Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | GUILHERMINA FREITAS | ||
Descritores: | ABUSO SEXUAL DE MENORES LENOCÍNIO DE MENORES PERÍCIAS SOBRE A PERSONALIDADE JUIZ NATURAL CASO JULGADO ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/23/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO EM PARTE | ||
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Sumário: | I – Se a testemunha em crime sexual for menor de 16 anos de idade (actualmente menor de 18 anos de idade) existe um poder-dever por parte da autoridade judiciária em ordenar perícia sobre a sua personalidade, tendo em vista não só a descoberta da verdade, mas também a própria protecção da criança ou jovem. II – Enquanto que o caso julgado formal pretende evitar que a mesma questão processual seja debatida e apreciada por diversas vezes no âmbito do mesmo processo, já o caso julgado material procura obstar à repetição da mesma causa em diferentes processos. III – De acordo com a doutrina, uma alteração de factos que se reporte ao tempo e ao lugar será não substancial se não se referir aos elementos constitutivos do tipo de crime e se do ponto de vista social continuar a ser possível identificar aquela unidade factual histórica como sendo a mesma. IV – Quando a factualidade dada como provada no acórdão condenatório consiste numa mera redução daquela que foi indicada na acusação ou pronúncia, por não se terem dado como assentes todos os factos aí descritos, não existe uma alteração dos factos integradora do art. 358.º, do CPP. V – O bem jurídico que se pretende proteger com a incriminação do art. 166.º do CP é a liberdade sexual de pessoas internadas e, ainda, se bem que de forma subsidiária, a incolumidade do exercício de funções no estabelecimento. VI – Na previsão do art. 175.º, do CP, o que está em causa é a exploração de um menor por outra pessoa, fundada no comércio do corpo da criança ou do jovem por parte de outrem (o agente). E não é exclusivamente o aspecto estrito de liberdade e autodeterminação sexual, como bem pessoal, que subjaz à criminalização do lenocínio de menores. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em audiência, na 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório 1. No âmbito do Proc. 1718/02.9JDLSB, (…) foram os arguidos A, (…), filho de B, (…); C, (…) filho de D, (…); E, (…), filho de F e de G, (…); H, (…), filho de I e de J, (…); K, (…) filho de L e de M, (…); N, (…), filho de O e de P, (…); Q, (…), filha de R e de S, (...); pronunciados pelos factos constantes do despacho de pronúncia de fls. 20828 a 21014 da forma seguinte: - Arguido A: a) Com referência ao capítulo 2.1. do despacho de pronúncia: 31 (trinta e um) crimes de abuso sexual de pessoa internada, então p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP (na redacção do Dec.- Lei n.º 48/95, de 15 de Março); b) Com referência ao capítulo 2.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec.- Lei n.º 48/95, de 15 de Março); c) Com referência ao capítulo 2.3. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; d) Com referência ao capítulo 2.4. do despacho de pronúncia: 48 (quarenta e oito) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; e) Com referência ao capítulo 2.5. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; f) Com referência ao capítulo 2.6. do despacho de pronúncia: 109 (cento e nove) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; 157 (cento e cinquenta e sete) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; e 84 (oitenta e quatro) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; g) Com referência ao capítulo 2.7. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; h) Com referência ao capítulo 2.8. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec.- Lei n.º 48/95, de 15 de Março); i) Com referência ao capítulo 2.9. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP e 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; j) Com referência ao capítulo 4.1.3. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; k) Com referência ao capítulo 4.1.4. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; l) Com referência ao capítulo 4.3.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; m) Com referência ao capítulo 4.4.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; n) Com referência ao capítulo 4.4.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; o) Com referência ao capítulo 4.4.3. do despacho de pronúncia: 7 (sete) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; p) Com referência ao capítulo 5.1. do despacho de pronúncia: 5 (cinco) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março) e ou pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; q) Com referência ao capítulo 5.2.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março); r) Com referência ao capítulo 5.2.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março); s) Com referência ao capítulo 5.2.3. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março) e ou pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; t) Com referência ao capítulo 5.2.4. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março) e ou pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; u) Com referência ao capítulo 5.2.5. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec.- Lei n.º 48/95, de 15 de Março); v) Com referência ao capítulo 5.3. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º. n.ºs 1 e 3 do CP; w) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 12 (doze) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; x) Com referência ao capítulo 6.3.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; y) Com referência ao capítulo 6.3.2. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; z) Com referência ao capítulo 6.4.1. do despacho de pronúncia: 4 (quatro) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; aa) Com referência ao capítulo 6.5.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; bb) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; cc) Com referência ao capítulo 6.7.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; dd) Com referência ao capítulo 7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; ee) Com referência ao capítulo 7.2. do despacho de pronúncia: 5 (cinco) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; ff) Com referência ao capítulo 7.3. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; gg) Com referência ao capítulo 7.4. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º nº.s 1 e 3 do CP; hh) Com referência ao capítulo 9.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP e 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 3 al. a) do CP; ii) Com referência ao capítulo 9.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; jj) Com referência ao capítulo 9.3. do despacho de pronúncia: 14 (catorze) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; kk) Com referência ao capítulo 9.4. do despacho de pronúncia: 5 (cinco) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; ll) Com referência ao capítulo 9.5. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP; 2 (dois) crimes de violação agravados, p.p. pelos arts. 164.º n.º 1 e 177.º n.º 4 do CP; e 1 (um) crime de violação agravado, sob a forma tentada, p.p. pelos arts. 164.º n.º 1, 177.º n.º 4, 22.º, 23.º e 73.º do CP; mm) Com referência ao capítulo 9.6. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP e 32 (trinta e dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; nn) Com referência ao capítulo 9.7. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; oo) Com referência ao capítulo 9.8. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 3 al. b) do CP; pp) Com referência ao capítulo 9.9. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP; e 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º, n.ºs 1 e 2 do CP; qq) Com referência ao capítulo 9.10. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP e 3 (três) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; rr) Com referência ao capítulo 9.11. do despacho de pronúncia: 9 (nove) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP e 5 (cinco) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; ss) Com referência ao capítulo 9.12. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 3 al. b) do CP; tt) Com referência ao capítulo 9.13. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e 5 (cinco) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; uu) Com referência ao capítulo 9.14. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; e 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; vv) Com referência ao capítulo 9.15. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e 3 (três) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; ww) Com referência ao capítulo 9.16. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP e 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; xx) Com referência ao capítulo 9.17. do despacho de pronúncia: 4 (quatro) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; yy) Com referência ao capítulo 9.18. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.º 1 do CP; 16 (dezasseis) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2; e 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; zz) Com referência ao capítulo 10. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de peculato de uso, p.p. pelo art. 376.º n.º 1 do CP. - Arguido C: a) Com referência ao capítulo 4.1.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; b) Com referência ao capítulo 4.1.2. do despacho de pronúncia: 37 (trinta e sete) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; c) Com referência ao capítulo 4.1.3. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; d) Com referência ao capítulo 4.1.4. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, por omissão, p.p. pelos arts. 10.º e 172.º n.º 1 do CP; f) Com referência ao capítulo 6.3.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; g) Com referência ao capítulo 6.3.2. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º n.ºs 1 e 2 do CP; h) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; i) Com referência ao capítulo 7.2. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; j) Com referência ao capítulo 10. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de peculato de uso, p.p. pelo art. 376.º n.º 1 do CP. - Arguido E: a) Com referência ao capítulo 4.2.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP e um crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; b) Com referência ao capítulo 5.2.5. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 2 do CP (então na redacção do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março); c) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; d) Com referência ao capítulo 6.4.1. do despacho de pronúncia: 4 (quatro) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP. - Arguido H: a) Com referência ao capítulo 4.3.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; b) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; c) Com referência ao capítulo 6.5.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de actos homossexuais com adolescentes, p.p. pelo art. 175.º do Código Penal; d) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.7.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; - Arguido K: a) Com referência ao capítulo 4.4.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; b) Com referência ao capítulo 4.4.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; c) Com referência ao capítulo 4.4.3. do despacho de pronúncia: 7 (sete) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; d) Com referência ao capítulo 4.4.4. do despacho de pronúncia: 7 (sete) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; f) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; - Arguido N: a) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 12 (doze) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.ºs 1 e 2 do CP; b) Com referência ao capítulo 6.3.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; c) Com referência ao capítulo 6.3.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP e 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs. 1 e 3 do CP; d) Com referência ao capítulo 6.4.1. do despacho de pronúncia: 4 (quatro) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.5.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; f) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP e 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP; g) Com referência ao capítulo 6.7.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; h) Com referência ao capítulo 7.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; i) Com referência ao capítulo 7.2. do despacho de pronúncia: 5 (cinco) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; j) Com referência ao capítulo 7.3. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP e um crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.º 1 do CP; k) Com referência ao capítulo 7.4. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; - Arguida Q: a) Com referência ao capítulo 6.2.1. do despacho de pronúncia: 12 (doze) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; b) Com referência ao capítulo 6.3.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; c) Com referência ao capítulo 6.3.2. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; d) Com referência ao capítulo 6.4.1. do despacho de pronúncia: 4 (quatro) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; e) Com referência ao capítulo 6.5.1. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; f) Com referência ao capítulo 6.7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; g) Com referência ao capítulo 6.7.2. do despacho de pronúncia: 1 (um) crime de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; h) Com referência ao capítulo 7.1. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; i) Com referência ao capítulo 7.2. do despacho de pronúncia: 5 (cinco) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; j) Com referência ao capítulo 7.3. do despacho de pronúncia: 3 (três) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP; k) Com referência ao capítulo 7.4. do despacho de pronúncia: 2 (dois) crimes de lenocínio, p.p. pelo art. 176.º n.ºs 1 e 3 do CP. 2. No âmbito do Proc. nº 3137/01.5JDLSB foi, ainda, o arguido A acusado da prática, como autor material, na forma consumada e em concurso real, de: a) relativamente a T: - 13 (treze) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2 do CP; - 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP; - 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP; b) relativamente a U: - 12 (doze) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP; - 2 (dois) crimes de abuso sexual de pessoa internada, p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP; c) relativamente a V: - 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, p.p. pelo art. 165.º, n.º 1 e 2, do CP; - 1 (um) crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, p.p. pelo art. 165.º, n.º 1, do CP; d) relativamente a W: - 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º, n.º 3, al. c), do CP; Por despacho proferido a fls. 22129, em 3/09/04, foi determinada a apensação deste processo nº 3137/01.5JDLSB, (…), aos autos n.º 1718/02.9JDLSB, tendo passado a ser identificado como Pº 1718/02.9 JDLSB-F (Processo Apensado). 3. A fls. 14517 a 14534, o assistente X apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 120.000,00€ (cento e vinte mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido C, o quantitativo de 90.000,00€ (noventa mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido K e, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 90.000,00€ (noventa mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente aos arguidos H e N e solidariamente com os arguidos A, C, E, K e Q, o quantitativo de 90.000,00€ (noventa mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14517 a 14534, quanto aos arguidos A, C, E, K, N e Q. Por despacho de fls. 22666 a 22667 não foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14517 a 14534, quanto ao arguido H, dado que o mesmo não fora pronunciado quanto a tais factos. A fls. 14538 a 14556, o assistente Y apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 192.200,00€ (cento e noventa e dois mil e duzentos Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido C, solidariamente com o arguido A o quantitativo de 24.800,00€ (vinte e quatro mil e oitocentos Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente aos arguidos C, H, N, K e E, solidariamente com os arguidos A e Q, o quantitativo de 93.000,00€ (noventa e três mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14538 a 14556, quanto aos arguidos A, C, E, K, N e Q. Por despacho de fls. 22666 a 22667 não foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14517 a 14534, quanto ao arguido H, dado que o mesmo não fora pronunciado quanto a tais factos. A fls. 14560 a 14572, o assistente Z apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 200.000,00€ (duzentos mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14560 a 14572. A fls. 14575 a 14587, o assistente AA apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 75.000,00€ (setenta e cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14575 a 14587. A fls. 14592 a 14603, o assistente AB apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14592 a 14603. A fls. 14608 a 14620, o assistente AC apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A e K, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 120.000,00€ (cento e vinte mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido K e, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 70.000,00€ (setenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14608 a 14620. A fls. 14625 a 14635, o assistente AD apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 50.000,00€ (cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14625 a 14635. A fls. 14640 a 14652, o assistente AE apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14640 a 14652. A fls. 14657 a 14663, o assistente AF apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 120.000,00€ (cento e vinte mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14657 a 14663. A fls. 14668 a 14678, o assistente AG apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 30.000,00€ (trinta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14668 a 14678. A fls. 14683 a 14693, o assistente AH apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 50.000,00€ (cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo Demandado ao Demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14683 a 14693. A fls. 14697 a 14707, o assistente AI apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, K, N, H e C, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 30.000,00€ (trinta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido A, solidariamente – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - com os arguidos K, N, H e C o quantitativo de 140.000,00€ (cento e quarenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo(s) demandado(s) ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14697 a 14707, contra os arguidos/demandados acima identificados e não admitido quanto aos demais demandados não pronunciados. A fls. 14712 a 14721, o assistente AJ apresentou pedido de indemnização cível contra – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14712 a 14721, delimitado ao arguido/demandado que foi pronunciado. A fls. 14725 a 14732, o assistente AK apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido E, pedindo a condenação deste no montante de 160.000,00€ (cento e sessenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14725 a 14732. A fls. 14737 a 14747, o assistente AL apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 190.000,00€ (cento e noventa mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14737 a 14747. A fls. 14751 a 14754, o assistente AJ apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo Demandado ao Demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14751 a 14754. A fls. 14761 a 14771, o assistente AM apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 15.000,00€ (quinze mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo Demandado ao Demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14761 a 14771. A fls. 14776 a 14786, o assistente AN apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, K, C, H, E e Q, pedindo a condenação destes solidariamente no montante de 175.000,00€ (cento e setenta e cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelos demandados ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5 e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14776 a 14786. A fls. 14791 a 14802, o assistente AO apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 40.000,00€ (quarenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14791 a 14802. A fls. 14807 a 14828, o assistente AP apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 5.000,00€ (cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido C solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 10.000,00€ (dez mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido K e, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 35.000,00€ (trinta e cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido H, solidariamente com os arguidos A e E, o quantitativo de 100.000,00€ (cem mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido H, solidariamente com os arguidos A, C, E, K, N e Q, o quantitativo de 100.000,00€ (cem mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5 e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14807 a 14828. A fls. 14833 a 14847, o assistente AQ apresentou pedido de indemnização cível – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 37.500,00€ (trinta e sete mil e quinhentos Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14833 a 14847, mas delimitado ao arguido/demandado pronunciado. A fls. 14851 a 14861, o assistente AR apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 50.000,00€ (cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14851 a 14861. A fls. 14866 a 14872, o assistente AS apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 100.000,00€ (cem mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por Despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14866 a 14872. A fls. 14876 a 14896, o assistente AT apresentou pedido de indemnização cível contra os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 30.000,00€ (trinta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo Demandado ao Demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido H, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 60.000,00€ (sessenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido K, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 30.000,00€ (trinta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente aos arguidos H, N e K, solidariamente com os arguidos A, C, E e Q, o quantitativo de 80.000,00€ (oitenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5 e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14876 a 14896. A fls. 14901 a 14908, o assistente AU apresentou pedido de indemnização cível contra – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - os arguidos A, E e K, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 30.000,00€ (trinta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido A, solidariamente – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - com os arguidos E e K, quantitativo de 170.000,00€ (cento e setenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida dos juros compensatórios devidos à taxa legal aplicável desde a data da prática de cada um dos factos e até efectivo e integral pagamento. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14901 a 14908, delimitado aos arguidos/demandados pronunciados. A fls. 14913 a 14933, o assistente AV apresentou pedido de indemnização cível – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - contra os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente ao arguido A, o quantitativo de 3.000,00€ (três mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido C, solidariamente com o arguido A o quantitativo de 247.000,00€ (duzentos e quarenta e sete mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente ao arguido K, solidariamente com o arguido A, o quantitativo de 25.000,00€ (vinte cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente aos arguidos – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - C, N, H e K, solidariamente com os arguidos A, E e Q, o quantitativo de 45.000,00€ (quarenta e cinco mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5 e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14913 a 14933, delimitado aos arguidos/demandados pronunciados. A fls. 14937 a 14947, o assistente AW apresentou pedido de indemnização cível contra o arguido A, pedindo a condenação deste no montante de 50.000,00€ (cinquenta mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB. Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14937 a 14947. A fls. 14952 a 14982, a assistente AX apresentou pedido de indemnização cível contra – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, pedindo a condenação destes no montante de: - relativamente aos arguidos A e C, solidariamente, o quantitativo de 8.323,79€ (oito mil, trezentos e vinte e três Euros e setenta e nove cêntimos), correspondendo 6.989,63€ (seis mil novecentos e oitenta e nove Euros e sessenta e três cêntimos) ao montante de capital e 1.334,16€ (mil trezentos e trinta e quatro Euros e dezasseis cêntimos) aos juros de mora já vencidos até à data em que deduziu pedido de indemnização cível, em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; - relativamente aos demandados – entre o mais, pois incluiu demandado(s) que não foi(foram) pronunciado(s) - no seu conjunto, solidariamente, o quantitativo de 500.000,00€ (quinhentos mil Euros), em consequência dos danos de natureza física e moral causados pelo demandado ao demandante, com a prática dos factos a que se referem estes autos principais com o NUIPC 1718/02.9JDLSB; Acrescida da indemnização pelos danos que se vierem a apurar em sede de execução de sentença, quantias essas actualizadas à data do seu efectivo pagamento através da incidência da taxa de juro legal. Por despacho de fls. 22551 a 22552, ponto 5 e de fls. 22666 a 22667, foi admitido o pedido de indemnização cível constante de fls. 14952 a 14982, mas delimitado aos arguidos/demandados que foram pronunciados. 4. Realizado o julgamento foi proferida decisão que absolveu a arguida Q da prática de todos os crimes pelos quais estava pronunciada e condenou os demais arguidos nos termos seguintes: A - arguido A pela prática de: - (Processo Apensado, NUIPC nº 3137/01.5JDLSB) 1. Na pessoa de T: a) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão. b) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão. c) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 ( três) anos de prisão. d) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão. e) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 2. Na pessoa de U: f) 1 (um) crime p.p. pelo art. 164.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão. 3. Na pessoa de V: g) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. - ( No Processo Principal - NUIPC 1718/02.9JDLSB ) 4. (Com referência ao capítulo 9.6, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AH: h) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 9 ( nove) meses de prisão. i) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. j) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. l) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 5. (Com referência ao capítulo 2.1., do Despacho de Pronúncia) na pessoa de X: m) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 2 (dois) anos de prisão. n) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 2 (dois) anos de prisão. o) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 2 ( dois) anos de prisão. p) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 2 ( dois) anos de prisão. q) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 2 ( dois) anos de prisão. 6. (Com referência ao capítulo 5.1., do Despacho de Pronúncia) na pessoa de X: r) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15/03), na pena de 3 (três) anos de prisão. s) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15/03), na pena de 2 ( dois) anos de prisão. 7. (Com referência ao capítulo 2.6., do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: t) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( DL 48/95, de 15/03), na pena de 2 (dois) anos de prisão. u) 46 (quarenta e seis) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 4 (quatro) anos de prisão, para cada um dos crimes. v) 6 (seis) crimes p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09) praticados pelo arguido, na pena de 3 ( três) anos de prisão, para cada um dos crimes. x) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão, para cada um dos crimes. 8. (Com referência ao capítulo 4.1.4., do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: z) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 9. (Com referência ao capítulo 4.4.2, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: aa) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 10. (Com referência ao capítulo 6.7.2, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: bb) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo art. 172.º n.º 1 do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 11. (Com referência ao capítulo 9.9, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AG : cc) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 3 (três) anos de prisão. dd) 1 ( um ) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 1 (um) ano de prisão. 12. (Com referência ao capítulo 9.10, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AA: ee) 1 (um) crime p.p. pelos arts. 166.º, n.º 1 e 2, 22.º, 23.º, 73.º (sob a forma tentada) do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão. ff) 1 (um) crime p.p. pelos arts. 166.º, n.º 1 e 2, 22.º, 23.º, 73.º ( sob a forma tentada) do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão. gg) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 3 (três) anos de prisão. 13. (Com referência ao capítulo 9.14, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AF: hh) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 3, al. b), do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 6 (seis) meses de prisão. 14. (Com referência ao capítulo 9.2, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AD: ii) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 3 (três) anos de prisão. 15. (Com referência ao capítulo 9.3, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AW: jj) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. ll) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, 22.º, 23.º e 73.º, (sob a forma tentada) do CP (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 16. (Com referência ao capítulo 9.4, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AM: mm) 3 (três) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 17. (Com referência ao capítulo 9.11, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AY: nn) 2 (dois) crimes p.p. pelos arts. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 1 (um) ano de prisão, para cada um dos crimes. oo) 5 ( cinco ) crimes p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão, para cada um dos crimes. 18. (Com referência ao capítulo 9.5, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AB: pp) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão. qq) 1 (um) crime de violação, agravado, p.p. pelo art. 164.º, n.º 1 e 177.º, do CP, na versão em vigor à data da sua prática ( Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98 ), na pena de 6 (seis) anos de prisão. 19. (Com referência ao capítulo 9.5, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AR: rr) 1 (um) crime de violação, agravado, p.p. pelo art. 164.º, n.º 1 e 177.º, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 6 (seis) anos de prisão. 20. (Com referência ao capítulo 9.13, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AS: ss) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 1 (um) ano de prisão. tt) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão, para cada um dos crimes. 21. (Com referência ao capítulo 2.2, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AP: uu) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15/03), na pena de 3 (três) anos de prisão. 22. (Com referência ao capítulo 2.8, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AU: vv) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15 de Março), na pena de 4 (quatro) anos de prisão, para cada um dos crimes. 23. (Com referência ao capítulo 5.2.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AP: xx) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 48/95, de 15/03), na pena de 3 (três) anos de prisão. 24. (Com referência ao capítulo 9.17. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AC: zz) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 25. (Com referência ao capítulo 2.3. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AV: aaa) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 26. (Com referência ao capítulo 2.4. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de Y: bbb) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. ccc) 7 (sete) crimes p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão para cada um dos crimes. 27. (Com referência ao capítulo 2.5. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: ddd) 2 ( dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos de prisão, para cada um dos crimes. 28. (Com referência ao capítulo 4.4.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: eee) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 , do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 29. (Com referência ao capítulo 2.7. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AN: fff) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 30. (Com referência ao capítulo 2.9. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AQ: ggg) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 31. (Com referência ao capítulo 4.1.3. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de Y: hhh) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 176.º, n.º 1 e 2 do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão, por cada um dos crimes. 32. (Com referência ao capítulo 4.3.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: iii) 2 ( dois ) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão, por cada um dos crimes. 33. (Com referência ao capítulo 5.2.5.. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AP: jjj) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15/03, em vigor desde 1/10/95), na pena de 3 (três) anos de prisão. 34. (Com referência ao capítulo 6.2.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AN: lll) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 35. (Com referência ao capítulo 6.5.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: mmm) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1 e 3, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. EM CÚMULO, foi o arguido A condenado na pena única de 18 (dezoito) anos de prisão. Relativamente aos restantes crimes que lhe eram imputados, quer no processo apensado, quer no processo principal, foi o arguido A absolvido. B - arguido C pela prática de: 1. (Com referência ao capítulo 4.1.4, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: a) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão. 2. (Com referência ao capítulo 4.1.1, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AP: b) 1 (um) crime p.p. pelo art. 166.º, n.º 1, na versão em vigor à data da sua prática (redacção introduzida pelo DL 49/85, de 15/03), na pena de 3 (três) anos de prisão. EM CÚMULO, foi o arguido C condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão. Relativamente aos demais crimes pelos quais estava pronunciado foi o arguido C absolvido. C - arguido E pela prática: 1. (Com referência ao capítulo 4.2.1, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AK: a) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, para cada um dos crimes. b) 1 (um) crime p.p. pelo art. 175.º, n.º 1, do CP, na versão introduzida pela Lei nº 59/2007, de 4/09, na pena de 2 (dois) anos de prisão. EM CÚMULO foi o arguido E condenado na pena única de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão. Relativamente aos restantes crimes pelos quais estava pronunciado foi o arguido E absolvido. D - arguido H pela prática: 1. (Com referência ao capítulo 6.7.2. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: a) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. 2. (Com referência ao capítulo 4.3.1., do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: a) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, para cada um dos crimes. EM CÚMULO, foi o arguido H condenado na pena única de 7 (sete) anos de prisão. Relativamente aos restantes crimes pelos quais estava pronunciado foi o arguido H absolvido. E - o arguido K pela prática: 1. (Com referência ao capítulo 4.4.2, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: a) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão. 2. (Com referência ao capítulo 4.4.4, do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AC: b) 2 (dois) crimes p.p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (DL 48/95, de 15 de Março), na pena de 3 (três) anos de prisão, para cada um dos crimes. 3. (Com referência ao capítulo 4.4.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: c) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão. Em CÚMULO, foi o arguido K condenado na pena única de 7 (sete) anos de prisão. Relativamente aos restantes crimes pelos quais estava pronunciado foi o arguido K absolvido. F - o arguido N pela prática: 1. (Com referência ao capítulo 6.2.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AN: a) 1 (um) crime p.p. pelo art. 172.º, n.º 1 e 2, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão. 2. (Com referência ao capítulo 6.5.1. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AT: b) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 2 (dois) anos de prisão. 3. (Com referência ao capítulo 6.7.2. do Despacho de Pronúncia) na pessoa de AI: c) 1 (um) crime p.p. pelo art. 176.º, n.º 1 e 3, do CP, na versão em vigor à data da sua prática (Lei 65/98, de 2/09, em vigor desde 7/09/98), na pena de 3 (três) anos de prisão. EM CÚMULO, foi o arguido N condenado na pena única de 6 (seis) anos e 2 (dois) meses de prisão. Relativamente aos restantes crimes pelos quais estava pronunciado foi o arguido N absolvido. Foram, ainda, os arguidos, com excepção da arguida Q, a qual foi absolvida dos pedidos civis contra si deduzidos, condenados a pagar aos demandantes civis indemnizações nos termos seguintes: - o arguido/demandado A, no pagamento a cada um dos demandantes AA, AB, AC, AD, AF, AG, AH, AI, X, AY, AM, AN, AP, AQ, AR, AS, AT, AU, AV, AW, da quantia de 15.000 (quinze mil) euros a título de indemnização por danos não patrimoniais. - o arguido/demandado K a pagar a cada um dos demandantes AC, AI e AT, o montante de 25.000 Euros, a título de indemnização por danos morais. - o arguido/demandado E a pagar ao demandante AK o montante de 25.000 Euros, a título de indemnização por danos morais. - o arguido/demandado N a pagar a cada um dos demandantes AI e AT, o montante de 25.000 Euros, a título de indemnização por danos morais. - o arguido/demandado H a pagar a cada um dos demandantes AI e AT, o montante de 25.000 Euros, a título de indemnização por danos morais. - o arguido/demandado C a pagar a cada um dos demandantes AI e AP, o montante de 25.000 Euros, a título de indemnização por danos morais. Tendo sido absolvidos relativamente aos demais pedidos de indemnização. 5. Inconformados com a decisão, dela recorreram os arguidos A, C, E, K, H, N, bem como o Ministério Público e os assistentes AX, Y, AN e AI. 6. Antes, porém, foram inter(...)s vários recursos interlocutórios, os quais foram mandados subir diferidamente com o recurso da decisão que viesse a pôr termo à causa, de entre os quais serão agora conhecidos aqueles que os recorrentes no cumprimento do dis(...) no n.º 5 do art. 412.º do CPP manifestaram manter interesse. 7. Nesta Relação, a Digna Procuradora Geral Adjunta tomou conhecimento do processo, nos termos e para os efeitos previstos no art. 416.º do CPP, pronunciando-se no que respeita à junção de documentos de fls. 72447 a 72471 pela sua não admissão. 8. Notificados os demais intervenientes processuais, nos termos do dis(...) no n.º 2 do art. 417.º do CPP, respondeu o arguido H, nos termos de fls. 72689 a 72719, pugnando pela tempestividade da junção dos documentos trazidos por si aos autos com a resposta ao recurso do MP e dos assistentes, fazendo a junção de novos documentos e solicitando “a renovação da prova relativamente às declarações prestadas em audiência de julgamento por A e AN”. Os arguidos C, E, K e N vieram aderir ao requerido pelo arguido H a fls. 72689 a 72719, nos termos constantes de fls. 72766, 72770 a 72772, 72777, 72791 a 72794. Mediante carta, por si redigida, dirigida a este processo, constante de fls. 72729, o arguido A veio requerer a este Tribunal da Relação para ser ouvido, a fim de transmitir de viva voz toda a verdade sobre os factos do processo, uma vez que se incriminou a si, bem como outras pessoas que também não cometeram qualquer crime. Também mediante carta, por si redigida, dirigida a este processo, constante de fls. 72750 a 72752 o assistente AN veio requerer para ser ouvido por este Tribunal da Relação, alegando ter prestado falsas declarações no decurso do processo, pretendendo agora contar a verdade. Igualmente mediante carta, por si redigida, dirigida a este processo, constante de fls. 72863, a testemunha AZ veio requerer para ser ouvido por este Tribunal da Relação, a fim de repor a verdade do processo, uma vez que as declarações que prestou anteriormente resultaram na condenação de algumas pessoas inocentes. Através de novo requerimento, constante de fls. 72866 a 72879, veio o arguido/recorrente H requerer a junção de mais cinco documentos, um dos quais um DVD, bem como a renovação da prova relativamente às declarações prestadas em audiência por AZ e BA. Notificados o MP, assistentes e demais arguidos vieram os arguidos C e E aderir, através dos requerimentos de fls. 73012 e 73014 ao requerido pelo arguido H a fls. 72866 a 72879. Também o arguido K, através do requerimento de fls. 73024 a 73026, se pronunciou no sentido de serem admitidos os documentos juntos aos autos pelo arguido H e de ser admitida a reinquirição de AN, AZ e BA. Por sua vez a AX e demais assistentes pronunciaram-se a fls. 73027 a 73031 no sentido de que não deviam ser admitidos os documentos juntos aos autos pelo arguido H, nem a renovação da prova requerida. No exame preliminar entendeu a relatora ser necessário conhecer previamente a questão suscitada pela Digna Procuradora Geral Adjunta, quanto à extemporaneidade da junção de documentos com a resposta aos recursos do MP e dos assistentes, bem como dos requerimentos para junção de novos documentos e pedido de renovação da prova apresentado pelo arguido H, a fls. 72689 a 72699 e 72866 a 72879, e, ainda, do requerido pelo arguido A, pelo assistente AN e testemunha AZ. Para o efeito determinou-se a remessa dos autos aos vistos para subsequente julgamento na conferência. 9. Após a conferência foi proferido acórdão indeferindo os requerimentos dos arguidos H, A, do assistente AN e da testemunha AZ. 10. Desse acórdão foi inter(...) recurso pelo arguido H para o Tribunal Constitucional, recurso que foi admitido com subida a final e efeito meramente devolutivo – fls. 73149. 11. Também o arguido K interpôs recurso desse acórdão, mas para o STJ, recurso esse que não foi admitido – fls. 73235. 12. Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, que havia sido requerida pelos arguidos H e N, com observância do legal formalismo. II. Fundamentação A. Recursos interlocutórios 1. Recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 1264 a 1265 do processo apensado (3137/01.5JDLSB), proferido em 27/10/03, que indeferiu a documentação em acta, através da gravação vídeo, das declarações do assistente T No âmbito do Proc. n.º 3137/01.5JDLSB, apenso aos presentes autos, o arguido A requereu a documentação através de gravação áudio das declarações a prestar em sede de audiência de discussão e julgamento, com excepção das declarações a tomar ao assistente T, surdo mudo, a documentar em acta através da gravação vídeo dos seus gestos, devendo, em caso de indisponibilidade dos meios técnicos necessários para o efeito, ser oficiado o CEJ a fim de os colocar à ordem da (…). Por despacho datado de 27-10-2003 (cf. Vol. 7.º, fls. 1264), o Mmo. Juiz pronunciou-se quanto a este requerimento do seguinte modo (transcrição): “A documentação das declarações orais prestadas na audiência vai ser realizada com os meios técnicos habituais à disposição do Tribunal. No que toca à testemunha T vai proceder-se ao registo integral das declarações prestadas oralmente e só destas. É que a lei só refere as declarações prestadas oralmente (art. 363.º do CPP), não se exigindo, como é óbvio, o registo em vídeo dos gestos e das expressões da testemunha. Acresce que o tradutor será, como também é óbvio, ajuramentado. Pelo ex(...), determino a documentação das declarações oralmente prestadas em audiência pelos meios técnicos ao dispor da Vara, no mais se indeferindo o requerido”. Inconformado com o despacho proferido, o arguido A dele interpôs recurso (cf. Vol. 7.º do Proc. n.º 3137/01.5JDLSB, fls. 1300 a 1307, rematando-o com as seguintes conclusões (transcrição): “1 – O recorrente requereu a documentação em acta das declarações orais prestadas em audiência, através de meios áudio, com excepção das declarações prestadas pela testemunha T, que requereu fossem documentadas em acta através de meios vídeo, atento o facto de ser surdo-mudo; 2 – O tribunal "a quo", através do despacho recorrido, indeferiu a documentação em acta das declarações da testemunha T, por meios vídeo, com o argumento de que a lei, art° 363° do CPP, só refere as declarações prestadas oralmente; 3 – E que as declarações da testemunha T serão oralmente reproduzidas, através do interprete; 4 – Salvo o devido respeito o tribunal interpretou erradamente a lei, à luz dos princípios constitucionais abaixo indicados, efectuando mera interpretação literal, sem se ater na interpretação teleológica; 5 – De facto, o legislador ordinário, através da alteração do CPP deu vida ao princípio do duplo grau de jurisdição, insito na norma do art° 32° n° 1 da CRP e art° 6° n° 1 da CEDH, consagrando a possibilidade de recurso de facto e de direito, a cargo dos TR, dando assim também expressão prática aos compromissos internacionais assumidos; 6 – E, por essa via, honrando o direito da pessoa humana, a sua intocabilidade e dignidade, que se assegura no processo, também, pela via do recurso, de facto e de direito, tendente a minimizar ao máximo o erro; 7 – O legislador disse menos que queria dizer, ao prever apenas declarações orais prestadas em audiência, na medida em que seguiu critérios de normalidade, sendo normal as pessoas exprimirem-se por palavras e anormal – no bom sentido aliás, no sentido de ser menos frequente – as pessoas serem surdos mudos; 8 – No entanto, quando o arguido a testemunha ou outro interveniente processual não pode exprimir-se pela palavra, ou pela escrita, como acontece aos que não ouvem nem falam mas escrevem, a documentação em acta terá que ser a da sua linguagem, como é o caso da testemunha T, linguagem gestual; 9 – As declarações são da testemunha, sendo o interprete mero meio de passagem, de transformação da linguagem gestual em linguagem oral; 10 - O interprete pode, por erro de interpretação, ou por outro motivo não interpretar bem, mesmo ajuramentado, não podendo ser vedado ao arguido exercer o contraditório, ou sindicar pela via do recurso da matéria de facto, essa interpretação, através de outro parecer de outro interprete, ou de outra interpretação, e parecer e interpretação a apresentar no tribunal superior; 11 – Ora, as normas devem ser interpretadas literal e teleologicamente, devendo o interprete fazer interpretação actualista ou extensiva, nos casos, como é o presente, em que o legislador não previu expressamente, literalmente, mas os princípios vigentes, impõem que se interprete a norma do artº 363° do CPP no sentido de no caso de surdos mudos a documentação em acta dever ser por meio video, para assegurar as garantias de defesa; 12 – Se a testemunha for estrangeira, fica documentado em acta as suas declarações e pode sempre o próprio tribunal se entender a língua formar o seu juízo de valor, e o arguido pedir tradução, por outro interprete, e recorrer de facto, se for caso disso; 13 – O despacho recorrido violou o dis(...) nos art°s 363° e 327° n° 2, ambos do CPP, e as normas dos art°s 20° n° 1, 32° n° 1 e 5 da CRP e a norma do art° 6° da CEDH. 14 – O tribunal "a quo" efectua uma interpretação inconstitucional da norma do art° 363° do CPP, violando assim, na interpretação que dela faz, essa norma, tornando-a materialmente inconstitucional , por violação dos princípios da legalidade, da proporcionalidade, da garantia do contraditório e da igualdade de armas, do acesso ao direito, consagrados nos art°s 20° n° 1 e 32° n° 1 e 5 da CRP, inconstitucionalidade que expressamente se suscita, para todos os efeitos legais. 15 – O tribunal "a quo" interpretou as normas dos art°s indicados na conclusão 13 no sentido de não ser de deferir a documentação em acta das declarações prestadas pela testemunha, através de meios video, bastando-se com a tradução feita em tribunal pelo tradutor, por não estar expressamente prevista a linguagem gestual no art° 363° do CPP, mas deveria tê-las interpretado no sentido de estar prevista, através de uma interpretação teleológica, actualista, de harmonia com as normas e princípios constitucionais indicados supra.” Termina pedindo que seja dado provimento ao recurso e que, em consequência, seja revogado o despacho recorrido. O Exmo. Magistrado do MP junto do Tribunal a quo, na sua resposta, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, por falta de previsão legal e por inexequibilidade prática do pedido (cf. fls. 17 a 19 do Apenso F desse Proc.). Também a assistente AX pugnou pela improcedência do recurso. Subindo de imediato o recurso a esta Relação, o Exmo. Procurador-Geral (...) suscitou a questão prévia do regime de subida fixado pelo despacho que procedeu à sua admissão, entendendo a este propósito que “deve ser revogado e substituído por outro que fixe ao recurso “sub judice” regime de subida diferente, qual seja o de subida conjunta, a final, com o que for inter(...) da decisão que já conheceu o mérito da causa e lhe pôs termo”. Por acórdão datado de 14 de Setembro de 2004, esta Relação decidiu não conhecer de imediato do objecto do recurso, vindo a alterar o seu regime de subida e determinando que o mesmo subisse, diferidamente, nos próprios autos, nos termos do n.º 3 do art. 407.º do CPP (cf. Proc. n.º 3137/01.5JDLSB-F, fls. 44 a 48). Apreciando. Com este recurso interlocutório, o arguido A pretendia que as declarações que viessem a ser prestadas pelo assistente T, surdo mudo, em sede de audiência de julgamento, fossem documentadas em acta, através de gravação vídeo dos seus gestos e expressões corporais, por forma a garantir, na sua perspectiva, o duplo grau de jurisdição, já que o intérprete de linguagem gestual, mesmo ajuramentado, pode, por erro ou por qualquer outro motivo, não interpretar bem aquilo que lhe foi transmitido, vedando-se, deste modo, ao arguido o exercício do contraditório e a sindicância dessa interpretação pela via do recurso da matéria de facto. Conforme resulta dos autos (cf. Vol. 149, fls. 35341 a 35352), o assistente T foi ouvido na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 23 de Novembro de 2005, mostrando-se que as declarações que prestou, com a intermediação de um intérprete de linguagem gestual, devidamente ajuramentado, ficaram registadas no sistema áudio e vídeo ao dispor do tribunal (cf. DVD 1). Deste modo, independentemente do mérito das considerações tecidas, o arguido A acabou por atingir o objectivo visado pela interposição do recurso interlocutório em apreço, ou seja, as declarações do assistente T ficaram integralmente documentadas, os gestos e expressões corporais utilizados na comunicação foram documentadas em registo de imagem e a subsequente tradução oral efectuada pelo intérprete ficou documentada em registo áudio. Ou seja, de facto, mediante o registo audiovisual das declarações prestadas pelo assistente T, foram ultrapassados os óbices suscitados pelo arguido A quanto à salvaguarda das suas garantias de defesa, pelo que se mostra absolutamente inútil conhecer o mérito dos fundamentos invocados no recurso. Em face do ex(...), ao abrigo do art. 287.º, al. e), do CPC, ex vi do art. 4.º do CPP, acorda-se em declarar extinto o recurso interlocutório inter(...) pelo arguido A a fls. 1300 a 1307 do Proc. n.º 3137/01.5JDLSB, apenso aos presentes autos, com base na sua inutilidade superveniente. 2. Recurso inter(...) pelo arguido K do despacho do JIC de fls. 17020 a 17055, proferido em 1/3/2004, que julgou inexistentes as alegadas nulidades ou irregularidades relativas às perícias sobre a personalidade de testemunhas O arguido K no seu requerimento de abertura de instrução, constante de fls. 16307 a 16323, alegou terem sido praticadas, durante a fase de inquérito, nulidades ou irregularidades processuais, consubstanciadas na omissão da notificação aos arguidos da realização das perícias sobre a personalidade de testemunhas, determinante da invalidade do meio de prova em apreço, por força do dis(...) no art. 122.° do CPP, e no facto de, em seu entender, tais perícias sobre a personalidade só puderem ser realizadas às alegadas vítimas de abuso sexual quando estas forem menores de dezasseis anos, em conformidade com o dis(...) no art. 131.°, n.º 3, do CPP. Por despacho, proferido pelo Mmº Juiz de Instrução Criminal, em 1 de Março de 2004 e constante nos autos a fls. 17020 a 17055, foram aquelas alegadas nulidades ou irregularidades, que também foram suscitadas por outros arguidos, apreciadas, concluindo-se pela sua inexistência. Nesse despacho expendeu-se, e passamos a transcrever apenas o seu segmento ora em apreço, que: "Os vícios apontados pelos arguidos requerentes da abertura de instrução reconduzem-se a um total de nove: (…) 3. Violação do dis(...) no art. 154°, nºs 2 e 3, do Cód. Proc. Penal (arguidos E, K, N, (…) e H); (…) 5. As perícias sobre a personalidade das testemunhas não respeitaram o dis(...) no art. 131°, n.º 3, do Cód. Proc. Penal (arguidos K, N, (…) e H); (…) No entender dos arguidos K e N, as perícias sobre a personalidade e de natureza sexual determinadas pelo Ministério Público, em que os examinados foram testemunhas, são nulas ou, caso assim não se entenda, deverá ser declarada a sua irregularidade. De acordo com estes arguidos, não tendo o Ministério Público justificado aquando da determinação da realização de tais perícias a razão pela qual não procedeu à notificação da defesa e sendo o n.º 3 do art. 154° do Cód. Proc. Penal tão expresso ao definir as duas excepções que contempla, a falta de menção da sua verificação faz presumir a sua inexistência. Defendem que outra interpretação de tal normativo agrediria claramente as garantias de defesa que assistem ao arguido em processo penal por força do dis(...) no art. 32° da Constituição da República Portuguesa. Acrescentam ainda os arguidos que se se entender que o Ministério Público não está obrigado a fundamentar a razão pela qual não notifica a defesa da realização das perícias nos termos do art. 154° do Cód. Proc. Penal, no próprio despacho em que as ordena, podendo esta justificação fazer-se após a reacção do arguido, este nunca poderia arguir a nulidade (ou irregularidade) da omissão sub judice. No entanto, de acordo com os arguidos, no caso dos autos não se verificam as duas ressalvas à obrigatoriedade de notificação da defesa, previstas no art. 154°, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, pelas razões que explicitam de fls. 16317 a 16319, alegando ainda que a omissão do Ministério Público, constitua ela uma nulidade ou uma irregularidade, jamais poderá vir a ser reparada, uma vez que as perícias em causa já se realizaram. (…) Cumpre apreciar e decidir. No caso sub judice, no decurso da fase de inquérito, o Ministério Público solicitou ao Instituto Nacional de Medicina Legal a realização de perícias (...)-legais sobre a personalidade e de natureza sexual a incidirem sobre diversas testemunhas (cfr. fls. 5836, 5867, 6837 e 9890). Estatui o art. 154°, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, que o despacho que ordena a perícia é notificado ao Ministério Público, quando este não for o seu autor, ao arguido, ao assistente e às partes civis, com a antecedência mínima de três dias sobre a data indicada para a realização da perícia. Ainda de acordo com o n. 3 do mesmo preceito legal, ressalvam-se do dis(...) no número anterior os casos: em que a perícia tiver lugar no decurso do inquérito e a autoridade judiciária que a ordenar tiver razões para crer que o conhecimento dela ou dos seus resultados, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis poderia prejudicar as finalidades do inquérito [al. a)]: de urgência ou de perigo na demora [al. b)]. No entanto, de harmonia com o dis(...) no art. 40° do Dec.-Lei n.º 11/98, de 24-01, que estabelece o regime jurídico de organização (...)-legal e o âmbito material e territorial de actuação dos serviços (...)-legais, as perícias (...)-legais são ordenadas, nos termos da lei de processo, por despacho da autoridade judiciária competente, não lhes sendo, todavia, aplicável o dis(...) nos artigos 154º e 155º do Código de Processo Penal. Verifica-se assim que não assiste qualquer razão aos arguidos E, K, N, (…) e H, pois basta ler o último dispositivo legal citado para se perceber que o despacho do Ministério Público que ordenou a realização das perícias sobre a personalidade e de natureza sexual mencionadas não tinha que ser notificado aos arguidos. E não se diga, como o fazem os arguidos K e N que tal falta de notificação por parte do Ministério Público ofende as garantias de defesa que assistem ao arguido em processo penal por força do dis(...) no art. 32° da Constituição da República Portuguesa. Na verdade, o n.º 1 deste preceito da Lei Fundamental determina que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. Mas acrescenta o n.º 5 do mesmo dispositivo que o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório. Ou seja, à luz das exigências Constitucionais, a audiência de julgamento é a sede própria para o exercício do contraditório, cabendo ao legislador ordinário estabelecer outros actos processuais em que tal exercício também tenha lugar, e foi precisamente o que sucedeu com o supra mencionado art. 154°, n.º 2, do Cód. Proc. Penal. A esta circunstância não terá sido alheio o facto de o juizo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial Se presumir subtraído à livre apreciação do julgador, conforme decorre do estatuído no art.163°, n.º 1, do Cód. Proc. Penal. No entanto, o mesmo legislador ordinário entendeu não abranger por esse regime as perícias (...)-legais, e compreende-se que assim seja, atenta a especial atribuição dos serviços (...)-legais de coadjuvação dos Tribunais na administração da justiça - cfr. art. 5°, al. a), do referido Dec,-Lei n.º 11/98. Por tudo o ex(...), julgo improcedente a arguição dos vícios (nomeadamente por não ter sido dado cumprimento ao dis(...) no art. 154º, n.ºs 2 e 3, do Cód. Proc. Penal) apontados pelos arguidos E, K, N, (…) e H às perícias sobre a personalidade e de natureza sexual realizadas em sede de inquérito. (…) - Alegaram os arguidos K, N, (…) e H que as perícias sobre a personalidade das testemunhas não respeitaram o dis(...) no art. 131°, n.º 3, do Cód. Proc. Penal. Entendem os arguidos K e N que de acordo como dis(...) no art. 131°, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, as perícias sobre personalidade só podem ser realizadas à alegada vítima de abuso sexual quando esta for menor de dezasseis anos. Referem que alguns dos examinados eram já maiores de dezasseis anos aquando da realização das aludidas perícias sobre a personalidade. (…) Cumpre apreciar e decidir. No decurso do inquérito, por ordem do Ministério Público, foi determinado a realização de perícias sobre a personalidade de diversas testemunhas, sendo que aquando da realização de tais perícias alguns dos examinados eram já maiores de dezasseis anos de idade. Estatui o art. 131°, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, que a autoridade judiciária verifica a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar da sua credibilidade e puder ser feito sem retardamento da marcha normal do processo. Por seu turno, acrescenta o n.º 3 do mesmo preceito legal que tratando-se de depoimento de menor de dezasseis anos em crime sexual, pode ter lugar perícia sobre a personalidade. Os arguidos K. N, (…) e H interpretam este n.º 3 do art. 131° do Cód. Proc. Penal como querendo significar que a perícia sobre a personalidade para avaliar da credibilidade de testemunha em crime sexual só pode ser realizada se a testemunha for menor de dezasseis anos. No entanto, entendo que o verdadeiro significado de tal n.º 3, ao contrário do que os referidos arguidos defendem, é que as perícias sobre a personalidade para avaliar da credibilidade de testemunha em crime sexual podem ser realizadas ainda que a testemunha seja menor de dezasseis anos. Ou seja, o n.º 2 do referido art. 131º prevê que a autoridade judiciária verifique a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, não estabelecendo de que forma. Por outro lado, de harmonia com o dis(...) no art. 151º do Cód. Proc. Penal, a prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos [in casu, credibilidade de testemunha] exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. Assim, da conjugação do art. 131°, n.º 2, com o art. 151°, ambos do Cód. Proc. Penal, resulta que a aludida verificação da aptidão de uma pessoa para prestar testemunho pode ser feita por qualquer forma que se entenda conveniente, incluindo através de perícia sobre a personalidade. O n.º 3 do já citado art. 131º apenas pretende significar que mesmo que a testemunha em crime sexual seja menor de dezasseis anos também pode ser realizada perícia sobre a sua personalidade. É o que a própria redacção do n.º 3 do art. 131° do Cód. Proc. Penal inculca, pois se o legislador lhe tivesse querido dar o sentido que os arguidos K, N, (…) e H lhe dão teria feito constar que "tratando-se de depoimento de menor de dezasseis anos em crime sexual, pode ainda ter lugar perícia sobre a personalidade" ou "só em caso de depoimento de menor de dezasseis anos em crime sexual pode ter lugar perícia sobre a personalidade". Em suma, o n.º 3 do art. 131º do Cód. Proc. Penal, atenta a natureza da investigação dos crimes sexuais, traduz apenas uma preocupação especial de o legislador tornar claro que mesmo que o depoimento seja de menor de dezasseis anos pode ter lugar perícia sobre a personalidade, implicando mesmo uma sugestão para que a mesma tenha lugar. Pelas razões expostas, julgo improcedente o aludida vício apontado pelos arguidos K, N, (…) e H às perícias sobre a personalidade de testemunhas realizadas no decurso do inquérito." (fim de transcrição) Inconformados com o teor do despacho, na parte ora transcrita, os arguidos K e N, dele interpuseram recurso, pedindo a sua subida imediata e extraindo da sua motivação (cf. fls. 17678 e segs.) as seguintes conclusões: "1. O artigo 40° do Decreto-Lei nº 11/98 de 24 de Janeiro estabelece que as perícias (...)-legais não estão sujeitas ao regime preceituado nos artigos 154° e 155° do Código de Processo Penal (doravante designado apenas por CPP). 2. Com fundamento em tal dispositivo, o tribunal a quo decidiu não dar razão aos ora recorrentes, quanto à alegada sujeição das perícias sobre personalidade realizadas no âmbito do presente inquérito, a testemunhas do processo, a tais normativos. 3. Contudo, as perícias sobre personalidade realizadas não constituem perícias (...)-legais. 4. A perícia (...)-legal é, obrigatoriamente, realizada por um (...) (com conhecimentos (...)s e habilitado com o curso superior de medicina), seja ela dirigida à descoberta de uma causa de morte (autópsia), de uma patologia de ordem psiquiátrica (perícia psiquiátrica), ou de ofensas à integridade física (traumatologia). 5. Ora, tanto a BB, como o BC - os dois peritos que realizaram as perícias de personalidade às testemunhas - têm como formação superior um curso de psicologia e foi tão só nessa qualidade de psicólogos que intervieram neste caso. 6. Consequentemente, tais profissionais não dispunham dos conhecimentos (...)s essenciais à realização de uma perícia (...)-legal. 7. Por essa razão, a sua intervenção limitou-se à realização de entrevistas aos visados, cuja interpretação não assume qualquer carácter (...) e cujas conclusões não são, manifestamente, de ordem (...). 8. Pelo ex(...), não constituindo as perícias de personalidade realizadas no âmbito dos presentes autos, pelos psicólogos supra mencionados e identificados nos vários relatórios constantes do Apenso CC, perícias (...)-legais, mas tão só perícias sobre personalidade, a ressalva estabelecida pelo artigo 40° do Decreto-Lei nº 11/98 de 24 de Janeiro à sujeição ao regime prescrito nos artigos 154º e 155º do CPP, não lhes é aplicável. 9. O artigo 154º nº 2 do CPP impõe a notificação do despacho que ordena a realização de uma perícia aos restantes intervenientes processuais, com uma antecedência mínima de três dias da sua realização, por forma a que os mesmos possam indicar um consultor técnico da sua confiança, que assista ao exame em apreço, afira da sua fiabilidade e assuma até alguma intervenção na realização do mesmo, nos termos aos artigos 155º e 156º do CPP. 10. O Ministério Público não efectuou tal notificação à defesa e nem fundamentou nos despachos em que ordenou as perícias em causa, a razão de tal incumprimento. 11. No presente caso, não se verificam as excepções previstas no nº 3 do artigo 154° do CPP, não existindo qualquer urgência ou perigo na demora na realização da perícia, nem tão pouco razões para crer que o conhecimento da sua realização pela defesa poderia prejudicar as finalidades do inquérito. 12. Pelo ex(...), o Mmo Juiz do tribunal a quo, deveria ter reconhecido que o Ministério Público estava obrigado a notificar os arguidos da realização das perícias sobre personalidade, nos termos dos artigos 154° e 155° do CPP e, em consequência, declarado o vício de nulidade - ou no limite de irregularidade - que feriu tal prova, por omissão desses requisitos legais. 13. Não o tendo feito, a decisão recorrida violou os artigos 154° e 155º do CPP que impunham tal notificação e, ao fazer uso do artigo 40º do Decreto-Lei nº 11/98 de 24 de Janeiro, o qual não é aplicável ao presente caso, agrediu também este dispositivo. 14. Dispõe o nº 3 do artigo 131º do CPP que "tratando-se de depoimento de menor de 16 anos em crime sexual pode ter lugar a perícia sobre a personalidade". 15. Este normativo não prevê, assim, a realização de perícia de personalidade, em caso de depoimento de maior de 16 anos, o que implica a proibição da sua realização. 16. O Código de Processo Penal não integra qualquer outra norma que preveja a realização de perícia de personalidade a testemunhas, mas tão só ao arguido, no seu artigo 160º do CPP. 17. Pelo ex(...), e atenta a clareza da redacção do nº 3 do artigo 131º do CPP, é manifesto que a nossa lei processual penal não concebe e, por isso, não permite, a realização de perícia sobre personalidade a testemunhas, maiores de dezasseis anos, em caso de crime sexual. 18. Se o legislador pretendesse consagrar a realização de tais perícias a menores e a maiores de dezasseis anos, não faria constar na lei processual qualquer referência etária como seu requisito, antes a suprimindo por completo. 19. Acresce que a nossa Jurisprudência já esclareceu que a preocupação do legislador nesta matéria, foi permitir a realização de uma perícia de personalidade a menores de dezasseis, em casos de crimes sexuais, para que o Julgador pudesse avaliar da sua maturidade para a compreensão dos factos: "Com a perícia mencionada no artigo 131º nº 3 do CPP, visa-se determinar o estado de desenvolvimento do menor, especialmente no plano psíquico, o grau de maturidade, em ordem a detectar se possui ou não capacidade para compreender, avaliar e relatar factos que digam respeito a si ou a outrém; elementos esses coadjuvantes do tribunal, que lhe permitem avaliar da credibilidade que deve ser atribuída ao testemunho prestado ou a prestar". - Ac- STJ de 7 de Dezembro de 1999, proc. 530/99-5ª; SASTJ, n° 36, 58. 20. A credibilidade do testemunho de maiores de dezasseis anos, em crimes sexuais, é, assim, avaliada, como sucede em relação a qualquer testemunha maior, sem necessidade de realização de perícia de personalidade. 21. Pelo ex(...), as perícias realizadas à personalidade das testemunhas - AP; AT; AI; AK; AN; Y; AU; AV -; sendo estes já maiores de dezasseis anos quando as efectuaram são, em rigor, inexistentes, não podendo assumir qualquer valor probatório nos presentes autos. 22. Não tendo declarado a sua inexistência, antes admitindo o seu valor probatório, o Mmo Juiz do tribunal a quo violou o artigo 131° n° 3 do CPP, o qual não admite claramente a realização de tais perícias. Pelo ex(...), deve o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser declarada a nulidade de todas perícias sobre personalidade realizadas nos presentes autos, ou, caso assim não se entenda, a sua irregularidade - por violação dos artigos 151°, 154°, 155° e 156° do CPP -, bem como a inexistência das perícias sobre a personalidade, realizadas a testemunhas/ ofendidos maiores de dezasseis anos, por violação do artigo 131º nº 3 e 160º do CPP e, como consequência, a insusceptibilidade destes meios de prova e respectivos relatórios, virem a assumir qualquer valor probatório nos presentes autos, devendo proceder-se ao seu desentranhamento dos autos." (fim de transcrição) A fls. 18015 foi proferido despacho a admitir o recurso, decidindo-se pela sua subida diferida, com o recurso que pusesse termo à causa, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Respondeu o Ministério Público, a este recurso do arguido K, extraindo as seguintes conclusões (fls. 72328 a 72333): “64. - Quanto ao Recurso do Arguido K, ora respondido em “B).4.”, o Arguido veio interpor recurso do Despacho Judicial de fls. 17.018 a 17.056, que indeferiu a arguição da nulidade - ou no limite - irregularidade, da realização das Perícias à Personalidade, constantes do Apenso “CC”, porquanto, o MºPº estaria obrigado a notificar a sua realização ao Arguido, nos termos dos artºs 154º e 155º, do C. Penal; 65. - Por outro lado, e relativamente à realização de Perícias a maiores de 16 anos, não há nenhuma norma que o preveja - ao contrário do que acontece com os menores de 16 anos (artº 131º, nº 3, do CPP) - pelo que a realização das mesmas é proibida; 66. - Conclui pela inexistência das perícias à personalidade, realizadas aos Ofendidos AP, AT, AI, AK, AN, Y, AU e AV; 67. - Em síntese, o Arguido pede que seja declarada a inexistência das perícias realizadas aos Ofendidos maiores de 16 anos e a nulidade das perícias realizadas nos autos, por violação do dis(...) nos artºs 151º,154º,155º e 156º, 131º, nº 3 e 160º, do CPP; 68. - O Arguido FD requereu, a fls. 24.222 (Contestação), a realização de novas Perícias aos Assistentes AV, AT, AN, AP, AI, Y e X, bem como, AC, sendo certo que todos estes Assistentes tinham já mais de dezasseis anos; 69. - Mais requereu que a realização das mesmas fosse deferida ao Instituto Nacional de Medicina Legal, concretamente às suas Delegações de Coimbra e Porto; 70. - Assim, o próprio Arguido vem reconhecer, não só, que as Perícias à Personalida-de podem ser realizadas a maiores de 16 anos, mas, também, que as mesmas são da competência do Instituto Nacional de Medicina Legal; 71. - O Arguido FD invoca a pretensa nulidade das Perícias (...)-Legais à Personalidade das Testemunhas, uma vez que, em seu entender resultará dos artºs 160º e 131º, nº 1, do CPP, a contrario, estar vedada a sua realização, pelo que, as que foram realizadas, enfermariam de nulidade insanável, ou, no limite, de irregularidade, não tendo, no entanto, indicado de que nulidade se trata, omitindo qualquer referência aos artºs 119º a 123º, do CPP; 72. - Estatui o art. 154°, nº 2, do CPP, que o Despacho que ordena a Perícia é notificado ao Mº Pº, quando este não for o seu autor, ao Arguido, ao Assistente e às Partes Civis, com a antecedência mínima de 3 dias, sobre a data indicada para a realização da Perícia; 73. - Ainda de acordo com o nº 3, do mesmo preceito legal, ressalvam-se, do dis(...) no número anterior, os casos: em que a perícia tiver lugar no decurso do Inquérito e a Autoridade Judiciária que a ordenar tiver razões para crer que o conhecimento dela ou dos seus resultados, pelo Arguido, pelo Assistente ou pelas Partes Civis poderia prejudicar as finalidades do Inquérito - «a)» -, de urgência, ou de perigo, na demora «b)»; 74. - No entanto, de harmonia com o dis(...) no artº 40°, do DL nº 11/98, de 24 de Janeiro, que estabelece o regime jurídico de organização (...)-legal e o âmbito material e territorial de actuação dos serviços (...)-legais, as Perícias (...)-Legais são ordenadas, nos termos da lei de processo, por Despacho da Autoridade Judiciária competente, não lhes sendo, todavia, aplicável o dis(...) nos artigos 154° e 155º, do CPP; 75. - Verifica-se, assim, que não assiste qualquer razão ao Arguido, pois basta ler o último dispositivo legal citado para se perceber que o Despacho do Mº Pº, que ordenou a realização das perícias sobre a personalidade e de natureza sexual, mencionadas, não tinha que lhe ser notificado; 76. - E nem se diga que, tal falta de notificação, por parte do Mº Pº, ofende as garantias de defesa que assistem ao Arguido em processo penal por força do dis(...) no art. 32º, da Constituição da República Portuguesa; 77. - Na verdade, o nº 1, deste preceito da Lei Fundamental, determina que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. Mas acrescenta o nº 5, do mesmo dispositivo, que o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório; 78. - Ou seja, à luz das exigências constitucionais, a audiência de julgamento é a sede própria para o exercício do contraditório, cabendo ao legislador ordinário estabelecer outros actos processuais em que tal exercício também tenha lugar, tendo sido precisamente o que sucedeu com o supra mencionado art. 154°, nº 2, do CPP. A esta circunstância não terá sido alheio o facto de o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial se presumir subtraído à livre apreciação do julgador, conforme decorre do estatuído no art. 163°, nº 1, do CPP; 79. - No entanto, o mesmo legislador ordinário entendeu não abranger por esse regime as Perícias (...)-Legais. E compreende-se que assim seja, atenta a especial atribuição dos serviços (...)-legais de coadjuvação dos Tribunais na administração da Justiça - cfr. art. 5°, a), do referido DL nº 11/98; 80. - Por outro lado, não se descortina o fundamento legal que suporta a alegação do Recorrente de que as perícias à personalidade não podem ser realizadas a Testemunhas maiores de 16 anos; 81. - Com efeito, da conjugação do dis(...) nos artºs. 151º e 131°, nºs 1, 2 e 3, ambos do CPP, resulta que a capacidade para ser testemunha pode ser verificada através de perícia sobre a personalidade. Destes dispositivos legais não se extrai em que se traduza em concreto uma perícia sobre a personalidade; 82. - O CPP prevê a realização deste tipo de perícia, mas na pessoa do Arguido e tendo em vista as finalidades a que se alude no nº 1, do art. 160°, do diploma em referência, podendo relevar, nomeadamente, para a decisão sobre a revogação da prisão preventiva, a culpa do agente e a determinação da sanção; 83. - No entanto, do mesmo preceito legal pode aproveitar-se algo para o entendi-mento do que seja a aludida perícia sobre a personalidade a incidir sobre testemunhas, pois sabe-se que tal perícia recai sobre as características psíquicas independentes de causas patológicas, bem como sobre o grau de socialização do Arguido. No nº 2, do referido preceito legal, prevê-se quem pode realizar as perícias sobre a personalidade, sendo que, não havendo serviços especializados, a Lei não estabelece qualquer ordem de deferimento que tenha necessariamente que ser seguida, sucessivamente, entre serviços de reinserção social, especialistas em Criminologia, em Psicologia, em Sociologia, ou, em Psiquiatria. Ou seja, qualquer um destes serviços ou especialistas pode realizar a perícia na ausência de serviços especializados; 84. - No caso dos autos, o Mº Pº deferiu a realização de tais perícias à Delegação de Lisboa, do Instituto Nacional de Medicina Legal (cujos relatórios periciais constam do Apenso “CC”); 85. - De harmonia com o dis(...) no art. 25°, nº 2, do DL nº 96/2001, de 26 de Março, são serviços técnicos das Delegações do Instituto Nacional de Medicina Legal: o Serviço de Tanatologia Forense «a)»; o Serviço de (...) (...)-Legal «b)»; o Serviço de Toxicologia Forense «c)»; o Serviço de Genética e Biologia Forense «d)»; o Serviço de Psiquiatria Forense «e)»; e o Serviço de Anatomia Patológica Forense «f)»; 86. - Estatui o art. 30°, nº 1, do referido DL, que ao Serviço de Psiquiatria Forense compete a realização de perícias e exames psiquiátricos e psicológicos, solicitados à Delegação; 87. - Ora, tendo a Delegação de Lisboa, do Instituto Nacional de Medicina Legal, com-petência para a realização de perícias e exames psiquiátricos e psicológicos, e podendo as perícias sobre a personalidade ser deferidas a especialistas em psicologia, ou em psiquiatria, não se verifica qualquer vício que afecte a validade das perícias, à personalidade, realizadas;” (fim de transcrição) O recorrente N veio entretanto aos autos informar não manter interesse neste seu recurso (vd. fls. 72767 a 72770). Apreciando. Atendendo às conclusões do recorrente K, já acima transcritas, este só alega que as notificações para as perícias sobre a personalidade tinham que ter lugar previamente à realização das mesmas por entender que estas não constituem perícias (...)-legais, pois, como do teor daquelas (conclusões) resulta, o recorrente conformar-se-ia com a omissão de notificação se estas (perícias de personalidade) tivessem tal natureza (de perícias (...)-legais), aceitando que nesse caso, face à ressalva estabelecida pelo artigo 40.° do Decreto-Lei n.º 11/98 de 24 de Janeiro, não haveria a sujeição ao regime prescrito nos arts. 154.º e 155.º do CPP. Portanto, a primeira questão que se coloca é a de saber se as perícias sobre a personalidade são perícias (...)-legais. Para o recorrente "A perícia (...)-legal é, obrigatoriamente, realizada por um (...) (com conhecimentos (...)s e habilitado com o curso superior de medicina), seja ela dirigida à descoberta de uma causa de morte (autópsia), de uma patologia de ordem psiquiátrica (perícia psiquiátrica), ou de ofensas à integridade física (traumatologia)", sendo que "tanto a BB, como o BC - os dois peritos que realizaram as perícias de personalidade às testemunhas – têm como formação superior um curso de psicologia e foi tão só nessa qualidade de psicólogos que intervieram neste caso", pelo que, para o recorrente, "tais profissionais não dispunham dos conhecimentos (...)s essenciais à realização de uma perícia (...)-legal" e "Por essa razão, a sua intervenção (…) não assume qualquer carácter (...)" e as suas "conclusões não são, manifestamente, de ordem (...)". Vejamos. Como ensina Mário R. Simões em "Relatórios psicológicos: Exercícios de aproximação ao contexto forense" in "Psicologia forense", obra coordenada por Carla Machado e Rui Abrunhosa Gonçalves, Ed. Quarteto, 2005, a pág. 58: "A perícia constitui um instrumento de assessoria técnica aos tribunais e tem como finalidade apoiar o juiz na tomada de decisão. A colaboração de psicólogos pode ser perspectivada, por exemplo, quer no âmbito da «perícia relativa a questões psiquiátricas» (Artigo 159.°, «Perícia (...)-legal e psiquiátrica»), quer da «perícia sobre a personalidade» (Artigo 160.°). «Para efeito de avaliação da personalidade e da perigosidade do arguido pode haver lugar a perícia sobre as suas características psíquicas independentes de causas patológicas, bem como sobre o seu grau de socialização. A perícia pode relevar, nomeadamente para a decisão sobre a revogação da prisão preventiva, a culpa do agente e a determinação da sanção. A perícia pode ser realizada por especialistas em criminologia, em psicologia ou em psiquiatria.. (Artigo 160.°, «Perícia sobre a personalidade»)." Por outro lado, como expende o Exmº Desembargador A. J. Latas em "Processo penal e prova pericial" in "Psicologia forense", obra coordenada por António Castro Fonseca, Ed. Almedina, 2006, a pág. 100 e segs.: "Nos termos do CPP, a perícia é ordenada pelo juiz de instrução ou pelo juiz de julgamento se o processo se encontrar nas fases de Instrução ou Julgamento, respectivamente, e pelo Ministério Público se o processo se encontrar na fase inicial de Inquérito, o qual, actualmente, pode delegar em autoridade de polícia criminal a competência para ordenar a realização de perícias em tipos determinados de crime, nos casos de urgência ou perigo na demora, exceptuando perícia que envolva a realização de autópsia (...)-legal (art. 270.° do CPP). Também uma alteração de 2001 à Lei Orgânica da Polícia Judiciária veio permitir que os seus funcionários qualificados como autoridades de polícia criminal possam ordenar a realização de perícias a efectuar por organismos oficiais, no âmbito de delegação genérica de competências (embora deva comunicá-lo imediatamente ao MP), excepto tratando-se de perícias relativas a questões psiquiátricas ou sobre a personalidade, para além de autópsia (...)-legal, as quais não podem ser solicitadas pelos OPC. Grande parte das perícias são ordenadas na fase de inquérito, assumindo importância crescente na própria configuração e rumo da investigação dos crimes na sua fase inicial, do mesmo modo que são essenciais, em cada vez maior número de casos, para que o MP fundamente a sua decisão de acusar ou não no termo do inquérito e possa sustentar a mesma nas fases jurisdicionais. Em regra, nesta fase é oficiosa a decisão de realizar a perícia, embora nada obste a que a mesma seja tomada a solicitação do arguido no âmbito do seu direito de requerer as diligências que entenda convenientes, em qualquer fase do processo, ou mesmo a sugestão do Assistente, como colaborador do MP. Na fase de Instrução cabe exclusivamente ao juiz ordenar a realização da perícia, quer oficiosamente, quer a solicitação do requerente de abertura da respectiva fase, seja ele o arguido ou o assistente, ou por sugestão de qualquer deles que o tribunal acatará ou não. Pelas razões aludidas, as perícias são realizadas na fase de Inquérito na generalidade dos casos, transmitindo-se os respectivos resultados às fases jurisdicionais, designadamente à fase de julgamento, pelo que, tal como a lei processual pressupõe, não é nesta fase processual que, em regra, tem lugar a realização de perícias. Nada impede, porém, que, apenas na fase de Julgamento seja ordenada a realização de perícia - oficiosamente ou a requerimento - o que sucederá sempre que a sua necessidade se torne evidente para o tribunal de julgamento ou para o juiz singular que dirige o processo, de acordo com o princípio da investigação ou da verdade material. (…) Nos termos do art, 154.° do CPP, as autoridades judiciárias ordenam a realização de perícia mediante despacho, contendo indicação sumária do objecto da perícia e o nome dos peritos (se for caso disso) e quando deve realizar-se. Este despacho deve ser notificado a todos os sujeitos processuais com interesse no respectivo resultado (MP se não for quem decide da mesma, o arguido o assistente e as partes civis), com antecedência mínima de três dias visando, desde logo, dar-lhes a possibilidade de designarem o seu consultor técnico, nos casos em que é admissível, como melhor veremos infra. Não haverá lugar à notificação em casos de urgência ou perigo na demora em qualquer fase processual, ou se, na fase de inquérito, o MP considerar que o conhecimento da realização da perícia ou dos seus resultados por parte do arguido, do assistente ou das partes civis, pode prejudicar as finalidades do inquérito, ou seja, no caso, o interesse público nas investigações dos crimes, o que nos remete para as razões que naquela fase processual justificam o segredo de justiça interno, isto é, a proibição de acesso ao processo por parte dos sujeitos processuais, maxime o arguido. (…) O regime legal das perícias (...)-legais expressamente afasta a aplicabilidade do art. 154.° do CPP, pelo que a autoridade judiciária se limita a ordenar a realização da perícia, cabendo ao Instituto Nacional de Medicina Legal (INML) a indicação dos peritos que em concreto a efectivarão. (…) O Código de Processo Penal e legislação avulsa regulam especialmente as perícias (...)-legais, ou seja, as perícias que supõem a aplicação de conhecimentos (...)s e biológicos à resolução de problemas jurídicos, designadamente jurídico-penais, cuja importância, no conjunto das perícias forenses, é indiscutível, conhecendo um elevado desenvolvimento científico e organizacional consentâneo com a importância que, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, detém no nosso sistema processual penal. O actual sistema legal das perícias (...)-legais, incluindo as perícias de psiquiatria e psicologia forenses, resulta no essencial de três diplomas legais: o Código de Processo Penal, o Decreto-lei n.º 96/2001, de 26 de Março, que aprovou a lei orgânica do Instituto Nacional de Medicina Legal, e a Lei n.º 45/2004, de 19 de Agosto, que estabelece o regime jurídico da realização das perícias (...)-legais e forenses. Estas são, obrigatoriamente, da competência das delegações e dos gabinetes (...)-legais do INML, que é um instituto público sujeito à superintendência e tutela do Ministério da Justiça. Todavia, perante manifesta impossibilidade daqueles serviços, podem as perícias ser levadas a cabo por entidades terceiras, públicas ou privadas, contratadas ou indicadas para o efeito pelo INML. Nas comarcas não abrangidas pelas delegações ou gabinetes em funcionamento, as perícias podem ser ainda realizadas por (...)s a contratar directamente pelo INML segundo o procedimento burocrático estabelecido na lei. (…) Embora o Código do Processo Penal continue a referir-se autonomamente à perícia psiquiátrica, a perícia a realizar no âmbito desta especialidade médica é legalmente tratada em paridade com as restantes perícias (...)-legais. Deve ser solicitada à delegação do INML (Lisboa, Porto ou Coimbra) da área territorial do tribunal que os requer e é levada a cabo pelo serviço de Psiquiatria Forense, que é um dos serviços técnicos das delegações do INML, ao lado do serviço de tanatologia forense, (...) (...)-legal, toxicologia forense, genética e biologia forense e anatomia patológica forense, sem particularidades de relevo face às restantes especialidades. Se os serviços próprios das delegações não dispuserem de especialistas em número suficiente para todas as solicitações, podem deferir a realização das perícias a serviços especializados do Serviço Nacional de Saúde. (…) Distinção entre perícia psiquiátrica e perícias sobre a personalidade O Código de Processo Penal refere ainda autonomamente a perícia sobre a personalidade, a qual pode consistir na avaliação da personalidade e perigosidade do arguido, nos termos do art. 160.° do CPP, ou versar sobre a capacidade e credibilidade de testemunha menor de 16 anos (em processo penal, mesmo a vítima tem o estatuto processual de testemunha quando não se constitui assistente ou não é parte civil) em crime sexual (art. 131.° n.º 3 do CPP) e não se confunde, em qualquer dos casos, com a perícia psiquiátrica. A perícia sobre a personalidade a que se refere o art. 160.° do CPP consiste na avaliação de características psíquicas do arguido (e não de quaisquer outros intervenientes processuais), independentes de causas patológicas, bem como na avaliação do seu grau de socialização, e visa assessorar o tribunal na decisão de questões específicas, como a revogação da prisão preventiva, a culpa do agente e a determinação da sanção (…). A perícia sobre a capacidade e credibilidade de testemunha em crime sexual (art. 131.° CPP) consiste, essencialmente, na apreciação sobre a existência de morbosidade, imaturidade ou outras características psíquicas susceptíveis de porem em causa a capacidade de a testemunha depor de forma credível. As perícias sobre a personalidade devem ser deferidas a serviços especializados e na falta ou inadequação destes, a serviços de reinserção social ou, ainda, a especialistas em criminologia, psicologia, sociologia ou psiquiatria, sem prejuízo da solicitação de exames complementares entre si ou perante outras especialidades. Também quanto a estas perícias, o CPP expressamente prevê a contratação de entidades terceiras, nos moldes já aludidos. Na prática, estas perícias têm sido realizadas pelo Instituto de Reinserção Social ou pelo serviço de psiquiatria forense do INML que inclui entre as suas competências a realização das perícias de psicologia forense. Quanto à perícia psiquiátrica, o CPP não procede à sua definição e a Lei de 2004 apenas refere genericamente as perícias psiquiátricas e as perícias no âmbito da psiquiatria forense, o que bem pode ficar a dever-se a dificuldades em delimitar o seu objecto face à constante evolução científica na área. Em todo o caso, resulta suficientemente da regulamentação penal e processual sobre os temas respectivos, que a perícia, realizada por (...)s da especialidade e, eventualmente, com a participação de especialistas em psicologia e criminologia, destina-se, desde logo, a apurar se o arguido sofre de anomalia psíquica que determine a sua inimputabilidade. Pode ainda aquela perícia incidir sobre a pessoa da vítima, como sucede, por exemplo, quando se trate de averiguar se esta sofre de anomalia psíquica para efeitos de agravação do crime de lenocínio (art. 170.° n." 2 do Código Penal) ou se ficou afectada de anomalia psíquica grave em consequência de ofensa à integridade física (art. 144.° c) do Código Penal). Ainda que nem sempre se apresente clara a distinção entre psiquiatria e psicologia que, cada vez mais, operam em territórios comuns, parece que a distinção entre a perícia psiquiátrica e perícia sobre a personalidade assenta, sobretudo, na definição legal do objecto de cada uma das perícias e na atribuição da responsabilidade pela realização da perícia psiquiátrica a (...)s psiquiatras, ainda que admitindo a participação de especialistas em psicologia, a qual pode consistir na realização de exames psicológicos complementares, quer incidindo sobre aspectos cognitivos, quer sobre a personalidade." (fim de transcrição) Como se consignou no acórdão do STJ de 23 de Outubro de 2008, relatado pelo Exmº Cons. Simas Santos, proferido no proc. 08/P2869 e consultável in www.jusnet.pt: «Note-se que a veracidade do depoimento da ora assistente é corroborada pelo "Relatório de avaliação psicológica" elaborado pelo Instituto de Educação e Psicologia da UM, conforme permite o n° 2 do art° 131° do C.P.P., cuja finalidade é a verificação da aptidão psíquica da então menor para prestar testemunho relativamente aos graves factos de que acusava o arguido. A prova pericial tem lugar, de acordo com o art°151° do CPP, quando a percepção ou apreciação dos factos exigem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, sendo a perícia, a actividade de percepção ou apreciação dos factos probandos efectuada por pessoas dotadas de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. (Marques da Silva - Curso de Processo Penal II, pág.197) O objecto da perícia é a percepção de factos ou a sua valoração. Embora o juiz pela formação que possui tenha capacidade para avaliar da credibilidade das testemunhas em geral, tratando-se de menores, porque a percepção da sua aptidão física e mental para prestar testemunho se toma mais difícil, permite e até aconselha a lei que se solicite a técnicos avalizados, com conhecimentos técnicos específicos, a realização de perícias destinadas a avaliar da sua credibilidade. O perito, pessoa dotada de especiais conhecimentos técnicos, está melhor preparado para percepcionar ou apreciar da credibilidade do depoimento, funcionando, assim, como auxiliar do juiz. É finalidade da perícia percepcionar e valorar factos (Germano Marques da Silva - Curso de Processo Penal II, pág. 198) constituindo prova que pode e deve ser considerada em julgamento. No caso dos autos a função do perito foi a de auxiliar do juiz apenas no que concerne à percepção da credibilidade da assistente Não se substitui ao juiz na avaliação do testemunho. Ou seja, o perito não "diz" ao juiz o que do depoimento deve ou não ser aproveitado. Apenas lhe indica, de acordo com os estudos que fez, se a testemunha ou declarante merece ou não credibilidade. Ora, de acordo com o art°163° do C.P.P. o relatório pericial impõe-se, em princípio, ao julgador, que o tem de acatar. Se dele divergir, essa divergência tem que ser devidamente fundamentada. No caso, a conclusão do relatório vai de encontro à percepção dos julgadores, corroborando-a.(…) O relatório não substitui as declarações da assistente.» E merecem estas considerações a nossa inteira concordância, sendo certo que a 1.ª instância se moveu nos limites traçados pela Lei, quer quanto à perícia em causa, quer quanto ao uso do princípio da livre convicção pelo Tribunal de 1.ª Instância, perante essa perícia. Escrevem sobre essa matéria Simas Santos e Leal-Henriques (CPP Anotado, I, pág. 938): «Fala o n.º 3 (…) em perícia da personalidade, o que nos remete para os art.ºs 160.º e 160.º-A, onde se dispõe sobre a perícia de personalidade. Ela deve ser deferida a serviços especializados, incluindo os serviços de reinserção social, ou, quando isso não for possível ou conveniente, a especialistas em criminologia, em psicologia, em sociologia ou em psiquiatria (n.º 2 do art.º 160.º), mas pode ainda ser realizada por entidades terceiras que para tanto tenham sido contratadas por quem as tivesse de realizar, desde que aquelas não tenham qualquer interesse na decisão a proferir ou ligação com o assistente ou com o arguido (n.º 1 do art.º 160.º-A). Enquanto a perícia de personalidade do arguido é realizada para efeito de avaliação da sua personalidade e perigosidade do arguido, incidindo sobre as características psíquicas independentes de causas patológicas, bem como sobre o seu grau de socialização (n.º 1 do art.º 160.º), aqui a perícia visa verificar a aptidão física e mental do menor de 18 para depor em crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, designadamente quando deles foi vítima, para avaliar da sua credibilidade (n.º 2 deste artigo).» E na verdade, a credibilidade prende-se necessariamente, pois, com a idade da testemunha e a natureza do crime e postula a obtenção de um discurso sobre a situação, pois não se trata de uma mera credibilidade geral e desligada da vida, tributária tão só de condicionantes psico-biológicas, mas sim da sua credibilidade relacionada com aquele pedaço de vida, que exactamente pela sua natureza autoriza a avaliação pericial da credibilidade da testemunha." (fim de transcrição) Por seu turno, no acórdão do TRP de 11 Junho de 2008, relatado pelo Exmº Desembargador Ferreira Ramos, proferido no proc. 0745662 e consultável in www.jusnet.pt, decidiu-se que: "A regra consagrada no Código de Processo Penal é a de que pode ser testemunha toda a pessoa com capacidade, art.º 131º do Código de Processo Penal. O único caso de incapacidade previsto na lei é a interdição por anomalia psíquica. Além deste caso pode acontecer que a pessoa esteja naturalmente incapacitada para testemunhar, por inaptidão física - a pessoa está em estado vegetativo - ou mental - distúrbio mental grave - incluindo a falta de maturidade própria da infância, v.g. criança de tenra idade. Nestes casos, a autoridade judiciária verificará da aptidão, usando dos meios que entender por convenientes e decidirá livremente sobre a credibilidade do depoimento (Germano Marquesa da Silva, Curso de Processo Penal, II vol, 4ª ed. 2008, p. 165). O meio por excelência para verificar a aptidão mental de um menor para prestar testemunho é a perícia de personalidade referida no art.º 131º do Código de Processo Penal. Se a menor tinha capacidade para testemunhar em observação psicológica, como aí se concluiu, em princípio também teria essa capacidade para depor em processo penal.(…) A perícia destinada a avaliar a credibilidade das declarações de testemunha só ganha relevo se a testemunha prestar depoimento no processo, normalmente depoimento em audiência ou que possa ser considerado em audiência, caso das declarações para memória futura. A narração constante da perícia sem depoimento na audiência ou que possa ser considerado em audiência, art.º 271º do Código de Processo Penal, nada vale. Finalmente o perito deve pronunciar-se sobre a capacidade ou incapacidade da pessoa sujeita a perícia conservar em memória e reproduzir acontecimentos que presenciou ou viveu, isto é sobre os aspectos perceptivos e cognitivos do depoimento, sendo que, quanto à credibilidade a última palavra é a do tribunal (Acórdão do TRL de 21 de Março de 2007, Carlos Almeida disponível no sítio da internet)." (fim de transcrição) O regime jurídico das perícias (...)-legais e forenses está hoje regulado pela Lei n.º 45/2004, de 19 de Agosto, que, nos termos da alínea a) do seu art. 33.º, revogou os arts. 40.º a 54.º e 78.º a 82.º do Decreto-Lei n.º 11/98, de 24 de Janeiro. Mas o art. 40.º do referido Decreto-Lei n.º 11/98, que anteriormente estabeleceu o "regime jurídico da organização (...)-legal e o âmbito material e territorial de actuação dos serviços (...)-legais" e estava em vigor à data em que as perícias dos autos foram ordenadas e realizadas, nele preceituava que: "As perícias (...)-legais são ordenadas, nos termos da lei de processo, por despacho da autoridade judiciária competente, não lhes sendo, todavia, aplicável o dis(...) nos artigos 154.º e 155.º do Código de Processo Penal". A aptidão da testemunha para depor - seja ela ou não vítima, seja maior ou menor de idade - pode ser verificada através de perícia sobre a sua personalidade, como se alcança da conjugação do dis(...) nos arts. 151.º e 131.º do CPP. Do teor destas indicadas normas não se extrai o que seja o exacto conteúdo e âmbito de uma perícia sobre a personalidade. A esta apenas se refere o art. 160.º do CPP. Do dis(...) neste preceito processual penal - e para o efeito é irrelevante que a norma se reporte às perícias sobre a personalidade dos arguidos, tendo em vista, "nomeadamente," "a decisão sobre a revogação da prisão preventiva, a culpa do agente e a determinação da sanção" – retira-se que uma perícia sobre a personalidade, seja de arguido, seja de testemunha, recairá sobre as "características psíquicas independentes de causas patológicas" do examinado. Por seu turno, sabendo-se que a prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos (art. 151.º do CPP), o n.º 2 do preceito em apreço (art. 160.º do CPP) estabelece quem pode realizar as perícias sobre a personalidade. Não existindo "serviços especializados", a lei adjectiva não estabelece qualquer ordem de deferimento, podendo a realização da perícia ser atribuída aleatoriamente aos "serviços de reinserção social", ou a "especialistas em criminologia, em psicologia, em sociologia ou em psiquiatria". Qualquer um destes serviços ou especialistas pode realizar a perícia na ausência de serviços especializados. Nos presentes autos, o Ministério Público deferiu a realização de tais perícias à Delegação de Lisboa do Instituto Nacional de Medicina Legal (constando os respectivos relatórios periciais do apenso CC). As Delegações do Instituto Nacional de Medicina Legal comportam os seguintes serviços técnicos: Tanatologia Forense, (...) (...)-Legal, Toxicologia Forense, Genética e Biologia Forense, Anatomia Patológica Forense e Psiquiatria Forense, sendo que "ao Serviço de Psiquiatria Forense compete a realização de perícias e exames psiquiátricos e psicológicos solicitados à Delegação" (cf. arts. 25.°, n.º 2, e 30.°, n.º 1 do Dec.-Lei n.º 96/2001, de 26 de Março). Se atentarmos no Diário da República, 2.ª série, n.º 120, de 23 de Junho de 2010, e consultarmos a página electrónica do Instituto Nacional de Medicina Legal, verificaremos que este realiza, no quadro da (...) forense, "exames periciais complementares de outras especialidades" e, entre estes, exames psicológicos, como é o caso dos exames de personalidade. Para o efeito, na sequência de concursos documentais, celebra com psicólogos "Contratos de prestação de serviços para realização de perícias no âmbito da psicologia forense", os quais se destinam às "delegações e gabinetes (...)-legais, de acordo com as vagas existentes”, sendo "requisitos de admissão - ser licenciado em ciências psicológicas ou psicologia e estar inscrito na Ordem dos Psicólogos" e considerados, na avaliação curricular, como factores de valoração a ponderar no apuramento, entre outros: "a) Doutoramento em psicologia forense, psicologia legal ou ciências forenses; b) Mestrado em psicologia forense, psicologia legal, psicologia criminal, psicocriminologia, medicina legal e ciências forenses ou ciências forenses; c) Licenciatura em ciências psicológicas ou psicologia com especialização na área da psicologia (...) ou psicologia criminal; d) Experiência profissional comprovada na área da avaliação psicológica (...) e instrumental (questionários, inventários e testes psicométricos mais frequentemente utilizados); e) Acções de formação no âmbito das ciências (...)-legais e forenses, nomeadamente curso superior de medicina legal, ministradas no âmbito do INML, I. P." Só no procedimento concursal aberto em 2010, pelo e para o INML, estiveram a concurso 34 vagas para psicólogos a contratar para diversas Delegações e Gabinetes (...)-Legais. São psicólogos, como era o caso da BB e do BC, que no quadro das suas funções e no das atribuições do INML realizam perícias de personalidade como aquelas a que foram sujeitas as testemunhas dos autos em causa. Ora, tendo a Delegação de Lisboa do Instituto Nacional de Medicina Legal competência para a realização de perícias e exames psiquiátricos e psicológicos e podendo as perícias sobre a personalidade ser deferidas a especialistas em psicologia ou em psiquiatria, não tem razão o recorrente K quando defende que as perícias de personalidade não são perícias (...)-legais. Esta posição tem ainda mais força se atentarmos no n.º 5 aditado ao art. 156.º sob a epígrafe “Procedimento” do CPP pela Lei n.º 48/2007 em que se veio explicitar que "As perícias referidas no n.º 2 do artigo 154.º são realizadas por (...) ou outra pessoa legalmente autorizada (…)", na esteira do dis(...) no n.º 1 do art. 24.º da Lei n.º 45/2004 ("Os exames e perícias de psiquiatria e psicologia forense são solicitados pela entidade competente à delegação do Instituto da área territorial do tribunal que os requer."). Caso se entendesse que as perícias de personalidade em causa não são perícias (...)-legais, então colocar-se-ia a questão de saber se os arguidos tinham de ser notificados previamente da realização das perícias de personalidade às testemunhas/menores/vítimas de crimes sexuais nos autos. Estabelece o art. 154.º do CPP, na redacção da Lei n.º 48/2007 que: "1 — A perícia é ordenada, oficiosamente ou a requerimento, por despacho da autoridade judiciária, contendo o nome dos peritos e a indicação sumária do objecto da perícia, bem como, precedendo audição dos peritos, se possível, a indicação do dia, hora e local em que se efectivará. 2 — Quando se tratar de perícia sobre características físicas ou psíquicas de pessoa que não haja prestado consentimento, o despacho previsto no número anterior é da competência do juiz, que pondera a necessidade da sua realização, tendo em conta o direito à integridade pessoal e à reserva da intimidade do visado. 3 — O despacho é notificado ao Ministério Público, quando este não for o seu autor, ao arguido, ao assistente e às partes civis, com a antecedência mínima de três dias sobre a data indicada para a realização da perícia. 4 — Ressalvam -se do dis(...) no número anterior os casos: a) Em que a perícia tiver lugar no decurso do inquérito e a autoridade judiciária que a ordenar tiver razões para crer que o conhecimento dela ou dos seus resultados, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis, poderia prejudicar as finalidades do inquérito; b) De urgência ou de perigo na demora." Também à data em que as perícias foram ordenadas nos autos era esta a redacção deste artigo, com excepção do seu n.º 2 que era então inexistente, sendo que os seus actuais n.ºs 3 e 4 eram então os seus n.ºs 2 e 3. Nos termos do preceito ora em apreço as perícias são ordenadas, oficiosamente ou a requerimento, por despacho da autoridade judiciária, sendo que naquela fase processual dos autos - inquérito - o Ministério Público era autoridade judiciária, como resulta da alínea b) do art. 1.º do CPP, cabendo-lhe a direcção do inquérito (arts. 263.º, n.º 1 e 267.º do CPP). A este propósito Maia Gonçalves na sua anotação 3. ao art. 154.º do CPP (pág. 362, 15ª Edição, 2005) explicita que: "Tendo a perícia que ser ordenada por despacho da autoridade judiciária, portanto por juiz, juiz de instrução ou MP, nos termos do art. 1.º, n.º 1, al. b), deverá sê-lo pelo MP durante o inquérito, por juiz de instrução durante esta fase ou pelo juiz do julgamento nas fases subsequentes. Quando ordenada a requerimento de quem tiver para tanto legitimidade deverá o requerimento ser dirigido à autoridade judiciária que no momento tiver a direcção do processo." A notificação a que alude o n.º 3 (anterior n.º 2) não tem que ter lugar no decurso do inquérito se a autoridade judiciária que ordenar a perícia tiver razões para crer que o conhecimento dela ou dos seus resultados, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis, pode prejudicar as finalidades do inquérito. É certo que o Ministério Público nos despachos de fls. 5836, 6837 e 9890, proferidos, respectivamente, em 17 de Junho, 16 de Julho e 7 de Outubro de 2003 (requisições a fls. 5867, 6845 e 9891), em que ordenou as perícias sobre a personalidade aos menores vítimas de abuso sexual, não alegou urgência ou perigo na demora, nem explicitou que o prévio conhecimento da realização daquelas por parte dos arguidos poderia prejudicar as finalidades do inquérito. Ou seja, o Ministério Público não fundamentou aqueles seus despachos, mas a tanto não estava obrigado, pois que, estando o processo em fase de inquérito, vigorava ainda, à data, o segredo de justiça interno, face à redacção que tinha o art. 86.º do CPP (o processo penal só se tornava público a partir da decisão instrutória ou, se a instrução não tivesse lugar, do momento em que já não podia ser requerida). O que não só implicava que não fosse feita qualquer notificação aos arguidos no tocante à realização das perícias, sob pena de se estar a violar o segredo de justiça, como, igualmente, se tornaria destituída de qualquer razão lógica estar o MP a fundamentar para si próprio a sua tomada de decisão em ordenar oficiosamente as perícias sobre a personalidade aos menores vítimas de abuso sexual; jovens que tinham já prestado declarações em inquérito e iriam mais tarde ser ouvidos como testemunhas na audiência de julgamento. E aqui, convocamos de novo, a posição de A. J. Latas, acima transcrita, no que concerne à questão da não notificação dos arguidos para as perícias ordenadas pelo MP em inquérito: "… o que nos remete para as razões que naquela fase processual justificam o segredo de justiça interno, isto é, a proibição de acesso ao processo por parte dos sujeitos processuais, maxime o arguido." E não se nos afigura que esta interpretação de tal normativo (art. 154.º do CPP) viole as garantias de defesa que assistem ao arguido em processo penal por força do dis(...) no art. 32.° da CRP, porquanto o que importa é que seja ulteriormente assegurado, como o foi in casu, o contraditório quanto ao conteúdo de tais perícias. Perícias que são meio de prova, como o são, entre outros, os reconhecimentos aos locais, cuja realização também não foi em inquérito previamente notificada aos arguidos, podendo estes, no entanto, vir a rebatê-las posteriormente. Aliás foi isso que sucedeu nos autos no que tange ao arguido K e às perícias sobre a personalidade ora em apreço. Com efeito, o MP ao indicar, no final da acusação, que deduziu em 29/12/2003, os meios de prova, menciona, como se alcança de fls. 13789: "Prova pericial" "Apenso CC", sendo que é neste apenso que se encontram todos os exames sobre a personalidade efectuados durante o inquérito às vítimas a que temos vindo a aludir. Na sequência do que, o arguido K, no exercício do contraditório, viria, por um lado, no seu requerimento para abertura de instrução, constante de fls. 16307 a 16323, alegar terem sido praticadas, durante a fase de inquérito, nulidades ou irregularidades processuais relativas à realização de tais perícias de personalidade, e, por outro lado, viria a requerer, na sua contestação, a realização de novas perícias de personalidade aos ofendidos, nos termos que constam de fls. 24406 a 244408. Sendo que as novas perícias sobre a personalidade aos ofendidos, requeridas pelo arguido K, foram deferidas, como resulta da alínea b) do ponto 6. do despacho de 23 de Novembro de 2004 (a fls. 24737), do ponto 27. do despacho de 7 de Dezembro de 2004 (a fls. 25271 e segs.), do despacho de 12 de Agosto de 2005 (a fls. 33896 e vº), do ponto 7. do despacho de 26 de Setembro de 2006 (a fls. 39670), do ponto 4. do despacho de 27 de Outubro de 2006 (a fls. 40820) do ponto 6. do despacho de 30 de Outubro de 2007 (a fls. 48876), do ponto 11. do despacho de 12 de Novembro de 2007 (a fls. 49202) e do despacho de 1 de Abril de 2008 (a fls. 51794), todos proferidos pela Mmª Juíza Presidente da (…). A propósito do exercício do contraditório em sede de perícias, face à possibilidade de realização de nova perícia ou renovação de anterior, releva aqui o acórdão do TC n.º 133/2007, proferido em 27 de Fevereiro de 2007 e consultável in www.tribunalconstitucional.pt, aliás, prolatado no âmbito do presente processo - decidindo recurso inter(...) pelo arguido H -, onde, após muito interessante exposição histórica sobre a evolução das perícias (...)-legais, se expendeu: "Fica, porém, desde logo totalmente por demonstrar que a sindicância a posteriori do resultado das perícias não garante o exercício cabal e pleno do princípio do contraditório, assim como fica por explicar a razão pela qual o exercício do contraditório há-de necessariamente compreender a possibilidade de serem apresentadas, através de consultor técnico, as sugestões julgadas pertinentes, "que os peritos acolherão ou não"; ou a possibilidade de, durante o decurso da produção do meio de prova, ser "fiscalizada", através de consultor técnico, a "idoneidade da metodologia adoptada". São – como se verá – afirmações infundamentadas." (…) "Com efeito, o princípio do contraditório, na sua caracterização mais rigorosa, corresponde a uma concepção próxima do direito de audiência e da oportunidade processual de influenciar, através da sua audição pelo Tribunal, o resultado do processo. Ora o exercício deste contraditório para os intervenientes processuais – e, portanto, também para o arguido –, resulta aqui do direito que a lei lhes confere de pedir esclarecimentos aos peritos, e até de requerer ao tribunal que determine a realização de nova perícia, ou a renovação da anterior." (…) "O Tribunal Constitucional tem entendido que o princípio do contraditório im(...), quanto à audiência de julgamento em processo penal, pelo n.º 5 do artigo 32º da Constituição, exige que ao arguido seja garantido o poder de discutir, contestar, ou debater o valor probatório de qualquer prova utilizada na audiência.". Por último, vejamos se a realização das perícias sobre a personalidade efectuadas nos autos às testemunhas/vítimas de crimes sexuais maiores de 16 anos de idade, à data da sua realização, poderia ter tido legalmente lugar. Assinale-se que as perícias sobre a personalidade, ora em causa, foram realizadas: - à testemunha AP em (…) (cf. fls. 17 a 30 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); - à testemunha AT em (…) (cf. fls. 2 a 16 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); - à testemunha AI em (…) (cf. fls. 31 a 42-B do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); - à testemunha AK em (…) (cf. fls. 55 a 68 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); - à testemunha AN em (…) (cf. fls. 69 a 80 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); - à testemunha Y em (…) (cf. fls. 98 a 109 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…) (cf. ponto dos factos provados no acórdão recorrido), pelo que contava (…); - à testemunha AU em (…) (cf. fls. 110 a 123-A do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…); e - à testemunha AV em (…) (cf. fls. 159-A a 170 do 1.º Volume do Apenso CC), o qual nasceu em (…), pelo que contava (…). Dispunha o art. 131.º do CPP, na versão vigente à data em que foram ordenadas pelo MP as referidas perícias sobre a personalidade, sob a epígrafe “Capacidade e dever de testemunhar”, que: “1. Qualquer pessoa que se não encontrar interdita por anomalia psíquica tem capacidade para ser testemunha e só pode recusar-se nos casos previstos na lei. 2. A autoridade judiciária verifica a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar da sua credibilidade e puder ser feito sem retardamento da marcha normal do processo. 3. Tratando-se de depoimento de menor de 16 anos em crime sexual, pode ter lugar perícia sobre a personalidade. 4. As indagações, referidas nos números anteriores, ordenadas anteriormente ao depoimento não impedem que este se produza.” Com as alterações introduzidas ao CPP pela Lei n.º 48/2007 de 29/8, o n.º 3 do preceito em análise passou a ter a redacção seguinte: “Tratando-se de depoimento de menor de 18 anos em crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, pode ter lugar perícia sobre a personalidade.” Mantendo-se a redacção dos restantes números. A elevação para 18 anos da idade prevista no n.º 3 visou acolher a definição de “criança” constante do art. 1.º da Convenção Sobre os Direitos da Criança (adoptada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990) segundo o qual "criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo." Quanto a nós é à luz da protecção da criança, no contexto da sua intervenção em actos processuais, em que estejam em causa crimes sexuais, que se deve colocar a tónica e razão de ser do n.º 3 do art. 131.º do CPP, quer na sua versão actual, quer na versão anterior. Entendemos, por isso, que o n.º 3 do art. 131.º do CPP, deverá ser interpretado no sentido de que se a testemunha em crime sexual for menor de 16 anos de idade (actualmente menor de 18 anos de idade) existe um poder-dever por parte da autoridade judiciária em ordenar perícia sobre a sua personalidade, tendo em vista não só a descoberta da verdade, relevante para a boa avaliação e decisão da causa, mas também a própria protecção da criança ou jovem. Porém, tal não exclui a possibilidade do MP, no inquérito, ou do Juiz, nas fases de instrução ou julgamento, determinarem a realização de perícias sobre a personalidade de testemunhas, com o propósito de avaliarem da sua aptidão para deporem e bem assim da sua credibilidade, sobretudo estando em causa crimes sexuais em vítimas maiores de 16 anos, mas menores de idade. E retiramo-lo da interpretação que fazemos do art. 131.º do CPP, muito em particular do seu n.º 2, onde, recorde-se, se preceitua que "A autoridade judiciária verifica a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar da sua credibilidade e puder ser feito sem retardamento da marcha normal do processo". Destarte não colhe a afirmação, como o faz o recorrente na sua 15.ª conclusão, que estava proibida a realização de perícia sobre a personalidade em caso de depoimento de maior de 16 anos. Não prever expressamente não significa proibir. Proibidas são, por exemplo, a confissão obtida sob tortura ou coacção, a busca sem mandado ou a escuta não autorizada, expressamente consagradas no art. 126.º do CPP, por constituírem ofensa à integridade física ou moral das pessoas ou intromissão no domicílio e nas telecomunicações do visado. Bem diversa é a situação ora em apreço, como se deixou demonstrado. Ou seja, nada legalmente inviabilizava, no caso concreto, a realização das perícias sobre a personalidade ordenadas pelo MP na fase de inquérito, atenta a idade dos ofendidos (todos já maiores de 16 anos de idade). Pelo ex(...), julga-se improcedente o recurso interlocutório inter(...) pelo arguido K do despacho de fls. 17020 a 17055, no que concerne à questão da obrigatoriedade de prévia notificação aos arguidos da realização das perícias sobre a personalidade de testemunhas (oficiosamente ordenadas pelo Ministério Público em inquérito, em segredo de justiça, e confiadas ao INML), bem como quanto à questão de as ditas perícias só poderem ser realizadas em vítimas de abuso sexual menores de dezasseis anos de idade. 3. Recurso inter(...) pelo arguido H do despacho do JIC de fls. 17020 a 17055, proferido em 1/3/2004, que julgou improcedentes as excepções arguidas de nulidade da acusação, ilegitimidade do MP para promover a acção penal e de violação do princípio do juiz natural Por despacho proferido pelo Senhor Juiz de Instrução Criminal em 01-03-2004, para além de ter sido admitida a instrução, foram simultaneamente decididas diversas questões suscitadas pelos arguidos nos requerimentos para abertura desta fase processual e atinentes a irregularidades, nulidades e inconstitucionalidades que, no entendimento dos mesmos, tinham sido cometidas durante a fase de inquérito (cf. fls. 17020 a 17055, Vol. 74.º). É este o teor desse despacho no segmento mais relevante (transcrição): “No entender dos arguidos (…) e H, a acusação do Ministério Público de fls. 13554 a 13806 é nula por na mesma não ter sido dado cumprimento ao dis(...) no art. 283°, n.° 3, al. b), do Cód. Proc. Penal.” (…) “Por último, o arguido H entende que a alegação na acusação do Ministério Público de uma determinada prática delituosa sua em dia e hora indeterminado, ocorrida um mês ou dois depois de uma outra actuação delituosa que se alega ter ocorrido em Dezembro de 1999 ou em Janeiro de 2000, pela sua excessiva vaguidade, impede um mínimo de defesa, o que gera a nulidade da acusação do Ministério Público, por ofensa do art. 283°, n.° 3, al. b), do Cód. Proc. Penal. Cumpre apreciar e decidir. Estatui o art. 283°, n.° 3, al. b), do Cód. Proc. Penal, que a acusação contém, sob pena de nulidade, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada. Como todas as outras disposições do Cód. Proc. Penal, esta tem também que ser interpretada à luz do que a Constituição da República Portuguesa consagrou sobre a matéria. E, a este propósito, há sobretudo que ter presente o dis(...) no art. 32°, n.° 1, da Lei Fundamental, nos termos do qual o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. É a acusação que define o objecto do processo e, daí a sua importância fulcral no âmbito do processo criminal, pois é dos factos que de tal peça processual constam que o arguido tem que se defender. E, na sequência do comando constitucional, o legislador ordinário, no mencionado art. 283.°, n.° 3, al. b), distinguiu dois níveis relativos à narração dos factos na acusação do Ministério Público. Um primeiro nível, essencial, constituído pelos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança. Trata-se dos factos integradores do tipo de crime em causa, sendo que, obviamente, se não fossem descritos, o arguido não saberia do que se havia de defender. Mas da acusação do Ministério Público pode ainda constar um segundo nível de factos, este já acessório e que só deve constar do libelo acusatório quando tal se torne possível, relativo ao lugar, ao tempo e à motivação da sua prática, ao grau de participação que o agente neles teve e a quaisquer circunstancias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada. O aludido preceito do Cód. Proc. Penal, em conjugação com a referida norma constitucional, não pode também ser desligado do n.° 1 do já citado art. 283°. De acordo com este dispositivo legal, se durante o inquérito tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente, o Ministério Público, na prazo de dez dias, deduz acusação contra aquele. Ou seja, só será nula uma acusação que não contenha os factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, pois é desses que se trata quando no n.° 1 se alude a recolha de indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente. O juízo sobre se no decurso do inquérito foram também recolhidos indícios suficientes relativos ao lugar, ao tempo e à motivação da sua prática, ao grau de participação que o agente neles teve e a quaisquer circunstancias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada apenas cabe ao Ministério Público, como dominus do inquérito. A favor deste entendimento, basta ver que a sindicabilidade da acusação que é feita através da fase de instrução, nos termos do art. 286°, n.° 1, do Cód. Proc. Penal, apenas abrange os indícios mencionados no n.° 1 do art. 283°, ou seja, aqueles que se referem aos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança [cfr. art. 283°, n.° 3, al. b), 1 parte, do Cód. Proc. Penal]. In casu, não deixa de ser curioso pensar-se que, caso da acusação do MP constassem datas exactas (o que só sucede relativamente a um dos arguidos, que no é nenhum dos acima citados), atentos os tipos de crime em apreço nos autos, certamente os arguidos viriam alegar que os depoimentos das testemunhas não ofereciam qualquer credibilidade, pois ser-lhes-ia impossível recordar com rigor uma determinada data. Por tudo o ex(...), julgo improcedente a arguida nulidade da acusação do Ministério Público por parte dos arguidos (…) e H.” (…) “Como já acima se referiu, os arguidos (…) e H alegaram que o juiz de instrução que teve intervenção no inquérito no foi o que resultou da distribuição, para daí extraírem a consequência de que estamos perante uma nulidade insanável.” (…) “Por seu turno, entende a este propósito o arguido H que o juiz de instrução que teve intervenção no inquérito não foi aquele que resultou da distribuição aleatória que ocorreu a 7 de Janeiro de 2003 – que determinou que o processo fosse afecto ao (...)–, mas sim o juiz do 1.º Juízo, também deste Tribunal, que antes teria “despachado uma diligência urgente”. Defende que existiu assim um desaforamento concreto do processo, que não respeitou as condições previstas nos arts. 37° e 38° do Cód. Proc. Penal, o que implicou que, de forma ilícita e objectivamente arbitrária, estes autos tivessem ficado afectos a um juiz de instrução criminal que não o juiz legal ou natural. Concluiu que se trata de uma nulidade insanável, nos termos do art. 119°, ai. e), do Cód. Proc. Penal, cuja verificação implica a nulidade de todas os actos praticados pelo juiz de instrução, muito particularmente os que determinaram e mantiveram a sua prisão preventiva. Cumpre apreciar e decidir. Todos os arguidos estão de acordo que o Tribunal competente para a prática de actos judiciais em inquérito era o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Entendem no entanto que por força da distribuição a que se procedeu neste Tribunal o juiz de instrução competente para a prática daqueles actos era diferente daquele que efectivamente os praticou. Concluem que dessa forma foi violado o princípio constitucional do juiz natural. Estatui o art. 32°, n.° 9, da Constituição da República Portuguesa, que nenhuma causa pode ser subtraída ao Tribunal cuja competência esteja fixada em Lei anterior, o que não sucedeu no caso dos autos, pois o juiz de instrução que praticou actos judiciais em sede de inquérito era titular de um juízo deste Tribunal. Nos casos em que o volume de serviço o justifique, os Tribunais podem desdobrar-se em juízos, conforme resulta do dis(...) no art. 65.°, n.° 1, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.° 3/99, de 13-01, rectificada pela Declaração n.° 7/99, de 16-02. Por fim, e de acordo com o que resulta do dis(...) no art 209° do Cód. Proc. Civil, a distribuição tem como finalidade a repartição com igualdade do serviço do Tribunal. Conjugando todas as normas citadas, conclui-se que não foi violado o princípio do juiz natural, pois os actos judiciais em inquérito foram praticados por um juiz de instrução titular de um juízo do Tribunal competente. Por outro lado, a ter havido qualquer desrespeito pela distribuição, a consequência terá sido apenas uma repartição desigual do serviço do Tribunal (competente). Pelo ex(...), não se verifica o vício apontado pelos arguidos (…) e H, nomeadamente qualquer nulidade insanável.” (…) “Os arguidos (…) e H invocaram falta de exercício tempestivo do direito de queixa, inexistência de despacho do Ministério Público prévio ao procedimento criminal proferido ao abrigo do dis(...) no art. 178°, n.° 4, do Cód. Penal, ou inaplicabilidade deste ao caso dos autos por os ofendidos serem maiores de dezasseis anos quando o Ministério Público deu início ao procedimento criminal.” (…) “Por fim, relativamente à questão em apreço, o arguido H refere que os crimes dos autos são “semi-públicos” e que nenhuma das “supostas vitimas” - ou os seus representantes legais - apresentou queixa no prazo de seis meses previsto no art. 115, n.° 1, do Cód. Penal, a contar da data em que tiveram conhecimento dos alegados factos, sendo certo que, de acordo com o que entende, é inaplicável ao caso dos autos a situação do art. 178°, n.° 4, do Cád. Penal, uma vez que as “alegadas vítimas” eram todas maiores de 16 anos quando o Ministério Público deu início ao procedimento. Concluiu no sentido de falecer assim uma das condições de procedibilidade da acusação. Apreciando e decidindo.” “(…) Por fim, os crimes imputados ao arguido H no libelo acusatório revestem apenas natureza semi-pública. Mais concretamente, e para apreciação da questão em apreço, estão em causa os crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172°, n°s 1 e 2, do Cód. Penal, e de actos homossexuais com adolescentes, p. e p. pelo art. 175° do Cád. Penal, que revestem a aludida natureza semi-pública, conforme resulta do dis(...) no art. 178°, n.° 1, do Cód. Penal, na redacção da Lei n.° 99/2001, de 25-08. Ainda de acordo com a acusação MP, há que ter presente o seguinte: (…) c) Os crimes de abuso sexual de crianças imputados ao arguido H tiveram como ofendidos os que estão identificados a fls. 561, 564 e 648, tendo o crime de actos homossexuais com adolescentes tido como ofendido o que está identificado a fls. 564. Os presentes autos tiveram início em 25-11-2002. Nesta data, o ofendido identificado a fls. 561 tinha 15 anos de idade, os ofendidos identificados a fls. 564 e 648 tinham 16 anos de idade e o ofendido identificado a fls. 6148 tinha 15 anos de idade. Estatui o art. 178°, n.° 4, do Cód. Penal, na sequência do previsto pelo art. 113°, n.° 6, também do Cód. Penal, que (...) quando os crimes previstos no t i forem praticados contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser. Isto releva quanto aos ofendidos identificados a fls. 561 e 6148.” (…) “Não se pode esquecer a razão por que os crimes a que se vem fazendo alusão revestem natureza semi-pública. Tais ilícitos criminais não revestem esta natureza porque o legislador entendeu que o bem jurídico tutelado com as incriminações respectivas não tem gravidade suficiente para lhes ser atribuída natureza pública. A natureza semi-pública dos referidos crimes destina-se tão-só, e bem, a proteger os interesses da vítima. Só a esta cabe decidir se a prática do crime deve ser conhecida de outros que não sejam a própria e o agente do crime. Tudo isto para se dizer que, independentemente de qualquer despacho, se o Ministério Público procedeu criminalmente por factos praticados sobre ofendidos menores de dezasseis anos à data da instauração do procedimento foi porque entendeu que o interesse daqueles o justificava, pois o início do procedimento criminal já tem pressu(...) que o Ministério Público entende que o interesse da vitima o impõe. O Ministério Público proferiu o despacho de fls. 13552 a 13554, na “antecâmara da acusação” como se lhe refere o arguido BD, o que apenas pode ter o significado de que no momento em que se preparava para encerrar o inquérito entendeu que as razões que o levaram a iniciar o procedimento criminal se mantinham. No que tange aos ofendidos identificados a fls. 564 e 648, apresentaram queixa contra quem dos mesmos abusou sexualmente, respectivamente, em 16-01-2003 (cfr. fls. 571) e em 25-03-2003 (cfr. fls. 2976). A fls. 571 o primeiro daqueles menores declara que “deseja procedimento criminal contra o (...), o H, o (…) e todos os outros que praticaram actos sexuais consigo”. A fls. 2976 o segundo daqueles menores declara “desejar procedimento criminal contra todos e quaisquer homens que de si tenham abusado sexualmente”. E fizeram-no dentro dos seis meses subsequentes a terem completado dezasseis anos de idade, sendo que tais seis meses completaram-se em 28-03-2003 no que ao ofendido identificado a fls. 564 concerne e em 26-03-2003 no que respeita ao ofendido identificado a fls. 648, não resultando dos autos que os representantes legais de tais ofendidos tenham tido conhecimento dos factos e dos seus autores em momento anterior à apresentação das aludidas queixas. Portanto, tais queixas foram apresentadas tempestivamente, de harmonia com o estatuído nos arts. 113°, n.ºs 1 e 3, e 115°, ,i.° 1, ambos do Cód. Penal. Em suma, e pelo ex(...), não se verifica a causa de extinção do procedimento criminal invocada pelos arguidos” (…) “e H, pois ao abrigo do dis(...) nos arts. 48° e 49°, n.° 1, do Cód. Proc. Penal, o Ministério Público tem legitimidade para promover a acção penal.” Inconformado com o teor deste despacho, o arguido H dele veio a interpor recurso (cf. fls. 18.237 a 18.248, Vol. 78.º), que rematou com a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “A - Uma das acusações relativas aos crimes alegadamente cometidos na (…) (ponto 4.3.1 da Acusação) refere que tais crimes teriam sido cometidos em dia e hora indeterminados, decorridos um ou dois meses depois de idênticos crimes cometidos anteriormente no mesmo local (numa noite de Dezembro de 1999 ou Janeiro de 2000). B - Tal formulação – dia e hora indeterminado, um ou dois meses depois – padece – sem qualquer razão atendível de acordo com um critério de experiência comum – de excessiva vaguidade e impede um mínimo de defesa, o que gera a sua nulidade, por ofensa do art. 283° n° 3-b) do C.P.P., que, assim, o despacho recorrido aplicou erroneamente. C - Na decisão ora recorrida sufraga-se o entendimento segundo o qual prazo de seis meses, estabelecido no art. 115° n° 1 do C.P.P., começa a correr da data em que a vítima adquira capacidade para exercer o direito de queixa – ao completar dezasseis – independentemente da data em que tenha tomado conhecimento do facto ou da identidade dos seus autores. D - Não pode sustentar-se que isso resulta da interpretação extensiva da norma constante do art.° 115°, n.° 1 do CP, a qual na sua letra e no seu espírito não acolhe minimamente aquele sentido interpretativo, o qual não encontra assim na letra da lei “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (cfr. art.° 9°, n.° 2 do CC). E - Pelo que se torna forçoso concluir que na decisão recorrida se procedeu, em sentido verdadeiro e próprio, à integração de uma lacuna da lei penal. F - Tal integração redundou na aplicação analógica da norma constante do art.° 115°, n.° 1 do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo será o da data em que as vítimas adquirem capacidade de exercício do direito de queixa (ou seja, a data em que completem dezasseis anos) independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores, o que traduz uma errónea aplicação da lei. G - Por redundar em desfavor do arguido – ao conduzir ao alargamento, não contemplado na lei, do prazo de exercício do direito de queixa, permitindo a verificação de uma condição de procedibilidade que, de outro modo, não se teria por verificada – tal analogia é inadmissível por violadora do princípio da legalidade, previsto no art.° 1, n.° 3 do CP e no art.° 29°, n.° 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP). H - O art. 115° do n° 1 do C.P., na interpretação que dele faz o despacho recorrido, é, pois, inconstitucional por violação do princípio da legalidade. I - Constam dos autos várias perícias à personalidade das alegadas vítimas, todas com mais de 16 anos, efectuadas nos termos do art. 160º do C.P.P.. Contudo, como decorre desse art. 160°, devidamente conjugado com o art. 131° n° 3 (a contrario sensu) do C.P.P., não podem ser efectuadas perícias (...)-legais à personalidade de testemunhas com mais de 16 anos. J - Todavia, no despacho recorrido sustenta-se que tal possibilidade legal resultaria do art. 131° n° 2 do mesmo diploma legal, que estabelece que a autoridade judiciária pode verificar a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar da sua credibilidade. K - Ressalvado o devido respeito, o art. 131° nº 2 tem apenas a ver com a aptidão física ou mental para prestar testemunho, designadamente para verificar se o depoente padece ou não de anomalia psíquica que impeça ou prejudique significativamente a sua realização. L - Questão distinta é a perícia sobre a personalidade, que tem a ver com uma avaliação da personalidade, as características psíquicas da pessoa ou o seu grau de sociabilização, o que só está previsto para o arguido (art. 160º do C.P.P.) ou para menores de 16 anos em crimes sexuais (art. 131° nº 3 do C,P.P. M - Assim sendo, o despacho recorrido aplicou erroneamente o art. 131º nºs 2 e 3 do C.P.P. N - O juiz de instrução que teve intervenção no inquérito não foi aquele que resultou da distribuição aleatória que ocorreu a 7 de Janeiro de 2003 – que determinou que o processo fosse afecto ao (…) –, mas sim o juiz do (…) que antes teria despachado uma diligência urgente. O - Como justamente já foi sublinhado pelo arguido E, existiu assim um desaforamento concreto do processo, que não respeitou as condições previstas nos arts. 37º e 38° do C.P.P., o que implicou que, de forma ilícita e objectivamente arbitrária, estes autos tivessem ficado afectos a um juiz de instrução criminal que não o juiz legal ou natural. P - Ou, se assim não for entendido, estaremos pelo menos perante uma situação de incompetência, nos termos dos arts. 32° e 33° do C.P.P.. Q - Em qualquer caso, trata-se de uma nulidade insanável, nos termos do art. 119°-e) do C.P.P., a qual foi arguida, cuja verificação implica a nulidade de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz de Instrução, muito particularmente os que determinaram e mantiveram a prisão preventiva do arguido, razão pela qual o despacho recorrido, interpretando erroneamente o princípio do juiz natural ou uma regra de competência funcional, aplicou erroneamente as normas legais referidas nesta e nas duas conclusões precedentes.” Este recurso foi admitido a subir diferidamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo – cf. despacho de fls. 18.510 a 18.511, Vol. 79.º. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu a este recurso inter(...) pelo arguido H (cf. fls. 71445 a 71461, Vol. 290.º), defendendo, muito em síntese, que (transcrição parcial):(…) “B).1.1. - O DIREITO DE QUEIXA NOS CRIMES DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS (ARGUIDOS MA E CC) O art° 178°, n° 1, do Código Penal, cuja redacção foi introduzida pela Lei n° 65/98, de 2 de Setembro, consigna que: “O procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 163° a 165°, 167°, 168° e 1 71° a 1 75° depende de queixa, salvo quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima.” Acrescenta, porém, o número 2, do citado preceito penal, que: “Nos casos previstos no número anterior, quando o crime for praticado contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao processo”. Cotejando a disciplina do preceito penal anteriormente aludido com a dos art°s. 48° e 49°, do CPP, resulta inquestionável que o M° P° dispõe de legitimidade para promover o processo pelo crime abuso sexual de criança previsto e punível pelo art° 172°, n° 1, e/ou, n° 2, do CP, quando, cumulativamente, se verifiquem os seguintes pressu(...)s: a) a vítima for menor de 16 anos; b) o interesse da vítima impuser o procedimento. Não tem sido unívoca a interpretação inerente ao mencionado preceito penal e, em consequência, no que toca à legitimidade de intervenção do M° P° Partindo da literalidade do art° 178°, n° 2, do CP, corroboramos o entendimento expresso por Leal-Henriques e Manuel Simas em “Código de Processo Penal Anotado”, 2° Volume, pág. 465, 3 Edição, Rei dos Livros, de acordo com o qual “O M° P° quando a vítima é menor de 16 anos e na falta de queixa dos titulares do direito (artigo 113°), só pode promover o processo quando conclua que a protecção do menor impõe a promoção penal e que a existência de um processo não é prejudicial para a pessoa da vítima.”. Sintomático de que o legislador não pretendeu consagrar mais uma situação de crime público, é o facto de não ter incluído as situações em apreço na ressalva do n° 1, do art° 178°, a par da morte ou suicídio da vítima. Acresce que, a redacção adoptada - anteriormente “menor de 12 anos” e “especiais razões de interesse público” e agora “menor de 16 anos” e “interesse da vítima” -, não pode deixar de ter outro significado que não seja que, para dar início ao procedimento, o Ministério Público não tem que esperar que quem de direito, apresente queixa. A este entendimento conduzem os antecedentes do preceito, que, pela respectiva oportunidade, importa referir. Recuando ao Código Penal de 1886, verifica-se que, nos termos do art° 399°, o procedimento criminal não teria lugar “. . . sem prévia denúncia do Ofendido, ou de seus pais, avós, marido, irmãos, tutores ou curadores”. Porém, sendo a pessoa ofendida menor de 12 anos ou tendo sido cometida violência qualificada por lei como crime público, o crime tinha natureza pública. A natureza semi-pública dos crimes sexuais foi consagrada como regra pelo art° 211°, n° 1, do CP de 1982. Todavia, o n° 2, do citado dispositivo, contemplava uma excepção similar à do Código de 1 886, quando os crimes tivessem por vítima pessoa menor de 12 anos; fosse cometido por meio de crime público; quando o agente do crime fosse o titular do exercício do direito de queixa; ou quando do crime resultasse ofensa corporal grave, suicídio ou morte da vítima, casos em que o crime revestia natureza pública. A natureza pública de tais crimes era eleita em homenagem a três ordens de razões, respectivamente, o interesse público na perseguição de crimes considerados de especial gravidade - hipótese de utilização de um meio que, por si só, integraria crime público, ou quando o crime sexual tivesse resultado em consequências particularmente gravosas para a vítima -; a presença de actividades com particular desvalor ético, energicamente repelidas pela comunidade - actos sexuais praticados com ou contra menor de 12 anos -; e a necessidade de ultrapassar a inevitável e chocante impossibilidade de procedimento por falta de queixa, por ser o próprio autor do crime o titular do direito de queixa. Pode concluir-se, conforme o faz o Acórdão da Relação do Porto de 10 de Fevereiro de 1999, publicado na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 9, Fascículo 2 (Abril/Junho), que “Deste modo, dando preponderância ao tratamento dos crimes sexuais como crimes semi-púbilcos o C. Penal de 1982 continuou a privilegiar o direito da vítima a definir o seu real interesse, se perseguir o crime, a resguardar-se do escândalo e publicidade que essa perseguição penal importaria. (. . .) Porém, (. . .) quanto a determinadas situações havidas como mais graves, postergou-se esse eventual interesse da vítima a presetvar o seu recato e, dando-se primazia ao interesse público na perseguição criminal, optou-se pelo enquadramento dessa situações na classe dos crimes públicos”. A revisão operada pelo Decreto-Lei n° 48/95, de 15 de Março, determinou, conforme já supra se salientou, que os crimes sexuais, até então sistematicamente inseridos nos “crimes contra os valores e interesses da vida em sociedade”, passassem a enquadrar-se nos “crimes contra as pessoas”, adquirindo a denominação de “crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual’. Não se tratou, contudo, de mera alteração terminológica, já que, por um lado, a tónica da caracterização foi colocada na vertente da protecção da liberdade sexual das pessoas, e, por outro lado, o diploma penal passou a dispor que “o procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 163° a 165°, 167° e 171° a 175°, depende de queixa, salvo quando de qualquer um deles resultar suicídio ou morte da vítima.”. Em suma, de todas as circunstâncias que, na versão original do Código Penal de 1982, conferiam a qualquer desses crimes a natureza semi-pública, apenas se manteve a acima apontada, tendo-se eliminado todas as demais. Ora, o n° 2, do art° 178° - que dispunha que nos casos previstos no n° 1, do preceito, quando a vítima fosse menor de 12 anos, o M° P° poderia dar início ao processo, se especiais razões de interesse público o impusessem - não constava do Projecto de Revisão do Código, tendo, no entanto, vindo a ser introduzido pelo DL n° 48/95. Esta vicissitude legislativa não pode deixar de inculcar que o legislador não pretendeu consagrar mais uma situação de crime público, pois se essa tivesse sido a intenção, bastaria incluir a hipótese na ressalva do n° 1. O que decorre, inexoravelmente, é que, nos casos da previsão do art° 178° n° 2, pretendeu-se consagrar que o M° P° não tem que esperar que quem de direito apresente queixa para, nesses casos, dar início ao procedimento, assim se prevenindo os inconvenientes que da tardia reacção do representante do menor, titular do direito de queixa, poderia advir para o bom êxito do procedimento que depois se quisesse instaurar, frustrando o interesse da vítima menor. Mas, tal não implicou que se tivesse querido preterir a possibilidade de a vítima decidir o interesse para si relevante. Deverá, assim, entender-se, que cessa o pressu(...) de legitimidade de intervenção do M° P° logo que a vítima possa, nos termos da lei, exercer o direito de queixa, ou se se preferir, a vítima possa decidir qual é, para si, o interesse relevante, se a perseguição penal se a não intervenção. Em consequência, pode afirmar-se que, completando a vítima 16 anos, perde razão de ser a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178° n° 2, a menos que o Ofendido não possua o discernimento para entender o alcance e significado do exercício do direito de queixa. É a disciplina que decorre do cotejo do citado normativo com o art° 113°, n° 3, do CP. Este entendimento resulta acentuado com a redacção de então do art° 178°, n° 2, do CP (redacção da Lei 99/2001), que expressamente aludia ao “interesse da vítima”. Com efeito, ao fazer depender o procedimento criminal de queixa nos casos a que se reporta o art° 178°, n° 1, do CP, o legislador concedeu uma especial protecção aos interesses daquela pessoa que, em concreto, é alvo da conduta típica, assim se justificando que só ela disponha de legitimidade para apresentar queixa. E porque assim é, o art° 178°, n° 2, do CPP, surge como uma forma de evitar a desprotecção do menor de 16 anos - e por isso, incapaz para exercer directamente o direito de queixa (art 113°, nº 3, daquele diploma) - naqueles casos em que o titular do direito de queixa a não apresenta, quando o interesse da vítima assim o impunha. A ratio legislativa situa-se em termos de combater e evitar os casos de impunidade resultantes da circunstância da vítima não ter, ainda, capacidade para o exercício do direito de queixa e de o titular desta a não apresentar — veja-se, neste sentido, Maria João Antunes, in “Revista Portuguesa de Ciência Criminal’, Ano 9, fasc.° 2°, pág. 328. Nesta linha de entendimento, a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178°, n° 2, do CP deve, necessariamente, ter-se por subsidiária e porque subsidiária, cessa quando passe a inexistir razão que sob o ponto de vista finalístico a fundamente, ou seja, quando a vítima complete 16 anos e passe a dispor de capacidade para o exercício do direito de queixa. Em suma, o preceito penal mencionado exige uma leitura conjugada do art° 178°, n° 1, 1ª parte, e do art° 113°, n°s 3 e 6, ambos do CP, dela resultando que: a) o art° 178°, n° 2, constitui um dos casos a que se refere o art° 113°, n° 6, do CP; b) quando se trate de procedimento por um dos crimes a que se reporta a 1ª parte do art° 178°, n° 1, do CP, e a vítima for menor de 16 anos, o M° P° pode, em face da inércia ou desconhecimento das pessoas a quem cumpre o exercício do direito de queixa, e se tal corresponder ao interesse da vítima, dar início ao procedimento criminal; c) a capacidade para o exercício do direito da vítima faz cessar qualquer possibilidade de intervenção do M° P° nos moldes consagrados no art° 178°, n° 2, do CP. Assim sendo, consagrando a lei a possibilidade de o Ofendido apresentar queixa a partir da altura em que completa 16 anos - e depois disso não podendo o mesmo ser exercido por mais ninguém (art° 113°, n°5 3 e 6 e 178°, n° 4, do C.P.) - tem de se concluir que o mesmo disporá do prazo geral de 6 meses para a apresentar, sob pena de se esvaziar de conteúdo tal possibilidade. Neste mesmo sentido se pronunciou o Acórdão, do TRP, de 15.4.2009 (RP 7344/08), consultado em “wvvw.dgsi.pt” (…)”. “Neste mesmo sentido foi a evolução legislativa posterior relativamente a crimes de natureza semi-pública praticados contra menores de 16 anos. Assim, o art° 113°, n° 6, do C. Penal, na redacção introduzida pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, consagra expressamente que o Ofendido pode exercer o direito de queixa a partir da data em que perfizer 16 anos, dispondo do prazo geral de 6 meses estipulado no art° 115°, n° 1, mas agora contado da data em que fizer 18 anos. No caso presente, o Ofendido AI nasceu a (…) e apresentou queixa no dia 25 de Março de 2003, conforme auto de fls. 2.973 a 2.976, isto é, dentro prazo legal de seis meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Logo, tem de se concluir que exerceu tempestivamente tal direito de queixa, legitimando o M° P° para exercer a acção penal, ao abrigo do dis(...) nos art°s 49° e 50º, do CPP. O Ofendido AT (…) e exerceu o direito de queixa a 16 de Janeiro de 2003 - cfr. Auto de fls. 564 a 571 -, isto é, dentro prazo legal de seis meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Logo, tem de se concluir que também ele exerceu tempestivamente tal direito de queixa, legitimando o M° P° para exercer a acção penal, ao abrigo do dis(...) nos art°s 49º e 50º, do CPP.” (…) “Pelo ex(...), entende-se que, ao enunciar em tempo a vontade de procedimento criminal contra todos os indivíduos que abusaram sexualmente da sua pessoa, o Ofendido AI, exerceu, tempestivamente, o seu direito de queixa, tendo o M° P° legitimidade para promover a acção penal no que àqueles factos concerne. B).1.2. - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO- ART° 178°, N° 4, DO C. PENAL (ARGUIDOS MA E CC) Todavia, mesmo que assim não se entenda, o M° P° declarou, em Despacho prévio à Acusação, a fls. 13.552 dos autos, que, ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C. Penal, considerava que o interesse particular das vítimas do presente processo impunha que o procedimento criminal fosse exercido.” (…) “Discutiu-se muito, no âmbito de processos que tiveram origem nos presentes autos, a questão de saber em que momento e qual a forma que a avaliação do interesse da vitima que sustenta a intervenção processual do M° P°, deve ser equacionada por este. Todavia, a conclusão a que sempre se chegou foi a de que a lei não fixa qualquer momento para ser aferido pelo M° P° qual o interesse da vítima, nem, tão pouco, impõe que seja lavrado um Despacho inicial justificativo de tal posição. Com efeito, conforme se refere no Acórdão do STJ, de 31.5.2000 - Proc. 272/2000,“sempre que sejam notórias as razões de facto em que se apoia o Ministério Público e a própria exigência do procedimento pelo interesse (objectivo) da vítima, a sua não especificação detalhada, só por si nunca pode implicar, necessariamente, a ilegitimidade daquele”. No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do STJ, de 3.4.2002 - Proc. 02P4628 (consultado em www.dqsi.pt) -, ao considerar que “a constatação de tal interesse público na promoção do procedimento criminal não carece de ser expressamente declarada no processo pelo magistrado titular do mesmo”, quando tal interesse decorra inquestionavelmente do teor dos próprios autos. Assim, o que é essencial é que os autos contenham elementos suficientes que habilitem o Tribunal e o M° P° a realizar esse juízo de ponderação. Ora, os presentes autos contêm elementos suficientes para permitir ao Tribunal sindicar a actuação processual do M° P°, em ordem a determinar a sua legitimidade processual. Conforme se refere no Acórdão do S.T.J., de 9.7.2003 - Proc. 03P2852 (consultado em www.dqsi.pt) -, “sempre que seja demonstrado o estilo de vida dos menores, e comprovadas as notórias consequências da respectiva adopção, em manifesto prejuízo para aqueles, à luz de um critério objectivo, que ninguém ouse refutar, ressalta à evidência a legitimidade do MP, alicerçada no seu interesse(...)”. Ora, encontrava-se demonstrado nos autos que os menores que foram vítimas da actuação criminosa dos Arguidos, eram crianças desprovidas de meio familiar normal, estavam confiados a uma Instituições de protecção e assistência e foram abusados por isso. O M° P° tem o imperativo constitucional consagrado no art° 69 da CRP de assegurar o cumprimento do direito que todas as crianças têm “à protecção do Estado e da Sociedade com vista ao seu desenvolvimento integral”, sendo também sua tarefa estatutária e legal (art°s 3°, n° 1 , a), c) e d), da Lei 47/86 e art° 53°, n° 1 , do CPP, Leis n°s 147/99 e 166/99, de 1 e 14 de Setembro, respectivamente) a obrigação de defender os interesses de determinadas pessoas mais carecidas de protecção, entre elas se contando os menores - neste sentido Gomes Canotilho e Vital Moreira “CRP Anotada”, ed. 1993, pág. 830. Os menores identificados nos autos não tinham qualquer contacto regular com a sua família e o organismo público a que se encontravam confiados não conseguiram protegê-los eficazmente, conforme aliás decorre do modo de vida a que se vinham dedicando. Assim, está mais que justificada a existência do interesse especial destas vítimas que legitima a intervenção processual do M° P°. Bem andou, pois, o Despacho recorrido, ao indeferir a arguição da nulidade da alegada falta de legitimidade do M° P°, para promover a acção penal, pelo que, nesta parte, o Despacho recorrido não é passível de qualquer censura. B).2. - DA ALEGADA NULIDADE POR VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO (ARGUIDOS C E H) Nos presentes autos, a questão suscitada pelo Arguido H, já foi objecto de apreciação pelo Tribunal (…), através de Acórdão de 5 de Maio de 2004 e que consta de fls. 98 a 102, do Apenso “AI”. Na sequência deste Acórdão, foi proferido o Despacho Judicial constante de fis. 25.475 a 25.488 (Ponto 2), na Acta da Audiência de Julgamento de 13 de Dezembro de 2004. Deste Despacho, foram inter(...)s Recursos pelos Arguidos H, K e C, cujas Motivações constam, pela ordem que segue, de fls. 27.393 e ss, 27.461 e ss. e 27.439 e ss.. Tais Recursos, deram origem aos Apensos “Q” (cfr. infra, “6).2.”), “P” (cfr. infra, “7).1.”) e “N” (cfr. infra, “4).2.”), respectivamente, e foram admitidos por Despacho Judicial de fls. 27.434, 27.575 (Ponto 16) e 27.574 (Ponto 15). As Respostas do Ministério Público constam de fls. 76 a 97, do Apenso “N”, fls. 55 a 69, do Apenso “Q” e 70 a 99, do Apenso “P”. Foram proferidos, pelo Tribunal (…), os Acórdãos de 3.10.2005, 7.11.2005 e 17.10.2005, que determinaram que tais Recursos deveriam ser conhecidos, a final, com o Recurso que viesse a ser inter(...) da decisão final. Assim, e nesta parte, o M° P° dá aqui por (re)produzidas as suas Respostas às correspondentes Motivações de Recurso, (...) que aí se centra a sede própria para deles se conhecer. B).3 – DA ALEGADA NULIDADE DA ACUSAÇÃO POR FORÇA DA SUA EXCESSIVA VAGUIDADE (ARGUIDO H) O Arguido H foi acusado, pelo M° P°, nos termos da Acusação deduzida a fls.13.449 e ss.. Foi, posteriormente, pronunciado pelos mesmos factos, por Despacho de fls. 20.738. Em face do Despacho de Pronúncia, a questão suscitada pelo Arguido perdeu oportunidade, uma vez que foram acolhidos, nos seus precisos termos, todos os factos descritos na acusação. Todavia, sempre se dirá, conforme o Mm° JIC teve oportunidade de referir, no Despacho recorrido (…)”. Apreciando. Das conclusões apresentadas e já acima transcritas ressalta que o recorrente H insurge-se contra o despacho recorrido nos segmentos em que julgou improcedente a excepção da nulidade da acusação por excessiva vaguidade, em que afirmou a legitimidade do Ministério Público para promover a acção penal com fundamento no exercício tempestivo do direito de queixa, em que julgou válidas as perícias (...)-legais efectuadas à personalidade das alegadas vítimas com mais de 16 anos e em que julgou improcedente a excepção de violação do princípio do juiz legal ou natural. Passemos então à análise das mencionadas questões controvertidas. 3.1. Nulidade da acusação por excessiva vaguidade: Inconformado com o despacho proferido pelo Senhor Juiz do (…), na parte em que julgou improcedente a excepção da nulidade da acusação, o recorrente começou por defender que esta peça processual é vaga e indeterminada no que respeita à definição do elemento temporal da prática dos crimes, o que impede um mínimo de defesa. O recorrente insurge-se especialmente quanto aos crimes cometidos na Avenida (…), alegando que se refere na acusação que os mesmos foram praticados em dia e hora indeterminados, decorridos um ou dois meses, depois de idênticos crimes cometidos anteriormente no mesmo local, numa noite de (…). No que diz respeito aos requisitos formais a que a acusação deve obediência, estabelece o art. 283.º, n.º 3, al. b), do CPP (que não sofreu alterações com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08), que: “A acusação contém, sob pena de nulidade:” (…) “b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada.” Com facilidade se constata que este preceito constitui um afloramento do princípio da estrutura acusatória do processo penal, previsto pelo art. 32.º, n.º 5, da CRP. Como este princípio constitucional impõe uma diferenciação entre o órgão que acusa e o órgão que julga, de modo a assegurar ao arguido um processo penal equitativo, a acusação deve conter, sob pena de nulidade, todos os elementos de facto e de direito indispensáveis para a imposição ao autor ou autores do crime de uma pena ou de uma medida de segurança. Este dispositivo deixa implícito que a acusação tanto quanto possível deve ser completa e auto-suficiente quanto à descrição dos factos integradores do crime e que não competirá, por regra, ao julgador proceder à correcção ou ao aperfeiçoamento da acusação deduzida pelo Ministério Público ou pelo assistente, enquanto peça processual que define o objecto do processo, que delimita os factos e o direito que são submetidos a apreciação judicial. Deste modo, uma acusação excessivamente vaga e genérica quanto aos factos imputados, em que nela tudo caiba para incriminar o arguido, compromete irremediavelmente o princípio da estrutura acusatória do processo penal, na medida em que remete para o julgador – que se quer equidistante – a investigação, o apuramento e a concretização dos factos que fundamentam a aplicação ao agente de uma pena ou medida de segurança. Nestes casos corre-se o risco de se quebrar o justo equilíbrio entre o estatuto processual da acusação e da defesa e de ficarem hipoteticamente comprometidas as garantias de independência e de imparcialidade do tribunal, uma vez que se pretende atribuir ao julgador um papel activo na investigação, para melhor apurar os concretos factos a imputar ao arguido e para melhor proceder à definição do direito que deverá vir a ser aplicado ao caso. Uma acusação formulada em termos imprecisos compromete igualmente de modo sério as garantias de defesa, uma vez que o arguido desconhece em concreto qual a matéria que lhe é imputada, que factos é que lhe são atribuídos ou que incriminações é que lhe são feitas. Em suma, o acusado fica sem saber, com rigor e com precisão, a matéria objecto da sua defesa, em que acontecimentos da vida real deverá centrar a sua atenção, quais as incriminações que deverá rebater, que meios de prova deverá apresentar para o efeito, o que traduzirá manifesto prejuízo para a sua defesa. Daí que, como assinala Germano Marques da Silva (in “Curso de Processo Penal”, Tomo III, págs. 114 e 115), a propósito das formalidades da acusação: “A descrição dos factos e de todas as circunstâncias pertinentes deve ser muito cuidada, pois se é certo que na fase de julgamento podem ser ainda consideradas as circunstâncias que não impliquem alteração substancial dos factos (art. 358.º), é de todo o interesse que todas as circunstâncias conhecidas no momento da acusação sejam nela descritas para serem objecto de defesa, de apreciação no julgamento e consideradas na decisão”. Também muito a este propósito, ainda que respeitante ao requerimento para abertura da instrução, o Tribunal Constitucional veio a pronunciar-se do seguinte modo no Ac. n.º 358/04 (in www.tribunalconstitucional.pt.): “A estrutura acusatória do processo penal português, garantia de defesa que consubstancia uma concretização no processo penal de valores inerentes a um Estado de direito democrático, assente no respeito pela dignidade da pessoa humana, impõe que o objecto do processo seja fixado com rigor e a precisão adequados em determinados momentos processuais (…). Essa definição abrange, naturalmente, a narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, bem como a indicação das disposições legais aplicáveis”. Apesar de aqui se deixar como assente a não aceitação de acusações deduzidas de forma imperfeita, deficiente ou incompleta, desde logo devido ao evidente prejuízo que comportam para os princípios constitucionais já acima enunciados, da simples leitura da citada al. b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP resulta claro que o legislador processual penal não colocou em pé de igualdade todos os elementos que devem constar da acusação, já que a falta de alguns deles não determina a forçosa nulidade do libelo acusatório. Enquanto que a acusação deve necessariamente conter, sem quaisquer ressalvas ou excepções, as indicações tendentes à identificação do arguido, à narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança e a indicação das disposições legais aplicáveis, já as circunstâncias, por exemplo, atinentes ao lugar, ao tempo e à motivação da prática do crime somente devem constar desta peça processual “se possível”. Afigura-se incontestável que o legislador processual penal distinguiu dois tipos de elementos da acusação, que aqui denominamos de essenciais e de acessórios. Enquanto que os primeiros não podem em caso algum ser omitidos pelo Ministério Público ou pelo assistente, sob pena de nulidade da acusação, já os segundos elementos podem dela não constar desde que não tenha sido possível ao acusador recolhê-los em sede de inquérito. Em caso algum se concebe a formulação de uma acusação sem a identificação do arguido, sem a imputação dos factos concretos que integram o crime ou sem a indicação dos preceitos legais aplicáveis ao caso. Nas ocasiões em que o Ministério Público no final do inquérito não tenha conseguido recolher ou indicar estes elementos, devido v.g. à fragilidade da prova produzida nesta fase processual, deverá arquivar o processo ou, caso não o faça, a acusação deduzida será inapelavelmente nula, o que conduzirá à sua rejeição pelo tribunal. Ao invés, a acusação mantém a sua inteira validade no caso de ser omissa v.g. quanto às circunstâncias espaço-temporais ou quanto à motivação da prática do crime, desde que objectivamente não tenha sido possível ao Ministério Público ou ao assistente recolher e indicar estes elementos, apesar das diligências levadas a cabo em sede de inquérito. Obviamente que uma absoluta omissão v.g. quanto ao elemento temporal não será aceitável na perspectiva da defesa, na medida em que coloca o arguido na diabólica posição de ter de se defender desde o passado mais longínquo até ao presente mais recente. De igual modo, inviabiliza a indicação dos preceitos legais aplicáveis ao caso, seja quanto à imputação da lei incriminadora (frequentemente, ao longo do tempo, vão sucedendo diferentes regimes jurídicos, devendo o aplicador do direito averiguar qual deles deve ser aplicado ao caso vertente), seja para o apuramento do eventual decurso do prazo de prescrição do procedimento criminal ou seja para a avaliação e para a sindicância da tempestividade na apresentação de queixa nos denominados crimes de natureza semi-pública ou particular. Até por isto não será muito correcto falar em elementos obrigatórios e elementos facultativos da acusação. Todos os elementos referidos nas als. a) a g) do n.º 3 do art. 283.º do CPP devem, por regra, constar da acusação, sendo obrigatória a sua inclusão. Somente se admite a omissão de alguns deles, não considerados essenciais ou indispensáveis, no caso em que eles não constem dos autos, quando não tenha sido possível apurá-los em sede de inquérito, apesar da investigação desenvolvida pelo Ministério Público e pelo assistente. Conforme se escreveu no Ac. do Tribunal (…) de 29-03-2005 (in CJ, Tomo II, págs. 267 a 269): “Quando o art. 283.º prescreve que a acusação contém, sob pena de nulidade, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o tempo da sua prática, está a impor que, se tiver sido apurada no inquérito a data dos factos, ela tem de ser obrigatoriamente mencionada na acusação, sob pena de, não o sendo, a acusação ser nula. Por isso é que amiúde vemos constarem das acusações expressões do género «em data que não foi possível determinar mas que se situa entre este e aquele mês de tal ano». Nestes casos, porque não foi possível no inquérito determinar a data da prática dos factos, não se comete qualquer nulidade por não fazer constar a mesma; mas, à cautela, e para que depois não se invoque qualquer nulidade a este respeito, é que se põe aquela expressão (…)”. Em suma: a omissão na acusação das concretas circunstâncias espaço-temporais do crime imputado ao arguido não constitui forçosamente causa de nulidade desta peça processual. Como vimos, a expressão “se possível”, constante da mencionada al. b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP, significa que as circunstâncias atinentes ao tempo e ao local da prática dos factos devem unicamente constar da acusação, sob pena de nulidade, nos casos em que tenha sido possível ao Ministério Público ou ao assistente proceder à recolha destes elementos no decurso do inquérito, constando dos autos e devendo, por isso, ser vertidas nesse despacho, até por uma questão de lealdade processual. Importa também assinalar que o dispositivo em causa fala amplamente em “tempo”, o que, na nossa perspectiva, não equivale exactamente ao dia e à hora da prática dos factos. O elemento temporal mostra-se integrado e, em consequência, a nulidade afastada, no caso em que conste da acusação v. g. a referência a uma semana, a um mês ou inclusive à estação de um determinado ano. A letra da lei não restringe a indicação do elemento temporal à menção na acusação de uma data precisa, ao dia e à hora certos da prática dos factos. Sem prejuízo naturalmente de constar da acusação, até por lealdade processual, uma data precisa no caso dos autos recolherem esse elemento. No caso vertente, conforme deixa assinalado o recorrente H, a acusação deduzida nos autos não indica o dia e a hora da prática dos factos. A dado passo, dela consta que “em Dezembro de 1999 ou Janeiro de 2000, em dia em concreto não determinado, o arguido H contactou com o arguido A e pediu-lhe que levasse a uma residência sita na Avenida (…), numa fracção do prédio correspondente ao Lote (…), n.º (…), em Lisboa, dois menores da AX, a fim de os sujeitar à prática de actos sexuais consigo”. Mais à frente, escreve-se que “decorridos cerca de um ou dois meses, o arguido H voltou a contactar com o arguido A, e pediu-lhe novamente que levasse à morada mencionada um menor da AX, a fim de sujeitar o mesmo à pratica de actos sexuais”. Todavia, como já se mencionou, a omissão na acusação de um dia certo e de uma hora exacta quanto aos factos que são imputados ao recorrente não fere inapelavelmente de nulidade a acusação deduzida pelo Ministério Público, por suposta violação da al. b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP. Desde logo, importa assinalar que, de acordo com os elementos constantes dos autos, o Ministério Público estava objectivamente impossibilitado de indicar com maior rigor e precisão a data destes factos. Efectivamente, feita a análise crítica do inquérito, muito em particular dos autos de inquirição das testemunhas AP, AT e AV (cf. v.g. fls. 295 a 300, 307 a 311, 564 a 571, 653 a 657, 1.112 a 1.113, 2.383 a 2.385, 3.490 a 3.494, 3.999 a 4.000 e 12.370 a 12.373), constata-se que o Ministério Público não podia ter ido além daquilo que disse na acusação no que respeita às circunstâncias temporais dos crimes que imputou ao ora recorrente H, sob pena, caso o fizesse, de incorrer em evidente e notório desfasamento perante os elementos probatórios até então recolhidos. Não se vislumbra pois que o inquérito recolha elementos que permitam uma indicação mais rigorosa e precisa quanto à data dos crimes imputados na acusação a este recorrente, nem tão pouco o mesmo os indica no recurso em apreciação, de modo a se poder concluir pela violação do dis(...) na al. b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP, maxime do trecho legal em que se diz expressamente “(…) incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada.” De resto, bem se compreende a impossibilidade do Ministério Público em mencionar com maior rigor e precisão a data da prática dos factos. Os crimes sexuais em apreço nestes autos tiveram como sujeitos passivos pessoas menores de idade, assumiram um carácter repetido ao longo do tempo e nada aponta para que tenham sido de algum modo registados ou documentados por parte dessas crianças e jovens fragilizados. Na ausência de um marco de referência quanto à precisa data da prática dos factos, de que foram vítimas menores repetidamente abusados, e atendendo ao lapso de tempo decorrido desde a prática dos crimes em causa, que faz naturalmente apagar na memória humana as suas concretas circunstâncias, facilmente se compreende que o Ministério Público não poderia ter ido mais além daquilo que fez verter na acusação quanto ao requisito temporal, por manifesta falta de elementos suficientes para o efeito. Estas considerações levam a afastar a tese de insuficiência do inquérito. As datas precisas não constam da acusação porque não foram apuradas. Mas igualmente sem que tenha sido possível, na nossa perspectiva, investigá-las na fase processual de inquérito, atendendo a tudo aquilo que já se expôs. Assim, de modo algum se pode afirmar que o Ministério Público deduziu uma acusação deficiente, incompleta ou imperfeita quanto ao requisito temporal, que merecia ter sido rejeitada com fundamento na sua nulidade, na medida em que simplesmente as datas e as horas precisas não constam dos autos, nem dela poderiam certamente constar caso os factos viessem a ser investigados no âmbito de um outro processo de inquérito. Acresce assinalar que na nossa opinião o requisito temporal – o “tempo” conforme consta da citada al. b) – se mostra plenamente satisfeito com as menções constantes da acusação (v.g. “em Dezembro de 1999 ou Janeiro de 2000, em dia em concreto não determinado” e “decorridos cerca de um ou dois meses”), já que o legislador expressamente não quis ir tão longe como o recorrente H, não exigindo a indicação precisa do dia e da hora da prática dos factos. Em face do ex(...), nenhuma censura nos merece a decisão recorrida que, ao interpretar o dis(...) na al. b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP, considerou improcedente a excepção invocada da nulidade da acusação deduzida nos autos pelo Digno Magistrado do Ministério Público. Importa agora averiguar se a interpretação efectuada pelo Tribunal a quo consubstancia, conforme entendimento do recorrente H, uma violação da Lei Fundamental, do n.º 1 do art. 32.º da CRP, onde se estabelece que “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”. Em anotação a este dispositivo constitucional, os Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 516) doutrinam o seguinte: “Em «todas as garantias de defesa» engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. (…) Em suma, a «orientação para a defesa» do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível.” Feita a análise crítica da acusação deduzida nestes autos, não se constata qualquer violação dos direitos fundamentais de defesa, plasmados no art. 32.º da CRP ou no art. 61.º do CPP, que aponte para a existência de um processo iníquo ou tramitado com ofensa do princípio da igualdade de armas. Como afirma Ireneu Cabral Barreto (in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2010, pág. 165): “Um processo equitativo exige, como elemento co-natural, que cada uma das partes tenha possibilidades razoáveis de defender os seus interesses numa posição não inferior à da parte contrária; ou, de outro modo, a parte deve deter a garantia de apresentar o seu caso perante o tribunal em condições que a não coloquem em substancial desvantagem face ao seu oponente.” Não se vê como o princípio da igualdade de armas entre a defesa e a acusação tenha ficado in casu comprometido, muito menos gravemente, por o Ministério Público não ter indicado um dia e uma hora exactos, precisos e determinados. Os factos imputados ao arguido H estão perfeitamente delimitados no tempo, no caso dos crimes cometidos na Avenida (…) entre o mês de (…), afigurando-se em abstracto ser de igual dificuldade a prova da sua ocorrência pela acusação como da sua não verificação por parte da defesa. Assim, não se compreende a afirmação feita pelo recorrente H de que a “excessiva vaguidade” “impede um mínimo de defesa”, ou seja, não se descortina como se pode considerar prejudicado por essa formulação, que considerou vaga, indeterminada e atentatória dos seus direitos de defesa. A falta de indicação de uma data precisa não constitui, em abstracto, factor de desequilíbrio ou de favorecimento para a acusação. Determinante será a prova oferecida pelos sujeitos processuais e produzida em audiência de julgamento. A omissão de data precisa na acusação, à partida, não comportará benefício ou prejuízo para alguém. Se a defesa tem que direccionar os seus meios para um período mais alargado de tempo, também a acusação terá que desenvolver idêntico esforço mas em sentido contrário, sendo certo que em caso de dúvida, hipoteticamente causada pela indefinição sobre a data da prática dos factos, esta será sempre julgada em benefício do acusado. Mais uma vez se salienta que o Ministério Público actuou com aparente lealdade processual, nada apontando para que tenha escondido a data precisa da prática dos factos que imputou ao recorrente H, para posteriormente, em audiência, os revelar, apanhando a defesa de surpresa. Para além disso, também não se vislumbra que a acusação comporte prejuízo para qualquer um dos direitos de defesa constitucional e legalmente consagrados. Não se compreende que a acusação assim formulada possa comprometer v.g. os princípios da presunção da inocência, da estrutura acusatória do processo criminal ou do contraditório, nem tão pouco ofender v.g. o direito ao recurso das decisões desfavoráveis, o direito a estar presente e a participar nos actos processuais que lhe digam respeito, o direito a ser assistido por defensor ou o direito a intervir no inquérito e na instrução. Deste modo, afigura-se incontornável que a acusação não atingiu nenhuma das garantias de defesa do arguido, não estabeleceu quanto a elas qualquer limitação ou restrição intolerável, nem igualmente o recorrente por tal motivo foi vítima de um processo iníquo, porque desequilibrado a favor da acusação, com inequívoco prejuízo para a posição processual dos acusados. Aliás, se bem interpretamos as palavras do arguido H no recurso inter(...), o Ministério Público devia abster-se de acusar se, em inquérito, apenas tivesse apurado um dia e uma hora indeterminados, mesmo que os autos recolhessem indícios suficientes quanto a factos que fundamentassem a aplicação ao agente de uma pena ou medida de segurança. Todavia, ao contrário do que este defende, havendo indícios suficientes da verificação da prática de um crime e sendo possível em sede de inquérito identificar o autor ou os autores do mesmo (o que no caso vertente se verificou e foi judicialmente confirmado pela instrução), o Ministério Público está obrigado a acusar (cf. maxime art. 283.º, n.º 1, do CPP), em cumprimento do princípio da legalidade (cf. maxime art. 219.º, n.º 1, da Constituição). Dificilmente se compreenderia, na perspectiva dos princípios constitucionais da legalidade, do Estado de Direito democrático e até da dignidade da pessoa humana (dando agora acento tónico, não ao arguido, mas à comummente esquecida e maltratada vítima), que um crime e que os seus autores não fossem criminalmente demandados, que estes não fossem submetidos a julgamento e que a final não lhes viesse a ser imposta uma pena ou uma medida de segurança, unicamente porque em sede de inquérito não se conseguiu apurar com rigor e exactidão a data da prática dos factos. Em face do ex(...), nada havendo a apontar à acusação deduzida pelo Digno Magistrado do Ministério Público, nenhum reparo merece igualmente o despacho em apreciação, proferido pelo (…), que entendemos ser de manter integralmente, pelo que nesta parte improcede o recurso inter(...) pelo arguido H. 3.2. Exercício do direito de queixa: No recurso inter(...) suscita-se também a questão da caducidade do direito de queixa, defendendo o recorrente que nenhuma das supostas vítimas apresentou queixa dentro do prazo de 6 meses previsto pelo art. 115.º, n.º 1, do CP, pelo que falece uma das condições da procedibilidade da acusação. Esta questão será apreciada infra em conjunto com o recurso inter(...) pelo arguido C. 3.3. Validade das perícias (...)-legais efectuadas às vítimas: O recorrente H pugnou também pela nulidade das perícias (...)-legais relativas à personalidade das alegadas vítimas, todas com mais de 16 anos, efectuadas no decurso do inquérito e constantes dos autos. Todavia, no recurso que interpôs do acórdão condenatório, proferido a final pelo Tribunal de 1.ª instância, o recorrente veio declarar que prescindia “(…) da apreciação da matéria relativa às conclusões I) a) M) (…)” do recurso interlocutório inter(...) a 29-03-2004 – cf. fls. 70412, Vol. 286.º. Em face desta posição processual deixou de interessar a apreciação da questão controvertida respeitante à validade das perícias (...)-legais e que foi precisamente suscitada nas conclusões I) a M) do recurso em apreço. 3.4. Violação do princípio do juiz natural ou incompetência: Por último, o recorrente H entende que o juiz de instrução que teve intervenção no inquérito não foi aquele que resultou da distribuição aleatória que teve lugar a 07-01-2003, pelo que os autos ficaram afectos a um juiz de instrução criminal que não o juiz legal ou natural ou, caso assim não se entenda, verificou-se uma situação de incompetência do tribunal. Mais defendeu que, em qualquer caso, ocorreu uma nulidade insanável, o que implica a nulidade de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz de Instrução, mormente daqueles que determinaram a sua prisão preventiva. Com relevo para a apreciação das questões suscitadas, na motivação do recurso, alega também que “o recorrente mantém o seu ponto de vista, sendo certo que, em recente acórdão, a Relação de Lisboa já entendeu que, no caso dos autos, houve violação das regras de competência do tribunal por não ter sido respeitada a distribuição efectuada, julgando cometida a nulidade insanável prevista no art. 119º e) do CPP, uma vez que houve violação de uma competência funcional (…)”. De facto, na sequência de recurso inter(...) pelo arguido E (cf. fls. 15238 a 15255, Vol. 68.º), no qual este pediu que fosse declarada a nulidade de todos os actos processuais praticados durante o inquérito pelo Senhor Juiz de Instrução, este Tribunal (…), mediante acórdão proferido no dia 17-03-2004, julgou esse recurso procedente, ainda que por razões diferentes das invocadas (cf. fls. 56 a 75 do Apenso AI). Nesse acórdão, já transitado em julgado, diz-se, a dado momento, que: “Dúvidas não restarão que o tribunal, «natural» ou «legalmente», competente ainda para conhecer dos presentes autos era, ao tempo, o TIC de Lisboa” (cf. fls. 68). Um pouco mais à frente da fundamentação, afastando o alegado pelo recorrente E para aí sustentar a nulidade do despacho de fls. 270, afirmou-se peremptoriamente: “Não vemos pois como possa ser possível falar-se de qualquer violação do princípio do juiz legal ou natural ou mesmo de desaforamento nos termos sobreditos e como se conclui.” (cf. fls. 68). Pese embora tenha sido afastada a violação do princípio do juiz natural, o Tribunal (…) reconheceu que “(…) dúvidas não haverá que o despacho em causa constitui e conduz a uma clara e verdadeira «falta de distribuição» do processo em causa, já que dá sem efeito a correctamente levada a cabo, atribuindo-a a outro Senhor Magistrado”, que “para além da nulidade decorrente da «distribuição» feita pelo Senhor Juiz do (…) de Lisboa nos termos deixados referidos, estamos, como se disse também, perante uma incompetência, do tipo funcional, do mesmo nesta matéria.” e que “«a violação das regras de competência do tribunal» constitui, nos termos do dis(...) no art. 119.º al. e) do CPP, nulidade insanável, vício de que, notoriamente sofre o despacho recorrido (…)” (cf. fls. 71 a 73 do Apenso AI). Esse acórdão remata declarando nulo o despacho recorrido de fls. 270 e ordenando “(…) a remessa dos autos para o Tribunal actualmente competente, o qual deverá dar cumprimento ao agora aqui ordenado e antes deixado referido.” Como se vê, os recursos em causa inter(...)s pelos arguidos E e H são essencialmente idênticos quanto aos seus fundamentos (nos dois recursos, estes arguidos insurgem-se contra o despacho de fls. 270, proferido a 07-01-2003, que consideram ter determinado um desaforamento ilícito, já que decidiu subtrair este processo ao (…), a quem foi regularmente distribuído, e atribui-lo ao (…) desse mesmo Tribunal, o que implicou, como defendem, uma violação do princípio do juiz legal ou natural) e quanto ao efeito útil pretendido pela sua procedência (ambos pretendiam que o Tribunal declarasse a nulidade insanável de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz de Instrução Criminal, ainda que o arguido H acentue a invalidade dos actos que determinaram e mantiveram a sua prisão preventiva). Com a interposição de recurso por parte do arguido H, já após ter sido proferido a 17-03-2004 o acórdão em causa (aliás, como o próprio reconhece na motivação do recurso que interpôs), este Tribunal é colocado perante a alternativa de confirmar tudo aquilo que já foi decidido por este mesmo Tribunal quanto à referida questão processual à data suscitada pelo arguido E (o que comporta manifesta inutilidade) ou então de contrariar total ou parcialmente o acórdão proferido a 17-03-2004, alterando o que já está definitivamente decidido com trânsito em julgado (aqui com manifesto prejuízo para os valores da segurança e da certeza jurídica). Antes de se avançar com a análise deste recurso, importa recordar que, quando o Apenso AI baixou à 1.ª instância, todos os arguidos foram notificados do aludido acórdão em obediência ao princípio do contraditório, que o arguido H veio a pronunciar-se quanto aos efeitos do seu trânsito em julgado (cf. fls. 25444 a 25453, Vol. 108.º), que o Tribunal de 1.ª instância proferiu despacho em audiência de julgamento com o intuito de dar cumprimento ao decidido pelo Tribunal (…) (cf. fls. 25475 a 25488 do Vol. 109.º) e que vários arguidos se mostraram inconformados com o teor dessa decisão judicial, dela recorrendo, como também sucedeu com o ora recorrente H (cf. fls. 27417 a 27427, Vol. 115.º). Este enquadramento chama-nos à atenção para o princípio da limitação dos actos processuais e para o pressu(...) processual do caso julgado, o que incontestavelmente inviabiliza a apreciação do mérito do recurso apresentado pelo arguido H. Aliás, a apreciação dos seus fundamentos traduziria o renovar de uma questão controvertida – validade/invalidade do despacho de fls. 270, violação do princípio do juiz natural ou das regras de competência dos tribunais – já anteriormente resolvida com trânsito em julgado. Com aplicação, ao que julgamos unânime, também no âmbito do processo penal, por força do dis(...) no art. 4.º do CPP, o art. 137.º do CPC estabelece que “Não é lícito realizar no processo actos inúteis (…)”. Caso viesse a optar pela apreciação de mérito do recurso, este Tribunal da Relação poder-se-ia ver confrontado com a integral adesão aos fundamentos e ao teor da decisão do aludido acórdão de 17-03-2004, o que lhe está legalmente vedado, desde logo com base no princípio da limitação dos actos processuais. Nesta perspectiva, mostrar-se-ia absolutamente inútil, porque destituído de quaisquer efeitos, o Colectivo deliberar e o Relator proceder à elaboração de um acórdão que nada acrescentaria de novo ao que já estava anteriormente decidido e em que se limitaria a reproduzir e a concordar integralmente com uma resolução prévia e definitivamente tomada. Para além disso, os princípios da economia e da celeridade processuais ficariam seriamente prejudicados, na medida em que impediria ou, pelos menos, dificultaria, sem qualquer relevância jurídica ou prática, o julgamento da causa no mais curto prazo. Acresce que comportaria irremediavelmente o julgamento do próprio julgamento já realizado ou, dito por outras palavras, a mesma questão controvertida voltaria a ser apreciada de novo, no âmbito do mesmo processo judicial, exactamente por um novo Colectivo integrante de um mesmo Tribunal e obviamente pertencente a igual grau hierárquico. Já eventualmente uma decisão de sentido contrário ao entendimento perfilhado no aludido acórdão de 17-03-2004, alterando total ou parcialmente o que já foi decidido com trânsito em julgado, colidiria com o caso julgado constituído quanto às questões processuais da violação do princípio do juiz natural ou das regras de competência dos tribunais, pondo em causa os valores que através dele se visam salvaguardar da segurança e da certeza jurídicas. De modo a garantir a estabilidade das decisões judiciais, o pressu(...) processual do caso julgado visa precisamente evitar que o Tribunal seja colocado perante a inaceitável alternativa de ter de repetir ou de ter de contrariar anteriores decisões judiciais, já transitadas em julgado, mesmo que proferidas por tribunais de inferior grau hierárquico, procedendo ao escrutínio dos seus fundamentos e à sindicância das resoluções já tomadas. Também aqui, como o processo penal não contém um regime próprio, importa lançar mão das normas estabelecidas no CPC, muito em particular dos seus arts. 671.º a 675.º, por força da remissão constante do art. 4.º do CPP. Os arts. 671.º e 672.º do CPC dão consagração legal aos tradicionais conceitos de caso julgado material e de caso julgado formal. Grosso modo, a sentença que conheça do mérito da causa, que aprecie a relação jurídica substantiva, formará caso julgado material, conforme decorre do primeiro destes preceitos. Por seu turno, as sentenças ou os despachos que venham a recair sobre a relação jurídica processual, sobre os requisitos ou pressu(...)s processuais da acção judicial, mas sem que conheçam do mérito da causa, formam caso julgado formal, como nos diz o art. 672.º do CPC. Elucidando estes conceitos, como se escreveu no Ac. do STJ de 02-12-2010, Proc. n.º 3564/10.7TXLSB (acessível em www.dgsi.pt): “Com os conceitos de caso julgado formal e material descrevem-se os diferentes efeitos da sentença. Com o conceito de caso julgado formal refere-se a inimpugnabilidade de uma decisão no âmbito do mesmo processo (efeito conclusivo) e converge com o efeito da exequibilidade da sentença (efeito executivo). Por seu turno o caso julgado material tem por efeito que o objecto da decisão não possa ser objecto de outro procedimento”. Desta forma, enquanto que o caso julgado formal pretende evitar que a mesma questão processual seja debatida e apreciada por diversas vezes no âmbito do mesmo processo, já o caso julgado material procura obstar à repetição da mesma causa em diferentes processos. E, de acordo com o dis(...) nos n.ºs 1 a 4 do art. 498.º do CPC, repete-se uma causa quando ocorre identidade nas duas acções quanto aos sujeitos, aos pedidos e às causas de pedir. A identidade de uma causa ocorre, pois, quando nas duas acções as partes são as mesmas, quando o efeito jurídico pretendido é exactamente o mesmo e quando as pretensões decorrem do mesmo facto jurídico. No Ac. de 25-05-1984, Proc. n.º 071441, o Supremo Tribunal de Justiça, interligando os conceitos de identidade da causa e de caso julgado material, defendeu, em síntese, que (sumário acessível www.dgsi.pt): “O caso julgado formal não pressupõe a verificação das três identidades referidas no artigo 498.º, n.º 1, do CPC. Por isso, decidida com trânsito em julgado questão que recaia unicamente sobre a relação processual, fica a decisão a ter força obrigatória dentro do processo em relação a qualquer possível interessado”. O caso julgado formal torna imodificável a decisão processual logo que se mostrem esgotadas as possibilidades de recurso ordinário. Com o trânsito em julgado, esse tribunal (ou mesmo outro tribunal de superior grau hierárquico) fica impedido de proceder à revogação, à alteração ou à simples reapreciação de uma decisão judicial anteriormente tomada, até porque ficou esgotado o seu poder jurisdicional quanto a esta matéria. Essa decisão ganha força obrigatória dentro do processo, vinculando os respectivos sujeitos processuais. Mas nada impede que essa questão processual seja apreciada e eventualmente decidida em sentido divergente num outro processo judicial. Aderindo ao pensamento de Damião da Cunha, no acima mencionado Ac. do STJ de 02-12-2010 teceram-se as seguintes considerações a propósito dos princípios da preclusão e da vinculação intraprocessual: “(…) qualquer decisão (incontestável ou tornada incontestável) tomada por um juiz, implica necessariamente tanto um efeito negativo, de precludir uma «reapreciação» (portanto uma proibição de «regressão»), como um efeito positivo, de vincular o juiz a que, no futuro (isto é, no decurso do processo), se conforme com a decisão anteriormente tomada (sob pena de, também aqui, «regredir» no procedimento. Este raciocínio, adianta o mesmo Autor vale, não só em primeira instância, como em segunda ou terceira instância (embora o grau de vinculação dependa da especificidade teleológica de cada grau de recurso)”. No caso vertente, o aludido acórdão desta Relação (…), datado de 17-03-2004, constitui a última palavra relativamente às questões suscitadas no presente recurso pelo arguido H, sob pena de ofensa do caso julgado. Conforme já se deixou assinalado, o ora recorrente, ressuscitando essencialmente os fundamentos constantes de igual recurso inter(...) pelo arguido E, pretende que seja declarada a nulidade de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz do (…) de Lisboa durante o inquérito. Todavia, sobre tal matéria esta Relação de (…) já se pronunciou. Já declarou a nulidade do despacho de fls. 270, já defendeu não se ter verificado qualquer violação do princípio do juiz legal ou natural e já reconheceu ter ocorrido uma ofensa das regras da competência do tribunal, tendo, então, remetido os autos para o competente Tribunal de 1.ª instância. Essa decisão, com o seu trânsito (cf. art. 677.º do CPC), formou caso julgado, nos termos do dis(...) no art. 672.º do CPC. Ganhou força obrigatória dentro do processo, motivo pelo qual esta Relação (…) está, de momento, impedida de proferir novo acórdão sobre a matéria em causa, muito menos de contrariar, de revogar ou de alterar o anteriormente decidido, dando acolhimento às pretensões do aqui recorrente. Qualquer nova decisão que fosse proferida nesse sentido sobre tal matéria, comprometeria a segurança e a certeza jurídicas, afectaria a estabilidade das decisões judiciais e violaria os princípios da preclusão e da vinculação intraprocessual. Também não subsistem dúvidas que estamos perante questões de natureza única e exclusivamente processual. Com o recurso inter(...), o recorrente H não coloca em causa o objecto do processo definido pela acusação ou pelo despacho de pronúncia. Não são os factos que lhe são imputados ou os crimes que lhe são atribuídos que estão em discussão e que constituem, em processo penal, o denominado “mérito da causa”. Ao invés, são matérias atinentes à distribuição, à competência dos tribunais ou a nulidades, que não se prendem directamente com a absolvição ou com a condenação do recorrente H pelos crimes de que vem pronunciado. Poder-se-ia obstar ao ex(...) o facto do acórdão da Relação (…) de 17-03-2004 não ter ainda transitado em julgado na data em que o recorrente H interpôs a 29-03-2004 o presente recurso. Todavia, entendemos que para o efeito a data relevante não será a de interposição do recurso mas aquela em que este veio a ser decidido pelo Tribunal de grau hierarquicamente superior. De qualquer modo, estaria sempre esgotado o poder jurisdicional, nos termos do art. 666.º do CPC, a partir do momento em que o referido acórdão se pronunciou sobre as matérias em causa. Em suma: este Tribunal está legalmente impedido de proceder à apreciação e ao julgamento de mérito do recurso. Caso o fizesse, vindo a confirmar integralmente o teor do acórdão desta Relação (…) de 17-03-2004, estaria a praticar actos processuais proibidos, porque absolutamente inúteis, uma vez que estaria a despender tempo e energia para nada acrescentar de novo, para nada alterar e tudo manter. Caso o fizesse, vindo a modificar total ou parcialmente o sentido do referido acórdão, estaria a ofender o caso julgado já formado, comprometendo a estabilidade das decisões judiciais. De qualquer modo, quer num caso, quer noutro, estaria a violar o princípio da extinção do poder judicial, na medida em que o acórdão proferido em sede de recurso pelo Tribunal (…) fez esgotar o poder jurisdicional quanto às matérias aí tratadas e decididas ou, dito por outras palavras, constituiu a última palavra dos tribunais quanto às questões suscitadas pelos arguidos da nulidade do despacho de fls. 270, da violação do princípio do juiz natural e da ofensa das regras da competência do tribunal. Em face do ex(...), de modo a que este Tribunal não venha a ser colocado perante a alternativa de ter de confirmar ou de contrariar o que já foi definitivamente decidido neste processo e esgotado que se mostra o poder jurisdicional, ao abrigo do dis(...) na al. e) do art. 287.º do CPC, ex vi do art. 4.º do CPP, deve, nesta parte, o recurso inter(...) pelo arguido H ser declarado extinto, com fundamento na sua impossibilidade superveniente. Termos em que se decide: a) julgar improcedente o recurso inter(...) pelo arguido H quanto à invocada excepção da nulidade da acusação deduzida pelo Ministério Público com base na sua excessiva vaguidade; b) declarar extinto, com base em impossibilidade superveniente, o recurso inter(...) pelo arguido H quanto à questão da violação do princípio do juiz natural (Conclusões n) a q) do recurso). 4. Recurso inter(...) pelos arguidos C e H do despacho proferido a fls. 17042 a 17046 dos autos, que apreciou e decidiu a questão da legitimidade do Ministério Público para promover a acção penal no que respeita aos crimes de abuso sexual de crianças imputados aos arguidos no despacho de acusação No âmbito dos presentes autos, o arguido H, no seu requerimento de abertura de instrução – cf. fls. 16792 a 16866 – suscita a questão de os crimes dos autos serem semi-públicos e nenhuma das supostas vítimas – ou os seus representantes legais – ter apresentado queixa no prazo de seis meses previsto no art. 115.º, n.º 1, do CP, a contar da data em que tiveram conhecimento dos alegados factos, sendo certo que é inaplicável ao caso dos autos a situação do art. 178.º, n.º 4, do CP, uma vez que as alegadas vítimas eram todas maiores de 16 anos quando o Ministério Público deu início ao procedimento, o que faz com que faleça assim uma das condições de procedibilidade da acusação. Do mesmo modo, o arguido C, no seu requerimento de abertura de instrução – cf. fls. 16695 a 16750 – suscita a questão da existência de causa de extinção do procedimento criminal, relativa à imputação, pela acusação, da prática de nove crimes de abuso sexual de crianças, por o Ministério Público não dispôr de legitimidade para prosseguir a acção penal, dado que tais crimes revestem natureza semi-pública e à data da instauração do presente processo todas as alegadas vítimas eram já maiores de dezasseis anos, não tendo exercido tempestivamente os seus direitos de queixa – art.ºs 113.º, n.º 3 a contrario, 115.º, n.º 1, e 178.º, n.º 1, todos do CP. O Tribunal a quo proferiu despacho a julgar não verificada a causa de extinção parcial do procedimento criminal invocada pelos arguidos, entendendo que ao abrigo do dis(...) nos arts. 48.º e 49.º, n.º 1, do CPP, o Ministério Público tinha legitimidade para promover a acção penal (cf. fls. 17042 a 17046 dos autos). Irresignado com aquele despacho, dele recorreu o arguido H, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões, na parte que aqui assume relevo: “(…) C - Na decisão ora recorrida sufraga-se o entendimentos segundo o qual o prazo de seis meses, estabelecido no art. 115º nº 1 do C.P.P., começa a correr da data em que a vítima adquira capacidade para exercer o direito de queixa – ao completar dezasseis – independentemente da data em que tenha tomado conhecimento do facto ou da identidade dos seus autores. D – Não pode sustentar-se que isso resulta da interpretação extensiva da norma constante do art.º 115º, n.º 1 do CP, a qual na sua letra e no seu espírito não acolhe minimamente aquele sentido interpretativo, o qual não encontra assim na letra da lei “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (cfr. art.º 9, n.º 2 do C.C.). E – Pelo que se torna forçoso concluir que na decisão recorrida se procedeu, em sentido verdadeiro e próprio, à integração de uma lacuna da lei penal. F – Tal integração redundou na aplicação analógica da norma constante do art.º 115º, n.º 1 do C.P., no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo será o da data em que as vítimas adquirem capacidade de exercício do direito de queixa (ou seja, a data em que completem dezasseis anos) independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores, o que traduz uma errónea aplicação da lei. G – Por redundar em desfavor do arguido – ao conduzir ao alargamento, não contemplado na lei, do prazo de exercício do direito de queixa, permitindo a verificação de uma condição de procedibilidade que, de outro modo, não se teria por verificada – tal analogia é inadmissível por violadora do princípio da legalidade, previsto no art.º 1º, nº 3 do CP e no art.º 29º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP). H – O art. 115º do nº 1 do C.P., na interpretação que dele faz o despacho recorrido, é, pois, inconstitucional por violação do princípio da legalidade (…) Termos em que merece provimento o recurso com as legais consequências”. Também inconformado com aquele despacho, dele recorreu igualmente o arguido C, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1 ª Na decisão recorrida entendeu-se ter o MP legitimidade para o exercício da acção penal contra o ora Recorrente, pela alegada prática de crimes de abuso sexual de crianças, perpetrados sobre os ofendidos identificados a fls. 561, 564 e 684 dos autos: 2ª No que respeita ao ofendido identificado a fls. 561, tal legitimidade decorreria do dis(...) nos arts. 113º, nº 6 e 178º, n.º 4, ambos do CP, porquanto; 3ª À data da instauração do presente processo – segundo a decisão recorrida, a 25/11/2002 – este não tinha ainda completado dezasseis anos de idade; 4ª No que se refere aos ofendidos identificados a fls. 564 e 648, estes teriam apresentado queixa tempestivamente, já que o fizeram “(…) dentro dos seis meses subsequentes a terem completado dezasseis de idade (…) não resultando dos autos que os representantes legais de tais ofendidos tenham conhecimento dos factos e dos seus autores em momento anterior à apresentação das aludidas queixas”; 5ª Afirmando-se encontrar-se, quanto a estes, preenchida a condições de procedibilidade constante do art.º 49.º do CPP. 6ª Porém, a data de instauração do presente processo é a de 29/11/2002 – e não a que se sustenta na decisão recorrida – 25/11/2002; 7ª Uma vez que a instauração do processo depende sempre de acto da autoridade judiciária competente, o MP; 8ª Sendo que o despacho que determina a abertura do inquérito é datado de 29/11/2002 (cfr. a fls. 44 dos autos), devendo esta data ser considerada como a da instauração do presente processo. 9ª Ao tempo, o ofendido identificado a fls. 561 dos autos havia já completado dezasseis anos de idade, o que se verificou a 26/11/2002; 10ª Razão pela qual o MP não tinha legitimidade, ao abrigo do dis(...) nos arts. 113º, n.º 6 e 178º, n.º 4, ambos do CP, para promover a acção penal, relativamente a crimes de abuso sexual de crianças pelos quais o ora Recorrente vem acusado. 11ª Ao assim não entender, a decisão recorrida violou o dis(...) nos arts. 113º, n.º 6 e 178º, n.º 4 do CP, bem assim como os arts. 48º e 49º do CPP. 12ª Relativamente aos ofendidos identificados a fls. 564 e 648, não decorre claramente, das declarações por estes prestadas em inquérito, a intenção de desejarem procedimento criminal contra o ora Recorrente; 13ª Referindo-se ambos à pessoa do ora Recorrente nos seus diversos depoimentos, nenhum dos ofendidos declara expressamente querer contra ele exercer o direito de queixa, afirmando mesmo nunca terem por aquele sido abusados sexualmente. 14ª Ao decidir no sentido de que estes haviam apresentado queixa tempestivamente, a decisão ora recorrida violou, nesta parte, o dis(...) nos arts. 113º, nrs. 1 e 3 e 115º, n.º 1, ambos do CP, bem assim como os arts. 48º e 49º do CPP. 15ª .Ainda que se entendesse, quanto a todos os supra mencionados ofendidos, que estes exerceram efectivamente os seus direitos de queixa, sempre tal exercício se haverá de ter por extemporâneo, por ter ocorrido fora do prazo estabelecido no art.º 155º, n.º 1 do CP, com a consequente preclusão de tais direitos. 16ª Na verdade, atenta a natureza dos crimes em presença, não poderá sustentar-se que os ofendidos não tomaram conhecimento dos factos nas datas em que os mesmos teriam sido praticados, mesmo se dizendo quanto à identidade do seu alegado autor, o aqui Recorrente. 17ª Segundo a acusação, os últimos factos teriam sido praticados: i) relativamente ao ofendido identificado a fls. 561, em Fevereiro ou Março de 2000; ii) relativamente ao ofendido identificado a fls. 564, em Fevereiro ou Março de 2000 e; relativamente ao ofendido identificado a fls. 648, em Janeiro de 2000. 18ª À data em que os alegados ofendidos completaram os dezasseis anos de idade – todos eles em 2002 – o prazo de seis meses, previsto no art.º 115º, n.º 1 do CP, encontrava-se já largamente excedido. 19ª Na decisão ora recorrida sufraga-se o entendimento segundo o qual o prazo de seis meses, estabelecido naquela norma legal, começa a correr da data em que a vítima adquira capacidade para exercer o direito de queixa – ao completar dezasseis anos – independentemente da data em que tenha tomado conhecimento do facto ou da identidade dos seus autores. 20ª O qual não tem expressa consagração legal. 21ª Nem pode sustentar-se resultar da interpretação extensiva da norma constante do art.º 115º, n.º 1 do CP, a qual na sua letra e no seu espírito não, acolhe minimamente aquele sentido interpretativo, o qual não encontra, assim, na letra da lei “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (cfr. art.º 9º, n.º 2 do CC). 22ª Pelo que se torna forçoso concluir que na decisão recorrida se procedeu, em sentido verdadeiro e próprio, à integração de uma lacuna da lei penal. 23ª Tal integração redundou na aplicação analógica da norma constante do art.º 115º, n.º 1 do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo será o da data em que as vítimas adquirirem capacidade de exercício do direito de queixa (ou seja, a data em que completem dezasseis anos) independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores. 24ª Por redundar em desfavor do arguido – ao conduzir ao alargamento, não comtemplado na lei, do prazo de exercício do direito de queixa, permitindo a verificação de uma condição de procedibilidade que, de outro modo, não se teria por verificada – tal analogia é inadmissível por violadora do princípio da legalidade, previsto no art.º 1º, n.º 3 do CP e no art.º 29º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP). 25ª Nestes termos, violou a decisão ora recorrida, o dis(...) nos arts. 113º, nrs. 1 e 3, 115º, n.º 1 e 1º, n.º 3, todos do CP, bem assim como o art.º 29º, n.º 1 da CRP. Termos em que, deverá ser julgado procedente o presente recurso e, consequentemente, dando-se provimento ao mesmo, ser revogada a decisão ora recorrida, proferida a fls. 17042 a 17046 dos autos, substituindo-se a mesma por outra, na qual se julgue: - a falta de legitimidade do Ministério Público para a promoção da acção penal no que respeita aos crimes de abuso sexual de crianças de que terá sido vítima o ofendido identificado a fls. 561; - a falta de legitimidade do Ministério Público, por se encontrar precludido o direito de queixa dos ofendidos identificados a fls. 564 e 648; declarando-se, nesta parte, extinto o procedimento criminal, com a consequente absolvição dos ora Recorrente da prática de todos os crimes de abuso sexual de crianças por que vem acusado, como é de JUSTIÇA!” O Magistrado do Ministério Público junto da 1.ª instância, apresentou resposta ao recurso interlocutório, juntamente com a resposta aos recursos inter(...)s do acórdão final, onde se refere: “(…) DA PRETENSA FALTA DE LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER A ACÇÃO PENAL (ARGUIDOS C E H) O arguido C acabou por ser condenado pela prática de um crime de abuso sexual de crianças (item “4.1.4”, do Despacho de Pronúncia) praticado na pessoa de AI. O Arguido foi ainda condenado pela prática de um crime de abuso sexual de pessoa internada, previsto no artº 166º, nº 1, do C. Penal que reveste natureza pública. Por outro lado, e tendo o Mº Pº recorrido apenas da absolvição deste Arguido relativamente ao crime de abuso sexual de pessoa internada, previsto pelo artº 166º do C. Penal, de que foi vítima o Ofendido Y, a apreciação da questão suscitada pelo Arguido tem interesse apenas relativamente ao menor AI. Por sua vez, o Arguido H foi condenado, apenas, pela prática de crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artº 172º, nºs 1 e 2, do C. Penal, praticados na pessoa dos Ofendidos AT e AI. Não tendo havido recurso pela absolvição dos demais crimes pelos quais se achava pronunciado, interessará, tão só, apreciar a questão suscitada – legitimidade do Mº Pº para o exercício da acção penal – relativamente às situações pelas quais veio a ser condenado. O Mº Pº deduziu Acusação, relativamente a estes Arguidos, no dia 29 de Dezembro de 2003 – fls. 13.449 a 13.808, vindo, os mesmos, a ser pronunciados, por Despacho de Pronúncia, proferido no 31 de Maio de 2004 – fls. 20.738 a 21.014. Em tais Despachos acolheu-se a tese de que o Mº Pº tinha legitimidade para o exercício da acção penal, tal como veio a acontecer no Acórdão condenatório, ora sob recurso, relativamente às questões suscitadas pelos Arguidos E e K. Também o Despacho Judicial de fls. 17.042 a 17.046 acolheu a mesma argumentação, indeferindo a arguição da nulidade invocada pelos Arguidos. Justifica-se, pois, que se faça uma breve incursão teórica sobre a natureza dos crimes em análise e do regime processual penal, no que respeita aos pressu(...)s processuais para o exercício da acção penal, consignando-se, todavia, e desde já, que, no que aos crimes semi-públicos diz respeito, o Despacho proferido, pelo Mº Pº, em 29.12.2003 (prévio à, embora integrando a, Acusação), EM CASO ALGUM, ABRANGEU QUALQUER OFENDIDO, RELATIVAMENTE AO QUAL JÁ TIVESSEM DECORRIDO 6 MESES, SOBRE A DATA EM QUE COMPLETARA 16 ANOS DE IDADE. (…) O DIREITO DE QUEIXA NOS CRIMES DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS (ARGUIDOS C E H) O artº 178º, nº 1, do Código Penal, cuja redacção foi introduzida pela Lei nº 65/98, de 2 de Setembro, consigna que: “O procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 163º a 165º, 167º, 168º e 171º a 175º depende de queixa, salvo quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima”. Acrescenta, porém, o número 2, do citado preceito penal, que: “Nos casos previstos no número anterior, quando crime for praticados contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao processo”. Cotejando a disciplina do preceito penal anteriormente aludido com a dos artºs. 48º e 49º, do CPP, resulta inquestionável que o Mº Pº dispõe de legitimidade para promover o processo pelo crime abuso sexual de criança previsto e punível pelo artº 172º, nº 1, e/ou, nº 2, do CP, quando, cumulativamente, se verifiquem os seguintes pressu(...)s: a) a vítima for menor de 16 anos; b) o interesse da vítima impuser o procedimento. Não tem sido unívoca a interpretação inerente ao mencionado preceito penal e, em consequência, no que toca à legitimidade de intervenção do Mº Pº. Partindo da literalidade do artº 178º, nº 2, do CP, corroboramos o entendimento expresso por Leal-Henriques e Manuel Simas em “Código de Processo Penal Anotado”, 2º Volume, pág. 465, 3ª Edição, Rei dos Livros, de acordo com o qual “O Mº Pº quando a vítima é menor de 16 anos e na falta de queixa dos titulares do direito (artigo 113º), só pode promover o processo quando conclua que a protecção do menor impõe a promoção penal e que a existência de um processo não é prejudicial para a pessoa da vítima”. Sintomático de que o legislador não pretendeu consagrar mais uma situação de crime público, é o facto de não ter incluído as situações em apreço na ressalva do nº 1, do artº 178º, a par da morte ou suicídio da vítima. Acresce que, a redacção adoptada – anteriormente “menor de 12 anos” e “especiais razões de interesse público” e agora “menor de 16 anos” e “interesse da vítima” –, não pode deixar de ter outro significado que não seja que, para dar início ao procedimento, o Ministério Público não tem que esperar que quem de direito, apresente queixa. A este entendimento conduzem os antecedentes do preceito, que, pela respectiva oportunidade, importa referir. Recuando ao Código Penal de 1886, verifica-se que, nos termos do artº 399º, o procedimento criminal não teria lugar “… sem prévia denúncia do Ofendido, ou de seus pais, avós, marido, irmãos, tutores ou curadores”. Porém, sendo a pessoa ofendida menor de 12 anos ou tendo sido cometida violência qualificada por lei como crime público, o crime tinha natureza pública. A natureza semi-pública dos crimes sexuais foi consagrada como regra pelo artº 211º, nº 1, do CP de 1982. Todavia, o nº 2, do citado dispositivo, contemplava uma excepção similar à do Código de 1886, quando os crimes tivessem por vítima pessoa menor de 12 anos; fosse cometido por meio de crime público; quando o agente do crime fosse o titular do exercício do direito de queixa; ou quando do crime resultasse ofensa corporal grave, suicídio ou morte da vítima, casos em que o crime revestia natureza pública. A natureza pública de tais crimes era eleita em homenagem a três ordens de razões, respectivamente, o interesse público na perseguição de crimes considerados de especial gravidade – hipótese de utilização de um meio que, por si só, integraria crime público, ou quando o crime sexual tivesse resultado em consequências particularmente gravosas para a vítima –; a presença de actividades com particular desvalor ético, energicamente repelidas pela comunidade – actos sexuais praticados com ou contra menor de 12 anos –; e a necessidade de ultrapassar a inevitável e chocante impossibilidade de procedimento por falta de queixa, por ser o próprio autor do crime o titular do direito de queixa. Pode concluir-se, conforme faz o Acórdão da Relação do Porto de 10 de Fevereiro de 1999, publicado na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 9, Fascículo 2 (Abril/Junho), que “Deste modo, dando preponderância ao tratamento dos crimes sexuais como crimes semi-públicos o C. Penal de 1982 continuou a privilegiar o direito da vítima a definir o seu real interesse, se perseguir o crime, a resguardar-se do escândalo e publicidade que essa perseguição penal imporia. (…) Porém, (…) quanto a determinadas situações havidas como mais graves, postergou-se esse eventual interesse da vítima a preservar o seu recato e, dando-se primazia ao interesse público na perseguição criminal, optou-se pelo enquadramento dessa situações na classe dos crimes públicos”. A revisão operada pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, determinou, conforme já supra se salientou, que os crimes sexuais, até então sistematicamente inseridos nos “crimes contra os valores e interesses da vida em sociedade”, passassem a enquadrar-se nos “crimes contra as pessoas”, adquirindo a denominação de “crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual”. Não se tratou, contudo, de mera alteração terminológica, já que, por um lado, a tónica da caracterização foi colocada na vertente da protecção da liberdade sexual das pessoas e, por outro lado, o diploma penal passou a dispor que “o procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 163° a 165°, 167° e 171° a 175°, depende de queixa, salvo quando de qualquer um deles resultar suicídio ou morte da vítima.”. Em suma, de todas as circunstâncias que, na versão original do Código Penal de 1982, conferiam a qualquer desses crimes a natureza semi-pública, apenas se manteve a acima apontada, tendo-se eliminado todas as demais. Ora, o n° 2, do art° 1 78° — que dispunha que nos casos previstos no n° 1, do preceito, quando a vítima fosse menor de 12 anos, o M° P° poderia dar início ao processo, se especiais razões de interesse público o impusessem — não constava do Projecto de Revisão do Código, tendo, no entanto, vindo a ser introduzido pelo DL n° 48/95. Esta vicissitude legislativa não pode deixar de inculcar que o legislador não pretendeu consagrar mais uma situação de crime público, pois se essa tivesse sido a intenção, bastaria incluir a hipótese na ressalva do n° 1. O que decorre, inexoravelmente, é que, nos casos da previsão do art° 178° n° 2, pretendeu-se consagrar que o M° P° não tem que esperar que quem de direito apresente queixa para, nesses casos, dar início ao procedimento, assim se prevenindo os inconvenientes que da tardia reacção do representante do menor, titular do direito de queixa, poderia advir para o bom êxito do procedimento que depois se quisesse instaurar, frustrando o interesse da vítima menor. Mas, tal não implicou que se tivesse querido preterir a possibilidade de a vítima decidir o interesse para si relevante. Deverá, assim, entender-se, que cessa o pressu(...) de legitimidade de intervenção do M° P° logo que a vítima possa, nos termos da lei, exercer o direito de queixa, ou se se preferir, a vítima possa decidir qual é, para si, o interesse relevante, se a perseguição penal se a não intervenção. Em consequência, pode afirmar-se que, completando a vítima 16 anos, perde razão de ser a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178° n° 2, a menos que o Ofendido não possua o discernimento para entender o alcance e significado do exercício do direito de queixa. É a disciplina que decorre do cotejo do citado normativo com o art° 113°, n° 3, do CP. Este entendimento resulta acentuado com a redacção de então do art° 178°, n° 2, do CP (redacção da Lei 99/2001), que expressamente aludia ao “interesse da vítima”. Com efeito, ao fazer depender o procedimento criminal de queixa nos casos a que se reporta o art° 178°, n° 1, do CP, o legislador concedeu uma especial protecção aos interesses daquela pessoa que, em concreto, é alvo da conduta típica, assim se justificando que só ela disponha de legitimidade para apresentar queixa. E porque assim é, o art° 178°, n° 2, do CPP, surge como uma forma de evitar a desprotecção do menor de 16 anos — e por isso, incapaz para exercer directamente o direito de queixa (art° 113°, n° 3, daquele diploma) — naqueles casos em que o titular do direito de queixa a não apresenta, quando o interesse da vítima assim o impunha. A ratio legislativa situa-se em termos de combater e evitar os casos de impunidade resultantes da circunstância da vítima não ter, ainda, capacidade para o exercício do direito de queixa e de o titular desta a não apresentar - veja-se, neste sentido, Maria João Antunes, in “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 9, fasc.° 2°, pág. 328. Nesta linha de entendimento, a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178°, n° 2, do CP deve, necessariamente, ter-se por subsidiária e porque subsidiária, cessa quando passe a inexistir razão que sob o ponto de vista finalístico a fundamente, ou seja, quando a vítima complete 16 anos e passe a dispor de capacidade para o exercício do direito de queixa. Em suma, o preceito penal mencionado exige uma leitura conjugada do art° 178°, n° 1, 1ª parte, e do art° 113°, n°s 3 e 6, ambos do CP, dela resultando que: a) o art° 178°, n° 2, constitui um dos casos a que se refere o art° 113°, n° 6, do CP; b) quando se trate de procedimento por um dos crimes a que se reporta a 1ª parte do art° 178°, n° 1, do CP, e a vítima for menor de 16 anos, o M° P° pode, em face da inércia ou desconhecimento das pessoas a quem cumpre o exercício do direito de queixa, e se tal corresponder ao interesse da vítima, dar início ao procedimento criminal; c) a capacidade para o exercício do direito da vítima faz cessar qualquer possibilidade de intervenção do M° P° nos moldes consagrados no art° 178°, n°2, doCP. Assim sendo, consagrando a lei a possibilidade de o Ofendido apresentar queixa a partir da altura em que completa 16 anos - e depois disso não podendo o mesmo ser exercido por mais ninguém (art° 113°, n°5, 3 e 6 e 178°, n° 4, do C.P.) - tem de se concluir que o mesmo disporá do prazo geral de 6 meses para a apresentar, sob pena de se esvaziar de conteúdo tal possibilidade. Neste mesmo sentido se pronunciou o Acórdão, do TRP, de 15.4.2009 (RP 7344/08), consultado em “wvvw.dgsi.pt”, em que se afirma: “A única interpretação coerente das regras legais aplicáveis é a que permite ao menor de 16 anos apresentar queixa nos 6 meses seguintes à aquisição do respectivo direito, ou seja, o direito de queixa só se extingue 6 meses depois de o menor atingir 16 anos. De outro modo (como no presente caso), o direito de queixa extinguir-se-ia sem que pudesse ter sido exercido, o que seria manifestamente absurdo: os pais da menor não o puderam exercer, pois quando tiveram conhecimento dos factos já não eram titulares desse direito; por seu turno, a menor só adquiriu o direito de queixa depois de já terem passado seis meses sobre o seu conhecimento dos factos. O artigo 115°, 1, do C. Penal, na redacção aplicável (pois a nova redacção do art. 113°, 6 do CP é clara nesse ponto, ao referir que «… o Ofendido pode exercer aquele direito a partir da data em que perfizer 16 anos”), deve ser interpretado no sentido de não ser possível a extinção do direito de queixa antes de decorrido o prazo de seis meses a contar da possibilidade do seu exercício. Por isso, nos casos em que o Ofendido seja menor de 16 anos, o direito de queixa só se extingue seis meses depois do conhecimento dos factos pelos legais representantes do menor, ou seis meses depois de o menor perfazer 16 anos, pois só nessa altura adquire ele próprio o direito de queixa.”. Neste mesmo sentido foi a evolução legislativa posterior relativamente a crimes de natureza semi-pública praticados contra menores de 16 anos. Assim, o art° 113°, n° 6, do C. Penal, na redacção introduzida pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, consagra expressamente que o Ofendido pode exercer o direito de queixa a partir da data em que perfizer 16 anos, dispondo do prazo geral de 6 meses estipulado no art° 115°, n° 1, mas agora contado da data em que fizer 18 anos. No caso presente, o Ofendido AI nasceu a (…) e apresentou queixa no dia 25 de Março de 2003, conforme auto de fls. 2.973 a 2.976, isto é, dentro prazo legal de seis meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Logo, tem de se concluir que exerceu tempestiva mente tal direito de queixa, legitimando o M° P° para exercer a acção penal, ao abrigo do dis(...) nos art°s 49° e 50.º, do CPP. O Ofendido AT nasceu a (…) e exerceu o direito de queixa a 16 de Janeiro de 2003 - cfr. Auto de fls. 564 a 571 -, isto é, dentro prazo legal de seis meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Logo, tem de se concluir que também ele exerceu tempestivamente tal direito de queixa, legitimando o M° P° para exercer a acção penal, ao abrigo do dis(...) nos art°s 49.º e 50.º, do CPP. O Arguido C pretende que, aquando da interposição da queixa, o Ofendido tem que nomear expressamente as pessoas contra quem pretende accionar o procedimento criminal - vd. Ponto 24, da Motivação de Recurso (fls. 17.944). Refere que o Ofendido AI apenas referiu, a fls. 2.973, que pretendia procedimento criminal contra “todos e quaisquer homens que de si tenham abusado sexualmente, incluindo-se até alguns dos quais se possa vir a recordar com mais pormenor”. Defende o Recorrente que tal não pode valer como exercício do direito de queixa contra si, uma vez que o Arguido não é referido expressamente. No entanto, não lhe assiste razão, não decorrendo tal exigência de qualquer das normas, substantivas ou adjectivas, que disciplinam o exercício do direito de queixa. A lei não refere, expressamente, quais os requisitos formais da queixa, ao contrário, por exemplo do que faz relativamente à denúncia — art°s 246° e 243°, do CPP — sendo que, salienta-se, apesar de o primeiro preceito mencionado, sobre a forma e conteúdo da denúncia, remeter para o segundo, sobre o Auto de Notícia, expressamente, se estatui que os elementos que o Auto de Notícia deve conter apenas são exigíveis quanto à denúncia “na medida do possível”. Não existe norma que faça depender a validade da denúncia do preenchimento de requisitos pré-estabelecidos relativamente ao seu conteúdo, resultando dos artigos citados que, apenas na medida do possível, a denúncia deverá conter os elementos circunstanciados relativos ao cometimento do crime, seus autores, vítimas e testemunhas. A maior ou menor pormenorização do ilícito denunciado e/ou a referenciação ou não dos seus autores não acarreta, como não poderia deixar de ser, consequências processuais, incumbindo ao M° P° desencadear a acção penal e investigar todos os factos atinentes ao crime denunciado e seus autores. O mesmo sucede no caso de crimes de natureza semi-pública, mantendo-se, quanto a estes, a incumbência do M° P° desencadear a acção penal e investigar todos os factos atinentes ao crime denunciado e seus autores, desde que exista uma manifestação de vontade nesse sentido, pelo titular do direito de queixa respectivo, e independentemente da maior ou menor pormenorização dos factos e da indicação imediata, ou não, dos seus autores. No caso de procedimento criminal dependente de queixa, o art° 49°, n.° 1, do CPP, estabelece que “quando o procedimento criminal depender de queixa, do Ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo”. Conforme referem Leal Henriques, Simas Santos e Borges de Pinho, in “Código de Processo Penal Anotado”, 1996, Editora Rei dos Livros, p. 248, “A queixa ou participação é a comunicação do facto à entidade que detém o poder-dever de accionar o respectivo procedimento ou, dito de outro modo, é a declaração de vontade de que se pretende que seja levantado processo para esclarecimento e prova de determinada conduta tida como criminalmente ilícita, com vista à punição do seu autor ou autores”. A queixa consubstancia-se assim numa manifestação de vontade de que se pretende o exercício da acção penal relativamente a factos qualificados por lei penal como crime. Não existe qualquer norma que determine quais os requisitos formais a que deve obedecer a queixa apresentada e/ou que faça depender a validade do exercício do direito de queixa da maior ou menor pormenorização dos factos e da individualização ou não do autor dos mesmos. Condição do suficiente para o exercício da acção penal é a manifestação de vontade nesse sentido pelo titular do direito de queixa, relativamente a condutas punidas criminalmente. Por isso, a lei estabelece, no art° 114°, do CPP, que “A apresentação da queixa contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento criminal extensivo aos restantes”, uma vez que, na disponibilidade do titular do direito de queixa está a manifestação ou não de vontade de procedimento criminal relativamente a condutas punidas por lei penal e já não, em casos de comparticipação, a concreta individualização/selecção, dos agentes, de entre os comparticipantes, que serão perseguidos criminalmente. Da leitura dos autos de declarações do Ofendido AI resulta que o mesmo manifestou a vontade de procedimento criminal contra todos os homens que abusaram sexualmente de si. O menor delimitou os factos pelos quais queria que fosse accionado o procedimento criminal — abuso sexual —, fê-lo em tempo, não havendo norma legal, conforme já se demonstrou, que estipule como condição de validade de queixa apresentada, a indicação dos autores dos factos e a maior ou menor pormenorização destes. Pelo ex(...), entende-se que, ao enunciar em tempo a vontade de procedimento criminal contra todos os indivíduos que abusaram sexualmente da sua pessoa, o Ofendido AI, exerceu, tempestivamente, o seu direito de queixa, tendo o M° P° legitimidade para promover a acção penal no que àqueles factos concerne. B).1.2. - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO - ART° 178°, N° 4, DO C. PENAL (ARGUIDOS C E H) Todavia, mesmo que assim não se entenda, o M° P° declarou, em Despacho prévio à Acusação, a fls. 13.552 dos autos, que, ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C. Penal, considerava que o interesse particular das vítimas do presente processo impunha que o procedimento criminal fosse exercido. Tal Despacho refere, expressamente, que: “Nos termos do dis(...) no art° 178° n° 4 do CPP, o Ministério Público pode dar início ao procedimento criminal por factos susceptíveis de integrar crimes contra a auto-determinação sexual de menores se os factos forem praticados contra menores de 16 anos e o interesse destes o impuser. Esta disciplina é, de resto, também, sufragada no art° 113° n° 6, do mesmo diploma legal. É hoje comummente aceite, que a aferição do interesse do menor na instauração do procedimento criminal implica um juízo de ponderação a levar a cabo com base nos factos indiciária, e objectivamente trazidos ao processo, por forma a determinar se as vítimas em causa, não obstante a inexistência de queixa, são beneficiadas com a tutela penal, ou se, ao invés, resultarão prejudicadas com a instauração da mesma. Como critério preponderante da referida valoração deve ter-se a vertente reparadora do mecanismo de perseguição penal, a qual pressupõe, por um lado o reconhecimento da qualidade de vítima e, por outro o da reprovação da conduta do agressor. Nos presentes autos, todos os Ofendidos eram crianças institucionalizadas, oriundas de famílias disfuncionais, com carências afectivas e económicas graves, sem quaisquer referências afectivas e securizantes, verdadeiros sobre viventes. Quotidianos pobres de afectos, de educação, de normas sociais básicas que lhes permitissem, no futuro, uma integração comunitária saudável e equilibrada foi o passado das crianças que, ao ingressarem numa Instituição vocacionada para a protecção e educação de menores, acalentaram a esperança de um amanhã melhor. Projectos amputados e sonhos adiados foram, seguramente, os resultados das condutas criminosas que, indiciariamente, as terão visado como alvos. O dano psíquico provocado pelos actos criminosos, muitas vezes imperceptível aos olhos dos outros, não surge, pois, nestes casos, como uma mera hipótese, mas antes como um facto de verificação certa. Danos cuja reparação passa, não em exclusivo, mas também, pela punição de quem os provocou. (. ..) para as crianças com idade igual ou superior a 8 anos, o processo mental de reparação do dano psíquico passa, com frequência, pelo reconhecimento da sua qualidade de vítima — o que os ajudará a metabolizar os seus sentimentos de culpa e vergonha — e pela punição de quem lhe fez mal” — Relatório Pericial de fls. 13192 a 13198. No caso vertente, entende o Ministério Público que o início do procedimento criminal desencadeou o processo de reparação psíquica dos menores indiciariamente vitimados. Prova disso é o facto dos mesmos terem prestado declarações e falado sobre factos que, ao longo de muito tempo, não revelaram, em parte por recearem comprometer a sua permanência na Instituição da qual faziam parte alguns dos autores das suas feridas. Essa atitude activa manifestada pelos menores é um sinal evidente do desejo de iniciarem o seu processo de estabilização emocional e afectiva. Ignorá-lo seria impedi-los de reivindicar um direito que lhes assiste, mas que, não podem exercer pessoalmente. Proceder criminalmente contra as pessoas que acusam de terem violado um bem que a lei penal elevou à categoria de fundamental para efeitos de sobrevivência da comunidade apresenta-se, assim como um interesse para elas, impondo-se, por tal razão, ao Ministério Público, agir em conformidade com o dis(...) no art° 178° n° 4 do CP”. Discutiu-se muito, no âmbito de processos que tiveram origem nos presentes autos, a questão de saber em que momento e qual a forma que a avaliação do interesse da vitima que sustenta a intervenção processual do M° P°, deve ser equacionada por este. Todavia, a conclusão a que sempre se chegou foi a de que a lei não fixa qualquer momento para ser aferido pelo M° P° qual o interesse da vítima, nem, tão pouco, impõe que seja lavrado um Despacho inicial justificativo de tal posição. Com efeito, conforme se refere no Acórdão do STJ, de 31.5.2000 — Proc. 272/2000 -, “sempre que sejam notórias as razões de facto em que se apoia o Ministério Público e a própria exigência do procedimento pelo interesse (objectivo) da vítima, a sua não especificação detalhada, só por si nunca pode implicar, necessariamente, a ilegitimidade daquele”. No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do STJ, de 3.4.2002 - Proc. 02P4628 (consultado em www.dgsi.pt) -, ao considerar que “a constatação de tal interesse público na promoção do procedimento criminal não carece de ser expressamente declarada no processo pelo magistrado titular do mesmo”, quando tal interesse decorra inquestionavelmente do teor dos próprios autos. Assim, o que é essencial é que os autos contenham elementos suficientes que habilitem o Tribunal e o M° P° a realizar esse juízo de ponderação. Ora, os presentes autos contêm elementos suficientes para permitir ao Tribunal sindicar a actuação processual do M° P°, em ordem a determinar a sua legitimidade processual. Conforme se refere no Acórdão do S.T.J., de 9.7.2003 - Proc. 03P2852 (consultado em www.dgsi.pt) -, “sempre que seja demonstrado o estilo de vida dos menores, e comprovadas as notórias consequências da respectiva adopção, em manifesto prejuízo para aqueles, à luz de um critério objectivo, que ninguém ouse refutar, ressalta à evidência a legitimidade do MP, alicerçada no seu interesse(...)”. Ora, encontrava-se demonstrado nos autos que os menores que foram vítimas da actuação criminosa dos Arguidos, eram crianças desprovidas de meio familiar normal, estavam confiados a uma Instituições de protecção e assistência e foram abusa dos por isso. O M° P° tem o imperativo constitucional consagrado no art° 69 da CRP de assegurar o cumprimento do direito que todas as crianças têm “à protecção do Estado e da Sociedade com vista ao seu desenvolvimento integral”, sendo também sua tarefa estatutária e legal (art°s 3°, n° 1 , a), c) e d), da Lei 47/86 e art° 53°, n° 1 , do CPP, Leis n°s 147/99 e 166/99, de 1 e 14 de Setembro, respectivamente) a obrigação de defender os interesses de determinadas pessoas mais carecidas de protecção, entre elas se contando os menores — neste sentido Gomes Canotilho e Vital Moreira “CRP Anotada”, ed. 1993, pág. 830. Os menores identificados nos autos não tinham qualquer contacto regular com a sua família e o organismo público a que se encontravam confiados não conseguiram protegê-los eficazmente, conforme aliás decorre do modo de vida a que se vinham dedicando. Assim, está mais que justificada a existência do interesse especial destas vítimas que legitima a intervenção processual do M° P°. Bem andou, pois, o Despacho recorrido, ao indeferir a arguição da nulidade da alegada falta de legitimidade do M° P°, para promover a acção penal, pelo que, nesta parte, o Despacho recorrido não é passível de qualquer censura (…)”. O recurso do arguido C foi admitido por despacho de fls. 18015 dos autos. Com efeito, embora no despacho proferido a fls. 18015 – segundo despacho de admissão de recurso a(...) nessa folha –, conste “Por versar sobre decisão recorrível – fls. 17.042 a 17.046 –, estar em tempo e para tal ter legitimidade, admito o recurso inter(...) pelos arguidos K e N através do requerimento de fls. 17.936 (fax de fls. 17.916 – artºs 399º, 411º, nº1, 401º, nº1, al. b), todos do C.P.P.), o qual sobe diferidamente – com o recurso inter(...) da decisão que puser termo à causa –, nos próprios autos e tem efeito meramente devolutivo (artºs 407º, nºs 1 e 2, “a contrario sensu”, e 3, 406º, nº 1, e 408º, “a contrario”, do mesmo diploma legal)”, trata-se de um manifesto lapso, já objecto de correcção a fls. 18.351, onde foi proferido despacho consignando expressamente que o recurso admitido é o inter(...) pelo arguido C. O recurso do arguido H foi admitido por despacho de fls. 18510 a 18511 dos autos. O arguido C, nas conclusões do recurso que interpôs do acórdão final, dando cumprimento ao dis(...) no art. 412.º, n.º 5, do CPP, reiterou o seu interesse na apreciação do recurso por si inter(...) do despacho de fls. 17042 a 17046 (cf. fls. 69440 a 69441). O arguido H, nas conclusões do recurso que interpôs do acórdão final, dando cumprimento ao dis(...) no art. 412.º, n.º 5, do CPP, afirmou manter interesse no recurso que havia inter(...) a 29 de Março de 2004, referente a nulidades arguidas no requerimento de abertura de instrução, prescindindo da apreciação da matéria relativa às conclusões I) a M) – perícias (...)-legais sobre a personalidade das testemunhas (cf. fls. 70412). Questões prévias Decisão conjunta dos recursos Conforme resulta das alegações de recurso supra transcritas, os recursos inter(...)s pelos arguidos C e H incidiram sobre o mesmo despacho proferido no âmbito da fase de instrução, coincidindo, na essência, nas questões que colocam, sendo certo que o referido despacho, também ele, tem por objecto a mesma questão, ainda que suscitada por distintos arguidos, apresentando uma única fundamentação, para decisão daquela questão. Assim, por razões de economia, celeridade processual e facilidade de compreensão, serão os elencados recursos tratados conjuntamente, numa só decisão, abrangendo as questões comuns que neles se colocam. Com efeito, não faz sentido que o Tribunal se pronuncie em separado sobre questões em tudo idênticas, apenas porque foram suscitadas em recursos inter(...)s por diferentes arguidos, repetindo, de modo desnecessário, a mesma argumentação. Aliás, como já se salientou, os recursos interlocutórios aqui em apreço, inter(...)s pelos mencionados arguidos (C e H), incidem sobre um mesmo despacho, sendo que este, ainda que referindo-se aos dois diferentes arguidos, também tem na sua génese a mesma fundamentação, tendo, em consequência, decidido no mesmo sentido as pretensões apresentadas pelos arguidos (designadamente indeferindo-as). Nestes termos, e à semelhança do que se fez quanto a outros recursos interlocutórios, será proferida decisão conjunta relativamente aos recursos dos arguidos C e H em apreço. Inutilidade superveniente parcial dos recursos inter(...)s pelos arguidos C e H Como o Digno Magistrado do Ministério Público bem salienta na sua resposta, o arguido C acabou por ser condenado pela prática de um crime de abuso sexual de crianças (item “4.1.4”, do Despacho de Pronúncia) praticado na pessoa de AI. O Arguido foi ainda condenado pela prática de um crime de abuso sexual de pessoa internada, previsto no art. 166.º, n.º 1, do CP que reveste natureza pública. Por outro lado, e tendo o Ministério Público recorrido apenas da absolvição deste arguido relativamente ao crime de abuso sexual de pessoa internada, previsto pelo art. 166.º do CP, de que foi vítima o ofendido Y, a apreciação da questão suscitada pelo arguido C tem interesse apenas relativamente ao menor AI. Por sua vez, o arguido H foi condenado, apenas, pela prática de crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172.º, n.ºs 1 e 2, do CP, praticados na pessoa dos ofendidos AT e AI. Não tendo havido recurso pela absolvição dos demais crimes pelos quais se achava pronunciado, interessará, tão só, apreciar a questão suscitada – legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal – relativamente às situações pelas quais veio a ser condenado. Conclui-se, assim, que a questão a apreciar nos presentes recursos interlocutórios apenas mantém interesse no que tange com a legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal relativamente aos crimes de natureza semi-pública dados como provados, quanto a ambos os arguidos C e H, o que limita a questão aos ofendidos AI e AT. A apreciação destes recursos de ambos os arguidos, quanto aos demais menores relativamente aos quais estiveram acusados e pronunciados pela prática de crimes de natureza semi-pública, face aos motivos ex(...)s, é neste momento totalmente inútil. Assim, ao abrigo do dis(...) no art. 287.º, al. e), do CPC, ex vi do art. 4.º do CPP, acorda-se em declarar parcialmente extintos os recursos inter(...)s pelos arguidos C e H do despacho de fls. 17.042 e ss., com base na sua inutilidade superveniente, designadamente no que se refere à apreciação da legitimidade do Ministério Público para exercer a acção penal quanto a outros menores, que não os ofendidos AI e AT. Delimitação do objecto dos recursos As questões suscitadas pelos recorrentes são: - Nulidade do despacho recorrido, por violação dos arts. 113.º, n.ºs 1 e 3, 115.º, n.º 1, e 1.º, n.º 3, todos do CP, bem assim como do art. 29.º, n.º 1, da CRP. - Inconstitucionalidade do art. 115.º, n.º 1, do CP, na interpretação que dele fez o despacho recorrido, por violação do princípio da legalidade. A decisão recorrida O despacho objecto do presente recurso tem o seguinte teor: “Os arguidos -+, C e H invocaram falta de exercício tempestivo do direito de queixa, inexistência de despacho do Ministério Público prévio ao procedimento criminal proferido ao abrigo do dis(...) no art. 178º, nº 4, do Cód. Penal, ou inaplicabilidade deste ao caso dos autos por os ofendidos serem maiores de dezasseis anos quando o Ministério Público deu início ao procedimento criminal. O arguido BD começa por alegar que trata-se de, no caso vertente, no que a si se refere, de “crimes semi-públicos”, cujo procedimento criminal sempre estaria dependente de queixa, a qual não foi apresentada (pelos ofendidos ou pelos seus representantes legais), pelo que aquele não poderia ter sido instaurado. Continua, alegando que na parte da incriminação que se lhe refere, a instauração do procedimento criminal, “no caso de a vítima ser menor de 16 anos, só podia efectivar-se, nos termos do art. 178º, nº 4, do Cód. Penal, se o interesse da vítima impusesse tal procedimento”. Alega ainda que a acusação refere sempre o art. 178º, nº 2, do Cód. Penal, que é o actual art. 178º, nº 4, do Cód. Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 99/2001, de 25-08, sendo que tal interesse teria que ter sido avaliado e demonstrado antes da instauração do procedimento e não após ele ter sido activado e, muito menos na “antecâmara da própria acusação”. E, após a valoração, análise e recolha de elementos para a decisão, teria esta que ser proferida mediante o despacho apropriado determinado pela entidade competente, consoante dispõe o art. 97º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, despacho esse que teria que ter sido devidamente fundamentado de facto e de direito, nos termos do que dispõe o art. 97º, nº 4, do Cód. Proc. Penal. Em suma, entende o arguido que tal despacho do Ministério Público tem que ser plasmado no processo em momento “anterior ao início do procedimento criminal”. No seu entender, não tendo tal sido feito, segue-se que o presente processo está inquinado desde o início em relação aos crimes de natureza semi-pública, como são todos quantos lhe são imputados e, consequentemente, falece, quanto a si, o pressu(...) de procedibilidade constante dos arts. 113º, n.º 1, 114º, 115º e 178º, n.º 1, todos do Cód. Penal, pelo que se impõe a declaração de extinção do procedimento criminal. O arguido C alega também que relativamente aos crimes de abuso sexual de crianças o Ministério Público não dispunha de legitimidade para prosseguir a acção penal. No seu entender, tais crimes revestem inequivocamente, no caso dos autos, natureza semi-pública, nos termos do dis(...) no art. 178º, n.º 1, do Cód. Penal, bem como que à data da instauração do presente processo (29-11-2003) todas as “alegadas vítimas” eram já maiores de dezasseis anos de idade e, portanto, capazes de exercer o direito de queixa, nos termos do art. 113º, n.º 3, a contrario, do Cód. Penal. Termina, concluindo que nenhuma das “alegadas vítimas” exerceu tempestivamente os seus direitos de queixa, os quais estão assim, no seu entender, inelutavelmente precludidos, nos termos do dis(...) no art. 115º, n.º 1, do Cód. Penal. Por fim, relativamente à questão em apreço, o arguido H refere que os crimes dos autos são “semi-públicos” e que nenhuma das “supostas vítimas” – ou os seus representantes legais – apresentou queixa no prazo de seis meses previsto no art. 115º, n.º 1, do Cód. Penal, a contar da data em que tiveram conhecimento dos alegados factos, sendo certo que, de acordo com o que entende, é inaplicável ao caso dos autos a situação do art. 178º, n.º 4, do Cód. Penal, uma vez que as “alegadas vítimas” eram todas maiores de 16 anos quando o Ministério Público deu início ao procedimento. Concluiu no sentido de falecer assim uma das condições de procedibilidade da acusação. Apreciando e decidindo. Na acusação do Ministério Público são imputados ao arguido BD unicamente crimes que revestem natureza semi-pública. Os crimes imputados ao arguido C revestem natureza pública e natureza semi-pública. Por fim, os crimes imputados ao arguido H no libelo acusatório revestem apenas natureza semi-pública. Mais concretamente, e para apreciação da questão em apreço, estão em causa os crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Penal, e de actos homossexuais com adolescentes, p. e p. pelo art. 175º do Cód. Penal, que revestem a aludida natureza semi-pública, conforme resulta do dis(...) no art. 178º, n.º 1, do Cód. Penal, na redacção da Lei n.º 99/2001, de 25-08. Ainda de acordo com a acusação Ministério Público, há que ter presente o seguinte: a) Os crimes de abuso sexual de crianças imputados ao arguido BD tiveram como ofendidos os que estão identificados a fls. 561, 564 e 648 e 6184; b) Os crimes de abuso sexual de crianças imputados ao arguido C tiveram como ofendidos os que estão identificados a fls. 561, 564 e 648; e c)Os crimes de abuso sexual de crianças imputados ao arguido H tiveram como ofendidos os que estão identificados a fls. 561, 564 e 648, tendo o crime de actos homossexuais com adolescentes tido como ofendido o que está identificado a fls. 564. Os presentes autos tiveram início em 25-11-2002. Nesta data, o ofendido identificado a fls. 561 tinha 15 anos de idade, os ofendidos identificados a fls. 564 e 648 tinham 16 anos de idade e o ofendido identificado a fls. 6148 tinha 15 anos de idade. Estatui o art. 178º, n.º 4, do Cód. Penal, na sequência do previsto pelo art. 113º, n.º 6, também do Cód. Penal, que (…) quando os crimes previstos no n.º 1 forem praticados contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser. Isto releva quanto aos ofendidos identificados a fls. 561 e 6148. O que em primeiro lugar há a realçar a este propósito é que quando o Ministério Público dá início ao procedimento já tem que ter entendido que o interesse da vítima o impõe. Estranha-se por isso que o arguido BD alegue que no caso dos autos tal interesse teria que ter sido avaliado e demonstrado antes da instauração do procedimento e não após ele ter sido activado, acrescentando ainda que o despacho do Ministério Público onde se fizesse tal avaliação teria que ter sido plasmado no processo em momento “anterior ao início do procedimento criminal”. É caso para perguntar como se pode plasmar um despacho num processo, se este ainda não existe. Não se pode esquecer a razão por que os crimes a que se vem fazendo alusão revestem natureza semi-pública. Tais ilícitos criminais não revestem esta natureza porque o legislador entendeu que o bem jurídico tutelado com as incriminações respectivas não tem gravidade suficiente para lhes ser atribuída natureza pública. A natureza semi-pública dos referidos crimes destina-se tão-só, e bem, a proteger os interesses da vítima. Só a esta cabe decidir se a prática do crime deve ser conhecida de outros que não sejam a própria e o agente do crime. Tudo isto para se dizer que, independentemente de qualquer despacho, se o Ministério Público procedeu criminalmente por factos praticados sobre ofendidos menores de dezasseis anos à data da instauração do procedimento foi porque entendeu que o interesse daqueles o justificava, pois o início do procedimento criminal já tem pressu(...) que o Ministério Público entende que o interesse da vítima o impõe. O Ministério Público proferiu o despacho de fls. 13552 a 13554, na “antecâmara da acusação” como se lhe refere o arguido BD, o que apenas pode ter o significado de que no momento em que se preparava para encerrar o inquérito entendeu que as razões que o levaram a iniciar o procedimento criminal se mantinham. No que tange com aos ofendidos identificados a fls. 564 e 648, apresentaram queixa contra quem dos mesmos abusou sexualmente, respectivamente, em 16-01-2003 (cfr. fls. 571) e em 25-03-2003 (cfr. fls. 2976). A fls. 571 o primeiro daqueles menores declara que “deseja procedimento criminal contra o (…), o H, o (…) e todos os outros que praticaram actos sexuais consigo”. A fls. 2976 o segundo daqueles menores declara “desejar procedimento criminal contra todos e quaisquer homens que de si tenham abusado sexualmente”. E fizeram-no dentro dos seis meses subsequentes a terem completado dezasseis anos de idade, sendo que tais seis meses completaram-se em 28-03-2003 no que ao ofendido identificado a fls. 564 concerne e em 26-03-2003 no que respeita ao ofendido identificado a fls. 648, não resultando dos autos que os representantes legais de tais ofendidos tenham tido conhecimento dos factos e dos seus autores em momento anterior à apresentação das aludidas queixas. Portanto, tais queixas foram apresentadas tempestivamente, de harmonia com o estatuído nos arts. 113º, n.ºs 1 e 3, e 115º, n.º 1, ambos do Cód. Penal. Em suma, e pelo ex(...), não se verifica a causa de extinção do procedimento criminal invocada pelos arguidos BD, C e H, pois ao abrigo do dis(...) nos arts. 48º e 49º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, o Ministério Público tem legitimidade para promover a acção penal.” Analisando Nos presentes recursos interlocutórios, aliás, à semelhança do que acontece com os recursos principais dos arguidos E e K, a questão que se coloca é a da legitimidade do Ministério Público (ou no entender dos arguidos, falta dela) para exercer a acção penal relativamente aos crimes de natureza semi-pública que envolveram os ofendidos AI e AT (isto no que se refere aos arguidos C e H). Contudo, no caso em apreço, como já se adiantou, dois dos restantes arguidos – E e K – optaram por invocar esta excepção da ilegitimidade do Ministério Público em sede de contestação, motivo pelo qual o Tribunal recorrido, previamente à indicação dos factos provados e não provados, apreciou essa questão, proferindo o seguinte despacho (cf. fls. 66.503 a 66.514): “I - Fls. 23.230 a 23.239, Arguido E: excepção de ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, quanto aos crimes imputados ao arguido nos pontos 6.2.1., 6.4.1. e 6.7.1. do Despacho de Pronúncia: 1. A fls. 23.230 a 23.239, na sua contestação, o arguido E arguiu a excepção de ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, quanto aos crimes imputados ao arguido nos pontos 6.21., 6.4.1. e 6.7.1. do Despacho de Pronúncia, por entender que não foi devidamente exercido o direito de queixa por parte do ofendido, em relação aos ilícitos em causa, devendo ser ordenado o arquivamento dos autos nessa parte. No despacho de fls. 22.525 a 22.556, concretamente a fls. 22.547, “Ponto III”, o Tribunal tinha proferido uma decisão genérica de legitimidade do Ministério Público, ao abrigo do dis(...) no art° 311°, n° 1, do C.P.Penal, decisão em relação à qual o arguido, a fls. 22.850 e segs., interpôs recurso (cfr., tb, Despacho de fls. 24.317, ponto IV). Por força do Acordão n° 2/95, de 16/05, do S.T.J. - publicado no D.R. 135/95, Série I -A -, a decisão genérica proferida pelo Tribunal, ao abrigo do art° 311°, n° 1, do C.P.Penal, não tem o valor de caso julgado formal, podendo até à decisão final o Tribunal tomar decisão quanto a tal questão, o que passamos a fazer. 