Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | VAZ GOMES | ||
Descritores: | UNIÃO DE FACTO PRESTAÇÃO ALIMENTOS | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/10/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | Demonstrada a união de facto do Autor com a falecida pensionista, carecia, ainda, o Autor, como se diz na sentença recorrida de demonstrar a necessidade de alimentos e a impossibilidade de os obter dos familiares referidos nas alíneas a) a d) do art.º 2009 do CCiv. (Sumário do Relator) | ||
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO APELANTE/AUTOR: B... APELADA/INTERVENIENTE: CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES * Ambos com os sinais dos autos. * Inconformado com a sentença de 5/1/09 que julgou a acção totalmente improcedente por não provada e absolveu a Ré do pedido, apelou o Autor em cujas alegações conclui: I. De acordo com o Acórdão da Relação de Coimbra de 09-05-2006, que segue “de perto(…) o acórdão do STJ de 20.4.04, (…)” os requisitos exigíveis ao membro sobrevivo da união de facto para que possa aceder às prestações sociais decorrentes do óbito de um beneficiário de um qualquer regime público de segurança social, reconduzem-se apenas, à prova relativa ao estado civil do beneficiário (…) e à circunstância de o respectivo interessado ter vivido e há mais de dois anos com o falecido. II. O que a Lei 7/01, de 11 de Maio, no seu art.º 6.º e o DL n.º 322/90, de 18-10, regulamentado pelo Dec. Reg. N.º 1/94, de 18.1, no seu art.º 8.º, visam é o direito à pensão de sobrevivência – a ser atribuído através de acção obrigatoriamente a ser instaurada contara a instituição de segurança social – autónomo e independente de um direito de alimentos previsto no art.º 2020º/1, parte final. III. Portanto, a lei em referência, ao dispôs no seu art.º 6.º/1 que beneficia dos direitos estipulados nas alíneas e), f) e g) do art.º 3º, no caso das uniões de facto previstas na presente lei, quem reunir as condições constantes no art.º 2020º do C.C., decorrendo a acção perante os tribunais cíveis, apenas está a exigir que esteja preenchida a condição de união de facto – comunhão de vida por mais de dois anos entre duas pessoas em condições análogas às dos cônjuges – e a prova relativa ao estado civil do beneficiário falecido. IV. Como se refere no citado Ac. do STJ de 20.4.04 , apenas nas acções em que seja peticionada à herança uma pensão de alimentos, se terão de provar os últimos indicados requisitos do art.º 2020.º. V. “(…) se dos enunciados diplomas – L.U.F. (lei das uniões de facto), DL 322/90 e Dec Reg. 1/94 – decorre uma total equiparação relativamente às medidas de protecção social que são atribuídas aos membros de uma agregado familiar unido pelo vínculo do matrimónio e aos que vivem em união de facto, não será de exigir, em nosso entender, e na falta de disposição legal em contrário, a prova da verificação de requisitos diversos para a atribuição de prestações sociais análogas, conforme se trate de interessados ligados ao beneficiário pelo casamento ou cuja titularidade aos referidos benefícios resulte da existência de uma situação de união de facto.” VI. Consta da sentença recorrida que “face à matéria de facto provada, constata-se que o A. e a falecida D....., que era viúva e beneficiária da CGA, viveram juntos em condições análogas aos dos cônjuges, desde 1998 e até à morte” daquela. VII. Segundo a orientação do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal da Relação de Coimbra – Ac STJ 24.4.04 e Ac RC de 09-05-06 – o tribunal a quo devia ter considerado que o A. é titular do direito à pensão de sobrevivência, uma vez que nos presentes autos, foi feita a prova relativa ao estado civil da beneficiária e à circunstância de o respectivo interessado ter vivido e há mais de dois anos com a falecida. VIII. O Tribunal a quo interpretou e aplicou mal o direito aos factos, uma vez que entendeu ser necessária a verificação de todos os requisitos legais previstos no art.º 2020.º do Código Civil, quando deveria ter seguido a interpretação dos acórdãos supra citados, ou seja, que o direito à pensão de sobrevivência deve ser atribuído apenas estando preenchida a condição de união de facto – comunhão de vida por mais de dois anos entre duas pessoas em condições análogas às dos cônjuges –e a prova relativa ao estado civil do beneficiário falecido; IX. O acórdão recorrido violou assim a Lei 7/01, de 11 de Maio, o art.