Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JORGE GONÇALVES | ||
Descritores: | OFENSA A PESSOA COLECTIVA BEM JURÍDICO PROTEGIDO ELEMENTOS ESSENCIAIS DO CRIME ELEMENTO CONSTITUTIVO DIREITO DE CRÍTICA NÃO PRONÚNCIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/05/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | I-O bem jurídico protegido no crime previsto no art. 187º do CP é complexo, englobando a credibilidade, o prestígio e a confiança do organismo, serviço, pessoa colectiva, instituição ou corporação, cujo significado se identifica com a ideia do seu “bom nome”. II-O tipo objectivo do ilícito previsto no art. 187º do CP preenche-se com a afirmação ou divulgação de “factos inverídicos”, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança, não abarcando a imputação de “juízos de valor” ofensivos, como sucede nos crimes de difamação e injúria. III-As expressões “afirmar” e “propalar” contidas no art. 187.º, n.º1, do CP, não incluem apenas expressões verbais, mas também escritas (“afirma-se” e “propala-se” de forma verbal e de forma escrita), pelo que o tipo de crime é preenchido independentemente da forma – oral ou escrita – pela qual os factos inverídicos sejam propalados. IV-Não integra o tipo objectivo de ilícito previsto no art. 187º do CP afirmar ou propalar juízos, comentários ou opiniões críticas, que podendo ser muito desagradáveis e até ofensivas para o visado, foram proferidos no âmbito da liberdade de expressão dos arguidos. V-O juízo sobre a suficiência dos indícios, em ordem à decisão de pronúncia, deve passar pela bitola da probabilidade elevada ou particularmente qualificada, correspondente à formação de uma verdadeira convicção de probabilidade de condenação, que será aquela que, num juízo de prognose, exibir a potencialidade de vir a ultrapassar a barreira do in dubio na fase do julgamento. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa. I-Relatório: 1.Na sequência de denúncia apresentada pela assistente, Massa Insolvente da Sociedade T...-F... e C..., SA, o Ministério Público procedeu a inquérito, findo o qual pela assistente foi deduzida acusação particular contra S...-Sociedade J...(Expresso) (I... P..., SA), CA..., LM... e JP..., todos melhor identificados nos autos, imputando-lhes a prática de um crime p. e p. pelo artigo 187.° e 183.°, n.°2, do Código Penal. O Ministério Público não acompanhou a acusação particular deduzida pela assistente. Os arguidos requereram a abertura da instrução, alegando que não praticaram qualquer ilícito e pedindo a consequente não pronúncia, arguindo, igualmente, a nulidade do inquérito por insuficiência, porquanto não foram no decurso do mesmo constituídos e interrogados como arguidos. Finda a instrução, foi proferido despacho de não pronúncia. 2.Inconformada com a decisão de não pronúncia, interpôs a assistente o presente recurso, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): A-O Tribunal a quo decidiu pela não pronúncia dos Arguidos, CA..., LM..., JP..., pela prática do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, p. e p. nos termos do artigo 187.º do Código Penal, especialmente agravado pela alínea a) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 183.º do Código Penal. Nomeadamente, o Tribunal a quo considerou no que concerne aos Recorridos CA... e JP..., as afirmações proferidas "não são agradáveis", mas foram proferidas como uma opinião e comentário, no âmbito da liberdade de expressão. No que concerne ao Recorrido LM..., o Tribunal a quo considerou que não foi por este proferida qualquer afirmação dirigida à Recorrente, que pusessem em causa o seu bom nome e credibilidade. B-Os factos cuja prova documental irrefutável consta dos autos e não foi posta em causa a sua veracidade, tendo sido aliás transmitida e divulgada publicamente por meio da comunicação social, refere-se a uma entrevista, publicada em ...-04-20..., na "R...", suplemento do S... "Expresso", realizada pela Recorrida CA..., onde esta dirigindo-se à Recorrente, expressamente afirmou que a Recorrente nunca deu formação profissional e que uma empresa "fake", que apenas existe para "sacar fundos". Em acto sequencial e como resposta, o Recorrido LM... refere que a "fraude é sempre possível" e que o "dinheiro não garante a qualidade dos cursos de formação". C-Já a ...-09-20..., no programa semanal "Q...C...", que é transmitido em directo, no canal informativo S...N..., o Recorrido JP... proferiu afirmações falsas dirigidas à Recorrente, entre as quais afirmou aquele que a Recorrente era uma "empresa falsa", "criada" para servir o poder político, sem verdadeira vida económica e que apenas "vive do tráfico de influências". Mas não só naquele programa o Recorrido proferiu tais afirmações, nos últimos 02 anos, continuadamente, através do seu blog pessoal, "Abrupto", faz afirmações, nos chamados "Posts", com conteúdo factual inverídico e não meramente desagradável, da actividade da Recorrente. D-A Recorrente é uma empresa com 30 anos de actividade comprovada no mercado, tendo ministrado centenas de cursos de formação e ajudado a formar milhares de pessoas, e assim perante as imputações feitas pelos Recorridos, verifica-se que o Tribunal a quo fez uma incorrecta aplicação de direito aos factos indiciados, com a não pronúncia dos ora Recorridos pela alegada prática do crime supra enunciado, uma vez que as afirmações dos Recorridos ultrapassam largamente o manto da liberdade de expressão e entram no âmbito das ofensas ao bom nome e credibilidade a pessoa colectiva, sendo que tais afirmações não são verdadeiras e mais não fazem do que por em causa 30 anos de trabalho demonstrado pela Recorrente na área da formação profissional. E-Motivo pelo qual, inclusive a Lei da Imprensa, nos seus artigos 29." e 30.°, por referência aos princípios constitucionais como a liberdade de expressão, reconhece e prevê a responsabilidade civil e criminal pelos actos dos profissionais ligados à comunicação social nas suas diversas vestes e também a CRP que prevê o direito à Liberdade de Expressão no seu artigo 37.°, prevê o direito ao bom nome e reputação no seu artigo 26.° n.° 1. E deste modo não pode a Recorrente conformar-se com uma "explicação" restritiva de actos lícitos, pela liberdade de expressão, em detrimento de uma flagrante desresponsabilização. F-Perante estes factos o Tribunal a quo, sufragando a falta de coragem do Ministério Público em investigar e reconhecer a força da prova produzida, com o devido respeito, optou por uma decisão simplista e redutora dos factos, quando nesta fase processual se lhe impunha o conhecimento de indícios fortes e suficientes para indagar de uma possível condenação em sede de julgamento e não de uma real certeza de condenação e assim se escondeu atrás do comum fundamento da liberdade de expressão, que nos autos comprovadamente não é perante uma verdadeira liberdade de expressão que estamos, mas quanto muito uma "liberdade" permitida pelos Tribunais de "dizer mal por dizer" e assim apenas se espera deste Tribunal ad quem uma decisão de responsabilização. G-Nestes termos mal andou o Tribunal a quo, devendo a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que decida peja pronúncia dos Recorridos, pela prática do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, p. e p. nos termos do artigo 187.° do Código Penal, especialmente agravado pela alínea a) do n.° 1 e n.° 2 do artigo 183.° do Código Penal. 3.O Ministério Público junto da 1." instância apresentou resposta em que sustenta o não provimento do recurso. 4.Os arguidos CA... e JP... responderam ao recurso, concluindo (transcrição das conclusões): A-O Direito de Queixa da Recorrente encontra-se prescrito relativamente às publicações do aqui Recorrido JP..., no seu blogue, nos dias .../10/20..., .../10/20... e .../12/20...; B-Também o Procedimento Criminal se mostra já prescrito relativamente aos textos publicado pelo Recorrido JP..., no seu blogue pessoal, cm .../10/20... e .../10/20...; C-Os comentários e entrevista realizados pelos Recorridos foram-nos ao abrigo do seu direito de liberdade de expressão e informação, protegido constitucionalmente, devendo prevalecer sobre os bens jurídicos cuja violação penal vem invocada nos autos pela Recorrente; D-Não se mostram indiciados nos autos os elementos objetivos e subjetivos do tipo de crime p. e p. do art. 187.