mora, sendo certo que os devedores não o fez continuando em incumprimento. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 45.620,27 €, sendo 32.860,32€ referente a capital e 12.759,95 €€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. Pelo exposto, a dívida global dos Executados ao Exequente ascende, a data de 15/10/2021, a 151.833,87€ Montante ao qual acresce os juros de mora, vencidos e vincendos, bem como as custas da execução, incluindo a taxa de justiça e os honorários e despesas do agente de execução. O crédito do Exequente é certo, líquido, exigível e encontra-se devidamente titulado.”. - No âmbito da liquidação no requerimento executivo alega a exequente que: “I. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 106.213,60€, sendo 76.505,75€ referente a capital e 29.707,85€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. II. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 45 620,27 €, sendo 32 860,32€ referente a capital e 12 759,95 €€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. Pelo exposto, a dívida global dos Executados ao Exequente ascende, a data de 15/10/2021, a 151.833,87€”. - Do teor dos documentos juntos com o requerimento executivo resulta que foi ainda o Banco BIC a notificar os executados do incumprimento do plano ao abrigo do processo de revitalização, interpelando os mesmos, com data de 28/01/2016 para, no prazo de 15 dias, procederem ao pagamento dos valores em dívida nos termos do art.º 218º nº 1 alínea a) do CIRE. - Nos embargos deduzidos (inicialmente separados por cada um dos executados, mas unidos neste único apenso) mas com iguais fundamentos, invocaram os embargantes o incumprimento dos contratos desde 2010, na sequência do desemprego e problemas de saúde, convocando a circunstância de o bem penhorado constituir a casa de morada de família e arguindo nulidades que adviriam de tal situação, por força da aplicação de normas de procedimento tributário. - Após a incorporação de ambos os embargos deduzidos foram os mesmos admitidos liminarmente e notificada a exequente para contestar. - Na defesa da improcedência dos embargos a exequente arguiu, no essencial, que não estamos perante uma execução fiscal, pelo que a norma convocada pelos embargante não tem aplicação no processo civil, nem o código de processo civil tem um regime idêntico ao do direito fiscal, suspendendo a venda de imóveis que constituam a habitação própria e permanente, impugnando ainda, por desconhecimento, se actualmente as frações em causa são ou não habitação própria permanente. - Após vicissitudes relacionadas com o patrocínio oficioso dos embargantes, veio a patrona dos mesmos com data de 19/03/2024, requerer, além do mais, que “(…) a falta de integração dos Executados no PERSI, por constituir condição de procedibilidade da acção, decorrente de obrigação legal imposta à instituição bancária, e impedimento legal da cessão dos créditos, tratando-se de uma excepção dilatória inominada, obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância, conforme art.º 30.º, n.º 1 e 2 do art.º 576.º e alínea e) do art.º 577.º do Código de Processo Civil, com as legais consequências. - Pelo que, desde já se requer a V. Ex.ª seja a Exequente notificada para informar se, com referência aos contratos objecto dos autos, foram os Executados F… e J… integrados no referido procedimento extrajudicial de regularização, em data anterior à resolução dos mesmos, remetendo aos autos o respectivo comprovativo dessa integração.” - Com data de 10/04/2024, foi proferido o seguinte despacho: “Compulsados os autos, atento o alegado, cumpre referir o procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) – que está em vigor desde 01-01-2013 e é aplicável a clientes bancários (consumidores) que estejam em mora ou em incumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito – constitui uma fase pré-judicial que visa a composição do litígio, por mútuo acordo, entre credor e devedor, através de um procedimento que comporta três fases: (i) a fase inicial; (ii) a fase de avaliação e proposta; e (iii) a fase de negociação (arts. 14.º a 17.º do referido diploma legal). Durante o período que decorre entre a integração do cliente no PERSI e a extinção deste procedimento, está vedada à instituição de crédito a instauração de acções judiciais com a finalidade de obter a satisfação do seu crédito (art.º 18.º, n.º 1, al. b)” – cf. ac. STJ, de 09/02/2017, Proc. 194/13.5TBCMN-A.G1.S1; no mesmo sentido, Ac. RE, de 08.03.2018, relatado por Conceição Ferreira; ambos disponíveis in www.dgsi.pt. A grande maioria da jurisprudência dos tribunais superiores tem entendido que a preterição de sujeição do devedor ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), por parte da instituição de crédito credora, traduz-se no incumprimento de norma imperativa e que, em termos adjectivos, consiste numa condição objectiva de procedibilidade da pretensão, que deve regulada, com as adaptações que se revelem necessárias pelo regime jurídico das excepções dilatórias. As excepções dilatórias, nominadas ou inominadas, salvo as excepções contempladas no artigo 578º do Código de Processo Civil, são de conhecimento oficioso. A preterição de sujeição do devedor ao PERSI é de conhecimento oficioso; como tal a sua invocação pela parte, ou a sua apreciação oficiosa, não está sujeita ao prazo concedido para apresentação da defesa, pelo que, atento o estatuído no artigo 573º, n.º 2, in fine do Código de Processo Civil, não está abrangida pelo princípio da preclusão. – cf. Ac. RL, de 29.09.2020, relatado por Micaela da Silva Sousa (in www.dgsi.pt). Em idêntico sentido pronunciaram-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 8-03-2018, relatora Conceição Ferreira, processo n.º 2267/15.0T8ENT-A.E1, de 16-05-2019, relator José Manuel Barata, processo n.º 4474/16.9T8ENT-A.E1, de 31-01-2019 e de 21-05-2010, relator Tomé de Carvalho, processos n.º 832/17.0T8MMN-A.E1 e n.º 715/16.1T8ENT-B.E1; acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9-05-2019, relatora Judite Pires, processo n.º 21609/18.0T8PRT-A.P1; e acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14-01-2020, relatora Ana Lucinda, processo n.º 4097/14.8TBMTS.P1, referindo-se, neste último: “E o certo é que a execução não poderia ter sido instaurada sem ter ocorrido previamente o dito Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI). Do prisma do demandante este era uma condição de acção. Mais precisamente uma específica condição de acção cuja inexistência conduz à carência da acção, causa de extinção do processo sem julgamento de mérito. Do ponto de vista da defesa do demandado é uma excepção dilatória, isto é, uma circunstância que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância. Uma excepção de cunho eminentemente processual visto o moderno entendimento da autonomia entre o processo e o direito material. Ela opera no plano da eficácia: não intenta extinguir a pretensão exercida mas apenas neutralizá-la ou retardá-la.” Verifica-se, pois, que ao contrário do entendimento plasmado na decisão recorrida, podia e devia o tribunal de 1ª instância ter apreciado a verificação da excepção dilatória inominada em referência, mesmo que então já se mostrasse ultrapassado o prazo para a dedução de embargos de executado, podendo fazê-lo no âmbito da própria execução (…)”. Em face de tudo o que se deixa dito e tendo sido alegado, pelo exequente, determino a notificação do mesmo para, em 10 dias, esclarecer se deu cumprimento ao aí determinado/previsto e, na afirmativa, para o comprovar documentalmente-carta, comprovativo da entrega/recebimento.”