º 8.º do DL 322/90, de 18 de Outubro e o art.º 3.º do Dec Reg 1/94, de 18 de Janeiro. X. Considerou o tribunal a quo que não ficou provado que a A. careça de alimentos, constando da sentença recorrida que “Quanto ao segundo requisito mencionado, sabemos, apenas, que o A. aufere uma pensão de €298,40 e que paga de renda de casa € 160,00, tendo, também, despesas relativas a consumo de electricidade, o que é, obviamente, insuficiente para concluir-se que o A. tem necessidade de alimentos. Com efeito, desconhece-se se o A. tem quaisquer outros rendimentos que lhe permitam prover ao seu sustento, sendo certo que se ignora quais as suas despesas e se é o A. que as suporta.” XI. Também aqui não decidiu o tribunal a quo correctamente, uma vez que o A. beneficia de apoio judiciário na protecção mais ampla, sendo despiciendo que se pense necessitar de apoio judiciário total mas não necessite de alimentos. XII. Embora no entender do Recorrente tal requisito não necessite de estar preenchido, conforme todo os alegado supra, não aceita o A., a interpretação de que pode não ter necessidade de alimentos, uma vez que os elementos dos autos são insuficientes para observar a sua situação de grave carência económica. Termina pedindo a revogação da sentença e consequente reconhecimento ao Autor da qualidade de titular do direito às prestações por morte. Em contra-alegações a C.G.A. conclui: 1. Para que a acção pudesse proceder, o Autor tinha que ter alegado e provado factos que pudessem servir de suporte ao reconhecimento de direito a alimentos, nos termos legais. Isto é, o Autor tinha que provar quer a existência da união de facto com o pensionista à data da morte deste pelo espaço de dois anos exigido por lei (no mínimo dois anos), quer ainda a carência efectiva da prestação de alimentos e ainda a impossibilidade de os obter das pessoas mencionadas no art.º 2009 do Código Civil; 2. Da matéria de facto provada em audiência resultou que o Autor não logrou provar a inexistência de quaisquer outros rendimentos para além da pensão que aufere para se concluir que tem necessidade de alimentos, bem como da inexistência de qualquer das pessoas enumeradas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art.º 2009 do CCiv, designadamente, de que não tem os seus pais vivos, filhos ou irmãos, ou se os tem, os mesmos não têm capacidade financeira para lhe prestar alimentos; 3. A douta sentença recorrida ao ter julgado improcedente a acção intentada pelo autor ora apelante e absolvido a Ré ora apelada, dos pedidos, não merece, pois, qualquer reparo ou censura, correspondendo, aliás, à mais correcta interpretação da lei, pelo que deve manter-se na íntegra, com as legais consequências Recebido o recurso, foram os autos aos vistos legais dos Meritíssimos Juízes-adjuntos que nada sugeriram. Nada obsta ao conhecimento do mérito do recurso. * Questão a resolver: Saber se ocorre erro de julgamento da sentença recorrida por erro de interpretação e aplicação da Lei 7/01, de 11/5, 8.º do DL 322/90, de 19/10 e 3.º do Dec Reg 1/94, de 18/1; mesmo perfilhando a interpretação feita pelo tribunal recorrido relativamente a essa disposições legais se está verificado o requisito da necessidade de alimentos II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos que o recorrente não impugna nos termos da lei de processo civil: 1. No dia 15.01.2004 faleceu D....., com ultima residência habitual em VP, CP, no estado de viúva, nos termos do doc. 1 junto com a petição inicial e que aqui se dá por reproduzido (al A) dos Factos Assentes); 2. O A. é reformado por invalidez, auferindo uma reforma por invalidez no valor de € 298,40, nos termos que constam do doc. 2 junto com a petição inicial que aqui se reproduz (al B) dos Factos Assentes). 3. D.... era pensionista da Caixa Geral de Aposentações, auferindo € 401,43, mensais, à data da morte, nos termos que constam do doc. 3 junto com a petição inicial que aqui se reproduz (al C) dos Factos Assentes); 4. Desde 1998 e até à data da sua morte D.... viveu com o A. na habitação indicada no n.º 1 (resp. ao n.