2. No capítulo 6.2.1, do Despacho de Pronúncia, está imputado ao arguido E a prática de 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art°. 172°, n° 1, do Código Penal, ocorrido num “... dia indeterminado dos meses de Fevereiro/Março do ano de 2000...”, tendo o assistente (…) de idade. No capítulo 6.4.1, do Despacho de Pronúncia, está imputado ao arguido a prática de 4 (quatro) crimes de abuso sexual de crianças, pp. e pp. pelo art°. 172°. n.°s 1 e 2 do Código Penal, ocorrido “… em datas próximas da Páscoa do ano de 2000, em concreto não determinadas ...”, tendo o assistente (…) de idade. E no capítulo 6.7.1, do Despacho de Pronúncia, está imputada a prática ao arguido de 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças, pp. e pp. pelo art°. 172°, n° 1, do Código Penal, ocorridos em “… dia indeterminado dos meses de Fevereiro/Março do ano de 2000...” e em dia “...indeterminado dos meses de Julho/Agosto 2000...”, tendo o assistente (…) de idade. 2.1. Os presentes autos - a investigação que deu origem à Acusação e posteriormente Despacho de Pronúncia, pelo qual o arguido está em julgamento - tiveram origem numa informação que foi feita pela Polícia Judiciária em 25/11/2002 (cfr. fls. 2). A fls. 46, por despacho datado de 29/11/2002, dá-se a intervenção do Ministério Público, com a promoção do procedimento criminal e abertura de inquérito, sendo que no Despacho de fls. 48, datado de 29/11/2002, é referido estar em causa a investigação de factos susceptíveis de integrar a prática de crimes de abuso sexual de criança, p. e p. no art° 172°, do C.Penal (cfr. art°s. 241°, 242°, 49°, n° 2 do C.P.Penal e art° 172°, do C.Penal, na versão em vigor à data do Despacho). Vejamos então qual a legislação aplicável ao caso concreto. (i) Com as alterações introduzidas pelo Decreto Lei n° 48/95, de 15 de Março, ao Código Penal (que entraram em vigor em 1/10/95), dentro do “Título I”, da Parte Especial, foi criado um novo “Capitulo V”, englobando os “Crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual”. Este capítulo passou a ser constituído pelos artigos 163° a 179°, do C.Penal, dispondo o art° 178°, nos seus n°s. 1 e 2, quanto à “Queixa”, que: “...1. O procedimento criminal pelos crimes previstos nos art°s 163° a 165°, 167°, 168° e 171° a 175°, depende de queixa, salvo quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima. 2. Nos casos previstos no número anterior, quando a vítima for menor de 12 anos, pode o Ministério Público dar início ao processo se especiais razões de interesse público o impuserem”. (ii) A Lei 65/98, de 2 de Setembro (que entrou em vigor em 7/09/98), alterou a redacção do n° 2, deste art° 178°, passando a dizer: “….2. Nos casos previstos no número anterior, quando o crime for praticado contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser.”. A Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto (que entrou em vigor em 30/08/01), alterou o art° 178°, do C.Penal, passando a ter a seguinte redacção: “1. O procedimento criminal pelos crimes previstos nos art°s. 163 a 165°, 167°, 168° e 171° a 175° depende de queixa, salvo nos seguintes casos: a) Quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima; b) Quando o crime for praticado contra menor de 14 anos e o agente tenha legitimidade para requerer procedimento criminal, por exercer sobre a vítima poder paternal, tutela ou curatela ou a tiver a seu cargo. 2. Nos casos previstos na alínea b) do número anterior, pode o Ministério Público decidir-se pela suspensão provisória do processo, tendo em conta o interesse da vítima (...). 3. A duração da suspensão ...(...). 4. Sem prejuízo do dis(...) nos n°s. 2 e 3, e quando os crimes previstos no n° 1 forem praticados contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser.”. (iii) Por sua vez a Lei n° 59/2007, de 4 de Setembro (que entrou em vigor em 15/09/07), começou por alterar o (anterior) art° 172° do C.Penal - intitulado abuso sexual de criança -, alterando a sua numeração do “art° 172°” para “171°”, passando o crime, em consequência, a ser p. e p. pelo art° 171°, do C.Penal. Alterou o art° 178°, do C.Penal, excluindo a necessidade de queixa para o procedimento criminal quanto ao crime de “abuso sexual de criança”, p.e p. (agora) no art° 171°, do C.Penal (anteriormente no 172°, do C.Penal, como dissemos). Mas alteração esta que, por sua vez, tem que ser articulada com a alteração que a Lei 59/07, de 4 de Setembro introduziu ao art° 118°, do C.Penal, nomeadamente o aditamento do “n° 5”, que diz que “…nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, o procedimento criminal não se extingue, por efeito de prescrição, antes de o ofendido perfazer 23 anos”. Do que antecede - e estamos a considerar os regimes sucessivamente em vigor tendo em atenção quer a data da prática do crime e a idade que o assistente (vítima) tinha à sua data, quer a data em que se iniciou o presente processo - , quer pela Lei 65/98, de 2 de Setembro, quer pela Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto, em relação a situações que à partida estão dependentes de queixa, o Ministério Público tem legitimidade para o exercício da acção penal, se o crime tiver sido praticado “...contra menor de 16 anos...” e o interesse da vítima o impuser. O Tribunal não convoca, no entanto, a Lei 59/07 - e isto sob a perspectiva da análise dos regimes sucessivamente aplicáveis, art° 2°, n°4, do C.Penal e art° 29°, da C.R. Portuguesa -, pois o princípio constitucional da proibição da retroactividade da lei penal desfavorável e da obrigatoriedade da aplicação retroactiva da lei penal de conteúdo mais favorável ao arguido, vale para todas as normas penais, materiais e processuais. Quer dizer que este princípio se aplica não só às normas penais substantivas, mas também aquele núcleo de normas processuais penais (materiais) que afectam os interesses do arguido. E a alteração introduzida pela Lei n° 59/07, de 15 de Setembro, ao alterar a natureza do presente ilícito - passando-o de semi-público a público -, é objectivamente um regime mais desfavorável para o arguido que veio suscitar o incidente da ilegitimidade. Assim e prosseguindo, resulta - dos dois regimes que estamos a considerar - que no que se refere à categoria de crimes que estamos a tratar, quando tenham sido praticados contra menor de 16 anos, independentemente do exercício do direito de queixa por parte de quem, à partida, é titular desse direito, por razões de interesse público - relacionadas com o que é a tutela do bem jurídico protegido -, mas inerentes e subjacentes ao interesse da vítima, o Ministério Público tem legitimidade para desencadear e exercer a acção penal. Tem, contudo, é que justificar as razões de facto (objectivas) que levam à sua intervenção no interesse da vítima (cfr., neste sentido, Ac. do S.T.J., 9/04/2003, relatado pelo Sr. Conselheiro Borges de Pinho, P° 02P4628, in www.dgsi.pt, Ac. S.T.J., 22/10/03, relatado pelo Sr. Conselheiro Armindo Monteiro, P° 03P2852, in www.dgsi.pt, Ac.. Tribunal Constitucional n° 403/2007, P° 535/04, relatado pelo Sr. Conselheiro Mário Torres, in www.dgsi.pt, em que é referida a posição da Sra. Professora Maria João Antunes quanto a esta questão, e vista também não só sob a perspectiva da legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, independentemente de queixa, nestas situações, mas também sob a perspectiva da não admissibilidade da desistência de queixa, em função do especial interesse da vítima, quando o crime tenha sido praticado contra menor de 16 anos). No caso concreto, atenta a data que está descrita para a prática dos factos, a idade do assistente em relação ao qual está imputado o crime ao arguido e à data dessa prática - o assistente AN - (…), cfr. fls. 22 e 23, “Apenso CJ” -, era inferior a 16 anos. Acresce que a fls. 13.552 a 13.554, o Ministério Público, previamente à articulação dos factos que constituíram a Acusação, proferiu Despacho no qual ponderou o interesse da vítima e as razões objectivas que levavam à sua intervenção, ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C.Penal (cfr. fls. 13.552 a 13.808, Despacho foi proferido em 29/12/2003). Invocam, em concreto, para fundamentar o interesse dos menores na intervenção do Ministério Público, a situação de institucionalização dos jovens, o quotidiano com deficit afectivo e oriundos de famílias disfuncionais, o dano psíquico que estes factos podem causar nos jovens, cuja reparação pode também passar pela punição do autor dos factos. Tendo em atenção a vivência do assistente que está agora em causa, o qual não sendo uma “criança da rua” estava institucionalizado na AX, familiarmente não tinha estrutura familiar pois estava sem contacto com os pais - cfr.” Apenso CJ” -, estando descrito o seu envolvimento nestes factos através de um funcionário da própria instituição, não tendo o Assistente, quando esteve perante o Tribunal, manifestado qualquer oposição a que este processo tivesse prosseguido - o que, caso tivesse acontecido, poderia ser um sinal para o Tribunal ter em atenção, quanto à avaliação objectiva do real interesse da vítima, no que se refere à existência desta acção e à decisão tomada pelo Ministério Público; notando-se que se constituiu mesmo como assistente -, consideramos objectivamente relevantes e suficientes, sob a perspectiva do interesse do assistente, tal como a lei o configura, as razões invocadas pelo Ministério Público a fls. 13.552 a 13.554, para a sua intervenção ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C.Penal (cfr. fls. 13.552 a 13.808, Despacho foi proferido em 29/12/2003). 3. Em consequência e face ao ex(...), ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 1 e 3 do C.Penal, na versão introduzida pela Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto (sendo que, no segmento concreto, a versão introduzida pela Lei 65/98, de 2 de Setembro, não continha disposição que alterasse de forma substancial o que está em causa no caso concreto), o Tribunal julga improcedente a excepção de ilegitimidade deduzida pelo arguido E a fls. 23.230 a 23.239. II - Fls. 24.388 a 24.409 (concretamente fls. 24.392, Ponto 1.2.); fls. 24.125 a 24.131 - Arguido K: excepção de extinção do Direito de Queixa em relação ao Assistente AI: 1. A fls. 24.388 a 24.409, na sua contestação - concretamente a fls. 24.392, Ponto 1.2. - e a fls. 24.125 a 24.131, o arguido K arguiu a excepção da extinção do Direito de queixa, em relação as factos pelos quais está pronunciado relativamente ao assistente AI. Alegou, em síntese, que atenta a data em que o assistente nasceu – (…) - quando, durante as declarações que prestou, manifestou o desejo de procedimento criminal contra o arguido K, já “...tinha 16 anos, 7 meses e dois dias...” (pois fizera 16 anos no dia (…)). Assim - não invocando, no entanto, qualquer preceito legal -, conclui dizendo que “…o ofendido não exerceu tempestivamente o direito de queixa, pelo que o mesmo se extinguiu.”. 1.1. Face à forma como o arguido deduziu e fundamentou o incidente, afigura-se-nos que o arguido pretende que o Tribunal, face a um procedimento criminal que foi iniciado pelo Ministério Público, declare o mesmo extinto, por ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, por falta de um pressu(...), que é o exercício do direito de queixa pelo ofendido. 2. No despacho de fls. 22.525 a 22.556, concretamente a fls. 22.547, “Ponto III”, o Tribunal proferiu uma decisão genérica de legitimidade do Ministério Público, ao abrigo do dis(...) no art° 311°, n° 1, do C.P.Penal, decisão em relação à qual o arguido, a fls. 22.850 e segs., interpôs recurso (cfr., tb, Despacho de fls. 24.317, ponto IV). Por força do Acordão n° 2/95, de 16/05, do S.T.J. - publicado no D.R. 135/95, Série 1-A -, a decisão genérica proferida pelo Tribunal, ao abrigo do art° 311°, n° 1, do C.P.Penal, não tem o valor de caso julgado formal, podendo até à decisão final o Tribunal tomar decisão quanto a tal questão, o que passo a fazer. 3. No capítulo 4.4.2., do Despacho de Pronúncia, está imputado ao arguido K a prática de 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art°. 172°. n° 1 e 2, do Código Penal, ocorrido em “... data em concreto não determinada, mas situada entre os meses de Outubro e Novembro de 1999...”, tendo o assistente AI 13 anos de idade. 3.1. Os presentes autos - a investigação que deu origem à Acusação e posteriormente Despacho de Pronúncia, pelo qual o arguido está em julgamento - tiveram origem numa informação que foi feita pela Polícia Judiciária em 25/11/2002 (cfr. fls. 2). A fls. 46, por despacho datado de 29/11/2002, dá-se a intervenção do Ministério Público, com a promoção do procedimento criminal e abertura de inquérito, sendo que no Despacho de fls. 48, datado de 29/11/2002, é referido estar em causa a investigação de factos susceptíveis de integrar a prática de crimes de abuso sexual de criança, p. e p. no art° 172°, do C.Penal (cfr. art°s. 241°, 242°, 49°, n° 2 do C.P.Penal e art° 172°, do C.Penal, na versão em vigor à data do Despacho). Vejamos então qual a legislação aplicável ao caso concreto. 3.2. Com as alterações introduzidas pelo Decreto Lei n° 48/95, de 1 5 de Março, ao Código Penal (que entraram em vigor em 1/10/95), dentro do “Título I”, da Parte Especial, foi criado um novo “Capitulo V”, englobando os “Crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual”. Este capítulo passou a ser constituído pelos artigos 163° a 179°, do C.Penal, dispondo o art° 178°, nos seus n°s. 1 e 2, quanto à “Queixa”, que: “...1. O procedimento criminal pelos crimes previstos nos art°s 163° a 165°, 167°, 168° e 171° a 175°, depende de queixa, salvo quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima. 2. Nos casos previstos no número anterior, quando a vítima for menor de 12 anos, pode o Ministério Público dar início ao processo se especiais razões de interesse público o impuserem.”. A Lei 65/98, de 2 de Setembro (que entrou em vigor em 7/09/98), alterou a redacção do n° 2, deste art° 178°, passando a dizer: “…2. Nos casos previstos no número anterior, quando o crime for praticado contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser.”. A Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto (que entrou em vigor em 30/08/01), alterou o art° 178°, do C.Penal, passando a ter a seguinte redacção: “1. O procedimento criminal pelos crimes previstos nos art°s. 163 a 165°, 167°, 168° e 171° a 175° depende de queixa, salvo nos seguintes casos: b) Quando de qualquer deles resultar suicídio ou morte da vítima; b) Quando o crime for praticado contra menor de 14 anos e o agente tenha legitimidade para requerer procedimento criminal, por exercer sobre a vítima poder paternal, tutela ou curatela ou a tiver a seu cargo. 2. Nos casos previstos na alínea b) do número anterior, pode o Ministério Público decidir-se pela suspensão provisória do processo, tendo em conta o interesse da vítima (...). 3. A duração da suspensão …(...). 4. Sem prejuízo do dis(...) nos n°s. 2 e 3, e quando os crimes previstos no n° 1 forem praticados contra menor de 16 anos, pode o Ministério Público dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser.”. Por sua vez a Lei n° 59/2007, de 4 de Setembro (que entrou em vigor em 15/09/07), começou por alterar o (anterior) art° 172° do C.Penal - intitulado abuso sexual de criança -, alterando a sua numeração do “art° 172°” para “171°”, passando o crime, em consequência, a ser p. e p. pelo art° 171°, do C.Penal. Alterou o art° 178°, do C.Penal, excluindo a necessidade de queixa para o procedimento criminal quanto ao crime de “abuso sexual de criança”, p.e p. (agora) no art° 171°, do C.Penal (anteriormente no 172°, do C.Penal, como dissemos). Mas alteração esta que, por sua vez, tem que ser articulada com a alteração que a Lei 59/07, de 4 de Setembro introduziu ao art° 118°, do C.Penal, nomeadamente o aditamento do “n° 5”, que diz que “…nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, o procedimento criminal não se extingue, por efeito de prescrição, antes de o ofendido perfazer 23 anos”. Do que antecede - e estamos a considerar os regimes sucessivamente em vigor tendo em atenção quer a data da prática do crime e a idade que o assistente (vítima) tinha à sua data, quer a data em que se iniciou o presente processo - , quer pela Lei 65/98, de 2 de Setembro, quer pela Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto, em relação a situações que à partida estão dependentes de queixa, o Ministério Público tem legitimidade para o exercício da acção penal, se o crime tiver sido praticado “...contra menor de 16 anos...” e o interesse da vítima o impuser. O Tribunal não convoca, no entanto, a Lei 59/07 - e isto sob a perspectiva da análise dos regimes sucessivamente aplicáveis, art° 2°, n°4, do C.Penal e art° 29°, da C.R. Portuguesa -, pois o princípio constitucional da proibição da retroactividade da lei penal desfavorável e da obrigatoriedade da aplicação retroactiva da lei penal de conteúdo mais favorável ao arguido, vale para todas as normas penais, materiais e processuais. Quer dizer que este princípio se aplica não só às normas penais substantivas, mas também aquele núcleo de normas processuais penais (materiais) que afectam os interesses do arguido. E a alteração introduzida pela Lei n° 59/07, de 15 de Setembro, ao alterar a natureza do presente ilícito - passando-o de semi-público a público -, é objectivamente um regime mais desfavorável para o arguido que veio suscitar o incidente da ilegitimidade. 3.3. Assim e prosseguindo, resulta - dos dois regimes que estamos a considerar - que no que se refere à categoria de crimes que estamos a tratar, quando tenham sido praticados contra menor de 16 anos, independentemente do exercício do direito de queixa por parte de quem, à partida, é titular desse direito, por razões de interesse público - relacionadas com o que é a tutela do bem jurídico protegido -, mas inerentes e subjacentes ao interesse da vítima, o Ministério Público tem legitimidade para desencadear e exercer a acção penal. Tem, contudo, é que justificar as razões de facto (objectivas) que levam à sua intervenção no interesse da vítima (cfr., neste sentido, Ac. do S.T.J., 9/04/2003, relatado pelo Sr. Conselheiro Borges de Pinho, P° 02P4628, in www.dgsi.pt, Ac. S.T.J., 22/10/03, relatado pelo Sr. Conselheiro Armindo Monteiro, P° 03P2852, in wvvw.dgsi.pt, Ac. Tribunal Constitucional n° 403/2007, P° 535/04, relatado pelo Sr. Conselheiro Mário Torres, in www.dgsi.pt, em que é referida a posição da Sra. Professora Maria João Antunes quanto a esta questão, e vista também não só sob a perspectiva da legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, independentemente de queixa, nestas situações, mas também sob a perspectiva da não admissibilidade da desistência de queixa, em função do especial interesse da vítima, quando o crime tenha sido praticado contra menor de 16 anos). No caso concreto, atenta a data que está descrita para a prática dos factos, a idade do assistente em relação ao qual está imputado o crime ao arguido e à data dessa prática - o assistente AI - (…) , cfr. fls. 34, “Apenso DD” -, era inferior a 16 anos. Acresce que a fls. 13.552 a 13.554, o Ministério Público, previamente à articulação dos factos que constituíram a Acusação, proferiu Despacho no qual ponderou o interesse da vítima e as razões objectivas que levavam à sua intervenção, ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C.Penal (cfr. fls. 13.552 a 13.808, Despacho foi proferido em 29/12/2003). Invocam, em concreto, para fundamentar o interesse dos menores na intervenção do Ministério Público, a situação de institucionalização dos jovens, o quotidiano com deficit afectivo e oriundos de famílias disfuncionais, o dano psíquico que estes factos podem causar nos jovens, cuja reparação pode também passar pela punição do autor dos factos. Tendo em atenção a vivência do assistente que está agora em causa, o qual não sendo uma “criança da rua” estava institucionalizado na AX, familiarmente, apesar de ter contactos com uma “família de acolhimento”, era um jovem que manifestava sofrimento pela ausência de contacto com os pais biológicos, tinha acompanhamento pedopsiquiátrico regular e sujeito a medicação com antidepressivos - cfr. “Apenso DD” e Apenso Z-15, 1° volume, fls. 174 a 487 -, estando descrito o seu envolvimento nestes factos através de um funcionário da própria instituição, não tendo o Assistente, quando esteve perante o Tribunal, manifestado qualquer oposição a que este processo tivesse prosseguido - o que, caso tivesse acontecido, poderia ser um sinal para o Tribunal ter em atenção, quanto à avaliação objectiva do real interesse da vítima, no que se refere à existência desta acção e à decisão tomada pelo Ministério Público; notando-se que se constituiu mesmo como assistente -, consideramos objectivamente relevantes e suficientes, sob a perspectiva do interesse do assistente, tal como a lei o configura, as razões invocadas pelo Ministério Público a fls. 13.552 a 13.554, para a sua intervenção ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 4, do C.Penal (cfr. fls. 13.552 a 13.808, Despacho foi proferido em 29/12/2003). 4. Em consequência e face ao ex(...), ao abrigo do dis(...) no art° 178°, n° 1 e 3 do C.Penal, na versão introduzida pela Lei n° 99/2001, de 25 de Agosto (sendo que, no segmento concreto, a versão introduzida pela Lei 65/98, de 2 de Setembro, não continha disposição que alterasse de forma substancial o que está em causa no caso concreto), o Tribunal julga improcedente a excepção de ilegitimidade deduzida pelo arguido K a fls. 24.388 a 24.409 (concretamente fls. 24.392, Ponto 1.2.) e a fls. 24.125 a 24.131.” O interesse da consideração aqui deste despacho é, precisamente, o de constatarmos que, ainda que em fases processuais distintas do processo – em sede de instrução e no acórdão final – o entendimento do Tribunal recorrido sempre foi o mesmo, designadamente considerando a existência da legitimidade do Ministério Público que os arguidos põem em causa. Ambos os despachos estão profundamente fundamentados, à semelhança, aliás, do que acontece com a resposta do Ministério Público, pelo que nos dispensamos aqui de reproduzir toda a evolução legislativa nesta matéria ao nível dos preceitos legais aplicáveis, bem como os motivos porque se defendem as posições expressas em tais peças processuais. O que foi dito foi-o com pertinência, adequação e de forma exaustiva, não se justificando uma repetição do muito que já foi afirmado. Seguiremos, então, o procedimento de analisar os fundamentos dos recursos interlocutórios dos arguidos C e H, de molde a verificar se de algum modo põem em crise o decidido. O arguido H, basicamente, invoca que o Tribunal faz uma aplicação analógica da norma constante do art. 115.º do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo será o da data em que as vítimas adquirem capacidade de exercício do direito de queixa, ou seja, na data em que completem 16 anos, independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores. Com o devido respeito, trata-se de uma conclusão que o arguido retira, desconsiderando por completo o complexo das normas penais e processuais penais que aqui têm que ser chamadas à colação, como bem se constata nas decisões recorridas e na resposta do Ministério Público. O que o Tribunal recorrido fez não foi qualquer interpretação analógica do citado normativo do art. 115.º, n.º 1, do CP, mas antes a interpretação conjugada das normas aplicáveis e que aponta para a resposta que foi encontrada, como, aliás, a nossa jurisprudência tem entendido (vejam-se, a esse propósito, os acórdãos citados quer pelo Ministério Público na sua resposta, quer os que são invocados pelo Tribunal recorrido no despacho proferido no acórdão final). Como facilmente se constata, os arguidos não indicam uma única decisão de um Tribunal Superior que suporte as conclusões por si defendidas. Voltando ao arguido H, reitera-se que não se verifica qualquer interpretação analógica de uma norma penal, mas sim a interpretação conjugada das várias normas jurídicas aplicáveis, encontrando-se o único sentido útil e justo para situações como as que aqui se colocam, como é dever do Tribunal – interpretar as normas legais reconstituindo a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada, sendo que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (art. 9.º do CC). E foi isso mesmo que o Tribunal a quo fez. Seguindo, de forma singela mas bem explícita, o que consta do Acórdão do TRP de 15-04-2009, consultado em “wvvw.dgsi.pt” e já citado: “A única interpretação coerente das regras legais aplicáveis é a que permite ao menor de 16 anos apresentar queixa nos 6 meses seguintes à aquisição do respectivo direito, ou seja, o direito de queixa só se extingue 6 meses depois de o menor atingir 16 anos. De outro modo, o direito de queixa extinguir-se-ia sem que pudesse ter sido exercido, o que seria manifestamente absurdo: os pais da menor não o puderam exercer, pois quando tiveram conhecimento dos factos já não eram titulares desse direito; por seu turno, a menor só adquiriu o direito de queixa depois de já terem passado seis meses sobre o seu conhecimento dos factos. O artigo 115°, 1, do C. Penal, na redacção aplicável (pois a nova redacção do art. 113°, 6 do CP é clara nesse ponto, ao referir que «… o Ofendido pode exercer aquele direito a partir da data em que perfizer 16 anos”), deve ser interpretado no sentido de não ser possível a extinção do direito de queixa antes de decorrido o prazo de seis meses a contar da possibilidade do seu exercício. Por isso, nos casos em que o Ofendido seja menor de 16 anos, o direito de queixa só se extingue seis meses depois do conhecimento dos factos pelos legais representantes do menor, ou seis meses depois de o menor perfazer 16 anos, pois só nessa altura adquire ele próprio o direito de queixa.”. Como se vê, não se trata de aplicar analogicamente qualquer norma, mas sim de interpretar da forma mais lógica e coerente o pensamento do legislador, expresso na conjugação das normas jurídicas aplicadas. Ao que acresce que a solução defendida pelo Tribunal recorrido e pela jurisprudência vai até de encontro às alterações legislativas entretanto ocorridas, não se encontrando melhor sinal de que a interpretação feita é a mais correcta. Disse a esse propósito o Ministério Público, numa clara interpretação das normas da forma imposta por lei: “O que decorre, inexoravelmente, é que, nos casos da previsão do art° 178° n° 2, pretendeu-se consagrar que o M° P° não tem que esperar que quem de direito apresente queixa para, nesses casos, dar início ao procedimento, assim se prevenindo os inconvenientes que da tardia reacção do representante do menor, titular do direito de queixa, poderia advir para o bom êxito do procedimento que depois se quisesse instaurar, frustrando o interesse da vítima menor. Mas, tal não implicou que se tivesse querido preterir a possibilidade de a vítima decidir o interesse para si relevante. Deverá, assim, entender-se, que cessa o pressu(...) de legitimidade de intervenção do M° P° logo que a vítima possa, nos termos da lei, exercer o direito de queixa, ou se se preferir, a vítima possa decidir qual é, para si, o interesse relevante, se a perseguição penal se a não intervenção. Em consequência, pode afirmar-se que, completando a vítima 16 anos, perde razão de ser a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178° n° 2, a menos que o Ofendido não possua o discernimento para entender o alcance e significado do exercício do direito de queixa. É a disciplina que decorre do cotejo do citado normativo com o art° 113°, n° 3, do CP. Este entendimento resulta acentuado com a redacção de então do art° 178°, n° 2, do CP (redacção da Lei 99/2001), que expressamente aludia ao “interesse da vítima”. Com efeito, ao fazer depender o procedimento criminal de queixa nos casos a que se reporta o art° 178°, n° 1, do CP, o legislador concedeu uma especial protecção aos interesses daquela pessoa que, em concreto, é alvo da conduta típica, assim se justificando que só ela disponha de legitimidade para apresentar queixa. E porque assim é, o art° 178°, n° 2, do CPP, surge como uma forma de evitar a desprotecção do menor de 16 anos — e por isso, incapaz para exercer directamente o direito de queixa (art° 113°, n° 3, daquele diploma) — naqueles casos em que o titular do direito de queixa a não apresenta, quando o interesse da vítima assim o impunha. A ratio legislativa situa-se em termos de combater e evitar os casos de impunidade resultantes da circunstância da vítima não ter, ainda, capacidade para o exercício do direito de queixa e de o titular desta a não apresentar - veja-se, neste sentido, Maria João Antunes, in “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 9, fasc.° 2°, pág. 328. Nesta linha de entendimento, a intervenção do M° P° a que se reporta o art° 178°, n° 2, do CP deve, necessariamente, ter-se por subsidiária e porque subsidiária, cessa quando passe a inexistir razão que sob o ponto de vista finalístico a fundamente, ou seja, quando a vítima complete 16 anos e passe a dispor de capacidade para o exercício do direito de queixa. Em suma, o preceito penal mencionado exige uma leitura conjugada do art° 178°, n° 1, 1ª parte, e do art° 113°, n°s 3 e 6, ambos do CP, dela resultando que: a) o art° 178°, n° 2, constitui um dos casos a que se refere o art° 113°, n° 6, do CP; b) quando se trate de procedimento por um dos crimes a que se reporta a 1ª parte do art° 178°, n° 1, do CP, e a vítima for menor de 16 anos, o M° P° pode, em face da inércia ou desconhecimento das pessoas a quem cumpre o exercício do direito de queixa, e se tal corresponder ao interesse da vítima, dar início ao procedimento criminal; c) a capacidade para o exercício do direito da vítima faz cessar qualquer possibilidade de intervenção do M° P° nos moldes consagrados no art° 178°, n°2, do CP. Assim sendo, consagrando a lei a possibilidade de o Ofendido apresentar queixa a partir da altura em que completa 16 anos - e depois disso não podendo o mesmo ser exercido por mais ninguém (art° 113°, n°5, 3 e 6 e 178°, n° 4, do C.P.) - tem de se concluir que o mesmo disporá do prazo geral de 6 meses para a apresentar, sob pena de se esvaziar de conteúdo tal possibilidade”. Não colhendo este único fundamento que consta da motivação de recurso do arguido H – para além da inconstitucionalidade que abaixo se apreciará – temos que concluir que improcede a caducidade do direito de queixa por si invocada. Quanto ao que em relação ao arguido H interessa, o ofendido AI nasceu a (…) e apresentou queixa no dia 25 de Março de 2003, conforme auto de fls. 2.973 a 2.976, isto é, dentro prazo legal de 6 meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Por seu turno, o ofendido AT nasceu a (…) e exerceu o direito de queixa a 16 de Janeiro de 2003 - conforme auto de fls. 564 a 571 -, isto é, dentro do prazo legal de 6 meses contados a partir da data em que perfez 16 anos. Consequentemente, ambos os ofendidos exerceram tempestivamente o direito de queixa, legitimando o Ministério Público para exercer a acção penal, ao abrigo do dis(...) nos arts. 49.º e 50.º do CPP. O fundamento do recurso do arguido H não tem, pois, pertinência para pôr em causa o decidido pelo Tribunal a quo. Já no caso do recurso do arguido C, acrescem os fundamentos de discordância invocados. Começa o arguido por invocar que a data da instauração do presente processo não deve ser aquela que foi considerada no despacho recorrido, mas sim uma outra. Contudo, tal questão apenas assume relevância porquanto um dos menores, designadamente o identificado a fls. 561 dos autos, perfez os 16 anos em (…). Logo, seria relevante saber se a instauração do processo ocorreu a 25-11-2002 (como defende o Tribunal a quo) ou a 29-11-2002 (como defende o arguido), para se aferir se a queixa que apresentou o foi ou não dentro do prazo de 6 meses previsto na lei para o efeito. Mas como já foi salientado, quanto ao arguido C, a questão da legitimidade do Ministério Público coloca-se, neste momento, apenas no que se refere ao menor AI. Em relação a este menor, deixa de ter qualquer interesse a posição que se possa assumir quanto à data da instauração do processo, tratando-se de matéria abrangida pela inutilidade superveniente parcial do recurso. Não deixa, porém, de se afirmar a irrelevância da afirmação que o recorrente faz quando diz que à data da instauração do presente processo, todos os su(...)s ofendidos a que aludiu haviam já completado 16 anos de idade, pois aquilo que interessa nos autos – de acordo com a posição do Tribunal recorrido que perfilhamos – é saber se após completarem os 16 anos de idade apresentaram queixa no prazo de 6 meses. Prossegue o arguido defendendo que os ofendidos a que se reportou tinham completado 16 anos à data da instauração do presente processo, o que levaria a concluir pela ilegitimidade do MP para o exercício da acção penal no caso dos crimes de abuso sexual de crianças de que o arguido vem acusado. Assim não se entendendo, estariam violados os arts. 113.º, n.º 6, e 178.º, n.º 4, do CP, bem como os arts. 48.º e 49.º do CPP. A este propósito, refere Paulo Pinto de Albuquerque:“O MP pode dar início ao procedimento criminal sempre que o interesse do ofendido o aconselhar e o direito de queixa não puder ser exercido porque a sua titularidade caberia apenas ao agente do crime. A Lei n.º 59/2007, de 4.9, substituiu a anterior ponderação das “especiais razões de interesse público” pela consideração do “interesse do ofendido”. O juízo do Ministério Público não é sindicável pelo juiz, nem antes do recebimento da acusação, nem no momento da prolação do despacho de recebimento da acusação, nem em momento posterior” (Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2ª edição, Universidade Católica Portuguesa, pág. 366). Parece, pois, que o juízo do Ministério Público não é sindicável pelo Tribunal, embora essa posição não seja unânime na nossa doutrina e jurisprudência. Mas sendo ou não sindicável, o que é certo é que no caso dos autos, como bem salienta o Ministério Público, era inteiramente justificada a sua intervenção. Os menores que foram vítimas no processo eram crianças desprovidas de meio familiar normal, estavam confiados a uma Instituição de protecção e assistência e foram abusados por isso. Os menores identificados nos autos não tinham qualquer contacto regular com a sua família e o organismo público a que se encontravam confiados não conseguiu protegê-los eficazmente, conforme aliás decorre do modo de vida a que se vinham dedicando. Conclui-se, pois, que está amplamente justificada a existência do interesse especial destas vítimas que legitimou a intervenção processual do Ministério Público. Mas entende-se que o arguido quer ir mais longe. Ao afirmar que todos os ofendidos tinham completado 16 anos à data em que foi instaurado o processo, parece querer dizer que poderiam eles ter formalizado a queixa, sendo, pois, ilegítima a intervenção do Ministério Público. Não podemos concordar com tal afirmação. Os ofendidos poderiam até ter todos perfeito os 16 anos, mas estava em curso o prazo de 6 meses para apresentarem a respectiva queixa. Se o Ministério Público, que é o titular da acção penal, durante esse período, vê necessidade de desencadear o procedimento criminal, o que foi devidamente justificado, deve fazê-lo. Os ofendidos têm um período para apresentar queixa, precisamente para reflectirem se o desejam fazer e não podem ser privados desse prazo para reflexão. Havendo necessidade de dar início às diligências investigatórias – o que só ao Ministério Público compete decidir – aquele deve fazê-lo, sempre que o interesse dos menores o justifique, até porque desconhece qual a posição que os mesmos vão assumir de futuro e não poderá deixar de tutelar os interesses que a lei lhe confiou. Não se verifica, pois, a procedência desta argumentação do arguido C. Mas este arguido prossegue imputando falhas às queixas que os menores acabaram por formalizar. Relembramos que, nesta fase, apenas o menor AI está em causa, motivo pelo qual só à sua situação nos referiremos. O ofendido AI referiu, a fls. 2.973, que pretendia procedimento criminal contra “todos e quaisquer homens que de si tenham abusado sexualmente, incluindo-se até alguns dos quais se possa vir a recordar com mais pormenor”. O próprio arguido salienta que este ofendido vem a referir-se expressamente ao recorrente como seu alegado abusador e que a declaração que fez equivale ao exercício do direito de queixa. Daqui resulta, portanto, que também esta questão se mostra prejudicada, por já só estarmos a tratar da situação do menor AI. Defende o recorrente que não podem entender-se como exercício do direito de queixa contra si, declarações em que o arguido não é referido expressamente. Não é, nem tinha que ser, afirmamos nós. Com efeito, nenhuma norma impõe que o seja. Conforme refere o Ac. do Tribunal da Relação de (…) de 06-06-2002, in CJ, XXVII, tomo 3, pág. 135, a queixa vale mesmo contra pessoas não nomeadas. O que releva é a manifestação do desejo de procedimento criminal, podendo ou não o queixoso ser capaz de identificar desde logo o arguido. De todo o modo, como se disse já, a questão quanto ao arguido AI está ultrapassada, mas sempre faleceria a argumentação que o arguido expendeu a esse propósito. Finalmente, argumenta o arguido, no mesmo sentido que já o fez o arguido H, que o Tribunal a quo procedeu à integração de uma lacuna da lei penal, aplicando analogicamente a norma constante do art. 115.º, n.º 1, do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, a situações como a dos presentes autos, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo seria o da data em que as vítimas adquirem capacidade de exercício do direito de queixa, ou seja, a data em que completem 16 anos, independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores. Já acima se disse, a respeito da fundamentação do recurso do arguido H, porque motivo não procede semelhante argumentação, pelo que damos aqui por reproduzido o que aí se deixou dito. No mais, ambos os arguidos vêm invocar a inconstitucionalidade da interpretação feita pelo Tribunal recorrido quanto à contagem do prazo para o exercício do direito de queixa por parte dos ofendidos e consequente legitimidade do Ministério Público para exercer a acção penal, por violação do princípio da legalidade, previsto no art. 1.º, n.º 3, do CP, e no art. 29.º, n.º 1, da CRP. É óbvio que ocorrendo aplicação analógica de uma norma processual penal, que conduziria ao alargamento, não contemplado na lei, do prazo do exercício do direito de queixa, se estaria a violar o princípio da legalidade. No entanto, mais uma vez teremos que o afirmar, não foi essa a actuação do Tribunal a quo. O Tribunal não aplicou analogicamente qualquer norma, antes tendo aplicado, em conjugação, as normas jurídicas que no caso vertente se aplicam, interpretando-as de acordo com o espírito da lei. Não se consegue, pois, descortinar qualquer inconstitucionalidade da interpretação normativa feita no despacho recorrido, por alegada violação do art. 29.º, n.º 1, da CRP. Em conclusão, improcedem na totalidade os recursos interlocutórios supra mencionados, apresentados pelos arguidos H e C, reiterando que se adere por completo à profunda fundamentação do despacho recorrido e resposta do Ministério Público. 5. Recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 22827 a 22828, proferido em 15/10/2004, que limitou perícia requerida pelo arguido No âmbito do processo apensado aos presentes autos (3137/01.5JDLSB), o arguido A, durante a realização da audiência de julgamento (sessão ocorrida no dia 28 de Outubro de 2003), e na sequência de anterior determinação da realização de relatório social, requereu que fosse ordenada a realização de perícia à sua pessoa, nos termos do art. 160.º, n.º 2, do CPP, englobando especialistas em criminologia, em psicologia, em sociologia e em psiquiatria, na medida em que entendia que todas essas valências são fundamentais para que com todo o rigor fosse elaborada uma perícia que permitisse compreender a personalidade do arguido, os efeitos dessa personalidade, quanto a perigosidade, bem como o enquadramento do foro sociológico-psiquiátrico do mesmo. O Tribunal a quo, após audição do Ministério Público, proferiu despacho a determinar a realização de perícia sobre a personalidade do arguido A, englobando todos os aspectos referidos no art. 160.º, n.º 1, do CPP – características psíquicas independentes de causas patológicas, bem como grau de socialização –, com recurso a especialistas em criminologia, psicologia, sociologia ou psiquiatria, consoante tal se revelasse necessário ao perito a quem couber a efectivação da perícia (cfr. fs. 22827 a 22828 dos autos). Inconformado com aquele despacho, dele recorreu o arguido A, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1 – O recorrente no dia do julgamento e depois de se ver confrontado com uma perícia sobre a personalidade mandada elaborar nos termos do artº 370º do CPP, antes da produção de qualquer prova em julgamento; 2 – Pelo que requereu que fosse julgada sem efeito e mandado fazer perícia com intervenção de peritos em criminologia, em psicologia, em sociologia ou em psiquiatria; 3 – De forma ao pleno conhecimento do enquadramento do foro sociológico-psiquiátrico do cidadão A; 4 – Ora, o despacho recorrido é ilegal, por violar o dis(...) no artº 159º e 160º do CPP; 5 – Mais até, o tribunal recorrido em vez de deferir ou não deferir, determinou que a perícia seria feita por perito singular, do IML, a quem deixou ao seu critério ser a perícia feita ou não por peritos em criminologia, psicologia, sociologia ou psiquiatria; 6 – Quanto à perícia sobre o foro psiquiátrico, igualmente o tribunal deixa nas mãos do perito do IML ter a perícia essa vertente ou não; 7 – Ora, mesmo o IML de Lisboa não deve fazer a perícia, porque todas as perícias sobre as “vítimas” foram feitas no IML de Lisboa, estando assim os seus técnicos ao corrente do que elas disseram; 8 – O arguido tem o direito de se defender, com a amplitude que entende necessária, devendo o Estado assegurar-lhe essa defesa, mesmo quanto a perícias, como a que o recorrente requereu; 9 – Recorrente que não tem meios económicos para pagar a peritos e encomendar perícias como as juntas aos autos por outros arguidos, e que seguramente custam muitos milhares de euros; 10 – O despacho recorrido deve ser revogado e substituído por outro que, mande fazer a perícia multidisciplinar, como ele requereu; 11 – O despacho recorrido viola o dis(...) nos artºs 159º, 160º do CPP e artº 32º nº 1 e 5 da CRP. 12 – Normas que interpretou no sentido de decidir como decidiu quando as deveria ter interpretado no sentido de ser o tribunal a decidir se é de fazer ou não a perícia e com a extensão que foi requerida, quando se sabe que a “pedofilia” é uma doença, como está classificada, sendo ainda certo que o arguido já revelou nos autos que foi abusado desde os 4/5 anos e a AX era a casa dos horrores, há dezenas de anos. NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo ser revogado o despacho recorrido e mandado ser revogado o despacho recorrido e mandada fazer a perícia multidisciplinar como requerida.” O Magistrado do Ministério Público na 1ª instância não apresentou resposta ao recurso. O recurso foi admitido por despacho de fls. 24323 dos autos. Não obstante, compulsados os autos, constata-se que a fls. 28255 (requerimento que deu entrada via fax e cujo original se encontra a fls. 28506) o arguido/recorrente A veio desistir do recurso assim inter(...), por o mesmo haver perdido utilidade. Na 1.ª instância não foi proferido despacho relativamente a esse requerimento, pelo que se impõe tomar posição sobre o mesmo nesta fase processual. De acordo com o dis(...) no art. 415.º n.º 1 do CPP, “o Ministério Público, o arguido, o assistente e as partes civis podem desistir do recurso inter(...), até ao momento de o processo ser concluso ao relator para exame preliminar.” Nos termos do nº 2 do mesmo normativo, “a desistência faz-se por requerimento ou por termo no processo e é verificada por despacho do relator.” Ora, no caso vertente, o recorrente desistiu, por requerimento, do recurso supra, ainda na 1.ª instância, não obstante só agora estejamos a pronunciar-nos sobre essa desistência. Assim, sendo tempestiva, legalmente admissível e provindo de sujeito processual com legitimidade para o efeito, homologa-se a desistência do recurso apresentada pelo arguido A a fls. 28255, declarando, em consequência, extinta a instância recursória por aquele iniciada e relativa ao recurso inter(...) do despacho proferido a fls. 22827 a 22828 dos autos. 6. Recurso inter(...) pelos arguidos H, C e K do despacho de fls. 25475 a 25488, proferido em 13/12/2004, que validou os actos jurisdicionais praticados pelo JIC do (…) do Tribunal de Instrução Criminal Na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 13-12-2004 (cf. fls. 25475 a 25488 do Vol. 109.º), na sequência do acórdão datado de 17-03-2004, proferido pelo Tribunal da Relação de (…) (cf. Proc. apenso n.º 1967/04 - 3.ª, fls. 56 a 75), o Tribunal recorrido proferiu o seguinte despacho (transcrição): “II - Do cumprimento do Acordão da Relação de (…) de 17/3/2004, proferido pela 3° Secção (Penal) do tribunal da Relação de (…), pº nº 1967/04 - 3. 1. A fls. 15.239 destes autos o arguido E interpôs recurso do despacho de fls. 270, proferido pelo M° Juiz de direito do (…) Juízo A, do TIC de Lisboa, na sequência da distribuição que foi feita a esse juízo dos presentes autos, despacho este com o seguinte teor: “Tendo em conta que o presente processo já foi despachado pelo meu Exmo. Colega do (…) Juízo deste T.I.C, (...) proceda-se ao averbamento dos presentes autos a esse juízo, dando-se a competente baixa da distribuição do processo no (…) juízo - A.”. Alegou o Recorrente, em síntese das doutas alegações então apresentadas, que o despacho em causa traduziu-se num desaforamento discricionário do processo e ilícito, feito com violação de lei expressa, ordinária e constitucional, consubstanciando uma nulidade insanável do processo. Tal nulidade, face ao teor (entre os demais preceitos expressamente referidos pelo arguido/recorrente) dos art°s. 209° e segs. do C.P.Civil, 32°, n° 9, da C.R.P. e art°s. 119°, al. e) e 122°, n° 1 e 2, do C.P.P., importava, no entendimento do Recorrente, a nulidade de todos os actos processuais praticados pelo Senhor Juiz do (…) J.l.C., o que devia ser declarado, com todas as consequências legais em termos do inquérito, quer relativamente aos actos jurisdicionais praticados no decurso do inquérito, quer em relação à própria acusação. 1.1. O Tribunal da Relação de (…), em acordão proferido no dia 17/3/2004 ( p° n° 1967/04-3 da (…) Secção), que se encontra apenso aos presentes autos, decidiu, em síntese, o seguinte: 1°. O despacho recorrido não violou o princípio constitucional do Juiz Natural, pois - e após as considerações de natureza Doutrinária e Jurisprudêncial que são feitas no acordão - face ao dis(...) nos art°s. 17° e 19°, n° 1, do C.P.P. e art° 79°, da LOFTJ, o Tribunal territorial e materialmente competente (na fase processual do Inquérito, em que o despacho recorrido foi proferido) era o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Acresce que o Juiz de Instrução era também o Juiz funcionalmente competente para exercer as funções jurisdicionais na fase do Inquérito, incluindo ordenar ou autorizar buscas, nos ternos do dis(...) nos art°s. 219°, da C.R.P., 1° a 3°, da Lei 60/98, de 27/8, 48°, do C.P.P., 79°, n°1 e 80°, da LOFTJ, 174°, n° 3 e 269°, n° 1, al. a), do C.P.P.. 2°. No entanto o Sr. Juiz do (…) Juízo - A do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa não tinha competência em matéria de distribuição, pelo que o despacho de fls. 270, dando sem efeito a correcta distribuição levada a efeito e atribuindo-a ao Sr. Juiz do (…) Juízo do T.I.C., padece de dois vícios de natureza processual: a) “falta de distribuição”, consubstanciando tal despacho a prática de um acto nulo, nos termos dos arts° 4°, do C.P.Penal e 210°, n° 1 e 220°, do C.P.Civil.; b) incompetência do tipo funcional - mas não processualmente autonomizada, uma vez que está integrada na competência material dos Tribunais, isto é, a distribuição da competência entre Tribunais do mesmo grau, nas diferentes fases do processo - do Senhor Juiz do (…) Juízo - A, do T.I.C., para proferir o despacho de fls. 270 a alterar a distribuição anteriormente feita, por força do dis(...) no art° 72°, n° 1, da LOFTJ, o que consubstancia uma nulidade insanável, nos termos do dis(...) no art° 119°, al. e), do C. P. Penal. Pelos fundamentos que antecedem o Tribunal da Relação de (…) concluiu pela declaração de nulidade do despacho de fls. 270. 3°. Quanto às consequências da declaração de nulidade do despacho de fls. 270, o Tribunal da Relação de (…) decidiu que havia que atender ao dis(...) no art° 122°, do C.P.P., com a consagração do princípio da economia processual, havendo ainda que ter em atenção o dis(...) no art° 33°, do C.P.P., em sede específica dos “efeitos da declaração de incompetência”. No entanto e porque dos autos do recurso não constava a indicação dos actos concretamente praticados pelo Senhor Juiz do (…) Juízo do TIC após 7/1/03, data do despacho recorrido, “...desconhecendo-se mesmo a fase processual em que os autos se encontram neste momento, tudo indicando - ao que é, de novo, público - estar a iniciar-se a fase da instrução...”, após ter declarado a nulidade do despacho de fls. 270, o Tribunal da Relação de (…) decidiu “... a remessa dos autos para o Tribunal actualmente competente, o qual deverá dar cumprimento ao agora aqui ordenado e antes deixado referido.”. 2. É ao decidido pelo Venerando Tribunal da Relação de (…), nos precisos termos aí determinado e que antecede, que este Tribunal tem de dar cumprimento. O que se passa a fazer, tendo também em consideração a argumentação e entendimento dos sujeitos processuais que se pronunciaram quanto a tal questão. 3. O decidido pelo Tribunal da Relação de (…) comporta neste momento, na perspectiva do Tribunal, o conhecimento de duas questões: -saber se este Tribunal corresponde ao referido como “actualmente competente” no acordão proferido, para aferir da validade/invalidade dos actos praticados pelo J.l.C na fase do inquérito após o despacho de fls. 270; -qual o alcance e conteúdo que o Tribunal deve atribuir, nesta fase processual, ao “princípio da economia processual” consagrado no art° 122°, do C.P.Penal, para aferir da validade/invalidade de actos praticados pelo Juiz de Instrução Criminal na fase do Inquérito; Embora a questão da “competência” seja, pela natureza de pressu(...) processual, uma questão a decidir previamente ao “fundo da causa”, no caso concreto tal questão está dependente do entendimento que o Tribunal tenha quanto ao sentido do art° 122°, n° 3, do C.P.P., critério a que deverá presidir a decisão de “validação/invalidação” dos actos processuais. 3.1. O acto processual declarado nulo pelo Tribunal da Relação de Lisboa foi a “afectação” que o Senhor Juiz do 5° Juízo - A do TIC fez, pelo despacho de fls. 270, ao Senhor Juiz do 1º Juízo do TIC, despacho este que alterou uma distribuição prévia e regularmente feita. Esta actuação corresponde, no decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a “falta de distribuição”, havendo que atender ao regime e efeitos do art° 210°, n° 1 e 220º, do C.P.Civil, por força do art° 4°, do C.P.P.. Mas, como acima foi dito, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, também, que o despacho em causa padecia de um outro vicio gerador de nulidade, insanável, nomeadamente incompetência “funcional” do Senhor Juiz do 5° Juízo - A, do TIC, para proferir despachos quanto à alteração da distribuição, pois por força do art° 72°, da LOFTJ, tal competência cabia ao Juiz de turno. Incompetência esta que foi declarada. Questão que se põe, desde logo, é: dispondo o artº 33º, nº 1, do C.P.P., quanto aos efeitos específicos da declaração de incompetência, que uma vez declarada “... o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os actos que se não teriam praticados se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos actos necessários para conhecer da causa...” e estando o processo na fase do julgamento, há que remetê-lo para o T.I.C., para ser suprida a “falta da distribuição” (vício apontado pelo Tribunal da Relação de Lisboa) nos termos do art° 210° e/ou 220°, do C.P.Civil? E, uma vez suprida essa falta de distribuição, apresentar o processo ao J.I.C. que resultar como aquele ‘perante o qual o processo devia ter corrido”, para aferir quais os actos que ter-se-iam praticado se o processo tivesse corrido perante ele? Face ao decidido no acordão do Tribunal da Relação de Lisboa, não entendo que possa ser essa a conclusão deste Tribunal, até porque não é o expressamente determinado no acordão. 3.2. O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que, no caso concreto, não houve violação do princípio constitucionalmente consagrado do “Juiz natural”, dizendo expressamente que “... a distribuição processual não é, nem pode assim constituir um princípio fundamental...”. Havia, por conseguinte, para decidir quanto às consequências da nulidade declarada, que ter em conta o regime constante do artº 122°, nº 1, 2 e 3, do C.P.P., não conhecendo o Tribunal de recurso da validade/invalidade dos actos jurisdicionais praticados na fase do inquérito pelo Senhor J.I.C., do 1° Juízo do T.I.C., por não ter elementos suficientes nos autos de recurso. Determinou, contudo, que tal fosse feito pelo Tribunal ”... actualmente competente...”, isto é, o da fase em que o processo se encontrasse (dado que o Tribunal da Relação desconhecia mesmo a fase processual em que os autos se encontravam no momento, embora tudo indicando, de acordo com o que era público, estar a iniciar-se a fase da instrução). O Tribunal da Relação de Lisboa não entendeu, por conseguinte, que o efeito da declaração da nulidade (do despacho que decidiu quanto à alteração da distribuição), tinha como consequência a remessa dos autos para o T.I.C., para “validação” dos actos pelo J.I.C. que devesse ter intervindo na fase do inquérito, isto é, aquele que teria resultado “competente” de uma distribuição não alterada pelo despacho de fls. 270. Caso assim o tivesse entendido tinha-o dito: em vez de referir-se ao Tribunal “actualmente competente” - pois o J.I.C. que veio a intervir na fase da Instrução, após distribuição para o efeito, também não era o J.I.C. que tivera competência para intervir na fase do Inquérito -, teria mandado baixar o recurso a fim de (pelo menos) os autos serem remetidos e/ou presentes ao J.I.C. com competência na fase do inquérito. E depreende-se, face aos princípios legais em matéria de arguição e sanação de nulidades que o acordão enuncia, que não o tenha entendido e determinado, pois é o próprio Tribunal que enuncia o princípio da economia processual para balizar a actuação do Tribunal de 1ª Instância, tendo dito que não tinha havido violação de princípio constitucionalmente consagrado, não constituindo a violação das regras da distribuição processual, por si, uma violação de um princípio fundamental. Seria contraditório com o princípio da economia processual e com a realização da Justiça que, estando ultrapassada a fase do inquérito, o processo fosse remetido sem mais para essa fase, para aferição da validade/invalidade dos actos a que se refere o acordão, pois face ao art° 122°, n° 3, do C.P.P., tal só se justificará processualmente se se concluir pela impossibilidade legal de os actos subsistirem nesta fase. O que o Tribunal da Relação não fez desde logo, por não ter os elementos necessários para o efeito. 3.3. Para dar cumprimento ao acordão do Tribunal da Relação e fazendo um breve enquadramento Doutrinário, há que considerar o seguinte: “(...) A ordem jurídica de um Estado de Direito Democrático pressupõe um mínimo de segurança e de certeza na protecção dos direitos e expectativas juridicamente relevantes, como única forma de tutelar a confiança dos cidadãos e da própria comunidade no direito (...).“. Deste modo “(...) as causas de sanação seleccionadas pelo poder legislativo e elevadas à dignidade de direito vigente podem agrupar-se em três classes fundamentais. O termo de certos prazos, incluindo a formação de caso julgado (...).Se o interessado não reagir atempadamente o acto fica consolidado (...). A faculdade de arguir ou não certo vício e de aceitar ou não os seus efeitos (...). Apenas os casos mais graves, onde o Estado não deve de forma alguma transigir, ficam excluídos deste regime (...), A consecução da finalidade prosseguida pela norma jurídica violada (...)“, pois tal ‘(...) impõe um limite lógico que o sistema nunca deverá ultrapassar, sob pena de irracionalidade. Se o vício não prejudicou os interesses substanciais que a norma jurídica violada procurava acautelar, não há razão para destruir o acto. Até porque a sua repetição nada traria que já não tivesse sido alcançado, embora de forma fortuita (...)“ (João Conde Correia, “Contributo Para A Análise Da Inexistência E Das Nulidades Processuais Penais”, B.F.D., Stvdia Ivridica, Univ. Coimbra, Coimbra Editora, págs. 23 e 196). Assim, ultrapassada a fase que antecede e declarada a nulidade de determinado acto, há que aferir dos efeitos dessa declaração de nulidade. Dispõe o art° 122°, n°1, do C.P.P., que “... as nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar...”, dizendo o n° 2 que “... a declaração de nulidade determina quais os actos que passam a considerar-se inválidos e ordena, sempre que necessário e possível, a sua repetição e concluindo o n° 3 que “... ao declarar uma nulidade o juiz aproveita todos os actos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela…”. “(...) O legislador português, numa lição de equilíbrio e ponderação, optou por um sistema progressivo e limitado. A invalidade pode contagiar o processado, comunicando-se aos actos subsequentes dependentes do acto nulo e afectados por aquela. A contaminação acaba, portanto, por ser duplamente controlada, atingindo apenas esses actos. A infecção não se restringe ao acto inválido, mas também não atinge o processado. São estes mecanismos que permitem tornar ineficaz o acto processual penal inválido ou então a consolidação dos seus efeitos. Sem eles (...) os direitos individuais, a realização da justiça, a descoberta da verdade material e a obtenção da paz jurídica ficariam irremediavelmente afectados (...). O processo penal perderia flexibilidade, tornando-se num óptimo instrumento ao serviço de uma qualquer ideologia totalitária, mas seria imprestável para a realização (…)” da “(…) Justiça” (João Conde Correia, ob. Cit., pag. 196). Face ao que antecede, para concluir pela destruição total de actos ou pela necessidade de renovação de outros, há que ver em que medida tal é legalmente necessário e/ou possível nesta fase processual, mas com o seguinte alcance: apenas serão invalidados os actos que na perspectiva finalística do processo não deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais que, em abstracto, condicionam a sua prática. Este entendimento, de que a este Tribunal, nesta fase processual, não cabe a reapreciação da validade substancial dos actos, mas tão só na perspectiva que antecede, advém da conjugação de dois aspectos. Por um lado, do já referido princípio da economia processual, consagrado no art° 122°, n° 3, do C.P.P. : “…o princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais em processo penal leva a que só se anulem ou só se repitam actos indispensáveis para adequar o processo à tramitação que ele teria face às razões específicas de competência do tribunal que vai conhecer da causa (cfr. Gil Moreira dos Santos, Noções de Processo Penal”, pag. 190, Manuel Simas Santos, Leal Henriques e Borges de Pinho, Código de Processo Penal”, 1° volume, Anotado, 1996, Ed. Rei dos Livros, pág. 205 a 207). Por outro, afastado que ficou, para este Tribunal, que o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa fosse o de que a apreciação da validade/invalidade dos actos seria levada a cabo pelo J.I.C. com competência jurisdicional na fase do inquérito (art° 17°, do C.P.P.) e porque apenas a esse Juiz cabe a competência para a prática dos actos jurisdicionais na (e da) fase do inquérito (art° 14°, do C.P.P., confrontado com art° 17°, do C.P.P.), a tarefa de valoração a que se reporta o art° 33°, n° 2, do C.P.P., conjugado com o art° 122°, do C.P.P., só pode ser tida nessa perspectiva. Assim e tendo em atenção a presente fase do processo, deverão anular-se os actos praticados pelo J.I.C. na fase de inquérito que não se inserissem no objecto do processo, ou aqueles que foram praticados extravasando e, consequentemente violando, as competências jurisdicionais atribuídas no C.P.P. ao J.I.C. na fase do inquérito, violando direitos fundamentais. Havendo que ter em conta, no entanto, as decisões que entretanto foram proferidas pelos Tribunais superiores, em consequência dos recursos inter(...)s pelos arguidos de actos praticados pelo senhor Juiz de Instrução na fase do inquérito e a apreciação que em sede de Instrução veio a ser feita pela J.I.C., em relação a meios de prova cuja obtenção foi judicialmente determinada pelo J.I.C. na fase do inquérito ou em relação a arguidas nulidades da fase do inquérito. 3.3.1. Começando pelo acto em si declarado nulo, a alteração da distribuição para afectação do processo a um outro juízo, mas dentro do mesmo Tribunal, tendo em atenção as consequências que a lei atribui a tal acto (cfr. Art° 210°, n° 1 e 220º, do C.P.Civil, por força do art° 4°, do C.P.P.), bem como o facto de o processo ter sido afectado a um Tribunal que por força do dis(...) nos art°s. 17°, 19°, n° 1, do C.P.P. e 79°, da LOFTJ, era o Tribunal material e territorialmente competente, ficando o processo atribuído a um Juiz de Instrução Criminal, a quem em abstracto compete exercer as funções jurisdicionais na fase do inquérito (art° 17°, do C.P.P., 79°, n° 1 e 80°, n° 1 e 2, da LOFTJ e mapa 1, anexo a DL n° 186-A/99), não se me afigura que o cumprimento do Acordão do Tribunal da Relação tenha como consequência, nesta fase processual, determinar que os autos sejam sujeitos a nova distribuição. Aliás, esse é o entendimento que emana do acordão do Tribunal da Relação, quando conclui que a alteração da distribuição não importou a violação de princípio fundamental e há que ter em atenção que este Tribunal tem de dar cumprimento ao acordão nos precisos termos aí determinado. Como pode ler-se no acordão, “... dúvidas não restarão que o tribunal, “natural” ou “legalmente”, competente ainda para conhecer era, ao tempo, o TIC de Lisboa (...)“. 3.3.2. Passando à apreciação da validade/invalidade dos actos praticados pelo Senhor Juiz de instrução do 1° juízo do T.I.C., após o despacho de fls. 270, há que dizer que no actual sistema judicial o exercício da acção penal pertence ao Ministério Público, a quem cabe a direcção do inquérito e a delimitação do objecto do processo, cabendo a si a movimentação do processo, culminando a sua actuação com a dedução da acusação ou a decisão de arquivamento. A intervenção do Juiz de Instrução Criminal na fase do Inquérito tem o seu âmbito legalmente delimitado: intervém nesta fase processual sempre que haja que decidir quanto a questões que tenham a ver com direitos fundamentais do arguido, sendo apenas da sua competência a prática dos actos materialmente jurisdicionais que a lei indica (Art° 17°, do C.P.P). Esses actos são os determinados no art°. 268°, n° 1, al. a) a e), do C.P.P., os quais, contudo, são praticados a requerimento do MP, de autoridade de polícia criminal em caso de urgência, do arguido ou do assistente (art° 268°, n° 2, do C.P.P.); no art° 269°, do C.P.P, relativo a buscas, apreensões e intercepções e art°s. 174°, 177°, 179° a 181°, 187° a 190°, do C.P.P., referente aos pressu(...)s da sua determinação, execução e validação; nos art°s. 141° e 142°, do C.P.P., quanto ao interrogatório do arguido detido; 191° a 226°, do C.P.P., relativamente à aplicação de medidas de coacção. Ora tendo em atenção o que antecede quanto à delimitação legal das funções jurisdicionais do J.I.C. na fase do inquérito e o objecto do processo tal como foi delimitado pelo Ministério Público e após ter efectivamente compulsados os autos de fls. 270 a fls. 20.743 (estas últimas folhas já referentes, no entanto, a altura posterior à dedução da acusação), estritamente para este efeito, concluo que os actos praticados pelo Sr. Juiz de instrução na fase do inquérito, entre os quais (e que pela sua maior relevância passo a referir de forma individualizada), fls. 271, 424, 526, 593, 749, 923, 942, 984 a 987, 989, 993, 1.029, 1,030, 1.039, 1.064, 1.067, 1.083, 1.139, 1.326, 1.394, 1.540, 1.699, 1.886, 1.912, 1.914, 2.024, 2.052, 2.170, 2.197, 2.219, 2.217, 2.276, 2.277, 2.278, 2.283, 2.303, 2.304, 2.305, 2.308, 2.338, 2.606, 2.625, 2.777, 2.939, 2.941, 3.081, 3.143, 3.195, 3.196, 3.213, 3.214, 3.215, 3.218, 3.219, 3.236, 3.239, 3.255, 3.279, 3.305, 3.306, 3.606, 3.668, 3.714, 3.802, 3.821, 3.825, 3.944, 3.988, 4.074, 4.097, 4.102, 4.107, 4.217, 4.271, 4.329, 4.486, 4.501, 4.507, 4.519, 4.575, 4.597, 4.598, 4.612, 4.641, 4.782, 4.808, 4.910, 5.007, 5.135, 5.271, 5.272, 5.419, 5.516, 5.841, 5.934, 5.998, 6.055, 6.264, 6.266, 6.268, 6.417, 6.574, 6.575, 6.577, 6.579, 6.593, 6.595, 6.596, 6.599, 6.600, 6.621, 6.914, 7.074, 7.370, 7.373, 7.563, 7.719, 7.835, 7.850, 7.902, 8.093, 8.293, 8.305, 8.310, 8.345, 8.393, 8.480, 8.482, 8.607, 8.930, 9.134, 9.151, 9.183, 9.301, 9.338, 9.367, 9.454, 9.876, 10.000, 10.157, 10.168, 10.179, 10.216, 10.258, 10.309, 10.349, 10.473, 10.790, 10.884, 10.985, 11.164, 11.165, 11.171, 11.219, 11.370, 11.412, 11.649, 11.678, 11.811, 11.830, 11.978, 12.335, 12.690, 12.919, 12.924, 12.941, 13.017, 13.035, 13.225, 13.229, 13.237, 13.365, 13.864, 13.941, 14.035, 14.294, 14.404, 14.424, 14.436, 15.044, 15.058, 15.269, 15.290, 15.895, 16.062, foram actos objectivamente praticados no âmbito e dentro da competência que lhe era atribuída por força do dis(...) nos art°s. 17°, 141°, 142°, 174°, 177°, 179° a 181°, 187° a 190º, 191° a 226°, 268°, 269°, do C. P.P., foram actos praticados a requerimento dos sujeitos processuais referidos nos art°s. 268°, n.º 2, do C.P.P., inseriram-se no objecto do processo tal como delimitado pelo Ministério Público, tendo sido praticados dentro dos objectivos e interesses inerentes à fase processual então em curso, prendendo-se intrinsecamente com o objecto da investigação. Não há actos que este Tribunal considere que foram praticados fora das competência legalmente atribuída ou subvertendo a direcção do inquérito. Há que passar, então, a um segundo aspecto. E foram actos que, neste momento processual, se entenda que devam ser repetidos, total ou parcialmente, por inobservância dos pressu(...)s legais de que a lei processual penal faz depender a respectiva prática? Entendo que não, em consequência do dis(...) no art. 122°, n°2, do C.P.Penal. Este preceito diz que o Tribunal só ordena a repetição dos actos “...sempre que necessário...”. Ora no que diz respeito aos actos em relação aos quais os arguidos não interpuseram recurso ou não arguiram a nulidade ou irregularidade, núcleo muito reduzido, há que entender que não ocorrendo nesses actos - como entendo que não ocorreu - violação dos pressu(...)s legais dos quais dependiam a respectiva prática e que firam a sua subsistência, a aceitação que ocorreu dos seus efeitos pelos sujeitos processuais conduz à sua convalidação nesta fase. Em relação a estes actos não há, no entendimento deste Tribunal, divergência entre a actividade processual levada a cabo e o modelo legal pelo qual o acto pode e deve ser praticado. Quanto ao núcleo mais alargado de actos em relação aos quais os sujeitos processuais não se conformaram, interpondo recurso ou arguindo nulidade, invalidade ou inexistência (consoante o modo processual escolhido pelos sujeitos processuais) - como se trata, por exemplo, da aplicação das medidas de coacção aos arguidos E, C, N, H e K, na sequência dos primeiros interrogatórios de arguido detido, da determinação de tomada de declarações para memória futura, do prazo para a prática de determinados actos, não verificação do contraditório (cfr., a título de exemplo, os recursos inter(...)s ou arguições de nulidade a fls. 1291, 1682, 1704, 1.872, 2058, 4707, 5047, 5121, 5473, 5946, 7322, 7530, 7649, 7676, 8012, 8404, 8533, 8587, 8730, 8788, 8805, 8847, 8909, 9988, 9996, 10183, 10196, 10486, 10551, 10767, 11266, 11281, 14232, 14042, 15219, 15740, 15827, 16094, 17056, 17236) -, as decisões que vieram a ser proferidas quanto a tais actos, ou por via da decisão do recurso nas instâncias superiores ou por via do conhecimento das arguidas nulidades aquando da abertura da instrução e do proferimento da decisão instrutória, constituíram já elas uma apreciação jurisdicional da validade dos actos praticados pelo Sr. Juiz de instrução do 1º juízo do TIC na fase do inquérito. Conhecimento (e validação ou invalidação) processualmente admissível e que não se ficou pela mera conformação formal dos actos de acordo com a lei processual, indo mesmo à apreciação da substância dos actos, do mérito do decidido, destruindo-os no caso em que foi entendido que os mesmos violaram a lei ordinária ou constitucional ou confirmando-os (cfr. Ac. RL, p° 10613/03, 3ª secção, aplicação sanção processual; p° 7936/03, 9ª secção, declaração de especial vulnerabilidade e declarações para memória futura; 10887/03-5, relacionado com medidas de coacção; p° 9514/02, de 14/1/04; p° 9785/03, 3ª secção, p° 10607/03, 3ª secção e 2428/04, 9ª secção, todos relacionado com medidas de coacção; p° 594/03, T. Const., relacionado com a obtenção e utilização de meios de prova/medidas de coacção; p° 309/03 e 963/03, do T.Const., relacionado com medidas de coacção e acesso a elementos constantes dos autos; todos apensados aos presentes autos). Isto é, quanto a este núcleo de actos a comprovação da sua validade ou invalidade - consoante o sentido das decisões jurisdicionais que os apreciaram -, que foi feita por Tribunais competentes para o efeito, levam este Tribunal a concluir que em relação aos mesmos já foi feita a validação ou invalidação que o acordão de 17/3/04 determina, não existindo, neste momento, actos nulos ou feridos de nulidade derivada dos actos apreciados (sem prejuízo do efeito decorrente dos recursos que se encontram pendentes, tempestiva e legalmente admitidos) que, por estarem numa dependência real e efectiva dos actos impugnados, cumpra declarar desde já, por ainda haver poder jurisdicional deste Tribunal para o efeito. Acresce que quanto às medidas de coacção, quer por força dos recursos inter(...)s pelos arguidos quanto a tal questão na fase do inquérito e decisões proferidas pelos Tribunais superiores na sequência dos mesmos (na sequência do que foram repetidos interrogatórios de arguidos presos, dado acesso aos arguidos a elementos dos autos), quer por força da decisão da J.l.C. na fase da instrução quanto a tal matéria - encontrando-se pendente os recursos inter(...)s quer pelos arguidos, quer pelo Ministério Público e pelos Assistentes, na sequência do proferimento da decisão instrutória, recurso este que inclui o decidido quanto às medidas de coacção determinadas pela J.l.C. - , já foi validamente dado cumprimento (e em data anterior) ao dis(...) no art° 33°, n° 3, do C.P.P.. Não resta a este Tribunal, salvo melhor entendimento, considerar também que os actos relativos a medidas de coacção se encontra validados. 4. Assim, nos precisos termos que antecede e dando cumprimento ao ordenado pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17/03/2004 e nos precisos termos aí determinados, atento o dis(...) no art° 122°, nº 1, 2 e 3, do C.P.P., tendo em atenção as decisões que entretanto foram proferidas em sede de recurso pelos Tribunais superiores, bem como em sede de instrução, quanto ao conteúdo dos actos praticados pelo Sr. J.I.C., do 1° juízo do T.I.C. de Lisboa na fase do inquérito - incluindo quanto às medidas de coacção aplicadas aos arguidos -, decisões judiciais que já se pronunciaram quanto à validade/invalidade do núcleo de factos sobre os quais se debruçaram, incluindo aplicação de medidas de coacção aos arguidos, considero validados todos os demais actos jurisdicionais praticados pelo J.I.C. do 1° Juízo, do T.I.C. de Lisboa, durante a fase do inquérito dos presentes autos, entendendo o Tribunal que não se afigura necessário determinar a repetição de qualquer acto.” Não se conformando com o seu teor, o arguido H interpôs recurso deste despacho interlocutório (cf. Vol. 115.º, fls. 27417 a 27427), no qual veio a apresentar as seguintes conclusões (transcrição): “A) O despacho recorrido devia ter procedido à apreciação substancial de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz de Instrução do 1° Juízo do TIC, posteriores a 07/01/2003, nos termos que são im(...)s pelo art. 33° n° 1 do C.P.P., uma vez que foi declarada a sua incompetência e a nulidade do acto que determinou que o processo lhe tivesse ficado afecto, o que o tribunal não fez, violando, em conformidade, tal preceito legal; B) Mesmo que assim não fosse, o certo é que, pelo menos, quanto aos despachos que ordenaram ou mantiveram as medidas de coacção e àquilo que delas é instrumental, o art. 33º nº 3 do C.P.P. impõe a sua convalidação ou infirmação pelo tribunal competente, com a consequente apreciação substancial da sua validade, o que o tribunal não fez, violando, em conformidade, tal preceito legal; C) Mesmo que se aceitasse a lógica do tribunal recorrido - no sentido de que só teria de verificar as situações em que houve ofensa de um direito fundamental -, a verdade é que, na parte mais relevante, os actos ora em causa são ilegais por ofenderam o núcleo fundamental das garantias de defesa do arguido, uma vez que não lhe facultaram a adequada informação acerca do facto concreto punível que lhe era atribuído. Com efeito, quanto ao interrogatório judicial de 1/02/2003 e aos despachos que determinaram e mantiveram a prisão preventiva, proferidos a 1/2/2003, 29/4/2003, 15/7/2003 e 15/10/2003, bem como quanto ao despacho que lhe negou acesso à factualidade e aos meios de prova que sustentavam tal prisão preventiva, preferido a 6/2/2003, a sua ilegalidade decorre, de forma manifesta, da circunstância de não ter sido facultada ao arguido adequada informação acerca do facto concreto punível que lhe era atribuído, nem acerca dos meios de prova em que se fundava a sua prisão preventiva, o que ofendeu - de forma gravíssima - o núcleo fundamental das garantias de defesa e traduziu-se numa interpretação errónea do artigo 141° n.° 4 do C.P.P., como o Tribunal Constitucional já declarou nestes autos por mais de uma vez. Todos esses actos deveriam ter sido anulados por ofensa de um direito fundamental da defesa, até por aplicação directa do art. 32° n° 1 da CRP, o mesmo acontecendo quanto ao despacho de 12/01/2004, que não tem qualquer autonomia, limitando-se a manter a situação anterior enquanto não era proferido o despacho que veio a ter lugar a 06/02/2004, o qual por sua vez veio a ser revogado por acórdão de 04/05/2004. D) Relativamente a tais situações, não é admissível qualquer leitura do art. 33º n° 1 do C.P.P., mesmo conjugado com o art. 122° n° 1 do C.P.P., no sentido de que não tem de ser feita uma apreciação substancial dos actos do juiz incompetente, sob pena de se subverter a própria natureza da intervenção do juiz do instrução no inquérito. E) Por cautela, vem arguir-se a inconstitucionalidade do entendimento normativo conjugadamente dado aos arts. 33º n° 1 e 3 e 120° n° 3 do C.P.P. no sentido de que, declarada a incompetência do juiz de instrução que interveio no inquérito, podem, por uma razão de economia processual ou outra de efeito prático equivalente, ser considerados validados os seus actos nos quais foi omitida ao arguido a adequada informação acerca da factualidade concreta punível que lhe é atribuída, bem como acerca dos meios de prova em que se funda a sua prisão preventiva - seja o interrogatório judicial, seja o despacho que ordena ou mantém a prisão preventiva, seja o despacho que nega acesso a essa informação - , por ofensa dos arts. 28º nº 1 e 32° n° 1 da CRP.” O Exmo. Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, apresentou resposta (cf. fls. 56 a 69 do Apenso Q), que rematou com estas conclusões (transcrição): “1 - O Acórdão proferido estipulou, claramente, quais as normas processuais a que devia obedecer a decisão de validação ou não dos actos praticados pelo Mmº JIC do 1º Juízo do TIC de Lisboa, referindo, também clara e expressamente que deviam ser aplicadas as normas gerais do processo penal sobre os efeitos da declaração de nulidade, bem como norma especifica, do mesmo processo penal, relativa à declaração de incompetência ("Em sede específica dos efeitos da declaração de incompetência dispõe o artº 33º do CPP que...” – pág. 19). 2 - No que se refere expressamente a nulidade decorrente da violação das regras de competência, no art° 33 n.° 1 do CPP, a lei aponta parâmetros a que deve obedecer o tribunal competente, na sequência de uma declaração de nulidade por violação daquelas regras. 3 - O art° 33 n° 1 do CPP determina, expressamente que só serão declarados inválidos os actos que se não teriam praticado, se perante ele (tribunal declarado competente) tivesse corrido o processo, ou seja, o conteúdo de tal dispositivo conduz à conclusão de que se anularão, apenas, os actos que, atentas a regras da competência material, territorial, funcional e hierárquica, se não deveriam ter praticado. 4 - Ao eleger como critério de validação actos processuais e não decisões, a lei visou impedir qualquer apreciação do seu mérito, devendo o tribunal cingir-se, apenas, ao cotejamento dos actos processuais que, do ponto de vista das regras de competência, poderiam ter sido realizados pelo tribunal declarado competente. 5 - A lei teve a preocupação de dizer que, apenas serão declarados inválidos os actos que se não teriam praticado se o processo tivesse corrido perante o tribunal declarado competente, não se tratando, por isso de escolher os actos processuais que o Tribunal declarado competente não teria decidido praticar, mas tão só aqueles que, em razão das normas ordenadoras da competência, perante si não se teriam praticado. 6 - A única ressalva que a lei expressamente consagra diz respeito às medidas de coacção e de garantia patrimonial que, muito embora conservem a sua eficácia mesmo após a declaração de incompetência, devem ser reavaliadas no mais breve espaço de tempo pelo tribunal competente, constituindo a única decisão de reapreciação que, do ponto de vista substancial, é permitida ao tribunal declarado competente, porquanto, constituindo restrições aos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, não podem ser sacrificadas em nome do principio da economia processual. 7 - O princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais em processo penal leva a que só se anulem ou só se repitam actos indispensáveis para adequar o processo à tramitação que ele teria face às razões específicas de competência do tribunal que vai conhecer da causa. 8 - Conforme reconhece o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, todos os actos ordenados pelo Senhor Juiz do 1° juízo cabiam no âmbito da competência funcional, material, territorial e hierárquica do Tribunal declarado competente, pelo que a sua valoração conduz no sentido do respectivo aproveitamento, porque conforme ao dis(...) no art° 33 do CPP: isto é, se o processo tivesse corrido perante o 5° juízo A - juízo declarado competente - todos os actos judiciais realizados caberiam no âmbito da competência deste e, portanto, se o processo tivesse corrido perante si, poderiam ter sido realizados. 9 - Relativamente às causas de sanação a ordem jurídica, em nome da consecução da finalidade prosseguida pela norma jurídica violada, reconhece que há um limite lógico que o sistema nunca poderá ultrapassar, sob pena de irracionalidade e que impõe que "apenas serão invalidados os actos que na perspectiva finalística do processo não deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais que, em abstracto, condicionam a sua prática”. 10 - A decisão recorrida cotejou todos os actos praticados pelo Mmº Juiz de Instrução do TIC de Lisboa proferidas em fase de inquérito, tendo concluído que "não há actos que este Tribunal considere que foram praticados fora das competências legalmente atribuída ou subvertendo a direcção do inquérito” ou com divergência com "o modelo legal pelo qual o acto pode e deve ser praticado”. 11 - O recorrente não foi capaz de enunciar uma única razão de facto ou de direito que permita sufragar um entendimento contrário, nem tão pouco enunciar um único acto que, por causa da violação das regras da competência funcional geradora da nulidade declarada, tenha violado os seus direitos fundamentais. 12 - A única questão levantada pelo arguido que se prende com o sentido e alcance do segredo de justiça em fase de inquérito e em sede de aplicação de medidas de coacção, já foi objecto de várias decisões proferidas nos autos pelos tribunais superiores na sequência de recursos por si inter(...)s. 13 - Relativamente às medidas de coacção e de garantia patrimonial aplicadas aos arguidos por aquele Senhor Juiz de Instrução do 1º JIC do TIC de Lisboa, verifica-se que todas elas foram sendo reapreciadas quer em sede de Instrução quer já em fase de julgamento, pelo que, não havendo alteração dos seus pressu(...)s fácticos e jurídicos, deve entender-se que as mesmas já foram validadas, tal como considerou a decisão recorrida, não havendo nos autos qualquer elemento novo que justifique a sua alteração. 14 - O despacho recorrido apreciou os fundamentos fácticos correctamente e aplicou lei convenientemente, pelo que deverá ser mantido.” Igualmente inconformado com o teor do despacho de fls. 25475 a 25488, também o arguido C dele interpôs recurso (cf. fls. 27439 a 27454 do 116.º Vol.), que rematou com as conclusões que abaixo se deixam transcritas (transcrição): “l.ª Por Acórdão de 17/03/2004, proferido no Proc.° n.° 1967/04, da 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, foi declarado ferido de nulidade insanável o despacho de fls. 270 dos autos, no qual o Senhor JIC do 5.º Juízo - A do TIC de Lisboa havia determinado a baixa da distribuição do presente processo àquele juízo e o seu averbamento ao 1.º Juízo do TIC de Lisboa. 2.ª O conhecimento das invalidades subsequentes ao acto declarado nulo, nos termos do art.° 122.° do CPP, foi relegado, naquela decisão, para o “tribunal actualmente competente”, por delas não ter podido conhecer a Relação, em virtude de não ter tido acesso aos “actos concretamente praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC”. 3.ª Os actos cuja validação ou invalidação estava em causa eram exclusivamente os actos praticados no decurso do inquérito pelo Senhor JIC do 1.° TIC de Lisboa. 4.ª Ao tempo da prolação daquele Aresto, o processo encontrava-se no início da fase de instrução, a qual veio a correr termos pelo 3.º Juízo do TIC de Lisboa, sendo este o competente para o cumprimento do determinado pela Relação de Lisboa. 5.ª A competência material e funcional do JIC na fase de inquérito decorre do estatuído nos arts. 17.º in fine do CPP e 79.°, n.° 1 in fine da LOFTJ, constando o núcleo essencial dos actos que naquela fase processual lhe estão reservados dos arts. 268° e 269.º do CPP; 6.ª Especificamente no que respeita aos efeitos da declaração de incompetência, dispõe o art.° 33.º, n.° 1 do CPP que “(...) o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo (...)“ — sublinhado nosso. 7.ª O supra afirmado nas conclusões 4.ª a 6.ª - bem como a circunstância de ser irrecorrível aquele Acórdão da Relação, ex vi do dis(...) no art.° 400.°, n.° 1 al. c) do CPP - depõe no sentido de que a expressão “tribunal actualmente competente”, constante do Acórdão, só poderia ser interpretada como querendo significar o TIC de Lisboa; 8.ª Acrescendo que a competência funcional dos tribunais é definida por lei e insusceptível de alteração por decisão judicial - pelo que só aquele sentido interpretativo seria o legalmente admissível. 9.ª Ao declarar-se competente para conhecer e decidir da validação ou invalidação dos actos praticados pelo Senhor JIC do 1.º TIC de Lisboa na fase de inquérito, o Tribunal a quo violou o dis(...) nos arts. 14.°, 17.°, n.° 1 in fine, 33.°, n.° 1, 268.° e 269.°, todos do CPP, bem assim como o art.° 79.°, n.° 1 in fine da LOFTJ; 10.ª Consequentemente, o despacho ora recorrido está ferido de nulidade insanável, ex vi do dis(...) no art.° 119.°, al. e) do CPP. 11.ª A decisão recorrida ofende, ainda, o princípio da estrutura acusatória do processo criminal, consagrado no art.° 32.°, n.° 5 da Constituição, já que as normas legais de delimitação do âmbito da competência funcional dos tribunais criminais traduzem e asseguram, no plano do direito ordinário, o respeito por aquele principio fundamental; 12.ª Pelo que, o sentido interpretativo subjacente à aplicação que das normas constantes dos arts. 14.°, 17.°, n.° 1 in fine, 33.°, n.° 1, 268.° e 269.°, todos do CPP é feita na decisão recorrida, ao reconhecer ao tribunal de julgamento competência para apreciar e decidir da validação ou invalidação de actos jurisdicionais do JIC declarado incompetente, praticados cm fase de inquérito, é inconstitucional, por ofensivo do princípio da estrutura acusatória do processa criminal, consagrado no art.° 32°, n.° 5 da Constituição. 13.ª Caso assim se não entenda, sempre será de revogar a decisão recorrida, porquanto: 14.ª Com fundamento num critério decisório meramente formal e finalístico, a decisão recorrida veio “(…) considerar validados todos os actos (...) jurisdicionais praticados pelo JIC do 1.° Juízo do TIC de Lisboa, durante a fase de inquérito (…)”; 15.ª Invocando, para tanto, a circunstância daqueles actos terem já sido objecto de apreciação substancial, seja em decisões proferidas pelos tribunais superiores por via de recurso, seja na fase de instrução. 16.ª Porém, a questão suscitada pelo cumprimento do Acórdão da Relação acima referido nunca foi, a se, devidamente ponderada e decidida em qualquer daquelas decisões, antes se configurando nos presentes autos como questão nova. 17.ª A decisão não respeita o estatuído nos arts. 122.°, n.° 1 e 33.°, nrs. 1 e 3,ambos do CPP, os quais impõem a ponderação substancial dos actos eventualmente feridos de nulidade subsequente; 18.ª Em especial no que tange ao art.° 33.°, n.° 1 do CPP, que impõe ao tribunal competente uma valoração material dos actos virtualmente feridos de nulidade subsequente, segundo uma perspectiva ex ante, tal como se perante o próprio “tivesse corrido o processo”; 19.ª E, em particular no que respeita ao despacho que determinou a prisão preventiva do ora Recorrente (de fis, 3246 e ss.), bem como relativamente aos subsequentes, proferidos aquando dos seus reexames obrigatórios (de fls. 6055 e s.; de fls. 9386 e s., e de fls. 13863 e s), em que expressamente impõe o art° 33.°, n.° 3 do CPP ao tribunal uma decisão de fundo quanto à convalidação ou não convalidação daquelas decisões (todas proferidas pelo Senhor JIC do 1.º TIC de Lisboa). 20.ª Pelo que, violou a decisão recorrida o dis(...) nos arts. 33º, nrs. 1 e 3 e 122.°, n.° 1, ambos do CPP; 21.ª Não dando, desta forma, cumprimento ao decidido no Acórdão de 17/03/2004, da 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.”. O Exmo. Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, na sua resposta a este recurso (cf. Apenso N, fls. 77 a 97), pronunciou-se do seguinte modo (transcrição): “1 - o Tribunal da Relação de Lisboa não decidiu que o processo deveria ser remetido para o TIC a fim de os actos praticados pelo Juiz do 1º Juízo serem "validados" pelo Juiz que deveria ter intervindo na fase de inquérito, de acordo com a distribuição efectuada antes do proferimento do despacho cuja nulidade foi declarada, por violação das regras de distribuição e de competência funcional; 2 - Como salienta a Mmª. Juiz no despacho recorrido, "Caso assim o tivesse entendido (o Tribunal da Relação) tinha-o dito: em vez de referir-se ao Tribunal "actualmente competente" - pois o J.I.C. que veio a intervir na fase da Instrução, após distribuição para o efeito, também não era o J.I.C. que tivera competência para intervir na fase do Inquérito -, teria mandado baixar o recurso a fim de (pelo menos) os autos serem remetidos e ou presentes ao J.I. C. com competência na fase de inquérito"; 3 - A fundamentação invocada pelo arguido recorrente, como forma de demonstrar que o Tribunal da Relação de Lisboa quando se refere ao Tribunal "actualmente competente" não pode deixar de se reportar ao TIC de Lisboa - sendo que, nas próprias palavras do arguido recorrente "uma vez que no presente processo houve lugar a instrução, a qual decorreu, após distribuição válida e incontestada, pelo 3º Juízo do TIC de Lisboa, só este poderia ser considerado o tribunal competente para dar cumprimento ao decidido no Acórdão de 17.03.2004, da 3ª. Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, no estrito respeito pelo espírito da decisão proferida" - encerra uma contradição nos seus próprios termos; 4 - Da aplicação da norma constante do art°. 33°. n°. 1 do CPP nunca resultaria a remessa dos autos para o Juízo do TIC onde decorreu a fase de Instrução, a fim de, pelo juiz titular de tal juízo, serem "validados" os actos judicias praticados na fase de inquérito, mas sim a remessa dos autos ao Juiz com competência na fase de inquérito, o juiz titular do 5ºJuízo A do T1C, a quem o processo fora inicialmente distribuído, e por isso com competência, nos termos da norma citada, para anular os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordenar a repetição dos actos necessários para conhecer da causa; 5 - Tal não foi o decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que determinou a remessa dos autos para "o Tribunal actualmente competente" só não tendo tal Tribunal superior efectuado a "validação" dos actos judicias realizados na fase de inquérito, por, conforme se salienta no Acórdão, não fornecerem os autos de recurso quaisquer indicações sobre quais concretamente os actos praticados pelo Juiz titular do 1 °. Juízo do TIC, posteriormente a 07.01.2003, data do proferimento pelo Juiz titular do 5º. Juízo A, do despacho declarado ferido de nulidade insanável; 6 - A validação efectuada no despacho recorrido, relativa aos actos judiciais praticados na fase de inquérito em nada contende com a estrutura acusatória do processo penal, com consagração constitucional; 7 - Os actos praticados na fase de inquérito não foram analisados no seu conteúdo substancial, nomeadamente tendo em conta o suporte fáctico que, em cada momento, determinou a sua prática, tendo sido erigido como critério de invalidação de tais actos apenas aqueles que "na perspectiva fìnalística do processo nulo deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais que, em abstracto, condicionam a sua pratica”; 8 - A norma ínsita no art°. 40°. do CPP não exclui a possibilidade de um juiz, que tenha intervenção na fase de inquérito ou instrução, poder vir a presidir ao julgamento, compreendendo-se que assim seja, pois, em concreto no que se reporta à fase de inquérito, a intervenção judicial não é conformadora do conteúdo e desfecho do objecto do processo, mas sim provocada sempre a apenas quando haja que decidir quanto a questões que tenham que ver com direitos fundamentais, estando taxativamente elencados os actos da competência do Juiz de Instrução em tal fase do processo; 9 - O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa estipulou, claramente, quais as normas processuais a que deve obedecer a decisão de validação ou não dos actos praticados pelo Mmº JIC do 1° Juízo do TIC de Lisboa, referindo, também clara e expressamente que devem ser aplicadas as normas gerais do processo penal sobre os efeitos da declaração de nulidade, bem como norma específica, do mesmo processo penal, relativa à declaração de incompetência ("Em sede especifica dos "efeitos da declaração de incompetência dispõe o artº 33º do CPP que...” – pág. 19); 10 - Resulta do dis(...) no art° 33º n°. 1 do CPP que são susceptíveis de ser anulados, apenas, os actos que, atentas a regras da competência material, territorial, funcional e hierárquica, se não deveriam ter praticado; 11 - Ao eleger como critério de validação actos processuais e não decisões, a lei visou impedir qualquer apreciação do seu mérito, devendo o tribunal cingir-se, apenas, ao cotejamento dos actos processuais que, do ponto de vista das regras de competência, poderiam ter sido realizados pelo tribunal declarado competente: 12 - In casu, a competência funcional, territorial, material e hierárquica do 1° e do 5° Juízos do TIC de Lisboa é em tudo idêntica - tal como o próprio Acórdão reconhece - pelo que é forçoso concluir que todos os actos praticados pelo Mm° Juiz do 1º Juízo do TIC poderiam ter sido praticados pelo 5° Juízo A, porque ambos são detentores da mesma competência; 13 - A única decisão de reapreciação que, do ponto de vista substancial, é permitida ao tribunal declarado competente, diz respeito às medidas de coacção, porquanto, constituindo restrições aos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, não podem ser sacrificadas em nome do princípio da economia processual; 14 - A Mmª Juiz, no despacho recorrido, efectuou uma correcta interpretação das normas em causa e do decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ao não efectuar uma reapreciação da validade substancial dos actos e ao adoptar o critério a que já se fez referência; 15 - A Mmª Juiz, verificou que todos os actos praticados pelo Juiz de instrução na fase de inquérito foram actos objectivamente praticados no âmbito e dentro da competência que lhe era atribuída nos termos legais, inseridos no objecto do processo tal como delimitado pelo Ministério Público, e convalidou aqueles actos que não foram alvo de impugnação pelos sujeitos processuais, por não ter ocorrido, quanto a tais actos, violação dos pressu(...)s legais dos quais dependiam a respectiva prática e que ferissem a sua subsistência, por não existir divergência entre a actividade processual levada a cabo e o modelo legal pelo qual o acto pode e deve ser praticado; 16 - Relativamente aos actos em relação aos quais os sujeitos processuais não se conformaram, tendo inter(...) recurso ou arguido nulidade, invalidade ou inexistência, entendeu a Mmª. Juiz que "as decisões que vieram a ser proferidas quanto a tais actos, ou por via da decisão do recurso nas instâncias superiores ou por via do conhecimento das arguidas nulidades aquando da abertura da instrução e do proferimento da decisão instrutória, constituíram já elas uma apreciação jurisdicional da validade dos actos praticados pelo Sr. Juiz de instrução do 1 º Juízo do TIC na fase de inquérito.”; 17 - Por - conforme já foi referido e é salientado, quer no acórdão do Tribunal da Relação, quer no despacho recorrido - todos os actos ordenados pelo Senhor Juiz do 1° juízo se integrarem no âmbito da competência funcional, material, territorial e hierárquica do Tribunal declarado competente, não foram "invalidados", no despacho recorrido, quaisquer actos praticados pelo juiz titular do 1°. Juízo do TIC, e não porque, como alega o arguido recorrente, tivesse sido adoptado pela Juiz um critério susceptível de ser qualificado como esvaziando de sentido as normas em causa e o decidido e ordenado pelo Acórdão da Relação de Lisboa; 18 - Atenta a natureza da intervenção do juiz de instrução na fase de inquérito, sempre provocada pelos sujeitos processuais, relativamente à prática de actos taxativamente elencados em que estejam em causa direitos, liberdades e garantias, compreende-se, também a essa luz, que não tivesse sido determinada a “repetição dos actos necessários para conhecer da causa”; 19 - Não assiste, também, qualquer razão ao arguido quando refere que a questão suscitada pelo cumprimento do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa é uma questão nova que, como tal, nunca foi considerada em qualquer decisão anteriormente proferida nos autos, uma vez que é um pressu(...) prévio da apreciação de qualquer outra questão substancial, a verificação, declarada ou não, de que a decisão a apreciar emana – como foi o caso – de tribunal com competência para o efeito e obedece a todos os pressu(...)s e requisitos legalmente estabelecidos; 20 - O despacho recorrido não violou qualquer norma constitucional ou legal, tendo efectuado uma correcta aplicação da Lei e cumprido o ordenado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pelo que, negando provimento ao recurso, V. Exªs farão a esperada JUSTIÇA”. De igual forma, o arguido K interpôs recurso do despacho que validou os actos jurisdicionais praticados pelo Senhor Juiz de Instrução do 1.º Juízo do TIC de Lisboa (cf. Vol. 116.º, fls. 27.493 a 27.522), do qual veio a extrair as seguintes conclusões (transcrição): “1. No despacho recorrido o Tribunal a quo considerou-se competente para cumprir o Acórdão proferido em 17.03.04 pelo Tribunal da Relação de Lisboa - nos termos do qual se declarou a nulidade do despacho proferido em 07.01.03 a fls. 270 e ordenou a remessa ao Tribunal competente para validação ou invalidação dos actos praticados pelo Tribunal incompetente e de todos os que por aqueles se encontrem afectados -, e validou todos os actos praticados pelo M.mo JIC declarado incompetente, com base em critérios juridicamente inaceitáveis. 2. O Tribunal a quo fez depender a resolução da questão da competência do entendimento que o tribunal competente tenha quanto a critério que deverá presidir à validação/invalidação dos actos processuais, quando a questão da determinação da competência do Tribunal é prévia àquela outra da validação/invalidação dos actos processuais praticados pelo Tribunal incompetente, e com ela não se pode confundir e de todo dela depender. 3. Ao fazer depender a decisão sobre o tribunal competente do entendimento que o Tribunal a quo tenha sobre o sentido art.° 122°, n.° 3 do CPP e do critério orientador da decisão a proferir sobre a validação/invalidação dos actos praticados pelo tribunal incompetente, o despacho proferido não só não cumpre o Acórdão proferido - a cuja decisão está submetido -, como viola lei expressa. 4. O Tribunal a quo não tinha que atender ao regime e efeitos do dis(...) no art.° 210°, n.° 1 e 220° do C.P.C., quer quanto à decisão a proferir sobre o tribunal competente para dar cumprimento ao Acórdão do TRL de 17.03.04, quer quanto à decisão sobre a validação/invalidação dos actos praticados pelo tribunal incompetente, verificando-se nesta parte da fundamentação erro de apreciação e interpretação daqueles dispositivos legais que inquina a decisão recorrida. 5. A referência no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 17.03.04 à remessa dos autos para o “... Tribunal actualmente competente…”, só numa leitura apressada poderia entender-se como conferindo competência ao tribunal de julgamento para cumprimento do ali decidido e ordenado, porquanto não cabia ao Tribunal da Relação de Lisboa ordenar a remessa dos autos para qualquer outro tribunal senão para aquele considerado legalmente competente. 6. Deve antes entender-se que a referência efectuada no referido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa só pode ter o sentido de remeter os autos para o Tribunal material e funcionalmente competente uma vez que as regras da competência dos tribunais estão definidas por Lei e, como tal, subtraídas à livre decisão do julgador, não estando pois na livre disposição do julgador a definição do Tribunal competente para resolver as questões decorrentes da incompetência de um tribunal ou a alteração por decisão judicial da regras de competência definidas pelo legislador. 7. Contrariamente ao regime fixado quanto a outras nulidades, no caso de declaração de incompetência, o Tribunal que declara a incompetência - in casu o Tribunal da Relação de Lisboa - ordena a remessa do processo para o tribunal competente, competindo a este determinar quais os actos que são inválidos e ordenar a repetição dos actos necessários para conhecer do mérito da causa. 8. Assim, cabe ao Tribunal competente declarar quais os actos nulos e ordenar a repetição dos actos necessários para conhecer da causa, tribuna para o qual o processo é remetido de acordo com o comando ínsito no art.° 33°, n.° 1 do CPP, que determina que, após declaração de incompetência do Tribunal, o Tribunal competente para anular os actos praticados pelo Tribunal incompetente, é aquele que deveria ter assumido o poder decisório do processo. 9. A lei processual penal não elenca as espécies de competência, embora as acolha implicitamente no art.° 32°, n.° 1 e 2 do CPP, ao prevenir regime excepcional para a incompetência territorial, mas não distinguindo a lei, parece contudo dever entender-se que os diferentes números e alíneas dos art.°s 11 a 17º do Código de Processo Penal delimitam, simultaneamente, a competência material e funcional dos respectivos tribunais. 10. Compete aos Tribunais de Instrução Criminal e ao Juiz de Instrução Criminal a competência funcional para proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicionais relativas ao inquérito (cfr. art.° 79°, n.° 1 da LOFTJ e art.°s 17°, 268° e 269° do CPP) e às Varas Criminais compete proferir despacho nos termos dos art.°s 311° e 313° do CPP e proceder ao julgamento e termos subsequentes nos processos de natureza criminal e de competência do tribunal colectivo ou de júri (art.°s 98°, 106°, n.° 1 da LOFTJ e art.° 14° do CPP). 11. Os actos a cuja apreciação se haveria que proceder na sequência da declaração de nulidade efectuada pelo Acórdão do TRL de 17.03.04, são todos aqueles que resultam de decisões proferidas pelo Senhor Juiz do 1° Juízo do TIC de Lisboa, subsequentes ao despacho proferido em 07.01.03, a fls. 270, declarado ferido de nulidade insanável, sendo que tais decisões e actos deles decorrentes inserem-se no âmbito da competência funcional do Juiz de Instrução Criminal, a qual decorre do estatuído nos art.°s 17°, 268° e 269° do CPP e art.°s 79°, n.° 1 e 64°, n.°s 1 e 2 da LOFTJ. 12. A competência funcional de um tribunal encontra-se definida na lei e não recai na esfera de poderes jurisdicionais o poder de alterar, por via decisória, matéria de competência funcional e tão pouco com apoio ou fundamento no princípio da economia processual. 13. Estando esta determinação afastada do poder do Tribunal da Relação de Lisboa bem como do Tribunal a quo, não faz sentido legal debater critérios de economia processual, de celeridade ou qualquer outro valor adjectivo, pois o princípio fundamental, o da legalidade, se encontra violado. 14. Atento todo o ex(...), a discussão em torno do sentido de “...Tribunal actualmente competente…” não faz sentido algum, sendo mesmo irrelevante, pois o Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito desta problemática, só podia ordenar a remessa para o tribunal cuja competência está prevista na lei. 15. Se os actos em causa se inserem no âmbito de competência do JIC, por força do dis(...) nos arts.° 17.°, n.° 1 in fine, 268.° e 269.°, todos do CPP, e art.° 79º, n.° 1 da LOFTJ, só a este poderia caber, nos termos do art.° 33º, n.° 1 do mesmo diploma, dar cumprimento àquela decisão, validando ou invalidando esse mesmos actos. 16. O Tribunal a quo não é, pois, o competente para conhecer da validação ou invalidação dos actos praticados pelo JIC do 1º Juízo, mas tão somente o Juiz de Instrução Criminal do 5º Juízo-A, ou seja, aquele que deveria ter actuado jurisdicionalmente na fase de inquérito do presente processo por os autos lhe terem sido valida e regularmente distribuídos. 17. Acresce que ao tempo da prolação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa a que se vem fazendo referência, os autos encontrava-se no início da instrução, facto mencionado por aquele Venerando Tribunal em mais do que uma passagem da decisão que proferiu, sendo tal decisão do Tribunal da Relação de Lisboa era insusceptível de recurso, por força do dis(...) no art.° 400.º, n.° 1 al. c) do CPP, o que era certamente do conhecimento dos Senhores Desembargadores que a proferiram. 18. Pelo que não era concerteza previsível para os Senhores Desembargadores que o proferiram que o Acórdão baixasse à primeira instância na fase do julgamento, não sendo legítimo retirar da expressão “... Tribunal actualmente competente…” outro sentido interpretativo que não o de que tal tribunal sempre seria o Tribunal de Instrução Criminal, por ser aquele que detinha a competência material e funcional para dar cumprimento ao ali determinado. 19. Na decisão que proferiu nesta parte, o Tribunal a quo violou o estatuído nos art.°s 33°, n.° 1, 11° a 17°, 268°, 269°, 311° e 313°, todos do CPP, bem como o estipulado nos art.°s 79°, n.° 1, 64°, n°s 1 e 2, 98°, 106°, n.° 1, todos da LOFTJ, aprovada pela Lei n.° 3/99, de 13 de Janeiro e republicada pela Lei n.° 105/2003, de 10 de Dezembro, assim inquinando o processo com a nulidade insanável prevista no art. 119°, alínea e), do Código de Processo Penal. 20. Nestes termos, devem Vossas Excelências declarar a nulidade da decisão recorrida, ordenando a remessa dos autos para o Tribunal competente, ou seja, para o Senhor Juiz do 5° Juízo - A do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. 21. A interpretação assumida pelo Tribunal a quo sobre os normativos dos art.°s 33°, n.° 1, 14°, 17°, in fine, 268° e 269°, todos do C.P.P., é inconstitucional, por violar o sentido do art.° 32°, n.° 5, da Constituição da República Portuguesa, no qual está consagrado o princípio da estrutura acusatória do processo criminal. 22. Princípio este que exige que se diferencie entre o órgão que investiga e/ou acusa e o órgão que julga, tratando-se de uma garantia essencial de julgamento independente e imparcial, traduzível, no plano material, na distinção entre instrução, acusação e julgamento, e significativa, no plano subjectivo, de diferenciação entre juiz de instrução e juiz julgador e entre estes e o órgão acusador. 23. A atribuição ao tribunal de julgamento da competência para validação ou invalidação de actos jurisdicionais para os quais é funcionalmente competente o tribunal de instrução criminal, traduz-se numa violação expressa da delimitação funcional dos diversos tribunais criminais e, por consequência, de estrutura acusatória do processo penal português consagrado no art.° 32°, n.° 5 da Lei Fundamental. 24. A interpretação dos normativos citados, tal como assumida pelo Tribunal a quo, implica uma reformulação não autorizada do princípio de estrutura acusatória do processo criminal vigente, violando a norma constitucional do art.° 32°, n°5, da Constituição da República Portuguesa. 25. O cumprimento do Acórdão do TRL implica a apreciação e decisão sobre a validade ou invalidade de um vastíssimo conjunto de actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.° Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa em fase de inquérito, decisões que se prendem com os direitos e garantias fundamentais do arguido, constitucionalmente consagradas e que não podem ser postergadas em nome do princípio da economia processual. 26. Tal apreciação e decisão não pode ser efectuada pelo Tribunal de julgamento sem que se verifique a violação das regras de competência funcional - arts. 14°, 17.°, n.° 1, 33.° n.° 1, 268.°, 269.°, 311º e 313°, todos do CPP e art.°s, 64°, nºs 1 e 2, 79°, n.° 1, 98° e 106 n.° 1 da LOFTJ - e do princípio consagrado no art.° 32.°, n.° 5 da Lei Fundamental. 27. Nestes termos, o despacho recorrido estará ferido de nulidade insanável, ex vi do dis(...) no art.º 119.º, al. e) do CPP. 28. A interpretação normativa efectuada pelo Tribunal a quo na decisão recorrida, das regras de competência funcional supra citadas, designadamente dos art.°s 14°, 17°, 330 nº 1, 268°, 269°, 311° e 313°, todos do CPP, e do dis(...) nos art.°s 64 n.°s 1 e 2, 79°, n.° 1, 98° e 106 n.° 1 da LOTJF, reconhecendo ao tribunal de julgamento, por via dessa interpretação, competência para apreciar e decidir da validação ou invalidação de actos jurisdicionais praticados em fase de inquérito pelo Senhor Juiz de Instrução Criminal declarado incompetente, é inconstitucional, por violadora da estrutura acusatória do processo penal e da norma constitucional que o consagra, art.° 32°, nº 5 da Constituição da República Portuguesa, a qual deve ser declarada. 29. O sentido interpretativo subjacente á aplicação daquelas mesmas normas efectuado na decisão recorrida, e por via dessa interpretação normativa conferindo competência ao Tribunal de julgamento para cumprir o Acórdão proferido em 17.03.04 pelo Tribunal da Relação de Lisboa, extravasando e anulando a delimitação da competência funcional dos tribunais criminais contidas naquelas normas é inconstitucional por violação do art.° 211°, n.°s l e 2, da Constituição da República Portuguesa, a qual deve ser declarada. 30. A interpretação dos normativos referidos pelo Tribunal a quo, na decisão recorrida, estabelece uma confusão nas funções, finalidades e competências entre os tribunais de julgamento e de instrução criminal, ao arrepio do que é consagrado na citada norma da Constituição da República, ou seja, a diferenciação de competências e a especialização de funções. 31. Nestes termos, a interpretação do normativo dos arts. 33º, n° 1, 14°. 17°, 268°, 269°, 311° e 313° todos do CPP, e art.°s 64°, n.°s 1 e 2, 79°, n.° 1, 98° e 106 n.° 1, é ofensiva da norma do art. 211º, n.°s 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, como tal devendo ser declarada. 32. Sem prescindir, o Tribunal a quo mal andou ao validar todos os actos jurisdicionais praticados pelo 1° Juízo do Tribunal de Instrução Criminal definindo como critérios para apreciação da validade dos actos, a perspectiva finalística do processo, a assunção formal dos actos em crise e o princípio da economia processual bem como o facto dos actos praticados pelo tribunal incompetente ter sido sindicada sistematicamente em sede de recurso, ou nem sequer ter sido suscitada pelos sujeitos processuais, encontrando-se, por qualquer das vias, validado ou convalidados os respectivos actos. 33. Pouco importa a eventual apreciação dos actos judiciais praticados pelo Senhor Juiz do 1° Juízo do Tribunal de Instrução Criminal em sede de recurso, pois a questão da incompetência do tribunal, porque à data desconhecida, não foi objecto de avaliação e decisão no âmbito de tais recursos, o que determinaria necessariamente a invalidação imediata das decisões recorridas. 34. A avaliação imposta pelos normativos dos art.°s 33°, n° 1 e 3, e 122°, ambos do CPP, dos actos praticados pelo tribunal incompetente não é uma avaliação formal ou finalística, temperada pelo princípio de máximo aproveitamento, mas uma avaliação material tutelada por um juízo de projecção decisória, como se perante o Tribunal que avalia a validade dos actos, tivesse decorrido o processo, 35. O Tribunal a quo, enraizado nos princípios aduzidos, considerou genérica e cabalmente validados todos os actos susceptíveis de estarem feridos de nulidade, sem que quaisquer razões ou fundamentos tivessem sido apresentados no sentido da demonstração da sua validade substancial, quando os normativos conjugados dos art.°s 33°, n.° 1, e 122°, ambos do CPP, exigem que se verifiquem todas as consequências da nulidade do acto declarada, se analisem as repercussões dessa nulidade no processo, o que determina uma avaliação substancial do universo decisório consequente. 36. Tal avaliação e decisão não pode ser condicionada, e por maioria de razão dominada, pelo princípio da economia processual, porquanto tais decisões prendem-se com direitos e garantias fundamentais do arguido, constitucionalmente consagradas e que não podem ser postergadas ou colocadas de salvaguarda inferior ao do princípio da economia processual, sob pena de violação do art.° 32°, n.°s 1, 2 e 5 da lei Fundamental. 37. A questão suscitada pelo decidido e ordenando pelo Acórdão proferido em 17.03.04, surge ex novo, pois nunca foi nesses termos avaliada e decidida nos recursos inter(...)s e nas arguições de nulidade, irregularidade ou inexistência anteriormente colocadas e decididas. 38. O Tribunal a quo ao não avaliar substancialmente os actos praticados pelo Senhor Juiz do 1° Juízo do TIC de Lisboa. não cumpriu o decidido e ordenado pelo Acórdão proferido em 17.03.04 pelo TRL, pois não assumiu, coma se lhe impunha, uma posição específica e substancial sobre as temáticas que lhe cabia apreciar e decidir, esvaziando o regime das nulidades e dos seus efeitos. 39. É o que sucede, no que respeita à decisão aos despachos que determinaram a prisão preventiva e os reexames trimestrais obrigatórios, cuja decisão genérica do Tribunal a quo não satisfaz as imposições normativas dos arts. 33°, n.°s 1 e 3 e 122, n.° 1 do CPP, pois não contém a avaliação substancial e material de cada acto praticado e das invalidades subsequentes deles derivadas, esvaziando assim de sentido útil aqueles normativos bem como o doutamente decidido e ordenado pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. 40. O que é particularmente expressivo no que concerne ao cumprimento do n.° 3 do art.° 33º do CPP, do qual decorre a obrigação de o Tribunal proferir decisão substancial, e não meramente formal, no que respeita à validação ou convalidação das decisões, o que, evidentemente, não foi efectuado pelo Tribunal a quo, conforme resulta expressa e inequivocamente do texto da decisão que proferiu e constitui violação expressa do determinado no Acórdão proferido pelo TRL em 17.O3.04 e do dis(...) naquele normativo legal. 41. Em consequência da interpretação normativa assumida pelo Tribunal a quo, ao recorrente está vedada a possibilidade de avaliar as conclusões da decisão recorrida, não podendo conhecer os fundamentos para a validação dos actos processuais praticados por tribunal incompetente. 42. O sentido interpretativo das normas dos art.°s 33°, n.°s 1 e 3 e 122°, n°s 1, 2 e 3 do CPP, efectuado no despacho recorrido, no sentido de que, nesta fase, não cabe efectuar a reapreciação substancial dos actos, mas apenas aferir do cumprimento dos pressu(...)s legais que, por uma questão de economia processual ou por falta de competência funcional do Tribunal de julgamento, é inconstitucional por ofensiva dos art.°s 28º, n.° 1 e 32°, n.°s 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa, a qual aqui se ergui e deve ser declarada. 43. Por outro lado, o Tribunal a quo sustenta a sua decisão em normas que não têm qualquer aplicabilidade neste domínio, a saber, os art.°s 2 10°. nº 1 e 220°, ambos do Código de Processo Civil. 44. Verifica-se ainda da leitura da decisão recorrida, que o Tribunal a quo não discrimina quais os critérios que determinaram a avaliação de determinados actos como de maior relevância que outros, ficando por saber, por completa ausência de fundamentação quanto a esta matéria, quais os princípios e os valores que determinaram a eleição de alguns actos como de maior relevância, afastando os restantes. 45. Ao limitar-se a proferir uma decisão genérica de validação de todos os actos praticados pelo tribunal incompetente, o despacho recorrido sofre do vício de ausência de fundamentação o que determina a impossibilidade de sindicar correctamente os critérios assumidos pelo Tribunal a quo, inquinando de uma nulidade da decisão, por violação do art. 97, nº 4, do Código de Processo Penal. 46. A interpretação normativa da norma do art.° 97°. n.° 4 do CPP efectuado na decisão recorrida, no sentido de que não tem de explicitar os critérios que subjazem ao seu juízo de maior ou menor relevância dos actos praticados, é inconstitucional por violação do dever de fundamentação das decisões consagrado no art.° 205°, n.° 1 da CRP, bem como do direito ao recurso consagrado no art.° 32°, n.° 1 da mesma Lei Fundamental, a qual deve ser declarada por Vossas Excelências. 47. Da leitura do despacho recorrido, verifica-se que o Tribunal a quo não se encontra em condições para avaliar e ponderar imparcialmente as questões essenciais do processo, uma vez que a ausência de quaisquer critérios válidos, a confusão de funções jurisdicionais e a inexistência de fundamentação quanto a esta problemática simples prenunciam uma sistemática violação dos princípios que devem imperar na formação da convicção. 48. Caso Vossas Excelências entendam não aceitar esta perspectiva, sempre se dirá que os actos praticados pelo tribunal incompetente que estão feridos de nulidade são todos os actos subsequentes ao despacho declarado nulo, ou seja, todos os actos praticados pelo M.mo Juiz do 1º Juizo-A do TIC de Lisboa, bem como todos aqueles que deles decorrem e aqueles que afectaram, designadamente - embora não exclusivamente -, o primeiro interrogatório judicial de arguido detido, o despacho que determinou a sua prisão preventiva e os proferidos aquando dos seus reexames, os despachos que negaram o acesso à factualidade relevante e ao meios de prova respectivos, os despachos que ordenaram, autorizaram e validaram revistas, buscas e apreensões e todos os actos deles decorrentes, os despachos que ordenaram e autorizaram a intercepção e gravação de conversações telefónicas dos telefones móveis e fixos e todos os actos deles decorrentes, os despachos que declararam a especial vulnerabilidade das vítimas e todos os demais actos que subsequentes a todos os atrás referidos e deles dependentes e/ou decorrentes. 49. Tais actos são ainda, por decorrência da declaração de invalidade daqueles, todos os actos praticados pelos M.mos Juizes que despacharam no âmbito da fase de instrução e os que deles decorreram e, por consequência, todos os actos praticados após a fase de instrução, ou seja, também na fase de julgamento e até ao presente momento, o que deve ser declarado, com as legais consequências.” O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso inter(...) pelo arguido K (cf. fls. 71 a 99 do Apenso P), defendendo, em síntese, que (transcrição): “1 - O Tribunal da Relação de Lisboa não decidiu que o processo deveria ser remetido para o TIC a fim de os actos praticados pelo Juiz do 1º. Juízo serem "validados" pelo Juiz que deveria ter intervindo na fase de inquérito, de acordo com a distribuição efectuada antes do proferimento do despacho cuja nulidade foi declarada, por violação das regras de distribuição e de competência funcional; 2 - Como salienta a Mmª. Juiz no despacho recorrido, "Caso assim o tivesse entendido (o Tribunal da Relação) tinha-o dito: em vez de referir-se ao Tribunal "actualmente competente" - pois o J.I.C. que veio a intervir na fase da Instrução, após distribuição para o efeito, também não era o J.I.C. que tivera competência para intervir na fase do Inquérito -, teria mandado baixar o recurso a fim de (pelo menos) os autos serem remetidos e/ou presentes ao J.1. C. com competência na fase de inquérito”; 3 - Da aplicação da norma constante do art°. 33°. n°. 1 do CPP nunca resultaria a remessa dos autos para o Juízo do TIC onde decorreu a fase de Instrução, a fim de, pelo juiz titular de tal juízo, serem “validados” os actos judicias praticados na fase de inquérito, mas sim a remessa dos autos ao Juiz com competência na fase de inquérito, o Juiz titular 5º. Juízo A do T1C, a quem o processo fora inicialmente distribuído, e por isso com competência, nos termos da norma citada, para anular os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordenar a repetição dos actos necessários para conhecer da causa; 4 - Tal não foi o decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que determinou a remessa dos autos para "o Tribunal actualmente competente", só não tendo tal Tribunal superior efectuado a "validação" dos actos judicias realizados na fase de inquérito, por, conforme se salienta no Acórdão, não fornecerem os autos de recurso quaisquer indicações sobre quais concretamente os actos praticados pelo Juiz titular do 1°. Juízo do TIC, posteriormente a 07.01 2003, data do proferimento pelo Juiz titular do 5º. Juízo A, do despacho declarado ferido de nulidade insanável; 5 - Não assiste qualquer razão ao arguido recorrente na argumentação que expende, pois, independentemente da considerações que o mesmo tece sobre qual é o tribunal competente, com base na aplicação da lei, para efectuar a "validação" dos actos em causa, a decisão do tribunal superior transitou em julgado, tendo, por isso, a Mmª. Juiz, no despacho recorrido, aferido e cumprido o ordenado pelo Tribunal Superior; 6 - A interpretação que o arguido recorrente efectua das normas processuais penais que cita como forma de concluir que o juiz de julgamento nunca poderia ter efectuado a "validação" dos actos praticados na fase de inquérito pelo juiz titular do 1º. Juízo do TIC, não é correcta nem está consentânea com o espírito e princípios que enformam o processo penal; 7 - Seria contrário aos princípios processuais penais, determinar o retorno dos autos à fase de inquérito, a fim de um juiz com competência material, funcional, hierárquica e territorial exactamente igual à competência do juiz que praticou os actos, "validar" os actos praticados por este; 8 - Estando em causa uma declaração de nulidade, impunha-se fazer apelo à disciplina constante do art°. 122°. n°. 3 do CPP - de acordo com a qual, uma vez declarada a nulidade, "o juiz aproveita todos os actos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela" — só não tendo o Tribunal da Relação de Lisboa procedido à "validação" dos actos judiciais praticados na fase de inquérito, após o proferimento do despacho cuja nulidade declarou, por não possuir os elementos necessários para o efeito, relativos a todos os actos judiciais praticados; 9 - O arguido recorrente não tem, sem pôr em causa o acórdão preferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, forma de defender que a competência para conhecer da validação ou invalidação dos actos praticados pelo J IC do 1°. Juízo pertence ao JIC do 5°. Juízo A, não sendo defensável que o sentido da expressão "tribunal actualmente competente" seja juiz do 5°. juízo A do TIC, que proferiu, na fase de inquérito, o despacho constante de fls. 270 dos autos; 10 - O "Tribunal actualmente competente", a que faz menção o Tribunal da Relação de Lisboa, é, conforme resulta do próprio acórdão, tendo em conta a considerada evolução temporal do processo, e da correcta aplicação das normas processuais penais, e conforme foi decidido na decisão recorrida, o Tribunal de Julgamento, não tendo o arguido recorrente invocado qualquer argumento válido susceptível de pôr em causa tal conclusão; 11 - A validação efectuada no despacho recorrido, relativa aos actos judicias praticados na fase de inquérito em nada contende com a estrutura acusatória do processo penal, com consagração constitucional; 12 - Os actos praticados na fase de inquérito não foram analisados no seu conteúdo substancial, nomeadamente tendo em conta o suporte fáctico que, em cada momento, determinou a sua prática, tendo sido erigido como critério de invalidação de tais actos apenas aqueles que "na perspectiva fìnalística do processo não deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais que, em abstracto, condicionam a sua pratica.”; 13 - A norma ínsita no art°. 40°. do CPP não exclui a possibilidade de um juiz, que tenha intervenção na fase de inquérito ou instrução, poder vir a presidir ao julgamento, compreendendo-se que assim seja, pois, em concreto no que se reporta à fase de inquérito, a intervenção judicial não é conformadora do conteúdo e desfecho do objecto do processo, mas sim provocada sempre a apenas quando haja que decidir quanto a questões que tenham que ver com direitos fundamentais, estando taxativamente elencados os actos da competência do Juiz de Instrução em tal fase de processo; 14 - O conhecimento, em qualquer fase do processo, incluindo na fase de julgamento, de nulidades ocorridas em fases anteriores do processo - quer nulidades insanáveis quer aquelas dependentes de arguição - implica sempre uma apreciação dos actos que, face à nulidade declarada, se deverão considerar inválidos, conforme estatuído no art°. 122°. do CPP, sem que tal contenda com as regras inerentes a delimitação funcional dos diversos tribunais; 15 - O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa estipulou, claramente, quais as normas processuais a que deve obedecer a decisão de validação ou não dos actos praticados pelo Mm° JIC do 1° Juízo do TIC de Lisboa, referindo, também clara e expressamente que devem ser aplicadas as normas gerais do processo penal sobre os efeitos da declaração de nulidade, bem como norma específica, do mesmo processo penal, relativa à declaração de incompetência ("Em sede específica dos “efeitos da declaração de incompetência dispõe o artº 33º do CPP que...” pág. 19); 16 - Resulta do dis(...) no art°. 33º. nº. 1 do CPP que são susceptíveis de ser anulados, apenas, os actos que, atentas a regras da competência material, territorial, funcional e hierárquica, se não deveriam ter praticado; 17 - Ao eleger como critério de validação actos processuais e não decisões, a lei visou impedir qualquer apreciação do seu mérito, devendo o tribunal cingir-se, apenas, ao cotejamento dos actos processuais que, do ponto de vista das regras de competência, poderiam ter sido realizados pelo tribunal declarado competente; 18 - In casu, a competência funcional, territorial, material e hierárquica do 1° e do 5° Juízos do TIC de Lisboa é em tudo idêntica – tal como o próprio Acórdão reconhece – pelo que é forçoso concluir que todos os actos praticados pelo Mm° Juiz do 1 ° Juízo do TIC poderiam ter sido praticados pelo 5° Juízo A, porque ambos são detentores da mesma competência; 19 - A única decisão de reapreciação que, do ponto de vista substancial, é permitida ao tribunal declarado competente, diz respeito às medidas de coacção, porquanto, constituindo restrições aos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, não podem ser sacrificadas em nome do princípio da economia processual; 20 - A Mmª. Juiz, no despacho recorrido, efectuou uma correcta interpretação das normas em causa e do decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ao não efectuar uma reapreciação da validade substancial dos actos e ao adoptar o critério a que já se fez referência; 21 - A Mmª. Juiz, verificou que todos os actos praticados pelo Juiz de Instrução na fase de inquérito foram actos objectivamente praticados no âmbito e dentro da competência que lhe era atribuída nos termos legais, inseridos no objecto do processo tal como delimitado pelo Ministério Público, e convalidou aqueles actos que não foram alvo de impugnação pelos sujeitos processuais, por não ter ocorrido, quanto a tais actos, violação dos pressu(...)s legais dos quais dependiam a respectiva prática e que ferissem a sua subsistência, por não existir divergência entre a actividade processual levada a cabo e o modelo legal pelo qual o acto pode e deve ser praticado; 22 - Relativamente aos actos em relação aos quais os sujeitos processuais não se conformaram, tendo inter(...) recurso ou arguido nulidade, invalidade ou inexistência, entendeu a Mmª. Juiz que "as decisões que vieram a ser proferidas quanto a tais actos, ou por via da decisão do recurso nas instâncias superiores ou por via do conhecimento das arguidas nulidades aquando da abertura da instrução e do proferimento da decisão instrutória, constituíram já elas uma apreciação jurisdicional da validade dos actos praticados pelo Sr. Juiz de instrução do 1º. Juízo do T1C na fase de inquérito.”; 23 - Por - conforme já foi referido e é salientado, quer no acórdão do Tribunal da Relação, quer no despacho recorrido - todos os actos ordenados pelo Senhor Juiz do 1° juízo se integrarem no âmbito da competência funcional. Material, territorial e hierárquica do Tribunal declarado competente. não foram "invalidados", no despacho recorrido, quaisquer actos praticados pelo juiz titular do 1°. Juizo do TIC, e não porque, como alega o arguido recorrente, tivesse sido adoptado pela Mma. Juiz um critério susceptível de ser qualificado como esvaziando de sentido as normas em causa e o decidido e ordenado pelo Acórdão da Relação de Lisboa; 24 - Atenta a natureza da intervenção do juiz de instrução na fase de inquérito, sempre provocada pelos sujeitos processuais, relativamente à prática de actos taxativamente elencados em que estejam em causa direitos, liberdades e garantias, compreende-se, também a essa luz, que não tivesse sido determinada a “repetição dos actos necessários para conhecer da causa”; 25 - É a todos os títulos incompreensível a invocação, pelo arguido recorrente, da falta de fundamentação da decisão recorrida, nesta estando expressos, de forma exaustiva e aprofundada, os critérios que presidiram à validação dos actos em causa e os motivos de facto e de direito que determinaram a adopção de tais critérios; 26 - O arguido recorrente, depois de argumentar - sem qualquer razão, conforme já se demonstrou - no sentido de que, na decisão recorrida, não foi enunciado qualquer critério válido susceptível de sustentar a validação efectuada - conclui propugnando pela nulidade de todos os actos judiciais praticados no âmbito do processo, após o proferimento do despacho constante de fls. 270, sem aventar qualquer critério ou fundamento, susceptível de justificar tal pretensão; 27 - Inexiste norma constitucional, processual penal ou princípio fundamental susceptível de ser invocado, como forma de justificar a pretendida declaração de nulidade de actos judiciais praticados em todas as fases do processo, incluindo a fase de inquérito, por juízes que dispunham/dispõem de competência material, funcional, hierárquica e territorial para a prática dos actos que levaram a cabo; 28 - O despacho recorrido não violou qualquer norma constitucional ou legal, tendo efectuado uma correcta aplicação da lei e cumprido o ordenado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pelo que, negando provimento ao recurso, V. Exªs farão a esperada JUSTIÇA”. Todos estes recursos foram admitidos a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (cf. despachos, respectivamente, de fls. 27434, 27574 e 27575). Todavia, mediante os acórdãos deste Tribunal da Relação de Lisboa de 30-06-2005, de 30-06-2005 e de 29-06-2005 foi alterado o regime de subida fixado pela 1.ª instância, determinando-se que os mesmos subissem diferidamente, com os que viessem a ser inter(...)s da decisão que ponha termo à causa (cf. respectivamente fls. 4093 a 4102 do Apenso Q, fls. 3969 a 3971 do Apenso N e fls. 4157 a 4161 do Apenso P). Apreciando. 6.1. Considerações Gerais Conforme decorre do dis(...) no art. 412.º, n.ºs 1 a 3, do CPP, são as conclusões, extraídas da motivação apresentada, que fixam o objecto do recurso e que delimitam as questões controvertidas, quer de facto e/ou quer de direito, que são submetidas a nova apreciação por parte do tribunal de instância hierarquicamente superior. Das conclusões das motivações apresentadas, já acima transcritas, constata-se que os arguidos H, C e K – mostrando a sua discordância quanto ao despacho de fls. 25475 a 25488, que validou todos os actos jurisdicionais praticados pelo JIC do 1.º Juízo do TIC de Lisboa – suscitam fundamentalmente as seguintes questões: - Qual o tribunal competente para dar cumprimento ao decidido pelo acórdão da Relação de Lisboa de 17-03-2004 – que declarou a nulidade do despacho de fls. 270 destes autos e que determinou a avaliação na perspectiva da validade/invalidade dos actos praticados pelo juiz do 1.º Juízo do TIC em momento posterior a 07-01-2003 –, se o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa (o 3.º Juízo na perspectiva do arguido C ou o 5.º Juízo - A do TIC de Lisboa na perspectiva do arguido K;) ou se a Vara Criminal a que foi distribuído para julgamento o processo comum colectivo, conforme foi entendimento do Tribunal a quo (no requerimento de fls. 25444 a 25453, o arguido H já tinha manifestado o seu entendimento no sentido de que “(…) deve ser o juiz de julgamento a validar ou infirmar os actos praticados pelo Dr. Rui Teixeira.”; - Se a decisão recorrida, ao assumir a competência da 8.ª Vara Criminal de Lisboa para a exigida apreciação dos actos praticados durante o decurso do inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, interpretou, maxime, os arts. 14.º, 17.º, 33.º, n.º 1, 268.º e 269.º, do CPP, e 79.º, n.º 1, da LOFTJ, de modo contrário à Constituição, ofendendo, quer o princípio da estrutura acusatória do processo criminal, quer a diferenciação de competências e a especialização de funções dos tribunais judiciais (cf., respectivamente, arts. 32.º, n.º 5, e 211.º, n.ºs 1 e 2, da Lei Fundamental); - Se, tendo em consideração o dis(...) nos arts. 33.º e 122.º do CPP, a decisão recorrida deveria ter procedido a uma avaliação substancial, que não puramente formal ou perspectivada em função de uma visão finalística do processo, dos actos em causa praticados pelo Juiz de Instrução Criminal durante a fase de inquérito, mormente dos despachos judiciais que aplicaram ou que mantiveram as medidas de coacção impostas aos arguidos; - Se a decisão recorrida, ao validar deste modo todos os actos jurisdicionais praticados pelo juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, ao arrepio do que pretendiam os ora recorrentes, efectuou uma interpretação inconstitucional dos preceitos legais nela aplicados, muito em particular dos arts. 33.º e 122.º do CPP, incorrendo em violação do estabelecido nos arts. 28.º, n.º 1, 32.º, n.ºs 1 e 2, e 205.º, n.º 1, da Lei Fundamental. Antes de se iniciar a análise das questões suscitadas em sede de recurso pelos referidos arguidos, importa recordar os principais actos processuais a elas atinentes, de acordo com uma sequência cronológica, para melhor proceder ao seu enquadramento: - no dia 07-01-2003, no início do inquérito, foi proferido o seguinte despacho, que aqui se transcreve: “tendo em conta que o presente processo já foi despachado pelo Exmo. Colega do 1º Juízo deste T.I.C. (…), proceda-se ao averbamento dos presentes autos a esse juízo, dando-se a competente baixa da distribuição do processo no 5º Juízo – A” – cf. fls. 270, Vol. 2.º; - no dia 22-01-2004, já após a dedução de acusação por parte do Ministério Público, o arguido E interpôs recurso do despacho acima transcrito, que endereçou ao Tribunal da Relação de Lisboa, no qual defendeu, em suma, que “há que concluir que todos os actos processuais praticados pelo Senhor Juiz ilegal e inconstitucionalmente aforado são nulos (…) o que deve ser declarado, daí se sacando as legais consequências em termos de Inquérito, dos actos jurisdicionais praticados no decurso deste e da própria acusação.” – cf. fls. 15.238 a 15.255, Vol. 68.º; - subindo este recurso de imediato e em separado, o Tribunal da Relação de Lisboa, mediante acórdão proferido no dia 17-03-2004, decidiu julgar procedente o recurso inter(...) pelo arguido E, ainda que por razões diferentes das invocadas (este acórdão considerou não ter ocorrido “ (…) qualquer violação do princípio do juiz legal ou natural ou mesmo de desaforamento”), declarando nulo o despacho recorrido de fls. 270 e ordenando “(…) a remessa dos autos para o Tribunal actualmente competente, o qual deverá dar cumprimento ao agora aqui ordenado e antes deixado referido.” – cf. fls. 56 a 75 do Apenso AI; - nestes autos de recurso, a que coube o n.º 1967/04 - 3.ª, mediante requerimento que deu entrada em juízo no dia 29-03-2004, o arguido A arguiu a nulidade dos despachos, do parecer do MP e do acórdão acabado de proferir pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ao mesmo tempo em que requereu a baixa dos autos ao TIC para notificação de todos os sujeitos processuais – cf. fls. 91 a 96 do Apenso AI; - por acórdão datado de 04-05-2004, proferido nos autos de recurso n.º 3432/04 - 5.ª, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu revogar o despacho que manteve a medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao arguido H, que substituiu pela medida de coacção de obrigação de permanência na habitação - cf. fls. 19.413 a 19.427, Vol. 83.º; - no dia 05-05-2004, no âmbito dos mencionados autos de recurso n.º 1967/04 - 3.ª, foram julgadas improcedentes as nulidades invocadas a 29-03-2004 pelo arguido A – cf. fls. 98 a 102 do Apenso AI; - por despacho datado de 07-05-2004, proferido pelo 3.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, foram substituídas as medidas de coação de prisão preventiva que tinham sido impostas aos arguidos C e K – cf. fls. 19690 a 19693, Vol. 84.º; - no dia 28-05-2004 o arguido A interpôs recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 29-03-2004, vindo o Supremo Tribunal de Justiça, mediante acórdão de 14-10-2004, a rejeitá-lo, ao abrigo do dis(...) nos arts. 400.º, n.º 1, al. c), 419.º, n.º 4, als. a) e c), 420.º, n.º 4 e 432.º, al. b), do CPP – cf. fls. 120 a 131 e 148 a 153 do Apenso AI; - no dia 31-05-2004, o 3.º Juízo do TIC de Lisboa procedeu à leitura da decisão instrutória, pronunciando os arguidos/recorrentes H, C e K – cf. fls. 20738 a 21014, Vol. 88.º; É tempo de passar a apreciar as questões enunciadas. Preceitua o art. 33.º do CPP (que não sofreu alterações com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08), sob a epígrafe ”Efeitos da declaração de incompetência”: “1 – Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os actos que não se teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos actos necessários para conhecer da causa.” (…) “3 – As medidas de coacção ou de garantia patrimonial ordenadas pelo tribunal declarado incompetente conservam eficácia mesmo após a declaração de incompetência, mas devem, no mais breve prazo, ser convalidadas ou infirmadas pelo tribunal competente.” Conforme resulta, quer da letra da epígrafe, quer do texto legal, quer ainda do confronto com os precedentes artigos do CPP, o aludido art. 33.º consagra o regime geral dos efeitos da declaração de incompetência em matéria processual penal, independentemente de se tratar de incompetência material, funcional ou territorial. Falando a epígrafe do artigo, em termos gerais, nos “efeitos da declaração de incompetência” e não contendo o texto do dispositivo qualquer regime específico (v.g. ao contrário do que sucede com o art. 32.º, n.º 2, do CPP, em que se fixam limites processuais para a dedução e declaração da incompetência territorial), afigura-se que o legislador não estabeleceu, no texto da lei, qualquer expressa diferenciação de tratamento consoante o tipo de incompetência em causa, remetendo para o aplicador do direito a tarefa prática de análise e de avaliação, de acordo com as circunstâncias do caso, da validade/invalidade dos actos praticados pelo tribunal declarado incompetente. Dito por outras palavras: quanto aos efeitos, a declaração de incompetência funcional, material ou territorial é tratada de modo igual pelo legislador no art. 33.º do CPP, sem qualquer regime próprio ou específico para cada uma delas, o que não significa que venham a ser iguais as soluções práticas a que se chegue a final, já que, conforme decorre da lei, o processo é remetido para o tribunal competente, “o qual anula os actos que não se teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo”. Em vez de delimitar o regime específico dos efeitos de cada uma das situações de incompetência, o legislador decidiu conferir plasticidade à norma do n.º 1 do art. 33.º do CPP, fazendo reverter para o aplicador do direito a sua moldagem em concreto, a quem cabe, naturalmente de acordo com o tipo de incompetência em causa, a avaliação dos actos que forçosamente terão de ser anulados por incompatibilidade e determinar a repetição daqueles que estritamente se mostrem necessários para a boa decisão da causa. De qualquer modo, procedendo à análise do artigo precedente, afigura-se que o legislador não atribui igual significado aos diferentes tipos de incompetência, tendo por referência os diferentes limites processuais para a sua dedução e declaração. Enquanto que a incompetência territorial só pode ser deduzida e declarada, no máximo, até ao início da audiência de discussão e julgamento (cf. n.º 2), a incompetência funcional ou material, aparentemente de maior relevância, poderá ser deduzida e declarada até ao trânsito em julgado da decisão final (cf. n.º 1), seja ou não proferida em 1.ª instância. Independentemente, a lei remete para o aplicador do direito a avaliação da validade dos actos praticados pelo tribunal declarado incompetente, de modo a considerá-los todos aproveitados, apenas alguns desses actos ou nenhuns deles, o que deverá ser conseguido de acordo com as normas processuais penais aplicáveis, mas tendo em consideração as particulares circunstâncias do caso. Nesta perspectiva, tendencialmente, num processo poderá ocorrer o aproveitamento de todos os actos praticados por um tribunal declarado territorialmente incompetente, do mesmo modo em que noutro processo poderá ficar comprometida a validade de todos os actos praticados, sendo, v.g., de anular toda a actividade processual de selecção de jurados caso venha a ser declarada a incompetência do tribunal do júri para o julgamento da causa ou quando definitivamente se reconheça a competência do tribunal colectivo e já tenha sido realizada audiência de julgamento no âmbito de processo comum singular. Tudo dependerá afinal de contas da avaliação a efectuar caso a caso, com base nos princípios fundamentais e nas normas que regulam o processo penal, por forma a apurar-se e a decidir-se se os actos praticados pelo tribunal que seja declarado incompetente podem todos vir a ser aproveitados, apenas alguns ou nenhuns deles. Dito isto, importa avançar na apreciação dos recursos inter(...)s, rejeitando o entendimento sufragado pelos recorrentes no sentido de que, por regra, devem ser anulados os actos praticados pelo tribunal declarado incompetente e que só excepcionalmente os mesmos devem ser aproveitados, uma vez que, em nossa opinião, quer o texto do art. 33.º do CPP, quer o seu enquadramento, impõem diferente solução. Da análise crítica do n.º 1 deste preceito resulta que os actos processuais praticados pelo tribunal declarado incompetente mantêm a sua validade, só sendo anulados aqueles que não teriam sido praticados ou só sendo repetidos pelo tribunal competente aqueles que se mostrem necessários para conhecer da causa. Se, nas palavras do legislador, são anulados os actos que se não teriam praticado, tal não pode deixar de significar que todos os outros mantêm a sua validade. De igual sorte, só será ordenada a repetição dos que se mostrem indispensáveis para o conhecimento da causa. Em face do teor do n.º 1 do art. 33.º do CPP, mostra-se incontornável que o legislador processual penal sufragou o princípio do aproveitamento dos actos processuais praticados por tribunal incompetente. A anulação e a repetição dos mesmos dependerá respectivamente da sua incompatibilidade e da sua indispensabilidade para a boa decisão da causa. Caso não se verifiquem estas circunstâncias, ou seja, quando se concluir que os actos processuais em causa teriam sido praticados na mesma pelo tribunal competente ou quando se chegar à conclusão que eles se mostram irrelevantes ou supérfluos, esses actos processuais manterão a validade e a eficácia ou não será determinada a sua repetição. Aliás, a doutrina tem-se pronunciado, de modo unânime, no sentido da aceitação do princípio do máximo aproveitamento desses actos processuais. Diz-nos Gil Moreira dos Santos (in “Noções de Processo Penal”, pág. 190): “O princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais em processo penal leva a que só se anulem ou se repitam actos indispensáveis para adequar o processo à tramitação que ele teria face às razões específicas de competência do tribunal que vai conhecer a causa – n.º 1 do artigo 33.º –, sem prejuízo da competência para actos urgentes mesmo pela entidade incompetente – 33.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 do C.P.P.”. Também Paulo Pinto de Albuquerque (in “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2007, pág. 108), em anotação ao mencionado art. 33.º do CPP, defende que: “A anulação dos actos praticados pelo tribunal incompetente está submetida a um critério de justiça material consentâneo com os princípios da economia processual e do máximo aproveitamento dos actos processuais espelhados ao longo do Título I. O critério é o do prejuízo para a justiça da decisão do processo. Este critério material deve orientar o tribunal competente na anulação dos «actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo»”. Em idêntico sentido, pronunciaram-se Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques (in “Código de Processo Penal Anotado”, Almedina, 2008, Vol. I, pág. 244): “Poderá, assim, haver actos que foram praticados a mais (ou melhor: que agora já não seriam precisos) e actos que é necessário repetir para correcto conhecimento da causa. Só no concreto se pode aquilatar do que há que fazer nesse aspecto – anular, repetir ou não fazer nada. Mas uma coisa deve ter-se sempre presente: é que «o princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais em processo penal leva a que só se anulem ou só se repitam actos indispensáveis para adequar o processo à tramitação que ele teria (…)»”. De igual sorte, também os Magistrados do Ministério Público do Distrito do Porto vieram manifestar a sua concordância quanto ao princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais praticados por tribunal incompetente (in “Código de Processo Penal – Comentários e Notas Práticas”, Coimbra Editora, 2009, pág. 81): “O critério de justiça material consentâneo com os princípios da economia processual e do máximo aproveitamento dos actos processuais em processo penal leva a que só se anulem ou se repitam actos indispensáveis para adequar o processo à tramitação que ele teria face às razões específicas de competência do tribunal que vai conhecer da causa. Temos assim que a declaração de incompetência não determina a nulidade do processo, mas tão-só dos actos que se não teriam praticado se o processo tivesse corrido perante o tribunal competente. É o tribunal competente que declara quais os actos que são nulos e que ordena a repetição dos actos necessários para conhecer da causa.” Este entendimento mostra-se consentâneo com o princípio constitucional do julgamento no mais curto lapso de tempo, consagrado no art. 32.º, n.º 2, da Constituição: “Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”. Desde que se mostrem salvaguardadas as garantias de defesa, desde que se assegure ao arguido um julgamento justo e equitativo, com igualdade de armas face à acusação e com efectiva defesa dos seus direitos, o legislador impôs ao aplicador do direito a realização de uma justiça célere e expedita, até para tutela do princípio da presunção de inocência. “Um processo que se arrasta durante longo tempo, por tempo superior ao necessário para o esclarecimento da suspeita e para assegurar ao arguido a preparação da defesa, converte-se frequentemente em sofrimento insuportável para o arguido, porque os riscos naturais inerentes a qualquer processo, a incerteza da decisão e a ameaça da condenação que sobre ele paira, podem comprometer a sua vida pessoal e profissional e até mesmo a sua liberdade” (cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Constituição Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2010, Tomo I, pág. 726). O que entronca precisamente no princípio da economia processual, e também, sobretudo, no tocante àquilo que nos trouxe até aqui, no princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais. Como a anulação e a repetição dos actos comporta dispêndio de tempo e de energia, comprometendo a celeridade processual, o aplicador do direito só deve enveredar por este caminho desde que o benefício a alcançar seja superior ao correspectivo custo, seja para a salvaguarda das garantias de defesa, seja por absoluta incompatibilidade ou indispensabilidade desses actos. Deste modo, na aplicação do dis(...) no art. 33.º, n.º 1, do CPP, joga-se o caminho de conflito entre a justiça formal e a justiça material, entre a economia processual (cujo corolário se traduz no princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais) e a estrita observância das normas processuais atinentes à fixação de competência dos tribunais (como já se viu, a lei admite tendencialmente a validade de actos praticados por órgãos jurisdicionais já declarados incompetentes), entre a celeridade processual e o assegurar ao arguido das necessárias garantias de defesa. O legislador processual penal, no n.º 3 do citado art. 33.º, prevê especificamente um regime para as medidas de coacção ou de garantia patrimonial decretadas por tribunal incompetente. Fá-lo, acentuando a nota da eficácia destas medidas. Apesar de inválidas, por terem sido decretadas por tribunal declarado incompetente, as medidas de coacção continuam a produzir os seus efeitos, preservando-se a sua eficácia, mas devem ser reapreciadas, caso ainda se mantenham, no mais curto lapso de tempo, pelo tribunal competente, que as poderá convalidar, revogar ou substituir por outras. Dito por outras palavras: as medidas de coacção ou de garantia patrimonial não perdem de modo imediato e automático a sua eficácia perante a declaração de incompetência do tribunal que as decretou. Mas obriga-se o tribunal que venha a ser julgado competente a reapreciá-las o quanto antes, confirmando-as ou infirmando-as, caso ainda subsistam. Nas palavras de Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques (in ob. cit., pág. 243), o n.º 3 do art. 33.º do CPP determina “(…) a apreciação (no mais breve prazo) das medidas de coacção ou de garantia patrimonial ordenadas pelo tribunal declarado incompetente, que se mantêm até lá (confirmação ou invalidação)”. 6.2. Tribunal competente para dar cumprimento ao decidido pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-03-2004 Nos recursos por si inter(...)s, os arguidos C e K suscitaram, desde logo, a questão da falta de competência do Tribunal a quo, a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, para dar cumprimento ao decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, através do acórdão datado de 17-03-2004, entendendo o primeiro que essa competência deve ser reconhecida ao 3.º Juízo do TIC de Lisboa, enquanto que o segundo recorrente pugna pela sua atribuição ao 5.º Juízo-A desse mesmo tribunal (nesta parte, o arguido H aceita a competência do juiz de julgamento – cf. requerimento de fls. 25444 a 25453, Vol. 108.º). Vejamos, então, esta questão controvertida à luz do que já foi decidido, com força de caso julgado, no âmbito do recurso n.º 1967/04 - 3.ª, bem assim dos princípios e das normas atinentes à competência dos tribunais criminais. A decisão judicial que recaiu sobre as concretas questões então suscitadas em sede de recurso e que as resolveu (no acórdão de 17-03-2004, a Relação de Lisboa entendeu não ter ocorrido ”qualquer violação do princípio do juiz legal ou natural ou mesmo de desaforamento”, declarou “nulo o despacho recorrido” e ordenou “a remessa dos autos para o Tribunal actualmente competente, o qual deverá dar cumprimento ao agora aqui ordenado e antes deixado referido”), transitou em julgado, nos termos do art. 677.º do CPC, aplicável ao caso por força do dis(...) no art. 4.º do CPP. Com o seu trânsito em julgado, esta decisão judicial adquiriu força obrigatória dentro deste processo, pelo que não pode mais ser alterada por decisão posterior do mesmo ou de outro tribunal, ainda que de superior grau hierárquico. Trata-se, pois, de uma decisão que constituiu caso julgado formal, nos termos do art. 672.º, n.º 1, do CPC. A propósito das questões não cobertas pela força do caso julgado, ensina Antunes Varela (in Manual de Processo Civil, 1985, pág. 714): “Pode assim dar-se por assente que a eficácia do caso julgado, como se depreende do dis(...) nos artigos 498.º e 96.º, apenas cobre a decisão contida na parte final da sentença (art. 659.º, 2, in fine), ou seja, a resposta injuntiva do tribunal à pretensão do autor e do réu, concretizada no pedido ou na reconvenção e limitada através da respectiva causa de pedir. A força do caso julgado não se estende, por conseguinte, aos fundamentos da sentença, que no corpo desta se situam entre o relatório e a decisão final (…)”. Mas tal não significa que o intérprete judiciário deva unicamente atender ao segmento decisório da sentença. Ainda que a fundamentação da decisão não constituía caso julgado, a sua interpretação mostra-se, por regra, absolutamente determinante para reconstituir o pensamento do decisor, para compreender o caminho lógico percorrido até final, para melhor percepcionar todo o alcance da parte decisória da sentença. No caso vertente, o Tribunal da Relação de Lisboa escreveu o seguinte na parte final da fundamentação do acórdão de 17-03-2004: “Pese embora a – pública – publicidade dada a muitos dos actos praticados (…)” e “Desconhece-se mesmo a fase processual em que os autos se encontram neste momento, tudo indicando – ao que é, de novo, público – estar a iniciar-se a fase de instrução”. Por seu turno, no segmento decisório, ordenou-se a remessa dos autos para “o Tribunal actualmente competente”. Em face do acórdão proferido – que, como mais uma vez se sublinha, assume força obrigatória dentro do processo – é manifestamente de rejeitar a conclusão vertida no recurso inter(...) pelo arguido K no sentido de que o tribunal competente para proceder à reavaliação dos actos praticados é o 5.º Juízo - A do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, juízo a que foram distribuídos estes autos em fase de inquérito. Incontestavelmente o Tribunal da Relação de Lisboa não pretendeu remeter o processo para o 5.º Juízo - A do Tribunal de Instrução Criminal, pois, caso contrário, tê-lo-ia dito de forma muito simples, linear e expressa. Importa não esquecer, a este propósito, que no âmbito desse recurso foi apreciada e decidida uma alegada violação do princípio do juiz natural, com base no argumento de que os autos foram distribuídos ao 5.º Juízo - A do TIC, vindo o juiz titular, mediante o já referido despacho de fls. 270, a determinar a baixa dessa distribuição e a impor o averbamento do processo ao 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. O tribunal de recurso tinha perfeito conhecimento de que o processo foi inicialmente distribuído ao 5.º Juízo - A do TIC de Lisboa e que foi tramitado durante a fase de inquérito pelo 1.º Juízo desse tribunal. Caso a competência fosse de atribuir àquele juízo do TIC de Lisboa, seriam perfeitamente destituídas de sentido, na perspectiva da instância de recurso, as referências feitas ao “Tribunal actualmente competente” e à circunstância de se estar a iniciar a fase da instrução. Com base nas citadas referências constantes do texto do acórdão, o tribunal com competência para a reavaliação dos actos praticados nunca poderia ser aquele ao qual o processo foi inicialmente distribuído, durante a já então ultrapassada fase de inquérito. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não subsistem quaisquer dúvidas, na perspectiva da transitada decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que não se visou atribuir competência ao 5.º Juízo - A para proceder à reapreciação dos actos praticados pelo Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa (em suma: caso fosse outra a intenção do colectivo, o acórdão incluiria uma simples referência ao juízo a que o processo foi inicialmente distribuído ainda em fase de inquérito ou conteria uma menção directa e expressa ao 5.º Juízo - A do TIC de Lisboa, mas nunca faria qualquer referência, sobretudo no segmento decisório, ao “Tribunal actualmente competente”). Como se afirmou na decisão recorrida: “O Tribunal da Relação de Lisboa não entendeu, por conseguinte, que o efeito da declaração de nulidade (do despacho que decidiu quanto à alteração da distribuição), tinha como consequência a remessa dos autos para o T.I.C., para «validação» dos actos pelo J.I.C., que devesse ter intervindo na fase de inquérito, isto é, aquele que teria resultado «competente» de uma distribuição não alterada pelo despacho de fls. 270. Caso assim o tivesse entendido, tinha-o dito: em vez de referir-se ao Tribunal «actualmente competente» (…)”. De igual forma, perfilhamos o entendimento de que essa competência não foi reconhecida ao 3.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, juízo a que os autos foram distribuídos para efeitos de instrução, ao contrário do que defende o recorrente C. À data em que foi publicado o acórdão, a 17-03-2004, o presente processo encontrava-se na fase da instrução, uma vez que já tinha sido proferido, a 01-03-2004, o despacho a declarar aberta tal fase processual (cf. 17018 a 17055, Vol. 74.º), mas ainda se aguardava a prolação da decisão instrutória, que veio a ser lida a 31-05-2004 (cf. fls. 20738 a 21014, Vol. 88.º). Porém, conforme já deixámos assinalado, o apenso de recurso não baixou de imediato à 1.ª instância, mas somente após o dia 14-10-2004, quando o STJ conheceu o recurso inter(...) pelo arguido A e quando os autos principais já tinham sido distribuídos, para julgamento, à 8.ª Vara Criminal de Lisboa (cf. fls. 21680, Vol. 91.º). Na data em que baixou à 1.ª instância o apenso de recurso n.º 1967/04 - 3.º, com vista a produzir os seus efeitos dentro deste processo, obrigando o tribunal a quo a proceder em conformidade com aquilo que foi decidido no mencionado acórdão da Relação de Lisboa de 17-03-2004, o “Tribunal actualmente competente” era a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, por força da distribuição entretanto realizada. Nesta perspectiva, o “Tribunal actualmente competente”, nessa data, não podia deixar de ser o Tribunal recorrido, pois já tinha sido encerrado o inquérito com a dedução de acusação (cf. arts. 276.º e ss. do CPP) e a fase processual facultativa da instrução já se mostrava finda mediante a prolação da decisão instrutória (cf. arts. 306.º e ss. do CPP). Pode dizer-se que na parte final da fundamentação do acórdão se alude à circunstância de que tudo indica “estar a iniciar-se a fase de instrução”. A menção a esta fase processual, em conjugação com o segmento decisório, pode ser interpretada no sentido de o acórdão ter reconhecido o 3.º Juízo do TIC, a que os autos foram distribuídos para instrução, como competente para proceder à validação/invalidação dos actos praticados durante o inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Todavia, em nossa opinião, não será esta a melhor interpretação a atribuir ao acórdão. Se bem lemos as palavras constantes da decisão e se bem avaliamos o seu sentido e alcance, o Tribunal da Relação de Lisboa quis precaver a eventualidade de não estar em curso a fase processual da instrução e naturalmente pretendeu evitar que a decisão a proferir viesse colidir com a normal tramitação do processo. Por isso, apesar de dizer, sem certezas, que se estava a iniciar a fase da instrução, conforme era público, não determinou a remessa dos autos para o TIC de Lisboa, indiscutivelmente o órgão judicial territorial, material e funcionalmente competente para essa fase processual. Pelo contrário, de uma forma mais cautelosa, visando, na nossa perspectiva, salvaguardar a marcha do processo, determinou a sua remessa para o “Tribunal actualmente competente”, sem fazer na decisão qualquer expressa referência ao Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. De certo, seja por formalmente desconhecer a fase processual em curso, seja por não controlar a tramitação do recurso nos momentos subsequentes à prolação do aludido acórdão (desde logo, deixava-se antever uma forte probabilidade de desfasamento entre os autos principais e o apenso de recurso. Aliás, como já acima se deixou mencionado, o apenso não baixou de imediato à 1.ª instância, demorando mais de 6 meses, primeiramente no Tribunal da Relação de Lisboa e posteriormente no STJ, em face dos incidentes suscitados e dos recursos inter(...)s), o Tribunal da Relação de Lisboa não se quis amarrar ou vincular ao tribunal que tinha então a seu cargo a instrução (ou seja, o 3.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa), no que respeita à reapreciação dos actos processuais em causa, determinando, antes, a simples e expressa remessa dos autos para o “Tribunal actualmente competente”. De facto, este acórdão ganhou a sua eficácia, começou a produzir os seus efeitos, não quando foi proferido no dia 17-03-2004, mas quando baixou à 1.ª instância, após terem sido definitivamente apreciados e decididos todos os incidentes e recursos subsequentes à sua prolação. De resto, era previsível que tal acórdão viesse a suscitar tais reacções. Seja como for, no seu segmento decisório – que, como já se disse, formou caso julgado formal e adquiriu força obrigatória dentro deste processo – decidiu-se atribuir essa competência, não ao TIC de Lisboa, mas ao “Tribunal actualmente competente”, que era a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, na data em que o apenso baixou à 1.ª instância, após ter transitado em julgado, no dia 02-11-2004, o já acima mencionado acórdão do STJ (cf. fls. 155 do apenso de recurso n.º 1967/04 - 3.ª). Efectivamente, no dia 08-07-2004, os autos vieram a ser distribuídos àquela vara criminal enquanto processo comum colectivo (cf. Vol. 91.º). Assim, nenhuma censura nos merece, nesta parte, a decisão recorrida. Mostrando-se esta interpretação em conformidade com o que foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pelo seu acórdão de 17-03-2004 (recurso n.º 1967/04 - 3.ª Secção), importa também averiguar se a solução a que chegou o Tribunal a quo respeita os princípios e as normas atinentes à competência dos tribunais criminais. Escusado será referir que esta é a interpretação que se mostra mais consentânea com os princípios da celeridade, da economia processual e do julgamento no mais curto lapso de tempo, sendo que a mesma, como veremos mais à frente, não comporta qualquer espécie de sacrifício ou de prejuízo para as garantias de defesa dos arguidos, muito em particular por ofensa da estrutura acusatória do processo criminal. Como facilmente se compreende, as posições perfilhadas nos recursos inter(...)s pelos arguidos C e K comportariam inegavelmente um retardamento do julgamento da causa, com prejuízo para todos os sujeitos processuais (inclusive para aqueles arguidos que não aderiram a tais posições), em face do acréscimo temporal de indefinição quanto à apreciação judicial dos factos controvertidos. Estando os autos já distribuídos como processo comum colectivo, inclusive com a audiência de julgamento já a decorrer, a adesão aos argumentos apresentados por estes recorrentes implicaria a remessa do processo ao juiz ou ao tribunal de instrução criminal, com o inelutável retardamento do julgamento da causa, com a previsível necessidade de repetição de actos processuais e em desconformidade, assim o entendemos, com o preceituado nos arts. 32.º, n.º 2, da CRP e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que impõem o julgamento em curto prazo ou em prazo razoável. A interpretação que acolhemos não significa que os princípios da celeridade, da economia processual e do julgamento no mais curto prazo devam prevalecer indiscriminadamente sobre outros princípios ou garantias constitucionais (v.g. garantias de defesa dos arguidos), que o seu enlace com a descoberta da verdade material se sobreponha ao cumprimento de regras formais ou processuais, nem tão pouco que eles se devam impor a todo o custo no âmbito do processo criminal. Significa somente que a posição assumida pelo Tribunal a quo na decisão recorrida não consubstancia, em nossa opinião, qualquer atentado, muito menos um grave e relevante atropelo, às garantias de defesa dos recorrentes C e K. Mais: O n.º 1 do art. 311.º do CPP preceitua que: “Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito do causa, de que possa logo conhecer”. O art. 311.º, que integra o Livro VII, relativo ao julgamento em processo penal, impõe ao juiz presidente, como desde logo decorre da epígrafe deste dispositivo, que proceda ao saneamento do processo, conhecendo imediatamente, se possível, de nulidades ou de outras questões que obstem ao conhecimento do mérito da causa. Deste dispositivo resulta que não compete única e exclusivamente ao juiz presidente proceder à realização da audiência de julgamento e proferir no final sentença ou acórdão, consoante os casos. A lei impõe-lhe que conheça inclusive de questões relativas a fases processuais preliminares ao julgamento, quer atinentes a actos de inquérito, quer atinentes a actos de instrução, desde que obstem à apreciação do mérito da causa. Aliás, o n.º 1 do art. 311.º do CPP começa logo por referir que “recebidos os autos no tribunal”. Este trecho significa que mal o processo venha a ser distribuído e concluso, o juiz presidente deverá certificar-se de que os autos podem seguir para julgamento, que podem vir a ser conhecidos os factos e as incriminações feitas aos arguidos, por não ocorrerem, até esse momento, quaisquer nulidades ou questões prévias ou incidentais que impeçam o conhecimento de mérito. De igual sorte, mesmo após a prolação da decisão final, continua a competir ao juiz de julgamento assegurar a subsequente tramitação do processo, admitindo os recursos que venham a ser inter(...)s, decidindo o que for necessário quanto a medidas de coacção até trânsito em julgado da sentença ou inclusive assegurando a execução das penas aplicadas. De resto, no que diz respeito às medidas de coacção, como decorre do dis(...) no n.º 1 do art. 194.º do CPP, a competência para as decretar compete ao juiz presidente durante o julgamento (cf. neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in ob. cit., pág. 529, acompanhando o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 14-10-1997). Em idêntico sentido, o art. 98.º, n.º 1, da LOFTJ, estabelece o seguinte: “compete às varas criminais proferir despacho nos termos dos artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal e proceder ao julgamento e aos termos subsequentes nos processos de natureza criminal da competência do tribunal colectivo ou do júri”. Deste preceito resulta inequívoco que estes tribunais têm competência para toda a tramitação do processo desde a altura em que é recebido em juízo, com a prolação do despacho a que aludem os arts. 311.º a 313.º do CPP, até ao momento em que é arquivado. Para além do julgamento propriamente dito, compete ao juiz presidente assegurar a tramitação processual anterior e posterior à sua realização, compete-lhe, seja em que altura for, decidir todas as questões que se suscitem, das nulidades, das excepções ou dos incidentes que impeçam o conhecimento do mérito da causa. Regressando ao caso vertente, temos que o acórdão de 17-03-2004 – proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa nos autos de recurso n.º 1967/04 – declarou nulo o despacho de fls. 270 e ordenou ao tribunal actualmente competente que procedesse em conformidade, anulando ou aproveitando os actos processuais praticados, ao longo do inquérito, pelo Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Quando os autos baixaram à 1.ª instância, depois do trânsito em julgado a 02-11-2004 do acórdão do STJ (cf. fls. 155 do apenso de recurso n.º 1967/04), foi precisamente a esta tarefa que lançou mãos o Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, após ter sido determinado o cumprimento do princípio do contraditório. Enquanto tribunal de julgamento, competia à 8.ª Vara Criminal de Lisboa, de acordo com os preceitos legais supra citados, decidir das questões que obstaculizassem ao conhecimento do mérito da causa, o que fez, procurando retirar consequências da declaração de nulidade do despacho de fls. 270, o que se traduzia, em abstracto, quer na anulação, quer no aproveitamento, dos actos processuais em causa. O Tribunal recorrido não praticou actos típicos de inquérito ou de instrução. Assumiu as competências reconhecidas pela lei ao tribunal de julgamento: em face do decidido em sede de recurso, o Tribunal recorrido ponderou as consequências que devia retirar da decretada declaração de nulidade, enquanto questão que podia obstar ao conhecimento do mérito da causa, muito embora tenha vindo a optar pelo aproveitamento dos actos, até de acordo com o estabelecido no art. 122.º, n.º 3, do CPP. Acresce que o dis(...) no n.º 1 do art. 33.º do CPP deve ser interpretado sistematicamente, isto é, de modo concertado e conjugado com as normas que fixam a competência do tribunal (ou do juiz) nas fases processuais de inquérito e de instrução. Nos seus arts. 268.º e 269.º, a lei processual penal enuncia um conjunto de actos que imperativamente devem ser praticados, ordenados ou autorizados pelo juiz de instrução no decurso da fase preliminar de inquérito, tais como, interrogatórios judiciais de arguidos detidos, aplicação de medidas de coacção diferentes do termo de identidade e residência, realização de buscas domiciliárias ou de intercepções telefónicas. A fase preliminar de inquérito inicia-se com a abertura de um processo de investigação decorrente da notícia de um crime (cf. arts. 241.º e ss.), é dirigida pelo Ministério Público (cf. n.º 1 do art. 263.º) e termina, por regra, com a prolação de despacho de arquivamento ou de acusação do arguido (cf. arts. 276.º e ss. do CPP). Por seu turno, a fase facultativa da instrução inicia-se com a aceitação do requerimento para a abertura desta fase processual, apresentado, consoante os casos, pelo arguido ou pelo assistente (cf. art. 287.º), é dirigida pelo juiz de instrução (cf. n.º 1 do art. 288.º) e termina com a decisão instrutória, consubstanciada em despacho de pronúncia ou de não pronúncia, consoante tenham sido ou não recolhidos indícios suficientes para submeter o arguido a julgamento (cf. arts. 306.º e ss. do CPP). Em conformidade com estes preceitos, o art. 79.º, n.º 1, da LOFTJ dispõe que: “Compete aos tribunais de instrução criminal proceder à instrução criminal, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicionais relativas ao inquérito”. Neste caso, quando transitou em julgado a 02-11-2004 o acórdão do STJ e quando baixou à 1.ª instância o apenso de recurso n.º 1967/04, estavam encerradas as fases de inquérito e de instrução, mediante a dedução de acusação a 29-12-2003 e a prolação de despacho de pronúncia a 31-05-2004. Deste modo, não podia subsistir a competência do tribunal (ou do juiz) de instrução, pois, sublinhe-se mais uma vez, tendo os autos sido distribuídos, a 08-07-2004, como processo comum colectivo, passou a competir ao tribunal de julgamento (8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção) decidir das questões que pudessem obstar à apreciação do mérito da causa, muito em particular retirar consequências do que foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa – “declarar nulo o despacho recorrido”. Como se depreende, a competência do tribunal (ou do juiz) de instrução decorre, não só dos actos a praticar ou a autorizar, mas também da fase processual em curso. Os citados dispositivos legais falam em “durante o inquérito” e “proceder à instrução criminal”. Encerradas estas fases preliminares, não compete ao juiz de instrução continuar a praticar ou continuar a autorizar a pratica de actos processuais, nem tão pouco proceder à reavaliação de actos de inquérito na perspectiva da sua anulação ou da sua confirmação, como se ainda não tivesse tido início outra fase processual, como se os autos ainda não tivessem sido remetidos para julgamento, quando é sabido que o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu singelamente “declarar nulo o despacho recorrido” e ordenar que se procedesse à validação/invalidação dos actos praticados durante o inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa. Mais uma vez se salienta que não se tratou de praticar ou de autorizar a prática de actos típicos de inquérito ou de instrução. Tratou-se diferentemente de avaliar, de ponderar, de verificar que efeitos deviam ser retirados da declaração de nulidade do despacho de fls. 270, quanto à validade de actos de inquérito. Enquanto tribunal competente para a realização do julgamento, o Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa procedeu ao saneamento do processo, em conformidade com o aludido acórdão de 17-03-2004, avaliando os efeitos de uma nulidade já declarada e que poderia obstar ao conhecimento do mérito da causa, ainda que reportada à fase preliminar de inquérito. Em suma: quer de acordo com o sentido e alcance do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, tirado a 17-03-2004 no âmbito do apenso de recurso n.º 1967/04 - 3.ª, quer de acordo com o princípio constitucional do julgamento no mais curto prazo, quer de acordo com os princípios da economia e da celeridade processuais, quer ainda de acordo com as normas legais delimitadoras da competência dos tribunais criminais, nenhuma censura merece a decisão recorrida na parte em que assumiu a competência da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, para a validação dos actos processuais praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa durante o inquérito. Não tem pois cabimento a alegação de que o Tribunal a quo na decisão recorrida fez aplicação ao caso vertente do regime e dos efeitos da distribuição previstos nos arts. 210.º, n.º 1, e 220.º, ambos do CPC. Muito embora se faça referência a estes dispositivos legais, a decisão recorrida é clara ao afirmar que “(…) não se me afigura que o cumprimento do Acórdão do Tribunal da Relação tenha como consequência, nesta fase processual, determinar que os autos sejam sujeitos a nova distribuição”, nem tão pouco foi a mesma realizada em face do decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, limitando-se a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, a assumir uma competência, que lhe cabia de acordo com os fundamentos já acima ex(...)s. Deste modo, improcedem quanto a esta questão os recursos inter(...)s pelos arguidos C e K, pelo que não se descortina fundamento legal para que seja declarada a nulidade insanável do despacho recorrido ou para que os autos sejam remetidos ao 3.º Juízo ou ao 5.º Juízo - A do TIC, conforme pretendiam estes recorrentes, já que, do acima ex(...), não subsistem dúvidas de que bem andou o Tribunal a quo ao assumir a sua competência para a validação /invalidação dos actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa. 6.3. Validação formal ou substancial dos actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa De seguida, importa apreciar se os arts. 33.º, n.ºs 1 e 3, e 122.º, n.º 1, do CPP, impõem uma avaliação substancial, que não puramente formal, dos actos processuais praticados pelo tribunal declarado incompetente. Se, nas palavras do recorrente H, “o despacho recorrido devia ter procedido à apreciação substancial de todos os actos praticados pelo Senhor Juiz de Instrução do 1° Juízo do TIC, posteriores a 07/01/2003, nos termos que são im(...)s pelo art. 33° n° 1 do C.P.P (…)”. Ou, segundo o recorrente C, se “a decisão não respeita o estatuído nos arts. 122.°, n.° 1 e 33.°, nrs. 1 e 3, ambos do CPP, os quais impõem a ponderação substancial dos actos eventualmente feridos de nulidade subsequente”. Ou se, nas palavras de dissidência do arguido K face à decisão recorrida, “a avaliação imposta pelos normativos dos art.°s 33°, n° 1 e 3, e 122°, ambos do CPP, dos actos praticados pelo tribunal incompetente não é uma avaliação formal ou finalística, temperada pelo princípio de máximo aproveitamento, mas uma avaliação material tutelada por um juízo de projecção decisória, como se perante o Tribunal que avalia a validade dos actos, tivesse decorrido o processo.”. Quanto a esta questão, importa recordar que o Tribunal a quo pronunciou-se no sentido de que “(…) apenas serão invalidados os actos que na perspectiva finalística do processo não deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais que, em abstracto, condicionam a sua prática (…)” e que “(…) nesta fase processual, não cabe a reapreciação da validade substancial dos actos, mas tão só na perspectiva que antecede (…)”, acabando, no segmento decisório, por considerar “(…) validados todos os demais actos jurisdicionais praticados pelo J.I.C. do 1° Juízo, do T.I.C. de Lisboa, durante a fase do inquérito dos presentes autos (…).” Por tudo aquilo que já se disse, não se afigura que os recorrentes tenham efectuado a interpretação mais correcta e adequada do art. 122.º do CPP, nem tão pouco do regime específico dos efeitos da declaração de incompetência do tribunal, plasmado no art. 33.º, n.º 1, do mesmo código. Com a reavaliação, com a hipotética anulação e com a eventual repetição dos actos processuais praticados por tribunal incompetente, previstas pelo n.º 1 do art. 33.º do CPP, o legislador não visou obter melhor justiça, não pretendeu abrir a porta a uma nova apreciação de questões já decididas (muito menos por tribunais eventualmente pertencentes a igual ou a inferior hierarquia), não quis conceder aos sujeitos processuais a oportunidade de alcançarem decisões judiciais de acordo com as suas pretensões. Entendemos que não se pretendeu impor ao tribunal competente uma actuação equivalente a uma instância de recurso, em que o tribunal superior – ponderando a argumentação apresentada pelos sujeitos processuais e analisando a decisão judicial proferida – procede a nova apreciação, a uma reavaliação, das questões suscitadas, na perspectiva de manutenção, de modificação ou de correcção do que já foi decidido. Se bem interpretamos os recursos inter(...)s, todos os ora recorrentes pretendiam que o Tribunal a quo viesse a avaliar substancialmente, valorasse materialmente, todos os actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, o que significaria, ao fim e ao cabo, a apreciação de mérito dessas decisões, que o Tribunal a quo, igualmente de 1.ª instância, reavaliasse os fundamentos que estiveram na sua base, por forma a concluir se esses despachos foram ou não proferidos secundum legem. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não é este o sentido que se impõe retirar do dis(...) no n.º 1 do art. 33.º do CPP. Apelando novamente ao princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais, que subjaz a este dispositivo, o tribunal somente deve anular os actos “que se não teriam praticado”, apenas aqueles, conforme acima já se deixou assinalado, que se mostrem absolutamente incompatíveis com a tramitação processual que deveria ter sido seguida no tribunal competente. De acordo com o n.º 1 deste artigo, não competirá ao aplicador do direito anular todos os actos emanados de juiz declarado incompetente, nem tão pouco efectuar uma avaliação fundada no seu mérito. Inversamente, os actos praticados por tribunal incompetente, por princípio, mantêm a sua validade e a sua eficácia. Só são anulados aqueles que se mostrem incompatíveis perante a declaração de incompetência. Mas a anulação não pode ser determinada por esses actos não terem acolhido a melhor doutrina ou a melhor jurisprudência sobre o assunto, por não terem reconhecido a interpretação mais idónea da lei ou por terem sido proferidos contra o entendimento perfilhado pelos sujeitos processuais, como de um recurso se tratasse. A anulação só pode ser declarada quando se concluir que os actos praticados não se enquadram na tramitação processual do tribunal declarado competente, quando a anulação seja indispensável para adequar o processo à tramitação que ele deveria ter tido. Independentemente da bondade das decisões proferidas em sede de inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, que os recorrentes já escrutinaram ou pelo menos tiveram a oportunidade de escrutinar através dos meios processuais próprios, nesta sede importa tão somente averiguar que actos processuais se não teriam praticado e que, por isso, deviam ser anulados e eventualmente repetidos, caso o processo tivesse sido sempre tramitado, como se impunha, pelo tribunal declarado competente. Para o caso, não podem relevar os estilos meramente pessoais, nem a avaliação do mérito dos actos processuais, a ter lugar, como decorre da lei, em sede de recurso. Conforme resulta bem claro da epígrafe do art. 33.º do CPP, em causa estão precisamente os “Efeitos da declaração de incompetência”. De acordo com esta perspectiva, procedendo à análise dos autos, não se descortina nenhum acto do 1.º Juízo do TIC de Lisboa que não fosse praticado caso o processo em sede de inquérito tivesse sido sempre tramitado pelo tribunal competente. Nem tão pouco os ora recorrentes os enumeram, insurgindo-se, segundo aquilo que alegam nos recursos, essencialmente contra a falta de ponderação ou de apreciação substancial desses actos pela decisão recorrida, o que, saliente-se novamente, não podia nem devia ter sido feito por o Tribunal a quo não constituir instância de recurso, nem por o regime do n.º 1 do art. 33.º do CPP, determinar a avaliação dos actos processuais numa lógica de nova ponderação dos fundamentos materiais da decisão. De qualquer modo, como se disse na decisão recorrida, os actos processuais que não foram objecto de reacção por parte dos arguidos, designadamente através da interposição de recurso ou através de arguição de nulidades ou irregularidades, consideram-se convalidados em face da sua aceitação por parte dos sujeitos processuais. Por seu turno, relativamente aos restantes actos, em que os sujeitos processuais interpuseram recurso, as decisões que sobre eles recaíram constituíram por si só uma apreciação jurisdicional da validade dos actos praticados em sede de inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, entretanto declarado incompetente. Em face do dis(...) no n.º 1 do art. 33.º do CPP, não resultando dos autos que algum destes actos processuais não fosse praticado pelo tribunal declarado competente, caso perante ele tivesse sempre corrido o processo, e dado que neste sentido nenhum acto em concreto foi indicado pelos ora recorrentes, nenhuma censura nos merece a decisão recorrida, na parte em que considerou validados os actos jurisdicionais praticados, durante a fase de inquérito, pelo Senhor Juiz do 1° Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa e que julgou desnecessário determinar a sua repetição. Com particular ênfase, os recorrentes H, C e K insurgem-se contra o facto da decisão recorrida não efectuar uma avaliação substancial dos despachos que ordenaram e que mantiveram as medidas de coacção impostas aos arguidos, ao arrepio, assim o defendem, do n.º 3 do art. 33.º do CPP, que impõe a sua convalidação ou infirmação pelo tribunal competente. Por se prender com direitos fundamentais dos arguidos, a lei processual penal estabeleceu no n.º 3 deste dispositivo um regime próprio para as medidas de coacção que, muito embora mantenham a sua eficácia, devem ser avaliadas pelo tribunal competente no mais curto lapso de tempo. Quanto a esta matéria, o Tribunal a quo, decidiu – e bem na nossa perspectiva – considerar que os actos processuais relativos às medidas de coacção já tinham sido validados, quer por força das decisões proferidas pelos tribunais superiores na sequência dos recursos inter(...)s, quer ainda por força das decisões da JIC proferidas em fase de instrução. De facto, com o trânsito em julgado das decisões que apreciaram a aplicação das medidas de coacção impostas aos ora recorrentes, formou-se caso julgado, com força obrigatória dentro do processo, pelo que inclusive estava vedado à 1.ª instância, ainda que no âmbito de aplicação do dis(...) no n.º 3 do art. 33.º do CPP, proceder à modificação ou revogação de tudo aquilo que anteriormente tinha sido decidido pelas instâncias de recurso, mantendo-se naturalmente as mesmas circunstâncias de facto. Na tese dos recorrentes, o tribunal competente devia ter procedido a uma avaliação substancial das medidas de coacção de prisão preventiva que lhes foram impostas em sede de inquérito. Levando à letra tal tese, o tribunal criminal competente seria legalmente confrontado, à partida, com duas soluções, a saber: a convalidação ou a infirmação dessas medidas de coação, nos termos da parte final do n.º 3 do art. 33.º do CPP. O aplicador do direito não pode à partida excluir nenhum dos potenciais caminhos previstos pelo legislador, devendo somente, após ponderar todas as circunstâncias do caso, optar por aquele que se afigure mais justo e adequado. Caso viesse a optar pela convalidação dessas medidas de coacção, por entender que substancialmente estavam preenchidos os pressu(...)s e os requisitos necessários para a sua aplicação, os recorrentes ver-se-iam novamente sujeitos a prisão preventiva, em violação do caso julgado formado pelas decisões posteriores que a substituíram. Caso contrário, perguntar-se-ia que sentido útil teria tal decisão para o objecto do processo, para quê proceder a uma avaliação substancial de todos os requisitos e pressu(...)s da prisão preventiva quando esta medida já tinha cessado e inclusive já tinha sido substituída por outra (v.g. obrigação de permanência na habitação). Muito embora invoquem o dis(...) no n.º 3 do art. 33.º do CPP, no sentido de imporem ao tribunal a quo uma avaliação substancial das medidas de coacção que já tinham sido revogadas – o que implicaria, como já se viu, alternadamente, a sua convalidação ou a sua infirmação –, os recorrentes partem do pressu(...) erróneo de que forçosamente o tribunal competente teria de considerar inválidas as medidas de coacção aplicadas em sede de inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa. Importa também recordar que a decisão do Tribunal a quo foi proferida no dia 13-12-2004, portanto, após terem sido substituídas as medidas de coacção que inicialmente foram impostas aos ora recorrentes. Conforme já se deixou assinalado, no dia 04-05-2004 o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu revogar a medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao arguido H, enquanto que no dia 07-05-2004 o 3.º Juízo do TIC de Lisboa substituiu as que tinham sido impostas aos arguidos C e K. Portanto: à data da decisão recorrida nenhum destes recorrentes estava ainda sujeito à medida de coação de prisão preventiva que lhe foi imposta em sede de inquérito, já que todas, sem excepção, tinham sido revogadas e substituídas pela medida de obrigação de permanência na habitação. Perante esta situação de facto, ainda menos se impunha ao Tribunal a quo que procedesse a uma avaliação substancial dessas medidas de coacção. À data da decisão recorrida, essa avaliação substancial, na perspectiva das garantias de defesa e da salvaguarda dos direitos fundamentais, como alegam os ora recorrentes, já tinha sido levada a cabo muito tempo antes pelos tribunais que as apreciaram e que as revogaram. Seria destituído de qualquer sentido que o Tribunal a quo se debruçasse sob o ponto de vista substantivo, procedendo à avaliação de todos os requisitos e pressu(...)s necessários à sua aplicação, quando essas medidas de coação já tinham cessado. De forma alguma, o n.º 3 do art. 33.º do CPP deve ser interpretado de um modo estritamente literal, como fazem os recorrentes. Quando se fala em convalidação ou infirmação pelo tribunal competente, naturalmente que se deixa pressupor que as medidas de coacção ainda coexistam. Até de acordo com o princípio da economia processual, seria destituído de sentido proceder à avaliação da medida de coacção, impondo-se ao tribunal declarado competente uma análise dos seus fundamentos e pressu(...)s, quando esta por qualquer motivo já tinha cessado a sua aplicação. Nenhuma utilidade teria essa apreciação por parte do Tribunal a quo. Desta sorte, não colhem os argumentos apresentados pelo recorrente H quando defende que até se impunha a anulação de certos actos relacionados com a aplicação e manutenção da medida de coacção de prisão preventiva, “(…) porque dela pode depender o direito a indemnização por prisão ilegal”. Em primeiro lugar, conforme melhor se verá a respeito do recurso do despacho de fls. 33.696 a 33.703, o objecto do processo é grosso modo delimitado pela acusação deduzida pelo Ministério Público ou pelo despacho de pronúncia nos casos em que seja requerida a abertura da instrução. O processo penal não pode olvidar a sua específica finalidade, tendente essencialmente ao apuramento dos factos integradores do crime (ou crimes em referência), das circunstâncias relativas à personalidade, à conduta e ao modo de vida habitual do arguido, com o intuito de, caso se mostrem integrados todos os elementos constitutivos do ilícito criminal, vir a ser aplicada ao agente uma ajustada pena ou medida de segurança. Deste modo, mostra-se completamente indiferente à marcha destes autos saber se no decurso do inquérito ocorreu alguma ilegalidade susceptível de fundamentar a propositura de uma acção de natureza exclusivamente cível, se o direito à indemnização por prisão ilegal deve eventualmente ser reconhecido ao arguido H com base em qualquer um dos actos processuais por si elencados no recurso em causa. Os sujeitos dispõem de meios processuais próprios para assegurarem em devido tempo os seus direitos e as suas garantias de defesa. Não usando esses meios ou usando-os sem sucesso, não competirá a um tribunal criminal vir posteriormente, no âmbito dos mesmos autos, emitir parecer sobre a legalidade ou ilegalidade da aplicação uma medida de coacção, que há muito que cessou, por ter sido substituída por outra. Os tribunais são órgãos de justiça vocacionados para a decisão das questões práticas que, no âmbito das suas funções, lhes são submetidas. Deste modo, não podem nem devem tomar posição sobre questões que extravasam os seus poderes de decisão. Em segundo lugar, não seria nem necessário nem útil aguardar pela decisão do tribunal competente que, ao abrigo do dis(...) no n.º 3 do art. 33.º do CPP, viesse a convalidar ou a infirmar os despachos emanados do 1.º Juízo do TIC de Lisboa. Como muito a este propósito se defendeu no Ac. do STJ de 22-03-2011, Proc. n.º 5715/04.1TVLSB.L1.S1 (acessível em www.dgsi.pt): “Se um Acórdão, proferido em processo crime, versa apenas sobre uma decisão interlocutória relativa à apreciação de uma medida de coacção aplicada a um arguido, e não conhece do mérito (condenação ou absolvição), apenas forma caso julgado formal no âmbito do respectivo processo, não tendo qualquer efeito fora dele”. Na perspectiva do interesse processual – este recorrente subscreve o entendimento de que da anulação dos actos processuais “pode depender o direito à indemnização por prisão ilegal” – de nada serviria que a decisão recorrida tivesse procedido a uma avaliação substancial da medida de coacção (maxime da prisão preventiva) decretada pelo Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa. Se, por um lado, não deixa de ser verdade que estes autos não têm por escopo a concessão ou a negação de indemnização por prisão ilegal decretada neste próprio processo, por outro lado, qualquer decisão interlocutória, como é o caso da decisão recorrida, que hipoteticamente se pronunciasse sobre a matéria em causa (considerando a posteriori a legalidade ou a ilegalidade da prisão preventiva a que foi sujeito o arguido H no decurso do inquérito), não produziria qualquer efeito fora deste processo, de nada serviria, já que não formaria caso julgado face à acção cível que se viesse a intentar, conforme resulta bem claro do citado aresto do Supremo Tribunal. Os actos jurisdicionais estão vocacionados para a decisão. Não para a simples apreciação, sem quaisquer consequências úteis para o processo. Importa também assinalar que não colhe a argumentação apresentada pelo recorrente H no sentido de que a nulidade dos actos praticados pelo Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa gera a automática caducidade dos actos proferidos pelos tribunais superiores que se reportaram a tais actos sem apreciar a questão da sua incompetência. Para além de não se descortinar qualquer fundamento legal para a “automática caducidade” dos acórdãos proferidos pelos tribunais superiores, tanto mais que o recorrente H não invoca quaisquer preceitos que sustentem tal tese, impõe-se, desde logo, salientar que a questão controvertida da incompetência para a prática dos actos processuais em causa unicamente se colocou ao nível dos tribunais de 1.ª instância. Como já se disse, o Tribunal da Relação de Lisboa, mediante o mencionado acórdão de 17-03-2004, declarou a nulidade do despacho de fls. 270, por entender que os autos tinham sido distribuídos ao 5.º Juízo – A do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, pelo que não deviam ter sido averbados, sem qualquer fundamento legal, ao 1.º Juízo do mesmo tribunal. Independentemente da questão em referência, o Tribunal da Relação de Lisboa é, por regra, o órgão jurisdicional competente para a apreciação e para o julgamento, em 2.ª Instância, dos recursos ordinários que incidam sobre as decisões judiciais proferidas pelos Tribunais de 1.ª instância sedeados neste Distrito Judicial de Lisboa (cf. maxime arts. 47.º, 51.º, 55.º e 56.º, n.º 1, al. a), da LOFTJ e art. 427.º do CPP), obviamente sem prejuízo da competência atribuída ao próprio Supremo Tribunal de Justiça. Assim, fosse qual fosse o tribunal criminal competente para a prolação das decisões em causa, sempre seria uma das Secções Criminais desta Relação de Lisboa, de acordo com a distribuição a efectuar, a competente para o julgamento desses recursos, como efectivamente sucedeu, de forma perfeitamente independente perante as decisões da 1.ª instância. Como o apontado vício diz respeito à fase de inquérito que decorreu na 1.ª instância, não se descortina que motivo, que especial dependência, poderia determinar por arrastamento a nulidade das decisões proferidas pelos tribunais superiores, quando, por exemplo, a Relação exerceu as suas próprias competências, apreciando e decidindo as questões controvertidas que constituíram o objecto dos vários recursos inter(...)s e que foram livremente delimitados pelos sujeitos processuais recorrentes, quando também é sabido que foi unicamente declarada a nulidade do despacho de fls. 270 destes autos. Acresce que o raciocínio do recorrente H parte do pressu(...) errado de que são nulos todos os actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Todavia, tendo o Tribunal a quo considerado validados todos esses actos e não existindo, na nossa perspectiva, suficientes fundamentos para se defender o contrário – pelos motivos que já deixámos explanados, mas atendendo desde logo ao princípios orientadores destas matérias, v.g., princípio constitucional do julgamento no mais curto lapso de tempo, princípio do máximo aproveitamento dos actos processuais, princípio da economia processual – não pode deixar de falecer a defendida tese do contágio por “automática caducidade” de todas as decisões proferidas pelos tribunais superiores. Por último, o recorrente K veio também defender que o Tribunal recorrido se limitou a proferir uma decisão genérica de validação de todos os actos praticados pelo tribunal incompetente, que a inquina de nulidade, por violação do dis(...) no n.º 4 do art. 97.º do CPP. Acrescenta, a este propósito, que devido à ausência de fundamentação ficou impossibilitado de sindicar correctamente os critérios assumidos pelo Tribunal a quo (cf. maxime pontos n.ºs 45 e 46 das conclusões do recurso). Para tanto alega na motivação apresentada que no “(...) despacho recorrido, verifica-se, lamentavelmente, que o Tribunal a quo não se encontra em condições para avaliar e ponderar imparcialmente as questões essenciais do processo, uma vez que a ausência de quaisquer critérios válidos, a confusão de funções jurisdicionais e a inexistência de fundamentação quanto a esta problemática simples prenunciam uma sistemática violação dos princípios que devem imperar na formação da convicção”. Preceitua o art. 97.º do CPP (na redacção anterior à introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08), sob a epígrafe ”Actos decisórios ”: “1 – Os actos decisórios dos juízes tomam a forma de: a) Sentenças, quando conhecerem a final do objecto do processo; b) Despachos, quando conhecerem de qualquer questão interlocutória ou quando puserem termo ao processo fora do caso previsto na alínea anterior; c) Acórdãos, quando se tratar de decisão de um tribunal colegial;” (…) “4 – Os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”. A respeito do dever de fundamentação, defendeu-se o seguinte no Ac. do STJ de 27-01-2009, Proc. n.º 3978/08 (acessível em www.dgsi.pt): “A motivação das sentenças judiciais é um dos Direitos do Homem, constante do art. 6.º, § 1, da CEDH, reputada como o direito do acusado a um processo justo, consagrado no art. 20.º, n.º 4, da CRP, e é considerada como o remédio essencial contra o arbítrio, através dela prestando o juiz contas, aos sujeitos processuais e à colectividade, dos critérios adoptados e dos resultados adquiridos. Não tem que consistir na análise aprofundada de todas as deduções das partes nem num exame pormenorizado de todos os elementos do processo, não tem que apresentar uma extensão “épica” (observa o Juiz Franz Matsher, citado no estudo de Lopes Rocha, in Documentação e Direito Comparado, BMJ n.ºs 75/76, págs. 99 e ss.), convertendo a motivação num complexo processo escrito e por vezes contraditório, satisfazendo-se com um raciocínio justificativo mediante o qual o juiz mostra que a decisão se funda em “bases racionais idóneas” para a tornarem aceitável, credível.” Perante este breve enquadramento jurídico e tendo em consideração as circunstâncias deste caso concreto, não se reconhece qualquer mérito à crítica apontada pelo recorrente K quando alega que a decisão interlocutória, ora impugnada, peca pela inexistência de fundamentação, o que o impediu de sindicar correctamente a decisão do Tribunal a quo. Muito embora se reconheça que o Tribunal a quo se dispensou da épica tarefa de analisar singularmente acto a acto, de avaliar individualmente, um a um, todos os actos de inquérito praticados ou ordenados pelo Juiz do 1.º Juizo do TIC de Lisboa, o certo é que a decisão proferida se mostra perfeitamente clara, transparente e perceptível, quer ao enunciar as questões a decidir, quer no percurso que seguiu, quer nas conclusões a que chegou. A decisão interlocutória, ora em referência, seguiu um percurso lógico e argumentativo, enunciou os factos, apontou os fundamentos jurídicos, indicou os critérios que adoptou (sublinhando até os trechos da decisão que entendeu mais relevantes para a percepção do sentido da decisão) e terminou com a solução que julgou como mais acertada. Tudo isso, na nossa perspectiva, permitiu ao leitor acompanhar com relativa facilidade o raciocínio que o julgador desenvolveu ao longo de todo o texto, pelo que não se pode afirmar que a decisão – ainda que, como sempre, discutível – constituía uma arbitrariedade perante aquilo que se disse ou que ficou por dizer. Aliás, a abordagem em conjunto de actos processuais, não transforma o despacho interlocutório numa decisão genérica. A identidade de tratamento do que se assume como igual não significa alheamento perante o caso concreto. Significa que as individualidades, avaliadas sem traços distintivos marcantes ou diferenciadores, não determinam a formulação de divergentes soluções, mas impõem a desnecessidade de repetição do inútil. Muito embora o despacho recorrido não teça considerações particulares sobre cada um desses actos processuais, por falta de especificidades com relevância para o caso, o certo é que não deixa de os elencar, vindo a concluir que “foram praticados a requerimento dos sujeitos processuais referidos nos arts. 268.º, n.º 2, do CPP” e que foram “praticados dentro dos objectivos e interesses inerentes à fase processual então em curso, prendendo-se intrinsecamente com o objecto da investigação”. Mais: o argumento da quantidade também para aqui não releva, pois, como se disse, o legislador processual penal não fixou qualquer percentagem mínima ou máxima para o aproveitamento dos actos processuais praticados, sendo que nesta área o princípio aplicável favorece o seu aproveitamento. Acresce que da simples análise do recurso apresentado pelo arguido K resulta precisamente o inverso daquilo que ele alega quanto à falta de fundamentação da decisão recorrida, já que naquela peça processual são suscitadas pelo próprio variadíssimas questões (v.g. incompetência do Tribunal a quo, nulidade dos actos praticados em sede de inquérito, nulidade do despacho ora impugnado, inconstitucionalidades), o que logo deixa pressupor que a decisão em causa se mostrou, pelo menos, minimamente perceptível para o seu destinatário e que este conseguiu, pelo menos, com o mínimo de clareza, descortinar as razões, os critérios que levaram o tribunal recorrido a decidir de modo contrário às suas pretensões. Dito por outras palavras: não terá sido seguramente a inexistência ou a deficiência de fundamentação, quanto aos critérios assumidos na decisão recorrida, que impediu ou que dificultou o exercício do direito ao recurso por parte deste arguido, pois para tanto basta atentar na extensão da peça processual apresentada pelo recorrente K e no leque de questões que aí foram suscitadas, mas também na atitude processual dos restantes arguidos que ou não recorreram do despacho em causa ou que recorrendo não invocaram quaisquer dificuldades na sua compreensão. De qualquer modo, estando em causa um simples despacho, que não pôs termo ao processo e que se limitou a decidir uma questão interlocutória (cf. al. b), do n.º 1 do art. 97.º do CPP), a pretensa falta de fundamentação nunca consubstanciaria nulidade da decisão, conforme defende o recorrente K, constituindo, quanto muito, uma mera irregularidade processual, que a ter ocorrido, estaria há muito sanada (cf. art. 123.º, n.º 1, do CPP). Muito a este propósito, em anotação ao art. 97.º do CPP, escreveu Paulo Pinto de Albuquerque (in ob. cit., pág. 273): “A omissão da fundamentação de acto decisório constitui uma irregularidade nos termos do artigo 123.º (de iure condendo, defendendo a consagração de uma nulidade, ANTÓNIO BARREIROS, acta n.º 6, de 9.4.1991, in Actas CPP/Figueiredo Dias, proposta que foi rejeitada). A omissão da fundamentação da sentença constitui nulidade (artigo 379.º, n.º 1, al. a) ).” Em suma: atendendo a que o regime do n.º 1 do art. 33.º do CPP não determina a avaliação dos actos processuais numa lógica de nova ponderação dos fundamentos materiais da decisão, que nesta sede não se impõe uma reapreciação das decisões proferidas pelo tribunal incompetente como se de um recurso se tratasse e que in casu nenhum dos actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa escapa aos objectivos e aos interesses inerentes à fase processual do inquérito, nenhuma censura nos merece a decisão do Tribunal a quo, ao considerar validados os actos processuais em referência, pelo que improcede a pretensão dos recorrentes no sentido de que a decisão recorrida deveria ter procedido a uma “apreciação substancial” dos mesmos e de que devia ser determinada a invalidade de todos os actos praticados ou autorizados durante a fase processual de inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. No que diz respeito às medidas de coacção, importa novamente salientar que à data em que foi proferida a decisão recorrida (13-12-2004) já nenhum dos recorrentes H, C e K estava sujeito à medida de coacção máxima de prisão preventiva, imposta em sede de inquérito, pelo que já então se mostrava absolutamente inútil e destituído de qualquer sentido prático, sobretudo na perspectiva do estabelecido no n.º 3 do art. 33.º do CPP, proceder à “apreciação substancial” daquilo que já tinha cessado, muito em particular com o intuito de apurar, de averiguar ou de indagar, mas realmente sem nada decidir, se os actos praticados pelo Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa eram ou não ilegais, inconstitucionais ou se ofendiam ou não as garantias de defesa dos arguidos. Aliás, ao contrário do que alegam os recorrentes, não se descortina qualquer segmento no citado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-03-2004 em que se impusesse à 1.ª instância uma avaliação substancial dos actos praticados em sede de inquérito, sobretudo das medidas de coacção que então foram decretadas. No seu segmento decisório nada se diz expressamente quanto a medidas de coacção e na parte final da fundamentação do acórdão cita-se o n.º 3 do art. 33.º do CPP, sem mais nada se acrescentar a este respeito, sem se avançar com alguma interpretação deste dispositivo. Deste modo, não se compreende a alegação de que a decisão recorrida constitui uma violação expressa da mencionada decisão do Tribunal da Relação de Lisboa. Como já se disse e conforme parece decorrer, pelo menos implicitamente, da decisão recorrida, com o trânsito em julgado das decisões que apreciaram a aplicação das medidas de coacção impostas aos recorrentes, formou-se caso julgado, com força obrigatória dentro do processo, pelo que estava vedado ao Tribunal a quo, ainda que no âmbito do dis(...) no n.º 3 do art. 33.º do CPP, proceder à confirmação, modificação ou revogação do que anteriormente tinha sido decidido, inclusive por instâncias de recurso. As expressões utilizadas pelo legislador “convalidadas ou infirmadas”, a propósito das medidas de coacção, devem ser interpretadas de modo sistemático. Em primeiro lugar, o dispositivo legal em causa pressupõe que as medidas de coacção ainda coexistam quando se impõe ao tribunal competente a sua reavaliação, pois, caso contrário, ocorre uma impossibilidade, até em sentido lógico, de serem convalidadas ou infirmadas. Em segundo lugar, a interpretação deste dispositivo de modo algum pode conduzir a fazer tábua rasa das decisões que foram sendo proferidas ao longo do tempo, sobretudo sobre medidas de coacção, até por tribunais superiores e que formaram inultrapassável caso julgado no âmbito destes autos. No decurso do inquérito foram proferidas decisões que não mereceram a concordância de todos os sujeitos processuais e que delas interpuseram recurso. As conclusões, extraídas das motivações apresentadas, fixaram o objecto desses recursos e delimitam as questões controvertidas, que foram apreciadas pelas instâncias de recurso e cujas decisões, após trânsito em julgado, formaram caso julgado. No âmbito de aplicação do art. 33.º do CPP, mais uma vez se salienta, não compete tomar posição sobre o mérito dessas decisões que ao longo do tempo foram sendo proferidas, inclusive por instâncias superiores, impõe-se antes a verificação da compatibilidade dos actos já praticados com a competência do tribunal entretanto declarada. Improcedem também nesta parte os recursos inter(...)s pelos arguidos. 6.4. Inconstitucionalidades suscitadas pelos recorrentes O recorrente C veio defender que “(…) o sentido interpretativo subjacente à aplicação que das normas constantes dos arts. 14.°, 17.°, n.° 1 in fine, 33.°, n.° 1, 268.° e 269.°, todos do CPP é feita na decisão recorrida, ao reconhecer ao tribunal de julgamento competência para apreciar e decidir da validação ou invalidação de actos jurisdicionais do JIC declarado incompetente, praticados em fase de inquérito, é inconstitucional, por ofensivo do princípio da estrutura acusatória do processa criminal, consagrado no art. 32°, n.° 5 da Constituição (…)” – cf. maxime conclusões 11.ª e 12.ª do recurso por ele inter(...). Também o arguido K veio perfilhar idêntico entendimento, pugnando que a “(…) interpretação assumida pelo Tribunal a quo sobre os normativos dos arts. 33°, n.° 1, 14°, 17°, in fine, 268.° e 269.°, todos do C.P.P., é inconstitucional, por violar o sentido do art. 32°, n.° 5, da Constituição da República Portuguesa, no qual está consagrado o princípio da estrutura acusatória do processo criminal (…)” - cf. maxime conclusões 21.ª e 22.ª do recurso inter(...). A questão da inconstitucionalidade suscitada por estes recorrentes reconduz-se fundamentalmente a saber se a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, ao considerar validados os actos praticados durante o decurso do inquérito pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, interpretou maxime os arts. 14.º, 17.º, 33.º, n.º 1, 268.º e 269.º, todos do CPP, de modo contrário à Constituição da República Portuguesa, ofendendo o princípio da estrutura acusatória do processo criminal, consagrado no seu art. 32.º, n.º 5. Estabelece este preceito constitucional, relativo às garantias de defesa, que “o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório”. Em anotação ao citado art. 32.º, especificamente quanto ao princípio do acusatório, doutrinam Jorge Miranda e Rui Medeiros (in “Constituição Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2010, 2.ª Edição, Tomo I, pág. 729): “A estrutura acusatória do processo significa, no que é essencial, o reconhecimento do arguido como sujeito processual a quem é garantida efectiva liberdade de actuação para exercer a sua defesa face à acusação que fixa o objecto do processo e é deduzida por entidade independente do tribunal que decide a causa. O processo de estrutura acusatória procura assegurar a parificação do posicionamento jurídico da acusação e da defesa em todos os actos jurisdicionais, ou seja, a igualdade material de meios de intervenção processual (igualdade de armas) pelo menos nas fases jurisdicionais”. Também quanto a este princípio, os (...) Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 522) anotam que: “(…) é um dos princípios estruturantes da constituição processual penal. Essencialmente, ele significa que só se pode ser julgado por um crime precedendo acusação por esse crime por parte de um órgão distinto do julgador, sendo a acusação condição e limite do julgamento. Trata-se de uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial. Cabe ao tribunal julgar os factos constantes da acusação e não conduzir oficiosamente a investigação da responsabilidade penal do arguido (princípio do inquisitório).” Em idêntico sentido, Germano Marques da Silva (in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 2000, Tomo I, págs. 58 e 59) defende que: “O sistema acusatório procura a igualdade de poderes de actuação processual entre a acusação e a defesa, ficando o julgador numa situação de interdependência, super «partes», apenas interessado na apreciação objectiva do caso que lhe é submetido pela acusação. O processo inicia-se com a acusação pelo ofendido ou quem o represente e desenvolve-se com pleno contraditório entre o acusador e o acusado, pública e oralmente, perante a passividade do juiz que não tem qualquer iniciativa em ordem à aquisição da prova, recaindo o encargo da prova sobre o acusador.” Perante o que acima ficou ex(...), resulta inequívoco que o princípio do acusatório, consagrado pelo n.º 5 do art. 32.º da CRP, pretende assegurar que o processo criminal decorra com equidade ou com justo equilíbrio entre os vários sujeitos processuais, que os poderes concedidos à acusação não suplantem aqueles que são reconhecidos à defesa, que haja um equilíbrio entre as prorrogativas atribuídas ao arguido para demonstrar a sua inocência e as prorrogativas reconhecidas à acusação para comprovar a culpabilidade do acusado, que existam diferentes órgãos encarregues de acusar e de julgar e que o tribunal assegure as garantias de independência e de imparcialidade, quer perante o arguido, quer perante a comunidade em geral. Até enquanto pressu(...) do Estado de Direito Democrático, a Lei Fundamental impõe que o cidadão suspeito da prática de um crime não seja logo à partida tratado como condenado e considerado como responsável pela prática desses actos, mas que lhe sejam asseguradas todas as garantias de defesa, de modo a ser julgado com isenção, com igualdade de armas perante a acusação, por um tribunal que seja imparcial e independente. Aliás, a imparcialidade e a independência do tribunal devem também ser consideradas à luz do dis(...) no art. 6.º, n.º 1, da CEDH: “Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela (…)”. Na nossa perspectiva, enquanto que a “independência” representará a não sujeição, a liberdade de actuação do juiz perante poderes externos ou internos ao próprio processo (v.g., poder executivo, poder legislativo, sujeitos processuais, outros tribunais), a “imparcialidade” consubstanciará o distanciamento do tribunal face às partes ou aos sujeitos processuais, a qualidade de não ter partido, de não estar a favor ou contra alguém, de se mostrar equidistante face à acusação e à defesa em processo penal. Como assinala Ireneu Cabral Barreto (in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2010, págs. 195 e 197): “A imparcialidade é posta em causa face a índices diversos, como, por exemplo, quando um ou mais membros do tribunal desempenharam ao longo de um processo outras funções”, acrescentando logo de seguida a este respeito que “Aqui o fundamental será que o juiz do julgamento não detenha uma opinião preconcebida sobre a culpabilidade do acusado dado o exercício prévio de funções de acusação ou de instrução”. Deste modo, não ocorre forçosamente preterição das garantias de imparcialidade do tribunal por o juiz que teve intervenção no processo durante as fases de inquérito ou de instrução, ainda que mínima, ter sido posteriormente chamado a participar no julgamento dessa causa. Importa analisar qual o grau e que tipo de intervenção foi essa. Tanto hoje, como no passado, o art. 40.º do CPP (sob a epígrafe “Impedimento por participação em processo”) constitui um barómetro, um ponteiro indicador, para o que deve ser considerado como atentatório das garantias de defesa por preterição da independência e da imparcialidade do tribunal. Por exemplo, de modo incontestável, a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva ou a intervenção em debate instrutório mostra-se absolutamente incompatível com a participação do mesmo juiz em julgamento, o que bem se compreende já que estes actos pressupõem a formulação de um juízo de culpabilidade, uma apreciação dos fundamentos de facto e de direito do objecto do processo. Se existem circunstâncias limite, quer num quer noutro sentido, que não suscitam quaisquer dúvidas ao aplicador do direito, outras assumem contornos mais difusos, mais de fronteira, casos em que se justifica fazer apelo à jurisprudência que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal Constitucional. Quanto a estas controvérsias, a propósito destes princípios e dispositivos, o Tribunal Constitucional firmou a seguinte jurisprudência: “Dos sucessivos pronunciamentos do Tribunal Constitucional sobre esta questão há uma linha de raciocínio que se mantém, deles se retirando com interesse para o caso que, é do tipo e frequência da intervenção que o julgador teve, na fase de inquérito, com especial relevância do momento em que, dentro dessa fase, ela ocorreu (o mesmo acto pode ser valorado de modo diverso consoante o desenvolvimento da investigação), que há-de resultar o juízo sobre a isenção, imparcialidade e objectividade do juiz enquanto julgador”. “(…) não é qualquer intervenção anterior no processo por parte do juiz que depois há-de participar no julgamento que é apta a justificadamente pôr em causa a sua independência e imparcialidade – ou a confiança do arguido e do público nessa mesma independência e imparcialidade – em termos de dever considerar-se que a norma que a permita é inconstitucional por violação do dis(...) no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição. Como se afirmou repetidamente naqueles acórdãos «um juízo de inconstitucionalidade da norma que permita a intervenção no julgamento do juiz que participou numa fase anterior, por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, pressupõe que as intervenções do juiz – pela sua frequência, intensidade ou relevância – sejam aptas a razoavelmente permitir que se formule um dúvida séria sobre as condições de isenção e imparcialidade desse mesmo juiz ou a gerar uma desconfiança geral sobre essa mesma imparcialidade e independência»” – cf., respectivamente Acs. n.ºs 129/07 e 423/00, acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt . No caso vertente, adianta-se desde já que não se vislumbra qualquer violação do princípio da estrutura acusatória do processo, ou seja, que não se mostra que os preceitos em causa, muito em particular o art. 33.º do CPP, tenham sido interpretados pela decisão recorrida de modo contrário ao espírito do n.º 5 do art. 32.º da CRP, de forma a levantar sérias e graves dúvidas sobre a isenção, a imparcialidade ou a independência do Tribunal a quo. Conforme já se deixou assinalado, o Tribunal recorrido não praticou nem autorizou a prática de actos de inquérito ou de instrução no decurso destas fases processuais. Antes se viu confrontado, enquanto tribunal de julgamento e já no decurso desta fase processual, com a baixa à 1.ª instância do aludido acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, que determinou a reavaliação, melhor dizendo, a anulação ou o aproveitamento dos actos processuais praticados, ao longo da fase processual de inquérito, pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Desta forma, o Tribunal a quo não usurpou de competências que estavam e estão legalmente atribuídas, até por imperativo constitucional, ao juiz de instrução durante a fase de inquérito, o Tribunal a quo não se imiscuiu na investigação do processo nem tão pouco conduziu a fase de instrução, não decretou a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva aos ora recorrentes, o Tribunal a quo limitou-se a assumir as competências atribuídas ao tribunal de julgamento, muito em particular limitou-se a ponderar que consequências podia e devia retirar da declaração de nulidade do despacho de fls. 270, enquanto questão que obstava ao conhecimento do mérito da causa. O Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa não teve qualquer intervenção ou interferência nas fases preliminares do processo, designadamente não praticou actos ou autorizou diligências com vista à obtenção de provas que permitissem sustentar a culpabilidade dos visados, nem tão pouco formou um juízo indiciário de modo a sujeitar os arguidos a julgamento, e quando foi chamado a tomar posição, na perspectiva dos arts. 33.º e 122.º do CPP, conforme foi superiormente determinado (relembre-se novamente que o citado acórdão de 17-03-2004 remeteu tal tarefa para o “Tribunal actualmente competente”), fê-lo enquanto tribunal de julgamento, a quem compete, para além do mais, conhecer das nulidades e das questões incidentais que possam obstar ao conhecimento do mérito da causa. Desta forma, na nossa perspectiva, não têm acolhimento neste caso concreto, as alegações feitas pelos recorrentes, que em abstracto se subscrevem, de que o princípio da estrutura acusatória do processo criminal – consagrado, como se mencionou, no n.º 5 do art. 32.º da Constituição – exige que se diferencie o órgão que investiga do órgão que julga. Escusado será repetir que in casu foi o 1.º Juízo do TIC de Lisboa a praticar ou a autorizar a prática de actos processuais durante a fase de inquérito (aliás, de modo ilegal, conforme se sabe), que a acusação foi deduzida contra os arguidos pelo Ministério Público, que a instrução decorreu e que a decisão instrutória foi proferida pelo 3.º Juízo do TIC de Lisboa e que o julgamento decorreu perante a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, não existindo nota que algum dos membros desse Colectivo tenha tido anterior intervenção no processo seja nas fases de inquérito ou de instrução. Mantendo-se intocável neste segmento o princípio da estrutura acusatório, também não assiste razão aos recorrentes quando defendem que competia ao juiz de instrução criminal, em face do decidido no aludido acórdão de 17-03-2004, apreciar e decidir a validade dos actos processuais praticados durante a fase de inquérito, sob pena de inconstitucionalidade, ou quando pugnam no sentido de que o Tribunal a quo invadiu a esfera funcional de competência do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Sobretudo se tivermos em consideração que não se vislumbra, numa perspectiva estritamente objectiva, uma actuação gravemente violadora ou simplesmente atentatória das garantias de isenção, de imparcialidade ou de independência do Tribunal recorrido, quer na óptica dos arguidos, quer na óptica da comunidade em geral. A 3.ª Secção da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, enquanto tribunal de julgamento ao qual foi distribuído este processo comum colectivo, exercendo uma competência própria, procurou dar seguimento ao que foi decidido pelo acórdão de 17-03-2004 e cujo apenso de recurso tinha acabado de baixar à 1.ª instância, abordando a nulidade que aí foi conhecida e declarada, numa lógica de anulação ou de aproveitamento dos actos em causa, enquanto questão processual que obstava ao conhecimento do mérito da causa. Acresce também afirmar, o que aliás mereceu acesa crítica por parte dos recorrentes, que a decisão recorrida não se debruçou sobre a fundamentação das decisões judiciais proferidas na fase processual de inquérito, sobre a valia da argumentação utilizada e sobre o acerto daquilo que foi então decidido, ou, dito por outras palavras, não avaliou, de fundo ou de substância, esses actos processuais de acordo com o quadro jurídico aplicável. Como efectivamente não o fez (conforme já acima deixámos assinalado, nem o podia e devia ter realizado), como não apreciou o mérito das questões controvertidas então suscitadas pelos diversos sujeitos processuais, não se compreende como estes recorrentes vêm agora defender que o Tribunal a quo invadiu a esfera funcional de competência do Tribunal de Instrução Criminal e que, por tal motivo, é inconstitucional a interpretação que foi feita pela decisão recorrida dos preceitos legais em causa. O Tribunal recorrido não tomou qualquer decisão de inquérito ou de instrução, nem tão pouco se pronunciou sobre a substância das decisões anteriormente tomadas. Simplesmente avaliou que efeitos deviam ser retirados da declaração de nulidade do despacho de fls. 270, quanto à validade/invalidade dos actos praticados no decurso do inquérito. Mais uma vez se salienta que o despacho recorrido foi proferido no âmbito de aplicação maxime do art. 33.º do CPP, relativo aos efeitos da declaração de incompetência. Perante a aludida decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, em face da declaração de incompetência, o Tribunal a quo procurou fundamentalmente verificar a compatibilidade dos actos processuais praticados no decurso do inquérito e, após ponderação, concluiu que nenhum desses actos estava desenquadrado, que todos se inseriam no âmbito da investigação e que todos se prendiam com o objecto do processo. Deste modo, considerou que todos eles foram praticados dentro da competência legalmente atribuída e que nenhum deles subvertia a direcção do inquérito. Considerando igualmente que vários actos não suscitaram quaisquer reparos por parte dos sujeitos processuais e que outros foram confirmados e infirmados pelas instâncias de recurso, quer em benefício quer contra as pretensões dos arguidos, o Tribunal a quo não apreciou o mérito daquilo que já tinha sido decidido em sede de inquérito, limitou-se a averiguar a sua conformação formal, a compatibilidade dos actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa, sem nunca entrar na concreta abordagem das questões atinentes aos actos de inquérito que considerou validados. Ao considerar a validade destes actos, o Tribunal a quo nada alterou de substancial face ao que já tinha sido decidido em sede de inquérito, quer pela 1.ª instância, quer pelas instâncias de recurso, seja em benefício ou seja contra as pretensões dos arguidos, pelo que não se descortina qualquer invasão da esfera funcional de competências do TIC de Lisboa, susceptível de comprometer o princípio da estrutura acusatória do processo criminal. O Tribunal a quo decidiu que todos esses actos se consideravam validados, sem modificar ou revogar quaisquer decisões judiciais anteriormente tomadas, precisamente por eles se enquadrarem na normal tramitação de um processo de inquérito e por respeitarem aos factos que foram investigados nestes autos. E fê-lo, de acordo com o art. 33.º, nº 1, do CPP, aproveitando ao máximo os actos processuais praticados pelo tribunal incompetente no decurso do inquérito, e dando cumprimento ao dis(...) no art. 32.º, n.º 2, da CRP, promovendo o julgamento no mais curto prazo. Muito menos se assinala que o Tribunal recorrido tenha formulado um juízo de culpabilidade ou que para o efeito tenha quebrado o dever de isenção ou de imparcialidade, o que, em nossa opinião, ainda se mostraria mais determinante. Tudo aquilo que de substancial já tinha sido decidido pelas instâncias, seja a favor ou seja contra as pretensões dos arguidos, foi mantido nos seus precisos termos pela decisão recorrida. Quanto a este aspecto, assumiu-se uma postura de absoluta neutralidade, não tendo o Tribunal a quo nada decidido – nem o devendo fazer, de acordo com enquadramento jurídico que acima já deixámos traçado – v.g. quanto ao mérito dos actos processuais relativos às medidas de coação aplicadas aos arguidos. Aliás, a estrutura acusatória do processo criminal não fica comprometida com uma qualquer intervenção, por mais singela e minimalista, do juiz de julgamento noutras fases processuais (maxime inquérito e instrução). Assim como não é a avaliação crítica de um acto de inquérito (v.g. apreciação de uma questão de nulidade referente a essa fase processual mas posteriormente suscitada) ou a simples sujeição já nesta fase processual de um arguido a termo de identidade e residência que farão quebrar as garantias de imparcialidade e de independência impostas ao juiz de julgamento. Como decorre da jurisprudência já citada do TC, a quebra deste princípio fundamental do processo criminal exige, para o que agora nos interessa, que o juiz tenha tido uma intervenção que, pela sua “frequência, intensidade ou relevância”, possa ser fundadamente considerada como comprometedora das garantias de imparcialidade e de independência. In casu, para além de se ter cingido a uma intervenção pontual (prolação do despacho de 13-12-2004), mais uma vez se repete, em síntese, que a 8.ª Vara Criminal de Lisboa, 3. ª Secção, não teve qualquer intervenção ou interferência nas fases preliminares do processo, que não tomou qualquer decisão de inquérito ou de instrução e que se limitou, em cumprimento do acórdão desta Relação de Lisboa de 17-03-2004, a tomar posição quanto à validade/invalidade dos actos de inquérito, o que fez, de acordo com os princípios e normas aplicáveis, considerando-os validados, por conformidade processual, mas sem entrar, e bem, na apreciação do mérito das decisões que a seu propósito foram sendo proferidas pelas instâncias ao longo do tempo. Perante o que já se deixou dito, na nossa perspectiva, não foi minimamente tocado o princípio da estrutura acusatória do processo penal. Nem tão pouco se afigura que os arts. 33.º, n.° 1, 14.°, 17.°, 268.°, 269.°, 311.° e 313.°, todos do CPP, e 64.°, n.°s 1 e 2, 79.°, n.º 1, 98.° e 106.º, n.º 1, todos da LOFTJ tenham sido interpretados de modo ofensivo à norma contida no art. 211.º, n.º 1 e 2, da Lei Fundamental, conforme defende o recorrente K, por, alegadamente, a decisão recorrida ter estabelecido uma confusão nas funções, finalidades e competências entre os tribunais de julgamento e os tribunais de instrução. Estabelece, então, o art. 211.º da Constituição, sob a epígrafe “Competência e especialização dos tribunais judiciais”: “1. Os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais. 2. Na primeira instância pode haver tribunais com competência específica e tribunais especializados para o julgamento de matérias determinadas”. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se compreende a alegada violação, a propósito deste caso concreto, do dis(...) no n.º 1 do citado ao art. 211.º da CRP, na medida em que quer o tribunal de instrução criminal quer a vara criminal são tribunais judiciais de 1.ª instância, o primeiro com competência especializada e a segunda com competência especifica, que exercem jurisdição em matéria criminal, não se verificando que algum tribunal integrante de qualquer outra ordem judicial tenha abusivamente decidido sobre a validade/invalidade dos actos de inquérito. Por outro lado, quanto ao n.º 2 deste preceito constitucional, apraz afirmar que a decisão recorrida não impossibilitou seguramente a existência facultativa, no quadro legal, de tribunais com competência específica a par de tribunais com competência especializada para o julgamento de determinadas matérias, ao mesmo tempo em que se mostra igualmente seguro que o legislador constitucional não delimitou as concretas funções e competências a atribuir pelo legislador ordinário a cada um desses tribunais. De qualquer modo, convirá agora repetir que a decisão recorrida não incorreu em qualquer confusão entre as funções e competências dos tribunais de instrução criminal e de julgamento, na medida em que procurou unicamente verificar que efeitos deviam ser retirados da declaração de nulidade do despacho de fls. 270 (ainda que respeitantes à fase de inquérito), quando já estavam encerradas as fases processuais de inquérito e de instrução, quando por tal motivo já tinha cessado a intervenção do juiz de instrução e quando o processo comum colectivo já tinha sido distribuído à 8.ª Vara Criminal de Lisboa, então o tribunal competente para proceder à realização da audiência de julgamento, para sanear o processo e para conhecer todas as questões que pudessem obstar à apreciação do mérito da causa. Em face do ex(...), entendemos que a interpretação efectuada pela decisão recorrida não consubstancia qualquer violação do dis(...) no art. 211.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição, afigurando-se que o Tribunal a quo ao sanear o processo actuou no âmbito de competências que lhe estavam legalmente atribuídas (cf. maxime arts. 311.º do CPP e 98.º, n.º 1, da LOFTJ), como já se deixou assinalado, porquanto os autos já tinham sido distribuídos como processo comum colectivo, encerradas que estavam as fases preliminares de inquérito e de instrução e, por consequência, esgotada a competência do juiz ou do tribunal de instrução para a questão da nulidade. Acresce que a decisão em causa foi incontestavelmente proferida por tribunal judicial, com competência em matéria criminal, sendo certo que a Lei Fundamental não impõe a forçosa existência de tribunais de competência específica e/ou especializada, remetendo-se para o legislador ordinário a tarefa de concretizar os casos em que esses tribunais devam ser criados e delimitar a competência de cada deles, quando existam numa determinada circunscrição. O recorrente K defendeu também que a decisão recorrida, para salvaguarda do princípio da economia processual, não pode postergar os direitos e garantias fundamentais do arguido, constitucionalmente consagrados, sob pena de violação do art. 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Constituição. Acrescenta que o sentido interpretativo das normas dos arts. 33.º, n.ºs 1 e 3, e 122.º, n.ºs 1, 2 e 3, ambos do CPP, efectuado na decisão recorrida, no sentido de que não tinha de efectuar uma reapreciação substancial dos actos, é inconstitucional por ofensa dos arts. 28.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1 e 2, da CRP. Não se descortina por que forma a decisão recorrida atentou contra as garantias de defesa dos arguidos, por não ter efectuado “uma avaliação substancial do universo decisório”, conforme defende este recorrente. Se ao apelar para as garantias fundamentais do arguido, o recorrente K pretendeu incluir o direito ao recurso, expressamente consagrado pelo n.º 1 do art. 32.º da CRP, não lhe assiste razão alguma. Quanto à decisão proferida pela 8.ª Vara Criminal de Lisboa, este arguido interpôs precisamente o recurso que está agora a ser objecto de apreciação. Quanto às decisões que foram tomadas ao longo do inquérito, das duas uma, ou foram aceites pelos sujeitos processuais ou foram impugnadas por via do recurso, como facilmente se pode constatar da análise dos autos. Seja como for, tendo os sujeitos processuais recorrido ou deixado de recorrer, o que se mostra incontornável é que decidiram livremente actuar da forma que tiveram por mais conveniente para a defesa das suas pretensões, pelo que não sofreram qualquer tipo de limitação intolerável ao exercício de tal direito, nem tão pouco o impugnante K o invoca expressamente. O que não pode, sob a capa da pretensa inconstitucionalidade, é criar uma nova oportunidade para recorrer das decisões que eventualmente não sejam do seu agrado, subvertendo todo o sentido dos arts. 33.º e 122.º do CPP, ao pretender que o Tribunal a quo viesse a conhecer os fundamentos substanciais das decisões judiciais proferidas nos autos, até por instâncias de recurso, já com trânsito em julgado, apreciando indevidamente o mérito delas, mas sem averiguar ou menorizando a determinante conformidade processual dos actos praticados em face da referida declaração de incompetência. Competiu aos sujeitos processuais fixar o objecto dos recursos que decidiram interpor, foram eles que delimitaram as questões controvertidas, que tiveram a oportunidade de se insurgir contra as medidas de coacção que foram decretadas em sede de inquérito, questionando as respectivas causas, requisitos e fundamentos. Perante os recursos livremente inter(...)s e delimitados, as instâncias de recurso decidiram as questões suscitadas e com o correspectivo trânsito, formou-se caso julgado, o que impediu o Tribunal a quo de delas conhecer, de modo a não ser confrontado com a confirmação, modificação ou revogação do que já estava definitivamente assente. Para além de não ter ocorrido a violação desta garantia de defesa, de igual modo se entende que permaneceu intocado o princípio da estrutura acusatória do processo criminal, pois, mais uma vez se repete, que o Tribunal recorrido exerceu competência própria (que não funcionalmente do juiz de instrução) e que manteve a sua isenção e imparcialidade (se nada confirmou, alterou ou revogou face ao que já tinha sido decidido pelas instâncias, não formulou qualquer juízo de culpabilidade relativamente aos arguidos). Apraz também afirmar que o princípio da economia processual não deve ser desvalorizado, face ao seu reconhecimento pelo art. 137.º do CPC (aplicável ex vi art. 4.º do CPP) e até devido ao seu assento doutrinal e jurisprudencial, nem tão pouco deve ser entendido como valor marginal face à Lei Fundamental, na medida em que o texto constitucional assegura o julgamento do arguido no mais curto prazo, o que obviamente não será conseguido com a prática de actos inúteis ou imprestáveis que não comportam qualquer benefício para as garantias de defesa do acusado. Pese embora a falta de explicitação a este propósito, sempre se dirá que a interpretação dos arts. 33.º e 122.º do CPP, levada a cabo pela 1.ª instância na decisão recorrida, não colide com qualquer garantia de defesa do recorrente K, designadamente com o princípio da presunção da inocência (considerando processualmente validado tudo o que já tinha sido decidido pelas instâncias, o Tribunal não formulou qualquer prévio juízo de valor no sentido de considerar o recorrente K como culpado da prática dos crimes de que vinha acusado e pronunciado) ou com o princípio do contraditório (antes de ter sido proferida a decisão em causa, todos os sujeitos processuais tiveram a oportunidade de se pronunciar sobre a questão). Em face do ex(...), não tendo o tribunal de julgamento invadido a esfera de competência funcional do tribunal de instrução criminal, mantendo-se intocada a sua isenção e imparcialidade, tendo sido reconhecido aos sujeitos processuais o direito de livremente interporem recurso e de livremente delimitarem o respectivo objecto para salvaguarda das suas pretensões, não se vislumbrando a preterição de garantias de defesa, nem havendo qualquer densificação nesse sentido por parte do recorrente K, não se mostra que o Tribunal recorrido tenha feito interpretação inconstitucional dos arts. 33.º e 122.º do CPP, ao não avaliar o mérito dos actos praticados pelo Senhor Juiz do 1.º Juízo do TIC de Lisboa durante o inquérito. Mais: como se entende não existir qualquer preterição das garantias de defesa (nem tão pouco estas foram concretizadas pelo recorrente K), a posição assumida pelo Tribunal de 1.ª Instância mostra-se plenamente compatível com o princípio da presunção da inocência e com o julgamento no mais curto prazo, sobretudo se tivermos como pressu(...) a defendida perspectiva da nulidade de todos esses actos processuais. O recorrente K veio também alegar que a interpretação do art. 97.º, n.º 4, do CPP, efectuada pela decisão recorrida, no sentido de que não tem de explicitar os critérios que subjazem ao seu juízo de maior ou menor relevância dos actos praticados, é inconstitucional, por violação do dever de fundamentação (cf. art. 205.º, n.º 1, da Constituição) e do direito ao recurso (cf. art. 32.º, nº 1, da Lei Fundamental). Como doutrinam Jorge Miranda e Rui Medeiros (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Tomo III, pág. 70): “A exigência de fundamentação não constitui uma simples exigência formal desprovida de sentido. A fundamentação cumpre, simultaneamente, uma função de carácter objectivo – pacificação social, legitimidade e auto-controlo das decisões – e uma função de carácter subjectivo – garantia do direito ao recurso, controlo da correcção material e formas das decisões pelos seus destinatários”. Acrescentam a este propósito estes autores: “O conteúdo essencial do dever de fundamentação analisa-se na comunicação das razões que justificam a decisão. Todavia, como já foi afirmado pelo Tribunal Constitucional, as exigências de fundamentação não são iguais relativamente a todo o tipo de decisões judiciais (…)”. “Assim (…) pode dizer-se que a fundamentação das decisões judiciais deve ser expressa, clara, e coerente e suficiente”. Como já se disse, a decisão recorrida cumpre, na nossa óptica, o dever de fundamentação im(...) pela Constituição e, consequentemente, pela lei, pelo que não se vislumbra a mais ténue ofensa dos dispositivos em causa, susceptível de comprometer as garantias de defesa deste recorrente. Sem necessidade de outras considerações, importa apenas assinalar que a falta de fundamentação não deve confundir-se com a legítima discordância perante o teor da decisão judicial, sendo que in casu, ao mesmo tempo em que o irresignado e singular sujeito processual alega a “ausência de critérios válidos”, “a confusão de funções jurisdicionais” e a “inexistência de fundamentação quanto a esta problemática”, apresenta recurso, dessa mesma decisão que considera infundamentada, numa extensa peça processual, em que suscita variadíssimas questões, desde a presente invocação de inconstitucionalidade, passando, por exemplo, pela nulidade insanável da decisão recorrida. Não subsistem quaisquer dúvidas de que a decisão recorrida mostra-se perfeitamente clara, lógica, inteligível e perceptível quanto aos motivos de facto e de direito que levaram o Tribunal Colectivo a ter assumido a validação dos actos processuais praticados no decurso do inquérito. Para além de ter enunciado as questões sujeitas a apreciação, a decisão interlocutória em causa assumiu para o Tribunal a quo a competência para a validação/invalidação desses actos, expôs os motivos (naturalmente discutíveis) que o levaram a chegar a essa conclusão, defendeu sem quaisquer hesitações ou dúvidas que não iria proceder a uma reapreciação substancial dos actos (v.g. “apenas serão invalidados os actos que na perspectiva finalística do processo não deviam ter sido praticados ou aqueles que não tenham observado os pressu(...)s legais” e “nesta fase processual, não cabe a reapreciação da validade substancial dos actos”), enumerou-os e assumiu, muito em síntese, a posição (naturalmente discutível) de que considerava convalidados os actos que não tinham sido impugnados pelos arguidos e que considerava validados os actos nos moldes em que já tinham sido apreciados pelas várias instâncias judiciais (v.g. “as decisões que vieram a ser proferidas quanto a tais actos, ou por via da decisão de recurso nas instâncias superiores ou por via do conhecimento das arguidas nulidades aquando da abertura da instrução e do procedimento da decisão instrutória, constituíram já elas uma apreciação jurisdicional da validade dos actos praticados”). Cumprido que foi, em nossa opinião, o dever de fundamentação por parte da decisão interlocutória (ainda que por muito relevante, esta decisão não pode assumir as mesmas exigências de fundamentação do que uma sentença/acórdão) e não ocorrendo qualquer espécie de impedimento ou de obstáculo ao exercício do direito ao recurso, como facilmente se pode constatar da análise dos autos, improcede também, nesta parte, o recurso inter(...) pelo arguido K, por falta de fundamento quanto à invocada inconstitucionalidade da interpretação do art. 97.º, n.º 4, do CPP. Por último, o arguido H veio arguir a inconstitucionalidade da interpretação dos arts. 33.º, n.ºs 1 e 3, e 120.°, n.º 3, do CPP, “(…) no sentido de que, declarada a incompetência do juiz de instrução que interveio no inquérito, podem, por uma razão de economia processual ou outra de efeito prático equivalente, ser considerados validados os seus actos nos quais foi omitida ao arguido a adequada informação acerca da factualidade concreta punível que lhe é atribuída, bem como acerca dos meios de prova em que se funda a sua prisão preventiva - seja o interrogatório judicial, seja o despacho que ordena ou mantém a prisão preventiva, seja o despacho que nega acesso a essa informação - , por ofensa dos arts. 28º nº 1 e 32° n° 1 da CRP”. Para além dos actos processuais sequenciados pelo próprio no recurso que interpôs, com relevância para a apreciação da questão em apreço, importa também assinalar, muito em síntese, a pertinente tramitação subsequente: - no dia 02-10-2003 o arguido H requereu que fosse inquirido sobre a concreta factualidade que lhe era imputada e sobre os elementos de prova em que se fundou a sua prisão (cf., fls. 9796 a 9798, Vol. 47.º); - por acórdão datado de 19-12-2003, proferido nos autos de recurso n.º 9785/03 - 3.ª, o Tribunal da Relação de Lisboa revogou o despacho que recaiu sobre o aludido requerimento de 02-10-2003 e que havia indeferido a inquirição do arguido H (cf. fls. 254 a 277, Apenso T); - dando cumprimento a este acórdão, foi designado o dia 09-01-2004 para interrogatório do arguido H (cf. fls. 14294, Vol. 63.º); - nos dias 09-01-2004 e 16-01-2004 decorreu o interrogatório judicial (cf. fls. 14404 a 14428, Vol. 64.º e fls. 15044 a 15054, Vol. 67.º); - no dia 06-02-2004 foi proferido despacho que manteve a medida de coacção aplicada de prisão preventiva (cf., fls. 15896 a 16010, Vol. 70.º); - por acórdão datado de 04-05-2004, proferido nos autos de recurso n.º 3432/04 - 5.ª, o Tribunal Relação de Lisboa revogou a decisão que manteve esta medida de coacção, que foi substituída pela medida de coacção de obrigação de permanência na habitação (cf. fls. 19413 a 19427, Vol. 83.º); Perante este enquadramento, não se descortina como a interpretação conjugada dos arts. 33.º, n.ºs 1 e 3, e 120.º, n.º 3, do CPP, tal como foi efectuada pelo Tribunal recorrido, possa ofender de forma gravíssima, na perspectiva do recorrente, o núcleo fundamental das garantias de defesa, na óptica do estabelecido nos arts. 28.º e 32.º da Lei Fundamental. No dia 13-12-2004, data da prolação da decisão impugnada e da interpretação considerada inconstitucional, os autos já tinham sido distribuídos como processo comum colectivo, o arguido H já tinha tido sobejamente conhecimento da acusação (dos factos e dos meios de prova apresentados pelo Ministério Público) e do despacho de pronúncia, já lhe tinha sido facultado o livre acesso aos autos e inclusive já tinha sido revogada e substituída a medida de coacção de prisão preventiva. Deste modo, a ter ocorrido eventual ofensa das garantias de defesa, o ponteiro indicador da inconstitucionalidade não devia ter sido direccionado à interpretação destes dispositivos legais – que, em nossa opinião, em nada conflitua com a Constituição – mas eventualmente aos entendimentos normativos que foram seguidos ao longo do decurso do inquérito a respeito das matérias em causa e que, em devido tempo, foram e puderam ser sindicadas, através da interposição dos pertinentes recursos. É sabido que o Tribunal Constitucional, aliás, a propósito do presente processo, julgou, por exemplo, inconstitucional “(…) a norma do n.º 4 do artigo 141.º do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que, no decurso do interrogatório de arguido detido, a «exposição dos factos que lhe são imputados» pode consistir na formulação de perguntas gerais e abstractas, sem consideração das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram os factos que integram a prática desses crimes, nem comunicação ao arguido dos elementos de prova que sustentam aquelas imputações (…)” – cf. acórdão n.º 416/2003, de 24-09-2003. Todavia, como já se disse, o art. 33.