. - Em resposta veio a exequente dizer o seguinte: “1. A ora exequente não se trata de uma Instituição de Crédito e não está sujeita às regras do PERSI, não sendo uma entidade habilitada a efectuar operações de crédito em Portugal, nos termos do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, na sua redação actual (RGICSF); 2. Pelo que, não está abrangida pelas obrigações decorrentes do regime do PERSI. 3. Acresce que a presente execução, como referido no requerimento executivo, teve origem no âmbito do incumprimento de um PER aprovado e homologado judicialmente. 4. Sendo que nesse plano de pagamentos, os executados se comprometiam a pagar o crédito da ora exequente, em 314 prestações mensais, com carência de capital durante os primeiros 12 meses desde a data de transito em julgado da sentença homologatória. 5. Assim, atento o incumprimento, a ora exequente enviou carta aos executados, nos termos do disposto no art.º 218º do CIRE, interpelando-os para regularizar, no prazo de 15 dias, a situação de mora, sendo certo que os devedores não o fizeram continuando em incumprimento. 6. Ora, tendo o incumprimento sido reportado ao PER homologado, não há que dar cumprimento ao disposto no PERSI, mas, antes ao previsto no CIRE, tendo sido cumprido o disposto no art.º 218º do CIRE. 7. Acresce que, como referido no requerimento executivo, o incumprimento inicial dos executados remonta a dezembro de 2010, em ambos os créditos hipotecários, data a partir da qual não mais liquidaram prestações. 8. Sendo certo que o cedente da aqui requerente operou a resolução contratual em julho de 2013. 9. Sendo que, a realidade é que o consumidor bancário é obrigatoriamente integrado em PERSI entre o 31º dia e o 60º dia subsequente à data de vencimento da obrigação, pelo que, no caso em apreço, à data de vencimento da obrigação (29/12/2010) o DL nº 227/2012 não estava em vigor. 10. Pelo que, nos que se refere ao cedente da aqui requerente o regime do PERSI não é aplicável, permitindo ao cedente resolver os contratos sem integração dos clientes no referido regime.”. * III. O Direito: Assenta a recorrente o seu recurso em quatro questões essenciais, a saber: A inaplicabilidade à embargada, por não revestir a natureza de entidade financeira, dos procedimentos decorrentes do regime do PERSI. A verificação de incumprimento e vencimento das obrigações do contrato em data anterior à entrada em vigor do DL nº 227/2012 de 25/10 referente ao regime do PERSI, não sendo assim de aplicar tal regime. Não ser de aplicar o PERSI dado o incumprimento alegado na execução se reportar ao PER homologado, tendo sido cumprido o disposto no art.º 218º do mesmo diploma. A ausência de possibilidade de indagar oficiosamente pela verificação das circunstâncias que determinariam a verificação da excepção dilatória inominada decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI. As questões serão abordadas de per si, todavia, comum a todas as questões, importa ter presente o que presidiu a tal Diploma. Com efeito, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, reconhecendo a degradação das condições económicas e financeiras sentidas na maioria dos países europeus e o aumento do incumprimento de contratos de crédito, estabeleceu um conjunto de princípios e de regras a observar pelas instituições de crédito destinadas a promover a prevenção do incumprimento, designado por Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI) e a regularização das situações já em incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos, chamado de Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI). Quanto ao seu ambito de aplicação, previu-se que o mesmo é aplicável aos contratos de crédito identificados no n.º 1 do seu art.2.º, onde se incluem os contratos de crédito ao consumo, celebrados com clientes bancários, enquanto consumidores, na aceção dada pelo n.º 1 do art.º 2.º da Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, onde intervenham como mutuários. O PERSI consiste num procedimento tipificado de composição extrajudicial, e por mútuo acordo, de situações de mora e/ou incumprimento, que se desenrola em três fases sucessivas: i). uma fase inicial, na qual as instituições de crédito mutuantes informam o cliente da ocorrência de uma situação de mora e dos montantes vencidos em dívida, procurando obter informações acerca das razões subjacentes ao incumprimento; e, caso esse incumprimento se mantenha, integram, obrigatoriamente, o cliente no PERSI entre o 31.º dia e 60.º dia subsequentes à entrada em mora; ii). uma fase de avaliação e proposta, na qual as instituições de crédito mutuantes procuram apurar se o incumprimento é pontual e temporário ou, ao invés, se denota uma incapacidade do cliente em cumprir de forma continuada com as suas obrigações contratuais, comunicando-lhe posteriormente o resultado dessa indagação, e apresentando ou não uma proposta de regularização adequada à sua situação financeira, objetivos e necessidades (consoante concluam que a renegociação das condições do contrato, ou a consolidação do crédito com outros, são soluções exequíveis); iii) uma fase de negociação, no âmbito da qual o cliente poderá recusar ou propor alterações à proposta apresentada e, por sua vez, a instituição de crédito mutuante poderá rejeitar as alterações sugeridas ou, quando considere que não existem alternativas viáveis e adequadas ao cliente, abster-se de apresentar uma contraproposta ou uma nova proposta. O diploma em análise entrou em vigor em 01/01/2013, em conformidade com o disposto no seu artº. 40.º. A partir desta data, passou a ser obrigatório para as instituições de crédito mutuantes incluírem no PERSI os seus clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito. E essa obrigação verifica-se mesmo relativamente aos clientes que já estivessem em mora aquando da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 227/2012, pois que conforme dispõe o n.º 1 do seu art.º 39.º, “São automaticamente integrados no PERSI e sujeitos às disposições do presente diploma os clientes bancários que, à data da entrada em vigor do presente diploma, se encontrem em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito que permaneçam em vigor, desde que o vencimento das obrigações em causa tenha ocorrido há mais de 30 dias.”. Estatui o art.º 18.º, n.º 1, al. b), do mesmo diploma a que “No período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento, a instituição de crédito está impedida de (…) intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito”. Refere Francisco Almeida Garrett, in «PARI, PERSI & AFINS - Breve Nota Sobre o Novo Regime», JusJornal, n.º 1676, 23.04.2013, que “o Decreto-Lei n.