º 1 da BI); 5. O A. e D.... partilhavam a mesma cama, relacionando-se afectiva e sexualmente (n.º 2 da BI); 6. Tomavam as refeições em conjunto (n.º 3 da BI); 7. Passeavam e saíam juntos (n.º 4 da BI); 8. Cada um contribuía com o que auferia para a aquisição de todos os bens alimentares, vestuário e tudo o mais necessário a uma economia familiar (n.º 5 da BI); 9. O A. cuidava da D... quando esta estava doente e o mesmo fazia a D.... em relação ao A. (n.º 6 da BI); 10. O A. e D... eram reconhecidos e tratados como se marido e mulher fossem por todas as pessoas com que se relacionavam (n.º 7 da BI); 11. Em Fevereiro de 2008, o A. pagava € 160,00 de renda de casa e pagou de consumo de electricidade, no período de 08.12.2007 a 06.02.2008 a quantia de € 54,25 (n.º 8 da BI); 12. D..... não deixou quaisquer bens para partilhar em herança (n.º 9 da BI); 13. O A. nasceu no dia 21.10.1944 e é filho de E.... e de F...., conforme doc de fls. certidão de fls. 170 a 172. * O Tribunal recorrido não deu como Não provados quaisquer factos. III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Findos os articulados o Meritíssimo Juiz do Tribunal recorrido louvando-se no disposto no art.º 265/2 do CPC convidou o requerente a apresentar nova petição inicial onde constem factos que permitam concluir que não pode o Autor obter alimentos nos termos das alíneas a) a d) do art.º 2009 do CCiv, “circunstancialismo que deverá ser articulado sob pena da petição inicial continuar a padecer das insuficiências ao nível da causa de pedir.(…)”- cfr. despacho de 30/01/2007 de fls. 79/80. Esse despacho foi notificado ao ilustre patrono oficioso nomeado ao Autor no âmbito do apoio judiciário G...., o qual veio informar que dirigira pedido de escusa ao Ex.mo Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, na sequência do que ao Autor e em substituição da daquela foi nomeada H.... (cfr. fls. 87), a qual também apresentou escusa, vindo a ser nomeado J..... (cfr. fls. 93), a qual apresentou aos 22/10/07 conforme a ilustre patrona refere nova petição aperfeiçoada, onde alega (art.ºs 14, 18) que é solteiro não tem pais vivos, filhos ou irmãos. Aquando do saneador o Meritíssimo juiz do Tribunal recorrido não leva aquela alegação nem aos Factos Assentes nem à Base Instrutório sustentando que “os factos alegados no art.º 14 da petição inicial corrigida poderão ser comprovados documentalmente”-cfr. fls. 115. Juntou a ilustre patrona a fls. 170 para prova do art.º 14 como recomendado pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal recorrido e pode ver-se a fls. 170 o assento de nascimento do Autor B....., nascido a 21/10/1944, sendo registado como filho de E.... e de F..... Mais nenhum documento foi, entretanto, junto, pelo que o único facto relevante plenamente provado pela certidão do assento de nascimento do Autor é que nasceu naquela data, os seus pais são aquelas pessoas que se desconhece se estão vivas ou não e obviamente o estado de solteiro do Autor, nada mais. Poderia o Autor juntar ainda certidão de nascimento dos pais com averbamentos em vigor e verificado o falecimento dos mesmos uma escritura de habilitação desses pais provaria ou não a existência de irmãos do Autor. A sentença recorrida entende que o Autor tinha que provar quatro requisitos: Concedendo a existência do 1.º e 3.º (pontos 1 a 10 e 12 da decisão de facto) por falta de alegação e prova dos 2.º e 4.º fez perecer a acção. Tendo o Autor alegado que é solteiro, não tem pais vivos filhos ou irmãos, obviamente não precisava de alegar que deles não pode obter alimentos. Sendo viável, conforme entendimento do Tribunal recorrido (de que não houve reclamação da Base Instrutória por parte do Autor) a prova documental daqueles factos negativos - pela certidão de óbito dos pais ou por escritura de habilitação de herdeiros por morte desses mesmos pais, acrescentamos nós! - , não tendo o Autor junto outro documento, para além da certidão do seu assento de nascimento que plenamente apenas demonstra o estado civil de solteiro do Autor no que toca ao alegado, entendendo-se ser ónus de alegação e prova de todos aqueles factos por banda do Autor, não o tendo feito, então sim, seria de confirmar e, adiantamos nós desde já que confirmamos, a sentença. Prende-se a questão colocada desde logo com a união de facto e seus efeitos. Não há na Constituição da República uma definição ou alusão à união de facto no Título referente aos Direitos Liberdades e Garantias no período que nos interessa de 1998 até 15 de Janeiro de 2004, data em que faleceu a mencionada D..... O art.