Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS ESPÍRITO SANTO | ||
Descritores: | EXPULSÃO DE ESTRANGEIRO REINSERÇÃO SOCIAL CONTRADIÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/08/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | 1.A aplicação da pena acessória de expulsão do território nacional está enformada por uma vertente de protecção da paz social e do ordenamento jurídico nacional que contende somente com critérios de prevenção geral positiva, tendo em conta o grau de violação dos bens jurídicos protegidos, embora não descure a situação pessoal do arguido ao atender às suas raízes e ligação à comunidade nacional. 2.Assim, não se antolha qualquer contradição ou desnecessidade na aplicação sucessiva da pena de prisão efectiva e da expulsão do território nacional, dado que a ressocialização do delinquente se realiza somente através daquela primeira sanção. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa. I-Relatório: * No âmbito do Processo Comum Colectivo supra id., que corre termos na Comarca de Lisboa – Instância ... – ...ª Secção Criminal – J ..., foi o arguido Rafael ..., com os demais sinais dos autos, condenado, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21°, n° 1, do D.L 15/93 de 22/01, na pena quatro anos e três meses de prisão. Inconformado com o teor de tal decisão interpôs aquele arguido o presente recurso pedindo a suspensão da execução da pena que lhe foi aplicada. Apresentou para tal as seguintes conclusões: O acórdão afastou a hipótese de suspender a pena, de acordo com o disposto no art.° 50 do CP. A prevenção geral, neste caso em concreto, não se atinge com um enclausuramento do recorrente durante quatro anos e três meses numa prisão, e depois expulsar o arguido para o seu país de origem, que, inexistem, conforme conclui o Douto Tribunal de que ora se recorre, quaisquer exigências a nível de prevenção especial, pois tendo em conta que a pena deve ter uma finalidade preventiva e não uma finalidade repressiva, a pena de prisão efectiva aplicada ao ora recorrente é destituída de sentido, violando assim os artigos 70.° e 40° do CP. Deveria portanto ser suspensa na sua execução a pena aplicada cuja medida o arguido não contesta, não o fazendo, não parece à defesa que o acórdão tenha neste caso concreto, acautelado os princípios pelos quais se aplica uma pena. Até porque como se disse, não deve ser o tribunal a aplicar as políticas de prevenção e combate ao tráfico de droga, mas sim a aplicar a lei, e nesses termos a mesma permite a suspensão da execução, nos termos já enunciados. As finalidades da punição devem ser a tutela dos bens jurídicos e a reinserção social do arguido. O arguido encontra-se plenamente inserido, quer socialmente, quer familiarmente, tem nacionalidade portuguesa, vive em casa arrendada que partilha com amigos. O arguido já tem já a noção dos aspectos negativos que a prisão pode trazer, pois está detido desde junho de 2015. O arguido confessou a prática do crime sem reservas, e com total colaboração com o tribunal. 9)O arguido reconhece a ilicitude da sua conduta, e não contesta a medida da pena, apenas não concorda com a sua não suspensão. pena, apenas não concorda com a sua não suspensão. Não se conforma o arguido com a não aplicação do regime da suspensão da execução da pena de prisão; A situação actual do arguido demandava solução diversa, pois o arguido tem a sanção de expulsão do território nacional, e não fará sentido a ressocialização e depois a expulsão. Face a todo o supra exposto, deverá a pena aplicada ser suspensa na sua execução, ser o arguido libertado e conduzido às autoridades competentes para o seu repatriamento. Respondeu o MP, pugnando pela improcedência do recurso nos seguintes termos: O Ministério Público concorda na íntegra com o douto acórdão proferido, nomeadamente com a fixação da matéria de facto efectuada pelo tribunal, considerando estar aquele devidamente fundamentado e ter feito correto enquadramento jurídico dos factos. Alega o arguido que não se conforma com a não aplicação do regime da suspensão da execução da pena de prisão, não tendo o Tribunal ponderado devidamente a sua situação actual, as circunstâncias da prática dos factos, o seu registo criminal. Ora, salvo melhor opinião, cremos não ter o recorrente razão no alegado em sede de recurso, como procuraremos demonstrar. A conduta do arguido integra a previsão normativa do art.