º 227/2012, impõe assim às instituições de crédito mutuante uma "renegociação forçada" e confere ainda ao cliente diversas garantias não displicentes tais como a impossibilidade de a instituição de crédito mutuante (a) resolver o contrato com fundamento no incumprimento, (b) intentar acções judiciais com vista à satisfação do seu crédito, (c) ceder a terceiros, total ou parcialmente, o crédito em questão, ou (d) transmitir a sua posição contratual – tudo isto, enquanto durar o PERSI”. Aqui chegados, importa primeiramente apreciar a possibilidade de conhecimento oficioso. · O alegado conhecimento oficioso das circunstâncias que determinariam a verificação da excepção dilatória inominada decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI. Sustenta a recorrente que a invocação da ausência de integração no PERSI enquanto excepção dilatória requer a demonstração concreta dos factos relevantes, algo que não foi feito pelos embargantes. Defendendo que sem essa alegação detalhada, o Tribunal a quo não deveria ter analisado a excepção, entendendo que esta não é de conhecimento oficioso, dado não envolver questões de ordem pública ou de interesse colectivo, nem se encontra expressamente qualificada como tal pela lei. Donde, conclui que o Tribunal não tem a obrigação de investigar ou averiguar a aplicação do PERSI na ausência de uma alegação detalhada e fundamentada pelos embargantes. Socorre-se de jurisprudência nesse sentido que transcreve, nomeadamente, Ac do STJ de 15/09/2022 disponível em www.dgsi.pt, no qual se sumaria que: Tendo sido alegado como fundamento dos embargos a violação por parte da exequente de um convénio estabelecido entre as partes, por altura da celebração do contrato de mútuo isso impede que o tribunal decida os embargos com diverso fundamento, não alegado pelas partes, nomeadamente a integração da situação em análise no regime do PERSI. Bem como o Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 20/02/2024 (no mesmo endereço), no qual se decidiu que: I – O conhecimento da excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso decorrente da não integração de cliente bancário no regime do PERSI depende de circunstâncias factuais. II – Não tendo tais circunstâncias de facto sido alegadas e tão pouco tendo advindo ao processo por outros meios, o tribunal não tem que fazer indagação oficiosa relativamente às mesmas, devendo decidir, na dúvida, contra a parte a quem interessava o conhecimento do pressuposto processual em causa. Ou ainda indicando o alegado Ac. desta Relação, de 28 de maio de 2019 (Proc. n.º 2253/18.3T8LSB.L1-7, este não foi encontrado nos sites de publicação das decisões superiores): “I - O PERSI (Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento) não é um mecanismo de conhecimento oficioso pelo tribunal. A sua aplicação depende da verificação de condições específicas de facto que devem ser invocadas e demonstradas pela parte interessada, geralmente o cliente bancário. II - Cabe ao devedor alegar e provar que o banco incumpriu as obrigações estabelecidas no âmbito do PERSI, caso pretenda opor-se à execução com base nessa excepção dilatória. III - O tribunal não está obrigado a investigar autonomamente a aplicação ou o incumprimento do regime do PERSI, uma vez que não se trata de uma matéria de ordem pública, mas sim de uma questão de carácter contratual e extrajudicial entre o cliente e a instituição financeira.” Invocando ainda no mesmo sentido o alegado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de novembro de 2020 (Proc. n.º 432/19.8T8STB.E1.S1), mas igualmente não publicado, ou encontrado nas pesquisas quer com a data, quer com o número do processo. A par dos indicados e cuja comprovação pode ser feita, não sendo de atentar os demais, haverá ainda que considerar o recente Acórdão do STJ, de 17/10/2023, proc. nº 2419/21.4T8VNF-A.G1.S1 (este publicado em www.dgsi.pt), com o seguinte sumário, na parte relevante: I – A verificação da excepção dilatória, atípica e inominada, consistente no incumprimento pela instituição financeira, ora exequente/embargada, dos deveres impostos pelo procedimento extra-judicial previsto no Decreto-lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, depende da alegação pela parte interessada (o ora embargante/executado) da factualidade que permita concluir estarmos perante qualquer das situações tipo, expressamente consignadas no mesmo diploma legal (artigo 2º), em que o dito procedimento deve obrigatoriamente ser seguido antes de instaurada a respectiva acção judicial (artigo 18º), desde que os autos não forneçam, por si só, elementos inequívocos quanto à aplicação ao caso desse mesmo regime. Não subscrevemos o entendimento dos recorrentes, nem aliás todas as decisões aludidas se reportam apenas à eventual impossibilidade de se conhecer oficiosamente de tal excepção, mas sim igualmente a eventual integração do crédito no diploma que prevê tal procedimento, ou seja, relativamente à exigência de determinada qualidade de devedor, mas também do tipo de crédito exigido, sendo que ou estas circunstâncias resultam dos autos, ou têm de ser invocadas por quem pretende fazer-se valer do PERSI. Pelo que, verificando-se a legibilidade do credor e do crédito para efeitos de aplicação do diploma, entendemos que o Tribunal pode aferir do seu cumprimento perante a credora, única que estará apta a juntar tal prova dita positiva. Acresce que não obstante a jurisprudência supra citada, tem sido entendimento maioritário que verificando-se os pressupostos do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), é obrigatória a integração do cliente bancário nesse regime, caso em que a acção/execução judicial destinada a satisfazer o crédito só poderá ser intentada pela instituição de crédito contra o cliente bancário, devedor mutuário, após a extinção desse procedimento. Assumindo-se tal posição no Acórdão do STJ de 14/11/2024 (proc. nº 451/14.3TBMTA-C.L2.S1, in Juris.stj.pt), no qual, na parte relevante se sumaria que: ”A omissão da informação ou a falta de integração do devedor no PERSI, pela instituição de crédito, constitui violação de normas de carácter imperativo, que configura, também, excepção dilatória atípica ou inominada, conducente à absolvição do executado da instância executiva. Trata-se de uma excepção de conhecimento oficioso, e, como tal, a sua invocação não está sujeita à preclusão decorrente do decurso integral do prazo para deduzir embargos de executado (tal como resulta da ressalva prevista no art.º 573º, n.º 2, in fine do CPC), para além do que o conhecimento de excepções dilatórias pode sempre ter lugar até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados – cf. art.ºs 726º, n.º 2, b) e 734º do CPC.”. Em sentido idêntico se decidiu no Acórdão desta Relação, datado de 15/12/2022, proc. nº 23116/16.7T8SNT-C.L1-8 I (in www.dgsi.pt), com o seguinte sumário: I. O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância. II. E como tal a sua invocação pela parte, ou a sua apreciação oficiosa, está subtraída ao prazo concedido para apresentação da defesa, regendo, por isso, a última parte do nº 2 do art.º 573º, do NCPC que descarta a aplicação do princípio da preclusão. Na fundamentação de tal decisão resulta que “a falta de integração no PERSI, verificados que estivessem os pressupostos para tanto, impede também que a instituição de crédito intente acção judicial com vista à satisfação do seu crédito, porque antes de o poder fazer tem de cumprir aquela obrigação que lhe é imposta de tentativa extrajudicial de regularização do incumprimento, ou seja, aquela integração surge como uma condição prévia ao accionamento judicial. Assim tem concluído a doutrina e a jurisprudência dos tribunais superiores, que é exemplo o Ac. da RE de 6.10.2016, relator Tomé de Carvalho, processo nº 4956/14.8T8ENT-A.E1, disponível in www.dgsi.pt. Havendo a obrigação legal de abertura do PERSI após o incumprimento do devedor e previamente à instauração da execução para cobrança do crédito, coloca-se a questão de saber que vício constitui a instauração da execução sem o cumprimento daquele requisito legal prévio, o qual nem sequer é sanável no âmbito da acção judicial (execução), conforme emerge com clareza e contundência da própria letra da lei (vg. art.