º 36 da Constituição da República Portuguesa na redacção vigente à data em que subsistiu a relação de união de facto entre o Autor e a falecida D.... estabelece no seu n.º 1: “Todos têm direito a constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.” Alguma doutrina tem entendido que a união de facto está prevista na 1.ª parte do n.º 1 do mencionado preceito constitucional.[1]O Professor Pereira Coelho sustenta que o art.º 36, n.º 1 da CRP citado não pretende referir-se à união de facto mas respeita exclusivamente à matéria de filiação já que o direito de constituir família é, em primeiro lugar, um direito a procriar e em segundo lugar um direito a estabelecer as respectivas relações de maternidade e de paternidade. A segunda parte do n.º 1 do art.º 36 da CRP prevendo o direito de casar contém em si a vertente negativa ou seja o direito de não casar por quaisquer ordem de razões sejam elas de ordem legal ou simplesmente, de ordem patrimonial. Conclui o ilustre professor que a união de facto está abrangida no “direito ao desenvolvimento da personalidade” que a revisão de 1977 reconheceu de modo explícito no art.º 26, e considerando não ser a união de facto para a generalidade dos efeitos e face ao art.º 1576 do CCiv uma relação de família em sentido técnico, num sentido mais generalista que o legislador tem utilizado quer para efeitos de segurança social, sucessão no arrendamento, pensão de alimentos pode ser considerada uma relação de família e o unido de facto pode ser tido como familiar.[2] Outros, porém, sustentam que o conceito de família não é um conceito aberto, sujeito às regulações do legislador ordinário.[3] Mais recentemente outros autores têm vindo a sustentar, na sequência de amplo debate sobre tal matéria na generalidade dos países da Europa, que a união de facto é uma relação familiar, embora em alguns autores restrita à união de facto heterossexual, isto antes de o legislador ordinário português pela Lei 7/2001 ter vindo a reconhecer a relação homossexual como união de facto.[4] Não havendo uma definição da união de facto nem na CRP, nem no Código Civil, nem na Lei n.º 135/99 de 28/08, sequer na Lei n.º 7/2001, numa coisa a maioria dos autores estão de acordo: a união de facto consubstancia um convívio duradouro entre duas pessoas, convívio esse traduzido numa comunhão de leito mesa e habitação (toro, mensae e habitationis), como se fossem casadas, com a diferença de que o não são, pois não estão ligadas pelo vínculo do casamento. Com a nova redacção da Lei n.º 7/2001 o que releva é que entre os unidos exista um projecto de vida em comum, análogo à vivência marital. Não sobram pois dúvidas quanto à qualificação da relação dos autos do Autor com a falecida D.... como união de facto já que a comunhão durou mais de dois anos, com referência há data da morte desta. A morte de D...., ex-companheira do Autor ocorreu em 15 de Janeiro de 2004. Tanto os art.ºs 40 e 41 do Estatuto das Pensões de Sobrevivência (DL 142/73 de 31/03 na redacção do DL 191-B/79 de 25/06 e art.ºs 3.º, n.º 1, alínea a) e 4, n.º 2, alínea b), e 10 do DL 223/95 de 08/09 como o art.º 8 do DL 322/90 de 18/10 e DRg 1/94 de 18/01 quanto aos beneficiários do regime geral da segurança social, atribuem ao unido de facto sobrevivo o direito à pensão de sobrevivência. A acção dos autos foi proposta contra o Centro Nacional de Pensões; sempre se dirá que, secundando a jurisprudência dos tribunais superiores quer anterior quer posterior à Lei 135/99, não se exige ao unido de facto que pretenda obter o reconhecimento do seu direito às prestações sociais por morte da beneficiária a propositura de duas acções uma contra a herança e outra seguinte contra a instituição da segurança social competente, bastando-lhe intentar acção contra a instituição da segurança social caso a herança do falecido não tenha bens ou se estes forem insuficientes. (cfr. entre outros o Acórdão da Relação de Lisboa de 14/05/98 relatado pelo Juiz Desembargador Ferreira Girão publicado na Colectânea de Jurisprudência, Ano XXVIII, t. III, págs. 100/101, onde se dá conta de jurisprudência contrária e Pereira Coelho, Curso de Direito de Família, vol. I. 2.