° 21° do DL 15/93, de 22.01. Tal crime é punível com pena de prisão de 4 a 12 anos. Como se pode constatar o Tribunal aplicou ao arguido uma pena ligeiramente superior ao limite mínimo da pena abstractamente aplicável. Perante o quadro fáctico descrito pela decisão recorrida não foi excessivamente dura a pena aplicada em concreto. O Tribunal limitou-se, afinal, a graduar a sanção em quantum muito próximo do mínimo legal, ou seja, numa moldura de 4 a 12 anos, optou-se por um período de 4 anos e 3 meses. Parece-nos, pois, que o Colectivo fez correcta interpretação dos critérios contidos nas disposições conjugadas dos art°s 40° n°l, 71° n°s 1 e 2 do C.Penal. Atendeu-se, cremos, à vantagem da reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade, sem esquecer, porém, que a pena deve visar também, de forma equilibrada, a protecção dos bens jurídicos e a prevenção geral e especial, neste caso particularmente relevante. As fortes exigências de prevenção, a gravidade da actuação do arguido, o meio que utilizou e o dolo com que actuou tinham, obviamente, em conformidade e de acordo com os critérios acima referidos, de ser traduzidos em pena correspondente à medida da sua culpa, o que o Tribunal recorrido conseguiu de forma justa, e com respeito pelas finalidades visadas pela punição. Não pode esquecer-se, porém, que o arguido detinha quantidade considerável de estupefaciente (cocaína) que se destinava a ser comercializado e que, uma vez cortado, abasteceria decerto muitas centenas de consumidores, manifestando, assim, elevada insensibilidade pelo destino de tantos jovens e pela saúde pública em geral e pela vaga de crimes contra o património e contra as pessoas que tanto alarme social causa aos demais cidadãos. O Tribunal Colectivo, e a nosso ver bem, não suspendeu a execução daquela pena de prisão como pretende o arguido. Nos termos do disposto no art.° 50°, n°l do Código Penal," O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição". Assim, a suspensão da aplicação da pena, apenas terá lugar quando se verifiquem cumulativamente duas circunstâncias: 1°-Que o Tribunal se convença de que a ameaça da pena evitará a repetição de condutas delituosas futuras, atendendo: A personalidade do arguido; Às suas condições de vida; Às circunstâncias do facto punível. 2°-Que a suspensão da execução da pena não coloque irremediavelmente em causa a tutela dos bens jurídicos e não contenda com o sentimento de reprovação social do crime e com a confiança da comunidade nas instâncias judiciais. Como refere Figueiredo Dias " pressuposto material da aplicação do instituto é que o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente: que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastar o delinquente da criminalidade". Para tal, " o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto". Contudo," apesar da conclusão do Tribunal por um prognóstico favorável, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (...) Estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita sempre o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto ora em análise". Ou seja, as considerações de prevenção especial de socialização têm sempre por limite considerações de prevenção geral positiva impostas pela defesa do ordenamento jurídico, sendo que " desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias". Mesmo sem fazer referência às exigências de prevenção geral a que acima se alude, sob a forma de conteúdo mínimo de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, considera-se que não estão sequer reunidos no caso em apreço os pressupostos atinentes à personalidade, circunstâncias do delito, comportamento do arguido após a prática do facto ilícito e circunstâncias da sua vida, que justificassem a aplicação de uma pena de substituição da prisão decretada. Os factos provados e atinentes à personalidade, condições de vida, e comportamento do arguido após a prática do delito, não assumem qualquer relevo para fundamentarem um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena, na vertente da prevenção especial e, bem pelo contrário, desaconselham totalmente a sua aplicação. Mas, mesmo que se entendesse que tais razões eram ponderosas do ponto de vista da prevenção especial de socialização nunca o seriam do ponto de vista da prevenção geral, já que a suspensão da execução da pena a um traficante de droga - ainda que mero detentor - ofende, inegavelmente, a imperatividade da defesa do Ordenamento Jurídico. O tráfico de estupefacientes é um flagelo das sociedades hodiernas sendo responsável, directa ou indirectamente, pela morte de milhares de pessoas, atingindo muitas outras na sua integridade física pelas sequelas, físicas e psíquicas, permanentes e irreversíveis, que o seu consumo ocasiona. Tal tipo de crime alarma ainda a sociedade por ser fracturante da organização familiar, estar associado à ruptura do tecido social e à crescente criminalidade contra o património. A tipificação de tal crime visa pois proteger a vida e a integridade física das pessoas, a liberdade individual, a sua capacidade de autodeterminação, a estabilidade e harmonia familiar e social e mesmo a economia dos Estados, afectadas por negócios paralelos e subterrâneos levados a cabo por verdadeiras redes tentaculares e com forte carácter organizado. A gravidade e aumento de crimes associados à droga, bem como a morbilidade e a mortalidade ligadas ao consumo de estupefacientes e que afectam um número considerável de cidadãos europeus determinou que o Conselho Europeu aprovasse, em Dezembro de 2004, uma estratégia anti-droga para a União Europeia, para o período de 2005-2012, visando, designadamente, "assegurar