º do CPP não pode ser analisado de forma desgarrada perante a sua inserção sistemática, de modo alheado à sua função, que, como resulta da sua epígrafe, se prende com os “efeitos da declaração de incompetência”. Mais uma vez se salienta, que neste âmbito não compete ao aplicador do direito, enquanto julgador de um recurso perfeitamente atípico, tomar posição sobre o mérito das decisões que ao longo do tempo foram sendo proferidas, inclusive por instâncias superiores, por mais absurdas ou discutíveis que as mesmas sejam, como insistentemente pretendem os recorrentes. Impõe-se tão simplesmente verificar da compatibilidade, da conformidade formal ou processual, dos actos já praticados com a competência do tribunal entretanto declarada. Por isso, a interpretação destes dispositivos legais em nada ofendeu as garantias de defesa do recorrente H, nem colidiu com as normas substanciais atinentes às medidas de coacção aplicadas em sede de interrogatório judicial de arguido detido, na medida em que – como se impõe, até para a salvaguarda do caso julgado enquanto valor respeitante à segurança e a certeza jurídica – a avaliação deve ser feita numa perspectiva estritamente processual, conforme foi entendimento do Tribunal a quo, ou seja, verificar que actos podem vir a ser aproveitados, se excepcionalmente alguns terão de ser anulados ou se no caso se justifica a sua repetição. Como se disse ao longo deste acórdão, o art. 33.º do CPP não impõe uma reapreciação substancial das decisões proferidas pelo tribunal declarado incompetente, não consubstancia o remédio para as decisões judiciais já transitadas em julgado ou a solução a posteriori para tudo aquilo que não mereceu a concordância dos sujeitos processuais, mas que agora se volta a querer discutir, a reboque de diferente matéria (os efeitos da declaração de incompetência do tribunal), procurando-se fazer tábua rasa do caso julgado. Deste modo, seja numa perspectiva pragmática, seja numa perspectiva mais dogmática, não se descortina como os dispositivos da Lei Fundamental, invocados pelo recorrente H e atinentes às garantias de defesa em termos gerais, podem ter sido tocados pela interpretação dos arts. 33.º, n.ºs 1 e 3, e 120.º, n.º 3, do CPP, elaborada pelo Tribunal recorrido, quando justamente se procurou – e bem, na nossa perspectiva – averiguar da conformidade dos actos processuais praticados em sede de inquérito em face da declaração de incompetência do tribunal, mas quando já tinha cessado a medida de coacção de prisão preventiva, quando estava esgotado o segredo de justiça, quando todos os factos e todos meios de prova já eram do conhecimento dos sujeitos processuais e que livremente puderam sindicar. Não havendo qualquer relação entre a interpretação efectuada pelo Tribunal a quo e a propalada violação das garantias de defesa, improcede a questão da inconstitucionalidade suscitada pelo recorrente H. Em face do ex(...), julgam-se totalmente improcedentes os recursos inter(...)s pelos arguidos H, C e K, por falta de fundamento quanto às questões aí suscitadas, e, em consequência, decide-se confirmar in totum o despacho de fls. 25475 a 25488, proferido em 13-12-2004. 7. Recurso inter(...) pelo arguido K do despacho de fls. 28916 (ponto 2.) a 28927, proferido em 17-03-2005, que conheceu da excepção da fiscalização concreta da constitucionalidade dos arts. 346.º n.º 1 e 347.º n.º 1 do CPP O arguido K interpôs recurso do despacho de fls. 28916 a 28927 (ponto 2.), que, na sessão da audiência de julgamento de 17-03-2005, conheceu da excepção da fiscalização concreta da constitucionalidade dos arts. 346.º, n.º 1 e 347.º, n.º 1, ambos do CPP, suscitada por si e pelo arguido H, na sessão da audiência de julgamento de 14-03-2005. Da motivação extraiu as seguintes conclusões: (cf. fls. 29728 a e 29747): 1. A decisão de fls. 28916 a 28927 declarou constitucional a interpretação dos normativos dos arts. 346°, n.º 1, e 347°, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, nos seguintes termos: - A tomada de declarações dos assistentes e dos demandantes cíveis é sempre realizada pelo Presidente do Tribunal, no caso de Tribunal Colectivo, e, caso o Ministério Público, o advogado do assistente, o advogado do demandante cível ou o defensor pretendam que seja formulada alguma questão ou pedido algum esclarecimento, deverão estes solicitar ao Presidente do Tribunal que formule tais questões ou pedidos de esclarecimentos aos assistentes e demandantes cíveis; - A ordem definida para a instância do assistente e do demandante cível é imperativa, pelo que o defensor do arguido formulará o seu pedido de questão ao Presidente depois do Ministério Público mas antes do mandatário do assistente e do demandante cível. 2. Esta dupla interpretação do Tribunal a quo dos normativos dos art.ºs 346º, n.º 1. e 347º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal viola claramente os princípios constitucionais do contraditório pleno e da presunção de inocência, consagrados no âmbito dos direitos e garantias do arguido, previstos no art.º 32°, n.ºs 1, 2 e 5, da Constituição da República. 3. A questão fundamental era saber como é que as garantias de defesa do arguido, maxime, o direito de contrainterrogar e contraditar directamente toda a prova incriminatória que seja produzida na audiência de julgamento - fora as excepções dos art.ºs 349° e 350º do C.P.P. -, se mantêm intactas se as normas em crise impõem que todo o interrogatório do assistente e das partes civis, nomeadamente, do demandante cível, seja realizado por intermédio do presidente do Tribunal. 4. Esta questão não foi resolvida, apesar de ter assumido o Tribunal a quo que este regime prejudicava a espontaneidade do depoimento, lhe retirava conteúdo emocional, i.e., tudo aquilo que permite, em sede de audiência de julgamento, aceder à humanidade da prova e, consequentemente, à possibilidade de valoração. 5. Regime assumido pelo Tribunal a quo, resultante da letra das normas citadas. viola directamente as garantias de defesa do arguido, consagradas no art. 32º n.º 1 e 5. da C.R.P., nomeadamente, o direito de exercer plenamente o contra-interrogatório de toda a prova oral produzida em audiência de julgamento. 6. Emende o recorrente que o regime definido nos artigos em causa para as declarações do assistente e das partes civis foi consagrado por se considerar que tais sujeitos processuais iriam formular, durante tais declarações, uma mera repetição das pretensões subjacentes à sua posição, não constituindo forma probatória com a relevância de uma testemunha, de documentos autênticos, apreensões, vigilâncias. etc ... 7. As normas do art.º 346°, n.º 1 e art.º 347º, n.º 1, ambos do C.P.P., não foram previstas para uma realidade complexa, mas para uma situação simples e mecânica, em que todo o processo se preenche de prova distinta e diferenciada, prova testemunhal, documental, apreensões e buscas, vigilâncias, reconhecimentos. 8. Consequentemente. as normas do art.º 346°. n.º 1 e art.º 347°, n.º 1 ambos do C.P.P, violam o direito do arguido contraditar, contra-interrogar, contra-analisar toda a prova que constitui concretização da incriminação constante do libelo acusatório. 9. Nestes termos, deverão V.Ex.as decretar que o sentido expresso pelo Tribunal a quo sobre estas normas, que a interpretação normativa dos art.ºs 346°, n.º 1 e 347º, n.º 1, ambos do C.P.P. efectuada na decisão recorrida é inconstitucional por violação directa do art.º 32º, n.ºs 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa. 10. Quanto à segundo vector interpretativo, o Tribunal a quo considera, por um lado, que a ordem é exaustiva e taxativa, e, por outro, que a possibilidade do defensor pedir esclarecimentos por último ou, aliás, qualquer outro sujeito processual, não invalida o exercício do contraditório princípio constitucionalmente previsto. 11. A imperatividade e exaustão da indicação da ordem nos referidos normativos não decorre de qualquer elemento literal constitutivo das normas nem do sistema normativo. 12. O Tribunal a quo, igualmente, não apresenta nenhuma razão lógica ou fundamento que demonstre a natureza taxativa da sucessão descrita, sendo que a afirmação de que tal ordem reflecte a natureza "tripartida" do processo penal - Ministério Público-arguido-vitima - não pode colher, dado estimular a violação de princípios e garantias constitucionais como o princípio do contraditório e o princípio da presunção da inocência. 13. A apresentação de tal ordem nas normas referidas é uma mera transposição para aquelas normas da sistematização do próprio Código de Processo Penal relativamente aos sujeitos do processo (vd. o índice do Código de Processo Penal, Livro I, Título V). 14. O legislador nos artigos supra-mencionados nada mais fez do que transpor a ordem pela qual descrevera os sujeitos processuais, não pretendendo com tal transposição definir taxativa e imperativamente a ordem a que os interrogatórios referidos em tais normas deviam obedecer. 15. Este entendimento é o único consentâneo com os princípios constitucionais consagrados no âmbito dos direitos e garantias do arguido, e com os valores do processo penal. 16. Atendendo que o princípio da adesão impõe a dedução no processo penal de pedido de indemnização cível fundado no crime respectivo, funcionando este pedido como uma acção civil enxertada no procedimento criminal, a interpretação do Tribunal a quo sobre o normativo do art.º 347°, n.º 1, do C.P.P., permitiria situações estranhas à própria dinâmica processual civilística, nomeadamente, ser o demandante cível instado primeiro pelo defensor e só depois pelo seu próprio advogado, ou seja, primeiro o defensor contestava as declarações do demandante e, depois, o advogado deste concederia ao seu constituinte a possibilidade de reafirmar a matéria contestada, reformulá-la, repô-la. 17. A interpretação adoptada pelo Tribunal a quo viola insanavelmente os princípios do contraditório como garantia de defesa, e da presunção da inocência, consagrados no art.º 32°, n.ºs 1 e 2 e 5 da Constituição da República. 18. Como garantia de defesa, o princípio do contraditório tem, entre outras consequências, a de impor que o arguido, através do seu defensor, reanalise, reformule, reveja, contradiga e contradite toda a prova produzida em audiência, determinando que a sua instância a testemunhas maiores ou menores de 16 por si não apresentadas, ao assistente e ao demandante cível devam realizar-se em último lugar. 19. Só figurando o defensor em último lugar na ordem de avaliação/ instância da prova é que o contraditório é plenamente realizado e o princípio da presunção da inocência salvaguardado e garantido. 20. Esta realidade desejada pelo legislador tem várias ressonâncias no processo penal, a saber, entre outras, a ordem de produção da prova prescrita no art.º 341º do C.P.P. e o direito do arguido prestar declarações após a realização das alegações, como decorre do art.º 361º, n.º 1, daquele diploma. 21. Por outro lado, a imposição de figuração do defensor em último lugar na inquirição a testemunhas maiores ou menores de 16 por si não apresentadas, ao assistente e ao demandante cível, decorre do princípio da presunção da inocência. 22. Na verdade, presumindo-se, sempre, o arguido inocente até trânsito em julgado de decisão condenatória. só a instância do seu defensor em último lugar permite que determinada prova, no presente caso, aquela decorrente das declarações do assistente (e do demandante cível), possa ser avaliada em toda a sua plenitude incriminatória. 23. O arguido estaria em clara desvantagem pois não poderia na sua instância gozar de todo o seu conhecimento sobre a realidade do processo, por saber que, em seguida, o advogado do assistente iria reconstituir ou reparar os danos provocados na sua instância. 24. Assim, a única interpretação que estaria em harmonia com os princípios e valores constitucionais referidos, com o sistema e espírito do processo penal, era a de considerar que a ordem a adoptar na instância do assistente devia ser a seguinte: primeiro o Ministério Público, advogado do assistente e, finalmente, defensor. 25. Nestes termos, deverão V.Ex.as revogar a decisão proferida pelo Tribunal a quo, determinando a inconstitucionalidade da interpretação do Tribunal a que dos normativos dos art.ºs 346º, n.º 1 e 347°, n.º 1, ambos do C.P.P., e aplicando o sentido alegado pelo recorrente, ou então, caso não considerem V.Exas tal interpretação inconstitucional, deverão assumir a Interpretação propugnada pelo recorrente como a única adequada e harmonioso com o sistema jurídico penal adjectivo." O recurso foi admitido a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (cf. ponto 5 do despacho de fls. 29971). Respondeu o Ministério Público em 1.ª instância, conforme resulta de fls. 79 e ss. do apenso O, nos seguintes termos (transcrição parcial): "(…) São duas as questões, suscitadas num e noutro Recurso, a que cumpre dar Resposta: - a pretensa desconformidade constitucional do n° 1. do art° 346°, e do n° 1, do art° 347°, do CPP, com os n°s. 1 e 5. do art° 32°, da CRP, na parte em que ambos impõem que as instâncias que, a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos Advogados das Partes Civis ou do Assistente, hajam de, a este. no caso do art° 346° e às Partes Civis, na previsão do art° 347 ser feitas, o devam ser, obrigatoriamente, pelo Presidente do Tribunal; - a pretensa desconformidade constitucional das referidas normas (art°s. 346°, n° 1 e 347°, n° 1, ambos do CPP), com os n°s 1. 2 e 5. do art° 32°, da CRP, na interpretação segundo a qual, numa e noutra, se estabelece, imperativamente, a ordem por que deverão ser solicitadas as instâncias por parte dos Sujeitos Processuais. ao Assistente e às Partes Civis.Duas notas : 1.a - As questões que vêm de elencar-se, tanto quanto resultou da consulta, necessariamente lacunar, que fizemos da Jurisprudência do Tribunal Constitucional, do STJ e das Relações, não foram, até à data, apreciadas, sequer, colocadas, à consideração daqueles Tribunais. Ou seja, 17 anos, 2 meses e 16 dias após a entrada em vigor do CPP de 1987, os art°s 346°, n° 1 e 347°, n° 1, deste diploma, vão, finalmente, ser sujeitos ao crivo da constitucionalidade, por parte, ao menos por ora, do Tribunal da Relação de Lisboa. Anote-se, porque não despiciendo, que tais normativos permaneceram intocados, nas suas redacções originárias, apesar das sucessivas revisões a que, quer o Código, quer a Constituição, desde então, foram sujeitos. A originalidade e o carácter precursor das questões em causa residirão, afinal, tal como expressamente referido na Motivação do Arguido H, no facto de tais questões terem sido ... colocadas neste processo, atendendo à sua visibilidade pública e notória." (sic). 2.a - Comum a uma e outra das Motivações é o facto de não ficar claro, em ambas, se, relativamente ao segmento das normas em que se estabelece uma ordem imperativa na solicitação das instâncias, se coloca, tão só, uma questão de desconformidade constitucional, ou, se prévia a essa, se impugna a interpretação que delas se faz, no Despacho recorrido, por se entender que tal interpretação, antes de ferir a Constituição, não é consentida pela própria lei ordinária. Nesse caso, o que estaria em causa não seria a norma, de per se, mas a interpretação, a um tempo desconforme com a Constituição e com o Código. Tal ambiguidade não pode deixar de resolver-se pelo recurso ao cotejo das respectivas Conclusões, as quais, como vem sendo Jurisprudência pacifica, delimitam o âmbito do recurso. Da análise das referidas Conclusões ("10a" a "25a". na Motivação do Arg° K e "H" a "K", na Motivação do Arg° H). não resulta qualquer menção expressa de quais as normas violadas, para além da invocada violação dos n°s. 1, 2 e 5, do art° 32°, da CRP. Por outras palavras, versando os Recursos, exclusivamente, matéria de Direito, a conjugação dos n°s. 1 e 2, a), do art° 412°, do CPP. impondo a referência inequívoca das normas que, no entender dos Recorrentes, hajam de ter-se por violadas e não tendo estes invocado outras que não sejam as disposições constitucionais referenciadas, impõe que se abordem as normas do CPP, tão só, na perspectiva da sua conformidade, ou não, com aquelas, pese embora sem descurar, antes pressupondo, a interpretação que das primeiras faz o Despacho recorrido, à luz da Lei ordinária. Ao Tribunal da Relação de Lisboa não caberá assim, salvo o devido respeito e melhor opinião, corrigir, ou confirmar, o entendimento que o Despacho recorrido perfilha, relativamente ao n° 1. do art° 346° e ao n° 1, do art° 347°, ambos do CPP. Caber-lhe-á, sim, decidir se esse entendimento está, ou não, conforme com os preceitos constitucionais invocados. É essa, a nosso ver, a incontornável consequência decorrente da apontada deficiência das Motivações. Desde há muito que o art° 32°, da CRP, se vem constituindo como uma das mais impressivas barreiras às tentativas. mais ou menos deliberadas, de compressão das garantias de defesa e direitos correlativos, na esfera do processo penal. À sua luz, tem o TC proferido das mais importantes decisões do panorama doutrinário e jurisprudencial português, reconduzindo, sistematicamente, o processo penal, aos ditames e princípios plasmados no texto constitucional. Os presentes autos foram, de resto, palco de algumas dessas decisões. Não obstante, não pode deixar de, concomitantemente, se reconhecer, que, a mesma norma, não poucas vezes, tem sido invocada e utilizada como um expediente meramente dilatório que mais não visa que o protelamento abusivo dos pleitos sujeitos a juízo ou a minagem potencialmente salvífica que polvilhe o processo de uma conflitualidade tal, que, ainda quando meramente doutrinária, nem por isso será de ter por legítima. O art° 32°, da CRP, não é uma coutada do arguido. O art° 32°, da CRP, é um baluarte que tutela e vigia o processo penal português, que consagra direitos aos que nele intervém, sejam eles suspeitos/arguidos, sejam os que vítimas foram da prática de factos que as Leis Penais definiram como crimes. Talvez por isso, o Legislador Constituinte tenha sentido necessidade de consagrar, na Lei Constitucional n° 1/97, de 20 de Setembro, o actual conteúdo do n° 7, do art° 32°, de acordo com o qual "o ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei. E se é certo que "a norma constitucional não especifica o conteúdo do direito de intervenção do ofendido, remetendo para a lei ordinária a sua densificação", não o é menos que, como assinala o Prof. J. Miranda, "... a lei não pode é retirar ao ofendido, directa ou indirectamente, o direito de participar no processo que tenha por objecto a ofensa de que foi vítima." - cfr. "Constituição Portuguesa Anotada, J. Miranda e Rui Medeiros, Coimbra Editora, Tomo 1, p. 361. Tão pouco indiferente foi a esta problemática o Despacho recorrido, ao citar Figueiredo Dias quando este recorda que, "para uma autêntica protecção da vítima, mais decisivo ainda que o «auxílio social» (...) é conferir-lhe voz autónoma logo ao nível do processo penal." O que vem de dizer-se não é inócuo e ajuda-nos, crê-se, a compreender, em geral, as tensões próprias e naturais de uma litigância sem desfalecimentos, e, em particular, a singularidade criativa de mais dois Recursos a que, igualmente, sem desfalecimentos, nos cabe responder. O Despacho que os Recorrentes impugnam é de tal forma exaustivo na sua fundamentação que pouca margem argumentativa consente sem que se corra o risco da redundância. Escrever, como o faz a Mandatária do Arguido K, que ".. a fundamentação da decisão recorrida fere a sensibilidade jurídica do recorrente, uma vez que é uma não-decisão, um simulacro de concretização dos valores constitucionais.", denota um tal simulacro de sensibilidade jurídica que só como uma não-afirmação deve ser considerada. E afinal, de que recorrem os Arguidos ? De um Despacho em que se decidiu que o facto de os art°s. 346°, n° 1 e 347°, n° 1, do CPP, imporem que os esclarecimentos que hajam de ser prestados, pelo Assistente e pelas Partes Civis, ao M° P° e aos Mandatários dos restantes sujeitos processuais, só por meio do juiz-presidente possam ser formulados; e, por outro lado, que tais normas, no segmento em que enumeram os sujeitos processuais, são pelo Tribunal interpretadas como estabelecendo a ordem por que as instâncias se produzem, (...) que "... o arguido - bem como qualquer outro sujeito processual -, tenha sempre a possibilidade de, finalizados todos os pedidos de esclarecimento e não tendo sido ele arguido, ou outro sujeito processual, o último a pedir os esclarecimentos - o que, como dissemos. mesmo na ordem que o arguido defende pode suceder. no caso de mais do que um arguido -, o Tribunal possibilite que o arguido ( ou outro sujeito processual) formule o pedido de esclarecimento suplementar". No que ao primeiro aspecto diz respeito, é patente que, numa e noutra das Motivações, se desfoca, se não mesmo, se confunde. o que seja o sentido último dos princípios do contraditório e da imediação. Deixaremos, deliberadamente, de lado, quaisquer considerações acerca do também invocado princípio da presunção de inocência e da sua pretensa violação, reconhecendo que nos falece engenho e sapiência para, sequer, descortinarmos onde possa ele ter sido desconsiderado. Valendo-nos da clareza e "simplicidade" dos Mestres, retenha-se o ensinamento de Figueiredo Dias: "Não deve o juiz levar a cabo a sua actividade solitariamente, mas deve, para tanto, ouvir quer a acusação quer a defesa. É este, prima facie, o sentido e o conteúdo do princípio do contraditório, tradução moderna das velhas máximas audiatur et altera pars nemo potest inauditu damnari. – (destaque e sublinhado nossos) - cfr. F. Dias. Direito Processual Penal, in "Clássicos Jurídicos", Coimbra Editora. 2004.. p. 149. No que a este princípio diz respeito, e ao invés do que se afirma na Motivação do Arg° H, o n° 5, do art° 32°, da CRP, não consagra uma plenitude absoluta do correlativo exercício, de tal sorte que se devam ter por excluídas as compressões próprias que decorram de outros princípios aos quais, igualmente, seja reconhecida tutela constitucional. O próprio texto constitucional não faz qualquer referência à subordinação do julgamento a um contraditório pleno, interpretado este de forma absoluta e irrestrita. A consagração do comando constitucional na sistemática do Código, emerge, em primeira linha, do art° 327°, inserido no "Título II – Da audiência". "Capítulo 1 - Disposições gerais". Nele se dispõe, no que agora importa, que "os meios de prova apresentados no decurso da audiência são submetidos ao principio do contraditório, mesmo que tenham sido oficiosamente produzidos pelo tribunal." - cfr. n° 2. Como bem se salienta no Despacho recorrido, ... o Tribunal entende que o legislador, ao determinar no art° 346°, n° 1 e 347°. n° 1, que os pedidos de esclarecimentos fossem feitos através do presidente e pela ordem respectivamente enunciada nestes preceitos, quis fazê-lo tendo em atenção as características do estatuto processual do Assistente e do lesado ou responsável civil e da natureza da acção em que cada um se insere. "Como referimos, o assistente é um sujeito processual que tem interesse próprio na procedência da incriminação, é o sujeito cuja esfera foi alegadamente afectada e violada pela actuação do arguido. É a alegada vítima. com um estatuto especial, sujeito processual da relação que está subjacente à acção penal, tripartida entre "Estado - Delinquente - Vítima" e a quem a lei confere alguns poderes processuais autónomos dos do Ministério Público (cfr citado Ac. do TC n° 205/2001, concretamente declaração do voto do Dr. Cons. Luís Nunes de Almeida).". "Da conjugação desta condição de vítima, com o estatuto especial que lhe advém de ser sujeito processual (assistente) e que foi mencionado - não deixando de referir a tutela constitucional que resulta do art° 32°. n° 7, da CRP. -, resulta para este Tribunal que com o art° 347°, n° 1 o legislador quis estabelecer para a audiência de julgamento um regime diferente e próprio para o Assistente do estabelecido para as testemunhas.". "Embora não se possa falar de uma equiparação da tutela do estatuto processual do arguido com o do assistente, detentores de interesses o(...)s e contra(...)s - e com tutelas constitucionais distintas -, pode entender-se que a referida especial situação de "vítima"(constituída assistente) justifica a diferença de procedimento que a lei determina na audiência de julgamento para o assistente e para as testemunhas: o primeiro não presta juramento mas está adstrito ao dever de falar verdade, prestando declarações através do presidente do tribunal e a testemunha tem que prestar juramento e é inquirida directamente pelos defensores/mandatários dos sujeitos processuais. começando por ser inquirida por quem a indicou. "O assistente, à semelhança do que acontece com o arguido, tem um interesse determinado - e expressamente manifestado no processo - na decisão da causa: a condenação do arguido nos termos em que foi acusado ou pronunciado.". O interesse em mediar as instâncias dos diversos sujeitos processuais, no que ao Arguido, ao Assistente e às Partes Civis diz respeito,enquanto sujeitos interessados, prende-se com a vulnerabilidade própria que a estes é inerente de actores principais da peça processual em cena, cujos desempenhos melhor serão salvaguardados pela intervenção moderadora do tribunal, o qual, por força dessa intervenção. poderá prevenir, ou atenuar, eventuais excessos que o (natural) calor da instância directa sempre potenciaria. Tal regime, de resto e por isso mesmo, é extensível a outros intervenientes processuais igualmente sensíveis, como o sejam as testemunhas menores de 16 anos e as testemunhas declaradas especialmente vulneráveis (cfr. art° 349°, do CPP e art° 29°, c), da Lei n° 93/99, de 14 de Julho). A intervenção do tribunal não restringe o depoimento para além das restrições que à instância directa fossem impostas em caso de formulação de perguntas impertinentes ou inúteis, ou sempre que o fossem de forma a prejudicar a espontaneidade e a sinceridade dos depoimentos - v. art° 138°, n° 1, aplicável ex vi do art° 348°. n° 1, do CPP, De onde seja lícito concluir que a mediação do tribunal não só não compromete o exercício do contraditório como. ao invés, assegura que ele se possa plenamente exercer. Por fim, há-de ter-se em conta que o contraditório tão pouco fica prejudicado pelo facto de o Tribunal ter entendido que a ordem por que devem ser produzidas as instâncias é a que, literalmente. resulta, no caso do Assistente, do art° 346°, n° 1 e, no caso das Partes Civis, do art° 347°. n° 1, do CPP (como bom exemplo da boa interpretação que o Tribunal acolheu e a título meramente ilustrativo, anote-se a "coincidência" de os n°s 1, dos art°s. 346° e 347° apenas divergirem na ordem que, entre si, estabelecem quanto às instâncias dos advogados do Assistente e Das Partes Civis. No primeiro caso - declarações do Assistente -. será o mandatário deste a instar em último lugar ; no segundo - declarações às Partes Civis -, será o mandatário destas a fazê-lo.). Tal como já atrás deixámos sublinhado, o Tribunal, ao interpretar as normas em causa no sentido ex(...), não deixou de enriquecer o conteúdo dos correspondentes comandos com o reconhecimento do direito que a qualquer sujeito processual assiste de instar após qualquer outro, se e enquanto os esclarecimentos solicitados se justifiquem. Por outras palavras, o Tribunal, tomando como ordem primeira das instâncias a que resulta das normas, não exclui, antes, expressamente, admite, a possibilidade de serem formuladas as perguntas que as instâncias anteriores não esgotaram ou que por aquelas tenham sido sugeridas. Ao assim considerar, o Tribunal, e, a nosso ver, bem, não reconhece aos mandatários de qualquer dos sujeitos processuais, no que às instâncias ao Assistente e às Partes Civis diz respeito, um direito a instar em último lugar. O limite das instâncias será balizado pela pertinência/necessidade das perguntas ou esclarecimentos solicitados. independentemente de qual seja o sujeito processual a formular o derradeiro pedido. Daí que, seja no que concerne à mediação do Tribunal na formulação das perguntas, seja no que respeita à ordem por que os esclarecimentos sejam pedidos, sai incólume, da interpretação dos art°s. 346° e 347°, do CPP, o princípio do contraditório e a correspondente conformação ao n° 5, do art° 32°, da CRP. Tão pouco é beliscado pelo Despacho recorrido o princípio da imediação. Socorrendo-nos, ainda e sempre, da limpidez conceptual do Prof. F. Dias, o princípio da imediação consiste na "relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão." - cfr. ob. cit., p. 230. Assim entendido, o princípio afirma-se na concepção subjectiva ou formal da imediação, por contraponto à acepção objectiva, ou material. «No primeiro sentido, o princípio da imediação prescreve ao juiz como há-de utilizar os meios probatórios e refere-se à relação do juiz com os meios de prova ; no segundo, determina ao juiz que meios probatórios há-de utilizar e refere-se à relação dos meios de prova com a questão-da-prova» (Goldschmidt). Do conceito emerge, como nota saliente. o facto de, entre o Tribunal e o material probatório, se estabelecer uma relação directa de percepção. Para além disso, o Tribunal dispõe da prova, obviamente, não no sentido de a subtrair aos sujeitos processuais mas, ao invés, como meio de disciplinar a forma e o tempo da sua produção. Daí que, a percepção da prova, por parte dos intervenientes processuais, não podendo deixar de afirmar-se como elemento crucial das diversas posições e interesses em conflito, nem por isso caracterize o núcleo central do princípio da imediação, o qual se preenche por meio da relação privilegiada que haja de se estabelecer entre o Tribunal e a prova. Tão pouco, neste registo, se alcança como e em que medida, possam, as normas postas em crise, conflituar com a afirmação do princípio da imediação, seja na parte em que ambas impõem a intervenção activa do Juiz-presidente na formulação das instâncias, seja no segmento em foram interpretadas pelo Despacho recorrido relativamente à ordem por que as mesmas se devam produzir. Por todo o ex(...), entendendo-se que o referido Despacho fez uma correcta interpretação dos art°s. 346°, n° 1 e 347°. n° 1. do CPP e que tal interpretação não colide, antes acolhe, os princípios constitucionais enformadores emergentes dos n°s. 1,2 e 5, do art° 32°. da CRP, propugna-se pela improcedência dos Recursos dos Arguidos H e K, confirmando-se, integralmente, o Despacho recorrido (…).” Subidos os autos, pronunciou-se o Exmº Procurador-Geral (...) junto desta Relação, conforme parecer de fls. 100 do apenso O. Por acórdão desta 9.ª Secção foi determinado que o recurso subisse diferidamente, a final, nos próprios autos, com o que viesse a ser inter(...) da decisão que pusesse termo à causa (vd. fls. 112 a 116 do Apenso O). Cumpre, agora, apreciar e decidir. Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida, que foi do seguinte teor: "2 - 1. Na audiência de julgamento que teve lugar em 14/3/05, os arguidos vieram excepcionar, incidentalmente a fiscalização concreta da constitucionalidade dos artºs. 346°, nº 1 e 347°, nº 1, do C. P. Penal. Alegam, em síntese, que o art° 346°, nº 1, do C.P.P, ao impedir o interrogatório directo da defesa aos assistente que prestem declarações sobre o objecto do processo, restringe de forma inaceitável as garantias de defesa dos arguidos, uma vez que prejudica a espontaneidade e a imediação própria de um contra interrogatório, que assim fica afectado de forma grave. A defesa fica limitada a poder sugerir ao Tribunal a formulação de perguntas, o que pode ou não ser deferido e em qualquer caso prejudica a espontaneidade e imediação, que são garantias fundamentais do contra interrogatório. Alegam, também, que quanto à ordem pela qual devem ser pedidos os esclarecimentos, deverá ser a seguinte: o Tribunal, o Ministério Público, Mandatários dos assistentes e finalmente os Mandatários dos arguidos. Sustentam que só assim será garantido um processo equitativo, pois a defesa nunca teria o privilégio nem de começar, nem de terminar as instâncias, ficando como que emparedado entre duas faces da mesma acusação. O arguido K requereu, também, a declaração de inconstitucionalidade do art° 347° ,n°1, doC.P.P., com fundamento nos mesmos argumentos, bem como na violação do princípio da presunção de inocência, consagrados nos artº 32°, nº 2 e 5, da CRP. 1.1. Apenas o Tribunal Constitucional tem competência para declarar determinada norma como inconstitucional. Isto é, apenas o Tribunal Constitucional tem competência para proceder à declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral; no caso de fiscalização concreta da constitucionalidade a julgar a norma como inconstitucional; no caso de fiscalização preventiva da constitucionalidade a pronunciar-se pela inconstitucionalidade da norma; e a verificar da existência de e inconstitucionalidade por omissão (art° 280° nº 5, 279°, nº 1, 281°, 282° e 283°, nº 2). Cabe no entanto a este Tribunal, por força do dis(...) no art° 204 e 209°, da CRP, oficiosamente ou porque tal é suscitado num processo, exercer acção de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas que tenha que aplicar, apreciando a conformidade dessa norma com o texto constitucional e, caso conclua por um juízo de desconformidade da norma com a constituição, não aplicar a norma em causa. No dia a dia dos Tribunais e em particular nos tribunais com jurisdição penal, a aplicação das normas é feita, com frequência, com recurso a um juízo de conformidade à constituição. Aliás, isso tem sido expressamente enunciado em alguns dos despachos que já foram proferidos neste processo, sendo o critério que deve estar subjacente às decisões do Tribunal, o de que entre os vários sentidos que a norma em causa possa configurar, deve decidir por aquele que na avaliação e ponderação do Tribunal, se conforme com os princípios constitucionais. A questão suscitada pelos arguidos e tanto quanto resulta da jurisprudência do Tribunal constitucional que se encontra publicada e que foi consultada por este Tribunal, coloca-se de modo inédito. Tal, só por si, não permite inferir falta de relevância do requerido, pelo que o Tribunal tem que apreciar o requerido na dimensão em que a lei o permite. 2. Há, então, que apreciar o seguinte: o art°. 346°, nº 1., do C.P. Penal, ao dispor que "(...) podem ser tomadas declarações ao assistente, mediante perguntas formuladas por qualquer dos juízes e dos jurados ou pelo presidente a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados das partes civis ou do assistente (...)" e o art° 347°, n° 1, do C.P.Penal, ao dispor que" (...) ao responsável civil e ao lesado podem ser tomadas declarações, mediante perguntas formuladas por qualquer dos juízes ou dos jurados ou pelo presidente a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados do assistente ou das partes civis (...)", violam o art° 32°, nº 1 e 5, da C. R. Portuguesa? Dispõe o art° 32°, n° 1 e 5, da C.R.P., que " ... o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa (...)", sendo que o processo criminal tem "(...) estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório (...)". Quanto ao sentido do n° 1, deste normativo, é entendimento consensual na Doutrina e Jurisprudência Constitucional, que " ... a formula do nº 1 é, sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas elas são, em última análise, garantias de defesa. Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo criminal. «Todas as garantias de defesa» englobam indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para op arguido defender a sua posição e contrariar a acusação (...)" (Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3a edição revista, pag. 202). Seguindo também a posição assumida pelo Prof. Figueiredo Dias, " ( ... ) esta cláusula constitucional apresenta-se com um cunho «reassuntivo» e «residual» - relativamente às concretizações que já recebe nos números seguintes desse mesmo artigo -, e, na sua «abertura», acaba por revestir-se também ela, de um carácter acentuadamente «programático». Mas, na medida em que se proclama aí o próprio princípio da defesa, e portanto inevitavelmente se apela para um núcleo essencial deste, não deixa a mesma cláusula constitucional de conter « um eminente conteúdo normativo imediato a que se pode recorrer directamente, em casos limite, para inconstitucionalizar certos preceitos de lei ordinária ( ... ) ( cfr. Figueiredo Dias, " A Revisão Constitucional, O Processo penal e os Tribunais", pag. 51). Por sua vez, resulta da Jurisprudência do Tribunal Constitucional que "(...) a ideia geral que pode formular-se a este respeito - a ideia geral, em suma, por onde terão de aferir-se outras possíveis concretizações (judiciais) do princípio da defesa, para além das consignadas nos nºs. 2 e seguintes do artº 32° - será a de que o processo criminal há-de configurar-se como um due process of law, devendo considerar-se ilegítimas, por consequência, quer eventuais normas processuais, quer procedimentos aplicativos delas, que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido (...)" (in Ac. Trib. Constit. nº 275/99, DR. n° 163, II série, de 13/7/99, pag. 10.160; e, cfr., ainda, Ac. T.C. nº 337/86, DR. I série, de 30/12/86; Ac. T.C. nº 124/90, de 19/4/90, Acórdãos do Trib. Constitucional, 15° volume, 1990). Quanto ao sentido do n° 5, 2a parte, do art° 32°, da C.R.P. - que consagra o princípio do contraditório e no segmento que para a presente questão importa -, é o de que ao arguido devem ser garantidos os meios para uma efectiva influência no desenvolvimento do processo, tendo o direito de contraditar os testemunhos, depoimentos e demais elementos de prova (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., pag. 206). E tem sempre o direito de ser o último a intervir no processo, princípio consagrado no art° 361°, do C.P.P., o qual dispõe que findas as alegações, isto é finda a produção de prova e discutido o aspecto jurídico da causa, o presidente pergunta ao arguido se tem mais alguma coisa a alegar em sua defesa, ouvindo-o em tudo o que declarar. Só após este momento processual o presidente declara encerrada a audiência, retirando-se para deliberar. Assim, se é certo que num Estado de Direito o processo penal deve assegurar ao Estado a realização do ius puniende, tem paralelamente que garantir ao cidadão que este possa sempre defender-se de uma acusação deduzida contra si. Em consequência e como acima ficou dito, este núcleo do n" 1, do art° 32°, da CRP, levará a concluir como ilegítima a norma processual ou o procedimento derivado de tal norma, que encurte de forma inadmissível as possibilidades de defesa do arguido, num prejuízo insuportável e injustificável das garantias de defesa em processo penal. 2.1. Passemos, então, a analisar, se o comando legal consagrado no art° 346°, n° 1 e no art° 347°, n° 1, do C.P.P., concretamente de as perguntas a suscitar pelo defensor do arguido ao Assistente, ao responsável civil ou ao lesado, serem feitas através do presidente e na ordem indicada nos citados art°s. 346°, n° 1 e 347°, n° 1, consubstanciam uma violação do pleno exercício do direito de defesa do arguido e do direito ao contraditório. O sistema consagrado no art° 346°, nº 1 e no art° 347°, nº 1, do C.P.P., contempla duas figuras processuais: a do Assistente e a das partes civis. Começando pela figura do Assistente - e ao contrário do argumentado pelos arguidos -, é considerado actualmente um passo singular do ordenamento jurídico português, que nas palavras do Prof. Figueiredo Dias" (...) a generalidade das legislações europeias não teve ainda a coragem de dar, apesar do discurso piedoso (e ruidoso) que hoje se faz com insistência, nomeadamente ao nível de uma instância internacional como o Conselho da Europa (...) sobre a necessidade de protecção da vítima. (...) Para uma autêntica protecção da vítima, mais decisivo ainda que o auxílio «social» (...) é conferir-lhe voz autónoma logo ao nível do processo penal (...)" (cfr. Prof. Jorge Figueiredo Dias, "Jornadas de Direito Processual Penal, O Novo Código de Processo Penal, "Sobre os Sujeitos Processuais No Novo Código De Processo Penal", Centro de Estudos Judiciários, pag. 10). No mesmo sentido vai Augusto Silva Dias (in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, A tutela do Ofendido e a Posição do Assistente No Processo Penal Português, Pag. 55), ao afirmar que o Assistente é uma figura característica do direito penal português, que resulta da moderna concepção da vitimologia, com ampliação da participação processual da vítima como a melhor forma para conseguir a pacificação social. Diz mesmo que tal figura é louvada como uma particularidade avançada do Direito Processual Penal Português (ob. cit., pag 58) Face ao art° 69°, do C.P.P., os Assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, a cuja actividade subordinam a sua actuação, mas surgindo actualmente "... como um verdadeiro sujeito processual, com atribuições próprias, permitindo-lhe a lei, pelo menos em determinadas situações, agir sozinho ou até contra o Ministério Público (cfr., por exemplo, os art°s 69, nº 2, 287°, nº 1, alínea b), 401°, alínea b), do C.P.P.) (...)" (cfr. Ac TC nº 205/2001, DR II série, 29/6/2001, pag. 10.796, em citação que é feita do Ac. TC nº 690/98, DR II série, 8/3/99; e Damião da Cunha, estudo e revista a pag. 153, nota 1; e Prof. Jorge Figueiredo Dias, est. Cit., pag. 9) " ... Intervém no processo como colaborador do MP na promoção da aplicação da lei ao caso e legitimado em virtude da sua qualidade de ofendido ... (cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2a ed.Lx, 1994, pag. 301). É, por conseguinte, um sujeito processual titular do interesse que a lei penal quis proteger com a incriminação , figura que, como acima referimos, resulta da evolução do entendimento sobre o papel da vítima no processo criminal, a qual deixou de ser espectadora passiva do desenrolar da política criminal, sendo hoje certo que a relação clássica e bi-polar Estado-delinquente, tornou-se tripolar: Estado-Delinquente- Vítima (cfr. Declaração de voto do Sr. Juiz Conselheiro Luís Nunes de Almeida, Ac. TC n° 205/2001, DR II série, de 29/6/2001, pag. 10.797, com referência a estudo de Mário Raposo, in BMJ n° 366, Maio 1987, pag. 5). Quanto ao responsável civil e ao lesado e em consequência do princípio da adesão do Pedido de Indemnização Cível ao processo penal - que implica o conhecimento de uma acção de indemnização cível no âmbito do processo penal, mas que não perde a sua especificidade de acção civil até ao fim -, do ponto de vista material o lesado ou o responsável civil, mantêm-se como são: sujeitos da acção civil que adere ao processo penal - art°s. 71° a 77° e 82°,n° 3, do C.P.P . Têm, assim, um estatuto processual específico, sendo que por força do dis(...) no art° 76°, do C.P.P, só é obrigatória a sua representação por advogado no caso previsto no nº1, deste preceito. A estrutura desta acção não colide, assim, com os direitos do arguido enquanto sujeito processual na acção penal, como aliás resulta do art° 82°, n° 3, do C.P.P .. 3. Assim e começando pela primeira questão suscitada, o Tribunal entende que o legislador, ao determinar no art° 346°, n° 1 e 347°, nº 1, que os pedidos de esclarecimentos fossem feitos através do presidente e pela ordem respectivamente enunciada nestes preceitos, quis fazê-lo tendo em atenção as características do estatuto processual do Assistente e do lesado ou responsável civil e da natureza da acção em que cada um se insere. Como referimos, o assistente é um sujeito processual que tem interesse próprio na procedência da incriminação, é o sujeito cuja esfera foi alegadamente afectada e violada pela actuação do arguido. É a alegada vítima, com um estatuto especial, sujeito processual da relação que está subjacente à acção penal, tripartida entre "Estado- Delinquente - Vítima" e a quem a lei confere alguns poderes processuais autónomos dos do Ministério Público (cfr. citado Ac. do TC n° 205/2001, concretamente declaração do voto do Dr. Cons. Luís Nunes de Almeida). Da conjugação desta condição de vítima, com o estatuto especial que lhe advém de ser sujeito processual (assistente) e que foi mencionado - não deixando de referir a tutela constitucional que resulta do art° 32°, nº 7, da CRP. -, resulta para este Tribunal que com o art° 347°, n" 1, o legislador quis estabelecer para a audiência de julgamento um regime diferente e próprio para o Assistente do estabelecido para as testemunhas. Embora não se possa falar de uma equiparação da tutela do estatuto processual do arguido com o do assistente, detentores de interesses o(...)s e contra(...)s - e com tutelas constitucionais distintas -, pode entender-se que a referida especial situação de "vítima" (constituída assistente) justifica a diferença de procedimento que a lei determina na audiência de julgamento para o assistente e para as testemunhas: o primeiro não presta juramento mas está adstrito ao dever de falar verdade, prestando declarações através do presidente do tribunal e a testemunha tem que prestar juramento e é inquirida directamente pelos defensores/mandatários dos sujeitos processuais, começando por ser inquirida por quem a indicou. A testemunha não pode ter qualquer interesse na causa, daí o ser depoimento ser desinteressado e com ausência de interesse. O assistente, à semelhança do que acontece com o arguido, tem um interesse determinado - e expressamente manifestado no processo - na decisão da causa: a condenação do arguido nos termos em que foi acusado ou pronunciado. 3.1. Ora o art° 32°, da CRP, assegura que aos arguidos sejam dados todos os meios necessários e adequados para que possa defender a sua posição em juizo e exercer plenamente o contraditório, impedindo a existências de normas processuais ou de interpretações normativas, que se traduzam numa limitação inadmissível ou injustificada da sua possibilidade de defesa. É certo que em termos abstractos a mediação do Tribunal na formulação dos esclarecimentos pode retirar determinada animosidade, determinada expressão, impressão ou conteúdo emocional que um sujeito processual queira imprimir de certa forma ao interrogatório, Mas também há que considerar o seguinte. o Tribunal apenas pode permitir que sejam feitas perguntas sobre factos, objectivas, que não sejam conclusivas, que não induzam respostas ou raciocínio, que a eventual resposta não tenha como pressu(...) facto que previamente deva ser esclarecido (cfr. art°s. 124° e 138°, nº 1 e 2, (quanto à regra da inquirição das testemunhas) do C.P.P.) . Se é certo que tal garantia pode ser assegurada pela imediata intervenção do Tribunal, como sucede no caso das testemunhas - que são inquiridas por quem as indicou e sujeitas a contra interrogatório, nos termos definidos no art° 138°,do C. P. P.; fazendo o juiz a qualquer momento as perguntas ou intervenções que considere relevantes para a descoberta da verdade material, nos termos do artº 348°, nº 5, isto numa expressão do princípio da investigação conjugado com o princípio do acusatório -, também é certo que o assistente, face à lei processual penal e como já referimos, tem uma qualidade diferente das testemunhas e interesse na causa. O conhecimento que dá ao tribunal tem a ver com vivência de factos que o terão lesado, com um natural interesse do desfecho da causa e em determinado sentido, que é a condenação do arguido pela prática de um crime. Daí ser tratado de forma diferente pelo legislador. Acresce e em termos abstractos, que a invocada espontaneidade do depoimento do assistente pode ficar tão prejudicada com a mediação do tribunal, como com um contra interrogatório directo que viole as regras processuais. Para o Tribunal, a forma e ordem de interrogatório/tomada de declarações ou contra interrogatório, enunciada pelo legislador nos art°s 346°, nº 1 e 347°, nº 1, do C.P.P, não se deveu a uma mera arbitrariedade de enunciação por parte do legislador, mas correspondeu a uma determinação casuística, consoante o estatuto processual de cada um, o seu papel no processo e a natureza da acção em que cada um intervém. 3.2. Questão a determinar, então, é saber qual a função do art° 346° e 347º, do C.P.P. , na perspectiva constitucional dos direitos do arguido. Para este Tribunal é a de garantir o exercício do contraditório quanto às declarações que sejam prestadas pelo assistente ou pela parte civil. E será uma exigência da garantia desse direito ao contraditório, que o contra interrogatório ao assistente ou à parte civil seja feito de forma directa por parte do mandatário do arguido e o pedido de esclarecimentos seja feito, sempre, em ultimo lugar por parte do arguido? Afigura-se-nos, quer num caso quer noutro, que não. A garantia do exercício do contraditório exige que o arguido possa pedir esclarecimentos em relação a todos os factos em relação aos quais o assistente ou a parte civil possa falar ou tenha falado. Há controle por parte do arguido do exercício deste direito, uma vez que pode solicitar os pedidos de esclarecimento e o tribunal apenas os pode recusar fundamentado a recusa. Acresce, no entendimento do Tribunal, que a garantia de defesa dos arguidos e do exercício ao contraditório não fica prejudicada pela sequência estabelecida nos art°s 346°, n° 1 e 347°, n° 1, do C.P.P., desde que o arguido - bem como qualquer outro sujeito processual - tenha sempre a possibilidade de, finalizados todos os pedidos de esclarecimento e não tendo sido ele arguido ou outro sujeito processual, o último a pedir os esclarecimentos - o que mesmo na ordem que o arguido defende pode suceder, no caso de mais do que um arguidos -, o Tribunal possibilite que o arguido (ou outro sujeito processual) formule o pedido de esclarecimento suplementar. Esta a válvula de segurança que em qualquer circunstância o tribunal deve usar, quando isso for relevante para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa. O que o Tribunal irá sempre fazer, na sequência do que também já fez em relação às declarações que foram prestadas pelos arguidos: isto é, após os pedidos de esclarecimento pelo defensor de cada um dos arguidos, sempre que aos demais sujeitos processuais surgiu qualquer dúvida ou necessidade de pedido de esclarecimento suplementar, o Tribunal, sempre que o considerou fundamentado, procedeu ao pedido de esclarecimento e, quando não o fez, justificou porque não solicitava o pedido de esclarecimento. 3.3. Assim, entende o Tribunal que do ponto de vista da garantia do exercício de todos os direitos consagrados aos arguido pelo art° 32, n°s 1, 2 e 5, da CRP, é excessivo considerar que o regime constante dos art°s 346°, nº 1 e 347°, n° 1, traduz-se num procedimento que implica de forma desproporcionada e inadmissível a restrição de direitos do arguido. A garantia de defesa dos arguidos e do exercício ao contraditório não fica prejudicada pela sequência estabelecida nos art° 346°, n° 1 e 347°, nº 1, do C.P.P., desde que o arguido – bem como qualquer outro sujeito processual -, tenha sempre a possibilidade de, finalizados todos os pedidos de esclarecimento e não tendo sido ele arguido, ou outro sujeito processual, o último a pedir os esclarecimentos – o que, como dissemos, mesmo na ordem que o arguido defende pode suceder, no caso de mais do que um arguidos -, o Tribunal possibilite que o arguido (ou outro sujeito processual) formule o pedido de esclarecimento suplementar. 4. Face a todo o ex(...) e com o entendimento que acabámos de enunciar, este Tribunal considera que os artºs 346°, nº 1 e 347°, nº 1, do C.P.P. são compatíveis com o artº 32°, nº 1, 2 e 5, da CRP, bem como com os princípios fundamentais subjacentes a tal dispositivo, garantido em si - com a interpretação que é feita pelo Tribunal, quanto à possibilidade de finalizados todos os pedidos de esclarecimento e não tendo sido ele arguido, ou outro sujeito processual, o último a pedir os esclarecimentos, o Tribunal possibilite que o arguido (ou outro sujeito processual) formule o pedido de esclarecimento suplementar -, o pleno exercício do direito de defesa e do exercício do contraditório pelos arguidos. Em consequência e face ao juízo de conformidade de constitucional idade pelo qual conclui, o Tribunal irá proceder à tomada de declarações aos Assistentes e às partes civis, na forma e pela ordem expressamente enunciadas nos art° 346°, nº 1 e 347º, nº 1, do C. P. Penal, mas com a interpretação que enunciou no parágrafo anterior. Notifique." Conforme decorre, quer da decisão recorrida, quer das alegações formuladas pelo recorrente, o arguido K insurge-se fundamentalmente contra a interpretação perfilhada pelo Tribunal a quo, que considera inconstitucional, quanto à tomada de declarações aos assistentes e às partes civis em sede de audiência de discussão e julgamento, em conformidade com o regime plasmado nos arts. 346.º, n.º 1, e 347.º, n.º 1, ambos do CPP. Seguindo, aliás, de muito perto a letra destes preceitos legais, o Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, no despacho sub judice, decidiu que os esclarecimentos pedidos aos assistentes fossem feitos através do presidente e pela ordem enunciada nos n.ºs 1 dos citados arts. 346.º e 347.º do CPP. O recorrente K sufraga o entendimento que, ao impedir o interrogatório directo da defesa e ao impor uma sequência imperativa na formulação dos pedidos de esclarecimento aos assistentes e às partes civis (de acordo com o texto da lei, primeiramente o Ministério Público, de seguida o defensor e, por último, os advogados das partes civis e dos assistentes ou vice-versa, consoante os casos), o Tribunal recorrido restringiu de forma inaceitável as garantias de defesa dos arguidos, violando, muito em particular, os princípios constitucionais do contraditório e da presunção da inocência. Entende que fica limitado a sugerir ao presidente do tribunal de julgamento a formulação de perguntas aos assistentes ou às partes civis, o que pode vir ou não ser deferido e que, em qualquer caso, ficam comprometidas as garantias da espontaneidade e da imediação próprias de um contra-interrogatório. Se bem interiorizamos as suas palavras, de acordo com o entendimento perfilhado pelo recorrente K, a única interpretação compatível com a Lei Fundamental e com as garantias de defesa nela consagradas, a respeito dos arts. 346.º e 347.º do CPP, é aquela que faculta à defesa instar directamente o assistente ou as partes civis (portanto, sem intermediação do tribunal) e em que as instâncias obedecem à seguinte ordem, a saber, em primeiro lugar, o Ministério Público, de seguida, os advogados dos assistentes e da partes civis e, finalmente, os defensores. Antes de mais, importa aqui relembrar o texto dos normativos em causa. Estabelece o art. 346.º do CPP, sob a epígrafe “Declarações do assistente”, no seu n.º 1, que: "Podem ser tomadas declarações ao assistente, mediante perguntas formuladas por qualquer dos juízes e dos jurados ou pelo presidente a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados das partes civis ou do assistente." Por seu turno, dispõe o art. 347.º, sob a epígrafe “Declarações das partes civis”, no seu n.º 1, que: "Ao responsável civil e ao lesado podem ser tomadas declarações, mediante perguntas formuladas por qualquer dos juízes ou dos jurados ou pelo presidente a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados do assistente ou das partes civis." De acordo com a estrita literalidade destes normativos, não subsistem quaisquer dúvidas quanto ao acerto da decisão recorrida (e, por consequência, quanto à falta de mérito do recurso em apreço inter(...) pelo arguido K), já que os arts. 346.º e 347.º do CPP são bem claros e explícitos quanto aos formalismos a que devem obedecer, em sede de audiência de discussão e julgamento, a recolha de declarações aos assistentes e partes civis. Se a lei expressamente menciona que “podem ser tomadas declarações ao assistente, mediante perguntas formuladas por qualquer dos juízes e dos jurados ou pelo presidente”, deixa-se antever que a instância é conduzida pelo tribunal, que os assistentes são directamente questionados pelo(s) juiz(es) ou pelos jurados, que o Ministério Público ou o arguido só podem dirigir perguntas aos depoentes com a intermediação ou, melhor dizendo, por intermédio do tribunal. De igual modo, ao afirmar expressamente que “podem ser tomadas declarações ao assistente (…) a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados das partes civis ou do assistente”, o legislador inequivocamente quis indicar a ordem, a sequência a cumprir pelo tribunal quanto aos esclarecimentos dirigidos aos depoentes que venham a ser solicitados pelos restantes sujeitos processuais. Ao contrário do afirmado, não se mostra que a sequência indicada nestes preceitos corresponda a uma simples transposição das normas da sistematização do CPP quanto aos sujeitos do processo, que o legislador de uma forma mais ou menos arbitrária tenha decidido elencar, em primeiro lugar, o Ministério Público e, de um modo pouco ponderado, em último lugar, os advogados dos assistentes. Tanto não é assim que, quanto às declarações dos assistentes, os advogados das partes civis podem solicitar esclarecimentos, através do tribunal, em penúltimo lugar, ao passo que, quanto às declarações das partes civis são os advogados dos assistentes que têm a faculdade de intervir nessa posição, conforme decorre expressamente do dis(...) nos n.º s 1 dos arts. 346.º e 347.º do CPP. Ou seja, quer quanto aos assistentes, quer quanto às partes civis, o respectivo mandatário judicial tem intervenção em último lugar. Aqueles respondem inicialmente às questões imediatamente colocadas pelo(s) juiz(es) ou pelos jurado(s) e, de seguida, dão resposta aos esclarecimentos pretendidos pelos restantes sujeitos processuais (desde, obviamente, que considerados pertinentes pelo tribunal). O mandatário do depoente tem sempre a faculdade de intervir em último lugar, para melhor esclarecer, elucidar, ou até contrariar, algo do que foi anteriormente relatado no decurso da tomada de declarações em causa. O legislador indicou uma ordem de intervenção consoante o sujeito processual que nesse momento esteja a prestar declarações. Até para salvaguarda da posição processual do depoente, o legislador resguardou para último lugar a intervenção do seu advogado ou mandatário. Depois de ter respondido às questões imediatamente colocadas pelo tribunal ou sugeridas por qualquer outro dos sujeitos processuais, eventualmente conflituantes com a sua posição, é permitido ao depoente que esclareça mais alguns aspectos relevantes para a boa decisão da causa, mediante esclarecimentos, desta feita, solicitados pelo seu advogado. Tanto assim é quanto ao assistente e às partes civis, como quando são tomadas declarações ao arguido. De acordo com o n.º 1 do art. 345.º do CPP, “se o arguido se dispuser a prestar declarações, cada um dos juízes e dos jurados pode fazer-lhe perguntas sobre os factos que lhe sejam imputados”. Acrescenta o n.º 2 deste preceito que “O Ministério Público, o advogado do assistente e o defensor podem solicitar ao presidente que formule ao arguido perguntas, nos termos do número anterior”. Com a sequência prevista nestes dispositivos, parece que, de igual modo, o legislador não olvidou o estatuto constitucional e legal dos diversos sujeitos processuais. Reconheceu o Ministério Público enquanto titular da acção penal (cf. arts. 219.º, n.º 1, da CRP e 48.º do CPP), o assistente como seu colaborador (cf. art. 69.º do CPP) e as partes civis como eventuais intervenientes no processo que, em face do princípio da adesão, deduziram nos autos pedido de indemnização civil fundado na prática do crime (cf. art. 71.º do CPP). Particularmente, reconheceu o estatuto próprio do arguido, as suas garantias de defesa, o direito ao silêncio, o amplo contraditório (cf. maxime arts. 32.º da CRP e 61.º do CPP). Tudo isto para salientar que, conforme decorre do dis(...) nos arts. 345.º a 347.º do CPP, o legislador ordenou de forma ponderada a sequência das intervenções dos sujeitos processuais no momento da tomada de declarações ao arguido, ao assistente ou às partes civis, em sede da audiência de julgamento. E fê-lo, em nossa perspectiva, em conformidade com o estatuto processual dos diversos sujeitos processuais, resguardando sempre para último lugar a intervenção do advogado ou mandatário do depoente pelas razões acima expostas. Como todos os preceitos legais, também estes normativos não podem, nem devem, ser interpretados e aplicados isoladamente, de forma desajustada ou indiferente perante todo o restante regime processual. Muito a este propósito, o n.º 1 do art. 343.º do CPP reconhece ao arguido o direito de prestar declarações em qualquer momento da audiência. Também o n.º 1 do art. 340.º determina a produção de todos os meios de prova necessários para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa. Em processo penal, assegura-se amplamente o princípio do contraditório, sobretudo enquanto garantia de defesa, ao mesmo tempo em que a justiça material prevalece perante critérios meramente formais. Isto significa, aliás, tal como expressamente consignado no despacho impugnado, que a interpretação que se fez a propósito do dis(...) nos arts. 346.º e 347.º do CPP, sufragando a posição assumida pela 1.ª instância, não exclui eventuais pedidos de esclarecimentos adicionais ou suplementares, desde que os mesmos se mostrem necessários para se atingirem as finalidades do processo, a descoberta da verdade e a decisão da causa dentro de padrões de justiça material. Conforme se deixou claramente expresso no despacho recorrido “a garantia de defesa dos arguidos e do exercício ao contraditório não fica prejudicada pela sequência estabelecida nos arts. 346.º, n.º 1 e 347.º, n.º 1, do CPP, desde que (…) o Tribunal possibilite que o arguido (ou outro sujeito processual) formule pedido de esclarecimento suplementar”. Seja como for, a opção do legislador processual penal é discutível, como tudo na vida, bem como são sempre admissíveis, ao nível do direito a constituir, outras soluções, particularmente as aqui sufragadas pelo recorrente K. Mas, de acordo com as regras de interpretação plasmadas no n.º 3 do art. 9.º do CC, “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”. Muito a este respeito, doutrina Jeschek (citado no acórdão do STJ de fixação de jurisprudência n.º 11/2008, in Diário República, I.ª série, n.º 239, de 11-12-2008): “(…) o sentido da lei, qualquer que ele seja, só pode expressar-se através de palavras. Estas são a matéria básica da interpretação e, por isso, deve ser sempre respeitado o sentido literal possível como limite extremo da interpretação." Em suma: a posição interpretativa preconizada pelo Tribunal a quo observa a letra e o espírito dos arts. 346.º e 347.º do CPP e respeita uma adequada conjugação com os restantes normativos atinentes às matérias em apreciação, pelo que não assiste qualquer razão ao arguido K quando, no recurso inter(...), afirma que a interpretação por si propugnada é “a única adequada e harmoniosa com o sistema jurídico penal adjectivo”. Desta feita, importará, agora, verificar da sua conformidade com a Lei Fundamental, particularmente na vertente da salvaguarda das garantias de defesa. Dispõe o art. 204.º que "nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o dis(...) na Constituição ou os princípios nela consignados". Nestes termos, podem, quer o Tribunal a quo quer o Tribunal ad quem, oficiosamente ou a solicitação de algum sujeito processual, exercer acção de fiscalização concreta da constitucionalidade das normas que tenham que aplicar, apreciando a sua conformidade com o texto constitucional e, caso concluam por um juízo de desconformidade, rejeitar a aplicação das mesmas. Todavia, apenas o Tribunal Constitucional tem competência para proceder à declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral e, para que um recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade de uma norma seja apreciado pelo Tribunal Constitucional, é necessário que o seu objecto seja uma norma aplicada como ratio decidendi pela decisão recorrida (vide, neste sentido, entre outros os Acórdãos do TC n.ºs 337/2005, de 22 de Junho de 2005, e 495/2007, de 8 de Outubro de 2007, ambos consultáveis in www.jusnet.pt). In casu, a questão da (in)constitucionalidade enquadra-se no âmbito da referida fiscalização concreta, por ter sido suscitada neste processo, pese embora o recorrente K não indique de modo detalhado em que acto, em que precisa tomada de declarações aos assistentes, se sentiu prejudicado ou veio a ser prejudicado nas suas garantias de defesa, pela interpretação seguida quanto aos arts. 346.º e 347.º do CPP, quer quanto ao interrogatório directo dos depoentes, quer também no tocante à sequência das intervenções ordenada pelo Tribunal. De facto, o recorrente K não explicita que concretas perguntas pretendeu ou pretendia formular directamente aos assistentes, de que forma foi prejudicado ou de que modo se sentiu prejudicado por esses esclarecimentos terem sido intermediados pelo Tribunal recorrido, que ganhos deixou de obter para a sua defesa por o seu mandatário não ter sido o último a pedir esclarecimentos ao assistente ou ao demandante civil que então estava a depor. Ao invés, escudou-se numa alegação genérica de violação das garantias de defesa, mas sem concretizar como se produziu a pretensa violação dos invocados princípios constitucionais do contraditório e da presunção de inocência, bem como de que modo a defesa ficou prejudicada em face da interpretação perfilhada pelo Tribunal recorrido. Prosseguindo: a propósito do que se deve entender por interpretação em conformidade com a Constituição, expendeu Rui Manuel Pacheco Duarte no estudo publicado in www.verbojuridico.com/doutrina/penal.html: “Por imposição deste postulado de hermenêutica, de entre as várias interpretações possíveis segundo os demais critérios sempre obtém preferência aquela que melhor concorde com os princípios da Constituição. Com efeito, a unidade do ordenamento impõe que cada preceito legal seja considerado não só no contexto do respectivo diploma, como sob o influxo dos princípios e preceitos constitucionais (por ex. Vieira de Andrade, "Os Direitos Fundamentais...", 1998, pág. 255, Karl Larenz, "Metodologia da Ciência do Direito", Lisboa, 1989, p. 410 e ss; (…)). Nesta linha de pensamento e diferentemente dos citados autores de séculos passados, o Sr. Dr. Bacelar de Vasconcelos salienta a nova "consideração do estatuto do juiz-interprete face à revisão do sentido da sua vinculação à lei, aliás, herança do absolutismo, que, de ora avante, significará também na Europa continental uma vinculação à Constituição. Fundamentalmente, abandona-se a crença na auto-suficiência de um processo lógico-dedutivo que reduzia a interpretação judicial a uma exegese do texto, para destacar a importância decisiva da "aplicatio" pela qual "todo o acto de interpretação constitui um aditamento de sentido," tornando-se o legislador, apenas, «o pólo geral de imputação da criação normativa do direito» " - citações de José Lamego e Castanheira Neves, respectivamente - ("A crise da justiça em Portugal", Gradiva, 1998, pág. 21). Para fundamentar a alegada inconstitucionalidade da interpretação sufragada pela decisão recorrida, o recorrente K veio invocar a violação dos princípios constitucionais consagrados pelo art. 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da CRP. Dispõe este preceito, sob a epígrafe “Garantias de processo criminal”, que "O processo criminal assegurará todas as garantias de defesa, incluindo o recurso." (n.° 1), que "Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa" (n.° 2) e que "O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório." (n.° 5). Conforme decorre da sua leitura, este dispositivo da Lei Fundamental contém, em termos mais gerais, o princípio das garantias de defesa, e, de um modo mais particular, os princípios do contraditório, da presunção da inocência, da imediação da prova e da verdade material, ínsitos na ideia de Estado de direito democrático (cf. também art. 2.º da Constituição). Como ensina Jorge Miranda, in Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, pág. 354, são garantias de defesa «todos os meios que em concreto se mostrem necessários para que o arguido se faça ouvir pelo juiz sobre as provas e razões que apresenta em ordem a defender-se da acusação que lhe é movida», sendo que «os direitos a uma ampla e efectiva defesa não respeitam apenas à decisão final, mas a todas as que impliquem restrições de direitos ou possam condicionar a solução definitiva do caso». Em idêntico sentido pronunciam-se Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Volume I, 4.ª edição revista, 2007, Coimbra Editora, pág. 516), quando afirmam: "Em «todas as garantias de defesa» engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este preceito pode, portanto, ser fonte autónoma de garantias de defesa. Em suma, a «orientação para a defesa» do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível." A propósito do princípio do contraditório e das garantias de defesa, no Ac. do TC n.° 350/2006, de 31-05 (in www.tribunalconstitucional.pt), expendeu-se: “A norma do n.º 1 do artigo 32.º, enquanto «cláusula geral» que permita identificar outras possíveis concretizações judiciais do princípio da defesa não referenciadas no preceito, não pode deixar de configurar o processo criminal como um due process of law que considere ilegítimas quer normas processuais quer procedimentos decorrentes das mesmas que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido (neste sentido, Acórdãos n.ºs 337/86 e 61/88, in Acórdãos do Tribunal Constitucional (…)”. “Por outro lado, o princípio do contraditório, expressamente referido no n.º 5 do artigo 32.º da Constituição, deve subordinar não só a audiência de julgamento como também todos os actos instrutórios que a lei determinar. O processo penal de um Estado de direito deve realizar primordialmente dois objectivos essenciais: por um lado, permitir que o Estado realize o direito de punir e, por outro lado, permitir que, na realização de tal finalidade, sejam concedidas aos cidadãos as garantias indispensáveis para os proteger contra eventuais abusos de tal poder de punir. Para concretizar tais fins, as garantias de defesa impõem a observância de princípios processuais criminais constitucionalizados, como é o caso do princípio do acusatório (um dos princípios estruturantes da constituição processual penal), do princípio do contraditório, do princípio da igualdade de armas, dos princípios da oralidade e da imediação. No que respeita ao princípio do contraditório aqui em questão, escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira (ibidem, p. 206): «Relativamente aos destinatários ele significa: a) dever e direito de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão; b) direito de audiência de todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afectados pela decisão, de forma a garantir-lhes uma influência executiva no desenvolvimento do processo; c) em particular, o direito de o arguido intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, o que impõe designadamente que ele seja o último a intervir no processo (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 54/87 e 154/87)». Os mesmos autores referem que «quanto à sua extensão processual, o princípio abrange todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição, e em especial a audiência de discussão e julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar, devendo estes ser seleccionados sobretudo de acordo com o princípio da máxima garantia de defesa do arguido» (ibidem). O princípio traduz-se, assim, na estruturação da audiência e dos outros actos instrutórios que a lei determinará, como uma discussão entre a acusação e a defesa, em que se procura também realizar a igualdade de armas entre os sujeitos do processo, cada um apresentando os seus argumentos e as suas provas, submetendo uns e outros ao controlo das razões e das provas apresentadas pelos outros sujeitos, assim participando activamente na formação da decisão que vier a ser tomada pelo juiz.”. Ainda a este respeito, no Ac. do STJ de 10-02-2005, Proc. n.° 04P4740 (in www.jusnet.pt), defendeu-se que: «O princípio do contraditório constitui elemento fundamental do direito a um processo equitativo no âmbito de um processo penal, devendo existir "igualdade de armas" entre a acusação e a defesa.» (AcTEDH de 25/09/2001, Caso P.G. e J. H. c. Reino Unido) «(1) As garantias do § 3 do artigo 6º da Convenção constituem a concretização, ou aspectos particulares, do direito ao processo equitativo consagrado no § 1 do artigo 6º. (2) No âmbito de um processo penal, o processo equitativo impõe e exige que se assegurem os princípios do contraditório e da igualdade de armas entre acusação e defesa. (3) Um julgamento contraditório implica, em processo penal, que à acusação e defesa seja dado conhecimento e oportunidade de resposta ao promovido pela parte contrária e à prova por ela produzida; decorre do artigo 6º § 1 para as autoridades responsáveis pela acusação o dever de fornecer à defesa toda a prova de que dispõem, quer deponha a favor ou contra o arguido.» (AcTEDH de 16/02/2000, Caso Fitt c. Reino Unido). Em geral o princípio do contraditório consiste na regra segundo a qual, sendo formulado um pedido ou o(...) um argumento a certa pessoa, deve-se dar a esta a oportunidade de se pronunciar sobre o pedido ou o argumento, não se decidindo antes de dar tal oportunidade (Castro Mendes, Dir. Processual Civil, 1980, 1.°-223); o processo reveste a forma de um debate ou discussão entre as partes (audiatur ei altera pars), muito embora se admita que as deficiências e transvios ou abusos da actividade dos pleiteantes sejam supridos ou corrigidos pela iniciativa e autoridade do juiz. Cada uma das partes é chamada a deduzir as suas razões (de facto e de direito), a oferecer as suas provas; a controlar as provas do adversário e a discretear sobre o valor e resultado de umas e outras (A. Anselmo de Castro, Dir. Processual Civil Declaratório, ed., 1981, 1.°-44). E, no domínio do processo penal, significa que o juiz não deve levar a cabo a sua actividade solitariamente, mas deve para tanto ouvir quer a acusação quer a defesa (Figueiredo Dias, Dir. Proc. Penal, I.°-149).” Igualmente, no Ac. do STJ de 07-11-2007, Proc. n.° 3630/07 (in www.jusnet.pt), decidiu-se, ainda a respeito do princípio do contraditório, que: "O princípio, que deve ter conteúdo e sentido autónomos, impõe que seja dada a oportunidade a todo o participante processual de ser ouvido e de expressar as suas razões antes de ser tomada qualquer decisão que o afecte, nomeadamente que seja dada ao acusado a efectiva possibilidade de contrariar e contestar as posições da acusação.” “A densificação do princípio deve, igualmente, relevante contributo à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que tem considerado o contraditório um elemento integrante do princípio do processo equitativo, inscrito como direito fundamental no art. 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Na construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central nos direitos do acusado (apreciação contraditória de uma acusação dirigida contra um indivíduo), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve ser proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial (…) Os elementos de prova devem, pois, em princípio, ser produzidos perante o arguido em audiência pública, em vista de um debate contraditório. Todavia, este princípio, comportando excepções, aceita-as sob reserva da protecção dos direitos de defesa, que impõem que ao arguido seja concedida uma oportunidade adequada e suficiente para contraditar uma testemunha de acusação posteriormente ao depoimento; sendo apenas os direitos da defesa limitados de maneira incompatível com o respeito do princípio sempre que uma condenação se baseie, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior, seja durante a audiência. São estes os princípios elaborados pela jurisprudência de Tribunal Europeu dos Direitos do Homem a respeito do art. 6º, §§ 1º e 2º, al. d), da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (cfr., v.g. acórdãos CRAXI c. Itália, de 5 de Dezembro de 2002, e S. N. c. Suécia, de 2 de Julho de 2002). Em certas circunstâncias, com efeito, pode ser necessário que as autoridades judiciárias recorram a declarações prestadas na fase do inquérito ou da instrução, nomeadamente quando a impossibilidade de reiterar as declarações é devida a factos objectivos, como sejam a ausência ou a morte, ou por circunstâncias específicas de vulnerabilidade da pessoa (crimes sexuais); se o arguido tiver oportunidade, adequada e suficiente, de contraditar tais declarações posteriormente, a sua utilização não afecta, apenas por si mesma o contraditório, cujo respeito não exige, em termos absolutos, o interrogatório directo em cross-examination. O princípio do contraditório tem, assim, uma vocação instrumental da realização do direito de defesa e do princípio da igualdade de armas: numa perspectiva processual, significa que não pode ser tomada qualquer decisão que afecte o arguido sem que lhe seja dada a oportunidade para se pronunciar; no plano da igualdade de armas na administração das provas, significa que qualquer um dos sujeitos processuais interessados, nomeadamente o arguido, deve ter a possibilidade de convocar e interrogar as testemunhas nas mesmas condições que ao outros sujeitos processuais (a "parte" adversa)." In casu, como primeira nota, importa desde logo assinalar que a interpretação das normas dos arts. 346.º e 347.º do CPP, perfilhada pelo Tribunal recorrido, não introduz um desequilíbrio dos pratos da balança a favor da acusação, os arguidos não se apresentaram, por tal motivo, em audiência, inferiorizados perante o Ministério Público, não se propôs o interrogatório directo ou indirecto dos assistentes ou das partes civis consoante o sujeito processual que solicitou os esclarecimentos, a ordem seguida para o interrogatório desses depoentes não estabeleceu tratamento de vantagem para uns em detrimento dos outros. O Tribunal a quo sufragou uma interpretação igualitária, na nossa perspectiva, inteiramente cumpridora do princípio da igualdade de armas. Não se afigura que a orientação interpretativa seguida pelo Tribunal a quo tenha prejudicado as garantias de defesa dos arguidos, que tenha estabelecido condições de vantagem para a acusação no interrogatório dos assistentes e das partes civis. Quer para o Ministério Público, quer para os arguidos, afirmou-se que o interrogatório desses depoentes seria sempre intermediado pelo tribunal. Inclusive, a defesa dos arguidos foi sequenciada (aliás, de acordo com o expresso texto da lei) depois do Ministério Público quanto aos esclarecimentos que viessem a ser solicitados por estes sujeitos processuais, com a inequívoca vantagem de poder rebater tudo aquilo que anteriormente foi transmitido em audiência. Acresce que, esta interpretação permitiu o amplo debate das declarações prestadas na 1.ª instância pelos assistentes e pelas partes civis. A existência de normativos ordenadores destes actos processuais não implica forçosa violação do princípio do contraditório. Esta garantia constitucional da defesa, de amplo debate de todos os factos favoráveis e desfavoráveis aos arguidos e de aberto confronto com os restantes sujeitos processuais, não é sinónima de anarquia na condução da audiência, nem da sua submissão única e exclusiva aos interesses dos arguidos. In casu, o Tribunal a quo não impediu o amplo debate, a livre discussão das declarações prestadas pelos assistentes e pelas partes civis, nem tão pouco impossibilitou o confronto entre as teses da acusação e da defesa, ao interpretar do modo que o fez os comandos ínsitos nos arts. 346.º e 347.º do CPP. O interrogatório intermediado pelo tribunal e a ordem estabelecida quanto aos pedidos de esclarecimento não impossibilitou que todas as questões pertinentes para a descoberta da verdade fossem colocadas aos assistentes e às partes civis, que toda a matéria relevante para a boa decisão da causa fosse averiguada em audiência ou que tenham sido postergadas as garantias de defesa, tanto mais que no despacho recorrido demonstrou-se abertura para eventuais diligências suplementares. De acordo com o regime adjectivo vigente, o julgador limitou-se a estabelecer o modo como os assistentes e as partes civis deviam ser instados em sede de audiência e a que sequência deviam obedecer os pedidos de esclarecimento. Mas não impossibilitou o debate de quaisquer factos, matérias ou questões com relevância substantiva, nem inviabilizou que os depoentes fossem contraditados pela versão dos factos apresentada pelos arguidos, particularmente pelo recorrente K, com prejuízo para a sua posição processual. Aliás, nem o próprio recorrente explica, de modo concretizado, como foi prejudicado pela interpretação seguida pelo despacho recorrido. Acresce que, até para salvaguarda das garantias de defesa e do exercício do contraditório, o Tribunal a quo, no despacho recorrido, é bem claro ao admitir esclarecimento adicionais ou suplementares desde que justificados. Peremptoriamente afirmou-se que seria admissível o arguido solicitar esclarecimentos suplementares após a intervenção do último sujeito processual, de acordo com a sequência prevista pelos arts. 346.º e 347.º do CPP. O princípio da presunção da inocência, consagrado como vimos pelo n.º 2 do art. 32.º da Lei Fundamental, significa que os cidadãos não podem ser considerados responsáveis pela prática de ilícitos criminais, presumindo-se inocentes, até prova em contrário, até ao momento em que uma sentença, com trânsito em julgado, demonstre a sua culpabilidade. Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira (in ob. cit., pág. 518), este princípio desdobra-se, designadamente na proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido, na preferência pela sentença de absolvição contra o arquivamento do processo, na exclusão de fixação de culpa em despachos de arquivamento, na proibição da antecipação de verdadeiras penas a título de medidas cautelares, na proibição de efeitos automáticos da instauração de procedimento criminal, na natureza excepcional e de última instância das medidas de coacção e no princípio in dubio pro reo. Ao interpretar os mencionados preceitos do CPP, não se afigura que o despacho recorrido formule, ainda que implicitamente, um juízo de culpabilidade relativamente ao recorrente K, que a interpretação normativa acolhida pelo Tribunal a quo comporte uma violação, ainda que muito ténue, do princípio da presunção da inocência, em alguma das suas valências. Mais ainda. Conforme assinala o Digno Magistrado do Ministério Público nas alegações de recurso, não se descortina de que forma o cumprimento do formalismo previsto nos arts. 346.º e 347.º do CPP possa colidir com o princípio da presunção da inocência, seja no tocante ao interrogatório dos assistentes e das partes civis por intermédio do tribunal, seja no tocante à ordem seguida quanto aos pedidos de esclarecimento solicitados pelos sujeitos processuais. Não parece que a orientação adoptada pelo Tribunal a quo comporte um juízo de culpabilidade dirigido ao ora recorrente K, que o Tribunal a quo tenha interpretado, do modo já expresso, os arts. 346.º e 347.º do CPP por considerar antecipadamente aquele arguido como autor dos crimes que lhe eram imputados pela acusação, que o Tribunal a quo tenha deixado de considerar o recorrente K como presumido inocente por apenas permitir perguntas por seu intermédio ou por o mandatário do assistente ser o último a intervir. Em suma: não se compreende a conexão estabelecida pelo recorrente K no sentido de que ocorre violação desse princípio constitucional por o Tribunal recorrido (aliás em conformidade com a letra e o espírito dos arts. 346.º e 347.º do CPP) ter determinado o interrogatório por seu intermédio e por ter concedido aos mandatários dos depoentes a última palavra para solicitarem esclarecimentos. Seguramente não será por o arguido (ou o seu mandatário) interrogar em último ou primeiro lugar o assistente ou as partes civis, que ele passa a ser considerado como presumido culpado (ou inocente) dos crimes em apreço. Nada aponta que a interpretação em causa tenha subjacente a formulação de um juízo antecipado quanto à culpabilidade dos arguidos, particularmente do recorrente K, que o Colectivo tenha assumido a posição em referência na medida em que os considerou como autores dos crimes que lhes são imputados. Nem tão pouco o recorrente K o explícita de modo fundamentado, indicando como considera que este princípio constitucional foi violado. O Tribunal a quo procurou simplesmente ordenar os actos da audiência de acordo com o regime expressamente previsto nos arts. 346.º e 347.º do CPP. Já a imediação, enquanto princípio que o recorrente K considera ter sido violado pela interpretação adoptada dos arts. 346.º e 347.º do CPP, traduz-se no contacto pessoal entre o juiz e os diversos meios de prova, podendo também ser definida como “a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá que ter como base da sua decisão” (cf. Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, Coimbra, 1984, Volume I, pág. 232, citado, entre outros, nos Acs. do Tribunal da Relação de Coimbra de 15-10-2008, Proc. n.º 400/06.2GCAVR.C1, e 18-02-2009, Proc. n.º 1019/05.0GCVIS.C1, in www.dgsi.pt). Conforme se consignou no citado Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 11/2008, a propósito do princípio da imediação: "Fazendo apelo às palavras de Perfecto Andrés Ibáñez, «o princípio da imediação relaciona-se com o carácter imediato, quer dizer, não mediado ou livre de interferências, da relação de todos os sujeitos processuais entre si e com o objecto da causa, que propicia tal modo de conceber o processo. Assim, para Calamandrei, pondo a ênfase na dimensão da interactividade, “imediação significa presença simultânea dos vários sujeitos do processo no mesmo lugar, e, por conseguinte, possibilidade de fontes de prova aonde os autores farão maior empenho”. Frente ao processo penal do antigo regime, no qual o processo se efectuava sobre um material que o tribunal recebia por escrito e, portanto, já elaborado em outra sede (morto, no dizer de Pagano), se afirma agora a superioridade do juízo presencial, em tempo real, que, em expressivos termos do mesmo autor, oferece a vantagem de que “na viva voz falam também o rosto, os olhos, a cor, o movimento, o tom de voz, o modo de dizer, e tantas outras pequenas circunstâncias, que modificam desenvolvem o sentido das palavras e fornecem tantos indícios a favor ou contra do afirmado com elas”. Portanto, imediação como ‘observação imediata’ (Florian); como forma de ‘encurtar as distâncias’ (Carnelutti) ou de ‘integral e directa percepção, por parte do juiz, da prova (Silva Melero)’.» Na verdade, na prova há coisas que, necessariamente, se têm de apreciar directamente e há outras que não necessitam de ser apreciadas da mesma maneira pois estão numa relação mais directa com a apreciação e valoração de verosimilhança. É assim que importa distinguir dois planos essenciais e igualmente importantes: primeiro distinguir entre a prova como fonte de conhecimento e o meio de prova ou, dito por outra forma, entre a credibilidade daquele que prova e a prova como realidade jurídica propriamente dita.” Do que se observa, o importante, para que seja respeitado o princípio da imediação, é que quer o tribunal, quer os demais sujeitos processuais, neles se incluindo os mandatários dos arguidos, estejam na sala de audiências face-a-face com os assistentes para que se não perca a relação directa de percepção da prova e a proximidade com a produção da prova prestada pelos assistentes. Não se vendo, no facto de ser o tribunal (juízes e/ou jurados) a colocar as questões ao assistente e de ser também através da mediação do juiz presidente que são pedidos os esclarecimentos pretendidos pelos demais sujeitos processuais, neles se incluindo os defensores dos arguidos, que haja perda de espontaneidade, muito menos que fique comprometido o princípio da imediação. Com efeito, se o assistente for espontâneo no seu depoimento tanto o é se interrogado directamente pelo mandatário do arguido como se por intermédio do juiz presidente. Tal como, se o assistente não estiver disponível ou predis(...) para ser espontâneo e fidedigno tanto fará que seja directamente contra-interrogado pelo defensor do arguido como se respondendo a este por intermédio do tribunal. De facto, a interpretação que mereceu acolhimento por parte do despacho recorrido em nada conflitua com este princípio. Em nada impediu a recolha directa e pessoal, pelo julgador, de todas as provas produzidas em audiência de julgamento. Também não determinou que o Tribunal a quo viesse a julgar os factos de acordo com prova produzida ou examinada fora da audiência. Também não proibiu os restantes sujeitos processuais de estarem presentes e de fazerem a sua própria avaliação da prova aí produzida publicamente, particularmente das declarações prestadas pelos assistentes ou pelas partes civis. Não se descortina, pois, qualquer ofensa do princípio da imediação. Para finalizar, importa, de novo, salientar que a solução consagrada pelo legislador nos arts. 346.º, n.º 1, e 347.º, n.º 1, ambos do CPP, foi devidamente ponderada e conscientemente tomada dentro da lógica do sistema, e que, por outro lado, a disciplina jurídica fixada nestes dispositivos não viola qualquer um dos princípios do processo criminal ínsitos no art. 32.º da Lei Fundamental, mormente os princípios constitucionais do contraditório pleno ou da presunção de inocência. Também que o Tribunal a quo mais não fez do que interpretar esses dispositivos de acordo com a letra e com o espírito da lei, ao decidir que os esclarecimentos pedidos aos assistentes fossem feitos através do juiz presidente e pela ordem enunciada nos n.ºs 1 dos citados arts. 346.º e 347.º do CPP. Tudo visto, afigura-se-nos não haver qualquer violação do pleno exercício dos direitos de defesa, nem padecerem de inconstitucionalidade, à luz do dis(...) nos n.°s 1, 2 e 5 do art. 32.° da Constituição e dos princípios fundamentais subjacentes a este dispositivo, as normas do processo penal em causa, na interpretação que o Tribunal a quo faz dos arts. 346.º, n.º 1, e 347.°, n.º 1, do CPP. Em face do ex(...), julga-se improcedente o recurso inter(...) pelo arguido K e, consequentemente, confirma-se integralmente a decisão recorrida de fls. 28916 a 28927 (ponto 2.). 8. Recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 30465 a 30466, proferido em 2/5/2005, que negou a possibilidade de acareação entre si e o assistente AH No decurso da audiência de julgamento (sessão ocorrida no dia 2 de Maio de 2005) e na sequência da tomada de declarações ao assistente AH, o arguido A requereu que fosse realizada acareação entre si e este assistente “quanto à questão concreta do transporte do AH para (…), transporte ao seu lado no veículo conduzido”, por parecer haver discrepância entre o que o arguido confessou e aquilo que o assistente refere. O Tribunal, após audição do Ministério Público e do assistente AH, proferiu despacho a indeferir a requerida acareação (cfr. fs. 30465 a 30466 dos autos). Inconformado com aquele despacho, dele recorreu o arguido A, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1 – O assistente é (…). Tem muita experiência de vida e de rua, infelizmente, como resulta do apenso DT; 2 – O recorrente confessou os factos da pronúncia, na generalidade, havendo agora que na especialidade – ou seja em audiência – ir burilando para se alcançar a verdade; 3 – Para nós a confissão integral e sem reservas é quanto ao crime e esse o arguido recorrente confessou; 4 – O assistente confirmou em audiência as declarações confessórias do recorrente em relação a três situações, individualizadas e concretas, em que ocorreu penetração anal; 5 – Opõe-os apenas uma situação em que o assistente diz ter o recorrente aberto o fecho das calças na zona dos genitais do assistente e o recorrente nega; 6 – Ora, e mal com o devido respeito, o Mº Pº acusou o recorrente contando os crimes como se fosse legal contar as acções, uma a uma – do género: uma piscadela de olhos, um crime; mão na perna outro crime e assim sucessivamente – sem ter tido em atenção que estamos perante um único crime continuado em relação a cada pessoa vítima; 7 – Por isso, é fundamental para a descoberta da verdade, para a justiça, para a defesa do recorrente, que o tribunal permita o exercício do contraditório; 8 – No caso concreto impunha-se a acareação entre o assistente e o recorrente; 9 – Sendo ainda certo que o recorrente é uma pessoa que deu tudo ao Mº Pº, tudo mesmo, ajudou o Mº Pº como ninguém, mas com verdade; 10 – E, ouvido o primeiro assistente, que foi honesto negando o resto da pronúncia, estamos em condições de estar contentes porque o arguido falou verdade, não inventou para se safar, nem teve a mão do advogado a por-lhe as palavras na boca; 11 – E essa é uma vitória moral para aqueles que pensavam que o recorrente ia ser trucidado, que eles do alto do seu estatuto de vedetas sociais e ou políticas tinham a força e condão de esmagar o recorrente, “um coitadito, boçal”; 12 – A acareação é útil e necessária para a descoberta da verdade; 13 – Porque nada na lei de protecção de testemunhas impede a acareação, e os arguidos têm o direito ao contraditório, por outras palavras, os assistentes não podem pensar que não têm de enfrentar os arguidos e podem dizer o que querem sem serem contraditados; 14 – No caso concreto verificam-se os requisitos do artº 146º do CPP e artº 32º nº 1 e 5 da CRP, bem como o artº 327º do CPP. 15 – A decisão recorrida é ilegal por violar as normas dos artºs 146º, 327º, 340º nº 1, todos do CPP, artº 32º nº 1 e 5 da CRP e artº 6º nº i da CEDH e ainda as normas da lei de protecção de testemunhas, pelo que é nula, nulidade do artº 120º nº 2, al. d) do CPP 16 – A norma do artº 146º, na interpretação dada pela decisão recorrida sofre do vício de inconstitucionalidade material, por ofensa das normas dos artºs 32º nº 1 e 5 da CRP, não devendo por isso ser apliacada pelo tribunal recorrido. 17 – O tribunal “a quo” interpretou as normas indicadas nas conclusões 15 e 16, de forma a que não devesse proceder à acareação requerida bem como a norma do artº 146º no sentido indicado na conclusão 16, e deveria tê-las interpretado no sentido o(...). NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência julgada ilegal a decisão e inconstitucional a norma do artº 146º na interpretação perfilhada pelo tribunal “a quo” FAZENDO-SE ASSIM A BOA E COSTUMADA JUSTIÇA” O Magistrado do MP na 1ª instância apresentou resposta ao recurso, concluindo que “o despacho recorrido não violou nenhuma norma legal, pelo que deverá ser mantido, fazendo-se a esperada JUSTIÇA!”. O recurso foi admitido por despacho de fls. 31852 dos autos. As questões suscitadas pelo recorrente são: - Nulidade do despacho recorrido, por violação das normas dos arts. 146.º, 327.º, 340.º, n.º 1, todos do CPP, art. 32.º, n.ºs 1 e 5, da CRP, art. 6.º da CEDH, e ainda das normas da Lei de Protecção de Testemunhas. - Inconstitucionalidade da norma do art. 146.º do CPP, na interpretação dada pela decisão recorrida, que sofre do vício de inconstitucionalidade material, por ofensa da norma do art. 32.º, n.ºs 1 e 5, da CRP. O despacho objecto do presente recurso tem o seguinte teor: “De acordo com o dis(...) no artº 146º, do C.P.Penal, é admissível a acareação entre o arguido e o assistente sempre que houver contradição entre as suas declarações e a diligência se afigurar útil à descoberta da verdade. O Ilustre Mandatário do arguido requereu a acareação quanto a um aspecto concreto, que tem a ver com uma deslocação a uma (…), em que o assistente AH terá ido com o arguido no mesmo veículo (cfr. fls. 20.966 ponto 9.6). Face às declarações que o arguido prestou no dia 21 de Dezembro de 2004 e 17 de Janeiro de 2005 e às declarações hoje prestadas pelo assistente, há divergência entre o afirmado por um e entre o que é afirmado por outro quanto a este aspecto em concreto: transporte pelo arguido A do assistente AH para uma (…), percurso no qual terá existido uma situação ou facto relacionados com abuso de natureza sexual. No entanto, para que o Tribunal determine a diligência deve fazer um juízo de previsibilidade de que a diligência possa resultar útil para o esclarecimento da verdade. Neste momento o Tribunal não vê que a confrontação entre o arguido e o assistente, em termos concretos, seja essencial para a descoberta da verdade. O Tribunal não diz que tal não possa ocorrer, só que neste momento, face à globalidade das declarações prestadas pelo arguido e pelo assistente, não considera que, como referimos, tal seja em termos concretos útil e necessário para a descoberta da verdade. Assim, indefere-se a requerida acareação.” Apreciando. Invoca o recorrente, no fundo, e em primeira linha, a nulidade do despacho recorrido, por violação das normas dos arts. 146.º, 327.º, 340.º, n.º 1, todos do CPP, art. 32.º, n.ºs 1 e 5, da CRP, art. 6.º da CEDH, e ainda das normas da lei de protecção de testemunhas, invocando, num segundo momento, a alegada inconstitucionalidade da interpretação feita pelo tribunal relativamente ao mencionado dispositivo legal do art. 146.º do CPP. Desde logo, cumpre referir que no acórdão final proferido nos autos se deu como provado (quanto ao que neste particular releva) que “Em dia indeterminado do mês de Julho ou Agosto de 1998, o menor, então com 12 anos, acompanhou o arguido A numa deslocação a uma (…). Durante a viagem o AH adormeceu, altura em que o arguido desapertou-lhe as calças e, por baixo das cuecas, começou a mexer-lhe no pénis, tendo o AH acordado neste momento” (ponto 152.3 da matéria de facto provada). Consequentemente, o concreto ponto da matéria de facto objecto do pedido de acareação formulado pelo arguido A veio a ser considerado como demonstrado no acórdão recorrido, tendo-se dado credibilidade à versão dos factos apresentada pelo assistente AH, como resulta especificamente do consignado a fls. 1760 e ss. dos autos, na fundamentação da matéria de facto do acórdão, nos seguintes termos: “Passando aos factos que o Tribunal deu como “provado” ou como “não provado”, em relação aos actos de natureza sexual, as declarações do assistente são globalmente compatíveis e de alguma forma coincidentes com as declarações do arguido A. É certo que, como acima referimos, o arguido num segundo momento veio dizer que não tinha levado o assistente para uma (...) do (…), pois só o tinha levado para outras (...). No entanto, avaliando globalmente o sentido das declarações do arguido, o Tribunal interpretou que o arguido estava a referir-se aos factos que o despacho de Pronúncia lhe imputa numa estação de serviço, a caminho de (…). E esses factos, como vamos referir, também não foram relatados pelo arguido da primeira vez que falou ao Tribunal, nem foram relatados pelo assistente, pelo que a negação do arguido, quanto aos factos e transporte para (…), para o Tribunal cingiu-se a estes episódios. Acresce que como resulta de fls. 436, do Apenso BQ, 3º volume (apenso relativo aos Boletins de itinerário apresentados pelo arguido A), em Julho de 1998 existe um registo do arguido de deslocação ao “(…)” e em Julho/Agosto de 1999 e Julho/Agosto de 2000, existem referência de deslocação ao (…), mas (…) não está expressamente indicado (cfr. fls. 448/9 e 461/2 do Apenso BQ, 3º volume) . No entanto, não é que a menção “…” não possa englobar uma deslocação ao (…). Mas, no caso concreto, com a ausência de referência do assistente as factos nos anos de 1999 e 2000 e aos factos numa “…”, em “…”, tal análise não se mostra necessária. Da globalidade das declarações do assistente o Tribunal concluiu que este localiza os factos ocorrido no “caminho para uma (…)” - a (…) do (…) e foi no primeiro Verão após ter entrado para a AX, 1998 (cfr., quanto ao Transporte, como dissemos o de fls. 436, do Apenso BQ, 3º volume, apenso relativo aos Boletins de itinerário apresentados pelo arguido A), em Julho de 1998 existe um registo do arguido de deslocação ao “(…)” -, como os “primeiros” e os actos em si confirma-os no mesmo sentido do arguido. O arguido A diz que os factos com este assistente não sucederam “logo” que ele entrou, mas mais tarde, o BE teve uma primeira (…) no (…) em 16/07/98 a 14/08/98 ( cfr. Apenso DX, fls. 49), tendo o Tribunal concluído a prática dos factos como ocorrida no caminho para esta (…). Das declarações do arguido e das declarações do Assistente, o Tribunal deu ainda como provados três situações, das que o despacho de Pronuncia refere durante o ano lectivo 2000/2001, no BF. O arguido A admitiu os actos de penetração oral e anal no BF, embora não os tenha localizado no tempo. O assistente começou por localizar estes factos no BF quando passou do 5º para o 6º ano, depois rectifica que foi no 5º ano, pois associa com uma situação em que o arguido lhe reteve a mochila e o assistente voltou atrás para apanhar a mochila, pois tinha trabalhos de grupo. Conjugando estas declarações com os elementos que se encontram a fls. 165 e 166, do Apenso DT, o Tribunal concluiu que os factos passaram-se, pelo menos, no ano de 2000. O assistente descreveu que os factos no BF foram junto ao refeitório - entraram junto à porta secundária do refeitório, a porta por onde saiam do refeitório, tendo explicado que havia uma sala contígua ao refeitório onde estava a máquina da loiça -. Da primeira vez, o arguido fechou a porta e começou a mexer-lhe nos órgãos genitais, tendo-lhe despertado a braguilha. Tentou evitar mas o arguido desapertou a sua própria braguilha, tirou o “órgão genital” para fora e penetrou com o seu pénis no ânus do declarante. Disse que doeu-lhe, ficou com dores no ânus e deitou sangue. Não disse a alguém pois não contava a ninguém. Ficou com raiva do arguido. Após este acontecimento não viu o arguido A no BF durante uns dias, umas duas semanas. Decorrido este tempo voltou a aparecer no (...) e a encontrar-se com o declarante no corredor do refeitório. Levou-o para a sala das máquinas de lavar a loiça, que está ao pé do refeitório, baixou-lhe as calças e o arguido penetrou com o seu pénis no ânus do declarante. Declarou que lhe doeu e chorou. Voltou a suceder uma terceira vez, no mesmo local junto ao refeitório, tendo o arguido penetrado com o seu pénis no ânus do menor. Na 1a e 2ª vez o arguido deu-lhe 3.000$00 e na terceira vez 4.000$00, dinheiro com que comprou bonecos para os irmão, uma luvas e meias para si. O arguido A disse-lhe para não dizer o que se tinha passado. Foi um depoimento em que, na parte em que descreveu nos factos ocorridos no BF, concretamente quando descrevia os actos sexuais em si, demonstrou dificuldade em contá-los ao Tribunal. Fez pausas nestes momentos, foi perceptível uma respiração mais funda, que o Tribunal interpretou como dificuldade em continuar. Foi um depoimento que avaliámos e valorámos como verídico. No entanto das declarações do assistente não resulta que estes factos tenham ocorrido três vezes por mês, durante o ano lectivo de 2000/01, também não resulta das declarações do arguido, pelo que nesta parte o Tribunal deu os factos como não provados (cfr. ponto 59.3. dos factos não provados)”. (...) que o Tribunal considerou como demonstrada essa concreta versão dos factos apresentada em julgamento pelo assistente AH, o recurso que o arguido apresentou sobre o despacho que lhe indeferiu a acareação por si requerida continua a ter interesse e/ou utilidade. No entanto, desde já se deixa realçado, que de acordo com a fundamentação da matéria de facto considerada como demonstrada, a prova desse ponto da matéria de facto não o foi em detrimento da versão que sobre os mesmos factos se considerou que assumiu o arguido A. Como se deixou transcrito acima, o tribunal entendeu que o arguido num segundo momento veio dizer que não tinha levado o assistente para uma (...) no (…), mas sim para outras (...), sendo que assim se referia aos factos que o despacho de pronúncia lhe imputava como tendo sido praticados numa estação de serviço, a caminho de (…) (os quais não foram confirmados nem pelo arguido nem pelo assistente). Quanto aos factos ocorridos a caminho de uma (…), mas no trajecto, dentro do próprio veículo em que se deslocavam – e não numa estação de serviço –, o Tribunal entendeu que não houve negação dos factos por parte do arguido. É certo que esta apreciação ou leitura das declarações do arguido A não foi assim feita logo na própria sessão da audiência de julgamento em que foi requerida a acareação, mas em sede de acórdão final. Ao fazer o seu enfoque, pretendemos apenas realçar que, a final, a diligência de acareação, mesmo que tivesse sido realizada, não conduziria a resultado distinto daquele que foi alcançado com a ponderação global da prova produzida, pois aí já é feita uma análise conjugada das declarações do arguido e assistente com os demais elementos de prova produzidos, e a aparente contradição entre aquelas declarações – tomada como certa em audiência de julgamento – é afastada. De todo o modo, uma vez que estamos a tratar de recurso interlocutório, e que na data em que o recurso foi apresentado, foi-o sobre despacho que expressamente refere terem ocorrido discrepâncias entre as declarações prestadas pelo arguido e as prestadas pelo assistente, não deixaremos de apreciar a questão objecto do mesmo. Importa, portanto, verificar, em primeiro lugar, se o despacho recorrido, independentemente do que se deixou expresso no acórdão final quanto a este concreto ponto da matéria de facto, padece da nulidade que o arguido lhe assaca – nulidade do art. 120.º, n.º 2, al. d), do CPP. De acordo com o mencionado normativo, constitui nulidade dependente de arguição, entre outras, a insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. E, segundo a al. a) do nº 3, a referida nulidade deve ser arguida, tratando-se de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado. (...) isto (e como já salienta o Ministério Público na sua resposta ao presente recurso), tendo o despacho sindicado – que indeferiu a acareação requerida pelo arguido e admitindo-se como mera hipótese que esta se tratava de diligência essencial à descoberta da verdade – sido proferido em audiência de julgamento, na qual estavam presentes o arguido A e o seu Ilustre Mandatário, a existir a nulidade invocada (nulidade sanável) a mesma estaria sanada, por não ter sido arguida até ao final da sessão da audiência de julgamento em que alegadamente foi cometida. Sem prejuízo disso, dado que o arguido veio a interpor recurso daquele mesmo despacho, sempre se pronunciará o tribunal relativamente aos fundamentos da sua pretensão, de modo a afastar qualquer suspeição de ilegalidade de procedimentos nos presentes autos, mormente ao nível da produção da prova. A acareação é um meio de prova típico, portanto, um instrumento processual que permite a produção de um elemento de prova. Subjacente à acareação está o princípio geral da demanda da verdade material. “Acarear” é pôr em presença física, é contrapor, confrontrar, pôr face a face, frente a frente (Código de Processo Penal, Comentários e Notas Práticas, Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, Coimbra Editora, págs. 390 e 391). Segundo Germano Marques da Silva “a acareação é um meio de prova que consiste no confronto entre as pessoas que prestaram declarações contraditórias, tendo por finalidade esclarecer depoimentos divergentes sobre o mesmo facto (…). A acareação pode permitir esclarecer as divergências dos depoimentos por permitir refrescar a memória sobre as circunstâncias dos factos e frequentemente porque permite compreender a causa das próprias divergências, facilitando, por isso, a sua melhor valoração. A acareação pode ter lugar entre quaisquer pessoas que prestem declarações no processo, com excepção dos peritos: entre co-arguidos, entre o arguido e o assistente, entre testemunhas ou entre estas e o arguido ou o assistente e entre todos estes e as partes civis e destas entre si (art. 146.º, n.ºs 1 e 2). Os pressu(...)s da admissibilidade deste meio de prova são a existência de declarações anteriores contraditórias das pessoas chamadas a acarear-se e que a diligência se afigure útil à descoberta da verdade” (Curso de Processo Penal, Vol. II, Editorial Verbo, 1999, pág. 173). Os pressu(...)s deste meio de prova são, portanto, os seguintes: a) a existência de contradições nas declarações ou depoimentos trazidos ao processo; e b) que seja de prever que da sua realização possa surtir o esclarecimento da verdade. Dependendo a admissibilidade da acareação da verificação dos referidos pressu(...)s, trata-se de um meio de prova subsidiário, ao qual se poderá recorrer, em função da forma como foi produzida a prova principal, neste caso declarações do arguido e de um dos assistentes. No caso vertente, o próprio tribunal, como se disse já, no despacho recorrido, assume que se verifica o primeiro dos pressu(...)s de que dependeria a realização da acareação – a existência de contradição entre, pelo menos, umas das declarações prestadas pelo arguido A e as declarações prestadas pelo assistente AH (ainda que no acórdão final, analisada a globalidade da prova, tenha constatado que essa divergência não respeitava a este concreto ponto da matéria de facto). O cerne da divergência entre o entendimento do arguido e o explanado pelo Tribunal a quo reporta-se ao segundo pressu(...) de que depende o deferimento deste meio de prova: que seja de prever que da sua realização possa surtir o esclarecimento da verdade. Com efeito, o Tribunal entendeu que, não obstante verificar-se a referida contradição de declarações, naquele momento em que foi requerida a acareação, não se vislumbrava que a confrontação entre o arguido e o assistente fosse essencial para a descoberta da verdade. Ressalvou-se que isso poderia acontecer, mas que no momento, face à globalidade das declarações prestadas pelo arguido e pelo assistente, não se considerava que aquele meio de prova subsidiário fosse em concreto útil e necessário para a descoberta da verdade. O arguido esgrime, em defesa da sua posição, que tinha o direito de ser acareado com o assistente, porque a lei o permite. Ora, a circunstância de a lei consagrar esse meio de prova, permitindo-o, não pode ser entendida como um direito absoluto à sua realização, instituindo um meio de prova subsidiário como se fosse principal. Ler o preceito como o arguido o lê traduzir-se-ia numa leitura do normativo do art. 146.º do CPP em que se escamoteia o dis(...) no segundo segmento do seu n.º 1. Equivaleria a dizer-se que sempre que existissem contradições entre as declarações – quanto ao que aqui releva – de arguidos e assistentes se realizaria acareação, o que manifestamente não tem acolhimento na letra da lei processual penal, que exige, para além disso, que a diligência de prova se afigure útil à descoberta da verdade. Não é, pois, de deferimento automático o requerimento de acareação somente porque se considera verificado o pressu(...) da existência de contradições. O mesmo há-de sempre ficar dependente de uma ponderação, por parte do tribunal, sobre a utilidade do meio de prova em causa e da sua necessidade para a descoberta da verdade. Daí a subsidiariedade do meio de prova. Razão pela qual, o próprio requerente deveria especificar porque motivo concreto entende que a acareação que almeja ver realizada é útil e necessária para a descoberta da verdade. O arguido invoca genericamente que a acareação interessa à sua defesa, mas de modo algum especifica porque motivo ela poderia ser, em concreto, útil à descoberta da verdade, designadamente tendo presente as concretas declarações do arguido e as concretas declarações do assistente. É certo que o arguido refere que o mesmo confessou os factos na generalidade, mas não tem de ser obrigado a aceitar alguns factos que não correspondem à verdade, que só se alcançaria através do contraditório, sendo que «quanto mais amplo ele for melhor se alcança o que aconteceu». O que o arguido defende é, pois, que perante a existência de uma contradição de declarações lhe deveria ser permitida a realização da acareação, como forma ampla de exercer o contraditório. E efectivamente, o que aqui está em causa é a forma como deve ser entendido e em concreto exercido esse princípio fundamental no nosso direito processual penal – o princípio do contraditório. A perspectiva trazida pelo arguido a este recurso é a de que se trata de um direito absoluto e intocável, que ao arguido deve ser assegurado em toda a sua plenitude e sem limitações. Daí a invocação de preterição também do dis(...) no art. 327.º do CPP, preceito que na nossa lei processual penal consagra expressamente o princípio do contraditório. A questão de fundo centra-se, portanto, no plano abrangente dos direitos de defesa do arguido, que molda o nosso processo penal. No seu art. 32.º, a CRP estabelece, entre os direitos, liberdades e garantias pessoais, as Garantias do processo criminal. Nos termos do preceituado nesse artigo, o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, sendo que o mesmo processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório. Seguindo de perto o que se expõe no Ac. do Tribunal Constitucional nº 387/2005, a propósito do princípio do acusatório, dizem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que ele «é um dos princípios estruturantes da constituição processual penal» e «uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial», significando essencialmente que «só se pode ser julgado por um crime precedendo acusação por esse crime por parte de um órgão distinto do julgador, sendo a acusação condição e limite do julgamento» (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed. Revista, Coimbra Editora, 1993, nota IX ao artigo 32º, pág. 205). Relativamente ao princípio do contraditório, assinalam os mesmos comentadores que ele implica o dever «de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão», bem como o «direito de audiência de todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afectados pela decisão», e ainda o «direito do arguido de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo», sendo certo que «o princípio abrange todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição» (ibidem, nota X ao artigo 32º, pág. 206). Os princípios do acusatório e do contraditório, enquanto princípios estruturantes do processo penal, movem-se necessariamente no quadro de um sistema processual que tem também de assegurar todas as garantias de defesa, ou seja, no quadro de um processo penal justo e equitativo. Escreveu-se no Ac. do TC n.º 172/92, acerca das garantias de defesa do arguido: “O processo penal há-de, assim, configurar-se em termos de ser “um due processo of law”, devendo considerar-se ilegítimas, por consequência, quer eventuais normas processuais, quer procedimentos aplicativos delas, que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido (cfr. acórdão deste Tribunal nº 61/88, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 375, p. 138; cfr. também o já citado acórdão nº 393/89). (…) O princípio do contraditório, encarado do ponto de vista do arguido, pretende, antes do mais, realizar, o seu direito de defesa. “A máxima audiatur et altera pars ou ne absens damanetur” é, justamente, no dizer de Eduardo Correia, a expressão, nesse sentido, do princípio do contraditório (Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 110º, p. 99). Dizendo com a Comissão Constitucional, no seu Parecer nº 18/81, o sentido essencial do princípio do contraditório está, de uma forma mais geral, em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão (mesmo só interlocutória) deve aí ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade, ao sujeito processual contra o qual é dirigida, de a discutir, de a contestar e de a valorar (Pareceres da Comissão Constitucional, volume 16º, p. 147).” A descoberta da verdade material em processo penal há-de, portanto, necessariamente compaginar-se com aquelas garantias de defesa do arguido. E assim se reconhecerá, como corolário do princípio do acusatório, o da vinculação temática do tribunal e da correlação entre a acusação (e a pronúncia) e a sentença. Como realça Jorge Figueiredo Dias, a concepção típica de um processo acusatório implica a estrita ligação do juiz pela acusação e pela defesa, em sede de determinação do objecto do processo como em sede de poderes de cognição e dos limites da decisão. E, acerca da vinculação temática do tribunal, como efeito consubstanciador dos princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consumpção do objecto do processo penal, defende este autor que deve afirmar-se que o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal e a extensão do caso julgado (in “Direito Processual Penal”, Coimbra, 1974, pág. 45). Centrando-nos no princípio do contraditório, que tem, como víamos, consagração a nível constitucional, no art. 32.º da CRP, vejamos as palavras de Jorge Miranda e Rui Medeiros, segundo os quais o preceito deve ser interpretado à luz do denominado processo equitativo, na designação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos ou do due process of law, na fórmula da jurisprudência norte-americana, envolvendo como aspectos fundamentais a consideração do arguido, como sujeito processual a quem devem ser asseguradas todas as possibilidades de contrariar a acusação, a independência e imparcialidade do juiz ou tribunal e a lealdade do procedimento. Os direitos a uma ampla e efectiva defesa não respeitam apenas à decisão final, mas a todas as que impliquem restrições de direitos ou possam condicionar a solução definitiva do caso (in “Constituição Portuguesa Anotada”, Tomo I, 2ª edição, revista, actualizada e ampliada, Coimbra Editora). Na mesma obra, e mais concretamente a propósito do princípio do contraditório, deixam aqueles autores ex(...) que o princípio do contraditório traduz-se na estruturação da audiência de julgamento e dos actos instrutórios que a lei determinar em termos de um debate ou discussão entre a acusação e a defesa. A acusação e a defesa são chamadas a deduzir as suas razões de facto e de direito, a oferecer provas, a controlar as provas contra si oferecidas e a discretear sobre o valor e o resultado probatórios de uma e outras. O princípio assim entendido tem carácter essencialmente formal, mas mesmo neste sentido tem grande importância. Desde logo porque, estando a audiência de julgamento subordinada ao princípio do contraditório, as provas hão-de ser produzidas ou discutidas em audiência, ficando excluída a possibilidade de condenação com base em elementos probatórios que não tenham sido discutidos em audiência, ainda que constantes dos autos. O Tribunal Constitucional tem-se pronunciado no sentido de que o conteúdo essencial do princípio do contraditório se traduz em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão – ainda que interlocutória – deve ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar, de a valorar, em si mesma e quanto aos seus fundamentos, em condições de plena igualdade e liberdade com os restantes sujeitos processuais, designadamente o Ministério Público. Será, contudo, que o princípio do contraditório, tal como acima é entendido, não admitirá limitações? Do que já se deixou ex(...) resulta, como primeira evidência, que nunca o princípio do contraditório ou, mais amplamente, os direitos de defesa do arguido são entendidos como ilimitados, antes se fazendo menção a possíveis limitações, ainda que sujeitas ao crivo do controlo da sua admissibilidade. Esta querela foi por diversas vezes – ainda que na maioria dos casos referindo-se a diferentes situações concretas – debatida ao longo do presente processo, o que aconteceu, por exemplo, quando se requereu a aplicação da Lei de Protecção de Testemunhas, diploma intrinsecamente ligado a esta discussão que temos vindo a abordar. Com efeito, a diversidade e complexidade da criminalidade nas sociedades contemporâneas veio a tornar cada vez mais frequentes os fenómenos da criminalidade organizada e transnacional, relativamente à qual se verifica uma imprescindibilidade da colaboração das testemunhas para a descoberta da verdade e para a punição deste tipo de crimes e seus autores. Atento o grau de sofisticação/organização dos grupos envolvidos e a dificuldade de penetração nesses meios, tem-se revelado essencial a prestação de informações por parte de pessoas com alguma ligação àqueles. Concomitantemente, começou a equacionar-se a necessidade de protecção desse tipo de pessoas/testemunhas. E o que se disse em relação às organizações criminosas vale, por maioria de razão, para determinados círculos sociais fechados – étnicos, religiosos, familiares ou institucionais –, sendo particularmente importante assegurar a previsão de medidas destinadas à protecção de pessoas especialmente vulneráveis – com particular destaque para os menores, mas abrangendo também idosos, mulheres, estrangeiros e outros. O recurso à prova testemunhal surge assim equacionado como meio probatório fundamental no combate a determinada criminalidade e gerador de eficácia processual, daí resultando a necessidade de encorajar tais pessoas à colaboração com a justiça, assegurando-lhes, em troca, a devida protecção e a eliminação de eventuais pressões a que possam estar sujeitas. Como refere o memorando elaborado pelo Committe of Experts on Intimidation of Witnesses and The Rights of Defense (PC-WI), “o reforço da confiança na justiça criminal, ameaçada pela criminalidade organizada e pela intimidação subjacente àquela como estratégia para se eximir à justiça, passa pela elaboração e aplicação nos diversos Estados-Membros de um quadro de medidas destinadas a incentivar as pessoas a colaborar com a justiça.” Ganha, pois, uma importância fulcral, essencialmente como estratégia pró-activa de combate ao crime, o estabelecimento de uma panóplia de princípios gerais destinados a assegurar a protecção do direito a testemunhar de forma livre e sem pressões ou intimidações, bem como a protecção da própria vida e segurança de tais pessoas (quer sejam vítimas, testemunhas ou outros intervenientes), antes, durante e após a conclusão do processo. Trata-se mesmo de um imperativo constitucional que deriva do preceituado nos arts. 9.º e 27.º da CRP, sendo que o primeiro estipula, na sua al. b), como tarefa fundamental do Estado garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático, enquanto que o segundo consagra como direito fundamental o direito à liberdade e segurança. Porém, não nos podemos alhear do reverso do problema. Numa perspectiva abrangente, convirá relembrar que a importância conferida à prova testemunhal não poderá ser alcançada à custa dos direitos que assistem ao arguido. Significa isto que o combate à criminalidade não poderá passar pela previsão de um regime jurídico de protecção de testemunhas que constitua uma compressão incomportável dos direitos fundamentais dos arguidos. E isto porque constitui um ponto essencial que sejam asseguradas todas as garantias de defesa por forma a apelidar-se o processo como um processo equitativo. Não podendo o arguido ser desligado da sua inalienável dimensão de pessoa humana, cabe-lhe um direito de defesa na sua amplitude máxima. Tendo por base esse contexto, vários países estabeleceram programas nacionais de protecção de testemunhas, os quais, na sua maioria, entroncam no pioneiro e famoso modelo americano – o Federal Witness Protection Program, criado na década de 60 e implementado já na década de 70. A nível nacional, a Recomendação nº R (97) do Comité de Ministros de 10 de Setembro de 1997, do Conselho da Europa, sobre Protecção de Testemunhas, constitui o arquétipo desta matéria, estabelecendo uma série de princípios norteadores e uma diversidade de medidas a ser acolhida pelos diversos Estados. Essa Recomendação recebeu acolhimento através da Lei nº 93/99, de 14 de Julho (Lei de Protecção de Testemunhas). A Lei tem o seu âmbito de aplicação vocacionado para a luta contra o crime organizado, mas também em casos relativos a crimes graves – art. 16.º, al. a) – ou em situações de especial vulnerabilidade das testemunhas – arts. 3.º, n.º 1, e 26.º e ss.. Quanto àquilo que nos interessa, independentemente da verificação de perigo para a vida, integridade física ou psíquica, liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado (art. 1.º, n.º 3) e da aplicação de outras medidas previstas no diploma, a Lei de Protecção de Testemunhas estabelece uma série de medidas, administrativas (assistência psicológica, social, jurídica, etc.), e em última instância judiciais (relativas às condições de prestação de declarações), para testemunhas especialmente vulneráveis. O conceito de testemunhas especialmente vulneráveis é definido, de forma abrangente, pelo n.º 2 do art. 26.º da Lei de Protecção de Testemunhas, o qual se reporta a um estado de particular risco ou fragilidade a que se encontram sujeitas determinadas pessoas, para testemunhar contra pessoas próximas, em virtude de uma dependência física, intelectual ou funcional ou de uma ligação familiar ou emocional. A Lei consagra um conjunto de medidas pensadas em especial para situações de criminalidade intra-familiar (atentas as relações de proximidade) ou em círculos sociais fechados (étnicos, religiosos, institucionais, etc.), e com particular atenção para crianças, mulheres e idosos, de forma a incutir à colaboração com a justiça e a garantir uma espontaneidade, sinceridade e veracidade das declarações. Entre as várias medidas previstas na Lei para protecção destas testemunhas, avulta a possibilidade de evitar o confronto da testemunha com os outros intervenientes processuais, nomeadamente com o arguido (art. 29.º, al. a)). As medidas consagradas não dependem tanto da situação de risco ou do tipo de crime em causa, mas mais do perfil da própria testemunha ou do carácter fechado do meio em que se encontra inserida, assim abarcando outras situações merecedores de tutela. Encontram-se aqui em jogo duas realidades conflituantes do processo penal: a prossecução da justiça criminal, pelo meios legalmente admissíveis, por um lado, e a protecção dos direitos fundamentais das pessoas, por outro. Assiste-se, assim, a uma dialéctica entre o direito do arguido à protecção das garantias de defesa e o direito-dever da testemunha de colaboração, sem estar sujeita a qualquer espécie de pressão ou intimidação, essencial à eficácia da justiça penal. Não se pode olvidar que as medidas de protecção de testemunhas têm carácter excepcional, significando que recai sobre as autoridades judiciárias o ónus de demonstrar que qualquer outra medida menos gravosa não é adequada ao caso concreto. Por outro lado, tendo em atenção que estas medidas processuais de protecção de testemunhas constituem restrições às regras de produção de prova, deve considerar-se que o direito do arguido à produção de prova perante o tribunal (em audiência pública) e na sua presença, não constitui um direito absoluto, mas admite ele também limitações em nome do interesse particular da protecção das testemunhas e do interesse público da realização da justiça. Assim, estão, sem dúvida, legalmente consagradas e justificadas limitações, ainda que restritas, às garantias de defesa do arguido. Podemos, pois, tomar como assente que as garantias de defesa do arguido não são irrestritas, podendo ser comprimidas em função da tutela dos interesses das vítimas, desde que se assegure um ponto de equilíbrio entre estas duas realidades, capaz de garantir uma interpretação dos normativos processuais penais em causa conforme à Constituição da República Portuguesa (CRP) e à Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). E, efectivamente, assim foi cumprido ao longo deste processo. Com efeito, se por um lado se aceitou a declaração de especial vulnerabilidade das testemunhas/ofendidos, com a aplicação das medidas de protecção adequadas, como foi já discutido no apenso de recurso O dos presentes autos – relativo a recurso com subida em separado, a propósito da possível audição das testemunhas/ofendidos para memória futura, com recurso a videoconferência e do dis(...) no art. 271.º do CPP, em que se salienta o teor do Parecer da Comissão Coordenadora do Apoio Psicológico para intervenção na Crise AX, de 21 de Julho de 2003, junto a fls. 7942 dos autos, sobre as implicações na saúde das testemunhas da realização de inquirições na presença dos arguidos, que refere, que “perante a necessidade de terem de prestar declarações em Tribunal sobre os factos de que foram vítimas e/ou terem de ser confrontados com a presença física dos seus agressores, existe uma clara contra indicação para o fazerem na presença directa dos presumíveis abusadores, uma vez que há um risco real de desequilibrio emocional grave, com reactivação dos efeitos traumáticos do próprio abuso e complicações imprevisíveis (…) é nossa avaliação (...) que os mesmos deverão ser ouvidos em sistema de videoconferência, para que exista uma real protecção dos seus interesses como menores e para que a validação do seu testemunho seja ainda consideravelmente mais eficaz.” No âmbito de tal Parecer, a Comissão sugeriu ainda que “estes alunos ou ex-alunos o possam fazer na presença de um adulto por eles escolhido, ou declarado por esta Comissão, como de importância emocional capital.” Como já salientado em despacho proferido na 1ª instância, as conclusões de tal Parecer foram corroboradas pelos depoimentos prestados por BG, identificada a fls. 7027, BH, identificada a fls. 7042, BI, identificado a fls. 7062, BJ, identificada a fls. 7283, BK, identificada a fls. 7367, BL, identificado a fls. 6455, e BM, identificada a fls. 7753. Todos referiram, não só relativamente aos alunos que, em concreto observaram, mas também referindo-se ao universo de alunos da AX, vítimas de abuso sexual, que o seu confronto directo com os agressores e/ou a sua presença e prestação de depoimento perante uma sala de audiências é susceptível de desencadear traumas e de afectar a autenticidade e espontaneidade dos seus depoimentos. Acabando o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, em decisão desse recurso, por mencionar: “perguntar-se-á, se o regime fixado no artº 271º traduz uma compressão inaceitável do direito de defesa? Pensamos que não. É que, como se viu, o contraditório está salvaguardado mediante as faculdades de o arguido ser informado da realização da diligência, de estar presente ao acto, e de formular perguntas adicionais à testemunha. E nem o facto de o arguido não ter tido prévio acesso a eventual auto de declarações que a testemunha haja prestado no inquérito coloca em crise o contraditório e as garantias da sua defesa. (…) Desde que o contraditório, enquanto princípio com consagração constitucional, possa ser assegurado, conforme o previsto na lei, no momento da produção da prova ou ainda mais tarde, não se pode ter como configurada qualquer disparidade com a Lei Fundamental.” Por outro lado, momentos houve, ao longo do processo, em que se asseguraram, sem limitações, os direitos de defesa dos arguidos, por se considerar não existir, em concreto, fundamento para os restringir. Aliás, no decurso da audiência de julgamento, o próprio arguido A viu ser-lhe deferido um outro requerimento de acareação com uma das vítimas do processo, contra a vontade manifestada pelo Ministério Público, conforme resulta da acta da sessão de audiência de julgamento ocorrida em 1 de Junho de 2005 – fls. 31743 a 31751-E. Aí o tribunal exarou em despacho o seguinte “decorre do dis(...) no artº 1, nº 4 e 5, da Lei nº 93/99, de 14 de Julho, que as medidas previstas em tal lei têm natureza excepcional, só podem ser aplicadas se, em concreto, se mostrarem adequadas e necessárias à protecção das pessoas e à realização das finalidades do processo, cabendo ao tribunal assegurar a realização de um contraditório que garanta um justo equilíbrio entre as necessidades do combate ao crime e o direito de defesa. Por sua vez, decorre do artº 26º, do mesmo diploma legal, que cabe à autoridade judiciária competente providenciar para que o acto em que a testemunha especialmente vulnerável participe, decorra nas melhores condições possíveis, com vista a garantir a espontaneidade e sinceridade das respostas. Da interpretação que o tribunal faz da Lei nº 93/99, não decorre que a confrontação entre uma testemunha declarada especialmente vulnerável e o arguido não possa ocorrer. Não só o artº 5º impõe, por exemplo, que o recurso à videoconferência deva ser justificado pelo Tribunal por ponderosas razões de protecção, como o artº 29º prescreve medidas que o juiz que presidir ao acto “pode” adoptar e não que “tem” que adoptar. (…) Ora o Tribunal tem que garantir que o declarante preste o seu depoimento com a maior serenidade, objectividade, sinceridade e espontaneidade possível, mas deve determinar as diligências que entenda necessárias e possíveis para tentar apurar a verdade dos factos, bem como para apurar da verdade do depoimento – artº 26º e 29º, da Lei nº 93/99, 138º, nº 2 (346º, nº 2), 340º, 146º, nº 1 e 4, 323º, al. e), do C.P.Penal. A avaliação, o equilíbrio e a justa proporção entre a necessidade da descoberta da verdade e a protecção da integridade física e/ou psíquica de um sujeito processual ou de uma testemunha, tem que ser ponderado em cada caso concreto, cabendo ao Juiz, dentro do preceituado pela lei ordinária e pela Lei constitucional, tomar as medidas de protecção que, em concreto, sejam reclamadas.” E assim como nessa situação concreta se entendeu que as necessidades de protecção da testemunha não contendiam com o exercício pleno do contraditório pelo arguido, abrangendo o direito à confrontação do próprio com a testemunha, noutras situações essa ponderação foi diferente, salientando-se que a ponderação foi sendo feita, caso a caso, pelo tribunal. Não podemos deixar de concordar com o Ministério Público, que na sua resposta ao presente recurso refere que o assistente AH, à semelhança de outros assistentes, foi declarado testemunha especialmente vulnerável, em virtude da sua condição psicológica, da sua idade e da circunstância de o seu depoimento recair sobre factos relacionados com a sua intimidade sexual, praticados quando ainda era menor de idade e quando estava confiado a uma Instituição pública da qual o arguido A era funcionário. Decorre desse estatuto, a obrigação de o Tribunal procurar garantir que a prestação de depoimento seja realizada nas melhores condições possíveis, por forma a assegurar a serenidade, a tranquilidade e a espontaneidade dos relatos, devendo evitar-se, de forma particular, os riscos de vitimização secundária e o confronto directo com o arguido – art. 1.º, n.º 3, da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho. A diligência de acareação só deveria ter sido deferida se a utilidade dela decorrente justificasse os riscos da confrontação entre o arguido e uma testemunha/assistente especialmente vulnerável. A Recomendação do Conselho da Europa nº R (2001) 16 – sobre a protecção das crianças vítimas de exploração sexual – aconselha, expressamente, no seu ponto 33, os Estados-Membros a instaurarem, para as crianças vítimas ou testemunhas de casos de exploração sexual, condições particulares de audição, a fim de se reduzirem os efeitos traumatizantes para as vítimas, testemunhas e suas famílias e de se proteger a credibilidade das suas declarações e o respeito pela sua dignidade. No mesmo sentido, foi a Decisão-quadro do Conselho da União Europeia, de 15 de Março de 2001, que no seu art. 8.º, n.º 3, consagra expressamente que “Cada Estado-Membro garante igualmente que o contacto entre vítimas e arguidos nos edifícios dos tribunais pode ser evitado”, prevendo que devem ser adoptadas “medidas adequadas de protecção da privacidade e da imagem da vítima.” E no n.º 4 do mesmo artigo refere-se que, quando for necessário proteger as vítimas, designadamente as mais vulneráveis, dos efeitos do seu depoimento em audiência pública, cada Estado-Membro “assegura o direito da vítima poder beneficiar, por decisão judicial, de condições de depoimento que permitam atingir esse objectivo.” Os direitos de defesa do arguido não são coarctados com esta decisão, porquanto, com ou sem confronto directo com o assistente, o arguido tem sempre a possibilidade de, através dos meios de prova de que dispõe, contraditar a versão do mesmo. Neste ponto particular, sobressai de toda a motivação de recurso apresentada pelo arguido uma confusão entre exercício do direito de defesa e o direito de confrontação directa do arguido com os assistentes que o incriminam. Tal como o Ministério Público escreveu a propósito da declaração de especial vulnerabilidade das testemunhas e do recurso à tomada de declarações através do sistema de vídeo-conferência (vd. Motivação de recurso constante do Apenso O, já mencionado – fls. 278 e ss.), em “nome do princípio da descoberta da verdade material, o direito da confrontação do arguido com a prova deve ceder nos casos em que a produção da mesma possa decorrer em melhores condições sem que tal direito de confrontação física deva ocorrer. Por outro lado, o direito de confrontação com a prova não tem de ser, necessariamente um “frente-a-frente” físico entre o arguido e a sua vítima, mas tão somente um confronto com todas as provas carreadas para os autos. Isto é, o arguido deve ter a oportunidade de conhecer as provas que contra si existem no processo, de as contraditar, o que não implica necessariamente que a produção da mesma tenha de ser feita na presença e no confronto físico dos seus protagonistas.” Esta é, precisamente, a tónica dominante, nas ainda não muito abundantes abordagens doutrinárias e jurisprudênciais que encontramos acerca da matéria. Encontramos, por exemplo, o escrito por Lopes da Mota, segundo o qual a “questão da protecção das testemunhas e da multiplicidade de medidas que podem ser concebidas para o efeito prende-se com princípios fundamentais do processo penal, de consagração constitucional – cfr. artº 32º da CRP –, que estruturam o conceito de processo equitativo, na acepção do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que garante ao arguido a possibilidade de examinar ou fazer examinar a prova contra ele produzida, interrogando ou fazendo interrogar as testemunhas que deponham contra ele, e de as testemunhas de defesa serem ouvidas em condições idênticas às da acusação. Trata-se de uma matéria que tem sido objecto de profunda elaboração jurisprudencial, por parte do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que a Recomendação nº R(97)13 levou especialmente em consideração. Daí que possam resultar limitações do direito de o arguido interrogar directa e pessoalmente testemunhas de acusação, em função dos interesses daquelas pessoas. O direito à “confrontação” não é, pois, um direito absoluto e poderá sofrer compressões em função de dois tipos de interesse: o interesse individual da testemunha a ser protegida na sua vida e integridade física e o interesse público na perseguição do crime e na condenação dos criminosos. Estas compressões poderão compreender mesmo restrições a um outro princípio fundamental – o da imediação –, nomeadamente nos casos de utilização da videoconferência ou de prestação de depoimento sobre anonimato. A lei portuguesa de protecção de testemunhas, aprovada pela Lei nº 93/99, de 14 de Julho, recebeu inspiração directa na Recomendação do Conselho da Europa nº R(97)13, visando dotar o direito interno de medidas que tinham vindo a ser recomendadas por organizações internacionais empenhadas na luta contra a criminalidade organizada, na protecção das testemunhas e das vítimas e na defesa do Estado de Direito, das quais se destacam as já citadas Recomendações do Conselho da Europa nºs R(85)11, sobre a posição da vítima no quadro do direito penal e do processo, R(87)21, sobre a assistência às vítimas e a prevenção da vitimização, R(85)21, sobre a violência no seio da família, R(96)8, sobre a política criminal numa Europa em transformação, e R(97)13, sobre a intimidação das testemunhas e os direitos de defesa; as Resoluções do Conselho da União Europeia nº 95/C 327/04, de 23 de Novembro de 1995, relativa à protecção de testemunhas no âmbito da luta contra o crime organizado internacional, e nº 97/C 10/01, de 20 de Dezembro de 1996, relativa a pessoas que colaboram com a justiça na luta contra a criminalidade organizada internacional, bem como os princípios orientadores para a prevenção e repressão do crime organizado e as medidas contra o terrorismo internacional adoptados no 8º Congresso das Nações Unidas para a prevenção do crime e o tratamento de delinquentes. A Lei nº 93/99, de 14 de Julho, contempla um aspecto circunscrito da resposta à criminalidade grave, ligado à protecção dos intervenientes no processo penal que possam dar um contributo relevante para a prova, sem perder de vista a “necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio entre os direitos individuais, nomeadamente do arguido, e o interesse colectivo da segurança. Este aspecto constituiu objecto de especial atenção, de modo a compatibilizar-se a luta contra o crime, em nome da segurança, com a salvaguarda das garantias de defesa, dentro dos limites im(...)s pela Constituição da República e pelos textos internacionais a que Portugal está vinculado (nomeadamente a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos) e prestando a devida atenção à jurisprudência produzida pelo TEDH na matéria. Paralelamente à contemplação de situações de risco, reuniu-se no mesmo diploma, um conjunto de medidas destinadas às denominadas «testemunhas especialmente vulneráveis», em relação às quais o objectivo da reconstituição da verdade dos factos não poderá alhear-se da sua especial fragilidade quando confrontadas com o funcionamento prático do sistema judiciário e com as dificuldades em intervir num processo penal, em desfavor de outras pessoas que lhes são muito próximas. Em nome do interesse da justiça penal, pretende-se, assim, que a testemunha dê um contributo o mais útil, espontâneo e verdadeiro possível, o que deverá passar pela eliminação, também o mais ampla possível, dos efeitos perniciosos da intervenção da própria testemunha. As medidas têm carácter excepcional e só podem ser aplicadas se, em concreto, além de necessárias, se mostrarem adequadas a duas finalidades: à protecção da testemunha e à prova dos crimes (artigo 1º). Uma vez que estas medidas representam em maior ou menor intensidade restrições às regras de produção de prova, consagra-se um princípio geral pelo qual se assegura a realização do contraditório que, atendendo à necessidade e adequação das medidas, aos interesses em presença e ao grau de perigo em questão, assegure um justo equilíbrio entre as necessidades de combate ao crime, ou seja, as necessidades de prova, e o direito de defesa (artigo 1º, nº 5). Os princípios da adequação e proporcionalidade que inspiram todo o regime projectam-se, desde logo, na própria formulação sistemática do diploma – quanto mais restritivas são as medidas, mais exigentes são os pressu(...)s, nomeadamente quanto à gravidade do crime em causa. Com as medidas destinadas às testemunhas especialmente vulneráveis (artigos 26º a 31º) procurou atender-se às dificuldades de obtenção de depoimentos de crianças, de idosos e de pessoas psicologicamente frágeis e teve-se essencialmente em vista a criminalidade cometida no seio da família, em que as crianças, as mulheres e os idosos são as principais vítimas. Para além da criminalidade no seio da família, as medidas destinadas a testemunhas especialmente vulneráveis podem igualmente beneficiar pessoas inseridas em grupos de natureza étnica fechada ou em ambientes também fechados, como são, designadamente, os estabelecimentos prisionais ou instituições de acolhimento de menores ou de idosos, em que não raras vezes se revelam situações de violência contra as pessoas carecidas da devida tutela jurídico-penal (…)” (Protecção das testemunhas em processo penal – Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, págs. 661 a 685). Também Anabela Miranda Rodrigues se pronunciou sobre o tema, expressando que o “direito do arguido a um “fair trial” é reconhecido nos instrumentos internacionais (…) Hoje diz-se, entretanto, mais do que isto. Um “fair trial” não é só um direito do arguido: é também algo devido à testemunha. Não sendo um sujeito processual, a testemunha é um participante necessário na realização da justiça. Trata-se de uma necessidade que se volve em dever, tendo em vista a finalidade que essa participação serve: uma finalidade que ultrapassa o mero interesse pessoal da testemunha na punição do culpado, para se transformar no interesse da sociedade na realização da justiça. Reconhece-se que a este “dever” da testemunha de participar na realização da justiça corresponde um interesse juridicamente relevante, um “quase-direito” de o fazer em segurança, isto é, livre de ameaças e coacção, e no respeito pela sua dignidade. “Direito” que se excerba quando a testemunha é ao mesmo tempo vítima e, de um lado, o seu depoimento se torna imprescindível à realização da justiça e, de outro lado, avulta a sua situação de extrema vulnerabilidade e o risco de vitimização secundária. A partir daqui, emerge a consideração devida pela protecção da vítima e da testemunha, que um fair trial deve realizar. (…) A limitação à protecção surge, todavia, em função da necessidade de salvaguarda de outro interesse digno de protecção, o direito de defesa do arguido. Está em causa, pois, a procura de um “novo ponto de equilíbrio” entre protecção do direito de defesa do arguido, de um lado, e eficácia da justiça penal, de outro. Este é o grande desafio. Hoje as dificuldades da justiça penal advêm do facto de se reconhecer que o processo não é unicamente um ordenamento de liberdade. Duas preocupações “contraditórias” orientam o equilíbrio almejado. De um lado, a necessidade de ênfase das garantias individuais, associada ao modelo político democrático; de outro, a exigência premente de realização da justiça (…). Quando é crescente a importância da vítima na realização da justiça, abre-se caminho à sua protecção, o que obriga a reequacionar os termos da polarização direitos fundamentais/eficácia. (…) A clivagem fez-se entre duas concepções: uma, defendendo um sentido muito limitado para a protecção de vítimas e testemunhas, à luz do direito do arguido de “interrogar as testemunhas de acusação (…)” (art. 6. 3, CEDH, e 14.3, PIDCP); outra, que relativiza o alcance deste direito, perante o imperativo de protecção de vítimas e testemunhas. (…) A lição que aqui se colhe, “relativizando” as disposições já referidas sobre o direito do arguido de se “confrontar” com a prova, permite-nos confrontarmo-nos com a doutrina que tem procurado caracterizar o direito ao contraditório à luz da ideia de que com ele se trata do “reconhecimento da participação constitutiva [das partes] na declaração do direito do caso”; e não, necessariamente, do right of confrontation, no sentido de um confronto face to face do arguido com a testemunha, de inspiração anglo-saxónica. (…) Tudo aponta, pois para que o “direito do arguido a confrontar-se com as provas que contra ele são apresentadas”, como direito ao contraditório (…) não seja entendido como um direito absoluto. É o próprio Estado a prever que a exigência de que o depoimento de uma testemunha no julgamento é dado “em pessoa” admite limitações decorrentes da adopção de medidas de protecção” (…)” (Justiça Penal Internacional e protecção de vítimas-testemunhas por meios tecnológicos, Boletim da Ordem dos Advogados, nº 21, Julho/Agosto de 2002, págs. 16 e 17). O nosso Supremo Tribunal de Justiça também já se debruçou sobre a problemática, defendendo que na “construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central nos direitos do acusado (apreciação contraditória de uma acusação dirigida contra um indivíduo), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve ser proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deve ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial; as excepções a esta regra não poderão, no entanto, afectar os direitos de defesa, exigindo o art. 6º, § 3.º, al. b), da Convenção que seja dada ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo (cfr. v.g., entre muitas referências, o acórdão Vissier c. Países Baixos, de 14-02-2002). Os elementos de prova devem, pois, em princípio, ser produzidos perante o arguido em audiência pública, em vista de um debate contraditório. Todavia, este princípio, comportando excepções, aceita-as sob uma reserva da protecção dos direitos de defesa, que impõem que ao arguido seja concedida uma oportunidade adequada e suficiente para contraditar uma testemunha de acusação posteriormente ao depoimento. Em certas circunstâncias pode ser necessário que as autoridades judiciárias recorram a declarações prestadas na fase de inquérito ou da instrução, nomeadamente quando a impossibilidade de reiterar as declarações é devida a factos objectivos, como sejam a ausência ou a morte, ou a circunstâncias específicas de vulnerabilidade da pessoa (crimes sexuais); se o arguido tiver oportunidade, adequada e suficiente, de contraditar tais declarações, posteriormente, a sua utilização não afecta, apenas por si mesma, o contraditório, cujo respeito não exige, em termos absolutos, o interrogatório directo em cross-examination. O princípio do contraditório tem, assim, uma vocação instrumental da realização do direito de defesa e do princípio da igualdade de armas: numa perspectiva processual, significa que não pode ser tomada qualquer decisão que afecte o arguido sem que lhe seja dada a oportunidade para se pronunciar; no plano da igualdade de armas na administração das provas, significa que qualquer um dos sujeitos processuais interessados, nomeadamente o arguido, deve ter a possibilidade de convocar e interrogar as testemunhas nas mesmas condições que os outros sujeitos processuais (a “parte” adversa)” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7 de Novembro de 2007, Proc. nº 3630/07 – 3ª Secção, Henriques Gaspar (Relator)). Como se vê, temos sempre presente a mesma conclusão: existe uma relação dialéctica entre os direitos de defesa do arguido e os interesses da realização da justiça e da protecção de testemunhas, havendo que encontrar um ponto de equilíbrio entre todos, de modo a que os primeiros só sejam limitados na medida em que isso seja adequado e proporcional a acautelar os segundos, sendo que essa ponderação passa sempre por uma decisão do tribunal sobre a matéria. Vertendo ao caso dos autos, e perante o ex(...), o indeferimento da acareação entre o arguido A e o assistente AH, tal como foi decidido pelo Tribunal a quo, não viola o dis(...) nos arts. 146.º e 327.º do CPP, nem a Lei de Protecção de Testemunhas, nem, ainda, o arts. 32.º, n.ºs 1 e 5, da CRP e 6.º da CEDH, antes se mostrando ponderados os interesses que havia que perspectivar. Note-se que atenta a especial vulnerabilidade do assistente, foi determinado pelo Tribunal, ao abrigo do dis(...) no art. 352.º, n.º 1, al. a), e arts. 26.º, n.º 1, e 29.º da Lei nº 93/99, que a tomada de declarações ao assistente fosse feita sem a presença do arguido na sala (cfr. fls. 30454 a 30456). E se a simples presença do arguido na sala de audiências, durante a tomada de declarações ao assistente, seria susceptível de constituir um factor de constrangimento, muito mais gravosa seria a confrontação do mesmo com a pessoa do arguido, em diligência de acareação. Ainda assim, aceita-se que se tal se tivesse revelado indispensável, poderia ter ocorrido. Faltou foi a constatação da necessidade e utilidade da diligência. Por outro lado, a limitação que possa ter ocorrido na possibilidade de o arguido contraditar as declarações do assistente foi praticamente inócua, já que o arguido requereu que lhe fossem tomadas novas declarações após as declarações prestadas pelo assistente e isso lhe foi deferido (cfr. fls. 30466 a 30568). No fundo, o arguido viu-se apenas impedido de confrontar fisicamente o assistente, de estar “cara a cara” com ele, mas não de se pronunciar pessoalmente sobre a sua versão dos factos. E já salientámos que não pode confundir-se o direito ao contraditório com o direito à confrontação da testemunha, sendo este último apenas uma das expressões daquele e, no caso, a que poderia ter sido beliscada. Face à declarada especial vulnerabilidade do assistente, não se compreende como, no caso concreto, essa falta de confrontação física inibiu o arguido de se defender. O arguido acabou por se defender das declarações do assistente, contraditando-as em novas declarações suas, e o assistente ficou protegido da confrontação física com o arguido. O princípio do contraditório foi respeitado, assim como o interesse de protecção do assistente. A ponderação feita pelo tribunal não merece, até aqui, censura. O arguido avança, ainda, com a violação do dis(...) no art. 340.º do CPP, aqui então, sem justificar de modo algum porque motivo teria sido violado. Todos sabemos que de acordo com o n.º 1 daquele artigo, “o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.” Este é também um dos dispositivos legais a que nos autos se faz ampla referência e que mereceu a atenção dos intervenientes processuais em distintas fases do processo. Já a fls. 25421 dos autos – a propósito da oportunidade de produção de prova – referia o Ministério Público: “O legislador contemplou no art. 340º do C. P. Penal um princípio residual de segurança. (…) A procura da verdade tem regras e há-de conter-se em limites que salvaguardem, em primeira linha, a dignidade humana e, em última análise, a proibição de ser conseguida de forma inopinada, surpreendente ou desleal. O artº 340º não pode ser lido como norma processual branca convertida em alfobres onde caibam esquecimentos ou omissões, ou, ainda, como expediente para que a prova seja apresentada no momento mais conveniente a uma qualquer estratégia (…). Acresce que o estatuto de arguido investe-o no direito de, entre outros, intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurem necessárias – cfr. Artº 61º, nº 1, al. f), do C. P. Penal. Aos sujeitos processuais deve ser vedada a possibilidade de transformarem o julgamento numa extensão das fases que o antecederam – Inquérito e Instrução –, transformando-o num palco permanente e sem fim de actividade investigatória.” Acrescentamos nós que o art. 340.º do CPP não pode ser entendido como um meio para, a todo o momento da produção de prova e a propósito de qualquer motivo, sem justificação, se vir defender que o tribunal tem um dever, sem limites razoáveis, de deferir todas as diligências de prova que sejam requeridas, a coberto da explicação da busca da verdade material. E em especial quando – como é o caso – os restantes dispositivos legais aplicáveis desaconselham a realização da diligência. O art. 340.º do CPP não pode ser entendido desligado das normas aplicáveis à prova em processo penal, quer elas sejam as inseridas no próprio CPP, quer resultem de diplomas avulsos ou sejam até constitucionais. Se como vimos, o próprio art. 146.º do CPP não obriga à realização da acareação requerida, não será por força do consagrado no art. 340.º que a diligência deveria ter sido realizada. Acresce que a acareação, que é um meio de prova expressamente previsto na lei, foi requerida em momento processualmente adequado – na sequência das declarações prestadas pelo assistente – motivo pelo qual nem se entende o recurso ao art. 340.º. Não se vislumbra, pois, que tenha de algum modo sido violado também o dis(...) no art. 340.º do CPP. Para além de tudo isto, merece deixar-se dito que o Tribunal a quo, na parte final do seu despacho, não afasta a possibilidade de em momento posterior – e caso a diligência de acareação viesse a ser considerada útil e necessária para a descoberta da verdade – vir a realizar a acareação requerida, pois consignou-se que “o tribunal não diz que tal não possa ocorrer, só que neste momento, face à globalidade das declarações prestadas pelo arguido e pelo assistente, não considera que, como referimos, tal seja, em termos concretos útil e necessário para a descoberta da verdade.” E o arguido, perante isto, não voltou a requerer a realização da diligência de acareação, sendo certo que o poderia ter feito e que o Tribunal deixou “a porta aberta” para essa possibilidade, omissão de diligência essa que só ao arguido pode ser imputada, especialmente quando o Tribunal, feita a ponderação conjugada dos demais elementos de prova, veio mesmo a concluir que não existiam divergências entre as declarações do arguido e do assistente. Finalmente, impõe-se tomar posição sobre a questão da alegada inconstitucionalidade da interpretação que o Tribunal recorrido fez do dis(...) no art. 146.º do CPP, (...) que o arguido expressamente a invocou. De quanto acima já se referiu, facilmente se conclui que a interpretação que o Tribunal fez do art. 146.º, assumindo-o não como um direito ilimitado do arguido, mas antes como um meio de prova que só deveria de ser deferido se isso se justificasse, nomeadamente quando a sua utilidade e necessidade para a descoberta da verdade justificassem que se sacrificasse o interesse de protecção da testemunha declarada especialmente vulnerável, não viola o espírito e a letra da nossa Constituição e designadamente os princípios vertidos no seu art. 32.º. Antes pelo contrário. Vimos também, que a CRP assegura não só as garantias de defesa do arguido em processo penal e, quanto ao que aqui está em causa, o seu direito ao contraditório (nele se incluindo o direito à confrontação com a testemunha), como também tutela os interesses do cidadão que, enquanto ser humano e colaborador com a justiça, vê perigar a sua saúde e integridade física (entendidas em sentido amplo, físico e psicológico), e ainda o interesse do Estado na realização da justiça. Abarcando a difícil tarefa de conciliar a tutela de interesses que muitas vezes se colocam em pólos o(...)s, o legislador constitucional assumiu a consequência directa da necessidade da compressão, justificada e adequada, dessa tutela. Tal compressão, consoante o caso concreto em apreço, tanto pode ocorrer do lado da defesa dos interesses do arguido como do lado da protecção da testemunha ou do interesse do Estado na realização da Justiça, sujeitando-se a ponderação da necessidade dessa compressão aos princípios da adequação e da proporcionalidade e ao crivo da decisão do tribunal. E, sendo assim, terá que aceitar-se como constitucionalmente coberta a limitação do direito do arguido ao contraditório, quando ela se limite ao estritamente necessário, adequado e proporcional. A interpretação que o Tribunal a quo fez do art. 146.º foi neste mesmo sentido. Logo, não está ferida de qualquer tipo de mácula de inconstitucionalidade. Em conclusão, temos que julgar improcedentes quer a questão da nulidade quer a da inconstitucionalidade suscitadas pelo arguido, com o que falecem ambos os fundamentos deste seu recurso. Uma última nota, para deixar expresso que nas suas alegações de recurso o arguido faz menção a matérias – como sejam a do crime continuado – e expressa opiniões que extravasam em absoluto o objecto do presente recurso, motivo pelo qual não serão sequer abordadas. Pelo ex(...), julga-se totalmente improcedente o recurso interlocutório inter(...) pelo arguido A do despacho que nega a possibilidade de acareação do arguido com o assistente AH (proferido a fls. 30465 a 30466 dos autos), confirmando-se integralmente o despacho recorrido. 9. Recurso inter(...) pelo arguido H dos despachos de fls. 34601 a 34603 e 34604 a 34605, proferidos ambos na sessão da audiência de julgamento 12-10-2005 Na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 12-10-2005 (cf. fls. 34601 a 34605 do Vol. 145.º), na sequência de dois requerimentos apresentados pelo arguido H aquando da tomada de declarações ao assistente AV, o Tribunal a quo proferiu os seguintes despachos (transcrição): “I - 1. Na sessão de audiência de julgamento de 10/10/05 o Ilustre Mandatário do arguido H requereu ao Tribunal que, em relação ao auto de fls. 8.984, identificado como “auto de reconhecimento”, o Assistente esclarecesse se disse ou não aos agentes da Polícia Judiciária que o acompanharam em tais diligências, o que nesse auto consta consignado como tendo sido declarado pelo assistente, concretamente: “a) Disse ou não disse aos agentes da Policia Judiciária que o acompanharam nesse reconhecimento, que se deslocou àqueles locais com o A a fim de entregar crianças da AX para práticas sexuais com adultos? b) Se disse, porque é que agora nega que tenha dito? c) Se não disse, como é que explica ter assinado um auto em que disse o contrário? d) Foi da sua iniciativa que disse aos agentes da Policia Judiciária que aqueles locais tinham ligação com a rede de pedofilia ou com qualquer outra coisa, ou foram os agentes da Policia Judiciária que lhe perguntaram se esses locais tinham a ver com essas actividades? e) O que é que disse aos agentes da Policia Judiciária que explique a necessidade de fazer o reconhecimento desses locais no âmbito deste Processo?” 2. Esta questão está relacionada, pelo menos na análise do enquadramento jurídico - sendo no entanto, na questão ora suscitada, o pressu(...) de alguma forma diferente dos anteriores, pois o que é requerido ao Tribunal é que conheça da possibilidade de recurso a declarações alegadamente produzidas pelo Assistente, em autos de reconhecimento de locais, feitos com agentes da Polícia Judiciária -, com as questões já decididas pelo despacho proferido na audiência de julgamento de 27/04/2005 e na de 20/7/2005 (cfr. fls. 33.696 a 33.703). Como já dissemos, o Tribunal entende que face ao art. 327°, do C.P.Penal, e porque estamos a falar de diligências que são apresentadas como meio de prova nos autos, a defesa tem o direito de em audiência de julgamento pôr em causa as circunstâncias em que estas diligências, no caso concreto reconhecimentos de locais, foram feitas. Isto é, se o Assistente fez estas diligências, se foi ele que indicou o percurso para chegar aos locais, que locais são estes. No entanto e como também já foi dito nos referidos despachos, se por força do art. 32°, da C.R.P. e 327° e 355°, do C.P.Penal, o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório impõem que o Tribunal, em audiência de julgamento, afira das circunstâncias em que diligências realizadas em fase processual anterior foram feitas, de modo a pôr em crise o seu valor como meio de prova. Mas impõe, também, que o Tribunal o faça nos termos definidos pela lei para o efeito. Ora resulta da conjugação do dis(...) nos arts. 355°, nº 1 e 2, com o dis(...) no art. 356°, n° 1 e 2, al. b) e n° 5, do C.P.Penal - e para o que ao caso concreto importa -, que no que se refere a esclarecimentos sobre o conteúdo de declarações do Assistente, contidas em autos processuais produzidos em fase de inquérito e feitas perante órgãos de policia criminal, tal só pode ocorrer se o Ministério Público, o Arguido e o Assistente estiverem de acordo na sua leitura. Cabe dizer de imediato que face à posição hoje expressa pelo Ministério Público e pelo Assistente AV, há que concluir que os mesmos opõem-se à leitura, pelo que fica prejudicada a necessidade de perguntar a demais arguidos quanto ao seu consentimento para a leitura. O documento de fls. 8.984 integra o conceito de auto a que se refere o art. 99°, do C.P.Penal. A leitura do que nesse auto consta como o Assistente ter dito, ou a confrontação do Assistente com o que nesse auto consta como tendo sido dito por si e o pedido de esclarecimentos na forma expressamente requerida pelo arguido H - e contra o consentimento do próprio Assistente e do Ministério Público -, viola o dis(...) no art. 356°, n° 1 e 2 al. b) e n°5, do C.P.Penal. Através dos pedidos de esclarecimento concretamente formulados pelo arguido H estar-se-ia, contra a Lei, a dar conhecimento ao Tribunal do conteúdo de declarações recolhidas do próprio assistente. De forma, repetimos, que entendemos estar processualmente vedada. 3. Em consequência, ao abrigo do dis(...) nos arts. 327°, 355° e 356°, n° 1 e 2 al. b) e 5, do C.P.P., por legalmente inadmissível, indefiro o requerido pelo arguido H na audiência de julgamento de 10/10/05. Taxa do incidente pelo arguido – art. 513°, do C.P.Penal e 84°, n° 1, do C.C.J.. II - 1. Passando ao pedido de esclarecimento formulado pelo arguido no fim da sessão da parte da manhã da presente audiência, quanto aos factos relacionados com o Bairro (…) e Bairro (…), referidos no auto de fls. 8.984, tal reflecte uma alteração da posição por si assumida na audiência de julgamento de 10/10/05. Com efeito, nessa audiência o Ilustre Mandatário do arguido disse que “… à defesa de H não interessa saber que factos são esses que o assistente prefere não recordar”. No entanto e porque o pedido de esclarecimento agora é formulado, cabe dizer o seguinte: Em audiência de julgamento (cfr. acta de 10/10/05), o assistente declarou que os locais Bairro (…) e Bairro (…) não têm a ver com locais a que tenha acompanhado o arguido A, para levar alunos da AX para actos de abuso de natureza sexual com adultos, não tem a ver com quaisquer factos relacionados com os arguidos deste processo. Hoje esclareceu e confirmou, que os factos relacionados com o Bairro (…) e (…) são factos que lhe causam sofrimento, passados consigo, tendo mesmo adiantado que são factos relativos a abusos de natureza sexual sofridos por si. Do despacho de pronúncia de fls.20.829 e segs., não resulta qualquer menção a estes lugares. No entanto, estando no processo os autos de reconhecimento destes locais, há que saber do assistente com o que se relacionam estes locais. Face às declarações já prestadas pelo assistente, quanto aos factos a que se referem tais locais e ao sofrimento que diz sentir em relação a estes factos e estando afastada pelo Assistente qualquer conexão directa ou indirecta dos arguidos que estão a ser julgados neste processo com tais locais (ou dos referidos no despacho de não pronúncia) - e não havendo neste momento qualquer indicio que os leve a relacionar, pelo menos, com os arguidos C, E, H, K, N e Q -, não resulta para o Tribunal que seja relevante o pedido de esclarecimento que ainda subsiste: “por quem é que o assistente diz ter sido abusado nestes locais”. Em consequência e ao abrigo do dis(...) nos arts 124°, 126°, nº 1, 346°, n° 1 e 2, 128°, n° 1, 323°, al. a) e f), do C.P.Penal e por não o considerar relevante para a descoberta da verdade, não formulo o pedido de esclarecimento adicional sugerido pelo Ilustre mandatário do arguido H.” Não se conformando com o teor destes despachos interlocutórios, o arguido H deles interpôs recurso (cf. Vol. 147.º, fls. 34976 a 34983), que rematou com a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “A - Podem ser colocadas ao depoente questões relacionadas com o que ele declarou em auto de reconhecimento de local, relativamente à finalidade da sua deslocação a esse local e às pessoas que nela o acompanharam, pelo que, no primeiro despacho, o tribunal interpretou erroneamente os art. 327°, 355° e 356° n° 1, 2 e 5 do CPP. B - O entendimento normativo do dis(...) nos art. 327°, 355° e 356° nº 1, 2 e 5 do CPP, no sentido de que o depoente não pode ser confrontado, em audiência de julgamento, com as suas declarações constantes de um auto de reconhecimento de local, onde refere a finalidade e a companhia presentes nas suas idas a esse local, é inconstitucional por violação dos art 32° n°1 e5 da CRP. C - Num processo de abuso sexual, a defesa de um arguido tem o direito de colocar à alegada vítima, que admite ter sido abusado por terceiros em circunstâncias que lhe causaram especial sofrimento, a questão de saber qual é a identidade dessas pessoas, quando tal defesa sustenta a hipótese de ter havido um processo psicológico de transferência ou projecção daquilo que aconteceu com tais terceiros nele próprio, razão pela qual o tribunal aplicou erroneamente ao caso concreto os art° 124°, 126° n° 1, 346 n°1 e 2, 128° n° 1 e 323°- a)e f) do CPP. D - O entendimento normativo dos art° 124°, 126°, 346°, 128° n°1 e 323° do CPP no sentido de que não podem ser colocadas ao depoente perguntas sobre a identidade de quem dele terá sexualmente abusado noutras circunstâncias que não aquelas que estão descritas na pronúncia submetida a julgamento, alegadamente por isso não interessar à descoberta da verdade, quando o arguido sustenta a pertinência dessa questão por poder ter havido um processo psicológico de transferência ou projecção de experiências com terceiros nele próprio, é inconstitucional, por violação dos art° 32° n° 1 e 5 da CRP.” O arguido K respondeu ao recurso (cf. fls. 44700 a 44706 do Vol. 192.º), alegando que (transcrição parcial): “1- Do despacho proferido a fls. 34601 a 34603 ss. 1. No recurso a que ora se responde entende o recorrente H ter o Tribunal a quo, ao indeferir fossem solicitados ao assistente AV os pedidos de esclarecimento concretamente formulados por si na audiência de julgamento de 10.10.2005, interpretado erroneamente os arts. 327°, 355° e 356°, n.°s 1, 2 e 5 do C.P.P.” (…) “6. A prova por reconhecimento consta do Capítulo IV do Livro III, mais concretamente dos arts. 147° e seguintes do Código de Processo Penal. 7, Nos termos do dis(...) no art. 147° do C.P.P., sob a epigrafe “Reconhecimento de pessoas”, sempre que houver necessidade “de proceder ao reconhecimento de qualquer pessoa, solicita-se à pessoa que deva fazer a identificação que a descreva com indicação de todos os pormenores de que se recorda. Em seguida, é-lhe perguntado se já a tinha visto antes e em que condições. Por último, é interrogada sobre outras circunstâncias que possam influir na credibilidade da identificação.” (cfr. n.° 1). 8. Prescrevendo o n.° 4 do referido artigo que “O reconhecimento que não obedecer ao dis(...) neste artigo não tem valor como meio de prova”. 9. Por sua vez, dispõe o art. 148° do C.P.P., sob a epígrafe “Reconhecimento de objectos” no seu n.° 1 que “Quando houver necessidade de proceder ao reconhecimento de qualquer objecto relacionado com o crime, procede-se de harmonia com o dis(...) no n.° 1 do artigo anterior, em tudo o que for correspondentemente aplicável.” 10. Sendo, nos termos do n.° 3 do referido dispositivo legal, correspondentemente aplicável o dis(...) no n.° 4 do artigo anterior. 11. Ora, não dispondo o regime processual penal especificamente sobre a prova por reconhecimento de local, necessário será aplicar, por analogia, o dis(...) no art. 148° relativo ao reconhecimento de objectos. 12. Donde, quando houver necessidade de proceder ao reconhecimento de qualquer local relacionado com o crime, terá que se proceder igualmente de harmonia com o dis(...) no n.° 1 do art. 147º do CP.P., sob pena de tal reconhecimento não ter qualquer valor como meio de prova. 13. E impondo-se assim ao tribunal a valoração do auto de reconhecimento na sua globalidade, incluindo o relato efectuado pela pessoa que deva fazer a identificação (no caso, o assistente) nos termos do n.° 1 do art. 147° do CP.P. 14. O reconhecimento de um qualquer local há-de estar sempre relacionado com um determinado crime, seus agentes e circunstâncias em que o mesmo foi cometido. 15. Nessa medida, terá sempre de constar do referido auto um relato explicativo da finalidade da deslocação ao local a reconhecer, o qual terá necessariamente por base aquilo que foi declarado por parte daquele que procede à identificação. 16. Assim, no caso do auto de reconhecimento de local de fls. 8964, consta expressamente como finalidade/necessidade da deslocação ao local o reconhecimento e indicação por parte da testemunha AV de “alguns dos locais onde declarou ter-se deslocado com o A a fim do entregar crianças de AX para práticas sexuais com adultos, bem como o estúdio fotográfico onde o mesmo agiu/do mandava revelar fotografias.”. “ (…) “22. O entendimento de que os relatos efectuados pelos assistentes aquando da realização de diligência de reconhecimento de local inseridos em auto levado a cabo na fase de inquérito, consubstanciam declarações em sentido material, encontrando-se a sua leitura/exame em audiência sujeita à disciplina do dis(...) no art.° 356° do C.P.P. é inadmissível. 23. Tais relatos não integram, pois, o conceito de declarações tais como definidas na lei processual penal, designadamente no âmbito do estipulado no art.° 356° do referido diploma legal. 24. Como tal, o denominado auto - Relatório de Reconhecimento de Local -, não está abrangido pela proibição contida no art. 356°, n.° 1, al. b) do C.P.P., disposição visa tão só impedir a leitura em audiência de discussão e julgamento de autos de instrução ou de inquérito que contenham declarações de assistente, parte civil e testemunha sem que haja acordo de todos os sujeitos processuais, mas que não estende aquela proibição a quaisquer autos de instrução ou inquérito que não contenham declarações do arguido, do assistente, das partes civis ou de testemunhas. 25. Ora, não podendo ser consideradas declarações o que consta do Auto de Reconhecimento de Local como tendo sido referido pelo assistente AV no âmbito da referida diligência ou que a motivou, nada impede que se proceda à sua leitura em audiência de julgamento bem como fossem solicitados os pertinentes esclarecimentos solicitados pelo arguido H quanto ao seu teor, porque constantes de auto relativamente ao qual tal leitura não só é expressamente permitida, como terá necessariamente de ser considerada pelo tribunal a quo na valoração que vier a efectuar de tal meio de prova, sob pena de ser o referido auto esvaziado de conteúdo e senso.” (…) “31. Atento todo o ex(...), não pode deixar de vingar o entendimento consentâneo com as normas processuais que regem tal matéria e, em consequência, determinar-se que podem ser pedidos ao assistente esclarecimentos relacionados com o que ele declarou em auto de reconhecimento de local, relativamente à finalidade da sua deslocação a esse local e às pessoas que nela o acompanharam, no que se inclui, naturalmente, o que ali está consignado como tendo sido relatado pelo autor do reconhecimento. 32. Como bem refere o recorrente “as declarações que constam de um auto de reconhecimento de local são, na medida em que sirvam para compreender a finalidade e a natureza da diligência, meramente instrumentais desse meio de prova, razão pela qual sendo o auto admitido como meio de prova, não pode haver impedimento a que se aprecie em audiência de julgamento todo o seu teor” 33. Termos e fundamentos por que, deve ser dado provimento ao recurso inter(...) e, em consequência ser revogado o despacho proferido e substituído por outro que ordene sejam solicitados ao assistente os esclarecimentos peticionados. II- Do despacho de fls. 34604 a 34605 34. Tendo o assistente declarado em audiência de julgamento que os locais Bairro (…) e Bairro (…) - objecto do auto de reconhecimento de fls. 8984 que o assistente aí expressamente reconheceu como locais onde se deslocou com o A a fim de entregar crianças da AX para práticas sexuais com adultos, bem como o estúdio fotográfico onde o mesmo arguido mandava revelar fotografias - afinal se encontram relacionados com abusos de natureza sexual sofridos por si, mas não com locais a que tenha acompanhado o arguido A, para levar alunos da AX, nem com quaisquer factos relacionados com os arguidos deste processo, impunha-se que o tribunal a quo tivesse questionado o assistente sobre a identidade das pessoas por quem diz ter sido abusado nesses locais. 35. Com efeito, muito embora tais locais não se encontrem descritos na pronúncia e tendo sido afastada pelo assistente qualquer conexão entre os arguidos que estão a ser julgados nestes autos e tais locais, ainda assim tal pedido de esclarecimento se revelava manifestamente pertinente. 36. Para lá do que no recurso refere o arguido H, a verdade é que tais factos, nas palavras do assistente ter-lhe-ão causado sofrimento que ainda hoje se mantém de tal forma que prefere não os recordar. 37. Tal pedido de esclarecimento em causa não só é relevante para a descoberta da verdade como, poderá ter relevantes implicações para efeitos de avaliação do pedido de indemnização civil formulado nos presentes autos contra os arguidos. 38. Apresentando-se nessa medida absolutamente essencial à defesa dos arguidos, seja aferida não só a identidade das pessoas por quem o assistente refere ter sido abusado, bem como e, salvo o devido respeito, as circunstâncias e momento temporal em que tais abusos terão ocorrido. 39. Termos e fundamentos por que não pode deixar de proceder o recurso (…)” Por seu turno, o Exmo. Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal a quo, na resposta ao recurso (cf. fls. 44784 a 44787 do Vol. 192.º), pronunciou-se do seguinte modo (transcrição parcial): “A Defesa do Arguido H interpôs recurso - cfr. fls. 34.605 - dos Despachos proferidos a fls. 34.601 a 34.603 (I, 1.,2. e 3.) e a fls. 34.604 e 34.605 (II, i.) No primeiro dos Despachos, o Tribunal apreciou e indeferiu à Defesa do Arguido H um requerimento apresentado no âmbito das instâncias que o próprio então dirigia ao Assistente AV e no qual se solicitava ao Tribunal que formulasse àquele um conjunto de perguntas - mais propriamente, cinco -, todas elas relacionadas com o conteúdo do intitulado Auto de Reconhecimento de fls. 8984.” (…) “É inquestionável que o Auto de Reconhecimento em causa e a diligência que lhe está subjacente ocorreram na fase de Inquérito. Tão pouco se questiona que na descrição dos itinerários e dos locais encontrados se faça referência às indicações que, naturalmente, vão sendo fornecidas pelo Assistente, porque tal é intrínseco à natureza e objectivos próprios de tal meio de obtenção de prova. O que não poderá admitir-se é que, a coberto de tais indicações, se invoquem, ou, e muito menos, se produzam, se sindiquem ou se valorem, quaisquer outras laterais declarações porque é isso, justamente, o que a norma invocada expressamente proíbe. O próprio Recorrente reconhece - embora não retirando daí as devidas consequências - que as declarações que constem de um auto de reconhecimento de local são sindicáveis, “... na medida em que sirvam para compreender a finalidade e a natureza da diligência…”. Nem mais, nem menos! Na verdade, para além da própria epígrafe da norma - “Leitura permitida de autos e declarações” - inculcar uma ideia de sentido abrangente no que por declarações deva entender-se, há que ter em conta que a metodologia do preceito traduz, em primeira linha, um critério de inclusão taxativo (“Só é permitida a leitura em audiência de autos:”) e, correlativamente, um consequente critério de exclusão (só aqueles e nenhum outro e, jamais, na parte em que contenham declarações do arguido, do assistente, das partes civis ou de testemunhas), para além, naturalmente, da excepção a que alude o n° 5, por remissão para o n° 2, b), do art. 356°, do CPP. No caso concreto, não se tendo verificado o acordo exigível, bem andou o Tribunal ao indeferir a pretensão. A Defesa do Arguido H interpôs, igualmente, recurso do Despacho que indeferiu a possibilidade de ao Assistente AV ser perguntado, em relação a dois locais referidos no Auto de Reconhecimento de fls. 8.984, nomeadamente, Bairro (…) e Bairro (…), “se foi abusado nestas casas e por quem?” - cfr. fis. 34.598. Há que assinalar, em primeiro lugar, o facto - que alguma perplexidade nos causa - de, na audiência de 10.10.2005, a Defesa do Arguido H, pela voz do mesmo Mandatário que subscreve a Motivação, ter declarado que “... à defesa de H não interessa saber que factos são esses que o assistente prefere não recordar” - tal como, de resto, o próprio Tribunal teve oportunidade de salientar no Despacho recorrido. Passando, entretanto, a interessar-lhe, o MP subscreve, em primeira linha, a posição assumida pelos Assistentes a fls. 34.599 - a qual, com a devida vénia, aqui se dá por reproduzida. Para além disso e do que o próprio Despacho recorrido consigna, esgotando o que possa ser a matéria de refutação atinente, entendemos salientar, tão só, que, mesmo atender-se à psiquiátrica incursão do Recorrente pelos desígnios, mais ou menos insondáveis, da mente humana e do que designa por processo de “transferência”, caberia perguntar da relevância das identidades dos “transferidos”, (...) que, nesse caso, tão só bastasse, ou devesse bastar-se, na lógica da pergunta que se pretende ver admitida, que a houvesse alguém de quem fosse deslocável a autoria dos abusos, de que o Assistente diz ter sido vítima nos referidos locais, para a pessoa dos Arguidos, designadamente, do Arguido H, então erigido em a “vítima de transferência”: Por todo o ex(...), entendemos que deve ser negado provimento a ambos os Recursos, confirmando-se os Despachos recorridos, nos seus precisos termos.” O recurso foi admitido a subir a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fls. 44032, Vol. 189.º). Apreciando. 9.1. Despacho recorrido de fls. 34601 a 34603: Na audiência de discussão e julgamento que decorreu no dia 10-10-2005, o arguido H requereu que o assistente AV respondesse a um lote de cinco perguntas (cf. fls. 34.452, Vol. 145.º), entendendo que tinha ocorrido contradição entre o que consta do auto de fls. 8984 e o que o depoente afirmou peremptoriamente em audiência. O Tribunal Colectivo indeferiu esse pedido de confronto por entender que esclarecimentos sobre o conteúdo de declarações prestadas pelo assistente, contidas em autos processuais produzidos em fase de inquérito e feitas perante órgãos de polícia criminal, só podem ocorrer em audiência de julgamento se o Ministério Público, os arguidos e os assistentes estiverem de acordo com a sua leitura, o que não se verificava no caso vertente. Perante este enquadramento, a questão controvertida que constitui objecto deste recurso interlocutório consiste em saber, de um modo muito sintético, se o regime de leitura de autos e de declarações em audiência de julgamento, previsto pelo art. 356.º do CPP, deve ou não ter aplicação a um auto de reconhecimento de local com as características do de fls. 8984. A fls. 8984 deste processo encontra-se um intitulado “AUTO DE RECONHECIMENTO DE LOCAL”, do qual consta que “Aos cinco dias do mês de Setembro de dois mil e três, VM e AAY, Inspectores da Polícia Judiciária, acompanhámos a testemunha AV, no sentido de esta reconhecer e indicar alguns dos locais onde declarou ter-se deslocado com o A a fim de entregar crianças da AX para práticas sexuais com adultos, bem como o estúdio fotográfico onde o mesmo arguido mandava revelar fotografias”, seguindo-se, designadamente, o reconhecimento pela testemunha de fracções localizadas no Bairro (…) e no Bairro (…). O CPP não estabelece um regime específico para este meio de prova, apenas prevendo no Título II do Livro III, nos seus arts. 147.º e 148.º, os reconhecimentos de pessoas e de objectos, que não se confundem com os reconhecimentos de locais, como naturalmente se compreende. Enquanto que nos primeiros se procura a identificação de uma pessoa ou de uma coisa móvel (ou, pelo menos, tendencialmente móvel), se necessário for, em caso de dúvida, através da comparação com outras pessoas ou com outros objectos de características semelhantes, nos segundos visa-se a localização de espaços, de lugares onde decorreram determinados factos, face aos quais se mostrará difícil ou até mesmo impossível, em caso de dúvida, o reconhecimento por comparação com outros espaços ou lugares similares. Pese embora a falta de específica previsão para o reconhecimento de local, não subsistem, na nossa perspectiva, nenhumas dúvidas quanto à validade deste meio de prova. Como em processo penal vigora o princípio da liberdade de prova, conforme decorre do dis(...) no art. 125.º do CPP, são válidos todos os meios de prova, mesmo que não tipificados ou regulamentados, desde que não proibidos por lei (constitucional ou ordinária). À partida não se vislumbra qualquer impedimento constitucional ou legal quanto à validade do reconhecimento de local enquanto meio de prova. Em abstracto, não se mostra que de per si esta espécie de reconhecimento, com carácter atípico, atente contra princípios ou valores constitucionalmente garantidos. De igual modo, também não parece que seja intrinsecamente proibido por qualquer norma processual, muito em particular pelo dis(...) no art. 126.º do CPP, já que poderá ser realizado de modo livre e voluntário, sem ofensa da integridade física ou moral das pessoas, sem intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações. Neste sentido, Germano Marques da Silva defende que “o CPP só disciplina o acto de reconhecimento de pessoas ou coisas, mas parece que nada obsta a que o reconhecimento incida sobre qualquer percepção sensorial reconhecível (sons, cheiros e quaisquer outros fenómenos captáveis pelos sentidos), pois a lei não o proíbe” (in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1993, Tomo II, pág. 150). Assumida a validade deste meio de prova, ainda que atípico por falta de específica regulamentação legal, importa agora averiguar em concreto que regime jurídico deverá ser aplicado ao “AUTO DE RECONHECIMENTO DE LOCAL” de fls. 8984, desde já se adiantando que a denominação que foi atribuída a este acto do processo não se mostra determinante para a solução a preconizar, mas antes preferencialmente a sua substância ou o seu conteúdo. Para além do reconhecimento propriamente dito de fracções de prédios pertencentes ao Bairro (…) e ao Bairro (…), o auto de fls. 8984 comporta também a reprodução de declarações prestadas pela então testemunha AV. Nesse auto consta expressamente e de modo determinante para o caso que “(…) acompanhámos a testemunha AV, no sentido de esta reconhecer e indicar alguns dos locais onde declarou ter-se deslocado (…)” – nosso sublinhado. Esse auto não se limita unicamente a reconhecer, a identificar, a localizar as casas do Bairro (…) e do Bairro (…) onde alegadamente ocorreram abusos sexuais envolvendo crianças da AX. Integra também materialmente um depoimento prestado pela testemunha que reconheceu esses locais. Da leitura do auto de fls. 8984 resulta não só o reconhecimento dessas casas, mas também aquilo que o assistente AV então comunicou à Polícia Judiciária. Ficou a saber-se, de acordo com o que então declarou, que se deslocou a esses locais na companhia do arguido A e que aí entregaram crianças da AX a fim de serem sujeitas a práticas sexuais com adultos. Aliás, a Polícia Judiciária só se deslocou em investigação ao Bairro (…) e ao Bairro (…) em face da notícia de crimes aí cometidos, constando do auto de reconhecimento alguns dos factos que integram a sua prática, com base nas declarações prestadas pela referida testemunha. O relato dos factos vertido no auto traduz inequivocamente declarações atribuídas ao ora assistente AV e atinentes à prática de ilícitos criminais. Na sua forma esse acto processual constitui unicamente um auto de reconhecimento de local. Materialmente contém também declarações de uma testemunha, nele está inserto um relato de factos que integra a prática de crimes sexuais com menores e que foram comunicados à Polícia Judiciária durante o inquérito. Deste modo, a denominação atribuída ao auto de fls. 8984 não retrata com inteira propriedade todo o seu conteúdo, toda a sua substância. Tratando-se de um quase completo relato de factos que integram a prática de ilícitos criminais, não procede a argumentação apresentada pelo recorrente de que essas declarações são meramente instrumentais, que servem apenas para compreender a finalidade e a natureza deste meio de prova. No nosso ponto de vista, essas declarações constituem antes uma excrescência perante o acto formal em causa. Dito por outras palavras: o reconhecimento do local poderia ser perfeitamente apreendido sem a inclusão no texto da descrição dos factos, ou seja, a inclusão do relato dos factos não constituiu meio necessário e indispensável para a realização ou para a compreensão desta diligência de prova. Bastava mencionar singelamente que a testemunha se tinha deslocado com elementos da PJ para localizar as casas do Bairro (…) e do Bairro (…). Conhecendo-se o objecto do inquérito, facilmente se apreenderia a natureza e a finalidade da diligência. Seja como for, mesmo admitindo que o auto de reconhecimento em causa não seria completamente compreendido sem a inclusão dessas declarações, isso não desvirtuaria a intrínseca natureza da sua parte inicial. Independentemente da sua finalidade, o primeiro parágrafo do auto de reconhecimento contém indiscutivelmente declarações atribuídas à testemunha AV, onde se relatam factos com relevância criminal. Tratando-se materialmente de declarações de uma testemunha, ainda que formalmente integradas em auto de reconhecimento de local, não podem deixar de ter tratamento igual ao dos autos de declarações prestadas por testemunhas a órgãos de polícia criminal durante a fase de inquérito. Aliás, nem se aceita diferente posição, sob pena de se desvirtuar, por completo, a disciplina prevista pelo art. 356.º do CPP, atinente à leitura de autos e de declarações em audiência de julgamento, o que comportaria manifesto prejuízo para as garantias de defesa dos arguidos, sobretudo para o princípio do contraditório. Sob pretexto de enquadrarem a diligência, de facilitarem a compreensão da sua finalidade e da sua natureza, bastaria inserir num auto de reconhecimento declarações prestadas por uma testemunha a um órgão de polícia criminal durante o inquérito, para posteriormente, em sede de audiência de julgamento, não ficarem sujeitas ao regime do art. 356.º do CPP, podendo ser valoradas para a formação da convicção do tribunal, mesmo que aí não tenham sido lidas, devido à oposição de algum dos sujeitos processuais. Por absurdo, para permitir a sua posterior valoração em juízo, bastaria inserir as principais declarações recolhidas em inquérito em documentos ou em autos (autos de reconhecimento ou outros) que, por regra, não têm de ser lidos e especificamente analisados em audiência. Como nos inquéritos se investiga a prática de crimes e os meios de prova visam precisamente a sua demonstração em juízo, para a diligência ficar convenientemente enquadrada deveria ficar a constar do auto um relato dos factos em investigação. O recorrente H veio alegar que podem ser colocadas ao assistente AV questões relacionadas com a finalidade da sua deslocação ao local e sobre as pessoas que o acompanharam. Caso se aceitasse a tese do arguido H apresentada em sede de recurso, o Tribunal a quo deveria também ter recusado a formulação dessas perguntas, mas com diferente fundamento. Nessa perspectiva, as perguntas em causa seriam irrelevantes e supérfluas. Quanto a tais matérias o auto é bem claro, explícito e peremptório. A finalidade da diligência prendia-se com o reconhecimento pela testemunha AV de fracções de prédios localizados nos Bairros (…) e (…). Foram dois Inspectores da Polícia Judiciária que acompanharam aquele a esses locais. De acordo com o dis(...) na al. a) do n.º 4 do art. 340.º do CPP, os requerimentos apresentados pelos sujeitos processuais devem ser indeferidos pelo tribunal quando for notório que as provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas. Não se aceitando que as perguntas em causa tenham sido formuladas com tais objectivos, como parece ser o caso, bem andou o Tribunal a quo ao indeferir o requerimento apresentado por este arguido. Sufraga-se aqui o que se defendeu no despacho recorrido: “Através dos pedidos de esclarecimento concretamente formulados pelo arguido H estar-se-ia, contra a Lei, a dar conhecimento ao Tribunal do conteúdo de declarações recolhidas do próprio assistente. De forma, repetimos, que entendemos estar processualmente vedada.” Manifestamente o recorrente H não estava interessado no auto de reconhecimento propriamente dito, tanto mais que não vinha acusado da prática de crimes ocorridos no Bairro (…) ou no Bairro (…). Não quis esclarecer o modo como decorreu esta diligência de prova. Indubitavelmente pretendeu explorar aparentes contradições entre aquilo que o assistente AV disse em inquérito e aquilo que afirmou em audiência, de modo a descredibilizar o seu testemunho, a desvalorizar o seu depoimento face aos factos de que estava acusado, a julgar o seu carácter. Aliás, a primeira pergunta formulada é logo bastante elucidativa a este respeito: “Disse ou não disse aos agentes da Policia Judiciária que o acompanharam nesse reconhecimento, que se deslocou àqueles locais com o A a fim de entregar crianças da AX para práticas sexuais com adultos?” Como facilmente se apreende destas e das restantes perguntas, o recorrente H pretendeu explorar as aparentes contradições entre as declarações do assistente em sede de inquérito e em sede de julgamento, utilizando para o efeito o primeiro parágrafo do auto de reconhecimento de fls. 8984, onde constam as declarações que já conhecemos, mas esquecendo-se, por completo, daquilo que constituiu o efectivo reconhecimento do local. Só que pretendeu fazê-lo recorrendo a declarações prestadas pelo ora assistente a um órgão de polícia criminal durante a fase de inquérito e sem que, em sede de audiência de discussão e julgamento, tenha obtido o necessário consentimento para a sua leitura (e subsequente valoração na decisão final), designadamente por parte do assistente e do Ministério Público. Quis fazê-lo de um modo substancial e processualmente inadmissível. Deste modo, nenhum reparo merece ser apontado à decisão recorrida, na medida em que o Tribunal a quo, avaliando de modo acertado o auto de reconhecimento de fls. 8984, compreendendo na perfeição a finalidade visada pelo recorrente e interpretando correctamente o dis(...) no art. 356.º, n.º s 1, 2, al. b), e 5, do CPP, indeferiu, e bem, a pretensão do arguido H. Mesmo admitindo a aplicação ao caso do dis(...) nos arts. 147.º a 149.º do CPP, em face da falta de previsão de um regime específico para o acto processual de reconhecimento de local, as declarações prestadas pelo assistente AV constituem uma excrescência perante o reconhecimento propriamente dito levado a cabo no decurso do inquérito. Adaptando ao caso vertente os supra citados preceitos legais, importaria perguntar à testemunha como descreveria o local, para indicar todos os pormenores com ele relacionados, se já tinha estado antes no Bairro (…) ou no Bairro (…), se foi conduzido para uma construção térrea ou para um edifício com vários pisos, qual a cor e o material da construção, qual o seu enquadramento paisagístico, se nas proximidades existia ou não algum ponto de referência, bem como todas as outras circunstâncias que permitissem contribuir para o reconhecimento desse local. Tudo isto para afirmar que o primeiro parágrafo do auto foi muito para além desta diligência de prova, que visava única e exclusivamente, sublinhe-se novamente, o reconhecimento de um local. Comporta materialmente declarações de uma testemunha ouvida no decurso do inquérito por um órgão de polícia criminal. A estas declarações não poderá deixar de se aplicar a disciplina prevista, maxime, pelos arts. 355.º e 356.º do CPP. Para o reconhecimento de local pouco ou nada interessa saber se a testemunha estava sozinha ou acompanhada, quem para aí foi transportado ou quais os concretos factos que aí se passaram. Esses factos constituem o objecto do inquérito e são ou virão a ser, no momento certo, do conhecimento dos sujeitos processuais. Relativamente a um outro meio de prova, a reconstituição do facto, mas cujas considerações se mostram pertinentes mutatis mutandis para o caso vertente, cita-se aqui Paulo Pinto de Albuquerque (in “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2007, págs. 418 e 419), que defende o seguinte: “O respeito pelo princípio da imediação impõe que as declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas feitas em reconstituição durante o inquérito ou a instrução sem observância do procedimento do artigo 271.º só possam ser lidas, visualizadas ou ouvidas nos termos dos artigos 356.º, n.º 2, al. b), n.º 3, als. a) e b), n.º 4 e n.º 5.”. “(…) as declarações feitas por um assistente numa reconstituição presidida pelo OPC durante o inquérito só podem ser lidas, visualizadas ou ouvidas em audiência, se o MP, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura, visualização ou audição”. Reforçando esta ideia, este autor vai mais longe, acrescentando que: “Portanto, é inconstitucional, por violar as garantias de defesa, o princípio do contraditório e o princípio da imediação, a leitura, visualização ou audição em julgamento (e o consequente aproveitamento como meio de prova) de declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas ou declarações do arguido prestadas em reconstituição ocorrida antes do julgamento quando aquela leitura, visualização ou audição tenha lugar fora das condições referidas (…)”. Com base neste fundamento – falta de consentimento para a leitura em audiência das declarações prestadas por uma testemunha em inquérito a um órgão de polícia criminal – não subsistem quaisquer dúvidas quanto ao acerto da decisão recorrida de fls. 34601 a 34603 ao indeferir os pedidos de esclarecimento pretendidos pelo recorrente H. 9.2. Despacho recorrido de fls. 34604 a 34605: Quer o pedido de esclarecimento apresentado na audiência de 10-10-2005, quer particularmente o pedido de esclarecimento apresentado na sessão de 12-10-2005 (neste último caso, o recorrente H pretendia que o assistente AV respondesse à pergunta sobre “se foi abusado nestas casas e por quem”), mostram-se irrelevantes relativamente ao objecto do processo e inadequados para a prova do alegado “processo psicológico de transferência ou projecção daquilo que aconteceu com tais terceiros nele próprio”. Dispõe o art. 124.º, n.º 1, do CPP que “constituem objecto da prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança”. Conforme decorre deste preceito, nem todos os factos relacionados com um determinado crime podem constituir objecto da prova em processo penal. A lei expressamente restringe o âmbito da actividade probatória aos factos que denomina de “juridicamente relevantes”. Desta forma, é legalmente inadmissível a prova de factos que denotem não ter qualquer relevância para o desfecho da causa, que não tenham influência para a decisão final, mesmo que eventualmente se apresentem relacionados com o objecto do processo. Até numa perspectiva de celeridade e de economia processual, deve ser vedada a prova de factos que demonstrem ser inócuos, que não tenham qualquer interesse para a causa ou que nada acrescentem para a descoberta da verdade material. A relevância jurídica desses factos deve ser apreendida de acordo com o segmento final do n.º 1 do mencionado art. 124.º do CPP. Dito por outras palavras, podem ser objecto de prova em processo penal os factos relacionados com “a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança”. Deste modo, por exemplo, são “factos juridicamente relevantes” os que se prendem, quer positiva quer negativamente, com os elementos constitutivos do crime que integra o objecto do processo, com a consciência da ilicitude, com o grau de participação no facto, com a imputabilidade do arguido, com as causas de exclusão da ilicitude e da culpa ou com as circunstâncias atinentes à escolha e à determinação da medida da pena (v.g. personalidade do agente, grau de censurabilidade, exigências de prevenção geral e especial). Em termos gerais, o crime (ou crimes) de que o arguido vem acusado (ou pronunciado) delimita grosso modo o objecto da prova. Importará em audiência oferecer prova sobre todos os factos juridicamente relevantes com ele relacionados, desde a existência do crime, à punibilidade do agente, passando pela determinação e a escolha da medida da pena. Assim, o mesmo acontecimento da vida pode ganhar e perder relevância jurídica, para o que agora nos interessa, consoante a natureza do crime que esteja para ser julgado. Por exemplo, um certo fenómeno atmosférico pode constituir objecto determinante de prova num crime rodoviário, enquanto que será absolutamente irrelevante averiguá-lo e apurá-lo num crime anti-económico. Por seu turno, o n.º 4 do art. 340.º do CPP atribui ao juiz presidente o poder-dever de indeferir os requerimentos de prova que se mostrem manifestamente infundados, por a prova ser irrelevante, inadequada, de obtenção duvidosa ou impossível ou consubstanciar uma manobra dilatória. Enquanto responsável pela condução do processo, pelo cumprimento dos princípios da celeridade e da economia processual, o juiz não se encontra obrigado a aceitar acriticamente todas as provas oferecidas pela acusação ou pela defesa. Ainda que o tribunal só possa rejeitar as provas ou os meios de legalmente inadmissíveis (cf. n.º 3 do citado art. 340.º) ou as notoriamente infundadas (cf. n.º 4), os pretextos de violação das garantias de defesa, da ofensa do princípio do acusatório ou da quebra da garantia de independência do tribunal, não podem servir para manietar o juiz à aceitação de toda a prova, com os argumentos de que se trata de prova oferecida pela acusação ou pela defesa e que se impõe ao juiz uma apática posição de acrítica neutralidade. Quer as provas legalmente inadmissíveis, quer aquelas que se mostrem infundadas na perspectiva da descoberta da verdade, por algum dos motivos previstos pelas als. a) a c) do n.º 4 do art. 340.º do CPP, devem ser rejeitadas pelo tribunal, independentemente da fase em que o processo se encontre. Para efeitos do n.º 4 do art. 340.º do CPP, as provas são “irrelevantes” quando respeitem a factos estranhos ao objecto do processo ou a factos que, mesmo que provados, não teriam qualquer influência na decisão final. São “supérfluas” se forem desnecessárias para o apuramento dos factos, por estes já serem do conhecimento do tribunal. Os meios de prova são “inadequados” quando se revelem inidóneos ou incapazes de provar os factos a que se destinem. De “obtenção impossível ou muito duvidosa” são aqueles que, independentemente do seu interesse para o objecto da causa, apresentam obstáculos ou dificuldades para que o tribunal a eles possa lançar a mão, por não ser de todo possível ou provavelmente não vir a ser possível a sua obtenção. Por último, o requerimento de prova tem finalidade meramente “dilatória” quando o requerente não pretende com ele provar qualquer facto, servindo única e exclusivamente para perturbar o bom andamento dos autos, para comprometer a celeridade processual, para retardar a prolação da decisão final (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2007, págs. 850 e ss.; Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1993, Tomo II, pág. 99). Na contestação o arguido é livre de escrever o que muito bem entender, de apresentar a versão dos factos que, no seu ponto de vista, melhor sirva a sua defesa, inclusive de descrever especulações e efabulações. Todavia, o tribunal não deve aceitar acriticamente toda a prova que lhe é oferecida. Compete-lhe, de acordo com o objecto do processo, avaliar os crimes que são imputados ao arguido, indagar ponderadamente se o que vem alegado está ou não relacionado com a sua prática, averiguar que factos se mostram juridicamente relevantes para o objecto da prova, apurar se os requerimentos de prova têm finalidade meramente dilatória ou se os meios de prova oferecidos se mostram ou não notoriamente infundados. Realizada esta ponderação, o tribunal deve apenas aceitar a prova que obedeça ao estabelecido nos arts. 124.º, n.º 1, e 340.º, n.ºs 3 e 4, ambos do CPP. No caso vertente, conforme se deixou assinalado no despacho recorrido de fls. 34604 a 34605, o esclarecimento que o recorrente H pretendia ver obtido do assistente AV, respondendo à pergunta “se foi abusado nestas casas e por quem”, afigura-se notoriamente irrelevante para a descoberta da verdade, tendo em atenção o objecto do processo delimitado pela pronúncia. Como se escreveu no despacho recorrido, neste processo não se encontravam pendentes para julgamento factos relacionados com o Bairro (…) ou com o Bairro (…), nem nenhum dos vários arguidos, incluindo o próprio recorrente H, vinha acusado de nesses locais ter abusado sexualmente de algum jovem ou criança da AX. Deste modo, com a pergunta em causa, com o pretendido esclarecimento por parte do assistente, não se visava o apuramento de “factos juridicamente relevantes”, ou seja, de factos que digam respeito aos elementos constitutivos dos crimes que estavam a ser julgados, à punibilidade dos arguidos ou à escolha e à determinação da medida da pena e, também por consequência, aos pedidos de indemnização cíveis formulados nos autos. Esses factos – apurar se na verdade o assistente foi ou não abusado sexualmente e, em caso afirmativo, por quem no Bairro (…) e no Bairro (…) – são alheios e marginais perante o objecto deste processo e, como tal, não podem constituir objecto de prova. O esforço probatório deve unicamente ser direccionado para os factos que aqui estavam a ser julgados. O apuramento desses factos nada traria de relevante para este processo, não seria por causa deles que o recorrente seria absolvido ou condenado pela prática dos crimes que efectivamente lhe são imputados, não seria por causa deles que ocorreria alguma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa, nem tão pouco seria por causa deles que veria a pena a ser atenuada ou a ser agravada. A consistência, a coerência e a credibilidade de uma testemunha devem ser fundamentalmente avaliadas pelo modo como depôs sobre os factos que constituem o objecto do processo, sob pena de se alargar excessivamente o âmbito da inquirição ao ponto de se passar a questionar a personalidade e o carácter do depoente. Neste caso, passaríamos a julgar a própria testemunha, com base em factos marginais ao processo, em vez de avaliarmos criticamente se o seu depoimento se revelou credível, por exemplo, por ter demonstrado distanciamento face à acusação e à defesa, por ter mantido a sua versão ao longo do tempo, por ter relatado de uma forma circunstanciada e pormenorizada todos os factos que constituem o objecto do processo. Também nesta perspectiva o pretendido esclarecimento mostra-se notoriamente irrelevante, uma vez que a credibilidade (ou a falta dela) das declarações prestadas pelo assistente AV não iria ser avaliada na óptica dos factos que integram o objecto do processo, mas ao invés com base em factualidade que perante o mesmo se revela marginal. E, neste caso, o tribunal estaria a averiguar factos alheios ao processo, dos quais, em nosso entendimento, nada se poderia retirar com relevância para a decisão final. A consistência, a coerência, a credibilidade desse depoimento (ou a sua falta) não deve ser utilizada para a avaliação dos concretos factos que constituem o objecto do processo. A credibilidade de um testemunho deve ser avaliada perante os concretos factos sobre os quais recai o depoimento. A não ser que se pretendam formular juízos de valor sobre o depoente, com a finalidade de retirar consequências daquilo que aquele disse quanto a factos alheios ao processo. Numa lógica de quem é sério nunca falta à verdade e de que quem é falso nunca fala a verdade. Deste modo, ir-se-iam retirar ilações para a prova dos factos que constituem o objecto do processo. Por exemplo, se o depoente apresenta uma personalidade volátil, manipulável ou influenciável, em face da forma como relatou factos marginais, o seu depoimento não é credível perante os factos fulcrais do processo. Numa só palavra: os factos que o recorrente H pretendia ver esclarecidos através da resposta à pergunta em causa são marginais perante o objecto do processo e, como tal, não podem constituir objecto de prova, já que em nada iriam influir na decisão final, seja em matéria penal, seja em matéria cível. Nem tão pouco serviriam para a avaliação da credibilidade do assistente AV, já que esta deve ser averiguada em face da forma como respondeu aos factos que constituem o objecto deste processo. Acresce afirmar que o meio de prova constituído pelas declarações do assistente AV, respondendo à pergunta que o recorrente H pretendeu formular na sessão da audiência de julgamento de 12-10-2005 – aliás, à semelhança das declarações que dele pretendeu obter na sessão de 10-10-2005 – se mostrava de todo inadequado para a demonstração de “(…) ter havido um processo psicológico de transferência ou projecção daquilo que aconteceu com tais terceiros nele próprio (…)”. Independentemente das respostas que viessem a ser obtidas do assistente AV, mesmo ainda que este respondesse da forma mais conveniente às pretensões do recorrente, não se compreende que factos tão significativos e relevantes poderiam vir a ser retirados para a demonstração do alegado “processo psicológico de transferência”. Sempre permaneceria em segredo o que teria supostamente levado o assistente AV, à semelhança de outros testemunhos produzidos em audiência de julgamento, a atribuir ao recorrente factos que efectivamente foram cometidos por terceiras pessoas. Caso a pergunta viesse a ser permitida e o assistente AV viesse a indicar o nome das pessoas que dele abusaram sexualmente no Bairro (…) e no Bairro (…), cabe perguntar o que de útil poderia vir a ser retirado para a demonstração do alegado pelo recorrente. O conhecimento dos autores desses pretensos actos não parece que viesse a elucidar de modo conclusivo e inequívoco o tribunal sobre a forma como decorreu esse denominado “processo psicológico de transferência”. Sempre permaneceria na esfera do absoluto desconhecimento se efectivamente ocorreu e, em caso afirmativo, o que teria levado o assistente a desencadear essa transferência psicológica. Não se pode de modo algum concluir que pelo simples facto do assistente ter sido sexualmente abusado por terceiros nos Bairros (…) e (…), vindo a indicar em audiência o nome dos autores desses pretensos factos, o arguido tenha sido vítima de um processo de transferência, sendo-lhe imputados factos que nunca cometeu. Para além das evidentes dificuldades de prova de fenómenos psicológicos, permaneceriam sempre insanáveis dúvidas – objectivamente, excluídas especulações – quanto a saber se ocorreu ou não esse “processo psicológico de transferência” e, em caso afirmativo, o que o motivou, o que lhe deu causa, se também ocorreu eventualmente um “processo de manipulação ou inquinação”, com o intuito de prejudicar o recorrente H. A revelação da identidade desses alegados terceiros abusadores não permitiria, em nossa opinião, vir a demonstrar quaisquer factos em benefício da defesa. O conhecimento da identidade destas pessoas – e era isso que estava em causa – nada aporta de determinante para a tese defendida pelo recorrente. Não seria o facto do assistente AV ter sido abusado sexualmente por terceiros no Bairro (…) e no Bairro (…) que levaria o tribunal a considerar demonstrada essa projecção psicológica. Em suma: não se sufraga a afirmação feita pelo recorrente de que para si é absolutamente decisivo saber quem abusou do assistente naqueles locais. Do eventual apuramento desses factos nada ressaltaria de decisivo para este processo. Inclusive a alegada transferência psicológica não resultaria ipso facto de se averiguar se o assistente foi ou não abusado nos Bairros (…) e (…) e de se conhecerem os nomes desses abusadores. Nem tão pouco aquilo que o assistente viesse a responder sobre a pergunta em causa permitiria demonstrar o aludido “processo psicológico de transferência”. Deste modo, não subsistem quaisquer dúvidas que, para além do mais, este meio de prova era inadequado, que as pretendidas declarações do assistente AV eram notoriamente inidóneas para demonstrar, em qualquer caso, o alegado “processo psicológico de transferência”. Ao contrário, subsistem sérias e inabaláveis dúvidas, de acordo com o dis(...) no n.º 1 do art. 124.º do CPP, que “(…) a hipótese de ter havido um processo psicológico de transferência ou projecção daquilo que aconteceu com tais terceiros nele próprio (…)” possa constituir objecto de prova em processo penal. O recorrente H não afirma como seguro que tenha ocorrido o aludido “processo psicológico de transferência”. Admite simplesmente essa hipótese, formula essa possibilidade, apresenta essa conjectura. Como já se disse, o citado art. 124.º do CPP admite a prova de factos juridicamente relevantes relacionados com os elementos constitutivos do crime, com a consciência da ilicitude, com o grau de participação, com a imputabilidade do arguido, com as causas de exclusão da ilicitude e da culpa e com as circunstâncias atinentes à escolha e à determinação da medida da pena. A admitir-se a pergunta em causa estar-se-ia a permitir que o assistente AV viesse a responder para demonstrar meras hipóteses, suposições, circunstâncias que inclusive podem nunca ter ocorrido. Tudo isto em vez de se pretender apurar factos juridicamente relevantes relacionados com as matérias que constituem o efectivo objecto de prova. Em face do ex(...), deve ser mantido o despacho de fls. 34604 a 34605 que indeferiu o pedido de esclarecimento adicional sugerido pelo arguido H na sessão da audiência de julgamento de 12-10-2005. 9.3. Inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente: O arguido H veio também defender que são inconstitucionais os entendimentos normativos perfilhados pelo Tribunal a quo dos preceitos legais aplicados nos despachos de fls. 34601 a 34603 e 34604 a 34605, em ambos os casos por violação do dis(...) no art. 32.º, n.º 1 e 5, da CRP. Efectuando o confronto destes despachos judiciais com os aludidos preceitos relativos às garantias do processo criminal, não se vislumbra que as interpretações efectuadas pelo Tribunal a quo atentem, muito menos de forma grave, contra alguma garantia de defesa, contra o princípio da estrutura acusatória do processo criminal ou contra o princípio do contraditório, consagrados precisamente pelos n.º 1 e 5 do art. 32.º da CRP. De qualquer modo, o recorrente também não o explicita de modo detalhado e fundamentado. Limita-se a expor, em termos genéricos, que considera ter ocorrido violação do citado preceito constitucional. Mas não explica as razões, os motivos ou os fundamentos, relativamente a cada um dos despachos em causa, que o levam a defender a tese de inconstitucionalidade. Pese embora tal formulação genérica e infundamentada, importa averiguar se a Lei Fundamental foi atingida em algum dos segmentos do artigo em causa. De facto, não se vislumbra que os despachos recorridos tenham atingido alguma das garantias de defesa do arguido, que quanto a elas tenham estabelecido limitações ou restrições intoleráveis, nem tão pouco que o recorrente se tenha visto injustificadamente prejudicado em face dos factos de que vinha acusado e pronunciado com notório benefício para a acusação. Muito embora tenham sido desatendidas as pretensões do recorrente, não se deve confundir o simples indeferimento de uma pretensão com a banalizada violação das garantias de defesa, do princípio da estrutura acusatória do processo ou do princípio do contraditório. Estas violações estão reservadas para os casos de ofensa grave e notória dos princípios estruturantes do nosso sistema de justiça criminal, em que v.g. são (...)s em causa os princípios da dignidade da pessoa humana, do Estado de Direito democrático, da igualdade de armas, da tutela de um processo criminal justo e equitativo. In casu, nada nos leva a afirmar que não foram reconhecidos ao arguido H todos os seus inalienáveis direitos de defesa. Ou, dito por outras palavras, que os despachos recorridos, proferidos pelo Tribunal a quo, tenham ofendido v.g. os princípios da presunção da inocência, da estrutura acusatória do processo criminal ou do contraditório, nem tão pouco que tenham violado v.g. o direito ao recurso das decisões desfavoráveis, o direito a estar presente e a participar nos actos processuais que lhe digam respeito, o direito a ser assistido por defensor ou o direito a intervir no inquérito e na instrução. Importa também aqui recordar, como apontou o Conselheiro Monteiro Diniz, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 1.052/96: “O posicionamento do arguido num processo de tipo acusatório há-de revestir uma situação de reciprocidade dialéctica face à acusação, pelo que, em conformidade, devem ser-lhe atribuídos aqueles meios legais de intervenção que compensem o desequilíbrio, que é pressu(...) indispensável de uma correcta administração da justiça. O princípio do contraditório é, afinal, expressão, ao nível jurídico- processual do princípio da igualdade.” (…) “A exigência de um consentimento alargado ao Ministério Público, ao arguido e à defesa, para que a leitura das declarações seja possível não se apresenta como encurtamento ou restrição inadequada ou inadmissível das garantias de defesa, traduzindo-se, ao contrário, numa linha de concretização do princípio geral sobre a produção de prova em audiência constante do artigo 355.º, n.º 1, o qual visa essencialmente a garantia da posição processual do arguido”. Parece que as invocadas inconstitucionalidades mais não traduzem do que uma simples discordância perante os despachos do Tribunal a quo, sem que daí resulte efectiva ofensa do estatuto substantivo e processual do arguido. Dando-se aqui também por integralmente reproduzidas, com as devidas adaptações, as considerações já tecidas nos autos, muito em particular a propósito dos recursos dos despachos de fls. 17020 a 17055 e de 25475 a 25488, não se verifica, em nosso entendimento, o cometimento de qualquer inconstitucionalidade na interpretação dos dispositivos legais em causa. Em face do ex(...), julga-se totalmente improcedente o recurso inter(...) pelo arguido H e, em consequência, decide-se confirmar in totum os despachos de fls. 34601 a 34603 e 34604 a 34605, proferidos ambos na sessão da audiência de julgamento 12-10-2005. 10. Recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 38247, proferido em 11/5/2006, que permitiu que fosse feita pergunta à testemunha BN sobre que conhecimento e relacionamento o assistente AV demonstrou ter com o arguido A Na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 11 de Maio de 2006, o arguido A deduziu oposição a que fossem formuladas perguntas à testemunha que na altura estava a ser inquirida, BN, sobre o que lhe foi transmitido no processo disciplinar contra si movido e de que esta testemunha foi instrutora, invocando, para sustentar a sua posição, o dis(...) no art. 356.º, n.º 7, do CPP (cf. Vol. 161.º, fls. 38246 e 38247). Seguidamente, por despacho proferido em acta, a Mma. Juiz Presidente pronunciou-se quanto a este requerimento do seguinte modo (transcrição): “Por o Tribunal entender poder ser relevante para a descoberta da verdade, nomeadamente para melhor conhecimento da relação que tenha existido entre o Assistente AV e o arguido A, o Tribunal permite que seja perguntado à testemunha que conhecimento e relacionamento o assistente AV demonstrou ter com o Senhor A e, por ora, apenas nessa perspectiva.” Inconformado com este despacho, o arguido A dele logo interpôs recurso em acta, vindo a 07 de Junho de 2006 (cf. fls. 38.706 a 38.710 do 163.º Vol.) a apresentar a respectiva motivação e as seguintes conclusões (transcrição): “1 - O mandatário do arguido C quis confrontar a testemunha BN com o comportamento do assistente AV no processo disciplinar que correu na AX contra o ora recorrente, 2 - Para o que requereu que a testemunha BN fosse confrontada com o depoimento que o assistente AV prestou no processo disciplinar. 3 - A decisão recorrida sofre do vício de irregularidade porque o Tribunal não deu a palavra ao Ministério Público para se pronunciar, querendo, o que tinha de fazer. 4 - A testemunha BN foi a instrutora do processo disciplinar. 5 - Pelo que está impedida de se pronunciar sobre tal depoimento, face ao dis(...) no artº 356.° n° 7 do CPP aplicável ao processo disciplinar comum, em vigor na AX. 6 - Ao processo disciplinar regulado no DL 24/84, de 16/1, adiante designado por RD, aplicam-se os princípios gerais de direito processual penal (art. 35.º n° 4 do RD). 7 - Como bem ensina o Conselheiro Leal-Henriques, na obra citada no art° 8° desta motivação, “De toda a filosofia que preside ao Estatuto Disciplinar poderá concluir-se que o legislador disciplinar, embora não o diga expressamente na totalidade, pretendeu acudir aos casos omissos de natureza processual pela formas seguinte: normas do processo penal; normas do processo civil, subsidiárias que são do processo penal; - princípios gerais do processo penal.” 8 - Conforme estatui a norma do art° 35° n°4 do RD; 9 - A pergunta viola a norma do art° 356° n° 7 do CPP; 10 - Por outro lado, a pergunta é ilegal, porque impertinente, irrelevante, já que toda a gente sabe e resulta abundantemente dos autos que o assistente AV era muito amigo do recorrente, era o seu “braço direito” e resulta ainda que funcionou a “omertà”, a lei do silêncio, principio fundamental dos (…), nada mais servindo a pergunta do que para tentar baralhar os dados, tentar criar a confusão; 11 - A decisão recorrida sofre do vício de irregularidade, previsto no art° 123° do CPP, o que se argui e é proibida face ao dis(...) no art° 356° n° 7 do CPP. 12 - O tribunal “a quo” interpretou as normas indicadas na conclusão 11 e a norma do art° 35° n° 4 do RD no sentido de dever permitir a pergunta quando as deveria ter interpretado no sentido contrário.” Este recurso foi admitido a subir a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo do processo (cf. Vol. 164.º, fls. 38781). O Exmo. Magistrado do MP junto do Tribunal recorrido, na sua resposta, manifestou a sua concordância quanto às razões de facto que levaram à interposição de recurso por parte do arguido A, ainda que o mesmo lhe parecesse prematuro, já que o Tribunal não tinha ainda proferido qualquer decisão sobre a irregularidade da pergunta formulada (cf. Vol. 165.º, fls. 39071 a 39076). Apreciando. O arguido A interpôs recurso do despacho, proferido em acta a fls. 38247, que permitiu perguntar à testemunha BN que conhecimento e relacionamento o assistente AV demonstrou ter com ele próprio, o ora recorrente A. Este recurso funda-se na alegação de que a esta testemunha, instrutora de um processo disciplinar movido ao recorrente, não lhe podiam ser colocadas perguntas sobre o que as testemunhas declararam nesse processo disciplinar, sob pena de violação do no n.º 7 do art. 356.º do CPP, também aplicável ao processo disciplinar. Para a apreciação deste recurso interlocutório importará atender à tramitação processual subsequente à sua interposição, muito em particular à arguição de irregularidades por parte do Exmo. Magistrado do MP, à postura assumida pelos sujeitos processuais e ao que foi sendo decidido a este respeito pelo tribunal a quo. Ainda na sessão de julgamento que decorreu no dia 11 de Maio de 2006 (cf. fls. 38248), o Exmo. Magistrado do MP arguiu irregularidades do despacho em causa, na sua perspectiva, decorrentes de não lhe ter sido dada a possibilidade de se pronunciar sobre a oposição formulada pela defesa do arguido A (cf. n.º 1 do art. 327.° do CPP) e por a pergunta que o tribunal permitiu formular implicar uma pronúncia sobre o conteúdo das declarações que o assistente AV prestou no âmbito do referido processo disciplinar (cf. n.º 7 do 356.°do CPP). Em face disto, o Tribunal a quo mandou notificar todos os sujeitos processuais para se pronunciarem sobre os vícios apontados pelo MP, mormente quanto à arguida violação do princípio do contraditório (o arguido H a fls. 38451 a 38452 respondeu, pronunciando-se, em suma, pela sua improcedência), ao mesmo tempo em que decidiu não proceder à formulação da pergunta em causa, nos termos em que a determinou, enquanto essas irregularidades não viessem a ser decididas. Posteriormente, já na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 03 de Dezembro de 2007, pela Mma. Juiz Presidente foi proferido a este respeito o seguinte despacho (cf. Vol. 215.º, fls. 49.740): “Ponderando, globalmente, o decurso e teor da instância que veio a ser feita à testemunha BN em 11/05/06 e em 23/10/07, incluindo as instâncias feitas pelos arguidos A e H - e em concreto a posição constante da sessão de 23/10/07 quanto a pedido de esclarecimentos ou esclarecimentos complementares -, notifique os Sujeitos Processuais respectivos para, em dez dias, dizerem se neste momento ainda subsiste interesse na arguição de irregularidade que o Ministério Público apresentou a fls. 38.248, ou no então comunicado pelo arguido H a fls. 38.253, sendo que se nada disser(em) no referido prazo, o Tribunal interpretar tal silêncio com o sentido que já não subsiste interesse na arguição e conhecimento do requerido por parte do Tribunal, nem em audição complementar.” E na sessão da audiência de julgamento que decorreu no dia 11 de Março de 2008 foi ainda proferido o seguinte despacho (cf. Vol. 222.º, fls. 51.469): “Face à posição processual do Ministério Público e do arguido H, na sequência da notificação do Despacho de fls. 49.740, ponto 3., o Tribunal interpreta que os sujeitos processuais já não mantêm interesse na Irregularidade arguida a fls. 38.248 e no requerido a fls. 38.253 - instância em momento posterior - nada mais havendo a decidir e não subsistindo interesse em audição complementar.” Em face do ex(...), verifica-se que, muito embora o Tribunal recorrido tenha autorizado a formulação da pergunta em causa, a testemunha BN acabou por não ser confrontada, seja em momento anterior ou posterior à prolação do despacho de fls. 51469, sobre o relacionamento que o assistente AV demonstrou ter com o arguido A. Após a interposição de recurso em acta pelo recorrente e perante a arguição de vícios por parte do MP, o Tribunal a quo, por despacho, decidiu sustar a que a testemunha BN fosse questionada e respondesse sobre tal matéria, enquanto não viesse a ser proferida decisão sobre as pretensas irregularidades suscitadas pelo MP. Esta testemunha continuou a ser inquirida na sessão de julgamento que decorreu ao longo do dia 11 de Maio de 2006 e posteriormente prestou depoimento, desta feita arrolada pela defesa, na sessão que teve lugar no dia 23 de Outubro de 2007 (cf. Vol. 210.º, fls. 48675 a 48679), não se vislumbrando que lhe tenha sido perguntado ou que tenha respondido sobre o relacionamento que o assistente AV demonstrou ter com o arguido A, muito menos ainda que tenha respondido com base naquilo que lhe foi transmitido enquanto instrutora desse processo disciplinar. Por outro lado, com a prolação do despacho de fls. 51469, que simultaneamente tomou posição quanto à irregularidade anteriormente suscitada pelo Exmo. Magistrado do MP, o Tribunal recorrido deu como assente que deixou de subsistir interesse na audição complementar da testemunha BN. Deste modo, independentemente do mérito das considerações tecidas, o arguido A acabou por atingir o objectivo visado pela interposição do recurso interlocutório de fls. 38247, ou seja, obstar a que a testemunha BN fosse questionada e respondesse sobre o relacionamento dele com o assistente AV, mais propriamente que viesse a trazer para estes autos tudo aquilo que lhe tinha sido transmitido pelas testemunhas inquiridas no âmbito do processo disciplinar. Em suma, não tendo a testemunha BN de(...) sobre esses factos, não tendo respondido à pergunta que justificou a oposição por parte do arguido A, seja em momento anterior ou em momento posterior à prolação do despacho de fls. 51469, mostra-se absolutamente inútil, neste momento, conhecer o mérito dos fundamentos invocados no recurso inter(...) a fls. 38247 (e cuja motivação se mostra junta a fls. 38706 a 38710), por forma a saber se, nos termos da lei, essa testemunha estava (ou não) impedida de depor nesta parte. Em face do ex(...), ao abrigo do art. 287.º, al. e), do CPC, ex vi do art. 4.º do CPP, acorda-se em declarar extinto o recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 38247, com base na sua inutilidade superveniente. 11. Recurso inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 41170, proferido em 8/11/06, que permitiu a formulação de pergunta à testemunha BO Na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 08 de Novembro de 2006, no decurso da inquirição da testemunha BO, o arguido A, através do seu Ilustre Mandatário (cf. Vol. 174.º, fls. 41170), ditou para a acta o seguinte requerimento (transcrição): “A pergunta formulada pela defesa do arguido C sobre quem nomeou a BP é absolutamente irrelevante para o objecto do Processo. Além do mais resulta patente dos autos que foi uma razão política de quem tinha competência para tanto. A persistência neste tipo de perguntas, embaraça este Tribunal e custa muito dinheiro para os contribuintes. O arguido A não tem os meios económicos do arguido C e não pode estar sujeito a que os trabalhos se arrastem com perguntas que saiam do âmbito do Processo. Por outro lado, a questão de quem nomeou a BP não consta, segundo pensamos saber, da Contestação do arguido C, logo não é facto que deva ser discutido em Tribunal, pelo que nos termos dos arts 128° e 138° do C.P.Penal deve ser proibida a pergunta por impertinente e condenando o arguido C por incidente por protelar o andamento dos trabalhos.” Seguidamente, por despacho proferido em acta, a Mma. Juiz Presidente pronunciou-se quanto a este requerimento do seguinte modo (transcrição): “Face às declarações que já foram prestadas em audiência de julgamento, quer pelo menos pelo arguido C quer pela BP, quanto à nomeação do lugar de (...) da AX em substituição do BQ, o Tribunal vai permitir a pergunta. Quanto ao critério, é o mesmo que o Tribunal teve quando permitiu que o Ilustre Mandatário do arguido A fizesse pergunta de idêntica natureza ao BR, Perito ouvido nos autos. A pergunta já está respondida e está gravada.” Inconformado com este despacho, o arguido A dele logo interpôs recurso em acta, vindo a 04 de Dezembro de 2006 (cf. Vol. 180.º, fls. 42041 a 42046) a apresentar a respectiva motivação e as seguintes conclusões (transcrição): “1 - O arguido C sabe quem nomeou a BP para exercer o cargo de (…) da AX e porque motivo: O Ministro e por causa da necessidade de investigação dos crimes, pela necessidade de mudar toda a forma da AX de cuidar, vigiar, educar os menores a seu cargo. 2 - O arguido C sabe que a AX já foi condenada em Tribunal Arbitral a pagar indemnização a dezenas de pessoas vítimas de abusos sexuais na AX, por ter violado os seus deveres de guarda e cuidado e protecção em relação a dezenas de alunos. 3 - Ora, quem nomeou e porque motivo a BP naquele momento para (…) da AX, é do conhecimento público e é matéria que está subtraída ao conhecimento do Tribunal, ao poder jurisdicional do Tribunal. 4 - Não faz parte da acusação, da pronuncia nem de qualquer contestação. Não faz parte do “thema probaudum”. 5 - Com o devido respeito, é totalmente inócuo, irrelevante, para ao tema da prova, para a boa decisão da causa. 6 - Mais uma vez com o devido respeito, discutir esta questão, é uma perda de tempo, de meios económicos, eterniza o Julgamento e está fora do âmbito do art° 128° e 138° do CPP. 7 - Essa pergunta nem ao BS pode ser colocada, porque é decisão política, não foi impugnada — se é que alguma vez o poderia ser face à legislação em vigor, quer quanto legislação relativa à Tutela, quer quanto ao Diploma que regula a AX, define a sua orgânica, os fins, o recrutamento. 8 - O arguido C não tinha na sua progressão na carreira o direito de ser (…) da AX. 9 - Perante tamanho escândalo, o Governo só tinha que mudar as coisas e essas mudam-se a começar pela nomeação para (…) de alguém da confiança política do Governo, para mexer as coisas, para alterar as coisas, para facilitar a investigação, para impedir os furtos de documentos confidenciais — alguns dos quais a testemunha deu para os autos!!! — para evitar que o “sistema” arreigado na AX impedisse, perturbasse as mudanças, as investigações, em quem todos diziam estar empenhados, até ao Presidente da República. 10 - Na contestação o arguido C não suscita qualquer questão relativa a eventual “cabala” envolvendo a BP para “prejudicar a carreira do C”. 11 - Então para quê permitir uma pergunta - ou mesmo tê-las permitido a outras testemunhas essas perguntas - do teor da que foi colocada pela defesa de C? 12 - Que facto da acusação se pretende provar? Nenhum! 13 - Que facto da contestação pretende a defesa do arguido C provar? 14 - Basta ler a norma do art° 128° n° 1 do CPP para se concluir que a testemunha só pode depor sobre factos que “constituam objecto da prova”. 15 - Aliás, nem como facto acessório a pergunta tem qualquer interesse. Deve pois ser julgada irregular com as consequências legais. 16 - A pergunta é assim ilegal, sendo o despacho além de ilegal irregular, face ao dis(...) no art° 128° n° 1, e are 123°, ambos do CPP, irregularidade que se argui. 17 - O tribunal interpretou as normas dos art°s 128° n° 1, 138° e 123° do CPP no sentido de ser legal que a defesa do arguido C poder colocar à testemunha BO a pergunta em causa, quando deveria tê-las interpretado no sentido o(...). NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao recurso e julgada irregular a decisão recorrida, com as legais consequências a nível de legalidade da prova.” O Magistrado do MP junto do Tribunal a quo, na sua resposta (cf. Vol. 186.º, fls. 43231 a 43233), pronunciou-se no seguinte sentido (transcrição parcial): “QUESTÃO PRÉVIA (da forma de admissão do Recurso) (…) Pelo ex(...), o M° P° entende que deve ser ordenada a devolução do recurso a esta 1ª Instância, admitindo-se o mesmo a subir a final, nos próprios autos, com o recurso que, porventura, venha a ser inter(...) da decisão final. DO RECURSO (…) as instâncias são obrigadas, por vezes, por uma questão de encadeamento lógico, a formularem questões que se tornam indispensáveis à formulação de outras. Não se pode exigir que, nesse processo, todo o percurso seja constituído por perguntas que valham por si próprias, antes devendo o Tribunal conceder alguma latitude por forma a não perturbar o desiderato último, esse sim, sempre relacionado com o objecto próprio do processo. Foi isso que, no caso em apreço, norteou a Decisão do Tribunal, razão pela qual não se tenha por ilegal ou, sequer, por irregular. Em conformidade, deve ser negado provimento ao Recurso, mantendo-se a Decisão recorrida, nos seus precisos termos.” Subindo de imediato o recurso a esta Relação, na sequência do despacho de admissão de fls. 42724 (cf. Vol. 183.º), o Exmo. Procurador-Geral (...) emitiu parecer, sufragando o entendimento do MP junto da 1.ª instância. Por acórdão datado de 17 de Maio de 2007, esta Relação decidiu não conhecer de imediato do objecto do recurso, vindo a alterar o seu regime de subida e determinando que o mesmo subisse diferidamente, nos próprios autos, com o que viesse a ser inter(...) da decisão que ponha termo à causa (cf. fls. 65 a 70 do Apenso AG). Apreciando. Na sessão da audiência de julgamento que se realizou no dia 08 de Novembro de 2006, o Ilustre Mandatário do arguido C questionou a testemunha de defesa BO sobre se “tem algum conhecimento dos motivos pelos quais foi escolhida a BP para este cargo neste momento”. A testemunha que estava a ser inquirida, de imediato, respondeu: “Olhe, eu tenho daquilo que ouvi da própria BP na televisão. É só isso que sei.”. Insurgindo-se contra esta parte da instância, o Ilustre Mandatário do arguido A requereu que esta pergunta fosse proibida por impertinente, considerando-a absolutamente irrelevante para o objecto do processo, e que o arguido C fosse condenado pelo incidente de protelar o andamento dos trabalhos. Inconformado com o despacho proferido em acta a fls. 41170, que em síntese decidiu que “o Tribunal vai permitir a pergunta”, o arguido A dele interpôs o recurso que agora se encontra pendente para apreciação. Como se passará a demonstrar de seguida, in casu suscita-se, desde logo, a questão prévia da falta de interesse em agir, o que conduzirá irremediavelmente à rejeição do recurso inter(...) pelo arguido A, com fundamento na sua inadmissibilidade legal, caso se venha a concluir, como julgamos, pela falta de verificação deste pressu(...) processual do direito ao recurso. Preceitua o art. 401.º do CPP (que não sofreu alterações com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08), sob a epígrafe ”Legitimidade e interesse em agir”: “1 - Têm legitimidade para recorrer: a) O Ministério Público, de quaisquer decisões, ainda que no exclusivo interesse do arguido; b) O arguido e o assistente, de decisões contra eles proferidas; c) As partes civis, da parte das decisões contra cada uma proferidas; d) Aqueles que tiverem sido condenados ao pagamento de quaisquer importâncias, nos termos deste Código, ou tiverem a defender um direito afectado pela decisão; 2 - Não pode recorrer quem não tiver interesse em agir.” Para além da legitimidade para interpor recurso imposta pelas várias alíneas do n.º 1, o recurso, em processo penal, só é admissível se o sujeito processual, inconformado com a decisão judicial contra si proferida, também tiver interesse em agir, conforme decorre da formulação negativa do n.º 2 deste preceito legal. Deste modo, a admissibilidade legal do recurso, em processo penal, encontra-se dependente, entre o mais, da verificação cumulativa destes dois pressu(...)s processuais autónomos e inconfundíveis: legitimidade e interesse em agir (ou legitimidade objectiva, por contraposição com a legitimidade subjectiva ou legitimidade tout court, na terminologia de alguns autores, como por exemplo, José Narciso da Cunha Rodrigues, in Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, pág. 389). A legitimidade activa é reconhecida a todos os sujeitos do processo, com excepção do juiz. O MP, o arguido, o assistente e as partes civis têm legitimidade para recorrer, desde que tenham ficado vencidos, isto é, quando a decisão recorrida tenha sido proferida contra eles. O MP pode também recorrer em interesse exclusivo do arguido, atenta a sua qualidade de titular da acção penal e de representante da legalidade democrática. Para além disso, a lei, na al. d) do n.º 1 do citado art. 401.º do CPP, reconhece igualmente legitimidade para o recurso a quem não tenha a qualidade de sujeito processual (cf. arts. 8.º a 84.º do CPP), mas que venha a ser afectado por uma decisão proferida nos autos (v.g. uma testemunha condenada no pagamento de uma multa processual ou um terceiro que vê o seu bem declarado perdido a favor do Estado). O interesse em agir reconduz-se ao efeito pretendido pela interposição do recurso, à necessidade de se lançar mão dele para a salvaguarda de um determinado direito (visando-se, deste modo, revogar, substituir ou alterar, em benefício do recorrente, uma decisão judicial que cause efectivo prejuízo a esse sujeito do processo), à utilidade prática decorrente da sua interposição (os recursos não são meios, nem os tribunais órgãos vocacionados para a apreciação de questões puramente dogmáticas ou teóricas, sem qualquer relevância para a definição no caso concreto dos direitos dos sujeitos processuais, mesmo que suscitadas por quem tenha legitimidade para o efeito). Desta forma, enquanto que a legitimidade ganha um cunho marcadamente subjectivo, visto que depende essencialmente da posição que o recorrente (ou sujeito activo do recurso) assume no processo, o interesse em agir traduz mais uma posição objectiva perante o mesmo, em que se avalia, de acordo com o caso concreto, se o recorrente tinha necessidade de lançar mão do recurso para a defesa dos seus direitos. Como se deixou assinalado, no Ac. do STJ de 07-05-2009, Proc. n.º 579/09 - 5.ª Secção, Relator Conselheiro Souto Moura (acessível em http://www.dgsi.pt): “Enquanto que a legitimidade do assistente se avalia para efeito de recurso, à partida, face ao seu posicionamento no processo perante a decisão proferida, assumindo pois um carácter mais subjectivo e formal, o interesse em agir resultará da análise da pretensão do recorrente, em concreto, quando confrontada com a respectiva necessidade ou indispensabilidade para fazer vingar um direito ou interesse seu. Em matéria de legitimidade averiguamos quem pode recorrer, e no domínio do interesse em agir apreciamos que interesse tem a pessoa que pode recorrer em interpor aquele concreto recurso.” Também a propósito da destrinça entre estes dois pressu(...)s processuais do direito ao recurso, diz-nos José Gonçalves da Costa (in ob. cit., págs. 411 e 412): “A legitimidade processual é «uma certa posição» das partes, em face da relação material controvertida que lhes permite ocuparem-se em juízo do objecto do processo (…). Para o efeito que aqui importa considerar, é uma posição (geralmente, de um sujeito do processo) relativamente a determinada decisão proferida em processo penal, que permite à aludida pessoa ou entidade impugnar tal decisão através de recurso.” “O interesse processual, ou, na terminologia adoptada pelo Código, «interesse em agir», é definido, tendo em vista o processo civil, como a necessidade do processo para o demandante, por estar carecido de tutela judicial o seu direito (…). Tem «interesse em agir», para efeitos de recurso (designadamente em processo penal, ressalvada a posição do ministério público quando actua no exclusivo interesse da defesa) quem tiver necessidade deste meio de impugnação para defender um seu direito.” Regressando ao caso em apreço, não se vislumbra, salvo o devido respeito por opinião contrária, que o recorrente A demonstre ter interesse na interposição deste recurso ou, dito por outras palavras, que o mesmo se mostre indispensável para a defesa em juízo dos seus direitos ou interesses, pese embora resulte incontestável a sua legitimidade para recorrer, atendendo à sua qualidade processual e à circunstância de ter ficado vencido pelo despacho recorrido de fls. 41170. Se bem interpretamos o texto, o arguido A insurge-se contra a formulação à testemunha de defesa BO da pergunta em causa – que considera inócua, irrelevante para a boa decisão da causa e uma perda de tempo e de meios económicos – , sem que, todavia, explicite, com a exigida clareza, as efectivas “consequências legais” que pretende retirar da interposição do recurso, qual o efeito útil que visa obter, qual o seu direito ou interesse, inadmissivelmente, atingido pelo despacho recorrido e que pode ser remediado mediante nova reapreciação judicial. Importa assinalar que o recurso foi inter(...) quando a testemunha de defesa já tinha sido questionada sobre tal matéria e quando inclusivamente já tinha respondido à pergunta formulada pelo Ilustre Mandatário do arguido C, como aliás se deixa bem expresso no despacho do Tribunal a quo (“A pergunta já está respondida e está gravada”), pelo que não se descortina que este recurso possa produzir algum efeito útil no que respeita à celeridade processual, à economia de meios e ao bom andamento dos trabalhos, com algum benefício ou vantagem para o arguido A. Por outro lado, caso o presente recurso viesse a ser considerado procedente, sufragando-se o entendimento de que a pergunta em causa é irregular e ilegal, continua sem se vislumbrar que interesse ou que direito do recorrente viria a obter ganho, tanto mais que o recurso se mostra inter(...) na perspectiva de reacção contra a formulação da pergunta e não, como aliás não podia deixar de ser, contra a valoração da resposta, que motivaria um recurso a final com impugnação da decisão sobre matéria de facto. De resto, a pergunta e a resposta em causa em nada contribuíram para o apuramento dos factos atinentes aos crimes de que o arguido vinha acusado e pronunciado, para a determinação da pena que lhe foi aplicada ou para elucidar o tribunal sobre a sua personalidade ou sobre as suas condições sócio-económicas, pelo que indubitavelmente o recorrente carece de interesse em agir, já que inexiste qualquer direito em perigo ou violado susceptível de vir a ser reparado pela interposição do presente recurso. Como já se disse, os recursos não têm por objecto questões puramente dogmáticas, por mais pertinentes que sejam sob o ponto de vista teórico, antes consubstanciam remédios com repercussões práticas, destinados a salvaguardar de modo directo e efectivo a posição de um determinado sujeito processual. Em face do ex(...), considera-se que o recorrente A carece de interesse em agir, já que nenhum benefício ou vantagem poderia advir para a sua posição processual decorrente de uma eventual procedência do recurso inter(...). O que conduzirá à sua rejeição liminar, por falta de “condições necessárias para recorrer” (cf. arts. 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, ambos do CPP). Finalmente, importa assinalar que, como decorre do n.º 3 do art. 414.º do CPP (que nesta parte também não sofreu alterações com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08), a decisão que admite o recurso não vincula o tribunal superior. Em face do ex(...), ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 401.º, n.º 2, 414.º, n.ºs 2 e 3, e 420.º, n.º 1, todos do CPP, acorda-se em rejeitar o recurso interlocutório inter(...) pelo arguido A do despacho de fls. 41170, com fundamento em falta de interesse em agir do recorrente. 12. Recurso inter(...) pelo arguido K do despacho de fls. 51445 a 51450, proferido em 11/3/2008, que julgou improcedentes irregularidades e nulidades arguidas relativamente a pergunta que pretendia que fosse efectuada ao assistente AV Na sessão da audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 11-03-2008 (cf. fls. 51445 a 51450 do Vol. 222.º), na sequência de irregularidades e de nulidades suscitadas pelos arguidos H, C, K e N, ainda a propósito da tomada de declarações ao assistente AV, o Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho (transcrição): “1. A fls. 34.607 e 34.811 o Arguido H, a fls. 34.609 os Arguidos C e K e a fls. 34.705 o arguido N vieram, fundamentando, arguir a nulidade ou se assim não se considerar irregularidade, do Despacho proferido oralmente pelo Tribunal na audiência de julgamento de 12/10/05 e pelo qual o Tribunal não colocou ao assistente AV uma pergunta sugerida pela defesa do arguido H. A fls. 34.609 o Arguido A, na sequência das arguições de nulidade/irregularidade acabadas de referir, veio requerer a condenação do arguido H em incidente anómalo. Dado cumprimento ao art. 327°, n.º 1, do C.P. Penal, a arguida Q pronunciou-se a fls. 34.744; o Ministério Público pronunciou-se a fls. 34.784; e o arguido K pronunciou-se de novo a fls. 34.809. Cumpre decidir. 2. Por força do dis(...) no art. 123°, do C.P. Penal, quando ocorre a violação de disposição legal na prática de um acto processual, violação esta que não seja cominada pela lei processual penal como nulidade, estamos perante uma irregularidade. As nulidades estão expressamente enunciadas no art. 119.º e 120°, do C.P. Penal. Passando ao enquadramento da questão e do núcleo de factos que estão em causa na presente arguição, na audiência de julgamento de 12/10/05 prestou declarações o assistente AV, identificado como vitima nestes autos. No decurso das suas declarações e quando lhe estavam a ser pedidos esclarecimentos quanto ao auto de reconhecimento de fls. 8.984, concretamente quanto a dois locais “Bairro (…)” e “Bairro (…)”, a Defesa do arguido H requereu ao Tribunal que perguntasse ao assistente AV “se foi abusado nesses casas e por quem’. Isto por admitir como hipótese que o assistente estivesse a transferir para os arguidos destes autos situações de abusos nesses locais. O Tribunal após ter pedido ao assistente AV esclarecimentos sobre estes locais - cfr. DVD 1, da sessão da AJ de 12/10/05 - e porque eram 12h.29m, interrompeu a audiência, sendo decidida a questão no reinício de Sessão na parte da tarde. Reiniciada a sessão o Tribunal proferiu o Despacho de fls. 34.604 a 34.605, no qual no seu “ponto II”, fundamentando, indeferiu a pergunta adicional colocada pela Defesa do arguido H. De tal Despacho foi inter(...) recurso pelo arguido H a fls. 34.605, o qual veio a ser admito pelo despacho de fls. 44.032. 