° do C.P., uma vez que os comentários e demais intervenções jornalísticas decorreram de notícias anteriores, não tendo os Recorridos razões para crer que os factos não eram verdadeiros e que, portanto, não poderiam com eles sustentar os respetivos exercícios do direito de liberdade de expressão e informação, não se mostrando, ainda, e em suma, indiciada nos autos a necessidade social imperiosa para restringir aquele direito dos Arguidos; E-O comportamento dos Arguidos em análise nos autos não ofenderam a credibilidade, prestígio e confiança da Recorrente, o que, a ter acontecido, sempre teria sido consequência das próprias notícias, e não dos comentários feitos sobre a Assistente e/ou, também, tendo por base os processos-crime instaurados contra a Recorrente; Nestes termos, e nos demais de direito que se mostrem aplicáveis ao caso, deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente, por não provado, e, em consequência, deve ser integralmente mantida nos autos a proferida decisão instrutória de não pronúncia, por não merecer qualquer reparo e ter interpretado e aplicado corretamente a Lei aos Factos. 4.Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pronunciando-se, a fls. 1111 e seguintes, no sentido do não provimento do recurso. 5.Cumprido o disposto no artigo 417.°, n.°2, do C.P.P. e apresentada resposta ao parecer, foi efectuado exame preliminar, após o que, colhidos os vistos, foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.°3, do mesmo diploma. II-Fundamentação. 1.Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. Assim, a questão a decidir é a da suficiência e/ou insuficiência da prova indiciária para sujeição (ou não) dos arguidos a julgamento. Como questões prévias colocam-se a invocada prescrição do procedimento e a caducidade do direito de queixa. 2.O despacho recorrido. O despacho recorrido tem o seguinte teor (transcrição): Decisão Instrutória. Nos presentes autos e na sequência da denúncia apresentada pela Assistente Massa Insolvente da Sociedade T...-F... e C..., SA, o Ministério Público procedeu a inquérito, tendo no fim deste pelo Assistente sido deduzida acusação particular, contra os arguidos S...-Sociedade J...(Expresso) (I...P..., SA), CA..., identificada a fls. 906 dos autos, LM..., identificado a fls. 866 dos autos e JP..., identificado a fls. 898 dos autos, imputando-lhes a prática de um crime p. e p. pelo artº 187º e 183º nº2 do Cod. Penal. O Ministério Público, conforme consta, do despacho que faz fls. 796 a 805 dos autos não acompanhou a acusação particular deduzida pela Assistente. Os arguidos por discordarem da acusação particular deduzida nos autos, vieram requerer a abertura da instrução, nos termos do artº 287º do CPP, pelos motivos que constam dos respetivos requerimentos de abertura da instrução que fazem fls. 845 e seguintes, 889 e seguintes e 915 e seguintes, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos pedindo que seja proferido despacho de não pronuncia, porquanto inexiste a prática de qualquer ilícito por parte dos arguidos e arguindo a nulidade do inquérito por insuficiência deste, porquanto os arguidos não foram no decurso do inquérito constituídos e interrogados como tal. * Foram juntos documentos. Procedeu-se à realização do debate instrutório com observância das formalidades legais. * CUMPRE DECIDIR. O Tribunal é competente. O Ministério Público tem legitimidade para exercer a ação penal. Não existem nulidades, exceções ou questões prévias de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa, com exceção das seguintes. Questão Prévia: Nos autos na acusação particular deduzida pela Assistente foi imputado à sociedade arguida S...-Sociedade J...(Expresso) (I... P..., SA) a prática de um crime de um crime p. e p. pelo art° 187º e 183º nº2 do Cod. Penal. A Sociedade arguida enquanto pessoa coletiva, apenas pode ser responsabilizada criminalmente pela prática dos crimes referidos no artº 11.º n.º2 do Cod. Penal. Do catálogo de crimes mencionados no nº2 do art° 11." do diploma legal citado não consta o ilícito pelo qual a sociedade arguida vem acusada nestes autos, sendo que pela prática de tal ilícito apenas podem ser responsabilizadas criminalmente, pessoas singulares (artº 11.º n.º 1 do Cod. Penal). Face ao exposto e pela razão referida julgo extinto o procedimento criminal a que nestes autos se procedia contra a S... -Sociedade J...(Expresso) /I... P..., SA/, por impossibilidade legal, pelo que e nesta parte determino o arquivamento dos autos. Nulidade por insuficiência do inquérito: No requerimento de abertura de instrução apresentado pelos arguidos CA... e JP... foi arguida a nulidade do inquérito por insuficiência deste, porquanto alegam os arguidos, não foram no decurso do inquérito constituídos e interrogados nessa qualidade verificando-se assim a nulidade prevista no artº120 nº2 al. d) do CPP. O Ministério Público pronunciou-se no sentido de não assistir razão aos arguidos a fls. 973 e seguintes. Cumpre decidir: Conforme refere o Ministério Público a fls. 973 e seguintes dos autos, a direção do inquérito compete ao Ministério Público, competindo-lhe determinar a realização das diligências que entender, com vista ao esclarecimento dos factos e que possibilitem a decisão final do inquérito, devendo orientar-se pelo principio de legalidade. A constituição como arguido como resulta da versão atualmente em vigor da al. a) do art° 58º do CPP, só é obrigatória no caso de existir fundada suspeita da prática de um crime. Com a alteração operada ao CPP, a constituição como arguido no decurso de inquérito e interrogatório de arguido deixou de ser obrigatória, só devendo ter lugar no caso de existir fundada suspeita da prática de um crime. Nos autos o Ministério Público procedeu a diligências e concluiu pela inexistência de indícios da prática de factos pelos arguidos que integrassem a prática de um crime, designadamente a prática do crime denunciado pela Assistente. Isso mesmo referiu o Ministério Público quando determinou a notificação da Assistente para deduzir acusação particular e posteriormente proferindo despacho em que não acompanhou a acusação particular deduzida pela Assistente. Face ao exposto e considerando a posição e conclusão a que chegou o Ministério Público após a investigação que realizou no decurso do inquérito, não se impunha a constituição dos arguidos como tal e a realização do seu interrogatório judicial, razão pela qual se considera que não se verifica a nulidade do inquérito, por insuficiência deste, arguida pelos arguidos. Assim sendo julgo não verificada a nulidade arguida pelo que e consequentemente, nesta parte indefiro o requerido. * Conforme resulta do art° 286º do CPP a instrução tem como fim a comprovação judicial de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito com vista a submeter ou não os factos a julgamento. No caso dos autos a instrução visa a comprovação judicial de acusar os arguidos, ou seja pretende-se que se afira da existência ou não de indícios dos quais resulte a possibilidade razoável de em julgamento vir a ser aplicado aos arguidos uma pena, pela prática dos factos e ilícito que lhes são imputados pela Assistente na acusação particular. Dispõe o artº 308º nº 1 do CPP que se até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o Juiz, por despacho pronúncia o arguido pelos respetivos factos; caso contrário, profere despacho de não-pronúncia. Resulta por outro lado do artº 283º nº 2 do CPP, para onde remete o artº 308º nº2 do mesmo diploma legal, que são suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de aos arguidos vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento uma pena ou uma medida de segurança. O despacho de não pronúncia deverá ser proferido sempre que, perante o material probatório constante dos autos, não se indicie que o arguido, se vier a ser julgado, venha provavelmente a ser condenado, sendo tal probabilidade um pressuposto indispensável da submissão do feito a julgamento - v. G. Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 1994, 205. Para ser proferido despacho de pronúncia embora não seja preciso uma certeza da infração é necessário que os factos indiciários sejam suficientes e bastantes, para que logicamente relacionados e conjugados, formem um todo persuasivo da culpa do arguido. A assistente imputa aos arguidos na acusação particular que deduziu a prática de um p. e p. pelo art° 187° e 183º nº2 do Cód. Penal. Resulta do artº 187º do Cód. Penal, que comete o crime de ofensa a pessoa coletiva, quem sem fundamento para, em boa-fé, reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos verídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa coletiva, instituição ou corporação. Assistente na acusação particular imputa aos arguidos os seguintes factos: No dia ... de Abril de 20... foi publicada uma entrevista, na "R...", suplemento do S..."Expresso", realizada pela arguida a jornalista CA... a LM..., M...-A... e do D...R.... No desenrolar da entrevista CA..., referiu a dado passo: "Formação profissional sem impacto lembra-me logo a T..., do senhor p...-m... e do seu antecessor na pasta, MR..., A T... nunca deu formação profissional. Existiram muitas empresas fake, que apenas queriam sacar fundos." Após o que o arguido LM..., entrevistado, na referida entrevista referiu: "Os incentivos não garantiam a qualidade da formação. Fraude é sempre possível, mas Portugal tem dos melhores sistemas de controle reconhecidos pela UE. O problema não é esse, é a falta de qualidade do curso, mesmo tendo dinheiro. Estamos a planear de outro modo. O pagamento às empresas vai depender da taxa de empregabilidade que os formandos tenham no mercado.". JP..., no dia ... de Setembro de 20..., no programa semanal "Q... C...", que é transmitido em direto, no canal informativo da estação televisiva S...-Sociedade I... de C..., SA, da qual é comentador referiu: "De um ponto de vista político o que as pessoas se deviam preocupar é o facto de terem havido empresas como a T... e ONCs cujo objectivo a gente desconhece o que é que faz. A única coisa que sabemos da T... envolvendo PC... é que houve um pedido presumo que a MR... para um financiamento com fundos que o estado resolvia para formar uma larga quantidade de pessoas para os aeroportos do interior do País. Quer dizer basta isso para nós percebermos que aquela empresa não é uma verdadeira empresa. E uma empresa destinada a ir atrás do dinheiro que o estado através das pessoas amigas é capaz de dar (...) Todas as vezes que a gente dava um pontapé numa pedra saía o Eng...S..., agora todas as vezes que a gente dá um pontapé numa pedra sai a T..., porque a T... é uma típica empresa criada para se colar ao estado através de relações que são inaceitáveis que é aquilo que disse lá o senhor da T... que disse" O P... abria-nos todas as portas". Portanto se ele teve um salário e como obviamente não foi para formar empregados dos aeroportos ou então uma ONG que eu não sei o que fez País e pelo mundo. (...) Mas para mim o problema está antes, o problema está em saber e porque durante tantos anos este tipo de empresas falsas, criadas única e simplesmente para rentabilizar relações íntimas com o poder político, como era o caso das relações como Sec... de E... na altura, MR... e porque razão é que estas empresas que não tem verdadeira vida económica e que vivem apenas do tráfico de influências que é isso que vivem ou as ONG 's que não se sabe o que fazem." JP..., publicou no seu blog pessoal, "Abrupto", os seguintes Post: Em ...-10-20..., EXTRACTO DO MEU ARTIGO DO PÚBLICO: A VINGANÇA SOBRE A FUNÇÃO PÚBLICA Os casos de PC... e MR... são típicos, porque uma parte fundamental da sua carreira é feita dentro dos partidos, nas '"jotas", passam pelos cargos mais ligados ao controlo político "distributivo" no Gov... (MR...) e são empregados por terceiros em empresas em que as redes de ligação com o poder político são fundamentais para aceder aos "negócios". Uma frase esquecida de IP... quando dizia que ter acesso ao poder político valia um milhão de contos traduz bem a utilidade dos políticos para os seus patrões privados. As contas ainda eram em escudos, mas toda agente percebeu de que é que ele falava. Essas áreas incluem a formação, no tempo áureo dos fundos, e depois nos sectores como o ambiente, energias renováveis, resíduos e construção, tudo áreas que conheceram grande expansão com dinheiros públicos nos últimos anos. O caso da T..., envolvendo PC... e MR..., é típico de uma espécie de empresas "jota", em que pessoas com carreiras políticas interdependentes entre si se organizam para aproveitar as oportunidades que o acesso ao poder político cria. Este tipo de processos é transversal aos dois partidos, PS e PSD, e acentuou-se nos momentos em que o dinheiro fácil, com os fundos comunitários e com um E... gastador, permitiram todo o tipo de "negócios". Uns são gigantescos, como as PPP, e outros medíocres, como o das empresas de "formação", mas são da mesma natureza e têm o mesmo perfil de protagonistas.". Em ...-10-20... 10:49 (...) Essas áreas incluem a formação, no tempo áureo dos fundos, e depois nos sectores como o ambiente, energias renováveis, resíduos e construção tudo áreas que conheceram grande expansão com dinheiros públicos nos últimos anos. O caso da T..., envolvendo PC... e MR..., é típico do uma espécie de empresas "jota", em que pessoas com carreiras políticas interdependentes entre si se organizam para aproveitar as oportunidades que o acesso ao poder político cria. Este tipo de processos é transversal aos dois partidos, PS e PSD, e acentuou-se nos momentos em que o dinheiro fácil, com os fundos comunitários e com um E.. gastador, permitiram todo o tipo de "negócios". Uns são gigantescos, como as PPP, e outros medíocres, como o das empresas de "formação", mas são da mesma natureza e têm o mesmo perfil de 1 protagonistas. (...)" Em ...-12-20..., VOU REPETIR o QUE ESCREVI há mais UM ANO SOBRE A T... Não costumo citar o que já escrevi, mas as notícias recentes dadas pelo Público sobre o programa F..., criado com fundos europeus para promover a formação profissional dos funcionários das autarquias, envolvendo MR... como decisor e B... como beneficiário, mostra mais uma vez sempre os mesmos nomes, as mesmas empresas, sempre as mesmas redes. E um modus operandi que corrompe o funcionamento da nossa democracia, desvia recursos do estado para enriquecimento privado e tem como instrumento fundamental o controlo dos mecanismos partidários. Também, como de costume, ninguém liga nenhuma, e as notícias foram cuidadosamente silenciadas pelos outros órgãos de comunicação, a começar pela televisão. Aqui vai a citação: "(...) o núcleo duro partidário do PSD, tem carreiras de dois tipos: ou na advocacia, ou num "privado" muito especial, aquele que vive da dependência do E... e das decisões políticas seja a nível central, seja a nível autárquico. Os casos de PC... e MR... são típicos, porque uma parte fundamental da sua carreira é feita dentro dos partidos, nas "jotas", passam pelos cargos mais ligados ao controlo político "distributivo" no Gov... (MR...) e são empregados por terceiros em empresas em que as redes de ligação com o poder político são fundamentais para aceder aos "negócios". (...) Essas áreas incluíam a formação, no tempo áureo dos fundos, e depois nos sectores como o ambiente, energias renováveis, resíduos e construção, tudo áreas que conheceram grande expansão com dinheiros públicos nos últimos anos. [Hoje as empresas de "comunicação" e marketing tem papel idêntico.] O caso da T..., envolvendo PC... e MR..., é típico de uma espécie de empresas 'jota", em que pessoas com carreiras políticas interdependentes entre si se organizam para aproveitar as oportunidades que o acesso ao poder político cria. (...) Não é por acaso que o "privado" que encontramos nos curricula governamentais, como estes de que falamos, é sempre do mesmo tipo. Não encontramos nunca nenhum genuíno empresário que já estivesse "feito" antes de ir para o Gov.... (...) É mais uma vez o mesmo". Em ...