um nível elevado de segurança dos cidadãos comunitários, adoptando medidas de luta contra a produção de droga e o tráfico internacional, reforçando os mecanismos de coordenação, intensificando as acções preventivas contra a criminalidade ligadas à droga". O aumento de tal tipo de crimes, a sua maior visibilidade e dimensão, fez crescer o sentimento de reprovação social das actividades ligadas ao tráfico de estupefacientes e a necessidade sentida de uma maior e mais eficaz protecção. Tal impõe que a repressão de tais actividades seja energética e firme por forma a não defraudar as expectativas e confiança dos cidadãos na eficácia do sistema jurídico e na lei enquanto instrumentos de protecção de interesses individuais e colectivos. Assim e ainda que se mostrasse razoável um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena, na vertente da prevenção especial, o que não se concede, "sempre esta seria de rejeitar por a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias", como vem sendo entendimento uniforme do Supremo Tribunal de justiça. Por todo o exposto, o douto acórdão recorrido não merece qualquer censura porque fez correta aplicação do direito à matéria de facto provada, nem violou qualquer disposição legal, designadamente as indicadas pelo recorrente, optou pela aplicação ao arguido/recorrente de pena que se mostra adequada, atentas as circunstâncias que se verificam no caso concreto, seguindo os critérios legais, pelo que deve ser mantido nos seus precisos termos. É o seguinte o teor do acórdão recorrido, na parte que ora releva: 2.Fundamentação. 2.1.Matéria de facto provada. No dia 26 de Junho de 2015, cerca das 12h, o arguido chegou ao Aeroporto Internacional de Lisboa, no voo TP072, procedente do Rio de Janeiro, no Brasil, com paragem em Lisboa e destino finai Zurique, Suiça. Submetido aos regulares controlos alfandegários, trazia no interior de calções pretos de Hera que o arguido vestia, na zona das nádegas, duas embalagens contendo cocaína o peso líquido de 1981,887 gramas. Mais trazia consigo: 1000 (mil dólares norte americanos), correspondentes ao adiantamento de despesas para fazer o transporte; um telemóvel de marca Blu, de cor azul, de sua pertença com cartão inserido da operadora Tim e com a sua bateria incorporada para ser conta para o qual seria contatado; Um cartão de embarque referente ao voo P926, com data de 26 de Junho de 2015, em nome do arguido, de Lisboa para a Suíça-Zurique que seria o destino da cocaína que trazia consigo; Uma etiqueta de bagagem, referente ao voo TP72, com data de 25 de Junho de 2015, em nome do arguido, do Rio de Janeiro para Lisboa; Um voucher constituído por três folhas, da empresa ... Assistance, em nome do arguido; Um E-Ticket, em nome do arguido, com data de 25/06/2015, da operadora TAM, com origem em Foz do Iguaçu e destino o Rio de Janeiro; Um documento de reserva de hotel IBIS, em Zurique, onde iriam ter consigo para receberem a cocaína. O telemóvel que o arguido detinha, destinava-se a permitir contactar e a ser contactado pelos ulteriores destinatários da cocaína. Todos os documentos, quantia monetária e objetos apreendidos, foram utilizados pelo arguido, para concretização da Viagem para transportar a cocaína e destinavam-se a este transporte de estupefaciente. O arguido tinha conhecimento de que transportava consigo cocaína e estava ciente da natureza e características estupefacientes dessa substância. Agiu com o único intuito de auferir proventos pecuniários. Atuou deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei. Confessou os fatos e mostrou-se arrependido. Condições pessoais do arguido: Filho de pai separado, com dois anos, foi entregue aos cuidados da avó paterna onde o pai e as tias também viviam. O pai era tecelão com alguns problemas de alcoolismo com alguma instabilidade na dinâmica familiar mas esta situação não impediu que o arguido recebesse educação e transmissão de valores normativos, proporcionando-lhe uma condição económica sustentável. Ainda viveu três anos com a mãe depois de esta ter construído novo agregado familiar. Concluiu o 9º ano de escolaridade e depois começou a sua atividade profissional como cobrador numa empresa de transportes públicos e posteriormente realizou vários trabalhos indiferenciados e esporádicos em fábricas em várias áreas. Sempre esteve inserido laboralmente mas com contratos instáveis. Tem um passado de consumo de estupefacientes canábis e cocaína e fez vários tratamentos de desintoxicação em instituições destinadas ao efeito. Teve um casamento com 29 anos e separou-se cerca de dois anos depois. No período que antecedeu os factos estava em situação instável pernoitando num quarto, realizava trabalhos de hospedagem confrontando-se com dificuldades sócio económicas mantendo consumos de cocaína. -Beneficia do apoio afetivo da mãe com quem contata telefonicamente, conseguindo algum pecúlio através de trabalhos que efetua para reclusos. Apresenta como projeto de vida regressar casa da mãe que vive com um companheiro e sua irmã em que o