ª edição, Coimbra editora, pág. 115). A questão principal é a da distribuição do ónus da prova, ou seja quais são os factos constitutivos do direito da Autora às prestações por morte da beneficiária Maria Albertina. Interessam os seguintes art.ºs do DL 322/90 de 18/10: O art.º 2020, n.º 1 do CCiv estatui: “Aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e de bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas à dos cônjuges, tem direito a exigir alimentos da herança do falecido se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do art.º 2009 do CCiv.” O art.º 2004, n.º 1 do CCiv estatui que os alimentos são proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de prestá-los. Por seu turno o art.º 2009 n.º 1 do CCiv estabelece uma ordem hierárquica quanto á pessoa do devedor de alimentos estando à cabeça o cônjuge ou ex-cônjuge, seguindo-se os descendentes, os ascendentes e por último os irmãos. O art.º 6 em conjugação com a alínea f) do art.º 3 da Lei 135/99 estatui: Artigo 6.o Regime de acesso às prestações por morte 1 — Beneficia dos direitos previstos nas alíneas f) e h) do artigo 3.o da presente lei quem reunir as condições previstas no artigo 2020 do Código Civil, decorrendo a acção perante os tribunais civis. 2 — Em caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança, o direito às prestações efectiva-se mediante acção proposta contra a instituição competente para a respectiva atribuição. 3 — Não obsta ao reconhecimento da titularidade do direito às prestações a inexistência ou insuficiência dos bens da herança para atribuição da pensão de alimentos. 4 — O direito à prestação pode ser reconhecido na acção judicial proposta pelo titular contra a herança do falecido com vista a obter a pensão de alimentos, desde que na acção intervenha a instituição competente para a atribuição das prestações. A Lei 7/2001 de 11/05 que revogou a Lei 135/99 (mas não expressamente o DL 322/90 de 18/10 e DReg 1/94) dispõe no seu art.º 6.º: Artigo 6.º Regime de acesso às prestações por morte 1 — Beneficia dos direitos estipulados nas alíneas e), f) e g) do artigo 3.o, no caso de uniões de facto previstas na presente lei, quem reunir as condições constantes no artigo 2020.o do Código Civil, decorrendo a acção perante os tribunais cíveis. 2 — Em caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança, ou os casos referidos no número anterior, o direito às prestações efectiva-se mediante acção proposta contra a instituição competente para a respectiva atribuição. As “condições” referidas nos mencionados art.ºs 6 resumem-se à situação de união de facto com o falecido há mais de dois anos ou o unido de facto sobrevivo tem ainda de alegar e provar como factos constitutivos do seu direito às prestações por morte do beneficiário que carece de alimentos e que os não pode obter das pessoas mencionadas no art.º 2009 do CCiv? Diga-se em primeiro lugar que a legitimidade quer do Réu quer do interveniente Caixa Geral de Aposentações se encontram asseguradas pelo despacho de 14/3/05 de fls. 31/32, pelo que se deve ter por assente serem elas as entidades competentes para processarem eventual prestação por morte da mencionada D...... Quanto aos pressupostos do direito às prestações, não tem sido pacífica a questão a nível da nossa jurisprudência maxime da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça. Assim encontra-se uma corrente doutrinária espelhada nas alegações recurso e também no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/04/2004, publicado na C.ª J.ºSTJ, Ano II, t. II, págs. 30/31 segundo a qual nas acções dirigidas às instituições da Segurança Social como é a do presente o unido de facto apenas tem de alegar e provar o estado civil do beneficiário falecido e as circunstâncias de facto que permitam concluir que viveu em união de facto com o falecido beneficiário durante mais de dois anos. Maioritária é, todavia, a posição contrária ou seja a de que para além dos requisitos do estado civil, situação do falecido beneficiário e união de facto para além de dois anos, com referência à data da morte do beneficiário, o Autor tem ainda de alegar que carece de alimentos e que os não pode obter das pessoas referidas no art.