2.1. O Assistente recomeça a prestar declarações e, após recomeço - cf. DVD 1, da sessão da Aj de 12/10/05 -, a defesa do arguido H, por considerar que o Assistente tinha relatado ao Tribunal, com detalhe e à vontade, as situações de abuso que, segundo ele, teria sido vitima por parte de alguns dos arguidos a ser julgados neste autos, mas não querendo falar dos abusos que referiu ter sido vítima no Bairro (…) e no bairro (…), porque lhe tinham causado grande sofrimento - mencionando expressamente que, em relação a tais abusos, o Tribunal tinha acabado de proferir Despacho impedindo que se fizessem mais perguntas sobre esses abusos, o que naturalmente respeitaria independentemente do recurso que acabara de interpor -, pediu ao Tribunal para colocar ao assistente uma pergunta que subsistia: - como é que o assistente explicava que relativamente aos abusos dos arguidos em julgamento neste processo não sentisse compressão em falar deles abertamente e relativamente aos outros sentisse. O Tribunal, oralmente - mas encontrando-se gravado - decidiu que não ia colocar a questão sugerida pela defesa do arguido H, por entender que a conclusão “não sentir compressão em falar” era a avaliação e uma conclusão feita pelo Ilustre Mandatário do arguido requerente, Sr. Dr. JJS. O Tribunal, face à avaliação feita até aquele momento das declarações do assistente, não podia tirar - pelo menos naquele momento - a mesma conclusão que a defesa do arguido: isto é, que o Assistente tinha falado sem qualquer compressão ou sem qualquer restrição em relação aos demais abusos que relatou. A perspectiva do Tribunal, pelo menos naquele momento, não era a mesma do arguido Requerente. É em relação a esta decisão que os arguidos vêm arguir a nulidade e irregularidade, por indeferimento do que, em súmula, consideram diligência essencial para a descoberta da verdade e por tal recusa afectar os direitos dos arguidos. 2.2. Analisando os invocados fundamentos, dispõe o art. 128º, n° 1, do C.PP., que a testemunha, no caso concreto o declarante, é inquirida sobre factos que constituam objecto da prova. Por sua vez diz o art. 124°, n° 1, do C.P.P., que “… constituem objecto da prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena...”, preceito este que terá que ser aferido face ao despacho de pronúncia proferido nos presentes autos. O Assistente AV declarou na audiência de julgamento de 12/10/05 que os factos ocorridos no Bairro (…) e (…) - abusos que declarou ter sofrido naqueles locais - , nada têm a ver com este processo ou com as pessoas envolvidas neste processo (Cfr. CD 1, da AJ de 12/10/05). Estariam, assim, numa primeira abordagem, excluídos do objecto do processo. No entanto e face ao art. 340°, do C.P. Penal, embora não sendo factos expressamente referidos no Despacho de pronúncia sempre poderiam ter relevância, de forma indirecta, para a descoberta da verdade material. Com efeito, o art. 340º, do C.P. Penal, consagra para a audiência de julgamento o princípio da investigação ou de verdade material: o Tribunal do julgamento tem o dever de investigar e esclarecer oficiosamente o facto que submetido a julgamento, sendo que, nas palavras do Prof. Figueiredo Dias “... a actividade investigatória do tribunal não é limitada pelo material de facto aduzido pelos outros sujeitos processuais, antes se estende autonomamente a todas as circunstâncias que devam reputar-se relevantes...” ( cfr. in Direito Processual Penar, 1° vol., edição da C.E., 1972, pág. 192. Este poder/dever de investigação é, contudo - no que diz respeito à produção de meios de prova -, sujeito aos requisitos de relevância e necessidade constantes do mencionado art. 340°, n° 1, do C.P.P. e condicionado pelos limites im(...)s no n° 3 e no n° 4, do mesmo preceito legal. A aferição dos factos relevantes que devem constituir objecto de prova e “(...) porque está em causa a busca da verdade material - apenas se encontra condicionada (e limitada) pela relevância jurídica dos mesmos factos quer em termos de existência ou não de crime, quer de punibilidade ou não do agente (...) Limitações a tal amplitude (...) temos apenas as que emanam do principio do contraditório e dos direitos de defesa do arguido, a emergirem (e a vingarem), naturalmente, quando, com a acusação, a pronúncia ou a contestação, se fixou formalmente, em certos termos e com um determinado suporte factual, um todo de imputação criminal (...) ( cfr. Manuel Sintas Santos, Manuel Leal-Henriques. David Borges de Pinho, “Código de Processo Penal”, 1º vol., Anotado, 1996, Edit. Rei dos Livros, pag. 532). E é em consequência do que antecede que o Tribunal considera que não assiste razão aos arguidos. O pressu(...) dos arguidos para a necessidade da colocação ao assistente AV da pergunta sugerida pelo Defesa de H, é a avaliação que naquele momento os arguidos fazem das declarações do assistente: consideram que o Assistente AV falou sem qualquer constrangimento e com à vontade, dos abusos que teriam sido cometidos por arguidos destes autos, apenas revelando constrangimento para falar dos outros que diz ter sofrido. Mas e como o Tribunal lá referiu noutros Despachos, o acto de julgar é do Tribunal. Tal acto tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção. A percepção do depoimento é conseguida com a imediação da prova e é da confrontação global do conteúdo do depoimento com a forma como o mesmo foi prestado em audiência de julgamento - quer do ponto de vista da exteriorização por sinais físicos, quer da hesitação, certeza, comoção, distanciamento, forma de reacção a confrontação, sendo do depoimento ao longo de todas as instâncias -, que o Tribunal, pelos princípios instrumentais e estruturais a que tem de recorrer para a formação e fundamentação da convicção, enunciados no citado art° 127°, do C.P.P., vai avaliar da liberdade da formação vontade do depoente na declaração, da ocorrência, ou não, do facto que é objecto da prova, da intervenção da factores estranhos na formação da vontade da declaração. No caso concreto e dentro do que processualmente, no momento em causa - decurso da audiência de julgamento - é permitido ao Tribunal, face à avaliação que o Tribunal fez das declarações produzidas até aquela altura, não podia tirar, ainda, a mesma conclusão dos arguidos. Acresce que no Despacho de fls. 34.604, ponto II - que antecedeu o requerimento que levou ao indeferimento da formulação de uma anterior pergunta e que também antecedeu a presente arguição de irregularidade e/ou nulidade -, o Tribunal já tinha dito que face às declarações prestadas pelo assistente AV na Audiência de Julgamento de 10/10/05 e face às prestadas na audiência de 12/10/05, não havia para o Tribunal - pelo menos naquele momento -, qualquer indicio que levasse a relacionar os factos dos locais “Bairro (…)” e “Bairro (…)” com os arguidos do presente processo, não havendo relevância para o Tribunal na formulação de perguntas em relação a tais factos. Mantendo o Tribunal o respeito pelo principio do contraditório e pelo dever da procura da verdade material, não pode é haver no decurso da audiência uma inversão das personagens do processo “...como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (…)” (cfr., quanto a esta referência, Ac. TC n° 198/2004, DR 2/6/04, II série, pag. 8544 e segs). Assim, dentro dos poderes e com os limites que a lei confere e impõe ao Juiz na fase do julgamento e da produção da prova - art. 323°, al. a) e g); art. 340º, n.º 1; art. 346º, n° 1; e art. 127°, do C.P. Penal -, o Tribunal pode não formular pergunta que não considere necessária para a descoberta da verdade, sem que isso consubstancie violação dos direitos de defesa ou denegação da procura da verdade material. Salvo melhor entendimento, no caso concreto o Tribunal não violou os direitos dos arguidos, nem o dis(...) nos arts. 128°, n°1 e 124º, n 1 e 2, do C.P. Penal ou qualquer outra disposição legal ou constitucional. 3. Face a todo o ex(...), e por considerar não se verificar qualquer uma das violações legais e pressu(...)s previstos nos art°s 118° e 120°, n°2, do C.P. Penal, o Tribunal julga improcedentes as irregularidades e nulidades arguidas a fls. 34.607, fls. 34.609, fls. 34.611l e fls. 34.705 pelos arguidos H, C, K e N.” Não se conformando com o teor deste despacho, o arguido K dele interpôs recurso (cf. Vol. 224.º, fls. 51892 a 51905), que rematou com a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “1. Vem o presente recurso inter(...) do despacho proferido em 11.03.2008 que, indeferiu a arguição de nulidade/irregularidade do despacho proferido oralmente pelo Tribunal na audiência de julgamento de 12.10.2005 e pelo qual recusou o Tribunal a quo apresentasse o assistente AV uma explicação para que relativamente aos abusos dos arguidos em julgamento neste processo não sentisse compressão em falar deles abertamente e relativamente aos por si referidos como sofridos no Bairro (…) e (…) sentisse. 2. Em audiência de Julgamento ocorrida em 10 e 12 de Outubro de 2005, o assistente AV declarou que os locais do Bairro (…) e Bairro (…) a que se reporta o auto de reconhecimento de fls. 8984, constante dos autos, não tinham que ver com locais, nem com quaisquer factos relacionados com os arguidos destes autos, mas antes com locais e factos passados consigo e relativos a abusos de natureza sexual sofridos por si e que lhe causam sofrimento. 3. Ao longo de todas as sessões em que depôs em audiência de julgamento, o assistente AV, nunca invocou qualquer constrangimento relativamente aos abusos de que terá sido vítima por parte de alguns arguidos nos presentes autos, o que não sucedeu já relativamente aos abusos de que terá sido vitima, como ele próprio afirmou, no Bairro (…) e no Bairro (…), aludindo a um sofrimento tão forte que o impede de se referir a eles, 4. Esta discrepância permite conceber como possível que o assistente tenha efectivamente sido abusado no Bairro (…) e no Bairro (…) - como de resto admite - não pelos arguidos referidos nos presentes autos - o que também admite - e que tenha transferido situações pelas quais efectivamente passou para os arguidos nestes autos, conferindo assim especial credibilidade à hipótese da existência de um processo de transferência, que leva à efabulação daquilo que é imputado aos arguidos. 5. Sendo assim da maior importância - crucial mesmo para a descoberta da verdade - perceber por que é que o assistente se sente tão constrangido por falar desses mesmos abusas constrangimento esse que o próprio admitiu em audiência de julgamento - ao ponto de se recusar a falar deles e nunca tenha invocado qualquer espécie de constrangimento para falar dos abusos imputados aos arguidos destes autos. 6. A descoberta da verdade material tem como desiderato não apenas que se escrutine a eventual verdade de determinada incriminação, como igualmente possibilitar aos arguidos, na busca da verdade, a demonstração da falsidade dos factos acusados, a sua impossibilidade e, no limite, a inocência dos arguidos perante os factos por que estão a responder, cabendo-lhe, designadamente o direito de demonstrar que, afinal, os abusos foram cometidos por outros. 7. O Tribunal de julgamento tem o dever de investigar e esclarecer oficiosamente o facto que é submetido a julgamento, estendendo-se a todas as circunstâncias que se devam reputar por relevantes e, no caso, havendo razão bastante para sindicar factos que podiam revelar a existência de um processo de transferência, com efabulação daquilo que é imputado aos arguidos - a inexistência de crime por parte daqueles agentes - tais factos, constituem necessariamente objecto de prova no sentido entendido pelo tribunal a quo no próprio despacho recorrido “a busca da verdade material apenas se encontra condicionada e limitada pela relevância jurídica dos mesmos factos, quer em termos de existência ou não de crime, quer de punibilidade ou não de agente. 8, Procurar a razão de ser da discrepância entre, por um lado, o constrangimento que o assistente referiu sentir em falar de abusos sofridos no Bairro (…) e no Bairro (…) e da ausência dele relativamente aos abusos que atribui aos arguidos é manifestamente objecto da prova nos presentes autos, sendo absolutamente essencial para o esclarecimento e apuramento da verdade que as declarações dos assistentes sobre os abusos de que alegadamente foram vítimas possam e devam ser prestadas sem limitações, de forma a que possa ser efectivamente avaliada a veracidade das mesmas e a credibilidade dos assistentes no que respeita aos factos imputados aos arguidos, impondo-se, consequentemente que a Mma. Juiz a quo tivesse autorizado a formulação do esclarecimento sugerido. 9. A restrição do âmbito dos esclarecimentos a prestar pelos assistentes aos abusos que dizem ter sido vitimas por parte dos arguidos, efectuada pelo tribunal, quando dos autos e das suas declarações parece evidenciar-se que os mesmos foram alegadamente vitimas de abusos cometidos por outros indivíduos, determina a impossibilidade da demonstração da existência de uma realidade que é, nos crimes desta natureza, absolutamente essencial para a descoberta da verdade, o que constitui uma compressão tal do direito de defesa dos arguidos atingidos por tal meio de prova que os impede de exercerem efectivamente o seu direito de defesa, no qual se inclui o direito a verem declarada a sua efectiva inocência. 10. O Tribunal a quo, ao impedir fosse colocada ao assistente a pergunta relacionada com a explicação para a sua diferente atitude psicológica relativamente aos diferentes abusos que diz ter sofrido, impediu igualmente fosse sequer avaliada a extensão dos alegados danos provocados por estes ou por outros nos assistentes, susceptíveis de ressarcimento em sede de pedido de indemnização civil, pelo que, também por esta via se impunha tivesse sido efectuado o pedido de esclarecimento ao assistente conforme solicitado pelo mandatária do arguido H. 11. Ao impedir a formulação da pergunta ao assistente, socorrendo-se dos poderes que a lei confere ao Juiz na fase de julgamento e da produção de prova por considerar a mesma desnecessária para a descoberta da verdade, o tribunal a quo fez errada interpretação da dis(...) nos arts. 323º, al. a) e g), 340°, n.° 1, art. 346°, n.° 1 e 127°, todos do C.P.P., com consequente violação dos direitas de defesa do arguido e denegação da procura da verdade material. 12. Do mesmo modo que violou o tribunal a quo o dis(...) no art. 128°, n.° 1 e 124°, n.° 1 e 2 do C.P.P. afectando ainda de forma grave o direito fundamental da defesa, tendo ainda em conta o pedido de indemnização civil formulado. 13, Nos termos do dis(...) nos arts. 118º e 120°, n.° 2, al. d) do C,P.P. a omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade, constitui nulidade dependente de arguição. 14. É manifesto que o esclarecimento pretendido do assistente AV, o qual ao não ser permitido pelo Tribunal a quo constitui uma diligência omitida que se revelava absolutamente essencial à descoberta da verdade material, impedindo-se por via da sua omissão a possibilidade de demonstração da falsidade dos factos acusados, a sua impossibilidade e, no limite, a inocência dos arguidos perante os factos por que estão a responder, bem como o direito de demonstrarem que, afinal, os abusos foram cometidos por outros. 15. Ao considerar não se verificar qualquer uma das violações legais e pressu(...)s previstos nos arts. 118° e 120°, n.° 2 do C.P.P, reiterando a desnecessidade da formulação da pergunta ao assistente, para a descoberta da verdade e indeferindo consequentemente as irregularidades e nulidades arguidas, o tribunal a quo fez errada interpretação do dis(...) nos arts 118°, n.° 1, 120°, n.° 2 al. d), 123° e arts. 128º, n.° 1 e 124° n.° 1 e 2, 323°, al. a) e g), 340°, n.° 1, art. 346º, n.° 1 e 127°, todos do C.P.P., dispositivos que violou. 16. Devia ao invés o tribunal a quo ter interpretado tais normativos no sentido de ser absolutamente essencial para o correcto apuramento da verdade a colocação ao assistente da questão sugerida, porquanto a mesma poderia possibilitar aos arguidos a demonstração da falsidade dos factos acusados, a sua impossibilidade, bem como a demonstração de que, afinal, os abusos foram cometidos por outros e, consequentemente, ter declarado a referida nulidade, determinando fosse formulado o esclarecimento suscitado ou qualquer outro que se prenda com o mesmo núcleo de factos, ou seja, a averiguação da existência de abusos sexuais na pessoa dos assistentes, perpetrados por outros indivíduos que não os arguidos nos presentes autos bem como as circunstâncias de tempo e lugar em que os mesmas ocorreram. 17. A interpretação conjugada do dis(...) nos art°s 118°, n.º 1, 120º, n.º 2 al. d), 123° e arts. 128°, n.º 1 e 1 24 n.º 1 e 2, 323°, al. a) e g), 340º, n.° 1, art. 346°, nº 1 e 127°, todos do C.P.P., efectuada na decisão recorrida, no sentido de que o Tribunal, constituindo objecto da prova a hipótese da existência de um processo de transferência, que leva à efabulação daquilo que é imputado aos arguidos, pode recusar a formulação de pergunta ao assistente por não a considerar necessária para a descoberta da verdade, muito embora tal esclarecimento tenha a virtualidade de possibilitar a demonstração da falsidade dos factos acusados, a sua impossibilidade ou mesmo a inocência dos arguidos, por constituir uma compressão do direito de defesa dos arguidos atingidos por tal meio de prova que os impede de exercerem efectivamente o seu direito de defesa, no qual se inclui o direito a verem declarada a sua efectiva inocência, contraria as garantias de defesa do arguido, sendo, como tal, inconstitucional por violação do dis(...) nos arts. 18°, n.º 2 e 3, 20°, n.° 4 e 32, n°5 1, 2 e 5, todos da Constituição da República Portuguesa, a qual deve ser declarada. 18. Uma interpretação conjugada daqueles normativos legais conforme à Lei Fundamental, exige que, na busca pela verdade material se escrutine a eventual verdade de determinada incriminação, como igualmente se possibilite aos arguidos, a demonstração da falsidade dos factos acusados, a sua impossibilidade e, no limite, a inocência dos mesmos perante os factos por que estão a responder, sendo absolutamente essencial para o esclarecimento e apuramento da verdade que as declarações dos assistentes sobre os abusos de que alegadamente foram vitimas possam e devam ser prestadas sem limitações, de forma a que possa ser efectivamente avaliada a veracidade das mesmas e a credibilidade dos assistentes no que respeita aos factos imputados aos arguidos.” O Exmo. Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, na resposta a este recurso (cf. fls. 52287 a 52290 do Vol. 226.º), pronunciou-se do seguinte modo (transcrição): “Tal como no Recurso anterior, a questão controvertida foi, inicialmente, suscitada pela Defesa do Arguido H - cfr. Acta de Audiência de Discussão e Julgamento de 12.102005, constante de fls. 34.591 a 34.613 -, à qual aderiram, ainda no decurso da referida Sessão, as Defesas dos Arguidos C e K (este, ora Recorrente). De igual modo, o Ministério Público deixa, ainda aqui, consignado, que subscreve, na íntegra, quer a parte Decisória, quer os Fundamentos do Despacho sob recurso. Fá-lo, igualmente, porque concorda com uma e com outros e, também, por uma questão de economia processual, para a qual pretende concorrer, evitando desnecessárias duplicações argumentativas. Tanto mais que, como é o caso, também o Despacho, ora sob recurso, é claro e exaustivamente fundamentado. O enquadramento e caracterização da questão controvertida resultam explícitos dos itens 2. e 2.1 do Despacho recorrido - cfr. fls. 51.446 e 51.447. O M°P°, para além do que aqui deixou dito, já teve oportunidade de se pronunciar sobre a questão em apreço, quando, após a arguição de irregularidade, foi notificado para o efeito. Porque o entendimento que perfilha é o que, já então, teve oportunidade de expressar no processo, permite-se, no essencial, reproduzi-lo no âmbito da presente Resposta (tendo em conta que a posição então expressa pela Defesa do Arguido H foi acompanhada, de entre outras, pela Defesa do Arguido K). “No decurso das instâncias ao Assistente AV, a dado passo, pela Defesa do Arguido H, foi sugerida ao Tribunal a formulação da seguinte pergunta: - Por que razão se sente o Assistente AV tão constrangido por falar dos abusos de que diz ter sido vítima nos Bairros (…) e (…), ao ponto de se recusar a falar deles, ao passo que, relativamente aos abusos que imputa aos Arguidos deste processo, nunca invocou qualquer espécie de constrangimento na respectiva descrição?”. “O Tribunal, por entender que a pergunta exorbitava o objecto do processo, indeferiu a requerida formulação, o que levou a defesa do Arguido H, logo secundada pelas Defesas dos Arguidos C e K, a arguir a nulidade prevista no art° 120°, nº 2, d), (omissão posterior de diligência que pudesse reputar-se essencial para a descoberta da verdade), ou, no limite, a irregularidade do respectivo Despacho, prevista no art. 123°, ambos do CPP”. “É sobre tal arguição que cabe pronunciarmo-nos.” “Já quando confrontado com o Auto de Reconhecimento de fls. 8984, no âmbito das instâncias que a propósito do mesmo se suscitaram, o Assistente AV teve oportunidade de dar conta ao Tribunal do profundo sofrimento que a evocação de episódios ocorridos nalguns dos locais ai referenciados lhe causava, acabando, não obstante, por admitir ter sido abusado sexualmente, em tais locais, pelo BT, da AX.”. “O Tribunal, no Despacho de fls. 34.604, teve oportunidade de chamar a atenção para o facto de a Defesa de H, na sessão de 10 do corrente, ter declarado não estar interessada em saber que factos eram esses que o Assistente prefere não recordar, relacionados com os Bairros (…) e (…), pretendendo, afinal, dois dias volvidos, saber se o Assistente havia sido abusado em tais locais e por quem.” “A razão de ser da insistente deriva da Defesa de H, relativamente a tais abusos, havia então sido justificada pelo facto de: “admitir como hipótese que o Assistente esteja a transferir para estes Arguidos situações de abuso sofridos nesses locais.” “Ou, mais adiante: “Ganha corpo para a defesa de H a tese que o assistente transferiu situações por que efectivamente passou para 05 arguidos destes autos.” “Ou, ainda: “Crescendo hoje a convicção na defesa de H que ó desse processo” (de transferência) que padece o assistente AV.” - cfr. fls. 34.607.”. “Culminando com a pergunta cuja formulação ora lhe foi indeferida, a Defesa de H tem-se afadigado na reiterada invocação de um conceito que, manifestamente, não domina, pese embora fazendo apelo a pretensas descrições que a Psiquiatria albergaria, sem, no entanto, as referenciar.”. “Diga-se, aliás, que não descortinámos, seja nos Pareceres do BU ou BV, seja nos Pareceres elaborados pelo BW, qualquer referência ao termo “transferência”, nem, tão pouco, ao respectivo conteúdo.” “Na verdade, Freud alude, pela primeira vez, ao conceito de transferência numa carta datada de 1909, reiterando-o na conferência que o Autor proferiu na II Convenção Internacional de Psicanálise, que teve lugar em Nuremberga, em Março de 1910, podendo ainda cotejar-se, a propósito, de entre outras, as referências feitas nas obras “A Dinâmica da Transferência”, de 1912 e “Observação sobre o Amor Transferencial”, de 1915.” “Para o seu autor, a transferência (enquanto transporte de sentimentos) do amor infantil (deslocado), por parte do Paciente, para a figura do Analista, constitui-se, não só, como o material de trabalho, mas também como a base da relação entre um e outro, no âmbito do processo psicanalítico, muito longe, como está bem de ver, da acepção que a Defesa de H pretende emprestar ao conceito.”. “Não será, pois, por aqui que se encontrará legitimação para uma tese que mais não existe do que na alegação que dela faz a defesa de H.” “Por outro lado, e não menos significativo, é o facto de o Tribunal ter deixado expresso, ainda no Despacho de fls. 34.604, não só que, do Despacho de Pronúncia, não resulta qualquer menção aos Bairros (…) e (…), como ainda, e sobretudo, que “face às declarações já prestadas pelo Assistente, quanto aos factos a que se referem tais locais e ao sofrimento que diz sentir em relação a estes fados e estando afastada pelo Assistente qualquer conexão, directa ou indirecta, dos arguidos que estão a ser julgados neste processo com tais locais…”, não considerou o Tribunal que estivessem verificados os pressu(...)s necessários à relevância do pedido de esclarecimento que, então, subsistia.”. “Como não estão relativamente à pergunta cuja formulação, de igual sorte, foi desatendida pelo Despacho cuja pretensa invalidade foi arguida.”. “Por fim, tal como bem assinalaram os Ilustres Mandatários do Assistente, tratando-se de matéria atinente à sua vida privada, estranha ao objecto do processo, a intromissão não autorizada pelo próprio Assistente nos factos correspondentes constituiria método proibido de obtenção de prova, o qual a tornaria nula e não utilizável, nos termos do dis(...) no art° 126º, n° 3, do CPP.”. “Por todo o ex(...), o M° P° é do parecer que o Despacho que indeferiu a formulação da pergunta em causa é plenamente válido, porque legal, não padecendo de qualquer nulidade ou irregularidade...’. O recurso foi admitido a subir a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fls. 54058, Vol 234.º). Apreciando. 12.1. Nulidades e irregularidades arguidas pelo recorrente A questão controvertida suscitada pelo recorrente K no recurso em análise prende-se com os esclarecimentos que o arguido H pretendeu obter do assistente AV, que estava a ser inquirido na sessão da audiência de julgamento de 12-10-2005 (cf. fls. 34591 a 34613, Vol. 145.º), a respeito do que este tinha afirmado sobre alegados abusos sexuais ocorridos no Bairro (…) e no Bairro (…). Após ter sido impedido pelo Tribunal a quo de questionar o assistente AV sobre se tinha e por quem tinha sido sexualmente abusado nas casas dos Bairros (…) e (…) (cf. despacho fls. 34604 e 34605), o arguido H pretendeu, de seguida, que o depoente esclarecesse como não sentia compressão em falar abertamente dos abusos em julgamento no processo, ao contrário do que acontecia com os abusos sofridos nos Bairros (…) e (…). Perante a recusa deste pedido de esclarecimento, o arguido H defendeu – no que foi secundado por outros arguidos, inclusive pelo recorrente K – que o Tribunal a quo tinha afectado um direito fundamental da defesa, o que comportaria a nulidade do acto que impediu a formulação da pergunta em causa ou que, no limite, tal situação constituiria uma irregularidade prevista pelo n.º 1 do art. 123.º do CPP (cf. fls. 34607 a 34609). Sobre este requerimento recaiu o despacho já acima transcrito e que veio a ser impugnado pelo arguido K mediante a interposição do presente recurso interlocutório. Do enquadramento destes actos processuais ressalta, desde logo, que a apreciação do mérito do presente recurso se encontra directamente dependente da pertinência, de acordo com o objecto do processo, da pergunta que a defesa do arguido H pretendeu formular ao assistente AV. Caso se venha a concluir pela sua indispensabilidade ou, pelo menos, pela sua relevância, ter-se-á de reconhecer que o Tribunal a quo omitiu diligências essenciais para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa, bem assim que ofendeu os inalienáveis direitos de defesa dos arguidos. Caso contrário, o presente recurso será irremediavelmente condenado ao fracasso. Vejamos então se assiste razão ao recorrente K. Como primeira nota, importa assinalar a coerência das decisões proferidas pelo Tribunal a quo ao longo do tempo quanto a estas matérias. Tendo primeiramente considerado irrelevante para a descoberta da verdade o esclarecimento pretendido pelo arguido H no sentido de saber se o assistente AV tinha sido e por quem tinha sido abusado nas casas dos Bairros (…) e (…), dificilmente se compreenderia que posteriormente viesse a considerar de interesse para o processo, que viesse de qualquer modo a admitir uma pergunta que tinha como pressu(...) a anterior questão que a defesa do arguido H pretendeu, mas sem êxito, colocar, ou que inclusive viesse, de seguida, a reconhecer a existência das nulidades e irregularidades apontadas pelo arguido no presente recurso. Os dois pedidos de esclarecimento mostram-se indissociáveis – a segunda pergunta parte do pressu(...) que o assistente AV foi sexualmente abusado nos Bairros (…) e (…), a sua formulação comporta, pelo menos implicitamente, a afirmativa de que ocorreram abusos nesses locais, já que se propunham esclarecimentos sobre as diferentes reacções do depoente, que pretensamente teria compressão em falar dos abusos ocorridos nos Bairros (…) e (…), ao contrário daqueles que estavam a ser julgados no âmbito do presente processo. Constituindo esta pergunta o ressuscitar, pelo menos em parte, do anterior pedido de esclarecimento rejeitado pelo Tribunal a quo e tendo este Tribunal da Relação considerado improcedente o respectivo recurso inter(...) pelo arguido H, ao mesmo tempo em que confirmou in totum o despacho de fls. 34604 a 34605, não será difícil de antever que também não merecerá procedência o recurso inter(...) pelo arguido K. Se de modo fundado, como já vimos, o Tribunal recorrido considerou notoriamente irrelevante para a descoberta da verdade, tendo em consideração o objecto do processo, saber se o assistente AV foi abusado e por quem nos Bairros (…) e (…), não podia deixar de considerar, de igual modo, notoriamente irrelevante o subsequente esclarecimento pretendido pela defesa do arguido H e de considerar, em consequência, sem qualquer fundamento o pedido de declaração de nulidade por alegada preterição de diligência essencial para a descoberta da verdade. Aliás, o próprio recorrente K, logo no início do presente recurso, a fls. 51895, enuncia correctamente, na nossa perspectiva, a questão em causa: “Sendo assim da maior importância — crucial mesmo para a descoberta da verdade — perceber por que é que o assistente se sente tão constrangido por falar desses mesmos abusos — constrangimento esse que o próprio admitiu em audiência de julgamento – ao ponto de se recusar a falar deles e nunca tenha invocado qualquer espécie de constrangimento para falar dos abusos imputados aos arguidos destes autos.” Nem mais. A pergunta que o arguido H então pretendeu formular ao depoente coloca a descoberto vários abusos sexuais. Por um lado, deparamo-nos com os abusos que são imputados aos arguidos e que se encontram sujeitos a julgamento neste processo. Por outro lado, temos os abusos sexuais cometidos nos Bairros (…) e (…), que não estão a ser julgados neste processo, face aos quais reconhecidamente nenhum dos arguidos foi por estes crimes pronunciado ou sequer acusado. De facto, esse pedido de esclarecimento delimita com assinalável rigor e clareza o que constitui o objecto do processo – os factos atinentes aos crimes imputados aos arguidos – e as circunstâncias que perante ele se mostram marginais – os factos que não estão a ser julgados neste processo. Dito por outras palavras: neste processo não se encontravam pendentes para julgamento factos relacionados com o Bairro (…) ou com o Bairro (…), nem nenhum dos vários arguidos, incluindo o próprio recorrente K, vinha acusado ou pronunciado de nesses locais ter abusado sexualmente de algum jovem ou criança da AX. Conforme também já se escreveu, o crime (ou crimes) de que o arguido vem acusado (ou pronunciado) delimita grosso modo o objecto do processo, e, em consequência, o objecto da prova. Em sede de audiência de julgamento, a prova a produzir deve centrar-se no objecto do processo, ou seja, no apuramento, quer numa perspectiva afirmativa quer num perspectiva negativa, de todos os factos juridicamente relevantes relacionados com o crime, a punibilidade do agente, a determinação e a escolha da medida da pena. Não constando da acusação ou da pronúncia qualquer menção aos Bairros (…) e (…), não vindo a nenhum dos arguidos imputada a prática de factos aí ocorridos, já se vê que escapa, por completo, ao objecto do processo qualquer pergunta que se relacione com tais locais. Como tal, tanto se mostra marginal perante o objecto do processo a pergunta dirigida ao depoente sobre se aí ocorreram factos delituosos e quem é o autor (ou autores) desses factos, como, consequentemente, a pergunta dirigida a saber se o mesmo depoente relatou de forma aberta ou comprimida esses factos em tribunal ou porque motivo (ou motivos) no depoimento reagiu de forma diferente perante os factos que estão a ser julgados nestes autos. Ou como se escreveu na decisão impugnada: “O Assistente AV declarou na audiência de julgamento de 12/10/05 que os factos ocorridos no Bairro (…) e (…) - abusos que declarou ter sofrido naqueles locais - , nada têm a ver com este processo ou com as pessoas envolvidas neste processo (…).” “Estariam, assim, numa primeira abordagem, excluídos do objecto do processo.” Em processo penal, a defesa apresenta-se como reacção aos factos que primeiramente o Ministério Público, enquanto titular da acção penal, fez verter no libelo acusatório. Não constando da acusação determinados factos, o acusado, por regra, não pode vir a final a ser condenado pela sua prática, a ser-lhe imposta uma pena ou uma medida de segurança. Em audiência de julgamento, a defesa foge ao objecto do processo quando procura investigar factos que não estão em discussão, que não constam nem da acusação nem da pronúncia, em vez de se centrar na contestação dos factos que podem determinar a sua condenação. Esses factos não beneficiam nem prejudicam a defesa do arguido porque simplesmente são alheios e marginais ao processo. Nestes casos, compete ao juiz presidente, no exercício dos seus poderes de disciplina e de direcção da audiência de julgamento, maxime proibir a formulação de perguntas legalmente inadmissíveis e impedir a realização de diligências manifestamente impertinentes ou dilatórias (cf. arts. 322.º e 323.º, als. a), f) e g), do CPP). Como afirmou o Tribunal recorrido, “o acto de julgar é do Tribunal”. O juiz não deve assumir uma atitude passiva perante a tentativa de prova de factos que não constituem o objecto do processo, sob pena, não intervindo, de comprometer os princípios da economia e da celeridade processuais, de não impedir a prática de actos inúteis e de não assegurar activamente que seja proferida decisão dentro de prazo razoável. Em consequência do ex(...), os esclarecimentos que se pretenderam obter do assistente AV – num primeiro momento, se foi abusado e por quem foi abusado no Bairro (…) e no Bairro (…); num segundo momento, porque demonstra compressão no relato dos factos aí ocorridos – não respeitam a factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime. Como tal, estes factos não podem constituir objecto de prova nos termos do dis(...) no n.º 1 do art. 124.º do CPP. A indagação desses factos respeita não à existência ou inexistência dos crimes que estavam a ser julgados, conforme imposição deste preceito, mas antes a outros crimes, pretensamente cometidos noutros locais. A maior ou menor compressão do depoimento de uma testemunha, para além de notoriamente não contribuir para a prova da existência do crime, também não serve para a demonstração da sua inexistência. Não será pela simples circunstância da testemunha não ter de(...) abertamente sobre factos marginais ao processo, que os arguidos não cometeram os crimes que lhes são imputados, que as incriminações vertidas nos autos nunca ocorreram. Doutro modo, as perguntas em causa não comportam notoriamente “factos juridicamente relevantes”. Estes, conforme já se assinalou a propósito do recurso do despacho de fls. 34604 a 34605, respeitam fundamentalmente aos elementos constitutivos do crime (ou crimes) que integra o objecto do processo, à consciência da ilicitude, ao grau de participação no facto, à imputabilidade do arguido, às causas de exclusão da ilicitude e da culpa ou a circunstâncias atinentes à escolha e à determinação da medida da pena. Das respostas a esses pedidos de esclarecimento não viria a ser apurado um facto sequer atinente a tais matérias. Nada viria a ser eventualmente demonstrado com relevo para o desfecho da causa. Indagar se ocorreram abusos sexuais no Bairro (…) e no Bairro (…), quem foram os seus autores e, de forma indissociável, como se explica que o assistente AV tenha prestado abertamente declarações sobre os abusos que estão a ser julgados nestes autos, ao contrário do relato alegadamente contido dos crimes sexuais que foram cometidos nesses bairros, em nada contribuiria para a boa decisão da causa. Tudo marginal e, como tal, irrelevante. Tendo ou não sido cometidos crimes de natureza sexual nos Bairros (…) e (…), tendo havido maior ou menor compressão (ou abertura) nas declarações prestadas pelo assistente AV em sede de audiência de julgamento, esclarecendo-se ou não os motivos dessas alegadas divergências, tais matérias mostram-se notoriamente marginais para o apuramento dos “factos juridicamente relevantes”, atinentes, como decorre do n.º 1 do art. 124.º do CPP, aos crimes efectivamente imputados nestes autos aos arguidos, ao apuramento ou não dos seus elementos constitutivos, à verificação de eventuais causas de exclusão da ilicitude e da culpa ou, por último, caso a matéria apurada o permita, à determinação da medida da pena. Em suma: não seria por causa dessas matérias que o recorrente K seria absolvido ou condenado pela prática dos crimes que efectivamente lhe são imputados, não seria por causa delas que ocorreria alguma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa, nem tão pouco seria por causa delas que aquele veria a sua pena a ser atenuada ou a ser agravada. Para além da pergunta em causa não comportar factos que constituam objecto de prova, as declarações do assistente, quanto a essa matéria (como explica que relativamente aos abusos sexuais dos arguidos em julgamento neste processo não sentisse compressão em falar deles abertamente, ao contrário dos sofridos no Bairro (…) e no Bairro (…), constituiriam também prova irrelevante, o que, nos termos da al. a) do n.º 4 do art. 340.º do CPP, determina à rejeição do respectivo requerimento. O pretendido esclarecimento por parte do assistente AV não influenciaria o processo, em nada contribuiria para a boa decisão da causa. Por um lado, respeita a factos estranhos ao objecto do processo, a factos que aqui não estão a ser julgados, a factos que, mesmo que provados, não teriam qualquer influência na absolvição ou na condenação dos arguidos. Por outro lado, visa obter do depoente explicações para as conclusões a que chegou o Ilustre Mandatário do arguido H. Conforme se assinalou no despacho recorrido, “(…) a conclusão «não sentir compressão em falar» era a avaliação e uma conclusão feita pelo Ilustre Mandatário do arguido requerente, Sr. Dr. JJS (…)”, o que nos conduz para o dis(...) no n.º 2 do art. 138.º do CPP – aplicável ao caso por força do n.º 3 do art. 145.º do mesmo código – que dispõe que “às testemunhas não devem ser feitas perguntas sugestivas ou impertinentes, nem quaisquer outras que possam prejudicar a espontaneidade e a sinceridade das respostas”. O pedido de esclarecimento em referência é indiscutivelmente sugestivo. Ao solicitar uma explicação para o sucedido, colocou a testemunha, neste caso particular o assistente AV, perante a insinuação, mesmo que implícita, que depôs de modo diferente ao longo das suas declarações, que perante uns factos falou abertamente e que perante outros sentiu compressão. A resposta a esta pergunta traduziria um reconhecimento, mesmo que implícito, que essa divergência de facto ocorreu como relatado. Podia igualmente comprometer a sinceridade da resposta. Sendo a pergunta formulada de modo sugestivo, o depoente podia ser tentado a aceitar, implícita ou expressamente, que depôs de forma divergente consoante os factos, contrariando uma posição mais reflectida e ponderada sobre o assunto. De igual modo, o sentir maior ou menor compressão (ou abertura) comporta uma conclusão retirada da análise crítica das declarações até ao momento prestadas pelo assistente. Conforme acima já se assinalou a respeito do n.º 1 do art. 124.º do CPP, o objecto da prova é constituído, logo em primeira análise, pelos “factos”. Em consonância com este preceito, o n.º 1 do art. 128.º do CPP, estabelece que “a testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova”. As conclusões constituem o desfecho lógico, o resultado a que se chega mediante o apuramento dos “factos juridicamente relevantes”, dos acontecimentos da vida real com relevância para o desfecho da causa. A prova testemunhal, à semelhança dos restantes meios de prova, serve para o apuramento de “factos”. A testemunha é inquirida sobre esses “factos”. As conclusões – sempre subjectivas e opinativas – ficam excluídas do objecto da prova. Acresce que a pergunta em causa tem subjacente factos que são estranhos ao objecto do processo, factos que não estavam a ser julgados e que, como tal, o Tribunal a quo sobre eles já se tinha pronunciado, indeferindo o pedido de esclarecimento formulado pela defesa do arguido H para que o assistente fosse questionado sobre “se foi abusado nestas casas e por quem”. A comparativa deixa implícitos factos que o Tribunal a quo já tinha considerado, fundada ou infundadamente, como irrelevantes para a descoberta da verdade. A pergunta tem como pressu(...) que no Bairro (…) e no Bairro (…) ocorreram abusos sexuais que envolveram jovens ou crianças da AX. Só deste modo se compreende o pedido para que o assistente AV indicasse os motivos, para que explicasse porque pretensamente relatou de forma contida esses factos marginais ao processo, enquanto que abertamente incriminou os arguidos. Como o despacho recorrido traduz o exercício de poderes de disciplina e de direcção da audiência, como na pergunta em causa são patentes os vícios acima apontados, como se reporta e tem subjacente factos estranhos ao objecto do processo e, como tal, ao objecto da prova, nenhuma censura nos merece o Tribunal a quo por ter impedido a formulação desse esclarecimento. Para justificar a relevância da pergunta, o recorrente K, aliás à semelhança do arguido H, veio alegar que esta “ (…) discrepância permite conceber como possível que o assistente tenha efectivamente sido abusado no Bairro (…) e no Bairro (…) - como de resto admite - não pelos arguidos referidos nos presentes autos - o que também admite - e que tenha transferido situações pelas quais efectivamente passou para os arguidos nestes autos, conferindo assim especial credibilidade à hipótese da existência de um processo de transferência, que leva à efabulação daquilo que é imputado aos arguidos.” O meio de prova constituído pelas declarações do assistente AV, respondendo à questão que as defesas lhe pretenderam colocar, mostra-se, em nossa opinião, inidóneo para prova do alegado processo psicológico de transferência, ou seja, que o depoente tenha transferido para os arguidos os abusos sexuais cometidos por terceiros. Deste modo, também com base neste fundamento, não seria de admitir a formulação do referido esclarecimento – cf. al. b) do n.º 4 do art. 340.º do CPP. Logo à partida, na perspectiva da defesa, tratando-se de um processo de imputação aos arguidos de actos praticados por terceiros, de cunho psicológico, de complicada apreensão, afigura-se que dificilmente poderia ser dispensado o recurso a prova pericial, por forma a que um técnico avalizado emitisse a sua opinião a partir de factos conhecidos, designadamente que analisando as declarações prestadas em audiência de julgamento pelo assistente AV viesse a retirar (ou não) alguma conclusão útil relativamente ao alegado processo psicológico de transferência. O assistente AV não foi indicado devido às suas particulares capacidades, competências ou conhecimentos para explicar esse complicado processo psicológico de transferência. Foi oferecido devido ao conhecimento que pretensamente possuía dos factos. Só que a pergunta que a defesa do arguido H lhe pretendeu formular – com os vícios, já acima apontados, de ser sugestiva, conclusiva e de partir de um anterior pedido de esclarecimento atempadamente indeferido pelo Tribunal a quo – em caso algum teria a virtualidade de demonstrar o que quer que seja com relevância para o desfecho do processo, muito em particular para a demonstração da propalada tese do processo psicológico de transferência. Caso o assistente viesse a afirmar que relatou com a mesma abertura (ou com a mesma compressão) quer os factos que constituem o objecto do processo, quer aqueles que lhe são alheios e marginais, o recorrente K nada de útil viria a conseguir em benefício da sua defesa. Não havendo o reconhecimento dessas discrepâncias por parte do depoente, muito menos viria este a assumir ou a admitir que houve um processo que levou à efabulação de tudo aquilo que foi imputado nestes autos aos arguidos. Caso viesse a assumir discrepâncias nas declarações por si anteriormente prestadas (v.g. não quis relatar abertamente os factos ocorridos no Bairro (…) e no Bairro (…) por não constituírem objecto do processo, por esses factos terem sido para si especialmente traumatizantes, por não se sentir preparado para falar sobre factos de que não contava que lhe fossem perguntados, por pretender salvaguardar os autores dos factos ocorridos nesses locais), também não se descortinam que factos significativos e determinantes viriam a ser apurados para a demonstração do alegado. A hipotética ocorrência de uma discrepância nas declarações prestadas, por uma das muitas pessoas que foram inquiridas em sede de audiência, não determina que tenha ocorrido o aludido processo psicológico de transferência. A eventual circunstância do assistente AV ter sido sexualmente abusado por adultos nos Bairros (…) e (…) e de ter relatado alegadamente de modo contido esses factos na audiência de julgamento, não deixa pressupor que os arguidos não tenham cometido os crimes que lhes são imputados nos autos, que outros sujeitos tenham sido os seus autores. Em suma: independentemente das respostas que viessem a ser obtidas, não se alcançam que factos tão significativos e relevantes poderiam vir a ser retirados das declarações do assistente AV para a demonstração do aludido processo de transferência. Cabe questionar o que de modo irrefutável, através da resposta à pergunta em causa, permitiria concluir que os arguidos não cometeram os crimes que lhes são imputados nos autos. Sempre permaneceria em segredo o que teria supostamente levado o assistente AV, à semelhança de outros testemunhos produzidos em sede de audiência de julgamento, a atribuir ao recorrente factos que efectivamente foram cometidos por terceiras pessoas. Deste modo, afigura-se incontornável que o pretendido meio de prova (declarações do assistente AV), com o âmbito delimitado pela pergunta que as defesas pretenderam formular (como explica que relativamente aos abusos sexuais dos arguidos em julgamento neste processo não sentisse compressão em falar deles abertamente, ao contrário dos sofridos no Bairro (…) e no Bairro (…)), era notoriamente inidóneo, inadequado para demonstrar a “hipótese da existência de um processo de transferência, que leva à efabulação daquilo que é imputado aos arguidos”. Independentemente dos factos que viessem a ser hipoteticamente revelados pelo assistente AV, através da resposta à pergunta em causa, este meio de prova, com o âmbito delimitado pela defesa, seria sempre inadequado para prova do conclusivo processo psicológico de transferência. De qualquer modo, parece que o recorrente K dá um salto no percurso lógico que desenvolve. Parece que, na sua perspectiva, uma vez demonstrada essa discrepância nas declarações, tinha de se admitir como possível que o assistente transferiu para ele factos que efectivamente foram cometidos por outras pessoas, sem mais nada alegar a este respeito no recurso inter(...). Todavia, não parece que uma coisa determine assim sem mais a outra. Não se descortina com facilidade essa relação de causa a efeito. Aliás, o próprio arguido não dá como absolutamente seguro este processo de transferência, não alega de modo detalhado como ele se desenvolveu, que concretas circunstâncias pretendia apurar para o tribunal chegar a essa conclusão, quem foram então os verdadeiros autores desses crimes, o que terá levado o depoente a indicá-lo a si como autor desses factos. Do recurso resulta apenas uma conjectura conclusiva, uma especulativa possibilidade ou, conforme aí se escreveu, permite-se “conceber como possível” que tal tenha sucedido. Mas esse processo psicológico de transferência não é afirmado como uma certeza e o recorrente K nada alegou quanto ao modo como ele se desenrolou ou processou. Igualmente sem razão, o recorrente K veio também defender que o Tribunal a quo “(…) impediu igualmente fosse sequer avaliada a extensão dos alegados danos provocados por estes ou por outros nos assistentes, susceptíveis de ressarcimento em sede de pedido de indemnização civil, pelo que, também por esta via se impunha tivesse sido efectuado o pedido de esclarecimento ao assistente conforme solicitado pelo mandatária do arguido H.” Também aqui se perdeu com questões perfeitamente marginais. Neste processo, não incumbia ao Tribunal recorrido avaliar a extensão dos danos alegadamente causados por terceiros aos assistentes. Antes incumbia apurar e avaliar esses mesmos danos mas causados pelos próprios arguidos. Até por força do princípio da adesão, o pedido de indemnização cível formulado em processo penal deve fundar-se nos factos que integram o crime em julgamento nos autos. Não em quaisquer outros. Ao tribunal incumbe indagar, apreciar e avaliar os factos delituosos que integram o objecto do processo e daí retirar consequências para efeitos de determinação dos danos que mereçam reparação indemnizatória. Eventuais situações traumáticas estranhas ao processo de nada relevam para o efeito. Os danos morais ou patrimoniais devem ser apurados a partir dos factos que integram o objecto do processo, daquilo que integra a prática do crime. A extensão dos danos a avaliar reporta-se unicamente aqueles que decorrem do delito em causa. Em síntese: para além de coerente com as anteriores decisões proferidas pelo Tribunal a quo, o despacho recorrido não merece qualquer censura ao julgar improcedentes as nulidades e irregularidades suscitadas pelos arguidos, particularmente pelo ora recorrente K. Reafirma-se aqui que o Tribunal a quo fez correcto uso dos poderes de disciplina e de direcção da audiência, que a pergunta em apreço carrega os vícios de ser sugestiva, conclusiva e de partir de um anterior pedido de esclarecimento atempadamente indeferido pelo Tribunal a quo, que escapa ao objecto do processo e ao objecto de prova, que o meio de prova constituído pelas declarações do assistente AV se mostra inadequado para a demonstração do alegado processo de transferência. Por tudo isto, não se acredita que o Tribunal a quo tenha cometido qualquer irregularidade ou qualquer nulidade por ter impedido a formulação dessa pergunta ao assistente AV. Em particular que tenha omitido “(…) diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade” – cf. art. 120.º, n.º 2, al. d), do CPP. Muito menos ainda que tenha violado os direitos de defesa do arguido K ou que o Tribunal recorrido tenha denegado a procura da verdade material. Muito embora não tenham sido atendidas as pretensões do recorrente, afigura-se que o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, ao impedir a formulação dessa pergunta, ao mesmo tempo em que não afectou as garantias de defesa, teve o mérito de centrar o processo no seu objecto, de impedir o seu desvio para questões marginais e, como tal, irrelevantes para a decisão final, procurou assegurar o julgamento da causa dentro de um prazo razoável. Como a pergunta em causa não se reportava a factos que integravam o objecto deste processo, a factos que não serviam para determinar a absolvição ou a condenação do visado, conforme já se teve anteriormente a oportunidade de defender, tudo aquilo que viesse a ser apurado a este respeito das declarações do assistente AV seria absolutamente neutro para o desfecho do processo, para a decisão final a proferir. Esses eventuais factos, distanciados do objecto do processo, nem beneficiariam nem prejudicariam o recorrente. Seriam pura e simplesmente irrelevantes. Acresce que para o processo penal não interessa a busca e a descoberta de toda e qualquer “verdade material”. Por muito interesse que determinadas matérias possam ter, a finalidade do processo penal prende-se unicamente com o apuramento dos factos concretos que são imputados aos arguidos. Por absurdo, v.g. a origem do mundo ou a existência de vida noutros planetas não integra o conceito de verdade delimitado pelo objecto do processo. Por último, não se aceita que, nos termos do dis(...) na al. d) do n.º 2 do art. 120.º do CPP, se invoque a omissão de “diligências que pudessem reputar-se essenciais”, quando o próprio recorrente K não está muito certo e seguro quanto à verdade que impõe ao Tribunal a quo que descubra. Mesmo na sua perspectiva, o denominado processo de transferência não constitui mais do que uma simples hipótese, do que uma mera possibilidade. A aceitação do entendimento pro(...) pelo recorrente K traduzia um inconcebível esforço de busca e de investigação, não de factos concretos ou de acontecimentos da vida real relacionados com o objecto do processo, mas de meras conjecturas ou mesmo de especulações, que tanto podem ter acontecido como não passar de irrealidades, com inevitáveis consequências ao nível da celeridade e da economia processuais. E cuja falta de investigação pelo tribunal, também na perspectiva do recorrente, determinaria os vícios da nulidade ou da irregularidade do acto processual. Dando-se também aqui por reproduzido mutatis mutandis tudo aquilo que já se disse a propósito do recurso do despacho de fls. 34604 a 34605, nenhuma censura merece o despacho de fls. 51445 a 51450, que deverá ser integralmente confirmado, já que carece de fundamento legal a arguição das nulidades/irregularidades suscitadas pelo recorrente K, muito em particular das previstas nos arts. 120.º, n.º 2, al. d), e 123.º do CPP. 12.2. Inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente O recorrente K veio também defender que a interpretação efectuada pelo Tribunal a quo do dis(...) nos arts. 118.º, n.º 1, 120.º, n.º 2, al. d), 123.º, 124.º, n.º 1 e 2, 127.º, 128.º, n.º 1, 323.º, als. a) e g), 340.º, n.° 1, e 346.º, nº 1, do CPP, é inconstitucional por violação do dis(...) nos arts. 18.º, n.ºs 2 e 3, 20.º, n.° 4, e 32.º, n.°s 1, 2 e 5, todos da CRP. Para sustentar a tese da inconstitucionalidade alega que ocorreu uma compressão dos direitos de defesa dos arguidos, em virtude do Tribunal recorrido ter impedido a colocação ao assistente AV da questão sugerida, que viria a possibilitar a demonstração da falsidade dos factos acusados, da sua impossibilidade e de que os abusos sexuais foram efectivamente cometidos por outros que não os arguidos. O art. 20.º da CRP, sob a epígrafe “Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva”, consagra no seu n.º 4, que “Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”. A propósito da exigência de um processo equitativo, aplicável ao processo penal, Jorge Miranda e Rui Medeiros (in “Constituição Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2010, 2.ª Edição, Tomo I, pág. 441) dizem que: “A exigência de um processo equitativo, constante do artigo 20.º, n.º 4, se não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação, impõe, antes de mais, que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialéctica que elas protagonizam no processo (Ac. n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efectividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas”. Já Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 415) anotam que: “O due process positivado na Constituição portuguesa deve entender-se num sentido amplo, não só como processo justo na sua conformação legislativa (exigência de um procedimento legislativo devido na conformação do processo), mas também como um processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais. A densificação do princípio de processo equitativo pressupõe a análise dos dados jurisprudenciais, desempenhando aqui um papel de relevo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em torno do art. 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), onde se consagrou expressamente o direito ao processo equitativo.” Ireneu Cabral Barreto (in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2010, pág. 165), em anotação ao já referido art. 6.º da CEDH e citando jurisprudência do TEDH, defende que: “Um processo equitativo exige, como elemento co-natural, que cada uma das partes tenha possibilidades razoáveis de defender os seus interesses numa posição não inferior à da parte contrária; ou, de outro modo, a parte deve deter a garantia de apresentar o seu caso perante o tribunal em condições que a não coloquem em substancial desvantagem face ao seu oponente.” Ao invocar o n.º 4 do art. 20.º da Lei Fundamental, enquanto dispositivo que na sua opinião foi ofendido pela interpretação sufragada pelo Tribunal a quo, não se perspectiva que o recorrente K faça menção ao segmento atinente ao direito de decisão da causa em prazo razoável. De qualquer modo, sempre se dirá que a pretendida autorização para a formulação da pergunta sugerida pela defesa do arguido H em nada iria contribuir para acelerar a prolação da decisão final deste processo, já que inelutavelmente esses esclarecimentos iriam comportar um dispêndio de tempo e iriam prolongar a realização da audiência de discussão e julgamento. Ao contrário, foi o Tribunal recorrido que, ao impedir a formulação dessa questão, direccionou o processo para o seu objecto, que procurou com a maior brevidade possível que o mesmo chegasse ao seu epílogo, evitando que as instâncias se perdessem em questões marginais e, como tal, irrelevantes. Seja como for, independentemente do mérito do pedido de esclarecimento, a interpretação de todos esses preceitos do CPP não se mostra, de forma alguma, ofensiva do direito de decisão da causa em prazo razoável, antes pelo contrário contribuiu para o julgamento mais célere deste processo. Igualmente não se vislumbra que o Tribunal a quo, ao impedir a formulação da pergunta sugerida pelo defesa do arguido H, tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, que tenha assegurado um tratamento de favor, de privilégio, para o Ministério Público e para os assistentes (e, consequentemente, discriminatório para a defesa), que não tenha garantido o cumprimento do princípio do contraditório, que tenha impedido os arguidos de se defenderem dos factos que lhe são imputados, promovendo a sua condenação a final. Nem tão pouco o recorrente o explica de modo mais detalhado, indicando que concreta valência do princípio do processo equitativo considera ter sido ofendida pela decisão recorrida. Ao impedir a formulação da questão sugerida pelo arguido H, não se vê de que modo o Tribunal recorrido beneficiou a acusação e desfavoreceu a defesa, de modo a se poder concluir que a decisão recorrida efectivou uma interpretação gravemente atentatória do dis(...) no n.º 4 do art. 20.º da CRP. É certo que indeferiu as pretensões de alguns dos arguidos, incluindo a do próprio recorrente K. Mas tal não significa que tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, que tenha sido por isso que foi ofendido o princípio da igualdade de armas. O processo penal não passa a ser iníquo pelo simples facto do tribunal ter indeferido uma, algumas ou até mesmo todas as pretensões apresentadas por um sujeito processual. Antes de se avançar para a formulação de um juízo de inconstitucionalidade, importa averiguar se essas pretensões têm (ou não) algum fundamento. O Tribunal a quo não permitiu à acusação algo que tenha proibido à defesa ou vice-versa, favorecendo um sujeito processual em detrimento do outro. In casu, se os arguidos foram impedidos de formular a sugestiva e conclusiva pergunta sobre a menor abertura ou sobre a maior compressão das declarações do assistente AV, também não se franquearam as portas para o Ministério Público obter do depoente esses mesmos esclarecimentos ou outros com conteúdo idêntico ou semelhante. Nada nos permite concluir que o Tribunal recorrido tenha usado de dois pesos e de duas medidas ou que, em violação do princípio da imparcialidade, tenha tomado partido pela acusação em detrimento da defesa, em desrespeito do princípio constitucional do processo equitativo. Sinceramente não se vê que o desfecho deste processo tenha ficado marcado por o Tribunal a quo não ter autorizado a formulação dessa pergunta, que o despacho recorrido tenha impossibilitado, dificultado ou prejudicado a defesa do recorrente K (que aliás, diga-se, num primeiro momento, aderiu ao requerido pelo arguido H), ao mesmo tempo em que beneficiou a acusação, que tenha comprometido o equilíbrio imanente a um processo equitativo. Também nunca é demais recordar o que já acima se defendeu. A pergunta em causa tem subjacente factos estranhos ao objecto do processo, factos que, mesmo que provados, não teriam qualquer influência na absolvição ou na condenação dos arguidos. Factos que são alheios ao objecto do processo e que, como tal, se mostram irrelevantes. Nenhum dos arguidos vinha acusado de ter cometido abusos sexuais no Bairro (…) ou no Bairro (…). A pergunta que a defesa do arguido H pretendeu formular e que originou a interposição pelo arguido K do presente recurso, não pode deles ser desprendida, nem da pretérita decisão do Tribunal a quo, que indeferiu o pedido de esclarecimento adicional sobre se o assistente foi sexualmente abusado naqueles bairros e por quem, por ter considerado o mesmo sem relevância para a descoberta da verdade. Mesmo tendo ocorrido abusos sexuais no Bairro (…) ou no Bairro (…), mesmo que estes tenham sido cometidos por outros que não os arguidos e mesmo verificando-se a apontada divergência nas declarações desse assistente, não se descortina que contributo absolutamente irrefutável viria a ser recolhido para a defesa ou para a descoberta da verdade, unicamente aquela que interessa para o processo. A resposta a estas questões não permitiria, sem saltos no percurso lógico, a demonstração, minimamente fundamentada, de um hipotético processo psicológico de transferência ou a impossibilidade dos arguidos terem cometido os factos que lhes são imputados nestes autos. Singelamente uma coisa não determina a outra. Tudo isto para afirmar que as perguntas, particularmente aquela que motivou o presente recurso, para além de irrelevante de acordo com o objecto do processo, se mostra inadequada, enquanto meio de prova, para a demonstração do hipotético processo psicológico de transferência. Como tal, não se perfilha o entendimento de que o Tribunal a quo sufragou uma interpretação ofensiva das efectivas garantias de defesa do arguido. Essa pergunta, com os apontados vícios de ser conclusiva e sugestiva, serviria, quanto muito, para a avaliação da consistência, da coerência e da credibilidade das declarações prestadas pelo assistente AV. Só que partiria de factos estranhos ao objecto do processo. Tal como já se defendeu a propósito do recurso do despacho de fls. 34.604 a 34.605, um depoimento deve ser avaliado tendo em consideração a forma como essa pessoa depôs sobre os factos que constituem o objecto do processo, sob pena de se alargar o âmbito da inquirição ao ponto de se passar a questionar a própria personalidade e o próprio carácter do depoente. Passaríamos então a julgar a própria testemunha, com base em factos marginais ao processo, em vez de avaliarmos criticamente se o seu depoimento se revelou credível. Numa lógica reprovável de quem é sério nunca falta à verdade e de que quem é falso nunca fala a verdade. O recorrente K imputa também ao despacho recorrido o vício da violação do dis(...) no art. 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Lei Fundamental, pese embora continue sem indicar, detalhadamente, quais as garantias do processo penal, reconhecidas pelos vários números desse dispositivo, que considera terem sido ofendidas e de que forma ocorreram esses atentados. O art. 32.º da CRP, sob a epígrafe ”Garantias de processo criminal”, dispõe: “1 – O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. 2 – Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.” (…) “5 – O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório.” Em anotação ao n.º 1 deste preceito constitucional, doutrinam Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 516): “(…) este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo criminal. Em «todas as garantias de defesa» engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas”. In casu, em face de todas as considerações já acima expostas, importa nesta sede reafirmar, agora a propósito do n.º 1 do art. 32.º da CRP, que a pergunta que deu origem ao despacho recorrido e ao presente recurso não constituía genericamente um “instrumento necessário e adequado” para o recorrente se defender e para contrariar a acusação do Ministério Público. A pergunta em causa não constitui instrumento “necessário” para rebater a acusação, por nenhum dos arguidos estar acusado da prática de crimes ocorridos no Bairro (…) ou no Bairro (…) e por o seu eventual cometimento por terceiros não excluir que os arguidos tenham incorrido na prática dos factos que integram o objecto deste processo. Também não constitui instrumento “adequado”, por os factos que reconhecidamente estiveram na génese da formulação da pergunta e por os factos que viessem eventualmente a ser apurados mediante resposta não se mostram idóneos para demonstrar o hipotético processo de transferência. A violação das garantias de defesa não se confunde com a simples rejeição de uma pretensão formulada pelo arguido em juízo. O tribunal não está constitucional e legalmente vinculado à aceitação de todas e quaisquer pretensões do arguido, por mais infundadas que estas sejam. Ou, conforme se escreveu no despacho recorrido, “(…) o Tribunal pode não formular pergunta que não considere necessária para a descoberta da verdade, sem que isso consubstancie violação dos direitos de defesa ou denegação da procura da verdade material.” Se genericamente, pelos motivos acima ex(...)s, não ocorreu violação das garantias de defesa, também de um modo mais particularizado não se constata a alegada ofensa ao dis(...) no n.º 1 do art. 32.º da Lei Fundamental. Efectivamente, não se mostra que o despacho recorrido tenha perfilhado uma interpretação normativa que seja ofensiva v.g. dos princípios da presunção da inocência, do julgamento no mais curto prazo, da estrutura acusatória do processo criminal ou do contraditório, nem tão pouco que tenha violado v.g. o direito ao recurso das decisões desfavoráveis, o direito a estar presente e a participar nos actos processuais que lhe digam respeito, o direito a ser assistido por defensor, o direito ao silêncio, o direito a intervir no inquérito e na instrução ou a liberdade máxima de produção da prova. Os cidadãos não podem ser considerados responsáveis pela prática de ilícitos criminais, presumindo-se inocentes, até prova em contrário, até ao momento em que uma sentença, com transito em julgado, demonstre a sua culpabilidade. O princípio da presunção da inocência, como vimos consagrado pelo n.º 2 do art. 32.º da CRP, desdobra-se, designadamente, na proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido, na preferência pela sentença de absolvição contra o arquivamento do processo, na exclusão de fixação de culpa em despachos de arquivamento, na proibição da antecipação de verdadeiras penas a título de medidas cautelares, na proibição de efeitos automáticos da instauração de procedimento criminal, na natureza excepcional e de última instância das medidas de coacção e no princípio in dubio pro reo (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in ob. cit., pág. 518). Ao interpretar os mencionados preceitos do CPP, não se afigura que o despacho impugnado de fls. 51.445 a 51.450 formule, ainda que implicitamente, um juízo de culpabilidade do recorrente K ou, melhor dizendo, que tenha abalado ou esbatido o princípio da presunção da inocência, tanto mais que esse despacho teve por base, ao indeferir a arguição de nulidades e de irregularidades, questões marginais ao objecto do processo. Em parte alguma, ainda que implicitamente, o Tribunal a quo, pronunciando-se sobre os factos vertidos no despacho de pronúncia, considerou antecipadamente, ainda no decurso da audiência, o recorrente K como culpado pela prática dos crimes que lhe são imputados. Nem tão pouco essa decisão permitiu ou facilitou a condenação do recorrente. Ao invés, o recurso inter(...) parece partir do pressu(...) de que incumbe ao arguido demonstrar a sua efectiva inocência, diligenciando inclusivamente pela prova de factos alheios ao processo, em vez de competir à acusação demonstrar a sua culpabilidade, ilidindo a presumida inocência prevista pelo n.º 2 do art. 32.º da CRP, mediante a prova dos factos vertidos na acusação, naturalmente com sujeição ao princípio do contraditório. Quanto ao segundo segmento do n.º 2 do citado preceito constitucional, torna-se desnecessário aqui repetir o que acima já se defendeu, no sentido de que a pergunta sugerida pela defesa do arguido H e de que as nulidades e irregularidades então suscitadas pelos arguidos implicariam inelutavelmente um retardamento na conclusão do julgamento, sem qualquer benefício para os arguidos e sem preterição de qualquer garantia de defesa. Quanto ao dis(...) no n.º 5 do art. 32.º da CRP, mais uma vez se escreve, que o princípio do acusatório, aí consagrado, pretende assegurar que o processo criminal decorra com equidade ou com justo equilíbrio entre os vários sujeitos processuais, que os poderes concedidos à acusação não suplantem aqueles que são reconhecidos à defesa, que haja um equilíbrio entre as prerrogativas atribuídas ao arguido para demonstrar a sua inocência e as prerrogativas reconhecidas à acusação para comprovar a culpabilidade do acusado, que existam diferentes órgãos encarregues de acusar e de julgar e que o tribunal assegure as garantias de independência e de imparcialidade. O despacho recorrido também não se mostra ofensivo para o princípio do acusatório. Reafirma-se que o Tribunal a quo, ao julgar improcedentes as nulidades e irregularidades invocadas pelos arguidos, não tomou partido pela acusação em detrimento da defesa, não favoreceu o Ministério Público promovendo a prova dos factos da acusação, não desfavoreceu os arguidos dificultando a sua defesa, não desequilibrou o processo, não se imiscuiu em competências que não eram as suas, não violou o dever de imparcialidade. Limitou-se simplesmente a indeferir uma pretensão apresentada, entre outros, pelo recorrente, mas sem que essa decisão tenha ofendido, em nossa opinião, qualquer direito, liberdade ou garantia. Ao tribunal compete-lhe decidir as questões que lhe são apresentadas. O Tribunal a quo fê-lo, indeferindo a pretensão do recorrente, não de um modo arbitrário, parcial ou discriminatório, mas com base em fundamentos já reputados como válidos. Mantém-se igualmente intocado o princípio do contraditório. Todos os arguidos estavam inteirados dos factos que lhes eram imputados nestes autos, puderam contestá-los ao longo do processo e puderam em audiência de julgamento produzir as provas que tiveram por convenientes para os rebater. O despacho recorrido limitou-se a centrar o processo no seu objecto quando indeferiu as nulidades e as irregularidades suscitadas na sequência de pedidos de esclarecimento que tinham subjacentes, directa ou indirectamente, factos ocorridos nos Bairros (…) ou (…). Mas esses factos não integram o objecto do processo, nem foram apresentados pelo Ministério Público para serem rebatidos pelos arguidos. A máxima liberdade no oferecimento de prova e a máxima amplitude do princípio do contraditório, não podem olvidar a celeridade e a eficácia do sistema de justiça. Que se perdem quando as atenções são desviadas para ocorrências marginais e que, a final, nada acrescentam para a absolvição ou para a condenação dos acusados. Deste modo, não se crê que seja inconstitucional a interpretação normativa efectuada pelo Tribunal a quo, que atente contra algum dos princípios constitucionais acima enunciados, que viole os direitos, liberdades e garantias do recorrente K ou que lhes tenha estabelecido restrições desnecessárias e intoleráveis à luz da Lei Fundamental. Em face do ex(...), julga-se totalmente improcedente o presente recurso interlocutório inter(...) pelo arguido K e, em consequência, decide-se confirmar integralmente o despacho de fls. 51445 a 51450, proferido na sessão da audiência de discussão e julgamento de 11-03-2008. 13. Recurso inter(...) pelo arguido E do despacho proferido a fls. 55504 a 55506, em 7/8/2008, que lhe indeferiu um seu requerimento de prova complementar No âmbito dos presentes autos, o arguido E, durante a audiência de julgamento, na sequência do depoimento prestado pela testemunha BO, formulou requerimento, ao abrigo do dis(...) no art. 340.º do CPP, pedindo que fosse ordenado à testemunha BO que, tendo encontrado o suporte de uma gravação de uma entrevista com o assistente AK, apresentasse o suporte dessa gravação, requerendo também que fosse feita a sua reprodução em audiência, na presença do assistente e da testemunha BX, para se pronunciarem quanto ao reconhecimento de vozes (cf. fls. 49158 a 49159). O Tribunal proferiu despacho a indeferir o requerido pelo arguido (cf. fls. 55504 a 55506 dos autos). Irresignado com aquele despacho, dele recorreu o arguido E, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1ª O recorrente requereu, a fls 49158/9 e ao abrigo do dis(...) no art° 340º do CPP, que fosse ordenado à testemunha BO que apresentasse suporte da entrevista que disse ter-lhe sido dada pelo assistente AK e ter gravado, requerendo também que fosse feita a sua reprodução em audiência, na presença do assistente e da testemunha BX, para se pronunciarem sobre o reconhecimento da vozes. 2ª Fundamentou o requerimento alegando que o jornalista afirmou que o assistente por ele entrevistado lhe disse, antes de iniciada a gravação, que não conhecia E, dizendo no decurso da gravação que talvez estivesse enganado, talvez o conhecesse, talvez não o conhecesse. 3ª Concluindo que é necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa esclarecer se o assistente conhecia ou não o recorrente, para o que poderá dar contributo decisivo a audição da gravação da entrevista, que poderá também contribuir decisivamente para esclarecer quanto aos factos imputados relativos a uma (...) em (…). 4ª O douto despacho recorrido refere, nomeadamente, que não há elementos de facto ou de dúvida que levem o Tribunal a concluir que, neste momento, a produção da diligência requerida é necessária e útil para a prova dos factos que se incluam no objecto do processo e para a produção da decisão final. 5ª É manifesto que é necessário e útil para a prova desses factos ou para a prova de que não aconteceram, determinar, também através de audição de entrevista dada pelo assistente, em conversa naturalmente mais solta do que as declarações prestadas em audiência, se ele conhecia ou não o recorrente. 6ª O recorrente pretendeu - e pretende - que esse meio de prova seja produzido em audiência, dada a sua grande relevância para o Tribunal aferir da credibilidade das declarações prestadas pelo entrevistado em audiência. 7ª A utilidade e necessidade da junção da gravação da entrevista, que resultavam dos fundamentos do requerimento, só podia ser cabalmente aferida com a sua audição. Por isso, o recorrente absteve-se no requerimento de referir extractos da entrevista, que melhor revelariam essas necessidade e utilidade. 8ª Fá-lo agora no âmbito de todas as garantias de defesa (art° 32° da Constituição) e também considerando que a defesa não está espartilhada por eventuais obstáculos de qualquer cartilha limitadora dessas garantias constitucionais. 9ª As transcrições feitas acima sob o n° 5 e que se dão por reproduzidas nesta conclusão confirmam plenamente os fundamentos constantes do requerimento indeferido, mormente se confrontadas com as declarações prestadas pelo entrevistado em audiência de julgamento. 10ª O douto despacho recorrido obviou à produção de meio de prova muito relevante para aferição da credibilidade das declarações prestadas em audiência pelo assistente AK e, por isso, necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, violando, por erro de aplicação, as normas do art° 340º do C.P.P. e do art° 32° da Constituição, que deviam ter sido aplicadas no sentido do deferimento do requerido pelo recorrente. Nestes termos e sobretudo pelo que doutamente será suprido, deve, se a decisão não for reparada ao abrigo do dis(...) no art° 414°-4 do CPP, ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o douto despacho recorrido e ordenando-se a notificação da testemunha BO para apresentar suporte da gravação da entrevista que lhe foi dada pelo assistente AK e que, junto esse suporte, seja feita a sua reprodução em audiência de julgamento, na presença do assistente e da testemunha BX, Como se espera e é de JUSTIÇA! O Magistrado do Ministério Público junto da 1.ª instância, apresentou resposta ao recurso interlocutório, onde se refere, transcrevendo: “(…) Refira-se, em primeiro lugar, que o Assistente AK, em parte alguma do depoimento que prestou em audiência, confirmou, expressamente, ter dado qualquer entrevista à Testemunha BO. Se o não fez, tão pouco poderá concluir-se que, a haver gravação, ela tenha sido realizada com o seu consentimento. Acresce ainda que, repete-se, a haver gravação, ela foi, no dizer do próprio BO, prestado em audiência, registada, a espaços, de acordo com o seu único e exclusivo critério. (“… nós passamos uma tarde toda juntos não é, de modo íamos falando e quando ele me dizia alguma coisa que eu achava que era relevante, eu ligava o gravador e pedia para repetir, de modo...”). Por fim, tenha-se em conta que, na determinação da necessidade, ou não, do meio de prova, apenas se poderá ter em conta a prova existente nos autos e produzida em audiência, (...) que as transcrições, alegadamente retiradas da pretensa gravação, só pela Defesa do Arguido E são invocadas. Daí que, nem a 1ª Instância, nem o Tribunal da Relação se possam delas valer com vista à avaliação da relevância do meio de prova e como suporte da correspondente decisão. A irrelevância da produção do “meio de prova” que o Tribunal, e bem, indeferiu, resulta, desde logo, da fragilidade do depoimento de quem afirma tê-lo na sua posse. Justamente, a Testemunha BO. Leia-se, porque elucidativo, o depoimento prestado na audiência de 08.11.2006, nas partes em que se faz alusão a AK e ao alegado encontro com a Testemunha BO: “JP (MERITÍSSIMA JUIZA PRESIDENTE): - Então Sr. Dr. avance se faz favor, Dr. Joaquim Moreira. Dr. KKW (Mandatário do arguido E - doravante designado por KKW):- Sr. BO, o Sr. esta tarde ia a falar de algo relacionado com o Sr. AK e com o BL, pode comunicar, informar ao Tribunal o que é que ia dizer? BO (BO): - Muito bem, de modo... JP:- Eu vou pedir o seguinte, perguntas concretas, face ao que já disse, pergunta concreta, o que de facto interessa saber ao Sr. Dr. se foi dito à testemunha se não foi para tentar começar através dum dado concreto, balizar o resto Sr. Dr., obrigada. KKW.- Se alguém lhe disse, se alguém lhe disse algo sobre a atitude do BL relativamente, não posso ir além disto porque foi o que a testemunha ia a dizer, relativamente ao Sr. AK? BO:- De modo eu falo com o BY que é o irmão do AK, e que conhecia o Sr. E... KKW:- Antes de avançarmos Sr. BO, como, porque é que o Sr. foi falar com o Sr. BY? BO:- Bom, eu fui ao, várias, duas ou três vezes ao (…), bom para me aperceber enfim, o que é aquilo, o que é aquele fenómeno, etc. e nesse sentido conheço lá várias pessoas, nomeadamente prostitutos, cinco seis, de cada noite que ia lá, encontrava-me cinco seis, falávamos sobre esta questão da AX, etc. perguntava-lhe obviamente, conhece fulano, sicrano, já viu o Sr. H, já viu outro, etc. enfim o trabalho de campo que o jornalista tem que fazer, uma dessas noites veio ter comigo um rapaz que me mostrou um cartão, um cartão de visita do inspector BZ, e disse-me, sabe podemos ir falar a qualquer lado, bom de modo levei-o e começámos a falar, passámos alguns dias a falar, de modo ele conhecia bem ou conhecia algumas partes deste processo, mas logo à partida ele disse-me o seguinte, eu sei muito sobre isto porque o E está preso por causa duma informação, por causa do meu irmão... JP:- Como é que se chama esse rapaz? BO:- AK. JP:- Não, não, o primeiro. BO:- BY, BY, mais tarde vinha a saber que tinha sido, que tinha vivido, que tinha sido apoiado na sua infância logo aos oito anos pelo Dr. BL, ele já se dedicava à prostituição aos oito nove anos no Jardim (…), no (…), tinha sido acolhido pela CA de modo uma jornalista que é, que é mãe da CB, CE que o ajudou e que depois o ajudou a colocar na AX, de modo isto só para atalhar a história deste rapaz, um rapaz bastante, de modo delinquente, bastante conflitivo, mas que tem sido acompanhado... JP:- Sr. Dr. ir tentando sempre balizar a resposta tal como o Sr. Dr. JJQ fez. BO:- Nessa altura, nessa altura ele diz-me o seguinte, é que o meu irmão não conhece o E, eu isso tenho a certeza disso, bom eu... KKW:- E quando ele dizia irmão, era que irmão? BO:- AK, eles são filhos de pais diferentes, ele têm a mesma mãe mas são filhos de pais diferentes. KKW.- E havia algum outro irmão? BO:- Tem um outro irmão BB, que eu também conheci um dia que fui a casa deles e com uma irmã BX, e fui com esta Sra. CA, de modo que a ex-mulher do mestre CD, a mãe da CB e da CE, de modo fomos lá os dois porque ela conhecia muito bem a família e fez-me a entrada para mim era essencial meterem-me no meio duma forma confortável e sem ter aquele ónus do jornalista que vai ali fazer perguntas, etc. era extremamente importante para nós podermos falar com tranquilidade... KKW:- Sim Sr. BO mas neste momento interessava-me que o Sr. esclarecesse o que é que lhe foi dito em relação ao Sr. Dr. BL. BO:- Em relação ao BL o que me foi dito foi que o BL acompanhava o BY, acompanhava o AK, foi-me dito também pela irmã do AK... KKW:- Como é que se chama essa irmã, sabe, recorda-se? BO:- BX, BX, tenho os contactos dela, volta e meia falo com ela, mantenho obviamente contacto com todas as minhas fontes isso é normal, a conversa com ele e com ela foram conversas bastante, de modo foram gravadas, ou seja, foram transcritas, de modo eu tenho a transcrição toda, horas de conversa com, obviamente com o conhecimento de ambos, de modo é uma questão clara, e ela diz-me a certa altura, de modo isto em Agosto de Dois Mil e Três se não estou em erro mas eu tenho as datas, antes de se saber a existência das, das inquirições para memória futura, ela fala comigo e diz-me recebi hoje ou ontem uma chamada do Dr. BL para, a avisar-me para eu avisar o meu irmão que estava numa (...) para ele não se preocupar porque as inquirições vão ser feitas em memória futura, de modo ele não se preocupe, bem e eu tinha, de modo nós só tínhamos a noticia de que o Juiz Rui Teixeira tinha negado as inquirições... JP:- Pronto, Sr. Dr. tentar balizar. KKW:- De momento não pretendo mais nada... RSF (DR. R. SÁ FERNANDES): - O Sr. tem entrevistas gravadas com o BY e com o AK? BO:- Com o BY não tenho, com o BY tenho a ameaça, etc. agora com o AK tenho, enfim espero, por acaso ando à procura dela, porque com esta mudança, mas pronto, mas está transcrita e eu sei onde ela está, ela está dentro de minha casa é uma questão de... BO:- Um momento, sim, um momento…isto é um, ou seja, nós passamos uma tarde toda juntos não é, de modo íamos falando e quando ele me dizia alguma coisa que eu achava que era relevante, eu ligava o gravador e pedia para repetir, de modo... JP:- E o Sr. AK sabia que o Sr. estava a ligar o gravador? BO:- Sabia, claro, ou seja, estou à frente... JP:- Então em concreto, em concreto o que é que lhe disse? BO:- Eu só vou ler, só vou ler... RSF.- Essa questão do dinheiro... BO:- BO : “De modo eu, és capaz de me repetir isso?” AK: “Veio mais testemunhas à pala que o Estado ia pagar indemnizações.” BO : “O que estás a dizer é que há muitos testemunhos destes que dizem que o Estado vai pagar indemnizações?” AK : “Sim.” BO : “E achas que os testemunhos são sinceros ou são falsos?“ AK : “Uns podem ser sérios, outros podem ser falsos…”. JP:- Sr. BO, em concreto tente encontrar as palavras, o que é que AK lhe disse dele próprio, é isso que está a ser pedido. RSF:- Porque o Sr. o que disse há pouco é que o BY disse que ele estava ali só podia ser por dinheiro, agora eu queria saber é se o AK também admitiu isso? BO:- Um momento só, agora tenho que... JP:- Mas a entrevista tanto quanto eu estudei essa questão tem a ver quando é pedido o sigilo, não de qualquer forma. Pelo Sr. AK foi-lhe pedido algum sigilo, foi- lhe dito para o Sr. não falar sobre esse assunto? BO:- Não, não, em nada. JP:- Pelos menos Srs. Drs. tanto quanto eu estudei a questão, penso que será assim. BO:- Nem eu violaria jamais essa questão, não, isso... JP:- Procurar então o elemento concreto... BO:- AK : “Está completamente fora de, de questão para mim não é. BO : “Quando os interrogatórios da Policia Judiciária, quando é que te disseram que tu podias pedir uma indemnização ? Foi logo no inicio ou foi a meio?” AK : “Foi a meio para aí, não me disseram logo porquê, porque eu por mim não quero nada, quero é paciência dizer o que sei e pôr uma pedra completamente esquecer isto, isto agora para mim repugna-me, dinheiros e isso assim repugna-me, para mim o que mais me interessa é ajudar outras pessoas não quero nada de ninguém, nunca fiz nada...”. JP.- Isso foi dito por AK? BO:- Exactamente. JP:- Pronto. Próxima questão Sr. Dr., existe mais alguma? RSF:- Não Sra. Dra. JP..- Nada, Sr. Dr.”. (Destaque e sublinhado nossos) De onde resulta, além do mais, que a afirmação da Testemunha BO, segundo a qual o Assistente AK lhe terá dito, com o gravador desligado, que não conhecia o Arguido E, afinal, não está registada na alegada gravação. Ainda segundo a Testemunha BO, após ter ligado o gravador, o Assistente, titubeando, lá foi dizendo que talvez conhecesse, etc., etc.. Qual, então, a utilidade do pretenso registo fonográfico? O que a Testemunha BO não referiu é se perguntou, ou não, a AK, o que quereria ele dizer quando afirmou: “… porque eu por mim não quero nada, quero é paciência dizer o que sei e pôr uma pedra completamente esquecer isto, isto agora para mim repugna-me…” e se, tendo-o feito, o que terá o Assistente respondido. O M°P° reconhece, com o Tribunal, “que dada a amplitude do despacho de pronúncia e das Defesas apresentadas, por vezes a “selecção” ou a aferição da probabilidade de relevância torna-se difícil”.. Compreende, igualmente, a particular dificuldade que se possa colocar, aos Sujeitos Processuais, em aferir o alcance da afirmação do Despacho, segundo a qual “…os elementos probatórios que têm vindo a ser adquiridos ao longo da audiência de julgamento…, são suficientes, neste momento, para o esclarecimento que o Tribunal considera precisar e ser necessário em relação a tal facto ou núcleo de factos.”. Não obstante, e pese embora a fase de produção da prova não esteja ainda encerrada, aceita-se que, dado o tempo já decorrido, desde o início do julgamento, bem como a quantidade, natureza e variedade da prova já produzida, o Tribunal se paute por critérios de acrescida exigência, no que à admissão de novos elementos probatórios diga respeito. À luz de tais critérios, o Despacho recorrido é claro e exaustivo, na respectiva fundamentação, nomeadamente, quando salienta, de entre outros, como factores de ponderação da necessidade, ou não, da produção do meio de prova, tal como requerido, o objecto do processo e as diversas linhas de Defesa, os depoimentos de AK, BX, dos Inspectores da P. Judiciária, designadamente, do Inspector CF, bem como do Arguido A, e, ainda, os elementos do processo individual da AX, relativos ao Assistente AK. Por todo o ex(...), bem decidiu o Tribunal ao indeferir, como indeferiu, o Requerimento da Defesa do Arguido E. Consequentemente, entende-se dever o Despacho recorrido ser mantido, nos seus precisos termos, negando-se, em consequência, provimento ao Recurso”. O recurso do arguido E foi admitido por despacho de fls. 60257 dos autos. O arguido E, nas conclusões do recurso que interpôs do acórdão final, dando cumprimento ao dis(...) no art. 412.º, n.º 5, do CPP, reiterou o seu interesse na apreciação do recurso por si inter(...) do despacho de fls. 55504 a 55506 (cf. fls. 69660). A questão suscitada pelo recorrente prende-se com o alegado vício do despacho recorrido, que obviou à produção de meio de prova muito relevante para aferição da credibilidade das declarações prestadas em audiência pelo assistente AK e, por isso, necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, violando, por erro de aplicação, as normas do art. 340.º do CPP e do art. 32.º da CRP, que deviam ter sido aplicadas no sentido do deferimento do requerido pelo recorrente. O despacho objecto do presente recurso tem o seguinte teor: “(…) 1. A fls. 49.158/9 o arguido E – subscrito a fls. 49.672 pelo arguido K –, fundamentando, requereu ao tribunal que determinasse o envio para os autos de eventual gravação de entrevista (telefónica), que teria sido dada pelo assistente AK a BO. O Ministério Público pronunciou-se a fls. 49.527. O Tribunal passa a decidir. 2. Tendo presente o que acima ficou dito quanto ao art.º 340.º, do C.P.P. e o princípio da investigação por parte do Tribunal e avaliando neste momento processual da necessidade da produção do meio de prova suplementar requerido, há que dizer que ao longo do Julgamento, de acordo com as linhas da Acusação ou Defesa que vão sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal vai construindo um encadeado – ou por vezes mera justaposição – de factos, conhecimento, reflexões, que acompanham tais linhas de acusação ou de defesa. Isto de modo a que, a final, chegue a uma decisão. Assim, o Tribunal deve investigar tudo o que puder e dever, mas com os limites im(...)s pelo art.º 340.º, do C.P.Penal, isto é, investigar o que considere necessário para tomar uma decisão e uma decisão Justa, verdadeira e fundamentada. Acresce, ainda, que nesta fase do julgamento a admissão de meios de prova complementares deve ser avaliada face ao global da prova entretanto adquirida em audiência de julgamento. O que, naturalmente, gera um juízo mais restrito quanto ao que o Tribunal possa considerar potencialmente relevante para o esclarecimento da verdade, do que em fases anteriores do julgamento. Isto sem deixar de dizer que dada a amplitude do despacho de pronúncia e das Defesas apresentadas, por vezes a “selecção” ou a aferição da probabilidade de relevância torna-se difícil. 2.1. Avaliando e ponderando o requerido pelos arguidos: - tendo em atenção o objecto do processo e sem descurar as linhas de Defesa apresentadas pelos vários arguidos; - ponderando (pelo menos) as declarações que foram prestadas em audiência de julgamento pelo assistente AK e, entre o mais, o que declarou quanto a reconhecimento (e momento) do arguido E, contactos com o arguido E, contactos com um Sr. jornalista BO, o que declarou quanto a deslocação a (…) com este senhor Jornalista ou com os Srs. Inspectores da Polícia Judiciária, incluindo os esclarecimentos que foram pedidos pelo Ilustre Mandatário do arguido E – quer na sessão da audiência de 28/10/05, quer na de 2/11/05 quanto ao núcleo de factos que antecede - ; as declarações que foram prestadas pelo arguido A e o depoimento da testemunha BX; - os elementos do “processo” do assistente AK na AX, que consta dos autos; - tendo também em atenção a posição processual assumida a fls. 49.127 pelos sujeitos processuais quanto à testemunha BO, o Despacho de fls. 49.128 e o Despacho de fls. 50.428/31 Ponto II, em que a testemunha acabou por ser (supervenientemente) prescindida; - e os demais elementos probatórios (entre os quais autos de reconhecimento de locais e os depoimentos que os Inspectores da Polícia Judiciária prestaram quanto a tais autos, em particular Inspector CF) que têm vindo a ser adquiridos ao longo da audiência de julgamento; o Tribunal considera que, neste momento, os elementos/meios de prova já adquiridos nos autos são suficientes para o esclarecimento que o Tribunal considera precisar em relação ao Facto ou núcleo de factos que estarão em causa com o requerimento dos arguidos E e K. Acresce que, como o Dª Magistrado do Ministério Público acentua, o assistente foi ouvido em audiência de julgamento, local onde a prova deve ser produzida, respondeu às questões a que foi perguntado pelo Tribunal e através do Tribunal e não há elementos de facto ou dúvida que levem o Tribunal a concluir que, neste momento, a produção da diligência requerida pelos arguidos é necessária e útil, para a prova dos factos que se incluam no objecto do processo e para a produção da decisão final. Assim e em consequência, por se entender que não se verificam os fundamentos do artº 340º, do C.P.Penal, o Tribunal indefere o requerido a fls. 49.158/9 pelo Arguido E, subscrito a fls. 49.672 pelo Arguido K.” Questão prévia Inadmissibilidade da consideração para a decisão do presente recurso das transcrições de parte da alegada entrevista do assistente constantes nas alegações de recurso do arguido O Digno Magistrado do Ministério Público, junto da 1.ª instância, em tomada de posição expressa previamente à sua resposta ao recurso – cf. fls. 56180 a 56181 – põe em causa a conduta assumida pela defesa do arguido E, ao consignar, na motivação de recurso, partes de uma pretensa entrevista, alegadamente, concedida pelo assistente AK à testemunha BO, visando com isso “dar a conhecer ao Tribunal, avant la lettre, factos que só a procedência do recurso legitimará serem conhecidos”. E, efectivamente, atentando na motivação de recurso do arguido E, a fls. 55677, afirma-se “Face ao indeferimento pelo douto despacho recorrido (que parece à defesa do recorrente ter sido proferido ao arrepio do deferimento de inúmeras diligências de prova com relevância para a aferição da credibilidade de declarações dos assistentes – junção de documento, de reportagens televisivas, de declarações e depoimentos prestados noutros processos, mesmo em fase de inquérito) fá-lo agora no âmbito de todas as garantias de defesa (artº 32º da constituição) e com respeito do princípio da proibição do excesso, pois a utilização da gravação como meio de prova não viola os direitos ou interesses do assistente constitucionalmente protegidos (art. 18º da Constituição). E também considerando que a defesa não está espartilhada por eventuais obstáculos de qualquer cartilha limitadora dessas garantias.” E, de seguida, passa a transcrever passagens da alegada gravação, da qual – pelos vistos – teve conhecimento, reportando-se a afirmações pretensamente feitas pelo assistente AK. A questão que, assim, se nos coloca é se tais transcrições, pela primeira vez trazidas ao processo na motivação de recurso, poderão ser consideradas por este Tribunal ad quem para aferir da bondade da pretensão do recorrente, que põe em causa um despacho do Tribunal a quo que não teve em consideração tais transcrições. O arguido invoca que apresenta tais transcrições no âmbito das garantias de defesa do arguido, por referência ao art. 32.º da CRP, não se considerando a defesa espartilhada por eventuais obstáculos de qualquer cartilha limitadora dessas garantias. Nos presentes autos a questão dos direitos e garantias de defesa dos arguidos têm sido amplamente debatidos, nas mais variadas circunstâncias e com contornos porventura nunca antes colocados com tanta intensidade. Sucede que as garantias de defesa do arguido, consagradas constitucionalmente no art. 32.º da CRP, têm também a sua expressão no nosso CPP, que – à semelhança da Constituição – acautela não só direitos dos arguidos, como também das vítimas e protege ainda os interesses do Estado na prossecução da Justiça. Erigir os direitos de defesa do arguido como única preocupação no sistema processual português seria subverter uma realidade plasmada na nossa lei ordinária e constitucional. Não bastará, pois, que se acene com a bandeira das garantias de defesa do arguido para que o Tribunal considere que tudo aquilo que a essa luz é pretendido possa ser aceite. E neste caso concreto, como é bom de ver, o arguido não tem nenhuma norma na nossa lei processual penal que lhe permita apresentar como fundamentos de apreciação de um despacho do qual discorda, factos que não foram tidos em consideração no momento da prolação desse despacho, por não serem conhecidos. O objecto do presente recurso é o despacho recorrido e os fundamentos que foram pelo Tribunal a quo apresentados para decidir num determinado sentido. Se há factos que em sede de recurso o recorrente apresenta pela primeira vez para contrariar a bondade do despacho recorrido, eles não podem ser tidos em consideração, porque o despacho recorrido deles não tinha conhecimento. Afirmar-se que se decidiu de forma errada porque novos factos contrariam o decidido no passado, quando não podiam ser considerados, seria uma clara violação dos princípios da legalidade e lealdade processuais. Como bem referem Simas Santos e Leal-Henriques, “(…) Ao estatuir que «sem prejuízo do dis(...) no artigo seguinte, o recurso inter(...) de uma sentença (isto é, de uma decisão que conhece, a final, do objecto do processo) abrange toda a decisão», o art.º 402.º, consagra no seu n.º 1, o princípio do conhecimento amplo. O objecto legal dos recursos é, assim, a decisão recorrida e não a questão por esta julgada. Na verdade, com o recurso abre-se somente uma reapreciação dessa decisão, com base na matéria de facto e de direito de que se serviu ou podia servir a decisão impugnada, pré-existente, pois ao recurso (…) (sublinhado nosso) (Recursos Penais, Rei dos Livros, 2011, pág. 87). Nestes termos, este Tribunal de recurso irá proceder à reapreciação da decisão recorrida, com base na matéria de facto e de direito que lhe serviu ou podia servir de fundamento (o que não é o caso das supra mencionadas transcrições, que só poderiam ser consideradas pelo Tribunal a quo em caso de procedência deste recurso interlocutório). Não será, pois, considerado, o ponto 5 da motivação de recurso do recorrente, constante de fls. 55.677 a 55.578. Analisando. Conforme dissemos inicialmente, o recorrente defende que o despacho recorrido obviou à produção de meio de prova muito relevante para aferição da credibilidade das declarações prestadas em audiência pelo assistente AK e, por isso, necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, violando, por erro de aplicação, o poder-dever estabelecido no art. 340.º do CPP e as garantias de defesa conferidas pelo art. 32.º da Constituição. Já num anterior recurso interlocutório abordámos o âmbito de aplicação do art. 340.º do CPP, que, de modo algum, pode ser entendido como um expediente processual por via do qual podem ser ordenadas todas e quaisquer diligências de prova. Como se deixou, então dito, “(…) Já a fls. 25421 dos autos – a propósito da oportunidade de produção de prova – referia o Ministério Público: O legislador contemplou no art. 340º do C. P. Penal um princípio residual de segurança. (…) A procura da verdade tem regras e há-de conter-se em limites que salvaguardem, em primeira linha, a dignidade humana e, em última análise, a proibição de ser conseguida de forma inopinada, surpreendente ou desleal. O artº 340º não pode ser lido como norma processual branca convertida em alfobres onde caibam esquecimentos ou omissões, ou, ainda, como expediente para que a prova seja apresentada no momento mais conveniente a uma qualquer estratégia (…). Acresce que o estatuto de arguido investe-o no direito de, entre outros, intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurem necessárias – cfr. Artº 61º, nº 1, al. f), do C. P. Penal. Aos sujeitos processuais deve ser vedada a possibilidade de transformarem o julgamento numa extensão das fases que o antecederam – Inquérito e Instrução –, transformando-o num palco permanente e sem fim de actividade investigatória”. Acrescentamos nós, uma vez mais, que o art. 340.º não pode ser entendido como um meio para, a todo o momento da produção de prova e a propósito de qualquer motivo, sem justificação, se vir defender que o tribunal tem um dever, sem limites razoáveis, de deferir todas as diligências de prova que sejam requeridas, a coberto da explicação da busca da verdade material. O art. 340.º do CPP exige que o meio de produção de prova a ordenar se afigure ao tribunal como necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Sabemos que a testemunha BO, no seu depoimento, aludiu a conversações que teria mantido com o assistente AK, as quais teriam, em parte, sido objecto de gravação. Contudo, no momento em que prestou esse depoimento, desconhecia o paradeiro da gravação e da sua transcrição. Mesmo notificado pelo Tribunal, na sequência do despacho de fls. 41175, para remeter aos autos todos os documentos que tivesse em seu poder, não juntou nem as gravações nem as transcrições. Mais tarde, o arguido E veio requerer a junção aos autos dessas gravações, com audição em audiência de julgamento, na presença do AK e da sua irmã, BX, para reconhecimento de voz. Tudo isto, como o arguido expressamente afirma a fls. 55677 da sua motivação de recurso visa que o Tribunal afira da credibilidade das declarações prestadas pelo assistente em audiência. Salienta-se que, o Tribunal a quo, quando profere o despacho recorrido não conhece, nem podia conhecer o teor das alegadas gravações, pois elas só seriam conhecidas se se viesse a deferir o requerido. Aquilo que considerou, como expressamente fundamentou, foi: - o objecto do processo e sem descurar as linhas de defesa apresentadas pelos vários arguidos; - as declarações que foram prestadas em audiência de julgamento pelo assistente AK e, entre o mais, o que declarou quanto ao reconhecimento (e momento) do arguido E, contactos com o arguido E, contactos com um Sr. jornalista BO, o que declarou quanto à deslocação a (…) com este senhor Jornalista ou com os Srs. Inspectores da Polícia Judiciária, incluindo os esclarecimentos que foram pedidos pelo Ilustre Mandatário do arguido E – quer na sessão da audiência de 28/10/05, quer na de 2/11/05 quanto ao núcleo de factos que antecede - ; as declarações que foram prestadas pelo arguido A e o depoimento da testemunha BX; - os elementos do “processo” do assistente AK na AX; - a posição processual assumida a fls. 49.127 pelos sujeitos processuais quanto à testemunha BO, o despacho de fls. 49128 e o despacho de fls. 50428/31 Ponto II, em que a testemunha acabou por ser (supervenientemente) prescindida; - e os demais elementos probatórios (entre os quais autos de reconhecimento de locais e os depoimentos que os Inspectores da Polícia Judiciária prestaram quanto a tais autos, em particular Inspector CF) que têm vindo a ser adquiridos ao longo da audiência de julgamento. Perante essa prova até então produzida, considerou o Tribunal a quo que, naquele momento, os elementos/meios de prova já adquiridos nos autos são suficientes para o esclarecimento que o Tribunal considera precisar. A pergunta que ora se impõe fazer é a de saber se, nos termos do dis(...) do art. 340.º do CPP, o Tribunal devia ordenar a diligência requerida, que tinha em vista aferir da credibilidade do assistente AK quanto às declarações por si prestadas em audiência de julgamento e que o ligavam ao arguido E, por ela ser necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Não temos como considerar que a resposta a essa questão devesse ser afirmativa. Tinham sido realizadas inúmeras diligências com essa mesma finalidade, as quais o Tribunal considerou como suficientes. A própria testemunha, como salienta o Digno Magistrado do Ministério Público, na sua resposta ao recurso, apresenta algumas fragilidades quando se refere às gravações de conversas e àquilo que o assistente AK lhe teria dito. Não explicitando bem se houve consentimento para as gravações, o que lhe foi dito com o gravador ligado e com ele desligado, sendo certo que ainda afirmou que apenas gravava o que ele próprio achava relevante. Compreende-se que o arguido pretenda levar ao limite a impugnação da credibilidade do assistente, mas num processo penal que se pretende justo, equilibrado, razoável e equitativo, há que estabelecer limites às diligências de prova, sob pena de elas se tornarem infindáveis. E o limite, quanto ao que se refere o art. 340.º do CPP, é a consideração pelo Tribunal da necessidade da diligência de prova requerida como necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Sendo certo, ainda, que já se estava em fase de prova complementar e não propriamente numa fase em que a prova não começasse já a estar sedimentada, sem prejuízo de, como é óbvio, poder sempre haver contributos relevantes para um complexo probatório todo ele bastante extenso. Perante os elementos que o Tribunal a quo tinha que ponderar no momento em que proferiu o despacho recorrido, entendemos, efectivamente, que não eram de considerar as diligências requeridas pelo arguido E como sendo necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Tão pouco daqui resultou uma violação dos direitos de defesa do arguido, tal como vêm consagrados no art. 32.º da CRP, pois, como se mencionou já, esses direitos não são ilimitados e não podem ser entendidos com uma extensão tal que torne inviável o processo penal e a prossecução do interesse do Estado na realização da Justiça, valor este também constitucionalmente assegurado. O despacho recorrido não violou, assim, nem o dis(...) no art. 340.º do CPP, nem o art. 32.º da CRP, pelo que será de manter. Pelo ex(...), nega-se provimento ao recurso interlocutório inter(...) pelo arguido E do despacho proferido a fls. 55504 a 55506 dos autos, mantendo-se integralmente a decisão recorrida. 14. Recursos inter(...)s pelos arguidos H e K dos despachos proferidos a fls. 33696 a 33703, 60474 a 60490 e 60575 a 60590, em 20/7/2005, 22/10/2008 e 29/10/2008, respectivamente. Passemos a apreciar agora, conjuntamente, por versarem as mesmas questões, quatro recursos interlocutórios, todos inter(...)s na fase de julgamento, sendo dois pelo arguido H e os outros dois pelo arguido K. Surgiram estes quatro recursos pelo facto de terem sido proferidos três despachos com que se não conformam. No primeiro, prolatado na sessão da audiência de julgamento de 20 de Julho de 2005, o Tribunal a quo indeferiu a possibilidade de se fazerem perguntas a testemunhas e assistentes, identificados como vítimas no processo, sobre o que em concreto lhes foi perguntado pela PJ aquando das suas inquirições, no caso de tais declarações não terem sido lidas na audiência de julgamento e não haver acordo dos sujeitos processuais quanto a tal leitura. Nos demais, prolatados nas sessões da audiência de julgamento de 22 e 29 de Outubro de 2008, por ter o Colectivo a quo, em síntese, indeferido requerimentos dos arguidos H e K em que solicitavam que fossem lidas, em julgamento, declarações prestadas no inquérito por diversos assistentes e testemunhas, mesmo com a oposição destes e do Ministério Público, e, efectuada tal leitura, fossem aqueles jovens confrontados com as suas declarações de inquérito que conflituassem com o que disseram em julgamento, de forma a avaliar a credibilidade das declarações prestadas em julgamento. Comecemos por transcrever o primeiro dos despachos ora colocados em crise (constante sob ponto II, de fls. 33696 a 33703) e, antes dele, o que imediatamente o antecedeu (constante sob ponto I, de fls. 33694 a 33696), por tratar questão estreitamente relacionada, ambos proferidos na audiência de julgamento de 20 de Julho de 2005: "I - 1. Por força do dis(...) no art° 123°, do C.P.P., quando ocorra a violação de disposição legal na prática de um acto processual, violação esta que não seja cominada pela lei processual como nulidade, estamos perante uma irregularidade. Na presente audiência foi arguida irregularidade pelo Ministério Público, pelo assistente AP e pelo arguido A, quanto a pergunta formulada pelo tribunal, na sequência de pedido de esclarecimento feito pelo Ilustre Mandatário do arguido H. Passamos a conhecer. 2. Na presente audiência de Julgamento o Ilustre Mandatário do arguido H pediu ao Tribunal para colocar a seguinte questão ao Assistente: "se não se lembra ter indicado estes quatro nomes (referidos na pergunta anteriormente feita), como nomes de rapazes que iam a (…)?, tendo acrescentado: " ter indicado no ano de 2003? Ter indicado alguém, ter identificado estas pessoas?" Na sequência deste pedido de esclarecimento o Tribunal formulou a seguinte pergunta ao assistente AP: " O Sr. em alguma circunstância referiu estes nomes?" Resposta do assistente: " Já". Perguntou então o tribunal: " Foi no âmbito deste processo?" Resposta do assistente: "Sim." Feitas estas perguntas e dadas as respectivas respostas, foi arguida a irregularidade desta pergunta nos termos acima enunciados e constantes dos requerimentos que foram ditados para a acta, por entenderem que o Tribunal violou o dis(...) no artº 356°, nº 2, al. b) e n° 5, bem como n° 6, do C.P.P. 2.1. Decorre do art° 355°, do C.P. Penal, que só valem em julgamento, para efeito de formação da convicção do Tribunal, as provas que tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência de julgamento, ressalvando-se, por força do nº 2, as provas contidas em actos processuais, cuja leitura seja permitida em audiência de julgamento, nos termos do artº 356° e 357°, do C.P.Penal. Como adiante se referirá de forma mais pormenorizada, o legislador quis garantir que a prova que fundamente uma absolvição ou uma condenação de um arguido, seja essencialmente produzida na fase do julgamento, em audiência de julgamento, onde vigora o princípio da imediação e da oralidade. Quis evitar que a convicção que o Tribunal venha a criar quanto à culpabilidade ou não de determinado arguido possa fundar-se, sem mais e por exemplo, em declarações prestadas por sujeito processual ou por testemunha fora da audiência de julgamento. Daí o que é proibido pelos artº 355° e 356°, do C.P.Penal, é que o Tribunal proceda à leitura de declarações que constem de autos do processo - e que, consequentemente, proceda à formulação de perguntas sobre tais autos em concreto -, sem que se verifique a permissão para a sua leitura, pela forma expressamente prevista na lei, nomeadamente as previstas no art° 356°, do C.P. Penal. O Tribunal desconhece se o assistente já falou em alguma altura sobre os nomes referidos pelo Mandatário do arguido H. O Tribunal desconhece se tais nomes fazem parte de declarações prestadas pelo assistente perante O.P.C. ou outro. Assim e porque o pedido de esclarecimento foi colocado pelo arguido, perguntou ao Assistente se em alguma circunstância referiu estes nomes. O Assistente referiu já. Foi perguntado então ao assistente se no âmbito deste processo. E o assistente respondeu que sim. Sendo a resposta a afirmativa, da mesma decorre que terá sido no âmbito de diligência feita no âmbito deste processo, estando vedado ao Tribunal avançar sem mais sobre a sindicância dessa declaração, a não ser que os sujeitos processuais requeiram ao tribunal a leitura de autos de declarações constantes dos autos, e exista o consenso para tal, nos termos do art° 356, nº 2, b) e nº 5 C.P.P.. Se a resposta do Assistente fosse negativa, isto é, que tivesse feito a referência desses nomes fora do âmbito deste processo, a terceiras pessoas, aí já o Tribunal, se o entendesse relevante, poderia avançar com pedidos de esclarecimentos quanto às circunstâncias concretas em que o assistente terá feito tal referência. O Tribunal entende que ao fazer a pergunta nos termos em que o fez não violou o dis(...) no artº 355° e 356°, do C.P.P., pois não procedeu à leitura de declarações constantes de autos do processo, nem se debruçou sobre pedidos de esclarecimento quanto ao conteúdo, em concreto, de auto de declarações prestadas no processo e em relação às quais não se verificara a permissão da leitura, nos termos do 356°, do C.P.P. Assim, julgo improcedente a arguida irregularidade. Taxa de justiça do incidente pela parte vencida, pelo mínimo atenta a simplicidade do incidente, sem prejuízo do dis(...) no artº 522°, do C.P.Penal - artº 513°, art° 515°, n° 1, al. c, artº 522° e artº 524°, do C.P.Penal e art° 84°, n° 1, do C.C.Judiciais. II - 1. Suscitada esta questão, cabe proferir despacho, neste momento, quanto a outra questão relacionada com a presente e que já foi suscitada pelos arguidos. A fls. 30.556 e a fls. 30.725, os arguidos H e K apresentaram requerimento, alegando que pretendem saber das testemunhas ou assistentes identificados como vítimas no processo se, quando inquiridas pela Polícia Judiciária, lhes foram colocadas questões (e quais) relativas ao eventual envolvimento dos arguidos, ou de outras pessoas que não A - e que a polícia tenha concretamente identificado -, em actos de abuso sexual praticados contra os depoentes ou declarantes ou de que tenham tomado conhecimento (cfr. fls. 30.556). Isto porque afirmam pretender por em crise a metodologia utilizada pela investigação na abordagem das alegadas vítimas, por ter sido feita de forma a obter uma sincronização dos seus discursos e encontrar uma "História Colectiva" para contar, assim sugestionando as alegadas vítimas a atribuírem comportamentos criminosos aos arguidos, pelo menos, H e K. Este arguido acrescenta, a fls. 30.725, que "... o mesmo tem dúvidas quanto à forma como foi feita a aquisição da prova em sede de inquérito (...), a qual poderá, ainda que de forma involuntária, ter inquinado todo o processo de obtenção de prova (...). 1.1. O D° Magistrado do Ministério Público pronunciou-se a fls. 30.625 a 30.631. 2. O Estado, enquanto titular do ius puniendi, tem interesse em que os culpados de actos criminosos sejam punidos. No entanto, só tem interesse em punir os verdadeiros culpados. "(...) O Estado está, por isso, igualmente interessado em garantir aos indivíduos a sua liberdade contra os perigos de injustiças. Está interessado, desde logo, em defendê-los «contra agressões excessivas da actividade encarregada de realizar a justiça penal» (...). Existe um dever ético e jurídico de procurar a verdade material. Mas existe também um outro dever ético e jurídico que leva a excluir a possibilidade de empregar certos meios na investigação criminal (...)." (cfr. AC. TC nº 578/98, DR. 26/2/99, II série, pag. 2.950). Daí que a verdade material não possa conseguir-se a qualquer preço, não dispondo a autoridade judiciária - que nesta fase processual do julgamento é o Juiz -, de um poder ilimitado de produção de prova: o juiz, dentro do thema probandi, está sujeito aos princípios instituídos pelo legislador ordinário e constitucional, para a obtenção da prova nas diferentes fases processuais. Isto para que a verdade processual corresponda ao que ontologicamente está subjacente à actividade punitiva dos Estado: para que seja "... o resultado probatório processualmente válido, que sustenta a convicção de que certa alegação de facto é justificavelmente aceitável como pressu(...) da decisão, por ter sido obtida por meio processualmente válido (...)." (cfr. G. Marques Silva, Curso processo penal II, 2a edição, verbo, pag. 111). Ora da conjugação do dis(...) nos artºs. 355°, nº 1 e 2 e 127°, do C.P.Penal e para o que à presente questão importa, resultam dois elementos estruturantes da actuação do juiz na fase processual do julgamento: - proibição da valoração de provas que não sejam examinadas ou produzidas em audiência de julgamento, ressalvando da imediação as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida em audiência de julgamento (observando-se, neste caso, o dis(...) no artº, 356° e 357°, do C.P.Penal); - e a valoração da prova de acordo com as regras da experiência, apreciada livremente pelo Tribunal. O legislador, ao consagrar nesta fase processual o princípio da concentração da prova na audiência de julgamento, da oralidade e da imediação, coloca limites ao modo como o Tribunal pode alcançar a verdade material e - porque a questão, neste segmento, foi suscitada pelos arguidos -, até onde o Juiz do Julgamento pode e deve ir quanto às condições da investigação do crime. Está a definir, de forma clara, uma separação entre o momento do inquérito ou da instrução e o momento do julgamento, separação esta que decorre da estrutura acusatória do processo. 2.1. Começando a analisar o primeiro núcleo que chamei "estruturante", ao Juiz do julgamento compete assegurar que na fase do julgamento a verdade material não seja alcançada por métodos de aquisição da prova proibidos (por exemplo, art° 126°, do C.P. Penal) - aqueles que afectam a liberdade e formação da vontade de declaração, podendo consubstanciar, por exemplo, manipulação da vontade por indução da declaração, adulteração da capacidade de memória, indução de certo raciocínio por introdução de premissas ou de factos pré determinados aquando de um interrogatório -. E compete assegurar, igualmente, que a prova que fundamente uma absolvição ou uma condenação (artº 355°, do C.P.P.), aquela em relação à qual o Tribunal pode e vai formar determinada convicção, tenha sido adquirida sem violação dos procedimentos ou da forma que a lei impõe para a produção de tal meio de prova em concreto (por exemplo: buscas, revistas, reconhecimentos, perícias, escutas). Resulta, assim e por decorrência do art° 32°, da C.R.P. e 237°, do C.P.Penal, que o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório, estende-se a todos os meios de prova que, nos termos do art° 355°, do C.P. Penal, possam fundamentar a convicção do julgador quanto aos factos que constituem o objecto do processo. No caso concreto, o que os arguidos pretendem é exercer o contraditório para pôr em causa a veracidade das declarações que tenham sido produzidas por alegadas vítimas na fase do inquérito, perante a Polícia Judiciária, por essas declarações, devido à metodologia usada e abordagem feita pela investigação às vítimas serem, na sua perspectiva, o resultado de uma sincronização de discursos para encontrar uma História Colectiva, que pode ter sugestionado as vítimas a atribuir comportamentos criminosos, pelo menos, aos arguidos H e K. Com respeito por melhor entendimento - e face ao enquadramento teórico que ficou enunciado -, a dimensão pretendida pelos arguidos e tal como é requerida, pode ultrapassar o que a lei permite aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior: a lei permite-o no caso de contaminação de meio de prova que possa ser usado em audiência de julgamento. Isto é, por força dos já citados artºs. 32°, da C.R.P., 327° e 355°, do C.P.Penal, o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório impõe que o Tribunal, em audiência de julgamento, afira das circunstâncias em que diligências realizadas em fase processual anterior foram feitas, de forma a pôr em crise o seu valor como meio de prova e no caso de estarmos perante um dos meios de prova pré adquiridos a que se refere o art° 355°, do C.P.Penal. Está neste caso, por exemplo, a impugnação que os arguidos fazem nas suas contestações de reconhecimentos que foram feitos na fase do inquérito. Mas no que a autos de declarações prestados pelas alegadas vítimas perante a polícia judiciária na fase do inquérito diz respeito, a lei não permite ao Tribunal usá-los livremente como meio de prova (pré-adquirido), sendo permitida a sua utilização no caso expressamente previsto no artº 356°, n° 5, por remissão para o art° 356°, nº 1 e 2, al. b), do C.P.Penal: quando o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (cfr. artº 355°, nº 1 e 2, 356°, n° 1, 2, al. b) e nº 5, do C.P.Penal). Assim, só no caso de ocorrer esta circunstância o Tribunal poderá debruçar-se sobre o conteúdo de determinadas declarações e, após, se tal for relevante para a descoberta da verdade, aferir como é que as perguntas foram feitas, que perguntas foram feitas, o que disse e verificar da concordância ou adequação do que for dito em audiência de julgamento, com o que está consignado como tendo sido dito pela alegada vítima. Refira-se que o que está (...) em causa pelos arguidos não é que a acção dos agentes de investigação tenha sido concorrente ou determinante, para a prática pelos arguidos de factos qualificados como crime pois, neste caso, o Tribunal ver-se-ia no imperativo legal de filtrar toda a actuação do agente de investigação, por poder haver um nexo causal entre a actuação do agente de investigação e a prática do ilícito ( agente provocador/agente infiltrado). O que é (...) em causa pelos arguidos, tal como resulta dos seus requerimentos, é que a actuação dos agentes de investigação, pela metodologia utilizada na investigação, teve subjacente a obtenção de uma sincronização de discursos das alegadas vítimas, de forma a encontrar uma História Colectiva para contar, que foi vertida para a acusação e, subsequentemente, para o despacho de pronúncia. 2.2. Mas, não sendo permitido ao Tribunal do Julgamento fazer uso das declarações prestadas pelas alegadas vítimas na fase de inquérito perante a Polícia Judiciária - por, no decurso da audiência, não ter havido o acordo a que se refere o artº 356°, nº 2, al. b) e nº 5 , do C.P.Penal -, fica comprometida a capacidade do Tribunal de proceder à descoberta da verdade material e à avaliação dos depoimentos que vierem a ser prestados em audiência de julgamento pelas alegadas vítimas? É, aqui, que cabe analisar o segundo núcleo que acima enunciei, como estruturante da actuação do juiz na fase de julgamento, consagrado no art° 127°, do C.P.Penal. O legislador, ao separar a fase da audiência de julgamento da fase do inquérito e da instrução, nos termos em que o fez no art° 355°, do C.P. Penal, quis marcar uma clara divisão entre o processo intelectual que levou à formação da convicção que sustentou uma acusação ou uma pronúncia, do processo de formação da convicção na fase da audiência de julgamento que pode levar a uma condenação ou a uma absolvição. E quis fazê-lo para garantia da defesa do arguido. "(...) O acto de julgar é do tribunal, e tal acto tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção. Tal operação não é pura e simplesmente lógico-dedutiva (...) não é uma mera operação de opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis) . Para a operação intelectual contribuem regras, impostas por lei, como sejam as da experiência, a da percepção da personalidade do depoente (impondo-se por tal a imediação e a oralidade), a da dúvida inultrapassável (conduzindo ao principio in dúbio pró reo). A lei impõe princípios instrumentais e princípios estruturais para formar a convicção. (...) Só a partir da oralidade e imediação pode o juiz perceber os dados não objectiváveis atinentes com a valoração da prova. A oralidade (...) permite ao Tribunal aperceber-se dos traços do depoimento, denunciadores da isenção, imparcialidade e certeza que se revelam por gestos, comoções e emoções, da voz, por exemplo, A imediação que vem definida como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de tal modo que, em conjugação com a oralidade, se obtenha uma percepção própria dos dados que haverão de ser a base da decisão. (...) A censura quanto à forma de formação da convicção ... terá de assentar na violação de qualquer um dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (...)" (cfr. Ac. TC nº 198/2004, DR 2/6/04, II série, pag. 8544 e segs). Do que antecede resulta que quem julga tem de o fazer com a prova produzida em audiência de julgamento, tal como o define o artº 355°, do C.P.Penal e com respeito pelos princípios decorrentes do art° 127°, do C.P.Penal. A percepção do depoimento é conseguida com a imediação da prova. É da confrontação global do conteúdo do depoimento com a forma como o mesmo foi prestado em audiência de julgamento - quer do ponto de vista da exteriorização por sinais físicos, quer da hesitação, certeza, comoção, distanciamento, forma de reacção a confrontação, sentido do depoimento ao longo de todas as instâncias -, que o Tribunal, pelos princípios instrumentais e estruturais a que tem de recorrer para a formação e fundamentação da convicção, enunciados no citado artº 127°, do C.P.P., vai avaliar da agora impugnada (pelos arguidos) liberdade da formação vontade do depoente na declaração e, assim, da ocorrência, ou não, do facto que é objecto da prova, da intervenção da factores estranhos na formação da vontade da declaração. Como o arguido H, ora requerente, refere na sua contestação, depois de falar na intervenção de agentes externos que inquinaram o andamento do processo, criando pânico na sociedade portuguesa e num ambiente de "caça às bruxas", com prejuízo do princípio da presunção de inocência, "... chegados, finalmente, à fase do julgamento do processo, importa depurar o processo de todas estas impurezas e voltar às bases ... " E referindo-se a uma passagem do despacho de pronuncia, relacionada com as perícias sobre a personalidade realizadas na fase do inquérito, transcreve que "... é evidente a constatação de que não «existe qualquer sistema ou método validade científica que permita aferir a completa veracidade de um relato ou testemunho» (o que é óbvio para qualquer cidadão medianamente informado) ... ". Diz, ainda, que "... nenhum perito pode substituir o Tribunal na apreciação da prova, ... cabe ao tribunal avaliar a credibilidade dos depoimentos. Não há «testes» nem « soros da verdade» que possam afastar esse dever. .. ". (cfr. Contestação do arguido, pontos 9 a 11 e pontos 118 a 124) E este dever tem que ser exercido nos termos definidos pela lei processual para a fase do julgamento, que derivam dos princípios constitucionais que consagram a estrutura acusatória do processo e o princípio da presunção de inocência, os quais (no que para a presente questão importa) estão determinados nos artºs. 355°, 356° , 357° e 127°, do C.P.Penal. A ir-se pelo caminho defendido pelos arguidos, isto é, sindicar em audiência de julgamento, sem mais, o processo intelectual que levou determinada testemunha, no inquérito, a produzir determinada declaração consignada em auto, como é que a pergunta lhe foi feita, que resposta deu, o que lhe foi perguntado a seguir por quem estava a inquiri-lo - não o sendo na sequência de leitura de declarações nos termos do art° 356°, nº 5, do C.P.Penal -, podia-se estar a inquinar o depoimento prestado em audiência de julgamento e a afectar a espontaneidade das declarações. A inquinar o depoimento que viesse a ser prestado em audiência de julgamento por, potencialmente, poder estar-se a transmitir um vício de raciocínio para a declaração que estivesse a ser prestada em audiência, pois o declarante ou a testemunha estaria a reportar-se ao que lhe foi perguntado no inquérito e não ao que lhe estava a ser perguntado; a fazer um processo de reavivamento da memória não do facto que diz ter vivido ou presenciado, mas do facto que terá contado e como o terá contado perante a P.J.; o que, por sua vez, tem ainda como pressu(...)s não a resposta a pergunta feita em audiência de julgamento, mas a pergunta feita pela Polícia Judiciária. Isto foi, no entendimento deste Tribunal, uma das consequências que o legislador também quis evitar ao consagrar o regime do art° 355°, 356° e 357°, do C.P. Penal, o que é, como dissemos, decorrência do princípio do acusatório. 3. É certo que o arguido H, nos pontos 234 a 237, da sua contestação e sob a epígrafe I) V - a Manipulação, Das Alegadas Vítimas", diz que "… há um dado cuja prova não dispensa de fazer em julgamento: a metodologia utilizada pela investigação na abordagem destas alegadas vítimas violou objectivamente as regras técnicas que devem presidir à inquirição e ao exame de menores abusados sexualmente. E isso inquinou irremediavelmente a sua capacidade para depor ..." Ao Tribunal cabe dar como provados ou não provados os factos que façam parte do thema probandum e, destes, dentro dos princípios e nos termos que a lei expressamente determina. Qualquer derrogação aos princípios estruturais acima mencionados, só pode ocorrer nos casos que a lei consagra e não nas condições em que qualquer sujeito processual o pretenda. Da contestação do arguido H resulta que o mesmo aponta contradições nos depoimentos prestados em fase anterior do processo, desorientação e flutuação das versões das alegadas vítimas e do arguido A nas declarações prestadas na fase do inquérito ou instrução, fazendo transcrições dessas declarações e concluindo pela fantasia dos depoimentos, flagrante contradição, que diz fazerem ruir os alicerces da tese da acusação (cfr. ponto II, A - Da prova testemunhal, pontos 14. a 60.). Por algum motivo o arguido no ponto 236., da sua contestação, se refere a "dado" cuja prova não dispensa. É que, salvo melhor interpretação, o que o arguido faz é uma análise conclusiva da actividade processual na fase do inquérito - pois só nesta fase aponta "vício" à actividade de inquirição das alegadas vítimas e não já na fase da instrução, finda a qual foi proferido o despacho que pronunciou o arguido pelos factos que estão agora a ser apreciados -, actividade da qual criou determinada convicção e retirou determinado juízo de valor: o arguido foi acusado pela ocorrências das circunstâncias que enuncia nos pontos "237." e "238." Daí o pretender fazer a prova da veracidade dessa convicção como facto. É claro, para este Tribunal, que essa "convicção" não deixará de estar presente nas suas instâncias às testemunhas ou assistente. No entanto a convicção que o Tribunal venha a formar quanto aos factos objecto do processo será fundada, sempre, na valoração da prova produzida em audiência de julgamento, tal como o define o art° 355°, do C.P. Penal e com recurso aos princípios decorrentes do art° 127°, do C.P.Penal, pois legalmente está-lhe proibido agir de outra forma. 4. Face a todo o ex(...) e ao abrigo do dis(...) nos art°s 32°, nº 1, 2 e 5, da C.R.P., 127°, 355° e 356°, n° 1, 2 al. b) e nº 5, 323°, al. f), do C.P.Penal, não tendo o Tribunal procedido à leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas pelos Assistente perante a Polícia Judiciária, por tal não ter sido requerido pelos sujeitos processuais ou porque não houve acordo para tal entre os sujeitos processuais, está vedado ao Tribunal, por ser legalmente inadmissível, fazer perguntas e pedir esclarecimentos ao Assistente que incidam sobre que perguntas, em concreto, lhe foram feitas pela Polícia Judiciária aquando dessa inquirição, como foram feitas e que resposta deu." (fim de transcrição) Inconformado, o arguido H interpôs recurso (cf. fls. 34671). O recurso foi admitido, com subida a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. ponto 2 do despacho de fls. 33908). Respondeu o Ministério Público (cf. fls. 35077), a AX e demais assistentes (cf. fls. 35084). Porém, o arguido H, a fls. 66143, viria a desistir do recurso – desistência que foi julgada válida pelo despacho de fls. 68216, ponto II. Igualmente inconformado, o arguido K interpôs recurso (cf. fls. 30725: requerimento de interposição de recurso; motivação de fls. 33946 a 33964 e original de fls. 33983 a 34002), extraindo as seguintes conclusões: "1. O presente recurso vem inter(...) da decisão proferida pelo Tribunal a quo na audiência de julgamento de 20.07.2005, a fls. 33.696/33.703, nos termos do qual se indeferiu a formulação de pedidos de esclarecimentos formulados às testemunhas/assistentes AA e AE relativamente a questões que lhes haviam sido colocadas pela Policia Judiciária em sede de inquérito relativamente ao envolvimento do arguido K em actos de abuso sexual praticados nas suas pessoas ou de que os mesmos tivessem conhecimento. 2. Os pedidos de esclarecimento que se pretendem sejam efectuados àqueles testemunhas/assistentes - tal como a todas as restantes testemunhas e/ou assistentes que ainda virão a prestar depoimento e/ou declarações nestes autos - não se prendem com o conteúdo dos depoimentos e/ou declarações que os mesmos prestaram em sede de inquérito e vertidos nos respectivos autos, mas antes com questões que lhes foram colocadas nessa fase processual e que poderão ou não constar daqueles Autos de Inquirição de Testemunhas e/ou Assistentes e resultaram das declarações prestadas na audiência de julgamento. 3. Tais esclarecimentos não visam contornar a disciplina imposta pelos art.ºs 355º e 356º do CPP, mas antes o esclarecimento de questões que não estão vertidas naquelas declarações e que se prendem, para além do mais, com metodologias de investigação, designadamente se a metodologia utilizada pela investigação violou ou não as regras técnicas que devem presidir à inquirição e ao exame de menores abusados sexualmente de tal modo que, ainda que de forma involuntária. possa ter inquinado todo o processo de obtenção da prova, nomeadamente por um processo de manipulação da liberdade e genuinidade da prova assim recolhida a reflectir-se na prova a produzir na audiência final. 4. O esclarecimento solicitado surgiu precisamente na sequência de factos e situações por estes relatados em audiência de julgamento, das quais resultou que foram formuladas perguntas às referidas testemunhas/assistentes sobre envolvimento de outros sujeitos, que não apenas o arguido A , em situações caracterizáveis como de abuso sexual de menores e que não foram vertidas nos respectivos autos e tão pouco resultavam da realidade fáctica relatada por essas mesmas testemunhas/assistentes, sugerindo tal linha de interrogatório ou inquirição uma orientação na obtenção da prova que bem poderá ter inquinado a mesma e, consequentemente, enviesado a descoberta da verdade material, em prejuízo dos arguidos, incluindo o ora recorrente. 5. Pelo que, ainda que o esclarecimento solicitado porventura viesse a incidir sobre qualquer facto por estes anteriormente relatado em sede de inquérito - o que não sucedeu - sempre seria legítimo ao arguido formular o pedido de esclarecimento, independentemente de tais factos terem ou não sido referidos anteriormente pelo depoente em auto constante do processo. 6. Apenas não sendo admissível o confronto directo do assistente/ testemunha ou a leitura do auto em audiência por força do regime dos arts. 355°, n.º 1 e 356°, n.ºs 1, 2 al, b) e 5 do C.P.P., mas não já a formulação de perguntas concretas sobre quaisquer factos (e não sobre autos em concreto) que constem do processo ou de que o arguido tenha conhecimento, quer estes se encontrem ou não consignados em auto elaborado em fase anterior ao julgamento. 7. Sem que com a formulação de tais questões incorra o Tribunal a quo no risco de vir a valorar qualquer prova que não tenha sido produzida em audiência de julgamento em violação do regime dos arts. 127º, 323°, al. f). 355°, n.º 1 e 356°, n.ºs 1, 2 al. b) e 5 do C.P.P. 8. De resto, uma interpretação do dis(...) nos arts. 355°, n.° 1 e 356°, n.ºs 1, 2 al. b) e 5, do C.P.P, como a que parece ser efectuada pelo despacho recorrido no sentido de ao assistente, à parte civil ou à testemunha ou não poderem ser pedidos esclarecimentos ou colocadas questões sobre factos concretos que se encontrem relatados em auto de declarações produzido durante a fase de inquérito, a não ser que seja consentida a leitura de tal auto, sempre redundaria numa impossibilidade absoluta de produção de qualquer prova em audiência de julgamento. 9. Pois que, seríamos levados ao absurdo de, em processos cuja acusação/pronúncia assentasse fundamentalmente em prova testemunhal ou por declarações das alegadas vítimas ou ofendidos produzida anteriormente - como é o caso dos presentes autos e da generalidade dos processos em que estão em causa crimes de natureza sexual - ser vedada, até ao próprio Tribunal, a possibilidade de formular ao assistente/testemunha qualquer questão concreta sobre a factualidade vertida naquelas peças processuais, desde que tal matéria se encontrasse vertida em tais autos de inquirição ou declarações. 10. Ao tribunal de julgamento compete também assegurar que a prova que fundamente uma absolvição ou condenação, aquela em relação à qual o Tribunal pode e vai formar determinada convicção, tenha sido adquirida sem qualquer violação dos procedimentos ou da forma que a lei impõe para a produção de tal meio de prova em concreto. 11. O esclarecimento solicitado bem como quaisquer outros que se prendam com este núcleo fundamental da defesa do arguido recorrente e que não estão vertidas nas declarações cuja leitura não é admitida em julgamento, mas antes relacionadas com metodologias de investigação e constituindo objecto do processo, não podem deixar de ser formuladas às testemunhas e/ou assistentes em relação aos quais o arguido considere pertinente fazê-lo no exercício do seu direito de defesa. 12. Tais questões, bem como quaisquer outras que se prendam com este núcleo fundamental da defesa do arguido recorrente, terão ainda de ser formuladas mesmo que vertidas em autos cuja leitura não seja permitida, quando a testemunha/assistente sobre elas se pronuncie no depoimento e/ou declarações que preste em audiência final, independentemente de ter sido pedida e obtida a concordância quanto à leitura dos autos de inquirição/declarações em sede de inquérito. 13. Mas também e ainda quando a testemunha e/ou assistente não refira tal(ais) facto(s) nos seus depoimentos e/ou declarações, se através de tais pedidos de esclarecimento se visar, tão só a demonstração da inquinação da recolha da prova, designadamente pela metodologia utilizada na mesma. 14. O cabal exercício do direito de defesa do arguido e o princípio do contraditório impõem que o tribunal de julgamento admita a produção de tal prova, ou seja, das circunstâncias em que as diligências realizadas em fase processual anterior foram efectuadas, pois só assim poderá aferir realmente se se verificou ou não aquela inquinação, tanto mais que, a prova desse modo adquirida, ainda que meramente indiciária. acabou por ser vertida para a acusação e subsequentemente, para o despacho de pronúncia, desse modo condicionando de forma indelével o thema probandum dos presentes autos. 15. O que os arts. 355°, n.º 1 e 356°, n.º 2, al. b) e n.º 5 do C.P.P., visam é, em respeito aos princípios da oralidade e imediação, impedir que o Tribunal, em audiência de julgamento, venha a valorar prova e a fundar um juízo de culpabilidade ou não com base na reprodução de depoimentos prestados fora dessa mesma audiência. 16. Não sendo assim permitida em audiência final a leitura (ou confronto directo com o referido no auto) de declarações prestadas pelo assistente, pelas panes civis ou por testemunhas em sede de inquérito quando não haja acordo na sua leitura por parte de todos os sujeitos processuais, tal proibição não impede contudo que sejam formulados aqueles esclarecimentos. 19. De resto, um entendimento como o do Tribunal a quo no sentido de se encontrar vedada a possibilidade de em julgamento questionar ou pedir esclarecimentos às testemunhas ou assistentes que depuseram em sede de inquérito sobre o modo como a entidades que presidiram às respectivas diligências abordaram as questões, designadamente como procederam à inquirição ou tomada de declarações, as perguntas concretamente formuladas e o modo como o foram para além do consignado no auto, nomeadamente quando não estão vertidas naquelas declarações, exclui a possibilidade de o arguido, em sede de julgamento questionar legitimamente os métodos e meios empregues na investigação criminal. cerceando de modo inaceitável as suas garantias de defesa. 20. Incidindo o esclarecimento solicitado sobre questões que versam a metodologia utilizada na recolha e aquisição da prova, designadamente, sobre a forma como foi efectuada a recolha da prova testemunhal ou por declarações - e de forma evidente quando essas questões não se encontram sequer vertidas em declarações prestadas anteriormente pela testemunha e/ou assistente -, a questão não se coloca no âmbito da previsão dos art.ºs 355º e 356º, n.ºs 1, 2, al. b) e 5 do CPP e da respectiva estatuição que proíbe a leitura dos autos que contenham declarações das testemunhas, dos assistentes ou das partes civis prestados perante o MºPº ou órgãos de polícia criminal, sem que haja a concordância de todos os sujeitos e intervenientes processuais. pelo que é admissível e deve ser formulado o requerido esclarecimento ou qualquer outro que se prenda com a concreta questão em causa. 21. Pelo ex(...). o despacho recorrido ao não admitir a formulação do esclarecimento aos assistentes nos termos requeridos pelo recorrente, por considerar que, não tendo o Tribunal procedido à leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas pelos assistentes perante a Polícia Judiciária, é legalmente inadmissível fazer perguntas e pedir esclarecimentos ao assistente que incidam sobre que perguntas, em concreto, lhe foram feitas pela Polícia Judiciária aquando dessa inquirição e como foram feitas, interpretou erroneamente os arts. 127°, 355°, 356°, C.P.P., dispositivos que violou. 22. Devia, ao invés o tribunal recorrido ter interpretado tais normativos no sentido de autorizar fossem pedidos aos assistentes AA e AE - bem como a toda e qualquer testemunha, assistente ou parte civil - esclarecimentos sobre se quando inquiridos pela Polícia Judiciária ou em qualquer outro momento do inquérito, lhes foram colocadas questões e (quais) relativas ao eventual envolvimento de K, ou de outras pessoas que não A - que a Polícia Judiciária tenha concretamente identificado - em actos de abuso sexual contra si ou de que tenha concretamente tomado conhecimento, questões essas que tão pouco se encontram vertidas naquelas declarações. 23. A interpretação normativa conjugada do dis(...) nos arts. 127°, 355°, 356°, n.º 1, 2 al. b) e 5, e 323°, al. f), todos do C.P.P. efectuada pelo Tribunal a quo no despacho recorrido, no sentido de se encontrar vedada ao Tribunal ou aos restantes sujeitos processuais solicitar esclarecimentos ou colocar questões aos assistentes/ partes civis e testemunhas sobre perguntas que, em concreto, lhes tenham sido feitas no âmbito da recolha da prova, designadamente pelas entidades que presidiram à recolha do prova, da prova testemunhal e/ou por declarações em fase anterior à audiência de discussão e julgamento, incluindo as que efectuaram as respectivas inquirições ou tomada de declarações, quando não tenha sido requerida a leitura das declarações anteriormente prestadas ou não tenha sido obtido o necessário acordo, ainda que a matéria objecto do esclarecimento resulte das declarações prestadas em sede de audiência final e não se encontre vertida naquelas declarações, é inconstitucional por violação das garantias do processo criminal consagradas no art. 32°, n.º 1 e 5 da C.R.P, e dos princípios subjacentes a um processo equitativo previsto nos arts. 5º e 6º da CEDH, a qual deve ser declarada. 24. Tais normativos devem ser conjugadamente interpretados no sentido de que quando está em causa o exercício do direito de defesa, designadamente no sentido de demonstrar a existência de uma específica orientação na recolha da prova demonstrativa de um processo de manipulação, ainda que involuntária, da forma como foi efectuada a aquisição da prova em sede de Inquérito, a qual poderá ter inquinado todo a prova incluindo aquela a produzir em audiência de julgamento e os pedidos de esclarecimento sejam relevantes para esse fim, devem ser efectuados, por legalmente admissíveis, bem como todas as questões que visem demonstrar tal desiderato, por não contenderem com a previsão dos art.ºs 355º e 356°, n.ºs 1, 2 al, b) e 5 e 323º, al. f) do CPP e a proibição ali estatuída, antes se impondo face ao dis(...) nos art.ºs 32°, n.ºs 1, 2 e 5 e 20º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa. Termos e fundamentos por que e ainda com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve a decisão recorrida ser revogada, com o que se fará a necessária Justiça." (fim de transcrição) Pelo ponto 12 do despacho de fls. 35265 foi admitido o recurso (a subir a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo), em obediência à decisão proferida pelo Exmo. Sr. Vice-Presidente deste TRL, na sequência de reclamação apresentada pelo arguido K do despacho de fls. 34194, que havia julgado o recurso extemporâneo. Respondeu o Ministério Público (cf. fls. 35673 e segs.) nos seguintes termos: "O Arguido K vem recorrer do Despacho que lhe indeferiu a possibilidade de " ... fazer perguntas e pedir esclarecimentos ao Assistente que incidam sobre que perguntas, em concreto, lhe foram feitas pela Polícia Judiciária aquando dessa inquirição, como foram feitas e que resposta deu." - transcrição parcial do Despacho recorrido. Tal como já assinalado no Despacho recorrido - constante da Acta da sessão de 20.7.2005 -, o ora Recorrente, conjuntamente com o Arguido H, apresentara, a fls. 30.556 e 30.725 requerimento em que invocava e se arrogava o direito de "saber das testemunhas ou assistentes, identificados como vítimas do processo se, quando inquiridas pela Polícia judiciária, lhes foram colocadas questões (e quais), relativas ao eventual envolvimento dos arguidos, ou de outras pessoas que não A - e que a polícia tenha concretamente identificado -, em actos de abuso sexual praticados contra os depoentes ou declarantes, ou de que tenham tomado conhecimento." Ou seja, pretende o Recorrente saber se, no âmbito das inquirições que prestaram no Inquérito, a PJ formulou, ou deixou de formular, determinadas questões. O Arguido teve ensejo, quer em sede de recurso, quer em sede de Instrução, de sindicar os indícios recolhidos pelo Ministério Público, bem como, quer os elementos de prova que os suportam, quer os métodos de aquisição dos mesmos, os quais, aliás, foram, em sede de Decisão Instrutória e, no que também ao Arguido, ora Recorrente diz respeito, objecto de comprovação judicial. Acresce que é em sede de audiência de julgamento, que o Tribunal, relativamente à prova testemunhal, avalia a forma como é prestada, aferindo da liberdade na prestação do depoimento, da sua consistência e credibilidade, desvalorando-o, pura e simplesmente, ou avaliando-o em conformidade com essa apreciação. Como neste processo, já tivemos oportunidade de salientar, o MºPº nunca se - opôs, nem jamais se oporá - e disso já deu prova insofismável -, a que se esclareçam quaisquer eventuais questões anómalas relativas aos métodos de obtenção de prova, (...) que elas emirjam da sua produção em audiência, com objectivação e consistência indiciária bastantes. Ao invés, o MºPº opor-se-á, sempre que o que se pretenda seja uma inversão dos estatutos dos diversos sujeitos ou intervenientes processuais e que possa implicar, nomeadamente, que o objecto do processo seja desvirtuado. Nesse sentido, o MºPº opor-se-á a quaisquer tentativas de transformar as instâncias no julgamento directo e deliberado da investigação, relembrando, sempre que tal se justifique e o entenda necessário, que, arguidos são os que o Despacho de Pronúncia definiu como tal. A questão suscitada pelo Arguido prende-se com a delimitação do objecto do processo, em geral, e com a delimitação do tema da prova, em particular, pois são estes que circunscrevem o conteúdo dos pedidos de esclarecimento a sugerir pelos sujeitos processuais e que o Tribunal pode decidir formular, ou não, aos Assistentes. É hoje pacificamente aceite que o objecto do processo é constituído pelos factos constantes da Acusação ou da Pronúncia e pelos factos relevantes constantes das Contestações, resultando ainda do dis(...) no artº 339°, n°. 4, do CPP, que a prova a produzir em julgamento há-de versar sobre os factos "alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, ..". Com efeito, e conforme refere o Prof. Germano M. da Silva, in "Curso de Processo Penal", Vol. III, pág. 223 e 224. "a contestação não está sujeita a formalidades especiais. Deve ser clara, indicando com clareza os factos relevantes que devem ser tidos em conta no decurso do julgamento e que o arguido procurará provar em audiência", Ainda de acordo com o Prof. Germano M. da Silva (ob. cit., pág. 267), "facto é (...) algo que acontece, uma ocorrência, uma modificação da realidade preexistente". Mesmo que se considere que a delimitação do objecto do processo não se confunde com o tema da prova e que este "não consiste exclusivamente, ou pelo menos directamente, nos factos que formam o objecto do processo, mas são também tema da prova os factos (...) que revelem a idoneidade de meios de prova", sempre o tema da prova hão de ser "factos, não argumentos, razões, pontos ou questões de direito" (cfr. Autor e ob. cit., Vol. 11, págs. 86 e 87). Para além do que vem sendo dito, o deferimento da formulação das perguntas sugeridas implicaria uma total subversão das regras relativas ao conhecimento dos autos de declarações prestadas em fases processuais anteriores ao julgamento. Na verdade, os depoimentos prestados nas fases de Inquérito e de Instrução só EXISTEM, em julgamento, como elementos de prova potencialmente determinante para a formação da convicção do Tribunal, se se proceder à respectiva leitura, nos termos dos artºs. 356° e 357°, do CPP. É o que, expressamente, resulta da ressalva contida no nº 2, do artº 355°, do referido diploma. Se assim é, a sindicância, em julgamento, da forma como foram conduzidas as tomadas de declarações aos Assistentes, nunca poderá ter lugar enquanto não for determinada a leitura dos respectivos autos. Os autos de declarações prestadas em Inquérito são ininvocável para e pelo Tribunal se a sua leitura não se produziu em sede de julgamento. Permitir a formulação das perguntas sugeridas seria permitir, de forma indirecta e ilegal, a invocação dos conteúdos dos respectivos autos, contornando-se, dessa forma, ilicitamente, os pressu(...)s que têm que se verificar para que tais leituras possam ser autorizadas, pressu(...)s esses disciplinados no art° 356°, nºs. 2, b) e 5, do CPP. De resto e em bom rigor, se não se descartar liminarmente a hipótese de, no âmbito do Inquérito, a Polícia Judiciária, ou o Ministério Público, terem formulado, aos Assistentes, as perguntas cuja formulação os Arguidos ora requerem e isso resultar dos autos de declarações respectivos, admitir as perguntas sugeridas pelos Arguidos implicaria uma violação grosseira do regime que disciplina a leitura dos depoimentos, por invocação dos respectivos conteúdos. Ao Tribunal está vedado cotejar os autos cuja leitura só ao abrigo do artº 356°, nºs. 2, b) e 5, seja permitida, enquanto tal leitura não for determinada. Fazê-lo, para além de manifestamente ilegal, implicaria o risco de formação de pré-juízos ou de sugestionamento, ainda que inconscientes, agravado pelo facto de, num e noutro caso, aos sujeitos processuais ficar então vedada a possibilidade de sindicarem o processo de aquisição mental de prova não produzida. Como bem se assinala no Ac. do ST J, de 20.5.1993, tirado no procº nº 43.817, "o art° 356°, do CPP, só permitindo a leitura em audiência de autos lavrados nos processos nos casos taxativos aí enumerados, visa assegurar o respeito pelos princípios do contraditório e da imediação da prova; a prova obtida durante o inquérito ou a instrução não constitui prova em sentido rigoroso. nem sequer um princípio de prova, apenas autorizando a convicção da possibilidade razoável do facto. Daí a redacção do art° 355°, completado pelo citado art° 356°, ditados pela preocupação de assegurar totais garantias de defesa, expressamente traduzida no art° 32°, da Constituição." Acresce que também o nº 7, do artº 356°, do CPP obsta a que a pergunta pudesse ser formulada. Dispõe tal preceito que: "Os órgãos de polícia criminal que tiverem recebido declarações cuja leitura não for permitida, bem como quaisquer pessoas que, a qualquer título, tiverem participado na sua recolha, não podem ser inquiridas como testemunhas sobre o conteúdo daquelas.". A razão de ser desta norma mais não visa do que impedir que, por via indirecta, se cotejassem os conteúdos das declarações em causa. A não existir, estaria aberto o caminho à possibilidade de revelar tais conteúdos por via da inquirição daqueles que, por qualquer forma, tivessem participado na sua recolha. Por outro lado, tal como relativamente aos Arguidos, a Jurisprudência tem vindo a não considerar meio de prova admissível, as chamadas "conversas informais", tão pouco, a terem-se verificado, elas são sindicáveis por parte das instâncias, (...) que, da discussão da causa não resulte, por forma minimamente consistente, qualquer suspeita de comportamento ou omissão anómalos. Nem se diga que, ao impedi-lo, se estaria a impedir o depoente de falar sobre os factos que narrou no Inquérito. Tal argumento, a ser - como, de resto, já foi -, invocado traduzir-se-ia num completo absurdo. O que o depoente estará obrigado a fazer, em sede de julgamento e no local próprio de produção da prova, é narrar os factos relacionados com o objecto do processo. Não será, em caso algum, narrar o que disse aos órgãos de policia criminal ou ao MºPº ainda que os factos possam, porventura, coincidir. Por fim, não pode deixar de estranhar-se que o ora Recorrente considere que " ... uma interpretação do dis(...) nos arts. 355°, n° 1 e 356°, n.ºs 1, 2 al. b) e 5, do C.P.P. como a que parece ser efectuada pelo despacho recorrido. no sentido de ao assistente, à parte civil ou à testemunha ou não poderem ser pedidos esclarecimentos ou colocadas questões sobre factos concretos que se encontrem relatados em autos de declarações produzido durante a fase de inquérito, a não ser que seja consentida a leitura de tal auto, sempre redundaria numa impossibilidade absoluta de produção de qualquer prova em audiência de julgamento.". Estranha-se, além do mais, porque, tal asserção, é contraditória com posição assumida noutra vertente da própria Motivação e, ainda, porque caberá então perguntar a que se reportam as instâncias que, desde então, a Ilustre Mandatária do Arguido tem vindo a dirigir a todos os Assistentes que, entretanto, depuseram, (...) que a doutrina do Despacho recorrido, coerentemente, se vem mantendo, face à proclamada "impossibilidade absoluta de produção de qualquer prova em audiência de julgamento". Por todo o ex(...), entendemos ser de julgar improcedente o Recurso, confirmando-se, nos seus precisos termos, a Decisão recorrida." (fim de transcrição) Passamos agora a transcrever o segundo dos despachos recorridos, ora em apreço (constante de fls. 60474 a 60490, Ponto II, proferido na audiência de julgamento de 22 de Outubro de 2008): "II - Fls. 55.520 a 55.523, Requerimento 2; Fls. 55.526 e fls. 55.787/55.792, Ponto II (Arguido H; Arguido K - Req. Leitura de declarações prestadas no inquérito pelos assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e pelas testemunhas AZ e CG): 1. A fls. 55.520 a 55.523, Requerimento 2 e a fls. 55.526 e fls. 55.787/55.792, Ponto II, os arguidos H e K, fundamentando e ao abrigo do dis(...) no arte 340°, do C. P. Penal, interpretado em consonância com o arte 6°, no 1, da CEDH, requereram ao Tribunal, em súmula; "... a) A leitura das declarações prestadas no inquérito pelos Assistentes de declarações prestadas no inquérito pelos assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e pelas testemunhas AZ e CG, tendo em conta que, durante o julgamento, descreveram factos que, directa ou indirectamente, incriminaram o arguido H em termos que devem ser avaliados considerando aquilo que de substancialmente diferente disseram no inquérito, de forma a que possa ser cabalmente avaliada a credibilidade da sua prestação; b) Efectuada tal leitura, devem os jovens acima referidos confrontados com as declarações prestadas em inquérito que, em matéria substancialmente relevante, conflitua com o que disseram em julgamento, de forma a avaliar a credibilidade das declarações prestadas em julgamento (...)". Disseram, ainda, que o requerimento feito mantém-se mesmo que qualquer dos sujeitos processuais se oponha à requerida leitura. O arguido H sustenta que tais declarações não podem servir para prova de factos positivos - e nisso se mantém útil o regime do arte 356°, do C.P.Penal -, mas podem ser utilizadas para avaliar da credibilidade de quem imputa factos criminosos a arguidos de um processo cuja prova fundamental assenta precisamente nos depoimentos dessas pessoas. No entanto, a fls. 55.787/55.792, ponto II, o arguido K sustenta que tais declarações prestadas na fase de inquérito e constantes de autos, podem servir não apenas para avaliar da credibilidade de quem as prestou. 1.1. Foi dado cumprimento ao dis(...) no art° 327°, n° 2, do C.P.Penal. O arguido E pronunciou-se a fls. 55.671 a 55.673, concluindo pelo deferimento do requerido. Os Assistentes pronunciaram-se a fls. 55.684 a 55.687, opondo-se expressamente à leitura das declarações constantes de autos e abrangidas pelo objecto do requerimento dos arguidos H e K, mas fundamentando e concluindo também pelo indeferimento do requerido. O Dº Magistrado do Ministério Público pronunciou-se a fls. 55.703 a 55.714, concluindo pelo indeferimento do requerido. O Tribunal passa a apreciar e decidir. 2. O Estado, enquanto titular do ius puniendi, tem interesse em que os culpados de actos criminosos sejam punidos. No entanto, só tem interesse em punir os verdadeiros culpados. "(...) O Estado está, por isso, igualmente interessado em garantir aos indivíduos a sua liberdade contra os perigos de injustiças. Está interessado, desde logo, em defendê-los «contra agressões excessivas da actividade encarregada de realizar a justiça penal» (...). Existe um dever ético e jurídico de procurar a verdade material. Mas existe também um outro dever ético e jurídico que leva a excluir a possibilidade de empregar certos meios na investigação criminal (...)." (cfr. AC. TC nº 578/98, DR. 26/2/99, II série, pag. 2.950). Daí que a verdade material não possa conseguir-se a qualquer preço, não dispondo a autoridade judiciária - que nesta fase processual do julgamento é o Juiz -, de um poder ilimitado de produção de prova: o juiz, dentro do thema probandi, está sujeito aos princípios instituídos pelo legislador ordinário e constitucional, para a obtenção da prova nas diferentes fases processuais. Isto para que a verdade processual corresponda ao que ontologicamente está subjacente à actividade punitiva dos Estado: para que seja "... o resultado probatório processualmente válido, que sustenta a convicção de que certa alegação de facto é justificavelmente aceitável como pressu(...) da decisão, por ter sido obtida por meio processualmente válido (...)." (cfr. G. Marques Silva, Curso processo penal II, 2ª edição, verbo, pag. 111). No caso concreto os arguidos pretendem "exercer o contraditório": a) através da leitura dos autos de declarações que os Assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e as testemunhas AZ e CG prestaram na fase de inquérito, perante a Polícia Judiciária ou perante o Ministério Público; b) com o subsequente confronto, em audiência de julgamento, dos Assistentes ou testemunhas com as declarações que se encontram consignadas nos autos, na parte em que as mesmas, em matéria substancialmente diferente, conflitua com o que disseram em julgamento; c) com o fim, o arguido H - dado que admite que tais declarações não podem servir para prova de factos positivos e nisso se mantém útil o regime do art° 356º, do C.P.Penal -, para serem utilizadas para avaliar da credibilidade de quem imputa factos criminosos a arguidos de um processo cuja prova fundamental assenta precisamente nos depoimentos dessas pessoas; e, o arguido K, com o objectivo de tais declarações prestadas na fase de inquérito e constantes de autos, poderem servir não apenas para avaliar da credibilidade de quem as prestou, mas produzirem prova positiva quanto aos factos. d) e devendo a leitura ser feita mesmo que não exista o acordo de todos os Sujeitos Processuais para o efeito. Ora da conjugação do dis(...) nos artºs. 355°, nº 1 e 2 e 127°, do C.P. Penal e para o que à presente questão importa, resultam dois elementos estruturantes da actuação do juiz na fase processual do julgamento: - proibição da valoração de provas que não sejam examinadas ou produzidas em audiência de julgamento, ressalvando da imediação as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida em audiência de julgamento (observando-se, neste caso, o dis(...) no art°. 356° e 357°, do C.P.Penal); - e a valoração da prova de acordo com as regras da experiência, apreciada livremente pelo Tribunal. O legislador, ao consagrar nesta fase processual o princípio da concentração da prova na audiência de julgamento, da oralidade e da imediação, coloca limites ao modo como o Tribunal pode alcançar a verdade material e - porque a questão, neste segmento, foi suscitada pelos arguidos -, até onde o Juiz do Julgamento pode e deve ir quanto às condições da investigação do crime. Está a definir, de forma clara, uma separação entre o momento do inquérito ou da instrução e o momento do julgamento, separação esta que decorre da estrutura acusatória do processo. 2.1. Analisando o requerimento apresentado pelos arguidos face ao enquadramento legal acabado de enunciar, os arguidos Requerentes pretendem que o Tribunal defira a leitura de autos de declarações prestadas em fase de inquérito perante a Polícia judiciária ou perante o Ministério Público, por Assistentes ou testemunhas e sua confrontação com tais autos em audiência de julgamento, não ao abrigo do dis(...) no art° 355° e 356°, do C.P. Penal, mas ao abrigo do artº 340°, do C.P.penal, interpretado de acordo com o art° 32°, da CRP e art° 6°, da CEDH. Mas, como vimos, o art° 355°, n° 1, do C.P.Penal, consagra e como corolário de princípios estruturante do processo penal, que não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito da formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência. Dispondo, no entanto, o n° 2 deste preceito, que ressalvam-se do dis(...) no número anterior as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida nos termos dos artigos seguintes. Dentro das excepções (que interessam ao presente caso) dispõe o artº 356°, n° 1, al. b), do C. P. Penal, que só é permitida a leitura em audiência de julgamento de autos de instrução ou de inquérito que não contenham declarações do arguido, do Assistente, partes civis e testemunhas. E diz, por sua vez, o n° 2, al. b), do mesmo preceito, que "… a leitura de declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas só é permitida, tendo sido prestadas perante o Juiz (...) se o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (…)", acrescentando o n° 5 que " … verificando-se os pressu(...) no nº 2, al. b), a leitura pode ter lugar mesmo que se trate de declarações prestadas perante o Ministério Público ou perante órgão de polícia criminal. Não encontramos, face ao regime excepcional constantes do artºs. 355° e 356, do C. P. Penal e como o mesmo está estruturado, enquadramento legal - incluindo constitucional -, que permita retirar a leitura de autos de declarações que em concreto são requeridas deste regime excepcional e enquadre tal possibilidade ao abrigo do princípio genérico para a produção da prova consagrado no artº 340°, do C.P.Penal. Tal deriva do que enunciámos quanto ao princípio que vigora na presente fase processual, de concentração da prova na audiência de julgamento, da oralidade e da imediação. Resulta deste núcleo "estruturante" subjacente à actuação do juiz na fase do julgamento, que ao Juiz do julgamento compete assegurar que nesta fase a verdade material não seja alcançada por métodos de aquisição da prova proibidos (por exemplo, art° 126°, do C.P.Penal) - aqueles que afectam a liberdade e formação da vontade de declaração, podendo consubstanciar, por exemplo, manipulação da vontade por indução da declaração, adulteração da capacidade de memória, indução de certo raciocínio por introdução de premissas ou de factos pré determinados aquando de um interrogatório -. E compete assegurar, igualmente, que a prova que fundamente uma absolvição ou uma condenação (artº 355°, do C.P.P.), aquela em relação à qual o Tribunal pode e vai formar determinada convicção, tenha sido adquirida sem violação dos procedimentos ou da forma que a lei impõe para a produção de tal meio de prova em concreto (por exemplo: buscas, revistas, reconhecimentos, perícias, escutas, leitura ou reprodução de declarações constantes de autos). Resulta, assim e por decorrência do artº 32°, da C.R.P. e 237º, do C. P. Penal, que o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório, estende-se a todos os meios de prova que, nos termos do art° 355°, do C.P. Penal, possam fundamentar a convicção do julgador quanto aos factos que constituem o objecto do processo. Reproduzindo o que foi decidido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão nº 1.052/96 (Ac. TC de 10/10/96, subscrito pelos Senhores Juízes Conselheiros Antero Alves Monteiro Diniz, Maria Fernanda Palma, Vítor Nunes de Almeida, Armindo Ribeiro Mendes, Alberto Tavares da Costa e José Manuel Cardoso da Costa, cfr. www.dgsi.pt. Acórdãos do Tribunal Constitucional e embora tal acórdão diga respeito a questão de leitura de autos ao abrigo do dis(...) no art. 356°, nº 2, al. b) e n° 5, do C. P. Penal, em que houve oposição do Assistente a tal leitura, mas que entendemos manter interesse para o presente caso, dado que trata dos pressu(...)s e princípios subjacentes ao enquadramento legal da leitura de actos processuais -, o princípio que está inerente a todas as regras "... sobre produção de prova na audiência de julgamento consta do art. 355°, nº 1, do C.P.penal, segundo o qual «não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de convicção do tribunal, quaisquer provas que não tivessem sido produzidas ou examinadas em audiência». Por influxo deste princípio, como aliás resulta do nº 2 daquele dispositivo, a prova constante de actos processuais praticados anteriormente (...) não pode ser utilizada para efeitos de decisão se os respectivos autos não forem lidos em audiência (...). A leitura dos autos e declarações autorizada pelo art. 356° representa uma emanação da oralidade e publicidade da audiência, traduzindo-se porém em excepção ao princípio da imediação da prova, excepção justificada pela impossibilidade ou grande dificuldade da sua produção directa ou por outras razões pertinentes (...). (...) A diferenciação de tratamento estabelecida para a leitura em audiência dos diversos actos ali previstos radica na sua particular natureza e conteúdo mas também, e é esse um ponto que aqui importa sublinhar, nas maiores ou menores garantias processuais com que os mesmos foram praticados (com as formalidades estabelecidas para a audiência, levadas a cabo pelo Juiz, perante o Ministério Público ou perante órgão de polícia criminal). (...) Em conformidade com o dis(...) no art. 32°, da Constituição «o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa» (nº 1), revestindo «estrutura acusatória» e «estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório» (nº 5). Quando aquele preceito se reporta a «todas as garantias de defesa», considera indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. O posicionamento do arguido num processo de tipo acusatório há-de revestir uma situação de reciprocidade dialéctica face à acusação, pelo que, em conformidade, devem ser-lhe atribuídos aqueles meios legais de intervenção que compensem o desequilíbrio, que é pressu(...) indispensável de uma correcta administração da justiça. O princípio do contraditório é, afinal, expressão, ao nível jurídico-processual do princípio da igualdade (...)". O artº 356°, do C.P. Penal, " ... só consente a leitura do depoimento da testemunha - presente na audiência de julgamento - prestado no inquérito perante um órgão de polícia criminal, desde que se verifique acordo por parte do ministério Público, do arguido e do assistente. Este condicionamento acha-se fundado, desde logo, na circunstância de as declarações cuja leitura se pretende não terem sido prestadas com observância das formalidades estabelecidas para a audiência perante Juiz, não existindo quanto a elas as garantias dialécticas de contraditoriedade constitucionalmente asseguradas. Por outro lado, achando-se presente na audiência a testemunha em causa, há-de dizer-se que quanto ao seu depoimento e à sua razão de ciência o arguido tem a possibilidade legal de exercer um pelo direito de defesa (...).". Diz, ainda, o Tribunal Constitucional, que esta exigência de um consentimento alargado ao Ministério Público, ao arguido e ao assistente, para que a leitura de declarações seja possível não se apresenta com "... encurtamento ou restrição inadequada ou inadmissível das garantias de defesa, traduzindo-se, ao contrário, numa linha de concretização do princípio geral sobre a produção da prova em audiência constante do art. 355°, n° 1, o qual visa essencialmente a garantia da posição processual do arguido. Não se tem assim por existente qualquer violação constitucional daquela norma (...)." 2.1.1. Em consequência, no que respeita aos auto de declarações prestadas pelas testemunhas ou Assistentes perante órgão de polícia criminal ou perante o Ministério Público na fase de inquérito - e a que se referem o requerimento dos arguidos -, este Tribunal entende que a lei só permite a sua utilização e o seu conhecimento, no caso expressamente previsto no artº 356°, n° 5, por remissão para o art° 356°, nº 2, al. b), do C. P. Penal. Face ao enquadramento teórico que ficou enunciado e aos preceitos legais já indicados, dado que os assistentes a fls. 55.684 a 55.687 expressamente dizem que não dão o seu consentimento para a leitura das declarações que constem de tais autos, não pode o Tribunal permitir, por legalmente vedado pelos arts. 355°, nº 1 e 356°, n° 2, al. b) e nº 5, do C. P. Penal, que às testemunhas ou assistentes identificados nos requerimentos dos arguidos, sejam colocadas questões sobre o conteúdo dessas declarações consignadas em auto, feitas perguntas sobre a incompatibilidade (para os arguidos requerentes) do conteúdo dessas declarações com as que prestaram em audiência de julgamento; não sendo, também, legalmente admissível considerar processualmente irrelevante a oposição dos assistentes a tal leitura e, não obstante essa oposição, proceder à leitura dos autos. Face ao dis(...) nos citados arts. 355°, nº 1 e 356°, nº 2, al. b) e n° 5, do C. P. Penal, a leitura e conhecimento do conteúdo dos autos a que se refere o requerimento dos arguidos só é possível com o consentimento de todos os sujeitos processuais, incluindo os assistentes. 2.2. Invocam no entanto os arguidos - para além do art° 32°, da C.R.P., mas este já expressamente abordado pelo acórdão do Tribunal Constitucional acabado de citar -, o artº 6°, da C.E.D.H .. No actual processo penal o princípio do contraditório impõe que seja dada a oportunidade a todo o sujeito processual de ser ouvido e de expressar as suas razões antes de ser tomada uma decisão que o afecte. Com assento constitucional no art° 32°, n° 5, da C.R.P., tem sido igualmente tratado pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e considerado como um elemento integrante do princípio de um processo equitativo, inscrito como direito fundamental no artº 6°, da CEDH." ... na construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central nos direitos do acusado (...), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve ser proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial (...), que seja dado ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo (...), sendo apenas os direitos da defesa limitados de maneira incompatível com o respeito do princípio sempre que uma condenação se basei, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior seja durante a audiência (...) - (cfr. Ac. STJ, de 20/12/06, Pº 06P3379, www.dgsi.pt). 2.2.1. Integrando e preenchendo o que antecede com o que ocorreu no presente julgamento, no que ao efectivo exercício do contraditório em audiência de julgamento diz respeito em relação aos assistentes e testemunhas identificados pelos arguidos Requerentes e em relação aos quais requerem a leitura dos autos de declarações prestadas na fase de inquérito, o Tribunal considera que foi dado aos arguidos possibilidade de em audiência de julgamento exercerem o contraditório tal como o artº 32°, nº 5, da C.R.P. o consagra ou o art° 6°, da CEDH. Os Assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e as testemunhas AZ e CG, foram ouvidos em audiência de julgamento, tendo sido inquiridos os Assistentes através do Tribunal (artº. 346°, do C. P. Penal) e as testemunhas inquiridas ou contra - inquiridas directamente pelos Mandatários/Representantes dos Sujeitos processuais (art. 348°, do C. P. Penal). O Assistente AV foi ouvido, por exemplo, nas audiências de julgamento de 12.09.05, 14.09.05, 15.09.05, 19.09.05, 21.09.05, 26.09.05, 28.09.05, 29.09.05, 3.10.05, 10.10.05, 12.10.05, 13.10.05, 14.10.05, 17.10.05, 19.10.05, 20.10.05, 24.10.05, 31.10.05. O Assistente AP foi ouvido, por exemplo, nas audiência de 20.06.05, 24.06.05, 27.06.05, 29.06.05, 30.06.05, 4.07.05, 6.07.05, 7.07.05, 13.07.05, 14.07.05, 18.07.05, 20.07.05, 22.07.05, 25.07.05, 25.11.05, 9.02.06, tendo sido confrontado com declarações prestadas perante JIC. O Assistente AT foi ouvido, por exemplo, nas audiências de 23.01.06, 25.01.06, 30.01.06, 1.02.06, 2.02.06, 6.02.06, 7.02.06, 8.02.06, 9.02.06. O Assistente AN foi ouvido, por exemplo, nas audiências de 19.12.05, 21.12.05, 5.1.06, 6.01.06, 9.01.06, 10.01.06, 11.01.06, 16.01.06, 20.01.06, 23.01.06. O Assistente X foi ouvido nas audiências de 9.11.05, 10.11.05, 11.11.05. O Assistente AI foi ouvido nas audiências de 29.11.05, 30.11.05, 5.12.05, 6.12.05, 7.12.05, 12.12.05, 14.12.05, 15.12.05, O Assistente Y foi ouvido nas audiências de julgamento de 10.02.06, 14.02.06, 15.02.06, 16.02.06, 20.02.06. O Assistente AU foi ouvido nas audiências de 2.11.05, 7.11.05, 9,11.05, tendo sido confrontado com declarações prestadas perante J.I.C. A testemunha AZ foi ouvido nas audiências de julgamento de 16/3/06 e 22/03/06. E a testemunha CG foi ouvido na audiência de julgamento de 29/3/06. Ouvindo e analisando a globalidade: - das declarações que os Assistentes e as duas testemunhas prestaram nas audiência de julgamento; - as perguntas que lhes foram feitas pelos Sujeitos processuais nas suas instâncias e contra-instâncias, incluindo os arguidos requerentes; - os documentos com que foram confrontados e que se encontram identificados nas actas das audiências em que prestaram depoimento/ declarações; - as explicações que deram quanto ao conhecimento ou momento do conhecimento de factos que poderão relevar para o objecto deste processo e razão de ciência; - os Peritos e consultores técnicos que foram ouvidos em audiência de julgamento quanto a Perícias ou sobre Perícias feitas aos Assistentes e que são mencionados pelos Arguidos na fundamentação do requerimento que está em apreciação - a título de exemplo, os Consultores Técnicos Sra. Dra. CH em 26/05/08, Sr. Prof. CI em 4/06/08 e 18/06/08, Sr. Prof. BV em 30/05/08, 9/07/08 e 11/07/08, Sra. Prof. CJ em 8/05/08, Sr. Prof. CK em 19/05/08, 29/05/08 e 5/06/08, Sr. Dr. CL em 21/12/06 e os Peritos Sra. Dra. CM em 20/09/07, 21/09/07 e 26/10/07, Srs. BC em 2/10/06, Sr. Prof BR em 25.09.06, 27.09.06, 28.09.06 e 16.10.06, Sra. Dra. CN em 22/11/07, Srs. Dr. CO em 29.09.06, Sr. Dr. CP em 10/12/07, Sra. Dra. CQ em 19/11/07, sra. Dra. CR em 15/04/08, sra. Dra. CS em 16/04/08, Sr. Dr. CT em 17/04/08, sra. Dra. CU em 18/04/08, Sra. Dra. CV em 23/04/08 -, Peritos estes ou consultores técnicos que alertaram ou esclareceram o Tribunal quanto ao crivo ou exigências especiais que, na sua perspectiva de técnicos e sempre sob essa perspectiva, o Tribunal deve ter em termos gerais, ou em termos específicos em relação aos Assistentes sobre os quais se debruçaram, analisaram ou examinaram, aquando da avaliação ou ponderação do seu comportamento em audiência de julgamento; o Tribunal considera que aos arguidos foi dada a efectiva possibilidade de, em audiência de julgamento, porem em causa perante o Juiz do julgamento a credibilidade dos assistentes ou testemunhas identificados no seu requerimento, a razão de ciência ou o conhecimento de factos efectivamente relevantes face ao objecto do processo, a possibilidade ou impossibilidade dos fados que declararem terem ocorrido, ou terem ocorrido nas circunstâncias de tempo, modo ou lugar que descreveram. Porque é isto que - e abrangendo quer a perspectiva do arguido H, quer a perspectiva do arguido K, quanto ao contributo do que é requerido para a prova dos factos em discussão em julgamento, isto é, valoração ou possibilidade de constituírem "prova positiva" ou "prova negativa" dos factos - o Tribunal interpreta como estando globalmente em causa com o requerimento dos arguidos: que o Tribunal proceda à avaliação cabal da credibilidade dos declarantes ou depoentes, mas o que - ao contrário do que é o entendimento deste Tribunal -, os arguidos consideram só poder ser efectivamente feito pelo tribunal se conhecer as declarações que foram prestadas em fase de inquérito e a sua evolução, por considerarem que existem contradições, sendo na perspectiva dos arguidos elemento imprescindível a avaliação dessas contradições para a formulação de um juízo adequado quanto àquela credibilidade (cfr. fis. 55.522, Ponto 10.). 2.2.2. Mas, não sendo permitido ao Tribunal do Julgamento fazer uso das declarações prestadas pelos assistentes ou pelas testemunhas na fase de inquérito perante a Polícia Judiciária ou perante o Ministério Público - por no decurso da audiência não ter havido o acordo a que se refere o art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5 , do C.P.Penal -, fica comprometida a capacidade do Tribunal de proceder à descoberta da verdade material e à avaliação dos depoimentos que vierem a ser prestados em audiência de julgamento pelos assistentes ou pelas testemunhas? É aqui que cabe analisar o segundo núcleo que acima enunciei, estruturante da actuação do juiz na fase de julgamento, consagrado no art° 127°, do C.P.Penal, pois tendo sido, no entendimento deste Tribunal, concretizado um efectivo exercício do contraditório em audiência de julgamento, foi respeitado o que está consagrado no artº 127°, do C.P.Penal. O legislador, ao separar a fase da audiência de julgamento da fase do inquérito e da instrução, nos termos em que o fez no art° 355°, do C. P. Penal, quis marcar uma clara divisão entre o processo intelectual que levou à formação da convicção que sustentou uma acusação ou uma pronúncia, do processo de formação da convicção na fase da audiência de julgamento que pode levar a uma condenação ou a uma absolvição. E quis fazê-lo para garantia da defesa do arguido. "(...) O acto de julgar é do tribunal, e tal acto tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção. Tal operação não é pura e simplesmente lógico-dedutiva (...) não é uma mera operação de opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis). Para a operação intelectual contribuem regras, impostas por lei, como sejam as da experiência, a da percepção da personalidade do depoente (impondo-se por tal a imediação e a oralidade), a da dúvida inultrapassável (conduzindo ao principio in dúbio pró reo). A lei impõe princípios instrumentais e princípios estruturais para formar a convicção. (...) Só a partir da oralidade e imediação pode o juiz perceber os dados não objectiváveis atinentes com a valoração da prova. A oralidade (...) permite ao Tribunal aperceber-se dos traços do depoimento, denunciadores da isenção, imparcialidade e certeza que se revelam por gestos, comoções e emoções, da voz, por exemplo. A imediação que vem definida como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de tal modo que, em conjugação com a oralidade, se obtenha uma percepção própria dos dados que haverão de ser a base da decisão. (...) A censura quanto à forma de formação da convicção ... terá de assentar na violação de qualquer um dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (...)" (cfr. Ac. TC nº 198/2004, DR 2/6/04, II série, pag. 8544 e segs). Do que antecede resulta que quem julga tem de o fazer com a prova produzida em audiência de julgamento, tal como o define o art° 355°, do C.P. Penal e com respeito pelos princípios decorrentes do arte 127°, do C.P Penal. A percepção do depoimento é conseguida com a imediação da prova. É da confrontação global do conteúdo do depoimento com a forma como o mesmo foi prestado em audiência de julgamento - quer do ponto de vista da exteriorização por sinais físicos, quer da hesitação, certeza, comoção, distanciamento, forma de reacção a confrontação, sentido do depoimento ao longo de todas as instâncias -, que o Tribunal, pelos princípios instrumentais e estruturais a que tem de recorrer para a formação e fundamentação da convicção, enunciados no citado artº 127°, do C.P.P., vai avaliar da liberdade da formação vontade do depoente na declaração e, assim, da ocorrência, ou não, do facto que é objecto da prova, da intervenção da factores estranhos na formação da vontade da declaração. Como o arguido H, ora requerente, refere na sua contestação, depois de falar na intervenção de agentes externos que inquinaram o andamento do processo, criando pânico na sociedade portuguesa e num ambiente de "caça às bruxas", com prejuízo do princípio da presunção de inocência, "... chegados, finalmente, à fase do julgamento do processo, importa depurar o processo de todas estas impurezas e voltar às bases ..." E referindo-se a uma passagem do despacho de pronuncia, relacionada com as perícias sobre a personalidade realizadas na fase do inquérito, transcreve que "… é evidente a constatação de que não « existe qualquer sistema ou método validade científica que permita aferir a completa veracidade de um relato ou testemunho» (o que é óbvio para qualquer cidadão medianamente informado) ... ". Diz, ainda, que"... nenhum perito pode substituir o Tribunal na apreciação da prova, ... cabe ao tribunal avaliar a credibilidade dos depoimentos. Não há «testes» nem «soros da verdade» que possam afastar esse dever ... ". (cfr. Contestação do arguido, pontos 9 a 11 e pontos 118 a 124). E este dever tem que ser exercido, para este Tribunal, nos termos definidos pela lei processual para a fase do julgamento, que derivam dos princípios constitucionais que consagram a estrutura acusatória do processo e o princípio da presunção de inocência, os quais (no que para a presente questão importa) estão determinados nos artºs. 355°, 356°,357° e 127°, do C.P.Penal. Porque isto é uma garantia de Defesa do arguido. A ir-se pelo caminho defendido pelos arguidos no requerimento que está em apreciação, isto é, sindicar em audiência de julgamento o processo intelectual que levou determinada testemunha, no Inquérito, a produzir determinada declaração consignada em auto, como é que a pergunta lhe foi feita, que resposta deu, porque é que respondeu assim, o que lhe foi perguntado a seguir por quem estava a inquiri-lo - não o sendo na sequência de leitura de declarações nos termos do artº 356°, na 5, do C. P. Penal, porque aí seria o respeito de uma das excepções que o Legislador quis consagrar ao 355°, do C.P.P -, podia-se estar a inquinar o depoimento prestado em audiência de julgamento e a afectar a espontaneidade das declarações. A inquinar o depoimento que viesse a ser prestado em audiência de julgamento por, potencialmente, poder estar-se a transmitir um vício de raciocínio para a declaração que estivesse a ser prestada em audiência, pois o declarante ou a testemunha estaria a reportar-se ao que lhe foi perguntado no inquérito e não ao que lhe estava a ser perguntado; a fazer um processo de reavivamento da memória não do facto que diz ter vivido ou presenciado, mas do facto que terá contado e como o terá contado perante órgão de polícia criminal; o que, por sua vez, tem ainda como pressu(...)s não a resposta a pergunta feita em audiência de julgamento, mas a pergunta feita pela Polícia Judiciária ou a autoridade policial que estivesse em causa. Porque há um aspecto que também não se pode descurar e que já foi focado pela Jurisprudência: em regra as declarações e depoimentos que são recolhidos em autos são redigidos por súmula e, também em regra, as afirmações de confirmação ou negação dos factos surgem descontextualizados, o que lhe diminui (em regra) a força de convencimento, em termos de permitir sustentar a prevalência de versão dos factos (cfr. Ac TRL, 8/06/05, Pº 1514/2005-3. www.dgsi.pt). E o que antecede foi, no entendimento deste Tribunal, uma das consequências que o legislador também quis evitar ao consagrar o regime do art° 355°, 356° e 357°, do C.P.Penal, o que é, como dissemos, decorrência do princípio do acusatório. Ao Tribunal cabe dar como provados ou não provados os fados que façam parte do thema probandum e, destes, dentro dos princípios e nos termos que a lei expressamente determina. Qualquer derrogação aos princípios estruturais acima mencionados só pode ocorrer nos casos que a lei consagra e não nas condições em que qualquer sujeito processual o pretenda. 3. Face a todo o ex(...), ao abrigo do dis(...) nos artºs 32°, nº 1, 2 e 5, da C.R.P., 127°, 355° e 356°, nº 1, 2 al. b) e nº 5, 323°, al. f), do C. P. Penal e art. 6°, da CEDH, o Tribunal indefere o requerido a fls. 55.520 a 55.523, Requerimento 2 e a fls. 55.526 e fls. 55.787/ 55.792, Ponto 11, pelos arguidos H e K." (fim de transcrição) Inconformado, o arguido H interpôs recurso, extraindo da sua motivação (fls. 60879 a 60891, original a fls. 60964 a 60977) as seguintes conclusões: "A) As declarações dos jovens ora em causa, prestadas no inquérito, conflituam, em aspectos cruciais, com aquilo que declararam no julgamento, quer quanto aos locais, quer quanto ao envolvimento de terceiros, quer quanto à cronologia dos factos, quer quanto ao circunstancialismo envolvente. B) Não há que escamotear o evidente: neste processo não se pode fazer verdadeira justiça se o tribunal não tiver conhecimento das declarações prestadas pelos jovens em apreço durante o inquérito, de forma a avaliar, cabalmente a sua credibilidade, tendo em conta a evolução do seu discurso e a natureza das contradições desse discurso, sendo certo que é consensual, na doutrina científica, que a avaliação dessas contradições é elemento imprescindível para a formulação de um juízo adequado quanto àquela credibilidade. C) O exercício da defesa não pode prescindir da leitura dessas declarações e, quando for o caso, do confronto dos jovens em causa com o teor das mesmas. D) O regime do art. 356º do C.P.P. não pode impedir tal leitura, quando se trate de declarações dos assistentes ou de testemunhas que igualmente incriminam os arguidos, em processo em que a prova da acusação assenta basicamente nos depoimentos dessas pessoas e quando tais pessoas foram ouvidas na fase de inquérito sob a égide do Ministério Público ou sob sua delegação, sempre que isso se revelar fundamental para o exercício da defesa. E) Tais declarações não podem servir para: a prova de factos positivos - e nisso se mantém útil o regime do art. 356º do C.P.P. -, mas podem ser utilizadas para avaliar da credibilidade de quem imputa factos criminosos a arguidos de um processo, cuja prova fundamental assenta precisamente nos depoimentos dessas pessoas, sob pena de se ofender o núcleo essencial das garantias de defesa e o princípio de um processo equitativo, tal como a CRP e CEDH salvaguardam. F) Foi nesse contexto que o arguido requereu, ao abrigo do art. 340º do C.P.P., interpretado em consonância com o art. 32° nº 1 da CRP e com o art. 6° nº 1 da CEDH, o seguinte: a) A leitura das declarações prestadas no inquérito pelos assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e pelas testemunhas AZ e CG, tendo em conta que, durante o julgamento, descreveram factos que, directa ou indirectamente, incriminam o arguido H em termos que devem ser avaliados considerando aquilo que de substancialmente diferente disseram no inquérito, de forma a que possa ser cabalmente avaliada a credibilidade da sua prestação; b) Efectuada tal leitura, devem os jovens acima referidos ser confrontados com as declarações prestadas em inquérito que, em matéria substancialmente relevante, conflitua com o que disseram em julgamento, de forma a avaliar a credibilidade das declarações prestadas em julgamento; c) Caso o Tribunal entenda que o deferimento do pedido depende da identificação concreta de todas essas contradições, requer-se que seía concedido prazo de 10 dias para o efeito. G) Nenhum dos arguidos se opôs à leitura das declarações ora em causa. Mas os assistentes opuseram-se expressamente a essa leitura e o Ministério Público pugnou pelo indeferimento do requerido, H) Tal requerimento foi indeferido pelo despacho ora recorrido. Aí se reconhece que o regime do art. 356º do C.P.P. constitui uma garantia de defesa do arguido, mas, ainda assim, tendo os assistentes expressamente recusado o consentimento para as leituras em causa, entende-se que tal leitura não pode ter lugar por força no dis(...) no art. 356º nºs 2 e 5, devidamente conjugado com o art. 355° n° 1, todos do C.P.P.. I) Estamos perante a questão processual mais grave destes quatro anos de julgamento. J) O acesso a essas declarações é imprescindível para se fazer a prova da inquinação das suas memórias e do processo de formação da sua vontade. K) O arguido desde a sua contestação - cfr, nºs 234 a 237 dessa peça processual - sempre afirmou que era indispensável demonstrar que a metodologia utilizada pela investigação na abordagem das alegadas vítimas tinha inquinado a sua credibilidade. L) É por isso intolerável que, com base na oposição dos assistentes, não se possa proceder à leitura do que eles próprios declararam em inquérito, sendo certo que foram essas as declarações em que se fundou a acusação pela qual os arguidos respondem ... M) Ressalvado o devido respeito, a leitura. restritiva do art, 356° do C.P.P. adoptada pelo Tribunal - a de que, havendo oposição ou não consentimento dos assistentes, não pode, em nenhuma situação, ser efectuada a leitura de declarações prestadas em inquérito - é errónea e constitui um gravíssimo entorse a um processo equitativo e uma inaceitável restrição das garantias de defesa. N) O entendimento normativo do art. 356º nº 2-b) e nº 5 do C.P.P., devidamente conjugado com o art. n° 355º n° 1 do C.P.P. no sentido de que, não tendo expressamente os assistentes dado o seu consentimento à leitura de declarações de assistentes e testemunhas que incriminam os arguidos - por estes requerida para avaliar cabalmente a credibilidade da sua prestação em audiência de julgamento, uma vez que são substancialmente diferentes das prestadas em inquérito -, como consta do despacho recorrido, a fls. 60.482, é inconstitucional, por violação do reduto nuclear das garantias de defesa consagradas pelo art. 32º nº 1 da C.R.P. e o princípio do processo equitativo salvaguardado pelo art. 20° n° 4 da C.R.P.. e pelo art. 6° da C.E.D.H." (fim de transcrição) Igualmente inconformado, o arguido K interpôs recurso, extraindo da sua motivação (fls. 61076 a 61096, original a fls. 61126 a 61148) as seguintes conclusões: "1. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o requerimento de leitura de declarações do assistente FFN prestadas em sede inquérito e seu subsequente as prestadas em audiência de julgamento, de forma a que pudesse ser avaliada a credibilidade das mesmas, sustentando o requerido ainda no caso de alguns dos sujeitos processuais se opor à requerida leitura. 2. Nos termos do dis(...) no art.º 379.º, n.º 1, al. c) do C.PP., aplicável aos restantes actos decisórios por força do dis(...) no n.º 5 do art.º 380.º, do mesmo diploma legal, o Tribunal não pode deixar de se pronunciar sobre todas as questões que lhe são colocadas e que devesse apreciar. 3. Face ao ex(...) deve ser declarada nula a decisão proferida e, em consequência, deve o Tribunal pronunciar-se sobre o requerido no que respeita ao assistente FFN, admitindo contudo que tal omissão se possa ter devido a mero lapso e como tal deve ser corrigido. 4. O recorrente requereu a leitura em audiência das declarações de depoimentos prestados pelos assistentes e testemunhas que ali identificou e o subsequente confronto daqueles com as declarações e depoimentos prestados em sede de audiência de discussão e julgamento. 5. Nenhum dos arguidos se opôs à leitura das declarações ora em causa, apenas se manifestando nesse sentido os assistentes e o Ministério Público que pugnou pelo indeferimento do requerido. 6. Tal requerimento foi indeferido pelo despacho ora recorrido, nos termos do qual se reconhece que o regime do art.º 356º do C.P.P. constitui uma garantia de defesa do arguido, mas, ainda assim, tendo os assistentes expressamente recusado o consentimento para as leituras em causa, entende-se que tal leitura não pode ter lugar por força no dis(...) no art.º 356º n.ºs 2 e 5, devidamente conjugado com o art.º 355º n.º 1, todos do C.P.P.. 7. O Tribunal entende ainda que a norma em causa visa garantir a espontaneidade das declarações em julgamento, as quais, fora do quadro do regime do art.º 356 do C.P.P., na leitura que faz dessa norma, poderiam ser inquinadas, mas sem razão, 8. No geral, as declarações e depoimentos dos jovens em causa, prestadas no inquérito, contradizem, em aspectos essenciais, com aquilo que declararam no julgamento, quer quanto aos locais, quer quanto ao envolvimento dos arguidos e de terceiros, quer quanto à cronologia dos factos, quer quanto ao circunstancialismo envolvente, quer ainda quanto ao tipo de actos praticados, entre outras circunstâncias igualmente relevantes para o efeito pretendido. 9. Ao longo de toda a audiência de discussão e julgamento, o Ministério Público e os assistentes, refugiando-se no dis(...) no art.º 356.°, n.ºs 2, al. b) e 5 do C.P.P., impediram sistematicamente o acesso ao conteúdo de tais declarações e depoimentos, porque bem sabem que aí se revela e desvenda o que verdadeiramente está na origem das imputações efectuadas aos arguidos. 10. Nos presentes autos, não se pode fazer verdadeira justiça se o tribunal não tiver conhecimento das declarações prestadas pelos jovens em apreço durante o inquérito, de forma a avaliar cabalmente a sua credibilidade, tendo em conta a evolução do seu discurso e a natureza das contradições desse discurso, sendo certo que é consensual, na doutrina científica, que a avaliação dessas contradições é elemento imprescindível para a formulação de um juízo adequado quanto àquela credibilidade. 11. O exercício efectivo do direito de defesa no caso concreto, não pode prescindir da leitura dessas declarações e depoimentos e, quando for o caso, do confronto dos jovens em causa com o teor das mesmas. 12. O regime consagrado no art.o 356.º do C.P.P. não impede tal leitura, quando sejam os próprios arguidos a requerê-lo e se trate de declarações dos assistentes ou de testemunhas que igualmente incriminam os arguidos, em processo e em que a prova da acusação assenta basicamente nos depoimentos dessas pessoas e quando tais pessoas foram ouvidas na fase de inquérito sob a égide do Ministério Público ou sob sua delegação, sempre que isso se revelar fundamental para o exercício da defesa. 13. Visando tal normativo legal essencialmente a garantia da posição processual do arguido - o que aliás expressamente se refere no douto despacho recorrido -, manifesto é que requerendo esse mesmo arguido que tais declarações sejam lidas e alegando que a sua leitura é essencial ao exercício efectivo da sua defesa, o indeferimento de tal pretensão traduz-se numa violação das garantias do arguido que com aquela proibição se visaram tutelar e salvaguardar. 14. E ainda que se entenda, no que não se concede, que tais declarações não podem servir para a prova de factos positivos, podem ser utilizadas para avaliar da credibilidade de quem imputa factos criminosos a arguidos de um processo, cuja prova fundamental assenta precisamente nos seus depoimentos e declarações, sob pena de se ofender o núcleo essencial das garantias de defesa e o princípio de um processo equitativo, tal como a CRP e CEDH salvaguardam . 15. Em razão do ex(...), o arguido requereu, ao abrigo do art.º 340º do C.P.P., interpretado em consonância com o art.º 32º n.o 1 da CRP e com o art.º 6º n.o 1 da CEDH, a leitura das declarações e depoimentos prestados no inquérito pelos assistentes e testemunhas supra referidos, os quais, em audiência de julgamento, relataram factos que, directa ou indirectamente, incriminam o ora recorrente, bem como os restantes co-arguidos, em termos que não podem deixar de ser avaliados considerando aquilo que de substancialmente diferente disseram no inquérito. 16. O que tudo se requereu de forma a que possa ser cabalmente avaliada a credibilidade da sua prestação, e que efectuada tal leitura, devem os jovens acima referidos ser confrontados com as declarações prestadas em inquérito que, em matéria substancialmente relevante, conflitua com o que disseram em julgamento e em ordem à avaliar a credibilidade das declarações prestadas nesta sede. 17. No entendimento do Tribunal, a leitura de tais declarações e depoimentos constituiria não apenas uma violação da garantia processual do arguido, como poderia interferir na espontaneidade das declarações e depoimentos em causa e ainda afectar, por essa via, o processo de formação da convicção do Tribunal. 18. Ora, os assistentes e testemunhas cujas declarações e depoimentos prestados em inquérito se pedem sejam lidas, já foram ouvidas nesta, pelo que o requerido em nada interferiria com a espontaneidade das suas declarações prestadas na actual sede. 19. Por outro lado, sendo lidas em audiência as ditas declarações e depoimentos prestados em inquérito, e subsequentemente, caso assim se entenda, sejam objecto de confronto com as prestadas em audiência, tal acto não interfere com a referida espontaneidade das declarações prestadas em audiência, já que nesse confronto é que o Tribunal poderia avaliar ou não da mesma. 20. Em qualquer dos casos, tal leitura e confronto em nada inquinaria o processo de formação da convicção com fundamento em utilização de prova proibida já que o requerido constitui uma salvaguarda das garantias de defesa permitida pelo espírito que presidiu à proibição ínsita do estatuído nos art.ºs 355.º e 356.º do CPP e pelas disposições constitucionais aplicáveis em sede de interpretação destes preceitos. 21. O art.º 18º da C.R.P., estabelece que a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente ali previstos, devendo tais restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos e estabelecendo ainda que as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias não podem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos Constitucionais. 22. Em razão do que, por imperativo constitucional, todas as normas processuais têm que ser interpretadas de modo que as restrições ao exercício de todas as garantias de defesa respeitem os limites constitucionais, ainda que com interpretação restritiva ou extensiva, desde que necessárias e adequadas para assegurar que não sejam ultrapassados os limites constitucionais. 23. Uma interpretação que não respeite todas as garantias de defesa e os limites às restrições no seu exercício acarreta necessariamente a inconstitucionalidade das normas interpretadas e a sua inaplicabilidade pelos tribunais de acordo com o art.º 204.° da Lei Fundamental. 24. O requerido visa, essencialmente, aferir a credibilidade dos assistentes, em função de contradições evidentes e flagrantes, entre as declarações e os depoimentos prestados em inquérito e as declarações e depoimentos prestadas em audiência, das quais resulta que mentiram ou se enganaram. 25. Ora, tendo a mentira ou o engano ocorrido em inquérito, os arguidos não teriam sido acusados nem pronunciados, dada a relevância fundamental e por vezes exclusiva dos seus depoimentos, e sem acusação e pronúncia nunca poderia haver condenação, sendo que ocorrendo a mentira ou o engano em audiência, as declarações mentirosas ou por engano também não podem contribuir para a prova dos factos criminosos imputados, o mesmo se verificando se subsistir dúvida quanto à fase processual em que os assistentes mentiram ou se enganaram. 26. Em processo de natureza criminal, a subordinação ao princípio do contraditório é estabelecida essencialmente em consideração do arguido, de modo a não poderem ser usadas contra ele provas que não pôde sindicar com o patrocínio de defensor, essencial idade essa que será, em regra, exclusividade. 27. Excepcionalmente e face ao alegado em oposição à exibição de documentos ou leitura de declarações, poderá considerar-se que também o Ministério Público e os assistentes são titulares do direito ao contraditório. 28. Mas o seu exercício, se impeditivo do exercício de todas as garantias de defesa, tem que respeitar os limites do art.º 18.º da C.R.P., com consideração dos princípios da necessidade, da proporcionalidade e da adequação. 29. Assim, só muito excepcionalmente e em concreto se poderá concluir pela prevalência do direito do Ministério Público e dos assistentes ao contraditório, em prejuízo do direito ao exercício da defesa. 30. Viola frontalmente as garantias de defesa do arguido deixar ao arbítrio sistemático e infundamentado do Ministério Público e dos assistentes obstar à produção de meios complementares de prova que os arguidos, únicos titulares das garantias de defesa, considerem pertinentes e necessários. 31. Por todo o ex(...), é inaceitável que não se defira o requerido com fundamento, por um lado, na perspectiva de que tal leitura violaria a garantia da posição processual do arguido que com o estatuído no art.º 356.0 do CPP se pretende salvaguardar e, por outro lado, com base na oposição dos assistentes, não se possa proceder à leitura do que eles próprios declararam em inquérito, sendo certo que foram essas as declarações em que se fundou a acusação pela qual os arguidos respondem nos presentes autos e pela qual podem ser condenados para o resto das suas vidas. 32. A interpretação restritiva do dis(...) nos artigos 355.º e 356.º do C.P.P. adoptada pelo Tribunal a quo - no sentido de que havendo oposição ou não consentimento dos assistentes, não pode, em nenhuma situação, ser efectuada a leitura de declarações prestadas em inquérito porque tal constituiria uma violação da garantia processual do arguido e ainda no sentido de que a requerida leitura poderia inquinar o processo de declaração e depoimento prestados em audiência e afectar a sua e inquinando o processo de formação da convicção do Tribunal não tem suporte constitucional e legal antes constituindo uma inaceitável restrição das garantias de defesa do arguido e uma violação do direito a um processo justo e equitativo. 33. Face ao ex(...), não é legítimo negar ao arguido um meio de defesa tão relevante para a sua absolvição, não podendo aceitar-se na interpretação conjugada do dis(...) nos art.ºs 204.º, 18.º e 32.°, n.ºs 1 e 5 da C.R.P. e artº 355.º e 356.º, n.ºs 2, al. b) e 5, do C.P.P. que intervenientes instrumentais obstar sistematicamente à produção de prova que pode ser tão relevante para a condenação ou absolvição, por mera oposição infundamentada de modo a poder aferir-se se a oposição respeita os limites constitucionais às restrições ao exercício da defesa. 34. O entendimento normativo conjugado do dis(...) nos art.ºs 356.º n.ºs 2, al. b) e 5 e 355.º, n.o 1, ambos do C.P.P., no sentido de que, não tendo expressamente os assistentes dado o seu consentimento à leitura de declarações de assistentes e testemunhas que incriminam os arguidos - por estes requerida para avaliar cabalmente a credibilidade da sua prestação em audiência de julgamento, uma vez que são substancialmente diferentes das prestadas em inquérito -, como consta do despacho recorrido, a fls. 60.482, é inconstitucional, por violação do reduto nuclear das garantias de defesa consagradas pelo art.º 32.º n.ºs 1 e 5, 18.° e 204º da C.R.P. bem como o dis(...) nos art.º 18.º da CRP, e o princípio do processo justo e equitativo salvaguardado pelo art.º 20.º n.º 4 da C.R.P. e pelo art.º 6.º da C.E.D.H.. Termos e fundamentos porque, em provimento de recurso, deve o douto despacho proferido ser revogado e, em consequência, ser determinada a leitura das declarações prestadas em sede de inquérito pelo assistentes e testemunhas ali referidos e o subsequente confronto com as declarações prestadas em audiências, com o que se fará JUSTIÇA." (fim de transcrição) Os recursos foram admitidos, com subida a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de 10/03/2010, a fls. 65289 e 65292). Respondeu o Ministério Público a este recurso do arguido H (cf. fls. 62375 a 62384) nos seguintes termos: "A Defesa do Arguido H, praticamente desde o dealbar do Julgamento, tem procurado, pelas mais diversas formas, que o Tribunal tome conhecimento de factos que, sem mais, está impedido de conhecer. Seja na formulação de perguntas a intervenientes processuais, seja em requerimentos dirigidos ao Tribunal, a Defesa de H não se tem poupado a esforços para levar ao conhecimento do Tribunal conteúdos de declarações prestadas em Inquérito, independentemente da disciplina, que não desconhece, do art° 356°, do CPP. Por mais do que uma vez, a Defesa de H foi advertida pelo Tribunal, nomeadamente, pela Mmª Juíza Presidente, de que não é lícito tentar fazer entrar pela janela o que não se logrou fazer entrar pela porta - V.g., cfr. gravação da Sessão de 30.5.2008 ; cfr., ainda, idem a título de exemplo, as Actas das Sessões de 31.10.2005 e 21.9.2006 (e respectivas gravações), na qual se pode constatar como, no âmbito de requerimentos, ou de instâncias, que formula ao Tribunal ou dirige a intervenientes processuais, a Defesa de H vai dando a conhecer ao Tribunal conteúdos de declarações prestadas em Inquérito, ao arrepio do dis(...) no art° 356°, do CPP. O presente Recurso não foge à regra, antes a confirma - cfr. item n° 8, da Motivação. O presente Recurso é o corolário do que atrás se assinalou, não se hesitando em, mais uma vez, imputar ao MºPº e ao que apelida de "acusações particulares" a prática, segundo a qual, um e outras, alegadamente, «têm impedido, sempre que podem, a coberto do artº 3560 do C.P.P., o acesso ao inquérito, porque bem sabem que aí se descobre como nasceu "o ovo da serpente"». O que seja "o ovo da serpente", a Defesa do Arguido H lá saberá! O MºPº, que leu e conhece os conteúdos dos Autos de Declarações prestados em Inquérito, não descortina nos mesmos, nem "ovo", nem "serpente", a não ser que assim se reputem, a eles afinal se reportando a Defesa do Arguido H, os abusos perpetrados sobre quem, neste processo, é Vítima. O que a Defesa do Arguido H não pode desconhecer, porque reiteradamente afirmado, é que o MºPº sempre deu conta que, por princípio, entende não dever opor-se a leitura de declarações, se e quando requeridas ao abrigo do dis(...) nos art°s. 356° ou 357°, do CPP, princípio com o qual crê a sua prática ser coerente. Das pouquíssimas vezes em que deduziu oposição - aliás, no exercício de um poder legal -, fê-lo, na maioria dos casos, ou porque se requeriam leituras parcelares de Autos de Declarações, ou porque se promovia a leitura de um único Auto, relativo a um mesmo declarante, de tal sorte que, num e noutro caso, se correria o risco de desvirtuar seja a dinâmica, seja o sentido global da totalidade dos depoimentos. De resto, a afirmação é tanto mais injusta e, até, paradoxal, quanto é certo que a Defesa de H - para além das restantes Defesas - por várias vezes, se opôs a leituras, nos mesmos termos que imputa ao MºPº. E quando o não fez, raras foram as vezes em que alguma das restantes Defesas não acabasse por fazê-lo. Em qualquer caso, exercendo prerrogativa legal relativamente à qual ora invoca uma pretensa desconformidade constitucional. Em que consiste, afinal, a pretensão da Defesa do Arguido H? Que sejam lidos os Autos de Declarações, prestados em Inquérito, pelos Assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU, bem como pelas Testemunhas AZ e BA, independentemente de eventual oposição por parte de qualquer Sujeito Processual. Por outras palavras, sem observância do dis(...) no art° 356°, do CPP (pese embora com uma subtilíssima excepção, sobre a qual se discorrerá adiante), sob pena de, ao assim não se entender, se dever ter tal norma como inconstitucional, por ofensa dos art°s. 32°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 6°, n" 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). Fica, assim, claro, que o Requerimento comporta, de forma incontornável, uma questão de pretensa inconstitucionalidade normativa, maxime, do art° 356°, do CPP, sobre a qual o Tribunal não poderá deixar de se pronunciar, declarando, expressamente, se a disposição em causa, quando interpretada no sentido em que sempre exige a não oposição dos restantes Sujeitos Processuais, como condição de permissão de leitura de Autos de Declarações prestados em Inquérito (art° 356°, nºs. 2, b) e 5, do CPP), está em conformidade com o texto constitucional, ou se, ao invés, viola, nomeadamente, o art? 32°, nº 1, da CRP, nos termos por que propugna a defesa do Arguido H. Como ensina o Prof. Gomes Canotilho ("Direito Constitucional e Teoria da Constituição", 7ª Edição, 2003, Almedina, páginas 1226 e 1227), "o princípio da exclusão da interpretação conforme a constituição mas "contra legem" impõe que o aplicador de uma norma não pode contrariar a letra e o sentido dessa norma através de uma interpretação conforme a constituição ... ". "Este princípio deve ser compreendido..., de modo que se torne claro: (i) a interpretação conforme a constituição só é. legitima quando existe um espaço de decisão (= espaço de interpretação) aberto a várias propostas interpretativas, umas em conformidade com a constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela " (ii) no caso de se chegar a um resultado interpretativo de uma norma jurídica em inequívoca contradição com a lei constitucional, impõe-se a rejeição, por inconstitucionalidade, dessa norma (= competência de rejeição ou não aplicação de normas inconstitucionais pelos juízes), proibindo-se a sua correcção pelos tribunais (= proibição de correcção de norma jurídica em contradição inequívoca com a constituição); (iii) a interpretação das leis em conformidade com a constituição deve afastar-se quando, em lugar do resultado querido pelo legislador, se obtém uma regulação nova e distinta, em contradição com o sentido literal ou sentido objectivo claramente recognoscivel da lei ou em manifesta dessintonia com os objectivos pretendidos pelo legislador." (Cfr. Jurisprudência Constitucional atinente, Ac. TC 398/89, DR I, 14-9; 63/91, DR,II, 3-7 ; 370/91, DR,II 2-4 ; 444/91, DR, II 2-4 ; 254/92, DR, I, 31-7 ; 266/92, in Acórdãos, Vol. 22, p. 783; 508/94, in Acórdãos, Vo1. 28; 636/94, in Acórdãos, Vol. 29; 41/95, in Acórdãos, Vo1. 30, in ob. cit..). A redacção do artº 356°, do CPP, nomeadamente, do dis(...) na conjugação dos nºs. 2, b) e 5, não consente qualquer ambiguidade interpretativa, de tal sorte que, interpretá-la como pretende a Defesa do Arguido H, implicará, forçosamente, a sua rejeição, ou não aplicação, explícitas. O Tribunal, de alguma forma, já se pronunciou, ainda que indirectamente e pese embora decidindo questão diversa, sobre a conformidade constitucional do art? 356°, do CPP. Na verdade, no Despacho proferido na Sessão de 4.7.2008 (Item VII), consignou-se o seguinte: "Resulta, face ao enquadramento teórico já enunciado, que a lei não permite ao Tribunal usar os autos de declarações prestados pelos agora Assistentes perante a polícia judiciária na fase do inquérito, como meio de prova (pré-adquirido), sendo permitida a sua utilização apenas no caso expressamente previsto no artº 356°, nº 5, por remissão para o artº 356°, nº 1 e 2, al. b), do C.P.Penal: quando o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (cfr. artº 355°, n° 1 e 2, 356°, n° 1, 2, al. b) e n° 5, do C.P.Penal). Só no caso de ocorrer este acordo o Tribunal poderá debruçar-se sobre o conteúdo das declarações e, após, eventualmente aferir como é que as perguntas foram feitas, que perguntas foram feitas, o que disse e verificar da concordância ou adequação do que for dito em audiência de julgamento, com o que está consignado como tendo sido dito pelo declarante agora assistente.". Se assim se entendeu, certamente que tal se deverá ao facto de a norma em causa (art° 356°, do CPP) não ter suscitado, ao Tribunal, qualquer dúvida relativamente à sua conformidade constitucional. Justamente por não o desconhecer, a Defesa do Arguido H introduziu agora, como atrás referimos, uma cláusula de salvaguarda, com a qual, naturalmente, pretende aplanar o percurso da Decisão do Tribunal num sentido que lhe seja favorável. Para que não haja deturpações, ainda que involuntárias, assinale-se o modo como o faz: "Tais declarações não podem servir para a prova de factos positivos - e nisso se mantém útil o regime do artº 356 do C.P.P. -, mas podem ser utilizadas para avaliar da credibilidade de quem imputa factos criminosos a arguidos de um processo, cuja prova fundamental assenta precisamente nos depoimentos dessas pessoas, sob pena de se ofender o núcleo essencial das garantias de defesa e o princípio de um processo equitativo, tal como a CRP e CEDH salvaguardam." . A Defesa do Arguido H concede ("Tais declarações não podem servir para a prova de factos positivos"), na estrita medida em que precisa de conceder para lograr atingir o núcleo essencial da sua pretensão. Certamente inspirada numa leitura enviesada do Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21.3.2007, proferido no âmbito dos presentes autos (Procº de Recurso n° 10.524/06, 3ª Secção, Apenso de Recurso AF.), a Defesa do Arguido H recupera os conceitos de «prova positiva/prova negativa», pese embora distorcendo a respectiva construção conceptual. Todavia, o que estava em causa no referido Recurso era questão bem diversa, pese embora com intercepções normativas e doutrinárias tributárias de um núcleo comum. Aí se discutia a possibilidade, ou não, de o Consultor Técnico ser confrontado com declarações prestadas pelos Assistentes, no âmbito das Perícias Psicológicas a que foram submetidos, ao passo que, do que ora se trata, é da possibilidade, ou não, de leitura de Autos de Declarações prestadas, na fase de Inquérito, seja perante o Mapa, seja perante os Órgãos de Polícia Criminal, independentemente de anuência, ou oposição, da totalidade dos Sujeitos Processuais. A norma em causa, sobre cuja conformidade constitucional o Tribunal Constitucional (TC) já teve ensejo de se pronunciar, nomeadamente, no que diz respeito a uma eventual compressão do Princípio do Contraditório e, por via dela, potencialmente violadora das garantias de defesa consagradas no art° 32º, nº 1, da CRP, não consagra uma plenitude absoluta e irrestrita do correlativo exercício, de tal sorte que se devam ter por excluídas as compressões próprias que decorram de outros princípios aos quais, igualmente, seja reconhecida tutela constitucional, nomeadamente, o principio do Acusatório. Este princípio, vertido na estrutura processual penal portuguesa, caracteriza-se, além do mais, por uma clara separação entre as diversas fases processuais - Inquérito, Instrução e Julgamento. A tipificação taxativa das situações em que, na fase de julgamento, é permitida a leitura de declarações prestadas em fases anteriores, emana, justamente, da estrutura acusatória do processo (também ela com consagração constitucional - cfr. artº 32°, nº 5, da CRP), pese embora mitigada pela possibilidade de, verificados que sejam determinados requisitos, essa leitura ser possível e, como tal, valorável. Nesse sentido se pronunciou o Ac. do TC, 1052/96, de 10.10.1996: "…o princípio do contraditório é, afinal, expressão, ao nível jurídico-processual do princípio da igualdade. (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3a ed., 1993, pp. 202 e ss e José António Barreiros, Processo Penal, vol. 1°, pp. 401 e ss).". "A norma posta em crise só consente a leitura do depoimento da testemunha - presente na audiência de julgamento - prestado no inquérito perante um órgão de polícia criminal, desde que se verifique acordo por parte do Ministério Público, do arguido e do assistente.". "Este condicionamento acha-se fundado, desde logo, na circunstância de as declarações cuja leitura se pretende não terem sido prestadas com observância das formalidades estabelecidas para a audiência ou perante juiz, não existindo quanto a elas as garantias dialéticas de contraditoriedade constitucionalmente asseguradas.". "A exigência de um consentimento alargado ao Ministério Público, ao arguido e à defesa, para que a leitura das declarações seja possível não se apresenta como encurtamento ou restrição inadequada ou inadmissível das garantias de defesa, traduzindo-se, ao contrário, numa linha de concretização do princípio geral sobre a produção de prova em audiência constante do artigo 355°, nº 1, o qual visa essencialmente a garantia da posição processual do arguido.". Não se retira, do alcance normativo emprestado pelo TC, à norma contida no artº 356°, do CPP, qualquer interpretação restritiva, de tal sorte que outro entendimento seja possível, consoante se esteja no domínio de «prova negativa» ou de «prova positiva» ("prova de factos positivos", no dizer da Defesa de H), conceitos, aliás, sobre cuja dialéctica conceptual, sempre salvaguardado o respeito por opinião contrária, temos as maiores dúvidas em sede de conformidade constitucional, tendo em conta, não só, a estrutura acusatória do processo penal português, como ainda a possibilidade que o exercício efectivo do princípio da «prova positiva» e da «prova negativa» (para determinados efeitos, que não para outros), potencialmente, comportará, de "contaminação" da formação da convicção do Julgador, por aquisição do "saber proibido" ((GRUNWALD, Beweisverbot im Strafverfahren, Juristenzeitung, 1966, p. 500).), efeito a que, justamente, a estrutura acusatória, visa obstar (Agravado pelo facto de, num e noutro caso, aos Sujeitos Processuais ficar então vedada a possibilidade de sindicarem o processo de aquisição mental de prova não produzida). Por outro lado, dúvidas não há de que às Defesas, nomeadamente, à Defesa do Arguido H, tivesse sido possível sindicar a probidade do Inquérito, ao requererem, como requereram, a abertura da Instrução ("O que nada tem de dramático do ponto de vista do 'asseguramento' dos direitos de defesa, porquanto as provas nele" (Inquérito) "recolhidas, enquanto e apenas destinadas a habilitar o Ministério Público a fundamentar a decisão de arquivamento ou de acusação, além de poderem ser eficazmente discutidas e impugnadas na instrução, não lhes é reconhecido qualquer valor no julgamento, enquanto aí não forem produzidas ou examinadas, agora sim, com absoluto respeito pelo contraditório - artº 355º e 356º do CPP." - cfr. Ac. TC, N.º 344/05, de 28 de Junho de 2005, Processo n.º 370/2005,3.ª Secção). Como (não) resulta do respectivo Requerimento - fls. 16.792 e ss. -, só agora se descobriu "o ovo da serpente", apesar de, supostamente, já então se encontrar no processo, porque aí, alegadamente, nascido. Não o descortinou a Mmª Juíza de Instrução, à qual, como está bem de ver, não assistia o dom de descortinar o que não existe. Não se diga é que ficaram comprometidas as garantias de defesa de qualquer dos Arguidos. O Processo Penal, entendido na sua globalidade, comporta fases às quais correspondem intervenções processuais diversas, assimétricas, por excelência, nas fases de Inquérito ede Instrução, mas tendencialmente (Tão só, tendencialmente, porque com clara prevalência das garantias de defesa - V.g., a disciplina do artº 357º, do CPP, o direito ao silêncio, por parte do Arguido, a prerrogativa da última palavra, o princípio "in dubio pro reo") paritárias na fase de Julgamento, onde toda a prova admissível se produz mediante a direcção equidistante e interventiva do Tribunal. A aferição, teleologicamente considerada pela tutela constitucional, da amplitude das garantias, há-de, assim, reportar-se, por um lado, ao respectivo recorte processual, em função da natureza específica de cada uma das fases que compõem o processo penal, bem como do modo próprio de intervenção em cada uma delas por parte, seja do Tribunal, seja dos Sujeitos/ intervenientes Processuais. Por outro lado, da consideração do processo penal como um todo, ele, sim, destinatário e, por isso, portador, do equilíbrio, enformador do direito ao processo equitativo, hoje positivamente consagrado no art° 20°, da CRP, no art° 6°, da CEDH, no artº 14°, do Pacto Internacional Relativo aos Direitos Civis e Políticos (PIRDCP) e no art° 10°, da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH). Acresce que, a Defesa do Arguido H, desconsidera, em absoluto, as garantias dos restantes co-arguidos. Movendo-se em função dos seus interesses e da sua estratégia - pretensão legitima, reconhece-se, pese embora nem sempre legitimamente afirmada -, a Defesa de H parece esquecer-se, omitindo-os, ou desvalorizando-os, correlativos direitos daqueles que, do mesmo modo, gozam do estatuto de arguido. A interpretação, erga omnes, da disposição em causa, tornaria inoperante a possibilidade de um co-arguido, também ele, se opor à leitura de um depoimento, assim se desvirtuando os interesse de um arguido em detrimento dos interesses do(s) restante(s), o mesmo é dizer, comprometendo as garantias de uns em nome dos direitos de outros. Foi, aliás, exactamente para obstar a prevalências conflituantes que o legislador ordinário, sem esquecer a Lei Fundamental, antes afirmando-a, exigiu a "não oposição" de todos os Sujeitos Processuais, à leitura de depoimentos, como pressu(...) da respectiva admissibilidade. Por fim, tenha-se em conta que, ao longo de todo o Julgamento, tem sido consentida uma amplitude de instância, aos Sujeitos Processuais, não poucas vezes no limite da proibição invasiva da prova recolhida no Inquérito. Na verdade, foi já possível saber de perguntas formuladas aos Assistentes e a Testemunhas, do modo como o foram, do número de vezes em que foram inquiridos, quem estava, ou não estava, presente, durante as respectivas inquirições, o que lhes foi, ou não, exibido, se reconheceram, ou deixaram de reconhecer, A, B ou C, em álbuns de fotos que lhes terão sido exibidos, se confirmavam, ou não, a autoria de esboços, desenhos ou "croquis", elaborados no âmbito da tomada de declarações ou das inquirições. Não houve, da parte do Tribunal, qualquer restrição de produção de prova, seja no âmbito das instâncias, seja na interpretação das normas processuais ordinárias, maxime, do dis(...) no art° 356°, nºs. 2, b) e 5), do CPP que, de qualquer forma, se tivessem configurado como encurtamento intolerável das garantias de defesa consignadas no art° 32°, nº 1, da CRP. Daí que, o MºPº entenda dever ser confirmado o Despacho recorrido, nos seus precisos termos, negando-se provimento ao Recurso." (fim de transcrição) E também respondeu o Ministério Público a este recurso do arguido K (cf. fls. 62389 a 62398) nos seguintes termos: "Uma vez que, declaradamente, se subscreve, seguindo-se, no essencial, a Motivação de Recurso do Arguido H, sobre a mesma questão, o MºPº reproduzirá aqui, igualmente, no essencial, o conteúdo da Resposta que produziu no âmbito do recurso inter(...) por aquele Arguido. Duas notas prévias: A primeira, para se subscrever, na íntegra, o Despacho recorrido, seja no que toca ao dispositivo, seja no que à fundamentação diz respeito. Com a devida vénia, cremos ser difícil dizer mais e/ou melhor, do que o faz o Despacho ora impugnado. A segunda, para deixar claro que, na opinião do MºPº, o Despacho não faz, ao contrário do que parece afirmar-se na Motivação - cfr. Conclusão 32. -, qualquer interpretação restritiva do art° 356°, do CPP, antes se interpretando tal norma de acordo com a letra e o espírito da Lei ordinária, bem como de acordo com as normas e princípios constitucionais atinentes. A Defesa do Arguido K, como outras, tem procurado, pelas mais diversas formas, praticamente desde o dealbar do Julgamento, que o Tribunal tome conhecimento de factos que, sem mais, está impedido de conhecer. O presente Recurso não foge à regra, antes a confirma - cfr. fls. 61.130/1, da Motivação. O presente Recurso é o corolário do que atrás se assinalou, não se hesitando em, mais uma vez, imputar ao Mapa e aos Assistentes, a prática, segundo a qual, um e outros, alegadamente, «têm, com raríssimas excepções, sistematicamente impedido o acesso ao conteúdo de tais declarações e depoimentos, porque bem sabem que aí se revela e desvenda o que verdadeiramente está na origem das imputações efectuadas aos arguidos.». O Mapa, que leu e conhece os conteúdos dos Autos de Declarações prestados em Inquérito, não descortina, nos mesmos, o que à Defesa de K se revela desvenda, facto que não espanta, quando é certo que, para o ora recorrente, o Mapa mais não é do que um "interveniente instrumental' (?!), que obsta, sistematicamente, "arbitrariamente ou por mero capricho" (?!), "à produção de prova que pode ser tão relevante para a condenação ou absolvição.". As palavras ficam, naturalmente, com quem as profere. O que a Defesa do Arguido não pode desconhecer, nem escamotear, porque reiteradamente afirmado, é que o Mapa sempre deu conta que, por princípio, entende não dever opor-se a leitura de declarações, se e quando requeridas ao abrigo do dis(...) nos art°s. 3560 ou 3570, do CPP, princípio com o qual crê a sua prática ser coerente. Das pouquíssimas vezes em que deduziu oposição - aliás, no exercício de um poder legal -, fê-lo, na maioria dos casos, ou porque se requeriam leituras parcelares e Autos de Declarações, ou porque se promovia a leitura de um único Auto, relativo a um mesmo declarante, de tal sorte que, num e noutro caso, se correria o risco de desvirtuar seja a dinâmica, seja o sentido global da totalidade dos depoimentos. De resto, a afirmação é tanto mais injusta e, até, paradoxal, quanto é certo que a Defesa de K - para além das restantes Defesas - por várias vezes, se opôs a leituras, nos mesmos termos que ora imputa, censurando-o, ao Mapa. E quando o não fez, raras foram as vezes em que alguma das restantes Defesas não acabasse por fazê-lo. Em qualquer caso, exercendo prerrogativa legal relativamente à qual ora invoca uma pretensa desconformidade constitucional. Em que consiste, afinal, a pretensão da Defesa do Arguido? Que sejam lidos os Autos de Declarações, prestados em Inquérito, pelos Assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU, bem como pelas Testemunhas AZ e BA (para além de AC, tal como referido em "Questão Prévia"), independentemente de eventual oposição por parte de qualquer Sujeito Processual. Por outras palavras, sem observância do dis(...) no art° 356°, do CPP (pese embora com uma subtilíssima excepção, sobre a qual se discorrerá adiante), sob pena de, ao assim não se entender, se dever ter tal norma como inconstitucional, por ofensa dos art°s. 32°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 6°, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). Fica, assim, claro, que o Requerimento comporta, de forma incontornável, uma questão de pretensa inconstitucionalidade normativa, maxime, do art° 356°, do CPP, sobre a qual o Tribunal não poderá deixar de se pronunciar, declarando, expressamente, se a disposição em causa, quando interpretada no sentido em que sempre exige a não oposição dos restantes Sujeitos Processuais, como condição de permissão de leitura de Autos de Declarações prestados em Inquérito (art° 356°, nºs. 2, b) e 5, do CPP), está em conformidade com o texto constitucional, ou se, ao invés, viola, nomeadamente, o artº 32°, nº 1, da CRP, nos termos por que propugna a Defesa do Arguido K. O que ao Tribunal estará vedado, ao invés do que expressamente se declara, é "ignorar" a norma que, porventura, viesse a considerar como violadora da constituição. Como ensina o Prof. Gomes Canotilho, "o princípio da exclusão da interpretação conforme a constituição mas "contra legem" impõe que o aplicador de uma norma não pode contrariar a letra e o sentido dessa norma através de uma interpretação conforme a constituição ...". "Este principio deve ser compreendido .", de modo que se torne claro: (i) a interpretação conforme a constituição só é legitima quando existe um espaço de decisão (= espaço de interpretação) aberto a várias propostas interpretativas, umas em conformidade com a constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela " (ii) no caso de se chegar a um resultado interpretativo de uma norma jurídica em inequívoca contradição com a lei constitucional, impõe-se a rejeição, por inconstitucionalidade, dessa norma (= competência de rejeição ou não aplicação de normas inconstitucionais pelos juízes), proibindo-se a sua correcção pelos tribunais (= proibição de correcção de norma jurídica em contradição inequívoca com a constituição) ; (iii) a interpretação das leis em conformidade com a constituição deve afastar-se quando, em lugar do resultado querido pelo legislador, se obtém uma regulação nova e distinta, em contradição com o sentido literal ou sentido objectivo claramente recognoscivel da lei ou em manifesta dessintonia com os objectivos pretendidos pelo legislador.". A redacção do artº 356°, do CPP, nomeadamente, do dis(...) na conjugação dos nºs. 2, b) e 5, não consente qualquer ambiguidade interpretativa, de tal sorte que, interpretá-la como pretende a Defesa do Arguido K, implicará, forçosamente, a sua rejeição, ou não aplicação, explicitas. O Tribunal, de alguma forma, já se pronunciou, ainda que indirectamente e pese embora decidindo questão diversa, sobre a conformidade constitucional do art° 356°, do CPP. Na verdade, no Despacho proferido na Sessão de 4.7.2008 (Item VII), consignou-se o seguinte: "Resulta, face ao enquadramento teórico já enunciado, que a lei não permite ao Tribunal usar os autos de declarações prestados pelos agora Assistentes perante a polícia judiciária na fase do inquérito, como meio de prova (pré-adquirido), sendo permitida a sua utilização apenas no caso expressamente previsto no artº 356°, n° 5, por remissão para o art° 356°, n° 1 e 2, el. b), do C.P.Penal: quando o Ministério Público, arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (cfr. artº 355°, n° 1 e 2, 356°, n° 1, 2, al. b) e n° 5, do C. P. Penal). Só no caso de ocorrer este acordo o Tribunal poderá debruçar-se sobre o conteúdo das declarações e, após, eventualmente aferir como é que as perguntas foram feitas, que perguntas foram feitas, o que disse e verificar da concordância ou adequação do que for dito em audiência de julgamento, com o que está consignado como tendo sido dito pelo declarante agora assistente.". Se assim se entendeu, certamente que tal se deverá ao facto de a norma em causa (art° 356°, do CPP) não ter suscitado, ao Tribunal, qualquer dúvida relativamente à sua conformidade constitucional. Certamente inspirada numa leitura enviesada do Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21.3.2007, proferido no âmbito dos presentes autos, a Defesa do ora Recorrente recupera os conceitos de «prova positiva/prova negativa», pese embora distorcendo a respectiva construção conceptual. Todavia, o que estava em causa no referido Recurso era questão bem diversa, pese embora com intercepções normativas e doutrinárias tributárias de um núcleo comum. Aí se discutia a possibilidade, ou não, de o Consultor Técnico ser confrontado com declarações prestadas pelos Assistentes, no âmbito das Perícias Psicológicas a que foram submetidos, ao passo que, do que ora se trata, é da possibilidade, ou não, de leitura de Autos de Declarações prestadas, na fase de Inquérito, seja perante o MºPº, seja perante os Órgãos de Polícia Criminal, independentemente de anuência, ou oposição, da totalidade dos Sujeitos Processuais. A norma em causa, sobre cuja conformidade constitucional o Tribunal Constitucional (TC) já teve ensejo de se pronunciar, nomeadamente, no que diz respeito a uma eventual compressão do Princípio do Contraditório e, por via dela, potencialmente violadora das garantias de defesa consagradas no art° 32°, n° 1, da CRP, não consagra uma plenitude absoluta e irrestrita do correlativo exercício, de tal sorte que se devam ter por excluídas as compressões próprias que decorram de outros princípios aos quais, igualmente, seja reconhecida tutela constitucional, nomeadamente, o princípio do Acusatório. Este princípio, vertido na estrutura processual penal portuguesa, caracteriza-se, além do mais, por uma clara separação entre as diversas fases processuais - Inquérito, Instrução e Julgamento. A tipificação taxativa das situações em que, na fase de julgamento, é permitida a leitura de declarações prestadas em fases anteriores, emana, justamente, da estrutura acusatória do processo (também ela com consagração constitucional - cfr. art° 32°, nº 5, da CRP), pese embora mitigada pela possibilidade de, verificados que sejam determinados requisitos, essa leitura ser possível e, como tal, valorável. Nesse sentido se pronunciou o Ac. do TC, 1052/96, de 10.10.1996: "… o princípio do contraditório é, afinal, expressão, ao nível jurídico-processual do princípio da igualdade. (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3a ed., 1993, pp, 202 e ss e José António Barreiros, Processo Penal, vol. 1°, pp. 401 e ss).". "A norma posta em crise só consente a leitura do depoimento da testemunha - presente na audiência de julgamento - prestado no inquérito perante um órgão de polícia criminal, desde que se verifique acordo por parte do Ministério Público, do arguido e do assistente.". "Este condicionamento acha-se fundado, desde logo, na circunstância de as declarações cuja leitura se pretende não terem sido prestadas com observância das formalidades estabelecidas para a audiência ou perante juiz, não existindo quanto a elas as garantias dia/éticas de contraditoriedade constitucionalmente asseguradas." . "A exigência de um consentimento alargado ao Ministério Público, ao arguido e à defesa, para que a leitura das declarações seja possível não se apresenta como encurtamento ou restrição inadequada ou inadmissível das garantias de defesa, traduzindo-se, ao contrário, numa linha de concretização do principio gera! sobre a produção de prova em audiência constante do artigo 355°, n° 1, o qual visa essencialmente a garantia da posição processual do arguido.". Não se retira, do alcance normativo emprestado pelo TC, à norma contida no art° 356°, do CPP, qualquer interpretação restritiva, de tal sorte que outro entendimento seja possível, consoante se esteja no domínio de «prova negativa» ou de «prova positiva» ("prova de factos positivos", no dizer da Defesa de K, a qual, nesta matéria, vai mais longe do que o Recurso do Arguido H, propugnando, ao contrário deste, pela possibilidade de os conteúdos dos Autos de Declarações, a serem lidos, poderem sempre ser valorados pelo Tribunal, seja em sede de prova positiva, como de prova negativa), conceitos, aliás, sobre cuja dialéctica conceptual, sempre salvaguardado o respeito por opinião contrária, temos as maiores dúvidas em sede de conformidade constitucional, tendo em conta, não só, a estrutura acusatória do processo penal português, como ainda a possibilidade que o exercício efectivo do princípio da «prova positiva» e da «prova negativa» (para determinados efeitos, que não para outros), potencialmente, comportará, de "contaminação" da formação da convicção do Julgador, por aquisição do "saber proibido'", efeito a que, justamente, a estrutura acusatória, visa obstar. Por outro lado, dúvidas não há de que às Defesas, nomeadamente, à Defesa do Arguido K, tivesse sido possível sindicar a probidade do Inquérito, ao requererem, como requereram, a abertura da Instrução. Não se diga é que ficaram comprometidas as garantias de defesa de qualquer dos Arguidos. O Processo Penal, entendido na sua global idade, comporta fases às quais correspondem intervenções processuais diversas, assimétricas, por excelência, nas fases de Inquérito e de Instrução, mas tendencialmente paritárias na fase de Julgamento, onde toda a prova admissível se produz mediante a direcção equidistante e interventiva do Tribunal. A aferição, teleologicamente considerada pela tutela constitucional, da amplitude das garantias, há-de, assim, reportar-se, por um lado, ao respectivo recorte processual, em função da natureza específica de cada uma das fases que compõem o processo penal, bem como do modo próprio de intervenção em cada uma delas por parte, seja do Tribunal, seja dos Sujeitos/intervenientes Processuais. Por outro lado, da consideração do processo penal como um todo, ele, sim, destinatário e, por isso, portador, do equilíbrio, enformador do direito ao processo equitativo, hoje positivamente consagrado no artº 20°, da CRP, no art° 6°, da CEDH, no art° 14°, do Pacto Internacional Relativo aos Direitos Civis e Políticos (PIRDCP) e no artº 10°, da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH). Acresce que, a Defesa do Arguido K, desconsidera, em absoluto, as garantias dos restantes co-arguidos. Movendo-se em função dos seus interesses e da sua estratégia - pretensão legitima, reconhece-se, pese embora nem sempre legitimamente afirmada -, a Defesa de K parece esquecer-se, omitindo-os, ou desvalorizando-os, correlativos direitos daqueles que, do mesmo modo, gozam do estatuto de arguido. A interpretação, erga omnes, da disposição em causa, tornaria inoperante a possibilidade de um co-arguido, também ele, se opor à leitura de um depoimento, assim se desvirtuando os interesse de um arguido em detrimento dos interesses do(s) restante(s), o mesmo é dizer, comprometendo as garantias de uns em nome dos direitos de outros. Foi, aliás, exactamente para obstar a prevalências conflituantes que o legislador ordinário, sem esquecer a Lei Fundamental, antes afirmando-a, exigiu a "não oposição" de todos os Sujeitos Processuais, à leitura de depoimentos, como pressu(...) da respectiva admissibilidade. Por fim, tenha-se em conta que, ao longo de todo o Julgamento, tem sido consentida uma amplitude de instância, aos Sujeitos Processuais, não poucas vezes no limite da proibição invasiva da prova recolhida no Inquérito. Na verdade, foi já possível saber de perguntas formuladas aos Assistentes e a Testemunhas, do modo como o foram, do número de vezes em que foram inquiridos, quem estava, ou não estava, presente, durante as respectivas inquirições, o que lhes foi, ou não, exibido, se reconheceram, ou deixaram de reconhecer, A, B, ou C, em álbuns de fotos que lhes terão sido exibidos, se confirmavam, ou não, a autoria de esboços, desenhos ou "croquis", elaborados no âmbito da tomada de declarações ou das inquirições. Não houve, da parte do Tribunal, qualquer restrição de produção de prova, seja no âmbito das instâncias, seja na interpretação das normas processuais ordinárias, maxime, do dis(...) no artº 356° (nos. 2, b) e 5), do CPP que, de qualquer forma, se tivessem configurado como encurtamento intolerável das garantias de defesa consignadas no art° 32°, nº 1, da CRP. Daí que, o MºPº entenda dever ser confirmado o Despacho recorrido, nos seus precisos termos, negando-se provimento ao Recurso." (fim de transcrição) Finalmente, passamos a transcrever o terceiro dos despachos ora recorridos (constante de fls. 60575 a 60590, Ponto II, proferido na audiência de julgamento de 29 de Outubro de 2008): "II - Fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, "1° Requerimento" (Arguidos H e K - Req. Leitura de declarações do Assistente AV): 1. A fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, "1° Requerimento", os Arguidos H e K, fundamentando e ao abrigo do dis(...) no art. 356°, nº 3, do C. P. Penal, requereram ao Tribunal: a) a leitura em audiência de julgamento, ao abrigo do dis(...) no artº 356°, nº 3 do C. P. Penal, dos autos ou de parte dos autos de que fazem parte fls. 153, 848, 309, 310, 313, 314, 315, 316, 317, 318, 319, 320, 456, 457, 848, 850, 1.426, 1.427, 2.969, 4.654, 4.655, 6.922, 7.146, 7.147, 7.280, 7.281, 7.776, 7.777, 11.836, referentes a declarações prestadas pelo assistente AV na fase de inquérito perante o M.P. ou O.P.C. ; b) ... como se se tratassem de autos de declarações prestadas perante J.I.C. na fase de instrução; c) ... por os arguidos considerarem que no auto de fls. 19.031 a 19.033, referente às declarações prestadas pelo assistente AV perante a Sra. J.I.C. na fase de instrução, este confirmou perante J.I.C. todas as declarações anteriores, aplicando-se assim o regime do art 356°, n° 3, do C.P. Penal, a todos os autos; 1.1. Os Assistentes AX e Demais assistentes pronunciaram-se a fls. 34.987 a 34.989, opondo-se ao requerido. O Ministério Público pronunciou-se a fls. 35.104 a 35.107, opondo-se ao requerido. Cumpre apreciar e decidir. 2. Para decidir a questão colocadas pelos arguidos, há que começar por fazer o enquadramento teórico dos princípios que estão subjacentes à estrutura do processo penal vigente e em particular no que diz respeito à fase da audiência de julgamento. De acordo com o dis(...) no art. 32°, n° 5, da C. R. Portuguesa, a audiência de julgamento está sujeita ao princípio do contraditório, bem como os actos instrutórios que a lei determinar. Para a densificação deste princípio teve relevante contributo a Jurisprudência do tribunal Europeu dos Direitos do Homem, " ... que tem considerado o contraditório um elemento integrante do princípio do processo equitativo, inscrito como direito fundamental no art. 6°, par. 1° da Convenção europeia dos Direitos do Homem. Na construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central dos direitos do acusado (apreciação contraditória de uma acusação dirigida contra um indivíduo), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve se proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial; as excepções a esta regra não poderão, no entanto, afectar os direitos de defesa, exigindo o art. 6°, §3°, al. b), da convenção, que seja dado ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo ( ... ). Os elementos de prova devem, pois, em princípio, ser produzidos perante o arguido em audiência pública, em vista de um debate contraditório. Todavia, este princípio, comporta excepções, aceita-as sob reserva da protecção dos direitos de defesa, que impõem que ao arguido seja concedida uma oportunidade adequada e suficiente para contraditar uma testemunha de acusação posteriormente ao depoimento; sendo apenas os direitos da defesa limitados de maneira incompatível com o respeito do princípio sempre que uma condenação se baseie, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior, seja durante a audiência. São estes os princípios elaborados pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (...). O princípio do contraditório tem, assim, uma vocação instrumental da realização do direito de defesa e do princípio da igualdade de armas: numa perspectiva processual, significa que não pode ser tomada qualquer decisão que afecte o arguido sem que lhe seja dada a oportunidade para se pronunciar; no plano da igualdade de armas na administração das provas, significa que qualquer um dos sujeitos processuais interessados, nomeadamente o arguido, deve ter a possibilidade de convocar e interrogar as testemunhas nas mesmas condições que aos outros sujeitos processuais (...)" (cfr. Ac. STJ 7/11/07, Pº 07P3630, www.dgsi.pt). Para além do princípio do contraditório, o legislador concentrou na audiência de julgamento os princípios da publicidade, da imediação e da oralidade, os quais são, por um lado, garantias de Defesa daquele contra o qual é deduzida uma acusação e, por outro, instrumentos que possibilitam o julgador a chegar à descoberta da verdade e realizar a Justiça. Daí os cuidados do legislador ao modo como a prova pode e deve ser introduzida ou produzida, em audiência de julgamento (cfr., neste sentido, Ac. TRL de 21/03/07, Pº 10.524/06, 3a Secção, www.dgsi.pt). Passemos, então, a ver em que medida é legalmente admissível o requerido pelos arguidos: a) possibilidade de leitura em audiência de julgamento, ao abrigo do dis(...) no artº 356°, nº 3 do C.P.penal, dos autos a que fazem parte fls. 153, 848, 309, 310, 313, 314, 315, 316, 317, 318, 319, 320, 456, 457, 848, 850, 1.426, 1.427, 2.969, 4.654, 4.655, 6.922, 7.146, 7.147, 7.280, 7.281, 7.776, 7.777, 11.836, referentes a declarações prestadas pelo assistente AV na fase de inquérito perante o M.P. ou O.P.C., como se se tratassem de autos de declarações prestadas perante J.I.C. na fase de instrução; b) ... por os arguidos considerarem que no auto de fls. 19.031 a 19.033, referente às declarações prestadas pelo assistente AV perante J.I.C., na fase de instrução, este confirmou/reproduziu perante J.I.C todas as declarações anteriores. 