º 18º do Decreto-Lei 227/2012). A resposta tem sido dada de forma unânime: o cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância. Nesse sentido, podemos ver os acs. da RP de 9.05.2019, processo nº 21609/18.0T8PRT-A.P1, Judite Pires, de 09.01.2019, processo nº 8207/14.7T8PRT-B.P1, Filipe Caroço, de 14.1.2020, processo nº 4097/14.8TBMTS.P1, Ana Lucinda Cabral, de 07.03.2022, processo nº 121/20.3T8VLG-A.P1, Miguel Baldaia Morais, de 07.02.2022, processo nº 1091/20.3T8OVR-A.P1, Ana Paula Amorim e de 15.06.2022, relator Aristides Rodrigues de Almeida; os acs. da RE de 6.10.2016, processo nº 4956/14.8T8ENT-A.E1, Tomé de Carvalho e de 28.06.2018, processo nº 2791/17.0T8STB-C.E1, Mata Ribeiro; da RL de 13.10.2020, processo nº 15367/17.3T8SNT-A.L1-7, Maria da Conceição Saavedra e de 7.05.2020, processo nº 2282/15.4T8ALM-A.L1-6, Adeodato Brotas; e do STJ de 13.04.2021, processo nº 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1, Graça Amaral, de 09.12.2021, processo nº 4734/18.5T8MAI-A.P1.S1, Ferreira Lopes e de 16.11.2021, processo nº 21827/17.9T8SNT-A.L1.L1.S, Clara Sottomayor, todos in www.dgsi.pt). Entendida a falta de integração do cliente bancário no PERSI como uma excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso, é aplicável o regime decorrente dos art.ºs 576º, nºs 1 e 2 e 578º do NCPC. Com efeito, nos termos do art.º 578º do NCPC o tribunal deve conhecer oficiosamente das excepções dilatórias, salvo da incompetência absoluta decorrente da violação de pacto privativo de jurisdição ou da preterição de tribunal arbitral voluntário e da incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no art.º 104º. E esta regra é válida também para o processo executivo, por força do comando previsto no art.º 551º, nº 1, do NCPC. E, assim sendo, a sua invocação não está sujeita à preclusão decorrente do decurso integral do prazo para deduzir embargos de executado, tal como resulta da ressalva prevista no art.º 573º, nº 2, in fine do NCPC, para além do que o conhecimento de excepções dilatórias pode sempre ter lugar até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados – cfr. art.ºs 726º, nº 2, b) e 734º do NCPC.”. Daqui resulta que dada a natureza de excepção dilatória de conhecimento oficioso haverá que aplicar o previsto no nº 2 do art.º 573º do CPC, ou seja, não ocorre quanto a tal excepção o efeito preclusivo, pelo que podem os embargantes depois da oposição, como ocorreu nos autos, invocar tal excepção. Pelo que a circunstância de ter sido suscitada em requerimento autónomo, já após os articulados, em nada releva, uma vez que está subtraída ao prazo concedido para apresentação da defesa. Deste modo, além de ser de conhecimento oficioso, não carecendo da iniciativa das partes para poder ser conhecido, por maioria de razão, nada impedia que os embargantes, ora recorridos tomassem essa iniciativa impulsionando o tribunal a exercer o seu dever de conhecer, o que foi feito nos autos, tendo permitido à embargada exercer o contraditório. Soçobra, assim, tal argumento recursório. · A inaplicabilidade à embargada, por não revestir a natureza de entidade financeira, dos procedimentos decorrentes do regime do PERSI. Defende a recorrente que não se trata de uma Instituição de Crédito, pelo que não está sujeita às regras do PERSI, não sendo uma entidade habilitada a efectuar operações de crédito em Portugal, nos termos do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, na sua redação actual (RGICSF). Concluindo que não está abrangida pelas obrigações decorrentes do regime do PERSI, pois este foi concebido exclusivamente para regular a actuação de instituições de crédito supervisionadas pelo Banco de Portugal, e, como tal, entidades que não são supervisionadas não estão obrigadas a seguir o procedimento. Entendemos subscrever o entendimento do Tribunal a quo nesta matéria quando expõe que: “(…) o art.º 18.º do Dec. Lei n.º 227/2012 contém um elenco taxativo de actos que as instituições de crédito ficam impedidas de praticar enquanto decorre o aludido procedimento, o que se traduz em garantias do cliente bancário. Uma das garantias que é atribuída aos clientes bancários na situação contemplada pelo Dec. Lei n.º 227/2012 é a proibição de sobre eles serem intentadas ações judiciais, proibição esta que impende sobre o credor, para a satisfação do seu crédito, entre a data da integração do devedor no procedimento e a sua extinção – cfr. art.º 18.º, n.º 1, al. b)– que no caso ocorre porque nem sequer se teve o procedimento por iniciado, muito menos por extinto. Não fazendo o legislador distinção entre ação declarativa e executiva, atendendo aos princípios e razões que subjazem à implementação do PERSI, deve ter-se por mais adequada a interpretação que inclui no âmbito daquela previsão os dois tipos de ações. Proíbe-se, portanto, que sejam intentadas ações (declarativas e executivas) para satisfazer o crédito no âmbito do decurso do PERSI. Por outro lado, no período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento, a instituição de crédito está impedida de ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito [al. c)] ou transmitir a terceiro a sua posição contratual [al. d)]. Porém, nos termos do n.º 2 do citado normativo, a instituição de crédito pode ceder créditos para efeitos de titularização [al. b)] ou ceder créditos ou transmitir a sua posição contratual a outra instituição de crédito [al. c)]; neste último caso, sendo exigível que a cessionária seja outra instituição de crédito, “fica esta obrigada a prosseguir com o PERSI, retomando este procedimento na fase em que o mesmo se encontrava à data da cessão do crédito ou da transmissão da posição contratual” (n.º 3). A razão de ser desta última excepção – permitir a cedência ou a transmissão do crédito de cliente bancário integrado em PERSI –, justifica-se desde que seja possível dar continuidade à aplicação do referido procedimento – o que poderá ser vantajoso em situações em que o cliente bancário consiga melhores condições com outra instituição de crédito –, pois caso contrário a cedência ou a transmissão poderia importar uma desvirtuação do regime, na medida em que se o cessionário não for uma instituição de crédito abrangida pelo âmbito de aplicação do Regime Geral não estaria obrigado a dar cumprimento ao PERSI Cfr. Andreia Sofia Lúcio Engenheiro, O crédito bancário: a prevenção do risco e gestão de situações de incumprimento, Dissertação com vista à obtenção do grau de Mestre em Direito na área de Ciências Jurídicas Empresariais - Universidade Nova de Lisboa, Julho, 2015, p. 57, https://run.unl.pt/bitstream/10362/16176/1/Engenheiro_2015.pdf. Assim, a entidade bancária não podia ter cedido o crédito dos autos à exequente sem ter previamente cumprido as exigências legais, não podendo a ora exequente escudar-se na circunstância de não ser uma entidade de crédito para, desde modo, evitar que sejam cumpridas as exigências legais, como alega. O facto de ter havido uma cessão de créditos para a aqui exequente não tem influência no que antecede, pois que as limitações decorrentes do PERSI impõem-se ao cessionário do crédito. Com efeito, de outro modo estaria encontrada uma via expedita para as instituições de crédito se subtraírem à obrigatória sujeição ao regime decorrente do Dec. Lei n.