pai e padrasto com sustentabilidade económica trabalham numa pequena empresa de construção civil do pai e projeta ter emprego numa fábrica de abate de suínos como auxiliar de produção. O arguido não tem quaisquer familiares, amigos ou emprego em Portugal. Onde apenas se deslocou em trânsito para prosseguir para Zurique para entregar a cocaína apreendida. No estabelecimento prisional, onde se encontra pela primeira vez tem revelado uma atitude consentânea com as normas e regras instituídas Não tem antecedentes criminais conhecidos. * 3.Motivação da decisão de facto: Nos termos do disposto no art. 374° n° 2 do C. P. Penal, o Tribunal deve indicar os motivos de facto e de direito que fundamentam a sua decisão, com indicação das provas que serviram para formar a sua convicção. Em sede de valoração da prova, a regra primacial é a constante do art. 127° do mesmo Código segundo a qual a prova é apreciada "segundo as regras da experiência e a livre convicção do Tribunal". Tal como explica o Dr. Carlos Matias em artigo na revista "Sub Júdice", n° 4, pag. 148. Este princípio da livre apreciação da prova traduz-se na ideia de que "o Tribunal baseia a sua decisão sobre a realidade de um facto na íntima convicção que formou a partir do exame e da ponderação das provas produzidas." Para a formação da nossa convicção ponderaram-se conjuntamente os seguintes elementos: No que respeita à matéria de facto constante da acusação e dada como provada teve-se em consideração o teor do Auto de Apreensão de fls. 12 dos autos; o teor dos documentos fotográficos de fls. 18 e 19, os documentos de fls. 13 e 17, referentes ao modo como vinha acondicionada a cocaína descrito nos fatos assentes e aos objetos, quantia monetária e documentos que lhe foram apreendidos. Prova pericial de fls. 81 - Exame de Toxicologia Forense. Conjugadamente, as declarações do arguido, que confessou integralmente e sem quaisquer reservas a matéria de facto dada como provada e constante da acusação esclareceu que o telemóvel era seu mas não afastou, antes pelo contrário que serviria para conatos eventuais até à entrega do produto estupefaciente, confissão esta que nos convenceu por ter sido prestada por forma lógica e coerente, sobretudo quando conjugada com os demais elementos probatórios acima referidos. Quanto à matéria atinente à motivação à para a prática dos factos ilícitos e às condições de vida do arguido teve-se em conta as declarações do próprio. Com particular relevo também se teve em consideração o relatório social junto aos autos que descreve a situação pessoal do arguido. Relativamente aos antecedentes criminais do arguido atendeu-se ao teor do C.R.C. Assim, a matéria de facto dada como provada teve por fundamento a análise conjugada e crítica dos elementos probatórios acima referidos, conjugados com razões de experiência comum. …………………………………………… 5.Da medida da pena: Feito pela forma descrita o enquadramento jurídico que antecede, importa agora determinar a medida e natureza da sanção a aplicar. Conforme ensina o Prof. Figueiredo Dias (Direito Penal, pag. 229), a determinação definitiva da pena é alcançada através de um procedimento que decorre em três fases distintas: na primeira investiga-se e determina-se a moldura penal (medida abstrata da pena) aplicável ao caso; na segunda investiga-se e determina-se a medida concreta (dita também individual ou judicial); na terceira escolhe-se (de entre as penas postas à disposição pelo legislador e através dos mecanismos das penas alternativas ou das penas de substituição) a espécie de pena que, efetivamente deve ser cumprida. O crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos art°s 21°, n° 1, do D.L. 15/93, de 22/01, é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos. A fixação da respetiva medida concreta da pena far-se-á nos termos equacionados no art.° 71°, n° 1, do C.P., ou seja, em função da culpa do agente, que constitui limite inultrapassável (traduzindo-se, assim, num princípio fundamental do Estado de Direito - Sousa Brito, A Medida da Pena no Novo Código Penai, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, pag. 560), tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes (vide também Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, pag. 198; Robalo Cordeiro, Escolha e Medida da Pena, in Jornadas de Direito Criminal, pag. 269; Manso-Preto, Moldura penal Abstracta, Pena Concreta, Escolha da Pena, pag. 162). Por outro lado, como dispõe o n° 2 do referido preceito, deverão ainda ser consideradas todas as circunstâncias gerais que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente, em particular o grau da ilicitude do facto, a intensidade do dolo e a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime, bem como as suas condições pessoais e a sua situação económica. No que respeita ao crime de tráfico de estupefacientes, é desde logo evidente que este tipo de ilícito reclama acrescidas exigências de prevenção geral. No entanto, o legislador já previu especialmente este fator de ordem social ao agravar