2.1. Da conjugação do dis(...) nos art°s. 355°, nº 1 e 2 e 127º do C. P. Penal e no que interessa à presente questão, resulta um elemento estruturante da actuação do juiz na fase processual do julgamento: a proibição da valoração de provas que não sejam examinadas ou produzidas em audiência de julgamento, ressalvando ela imediação as provas (antecipadas ou pré-constituídas) contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida em audiência de julgamento e observando-se, neste caso, o dis(...) no artº 356° e 357°, do C.P.Penal. Assim, dispõe o art° 355°, n° 1, do C.P.Penal, que não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito da formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência. Por força do nº 2, deste preceito, ressalvam-se do número anterior as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida nos termos dos artigos seguintes. Dentro das excepções (que interessam ao presente caso) determina o art° 356°, nº 1, al. b), do C. P. Penal, que só é permitida a leitura em audiência de julgamento de autos de instrução ou de inquérito que não contenham declarações do arguido, do Assistente, partes civis e testemunhas. Por força do n° 2, al. b), do mesmo preceito, "... a leitura de declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas só é permitida, tendo sido prestadas perante o Juiz (...) se o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (...)", acrescentando o nº 5 que" ... verificando-se os pressu(...) no nº 2, al. b), a leitura pode ter lugar mesmo que se trate de declarações prestadas perante o Ministério Público ou perante órgão de polícia criminal. E por força do n° 3, al. a) e b), "é também permitida a leitura de declarações anteriormente prestadas perante o Juiz (…) para avivamento da memória (...) ou (...) quando houver, entre elas e as feitas em audiência, contradições ou discrepâncias (...)". Na audiência de julgamento deve realizar-se o contraditório pela prova e não um contraditório sobre a prova. Se é certo que o nosso Código de Processo Penal deixa por resolver "... diversas questões - (...) nomeadamente a de saber se , nalguns casos em que a leitura é permitida, estamos perante «prova positiva» ou «prova negativa» (...), poderá, por exemplo sustentar-se que a convicção do Tribunal pode assentar nas declarações lidas nos casos previstos no nº 2 do art° 356° e já não naquelas que se destinam apenas ao avivamento da memória ou a permitir o confronto do declarante com anteriores declarações pelo mesmo prestadas, caso em que elas podem constituir apenas «prova negativa» (...)" (cfr., Ac. TRL de 21/03/07, Pº 10.524/06, 3a Secção, www.dgsi.pt); e Damião da Cunha, Revista Portuguesa de C.C., Ano 7, Fasc. 3°, Julho-Setembro 1997, pag. 403 a 443) -, com o art° 355° e 356°, do C. P. Penal, o legislador quis afirmar de forma clara que a leitura de autos de declarações tem carácter excepcional. Assim e independentemente do entendimento que se tenha quanto ao regime de utilização das declarações anteriormente prestadas e que venham a ser lidas em audiência de julgamento - pois afigura-se-nos que esta utilidade não depende apenas da concepção teórica que se tenha quanto à "utilidade" da leitura para "esclarecer a prova" ou como "prova", mas também e por exemplo, se estamos perante uma situação prevista no arte 356°, nº 4, do C.P.Penal, ou 271 e 294°, do C.P.Penal - a lei, ao fazer distinção entre o regime de leitura de declarações prestadas perante o Juiz, perante o Ministério Público ou perante O.P.C., dando uma resposta jurídica diferente consoante a necessidade/desnecessidade ou existência/ inexistência de consentimento dos Sujeitos processuais, para o Tribunal proceder à leitura dos autos em audiência de julgamento, teve subjacente aspectos com relevância ou peso diferentes, mas forçosamente concordantes com os princípios estruturantes do processo e concorrentes para a realização da justiça que acima foram ex(...)s. Deste modo e começando pela situação mais "linear", se os Sujeitos processuais estão de acordo quanto à leitura das declarações constantes de autos - art° 356° nº 2, al. b) ou nº 5, do C. P. Penal -, as mesmas podem ser lidas quer tenham sido prestadas perante o juiz, quer tenham sido perante o ministério Público ou O.P.Criminal. A ideia do consenso está ligada à celeridade processual, ao reconhecimento de um princípio de (relativa) disponibilidade da prova, possibilidade de co-aceítação de provas (cfr. Damião da Cunha, Revista Portuguesa de C.C., Ano 7, Fase. 3°, Julho-Setembro 1997, pago 403 a 443, em concreto fls. 416, com refr. a COSTA ANDRADE, "Consenso e Oportunidade" ... ). No caso concreto os arguidos não requereram a leitura ao abrigo destes dispositivos legais, antes resulta da fundamentação do seu requerimento que expressamente pretendem invocar outro regime, pelo que fica afastada a possibilidade de o tribunal considerar tal dispositivo legal. 2.2. Passemos então à análise da situação ao abrigo do artº 356°, n° 3, do C. P. Penal, sendo que face à fundamentação dos arguidos requerentes a fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21 - leitura de autos de declarações, por "existência de contradições" entre as declarações prestadas em audiência de julgamento e as prestadas anteriormente e constantes de autos. -, o Tribunal conclui que no seu requerimento apenas está em causa a al. b), do nº 3, do 356° e não a al. a), do C. P. Penal, pelo que não irá considerar esta última. Seguindo Damião da Cunha - (cfr. Damião da Cunha, Revista Portuguesa de C.C., Ano 7, Fasc. 3°, Julho-Setembro 1997, pago 403 a 443, em concreto fls. 418) - quanto ao art° 356°, n° 3, do C.P.Penal, " ... a admissão desta leitura visa comprovar a veracidade das declarações prestadas na audiência de, julgamento, não, evidentemente, comprovar se as declarações anteriores prestadas são (as) verdadeiras - visa, pois, «esclarecer» o depoimento efectivamente prestado. As anteriores declarações não são objecto de prova e, neste sentido, não são provas verdadeiramente produzidas em audiência de julgamento (...). (...) O recurso a esta leitura está também limitado pela entidade perante quem elas foram prestadas: elas têm de ter sido prestadas perante o juiz. A exigência de tal pressu(...) é perfeitamente compreensível face à credibilidade que merece a posição institucional de um juiz (...)", quer - acrescentamos nós - quanto ao respeito das formalidades inerentes à recolha das declarações ou quanto à forma de formulação das perguntas. A intervenção do juiz é um princípio de garantia de formulação de perguntas isentas de sugestão, indução ou pressu(...)s e um princípio de garantia de correspondência fidedigna da resposta reduzida a auto com a forma, palavras, termos ou expressões utilizadas pelo declarante na resposta, de que a redução a auto foi feita sem introdução de conclusões, súmulas ou expressões que não foram feitas ou que não correspondem ao dito pelo declarante. Continua este autor que poder-se-ia discutir porque não podem ser lidas declarações prestadas perante o Ministério Público, autoridade judiciária sujeita também a especiais deveres de actuação profissional, não só ao nível da "recolha das declarações" mas também sujeito a critérios de objectividade (artº 53°, nº 1, do C.P.penal). Mas o Ministério Público não deixa de ser um sujeito processual, com as competências especificamente consignadas no artº 53°, nº 2, do C. P. Penal. Para além da permissão de leitura de declarações ser configurada pelo legislador como excepcional, estruturalmente seria impossível aceitar esta hipótese, pois "(... ) significaria admitir que o Ministério Público pusesse em causa um testemunho perante ele próprio prestado, o que, para além de incoerente, implicaria que o próprio Ministério Público se tornasse uma testemunha (...)". Estaria também em causa a situação de paridade que acima começámos por enunciar, como pressu(...) da efectivação de um due process af law.- (cfr, tb, Acórdão TC nº 1.052/96, de 10/10/96, subscrito pelos Senhores Juízes Conselheiros Antero Alves Monteiro Diniz, Maria Fernanda Palma, Vítor Nunes de Almeida, Armindo Ribeiro Mendes, Alberto Tavares da Costa e José Manuel Cardoso da Costa, cfr. www.dgsi.pt, Acordãos do Tribunal Constitucional). 2.3. Como os arguidos referem no seu requerimento de fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, " 1° Requerimento", sucede com frequência na fase de instrução, em interrogatórios de arguidos ou em audição de testemunhas ou assistentes, os declarantes dizerem que confirmam as declarações anteriormente prestadas "na Polícia ou no Ministério Público", ou confirmam" o que disseram à polícia ou ao Ministério Público". Mas há que considerar o seguinte: a instrução é uma fase processual que assume efectiva relevância no desenrolar do processo, pois a decisão de pronunciar alguém pela prática de um crime afecta, de forma grave, a esfera de quem é pronunciado. Assim, a fase da instrução tem consecutivamente assumido natureza contraditória em relação à globalidade dos actos que são praticados pelo J.I.C., como é exemplo a actual redacção do artº 289°, nº 2, do C. P. Penal. Na fase de instrução quer o interrogatório do arguido, quer a tomada de declarações a uma testemunha ou a um assistente são de tal forma processualmente relevante, que não só o J.I.C. não pode delegar esse interrogatório, tomada de declarações ou depoimento, como os sujeitos processuais podem assistir a actos de instrução por eles requeridos, suscitar pedidos de esclarecimentos ou requererem que sejam formuladas perguntas (art° 289°, nº 2 e artº 290°, do C. P. Penal) e as declarações que foram tomadas em auto podem ser lidas em audiência de julgamento, independentemente do consentimento de todos os sujeitos processuais, mas claro sempre dos limites constantes no art. 356° e 357º, do C.P.Penal (e com as especificidades que podem surgir quanto ao arguido, quando o mesmo exerce o direito de não prestar declarações em audiência de julgamento). Daí que quando ocorre uma das situações que acima referimos - no caso concreto e limitando, testemunhas ou assistentes, perante JIC, dizerem que confirmam as declarações anteriormente prestadas "na Polícia ou no Ministério Público", ou confirmam "o que disseram à polícia ou ao Ministério Público" -, para que processualmente se possa considerar suficientemente configurado que "essas declarações prestadas à polícia ou ao Ministério Público" foram "prestada perante o juiz", há que haver no auto de declarações uma expressão inequívoca da intervenção do Juiz que está a presidir à tomada de declarações, da qual resulte claro quais os autos e conteúdo dos autos de declarações que estão em causa e em relação aos quais o Juiz está a proceder à introdução, na fase da instrução, como declarações prestadas perante si. É preciso que do auto resulte igualmente inequívoca a garantia judicial que um auto de declarações perante Juiz deve comportar, que o declarante sabia exactamente o que estava a dizer e a extensão do que estava a dizer perante um Juiz: eu sei o que estou a dizer e volto a dizê-lo perante o juiz. Por exemplo, que do auto de declarações perante JIC conste quais os autos que em concreto estão abrangidos pela declaração "tabelar" de quem está a ser ouvido, esclarecimentos complementares que foram pedidos e prestados em relação às declarações dos autos anteriores, ou se não foram prestados mais esclarecimentos ficar consignado. Isto é, e com respeito por melhor entendimento, do auto tem que resultar explícito e ser inequívoco que o J.I.C. que presidiu ao acto de tomada de declarações, face à declaração "tabelar" da testemunha/assistente, considerou estarem em causa as declarações constantes do auto de fls. X, Y ou Z., serem essas as pretendidas prestar perante si pelo declarante e serem essas as a considerar prestadas perante si. E esta exigência, face à relevância que pode assumir na audiência de julgamento as declarações prestadas perante J.I.C. na fase da instrução e específico regime de leitura que já abordámos, não a entendemos como um excesso de formalismo, mas como procedimento com efectiva relevância prática, como instrumento de definição e delimitação dos Direitos de defesa e dos meios/instrumentos/actos a que o Tribunal pode recorrer para realizar a Justiça. E é isto que justifica e legitima o formalismo. Assim vejamos: se o J.I.C. não enuncia quais os autos de declarações que considera estarem abrangidos pela "declaração tabelar" do arguido, assistente ou testemunha, como os reproduzidos perante si, deve abranger-se apenas os autos chamados de "interrogatório/ inquirição" que existam ou estão também abrangidos quaisquer autos de "reconhecimento", seja de pessoas, objectos, locais ou percursos que existam no processo e dos quais constem declarações do arguido, testemunha ou assistente? Entendemos que a relevância do acto que está em causa, prestação de declarações perante J.I.C. em sede de instrução, com as consequências na fase do julgamento que já referimos, exige a clara delimitação de entre todos os meios de investigação e de obtenção de prova que foram usados na fase de inquérito, aqueles que o J.I.C. considera estar a introduzir com a instrução, como actos de instrução praticados por si e perante si. 2.4. Mas, no caso concreto, no auto de fls. 19.031/3 o Assistente presta declarações e na parte final dessas declarações, concretamente a "linhas 4 a 8" da terceira página do auto, diz "... no passado, o declarante foi mentiroso e sabe que mentiu muito. Mas está consciente que agora já não é assim: todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim ... ". Não entendemos que esta declaração, da forma como está consignada, tenha o propósito e a potencialidade de permitir concluir que a perguntas sobre o objecto do processo, o declarante reproduziu todas as declarações que prestou anteriormente perante a Polícia judiciária e o ministério Público. E que o J.I.C. que estava a presidir ao auto de fls. 19.031/3 assim o considerou, com a garantia judicial que está inerente a tal situação. No auto não consta resposta ou referência que permita concluir que, após esta declaração, o J.I.C. que estava a presidir ao auto foi buscar, verificar, sindicar ou identificar quais os autos a que o declarante se estava a referir e quais os que se deveriam considerar referidos como reproduzidos naquele acto, por o Assistente os estar a querer dizer perante si. Não consta no auto qualquer pedido de esclarecimento em relação a declarações constantes de autos anteriores - e no caso concreto, verificando também pela fundamentação do requerimentos dos arguidos, o arguido faz referência a, pelo menos, doze autos de declarações do assistente AV e este número não esgota os autos identificados no processo como de "inquirição de AV" - ou qualquer menção, posteriormente à citada declaração do assistente (que começa no passado, o declarante foi mentiroso e sabe que mentiu muito. Mas está consciente que agora já não é assim: todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim ..."), que leve a concluir que o J.I.C., independentemente de não ter feito qualquer referência à identificação concreta dos autos ou esclarecimento ao conteúdo, considerou como prestadas perante si todas as declarações anteriormente prestadas pelo assistentes. Isto é, que processualmente as considerou reproduzidas perante si, como declarações "de instrução". A declaração do assistente permite concluir, apenas e como sustentam os assistentes a fls. 34.988, que o que assistente AV disse perante o juiz foi a afirmação de que nem sempre tinha falado verdade, que a partir de certo momento - que identificou - passou a falar verdade, no que se deve entender incluído o que estava a declarar perante a Sra. J.I.C., verdade que vai manter " ... até ao fim ...". E este entendimento não corresponde, para este tribunal, a um arbítrio, mas a uma delimitação que se nos afigura justificada e razoável perante o acima enunciado quanto ao regime da leitura, em audiência de julgamento, de autos de declarações prestados em fase anterior. Sempre com respeito por melhor opinião, o arguido pretende, por uma via que este Tribunal entende que o Código de Processo Penal e os princípios inerentes à estrutura acusatória do processo penal não consentem, e que o teor concreto do auto de fls. 19.031/3 também não consente, fazer um contraditório (à posteriori) e ao abrigo do dis(...) no art. 356°, nº 3, al. b), do C.P.Penal, em relação a depoimento que não se verifica a garantia de ter sido colhido por um juiz na fase de instrução. Justifica, em alguma medida, a necessidade de introduzir na audiência de julgamento os autos de fls 153, 848, 309, 310, 313, 314, 315, 316, 317, 318, 319, 320, 456, 457, 848, 850, 1.426, 1.427, 2.969, 4.654, 4.655, 6.922, 7.146, 7.147, 7.280, 7.281, 7.776, 7.777, 11.836, ao abrigo do art. 356º n° 3 - isto é, sem necessidade de consentimento dos demais sujeitos processuais -, por considerar que face à sua estratégia de defesa, nos referidos autos de declarações prestadas perante o Ministério Público ou O.P.C. existem declarações que podem beneficiar a sua defesa. Por, na sua perspectiva e da avaliação que faz das declarações que o assistente AV prestou em audiência de julgamento, está afectada a credibilidade do assistente, pois " ... a defesa de H tem sustentado, cada vez com mais convicção, que o Sr. AV, através de um processo psicológico que só a prova pericial poderá esclarecer cabalmente, transferiu ou projectou para o arguido H e para os outros arguidos aquilo que com eles se não passou ... " (cfr. fls. 34.921, do requerimento dos arguidos). No entanto e face ao que acima ficou dito quanto ao que este Tribunal entende ser permitido considerar como tendo sido dito perante o J.I.C. pelo assistente AV, o que o arguido pretende é que actos que à partida não são permitidos levar a cabo pelo juiz do Julgamento - concretamente a leitura na audiência de julgamento de autos de declarações prestadas em fase de inquérito perante o Ministério Público ou O.P.C., quando não há o consentimento de todos os sujeitos processuais nos termos do artº 356°, nº 2, al. b), do C.P.P. -, passem a ser admitidos e legitimados ao abrigo de uma invocada (pelo arguido) necessidade, estratégia, interesse ou vantagem de defesa. Para uma demonstração, na perspectiva do arguido, da insubsistência da prova que foi sendo adquirida ao longo da audiência de julgamento. E, assim, abrindo a porta a um entendimento do exercício do contraditório que permita que actos na sua génese proibidos, possam ser legitimados em função das suas consequências, introduzindo o Juiz do julgamento alterações ao regime do art. 355° e 356°, do C.P.Penal, em função de um hipotético ou invocado interesse da Defesa. 2.5. Pode de facto haver situação em que em concreto e contextualizando, o Juiz do julgamento e para tutela de interesses constitucionalmente consagrados, possa ultrapassar os limites que à partida lhe estão legalmente im(...)s no poder/dever de investigação da verdade material. Por exemplo - e como o Tribunal já o tem dito nos vários Despachos que tem proferido, quanto a outros requerimentos de leitura de autos de declarações -, por poder estar em causa situação em que com um requerimento de leitura de autos de declarações, ao abrigo do dis(...) no art. 356°, do C.P.Penal, esteja em causa o Tribunal aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, e que contamine meio de prova (pré-adquirido) que possa ser usado em audiência de julgamento. Isto porque, por força dos art°s. 32°, da C.R.P., 327° e 355°, do C. P. Penal, o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório impõem que o Tribunal, em audiência de julgamento, afira das circunstâncias em que diligências realizadas em fase processual anterior foram feitas, de forma a pôr em crise o seu valor como meio de prova e no caso de estarmos perante um dos meios de prova pré adquiridos a que se refere o artº 355°, do C.P. Penal. Está nesta hipótese, por exemplo, a impugnação que os arguidos fazem nas suas contestações de reconhecimentos de locais que foram feitos na fase do inquérito, o que pode implicar a necessidade de o Tribunal - mesmo com oposição de algum sujeito processual -, ir ao conteúdo desses autos, que em alguma medida contêm declarações prestadas por um assistente ou por uma testemunha perante a entidade (órgão de polícia criminal) que presidiu o acto. Mas, como temos afirmado, a verdade material não pode procurar-se a qualquer preço, não dispondo o Juiz do julgamento de um poder ilimitado de produção de prova: o juiz, dentro do thema probandi, está sujeito aos princípios instituídos pelo legislador ordinário e constitucional, para a obtenção da prova nas diferentes fases processuais. Isto para que a verdade processual corresponda ao que ontologicamente está subjacente à actividade punitiva dos Estados para que seja "...o resultado probatório processualmente válido, que sustenta a convicção de que certa alegação de acto é justificavelmente aceitável como pressu(...) da decisão, por ter sido obtida por meio processualmente válido (...)." (cfr. G.Marques Silva, Curso processo penal II, 2a edição, Verbo, pag. 111). Mas, avaliando e ponderando: - o depoimento que foi prestado pelo Assistente AV nas audiências de julgamento de 12.09.05, 14.09.05, 15.09.05, 19.09.05, 21.09.05, 26.09.05, 28.09.05, 29.09.05, 3.10.05, 10.10.05, 12.10.05, 13.10.05, 14.10.05, 17.10.05, 19.10.05, 20.10.05, 24.10.05, 31.10.05., inquirição que foi feita através do Tribunal (art°. 346°, do C.P.Penal); - ouvindo e analisando a globalidade as perguntas que lhe foram feitas pelos Sujeitos processuais nas suas instâncias e contra-instâncias, incluindo os arguidos requerentes; os documentos com que foi confrontado e que se encontram identificados nas actas das audiências em que prestou declarações, as explicações que deu quanto ao conhecimento ou momento do conhecimento de factos que poderão relevar para o objecto deste processo e razão de ciência; - o teor das perícias que foram feitas a AV - e que se encontram a fls. 159 a 170, Apenso CC, vol. 1°, perícia feita na fase de inquérito a pedido do Ministério Público; e a fls. 189 a 212, do Apenso Z 11, vol. 1°, perícia sobre a capacidade para o Assistente prestar depoimento e que foi determinada por este Tribunal -; - os Peritos e consultores técnicos que foram ouvidos em audiência de julgamento quanto a tais Perícias ou sobre tais Perícias - a título de exemplo, os Consultores Técnicos Sra. Dra. CH em 26/05/08, Sr. Prof. CI em 4/06/08 e 18/06/08, Sr. Prof. BV em 30/05/08, 9/07/08 e 11/07/08, Sra. Prof. CJ em 8/05/08, Sr. Prof. CK em 19/05/08, 29/05/08 e 5/06/08, Sr. Dr. CL em 21/12/06 e os Peritos Sra. Dra. CM em 20/09/07, 21/09/07 e 26/10/07, Sr. Prof BR em 25.09.06, 27.09.06, 28.09.06 e 16.10.06, Sra. Dra. CS em 16/04/08, Sr. Dr. CT em 17/04/08 e sra. Dra. CU em 18/04/08 -, Peritos estes ou consultores técnicos que alertaram ou esclareceram o Tribunal quanto ao crivo ou exigências especiais que, na sua perspectiva de técnicos e sempre sob essa perspectiva, o Tribunal deve ter em termos gerais, ou em termos específicos em relação ao Assistente AV (por o terem analisado ou examinado) aquando da avaliação ou ponderação do seu comportamento em audiência de julgamento; - e analisando a argumentação dos arguidos Requerentes de fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, "1° Requerimento"; o Tribunal não conclui nem encontra que esteja em causa, com o pretendido pelos arguidos e tal como é requerido, situação idêntica à exemplificada e em que haja necessidade de o Tribunal aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, por estar a contaminar (na sua validade) meio de prova pré adquirido que possa ser usado em audiência de julgamento. Nem considera que esteja em causa outra situação que em concreto e contextualizando, o Juiz do julgamento, para tutela de interesse constitucionalmente consagrado, deva ultrapassar os limites que à partida lhe estão legalmente im(...)s no poder/dever de investigação da verdade material. No caso concreto o Tribunal não encontra motivo de facto ou fundamento legal para deferir o requerido pelos arguidos, tendo sido feito em audiência de julgamento o exercício do contraditório para os arguidos porem em causa, perante o Juiz do julgamento, a credibilidade do assistente, a razão de ciência ou o conhecimento de factos efectivamente relevantes face ao objecto do processo, a possibilidade ou impossibilidade dos factos que declararem terem ocorrido, ou terem ocorrido nas circunstâncias de tempo, modo ou lugar que o assistente descreveu ao Tribunal. 3. Face a todo o ex(...) e ao abrigo do dis(...) nos artºs 32°, nº 1, 2 e 5, da C.R.P., 127°, 355° e 356°, nº 3, al. b), 323°, al. f), do C. P. Penal, o Tribunal indefere o requerido a fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, "1° Requerimento", pelos Arguidos H e K." (fim de transcrição) Inconformado, o arguido H interpôs recurso (cf. fls. 62230 a 62241, original a fls. 62252 a 62263) extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: A) As contradições entre as declarações prestadas pelo assistente AV na audiência de julgamento e as que foram prestadas no inquérito e de instrução são flagrantes e gravíssimas, pois revelam. o processo sinuoso e adulterado de formação do seu discurso, que põem em causa o próprio estado psíquico desse jovem, como, de resto, admitiu o perito CT, na audiência de 17/04/2008, quando confrontado com algumas das contradições do discurso daquela alegada vítima. B) É manifesta a importância da dilucidação das discrepâncias supra referidas no n° 4 da motivação do recurso, já que a coerência do discurso é fundamental para aferir da sua credibilidade, razão pela qual foi pedida a leitura das declarações prestadas em inquérito supra referidas, ao abrigo do art. 356º n° 3-b) do C.P.P., tendo em conta que foram confirmadas em Instrução. C) O Tribunal, no despacho recorrido, indefere o requerido com um primeiro argumento de que o declarado perante o juiz de Instrução não corresponderia a uma verdadeira confirmação das declarações prestadas nos autos do inquérito. D) Porém, o Tribunal admite, numa segunda linha, que pudesse proceder a essa leitura se estivesse em causa "eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, e que contamine meio de prova (pré-adquirido) que possa ser usado em audiência de julgamento" (cfr. fls. 60.587). Mas, ponderando as declarações do assistente AV, o teor das perícias e as declarações dos peritos e consultores técnicos, o Tribunal entende que não se torna necessário apreciar aquelas declarações para avaliar da contaminação da prova produzida em audiência de julgamento. E) O ora recorrente não se conforma nem com um nem com outro dos entendimentos acima ex(...)s nas duas conclusões precedentes. F) Quanto ao primeiro argumento, a verdade é que o (assistente declarou, perante o juiz de instrução, a linhas 4 a 8 da terceira página do auto de fls. 19.031, o seguinte: "( ... ) no passado, o declarante foi mentiroso e sabe que mentiu muito. Mas esta consciente que agora já não é assim: todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim". O sentido dessa declaração só pode ser o de que o assistente mantém o teor das declarações prestadas durante o inquérito, não considerando que quaisquer factores, exógenos, debilidades suas ou actuações menos próprias ou adequadas das autoridades judiciarias possam ter afectado a genuinidade dos seus depoimentos. G) Deste modo, o requerimento em apreço inscreve-se no âmbito da previsão legal do art. 356º n° 3-b) do C.P.P., pelo que devia ter sido deferido. H) Contudo, mesmo que assim não fosse, a verdade é que os autos evidenciam o tal perigo de contaminação que o despacho recorrido afasta. I) A um tempo, porque é isso que resulta da própria extraordinária oscilação daquilo que o assistente ora diz ora não diz. J) A outro tempo, porque é também isso que decorre das perícias a que foi submetido e dos esclarecimentos prestados por peritos e consultores técnicos, como mais de espaço acima se referiu no nº 11 da motivação. K) Perante tais dados, como é que é possível ignorar o gravíssimo risco de as suas declarações em audiência de julgamento terem sido contaminadas pelas influências a que foi ex(...) na fase de inquérito, que o terão levado a cristalizar-se em versões falsas ou efabulatórias da realidade, que uma avaliação ponderada das suas contradições e incoerências revelaria? L) Pelo ex(...), as premissas de que parte a segunda linha de argumentação do tribunal (cfr. supra conclusão D) só poderiam ter levado à conclusão contrária, o que deveria ter implicado a leitura das declarações em apreço para avaliação desse processo de inquinação. Termos em que o recurso merece provimento com as legais consequências." (fim de transcrição) Respondeu o Ministério Público em primeira instância (cf. fls. 62375 a 62388), o que fez nos seguintes termos: "De um modo absolutamente desnecessário - para além de ilegal -, a Defesa de H enxameia a Motivação com referências a alegadas discrepâncias entre os depoimentos prestados em Julgamento e os anteriormente efectuados em Inquérito, pelo Assistente AV, antecipando conteúdos de declarações que só a procedência do Recurso poderia legitimar. Na sessão de 31.10.2005, a Defesa do Arguidos H requereu ao Tribunal que considerasse todas as declarações que o Assistente AV prestou, no âmbito do Inquérito, perante a Polícia Judiciária e o Ministério Público, como igualmente prestadas perante a Mmº JIC, sujeitando, assim, a respectiva leitura, ao regime emergente da b), do nº 3, do artº 356°, do CPP. Estribou tal requerimento - para além da singularíssima invocação do que apelida de prática judiciária comum - na circunstância de, alegadamente, o Assistente ter declarado, no depoimento que prestou em 22.4.2004, na fase de Instrução, perante a Mm" JIC, que confirmava as suas declarações prestadas em Inquérito, confirmação essa que legitimaria a deslocação, do regime próprio da leitura de autos de declarações prestadas perante a PJ e o MºPº, para o regime específico das declarações prestadas perante o Juiz - cfr. nºs. 5, 2, b) e 3 do art° 356°, do CPP. Dando tal entendimento como assente ou, ao menos, investindo-o em pressu(...), a Defesa do Arguido H parte, acto contínuo, para a especificação das alegadas contradições entre as declarações prestadas em audiência, pelo Assistente AV, e as prestadas na fase de Inquérito e pretensamente confirmadas na fase de Instrução. O MºPº, logo que claro ficou que o Arguido iria reproduzir, no próprio requerimento que ditava para a acta, parte do conteúdo das declarações prestadas pelo Assistente no Inquérito, teve oportunidade de manifestar a sua oposição a tal propósito, por entender que só após o Tribunal, por meio de Despacho, ratificar o entendimento perfilhado pelos Requerentes, seria possível, a estes, especificar as alegadas contradições. É que, só então, tal como igualmente assinalámos, se evitaria o risco de desnecessário prolongamento dos trabalhos, o que se verificaria caso o Tribunal acolhesse o entendimento perfilhado pelo Arguido. Para além de, a um tempo, se impedir o efeito perverso que decorreria de o próprio requerimento dar a conhecer ao Tribunal o conteúdo de declarações cuja leitura acabe por não ser permitida. O risco de inquinação inconsciente do processo mental de formação da convicção deixaria de ser uma mera quimera para se afirmar como potencialmente efectivo. Porém, só em parte - não obstante, em boa parte -, foi acolhida a posição do MºPº. Permitindo-se, embora, a enumeração das alegadas contradições, o Tribunal condicionou-a à indicação das localizações das declarações, impedindo a reprodução dos respectivos conteúdos. Atenhamo-nos, então, à questão de saber se a afirmação produzida pelo Assistente AV, no âmbito da sua inquirição de fis. 19.031 a 19.033, permite que dela se retirem as consequências pretendidas pelo agora Recorrente. Na parte que ora importa, é do seguinte teor a afirmação de AV, constante de fls. 19.033: "…todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim…". A simples leitura de tal declaração não deixa margem para dúvidas. O Depoente, em momento algum declara dar por reproduzidas as declarações que prestara à PJ e ao MºPº. Limita-se, isso sim, porventura numa afirmação de jactância, a reiterar o que diz ser a verdade dessas declarações e a manifestar o propósito de levar a sua verdade até ao fim do processo. Reportando-se, de forma absolutamente genérica e abstracta, a declarações anteriores, o Assistente preocupa-se em dar conta do que a memória do momento em que fala lhe permite evocar, referenciando, não factos, ou conjuntos de factos determinados, concretos e objectivos, mas, antes, uma firme convicção sobre o propósito que lhe presidiu de ter querido dizer, de ter dito e de querer continuar a dizer a sua verdade. Em qualquer caso, ainda que tivesse, expressamente, dado como reproduzidas - e não deu - as declarações que prestara em fase processual precedente, seria, no mínimo, duvidoso, que tal implicasse, só por si, uma incorporação automática dos respectivos conteúdos no auto de declarações em que as reiterava e reproduzia. Na verdade, sem que tais declarações lhe tivessem sido lidas e concretamente recordadas, seria, porventura, temerário considerar-se, sem mais, que pudessem ter-se por igualmente prestadas perante o Juiz, sobretudo se e quando, como é o caso, se tratar de declarações múltiplas e particularmente extensas. O que vem de dizer-se valerá, naturalmente, qualquer que seja o estatuto processual do depoente (testemunha, declarante, ou, até mesmo e sobretudo, o próprio arguido). Não foi, sequer, esse o caso. Daí que as declarações prestadas pelo Assistente AV no âmbito do Inquérito não devam ter-se como parte integrante do depoimento que prestou, em fase de Instrução perante a Mmº JIC, cingindo-se, assim, o regime de leitura dos respectivos autos, não como vem requerido, ao nº 3, do art° 356°, do CPP, mas antes, e tão só, ao dis(...) no nº 5 com referência à b), do n° 2, da norma em apreço. Porque é disso, e só disso, que aqui se trata. Do que venha a ser considerado sobre a personalidade do Assistente AV, o Tribunal dirá a final, dispondo, como dispõe, de elementos probatórios - incluindo periciais - que, seguramente, não deixarão de ser considerados. E se é verdade que o Tribunal considerou que pode "… haver situação em que em concreto e contextualizando, o Juiz do julgamento e para tutela de interesses constitucionalmente consagrados, possa ultrapassar os limites que à partida lhe estão legalmente im(...)s no poder/dever de investigação da verdade material, quando considere "... poder estar em causa situação em que com um requerimento de leitura de autos de declarações, ao abrigo do dis(...) no art. 356°, do C. P.Penal, esteja em causa o Tribunal aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, e que contamine meio de prova (pré-adquirido) que possa ser usado em audiência de julgamento. ", não o é menos não ter considerado que tal situação, in casu, se verificasse, assim legitimando a ultrapassagem dos limites legalmente im(...)s. Por outras palavras, se o Tribunal não foi além do que o legislador ordinário consagrou, por outro motivo não há-de ter sido do que o ter considerado haver perfeita correspondência entre os preceitos do CPP e as normas e princípios plasmados na Lei Fundamental. Em conformidade, deverá confirmar-se o Despacho recorrido, nos seus precisos termos, negando-se provimento ao Recurso." (fim de transcrição) O recurso foi admitido, com subida a final, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. ponto I-2 do despacho de 10 de Março de 2010 a fls. 65290). Cumpre, agora, apreciar e decidir. 14.1. O despacho de 20 de Julho de 2005 Proibição de valoração de provas e leitura de autos e declarações De acordo com as conclusões extraídas da motivação apresentada, a questão controvertida suscitada pelo recorrente K circunscreve-se essencialmente a saber se a disciplina da leitura permitida de autos e de declarações, estabelecida pelos arts. 355.º e 356.º do CPP, tem ou não aplicação aos casos em que se pretendam obter esclarecimentos de testemunhas/assistentes, muito em particular dos assistentes AA e AE, sobre as questões (e quais) que lhes foram colocadas pela Polícia Judiciária em sede de inquérito relativamente ao envolvimento do arguido K em actos de abuso sexual praticados nas suas pessoas ou de que os mesmos tivessem tido conhecimento. A este propósito importa recordar que na sessão da audiência de julgamento de 04-05-2005 (cf. fls. 30556, Vol. 129.º), a defesa do arguido H pretendeu “saber das testemunhas AA e AE se, quando inquiridas pela Policia Judiciária, lhes foram colocadas questões (e quais) relativas ao eventual envolvimento de H, ou de outras pessoas que não A – que a Policia Judiciária tenha concretamente identificado –, em actos de abuso sexual praticados contra si ou de que tenha concretamente tomado conhecimento”, com o intuito, expresso no requerimento em causa, de “(…) pôr em crise a metodologia utilizada pela investigação na abordagem das vítimas, designadamente que, em concreto, consiga numa sincronização dos discursos de forma a encontrar uma História Colectiva para contar, o que, em concreto, pode ter sugestionado as vítimas (…)”. O ora recorrente K aderiu a este requerimento, pugnou pelo alargamento do seu âmbito a ele próprio e sustenta essencialmente que “(…) não se trata de um confronto com as declarações produzidas em inquérito – essas sujeitas à disciplina dos arts. 356.º e 357.º do CPP –, mas de esclarecer questões que não estão vertidas naquelas declarações e que se prendem, para além do mais, com metodologias de investigação (…)” – cf. fls. 30725 a 30726, Vol. 130.º. In casu mostra-se incontestado que não houve acordo dos restantes sujeitos processuais, mormente do Ministério Público, para se proceder à leitura das declarações prestadas pelas pessoas em causa em sede de inquérito. Passemos, então, à análise da questão controvertida. O regime jurídico previsto pelo art. 355.º do CPP (as alterações ao n.º 2 deste artigo, introduzidas pela Lei 48/2007, de 29/08, não denotam relevo para o caso, já que a nova redacção do preceito acrescenta unicamente ao texto a visualização e a audição das provas) proíbe que as provas que não sejam produzidas ou examinadas em audiência possam ser validamente consideradas, particularmente para a formação da convicção do tribunal. O princípio da produção da prova na audiência determina que toda a prova utilizada para a formação da convicção do julgador deve ser produzida ou examinada em julgamento e que só essa pode ser atendida pelo tribunal. O que significa, por exclusão, que as provas produzidas ou examinadas noutras fases processuais, no inquérito ou na instrução, não valem em julgamento, excepcionadas as situações previstas pelo n.º 2 do art. 355.º do CPP. A prova indiciária recolhida em fase de inquérito serve para fundamentar a acusação ou o arquivamento dos autos por parte do Ministério Público ou do assistente (cf. maxime arts. 277.º, 283.º e 285.º do CPP). A prova indiciária recolhida até ao encerramento da instrução serve para o juiz de instrução proferir despacho de pronúncia ou de não pronúncia (cf. maxime art. 308.º do CPP). Só a prova produzida ou examinada em audiência pode ser considerada para a formação da convicção do juiz de julgamento no sentido de considerar provados ou não provados os factos imputados ao arguido, de forma que, a final, venha a proferir sentença condenatória ou absolutória. Ou, como se escreveu no despacho impugnado, “o legislador, ao separar a fase da audiência de julgamento da fase do inquérito e da instrução, nos termos em que o fez no art. 355°, do C.P. Penal, quis marcar uma clara divisão entre o processo intelectual que levou à formação da convicção que sustentou uma acusação ou uma pronúncia, do processo de formação da convicção na fase da audiência de julgamento (…)”. Não está tanto aqui em causa a prova documental, mas antes as inquirições das testemunhas, as declarações dos arguidos, as declarações dos assistentes ou das partes civis, durante outras fases processuais. A jurisprudência e a doutrina nacionais, de um modo quase unânime, entendem que os documentos podem ser considerados, mesmo para a formação da convicção do tribunal, ainda que não tenham sido lidos ou examinados em audiência, se estavam juntos aos autos, podendo ser contraditados e o seu teor impugnado pelos sujeitos processuais, durante o julgamento da causa. Até como decorrência de um processo penal com estrutura acusatória, o art. 355.º do CPP incorpora os princípios da imediação e da contraditoriedade. A estrutura acusatória do processo penal determina a separação entre a acusação e o julgamento e implica a independência dos tribunais. Por princípio, para a formação da convicção do julgador não valem as provas produzidas fora da audiência de julgamento, muito em particular aquelas que foram obtidas durante a fase de investigação, que serviram para sustentar a acusação. As provas devem ser oferecidas em audiência de julgamento, sem aproveitamento das anteriormente produzidas, na presença dos sujeitos processuais, com amplo debate e discussão entre a acusação e a defesa. O regime jurídico estabelecido pelo art. 355.º do CPP incorpora também a mensagem da maior garantia de consistência e de credibilidade da prova produzida ou examinada em audiência. Como é escrutinada numa fase processual especialmente vocacionada para o efeito, como é sopesada por órgãos jurisdicionais caracterizados pela imparcialidade e pela independência e como é ampla e publicamente debatida por todos os sujeitos processuais, o processual penal parece atribuir-lhe especial relevância e exigência, já que é aquela que permite determinar a condenação ou a absolvição do arguido. Como assinala Paulo de Sousa Mendes (in “Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais”, Almedina, 2004, pág. 136): “O regime legal dos meios de prova típicos visa garantir a máxima credibilidade dos mesmos para a demonstração dos factos probandos. Neste campo, são proibidos – por exemplo – o chamado testemunho de ouvir dizer (art. 129.º, n.º 1, do CPP) (…) ou a leitura em audiência de autos e declarações fora dos casos expressamente permitidos (art. 356.º do CPP).”. Por princípio, o tribunal encontra-se legalmente impedido de valorar provas que tenham sido produzidas nas fases preliminares do processo penal, com particular incidência no decurso do inquérito, ressalvando-se, todavia, nos termos do n.º 2 do art. 355.º do CPP, aquelas que estejam contidas em autos ou declarações cuja leitura seja permitida, em conformidade com a regulamentação estabelecida pelos arts. 356.º e 357.º do CPP. Mais a este propósito, como decorre do dis(...) no art. 356.º, n.º s 2, al. b), e 5, do CPP, o tribunal pode para todos os efeitos valorar as declarações de assistentes ou de testemunhas prestadas durante a fase de investigação do processo, no decurso do inquérito, a um órgão de polícia criminal, desde que o Ministério Público, o arguido e o assistente consintam na sua leitura. Nestes casos, o tribunal pode aportar para a fase de julgamento e inclusivamente utilizá-las para a formação da sua convicção, as provas testemunhais que foram produzidas no decurso de inquérito, desde que obtida a concordância dos sujeitos processuais para a leitura dessas declarações. In casu, para além da falta de concordância dos restantes sujeitos processuais, na nossa perspectiva também não subsistem quaisquer dúvidas que os arguidos procuraram transportar para a audiência de julgamento provas produzidas durante a fase processual de inquérito. Através das perguntas que a defesa do arguido H pretendeu formular, entre outros, aos assistentes AA e AE – com a posterior adesão do recorrente K – procuraram invocar-se em julgamento provas anteriormente produzidas em sede de inquérito. Por outras palavras: procurou averiguar-se expressamente o âmbito do questionário formulado pela Polícia Judiciária na fase de investigação. Quis saber-se directamente o que, durante a fase de inquérito, foi perguntado aos assistentes e a que perguntas é que estes então responderam, sobre o eventual envolvimento dos arguidos em actos de abuso sexual sobre eles praticados. As defesas dos arguidos H e K desinteressaram-se dos factos que integram o objecto do processo. Antes procuraram examinar em audiência de julgamento a prova produzida em sede de inquérito, isto é, saber como decorreu perante a Polícia Judiciária a inquirição dos assistentes e das testemunhas durante a fase de investigação. Mas, como já se disse, a prova produzida fora da audiência só pode ser considerada, designadamente para a formação da convicção do tribunal, desde que seja aí examinada. E o exame das inquirições das testemunhas, das declarações dos arguidos, dos assistentes ou das partes civis, produzidas noutras fases processuais, encontra-se submetido ao regime de ressalva estabelecido pelos arts. 355.º, n.º 2, 356.º e 357.º, todos do CPP. Para tal, de acordo com estes dispositivos, mostra-se necessário que as provas estejam contidas em actos processuais escritos, que estejam vertidas em autos ou declarações. O legislador parece desconsiderar as provas que não estejam contidas em actos processuais registados, as provas que assumam cunho informal, que não sejam materialmente transpostas para o processo. Por um lado, o n.º 2 do mencionado art. 355.º fala expressamente nas “provas contidas em actos processuais”. Por outro lado, o preceito imediatamente seguinte acrescenta como epígrafe “leitura permitida de autos e declarações”. Muito a este propósito, Germano Marques da Silva (in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1993, Tomo II, pág. 139) defende que: “Poder-se-ia questionar se as pessoas referidas no art. 356.º poderão ser inquiridas sobre o conteúdo de declarações que não foram reduzidas a auto. Parece-nos que é de aplicar o princípio geral traduzido no brocardo quod non est in auto non est in mundo. Tudo o que for relevante deve constar do auto e se há declarações que do auto não constam não podem ser consideradas, tanto mais que o auto não pode ser lido em audiência”. Como decorre destes preceitos, o princípio da produção da prova na audiência só pode ser excepcionado, nos termos do n.º 2 do art. 355.º do CPP, quando as provas estejam contidas em actos processuais, e desde que a leitura dos respectivos autos e declarações seja autorizada de acordo com o regime previsto nos artigos seguintes. Sobretudo para a salvaguarda do estatuto do arguido (importa não esquecer que este é investigado durante o inquérito, que nesta fase processual são frequentemente produzidas provas para o incriminar e que no decurso da investigação encontra-se mitigado o princípio do contraditório), não se excepciona a valoração de provas exteriores à audiência de julgamento produzidas informalmente, de provas orais que não estejam processualmente vertidas ou contidas em autos e declarações. Simplesmente, quod non est in auto non est in mundo. Quanto aos efeitos da valoração proibida de provas produzidas ou examinadas fora da audiência, Paulo Pinto de Albuquerque (in “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2007, pág. 892) diz-nos o seguinte: “A violação das regras que permitem a leitura, audição ou visualização dos ditos actos processuais, estabelecidas nos artigos 356 e 357, pode também ter lugar na sentença. A lei estatui expressamente a sanção neste caso: a prova não vale para o efeito de formação da convicção do tribunal e, portanto, não pode ser invocada na fundamentação da sentença ou acórdão.” (…) “A «inutilizabilidade» da prova cuja produção na audiência não tenha tido lugar ou cuja produção na audiência fosse mesmo proibida constitui uma verdadeira proibição de prova”. Se durante o inquérito, a Polícia Judiciária (ou qualquer outro órgão de polícia criminal), formulou perguntas, recolheu depoimentos de assistentes ou de testemunhas que acabou, por algum motivo, por não formalizar em autos e declarações, estas provas não podem ser consideradas em audiência, sobretudo para a formação da convicção do tribunal. O princípio da produção da prova na audiência só é excepcionado pela leitura autorizada dessas peças processuais, de acordo com o dis(...) nos arts. 356.º e 357.º do CPP. Outro não pode ser o regime aplicável às denominadas declarações informais, às perguntas e às respostas que acabam por não ser vertidas para o processo. Se pudessem ser validamente consideradas, inclusive para a formação da convicção do tribunal, podia estar encontrado o sistema perfeito de fraude ao regime estabelecido pelos arts. 355.º, n.º 2, 356.º e 357.º, do CPP. Bastaria em sede de inquérito omitir a formalização dos actos processuais. Posteriormente, em sede de audiência, sem sujeição a esse regime, as provas de inquérito eram examinadas, questionando os arguidos, os assistentes ou as testemunhas sobre o que então lhes foi perguntado e o que então responderam. Se em inquérito foram eventualmente formuladas perguntas, se foram eventualmente prestadas declarações que não constam dos respectivos autos – como o recorrente K parece admitir, quer no requerimento de fls. 30725 a 30726, quer no recurso ora em apreciação – as mesmas não podiam nem podem, de modo algum, vir a ser consideradas pelo tribunal de julgamento, sob pena de subversão do regime estabelecido pelos arts. 355.º, n.º 2, 356.º e 357.º, do CPP, conforme já acima se enunciou. Deste modo, se as provas produzidas em sede de inquérito, perante a Polícia Judiciária, não estão processualmente expressas em autos e declarações, mostrar-se-ia absolutamente inútil questionar esses intervenientes processuais sobre se “(…) lhes foram colocadas questões (e quais) relativas ao eventual envolvimento de H, ou de outras pessoas que não A – que a Policia Judiciária tenha concretamente identificado –, em actos de abuso sexual praticados contra si ou de que tenha concretamente tomado conhecimento”. Não constando do processo, não podiam vir a ser consideradas, muito menos para a formação da convicção do tribunal. Acresce que também vigora em processo penal o princípio da proibição da prática de actos inúteis – cf. art. 137.º do CPC, aplicável por força do dis(...) no art. 4.º do CPP. Seja como for, para se saber se as testemunhas e assistentes foram (ou não) inquiridos sobre o eventual envolvimento dos arguidos em actos de abuso sexual sobre eles praticados e se esse hipotético relato ficou (ou não) formalmente plasmado em auto, impunha-se, logo à partida, a leitura das declarações prestadas ao longo do inquérito aos órgãos de polícia criminal. Mas para tal, de acordo com o preceituado no art. 356.º, n.º s 2, al. b), e 5, do CPP, exigia-se a concordância – in casu não obtida – dos demais sujeitos processuais. É este o regime jurídico consagrado pelo CPP. Mais uma vez se salienta que a única ressalva ao princípio da produção da prova na audiência está consagrada pelos arts. 355.º, n.º 2, 356.º e 357.º, do CPP. A lei diz textualmente “ressalvam-se do dis(...) no número anterior (…)”. A prova produzida noutras fases processuais somente pode ser utilizada pelo juiz de julgamento desde que esteja vertida em autos e declarações e desde que seja processualmente permitida a sua leitura. Qualquer interpretação em sentido contrário defraudaria as expectativas do legislador e inclusive abriria perigosamente a porta para a violação do estatuto do arguido. As questões formuladas em sede de inquérito pelos órgãos de polícia criminal constituem parte integrante da prova, maxime testemunhal, então produzida. Sem perguntas não há respostas e sem perguntas e respostas não há testemunho. As inquirições das testemunhas e as declarações dos arguidos, bem como as declarações dos assistentes e das partes civis, são compostas por um conjunto indissociável de perguntas e de respostas, relacionadas com o objecto do processo, que fazem parte integrante destes elementos de prova. Quando os arts. 356.º e 357.º do CPP falam em leitura permitida de autos e declarações estão a referir-se às peças processuais escritas que comportem declarações do arguido, declarações do assistente, declarações das partes civis e depoimentos das testemunhas. Só se pode proceder à leitura de um texto escrito. E essas peças processuais não são compostas unicamente por aquilo que as pessoas em referência transmitiram à entidade que recolheu as declarações ou os depoimentos durante a fase de inquérito. As declarações e os depoimentos não são normalmente espontâneos. Os depoentes respondem àquilo que lhes é perguntado em conformidade com o objecto do processo. Conforme afirma o recorrente K, as questões que foram colocadas na fase de inquérito pela Polícia Judiciária às pessoas em causa podem ou não constar dos respectivos autos e declarações. Se não constam destas peças processuais, essa potencial prova não pode ser considerada para efeito algum, na medida em que, conforme já se defendeu, as pessoas mencionadas no art. 356.º do CPP não podem ser inquiridas sobre o que não ficou reduzido a auto – quod non est in auto non est in mundo. Nunca seriam “provas contidas em actos processuais, cuja leitura” possa ser consentida pelo regime jurídico de excepção acima ex(...). Se ao invés constarem dessas peças processuais, se integrarem esses autos e declarações, o aproveitamento dos elementos de prova não pode escapar ao regime estabelecido pelo dis(...) nos arts. 355.º, n.º 2, 356.º e 357.º, todos do CPP. As perguntas formuladas pelo Ministério Público ou pelo órgão de polícia criminal também fazem parte das declarações e dos autos produzidos ao longo da fase processual de inquérito. E a sua valoração está dependente da sua leitura em audiência, dento do condicionalismo legal, como única ressalva consentida ao princípio da produção da prova na audiência. De qualquer forma, para se concluir se essas questões (a saber, se às testemunhas/assistentes AA e AE foram ou não questionadas e, em caso afirmativo, que perguntas lhes foram colocadas pela Polícia Judiciária em sede de inquérito relativamente ao envolvimento do recorrente K em actos de abuso sexual praticados nas suas pessoas ou de que os mesmos tivessem conhecimento) foram ou não vertidas em autos e declarações durante a fase de inquérito, o que não se mostra despiciendo, ter-se-ia de se proceder à leitura destas peças processuais. Só lendo os autos e declarações prestados ao longo do inquérito se consegue apurar o que foi perguntado aos assistentes e às testemunhas e o que a autoridade que presidiu à diligência fez verter nessas peças processuais. Muitas vezes, dos autos e declarações não constam expressamente os questionários feitos aos arguidos, aos assistentes, às testemunhas ou às partes civis. O inquiridor limita-se a transpor para escrito o que lhe foi transmitido a propósito das perguntas oralmente formuladas. Frequentemente, para se conhecerem as questões têm de se ler as declarações prestadas pelo depoente. Importa recordar que a leitura permitida dos autos e declarações, nos termos do dis(...) nos arts. 355.º, n.º 1, e 356.º, n.ºs 2, al. b), e 5, do CPP, não está única e exclusivamente dependente da vontade e do interesse do arguido. Como resulta expressamente do texto da lei, a leitura em audiência desses actos processuais depende de um consenso mais alargado. Os autos e declarações de inquérito não podem ser lidos (e, em consequência serem considerados pelo tribunal) quando o Ministério Público ou o assistente não derem a sua concordância, apesar da posição do arguido. Também não se sufraga a afirmação do recorrente K quando diz que “(…) uma interpretação do dis(...) nos arts. 355°, n.° 1 e 356°, n.ºs 1, 2 al. b) e 5, do C.P.P, como a que parece ser efectuada pelo despacho recorrido no sentido de ao assistente, à parte civil ou à testemunha ou não poderem ser pedidos esclarecimentos ou colocadas questões sobre factos concretos que se encontrem relatados em auto de declarações produzido durante a fase de inquérito, a não ser que seja consentida a leitura de tal auto, sempre redundaria numa impossibilidade absoluta de produção de qualquer prova em audiência de julgamento.” Com o devido respeito, importa não confundir a prova dos factos que constituem o objecto do processo com a intromissão na actividade probatória desenvolvida fora da audiência de julgamento, maxime em sede de inquérito. O art. 355.º do CPP somente impede a valoração de provas que não tenham sido produzidas ou examinadas em audiência. Mas não proíbe a prova em audiência dos factos que integrem o objecto do processo, nada impossibilita que os arguidos, os assistentes, as partes civis ou as testemunhas sejam questionadas em audiência sobre os factos atinentes aos crimes em julgamento nos autos. Todavia, as declarações ou os depoimentos são colhidos na perspectiva daquilo que essas pessoas sabem sobre o objecto do processo e não sobre aquilo que lhes foi perguntado ou que responderam em inquérito. Com as perguntas em causa, o recorrente K inequivocamente não se mostra interessado no objecto do processo, naquilo que os assistentes e que as testemunhas sabiam sobre os factos vertidos na acusação e na pronúncia. Antes procurou averiguar como decorreu o inquérito, que perguntas foram formuladas pela Polícia Judiciária às pessoas que então foram inquiridas. Ou, nas palavras do recorrente K, pretendeu-se averiguar a metodologia seguida pela investigação, que regras técnicas foram, noutra sede, incumpridas pela Polícia Judiciária. Ao pretender saber-se se certas questões foram (ou não) formuladas pela investigação fora da audiência de julgamento entra-se no campo das declarações dos assistentes e das testemunhas produzidas em sede de inquérito. Essas questões não se prendem com os factos juridicamente relevantes relacionados com o crime, com a punibilidade do agente ou com a determinação e a escolha da medida da pena. Antes estão relacionadas com uma visão crítica da produção de prova na fase processual de inquérito. Efectuada esta destrinça, não se mostra que o despacho recorrido padeça do vício que lhe é apontado pelo recorrente K, quando defende que o Tribunal a quo impediu o esclarecimento de factos que constam do processo e que se encontram consignados em autos elaborados em fase anterior ao julgamento. Os factos que integram o objecto do processo podem (e devem) ser livremente questionados em audiência, desde que o sejam de um modo directo, sem referência a fases processuais preliminares. Unicamente o que o despacho recorrido impediu – e bem, na nossa perspectiva – foi questionar os assistentes e as testemunhas sobre aquilo que lhes foi perguntado pela Polícia Judiciária em sede de inquérito. De modo algum existe impossibilidade absoluta de produção de prova em audiência de julgamento sobre factos concretos vertidos em autos de declarações produzidos durante a fase de inquérito. Diferentemente, a impossibilidade relativa, decorrente da lei processual penal, determina que os assistentes e que as testemunhas não podem ser questionados em audiência sobre aquilo que lhes foi perguntado e sobre aquilo que responderam em inquérito a um órgão de polícia criminal, a não ser que seja obtida a concordância de todos para a leitura dos respectivos autos e declarações. Nenhum reparo merece ser apontado à decisão recorrida, na medida em que o Tribunal a quo, interpretando correctamente o dis(...) no art. 356.º, n.ºs 1, 2, al. b), e 5, do CPP, indeferiu, e bem, a pretensão do recorrente. Acresce que também não se vislumbra de que modo os pretendidos esclarecimentos poderiam vir a contribuir para a demonstração da tese da manipulação das vítimas, ainda que não intencional, pretensamente ocorrida durante o inquérito. Muito sinceramente não se descortina o que de tão relevante poderia vir a ser conseguido, caso se soubesse se os assistentes AA e AE foram (ou não) questionados sobre o envolvimento do recorrente em actos de abuso sexual praticados nas suas pessoas ou de que tivessem tido conhecimento. Singelamente as questões que foram (ou não) dirigidas pela Polícia Judiciária aos depoentes em inquérito, despidas das respectivas respostas, em nada contribuiriam, excluídas especulações, para a demonstração da tese da manipulação. Caso tenham sido efectivamente formuladas, cabe aqui perguntar se isso exclui ou inclui a condução ardilosa da investigação. Ou caso não tenham sido equacionadas pela Polícia Judiciária, será que isso significa (ou não) inelutavelmente que as vítimas foram manipuladas. Conforme deixa transparecer no recurso inter(...), o recorrente K apenas pretendeu saber aquilo que foi perguntado em inquérito, não aquilo que foi respondido pelos intervenientes processuais, muito em particular pelos assistentes AA e AE. Das questões que a estes se pretenderam formular (ou seja, na expressa perspectiva do recorrente, simplesmente as perguntas sobre as perguntas equacionadas em sede de inquérito) nunca seria possível retirar quaisquer conclusões, muito menos seguras e inequívocas, para demonstrar a tese de que foi inquinado todo o processo de obtenção de prova. De igual modo, também não seriam estes esclarecimentos, estas perguntas sobre perguntas, que trariam algum contributo útil e determinante para o apuramento dos vícios apontados pela defesa de H às inquirições das alegadas vítimas, a saber (cf. fls. 23340, Vol. 99): “realização de inquirições policiais desacompanhadas de pessoal técnico especializado e sem gravação de qualquer espécie”, “Falta de acompanhamento das motivações dos jovens”,“inexistência de valoração das influências mediáticas”, “aceitação de «memórias recuperadas»”, “sincronização dos discursos de modo a encontrar uma história colectiva para contar” e “manifesta falta de avaliação dos meios familiares e sociais”. Conforme o Digno Magistrado do Ministério Público deixa, e bem, assinalado nas alegações de fls. 35673 a 35680, já acima transcritas, o recurso inter(...) pelo arguido K suscita igualmente as questões da delimitação do objecto do processo e do objecto da prova. A respeito do objecto do processo, Jorge de Figueiredo Dias (in “Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, pág. 145) entende que: “Deve pois firmar-se que o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal (…) e a extensão do caso julgado (…). É a este efeito que se chama a vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal; os princípios, isto é, segundo os quais o objecto do processo deve manter-se o mesmo da acusação ao trânsito em julgado da sentença, deve ser conhecido e julgado na totalidade (unitária e indivisivelmente) e – mesmo quando o não tenha sido – deve considerar-se irrepetivelmente decidido”. Já Germano Marques da Silva (in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 2000, Tomo I, pág. 23) delimita deste modo o objecto do processo: “O objecto do processo é o crime, no sentido que lhe é dado pelo art. 1.º, n.º 1, al. a), do CPP: facto humano de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança criminais”. Por seu turno, o Tribunal Constitucional, no Ac. n.º 130/98 (in www.tribunalconstitucional.pt.), entendeu o seguinte a este propósito: “Os factos descritos na acusação normativamente entendidos, isto é, em articulação com as normas consideradas infringidas pela sua prática e também obrigatoriamente indicadas na peça acusatória, definem e fixam o objecto do processo, que, por sua vez, delimita os poderes de cognição do tribunal”. Por seu turno, o art. 124.ºdo CPP, sob a epígrafe “Objecto da prova”, dispõe, no seu n.º 1, que “constituem objecto da prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança”. Conforme decorre deste preceito, nem todos os factos relacionados com um determinado crime podem constituir objecto da prova em processo penal. A lei expressamente restringe o âmbito da actividade probatória aos factos que denomina de “juridicamente relevantes”. Desta forma, é legalmente inadmissível a prova de factos que denotem não ter qualquer relevância para o desfecho da causa, que não tenham influência para a decisão final, mesmo que eventualmente se apresentem relacionados com o objecto do processo. Até numa perspectiva de celeridade e de economia processual, deve ser vedada a prova de factos que demonstrem ser inócuos, que não tenham qualquer interesse para a causa ou que nada acrescentem para a descoberta da verdade material. A relevância jurídica desses factos deve ser apreendida de acordo com o segmento final do n.º 1 do mencionado art. 124.º do CPP. Dito por outras palavras, podem ser objecto de prova em processo penal os factos relacionados com “a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança”. Por exemplo, são “factos juridicamente relevantes” os que se prendem, quer positiva quer negativamente, com os elementos constitutivos do crime que integra o objecto do processo, com a consciência da ilicitude, com o grau de participação no facto, com a imputabilidade do arguido, com as causas de exclusão da ilicitude e da culpa ou com as circunstâncias atinentes à escolha e à determinação da medida da pena (v.g. personalidade do agente, grau de censurabilidade, exigências de prevenção geral e especial). Em termos gerais, em sede de julgamento, o crime (ou crimes) de que o arguido vem acusado (ou pronunciado) delimita o objecto da prova. Importará em audiência oferecer prova sobre todos os factos juridicamente relevantes com ele relacionados, desde a existência do crime, à punibilidade do agente, passando pela determinação e a escolha da medida da pena. Por seu turno, o art. 340.º, n.º 4, do CPP confere ao juiz presidente o poder-dever de indeferir os requerimentos de prova que se mostrem manifestamente infundados, por a prova ser irrelevante, inadequada, de obtenção duvidosa ou impossível ou consubstanciar uma manobra dilatória. Para este efeito, os meios de prova consideram-se “irrelevantes” quando respeitem a factos estranhos ao objecto do processo ou a factos que, mesmo que provados, não teriam qualquer influência na decisão final. O tribunal não deve aceitar acriticamente toda a prova que lhe é proposta ou oferecida. Compete-lhe, de acordo com o objecto do processo, avaliar os crimes que são imputados ao arguido, indagar ponderadamente se o que vem alegado está ou não relacionado com a sua prática, averiguar que factos se mostram juridicamente relevantes para o objecto da prova, apurar se os requerimentos de prova têm finalidade meramente dilatória ou se os meios de prova oferecidos se mostram ou não notoriamente infundados. Realizada esta ponderação, o tribunal deve apenas aceitar a prova que obedeça ao estabelecido nos arts. 124.º, n.º 1, e 340.º, n.ºs 3 e 4, ambos do CPP. In casu, por muito que custe ao recorrente K, a tese que apresenta, aderindo aos fundamentos do arguido H, no sentido de questionar os métodos e os meios empregues na investigação criminal, não integra o objecto deste processo e, consequentemente, o objecto da prova. Importa aqui recordar que a investigação decorreu no decurso do inquérito, que esta fase processual é dirigida pelo Ministério Público (cf. art. 263.º do CPP) e que a prova produzida nas fases preliminares não pode, por princípio, ser considerada em audiência de julgamento, sobretudo para a formação da convicção do tribunal, conforme já acima se deixou apontado. Enquanto titular da acção penal (cf. art. 219.º, n.º 1, da CRP), compete ao Ministério Público dirigir o inquérito, executar as diligências de investigação que tiver por pertinentes para o apuramento dos crimes em referência nos autos, se necessário for com a colaboração dos órgãos de polícia criminal, na estrita observância da legalidade democrática. O objecto do processo, nos moldes acima explanados, não é integrado pelos métodos ou pelos meios empregues na investigação criminal, nem tão pouco pelas denominadas regras técnicas que devem presidir à inquirição das testemunhas numa fase processual que é dirigida pelo Ministério Público. Grosso modo, o objecto do processo é delimitado pelos factos e pelos crimes descritos na acusação ou no despacho de pronúncia, neste último caso quando o sujeito processual, inconformado com o arquivamento ou com a acusação do Ministério Público, tenha requerido a abertura da facultativa instrução. Ao tribunal não compete, particularmente em julgamento, escalpelizar se a investigação foi bem ou mal conduzida, se os órgãos de polícia criminal levaram a cabo todas, algumas ou nenhumas das diligências de prova que se impunham no caso concreto, se a investigação foi estendida ou não a todos os suspeitos ou se a metodologia utilizada na inquirição das testemunhas foi mais ou menos correcta de acordo com as denominadas regras técnicas. Ao invés, ao tribunal compete apreciar os factos que constituem o objecto do processo, de modo a proferir, a final, sentença ou acórdão, condenando ou absolvendo o arguido da prática dos factos que lhe são imputados. Como se sabe, por regra, essa decisão é proferida de acordo com a prova produzida ou examinada em audiência. O juiz deve ficar convencido quanto à existência ou inexistência do crime. Em caso de dúvida aplica o princípio in dubio pro reo. A investigação criminal não releva para o caso, é absolutamente irrelevante procurar saber como decorreu a fase de inquérito, como as testemunhas foram inquiridas pelos órgãos de polícia criminal. A boa ou a má investigação do processo não faz com que os arguidos sejam culpados ou inocentes da prática dos crimes que lhes são imputados. A investigação criminal pode ser de excepção, mas os arguidos serem inocentes. Ou vice-versa. Para além de que esta é sempre apreciada de vários ângulos, de acordo com as posições antagónicas dos diferentes sujeitos processuais. Subjectivamente, é mal conduzida para uns e bem conduzida para outros. O arguido pode reagir à investigação criminal de diferentes formas, sem ter de transmitir as suas convicções ou opiniões sobre matéria que está a cargo do Ministério Público, sem ter de desencadear uma ineficaz análise crítica e conclusiva sobre a actividade processual desenvolvida durante o inquérito. Caso constate a ocorrência de ilegalidade, pode suscitá-la, pedindo a sua reparação, mesmo no decurso do inquérito, sem prejuízo da sanação dos vícios dos actos processuais de menor gravidade. Solicita ao Ministério Público ou ao juiz de instrução a reparação dessa ilegalidade e, caso as suas pretensões não sejam atendidas, recorre da decisão judicial proferida. Caso contrário, o arguido pode alternativamente requer a abertura da instrução ou aguardar pela realização da audiência de julgamento. Em ambas as opções com o intuito de rebater os indícios até aí recolhidos, de modo a impugnar e a contraditar os meios de prova oferecidos pela acusação, para que, a final, o tribunal considere não demonstrados os factos atinentes aos crimes versados nos autos, convencendo-se da sua inocência, absolvendo-o. Para além do ex(...), o que de todo não pode acontecer é vincular o juiz de julgamento à sindicância de uma fase processual dirigida por outrem, com a colaboração dos órgãos de polícia criminal, intrometendo-se na avaliação, na apreciação crítica, da investigação criminal. Ou seja, em vez de se julgarem os factos concretos, os acontecimentos da vida humana, que integram os elementos constitutivos do crime, o recorrente K visou que o Tribunal a quo julgasse o inquérito, que produzisse prova e que apreciasse a actuação da Polícia Judiciária, que viesse a afirmar que a metodologia utilizada na inquirição das testemunhas viola as denominadas regras técnicas, inquinando todo o processo de obtenção da prova. Mas se tal sucedeu, como admite no recurso inter(...), se eventualmente as testemunhas foram manipuladas e todo o processo de obtenção de prova foi inquinado no decurso do inquérito, o recorrente K teve todas as oportunidades, neste extenso processo, para o demonstrar, quer na fase de instrução, quer no julgamento da causa. Rebatendo os factos que lhe foram imputados pela acusação. Como já se disse, também vigora em processo penal o princípio da proibição da prática de actos inúteis. Mesmo dando de barato que o Tribunal a quo podia valorar provas produzidas ou examinadas fora da audiência de julgamento, sempre a pretendida inquirição constituiria acto inútil, uma vez que essa prova não respeita ao objecto deste processo. Este é com(...) pelos factos integradores dos crimes em apreço. O visado objecto de prova prendia-se com a actividade desenvolvida no inquérito. O que não é a mesma coisa. Com a pretendida inquirição não se visava o apuramento de “factos juridicamente relevantes”, ou seja, de factos que digam respeito aos elementos constitutivos dos crimes que estavam a ser julgados, à punibilidade dos arguidos ou à escolha e à determinação da medida da pena. Apurar se a metodologia utilizada pela investigação infringiu (ou não) as denominadas regras técnicas, que devem presidir à inquirição e ao exame de menores abusados sexualmente, é matéria completamente marginal perante o objecto deste processo e, como tal, também não pode constituir objecto de prova. O esforço probatório deve ser unicamente direccionado para os factos que aqui estavam a ser julgados. O apuramento das perguntas dirigidas aos assistentes AA e AE ou a outras pessoas durante o inquérito nada traria de relevante para este processo, não seria por causa disso que o recorrente K seria absolvido ou condenado pela prática dos crimes que efectivamente lhe são imputados, não seria por causa disso que ocorreria alguma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa, nem tão pouco seria por causa disso que ele veria a pena a ser atenuada ou a ser agravada. Extravasa o objecto deste processo o propalado envolvimento de outros sujeitos, que não apenas o arguido A, em situações caracterizáveis como de abuso sexual de menores e que alegadamente não foram vertidas nos respectivos autos. De facto, não competia nesta sede, ao Tribunal recorrido, averiguar, investigar e apurar a eventual prática por outros agentes, que não os arguidos, de hipotéticos crimes omissos na acusação. A hipotética prática por outro(s) de crime(s) de abuso sexual não determina que esteja inquinada a prova recolhida no decurso do inquérito relacionada com o ora recorrente K. Também a omissão de referência no inquérito a estes hipotéticos crimes não significa que o ora recorrente seja culpado ou inocente dos crimes que lhe foram imputados ou que sejam genuínos ou que tenham sido manipulados os testemunhos recolhidos pela investigação. Nem tão pouco tal resulta de forma peremptória do recurso inter(...). O recorrente K admite simplesmente que o processo de obtenção da prova possa estar inquinado. Seja como for, não se vê como os arguidos tenham ficado prejudicados, na perspectiva do recorrente, por terem sido cometidos crimes de abuso sexual de menores que não foram descritos e investigados neste processo. Como já se disse, o processo penal reconhece ao arguido, ao longo do seu curso, vários mecanismos para assegurar as garantias de defesa, seja para correcção de actos violadores da lei, seja para rebater os factos e a prova da acusação. Por todos os motivos apontados, deve ser mantido o despacho recorrido de fls. 33696 a 33703, proferido na sessão da audiência de 20-07-2005, que indeferiu o pedido de formulação das perguntas em causa, particularmente aos assistentes AA e AE. Inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente O recorrente K veio também defender que a interpretação efectuada pelo Tribunal a quo do dis(...) nos arts. 127.º, 355.º, 356.º, n.ºs 1, 2, al. b), e 5, e 323.º, al. f), todos do CPP, é inconstitucional por violação do dis(...) nos arts. 20.º, n.º 4, e 32.º, n.°s 1, 2 e 5, da CRP. Para tanto alega que a interpretação em causa ofende as garantias do processo criminal e os princípios subjacentes a um processo equitativo. Vejamos: O art. 20.º da CRP, sob a epígrafe “Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva”, consagra no seu n.º 4, que “Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”. A propósito da exigência de um processo equitativo, aplicável ao processo penal, Jorge Miranda e Rui Medeiros (in “Constituição Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2010, 2.ª Edição, Tomo I, pág. 441) dizem que: “A exigência de um processo equitativo, constante do artigo 20.º, n.º 4, se não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação, impõe, antes de mais, que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialéctica que elas protagonizam no processo (Ac. n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efectividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas”. Já Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 415) anotam que: “O due process positivado na Constituição portuguesa deve entender-se num sentido amplo, não só como processo justo na sua conformação legislativa (exigência de um procedimento legislativo devido na conformação do processo), mas também como um processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais. A densificação do princípio de processo equitativo pressupõe a análise dos dados jurisprudenciais, desempenhando aqui um papel de relevo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em torno do art. 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), onde se consagrou expressamente o direito ao processo equitativo.” Ireneu Cabral Barreto (in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2010, pág. 165), em anotação ao já referido art. 6.º da CEDH e citando jurisprudência do TEDH, defende que: “Um processo equitativo exige, como elemento co-natural, que cada uma das partes tenha possibilidades razoáveis de defender os seus interesses numa posição não inferior à da parte contrária; ou, de outro modo, a parte deve deter a garantia de apresentar o seu caso perante o tribunal em condições que a não coloquem em substancial desvantagem face ao seu oponente.” Ao invocar o n.º 4 do art. 20.º da Lei Fundamental, enquanto dispositivo que na sua opinião foi ofendido pela interpretação sufragada pelo Tribunal a quo, não se perspectiva que o recorrente K faça menção ao segmento atinente ao direito de decisão da causa em prazo razoável. De qualquer modo, sempre se dirá que a formulação das questões em causa relacionadas com a fase processual de inquérito em nada contribuiria para acelerar a prolação da decisão final deste processo, já que inelutavelmente esses esclarecimentos iriam comportar um dispêndio de tempo e iriam prolongar a realização da audiência de discussão e julgamento. Ao contrário, foi o Tribunal a quo, ao impedir a formulação dessas questões, que direccionou o processo para o seu objecto, que procurou com a maior brevidade possível que o mesmo chegasse ao seu epílogo, evitando que as instâncias se perdessem em questões marginais e, como tal, irrelevantes. Seja como for, independentemente do mérito do pedido de esclarecimento, a interpretação de todos esses preceitos do CPP não se mostra, de forma alguma, ofensiva do direito de decisão da causa em prazo razoável, antes pelo contrário contribuiu para o julgamento mais célere deste processo. Igualmente não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, que tenha assegurado um tratamento de favor, de privilégio, para o Ministério Público e para os assistentes (e, consequentemente, discriminatório para a defesa), que não tenha garantido o cumprimento do princípio do contraditório, que tenha impedido os arguidos de se defenderem dos factos que lhe são imputados, promovendo a sua condenação a final. Nem tão pouco o recorrente o explica de modo mais detalhado, indicando que concreta valência do princípio do processo equitativo considera ter sido ofendida pela decisão recorrida. Ao invés, o Tribunal recorrido proferiu a decisão impugnada em consonância com o reconhecimento de um processo equitativo. Soube afirmar a destrinça entre a fase de inquérito e a fase de julgamento, entre os órgãos competentes para a investigação e os órgãos competentes para a decisão da causa. Soube afirmar que os arguidos não são julgados com a prova produzida em inquérito, sem sujeição a amplo debate e discussão. Soube afirmar que, por princípio, só considera a prova produzida em audiência, na presença de todos os sujeitos processuais, inclusive para a formação da sua convicção. Por outras palavras: o tribunal reconheceu como princípio a igualdade de armas. A acusação e a defesa em julgamento são iguais. Não há a valoração de provas pré-adquiridas, nem de provas produzidas fora da audiência, quer tenham sido oferecidas pela acusação, quer tenham sido apresentadas pela defesa, a não ser com a concordância de todos. A audiência de julgamento é o local próprio para serem esgrimidos os argumentos da acusação e da defesa, com amplo contraditório e sem aproveitamento de provas produzidas ou examinadas nas fases preliminares do processo. Aliás, inversa interpretação, comportaria, por regra, prejuízo para o estatuto processual do arguido. É certo que o Tribunal a quo indeferiu a pretensão do recorrente K. Mas tal não significa que tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, que tenha sido por isso que foi ofendido o princípio da igualdade de armas. O processo penal não passa a ser iníquo pelo simples facto do tribunal ter indeferido uma, algumas ou até mesmo todas as pretensões apresentadas por um determinado sujeito processual. Antes de se avançar para a formulação de um juízo de inconstitucionalidade, importa averiguar se essas pretensões têm (ou não) algum fundamento. O entendimento perfilhado pelo recorrente K denota uma visão egocêntrica do processo, a rejeitar. Na sua perspectiva, a prova produzida em sede de inquérito pode ser invocada, pode ser considerada em audiência de julgamento, quando unicamente o arguido veja nisso interesse. O recorrente K imputa também ao despacho recorrido o vício da violação do dis(...) no art. 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Lei Fundamental, pese embora continue sem indicar, detalhadamente, quais as garantias do processo penal, reconhecidas pelos vários números desse dispositivo, que considera terem sido ofendidas e de que forma ocorreram esses atentados. O art. 32.º da CRP, sob a epígrafe ”Garantias de processo criminal”, dispõe: “1 – O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. 2 – Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.” (…) “5 – O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório.” Em anotação ao n.º 1 deste preceito constitucional, doutrinam Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, Vol. I, pág. 516): “(…) este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo criminal. Em «todas as garantias de defesa» engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas”. Mesmo que o despacho recorrido merecesse algum reparo, nunca as garantias de defesa seriam atingidas por o Tribunal a quo ter impedido o arguido de escrutinar a metodologia seguida pela investigação no decurso da fase de inquérito. Não são os actos de investigação ou os métodos policiais que condenam ou que absolvem alguém, por muito importantes que sejam. O arguido deve poder amplamente defender-se dos factos e dos crimes que lhe são imputados na acusação ou na pronúncia. As garantias de defesa devem ser avaliadas nesta perspectiva. Não tem sentido pugnar por essas garantias quando as provas que estão em causa, por princípio, não podem ser consideradas pelo tribunal, inclusive para a formação da sua convicção. Conforme já se afirmou, se eventualmente as testemunhas foram manipuladas e todo o processo de obtenção de prova foi inquinado na investigação, parece que o recorrente teve todas as oportunidades, neste extenso processo, para o demonstrar, quer na fase de instrução, quer no julgamento, contraditando os factos que lhe são imputados e rebatendo as provas que, em sua opinião, foram obtidas com violação das regras técnicas. Se genericamente, pelos motivos acima ex(...)s, não ocorreu violação das garantias de defesa, também de um modo mais particularizado não se constata a alegada ofensa ao dis(...) no n.º 1 do art. 32.º da Lei Fundamental. Efectivamente, não se mostra que o despacho recorrido tenha perfilhado uma interpretação normativa que seja ofensiva v.g. dos princípios da presunção da inocência, do julgamento no mais curto prazo, da estrutura acusatória do processo criminal ou do contraditório, nem tão pouco que tenha violado v.g. o direito ao recurso das decisões desfavoráveis, o direito a estar presente e a participar nos actos processuais que lhe digam respeito, o direito a ser assistido por defensor, o direito ao silêncio, o direito a intervir no inquérito e na instrução ou a liberdade máxima de produção da prova. Os cidadãos não podem ser considerados responsáveis pela prática de ilícitos criminais, presumindo-se inocentes, até prova em contrário, até ao momento em que uma sentença, com trânsito em julgado, demonstre a sua culpabilidade. O princípio da presunção da inocência, como vimos consagrado pelo n.º 2 do art. 32.º da CRP, desdobra-se, designadamente, na proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido, na preferência pela sentença de absolvição contra o arquivamento do processo, na exclusão de fixação de culpa em despachos de arquivamento, na proibição da antecipação de verdadeiras penas a título de medidas cautelares, na proibição de efeitos automáticos da instauração de procedimento criminal, na natureza excepcional e de última instância das medidas de coacção e no princípio in dubio pro reo (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in ob. cit., pág. 518). Ao interpretar os mencionados preceitos do CPP, não se afigura que o despacho impugnado de fls. 33696 a 34703 formule, ainda que implicitamente, um juízo de culpabilidade do recorrente K ou, melhor dizendo, que tenha abalado ou esbatido o princípio da presunção da inocência, tanto mais que esse despacho procurou unicamente centrar o processo no seu objecto, afastando da audiência questões marginais. Em parte alguma, ainda que implicitamente, o Tribunal a quo considerou antecipadamente, ainda no decurso da audiência, o recorrente K como culpado pela prática dos crimes que lhe são imputados. Nem tão pouco essa decisão permitiu ou facilitou a condenação do recorrente. Quanto ao segundo segmento do n.º 2 do citado preceito constitucional, torna-se desnecessário repetir aqui o que acima já se defendeu, no sentido de que as perguntas em causa, que as defesas procuraram formular, implicariam inelutavelmente um retardamento na conclusão do julgamento, sem qualquer benefício para os arguidos e sem preterição de qualquer garantia de defesa. O princípio do acusatório, consagrado no n.º 5 do art. 32.º da Lei Fundamental, pretende essencialmente assegurar que o processo criminal decorra com equidade ou com justo equilíbrio entre os vários sujeitos processuais, que os poderes concedidos à acusação não suplantem aqueles que são reconhecidos à defesa, que haja um equilíbrio entre as prerrogativas atribuídas ao arguido para demonstrar a sua inocência e as prerrogativas reconhecidas à acusação para comprovar a culpabilidade do acusado, que existam diferentes órgãos encarregues de acusar e de julgar e que o tribunal assegure as garantias de independência e de imparcialidade. De igual modo não parece que o despacho recorrido tenha comprometido os princípios do acusatório e do contraditório. Antes pelo contrário, o Tribunal a quo desconsiderou, ao arrepio do pretendido pelo recorrente, as diligências de inquérito, executadas por órgãos de polícia criminal e dirigidas pelo Ministério Público. Valorizou os princípios da imediação e da oralidade, exigindo que, por regra, a prova relevante seja produzida ou examinada em audiência de julgamento, na presença de todos os sujeitos processuais, com amplo debate e discussão, concedendo à defesa e à acusação iguais faculdades para oferecerem os seus meios de prova e para rebaterem aqueles que por outros foram apresentados na audiência. Deste modo, não se crê que seja inconstitucional a interpretação normativa efectuada pelo Tribunal a quo, que atente contra algum dos princípios constitucionais acima enunciados, que viole os direitos, liberdades e garantias do recorrente K ou que lhes tenha estabelecido restrições desnecessárias e intoleráveis à luz da Lei Fundamental. Quanto à alegada violação dos arts. 5.º e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que desde já se avança ser in casu inexistente - quer no despacho ora sub judice (prolatado na sessão da audiência de julgamento de 20 de Julho de 2005) quer nos despachos proferidos nas sessões da audiência de julgamento de 22 e 29 de Outubro de 2008, a que nos ateremos de seguida -, remete-se nos três casos, mutatis mutandis, para aquilo que se disse na apreciação de outros recursos interlocutórios, valendo aqui por todos o por nós expendido a propósito do recurso também inter(...) pelo arguido K, de fls. 51892 a 51905, do despacho proferido na sessão da audiência de julgamento de 11 de Março de 2008 (cf. fls. 51445 a 51450). Assim sendo, impõe-se concluir não merecer reparo o despacho recorrido (vertido no ponto II de fls. 33696 a 33703 e proferido em 20 de Julho de 2005), que importa ser confirmado, julgando-se improcedente o recurso do arguido K que sobre o mesmo incidiu (constante de fls. 33983 a 34002). 14.2. Os despachos de 22 e 29 de Outubro de 2008 Passemos agora a apreciar os demais recursos, isto é os (três) que incidiram sobre despachos proferidos nas sessões da audiência de julgamento de 22 e 29 de Outubro de 2008, em que foram indeferidos requerimentos dos arguidos H e K solicitando que fossem lidas, em julgamento, declarações prestadas no inquérito por diversos assistentes e testemunhas e pelo assistente AV em instrução, mesmo com a oposição destes e do Ministério Público. Antes de mais, comecemos por atentar no lapso assinalado pelo arguido K no recurso que interpôs do despacho constante sob o ponto II, de fls. 60474 a 60490, proferido na audiência de julgamento de 22 de Outubro de 2008, em que, recorde-se, extrai o recorrente da sua motivação as seguintes três primeiras conclusões: "1. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o requerimento de leitura de declarações do assistente FFN prestadas em sede inquérito e seu subsequente as prestadas em audiência de julgamento, de forma a que pudesse ser avaliada a credibilidade das mesmas, sustentando o requerido ainda no caso de alguns dos sujeitos processuais se opor à requerida leitura. 2. Nos termos do dis(...) no art.º 379.º, n.º 1, al. c) do C.PP., aplicável aos restantes actos decisórios por força do dis(...) no n.º 5 do art.º 380.º, do mesmo diploma legal, o Tribunal não pode deixar de se pronunciar sobre todas as questões que lhe são colocadas e que devesse apreciar. 3. Face ao ex(...) deve ser declarada nula a decisão proferida e, em consequência, deve o Tribunal pronunciar-se sobre o requerido no que respeita ao assistente FFN, admitindo contudo que tal omissão se possa ter devido a mero lapso e como tal deve ser corrigido." (fim de transcrição) Na resposta do Ministério Público a este recurso do arguido K, o Digno Magistrado de primeira instância, que a subscreveu, suscitou uma questão prévia, circunscrita a esta matéria, que se passa, só agora, a transcrever: "Alega o Recorrente que o Despacho recorrido, ao não se pronunciar sobre a parte do seu Requerimento (fls. 55.787-55.792) em que aditara ao de outros Assistentes o pedido de leitura das declarações, prestadas em Inquérito, pelo Assistente AC. Com tal omissão, conclui, o Despacho deixou de se pronunciar sobre questão que lhe havia sido colocada e que estava obrigado a apreciar, assim configurando a nulidade prevista no artº 379°, nº 1, c), do CPP, aplicável por força do dis(...) no nº 5, do artº 380°, do referido diploma legal (tratar-se-á de manifesto lapso a referência ao nº 5 - inexistente na norma -, que não ao nº 3, para onde se crê que se pretenderia fazer remissão). Assiste razão ao Recorrente. Certamente por lapso - que, estamos em crer, o Tribunal não deixará de suprir -, o Despacho, pese embora profusamente fundamentado, decide quanto aos restantes Assistentes, relativamente aos quais a leitura havia sido igualmente requerida, não referindo, porém, se irá, ou não, proceder à leitura dos depoimentos prestados pelo Assistente AC, pese embora seja previsível que, pelos mesmos motivos que indeferiu quanto aos restantes, assim venha a suceder quanto a este Assistente. Pelo ex(...), nos termos do dis(...) no art° 414°, nº 4, aplicável ex vi, do artº 379°, nº 2, ambos do CPP, entende-se que o Tribunal poderá/deverá reparar o Despacho recorrido, na parte em que deixou de se pronunciar sobre o Requerimento de leitura das declarações prestadas em fases anteriores, pelo Assistente AC, decidindo agora nesse segmento. Se, porventura, assim não se entender - o que só por mera hipótese se coloca -, deverá ser declarada a nulidade no Despacho, na parte (omissiva) em apreço, ordenando-se ao Tribunal que se pronuncie sobre o requerido." (fim de transcrição) Contudo, o despacho recorrido nunca chegou a ser reparado. Atento o teor da decisão recorrida, verificamos, como também, e bem, constatou o recorrente no final daquelas suas conclusões, que a não referência no despacho ao assistente AC se ficou a dever a mero lapso de escrita e não a uma situação de omissão de pronúncia, essa sim, potencialmente geradora da invocada nulidade. Com efeito, o Tribunal a quo não quis excluir daquela sua decisão o assistente AC, tendo-se tão-só esquecido de o incluir na lista dos demais assistentes abrangidos naquele despacho, que, por cinco vezes, elencou. Tratou-se de manifesto lapsus calami, pois ressalta inequivocamente do contexto que foi ali praticado um mero erro material de escrita, por involuntário cometimento de omissão, facilmente inteligível e não essencial para compreensão do despacho na sua globalidade, podendo ser corrigido pelo Tribunal de recurso, nos termos do art. 380.°, n.°s 1, al. b), e 2 do CPP. Recorde-se que o art. 380.º do CPP dispõe no seu n.º 1 que “O tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando: a) Fora dos casos previstos no artigo anterior, não tiver sido observado ou não tiver sido integralmente observado o dis(...) no artigo 374.º; b) A sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial”. E no seu nº 2 “Se já tiver subido recurso da sentença, a correcção é feita, quando possível, pelo tribunal competente para conhecer do recurso”. Sendo certo que o n.º 3 do mesmo preceito diz que “o dis(...) nos números anteriores é correspondentemente aplicável aos restantes actos decisórios previstos no artigo 97.º”. Nestes termos, e antes de mais, este Tribunal da Relação entende dever corrigir, visto o dis(...) no art. 380.º, n.ºs 1 al. b), 2 e 3 do CPP, e em conformidade com o expendido supra, o lapso acima indicado – não inclusão do assistente AC no rol de assistentes efectuado em diversos momentos do despacho de 22 de Outubro de 2008 ora recorrido –, atenta a circunstância de tal correcção não importar em modificação essencial ao ali decidido e não consubstanciar uma limitação das garantias de defesa. Assim: - onde na penúltima linha de fls. 60474 se lê "AU e as testemunhas AZ e CG" deve passar a ler-se "AU, AC e as testemunhas AZ e CG"; - onde na oitava linha de fls. 60475 se lê "AU e as testemunhas AZ e CG" deve passar a ler-se "AU, AC e as testemunhas AZ e CG"; - onde na sexta linha de fls. 60477 se lê "AU e as testemunhas AZ e CG" deve passar a ler-se "AU, AC e as testemunhas AZ e CG"; - onde na quarta linha de fls. 60484 se lê "AU e as testemunhas AZ e CG" deve passar a ler-se "AU, AC e as testemunhas AZ e CG" e no final dessa mesma página (fls. 60484) deve ainda passar a ler-se: "O Assistente AC foi ouvido na audiência de julgamento de 21/11/2005." Feita esta correcção e julgando-se, consequentemente, improcedente a invocada nulidade do despacho recorrido, avancemos então. Como, e bem, se decidiu em 1.ª instância (despacho de 22 de Outubro de 2008): "da conjugação do dis(...) nos artºs. 355°, nº 1 e 2 e 127°, do C.P. Penal e para o que à presente questão importa, resultam dois elementos estruturantes da actuação do juiz na fase processual do julgamento: - proibição da valoração de provas que não sejam examinadas ou produzidas em audiência de julgamento, ressalvando da imediação as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida em audiência de julgamento (observando-se, neste caso, o dis(...) no art°. 356° e 357°, do C.P.Penal); - e a valoração da prova de acordo com as regras da experiência, apreciada livremente pelo Tribunal. O legislador, ao consagrar nesta fase processual o princípio da concentração da prova na audiência de julgamento, da oralidade e da imediação, coloca limites ao modo como o Tribunal pode alcançar a verdade material e - porque a questão, neste segmento, foi suscitada pelos arguidos -, até onde o Juiz do Julgamento pode e deve ir quanto às condições da investigação do crime. Está a definir, de forma clara, uma separação entre o momento do inquérito ou da instrução e o momento do julgamento, separação esta que decorre da estrutura acusatória do processo. Analisando o requerimento apresentado pelos arguidos face ao enquadramento legal acabado de enunciar, os arguidos Requerentes pretendem que o Tribunal defira a leitura de autos de declarações prestadas em fase de inquérito perante a Polícia judiciária ou perante o Ministério Público, por Assistentes ou testemunhas e sua confrontação com tais autos em audiência de julgamento." O art. 355.º do CPP - norma considerada como um dos expoentes máximos da consagração de princípios estruturantes do processo penal - dispõe no seu n.° 1, que "não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito da formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência". Estabelecendo, contudo, o seu n.° 2, que "ressalvam-se do dis(...) no número anterior as provas contidas em actos processuais cuja leitura seja permitida nos termos dos artigos seguintes." E dentro das excepções que ora interessam, preceitua o art. 356.°, n.° 1, al. b), do CPP, que "só é permitida a leitura em audiência de julgamento de autos de instrução ou de inquérito que não contenham declarações do arguido, do assistente, das partes civis ou de testemunhas." Explicitando o n.° 2, al. b), daquela norma adjectiva, que "… a leitura de declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas só é permitida, tendo sido prestadas perante o Juiz (...) se o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo na sua leitura (…)", e acrescentando o n° 5 que " … verificando-se o dis(...) na alínea b) do n.º 2, a leitura pode ter lugar mesmo que se trate de declarações prestadas perante o Ministério Público ou perante órgão de polícia criminal." Lembre-se que, como defendeu Maia Gonçalves (vd. sua anotação 2. ao art. 356.º do CPP, in pág. 688, do CPP Anotado e Comentado, 15ª Edição, 2005): "Regulam-se neste artigo, muito mais pormenorizadamente que no regime anterior, os casos em que, na audiência de julgamento, é permitida a leitura de autos lavrados no processo. Estes casos são taxativos, como se deduz do intuito que houve em fazer respeitar o contraditório e a imediação da prova, reflectido neste artigo através do uso do advérbio de exclusão só, logo à testa do texto legal, e também no n.º 2." Tal como o Tribunal a quo, também este Tribunal ad quem não encontra enquadramento legal para, ao abrigo do princípio genérico para a produção da prova, consagrado no art. 340.° do CPP, ultrapassar o regime excepcional constante dos arts. 355.° e 356.º do CPP, no que concerne à leitura de autos de declarações. Aliás, tal deriva também dos princípios da concentração da prova na audiência de julgamento, da oralidade e da imediação que, melhor garantindo a espontaneidade das declarações em julgamento, vigoram naquela fase processual em que os despachos recorridos foram proferidos. E, na sua análise, que inteiramente subscrevemos, o Colectivo a quo, referiu, e bem, a dado passo: "Resulta deste núcleo "estruturante" subjacente à actuação do juiz na fase do julgamento, que ao Juiz do julgamento compete assegurar que nesta fase a verdade material não seja alcançada por métodos de aquisição da prova proibidos (por exemplo, art° 126°, do C.P.Penal) - aqueles que afectam a liberdade e formação da vontade de declaração, podendo consubstanciar, por exemplo, manipulação da vontade por indução da declaração, adulteração da capacidade de memória, indução de certo raciocínio por introdução de premissas ou de factos pré determinados aquando de um interrogatório -. E compete assegurar, igualmente, que a prova que fundamente uma absolvição ou uma condenação (artº 355°, do C.P.P.), aquela em relação à qual o Tribunal pode e vai formar determinada convicção, tenha sido adquirida sem violação dos procedimentos ou da forma que a lei impõe para a produção de tal meio de prova em concreto (por exemplo: buscas, revistas, reconhecimentos, perícias, escutas, leitura ou reprodução de declarações constantes de autos). Resulta, assim e por decorrência do artº 32°, da C.R.P. e 237º, do C. P. Penal, que o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório, estende-se a todos os meios de prova que, nos termos do art° 355°, do C.P. Penal, possam fundamentar a convicção do julgador quanto aos factos que constituem o objecto do processo." Releva aqui sobremaneira o decidido pelo TC no acórdão n.º 1052/96, de 10 de Outubro de 1996, já acima parcialmente transcrito, proferido no proc. n.º 321/96 e consultável in www.dgsi.pt: "Como é sabido, o princípio rector de todas as regras sobre produção de prova na audiência de julgamento consta do artigo 355º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo o qual "não valem em julgamento nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tivessem sido produzidas ou examinadas em audiência". Por influxo deste princípio, como aliás resulta do nº 2 daquele dispositivo, a prova constante de actos processuais praticados anteriormente muito embora esteja à disposição do tribunal, não pode por este ser utilizada para efeitos de decisão se os respectivos autos não forem lidos em audiência. A leitura dos autos e declarações autorizada pelo artigo 356º representa uma emanação da oralidade e publicidade da audiência, traduzindo-se porém em excepção ao princípio da imediação da prova, excepção justificada pela impossibilidade ou grande dificuldade da sua produção directa ou por outras razões pertinentes. Mas, nas situações que, a título taxativo, são previstas naquele preceito houve o evidente propósito de acautelar as garantias de defesa do arguido, nomeadamente o princípio do contraditório estabelecendo-se um regime diferenciado em função, não só da natureza dos actos processuais, como também da autoridade judiciária ou de polícia criminal perante quem foram praticados.(…) A diferenciação de tratamento estabelecida para a leitura em audiência dos diversos actos ali previstos radica na sua particular natureza e conteúdo mas também, e é esse um ponto que aqui importa sublinhar, nas maiores ou menores garantias processuais com que os mesmos foram praticados (com as formalidades estabelecidas para a audiência, levadas a cabo perante o juiz, perante o Ministério Público ou perante órgãos de polícia criminal). (…) Como se extrai da respectiva acta de audiência (a fls. 729 e ss) aquando do depoimento de uma testemunha arrolada pela acusação, o senhor advogado do recorrente requereu que as suas declarações prestadas nos autos de inquérito perante um agente da Polícia Judiciária fossem lidas em audiência. Ao assim requerido foi deduzida oposição pelo assistente, havendo então sido proferido despacho de indeferimento, fundado, com base em tal oposição, no artigo 356º, nºs 2, alínea b) e 5 do Código de Processo Penal. Sustenta o recorrente que esta norma, assim entendida, "prejudica o amplo âmbito e alcance do artigo 32º, nº 1, da Constituição" violando, por outro lado o princípio do contraditório "estabelecido este como modalidade exponencial de 'favor libertatis', não se compadece com quaisquer entorses da possibilidade dum mais largo e agudo debate cruzado das provas, por parte do arguido e defensor".Mas não tem razão. Em conformidade com o dis(...) no artigo 32º da Constituição "o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa" (nº 1), revestindo "estrutura acusatória" e "estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório" (nº 5). Quando aquele preceito se reporta a "todas as garantias de defesa", considera indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. O posicionamento do arguido num processo de tipo acusatório há-de revestir uma situação de reciprocidade dialéctica face à acusação, pelo que, em conformidade, devem ser-lhe atribuídos aqueles meios legais de intervenção que compensem o desequilíbrio, que é pressu(...) indispensável de uma correcta administração de justiça. O princípio do contraditório é, afinal, expressão, ao nível jurídico-processual do princípio da igualdade. (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., 1993, pp. 202 e ss e José António Barreiros, Processo Penal, vol. 1º, pp. 401 e ss). A norma posta em crise só consente a leitura do depoimento da testemunha - presente na audiência de julgamento - prestado no inquérito perante um órgão de polícia criminal, desde que se verifique acordo por parte do Ministério Público, do arguido e do assistente. Este condicionamento acha-se fundado, desde logo, na circunstância de as declarações cuja leitura se pretende não terem sido prestadas com observância das formalidades estabelecidas para a audiência ou perante juiz, não existindo quanto a elas as garantias dialécticas de contraditoriedade constitucionalmente asseguradas. Por outro lado, achando-se presente na audiência a testemunha em causa, há-de dizer-se que quanto ao seu depoimento e à sua razão de ciência o arguido tem a possibilidade legal de exercer um pleno direito de defesa (the accused has the right [...] to meet witnesses face to face, como se escreve no artigo 1º, secção 9, da Constituição dos Estados Unidos da América). A exigência de um consentimento alargado ao Ministério Público, ao arguido e à defesa, para que a leitura das declarações seja possível não se apresenta como encurtamento ou restrição inadequada ou inadmissível das garantias de defesa, traduzindo-se, ao contrário, numa linha de concretização do princípio geral sobre a produção de prova em audiência constante do artigo 355º, nº 1, o qual visa essencialmente a garantia da posição processual do arguido. Não se tem assim por existente qualquer violação constitucional daquela norma." (fim de transcrição) Na mesma linha, mais recentemente e reportando-se ainda a esta decisão do TC, Paulo Pinto de Albuquerque defende, nas suas notas 15 e 17, ao art. 356.º do CPP (in “Comentário do Código de Processo Penal”, Universidade Católica Editora, Lisboa, Ed.ª 2009, págs. 879 e 880), que: "O acordo na leitura pode fracassar devido à recusa do assistente. Não viola as garantias de defesa, nem o principio do contraditório a interpretação do artigo 356, n.ºs 2, al. b) e 5, segundo a qual a leitura a pedido do arguido de depoimento de uma testemunha prestado no inquérito perante um polícia é proibida se o assistente a rejeitar (acórdão do TC n.º 1052/96). O arguido não é senhor do princípio da imediação, pois este é um princípio de garantia da sentença e, nessa medida, protege também o assistente. (…) Só é permitida a leitura, visualização ou audição da prova contida em acto processual presidido pelo órgão de polícia criminal quando haja acordo do MP, do arguido e do assistente na leitura. Não havendo acordo, nenhumas declarações prestadas diante do órgão de polícia criminal podem ser lidas, visualizadas ou ouvidas. Para garantir a eficácia desta proibição a lei acrescenta uma outra: os órgãos de polícia criminal que tiverem recebido declarações de qualquer pessoa cuja leitura, visualização ou audição não for permitida (isto é, cuja leitura não seja autorizada pelo MP, assistente e arguido) não podem: ser inquiridos como testemunhas sobre o conteúdo daquelas." (fim de transcrição) Deste modo, bem andou o Tribunal a quo quando decidiu que: "Em consequência, no que respeita aos auto de declarações prestadas pelas testemunhas ou Assistentes perante órgão de polícia criminal ou perante o Ministério Público na fase de inquérito - e a que se referem o requerimento dos arguidos -, este Tribunal entende que a lei só permite a sua utilização e o seu conhecimento, no caso expressamente previsto no artº 356°, n° 5, por remissão para o art° 356°, nº 2, al. b), do C. P. Penal. Face ao enquadramento teórico que ficou enunciado e aos preceitos legais já indicados, dado que os assistentes a fls. 55.684 a 55.687 expressamente dizem que não dão o seu consentimento para a leitura das declarações que constem de tais autos, não pode o Tribunal permitir, por legalmente vedado pelos arts. 355°, nº 1 e 356°, n° 2, al. b) e nº 5, do C. P. Penal, que às testemunhas ou assistentes identificados nos requerimentos dos arguidos, sejam colocadas questões sobre o conteúdo dessas declarações consignadas em auto, feitas perguntas sobre a incompatibilidade (para os arguidos requerentes) do conteúdo dessas declarações com as que prestaram em audiência de julgamento; não sendo, também, legalmente admissível considerar processualmente irrelevante a oposição dos assistentes a tal leitura e, não obstante essa oposição, proceder à leitura dos autos. Face ao dis(...) nos citados arts. 355°, nº 1 e 356°, nº 2, al. b) e n° 5, do C. P. Penal, a leitura e conhecimento do conteúdo dos autos a que se refere o requerimento dos arguidos só é possível com o consentimento de todos os sujeitos processuais, incluindo os assistentes." E, mais adiante, com que igualmente se concorda, consignou o Tribunal a quo: "Invocam no entanto os arguidos - para além do art° 32°, da C.R.P. (…) -, o artº 6°, da C.E.D.H .. No actual processo penal o princípio do contraditório impõe que seja dada a oportunidade a todo o sujeito processual de ser ouvido e de expressar as suas razões antes de ser tomada uma decisão que o afecte. Com assento constitucional no art° 32°, n° 5, da C.R.P., tem sido igualmente tratado pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e considerado como um elemento integrante do princípio de um processo equitativo, inscrito como direito fundamental no artº 6°, da CEDH. "...na construção convencional, o contraditório, colocado como integrante e central nos direitos do acusado (...), tem sido interpretado como exigência de equidade, no sentido em que ao acusado deve ser proporcionada a possibilidade de expor a sua posição e de apresentar e produzir as provas em condições que lhe não coloquem dificuldades ou desvantagens em relação à acusação. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial (...), que seja dado ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo (...), sendo apenas os direitos da defesa limitados de maneira incompatível com o respeito do princípio sempre que uma condenação se basei, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior seja durante a audiência (...) - (cfr. Ac. STJ, de 20/12/06, Pº 06P3379, www.dgsi.pt). (…) Integrando e preenchendo o que antecede com o que ocorreu no presente julgamento, no que ao efectivo exercício do contraditório em audiência de julgamento diz respeito em relação aos assistentes e testemunhas identificados pelos arguidos Requerentes e em relação aos quais requerem a leitura dos autos de declarações prestadas na fase de inquérito, o Tribunal considera que foi dado aos arguidos possibilidade de em audiência de julgamento exercerem o contraditório tal como o artº 32°, nº 5, da C.R.P. o consagra ou o art° 6°, da CEDH. Os Assistentes AV, AP, AT, AN, X, AI, Y, AU e as testemunhas AZ e CG, foram ouvidos em audiência de julgamento, tendo sido inquiridos os Assistentes através do Tribunal (artº. 346°, do C. P. Penal) e as testemunhas inquiridas ou contra - inquiridas directamente pelos Mandatários/Representantes dos Sujeitos processuais (art. 348°, do C. P. Penal). (…) Ouvindo e analisando a globalidade: - das declarações que os Assistentes e as duas testemunhas prestaram nas audiência de julgamento; - as perguntas que lhes foram feitas pelos Sujeitos processuais nas suas instâncias e contra-instâncias, incluindo os arguidos requerentes; - os documentos com que foram confrontados e que se encontram identificados nas actas das audiências em que prestaram depoimento/ declarações; - as explicações que deram quanto ao conhecimento ou momento do conhecimento de factos que poderão relevar para o objecto deste processo e razão de ciência; - os Peritos e consultores técnicos que foram ouvidos em audiência de julgamento quanto a Perícias ou sobre Perícias feitas aos Assistentes e que são mencionados pelos Arguidos na fundamentação do requerimento que está em apreciação (…) o Tribunal considera que aos arguidos foi dada a efectiva possibilidade de, em audiência de julgamento, porem em causa perante o Juiz do julgamento a credibilidade dos assistentes ou testemunhas identificados no seu requerimento, a razão de ciência ou o conhecimento de factos efectivamente relevantes face ao objecto do processo, a possibilidade ou impossibilidade dos fados que declararem terem ocorrido, ou terem ocorrido nas circunstâncias de tempo, modo ou lugar que descreveram. Porque é isto que - e abrangendo quer a perspectiva do arguido H, quer a perspectiva do arguido K, quanto ao contributo do que é requerido para a prova dos factos em discussão em julgamento, isto é, valoração ou possibilidade de constituírem "prova positiva" ou "prova negativa" dos factos - o Tribunal interpreta como estando globalmente em causa com o requerimento dos arguidos: que o Tribunal proceda à avaliação cabal da credibilidade dos declarantes ou depoentes, mas o que - ao contrário do que é o entendimento deste Tribunal -, os arguidos consideram só poder ser efectivamente feito pelo tribunal se conhecer as declarações que foram prestadas em fase de inquérito e a sua evolução, por considerarem que existem contradições, sendo na perspectiva dos arguidos elemento imprescindível a avaliação dessas contradições para a formulação de um juízo adequado quanto àquela credibilidade (cfr. fis. 55.522, Ponto 10.)." Por seu turno, como, e também mui acertadamente, se decidiu em primeira instância, agora no despacho de 29 de Outubro de 2008: "Assim e independentemente do entendimento que se tenha quanto ao regime de utilização das declarações anteriormente prestadas e que venham a ser lidas em audiência de julgamento - pois afigura-se-nos que esta utilidade não depende apenas da concepção teórica que se tenha quanto à "utilidade" da leitura para "esclarecer a prova" ou como "prova", mas também e por exemplo, se estamos perante uma situação prevista no arte 356°, nº 4, do C.P.Penal, ou 271º e 294°, do C.P.Penal - a lei, ao fazer distinção entre o regime de leitura de declarações prestadas perante o Juiz, perante o Ministério Público ou perante O.P.C., dando uma resposta jurídica diferente consoante a necessidade/desnecessidade ou existência/inexistência de consentimento dos Sujeitos processuais, para o Tribunal proceder à leitura dos autos em audiência de julgamento, teve subjacente aspectos com relevância ou peso diferentes, mas forçosamente concordantes com os princípios estruturantes do processo e concorrentes para a realização da justiça que acima foram ex(...)s. Deste modo e começando pela situação mais "linear", se os Sujeitos processuais estão de acordo quanto à leitura das declarações constantes de autos - art° 356° nº 2, al. b) ou nº 5, do C. P. Penal -, as mesmas podem ser lidas quer tenham sido prestadas perante o juiz, quer tenham sido perante o ministério Público ou O.P.Criminal. A ideia do consenso está ligada à celeridade processual, ao reconhecimento de um princípio de (relativa) disponibilidade da prova, possibilidade de co-aceítação de provas (cfr. Damião da Cunha, Revista Portuguesa de C.C., Ano 7, Fase. 3°, Julho-Setembro 1997, pago 403 a 443, em concreto fls. 416, com refr. a COSTA ANDRADE, "Consenso e Oportunidade" ... ). No caso concreto os arguidos não requereram a leitura ao abrigo destes dispositivos legais, antes resulta da fundamentação do seu requerimento que expressamente pretendem invocar outro regime, pelo que fica afastada a possibilidade de o tribunal considerar tal dispositivo legal. (…) Passemos então à análise da situação ao abrigo do artº 356°, n° 3, do C. P. Penal, sendo que face à fundamentação dos arguidos requerentes a fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21 - leitura de autos de declarações, por "existência de contradições" entre as declarações prestadas em audiência de julgamento e as prestadas anteriormente e constantes de autos. -, o Tribunal conclui que no seu requerimento apenas está em causa a al. b), do nº 3, do 356° e não a al. a), do C. P. Penal, pelo que não irá considerar esta última. Seguindo Damião da Cunha - (cfr. Damião da Cunha, Revista Portuguesa de C.C., Ano 7, Fasc. 3°, Julho-Setembro 1997, pag. 403 a 443, em concreto fls. 418) - quanto ao art° 356°, n° 3, do C.P.Penal, " ... a admissão desta leitura visa comprovar a veracidade das declarações prestadas na audiência de, julgamento, não, evidentemente, comprovar se as declarações anteriores prestadas são (as) verdadeiras - visa, pois, «esclarecer» o depoimento efectivamente prestado. As anteriores declarações não são objecto de prova e, neste sentido, não são provas verdadeiramente produzidas em audiência de julgamento (...). (...) O recurso a esta leitura está também limitado pela entidade perante quem elas foram prestadas: elas têm de ter sido prestadas perante o juiz. A exigência de tal pressu(...) é perfeitamente compreensível face à credibilidade que merece a posição institucional de um juiz (...)", quer - acrescentamos nós - quanto ao respeito das formalidades inerentes à recolha das declarações ou quanto à forma de formulação das perguntas. A intervenção do juiz é um princípio de garantia de formulação de perguntas isentas de sugestão, indução ou pressu(...)s e um princípio de garantia de correspondência fidedigna da resposta reduzida a auto com a forma, palavras, termos ou expressões utilizadas pelo declarante na resposta, de que a redução a auto foi feita sem introdução de conclusões, súmulas ou expressões que não foram feitas ou que não correspondem ao dito pelo declarante." (fim de transcrição) Vem isto a propósito pelo facto de no despacho recorrido de 29 de Outubro de 2008 se suscitarem o mesmo tipo de questões que no despacho recorrido de 22 de Outubro de 2008, no que tange à pretendida leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas pelo assistente AV na fase de inquérito perante o MP ou OPC, mas a questão ganha novos contornos quando o recorrente H entende que tais declarações devem ser consideradas como se se tratassem de autos de declarações prestadas perante JIC na fase de instrução e isto porque os arguidos consideraram que no auto de fls. 19031 a 19033, referente às declarações prestadas pelo assistente AV perante JIC na fase de instrução, este teria confirmado perante a Mmª Juíza de Instrução todas as declarações anteriores, aplicando-se assim o regime do art. 356.°, n.° 3, do CPP, a todos os autos. Porém, sem razão. Como bem se explicou no despacho recorrido, não é pelo facto de uma testemunha ou assistente dizer perante JIC que confirma as suas declarações anteriormente prestadas na polícia ou no Ministério Público que se pode processualmente considerar que essas declarações foram prestadas perante o Juiz. Com efeito, também entendemos que terá de haver no auto de declarações perante JIC uma expressão inequívoca da intervenção do Juiz que está a presidir à tomada de declarações, da qual resulte claro quais os autos e conteúdo dos autos de declarações que estão em causa e em relação aos quais o Juiz está a proceder, na fase da instrução, como declarações prestadas perante si. E, para além disso, é preciso que do auto também resulte inequívoca a garantia judicial que um auto de declarações perante Juiz deve comportar, "que o declarante sabia exactamente o que estava a dizer e a extensão do que estava a dizer perante um Juiz: eu sei o que estou a dizer e volto a dizê-lo perante o juiz. Por exemplo, que do auto de declarações perante JIC conste quais os autos que em concreto estão abrangidos pela declaração "tabelar" de quem está a ser ouvido, esclarecimentos complementares que foram pedidos e prestados em relação às declarações dos autos anteriores, ou se não foram prestados mais esclarecimentos ficar consignado." Ou seja, "do auto tem que resultar explícito e ser inequívoco que o J.I.C. que presidiu ao acto de tomada de declarações, face à declaração "tabelar" da testemunha/assistente, considerou estarem em causa as declarações constantes do auto de fls. X, Y ou Z., serem essas as pretendidas prestar perante si pelo declarante e serem essas as a considerar prestadas perante si. E esta exigência, face à relevância que pode assumir na audiência de julgamento as declarações prestadas perante J.I.C. na fase da instrução e específico regime de leitura que já abordámos, não a entendemos como um excesso de formalismo, mas como procedimento com efectiva relevância prática, como instrumento de definição e delimitação dos Direitos de defesa e dos meios/instrumentos/actos a que o Tribunal pode recorrer para realizar a Justiça. E é isto que justifica e legitima o formalismo." Portanto, as declarações prestadas perante um Juiz, em sede de instrução, face às legais consequências que estas podem comportar na fase do julgamento, exigem uma clara delimitação e distinção entre todos os meios de investigação e de obtenção de prova que foram usados na fase de inquérito daqueles que o JIC considera estar a introduzir com a instrução, como actos de instrução praticados por si e perante si. Acresce que, no caso concreto e tal como devidamente assinalado no despacho recorrido, o assistente AV ao prestar declarações perante JIC referiu o seguinte: "... no passado, o declarante foi mentiroso e sabe que mentiu muito. Mas está consciente que agora já não é assim: todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim ...". (cf. linhas 4 a 8 da terceira página do auto de fls. 19031 e segs.) Não entendemos, tal como não entendeu o Tribunal a quo, que esta declaração, da forma como está consignada, tenha o propósito e a potencialidade de permitir concluir que, a perguntas sobre o objecto do processo, o declarante reproduziu todas as declarações que prestou anteriormente perante a Polícia Judiciária e perante o Ministério Público. Com efeito, "no auto não consta resposta ou referência que permita concluir que, após esta declaração, o J.I.C. que estava a presidir ao auto foi buscar, verificar, sindicar ou identificar quais os autos a que o declarante se estava a referir e quais os que se deveriam considerar referidos como reproduzidos naquele acto, por o Assistente os estar a querer dizer perante si. Não consta no auto qualquer pedido de esclarecimento em relação a declarações constantes de autos anteriores - e no caso concreto, verificando também pela fundamentação do requerimentos dos arguidos, o arguido faz referência a, pelo menos, doze autos de declarações do assistente AV e este número não esgota os autos identificados no processo como de "inquirição de AV" - ou qualquer menção, posteriormente à citada declaração do assistente (que começa no passado, o declarante foi mentiroso e sabe que mentiu muito. Mas está consciente que agora já não é assim: todos os depoimentos que prestou na Polícia Judiciária e no Ministério Público são o que se passou e vai mantê-los até ao fim ..."), que leve a concluir que o J.I.C., independentemente de não ter feito qualquer referência à identificação concreta dos autos ou esclarecimento ao conteúdo, considerou como prestadas perante si todas as declarações anteriormente prestadas pelo assistentes. Isto é, que processualmente as considerou reproduzidas perante si, como declarações "de instrução"." Deste modo, a declaração do assistente AV permite apenas concluir que este afirmou perante o Juiz de Instrução de que nem sempre falou verdade e que a partir do momento que indicou passou a falar verdade, "no que se deve entender incluído o que estava a declarar perante a Sra. J.I.C., verdade que vai manter " ... até ao fim ..."" E este entendimento não corresponde, para este Tribunal ad quem como já assim sucedeu para o Tribunal a quo, a um arbítrio, mas a uma delimitação que se nos afigura justificada e razoável perante o acima enunciado quanto ao regime da leitura, em audiência de julgamento, de autos de declarações prestados em fase anterior. O arguido, ora recorrente H, pretende, por uma via, que este Tribunal entende que o CPP e os princípios inerentes à estrutura acusatória do processo penal não consentem, e que o teor concreto do auto de fls. 19031/3 também não consente, fazer um contraditório (à posteriori) e ao abrigo do dis(...) no art. 356.°, nº 3, al. b), do CPP, em relação a depoimento em que não se verifica a garantia de ter sido colhido por um juiz na fase de instrução. E justifica o ora recorrente H a necessidade de introduzir na audiência de julgamento os autos de fls. 153, 848, 309, 310, 313, 314, 315, 316, 317, 318, 319, 320, 456, 457, 848, 850, 1426, 1427, 2969, 4654, 4655, 6922, 7146, 7147, 7280, 7281, 7776, 7777, 11836, ao abrigo do art. 356.º, n.° 3 do CPP, - portanto, sem necessidade de consentimento dos demais sujeitos processuais - no facto de considerar que face à sua estratégia de defesa, nos referidos autos de declarações prestadas perante o Ministério Público ou OPC existem declarações que podem beneficiar a sua defesa. Por, na sua perspectiva e da avaliação que faz das declarações que o assistente AV prestou em audiência de julgamento, estar afectada a credibilidade do assistente, pois "... a defesa de H tem sustentado, cada vez com mais convicção, que o Sr. AV, através de um processo psicológico que só a prova pericial poderá esclarecer cabalmente, transferiu ou projectou para o arguido H e para os outros arguidos aquilo que com eles se não passou ... " (cfr. fls. 34921). No entanto, como bem assinalou o Tribunal a quo, a respeito da pretensão de ser permitido considerar como tendo sido dito perante o Juiz de Instrução o que o assistente AV disse em inquérito perante o Ministério Público ou OPC, “o que o arguido pretende é que actos que à partida não são permitidos levar a cabo pelo juiz do Julgamento - concretamente a leitura na audiência de julgamento de autos de declarações prestadas em fase de inquérito perante o Ministério Público ou O.P.C., quando não há o consentimento de todos os sujeitos processuais nos termos do artº 356°, nº 2, al. b), do C.P.P. -, passem a ser admitidos e legitimados ao abrigo de uma invocada (pelo arguido) necessidade, estratégia, interesse ou vantagem de defesa. Para uma demonstração, na perspectiva do arguido, da insubsistência da prova que foi sendo adquirida ao longo da audiência de julgamento. E, assim, abrindo a porta a um entendimento do exercício do contraditório que permita que actos na sua génese proibidos, possam ser legitimados em função das suas consequências, introduzindo o Juiz do julgamento alterações ao regime do art. 355° e 356°, do C.P.Penal, em função de um hipotético ou invocado interesse da Defesa. (…) Pode de facto haver situação em que em concreto e contextualizando, o Juiz do julgamento e para tutela de interesses constitucionalmente consagrados, possa ultrapassar os limites que à partida lhe estão legalmente im(...)s no poder/dever de investigação da verdade material. Por exemplo - e como o Tribunal já o tem dito nos vários Despachos que tem proferido, quanto a outros requerimentos de leitura de autos de declarações -, por poder estar em causa situação em que com um requerimento de leitura de autos de declarações, ao abrigo do dis(...) no art. 356°, do C.P.Penal, esteja em causa o Tribunal aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, e que contamine meio de prova (pré-adquirido) que possa ser usado em audiência de julgamento. Isto porque, por força dos art°s. 32°, da C.R.P., 327° e 355°, do C. P. Penal, o direito de defesa do arguido e o exercício do contraditório impõem que o Tribunal, em audiência de julgamento, afira das circunstâncias em que diligências realizadas em fase processual anterior foram feitas, de forma a pôr em crise o seu valor como meio de prova e no caso de estarmos perante um dos meios de prova pré adquiridos a que se refere o artº 355°, do C.P. Penal. Está nesta hipótese, por exemplo, a impugnação que os arguidos fazem nas suas contestações de reconhecimentos de locais que foram feitos na fase do inquérito, o que pode implicar a necessidade de o Tribunal - mesmo com oposição de algum sujeito processual -, ir ao conteúdo desses autos, que em alguma medida contêm declarações prestadas por um assistente ou por uma testemunha perante a entidade (órgão de polícia criminal) que presidiu o acto. Mas, como temos afirmado, a verdade material não pode procurar-se a qualquer preço, não dispondo o Juiz do julgamento de um poder ilimitado de produção de prova: o juiz, dentro do thema probandi, está sujeito aos princípios instituídos pelo legislador ordinário e constitucional, para a obtenção da prova nas diferentes fases processuais. Isto para que a verdade processual corresponda ao que ontologicamente está subjacente à actividade punitiva dos Estados para que seja "...o resultado probatório processualmente válido, que sustenta a convicção de que certa alegação de acto é justificavelmente aceitável como pressu(...) da decisão, por ter sido obtida por meio processualmente válido (...)." (cfr. G.Marques Silva, Curso processo penal II, 2a edição, Verbo, pag. 111)." E, prossegue o Tribunal a quo: "Mas, avaliando e ponderando: - o depoimento que foi prestado pelo Assistente AV nas audiências de julgamento de 12.09.05, 14.09.05, 15.09.05, 19.09.05, 21.09.05, 26.09.05, 28.09.05, 29.09.05, 3.10.05, 10.10.05, 12.10.05, 13.10.05, 14.10.05, 17.10.05, 19.10.05, 20.10.05, 24.10.05, 31.10.05., inquirição que foi feita através do Tribunal (art°. 346°, do C.P.Penal); - ouvindo e analisando a globalidade as perguntas que lhe foram feitas pelos Sujeitos processuais nas suas instâncias e contra-instâncias, incluindo os arguidos requerentes; os documentos com que foi confrontado e que se encontram identificados nas actas das audiências em que prestou declarações, as explicações que deu quanto ao conhecimento ou momento do conhecimento de factos que poderão relevar para o objecto deste processo e razão de ciência; - o teor das perícias que foram feitas a AV - e que se encontram a fls. 159 a 170, Apenso CC, vol. 1°, perícia feita na fase de inquérito a pedido do Ministério Público; e a fls. 189 a 212, do Apenso Z 11, vol. 1°, perícia sobre a capacidade para o Assistente prestar depoimento e que foi determinada por este Tribunal -; - os Peritos e consultores técnicos que foram ouvidos em audiência de julgamento quanto a tais Perícias ou sobre tais Perícias (…) - e analisando a argumentação dos arguidos Requerentes de fls. 34.914/5 e fls. 34.915/21, "1° Requerimento"; o Tribunal não conclui nem encontra que esteja em causa, com o pretendido pelos arguidos e tal como é requerido, situação idêntica à exemplificada e em que haja necessidade de o Tribunal aferir quanto ao efeito à distância de eventual vício de que padeça acto processual que tenha sido praticado em fase anterior, por estar a contaminar (na sua validade) meio de prova pré adquirido que possa ser usado em audiência de julgamento. Nem considera que esteja em causa outra situação que em concreto e contextualizando, o Juiz do julgamento, para tutela de interesse constitucionalmente consagrado, deva ultrapassar os limites que à partida lhe estão legalmente im(...)s no poder/dever de investigação da verdade material.” Assim, como bem entendeu o Tribunal a quo e é também nosso entendimento, no caso concreto não se encontra motivo fáctico ou fundamento legal para deferir o requerido, tendo sido devidamente assegurado em audiência de julgamento, perante o Colectivo de Juízes, o exercício do contraditório, aí se aferindo da credibilidade do assistente, da sua razão de ciência e conhecimento dos relevantes factos objecto do processo, bem como da possibilidade ou impossibilidade dos factos que declarou terem ocorrido, ou terem ocorrido nas circunstâncias de tempo, modo ou lugar que o assistente AV descreveu ao Tribunal a quo. Resulta assim, de todo o ex(...), que face ao preceituado nos citados arts. 355.°, n.º 1 e 356.°, n.ºs 2, al. b), e 5, do CPP, a leitura e conhecimento do conteúdo dos autos a que se referem os requerimentos dos arguidos ora em apreço só seria possível com o consentimento de todos os sujeitos processuais, incluindo os assistentes, e esta anuência não existiu in casu. Releva assim tão-só o que disseram em audiência, declarações que foram devidamente sujeitas a um procedimento adversarial. Finalmente, a par do invocado desrespeito pelo preceituado nos arts. 5.º e 6.º da CEDH e 32.º, n.ºs 1, 2 e 5 da CRP, a que já sobejamente aludimos, considera o arguido K terem sido também violados os princípios contidos nos arts. 18.º, 20.º, n.º 4, e 204.º da CRP. Contudo, sem razão. Com efeito, dizem estas normas fundamentais respeito, respectivamente, à força jurídica dos preceitos constitucionais, ao acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, por via de um processo justo e equitativo, e ao princípio de que nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o dis(...) na Constituição ou os princípios nela consignados. Da conduta do Tribunal a quo, vistos os autos e tudo o que deixámos ex(...), nada se retira de onde se possam inferir as alegadas violações. A propósito da exigência de um processo equitativo, aplicável ao processo penal, remetemos aqui ao que a este respeito dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros, Gomes Canotilho e Vital Moreira e Ireneu Cabral Barreto citados na apreciação do recurso interlocutório também inter(...) pelo arguido K, de fls. 51892 a 51905, do despacho proferido na sessão da audiência de julgamento de 11 de Março de 2008 (cf. fls. 51445 a 51450) e ao que aí lavrámos a propósito do n.º 4 do art. 20.º da Lei Fundamental. Igualmente não se vislumbra que o Tribunal a quo, ao impedir a leitura das declarações prestadas em inquérito pelos assistentes e/ou testemunhas, perante a Polícia Judiciária ou perante o Ministério Público, e sua confrontação com tais autos em audiência de julgamento, tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, que tenha assegurado um tratamento de favor ou privilégio para o Ministério Público e para os assistentes (e, consequentemente, discriminatório para a defesa), que não tenha garantido o cumprimento do princípio do contraditório, já que estes foram devida e pessoalmente ouvidos e instados em julgamento, no respeito pelo princípio da concentração da prova na audiência de julgamento e com as vantagens inerentes à imediação e oralidade, que tenha impedido os arguidos de se defenderem dos factos que lhe são imputados, promovendo a sua condenação a final. Nem tão pouco o recorrente o explica de modo mais detalhado, indicando que concreta valência do princípio do processo equitativo considera ter sido ofendida pela decisão recorrida. Ao impedir aquela leitura - de anteriores declarações, que, sublinhe-se, não são objecto de prova - perante oposição de quem tinha legal poder para o permitir ou impedir, não se vê que as decisões recorridas de 22 e 29 de Outubro de 2008 tenham efectuado uma interpretação atentatória do dis(...) no n.º 4 do art. 20.º da CRP. É certo que indeferiu as pretensões dos arguidos, mas tal não significa, repete-se, que tenha desequilibrado o processo a favor da acusação, ou que, por isso, tenha sido ofendido o princípio da igualdade de armas. Como é nosso entendimento, o processo penal não passa a ser iníquo pelo simples facto do tribunal ter indeferido uma, algumas ou até mesmo todas as pretensões apresentadas por um sujeito processual. Nada nos permite concluir que o Tribunal recorrido tenha usado de “dois pesos e de duas medidas” ou que, em violação do princípio da imparcialidade, tenha tomado partido pela acusação em detrimento da defesa, em desrespeito do princípio constitucional do processo equitativo. Não se vê que o desfecho deste processo em primeira instância tenha ficado marcado pela circunstância do Tribunal a quo não ter autorizado a leitura dessas declarações e que os despachos ora recorridos tenham impossibilitado, dificultado ou prejudicado a defesa do recorrente K, beneficiando a acusação e comprometendo o equilíbrio imanente a um processo equitativo. Assim, não se perfilha o entendimento de que o Tribunal a quo sufragou uma interpretação ofensiva das efectivas garantias de defesa do arguido. Em suma: Destarte e atento o dis(...) no art. 32.°, n.ºs 1, 2 e 5, da CRP e nos arts. 127.°, 355.°, 356.°, n.°s 1, 2, al. b) e 5 e 323.°, al. f), estes do CPP, bem andou o Tribunal a quo ao não ter procedido à leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas por testemunhas/assistentes em inquérito, perante a Polícia Judiciária ou perante o Ministério Público, porquanto, não tendo havido acordo para tal entre os sujeitos processuais, estava-lhe vedado (ao Colectivo de primeira instância), por ser legalmente inadmissível, bem como a não permitir a leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas por testemunha/ assistente em instrução perante Juiz na interpretação, errónea, que este estava aí a dar por reproduzidas as prestadas anteriormente em inquérito, perante a Polícia Judiciária ou perante o Ministério Público, porque, de facto, não era manifestamente isso que estava a acontecer. Assim sendo, impõe-se concluir não merecerem reparo os despachos recorridos de 22 e 29 de Outubro de 2008 (pontos II), que importa serem confirmados, julgando-se improcedentes os recursos dos arguidos H e K que sobre os mesmos incidiram. Pelo ex(...): - julga-se improcedente o recurso interlocutório inter(...) a fls. 33983 a 34002, pelo arguido K do despacho proferido em 20 de Julho de 2005 e constante no ponto II de fls. 33696 a 33703, que, em consequência, integralmente se confirma; - julgam-se improcedentes os recursos interlocutórios inter(...)s pelos arguidos H e K, de fls. 60964 a 60977 e 61126 a 61148, respectivamente, do despacho proferido em 22 de Outubro de 2008 e constante no ponto II de fls. 60474 a 60490, que, em consequência, se confirma, com a correcção dos lapsos de escrita acima consignados; - julga-se improcedente o recurso interlocutório inter(...), de fls. 62252 a 62263, pelo arguido H, do despacho proferido em 29 de Outubro de 2008 e constante no ponto II de fls. 60575 a 60590, que, em consequência, integralmente se confirma. 15. Recursos inter(...)s pelos arguidos C, E, K e H dos despachos que julgaram improcedente a arguição de irregularidades por erro na qualificação das alterações comunicadas, por extemporaneidade da sua comunicação, e por falta de fundamentação, assim como os que indeferiram requerimentos de prova (proferidos a fls. 63918 a 63959, 64055 a 64107 e 65137 a 65225 dos autos) 15.1. No âmbito dos presentes autos, os arguidos E e K, durante a realização da audiência de julgamento – sessão ocorrida no dia 23 de Novembro de 2009 – e na sequência de despacho do tribunal a comunicar eventuais alterações de factos e/ou qualificações jurídicas, dando cumprimento ao dis(...) no art. 358.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, arguiram irregularidade do mesmo despacho, por falta de fundamentação, invocaram a extemporaneidade das alterações comunicadas e também que se tratava de alterações substanciais dos factos constantes do despacho de pronúncia. O Tribunal, após audição do Ministério Público, dos assistentes e dos arguidos, na sessão de julgamento ocorrida no dia 18 de Dezembro de 2009, proferiu despacho considerando que a alteração de factos comunicada ao arguido E consiste numa alteração não substancial de factos, que as alterações comunicadas a todos os arguidos são tempestivas, assim como julgou procedente a arguição de irregularidade apresentada pelos arguidos mencionados no que se refere à suficiência da fundamentação do despacho de comunicação de alterações, decidindo proceder à respectiva reparação (cf. fls. 63918 a 63959 dos autos). Inconformado com aquele despacho de fls. 63918 a 63959, dele recorreu o arguido E, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1º No contexto que ficou indicado, foi proferida a douta decisão recorrida, que julgou improcedente a arguição de irregularidades por erro na qualificação das alterações e por extemporaneidade da sua comunicação. 2° Procedendo à determinação do que para o Tribunal é uma alteração substancial ou não substancial dos factos, a douta decisão recorrida refere (que interessa quanto às alterações comunicadas ao recorrente) que, se ocorrer uma diferença de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual e que determine a imputação de crime diverso, temos uma alteração substancial dos factos. 3º E conclui que “face ao que antecede, a alteração de factos comunicada ao arguido E no Despacho de fls 63631 a 63635” ... consiste, no entendimento do Tribunal, numa alteração não substancial de factos”. 4° Contrariamente ao decidido e de acordo com o conceito determinado, as alterações comunicadas devem ser qualificadas como substanciais. 5° Para demonstrar esta qualificação, importa determinar essencialmente, o que é a imputação de um crime diverso. 6° Resulta do dis(...) no art° 1°-1 do CP que, em abstracto, crime é o facto descrito e declarado punível por lei. A concretização processual da abstracção legal “crime” é feita de acordo com o estabelecido no art° 283°-3-b) do CPP: a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, incluindo, se possível, nomeadamente, o lugar e o tempo. É tal narração que, acompanhada da indicação das disposições legais aplicáveis, constitui a imputação de um crime concreto ao arguido, imputação que o dis(...) no art° 339°-4 do CPP impõe que se mantenha na discussão da causa, embora “sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos”. 7º Não há facto material ou acto fisico sem tempo e sem lugar. Se não for possível a determinação desses elementos do facto, o crime pode ser processualmente imputado mesmo sem a narração espacial e temporal. Mas sendo possível, a imputação processual integra a narração, “ainda que sintética” (art° 283°-3-b) do CPP), do tempo e do lugar. 8° Feita a determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologicamente mas também quanto à sua cognição, pois o facto criminoso não é uma abstracção parcelada, é um facto concreto e unitário. É, no ensinamento do Professor Cavaleiro de Ferreira (Lições de Direito Penal, Verbo, 1985, pág. 13), “uma realidade unitária e não uma justaposição ou soma de elementos autónomos”. 9º Alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado, verifica-se a imputação de um crime diverso, não é mantida a imputação do MESMO crime. 10º E a nova indiciação de um crime em concreto diverso não é confundível com a indiciação de um diverso tipo legal de crime, a qual, sem alteração da narração factual, incluindo o lugar e o tempo, constitui alteração da qualificação jurídica dos factos, que não está em causa na douta decisão recorrida e que está regulada no n° 3 do art° 358°. 11° Só se a nova indiciação não alterar o núcleo factual narrado na imputação, limitando-se a explicitar ou esclarecer a narração, ainda que sintética, dos factos, incluindo o lugar e o tempo, mantém-se a imputação do MESMO crime, com alteração não substancial dos factos. 12° Como geralmente admitido e refere Frederico Isasca (in Alteração Substancial dos Factos e sua Relevância no Processo Penal Português, pags 139 e 144) os limites à identidade do crime, na qualificação duma alteração, terão que ser “a total garantia dos direitos de defesa do arguido e a prossecução da justiça e da verdade material”, pelo que, “sempre que ... essa alteração … ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos”. 13° Em consideração das garantias de defesa, são diferentes os regimes das alterações substanciais e não substanciais. Quanto a estas, o art° 358° não vai além de possibilitar uma defesa incidental, preparada no tempo “estritamente necessário”. Quanto às substanciais, porque incidem sobre o núcleo factual, incluindo as suas componentes temporal e espacial, não estando, em princípio, totalmente garantida a defesa no próprio processo, o art° 359° impõe que não sejam tomadas em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, admitindo o procedimento pelos novos factos em novo processo, com as mesmas possibilidades de defesa proporcionadas ab initio no processo em que foram comunicadas as alterações. 14° Das referidas alterações que foram comunicadas ao recorrente resulta: O imputado crime de abuso sexual, indiciado na pronúncia como ocorrido no prédio (…) da Alameda (…), num sábado de Novembro de 1999, passou a estar indiciado com alargamento a todos os prédios do lado ímpar da Alameda, com ampliação de sábado para sexta- feira ou sábado e do período de um mês para um mês e 29 dias e com antecipação de mais de 11 meses. 15° Ocorre nesta alteração uma diferença de tempo e espaço, que transforma o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, manifestamente diferente no que se refere aos seus elementos relevantes de construção e identificação factual. E que determina a imputação de crime diverso. Não é o mesmo crime um abuso sexual no prédio (…) e um abuso sexual em algum dos prédios n°s (…) a (…) e (…) a (…), não é o mesmo crime um abuso sexual ocorrido num sábado do mês de Novembro de 1999 e um abuso sexual ocorrido mais de 11 meses antes, numa sexta-feira ou num sábado entre 12 de Dezembro de 1998 e Janeiro de 1999, inclusive. Estas narrações constituem o núcleo do tempo e do lugar que integram o crime imputado, que integram o facto concreto e unitário, a realidade unitária do facto criminoso. 16° Também considerando as garantias de defesa, esta substituição de indiciação constitui alteração substancial dos factos. O recorrente preparou há cinco anos a sua defesa relativamente a um imputado crime num prédio e num tempo determinados. Não respeita de modo algum as suas garantias de defesa, ser restringido, decorridos cinco, anos à possibilidade duma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que teria acesso em 2004. 17° O imputado crime, indiciado na pronúncia como ocorrido numa casa da Av. (…), numa sexta-feira de Junho de 2000, passou a estar indiciado com restrição a casas da mesma avenida em área delimitada pela proximidade não determinada da zona da (…) (seria inqualificável manter a indiciação em toda a avenida (…), do (…)), com ampliação de sexta-feira para todos os dias da semana e de um para 4 meses e com antecipação de um ano e 2 meses. 18° O imputado crime de lenocínio, indiciado na pronúncia como ocorrido em parte (“dias depois”) do mês de Junho de 2000, passou a estar indiciado com ampliação de menos de um mês para mais de 2 meses e com antecipação de 11 meses. 19° Pelos fundamentos indicados, também se demonstra que as comunicadas alterações temporais quanto a estes dois crimes têm por efeito a imputação de um crime diverso, constituindo alterações substanciais dos factos descritos na pronúncia. 20° Só as alterações temporais e espaciais que não invadirem o núcleo do tempo e do lugar dos crimes imputados, devem, em princípio ser qualicadas como não substanciais, o que, como demonstrado, não se verifica quanto às alterações em causa. 21° Relativamente a alterações, pronunciou-se, em recurso inter(...) neste processo, o acórdão da Relação de Lisboa de 9 de Novembro de 2005, proferido no processo n° 6882/06 da 3ª Secção. Alguns extractos significativos: “…o tempo e o lugar da infracção só têm de ser indicados na acusação quando tal for “possível”. “Mas no caso dos autos verificou-se esta última hipótese: isto é, o M°P° indicou na acusação, sem qualquer dúvida, o tempo e o lugar da infracção.” “Ora, sendo indicados estes elementos, eles não podem depois ser desvalorizados a bel-prazer dos sujeitos processuais...”. “A tanto se opõe o pleno respeito da pessoa humana e dos seus alienáveis direitos - cfr Artºs 29° e 32° da CRP - que o processo penal democrático tem de assegurar, designadamente através do funcionamento dos princípios da legalidade do processo, da presunção da inocência e do acusatório”. 22° A douta decisão recorrida ao considerar que as alterações comunicadas - que modificam a narração do núcleo do lugar e ou do tempo dos crimes imputados - são alterações não substanciais, violou, por erro de interpretação e aplicação, os art°s 1°-f) e 358° do CPP, disposições que, nessa interpretação são inconstitucionais, por violarem as garantias de defesa conferidas pelo art° 32° da CRP, inconstitucionalidade que desde já se suscita. 23° Quanto ao momento temporal da admissibilidade das alterações, o art° 358° do CPP tem que ser interpretado e aplicado em sintonia com o dis(...) nos art°s 360º e 361º., dos quais resulta que, na tramitação normal, finda a produção de prova, incluindo a sequente à comunicação de alterações, se seguem as alegações orais e a estas as últimas declarações do arguido. 24° A admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literalidade legal - “no decurso da audiência”-, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa (que tem ínsita a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório) conferida pelo art° 32° da CRP e do processo equitativo im(...) pelo art° 20º-4 da CRP e pelo art° 6° da CEDH. 25° A violação das garantias de defesa está altamente patenteada pela conjugação da grande intempestividade da decisão com a enorme amplitude das alterações, quer no aspecto espacial quer no aspecto temporal. 26° A admissibilidade de alterações indiciárias não substanciais é justificada pelo princípio da verdade material. Mas este princípio não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja obervância é imposta pelo art° 18° da CRP. 27°. Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso na audiência, o que também está estatuído e de forma mais directa no art° 6°- 3-a) da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. 28° É manifesto que, se algumas alterações fossem indiciadas no decurso de 5 anos de audiência de julgamento, com a sequência de fases processuais acima resumida, tal indiciação teria ocorrido muito antes do início das alegações orais, permitindo e impondo o respeito pela sequência processual dos art°s 358°, 360º e 361° do CPP. 29° Mesmo considerando, sem conceder, que, como se refere na douta decisão recorrida, “face à actividade processual que tem sido e é este processo, não era possível … proceder à comunicação de alterações sem ter feito a análise global de toda a prova produzida em audiência de julgamento” (fls 63927) e que “A comunicação deve ser feita … apenas quando após a avaliação da prova produzida, o Tribunal sente que a mesma tem determinado sentido, que tem a propriedade no processo - por ser adequada, um caminho possível e verosímil e, por isso, indiciária - de levar ao alargamento do objecto do processo” (fls 63928), a sequência da actividade processual necessária à descoberta da verdade, não pode postergar as garantias de defesa. Impossibilitando-se ou limitando-se uma defesa eficaz, prejudica-se a própria descoberta da verdade e põe-se em risco a boa decisão da causa. 30º Se houvesse indiciação de alterações, ela resultaria, primordialmente, se não exclusivamente, como resulta da experiência judiciária, das declarações do assistente, prestadas em 28.10.2005 e em 2.11.2005, há mais de quatro anos! 31° O art° 358° do CPP, na interpretação subjacente ao tempo em que a decisão recorrida foi proferida, é inconstitucional, por violação dos art°s 20º-4, 32°- l, 2 e 5, e 18°-2 e 3 da CRP e do art° 6°-l e 3-a) da CEDH, inconstitucionalidade que desde já se suscita. Nestes termos e sobretudo pelo que doutamente será suprido, deve, se a decisão não for reparada ao abrigo do dis(...) no art° 414°-4 do CPP, ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto despacho recorrido, julgando-se procedente a arguição de irregularidades e declarando-se a invalidade das alterações. Como se espera e é de JUSTIÇA.” Igualmente irresignado com aquele despacho de fls. 63918 a 63959, dele recorreu o arguido K, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1. A audiência de discussão e julgamento teve início em Novembro de 2004, tendo o Assistente AP começado a prestar declarações em 23 de Janeiro de 2006 e terminado em 9 de Fevereiro do mesmo ano. As alegações orais terminaram em Fevereiro de 2009, com sessões mensais desde então para “produção de prova complementar” - o que, na prática, redundou em visionamento de dvd’s e na abertura de documentos já juntos aos autos - vindo o Tribunal, após as necessariamente breves alegações complementares e as últimas declarações dos Arguidos, comunicar a alguns a alteração dos factos, na sessão de 23 de Novembro último, prometendo “eventualmente” outras para a sessão seguinte, a ter lugar quase um mês depois, o que veio a verificar-se, tendo já uma quarta sessão para eventuais comunicações de alterações sido agendada. 2. A descrição factual constante da pronúncia, dos crimes alegadamente perpetrados pelo ora Recorrente sobre o Assistente AT, não pode deixar de corresponder a uma das muitas versões apresentadas pelo Assistente nas diversas vezes em que prestou declarações no processo, ou à conjugação de várias delas, na forma vertida na acusação pública e, no essencial, reproduzida na pronúncia. E essa versão não corresponde, mais uma vez, às dadas em audiência de julgamento. 3. O Tribunal a quo veio agora, no final de Novembro de 2009, comunicar alterações de factos, quase um ano depois de todas as alegações finais, réplica e resposta das defesas estarem concluídas, e quase quatro anos depois do fim das declarações do Assistente. 4. O arguido tem presente que a iniciativa de alteração dos factos prevista nos art.°s 358.° e 359.º do CPP pode ter lugar, a requerimento de qualquer um dos sujeitos processuais, ou oficiosamente, até ao final da discussão da causa. Contudo, a interpretação da oportunidade da convocação do instituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal - “se no decurso da audiência” -, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do sistema processual penal, constitucional, numa compaginação dos direitos de defesa e respectivas garantias e o dever de perseguir a verdade material. 5. Há um confronto, não necessariamente antagónico e dissonante, entre os direitos dos arguidos, e também dos assistentes, e o dever de descoberta da verdade material e realização da justiça no caso concreto, ainda que, como refere Figueiredo Dias, “deve ter-se presente que o princípio da investigação que integra e completa o princípio do contraditório não tem por missão essencial suprir as deficiências dos representantes das «partes», sob pena de se transformar o processo de contraditório em inquisitório.” 6. Com a comunicação de alteração de factos ao ora Recorrente não está, pois, em causa, a consequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efectivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efectivo das garantias de defesa consagradas no art.° 32º da CRP. Até porque a alteração em questão, de um local determinado para um não concretamente apurado numa zona algo vaga, configura, em boa verdade, uma nova acusação que, como tal, implica uma nova contestação, com indicação da prova que for tida por adequada, respectiva produção, enfim, um novo julgamento, o que tudo prolongaria de forma insustentável e injustificável os presentes autos. 7. O respeito pela ordem da sistematização prescrita no CPP deverá, no caso dos “mega-processos” - como sucede nos autos, em que o julgamento se prolongou por cinco anos, e em que a prova carreada pela acusação se limitou às declarações dos Assistentes, tendo estas sido concluídas mais de três anos antes do fim da discussão - deve revestir-se de acrescidos cuidados, sob pena de vir a pôr-se inapelavelmente em causa as garantias constitucionais de defesa dos arguidos. 8. Muito naturalmente, cuidou o Recorrente de organizar a sua defesa relativamente aos factos que lhe eram imputados na acusação e subsequentemente na pronúncia (não teve presente a prova de factos hipoteticamente ocorridos em local diferente, pelos quais nunca antes fora acusado). No momento presente, atento o lapso de tempo decorrido, está materialmente impossibilitado de o fazer com o mínimo de eficácia. 9. A partir do presente momento, tendo tido a acusação pública e os Assistentes cinco anos de julgamento para tentarem provar os factos constantes da pronúncia por todos os meios processualmente admissíveis, um prolongamento da discussão por mais tempo, que, com probabilidade, redundaria em anos ((...) que o Recorrente teria necessariamente que ouvir os Assistentes e muitíssimas testemunhas, entre outros meios de prova a requerer, dentro do que se revelasse de interesse e utilidade para a sua defesa), seria absolutamente insuportável e representaria uma inadmissível inutilização prática das garantias constitucionais de defesa. 10. O Recorrente foi surpreendido com a extemporaneidade injustificada da comunicação das alterações de factos, o que viola a plenitude das garantias de defesa, consagradas no art.° 32º da CRP, e o princípio do processo equitativo im(...) pelo art.° 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). 11. Quanto ao momento temporal da admissibilidade das alterações, o art.° 358.° do CPP tem que ser interpretado e aplicado em sintonia com o dis(...) nos art.°s 360.° e 361.°, dos quais resulta que, na tramitação normal, finda a produção de prova, incluindo a sequente à comunicação de alterações, se seguem as alegações orais e a estas as últimas declarações do arguido. 12. A admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literalidade legal - “no decurso da audiência”-, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa (que tem ínsita a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório) conferida pelo art.° 32.° da CRP e do processo equitativo im(...) pelo art.° 20.°, n.° 4 da CRP e pelo art.° 6.° da CEDH. 13. A violação das garantias de defesa está altamente patenteada pela conjugação da grande intempestividade da decisão com a enorme amplitude das alterações, quer no aspecto espacial quer no aspecto temporal. 14. A admissibilidade de alterações indiciárias é justificada pelo princípio da verdade material. Mas este princípio não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo art.° 18.º da CRP. 15. Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso na audiência, o que também está estatuído e de forma mais directa no art.° 6.°, n.° 3, al. a) da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. 16. É manifesto que, se algumas alterações fossem indiciadas no decurso de 5 anos de audiência de julgamento, com a sequência de fases processuais acima resumida, tal indiciação teria ocorrido muito antes do início das alegações orais, permitindo e impondo o respeito pela sequência processual dos art°s 358.°, 360.° e 361.° do CPP. 17. Mesmo considerando, sem conceder, que, como se refere na douta decisão recorrida, “face à actividade processual que tem sido e é este processo, não era possível … proceder à comunicação de alterações sem ter feito a análise global de toda a prova produzida em audiência de julgamento” (fls. 63927) e que “A comunicação deve ser feita … apenas quando após a avaliação da prova produzida, o Tribunal sente que a mesma tem determinado sentido, que tem a propriedade no processo - por ser adequada, um caminho possível e verosímil e, por isso, indiciária - de levar ao alargamento do objecto do processo” (fls 63928), a sequência da actividade processual necessária à descoberta da verdade, não pode postergar as garantias de defesa. impossibilitando-se ou limitando-se uma defesa eficaz, prejudica-se a própria descoberta da verdade e põe-se em risco a boa decisão da causa. 18. Se houvesse indiciação de alterações, ela resultaria, primordialmente, se não exclusivamente, como resulta da experiência judiciária, das declarações do assistente, as quais foram prestadas cerca de quatro anos antes das alterações comunicadas. 19. Ao fim de mais de cinco anos de julgamento, não pode deixar de se entender que tal estado de coisas briga com um processo justo e equitativo, o qual exige, como seu elemento co-natural, que acusação e defesa tenham a possibilidade efectiva de defender os seus interesses numa posição idêntica, e não numa situação substancial de desvantagem, em que o princípio da igualdade de armas se apresenta como elemento incindível daquele, como aliás tem sido sucessivamente reafirmado pelo TEDH. 20. Assim, forçoso será concluir que a (injustificada) extemporaneidade de comunicação das alterações de factos, viola a plenitude das garantias de defesa consagradas no art.° 32.º da CRP e o princípio do processo equitativo im(...) pelo art.° 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). 21. É claramente violador do direito a um processo equitativo e ao princípio da igualdade de armas comunicar a referida alteração nesta fase processual, por violação do dis(...) nos art.°s 20.º, n.° 4 e 32.°, n.°s 1, 2 e 5 e 18.°, n.°s 2 e 3 da CRP e art.° 6.°, n.° 1 e 3 al. a) da CEDH. 22. A interpretação normativa conjugada dos art.°s 358.º, n.°s 1 e art.° 1.° al. f) do C.P.P. que comporte o entendimento de que é possível, ao seu abrigo, alterar os factos do despacho de pronúncia em prazo muito para além do razoável, de forma tal que impeça o exercício efectivo dos direitos de defesa, é inconstitucional por manifestamente violadora do dis(...) nos art.°s 32.º, n.° 1, 2 e 5, 20.°, n.° 4 e 18.°, n.°s 2 e 3 da C.R.P., bem como ainda do dis(...) no art.° 6.°, n.°s 1 e 3 al. a) da CEDH, e como tal do direito a um processo justo e equitativo, inconstitucionalidade que deve ser declarada. 23. O sentido interpretativo subjacente à aplicação da norma do art.° 358.°, n.° 1 do CPP a que procedeu o Tribunal a quo ao efectuar a comunicação de alteração não substancial de factos está ferido de inconstitucionalidade, por violação do dis(...) no art.° 32.°, n.°s 1, 2, e 5 da CRP, ou seja, por violação dos princípios da máxima extensão dos direitos de defesa em processo penal (em conjugação com o art.° 18.º, n.° 3 da CRP) e da presunção de inocência, do direito a um processo leal, equitativo e célere, da estrutura acusatória do processo penal e do contraditório (entendido este na sua única conformação constitucionalmente admissível, como princípio de conteúdo material e dotado de plena eficácia). 24. Procedendo à determinação do que para o Tribunal é uma alteração substancial ou não substancial dos factos, a douta decisão recorrida refere (no que interessa quanto às alterações comunicadas ao recorrente) que, se ocorrer uma diferença de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual e que determine a imputação de crime diverso, temos uma alteração substancial dos factos. 25. E conclui que “face ao que antecede, a alteração de factos comunicada ao arguido E no Despacho de fls 63631 a 63635” ... consiste, no entendimento do Tribunal, numa alteração não substancial de factos”. 26. Contrariamente ao decidido e de acordo com o conceito determinado, as alterações comunicadas devem ser qualificadas como substanciais. 27. Para demonstrar esta qualificação, importa determinar essencialmente, o que é a imputação de um crime diverso. 28. Resulta do dis(...) no art.° 1.º, n.° 1 do CP que, em abstracto, crime é o facto descrito e declarado punível por lei. 29. A concretização processual da abstracção legal “crime” é feita de acordo com o estabelecido no art.º 283.º, n.° 3, al. b) do CPP: a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, incluindo, se possível, nomeadamente, o lugar e o tempo. 30. É tal narração que, acompanhada da indicação das disposições legais aplicáveis, constitui a imputação de um crime concreto ao arguido, imputação que o dis(...) no art.° 339.°, n.° 4 do CPP impõe que se mantenha na discussão da causa, embora “sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos”. 31. Não há facto material ou acto físico sem tempo e sem lugar. Se não for possível a determinação desses elementos do facto, o crime pode ser processualmente imputado mesmo sem a narração espacial e temporal. Mas sendo possível, a imputação processual integra a narração, “ainda que sintética” (art.° 283.°, n.° 3, al. b) do CPP), do tempo e do lugar. 32. Feita a determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologicamente mas também quanto à sua cognição, pois o facto criminoso não é uma abstracção parcelada, é um facto concreto e unitário, “uma realidade unitária e não uma justaposição ou soma de elementos autónomos”. 33. As circunstâncias de tempo, lugar e modo não são pois um elemento acessório, mas antes um elemento integrante dos factos objecto da acusação, pelo que, alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado, verifica-se a imputação de um crime diverso, não é mantida a imputação do MESMO crime. 34. E a nova indiciação de um crime em concreto diverso não é confundível com a indiciação de um diverso tipo legal de crime, a qual, sem alteração da narração factual, incluindo o lugar e o tempo, constitui alteração da qualificação jurídica dos factos, que não está em causa na douta decisão recorrida e que está regulada no n.° 3 do art.° 358.° do CPP. 35. Só se a nova indiciação não alterar o núcleo factual narrado na imputação, limitando-se a explicitar ou esclarecer a narração, ainda que sintética, dos factos, incluindo o lugar e o tempo, mantém-se a imputação do MESMO crime, com alteração. não substancial dos factos. 36. Como geralmente admitido, os limites à identidade do crime, na qualificação duma alteração, terão que ser “a total garantia dos direitos de defesa do arguido e a prossecução da justiça e da verdade material”, pelo que, “sempre que essa alteração … ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos”. 37. O imputado crime de abuso sexual, indiciado na pronúncia como ocorrido “na casa do arguido K, sita na Rua (…), n.° (…), (…), (…)”, passou a estar indiciado com alargamento a todos a todas as moradias localizadas no (…), em (…), “no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e Rua (…) e na zona dessas ruas”, abrangendo dezenas, senão mesmo centenas de moradias. 38. Ocorre nesta alteração uma diferença de espaço, que transforma o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, manifestamente diferente no que se refere aos seus elementos relevantes de construção e identificação factual e que determina a imputação de crime diverso e num lapso de tempo demasiado amplo. 39. A alteração de factos consistente na passagem do local determinado para local indeterminado dentro de uma dada zona, traduzindo-se em inovação do quadro fáctico da pronúncia, não configura uma alteração não substancial dos factos, mas antes uma alteração substancial, ao abrigo do dis(...) no art. 359.º do CPP, por redundar num crime diverso. 40. As alterações referidas no despacho ora recorrido, ao virem substituir os factos da pronúncia por factos novos, que transformam o quadro factual descrito noutro manifestamente diferente no que respeita aos seus elementos integrantes, constituem verdadeiras alterações substanciais de factos, enquadráveis no regime previsto no art. 359.º do CPP, e não do art. 358.º, pois delas resulta a imputação de um facto diverso - cfr. o art. 1.º, al. f) do CPP. Das alterações decididas resulta, não a mera especificação dos factos descritos na pronúncia, mas uma inovação do quadro fáctico relativo às circunstâncias de lugar, com imputação de um crime diverso. 41. Uma alteração de factos correspondente à mudança do local do crime de um lugar determinado para um indeterminado, na zona, consistindo em inovação do quadro fáctico da pronúncia, não configura uma alteração não substancial dos factos, mas antes uma alteração substancial, ao abrigo do dis(...) no art. 359°. do CPP. 42. Só as alterações temporais e espaciais que não invadirem o núcleo do tempo e do lugar dos crimes imputados, devem, em princípio ser qualificadas como não substanciais, o que, como demonstrado, não se verifica quanto às alterações em causa. 43. Também considerando as garantias de defesa, esta substituição de indiciação constitui alteração substancial dos factos. O recorrente preparou há cinco anos a sua defesa relativamente a um imputado crime num prédio e num tempo determinados. Não respeita de modo algum as suas garantias de defesa, ser restringido, decorridos cinco, anos à possibilidade duma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que teria acesso em 2004. 44. Face ao ex(...), a decisão recorrida é inválida, desta feita por violação do dis(...) nos artigos 358.°, n.° 1, 359.° e 1.° al. f) do CPP. 45. Ao considerar que as alterações comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar e ou do tempo dos crimes imputados, são não substanciais, a douta decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, os art°s 1.°, al. f) e 358.° do CPP, disposições que, nessa interpretação normativa são inconstitucionais, por violarem as garantias de defesa conferidas pelo art° 32.° da CRP, inconstitucionalidade que desde já se suscita e se pretende seja declarada. Nestes termos e sobretudo pelo que doutamente será suprido deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogado o despacgho recorrido, julgando-se procedente a arguição de irregularidades, como é de JUSTIÇA!” O Magistrado do Ministério Público na 1ª instância apresentou resposta a esses recursos, concluindo (em transcrição) que: “Do que já vem de dizer-se, resulta implícito que as questões suscitadas e os argumentos invocados nos Recursos a que ora cumpre responder, inter(...)s pelas Defesas dos Arguidos E e K, sejam a(o)s mesma(o)s - com excepção da pretensa irregularidade decorrente de uma suposta falta de fundamentação do Despacho que, ao abrigo do art° 358°, do CPP, comunicou alterações não substanciais de alguns dos factos descritos no Despacho de Pronúncia - que o foram no âmbito dos Recursos que ambos os Arguidos interpuseram do Despacho proferido em 23.11.2009, razão pela qual a presente Resposta seguirá, de perto, a Resposta então produzida a propósito de tais Recursos. Os modelos penal e processual penal vigentes acolhem, a um tempo, um conceito normativo e naturalístico de facto. No conceito normativo, o facto reportar-se-á ao núcleo essencial e determinante da caracterização de um conjunto de comportamentos reais e concretos, os quais, configurando e dando corpo à norma, são por esta, conceptual e selectivamente acolhidos, por forma a legitimarem a aplicação de uma pena ou de uma medida de segurança. Por sua vez, uma concepção puramente naturalística, acolhendo, embora, aquele núcleo decisivo, diverge na sua caracterização, exigindo, antes, a concepção do facto como evento alargado, isto é, enfatizando a natureza do facto como “existência histórica”, em detrimento, embora sem abstrair, da sua conceptualização normativa. Daí, algumas das dificuldades que se colocam, quando da caracterização do que deva ter-se por “facto”, para efeitos do dis(...), quer no art° 358°, quer no art° 359º, do CPP. A ultrapassagem de tais escolhos há-de fazer-se, antes do mais, pela delimitação do que seja o objecto do processo e, com ele, a vinculação temática a que o Tribunal está sujeito. Como refere Frederico Isasca, “A definição e delimitação do objecto do processo é a charneira entre o interesse público na perseguição do crime e na aplicação do direito, ou seja, na pronta reposição dos valores de que o arguido é acusado de ter violado com um certo comportamento que se lhe imputa e os direitos inalienáveis que lhe assistem e que passam necessariamente pela possibilidade de uma defesa eficaz”. De acordo com o art° 339°, n° 4, do CPP, “Sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos, a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.° e 369°.” - (destaque e sublinhado nossos). Por sua vez, dispõe o n° 3, do art° 283°, do CPP, que: “A acusação contém, sob pena de nulidade: a) As indicações tendentes à identificação do arguido; b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; c) A indicação das disposições legais aplicáveis; d) O rol com o máximo de 20 testemunhas, com a respectiva identificação, discriminando-se as que só devam depor sobre os aspectos referidos no n.° 2 do artigo 128.°, as quais não podem exceder o número de cinco; e) A indicação dos peritos e consultores técnicos a serem ouvidos em julgamento, com a respectiva identificação; f) A indicação de outras provas a produzir ou a requerer; g) A data e assinatura”. (destaque e sublinhado nossos). Da conjugação dos respectivos enunciados, com os princípios a que vem de se aludir, resulta claro que, nos requisitos a que o M°P° haverá de ater-se, na estruturação de uma peça acusatória, se acolheu um conceito normativo de facto, traduzido este na exigência de “narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”, mas já não, da obrigatoriedade de menção, de entre outras, das circunstâncias de tempo e de lugar, ainda que “relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada”, as quais deverão ser mencionadas, tão só, “se possível”. Por outro lado, a vinculação temática, típica de uma estrutura acusatória do processo, comporta excepções, coerentemente decorrentes do facto de, tal estrutura, ser mitigada por um princípio de investigação, o qual, de igual sorte, se impõe ao Tribunal. Daí que, constituindo-se a Acusação como elemento nuclear da delimitação do objecto do processo, este não se esgote naquela, antes lhe sendo adjacentes, como verdadeiros elementos estruturantes, quer os factos relevantes invocados pelas Defesas, quer os que, de igual modo relevantes, resultem da discussão da causa. Se assim é, com correspondente ênfase hão-de colocar-se as garantias de defesa, sobretudo, aquelas que, necessariamente, decorram, da mutabilidade que, ao longo do iter processual, maxime, do julgamento, seja imposta - para o que ora nos importa, de forma não substancial - à versão que, originariamente (Acusação ou Pronúncia), constituía o acervo factual de que o arguido cumpriria defender-se. É deste contexto que emerge o dis(...) nos art°s. 358° e 359°, do CPP, verdadeiro corolário do compromisso regulador entre a natureza acusatória, os princípios da investigação, da identidade e da vinculação temática, as alterações ao objecto do processo e as garantias de defesa. Numa e noutra, dessas normas, se salvaguarda a preservação da matriz que, sob pena de descaracterização, deve permanecer imutável na definição do objecto do processo, sem prejuízo das alterações que se imponham e justifiquem na demanda da verdade material, sujeitas, não obstante, a uma disciplina que não ponha em causa a amplitude dos direitos de defesa do arguido. No que aos Arguidos E e K diz respeito, o Tribunal, invocando, para tanto, o dis(...) no art° 358° n°s. 1 e 2, ou os n°s. 1, 2 e 3, do CPP, comunicou “poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos ….“, sete alterações, sendo seis, relativas ao Arguido E (correspondendo a, tão só, três situações distintas) e, uma, ao Arguido K, todas relativas a períodos temporais, ou a locais, referidos no Despacho de Pronúncia. Como se viu e, crê-se, ter ficado demonstrado, a alteração de data, ou lugar, da prática de um crime, não é elemento essencial, de entre os que, como tal, são reputados pelo dis(...) no art° 283°, do CPP. Ainda que o fosse, não estaria o Tribunal impedido de, com recurso ao mecanismo previsto no art° 358°, do CPP, comunicar as alterações que entendesse decorrerem da discussão da causa, (...) que tal não implicasse modificação de factos que tivesse “por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”, caso em que, porque configurada uma alteração substancial, haveria que desencadear-se a disciplina prevista no art° 359°. Tratou-se, assim, de alterações meramente circunstanciais, que em nada afectaram o núcleo essencial dos ilícitos que vinham imputados. De tudo o que vem de dizer-se, resulta, a nosso ver, uma objecção global às reservas colocadas pelos Arguidos ao Despacho, relativamente a pretensas desconformidades de interpretação normativa (maxime, do art° 358°, do CPP), nele contidas, com o texto constitucional. Ver-se-á como, tão pouco, lhes assiste razão nas especificidades violadoras que imputam ao referido Despacho. Alegam as Defesas dos Arguidos E e K a ilegalidade do Despacho recorrido por pretensa extemporaneidade de prolação. O que decorre do dis(...) no art° 358°, do CPP, é que a verificação da alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia ocorra no decurso da audiência. Ao consignar, no Despacho, que as alterações se lhe suscitaram, em face da prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal dá conta, de forma insofismável, que foi no decurso daquela que se produziu a convicção indiciária que culminou com a comunicação das alterações. Mais alegam que, na sistemática do CPP, porque o art° 358° precede as normas que contemplam, quer as Alegações Orais, quer as últimas declarações dos Arguidos (art°s. 360º e 361°), a comunicação das alterações deveria preceder, igualmente, umas e outras. A tese assim expendida, além do mais, menoriza, subestimando-as, quer as Alegações, quer as últimas declarações dos Arguidos. A umas e outras há-de reconhecer-se a virtualidade de convencerem o Tribunal, em função dos argumentos, e razões que, nelas, sejam produzidas, não sendo de excluir a possibilidade de levarem a produção suplementar de prova (possibilidade, essa, que, embora a título excepcional, está plasmada no n° 4, do art° 360º, do CPP e que, como é sabido, teve aplicação no decurso das Alegações produzidas neste processo). Aliás, parece olvidar-se que, na própria sessão de 23.11.2009, antes mesmo de proceder à comunicação das alterações, o Tribunal produziu prova, tendo “em atenção a Jurisprudência do acórdão para Fixação de Jurisprudência, proferido pelo S. T.J. em 28/10/2008, quanto à interpretação do art° 328°, n° 6, do C.P.Penal” procedendo “à abertura e análise, na presente audiência, dos documentos de fls. 50.762 a 50.765 dos autos, os quais poderão ser relevantes, de forma mais directa, para a defesa dos arguidos A e C”. Porque assim é, nada obsta a que a comunicação, nos termos do art° 358°, tenha ocorrido no momento em que ocorreu, antes se compreendendo que assim seja e, não, no próprio decurso da audiência, sob pena de a dinâmica da produção de prova poder levar a alterações de alterações. Será, a todos os títulos, mais racional, que a comunicação ocorra no termo, ou no dealbar, da produção de prova, pressupondo que, para que assim seja, se tenha já iniciado o processo deliberativo, no âmbito do qual a necessidade daquelas se suscite. A Jurisprudência que lográmos recolher, sobre esta matéria, é, aliás, pacífica e constante. A mero título de exemplo: - o Ac. do TC n° 387/2005, de 13.7.2005, considerou que “não se vê que a circunstância de a alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia ser comunicada ao arguido após deliberação dos juízes que compõem o tribunal colectivo que julga a causa em 1ª instância, dando-lhe ao mesmo tempo prazo para a sua defesa, nomeadamente, para os poder contestar e oferecer prova a produzir na mesma audiência, ofenda os princípios constitucionais do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa, quando a deliberação sobre tais factos novos e sobre todos os demais é assumida pelo tribunal como uma posição provisória sobre o julgamento da matéria de facto. Sendo o julgamento da matéria de facto da competência de um órgão colegial, qualquer posição do tribunal sobre se ocorrem factos novos susceptíveis de serem tidos como uma alteração não substancial de factos apenas é possível ser tomada se se efectuar deliberação que constate a existência dos indícios desses factos e decida ordenar a sua investigação. A existência de uma tal deliberação surge como necessidade imposta pela natureza colegial do tribunal que tem de formar a decisão: esta em vez de corresponder à vontade funcional de uma só pessoa que não precisa para a formar de conferenciar com outrem, como acontece no juiz singular, é a resultante da vontade funcional dos vários juízes. Numa tal perspectiva - e reproduzindo asserções do acórdão recorrido - “é irrelevante que a essa comunicação se chame leitura de acórdão ou que se designe a mesma por qualquer outra expressão”. - Por seu lado, o Ac. do STJ, de 11.12.1998, postula que “Se é certo que, pelas vantagens da concentração da fase de produção da prova e das alegações quanto aos factos e à sua integração jurídica e, ainda, por razões de economia e celeridade processual, é desejável que a verificação da alteração não substancial dos factos e a sua comunicação ao arguido, nos termos do artigo 358, do CPP, ocorra antes do encerramento da discussão (cfr. artigo 361, n. 2, do CPP), não é menos certo que as evidentes razões de justiça material e de economia processual que estão na base da previsão do citado artigo 358 apontam para que tal verificação possa ainda ter lugar - sem risco de irregularidade - quando o tribunal já está reunido para decidir sobre a matéria de facto, desde que seja possível assegurar o respeito pelo incontornável princípio do contraditório”. - Ainda do STJ, o Ac. de 26.5.2004, dispõe que “A expressão “no decurso da audiência”, usado no art° 358°, n° 1, do CPP, não significa que a alteração tenha que ser notada e comunicada até ao fim da discussão da causa, uma vez que a audiência só é encerrada depois de publicada a sentença, razão porque o tribunal não comete qualquer nulidade ao dar cumprimento ao dis(...) naquele artigo já depois de produzidas as alegações orais finais.” - No mesmo sentido, o Ac. do STJ, de 16.6.2005, ao consignar que “A observância do dis(...) nos artigos 358.° e 359.° não tem tempo específico e preciso para ter lugar. Como resulta da lei e do seu escopo, o que importa salvaguardar é que, no decurso da audiência, seja o arguido colocado perante a possibilidade de o tribunal levar avante uma alteração, substancial ou não, dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, com o evidente objectivo de lhe assegurar todos os direitos de defesa também quanto à alteração anunciada. Mas tendo em conta o objectivo da lei - que ao arguido seja proporcionada oportunidade de se defender, em plenitude, dessa alteração de factos - aquele decurso da audiência só termina com a prolação da decisão”. - Por fim, o Ac. do TRP, de 20.10.2004, sumaria que “O mecanismo processual previsto no artigo 358 n. 1 do Código de Processo Penal de 1998 pode ser accionado até à publicação da sentença”. A Defesa de E considera, ainda, ilegal, o Despacho recorrido, uma vez que as alterações comunicadas pelo Despacho integram, não alterações não substanciais - como foi considerado -, mas, verdadeiras alterações substanciais. Já no âmbito do que ora se subscreve tivemos oportunidade de salientar que, ao contrário do sustentado pela Defesa de E, as circunstâncias de tempo e de lugar não têm, em princípio, a virtualidade de alterar o tipo de crime, só tal podendo suceder quando, por exemplo, a idade da vítima constitui elemento do tipo. Todas as alterações comunicadas ao, e relacionadas com, o Arguido E, dizem respeito a alterações de tempo e de lugar, as quais, como já referido, nem sequer são elementos decisivos na estruturação da Acusação, apenas desta devendo constar, “se possível” (cfr. art° 283°, n° 3, b), do CPP). Assim, porque as alterações em causa não tiveram por efeito a imputação ao arguido de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis (cfr. art° 1°, f), do CPP), não poderão elas ser reputadas senão como alterações não substanciais. Por fim, consigna-se que, de tudo o que vem de expor-se, poderá concluir-se que, para o M°P°, a interpretação que subjaz ao Despacho proferido ao abrigo do art° 358°, do CPP, é absolutamente conforme à CRP, designadamente às normas invocadas - art° 6°, da CEDH, com referência aos art°s. 8° e 16°, e, ainda, art°s. 18°, 20º, n°4 e 32°, n°s. 1, 2 e 5, da CRP. O Tribunal Constitucional já, por várias vezes, se pronunciou pela conformidade do art° 358°, do CPP, com a Lei Fundamental, interpretado em diversas perspectivas e dimensões, mas sendo constante e transversal o entendimento segundo o qual, a referida norma, assegura, plenamente, as garantias de defesa, a estrutura essencialmente acusatória do processo, e o direito a um julgamento justo e equitativo. Acresce que, ao longo da abordagem que acaba de produzir, o M°P° foi deixando expressas, embora de forma, porventura, esparsa, as razões pelas quais entende que as garantias de defesa, constitucionalmente tuteladas, não sofreram qualquer compressão, designadamente, porque a própria norma cuja aplicação suscitou a invocação de desconformidade constitucional, consagra o direito de as Defesas reorganizarem as suas estratégias, indicando, ou requerendo, novos elementos de prova. Aliás, o Tribunal concedeu, para o efeito, o prazo requerido. Dando-se, assim, por reiterada, toda a argumentação aduzida, da qual resulta a posição do M°P° quanto à correcta leitura constitucional que o Tribunal fez, ao proferir o Despacho que proferiu, ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP, promove-se o indeferimento das alegadas inconstitucionalidades. Todavia, porque também aqui invocado, permitimo-nos tecer umas breves considerações complementares, no que diz respeito à alegada violação do art° 6°, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), por descaracterização do processo, enquanto processo equitativo e decidido em tempo útil. No que à exigência de um processo equitativo se alega - em bom rigor, de uma mera invocação se trata -, pouco haverá a considerar, (...) que não se concretizam quaisquer factos que configurem a violação do princípio da equidade. À comunicação de eventual alteração, seja de novos factos, seja de qualificação jurídica, operadas, uma e outra, ao abrigo do art° 358°, do CPP, corresponde adequada e proporcional possibilidade de defesa, por parte dos Arguidos, não se alcançando, por isso, em que se possa traduzir a violação, não só, de tal princípio, como do que lhe é correlativo, o princípio da igualdade das armas. Note-se, aliás, que quando as alterações comunicadas o são por iniciativa do Tribunal, ou, não correspondem às que, porventura, tenham sido requeridas pelas Acusações, a estas não é reconhecida qualquer possibilidade para reorganização das respectivas estratégias processuais, ao contrário do que sucede com as defesas dos Arguidos. Nomeadamente, não é facultado, às Acusações, a faculdade de, em tais circunstâncias, requerer, apenas por força da comunicação das alterações, produção de prova suplementar. Daí que não se tenha por, minimamente, beliscado, o princípio da equidade do processo. Já quanto ao princípio que impõe o julgamento da causa em tempo razoável - cfr. art° 6°, n° 1 , da CEDH -, cumprirá, desde logo, salientar, que, ao contrário do que, não poucas vezes, se invoca, ele não consagra direitos exclusivos dos arguidos, acolhendo, antes, direitos extensivos aos que, no âmbito das causas sujeitas a Juízo, aí lutam pelos seus interesses. Por outro lado, são múltiplos os instrumentos internacionais que tutelam, especificamente, os interesses das Vítimas. A título de exemplo, refiram-se a Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1989/57 do Conselho Económico e Social, relativo à Aplicação da Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1990/22 do mesmo Conselho, relativo às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder. Sem olvidar, naturalmente, inúmeros outros instrumentos em que são salvaguardados os direitos das crianças, (...) que, o que em causa está neste processo, reportado à data dos factos, diz respeito a crianças e a jovens sexualmente abusados. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sempre que chamado a pronunciar-se sobre as violações ao art° 6°, da CEDH, tem produzido Jurisprudência que, reiterada, tabelar e literalmente, enuncia o princípio, segundo o qual, o Tribunal, nesta matéria, leva em conta, segundo as circunstâncias, nomeadamente, a complexidade da causa, bem como o comportamento dos intervenientes e das autoridades judiciárias. O tempo dirá em que medida cada um dos intervenientes contribuiu para que o julgamento ainda perdure. Por outro lado, o Tribunal não deixa de salientar (“Affaire Pélissier et Sassi c. France”, Requête n° 25444/94, Arrêt 25.1 0.1 999), “a este respeito, que o art° 6°, n° 1 da Convenção, obriga os Estados contratantes a organizar o seu sistema judiciário de tal sorte que os tribunais possam satisfazer o que lhes é exigível, nomeadamente, a obrigação de resolver as causas dentro de prazos razoáveis, consignando, ainda, que, por vezes, o processo apresenta atrasos excessivos, que são imputáveis às autoridades nacionais. A avaliação das responsabilidades na perdurabilidade de um julgamento pressupõe uma avaliação global, a qual tenha em conta o número de intervenientes (arguidos, vítimas e lesados), a dificuldade e a quantidade das provas, a indefinição ou sucessão das leis, a quantidade de incidentes, incluindo recusas de juízes, de requerimentos, recursos, arguições de nulidades e irregularidades, etc., etc. Que os Arguidos se queiram investir no papel de únicas, ou principais, vítimas da duração do julgamento, desresponsabilizando-se do seu próprio contributo (bastando, para tanto, recordar o que foram as instâncias dirigidas aos Assistentes), compreende-se, tão só, na medida em que, dessa forma, não estarão impedidos de invocar, como invocam, em uníssono, a violação do art° 6°, da CEDH. Para o M°P°, a conclusão, segundo a qual, o art° 6°, da CEDH, deve, desde já, ter-se por violado, é absolutamente prematura. Se e quando o TEDH for chamado a pronunciar-se, com a autoridade que lhe é reconhecida, e de acordo com os critérios que vêm constituindo a sua Doutrina, saber-se-á, então, de forma desapaixonada, se tal norma foi, ou não violada. (…) Por todo o ex(...), entende-se ser de negar provimento aos Recursos dos Arguidos E e K, confirmando-se o Despacho recorrido, nos seus precisos termos”. O arguido C, notificado da interposição de recursos pelos arguidos E e K e das respectivas motivações, veio aderir aos fundamentos de ambos (cf. fls. 65041). O recurso do arguido E foi admitido por despacho de fls. 65292 dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse no mencionado recurso interlocutório por si inter(...) (cf. fls. 69565). O recurso do arguido K foi admitido por despacho de fls. 65049 a 65052 dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse neste concreto recurso interlocutório (cf. fls. 68878 a 68879 – alínea h) das conclusões do recurso inter(...) pelo arguido do acórdão final). Mais se consigna que este particular recurso se encontra instruído por apenso a que foi atribuída a designação ZB. Na sessão de julgamento ocorrida em 11 de Janeiro de 2010, o tribunal proferiu despacho pronunciando-se sobre as irregularidades/nulidades arguidas pelos arguidos H, C, K, E, N e Q – cf. fls. 64055 a fls. 64093 – e considerando tempestivas as alterações de factos comunicadas, assim como julgou procedente a arguição de irregularidade subsidiariamente suscitada, quanto à insuficiência de fundamentação do despacho de fls. 63685 a 63687, reparando-a, com nova comunicação aos arguidos de alterações de facto nos termos do art. 358.º do CPP – cf. fls. 64093 a 64107. Inconformado com aquele despacho, dele recorreu o arguido C, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1ª - A audiência de discussão e julgamento teve início em Novembro de 2004, tendo o Assistente AP começado a prestar declarações em 20 de Junho de 2005 e terminado em 22 de Julho do mesmo ano. As alegações orais terminaram em Fevereiro de 2009, com sessões mensais desde então para “produção de prova complementar” - o que, na prática, redundou em visionamento de dvd’s e na abertura de documentos já juntos aos autos para cumprimento dos trinta dias sem sessões - vindo o Tribunal, após breves alegações complementares e as últimas declarações dos Arguidos, comunicar a alguns destes a alteração dos factos, na sessão de 23 de Novembro de 2009, prometendo “eventualmente” outras para depois, o que veio a acontecer em sessões seguintes, ficando as últimas “eventuais” alterações para data a anunciar. 2ª - A descrição factual constante da pronúncia, dos crimes alegadamente perpetrados pelo ora Recorrente sobre o Assistente AP, não pode deixar de corresponder a uma das muitas versões apresentadas pelo Assistente nas diversas vezes em que prestou declarações no processo, ou à conjugação de várias delas, na forma vertida na acusação pública e, no essencial, reproduzida na pronúncia. E essa versão não corresponde, mais uma vez, às dadas em audiência de julga mento. 3ª - O Tribunal a quo veio apenas desde o final de Novembro de 2009 comunicar alterações de factos, quase um ano depois das alegações finais, réplica e resposta das defesas estarem concluídas, e quatro anos e meio depois do fim das declarações do Assistente. 4ª - O Arguido tem presente que, literalmente, a iniciativa de alteração dos factos prevista nos art.°s 358.° e 359.° do CPP pode ter lugar, a requerimento de qualquer um dos sujeitos processuais, ou oficiosamente, até ao final da discussão da causa. Contudo, a interpretação da oportunidade da convocação do instituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal - “se no decurso da audiência” -, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do sistema processual penal e constitucional, numa compaginação dos direitos de defesa e respectivas garantias e o dever de perseguir a verdade material. 5ª - Há um confronto, não necessariamente antagónico e dissonante, entre os direitos dos Arguidos, e também dos Assistentes, e o dever de descoberta da verdade material e realização da justiça no caso concreto, ainda que “…deve ter-se presente que o princípio da investigação que integra e completa o princípio do contraditório não tem por missão essencial suprir as deficiências dos representantes das «partes», sob pena de se transformar o processo de contraditório em inquisitório”. 6ª - Com a comunicação de alteração de factos ao ora Recorrente não está, pois, em causa, a consequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efectivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efectivo das garantias de defesa consagradas no art.° 32.° da CRP. 7ª - Até porque a alteração em questão, de um período determinado para um alargado em 365 dias, configura, em boa verdade, uma nova acusação que, como tal, implica uma nova contestação, com indicação da prova que for tida por adequada e respectiva produção. 8ª - O respeito pela ordem da sistematização prescrita no CPP deverá, no caso dos “mega-processos” - como sucede nos autos, em que o julgamento se prolongou por mais de cinco anos e em que a prova carreada pela acusação se limitou às declarações dos Assistentes, tendo estas sido concluídas mais de três anos antes do fim da discussão - revestir-se de acrescidos cuidados, sob pena de vir a pôr-se inapelavelmente em causa as garantias constitucionais de defesa dos Arguidos. 9ª - Se o ora Recorrente já havia tido dificuldade na obtenção dos meios de prova necessários à sua defesa, afigurar-se-á materialmente impossível que consiga, hoje, obter meios de prova relativos a factos respeitantes aos anos de 1997 e 1998 (registos documentais sobre a localização celular, registos de movimentos bancários, registos de passagem na via verde, etc., com 12 e 13 anos!). Muito naturalmente, cuidou o Recorrente de organizar a sua defesa relativamente aos factos que lhe eram imputados na acusação e subsequentemente na pronúncia (não teve presente a prova de factos hipoteticamente ocorridos em tempo diferente, pelos quais nunca antes fora acusado). No momento presente, atento o lapso de tempo decorrido, está materialmente impossibilitado de o fazer com o mínimo de eficácia. 10ª - A partir do presente momento, tendo tido a acusação pública e os Assistentes cinco anos de julgamento para tentarem provar os factos constantes da pronúncia por todos os meios processualmente admissíveis, um prolongamento da discussão por mais tempo, que, com probabilidade, redundaria em anos ((...) que o Recorrente teria necessariamente que ouvir os Assistentes e muitíssimas testemunhas, entre outros meios de prova a requerer, dentro do que se revelasse de interesse e utilidade para a sua defesa), seria absolutamente insuportável e representaria uma inadmissível inutilização prática das garantias constitucionais de defesa. 11ª - O Recorrente foi surpreendido com a extemporaneidade injustificada da comunicação das alterações de factos, o que viola a plenitude das garantias de defesa, consagradas no art.° 32° da CRP, e o princípio do processo equitativo im(...) pelo art.° 6.° da CEDH. 12ª - Quanto ao momento temporal da admissibilidade das alterações, o art.° 358.° do CPP tem que ser interpretado e aplicado em sintonia com o dis(...) nos art.°s 360.° e 361 .°, dos quais resulta que, na tramitação normal, finda a produção de prova, incluindo a sequente à comunicação de alterações, se seguem as alegações orais e a estas as últimas declarações do Arguido. 13ª - A admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literalidade legal - “no decurso da audiência”-, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa (que tem ínsita a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório) conferida pelo art.° 32.° da CRP e do processo equitativo im(...) pelo art.° 20.°, n.° 4 da CRP e pelo art.° 6.° da CEDH. l4ª A violação das garantias de defesa está evidenciada pela conjugação da extemporaneidade da decisão com a amplitude temporal das alterações preconizadas. A admissibilidade de alterações indiciárias é justificada pelo princípio da verdade material. Mas este princípio não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo art° 18.° da CRP. 15ª - Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso na audiência, o que também está estatuído e de forma mais directa no art.° 6.°, n.° 3, al. a) da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. 16ª - É manifesto que, se algumas alterações fossem indiciadas no decurso de cinco anos de audiência de julgamento, com a sequência de fases processuais acima resumida, tal indiciação teria ocorrido muito antes do início das alegações orais, permitindo e impondo o respeito pela sequência processual dos art°s 358.°, 360.° e 361 .° do CPP. 17ª - Mesmo considerando, sem conceder, que, como se refere na douta decisão recorrida, “face à actividade processual que tem sido e é este processo, não era possível (…) proceder à comunicação de alterações sem ter feito a análise global de toda a prova produzida em audiência de julgamento” (fls. 63.927) e que “A comunicação deve ser feita (...) apenas quando, após a avaliação da prova produzida, o Tribunal sente que a mesma tem determinado sentido, que tem a propriedade no processo - por ser adequada, um caminho possível e verosímil e, por isso, indiciária - de levar ao alargamento do objecto do processo” (fls. 63.928), a sequência da actividade processual necessária à descoberta da verdade não pode postergar as garantias de defesa. Impossibilitando-se ou limitando-se uma defesa eficaz, prejudica-se a própria descoberta da verdade e põe-se em risco a boa decisão da causa. 18ª - Ao fim de mais de cinco anos de julgamento, não pode deixar de se entender que tal estado de coisas briga com um processo justo e equitativo, o qual exige, como seu elemento co-natural, que acusação e defesa tenham a possibilidade efectiva de defender os seus interesses numa posição idêntica, e não numa situação substancial de desvantagem, em que o princípio da igualdade de armas se apresenta como elemento incindível daquele, como aliás tem sido sucessivamente reafirmado pelo TEDH. 19ª - Assim, forçoso será concluir que a (injustificada) extemporaneidade da comunicação das alterações de factos viola a plenitude das garantias de defesa consagradas no art.° 32.° da CRP e o princípio do processo equitativo im(...) pelo art.° 6° da CEDH. 20ª - É claramente violador do direito a um processo equitativo e do princípio da igualdade de armas comunicar a referida alteração nesta fase processual, por violação do dis(...) nos art.°s 20.°, n.° 4 e 32.°, n.°s 1, 2 e 5 e 18.°, n.°s 2 e 3 da CRP e art.° 6.°, n.° 1 e 3 al. a) da CEDH. 21ª - A interpretação normativa conjugada dos art.°s 358.°, n.°s 1 e 1.° al. f) do CPP que comporte o entendimento de que é possível, ao seu abrigo, alterar os factos do despacho de pronúncia em prazo muito para além do razoável, de forma tal que impeça o exercício efectivo dos direitos de defesa, é inconstitucional por manifestamente violadora do dis(...) nos art.°s 32.°, n.° 1, 2 e 5, 20.°, n.° 4 e 18.°, n.°s 2 e 3 da CRP, bem como ainda do dis(...) no art.° 6.°, n.°s 1 e 3 al. a) da CEDH, e como tal do direito a um processo justo e equitativo, inconstitucionalidade que deve ser declarada. 22ª - Definindo o entendimento do que para o Tribunal é uma alteração substancial ou não substancial dos factos, a douta decisão recorrida refere (no que interessa quanto às alterações comunicadas ao Recorrente) que, se ocorrer uma diferença de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual e que determine a imputação de crime diverso, temos uma alteração substancial dos factos. Mas foi uma alteração não substancial aquela que comunicou ao ora Recorrente (fls. 64.107, ponto V). 23ª - Contrariamente ao decidido e de acordo com o conceito determinado, as alterações comunicadas devem ser qualificadas como substanciais. Para demonstrar esta qualificação, importa determinar essencialmente, o que é a imputação de um crime diverso. Resulta do dis(...) no art.° 1.°, n.° 1 do CP que, em abstracto, crime é o facto descrito e declarado punível por lei. A concretização processual da abstracção legal “crime” é feita de acordo com o estabelecido no art.° 283.°, n.° 3, al. b) do CPP: a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao Arguido de uma pena ou medida de segurança, incluindo, se possível, nomeadamente, o lugar e o tempo. É tal narração que, acompanhada da indicação das disposições legais aplicáveis, constitui a imputação de um crime concreto ao Arguido, imputação que o dis(...) no art.° 339.°, n.° 4 do CPP impõe que se mantenha na discussão da causa, embora “sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos”. 24ª - Não há facto material ou acto fisico sem tempo e sem lugar. Se não for possível a determinação desses elementos do facto, o crime pode ser processualmente imputado mesmo sem a narração espacial e temporal. Mas, sendo possível, a imputação processual integra a narração, “ainda que sintética” (art.° 283.°, n.° 3, al. b) do CPP), do tempo e do lugar. Feita a determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologicamente mas também quanto à sua cognição, pois o facto criminoso não é uma abstracção parcelada, é um facto concreto e unitário. “[O] acto criminoso é uma realidade unitária e não uma justaposição ou soma de elementos autónomos”, “pelo que o tempo e o lugar concretamente determinados são parte integrante do mesmo”. 25ª - As circunstâncias de tempo, lugar e modo não são pois um elemento acessório, mas antes um elemento integrante dos factos objecto da acusação, pelo que, alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado, verifica-se a imputação de um crime diverso, não sendo mantida a imputação do mesmo crime. 26ª - E a nova indiciação de um crime em concreto diverso não é confundível com a indiciação de um diverso tipo legal de crime, a qual, sem alteração da narração factual, incluindo o lugar e o tempo, constitui alteração da qualificação jurídica dos factos, que não está em causa na douta decisão recorrida e que está regulada no n.° 3 do art.° 358.° do CPP. 27ª - Como geralmente admitido, os limites à identidade do crime, na qualifica- ção de uma alteração, terão que ser “a total garantia dos direitos de defesa do Arguido e a prossecução da justiça e da verdade material”, pelo que, “sempre que essa alteração (…) ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos.”. 28ª - As alterações referidas no despacho ora recorrido, ao virem substituir os factos da pronúncia por factos novos, que transformam o quadro factual descrito noutro manifestamente diferente no que respeita aos seus elementos integrantes, constituem verdadeiras alterações substanciais de factos, enquadráveis no regime previsto no art. 359° do CPP, e não do art. 358°, pois delas resulta a imputação de um crime diverso - cfr. o art.1º, al. f) do CPP. 29ª - Das alterações decididas resulta, não a mera especificação dos factos descritos na pronúncia, mas uma inovação do quadro fáctico relativo às circunstâncias de tempo, com imputação de um crime diverso. Só as alterações temporais e espaciais que não invadirem o núcleo do tempo e do lugar dos crimes imputados devem, em princípio, ser qualificadas como não substanciais, o que, como demonstrado, não se verifica quanto às alterações em causa. 30ª - A factualidade descrita na pronúncia consiste num crime perpetrado sobre o Assistente quando este teria 14 anos, entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, passando-se, com a comunicação da alteração, para o período entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, ampliando-se num ano - logo, 365 dias de novas datas possíveis para a perpetração dos factos, datas em que tinha ainda 13 anos de idade e frequentava um ano lectivo diferente. 31ª - Também considerando as garantias de defesa, esta substituição de indiciação constitui alteração substancial dos factos. O Recorrente preparou há cinco anos a sua defesa relativamente a um imputado crime num certo período, já de si bastante longo. Não respeita de modo algum as suas garantias de defesa ser restringido, decorridos cinco anos, à possibilidade de uma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que teria acesso em 2004. 32ª - Face ao ex(...), a decisão recorrida é inválida, desta feita por violação do dis(...) nos artigos 358.°, n.° 1, 359.° e l.° al. f) do CPP. 33ª - Ao considerar que as alterações comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar e/ou do tempo dos crimes imputados, são não substanciais, a douta decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, os art°s 1.°, al. f) e 358.° do CPP, disposições que, nessa interpretação normativa, são inconstitucionais, por violarem as garantias de defesa conferidas pelo art.° 32.° da CRP, inconstitucionalidade que desde já se suscita e se pretende seja declarada. 34ª - Não se descortina na decisão recorrida motivação que minimamente sustente a alteração comunicada. Não bastará, para tanto, a invocação da prova produzida em audiência de julgamento, descrevendo em seguida um rol enumerativo dos depoimentos prestados por todos os arguidos, assistentes e testemunhas, de todos os documentos dos apensos e ainda de vastíssima documentação dos autos principais, sem qualquer utilidade para o efeito da compreensão do que é que determinou o Tribunal a comunicar tais alterações. 35ª - A defesa não pode ser exercida sem que o Recorrente compreenda de que factos está a defender-se. Na verdade, a fundamentação da decisão de alteração não substancial dos factos contidos no despacho de pronúncia, contida no singelo trecho “face à prova produzida em audiência de julgamento”, não é inteligível de forma a permitir descortinar a razão de ser das alterações comunicadas. 36ª - O despacho recorrido, proferido nos termos do art.° 358, nrs. 1, 2 e 3 do CPP, é uma decisão sujeita ao princípio do dever geral de fundamentação das decisões, consignado constitucionalmente no art. 205°, n.° 1 da CRP e também no art.° 97, n.° 5 do CPP, normas que, assim, resultaram violadas. Assim, a interpretação normativa das mesmas no sentido em que tal despacho se basta sem fundamentação consubstancia inconstitucionalidade que desde já se suscita e se pretende seja declarada. 37ª - No contexto que ficou indicado, na sessão de 11 de Janeiro de 2010, o Tribunal a quo, depois de proceder “à decidida reparação das comunicações feitas pelo Despacho de 63.635 a 63.639” (fls. 64.097), repetiu a comunicação de alterações feita na sessão de 23 de Novembro de 2009. O imputado crime a que se reporta o ponto II. da decisão recorrida, indiciado na pronúncia como ocorrido “...num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade…” passou a estar indiciado com alargamento a “dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP l3/14 anos de idade”. 38ª - A decisão recorrida, proferida não apenas “face à prova produzida em audiência dejulgamento”, como a anterior decisão de 23 de Novembro de 2009 (fls. 63.631), mas “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada)” – fls. 64.097 a 64.101, com a indicação de numerosos meios de prova, é, nesta vertente, uma nova decisão, em substituição da anterior. 39ª - A douta decisão recorrida, limitando-se a indicar “grupos de provas ou meios de prova”, sem referência a nenhuma prova concreta, ficcionou uma reparação da arguida irregularidade por falta de fundamentação. Passou-se de uma abstracção unitária para abstracções parceladas, sem indicação de nenhuma prova concreta que permita ao Recorrente percepcionar o que o Tribunal teve em mente para considerar provadas indiciariamente as alterações e impugná-las directamente por não provadas. 40ª - Não está ao alcance do Recorrente ir além de alegar, quase no vazio, quanto à prova produzida relativamente ao tempo alterado, no âmbito dos meios de prova abstractamente referidos na decisão recorrida e que o Recorrente considera que são relevantes quanto a ele. 41ª - No que respeita as mencionadas “Declarações dos arguidos”, dos Assistentes e a prova testemunhal e documental, nem o Recorrente nem o co-arguido A confirmaram o tempo sequer remotamente; o Assistente AP, nas suas declarações em audiência de julgamento, datou o alegado abuso quer em data muito posterior à referida na pronúncia, situando-o em data próxima daquela em que alegadamente presenciara o abuso ao colega AT e em data posterior a ter ido à casa das (…), quer em data muito anterior à da pronúncia, em que teria menos de sete ou oito anos, para além de situar ainda o abuso em questão em data em que a AX já dispunha de Mercedes Vito e de película protectora dos vidros no edificio da (…) (declarações entre si contraditórias, mas que excluem sempre os anos de 1997 e 1998). 42ª - O Recorrente, para além de haver arrolado várias testemunhas que depuseram sobre a localização das salas e das mobílias e demais conteúdo das caves, sobre a disponibilidade que o Recorrente teria sobre a chave da (…) e das salas das caves, sobre a presença de alunos na (…) e a descarregar material nas suas instalações, assim como sobre a personalidade do Recorrente e sobre a do Assistente, sua história de vida e percurso sinuoso na AX (que culminou com a sua expulsão), juntou ainda documentação sobre a data em que a AX passou a dispor de Mercedes Vito e de películas protectoras do sol nos vidros da (…). Dos autos constava outra documentação relevantíssima, como a data da expulsão do Assistente AP da AX e a da entrada do Assistente AT para interno da instituição, entre outra. 43ª - Sendo claro que nenhuma das referidas datas são coincidente e minimamente compatíveis entre si, a verdade é que qualquer delas se reporta a partir do ano de 1999 até 2002, nunca antes disso. 44ª - E o Assistente AT, que acusara, no processo, o Recorrente de abusar de si noutra ocasião, reiterou em julgamento que o alegado abuso do ora Recorrente sobre si (que AP refere ter presenciado nas caves da (…)) nunca aconteceu. 45ª - A referência a estes meios de prova só pode ser entendida como contributo para a formação de convicção genérica prévia. O processo racional que o julgador não pode perverter afasta a admissibilidade de uma genérica convicção prévia, com elevada componente emocional conducente à adequação da apreciação da prova a essa convicção prévia. 46ª - Nenhuma prova foi produzida no sentido da alteração comunicada. 47ª - O juiz é livre na valoração dos factos que lhe foram apresentados, mas essa valoração não pode ser fruto do mero arbítrio, ou de prévias convicções, tem de ser concordante com a prova efectivamente produzida em audiência de julgamento. Não tendo sido produzida qualquer prova no sentido da alteração comunicada, a mesma não pode ser admitida desde logo por absoluta falta de fundamentação - ou, se assim se não entender, por não provada indiciariamente. Nestes termos e pelo que doutamente será suprido, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogado o despacho recorrido e a alteração comunicada, com manutenção da indiciação constante da pronúncia, ou, se assim se não entender, e por mera cautela se requer, seja o mesmo revogado e substituído por outro fundamentado de modo inteligível e adequado para que o Recorrente possa compreender de que prova testemunhal e/ou documental resulta, em concreto, o novo período de um ano comunicado, como é de JUSTIÇA!” O Magistrado do Ministério Público na 1.ª instância apresentou resposta a este recurso – cf. fls. 65234 a 65257 –, concluindo (em transcrição) que: “1. - QUESTÕES COMUNS As questões suscitadas nos Recursos inter(...)s pelos Arguidos E, K e C podem, em síntese, enumerar-se do seguinte modo: A) - Extemporaneidade da comunicação de alterações operada ao abrigo do art° 358°, do CPP (Argos. K e C); B) - Falta de fundamentação do Despacho que procedeu à referida comunicação, ou, na nova designação utilizada pela Defesa de E, por alegada “inadmissibilidade das alterações comunicadas, por falta de prova da sua indiciação” (Arg°s. E, K e C); C) - Inconstitucionalidade do sentido interpretativo, subjacente à aplicação do art° 358°, do CPP, no Despacho recorrido (Arg°s. K e C); D) - A natureza das alterações de factos comunicadas, como alterações substanciais, que não, como o foram, como meras alterações não substanciais (Arg°s. K e C). Tendo em conta o enunciado, dar-se-á resposta em função do respectivo alinhamento. A) - O que decorre do dis(...) no art° 358°, do CPP, é que a verificação da alteração não substancial dos factos descritos na Pronúncia ocorra no decurso da audiência. Ao consignar, no Despacho, que as alterações se lhe suscitaram, em face da prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal dá conta, de forma insofismável, que foi no decurso daquela que se produziu a convicção indiciária que culminou com a comunicação das alterações. Alegam as Defesas que, na sistemática do CPP, porque o art° 358° precede as normas que contemplam, quer as Alegações Orais, quer as últimas declarações dos Arguidos, a comunicação das alterações deveria preceder, igualmente, umas e outras. A tese assim expendida, além do mais, menoriza, subestimando-as, quer as Alegações, quer as últimas declarações dos Arguidos. A umas e outras há-de reconhecer-se a virtualidade de convencerem o Tribunal, em função dos argumentos, factos e razões que, nelas, sejam produzidas, não sendo de excluir a possibilidade de levarem a produção suplementar de prova (possibilidade, essa, que, embora a título excepcional, está plasmada no n° 4, do art° 360º, do CPP e que, como é sabido, teve aplicação no decurso das Alegações produzidas neste processo). Aliás, parece olvidar-se que, na própria sessão de 23.11.2009, antes mesmo de proceder à comunicação das alterações, o Tribunal produziu prova, invocando, para tanto, “a Jurisprudência do acórdão para Fixação de Jurisprudência, proferido pelo S.T.J. em 28/10/2008, quanto à interpretação do art° 328°, n° 6, do C.P.Penal” procedendo “à abertura e análise, na presente audiência, dos documentos de fls. 50.762 a 50.765 dos autos, os quais poderão ser relevantes, de forma mais directa, para a defesa dos arguidos A e C.” Porque assim é, nada obsta a que a comunicação, nos termos do art° 358°, tenha ocorrido no momento em que ocorreu, antes se compreendendo que assim seja e, não, no próprio decurso da audiência, sob pena de a dinâmica da produção de prova poder levar a sempre indesejáveis alterações de alterações. Será, a todos os títulos, mais racional, que a comunicação ocorra no termo, ou no dealbar, da produção de prova, pressupondo que, para que assim seja, se tenha já iniciado o processo deliberativo, no âmbito do qual a necessidade daquelas se suscite. A Jurisprudência que lográmos recolher, sobre esta matéria, é, aliás, pacífica e constante. (…) Falecem, assim, os argumentos invocados, com base nos quais se tem por verificada a extemporaneidade da comunicação operada ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP. B) - Atendendo às razões que expendemos, no preâmbulo da presente Resposta, quanto à não admissibilidade de recurso, abordar-se-á, condicionalmente, a questão relativa à pretensa falta de fundamentação do Despacho recorrido (para além de nos revermos, sem inúteis e redundantes acréscimos, nos fundamentos, reiteradamente, explanados, a esse respeito, em sucessivos Despachos, os quais, com a devida vénia, aqui se têm por considerados). Face ao teor do dis(...) no art° 358°, do CPP (norma invocada), já quanto aos Despachos reparados, não se via que outra fundamentação, sem extravasar, pudesse/dever-se exigir-se aos referidos Despachos. Todavia, ainda assim, entendeu o Tribunal proceder à sua reparação, acrescendo fundamentação probatória aos Despachos que comunicaram as alterações. Os Recorrentes, não obstante, defendendo uma interpretação restritiva do art° 358° (interpretação essa que mal se alcança em que possa consistir, (...) que, como referido infra, o desiderato último conciliador dos princípios em conflito prescindirá da prevalência de uns sobre os outros, sob pena de correspondente prevalência de um sistema puramente inquisitório sobre o paradigma acusatório, ou vice-versa, o que, de forma unânime, é repudiado pela Doutrina e pela Jurisprudência), reiteram a alegação segundo a qual inexiste fundamentação bastante como substracto do Despacho relativo à comunicação das alterações. Fica, implicitamente, claro, desta argumentação, que os Arguidos E, K e C entendem que o Tribunal deveria fundamentar o Despacho em termos em tudo idênticos à fundamentação que é exigida às sentenças, ou, quando muito, à justificação exigível ao Juiz de Instrução, quando profere Despacho de Pronúncia. Que assim seja, é, justamente, afastado pela própria natureza eminentemente acusatória do processo penal português. Como é sabido, uma das marcas impressivas de tal estrutura consiste na diferenciação clara entre as diferentes fases processuais - Inquérito, Instrução e Julgamento. Daí os impedimentos, taxativamente enumerados no art° 40º, do CPP, que obstam a que qualquer juiz que, num determinado processo, tenha aplicado medida de coacção prevista nos art°s. 200º a 202° (a)), ou que tenha presidido a debate instrutório (b)), possa intervir em julgamento, recurso, ou pedido de revisão, nesse mesmo processo. Desse modo, compreende-se que a fundamentação do juiz da Pronúncia lhe seja exigível, nomeadamente, por explicitação dos indícios que considere verificáveis, justamente porque, estando em causa um juízo precário e perfunctório, ele não se reflectirá, ao menos de forma directa, no que venha a ser a decisão final que culmine um julgamento. Diferentemente se coloca o problema em sede de julgamento. Exigir-se ao Tribunal que fundamentasse, nos termos sobreditos, a comunicação de alteração de factos que opera ao abrigo do art° 358°, do CPP, discutindo e valorando a prova - ainda que a título meramente indiciário -, abstraindo que será o mesmo Tribunal que, a final, ao proferir o Acórdão, terá que o fundamentar, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, constituir-se-ia, por uma lado, numa virtual pré-valoração da fundamentação do Acórdão, e, por outro lado, na abertura de um espaço potencial de conflitualidade indesejável e virtualmente perniciosa, antecipando, prematuramente, um debate que a Defesa não está impedida de reabrir, (...) que lhe é dada oportunidade de se reorganizar, requerendo produção de prova suplementar. De resto, como decidiu o TC, no Ac. n° 442/99, de 8.7.1999, “o princípio da presunção da inocência “não é obviamente susceptível de «apagar» a realidade dos factos, demonstrada efectivamente em audiência, processada com todas as garantias de defesa do arguido”; bem como que “a circunstância de o tribunal se aperceber de tais factos no decurso da audiência e exercer o poder-dever de os valorar em nada contende com o princípio da independência e imparcialidade do julgador.” - destaque e sublinhado nossos. Tão pouco será atendível o argumento segundo o qual, porque se trate de processo de especial complexidade, mais se exigiria ao Tribunal que indicasse, especificadamente, os meios de prova a que atendeu para proceder à comunicação das alterações. Primeiro, porque nada na lei estabelece regime diferenciado, consoante se trate, ou não, de processo de especial complexidade ou de “longa duração”. Depois, porque a prova foi produzida em audiência, à vista de todos os Sujeitos Processuais, os quais não podem exigir do Tribunal que lhes forneça um qualquer índice, ou sinopse, actualizados com as incidências do julgamento. A fundamentação do Despacho foi, sem mácula ou omissão, até onde lhe era permitido que fosse. Fundamentou, quanto lhe era exigível que fundamentasse, ficando claro o que se comunicava, porque, e com que base, se comunicava, ao abrigo de que norma se comunicava e quais os efeitos e consequências, reais ou potenciais, que decorrem, ou podem decorrer, de tal comunicação. A exigência de fundamentação dos actos decisórios, tal como emerge do art° 97º, n° 5, do CPP, há-de conjugar-se com as exigências, especificidades e limitações de outras normas, dando-se por cumprida sempre que, dessa conjugação, resulte o quantum óptimo que, no limite, torne perceptível a razão de ser da decisão. C) - Os modelos penal e processual penal vigentes acolhem, a um tempo, conceito normativo e naturalístico de facto. No conceito normativo, o facto reportar-se-á ao núcleo essencial e determinante da caracterização de um conjunto de comportamentos reais e concretos, os quais, configurando e dando corpo à norma, são por esta, conceptual e selectivamente acolhidos, por forma a legitimarem a aplicação de uma pena ou de uma medida de segurança. Por sua vez, uma concepção puramente naturalística, acolhendo, embora, aquele núcleo decisivo, diverge na sua caracterização, exigindo, antes, a concepção do facto como evento alargado, isto é, enfatizando a natureza do facto como “existência histórica”, em detrimento, embora sem abstrair, da sua conceptualização normativa. Daí, algumas das dificuldades que se colocam, quando da caracterização do que deva ter-se por “facto”, para efeitos do dis(...), quer no art° 358°, quer no art° 359º, do CPP. A ultrapassagem de tais escolhos há-de fazer-se, antes do mais, pela delimitação do que seja o objecto do processo, e, com ele, a vinculação temática a que o Tribunal está sujeito. Como refere Frederico lsasca, “A definição e delimitação do objecto do processo é a charneira entre o interesse público na perseguição do crime e na aplicação do direito, ou seja, na pronta reposição dos valores de que o arguido é acusado de ter violado com um certo comportamento que se lhe imputa e os direitos inalienáveis que lhe assistem e que passam necessariamente pela possibilidade de uma defesa eficaz.”. De acordo com o art° 339°, n° 4, do CPP, “Sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos, a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.° e 369°.” - (destaque e sublinhado nossos). Por sua vez, dispõe o n° 3, do art° 283°, do CPP, que: “A acusação contém, sob pena de nulidade: a) As indicações tendentes à identificação do arguido; b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível. o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; c) A indicação das disposições legais aplicáveis; d) O rol com o máximo de 20 testemunhas, com a respectiva identificação, discriminando-se as que só devam depor sobre os aspectos referidos no n.° 2 do artigo 128.°, as quais não podem exceder o número de cinco; e) A indicação dos peritos e consultores técnicos a serem ouvidos em julgamento, com a respectiva identificação; f) A indicação de outras provas a produzir ou a requerer; g) A data e assinatura.”. (destaque e sublinhado nossos). Da conjugação dos respectivos enunciados, com os princípios a que vem de se aludir, resulta claro que, nos requisitos a que o M°P° haverá de ater-se, na estruturação de uma peça acusatória, se acolheu um conceito normativo de facto, traduzido este na exigência de “narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”, mas, já não, da obrigatoriedade de menção, de entre outras, das circunstâncias de tempo e de lugar, ainda que “relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada”, as quais deverão ser mencionadas, tão só, “se possível”. Por outro lado, a vinculação temática, típica de uma estrutura acusatória do processo, comporta excepções, coerentemente decorrentes do facto de, tal estrutura, ser mitigada por um princípio de investigação, o qual, de igual sorte, se impõe ao Tribunal. Daí que, constituindo-se a Acusação como elemento nuclear da delimitação do objecto do processo, este não se esgote naquela, antes lhe sendo adjacentes, como verdadeiros elementos estruturantes, quer os factos relevantes invocados pelas Defesas, quer os que, de igual modo relevantes, resultem da discussão da causa. Se assim é, com correspondente ênfase hão-de colocar-se as garantias de defesa, sobretudo, aquelas que, necessariamente, decorram, da mutabilidade que, ao longo do iter processual, maxime, do julgamento, seja imposta - para o que ora nos importa, de forma não substancial - à versão que, originariamente (Acusação ou Pronúncia), constituía o acervo factual de que o arguido cumpriria defender-se. É deste contexto que emerge o dis(...) nos art°s. 358° e 359°, do CPP, verdadeiro corolário do compromisso regulador entre a natureza acusatória, os princípios da investigação, da identidade e da vinculação temática, as alterações ao objecto do processo e as garantias de defesa. Numa e noutra, dessas normas, se salvaguarda a preservação da matriz que, sob pena de descaracterização, deve permanecer imutável na definição do objecto do processo, sem prejuízo das alterações que se imponham e justifiquem na demanda da verdade material, sujeitas, não obstante, a uma disciplina que não ponha em causa a amplitude dos direitos de defesa do arguido. À luz do que vem de dizer-se, não poderá deixar de concluir-se que falece razão, em toda a linha, às Defesas de E, K e C. O Tribunal, invocando, para tanto, o dis(...) nos n°s. 1 e 2, ou, nos n°s. 1, 2 e 3, do art° 358°, do CPP, comunicou “poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos …”, 3 alterações, relativamente ao Arguido E, 1 alteração, respeitante ao Arguido K e 1/2 alteração(ões), relacionada(s) com o Arguido C. As alterações, respeitantes a E, correspondem a três conjuntos de factos, relativamente aos quais se verificam, em dois deles, modificações de tempo e lugar e, no terceiro, tão só de lugar, em qualquer caso, por referência aos períodos de tempo e às localizações referidos no Despacho de Pronúncia. Quanto ao Arguido K, tratou-se, tão só, de uma alteração relativa ao alargamento de um período temporal referido na Pronúncia. Por fim, no que ao Arguido C diz respeito, o Tribunal procedeu a uma alteração de um período temporal, a qual teve, como consequência, uma alteração da qualificação jurídica - “não a prática de um crime p. e p. pelo art° 166°, n° 1 e 2, do C.Penal, mas a prática de um crime p. e p. pelo art° 166°, n° 1, do C.Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuízo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do art° 2°, do C.Penal.”. Fica, pois, patente, que, do que se tratou, mais não foi do que meras modificações pontuais das circunstâncias de tempo e/ou de lugar em que ocorreram, normativamente considerados, os factos típicos integradores dos ilícitos imputados aos Arguidos. Aliás, a única alteração da qualificação jurídica, comunicada pelo Tribunal, em bom rigor, nem sequer configura qualquer alteração que devesse ter-se por abrangida pela disciplina do art° 358°, do CPP. Na verdade, a Jurisprudência e a Doutrina vêm entendendo, de forma reiterada, que, quando a alteração se cinge a um minus de imputação, já contida na incriminação, porque nenhuma surpresa poderá daí resultar para o Arguido, não haverá que comunicar, previamente, a eventualidade de uma atenuação penalizante. O STJ, no Ac. de 07.11.2002, Proc° 02P3158, relatado pelo Conselheiro Simas Santos, prescreve “que se a imputação resulta de um crime simples, ou “menos agravado” quando da acusação ou da pronúncia resultava a atribuição do mesmo crime, mas em forma mais grave, por afastamento do elemento qualificador ou agravativo inicialmente imputado, não há qualquer alteração relevante para este efeito, pois que o arguido se defendeu em relação a todos os factos, embora venha a ser condenado por diferente crime (mas consumido pela acusação ou pronúncia).” É disso que se trata. O Tribunal comunicou - e, repete-se, salvo o devido respeito, não tinha que o fazer - que a incriminação poderia vir a fazer-se, não por referência aos n°s. 1 e 2, do art° 166°, do C. Penal, mas, tão só, por referência ao nº 1, tendo em conta que uma eventual antecipação temporal da prática dos factos, descritos no Capítulo 4.1.1., da Pronúncia, poderia implicar que a qualificação a ter em conta fosse a que resultava da redacção anterior à Lei 65/98, de 2 de Setembro, na qual a prática de coito oral não estava, como, desde então, passou a estar, contemplada no seu n° 2. Em consequência, se tal se vier a verificar e se forem, a final, dados como provados os correspondentes factos, a conduta do Arguido C reportar-se-á ao n° 1 do art° 166°, cabendo-lhe uma moldura penal abstracta (mais favorável) de 6 meses a 5 anos de prisão, ao invés da moldura resultante do n° 2, a qual prevê pena de 1 a 8 anos de prisão. Como se viu e, crê-se, ter ficado demonstrado, a alteração de data, ou lugar, da prática de um crime, não é elemento essencial, de entre os que, como tal, são reputados pelo dis(...) no art° 283°, do CPP. Ainda que o fosse, não estaria o Tribunal impedido de, com recurso ao mecanismo previsto no art° 358°, do CPP, comunicar as alterações que entendesse decorrerem da discussão da causa, (...) que tal não implicasse modificação de factos que tivesse “por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”, caso em que, porque configurada uma alteração substancial, haveria que desencadear-se a disciplina prevista no art° 359°. Em qualquer caso, não se tratou, como referido pelas Defesas de K e C, nem de crime diverso, nem, tão pouco, de uma nova Acusação. Tratou-se, isso sim, de alterações meramente circunstanciais, que em nada afectaram a caracterização identitária dos ilícitos que vinham imputados. Por outro lado, como resulta, expressamente, do n° 3, do art° 358°, do CPP, “O dis(...) no n.° 1 é correspondentemente aplicável quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia.”, sendo pacífico, quer em sede de Doutrina, quer de Jurisprudência, o entendimento segundo o qual a alteração da qualificação jurídica configura alteração não substancial, ainda quando a modificação implique a imputação de crime mais grave. (sendo certo que, como já referido infra, do que aqui se tratou, no que ao Arguido C diz respeito, a “alteração” da qualificação jurídica, a verificar-se, redundará num enquadramento legal não inopinado e menos gravoso). Os Recorrentes E, K e C, invocam, ainda, a inconstitucionalidade do art° 358°, do CPP, quando interpretado e aplicado com o alcance, sentido e oportunidade que resulta do Despacho recorrido, por pretensa violação das normas constitucionais (ou de norma pela Constituição acolhida - cfr. art° 6°, da CEDH e art°s. 8° e 16°, da CRP) constantes dos art°s. 18°, 20°, n° 4 e 32°, n°s. 1, 2 e 5, da CRP. Ao longo da abordagem que acaba de produzir, o M°P° foi deixando expressas, embora de forma, porventura, esparsa, as razões pelas quais entende que as garantias de defesa, constitucionalmente tuteladas, não sofreram qualquer compressão, designadamente, porque a própria norma cuja aplicação suscitou a invocação de desconformidade constitucional, consagra o direito de as Defesas reorganizarem as suas estratégias, indicando, ou requerendo, novos elementos de prova. Aliás, o Tribunal concedeu, para o efeito, o prazo requerido. Poderá, assim, concluir-se que, para o M°P°, a interpretação que subjaz ao Despacho proferido ao abrigo do art° 358°, do CPP, é absolutamente conforme à CRP, designadamente às normas invocadas - art° 6°, da CEDH, com referência aos art°s. 8° e 16°, e, ainda, art°s. 18°, 20°, n° 4 e 32°, n°s. 1, 2 e 5, da CRP. O Tribunal Constitucional já, por várias vezes, se pronunciou pela conformidade do art° 358°, do CPP, com a Lei Fundamental, interpretado em diversas perspectivas e dimensões, mas sendo constante e transversal o entendimento segundo o qual, a referida norma, assegura, plenamente, as garantias de defesa, a estrutura essencialmente acusatória do processo, e o direito a um julgamento justo e equitativo. Invoca-se, igualmente, uma pretensa violação do art° 6°, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), por descaracterização do processo, enquanto processo justo, equitativo e decidido em tempo útil. No que à exigência de um processo justo e equitativo se alega - em bom rigor, de uma mera invocação se trata -, pouco haverá a considerar, (...) que não se concretizam quaisquer factos que configurem a violação do princípio da equidade. À comunicação de eventual alteração, seja de novos factos, seja de qualificação jurídica, operadas, uma e outra, ao abrigo do art° 358°, do CPP, corresponde adequada e proporcional possibilidade de defesa, por parte dos Arguidos, não se alcançando, por isso, em que se possa traduzir a violação, não só, de tal princípio, como do que lhe é correlativo, o princípio da igualdade das armas. Note-se, aliás, que quando as alterações comunicadas o são por iniciativa do Tribunal, ou, não correspondem às que, porventura, tenham sido requeridas pelas Acusações, a estas não é reconhecida qualquer possibilidade para reorganização das respectivas estratégias processuais, ao contrário do que sucede com as defesas dos Arguidos. Nomeadamente, não é facultado, às Acusações, a faculdade de, em tais circunstâncias, requerer, apenas por força da comunicação das alterações, produção de prova suplementar. Daí que não se tenha por, minimamente, beliscado, o princípio da equidade do processo. Já quanto ao princípio que impõe o julgamento da causa em tempo razoável - cfr. art° 6°, n° 1 , da CEDH -, cumprirá, desde logo, salientar, que, ao contrário do que, não poucas vezes, se invoca, ele não consagra direitos exclusivos dos arguidos, acolhendo, antes, direitos extensivos aos que, no âmbito das causas sujeitas a Juízo, aí lutam pelos seus interesses. Por outro lado, são múltiplos os instrumentos internacionais que tutelam, especificamente, os interesses das Vítimas. A título de exemplo, refiram-se a Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1989/57 do Conselho Económico e Social, relativo à Aplicação da Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1990/22 do mesmo Conselho, relativo às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder. Sem olvidar, naturalmente, inúmeros outros instrumentos em que são salvaguardados os direitos das crianças, (...) que, o que em causa está neste processo, reportado à data dos factos, diz respeito a crianças e a jovens sexualmente abusados. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sempre que chamado a pronunciar-se sobre as violações ao art° 6°, da CEDH, tem produzido Jurisprudência que, reiterada, tabelar e literalmente, enuncia o princípio, segundo o qual, o Tribunal, nesta matéria, leva em conta, segundo as circunstâncias, nomeadamente, a complexidade da causa, bem como o comportamento dos intervenientes e das autoridades judiciárias. O tempo dirá em que medida cada um dos intervenientes contribuiu para que o julgamento ainda perdure. Por outro lado, o Tribunal não deixa de salientar (“Affaire Pélissier et Sassi c. France”, Requête n° 25444/94, Arrêt 25.10.1999), “a este respeito, que o art° 6°, n° 1, da Convenção, obriga os Estados contratantes a organizar o seu sistema judiciário de tal sorte que os tribunais possam satisfazer o que lhes é exigível, nomeadamente, a obrigação de resolver as causas dentro de prazos razoáveis, consignando, ainda, que, por vezes, o processo apresenta atrasos excessivos, que são imputáveis às autoridades nacionais. A avaliação das responsabilidades na perdurabilidade de um julgamento pressupõe uma avaliação global, a qual tenha em conta o número de intervenientes (arguidos, vítimas e lesados), a dificuldade e a quantidade das provas, a indefinição ou sucessão das leis, a quantidade de incidentes - incluindo recusas de juízes -, de requerimentos, recursos, arguições de nulidades e irregularidades, etc., etc.. Que os Recorrentes se queiram investir no papel de únicas, ou principais, vítimas da duração do julgamento, desresponsabilizando-se do seu próprio contributo (bastando, para tanto, recordar o que foram as instâncias dirigidas aos Assistentes), e olvidando, ou omitindo, que as Vítimas o são há muito mais tempo do que eles próprios são Arguidos, compreende-se, tão só, na medida em que, dessa forma, não estarão impedidos de invocar, como invocam, em uníssono, a violação do art° 6°, da CEDH. Para o M°P°, a conclusão, segundo a qual, o art° 6°, da CEDH, deve, desde já, ter-se por violado, no segmento relativo ao tempo decorrido, é absolutamente prematura. Se e quando o TEDH for chamado a pronunciar-se, com a autoridade que lhe é reconhecida, e de acordo com os critérios que vêm constituindo a sua Doutrina, saber-se-á, então, de forma desapaixonada, se tal norma foi, ou não violada, e se, tendo-o sido, a quem cabem as maiores responsabilidades. D) - As Defesas de K e de C, impugnam, ainda, o Despacho recorrido, uma vez que, alegam, a natureza das alterações de factos comunicadas, hão-de ter-se por alterações substanciais, que não, como o foram, como meras alterações não substanciais. Já no âmbito do que ora se subscreve tivemos oportunidade de salientar que, ao contrário do sustentado, as circunstâncias de tempo e de lugar não têm, em princípio, a virtualidade de alterar o tipo de crime, só tal podendo suceder quando, por exemplo, a idade da vítima constitui elemento do tipo. Todas as alterações, comunicadas aos Arguidos K e C, dizem respeito a alterações de tempo e/ou de lugar, as quais, como já referido, nem sequer são elementos decisivos na estruturação da Acusação, apenas desta devendo constar, “se possível” (cfr. art° 283°, n° 3, b), do CPP). Assim, porque as alterações em causa não tiveram por efeito a imputação ao arguido de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, por força da alteração do elenco factual (cfr. art° 1°, f), do CPP), não poderão elas ser reputadas senão como alterações não substanciais, razão pela qual, igualmente se promove o indeferimento de mais esta irregularidade, arguida pela Defesa do Arguido E. Por todo o ex(...), entende-se ser de negar provimento a todos os Recursos que, não obstante, venham, a ser admitidos, confirmando-se, na íntegra, o Despacho recorrido”. O recurso do arguido C foi admitido por despacho de fls. 65296 (Ponto I – 8) dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse neste concreto recurso interlocutório (cf. fls. 69440 a 69441 – ponto 2 das conclusões do recurso inter(...) pelo arguido do acórdão final). Consigna-se que este recurso interlocutório foi autuado por apenso, passando a constituir o apenso ZG. Na sessão de julgamento ocorrida em 26 de Fevereiro de 2010, o Tribunal, na sequência do processado na anterior sessão de julgamento (de 11 de Janeiro de 2010), veio a proferir novo despacho de acordo com o qual julgou improcedente a arguição de irregularidade apresentada pelos arguidos H, K e E, quanto à insuficiência de fundamentação do despacho de fls. 64097 a 64107, “Ponto II”, em que fez a comunicação de alteração não substancial de factos descritos na pronúncia, nos termos do art. 358.º do CPP – cf. fls. 65137 a 65144. Nessa mesma sessão de julgamento, o Tribunal proferiu um segundo despacho, pronunciando-se sobre requerimentos de diligências de prova apresentados pelos arguidos na sequência das alterações comunicadas, nos termos do qual indeferiu, pelo menos em parte, as diligências de prova requeridas pelos arguidos C, E, K e H – cf. fls. 65144 a 65225. Inconformado com aquele despacho, dele recorreu o arguido E, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1º No contexto que ficou indicado, na sessão de 11.1.2010, o Tribunal a quo, depois de proceder “à decidida reparação das comunicações feitas pelo Despacho de 63.635 a 63.639” (fls 64.097) repetiu a comunicação de alterações feita na sessão de 23.11.2009. 2° Assim, os factos descritos no ponto 4.2.1. do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.888, último parágrafo e fls. 20.889, 1° parágrafo, indiciados como ocorridos no prédio n° (…) da alameda (…), num sábado de Novembro de 1999, passaram a estar indiciados com alargamento a todos os prédios do lado ímpar da alameda, com ampliação de sábado para sexta-feira ou sábado e do período de um mês para um mês e 29 dias e com antecipação de mais de 11 meses. 3º Os factos descritos no penúltimo parágrafo de fls 20889, indiciados como ocorridos numa casa da Av. (…), numa sexta-feira de Junho de 2000, passaram a estar indiciados com restrição a casas da mesma avenida em área delimitada pela proximidade não determinada da zona da feira popular, com ampliação de sexta-feira para todos os dias da semana e de um para 4 meses e com antecipação de um ano e 2 meses. 4° Os factos descritos no 10° parágrafo de fls 20.890, indiciados como ocorridos em parte do mês de Junho de 2000, passaram a estar indiciados com ampliação de menos de um mês para mais de 2 meses e com antecipação de 11 meses. 5º Dentro do prazo que para tal lhe foi concedido, nos termos do art° 358°, n° 1 do CPP, o recorrente reiterou que não praticou os factos que lhe são imputados e requereu a notificação da AX para juntar os livros de ocorrências do CW (CW em que o assistente AK era interno) que abranjam o período das alterações - 12.12.1998 a 31.7.99 e requereu prova testemunhal relativamente aos prédios localizados na Av. (…) e lateral da Alameda (…), onde se situam os números ímpares. 6° O tribunal indeferiu a requerida notificação para junção dos livros de ocorrências invocando que “o arguido não indicou o que, na sua perspectiva, essa junção torna-se relevante para a prova dos “factos novos” objecto da comunicação de alterações, ou noutro contexto mais amplo”, mas e sobretudo por ser um meio de prova impossível de obter, uma vez que consta do oficio de fls 36.275 que “em relação ao CW não têm os registos anteriores ao ano 2000” 7º Do dis(...) nos art°s 315° e 358° do CPP não resulta a obrigatoriedade de justificação dos requerimentos de prova. Além de que é manifesto que os livros de ocorrências podem conter informações de factos incompatíveis com os factos indiciariamente imputados, face às alterações, no período entre 12.12.98 e 31.7.99, sendo a sua junção necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, independentemente de explicitação dessa necessidade pelo requerente. 8° Contrariamente ao referido a fls 65174 da decisão recorrida, o que consta do oficio é que “segundo informação do Director deste (...) não foram encontrados os registos anteriores ao ano 2000 relativos a este lar”, do que não resulta necessariamente que não possam ser agora encontrados. A negação dum meio de prova manifestamente relevante e possível viola o dis(...) no art° 32°-1 da Constituição, que confere ao arguido todas as garantias de defesa. 9º O despacho recorrido indeferiu também a requerida inquirição de testemunhas relacionadas com casas situadas na Av. (…), perto da zona (…), com o fundamento de que o tribunal “está a fazer uma descrição dos factos dentro do mesmo contexto factual do despacho de Pronúncia”, não havendo factos novos a ter em conta pelo Tribunal, “tratando-se de um “menos” em relação ao “mais” pelo qual o arguido vinha pronunciado”. 10º O recorrente foi acusado com a componente espacial no (…) andar (…) do (…) da avenida (…) e, face à prova produzida em instrução, tal componente foi arbitrariamente alargada a toda a avenida (…). Tal alargamento correspondia a uma tão grande indeterminação, que impedia a produção de prova da defesa quanto à componente espacial. Por isso, o recorrente, com a contestação, limitou-se a indicar uma única testemunha - o vigilante do prédio (…) - em vez de indicar pelo menos uma pessoa de cada fogo, loja ou escritório situados entre a praça (…) e (…), que se traduziria com toda a certeza em milhares de testemunhas. 11° O recorrente interpretou a alteração comunicada como relativa determinação espacial, já processualmente consentânea com a produção de prova testemunhal com alguma eficácia. 12° A não ser interpretada asssim, a alteração indiciária comunicada seria inútil. 13° É manifesto o interesse do recorrente na produção do meio de prova requerido - perante a comunicação das alterações dos factos, agora com alguma determinação espacial - para descoberta da verdade material e boa decisão da causa. 14° Não se impondo, como já referido, a exigência de especificação pelo arguido das razões concretas pelas quais considera necessária a audição de novas testemunhas. 15° A decisão recorrida, ao indeferir a requerida produção de prova testemunhal, violou o art° 32°-1 da Constituição, que confere ao arguido todas as garantias de defesa e os art°s 340º, nº 1 e 358° do CPP. 16° Relativamente à produção de prova requerida pelo recorrente para os prédios situados na lateral dos números ímpares da Alameda (…), o despacho recorrido limitou a 10 o número de testemunhas a serem inquiridas, apesar de referir (fls 65179) que se revela necessário para a boa e Justa decisão da causa a audição de testemunhas quanto à prova da circustância de lugar. 17º No caso concreto, ouvir dez testemunhas ou nenhuma, tem o mesmo significado, pois não chega a ser uma testemunha por prédio. 18° A produção da prova requerida pelo recorrente é essencial para a descoberta da verdade material e surge perfeitamente justificada à luz do princípio do contraditório consagrado no art° 358°, n° 1, do CPP. 19° Verificando-se os fundamentos do n° 1 do art° 340º do C.P.P., o indeferimento da produção de prova estaria limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superficialidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória (art° 340, n°s 3 e 4), o que não é o caso. 20º A decisão recorrida, ao indeferir parcialmente a produção de prova testemunhal, limitando-a à inquirição de 10 testemunhas, violou o art° 32°, n° 1 da C.R.P., os art°s 358°, n° 1 e 340° do C.P.P. Nestes termos e sobretudo pelo que doutamente será suprido, deve, se a decisão não for reparada ao abrigo do dis(...) no art° 414°-4 do CPP, ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto despacho recorrido e ordenando-se a produção de prova nos termos requeridos pelo recorrente Como se espera e é de JUSTIÇA.” Igualmente irresignado com aquele despacho, dele recorreu o arguido K, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “1. O presente recurso vem inter(...) dos despachos proferidos na sessão da Audiência de Discussão e Julgamento de 26.02.2010, pontos I. e II., constantes de fls. 65.137 a 65.144 na parte em que decidiu sobre as irregularidades e nulidades arguidas na sessão da audiência de julgamento de 11.01.09, e de fls. 65.146 a 65.152 e 65.193 a 65.211, na parte em que decidiu sobre questão prévia suscitada e o requerimento de prova apresentado pelo arguido a fls. 64.848 a 64.858. 2. A irregularidade, foi arguida relativamente ao despacho proferido pelo Tribunal a quo na mesma sessão de audiência de discussão e julgamento de fls. 64.097 a 64.107, ponto II, relativo à comunicação de alteração qualificada como não substancial dos factos descritos na pronúncia. 