º 227/2012, bastando para o efeito que, em violação do estatuído no citado diploma legal, se abstivessem de integrar obrigatoriamente o cliente bancário no PERSI e cedessem o seu crédito a um terceiro que não é uma instituição de crédito, o que permitiria que este (cessionário) não ficasse sujeito às proibições ou impedimentos elencados no art.º 18º e pudesse obter de imediato a satisfação do crédito cedido, sendo-lhe, por isso, lícito, sem quaisquer restrições, resolver de imediato o contrato de crédito com fundamento em incumprimento (art.º 18.º, n.º 1, al. a)), intentar ações judiciais contra o mutuário, tendo em vista a satisfação dos respectivos créditos (al. b)), ceder a terceiros uma parte ou a totalidade do crédito em causa (al. c)) ou transmitir a terceiro a sua posição contratual (al. d)). Tal representaria, fácil é de ver, uma autêntica fraude à lei, na medida em que frustraria por completo os objectivos que presidiriam à consagração daquele especial regime que visa tutelar as situações dos clientes bancários que se encontrem em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito, solução essa que deve ser rejeitada.” Com efeito, a exequente intentou a presente execução a 7/5/2022, e no requerimento executivo alegou que adquiriu “por escritura de cessão de créditos, que se protesta juntar, diversos créditos, incluindo as respectivas garantias e demais acessórios, sem quaisquer reservas ou excepções, onde se inclui o crédito abaixo referido e que agora se executa.”. Tal escritura não resulta ter sido junta aos autos. Acresce que também resulta alegado pela exequente no seu requerimento executivo que “os Executados não procederam ao pagamento das prestações vencidas a partir de Dezembro de 2010. Por esse motivo, por carta datada de 9 de Julho de 2013, o Exequente procedeu à resolução do contrato, declarando antecipadamente vencido o crédito (cfr. cópia das cartas que se juntam como documento n.º 4 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).”. Do teor dos documentos juntos não resulta tal interpelação, mas com o requerimento executivo foi junto um documento de onde se extrai que foi ainda o Banco BIC a notificar os executados do incumprimento do plano ao abrigo do processo de revitalização, interpelando os mesmos, com data de 28/01/2016, para, no prazo de 15 dias, procederem ao pagamento dos valores em dívida nos termos do art.º 218º nº 1 alínea a) do CIRE. Logo, a cessão invocada pela embargada, ora recorrente, terá ocorrido em momento posterior a 28/01/2016, pelo que quer na data da mesma, quer na data da alegada resolução dos contratos, já estaria em vigor o PERSI, pelo que não pode a recorrente fazer-se valer da ausência da qualidade exigida para cumprimento de tal procedimento. Como bem se alude na bem fundamentada decisão e em abundante jurisprudência “considerando que o legislador do Dec.º-Lei nº 227/12, de 25.10 teve o cuidado de plasmar todo um conjunto de garantias de defesa aos clientes em situações de mora ou incumprimento, maxime no art.º 18º (Garantias do Cliente bancário), estando o mutuário/devedor em situação de lhe ser aplicado o PERSI, a entidade bancária não pode ceder o crédito a terceiro (instituição não bancária) sem ter previamente cumprido as exigências decorrentes do regime ínsito no regime decorrente do Dec. Lei n.º 227/2012, de 25.10.”. Pois “de outro modo, estaria encontrada uma via expedita para as instituições de crédito se subtraírem à obrigatória sujeição ao regime decorrente do Dec. Lei n.º 227/2012 (bastando que, em violação desse diploma legal, se abstivessem de integrar obrigatoriamente o cliente bancário no PERSI e cedessem o seu crédito a um terceiro que não é uma instituição de crédito, o que permitiria que este (cessionário) não ficasse sujeito às proibições ou impedimentos elencados no art.º 18º e pudesse obter de imediato a satisfação do crédito cedido), o que representaria uma autêntica fraude à lei, pois era uma forma de deixar entrar pela janela o que o legislador proibiu que entrasse pela porta, frustrando-se completamente o objectivo prosseguido com a criação do PERSI.” (cf. entre outros Acórdão do STJ de 2/02/2023, proc. nº 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1, in www.dgsi.pt). Por outro lado, não há que olvidar que a cessão de créditos é livre, “independentemente do consentimento do devedor” (art.º 577º do CCivil), mas o art.º 585º do CC consagra o direito do devedor de “opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão.”. Destarte improcede igualmente o recurso com este fundamento. · A verificação de incumprimento e vencimento das obrigações do contrato em data anterior à entrada em vigor do DL nº 227/2012 de 25/10 referente ao regime do PERSI, não sendo assim de aplicar tal regime. Sustenta a recorrente/embargada que não será de aplicar o regime do PERSI, dizendo que o incumprimento dos executados ocorre a partir de 2010, pelo que antes da entrada em vigor do diploma que instituiu tal procedimento, convocando para o efeito a seguinte decisão da Relação de Évora, de 24/02/2022, disponível em www.dgsi.pt: “Assim, verificando-se que o contrato de crédito já havia sido resolvido antes da entrada em vigor do referido diploma, não tinha a instituição bancária que integrar o consumidor cliente bancário em PERSI, nem informar o fiador dessa possibilidade, antes de instaurar a execução.”. Na decisão recorrida discorre-se sobre tal temática da seguinte forma: “Ora, como se salienta no Ac. da RE de 06/10/2016 (relator José Tomé de Carvalho), in www.dgsi.pt., estamos perante “incumprimento de norma imperativa, a qual constitui, do ponto de vista adjetivo - com repercussões igualmente no domínio substantivo -, uma condição objetiva de procedibilidade” da própria pretensão, que deve ser enquadrada “com as necessárias adaptações, no regime jurídico das exceções dilatórias. E isto porque, em termos finalísticos, atendendo ao respetivo resultado, a referida falta de condição objetiva de procedibilidade conduz à absolvição da instância e não se reporta ao mérito da causa”, não sendo o vício decorrente de tal omissão sanável no âmbito da ação judicial (execução), conforme emerge com clareza e contundência da própria letra da lei (vg. art.