substancialmente as molduras penais para as várias espécies de tráfico de estupefacientes, pelo que entendemos não dever ponderar especialmente este aspeto nesta sede. Começando pelo grau de ilicitude do facto típico praticado pelo arguido, entendemos que ela se situa num grau médio, tendo em conta, designadamente, o seu modo de atuação e a natureza do produto estupefaciente por ele transportado e detido (cocaína), sendo precisamente das mais perigosas e com fortíssimo poder aditivo no plano psíquico, fonte de ampla criminalidade direta e indireta. Por outro lado, há que ter em conta a quantidade de cocaína apreendida a este, que não pode dizer-se elevada, em termos comparativos a outras decisões que temos proferido. E deve ter-se em conta que esta quantidade de cocaína transportada, se colocada no mercado, infalivelmente iria contribuir para aniquilar a saúde de muitos consumidores - sendo certo que, devido à apreensão efetuada, os malefícios do crime não chegaram a verificar-se - art° 71°, n°2, al. a) do CP. Quanto à modalidade da ação, há que ponderar que o arguido não era o dono do negócio, mas um simples "correio". Damos aqui por reproduzidas as considerações acima feitas quanto à gravidade objetiva da atuação dos "correios", contribuindo para a escalada crescente do tráfico internacional de estupefacientes. Face aos contornos específicos do presente caso, há ainda que ponderar especialmente - tal como foi referido recentemente pelo S.T.J. - que "a frequência com que a cocaína provinda destes países é introduzida na Europa por intermédio de "correios" exige das instâncias jurisdicionais de controlo uma resposta minimamente dissuasora." Não obstante estas considerações, cumpre ter em conta que o arguido, como "correio", não seria seguramente quem mais lucraria com a disseminação do produto estupefaciente. No que diz respeito à intensidade do dolo, ao atuar como atuou, o arguido representou os factos que preenchem o tipo de crime previsto no art.° 21°, n° 1, do D.L 15/93, de 22/01. Quis introduzir estupefaciente na Europa, sabendo que tal ação era contrária à lei. Atuou, pois, com dolo direto, sendo, nessa medida, particularmente intensa a sua vontade criminosa.[1] - art° 71°, n°2, al b) do CP. No que respeita à motivação do crime, há que ponderar que o arguido procedeu pela forma dada como provada exclusivamente com o intuito de receber uma certa quantia monetária, traduzido em remuneração inerente à sua provada conduta como "correio". - art° 71, n°2, al.c) do CP. E beneficia-o a circunstância de o arguido ter agido desta forma porque necessitava do dinheiro, atenta a situação de desemprego e as rendas em atraso -art°71°, n°2, al.c) do CP. Mais beneficia o arguido o facto de este ter confessado integralmente os factos constantes da acusação com arrependimento - 71°, n°2, al. e) do CP. No entanto, o valor desta conduta não é muito significativo. Como se vê do relato da matéria de facto provada, o arguido foi surpreendido pela polícia com a droga apreendida. Dentro deste contexto, a sua confissão foi uma consequência natural e necessária de ter sido encontrada o estupefaciente na sua posse. Beneficia igualmente o arguido a circunstância de este não ter antecedentes criminais conhecidos. As exigências de prevenção geral são elevadas neste sector de criminalidade. As necessidades de prevenção especial são medianas, atenta a sua inserção familiar e a ausência de antecedentes criminais. Beneficia de apoio familiar. Ponderadas as referidas circunstâncias, entende o tribunal adequado punir o arguido pela prática do crime de tráfico de estupefacientes dos autos com uma pena de quatro anos e três meses de prisão. * 5.1.Da suspensão da execução da pena de prisão: Nos termos do disposto no art. 50.° do C.P., o Tribunal suspende a execução aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de punição. Quanto aos demais pressupostos ínsitos na norma, vem sendo sustentado pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que o pressuposto material da suspensão da execução da pena é limitado por duas coordenadas: a salvaguarda das exigências mínimas essenciais de defesa do ordenamento jurídico (prevenção geral) e o afastamento do agente da criminalidade (prevenção especial), sendo indispensável que o Tribunal possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido, assente numa expectativa fundada de que a simples ameaça de prisão seja suficiente para realizar as finalidades da punição. Além disso, não são considerações de culpa que interferem na decisão sobre a execução da pena, mas apenas razões ligadas às finalidades preventivas da punição. Ora, a propósito dos vulgarmente apelidados "correios de droga" vem o STJ perfilhando jurisprudência no sentido de que estes são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes concorrendo, de modo direto, para a sua disseminação, não merecendo um tratamento penal de favor. De facto, toma-se mais difícil a sua detenção e apreensão, não se deixando contra motivar pelas consequência perniciosas do seu ato, demonstrando