º 2009 do CCiv. A título de exemplo referem-se os seguintes sumários de recentes acórdãos do STJ disponíveis na base de dados do sítio www.dgsi.pt. JSTJ000 Relator: SALVADOR DA COSTA Descritores: UNIÃO DE FACTO PENSÃO DE SOBREVIVÊNCIA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES BENEFICIÁRIOS PRESSUPOSTOS ÓNUS DA PROVA Nº do Documento: SJ200807100016957 Data do Acordão: 10-07-2008 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. São pressupostos do direito à pensão de sobrevivência no âmbito das uniões de facto a convivência, em condições análogas às dos cônjuges, com o titular do direito à pensão beneficiário da Caixa Geral de Aposentações, mais de dois anos antes do decesso, não ser o último nessa altura casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, carecer o companheiro sobrevivo de alimentos, não ser possível obtê-los da herança ou do seu cônjuge, ex-cônjuge, descendentes, ascendentes ou irmãos. 2. O ónus de prova dos referidos pressupostos incumbe ao requerente da pensão de sobrevivência. 08A2232 Nº Convencional: JSTJ000 Relator: FONSECA RAMOS Descritores: UNIÃO DE FACTO PENSÃO DE SOBREVIVÊNCIA REQUISITOS ÓNUS DA PROVA CONSTITUCIONALIDADE Nº do Documento: SJ200809160022326 Data do Acordão: 16-09-2008 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGAÇÃO DE REVISTA Sumário : I) A norma constante do art. 2020º, n°1, do Código Civil, na referência que lhe é feita pelo art.6º, nº1, da Lei nº7/2001, de 11.5, não deve ser interpretada restritivamente, no sentido que ao requerente apenas cumpre provar que vivia em união de facto há mais de dois anos e que o companheiro era subscritor da CGA. II) Sobre o requerente da pensão de sobrevivência, em caso de união de facto, impende o ónus de provar, além daqueles requisitos, a sua necessidade de alimentos e a incapacidade dos familiares a que alude o art. 2009º, als. a) a d) do Código Civil lhos prestarem. III) – Não devem ser tratadas no mesmo plano as obrigações jurídicas dos que se vinculam pelo contrato de casamento, daqueles que vivem em união de facto, ainda que em condições análogas às dos casados, não sendo violador dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade a maior exigência da lei no que respeita aos requisitos para a atribuição de alimentos ao sobrevivente de união de facto. JSTJ000 Relator: SERRA BAPTISTA Descritores: SEGURANÇA SOCIAL PRESTAÇÕES POR MORTE UNIÃO DE FACTO Nº do Documento: SJ200903190002022 Apenso: Data do Acordão: 19-03-2009 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. O direito às prestações por morte de um beneficiário da Segurança Social, não casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, depende, para além da prova de com este conviver, em condições análogas às dos cônjuges, há mais de dois anos, da alegação e prova do sobrevivente estar carenciado de alimentos e de não os poder obter, quer da herança do falecido, quer dos familiares elencados no art. 2009º do CC. 2. As normas dos artigos 3º, alíneas e), f) e g) e 6º da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, 8º do Decreto-Lei nº 322/80, de 18 de Outubro e 3º do Decreto Regulamentar nº 1/94, de 18 de Janeiro, interpretadas no sentido de ser necessária sentença judicial a reconhecer o direito a alimentos do companheiro do beneficiário falecido, não são materialmente inconstitucionais. Também o Tribunal Constitucional em aresto de 2005 assim o defende conforme se segue e disponível na base de dados do Tribunal Constitucional: ACÓRDÃO N.º 705/2005 Processo n.º 62/05 3.ª Secção Relator: Conselheiro Vítor Gomes Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional 1. A. instaurou contra a Caixa Geral de Aposentações (CGA) uma acção visando o reconhecimento a seu favor da qualidade de titular do direito às prestações por morte de um beneficiário dessa Caixa, com quem vivera em união de facto duradoura (13 anos), ao abrigo das disposições conjugadas dos art. 40.º, n.º 1 e 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência no Funcionalismo Público, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho e do artigo 6.