º 18º do Dec. Lei 227/2012)” Cfr., no mesmo sentido, Acs. da RE 31/01/2019 (relator José Tomé de Carvalho), de 28/06/2018 (relator Mata Ribeiro) e de 08/03/2018 (relatora Maria da Conceição Ferreira), in www.dgsi.pt. A falta de integração obrigatória do cliente bancário no PERSI, quando reunidos os pressupostos para o efeito, constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, intente ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito. Pelo que, sendo a integração de cliente bancário no PERSI, obrigatória, quando verificados os seus pressupostos, a ação judicial destinada a satisfazer o crédito, só poderá ser intentada pela instituição de crédito contra o cliente bancário, devedor mutuário, após a extinção do PERSI (cfr. Acórdãos do STJ, de 09.02.2017, Proc. 194/13.5TBCMN.A.G1.S1, e da RE, de 27.04.2017, Proc. 37/15.5T8ODM.A.E1, ambos disponíveis in https://jurisprudencia.csm.org.pt). A omissão dessa obrigação constitui uma verdadeira falta de condição objectiva de procedibilidade que, na busca do lugar paralelo, é enquadrada, com as necessárias adaptações, no regime jurídico das exceções dilatórias. E isto porque, em termos finalísticos, atendendo ao respetivo resultado, a referida falta de condição objetiva de procedibilidade conduz à absolvição da instância e não se reporta ao mérito da causa (cfr. Acórdão da RE, de 06.10.2016, Proc. 4956/14.8T8ENT.A.E1; Acórdão da RL, de 07.06.2018, relatado por Pedro Martins (in www.dsgi.pt). De qualquer das formas, a não verificação dessa condição é insanável pois que o regime excecional previsto no Decreto-Lei n.º 227/2012 afasta liminarmente a possibilidade de ser intentada a ação e, por maioria de razão, existe uma circunstância impeditiva que obsta a que, no decurso de uma ação executiva se desenvolva um PERSI. Nos termos do art.º 4.º do aludido diploma, devem as instituições de crédito “proceder com diligência e lealdade, adotando as medidas adequadas à prevenção do incumprimento de contratos de crédito e, nos casos em que se registe o incumprimento das obrigações decorrentes desses contratos, envidando os esforços necessários para a regularização das situações de incumprimento em causa.” A par de tal apreciação importa ter presente que é o recorrente que em sede de requerimento executivo alega que “por carta datada de 9 de Julho de 2013, o Exequente procedeu à resolução do contrato, declarando antecipadamente vencido o crédito”. Donde, mesmo que se tenha por confessado que o incumprimento pelos executados do pagamento devido decorria desde Dezembro de 2010, claramente, aquando da entrada em vigor do diploma, a 1/01/2013, ou seja, em momento anterior à resolução, já a credora estaria obrigada ao seu cumprimento. Haverá aliás que trazer à colação o decidido no Acórdão do STJ de 2/02/2023, supra aludido, ao sumariar que “O procedimento PERSI deve ser repetido sempre que ocorra futuro e sucessivo incumprimento: quer a letra da lei, quer o espírito que preside ao DL nº 272/2012, não dão sustento à interpretação que limita a um único PERSI o incumprimento pelo mutuário num contrato de mútuo em que se convencionou o reembolso do capital e juros em prestações mensais, em contratos em que o mutuário fica vinculado a reembolsar o empréstimo por períodos largos de tempo, que podem atingir as dezenas de anos, como sucede nos casos de empréstimos para a habitação. A diversidade de situações justifica o desencadear de diferentes procedimentos.”. Logo, à data da entrada em vigor do D.L. nº 272/2012, ainda que os executados estivessem em mora em data anterior, o incumprimento decorria, sem que tivesse ocorrido a resolução, o que veio a acontecer já na vigência do diploma. É abundante a jurisprudência no sentido de considerar que o regime do PERSI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, é obrigatório mesmo no caso em que o início do incumprimento do contrato dado à execução tenha ocorrido em data anterior à vigência do referido diploma desde que o contrato se mantenha em vigor depois da sua entrada em vigor. Como bem se decidiu e sumariou no Acórdão desta Relação e secção, a 18/10/2020, proc. nº 14235/15.8T8LRS-A.L1-6: “II. O PERSI é aplicável aos contratos em vigor à data da sua entrada em vigor, mesmo sendo o incumprimento anterior. III) A omissão de PERSI prévio à instauração da execução constitui obstáculo a que o tribunal possa conhecer do mérito da causa instaurada, assumindo a natureza processual de excepção dilatória, determinante de absolvição da instância e de conhecimento oficioso.” Também nesta Relação, foi proferido a 09/04/2024 (proc. nº 8328/23.5T8LRS.L1-7, in www.dgsi.pt) a decisão com o seguinte sumário: I. A aplicação do regime legal introduzido pelo Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, aos casos de mora iniciados antes do início da vigência deste diploma tem como pressuposto, além da manutenção da mora no incumprimento das obrigações contratuais, que o contrato permaneça em vigor nessa data. II – Não tendo sido demonstrado que o credor havia procedido à resolução do contrato de crédito em momento anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, é forçoso concluir pela aplicabilidade deste diploma a tal contrato. III – Consequentemente, não tendo a executada sido integrada em PERSI antes da instauração da execução destinada à cobrança coerciva do crédito, verifica-se a excepção dilatória atípica e inominada de falta da condição objectiva de procedibilidade, prevista no artigo 18º, nº 1, al. b) do citado Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, o que determina o indeferimento liminar do requerimento executivo.” (no mesmo sentido ainda Ac. da RE de 10/03/2022, proc. nº 1340/21.0T8ENT.E1; Ac. da RG de 18/01/2024, proc. nº 657/13.2TBVVD-E.G.). De tudo o exposto, determina-se a improcedência do recurso também relativamente a este fundamento. · Não ser de aplicar o PERSI dado o incumprimento alegado na execução se reportar ao PER homologado, tendo sido cumprido o disposto no art.º 218º do mesmo diploma Por fim, sustenta o recorrente que o PER é um processo judicial especial previsto no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), destinado especificamente à reestruturação das obrigações de uma empresa ou devedor em situação de dificuldade financeira, mas com viabilidade económica. A sua natureza é distinta e mais formal em comparação com o regime do PERSI, que é um mecanismo de negociação extrajudicial, aplicável principalmente a consumidores. Como o PER foi aprovado e homologado judicialmente, o plano reestruturado tornou-se obrigatório para todas as partes envolvidas, incluindo os credores. Neste caso, o incumprimento refere-se a obrigações que foram reestruturadas judicialmente e não a novas obrigações contraídas após o PER. Logo, o PERSI não é aplicável, dado que o CIRE é o regime específico para tratar situações decorrentes do incumprimento do PER homologado. O CIRE, especificamente o artigo 218º, estabelece o regime para lidar com o incumprimento de obrigações decorrentes de um plano de recuperação aprovado (neste caso, o PER). Esse artigo prevê que, em caso de incumprimento das obrigações constantes de um plano de recuperação homologado, o credor poderá requerer a execução da totalidade das dívidas, sem a necessidade de recorrer ao PERSI. A homologação judicial do PER torna-o parte integrante do contrato entre devedor e credores, e o incumprimento de tais obrigações deve seguir o regime previsto no CIRE, e não no PERSI, que se aplica apenas a situações de incumprimento onde não há um processo judicial de reestruturação formal. Mais defende que o PERSI não tem competência para interferir num plano homologado por um tribunal, uma vez que o plano possui autoridade judicial, tornando o recurso ao PERSI irrelevante e inaplicável. O PER, por ser um processo judicial, prevalece sobre o PERSI, que é um procedimento extrajudicial e é subsidiário em relação ao PER quando existe um plano homologado para a regularização das dívidas. O Tribunal recorrido relativamente a tal questão apenas expõe o seguinte: “(…) o ónus de alegar e provar o cumprimento do PERSI junto dos clientes bancários em incumprimento, designadamente o encargo de comprovar o envio aos mesmos da comunicação da sua integração no PERSI e da comunicação da extinção do mesmo, cabe à exequente, o que não fez. Assim, atento o incumprimento do crédito, conforme alega a exequente no decurso do contrato, independentemente, de o mesmo ocorrer no âmbito de um PER, ou de retoma do mesmo crédito, por anterior incumprimento, não é fundamento para não estar abrangido pelas obrigações decorrentes do regime do PERSI.”