arrojo, audácia e dolo intenso, insensibilidade e ganância, porquanto, a troco de uma compensação, se dispõem a fazer o transporte da droga até ao local da sua entrega, apesar de saberem da ilegalidade desse transporte[2]. Em idêntico sentido, também o Acórdão da Relação de Lisboa cujo sumário se reproduz, na íntegra, por corresponder ao nosso entendimento: 1-"O chamado "correio de droga" é uma peça importante no mercado de estupefacientes. É através dele que, a determinado nível claro está, se processa a circulação dos estupefacientes sendo, por conseguinte, peça relevante no acesso às drogas pela generalidade dos consumidores. É ele que assume um papel intermédio no circuito de distribuição, contribuindo de forma determinante para a difusão alargada de drogas tal como hoje ela se faz. Os chamados "grande e médios traficantes" precisam de montar o seu circuito de distribuição para levar a cabo o seu objetivo e dele fazem parte, não sendo dispensáveis, tanto os "correios" como os "dealers de rua". Sem embargo de, no domínio da culpa, a sua posição poder ser muito mais diversificada, ao nível da ilicitude não se afigura correta a ideia que se pretende ver aceite pelo chamado senso comum de que o "correio" ou mesmo o "dealerde rua" são sempre figuras secundárias no negócio dos estupefacientes. A suspensão da execução da pena nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes, em que não se verifiquem razões muito ponderosas, que no caso se não postulam, seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral." Assim, atentas as elevadas necessidades de prevenção geral e pelas razões acima explanadas, decide-se não suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido. 7.Sanção acessória de expulsão: Como vimos, o Ministério Público pede que seja decretada a expulsão do arguido do território nacional, em conformidade com os art°s 134°, n°1, ais. a) e b), 140° e 15l0,n°1, da Lei 23/2007. de 4/07 e 34°, n° 1, do D.L. 15/93, de 22/01. Vejamos: Nos termos do art° 34°, n° 1, do D.L. 15/93, de 22/01, em caso de condenação por crime previsto no referido diploma, se o arguido for estrangeiro, o tribunal pode ordenar a sua expulsão do país por período não superior a 10 anos. Por sua vez, estabelece o art° 151°, n°1 da Lei 23/2007, que a pena acessória de expulsão pode ser aplicada a cidadão estrangeiro não residente no país, condenado por crime doloso em pena superior a 6 meses de prisão efetiva ou com pena de muita em alternativa à pena de prisão superior a 6 meses. Esta lei foi alterada pela Lei n.° 29/2012 de 9 de Agosto passando o artigo 151.° a ter a seguinte redação: "1—A pena acessória de expulsão pode ser aplicada ao cidadão estrangeiro não residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a seis meses de prisão efetiva ou em pena de multa em alternativa à pena de prisão superior a seis meses igual ou inferior a cinco anos de prisão e desde que esteja assegurado o cumprimento do remanescente da pena no país de destino". Por seu turno, o art° 144° da referida Nova Lei refere que o período pode ser até cinco anos. Conforme já se referiu este tipo de crime atenta contra a saúde pública. O arguido foi condenado por crime doloso em pena efetiva de quatro anos e três meses de prisão. Pelo que se afigura justa adequada e proporcional a aplicação da sanção acessória de expulsão pelo período de quatro anos e três meses. …………………………………………………… 7.Decisão. Nestes termos, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, nos termos expostos, e, em consequência, condena-se o arguido Rafael ..., pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21°, n° 1, do D.L 15/93 de 22/01, em conjugação com art. 4º, do D.L 401/82, de 23 de Setembro, na pena quatro anos e três meses de prisão. Em não suspender a execução da pena aplicada. Mais vai condenado na sanção acessória de expulsão pelo período de quatro anos e três meses. A Digna PGA junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência. O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões, é: saber se deve ser suspensa a pena de prisão aplicada ao recorrente. * Insurge-se o arguido contra a não suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada pelo tribunal a quo, entendendo que não decorrem quaisquer exigências de prevenção especial por estarmos perante indivíduo socialmente inserido, que interiorizou os aspectos negativos da sua conduta e confessou os factos, para além de que lhe parece não fazer sentido a ressocialização seguida de expulsão do território nacional. Encontra-se assente que: No dia 26 de Junho de 2015, cerca das 12h, o arguido chegou ao Aeroporto Internacional de Lisboa, no voo TP072, procedente do Rio de Janeiro, no Brasil, com paragem em Lisboa e destino final Zurique, Suiça. Submetido aos regulares controlos alfandegários, trazia no interior de calções pretos de Hera que o arguido vestia, na zona das nádegas, duas embalagens contendo cocaína o peso líquido de 1981,887 gramas. O arguido tinha conhecimento de que transportava consigo cocaína e estava