3. Na sessão da AJ de 23 de Novembro de 2009, veio o Tribunal comunicar a alguns Arguidos, ao abrigo do dis(...) no art.° 358.° do CPP, a alteração dos factos que qualificou de não substanciais e que m«no que ao ora recorrente respeita foi comunicada nos seguintes termos: “ Em relação ao objecto do Processo n.º 1718/02.9JDLSB - Processo “Principal” (NUIPC 1718/02. 9JDLSB)-, face à prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal considera que está indiciado e, por conseguinte, poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos, o seguinte: (…) IV - Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao Arguido K: 2. Que os factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.1.1”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5º parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “…casa do Arguido K, sita na Rua (…), n.º (…), (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”; (…) VI - O Tribunal faz a presente comunicação nos termos: (…) d) Do artº 358º, nº 1 e 2, do C.P.Penal, para os “Pontos I, III, Iv e V”;” 4. Também na sessão seguinte, em 14 de Dezembro de 2009, veio o Tribunal comunicar a alguns Arguidos, ao abrigo do dis(...) no art.º 358.º do CPP, a alteração dos factos que qualificou de não substanciais, que no que ora recorrente respeita o foi nos seguintes termos: “Em relação ao objecto do Processo n.º 1718/02.9JDLSB - Processo “Principal” (NUIPC 1718/02.9JDLSB) -, faceà prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal considera que está indiciado e, por conseguinte, poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos, o seguinte: (…) II - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao Arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.906 a 20.907, “Ponto 5.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.906, 6º (sexto) parágrafo” e fls. 20.907, 1º (primeiro) parágrafo “factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “…em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998…”, sendo que o AP “…à data tinha 13 anos de idade…”, podem ter ocorrido: - em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do anos de 1998; - tinha o AP 12/13 anos de idade” (…) V - O Tribunal faz a presente comunicação nos termos:(…) e) Do artº 358º, nº 1 e 2, do C:P:Penal, para os “Pontos I, III e IV”;” 5. Tais comunicações foram reproduzidas no despacho proferido em 11.01.10, que reparou aqueles, sendo que a afirmada indiciação de tais factos assim comunicada, tem repercussão sobre o Arguido ora recorrente. 6. Nos despachos que comunicaram as alterações, proferidos em 23.11.09 e 14.12.09, o Tribunal a quo em sede de fundamentação limitou-se a dizer o seguinte: “Em relação ao objecto do Processo n° 1718/02.9 JDLSB - Processo “Principal” (NUIPC 1718/02.0 JSLSB) -, face à prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal considera que está indiciado e, por conseguinte, poder a vir considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos, o seguinte:”, passando de imediato à indicação das alterações propostas. 7. Foi arguida a nulidade do despacho proferido por falta de fundamentação e/ou a sua irregularidade e sobre tais arguições o Tribunal a quo pronunciou-se, no que respeita ao despacho proferido em 23.11.09, em 18.12.09, anunciando a reparação do mesmo para o dia 11.01.10, o que veio a fazer, pronunciando-se nesta data também quanto à referida nulidade e/ou irregularidade arguida em 14.12.09. 8. No que respeita à nulidade e irregularidade arguidas por falta de fundamentação o Tribunal pronunciou no despacho proferido na audiência de discussão e julgamento de 26.02.2010, de fls. 65.141 a 65.144, decisão esta que é objecto do presente recurso, reafirmando o que antes decidira quanto à irregularidade por falta de fundamentação no despacho proferido em 11.01.2010. 9. O recorrente não se conforma com o decidido pelas razões já supra aduzidas e ainda pelas que de imediato passa a expor, sem prejuízo do que em sede de recursos anteriormente inter(...)s expendeu e mantém, nomeadamente sobre a natureza das alterações do factos do despacho de pronúncia que considera serem substanciais. 10. No despacho proferido em 11.01.10, o Tribunal a quo procedeu no seu ponto II, a fls. 64.097 e ss., à reparação parcial do despacho de fls. 63.631 a 63.635 - proferido na sessão de 23.11.09 - e de fls. 63.685 a 63.687 - proferido na sessão de 14.12.09 - quanto à comunicação de alterações de facto nos termos do art° 358º, do C.P.Penal, nos seguintes termos: “(...)Em relação ao objecto do Processo n.º 718/02.9JDLSB - Processo “Principal” (NUIPC 1718/02.9JDLSB) - face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada): O Tribunal considera que está indiciado e, por conseguinte, poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos o seguinte:” 11. A fundamentação da decisão de alteração não substancial dos factos vertidos no despacho de pronúncia vem contida no singelo trecho acima transcrito, sendo que da frase - “face à prova produzida em audiência dejulgamento”, utilizada nos despachos proferidos em 23.11.09 e 14.12.09 -, ou da frase “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada)”, utilizada no despacho proferido em 11.01.10 -, não decorre fundamentação alguma inteligível que permita descortinar a razão de ser das alterações comunicadas, o que esvazia de conteúdo útil o exercício do direito de defesa e não assegura o respeito pelo princípio do contraditório que, afinal, o art.° 358.° do CPP visa acautelar. 12. Passou o despacho recorrido de uma abstracção unitária para abstracções parceladas, sem indicação de nenhuma prova concreta que permita ao recorrente percepcionar, compreender, entender o que o Tribunal “sentiu”, teve em mente para considerar provadas indiciariamente as comunicadas alterações e impugná-las directamente por não provadas ou apresentar prova que contrarie tais novos factos. 13. O Recorrente não consegue verdadeiramente entender o sentido e alcance da decisão proferida nos termos em que genericamente ali se remete para toda a prova produzida em audiência, declarações de arguidos, declarações de assistentes, depoimentos de testemunhas, bem como a menção de abundante prova documental junta aos autos, continuando a não se conseguir vislumbrar em concreto quais daqueles elementos de prova leva o tribunal a considerar indiciada as ali preconizadas alterações. 14. Com efeito, não se descortina qualquer motivação que minimamente sustente as alterações comunicadas, antes se invoca apenas a produção de prova, toda a prova produzida em audiência e a já constante dos autos à data de início da audiência, distribuída por dezenas de volumes o que, atenta a imensidão dos autos de que se dá conta no despacho recorrido, remete para um vazio impossível de preencher. 15. Nem sequer se antevê que tal alteração se funde nas próprias declarações dos Assistentes, uma vez que se afasta totalmente destas, nomeadamente no que toca ao local e tempo em que alegadamente ocorreram os abusos 17. A norma contida no art.° 358.° do CPP só pode ser entendida como um afloramento do princípio da verdade material, que a lei processual penal estatui para situações que diríamos “normais”, devendo, na medida em que encerra em si mesmo um conflito com outros princípios estruturantes do processo penal, como sejam os da máxima extensão das garantias de defesa, do contraditório e da estrutura acusatória do processo, ser interpretada e aplicada num sentido restritivo, porquanto estes últimos princípios, sendo princípios constitucionais atinentes a direitos, liberdades e garantias, dispõem de força vinculante acrescida, nos termos do dis(...) no art.° 18º da CRP. 18. Ora, a fundamentação apresentada equivale á falta de fundamentação, pois abrange toda a prova produzida ao longo de cinco anos de audiência de julgamento, bem como de prova adquirida ainda na fase de inquérito, não descriminando os meios de prova indicados relativamente a cada uma das alterações comunicadas, não permitindo conhecer o caminho percorrido pelo Tribunal no sentido de julgar que tais alterações se justificam e, consequentemente, de o recorrente organizar a sua nova defesa. 19. É por demais evidente o desequilíbrio existente e o grau de exigência im(...) às defesas, chegando ao ponto de as inviabilizar, o que ao Tribunal a quo se impunha, como fiel da balança, garantir que tal situação não ocorresse, não se encontrando no despacho recorrido justificação bastante para tal comportamento. 20. A indicação de toda a prova produzida tal como efectuado pelo Tribunal a quo, não permite ao Recorrente organizar a sua defesa, o que acontece não obstante nas decisões proferidas o próprio Tribunal reconhecer que o arguido tem, face às alterações comunicadas, direito a organizar uma nova defesa. 21. Face ao ex(...), é manifesto que a indicação “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento”, não permite à defesa saber concretamente qual a prova produzida que conduziu à decisão de modo a ser possível a contra-prova eficiente e que a mera afirmação de que a comunicação é feita nos termos do art.° 358.° do C.P.P., de modo algum constitui fundamento de direito. 22. Assim, não pode haver dúvidas de que o despacho recorrido, proferido pelo Tribunal nos termos do art.° 358, n°s. 1, 2 e 3 do CPP é, naturalmente, uma decisão sujeita ao princípio do dever geral de fundamentação das decisões, consignado constitucionalmente no art. 205.°, n.° 1 da CRP e também no art.° 97, n.° 5 do CPP., impondo-se que sejam ainda especificados os motivos de facto e de direito da decisão, pelo que jamais bastaria remeter apenas, como foi feito, para a fórmula de cómodo: “face à prova produzida em audiência de julgamento” ou “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada)”. 23. Ao não fundamentar a decisão recorrida o Tribunal a quo cometeu também uma irregularidade processual, que foi tempestivamente arguida e deve ser declarada. 24. A interpretação normativa conjugada dos art.°s 97º, n.° 5, 358.° e 359° do C.P.P. efectuada pelo Tribunal a quo, no sentido de que a comunicação de alteração de factos do despacho de pronúncia se basta com a indicação dos novos factos que considera indiciados e cuja fundamente se limita a remeter para toda a prova produzida nos autos, sendo esta constituída por centenas de declarações e depoimentos de assistentes, testemunhas, peritos e milhares de documentos, é inconstitucional por violação do dever de fundamentação das decisões e das garantias de defesa do arguido consagrados nos art.°s 205.º, n.° 1 e 32.º da CRP e do princípio a um processo equitativo tal como consagrado no art.° 6.º, n.°s 1 e 3, als. a) e b) da C.E.D.H. 25. A interpretação normativa do dis(...) nos art.°s 97.°, n.° 5 e 358.° e 359.° do C.P.P. conforme àqueles preceitos constitucionais e do princípio a um processo equitativo tal como consagrado no art.° 6.°, n.°s 1 e 3, als. a) e b) da C.E.D.H., impõe que no despacho proferido ao abrigo e para os efeitos do dis(...) no art.° 358.° e 359.° do C.P.P. sejam especificados os motivos de facto e de direito da decisão proferida, devendo a fundamentação ser eficiente para o exercício de todas as garantias de defesa constitucionalmente salvaguardadas. 26. Termos e fundamentos porque deve ser declarada a arguida nulidade e, em consequência, determinado que o Tribunal a quo fundamente de facto e de direito a decisão de comunicação de alteração dos factos da pronúncia, enunciado a prova indiciária que em cada caso concretamente determinou a prolação de despacho de comunicação de alteração dos factos. 27. Vem o presente recurso inter(...) ainda do despacho proferido na mesma sessão de 26.02.10 da Audiência de Discussão e Julgamento na parte em que aprecia e decide sobre o requerimento de produção de prova de fls. 64.848 a 64.858, apresentado pelo arguido na sequência do despacho de comunicação de alterações do despacho de pronúncia proferido na AJ de 11.01.10, na parte em que decidiu sobre a questão prévia e indeferiu a realização de parte das diligências de prova ali requeridas - Ponto II., 5 e 5.1, fls. 65.193 a 65.195. 28. Conforme resulta de II. da presente Motivação, em 23.11.09, o Tribunal a quo comunicou ao arguido as alterações dos factos levados ao despacho de pronúncia relativamente aos crimes imputados ao recorrente ali referidos nos termos ali referidos. 29. Face aos termos da comunicação efectuada quanto ao Assistente AT, veio o recorrente veio requerer as diligências de prova levadas ao ponto III. do seu requerimento probatório, ou seja a inquirição dos proprietários e/ou arrendatários dos imóveis situados nas Ruas (…) e a Rua (…), pedindo em questão prévia o esclarecimento do despacho ali proferido na parte em que refere “e na zona dessas ruas”, tendo em vista a audição dos proprietários e/ou arrendatários dos restantes imóveis abrangidos por aquelas não identificadas ruas. 30. Surpreendentemente, na decisão ora recorrida, aquilo que nos termos do despacho proferido em 23.11.09 e 11.01.10 supra transcritos fazia pressupor que seria uma zona situada na confluência ou proximidade daquelas duas delimitadas ruas, afinal abrangia todas as ruas do bairro (…), e por consequência todas as moradias do Bairro (…) em (…), como decorre do do ponto II. 5 e 5.1., al. a) do despacho recorrido, a fls. 65.193 a 65.195, em resposta à questão prévia/esclarecimento suscitado pelo recorrente, no qual se esclarece que “O Tribunal não limitou a comunicação a moradia que se situasse nas Ruas (…)e na Rua (…). A comunicação abrangeu moradia localizada no (…), No bairro de moradias em que se situam as Ruas (…) e a Rua (…). E na zona dessas ruas, mas não limitada a localização a uma dessas duas ruas.” 31. Tal esclarecimento não pode deixar de ser entendido como integrando o despacho de comunicação de alteração dos factos iniciaimente proferido, alterando a indiciação dos factos do despacho no sentido do alargamento da local de cometimento do imputado ilícito criminal, pelo que dele se recorre. 32. Importa antes de mais afirmar a máxima relevância do esclarecimento agora prestado na compreensão da conduta do Tribunal a quo na perspectiva que tem adoptado do que são os direitos de defesa do arguido e a garantia efectiva desses direito, porquanto do despacho de comunicação de alterações, não se pode inferir que o Tribunal a quo estendeu, ainda que indiciariamente, a localização do local onde alegadamente ocorreu o abuso sexual na pessoa do assistente AT, a toda e qualquer moradia localizada no (…) como agora se vem dizer no despacho recorrido. 33. O que é de extrema gravidade, na medida em que para além da falta de fundamentação do despacho de comunicação de alteração, eleva para um nível de indeterminação absolutamente insustentável o local de cometimento do imputado ilícito criminal e, consequentemente, o exercício do direito de defesa e sem que no despacho de comunicação de alterações o tenha deixado claro para o arguido, antes sugerindo um delimitação do local mais restrita do que aquela que afinal pode vir a considerar na decisão a proferir. 34. Ao alterar o sentido da comunicação inicialmente efectuada - abrangendo as ruas ali identificadas e a zona dessas ruas - alargando ainda mais e de forma insustentável o espaço/localização do cometimento do ilícito - para todo o bairro do (…) - manifesto é que tal alteração para além de extemporânea, consubstancia uma alteração substancial dos factos. 35. O Arguido tem presente que a iniciativa de alteração dos factos prevista nos art.°s 358.° e 359.º do CPP pode ter lugar, a requerimento de qualquer um dos sujeitos processuais, ou oficiosamente, até ao final da discussão da causa. Contudo, a interpretação da oportunidade da convocação do instituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal - “se no decurso da audiência” -, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do sistema processual penal, constitucional, numa compaginação dos direitos de defesa e respectivas garantias e do dever de perseguir a verdade material. 36. Referimo-nos ao confronto, não necessariamente antagónico e dissonante, entre os direitos dos Arguidos, e também dos Assistentes, e o dever de descoberta da verdade material e realização da justiça no caso concreto, ainda que, como refere Figueiredo Dias, “…deve ter-se presente que o princípio da investigação que integra e completa o princípio do contraditório não tem por missão essencial suprir as deficiências dos representantes das «partes», sob pena de se transformar o processo de contraditório em inquisitório.”. 37. Com a comunicação de alteração de factos ao ora Recorrente não está, pois, em causa, a subsequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efectivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efectivo das garantias de defesa consagradas no art.° 32.º da CRP. 38. Até porque a alterações em questão quanto ao Assistente AT, de um local determinado para um não concretamente apurado numa zona inicialmente algo vaga, e agora abrangendo todo o bairro do (…), configura, em boa verdade, uma nova acusação que, como tal, implica uma nova contestação, com indicação da prova que for tida por adequada, respectiva produção, enfim, um novo julgamento sobre tal matéria, o que tudo prolongaria de forma insustentável e injustificável os presentes autos. 39. Se bem que a lei não determine expressamente o tempo em que alterações de factos podem ser requeridas ou aquele em que Tribunal, caso as decida ex officio, as deverá comunicar, certamente que as normas constantes dos arts. 358.° e 359.º do CPP não terão sido pensadas para mega-processos, como é o caso dos presentes autos. 40. De igual modo não será neutra ou irrelevante a inserção sistemática daqueles preceitos legais, que surge antes da norma referente às alegações orais, que, por sua vez, precede a norma referente às últimas declarações de Arguido e ao encerramento da discussão (devendo entender- se, até por razões de elementar lealdade processual, que tais alterações se devem suscitar, como literalmente dispõe o art.° 358.º, n.° 1 do CPP, “no decurso da audiência”, nomeadamente no momento em que se descortina a alteração não substancial). 41. O respeito pela sequência decorrente da sistematização legal - que, repita-se, não poderá ter-se por neutral no que respeita à “normal” tramitação do processo, há-de impor-se por elementares exigências de asseguramento da máxima extensão das garantias de defesa. 42. No caso vertente, tratando-se de um mega-processo cujo julgamento se prolonga há mais de cinco anos e em que a prova carreada para os autos pela acusação quase se limitou às declarações dos Assistentes, tendo estas terminado mais de três anos antes do fim da discussão, a aplicação da norma constante do art.° 358.º do CPP deverá revestir-se de particulares cuidados, sob pena de vir a pôr-se inapelávelmente em causa as garantias de defesa dos Arguidos. 43. E a verdade é que, no presente caso, não há nem houve qualquer justificação atendível para que o Tribunal não tivesse comunicado as alterações que entendesse em momento anterior àquele em que deliberou fazê-lo, o que consistiria na única forma de, em homenagem ao princípio da lealdade processual, assegurar as garantias de defesa, a um processo justo e equitativo e à igualdade de armas entre acusação e defesa. 44. Retornando, em concreto, à decisão sob recurso, dir-se-á que uma alteração de um local concretamente situado para um local indeterminado dentro de um grande bairro de moradias, na zona de duas ruas, num período de há 10 anos atrás e agora, por virtude do despacho recorrido para todo o bairro (…) - no que concerne Assistente AT -, não pode respeitar o princípio do processo equitativo, redundando afinal numa autêntica e inadmissível alteração qualitativa da pronúncia, o que esvazia de sentido útil a defesa deduzida pelo ora Recorrente. 45. A comunicação de alterações de factos com arrimo no dis(...) no art.° 358.º do CPP também sob esta vertente se apresenta ao Recorrente como surpreendente e absolutamente inesperada, atento o momento processual em que vem a ser proferida. 46. Refira-se que no que respeita aos factos levados ao ponto 4.4.1. do despacho de pronúncia, relativamente ao Assistente AT, o Recorrente apenas cuidou de trazer aos autos, dentro do que lhe foi possível, prova de vária índole relacionada com a casa onde, segundo a Pronúncia, teria perpetrado o abuso sobre o Assistente AT, e não quanto a toda uma zona de moradias de um bairro em (…), o (…), o que, com o decorrer dos anos desde o início do julgamento, pode ter ficado, nalguma medida, comprometido! Foi destes factos concretamente delimitados - e não de outros - que o Recorrente se defendeu. 47. Desses factos cuja alteração foi comunicada, dado o período temporal decorrido, o Tribunal estava ciente da dificuldade de obtenção de prova, testemunhal e documental, como por exemplo, de registos telefónicos que já ao tempo da prolacção da acusação, dado o tempo já então decorrido, não lhe foram facultados pela operadora, por já não os possuir segundo informação junta aos autos, mas tal não inibiu o Tribunal de comunicar, entre outras, a alteração do local certo para local indeterminado da forma como o fez. 48. O decurso da audiência referido no art° 358.° do CPP como âmbito temporal da admissibilidade de alterações, tem que ser interpretado e aplicado em sintonia com o dis(...) nos art°s 360.° e 361.º, dos quais resulta que, na tramitação normal, finda a produção de prova, incluindo a sequente à comunicação de alterações, se seguem as alegações orais e a estas as últimas declarações do Arguido, sendo que a interrupção desta sequência na tramitação processual normal está admitida apenas em casos excepcionais de produção de prova superveniente, conforme o n.° 4 do art.° 360° do CPP. 49. Pelo que sem a demonstração de tais excepcionalidade e superveniência, a admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literalidade legal - “no decurso da audiência” -, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa conferida pelo art.° 32.° da CRP e do processo equitativo im(...) pelo art.° 20.°, n.° 4 da CRP e pelo art.° 6.° da CEDH. 50. A violação das garantias de defesa tem ínsita a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório, sendo a admissibilidade de alterações indiciárias é justificada pelo princípio da verdade material. Mas este princípio não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo art.° 18.° da CRP. 51. Face ao ex(...), está altamente patenteada pela conjugação da grande intempestividade da decisão com a enorme amplitude da alteração comunicada. 52. Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso na audiência, o que também está estatuído e de forma mais directa no art.° 6.°, n.° 3, al. a) da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. 53. Impossibilitando-se ou limitando-se uma defesa eficaz, prejudica-se a própria descoberta da verdade e põe-se em risco a boa decisão da causa. 54. Objectivamente, as garantias de defesa foram violadas, não podendo postergar-se as consequências dessa violação, sendo obrigação do Tribunal comunicar de forma absolutamente clara e inequívoca o âmbito das alterações comunicadas, e não de forma a induzir no visado uma ideia completamente diversa daquela que afinal o Tribunal tinha em mente. 55. Ao fim de mais de cinco anos de julgamento, não pode deixar de se entender que tal estado de coisas briga com um processo leal, justo e equitativo, o qual exige, como seu elemento co-natural, que acusação e defesa tenham a possibilidade efectiva de defender os seus interesses numa posição idêntica, e não numa situação substancial de desvantagem, em que o princípio da igualdade de armas se apresenta como elemento incindível daquele, como aliás tem sido sucessivamente reafirmado pelo TEDH. 56. Tanto mais que o Tribunal a quo, admite a dificuldade que tem tido na análise da prova produzida e constante dos autos, dada a sua dimensão, não obstante o regime de exclusividade. Contudo, retira consequências apenas num sentido, o da justificação da demora na apreciação pelo próprio Tribunal, omitindo e postergando o que tal representa para o arguido, o enorme desequilíbrio que representa para a sua defesa e o asseguramento dessas mesmas garantias, o que não é de todo admissível. 57. Assim, forçoso será concluir que a (injustificada) extemporaneidade de comunicação da alteração de factos agora em causa, viola a plenitude das garantias de defesa consagradas no art.° 32.° da CRP e o princípio do processo equitativo im(...) pelo art.° 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). 59. É claramente violador do direito a um processo equitativo e ao princípio da igualdade de armas comunicar as referidas alterações nesta fase processual, por violação do dis(...) nos art.°s 20.°, n.° 4 e 32.º, n.°s 1, 2 e 5 e 18.º, n.°s 2 e 3 da CRP e art.° 6.º, n.° 1 e 3 als. a) e b) da CEDH. 60. A interpretação normativa conjugada dos art.°s 358.°, n.°s 1 e art.° 1.° al. f) do C.P.P. que comporte o entendimento de que é possível, ao seu abrigo, alterar os factos do despacho de pronúncia em prazo muito para além do razoável, de forma tal que impeça o exercício efectivo dos direitos de defesa, é inconstitucional por manifestamente violadora do dis(...) nos art.°s 32.°, n.° 1, 2 e 5, 20.°, n.° 4 e 18., n.°s 2 e 3 da C.R.P., bem como ainda do dis(...) no art.° 6.º, n.°s 1 e 3 als a) e b) da CEDH, e como tal do direito a um processo justo e equitativo, inconstitucionalidade que deve ser declarada. 61. Por outro lado, a alteração de factos foi no despacho originário comunicada nos termos do art.° 358.°, n.°s 1 e 2 do CPP, qualificando-a o Tribunal a quo como não substancial e sustentando essa decisão nos vários despachos proferidos sobre a matéria. 62. Salta à vista que, por exemplo e quanto ao mesmo imputado crime relativamente ao Assistente AT, passar de uma (...) concretamente identificada - sita na Rua (…), n.° (…),(…),(…) - para “…moradia localizada no (…). No Bairro de moradias em que se situam as Ruas (…) e a Rua (…). E na zona dessas ruas, mas não limitada a localização a uma dessas duas ruas.” considerando que ali existem centenas de moradias, são alterações substanciais. 63. De acordo com a determinação constante de fls. 63923, do que para o Tribunal é uma alteração substancial dos factos, e no que interessa quanto às alterações comunicadas ao Recorrente, se ocorrer uma diferença de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual e que determine a imputação de crime diverso, temos uma alteração substancial dos factos. 64. Face a essa determinação que respeita a noção de alteração substancial dos factos estabelecida no art.° 1.°, al) f) do CPP, importa ter presente que nos termos do dis(...) no art.° 1.º, n.° 1 do CP que, em abstracto, crime é o facto descrito e declarado punível por lei. 65. A concretização processual da abstracção legal “crime” é feita de acordo com o estabelecido no art.° 283.°, n.° 3, al. b) do CPP: a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao Arguido de uma pena ou medida de segurança, incluindo, se possível, nomeadamente, o lugar e o tempo, sendo tal narração que, acompanhada da indicação das disposições legais aplicáveis, constitui a imputação de um crime concreto ao Arguido, imputação que o dis(...) no art.° 339.°, n.° 4 do CPP impõe que se mantenha na discussão da causa, embora “sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos”. 66. Não há facto material ou acto físico sem tempo e sem lugar, pelo que o lugar e o tempo integram ontologicamente o próprio facto ou acto, mas a sua indicação pode ser impossível, quer por indeterminabilidade, quer por não ter sido alcançada a determinação; feita a determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologicamente mas também quanto à sua cognição, pois o facto criminoso não é uma abstracção parcelada, é um facto concreto e unitário. 67. Se não for possível a determinação, o crime pode ser processualmente imputado mesmo sem a narração espacial e temporal; mas sendo possível, a imputação processual integra a narração, “ainda que sintética” (art.° 283., n.° 3, al. b) do CPP), do tempo e do lugar, mas alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado, verifica- se a imputação de um crime diverso, não é mantida a imputação do MESMO crime e a nova indiciação de um crime em concreto diverso não é confundível com a indiciação de um diverso tipo legal de crime, a qual, sem alteração da narração factual, incluindo o lugar e o tempo, constitui alteração da qualificação jurídica dos factos. 68. Só se a nova indiciação não alterar o núcleo factual narrado na imputação, limitando-se a explicitar ou esclarecer a narração, ainda que sintética, dos factos, incluindo o lugar e o tempo, é que se mantém a imputação do MESMO crime, com alteração não substancial dos factos. 69. Os limites à identidade do crime, na qualificação duma alteração, terão que ser “a total garantia dos direitos de defesa do Arguido e a prossecução da justiça e da verdade material”, pelo que, “sempre que essa alteração… ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos.”. 70. Nos crimes contra a autodeterminação sexual, dada a sua normal privacidade, o exercício da defesa incide essencialmente sobre o núcleo dos elementos temporal e espacial dos factos criminosos imputados e, se não estiver presente a total garantia dos direitos de defesa, corre-se o risco de confundir falta de prova do crime com indiciação de alterações. 71. Em consideração das garantias de defesa, são diferentes os regimes das alterações substanciais e não substanciais, sendo que quanto a estas, o art.° 358.° não vai além de possibilitar uma defesa incidental, preparada no tempo “estritamente necessário” e quanto às substanciais, porque incidem sobre o núcleo factual, incluindo as suas componentes temporal e espacial, não estando, em princípio, totalmente garantida a defesa no próprio processo, o art.° 359.° impõe que não sejam tomadas em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, admitindo o procedimento pelos novos factos em novo processo, com as mesmas possibilidades de defesa proporcionadas ab initio no processo em que foram comunicadas as alterações. 72. É uma evidência que quanto ao mesmo imputado crime relativamente ao Assistente AT, passar de uma (...) concretamente identificada - sita na Rua (…), n.° (…),(…),(…) - para “...moradia não concretamente apurada mas localizada no (…), em (…)”, considerando que ali existem centenas de moradias, traduz uma alteração substancial. 73. Ocorre nestas alterações uma diferença de espaço, que transforma o quadro factual descritos no despacho de pronúncia em outro diverso, manifestamente diferente no que se refere aos seus elementos relevantes de construção e identificação factual e que determina a imputação de crime diverso e num lapso de tempo demasiado amplo. 74. O que determina a imputação de um crime diverso, já que não é o mesmo crime um abuso sexual ocorrido numa (...) sita na Rua (…), n.° (…),(…),(…)e o abuso sexual ocorrida numa qualquer (...) sita no Bairro (…), já que esta narração constitui o núcleo do lugar que integra o crime imputado, a realidade unitária do facto criminoso pelo que, também considerando as garantias de defesa, esta substituição de indiciação constituem alteração substancial dos factos. 75. O recorrente preparou há cinco anos a sua defesa relativamente a um imputado crime numa moradia concretamente identificada no despacho de pronúncia, não respeitando de modo algum as suas garantias de defesa, ser restringido, decorridos cinco anos, à possibilidade duma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que teria acesso em 2004, quando foi notificado da acusação proferida ou ainda em 2005 e 2006 quando aqueles assistentes terminaram as suas declarações. 76. Acrescente-se que, por natureza, a alteração não substancial dos factos comprime inevitavelmente as garantias de defesa e bole com a estrutura acusatória do processo penal, uma vez que o tribunal de julgamento estará inevitavelmente a imiscuir-se na indiciação de factos que não constam da acusação, interferindo em área que a Constituição da República Portuguesa (CRP) e a lei processual penal reservam ao Ministério Público e, com estritos limites, ao juiz de instrução criminal. 77. Que o possa fazer ao abrigo da faculdade prevista no art.° 358.° do CPP, com latitude necessariamente restrita e em homenagem a princípios conflituantes, como os da investigação e da descoberta de verdade material, é algo que o Recorrente não contesta em tese geral, mas, na aplicação que do art.° 358.º, n.° 1 do CPP o Tribunal a quo fez ao caso concreto, atentas as circunstâncias e as consequências a que supra se aludiu, resulta clara e inevitavelmente violada aquela norma legal, bem assim como os princípios constitucionais constantes dos art.° 32.°, n.°s. 1, 2 e 5 da CRP. 78. A alteração referida no despacho ora recorrido, ao vir substituir os factos da pronúncia por factos novos, que transformam o quadro factual descrito noutro manifestamente diferente no que respeita aos seus elementos integrantes, constitui verdadeira alteração substancial de factos, enquadráveis no regime previsto no art.° 359.º do CPP, e não do art. 358.º, pois delas resulta a imputação de um facto diverso - cfr. o art. 1°, al. f) do CPP, pois que da alteração decidida resulta, não a mera especificação dos factos descritos na pronúncia, mas uma inovação do quadro fáctico relativo às circunstâncias de lugar e tempo, com imputação de um crime diverso. 79. Face ao ex(...), a decisão recorrida é inválida por violação do dis(...) nos arts. 358.°, n.° 1, 359.° e 1.° al. f) do CPP., pelo que ao considerar que as alterações comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar do crimes imputado é não substancial, a douta decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, os art°s 1º., al. f) e 358.° do CPP, disposições que, nessa interpretação normativa são inconstitucionais, por violarem as garantias de defesa conferidas pelo art.° 32.°, n.°s 1, 2 e 5 da CRP, inconstitucionalidade que desde já se suscita e se pretende seja declarada. 80. Relativamente a uma pronúncia por um concreto conjunto de factos abrangendo um local determinado, apreciado num julgamento que se prolongou por cinco anos, a comunicação da alteração dos mesmos para um local indeterminado de todo um amplo bairro e feita de forma não fundamentada, redunda num inapelável juízo de inconstitucionalidade. 81. O sentido interpretativo da norma do art.° 358.°, n.° 1 do CPP que veio a acobertar tal comunicação está ferido de inconstitucionalidade, por violação do dis(...) no art.° 32.°, n°s. 1, 2, e 5 da CRP, ou seja, por violação dos princípios da máxima extensão dos direitos de defesa em processo penal (em conjugação com o art.° 18.º, n.° 3 da CRP) e da presunção de inocência, do direito a um processo leal, equitativo e célere, da estrutura acusatória do processo penal e do contraditório, entendido este na sua única conformação constitucionalmente admissível, como princípio de conteúdo material e dotado de plena eficácia, inconstitucionalidade essa que, desde já, se deixa arguida e se pretende seja declarada 82. O Tribunal a quo também não fundamentou tal alteração dos factos da pronúncia - que aliás nem comunicou - padecendo a decisão de vício de falta de fundamentação nos precisos termos constantes do ponto II. da presente Motivação que aqui se dá por inteiramente reproduzida nos termos e para os legais efeitos. 83. Face ao ex(...) e aos termos da comunicada alteração de 23.11.09, 14.12.09 e 11.01.10 o Recorrente veio requerer as diligências de prova constantes do seu requerimento probatório junto a fls. 64.848 a 64.858 que aqui dá por inteiramente reproduzido. 84. Dessas diligências probatórias o Tribunal a quo entendeu deferir o requerido no ponto II. b) - visionamento do DVD da deslocação do Tribunal à moradia identificada em 4.1.1. do Despacho de Pronúncia - e a inquirição de 10 (dez) testemunhas das indicadas no ponto III. do mesmo requerimento, devendo o arguido indicar em 5 (cinco) dias as testemunhas seleccionadas, sob pena de se considerarem as dez primeiras, indeferindo o mais ali requerido. 85. Como resulta do despacho recorrido, o Tribunal compreendeu perfeitamente que a produção da prova testemunhal foi indicada em consequência da comunicação da possibilidade de alteração dos factos descritos no ponto 4.1.1. do Despacho de Pronúncia “e para indagação da componente espacial dos factos na versão comunicada.”. 86. Mas concluindo que não é necessário “…para garantir o eficaz exercício da Defesa “toda a prova testemunhal que o arguido requer, em relação a todos os edifícios que se situem na Rua (…), Rua (…), ruas confluentes e que com as mesmas se cruzem, tendo em consideração a fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento!, sendo no seu entendimento desproporcionado face ao art.°s 32.º, n.°1 e 5 e 20.°, n.°s 1 e 4 da CRP e art.° 6.° da CEDH que para prova de tal elemento objectivo, mas não essencial o Tribunal deva admitir tal número de testemunhas. 87. Acabando por afirmar-se ainda no despacho recorrido que “... no decurso da audiência fossem feitas perguntas (ou requeridas diligências), quer em relação aos Assistentes, quer em relação às testemunhas, sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia.”! 88. Ora, no que respeita à concreta comunicação de alteração dos factos levados ao ponto 4.1.1. do despacho de pronúncia importa salientar que face aos termos da comunicada alteração o recorrente veio requerer as diligências de prova levadas ao ponto III. do seu requerimento probatório, ou seja a inquirição dos proprietários e/ou arrendatários dos imóveis situados nas Ruas (…) e a Rua (…), pedindo o esclarecimento sobre na parte em que ali ainda se refere “e na zona dessas ruas”, tendo em vista a audição dos proprietários e/ou arrendatários dos restantes imóveis abrangidos pela designação “zona dessas ruas” constante do despacho proferido. 89. Tal moradia vinha identificada concretamente identificada no despacho de pronúncia - Rua (…), n.° (…),(…)- e por isso foi em relação a esse específico local que relativamente a tal ilícito imputado ao recorrente este se defendeu. 106. O que aliás o Tribunal a quo reconhece no despacho recorrido quando afirma que o arguido “…quando no início do julgamento preparou a sua defesa e quando ao longo do julgamento a desenvolveu, fê-lo tendo como enquadramento um prédio certo e determinado o n.° (…) da Rua (…)”. 90. Só que, ao contrário do referido no despacho recorrido, o arguido não teve sequer necessidade de no decurso da audiência de discussão e julgamento se defender em relação a qualquer outra (...) localizada no (…) na medida em que, tendo-se o Tribunal a quo deslocado a tal moradia no decurso da audiência, com a presença dos assistentes AT e AP, estes afirmaram terem-se deslocado àquela concreta moradia e ali sido cometido o pretenso abuso sexual na pessoa do assistente AT, cfr. documentado no DVD que contem a gravação audiovisual dessa diligência e que instrui o presente recurso. 91. Pelo que seria absolutamente irrelevante que o Tribunal tivesse permitido que “... fossem feitas perguntas ou requeridas diligências, sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia”, já que os referidos assistentes confirmaram a moradia constante do despacho de pronúncia! Tal moradia vinha identificada concretamente identificada no despacho de pronúncia - Rua (…), n.° (…),(…)- e por isso foi em relação a esse específico local que relativamente a tal ilícito imputado ao recorrente este se defendeu. 92. Acresce que, de acordo com o dis(...) no art.° 340.° do CPP, o Tribunal deve obstar à produção dos meios de prova cujo conhecimento não se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. 93. Contudo, diferentemente do sustentado na decisão recorrida, tal não implica que o pedido de produção de meios de tenha de ser acompanhado de uma justificação, já que tal obrigatoriedade não consta nem resulta do dis(...) no art.° 315.° do CPP, quanto à prova da defesa das imputações indiciárias feitas na acusação ou na pronúncia, nem do art.° 358.º, quanto à prova da defesa da imputação de novos factos indiciários resultantes de alteração de factos descritos na pronúncia, tanto mais que dis(...) no art° 358.° estipula a possibilidade de alteração de factos, mas a sua efectiva alteração, naturalmente em termos indiciários, pois refere-se à alteração de factos descritos na acusação ou na pronúncia. 94. Com a comunicação da alteração dos factos, o arguido fica, pois perante outra pronúncia com a inerente alteração do objecto do processo. 95. Ora, o poder-dever de descoberta da verdade material imporia antes de mais que o Tribunal, se em concreto entendesse necessária justificação do pedido de produção de meios de prova, disso notificasse o recorrente, o que não aconteceu e nem sequer era o caso já que ressalta do despacho recorrido que o Tribunal compreendeu perfeitamente a razão e o sentido da prova testemunhal que veio a indeferir. 96. Mas tal nem era necessário, pois a necessidade da requerida e indeferida produção de meios de prova é manifesta face às alterações comunicadas, para a descoberta da verdade, não se impondo a especificação pelo arguido das razões concretas pelas quais considera relevante e necessária a audição de novas testemunhas, o que aliás decorre do próprio despacho recorrido na parte onde se afirma que “esta comunicação de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância do “tempo” ou “lugar” em que os actos poderão ter sido praticados pode interferir com o exercício eficaz da Defesa do arguido”. 97. Acresce que como já referido, o recorrente foi pronunciado com a componente espacial no n.° (…) da Rua (…), tendo tal componente sido, arbitrária e infundamentadamente alargada a todo o bairro do (…) o que, como supra se deixou referida, corresponde a indeterminação que afecta de forma inequívoca o exercício do direito de defesa. 98. O recorrente interpretou a alteração como relativa determinação espacial, já processualmente consentânea com a produção de prova testemunhal com alguma eficácia, pois se assim não fosse a alteração indiciária comunicada seria inútil, não podendo ainda tal prova ser drástrica e arbritrariamente reduzida à audição de 10 (dez) testemunhas de entre as indicadas de acordo com critério que não tem suporte legal. 99. Considerada aquela determinação, o recorrente não pode ser privado, impedido, da possibilidade de defesa, cabendo-lhe a ele a definição da estratégia da sua defesa. 100. A invocação da falta de justificação para o indeferimento de produção de meios de prova, requeridos na sequência de comunicação da alteração de factos descritos na pronúncia, bem como o indeferimento da produção da prova testemunhal indicada com fundamento na desnecessidade da mesma para uma defesa eficaz, é violadora do dis(...) nos art.°s 340.º e 358.° do CPP, por erro de interpretação e aplicação, bem com as garantias de defesa asseguradas ao arguido por virtude do dis(...) no art.° 32°, n.°s 1 e 5 da CRP e o dis(...) no art.° 6.° da CEDH.. 101. O Tribunal considera que se verificam os fundamentos do n° 1 do art° 340º do C.P.P., logo, o indeferimento da produção de prova estaria limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superfluidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória, conforme dispsoto nos n.°s 3 e 4 do mesmo normativo legal, o que não é o caso. 102. Com efeito, face à extensão da alteração espacial que foi comunicada, não restava ao arguido outra alternativa que o da produção da prova requerida, já que a inquirição daquelas testemunhas é essencial para a descoberta da verdade material e surge perfeitamente justificada à luz do princípio do contraditório consagrado no art.° 358.°, n.° 1, do CPP. 103. Com a comunicação de alteração de factos ao ora Recorrente não está, pois, em causa, a subsequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efectivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efectivo das garantias de defesa consagradas no art.° 32.º da CRP. 104. Até porque a alterações em questão quanto ao Assistente AT, de um local determinado para um não concretamente apurado numa zona extensa, configura, em boa verdade, uma nova acusação que, como tal, implica uma nova contestação, com indicação da prova que for tida por adequada e respectiva produção. 105. O despacho proferido, na limitação imposta quanto à inquirição de apenas 10 testemunhas avaliou erroneamente a utilidade e relevância das diligências probatórias requerida, cerceando de forma intolerável a possibilidade de o recorrente exercer eficazmente a sua defesa, dessa forma violando de forma grave e irreparável o direito de defesa, impedindo-o de contrariar, fosse de que maneira fosse, a nova factualidade que lhe é imputada. 106. O que consubstancia inequívoca violação do dis(...) no art.° 32.º, n.°s 1 e 5 da C.R.P., dos art°s 358.°, n.° 1 e 340,° do C.P.P. e art.° 6.º da C.E.D.H., , pelo que violou, de forma grave, o direito do arguido à sua defesa, tal como é configurado pelo art. 32° n° 1 da CRP e pelo art. 6° da C.E.D.H 107. A interpretação normativa conjugada dos art.°s 97.º, n.° 5, 358.° e 359° do C.P.P. efectuada pelo Tribunal a quo, no sentido de que a comunicação de alteração de factos do despacho de pronúncia se basta com a indicação dos novos factos que considera indiciados e com remissão para toda a prova produzida nos autos, é inconstitucional por violação do dever de fundamentação das decisões e das garantias de defesa do arguido consagrados nos art.°s 205.º, n.°1 e 32.°, n.°s 1 e 5 da CRP e art.° 6.° da C.E.D.H. 108. A interpretação normativa do dis(...) nos art.°s 97.º, n.° 5 e 358.° e 359.° do C.P.P. conforme àqueles preceitos constitucionais e ao dis(...) no art.° 6.° da C.E.D.H. impõe que no despacho proferido ao abrigo e para os efeitos do dis(...) no art.° 358.º e 359.° do C.P.P. sejam especificados os motivos de facto e de direito da decisão proferida, devendo a fundamentação ser eficiente para o exercício de todas as garantias de defesa constitucionalmente salvaguardadas. Termos em que com o douto suprimento de Vossas Excelências deve, em provimento do presente recurso, serem revogados os despacho proferidos, julgando-se procedentes as arguições de irregularidades e revogando-se o despacho de comunicação de alterações dos factos, bem como o de indeferimento da prova requerida, a qual deve ser admitida, como é de JUSTIÇA.” Inconformado com aquele despacho, dele também recorreu o arguido H, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “A) Através de despacho proferido em audiência de 26 de Fevereiro de 2010, o Tribunal indeferiu todas as diligências probatórias requeridas, na sequência de comunicação que foi feita ao abrigo do art. 358° n° 1 do C.P.P. B) Quanto às 27 testemunhas arroladas no art. 8° do requerimento probatório em apreço, com o objectivo de desfazer a indiciação de que o assistente AP teria ido ao prédio da Av. (…) no contexto escrito na alteração efectuada no ponto 5.2.3 do despacho de pronúncia, a defesa de H pretende que sejam ouvidas pessoas que moraram, trabalharam ou frequentaram o prédio em apreço no novo período em referência para a prática de actos que envolvem o assistente AP e o ora Recorrente. C) Quanto às outras diligências requeridas, o arguido, ora Recorrente, embora as considere úteis, por uma questão de economia processual, conforma-se com o despacho proferido, com a excepção abaixo referida, até para não obscurecer o seu propósito central: a demonstração inequívoca e consistente de que a alteração temporal acima referida é insubsistente, para o que podia contribuir a inquirição de pessoas que moraram, trabalharam ou frequentaram o local em apreço no novo período temporal definido. D) Mas há uma outra diligência probatória que é inaceitável que tenha sido recusada: a reinquirição do assistente AP sobre as alterações supra referidas nos n°5 2 e 3, que lhe dizem respeito e são susceptíveis de afectar a defesa do arguido, bem como sobre a entrevista que terá dado ao jornal CX, a 6 de Março de 2009 – cujo exemplar deve permanecer nos autos até que este recurso seja decidido –, a qual contém referências muito relevantes a mentiras proferidas por outras alegadas vítimas, com referência ao processo em curso. E) Pelo ex(...), o despacho recorrido – pelo menos quanto à inquirição das testemunhas referidas no art. 8° do requerimento probatório em apreço e quanto à reinquirição do assistente – avaliou erroneamente a utilidade e relevância das diligências probatórias requeridas, pelo que violou, de forma grave, o direito do arguido à sua defesa, tal como é configurado pelo art. 32° n° 1 da CRP e pelo art. 60 da C.E.D.H., impedindo-o de contrariar, fosse de que maneira fosse, a nova factualidade que lhe é imputada. Termos em que o recurso merece provimento, com as legais consequências”. O Magistrado do Ministério Público na 1.ª instância apresentou resposta a estes recursos, concluindo (em transcrição) que: “2) - DOS RECURSOS O que, nos Recursos inter(...)s pelos Arguidos E, H e K, é comum a todos eles, prende-se com o (A)) indeferimento da produção de prova, requerida na sequência da comunicação das alterações, a que o Tribunal procedeu, ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP. O Recurso inter(...) pelo Arguido cinge-se, de resto, a essa questão. Por sua vez, os Arguidos H e K, impugnam, ainda: - O Despacho recorrido, na parte em que indeferiu a arguida irregularidade/nulidade, relativamente à pretensa (B)) falta de fundamentação do Despacho originário, proferido em 11.01.2010, bem como na parte em que invoca a (C)) inconstitucionalidade do sentido interpretativo, subjacente à aplicação do art° 358°, do CPP, no Despacho recorrido; - O Arguido K, por sua vez, indo mais longe, recorre, igualmente, do Despacho proferido em 26.02.2010, por pretensa (D)) extemporaneidade da comunicação de alterações operada ao abrigo do art° 358°, do CPP, e, por fim, por discordância quanto (E)) à qualificação da natureza das alterações de factos comunicadas, como não substanciais, quando, alegadamente. o deveriam ter sido como alterações substanciais. Pese embora a posição que assumimos, relativamente ao que entendemos dever ser o âmbito de admissão dos Recursos, por mera cautela, não deixaremos de tratar das questões relativas aos segmentos cuja apreciação se entende, em conformidade, prejudicada. Seguir-se-á, assim, a ordem das questões suscitadas, tal como vêm de elencar-se. A) - INDEFERIMENTO DA PRODUÇÃO DE PROVA, NA SEQUÊNCIA DA COMUNICAÇÃO OPERADA AO ABRIGO DO DIS(...) NO ART° 358°, DO CPP A comunicação de alterações não substanciais dos factos descritos no Despacho de Pronúncia, ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP, releva, em última análise, de uma pré-extensão do princípio da livre apreciação da prova. Todavia, porque do que, nesta fase, se trata, mais não é do que de prova indiciária, inexistem, quanto a ela, os requisitos de fundamentação que se impõem, sede de decisão final, nomeadamente, pela exigência do correspondente exame crítico. Do que ali se trata mais não é, afinal, do que (na expressão do Ac. do TC n° 387/2005, de 13.7.2005), uma “convicção provisória” considerar como possíveis enquadramentos diversos, embora não substancialmente diversos, dos factos que, originariamente, corporizaram o objecto do processo. Do que, a final, ao invés, se tratará, é, já não de meras possibilidades, mas do que o Tribunal venha, em definitivo, a, convictamente, acolher como resultado da apreciação global da prova, dando como provados, ou como não provados, os factos sujeitos a juízo. Daqui resulta que, sendo a comunicação o corolário de uma apreciação, necessariamente precária, da globalidade da prova até então produzida, a prova que venha a ser indicada pelas Defesas não possa deixar de ser aferida pelos critérios emergentes do art° 340º, do CPP, designadamente, pelos princípios da necessidade, da adequação e da viabilidade de obtenção, sendo, consequentemente, de afastar, a possibilidade de uma mera indicação potestativa de prova, cuja produção se imporia ao Tribunal, como resultado daquela. Por outro lado, a necessidade, ou não, de produção de prova suplementar, não pode, tão pouco, deixar de aferir-se pela prova já produzida. Na verdade, se é certo que os novos factos podem legitimar a necessidade de admissão de prova já produzida, (...) que, no âmbito das respectivas instâncias não se tenham levado em conta as alterações entretanto comunicadas, já não, assim, quando aos Sujeitos Processuais tenha sido dado ensejo de contraditar tal prova, muito para além do que, então, se constituía como objecto do processo e, de tal sorte que os novos factos tenham já sido amplamente debatidos em sede de audiência. Acresce que a “preparação da defesa” a que alude o n° 1, do art° 358°, do CPP, jamais se poderá constituir como pretexto para produção de prova que não esteja relacionada com as alterações comunicadas pelo Tribunal, sob pena de se permitir, nesta fase, um aditamento anómalo relativamente a factualidade que já constava da versão originária dos factos descritos no Despacho de Pronúncia. Aliás, todos os Requerimentos então formulados pelas Defesas dos Arguidos o terão sido à luz dos princípios que, em suma, vêm de enunciar-se, (...) que todos eles, ao formulá-los, os formalizaram sob a forma de Requerimentos de Prova, entendimento que, de resto, expressamente, reiteram nas Motivações de Recurso a que ora cumpre responder. Ter-se-á, por fim, em conta, que as alterações comunicadas ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP, e no que aos Arguidos em causa diz respeito, o foram por Despachos proferidos nas sessões de julgamento de 23 de Novembro e 14 de Dezembro de 2009, reparados - embora não quanto aos respectivos conteúdos das alterações propriamente ditas -, por Despacho proferido na sessão de 11.01.2010. As arguições de irregularidades/nulidades que, acto contínuo, foram suscitadas pelas Defesas dos Arguidos, ora Recorrentes (para além de o terem sido, igualmente, pela Defesa do Arguido C), foram decididas pelo Despacho ora recorrido, proferido na Sessão de 26.02.2010. No mais, Excelentíssimos Senhores Desembargadores, cumpre-nos remeter para a excelência do Despacho recorrido, o qual se sustenta a si próprio, estribado numa fundamentação claríssima, exaustiva, ponderada e - permita-se-nos dizê-lo - absolutamente irrefutável. Dizer mais - se mais houvesse para dizer, que não há -, seria, forçosamente, dizer pior. Não obstante, porque particularmente esclarecedor da filosofia e dos fundamentos que o enformam, transcrevem-se, com a devida vénia, breves excertos do Despacho em causa, os quais, a nosso ver, ilustram, por forma particularmente impressiva, a desnecessidade de considerações acrescidas:(…) B) - FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO Atendendo às razões que expendemos, no preâmbulo da presente Resposta, quanto à não admissibilidade de recurso, como referimos já, abordar-se-á, condicionalmente, a questão relativa à pretensa falta de fundamentação do Despacho recorrido (para além de nos revermos, sem inúteis e redundantes acréscimos, fundamentos, reiteradamente, explanados, a esse respeito, em sucessivos Despachos, os quais, com a devida vénia, aqui se têm por considerados). Face ao teor do dis(...) no art° 358°, do CPP (norma invocada), já quanto aos Despachos reparados, não se via que outra fundamentação, sem extravasar, pudesse/dever-se exigir-se aos referidos Despachos. Todavia, ainda assim, entendeu o Tribunal proceder à sua reparação, acrescendo fundamentação probatória aos Despachos que comunicaram as alterações. Os Recorrentes, não obstante, defendendo uma interpretação restritiva do artº 358° (interpretação essa que mal se alcança em que possa consistir, (...) que, como referido infra, o desiderato último conciliador dos princípios em conflito prescindirá da prevalência de uns sobre os outros, sob pena de correspondente prevalência de um sistema puramente inquisitório sobre o paradigma acusatório, ou vice-versa, o que, de forma unânime, é repudiado pela Doutrina e pela Jurisprudência), reiteram a alegação segundo a qual inexiste fundamentação bastante como substracto do Despacho relativo à comunicação das alterações. Fica, implicitamente, claro, desta argumentação, que os Arguidos H e K entendem que o Tribunal deveria fundamentar o Despacho em termos em tudo idênticos à fundamentação que é exigida às sentenças, ou, quando muito, à justificação exigível ao Juiz de Instrução, quando profere Despacho de Pronúncia. Que assim seja, é, justamente, afastado pela própria natureza eminentemente acusatória do processo penal português. Como é sabido, uma das marcas impressivas de tal estrutura consiste na diferenciação clara entre as diferentes fases processuais - Inquérito, Instrução e Julgamento. Daí os impedimentos, taxativa- mente enumerados no art° 400, do CPP, que obstam a que qualquer juiz que, num determinado processo, tenha aplicado medida de coacção prevista nos art°s. 200º a 202° (a)), ou que tenha presidido a debate instrutório (b)), possa intervir em julgamento, recurso, ou pedido de revisão, nesse mesmo processo. Desse modo, compreende-se que a fundamentação do juiz da Pronúncia lhe seja exigível, nomeadamente, por explicitação dos indícios que considere verificáveis, justamente porque, estando em causa um juízo precário e perfunctório, ele não se reflectirá, ao menos de forma directa, no que venha a ser a decisão final que culmine um julgamento. Diferentemente se coloca o problema em sede de julgamento. Exigir-se ao Tribunal que fundamentasse, nos termos sobreditos, a comunicação de alteração de factos que opera ao abrigo do art° 358°, do CPP, discutindo e valorando a prova - ainda que a título meramente indiciário -, abstraindo que será o mesmo Tribunal que, a final, ao proferir o Acórdão, terá que o fundamentar, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, constituir-se-ia, por uma lado, numa virtual pré-valoração da fundamentação do Acórdão, e, por outro lado, na abertura de um espaço potencial de conflitualidade indesejável e virtualmente perniciosa, antecipando , prematuramente, um debate que a Defesa não está impedida de reabrir, (...) que lhe é dada oportunidade de se reorganizar, requerendo produção de prova suplementar. De resto, como decidiu o TC, no Ac. n° 442/99, de 8.7.1999, “o princípio da presunção da inocência “não é obviamente susceptível de «apagar» a realidade dos factos, demonstrada efectivamente em audiência, processada com todas as garantias de defesa do arguido”; bem como que “a circunstância de o tribunal se aperceber de tais factos no decurso da audiência e exercer o poder-dever de os valorar em nada contende com o princípio da independência e imparcialidade do julgador.” -destaque e sublinhado nossos. Tão pouco será atendível o argumento segundo o qual, porque se trate de processo de especial complexidade, mais se exigiria ao Tribunal que indicasse, especificadamente, os meios de prova a que atendeu para proceder à comunicação das alterações. Primeiro, porque nada na lei estabelece regime diferenciado, consoante se trate, ou não, de processo de especial complexidade ou de “longa duração”. Depois, porque a prova foi produzida em audiência, à vista de todos os Sujeitos Processuais, os quais não podem exigir do Tribunal que lhes forneça um qualquer índice, ou sinopse, actualizados com as incidências do julgamento. A pretendida fundamentação bastar-se-ia com a própria natureza e disciplina da comunicação operada ao abrigo do dis(...) no art° 358° (e/ou 359°), do CPP, estando intrínseca e implicitamente com ela relacionada e emergindo da avaliação global da prova, até então, necessariamente precária, uma vez que, só em sede de Acórdão, poderá/deverá ser expressa e criticamente analisada. Como refere Frederico lsasca, os poderes de investigação do Tribunal não podem extravasar substancialmente dos factos constitutivos do objecto do processo, “ao ponto de o facto processual perder a sua identidade e se descaracterizar, ganhando uma imagem ou configuração diversas daquela com que nasceu no processo em causa.”. A fundamentação do Despacho foi, sem mácula ou omissão, até onde lhe era permitido que fosse. Fundamentou, quanto lhe era exigível que fundamentasse, ficando claro o que se comunicava, porque, e com que base, se comunicava, ao abrigo de que norma se comunicava e quais os efeitos e consequências, reais ou potenciais, que decorrem, ou podem decorrer, de tal comunicação, sem, no entanto, descaracterizar a identidade originária dos factos, e, ainda assim, acrescido na reparação operada, pela indicação dos meios de Prova que determinaram as alterações. A exigência de fundamentação dos actos decisórios, tal como emerge do art° 97º, n° 5, do CPP, há-de conjugar-se com as exigências, especificidades e limitações de outras normas, dando-se por cumprida sempre que, dessa conjugação, resulte o quantum óptimo que, no limite, torne perceptível a razão de ser da decisão. O Despacho recorrido não só cumpriu, como reforçou, tais exigências, razão pela qual, também nesta parte, deve ser considerada improcedente a correspondente impugnação. C) - INCONSTITUCIONALIDADE DO SENTIDO INTERPRETATIVO, SUBJACENTE À APLICAÇÃO DO ART° 358°, DO CPP, NO DESPACHO RECORRIDO Os modelos penal e processual penal vigentes acolhem, a um tempo, um conceito normativo e naturalístico de facto. No conceito normativo, o facto reportar-se-á ao núcleo essencial e determinante da caracterização de um conjunto de comportamentos reais e concretos, os quais, configurando e dando corpo à norma, são por esta, conceptual e selectivamente acolhidos, por forma a legitimarem a aplicação de uma pena ou de uma medida de segurança. Por sua vez, uma concepção puramente naturalística, acolhendo, embora, aquele núcleo decisivo, diverge na sua caracterização, exigindo, antes, a concepção do facto como evento alargado, isto é, enfatizando a natureza do facto como “existência histórica, em detrimento, embora sem abstrair, da sua conceptualização normativa. Daí, algumas das dificuldades que se colocam, quando da caracterização do que deva ter-se por “facto”, para efeitos do dis(...), quer no art° 358°, quer no art° 359º, do CPP. A ultrapassagem de tais escolhos há-de fazer-se, antes do mais, pela delimitação do que seja o objecto do processo, e, com ele, a vinculação temática a que o Tribunal está sujeito. Como refere Frederico Isasca, “A definição e delimitação do objecto do processo é a charneira entre o interesse público na perseguição do crime e na aplicação do direito, ou seja, na pronta reposição dos valores de que o arguido é acusado de ter violado com um certo comportamento que se lhe imputa e os direitos inalienáveis que lhe assistem e que passam necessariamente pela possibilidade de uma defesa eficaz.”. De acordo com o art° 339°, n° 4, do CPP, “Sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos, a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.° e 369°.” - (destaque e sublinhado nossos). Por sua vez, dispõe o n° 3, do art° 283°, do CPP, que: “A acusação contém, sob pena de nulidade: a) As indicações tendentes à identificação do arguido; b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; c) A indicação das disposições legais aplicáveis; d) O rol com o máximo de 20 testemunhas, com a respectiva identificação, discriminando-se as que só devam depor sobre os aspectos referidos no n.° 2 do artigo 128.°, as quais não podem exceder o número de cinco; e) A indicação dos peritos e consultores técnicos a serem ouvidos em julgamento, com a respectiva identificação; f) A indicação de outras provas a produzir ou a requerer; g) A data e assinatura.”. (destaque e sublinhado nossos). Da conjugação dos respectivos enunciados, com os princípios a que vem de se aludir, resulta claro que, nos requisitos a que o M°P° haverá de ater-se, na estruturação de uma peça acusatória, se acolheu um conceito normativo de facto, traduzido este na exigência de “narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”, mas, já não, da obrigatoriedade de menção, de entre outras, das circunstâncias de tempo e de lugar, ainda que “relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada”, as quais deverão ser mencionadas, tão só, “se possível”. Por outro lado, a vinculação temática, típica de uma estrutura acusatória do processo, comporta excepções, coerentemente decorrentes do facto de, tal estrutura, ser mitigada por um princípio de investigação, o qual, de igual sorte, se impõe ao Tribunal. Daí que, constituindo-se a Acusação como elemento nuclear da delimitação do objecto do processo, este não se esgote naquela, antes lhe sendo adjacentes, como verdadeiros elementos estruturantes, quer os factos relevantes invocados pelas Defesas, quer os que, de igual modo relevantes, resultem da discussão da causa. Se assim é, com correspondente ênfase hão-de colocar-se as garantias de defesa, sobretudo, aquelas que, necessariamente, decorram, da mutabilidade que, ao longo do iter processual, maxime, do julgamento, seja imposta - para o que ora nos importa, de forma não substancial - à versão que, originariamente (Acusação ou Pronúncia), constituía o acervo factual de que o arguido cumpriria defender-se. É deste contexto que emerge o dis(...) nos art°s. 358° e 359°, do CPP, verdadeiro corolário do compromisso regulador entre a natureza acusatória, os princípios da investigação, da identidade e da vinculação temática, as alterações ao objecto do processo e as garantias de defesa. Numa e noutra, dessas normas, se salvaguarda a preservação da matriz que, sob pena de descaracterização, deve permanecer imutável na definição do objecto do processo, sem prejuízo das alterações que se imponham e justifiquem na demanda da verdade material, sujeitas, não obstante, a uma disciplina que não ponha em causa a amplitude dos direitos de defesa do arguido. À luz do que vem de dizer-se, não poderá deixar de concluir-se que falece razão, em toda a linha, à Defesa de K. O Tribunal, invocando, para tanto, o dis(...) nos n°s. 1 e 2, ou, nos n°s. 1, 2 e 3, do art° 358°, do CPP, comunicou “poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos,…”, uma única alteração respeitante ao Arguido K. Quanto ao Arguido K, tratou-se, tão só, de uma alteração relativa ao alargamento do local possível de consumação do facto, com referência à Pronúncia. Fica, pois, patente, que, do que se tratou, mais não foi do que uma mera modificação pontual das circunstâncias relativas ao local em que ocorreram, normativamente considerados, os factos típicos integradores dos ilícitos imputados ao Arguido. Como se viu e, crê-se, ter ficado demonstrado, a alteração de lugar (ou da data), da prática de um crime, não é elemento essencial, de entre os que, como tal, são reputados pelo dis(...) no art° 283°, do CPP. Ainda que o fosse, não estaria o Tribunal impedido de, com recurso ao mecanismo previsto no art° 358°, do CPP, comunicar as alterações que entendesse decorrerem da discussão da causa, (...) que tal não implicasse modificação de factos que tivesse “por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”, caso em que, porque configurada uma alteração substancial, haveria que desencadear-se a disciplina prevista no art° 359°. Em qualquer caso, não se tratou, como referido pela Defesa de K, nem de crime diverso, nem, tão pouco, de uma nova Acusação. Tratou-se, isso sim, de alteração meramente circunstancial, que em nada afectou a caracterização identítária dos ilícitos que vinham imputados. Os Recorrentes H e K, invocam, ainda, a inconstitucionalidade do art° 358°, do CPP, quando interpretado e aplicado com o alcance, sentido e oportunidade que resulta do Despacho recorrido, por pretensa violação das normas constitucionais (ou de norma pela Constituição acolhida - cfr. art° 6°, da CEDH e art°s. 8° e 1 6°, da CRP) constantes dos art°s. 18°, 20°, n° 4 e 32°, n°s. 1, 2 e 5, da CRP. Ao longo da abordagem que acaba de produzir, o M°P° foi deixando expressas, embora de forma, porventura, esparsa, as razões pelas quais entende que as garantias de defesa, constitucionalmente tuteladas, não sofreram qualquer compressão, designadamente, porque a própria norma cuja aplicação suscitou a invocação de desconformidade constitucional, consagra o direito de as Defesas reorganizarem as suas estratégias, indicando, ou requerendo, novos elementos de prova. Aliás, o Tribunal concedeu, para o efeito, o prazo requerido. Poderá, assim, concluir-se que, para o M°P°, a interpretação que subjaz ao Despacho proferido ao abrigo do art° 358°, do CPP, é absolutamente conforme à CRP, designadamente às normas invocadas - art° 6°, da CEDH, com referência aos art°s. 8° e 16°, e, ainda, art°s. 18°, 20º, n° 4 e 32°, n°s. 1, 2 e 5, da CRP. O Tribunal Constitucional já, por várias vezes, se pronunciou pela conformidade do art° 358°, do CPP, com a Lei Fundamental, interpretado em diversas perspectivas e dimensões, mas sendo constante e transversal o entendimento segundo o qual, a referida norma, assegura, plenamente, as garantias de defesa, a estrutura essencialmente acusatória do processo, e o direito a um julgamento justo e equitativo. Invoca-se, igualmente, uma pretensa violação do art° 6°, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), por descaracterização do processo, enquanto processo justo, equitativo e decidido em tempo útil. No que à exigência de um processo justo e equitativo se alega - em bom rigor, de uma mera invocação se trata -, pouco haverá a considerar, (...) que não se concretizam quaisquer factos que configurem a violação do princípio da equidade. À comunicação de eventual alteração, seja de novos factos, seja de qualificação jurídica, operadas, uma e outra, ao abrigo do art° 358°, do CPP, corresponde adequada e proporcional possibilidade de defesa, por parte dos Arguidos, não se alcançando, por isso, em que se possa traduzir a violação, não só, de tal princípio, como do que lhe é correlativo, o princípio da igualdade das armas. Note-se, aliás, que quando as alterações comunicadas o são por iniciativa do Tribunal, ou, não correspondem às que, porventura, tenham sido requeridas pelas Acusações, a estas não é reconhecida qualquer possibilidade para reorganização das respectivas estratégias processuais, ao contrário do que sucede com as defesas dos Arguidos. Nomeadamente, não é facultado, às Acusações, a faculdade de, em tais circunstâncias, requerer, apenas por força da comunicação das alterações, produção de prova suplementar. Daí que não se tenha por, minimamente, beliscado, o princípio da equidade do processo. Já quanto ao princípio que impõe o julgamento da causa em tempo razoável - cfr. art° 6°, n° 1 , da CEDH -, cumprirá, desde logo, salientar, que, ao contrário do que, não poucas vezes, se invoca, ele não consagra direitos exclusivos dos arguidos, acolhendo, antes, direitos extensivos aos que, no âmbito das causas sujeitas a Juízo, aí lutam pelos seus interesses. Por outro lado, são múltiplos os instrumentos internacionais que tutelam, especificamente, os interesses das Vítimas. A título de exemplo, refiram-se a Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1989/57 do Conselho Económico e Social, relativo à Aplicação da Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, a Resolução 1990/22 do mesmo Conselho, relativo às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder. Sem olvidar, naturalmente, inúmeros outros instrumentos em que são salvaguardados os direitos das crianças, (...) que, o que em causa está neste processo, reportado à data dos factos, diz respeito a crianças e a jovens sexualmente abusados. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sempre que chamado a pronunciar-se sobre as violações ao art° 6°, da CEDH, tem produzido Jurisprudência que, reiterada, tabelar e literalmente, enuncia o princípio, segundo o qual, o Tribunal, nesta matéria, leva em conta, segundo as circunstâncias, nomeadamente, a complexidade da causa, bem como o comportamento dos intervenientes e das autoridades judiciárias. O tempo dirá em que medida cada um dos intervenientes contribuiu para que o julgamento ainda perdure. Por outro lado, o Tribunal não deixa de salientar (“Affaire Pélissier et Sassi c. France”, Requête n° 25444/94, Arrêt 25.10.1999), “a este respeito, que o art° 6°, n° 1, da Convenção, obriga os Estados contratantes a organizar o seu sistema judiciário de tal sorte que os tribunais possam satisfazer o que lhes é exigível, nomeadamente, a obrigação de resolver as causas dentro de prazos razoáveis, consignando, ainda, que, por vezes, o processo apresenta atrasos excessivos, que são imputáveis às autoridades nacionais. A avaliação das responsabilidades na perdurabilidade de um julgamento pressupõe uma avaliação global, a qual tenha em conta o número de intervenientes (arguidos, vítimas e lesados), a dificuldade e a quantidade das provas, a indefinição ou sucessão das leis, a quantidade de incidentes - incluindo recusas de juízes -, de requerimentos, recursos, arguições de nulidades e irregularidades, etc., etc.. Que os Recorrentes se queiram investir no papel de únicas, ou principais, vítimas da duração do julgamento, desresponsabilizando-se do seu próprio contributo (bastando, para tanto, recordar o que foram as instâncias dirigidas aos Assistentes), e olvidando, ou omitindo, que as Vítimas o são há muito mais tempo do que eles próprios são Arguidos, compreende-se, tão só, na medida em que, dessa forma, não estarão impedidos de invocar, como invocam, em uníssono, a violação do art° 6°, da CEDH. Para o M°P°, a conclusão, segundo a qual, o art° 6°, da CEDH, deve, desde já, ter-se por violado, no segmento relativo ao tempo decorrido, é absolutamente prematura. Se e quando o TEDH for chamado a pronunciar-se, com a autoridade que lhe é reconhecida, e de acordo com os critérios que vêm constituindo a sua Doutrina, saber-se-á, então, de forma desapaixonada, se tal norma foi, ou não violada, e se, tendo-o sido, a quem cabem as maiores responsabilidades. D) – EXTEMPORANEIDADE DA COMUNICAÇÃO DE ALTERAÇÕES, OPERADA AO ABRIGO DO ARTº 358º, DO CPP O que decorre do dis(...) no artº 358º, do CPP, é que a verificação da alteração não substancial dos factos descritos na Pronúncia ocorra no decurso da audiência. Ao consignar, no Despacho, que as alterações se lhe suscitaram, em face da prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal dá conta, de forma insofismável, que foi no decurso daquela que se produziu a convicção indiciária que culminou com a comunicação das alterações. Alega a Defesa do Arguido K que, na sistemática do CPP, porque o artº 358º precede as normas que contemplam, quer as Alegações Orais, quer as últimas declarações dos Arguidos, a comunicação das alterações deveria preceder, igualmente, umas e outras. A tese assim expendida, além do mais, menoriza, subestimando-as, quer as Alegações, quer as últimas declarações dos Arguidos. A umas e outras há-de reconhecer-se a virtualidade de convencerem o Tribunal, em função dos argumentos, factos e razões que, nelas, sejam produzidas, não sendo de excluir a possibilidade de levarem a produção suplementar de prova (possibilidade, essa, que, embora a título excepcional, está plasmada no n.º 4, do artº 360º, do CPP e que, como é sabido, teve aplicação no decurso das Alegações produzidas neste processo). Aliás, parece olvidar-se que, na própria sessão de 23.11.2009, antes mesmo de proceder à comunicação das alterações, o Tribunal produziu prova, invocando, para tanto, “a Jurisprudência do acórdão para Fixação de Jurisprudência, proferido pelo S.T.J. em 28/10/2008, quanto à interpretação do artº 328º, nº 6, do C.P.Penal” procedendo “à abertura e análise, na presente audiência, dos documentos de fls. 50.762 a 50.765 dos autos, os quais poderão ser relevantes, de forma mais directa, para a defesa dos arguidos A e C.”. Porque assim é, nada obsta a que a comunicação, nos termos do art° 358°, tenha ocorrido no momento em que ocorreu, antes se compreendendo que assim seja e, não, no próprio decurso da audiência, sob pena de a dinâmica da produção de prova poder levar a sempre indesejáveis alterações de alterações. Será, a todos os títulos, mais racional, que a comunicação ocorra no termo, ou no dealbar, da produção de prova, pressupondo que, para que assim seja, se tenha já iniciado o processo deliberativo, no âmbito do qual a necessidade daquelas se suscite. A Jurisprudência que lográmos recolher, sobre esta matéria, é, aliás, pacífica e constante. (…) Falecem, assim, os argumentos invocados, com base nos quais se tem por verificada a extemporaneidade da comunicação operada ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do CPP. E) - QUALIFICAÇÃO DA NATUREZA DAS ALTERAÇÕES DE FACTOS COMUNICADAS, COMO NÃO SUBSTANCIAIS, QUANDO. ALEGADAMENTE. O DEVERIAM TER SIDO COMO ALTERAÇÕES SUBSTANCIAIS. A Defesa de K impugna, ainda, o Despacho recorrido, uma vez que, alega, a natureza da alteração de factos comunicada, há-de ter-se por alteração substancial, que não, como o foi, como mera alteração não substancial. Curiosamente - quiçá influenciada pelas repercussões da comunicação das alterações, na Defesa do Arguido H -, a Defesa de K, pela primeira vez, invoca uma outra alteração que, directamente, a não afecta, (...) que, embora envolvendo o Arguido, não o incrimina, implicando, tão só, o Arguido A. Na verdade, até aqui, a Defesa de K considerava ser afectada, tão só, pela seguinte alteração, inicialmente comunicada a 23.11.2009, e reparada por Despacho proferido na Sessão de 11.01.2010: “IV - Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido K: 1. Que os factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.4.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “…casa do arguido K, sita na Rua (…), n° (…), (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”;. No Recurso ora inter(...), adveio-lhe aportar, ainda, à seguinte alteração, comunicada na Sessão de 14.12.2010 e, igualmente, reparada no Despacho proferido em 11.01.2010: “II - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.906 a 20.907, “Ponto 5.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.906, 6° (sexto) parágrafo” e fls. 20.907, 1º (primeiro) parágrafo”, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “… em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998…”, sendo que AP “…à data tinha 13 anos de idade…”, podem ter ocorrido: - em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998; - tinha AP 12/13 anos de idade;”. Tendo em conta a amplitude da arguição deduzida na Sessão de 11.01.2010, há-de reconhecer-se à Defesa de K, tal como reconhecida foi à Defesa do Arguido H, legitimidade para a inovadora invocação/inclusão, no presente Recurso, da alteração em apreço. Já no âmbito do que ora se subscreve tivemos oportunidade de salientar que, ao contrário do sustentado, as circunstâncias de lugar (e/ou de tempo) não te(ê)m, em princípio, a virtualidade de alterar o tipo de crime, só tal podendo suceder quando, por exemplo, a idade da vítima constitui elemento do tipo. A alteração comunicada ao Arguido K, diz respeito a alteração do lugar possível da consumação dos factos criminalmente relevantes, a qual, como já referido, nem sequer é elemento decisivo na estruturação da Acusação, apenas desta devendo constar, “se possível” (cfr. art° 283°, n° 3, b), do CPP). Assim, porque a alteração em causa não teve por efeito a imputação ao arguido de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, por força da alteração do elenco factual (cfr. art° 1°, f), do CPP), não poderá ela ser reputada senão como alteração não substancial, razão pela qual, igualmente se promove o indeferimento de mais esta irregularidade/nulidade, arguida pela Defesa do Arguido K. Por todo o ex(...), entende-se ser de negar provimento a todos os Recursos que, não obstante, venham, a ser admitidos, confirmando-se, na íntegra, o Despacho recorrido.” Os Assistentes apresentaram resposta aos supra mencionados recursos (esclarecendo que, “considerando que os arguidos se debruçam, no essencial, e de forma até repetitiva sobre as mesmas questões, os assistentes organizaram a presente resposta, respeitando e abrangendo a integralidade dos recursos inter(...)s: Vêm os presentes recursos inter(...)s do Despacho proferido em 26.02.2010 que admitiu, apenas parcialmente, os requerimentos probatórios apresentados pelos arguidos, ora recorrentes, bem como julgou improcedente a nulidade ou irregularidade emergente do vício de falta de fundamentação do despacho que comunicou as alterações. É sobre estas questões que iremos tomar posição, em resposta”), concluindo (em transcrição) que: “1 - indeferimento de produção de prova requerida pelos arguidos: 1) A norma em apreciação, o n° 1 do artigo 358° do CPP concede aos arguidos, se eles o requererem, o tempo estritamente necessário para a preparação das defesas, devendo as mesmas reconduzir-se aos factos que resultaram não substancialmente alterados em face da sua comunicação e por reporte à pronúncia. 2) Os requerimentos probatórios dos recorrentes transbordaram, para além dos limites do que é razoável, essa recondução. 3) A circunstanciação espácio-temporal da conduta em nada releva para a qualificação da mesma como preenchendo o tipo incriminador por que vêm os recorrentes pronunciados; 4) Percebe-se a pretensão dos recorrentes, a de atrasar a prolação da decisão final. Circunstância legítima do ponto de vista do exercício do direito de defesa mas, claramente incompatível com os fins públicos de perseguição do crime e aplicação da Justiça em, nome do Povo e em tempo útil. 5) A prova pretendida não tem, ainda que a latere algo a ver com o cerne das alterações comunicadas aos recorrentes, só a um título que não a boa fé processual que deve pautar a conduta dos sujeitos se entendendo a pretensão dos recorrentes pois, com os factos de que resultou a alteração não substancial comunicada nada tem a ver. 6) Esta prova, que é suplementar, tem de se compaginar com critérios de necessidade, adequação, realidade e relevância como resulta do n° 4 do art. 340º do CPP (a contrario). II - falta de fundamentação do despacho 7) O Tribunal a quo reparou o seu primeiro despacho e, dentro do que entendeu ser possível fundamentar sem entrar na análise crítica da prova, fundamentou-o. Fê-lo para além dos seu deveres, não estando obrigado a fundamentar; 8) O despacho que comunica as alterações é um despacho interlocutório proferido antes da sentença e que, atendendo a essa natureza tem aqui mais um sentido de comunicação e prevenção, em ordem ao arguido poder organizar a sua defesa face à alteração comunicada. 9) Fazendo, como o pretendem os recorrentes, o Tribunal estará a antecipar a discussão e valoração da prova que deve, como é óbvio, relegar para a decisão final. 10) E, nem se compreende que a fundamentação não intrusiva da decisão final possa ferir direitos de defesa como pretendem os arguidos. III - inconstitucionalidade do artigo 358° CPP 11) A pronúncia importa para o processo um conjunto de factos que são da vida real e que são, bastas vezes, desconformes, em latitude e longitude com o que se plasmou no texto que a constitui. 12) Não pode esse instrumento ser de tal forma moldável que não tenha qualquer conexão com o iter criminis e delimite ou comprima direitos fundamentais de defesa. 13) A possibilidade de alteração do libelo acusatório resulta daquilo que é o processo aquisitivo da prova que é feito em julgamento, assim se garantindo o direito a um julgamento justo e equitativo, a um processo onde a paridade dos sujeitos é tal que não existem surpresas nem o arguido é confrontado com nada que, de forma substancial, não se contenha na pronúncia, traduzida no princípio da vinculação temática. 14) Constituindo uma garantia de defesa, na medida em que impede alterações significativas do objecto de processo, alterações essas que prejudicariam (poderiam até inviabilizar) a defesa. 15) As alterações comunicadas não são substanciais, não afectam o objecto do processo e visam, apenas, conformar a realidade a reconstituir com a prova adquirida em julgamento. 16) Não se vislumbra qualquer compressão de Direitos Fundamentais, sejam os constantes da Constituição da República Portuguesa, sejam os que, de Direito Internacional, em conformidade com aquela, tenham sido adquiridos pela ordem jurídica interna, sendo jurisprudência constitucional pacífica a que conforma o artigo 358° do CPP com a CRP (vejam-se: os Acs. do TC 330/97, 130/98, 387/2005 e 544/2006). IV - extemporaneidade da comunicação das alterações 17) Sendo as comunicações das alterações o produto de um processo probatório, constituindo as alegações finais as conclusões extraídas sobre a prova produzida e sendo as ultimas declarações do arguido valoráveis como tal, não se vislumbra como, antes, deverá ser o momento para o conhecimento das alterações. 18) Não há qualquer regra imperativa que condicione o Tribunal a um momento para o efeito. 19) No próprio dia em que foram comunicadas as alterações, o Tribunal a quo, ter feito produzir prova. Pelo que, mesmo que se entendesse como os recorrentes, decairia também, por esse motivo, a razão dos recorrentes. V - errada qualificação das alterações comunicadas (K) 20) Só a idade da vítima produz consequências essenciais para o crime em apreço, alterando-o ad substantiam, o que se traduziria numa alteração substancial de factos. 21) As conhecidas, sendo alterações dos factos que não invadem a estrutura do crime, que não o abalam nas suas fundações, são reconhecidamente entendidas como não substanciais. 22) Além de que, a precisão do lugar da prática do crime só tem de constar da acusação ou, in casu, da pronúncia, se possível (al. b) do n° 2 do artigo 283° do CPP). 23) O que se trata aqui é saber se o arguido ora recorrente praticou o crime de abuso sexual na Rua (…), n° (…),(…), em (…)ou se, como resulta da alteração comunicada, praticou, o mesmo crime de abuso sexual numa moradia não concretamente apurada mas localizada no (…). TERMOS EM QUE deve ser confirmada a decisão recorrida fazendo-se, assim, inteira JUSTIÇA.” O recurso do arguido E foi admitido por despacho de fls. 65723 (Ponto I) dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse neste concreto recurso interlocutório (cf. fls. 69691 das conclusões do recurso inter(...) por este arguido). O recurso do arguido K foi admitido por despacho de fls. 65737/8 (Ponto 4) dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse neste concreto recurso interlocutório (cf. fls. 68879 – ponto 2, al. i) das conclusões do recurso inter(...) pelo arguido do acórdão final). Consigna-se que este recurso interlocutório foi autuado por apenso, passando a constituir o apenso ZL. O recurso do arguido H foi admitido por despacho de fls. 65724/7 (Ponto II) dos autos, tendo o arguido declarado, na sequência da interposição de recurso do acórdão final, que mantinha interesse neste concreto recurso interlocutório (cf. fls. 70412 – al. D) das conclusões do recurso inter(...) pelo arguido do acórdão final). 15.2. Questões prévias 15.2.1. Decisão conjunta dos recursos Conforme resulta das alegações de recurso supra transcritas, os recursos inter(...)s pelos arguidos C, E, K e H incidiram sobre três despachos subsequentes proferidos pelo Tribunal Colectivo em audiência de julgamento (nas sessões de 18 de Dezembro de 2009, 11 de Janeiro de 2010 e 26 de Fevereiro de 2010), coincidindo, na essência, nas questões que colocam, sendo certo que os referidos despachos, também eles, têm por objecto as mesmas questões, ainda que suscitadas por distintos arguidos ou em diferentes datas, repetindo, a mesma fundamentação, para decisão daquelas questões (ainda que nem todos os mencionados arguidos tenham recorrido da totalidade dos referidos despachos). Assim, por razões de economia, celeridade processual e facilidade de compreensão, serão os elencados recursos tratados conjuntamente, numa só decisão, abrangendo as questões comuns que neles se colocam. Com efeito, não faz sentido que o Tribunal se pronuncie em separado sobre questões em tudo idênticas, apenas porque foram suscitadas em recursos inter(...)s por diferentes arguidos, repetindo, de modo desnecessário, a mesma argumentação. Aliás, como já se salientou, os recursos interlocutórios aqui em apreço, inter(...)s pelos mencionados quatro arguidos (C, E, K e H), incidem sobre os mesmos despachos, sendo que estes, ainda que referindo-se aos diferentes arguidos, também têm na sua génese a mesma fundamentação, tendo, em consequência, decidido no mesmo sentido as pretensões apresentadas pelos arguidos (quando eram as mesmas). 15.2.2. O recurso por parte do arguido C quanto ao despacho proferido em 18 de Dezembro de 2009 O arguido C, tendo sido notificado da interposição de recurso do despacho proferido na sessão de julgamento ocorrida em 18 de Dezembro de 2009, por parte dos arguidos E e K, bem como das respectivas motivações, veio aderir aos fundamentos dos recursos de ambos, conforme resulta da peça processual que consta de fls. 65041 dos autos. Porém, não só não procedeu ao pagamento da taxa de justiça que seria devida, como no recurso que interpôs do acórdão final, e onde tomou posição quanto aos recursos interlocutórios relativamente aos quais mantém interesse, referiu-se apenas (no que a este conjunto de recursos relativos ao tema abrangente da comunicação de alterações de factos diz respeito) ao recurso interlocutório que constitui o apenso ZG, nada referindo quanto ao recurso do despacho proferido em audiência a 18 de Dezembro de 2009, concluindo-se, pois, que não manteve interesse neste. 15.2.3. Admissibilidade dos recursos O Digno Magistrado do Ministério Público, junto da 1.ª instância, suscita, na resposta ao recurso junta a fls. 64252 a 64270, a falta de legitimidade do arguido K relativamente a parte do recurso que interpôs do despacho proferido na sessão de julgamento de 18 de Dezembro de 2009. Isto porquanto o arguido K (diversamente do arguido E), ao impugnar, por via de arguição de irregularidades, o despacho proferido na mencionada sessão de 18 de Dezembro de 2009, não arguiu qualquer vício decorrente da qualificação da alteração como não substancial. Mas no recurso que, do mesmo despacho, interpôs a fls. 63986 e ss., invocou essa discordância, alegando que, no que lhe dizia respeito, as alterações comunicadas pelo Tribunal configuram verdadeiras alterações substanciais, e não meras alterações não substanciais, tal como lhe foram comunicadas. Nessa sequência, entende o Ministério Público que o arguido K carece de legitimidade para recorrer do despacho proferido na sessão de 18 de Dezembro de 2009, na parte em que, apreciando as irregularidades suscitadas em 23 de Novembro de 2009, se indeferiu a que somente pelo arguido E havia sido arguida, ou seja, justamente a que dizia respeito à qualificação da natureza das alterações comunicadas. Acresce que a única alteração comunicada ao arguido K, apenas a si e ao arguido A diz respeito, sendo certo que das restantes comunicadas nenhuma diz respeito ao arguido K, inexistindo qualquer tipo de comunicabilidade, directa ou indirecta, entre umas e outras. Consequentemente, o arguido K não podia recorrer de um despacho, na parte em que este aprecia e indefere a arguição de uma irregularidade que, por via de arguição, não havia, por si, sido suscitada. O próprio Tribunal a quo havia consignado, em despacho exarado a fls. 65049, as suas dúvidas quanto à legitimidade do arguido K para recorrer de tal despacho, na parte em que julgou improcedente a arguição de irregularidade deduzida pelo arguido E a fls. 63639 a 63641, do despacho de fls. 63631 a 63635, “…por erro na qualificação das alterações…”. Ora, conforme acima já se mencionou – a propósito do recurso interlocutório inter(...) pelo arguido A sobre a inquirição da testemunha BO –, a admissibilidade legal do recurso, em processo penal, encontra-se dependente, entre o mais, da verificação cumulativa de dois pressu(...)s processuais autónomos e inconfundíveis: legitimidade e interesse em agir (ou legitimidade objectiva, por contraposição com a legitimidade subjectiva ou legitimidade tout court (…). A legitimidade activa é reconhecida a todos os sujeitos do processo, com excepção do juiz. O Ministério Público, o arguido, o assistente e as partes civis têm legitimidade para recorrer, desde que tenham ficado vencidos, isto é, quando a decisão recorrida tenha sido proferida contra eles. O Ministério Público pode também recorrer em interesse exclusivo do arguido, atenta a sua qualidade de titular da acção penal e de representante da legalidade democrática. Dúvidas não existem de que o arguido K assume no processo posição processual que, à luz do dis(...) no art. 401.º, n.º 1, al. b), do CPP, o colocaria em situação de ter legitimidade para recorrer. Contudo, o normativo em apreço estatui expressamente que arguido e assistente apenas têm legitimidade para recorrer de decisões contra eles proferidas. Para o recurso do arguido de um determinado despacho ser admissível, não lhe basta, pois, assumir no processo posição processual que lhe confere o direito de recorrer, sendo necessário que a decisão inserta no despacho recorrido tenha sido contra si proferida. Se assim não fosse, não se compreenderia sequer qual o interesse em agir que o recorrente teria. Como recentemente referiu o STJ, o interesse em agir “(…) consiste na necessidade de que a decisão recorrida seja alterada para que a pretensão do assistente seja satisfeita, para que o direito que aquele exerce em juízo seja tutelado, obtenha vencimento ou ganho de causa, necessidade que se terá de traduzir na existência de um interesse material, juridicamente protegido, cuja não satisfação causa prejuízo ou desvantagem, constituindo o recurso o meio adequado para sua obtenção. Como refere Figueiredo Dias, citando Roxin: “aquele a quem a decisão não inflige uma desvantagem não tem qualquer interesse juridicamente protegido na sua correcção, não lhe assistindo, por isso, qualquer possibilidade de recurso” Com efeito, o interesse na correcta aplicação do direito tout court nada tem a ver com a legitimidade processual e com o interesse em agir; trata-se de um interesse geral que todo e qualquer indivíduo, enquanto cidadão integrante do Estado de direito, tem ou deve ter, que não lhe confere o direito a impugnar a decisão” (Ac. do STJ de 7/9/2011, proferido no âmbito do Proc. 356/09.0JAAVR.S1 disponível in www.dgsi.pt). Vertendo ao caso em apreço, se o arguido K não suscitou a nulidade/irregularidade do despacho com fundamento na qualificação da alteração comunicada como sendo substancial, o despacho recorrido nada decidiu contra pretensão sua. O despacho sob recurso é certo que aborda essa temática, mas a propósito de requerimento formulado pelo arguido E, quanto a uma outra alteração de factos que a ele foi comunicada e que em nada está relacionada com a comunicada ao arguido K. Não existindo, quanto a esse concreto fundamento do recurso, decisão proferida contra o arguido K, terá de concluir-se que o mesmo carece, em parte, de legitimidade para o recurso que apresentou. Assim, nos termos do dis(...) nos arts. 401.º, n.º 1, al. b), 414.º, nºs 2 e 3, e 420.º, n.º 1, al. b), do CPP, conclui-se que o arguido K não tem legitimidade para recorrer do despacho proferido na sessão de julgamento ocorrida em 18 de Dezembro de 2009, na parte em que aprecia as irregularidades suscitadas em 23 de Novembro de 2009, com fundamento em que a alteração de factos que lhe foi comunicada deve ser qualificada como substancial e não como não substancial, tal como o Tribunal a quo considerou. Esta questão acaba, contudo, por ser praticamente inócua para o arguido, porque em recurso subsequente o mesmo volta a suscitar a mesma questão. Com efeito, a forma como se processaram as comunicações de alterações de factos – ao longo de diferentes sessões de julgamento e com repetição das mesmas, com distinta fundamentação – levou a que alguns dos arguidos, como foi o caso do arguido K optassem por interpor subsequentes recursos, muitas vezes versando as mesmas matérias, até porque o Tribunal, reparando a reconhecida irregularidade atinente à fundamentação, repetiu o despacho de comunicação de alterações de factos. Assim, o arguido, no recurso que interpôs a fls. 65509 dos autos volta a colocar, desta vez em termos admissíveis, a questão da qualificação das comunicações de alterações que lhe foram realizadas como sendo alterações substanciais. Este recurso foi admitido, tendo o Ministério Público junto da 1.ª instância tomado posição nesse mesmo sentido, ou seja, que seria de admitir o recurso inter(...) pelo arguido K na parte em que discorda da natureza das comunicações operadas, por reputar de substanciais as alterações que o Tribunal qualificou como não substanciais (cf. fls. 65616). Consequentemente, ainda que tomando posição quanto a um segundo recurso interlocutório apresentado pelo arguido K, acabará o Tribunal por apreciar a questão que não tinha legitimidade para suscitar no primeiro recurso supra referido. É também o Ministério Público junto da 1.ª instância, que numa das suas respostas, a fls. 65614 a 65616 dos autos, e quanto ao que neste momento assume relevo, vem invocar a inadmissibilidade do recurso inter(...) pelo arguido K, a fls. 65508 e ss., na parte em que impugna o despacho recorrido porquanto lhe foi indeferida a arguição de irregularidades/nulidades, por alegada falta de fundamentação. Defende, para tanto, que, na sessão de julgamento de 11 de Janeiro de 2010, o Tribunal proferiu despacho, no qual, além do mais, decidiu julgar parcialmente procedente “a arguição de irregularidade subsidiariamente apresentada pelos arguidos H, C, K, E, N e Q – quanto à insuficiência de fundamentação do despacho de fls. 63.685 a 63.687 –, julgando-a improcedente quanto ao demais. E, ainda, que “Na sequência do Despacho de fls. 63.918 a 63.960 e do Despacho que antecede, o Tribunal vai proceder à leitura da comunicação que tem a fazer nos autos, de alteração não substancial de factos descritos no despacho de pronúncia, procedendo à decidida reparação das comunicações feitas pelo Despacho de fls. 63.636 a 63.639, em 23/11/09 e de fls. 63.685 a 63.687, em 14/12/09”. E quanto à admissibilidade, ou não, dos recursos, o Ministério Público salientou que “A estratégia processual prosseguida pelas Defesas tem, sistematicamente, impugnado os Despachos, quer por via de arguição de irregularidades/nulidades, quer por via de recurso, seja dos próprios Despachos que comunicam as alterações, seja dos Despachos que indeferem tais arguições. Já na posição que assumiu no processo, a fls. 64.232, o MºPº dera conta do entendimento que perfilhava, relativamente à irrecorribilidade relativa do Despacho que, ao abrigo do dis(...) no artº 358º, do CPP, comunica alterações não substanciais aos factos descritos na Acusação ou no Despacho de Pronúncia. Aí se consignou que, para o Mº Pº, tal Despacho é, materialmente, irrecorrível, significando-se, com isso, que, para o que ora importa, não é susceptível de recurso, por pretensa falta de fundamentação da comunicação propriamente dita, já o sendo, todavia, no que diz respeito à divergência de qualificação das alterações, como substanciais, ou não substanciais, bem como no que diz respeito à questão da tempestividade/entemporaneidade da comunicação. A fls. 64.232, acrescentámos que, apesar da irrecorribilidade relativa do Despacho, não seria irrecorrível o Despacho que indeferisse a arguição das irregularidades/nulidades, posição esta que reavaliámos na Resposta constante de fls. 65.234 e ss., na qual passámos a perfilhar entendimento restritivo de tal conclusão. Na verdade, como então referimos – e mantemos –, se os fundamentos da arguição se ativerem à materialidade do Despacho, sendo este irrecorrível, e, como é o caso, coincidindo, tais fundamentos, com os fundamentos pelos quais se impugna o Despacho, por via de recurso directo, ter-se-á que concluir que o Despacho que indeferir a respectiva arguição é, igualmente, irrecorrível. A não ser assim, lograr-se-ia, sempre, recorrer de Despachos que a Lei repute de …irrecorríveis, bastando, para tanto, que, antes de se interpor recurso do Despacho, se imputem a este, por via de arguição, quaisquer irregularidades e/ou nulidades. Reconhecesse que a questão pode não ser pacífica, tanto mais que as irregularidades se reportam a uma categoria atípica e genérica de vícios processuais, relativamente aos quais não funciona o princípio da legalidade, estabelecido no artº 118º, do CPP, o qual é específico das nulidades”. Proferido o despacho que reparava os referidos despachos que haviam operado comunicações de alterações não substanciais de factos aos arguidos (acrescendo aos anteriores nova fundamentação), nessa mesma sessão, foi arguida, pelos ora recorrentes, “a nulidade, ou no limite irregularidade…”, do despacho acabado de proferir, por alegada “…falta de fundamentação…”. Salienta-se, desde já, que o que está em causa não é a admissibilidade do recurso de despacho que comunique ao arguido ou arguidos alterações não substanciais de factos, pois essa matéria encontra-se definitivamente tratada nos autos, quer pelos despachos proferidos pelo próprio Tribunal de 1.ª instância – cf. fls. 65293 a 65295, 65301 a 65302 e 65307 a 65309 – quer pelo Tribunal da Relação, nas decisões que tomaram posição quanto à reclamação apresentada pelos arguidos da mencionada decisão de não admissão do recurso – cf., a título de mero exemplo, os Autos de Reclamação, autuados sob o apenso ZC – ficando assente que, nesse particular, não é admissível recurso, dado não se ter na génese um despacho de teor decisório, mas antes um despacho meramente ordenador ((...) que, tal como se deixou expresso na 1.ª instância, se trata de actos meramente ordenadores do processo, instrumentais para a validade do acórdão a proferir, não se reconduzindo a actos decisórios ou pré-decisórios do processo). A questão aqui suscitada, estando conexiada com essa, tem contornos diferentes. Trata-se de ponderar da admissibilidade de recurso do despacho proferido pelo Tribunal quanto às nulidades e/ou irregularidades apontadas pelos arguidos aos referidos despachos de comunicação de alterações não substanciais de factos, designadamente, por falta de fundamentação. E aqui, embora se possa conceder que se trate de matéria passível de discussão, o que é certo é que o argumento base que conduz ao entendimento de que naquelas outras situações o recurso não é admissível – a circunstância de não se estar perante um acto de decisão – deixa de poder ser invocado. Com efeito, o Tribunal, ao julgar procedente ou improcedente a arguição de nulidade(s)/irregularidade(s) decide do fundo da questão suscitada, que julga procedente ou improcedente. Trata-se de decisões, à luz do dis(...) no art. 97.º do CPP, por estarmos perantes actos que são ou favoráveis ou desfavoráveis ao/s arguido/s. Pode repugnar que por esta via possa ser alcançado um caminho que permite aos arguidos a utilização de uma estratégia processual capaz de contornar a irrecorribilidade de uma decisão, mormente assacando-lhe sempre alguma nulidade ou irregularidade, para depois apresentar como fundamento desse vício o mesmo ou os mesmos que os levavam a recorrer da decisão que não admite recurso. Exemplificando com o que neste caso está em análise, temos que o despacho que comunicou a um arguido uma alteração não substancial de factos e com o qual este não se conforma, por entender que tal despacho não está devidamente fundamentado, não é passível de recurso (por não ser um acto decisório), mas já é possível sindicar o despacho que decide da existência/inexistência de uma nulidade ou irregularidade que o mesmo arguido entenda apontar ao mesmo despacho, invocando para o efeito falta de fundamentação. É caso para se afirmar que acaba por se «deixar entrar pela janela o que não se permitiu que entrasse pela porta», bastando que o arguido trate a mesma “falta de fundamentação” que serve de base à sua discordância relativamente ao despacho que lhe comunicou alterações de factos como uma nulidade e/ou irregularidade assacada ao mesmo despacho. O princípio da lealdade processual deveria obstar a que semelhantes situações pudessem ocorrer. Mas o percurso para aí chegar não parece que já tenha sido trilhado pelo nosso sistema processual penal. Neste, como aliás noutros casos, estando consagrada na lei a possibilidade de recurso, não se vislumbra como possa o tribunal coarctar ao arguido o direito de recorrer. Acresce que neste processo em particular, como já supra salientado, sobre estes mesmos despachos foram inter(...)s recursos pelos vários arguidos, recursos esses que não foram, desde o início, processados conjuntamente, antes dando origem a distintos apensos de recurso, que mereceram, por parte do Tribunal da Relação, diferente tratamento. Na verdade, enquanto em relação a alguns dos recursos interlocutórios, nomeadamente os que agora estão em apreciação, foi entendido que deveriam subir apenas a final, com o recurso que fosse inter(...) do acórdão que pusesse termo ao processo, casos houve em que recursos com o mesmo objecto foram apreciados de imediato. Assim aconteceu, designadamente, e quanto a esta matéria, com o recurso inter(...) pelo arguido H, que constitui o apenso ZK. Nessa situação, o recurso do arguido H – que, salienta-se uma vez mais, abordava as mesmas questões (nesse caso, e mais concretamente, a da suficiência ou não da fundamentação do despacho que procedeu à comunicação da alterações de factos) – foi admitido e conhecido. Consequentemente, e também por uma questão de igualdade de tratamento de situações, será apreciado na totalidade o objecto do recurso inter(...) pelo arguido K quanto às irregularidades/nulidades arguidas. Conforme acima se deixou dito, na sequência do despacho proferido pelo Tribunal a quo comunicando alterações não substanciais de factos, e dando cumprimento ao dis(...) no art. 358.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, o arguido H formulou um requerimento de prova, que veio a ser indeferido, por despacho proferido em 26 de Fevereiro de 2010. Desse despacho de indeferimento, interpôs o mencionado arguido, em 25 de Março do mesmo ano, recurso interlocutório, concluindo pela existência de uma errada avaliação da utilidade e relevância das diligências probatórias requeridas. No recurso que o arguido H apresentou do acórdão final, declarou que mantinha interesse na subida desse recurso interlocutório (entre outros) ao Tribunal da Relação. Sucede que, analisando com maior detalhe o recurso em questão, se constata que as diligências probatórias que o arguido pretendia ver realizadas foram requeridas na sequência de duas diferentes comunicações de alterações de factos: - a alteração ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia, em que se alteram as datas e a idade do assistente AP, de forma a que tal crime de lenocínio imputado ao arguido A passa a coincidir, temporal e espacialmente, com os crimes de abuso sexual imputados ao arguido H, com referência aos eventuais abusos sexuais cometidos sobre o assistente AT no prédio da Av. (…), nos termos do ponto 4.3.1. do despacho de pronúncia; - a alteração ao ponto 5.2.5. do despacho de pronúncia, com referência ao mesmo assistente AP e aos crimes de lenocínio imputados aos arguidos A e E, em que é alterado o local onde o arguido H o estaria supostamente a aguardar, o que pressupõe que é considerada indiciada uma intervenção do ora recorrente nessa factualidade. Ora, desde logo, se constata que o arguido H pretende produzir prova relativamente à alteração ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia, o qual veio a ser dado como não provado no acórdão final, a fls. 246 dos factos não provados. E pretende relacioná-lo com os termos do ponto 4.3.1., este sim que veio a ser dado como provado, mas nos exactos termos em que constava do despacho de pronúncia (fls. 154 dos factos provados do acórdão final). Significa isto que o Tribunal recorrido comunicou uma possível alteração de datas quanto ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia, na versão do arguido, para compatibilizar as versões apresentadas pelos assistentes AP e AT quanto aos factos a que respeita o ponto 4.3.1. do despacho de pronúncia. Constatando-se que a alteração de datas e todo o ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia vieram a ser dados como não provados no acórdão final, e que quanto ao ponto 4.3.1. foi dado como provado, mas com a mesma versão que já constava do despacho de pronúncia, não se vislumbra, nesta fase processual, qualquer utilidade na parte do recurso do arguido H que pretendia reapreciar o indeferimento de diligências de prova que respeitavam à comunicação de alterações não substanciais do ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia (relacionando-o com o ponto 4.3.1.). Aliás, não se vislumbra utilidade no recurso, nem se vê que interesse em agir – já acima deixámos bem explícito o que deve entender-se por tal pressu(...) processual – tinha o arguido quando pretendeu ver, nessa parte, apreciado o recurso interlocutório que havia inter(...) aquando do indeferimento da prova requerida na sequência da alteração de comunicações ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia. Compreende-se o interesse do arguido ao recorrer na fase em que o fez, mas já não em manter a vontade de ver reapreciado o recurso na sua totalidade aquando do recurso que interpôs do acórdão final. Nos termos do requerimento do próprio arguido, os pontos 6.º a 14.º do seu requerimento probatório referem-se a diligências que estavam relacionadas com a comunicação de alterações quanto ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia. A reapreciação do indeferimento de tais diligências de prova, face aos motivos ex(...)s, é neste momento totalmente inútil. Assim, ao abrigo do dis(...) no art. 287.º, al. e), do CPC, ex vi do art. 4.º do CPP, acorda-se em declarar parcialmente extinto o recurso inter(...) pelo arguido H do despacho de fls. 65229 e ss., com base na sua inutilidade superveniente, designadamente no que se refere ao indeferimento das diligências de prova mencionadas nos pontos 6.º a 14.º de fls. 65463 e 65464, correspondente às conclusões B) e C) desse recurso interlocutório. No mais, será apreciado o recurso interlocutório do arguido H. Aqui apenas se acrescentará que o arguido, no ponto 14 da sua motivação de recurso, vem afirmar que “valerá ainda a pena recordar que a alteração da factualidade em apreço foi comunicada ao arguido mais de cinco anos após o início do julgamento e mais de um ano após a prolação das alegações finais, ultrapassando assim um prazo razoável para o efeito, sem que o arguido em nada para isso tenha contribuído, pelo que a posição do Tribunal no sentido de lhe recusar o direito a qualquer defesa é ainda mais chocante, porque consubstancia uma verdadeira inversão dos valores que devem assistir a um processo equitativo, isto é, aquilo a que a que a doutrina anglo-saxónica designa por fair trail.” Esta afirmação do arguido, no recurso e no momento processual em que foi feita, é por si só perfeitamente inóqua. Como vimos já, outros arguidos colocaram a questão – por intermédio do respectivo recurso interlocutório – da extemporaneidade da comunicação das alterações e da sua eventual repercurssão na defesa dos arguidos. Não é o que acontece aqui. O recurso interlocutório que agora se analisa foi inter(...) na sequência do despacho de indeferimento do requerimento de prova apresentado pelo arguido H, após comunicação de alterações não substanciais de factos, e portanto, muito depois do prazo em que seria admissível recorrer com fundamento na mencionada extemporaneidade. Consequentemente, o Tribunal mais adiante limitar-se-á a ponderar tal afirmação na estrita medida em que ela possa estar relacionada com a argumentação do indeferimento de requerimentos de prova e não na perspectiva da extemporaneidade das comunicações (questão, aliás, já acima abordada). 15.3. Fundamentação 15.3.1. Delimitação do objecto dos recursos As questões suscitadas pelos recorrentes (E, C, K e H), no seu conjunto, são: a) violação dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, na medida em que as alterações de factos comunicadas aos arguidos E, C e K devem ser qualificadas como substanciais (arguidos E, C e K); b) inconstitucionalidade dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, quando interpretados no sentido de que as alterações de factos comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar e/ou do tempo dos crimes imputados, não são substanciais, por violação do art. 32.º da CRP (arguidos E, C e K); c) violação dos arts. 358.º, 360.º e 361.º, do CPP, por não ser admissível o momento processual em que foram comunicadas as alterações de factos aos arguidos, designadamente por se tratar de momento posterior às Alegações (arguidos E, C e K); d) violação dos arts. 358.º, 359.º e 1.º, al. f), do CPP, por extemporaneidade injustificada da comunicação das alterações, designadamente dado o lapso de tempo decorrido desde a produção de prova e preparação da defesa (arguidos E, C e K); e) inconstitucionalidade do art. 358.º do CPP, na interpretação feita pelo tribunal subjacente ao tempo em que a decisão recorrida – de comunicação de alterações de facto – foi proferida, por violação dos arts. 20.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, e 18.º, n.ºs 2 e 3, da CRP, e art. 6.º, n.ºs 1 e 3, al. a), da CEDH (arguidos E, C e K); f) nulidade/irregularidade do despacho que comunicou alterações de factos, por falta de fundamentação, violando o dis(...) nos arts. 97.º, n.º 5, 358.º e 359.º do CPP (arguidos E, C e K); g) inconstitucionalidade da interpretação normativa conjugada dos arts. 97.º, n.º 5, 358.º e 359.º do CPP, efectuada pelo Tribunal, no sentido de que a comunicação de alteração de factos do despacho de pronúncia se basta com a indicação dos novos factos que considerada indiciados e cuja fundamentação se limita a remeter para toda a prova produzida nos autos, por violação dos arts. 205.º, n.º 1, e 32.º da CRP, e art. 6.º, n.ºs 1 e 3, als. a) e b), da CEDH(arguidos E, C e K); h) ilegalidade do despacho de indeferimento de requerimentos de produção de prova, por violação dos arts. 340.º e 358.º do CPP, 36.º, n.º 1, da CRP, e 6.º da CEDH (arguidos E, K e H); i) inconstitucionalidade da interpretação dos arts. 340.º e 358.º do CPP, no sentido da invocação de falta de justificação para o indeferimento dos requerimentos de prova dos arguidos, por violação do art. 32º, n.º 1, da CRP (arguidos E e K). 15.3.2. As decisões recorridas Os despachos objecto dos presentes recursos interlocutórios têm o seguinte teor: Despacho proferido na sessão de julgamento ocorrida em 18 de Dezembro de 2009 (cf. fls. 63918 a 63957) “(…) II - Fls. 63.636 a 63.638, fls. 63.639 a 63.641 - Arguido C, Arguido K, arguido E; 1. Na Audiência de Julgamento de 23/11/09, a fls. 63.636 a 63.638 e fls. 63.639 a 63.641, fundamentando, os arguidos C, K e E, vieram, ao abrigo do dis(...) no art° 123°, do C.P. Penal: - Arguir a irregularidade do despacho de fls. 63.631 a 63.635, que comunicou alterações ao objecto do processo nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, por falta de fundamentação de tal Despacho e por extemporaneidade, dando ainda, na sua fundamentação, reproduzido o que já disseram nos autos a fls. 63.037 a 63.049 e de fls. 63.067 a 63.078 e arguindo a inconstitucionalidade a que se refere tal fundamentação; - A fls. 63.640/1, Ponto 3., o arguido E veio arguir, ainda, a irregularidade do Despacho, por ter qualificado as alterações que lhe comunicou como não substanciais, quando as mesmas são, para si, alterações substanciais de factos; 1.1. Nos termos do art° 327°, n° 1, do C.P.Penal, o Tribunal deu lugar ao contraditório. Cumpre apreciar e decidir. 2. A Acusação do Ministério Público, com a descrição dos factos e a indicação das normas violadas, delimitam o objecto do processo, o qual, por sua vez, delimita os poderes de cognição do Tribunal e o âmbito do caso julgado. No entanto, os art°s. 358° e 359°, do C.P.Penal, estabelecem situações em que o Tribunal pode vir a condenar o arguido por factos diversos dos que contam na acusação ou na pronúncia - desde que cumpridos os procedimentos determinados em tais preceitos -, situações estas que têm levantado questões quanto à (por exemplo) violação dos princípios subjacentes à estrutura acusatória do processo, ao principio da presunção de inocência, de imparcialidade e independência do Juiz ou do princípio do contraditório. Estas questões têm sido consecutivamente tratadas - do ponto de vista Jurisprudencial -, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça quer pelo Tribunal Constitucional, pelo que este Tribunal irá seguir o decidido em tais instâncias. Assim, seguindo o Acórdão n° 237/2007 do Tribunal Constitucional - citado, por sua vez, no Acórdão n° 226/2008 do Tribunal Constitucional, como contendo um resumo pormenorizado da Jurisprudência constitucional mais relevante a propósito do regime do objecto do processo penal em fase de julgamento, no C.P.Penal de 1987, “(…) a possibilidade de, em audiência de julgamento, se atender a factos não referidos na acusação pareceria, à primeira vista, pouco compatível com a estrutura acusatória do processo criminal. Como se referiu no Acordão n° 130/98 (…) «os factos descritos na acusação normativamente entendidos isto é, em articulação com as normas consideradas infringidas pela sua prática e também obrigatoriamente indicadas na peça acusatória, definem e fixam o objecto do processo, que, por sua vez, delimita os poderes de cognição do tribunal. Segundo FIGUEIREDO DIAS (in Direito Processual Penal, Coimbra editora, 1974, p. 145) é a este efeito que se chama vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal, ou seja, os princípios segundo os quais o objecto do processo deve manter-se o mesmo, da acusação ao trânsito em julgado da sentença, deve ser conhecido e julgado na sua totalidade (unitária indivisivelmente), e - mesmo quando não o tenha sido - deve considerar-se irrepetivelmente decidido. Com efeito, um processo penal de estrutura acusatória exige, para assegurar a plenitude das garantias de defesa do arguido, uma necessária correlação entre a acusação e a sentença que, em princípio, implicaria a desconsideração no processo de quaisquer outros factos ou circunstâncias que não constassem do objecto do processo, uma vez definido este pela acusação». Porém, este princípio não deve ser rigidamente entendido. Como o citado Acórdão n.º 130/98 logo acrescentava: «O processo penal admite (…) que sendo a descrição dos factos da acusação uma narração sintética, nem todos os factos ou circunstâncias factuais relativas ao crime acusado possam constar desde logo dessa peça, podendo surgir durante a discussão factos novos que traduzam alteração dos anteriormente descritos. A este respeito os artigos 358° e 359° do CPP, que regulam esta matéria, distinguem entre «alteração substancial» e «alteração não substancial ou simples» dos factos descritos na acusação ou pronúncia, fazendo, assim apelo à definição constante do artigo 1.º, n° 1, al. f) do CPP»”. Se a alteração dos factos for “substancial”, de acordo com a definição constante no artigo 1°, n.º 1, al. f), do C.P.Penal, há que dar lugar ao cumprimento do art° 359°, do C.P.Penal - na actual redacção, para o caso concreto -, mas “«ao invés, se a alteração dos factos for simples ou não substancial isto é, tal que não determine uma alteração do objecto do processo, então o tribunal pode investigar e integrar no processo factos que não constem da acusação e que tenham relevo para a decisão do processo. A lei exige apenas, como condição de admissibilidade, que ao arguido seja comunicada, oficiosamente ou a requerimento, a alteração e que se lhe conceda, se ele requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (art° 358°, n.º 1, parte final). Assim, é uma exigência do princípio da plenitude das garantias de defesa do arguido que os poderes de cognição do tribunal se limitem aos factos constantes da acusação, porém, se, durante a audiência surgirem factos relevantes para a decisão e que não alterem o crime tipificado na acusação nem levem à agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, respeitados que sejam os direitos de defesa do arguido, pode o tribunal investigar esses factos indiciados ex novo e, se se vierem a provar, integrá-los no processo, sem violação do preceituado no art° 32°, n° 1 e 5, da Constituição»”. Na sequência do que antecede - na parte que directamente pode relevar para a apreciação e decisão das questões suscitadas pelos arguidos nestes autos -, concluiu o Tribunal Constitucional que o art° 358°, do C.P.Penal, não violava os direitos de Defesa nem o princípio do contraditório, na parte em que directamente confere ao Juiz do Julgamento poderes para oficiosamente seleccionar novos factos surgidos na audiência de julgamento, que não impliquem uma alteração substancial, desde que seja dada ao arguido a oportunidade processual de organizar a sua defesa quanto a esses factos não especificados. No mesmo sentido foi o Acórdão n° 442/99 do Tribunal Constitucional - mas acórdão em que estava em causa a apreciação de um juízo de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, por violação do principio da presunção de inocência -, dizendo que o princípio da presunção de inocência “… não tem, como pretende o recorrente, o alcance de impedir que se considerem na decisão factos revelados em audiência que, não configurando uma alteração substancial dos descritos na acusação, sejam relevantes para a boa decisão da causa.(…) A consideração de tais factos não só não viola o princípio de presunção de inocência como é, pelo contrário, exigida pelo princípio da verdade material …”, pois tal princípio “… não é obviamente susceptível de «apagar» a realidade dos factos, demonstrada efectivamente em audiência, processada com todas as garantias de defesa do arguido …” e “…. a circunstância de o tribunal se aperceber de tais factos no decurso da audiência e exercer o poder-dever de os valorar em nada contende com o princípio da independência e imparcialidade do julgador (...)”. O Acórdão n° 544/2006, do Tribunal Constitucional (relatado pela Senhora Juíza Conselheira Maria Fernanda Palma), fez a análise do art° 358° e 359°, do C.P.Penal, mas numa situação em tinha havido despacho de pronúncia, invocando o arguido o caso julgado formal ocorrido com o proferimento do Despacho de pronúncia, quanto à qualificação jurídica dos factos. Transcrevendo o decidido no Acórdão, “… o despacho de pronúncia traduz-se na decisão de submeter o arguido a julgamento. Por força da estrutura acusatória do processo penal, tal decisão fixa o objecto do processo, encontrando-se o Juiz do Julgamento tematicamente vinculado na apreciação da acusação (em sentido material). Contudo, no momento da pronúncia o julgamento ainda não foi realizado. O juiz de julgamento tem poderes de investigação e tem naturalmente o poder de aplicar o Direito. O princípio da vinculação temática constitui uma garantia de defesa, na medida em que impede alterações significativas do objecto do processo, alterações essas que prejudicariam (poderiam até inviabilizar) a defesa. Porém, a dimensão do objecto do processo cuja alteração se repercute irreparavelmente na estratégia da defesa, e por isso só pode ser alterada em casos específicos, é a dimensão da alteração dos factos suporte de uma qualificação jurídica. E é assim, já que a alteração substancial dos factos implicará, por parte da defesa, uma necessária reorganização em matéria de prova. Já a alteração da mera qualificação jurídica dos factos importa uma discussão sobre o Direito aplicável mas não tem a mesma repercussão na defesa que tem a alteração substancial dos factos (…). O regime do objecto do processo deve ser interpretado de modo substancial em articulação com as garantias de defesa, é certo, mas também em equilíbrio com os demais princípios do Processo Penal, tais como os do jura novit cura, da verdade material e o imperativo da correcta aplicação do Direito (…)”. 2.1. Passemos, agora, à análise de um segundo aspecto relevante para o conhecimento dos vícios invocados pelos arguidos, mas em particular o invocado a fls. 63.640 a 63.641, ponto 3, pelo arguido E, pois este arguido invoca que o Tribunal procedeu-lhe à comunicação de alterações “substanciais” de factos, chamando-lhes “não substanciais”. Procedendo à determinação do que para o Tribunal é uma alteração “substancial” ou “não substancial” dos factos descritos na acusação ou na Pronúncia - o que vai fazer esquematicamente, mas resultando tal forma de exposição das conclusões retiradas pelo Tribunal da Jurisprudência dos Tribunais Superiores -, temos que o ponto de partida para a distinção entre alteração “substancial” de factos e alteração “não substancial” dos factos, é o o art° 1°, al. f), do C.P.Penal, o qual dispõe que: “…Alteração substancial dos factos, aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.” Deste modo: 1 - Alteração substancial de factos significa: - uma modificação estrutural dos factos descritos na acusação, - de modo a que a matéria de facto provada seja diversa, - com elementos essenciais que agravem a posição processual do arguido, ou a tornem não sustentável, - fazendo integrar consequências que se não continham na descrição da acusação, constituindo uma surpresa com a qual o arguido não poderia contar; (Artº 1°, al. f), do C P Penal: “… Alteração substancial dos factos aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.”) Então se (em relação á imputação que é feita ao arguido e em consequência da prova que é produzida em audiência de julgamento) ocorrer: - diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, - que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, - ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual; - E que determine a imputação de crime diverso - ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis; Temos uma alteração substancial de factos, art° 359°, do C.P.Penal - cfr. Ac. STJ, 21/03/07, P° 07P024, Relator Senhor Conselheiro Henriques Gaspar; cfr. www.DGSI - STJ , P° 07P4565, de 16/01/08; STJ, P° 4827/07, 5ª Secção, Relator Senhor Juiz Conselheiro Simas Santos; STJ, P° n.º 3271/07, 5.º Secção, Relator Senhor juiz Conselheiro Costa Mortágua; Ac. STJ 17/09/09, P° 169/07.3GCBNVSI, 5.ª Secção, Relator senhor Juiz Conselheiro Rodrigues da Costa. II - Alteração não substancial de factos significa: - uma divergência ou diferença de identidade, - que não transformam o quadro factual da acusação em outro diverso no que se refere a elementos essenciais, - mas apenas de modo parcelar e mais ou menos pontual e sem descaracterizar o quadro factual da acusação, - e que, de qualquer modo, não tem relevância para alterar a qualificação penal ou para a determinação da moldura penal; Então, se (em relação à imputação que é feita ao arguido e em consequência da prova que é produzida em audiência de julgamento) se verificar que: - há factos que não constam da acusação e resultaram da discussão; - têm relevância para a discussão ( art° 339°, n° 4, do C.P.Penal); - mas não têm repercussão no tipo de crime, não dando lugar à aplicação de um crime diverso (porque se tiver há alteração substancial); - ou não têm repercussão nos limites máximos das sanções legais aplicáveis (porque se tiver há alteração substancial); - não podem ser valorados desfavoravelmente sem serem comunicados; - (salvo se os factos resultarem da alegação da Defesa); Temos uma alteração não substancial de factos e há que dar lugar ao 358°, n.º 1 e 2, do C.P.P., com comunicação e concessão de prazo para defesa, se requerido - cfr. www.DGSI – STJ, P° 07P4565 de 16/01/08, STJ, P° 4827/07 5.ª Secção, Relator Senhor Juiz Conselheiro Simas Santos; STJ, P° n° 3271/07, 5.ª Secção, Relator Senhor Juiz Conselheiro Costa Mortágua). III - Alteração da qualificação jurídica Significa: - apenas alteração da qualificação jurídica dos factos - mesmo que implique crime mais grave (STJ, Ac FJ 3/00) - e não há alteração de factos; Aplica-se o regime da alteração não substancial e deve ser comunicada - Art° 358°, n° 3, do C.P.Penal) (cf. STJ 07P4449, Relator Senhor Juiz Conselheiro Oliveira Mendes, 25/06/08). 2.1.1. Ora face ao que antecede, a alteração de factos comunicada ao arguido E no Despacho de fls. 63.631 a 63.635 - pois os demais arguidos, tanto quanto se interpreta a sua fundamentação não invocaram tal vício - consiste, no entendimento do Tribunal numa alteração não substancial de factos, não assistindo, por isso, razão ao arguido. 3. Outra questão colocada pelos arguidos tem a ver com o momento em que o Tribunal fez a comunicação das alterações, nos termos do art° 358°, n° 1, 2 e 3, do C.P.Penal, colocando os arguidos a questão numa dupla vertente: - extemporaneidade da comunicação, por ocorrer em momento processual posterior às Alegações; - a comunicação violar os direitos do arguido, tendo em atenção o momento em que lhe é feita e o tempo já decorrido após as Alegações; Assim vejamos. 3.1. Quanto à primeira questão, extemporaneidade da comunicação, resulta do art° 358°, n° 1, do C.P.Penal que “se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido …”. Como acima vimos - no enquadramento que foi feito quanto ao tratamento das questões emergentes do art° 358° e 359°, do C.P.Penal, pela Jurisprudência -, o sentido da lei e o que o legislador pretende salvaguardar com a imposição das formalidades de comunicação e consentimento (se for o caso), constantes do art° 358° e 359°, do C.P. Penal, é que se no decurso da audiência o Tribunal se deparar com a eventualidade de vir a fazer uma alteração “substancial” ou “não substancial”, dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, ou de uma diferente qualificação jurídica dos factos, tal seja obrigatoriamente comunicado ao arguido, com o objectivo de lhe assegurar todos os direitos de defesa quanto à eventual alteração. A lei não estabelece nenhum momento concreto para a comunicação da alteração, dizendo apenas que se essa alteração ocorrer “… no decurso da audiência …” tem que ser comunicada. Resulta do dis(...) no art° 361°, do C.P.Penal, que a audiência encerra-se após as ultimas declarações do arguido e quando o Juiz Presidente a declarar encerrada. No presente caso o Tribunal ouviu os arguidos que quiseram prestar declarações em 2/11/09, após o que determinou a interrupção da audiência e a sua continuação no dia 6/11/09, audiência em que fez a comunicação de fls. 63.619 a 63.621 e no dia 23/11/09, altura em que fez a comunicação de fls. 63.631 a 63.635 (cfr. fls. 63.605 a 63.612 e f1s. 63.619 a 63.621). No entanto, mesmo que assim não tivesse sido e o Tribunal tivesse declarado a audiência encerrada procedido à reabertura da audiência especificamente para este efeito, em consequência e/ou na decorrência do processo de deliberação, tem sido entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça que tal não configura vicio de irregularidade ou nulidade – cfr. Ac STJ, 9/02/05, P° 05P1576, Relator Senhor Juiz Conselheiro Pereira Madeira, vww.DGSI.pt; cf. STJ 18/06/09… Pelo Tribunal Constitucional foi decidido no mesmo sentido, dizendo o Acórdão no 387/2005 (cf. www.DGSI.pt), que “… não se vê que a circunstância de a alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia, se comunicada ao arguido após deliberação dos juízes que compõem o tribunal colectivo que julga a causa em 1.ª instância, dando-lhe ao mesmo tempo prazo para a sua defesa (…), ofenda os princípios constitucionais do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa, quando a deliberação sobre tais factos novos e sobre todos os demais é assumida pelo Tribunal como uma posição provisória sobre o julgamento da matéria de facto…” (cfr., no mesmo sentido, Ac. TC 392/04). Pelo que a comunicação feita a fls. 63.631 a 63.635, foi, sob esta primeira perspectiva, tempestiva. 3.2. Quanto à segunda questão, extemporaneidade da comunicação tendo em atenção o tempo já decorrido após “as alegações”, o presente processo - “Principal” e “Apensado” -, diz respeito à imputação de crimes a sete arguidos e à imputação de crimes nas pessoas de 32 (trinta e dois) Ofendidos e/ou Assistentes. Há um núcleo de 9 (nove) Ofendidos e/ou Assistentes que têm a ver com os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, sendo que os restantes 23 (vinte e três) Ofendidos e/ou assistentes têm a ver exclusivamente com o arguido A. A comunicação de uma alteração substancial ou não substancial de factos, no decurso de uma audiência, tem a consequência de poder provocar o alargamento do objecto do processo e de poder levar a actividade probatória suplementar. Acresce que face à actividade processual que tem sido e é este processo, não era possível - salvo situações de excepção, como ocorreu, por exemplo, com a comunicação de alteração substancial de factos que foi feita pelo tribunal na Audiência de julgamento de 6/05/05 - ao arguido A -, proceder à comunicação de alterações, sem ter feito a análise global de toda a prova produzida em audiência de julgamento, análise esta que, contudo, não se pode confundir com a análise crítica da prova que é feita para a decisão. Isto porque não é qualquer declaração ou sentido de declaração, ou qualquer documento ou outra prova (com o sentido que de tal documento possa advir), que pode ou deve levar à comunicação de alterações. A comunicação deve ser feita, na perspectiva deste Tribunal, apenas quando após a avaliação da prova produzida, o Tribunal sente que a mesma consente determinado sentido, que tem a propriedade no processo - por ser adequada, um caminho possível e verosímil e, por isso, indiciária - de levar ao alargamento do objecto do processo. 3.2.1. Ora, neste processo, as situações de facto - com as respectivas multiplicidades de circunstância de tempo modo e lugar de execução e imputação de ilícitos criminais - que o tribunal teve que considerar na avaliação da prova produzida em audiência de julgamento, e em relação as quais teve que “considerar” a prova produzida, só pela sua mera enunciação, que se passa a fazer, são uma imagem do que exigem em tempo e trabalho:(…) 3.2.2. Na presente audiência de julgamento foram efectivamente arroladas e admitidas – e quando dizemos “efectivamente”, tem a ver com o facto de os nomes inicialmente arrolados terem sido em número superior a 2.000, mas ocorrendo a circunstância de várias testemunhas serem comuns a vários róis e por outro lado de nem todos as pessoas arroladas terem sido admitidas pelo Tribunal – 990 (novecentos e noventa) pessoas, correspondendo a: - 920 testemunhas; - 32 pessoas identificadas como vítima, - Legal representante da Assistente AX, - 19 consultores técnicos, - 18 Peritos; Para além das pessoas que antecedem, o Tribunal ouviu ainda em declarações os arguidos. O Total em horas (tempo útil) de gravações de declarações ou depoimentos prestados em audiência de julgamento pelos arguidos, pessoas identificadas como vítimas, legal representantes da AX, testemunhas, Peritos, Consultores Técnicos, é de 1182 (mil cento e oitenta e duas) horas. Dado o tempo que duraram as inquirições e audições de pessoas em audiência de julgamento - até à altura em que o tribunal deu início às Alegações (as primeiras, pois houve lugar a alegações complementares, em consequência de prova entretanto produzida na continuidade da audiência) tinham decorrido 408 (quatrocentas e oito) sessões de Audiência de Julgamento -, para proceder à avaliação global da prova o Tribunal teve que proceder à audição das gravações, pelo menos, de todos os trinta e dois assistentes, de parte das declarações dos arguidos, de parte das testemunhas e demais declarantes. Há que dizer que houve Assistentes/Ofendidos – e na maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A – que foram ouvidos (cada um) em 18 sessões (FG), 10 sessões (IM), 17 sessões (JPL), 8 sessões (LDN), 9 sessões (LM), 3 sessões (MP), 5 sessões (PP) e a legal representante da AX prestou declarações em 16 sessões. E há também que dizer, para se ter efectivamente a noção da dimensão do que está em causa – e do que a multiplicidade gera –, que o número de horas (úteis) de gravações de declarações, as 1.182 horas, a serem ouvidas na totalidade e, por exemplo, a cinco horas de audição por dia, levariam 236 dias. 3.2.3. E acresce, por fim, a prova documental que sucessivamente foi sendo requerida por todos os Sujeitos Processuais para os autos e que o tribunal, necessariamente, teve e tem que cruzar com a prova testemunhal ou por declarações produzida. A prova documental encontra-se quer no processo principal – com, actualmente, 276 volumes e cerca de 64.000 folhas – e nos mais 570 volumes de Apensos, nos quais se incluem, ainda, os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, que foram adquiridos para os autos. 3.2.4. As alegações nos presentes autos iniciaram-se no dia 24/11/08, tendo terminado (as iniciais, porque houve lugar a alegações complementares), com Réplica, no dia 3/02/09. O início das Alegações foi marcado para 24/11/08, por Despacho proferido na audiência de julgamento de 22/10/08 (Acta de fls. 60.454 a 60.505-D), na sequência de requerimento conjunto do Ministério Público, do Ilustre Mandatário dos Assistentes AX (32) Assistentes identificados como vítimas no processo e dos Ilustre Mandatários dos arguidos C, E, H, K, N e Q, pedindo ao Tribunal que as Alegações fossem marcadas apenas para esse dia 24/11/08, dado as diligências de prova sucessivamente em curso e a necessidade de tempo para a sua preparação (Por Despacho proferido na audiência de julgamento de 16/07/2008 – Acta de fls. 54.603 a 54.621 –, o Tribunal procedera ao agendamento de nove audiências a decorrer entre 18/07/08 e 15/09/08, para diligências de prova que estavam a ser requeridas e as que, previsivelmente, ainda viriam a ser requeridas e ao agendamento do início das Alegações para o dia 18/09/2008; Por Despacho proferido na audiência de julgamento de 5/09/08 – Acta de fls. 55.953 a 55.962 –, o Tribunal procedeu à alteração da data designada para as Alegações, em consequência da Ilustre Mandatária de um arguido ter cesariana marcada para o dia 18/09/08, tendo designado o dia 20/10/2008). O M°P° alegou nos dias 24/11/08, 25/11/08, 26/11/08, 9/12/08, 10/12/08; Os Assistentes alegaram no dia 11/12/08; A defesa do arguido A alegou no dia 16/12/08; A defesa do arguido C alegou no dia 18/12/08, 19/12/08, 5/01/09,6/01/09; A defesa do arguido E alegou no dia 7/01/09; A defesa do arguido H alegou no dia 9/01/09, 12/01/09, 13/01/09, 14/01/09; A defesa do arguido K alegou no dia 19/01/09, 20/01/09, 21/01/09; A defesa do arguido N alegou no dia 22/01/09; A defesa da arguida Q alegou no dia 26/01/09; A Réplica do Ministério Publico e dos assistentes teve lugar no dia 28/01/09; A Réplica do arguido A e do arguido E teve lugar no dia 30/01/09 A Réplica do arguido C e do arguido H teve lugar no dia 2/02/09; A Réplica do arguido K, do arguido N (que prescindiu) e da arguida Q teve lugar no dia 3/02/09; Na audiência de 26/02/09, os arguidos K e N prestaram declarações, tendo o arguido K requerido a junção de documentos aos autos, para complemento das suas declarações. Nas audiências de 18/03/09, 14/04/09 foram proferidos Despacho a decidir questões levantadas por arguidos, deferimento ou indeferimento de diligências de prova entretanto requeridas, abertura e análise de meios de prova/prova constantes dos autos. Na audiência de 8/05/09 o arguido H prestou declarações, bem como na audiência de 1/06/09, repetindo parte das já prestadas anteriormente, dado que a gravação do dia 8/05/09 não ficou integralmente audível. Nas audiências de 24/08/09, 20/07/09 e 11/08/09, o tribunal procedeu à abertura e análise de meios de prova/prova existente nos autos, sendo que nesta última sessão o arguido H requereu a diligências de prova. Nas audiências de 7/09/09, 2/10/09, o tribunal procedeu à abertura e análise de meios de prova/prova existentes nos autos. Na audiência de 23/10/09, o arguido N prestou declarações, O Ministério Público, os assistentes, o arguido E produziram Alegações complementares – em relação à prova entretanto produzida –, não tendo o Tribunal dado início às alegações complementares dos arguidos, por motivo de doença do ilustre mandatário do arguido A (cf. fls. 63.580) e tendo a Ilustre Mandatária do arguido N prescindido de alegações complementares. Na audiência de 30/10/09 os arguidos A, C, H, K e Q produziram alegações complementares. Na audiência de 2/11/09 os arguidos prestaram declarações nos termos do artº 361º, do C.P.Penal. Na audiência de 6/11/09, o Tribunal começou a fazer a comunicação de alterações nos termos do artº 358º, do C.P.Penal, concretamente quanto aos factos do “Processo Apensado”. 3.2.5. Todo o que antecede é bastante, no entendimento do Tribunal, para dar sentido ao tempo decorrido. Como já foi referido na audiência de julgamento de 14/12/09, se o Tribunal demorasse uma semana com cada um dos assistentes, nesta análise prévia e global de toda a prova produzida em audiência de julgamento – e há assistentes para os quais, objectivamente, uma semana, é manifestamente insuficiente –, incluindo nesse tempo também a análise das declarações que foram prestadas pelos arguidos, seriam necessárias, pelo menos, 32 (trinta e duas) semanas. Sendo que, quanto ao momento processual em que o Tribunal decidiu que devia fazer e fez, a comunicação de alterações, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal. Pelo que, também nesta parte, o Tribunal considera que não violou os direitos de Defesa dos arguidos, quer os consignados na lei ordinária, quer os consagrados pela Constituição ou pela C.E.D.H., como invocado”. Despacho proferido na sessão de julgamento ocorrida em 11 de Janeiro de 2010 (cf. fls. 64055 a 64112) “I - Fls. 63.688 a 63.691, fls. 63.691 a fls.63.692 - Arguidos H, C, K, E, N e Q – arguição de irregularidades/nulidade: 1. Na Audiência de Julgamento de 14/12/09, a fls. 63.688 a 63.691, o arguido H, a que a fls. 63.691 a fls. 63.692 aderiram os arguidos C, K, E, N e Q, vieram: - Arguir a nulidade “…dos Despachos que têm sido proferidos quanto à alteração dos factos, por falta de fundamentação, proferidos em prazo razoável e em contexto em que é violado o princípio do processo equitativo que a Constituição e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem…”; - Subsidiariamente, “…caso se entenda que está perante uma mera irregularidade no que diz respeito ao despacho hoje proferido, vai arguida a irregularidade respectiva, com os mesmos fundamentos já reportados à nulidade…”; 1.1. Nos termos do artº 327º, nº 1, do C.P.Penal, o Tribunal deu lugar ao contraditório. Cumpre apreciar e decidir. 2. De acordo com o dis(...) no artº 118º, nº 1 e 2, do C.P.Penal, “…a violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei…”, sendo que “…nos casos em que a lei o cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular…”. Os arguidos, nos fundamentos que invocam a fls. 63.688 a 63.691 - tendo o Tribunal interpretado do requerimento dos arguidos que a arguição de nulidade/irregularidade refere-se ao Despacho de fls. 63.685 a 63.687 - , não indicam o dispositivo legal ao abrigo do qual qualificam os vícios apontados como “nulidade”. Ora face ao citado art° 118°, do C.P.Penal, confrontado com o dis(...) nos art°s. 119°, 120º, 358° (ou mesmo art° 359°, se for o caso), do C.P.Penal, e a natureza da comunicação que está em causa e que foi objecto de arguição de nulidade - a comunicação de fls. 63.685 a 63.687, tal como o Tribunal interpreta, globalmente, o objecto do requerimento dos arguidos -, não se afigura a este Tribunal que os vícios apontados pelos arguidos possam consubstanciar uma nulidade. A comunicação feita pelo Tribunal, ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do C.P.Penal - tal como veremos com mais pormenor a seguir -, tem como propósito exclusivo a preparação da defesa, por parte dos arguidos que o queiram fazer, em relação às alterações comunicaclas. Não integram um acto “decisório” do Tribunal em relação a quaisquer factos, no sentido equacionado no art° 97°, do C.P.Penal, não se podendo por isso concluir que é um acto “ favorável “ ou “ desfavorável” aos arguidos. Assim e desde já, para este Tribunal não está em causa o conhecimento não de nulidade processual, mas sim de uma irregularidade processual. 3. Ora a Acusação do Ministério Púbtico, com a descrição dos factos e a indicação das normas violadas, delimitam o objecto do processo, o qual, por sua vez, delimita os poderes de cognição do Tribunal e o âmbito do caso julgado. No entanto, os art°s. 358° e 359°, do C.P.Penal, estabelecem situações em que o Tribunal pode vir a condenar o arguido por factos diversos dos que constam na acusação ou na pronúncia desde que cumpridos os procedimentos determinados em tais preceitos -, situações estas que têm levantado questões quanto à (por exemplo) violação dos princípios subjacentes à estrutura acusatória do processo, ao principio da presunção de inocência, de imparcialidade e independência do Juiz ou do princípio do contraditório. São questões que têm sido tratadas - do ponto de vista Jurisprudencial -, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça quer pelo Tribunal Constitucional e em cujas decisões têm sido afloradas ou expressamente tratadas as questões agora suscitadas pelos arguidos. Começando pelo Acórdão n° 237/2007 do Tribunal Constitucional - citado, por sua vez, no Acórdão n° 226/2008 do Tribunal Constitucional, como contendo um resumo pormenorizado da Jurisprudência constitucional mais relevante a propósito do regime do objecto do processo penal, em fase de julgamento, no C.P.Penal de 1987 - “(…) a possibilidade de, em audiência de julgamento, se atender a factos não referidos na acusação pareceria, à primeira vista, pouco compatível com a estrutura acusatória do processo criminal. Como se referiu no Acordão n° 130/98 (…) «os factos descritos na acusação normativamente entendidos, isto é, em articulação com as normas consideradas infringidas pela sua prática e também obrigatoriamente indicadas na peça acusatória, definem e fixam o objecto do processo, que por sua vez, delimita os poderes de cognição do tribunal. Segundo FIGUEIREDO DIAS (in Direito Processual Penal, Coimbra editora, 1974, p. 145) é a este efeito que se chama vinculação temática do tribunal e e nele que se consubstanciam os principios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal, ou seja, os princípios segundo os quais o objecto do processo deve manter-se o mesmo, da acusação ao trânsito em julgado da sentença, deve ser conhecido e julgado na sua totalidade (unitária indivisivelmente), e - mesmo quando não o tenha sido - deve considerar-se irrepetivelmente decidido. Com efeito, um processo penal de estrutura acusatória exige, para assegurar a plenitude das garantias de defesa do arguido, uma necessária correlação entre a acusação e a sentença que, em princípio, implicaria a desconsideração no processo de quaisquer outros factos ou circunstâncias que não constassem do objecto do processo, uma vez definido este pela acusação». Porém, este princípio não deve ser rigidamente entendido. Como o citado Acórdão nº 130/98 logo acrescentava: «O processo penal admite (…) que sendo a descrição dos factos da acusação uma narração sintética, nem todos os factos ou circunstâncias factuais relativas ao crime acusado possam constar desde logo dessa peça, podendo surgir durante a discussão factos novos que traduzam alteração dos anteriormente descritos. A este respeito os artigos 358° e 359° do CPP, que regulam esta matéria, distinguem entre «alteração substancial» e «alteração não substancial ou simples» dos factos descritos na acusação ou pronúncia, fazendo, assim, apelo à definição constante do artigo 1°, n° 1, al. f) do CPP»”. Se a alteração dos factos for “substancial”, de acordo com a definição constante no artigo 1°, n° 1, al. f), do C.P.Penal, há que dar lugar ao cumprimento do art° 359°, do C.P.Penal - na actual redacção, para o caso concreto, mas “… « ao invés, se a alteração dos factos for simples ou não substancial, isto é, tal que não determine uma alteração do objecto do processo, então o tribunal pode investigar e integrar no processo factos que não constem da acusação e que tenham relevo para a decisão do processo. A lei exige apenas, como condição de admissibilidade, que ao arguido seja comunicada, oficiosamente ou a requerimento, a alteração e que se lhe conceda, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (art° 358°, n° 1, parte final). Assim, é uma exigência do princípio da plenitude das garantias de defesa do arguido que os poderes de cognição do tribunal se limitem aos factos constantes da acusação; porém, se, durante a audiência, surgirem factos relevantes para a decisão e que não alterem o crime tipificado na acusação nem levem à agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, respeitados que sejam os direitos de defesa do arguido, pode o tribunal investigar esses factos indiciados ex novo e, se se vierem a provar, integrá-los no processo, sem violação do preceituado no art° 32°, n° 1 e 5, da Constituição»”. Na sequência do que antecede - na parte que directamente pode relevar para a apreciação e decisão das questões suscitadas pelos arguidos nestes autos -, concluiu o Tribunal Constitucional que o art° 358°, do C.P. Penal, não violava os direitos de Defesa nem o princípio do contraditório, na parte em que directamente confere ao Juiz do Julgamento poderes para oficiosamente seleccionar novos factos surgidos na audiência de julgamento, que não impliquem uma alteração substancial, desde que seja dada ao arguido a oportunidade processual de organizar a sua defesa quanto a esses factos não especificados. No mesmo sentido foi o Acórdão n° 442/99 do Tribunal Constitucional - mas acórdão em que estava em causa a apreciação de um juízo de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, por violação do princípio da presunção de inocência - , dizendo que o princípio da presunção de inocência “…não tem, como pretende o recorrente, o alcance de impedir que se considerem na decisão factos revelados em audiência que, não configurando uma alteração substancial dos descritos na acusação, sejam relevantes para a boa decisão da causa. (…) A consideração de tais factos não só não viola o princípio de presunção de inocência como é, pelo contrário, exigida pelo princípio da verdade material…”, pois tal princípio “…não é obviamente susceptível de «apagar» a realidade dos factos, demonstrada efectivamente em audiência, processada com todas as garantias de defesa do arguido…” e “…a circunstância de o tribunal se aperceber de tais factos no decurso da audiência e exercer o poder-dever de os valorar em nada contende com o princípio da independência e imparcialidade do julgador (...)”. O Acórdão n° 544/2006, do Tribunal Constitucional (relatado pela Senhora Juíza Conselheira Maria Fernanda Palma), fez a análise do art° 358° e 359°, do C.P.Penal, mas numa situação em tinha havido despacho de pronúncia, invocando o arguido o caso julgado formal ocorrido com o proferimento do Despacho de pronúncia, quanto à qualificação jurídica dos factos. Transcrevendo o decidido no Acórdão, “…o despacho de pronúncia traduz-se na decisão de submeter o arguido a julgamento. Por força da estrutura acusatória do processo penal, tal decisão fixa o objecto do processo, encontrando-se o Juiz do Julgamento tematicamente vinculado na apreciação da acusação em sentido material. Contudo, no momento da pronúncia o julgamento ainda não foi realizado. O juiz de julgamento tem poderes de investigação e tem naturalmente o poder de aplicar o Direito. O princípio da vinculação temática constitui uma garantia de defesa, na medida em que impede alterações significativas do objecto do processo, alterações essas que prejudicariam (poderiam ate inviabilizar) a defesa. Porém, a dimensão do objecto do processo cuja alteração se repercute irreparavelmente na estrategia da defesa, e por isso só pode ser atterada em casos específicos, é a dimensão da alteração dos factos suporte de uma qualificação juridica E é assim, já que a alteração substancial dos factos implicará, por parte da defesa, uma necessária reorganização em materia de prova (...). O regime do objecto do processo deve ser interpretado de modo substancial em articulação com as garantias de defesa, é certo, mas também em equilíbrio com os demais principios do Processo Penal, tais como os do jura novit cura, da verdade material e o imperativo da correcta aplicação do Direito (…).” 4. Passemos, agora, ao conhecimento da questão colocada pelos arguidos, quanto ao momento e forma como o Tribunal fez a comunicação das alterações, nos termos do art° 358°, n° 1, 2 e 3 do C P Penal, colocando os arguidos a questão em sumula, da seguinte forma - comunicação violadora dos direitos dos argutdos por ocorrer em momento processual “muito” posterior às Alegações feita de forma fragmentada e não fundamentada. Assim vejamos. 4.1. Quanto a primeira questão, extemporaneidade/momento da comunicação, resulta do art° 358°, n° 1, do C P Penal, que “…se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver com relevo para a decisão da causa o presidente oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido…”. Como acima vimos - no enquadramento que foi feito quanto ao tratamento das questões emergentes do art° 358° e 359°, do C.P.Penal, pela Jurisprudência -, o sentido da lei e o que o legislador pretende salvaguardar com a imposição das formalidades de comunicação e consentimento (se for o caso), constantes do art° 358° e 359°, do C.P.Penal, é que se no decurso da audiência o Tribunal se deparar com a eventualidade de vir a fazer uma alteração “substancial” ou “não substancial” dos factos descritos na acusação ou na pronúncia ou de uma diferente qualificação juridica dos factos, tal seja obrigatoriamente comunicado ao arguido, com o objectivo de lhe assegurar todos os direitos de defesa quanto à eventual alteração. A lei não estabelece nenhum momento concreto para a comunicação da alteração, dizendo apenas que se essa alteração ocorrer “…no decurso da audiência…” tem que ser comunicada. Resulta do dis(...) no art° 361° do C.P.Penal, que a audiência encerra-se apos as últimas declarações do arguido e quando o Juiz Presidente a declarar encerrada. No presente caso o Tnbunal ouviu os arguidos que quiseram prestar declarações em 2/11/09, após o que determinou a interrupção da audiência e a sua continuação no dia 6/11/09, audiência em que fez a comunicação de fls 63.619 a 63.621 e no dia 23/11/09, altura em que fez a comunicação de fls. 63.631 a 63.635 (cfr. fls. 63.605 a 63.612 e fls. 63.619 a 63.621). No entanto, mesmo que assim não tivesse sido e o Tribunal tivesse declarado a audiência encerrada procedido à reabertura da audiência especificamente para este efeito, em consequência e/ou na decorrência do processo de deliberação, tem sido entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça que tal não configura vicio de irregularidade ou nulidade - cfr Ac. STJ, 9/02/05, P° 05P1576, Relator Senhor Juiz Conselheiro Pereira Madeira, www.DGSI.pt e cfr. STJ 18/06/09. Pelo Tribunal Constitucional foi decidido no mesmo sentido, dizendo o Acórdão n° 387/2005 (cf. www.DGSI.pt), que “…não se vê que a circunstânçia de a alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia, se comunicada ao arguido após deliberação dos juízes que compõem o tribunal colectivo que julga a causa em 1ª instância, dando-lhe ao mesmo tempo prazo para a sua defesa (…), ofenda os princípios constitucionais do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa, quando a deliberação sobre tais factos novos e sobre todos os demais é assumida pelo Tribunal como uma posição provisória sobre o julgamento da matéria de facto…” ( cfr., no mesmo sentido, Ac. TC 392/04). Pelo que a comunicação feita a fls. 63.619 a 63.621, foi, sob esta primeira perspectiva, tempestiva. 4.2. Quanto à segunda questão, extemporaneidade da comunicação tendo em atenção o tempo já decorrido após “as alegações”, consubstanciando tal a violação dos Direitos dos arguidos a um processo equitativo, o presente processo -“Principal” e “Apensado” -, diz respeito à imputação de crimes a sete arguidos e à imputação de crimes nas pessoas de 32 ( trinta e dois) Ofendidos e/ou Assistentes. Há um núcleo de 9 (nove) Ofendidos e/ou Assistentes que têm a ver com os arguidos A, C, E, H, K, N e Q, sendo que os restantes 23 (vinte e três) Ofendidos e/ou assistentes têm a ver exclusivamente com o arguido A. A comunicação de uma alteração substancial ou não substancial de factos, no decurso de uma audiência, tem a consequência de poder provocar o alargamento do objecto do processo e de poder levar a actividade probatória suplementar. Acresce que face à actividade processual que tem sido e é este processo, não era possível para este Tribunal - salvo situações de excepção, como ocorreu, por exemplo, com a comunicação de alteração substancial de factos que foi feita pelo tribunal na Audiência de julgamento de 6/05/05 ao arguido A -, proceder à comunicação de alterações, sem ter feito a análise global de toda a prova produzida em audiência de julgamento, análise esta que, contudo, não se pode confundir com a análise crítica da prova que é feita para a decisão. Isto porque não é qualquer declaração ou sentido de declaração, ou qualquer documento ou outra prova (com o sentido que de tal documento possa advir), que pode ou deve levar à comunicação de alterações. A comunicação deve ser feita, na perspectiva deste Tribunal, apenas quando após a avaliação da prova produzida, o Tribunal sente que a mesma consente determinado sentido, que tem a propriedade no processo - por ser adequada, um caminho possivel e verosimil e, por isso indiciária - de levar ao alargamento do objecto do processo. 4.2.1. Ora, neste processo, as situações de facto - com as respectivas multiplicidades de circunstância de tempo, modo e lugar de execução e imputação de ilicitos criminais - que o tribunal teve que considerar na avaliação da prova produzida em audiência de julgamento, e em relação às quais teve que “considerar” a prova produzida, só pela sua mera enunciação, que se passa a fazer, são uma imagem do que exigem em tempo e trabalho: A descrição dos factos a considerar pelo Tribunal, no processo principal e apensado (Despacho de pronúncia no Principal e Acusação no Apensado), tem cerca de 200 páginas. A multiplicidade ou variedade de situações de facto que digam directamente respeito a prática de crimes é, em súmula, como segue:(..) 4.2.2. Na presente audiência de julgamento foram efectivamente arroladas e admitidas - e quando digo “efectivamente”, tem a ver com o facto de os nomes inicialmente arrolados terem sido em número superior a 2.000, mas ocorrendo a circunstância de várias testemunhas serem comuns a vários róis e por outro lado de nem todos as pessoas arroladas terem sido admitidas pelo Tribunal - 990 (novecentos e noventa) pessoas, correspondendo a: - 920 testemunhas; - 32 pessoas identificadas como vítima; - Legal representante da Assistente AX; - 19 consultores técnicos; - 18 Peritos; Para além das pessoas que antecedem, o Tribunal ouviu ainda em declarações os arguidos. O total em horas (tempo útil) de gravações de declarações ou depoimentos prestados em audiência de julgamento pelos arguidos, pessoas identificadas como vitimas, legal representantes da AX testemunhas, Peritos, Consultores TéCnicos, é de 1.182 (mil cento e oitenta e duas) horas. Dado o tempo que duraram as inquirições e audições de pessoas em audiência de julgamento - até à altura em que o tnbunal deu inicio às Alegações (as primeiras, pois houve lugar a alegações complementares, em consequência de prova entretanto produzida na continuidade da audiência) tinham decorrido 408 (quatrocentas e oito) sessões de Audiência de Julgamento -, para proceder à avaliação global da prova o Tribunal teve que proceder à audição das gravações, pelo menos, de todos os trinta e dois assistentes, de parte das declarações dos arguidas, de parte das testemunhas e demais declarantes. Há que dizer que houve Assistentes/Ofendidos - e na sua maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A - que foram ouvidos (cada um) em 18 sessões (FG), 10 sessões (IM), 17 sessões (JPL), 8 sessões (LDN), 9 sessões ( LM), 3 sessões (MP), 5 sessões (PP) e a legal representante da AX prestou declarações em 16 sessões. E há também que dizer, para ter-se efectivamente a noção da dimensão do que está em causa - e do que a multiplicidade gera -, que o número de horas (úteis) de gravações de declarações, as 1.182 horas, a serem ouvidas na totalidade e por exemplo, a cinco horas de audição por dia, levariam 236 dias. 4.2.3. E acresce, por fim, a prova documental que sucessivamente foi sendo requerida por todos os Sujeitos Processuais para os autos e que o tnbunal, necessariamente, teve e tem que cruzar com a prova testemunhal ou por declarações produzida. A prova documental encontra-se quer no processo principal - com, actualmente, 276 volumes e cerca de 64.000 folhas - e nos mais 570 volumes de Apensos, nos quais se incluem, ainda, os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, que foram adquiridos para os autos. 4.2.4. As Alegações nos presentes autos iniciaram-se no dia 24/11/08, tendo terminado (as iniciais, porque houve lugar a alegações complementares), com Réplica, no dia 3/02/09. O início das Alegações foi marcado para 24/11/08, por Despacho proferido na audiência de julgamento de 22/10/08 (Acta de fls. 60.454 a 60.505-D). Esta data foi marcada na sequência de requerimento conjunto do Ministério Público, do Ilustre Mandatário dos Assistentes AX e Demais (32) Assistentes identificados como vitimas no processo e dos Ilustre Mandatários dos arguidos C, E, H, K, N e Q, pedindo ao Tribunal que as Alegações fossem marcadas apenas para esse dia 24/11/08, dado as diligências de prova sucessivamente em curso e a necessidade de tempo para a sua preparação. Isto porque por Despacho proferido na audiência de julgamento de 16/07/2008 - Acta de fls 54.603 a 54.621 -, o Tribunal procedera ao agendamento de nove audiências a decorrer entre 18/07/08 e 15/09/08, para diligências de prova que estavam a ser requeridas e as que, previsivelmente, ainda viriam a ser requeridas e ao agendamento do início das Alegações para o dia 18/09/2008. Por Despacho proferido na audiência de julgamento de 5/09/08 - Acta de fls. 55.953 a 55.962 -, o Tribunal procedeu á alteração da data designada para as Alegações, em consequência da Ilustre Mandatária de um arguido ter cesariana marcada para o dia 18/09/08, tendo designado o dia 20/10/2008. Data esta que, entretanto, foi objecto de adiamento por requerimento dos arguidos e do Ministério Público, conforme acima referido. O M°P° alegou nos dias 24/11/08, 25/11/08, 26/11/08, 9/12/08, 10/12/08. Os Assistentes alegaram no dia 11/12/08. A defesa do arguido A alegou no dia 16/12/08. A defesa do arguido C alegou no dia 18/12/08, 19/12/08, 5/01/09, 6/01/09. A defesa do arguido E alegou no dia 7/01/09 A defesa do arguido H alegou no dia 9/01/09, 12/01/09, 13/01 /09, 14/01/09. A defesa do arguido K alegou no dia 19/01/09, 20/01/09, 21/01/09. A defesa do arguido N alegou no dia 22/01/09. A defesa da arguida Q alegou no dia 26/01/09. A Réplica do Ministerio Publico e dos assistentes teve lugar no dia 28/01/09. A Réplica do arguido A e do arguido E teve lugar no dia 30/01/09. A Réplica do arguido C e do arguido H teve lugar no dia 2/02/09. A Réplica do arguido K, do arguido N (que prescindiu) e da arguida Q teve lugar no dia 3/02/09. No total, as Alegações tiveram a duração de 25 (vinte e cinco) dias úteis, tendo ocupado todo o dia. Na audiência de 26/02/09, os arguidos K e N prestaram declarações, tendo o arguido K requerido a junção de documentos aos autos, para complemento das suas declarações. Nas audiências de 18/03/09, 14/04/09 foram proferidos Despacho a decidir questões levantadas por arguidos, deferimento ou indeferimento de diligências de prova entretanto requeridas, abertura e análise de meios de prova/prova constantes dos autos. Na audiência de 8/05/09 o arguido H prestou declarações, bem como na audiência de 1/06/09, repetindo parte das já prestadas anteriormente, dado que a gravação do dia 8/05/09 não ficou integralmente audível. Nas audiências de 24/08/09, 20/07/09 e 11/08/09 o tribunal procedeu à abertura e análise de meios de prova/prova existente nos autos sendo que nesta última sessão o arguido H requereu a diligências de prova. Nas audiências de 7/09/09, 2/10/09, o tribunal procedeu à abertura e analise de meios de prova/prova existente nos autos. Na audiência de 16/10/09 o arguido K prestou declarações, tendo o arguido K requerido a junção de documentos aos autos para complemento das suas declarações Na audiência de 23/10/09, o arguido N prestou declarações, O Ministério Público, os assistentes, o arguido E produziram Alegações complementares - em relação à prova entretanto produzida -, não tendo o Tribunal dado início às alegações complementares dos arguidos, por motivo de doença do ilustre mandatario do arguido A (cf. fls. 63.580) e tendo a Ilustre Mandatária do arguido N prescindido de alegações complementares. Na audiência de 30/10/09 os arguidos A, C, H, K e Q produziram alegações complementares. Na audiência de 2/11/09 os arguidos prestaram declarações nos termos do art° 361°, do C.P.Penal. Na audiência de 6/11/09, o Tribunal começou a fazer a comunicação de alterações nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, concretamente quanto aos factos do “Processo Apensado”. 4.2.5. Todo o que antecede é bastante, no entendimento do Tribunal, para dar sentido ao tempo decorrido. Como já foi referido na audiência de julgamento de 14/12/09, se o Tribunal demorasse uma semana com cada um dos assistentes, nesta análise prévia e global de toda a prova produzida em audiência de julgamento - e há assistentes para os quais, objectivamente, uma semana , é manifestamente insuficiente -, incluindo nesse tempo tambem a analise das declarações que foram prestadas pelos arguidos, seriam necessárias, pelo menos, 32 (trinta e duas) semanas. Quanto ao momento processual em que o Tribunal decidiu que devia fazer e fez a comunicação de alteraçes (nos termos do art° 358° do C.P.Penal) o que acima já foi dito a propósito do critério ou circunstâncias em que o Tribunal considera que deve fazer uma comunicação de alterações - que pode levar ao alargamento do objecto do processo -, demonstram que o Tribunal não adoptou procedimentos arbitrários. O Tribunal agiu dentro dos poderes e dos deveres que a lei processual lhe confere na direcção, condução e decisão do processo. Pelo que, também nesta parte, o Tribunal considera que não violou os direitos de Defesa dos arguidos, quer os consignados na lei ordinária, quer os consagrados pela Constituição ou pela C.E.D.H., como invocado. 5. A última questão levantada pelos arguidos na arguição de irregularidade do Despacho, tem a ver com a “ falta de fundamentação”. Os arguidos vieram arguir o vício de falta de fundamentação do despacho que comunicou as alterações não substanciais de factos. No caso concreto o Tribunal fundamentou de forma que os arguidos dizem lacónica, na “prova produzida em audiência de julgamento”. Isto não foi feito pelo Tribunal porque sempre tem sido feito assim, mas atendendo à natureza do despacho em causa. Como acima dissemos o Juiz do julgamento tem poderes de investigação e de aplicar o direito. O princípio da vinculação temática que já referimos, constitui uma garantia de defesa, na medida em que não permite alterações significativas do objecto do processo, que poderiam prejudicar ou inviabilizar a defesa do arguido No entanto, vimos que a lei admite a possibilidade de alargamento do processo, nos termos do art° 358º e 359º, do C.P.Penal. Este despacho do art° 358°, do C.P.Penal, tem o sentido de comunicação e prevenção de forma a que o arguido possa organizar a sua defesa face a possibilidade de alteração comunicada e assim, ser dado lugar ao contraditório em relação à possibilidade de alargamento do objecto do processo. É o afloramento dos mecanismos de defesa que são reconhecidos ao arguido, como seja o exercicio do contraditório. A comunicação que é feita pelo tribunal nos termos do art° 358° do C.P.Penal, é feita enquanto possibilidade de alargamento do objecto do processo e não enquanto acto decisório. Aliás, não tem qualquer outro conteúdo decisório, pois embora o Tribunal qualifique tais factos novos como alterações não substanciais, não é uma decisão no sentido de pronúncia definitiva sobre determinado caso de vida. O Tribunal é um garante de constitucionalidade, o fiel da balanças para que todos os princípios sejam efectivamente respeitados e o dever de fundamentação do despacho em que e feita esta comunicação tem que ser apreendido com este objectivo. Como disse, no Despacho proferido o Tribunal fundamentou a comunicação face à prova produzida em audiência de julgamento, forma que os arguidos, como já mencionado, apelidaram de lacónica ou mesmo apenas de arremedo de fundamentação. Quando o Tribunal diz face à prova produzida e numa altura em que já foram feitas as alegações, partiu sempre do pressu(...)s que os sujeitos processuais, os arguidos, estiveram presentes na audiência de julgamento, ouviram a prova, tiveram e têm a possibilidade de a “valorar” e interpretar. A comunicação feita pelo tribunal nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, repito, é feita apenas enquanto possibilidade de alargamento do objecto do processo e não enquanto acto decisório, não tem qualquer outro conteúdo decisório, pois embora o Tribunal qualifique tais factos novos como alterações não substanciais, não é uma decisão no sentido de pronúncia definitiva sobre determinado caso de vida. Dai por exemplo o Tribunal Constitucional (cfr. Ac TC n° 237/07 e Ac TC no 442/99) falar em “factos indiciários”, quando se refere aos que são objecto da comunicação, pois a avaliação global que o tribunal faz de toda a prova produzida em audiência de julgamento e que está na base da comunicação do art° 358°, do C.P.Penal, não é, nem pode ser o exame crítico da prova que é feito para a decisão. Caso contrário, estaríamos perante uma antecipação de decisão, violando a lei e a constituição. Assim, a advertência feita no cumprimento do art° 358°, do C.P.Penal, reconduz-se a um acto ordenador do processo, instrumental para a validade do acordão que vier a ser proferido - caso o Tribunal venha a dar como provados factos não descritos no Despacho de pronúncia -, não se reconduz a um acto decisório ou pré-decisório do objecto do processo. É à luz do que antecede que tem que ser vista a natureza e características da fundamentação de tal despacho de comunicação. 5.1. E à luz do que antecede e considerando as posições assumidas pelos arguidos que invocaram o vício da falta de fundamentação, o Tribunal considera que pode - e se pode “deve” -, dizer em sede de fundamentação da comunicação que fez a fls 63.685 a 63.687 mais do que disse, porque isso pode ser, de facto, relevante para a organização da Defesa e para o exercicio do contraditório. Pode enunciar, de facto, grupo de provas ou meios de prova que tenha globalmente equacionado para a possibilidade de alargamento do objecto do processo permitindo ao arguido organizar a sua (nova) Defesa já com esse conhecimento, mas sempre com uma barreira intransponível: a comunicação do art° 358° do C.P.Penal, não é uma antecipação da decisão, não é um acto decisório nem se equipara, quanto aos seus pressu(...)s ou requisitos, a um Despacho de Acusação. Pelo que não pode ser - como parece ser o entendimento defendido pelos arguidos -, uma comunicação em que o Tribunal revele um prévio exame crítico da prova, mesmo que sumário. Isso seria uma antecipação de decisão, violando a lei - cfr art° 365°, 367°, 368°, 372°, n° 1 e 2, do C.P.Penal - e a constituição. 6. Face a todo os ex(...) e sem prejuízo do que antecede o tribunal julga improcedente a arguição de nulidade apresentada pelos arguidos quanto ao despacho de fls 63.685 a 63.687. Julga parcialmente procedente a arguição de irregularidade subsidianamente apresentada pelos arguidos H, C, K, E, N e Q - quanto à insuficiência de fundamentação do despacho de fis 63.685 a 63.687 - , juIgando-a improcedente quanto ao demais. Assim, nos termos do art° 123° n° 2, do C.P.penal – e, também, tendo em atenção o dis(...) no art° 380, n° 1, al. a) e n° 3, do C.P.Penal -, o Tribunal irá proceder à reparação, nesta parte, do Despacho de fls. 63.685 a 63.687. Custas do incidente pelo(s) arguido(s) Requerente(s), na parte do respectivo decaimento, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs - art° 513°, n° 1 e 3, do C.P.Penal. II - Despacho de fls. 63.918 a 63.960 e Despacho que antecede - reparação (parcial), do Despacho de fls. 63.631 a 63.635 e 63.685 a 63.687: comunicação de alterações de facto nos termos do art° 358°, do C.P.Penal: Na sequência do Despacho de fls. 63.918 a 63.960 e do Despacho que antecede, o Tribunal vai proceder a leitura da comunicação que tem a fazer nos autos, de alteração não substancial de factos descritos no despacho de pronúncia, procedendo a decidida reparação das comunicações feitas pelo Despacho de fls. 63.636 a 63.639, em 23/11/09 e de fls. 63.685 a 63.687, em 14/12/09: Em relação ao objecto do Processo n° 1718/02.9JDLSB - Processo “Principal (NUIPC 1718/02.9JDLSB) -, face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuizo da que não for neste momento expressamente mencionada): - as declarações prestadas pelos arguidos em audiência de julgamento; - as declarações prestadas pelos Assistentes em audiência de julgamento; - o depoimento das testemunhas que foram ouvidas pelo Tribunal, entre as quais as que exerceram cargos de Direcção na AX ou de (...)s da AX, das testemunhas que exerceram funções de educadores/monitores nos Lares da AX, das testemunhas que exerceram funções como administrativos, porteiros, motoristas, (...) ou, mesmo não sendo funcionários da AX, no refeitorio da AX; as que prestaram depoimento sobre o Imóvel sito na Avenida (…) (…) e sobre o Imóvel sito na Alameda (…) (…), identificados no Despacho de Pronúncia; a testemunha BX, irmã do assistente AK; as testemunhas apresentadas pelo arguido K, entre as quais as suas irmãs e sobrinhos, funcionária do seu (...), bem como a testemunha CY; - o teor dos documentos constantes nos apensos dos autos, entre os quais, os Apensos ABA-f); AR (1 volume); BF, BF-1 a BF-6, BF-7, BJ (Pasta 2), BP, BQ (volumes 1 e 7); BR Sobrescritos 3 e 4; BU-L: BV (5 volumes); BX; CB; CC (3 volumes); CG; CH; CQ; DA; DJ; DQ; DX; DZ (7 volumes); Ea; EE; EF; EI; EJ; EK; EL 82 volumes), J; K; L; S-L; T; V, Caixa 1, sobrescrito 16 e 19; W-1; W-5 (dois volumes); W9 (2 volumes); W-10 (10 volumes); W-11 (8 volumes); W-12 (1 volume); Y; Z-9 (1 volume); Z-10; Z-11 (2 volumes); Z-12; Z-13; z-15 (5 volumes); z-17 (1 volume); - o teor dos documentos de fls. 231 a 262 (Lista dos Lares, educandos, Docentes, Educadores e demais equipa/pessoal dos lares da AX), fls. 3.122 a 3.139 (Lista dos educandos internos da AX, Lares e (...)s a que pertencem), fls. 33.333 a 33.343: fotocópia das fotografias constantes de fls. 10 a 20, do apenso AS; fls. 33.762 (auto de recepção definitivo pelo CZ, da empreitada para execução de uma pista de Skate, datado de 24 de Setembro de 1997), fls. 34.937 e 34.938 (Documentos relativos à inauguração da estação do Metro do Cais do Sodré, 18/04/98); fls. 36.291 (informação da AX, data de 17/01/06, sobre horários de AK e remetendo cópia de horários e pautas - fls. 36.292 a 36.297); fls. 36.345 a 36.546 (Ofício da AX e horários de alunos, entre os quais AT e AK; fls. 38.070 a 38.084 (Processo licenciamento do prédio da Rua (…), Lote (…), nº (…)), fls. 41.129/30 (Documentos entregues pela testemunha DA), fls. 41.387 a 41.401 (documentos entregues pela testemunha DB, relativos a “contrrato promessa de arrendamento” da fracção (…), (…) Loja, Bloco (…), Lote (…), do prédio sito na Av. (…) em (…), a DC, datado de 21 de Janeiro de 1992; “Autorização de obras” ao inquilino do (…) loja e (…), do lote (…), Bloco (…), da Av. (…), DC, datado de 21 de Janeiro de 1992; uma folha com “Contrato de Arrendamento” a DD, do (…), do prédio sito na Av. (…), Bloco (…), Lote (…), a(...) início em 1 de Outubro de 1995; Contrato promessa de arrendamento a DD, da fracção designada pela letra (…), correspondente à Loja, com entrada pelo n° (…) a (…), da Av. (…), torneando para a Rua (…), n° (…), datado de 2 de Fevereiro de 1998; Contrato Promessa de Arrendamento a DE, do (…), do prédio sito na Av. (…) Bloco (…), Lote (…), datado de 1 de Janeiro de 1987; Contrato de arrendamento a DE, da Fracção (…), do prédio sito na Av. (…), Bloco (…), lote (…),(…) andar (…), datado de 6 de Julho de 1988), Fls. 41.521 a 41.539 (Documentos remetidos pela testemunha DF, relativos a obras feitas na Av. (…), (lote (…)), n° (…),(…), entre os quais orçamento datado de 18/05/01 (cfr. Fls. 41.522), cópia de escritura de mútuo com hipoteca datada de 15/10/01 (cfr. Fls. 41.528/39); fls. 41.562 a 41.571: Documentos entregues pela testemunha DB, referentes a contrato de trabalho da DD, sita na Av. (…), Bloco (…), lote (…),(…) Frente e DG; contrato de trabalho da DE, sita na Av. (…), Lote (…), Bloco (…),(…) Frente e FFV, FFW e FFV; declaração de remunerações da DE referente a Maio de 2002, com data aposta de 15/06/02; declaração de rendimentos da DC, com data de recepção de 28/04/99; cópia de folha de modelo 10 da DE, com identificação de listagem de rendimentos para o ano de 1998; Fls. 42.605 a 42.613 (documentos apresentados pela testemunha DH); Fls. 43.521 a 43.791 (Documentos remetidos pela CML relativamente ao Processo de Obras na (...) (…) n° (…), em (…)); fls. 43.960 a 43.997 (Documentos remetidos pela DI, envio de projecto de arquitectura do Edifício da Rua (…), n° (…), em (…)); Fls. 45.213 (Ofício da AX a enviar relação de educando internos e equipas técnicas de cada um dos lares da AX, de 1997 a 2002; Mapa dos directores e Coordenadores dos estabelecimentos entre 1997 e 2002, elementos que se encontram no Apenso Z-10); fls. 48.166 a 48.173 (Documentos apresentados pela testemunha DJ, referentes a factura de mesa de bilhar (fls. 48.167, 23/09/97, “DK”, Rua (…)), compra de sofá (fls. 48.168, aposta a data 29/02/00, DK e fls. 48.169, aposta a data 17/03/04), remoção da mesa de bilhar (fls. 48.170, aposta a data 13/04/04, DK, Rua (…)), factura de obras de entrada de hall (fls. 48.172, aposta a data de 22/11/05) e CD com fotografias de mesa de bilhar e interior de habitação, relacionados DK e com prédio sito na Rua (…), n° (…), em (…)); FIs. 50.759 a 50.761 (Documentos remetidos pela AX, referentes à colocação de película antireflectora nos Vidros do R/C da (...), com auto de recepção datado de 28/05/02); Fls. 50.762 a 50.765 (Documentos remetidos pela AX, referentes à abertura de processo para execução de refeitório na cave da (...), datado de 31/03/99; comunicação no processo de execução do novo refeitório, datada de 23/06/99; auto de consignação para inicio imediato dos trabalhos, datado de 22/07/99 e auto de recepção provisória datado de 12/09/01); Fls. 52.615/6 (Contrato de arrendamento entre DL e K, do (…) andar (…), do n° (…) do prédio da (...) (…), em (…), com início em 1/01/93, datado de 2/12/92); Fls. 52.617/9 (Doc. da JJM para fornecimento de água na (...) (…) n° (…),(…), em nome de K e recibo de pagamento de fornecimento de contador, datado de 29/12/92); FIs 52.620 (Doc. da EDP referente a fornecimento na Trav (…) n° (…),(…), em (…), em nome de K datado de 29/12/92); Fls 52.621/2 (Doc, dos TLP, requisição de telefone para a (...) (…) n° (…),(…), em (…), em nome de K, datado de 30/1 2/92), Fls. 52 623/4: Doc. CML, de cópia da informação do processo referente à (...) (…) n° (…), datado de 24/07/96; Fls. 52.625/6: certidão do certificado de Vistoria sanitária do prédio sito na (...) (…) n° (…),(…), em (…), datado de 17/10/96; Fls. 52.627/8: Doc. Do. serviço Nacional de Bombeiros, para efeitos de concessão de alvará do prédio sito na (...) (…) n° (…)(…), em (…), datado de 5/6/97; fls. 52.738 a 52.768: Doc. Apresentados pelo arguido K, referentes a veiculo (…), matrícula (…); fls. 54.748 a 54.808 e fls. 55.553 a 55.647: Relatório da perícia feita ao arguido A, Hospital DM, pelo Prof. Dr. DN, e Sra. Dra. DO e cópia dos testes aplicados (fls. 55.553 a 55.647); fls. 54.873 a 54.880 (ofício da AX com informação e documentos pedidos pelo arguido C sobre programa de comemorações do 3 de Julho de 1999, espectáculo realizado em 4 de Julho de 1999 na DP, fotografias tiradas nestes dias com o arguido C em 3/07/99 e 4/07/99 (fls. 54.877 a 54.880); fls. 54.891 a 55.076 (Documentos remetidos pela AX, a pedido do arguido C, pagamentos mensais relativos ao telefone n° (…), utilizado pelo arguido C e referentes ao período de 1999 a 2001), fls. 60.043/4: documento da DQ junto pelo arguido H (relativo a contagem de notícias e tempo de emissão, ano de 2002, 2003, 2004, referentes a H e AX); Fls. 60.314/9 e 60.403/8 (Ofic. da AX a remeter os documentos de fls. 60.315/9, referentes a adjudicação e auto de recepção do arquivo de carril instalado na cave da (...), estando o auto de recepção de fls. 60.317 e 60.406 datado de 3/11/98); Fls. 60.320 (Oficio da DR a enviar 3 DVDs, contendo notícias sobre o processo AX, emitidas nos Jornais noticiosos durante Janeiro e Fevereiro de 2003); Fls. 60.412 (Ofício da DR a enviar dois DVDs referentes a peças noticiosas do processo AX, emitidas nos serviços noticiosos durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2003 e de 14 a 21 de Fevereiro de 2003); Fls. 60.421 (Ofício da DS a remeter DVD com gravação pedida pelo tribunal no oficio de 2/10/08); Fls. 60.687 (Ofic. Da DR a enviar 2 DVDs, com entrevistas concedidas por alunos da AX e emitidas entre 25 de Novembro de 2002 a 24 de Novembro de 2003);o Tribunal considera que esta indiciado e, por conseguinte, poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objecto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos, o seguinte: A - Comunicação já feita na audiência de Julgamento de 23/11/09 ( fls. 63.631 a 63.635): I - Factos relativos ao Assistente AV, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.850 a 20.853, “Ponto 2.3.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.852, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na casa do arguido A “…que, então, era um barracão situado no interior das instalações do DT…”, podem ter ocorrido: - na garagem do CZ; II - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido C: 1. Que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.” do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.876, 3° (terceiro parágrafo), factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; 1.1. Em consequência da comunicação que antecede, que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.”, do Despacho de Pronúncia, podem integrar: - não a prática de um crime p e p pelo art° 166° n° 1 e 2 do C Penal, mas a prática de um crime p e p pelo art° 166°, n° 1, do C Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuizo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do art° 2°, do C.Penal. III - Factos relativos ao Assistente AK, em que e imputada a prática de crime(s) ao arguido E: 1. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.888, último parágrafo e fls. 20.889, 1° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num Sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade…”, tendo, após o jantar, o arguido E pro(...) que se dirigissem para uma casa de que “…tinha a disponibilidade, sita na Alameda (…), n° (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, numa Sexta-feira ou num Sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive); - em prédio localizado na Alameda (…), em (…), com numero de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os numeros impares; - local para onde, após o jantar, o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC; 2. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.889, penúltimo parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta feira…”, numa casa de que o arguido E “…tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999; - numa casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…) (…), local onde o arguido E se encontrava quando o Assistente AK ai foi; 3. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.890, 10° parágrafo, factos que oDespacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…dias depois…” da situação referida no ponto “2.” que antecede, “... ainda em Junho do ano 2000...”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, mas situado no período das férias escolares do Verão de 1999; IV - Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido K: 1. Que os factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.4.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “…casa do arguido K, sita na Rua (…), n° (…),(…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”; V - Factos relativos ao Assistente AW, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.956 a 20.959, “Ponto 9.3.”, do Despacho de Pronúncia, concretarnente os factos que constam a fls. 20.957, ocorridos numa (...) (…), que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido no ano de 2001, “…em dia indeterminado situado na primeira quinzena do mês de Agosto, tinha o menor AW 12 anos…”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado na primeira quinzena do mês de Agosto de 2002, tinha AW 12 anos; VI - O Tribunal faz a presente comunicação nos termos: a) Do artº 358º, nº 1 e 2, do C.P.Penal, para os “Pontos I, III, IV e V”; b) Do artº 358º, nº 1, 2 e 3, do C.P.Penal, para o “Ponto II”; B - Comunicação já feita na audiência de Julgamento de 14/12/09 (fls. 63.685 a 63.687) I - Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao(s) arguidos A e H: 1. Que os factos descritos a fls. 20.892 a 20.896, “Ponto 4.3.1.” do Despacho de Pronúncia, concretamente no que diz respeito à qualificação jurídica dos factos quanto ao arguido A, podem integrar: - não a prática de um crime p. e p. pelo artº 172º, nº 1, do C.Penal, mas a prática de dois crimes p. e p. pelo artº 172º, nº 1, do C.Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuízo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do artº 2º, do C.Penal. II - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.906 a 20.907, “Ponto 5.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.906, 6º (sexto) parágrafo” e fls. 20.907, 1º (primeiro) parágrafo”, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998…”, sendo que AP “…à data tinha 13 anos de idade…”, podem ter ocorrido: - em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998; - tinha AP 12/13 anos de idade; III - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.909 a 20.910, “Ponto 5.2.3.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.909, 5º (Quinto) parágrafo” e fls. 20.910, 2º (Segundo) parágrafo”, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em datas em concreto não apuradas, entre finais do ano de 1997 e Setembro de 1999…”, sendo que “…na primeira das referidas ocasiões o menor AP contava 13 anos de idade, sendo que na última já tinha completado 14 anos…”, podem ter ocorrido: - em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e princípio de Abril de 2000; - tinha AP 15 anos de idade; IV - Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A e E: 1. Que os factos descritos a fls. 20.911 a 20.913, “Ponto 5.2.5”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.911, 1º (Primeiro) e 3º (Terceiro) parágrafos, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na sequência de o arguido A ter levado “…o menor AP (…) ao (…), em (…), onde o aguardava o arguido H…”, podem ter ocorrido: - na sequência de o arguido A ter dito a AP para ir ter à rua que se situa nas traseiras do CZ, onde um veículo em que•estava o arguido H o aguardava; V - o Tribunal faz a presente comunicação nos termos: a) Do art° 358°, n° 1 e 3, do C.P.Penal, para o “Ponto I”; b) Do art° 358°, n° 1 e 2 , do C.P.Penal, para os “Pontos II, III e IV”;” Despacho proferido na sessão de julgamento ocorrida em 26 de Fevereiro de 2010 (cfr. fls. 65137 a 65225) “I - fls. 64.109, Ponto “2”, fls. 64.111 - Arguidos H, K e E - arguição de irregularidades/nulidade: 1. Na Audiência de Julgamento de 11/01/2010, a fls. 64.109, Ponto 2., o arguido H e a que a fls. 64.111 aderiram os arguidos K e E, vieram arguir “…a nulidade, ou no limite irregularidade…”, do Despacho proferido pelo Tribunal na Audiência de Julgamento de 11/01/2010, a fls. 64.097 a 64.107, “Ponto II”, relativo à comunicação de alteração não substancial de factos descritos na pronúncia, nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, por “…falta de fundamentação…”. Nos termos do art° 327°, n° 1, do C.P.Penal, o Tribunal deu lugar ao contraditório. Cumpre apreciar e decidir. 2. De acordo com o dis(...) no art° 118°, n° 1 e 2, do C.P.Penal, “…a violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei…”, sendo que “…nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal e irregular…”. Os arguidos, nos fundamentos que invocam a fls. 64.109, Ponto 2., não indicam o dispositivo legal ao abrigo do qual qualificam os vícios apontados como “nulidade”, fazendo no entanto referência, quanto à exigência de fundamentação legal, ao art° 97°, n° 5, do C.P.Penal, ao art° 32°, da C.R.P. e aos princípios gerais da C.E.D.H.. Face ao citado art° 118°, do C.P.Penal, confrontado com o dis(...) nos art°s 119°, 120º, 358° (ou mesmo art° 359°, se for o caso), do C.P.Penal, e a natureza da comunicação que está em causa e que foi objecto de arguição de nulidade - a comunicação de fls. 64.097 a 64.107, Ponto II, pela qual o Tribunal fez a comunicação de alteração não substancial de factos -, não se afigura a este Tribunal que os vícios apontados pelos arguidos possam consubstanciar uma nulidade. Com efeito, a comunicação feita pelo Tribunal ao abrigo do dis(...) no art° 358°, do C.P.Penal - tal como veremos com mais pormenor a seguir -, tem como propósito exclusivo a comunicação da possibilidade de o Tribunal, em sede de decisão final, vir a ter em conta a “nova” factualidade e, assim, dar a possibilidade de preparação da defesa, por parte dos arguidos afectados e que o queiram fazer, em relação às alterações comunicadas. Não integra um acto “decisório” do Tribunal em relação a quaisquer factos, não se podendo por isso concluir que é um acto “favorável” ou “desfavorável” aos arguidos. Não está, portanto, englobado na categoria de actos previstos no art° 97°, n° 5 do C.P.Penal, disposição invocada pelos arguidos. Assim e desde já, para este Tribunal poderá estar em causa o conhecimento não de nulidade processual, mas sim de uma eventual irregularidade processual. 3. Conhecendo da arguida irregularidade, a Acusação do Ministério Público, com a descrição dos factos e a indicação das normas violadas, delimita o objecto do processo, o qual, por sua vez, delimita os poderes de cognição do Tribunal e o âmbito do caso julgado. No entanto, os art°s. 358° e 359°, do C.P.Penal, estabelecem situações em que o Tribunal pode vir a condenar o arguido por factos diversos dos que constam na acusação ou na pronúncia, desde que cumpridos os procedimentos determinados em tais preceitos. Seguindo o Acordão n° 237/2007 do Tribunal Constitucional - citado, por sua vez, no Acórdão n° 226/2008 do Tribunal Constitucional, como contendo um resumo pormenorizado da Jurisprudência constitucional mais relevante a propósito do regime do objecto do processo penal, em fase de julgamento, no C.P.Penal de 1987 -, “(…) a possibilidade de, em audiência de julgamento, se atender a factos não referidos na acusação pareceria, à primeira vista, pouco compatível com estrutura acusatória do processo criminal. Como se referiu no Acórdão n° 130/98 (…) «os factos descritos na acusação normativamente entendidos, isto é, em articulação com as normas consideradas infringidas pela sua prática e também obrigatoriamente indicadas na peça acusatória, definem e fixam o objecto do processo, que, por sua vez, delimita os poderes de cognição do tribunal. Segundo FIGUEIREDO DIAS (in Direito Processual Penal, Coimbra editora, 1974, p.145) é a este efeito que se chama vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal, ou seja, os princípios segundo os quais o objecto do processo deve manter-se o mesmo, da acusação ao trânsito em julgado da sentença, deve ser conhecido e julgado na sua totalidade (unitária indivisivelmente); e - mesmo quando não o tenha sido - deve considerar-se irrepetivelmente decidido. Com efeito, um processo penal de estrutura acusatória exige, para assegurar a plenitude das garantias de defesa do arguido, uma necessária correlação entre a acusação e a sentença que, em princípio, implicaria a desconsideração no processo de quaisquer outros factos ou circunstâncias que não constassem do objecto do processo, uma vez definido este pela acusação». Porém, este princípio não deve ser rigidamente entendido. Como o citado Acórdão n° 130/98 logo acrescentava: «O processo penal admite (…) que sendo a descrição dos factos da acusação uma narração sintética, nem todos os factos ou circunstâncias factuais relativas ao crime acusado possam constar desde logo dessa peça, podendo surgir durante a discussão factos novos que traduzam alteração dos anteriormente descritos. A este respeito os artigos 358° e 359° do CPP, que regulam esta matéria, distinguem entre «alteração substancial» e «alteração não substancíal ou simples» dos factos descritos na acusação ou pronúncia, fazendo, assim, apelo à definição constante do artigo 1°, n° 1, al. f) do CPP»”. Se a alteração dos factos for “substancial”, de acordo com a definição constante no artigo 1°, nº 1, al. f), do C.P.Penal, há que dar lugar ao cumprimento do art° 359°, do C.P.Penal, mas ao invés, se a alteração dos factos for simples ou não substancial, isto é, tal que não determine uma alteração do objecto do processo, então o tribunal pode investigar e integrar no processo factos que não constem da acusação e que tenham relevo para a decisão do processo. A lei exige apenas, como condição de admissibilidade, que ao arguido seja comunicada, oficiosamente ou a requerimento, a alteração e que se lhe conceda, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (art° 358°, n° 1, parte final). (…) Respeitados que sejam os direitos de defesa do arguido, pode o tribunal investigar esses factos indiciados ex novo e, se se vierem a provar, integrá-los no processo, sem violação do preceituado no art° 32°, n° 1 e 5, da Constituição»”. 3.1. Do enquadramento teórico que antecede - e desenvolvendo o já cima dito quanto à natureza do Despacho que está em causa -, resulta que a comunicação que é feita pelo tribunal nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, é feita enquanto possibilidade de alargamento do objecto do processo e não enquanto acto decisório. Não tem qualquer outro conteúdo “decisório”, pois embora o Tribunal qualifique tais factos novos como alterações não substanciais, não é uma decisão no sentido de pronúncia definitiva sobre determinado caso de vida. Daí por exemplo o Tribunal Constitucional (cfr. Ac. TC nº 237/07 e Ac. TC n° 442/99) falar em “factos indiciários”, quando se refere aos que são objecto da comunicação e a avaliação global que o tribunal faz de toda a prova produzida em audiência de julgamento e que esta na base da comunicação do art° 358°, do C.P.Penal, não é, nem pode ser o exame crítico da prova que é feito para a decisão. Caso contrário, estaríamos perante uma antecipação de decisão, violando a lei e a Constituição. Assim, a advertência feita no cumprimento do art° 358°, do C.P.Penal, reconduz-se a um acto ordenador do processo, instrumental para a validade do acordão que vier a ser proferido - caso o Tribunal venha a dar como provados factos não descritos no Despacho de pronúncia -, não se reconduz a um acto decisório ou pré-decisório do objecto do processo. 3.2. É à luz do que antecede que tem que ser vista a natureza e características da fundamentação de tal despacho de comunicação. Este despacho do art° 358°, do C.P.Penal, tem o sentido de comunicação e prevenção, de forma a que o arguido possa organizar a sua defesa face à possibilidade de alteração comunicada e, assim, ser dado lugar ao contraditório em relação à possibilidade de alargamento do objecto do processo. É o afloramento dos mecanismos de defesa que são reconhecidos ao arguido, como seja o exercício do contraditório e o Tribunal, como garante de constitucionalidade, tem que proceder de forma a que todos os princípios sejam efectivamente respeitados. O dever de fundamentação do despacho em que é feita esta comunicação tem que ser apreendido com este objectivo. Assim e no que a este Dever diz respeito - e tendo em atenção a argumentação dos arguidos que invocaram o vício da falta de fundamentação e reproduzindo que já disse no despacho de fls 64.055 a 64.096 -, o Tribunal considera que o que pode (e, portanto, se “pode”/”deve”) dizer em sede de fundamentação da comunicação é enunciar o grupo de provas ou meios de prova que tenha globalmente equacionado para a possibilidade de alargamento do objecto do processo, enunciá-los de forma mais delimitada quando o considerar poder fazer, permitindo ao arguido organizar a sua (nova) Defesa já com esse conhecimento. Mas sempre com uma barreira intransponível e que resulta da Jurisprudência acima citada: a comunicação do art° 358°, do C.P.Penal, não é uma antecipação da decisão, não é um acto decisório, nem se equipara, quanto aos seus pressu(...)s ou requisitos, a um Despacho de Acusação. Pelo que e com respeito por melhor entendimento, não pode ser - como parece ser o entendimento defendido pelos arguidos -, uma comunicação em que o Tribunal revele um prévio exame crítico da prova, mesmo que sumário. Isso seria uma antecipação da decisão - e, consequentemente, do resultado da deliberação -, violando a lei - cfr. art° 365°, 367°, 368°, 372°, n° 1 e 2, do C.P.Penal - e a Constituição. No caso concreto os arguidos argumentam que a fundamentação é tão ampla e genérica na sua formulação, que não permite conhecer o caminho que levou o Tribunal a julgar que tais alterações se justificavam. Processualmente - e interpretando o Tribunal o que é invocado pelos arguidos -, de “nada lhes serve”. No entanto o conhecimento que foi dado aos arguidos, na perspectiva do Tribunal, pode ter, de facto, alguma relevância para a organização da Defesa do arguido e para o exercício do contraditório. Isto porque o conhecimento de provas ou grupo de provas especialmente enunciadas - e portanto equacionadas - pelo Tribunal, pode contribuir para a percepção e decisão do arguido do que, em cada caso concreto e no requerimento que vá apresentar ao Tribunal para a produção de “prova nova”, pode ser efectivamente “prova nova” ou traduzir-se na repetição de prova produzida. E assim, por exemplo, se o arguído equacionar arrolar testemunhas que façam parte do grupo de educadores da AX, ou do grupo dos motoristas da AX, já ouvidas em audiência, decerto ficará processualmente “alerta” para uma especial necessidade de demonstrar e fundamentar especificamente ao Tribunal da necessidade dessa reinquirição. Diminuta ou nula ajuda, dizem os arguidos no caso concreto. Mas é a que o Tribunal - face ao que acima já disse quanto ao enquadramento que decorre dos art°s 365°, 367°, 368°, 372°, n° 1 e 2, do C.P.Penal - considera poder legalmente fazer nesta fase processual, por estar afastada a possibilidade legal de fazer uma comunicação de alteração não substancial de factos acompanhada de um exame crítico da prova, mesmo que sumário, pelo qual o Tribunal revele o seu raciocínio e valoração de cada prova ou grupos de provas, ou de meios de prova, já adquiridos nos autos. Há também que ter em conta que quando o Tribunal, no despacho do art° 358°, do C.P.Penal, diz face “a toda a prova produzida em audiência de julgamento”, enuncia os grupos de provas ou provas especialmente equacionadas e faz a comunicação, fá-lo num momento processual em que os sujeitos processuais e, assim, os arguidos, estiveram presentes na audiência de julgamento, ouviram a prova , tiveram e têm a possibilidade de a “valorar” e interpretar. O que fizeram de forma que para o Tribunal foi relevante e séria, nas suas Alegações. Mas, neste momento processual e como acima dito, nesta comunicação do art° 358°, do C.P.Penal, o Tribunal ainda não pode “dar” a percepção da análise crítica da prova ou a percepção da valoração que o Tribunal dá a cada prova ou meio de prova, produzido em audiência de julgamento. 4. Face a todo o ex(...), o Tribunal entende que ao proferir na Audiência de Julgamento de 11/01/2010, o Despacho de fls. 64.097 a 64.107, “Ponto II”, em que fez a comunicação de alteração não substancial de factos descritos na pronúncia, nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, não violou disposição legal quanto à fundamentação do Despacho, pelo que não violou, em consequência, o art° 97°, n° 5, do C.P.Penal, o art° 32°, da C.R.P. e aos princípios gerais da C.E.D.H.. Assim e por considerar não se verificar qualquer uma das violações legais e pressu(...)s dos art° 118°, n° 2 e 123°, do C.P.Penal, o Tribunal julga improcedente a arguição de irregularidade apresentada pelos arguidos H, K e E, quanto à insuficiência de fundamentação do Despacho de fls. 64.097 a 64.107, “Ponto II”, em que fez a comunicação de alteração não substancial de factos descritos na pronúncia, nos termos do art° 358°, do C.P.Penal. Custas do incidente pelo(s) arguido(s) Requerente(s), na parte do respectivo decaimento, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs - art° 513°, n° 1 e 3, do C.P.Penal. II - Requerimentos de diligência de prova: 1. Requerimentos de diligência de prova: - Fls. 64.915 a 64.921 - Arguido C (Req. Diligências de Prova): a) a inquirição de 23 (vinte e três) testemunhas, identificando-as pelos nomes, entre as quais estão testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento; b) a inquinção de “…todas as restantes pessoas que trabalhavam, entre o início de 1997 e meados de 1999, na (...) da AX, cujos nomes e moradas se requer seja notificada a AX para vir indicar aos autos (incluindo os dos quadros técnicos que trabalhavam regularmente na sala de informática da cave da (...)), testemunhas que desde já se arrola...”; c) junção do documento de fls. 64.920 e 64.921; d) deslocação do Tribunal às caves da (...) da AX, ao abrigo do dis(...) no art° 354°, do C.P.Penal, com gravação da diligência por meios audiovisuais; e) leitura, em audiência de julgamento, de “…todas as declarações prestadas pelo Assistente AP em sede de inquérito à Polícia Judiciária/Ministério Público...”. - Fls. 64.364 a 64.394 e fls. 64.395 a 64.778 - Arguido E (Req. Diligências de Prova): a) leitura das declarações do assistente AK, prestadas em inquérito em 5/5/2003, constantes de linhas 20 a 23 e de 42 e 43 de fls. 4.235, linhas 106 e 107 de fls. 4.237, linhas 165 a 176 de fls. 4.239, linhas 177 a 192 de fls. 4.240; em 6/05/2003, constantes de linhas 4 a 11 de fls. 4.282 e de linhas 12 a 14 de fls 4.283; b) notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW, que abranja o período entre 12/12/98 e 31/07/99; o) a “… inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número ímpar (excepto o n° (…)), da alameda (…),(…), que utilizassem o respectivo prédio entre 12.12.1998 e 31.1.1999, uns e outras a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito se requer…”, d) a “…inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número par (excepto o n° (…)) ou ímpar, situados na avenida (…), em (…), perto da Zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 1.4.1999 e 31.7.1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também se requer...”; e) em alternativa às alíneas c) e d), que antecedem e para o caso de não ser deferido, requer, a fls. 64.367 a 63.394 e por remissão ou completado com os documentos de fls. 64.395 a 64.778: - a audição de 157 testemunhas, que identifica pelo nome ou pela qualidade de Legal representante de entidade que identifica; - a audição de 37 Porteiros de imóveis, cujos números de porta identifica e em relação aos quais requer ao Tribunal diligências com vista á sua identificação e posterior notificação; - a audição de uma das pessoas que entre 12/12/98 e 31/01/99 utilizaram as fracções dos n°s. (…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 21 fracções), n° (…), n°s. (…) a (…), nº (…) a (…), n° (…) a (…), n° n° (…), n°s. (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 13 fracções), n° (…), n° (…), n° (…), n°s (…)e (…), n° (…) (especificamente identificadas pelo arguido 10 fracções), n° (…), n° (…), n° (…) (especificamente identificadas pelo arguido 14 fracções), n°s (…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 14 fracções), n°s (…),(…),(…),(…),(…), n°s (…),(…) e (…), n°s (…),(…),(…) e (…), n°s (…)a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 15 fracções), n°s (…) a (…), n°s (…), n°s (…), da (…), requerendo ao tribunal diligências com vista a respectiva identificação; - a audição de uma das pessoas que entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Julho de 1999 utilizaram as fracções do n° (…)°, dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 19 fracções), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 12 fracções), dos n°s (…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…),(…) e (…), do nº (…), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos n°s (…) a (…), dos n°s (…)a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 10 fracções), do n° (…), do n° (…), do n° (…), do nº (…), do nº (…), dos n°s (…)e (…), do n° (…), dos n°s (…),(…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 8 fracções), do n° (…), dos n°s. (…)a (…), do n° (…), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s (…) a (…), do n° (…), do n° (…), do n° (…) e do n° (…), da Av (…), requerendo ao tribunal diligências com vista à respectiva identificação; f) e a junção de 33 documentos (fls. 64.395 a 64778); - Fls. 64.848 a 64.858 - Arguido K (Req. Diligências de Prova): a) A título de “questão prévia” e em consequência de diligência que comunicou ao tribunal ter feito na zona da Rua (…) e da Rua (…), locais a que se refere a comunicação de alteração não substancial de factos que lhe foi feita pelo Tribunal, nos termos do art° 358°, n° 1 e 2, do C.P.Penal, quanto aos factos descritos no “Ponto 4.4.1, fls. 20.896 a 20.898, do Despacho de Pronúncia, se o tribunal se estava a referir apenas a moradias situadas nestas duas ruas, ou se também se estava a referir a qualquer outra moradia situada na confluência dessas ruas ou que com aquelas se cruze; E a título de diligências de prova: b) a leitura de todas as declarações prestadas em inquérito pelos assistentes AT e AP; c) o visionamento em audiência do DVD que contém a deslocação dos assistentes AT e AP à moradia sita na Av. (…), n° (…), em (…); d) a audição de 99 testemunhas, que identifica pelo nome ou pela qualidade de Legal representante de entidade que identifica a fls. 64.850 a 64,857; e) a audição de todos os proprietários dos imóveis abrangidos “...pelo despacho de comunicação de alterações que ... residiram, usaram ou a qualquer título ocuparam os mesmos no período temporal constante do despacho de pronúncia, considerando-se como arrolados pelo ora requerente todos os que venham a ser identificados; f) que o tribunal oficie à Conservatória do registo Predial de Lisboa. e/ou à P.S.P., no sentido de serem identificados todos aqueles que eram proprietários dos imóveis existentes nas ruas abrangidas pelo despacho de comunicação de alterações nos meses de Março e Abril de 2000, bem como os respectivos inquilinos ou utilizadores dos mesmos, a fim de serem ouvidos como testemunhas e que o arguido, desde já, arrola; - Fls. 64.990 a 65.002 - Arguido H (Req. Diligências de Prova): a) a inquirição de 27 (vinte e sete ) testemunhas, identificando-as pelos nomes a fls. 64.992 a 64.994; b) que o Tribunal solicite informação às proprietárias do prédio sito na Avenida (…) n° (…) e que identifica, a identificação “...dos inquilinos do prédio nos anos de 1999 e 2000...”; com o objectivo de proceder à respectiva inquirição; c) que o Tribunal obtenha informação acerca dos familiares de DV, que residiu no (…) do prédio sito na Avenida (…) n° (…), a fim de os mesmos serem inquiridos em audiência de julgamento, de forma a esclarecer aspectos da vida da referida enfermeira e da utilização da casa onde habitava, devendo, para o efeito, o tribunal enviar ofício para o DW, onde a referida DV trabalhou e esteve internada; d) requer a junção de um DVD, de uma entrevista de DV á DS, em Junho de 2003, com filmagem do interior da casa da mesma; e) a notificação do DX, para juntar um contrato de leasing de um empilhador referido pela testemunha DB; f) a inquirição de DU, solicitando ao tribunal diligências com vista à localização do seu paradeiro; g) a inquirição do assistente AP; h) a junção do documento de fls. 65.001 a 65.002; i) a inquirição do jornalista DY sobre a “entrevista” a que se refere o documento de fls. 65.001 a 65.002; 1.1. Estes requerimentos de produção de prova foram apresentados na sequência das comunicações que, nos termos do art° 358°, do C.P.Penal, o Tribunal fez aos arguidos pelo Despacho de fls. 64.097 a 64.107, na audiência de julgamento de 11/01/2010 e em que reparou - quanto à “Fundamentação”, mas mantendo nos seus precisos termos quanto aos factos comunicados -, os Despachos de comunicações anteriormente feitos a fls. 63.636 a 63.639, na audiência de Julgamento de 23/11/09 e a fls. 63.685 a 63.687, na audiência de julgamento de 14/12/09. 2. Fazendo o enquadramento teórico da questão a decidir - deferimento ou indeferimento das diligências de prova requeridas pelos arguidos -, comecemos pelo art° 358°, do C.P.Penal. Quando ocorrer “... uma alteração dos factos descritos na acusação, mas ela não implicar a imputação de um crime diferente, ou, ao menos, o agravamento dos limites máximos da sanção aplicável, deve o juiz proceder como manda o art° 358°, desde que a consideração desses novos elementos de facto implique com a produção de uma defesa eficaz (…)” (cfr. António Qurino Duarte Soares, Convolações,...) Para o preenchimento do conceito do que é interferir com o exercício eficaz de uma defesa, o Tribunal Constitucional - citando-se neste momento o Acordão 674/99 e no qual, por sua vez, é feita a citação de Antonio Quirino Duarte Soares - dá-nos a linha de raciocínio a seguir para o Despacho a proferir no presente caso. O critério orientador para desencadear o mecanismo do art° 358°, do C.P.Penal, é o da defesa eficaz do arguido, de forma permitir que o arguido “... tome conhecimento das alterações de factos que sejam relevantes do ponto de vista daquela defesa - o que se passará, sem qualquer dúvida, quando os novos factos se reportem a um distinto modo de comissão ou execução do crime (…). Na verdade, não se afigura admissível que factos dessa natureza e relevância possam ser tomados em consideração na sentença condenatória, sem que seja dada a oportunidade ao arguido de sobre a pretendida alteração se pronunciar, e de, se assim o entender, reorganizar a sua defesa em função dessa alteração (...)”. Neste sentido, a comunicação ao arguido visa permitir-lhe a modificação da estratégia de defesa, no que esta pode comportar de opção por determinadas provas em vez de outras e o sublinhar de certos aspectos e não de outros. 2.1. Passemos, então, a um segundo plano. O Tribunal faz a comunicação ao arguido nos termos do art° 358°, do C.P.Penal e o arguido requer ao tribunal a produção de nova prova. De acordo com os princípios subjacentes ao art° 340º, do C.P.P., o Tribunal deve determinar a realização de diligências de prova se considerar que as mesmas são necessárias a descoberta da verdade e boa decisão da causa. Esta relevância da (nova) prova ou da admissão (ou não) de produção de novo meio de prova, pode advir por duas vias: ou por face ao objecto do processo e aos elementos probatórios que constam do processo, ou a prova que vai sendo produzida em audiência de julgamento, o Tribunal considerar necessaria a produção de meios de prova não constantes da acusação e determina-o oficiosamente; ou na sequência de requerimento de sujeito processual, por considerar que é relevante a realização de diligências suplementares requeridas, com vista à descoberta da verdade material e boa decisão da causa (vide, neste sentido, Ac RP, 13/3/02, CJ II, pag 230). Está subjacente ao que antecede que o actual processo penal caracteriza- se por ter “… uma estrutura acusatória integrada por um princípio de investigação oficial… (…) Através do princípio da investigação, é sabido, pretende-se traduzir o poder-dever que ao tribunal pertence de esclarecer e instruir autonomamente, isto é, independentemente das contribuições da acusação e da defesa, o “facto” sujeito a julgamento, criando ele proprio as bases necessárias à sua decisão. Mas tal como acontece com a apresentação dos meios de prova ao abrigo do dis(...) no art° 315°, do C.P.Penal, ou com os meios de prova que venham a ser requeridos no decurso da audiência, ao abrigo do dis(...) no art° 340°, do CPP, o pedido de produção de meios de prova, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos nos termos do art° 358°, do C.P.Penal e no decurso da audiência, tem de ser acompanhada de uma justificação para os efeitos do art° 340º, do C.P.Penal. Assim, quem requer a produção de qualquer meio de prova nesta fase deve alegar o interesse que, em concreto, essa prova tem para determinado núcleo de factos ou para certo facto objecto da comunicação de alterações - consoante tenha sido comunicada a possibilidade de alteração de um facto isolado ou de um núcleo de factos -, de forma a que o Tribunal possa (efectivamente) aferir da necessidade ou eventual relevância dessa prova para o eficaz exercício da defesa do arguido, face à (possibilidade de) alteração de facto que foi comunicada e, em consequência, para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa. No entendimento do Tribunal não basta alegar, em termos genéricos, que a prova se destina a “contribuir para a descoberta da verdade”, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos. Há que invocar em concreto a razão ou razões pela quais o Requerente considera relevante a junção de determinado documento, a sua requisição ou a realização de determinadas diligências, pois tal relevância ou necessidade terá que ser, por sua vez, ponderada pelo Tribunal face a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, face ao enquadramento em que a Defesa do arguido foi exercida no contexto do Despacho de pronúncia e ao enquadramento em que o arguido pretende exercer nova Defesa, à luz e no contexto dos “novos” factos. Só assim se pode concretizar e dar sentido, ao que é ou pode ser em cada situação, a garantia do eficaz exercício da Defesa do arguido. 2.2. E isto porque, passando a um terceiro plano, decorrente e implícito no enquadramento teórico que antecede, na fase processual em que os autos se encontram - prova da Acusação e da Defesa já produzida -, tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, o art. 340º, do C.P.Penal, confere ao Tribunal “…o poder de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Assim e seguindo este acórdão, é a própria lei que dá ao Juiz poderes de disciplina da produção da prova, exigindo no entanto, para o seu indeferimento, a decisão quanto à notoriedade do seu carácter irrelevante ou supérfluo, inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa, ou, ainda, quando for a situação, da sua finalidade meramente dilatória. Em consequência, o Tribunal tem que valorar, em concreto, cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliando a efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Seguindo, nesta linha, a Jurisprudência do S.T.J. (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pag. 208 a 214, sendo que as partes especialmente realçadas a “bold” são da responsabilidade da relatora deste Despacho), que de forma muito clara traduz a posição que este Tribunal entende ser a processualmente adequada, “(…) deve evitar-se o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não, portanto, para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptivel de resultar dos factos…” - em termos de qualificação juridica, diz este acórdão, por ser a situação que estava em apreciação, mas também em termos de enquadramento fáctico da conduta qualificada como crime, acrescenta este Tribunal, por ser a situação que em concreto está em análise - “…face à forma como eles se apresentam descritos: tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações...”. Assim e decidindo quanto a cada diligência concretamente requerida: 3. Fls. 64.915 a 64.921 (Arguido C): A fls. 64.915 a 64.921, o arguido Arguido C requereu ao Tribunal: a) a inquirição de 23 (vinte e três) testemunhas, identificando-as pelos nomes, entre as quais estão testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento; b) e a inquirição de “…todas as restantes pessoas que trabalhavam, entre o início de 1997 e meados de 1999, na (...) da AX, cujos nomes e moradas se requer seja notificada a AX para vir indicar aos autos (incluindo os dos quadros técnicos que trabalhavam regularmente na sala de informática da cave da (...)), testemunhas que desde já se arrola...”; c) a junção do documento de fls. 64.920 e 64.921; d) uma deslocação do Tribunal às caves da (...) da AX, ao abrigo do dis(...) no art° 354°, do C P Penal, com gravação da diligência por meios audiovisuais, e) e a leitura, em audiência de julgamento, de “todas as declarações prestadas pelo Assistente AP em sede de inquerito à Policia Judiciária/Ministério Publico. O arguido C requereu as diligências acabadas de enunciar na sequência da “comunicação de alteração de factos, qualificada pelo Tribunal como não substancial”, proferida na audiência de julgamento de 1/01/2010, “referente ao crime pelo qual vem pronunciado no ponto 4.1.1. do Despacho de Pronuncia, concretamente a fls 20.876, 3° parágrafo. Para fundamentar a necessidade da produção de prova testemunhal - reinquirição de testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento e inquirição de “novas” testemunhas -, o arguido diz que o requer “por se revelar de importância crucial para a sua defesa para prova de factos que só agora, perante as novas datas comunicadas, se tomaram relevantes e sobre os quais não foram feitas perguntas (ou não foram feitas em toda a necessária extensão) às testemunhas já ouvidas em audiência dë julgamento…”. Para a junção do documento de fls. 64.920/1, por “reputar de crucial importância para a sua defesa e para a descoberta da verdade material”. E para a deslocação às caves da (...) da AX “por se revelar de importância crucial para a sua defesa” e para “… exame ao local, nomeadamente no que respeita aos acessos às caves, à forma de abertura da porta situada em frente das escadas e ao interior desta”. 3.1. Começando pela requerida junção do documento de fls. 64.920 a 64921, a fotocópia de uma “entrevista” publicada no CX, no dia 6/03/09, o arguido não indicou o que, na sua perspectiva, esse artigo traz de relevante para a prova dos “factos novos” objecto da comunicação de alterações, ou mesmo noutro contexto mais amplo. Mas apesar de o arguido não ter demonstrado a relevância, necessidade ou adequação concreta do que requer, o Tribunal, dentro dos poderes/deveres que decorrem, pelo menos, do art° 340°, do C.P.Penal e na sequência do enquadramento teórico acima ex(...), vai avaliar da residual relevância, necessidade ou adequação ao caso concreto do requerido, avaliando e ponderando a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, o enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados. Tendo sempre em atenção a, já referida, linha orientadora de garantia/verificação do exercício eficaz do direito de defesa. E o Tribunal: - face ao conteúdo concreto do documento de fls. 64.920 a 64.921; - face à alteração de factos que em concreto foi comunicada ao arguido - que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1 .“, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.876, 3° (terceiro parágrafo), factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “...num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade...” podem ter ocorrido: em dia não çoncretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; podendo integrar não a prática de um crime p. e p. pelo art° 166°, n° 1 e 2, do C.Penal, mas a prática de um crime p.e p. pelo art° 166°, n° 1, do C.Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuizo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do art° 2°, do C.Penal.”; - face ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados - a referida alteração quanto à circunstância tempo, situando em fins de 1997 e, portanto, antecipando para o ano anterior a possibilidade do início do período em que os factos poderão ter ocorrido -; - não tendo o arguido sofrido, por parte do Tribunal, limitação de perguntas ou do âmbito temporal das perguntas ao assistente AP ou às pessoas que com o assistente estiveram como educandos, educadores, trabalhadores ou dirigentes da AX, (...)s ou Lares, tendo permitido a inquirição em relação a todo o período em que o Assistente esteve na AX; - e face a toda a prova que ao longo do Julgamento, de acordo com as linhas de Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal foi determinando e foi sendo adquirida, com 734 pessoas efectivamente ouvidas (das 990 pessoas arroladas); em que o Tribunal procedeu à audição dos arguidos que quiseram prestar declarações pelo tempo que os mesmos solicitaram (o arguido A prestou declarações ou esclarecimentos pontuais, pelo menos, em 39 sessões, o arguido C em, pelo menos, 11 sessões, o arguido H em 16 sessões; o arguido K em, pelo menos, 3 sessões; e o arguido N e a arguida Q, em duas sessões); em que o Tribunal procedeu a à audição de 32 assistentes e legal Representante da assistente AX (em que houve Assistentes/Ofendidos - e na sua maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A - que foram ouvidos, cada um, em 17 sessões o Assistente AV; 10 sessões AN; 16 sessões AP; 8 sessões AI; 9 sessões AT; 3 sessões X; 5 sessões Y; e a legal representante da AX em 16 sessões); em que o tribunal procedeu à audição de 7 (sete) consultores técnicos da área da psicologia ou psiquiatria e sob diferentes vertentes do conhecimento da memória e da avaliação da “credibilidade” e questões relacionadas (e por vezes mais do que um dia, como sucedeu com a audição do Sr. Professor DZ e do Sr. Professor CK, que foram ouvidos, cada um, em três sessões); à audição de 14 (catorze) Peritos (tendo sido pedidos pormenorizados esdarecimentos em relação a Perícias de natureza sexual ou para a avaliação da capacidade de assistentes para prestarem depoimento, que foram feitas nos autos); o que importou, em horas úteis de gravação de declarações/depoimentos prestados em Audiência de Julgamento, pelo menos 1.182 (mil cento e oitenta e duas) horas; e em que foi sendo adquirida prova documental que se encontra quer no processo principal (com, actualmente, 270 volumes e cerca de 65.000 folhas) e nos mais 570 volumes de Apensos (nos quais se incluem, por exemplo, os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, cópias de registos de vias verdes, talões de Multibanco ou visa, documentos referentes à AX e suas instalações, livros de registos de ocorrências dos Lares da AX, documentos referentes a prédios mencionados no Despacho de Pronúncia, como o prédio sito na Av. (…) n° (…), a moradia sita no (…), prédio sito na (…), imóvel sito em (…), na Rua (…) e (...)s e habitação do arguido K); o Tribunal não vê em que medida este documento se revele fulcral e seja útil ou necessário para a descoberta da verdade, para a formação da convicção do Tribunal quanto aos factos a decidir e para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada. Nem se impõe, no entendimento do Tribunal - tendo sempre conta os factos concretos em que se consubstanciou a alteração comunicada -, por razão de garantia de direito de Defesa. 3.2. Quanto à requerida deslocação às caves da (...) da AX, o arguido fundamenta a necessidade do exame ao local para observação dos “acessos às caves, à forma de abertura da porta situada em frente das escadas e ao interior desta”. O Tribunal no dia 8/07/2005 deslocou-se as instalações da AX, tendo examinado não só as instalações da (…) da AX - piso de entrada e caves da (...) -, mas também as garagens, zonas dos lares e zona de pista de skate (cfr auto de fis 33 492 a 33 495). Aquando da deslocação às caves da (…) o Tribunal observou as salas que se situam nessa parte do edificio, portas e formas de abertura, observação esta que abrangeu a saída situada “em frente das escadas” que, vindo da zona de entrada, átrio interior, da (…), dão acesso às caves (cfr. auto de fis. 33.492 a 33.495). Ora considerando: - a diligência que em concreto é requerida pelo arguido e a que já foi realizada no dia 8107/2005 (cfr. auto de fls. 33.492 a 33.495); - a alteração de factos que em concreto foi comunicada ao arguido - que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.876, 3° (terceiro parágrafo), factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “ ...num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade...” podem ter ocorrido: em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; podendo integrar não a prática de um crime p. e p. pelo artº 166º, nº 1 e 2, do C.Penal, mas a prática de um crime p. e p. pelo artº 166º, nº 1, do C.Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuízo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do artº 2º, do C.Penal.” - que em nada alterou ou afectou as circunstâncias de lugar em que o despacho de pronúncia diz terem ocorrido os factos; - o enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados - que, como vimos, a comunicação de alteração limitou-se a circunstância tempo, situando em fins de 1997 e, portanto, antecipando para o ano anterior ao referido no despacho de Pronúncia a possibilidade do início do período em que os factos poderão ter ocorrido, nada tendo alterado quanto à factualidade do lugar; - sendo que o arguido não sofreu, por parte do Tribunal, limitação de perguntas ao assistente AP ou às testemunhas da AX ou colaboradores com a AX (trabalhadores ou pessoas que desempenharam funções na (…) da AX, incluíndo no departamento informático), quanto às instalações da (…) da AX, piso principal, caves, ou piso superior, disposição do espaço, existência de janelas, portas, forma de abrir das portas, existência de mobiliário ou elementos do edifício, acesso e procedimentos de pessoas ou materiais a tais espaços; - e considerando toda a prova que ao longo do Julgamento, de acordo com as linhas de Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal foi determinando e foi sendo adquirida; o Tribunal não vê em que medida a repetição de uma diligência de exame ao local, com o objectivo que o arguido C requer a fls. 64.918, al. a), seja necessária ou útil para a formação da convicção do Tribunal quanto aos factos a decidir e para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada. Ou se imponha como garantia de qualquer direito de defesa – tendo sempre em atenção que está em causa, ou seja, o ou os factos cuja possibilidade de alteração foi em concreto comunicada ao arguido –, por estar afectado. 3.2.1. Há, no entanto, uma consideração a fazer. O arguido requer a diligência seja gravada “…por meios audiovisuais… à semelhança do que foi ordenado para os outros exames ao local efectuados no processo, omissão esta a que a defesa é alheia…” O Tribunal efectuou cinco deslocações a locais identificados no Despacho de Pronúncia, como locais onde foram praticados os crimes imputados aos arguidos, na sequência de requerimentos apresentados pelos arguidos nesse sentido. Assim, efectuou duas deslocações ao prédio sito na Av (…), n° (…), em (…), uma das vezes no dia 22/9/05 com a presença do arguido A, uma deslocação a (…), em 3/11/05, à casa da arguida Q, com a presença do arguido A e de dois Assistentes, uma deslocação ao “(…)”, em 25/11/05, com a presença do arguido A e de um assistente, uma deslocação à Rua (…), no (…), em 9/02/06, tendo estado presentes dois assistentes, e uma deslocação às instalações da AX, (…), Garagens e Lares adjacentes A deslocação às instalações da AX, (…), Garagens e Lares adjacentes, consistiu numa diligência nos termos do art° 354°, do C.P.Penal, um exame ao local, tendo sido elaborado o competente auto conforme fls. 33.492 a 33.495, formalismo que o Tribunal considerou o processualmente necessário e adequado para o objectivo e regularidade processuais, nada mais tendo sido requendo pelo arguido C quanto a tal auto. Mas quando estiveram em causa deslocações em audiência de julgamento, o Tribunal determinou a gravação dessas audiências em vídeo, pois foram prestadas declarações pelos Assistente ou pelo arguido A e pedidos esclarecimentos pelo Ministério Publico e pelos Mandatários dos Sujeitos Processuais (cfr., a título de exemplo, Despacho de fls. 34.740). 3.3. Passemos, agora, à requerida produção de prova testemunhal. Para fundamentar a necessidade da produção de prova testemunhal - reinquirição de testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento e inquirição de “novas” testemunhas -, o arguido diz que o requer “…por se revelar de importância crucial para a sua defesa para prova de factos que só agora, perante as novas datas comunicadas, se tornaram relevantes e sobre os quais não foram feitas perguntas (ou não foram feitas em toda a necessária extensão) às testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento…”. Esta fundamentação, salvo melhor entendimento, não contém a especificação de razões concretas pelas quais o Requerente considera relevante ou necessária a audição de “novas testemunhas” ou nova audição de testemunhas, de modo a que o tribunal possa ponderar as suas “razões concretas” face a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Isto para que o Tribunal, a final, possa concluir pela eventual necessidade de reinquirição ou audição de novas testemunhas. Mas, e na sequência do enquadramento teórico acima enunciado, não tendo o arguido especificado e dado ao Tribunal as suas razões concretas, tendo presente o que acima ficou dito quanto ao art° 340, do C.P.Penal e quanto ao princípio da investigação por parte do Tribunal, o Tribunal irá avaliar face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados -, da necessidade de produção da prova testemunhal agora requerida pelo arguido. 3.3.1 . Começando pela extensão ou complexidade das alterações comunicadas ao arguido, a comunicação feita foi a seguinte: “(...) 1 . Que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.” do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.876, 3° (terceiro parágrafo), factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “...num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade...” podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; 1.1. Em consequência da comunicação que antecede, que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.”, do Despacho de Pronúncia, podem integrar: não a prática de um crime p. e p. pelo art° 166°, n° 1 e 2, do C.Penal, mas a prática de um crime p.e p. pelo art° 166°, n° 1, do C.Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuízo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do ar 2°, do C.Penal.” Assim, a comunicação de alteração traduziu-se em antecipar o início do periodo em que os factos poderão ter ocorrido para o fim do ano de 1997, quando o Despacho de pronúncia referia Outubro de 1998, e em antecipar o termo do período em que os factos poderão ter ocorrido para Julho de 1999, quando o Despacho de pronúncia dizia Outubro de 1999. O momento do cometimento de um facto qualificado como crime não é elemento objectivo essencial do crime, embora a sua alteração possa ter repercussões processuais (por exemplo, aplicação da lei em vigor à data da prática dos factos, prescrição). No entanto, esta comunicação de (possibilidade) de alteração do elemento relativo a circunstância do “tempo” em que os actos poderão ter sido praticados, pode interferir com o exercicio eficaz da Defesa do arguido. E interfere, na perspectiva do Tribunal, se em concreto o contraditório que o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu, foram limitados pelo Tribunal, não permitindo que fossem feitas perguntas às testemunhas ou aos assistentes ou limitando o objecto de diligências, de forma a não abranger o período temporal que agora veio a ser comunicado ou a não investigar a possibilidade da ocorrência dos factos nesse período. 3.3.2. Ora passando para a avaliação, em concreto, da necessidade de reinquirição, nos presentes autos - e conforme pode ser aferido pela audição das gravações dos depoimentos/deciarações que foram prestados em audiência de julgamento -, numa avaliação ampla do que foi o exercício do Contraditório por parte do arguido, o arguido inquiriu todas as testemunhas que arrolou, incluindo aquelas em relação às quais agora requer a reinquirição - as 18 (dezoito) das que estão identificadas a fls. 64.915 a 64.917 -, quanto aos factos e períodos que considerou relevantes, incluindo o período que veio a ser objecto da comunicação de alterações. Falando de forma mais próxima das testemunhas em relação às quais o arguido agora requereu a reinquirição, as inquirições incidiram, consoante as testemunhas, sobre factos da vivência do assistente AP quer na AX, quer fora da AX, sobre a AX e sua (…), instalações, acesso, exercicio de funções por parte do arguido C, funcionamento dos Lares, vigilância dos educandos, organização de transportes na AX, por todo o peníodo que o arguido quis perguntar e abrangendo o periodo temporal objecto da comunicação. E tendo o Tribunal permitido - por ter tido sempre presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e sua dinâmica espacial ou temporal -, que fossem feitas as perguntas ou requeridas as diligências, sem qualquer limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. Assim, a testemunha EA respondeu à Defesa do arguido C em relação a todas as perguntas que fez quanto a toda a vivência do assistente AP e ao acompanhamento que a testemunha fez dessa vivência, incluindo todo o período em que assistente esteve na AX, abrangendo os fins de semana em casa da testemunha ou na AX, a vivência com fugas ou saídas da AX, tendo mesmo respondido a todas as perguntas que foram feitas pelo arguido sobre factos ocorridos após a saída do Assistente da AX. A testemunhas foi inquirida por mais três arguidos, um que a tinha arrolado, o arguido A e os arguidos H e K que o requereram ao abrigo do dis(...) no art° 348°, n° 6, do C.P.Penal), as instâncias destes arguidos também foram minuciosas e abrangeram o período anterior à entrada do assistente AP na AX, durante e após saída da instituição. O Ministério Público e os Assistente fizeram contra instância, após o que ainda foi dada a instância à defesa do arguido C para perguntas complementares, por o ter requerido. A testemunha Dr BL foi ouvido em 5 (cinco) sessões (em 19/04/06, 20/04/06, 21/04/06, 26/04/06 e 6/11/07, esta última na fase da produção da prova da Defesa, pois os arguidos C, E e K não prescindiram de ouvir a testemunha nesta última fase embora em 6/11/07 a testemunha apenas tenha respondido a perguntas do arguido E pois os arguidos C e K declararam nessa audiência prescindir de esclarecimentos complementares). Respondeu à Defesa do arguido C, bem como a mais cinco Defesas (a Defesa do arguido N já nada perguntou à testemunha), Ministério Publico e Assistentes, sem limitação do âmbito temporal e abrangendo, dentro do conhecimento da testemunha, toda a vivência do assistente AP e o acompanhamento que a testemunha fez dessa vivência, antes, durante e apos estadia do assistente na AX. Todas as instâncias e durante os 5 (cinco) dias, foram minuciosas e após todas as instâncias ou contra instâncias, nada mais foi requerido pelo arguido C quanto a perguntas complementares, tendo mesmo o arguido C, na audiência de julgamento de 6/11/07 e como acima referimos, prescindido de esclarecimentos complementares. As testemunhas EB (ouvida na audiência de 25/10/06), EC (ouvida na Audiência de 21/04/06), ED (ouvida na audiência de 18/09/06) EE (ouvido nas audiências de 27/10/06 e essencialmente na de 3/11/06), EF (ouvido nas audiências de 26/02/07 e 2/03/07), EG (ouvida na audiência de 24/01/07), EH (ouvida na audiência de 9/11/06), EI (ouvida na audiência de 14/12/06), responderam a Defesa do arguido C (bem como dos demais arguidos que também as arrojaram, sendo que a testemunha EB foi também arrolada pela Defesa do arguido A; a testemunha EC foi também inquirido pela defesa dos arguidos A e H; a testemunha ED pela Defesa do arguido A; a testemunha EE foi tambêm arrolada/inquirida pelas Defesas dos arguidos A e H a testemunha EF foi também arrolada/inquirida pela defesa dos arguidos K e H; a testemunha EG foi também arrolada/inquirida pela defesa do arguido A; a testemunha EH foi também arrolada/inquirida pela defesa do arguido A; a testemunha EI foi também arrolada/inquirida pela defesa do arguido A), instâncias/contra instâncias do Ministério Público e Assistentes, sem limitação do âmbito temporal e abrangendo o conhecimento das testemunhas em relação a todo o período em que estiveram na AX ou em que colaboraram com a (…) - a testemunha EB declarou ter exercido funções na AX desde 1992 mas tendo respondido ao pedido de esclarecimentos que foram até ao período de 2003 relacionado com a suspensâo e saída do arguido C da AX; a testemunha EC declarou ter exercido funções na AX desde Maio de 1978; a testemunha ED declarou ter exercido funções na AX desde 1988; a testemunha EE declarou estar há 46 anos na AX; a testemunha EF declarou trabalhar na (…) desde 1976; a testemunha EG declarou exercer funções na AX desde 1974; a testemunha EH declarou exercer funções na AX desde 1976; a testemunha EI declarou ter colaborado no apoio à informática da AX -. Responderam a todas as questões que de forma minuciosa e globalmente pormenorizada lhes foram sucessivamente colocadas sobre o funcionamento, procedimentos de funcionamento e organização da AX, utilização e acesso das/às instalações da (...) da AX, disponibilidade do arguido C e de outros funcionários da AX, incluindo o arguido A, ou educandos, sobre as instalações da AX, da (...) e acesso às instalações, relações profissionais ou outras, horários do arguido C, organização do sistema informático da AX, organização dos transportes na AX. Após as contra instâncias do Ministério Publico e dos Assistente, ainda foi dada a instância à defesa do arguido C para perguntas complementares às testemunhas EF, EB, EG (a esta testemunha por duas vezes) e EH, par tal ter sido requerido pelo arguido. As testemunhas EJ (ouvida nas audiências de 8/05/08 e 10/05/06) e EK (ouvida nas audiências de Julgamento de 5/03/07 e 9/03/07), responderam à Defesa do arguido C, bem como à Defesa dos demais arguidos que também o arrolaram, instância/contra instâncias do Ministério Público e Assistentes, sem limitação do âmbito temporal e abrangendo o conhecimento das testemunhas em relação a todo o período em que estiveram em exercício de funções na AX - a testemunha EJ declarou ter sido director do CZ entre o ano de 2000 e 2003; e a testemunha EK declarou ter exercido funções na AX de Julho de 1995 a Setembro de 2004 -. Responderam aos pedidos de esclarecimento que de forma detalhada, minuciosa, lhes foram colocados em todas as instâncias ou contra instâncias, em relação ao assistente AP ou em relação a outros assistentes, funcionamento dos Lares, (...)s, organização da vivência dos educandos internos nos Lares, em particular da vivência do assistente AP na AX, saída da AX ou incidentes ocorridos. As testemunhas EL (ouvida na audiência de 7/02/08), EM (ouvida nas audiências de Julgamento de 15/05/06, 17/05/06 e 18/05/06), EN (ouvida na Audiência de 13/12/06 e 14/12/06) responderam à Defesa do arguido C (bem como à Defesa dos demais arguidos que também o arrolaram, sendo que a testemunha EL foi também arrolada pelo arguido A e respondeu a pedidos de esclarecimento do arguido K, que o requereu ao abrigo do dis(...) no art° 348°, n°6, do C.P.Penal; a testemunha EM foi também arrolada pelos arguidos A, E, H e K; a testemunha EN foi também arrolada pelos arguidos A, E, H, K e N, embora este último arguido nada tenha já perguntado) instância/contra instâncias do Ministério Público e Assistentes, sem limitação do âmbito temporal e abrangendo o conhecimento das testemunha em relação a todo o período em que estiveram em exercício de funções na AX - a testemunha EL declarou ter sido educadora na AX de 1997 a 2002; a testemunha EM declarou ter exercido funções na AX desde 1991 e ainda as exercendo na altura em que prestou depoimento; e a testemunha EN declarou ter exercido funções na AX desde Outubro de 1991 -. Responderam aos pedidos de esclarecimento que de forma detalhada, minuciosa, lhes foram colocados em todas as instâncias ou contra instâncias, em relação ao assistente AP ou em relação a outros assistentes, funcionamento dos Lares, (...)s, relação/ou ausência dela dos arguidos A ou C com os lares, organização da vivência dos educandos internos nos Lares, incluindo os aspectos da vivência do assistente AP na AX, saída deste assistente da AX ou incidentes ocorridos durante o período em que esteve na AX. Em relação à testemunha EN, após todas as demais instâncias e as contra instâncias do Ministério Público e dos Assistentes, ainda foi dada a instância à defesa do arguido C para perguntas complementares, por o ter requerido. A testemunha EO (ouvido na audiência de 24/09/07) respondeu à Defesa do arguido C (bem como à defesa dos arguidos A, H, K, por o terem arrolado), Ministério Público e Assistentes, de forma pormenorizada dentro do conhecimento da testemunha - que declarou ter sido aluno interno da AX entre Setembro de 1993 e 2001 - e sem limitação do âmbito temporal dos factos que foram perguntados, abrangendo toda a vivência (pelo menos) do assistente AP, enquanto a testemunha com ele conviveu como aluno interno na AX. As testemunhas (Inspector) CF (ouvido nas audiências de 22/06/06, 28/06/06, 30/06/06 e 6/11/07, esta última na fase de produção da prova da Defesa, pois os arguidos E e K não prescindiram de ouvir a testemunha nesta última fase) e (Inspector) EP (ouvido nas audiências de 26/06/06 e 18/08/06), responderam à Defesa do arguido C (bem como à Defesa dos demais arguidos que também os arrolaram, sendo as duas testemunhas foram também arroladas pelos arguidos A, E, H e K e responderam em sede de contra instância ao arguido N e Q) instância/contra instâncias do Ministério Público e Assistentes, sem limitação do âmbito temporal e abrangendo o conhecimento das testemunhas em relação a todo o período em que desempenharam funções no âmbito da investigação do presente processo, e em relação a toda e qualquer informação ou conhecimento de facto que pudessem ter do assistente AP ou de outro. Responderam, dentro do legalmente admissível, face ao art° 356°, n° 7, do C.P.Penal, a todos os pedidos de esclarecimento que de forma detalhada e minuciosa, lhes foram sendo sucessivamente e, por vezes, repetidamente colocados em todas as instâncias ou contra instâncias, em relação ao assistente AP ou em relação a outros assistentes, actos ou diligências praticadas pelas testemunhas no âmbito do processo. Assim e para este Tribunal, ponderado o objecto dos depoimentos das testemunha especialmente enunciadas e as instâncias que em concreto lhes foram feitas, a inquirição abrangeu, sem qualquer limitação do Tribunal, o período temporal objecto de comunicação que foi feita no âmbito do art° 358°, do C.P.Penal. As testemunhas em relação às quais o arguido requereu nova inquirição foram inquiridas não so à luz do contexto fáctico, temporal, do despacho de pronúncia, mas também do contexto fáctico, temporal, objecto da comunicação do Tribunal, pois o critério adoptado pelo Tribunal - por ter tido sempre presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e sua dinâmica espacial ou temporal face ao despacho de pronúncia -, permitiu que fossem feitas as perguntas (ou requeridas as diligências) sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. E, por essa razão, tais testemunhas integram o grupo de pessoas ouvidas que contribuiram para a decisão do Tribunal de proceder a comunicação da alteração de factos a que se refere o Despacho de fls. 64.097 a 64.107, no caso concreto o “Ponto II”, de fls. 64.102, referente aos factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1” do Despacho de Pronúncia. De tudo o que antecede resulta, para este Tribunal, que a audição das testemunhas em relação às quais o arguido C requer a reinquirição a fls. 64.915 a 64.917, Ponto 1., não se afigura necessária, relevante ou útil para a descoberta da Verdade, para a formação da convicção do Tribunal quanto aos factos a decidir e para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada. Nem se impõe para garantia de qualquer direito de defesa, por tal núcleo não ter sido afectado pelo Tribunal - tendo sempre presente o que foi o objecto e consequentemente o facto da comunicação de alterações feitas ao arguido, ao abrigo do art° 358°, do C.P.Penal -, estando devidamente preenchido o exercício do contraditório por parte do arguido. 3.3.3. Mas também, por tudo o que antecede, o Tribunal não vê em que medida a inquirição de mais pessoas - as demais especificadas a fls. 64.916 e que não fazem parte das cerca de 734 ( setecentas e trinta e quatro ) pessoas efectivamente ouvidas ao longo do julgamento e as que o arguido genericamente “arrola” a fls. 64.917, sob a designação “ ... e ainda todas as restantes pessoas que trabalhavam, entre o inicio de 1997 e meados de 1999, na (...) da AX, cujos nomes e moradas se requer seja notificada a AX para vir indicar aos autos (incluindo os dos quadros técnicos que trabalhavam regularmente na sala de Informática da cave da (...))