. O (PER) foi introduzido no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Dec.-Lei n.º 53/2004 de 18/03, pela Lei nº 16/2012 de 20/04 dando cumprimento ao memorando de entendimento celebrado pelo Estado Português com a “Troika” que previa a adopção de um conjunto de medidas com o objectivo de promover mecanismos de reestruturação extrajudicial de devedores que se encontrassem em situação financeira muito difícil, mas ainda susceptíveis de recuperação. Assim, no âmbito do CIRE, ao lado do objectivo da satisfação dos direitos dos credores através da liquidação do património do devedor, passou a haver um outro fim, a revitalização do devedor. Trata-se de um procedimento de natureza voluntária, de tendência extrajudicial e negocial sob a coordenação e direcção do administrador judicial. A recorrente indica, em abono da posição assumida quanto a este item, Acórdãos, quer da Relação do Porto, quer do STJ, que o recorrente indica como sendo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29 de maio de 2017 (Proc. n.º4460/15.2T8PRT.P1) e ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de julho de 2019 (Proc. n.º 490/13.9TBTMR-E.P1.S1) dizendo que este contém o seguinte sumário: "I - A homologação judicial de um plano de recuperação no âmbito de um Processo Especial de Revitalização (PER) tem força vinculativa para todas as partes e constitui título executivo, conferindo ao credor o direito de exigir judicialmente a totalidade das prestações vencidas em caso de incumprimento das obrigações previstas. II - O regime específico do CIRE, especialmente o artigo 218º, é suficiente para permitir a execução da dívida e substitui a necessidade de quaisquer mecanismos extrajudiciais de regularização, como o PERSI. III - Assim, o incumprimento de um plano de pagamento homologado em PER não exige a intervenção ou aplicação do regime do PERSI, sendo suficiente o recurso ao título executivo consubstanciado no plano homologado.". Quanto ao primeiro Acórdão indicado refere que o mesmo tem a seguinte posição contida no sumário: “I - A homologação judicial de um plano de recuperação no âmbito de um Processo Especial de Revitalização (PER) confere a esse plano força executiva, vinculando o devedor e os credores às obrigações estabelecidas. II - Em caso de incumprimento do PER homologado, o credor pode exigir a execução da totalidade do crédito nos termos do artigo 218º do CIRE, sem necessidade de recurso ao regime do PERSI, que não se aplica a planos aprovados judicialmente. III - O regime do PERSI é inaplicável quando existe um título executivo derivado de um plano homologado, dado que o CIRE fornece um mecanismo judicial específico e suficiente para a execução.”. Tal como já tínhamos referenciado quanto a Acórdãos indicados pela apelante, relativamente ao primeiro item supra apreciado, de todos os elementos que nos permitem aceder à jurisprudência dos Tribunais superiores, nomeadamente no que concerne aos proferidos pelo STJ, os quais se encontram todos sumariados no seguinte endereço - https://www.stj.pt/sumario-dos-acordaos/- não foram proferidos Acórdãos cíveis com data de 10/07/2019, mas apenas a 11 de Julho, por outro lado, da consulta de tais sumários não figura o número do processo indicado. O mesmo ocorre com o Acórdão da Relação do Porto, sendo que, com data de 29/05/2017, apenas foram proferidos Acórdãos na secção social desse Tribunal e nem nesta data ou outra existe a indicação de algum Acórdão com a numeração indicada, ou com o sumário também reproduzido. Desconhecesse assim, a fonte (que o recorrente também não indica) ou a existência de tais decisões. O regime do processo especial de revitalização introduzido no Código da insolvência e da Recuperação de Empresas pela Lei n.º 16/2012, de 20.04, e previsto nos artigos 17.º-A a 17.º-H é omisso quanto às consequências do incumprimento do plano de recuperação. Tal questão não tem tido uma resposta unanime na jurisprudência, numa corrente jurisprudencial entende-se que a sentença homologatória do plano de recuperação proferida no âmbito do processo especial de revitalização previsto nos artigos 17.º-A a 17.º-H do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas introduzidos pela Lei n.º 16/2012, de 20.04, constitui título executivo, em caso de incumprimento daquele plano. Nesta posição, haverá, nomeadamente, que considerar o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 21/01/2016 (Processo n.º 1963/14.4TbCL.1.G1, consultável em www.dgsi.pt ), no qual se defende a aplicação, por analogia, do disposto no artigo 233.º, n.º 1, parte final, da al. c), do CIRE ao plano de revitalização; ali se escreveu que «não há razões para não conferir à sentença que homologa o plano de revitalização natureza diferente da que atribui à que homologa o plano de insolvência, desde que nela conste identificado o valor dos créditos ou remeta para o acordo ou para peça processual onde conste como admitidos os montantes em dívida a cada credor», em sentido idêntico a decisão proferida no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19.03.2018 (Processo n.º 121/14.2TBAMT.P1), bem como o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.01.2020 (Processo n.º 7725/15.4T8MAI.P1, endereço da net aludido). Recentemente porém, tem sido defendido que: - o incumprimento do plano de recuperação homologado por sentença afere-se pela análise da conduta do devedor em face do concreto teor do referido plano; - os efeitos do incumprimento enunciados no n.º 1 al. a) do art.º 218.º n.º 1 do CIRE, aplicável no âmbito do PER, produzem-se desde que o credor interpele por escrito o devedor que se tenha constituído em mora e a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias a contar dessa interpelação; - a homologação, por sentença, do plano de recuperação, não retira a qualidade de título executivo a documento atinente a crédito considerado nesse plano; - verificando-se o incumprimento do plano de recuperação nos moldes previstos no art.º 218.º do CIRE, os créditos recuperam a sua situação originária, pois só o cumprimento do plano exonera o devedor da totalidade das dívidas remanescentes; - não obstante seja homologado plano de recuperação, o credor mantém incólumes os direitos de que dispunha contra condevedores e terceiros garantes.( Acórdão da RE de 11/04/2019, proc. nº 425/18.5T8BJA-A.E1, in www.dgsi.pt, no mesmo sentido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/04/2019, Processo n.º 154/17.7T8ALD.C1.S2 e ainda o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 13/02/2020 Processo n.º 7081/18.9T8VNF-B.G1, todos em www.dgsi.pt.). Tal como se alude no Acórdão do TRG de 23/05/2024 ( Proc. nº472/23.5T8CHV-A.G1) “os efeitos do incumprimento do plano de recuperação enunciados no art.º 218.º, n.º 1, al. a) “ex vi” do art.º 17º-F, n.