ciente da natureza e características estupefacientes dessa substância. Agiu com o único intuito de auferir proventos pecuniários. Atuou deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei. A conduta do arguido reflecte a prática de um crime de tráfico de estupefacientes com um considerável grau de desvalor objectivo (e subjectivo) traduzido na natureza, características (cocaína) e quantidade da droga transportada, a sua finalidade e modo sofisticado de actuação. Relativamente às necessidades de prevenção especial, pode afirmar-se que relevantemente se apurou que o recorrente para além de ter confessado os factos, se mostrou arrependido, não tem antecedentes criminais conhecidos, agiu num quadro de necessidade económica por se encontrar desempregado, está socialmente inserido e interiorizou o desvalor da sua conduta. Assim, no domínio da prevenção especial, se a personalidade do arguido e o seu comportamento anterior e posterior ao crime não sejam de molde a perspectivar uma elevada desconfiança quanto ao comportamento futuro, já o mesmo não se pode concluir em face das suas actuais condições de vida (de precaridade económica e financeira e das circunstâncias e motivos determinantes da prática do crime. Entendemos, assim, que as necessidades de prevenção especial resultam medianas. Porém, como salienta Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1ª ed., pgs. 501 e 516 a 520, as considerações de prevenção especial de socialização têm sempre por limite considerações de prevenção geral positiva impostas pela defesa do ordenamento jurídico. Assim, desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias. Assim, em sede de prevenção geral, relevam particulares preocupações com a inusitada frequência deste tipo de crime com consequências deveras perniciosas para a saúde pública e a paz social, encontrando-se a sociedade particularmente atenta às decisões judiciais no que toca ao tipo de crime em causa, com reflexos directos no prestigio das instituições e na confiança dos cidadãos nas mesmas. Destarte, a propósito dos denominados correios de droga ,vem-se alertando precisamente para a circunstância de Portugal se ter tornado, atenta a sua situação geográfica, numa placa giratória para o tráfico de drogas. De acordo com o art. 50º, 1, C. Pen., a suspensão da execução da pena, para além da consideração da situação e das condições pessoais do agente, não pode contender com a realização adequada das finalidades da punição. Ora, uma das finalidades da punição é precisamente a protecção dos bens jurídicos, ou seja, a prevenção geral do tipo de crime (art. 40º, 1, C. Pen.) e, consabidamente, os de tráfico de estupefacientes, vêm constituindo um factor de enorme insegurança e alarme social, impondo-se prementemente o seu desencorajamento e a afirmação ante a comunidade da eficácia do ordenamento jurídico-penal ante as situações em apreço, nomeadamente, no que tange aos denominados “correios de droga”, largamente utilizados hodiernamente, sendo certo que o comércio ilícito de estupefacientes deve continuar a ser objecto de grave repressão, não só ético-moral como também jurídica, atentos os manifestos danos causados no tecido e na harmonia social. Relativamente às necessidades de prevenção especial, elas afiguram-se in casu, como se disse, medianas, pelos motivos supra apontados. Contudo, as necessidades de prevenção geral deste tipo de ilícito, em face da argumentação acima aduzida, tornam deveras limitadas as possibilidades de aplicação do instituto em causa, atenta a proliferação de situações como a presente e as mencionadas expectativas contrafácticas. Ora, como acima se aludiu, o art. 50º, C. Pen., para além de exigir formalmente que a pena aplicada não seja superior a 5 anos de prisão, impõe também que se atenda à personalidade do agente, às suas condições de vida e conduta anterior e posterior ao crime, implicando a formulação de um juízo de prognose positivo, no sentido de se concluir que simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Como se alude no Ac. desta Relação, de 3-4-08, Proc. nº 1515/08-9, em www.dgsi.pt “ a actuação do recorrente como “correio de droga”, transportando uma quantidade significativa de cocaína, induz um acréscimo de razões de prevenção geral de intimidação. Assim, a efectiva execução da pena de prisão, neste caso, mostra-se indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização das expectativas comunitárias. Ou, como se afirma no Ac. desta Secção, Proc. nº 1742/08-5 (Des. Nuno Gomes da Silva), in www.dgsi.pt., “ o chamado correio de droga é uma peça importante no mercado de estupefacientes. É através dele que, a determinado nível se processa a circulação dos estupefacientes sendo, por conseguinte, peça relevante no acesso às drogas pela generalidade dos consumidores. É ele que assume um papel intermédio no circuito de distribuição contribuindo de forma determinante para a difusão alargada das drogas tal como ela se faz. Os chamados grande e médio traficantes precisam de montar o seu circuito de distribuição