…” -, se revele necessário para a descoberta da verdade ou para garantia a efectivação dos direitos de defesa do arguido, face à comunicação de possibilidade de alteração de factos que lhe foi feita, ou mesmo num entendimento mais amplo. Lembramos que o arguido não indicou ao Tribunal a relevância, necessidade ou adequação concreta desta parte do seu requerimento. E que, por conseguinte, o Tribunal está a aferir de tal necessidade e relevância à luz dos poderes/deveres de investigação que a lei lhe confere e impõe no âmbito do art° 340º, do C.P.Penal, e à luz da ponderação da real e efectiva necessidade de tais audições, por a sua não verificação afectar de forma inadmissível os direitos de defesa do arguido, na sequência da comunicação feita ao abrigo do art° 358°, do C.P.Penal. E lembramos o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, quanto ao facto de o Tribunal, na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao o art 340º, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever - para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova -, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliação criteriosa da efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecânismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptível de resultar dos factos (…) face a forma como se encontram descritos”, pois “tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do principio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações” (cfr. Ac STJ de 615/99, in CJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214 sendo que as partes especialmente realçadas a bold são da responsabilidade da relatora deste Despacho). A celeridade processual em matéria penal tambem tem dignidade constitucional - art° 32° n° 2, 2º parte, da CRP - o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da CRP, engloba “todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação” (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. 1, pag 5164, edição Coimbra Editora) e daí o Dever e o Poder do Tribunal do Julgamento, em conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso concreto possam conflituar. Ora no entendimento do Tribunal, todas as testemunhas que foram efectivamente ouvidas em audiência de julgamento - pelo menos 732 e recorrendo o Tribunal ao acima já ex(...), quanto ao que foi a produção da prova, quer quanto à sua extensão, quer quanto à sua diversidade - e que foram ouvidas após as declarações dos assistentes, foram sempre ouvidas no contexto que acima referi: o Tribunal permitiu – por ter presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e sua dinâmica espacial ou temporal e o que, em algumas situações, aparentemente se poderia desviar do descrito do despacho de pronúncia – que fossem feitas as perguntas (ou requeridas diligências), sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. Isto para que, a final, esses testemunhos, valorados também face à prova documental que existe nos autos, pudessem ser efectivamente úteis e contribuir para a descoberta da verdade. Isto é, ou poder dar consistência a declarações dos assistentes quanto a diferentes circunstâncias de tempo ou lugar, que aparentemente resultavam das declarações dos assistentes em relação às circunstâncias de tempo ou lugar descritas no Despacho de pronúncia; ou contribuir para a fragilidade de tais declarações por, por exemplo, não ser verosímil, com explicação racional, que factos imputados aos arguidos pudessem ter ocorrido em circunstâncias de tempo ou lugar diferentes das descritas no Despacho de pronúncia e “no” ou “num” dos sentidos que, numa primeira abordagem, poderia resultar das declarações dos assistentes. Este momento processual – com a extensa e diversificada prova da Acusação e da Defesa já produzida – e renovando o já acima dito, em particular no Ponto 2.2. e no que antecede, é aquele em que o Tribunal tem a possibilidade de avaliar ou ponderar o que resultou de toda a actividade do Julgamento, ao longo do qual, de acordo com as linhas Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, construindo um encadeado de factos, conhecimentos, reflexões, que acompanhando tais linhas de acusação ou de defesa, permitiriam e permitem ao Tribunal, neste momento, chegar a uma decisão. Assim, à luz da ponderação do conteúdo concreto de toda a prova produzida em audiência de julgamento - invocando de novo o Tribunal o que acima descreveu quanto ao que foi, em concreto, a quantidade e diversidade de prova produzida nos autos ao longo do julgamento e do que foi a efectiva extensão, sem as já referidas limitações, das instâncias feitas pelo arguido C - , do que é a alteração que em concreto foi comunicada ao arguido nos termos do art° 358°, do CPPenal, o Tribunal não considera relevante e necessário para a prova dos factos que são objecto da comunicação feita ao arguido, para a descoberta da Verdade, para a formação da convicção quanto aos factos a decidir e para o proferimento de uma Decisão fundamentada e Justa, a audição de mais pessoas requerida pelo arguido C a fls. 64.915 a 64.917, “Ponto 1”. Nem tal se impõe, na avaliação do Tribunal, para garantia do exercicio do direito de Defesa e do contraditorio pois, para o Tribunal, o contraditório que já foi exercido pelo arguido na audiência de julgamento e com a abertura com que o foi, permitiu ao arguido exercer a sua Defesa e este exerceu-a efectivamente - como resulta da audição das gravações de todas as testemunhas que foram instadas pelo arguido e em particular das já acima expressamente mencionadas quando o tribunal tratou da questão da pedida reinquirição de testemunhas -, potencializando o que resulta, em termos factuais e de qualificação juridica, da comunicação (de possibilidade) de alteração não substancial feita ao arguido no Despacho de fls. 64.097 a 64.107, no caso concreto o “Ponto II”, de fls. 64.102, referente aos factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.” do Despacho de Pronúncia. 3.4. Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem, ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n° 1, do CPPenal, “a contrario”, por o Tnbunal não o considerar relevante, útil, nem necessário para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada, o Tribunal indefere: a) A junção do documento de fls. 64.920 a 64.921 - fotocópia de uma “entrevista” publicada no CX, no dia 6/03/09 -, requerida pelo arguido a fls. 64.917, Ponto II; b) A deslocação do Tribunal às caves da (…) da AX, requerida pelo arguido a fls. 64.918, Ponto III, al. a); c) A produção da prova testemunhal - reinquirição de testemunhas já ouvidas em audiência de julgamento e inquirição de “novas” testemunhas -, requerida pelo arguido a fls. 64.91 5 a 64.917, “Ponto 1” (a inquirição de 23 (vinte e três) testemunhas, identificadas pelos nomes, entre as quais estão testemunhas já ouvidas em audiência dejulgamento; e a inquirição de “...todas as restantes pessoas que trabalhavam, entre o início de 1997 e meados de 1999, na (…) da AX, cujos nomes e moradas se requer seja notificada a AX para vir indicar aos autos (incluindo os dos quadros técnicos que trabalhavam regularmente na sala de informática da cave da(...); 3.5. Quanto à requerida, a fls. 64.918/64.919, Ponto III, al. b), “…leitura em audiência de todas as declarações prestadas pelo assistente AP em sede de inquérito à Polícia Judiciária/Ministério Público, (…) abrangendo todos os depoimentos de inquérito”, e diligência que tem subjacente um regime processual especifico no art° 356°, nº 2, al. b) e n° 5, do CPPenal, pelo que na audiência de Julgamento o Tribunal irá dar cumprimento a tal dispositivo legal. Acresce que o arguido não indica ao tribunal as fls. dos autos cuja leitura requer, o que tendo em atenção o regime muito específico do art° 356°, n° 2, al. b) e no 5, do CPPenal, se impõe, notificação que o Tribunal faz ao arguido. 3.6. Após trânsito em julgado do Despacho que antecede desentranhe o documento de fls. 64.920 a 64.921 e remeta ao apresentante. 4. Fls. 64.364 a 64.394 e fls. 64.395 a 64.778 - Arguido E: A fls. 64.364 a 64.394 e fls. 64.395 a 64.778, o arguido E requereu ao Tribunal: a) leitura das declarações do assistente AK, prestadas em inquérito em 5/5/2003, constantes de linhas 20 a 23 e de 42 e 43 de fls. 4.235, linhas 106 e 107 de fls. 4.237, linhas 165 a 176 de fls. 4.239, linhas 177 a 192 de fls. 4.240; e em 6/05/2003, constantes de linhas 4 a 11 de fls. 4.282 e de linhas 12 a 14 de fls. 4.283; b) notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW, que abranja o período entre 12/12/98 e 31/07/99; c) a “…inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com numero ímpar (excepto o n° (…)), da alameda (…),(…), que utilizassem o respectivo prédio entre 12.12.1998 e 31.1.1999, uns e outras a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito se requer”; d) a “inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com numero par (excepto o n° (…)) ou ímpar, situados na Avenida (…), em (…), perto da Zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 1.4.1999 e 31.7.1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também se requer”; e) em alternativa às alineas c) e d), que antecedem e para o caso de não ser deferido, requer, a fls. 64.367 a 63.394 e por remissão ou completado com os documentos de f.s 64.395 a 64.778: - a audição de 157 testemunhas, que identifica pelo nome ou pela qualidade de Legal representante de entidade que identifica; - a audição de 37 Porteiros de imóveis, cujos números de porta identifica e em relação aos quais requer ao Tribunal diligências com vista a sua identificação e posterior notificação; - a audição de uma das pessoas que entre 12/12/98 e 31/01/99 utilizaram as fracções dos n°s (…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 21 fracções), n° (…), n°s (…) a (…), n° (…) a (…), n° (…) a (…), n° n° (…), n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 13 fracções), n° (…), n° (…), n° (…), n°s (…) e (…), n° (…) (especificamente identificadas pelo arguido 10 fracções), nº (…), n° (…), n° (…) (especificamente identificadas pelo arguido 14 fracções), n°s (…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 14 fracções), n°s (…),(…),(…),(…),(…), n°s (…),(…) e (…), n°s (…),(…),(…) e (…), n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 15 fracções), n°s. (…) a (…), n°s (…), n°s (…), da Alameda (…), requerendo ao tribunal diligências com vista à respectiva identificação; - a audição de uma das pessoas que entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Julho de 1999 utilizaram as fracções do n° (…), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 19 fracções), dos n°s. (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 12 fracções), dos n°s. (…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos n°s. (…),(…) e (…), dos nºs. (…),(…) e (…), dos nºs. (…),(…),(…) e (…), do nº (…), dos nºs. (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos nºs. (…) a (…), dos nºs. (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 10 fracções), do nº. (…), do nº. (…), do nº. (…), do nº. (…), do nº. (…), dos nºs. (…) e (…), do nº. (…), dos nºs. (…),(…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 8 fracções), do nº (…), dos nºs. (…) a (…), do nº (…), dos nºs. (…),(…) e (…), dos nºs. (…) a (…), do nº (…), do nº (…), do nº (…) e do nº (…), da Av. (…), requerendo ao tribunal diligências com vista à respectiva identificação; f) e a junção de 33 documentos (fls. 64.395 a 64.778). Na análise e decisão que se segue, quanto às diligências requeridas pelo arguido E, o Tribunal tem sempre como pressu(...) o enquadramento teórico que acima fez nos Pontos “2”, “2.1” e “2.2”. Assim temos que o arguido E requereu as diligências acabadas de enunciar na sequência de “…alterações que lhe foram comunicadas como não substanciais, das quais interpôs recursos em 14.12.2009, em 11.1.2010 e em 27.1.2010, mas que ainda se mantêm…”. 4.1. Começando pela requerida notificação da AX para juntar o Livro de ocorrências do CW, que abranja o período entre 12/12/98 e 31/7/99, o arguido não indicou o que, na sua perspectiva, esse junção torna-se relevante para a prova dos “factos novos” objecto da comunicação de alterações, ou noutro contexto mais amplo. Devia tê-lo feito, no entendimento do Tribunal pois, como acima já referi, tal como acontece com a apresentação dos meios de prova ao abrigo do dis(...) no artº 315º, do C.P.Penal, ou com os meios de prova que venham a ser requeridos no decurso da audiência, ao abrigo do dis(...) no artº 340º, do CPP, o pedido de produção de meios de prova, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos nos termos do artº 358º, do C.P.Penal e no decurso da audiência, tem de ser acompanhada de uma justificação para os efeitos do artº 340º, do C.P.Penal. Deve alegar o interesse que, em concreto, essa prova tem para determinado núcleo de factos ou para certo facto objecto da comunicação de alterações, de forma a que o Tribunal possa (efectivamente) aferir da necessidade ou eventual relevância dessa prova para o eficaz exercício da defesa do arguido e, em consequência, para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa. Não basta alegar, em termos genéricos, que a prova se destina a “contribuir para a descoberta da verdade” e para a prova da inocência do arguido na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos, havendo que invocar a concreta razão ou razões pela quais o Requerente considera relevante a realização da diligência, pois tal relevância ou necessidade terá que ser, por sua vez, ponderada pelo Tribunal face a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, face ao enquadramento em que a Defesa do arguido foi exercida no contexto do Despacho de pronúncia e ao enquadramento em que o arguido pretende exercer nova Defesa, à luz e no contexto dos “novos” factos. Só assim se concretiza e dá sentido ao que é ou pode ser em cada situação, a garantia do eficaz exercicio da Defesa do arguido. Sucede, contudo, que quanto ao documento que o arguido requer que seja pedido à AX, no ofício de fls. 36.275, quando a AX remeteu para os autos os livros dos registos de ocorrências dos lares, já consta a informação da Instituição a dizer que em relação ao CW não têm os registos anteriores ao ano 2000. Revela-se, por conseguinte, que o meio de prova requerido pelo arguido é impossível de obter. Assim, fica prejudicada a necessidade de avaliar à luz de outros critérios o requerido, havendo que indeferir a diligência ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n°4, al. b), do C.P.Penal. 4.2. Passando à requerida produção de prova testemunhal, a que consta de fls. fls. 64.365 a 64.394, tal como no ponto anterior - e valendo as considerações que em termos de enquadramento teórico se fizeram quanto á necessidade e razões dessa necessidade, de especificação e fundamentação -, também aqui e salvo melhor entendimento, o arguido não especificou as razões concretas pelas quais considera relevante ou necessária a audição das “novas testemunhas” arroladas, de modo a que o tribunal possa ponderar as suas “razões concretas” face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Depreende-se, contudo, que o arguido apresenta o requerimento para produção da prova testemunhal por reiterar a sua inocência em qualquer circunstância, considerando que o Tribunal deveria ter “indagado” mais do que indagou antes de ter comunicado a alteração. E diz, a fls. 64.364, que “incumbiria ao Tribunal indagar da possibilIdade de determinação da componente espacial dos factos a alterar. Na sua perspectiva o Tribunal, sem “tal indagação”, está a fazer uma imputação no vazio, onerando o arguido “com a prova do negativo” Justifica, assim, também, as diligências de “indagação” de nomes e moradas que requer que seja o Tribunal a determinar quanto aos imóveis sitos na Alameda (…) e na Avenida (…). Concluindo, apresenta prova em consequência da comunicação e para indagação da “determinação da componente espacial dos factos a alterar”, mas não fundamenta a necessidade concreta da audição das, potencialmente e pelo menos, de acordo com o que já é perceptível do seu requerimento, 389 (trezentas e oitenta e nove) novas testemunhas. E digo potencialmente, pois é partindo de dois pressu(...)s: que em relação aos períodos abrangidos pelo requerimento do arguido, de 12/12/98 a 31/01/99, apenas uma pessoa utilizou as fracções já indicadas pelo arguido, e contabilizando apenas uma testemunha por cada prédio que está identificado por número de polícia e sem fracções ainda especificamente identificadas, quando o que o tribunal terá ou teria mesmo que fazer, no caso de conclusão pela audição, é/era de começar por contabilizar o número de andares. 4.2.1. Assim, prosseguindo e na sequência do enquadramento teórico acima enunciado, não tendo o arguido especificado e dado ao Tribunal as suas razões concretas, tendo presente o que acima ficou dito quanto ao art° 340º, do C.P.Penal e quanto ao princípio da investigação por parte do Tribunal, o Tribunal irá avaliar - face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados -, da necessidade de produção da prova testemunhal agora requerida pelo arguido. Começando pela extensão ou complexidade das alterações comunicadas ao arguido e em relação às quais o mesmo vem requerer produção de novos meios de prova - como vimos, em relação a determinação da componente espacial dos factos a alterar e em relação a duas situações distintas - a comunicação feita foi a seguinte: “III. Factos relativos ao Assistente AK, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido E: 1. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.888 último parágrafo e fls 20.889 1° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “...em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num Sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade...”, tendo, após o jantar, o arguido E pro(...) que se dirigissem para uma casa de que “... tinha a disponibilidade, sita na Alameda (…), nº (…), em (…)...”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, numa Sexta-feira ou num Sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive); - em prédio localizado na Aiameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os números Impares; - local para onde, após o jantar, o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC; 2. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.889, penúltimo parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “... em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta feira...”, numa casa de que o arguido E “... tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…)...” , podem ter ocorrido; - em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999; - numa casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…) (…), local onde o arguido E se encontrava quando o Assistente AK aí foi;” O momento ou o local do cometimento de um facto qualificado como crime não é elemento objectivo essencial do crime, embora a alteração do momento possa ter repercussões processuais (por exemplo, aplicação da lei em vigor à data da prática dos factos, prescrição). No entanto, esta comunicação de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância do “tempo” ou “lugar” em que os actos poderão ter sido praticados, pode interferir com o exercício eficaz da Defesa do arguido. E interfere, na perspectiva do Tribunal, se em concreto o contraditório que o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu, foram limitadas pelo Tribunal, não permitindo que fossem feitas perguntas às testemunhas ou aos assistentes ou limitando o objecto das diligências, de forma a não abranger a circunstância de modo cuja possibilidade de alteração veio a ser comunicada e em relação à qual o arguido está a requerer a produção de prova – no caso concreto o lugar –, ou de forma a não investigar a possibilidade da ocorrência dos factos nesse local. 4.2.2. Ora passando para a avaliação, em concreto, da necessidade das pessoas indicadas pelo arguido a fls. 64.365 a 64.394, em relação aos factos que o despacho de pronúncia diz terem-se passado no local “prédio sito na Avenida (…)”, em rigor – e como aponta o Dº Magistrado do Ministério Público e os Assistentes, nas respostas que apresentaram a fls. 65.070 a 65.085 e a fls. 65.086 a 65.101 –, no caso concreto a comunicada possibilidade de alteração da descrição dos factos quanto à “circunstância local”, não representa uma alteração não substancial que deva ser comunicada ao abrigo do dis(...) no artº 358º, do C.P.Penal. Isto porque o Tribunal, ao estar a delimitar a possibilidade de ocorrência dos factos para uma “…casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…)…”, quando o Despacho de pronúncia diz numa casa de que o arguido E “…tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…)…”, está a a fazer uma descrição dos factos dentro do mesmo contexto factual do despacho de Pronúncia, não há efectivamente factos novos a ter em conta pelo Tribunal, tratando-se de “um menos” em relação ao “mais” pelo qual o arguido vinha pronunciado. Assim o arguido quando no início do julgamento preparou a sua Defesa e quando ao longo do julgamento exerceu o contraditorio e requereu diligências, preparou essa Defesa e exerceu o contraditório potencializando o que resulta, em termos factuais, da comunicação (de possibilidade) de alteração não substancial feita ao arguido no Despacho de fls. 64.097 a 64.107, no caso concreto no “Ponto III”, de fls. 64.102 a 64.104, em relação aos factos imputados num prédio sito na Avenida (…), tendo em atenção a forma como os factos se encontravam descntos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia. Potencializou e exerceu a sua Defesa e o contraditório, configurando a hipótese, mais abrangente, de os factos poderem ter ocorrido num prédio sito na Avenida (…), sem qualquer restrição ou delimitação quanto a zona dessa Avenida. Em consequência e quanto às diligências de prova/inquirição de testemunhas e junção de documentos requeridas pelo arguido, em relação à prova do facto “local/prédio sito na Avenida (…)”, não se afigura a este Tnbunal que tal se revele necessário ou útil para a descoberta da verdade ou para garantia do eficaz exercício da defesa do arguido. Por conseguinte, não se verificam os fundamentos do art° 340º, n° 1, do CPPenal, havendo que indeferir o requerido nesta parte. 4.2.3. Já quanto a necessidade de inquirição das pessoas indicadas pelo arguido a fls. 64.365 a 64.394, em relação aos factos que o despacho de pronúncia diz terem-se passado no “local” prédio sito na Alameda (…)”, a situação é diversa da anterior. Embora o local do cometimento de um crime não seja, como referimos, elemento objectivo essencial do crime, no caso concreto a comunicação que o tribunal fez no “Ponto III”, de fls. 64.102 a 64.104, em relação ao prédio sito na Alameda (…), de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância do “lugar” em que os actos poderão ter sido praticados, tendo em atenção a forma como os factos se encontravam descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, pode interferir com o exercício eficaz da Defesa do arguido. Quando o arguido, no início do julgamento preparou e organizou a sua defesa e quando ao longo do julgamento a desenvolveu, fê-lo tendo como enquadramento um prédio certo e determinado o n° (…) da Alameda (…). Isto significou que todas as instâncias que fez e diligências que requereu, foi em função desse enquadramento da circunstância de facto “local”, descrição mais restritiva que aquela que o Tribunal agora veio a comunicar. Assim, se o contraditório que, em concreto, o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu foram limitadas à realidade “n° (…), da Alameda (…)”, com a comunicação feita pelo Tribunal de possibilidade de alargamento da realidade factual que o arguido configurou, pode estar, de algum modo, afectado o eficaz exercicio da defesa do arguido. Pelo que, ao abngo do dis(...) no art° 340°, n° 1, do CPPenal e por tal se revelar necessário para a boa e Justa decisão da causa, há que deferir a audição de testemunhas, quanto à prova da circunstância de lugar - prédio sito na Alameda (…), número não concretamente determinado mas situado na lateral dos números impares -, cuja possibilidade de alteração do facto o Tribunal comunicou ao arguido. 4.2.4. Mas neste ponto e face à extensão da prova requerida pelo arguido – cfr. fls. 64.364 a 64.394 -, põe-se uma questão ao Tribunal. Para assegurar e garantir o eficaz exercício da Defesa do arguido e, consequentemente, o Tribunal tem que admitir toda a prova testemunhal que o arguido requer, em relação a todos os edifícios que se situem na lateral da Alameda (…), onde se situam os números ímpares? Lembrando o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, há que ter em atenção que na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao o art 340°, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “…de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC nº 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever - para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova -, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliação criteriosa da efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não … para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptível de resultar dos factos (…) face à forma como se encontram descritos …” pois “… tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações …” (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214, sendo que as partes especialmente realçadas a “bold” são da responsabilidade da relatora deste Despacho). Como já referimos, aquando do conhecimento das diligências de prova requeridas pelo arguido C, a celeridade processual em matéria penal também tem dignidade constitucional - art° 32°, n° 2, 2ª parte, da C.R.P. -, o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da C.R.P., engloba “… todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação …” (cf. Gomes Canotilho, Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. 1, pág. 516, 4 edição, Coimbra Editora) e daí o Dever e Poder do Tribunal do Julgamento, de conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso concreto possam conflituar. Nos presentes autos foi declarada a especial complexidade do processo, o que significa que, por força da conjugação do dis(...) no art° 315°, n° 4 e no art° 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do C.P.Penal, o número de 20 testemunhas a que se referem os arts° 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al d), do C P Penal, pode ser ultrapassado. E pode ser ultrapassado, diz o art° 283°, n° 7, “desde que tal se afigure necessário para a descoberta da verdade material, designadamente quando tiver sido praticado algum dos crimes referidos no n° 2 do art° 215° ou se o processo se revelar de especial complexidade, devido ao número de arguidos ou ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime”. No caso concreto está em causa produzir prova pelo arguido quanto a uma circunstância de lugar, que o Tribunal prevê a possibilidade de poder vir a deslocar do n° (…) da Alameda (…), para um prédio sito na (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os números ímpares. É uma circunstância que não é um elemento objectivo essencial do crime. E é uma circunstância de lugar que, face a toda a factualidade descrita no Despacho de Pronúncia - que imputa ao:(…) é uma parte objectivamente reduzida e limitada, face a todo o objecto do processo e à actividade probatória que foi desenvolvida ao longo do julgamento. É desproporcionado face ao art° 32°, n° 1 e 5 e art° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa e mesmo face ao dis(...) no art° 6°, da CEDH, que para a eventual prova de tal elemento objectivo, mas não essencial, da prática do crime, o Tribunal deva e, por conseguinte possa - tendo em consideração também o que resulta do art° 323°, al a), do CPPenal, admitir o número de testemunhas que no caso concreto o arguido requer ao tribunal. Acresce que a prova ou não prova da prática do crime imputado ao arguido não depende, unicamente ou directamente, do que em audiência de julgamento pessoas que vivam ou tenham vivido, nos prédios situados na lateral dos números ímpares da Alameda (…), venham dizer ao Tribunal quanto a terem visto ou não, o arguido E em alguma habitação, ou de terem tido conhecimento ou não, do arguido E ter ocupado alguma das habitações a titulo precário, acidental, ou outro. Configurando a hipótese, em abstracto, de serem ouvidas 300 pessoas em relação a este local ou zona e essas 300 pessoas dizerem ao Tribunal que não viram, nem tiveram conhecimento, em circunstância alguma, do arguido ter estado numa habitação nesse local, ou se, em sentido contrário, essa 300 pessoas disserem que viram o arguido nesse local, isso implica, necessáriamente ou directamente, que o Tribunal dê como “não provada”, na primeira situação, a prática do crime pelo arguido, ou como “provada” na segunda? No caso concreto a resposta tem que ser negativa em qualquer uma das situações, pois a decisão que o tribunal venha a tomar quanto aos factos objecto do despacho de pronúncia depende da valoração global e conjunta das testemunhas, assistentes, arguidos, peritos, ouvidos em audiência de julgamento e da prova documental ou pericial produzida. E todas as testemunhas que foram efectivamente ouvidas em audiência de julgamento - com 734 pessoas efectivamente ouvidas das 990 pessoas arroladas e em que o Tribunal procedeu à audição dos arguidos que quiseram prestar declarações pelo tempo que os mesmos solicitaram (o arguido A prestou declarações ou esclarecimentos pontuais pelo menos em 39 sessões; o arguido C em pelo menos 11 sessões; o arguido H em 16 sessões; o arguido K em pelo menos 3 sessões; e o arguido N e a arguida Q, em duas sessões); em que o Tribunal procedeu a à audição de 32 assistentes e legal Representante da assistente AX (em que houve Assistentes/Ofendidos e na sua maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A - que foram ouvidos cada um em 17 sessões, o Assistente AV 10 sessões, AN 16 sessões, AP 8 sessões, AI 9 sessões, AT 3 sessões, X 5 sessões, Y e a legal representante da AX em 16 sessões); em que o tribunal procedeu a audição de 7 (sete) consultores técnicos da área da psicologia ou psiquiatria e sob diferentes vertentes do conhecimento da memória e da avaliação da “credibilidade” e questões relacionadas (e por vezes mais do que um dia como sucedeu com a audição do Sr Professor DZ e do Sr Professor CK que foram ouvidos cada um em três sessões); à audição de 14 (catorze) Peritos (tendo sido pedidos pormenorizados esclarecimentos em relação a Perícias de natureza sexual ou para a avaliação da capacidade de assistentes para prestarem depoimento que foram feitas nos autos); o que importou, em horas úteis de gravação de declarações/depoimentos prestados em Audiência de Julgamento, pelo menos 1.182 (mil cento e oitenta e duas) horas, e em que foi sendo adquirida prova documental que se encontra quer no processo principal (com actualmente 270 volumes e cerca de 65.000 folhas), e nos mais 570 volumes de Apensos (nos quais se incluem por exemplo os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, cópias de registos de vias verdes, talões de Multibanco ou visa, documentos referentes á AX e suas Instalações, livros de registos de ocorrências dos Lares da AX, documentos referentes a prédios mencionados no Despacho de Pronúncia como o prédio sito na Av. (…) n° (…), a moradia sita no (…), prédio sito na Alameda (…), imóvel sito em (…), na Rua (…), e (...)s e habitação do arguido K) - e que foram ouvidas após as declarações dos assistentes, foram ouvidas sempre no contexto de procurar a descoberta da verdade material e não a descoberta da verdade tal como foi escrita no Despacho de pronúncia. Assim, o Tribunal permitiu por ter presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e sua dinâmica espacial ou temporal e o que, em algumas situações, aparentemente se poderia desviar do descrito do despacho de pronúncia - que fossem feitas as perguntas (ou requeridas diligências), quer em relação aos Assistentes, quer em relação às testemunhas, sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. Isto para que, a final, esses testemunhos, valorados também face à prova documental que existe nos autos, pudessem ser efectivamente úteis e contribuir para a descoberta da verdade. Isto é, ou poder dar consistência a declarações dos assistentes quanto a diferentes circunstâncias de tempo ou lugar, que aparentemente resultavam das declarações dos assistentes em relação às circunstâncias de tempo ou lugar descritas no Despacho de pronúncia, ou contribuir para a fragilidade de tais declarações por, por exemplo, não ser verosímil, com explicação racional, que factos imputados aos arguidos pudessem ter ocorrido em circunstâncias de tempo ou lugar diferentes das descritas no Despacho de pronúncia e “no” ou “num” dos sentidos que, numa primeira abordagem, poderia resultar das declarações dos assistentes. Deste modo, a prova testemunhal que venha a ser produzida quanto à circunstância de lugar em causa, também terá que ser vista sempre como mais um elemento probatório a valorar face aos já adquiridos e não como o único e exclusivo contributo probatório. Dito tudo isto e tendo sempre em atenção que está em causa o Tribunal garantir o eficaz exercicio do direito de Defesa do arguido, o que não se confunde com permitir uma forma excessiva de procurar assegurar essa garantia em determinadas situações, a conjugação do dis(...) no art.° 32°, n° 1 e 5 e art.° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, com o dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do C.P.Penal, permite ao Tribunal, no caso concreto, limitar o número de testemunhas a ouvir pelo arguido. Para o efeito o Tribunal: - tendo em atenção que o legislador penal, para crimes que diariamente são julgados nos Tribunais Colectivos, mas em relação aos quais não se pode aplicar o regime de excepção do artº 283º, nº 7, do C.P.Penal – que deve ser sempre avaliado como excepção, sob pena de perder processualmente sentido – entendeu necessário, proporcional e adequado para descoberta da Verdade e boa administração da Justiça o número máximo de 20 testemunhas; - considerando a proporção objectivamente diminuta da factualidade a apurar – a circunstância de lugar –, face à globalidade da factualidade objecto do presente processo, conforme resulta de todo o teor do Despacho de Pronúncia; - e a relatividade, no sentido de não ser exclusivo ou absoluto para a descoberta da verdade, do meio de prova que está em causa produzir e da prova a obter; - e tendo presente toda a actividade probatória já desenvolvida pelo Tribunal e acima já referidas e em que, como já dito, o Tribunal permitiu que fossem feitas as perguntas (ou requeridas diligências), sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia; o Tribunal entende como adequado e proporcional, no caso concreto, limitar o número de testemunhas a ouvir a 10 (dez) testemunhas, 4.2.5. Na sequência do acabado de decidir, o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias – a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tribunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias –, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.367 a 64.380 (em relação aos imóveis sitos na Alameda (…)), ou o que tiver por conveniente. Caso o arguido nada venha a comunicar ao Tribunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas - para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de prédios -, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente. 4.3. Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem: a) ao abrigo do dis(...) no art° 340, n° 1,“a contrario” e no art° 340º, n°4, al b), do C P Penal, por não se revelar necessano para a descoberta da Verdade e de obtenção ImpossíVel, a requerida notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW, que abranja o periodo entre 12/12/98 e 31/07/99; b) ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n° 1 , do CPPenal, “a contrario”, por o Tnbunal não o considerar relevante, nem necessário para proferir uma decisão Justa, objectiva e fundamentada, o Tribunal indefere - a “inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número par (excepto o n° (…)) ou ímpar, situados na Avenida (…), em (…), perto da Zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 1.4.1999 e 31.7.1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também se requer...”; - ou a audição dos porteiros, das pessoas especificamente identificadas e de uma das pessoas que entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Julho de 1999 utilizaram as fracções do n° (…), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 19 fracções), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 12 fracções), dos n°s (…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos n°s. (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…),(…) e (…), do nº (…), dos n°s (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 11 fracções), dos n°s. (…) a (…) , dos n°s. (…) a (…) (especificamente identificadas pelo arguido 10 fracções), do n°. (…), do n° (…), do n° (…), do nº (…), do n° (…), dos n° (…) e (…), do n° (…), dos n°s. (…),(…),(…) e (…) (especificamente identificadas pelo arguido 8 fracções), do n° (…), dos n°s. (…) a (…), do n° (…), dos n°s. (…),(…) e (…), dos n°s. (…) a (…), do n° (…), do n° (…), do n° (…) e do n° (…), da Av. (…); - bem como a requerida determinação de diligências por parte do Tribunal, com vista a identificação de pessoas; - e a junção dos documentos de fls. 64.690 a 64.778 e que digam respeito aos prédios sitos na Avenida (…), conforme requerimento de fls. 63.364 a 64.394. c) ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n° 1, do C.P.Penal, do dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do CPPenal e do art° art° 32°, n° 1 e 5 e art° 20°, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, por tal se revelar necessário para a boa e Justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, o Tribunal defere: - a audição de dez testemunhas, de entre as indicadas pelo arguido a fls. 63.364 a 64.394 e referentes à prova da circunstância de lugar - prédio sito na Alameda (…), número não concretamente determinado, mas situado na lateral dos numeros ímpares da Alameda, - o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias - a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tribunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias -, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.367 a 64.380 (em relação aos imóveis sitos na Alameda (…)), ou o que tiver por conveniente, sendo que caso o arguido nada venha a comunicar ao Tnbunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas - para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de prédios -, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente; - e defere a junção dos documentos de fls. 64.395 a 64.586, que dizem respeito aos prédios sitos na Alameda (…); indeferindo quanto ao demais requerido a fls. 63.364 a 64.394, em relação a diligências referentes aos prédios sitos na Alameda (…). d) Quanto à requerida, a fls. 64.364 a 64.394, leitura das declarações do assistente AK, prestadas em inquérito em 5/5/2003, constantes de linhas 20 a 23 e de 42 e 43 de fls. 4.235, linhas 106 e 107 de fls. 4.237, linhas 165 a 176 de fls. 4.239, linhas 177 a 192 de fls. 4.240, e em 6/05/2003, constantes de linhas 4 a 11 de fls. 4.282 e de linhas 12 a 14 de fls. 4.283, e diligência que tem subjacente um regime processual especifico no art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5, do CPPenal, pelo que na audiência de Julgamento o Tribunal irá dar cumprimento a tal dispositivo legal. 4.4. Após trânsito em julgado do Ponto 4.3, al a), do Despacho que antecede desentranhe os documentos de fls. 64.587 a 64.770 e remeta ao apresentante (…)”. 5. Fls. 64.848 a 64.858 - Arguido K: A fls. 64.848 a 64.858, o arguido K requereu ao Tribunal: a) A titulo de “questão prévia” e em consequência de diligência que comunicou ao tribunal ter feito na zona da Rua (…) e da Rua (…), locais a que se refere a comunicação de alteração não substancial de factos que lhe foi feita pelo Tribunal, nos termos do art° 358°, n° 1 e 2, do C.P.Penal, quanto aos factos descritos no “Ponto 4.4.1.”, fls. 20.896 a 20.898, do Despacho de Pronúncia, se o tribunal se estava a referir apenas a moradias situadas nestas duas ruas, ou se também se estava a referir a qualquer outra moradia situada na confluência dessas ruas ou que com aquelas se cruze; E a título de diligências de prova: b) a leitura de todas as declarações prestadas em inquérito pelos assistentes AT e AP; c) o visionamento em audiência do DVD que contém a deslocação dos assistentes AT e AP à moradia sita na Av. (…), n° (…) , em (…); d) a audição de 99 testemunhas, que identifica pelo nome ou pela qualidade de Legal representante de entidade que identifica a fls. 64.850 a 64.857; e) a audição de todos os proprietários dos imóveis abrangidos “... pelo despacho de comunicação de alterações que … residiram, usaram ou a qualquer título ocuparam os mesmos no período temporal constante do despacho de pronúncia, considerando-se como arrolados pelo ora requerente todos os que venham a ser identificados; f) que o tribunal oficie à Conservatória do Registo Predial de Lisboa e/ou à P.S.P., no sentido de serem identificados todos aqueles que eram proprietários dos imóveis existentes nas ruas abrangidas pelo despacho de comunicação de alterações nos meses de Março e Abril de 2000, bem como os respectivos inquilinos ou utilizadores dos mesmos, a fim de serem ouvidos como testemunhas e que o arguido, desde já, arrola. Na análise e decisão que se segue, quanto às diligências requeridas pelo arguido K, o Tribunal tem sempre como pressu(...) o enquadramento teórico que acima fez nos Pontos “2.”, “2.1” e “2.2”. Assim temos que o arguido K requereu as diligências acabadas de enunciar na sequência “…das alterações dos factos constantes dos pontos 4., 4.1. e 5.2.1. do despacho de pronúncia e nos termos e para os efeitos do dis(...) no art° 358°, n°s. 1 e 2, do C.P.P….”, sendo que no desenrolar do seu requerimento requer efectivamente e exclusivamente, diligências em relação aos factos do “Ponto 4.4.1., fls. 20.896 a 20.898, do Despacho de Pronúncia. 5.1. Começando pela questão que o arguido identifica como “ questão prévia”, a comunicação feita ao arguido e a que se refere o seu requerimento de fls. 64.848 a 64.858, foi a seguinte (cfr. fls. 64.104, Ponto IV): “IV - Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido K: 1. Que os factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.4.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “...casa do arguido K, sita na Rua (…), n° (…),(…), em (…)...”, podem ter ocorrido: - em moradia não concretarnente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”; O Tribunal não limitou a comunicação a moradia que se situasse nas Ruas (…) e na Rua (…). A comunicação abrangeu moradia localizada no (…), No Bairro de moradias em que se situam as Ruas (…) e a Rua (…). E na zona dessas ruas, mas não limitada a localização a uma dessas duas ruas. 5.2. Passando à requerida produção de prova testemunhal, a que consta de fls. 64.848 a 64.858 e da forma abrangente com que acima foi enunciada, o arguido não especificou as razões concretas pelas quais considera relevante ou necessária a audição das “novas testemunhas” arroladas, de modo a que o tribunal possa ponderar as suas “razões concretas” face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Devia tê-lo feito, no entendimento do Tribunal pois, como acima já referi, tal como acontece com a apresentação dos meios de prova ao abrigo do dis(...) no art° 315°, do CPPenal, ou com os meios de prova que venham a ser requeridos no decurso da audiência, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, do CPP, o pedido de produção de meios de prova, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos nos termos do art° 358°, do C.P.Penal e no decurso da audiência, tem de ser acompanhada de uma justificação para os efeitos do art° 340º, do C.P.Penal. Deve alegar o interesse que, em concreto, essa prova tem para determinado núcleo de factos ou para certo facto objecto da comunicação de alterações, de forma a que o Tribunal possa (efectivamente) aferir da necessidade ou eventual relevância dessa prova para o eficaz exercicio da defesa do arguido e, em consequência, para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa. Não basta alegar, em termos genéricos, que a prova se destina a “contribuir para a descoberta da verdade” e para a prova da inocência do arguido na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos, havendo que invocar a concreta razão ou razões pela quais o Requerente considera relevante a realização da diligência, pois tal relevância ou necessidade terá que ser, por sua vez, ponderada pelo Tribunal face a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, face ao enquadramento em que a Defesa do arguido foi exercida no contexto do Despacho de pronúncia e ao enquadramento em que o arguido pretende exercer nova Defesa, à luz e no contexto dos “novos” factos. Só assim se concretiza e dá sentido ao que é ou pode ser em cada situação, a garantia do eficaz exercicio da Defesa do arguido. Depreende-se, contudo, que o arguido apresenta o requerimento para produção da prova testemunhal em consequência da comunicação de possibilidade de alteração dos factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.4.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5° parágrafo e para indagação da determinação da componente espacial dos factos na versão comunicada. 5.2.1. Assim, prosseguindo, e na sequência do enquadramento teórico acima enunciado, não tendo o arguido especificado e dado ao Tribunal as suas razões concretas, tendo presente o que acima ficou dito quanto ao art° 340°, do C.P.Penal e quanto ao princípio da investigação por parte do Tribunal, o Tribunal irá avaliar - face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados -, da necessidade de produção da prova testemunhal agora requerida pelo arguido. A extensão ou complexidade das alterações comunicadas ao arguido e em relação as quais o mesmo vem requerer produção de novos meios de prova - como vimos, em relação a determinação da componente espacial dos factos a alterar - a comunicação consistiu em poder alargar a localização da prática dos factos da “Rua (…), n° (…),(…), em (…)”, para “moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”. O momento ou o local do cometimento de um facto qualificado como crime não é elemento objectivo essencial do crime, embora a alteração do momento possa ter repercussões processuais (por exemplo aplicação da lei em vigor à data da prática dos factos, prescrição). No entanto, esta comunicação de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância do “tempo” ou “lugar” em que os actos poderão ter sido praticados, pode interferir com o exercício eficaz da Defesa do arguido. E interfere, na perspectiva do Tribunal, se em concreto o contraditório que o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu, foram limitados pelo Tribunal, não permitindo que fossem feitas perguntas às testemunhas ou aos assistentes ou limitando o objecto de diligências, de forma a não abranger a circunstância de modo cuja possibilidade de alteração veio a ser comunicada e em relação à qual o arguido esta a requerer a produção de prova - no caso concreto o lugar -, ou se resulta que o arguido não equacionou, por não ser previsível e não lhe ser exigível, o objecto do processo com o âmbito que veio a fazer parte da comunicação de possibilidade de alterações. 5.2.2. Embora o local do cometimento de um crime não seja, como referimos, elemento objectivo essencial do crime, no caso concreto a comunicação que o tribunal fez a fls. fls. 64.104, “Ponto IV”, de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância do “lugar” em que os actos poderão ter sido praticados, no caso concreto pode interferir com o exercicio eficaz da Defesa do arguido. Quando o arguido, no início do julgamento preparou e organizou a sua defesa e quando ao longo do julgamento a desenvolveu, fé-lo tendo como enquadramento um prédio certo e determinado o n° (…) da Rua (…). Isto significou que todas as instâncias que fez e diligências que requereu, foi em função desse enquadramento da circunstância do facto “local”, descrição mais restritiva que aquela que o Tribunal agora veio a comunicar. Assim, se o contraditório que, em concreto, o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu foram limitadas à realidade “n° (…), da Rua (…)”, com a comunicação feita pelo Tribunal de possibilidade de alargamento da realidade factual que o arguido configurou, pode estar, de algum modo, afectado o eficaz exercício da defesa do arguido. Pelo que, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1, do CPPenal e por tal se revelar necessário para a boa e Justa decisão da causa, há que defender a audição de testemunhas, quanto à prova da circunstância de lugar - moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas -, cuja possibilidade de alteração do facto o Tribunal comunicou ao arguido. 5.2.3. Mas neste ponto e face à extensão da prova requerida pelo arguido – cfr. fls. 64.849 a 64.857 -, põe-se uma questão ao Tribunal. Para assegurar e garantir o eficaz exercício da Defesa do arguido e, consequentemente, o Tribunal tem que admitir toda a prova testemunhal que o arguido requer, em relação a todos os edifícios que se situem na Rua (…), Rua (…), ruas confluentes ou que com as mesmas se cruzem? Lembrando o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, há que ter em atenção que na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao o art. 340º, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “… de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC nº 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever - para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova -, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliação criteriosa da efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não … para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptivel de resultar dos factos (…) face à forma como se encontram descritos… “pois”…tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações” (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214, sendo que as partes especialmente realçadas a “bold” são da responsabilidade da relatora deste Despacho). Como já referimos, aquando do conhecimento das diligências de prova requeridas pelo arguidos que antecedem, a celeridade processual em matéria penal também tem dignidade constitucional - art° 32°, n° 2, 2ª parte, da C.R.P., o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da C.R.P., engloba “todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação” (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. I, pag. 516, 4ª edição, Coimbra Editora) e daí o Dever e Poder do Tnbunal do Julgamento, de conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso concreto possam conflituar. Nos presentes autos foi declarada a especial complexidade do processo, o que significa que, por força da conjugação do dis(...) no art° 315°, n° 4 e no art° 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do CPPenal, o número de 20 testemunhas a que se referem os arts° 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al d), do CPPenal, pode ser ultrapassado. E pode ser ultrapassado, diz o art° 283°, nº 7, “desde que tal se afigure necessário para a descoberta da verdade material, designadamente quando tiver sido praticado algum dos crimes referidos no n° 2 do art° 215° ou se o processo se revelar de especial complexidade, devido ao número de arguidos ou ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime”. No caso concreto está em causa produzir prova pelo arguido quanto a uma circunstância de lugar, que o Tribunal prevê a possibilidade de poder vir a deslocar do n° (…) da Rua (…), para moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas. É uma circunstância que não é um elemento objectivo essencial do crime. E é uma circunstância de lugar que, face a toda a factuahdade descrita no Despacho de Pronúncia(…) é uma parte objectivamente reduzida e limitada, face a todo o objecto do processo e a actividade probatória que foi desenvolvida ao longo do julgamento. É desproporcionado face ao art° 32°, n° 1 e 5 e art° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa e mesmo face ao dis(...) no art° 6°, da CEDH, que para a eventual prova de tal elemento objectivo, mas não essencial, da prática do crime, o Tribunal deva e, por conseguinte possa - tendo em consideração também o que resulta do art° 323°, al. a), do CPPenal -, admitir o número de testemunhas que no caso concreto o arguido requer ao tribunal. Acresce que a prova ou não prova da prática do crime imputado ao arguido não depende, unicamente ou directamente, do que em audiência de julgamento pessoas que vivam ou tenham vivido, nas moradias situadas em todas as mencionadas artérias, venham dizer ao Tribunal quanto a terem visto ou não, o arguido K - ou eventualmente os assistentes - em alguma habitação, ou de terem tido conhecimento ou não, do arguido K ter utilizado alguma habitação situada nessas artérias, a titulo precário, acidental, ou outro. Configurando a hipótese, em abstracto, de serem ouvidas 150 ou 200 pessoas em relação a este local ou zona e essas 150 ou 200 pessoas dizerem ao Tribunal que não viram, nem tiveram conhecimento, em circunstância alguma, do arguido ter estado numa habitação nesse local, ou se, em sentido contrário, essas 150 ou 200 pessoas disserem que viram o arguido nesse local, isso implica, necessáriamente ou directamente, que o Tribunal dê como “não provada”, na primeira situação, a prática do crime pelo arguido, ou como “provada” na segunda? No caso concreto, a resposta tem que ser negativa em qualquer uma das situações, pois a decisão que o tribunal venha a tomar quanto aos factos objecto do despacho de pronúncia depende da valoração gobal e conjunta do depoimento das testemunhas, assistentes, arguidos, peritos, ouvidos em audiência de julgamento e da prova documental ou pericial produzida. E todas as testemunhas que foram efectivamente ouvidas em audiência de julgamento - com 734 pessoas efectivamente ouvidas das 990 pessoas arroladas e em que o Tribunal procedeu a audição dos arguidos que quiseram prestar declarações pelo tempo que os mesmos solicitaram (o arguido A prestou declarações ou esclarecimentos pontuais pelo menos em 39 sessões, o arguido C em pelo menos 11 sessões, o arguido H em 16 sessões, o arguido K em pelo menos 3 sessões e o arguido N e a arguida Q em duas sessões); em que o Tribunal procedeu a a audição de 32 assistentes e legal Representante da assistente AX (em que houve Assistentes/Ofendidos - e na sua maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A - que foram ouvidos cada um, em 17 sessões o Assistente AV, 10 sessões AN, 16 sessões AP, 8 sessões AI, 9 sessões AT, 3 sessões X, 5 sessões Y, e a legal representante da AX em 16 sessões); em que o tribunal procedeu à audição de 7 (sete) consultores técnicos da área da psicologia ou psiquiatria e sob diferentes vertentes do conhecimento da memória e da avaliação da “credibilidade” e questões relacionadas (e por vezes mais do que um dia como sucedeu com a audição do Sr. Professor DZ e do Sr. Professor CK, que foram ouvidos, cada um, em três sessões;) audição de 14 (catorze) Peritos (tendo sido pedidos pormenorizados esclarecimentos em relação a Pericías de natureza sexual ou para a avaliação da capacidade de assistentes para prestarem depoimento que foram feitas nos autos); o que importou, em horas úteis de gravação de declarações/depoimentos prestados em Audiência de Julgamento, pelo menos 1.182 (mil cento e oitenta e duas) horas; e em que foi sendo adquirida prova documental que se encontra quer no processo principal (com, actualmente, 270 volumes e cerca de 65.000 folhas) e nos mais 570 volumes de Apensos (nos quais se incluem por exemplo os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, cópias de registos de vias verdes, talões de Multibanco ou visa, documentos referentes á AX e suas instalações, livros de registos de ocorrências dos Lares da AX, documentos referentes a prédios mencionados no Despacho de Pronúncia, como o prédio sito na Av. (…) n° (…), a moradia sita no (…), prédio sito na Alameda (…), imóvel sito em (…), na Rua (…) e (...)s e habitação do arguido K) - e que foram ouvidas após as declarações dos assistente, foram ouvidas sempre no contexto de procurar a descoberta da verdade material e não a descoberta da verdade tal como foi escrita no Despacho de pronúncia. Assim, o Tribunal permitiu - por ter presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e sua dinâmica espacial ou temporal e o que, em algumas situações, aparentemente se poderia desviar do descrito do despacho de pronúncia - que fossem feitas as perguntas (ou requeridas diligências), quer em relação aos Assistentes, quer em relação às testemunhas, sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. Isto para que, a final, esses testemunhos, valorados tambem face à prova documental que existe nos autos, pudessem ser efectivamente úteis e contribuir para a descoberta da verdade. Isto é, ou poder dar consistência a declarações dos assistentes quanto a diferentes circunstâncias de tempo ou lugar, que aparentemente resultavam das declarações dos assistentes em relação às circunstâncias de tempo ou lugar descritas no Despacho de pronúncia, ou contribuir para a fragilidade de tais declarações por, por exemplo, não ser verosímil, com explicação racional, que factos imputados aos arguidos pudessem ter ocorrido em circunstâncias de tempo ou lugar diferentes das descritas no Despacho de pronúncia e “no” ou “num” dos sentidos que, numa primeira abordagem, poderia resultar das declarações dos assistentes. Deste modo, a prova testemunhal que venha a ser produzida quanto à circunstância de lugar em causa, também terá que ser vista sempre como mais um elemento probatório a valorar face aos já adquiridos e não como o único e exclusivo contributo probatório. Dito tudo isto e tendo sempre em atenção que está em causa o Tribunal garantir o eficaz exercício do direito de Defesa do arguido, ou que no se confunde com permitir uma forma excessiva de procurar assegurar essa garantia em determinadas situações, a conjugação do dis(...) no art° 340º, n° 1, do C.P.Penal, com o dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do C.P.Penal e nos art° art°. 32°, n° 1 e 5 e art° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, permite ao Tribunal, no caso concreto, limitar o número de testemunhas a ouvir pelo arguido. Para o efeito o Tribunal: - tendo em atenção que o legislador penal, para crimes que diariamente são julgados nos Tribunais Colectivos, mas em relação aos quais não se pode aplicar o regime de excepção do art° 283°, n° 7, do C.P.Penal - que deve ser sempre avaliado como excepção, sob pena de perder processualmente sentido - entendeu necessário, proporcional e adequado para a descoberta da Verdade e boa administração da Justiça o número máximo de 20 testemunhas; - considerando a proporção objectivamente diminuta da factualidade a apurar - a circunstância de lugar -, face à globalidade da factualidade objecto do presente processo, conforme resulta de todo o teor do Despacho de Pronúncia; - e a relatividade, no sentido de não ser exclusivo ou absoluto para a descoberta da verdade, do meio de prova que está em causa produzir e da prova a obter; - e tendo presente toda a actividade probatória já desenvolvida pelo Tribunal e acima já referida e em que, como já dito, o Tribunal permitiu que fossem feitas as perguntas (ou requeridas diligências), sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia; o Tribunal entende como adequado e proporcional, no caso concreto, limitar o número de testemunhas a ouvir a 10 ( dez) testemunhas. 5.2.4. Na sequência do acabado de decidir, o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias - a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tribunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias -, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.850 a 64.857, ou o que tiver por conveniente. Caso o arguido nada venha a comunicar ao Tribunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas - para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de imóveis -, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente. 5.3. Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem: a) ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1 , do CPPenal, do dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do CPPenal e do art° art° 32°, n° 1 e 5 e art° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, por tal se revelar necessário para a boa e Justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, o Tribunal defere: - a audição de dez testemunhas, de entre as identificadas pelo arguido a fls. 64.850 a 64.857; - o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias - a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tnbunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias -, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.850 a 64 857, ou o que tiver por conveniente, sendo que caso o arguido nada venha a comunicar ou requerer ao Tribunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas - para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de prédios -, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente; - indeferindo quanto ao demais requerido a fls. 64.848 a 64.857 em relação a moradias localizadas no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas. b) Quanto à requerida, a fls. 64.850, leitura “de todas as declarações prestadas em inquérito pelos assistentes AT e AP”, é diligência que tem subjacente um regime processual específico no art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5, do C.P.Penal, pelo que na audiência de Julgamento o Tribunal irá dar cumprimento a tal dispositivo legal. Mas o arguido não indica ao tribunal as fls. dos autos cuja leitura requer, o que tendo em atenção o regime muito especifico do art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5, do CPPenal, se impõe, notificação que o Tribunal faz ao arguido. c) Quanto ao requerido visionamento em audiência de julgamento do DVD que contém a deslocação dos assistentes AT e AP a moradia sita na Av (…), nº (…), em (…), por tal poder ser útil para a boa decisão da causa, no actual momento processual, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1, do CPPenal, o Tribunal defere-o. 6. Fls. 64.990 a 65.002(Arguido H): A fls. 64.990 a 65.002, o arguido Arguido H requereu ao Tribunal: a) a inquirição de 27 (vinte e sete) testemunhas, identificando-as pelos nomes a fls. 64.992 a 64.994; b) que o Tribunal solicite informação às proprietárias do prédio sito na Avenida (…) n° (…) e que identifica, a identificação “… dos inquilinos do prédio nos anos de 1999 e 2000...”; com o objectivo de proceder à respectiva inquirição; c) que o Tribunal obtenha informação acerca dos familiares de DV, que residiu no (…) do prédio sito na Avenida (…) n° (…), a fim de os mesmos serem inquiridos em audiência de julgamento, de forma a esclarecer aspectos da vida da referida enfermeira e da utilização da casa onde habitava, devendo, para o efeito, o tribunal enviar ofício para o Hospital DW, onde a referida DV trabalhou e esteve internada; d) requer a junção de um DVD, de uma entrevista de DV à DS, em Junho de 2003, com filmagem do interior da casa da mesma; e) a notificação do DX, para juntar um contrato de leasing de um empilhador referido pela testemunha DB; f) a inquirição de DU, solicitando ao tribunal diligências com vista a localização do seu paradeiro; g) a inquirição do assistente AP; h) a junção do documento de fls 65.001 a 65.002; i) a inquirição do jornalista DY sobre a “entrevista” a que se refere o documento de fls 65.001 a 65.002. O arguido H requereu as diligências acabadas de enunciar na sequência da comunicação de alteração de factos, nos termos do art° 358°, do CPPenal, que lhe foi feita na audiência de julgamento de 11/01/2010. Diz que as alterações comunicadas não visam directamente factos imputados ao arguido, mas indirectamente dão como indiciados factos que acabam por ter repercurssão nas incriminações que lhe são imputadas, como é o caso do “Ponto 5.2.3.” do Despacho de Pronúncia. 6.1. Começando pelo conhecimento da requerida produção de prova testemunhal, vimos que para fundamentar a necessidade da produção de prova testemunhal o arguido diz que a mesma se justifica “ para desfazer a indiciação de que o assistente AP terá ido ao prédio da Avenida (…) no contexto descrito na alteração efectuada ao ponto 5.2.3…“e que em face desta nova indiciação justifica-se a audição das testemunhas que indica expressa ou globalmente, em relação ao período de tempo que vai de 1998 a 2002, mas com especial relevo para o período 1999/2000. Para a audição de DU, vimos que fundamenta a necessidade de audição no facto de o mesmo ter tido um relacionamento próximo com o assistente AP, sendo relevante o seu depoimento para aspectos da vida do assistente. O tribunal começa por dizer que na análise e decisão que se segue quanto às diligências requeridas pelo arguído H, o Tribunal tem sempre como pressu(...) o enquadramento teórico que acima fez nos Pontos “2”, “2.1” e “2.2”. Assim, contendo o requerimento do arguido, embora de forma reduzida, a especificação de algumas razões concretas pelas quais o Requerente considera relevante ou necessária a audição de “novas testemunhas”, a ponderação do Tribunal quanto a essas necessidade, adequação ou proporcionalidade das diligências, tem que ser feita à luz do enquadramento teórico acima enunciado quanto ao art° 340°, do CPPenal e quanto ao princípio da investigação por parte do Tribunal. Isto é, o Tribunal tem que fazer a sua ponderação face á extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Para, a final, poder concluir pela eventual necessidade de audição de novas testemunhas ou produção de mais meios de prova e pela verificação dos pressu(...)s que levam ao deferimento das diligências. 6.1.1. Analisando a extensão ou complexidade da alteração comunicada ao arguido A pelo Despacho de fls 64.106, “Ponto III” – que reproduziu a comunicação que fora feita anteriormente pelo despacho de fls. 63.685 a 63.687, Ponto III e em relação à qual o arguido H está a requerer a produção de prova, por tal comunicação o afectar, foi a seguinte: “III – Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.909 a 20.910, “Ponto 5.2.3.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.909, 5.º (Quinto) parágrafo e fls. 20.910, 2.º (Segundo) parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em datas em concreto não apuradas, entre finais do ano de 1997 e Setembro do ano de 1999…”, sendo que “…na primeira das referidas ocasiões o menor AP contava 13 anos de idade, sendo que na última já tinha completado 14 anos…”, podem ter ocorrido: - em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e princípio de Abril de 2000; - tinha AP 15 anos de idade”. Assim, a comunicação de alteração traduziu-se em avançar o início do período em que os factos poderão ter ocorrido para finais do ano de 1999, quando o Despacho de pronúncia referia finais do ano de 1997; e em avançar o termo do período em que os factos poderão ter ocorrido para princípio de Abril de 2000, quando o Despacho de pronúncia dizia Setembro de 1999. O momento do cometimento de um facto qualificado como crime não é elemento objectivo essencial do crime, embora a sua alteração possa ter repercurssões processuais (por exemplo, aplicação da lei em vigor à data da prática dos factos, prescrição). No entanto, esta comunicação de (possibilidade) de alteração do elemento relativo à circunstância de “tempo” em que os actos poderão ter sido praticados, pode interferir com o exercício eficaz da Defesa do arguido. E interfere, na perspectiva do Tribunal, se em concreto o contraditório que o arguido exerceu durante a audiência de julgamento e as diligências de prova que requereu, foram limitados pelo Tribunal, não permitindo que fossem feitas perguntas às testemunhas ou aos assistentes ou limitando o objecto de diligências, de forma a não abranger a circunstância de modo cuja possibilidade de alteração veio a ser comunicada e em relação à qual o arguido está a requerer a produção de prova – no caso concreto o tempo –, ou se resulta que o arguido não equacionou, por não ser previsível e não lhe ser exigível, o objecto do processo com o âmbito que veio a fazer parte da comunicação de possibilidade de alterações. 6.2.2. Sucede que, no caso concreto, no ponto “4.3.1.”do Despacho de Pronúncia, fls. 20.892, está imputada directamente ao arguido H a prática de 2 (dois) crimes punidos pelo art.° 172°, n° 1 e 2, do C.Penal, praticados na pessoa do Assistente AT, no prédio sito na Avenida (…), n° (…), em (…). Este é o mesmo local referido a fls. 20.909 a 20.910, “Ponto 5.2.3.”, do Despacho de Pronúncia, a situação em relação à qual foi feita a comunicação de alteração não substancial de factos a fls. 64.106, “Ponto III” e ao abrigo da qual o arguido H veio requerer as diligências de prova em apreciação – embora na situação do “ponto 5.2.3.”, do Despacho de Pronúncia, o arguido H não esteja incriminado, pois apenas o está arguido A. Neste “Ponto 4.3.1.” do Despacho de Pronúncia, fls. 20.892, também é referida a intervenção, embora indirecta, do assistente AP nesses factos e situação, embora não esteja identificado como “ofendido” e dizendo o Despacho de Pronúncia que estes factos ocorreram em dia não apurado de Dezembro de 1999 a Janeiro de 1999 – que é período próximo daquele que foi comunicado e por causa do qual estão a ser requeridas diligências, pois os factos foram comunicados como podendo ter ocorrido “em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e princípio de Abril de 2000”. Lembrando o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, há que ter em atenção que na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao art. 340°, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “…de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…“ (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever – para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova –, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e a efectiva afectação das garantias de defesa do arguido e como estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não (…) para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptivel de resultar dos factos (…) face à forma como se encontram descritos… “pois”… tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações...” (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214, sendo que as partes especialmente realçadas a bold são da responsabdidade da relatora deste Despacho). E, como já referido aquando do conhecimento das diligências de prova requeridas pelo arguidos que antecedem, a celeridade processual em matéria penal também tem dignidade constitucional – art° 32°, nº 2, 2 parte, da C.R.P. –, o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da C.R.P., engloba “todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação”(cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. 1, pag 516, 4 edição, Coimbra Editora) e daí o Dever e Poder do Tribunal do Julgamento, de conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso çoncreto possam conflituar. Ora sucede que em consequência da referida identidade de locais (prédio sito na Av. (…), n° (…), em (…)) e de convergência de participantes nas situações descritas a fls. 20.909 a 20.910, “Ponto 5.2.3.”, do Despacho de Pronúncia, factos em relação aos quais foi feita a comunicação de alteração de factos e no “Ponto 4.3.1.”, fls. 20.892, do Despacho de Pronúncia – nas duas situações AP e AT, embora com diferentes participações em cada uma das situações –, quando o arguido, ao longo do Julgamento, procedeu à audição e inquirição de assistentes, testemunhas ou Peritos que pudessem estar relacionados com a prova deste núcleo de factos, teve a amplitude de as ouvir sempre no contexto de procurar a descoberta da verdade material e não a descoberta da verdade tal como foi escrita no Despacho de pronúncia. Nos presentes autos e conforme já dito, foram efectivamente ouvidas em audiência de julgamento cerca de 734 pessoas – das 990 pessoas arroladas e em que o Tribunal procedeu à audição dos arguidos que quiseram prestar declarações pelo tempo que os mesmos solicitaram (o arguido A prestou declarações ou esclarecimentos pontuais, pelo menos, em 39 sessões, o arguido C em, pelo menos, 11 sessões, o arguido H em 16 sessões; o arguido K em, pelo menos, 3 sessões; e o arguido N e a arguida Q, em duas sessões); em que o Tribunal procedeu à audição de 32 assistentes e legal Representante da assistente AX (em que houve Assistentes/Ofendidos e na sua maioria fazendo parte do grupo dos nove Ofendidos que implicavam factos referentes a todos os arguidos e não apenas ao arguido A – que foram ouvidos, cada um, em 17 sessões o Assistente AV; 10 sessões, AN; 16 sessões AP;8 sessões AI; 9 sessões AT; 3 sessões X; 5 sessões Y; e a legal representante da AX em 16 sessões); em que o tribunal procedeu à audiçâo de 7 (sete) consultores técnicos da área da psicologia ou psiquiatria e sob diferentes vertentes do conhecimento da memória e da avaliação da “credibilidade” e questões relacionadas (e por vezes mais do que um dia, como sucedeu com a audição do Sr. Professor DZ e do Sr. Professor CK, que foram ouvidos, cada um, em três sessões); à audição de 14 (catorze) Peritos (tendo sido pedidos pormenorizados esclarecimentos em relação a Perícias de natureza sexual ou para a avaliação da capacidade de assistentes para prestarem depoimento, que foram feitas nos autos); o que importou, em horas úteis de gravação de declarações /depoimentos prestados em Audiência de Julgamento, pelo menos 1.182 (mil cento e oitenta e duas) horas; e em que foi sendo adquirida prova documental que se encontra quer no processo principal (com, actualmente, 270 volumes e cerca de 65.000 folhas) e nos mais 570 volumes de Apensos (nos quais se incluem, por exemplo, os suportes informáticos com registos de tráfego de telefones, cópias de registos de vias verdes, talões de Multibanco ou visa, documentos referentes à AX e suas instalações, livros de registos de ocorrências dos Lares da AX, documentos referentes a prédios mencionados no Despacho de Pronúncia, como o prédio sito na Av. (…) n° (…), a moradia sita no (…), prédio sito na Alameda (…), imóvel sito em (…), na Rua (…) e (…) e habitação do arguido K) – e todas foram ouvidas, sempre, no contexto de procurar a descoberta da verdade material e não a descoberta da Verdade tal como foi escrita no Despacho de pronúncia. Assim e como se pode aferir pela audição das gravações dos depoimentos de todas as testemunhas ou assistentes, que o arguido considerou importantes para a prova destes factos, ou mesmos quaisquer outras pessoas, o Tribunal permitiu – por ter presente o que foram sendo as declarações dos Assistentes e a memória que foram revelando ao longo dos seus depoimentos, quanto aos factos que declararam ter sido vítimas e dinâmica espacial ou temporal que iam descrevendo e que, em algumas situações, aparentemente se poderia desviar do descrito no Despacho de Pronúncia – que fossem feitas as perguntas ou requeridas diligências, sem limitação que pudesse pôr em causa a possibilidade de investigação de os factos terem ocorrido em períodos ou locais diferentes dos descritos no despacho de pronúncia. Isto para que, a final, esses testemunhos, valorados também face à prova documental que existe nos autos, pudessem ser efectivamente úteis e contribuir para a descoberta da verdade. Isto é, ou poder dar consistência a declarações dos assistentes quanto a diferentes circunstâncias de tempo ou lugar, que aparentemente resultavam das declarações dos assistentes em relação as circunstâncias de tempo ou lugar descritas no Despacho de pronúncia, ou contribuir para a fragilidade de tais declarações por, por exemplo, não ser verosímil, com explicação racional, que factos imputados aos arguidos pudessem ter ocorrido em circunstâncias de tempo ou lugar diferentes das descritas no Despacho de pronúncia e “no” ou “num” dos sentidos que, numa primeira abordagem, poderia resultar das declarações dos assistentes. Casos específicos deste procedimento podem ser aferidos, por exemplo, pela audição dos depoimentos das testemunhas DF (ouvido em 9/11106), EQ (ouvida em 23/11/06), DH (ouvida em 14/12/06), DA (ouvido em 2/11/06), ER (ouvido em 25/06/07), ES (ouvido em 20/11/06), DB (ouvido em 15/11/06 e 20/11/06), DG (ouvido em 9/07/07), ET (ouvida em 31/01/07), testemunhas especialmente ouvidas em relação ao prédio sito na Avenida (…) e das diligências que foram deferidas pelo Tribunal em relação a tais depoimentos, na parte em que importaram a junção de documentos aos autos. Casos especificos destes procedimentos podem ser também aferidos, por exemplo, pela audição das declarações dos assistentes AP e AT, referindo o caso concreto do assistente AP, por também estar requerida pelo arguido a sua (nova) audição. O assistente AP prestou declarações em dezasseis sessões de audiência de julgamento, sendo que foi prestando sucessiva e, por vezes, repetidamente em relação a aspectos parcelares, a todos os sujeitos processuais e ao Tribunal. Foi perguntado, sucessivamente, de forma pormenorizada e minuciosa em relação a todas e diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia – incluindo a situação objecto da comunicação de alteração de factos – e tendo já sido perguntado e dado esclarecimentos, por todo o período abrangido pela comunicação, anterior e posterior. O arguido H, por exemplo, nas sessões de 18/07/05 e 20/07/05 esteve, exclusivamente, a pedir esclarecimentos ao assistente, tendo-os pedidos ainda – embora aí não exclusivamente –, nas sessões de 22/7/05, 25/07/05 e 25/11/05. Na sessão de 18/07/05 – como se pode ouvir pela gravação das declarações –, foi interrogado pela defesa do arguido H quanto aos factos que o despacho de pronúncia diz terem-se passado no prédio sito na Avenida (…) e foi-o sem restrições por parte do Tnbunal quanto a periodos temporais e de forma cuidada, pormenonzada, por parte do Ilustre Mandátario do arguido. Há que considerar que qualquer prova testemunhal ou outra, a determinar quanto à circunstância de tempo ou lugar em causa, resultante da alteração comunicada, também terá que ser vista sempre como mais um elemento probatório a valorar face aos já adquiridos e não como o único e exclusivo contributo probatório. Isto porque está em causa o Tribunal garantir o eficaz exercício do direito de Defesa do arguido, o que não se confunde com permitir uma forma excessiva de procurar assegurar essa garantia em determinadas situações. Este momento processual e renovando de algum modo o já acima dito, é aquele em que o Tribunal tem a possibilidade de avaliar ou ponderar o que resultou de toda a actividade do Julgamento, ao longo do qual, de acordo com as linhas da Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal foi, com o contributo de tudo o que foi requerido e exercido pelos Sujeitos processuais, construindo um encadeado de factos, conhecimentos, reflexões, que acompanhando tais linhas de acusação ou de defesa, permitiriam e permitem ao Tribunal, neste momento, chegar a uma decisão. Assim, à luz da ponderação do conteúdo concreto de toda a prova produzida em audiência de julgamento, do que é a alteração que em concreto foi comunicada ao arguido nos termos do art° 358°, do CPPenal e do que são as inquirições em concreto requeridas, o Tribunal também não considera necessário e útil, para a prova dos factos que são objecto da comunicação (de possibilidade) de alteração feita pelo tribunal em relação ao “Ponto 5.2.3”, fls 20.909 a 20.910, do Despacho de Pronúncia, para a descoberta da Verdade, para a formação da convicção quanto aos factos e para o proferimento de uma Decisão fundamentada e Justa: - a audição das pessoas requeridas pelo arguido H fls 64.990 a 64.997, pontos 6° a 11º, 15° e 16°; - a nova audição do assistente AP, requerida no ponto 16°, de fls. 64.997; - nem, em consequência, as diligências requeridas pelo arguido quanto á obtenção, identificação e nomes de pessoas a inquirir. Nem tal se impõe, na avaliação do Tribunal, para garantia do exercicio do direito de Defesa e do contraditório pois, para o Tribunal, o contraditório que já foi exercido pelo arguido na audiência de julgamento e com a abertura com que o foi, permitiu ao arguido exercer a sua Defesa e este exerceu-a efectivamente, potencializando o que resulta, em termos factuais e de qualificação jurídica, da comunicação (de possibilidade) de alteração não substancial feita ao arguido A no Despacho de fls. 64.106, “Ponto III” – que reproduziu a comunicação que fora feita anteriormente pelo despacho de fls. 63.685 a 63.687, Ponto III –, referente aos factos descritos no “Ponto 5.2.3”, fls. 20.909 a 20.910, do Despacho de Pronúncia e em relação à qual o arguido H está a requerer a produção de prova. 6.3.3. Mas também, por tudo o que antecede, o Tribunal não vê em que medida a requerida junção do documento de fls. 65.001 a 65.002, fotocópia de uma “entrevista” publicada no CX, no dia 6/03/09 – que o arguido diz ser relevante, pelo facto de do mesmo constar que o assistente terá dito que terá havido vítimas que podem ter mentido neste processo –; a junção de um DVD com uma gravação de uma entrevista à DS da DV – em que o arguido diz que a mesma terá sido confrontada com a eventual prática de abusos sexuais na sua casa, cujo interior foi filmado – ou o pedido de documento ao DX – a que o arguido atribui relevância pelo facto de considerar que permite localizar o retorno dos estafetas ao (…) do prédio sito na Avenida (…) em 2003 –, se afigure necessário e útil, para garantir o eficaz exercício de defesa por parte do arguido, em resultado da comunicação que foi feita ao arguido A e em relação a qual o arguido H requer as diligências. Mas aqui e salvo melhor entendimento - e em relação a cada um dos documentos -, o arguido não especifica nem demonstra, o que o artigo de fls. 65.001 a 65.002 traz de relevante para a prova dos “factos novos” objecto da comunicação de alterações, ou mesmo noutro contexto mais amplo não demonstra o que a junção do DVD ou do documento de um empilhador, pode acrescentar de essencial e relevante neste momento processual, tendo em atenção a factualidade objecto da comunicação de alterações no âmbito do art° 358°, do C.P.P. e que fundamenta o pedido de produção de prova complementar. Mas apesar de o arguido não ter demonstrado, suficientemente, a relevância, necessidade ou adequação concreta do que requer, o Tribunal, dentro dos poderes/deveres que decorrem, pelo menos, do art° 340°, do CPPenal e na sequência do enquadramento teórico acima ex(...), avaliará sempre da residual relevância, necessidade ou adequação ao caso concreto do requerido, ponderando a extensão ou complexidade das alterações cornunicadas, o enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados. Tendo sempre em atenção a já referida linha orientadora de garantia/verificação do exercício eficaz do direito de defesa. E o Tribunal: - face ao conteúdo concreto do documento de fls. 65.001 a 65.002; do conteúdo do DVD e do potencial conteúdo do documento a requerer ao DX; - face à alteração de factos que em concreto foi comunicada e na sequência da qual o arguido veio requerer a diligência de prova – que os factos descritos a fls. 20.909 a 20.910, Ponto 5.2.3 do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.909, 5° (Quinto) parágrafo, e fls. 20.910, 2° (Segundo) parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocortido em datas em concreto não apuradas entre finais do ano de 1997 e Setembro do ano de 1999, sendo que na primeira das referidas ocasiões o menor AP contava 13 anos de idade sendo que na última já tinha completado 14 anos, podem ter ocorrido em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e principio de Abril de 2000, tinha AP 15 anos de Idade”, - face ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados – a referida alteração quanto à circunstância tempo, situando a Pronúncia em fins de 1997 a Setembro de 1999 factos que o tribunal diz que poderão ter ocorrido entre finais de 1999 e princípio de Abril de 2000 -, - não tendo o arguido sofrido, por parte do Tribunal, limitação de perguntas ou do âmbito temporal das perguntas ao assistente AP, às pessoas que prestaram depoimentos em relação ao prédio sito na Avenida (…), ou às pessoas que conviveram com o assistente, familiar, educandos, educadores, trabalhadores ou dirigentes da AX, (...)s ou Lares, e que depuseram quanto á sua vivência, personalidade ou comportamento, tendo permitido a inquinção em relação a todo o período em que o Assistente esteve na AX; - que o tribunal já procedeu em audiência de julgamento às declarações que a DV prestou neste autos ainda em sede de inquérito, diligência que, essa sim, potenciará obter prova por meio processualmente adequado e próprio, no sentido pretendido pelo arguido; - os documentos que já se encontram nos autos a, por exemplo, fls. 1.430 (Planta da Av. (…), a que se refere o auto de fls. 1.429); fls. 1.431: fotografia da casa da Av. (…), a que se refere 1.429 e 1.430; fls. 1.432: fotografia da porta verde a que se refere fls. 1.431; fls. 1.433: fotografia da porta do (…) andar a que se refere fls. 1.429; fls. 2.003 a 2.008: certidão da CRP referente ao prédio Av. (…); fls. 2.026: croqui do (…) andar (…) da Rua (…) (a que se refere a busca de fls. 2.025); fls. 2.142 e segs., reportagem fotográfica do (…) andar (…) da Rua (…) (a que se refere a busca de fls. 2.025, feita em 25/02/03); fls. 2.149 a 2.166: fotografias do interior Av. (…), lote (…),(…) Frente; fis. 2.268: certidão DGI, Av. (…), lote (…),(…) andar, letras (…),(…),(…),(…); fls. 18.185: foto das portas da Av. (…); fls. 19.162: Planta do local a que se refere o auto de fls. 19.160; fls. 19.163: fotog. de exterior Av (…); fls. 19.164: fotog. da porta da (…) n° (…) das (…); fls. 19.165: fotog. das traseiras do n° (…) da Av. (…); fls. 38.070 a 38.084: Processo licenciamento do prédio da Rua (…), Lote (…), n° (…); Fls. 42.605 a 42.613: Junção de documentos pela testemunha DH; fls. 41.387/9: Contrato arrendamento da DC, fracção (…), correspondente ao (…) Loja, do Lote (…), Bloco (…), Av. (…), com início em 1/1/92 e autorização de Obras de 21/1/92; fls. 41.394: Contrato arrendamento da DE, correspondente ao (…), Av. (…), Bloco (…), Lote (…), com data 1/1/87; fls. 41.391: Contrato arrendamento da LLZ, Fracção (…), correspondente à Loja, com entrada pelo (…) a (…), da Av. (…), torneando para a Rua (…), n° (…), com data 2/2/98; fls. 41.522 a 41.539: Documentos entregues pela testemunha DF, referentes à Av. (…),(…),(…), orçamento de 18/05/01 ...escritura de Mútuo de 15/10/01; fls. 41.390, contrato arrendamento LLZ, fracção designada pela letra (…), Av. (…), Bloco (…), Lote (…),(…), com início em 1/10/95; fls. 41.396 a 41.401: escritura de arrendamento à DE, (…) andar (…), Av. (…), Bloco (…), Lote (…), Fracção (…), com inicio em 1/06/86; fls. 41.562: documento referente a contrato de Trabalho da test. DG, com LLZ, 1/1/95;(Av. (…), Bloco (…), Lote (…),(…)); fls. 41.563: documento referente a contrato de trabalho feito pela DE, 1/11/96; Av. (…), Bloco (…), Lote (…),(…)); fls. 41.564: documento referente a contrato de trabalho feito pela DE, com início em 1/1/89; fls. 41.565: documento referente a contrato de trabalho feito pela LLZ, 1/1/95; fls. 41.566: documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, 1/1 1/96; fls. 41.567: documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, com início em 1/1/89; fls. 41.568/9: documento referente a declaração de remunerações para 55, pela DE, mês Maio de 2002; fls. 41.570: documento referente a declaração IRC, DC, 28/04/99; fls. 41.571: documento referente a Modelo 10, DC, rendimentos 1998; - e face a toda a demais prova que ao longo do Julgamento, de acordo com as linhas de Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal foi determinando e foi sendo adquirida; o Tribunal não vê em que medida o documento de fls. 65.001/65.002, a junção do DVD requerida, o pedido de documento ao DX, se revele útil e necessário para a descoberta da verdade, para a formação da convicção do Tribunal quanto aos factos a decidir e para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada. Nem se impõe, no entendimento do Tribunal, por razão de garantia de direito de Defesa, em consequência da comunicação que em concreto foi feita, de possibilidade de alteração de factos do objecto do processo. 6.4. Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1 , do CPPenal, “a contrario”, por o Tribunal não o considerar relevante, útil, nem necessário para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada, nem se impondo para efectivar o eficaz direito de defesa do arguido, em consequência da comunicação da possibilidade de alteração de factos, o Tribunal indefere: a) a inquirição de 27 (vinte e sete) testemunhas, identificadas a fls. 64.992 a 64.994; b) o pedido de informação às proprietárias do prédio sito na Avenida (…) n° (…) e que identifica, a identificação “… dos inquilinos do prédio nos anos de 1999 e 2000…”; com o objectivo de proceder à respectiva inquirição; c) o pedido de informação acerca dos familiares de DV, que residiu no (…) do prédio sito na Avenida (…) n° (…), a fim de os mesmos serem inquiridos em audiência de julgamento, de forma a esclarecer aspectos da vida da referida enfermeira e da utilização da casa onde habitava, devendo, para o efeito, o tribunal enviar ofício para o Hospital DW, onde a referida DV trabalhou e este internada; d) a junção de um DVD, de uma entrevista de DV à DS, em Junho de 2003, com filmagem do interior da casa da mesma, e) a notificação do DX, para juntar um contrato de leasing de um empilhador referido pela testemunha DB, f) a inquirição de DU, 9) a inquirição do assistente AP, h) a junção do documento de fls. 65.001 a 65.002, i) a inqüirição do jornalista DY sobre a “entrevista” a que se refere o documento de fls 65.001 a 65.002, 6.5. Após trânsito em julgado do Despacho que antecede desentranhe o documento de fls. 65.001 a 65.002 e DVD e remeta ao apresentante (…)”. 15.4. Analisando Conforme acima se deixou ex(...), a primeira das questões a apreciar no presente recurso diz respeito à alegada violação dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, na medida em que as alterações de factos que foram comunicadas aos arguidos E, C e K devem ser qualificadas como substanciais e não como não substanciais ou simples, como considerou o Tribunal recorrido. As alterações em causa são as que foram comunicadas aos arguidos nas sessões de julgamento ocorridas em 23 de Novembro de 2009 e 14 de Dezembro de 2009, e posteriormente reiteradas, ainda que com nova fundamentação, nas sessões de julgamento de 18 de Dezembro do mesmo ano e de 11 de Janeiro de 2010, a saber: A – Quanto ao arguido E: “Factos relativos ao Assistente AK, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido E: 1. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.888, último parágrafo e fls. 20.889, 1° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num Sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade…”, tendo, após o jantar, o arguido E pro(...) que se dirigissem para uma casa de que “…tinha a disponibilidade, sita na Alameda (…), n° (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, numa Sexta-feira ou num Sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive); - em prédio localizado na Alameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os numeros ímpares; - local para onde, após o jantar, o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC; 2. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.889, penúltimo parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta feira…”, numa casa de que o arguido E “…tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999; - numa casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…) (…), local onde o arguido E se encontrava quando o Assistente AK aí foi; 3. Que os factos descritos a fls. 20.887 a 20.892, “Ponto 4.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.890, 10° parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “…dias depois…” da situação referida no ponto “2.” que antecede, “... ainda em Junho do ano 2000...”, podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, mas situado no período das férias escolares do Verão de 1999”. Antes do mais cumpre salientar que estes três factos objecto de comunicação vieram a ser dados como provados no acórdão final (cf. fls. 66.563 a 66.566 dos autos), motivo pelo qual o recurso inter(...) pelo arguido mantém actualidade e interesse. B – Quanto ao arguido C: “II – Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao arguido C: 1. Que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.876, 3º (terceiro parágrafo), factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido “… num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade…” podem ter ocorrido: - em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; 1.1. Em consequência da comunicação que antecede, que os factos descritos a fls. 20.876 a 20.881, “Ponto 4.1.1., do despacho de Pronúncia, podem integrar: - não a prática de um crime p. e p. pelo artº 166º, nº 1 e 2, do C. Penal, mas a prática de um crime p. e p. pelo artº 166º, nº 1, do C. Penal, na versão em vigor à prática dos factos, sem prejuízo da aplicação da lei mais favorável, nos termos do artº 2º, do C. Penal”. Este facto, objecto de comunicação de alteração, veio assim a ser dado como provado no acórdão final (cf. fls. 66.556), pelo que a questão colocada pelo arguido no seu recurso mantém efectivo interesse. C – Arguido K “IV – Factos relativos ao Assistente AT, em que é imputada a prática de crime(s) ao Arguido K: 1. Que os factos descritos a fls. 20.896 a 20.898, “Ponto 4.1.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.896, 5º parágrafo, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “… casa do arguido K, sita na Rua (…), n.º (…),(…), em (…)…”, podem ter ocorrido: - em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas”; II – Factos relativos ao Assistente AP, em que é imputada a prática de crime(s) ao Arguido A: 1. Que os factos descritos a fls. 20.906 a 20.907, “Ponto 5.2.1.”, do Despacho de Pronúncia, concretamente o que consta a fls. 20.906, 6º (sexto) parágrafo” e fls. 20.907, 1º (primeiro) parágrafo”, factos que o Despacho de Pronúncia diz terem ocorrido na “… em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998 …”, sendo que o AP “… à data tinha 13 anos de idade …”, podem ter ocorrido: - em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998; - tinha o AP 12/13 anos de idade”. Tais factos vieram, igualmente, a ser dados como demonstrados no acórdão final (cf. fls. 66.570 e 66.576), pelo que também quanto a este arguido se mantêm pertinentes as questões suscitadas em sede de recurso interlocutório, muito embora de forma mais directa na primeira situação do que na segunda, que a si não diz directamente respeito. O cerne desta – sem dúvida díficil e controversa – questão passa pela definição do que deve entender-se por alteração substancial dos factos. Para o arguido E – bem como para os arguidos C e K, que aderiram, no essencial, à argumentação expendida por aquele –, para demonstrar a qualificação das alterações como substanciais, importa determinar, essencialmente, o que é a imputação de um crime diverso, recorrendo ao dis(...) nos arts. 1.º, n.º 1, do CP, e 283.º, n.º 3, al. b), do CPP. Na essência, defendem que só as alterações temporais e espaciais que não invadirem o núcleo do tempo e do lugar dos crimes imputados devem, em princípio, ser qualificadas como não substanciais, o que não aconteceria relativamente às supra mencionadas alterações. O Tribunal recorrido, por seu turno, considerou que o ponto de partida essencial para a definição de uma alteração de factos como substancial ou não substancial passa pela definição constante do art. 1.º, al. f), do CPP, concluindo que se ocorrer: - diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, - que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, - ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual; - e que determine a imputação de crime diverso - ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis; temos uma alteração substancial de factos, com a aplicação do dispositivo do art. 359.° do CPP. Já uma alteração não substancial de factos significaria: - uma divergência ou diferença de identidade, - que não transformam o quadro factual da acusação em outro diverso no que se refere a elementos essenciais, - mas apenas de modo parcelar e mais ou menos pontual e sem descaracterizar o quadro factual da acusação, - e que, de qualquer modo, não tem relevância para alterar a qualificação penal ou para a determinação da moldura penal. Vejamos se assim é e em que medida tais considerações nos permitem solucinar a questão. O art. 1.º, al. f), do CPP define alteração substancial dos factos como “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.” É importante, desde logo, que se tenha presente que “Alteração (dos factos constantes na acusação) quer significar que ainda há-de corresponder a uma variação dos mesmos factos, a qualquer coisa reconhecível como uma mudança naqueles factos e não outros factos que não tenham qualquer ligação com aqueles. A disposição do Código de Processo Penal que vimos analisando só se refere a alterações dos factos e não a factos novos que nada tenham a ver com os que constam do processo. Em relação a estes, é evidente que só um novo processo pode existir” (Teresa Beleza, Apontamentos de Direito Processual Penal, Tomo III, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1995, pág. 94). E não há dúvidas de que o que está em discussão neste caso são alterações aos factos constantes do despacho de pronúncia e não novos factos que nada tenham a ver com os que já constavam daquela peça processual. Na verdade, veio a considerar-se que tais factos terão indiciariamente ocorrido, mas com alguma/s diferença/s do exacto contexto referido no despacho de pronúncia. Não se trata, inequivocamente, da descoberta de novos factos, mas sim de alterações aos já inicialmente indiciados. Conforme refere Paulo Pinto de Albuquerque, no seu Comentário do Código de Processo Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (ed. Universidade Católica Editora, págs. 37 a 41), naquela que entendemos ser uma possível delimitação dos conceitos e figuras processuais em causa, “a alteração substancial dos factos é uma noção complexa e deve ser delimitada em função da alteração não substancial dos factos e da alteração da qualificação jurídica dos factos. A noção legal de alteração substancial dos factos é composta pelos seguintes requisitos: a. A alteração substancial dos factos é uma alteração dos “factos”. Portanto, uma alteração da qualificação jurídica sem que haja qualquer modificação dos factos da acusação ou da pronúncia não está submetida ao regime dos artigos 359 e 303, n.ºs 3 e 4, mas antes ao regime do artigo 358, n.º 3, e do artigo 303, n.º 5 (desde logo, acórdão do STJ de 8.1.1992, in CJ, XVII, 1, 5, 1 acórdão do STJ de 27.5.1992, in CJ, XVII, 3, 40). b. A alteração substancial dos factos é uma alteração dos factos relevantes para a “imputação” de um crime ou a “agravação dos limites máximos” das sanções aplicáveis. Isto é, só constitui alteração substancial dos factos a modificação que se reporte a factos constitutivos do crime e a factos que tenham o efeito de imputação de um crime punível com uma pena abstracta mais grave. A modificação dos restantes factos que constem da acusação constitui alteração não substancial dos factos, desde que sejam relevantes para a decisão da causa (…). c. A alteração substancial dos factos é uma alteração dos factos que tem por efeito uma agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis. A lei exige que se faça uma ponderação do conjunto das “sanções aplicáveis” e não apenas da moldura abstracta da pena de prisão aplicável. A agravação das sanções aplicáveis pode ter lugar mesmo que não haja “crime diverso”, uma vez que os critérios da al. f) do n.º 1, do artigo 1 são alternativos. Assim, há alteração substancial dos factos por agravação das sanções aplicáveis nos seguintes casos: i. A adição de factos novos à acusação que tenha o efeito de agravar os limites máximos das sanções aplicáveis ou ii. A subtracção de factos da acusação que tenha o efeito de agravar os limites máximos das sanções aplicáveis, como, por exemplo, no caso de imputação de um crime continuado e condenação pela pluralidade de crimes, por não se terem provado os factos que atenuavam a culpa (acórdão do STJ, de 3.4.1991, in CJ, 1991, 2, 17, mas diferentemente acórdão do STJ, de 16.12.1995, in CJ, 1995, 1, 221, considerando, sem razão, que há apenas alteração da qualificação jurídica). d. A alteração substancial dos factos é uma alteração que tem o efeito da imputação ao arguido de um crime diverso. O critério da “diversidade” do crime só tem utilidade prática no caso de o “crime diverso” ser punível com as mesmas sanções ou com sanções de gravidade inferior às sanções previstas para o crime da acusação ou da pronúncia, uma vez que, sendo o crime novo punível com sanções mais graves, funciona desde logo o critério da “agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”. A “diversidade” do crime afere-se da seguinte maneira: i. Não há crime diverso quando os factos novos pertencem ao mesmo “facto histórico unitário” (…), com(...) por todas as acções do agente que tenham “um conteúdo ilícito semelhante e uma estreita continuidade espacio-temporal” (…). ii. Não há crime diverso em face da mera alteração das circunstâncias da execução do crime (incluindo o dia, hora, local, modo de execução e instrumentos do crime), desde que essas circunstâncias não constituam elementos do tipo legal, nem constituam um outro “facto histórico unitário”; trata-se então de uma mera alteração não substancial dos factos (…). iv. Não há crime diverso se o bem jurídico protegido pelo tipo criminal imputado na acusação abranger o bem jurídico protegido pelo tipo criminal resultante dos factos novos: trata-se então de uma alteração não substancial dos factos (…). v. Não há crime diverso se não se provarem os factos da acusação com a consequência da absolvição de alguns dos crimes imputados ou a condenação por crimes de menor gravidade: não há então sequer alteração não substancial dos factos (…)”. Daqui se retira, desde logo, um princípio de definição de alteração substancial dos factos, que resulta da distinção clara dessa figura da da mera alteração da qualificação jurídica e da da alteração não substancial de factos. Em primeiro lugar (e sem prejuízo de essa ter sido mais remotamente uma questão bastante controvertida na nossa doutrina e jurisprudência), sempre que não ocorra qualquer alteração de factos, mas apenas da qualificação jurídica, não se coloca a questão dessa alteração ser substancial ou não. Estaremos apenas perante uma simples alteração de qualificação jurídica, a qual implica que se dê cumprimento ao dis(...) no art. 358.º, n.º 3, do CPP, caso ocorra – como aconteceu no caso vertente – na fase de julgamento. Somente nas situações em que ocorra qualquer tipo de alteração de factos é que devemos equacionar se ela deve ser qualificada como substancial ou não substancial. Nesse particular, o segundo segmento da norma do art. 1.º, al. f), do CPP, é o que oferece menos dúvidas interpretativas, sendo certo que estamos perante critérios alternativos e não cumulativos. A alteração substancial dos factos pode resultar da imputação de um crime diverso (critério material) e/ou de agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis (critério formal). Sempre que a alteração de factos tiver por efeito a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis estamos perante uma alteração substancial de factos (sem necessidade de reflectir se estamos perante um crime diverso). Para esse efeito, terá que se fazer uma ponderação do conjunto das “sanções aplicáveis” e não apenas da moldura abstracta da pena de prisão aplicável. No entanto, as situações em que tal pode ocorrer são de verificação relativamente simples. É o primeiro segmento da norma – o que se reporta à imputação de um crime diverso – aquele que constitui o núcleo da questão que aqui pretendemos dilucidar e também aquele que traz maiores dificuldades interpretativas, tomando como assente (como o faz a generalidade da nossa doutrina e jurisprudência) que crime diverso não significa «tipo legal» de crime distinto. Para o autor que acabámos de citar, verificar-se-á um crime diverso quando as alterações de factos se reportem a elementos constitutivos do tipo de crime, não havendo crime diverso quando os factos novos pertencem ao mesmo “facto histórico unitário”, com(...) por todas as acções do agente que tenham “um conteúdo ilícito semelhante e uma estreita continuidade espacio-temporal”, assim como quando se está perante meras alterações das circunstâncias da execução do crime (incluindo o dia, hora, local, modo de execução e instrumentos do crime), desde que essas circunstâncias não constituam elementos do tipo legal, nem constituam um outro “facto histórico unitário”. Nestas situações estaremos perante uma mera alteração não substancial dos factos. Mas não deixaremos de aprofundar mais a análise desta temática, porventura das mais difíceis do nosso processo penal, tendo em vista consolidar a solução a que iremos chegar. É, aliás, profusa quer a obra doutrinal quer os elementos de jurisprudência existentes sobre a matéria, como facilmente se constata pelas citações realizadas nas alegações de recurso dos arguidos, na resposta do Ministério Público e na própria decisão recorrida (e que aqui pontualmente abordaremos, na medida em que tal se assuma como relevante). Sendo, porém, relativamente simples, do ponto de vista teórico, optar por uma determinada solução, concretizar o que sejam elementos constitutivos de um determinado tipo de crime ou o que seja o mesmo facto histórico-unitário, numa certa realidade de facto, já se apresenta como uma operação muito mais complexa. Aliás, o próprio arguido E, nas suas alegações de recurso (cf. fls. 64123) “adere à determinação, constante de fls. 63923, do que para o Tribunal é uma alteração substancial de factos”. O mesmo acontece com os outros dois arguidos que o acompanham. Mas depois já discordam do Tribunal quanto ao que deva ser entendido por crime diverso, defendendo, como já se mencionou, que sempre que se altere a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado não é mantida a imputação do mesmo crime. No fundo, embora aderindo, em abstracto, à definição de alteração substancial dos factos defendida pelo Tribunal a quo, os arguidos referidos acabam por ter um entendimento diverso na concretização dessa definição geral. Sabemos já que, na procura da resposta a esta questão trazida ao tribunal de recurso pelos arguidos E, C e K – a de saber se as alterações de factos que lhe foram comunicadas são substanciais ou não – iremos pelo caminho certo se ponderarmos se as alterações comunicadas constituem um crime diverso do constante do despacho de pronúncia ((...) que não implicam um agravamento das sanções aplicáveis). Isso requer, em concreto, que se conclua se: - a comunicação de que, em vez de se considerar que os factos aconteceram em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade, tendo, após o jantar, o arguido E pro(...) que se dirigissem para uma casa de que tinha a disponibilidade, sita na Alameda (…), n° (…), em (…), podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, numa sexta-feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive), em prédio localizado na Alameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os numeros ímpares, local para onde, após o jantar, o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC; - a comunicação de que factos ocorridos em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta feira, numa casa de que o arguido E tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…), podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999, numa casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…), local onde o arguido E se encontrava quando o assistente AK aí foi; - a comunicação de que factos ocorridos dias depois da situação referida no ponto “2.” que antecede, ainda em Junho do ano 2000, podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, mas situado no período das férias escolares do Verão de 1999; - a comunicação de que factos ocorridos num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade; - a comunicação de que factos ocorridos na casa do arguido K, sita na Rua (…), n.º (…),(…), em (…), podem ter ocorrido em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas; - a comunicação de que factos ocorridos em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998, sendo que o AP à data tinha 13 anos de idade, podem ter ocorrido em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998, tinha o AP 12/13 anos de idade; constitui a comunicação ou não de crimes diversos (sendo certo que a quarta situação referida implica também uma alteração de qualificação jurídica, ainda que mantendo-se no mesmo tipo legal de crime). Aquilo que está em causa, nestas seis situações objecto do recurso dos três mencionados arguidos é pois: 1.º - uma alteração da data, de factos ocorridos em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num sábado à noite, para dia não concretamente apurado, numa sexta-feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive), e simultaneamente, uma alteração de localização, de uma casa sita na Alameda (…), n° (…), em (…), para um prédio localizado na Alameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os números ímpares (arguido E); 2.º - uma alteração de data, de factos ocorridos em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta feira, para um dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999, simultaneamente com uma alteração de localização, de uma casa sita na Avenida (…), em (…), para uma casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…) (arguido E); 3.º - uma alteração de data, de dia ainda em Junho do ano 2000, para dia não concretamente apurado, mas situado no período das férias escolares do Verão de 1999 (arguido E); 4.º - uma alteração de data, de dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, para dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha o menor 13/14 anos de idade (arguido C); 5.º - uma alteração de localização, de factos ocorridos na casa do arguido K, sita na Rua (…), n.º (…),(…), em (…), para moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas (arguido K); 6.º - uma alteração de data, de dia em concreto não determinado de meados do ano de 1998, sendo que o AP à data tinha 13 anos de idade, para data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998, tinha o AP 12/13 anos de idade (arguido K). E a conclusão a que o tribunal tem de chegar é a de saber se tais situações concretas se traduzem ou não numa alteração de seis dos concretos crimes imputados aos arguidos E, C e K, mormente os que têm na sua base esta factualidade a que nos vimos referindo, transformando-os em crimes diversos dos que lhes foram imputados pelo despacho de pronúncia (e não em diferentes tipos de crime, (...) que, como já se salientou, não é isso que aqui está em causa). Impõe-se, desde logo, que se deixe expresso que nos autos foram realizadas muitas outras comunicações de alterações de factos (relativas a outros arguidos), de natureza análoga a estas que agora apreciamos, tendo todas elas sido consideradas e tratadas pelo Tribunal recorrido como alterações não substanciais de factos. Tais arguidos não apresentaram recurso (admissível) tendo por objecto discutir a qualificação das alterações que lhes foram comunicadas como substanciais ou não substanciais, motivo pelo qual é de ter por assente que todas as demais alterações comunicadas aos restantes arguidos, ainda que em situações similares às agora em apreço, são alterações não substanciais de factos. Mas ainda que da presente discussão pudesse resultar uma situação de tratamento desigual para situações similares, o que é certo é que os três referidos arguidos, porque apresentaram o recurso com o objecto ex(...), terão de ver a sua pretensão apreciada. Voltemos, pois, ao ponto crucial desta nossa reflexão, qual seja o de saber o que deve ser entendido como imputação a um arguido de um crime diverso. Contudo, esta questão aparentemente singela, envolve a consideração de aspectos mais amplos do nosso sistema processual penal, designadamente dos que se referem ao princípio do acusatório e à definição do objecto do processo penal, uma vez que aquilo que aqui tratamos é da alteração ou possibilidade de alteração desse mesmo objecto, ainda que nem todos os autores estejam de acordo quanto à inteira identidade de situações que conduzem à alteração de factos e do objecto do processo. Seguiremos aqui a resenha que Frederico Isasca faz relativamente à definição de objecto do processo, num dos seus trabalhos publicados. “Ao longo deste século, a doutrina e no seu seguimento a jurisprudência, tanto nacionais como estrangeiras, têm oscilado entre formulações ora de acentuado cariz naturalístico, ora normativista do objecto do processo. Historicamente mais antiga e na esteia da MAX BERNER, a concepção naturalística entendia o objecto do processo como um acontecimento histórico concreto, delimitado no tempo e no espaço, sem qualquer referência normativa: o facto histórico era a acção naturalística apenas unificada por critérios psicológicos. Posteriormente, von LISZT e BELING emprestaram-lhe valioso contributo. O acontecimento histórico como e enquanto objecto do processo, passa a ser entendido, não como um acontecimento concreto, real e efectivamente verificado, mas antes como um acontecimento da vida hipoteticamente pensado (Lebensangelegenheit), cuja reconstituição ou verificação é exactamente a tarefa do processo penal, o qual recebe agora um decisivo complemento: a imprescindível referência normativa que legítima a própria acção penal. E logo implícitas vão aqui duas ideias fundamentais: a hipoteticidade do juízo de verificação do facto e o correspondente enquadramento jurídico. Ambos em plena concordância com dois postulados constitucionais: a presunção de inocência e o princípio da legalidade. Próximas desta concepção foram, entre nós, as posições, primeiro de BELEZA DOS SANTOS, e posteriormente de CAVALEIRO FERREIRA. Referindo-se ao objecto do processo, escrevia este citado autor (1988: Vol. I, p. 33): “É o facto na sua existência histórica que importa averiguar e cuja verificação é pressu(...) da aplicação da lei penal”. E noutro passo da sua obra (1980: p.161) logo acrescenta: mas “há que distinguir entre o conceito de facto conforme ele é descrito na lei e o facto que preenche esse conceito, o facto cometido pelo agente (…) a que se aplica a lei, é uma realidade concreta; contudo, a lei só se aplica, enquanto o facto concreto, real, é por ela conceptualizado”. (…) Diametralmente oposta e inserindo-se num discurso de matiz valorativo e de clara influência neo-Kantiana, portanto de irredutibilidade entre a realidade física ou ontológica e o mundo dos valores e consequentemente negando qualquer correlação entre eles, entendia EDUARDO CORREIA (…) o conceito de objecto do processo nos seguintes termos: “A realidade, mais precisamente, um comportamento dum sujeito nas suas relações de coincidência ou não coincidência com um facto representado, é, pois, o verdadeiro objecto processual, ou seja, aquilo sobre que incide a investigação. Ele não é, assim, a representação de um facto, nem a realidade, mas a investigação das relações positivas ou negativas de coincidência entre uma e outra”. (…) Para CASTANHEIRA NEVES o objecto do processo será o problema jurídico-criminal do caso concreto, colocado ao tribunal e que este terá de resolver. E nesta conformidade, afirma o citado autor (1968: p. 259): o objecto do processo é “o problema jurídico-criminal que suscita um certo caso”. E explicita: “é um caso porque nele se põe um problema; é concreto porque esse problema se põe numa certa situação e para ela; é jurídico porque desta emerge um sentido jurídico, o problemático sentido jurídico que o problema lhe refere e que nela ou através dela se assume e para o qual ela se individualiza como situação (como o dado correlativo que oferece o âmbito e o conteúdo relevante)”. (…) A definição e delimitação do objecto do processo é a charneira entre o interesse público na perseguição do crime e na aplicação do direito, ou seja na pronta reposição dos valores de que o arguido é acusado de ter violado com um certo comportamento que se lhe imputa e os direitos inalienáveis que lhe assistem e que passam necessariamente pela possibilidade de uma defesa eficaz. O que implica, não só o reconhecimento, como o integral respeito pelos princípios da identidade, da indivisibilidade e da vinculação temática que corporizam a estrutura acusatória do processo penal e que portanto inviabilizam a imputação e/ou condenação por factos não conhecidos pelo arguido e dos quais não se possa consequentemente defender. Em face da questão em análise, estes são os postulados metodológicos fundamentais que justificam, num processo de estrutura basicamente acusatória, a necessidade de fixação do seu objecto. Mas este horizonte logo se perde e com ele aquela aludida estrutura, quando a delimitação do objecto do processo se afere por referências exclusivas ou predominantemente normativas. Nesta conformidade, afigura-se-nos prudente, se não mesmo necessário, tomar o centro polarizador do objecto do processo na materialidade fáctica carreada pela acusação. E é neste exacto sentido que se pronuncia, se bem interpreto o seu pensamento, FIGUEIREDO DIAS ao afirmar que “o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo esta que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consumpção do processo penal (…), os valores e interesses subjacentes a esta vinculação (…) constituem o cerne de um verdadeiro direito de defesa do arguido e deixam transparecer os pilares fundamentais em que se alicerça um Estado que os acolhe”. Penso não estar em dissonância com a melhor doutrina, quer estrangeira, quer nacional, se afirmar que o objecto do processo é o acontecimento histórico, o assunto ou pedaço unitário da vida, vertido na acusação e imputado, como crime, a um determinado sujeito (…)” (Alteração da qualificação jurídica e objecto do processo, Estudos Comemorativos do 150º Aniversário do Tribunal da Boa-Hora, Ministério da Justiça, 1995, págs. 236 a 241). Ou, segundo Leones Dantas, “hoje o processo é entendido como um todo, desde a notícia do crime que lhe marca o início até à execução da decisão que venha a ser proferida (…) e visto o processo como um todo, a questão do objecto não é pois uma questão de instrução ou do julgamento, mas uma questão de todas as fases do processo (…). Uma das implicações do princípio da acusação é a vinculação temática do tribunal à conformação do caso submetido à sua apreciação pela entidade que a solicita. Assim, o tribunal terá de se mover na apreciação do caso nos parâmetros que são definidos por uma entidade que lhe é estranha. Este princípio pretende acautelar o arguido de novas imputações surgidas no âmbito da actividade do tribunal, o que lhe retiraria a possibilidade de estruturar a sua defesa em relação às mesmas. Contudo, embora o processo penal tenha uma estrutura basicamente acusatória, ele não é um processo acusatório puro. Daí que o legislador não tenha deixado o juiz na completa dependência dos sujeitos processuais relativamente às diligências tendentes ao esclarecimento dos factos sobre os quais irá formular a sua decisão. (…) Ao processo penal estão subjacentes preocupações de justiça que impõe uma mais completa indagação da verdade permitindo que a versão dos factos construída no processo e a realidade se aproximem. No fundo mais uma demonstração de concordância prática, através da qual se articulam proposições aparentemente em litígio, mas cuja concordância se impõe para a realização dos objectivos mais vastos do processo. Conseguiu-se desta forma harmonizar os interesses da defesa do arguido e que inspiram a estrutura acusatória do processo, com a investigação da verdade material essencial a uma ideia de justiça. Desta articulação resultam assim a fixação do objecto do processo – definindo ao tribunal um tema de investigação –, e a fixação das condições em que a conformação dos factos resultantes daquele tema pode ser alterada. Assim, enquanto no inquérito o M.P. investiga livremente em quadro aberto, na busca de todos os elementos do acontecimento investigado susceptíveis de uma valoração jurídico-penal, na instrução e no julgamento o tribunal depara-se já com uma modelação do acontecimento resultante das peças processuais que definem o objecto do processo. Apesar de enquadrado nesta modelação, o tribunal desencadeia diligências que podem trazer para o processo outros aspectos do acontecimento alheios àquela modelação e que podem alterar até a configuração da mesma. O que a questão da alteração do objecto do processo vai esclarecer é precisamente definir as condições em que estes novos elementos podem ser submetidos à actividade cognitiva do tribunal e fundamentar a decisão. Esta questão da alteração é abordada no processo penal a partir do conceito de alteração substancial dos factos (…)” (Revista do Ministério Público, Ano 16.º, Julho-Setembro 1995, n.º 63, págs. 89 a 107). Vimos, pois, como tudo acaba por se reconduzir à definição do que seja alteração substancial dos factos, e, tendo presente o que acima já se deixou dito, mais concretamente àquilo que deve entender-se por crime diverso, sendo que o processo penal é uma realidade dinâmica (incluindo no que tange com o seu objecto), naturalmente dentro dos limites legalmente im(...)s. Ainda este mesmo último autor, diz-nos que “crime diverso deve pois ser entendido como facto processual diverso. Por facto processual deve entender-se o acontecimento da vida valorado à luz de todas as normas jurídico-penais que no caso concorram e que justificam a aplicação ao seu autor de uma reacção criminal (…). O conceito de alteração substancial vai assim dizer-nos quais as mudanças que aquele acontecimento pode sofrer na sua configuração sem que ponham em crise os valores essenciais do processo, nomeadamente os que se prendem com a sua estrutura e com a unidade e indivisibilidade do respectivo objecto. Na linha do pensamento de Souto Moura diremos que o facto processual ainda será o mesmo quando o acontecimento histórico que enquadra ainda seja visto pelo comum das pessoas como sendo o mesmo. Torna-se pois necessário que o facto inicialmente considerado e o facto resultante da alteração ainda sejam vistos no âmbito social como sendo o mesmo acontecimento (…)” (op. cit). Daqui resulta, um primeiro critério a que é possível atender – verificar se o facto histórico inicialmente considerado e o facto resultante da alteração são vistos no âmbito social como sendo o mesmo acontecimento. Conforme melhor se expôs no Ac. do STJ, de 18/07/2008, relatado pelo Sr. Conselheiro Souto Moura, in www.dgsi.pt: “Quando a al. f) do art. 1.º do CPP nos diz que alteração substancial dos factos é aquela que «tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites das sanções aplicáveis», e deixando de lado esta última hipótese, pensada para situações em que os factos novos representam agravantes qualificativas especiais, somos confrontados com a necessidade de estabelecer um sentido para o conceito de “crime diverso”. Só assim poderemos constatar se houve ou não alteração substancial dos factos, o mesmo é dizer, se ocorreu ou não, por essa via, uma modificação intolerável do objecto do processo. Duas notas são de adiantar, a tal propósito: - por um lado, o conceito de “crime diverso” terá que ter uma natureza processual e não substantiva, porque ao serviço do apuramento da alteração substancial dos factos, o mesmo é dizer, se ocorreu ou não, que por sua vez presta homenagem ao princípio acusatório, e, no fundo, serve os interesses da defesa; de tal modo que não se poderá confundir com a ideia de tipo legal de crime diverso (poderemos estar perante “crime diverso” mantendo-se o tipo legal, e poderemos não estar perante “crime diverso” pese embora a mudança de tipo); - por outro lado, importará recorrer, na determinação do conceito, tanto a um critério normativo, jurídico-penal, como a um critério simplesmente sociológico, que se centre sobre o facto histórico ocorrido. Haverá que apurar, como ponto de partida, com recurso a um critério normativo, se o significado jurídico-penal da primeira representação hipotética do acontecimento, confrontada com representações ulteriores, não configura a lesão de outra categoria de bem jurídico, ou seja, se não surgirá entre ambas uma relação de concurso aparente, com o que, em princípio se não estará perante um “crime diverso”. Só que, sempre importará averiguar se o acontecimento histórico, de acordo com uma tal segunda representação do ocorrido, se distingue radicalmente da primeira versão do mesmo. No sentido de que o evento histórico será radicalmente diferente quando, numa abordagem pré-jurídica da factualidade, possamos dizer que partimos de um facto para chegar a outro que nada tem a ver com o primeiro. Por último, será ainda com recurso a critérios não normativos, que se terá que concluir pela não diversidade do crime, nas situações em que os factos novos impliquem lesão de bens jurídicos diferentes, e portanto um concurso efectivo de crimes, designadamente ideal, mas os factos antes adquiridos para o processo formem com os novos uma “unidade natural” forte. Um pedaço de vida com a mesma imagem social, ou seja, valorado socialmente em termos muito semelhantes.” Também no Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 21/05/2007 (in www.dgsi.pt), citando Robalo Cordeiro, se aponta no mesmo caminho, referindo-se “o conceito de crime diverso é-nos dado por um critério misto normativo-social, que parte da identidade ou coincidência fundamental dos bens jurídicos – logo, dos tipos legais de crime – sem perder de vista as realidades da vida, mantendo-se por isso igualmente atento à valoração social dos factos. Assim, encontrar-nos-emos perante o mesmo crime quando os factos provados em julgamento, no seu relacionamento com os acusados, dão lugar a uma situação de concurso aparente ou de continuação criminosa, formando, com eles uma unidade em sentido jurídico-normativo (sem deixar de admitir-se que o crime possa ter-se por “diverso” quando os novos factos imprimirem ao conjunto um tónus social marcadamente distinto); e bem assim nos casos em que se mantém firme a incriminação, embora com alteração dos factos que lhe servem de apoio; alteração, entenda-se, não essencial, por forma que continuam passíveis do mesmo juízo de valoração social.” Veremos, adiante, que este não será o único critério a considerar, mas que ele assume uma preponderância fundamental na análise a fazer casuisticamente. Mas transpondo este critério e enquadramento teórico para o processo em apreço e para os pedaços de realidade histórica que aqui nos importam, não poderemos deixar de concluir que no âmbito social, e do ponto de vista do homem médio, os núcleos de factos que foram indiciariamente imputados aos arguidos E, C e K no despacho de pronúncia e aqueles outros que posteriormente lhes foram objecto de comunicação de alteração não substancial, são vistos como um mesmo acontecimento. Os factos que, do ponto de vista social, modelam o crime, traduzem-se na circunstância de aquele arguido, ter tido uma determinada acção tipificada na lei como crime, para com aquela concreta vítima, quando ela tinha uma idade abrangida pelo tipo legal de crime, tendo sido possível apurar que isso ocorreu numa data e local algo difusos, mas ainda assim passíveis de situar no tempo e no espaço, com uma margem de indefinição perfeitamente admissível no concreto contexto em que se verificaram os factos (como tantas vezes foi explicado pelo Tribunal recorrido na fundamentação da matéria de facto do acórdão final e como, em sede de recurso interlocutório, também já nos pronunciamos a propósito da invocada “vaguidade da acusação”). Será que, por exemplo, por não ter sido possível apurar que os factos ocorreram concretamente numa casa sita na Alameda (…), n.° (…), em (…), antes se indiciando apenas que tenham ocorrido num prédio localizado na Alameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os números ímpares, é uma alteração susceptível de, do ponto vista social, transformar este acontecimento num crime diverso? A resposta afigura-se-nos ser manifestamente negativa. E esta realidade concreta é muito mais aprensível se tivermos em consideração a totalidade do conjunto de factos que aqui estão em causa – porque são eles que constituíem o pedaço de vida histórico que o tribunal vai apreciar. Consta do despacho de pronúncia: “Em data em concreto não apurada, do mês de Novembro de 1999, num Sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade, foi, com os seus irmãos, com o arguido E e com um indivíduo de nome DU, jantar a um restaurante chinês localizado em (…). Terminado o jantar o arguido E propôs que fossem todos a sua casa “beber um copo”. Dirigiu-se, então, para uma casa de que o arguido E tinha a disponibilidade, sita na Alameda (…), no. (…), em (…). No interior desta, o arguido E dirigiu-se ao AK e disse-lhe para o acompanhar a um quarto pois “tinha uma coisa que lhe queria mostrar”, que os seus irmãos já tinham visto. Já nesse quarto, sentou-se na cama junto do AK e começou a acariciar-lhe os ombros, costas e pernas. Depois, o arguido E empurrou a cabeça do menor na direcção da sua braguilha. O AK afastou-se, tendo-lhe, então, o arguido dito que “tinha uma boa casa”, que o “AK poderia ter uma boa vida”, que a sua mãe poderia também “ter uma boa vida” e que lhe daria muito dinheiro. Enquanto falava, o arguido E, abriu a braguilha e segurou novamente a cabeça do AK na direcção desta, tendo introduzido, de seguida, o seu pénis na boca do menor, aí o tendo friccionado. Depois, o arguido baixou as calças, disse ao menor para baixar as dele, o que este fez. Então, e depois de virar o menor de costas para si, ao mesmo tempo que o inclinou, dobrando-o, o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. Após tais actos, o menor regressou a casa na companhia dos irmãos”. No âmbito social, falamos do mesmo acontecimento, quer seja possível dizer-se que ele ocorreu numa das laterais da Alameda (…), em (…), quer tivesse sido possível ir mais longe e indiciariamente sustentar que os factos ocorreram concretamente no n.º (…) dessa mesma Alameda. Aliás, neste particular, o que se indiciou contitui um minus em relação ao que estava indiciado no despacho de pronúncia, pelo que, por si só, nem justificaria falarmos de alteração não substancial de factos. Mas quanto a este mesmo acontecimento histórico, para além da referida alteração relativa ao local onde os factos terão indiciariamente ocorrido, foi também comunicado ao arguido que se entendia provisoriamente que os mesmos factos poderiam ter acontecido não em data não concretamente apurada, do mês de Novembro de 1999, num sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade, mas sim em dia não concretamente apurado, numa sexta-feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive). Contudo, esta alteração de data não pode ser desligada da unidade fáctica histórica a que diz respeito. Não falamos de um qualquer abuso sexual alegadamente cometido pelo arguido E relativamente ao menor AK, mas sim daquele que terá acontecido em prédio localizado na Alameda (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da Alameda (…), onde se situam os números impares, local para onde, após o jantar, o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC, como acima vimos. Ora, esta realidade factual histórica constitui uma unidade que não resulta substancialmente alterada, se o Tribunal vier a apurar que esses concretos factos não aconteceram num sábado à noite do mês de Novembro de 1999 mas sim numa sexta-feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive). Mais uma vez, do ponto de vista social, continua a identificar-se a mesma ocorrência com relevância criminal, como tendo sido aquela que terá envolvido o arguido E e DU, com o AK e os irmãos deste, BY e CC, num acontecimento que se desenrolou na Alameda (…). A situação não passou a ser outra realidade histórica, especialmente quando no processo não existe nenhum outro abuso sexual indiciado que tenha uma descrição similar (nomeadamente no que se refere aos envolvidos, sequência dos factos, localização e data). E isto que concluímos para esta concreta alteração vale para as demais comunicadas, como adiante veremos. Não significa isto que aos arguidos não seja dada a oportunidade de se pronunciarem e de se defenderem das alterações comunicadas. Só que isso não implica que estejamos perante uma alteração substancial dos factos, dando lugar à aplicação do dis(...) no art. 359.º do CPP, pois o art. 358.º também garante os direitos de defesa do arguido. Mas avancemos mais na procura de especificação do critério teórico do que deva ser considerado um crime diverso, de modo a perceber se de acordo com algum outro critério deverão as alterações de factos comunicadas aos arguidos ser qualificadas como substanciais. Para Marques Ferreira, estaremos perante um crime idêntico “sempre que os factos conhecidos depois de fixado o objecto do processo em sentido técnico não impliquem um novo ou diferente agente criminoso nem respeitem a bens jurídicos concretamente diferentes dos referidos na acusação ou na pronúncia e, simultaneamente, tais factos se relacionem como unidade criminosa normativa [artigo 30.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal (CP)] (…). Na tentativa de aplicar praticamente as ideias antes expostas passamos a analisar alguns exemplos de «factos novos» e respectivas propostas de solução: (…) Os factos novos provocam alterações meramente circunstanciais do objecto do processo em sentido técnico. Os casos mais vulgares são relativos aos factos novos que consubstanciam circunstâncias agravantes ou atenuantes de carácter geral ou modificativas especiais ou comuns. As alterações, no entanto, podem ocorrer numa infinita série de meras circunstâncias, irrelevantes sob o ponto de vista da dosimetria penal e de importância meramente contextual, tais como: tempo, lugar, temperatura, textura, cor, velocidade, etc. (…)” (Da alteração dos factos objecto do processo penal, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano I, Fasc. 2, Abril – Junho 1991, Aequitas, Editorial Notícias, págs. 228 a 232). Também para este autor alterações de factos da natureza das que foram comunicadas aos arguidos, porque constituem alterações meramente circunstanciais do objecto do processo (referentes ao local e data), traduzem-se em alterações não substanciais, uma vez que nos mantemos com o mesmo agente e com o mesmo bem jurídico protegido. Para Germano Marques da Silva “o crime será o mesmo, ou melhor, não será materialmente diverso, desde que o bem jurídico tutelado seja essencialmente o mesmo. E será essencialmente o mesmo quando os seus elementos constitutivos essenciais não divergirem. “Se os novos factos puderem ainda integrar a hipótese de facto histórico descrito na acusação, podem alterar-se as modalidades de acção, pode o evento material não ser inteiramente coincidente com o modo descrito, podem alterar-se as circunstâncias e as formas de culpabilidade que o crime não será materialmente diverso, desde que a razão do juízo de ilicitude permaneça a mesma. O crime não será materialmente diverso quando apenas variarem as formas de execução do crime ou as modalidades de autoria ou comparticipação, desde que os actos acusados e apurados possam ainda reconduzir-se ao mesmo facto histórico” (Curso de Processo Penal, Vol. I, Editorial Verbo, 2000, pág. 382). Vemos, uma vez mais, um afloramento de um conceito em que a ênfase é colocada na possibilidade de os factos se reconduzirem ao mesmo facto histórico. Em anotação ao art. 1.º do CPP, afirmam os Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto: “(…) cremos poder afirmar que se imputa ao arguido um crime diverso quando: - Da referida adição ou modificação dos factos resulte que o bem jurídico agora protegido é distinto do primitivo; - Da referida adição ou modificação dos factos resulte um facto naturalístico diferente, objecto de um diferente e distinto juízo de valoração social; - Da referida adição ou modificação dos factos resulte a perda da “imagem social” do facto primitivo, ou seja, resulte a perda da sua identidade. O critério normativo – é disso que se trata – encontrado só fica completo quando se fizer a previsão das situações em que o arguido não teve oportunidade de se defender dos novos factos, com relevância jurídico-penal, e em que, por força dessa modificação ou aditamento de novos factos, resulte o agravamento dos limites máximos das sanções aplicáveis ao arguido (neste sentido, Ac. RP de 23-05-2007). Assim, e concluindo, haverá alteração substancial dos factos nos casos em que a investigação feita em sede de instrução ou audiência de discussão e julgamento resulta numa alteração da base factual da acusação. Tratando-se de uma alteração e não de inovação, o limite do poder investigatório do tribunal é fixado pela identidade do objecto do processo fixado na acusação. Tendo por base tudo o que se expendeu, e sintetizando, haverá alteração substancial dos factos nas seguintes situações (elencadas por António Quirino Duarte Soares) (…): - Conhecimento, em audiência, de novos factos que impliquem incriminação diversa da indicada na acusação, quer de maior, quer de menor gravidade [tratando-se de normas em concurso aparente, a hipótese é outra, pois, nesse caso, não se pode falar de crime diverso (por exemplo, convolação do crime de furto para o de receptação)]; - Conhecimento, em audiência, de elementos que constituem circunstâncias qualificativas do crime e lhe agravam o limite máximo da sanção (por exemplo, convolação de homicídio simples para o qualificado, por se ter averiguado a premeditação, não descrita na acusação); - Conhecimento, em audiência, de factos novos que, juntos aos da acusação, integrem o tipo legal mais abrangente dentro das relações de consunção (por exemplo, convolação de furto para roubo, ou das ofensas corporais para o homicídio); - Conhecimento, em audiência, de novas condutas criminosas integradas com as da acusação num crime continuado, e a que, isoladamente consideradas, corresponda pena de limite máximo maior do que corresponderia às da acusação; - Conhecimento, em audiência, de novas condutas unificáveis criminalmente às relatadas na acusação pela mesma resolução criminosa, mas que contribuam para elevar o limite máximo das sanções aplicáveis (por exemplo, objecto não indicado na acusação, também furtado no mesmo local, dia e hora, e que, ao contrário dos demais, tem valor consideravelmente elevado obrigando a convolar do furto simples para o furto qualificado); - Subida de grau no elemento ético-psicológico do crime (negligência para dolo) em que a moldura penal se agrave nos seus limites máximos; - Alteração da forma de participação do agente (art. 26.º e ss. do CP) que implique modificação do limite máximo da pena ou das penas aplicáveis (por exemplo, da cumplicidade para qualquer das formas de autoria). Por sua vez, haverá alteração não substancial dos factos nos seguintes casos: - Alteração nos elementos espaço-temporais (dia, hora, local) e no objecto do crime (desde que, neste caso, a mudança de valor não implique a passagem de crime simples para o qualificado, caso em que se tratará de alteração substancial); - Conhecimento, em audiência, de novas condutas integradas, com as acusadas, na mesma unidade de resolução e, portanto, no mesmo crime (desde que a “nova” conduta não qualifique o crime, alterando-lhe o limite máximo da sanção); - Conhecimento, em audiência, de novas condutas criminosas integradas num crime continuado com as da acusação (desde que a moldura penal que lhes cabe, como condutas isoladas, não seja mais grave do que a que caberia à mais grave das já constantes da acusação); - Subida de grau no elemento ético-psicológico doloso ou negligente do crime (dolo eventual para o necessário, ou deste para o directo ou negligência inconsciente para a consciente); - Alteração na forma de participação do agente (art. 26.º e ss. do CP) que implique modificação do limite máximo da pena ou penas aplicáveis (modificação da forma de autoria, ou desta para a cumplicidade)” (Código de Processo Penal, Comentários e Notas Práticas, Coimbra Editora, 2009, págs. 24 e 25). Como se pode constatar, mais uma vez é seguido um critério em que expressamente se entende a alteração nos elementos espaço-temporais, tais como dia, hora ou local da prática do crime como constituindo alterações não substanciais de factos. Temos para nós que essa será, efectivamente a regra, excepto quando essas circunstâncias possam contender com elementos constitutivos do tipo de crime, como aconteceria, no caso em apreço, se as alterações de datas comunicadas implicassem uma alteração na idade da vítima do crime com relevo para o preenchimento do tipo de abuso sexual de criança imputado, ou quando desvirtuem a realidade histórica que vem imputada ao arguido, o que só acontecerá quando as alterações dos elementos espaço-temporais transformem o objecto do processo num outro distinto, por se perder por completo a identidade, imagem e valoração social do facto. Aqui chegados, e tendo percorrido o que na essência a nossa doutrina expressa sobre o tema, é momento de retornar ao despacho recorrido, para atentar com maior detalhe na sua fundamentação. No despacho recorrido referiu-se (quanto ao ponto em apreciação): “Então, se (em relação à imputação que é feita ao arguido e em consequência da prova que é produzida em audiência de julgamento) se verificar que: - há factos que não constam da acusação e resultaram da discussão; - têm relevância para a discussão ( art° 339°, n° 4, do C.P.Penal); - mas não têm repercussão no tipo de crime, não dando lugar à aplicação de um crime diverso (porque se tiver há alteração substancial, ou seja, há uma diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, e que determine a imputação de crime diverso); - ou não têm repercussão nos limites máximos das sanções legais aplicáveis (porque se tiver há alteração substancial); - não podem ser valorados desfavoravelmente sem serem comunicados; - (salvo se os factos resultarem da alegação da Defesa); Temos uma alteração não substancial de factos e há que dar lugar ao 358°, n.º 1 e 2, do C.P.P., com comunicação e concessão de prazo para defesa, se requerido - cfr. www.dgsi – STJ, P° 07P4565 de 16/01/08, STJ, P° 4827/07 5.ª Secção, Relator Senhor Juiz Conselheiro Simas Santos; STJ, P° n° 3271/07, 5.ª Secção, Relator Senhor Juiz Conselheiro Costa Mortágua). Por tudo aquilo que já se deixou dito, não vislumbramos que o assim considerado incorra em qualquer lapso. A diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, é um entendimento de crime diverso que está em inteira consonância com o que acima se expôs (e que adiante se completará) e que, portanto, não se nos oferece dúvidas de que deva ser seguido. O arguido E começou por invocar nas suas alegações de recurso que logo no despacho de pronúncia foram feitas alterações de factos, sem que tenha sido feita a comunicação a que se refere o n.º 1 do art. 303.º do CPP, pelo que é plausível considerar que o Tribunal de Instrução Criminal considerou as referidas alterações como substanciais, as quais, como determina o n.º 3 do mesmo artigo, não podem ser tomadas em conta para o efeito de pronúncia, pelo que, apesar de levadas à pronúncia, não poderiam ser levadas em conta, mantendo-se o enquadramento fáctico da acusação. Mais invoca que, prevenindo que pudesse ser levado em conta o enquadramento indiciário constante da pronúncia, o recorrente, com a sua contestação indicou prova relativa a tal enquadramento. Não se vê como retira o arguido a conclusão de que, por não se ter dado cumprimento ao dis(...) no art. 303.º, n.º 1, do CPP, aquando do despacho de pronúncia, se teria operado uma alteração substancial dos factos, quando, na verdade, a conclusão mais evidente a retirar é a de que não se terá dado cumprimento ao mencionado normativo porque não se entendeu sequer que tenha ocorrido qualquer alteração de factos com relevo que justificasse tal aplicação. Com efeito, não é toda e qualquer alteração de factos que assume o relevo processual suficiente para desencadear a necessidade de comunicação a que aludem os arts. 303º, n.º 1, e 358.º, n.º 1, do CPP. Vinício A. P. Ribeiro, em anotação ao art. 1.º do CPP, esclarece que “«A jurisprudência dos Tribunais superiores tem sido constante no entendimento de que, não há alteração, substancial ou não, para os efeitos dos arts. 358.º e 359.º do CPP, quando os factos considerados provados representam um minus relativamente aos da acusação e nenhuns novos são introduzidos – cfr. Ac. STJ, de 3.4.1991, CJ, tomo II, pág. 17; Ac. STJ, de 5.7.2001, proc. n.º 4000/00-3.ª, SASTJ n.º 53, 62; Ac. STJ, de 7.11.2002, proc. n.º 3158/02-5.ª, SASTJ n.º 65, 67; Ac. STJ, de 12.11.2003, proc. n.º 1216/03-3.ª; SASTJ, n.º 75,93.» (Extracto do Ac. RP de 14 de Junho de 2006, Proc. 0612048, Rel. Borges Martins). «Nesta conformidade podemos assentar que a comunicação prevista no citado art. 358.º, apenas tem lugar quando se tratar de uma alteração não substancial relevante, o que sucede quando essa modificação divirja do que se encontra descrito na acusação ou na pronúncia e a subsequente comunicação se mostre útil à defesa. Mas quando é que isso sucede? Para o efeito tem-se considerado que não existe uma alteração dos factos integradora do art. 358.º, quando a factualidade dada como provada no acórdão condenatório consiste numa mera redução daquela que foi indicada na acusação ou na pronúncia, por não se terem dado como assentes todos os factos aí descritos – Ac. TC n.º 330/97 [DR, II Série 1997/Julho/03] (…)” (Código de Processo Penal, Notas e Comentários, Coimbra Editora, 2008, pág. 73). As alterações a que o arguido se reporta dizem respeito, por um lado, à consideração, na decisão instrutória, de que “A casa da Alameda (…), n.º (…), não será certamente a correspondente ao (…) andar direito” e que “O que já não se pode de todo excluir (bem pelo contrário) é que tais práticas não tenham ocorrido no andar do lado, (…) esquerdo”, acabando por indiciar a prática do crime não no (…) esquerdo, mas apenas no prédio n.º (…). Além disso, também à consideração, na decisão instrutória, de que “A casa da Av. (…), nº (…), também não pode ser a do (…) direito”, acabando por indiciar o crime como localizado “numa casa de que este tinha a disponibilidade, sita na Av. (…)”. O que aconteceu em ambas as situações foi, portanto, a não demonstração indiciária de uma localização mais especifica, num determinado andar de um prédio, para se deixarem os factos indiciados apenas como tendo ocorrido no prédio em geral, sem excluir qualquer andar concreto. E isto corresponde a uma redução, por falta de demonstração, dos factos de que o arguido estava acusado e, logo, a um minus do que constava da acusação, sem introdução de novos factos. No que se refere à localização dos referidos crimes, foi inicialmente considerado na acusação que ela podia ser, com uma probabilidade forte, um determinado andar de um certo prédio. Em sede de decisão instrutória, deixou-se cair a concretização do andar, mantendo-se apenas a do prédio. A alteração daí decorrente não foi, pois, entendida como relevante o suficiente para justificar que fosse tratada como alteração não substancial dos factos e não, como pretende o arguido, que tenha sido considerada uma alteração substancial e que por isso deva ser desconsiderada. E tanto não deve ser desconsiderada que o arguido não a desconsiderou e organizou a sua defesa em audiência de julgamento tendo presentes os factos imputados pelo despacho de pronúncia e não pelo despacho de acusação, aceitando assim os efeitos daquele despacho. Ademais, se o arguido entendia que tinha ocorrido alguma irregularidade ou nulidade a esse nível deveria tê-la invocado oportunamente e não conformar-se com ela, para a vir suscitar neste momento processual. Logo, qualquer eventual irregularidade ou nulidade que pudesse ter ocorrido (por não se tratar de nulidade insanável consagrada no art. 119.º do CPP e, como tal, susceptível de arguição e apreciação em qualquer fase do processo) encontra-se sanada. Salienta-se, ainda, que nada obsta a que no mesmo processo ocorram diferentes comunicações de alterações de factos em diferentes fases processuais, designadamente, que se proceda a alteração de factos aquando da fase de instrução e posteriormente em sede de audiência de julgamento (tanto assim que o Tribunal Constitucional, no seu Ac. n.º 544/2006, de 27/09/2006, in www.tribunalconstitucional.pt, não julgou inconstitucionais as normas dos arts. 303.º e 358.º, do CPP, quando intrepretadas no sentido de permitirem a alteração da qualificação jurídica dos factos mais do que uma vez no mesmo processo, com fundamentação que tem inteira aplicação na situação em apreço). Mas a essência da argumentação do arguido – e aqui referimo-nos à argumentação do arguido E, mas que vale para o caso dos outros dois arguidos, que fizeram sua aquela mesma argumentação – está na conclusão de que alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado (nos casos em que foi possível determiná-la) se verificará sempre a imputação de um crime diverso. Face a tudo o que já foi ex(...), não podemos concordar com essa conclusão. O próprio arguido acaba por extrair essa conclusão escamoteando as premissas de que partiu. Na verdade, o arguido começa por aceitar que se ocorrer uma diferença de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual e que determine a imputação de crime diverso, temos uma alteração substancial de factos (sublinhado nosso). No entanto, logo a seguir parece pretender que qualquer diferença de tempo ou espaço seja entendida como uma alteração substancial de factos, esquecendo que ela tem que se referir aos elementos materialmente relevantes de construção de identificação factual. Para o arguido, só se a nova indiciação não alterar o núcleo factual narrado na imputação, limitando-se a explicitar ou esclarecer a narração, ainda que sintética, dos factos, incluindo o lugar e o tempo, é que se mantém a imputação do mesmo crime, com alteração não substancial dos factos. No entanto, não podem ter-se como equivalentes as referências aos elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual (que os arguidos aceitam) e ao núcleo factual narrado na acusação. E vimos já que de acordo com a nossa doutrina, uma alteração de factos que se reporte ao tempo e ao lugar será não substancial se não se referir aos elementos constitutivos do tipo de crime e se do ponto de vista social continuar a ser possível identificar aquela unidade factual histórica como sendo a mesma. No fundo, do ponto de vista da afirmação teórica, não estamos perante algo muito diferente do que o arguido toma como ponto de partida para considerar as situações em que se verifica um crime diverso – uma transformação do quadro factual descrito na acusação em outro diverso ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual. O arguido socorre-se também duma definição de objecto do processo que toma como essenciais o tempo e o lugar. Diz, nomeadamente que “não há facto material ou acto físico sem tempo e sem lugar, pelo que o lugar e o tempo integram ontologicamente o próprio facto ou acto. Mas a sua indicação pode ser impossível, quer por indeterminabilidade quer por não ter sido alcançada a determinação. Feita a determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologicamente mas também a sua cognição. O tempo e o lugar, se concretamente determinados, integram o próprio facto, pois o facto criminoso não é uma abstracção parcelada, é um facto concreto e unitário. (…) Se não for possível a determinação, o crime pode ser processualmente imputado mesmo sem a narração espacial e temporal. Mas sendo possível a imputação processual integra a narração, “ainda que sintética” (artº 283º, 3-b do CPP), do tempo e do lugar.” No entanto, nada do que assim foi defendido pelo arguido contraria a possibilidade de ocorrer, na sequência da prova produzida, uma alteração das circunstâncias de tempo e lugar, sem que daí resulte, de modo necessário, uma alteração substancial dos factos, tanto mais que essas circunstâncias só constarão da acusação ou pronúncia se for possível indiciá-las. Reiteramos o nosso entendimento – conforme ao do Tribunal recorrido – de que só ocorrerá uma alteração substancial dos factos se ocorrer uma alteração que se reporte aos elementos materiais relevantes de construção e identificação factual, e acrescentamos que a avaliação que se faça dessa alteração deve ter por base a imagem e valoração social do facto. Iremos ainda referir-nos à argumentação de recurso dos arguidos C e K, se bem que quanto a esta questão particular, como já salientado, tenham seguido, na essência, a posição e argumentos do arguido E, pelo que lhe faremos apenas uma breve referência. Importante é salientar que também o arguido C sufraga o entendimento, constante de fls. 63923, do que para o Tribunal a quo é uma alteração substancial de factos. Mas logo depois acaba por concluir que alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado se verifica a imputação de um crime diverso, mas querendo com isso significar que qualquer alteração de tempo ou lugar – como é o caso das que aqui estão em análise – contendem com o núcleo do tempo ou lugar do crime, quando isso não ocorre de modo necessário. O arguido K, por seu turno, também aderiu à definição do Tribunal a quo do que seja uma alteração substancial dos factos, mas, à semelhança dos restantes arguidos, defende que nestas alterações comunicadas nos autos ocorre uma diferença de tempo e espaço que transforma o quadro factual descrito no despacho de pronúncia em outro diverso, manifestamente diferente no que se refere aos seus elementos relevantes de construção e identificação factual e que determina a imputação de crime diverso num local demasiado amplo. O Ministério Público, na sua resposta ao recurso apresentado pelos arguidos, salienta que: “Da conjugação dos respectivos enunciados, com os princípios a que vem de se aludir, resulta claro que, nos requisitos a que o MºPº haverá de ater-se, na estruturação de uma peça acusatória, se acolheu um conceito normativo de facto, traduzido este na exigência de “Narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”, mas, já não, da obrigatoriedade de menção, de entre outras, das circunstâncias de tempo e lugar, ainda que “relevantes para a determinação da senção que deve ser aplicada”, as quais deverão ser mencionadas, tão só, “se possível”. Por outro lado, a vinculação temática, típica de uma estrutura acusatória do processo, comporta excepções, coerentemente decorrentes do facto de, tal estrutura, ser mitigada por um princípio de investigação, o qual, de igual sorte, se impõe ao Tribunal. Daí que, constituindo-se a Acusação como elemento nuclear da delimitação do objecto do processo, este não se esgote naquele, antes lhe sendo adjacentes, como verdadeiros elementos estruturantes, quer os factos relevantes invocados pelas Defesas, quer os que, de igual modo relevantes, resultem da discussão da causa. Se assim é, com correspondente ênfase hão-de colocar-se as grantias de defesa, sobretudo, aquelas que, necessariamente, decorram, da mutabilidade que, ao longo do inter processual, maxime, do julgamento, seja imposta – para o que ora nos importa, de forma não subtancial – à versão que, originariamente (Acusação ou Pronúncia), constituía o acervo factual de que o arguido cumpriria defender-se. É deste contexto que emerge o dis(...) nos artºs. 358º e 359º, do CPP, verdadeiro colorário do compromisso regulador entre a natureza acusatória, os princípios da investigação, da identidade e da vinculação temática, as alterações ao objecto do processo e as garantias de defesa. Numa e noutra, dessas normas, se salvaguarda a preservação da matriz que, sob pena de descaracterização, deve permanecer imutável na definição do objecto do processo, sem prejuízo das alterações que se imponham e justifiquem na demanda da verdade material, sujeitas, não obstante, a uma disciplina que não ponha em causa a amplitude dos direitos de defesa do arguido (…) Como se viu e, crê-se, ter ficado demonstrado, a alteração da data, ou lugar, da prática de um crime, não é elemento essencial, de entre os que, como tal, são reputados pelo dis(...) no art. 283.º, do CPP. Ainda que o fosse, não estaria o Tribunal impedido de, com recurso ao mecanismo previsto no artº 358º, do CPP, comunicar as alterações que entendesse decorrerem da discussão da causa, (...) que tal não implicasse modificação de factos que tivesse “por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravção dos limites máximos das sanções aplicáveis, caso em que, porque configurada uma alteração substancial, haveria que desencadear-se a disciplina prevista no artº 359º. Tratou-se, assim de alterações meramente circunstanciais, que em nada afectaram o núcleo essencial dos ilícitos que vinham imputados (…)”. No mesmo sentido se posicionaram os assistentes, concluindo que a “pronúncia importa para o processo um conjunto de factos que são da vida real e que são, bastas vezes, desconformes, em latitude e longitude com o que se plasmou no texto que a constitui. Não pode esse instrumento ser de tal forma moldável que não tenha qualquer conexão com o iter criminis e delimite ou comprima direitos fundamentais de defesa. A possibilidade de alteração do libelo acusatório resulta daquilo que é o processo aquisitivo da prova que é feito em julgamento, assim se garantindo o direito a um julgamento justo e equitativo, a um processo onde a paridade dos sujeitos é tal que não existem surpresas nem o arguido é confrontado com nada que, de forma substancial, não se contenha na pronúncia, traduzida no princípio da vinculação temática. Constituindo uma garantia de defesa, na medida em que impede alterações significativas do objecto de processo, alterações essas que prejudicariam (poderiam até inviabilizar) a defesa. As alterações comunicadas não são substanciais, não afectam o objecto do processo e visam, apenas, conformar a realidade a reconstituir com a prova adquirida em julgamento.” Trata-se, efectivamente, da posição que se apresenta como mais ponderada e de acordo com aquilo que já defendemos quanto ao que deva entender-se por alteração substancial dos factos. Existe, contudo, uma vertente das alegações dos arguidos que não pode deixar de ser aqui considerada e que extravasa a análise da questão que aqui vimos debatendo e que é tal como ela surge normalmente colocada aos nossos tribunais. E essa vertente prende-se com a influência que os direitos de defesa do arguido poderão ter no entendimento do que possa ser uma alteração substancial de factos. Dito de outra forma, os arguidos, para além de pugnarem que as alterações de tempo e lugar comunicados são substanciais, porque alteram o núcleo factual do crime, transformando-o num diverso, invocam também que este tipo de alterações, atenta a dificuldade de defesa que delas decorre, deveriam, também por esse motivo, ter-se como substanciais. Argumenta, nesse sentido o arguido E, “Em consideração das garantias de defesa, são diferentes os regimes das alterações substanciais e não substanciais. Quanto a estas, o artº 358º não vai além de possibilitar uma defesa incidental, preparada no tempo “estritamente necessário”. Quanto às substanciais, porque incidem sobre o núcleo factual, incluindo as suas componentes temporal e espacial, não estando em princípio, totalmente garantida a defesa no próprio processo, o artº 359º impõe que não sejam tomadas em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, admitindo o procedimento pelos novos factos em novo processo, com as mesmas possibilidades de defesa proporcionadas ab initio no processo em que foram comunicadas as alterações. (…) Também considerando as garantias de defesa, esta substituição de indiciação constitui alteração substancial dos factos. O recorrente preparou há cinco anos a sua defesa relativamente a um imputado crime num prédio e num tempo determinados. Não respeita de modo algum as suas garantias de defesa, ser restringido, decorridos cinco anos, à possibilidade uma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que teria acesso em 2004.” Também o arguido C reproduziu estas mesmas afirmações nas suas alegações de recurso. Já o arguido K afirmou ainda que “para além da falta de fundamentação do despacho de comunicação de alteração, eleva para um nível de indeterminação absolutamente insustentável o local de cometimento do imputado ilícito criminal e, consequentemente, o exercício do direito de defesa.” É certo que todos os arguidos dão particular ênfase à dificuldade da defesa também devido ao momento em que as alterações foram comunicadas (questão relativamente à qual nos pronunciaremos de seguida). Mas não deixam de fazer notar que o elemento dificuldade de preparação da defesa deve influenciar a noção de alteração substancial de factos, valendo-se até do que foi escrito quer por parte da doutrina quer por parte da jurisprudência. Frederico Isasca, um dos autores que a nível nacional mais se tem dedicado a esta matéria, refere que “Os direitos ou, em sentido amplo, o direito de defesa do cidadão em geral e do arguido em especial, face ao direito processual penal, só pode definir-se ou apurar-se correctamente no seu conteúdo e em face de um modelo constitucional como o nosso, de estrutura basicamente acusatória com princípio de investigação, tendo em atenção, quer os princípios quer os fins de um processo penal que se vê dividido entre o respeito pela dignidade humana e livre desenvolvimento da personalidade de cada homem e a prossecução da justiça com a consequente reposição do direito no caso (…). Deve porém ter-se sempre presente que o antagonismo, próprio e inevitável daqueles fins e princípios, porque orientados face a valores antinómicos, implica uma conflitualidade latente que a(...) todas as instâncias do processo, perante a qual apenas é possível uma tentativa de concordância prática, mas necessária e concomitantemente reveladora das disfuncionalidades de um sistema onde se procura o inconciliável. A amplitude ou extensão dos direitos de defesa é exactamente um dos terrenos onde por excelência e de forma mais expressiva, são perceptíveis as fissuras que derivam da inevitável fricção dos valores e fins conflituantes no processo penal. (…) A dificuldade e o mérito, estão, exactamente, em encontrar o ponto óptimo de equilíbrio e harmonia entre eles. Se é certo que não podem imolar-se no altar da justiça, a dignidade humana e os direitos de defesa, o inverso não é menos verdadeiro. Uma perspectiva exclusivamente orientada naquele sentido, comprometeria irremediavelmente os próprios fins do Estado e com ele o escopo último do direito penal. O inverso conduziria a uma injustificada e ilegítima pretensão estadual, porque comprometedora de uma concepção marcadamente humanista e cujas consequências se não apresentam mais válidas, face ao modelo estadual constitucionalmente consagrado. E eis-nos mesmo no centro do mais delicado e pertinente problema que coloca o direito processual penal de um Estado social de Direito materialmente democrático: até onde se pode ou deve ir na concessão do direito de defesa, ante a necessidade de prossecucação da justiça como e enquanto fim do Estado (…)” (Sobre a Alteração da Qualificação Jurídica em Processo Penal, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 4, Fasc. 3, Julho-Setembro 1994, Aequitas, Editorial Notícias). Não duvidamos de que assim seja. Nesta matéria, efectivamente, assegurar com equilíbrio os direitos de defesa dos arguidos e garantir a necessidade de prossecução da justiça como e enquanto fim do Estado é tarefa delicada, mas não impossível (a génese dos arts. 358.º e 359.º do CPP é precisamente a de assegurar esse equilíbrio, impondo diferentes procedimentos consoante o grau de compressão dos direitos de defesa dos arguidos). São também os arguidos quem recorre às palavras de Frederico Isasca, quando nas suas alegações de recurso procedem a uma citação composta por excertos de frases da obra daquele, nos seguintes termos: “Como geralmente admitido e refere Frederico Isasca (in Alteração Substancial dos Factos e sua Relevância no Processo Penal Português, págs. 139 e 144) os limites à identidade do crime, na qualificação duma alteração, terão que ser “a total garantia dos direitos de defesa do arguido e a prossecução da justiça e da verdade material”, pelo que, “sempre que… essa alteração… ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos.” Trata-se, salvo o devido respeito, de extrair partes de afirmações que o referido autor faz entre as fls. 139 a 144 da obra, para as compor numa frase conclusiva que extravasa o pensamento daquele, se bem o entendemos. Aliás, como é bom de ver, afirmar que sempre que uma alteração de factos ponha em causa a defesa estaremos perante uma alteração substancial de factos, equivale a dizer que todas as alterações de factos serão substanciais, não se compreendendo, então, porque razão o legislador processual penal consagra um regime específico para as alterações não substanciais. Com efeito, a defesa do arguido é sempre posta em causa com qualquer alteração de factos ou até mesmo de mera qualificação jurídica que lhe seja comunicada, pois o objecto do processo está fixado com a acusação e é a esta que o arguido direcciona a sua defesa. Introduzir alterações para as quais o arguido não estava preparado vai bulir, potencialmente, com a defesa que delineou. Daí que o legislador tenha im(...), quer no caso da simples alteração da qualificação jurídica, quer no caso das alterações não substanciais de factos, que ocorra comunicação ao arguido e que lhe seja concedido prazo para reorganizar a sua defesa em função das alterações comunicadas (art. 358.º do CPP). Vejamos, pois, o texto do mencionado autor, de onde são retiradas as partes de frases a que os arguidos se referem: “(…) Isto significa que qualquer daqueles critérios “ normativos “não pode eleger-se como critério geral e por outro lado, se exigíssemos a convergência de todos eles, daí resultaria uma insuportável rigidez do objecto do processo, seria tomar a nuvem por Juno, i. e., exigir-se-ia a igualdade, quando resulta da própria lei que ela se basta com a identidade, permitindo uma certa elasticidade, cujos limites são a total garantia dos direitos de defesa do arguido e a prossecução da justiça e da verdade material. (sublinhado nosso) Ao que tudo acrescem mais duas ideias que parecem assentes. Por um lado, o acontecimento ou pedaço de vida, tomado como base pela acusação, não pode ser inteiramente abandonado no momento da decisão – i. e., pela sentença – no sentido de uma mudança ou troca do facto processual; por outro, também não é possível modificar a qualificação jurídica, se essa modificação é feita com base num facto não acusado, pois tal contraria o princípio do acusatório e os direitos de defesa do arguido, não obstante poder justificar-se do ponto de vista da economia processual. Mas aqui, como ensina a melhor doutrina e impõe a lei – não só a ordinária como a constitucional – é esta e não aqueles que devem e têm que ceder. Nenhuma das teorias conseguiu elaborar uma fórmula abstracta para determinar o conceito de identidade do facto processual. Torna-se pois necessário encontrar um critério que permitindo o funcionamento de referentes normativos, não cristalize nenhum deles em detrimento dos outros e que simultaneamente respeite os princípios e os fins do processo penal e que muito em especial nos dê exactamente o ponto de equilíbrio entre o respeito pela dignidade do sujeito processual que é o arguido, não comprometendo as suas expectativas e a posição da defesa, mas que, por outro lado, permita uma efectiva operatividade dos poderes de investigação do tribunal, em vista à descoberta da verdade e portanto que com ele se possa atingir a realização efectiva do direito penal, possibilitando assim uma realização óptima do fim último do processo penal que é a justa decisão da causa, através da reposição da verdade, declarando o direito do caso concreto, i. e., utilizando a expressão de FIGUEIREDO DIAS “definindo o que para este caso é, hoje e aqui, justo”. “Só nos aproximamos do problema da identidade do facto de forma correcta – escreve ACHENBACH (1975-A: pp. 90 e 91) – se se compreender o facto como acontecimento que desencadeia a perseguição jurídico-penal. A solução tem portanto que ser procurada na direcção que nos é indicada pelo conceito de facto processualmente dominante”. Mas este, na opinião do Autor e muito bem, é pouco feliz, não só na forma totalmente naturalística de que faz depender a identidade do facto, como, por outro lado, pela confusa significação e entendimento que se tem dado à expressão acontecimento histórico. Por isso afirma, com razão, que “na realidade do que se trata (referindo-se à expressão acontecimento histórico) é de um conjunto de factos unitários segundo a experiência social, na inteira riqueza da qual, de acordo com a experiência da vida, um determinado acontecimento está na base da razão da investigação. Se entendermos assim, a identidade do facto deve ser apreciada de acordo com a experiência modelar de um observador não juridicamente formado”. Em idêntico sentido se pronuncia ROXIN (1987: pp. 119 e 315): “sobre a identidade do facto decide a compreensão da vida”, a unidade de sentido que o acontecimento tem em termos sociais. E repara-se que o recurso ao critério de experiência social, portanto às regras da experiência do comportamento e dos acontecimentos, não é algo a que o nosso legislador não tenha atendido. Bem pelo contrário, é com base nelas que a prova e consequentemente os factos devem e têm que ser apreciados (art. 127º). Ora, se a própria lei remete, em sede de apreciação da prova, para as regras da experiência social, não se vê razão para não se aplicar também esse critério na determinação da identidade ou diversidade do crime, quando exactamente o que lhe está na base é a apreciação de novos factos. Isto é, se o critério das regras da experiência está na base da apreciação da prova e portanto das conclusões sobre a verificação, ou não, dos factos que conduzem à condenação, ou à absolvição, não se compreenderia o afastamento do mesmo critério – por ser difuso ou inseguro (?) – para a determinação da identidade do objecto do processo, quando é exactamente com base nele que se vai dar como provado, ou não, esse mesmo objecto do processo. E tanto mais que, como já se demonstrou, em face da nossa lei, todos os critérios isoladamente considerados se mostram insuficientes e a sua exigência cumulativa seria insustentável. (…) ROBALO CORDEIRO trilha caminho certo ao apontar – na esteia da melhor doutrina alemã e do que parece ser, ao que julgamos, o pensamento de FIGUEIREDO DIAS – o critério da valoração social do comportamento, para determinar, face à nossa lei, o conceito de crime diverso. Não nos deixemos, contudo, influenciar demasiado pelo critério da valoração social e tomá-lo como único. (…) Pelo que ao critério da valoração social se terá que adicionar (ou melhor, ter também como referência) o da identidade – que não igualdade – da imagem social daquele pedaço de vida que forma o objecto do processo. Por outro lado, devemos ter presente a razão de ser da definição legal, qual seja, como se referiu e fundamentou, a protecção da defesa. Deve pois este formar, além daqueles outros, um critério que permita determinar a diversidade do crime. Só a combinação destes critérios nos permite, com segurança, concluir pela diversidade do crime e determinar se a alteração dos factos é substancial. Decisivo será, quer a valoração social, quer a imagem social do acontecimento ou comportamento trazido a juízo e consequentemente, a forma como o pedaço de vida é representado ou valorado do ponto de vista do homem médio – da experiência social se se preferir –, quer a salvaguarda da posição de defesa do arguido. Sempre que ao pedaço individualizado da vida, trazido pela acusação, se juntem novos factos e dessa alteração resulte uma imagem ou uma valoração não idênticas àquela criada pelo acontecimento descrito na acusação, ou que ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos. (sublinhado nosso) À luz do nosso critério é possível que, v.g., o tempo, o lugar, o modo de execução, o nexo de causalidade, a forma de participação, o resultado, o grau de execução, etc., nalguns casos, possam sofrer modificações e nem por isso, necessariamente, se deverá concluir pela transformação do crime e consequentemente por uma alteração substancial dos factos. Assim, se por exemplo, se provar na audiência que o furto não foi cometido às 2h, mas às 2.30h; que a ofensa corporal não foi cometida no Rossio, mas sim nos Restauradores; que o rebanho furtado não tinha 150 cabeças, mas 160; que a vítima não foi afogada numa dorna de vinho, mas num lagar de azeite, etc., isso não significa que estejamos necessariamente perante uma alteração dos factos que consubstancia um crime diverso. Poderão todos estes casos ser considerados como alterações substanciais ou não, o que já não sucederia se tomássemos como decisivo um só desses critérios apontados. O que demonstra que tomar como único critério qualquer um daqueles referentes (tempo, lugar, modo de execução, nexo de causalidade…), apenas com eles se abarcaria uma parte das modificações de que o objecto do processo é susceptível e não a globalidade potencial das transformações possíveis do facto processual. Que a alteração da valoração e da imagem do facto e o comprometimento da defesa, possam derivar ou ter origem na modificação de um, ou vários daqueles elementos ou critérios, não se nega, o que se afirma é que qualquer deles, per se, não pode erigir-se como critério padrão para determinar quando é que a alteração dos factos consubstancia um crime diverso e é, nessa medida, qualificável como substancial.” (Alteração substancial dos factos e sua relevância no processo penal português, Livraria Almedina, Coimbra, 1992, págs. 139 a 144). Como se vê, o que Frederico Isasca acaba por concluir é que quer a alteração da valoração e da imagem do facto quer o comprometimento da defesa são susceptíveis de determinar a qualificação de uma alteração como substancial. O que o autor já não diz é que isso ocorra necessariamente. Reitera-se que não se comprenderia porque razão instituiu o legislador o regime do art. 358.º do CPP se sempre que a defesa do arguido fosse posta em causa existiria uma alteração substancial de factos, pois em semelhante situação todas as alterações de factos seriam substanciais. Mais, note-se que o autor a que nos temos vindo a referir não se reporta a qualquer dificuldade de defesa, mas sim ao comprometimento da defesa. Consequentemente, a circunstância de a alteração de factos comunicada ao arguido comprometer a sua defesa pode determinar a qualificação daquela como substancial. Mas isso já não sucede quando se verifiquem dificuldades na defesa, sejam elas de maior ou menor dimensão. Comprometimento da defesa ocorrerá quando ela seja inviabilizada mas não quando esteja dificultada. Na primeira situação os direitos de defesa do arguido sofrem uma compressão inaceitável. Na segunda situação essa compressão é equilibrada face às finalidade do Estado de prossecução da justiça – o Estado prossegue na realização de um julgamento que atenda aos factos alterados e conhecidos na sequência da prova produzida, permitindo, ao mesmo tempo, que o arguido adeqúe a sua defesa a essas alterações. E salvo o devido respeito por opinião distinta, no caso dos autos, com as alterações comunicadas, a defesa dos arguidos não ficou comprometida. Podia-lhes ser mais ou menos difícil, mas não se tornou impossível. E mesmo as dificuldades que os arguidos apontam estão muito mais relacionadas com as vicissitudes do próprio processo (a sua especial complexidade, o tempo que demorou a realização da audiência de julgamento e o nível de profundidade e extensão da defesa) do que com as alterações comunicadas em si. Se atentarmos naquilo que todos os arguidos dizem facilmente se apreende que as invocadas dificuldades de defesa têm a ver com a fase processual em que as alterações de factos comunicadas foram realizadas e não propriamente com as alterações em si. Nenhum deles afirma que é impossível defender-se da alteração de factos comunicada por ela ter esta ou aquela característica. O que dizem é que “agora” ser-lhes-á difícil organizar a defesa. Além disso, os arguidos abordam praticamente todas as questões que colocam nos autos do ponto de vista da essencialidade dos seus direitos de defesa, elevando-os a um exponencial que nem a lei ordinária nem a lei constitucional lhes dá. Os arguidos não estão preocupados em equilibrar os direitos de defesa com os restantes valores constitucionalmente consagrados, mas a verdade é que isso é im(...) ao Tribunal por lei. Diga-se, ainda, que o arguido E não exclui a possibilidade de as alterações temporais e espaciais serem qualificadas como não substanciais, desde que elas não invadam o núcleo do tempo e do lugar dos crimes imputados. Mas o que já não deixa expresso é o que deva entender-se por essa «invasão» do núcleo do tempo e do lugar. Aliás, nem este arguido nem os outros dois. E essa falta de explicitação é tanto mais relevante quanto o núcleo de tempo e lugar do crime pode ser mais ou menos circunstanciado e ter distintas valorações em face do tipo de crime que esteja em causa. Em conclusão, aderindo, como aderiram os arguidos recorrentes, à definição de alteração substancial de factos a que atendeu o Tribunal recorrido, com todas as explicitações que atrás deixámos enunciadas, considera-se que as alterações de factos objecto do presente recurso não transformam o quadro factual descrito na pronúncia em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refere aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual. Do ponto de vista do homem médio, a imagem e valoração social que se tem de cada uma das unidades factuais alteradas mantém-se dentro dos elementos essenciais ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, ainda que tenham sido modificados os locais ou as datas em que determinado arguido praticou um certo acto com relevo sexual com um dos menores. Para melhor o explicitar, seguiremos aqui, para todas as alterações comunicadas objecto deste recurso, o mesmo tipo de abordagem que já acima se fez para a primeira das alterações comunicadas ao arguido E (a que dizia respeito à Alameda (…)). Comecemos pela comunicação ao arguido E de que factos ocorridos em dia não concretamente apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta-feira, numa casa de que aquele tinha a disponibilidade, sita na Avenida (…), em (…), podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999, numa casa sita na Avenida (…), em (…), perto da zona (…), local onde o arguido E se encontrava quando o assistente AK aí foi. A data do acontecimento continua a ser não concretamente apurada, mas em vez de uma sexta-feira do mês de Junho de 2000, passou a estar indiciado o abuso sexual como tendo ocorrido entre os meses de Abril e Julho de 1999. O arguido continua a ser o arguido E e o menor abusado o AK. O local do cometimento do crime mantém-se numa casa sita na Avenida (…), em (…), particularizando-se a localização da casa como sendo perto da zona (…). Pergunta-se, seguindo o pensamento de Souto Moura, este facto processual ainda é o mesmo, na medida em que o acontecimento histórico que enquadra ainda é visto pelo comum das pessoas como sendo o mesmo? Não podemos deixar de concluir positivamente. Para o comum das pessoas, para o homem médio, o acontecimento histórico é aquele abuso sexual alegadamente perpetrado pelo arguido E sobre o menor AK numa casa na Avenida (…). Não é irrelevante conseguir determinar a data, ainda que aproximada, em que isso aconteceu – até porque o tipo de crime pressupõe que o menor se enquadre dentro de uma determinada faixa etária – mas essa circunstância “tempo”, ainda que variando no espaço de um ano, não transforma o acontecimento histórico num outro totalmente diferente. Segue-se a comunicação de uma alteração de data, ainda referente ao arguido E, no sentido de que factos ocorridos dias depois da situação referida no ponto “2. que antecede”, ainda em Junho do ano 2000, podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, mas situado no período das férias escolares do Verão de 1999. Mais uma vez temos um arguido e uma vítima identificada, sendo imputados ao arguido um concreto número de abusos sexuais praticados na pessoa daquele menor. Se uma determinada unidade factual histórica vem descrita como tendo acontecido dias depois de uma outra bem concreta, que indiciariamente se alterou do ano de 2000 para o ano de 1999, a alteração, quanto à situação que ocorre de seguida, também de Junho de 2000 para o período de férias escolares do Verão de 1999, não só é lógica, como não contende com os elementos constitutivos essenciais do crime. Seguindo, desta vez, as palavras de Germano Marques da Silva, os novos factos podem ainda integrar a hipótese de facto histórico descrito no despacho de pronúncia. O cidadão comum não teria dificuldade de assim o identificar. A comunicação que se segue reporta-se já ao arguido C. Comunicou-se ao arguido que factos ocorridos num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, podem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos de idade. Mas o conjunto factual tem a seguinte descrição de contexto (cf. fls. 20876): “Num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, o arguido C encontrou-o nas instalações da (…) da AX, onde se situava o seu Gabinete. Valendo-se do ascendente que a sua posição lhe conferia, disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave daquele edificio que habitualmente se encontrava fechada e onde praticamente ninguém ia. Aí, o arguido C começou a acariciar o pénis do menor, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis que, entretanto, tinha (...) fora das calças. Depois, segurou a cabeça do menor, forçando-o a dobrar-se e introduziu-lhe o pénis erecto na boca, aí o tendo friccionado. De seguida, pegou na mão do menor e forçou-o a manipular-lhe o pénis até ejacular. Após a prática dos actos descritos, o arguido C deu ao menor 3 mil escudos e abandonou o local.” Como é bom de ver, quanto aos elementos constitutivos do tipo de crime (para além da relevância que a idade do menor tem), esta realidade histórica, ocorrida no gabinete do arguido C na (...) da AX, transmutou-se numa distinta porque indiciariamente se veio a apurar que os factos terão ocorrido não entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999 mas em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999? Manifestamente entendemos que não. Alteração de factos ocorreu sem dúvida, mas não transformando o crime noutro diverso. Ele continua a ser uma e a mesma realidade histórica perfeitamente identificável. Ao arguido K comunicou-se que factos ocorridos na casa do mesmo, sita na (…), n.º (…),(…), em (…), podem ter ocorrido em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas. Muito à semelhança do que acima já foi dito quanto à alteração de local comunicada ao arguido E na situação relativa à Alameda (…), vamos precisar também o que se dizia no despacho de pronúncia em termos circunstanciais quanto a esta situação concreta: “No mês de Março ou Abril do ano de 2000, em data em concreto não determinada, o arguido K contactou com o arguido A e pediu-lhe que levasse a sua casa um menor da AX, a fim de o sujeitar à prática de actos sexuais consigo. O arguido A pediu então ao AP que acompanhasse o AT, à data com 13 anos de idade, a casa do arguido K. Nesse dia, da parte da tarde, o AP acompanhou o AT à casa do arguido K, sita na Rua (…), n°. (…),(…), em (…), onde o primeiro já havia estado, aí tendo sido sujeito à prática de actos sexuais por tal arguido, conforme se descreverá noutro capítulo deste despacho de acusação. Ao chegarem à casa do arguido K, os menores foram recebidos por uma pessoa de identidade desconhecida, que encaminhou o AT para a sala, tendo o AP abandonado o local, sem que tivesse chegado a entrar na residência. Entretanto, o arguido K, que aguardava a chegada do menor, dirigiu-se ao mesmo e conduziu-o a um quarto da residência. Aí, o arguido K manipulou o pénis do menor, até este ejacular, tendo o menor também manipulado o pénis do arguido. De seguida, o arguido K introduziu o seu pénis na boca do menor, que chupou, a mando daquele. Depois, o arguido K virou o menor de costas para si, dobrando-o pela cintura introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado. Após a prática dos actos descritos o arguido K deu ao menor cerca de 6 mil escudos, tendo este voltado ao (...). Posteriormente, o arguido K entregou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, como pagamento por este lhe ter levado o menor AT nas condições descritas.” O que indiciariamente se alterou foi uma concretização precisa do local onde os factos aconteceram, passando da casa do arguido K, sita na Rua (…), n.° (…),(…), em (…), para uma localização mais vaga, numa moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as Ruas (…) e a Rua (…) e na zona dessas ruas. E isto torna o crime imputado ao arguido num crime diverso? Não vislumbramos como isso possa ocorrer. Os factos imputados ao arguido são bem claros quanto aos elementos típicos do crime. A moradia onde ocorreram não é seguramente um deles. O crime mantém-se o mesmo, pois o quadro factual não é diferente quanto aos elementos materialmente relevantes de construção e identificação factual. Aliás, a circunstância de indiciariamente não se conseguir com segurança apontar a moradia do arguido K como tendo sido o local onde o crime aconteceu, mas uma localização mais ampla, onde aquela também se pode inserir, mostra bem como o que é essencial se mantém suficientemte indiciado, o que só não acontece com aquilo que é contextual, lateral. No que tange com o critério da interferência na defesa do arguido, vimos já que ela só pode ter força suficiente para impedir que a alteração seja tratada no âmbito do dis(...) no art. 358.º, n.º 1, do CPP se aquela defesa ficar comprometida, inviabilizada, o que não é o caso. Aliás, a zona da casa até se mantém no círculo restrito da área do (…), não se excluindo até que fosse no local indicado no despacho de pronúncia. Finalmente, comunicou-se a este mesmo arguido que os factos ocorridos em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998, sendo que o AP à data tinha 13 anos de idade, podem ter ocorrido em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998, tinha o AP 12/13 anos de idade. Iremos mais uma vez socorrer-nos do contexto e das circunstâncias desta concreta situação, tal como consta do despacho de pronúncia. Conforme resulta de fls. 20906 a 20907 dos autos, “em data em concreto não determinada de meados do ano de 1998, o arguido A foi contactado pelo arguido K que lhe pediu que levasse ao seu (...) um menor da AX a fim de, no mesmo, perpetrar actos sexuais. O arguido A abordou o menor AP, que à data tinha 13 anos de idade, mandando-o “ir ter com o Doutor K” ao (...) do mesmo, sito na (...) (…), n° (…) em (…), o que o menor fez. No interior do (...), o arguido K sentou o AP ao seu colo, e deu-lhe diversos beijos na cara, tendo tentado beijar o menor na boca, sem que o conseguisse por o mesmo desviar o rosto. O arguido K manipulou o pénis do menor, enquanto acariciava o seu próprio pénis que retirou para fora das calças. Também colocou o seu pénis na boca do menor que, obedecendo ao que lhe foi ordenado pelo arguido, o chupou. Depois o arguido K introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. O arguido K, depois de ter sujeitado o menor AP à prática de tais actos deu-lhe cerca de mil escudos.” Desta factualidade o que foi alterado foi a circunstância temporal, que deixou de estar limitada a data em concreto não determinada de meados do ano de 1998, para passar a estar indiciada em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998, o que pode influenciar na idade do menor, pelo que se passou a considerar a idade de 12/13 anos em vez da de 13 anos. É possível afirmar que esta realidade fáctica resultou desvirtuada na sua essência na sequência da mencionada alteração? Trata-se de um caso em tudo idêntico aos anteriores. Há alterações de facto circunstanciais a comunicar aos arguidos, para que em função disso organizem a sua defesa, mas não há um crime diferente do que estava indiciado no despacho de pronúncia. Também já se disse, e reitera-se, que as alterações comunicadas não inviabilizaram a defesa dos arguidos, muito embora as possam ter dificultado (especialmente se ponderadas outras circunstâncias envolventes deste processo, que não as alterações em singelo; os próprios arguidos o referem, quando invocam que passaram vários anos e que isso dificultaria voltar a organizar a defesa, bem como quando aludem à extensão e amplitude do objecto do processo, tudo considerações que extravasam a questão da qualificação de uma alteração de factos como substancial ou não). Também por isso, não podem ser consideradas como alterações substanciais. Note-se que os arguidos não deixaram de se defender das alterações comunicadas, apresentando requerimentos de prova quanto a elas. É sabido que esses requerimentos de prova não foram admitidos pelo tribunal na sua totalidade – com a valia que adiante será apreciada. No entanto, o facto de o tribunal não admitir, em toda a sua extensão, os requerimentos de prova apresentados pelos arguidos não escamoteia que eles foram apresentados e em parte admitidos, o que equivale a dizer que a sua defesa dos arguidos foi possível e que os respectivos direitos não ficaram irremediavelmente comprometidos (os arguidos conseguiram configurar o modo de se defenderem e de assegurarem os seus direitos, o que não implica que a defesa apresentada fosse admissível). Uma nota final merece a afirmação feita pelo recorrente C de que o despacho de comunicação de alterações por parte do Tribunal foi proferido ex officio e não constitui decisão da promoção do Ministério Público, vindo até a comunicar a indiciação de factos em termos não coincidentes com os que constam daquela promoção. Desta afirmação não retira o arguido/recorrente qualquer consequência, nem este Tribunal o pode fazer. Nos termos do dis(...) no art. 358.º do CPP nada impede o Tribunal de, oficiosamente, comunicar aos arguidos as alterações de factos que tenha por conveniente. Por outro lado, se o Tribunal a quo não tomou posição expressa quanto ao requerido pelo Ministério Público nesse particular, trata-se de arguição que àquele competia fazer em devido tempo, o que não fez (até porque nas comunicações de alterações que o Tribunal realizou acabou por tomar posição quanto a muitas dessas alterações que haviam sido propostas pelo Ministério Público). Nestes termos, nada mais há a referir quanto a tal. Improcede, assim, na totalidade, a primeira questão abordada no presente recurso. A segunda questão a apreciar no recurso – igualmente formulada pelos arguidos E, C e K – reporta-se à invocada inconstitucionalidade dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, quando interpretados no sentido de que as alterações de factos comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar e/ou do tempo dos crimes imputados, não são substanciais, por violação do art. 32.º da CRP. O arguido E, no que também aqui é secundado pelos outros dois arguidos, limita-se a invocar, no que concerne com esta questão da inscontitucionalidade, que o Tribunal a quo ao interpretar as mencionadas normas no sentido indicado violou, por erro de interpretação e aplicação, as garantias de defesa do arguido, conferidas pelo art. 32.º da CRP. O Tribunal recorrido, no seu despacho, desde logo invoca diversos Acórdãos do Tribunal Constitucional, em que fica patente não ser o regime da alteração não substancial de factos, consagrada no art. 358.º do CPP incompatível com a garantia dos direitos de defesa do arguido, consagrados no art. 32.º da CRP. Reportamo-nos, nesse particular, aos Acórdãos nºs. 442/99, 544/2006, 237/2007 e 226/2008. Voltamos a chamar à colação o que o Tribunal Constitucional expõe no já citado nos autos Acórdão n.º 330/97, em que consta: “O dis(...) nos arts. 358 e 359 CPP87 corresponde, grosso modo e de forma mais explicitada e actualizada, aos arts. 443, 444, 447 e 448 CPP29. Beleza dos Santos considerava (RLJ 64/17-19) haver aqui uma disposição a favor do arguido e que era necessário não a converter em disposição odiosa para o mesmo, como seria uma prática que representasse «uma imputação de surpresa, feita no acto da qualificação, sem que estivesse prevenido de que, sendo por ela acusado, dela tinha que se defender». Sempre, pois, presente a ideia do favor defensionis e que o arguido, em nome deste princípio, deve ser avisado para ter a possibilidade de preparar, reformular o seu plano de defesa (CPP-358,1 e 359,3). (…) Se resultar de alteração dos factos (quer se trate de factos novos que não tenham relação com os da acusação quer simplesmente constituam uma modificação destes – vd., sobre tal, Ed. Correia in Teoria do Concurso, p. 400) a articulação do princípio acusatório com o contraditório impõe que o arguido seja avisado para poder preparar a defesa em relação a essa alteração. (…) A mera redução da matéria de facto da acusação, por supressão de algum dos factos aí constantes, situa-se exactamente nesta área, pelo que a alteração da incriminação daí resultante não requer, da parte do Tribunal, qualquer advertência ao arguido. O favor defensionis está satisfeito. A ideia de diálogo a que o princípio do contraditório alude, «de tal modo que a decisão possa ser um convencimento da comunidade e do arguido quanto à justiça da decisão» (G.M.Santos, op. cit., p. 58) foi concretizada, esse diálogo estabeleceu-se em pleno ou o arguido teve a possibilidade de o estabelecer em pleno com o acusatório." A transcrita passagem do acórdão revela-nos, assim, ter ocorrido redução da matéria de facto constante da acusação, relativamente à qual se tinha assegurado ao arguido o contraditório. Ora, essa redução teve como efeito autonomizar a norma incriminadora do artigo 144º do Código Penal que o artigo 281º do mesmo diploma consumira – como, semelhantemente, ocorreu na situação contemplada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Abril de 1991, anteriormente citado. Não se surpreende, nessa medida, que o tribunal recorrido tenha, no caso vertente, procedido a qualquer interpretação normativa passível de censura, seja por afectação das garantias de defesa, seja por inobservância do princípio do contraditório: não resultou da diversidade do tipo incriminador uma alteração essencial do sentido da ilicitude típica do comportamento do arguido”. Como se pode constatar, até nas situações em que o que acontece é uma redução da matéria indiciada e não uma alteração que contenha factos novos, o Tribunal Constitucional considera – e bem em nosso entender – que não há qualquer comunicação a fazer ao arguido e que este não vê comprometidos os seus direitos de defesa. Mas o Tribunal Constitucional tem-se pronunciado diversas vezes sobre a matéria da comunicação de alterações e sua compatibilidade com os princípios constitucionais da defesa. Maioritariamente fê-lo a propósito da situação então mais controversa da comunicação de alteração de qualificação jurídica. Destes, seleccionamos aqui o Acórdão do TC n.º 387/2005, in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050387, citado em parte neste acórdão num outro recurso interlocutório inter(...) pelo arguido A, (...) que aqui se espelha bem o entendimento do Tribunal Constitucional quanto à compatibilização entre o princípio do acusatório, o dever de procura da verdade material e as garantias de defesa do arguido: “o art. 358º, n.º 1, do CPP dispõe que, se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, com relevo para a decisão da causa, o presidente comunica a alteração ao arguido. Julgamos que esta norma não pode deixar de significar que o tribunal faz um juízo sobre a prova já produzida e, concluindo que a prova aponta para factos que não correspondem exactamente aos descritos na acusação ou na pronúncia, comunica ao arguido os factos tal como os considera indiciados pelas provas produzidas. Esse juízo sobre os factos que resultam da prova produzida não pode ser um juízo definitivo já que o citado art. 358º, n.º 1, do CPP prevê que ao arguido seja concedido o tempo necessário para a preparação da defesa. A esse juízo sobre os factos que terão resultado da prova produzida poderá chamar-se “convicção provisória” ou designar-se por outra qualquer expressão que traduza a realidade tida em vista pelo citado normativo. (…) Quando o julgamento é da competência de um tribunal colegial, o juízo sobre os factos que resultam da prova já produzida é o que for expresso após deliberação dos juízes ou dos juízes e jurados que constituam o tribunal. Uma vez que o art. 358º, n.º 1, do CPP prevê que o presidente do tribunal comunica ao arguido a alteração dos factos que se entende estar verificada relativamente aos que foram descritos na acusação ou na pronúncia, a verificação desse alteração não poderá deixar de resultar de deliberação quando o tribunal for colegial. (…) Como já resulta do que acima se expôs, o art. 358º, n.º 1, do CPP, ao prever que o tribunal comunique ao arguido alteração dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, está a admitir que o tribunal possa fazer um juízo quanto aos factos antes da decisão final. É, aliás, o resultado da constatação do facto psicológico de que a convicção quanto aos factos que se investigam é progressivamente compreensiva, ou seja, é progressivamente enriquecida pelas provas a que sucessivamente se vai tendo acesso, por forma a que a convicção quanto aos factos que se investigam vai evoluindo consoante os sucessivos “apports” probatórios. Quanto ao momento e ao modo como se forma sucessivamente a convicção relativamente aos factos averiguados, para os efeitos do art. 358º, n.º 1, do CPP apenas interessa o momento em que o tribunal conclui que a prova produzida aponta para uma alteração dos factos descritos na acusação ou na pronúncia. Na prática esse momento surgirá normalmente quando, produzida toda a prova requerida, ao examinar essa prova o tribunal conclui que a mesma aponta para uma alteração dos factos descritos na acusação ou pronúncia. Se tal acontecer depois de encerrada a discussão da causa, esta terá de ser reaberta para ser produzida a nova prova que venha a ser requerida pelo arguido (aplicação por analogia dos arts. 361º, n.º 2, e 371º, n.º 1, do CPP “ex vi”do art. 4º do mesmo diploma). (…) O recorrente sustenta que tais dimensões normativas do art.º 358º do CPP violam os princípios do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa. Debrucemo-nos sobre a primeira questão suscitada. O Tribunal Constitucional tem-se pronunciado repetidas vezes sobre o conteúdo constitucional de tais princípios, nomeadamente no quadro de apreciação de questões de (in)constitucionalidade relativas aos art.ºs 358º (alteração não substancial dos factos descritos na acusação e na pronúncia) e 359º (alteração substancial), ambos do CPP. Entre eles conta-se o Acórdão n.º 674/99, publicado no Diário da República II Série, de 20 de Fevereiro de 2000 (também em BMJ, n.º 492, pp. 62, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 45º vol., pp. 559), que o recorrente convoca como caso pretensamente análogo e onde o Tribunal concluiu pela inconstitucionalidade das “normas contidas nos artigos 358º e 359º do CPP, quando interpretados no sentido de se não entender como alterações dos factos – substancial ou não substancial – a consideração, na sentença condenatória, de factos atinentes ao modo de execução do crime, que, embora constantes ou decorrentes dos meios de prova juntos aos autos, para os quais a acusação e a pronúncia expressamente remetiam, no entanto aí se não encontravam especificamente enunciados, descritos ou discriminados, por violação das garantias de defesa do arguido e dos princípios do acusatório e do contraditório, assegurados no artigo 32º, n.ºs 1 e 5 da Constituição da República”. Discreteou-se, então, aí:«[…] 61. No seu artigo 32º, a Constituição da República Portuguesa estabelece, entre os direitos, liberdades e garantias pessoais, as Garantias de processo criminal. Nos termos do preceituado nesse artigo 32.º, «o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso» (n.º 1), sendo que o mesmo «processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório» (n.º 5). A propósito do princípio acusatório, dizem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que ele «é um dos princípios estruturantes da constituição processual penal» e «uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial», significando essencialmente que «só se pode ser julgado por um crime precedendo acusação por esse crime por parte de um órgão distinto do julgador, sendo a acusação condição e limite do julgamento» (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed. Revista, Coimbra Editora, 1993, nota IX ao artigo 32º, pág. 205). Relativamente ao princípio do contraditório, assinalam os mesmos comentadores que ele implica o dever «de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão», bem como o «direito de audiência de todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afectados pela decisão», e ainda o «direito do arguido de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo», sendo certo que «o princípio abrange todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição» (ibidem, nota X ao artigo 32º, pág. 206). 62. Os princípios do acusatório e do contraditório, enquanto princípios estruturantes do processo penal, movem-se necessariamente no quadro de um sistema processual que tem também – como vimos – de assegurar todas as garantias de defesa, ou seja, no quadro de um processo penal justo e equitativo. Escreveu-se no Acórdão n.º 172/92 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 22º vol., págs. 350), acerca das garantias de defesa do arguido: O processo penal há-de, assim, configurar-se – como se disse já – em termos de ser "um due process of law, devendo considerar-se ilegítimas, por consequência, quer eventuais normas processuais, quer procedimentos aplicativos delas, que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido" (cf. acórdão deste Tribunal n.º 61/88, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 375, p. 138; cf. também o já citado acórdão n.º 393/89). [...] O princípio do contraditório, encarado do ponto de vista do arguido, pretende, antes de mais, realizar, o seu direito de defesa. "A máxima audiatur et altera pars ou ne absens damnetur" é, justamente, no dizer de EDUARDO CORREIA,"a expressão", nesse sentido, "do princípio do contraditório" (Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 110º, p. 99). Dizendo com a Comissão Constitucional, no seu Parecer n.º 18/81, publicado em Pareceres da Comissão Constitucional, volume 16º, p. 147: o sentido essencial do princípio do contraditório "está, de uma forma mais geral, em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão (mesmo só interlocutória) deve aí ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade, ao sujeito processual contra o qual é dirigida, de a discutir, de a contestar e de a valorar". A descoberta da verdade material em processo penal há-de, portanto, necessariamente compaginar-se com aquelas garantias de defesa do arguido. E assim se reconhecerá, como corolário do princípio do acusatório, o da vinculação temática do tribunal e da correlação entre a acusação (e a pronúncia) e a sentença. 63. Como realça Jorge Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, Coimbra, 1974, pág. 45), a concepção típica de um «processo acusatório» implica a «estrita ligação do juiz pela acusação e pela defesa», em sede de determinação do objecto do processo como em sede de poderes de cognição e dos limites da decisão. E, mais adiante (id., pág. 145), acerca da vinculação temática do tribunal, como efeito consubstanciador dos princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal, afirma este autor: Deve pois firmar-se que objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal [...] e a extensão do caso julgado. Como também se pode ler no Acórdão n.º 173/92 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 22º vol., págs. 361): A questão não pode ser apresentada ao tribunal para julgamento sem que tenha sido previamente delimitado o seu objecto num documento (a acusação, ou requerimento acusatório) que indique os factos de que o arguido é acusado e qual o seu enquadramento jurídico-penal (esta questão está sistematicamente concatenada com o princípio da legalidade vigente em direito penal substantivo, do qual decorre a necessidade de fixação prévia de um determinado quadro fáctico e de uma determinada moldura penal adequada a esse quadro fáctico); por vezes, exige-se até que um juiz se pronuncie previamente sobre essa acusação (através da pronúncia) antes de a questão ser apresentada ao tribunal do julgamento. Mas a acusação não basta, porque é preciso dar também ao arguido a possibilidade de produzir ele próprio um documento (a contestação) que contrarie o anterior. Em segundo lugar, o princípio da correlação entre acusação e sentença. Como a acusação fixa o objecto do processo, o julgamento incide sobre a matéria da acusação e o tribunal não pode, por sua iniciativa, ou por iniciativa da parte acusadora, apreciar questões diversas das descritas na acusação, julgar um arguido por factos que foram atribuídos a outro, nem muito menos julgar pessoas nela não indicadas. Uma norma legal que o permitisse violaria este princípio processual penal. Como assinala António Quirino Duarte Soares (ibidem), do «princípio da acusação (segundo o qual é esta que define e fixa perante o juiz o objecto do processo)» decorre logicamente um outro princípio, corolário do primeiro - «tal princípio é o da identidade do objecto do processo, que representa a ideia de que o objecto da acusação se deve manter idêntico, o mesmo, desde aquela, até à sentença final». Ora, este princípio da identidade do objecto do processo significa, desde logo, que a correlação entre a acusação e a pronúncia se há-de prolongar numa necessária correlação entre a pronúncia e a sentença. Quando esta imputar ao arguido factos absolutamente novos, estranhos ao objecto do processo, tal como este resulta da pronúncia, ainda aí se estará, pois, perante uma ofensa ao princípio do acusatório. 64. De resto, o Tribunal Constitucional tem-se por diversas vezes debruçado sobre esta temática, no âmbito das garantias de defesa do arguido, não apenas nos já citados Acórdão n.º 172/92, Acórdão n.º 173/92 e Acórdão n 330/97, mas também no Acórdão n.º 279/95 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 31º vol., págs. 389 e segs.), no Acórdão n.º 16/97 (Diário de República II Série, de 28 de Fevereiro de 1997), no Acórdão n.º 130/98 (Diário da República II Série, de 7 de Maio de 1998) e no Acórdão n.º 442/99 (inédito), entre outros. No quadro dessa numerosa jurisprudência, o Tribunal já teve ocasião de apreciar as normas dos artigos 358º e 359º do Código de Processo Penal. Fê-lo sempre, todavia, e até ao momento, apenas do ponto de vista da conformidade constitucional da mera alteração da qualificação jurídica dos factos imputados ao arguido, designadamente no que se refere ao respeito pelo princípio do contraditório. Assim, afirmou-se, a este propósito, no já mencionado Acórdão n.º 330/97: O "direito a ser ouvido", enquanto direito a dispor de oportunidade processual efectiva de discutir e tomar posição sobre quaisquer decisões, particularmente as tomadas contra o arguido, integra as garantias de defesa, no que à respectiva estratégia respeita, de outro modo se violando o princípio do contraditório. Compreende-se que assim seja uma vez que, em princípio, a faculdade de alteração da incriminação constante da acusação, se operada sem ao arguido se dar ensejo de a conhecer e de organizar a sua defesa em função da mesma, pode-lhe causar grave prejuízo (neste sentido, para além dos arestos citados, mencionem-se inter alia, os acórdãos nºs. 402/95, 22/96 e 596/96, publicados no Diário da República II Série, de 16 de Novembro de 1995, 17 de Maio e 6 de Julho de 1996, respectivamente). No presente recurso já não importa, porém, apurar em que medida é constitucionalmente possível proceder à alteração das qualificações jurídicas, mas antes em que casos se está perante uma verdadeira alteração de factos e em que medida é lícito efectuar tais alterações de factos, sem que se mostrem violados os referidos princípios do acusatório e do contraditório ou as garantias de defesa do arguido. [...]». Reafirma-se aqui a fundamentação acabada de transcrever na parte que respeita à explicitação do sentido jurídico-constitucional dos princípios do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa. Porém, não obstante haver uma réstia de semelhança entre os dois casos, são bem diversas, ao contrário do que o recorrente pretende fazer crer, as dimensões normativas do art.º 358º do CPP que nesse aresto e no presente caso são alegadas como estando em confronto com tais princípios constitucionais. Será possível ver a semelhança no facto de em ambos os casos a sentença ter considerado factos que não estavam concretamente especificados ou descritos no despacho de pronúncia mas que, no primeiro caso, se podiam extrair dos documentos para os quais esta remetia e, neste caso, se podiam inferir como normais ilações de facto dos factos sinteticamente descritos. No entanto, existe uma diferença abissal entre as duas situações, como se denota do ponto 65 de tal aresto, que não poderá deixar de induzir a uma diferente conclusão quanto à (in)conformidade constitucional das dimensões normativas impugnadas. É que, embora nas duas situações a alteração do factos não importe a imputação de crime diverso ao arguido nem a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, na situação analisada no Acórdão n.º 674/99 havia sido seguido o entendimento de que essa alteração não tinha de ser comunicada ao arguido e ser-lhe concedido prazo para a sua defesa; ao invés, no presente caso, o entendimento normativo seguido foi o de que essa alteração obrigava a que a mesma fosse comunicada ao arguido, este fosse ouvido sobre ela e que fosse concedido prazo para a sua defesa. Ora, numa situação destas em que os factos não conduzem à imputação ao arguido de um crime diverso nem à agravação dos limites máximos das penas aplicáveis; em que a imputação de um crime continuado punível nos termos dos art.ºs 30º, n.º 2, e 79º, do Código Penal se afigura mais favorável que a punição a título de concurso de crimes do mesmo tipo legal prevista no art.º 77º do mesmo código que uma diferente compreensão dos factos descritos na pronúncia poderiam em alternativa sugerir e em que é dada oportunidade ao arguido de se pronunciar sobre esses factos novos e deles se defender, nomeadamente, contestando-os e oferecendo prova que, uma vez considerada útil à descoberta da verdade material, é produzida no tribunal, não se vê como se possa sustentar saírem violados aqueles princípios constitucionais. Em situações paralelas à da primeira dimensão normativa cuja constitucionalidade o recorrente aqui impugna, o Tribunal Constitucional concluiu pela conformidade constitucional da “norma do art.º 358º do CPP na parte em que confere ao juiz poderes para, oficiosamente, seleccionar novos factos surgidos na audiência de julgamento, comunicando a alteração ao arguido e concedendo-lhe o tempo necessário para a preparação da sua defesa”. Referimo-nos aos Acórdãos n.ºs 130/98, publicado no Diário da República II Série, de 7 de Maio de 1998, e n.º 442/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. Discreteou-se, a propósito, no primeiro aresto, sendo tal argumentação também assumida no segundo: «[..] é uma exigência do princípio da plenitude das garantias de defesa do arguido que os poderes de cognição do tribunal se limitem aos factos constantes da acusação; porém, se, durante a audiência, surgirem factos relevantes para a decisão e que não alterem o crime tipificado na acusação nem levem à agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, respeitados que sejam os direitos de defesa do arguido, pode o tribunal investigar esses factos indiciados «ex novo» e, se se vierem a provar, integrá-los no processo, sem violação do preceituado no artigo 32º, n.ºs 1 e 5, da Constituição. 5. – (…) Ponto firme de partida é assim o de que a decisão recorrida, que negou provimento a recurso ordinário de julgamento proferido na primeira instância, entendeu que os factos referidos na audiência, e que originaram a aplicação da norma constante do artigo 358º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ou não eram factos novos ou, a considerarem-se como novos, não implicariam uma alteração substancial da acusação. Mas, tendo sido assim, logo se deu aos arguidos a oportunidade processual de organizarem a sua defesa quanto a esses factos então especificados. Nessa perspectiva, não se vê como possam ter sido feridos os direitos de defesa e do contraditório, sendo até lícito deduzir-se que esses mesmos direitos ganharam em consistência. Com efeito, não tendo havido alteração do objecto do processo e tendo-se mantido a acusação, os referidos factos poderiam, sem mais, ou seja, sem os elementos adicionais que o contraditório posterior viesse a revelar, porventura no sentido de infirmar a sua procedência, contribuir de imediato para a formação da convicção do julgador. Na decisão recorrida não se encontra, portanto, uma interpretação inconstitucional da norma questionada [...]»”. Está mais do que esclarecida a posição do Tribunal Constitucional quanto à conformidade do art. 358.º, n.º 1, do CPP, com o texto constitucional, mormente o art. 32.º da CRP, bem como o conteúdo dos princípios constitucionais aqui em consideração. Contudo, o que os arguidos pretendem é que se considere a inconstitucionalidade dos arts. 1.º, al. f), e 358.º do CPP, quando interpretados no sentido de que as alterações de factos comunicadas, que modificam a narração do núcleo do lugar e/ou do tempo dos crimes imputados, não são substanciais. Mas os arguidos nunca expressaram em que casos é que acontece a alteração do núcleo do lugar e/ou tempo dos crimes. Será sempre que há alteração do lugar ou do tempo? E se assim não for, em que se consubstancia o núcleo do tempo e do lugar? Parece evidente que os arguidos não podem pretender que qualquer alteração de tempo ou lugar consubstancie uma alteração substancial dos factos. Aliás, o próprio arguido E, nas suas alegações de recurso, a fls. 64128, se refere a uma situação de comunicação de alteração de localização que lhe foi feita como sendo não substancial e que aceitou como tal. Resta, portanto, perceber o que querem os arguidos significar com o núcleo do lugar e/ou do tempo, porque das suas motivações de recurso tal não resultou compreensível. Para este Tribunal de recurso o núcleo do lugar e/ou tempo só poderá reportar-se a elementos essenciais da descrição dos elementos típicos do crime, porque só esses poderão comprometer a defesa dos arguidos e comprimir de tal forma os seus direitos de defesa, que importem a aplicação do dis(...) no art. 359.º do CPP. Daí que tenhamos considerado as alterações de factos comunicadas aos arguidos como não substanciais, interpretando os arts. 1.º, al. f), e 358.º do CPP em conformidade com o art. 32.º da CRP. Acresce que os arguidos, embora defendendo a inconstitucionalidade dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, quando interpretados no sentido de que as alterações de factos comunicadas, que modificam a narração do núcelo do lugar e/ou tempo dos crimes, não são substanciais, por violação do art. 32.º da CRP, não indicam um único Acórdão do Tribunal Constitucional do qual se possa retirar que a invocada inconstitucionalidade já alguma vez foi reconhecida. Curiosamente, o que mais do que um dos arguidos recorrentes faz é invocar nas suas alegações o Ac. do STJ de 20 de Novembro de 2006, in BMJ 461, págs. 321 a 330. Segundo esse aresto: “(…)É essencial no processo criminal a oportuna informação ao arguido dos factos que lhe são imputados, sem o que se não pode esperar que este defina uma estratégia ajustada para exercer o seu direito à defesa. E aquela informação pressupõe uma identificação cabal, através dos seus contornos mais inportantes que variam de caso para caso mas que, de um modo geral, incluirão as circunstâncias de lugar e de tempo em que tiveram lugar. É evidente que as circunstâncias que influem na determinação da medida da pena relevam para a decisão, de um modo, aliás, directo e imediato. Mas há circunstâncias que, não influindo naquela medida, no entanto contribuem para situar os factos de uma maneira ou de outra nos planos temporal ou geográfico, o que pode levar a que o arguido, no exercício daquele seu direito, desenvolva, consoante as circunstâncias, produção de prova diversa. E, podendo desta prova resultar uma maior ou menor eficácia da sua defesa, temos de concluir que tais circunstâncias relevam, agora indirectamente, para a decisão. De outro modo, não se dariam ao arguido todas as necessárias e razoáveis garantias de defesa. Só que esta forma de relevância não deve também ficar restringida à repercussão que a alteração factual tenha na estratégia da defesa, tal como foi estruturada na contestação; na sentença consideram-se, não só os factos alegados pela acusação e pela defesa, mas outros que resultem da discussão da causa – n.º 2 do art. 368.º –, devendo também em relação a estes últimos ser respeitadas as garantias de defesa do arguido, a primeira das quais será o princípio do contraditório e consequente possibilidade de sobre tais factos tomar posição. Desde que os factos surgidos ex novo possam razoavelmente repercurtir-se na actividade de defesa, o que só caso a caso se poderá avaliar, compreende-se a necessidade de fazer funcionar o mecanismo do artigo 358.º. (…) Já se disse atrás que no caso destes autos a variação temporal foi, nem mais nem menos, de um ano. É fácil imaginar a repercussão que esta divergência pode ter na prova a que o arguido decida lançar mão, o que nos leva a dar como verificado o pressu(...) acima mencionado – a possibilidade razoável de repercussão na actividade da defesa. (…) E é legítimo admitir, no necessário pressu(...) da sua presunção de inocência, que o arguido, se tivesse sido oportunamente alertado de que se lhe imputavam factos afinal ocorridos um ano depois da data que lhe fora inicialmente indicada, poderia ter encaminhado num outro sentido a sua actividade probatória. Um ano de distância é, seguramente, bem mais que «a pequena divergência» admitida no citado acórdão de 6 de Outubro de 1966. Temos, pois, por demonstrado que o tribunal recorrido omitiu, nos termos indicados, o cumprimento do que é dis(...) no artigo 358.º” (sublinhado nosso). Aqui temos, pois, um Ac. do nosso STJ, do qual os arguidos apenas quiseram salientar o excerto que sublinhámos. Escamoteou-se foi que a alteração de factos comunicada de uma diferença de espaço temporal de um ano foi qualificada pelo STJ como alteração não substancial de factos, à semelhança daquilo que neste processo o Tribunal a quo também entendeu. É, pois, manifesto que a interpretação que o tribunal recorrido fez dos arts. 1.º, al. f), e 358.º do CPP, é inteiramente conforme ao art. 32.º da CRP, não ocorrendo a invocada situação de inconstitucionalidade dos arts. 1.º, al. f), e 358.º, do CPP, quando interpretados no sentido de que as alterações de factos comunicadas aos arguidos não são substanciais, por violação daquele imperativo constitucional. A terceira questão que no presente recurso interlocutório vem colocada, respeita à alegada extemporaneidade das comunicações de alterações de factos realizadas – por não ser admissível o momento processual em que foram comunicadas as alterações de factos aos arguidos, designadamente por se tratar de momento posterior às alegações –, sendo esta questão comum aos arguidos E, C e K. E a questão vem assim colocada porquanto nos autos, efectivamente, foram comunicadas alterações de factos aos arguidos, dando-se cumprimento ao dis(...) no art. 358.º do CPP após terem sido realizadas as alegações orais, e reabrindo-se para o efeito a audiência de julgamento. Para o arguido E, o “decurso da audiência referido no art. 358.º do CPP como âmbito temporal da admissibilidade de alterações, tem que ser intrepretado e aplicado em sintonia com o dis(...) nos arts. 360.º e 361.º, dos quais resulta que, na tramitação normal, finda a produção de prova, incluindo a sequente à comunicação de alterações, se seguem as alegações orais e a estas últimas declarações do arguido. A interrupção desta sequência na tramitação processual normal estaria apenas admitida em casos excepcionais de produção de prova superveniente, conforme o n.º 4 do art. 360.º. Sem a demonstração de tais excepcionalidade e superveniência, a admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literalidade legal – “ no decurso da audiência” –, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa conferida pelo art. 32.º da CRP e do processo equitativo im(...) pelo art. 20.º, n.º 4, e pelo art. 6.º da CEDH”. Acrescenta, ainda, que “é manifesto que, se algumas alterações fossem indiciadas no decurso de 5 anos de audiência de julgamento (…), tal indiciação teria ocorrido muito antes do início das alegações orais, permitindo e impondo o respeito pela sequência processual dos arts. 358.º, 360.º e 361.º do CPP. Se houvesse indiciação de alterações, ela resultaria, primordialmente, se não exclusivamente, como resulta da exclusivamente, como resulta da experiência judiciária, das declarações do assistente, prestadas em 28.10.2005 (fls. 34868 a 34848) e em 2.11.2005 (fls. 34941 a 34951)”. Já o arguido C invoca que “Se bem que a lei não determine expressamente o tempo em que as alterações de factos podem ser requeridas ou aquele em que Tribunal, caso as decida ex officio, as deverá comunicar, certamente que as normas constantes dos arts. 358.º e 359.º do CPP não terão sido pensadas para mega-processos, como é o caso dos presentes autos. De igual modo não será neutra ou irrelevante a inserção sistemática daqueles preceitos legais, que surge antes da norma referente às alegações orais, que, por sua vez, precede a norma referente às últimas declarações de arguido e ao encerramento da discussão (devendo entender-se, até por razões de elementar lealdade processual, que tais alterações se devem suscitar, como literalmente dispõe o art.º 358.º, n.º 1 do CPP, “no decurso da audiência”, nomeadamente no momento em que se descortina a alteração não substancial). Ainda que possa aceitar-se que – literalmente – tal comunicação pode ter lugar até ao final da discussão da causa, em momento imediatamente anterior à sentença, a interpretação da oportunidade da convocação do intituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal – “Se no decurso da audiência” –, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do sistema processual penal e constitucional, numa compaginação do princípio do asseguramento de todas as garantias de defesa com o princípio da verdade material.” Também o arguido K convoca, para as suas alegações de recurso, argumentação semelhante à já expendida pelos referidos arguidos, defendendo que “O Arguido tem presente que a iniciativa de alteração dos factos prevista nos art.ºs 358.º e 359.º do CPP pode ter lugar, a requerimento de qualquer um dos sujeitos processuais, ou oficiosamente, até ao final da discussão da causa. Contudo, a interpretação da oportunidade da convocação do instituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal – “se no decurso da audiência” –, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do sistema processual penal, constitucional, numa compaginação dos direitos de defesa e respectivas garantias e do dever de perseguir a verdade material. Referimo-nos ao confronto, não necessariamente antagónico e dissonante, entre os direitos do Arguidos, e também dos Assistentes, e o dever de descoberta da verdade material e realização da justiça no caso concreto (…)”. O Ministério Público, na 1.ª instância, defendeu nesse particular a posição de que “Ao consignar, no Despacho, que as alterações se lhe suscitaram, em face da prova produzida em audiência de julgamento, o Tribunal dá conta, de forma insofismável, que foi no decurso daquela que se produziu a convicção indiciária que culminou com a comunicação das alterações. Alegam as Defesas que, na sistemática do CPP, porque o artº 358º precede as normas que contemplam, quer as Aelgações Orais, quer as últimas declarações dos Arguidos, a comunicação das alterações deveria preceder, igualmente, umas e outras. A tese assim expendida, além do mais, menoriza, subestimando-as, quer as Alegações, quer as últimas declarações dos Arguidos. A umas e outras há-de reconhecer-se a virtualidade de convencerem o Tribunal, em função dos argumentos, factos e razões que, nelas, sejam produzidas, não sendo de excluir a possibilidade de levarem a produção suplementar de prova (possibilidade, essa, que, embora a título excepcional, está plasmada no nº 4, do artº 360º, do CPP e que, como é sabido, teve aplicação no decurso das Alegações produzidas neste processo). (…) Porque assim é, nada obsta a que a comunicação, nos termos do artº 358º, tenha ocorrido no momento em que ocorreu, antes se compreendendo que assim seja e, não, no próprio decurso da audiência, sob pena de a dinâmica da produção de prova poder levar a sempre indesajáveis alterações de alterações. Será, a todos os títulos, mais racional, que a comunicação ocorra no termo, ou no dealbar, da produção de prova, pressupondo que, para que assim seja, se tenha já iniciado o processo deliberativo, no âmbito do qual a necessidade daquelas se suscite”. A questão da extemporaneidade da comunicação das alterações de factos é colocada pelos arguidos numa dupla vertente, como mais à frente se verá, mas aquilo que aqui em concreto importa é saber se ao realizar as comunicações de alterações de factos em momento posterior às alegações o Tribunal a quo violou os arts. 358.º, 360.º e 361.º, do CPP. O art. 358.º, n.º 1, do CPP reporta-se à alteração não substancial de factos e expressamente refere que se no decurso da audiência se verificar uma alteração. O art. 360.º refere-se ao procedimento subsequente à produção de prova, nomeadamente às alegações orais. E o art. 361.º ao procedimento subsequente às alegações orais, designadamente às últimas declarações do arguido e encerramento da discussão. Em sentido estritamente literal, nestes normativos apenas o art. 358.º se refere expressamente ao momento da comunicação das alterações (neste caso não substanciais), colocando-o no decurso da audiência. O decurso da audiência não exclui o momento posterior às alegações, pelo que o elemento literal da norma em apreço está de acordo com o procedimento seguido pelo Tribunal a quo. Mas será, então, que conclusão diferente resulta do modo como devem ser interpretados estes normativos, por um lado a menção a decurso da audiência do art. 358.º e, por outro, a conjugação dos artigos 358.º, 360.º e 361.º. A resposta à questão tem necessariamente que ser encontrada na razão de ser da comunicação ao arguido das alterações de facto e que é, como abundamente já vimos, que sejam acautelados os seus direitos de defesa. Logo, a comunicação desde que ocorra no decurso da audiência de julgamento, e isso não exclui, a fase posterior às alegações, assegura a possibilidade de o arguido apresentar a defesa que tenha por conveniente e que a mesma seja produzida e considerada na decisão final. A avaliação que ao tribunal compete fazer é uma avaliação indiciária da prova produzida e que entende justificar a alteração de factos a comunicar. Se essa prova indiciária só se completa no momento final da audiência de julgamento, será nesse momento que o tribunal terá que fazer a comunicação ao arguido. Aliás, sendo o julgamento da competência do tribunal colectivo, a avaliação, ainda que indiciária, da prova produzida, supõe deliberação dos membros desse tribunal. Da articulação dos arts. 358.º, 360.º e 361.º do CPP resulta que a deliberação do tribunal colectivo acontece após as alegações. Assim sendo, se somente após a deliberação do tribunal colectivo é que o tribunal esteve em condições de avaliar convenientemente a prova, então poderá ser esse o momento oportuno e adequado para se decidir pela necessidade de realizar alterações de factos, com a subsequente comunicação ao arguido. Naturalmente que o Tribunal, mesmo sendo colectivo, não está impedido de realizar uma avaliação da prova indiciária em qualquer momento anterior da audiência de julgamento e de a comunicar ao arguido. Tudo dependerá da extensão da prova indiciária a apreciar para a realização da concreta alteração de factos a comunicar. Neste caso concreto, tendo presente o teor das alterações de factos comunicadas pelo tribunal, é evidente que a prova a ponderar, ainda que de modo indiciário, teve que ser muito ampla, até porque muito ampla foi a prova produzida. E diga-se que não pode aceitar-se, como fazem os arguidos, que as alterações de factos comunicadas resultaram apenas das declarações dos assistentes, pois o próprio tribunal a quo fundamentou a razão de ser dessas alterações num conjunto de meios de prova que vão muito além das simples declarações dos asssistentes. Consequentemente, não podiam esperar que as comunicações de alterações ocorressem em momento subsequente à prestação de declarações pelos assistentes, fazendo tábua rasa da restante prova que já estava indicada para ser produzida. E muito menos convence o argumento de que a comunicação de alterações de factos em momento posterior às alegações viola as garantias de defesa do arguido, que com elas é surpreendido, em momento processual em que já não as esperava (pois já tinham sido produzidas as alegações), quando precisamente o que se pretende é que o arguido se possa defender dessas alterações e não que seja surpreendido com os factos dados como provados na decisão final, sem que tivesse qualquer oportunidade para se pronunciar sobre eles e de apresentar a sua defesa. Paulo Pinto de Albuquerque refere, em anotação ao art. 358.º do CPP, que “A comunicação ao arguido da possibilidade de convolação tem lugar durante a audiência de julgamento no tribunal de primeira instância, isto é, antes da decisão da convolação propriamente dita, que tem lugar na sentença.” (in Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Portuguesa, 3ª ed., pág. 907). Portanto, aquilo a que tem de se atender como limite para a realização da comunicação de alterações de factos é à sentença. E isto seja o processo um processo normal ou um processo de especial complexidade, como é o caso. Mas se assim é nos processos ditos normais, muito mais será nos chamados “mega processos”, em que o grau de exigência na apreciação da imensa prova produzida se eleva a um exponencial máximo. Aliás, é vasta a jurisprudência dos nossos tribunais sobre esta matéria. Segundo o Ac. do STJ de 26/05/2004, in www.stj.pt, “A expressão no decurso da audiência”, usada no artº 358º, n.º 1, do CPP, não significa que a alteração tenha que ser notada e comunicada até ao fim da discussão da causa, uma vez que a audiência só é encerrada depois de publicada a sentença, razão porque o tribunal não comete qualquer nulidade ao dar cumprimento ao dis(...) naquele artigo já depois de produzidas as alegações orais finais”. Também do Supremo Tribunal, temos o Ac. de 16/06/2005, in www.stj.pt, onde se refere“A observância do dis(...) nos artigos 358º e 359º não tem tempo específico e preciso para ter lugar. Como resulta da lei e do seu escopo, o que importa é que, no decurso da audiência, seja o arguido colocado perante a possibilidade de o tribunal levar avante uma alteração, substancial ou não, dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, com o evidente objectivo de lhe assegurar todos os direitos de defesa também quanto à alteração enunciada. Mas tendo em conta o objectivo da lei – que ao arguido seja proporcionada oportunidade de se defender, em plenitude, dessa alteração de factos – aquele decurso da audiência só termina com a prolação da decisão”. O Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 20/10/2004, in www.dgsi.pt toma também posição quanto a esta questão, expressamente determinando que “O mecanismo processual previsto no artigo 358º nº 1 do Código de Processo Penal de 1998 pode ser accionado até à publicação da sentença”. O Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09-03-2009, in www.dgsi.pt, onde pode ler-se que o “mecanismo previsto no artigo 358.º do CPP para o caso de alteração não substancial dos factos pode ser desencadeado até à publicação da sentença, pois só com esta se encerra a audiência.” O próprio Tribunal Constitucional abordou a questão no seu Ac. n.º 387/2005, de 13/07/2005, in www.tribunalconstitucional.pt, dizendo que“não se vê que a circunstância de a alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia ser comunicada ao arguido após deliberação dos juízes que compõem o tribunal colectivo que julga a causa em 1.ª instância, dando-lhe ao mesmo tempo prazo para a sua defesa, nomeadamente, para os poder contestar e oferecer prova a produzir na mesma audiência, ofenda os princípios constitucionais do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa, quando a deliberação sobre tais factos novos e sobre todos os demais é assumida pelo tribunal como uma posição provisória sobre o julgamento da matéria de facto. Sendo o julgamento da matéria de facto da competência de um órgão colegial, qualquer posição do tribunal sobre se ocorrem factos novos susceptíveis de serem tidos como uma alteração não substancial de factois apenas é possível ser tomada se se efectuar deliberação que constate a existência dos indícios desses factos e decida ordenar a sua investigação. A existência de uma tal deliberação surge como necessidade imposta pela natureza colegial do tribunal que tem de formar a decisão: esta em vez de corresponder à vontade funcional de uma só pessoa que não precisa para a formar de conferenciar com outrem, como acontece no juiz singular, é a resultante da vontade funcional dos vários juízes. (…) é irrelevante que essa comunicação se chame leitura de acórdão ou que se designe a mesma por qualquer outra expressão”. Nestes termos, considera-se sem qualquer fundamento a invocação pelos arguidos de que nos autos ocorreu violação dos arts. 358.º, 360.º e 361.º do CPP, por as comunicações de alterações de factos terem ocorrido em momento posterior às alegações, sendo por isso extemporâneas. Nessa sequência, improcede também este fundamento de recurso dos arguidos. Contudo, os arguidos, como se disse já, colocam a questão da extemporaneidade das comunicações de alterações de factos numa outra vertente, que constitui a quarta questão a apreciar neste recurso, pois consideram também terem sido violados os arts. 358.º e 359.º, n.º 1, do CPP, por extemporaneidade injustificada da comunicação das alterações, designadamente dado o lapso de tempo decorrido desde a produção da prova e a produção da defesa e a altura em que foram comunicadas as alterações de factos. Para o arguido E, “a violação das garantias de defesa está altamente patenteada pela conjugação da grande intempestividade da decisão com a enorme amplitude das alterações, quer no aspecto espacial quer no aspecto temporal, questionando como reestruturar a defesa decorridos tantos anos. Acrescenta que a admissibilidade de alterações indiciárias não substanciais é justificada pelo princípio da verdade material. Mas este princípio não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo art. 18.º da CRP. Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso da audiência, o que também está estatuído e de forma directa no art. 6.º, n.º 3, al. a), da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da acsuada da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. É para este arguido manifesto que, se algumas alterações fossem indiciadas no decurso de 5 anos de audiência de julgamento, tal indiciação teria ocorrido muito antes do início das alegações orais. Mais entende que se houvesse indiciação de alterações, ela resultaria primordialmente, se não exclusivamente, como resulta da experiência judiciária, das declarações do assistente, prestadas em 28/10/2005 e em 02/11/2005. Quatro anos entre as declarações hipoteticamente indiciantes e a comunicação de decisão de alterações consideradas indiciadas não seria de modo algum o mais curto prazo que o recorrente tem direito. Diz o recorrente ser inadmissível procurar responsabilizar o Tribunal recorrido pela comunicação tardia das alterações, com violação das garantias de defesa. Mas, objectivamente, independentemente de qualquer responsabilidade, tais garantias foram violadas, não podendo postergar-se as consequências dessa violação. E muito menos pode ser responsabilizado o recorrente – nem os co-arguidos – pelo volume e longevidade do processo. Acaba por concluir que a enormidade e anormalidade do processo não são imputáveis aos arguidos, mas à arquitectura acusatória, que o Tribunal recebeu e manteve, sem ter expurgado o objecto do processo de questões marginais aos imputados crimes. E as alterações comunicadas eram percepcionáveis no decurso do processo, designadamente logo no primeiro ano da audiência de julgamento, sem prejuízo para o regular desenvolvimento do processo, evitando a irracionalidade da tramitação a que agora se procede e irá continuar a proceder-se e, sobretudo, possibilitando meios de defesa, agora inalcansáveis.” Já o arguido C defende que “é de presumir que o que consta da pronúncia corresponde à versão dos factos que o assistente apresentou, tão-só e apenas. E tendo tido lugar mais de 450 sessões de julgamento, há já quatro anos e meio que é bem conhecido o teor dos depoimentos prestados pelo assistente em julgamento, sendo que o Tribunal a quo só passados quatro anos sobre o fim das declarações do assistente e quase um ano sobre o fim das alegações orais, tendendeu começar a comunicar alterações de factos. E entende que com a comunicação de alterações de factos não está em causa a subsequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efectivo das garantias de defesa consagradas no art. 32.º da CRP. No caso vertente, tratando-se de um mega-processo cujo julgamento se prolonga há mais de cinco anos e em que a prova carreada para os autos pela acusação se limitou às declarações dos assistentes, tendo estas terminado mais de três anos antes do fim da discussão, a aplicação da norma constante do art. 358.º do CPP deverá revestir-se de particulares cuidados, sob pena de vir a pôr-se inapelavelmente em causa as garantias de defesa dos arguidos. Para este arguido, no presente caso, não há nem houve qualquer justificação atendível para que o Tribunal não tivesse comunicado as alterações que entendesse em momento anterior àquele em que deliberou fazê-lo, o que consistiria na única forma de, em homenagem ao princípio da lealdade processual, assegurar as garantias de defesa, a um processo justo e equitativo e à igualdade de armas entre acusação e defesa. Chega mesmo a afirmar que o Tribunal impossibilitou o efectivo exercício da defesa, pela inaceitável prorrogação do julgamento no tempo que inevitavelmente se seguirá.” Também o arguido K vem expor que “o Tribunal a quo só passados quase quatro anos sobre o fim das declarações dos assistentes e quase um sobre o fim das alegações orais, entendeu comunicar ao recorrente alterações de factos. O arguido tem presente que a iniciativa de alteração dos factos prevista nos arts. 358.º e 359.º do CPP pode ter lugar, a requerimento de qualquer um dos sujeitos processuais, ou oficiosamente, até ao final da discussão da causa. Contudo, a interpretação da oportunidade da convocação do instituto em causa não se pode ater ao seu elemento literal – “se no decurso da audiência” –, antes tem de ser integrada pelos restantes princípios informadores do distema processual penal, constitucional, numa compaginação dos direitos de defesa e respectivas garantias e do dever de perseguir a verdade material. Referimo-nos ao confronto, não necessariamente antagónico e dissonante, entre os direitos dos arguidos, e também dos assistentes, e o dever de descoberta da verdade material e realização da justiça no caso concreto, ainda que, como refere Figueiredo Dias, “…deve ter-se presente que o princípio da investigação que integra e completa o princípio do contraditório não tem por missão essencial suprir as deficiências dos representantes das «partes», sob pena de se transformar o processo de contraditório em inquisitório”. Com a comunicação de alteração de factos ao ora recorrente não está, pois, em causa, a subsequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efectivo do direito de defesa, no que se inlcui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimentos efectivo das garantias de defesa consagradas no art. 32.º da CRP. E a verdade é que, no presente caso, não há nem houve qualquer justificação atendível para que o Tribunalo não tivesse comunicado as alterações que entendesse em momento anterior àquele em que deliberou fazê-lo, o que consistiria na única forma de, em homenagem ao princípio da lealdade processual, assegurar as garantias de defesa, a um processo justo e equitativo e à igualdade de armas entre acusação e defesa. O Tribunal teve oportunidade, ao longo de cinco anos de audiência de julgamento, de apreciar a prova carreada para os autos pelos vários sujeitos processuais, o que levaria a supor que estaria mais do que suficientemente habilitado a proferir uma decisão, pelo que nem sequer se vislumbra que a alteração só agora comunicada se revista de relevo para a decisão da causa. A comunicação de alterações de factos com arrimo no dis(...) no art. 358º do CPP também sob esta vertente se apresenta ao recorrente como surpreendente e absolutamente inesperada, atento o momento processual em que vem a ser proferida.” O Digno Magistrado do Ministério Público junto da 1.ª instância, na sua resposta, salientou que “Ao longo da abordagem que acaba de produzir, o MºPº foi deixando expressas, embora de forma, porventura, esparsa, as razões pelas quais entende que as garantias de defesa, constitucionalmente tuteladas, não sofreram qualquer compressão, designadamente, porque a própria norma cuja aplicação suscitou a invocação de desconformidade constitucional, congagra o direito de as Defesas reorganizarem as suas estratégias, indicando, ou rwquerendo, novos elementos de prova. Aliás, o Tribunal concedeu, para o efeito, o prazo requerido. Poderá, assim, conluir-se que, para o MºPº, a interpretação que subjaz ao Despacho proferido ao abrigo do art.º 358.º, do CPP, é absolutamente conforme à CRP, designadamente às normas invocadas – artº 6º, da CEDH, com referência aos artºs 8.º e 16º, e, ainda, artºs 18.º, 20.º, n.º 4 e 32.º, nºs 1, 2 e 5, da CRP. O Tribunal Constitucional já, por várias vezes, se pronunciou pela conformidade do art.º 358.º, do CPP, com a Lei Fundamental, interpretado em diversas perspectivas e dimensões, mas sendo constante e transversal o entendimento segundo o qual, a referida norma, assegura, plenamente, as garantias de defesa, a estrutura essencialmente acusatória do processo, e o direito a um julgamento justo e equitativo. Invoca-se, igualmente, uma pretensa violação do art.