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio. A acção foi julgada improcedente, com fundamento em que a autora não alegara factos que servissem de suporte ao reconhecimento do seu direito a alimentos da herança, nomeadamente a sua necessidade de alimentos e a impossibilidade de os obter das pessoas referidas nas alíneas a) a d) do artigo 2009.º do Código Civil. Esta decisão veio a ser confirmada pela Relação e, finalmente, pelo Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 2 de Dezembro de 2004. A autora interpôs recurso deste acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 1º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC). 2. Notificadas as partes para alegações, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal julgue inconstitucional “a norma que se extrai dos artigos 40.º, n.º 1, alínea a) e 41.º n.º 2 do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, bem como dos artigos 1.º, 3.º alínea e) e 6.º da Lei n.º 7/2001, quando interpretada, como na decisão recorrida, no sentido de a atribuição da pensão de sobrevivência por morte de beneficiário da Caixa Geral de Aposentações em 7/1/2002, a quem em tal data convivia com ele em união de facto há mais de 12 anos, depender também da prova de factos que sirvam de suporte ao reconhecimento do seu direito a alimentos da herança do companheiro falecido, com a prévia verificação da impossibilidade de os obter das pessoas referidas nas alíneas a) e d) do artigo 2009.º do Código Civil”. Por sua vez, a Caixa Geral de Aposentações sustenta que deve negar-se provimento ao recurso. 3. A questão mais uma vez colocada à apreciação do Tribunal Constitucional é, reduzida à sua essência, a de saber se é materialmente constitucional a interpretação normativa segundo a qual o direito à pensão de sobrevivência, em caso de união de facto, depende de o companheiro do falecido demonstrar que tem direito de obter alimentos da herança por não os poder obter das pessoas referidas no artigo 2009.º, n.º 1, alíneas a) a d) do Código Civil. É questão relativamente à qual havia jurisprudência divergente, como o acórdão recorrido dá nota. Sucede que pelo acórdão n.º 614/2005, de 9 de Novembro de 2005, proferido no processo n.º 697/2004, em recurso interposto para o Plenário, ao abrigo do artigo 79.º-D da LTC, do acórdão n.º 159/2005 (disponível em http:/www.tribunalconstitucional.pt) por divergência com o decidido no acórdão n.º 88/2004 (publicado no Diário da República, II Série, de 16 de Abril de 2004), o Tribunal considerou não ser inconstitucional a norma do citado artigo 41.º, n.º 2, 1ª parte daquele Estatuto, “na interpretação normativa segundo a qual a titularidade de pensão de sobrevivência em caso de união de facto depende de o companheiro do falecido estar nas condições do artigo 2020.º do Código Civil, isto é, de ter direito a obter alimentos da herança, por não os poder obter das pessoas referidas no artigo 2009.º, n.º 1, alíneas a) a d) do mesmo Código”. Fez, portanto, vencimento em Plenário o entendimento que o acórdão recorrido seguiu quanto à questão de constitucionalidade, em prejuízo daquele outro que a recorrente defende e que tinha sido adoptado no acórdão n.º 88/2004. Assim, aplicando a doutrina do referido acórdão do Plenário, tem de julgar-se improcedentes as razões da recorrente quanto à questão de constitucionalidade que é objecto do presente recurso. Efectivamente, embora no caso seja reportada a um bloco normativo composto por outros preceitos para além daquele que é directamente referido no acórdão n.º 614/2005, a questão de constitucionalidade é a mesma. 4. Decisão Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e condenar a recorrente nas custas, com 20 (vinte) unidades de conta de taxa de justiça. Lisboa, 14 de Dezembro de 2005 Vítor Gomes Gil Galvão Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Artur Maurício Como se disse no princípio não há diploma que defina a união de facto, tão-pouco o mencionado art.º 2020 do CCiv. Se o legislador dos DL 322/90, Leis 135/99 e 7/2001 tivesse querido atribuir aos sobrevivos da união de facto as prestações por morte a que os cônjuges sobrevivos têm direito e nos mesmos termos que estes últimos a elas acedem tê-lo-ia dito pura e simplesmente, não fazendo sentido remeter para o art.º 2020 do CCiv que não é uma norma definidora da união de facto. O art.