-05-20..., SAIBA-SE O QUE SE SOUBER, FICA TUDO NA MESMA. (...)A história dá muitas voltas, mas compreende-se que assim tenha sido, até porque MR... tinha também um estranho percurso escolar e havia a T.... Eles sabiam que havia, nós não. (...) (...)Por seu lado, FM..., o ex-sócio maioritário da T..., faz um retrato exemplar do modo como certas actividades empresariais, por isso lucrativas, dependem estritamente do acesso ao poder político e de como é nessas empresas que fazem a sua carreira de "gestão" muitos dos actuais governantes que não tem outro curriculo. O que eles tracem para o negócio não é qualquer experiência empresarial ou de gestão, mas sim a sua agenda telefónica, e as relações de pertença e proximidade troca de favores com o poder político. São "facilitadores" e há muitos anos IP... disse numa entrevista sobre o mestre deles todos que valia um "milhão de contos ". Como diz FM..., "desbloqueiam": "o P... abria as portas todas". Pode haver ajustes de contas nestas entrevistas: mas os factos nelas revelados permanecem, por desmentir. Ambos são testemunhas privilegiadas das matérias sobre as quais falam e, quer num quer noutro caso, os seus depoimentos são consistentes com o que já era conhecido. Mas, para além disso acrescentam detalhes e é nos detalhes que se percebe muita coisa. São um retrato dos círculos negros do actual poder político partidário em Portugal. Não sei se algum dos factos que referi têm incidência criminal e espero que as, investigações em curso cheguem a bom termo. Talvez não tenham, embora a história da T... é idêntica à de muitas outras empresas criadas em eirados do PSD e PS para usar o acesso ao poder político nacional e local para fazer negócios, e sei também que muita gente enriqueceu nesse processo. Sem esse acesso ao poder político essas empresas não valiam nada, até porque não eram verdadeiramente empresas. No caso dos serviços de informações, a perigosidade da sua politização, para além da que já existiu e da que ainda existe, é um risco para a democracia. As eminências pardas do PSD, as maiores e mais sabidas e os aprendizes de feiticeiro, são nomes que aparecem sempre, tocam e voam para longe quando as coisas começam a apertar. (...)" Em ...-10-20...; 22:37 SEMPRE A ATIRAR PARA O LADO A VER SE A GENTE SE DISTRAI. O problema do "caso T..." para o P...-M... não resulta de se ter "explicado tarde". Resulta do "caso T...", em primeiro, segundo, décimo, milionésimo lugar. E resulta das suas "explicações" que não explicam nada, bem pelo contrário. Quem está a desviar o mal-estar à volta de PC... apenas para o atraso das suas explicações, está a ver se cola um erro instrumental, naquilo que pode ser uma enorme complicação substancial. Já escrevi várias vezes e em devido tempo, muito antes destes eventos, sobre empresas como a T... e a sua "peculiar" relação com o poder político. Porque razão nascem ou contratam políticos, muitas vezes sem qualquer qualificação, e como proliferam e ganham dinheiro encostadas a decisões políticas e a informação privilegiada. Do lado de cá está uma "empresa", do lado de lá está sempre um amigo no sítio certo. Pelo meio, estão os homens que "abrem todas as portas". Sabe-se agora, sem surpresa, que a T... criou e financiou com verbas consideráveis (que é o que significa "ser o único mecenas'") uma ONG chamada C... P... para a Cooperação na qual PC... "trabalhava" de graça. E suposto que uma ONG tenha como objectivo qualquer coisa de bom e nobre e útil para quem precisa neste caso os, PALOPs. É por isso que tem um regime de favor no plano fiscal, na contabilidade, no governance, com muito poucas regras e sem o controlo que teria uma empresa. Mas o C... P... para a Cooperação, obra do "mecenato" da T..., tinha um objectivo peculiar arranjar projectos para financiar a T..., acedendo a fundos e recursos indisponíveis para uma empresa, mas disponíveis para uma ONG. Ou seja era uma falsa ONG. Pode ser que até tenha sido tudo legal (duvido), mas tudo isto é uma fraude e um abuso. E a natureza deste tipo de empresas e deste tipo de actividades só é acessível a quem conhece os meandros do poder político e quem sabe onde ir buscar os fundos desviando-os do seu objectivo filantrópico ou útil para a nação. Assim foram úteis mas foi para outra coisa. Quem se mete ou é parte activa neste tipo de actividades, fica sempre manchado, até porque sabe muito bem o que fez e com quem fez. Não me admira por isso que a memória emperre." Entende a Assistente que os arguidos ao fazerem na entrevista referida no caso da arguida CA... e do arguido LM... e no programa de televisão "Q...C..." e através dos Post, supra mencionados no caso do arguido JP..., a que acima se faz referencia, fizeram afirmações e teceram considerações que sabiam serem falsas e que lesavam a sua consideração, prestígio e credibilidade o que quiseram. Cumpre desde já referir que no caso do arguido LM..., não se vislumbra que o mesmo tenha dito algo na entrevista citada, que tenha a ver com a Assistente. O mesmo refere uma situação em abstrato, nada dizendo sobre a Assistente, na sequência do que lhe foi referido pela arguida CA... /Vives. Do ponto de vista objetivo o arguido nada refere sobre a Assistente, pelo que não se indicia a prática pelo mesmo de qualquer facto suscetível de preencher a tipicidade do crime que lhe vem imputado. No que concerne a arguida CA..., jornalista, na entrevista supra referida e ao arguido JP..., nos artigos que escreveu no seu Blog e como comentador em direto no programa da estação televisão S... "Q...C...", os mesmos referiram factos e teceram considerações, que efetivamente não são agradáveis para a Assistente. Não obstante tendo em conta o contexto em que a prática de tais factos se insere, ou seja as notícias que sobre os factos mencionados tinham sido anteriormente publicadas nos diversos órgãos de comunicação social, bem como as interrogações que as práticas referidas pelos arguidos, nos citados artigos e entrevista, levantavam na sociedade portuguesa, numa conjuntura de "crise", designadamente de "crise económica" em que se procurava justificação para o descalabro económico e crise em que se vivia, o referido pelos arguidos configura o exercício do direito de liberdade de expressão. Os arguidos manifestaram a sua opinião referindo factos e fazendo considerações, que se inserem no exercício do referido direito de liberdade de expressão. Indiciam ainda os autos que os arguidos ao fazerem as afirmações e considerações supra mencionadas tinham fundamento para reputar como verdadeiro o que diziam, face ao que se vinha a dizer e publicar em vários órgãos de comunicação social. A liberdade de expressão tem consagração constitucional e supra constitucional, designadamente no artº 10º da CEDH, sendo que tal consagração visa garantir a plenitude democrática. Conforme resulta do Acórdão do STJ de 30/6/2011, proferido no processo 1272/04.7TBBCL.G1.S1, in www.dgsj.pt. refere-se que "2 . A Constituição da República Portuguesa tutela, quer o direito à honra, quer o direito à liberdade e expressão e informação. 3 . Sem estabelecer hierarquia entre eles. 4 . Por força dos artigos 8." e 16. º, n.º1 da lei Fundamental, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem situa-se em plano superior ao das leis ordinárias internas. 5.Esta não tutela, no plano geral, o direito à honra, a ele se reportando apenas como possível integrante das restrições à liberdade de expressão enunciadas no artigo 10. º, nº2. ... 6.O que leva o intérprete a ter seguir o caminho consistente, não em partir da tutela do direito à honra e considerar os casos de eventuais ressalvas, mas em partir do direito à livre expressão e averiguar se têm lugar algumas das excepções deste n.º2. 7.Este caminho sai reforçado pelo texto da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. 