º 13, ambos do CIRE – como seja a cessação dos efeitos da moratória ou do perdão de créditos –, produzem-se desde que o credor interpele por escrito o devedor que se tenha constituído em mora e a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias a contar dessa interpelação.”. Logo, é apenas no âmbito da insolvência que após o seu encerramento, o título executivo a ser utilizado pelo credor que pretenda exercer os seus direitos contra o insolvente incumpridor não é o título originário, passando antes a ser a sentença homologatória do plano de pagamento, bem como a sentença de verificação de créditos, nos termos do artigo 233.º, n.º 1, c) do CIRE. No caso dos autos é desde logo contraditória a posição que a apelante assume neste recurso e a que assumiu no requerimento executivo, pois não há que olvidar que no requerimento executivo o mesmo indica o seguinte: “I. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 106.213,60€, sendo 76.505,75€ referente a capital e 29.707,85€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. II. Nos termos legais, tendo sido incumprido o plano, nos termos do art.º 218º do CIRE, as moratórias e perdões concedidos através da aprovação do plano, ficam sem efeito, assim, à data de 15/10/2021 é devida a quantia de 45 620,27 €, sendo 32 860,32€ referente a capital e 12 759,95 €€ referente a juros moratórias à taxa de 4,706% A hipoteca acima referida sobre as frações devidamente identificadas na escritura pública, nos termos contratuais e registrais, garante a operação de crédito acima identificada e todos os valores em dívida. Pelo exposto, a dívida global dos Executados ao Exequente ascende, a data de 15/10/2021, a 151.833,87€”. Tal como resulta do requerimento executivo, também entendemos que é de aderir à tese que nega à sentença homologatória do plano de recuperação a natureza de título executivo, nem aliás, este foi apresentado como tal. Seguindo de perto o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 29/04/2021, (Processo nº3909/18.1T8ENT.E1): “De acordo com o preceituado no artigo 17.º-F, nº 12, do CIRE, ao plano de recuperação aplica-se o disposto no n.º 1 do artigo 218.º do mesmo diploma normativo, preceito que regula os efeitos do incumprimento do plano de insolvência. Em face do disposto no artigo 18.º, n.º 1, alínea a), do CIRE «salvo disposição expressa do plano de insolvência em sentido diverso, a moratória ou o perdão, previstos no plano ficam sem efeito quanto a crédito relativamente ao qual o devedor se constitua em mora, se a prestação acrescida dos juros moratórios não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor». Por força deste normativo legal, os créditos originais (isto é, sem o perdão/moratória) são repristinados. Destarte, relativamente a estes (créditos originais) a sentença homologatória não pode constituir título executivo porque ela apenas contempla os créditos modificados por força do plano (cf. Ac. STJ de 09.04.2019). Ademais, relativamente aos créditos originais não existe uma decisão de reconhecimento dos mesmos no âmbito do PER com força de caso julgado material na medida em que as reclamações no âmbito do processo especial de revitalização têm como objectivo primordial legitimar a intervenção dos credores no processo de negociação e permitir o cálculo do quorum deliberativo e a maioria prevista no artigo 17.º-F, n.º 3.”. Sobre tal questão salienta Catarina Serra (in “Lições de Direito da Insolvência´”, 2018, Almedina, p. 408) que a segunda função da lista definitiva de créditos – que pode resultar da conversão da lista provisória de créditos, quando não há impugnações, ou de decisão judicial sobre as impugnações – consiste em evitar que em eventual processo de insolvência subsequente ao PER os credores reclamem de novo os seus créditos (cfr. artigo 17.º-G, n.º 7, do CIRE). Tal como se decidiu no Ac. RG de 19/03/2015 ( processo n.º 6245/13.6TBBRG.G1, in www.dgsi.pt): «1. O processo especial de revitalização (PER) não se destina a resolver litígios sobre a existência e amplitude de créditos e a decisão sobre a reclamação de créditos é meramente incidental, logo não constitui caso julgado fora do processo (artigo 91.º CPC), destinando-se à formação e apreciação do quórum deliberativo. 2. Os credores cujos créditos tenham sido reconhecidos no âmbito do PER ficam dispensados do ónus de reclamar no processo de insolvência. 3. Não fazendo caso julgado o reconhecimento do crédito fora do PER, a dispensa do ónus de reclamação não afasta o direito de impugnação por parte dos demais credores no subsequente processo de insolvência». O PER é um processo que visa a renegociação do passivo do devedor e a recuperação económico-financeira daquela, não se destinando a resolver litígios sobre a existência e amplitude dos créditos; com efeito, a lista provisória dos créditos, uma vez convertida em definitiva, vai servir de base às negociações entre o devedor e os seus credores, e a estes basta que os respectivos créditos sejam admitidos e integrem aquela lista, com o valor por eles indicado, independentemente de ali constarem como créditos comuns ou com garantia real, pois para poderem participar nas negociações e votar o plano basta que os créditos respectivos sejam admitidos. Por último, dir-se-á que nos termos do artigo 233.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, o título executivo ali previsto é constituído, em primeira linha, pela sentença de verificação e graduação de créditos, tendo a sentença homologatória do plano de insolvência uma função meramente complementar qual seja a de demonstrar e certificar as modificações introduzidas no plano aos créditos reconhecidos. Logo, tal não pode ser considerado transposto para o processo especial de revitalização, dado o diferente escopo do mesmo. Outrossim, não pode o recorrente pretender que afinal não estaria obrigada ao cumprimento do PERSI, pois aquando da interpelação pela exequente nos termos do art.º 218º nº 1 alínea a) do CIRE a execução passou a ter por base o crédito originário, expurgado de perdões e moratórias. E foi com base no título executivo originário que a ora exequente intentou a execução de que estes embargos correm por apenso e não com a homologação do plano, como agora pretende que se considere. Assim, não colhem os argumentos expostos pela recorrente, o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), regulado pelo DL 227/2012, de 25-10, visa promover a tutela dos consumidores em incumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito, impondo às instituições financeiras um conjunto de deveres prévios à instauração de ação judicial (declarativa ou executiva), tendentes a proporcionar uma solução extrajudicial para o litígio. Logo, recai sobre a instituição de crédito o ónus da prova do cumprimento de tais obrigações que para si decorrem do artigo 12º, e ss do DL 227/2012, de 25-10, demonstrando, designadamente, as comunicações de integração e de extinção de PERSI, que constituem condições objectiva de procedibilidade da execução, consubstanciando, a sua ausência, excepção dilatória inominada geradora da extinção da instância. É, assim, de manter a decisão recorrida, improcedendo a apelação. * IV. Decisão: Por todo o exposto, Acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela embargada e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas pela apelante. Registe e notifique. Lisboa, 20 de Fevereiro de 2025 Gabriela de Fátima Marques Nuno Lopes Ribeiro Anabela Calafate |