º 2020 do CCiv refere-se ao direito do unido de facto sobrevivo de exigir alimentos da herança do falecido quando os não possa obter as pessoas obrigadas a esses alimentos nos termos do art.º 2009 do CCiv. E só nessas condições é que o unido de facto sobrevivo tem direito a alimentos da herança do unido de facto falecido. É este o alcance da previsão e da estatuição do art.º 2020 do CCiv e as condições de atribuição do direito a alimentos são elas todas acima referidas. A remissão para a situação ou para as condições do art.º 2020 do CCiv feita pelo legislador tem de se considerar no todo e não na parte. O legislador ciente (o n.º 3 do art.º 9 do CCiv estatui que se presume que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados) de que o art.º 2020 do CCiv não é uma norma definidora da união de facto antes prevê os requisitos para a atribuição do direito a alimentos do unido sobrevivo quis que as condições para a atribuição ao unido sobrevivo das prestações por morte do beneficiário da segurança social fossem as mesmas e só assim se reconstitui o pensamento legislativo (art.º 9 do CCiv). Demonstrada a união de facto do Autor com a falecida pensionista, carecia, ainda, o Autor, como se diz na sentença recorrida de demonstrar a necessidade de alimentos e a impossibilidade de os obter dos familiares referidos nas alíneas a) a d) do art.º 2009 do CCiv. Apesar do convite ao aperfeiçoamento do articulado onde estava implícito o convite à alegação dos factos consubstanciadores da necessidade de alimentos por parte do Autor, o certo é que o Autor limitou-se a alegar o que consta de 10 e 11 do articulado ou seja que aufere aquele valor de pensão de reforma e tem aquelas despesas, mas não alega que vive exclusivamente do valor daquela pensão de reforma com a qual faz face às mencionadas despesas. Não o tendo alegado também o não provou, pelo que insuficientemente está caracterizada a necessidade de alimentos por parte do Autor, ónus de prova que também lhe cabe (art.º 342/1 do cCiv) E, como se referiu acima a propósito dos documentos que o requerente deveria juntar para prova do alegado nos art.ºs 14 e 18 do articulado aperfeiçoado; apenas ficou demonstrado que o Autor é solteiro, o que não é suficiente face às alíneas do art.º 2009 do CCiv. O ónus da alegação e prova da impossibilidade de obtenção dos alimentos das pessoas a tal obrigadas nos termos do art.º 2009 do CCiv recai sobre o Autor (art.º 342, n.º 1 do CCiv)., como acima se disse e o acentua a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça. A maior dificuldade da prova de factos negativos não impõe a inversão do ónus da prova.. Não tendo a Autora provado, também, esse facto constitutivo do seu direito (impossibilidade do Autor obter alimentos do seu alegado único filho e dos irmãos), não havendo elementos que nos permitam, ainda que por via da presunção (art.º 349 do CCiv), chegar aos factos alegados, soçobra a acção. IV- DECISÃO Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida. Custas pelo Autor recorrente que decai, por força do disposto no art.º 446, n.ºs 1 e 2 do Código do Processo Civil, sem prejuízo da dispensa de que goza no âmbito do apoio judiciário que lhe foi concedido. A ilustre advogada que patrocina o Autor no âmbito do apoio judiciário tem direito a remuneração pela apelação em conformidade com o disposto em 1.3 do Anexo à portaria 1386/2004 de 10/11, ou seja 9 (nove) unidades de referência (U.R.) sendo a U.R equivalente a ¼ da unidade de conta em vigor, remuneração que oportunamente lhe deverá ser processada. Lxa., 10/9/2009 João Miguel Mourão Vaz Gomes Jorge Manuel Leitão Leal Nelson Paulo Martins de Borges Carneiro [1] Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, 1993, pág. 20. [2] Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito de Família, Coimbra editora 2.ª edição, pág. 88 [3] José Joaquim Almeida Lopes, A União de Facto no Direito Português, Separata de Revista Española de Derecho Canónico, vol. 50, n.º 134 (1993), Salamanca. [4] Geraldo da Cruz Almeida in Da União de Facto, convivência more uxorio em Direito Internacional Privado, pág. 184 e Telma Carvalho in A União de Facto: A sua Eficácia Jurídica, , Comemorações do 35 anos do Código Civil e dos 25 Anos da Reforma de 1977, vol. I, págs. 222 e ss. |