8.Na interpretação daquele artigo 10° é de acatar, pelos tribunais internos, a orientação jurisprudencial que, muito reiteradamente, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem vem seguindo e que se caracteriza, no essencial, pelo seguinte: A liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa; As excepções constantes deste n.º2 devem ser interpretadas de modo restrito; Tal liberdade abrange, com alguns limites, expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade. Os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum - quanto à comunicação social, o Tribunal vem reiterando mesmo a expressão "cão de guarda" - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas; Na aferição dos limites da liberdade de expressão, os Estados dispõem de alguma margem de apreciação, que pode, no entanto, ser sindicada pelo próprio TEDH. " A liberdade de expressão e o direito ao bom nome ou credibilidade no caso de pessoas coletivas, podem em certas circunstâncias estar em conflito. Pela sua relevância enquanto pilar de uma sociedade democrática e por ser essencial para a existência da democracia, ou seja de uma sociedade livre e plural, tem vindo a Jurisprudência, designadamente do TEDH, a entender que em caso de conflito prevalece o Direito à liberdade de expressão, o qual só deve ser restringido quando existir uma "necessidade social imperiosa". Face ao exposto e após análise crítica de todos os elementos que dos autos constam, considero que não se indicia a prática de factos pelos arguidos que sejam suscetíveis pelas circunstâncias referidas de integrar a tipicidade objetiva e subjetiva do crime que a Assistente lhes imputa no requerimento de abertura da instrução. Tendo em conta o referido pelos arguidos, o contexto existente à data da prática dos factos, os preceitos legais referidos e fazendo um juízo de prognose considero que em julgamento se afigura como mais provável a absolvição dos arguidos, do que a sua condenação pela prática dos factos e crime de que vem acusados. Face ao exposto e pelas razões referidas pelo Ministério Público no despacho que faz fls. 796 a 805 dos autos, que aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais, não serão os arguidos pronunciados pela prática dos factos e ilícito de que vêm acusados - cf. Artº 283º nº2 ex «artº 308º nº2 do Cód. Proc. Penal -. * DECISÃO. Tendo em conta o exposto as considerações expendidas e disposições legais citadas não pronuncio os arguidos CA..., LM... e JP..., pela prática de um crime de difamação p. e p. pelo art° 187° e 183º nº2 do Cod. Penal, que lhes é imputado pela Assistente na acusação particular deduzida, pelo que e consequentemente determino o arquivamento dos autos. Fixo cm 3 UCs a taxa de justiça devida pela Assistente. Notifique. Oportunamente arquive. 3.Apreciando 3.1-Estabelece o artigo 187.° do Código Penal, sob a epígrafe "Ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva": «1-Quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação, é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias. 2-É correspondentemente aplicável o disposto: No artigo 183.°; e Nos n.° 1 e 2 do artigo 186.°» Alegam os arguidos CA... e JP... que, relativamente aos textos publicados por este último, no seu blogue "Abrupto", em ... e ... de Outubro de 20..., ocorreu a prescrição do procedimento criminal, mesmo que seja aplicável a agravação prevista no artigo 183.º, n.º2, que pune o crime com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias, por entenderem que, nesse caso, o prazo de prescrição é de dois anos, nos termos do artigo 118.º, n.ºl, alínea d), do Código Penal. Na definição do conceito de "meio de comunicação social", utilizado no artigo 183.°, n.º2, José de Faria Costa (Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, 2ª edição, § 8 da anotação ao artigo 183.°, p. 641 e 642) sustenta que importa considerar «o valor de uso - ao nível da esfera do leigo - que uma tal expressão adquire no seio da comunidade jurídica em que se emprega ou utiliza», Sendo que a comunicação social se realiza «na pluralidade de meios que, em determinado momento histórico, a comunidade é capaz de fornecer para a difusão dos diferentes fluxos informacionais e que visa, tem por específica finalidade, atingir com essa informação um conjunto alargado ou maciço de pessoas». Por sua vez, refere Paulo Pinto de Albuquerque, em anotação ao artigo 183.º (Comentário do Código Penal, 2008, p. 502): «A difamação através de meio de comunicação social é a feita através de um meio de difusão de informação a um número alargado de pessoas, como a imprensa, a televisão, a rádio, a internet (como resulta da extensão dada ao conceito nos artigos onde é referido, isto é, artigos 183.º, n.º2, 197.º, 223.º, n.º2, 240.º, n.º2, 297.º e 298.º; também neste sentido amplo, Helena Moniz, anotação 12ª ao artigo 297.º, in CCPP, 1999; e acórdão do STJ, de 23.01.20002, in SASTJ, 57, 58). Os graffiti, o correio e as redes de telecomunicações (telefone, telemóvel, telégrafo) não são "meios de comunicação social", mas são um meio de "publicidade", para os efeitos do nº11, al. a).» Uma vez que estamos perante escritos publicados num blogue que eram livremente acessíveis a qualquer pessoa que o consultasse, admitimos a qualificação indicada. Porém, no pressuposto de ser essa a pena abstractamente aplicável - prisão até 2 anos ou pena de multa não inferior a 120 dias -, o prazo de prescrição do procedimento criminal será o previsto no artigo 118.º, n.ºl, alínea c) - prazo de cinco anos - e não o da alínea d), invocado, certamente por lapso, na resposta ao recurso, pelo que o procedimento criminal não prescreveu. 3.2-Estabelece o artigo 262.º, n.º 1, do C.P.P.: "O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação." Inquérito cuja direcção, por força do disposto no subsequente artigo 263.º, n.º1, cabe ao Ministério Público, assistido pelos órgãos de polícia criminal, decorrendo a legitimidade do Ministério Público do artigo 48.º, do mesmo diploma, que prescreve: "O Ministério Público tem legitimidade para promover o processo penal, com as restrições constantes dos artigos 49.º a 52.º". No caso em apreço, relevam os artigos 49.º e 50.º, atinentes aos crimes semipúblicos e particulares, ou seja, aos crimes em que a legitimidade do Ministério Público para exercer a acção penal necessita de ser integrada ou só com uma queixa (os primeiros), ou, para além dela, de uma acusação particular (os segundos). Estabelece o artigo 49.º, n.º1: "Quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo." Acrescenta o n.º 2 do mesmo artigo: "Para o efeito do número anterior, considera-se feita ao Ministério Público a queixa dirigida a qualquer outra entidade que tenha a obrigação legal de a transmitir àquele." Por sua vez, prescreve o artigo 50.º, n.º1: "Quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituam assistentes e deduzam acusação particular." A queixa é o acto pelo qual se dá conhecimento do facto ilícito à autoridade competente para que seja desencadeado o respectivo processo, constituindo numa manifestação de vontade de perseguição criminal. Quer isto dizer que o instituto do direito de queixa integra duas componentes: a transmissão da notícia de um crime (o que também sucede com a denúncia) e a manifestação de vontade de que contra o agente ou agentes seja instaurado o respectivo procedimento criminal. Tratando-se de crime particular, além da queixa é necessário, para que o procedimento possa prosseguir, que o assistente deduza acusação particular na respectiva oportunidade (artigo 285.º, do C.P.P.). No caso em apreço, está em causa a imputação de um crime particular, de harmonia com o disposto no artigo 188.º, n.ºl, do Código Penal. Prescreve o artigo 115.º. n.