para levar a cabo o seu objectivo e dele fazerem parte, não sendo dispensáveis, tanto os correios como os dealers de rua”. Como decorre do Ac. desta Relação transcrito na decisão recorrida, a suspensão da execução da pena seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a este tipo de crime, fazendo desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos da prevenção geral – cfr. tb. os Acs. STJ, de 27-9-07, Proc. nº 07P3297; de 9-4-08, Proc. nº 08P825; de 8-5-08, Proc. nº 08P1134; de 29-10-08, Proc. nº 08P2961; de 19-12-07, Proc. nº 07P3206, em www.dgsi.pt. e de 4-6-09, CJ, S, XII, 2, pg. 221 -. Como sublinha o STJ no acórdão de 6-12-2013 cit. na decisão recorrida “os denominados correios de droga são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes concorrendo, de modo directo, para a sua disseminação, não merecendo um tratamento penal de favor. De facto, torna-se mais difícil a sua detenção e apreensão, não se deixando contra motivar pelas consequências perniciosas do seu acto, demonstrando arrojo, audácia e dolo intenso, insensibilidade e ganância, porquanto a troco de uma compensação, se dispõem a fazer o transporte da droga até ao local da sua entrega, apesar de saberem da ilegalidade desse transporte”. Assim, tendo em conta as expostas necessidades de prevenção geral e especial, cremos que no caso em apreço, em face dos motivos supra enunciados, não se poderá alcançar aquele juízo de prognose positiva. Cremos, pois, que bem andou o tribunal a quo ao não suspender a execução da pena aplicada ao recorrente. Já a aplicação da pena acessória de expulsão do território nacional está enformada por uma vertente de protecção da paz social e do ordenamento jurídico nacional que contende somente com critérios de prevenção geral positiva, tendo em conta o grau de violação dos bens jurídicos protegidos, embora não descure a situação pessoal do arguido ao atender às suas raízes e ligação à comunidade nacional. Assim, não se antolha qualquer contradição ou desnecessidade na aplicação sucessiva da pena de prisão efectiva e da expulsão do território nacional, dado que a ressocialização do delinquente se realiza somente através daquela primeira sanção. Daí que não entendamos também a alegação do recorrente de que se verifica uma contradição insanável entre a fundamentação e a decisão que excluiu a aplicação do regime de suspensão da execução da pena. Efectivamente, como resulta do art. 410º, 2, C. P. Pen., qualquer dos vícios aí previstos terá de resultar do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência: o vício há-de ser, assim, evidenciado pela conjugação desses dois elementos, sem possibilidade ou sem que se torne necessário atender a outros, designadamente, ao conteúdo e sentido da prova produzida em julgamento. E, tanto pode incidir sobre a relação entre a prova efectivamente produzida e o que se considerou provado – al. c) do nº 2 do art. 410º – como sobre a relação entre o que se considerou provado e o que se decidiu – als. a) e b) do nº 2 do art. 410º - (cfr. Acs. STJ, de 29-10-08, Proc. nº 07P1016; de 8-10-08, Proc. nº 08P3068; e de 12-6-08, Proc. nº 07P4375, in www.dgsi.pt.). Verifica-se contradição insanável da fundamentação ou entre os fundamentos e a decisão, quando existe uma incompatibilidade não ultrapassável através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão. Ou seja, há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão dos fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente – cfr. Simas Santos/Leal Henriques, ob. cit., pg. 75; G. Marques da Silva, ob. Cit., pg. 325; P. Pinto de Albuquerque, ob. Cit. pg. 1082; e Acs. STJ, de 22-5-96, Proc. nº 96P306, in www.dgsi.pt; e de 20-1-94, CJ, S, II, 1, pg. 200 -. Ora, o tribunal a quo demonstrou coerência entre a fundamentação que expôs e a decisão que proferiu, na medida em que concluiu, ante os requisitos expressos no art. 50º, C. Pen., que as prementes necessidades de prevenção geral do crime em apreço, designadamente, de âmbito internacional realizado através do transporte do estupefaciente pelos denominados correios de droga não ficariam satisfeitas com a suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido. Tal asserção porque assente em fundamentos lógico-racionais e parâmetros legais, não denota, assim, qualquer contradição, traduzindo-se a mencionada afirmação do recorrente numa mera opinião acerca da predita questão. É, assim, de manter o acórdão recorrido, não se mostrando violada qualquer das disposições legais invocadas. * Pelo exposto: Acordam, em conferência, os juízes da ...ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em negar provimento ao recurso, mantendo integralmente o acórdão recorrido. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC,s. Lisboa,08-03-2016 Carlos Espírito Santo Alda Tomé Casimiro [1]Fala a este respeito o Prof. Figueiredo Dias na intensidade da vontade do dolo in "Direito Penal Português" ; pag. 246. [2]Acórdão de 06.02.2013, relatado pelo Conselheiro Armindo Monteiro, disponível no site do itij. |