ºl, do Código Penal, que o direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores, ou a partir da morte do ofendido, ou da data em que ele se tiver tornado incapaz, sendo o regime da queixa o mesmo, quer se trate de um crime particular, quer de um crime semipúblico. Alega-se na resposta que o direito de queixa "prescreveu" (extinguiu-se, por ter sido exercido para além do prazo de 6 meses) relativamente às publicações constantes do blogue do recorrido JP..., dos dias ... e ... de Outubro de 20... e ... de Dezembro de 20.... A queixa contra o referido arguido foi apresentada no dia 10 de Outubro de 2012, mais de seis meses após as publicações (posts) datadas de 14 e 20 de Outubro de 2012 e 22 de Dezembro de 2013. A única justificação que se encontra para essa tardia apresentação é a de que a assistente considera ter sido praticado um único crime, na forma continuada. Diz-se na fundamentação do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2012, publicado no Diário da República, 1ª série, nº 98, de 21 de Maio de 2012, a dado passo (com sublinhado nosso): «VICTOR DE SÁ PEREIRA E ALEXANDRE LAFAYETTE: assinalam: - "Não se justificaria que o titular do direito de queixa pudesse exercê-lo a todo o tempo, v.g. por ódio ou vingança. Conhecidos, na verdade, o facto e os seus autores [a lei não fala agora — incorretamente, como acentua FIGUEREDO DIAS (ibidem, 674) - em comparticipantes: cfr. Artigos 114º e 116º , nº 2 ], preenchidos se encontram, em princípio, os pressupostos sem os quais se não desencadeia o termo inicial da caducidade, a todos os títulos se impondo, então que a queixa seja deduzida em certo prazo. Este terá de ser contado, pois, a partir da data em que o titular passou a dispor de tal conhecimento. (n.º1). Há, todavia, casos especiais e é assim que o prazo de caducidade se conta a partir da morte do ofendido (n.º 2 do artigo 113°), do início da sua incapacidade (n.º 4 do mesmo artigo 113º) ou da data em que o ofendido perfizer 18 anos (n.º 2) se o efeito extintivo, nas duas primeiras hipóteses, não houver operado antes dos factos a que as mesmas se reportam. E, quanto às pessoas coletivas (em sentido lato), a contar do conhecimento do órgão competente para o exercício do direito de queixa (ibidem), nos termos do nº1." Em relação ao crime continuado: "A solução mais correta parece ser, porém, a de o fazer correr relativamente a cada um dos atos parciais em que aquele crime se desdobra, não podendo o procedimento ter lugar relativamente aos atos parciais de que não tenha havido queixa tempestiva». É esse o entendimento de Figueiredo Dias (Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, 1993, p. 675) e de Paulo Pinto de Albuquerque (ob. cit., p. 322), também adoptado, entre outros, por esta Relação, no seu acórdão de 25 de Outubro de 2013, publicado na Colectânea de Jurisprudência, 2013, Tomo 4, pág.149. Assim, não sendo invocado o conhecimento noutra data do facto alegadamente delitivo e do seu autor, a queixa só foi apresentada em tempo relativamente à actividade desenvolvida nos seis meses anteriores, uma vez que, relativamente aos actos parciais anteriores a esse período de tempo (no pressuposto, de que parte a assistente, da existência de continuação criminosa), se mostrava já extinto por caducidade o direito de queixa. À luz deste entendimento, foi, efectivamente, extemporâneo o exercício do direito de queixa por parte da assistente, no que concerne às publicações (posts) do arguido JP... com datas de ... e ... de Outubro de 20... e ... de Dezembro de 20..., encontrando-se extinto, quanto a esses factos, por caducidade, ao tempo em que foi exercido, o direito de queixa da assistente. 3.3-Conforme entendimento dos tribunais superiores, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça, «um acórdão da Relação que confirma um despacho de não pronúncia da 1ª. instância é um acórdão absolutório» para os efeitos do preceituado na alínea d), do n.ºl, do artigo 400.º, do C.P.P. (Acórdão do S.T.J., de 8 de Julho de 2003, Proc. n.º 2304/03 - 5ª. Secção, Relator o Ex.mo Conselheiro Abranches Martins). Assim, devendo haver confirmação da decisão recorrida - como acontece no presente caso -, pode a respectiva fundamentação limitar-se a remeter para os fundamentos da decisão impugnada, nos termos do disposto no artigo 425.º, n.º5, do C.P. Penal. A nosso ver, a decisão recorrida mostra-se bem fundamentada, de facto e de direito. Não deixaremos, porém, de fazer algumas observações complementares e autónomas (seguindo de perto, quanto ao conceito de «indícios suficientes», o Acórdão da Relação de Coimbra, de 17 de Dezembro de 2008, processo n.º 1096/06.7PBLRA.C1, do mesmo relator deste). 3.3.1. Dispõe O artigo 308.º, n.ºl, do C.P.P.: Se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se lerem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, Por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia. Esclarece o legislador, no artigo 283.º, n.º2, do mesmo diploma, que se consideram suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança. Está em causa a apreciação de todos os elementos de prova produzidos no inquérito e na instrução e a respectiva integração e enquadramento jurídico, em ordem a aferir da sua suficiência ou não para fundamentar a sujeição dos arguidos a julgamento pelo crime que o assistente lhes imputa. E nessa aferição o tribunal aprecia a prova segundo as regras da experiência e a sua livre convicção (artigo 127.º, do Código de Processo Penal). Para Germano Marques da Silva, «o juiz só deve pronunciar o arguido quando pelos elementos de prova recolhidos nos autos forma a sua convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido crime do que não o tenha cometido». Para tanto, a lei «não se basta, porém, como um mero juízo subjectivo, mas antes exige um juízo objectivo fundamentado nas provas dos autos. Da apreciação crítica das provas recolhidas no inquérito e na instrução há-de resultar a convicção da forte probabilidade ou possibilidade razoável de que o arguido seja responsável pelos factos da acusação.» (Curso de Processo Penal, III, 2.ª ed., Verbo, 2000, p. 179). Figueiredo Dias, por sua vez, ensina que «os indícios só serão suficientes, e a prova bastante, quando, já em face deles, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado ou quando esta seja mais provável do que a absolvição.» E adianta: «tem pois razão Castanheira Neves quando ensina que na suficiência dos indícios está contida a mesma exigência de verdade requerida pelo julgamento final, só que a instrução preparatória (e até a contraditória) não mobiliza os mesmos elementos probatórios que estarão ao dispor do juiz na fase do julgamento, e por isso, mas só por isso, o que seria insuficiente para a sentença pode ser bastante ou suficiente para a acusação.» (Direito Processual Penal, 1." vol., 1974, pág. 133). Como escreve Carlos Adérito Teixeira, no conceito de indícios suficientes «liga-se o referente retrospectivo da prova indiciária coligida ao referente prospectivo da condenação, no ponto de convergência da "possibilidade razoável" desta, por força daqueles indícios e não de outros» ("Indícios suficientes": parâmetros de racionalidade e "instância de legitimação"(...), Revista do CEJ, 2.º semestre 2004, n.º1, p. 189). Assim, os indícios qualificam-se de suficientes quando justificam a realização de um julgamento; e isso acontece quando a possibilidade de condenação, em função dos indícios, for razoável. —É sabido que existem algumas diferenças de entendimento sobre o juízo de indiciação suficiente. Há quem se baste com a bitola da probabilidade predominante -os indícios são suficientes quando a possibilidade de futura condenação for mais provável (mais de 50% de possibilidades) do que a possibilidade de absolvição, tese que, de forma explícita ou implícita, colhe o apoio de grande parte da jurisprudência. Por outro lado, uma orientação mais exigente (e mais compatível com o princípio da presunção de inocência e outros princípios do processo penal) afirma o critério da possibilidade particularmente qualificada, em que os diversos elementos de prova, relacionados e conjugados, fazem nascer uma convicção de alta probabilidade de que o arguido, em julgamento, será condenado (cfr. Jorge Noronha e Silveira, o conceito de indícios suficientes no processo penal português. Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, 2004, pp. 155 e seguintes). Contrapõe-se, por vezes, o juízo de probabilidade formulado no momento da acusação e da pronúncia, ao juízo de certeza, o único que pode conduzir à condenação, para sustentar que o primeiro é menos exigente do que o segundo, contentando-se com uma prova indiciária mais fraca e ainda compatível com a subsistência de uma certa margem de dúvida razoável. A este respeito, importa reter que a verdade a que se chega no processo não é a verdade absoluta ou ontológica, mas uma verdade judicial e prática, uma «verdade histórico-prática», em que a sua modalidade «não é a de um juízo teorético, mas a daquela vivência de certeza em que na existência, na vida, se afirma a realidade das situações, como tudo o que nestas de material e de espiritual participa» (Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal, 1967-1968, pp. 48 e 49). Por isso, o Juízo de certeza é, de algum modo, também probabilístico (como probabilística é a certeza científica), traduzindo-se num tão alto grau de probabilidade que faça desaparecer toda a dúvida e imponha uma convicção. No que concerne à dedução de acusação ou de pronúncia, constitui uma garantia fundamental de defesa, manifestação do princípio da presunção de inocência constitucionalmente consagrado, que ninguém seja submetido a julgamento penal senão havendo indícios suficientes de que praticou um crime. E o conteúdo normativo a conferir a esse conceito de indícios suficientes não pode alhear-se do mencionado princípio da presunção de inocência. Nesta linha de raciocínio, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 439/2002, de 23 de Outubro (D.R., II SÉRIE N.º 276, de 29 de Novembro de 2002), entendeu que «... a interpretação normativa dos artigos citados [286.º n.º1, 298.º e 308.º n.º1, do CPP] que exclui o princípio in dúbio pro reo da valoração da prova que subjaz à decisão de pronúncia reduz desproporcionada e injustificadamente as garantias de defesa, nomeadamente a presunção de inocência do arguido, previstas no art. 32.º n.°2, da Constituição». Assim, o juízo sobre a suficiência dos indícios, no contexto probatório em que se afirma, deverá passar pela bitola da probabilidade elevada ou particularmente qualificada, correspondente à formação de uma verdadeira convicção de probabilidade de condenação, que será aquela que, num juízo de prognose, exibir a potencialidade de vir a ultrapassar a barreira do in dúbio na fase do julgamento (sobre a questão do in dúbio e o conceito de indícios suficientes, cfr. Fernanda Palma, Acusação e pronúncia num direito processual penal de conflito entre a presunção de inocência e a realização da justiça punitiva, "I Congresso de Processo Penal", Almedina, 2005, pp. 125 e segs.; com interesse o acórdão da Relação de Évora, de 21.06.2011, processo 1273/08.6PCSTB-A.E1, relatado pelo Desemb. João Gomes de Sousa, em vvww.dgsi.pt). Em todo o caso, o referente da condenação respeita ao crime que é imputado e em relação ao qual o juízo de indiciação suficiente se reporta. 3.3.2-Importa questionar se, com base nos elementos de prova recolhidos nos autos, é de formular um juízo de probabilidade elevada de que, em julgamento, os arguidos venham a ser condenados pelos factos e incriminação legal imputados pela assistente. 3.3.2.1-Como já se disse, o crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva encontra-se previsto no artigo 187.º do Código Penal, estabelecendo este preceito legal que quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação, é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias. Este artigo faz uma remissão interna para o artigo 183.º (publicidade e calúnia) e para os números 1 e 2 do artigo 186º (dispensa de pena), ambos do Código Penal. O núcleo do bem jurídico que se quer proteger nesta incriminação prende-se, como ensina Faria Costa (Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, 2ª. edição, § 8 da anotação ao artigo 187.º, p. 782), com a "A ideia de bom nome" do sujeito passivo (que, desde a reforma de 2007, introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, é o organismo ou serviço que exerçam a autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação), bom nome que se assume «como uma realidade dual. De um lado, suporte indesmentível para que a credibilidade, o prestígio e a confiança possam existir. De outra banda, resultado dessas mesmas e precisas realidades ético-socialmente relevante». Acrescenta o mesmo autor que tudo isto «nos faz ter como ponto de referência, para a compreensão e determinação do bem jurídico em estudo a ideia de exterioridade. O que conta, neste contexto, é a imagem real que os "outros" têm da pessoa colectiva. O seu prestígio, credibilidade e confiança dependem muito da forma como a comunidade valora as actuações da pessoa colectiva ou instituição», acabando por concluir que é a «valoração que a comunidade faz da actuação» do sujeito passivo «que constitui a pedra angular para uma correcta e ajustada compreensão do bem jurídico em análise.» Trata-se de um bem jurídico complexo - «mais do que poliédrico, um bem jurídico heterogéneo», nas palavras de Faria Costa -, englobando a credibilidade, o prestígio e a confiança do organismo, serviço, pessoa colectiva, instituição ou corporação, cujo significado se identifica com o do seu bom nome. O crime em apreço é de mera atividade e de perigo (abstracto-concreto), bastando que a conduta/acção seja apta ou idónea a criar perigo para o bem jurídico protegido, pelo que a sua consumação não depende da verificação de um dano. O tipo objectivo deste crime preenche-se com a afirmação ou divulgação de "factos inverídicos", capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança, não abarcando a imputação de "juízos de valor" ofensivos, como sucede nos crimes de difamação e injúria. Facto é um acontecimento da vida real, inserido num tempo e espaço precisos ou determináveis. Quando emitem comentários ou opiniões relativos a um organismo, serviço ou pessoa colectiva, os mesmos não são susceptíveis de integrar o tipo de crime em análise. Ao não existir remissão expressa para o regime estatuído no artigo 182.º do Código Penal (que equipara, para efeitos de tipificação como crimes de difamação e injúrias, as ofensas verbais às feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão), entende Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Código Penal, 2008, p.509) que o tipo de crime em apreço supõe apenas ofensas verbais e não ofensas escritas. Diversamente, entendemos, em consonância com os acórdãos da Relação do Porto, de 11 de Setembro de 2013 e 20 de Novembro de 2013 (proferidos nos processos 4581/I0.2TAVNG.P1 e 5803/1 1.8TDPRT.P1, disponíveis em www.dgsi.pt), que a não remissão para o artigo 182.º não tem, a este respeito, qualquer significado, pois seria inútil. As expressões "afirmar" e "propalar" não incluem apenas expressões verbais, mas também escritas ("afirma-se" e "propala-se" de forma verbal e de forma escrita), pelo que o tipo de crime é preenchido independentemente da forma - oral ou escrita - pela qual os factos inverídicos sejam propalados. 3.3.2.2-Vejamos, então, os factos que a assistente imputa nos autos aos arguidos. No que concerne à entrevista publicada no dia ... de Abril de 20..., na "R..." suplemento do S... "Expresso", realizada pela arguida/recorrida CA... a LM..., então M...-A... e do D...R... do ... Governo Constitucional, referiu a entrevistadora, a dado passo. «Formação profissional sem impacto lembra-me logo a T..., do senhor P...-M... e do seu antecessor na pasta, MR.... A T... nunca deu formação profissional. Fxistiram muitas empresas fake, que apenas queriam sacar fundos». Após o que o entrevistado afirmou: «Os incentivos não garantiam a qualidade da formação. Fraude e sempre possível, mas Portugal tem dos melhores sistemas de controle reconhecidos pela UE. O problema não e esse, é a falta de qualidade do curso, mesmo tendo dinheiro. Estamos a planear de outro modo. O pagamento às empresas vai depender da taxa de empregabilidade que os formandos tenham no mercado». Integrando o objecto da acusação temos, igualmente, as afirmações do arguido JP..., proferidas no dia ... de Setembro de 20..., no programa semanal "Q...C...", transmitido no canal informativo da estação televisiva S...-Sociedade I... de C..., SA, da qual é comentador, e bem assim as publicações que subscreve (posts) no seu blogue pessoal, "Abrupto", em ... e ... de Outubro de 20..., ... de Dezembro de 20..., ... de Maio e ... de Outubro de 20..., que nos dispensamos de reproduzir por constar a sua reprodução no despacho recorrido, acima transcrito, sendo que, quanto às de ... e ... de Outubro de 20... e à de ... de Dezembro de 20..., já vimos não ter sido respeitado o prazo de exercício do direito de queixa. Como se diz na decisão recorrida, não se vislumbra que o arguido LM... tenha dito algo na entrevista citada que tenha a ver com a assistente. Realmente, na sequência do que lhe foi referido pela entrevistadora, o arguido limitou-se a tecer considerações genéricas, nada dizendo sobre a assistente, pelo que não se indicia a prática pelo mesmo de qualquer facto minimamente susceptível de preencher a tipicidade do crime que lhe foi imputado. No que concerne à arguida CA..., mais do que a afirmação de factos "inverídicos", estamos, em substância das coisas, perante uma valoração, certamente negativa, sobre a actividade da assistente, mas que se insere no âmbito da liberdade de expressão da referida arguida. O mesmo podemos dizer dos comentários e afirmações do arguido JP..., no programa "Q... C..." ou inseridos no seu blogue "pessoal "Abrupto" (mesmo os três primeiros, em que o prazo para exercício do direito de queixa foi excedido). Em essência, o arguido, em todos eles, comenta as relações de proximidade entre a assistente e o poder político, o acesso a dinheiros públicos facilitado por essas relações, admitindo que tudo pudesse ter sido feito de modo legal e sem incidência criminal, mas ainda assim ajuizando muito negativamente sobre essas conexões e sobre o mérito das actividades desenvolvidas pela assistente. Os arguidos CA... e JP... proferiram as afirmações mencionadas na acusação particular num determinado contexto: em espaços destinados à formação da opinião pública e abordando factos trazidos previamente ao conhecimento público e comentados em diversos órgãos de comunicação social. Como já se disse, encontramo-nos, em substância das coisas, perante juízos de valoração e não tanto perante a afirmação de factos. Tais juízos, comentários ou opiniões, podendo ser muito desagradáveis e até ofensivos para a assistente, foram proferidos no âmbito da liberdade de expressão dos arguidos, não tendo relevância no âmbito do tipo legal de crime imputado. Como se lê na decisão instrutória de não pronúncia, «tendo em conta o contexto em que a prática de tais factos se insere, ou seja as notícias que sobre os factos mencionados tinham sido anteriormente publicadas nos diversos órgãos de comunicação social, bem como as interrogações que as práticas referidas pelos arguidos, nos citados artigos e entrevista, levantavam na sociedade portuguesa, numa conjuntura de "crise", designadamente de "crise económica" em que se procurava justificação para o descalabro económico e crise em que se vivia, o referido pelos arguidos configura o exercício do direito de liberdade de expressão.» Recordemos que a Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (vulgarmente designada Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que também designaremos de C.E.D.H.) vincula o Estado português na ordem jurídica interna e na ordem jurídica internacional, devendo ser aplicada, de harmonia com o artigo 8.º da Constituição da República, enquanto direito interno de origem convencional e, por isso, com valor que, sendo infraconstitucional, não deixa de ser supralegal, ou seja, superior ao direito ordinário português ("A Convenção Europeia dos Direitos do Homem, anotada" de Irineu Cabral Barreto, Coimbra Editora, 3.ª edição, p. 31-32). A liberdade de expressão é um valor que assume a dignidade constitucional conferida pelo artigo 37.º da Constituição da República. Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume 1, 4ª. edição revista, p. 572), o direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento é, desde logo e em primeiro lugar, a liberdade de expressão, isto é, o direito de não ser impedido de exprimir-se e de divulgar ideias e opiniões. Neste sentido, enquanto direito negativo ou direito de defesa, a liberdade de expressão é uma componente da clássica liberdade de pensamento, que tem outras dimensões na liberdade de criação cultural (artigo 42.º), na liberdade de consciência e de culto (artigo 41.º), na liberdade de aprender e ensinar (artigo 43.º) e, em certa medida, na liberdade de reunião e manifestação (artigo 45.º). Tais direitos não podem ser sujeitos a impedimentos nem discriminações (n.º 1, in fine) ou seja, dentro dos limites do direito (expressos ou implícitos), não pode haver obstáculos ao seu exercício e, fora as exclusões constitucionalmente admitidas, todos gozam dele em pé de igualdade, o que exclui qualquer «delito de opinião». A liberdade de opinião e de expressão são indissociáveis: a primeira é a liberdade de escolher a sua verdade no segredo do pensamento; a segunda é a liberdade de revelar a outrem o seu pensamento. São liberdades que carecem uma da outra para se desenvolverem e se expandirem. Ao artigo 37.º da Constituição da República corresponde normativamente o artigo 10.º, n.º 1, da C.E.D.H. A liberdade de expressão, segundo a jurisprudência do T.E.D.H., constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática, o que vale mesmo para as ideias que ferem, chocam ou inquietam; e qualquer restrição a essa liberdade só é admissível se for proporcionada ao objectivo legítimo protegido. Aceitando-se que a liberdade de expressão não significa um exercício sem quaisquer limites, alheio à possibilidade de colisão com outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, entendemos que a ponderação dos valores que se mostrem conflituantes não pode prescindir dos parâmetros da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da abundante jurisprudência a que tem dado origem. Ora, o que essa jurisprudência tem afirmado, repetidamente, é que no campo da luta e discurso político ou em questões que sejam de interesse geral "pouco espaço há para as restrições à liberdade de expressão", prevalecendo, no geral, neste campo, como direito maior, a liberdade de expressão, pela sua essencialidade democrática. Quer isto dizer que, em matérias de interesse geral ou de combate político, a prevalência valorativa deve claramente pender a favor da liberdade de expressão (com interesse, o acórdão da Relação de Évora, de 1 de Julho de 2014, processo n.° 53/11.6TAEZ.E2). No caso em apreço, como já se realçou, as conexões da assistente com determinados agentes políticos, o acesso da mesma a dinheiros públicos e a natureza (e real mérito) das suas actividades suscitaram o interesse de diversos órgãos de comunicação social e causaram dúvidas e interrogações. Nesse contexto, os comentários opinativos dos arguidos CA... e JP... não são mais do que isso mesmo: comentários e juízos expressos de forma vigorosa, reconhecidamente desagradáveis para a assistente, mas ainda assim inseridos nos campos do agir social em que é maior a tutela da liberdade de expressão. Neste quadro, não se vislumbra que as condutas dos arguidos preencham os elementos tipificadores do crime imputado e, não obstante se compreenda o desconforto e desagrado da assistente perante as opiniões, juízos e comentários proferidos por aqueles, certo é que a matéria dos autos não sustenta a formulação de acusação pelo crime que a assistente imputa aos arguidos. Subscrevendo-se, assim, a fundamentação expendida na decisão recorrida, conclui-se não haver indiciação suficiente da prática do crime em causa, já que os elementos dos autos não permitem formular um juízo de probabilidade, predominante ou qualificada, de condenação dos arguidos. Em consequência, o recurso não merece provimento. III—Dispositivo: Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UCs. Lisboa, 05 Abril de 2016 Jorge Gonçalves Maria José Machado
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