º 6º, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), por descaracterização do processo, enquanto processo justo e equitativo e decidido em tempo útil. No que à exigência de um processo justo e equitativo se alega – em bom rigor, de uma mera invocação se trata –, pouco haverá a considerar, (...) que não se concretizam quaisquer factos que configurem a violação do princípio da equidade. À comunicação de eventual alteração, seja de novos factos, seja de qualificação jurídica, operadas, uma e outra, ao abrigo do artº 358º, do CPP, corresponde adequada e proporcional possibilidade de defesa, por parte dos Arguidos, não se alcançando, por isso, em que se possa traduzir a violação, não só, de tal princípio, como do que lhe é correlativo, o princípio da igualdade das armas. (…) Já quanto ao princípio que impõe o julgamento da causa em tempo razoável – cfr. artº 6º, nº 1, da CEDH – cumprirá, desde logo, salientar, que, ao contrário do que, não poucas vezes, se invoca, ele não consagra direitos exclusivos dos arguidos, acolhendo, antes, direitos extensivos aos que, no âmbito das causas sujeitas a Juízo, aí lutam pelos seus interesses. (…) O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sempre que chamado a pronunciar-se sobre as violações ao artº 6º, da CEDH, tem produzido Jurisprudência que, reiterada, tabelar e literalmente, enuncia o princípio, segundo o qual, o Tribunal, nesta matéria, leva em conta, segundo as circunstâncias, nomeadamente, a complexidade da causa, bem como o comportamento dos intervenientes e das autoridades judiciárias. (…) Para o Mº Pº, a conclusão, segundo a qual, o artº 6º, da CEDH, deve, desde já, ter-se por violado, no segumento relativo ao tempo decorrido, é absolutamente prematura.” Como se vê, aquilo que os arguidos aqui chamam à colação é concretamente a circunstância de a comunicação das alterações de facto lhes ter sido realizada praticamente no fim do julgamento, tendo este tido uma duração de cinco anos, sem que – no seu entender – houvesse qualquer justificação para essa realidade e assim pondo em causa na sua plenitude os direitos de defesa dos arguidos. É inegável que o julgamento teve a duração que é conhecida, assim como os momentos temporais que os arguidos consideram nas suas motivações de recurso. O que é discutível é saber se houve justificação para que a comunicação das alterações fosse realizada na data em que o foi e se, havendo justificação, ainda assim não deveriam ter sido realizadas as comunicações por prejudicarem os direitos de defesa dos arguidos. E mais uma vez salta à vista esse elemento que os arguidos dão como pressu(...) do raciocínio que desenvolvem: que a única prova indiciariamente valorada pelo Tribunal a quo como fundamento das alterações comunicadas foram as declarações dos assistentes. Já acima se disse que os despachos que procederam à comunicação de alterações de factos se encontram fundamentados – adiante veremos se de modo suficiente ou não –, e como facilmente se constata pela simples leitura dos mesmos, indicam ter na sua base a ponderação das declarações dos assistentes, mas muitos outros meios de prova produzidos ao longo de toda a audiência de julgamento. Aliás, mesmo que a final tenha sido com base nas declarações dos assistentes que essa prova indiciária se produziu, o Tribunal teve que ouvir toda a demais prova produzida para poder chegar a uma conclusão segura de que o que os assistentes declararam em julgamento era a versão indiciariamente mais sustentada dos factos. As declarações dos assistentes poderiam ter sido contrariadas pela muita prova que os arguidos produziram depois delas. Faria algum sentido o Tribunal tomar uma posição, ainda que avaliando prova indiciária, com base apenas nessas declarações, correndo o risco de perceber posteriormente que outros elementos de prova a contrariavam. É óbvio que não. Falece, pois, desde logo, essa premissa de que por terem sido fundamentadas apenas com base nas declarações dos assistentes, as comunicações poderiam ter sido comunicadas temporalmente em momento subsequente à produção daquelas e muito anterior àquele em que realmente o foram. A baliza temporal de prova que o Tribunal tem que considerar para aferir da justificação da oportunidade temporal do momento da realização das comunicações é, pois, a prova que o próprio Tribunal a quo indicou como fundamento dos seus despachos e a data em que foi produzida. E atendendo a essa prova, constata-se que o termo final da sua produção não está assim tão distante do momento em que as alterações foram comunicadas. Além disso, os arguidos conhecem bem a dimensão do despacho de pronúncia e da defesa por si apresentada, pelo que não poderão deixar de entender como necessário ao Tribunal a quo, depois da prova que teve como fundamento das alterações comunicadas, um período de tempo para reflectir sobre essa prova, não podendo escamotear-se que o Tribunal era de composição colectiva e, como tal, teve que deliberar cada um dos elementos de prova em causa para chegar à conclusão de que, indiciariamente, se justificavam as alterações de factos a comunicar. E reflectindo sobre os “tempos” que tais operações implicam, entende este Tribunal como perfeitamente justificado o momento em que as alterações de factos aqui em causa foram comunicadas aos arguidos. Mas, mais uma vez, os arguidos vêm apelar à defesa intransigente dos seus direitos e garantias de defesa para suportar a argumentação da extemporaneidade das comunicações, já que bem vistas as coisas, literalmente, o art. 358.º, n.º 1, do CPP apenas impõe como limite temporal que a comunicação das alterações ocorra durante a audiência de julgamento. O problema dos arguidos é outro: defender que dada a amplitude da acusação e o tempo que demorou a audiência de julgamento, a sua defesa em relação às alterações a final comunicadas se veja dificultada. E não se diga, como chegam a avançar os arguidos, que a prova aqui em causa não é prova complementar, podendo implicar a renovação da prova já produzida relativamente aos factos que lhes eram imputados no despacho de pronúncia. O art. 358.º, n.º 1, do CPP destina-se a dar a conhecer ao arguido a alteração de factos que o Tribunal indiciariamente está a ponderar e a organizar a sua defesa, limitada às alterações que foram comunicadas. Não implica, de modo algum, renovação de prova já produzida, porque essa, aliás, já foi ponderada (para serem realizadas as comunicações), mas sim novos elementos de prova direccionados às alterações comunicadas (o que não impede que, por exemplo, uma testemunha que já depôs volte novamente a ser chamada nessa qualidade, mas apenas para se pronunciar sobre a matéria das alterações, sobre o que elas têm de novo). Sabemos todos que este processo tem uma amplitude acusatória grande, mas a amplitude da defesa não é menor. O julgamento demorou, de facto, cinco anos. Não compete a este Tribunal julgar das causas dessa demora e muito menos se ela se justificou. O que temos que tomar como certo são os elementos que não dependem da visão subjectiva de cada um, eivada de parcialidade e interesses pessoais, que se propõe opinar sobre o assunto, com mais ou menos conhecimento daquilo que realmente está em causa. Trata-se inequivocamente de um processo de especial complexidade. A matéria do despacho de pronúncia é muito extensa. A prova produzida, quer por iniciativa da acusação quer por iniciativa da defesa prolongou-se por anos, o que demonstra bem a sua quantidade e profundidade. Processos desta natureza não surgem nos nossos Tribunais todos os dias, mas alguns outros existem ou existiram e que também são manifestamente complexos. Não obstante, o nosso CPP não contém (nem aqui dizemos que deveria conter) nenhum regime processual específico para o processamento deste tipo de processos, aplicando-se-lhe as normas comuns. E aplicando-se as normas processuais comuns a este processo o resultado em termos de dimensão de matéria de facto, meios de prova, requerimentos, despachos, acórdão final, recursos, etc. é o que facilmente se apreende do simples olhar para o processo físico, que necessita de uma divisão própria para poder ser instalado, tal a dimensão do processado. Nos denominados mega-processos tudo é mais complicado pela dimensão das coisas. Não sabemos, nem essa discussão agora aqui interessa, se tais processos devem ou não continuar a existir tal como têm sido configurados. A nossa realidade é que este processo existe. E aquilo que, no fundo, podemos discutir, como pretendem os arguidos, é se, por existir com estas características, justifica um tratamento diferenciado do comum. A resposta não pode deixar de ser negativa, sob pena de se estar a violar a lei processual penal e os próprios princípios constitucionais, que não podem ser interpretados com excepções nos casos de processos de especial complexidade. Nestes processos – como já se disse – a defesa do arguido é mais complicada, tal como é o trabalho da acusação e o dos juízes, mas ele nunca deixará de se poder reger pelas mesmas normas que nos processos comuns. Aliás, defender a existência de especiais garantias de defesa aos arguidos dos processos de especial complexidade seria até um contra-senso, porque é neste tipo de processos que muitas vezes tratamos da criminalidade mais complexa e grave. Seria dar aos arguidos destes processos prerrogativas e garantias de defesa mais alargadas do que aos arguidos que, julgados nos processos comuns, cometem crimes de menor gravidade. Os arguidos nas suas motivações fazem citações de obras de autores, assim como afirmações suas, com as quais concordamos inteiramente. O arguido E afirma que o princípio da verdade material não pode sobrepor-se aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proprocionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo art. 18.º da CRP. Sem dúvida que assim é. Mas o inverso também é verdadeiro, ou seja, a defesa da plenitude das garantias de defesa não pode sobrepor-se ao princípio da verdade material. Tudo reside no justo equilíbrio entre os interesses em “conflito”. Aqui como em qualquer processo. Também é este arguido que afirma que as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso da audiência, o que também está estatuído e de forma directa no art. 6.º, n.º 3, al. a), da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspectiva obrigação de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. Mas o recorrente insiste, para concluir que as comunicações de alterações não ocorreram no mais curto espaço de tempo, que a indiciação das alterações decorreu primordial ou exclusivamente das declarações dos assistentes, o que já vimos não estar de modo algum suportado no processo e na fundamentação do despacho que comunica as alterações. Mais diz, curiosamente, ser inadmissível procurar responsabilizar o Tribunal recorrido pela comunicação tardia das alterações, com violação das garantias de defesa. Mas é precisamente isso que aqui está em causa, é saber se o Tribunal recorrido, ao comunicar as alterações no momento em que o fez violou a lei e com isso inviabilizou as garantias de defesa dos arguidos. Concordamos com o Digno Magistrado do Ministério Público quando afirma não ser este o momento adequado para ponderar a demora do processo à luz do art. 6.º da CEDH, até porque ele ainda não se mostra terminado. Invocam os arguidos as palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, ao dizer que“O princípio do processo equitativo está previsto nos artigos 20.º, n.º 4, e 32º, n.º 1, da CRP, e, por exemplo, nos artigos 283.º, n.º 3, alª. d), e n.º 7, e 315.º, n.º 4, do CPP: a causa deve ser julgada mediante processo equitativo, que reconheça ao acusador (Ministério Público ou assistente) e ao arguido uma posição de igualdade material (“igualdade de armas”). O princípio representa, pois, uma concretização processual de um princípio mais amplo, o princípio da igualdade.(…) O princípio da lealdade tem uma dupla vertente. Por um lado, respeita à produção de prova e, por outro lado, respeita à condução dos sujeitos processuais no processo, incluindo o juiz e o MP.” ( in Comentário do Código do Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Portuguesa, 3ª ed., págs. 46, 47). Ora, processo equitativo tiveram-no os arguidos por certo, uma vez que tanto o Ministério Público como eles gozaram de uma plenitude de produção de prova provavelmente sem par nos nossos Tribunais, com uma total igualdade de armas (curiosamente só não atendida na nossa lei processual penal nesta situação do art. 358.º, em que só ao arguido é dada a possibilidade de se defender da alteração de factos, ainda que ela seja determinada oficiosamente pelo Tribunal, precisamente porque o normativo se destina à defesa dos direitos do arguido e não de outros sujeitos processuais). Diz-nos o mencionado autor que o princípio da lealdade tem uma dupla vertente. Por um lado, respeita à produção de prova e, por outro lado, respeita à condução dos sujeitos processuais no processo, incluindo o juiz e o Ministério Público. Estamos inteiramente de acordo. Analisando o processo em apreço na sua globalidade encontramos pontos em que poderíamos discutir se ocorreu violação do princípio da lealdade, e porventura não seriam poucos, o que não se vislumbra é que ao Tribunal a quo possam os arguidos apontar qualquer atitude violadora de tal princípio. Aliás, os próprios arguidos evitam dizê-lo expressamente, embora implicitamente não deixem de o fazer. Se há julgamentos em que os arguidos alargam a produção de prova até limites pouco comuns este é seguramente um deles. Vir agora invocar que com isso viram a sua defesa prejudicada pelo decurso do tempo é uma incongruência. Por um lado, procuraram produzir prova com uma amplitude máxima, o que lhes foi permitido pelo Tribunal e, necessariamente, implica que o julgamento se torne mais moroso, por outro, invocam que essa morosidade lhes prejudica os direitos de defesa no processo. Os arguidos (como antes tinha feito o Ministério Público com a acusação), asssumiram a realização de um determinado tipo de defesa, pelo qual são responsáveis. Se uma das consequências dessa defesa é que, em caso de, anos depois, se vir a entender que são de comunicar alterações não substanciais de factos, com a eventual necessidade de produzir mais prova, essa prova se torna mais difícil, os arguidos tinham que ter a noção disso. O instituto da alteração não substancial de factos não é de uso excepcional. Nada do que ocorreu na comunicação de alterações de factos aos arguidos foi inesperado ou uma surpresa. Os arguidos tinham que saber que essa possibilidade existia e existia até ao final da audiência de julgamento e aceitaram-na – tal como a outras consequências da demora do processo – em nome de uma defesa extensa e que cobrisse totalmente a pronúncia contra eles dirigida, tal como a delinearam. Não lhes assiste, pois, qualquer razão, atentos todos os fundamentos já ex(...)s, para invocar que a comunicação de alterações de factos foi extemporânea e injustificada, face ao lapso de tempo decorrido desde a produção de prova e a preparação da defesa. Consequentemente, também aqui, não foram violados os artigos 358.º, 359.º e 1.º, al. f) do CPP, improcedendo mais este fundamento do recurso. Segue-se a invocação pelos mesmos arguidos da inconstitucionalidade do art. 358.º do CPP, na interpretação feita pelo Tribunal subjacente ao tempo em que a decisão recorrida – de comunicação de alteração de factos – foi proferida, por violação dos arts. 20.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, e 18.º, n.ºs 2 e 3, da CRP, e art. 6.º, n.ºs 1 e 3, al. a), da CEDH, o que consubstancia a quinta questão objecto de apreciação no presente recurso interlocutório. Desde logo, vamos começar por relembrar aqui o já acima citado Ac. do Tribunal Constitucional n.º 387/2005, de 13/07/2005, in www.tribunalconstitucional.pt, em que expressamente se diz que“não se vê que a circunstância de a alteração não substancial dos factos descritos na pronúncia ser comunicada ao arguido após deliberação dos juízes que compõem o tribunal colectivo que julga a causa em 1.ª instância, dando-lhe ao mesmo tempo prazo para a sua defesa, nomeadamente, para os poder contestar e oferecer prova a produzir na mesma audiência, ofenda os princípios constitucionais do acusatório, do contraditório e da plenitude das garantias de defesa, quando a deliberação sobre tais factos novos e sobre todos os demais é assumida pelo tribunal como uma posição provisória sobre o julgamento da matéria de facto. Sendo o julgamento da matéria de facto da competência de um órgão colegial, qualquer posição do tribunal sobre se ocorrem factos novos susceptíveis de serem tidos como uma alteração não substancial de factois apenas é possível ser tomada se se efectuar deliberação que constate a existência dos indícios desses factos e decida ordenar a sua investigação. A existência de uma tal deliberação surge como necessidade imposta pela natureza colegial do tribunal que tem de formar a decisão: esta em vez de corresponder à vontade funcional de uma só pessoa que não precisa para a formar de conferenciar com outrem, como acontece no juiz singular, é a resultante da vontade funcional dos vários juízes. (…) é irrelevante que essa comunicação se chame leitura de acórdão ou que se designe a mesma por qualquer outra expressão”. Tendo-se o Tribunal Constitucional pronunciado deste modo quanto a esta mesma questão, é manifesto que a interpretação que o Tribunal recorrido fez dos dispositivos legais em apreço não viola qualquer preceito constitucional. Sem prejuízo disso, vamos tomar posição quanto a cada um dos preceitos que os arguidos entendem violados, dando-se aqui por inteiramente reproduzido tudo quanto já foi ex(...) sobre a questão da extemporaneidade das comunicações de alterações de factos. O primeiro preceito constitucional que se defende ter sido violado é o art. 20.º, n.º 4, da CRP, nos termos do qual “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de uma decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.” “No n.º 4, a Constituição dá expresso acolhimento ao direito à decisão da causa em prazo razoável e ao direito ao processo equitativo. (…) O significado básico da exigência a um processo equitativo é o da conformação do processo de forma materialmente adequada a uma tutela judicial efectiva. (…) A doutrina e a jurisprudência têm procurado densificar o princípio do processo equitativo através de outros princípios: (1) direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de todas as discriminações ou diferenças de tratamento arbitrárias; (2) o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas provas; (3) direito a prazos razoáveis de acção ou de recurso, proibindo-se prazos de caducidade exíguos do direito de acção ou de recurso (…); (4) direito à fundamentação das decisões; (5) direito à decisão em tempo razoável; (6) direito ao conhecimento dos dados processuais; (7) direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar e provar os factos alegados em juízo; (8) direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas. O princípio da efectividade está estreitamente relacionado com o direito à decisão da causa em prazo razoável (n.º 4). Noutras formulações, fala-se em direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, direito a uma decisão temporalmente adequada, direito à tempestividade da tutela jurisdicional. O direito à decisão da causa em tempo razoável pressupõe, desde logo, uma formatação processual temporalmente adequada feita pelo legislador (prazos, recursos). Além disso, o sentido da razoabilidade do prazo aponta para a necessidade da tutela jurisdicional dever assegurar-se em prazo côngruo. A não observância do princípio da razoabilidade temporal na duração do processo só poderá ser justificada nos processos de particular dificuldade ou extensão (…)”. (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2007, págs. 414 a 417). Vendo, assim, explicitado o conteúdo do normativo que os arguidos entendem ter sido violado, não consegue este Tribunal encontrar qualquer fundamento para semelhante afirmação, que, aliás, os próprios arguidos também não concretizam. Vimos já que a comunicação das alterações de factos feita aos arguidos não pode ser considerada extemporânea, logo, também não pode entender-se que não foi observado o princípio da razoabilidade temporal quanto ao tempo em que as alterações foram comunicadas. No que se refere à garantia de um processo equitativo, mais uma vez se salienta que não se vislumbra que neste – como noutros – momentos processuais o processo não tenha sido equitativo. Aos arguidos foram assegurados o direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de todas as discriminações ou diferenças de tratamento arbitrárias, o direito de defesa e o direito ao contraditório, o direito à fundamentação das decisões, o direito à decisão em tempo razoável, o direito ao conhecimento dos dados processuais, o direito à prova e o direito a um processo orientado para a justiça material. Não se verifica, portanto, qualquer inconstitucionalidade, por violação do art. 20.º, n.º 4, da CRP. Os arguidos entendem também – à semelhanças de muitas outras situações processuais – ter sido violado o art. 32.º da CRP, nos seus n.ºs 1, 2 e 5, de acordo com os quais “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”, “todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”, e “o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório”. Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “a fórmula do n.º 1 é, sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas deste artigo, que todas elas são, em última análise, garantias de defesa” (op. cit., pág. 516). Os arguidos usam com regularidade a expressão de que ao agir de determinado modo o Tribunal a quo violou as suas garantias de defesa. Essa afirmação, foi já por nós acima rebatida, aquando da apreciação das terceira e quarta questões suscitadas pelos arguidos. Assim, nesse particular, nada mais se nos oferece dizer do que não encontramos violação das garantias de defesa dos arguidos no que se refere ao momento em que as alterações de factos lhes foram comunicadas. Aliás, aos arguidos competia concretizar porque razão entendem que nesta interpretação que o Tribunal a quo fez dos mencionados normativos foram preteridos os seus direitos de defesa. Basta atentar na globalidade deste recurso para perceber que os arguidos fazem essa invocação dezenas de vezes, parecendo fazer tábua rasa de que o que é estatuído na lei foi cumprido pelo Tribunal a quo. Entende-se que os arguidos discordem, que desejassem que as comunicações de alterações não lhe tivessem sido feitas. Só que ao Tribunal compete cumprir a lei, que neste particular até se refere a dispositivos que têm a sua razão de ser na defesa dos direitos do próprio arguido. Chega a afirmar-se que o Tribunal a quo pelos vários “defeitos” que foram apontados à comunicação de alteração de factos, não a deveria ter feito, tomando posição no acórdão final sobre os factos constantes do despacho de pronúncia e nada mais, assim se garantindo os direitos de defesa dos arguidos. Mas se a lei e os deveres a que o Tribunal a quo está sujeito determinam que em caso de serem indiciadas alterações não substanciais de factos, lhe compete dar cumprimento ao dis(...) no art. 358.º do CPP, não podia ter sido tomada outra posição que não aquela que o Tribunal recorrido tomou, sem qualquer interpretação da lei violadora do art. 32.º da CRP. Prosseguindo, o art. 18.º, n.ºs 2 e 3, da CRP, estatui que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”, sendo que “as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carécter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.” Em anotação a este artigo, referem também Gomes Canotilho e Vital Moreira, “o primeiro pressu(...) material de legitimidade das restrições ao exercício de direitos, liberdades e garantias consiste na exigência de previsão constitucional expressa da respectiva restrição. E o segundo pressu(...) material para a restrição legítima de «direitos, liberdades e garantias», consiste em que ela só pode se justificar para salvaguardar um outro direito ou interesse constitucionalmente protegido.” Ora, no caso vertente, estamos perante um mecanismo processual – o do art. 358.º do CPP – que se destina a salvaguardar um direito constitucionalmente consagrado, precisamente o direito do arguido a uma defesa plena. Logo, perguntamos nós: onde é que os arguidos viram restringidos – e especificamente nesta matéria – os seus direitos, liberdades e garantias? O Tribunal recorrido agiu sempre ao abrigo das normas aplicáveis, garantindo aos arguidos o exercício dos direitos de defesa previstos na lei, motivo pelo qual não pode ter-se como violado o citado normativo constitucional. Finalmente, dizem os arguidos ter sido violado o art. 6.º, n.ºs 1 e 3, al. a), da CEDH, segundo o qual “qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os intresesses dos menores ou a protecção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os intresses da justiça, tendo o acusado direito a ser informado no mais curto prazo, em língua que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada.” Conforme refere Ireneu Cabral Barreto, em anotação ao normativo em apreço, ele apenas significa que “o acusado tem o direito a ser informado no mais curto prazo, em língua que entenda e de forma minuciosa, acerca da natureza e da causa da acusação contra ele formulada, isto é, dos factos materiais que lhe são imputados e da sua qualificação jurídica, para que assim possa preparar a sua defesa; a extensão da informação depende das circunstâncias do caso, mas o acusado deve receber a necessária para compreender o conteúdo da acusação tendo em vista a preparação de uma defesa adequada. E, se no decurso do processo há requalificação jurídica dos factos incriminados, ela deve ser comunicada a tempo de o acusado preparar a sua defesa. A informação deve ser feita no mais curto prazo, o que deve ser apreciado em concreto.” (in A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada, 4ª Edição, 2010, Coimbra Editora, pág. 207). O que os arguidos pretendem afirmar é que o Tribunal a quo interpretando, como interpretou o art. 358.º do CPP, não o fez de acordo com a CEDH, por, em seu entender, não ter comunicado aos arguidos as alterações no mais curto espaço de tempo, de modo a estes prepararem a sua defesa. Dá-se aqui por reproduzido tudo quanto acima já se disse relativamente à adequação temporal da comunicação de alterações feita pelo tribunal. Se ela não foi realizada em momento anterior foi porque tal não era nem possível, nem adequado. Assim, só podemos concluir pela improcedência de mais uma das inconstitucionalidades invocadas pelos arguidos. A sexta questão a abordar neste recurso prende-se com a arguida nulidade/irregularidade do despacho que comunicou aos arguidos alterações de factos, por falta de fundamentação, violando o dis(...) nos arts. 97.º, n.º 5, 358.º e 359.º do CPP (questão suscitada em recurso interlocutório pelos arguidos C e K). O arguido C, apelidando a questão de falta de fundamentação do despacho ou, subsidiariamente, da inadmissibilidade da alteração comunicada por falta de prova da sua indiciação, invoca que o Tribunal a quo ficcionou uma reparação da irregularidade por falta de fundamentação, passando de uma abstracção unitária para abstracções parceladas, sem indicação de nenhuma prova concreta que permita ao recorrente percepcionar o que o Tribunal teve em mente para considerar provadas indiciariamente as alterações e impugná-las directamente por não provadas. Para o arguido, a mera enunciação de meios de prova não permite eficazmente àquele organizar a sua (nova) defesa. Por isso, se o Tribunal entende estar-lhe vedada a indicação das provas indiciárias das alterações, deveria, na salvaguarda de todas as garantias de defesa, abster-se de comunicar alterações da indiciação, decidindo, a final, se estão provados ou não provados os factos tal como imputados na indiciação não alterada. Desde logo, não podemos deixar de salientar que o objecto deste recurso do arguido é, precisamente, a alegada falta de fundamentação do despacho e não a inadmissibilidade da alteração comunicada por falta de prova da sua indiciação. Já está sobejamente assente que não é recorrível a decisão do Tribunal a quo que comunica as alterações aos arguidos, por não se tratar de um acto decisório, mas antes de um acto meramente ordenador do processo. Consequentemente, não pode este Tribunal avaliar da inadmissibilidade da alteração comunicada, quando o despacho que a comunicou não admite recurso. Tudo o que este Tribunal pode sindicar é se esse despacho de comunicação está suficientemente fundamentado, mas já lhe está vedado aferir se as provas comunicadas indiciam ou não as alterações comunicadas. Assim, quando a fls. 64.950 das motivações do seu recurso o arguido invoca que “contendo a nova comunicação de alterações apenas meios de prova, sem indicação de provas concretas, não está ao alcance do recorrente ir além de alegar, quase no vazio, quanto à prova produzida relativamente ao tempo alterado, no âmbito dos meios de prova abstractamente referidos na decisão recorrida e que o recorrente considera que são relevantes quanto a ele”, para depois prosseguir analisando alguns dos indicados meios de prova, tentando convencer de que não são adequados ou que não justificam as alterações indiciárias comunicadas, esquece que a este Tribunal de recurso está vedado fazer esse tipo de valoração, motivo pelo qual apenas nos pronunciaremos quanto à questão da suficiência de fundamentação do despacho que comunicou as alterações e não quanto à questão de saber se a prova justificava ou não as alterações indiciadas e comunicadas aos arguidos. O arguido K, quanto a este tema em particular, refere (em alguns dos excertos que retirámos da sua motivação de recurso) que “não ignora que entre a necessária fundamentação dos despachos proferidos ao abrigo do art. 358º, n.º 1 do C.P.Penal e a necessidade que decorre desta, não resulte a final uma fundamentação confundível com aquela que deve presidir ao julgamento definitivo da matéria de facto, a exarar, naturalmente, no acórdão. Contudo, o recorrente não consegue verdadeiramenter entender o sentido e alcance da decisão nos termos em que genericamente ali se remete para toda a prova produzida em audiência, declarações de arguidos, declarações de assistentes, depoimentos de testemunhas, bem como a menção de abundante prova documental, continuando a não se vislumbrar em concreto quais daqueles elementos de prova leva o tribunal a considerar indiciada as ali preconizadas alterações. Com efeito, não se descortina qualquer motivação que minimamente sustente as alterações comunicadas. Tal comunicação deveria ter sido necessariamente fundamentada pelo Tribunal, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito. Para mais, tratando-se de um processo de especial complexidade, em que a alteração vem tanger de forma incontornável o direito de defesa do arguido, passando no caso a abranger um local indeterminado e novo, bem como para um período temporal indeterminado muito mais alargado, e introduziu no objecto do processo matéria factual absolutamente nova, extensa e relativamente à qual nunca o arguido, ora recorrente, se defendeu, porque nunca foi acusado. A defesa não pode ser eficazmente exercida sem que o recorrente compreenda do que está a defender-se. Face ao ex(...), a fundamentação apresentada equivale à falta de fundamentação, pois abrange toda a prova produzida ao longo de cinco anos de audiência de julgamento, bem como de prova adquirida ainda na fase de inquérito, não descriminando os meios de prova indicados relativamente a cada uma das alterações comunicadas.” O Ministério Público junto da 1.ª instância, escreveu que “Os arguidos entendem que o Tribunal deveria fundamentar o Despacho em termos em tudo idênticos à fundamentação que é exigida às sentenças, ou, quanto muito, à justificação exigível ao Juiz de Instrução, quando profere Despacho de Pronúncia. Que assim seja, é, justamente, afastado pela própria natureza eminentemente acusatória do processo penal português. Como é sabido, uma das marcas impressivas de tal estrutura consiste na diferenciação clara entre as diferentes fases processuais – Inquérito, Instrução e Julgamento. Daí que os impedimentos, taxativamente enumerados no art.º 40.º do CPP, que obstam a que qualquer juiz que, num determinado processo, tenha aplicado medida de coacção prevista nos artºs. 200º a 202º (a)) ou que tenha presidido a debate instrutório (b)), possa intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão, nesse mesmo processo. Desse modo, compreende-se que a fundamentação do juiz da Pronúncia lhe seja exigível, nomeadamente, por explicitação dos indícios que considere verificáveis, justamente porque, estando em causa um juízo precário e perfunctório, ele não se reflectirá, ao menos de forma directa, no que venha a ser a decisão final que culmine um julgamento. Diferentemente se coloca o problema em sede de julgamento. Exigir-se ao Tribunal que fundamentasse, nos termos sobreditos, a comunicação de alteração de factos que opera ao abrigo do artº 358º, do CPP, discutindo e valorando a prova – ainda que a título meramente indiciário –, abstraindo que será o mesmo Tribunal que, a final, ao proferir o Acórdão, terá que fundamentar, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, constituir-se-ia, por um lado, numa virtual pré-valoração da fundamentação do Acórdão, e, por outro lado, na abertura de um espaço potencial de conflitualidade indesejável e virtualmente perniciosa, antecipando, prematuramente, um debate que a Defesa não está impedida de reabrir, (...) que lhe é dada oportunidade de se reorganizar, requerendo produção de prova suplementar. Tão pouco será atendível o argumento segundo o qual, porque se trate de processo de especial complexidade, mais se exigiria ao Tribunal que indicasse, especificadamente, os meios de prova a que atendeu para proceder à comunicação das alterações. Primeiro, porque nada na lei estebelece regime diferenciado, consoante se trate, ou não, de processo de especial complexidade ou de “longa duração”. Depois porque a prova foi produzida em audiência, à vista de todos os Sujeitos Processuais, os quais não podem exigir do Tribunal que lhes forneça um qualquer índice, ou sinopse, actualizados com as incidências do julgamento. A exigência de fundamentação dos actos decisórios, tal como emerge do artº 97º, nº 5, do CPP, há-de conjugar-se com as exigências, especificidades e limitações de outras normas, dando-se por cumprida sempre que, dessa conjugação, resulte o quantum óptimo que, no limite, torne perceptível a razão de ser da decisão”. Os assistentes, indo no mesmo sentido, responderam ao recurso afirmando que: “O Tribunal a quo reparou o seu primeiro despacho e, dentro do que entendeu ser possível fundamentar sem entrar na análise crítica da prova, fundamentou-o. Fê-lo para além dos seu deveres, não estando obrigado a fundamentar. O despacho que comunica as alterações é um despacho interlocutório proferido antes da sentença e que, atendendo a essa natureza tem aqui mais um sentido de comunicação e prevenção, em ordem ao arguido poder organizar a sua defesa face à alteração comunicada. Fazendo, como o pretendem os recorrentes, o Tribunal estará a antecipar a discussão e valoração da prova que deve, como é óbvio, relegar para a decisão final. E, nem se compreende que a fundamentação não intrusiva da decisão final possa ferir direitos de defesa como pretendem os arguidos.” Desde logo, impõe-se salientar que o arguido H havia apresentado recurso interlocutório com idêntico objecto, que constitui o apenso ZK deste processo, e relativamente ao qual foi entendido pelo Tribunal da Relação que o mesmo deveria ser conhecido de imediato, como foi. E o recurso em causa, foi decidido nesta Relação, com a seguinte fundamentação: “(…) A lei processual impõe, naturalmente, que todos os Despachos Judiciais sejam fundamentados, de facto e de direito, por decorrência dos princípios constitucionais invocados pelo recorrente. Porém, “só em casos pontuais, máximo quanto à sentença, acto decisório por excelência, é que a lei específica pormenorizadamente os requisitos da fundamentação” – artigos 374º nº 3 e 379º nº 1 al. a), do Código de Processo Penal. Nos demais casos, entende a Jurisprudência tem entendido que basta que as decisões contenham, ainda que de forma resumida ou sumária, os elementos que permitam concluir que: “a) O julgador ponderou os motivos de facto e de direito da sua decisão – isto é, não agiu discricionariamente; b) a decisão tem virtualidade para os interessados e os cidadãos em geral se convencerem da sua correcção e justeza; e c) o controlo da legalidade não é prejudicado pela forma como foi proferido” No caso em apreço, o Despacho recorrido procede a uma extensa enumeração das provas produzidas em Audiência de Julgamento que constituem a base material em que assentou a sua ponderação de modificação da matéria de facto. É curial referir, que tal modificação não representa um pré-juízo sobre a matéria provada ou não provada mas antes e tão só uma possibilidade de alargamento da esfera de cognição do Tribunal para dar eficaz cumprimento ao princípio da verdade material. E também que, repete-se, não assumindo o Despacho recorrido a natureza de uma decisão final, não lhe era legalmente exigível que procedesse a uma maior ou mais explícita fundamentação que a realizada. Pois que, nunca poderia este Despacho, pela sua própria natureza, frisa-se, antecipar uma decisão de fixação de factos e como tal, indicar ponto por ponto as provas que serviram para firmar a sua convicção quanto à ocorrência, ou não ocorrência, de qualquer facto. Nesta medida, e tendo em atenção todo o ex(...), se conclui pela improcedência do alegado quanto à ausência de fundamentação do Despacho recorrido.” Aqui, não poderemos dizer mais, nem melhor. De acordo com o art. 97.º, n.º 5, do CPP, “os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.” Mas tal como refere Paulo Pinto de Aluquerque, em anotação a este dispositivo legal, “Os actos decisórios dos juízes ou do Ministério Público são sempre fundamentados, especificando-se os motivos de facto e de direito da decisão. O acto da sentença tem uma fundamentação especial (artigo 374) (…)” (op. cit., pág. 266). Ora, aquilo que os arguidos entendem que o Tribunal a quo deveria fazer era uma fundamentação especial, como se de uma sentença se tratasse, quando o Tribunal estava impedido de o fazer, precisamente porque teve que reservar o especial dever de fundamentação para o acórdão final. A fundamentação do Tribunal é a bastante e adequada para o acto decisório em causa, que saliente-se é apenas a decisão de comunicar as alterações aos arguidos e não as alterações comunicadas. O tribunal não podia explicar porque motivo probatório entendia indiciada cada uma das alterações concretas, mas sim justificar porque decidiu comunicar alterações de factos, e isso fê-lo de modo suficiente para a decisão ser apreeendida pelos seus destinatários. Tratando-se, como se trata, da comunicação da indiciação de alterações de factos, a extensão com que os recorrentes pretendem que o Tribunal a quo fundamente, de facto e de direito, esse despacho implicaria uma antecipação da apreciação da prova e da subsunção de direito, inadmissível, pois essa só poderá ser feita no acórdão final. Aliás, os arguidos invocam existir falta de fundamentação do despacho, mas não mostram que não o tenham entendido, nem que não tenham compreendido os seus fundamentos. Eles próprios dão como certo, por exemplo, que as alterações são fundadas exclusivamente nas declarações dos assistentes. Não foi isso que o Tribunal afirmou, mas eles tomam-no como seguro pela interpretação que eles próprios fazem da prova produzida no julgamento. E isso mostra, efectivamente, que a fundamentação de um despacho desta natureza não tem de modo algum a profundidade da fundamentação de uma sentença. O que está em causa são probabilidades indiciárias de as provas a que todos assistiram, indiciarem que determinados factos ocorreram de modo distinto do indicado, no caso, no despacho de pronúncia, não sendo exigível ao tribunal que adiante a apreciação que fez da prova produzida, até porque essa apreciação pode vir a ser diferente depois da prova que os arguidos, na sequência da comunicação de alterações, eventualmente venham a requerer e seja produzida. Mais, se os arguidos não tivessem entendido a fundamentação do despacho não teriam preparado a defesa que prepararam. Os arguidos conheciam, como todos os intervenientes processuais, a prova produzida no julgamento, e a fundamentação que o Tribunal apresentou no despacho de comunicação de alterações foi claramente suficiente para prepararem requerimentos de defesa que pretendiam fossem eficazes em termos de contra-prova. Assim, dando aqui como inteiramente reproduzido tudo quanto já foi decidido, com trânsito em julgado, no acórdão deste Tribunal da Relação, constante do apenso ZK, improcede o recurso dos arguidos C e K na parte em que invocam falta de fundamentação do despacho que lhes comunicou as alterações de factos. À semelhança do que aconteceu em todas as anteriores situações, os arguidos C e K suscitam, na sequência da questão da falta de fundamentação do despacho de comunicação de alterações, a inconstitucionalidade da interpretação normativa conjugada dos arts. 97.º, n.º 5, 358.º e 359.º do CPP, efectuada pelo Tribunal a quo, no sentido de que a comunicação de alterações de factos do despacho de pronúncia se basta com a indicação dos novos factos que considera indiciados e cuja fundamentação se limita a remeter para toda a prova produzida nos autos, por violação dos arts. 205.º, n.º 1, 32.º da CRP, e art. 6º, nºs 1 e 3, als. a) e b), da CEDH, o que constitui a sétima questão a abordar neste recurso interlocutório. Neste particular, o arguido C vem afirmar que “não se descortina na decisão recorrida motivação que minimamente sustente a alteração comunicada. Não bastará, para tanto, a invocação da prova produzida em audiência de julgamento, descrevendo em seguida um rol enumaretivo dos depoimentos prestados por todos os arguidos, assistentes e testemunhas, de todos os documentos dos apensos e ainda da vastíssima documentação dos autos principais, sem qualquer utilidade para o efeito da compreensão do que é que determinou o Tribunal a comunicar tais alterações. O despacho recorrido, proferido nos termos do art.º 358, nrs. 1, 2 e 3 do CPP, é uma decisão sujeita ao princípio do dever geral de fundamentação das decisões, consignado constitucionalmente no art. 205.º, n.º 1, da CRP, e também no art. 97.º, n.º 5 do CPP, normas que, assim, resultaram violadas. Assim, a interpretação normativa das mesmas no sentido em que tal despacho se basta sem fundamentação consubstancia inconstitucionalidade que desde já se suscita e se pretende seja declarada.” Por seu turno, o arguido K argumenta que “não pode haver dúvidas de que o despacho recorrido, proferido pelo Tribunal nos termos do art. 358.º, nºs. 1, 2 e 3 do CPP é, naturalmente, uma decisão sujeita ao princípio do dever geral de fundamentação das decisões, consignado constitucionalmente no art. 205.º, n.º 1 da CRP e também no art.º 97, n.º 5 do CPP. Note-se que esta norma dispõe ainda que devem ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão, logo jamais bastaria remeter apenas, como foi feito, para a fórmula de cómodo: “face à prova produzida em audiência de julgamento” ou “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada). (…) Face ao ex(...), é manifesto que a indicação “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento”, e perante um julgamento com mais de 5 (cinco) anos e a extensão da prova testemunhal, pericial, mas também documental, adquirida ao longo de mais de 7 (sete) anos, em sede de inquérito, instrução e audiência final, não permite à defesa saber concretamente qual a prova produzida que conduziu à decisão de modo a ser passível de contra-prova eficiente e que a mera afirmação de que a comunicação é feita nos termos do art.º 358.º do C.P.P., de modo algum constitui fundamento de direito. (…) A interpretação normativa conjugada dos art.ºs 97.º, n.º 5, 358.º e 359.º do C.P.P. efectuada pelo Tribunal a quo, no sentido de que a comunicação de alteração de factos do despacho de pronúncia se basta com a indicação dos novos factos que considera indiciados e cuja fundamente se limita a remeter para toda a prova produzida nos autos, sendo esta constituída por centenas de declarações e depoimentos de assistentes, testemunhas, peritos e milhares de documentos, é inconstitucional por violação do dever de fundamentação das decisões e das garantias de defesa do arguido consagrados nos art.ºs 205.º, n.º 1 e 32.º da CRP e do princípio a um processo equitativo tal como consagrado no art. 6.º, nºs 1 e 3, als. a) e b) da C.E.D.H..” Também aqui, começaremos por salientar que o arguido H, no recurso com o mesmo objecto e que constitui o apenso ZK do processo, veio a interpôr recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação para o Tribunal Constitucional, que proferiu acórdão no seguinte sentido: “(…) A decisão recorrida não se limitou pois a afirmar que a fundamentação de um despacho, para os efeitos previstos nos nºs 1, 2 e 3 do artigo 358º do CPP, podia ser feita por mera remissão para “mero rol de meios probatórios, de centenas de inquirições de arguidos, assistentes e testemunhas e de milhares de documentos, colocados a eito, sem a exibição de qualquer critério ou a apresentação de qualquer justificação, tal como consta do despacho em causa”. Pelo contrário, notou bem que, por um lado, o grau de fundamentação do referido despacho não seria tão intenso como o de uma decisão final condenatória e que, por outro lado, a própria fundamentação – tal como efectivamente ocorrida nos autos – teria permitido ao recorrente conhecer o objecto da alteração da qualificação jurídica, tanto assim que o próprio recorrente havia requerido meios complementares de prova, com vista a contraditar tal alteração. (…) Do referido despacho decorre que o mesmo não se limitou a apresentar um rol de meios probatórios, tendo antes seleccionado, de modo individualizado, quais os meios pertinentes para a formação da convicção quanto à alteração (…). Em suma, torna-se evidente que a decisão recorrida não aplicou efectivamente a interpretação normativa reputada de inconstitucional pelo recorrente, relativamente ao n.º 1 do artigo 358º do CPP (…). Por último – e a título meramente subsidiário, sublinhe-se –, diga-se ainda que, mesmo que se viesse a conhecer do objecto do presente recurso, é jurisprudência consolidada no Tribunal Constitucional (ver Acórdãos n.º 310/94, n.º 680/98, n.º 147/2000 e n.º 281/2005, disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), que o dever de fundamentação de decisões assume uma geometria variável, podendo ser mais ou menos amplo, consoante se trate de decisões que julgam, de fundo, a questão principal objecto dos autos, ou de decisões meramente interlocutórias. Para além disso, a mesma jurisprudência tem alertado para a circunstância de o legislador ordinário gozar de uma particular liberdade quanto à definição da amplitude do dever de fundamentação, apenas sendo configuradas como inconstitucionais as normas (ou as interpretações normativas) que esvaziem completamente de conteúdo tal fundamentação, designadamente, aquelas que impeçam os sujeitos processuais de apreender o sentido essencial da decisão jurisdicional. Por último, a referida jurisprudência tem admitido, expressamente, a possibilidade de fundamentação mediante mera remissão para outras decisões jurisprudenciais. Assim sendo, e independentemente de um juízo mais profundo (…) a interpretação normativa que assenta na remissão do despacho para os meios probatórios constantes dos autos e produzidos durante a extensa audiência de julgamento aparenta não ser incompatível com a dimensão constitucional do dever de fundamentação de decisões interlocutórias (…)”. Temos, pois, também aqui, uma decisão, transitada em julgado, em que o Tribunal Constitucional se pronuncia expressamente sobre a mesma inconstitucionalidade agora em apreço, pelo que, uma vez mais, temos que considerar como reproduzida toda esta fundamentação que afasta a existência da inconstitucionalidade invocada pelos arguidos, concordando-se inteiramente com o seu teor. Acresce que, o art. 205.º, n.º 1, da CRP se limita a determinar que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.” O imperativo constitucional não afasta, pois, a existência de diferentes níveis de fundamentação, referindo-se precisamente à “forma prevista na lei”, o que significa que quando a lei impõe uma fundamentação específica ou especial ela deve ser realizada. Nos demais casos, a fundamentação deve ser a adequada ao acto decisório que esteja em causa. Gomes Canotilho e Vital Moreira, afirmam a este propósito, “A constituição excepciona do dever de fundamentação apenas as decisões de mero expediente. Mas não impõe igual tratamento à fundamentação de todas as outras decisões judiciais, não estabelece regras quanto ao se e como da fundamentação nem impõe procedimentos metódicos conducentes à fundamentação justa. Parece não oferecer quaisquer dúvidas que, dentre as decisões judiciais em que as funções do dever de fundamentação se revelam particularmente evidentes, devem inclui-se os actos decisórios dos juízes sob a forma de sentença (que conhecem a final do objecto do processo) ou sub a forma de acórdãos (decisão de um tribunal colegial (…)” (op.cit., págs. 527 e 528). Trata-se de posição que está em consonância com o que acima já se afirmou, não se vislumbrando, pois, na interpretação feita pelo Tribunal a quo qualquer divergência com o dis(...) no art. 205.º, n.º 1, da CRP. Os arguidos, além disso, voltam a invocar que esta mesma interpretação dos arts. 97.º, n.º 5, e 358.º do CPP, viola o art. 32.º da CRP. Não há dúvida de que os direitos de defesa do arguido têm uma ampla tutela constitucional, mas ela não é ilimitada nem incompatível com as demais normas constitucionais e processuais, como por vezes os arguidos parecem entender. Não se justifica ir mais além do supra mencionado Acórdão do Tribunal Constitucional que se referiu a esta mesma questão, para concluir que a interpretação do Tribunal a quo também não contraria o art. 32.º da CRP. O arguido K vem, ainda, chamar à colação a violação do art. 6.º, n.ºs 1 e 3, als. a) e b) da CEDH. Não vislumbramos, nem o arguido o explica, de que modo entende que a interpretação feita pelo Tribunal dos arts. 97.º, n.º 5, e 358.º do CPP, ao fundamentar como fundamentou o despacho que comunicou alterações de factos, contende com o dis(...) naquele art. 6.º da CEDH. Aliás, já acima nos referimos a este normativo, precisamente para concluirmos que não se mostra violado. O que o arguido diz a este propósito é que “Tanto mais que atenta a dimensão dos autos, os longos anos em que decorre a audiência de julgamento e o momento da comunicação efectuada, não respeita o princípio de um processo justo e equitativo, tal como exigido pelo dis(...) no art.º 6.º, n.ºs 1 e 3, als. a) e b) da C.E.D.H.”. Assim, se bem entendemos a afirmação do arguido, a invocada violação do mencionado art. 6.º será consequência da dimensão dos autos, dos longos anos em que decorreu a audiência de julgamento e do momento em que as alterações foram comunicadas, e nada tem a ver com a fundamentação do despacho que procedeu a essas alterações. Nestes termos, nem o arguido o diz, nem aqui se vê, que a interpretação que o Tribunal a quo fez do dever do fundamentação do despacho que comunicou as alterações de factos colida de algum modo com o art. 6.º da CEDH. Os arguidos parecem entender que em todos os aspectos que estão relacionados com a comunicação de alterações de factos realizada nos autos lhes basta fazer menção a um dispositivo legal e afirmar que foram violados os seus direitos de defesa. Reportando-nos estritamente à letra do artigo referido pelo arguido, pergunta-se: o Tribunal com a fundamentação que aduziu ao despacho de comunicação de alteração de factos beliscou o direito dos arguidos a que a causa fosse examinada equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei? Os arguidos não foram informados no mais curto prazo da causa da acusação contra eles formulada? Os arguidos não dispuseram do tempo e dos meios necessários para a preparação da sua defesa? Tudo isto em resultado da mencionada fundamentação? O raciocínio seguido pelo arguido para chegar a essas conclusões não está patenteado nas suas alegações de recurso, nem da análise dos autos se pode retirar. Consequentemente, improcede na totalidade a sétima questão abordada nestes recursos interlocutórios. Como oitava questão a conhecer no recurso, surge-nos a invocação da ilegalidade do despacho de indeferimento de requerimentos de prova, por violação dos arts. 340.º e 358.º do CPP, art. 32.º, n.º 1, da CRP, e art. 6.º da CEDH (suscitada pelos arguidos E, K e H). Desde logo impõe-se ter presente que o arguido E, na sequência das alterações factuais que lhe foram comunicadas, nos termos do dis(...) no art. 358.º, n.º 1, do CPP, requereu a seguinte prova: - leitura das declarações do assistente AK prestadas em inquérito; - notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW que abranja o período entre 12/12/1998 e 31/07/1999; - a inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número ímpar (excepto o n.º (…)) da Alameda (…), em (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 12/12/1998 e 31/01/1999, uns e outras a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito se requereu; - a inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número par (excepto o n.º (…)) ou ímpar, situados na Avenida (…), em (…), perto da zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 01/04/1999 e 31/07/1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também requereu; - em alternativa e na eventualidade de indeferimento da inquirição de testemunhas a identificar, requereu a inquirição de testemunhas que, através da EU, conseguiu identificar, relacionadas com os prédios das novas componentes espaciais comunicadas; - e a junção de 33 documentos. Para este arguido “face ao dis(...) no art. 340.º do CPP, o Tribunal deve obstar à produção dos meios de prova cuja conhecimento não se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Mas, contrariamente ao afirmado pelo Tribunal, designadamente a fls. 65.150, tal não implica que o pedido de produção de meios de tenha de ser acompanhada de uma justificação. Com a alteração, o arguido fica perante outra (parcialmente) pronúncia. Contrariamente ao afirmado pelo Tribunal, designadamente a fls. 65.151, o art.º 358.º não regula a possibilidade de alteração de factos, mas a efectiva alteração, naturalmente em termos indiciários, pois refere-se à alteração de factos descritos na acusação ou na pronúncia. O poder-dever de descoberta da verdade imporia que o Tribunal, se em concreto entendesse necessária justificação do pedido de produção de meios de prova, disso notificasse o recorrente.” O arguido prosseguiu depois, abordando o, no seu entender, injustificado indeferimento de cada um dos meios de prova que requereu. O requerimento de notificação da AX para juntar aos autos o livro de ocorrências do CW foi indeferido por se revelar “que o meio de prova requerido pelo arguido é impossível de obter” (fls. 65174). O arguido invoca que, contrariamente ao referido a fls. 65174, no ofício de fls. 36275 não consta a informação da AX a dizer que em relação ao CW não têm os registos anteriores ao ano de 2000. O que constaria desse ofício é que segundo informação do Director deste (...) não foram encontrados os registos anteriores ao ano de 2000 relativos a este lar, do que não resulta necessariamente que não possam ser agora encontrados. O requerimento para inquirição das testemunhas relacionadas com casas situadas na Avenida (…), perto da zona (…), foi, segundo o arguido, indeferido porque o Tribunal recorrido entendeu que estava a fazer uma descrição dos factos dentro do mesmo contexto factual do despacho de pronúncia, não havendo factos novos a ter em conta pelo Tribunal, tratando-se de um “menos” em relação ao “mais” pelo qual o arguido vinha pronunciado. Para o arguido “o recorrente foi acusado com a componente espacial no (…) andar (…) do n.º (…) da Avenida (…) e, face à prova produzida em instrução, tal componente foi arbitrariamente alargada a toda a Avenida (…). Tal alargamento corresponde a indeterminação, que impedia a produção de prova de defesa quanto à componente espacial indeterminada. Por isso e como referido, o recorrente, com a contestação, indicou uma única testemunha, o vigilante do prédio nº (…). Se, como se refere no despacho recorrido, a fls. 65.178, o recorrente tivesse potenciado e exercido a sua defesa e o contraditório, configurando a hipótese mais abrangente de os factos poderem ter ocorrido mum prédio da Avenida (…), sem qualquer restrição ou delimitação quanto à zona dessa avenida, deveria ter requerido a identificação ou indentificado pelo menos uma pessoa de cada fogo, loja ou escritórios situados entre a Praça (…) e (…). O recorrente interpretou a alteração como relativa determinação espacial, já processualmente consentânea com a produção de prova testemunhal com alguma eficácia. Se assim não fosse a alteração indiciária comunicada seria inútil. Considerada essa determinação, o recorrente não pode ser esbulhado da possibilidade de defesa.” Quanto à limitação do número de testemunhas relacionadas com casas situadas na lateral dos números ímpares da Alameda (…), o despacho recorrido, por considerar que se revelava necessário para a boa e justa decisão da causa, deferiu a audição de testemunhas, quanto à prova da circunstância de lugar (cf. fls. 65179), porém considerou desproporcional admitir o número de testemunhas que no caso concreto o arguido pretendia ouvir, deferindo o requerido apenas quanto a dez testemunhas. Defende o arguido que o indeferimento da produção de prova ao abrigo do dis(...) no art. 340.º, n.º 1, do CPP, estaria limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superfluidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória, mas não pela extensão da prova requerida. Assim, conclui, a limitação imposta pelo despacho recorrido de inquirição apenas de 10 testemunhas cerceia a possibilidade de o arguido se defender, violando o art. 32.º, n.º 1, da CRP, e os arts. 358.º, n.º 1, e 340.º do CPP. O arguido K, por seu turno, requereu a realização das seguintes diligências de prova: - a leitura de todas as declarações prestadas em inquérito pelos assistentes AT e AP; - o visionamento em audiência de DVD que contém a deslocação dos assistentes AT e AP à moradia sita na Av. (…), n.º (…), em (…); - a audição de 99 testemunhas; - a audição de todos os proprietários dos imóveis abrangidos “… pelo despacho de comunicação de alterações…” que residiram, usaram ou a qualquer título ocuparam os mesmos no período temporal constante do despacho de pronúncia, considerando-se como arroladas pelo requerente todos os que venham a ser identificados; - que o Tribunal oficiasse à EU, e/ou à PSP, no sentido de serem identificados todos aqueles que eram proprietários dos imóveis existentes nas ruas abrangidas pelo despacho de comunicação de alterações nos meses de Março e Abril de 2000, bem como os respectivos inquilinos ou utilizadores dos mesmos, a fim de serem ouvidos como testemunhas, que o arguido assim arrola. O arguido K motivou o seu recurso, quanto a esta questão, dizendo que “das diligências probatórias por si requeridas o Tribunal a quo entendeu deferir o visionamento do DVD da deslocação do Tribunal à moradia identificada em 4.1.1. do despacho de pronúncia, e a inquirição de 10 testemunhas das que o arguido havia requerido fossem inquiridas, indeferindo o demais requerido pelo arguido. Fundamentou o indeferimento das diligências de prova no entendimento de que por um lado o recorrente quanto à prova testemunal “… forma abrangente com que foi enunciada, o arguido não especificou as razões concretas pelas quais considera relevante ou necessária a audição das “novas testemunhas” arroladas, de modo que o Tribunal pudesse ponderar as “razões concretas” face à extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do despacho de pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Devia tê-lo feito, no entendimento do Tribunal, por tal requerimento probatório ter de ser acompanhado de justificação para os efeitos do art. 340.º do CPP. Contudo como resulta do despacho recorrido, o Tribunal compreendeu perfeitamente que a produção de prova testemunhal foi indicada em consequência da comunicação da possibilidade de alteração dos factos descritos no ponto 4.1.1. do despacho de pronúncia “e para indagação da componente espacial dos factos na versão comunicada”. Mas concluindo que não é necessário “… para garantir o eficaz exercício da Defesa” toda a prova testemunhal que o arguido requer (…) tendo em consideração a fase processual em que os autos de encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, sendo no seu entendimento desproporcionado face aos artºs 32.º, n.º 1 e 5, e 20.º, nºs 1 e 4 da CRP, e art.º 6.º da CEDH que para a prova de tal elemento objectivo, mas não essencial, o Tribunal deva admitir tal número de testemunhas. Acresce que, de acordo com o dis(...) no art.º 340.º do CPP, o Tribunal deve obstar à produção dos meios de prova cujo conhecimento não se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Contudo, diferentemente do sustentado na decisão recorrida, tal não implica que o pedido de produção de meios tenha de ser acompanhado de uma justificação. Tal obrigatoriedade não consta nem resulta do dis(...) no art.º 315.º do CPP, quanto à prova da defesa das imputações indiciárias feitas na acusação ou na pronúncia, nem do artº 358º, quanto à prova da defesa da imputação de novos factos indiciários resultantes de alteração de factos descritos na pronúncia, tanto mais que o dis(...) no art.º 358º estipula a possibilidade de alteração de factos, mas a sua efectiva alteração, naturalmente em termos indiciários, pois refere-se à alteração de factos descritos na acusação ou na pronúncia. Com a comunicação da alteração dos factos, o arguido fica, pois, perante outra pronúncia com a inerente alteração do objecto do processo. Ora, o poder-dever de descoberta da verdade material imporia antes de mais que o Tribunal, se em concreto entendesse necessária justificação do pedido de produção de meios de prova, disso notificasse o recorrente. Tal não aconteceu e nem sequer era o caso já que ressalta do despacho recorrido que o Tribunal compreendeu perfeitamente a razão e o sentido da prova testemunhal que veio a indeferir.” Já o arguido H requereu a produção das diligências de prova que agora se indicam (de acordo como o Tribunal a quo as identificou, por alíneas): a) a inquirição de 27 (vinte e sete) testemunhas, identificando-as pelos nomes a fls. 64992 a 64994; b) que o Tribunal solicite informação às proprietárias do prédio sito na Avenida (…) n° (…) e que identifica, a identificação “… dos inquilinos do prédio nos anos de 1999 e 2000...”; com o objectivo de proceder à respectiva inquirição; c) que o Tribunal obtenha informação acerca dos familiares de DV, que residiu no (…) Ft. do prédio sito na Avenida (…) n.° (…), a fim de os mesmos serem inquiridos em audiência de julgamento, de forma a esclarecer aspectos da vida da referida enfermeira e da utilização da casa onde habitava, devendo, para o efeito, o tribunal enviar ofício para o Hospital DW, onde a referida DV trabalhou e esteve internada; d) requer a junção de um DVD, de uma entrevista de DV à DS, em Junho de 2003, com filmagem do interior da casa da mesma; e) a notificação do DX, para juntar um contrato de leasing de um empilhador referido pela testemunha DB; f) a inquirição de DU, solicitando ao tribunal diligências com vista a localização do seu paradeiro; g) a inquirição do assistente AP; h) a junção do documento de fls 65001 a 65002; i) a inquirição do jornalista DY sobre a “entrevista” a que se refere o documento de fls 65001 a 65002. Como acima já se decidiu, foi declarado extinto, em parte, o recurso assim apresentado pelo arguido H, designadamente no que tange com as diligências probatórias das als. a) a e) supra referidas. Consequentemente, neste recurso, iriamos apenas apreciar as diligências de prova requeridas pelo arguido nas als. f) a i). Não obstante, o arguido, no ponto 11 da sua motivação de recurso, afirma que quanto às outras diligências requeridas – no caso já só as das als. f), h) e i) – afirma que, embora as considere úteis, por uma questão de economia processual, conforma-se com o despacho proferido (restando a apreciação da diligência de prova requerida na al. g)). O arguido H entende que “há uma diligência probatória que é inaceitável que tenha sido recusada: a reinquirição do assistente AP sobre as alterações que lhe dizem respeito e são susceptíveis de afectar a defesa do arguido, bem como sobre a entrevista que terá dado ao jornal CX, a 6 de Março de 2009, a qual contém referências muito relevantes e mentiras proferidas por outras alegadas vítimas, com referência ao processo em curso. Tal diligência foi recusada com o fundamento de que a defesa de H já teria interrogado o assistente sobre aquilo que tinha achado relevante, sem limitações de período temporal. Porém, essa argumentação é inaceitável, pela simples e elementar razão de que tal interrogatório teve por base a factualidade que constava nos primitivos pontos 5.2.3. e 5.2.5. do despacho de pronúncia e não a que ora passa a constar. Mais uma vez o Tribunal esqueceu-se de que quem define a estratégia da defesa é a defesa e não o Tribunal. Alterada a factualidade de pronúncia que envolve tal assistente e o arguido, tem a defesa o inalienável direito de voltar a inquirir aquele assistente acerca dessa alteração. E idêntico direito parece que igualmente lhe assiste quando se pretende confrontar o assistente com uma entrevista que, entretanto, lhe é atribuída, na qual AP terá dito que algumas das alegadas vítimas terão mentido e que “se a minha boca se abre é o descambar do mundo”. Pelo ex(...), o despacho recorrido – pelo menos quanto (…) à reinquirição do assistente – avaliou erroneamente a utilidade e relevância das diligências probatórias requeridas, pelo que violou, de forma grave, o direito do arguido à sua defesa, tal como é configurado pelo art. 32.º n.º 1 da CRP e pelo art. 6.º da C.E.D.H., impedindo-o de contrariar, fosse de que maneira fosse, a nova factualidade que lhe é imputada.” O Digno Magistrado do Ministério Público junto da 1.ª instância, quanto a esta questão, invocou que “sendo a comunicação o corolário de uma apreciação, necessariamente precária, da globalidade da prova até então produzida, a prova que venha a ser indicada pelas Defesas não possa deixar de ser aferida pelos critérios emergentes do art.º 340.º, do CPP, designadamente, pelos princípios da necessidade, da adequação e da viabilidade de obtenção, sendo, consequentemente, de afastar, a possibilidade de uma mera indicação potestativa de prova, cuja produção se imporia ao Tribunal, como resultado daquela. Por outro lado, a necessidade, ou não, de produção de prova suplementar, não pode, tão pouco, deixar de aferir-se pela prova já produzida. Na verdade, se é certo que os novos factos podem legitimar a necessidade de admissão de prova já produzida, (...) que, no âmbito das respectivas instâncias não se tenham levado em conta as alterações entretanto comunicadas, já não, assim, quando aos Sujeitos Processuais tenha sido dado o ensejo de contraditar tal prova, muito para além do que, então, se constituía como objecto do processo e, de tal sorte que os novos factos tenham já sido amplamente debatidos em sede de audiência.” E os assistentes, por seu turno, alinhando no mesmo sentido argumentativo, aduziram que “a norma em apreciação, o n° 1 do artigo 358° do CPP concede aos arguidos, se eles o requererem, o tempo estritamente necessário para a preparação das defesas, devendo as mesmas reconduzir-se aos factos que resultaram não substancialmente alterados em face da sua comunicação e por reporte à pronúncia. Os requerimentos probatórios dos recorrentes transbordaram, para além dos limites do que é razoável, essa recondução. A circunstanciação espácio-temporal da conduta em nada releva para a qualificação da mesma como preenchendo o tipo incriminador por que vêm os recorrentes pronunciados. Percebe-se a pretensão dos recorrentes, a de atrasar a prolação da decisão final. Circunstância legítima do ponto de vista do exercício do direito de defesa mas, claramente incompatível com os fins públicos de perseguição do crime e aplicação da Justiça em, nome do Povo e em tempo útil. A prova pretendida não tem, ainda que a latere algo a ver com o cerne das alterações comunicadas aos recorrentes, só a um título que não a boa fé processual que deve pautar a conduta dos sujeitos se entendendo a pretensão dos recorrentes pois, com os factos de que resultou a alteração não substancial comunicada nada tem a ver. Esta prova, que é suplementar, tem de se compaginar com critérios de necessidade, adequação, realidade e relevância como resulta do n° 4 do art. 340º do CPP (a contrario).” Antes do mais, importa ponderar o que foi considerado pelo Tribunal a quo, no despacho recorrido. O Tribunal afirma, em jeito de fundamentação teórica, aplicável a todos os requerimentos de prova apresentados pelos arguidos, o seguinte: “O critério orientador para desencadear o mecanismo do art° 358°, do C.P.Penal, é o da defesa eficaz do arguido, de forma permitir que o arguido “... tome conhecimento das alterações de factos que sejam relevantes do ponto de vista daquela defesa – o que se passará, sem qualquer dúvida, quando os novos factos se reportem a um distinto modo de comissão ou execução do crime (…). Na verdade, não se afigura admissível que factos dessa natureza e relevância possam ser tomados em consideração na sentença condenatória, sem que seja dada a oportunidade ao arguido de sobre a pretendida alteração se pronunciar, e de, se assim o entender, reorganizar a sua defesa em função dessa alteração (...)”. Neste sentido, a comunicação ao arguido visa permitir-lhe a modificação da estratégia de defesa, no que esta pode comportar de opção por determinadas provas em vez de outras e o sublinhar de certos aspectos e não de outros. 2.1. Passemos, então, a um segundo plano. O Tribunal faz a comunicação ao arguido nos termos do art° 358°, do C.P.Penal e o arguido requer ao tribunal a produção de nova prova. De acordo com os princípios subjacentes ao art° 340º, do C.P.P., o Tribunal deve determinar a realização de diligências de prova se considerar que as mesmas são necessárias a descoberta da verdade e boa decisão da causa. Esta relevância da (nova) prova ou da admissão (ou não) de produção de novo meio de prova, pode advir por duas vias: ou por face ao objecto do processo e aos elementos probatórios que constam do processo, ou a prova que vai sendo produzida em audiência de julgamento, o Tribunal considerar necessária a produção de meios de prova não constantes da acusação e determina-o oficiosamente; ou na sequência de requerimento de sujeito processual, por considerar que é relevante a realização de diligências suplementares requeridas, com vista à descoberta da verdade material e boa decisão da causa (vide, neste sentido, Ac RP, 13/3/02, CJ II, pag 230). Está subjacente ao que antecede que o actual processo penal caracteriza-se por ter “… uma estrutura acusatória integrada por um princípio de investigação oficial… (…) Através do princípio da investigação, é sabido, pretende-se traduzir o poder-dever que ao tribunal pertence de esclarecer e instruir autonomamente, isto é, independentemente das contribuições da acusação e da defesa, o “facto” sujeito a julgamento, criando ele proprio as bases necessárias à sua decisão. Mas tal como acontece com a apresentação dos meios de prova ao abrigo do dis(...) no art° 315°, do C.P.Penal, ou com os meios de prova que venham a ser requeridos no decurso da audiência, ao abrigo do dis(...) no art° 340°, do CPP, o pedido de produção de meios de prova, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos nos termos do art° 358°, do C.P.Penal e no decurso da audiência, tem de ser acompanhada de uma justificação para os efeitos do art° 340º, do C.P.Penal. Assim, quem requer a produção de qualquer meio de prova nesta fase deve alegar o interesse que, em concreto, essa prova tem para determinado núcleo de factos ou para certo facto objecto da comunicação de alterações - consoante tenha sido comunicada a possibilidade de alteração de um facto isolado ou de um núcleo de factos -, de forma a que o Tribunal possa (efectivamente) aferir da necessidade ou eventual relevância dessa prova para o eficaz exercício da defesa do arguido, face à (possibilidade de) alteração de facto que foi comunicada e, em consequência, para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa. No entendimento do Tribunal não basta alegar, em termos genéricos, que a prova se destina a “contribuir para a descoberta da verdade”, na sequência de uma comunicação de alteração não substancial de factos. Há que invocar em concreto a razão ou razões pela quais o Requerente considera relevante a junção de determinado documento, a sua requisição ou a realização de determinadas diligências, pois tal relevância ou necessidade terá que ser, por sua vez, ponderada pelo Tribunal face a extensão ou complexidade das alterações comunicadas, face ao enquadramento em que a Defesa do arguido foi exercida no contexto do Despacho de pronúncia e ao enquadramento em que o arguido pretende exercer nova Defesa, à luz e no contexto dos “novos” factos. Só assim se pode concretizar e dar sentido, ao que é ou pode ser em cada situação, a garantia do eficaz exercício da Defesa do arguido. 2.2. E isto porque, passando a um terceiro plano, decorrente e implícito no enquadramento teórico que antecede, na fase processual em que os autos se encontram - prova da Acusação e da Defesa já produzida –, tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, o art. 340º, do C.P.Penal, confere ao Tribunal “…o poder de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Assim e seguindo este acórdão, é a própria lei que dá ao Juiz poderes de disciplina da produção da prova, exigindo no entanto, para o seu indeferimento, a decisão quanto à notoriedade do seu carácter irrelevante ou supérfluo, inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa, ou, ainda, quando for a situação, da sua finalidade meramente dilatória. Em consequência, o Tribunal tem que valorar, em concreto, cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliando a efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Seguindo, nesta linha, a Jurisprudência do S.T.J. (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pag. 208 a 214, sendo que as partes especialmente realçadas a “bold” são da responsabilidade da relatora deste Despacho), que de forma muito clara traduz a posição que este Tribunal entende ser a processualmente adequada, “(…) deve evitar-se o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não, portanto, para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptivel de resultar dos factos…” - em termos de qualificação juridica, diz este acórdão, por ser a situação que estava em apreciação, mas também em termos de enquadramento fáctico da conduta qualificada como crime, acrescenta este Tribunal, por ser a situação que em concreto está em análise - “…face à forma como eles se apresentam descritos: tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações...”. E partindo destas considerações jurídicas, decidiu: A) Quanto ao requerido pelo arguido E: - ao abrigo do dis(...) no art° 340, n° 1,“a contrario” e no art° 340º, n°4, al b), do C P Penal, por não se revelar necessário para a descoberta da verdade e de obtenção impossível, a requerida notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW, que abranja o periodo entre 12/12/98 e 31/07/99; - ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n° 1, do CPPenal, “a contrario”, por o Tribunal não o considerar relevante, nem necessário para proferir uma decisão justa, objectiva e fundamentada, o Tribunal indefere - a “inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número par (excepto o n° 84) ou ímpar, situados na Avenida (…), em (…), perto da Zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 1.4.1999 e 31.7.1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também se requer...”; - ou a audição dos porteiros, das pessoas especificamente identificadas e de uma das pessoas que entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Julho de 1999 utilizaram as fracções do n° (…), dos n°s (…)a (…), dos n°s (…)a (…), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s. (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…) e (…), dos n°s (…),(…),(…) e (…), do nº (…), dos n°s (…)a (…), dos n°s. (…)a (…), dos n°s. (…)a (…), do n°. (…), do n° (…), do n° (…), do nº (…), do n° (…), dos n° (…) e (…), do n° (…), dos n°s. (…),(…),(…) e (…), do n° (…), dos n°s. (…)a (…), do n° (…), dos n°s. (…),(…) e (…), dos n°s. (…) a (…), do n° (…), do n° (…), do n° (…) e do n° (…), da Av. (…); - bem como a requerida determinação de diligências por parte do Tribunal, com vista a identificação de pessoas; - e a junção dos documentos de fls. 64.690 a 64.778 e que digam respeito aos prédios sitos na Avenida (…), - ao abrigo do dis(...) no art° 340°, n° 1, do C.P.Penal, do dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do CPPenal e do art° art° 32°, n° 1 e 5 e art° 20°, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, por tal se revelar necessário para a boa e Justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, o Tribunal defere: - a audição de dez testemunhas, de entre as indicadas pelo arguido a fls. 63.364 a 64.394 e referentes à prova da circunstância de lugar – prédio sito na Alameda (…), número não concretamente determinado, mas situado na lateral dos numeros ímpares da Alameda, - o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias – a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tribunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias-, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.367 a 64.380 (em relação aos imóveis sitos na Alameda (…)), ou o que tiver por conveniente, sendo que caso o arguido nada venha a comunicar ao Tnbunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas – para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de prédios –, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente; - e defere a junção dos documentos de fls. 64.395 a 64.586, que dizem respeito aos prédios sitos na Alameda (…); indeferindo quanto ao demais requerido a fls. 63.364 a 64.394, em relação a diligências referentes aos prédios sitos na (...) (…). - Quanto à requerida, a fls. 64.364 a 64.394, leitura das declarações do assistente AK, prestadas em inquérito em 5/5/2003, constantes de linhas 20 a 23 e de 42 e 43 de fls. 4.235, linhas 106 e 107 de fls. 4.237, linhas 165 a 176 de fls. 4.239, linhas 177 a 192 de fls. 4.240, e em 6/05/2003, constantes de linhas 4 a 11 de fls. 4.282 e de linhas 12 a 14 de fls. 4.283, é diligência que tem subjacente um regime processual especifico no art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5, do CPPenal, pelo que na audiência de julgamento o Tribunal irá dar cumprimento a tal dispositivo legal. B) Quanto ao requerido pelo arguido K: - ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1 , do CPPenal, do dis(...) nos art°s 315°, n° 4 e 283°, n° 3, al. d) e n° 7, do CPPenal e do art° art° 32°, n° 1 e 5 e art° 200, n° 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, por tal se revelar necessário para a boa e justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, o Tribunal defere: - a audição de dez testemunhas, de entre as identificadas pelo arguido a fls. 64.850 a 64.857; - o arguido deverá comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias - a fim de possibilitar uma maior celeridade processual, sendo que se ao arguido não for possível cumprir tal prazo, que é inferior ao prazo legal, deverá comunicá-lo ao Tnbunal, aplicando-se nesse caso, sem necessidade de novo Despacho, o prazo legal de dez dias -, o nome das dez testemunhas a ouvir e de entre as já identificadas pelo arguido a fls. 64.850 a 64 857, ou o que tiver por conveniente, sendo que caso o arguido nada venha a comunicar ou requerer ao Tribunal, o Tribunal notificará as dez primeiras, de entre as primeiras identificadas - para os primeiros dez, mas diferentes, números de polícia de prédios -, de forma a ouvir cada testemunha em relação a um imóvel diferente; - indeferindo quanto ao demais requerido a fls. 64.848 a 64.857 em relação a moradias localizadas no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as (...) (…) e a (...) (…) e na zona dessas (...). - Quanto à requerida, a fls. 64.850, leitura “de todas as declarações prestadas em inquérito pelos assistentes AT e AP”, é diligência que tem subjacente um regime processual específico no art° 356°, n° 2, al. b) e n° 5, do C.P.Penal, pelo que na audiência de julgamento o Tribunal irá dar cumprimento a tal dispositivo legal. - Quanto ao requerido visionamento em audiência de julgamento do DVD que contém a deslocação dos assistentes AT e AP a moradia sita na Av (…), nº (…), em (…), por tal poder ser útil para a boa decisão da causa, no actual momento processual, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1, do CPPenal, o Tribunal defere-o. D) Quanto ao requerido pelo arguido H: Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1 , do CPPenal, “a contrario”, por o Tribunal não o considerar relevante, útil, nem necessário para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada, nem se impondo para efectivar o eficaz direito de defesa do arguido, em consequência da comunicação da possibilidade de alteração de factos, o Tribunal indefere: a) a inquirição de 27 (vinte e sete) testemunhas, identificadas a fls. 64.992 a 64.994; b) o pedido de informação às proprietárias do prédio sito na (...) (…) n° (…) e que identifica, a identificação “… dos inquilinos do prédio nos anos de 1999 e 2000…”; com o objectivo de proceder à respectiva inquirição; c) o pedido de informação acerca dos familiares de DV, que residiu no (…) Ft. do prédio sito na (...) (…) n° (…), a fim de os mesmos serem inquiridos em audiência de julgamento, de forma a esclarecer aspectos da vida da referida enfermeira e da utilização da casa onde habitava, devendo, para o efeito, o tribunal enviar ofício para o Hospital DW, onde a referida DV trabalhou e este internada; d) a junção de um DVD, de uma entrevista de DV à DS, em Junho de 2003, com filmagem do interior da casa da mesma, e) a notificação do DX, para juntar um contrato de leasing de um empilhador referido pela testemunha DB, f) a inquirição de DU, g) a inquirição do assistente AP, h) a junção do documento de fls. 65.001 a 65.002, i) a inquirição do jornalista DY sobre a “entrevista” a que se refere o documento de fls 65.001 a 65.002. Ora, tendo presente o assim decidido, vejamos se nos merece algum reparo a decisão respectiva e que os arguidos pretendem ver sindicada. O arguido E começa por defender que, contrariamente ao afirmado pelo Tribunal a quo a apresentação de requerimento de prova ao abrigo do dis(...) no art. 340.º do CPP não implica que o pedido de produção de meios de prova tenha que ser acompanhado de uma fundamentação. Acrescenta que essa obrigatoriedade não consta nem resulta dos arts. 315.º e 358.º do CPP. E o poder-dever de descoberta da verdade imporia que o Tribunal recorrido, se em concreto entendesse necessária justificação do pedido de produção de meios de prova, disso notificasse o recorrente. Tal não aconteceu e, na interpretação do próprio, porque não era necessária, pois a necessidade da requerida e indeferida produção de meios de prova é manifesta face às alterações comunicadas. Tanto assim que a decisão recorrida, embora tendo subjacente o enquadramento teórico nela feito, indefere a produção de cada um dos meios de prova com outros fundamentos. O arguido K sufraga este mesmo entendimento na sua motivação de recurso. Sucede que a generalidade da nossa doutrina e jurisprudência têm um entendimento que está em consonância com o do Tribunal a quo. Para Germano Marques da Silva, “O art. 341.º do Código Civil dispõe que as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos. (…) Em conclusão, utilizar-se-á o termo prova num tríplice significado: A – Prova como actividade probatória: acto ou complexo de actos que tendem a formar a convicção da entidade decidente sobre a existência ou inexistência de uma determinada situação factual; B – Prova como resultado: a convicção da entidade decidente formada no processo sobre a existência ou não de uma dada situação de facto; C – Prova como meio: o instrumento probatório para formar aquela convicção. (…) O thema corresponde aos factos a provar, que, em princípio, são todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou medida de segurança aplicáveis e os factos relevantes para a determinação da responsabilidade civil. (…) As provas requeridas pelas partes terão de ser sempre admitidas no processo? Poderão as autoridades judiciárias rejeitar os requerimentos de prova sem qualquer limitação? Há que distinguir. A preocupação do legislador em estabelecer o controlo judicial das provas permanece ao longo da história do direito e surge da necessidade de as limitar às que são imprescindíveis para a decisão, eliminando as que não têm que ver com os factos objecto do processo ou as que, ainda que tendo relação com eles, não representam novidade alguma que possa influir na decisão. Na fase do julgamento o poder do tribunal de recusar a admissão e produção de prova requerida pela acusação e pela defesa é limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superfluidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória (art. 340.º, n.º 3) (…). a) Os requerimentos de prova são indeferidos quando a prova ou o respectivo meio forem legalmente inadmissíveis (art. 340.º, n.º 3). É a consequência do princípio da legalidade (…). b) A irrelevância equivale a falta de pertinência da prova requerida coom o thema probandi e a superfluidade que a prova requerida apenas confirmaria desnecessariamente a convicção já formada. c) A inadequação tem que ver com a idoneidade do meio para prova do facto a que se destina. d) A inobtenibilidade significa que o meio de prova é de obtenção impossível ou muito duvidosa.” (Curso de Processo Penal, I, Verbo Jurídico, págs. 78, 88, 98, 99). Daqui resulta, sem margem para dúvidas, e de acordo com a letra da lei (art. 340.º do CPP), que o Tribunal não está sujeito ao dever de admitir todo e qualquer requerimento de prova apresentado pelo arguido, podendo rejeitá-lo quando constate ser a prova ou o meio de prova requeridos legalmente inadmissíveis, quando se trate de prova irrelevante, inadequada ou de obtenção impossível ou duvidosa. E nisto os arguidos parecem, pelo menos do ponto de vista teórico, estar de acordo com o Tribunal. O que discutem é a necessidade de o arguido, no requerimento de prova que apresenta, justificar a razão de ser do requerimento e de cada prova ou meio de prova que pretende ver produzida, para que o Tribunal possa verificar da pertinência da sua pretensão. Paulo Pinto de Albuquerque, em anotação ao art. 315.º, do CPP (op. cit., págs. 806 e 840) escreve: “Com a contestação o arguido pode juntar o “rol de testemunhas” e a lista das demais provas, isto é, os meios de prova e de obtenção de prova cuja produção ou exame são requeridos e os factos que através deles se espera provar. Com efeito, qualquer pedido de produção ou exame de meios de prova e de meios de obtenção de prova deve ser acompanhado da respectiva justificação, isto é, da indicação do facto que se pretende provar, para os efeitos do art. 340.º, n.º 4. É assim durante a audiência e também na contestação. De outro modo, o juiz ficaria impedido de apreciar a legalidade dos meios de prova requeridos e de proferir decisão sobre a sua admissibilidade”. No Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 26 de Outubro de 2009, in www.dgsi.pt, (citado na resposta do Ministério Público), refere-se: “a única questão trazida à apreciação desta Relação consiste em saber se o tribunal a quo podia indeferir, ancorado no artigo 340.º, n.º 4, al. c), do C.P.Penal, a inquirição das duas testemunhas requerida pelo arguido para prova da defesa que aduzira ao abrigo do dis(...) no artigo 358.º, n.º 1, do C.P.Penal. Vejamos… (…) Com efeito, o Código de Processo Penal refere uma outra: «a alteração não substancial dos factos» – art.º 358.º, n.º 1. Para além dos factos constantes da acusação (que, como já referido, constituem o objecto do processo em sentido técnico), podem existir outros factos que não foram formalmente vertidos na acusação, mas que têm “com aqueles uma relação de unidade sob o ponto de vista subjectivo, histórico, normativo, finalista, sociológico, (...), temporal, psicológico, etc.” Esses novos factos fazem parte do chamado «objecto do processo em sentido amplo». Não têm como efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis (isto é, não contendem com a identidade do objecto do processo), mas, por serem relevantes para a decisão, o seu conhecimento pressupõe o recurso ao mecanismo previsto no art.º 358.º, nº 1 do CPP, ou seja, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (…). Porém, tal como acontece com a apresentação dos meios de prova ao abrigo do artº 315º do CPP, ou com os meios de prova superveniententes requeridos na audiência de julgamento, ao abrigo do artigo 340.º, n.º 1, do CPP, o pedido de produção de meios de prova, na sequência da comunicação da alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, tem de ser acompanhado da respectiva justificação, para os efeitos do artigo 340.º, n.º 4, do CPP. De outro modo, o juiz ficaria impedido de apreciar a legalidade dos meios de prova requeridos e de proferir decisão sobre a sua admissibilidade, à luz dos critérios de aferição fixados nos nºs 3 e 4 do citado artigo 340.º (…)”. Também no Ac.do Tribunal da Relação do Porto, de 02 de Julho de 2008, in www.dgsi.pt, se deixa expresso que “para a decisão a tomar pelo tribunal sobre o requerimento de produção de novas provas é determinante a argumentação então desenvolvida pelo requerente”. Como se constata, tanto a doutrina como a jusriprudência, apontam para uma real necessidade de o requerente das diligências de prova, logo na fase da contestação, apresentar uma justificação para a razão de ser da produção de tal prova, de modo a que o Juiz possa controlar a fase de produção de prova e obstar a que seja produzida prova inadmissível ou inútil. E se assim é na fase da contestação, em que a amplitude probatória é muito maior, pois é reportada a toda a matéria constante da acusação/pronúncia e defesa, por maioria de razão, também terá que o ser na fase de produção de prova a que se reporta o art. 340.º do CPP, ou seja, quando o requerimento de prova é apresentado já durante a audiência de julgamento e com prova já produzida. E muito mais se justificará quando esse requerimento, formulado ao abrigo do dis(...) no art. 340.º do CPP, decorre da comunicação ao arguido de uma alteração não substancial de factos. Com efeito, e em particular no caso em apreço, foi após toda a produção de prova da acusação e das defesas, que foram realizadas as comunicações de alterações de factos. Logo, os requerimentos de prova apresentados pelos arguidos, não poderiam deixar de ser fundamentados, para que o tribunal pudesse avaliar, face a todo o acervo probatório já constante dos autos, da sua necessidade e pertinência. Entender-se que ao arguido assiste o direito de apresentar todo e qualquer requerimento de prova, sem de algum modo explicitar os motivos que deveriam justificar a produção dessa prova, equivaleria a afirmar-se que o Tribunal não pode exercer qualquer tipo de controlo sobre a prova que é produzida numa audiência de julgamento, quando esse manifestamente não é o entendimento mais conforme à lei e ao nosso sistema processual penal. O facto de a lei não estabelecer directamente limites específicos e concretos à produção de prova, por exemplo, limitando o número de testemunhas a inquirir num processo de especial complexidade (como é o caso deste), não significa que essa produção de prova não seja controlada, limitada àquilo que é essencial aferido em face do objecto do processo. Se Ministério Público, assistentes e arguidos pudessem livremente ir apresentando os requerimentos de prova que entendessem, poderia eternizar-se um processo, em clara violação não só do princípio da economia processual, como principalmente do direito a um processo justo e equitativo. E esse controlo da prova, que competirá ao Tribunal, é feito a dois níveis: num primeiro momento, admitindo ou não a prova requerida; e, num segundo momento, em caso de admissão, controlando a forma como ela é produzida, para que não o seja de modo a que passe a ser inadmissível, irrelevante ou até proibida, tendo sempre presentes os princípios subjacentes ao processo penal e, em particular, as condicionantes a que expressamente alude o art. 340.º do CPP. Estando nós aqui a ponderar uma situação fáctica que se enconquadra naquela primeira situação, pode acontecer que o Tribunal, só pela mera apresentação do requerimento de prova, se aperceba logo da inadmissibilidade do requerido (imagine-se, por exemplo, o caso de ser requerida a junção de um documento que já havia sido tentada no processo e não havia sido possível). Mas na generalidade das situações, só perante uma justificação do “porquê” do requerimento é que essa aferição poderá ser realizada pelo Tribunal com profundidade (pode dar-se o caso até, de ser requerida a produção de prova que já fora apresentada – por exemplo, a inquirição de determinada testemunha – mas o arguido justificar devidamente que pretende a sua inquirição relativamente a matéria de facto sobre a qual não prestou depoimento e que agora, face à alteração de factos, passou a estar no âmbito do objecto do processo, e aquilo que, à partida, seria irrelavante passar a ser considerado de relevo e interesse para a descoberta da verdade). É claro que, no caso em apreço, como referem os arguidos, o Tribunal tinha conhecimento de que o requerimento de prova apresentado o era na sequência da comunicação de alteração de factos realizada, mas isso por si só não basta para que se tenham como justificadas todas e cada uma das diligências de prova requeridas e que, por conseguinte, fosse desnecessária a apresentação de justificação para cada concreta prova requerida. Era necessário que os arguidos explicitassem porque motivo os requerimentos de prova que formularam eram essenciais à sua defesa perante os novos factos comunicados e isso, efectivamente, não foi feito. Essa falta só aos arguidos pode ser imputada. O Tribunal não deixou de apreciar os requerimentos de prova formulados, mas fê-lo com a limitação de não terem os arguidos explicitado, face a cada uma das diligências de prova que pretendiam ver produzida, a razão de ser do requerido. Assim, o Tribunal teve que ater-se à apreciação dos requerimentos de prova, confrontando-os com as alterações de factos comunicadas e com toda a prova que já havia sido produzida nos autos, tendo sempre subjacente o princípio da necessidade dessa prova para a boa decisão da causa. E ao Tribunal não competia fazer mais do que isso, designadamente, convidar os arguidos a apresentarem uma justificação para as diligências de prova que requereram, pois que ao Tribunal não compete colmatar as falhas dos arguidos ou de quaisquer outros intervenientes processuais, excepto nos casos especial e expressamente previstos na lei. Até porque o facto de os arguidos não terem apresentado aquela justificação não tinha como consequência directa – como não teve – o indeferimento dos requerimentos que apresentaram, mas tão só aquela que já se apontou, de o Tribunal fazer a apreciação do requerido à luz dos elementos constantes dos autos e com a limitação de não saber especificamente o que os arguidos (na sua perspectiva de defesa) pretendiam com a apresentação do requerimento. E não se diga que a circunstância de o Tribunal a quo ter acabado por indeferir cada um dos meios de prova, apreciando cada um dos requerimentos, demonstra que era manifesta a desnecessidade da fundamentação dos requerimentos de prova face às alterações comunicadas. Antes significa que o Tribunal, pese embora já houvesse apresentado a argumentação jurídica essencial que justificava o indeferimento dos requerimentos de prova que foram indeferidos, quis ainda esclarecer, caso a caso, porque motivo, e de acordo com a ponderação limitada que podia fazer dos elementos constantes do processo, seriam indeferidos aqueles requerimentos. Note-se que o Tribunal não afirmou que os arguidos não apresentaram justificação para os seus requerimentos de prova e que em consequência os indeferia na totalidade. O que o Tribunal fez foi salientar a falta de fundamentação dos requerimentos para uma total compreensão da pretensão dos arguidos, passando a analisar da necessidade ou oportunidade de cada um dos elementos de prova requeridos no circunstancialismo limitado já acima ex(...), indeferindo parte dos requerimentos de prova e deferindo outra parte. Vejamos, pois, se de acordo com os elementos de que dispunha o Tribunal (e sem a justificação que aos arguidos competia apresentar), merece algum tipo de censura o despacho que recaiu sobre os requerimentos de prova suplementar apresentados pelos arguidos E e K. Antes dessa análise particular, não podemos deixar de expressar a nossa inteira concordância com as considerações que o Tribunal a quo tece a propósito da produção de prova requerida, em termos gerais, designadamente a necessidade de a adequar à fase do processo em que se encontravam, à sua utilidade, e ao seu dever de obstar à eternização do processo, com tudo o que de nefasto isso acarreta. Ora, quanto ao requerido pelo arguido E, o Tribunal começou por indeferir a requerida notificação da AX para juntar o livro de ocorrências do CW, que abranjesse o periodo entre 12/12/98 e 31/07/99; por não se revelar necessário para a descoberta da verdade e de obtenção impossível. Se compulsarmos os autos constatamos que já havia sido formulado idêntico requerimento de prova, o qual obteve resposta da AX, a fls. 36275 a 36246 (datada de 23-01-2006), dizendo-se, concretamente quanto a esse documento que “não foram encontrados registos anteriores ao ano de 2000 relativos a este Lar”. O que o arguido diz é que dessa informação não resulta necessariamente que os registos não possam ser agora encontrados, pelo que não se estaria perante uma situação de prova impossível. Ora, a al. b) do n.º 4 do art. 340.º do CPP, refere que “os requerimentos de prova são indeferidos se for notório que o meio de prova é inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa.” Aqui temos uma situação em que já numa fase anterior do processo haviam sido solicitados à AX o registo de diversos Lares, alguns dos quais foram juntos aos autos e havendo como resposta ao solicitado quanto ao CW o acima citado. O arguido no seu requerimento nada disse quanto a novas circunstâncias que pudessem levar a considerar que tenha ocorrido qualquer alteração que levasse à conclusão que em momento posterior já era possível encontrar aquele registo. Assim, a conclusão a que o Tribunal chegou é a mais lógica e coerente: se num momento mais próximo dos factos não foi possível encontrar o documento na AX, decorridos alguns anos sobre essa data, mais afastada estaria a possibilidade de os registos serem encontrados. Assim, é adequado concluir que o meio de prova requerido, se não é de obtenção impossível é, pelo menos, de obtenção muito duvidosa, o que se enquadra num dos fundamentos de indeferimento consagrados no n.º 4 do art. 340.º do CPP. Depois, por o Tribunal não o considerar relevante, nem necessário para proferir uma decisão justa, objectiva e fundamentada, o Tribunal indefere: - a “inquirição dos porteiros e de uma pessoa de cada casa de cada um dos prédios com número par (excepto o n° (…)) ou ímpar, situados na (...) (…), em (…), perto da Zona (…), que utilizassem o respectivo prédio entre 1.4.1999 e 31.7.1999, também a identificar e indicar pela PSP, cuja notificação para o efeito também se requer...”; - ou a audição dos porteiros, das pessoas especificamente identificadas e de uma das pessoas que entre 1 de Abril de 1999 e 31 de Julho de 1999 utilizaram as fracções do n° (…), dos n°s (…) a (…), dos n°s (…) a (…), dos n°s (…), (…) e (…), dos n°s. (…), (…) e (…), dos n°s (…), (…) e (…), dos n°s (…), (…), (…) e (…), do nº (…), dos n°s (…) a (…), dos n°s. (…) a (…), dos n°s. (…) a (…), do n°. (…), do n° (…), do n° (…), do nº (…), do n° (…), dos n° (…) e (…), do n° (…), dos n°s. (…), (…), (…) e (…), do n° (…), dos n°s. (…) a (…), do n° (…), dos n°s. (…), (…) e (…), dos n°s. (…) a (…), do n° (…), do n° (…), do n° (…) e do n° (…), da Av. (…); - bem como a requerida determinação de diligências por parte do Tribunal, com vista a identificação de pessoas; - e a junção dos documentos de fls. 64690 a 64778 e que digam respeito aos prédios sitos na (...) (…). Para tanto, invoca o Tribunal que quanto à factualidade relacionada com a Av. (…), o que se fez foi uma descrição dos factos dentro do mesmo contexto factual do despacho de pronúncia, não havendo factos novos a ter em conta pelo Tribunal, tratando-se de um “menos” em relação ao “mais” pelo qual o arguido vinha pronunciado. O recorrente considera que foi esbulhado da sua possibilidade de defesa, pois foi acusado com a componente espacial no (…) andar (…) do n.º (…) da Av. (…) e, face à prova produzida em instrução, tal componente foi alargada a toda Av. (…). Tal alargamento corresponde, no seu entender, a indeterminação, que impedia a produção de prova da defesa quanto à componente espacial indeterminada. Por isso, o recorrente afirma ter optado por indicar, com a contestação, uma única testemunha, o vigilante do prédio n.º (…). Mais invoca que se o recorrente tivesse potenciado e exercido a sua defesa e o contraditório, configurando desde logo a hipótese mais abrangente de os factos poderem ter ocorrido num qualquer prédio da Av. (…), sem qualquer restrição ou delimitação quanto à zona dessa (...), deveria ter requerido a identificação ou identificado pelo menos uma pessoa de cada fogo, loja ou escritório situados entre a Praça (…) e (…), do que resultaria a inquirição de milhares de testemunhas. Uma vez que o Tribunal alterou a componente espacial indiciária do todo da (...) para uma parte, o recorrente interpretou a alteração como relativa determinação espacial, já processualmente consentânea com a produção de prova testemunhal com alguma eficácia, pois se assim não fosse a alteração indiciária seria inútil. Ou seja, o arguido na sua contestação optou por indicar uma única testemunha referente a um específico prédio da (...) (…), porque entendeu que não seria possível/viável produzir esse mesmo tipo de prova relativamente a cada um dos prédios da mesma (...). Mas como a alteração comunicada foi no sentido de se referir a uma parte mais determinada dessa (...), já considera viável a inquirição de centenas de testemunhas, com o mesmo objectivo que inicialmente ponderou. Acrescentando que se assim não fosse a alteração comunicada seria inútil. Desde logo, não se compreende como retira o arguido a inutilidade de uma comunicação de alteração de factos da inviabilidade de inquirir diversas testemunhas quanto a esse facto. A alteração não substancial de factos é comunicada ao arguido, como reiteradamente já se afirmou, para que o mesmo possa defender-se dessa alteração e não seja confrontado com ela, de surpresa, na decisão final. A utilidade da alteração nada tem a ver com a impossibilidade de o arguido em relação a ela poder produzir determinado meio de prova – no caso testemunhal. Se esse meio de prova não é viável o arguido terá que socorrer-se de outro. O que não pode é pretender que a comunicação seja inútil. O Tribunal entendeu, e a nosso ver bem, que as diligências de prova requeridas, nesse particular, não eram relevantes para a decisão da causa, especialmente porque a alteração comunicada constitui uma redução da localização que já constava do despacho de pronúncia. Se confrontado com a possibilidade de os factos terem ocorrido em qualquer prédio da (...) (…) o arguido não achou viável inquirir milhares de testemunhas, e se satisfez com a inquirição do porteiro de um prédio determinado, porque razão entende ser viável inquirir centenas de testemunhas, quando se delimitou a localização dos factos a parte dessa mesma (...). A alteração comunicada constitui, de facto, um menos em relação ao que constava do despacho de pronúncia, por isso não se compreende que quanto a esse particular o arguido defenda a necessidade de agora, quanto ao menos, inquirir muitas mais testemunhas. Note-se que as falhas que o arguido possa apontar ao decidido pelo Tribunal a quo têm de ser aferidas ao momento em que o Tribunal decidiu. E no momento em que o Tribunal decidiu, na falta de qualquer justificação apresentada pelo arguido, é patente a lógica do raciocínio seguido e do decidido. A motivação que o arguido agora apresenta para pretender a inquirição dessas testemunhas não a explanou ao Tribunal no momento em que apresentou o seu requerimento de prova. Não sendo essa motivação evidente, não poderia o Tribunal tê-la em consideração. Mas mesmo que assim não fosse – mesmo que o arguido não tivesse indicado uma única testemunha para se defender da localização relativa a toda uma (...) e depois tenha requerido a inquirição de centenas para se defender da localização relativa a parte dessa mesma (...) – sempre teria que se concluir pela inviabilidade e irrelevância da inquirição dessas testemunhas. Nesta, como noutras matérias, nunca podemos deixar de avaliar as situações com a razoabilidade e o sentido que as regras da experiência comum nos impõem ponderar. Reportando-nos à situação probatória concreta, temos que após a produção da vastíssima prova da acusação e da defesa, foi comunicada ao arguido uma alteração de factos traduzida numa alteração de localização, estando em causa, no fundo, a prova e contraprova de que determinados factos terão ocorrido numa certa (...) ou em parte dela, horizonte espacial esse que se configurou no processo desde a acusação, ainda que com diferentes concretizações. O que o arguido pretendia – presumimos nós, dentro da lógica da defesa – é que fosse identificada uma pessoa de cada fogo habitacional de parte daquela (...), reportando-se a um período de tempo já passado, para que, feitos comparecer em Tribunal, se pronunciassem sobre o conhecimento/presença do arguido nessas mesmas casas, à data a que se reporta o despacho de pronúncia. Mas, questionamos nós, que prova eficaz pode ser produzida sobre os factos imputados ao arguido neste particular, inquirindo, no limite, uma testemunha de cada uma das casas da zona da (...) (…) em questão. Mesmo que cada uma dessas pessoas viesse ao Tribunal declarar que nunca viu o arguido na sua casa, estaria o Tribunal em condições de concluir que o arguido nunca esteve em nenhuma dessas casas? Então e os restantes moradores das mesmas casas? E os das casas vizinhas? Não poderiam eles ter facultado o acesso da casa ao arguido e outras pessoas? Também no limite, mesmo que se lograsse a comparência de todas as pessoas – que aquando do requerimento do arguido estavam por identificar – no Tribunal, conseguiria o arguido demonstrar em absoluto a impossibilidade da ocorrência dos factos? A resposta afigura-se-nos negativa. O meio de prova em causa não é absoluto, infalível, definitivo, susceptível de afastar a dúvida razoável sobre a ocorrência dos factos, quando sopesado com a demais prova já produzida. Como bem se salienta no parecer da PGR, de 09-07-2010, in www.pgdl.pt, “como também é por demais sabido e resulta, de resto, do estatuído no art. 340.º do CPP, do princípio da investigação ou verdade material decorre que o juiz tem o dever de recolher todas as provas tendentes à investigação e esclarecimento da situação em que ocorreu o facto delituoso submetido a julgamento, mas não tem de deferir qualquer pedido de produção de prova que, no seu prudente critério, não seja imprescindível para esse fim. O mesmo é dizer, pois, que o princípio da investigação conferido, mesmo oficiosamente, ao tribunal de julgamento tem os seus limites previstos na lei e é condicionado pelo princípio da necessidade, já que só os meios de prova cujo conhecimento se considere necessário para habilitar o julgador a uma decisão justa e criteriosa devem ser produzidos.” E neste caso particular, tal como o Tribunal recorrido salientou, o meio de prova requerido não é, de facto, imprescindível ou necessário à boa decisão da causa. Acresce que no domínio da produção de prova, como noutras vertentes do processo penal, deve ter-se sempre presente o princípio da proporcionalidade. E aqui podemos questionar se aquilo que pode ser alcançado com o meio de prova requerido (tendo presente a eficácia da defesa do arguido) é proporcional à demora e mobilização de meios que acarreta para o processo. Mais concretamente, será que o princípio da proporcionalidade, a justa medida das coisas, justifica que para que o arguido consiga que uma pessoa de cada casa de uma zona da Av. (…) venha ao Tribunal afirmar que o arguido nunca esteve na sua casa (admitindo isso como um cenário possível e o mais favorável ao arguido), se demorem meses a identificar e inquirir centenas de testemunhas? Mais, como o próprio arguido considerou na fase da contestação, será viável pensar que se conseguiriam identificar e trazer a Tribunal todas as pessoas que o arguido pretende ver inquiridas? Mesmo tendo em conta as probabilidades mais optimistas, há-de sempre concluir-se pela inviabilidade de trazer a julgamento todas as pessoas. E bastava que faltasse uma para que a prova que o arguido pretendia fazer ficasse inviabilizada. Conclui-se, pois, que o pretendido pelo arguido era, além do mais, desproporcional à finalidade última do processo penal, à realização da Justiça, em qualquer das vertentes em que ela possa ser entendida, como adiante melhor se deixará ex(...). No mais, ao abrigo do dis(...) nos arts. 340.°, n.° 1, 315.°, n.° 4, e 283.°, n.° 3, al. d), e n.° 7, do CPP e do art. art. 32.°, n.° 1 e 5 e art. 20.°, n.° 1 e 4, da CRP, por tal se revelar necessário para a boa e justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, o Tribunal deferiu a audição de dez testemunhas, de entre as indicadas pelo arguido e referentes à prova da circunstância de lugar – prédio sito na (...) (…), número não concretamente determinado, mas situado na lateral dos numeros ímpares da (...). O Tribunal fundamentou a limitação da inquirição de testemunhas a dez por considerar desproporcional admitir o número de testemunhas que no caso concreto o arguido pretendia inquirir. Para o arguido, o indeferimento do requerimento de prova estaria limitado às circunstâncias do art. 340.º, n.º 1, do CPP, logo, o indeferimento da produção de prova estaria limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superfluidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória, não sendo fundamento de indeferimento a extensão da prova requerida. Não podemos concordar com o arguido. Se em rigor a extensão da prova, por si só, não constitui fundamento do seu indeferimento, ela não pode deixar de ser enquadrada dentro dos parâmetros já acima ex(...)s. Ou seja, para a prova ser admitida ela tem que se apresentar como necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, não podendo ser irrelevante ou supérflua, como o será a prova ineficaz à defesa do arguido. E aqui mais uma vez se pergunta: será que a prova que o arguido conseguiria obter com a presença de cada uma das pessoas de um andar da (...) (…), da lateral dos números ímpares, do ponto de vista da eficácia da sua defesa, é absolutamente relevante, capaz de afastar a prova indiciariamente já produzida a esse propósito, imprescindível à defesa? De tal modo que se possa considerar que o resultado probatório que é passível de por esse meio ser obtido é proporcional à mobilização de diligências para identificação e inquirição de centenas de testemunhas, com a demora processual que daí decorreria necessariamente? E também aqui perguntamos se será razoável dar como certo que seria possível identificar e fazer comparecer em Tribunal todas as testemunhas que o arguido pretendia inquirir? E mais uma vez temos que considerar que não. É certo que o Tribunal recorrido considerou que a inquirição dessas testemunhas era necessária para a boa e justa decisão da causa, mas depois reduziu a inquirição das testemunhas a dez, por considerar desproporcional a quantidade de testemunhas que o arguido pretendia inquirir. Neste particular discordamos da fundamentação da decisão recorrida. Efectivamente, pelos motivos já apontados, entende-se ser desporcionada a inquirição de centenas de testemunhas, como pretendido pelo arguido. Mas desporporcional face ao resultado probatório que poderia previsivelmente ser alcançado. Contudo, se a inquirição da totalidade das testemunhas pretendida pelo arguido era, a nosso ver, desproporcional e, como tal, desnecessária à boa decisão da causa, a inquirição de apenas dez dessas testemunhas – face ao que o arguido pretendia – era de todo irrelevante. Se o resultado probatório que o arguido poderia, numa hipótese muito remota, obter com a inquirição da totalidade das testemunhas já não é passível de ser eficaz à sua defesa, o resultado probatório que poderia obter com dez testemunhas é absolutamente nulo. Num universo de centenas de residências, perguntar a dez pessoas se viram o arguido no prédio, na sua casa, ou em alguma casa daquela (...) é totalmente inóquo, pois mesmo que estes respondam negativamente restariam centenas de casas onde o arguido poderia ter estado. Nestes termos, concorda-se inteiramente com o indeferimento da inquirição das testemunhas relativas à alteração de localização referente à (...) (…), por ser desporporcional e desnecessária para a boa decisão da causa, o que deve ser entendido relativamente à totalidade das testemunhas cuja inquirição foi requerida. O Tribunal a quo entendeu deferir a inquirição de dez testemunhas, mas trata-se de diligência probatória sem qualquer alcance prático, tanto assim que os próprios arguidos não viram utilidade na inquirição das testemunhas nos termos em que foi deferida. Aquilo que este Tribunal de recurso é chamado a apreciar é a decisão de indeferimento da inquirição das testemunhas relativas aos factos praticados na (...) (…), nos termos em que o arguido a requereu. E essa decisão de indeferimento não nos merece qualquer reparo, ainda que com fundamentação, em parte, distinta da que serviu de base à decisão do Tribunal recorrido. Neste contexto, não podemos deixar de salientar aqui o que, com muita actualidade e interesse, se refere no recente Ac. do STJ, de 23 de Novembro de 2011, em que foi relator o Exmº Srº Conselheiro Santos Cabral, proferido no âmbito do Proc. 550/09.3GBPMS.C1.S1. disponível in www.dgsi.pt: “(…) o princípio envolvente, e estruturante do processo penal na sua globalidade (mandado superior do direito processual penal como refere Roxin), é o princípio do processo justo. Esta máxima, formulada em termos de cláusula geral, é uma consequência das decisões valoraticas fundamentais do Estado de Direito e do Estado Social. A ideia do procedimento justo expresso, processualmente, no princípio da lealdade, deve compreender-se como uma exigência concreta da optimização de valores constitucionais (…). Nenhum argumento, ou princípio, poderá ser mobilizado para provocar a erosão do pressu(...) fundamental que se consubstancia na exigência de que todos os actores do processo penal tenham a sua actuação procedimental pautada pela finalidade última que é a da realização da justiça, e de procura da verdade material. Este objectivo teleológico não se compadece com a realização processual que visa a utilização estratégica do processo como instrumento acrítico e neutro, procurando outras finalidades laterais e, até, em clara oposição com aquela realização e procura. Do juiz até ao mais anódino interveniente todos são construtores de um processo justo, necessariamente orientado, de forma linear e objectiva, para a procura da verdade. Tal princípio, e pressu(...), não admite inscrever no seu perfil a admissibilidade de condutas processuais orientadas para a instrumentalização do processo penal, colocando-o ao serviço de finalidades que visam os seu entorpecimento, quando não a negação dos seus princípios orientadores. Refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3/03/2004 que a lealdade não é uma noção jurídica autónoma, mas é sobretudo de natureza essencialmente moral e ética, e traduz uma forma de estar em conformidade com o respeito dos direitos do cidadão e a dignidade da Pessoa e da Justiça. A lealdade, a boa-fé, a confiança, o equilíbrio entre o rigor das decisões do processo e as expectativas que delas decorram, são elementos fundamentais a ter em conta quando seja necessário interpretar alguma sequência que, nas aparências, possa exteriormente apresentar-se com algum carácter de disfunção intraprocessual. A procura do processo justo e leal, e a confiança como elemento do princípio do processo equitativo, derrubam qualquer obstáculo formal e não nos permitem tomar outra decisão que não seja garantir aquela finalidade. Na verdade, ousamos afirmar que o cumprimento do princípio da lealdade processual revela até que ponto se reflecte no processo a credibilidade de um regime democrático. O mesmo princípio, particularmente em processo penal, é revelador da forma, e condições, sobre as quais se concebem as relações do Estado e o Cidadão. A natureza democrática, ou não, de um Estado depende, também do estatuto do cidadão face ao poder público, especificamente face à instância de controle reforçado, que é característica do processo penal, e da forma leal, ou desleal, como é tratado no seu catálogo de direitos e deveres. O princípio da lealdade no comportamento processual, nomeadamente na recolha de prova, representa uma imposição de princípios gerais inscritos na própria dignidade humana, e da ética, que deve presidir a todos os actos do cidadão. O mesmo liga-se, de forma inexorável, ao direito a um processo justo e ao princípio da igualdade de armas. Em termos gerais e, em qualquer litígio, a existência de um princípio geral de lealdade é essencial para a afirmação da existência do Estado de Direito. (…) o delicado equilíbrio entre direitos fundamentais e as necessidades impostas pela eficiência da justiça penal, que também é nuclear no funcionamento do Estado de Direito, encontra o seu eixo fundamental no princípio da proporcionalidade à luz dos requisitos da idoneidade, necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito, nos quais se decompõe. Estas três exigências são requisitos intrínsecos de toda a medida processual restritiva de direitos fundamentais e exigíveis, tanto no momento da sua previsão pelo legislador, como na sua aplicação prática. O respeito pelo princípio da idoneidade implica que as limitações dos direitos fundamentais antecipadas pela lei estejam adptadas aos fins legítimos a que se dirigem e que as mesmas sejam adequadas à prossecução das finalidades que visam atingir em função da sua adequação quantitativa e qualitativa e do deu espaço de aplicação subjectivo. Significa o ex(...) que o juízo sobre a idoneidade não se esgota na demonstração da capacidade abstracta de uma medida determinada para conseguir determinado objectivo, nem na adequação objectiva da mesma, tendo em consideração as circunstâncias concretas, mas também requer o respeito pelo princípio da idoneidade a forma concreta e ajustada como é aplicada a medida por forma a que não se persiga uma finalidade diferente da antecipada pela lei. Pela aplicação do princípio da necessidade o sujeito chamada a aplicar a medida restritiva deve eleger, entre aquelas medidas que são igualmente aptas para o objectivo pretendido, aquela que é menos prejudicial para os direitos dos cidadãos. Por último, o uso do princípio da proporcionalidade em sentido estrito implica que se verifique se a restrição dos direitos individuais sujeitos à sua aplicação consagra uma relação razoável ou proporcional com a importância do objectivo que se pretende atingir. Consequentemente, a ponderação do princípio da proporcionalidade em sentido estrito terá de sopesar os interesses em conflito o que, na prática se resume aos direitos do indivíduo face aos interesses protegidos pelo Estado (…) (sublinhado nosso)”. Por tudo quanto assim foi dito, compreende-se que as diligências de prova requeridas pelo arguido tendo em vista a inquirição de centenas de testemunhas, na sequência da comunicada alteração na componente da localização factual, contendem com o princípio da proporcionalidade e, como tal, devem ser indeferidas. A eventual compressão dos direitos de defesa do arguido que daí possa resultar é inteiramente compatível com a finalidade última do processo justo e equitativo. Logo, não se verifica qualquer violação dos arts. 32.º, n.º 1, da CRP, 358.º, n.º 1, e 340.º, do CPP. O que se expôs quanto ao requerimento para inquirição de testemunhas apresentado pelo arguido E tem inteira validade e cabimento para semelhante requerimento apresentado pelo arguido K. Efectivamente, quanto a este arguido, o Tribunal decidiu, ao abrigo do dis(...) no art. 340.º, n.° 1, do CPP, do dis(...) nos arts. 315.°, n.° 4, e 283,°, n.° 3, al. d), e n.° 7, do CPP e do art. 32.°, n.°s 1 e 5 e art. 200.º, n.°s 1 e 4, da CRP, por tal se revelar necessário para a boa e justa decisão da causa e proporcionalmente adequado ao caso concreto, deferir: - a audição de dez testemunhas, de entre as identificadas pelo arguido a fls. 64850 a 64857; - indeferindo quanto ao demais requerido a fls. 64848 a 64857 em relação a moradias localizadas no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as (…) e a (…) e na zona dessas (...). O arguido insurge-se contra este despacho, invocando, à semelhança do que fez o arguido E, que interpretou a alteração como relativa determinação espacial, já processualmente consentânea com a produção de prova testemunhal com alguma eficácia, pois se assim não fosse a alteração indiciária seria inútil. Já acima referimos que não merece acolhimento a argumentação assim apresentada pelo arguido. Desde logo, porque do indeferimento de um concreto meio de prova não se pode retirar a inutilidade da alteração, (...) que o arguido poderia recorrer a outros meios de prova que entendesse relevantes. Além disso, não se compreende, à luz das regras da experiência comum e do princípio da proporcionalidade, como pode o arguido entender que seria viável identificar e fazer comparecer em tribunal centenas de testemunhas, com eficácia para a sua defesa (pois essa só poderia verificar-se no caso de serem inquiridos todos os moradores, num determinado período temporal, das moradias na zona do (…) identificada no despacho que comunicou as alterações, o que manifestamente era muito improvável que acontecesse). Consequentemente, e sem necessidade de mais considerações – pois damos aqui por reproduzidas todas as que já foram adiantadas a propósito do idêntico objecto de recurso apresentado pelo arguido E – entendemos que a decisão de indeferimento do requerimento de inquirição de testemunhas apresentado pelo arguido K não nos merece qualquer reparo, ainda que com fundamentação, em parte, distinta da que serviu de base à decisão do Tribunal recorrido, dado que a prova tal como foi requerida, era irrelevante, ineficaz e desproporcionada, não sendo, objectivamente, violadora dos direitos de defesa do arguido, nem do dis(...) nos arts. 32.º, n.ºs 1 e 5 da CRP, 358.º, n.º 1, 340.º, do CPP, e 6.ª da CEDH. Já o requerimento de prova apresentado pelo arguido H respeita a diferentes diligências de prova. Como acima justificado, foi declarado extinto, em parte, o recurso interlocutório apresentado pelo arguido H, designadamente no que tange com as diligências probatórias das als. a) a e) do seu requerimento de prova (mais uma vez se salienta que esta identificação se reporta ao modo como o Tribunal a quo identificou essas mesmas diligências no despacho recorrido). (...) que o arguido, no ponto 11 da sua motivação de recurso, afirma que quanto às outras diligências requeridas – no caso já só as das als. f), h) e i) –, embora as considere úteis, por uma questão de economia processual, conforma-se com o despacho proferido, resta a apreciação da diligência de prova mencionada na al. g) – a reinquirição do assistente AP sobre as alterações comunicadas (relativas aos pontos 5.2.3. e 5.2.5. do despacho de pronúncia), bem como sobre a entrevista que terá dado ao jornal CX, a 6 de Março de 2009. O arguido H entende que tal diligência foi recusada com o fundamento de que a defesa de H já teria interrogado o assistente sobre aquilo que tinha achado relevante, sem limitações de período temporal, sendo essa argumentação, para o arguido, inaceitável, pela simples e elementar razão de que tal interrogatório teve por base a factualidade que constava nos primitivos pontos 5.2.3. e 5.2.5. do despacho de pronúncia e não a que passou a constar na sequência da alteração de factos comunicada. Para aquele arguido, ter-se-ia o Tribunal esquecido de que quem define a estratégia da defesa é a defesa e não o Tribunal. Uma vez alterada a factualidade de pronúncia que envolve tal assistente e o arguido, teria a defesa o inalienável direito de voltar a inquirir aquele assistente acerca dessa alteração. E idêntico direito parece-lhe que igualmente lhe assiste quando pretende confrontar o assistente com uma entrevista que, entretanto, lhe é atribuída, na qual AP terá dito que algumas das alegadas vítimas terão mentido e que “se a minha boca se abre é o descambar do mundo”, entrevista que pretende ver junta aos autos. Conclui o arguido, que o despacho recorrido – pelo menos quanto (…) à reinquirição do assistente – avaliou erroneamente a utilidade e relevância das diligências probatórias requeridas, pelo que violou, de forma grave, o direito do arguido à sua defesa, tal como é configurado pelo art. 32.º, n.º 1, da CRP e pelo art. 6.º da CEDH, impedindo-o de contrariar, fosse de que maneira fosse, a nova factualidade que lhe é imputada. Apreciando a pretensão do arguido, impõe-se precisar que a diligência de reinquirição do assistente AP só poderá ter interesse do ponto de vista da comunicada alteração de factos quanto ao ponto 5.2.5. do despacho de pronúncia, uma vez que essa versão dos factos foi a que, efectivamente, acabou por ser dada como demonstrada no acórdão final (tudo quanto respeite ao ponto 5.2.3. do despacho de pronúncia está abrangido pelo despacho supra, de extinção parcial do recurso). E a alteração em causa, como o próprio arguido afirma, respeita a uma alteração do local onde o arguido H estaria a aguardar o assistente. Com efeito, a fls. 164 do acórdão, veio a dar-se como provado o seguinte: “113. Em data em concreto não determinada, entre Outubro de 1996 e Outubro de 1997, na sequência de o arguido A ter dito a AP para ir ter à (...) que se situa nas traseiras do CZ, onde um veículo em que estava o arguido H o aguardava. 114. Após AP entrou no veículo onde estava o arguido H e foi transportado até (…), para uma casa.” O Tribunal recorrido fundamentou o indeferimento do requerimento de prova do arguido H, quanto à diligência em causa – reinquirição do assistente e junção de entrevista do mesmo a um jornal – nos seguintes termos, parcialmente transcritos: “(…)o Tribunal tem que fazer a sua ponderação face á extensão ou complexidade das alterações comunicadas, ao enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que pretende exercer nova Defesa, no contexto dos “novos factos” comunicados. Para, a final, poder concluir pela eventual necessidade de audição de novas testemunhas ou produção de mais meios de prova e pela verificação dos pressu(...)s que levam ao deferimento das diligências. (…) Lembrando o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, há que ter em atenção que na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao art. 340°, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “…de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…“ (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever – para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova –, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e a efectiva afectação das garantias de defesa do arguido e como estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecanismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não (…) para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptivel de resultar dos factos (…) face à forma como se encontram descritos… “pois”… tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do princípio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações...” (cfr. Ac. STJ de 6/5/99, in CJ, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214). E, como já referido aquando do conhecimento das diligências de prova requeridas pelo arguidos que antecedem, a celeridade processual em matéria penal também tem dignidade constitucional – art° 32°, nº 2, 2 parte, da C.R.P. –, o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da C.R.P., engloba “todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação”(cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. 1, pag 516, 4 edição, Coimbra Editora) e daí o Dever e Poder do Tribunal do Julgamento, de conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso çoncreto possam conflituar.(…) Isto é, ou poder dar consistência a declarações dos assistentes quanto a diferentes circunstâncias de tempo ou lugar, que aparentemente resultavam das declarações dos assistentes em relação as circunstâncias de tempo ou lugar descritas no Despacho de pronúncia, ou contribuir para a fragilidade de tais declarações por, por exemplo, não ser verosímil, com explicação racional, que factos imputados aos arguidos pudessem ter ocorrido em circunstâncias de tempo ou lugar diferentes das descritas no Despacho de pronúncia e “no” ou “num” dos sentidos que, numa primeira abordagem, poderia resultar das declarações dos assistentes. (…) O assistente AP prestou declarações em dezasseis sessões de audiência de julgamento, sendo que foi prestando sucessiva e, por vezes, repetidamente em relação a aspectos parcelares, a todos os sujeitos processuais e ao Tribunal. Foi perguntado, sucessivamente, de forma pormenorizada e minuciosa em relação a todas e diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia – incluindo a situação objecto da comunicação de alteração de factos – e tendo já sido perguntado e dado esclarecimentos, por todo o período abrangido pela comunicação, anterior e posterior. O arguido H, por exemplo, nas sessões de 18/07/05 e 20/07/05 esteve, exclusivamente, a pedir esclarecimentos ao assistente, tendo-os pedidos ainda – embora aí não exclusivamente –, nas sessões de 22/7/05, 25/07/05 e 25/11/05. Na sessão de 18/07/05 – como se pode ouvir pela gravação das declarações –, foi interrogado pela defesa do arguido H quanto aos factos que o despacho de pronúncia diz terem-se passado no prédio sito na (...) (…) e foi-o sem restrições por parte do Tnbunal quanto a periodos temporais e de forma cuidada, pormenonzada, por parte do Ilustre Mandátario do arguido.(…) Este momento processual e renovando de algum modo o já acima dito, é aquele em que o Tribunal tem a possibilidade de avaliar ou ponderar o que resultou de toda a actividade do Julgamento, ao longo do qual, de acordo com as linhas da Acusação ou Defesa que foram sendo delineadas pelos Sujeitos processuais, o Tribunal foi, com o contributo de tudo o que foi requerido e exercido pelos Sujeitos processuais, construindo um encadeado de factos, conhecimentos, reflexões, que acompanhando tais linhas de acusação ou de defesa, permitiriam e permitem ao Tribunal, neste momento, chegar a uma decisão. Assim, à luz da ponderação do conteúdo concreto de toda a prova produzida em audiência de julgamento, do que é a alteração que em concreto foi comunicada ao arguido nos termos do art° 358°, do CPPenal e do que são as inquirições em concreto requeridas, o Tribunal também não considera necessário e útil, para a prova dos factos que são objecto da comunicação (de possibilidade) de alteração feita pelo tribunal em relação ao “Ponto 5.2.3”, fls 20.909 a 20.910, do Despacho de Pronúncia, para a descoberta da Verdade, para a formação da convicção quanto aos factos e para o proferimento de uma Decisão fundamentada e Justa: - a audição das pessoas requeridas pelo arguido H fls 64.990 a 64.997, pontos 6° a 11º, 15° e 16°; - a nova audição do assistente AP, requerida no ponto 16°, de fls. 64.997; - nem, em consequência, as diligências requeridas pelo arguido quanto á obtenção, identificação e nomes de pessoas a inquirir. Nem tal se impõe, na avaliação do Tribunal, para garantia do exercicio do direito de Defesa e do contraditório pois, para o Tribunal, o contraditório que já foi exercido pelo arguido na audiência de julgamento e com a abertura com que o foi, permitiu ao arguido exercer a sua Defesa e este exerceu-a efectivamente, potencializando o que resulta, em termos factuais e de qualificação jurídica, da comunicação (de possibilidade) de alteração não substancial feita ao arguido A no Despacho de fls. 64.106, “Ponto III” – que reproduziu a comunicação que fora feita anteriormente pelo despacho de fls. 63.685 a 63.687, Ponto III –, referente aos factos descritos no “Ponto 5.2.3”, fls. 20.909 a 20.910, do Despacho de Pronúncia e em relação à qual o arguido H está a requerer a produção de prova. 6.3.3. Mas também, por tudo o que antecede, o Tribunal não vê em que medida a requerida junção do documento de fls. 65.001 a 65.002, fotocópia de uma “entrevista” publicada no CX, no dia 6/03/09 – que o arguido diz ser relevante, pelo facto de do mesmo constar que o assistente terá dito que terá havido vítimas que podem ter mentido neste processo –; a junção de um DVD com uma gravação de uma entrevista à DS da Sra. D. DV – em que o arguido diz que a mesma terá sido confrontada com a eventual prática de abusos sexuais na sua casa, cujo interior foi filmado – ou o pedido de documento ao DX – a que o arguido atribui relevância pelo facto de considerar que permite localizar o retorno dos estafetas ao (…) Dto. do prédio sito na (...) (…) em 2003 –, se afigure necessário e útil, para garantir o eficaz exercício de defesa por parte do arguido, em resultado da comunicação que foi feita ao arguido A e em relação a qual o arguido H requer as diligências. Mas aqui e salvo melhor entendimento - e em relação a cada um dos documentos -, o arguido não especifica nem demonstra, o que o artigo de fls. 65.001 a 65.002 traz de relevante para a prova dos “factos novos” objecto da comunicação de alterações, ou mesmo noutro contexto mais amplo não demonstra o que a junção do DVD ou do documento de um empilhador, pode acrescentar de essencial e relevante neste momento processual, tendo em atenção a factualidade objecto da comunicação de alterações no âmbito do art° 358°, do C.P.P. e que fundamenta o pedido de produção de prova complementar. Mas apesar de o arguido não ter demonstrado, suficientemente, a relevância, necessidade ou adequação concreta do que requer, o Tribunal, dentro dos poderes/deveres que decorrem, pelo menos, do art° 340°, do CPPenal e na sequência do enquadramento teórico acima ex(...), avaliará sempre da residual relevância, necessidade ou adequação ao caso concreto do requerido, ponderando a extensão ou complexidade das alterações cornunicadas, o enquadramento fáctico em que o arguido já exerceu a sua defesa no contexto do Despacho de Pronúncia e o enquadramento em que poderia haver lugar ao exercício de nova Defesa no contexto dos “novos factos” comunicados. Tendo sempre em atenção a já referida linha orientadora de garantia/verificação do exercício eficaz do direito de defesa.(…) 6.4. Em consequência e face a toda a fundamentação e conclusões que antecedem, ao abrigo do dis(...) no art° 340º, n° 1 , do CPPenal, “a contrario”, por o Tribunal não o considerar relevante, útil, nem necessário para proferir uma Decisão Justa, objectiva e fundamentada, nem se impondo para efectivar o eficaz direito de defesa do arguido, em consequência da comunicação da possibilidade de alteração de factos, o Tribunal indefere a diligência requerida.” Tudo quanto o Tribunal assim afirmou não nos merece qualquer reparo, mormente no que se reporta à reinquirição do assistente AP, pelo motivos já ex(...)s pelo Tribunal a quo – a que aderimos –, e pelos que adiante também se aduzirão. O arguido, na sua motivação de recurso começa por afirmar que a relevância probatória que é atribuída aos asssistentes, neste caso ao assistente AP, também é susceptível de afectar a defesa do arguido. No entanto, impõe-se salientar que estamos na fase de comunicação de alterações não substanciais de factos, em que o Tribunal a quo fez uma avaliação de toda a prova indiciária que indicou como fundamento do despacho de comunicação de alterações e não em sede de acórdão final. Desconhece-se nessa fase processual qual a relevância probatória que foi atribuída ao assistente – e que sempre será meramente indiciária. Os arguidos insistem em afirmar que as alterações de factos comunicadas resultaram das declarações dos assistentes (e poderão, pelo menos algumas delas, ter resultado), mas isso não podemos nós corroborar, nem considerar para a decisão do recurso interlocutório, porque o Tribunal recorrido não o afirmou. No acórdão final o Tribunal justifica porque considera ou não determinadas declarações relevantes do ponto de vista probatório. Na fase processual em que comunicou as alterações de factos essa relevância não é invocada pelo Tribunal nem pode ser inferida. Aquilo a que temos que atender é à fundamentação que o Tribunal recorrido apresentou como razão de ser das alterações, sem que de algum modo tenha antecipado, do ponto de vista da apreciação da prova, se esta ou aquela outra era mais relevante. Não tendo o Tribunal a quo feito essa apreciação – que, aliás, lhe estava vedada –, não se vê que interesse possa ter a reinquirição do assistente para contrariar uma relevância probatória que, à data, não consta dos autos como tendo sido a que o Tribunal aceitou. Aceitar semelhante argumentação seria aceitar que o Tribunal de 1.ª instância tomou posição quanto à relevância probatória das declarações dos assistentes, o que não corresponde à verdade. Se o Tribunal não tomou posição quanto a essa relevância probatória carece de sentido pretender realizar diligências de prova para contrariar o que não foi feito. No mais, o que o arguido põe em causa é que o Tribunal tenha indeferido a reinquirição do arguido AP porque o arguido já tinha exercido o contraditório sobre aquilo que tinha achado relevante, sem limitações de período temporal, aquando da tomada de declarações ao assistente. Isto porque, diz o arguido, que o fez com base no que constava do primitivo ponto 5.2.5. do despacho de pronúncia. E até pode tê-lo feito. Mas isso não significa que não o tenha feito com uma latitude tal que tenha abrangido todas as questões que ao assistente podiam ser colocadas a esse propósito, esvaziando, assim, de utilidade, nova inquirição do assistente com a mesma finalidade. Não esqueçamos que aquilo que agora está em análise é apenas uma alteração no local onde o arguido H teria esperado o menor. Revendo com pormenor as declarações prestadas em audiência de julgamento pelo AP – em inúmeras sessões – podemos realçar as seguintes perguntas e respostas: “(sessão de 20 de Junho de 2005) AP – Como eu estava a dizer. No interior desta casa se encontrava o Sr. H, o Sr. K, o Sr. N, o Sr. BD, o Sr. C. (suspira) Ahn... E... já “memo” no interior desta casa e visto “távamos” todos dentro, e onde éramos também encaminhados até ao interior da casa pelo Sr. A ... Ahn... o Sr. N perguntou se alguém, alguma das crianças que se encontravam queriam tomar algum sumo, ou uma água, onde eu aceitei um sumo. Acabado de beber este sumo, fomos (...)s num quarto, onde tivemos de tirar a nossa roupa e onde o Sr. N entrou dentro do quarto, mexeu no nosso pénis até ficar erecto e onde se acompanhava pelos mesmos que já nomeei a este Tribunal e onde o... quando o Sr. N mexia no nosso pénis, o Sr. H estava com um olhar muito atento em mim e onde me chamou. Dirigi-me ao Sr. H, onde fui levado para um quarto e onde este, ahn... pegando na minha mão e pondo no pénis do Sr. H, pedindo para acariciar e acariciando o meu, falou que tinha pele de bebé e que era o rapaz mais bonito dos colegas que se encontravam naquela casa. Dentro do quarto, o Sr. H obrigou-me a fazer sexo oral, penetração no anus, até à ejaculação, onde também praticou sexo oral no meu pénis. Ahn... acabando este, esta coisa que aconteceu, descemos e visto que os colegas já estavam despachados, o Sr. A era chamado para nos ir buscar. Na presença do Sr. A na casa para nos levar de novo para o (...). Já na nossa retirada, o Sr. N dirigiu-se ao Sr. A entregando-lhe um envelope amarelo. De momento, não sabia o que era o envelope, nem o que continha. Dentro da própria carrinha, (…), cor (…) da AX, o Sr. A fazia uma entrega de dinheiro aos meninos, onde dava uma quantia de cinco contos a todos, dando 2 euros... dois contos a mim, não dando o resto. Tomávamos viagem, de novo para o (...). As viagens a (…) foram~, se não estou em erro, cinco vezes que eu lá fui, entretanto, já no (...), fui levado pelo Sr. A ao (…), se não estou em erro, onde me fui encontrar com o Sr. H, onde este se acompanhava do Sr. EV, num (…). Entrando nessa viatura o Sr. H levou-me a fazer um passeio no (…) e mostrou-me um estúdio que havia na (…), que não sei dizer a este Tribunal o nome daquele estúdio. Ahn... Ainda e por várias vezes... o... encontrei-me... nesse... meses depois... ou dias... não me recordo Srª Srª Juíza, o... encontrei-me outra vez com o Sr. H, onde fui com este e com o seu assessor EV, até uma praia de (…) que fica na linha, para um encontro com o Sr. E, onde este lhe entregou umas chaves que supostamente eram do apartamento do mesmo. O Sr. H recebida esta, esta chave, tomou viagem até (…), a um apartamento do Sr. H. Do Sr. H, peço im...peço perdão a este Tribunal, pertencente ao Sr. E. Ahn... Entretanto, já nas instalações da AX, o Sr. A pediu-me para que eu fosse ao (...) do Sr. K, que fica junto dos (…), onde este (...) K, tem um novo (...), mas quando eu ia, o (...) ficava na mesma (...) um pouco mais acima. Dirigi-me ao (...), tinha uma porta (…), entrando nessa porta subia umas escadas, virava à esquerda num corredorzinho pequeno, virava e tinha uma porta do lado direito onde eu batia e era recebido por uma senhora que supostamente era funcionária do Dr. K. Recebido por esta senhora e questionado pelo qual o que é que eu estava lá a fazer, onde eu respondia que vinha-me encontrar com o Sr. K, ela disse sim senhora, aguarde um momento que eu vou perguntar se o Sr. Dr. lhe pode receber. Perdão. Dirigiu-se ao Sr. Dr. enquanto eu fiquei na sala à espera e onde o Sr. Dr. K respondeu que sim senhor podia receber o menino, que era eu. Entrando naquele (...), o Sr. K mandou baixar as calças e acariciando o meu pénis e depois, mandou-me sentar no colo do mesmo e tentando-me dar beijinhos na boca, onde eu afastava sempre a cara. Aí o Sr. K tentou fazer a penetração no anus, onde não conseguiu, onde também tentou usar um creme que eu não pos... não sei qual era, para ver se conseguia fazer a penetração no anus, ou não, onde acabou por conseguir fazer a penetração. Saí, e fui para o (…). Mais tarde, o Sr. A pediu-me para que levasse um aluno da AX, colega, de nome AT a casa do Sr. K, no (…), onde eu levei. O Sr. A deu-me as indicações, que tinha que apanhar um autocarro, sair numa, na antepenúltima paragem, se não estou em erro, e “tava”... passar por baixo dum, dum túnel, que é, que julgo eu, que era por baixo de uma coisa qualquer, e estava logo de frente para a casa do Sr. K. Entrei com o AT, onde fiquei lá com ele e onde o Sr. K, mais uma vez, abusou de mim e do meu colega AT. Saímos e fomos para a Instituição. Mais tarde, fui levado pelo Sr. A e pelo AV a uma casa em (…). Não sei explicar se era a casa (…), ou não, porque se era a casa (…), eu nunca descobri esse nome. Ahn... fomos levados a essa casa. Eu subi até lá acima, com o AT também, onde o AV desceu com o Sr. A. Fui, aí ninguém abusou de mim, fui lá por mero acaso, não sei bem porquê. Talvez o Sr. A possa explicar a este Tribunal o porquê de eu ter ido à casa das (…), se é esse o nome, porque eu não sei explicar bem porque é que eu lá fui. Saí daquela casa, entrei outra vez dentro da carrinha da AX e fui outra vez para a Instituição. Mais tarde, o Sr. A pediu para eu lhe ajudar a tirar umas caixas que se encontravam numa... na carrinha (…), não sei se eram documentos da AX ou não, mas que era para levar para as caves da (...), onde eu aceitei, sim senhora, e dirigi-me à (...), onde o Sr. A já se encontrava. Entretanto, o Sr. A tinha as chaves da (...), abriu a porta e eu fui à frente com uma caixa. Cheguei lá abaixo à cave da (...) e deparei que a porta se encontrava aberta, o que não era normal. Empurrei a porta com o pé devagarinho, entrei e quando me virei para a direita para pousar a caixa, deparei que se encontravam lá duas pessoas, onde consegui ver que eram o senhor C, mais o AT, onde o AT, onde o AT, peço desculpa, estava a fazer sexo oral ao Sr. C. Saí, trouxe a caixa outra vez de volta comigo, saí, dirigi-me ao Sr. A e disse: “Sr. A a porta encontra-se aberta o que não é normal, e deparei que lá dentro encontrava-se o Sr. C e AT a fazer práticas de pedofilia, “tava” a fazer sexo oral”. Onde o Sr. A me respondeu que para eu não contar nada a ninguém do que vi, nem do que ele tinha feito comigo porque senão, bem que podia fugir da AX, senão não sei o que é que o Sr. A fazia. Nunca contei nada, dirigi-me para o lar, onde me fui deitar chateado. No outro dia fui para as aulas onde a professora notou um bocado de... pronto, notou que eu não estava igual, quando iniciei as aulas mas não deu importância, pois como às vezes eu quando “tava” doente, ou chateado não falava com ninguém, ela não deu importância, nem sequer me veio perguntar o que é que se passava comigo. Aos 15 anos, foi pela última vez em que eu estive em (…), e onde estive com os mesmos arguidos. Já com esses 15 anos, eu fui retirado da AX, porque... na juventude nós experimentamos coisas, que pensamos que estamos a fazer bem para nós sem saber o que aquilo pode causar um dia mais tarde. E então fui apanhado com uma pedra de chamon, onde os educadores fizeram um relatório a dizer que tinham-me apanhado com uma pedra de chamon e onde enviaram ao Sr. director, onde eu fui, acabei por ser expulso do CZ e (...) na casa de correcção EW, em (…). Nesse (...), não estive muito tempo, porque a minha tia deu..., que é uma senhora que sempre gostou de mim, como do meu irmão, falou para os Tribunais, para que me tirasse daquela casa e me pusesse na casa da mesma, porque esta se responsabilizava por mim. Foi feito, eu saí não sei quanto tempo depois de ter entrado. Saí, e onde vivi com a minha tia, dos 15 anos até aos 18, onde iniciei a minha carreira militar. (sessão de 24 de Junho de 2005) Juíza Presidente – Essa, esse episódio que está a relatar foi a primeira vez que viu o Sr. H, ou já o tinha visto antes? AP – Já o tinha visto antes. Juíza Presidente – Aonde? AP – Srª Drª, eu encontrava-me dentro das instalações da AX, e onde o Sr. A me disse para ir às traseiras da AX, ao EX, que também é da Instituição da AX, que é onde é o lar (…). Aí, nessas traseiras, nós passávamos pelo preceptor fininho que é um ferro que nós “alevantávamos”, que ficava "memo" de frente, junto a um poste que ilumina o campo. Passei esse ferro, dirigi-me à viatura do Sr. H, (…), cor (…), entrei dentro dessa viatura e fui levado pelo, também dessa vez, pelo Sr. EV até à praia de (…) onde me encontrei com o Sr. E.(…) Juíza Presidente – Então vou-lhe pedir para começar por esta vez em que foi, em que diz que foi a (…), como é que isso se passou? AP – Srª Drª, eu estava na Instituição, como já referenciei ao Tribunal, e fui abordado pelo Sr. A, onde me questionou para que fosse atrás da Instituição que se encontrava lá uma, um carro topo de gama, (…), cor (…), e que estava lá o Sr. H à minha espera. Juíza Presidente – Disse mesmo, o Sr. A disse-lhe mesmo o nome H? AP – Sim, Srª Drª Juíza. Eu dirigi-me, passei pelo... dito ferro que é, nós chamamos, entre os nossos códigos, o preceptor fininho, dirigi-me a essa viatura, entrei no carro e dirigi-me à praia de (…) juntamente com o Sr. Juíza Presidente – Nesse carro, quem é que estava, então? AP – O Sr. H e o seu assessor, EV. Juíza Presidente – Quem é que falou consigo? Ou quem é que lhe abriu a porta? Algum dos senhores estava fora do carro, ou como é que isso se passou? AP – O Sr. H encontrava-se da parte exterior do carro, encostado a ele à espera, provavelmente, que eu fosse lá porque já... provável, no meu ver, hoje, isto devia ter sido combinado, já, pelo Sr. A, onde dirigi-me, entrei dentro da viatura, o Sr. H também entrou dentro da viatura, Juíza Presidente – Mas entrou, porquê? Alguém lhe disse alguma coisa? O que é que se passou? AP – O Sr. H disse que era para a gente ir a encontrar-se com o Sr. E, que ele estava à espera dele numa praia. Fomos então com destino a essa Juíza Presidente – E então, quem é que estava dentro desse carro? AP – O assessor, Sr. EV e o Sr. H. Juíza Presidente – Quem é que conduzia o carro? AP – O Sr. EV. Chegando a essa praia, Srª Drª, encontrava-se o Sr. E, onde o Sr. H Juíza Presidente – Mas foi mesmo à praia? Uma praia (…)? AP – Não sei se a Srª Drª conhece a praia (…)? Juíza Presidente – Explique. Pode ser que eu consiga reconhecer o local. AP – A Srª Drª tem as praias (…). Tem (…), praia (…). Juíza Presidente – Hum, hum. AP – E ali do seu lado direito agora tem o (…), e há ali uns prediozinhos. O Sr. H parou aí o carro, dirigiu-se àquela praia onde se encontrava Juíza Presidente – Portanto, nuns prédios ao pé do (…). É isso? AP – Correcto. Juíza Presidente – Um (…) que há aí? AP – Onde morava o arguido DU, também era, que me “molestrou”, abusou de mim, em que o processo já foi, já foi feita justiça, pronto. Parou aí a viatura. Fomos em direcção, então, ao Sr. E. Juíza Presidente – Portanto, diz que pararam a viatura? AP – Exactamente, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E foram... AP – A pé até à praia. Entretanto, já lá "tava" o Sr. E. Juíza Presidente – A(...)ram alguma, alguma estrada, ou não? Ou é...? AP – Tem um túnel, Srª Drª Juíza. Entretanto, o Sr. E já se encontrava nessa praia, onde o Sr. H se dirigiu a ele, e eu vi uma coisa brilhar. Quando o Sr. H se aproximou na minha direcção, vi que o Sr. H transportava umas chaves, supostamente, do condomínio do Sr. E. Dirigimo-nos, então, de novo, à viatura e onde fomos em direcção ao apartamento do Sr. E, que sei que situa-se em (…), não conseguindo referir a este Tribunal o sítio em concreto. Juíza Presidente – E nesta ida para (…), quem é que ia dentro do carro? AP – Eu, o Sr. EV e o Sr. H. Juíza Presidente – Quem é que ia a conduzir? AP – O Sr. EV, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – O Sr. E já o tinha, nesse dia, já o conhe, já o tinha visto antes, ou foi a primeira vez que o viu? AP – Foi a primeira vez que eu o tinha, que o vi naquela, naquela praia, foi a primeira vez. Vi depois Juíza Presidente – Então, quando é que soube como é que este senhor se chamava? AP – Srª Drª, como é normal, eu não sabia o nome das pessoas, a não ser o Sr. H que era a pessoa com quem eu mantinha mais contacto, pois visto que o Sr. H me tratava com, com muito afecto, dizendo que eu que era o menino mais bonito do, dos outros rapazes e dizendo que eu tinha pele de bebé. Juíza Presidente – Sim. Mas oh Sr. AP, nesta vez em que diz que foi à praia (…), já tinha ido a (…)? AP – Não, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Pronto. E diz que dessa vez foi a primeira vez, de acordo com o que há pouco referiu, foi a primeira vez que viu o Sr. H? AP – Exactamente, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E o que eu lhe estou a perguntar é: nessa praia (…), em que diz que viu um senhor que diz que era o Sr. E... Perguntei-lhe se já tinha visto este senhor antes, e disse-me que...? AP – Foi a primeira vez que o vi, naquela praia. Juíza Presidente – Depois eu perguntei-lhe: quando é que soube o nome deste senhor que se chamava E? AP – Srª Drª, como é normal, eu vi a cara da pessoa e não sabia o nome. Ahn... quando isso, o processo “arrebentou”, que foi o, o Sr. A o primeiro a ser detido e depois vieram-se a surgir os outros nomes, eu vim a descobrir que afinal o nome do senhor, do senhor que eu nomeei na praia era o nome E. Ahn... Juíza Presidente – E já agora, faço-lhe uma outra pergunta que é o seguinte: AP – Faz favor. Juíza Presidente – E o nome, e quando é que soube como é que se chamava o senhor que ia a conduzir o carro? Para a praia (…) e depois para (…)? AP – Como eu já disse, eu quando fui à Judiciária prestar o meu depoimento, e onde sempre falei a verdade, somente a verdade, eu questionei ao senhor inspector que se ocorreu de investigar este processo de que havia outra pessoa que guiava aquele carro, que era ligado ao Sr. H. Não sabia também o nome, vim a saber na comunicação social, também, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Então e diz que foi, ver se eu tenho aqui o meu apontamento, para uma casa em (…)? AP – Exactamente, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E depois como é que foi para o (...)? AP – O Sr. H levou-me de volta, deixando-me outra vez no ponto em que eu parti, e onde eu entrei outra vez pela mesma grade que tinha saído. Juíza Presidente – E o tal senhor que ia a conduzir o carro, desta vez, no regresso, também ia, ou não? AP – Ia sim, Srª Drª Juíza. (sessão de 29 de Junho de 2005) Procurador – Mudando agora também o registo, Srª Juíza Presidente. Ficou-me a dúvida, em função das declarações anteriores do assistente, de quando ao certo, quando é que ao certo, viu, falou, esteve com o arguido H, a primeira vez? Eu não vou, ahn, citar a transcrição das declarações para não induzir, dizer quais são os episódios que me causam dúvida. Faria apenas assim a pergunta: quando é que, ao certo, esteve, falou com o arguido H a primeira vez? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Posso sim, Srª Drª Juíza. Ahn... a primeira vez que eu en, que eu estive frente a frente com o Sr. H e que fui abusado pelo mesmo foi quando fomos à praia (…) para recebermos as chaves do apartamento do Sr. E. Procurador – Se, onde é que o arguido H o tinha recolhido? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Ahn... o Sr. H encontrava-se nas traseiras da AX, junto ao EX, instituição (…), onde eu passei pelo um ferro fininho e entrei dentro da viatura onde se acompanhava de, fazia-se acompanhar do Sr. EV.(…) Procurador – Srª Drª Juíza, reportando-nos agora à ida à casa de (…), a que o assistente já fez referência, o que é que se passou nessa casa? Não foi perguntado. Na transcrição não... Juíza Presidente – Pode responder. AP – Posso sim. Como eu já referenciei a este Tribunal, fui até à praia (…), acompanhado do Sr. EV e do Sr. H, a encontrar-nos com o Sr. E para este dar as chaves do seu apartamento ao Sr. H. Tendo o Sr. H as chaves do apartamento do Sr. E em sua posse, dirigimo-nos a esse apartamento, onde eu e o Sr. H subimos, ficando o Sr. EV cá em baixo e onde, já encontrando-nos nessa casa, o Sr. H abusou da mi, da mesma maneira, pedindo para lhe acariciar o pénis, em que ele acariciava a mim, também, pedindo depois para fazer sexo oral, pelo qual ele também, às vezes, muita das vezes, fazia-me. Procurador – Peço desculpa. Pedindo para fazer sexo...? Juíza Presidente – Pode repetir? AP – Posso sim. Sexo oral. Procurador – Se dessa vez, não houve sexo anal? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Posso sim. Dessa vez, não houve sexo anal. O sexo anal em que, ocorreu Procurador – Srª Drª, eu peço desculpa. Eu tou-me a reportar a esta vez e portanto, a resposta foi: desta vez, não houve. Juíza Presidente – Sim. E o que é que... quer especificar, Sr. Procurador? Procurador – Muito obrigado, Srª Drª. Srª Drª, eu peço desculpa de algum intervalo entre as perguntas, é que eu tenho que ir alternando entre a pronúncia Juíza Presidente – Não. Não tem. Mas em relação a esta, a esta resposta que foi dada, o Sr. Dr. quer alguma concretização? Procurador – Não, Srª Drª. É em relação, a pergunta foi se desta vez, houve ou não, sexo anal, ele, o assistente respondeu que não. Juíza Presidente – Sim. Respondeu que não. Procurador – Pronto. Quando ahn... terminou, o que é que se passou a seguir? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Posso sim. Ahn, terminando esse acto sexual com o Sr. H, descemos novamente, entrámos dentro da viatura que estava lá com o Sr. EV e onde o Sr. H e o Sr. EV me deixaram no ponto em que eu tinha partido: nas traseiras do CZ com o EX. (14 de Julho de 2005) Dr. Joaquim Moreira – Quando o Sr. A o abordou, saiu logo de seguida? Juíza Presidente – Pode esclarecer, Sr. AP. AP – Sim, quando foi feita a abordagem e que o Sr. A me solicitou que fosse às traseiras do EX, fui para lá directo, logo de imediato. Onde já estava lá a viatura e o Sr. H... com o seu motorista EV. Ou sócio, não sei. Dr. Joaquim Moreira – Estava... vestido e preparado para sair? Juíza Presidente – Foi mudar de roupa, para sair? AP – Não, Srª Drª. Juíza Presidente – Foi com a roupa que tinha no corpo? AP – Exacto. Dr. Joaquim Moreira – Nessa ocasião, qual era a roupa que, normalmente, usava durante o dia na AX? Que género de roupa era? Se usava alguma bata? Se usava alguma... Juíza Presidente – Compreendeu a pergunta? AP – Compreendi sim. Juíza Presidente – Pode esclarecer. AP – Não. Não usávamos batas nenhumas. Simplesmente, usava a minha roupa, como estou hoje, aqui, em Tribunal. Ou andava de camisa e calça, ou andava de fato de treino. Ou de calções... Dr. Joaquim Moreira – O Sr. H, o Sr. H, como disse, abriu a porta e o que é que aconteceu a seguir, com o máximo de pormenor possível? O que aconteceu a seguir à abertura da porta? (sessão de 18 de Julho de 2005) Dr. JJS – Sr. AP, o Sr. AP, na sessão de 20 (vinte) de Junho... foi-lhe colocado por Vª Exª a seguinte questão, passo a citar, portanto, a Srª Drª Juíza, nesta sessão disse-lhe assim: “dos vários factos que relatou, em (…), na casa fora de (…), numa casa em (…), num estúdio. Tendo em conta estes vários factos que relatou e relacionando-os com a primeira situação que relatou, na garagem, com o Sr. A, quais é que se passaram primeiro, depois da garagem?” o senhor, começou por não perceber a pergunta e a Srª Drª Juíza explicou melhor, disse: “houve factos passados com o Sr. A, na garagem, e depois o senhor falou de factos passados em (…); numa casa fora de (…); numa casa em (…) e num estúdio.” E a Srª Drª Juíza perguntou-lhe: “destes factos, quais é que se passaram depois da garagem?” e o Sr. AP respondeu muito claramente: “O primeiro, foi a ida a (…).” Eu queria que o Sr. AP fosse confrontado com esta transcrição, entre aspas, e confirmasse que isto foi assim. Juíza Presidente – Pode esc, compreendeu? AP – Compreendi sim. Juíza Presidente – Pode esclarecer, Sr. AP. AP – Srª Drª, após ter sido abusado pelo Sr. A eu fui com o Sr. H à praia (…). Como já disse, fui abordado pelo Sr. A, o qual me mandou ir às traseiras da AX, onde iria lá tar a viatura (…),(…), e estava lá o Sr. H. Dr. JJS – Porque é que o senhor, na primeira vez que lhe foi colocada a questão, na sessão de 20 (vinte) de Junho, a uma pergunta tão clara da Srª Drª Juíza, disse que a primeira situação tinha sido em (…)? Juíza Presidente – Quer acrescentar alguma coisa? Quer prestar algum esclarecimento, Sr. AP? AP – Não percebi agora a pergunta, peço desculpa. Juíza Presidente – Inicialmente, na sessão, quando comecei eu a fazer-lhe perguntas e quando lhe perguntei em relação ao Sr. H, qual tinha sido o primeiro, em relação à situação havida, na garagem, com o Sr. A, quando é que tinha sido a primeira vez que se tinha encontrado com o Sr. H, o senhor referiu – eu não tenho essa forma tão fidedigna como o Sr. Dr. – referiu (…). No entanto, em declarações posteriores, e nas que tem, nas que tem vindo a prestar, refere, no que diz respeito ao Sr. H, a seguir ao Sr. A, refere essa situação da praia (…), ir lá atrás, preceptor fininho, junto ao EX. Quer esclarecer esta discrepância do que disse primeiro, ou eventual discrepância, divergência entre o que disse primeiro e o que disse depois? E quer confirmar qual foi a primeira vez que se encontrou com o Sr. H? AP – Srª Drª, nós fomos a vários sítios. É... normal eu ter confundido a primeira vez com a segunda vez. Juíza Presidente – E neste momento, pode afirmar, com toda a certeza, a seguir à situação que teve com o Sr. A, qual foi a primeira vez que encontrou o Sr. H? AP – Srª Drª afirmo que foi após ter sido abusado pelo Sr. A que encontrei-o nas traseiras da AX, a mando do Sr. A. Dr. JJS – Portanto, as primeiras declarações que prestou ao Tribunal, não correspondem à verdade? Juíza Presidente – Diz, o que declarou foi que terá feito confusão, Sr. Dr. E eu terei que ver, também, com precisão, o contexto, não ponho em dúvida que a transcrição seja (imperceptível) mas o contexto. Dr. JJS – Srª Drª, eu transcrevi, praticamente, Srª Drª. Juíza Presidente – Pois. Dr. JJS – Mas nessa vez em que o senhor referiu que tinha ido primeiro a (…), também à Srª Drª Juíza, o senhor começou por dizer que o Sr. H o levou ao (…) e lhe mostrou um estúdio na (…) e que meses depois, ou dias, foi o encontro em (…). Nessa mesma sessão. O senhor começou por dizer, primeiro que tinha, o Sr. H o tinha levado ao (…) e ao estúdio da (…) e que meses depois, ou dias, tinha sido o encontro em (…), ahn... onde houve a entrega das chaves. Juíza Presidente – Um momento só Sr. Dr., que eu vou ver, que eu há uma parte que tenho transcrita. Dr. JJS – Srª Drª, a expressão do senhor assistente é: “meses depois, ou dias”. Falou do estúdio da (…) e a seguir disse “meses depois, ou dias encontrei-me com o Sr. H, onde fui com este e com o EV a (…).” Portanto, queria saber se também aqui fez confusão? Ou se esta versão é que é verdadeira? A do primeiro dia. Juíza Presidente – Sr. AP, compreendeu o sentido da pergunta do Sr. Dr.? AP – Não, Srª Drª. Juíza Presidente – Então, eu vou-lhe pedir o seguinte: para... no que tiver a certeza e no que não tiver, o senhor dizer ao Tribunal, no que diz respeito ao Sr. H, dizer sequencialmente, em sequência, e se for possível, o tempo que terá havido entre cada um dos encontros que teve algum encontro com este senhor? AP – Se eu tive? Juíza Presidente – Sim. Com que sequência e com que ordem? AP – Srª Drª, a primeira vez que eu vi o Sr. H, o Sr. H, (…), foi nas traseiras da AX, onde fui à casa de (…). Juíza Presidente – E depois da casa, e depois dessa ida a (…), quando é que o voltou a encontrar? AP – Vi-o em (…). Onde... cheguei a vê-lo em (…), no estúdio... Juíza Presidente – E esse estúdio, foi a seguir a quê? AP – Não me recordo, Srª Drª. Sei que tá entre a casa de (…) e... agora, não sei dizer se foi antes, se foi depois. Mas sei que fui lá. Dr. JJS – Então primeiro foi, foi (…); depois foi (…)? Juíza Presidente – Não é isso que está a dizer. Não sabe dizer se a questão do estúdio... repita o que quis dizer, Sr. AP, para eu não estar a pôr palavras AP – Srª Drª, Juíza Presidente – Sim. AP – A primeira vez que eu vi o Sr. H, foi nas traseiras da AX. Juíza Presidente – Sim. AP – Ao pé do EX. Depois, Juíza Presidente – E depois dessa vez? AP – Julgo que fomos para (…), onde eu voltei a ver, outra vez, o Sr. H... depois foi o estúdio, onde chegámos também a ir ao (…)... (…)” Não há, pois, dúvidas de que o assistente foi inquirido e reinquirido diversas vezes sobre o local onde se encontrou com o arguido H, nomeadamente nas traseiras do (...), onde o arguido o aguardava num veículo automóvel, quer pela Sra. Juiz Presidente, quer pelo Ministério Público, quer pelos Exmos. Mandatários dos arguidos, nomeadamente o que assegurava a defesa do arguido H, tendo sempre respondido que foi naquele local. Se esta é a única matéria de facto – localização do encontro – que foi alterada, que utilidade se poderá retirar da nova inquirição do assistente, que sempre deu a mesma resposta, quando sobejamente perguntado sobre essa matéria. Voltar a fazer-lhe as mesmas perguntas seria de todo dispiciente. Nos termos do dis(...) no art. 340.º do CPP, só deverão ser realizadas as diligências de prova que se reputem como úteis e necessárias à descoberta da verdade material. Não podemos estar mais de acordo com o Tribunal a quo quando considerou que, por força do citado normativo, a diligência de prova deveria ser indeferida. Afirma o arguido que quem define a estratégia da defesa é o arguido. E está certo ao afirmá-lo. Mas essa estratégia de defesa tem que ser delineada pelo arguido dentro das normas legais aplicáveis, cujo cumprimento compete ao Tribunal assegurar. Se a estratégia de defesa do arguido passa pela realização de diligências desnecessárias, ao Tribunal compete indeferi-las, sem que com isso esteja ele a delinear a defesa do arguido ou sequer a limitá-la, mas sim a controlar a legalidade dela e da forma como é exercida. Mais invoca o arguido o inalienável direito de voltar a inquirir o assistente. Mas, perguntamos nós, porquê o inalienável direito de voltar a inquirir o assistente? Qual a base legal para o arguido fazer essa afirmação? O arguido tem o direito de pedir esclarecimentos acerca das declarações prestadas pelo assistente em audiência de julgamento (nos termos do dis(...) no art. 346.º do CPP) e nada na lei o impede até de prescindir desses esclarecimentos. Não queira o arguido confundir as declarações de um assistente com as de um arguido, esse sim com o direito inalienável de prestar declarações em audiência de julgamento sempre que essa seja a sua vontade. Aliás, os direitos do arguido estão expressamente previstos no art. 61.º, n.º 1, do CPP, sendo certo que desse normativo não consta o direito invocado pelo ora arguido. Na fase processual, em que foram comunicadas ao arguido as alterações indiciárias de localização de um encontro, só lhe assistia o direito de voltar a pedir esclarecimentos ao assistente se o Tribunal entendesse que a diligência de nova inquirição do assistente se justificava ao abrigo do art. 340.º do CPP. Se ouvido em primeiras declarações o assistente sempre declarou o mesmo, não obstante as muitas instâncias a que foi sujeito, incluindo pela defesa do arguido H, porque motivo haveria de ser novamente inquirido? Nada do que o arguido invoca constitui fundamento que justifique a realização dessa reinquirição. Isto, pelo menos, na perspectiva de que o assistente iria ser reinquirido sobre a alteração comunicada e não naquela que o arguido verdadeiramente busca, que é a da sua confrontação com declarações prestadas numa determinada entrevista, por forma a pôr em causa a credibilidade do assistente. Perguntamos nós: o arguido queria verdadeiramente voltar a perguntar ao assistente AP onde foi o encontro com o arguido H quando terão ido à zona de (…), ou pretendia questioná-lo sobre a entrevista que concedeu (sobre temática que aborda o processo, mas que não se prende com esta concreta alteração comunicada) e, por essa via, pôr em causa a credibilidade da testemunha? Parece evidente que a segunda das opções é aquela que verdadeiramente estava na estratégia de defesa do arguido. Diz o arguido H que o assistente AP, numa entrevista que lhe é atribuída, terá dito que algumas das alegadas vítimas terão mentido e que “se a minha boca se abre é o descambar do mundo”. Logo daqui não se retira que o assistente tenha, de algum modo, afirmado que ele próprio mentiu. Aliás, se fosse esse o caso, assim como o poderia afirmar numa entrevista a um órgão de comunicação social, mais o deveria ter declarado em Tribunal, retratando-se das declarações prestadas. O assistente fala em testemunhas que terão mentido, não sabemos sequer se são as da acusação ou de defesa. E a própria afirmação de que “se a minha boca se abre é o descambar do mundo” não significa, de modo algum, que o assistente esteja a afirmar que mentiu, até pode ser uma expressão que inculca a ideia de que poderia vir a dizer muito mais do que aquilo que disse em audiência de julgamento, no sentido de incriminar os arguidos ou até terceiros. Mas nada disso aqui assume relevo. O assistente AP não pediu ao Tribunal para ser ouvido novamente – e encontrava-se representado por mandatário – nem fez menção de prestar ele próprio qualquer esclarecimento ao Tribunal, que decerto o teria ouvido, se essa fosse a sua vontade. Se o que o arguido H pretende afirmar é que o assistente poderia ter dito em Tribunal o mesmo que disse numa qualquer entrevista, então porque não o fez voluntariamente? Se não o fez voluntariamente é porque não teve interesse em esclarecer ao Tribunal o que quer que fosse para além daquilo que já tinha dito e não havia nenhum impedimento a que o fizesse. O que já seria injustificável é que o Tribunal admitisse que o assistente voltasse a prestar declarações sobre uma entrevista que deu a um órgão de comunicação social, por iniciativa dos arguidos e para pôr em dúvida a credibilidade do assistente, pois sobre essas entrevistas, já este Tribunal teve oportunidade de se pronunciar sobre qual a sua relevância no âmbito do processo. Com efeito, conforme este Tribunal ad quem já afirmou, a propósito de requerimentos análogos, ainda que formulados já na fase processual de recurso: “Seja como for, não se consegue de modo nenhum afirmar que os documentos em causa, ainda que supervenientes perante a data da prolação da decisão recorrida, possam incontestavelmente influir na decisão da causa. Os documentos particulares, avaliados intrinsecamente, fazem “prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor”, nos termos do art. 376.º, n.º 1, do CC. Por exemplo, pegando num dos documentos em causa, o mesmo é susceptível de demonstrar que num determinado dia o seu autor transmitiu em entrevista à comunicação social que: “Estava sempre drogado”, “Lembro-me que ainda tentei dizer a verdade em tribunal, mas a juíza, o procurador e o meu advogado não me deixaram”, “Na maior parte das sessões eu só estava lá fisicamente. Fui ouvido dezenas de vezes na PJ sem advogado e sempre que chegava à sala de interrogatórios estava lá um copo de água que me obrigavam a beber. Ficava logo doente, a transpirar e maldis(...).”. Mas este documento particular não faz prova que tudo aquilo que dele consta corresponda mínima ou inteiramente à verdade. Enquanto meios de prova, os documentos oferecidos pela defesa do arguido H são unicamente susceptíveis de demonstrar que, nas datas em causa (quando foram redigidos ou quando as entrevistas foram gravadas), o arguido A e os assistentes AV, AP e AN, bem como as testemunhas , bem como as testemunhas AZ e BA, afirmaram tudo aquilo que deles consta. Ou, dito por outras palavras, que eles escreveram em livro ou que eles apresentaram, em entrevista, perante órgãos de comunicação social, essa versão dos factos. Não mais do que isso. A prova do que se disse ou do que se transmitiu a um órgão de comunicação social não se confunde com a demonstração em juízo da ocorrência de um determinado facto. A prova em juízo pressupõe frequentemente a apreciação conjugada de vários meios de prova (muitos deles de cunho mais marcadamente objectivo), produzidos com observância de regras processuais próprias, com publicidade, na presença de todos os intervenientes processuais e com o cumprimento do princípio do contraditório, em que os interessados são confrontados com versões antagónicas dos factos. Ainda que falível, como tudo na vida, a prova em processo criminal é exigente. Demorada, por vezes, mas ponderada e contrária ao efémero. O facto controvertido só se considera demonstrado quando, para além de toda a dúvida razoável, se mostrar possível, de um modo fundado, afirmar a sua ocorrência. Avaliando critica e conjugadamente os diversos meios de prova, atribuindo importância a uns, rejeitando outros, consoante a sua consistência e a sua credibilidade, mas reconhecendo sempre a relevância da intervenção de todos os sujeitos processuais no difícil percurso da descoberta da verdade. Para além dos documentos em que estão vertidos os escritos e as entrevistas em causa, que têm a assinalada força probatória, a pretensão formulada pelo requerente H, no sentido de serem reinquiridos o arguido A e o assistente AN, agora perante este Tribunal da Relação, embate também na falta de novidade destes elementos de prova. Quer um quer outro foram inquiridos em sede de audiência de julgamento. Estes meios de prova são anteriores à decisão recorrida. A respeito do que se deve considerar como novos meios de prova, ainda que a propósito dos recursos de revisão, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido de que não há novidade quando a testemunha apresenta ao longo do tempo diferentes versões dos factos. Conforme se defendeu no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 04-02-2010, Proc. n.º 221/08.8TCLSB-B.S1, in www.dgsi.pt.: “A novidade dos meios de prova exige, pelo menos, que não tenham sido apreciados no processo em que foi proferida a sentença condenatória. No caso, o meio de prova que o recorrente entende ser novo resume-se a declarações de uma testemunha – FF – ouvida no julgamento que terminou com a prolação daquela sentença. Ora, quando está em causa prova testemunhal, meios de prova são as testemunhas, e não cada uma das versões que elas apresentem dos factos. Por isso, se a referida testemunha já foi ouvida no processo em que foi proferida a sentença cuja revisão se pretende, não se está perante um novo meio de prova.” Aqui chegados, resta concluir que não assiste razão ao requerente H. Para além da falta de tempestividade no oferecimento dos documentos em que estão vertidos os escritos e as entrevistas e para além da sua força probatória não ir além do já acima apontado, também as declarações propriamente ditas do arguido A, do assistente AN e das testemunhas AZ e BA não constituem novos meios de prova, por os mesmos já terem sido inquiridos em sede de audiência de discussão e julgamento em 1.ª instância, mostrando-se irrelevantes, para este efeito, as diferentes versões dos factos apresentadas. Deste modo, deve improceder a pretensão formulada pelo arguido H, com base no alegado nos requerimentos de fls. 72.689 a 72.699 e 72866 a 72879, na medida em que as entrevistas concedidas pelo arguido A, pelo assistente AN e pelas testemunhas AZ e BA não constituem fundamento para a pretendida renovação da prova, de acordo com o dis(...) no art. 430.º, n.º 1, do CPP. Como resulta expressamente deste preceito, a renovação da prova está dependente da verificação de algum dos vícios previstos no n.º 2 do art. 410.º do CPP, de modo a evitar o reenvio do processo. O alegado pelo arguido não constitui por si só fundamento suficiente para a renovação da prova. A concessão de entrevistas por parte de um, de alguns ou de todos os intervenientes processuais, mesmo no pressu(...) que contrariem o que foi afirmado em sede de audiência de julgamento, não faz a decisão recorrida forçosamente padecer de algum dos apontados vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto, da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão ou do erro notório na apreciação da prova. De qualquer modo, repete-se que os documentos em causa são unicamente susceptíveis de demonstrar que os mencionados sujeitos processuais afirmaram a órgãos de comunicação social tudo aquilo que deles consta e que as suas pretendidas declarações não constituiriam novo meio de prova por eles já terem sido atempadamente inquiridos em 1.ª instância”. Não se escamoteia que aquilo que estava em causa no despacho agora citado era a junção de documentos contendo entrevistas de um arguido, de assistente e testemunhas já na fase de recurso. Diferente será a produção de tais diligências durante a audiência de julgamento, em que nenhum obstáculo formal as impede. Mas não existindo obstáculo formal que o impeça, a junção de documentos ou a nova tomada de declarações a assistentes não deixa de estar sujeita a regras e na fase processual subsequente à comunicação de alterações de factos, só é possível nos estritos parâmetros definidos no art. 340.º do CPP, e que no caso não estão verificados. Situação diversa é a das declarações de arguido, que podem ocorrer em qualquer momento da audiência de julgamento, se essa for a vontade manifestada pelo mesmo, mas essa diligência aqui não estava em causa. Ao Tribunal de julgamento nada interessa o que assistentes ou testemunhas declaram a órgãos de comunicação social, no âmbito de entrevistas em que se desconhece o contexto em que surgem e qual a sua finalidade. O que ao Tribunal importa são as declarações ou depoimentos que essas pessoas prestam em audiência, onde estão obrigadas a dizer a verdade. No caso, a entrevista que o assistente AP terá concedido apenas é susceptível de demonstrar que, quanto muito, prestou as declarações que dela constam, cuja valoração o Tribunal está impedido de fazer, porque não foram sujeitas ao princípio da imediação. A junção do documento em causa, por si só, não tem qualquer interesse para a defesa do arguido à alteração de factos do ponto 5.2.5. do despacho de pronúncia. E quanto às declarações que o assistente pudesse prestar sobre essa entrevista, já se disse que as declarações que prestou no processo foram-no de livre vontade, sujeito aos deveres do art. 145.º do CPP – dos quais se salienta o dever de dizer a verdade e a responsabilidade penal pela sua violação (n.º 2 do citado normativo –, e que em nenhum outro momento o assistente pretendeu dizer o que quer que fosse ao Tribunal. Só ele poderá saber porquê. No mais, permitir que, por iniciativa do arguido, seja o assistente confrontado com declarações que prestou publicamente, sem ser em audiência de julgamento, não tem suporte legal, nem assume relevo para a descoberta da verdade material, muito menos em momento de produção de prova limitado à defesa prevista no art. 358.º do CPP. Aliás, levando estas entrevistas e declarações públicas a extremos, podemos até configurar a situação de um arguido que em julgamento opte por se remeter ao silêncio ou negue a prática dos factos e que depois venha a público confessar o crime. Poderia o Tribunal valorar essa confissão? Seguramente que não. Por outro lado, num julgamento com a duração deste, o que aconteceria se arguidos, assistentes e testemunhas declarassem em Tribunal uma coisa e depois viessem a público alterar sucessivamente as suas versões dos factos. Seria o Tribunal obrigado a chamá-los para os confrontar com tais declarações públicas, sempre que elas acontecessem, em nome do princípio da descoberta da verdade material? Os julgamentos decorrem no Tribunal, em audiência de julgamento e somente a prova que aí é produzida pode ser valorada. Não são as “provas” que a comunicação social reproduz ou que os próprios arguidos produzem que hão-de ser consideradas pelo Tribunal. Essas servirão outros interesses, que não o da realização da Justiça pelo Tribunal. O assistente prestou as suas declarações em Tribunal, advertido para a obrigação de respeitar a verdade. Se por algum motivo o arguido entende que pode demonstrar que ele faltou à verdade deve desencadear o respectivo procedimento criminal, junto das entidade competentes para o efeito. O que não pode pretender é que o Tribunal, sempre que algum arguido, assistente ou testemunha venha a público fazer afirmações diferentes das que fez em julgamento, os vá confrontar com essa situação. O Tribunal é um órgão de soberania, que se rege pelos princípios constitucionais e legais a que está obrigado para administrar a justiça em nome do povo. Não lhe compete fazer julgamentos públicos nem se deixa influenciar por eles. Se o Tribunal recorrido, na fase processual do art. 358.º do CPP, e para defesa quanto à comunicação da alteração de um local de encontro, permitisse ao arguido confrontar o assistente com entrevista que deu a um órgão de comunicação social, estaria a instrumentalizar o processo. Concluiu o arguido, que o despacho recorrido – pelo menos quanto (…) à reinquirição do assistente – avaliou erroneamente a utilidade e relevância das diligências probatórias requeridas, pelo que violou, de forma grave, o direito do arguido à sua defesa, tal como é configurado pelo art. 32.º n.º 1 da CRP e pelo art. 6.º da CEDH, impedindo-o de contrariar, fosse de que maneira fosse, a nova factualidade que lhe é imputada. Pensamos que já ficou bem patente que o Tribunal a quo não avaliou de modo erróneo a utilidade e relevância das diligências requeridas, de modo que não violou de forma alguma o direito do arguido à sua defesa, impedindo-o de contrariar a nova factualidade. Aliás, permitir que o arguido, que já tinha exercido o contraditório em relação às declarações do assistente, o fizesse de novo, sem qualquer utilidade ou necessidade, constituiria até um abuso de direito. O Tribunal recorrido não violou os arts. 32.º, n.º 1, da CRP e 6.º da CEDH, tendo decidido de modo correcto, e a não merecer qualquer reparo, também o requerimento de prova apresentado pelo arguido H. Nestes termos, improcedem na totalidade os recursos interlocutórios apresentados pelos arguidos E, K e H relativos ao indeferimento dos seus requerimentos de prova, apresentados na sequência da alteração de factos que lhes foi comunicada. Por fim, suscitaram os arguidos E e K a inconstitucionalidade operada pelo Tribunal a quo da interpretação dos arts. 340.º e 358.º do CPP, no sentido da invocação de falta de justificação para deferimento dos requerimentos de prova apresentados por aqueles, por violação do dis(...) no art. 32.º, nºs. 1 a 5, da CRP, dos arts. 358.º, n.º 1, e 340.º do CPP, e art. 6º da CEDH, o que consubstancia a nona questão apreciada neste recurso interlocutório. Nesta, como em muitas outras situações, os arguidos invocam a violação pelo Tribunal a quo dos arts. 32.º, n.ºs 1 a 5, da CRP, e 6.º da CEDH, mas sem justificarem porque razão o Tribunal recorrido aplicou a lei em sentido contrário aos normativos constitucionais e da CEDH, limitando-se a afirmar que o Tribunal violou os direitos de defesa do arguido ou o seu direito a um processo justo e equitativo. Do que acima já se deixou dito resulta patente não ser esse o entendimento do Tribunal. Aliás, quanto ao recurso apresentado pelo arguido H, a respectiva pretensão sustentava-se, precisamente, na violação daqueles mesmos normativos. Como já várias vezes se referiu ao longo desta decisão recursória, a limitação dos direitos de defesa do arguido não é necessariamente incompatível com o dis(...) no art. 32.º da CRP. Pelo contrário, ela é inteiramente permitida pela norma constitucional, desde que a compressão dos direitos de defesa do arguido seja justificada e proporcional face à defesa de outros valores também eles protegidos constitucionalmente, tal como o interesse do Estado na realização da Justiça e o direito de todos os intervenientes processuais a um processo justo e equitativo. Já no Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 03-12-2008 (in www.dgsi.pt), se deixou dito que: I. - Na fase do julgamento, o poder de o tribunal recusar a admissão e produção de prova, requerida pela defesa ou pela acusação, é limitado pela sua inadmissibilidade, irrelevância ou superfluidade, inadequação, inobtenibilidade ou por ser meramente dilatória. II. - O princípio da investigação oficiosa consagrado no art. 340º do Código de Processo Penal está condicionado pelo princípio da necessidade, devendo ser limitado aos meios de prova cujo conhecimento se afigure necessário para habilitarem o julgador a uma decisão justa e o árbitro dessa necessidade é o tribunal. III. - Não viola o artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa "o art. 340º nº 4 do Código de Processo Penal, na medida em que confere ao juiz poderes de disciplina da produção de prova, exigindo para o indeferimento desta a notoriedade do seu carácter irrelevante ou supérfluo, inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa, ou, ainda, da sua finalidade meramente dilatória, não viola as garantias de defesa do arguido - isto, sempre reiterando-se que não cabe nos poderes do Tribunal Constitucional apreciar a relevância ou não, no caso concreto, da diligência de prova requerida, ou, mesmo, o juízo decisório sobre a procedência ou não, no caso concreto, da diligência de prova requerida, ou, mesmo o juízo decisório sobre a procedência ou não, no caso concreto, das qualificações apontadas, mas apenas apreciar a conformidade com a Constituição da República da norma em causa" Acórdão do Tribunal Constitucional nº 171/05, publicado no DR IIª série de 6.5.05. Reportando-se também aos direitos de defesa dos arguidos, afirma Germano Marques da Silva: “Toda a problemática das limitações do objecto do processo está estreitamente relacionada com o âmbito do direito de defesa do arguido (…). O direito de defesa do arguido abrange o direito de se pronunciar sobre o objecto total da acusação, sobre a prova produzida e sobre as normas jurídicas aplicáveis, mas também o direito de participar activamente na produção de prova, quer oferecendo a prova, quer participando na produção da prova oferecida pela parte contrária ou oficiosamente determinada. E a necessidade da prova a produzir para a defesa, bem como o teor das alegações a produzir pela defesa, estão naturalmente condicionadas pelo teor da acusação, quer na perspectiva meramente factual, quer na perspectiva jurídica. A defesa só é livre, plena, total, quando o arguido tenha plena informação dos possíveis resultados do julgamento, pois toda a defesa é condicionada e deduzida na perspectiva desses mesmos eventuais resultados, que são anunciados ao arguido pela acusação ou pela pronúncia. (…) O art. 32.º, n.º 1, da Constituição assegura um amplo direito de defesa, consistente nos meios concretos de defesa que em cada caso se mostrem necessários, naturalmente no quadro dos princípios estabelecidos pela lei (…)”. (O Direito de Defesa em Processo Penal, Homenagem ao Prof. Doutor João de Castro Mendes, págs. 283 a 287). E é precisamente esta última frase que nos merece destaque. O art. 32.º, n.º 1, da CRP assegura os direitos de defesa do arguido, de modo amplo, mas sempre tendo presente o princípio da necessidade e os demais princípios conformadores do processo penal. Sublinha-se, que à luz da nossa Lei Fundamental, os direitos de defesa do arguido não são inantingíveis e admitem restrições também elas constitucionalmente permitidas, como ocorre no caso em apreço. No despacho recorrido disse-se, e a nossa ver, com ponderação: “E lembramos o que acima foi dito em sede de “enquadramento teórico”, quanto ao facto de o Tribunal, na fase processual em que os autos se encontram, com a prova da Acusação e da Defesa já produzida e tendo em consideração a aquisição probatória já desenvolvida pelo tribunal no decurso do julgamento, face ao o art 340º, do C.P.Penal, ter o poder e consequentemente o Dever, “de disciplinar a produção da prova, quer da acusação, quer do arguido, para evitar que aquela se eternize ou se perca o contacto com o thema decidendum…” (cfr. Ac. TC n° 171/2005, www.dgsi.pt). Tendo ainda um especial dever - para a efectiva concretização destes poderes/deveres legais de disciplina da produção da prova -, de valorar em concreto cada uma das situações que foram objecto de comunicação de alterações, ponderando de forma criteriosa e equilibrada o princípio da celeridade processual e avaliação criteriosa da efectiva afectação das garantias de defesa que estejam em causa. Como dissemos, o tribunal tem que evitar “(…) o garantismo excessivo e usar dos mecânismos que garantem a defesa dos arguidos apenas e enquanto a normalidade da hipótese concreta demonstre que são indispensáveis àquela defesa a sua garantia e não para que os mesmos arguidos os reclamem ou deles se sirvam naqueles casos em que tudo inculca que tiveram oportunidade e ensejo de prepararem convenientemente a sua defesa, potencializando o que é susceptível de resultar dos factos (…) face a forma como se encontram descritos”, pois “tão grave quanto a ofensa das garantias de defesa ou a violação do principio do contraditório será o excesso dessas garantias ou a forma excessiva de procurar assegurar essas garantias em determinadas situações” (cfr. Ac STJ de 615/99, in CJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo II, pág. 208 a 214 sendo que as partes especialmente realçadas a bold são da responsabilidade da relatora deste Despacho). A celeridade processual em matéria penal tambem tem dignidade constitucional - art° 32° n° 2, 2º parte, da CRP - o significado de todas as garantias de defesa consagradas pelo art° 32° da CRP, engloba “todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação” (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. 1, pag 5164, edição Coimbra Editora) e daí o Dever e o Poder do Tribunal do Julgamento, em conciliar os diferentes interesses do processo penal que num caso concreto possam conflituar.” O assim decidido esclarece bem porque motivo a decisão do Tribunal a quo não é nem violadora do art. 32.º da CRP, nem do art. 6.º da CEDH (neste último caso, o que eventualmente teria conduzido à violação desse normativo seria o Tribunal permitir que o processo se arrastasse por um número indeterminado de meses, para inquirir testemunhas e produzir prova que não era nem essencial nem eficaz à defesa dos arguidos). Assim, também analisando o despacho recorrido à luz da CRP e da CEDH, não merece o mesmo qualquer censura. Pelo ex(...), nega-se provimento aos recursos interlocutórios (na parte em que foram conhecidos) inter(...)s pelos arguidos E, C, K e H dos despachos que julgaram improcedente a arguição de irregularidades por erro na qualificação das alterações comunicadas, por extemporaneidade da sua comunicação, e por falta de fundamentação, assim como os que indeferiram requerimentos de prova (proferidos a fls. 63918 a 63959, 64055 a 64112 e 65137 a 65225 dos autos), confirmando-se integralmente os despachos recorridos. B. Recursos da decisão final 1. A decisão recorrida No acórdão recorrido foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): “(A) Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal (NUIPC 1718/02.9 JDLSB): Da prova produzida e da discussão da causa, com relevância para a decisão da causa resultaram provados os seguintes factos (do despacho de pronúncia, dos pedidos de indemnização cível e das contestações): I – FACTOS PROVADOS: (I) – Dos factos referentes à AX (Factos constantes de fls. 20.831 a 20.836 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “ I – A AX; 1 – Estrutura e finalidades”): 1. A AX foi fundada em (…) por (…), no prosseguimento da reforma anos antes lançada pelo Marquês de Pombal e começou por dar resposta a algumas das preocupações com a ordem pública e saneamento social, transformando-se numa escola para as famílias mais desamparadas do País; 2. Ao longo da sua existência a AX sofreu várias reformas, alargou a sua actuação a áreas específicas da formação profissional, modificou e modernizou as suas instalações e desenvolveu um trabalho de apoio a crianças e jovens com deficiências físicas, nomeadamente surdas, mudas e cegas; 3. Desde 1985 a AX, doravante designada pela sigla AX, caracteriza-se por ser um instituto público dotado de autonomia administrativa, financeira, técnica e pedagógica, sob a tutela do Ministério do Trabalho e Segurança Social /Solidariedade. Como instituto público destina-se ao acolhimento, educação, ensino, formação e inserção social de crianças e jovens em perigo ou em risco de exclusão social; 4. Até Fevereiro de 2001, a AX detinha a “tutela educativa de todos os menores assistidos” e a tutela jurídica poderia ser requerida sempre que se mostrasse necessária. Como atribuições detinha a tarefa do apoio e desenvolvimento integral dos menores de ambos os sexos, desde a idade pré-escolar, carecidos de meio familiar normal e ou de meios de subsistência, dando preferência aos órfãos e abandonados; 5. A prossecução de tais objectivos desenvolvia-se nos domínios do ensino, da educação e da integração social, “apoiada nas modalidades seguintes: a) Internamento em estabelecimentos apropriados, designadamente lares; b) Semi –internato; c) Subsídios a alunos semi –internos; d) Subsídios provisórios de manutenção; e) Bolsas e subsídios de estudo; f) Colocação subsidiada em famílias idóneas.” 6. A AX tinha uma estrutura composta pela (...) e pelos estabelecimentos nela integrados, sendo a primeira a “estrutura básica de direcção, administração e orientação técnico-normativa dos objectivos a prosseguir.”. 7. Em 1985 existiam sete estabelecimentos integrados, cada um dirigido por um Director, podendo a AX integrar ou criar novos estabelecimentos, sendo estabelecimentos integrados na AX os (...)s CX, EY, DT, BF, EZ, FA e o EX. 8. Para a prossecução das suas finalidades a AX dispunha de órgãos e serviços próprios, sendo que entre 1985 e 2001 a AX era dirigida e coordenada pelo (...), coadjuvado por dois (...)s, sendo um para os serviços administrativos e outro para os serviços técnicos, detendo competências previamente determinadas por Lei. A AX dispunha, ainda, de um Conselho de ex-alunos, de um Conselho Técnico, de um Conselho Administrativo, de uma Direcção de Serviços Técnicos e outra de Serviços Administrativos e de Estabelecimentos integrados. 9. Por despacho de 17 de Outubro de 1997, o então (...) da AX, Dr. BQ, delegou nos seus (...)s as competências aí definidas, designando o Lic. FB como (...) do (...) para os Serviços Técnicos e o arguido C como (...) do (...) para os Serviços Administrativos. 10. Os alunos admitidos na AX em regime de internato eram colocados em Lares, os Lares funcionavam sob a alçada de cada (...), estando distribuídos em instalações dentro e fora dos mesmos. 11. Com o decorrer dos anos a AX foi alargando os seus estabelecimentos e integrando novos, tendo desde 1998 cerca de 5000 alunos, dos quais cerca de 800 em regime de internato. 12. Tais alunos, pelo menos até 25 de Novembro de 2002, estavam distribuídos pelos seguintes (...)s e Lares e nos seguintes locais: a) (...) CZ – situado no (…), em (…), com 5 Lares a funcionar dentro das suas instalações: FC, FD, FE, FF e FG; b) (...) EY – situado em (…), com Lares a funcionar dentro das suas instalações (FH, FI, FJ, FK e FL) e Lares que funcionam fora delas (FM, FN, FO e FP); c) (...) DT – situado na (…), em (…), com 4 Lares a funcionar dentro das suas instalações (FQ, CW, FR e FS) e um Lar que funciona fora delas (FT); d) (...) BF – situado nas imediações do (…), em (…), com apenas dois Lares que funcionam no interior das suas instalações: BE e FU; e) (...) EZ – situado no (…), em (…), com apenas um Lar que funciona fora das suas instalações: FV; f) (...) FA – situado em (…), (…), com uma residência localizada no interior do (...) e os Lares FW e FX que funcionam fora das suas instalações. g) EX – situado no (…), em (…) e vocacionado para o apoio a educandos com deficiências auditivas, com duas residências e um Lar situados no interior das suas instalações: FY e FZ (surdos) e GA (ouvintes). h) (...) GB – situado em (…), (…), com dois Lares que funcionam nas suas instalações, um de ouvintes e outro de surdos cegos, estando vocacionado para o apoio a crianças e jovens com deficiências auditivas e visuais. i) GC – situada na (…), com um Lar em (…) e um polo de ensino (…). 13. Até ao ano de 2002 os alunos internos que residiam nos vários Lares ficavam entregues a uma equipa de Educadores que, no entanto, pelo menos nos Lares do CZ, nunca pernoitava com os educandos. Entre as 22 horas e as 7 horas do dia seguinte, nos lares onde não pernoitava Educador, os internos ficavam apenas ao cuidado de um monitor que, em regra, era um aluno mais velho, sem nunca ultrapassar os 21 anos de idade, a quem cabia gerir e ordenar a vida de cada Lar nesse período, incluindo a manutenção da disciplina. 14. O pessoal docente e o corpo de funcionários da AX, era também recrutado entre ex-alunos da instituição. 15. Em 13 de Fevereiro de 2001 foi publicada uma nova Lei Orgânica da AX, mas a estrutura base manteve-se similar, tal como as competências dos (...) e (...)es–(...)s, permanecendo, no essencial, a mesma estrutura nos (...)s e Lares que continuaram a trabalhar nos mesmos moldes. 16. A maioria dos alunos internos da AX são crianças e jovens oriundas de famílias disfuncionais ou com graves dificuldades de subsistência, caracterizando-se por necessitarem de apoios educativos especiais, por apresentarem carências afectivas notórias e por uma ausência de referências parentais sólidas e securizantes. Os alunos internos estão confiados, de facto, à guarda da AX, o seu dia-a-dia decorre dentro das instalações desta, detendo os seus responsáveis e funcionários a tutela efectiva dos alunos, mesmo nos casos em que a tutela jurídica ainda pertence aos progenitores ou a outros familiares. 17. Em regra e pelo menos até 25/11/2002, no internato os alunos só iam a casa de familiares em fins de semana e períodos de férias, permanecendo nos Lares a maior parte do tempo. 18. Face ao descrito no “Ponto 17”, destes “ Factos Provados”, a AX instituiu um regime de (...), funcionando, pelo menos, durante os meses de Julho e Agosto, o qual visa proporcionar aos seus alunos internos, fora de (…) e preferencialmente em praias, o gozo de um tempo de actividades lúdicas e lazer. 19. Para as (...) os alunos internos eram transportados em autocarros para as localidades onde se realizavam as (...). 20. O material logístico (colchões, roupas, jogos e demais equipamento) era normalmente transportado em carrinhas pertença da AX, que eram conduzidas pelos motoristas do seu quadro, entre os quais se contava o arguido A. 21. A AX possuía, ainda, uma casa sita em (…), cuja administração era realizada pelo Director do (...) EY, onde se realizavam alguns convívios de fim de semana, dispondo a mesma de camaratas equipadas com camas e beliches e possuindo um jardim onde se realizavam algumas actividades ao ar livre. 22. O pessoal da AX agrupava-se, de harmonia com classificação estipulada por lei, em pessoal dirigente, técnico-superior, docente, de assistência médica e religiosa, técnico, técnico-profissional, administrativo, operário e fabril, sendo que a todos era aplicado o estatuto e regime de funcionário público. 23. O cargo de (...) era provido por escolha do Ministro do Trabalho e Segurança Social, que nomeava também os seus (...)s por proposta do primeiro. 24. A AX dispunha, ainda, de um corpo clínico, recrutado entre licenciados em Medicina, contratados além do quadro e remunerados nos termos da lei geral, ao qual competia assegurar todos os actos (...)s de saúde, preventiva ou curativa, em todos os estabelecimentos. 25. Esta equipa médica realizava controlos analíticos aos alunos internos da AX, periodicamente, sendo os resultados de tais controlos arquivados nos seus processos individuais. 25.1. Entre os rastreios realizados regularmente, contavam-se a despistagem de HIV, hepatites e outras doenças sexualmente transmissíveis. 26. Os resultados analíticos eram depositados na (...) ou nos (...)s, depois de passarem pela (...); na (...) funcionava um serviço de saúde onde eram referenciadas todas as situações de doença detectadas e bem assim todos os resultados de controlos analíticos tidos por anormais. 26.1. As situações de doença detectadas através dos controlos analíticos ou diagnosticadas em (...) e observações (...)s foram, pelo menos uma vez, referidas nas reuniões de direcção – (...) ((...) e (...)es (...)s) e Directores dos (...)s. 27. A AX dispunha de uma frota automóvel composta por veículos ligeiros e pesados, os quais eram conduzidos pelo corpo de motoristas da Instituição e eram utilizados nas deslocações de serviço do pessoal dirigente, no transporte de alunos, na distribuição de correio e equipamento, e na realização de tarefas administrativas que importassem deslocações. 28. Visando fomentar o convívio e a actividade desportiva entre alunos e ex-alunos da AX, foi criado o “GD”, doravante designado por GD, com autonomia administrativa e financeira e personalidade jurídica própria. 29. O GD tinha a sua sede e um campo de jogos situado nas imediações do (…), tendo sido elaborado um protocolo com a AX segundo o qual poderiam ser utilizadas as instalações desta última em eventos organizados pela primeira. 30. Vários alunos da AX praticavam, ao abrigo do referido protocolo, modalidades desportivas organizadas pelo GD, sendo transportados para treinos e eventos desportivos pelos motoristas da AX, entre os quais se contava o arguido A, o qual realizava tal tarefa com frequência. 31. O arguido A foi admitido como aluno interno na AX com 4 anos de idade. 32. O arguido A veio a ser admitido como vigilante, em regime eventual, tendo desempenhado funções no (...) CZ entre 3 e 23 de Novembro de 1975. 33. A partir de 1 de Fevereiro de 1977 passou a exercer funções com carácter de continuidade, em regime de prestação eventual de serviços, com igual categoria, tendo tomado posse em 15 de Dezembro de 1977, cargo que desempenhou até 7 de Abril de 1981, à excepção do período em que esteve a prestar serviço militar obrigatório, entre 4 de Janeiro de 1978 e 14 de Janeiro de 1980. 34. Em 8 de Abril de 1981 ingressou no quadro da AX como jardineiro de 3ª classe, sendo ascendido na categoria até 10 de Dezembro de 1999, altura em que foi reclassificado como motorista de ligeiros, embota tenha exercido de facto tais funções pelo menos desde o Verão de 1998. 35. Durante os anos em que esteve ao serviço da AX, o arguido A foi objecto de vários processos disciplinares, tendo alguns deles dado lugar ou surgido na sequência de processos criminais. 36. Por despacho de 29/02/80 foi instaurado processo de averiguações, na sequência de carta dirigida por GE, em que eram denunciadas situações de abuso sexual de menores, alunos da AX, praticadas pelo arguido. 37. Em relatório datado de 25/03/1980, o instrutor propôs a abertura de processo disciplinar ao arguido A, o que foi confirmado por despacho de 16 de Junho de 1980, Despacho nº 28/80, da Secretária de Estado da Família, AAG e no qual a então Secretária de Estado determinava que enquanto não estivesse concluído o processo, o arguido A ficava impedido de entrar nos estabelecimentos em que houvessem educandos. 38. O processo disciplinar instaurado ao arguido A e a que se refere o “ponto 37.”, dos "Factos Provados" que antecede - Pº 1/80 da Inspecção Geral do M.S.S.Trabalho à AX - veio a ser arquivado por, entretanto, terem caducado os prazos legais previstos para tais procedimentos administrativos. 39. Os factos que deram origem ao processo disciplinar referidos nos pontos “37.” e “38.” que antecedem, acabaram por ser participados à Polícia Judiciária por GE em 22 de Maio de 1981, tendo corrido inquérito com nº. 10344/81, na 4ª Secção da 4ª Brigada da Directoria de Lisboa. 40. Nos relatórios enviadas para a Polícia Judiciária estava também escrito que o “A” – alcunha pela qual, já então, era conhecido o arguido A – tinha levado um grupo de alunos para uma festa perto de (...) e que esperava com frequência um aluno à porta do (...), a quem convidava para ir às compras e ao cinema. 41. Em 22 de Julho de 1982, o Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família comunicou à Directoria (…) da PJ que os Jardins (…) estavam “infestados de homossexuais que procuram aliciar os menores a cargo da AX, tendo sido solicitado à PJ “o desenvolvimento das acções necessárias a fim de evitar a continuação desta situação”. 42. Os documentos remetido para a Directoria (…) da P.J., com a comunicação de 22 de Julho de 1982, do Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família, foram mandados autuar como inquérito; 43. …dando origem ao Inquérito nº 16.044, que passou a correr na 4ª Secção da Directoria (…) da PJ. 44. Corria também na 4ª Secção da Directoria (…), o Inquérito 14.685/75, que deu origem ao Proc. nº. 2993/82, em que eram denunciados factos susceptíveis de integrar crime de atentado ao pudor, sendo denunciado o agora arguido A. 45. Ambos os processos acabaram por ser arquivados por prescrição. 46. Em 1982 correu termos na Directoria (…) da Polícia Judiciária o Inquérito nº 16.868/82, em que eram denunciados factos susceptíveis de integrar crime de atentado ao pudor, sendo ofendidos alunos da AX e sendo referido que tais factos ocorreram numa casa sita na Avª (…), lote (…) – (…), em (…), casa esta que era referenciada como pertencendo ao arguido E. 47. Este inquérito nº 16.868/82 foi remetido à comarca de (…), por ser territorialmente competente, mas como nesses autos era referido o nome do arguido E, foram remetidas cópias de peças processuais desse processo (…). 48. Neste inquérito nº 16.868/82 estava um relatório e um interrogatório feitos pela AX, por causa de uma fuga de alunos da secção de DT, onde o arguido E era referido como frequentador dos Jardins (…) e como levando menores para a sua casa de (…), onde os mesmos eram abusados sexualmente, ao mesmo tempo que eram fotografados e filmados, estando igualmente referido como frequentadores da casa do arguido E indivíduos estrangeiros e o arguido H. 49. O processo de inquérito ficou a aguardar a produção de melhor prova e mais tarde foi destruído. 50. Por despacho do (...) da AX datado de 29/55/89, um processo de averiguações que nessa altura corria contra o arguido A foi convertido em processo disciplinar, recebendo o nº. 91/2012. 51. Este processo (nº 91/2012) havia sido instaurado em virtude da denúncia de abusos sexuais praticados sobre dois alunos menores daquela Instituição, tendo sido proposta a pena de aposentação compulsiva daquele arguido, por decisão de 7.9.89. 52. A tal processo (nº 91/2012) veio a ser apensado um outro processo disciplinar, que lhe foi instaurado por injúrias a colegas, uma vez que a pena proposta era igualmente a de demissão e aposentação compulsiva. 53. Por despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4.10.89 foi aplicada ao arguido a pena disciplinar de demissão. 54. A decisão de demissão do arguido proferida no processo nº 91/2012 foi anulada pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16.4.91, na sequência do que o arguido foi reintegrado nas suas funções - com efeitos retroagindo a 14.10.89 - e colocado na (...) da AX por determinação do (...). 55. Os factos a que se refere o Processo Disciplinar instaurado contra o arguido A, na sequência do despacho do (...) da AX de 29.5.89, inicialmente processo de averiguações e que foi convertido em processo disciplinar, recebendo o nº. 91/2012, não foram comunicados ao Ministério Público. 56. Em 19.10.2001 foi instaurado novo processo disciplinar ao arguido A, na sequência de denúncia por injúrias e ofensas corporais a dois funcionários da AX, colegas do arguido, tendo-lhe sido aplicada uma pena de multa. 57. Em 15.1.2002, na sequência de denúncia apresentada pela mãe de um aluno da AX, em que eram relatados abusos sexuais perpetrados por aquele arguido na pessoa do seu filho – masturbação, coito anal e oral consumados –, foi instaurado o processo disciplinar n.º 337-02/1856 no âmbito do qual, por despacho da Secretária de Estado da Segurança Social de 19.09.02, ao arguido A foi aplicada a pena de aposentação compulsiva. 58. A mãe do menor apresentou queixa ao Ministério Público, dando origem ao inquérito com o NUIPC 3137/01.5JDLSB. 59. No decurso do período a que se referem os processos disciplinares e sanções descritos nos pontos “35.” a “ 58.”, dos "Factos Provados" e que antecedem, o arguido A foi referido dentro da AX, por mais do que uma vez, como suspeito da prática de actos sexuais com menores, mas continuou a movimentar-se com “à-vontade” no interior das instalações da AX, tendo residido num barracão pertencente às instalações do DT, pelo menos até Dezembro de 2001. 60. Enquanto funcionário da AX, até 31/12/01 o arguido A teve instaurados sete processos disciplinares, dois dos quais por ter sido imputado ao arguido a prática da actos de natureza sexual com alunos da AX; 61. Enquanto funcionário da AX, até 31/12/01 o arguido A teve atribuída a classificação de: BOM nos Anos de 1983 a 1985 (fls. 611) (fls. 867) (fls. 848), MUITO BOM nos anos de 1986 a 1988 fls. 837)(fls. 750)(fls. 746), BOM nos Anos de 1989 e 1990 (fls. 614 e 672 (fls. 724), (fls. 608) e MUITO BOM nos Anos de 1991 a 2001(fls. 607, 710)(fls.692, 682)(fls. 682) (fls. 604, 674), (fls. 666) (fls. 598), (fls. 594), (fls. 590), (fls. 586) (fls. 582); 62. De 14/10/89 a 5/06/91 o arguido A não exerceu funções como funcionário da AX, em consequência da pena de demissão compulsiva que lhe fora imposta por Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4/10/89, Despacho que veio a ser anulado pelo Acórdão do S.T.A. de 16/04/91 e o arguido A reintegrado, por Despacho do (...) BQ, datado de 5/06/91. 63. Enquanto funcionário da AX, até 31/12/01 o arguido A percorreu sucessiva e progressivamente todos os escalões da carreira administrativa respectiva. 64. O arguido A foi aluno interno da AX desde os 4 anos de idade, fez toda a sua vida pessoal e profissional sempre ligada àquela Instituição, tinha acesso aos (...)s e Lares, sendo aceite pela generalidade dos funcionários, que o conheciam, quer por força das funções que desempenhava, quer pelo facto de muitos terem sido seus colegas. 65. Dentro do GD o arguido A era aceite pelas pessoas que faziam parte da entidade e gozava de mobilidade nas instalações. 66. Para alguns funcionários da AX, o arguido A era protegido pelo arguido C, a quem, não obstante a diferença de estatutos de cada um, tratava às vezes com arrogância e desrespeito, pondo em causa publicamente a sua autoridade, sem que daí lhe adviesse sanção ou recriminação. 67. Algumas das vezes em que o arguido A se encontrava ausente ou manifestava indisponibilidade para prestar algum serviço e lhe eram pedidas justificações, o mesmo justificava-se dizendo ter estado “ao serviço do Dr. C”, sem que alguém questionasse tal facto. 68. Era também a relação de proximidade que o arguido A tinha com o arguido C e a que se referem os factos provados nos Pontos “66.” a “67”, que antecedem, que lhe dava um “estatuto de facto” diferenciado em relação aos restantes motoristas da AX, sendo que o arguido A por vezes não cumpria horários ou determinações superiores. 69. O arguido obteve licença para conduzir em 24/11/94, tendo sido emitida a carta de condução em 2/05/95. 70. A protecção que desde 1997 teve dentro da AX por parte do arguido C, também permitiu ao arguido A movimentar-se no interior da AX como quis. 71. O arguido C ingressou como aluno da AX no dia 28 de Agosto de 1965, tendo sido colocado na Secção CZ. 72. A partir de 1971 começou a prestar serviço como tarefeiro na (...) da AX, continuando a estudar em regime de acumulação. 73. Em 23 de Julho de 1971 foi admitido como escriturário dactilógrafo, em regime de Prestação de Serviços, tendo sido nomeado definitivamente para tal lugar em 14 de Janeiro de 1977. 74. Em 1 de Fevereiro de 1984 ascendeu à categoria de Técnico Superior. 75. Em 18 de Dezembro de 1990 foi nomeado Director de Serviços e por despacho do (...) da AX de 16/01/91 foi-lhe atribuída a competência para administrar as áreas da Contabilidade, da Tesouraria e do Património, cabendo-lhe especialmente gerir as áreas da informatização dos serviços e a gestão directa das Repartições da Contabilidade e do Património e do serviço de Tesouraria, despachar o expediente corrente, controlar a execução orçamental e a Gestão de tesouraria, propor aplicações financeiras e controlar a gestão patrimonial. 76. Em 18 de Março de 1997 o arguido foi nomeado Assessor Principal e, por despacho do Ministro da Solidariedade e Segurança Social de 30/06/97, foi nomeado (...) do (...) da AX, cargo que exerceu até 27 de Novembro de 2002, tendo, entre 25 e 27 de Novembro desse ano, exercido as funções de (...) da AX, em regime de substituição. 77. Reassumiu as funções de Assessor principal, até que em 22.1.2003 e na sequência do processo disciplinar que lhe foi instaurado, foi suspenso preventivamente do exercício das suas funções, tendo a 1 de Abril de 2003 sido preso preventivamente no âmbito dos presentes autos. 78. O facto de A ser funcionário da AX desde, pelo menos, 1977, de ter exercido as funções de motorista, circulando entre todos os (...)s e Lares, realizando o transporte para (...) e para actividades lúdicas dos alunos da AX, permitia-lhe conhecer a maioria destes, junto de quem gozava de grande popularidade. 79. O arguido residiu, pelo menos até Dezembro de 2001, num barracão sito no interior das instalações do DT. 80. O arguido não tinha qualquer relação familiar ou afectiva fora da AX e, em regra, durante toda a sua vida, em férias, fins de semana e feriados permanecia na Instituição. 81. Quando se deslocava para fora das instalações da AX, algumas vezes o arguido levou consigo alunos menores da Instituição para passeios ou visitas, inclusivamente para fora (…). 82. Durante o decurso das (...) que se realizavam em vários pontos do país, por vezes o arguido A aparecia nas mesmas para levar coisas para as (...). 83. Por ter sido desde os 4 anos aluno interno da AX, o arguido conhecia bem os problemas dos menores, inerentes ao internamento nessa Instituição, tais como a falta de suporte familiar, o abandono, a ausência de referências parentais sólidas e a situação de precariedade económica das famílias de que os menores provinham. 84. O arguido A era sociável e simpático para com os educando da AX, mostrava-se interessado por actividades desportivas e disponível para os ajudar, estabelecendo assim com alguns deles uma relação de proximidade e dependência afectiva. 85. Para consolidação de tal relação o arguido A fazia ofertas aos menores, designadamente de dinheiro, doces, roupas, telemóveis, a cujo carregamento procedia e dava-lhes boleias nas deslocações de e para os (...)s a que os menores pertencessem e para as actividades desportivas que frequentassem. 86. O arguido A conversava com os menores, ficando a par, em relação a alguns educandos, da realidade e dificuldades familiares e escolares, dos seus problemas económicos e das angústias e apreensões que os afligiam. 87. O arguido A pediu a alguns menores que o tratassem por pai ou padrinho; 88. ... o que aconteceu com o assistente AS. 89. O relacionamento que mantinha com o arguido C, (...)-(...) da AX, também permitiu ao arguido A exercer as funções na AX de acordo com os seus interesses, sem que sofresse consequências no seu desempenho funcional devido ao tempo que demorava a fazer deslocações, locais para onde se deslocava, boleias que dava aos alunos e a utilização de carros de serviço da Instituição fora do exercício das suas funções. 90. Esta liberdade e autonomia de que o arguido gozava conferia-lhe, aos olhos dos menores, um especial ascendente, sendo por eles considerado como uma pessoa importante e com poder no seio da Instituição que os acolhia. (2.1 - Ofendido X, (…)) 91. O X nasceu em (…), ingressou na AX em 29 de Julho de 1996, como aluno interno do CZ, tendo sido colocado no FF. 91.1. X fora adoptado com cinco anos de idade, uma vez que a sua família natural não possuía condições para dele cuidar. 91.2. Os pais adoptivos solicitaram o internamento do menor na AX, e, desde o seu internamento, o X visitava-os aos fins de semana, mais ou menos de 15 em 15 dias. 91.3. No ano de 2000 e face às dificuldades de relacionamento surgidas com a sua família adoptiva, o X procurou a família biológica, tendo para isso fugido da AX, e conseguido restabelecer o contacto com uma tia materna. 91.4. As dificuldades de relacionamento do menor com os pais adoptivos agudizavam-se, diluindo-se cada vez mais os laços afectivos existentes entre este e a sua família adoptiva. 91.5. Em Abril do ano de 2000 foi iniciado o processo de desvinculação do X da AX, uma vez que o mesmo revelava sinais de desmotivação que se reflectiam na fraca assiduidade e aproveitamento escolar, na dificuldade de cumprimento das regras do (...) e na adaptação ao ambiente escolar. 91.6. Em Maio de 2000 o X saiu da AX, tendo começado por trabalhar de forma precária continuando, por isso, a ser apoiado pela Instituição. 91.7. Após a admissão do X na AX, em 29 de Julho de 1996, tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com ele, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, com quem conversava amiúde e a quem entregava dinheiro, em montante não concretamente apurado, granjeando assim a sua confiança. 91.8. No último trimestre do ano de 1996, o arguido A conduziu o menor, então com 13 anos de idade, à garagem do CZ e no interior de tal garagem, onde não se encontrava ninguém, o arguido introduziu o pénis do menor na sua boca, tendo-o chupado e o X, por sua vez, obedecendo ao que lhe era dito pelo arguido A, manipulou o pénis deste, masturbando-o. Seguidamente, o arguido A esfregou o seu pénis erecto nas nádegas do menor. 91.9. Depois do dia em que ocorreram os factos acabados de descrever, ainda no ano de 1996, o arguido A, pelo menos uma vez por semana e durante cerca de um mês, conduziu o menor X à garagem supra referida. 91.10. Uma vez aí, o arguido A colocava o pénis do menor na sua boca e chupava-o e introduzia o seu próprio pénis na boca do menor, fazendo com que este o chupasse. 91.11. O arguido A dava dinheiro ao assistente. 91.12. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência. 91.13. O arguido A sabia que o menor X era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática, para o qual a referida instituição representava a segurança indispensável ao respectivo quotidiano e a quem as pessoas ligadas à instituição geravam confiança. 91.14. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, valendo-se da relação que estabelecera com o X na instituição, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. (2.2 – Ofendido AP, (…)) 92. AP nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX em 7.8.92, tendo sido colocado no FC do CZ, onde permaneceu até meados de Abril de 2000, mas tendo tido baixa definitiva na AX apenas em 21.8.00. 92.1. O AP foi abandonado pelos pais, com quem apenas teve contactos esporádicos na instituição, tendo sido criado num ambiente violento que afectou o desenvolvimento da sua personalidade e o seu equilíbrio psicológico e afectivo apresentando “perturbações psicológicas graves na área afectivo-emocional” . 92.2. Em 1997 era apresentado como sendo “uma criança extremamente infantil e imatura com tendência para adoptar comportamentos regressivos como mecanismo de defesa. Tem uma necessidade constante de atenção por parte dos adultos, o que lhe permite suprir em parte a imagem desvalorizada e deformada de si próprio. Face a estas dificuldades tem comportamentos pouco adaptados à realidade, sendo por vezes impulsivo e agressivo em relação a si próprio e aos outros”. 92.3. AP passava alguns períodos de férias e fins de semana no Lar da AX. 92.4. Em 2000 AP acabou por sair da AX, tendo-se reconhecido que a problemática do AP se relacionava “com experiências abandónicas por parte das figuras parentais (...) o que o impossibilitava de se desenvolver de forma harmoniosa”.. 92.5. Acabou por ingressar num dos (...)s do Instituto de Reinserção Social, tendo saído da AX e procurado apoio junto da tia avó, e ingressado no mercado de trabalho de forma precária. 92.6. O arguido A, valendo-se, para o efeito, da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, conheceu o menor AP assim que este ingressou na AX, e, tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com ele, passou a mostrar-se muito simpático para com o mesmo, com quem brincava e falava com frequência, granjeando assim a sua confiança. 92.7. Em dia indeterminado, entre Outubro de 1996 e Agosto de 1997, quando AP já tinha 12 anos de idade, o arguido A, à semelhança do que já fizera anteriormente, chamou-o e disse-lhe para ir ter consigo à zona da garagem do CZ. 92.8. Uma vez aí, o arguido começou a acariciar o pénis do menor, primeiro por fora das calças e depois por dentro das mesmas, ao mesmo tempo que punha o seu próprio pénis para fora das calças e o manipulava. Depois introduziu o seu pénis na boca do AP, aí o friccionando. De seguida o arguido voltou o AP de costas para si, dobrando-o e introduziu-lhe o pénis erecto no ânus, aí o tendo friccionado. 92.9. Logo após a ocorrência da situação acima descrita, o arguido deu dinheiro ao AP, em quantia que não foi possível determinar. 92.10. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 92.11. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 92.12. O arguido A sabia que o menor AP era um aluno interno da AX que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática, para o qual a referida instituição representava a segurança indispensável ao respectivo quotidiano e sobrevivência e a quem as pessoas a ela funcionalmente ligadas inspiravam autoridade e dever de obediência. 92.13. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AP havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 92.14. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. 92.15. O arguido A percebeu que AP não falava do que lhe tinha acontecido. (2.3 – Ofendido AV, (…)) 93. O AV nasceu em (…), ingressou como aluno interno da AX, no dia 4 de Maio de 1998, tendo sido colocado no FC, do CZ. 93.1. Foi ali colocado através de mandado de condução do Tribunal de Menores e Família de (…) e foi confiado àquela Instituição, ficando esta com o dever de cuidar e guardar o menor, “devendo zelar por satisfazer todos os superiores interesses desta criança”. 93.2. Em Setembro de 2001, na sequência do desmantelamento daquele Lar, transitou para o FD do mesmo (...). 93.3. O AV foi abandonado pelos pais quando era ainda bebé, tendo sido criado até aos 4 anos de idade pela avó materna. Depois da morte desta, o menor viveu uns tempos com os pais que o maltratavam, espancando-o violentamente e obrigando-o a mendigar, até que decidiu fugir para casa de uma tia materna, em (…), a quem foi confiado pelo Tribunal de Menores. 93.4. Esta tia acabou por internar o AV no GG, onde o mesmo se manteve até à entrada na AX. 93.5. Aquando do seu internamento na AX, AV foi avaliado como “uma criança algo triste, deixando transparecer momentos de grande sofrimento e uma ausência de figuras parentais que possam servir de modelo ou referência, parecendo formular-nos um pedido de ajuda”. 93.6. Apesar de ter ficado estipulado que o menor passaria as férias e alguns fins de semana em casa da tia, tal nem sempre aconteceu. 93.7. AV recebeu apoio pedopsiquiátrico desde 1998, através da GH. 93.8. No ano de 2001 passou a desempenhar tarefas num dos armazéns do CZ e em Outubro de 2002, foi contratado como ajudante de 3ª pela firma “GI”. 93.9. Na vigência do presente processo o AV teve apoio da tia, tendo-lhe esta prestado algum apoio, acolhendo-o nalguns fins de semana e nalguns dias durante as férias. 93.10. O arguido A, logo que o AV ingressou na AX, em 4 de Maio de 1998, estabeleceu um contacto estreito com o mesmo. 93.11. Após a admissão do AV na AX, tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com ele, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, com quem conversava amiúde, granjeando assim a sua confiança. 93.12. AV ficou desde logo fascinado com o arguido A, que era motorista e percebia muito de automóveis, uma vez que o seu grande sonho era vir a ser também motorista, revelando uma especial aptidão e gosto por assuntos ligados a automóveis. 93.13. Apercebendo-se desse grande fascínio, o arguido A passou a contactar regularmente com o menor, levando-o muitas vezes a passear. Nessas ocasiões o menor relatava-lhe o seu passado, as suas inquietações e aspirações. 93.14. O arguido A além de proporcionar passeios a AV, dava-lhe dinheiro com regularidade para os seus gastos pessoais. 93.15. AV via o arguido A como modelo, com quem partilhava afinidades e falava da sua vida. Aproveitando-se disso, o arguido A adquiriu um elevado ascendente sobre o menor. 93.16. Num dia indeterminado do ano de 1998, entre os meses de Setembro e Dezembro, o arguido A levou AV, à data com 12/13 anos de idade, à garagem do CZ. 93.17. Uma vez aí, o arguido começou a mexer no pénis do menor, até que o mesmo ficou erecto. 93.18. Depois o arguido introduziu o seu pénis na boca do menor e disse-lhe para lho chupar, o que o menor fez e disse-lhe que não contasse a ninguém o que se passara, o que o menor acatou. 93.19. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 93.20. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 93.21. O arguido A sabia que o AV era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática, para o qual a referida instituição representava a segurança indispensável ao respectivo quotidiano e sobrevivência e a quem as pessoas a ela funcionalmente ligadas inspiravam autoridade e dever de obediência. 93.22. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se, da relação de dependência que o menor AV havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 93.23. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. (2.4 – Ofendido Y, (…)) 94. Y nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX em 26 de Novembro de 1998, tendo sido colocado no FD do CZ. 94.1. Y era frequentemente agredido pelo pai, tendo sido legalmente confiado à AX, por decisão do Tribunal de Menores de (…) proferida 3.9.99, no Procº 2183/98 do 1º Juízo. 94.2. Y começou por receber a visita do pai e da família apenas uma vez por mês, ficando no Lar nos fins de semana e nas férias escolares. A partir de Maio de 2000, o menor passou a ir a casa mais ou menos de quinze em quinze dias. À medida que as relações com o pai se normalizavam, os contactos passaram a ser semanais, o que aconteceu a partir de Novembro de 2001. 94.3. Aquando da sua entrada na AX, Y era descrito como sendo “uma criança deprimida, carente, que estabelece “avidamente” relação com o observador, mas também facilmente se desliga e procura um novo alvo para a sua necessidade de afecto”. 94.4. Após a admissão do Y na AX, tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com ele, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário daquela Instituição, e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, com quem conversava amiúde e a quem pagava os bens que o mesmo consumia no bar do (...), granjeando assim a sua confiança. 94.5. Gradualmente, o arguido A passou a entregar dinheiro ao Y. Por vezes, o arguido A pedia ao menor que lhe fizesse pequenas compras, nomeadamente de tabaco, entregando-lhe dinheiro para o efeito, dizendo-lhe depois que guardasse o troco. 94.6. Num fim de semana do mês de Janeiro de 1999, em dia em concreto não determinado, tinha o menor 12 anos de idade, o arguido A pediu-lhe que fosse comprar tabaco e que lho fosse entregar à garagem do CZ. 94.7. Y acedeu a este pedido, idêntico a muitos outros que o arguido A lhe tinha já feito, tendo comprado o tabaco e ido, de seguida, à garagem. 94.8. Neste local, o arguido A aguardava, sozinho, o Y. O arguido aproximou-se então do Y, começando a mexer-lhe no pénis sobre a roupa. Seguidamente o arguido retirou o pénis do menor para fora das calças e continuou a manipulá-lo, masturbando-o. 94.9. Após o arguido A retirou o seu pénis para fora e forçou o menor a chupar-lho, depois de lho ter introduzido na boca. 94.10. O arguido A entregou ao menor dinheiro, em quantia não concretamente apurada. 94.11. Depois da ocorrência dos factos descritos, entre Janeiro de 1999 e Setembro de 1999 (inclusive), aos sábados ou domingos, da parte da tarde ou à noite, pelo menos num fim de semana por mês, à excepção do mês de férias, o arguido A, pedia ao menor Y para ir ter consigo à garagem supra referida, sempre sob o pretexto de que o menor lhe deveria aí entregar tabaco ou outra coisa que lhe pedia previamente para comprar. 94.12. No interior daquela garagem o arguido A tirava para fora da roupa o pénis do menor e manipulava-o. O arguido introduzia o pénis na boca do menor, forçando-o a chupá-lo e pelo menos numa das vezes o arguido voltou o Y de costas para si e introduziu o seu pénis erecto no ânus do educando. 94.13. Y tinha receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse tal arguido, que sabia ser um funcionário influente na AX, bem relacionado com os dirigentes da instituição. 94.14. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 94.15. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 94.16. O arguido A sabia que o menor Y era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática, para o qual a referida instituição representava a segurança indispensável ao respectivo quotidiano e sobrevivência e a quem as pessoas a ela funcionalmente ligadas inspiravam autoridade e dever de obediência. 94.17. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor Y havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 94.18. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. (2.5 – AT, (…)) 95. AT nasceu em (…), ingressou como aluno interno da AX, em 27 de Outubro de 1999, tendo sido colocado no FG do CZ. Em 2001, o referido Lar foi desmantelado, tendo o menor transitado para o FC do mesmo (...). 95.1. O pai do menor, com quem o mesmo tinha uma ligação afectiva forte, morreu no ano de 1994. A mãe tinha problemas de saúde graves e pouca disponibilidade para o acompanhar, educando o mesmo de uma forma autoritária, violenta e não respeitadora dos seus direitos básicos. 95.2. Em 27 de Outubro de 1999 o Tribunal de Menores e Família de (…), tendo considerado que o menor estava em situação de risco, manifestando graves dificuldades de aprendizagem e uma grande carência afectiva, determinou a entrega e confiança do menor à AX. 95.3. Aquando da sua admissão na AX, o menor apresentava “uma problemática depressiva decorrente destas vivências de perda e da má qualidade do investimento afectivo, revelando-se inseguro, fragilizado e com uma baixa auto-estima”. 95.4. O arguido A conheceu o AT pouco tempo depois deste ter sido internado na AX, passando a falar com ele e a dar-lhe boleias com regularidade. O arguido passou, também a dar-lhe rebuçados e guloseimas, deixando dinheiro no bar do (...). 95.5. Em Dezembro do ano de 1999, em dia não concretamente apurado, o arguido A, chamou os menores AP e AT, pedindo-lhes que fossem ter com ele à garagem do CZ levar-lhe um objecto de que precisava. 95.6. Depois de conversarem um pouco o arguido mandou sair o menor AP. O arguido dirigiu-se, então, ao menor AT, à data com 13 anos de idade e começou a acariciar-lhe o pénis, primeiro por cima das calças e depois por dentro das cuecas, após ter-lhe desapertado a braguilha. 95.7. Forçou o AT a mexer no pénis do arguido. De seguida pegou na cabeça do AT e introduziu o seu pénis na boca do AT. 95.8. No final de tais actos, disse ao menor para não contar nada a ninguém e deu-lhe cerca de 3 mil escudos. 95.9. O arguido voltou a repetir aqueles comportamentos uns dias depois. Assim, o arguido voltou a encontrar o menor e ordenou-lhe que voltasse à referida garagem. Uma vez aí, o arguido voltou a manipular o pénis do menor e a obrigá-lo a acariciar o seu próprio pénis até ficar erecto. 95.10. Depois o arguido introduziu o seu pénis erecto na boca do AT. 95.11. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 95.12. O arguido A sabia que o menor AT era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha, apenas, 13 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 95.13. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 95.14. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 95.15. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. (2.6 – Ofendido AI, (…)) 96.1. AI, (…), ingressou como aluno interno na AX na sequência de Despacho de 17.10.97, tendo sido colocado no FU do (...) BF, tendo sido transferido no ano de 2992 para o CZ e colocado no FD. 96.2. O AI fora abandonado pelos pais quando tinha 5 anos de idade, foi colocado numa instituição “ GJ”; 96.3. Esta instituição foi encerrada por falta de condições, após o que o AI, em Fevereiro de 1997, foi colocado pelo C.R.S.S. numa família de Acolhimento em (…); 96.4. A família de acolhimento recebeu o AI, mas apenas durante o tempo necessário para a sua institucionalização, família com a qual passava alguns fins de semana; 96.5. Os restantes fins de semana passava-os, em regra, no Lar da instituição; 96.6. A partir do seu internamento AI é descrito como tendo uma “estrutura de personalidade fragilizada e ambivalente na relação com os outros revelando-se ora imprevisível e agressivo ora meigo e submisso”;. 96.7. Recebia apoio pedopsiquiátrico desde 1999, tendo sido descrito pela pedopsiquiatra Dra. GK, que o começou a seguir nessa altura, como sendo “um adolescente com uma história de abandono e rejeição familiar que o marcaram profundamente. Existe um sofrimento depressivo importante que só raramente é expresso directamente pela sua atitude, tendendo a manifestar-se através de comportamentos de revolta, com passagens ao acto impulsivas e descontroladas”; 96.8. Durante o ano lectivo de 1997/1998 o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, travou conhecimento com o AI, pediu-lhe para o ajudar a descarregar o material que levava na carrinha da AX quando ia ao (...) do mesmo, deu dinheiro ao menor e começaram a conversar com mais assiduidade: 96.9. No início do Verão de 1998 ou em altura próxima do seu início, tinha o AI 11 anos de idade, quando se encontrava no refeitório do BF apareceu o arguido A que, abordando o AI, acariciou-lhe e manipulou-lhe o pénis, após o que tirou o seu pénis para fora, colocou-o na boca do menor, aí o tendo friccionado. 96.10. No ano lectivo seguinte, 1998/1999, o menor passou a ter aulas na Escola GC, no polo (…), situada na (…), tendo o arguido pro(...) ao AI dar-lhe boleias do (...) para a referida Escola, o que este aceitou. 96.11. Durante esse ano lectivo – 1998/1999 – o arguido convidou o AI para ir a sua casa, situada, à data, num barracão pertencente às instalações do DT, o que o AI aceitou. 96.12. Em dia indeterminado, pelo menos de Novembro do ano de 1998, tinha o AI 12 anos de idade, o arguido levou-o à sua casa, onde o arguido exibiu ao AI um vídeo, com conteúdo pornográfico, tendo acariciado o pénis do menor, depois de este ter tirado a roupa e, simultaneamente, disse ao menor para tocar no seu pénis e o manipular, o que o AI fez. 96.13. De seguida deu dinheiro ao menor, em quantia não apurada e levou-o de regresso ao (...). 96.14. Após os factos descritos no ponto “96.12” que antecede, o arguido passou a encontrar-se com o menor, por vezes ao pé do (…), de manhã e antes do mesmo se dirigir à escola, levava-o até à sua casa, num dos carros da AX que habitualmente conduzia ou no seu carro particular, um (…), de cor (…). 96.15. E pelo menos a partir de Novembro de 1998 (inclusive) e até Dezembro de 2000 (inclusive); 96.16. … o arguido, além de forçar o AI a manipular o pénis do arguido, passou ou a introduzi-lo na boca do menor, forçando-o a chupá-lo ou a introduzir o seu pénis erecto no ânus do AI, aí o friccionando até ejacular. 96.17. …sendo que os actos descritos no ponto “96.15” e “96.16” dos factos provados (que antecede) aconteceram, pelo menos, duas vezes por mês, de manhã, antes do AI ir para as aulas, sempre em casa do arguido. 96.18. Após ao actos descritos nos pontos “96.15” e “96.16”, que antecedem, o arguido dava sempre dinheiro ao AI, em quantia que não foi possível determinar. 96.19. O arguido A estava ciente de que enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 96.20. Estava também ciente de que as funções que desempenhava na AX propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 96.21. O arguido A sabia que o AI era um aluno interno da AX, sabia que o AI tinha 11 anos quando o conheceu e a sabia a idade que o jovem tinha à data em que ocorreram os factos descritos. 96.22. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AI havia estabelecido com ele. 96.23. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AI prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 96.24. Tinha também conhecimento de que a exibição, perante aquele menor, à data com 11 anos de idade, de um filme de conteúdo pornográfico, prejudicava o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influía negativamente na formação da respectiva personalidade. 96.25. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. 96.26. O arguido percebeu que o AI não falava do que lhe havia feito. (2.7 - Ofendido AN, (…)) 97. AN (…), ingressou como aluno interno da AX, em 14.9.98, tendo sido colocado no FG do CZ. 97.1. Os pais do menor separaram-se quando o mesmo era ainda uma “criança de colo”, tendo perdido o contacto com ambos. Só no ano de 2001 é que passou a visitar a mãe, de vez em quando, aos fins de semana, na casa desta. 97.2. Durante a sua permanência na AX, o menor ficava os fins de semana e as férias no Lar, fazendo parte das (...) de Verão que aquela Instituição tradicionalmente organiza. 97.3. Era no Lar que recebia as poucas visitas da mãe e da tia avó, únicos familiares que lhe prestavam algum apoio, uma vez que nunca ia a casa, para evitar o contacto com o padrasto que foi indiciado por abuso sexual de crianças, no âmbito de um processo crime que correu já termos. 97.4. Aquando do seu internamento na AX, o menor mostrava ser “tímido, inseguro, com marcas de sofrimento e abandono, tendo dificuldades em se envolver na relação, defendendo-se deste modo de possíveis perdas que lhe venham a causar sofrimento”, tendo um percurso de vida notoriamente marcado pelo abandono. 97.5. Por decisão do Tribunal de Família e Menores de (…), de 15.01.01, a guarda do menor foi legalmente confiada à AX. 97.6. O arguido A, pouco tempo depois de o menor ter ingressado na AX, passou a dar-lhe boleias entre o seu (...) e o Lar, utilizando as viaturas da AX que habitualmente conduzia. 97.7. Em dia em concreto não apurado, no fim do Verão do ano de 1999, tinha o menor 12 anos de idade, o arguido A convidou-o “para ir dar uma volta” no seu veículo particular. 97.8. O menor acedeu a acompanhar o arguido A, tendo este seguido em direcção ao (…) onde estacionou, em frente à entrada principal. 97.9. Logo que estacionou o veículo, o arguido A entabulou uma conversa com o menor centrada em temas sexuais, tendo aproveitado o conhecimento que tinha de que o menor já tinha uma namorada. 97.10. O arguido A colocou uma mão sobre o pénis do menor, perguntando-lhe se a namorada “já lhe tinha mexido na picha”, ao que obteve resposta afirmativa. 97.11. Após o arguido A mexeu no pénis, masturbando-o até à ejaculação. 97.12. Depois o arguido A deu 2 ou 3 mil escudos ao AN. 97.13. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 97.14. O arguido A sabia que o menor AN era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha, apenas, 12 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 97.15. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 97.16. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AN prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico. 97.17. Sabia que tais actos influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 97.18. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita lhe era proibida pela lei penal. 97.19. O arguido sabia que as condições económicas do menor eram muito precárias. Assim, explorando as necessidades económicas do menor. 97.20. Valendo-se do ascendente que tinha sobre ele, decidiu que o mesmo tinha o perfil adequado para entrar no grupo de menores que levava para encontros com alguns dos aqui arguidos, para o sujeitarem à prática de actos sexuais. (2.8 – Ofendido AU, (…)) 98. AU nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX na sequência de Despacho de 9 de Novembro de 1993, tendo sido colocado no FH do (...) EY. 98.1. Frequentou o EY e posteriormente passou a ter aulas no BF. 98.2. A mãe do menor morreu no ano de 1989, tendo-se o pai demitido da sua função afectiva e educativa, deixando de ter qualquer tipo de contacto com o menor. 98.3. O arguido A conheceu o menor logo a seguir à sua entrada na AX e começou a conversar com ele, acabando por conquistar o seu afecto e confiança. 98.4. Em dia indeterminado da segunda quinzena de Agosto de 1996, durante uma (...) que decorreu na praia (…), o arguido A convidou o menor, então com 9 anos de idade, para um passeio. 98.5. Levou-o, então a uma gruta existente na praia e junto desse local o arguido despiu-se e disse ao AU que se despisse também. De seguida, introduziu o seu pénis na boca do mesmo, tendo-lhe dito para que o chupasse, o que o menor fez. 98.6. Depois o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 98.7. Após aqueles actos o arguido deu dinheiro ao menor, uma quantia não determinada e disse-lhe que não deveria falar com ninguém sobre o que se passara. 98.8. Algum tempo depois, o arguido encontrou o menor, ainda com 9 anos de idade, nas instalações da AX e disse-lhe para ir ter consigo a um local não concretamente apurado. O menor foi para o local que o arguido lhe dissera, onde o arguido A o apanhou, estando ao volante de uma carrinha da AX e convidou o menor a acompanhá-lo. 98.9. O arguido conduziu o menor à sua casa, a barraca sita nas instalações do DT. Aí chegados o arguido despiu-se e disse ao menor para fazer o mesmo. De seguida, o arguido mexeu no seu próprio pénis manipulando-o e introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 98.10. Após aqueles actos o arguido voltou a dar dinheiro ao menor, em quantia que não foi possível determinar e disse-lhe para não contar a ninguém o que se passara. 98.11. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 98.12. O arguido A sabia que o menor AU era um aluno interno da AX que tinha, apenas, 9 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas ligadas funcionalmente àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 98.13. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 98.14. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AU prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 98.15. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. (2.9 – Ofendido AQ, (…)) 99. AQ nasceu em (…), ingressou como aluno interno da AX no dia 15.9.98, tendo sido colocado na residência do FA, de onde transitou para o GL do mesmo (...). 99.1. AQ foi ali colocado por decisão do Tribunal de Menores e Família de (…). 99.2. Aquando da sua entrada na AX o então menor era descrito como “um rapaz tímido, com marcas de muito sofrimento e abandono”.. 99.3. AQ, apesar de se encontrar acolhido na residência do FA, frequentava as aulas de um dos cursos técnico profissionais do EY, para onde se deslocava todas as manhãs. 99.4. Os pais do AQ residiam fora de (…), separaram-se quando o mesmo era ainda pequeno, mantendo com o filho apenas contactos muito esporádicos. O AQ permaneceu a maioria dos fins de semana no Lar, apenas tendo visitado, alguns fins de semana, um familiar, residente na zona de (…). 99.5. O arguido conheceu o menor AQ logo após este ter ingressado na AX, pois ia com frequência ao (...) do mesmo, para, nomeadamente, entregar correio ou transportar material. 99.6. Tendo também por objectivo relacionar-se sexualmente com o AQ, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, a quem passou a oferecer boleias, entre o (...) EY e o de FA, que o menor aceitava, granjeando assim a sua confiança. 99.7. O arguido começou também a oferecer dinheiro ao menor, entre 500 e mil escudos, pedindo-lhe que não contasse a ninguém que o fazia. 99.8. O arguido oferecia-lhe ainda guloseimas e pagava-lhe as despesas que ele fazia no bar do (...). Passou a ir buscar o menor ao (...) e a conversar com o AQ. 99.9. Em Janeiro de 1999 o arguido procurou o menor no EY e ofereceu-lhe um fato de treino, um jogo de computador, um relógio, um “walkman” e uma máquina calculadora. O AQ ficou contente, acabou por contar a uma das educadoras quem lhe tinha feito tais ofertas, a qual o proibiu de voltar a contactar com o arguido. 99.10. Apesar disso o AQ continuou a ver o arguido, sem que os educadores se apercebessem, pois gostava muito dele, necessitando da companhia, apoio e compreensão que este parecia dispensar-lhe. 99.11. Em dia indeterminado do primeiro trimestre de 2001, a meio da tarde, o arguido foi buscar o menor ao (...), numa carrinha da AX que conduzia, tendo-o levado até junto do parque de estacionamento da discoteca “GM”, sita nas (…), em (…), onde estacionou a referida viatura. 99.12. O arguido começou a manipular o pénis do menor, masturbando-o. Depois, introduziu o seu pénis na boca do menor aí o tendo friccionado. 99.13. De seguida baixou as suas calças e as do menor, voltou-o de costas contra si e introduziu-lhe o pénis erecto no ânus, aí o tendo friccionado até ejacular. 99.14. O arguido praticou todos os factos acima descritos, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do facto de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, o que lhe possibilitou granjear ascendente e confiança junto do menor AQ e sujeitá-lo à prática de actos sexuais consigo. 99.15. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar e dos alunos daquela instituição. 99.16. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 99.17. O arguido A sabia que o menor AQ era um aluno interno da AX que tinha 14 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas ligadas funcionalmente àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 99.18. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AQ havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 99.19. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AQ prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 99.20. O arguido sabia também que o menor AQ nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual, para além daquele a que foi pelo mesmo sujeito, aproveitando-se da especial fragilidade, vulnerabilidade e inexperiência do menor, para concretização das práticas sexuais descritas. 99.21. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibidas pela lei penal. 100. O arguido K, (...) de profissão, vivia na zona do (…), onde se situam alguns dos (...)s da AX e tinha um (...) de medicina nas imediações do CZ. 100.1. O arguido K prestava serviço como (...) de saúde pública no Centro de Saúde sito na (...) (…), onde recebiam assistência médica os alunos do FA, cuja localização se situava na área de intervenção daquele Centro. 100.2. O arguido K foi (...) de família de vários alunos do FA. 100.3. O arguido A era frequentador assíduo dos jogos de futebol do AXAC, para onde, aliás, transportava alunos da AX que aí praticavam desporto. 100.4. O arguido K conhecia o arguido E. 100.5. O arguido N concorreu ao lugar de Director de vários (...)s da AX. (4.1.1. - Ofendido AP (…)) 101. O arguido C sabia que o então menor AP era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e que o mesmo era carente e vulnerável. 101.1. Em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos idade, o arguido C encontrou-o nas instalações da (...) da AX, onde se situava o seu Gabinete. 101.2. Valendo-se do ascendente que a sua posição lhe conferia, disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave daquele edifício que habitualmente se encontrava fechada. 101.3. Aí, o arguido C começou a acariciar o pénis do menor, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis que, entretanto, tinha (...) fora das calças. 101.4. Depois, segurou a cabeça do menor, forçando-o a dobrar-se e introduziu-lhe o pénis erecto na boca, aí o tendo friccionado. De seguida, pegou na mão do menor e forçou-o a manipular-lhe o pénis. 101.5. Após a prática dos actos descritos, o arguido C deu dinheiro ao menor, em quantia não concretamente apurada 101.6. O arguido C praticou os factos descritos valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do facto de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos. 101.7. O arguido C estava ciente de que, enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 101.8. Estava ciente que as pessoas ligadas funcionalmente à AX – especialmente os seus dirigentes – inspiravam autoridade e dever de obediência, pelo que as funções que ali desempenhava o tornavam conhecido e respeitado por tais alunos, que tinham, relativamente a ele, um manifesto temor reverencial que os impedia de oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava, tendo decidido agir pela forma descrita sobre o então menor AP. 101.9. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se efectivamente da reverência e do temor que o menor AP tinha por ele e que anulavam totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 101.10. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita lhe era proibida pela lei penal. (4.1.3 – Ofendido Y, (…)) 102. Entre os meses de Setembro e Outubro do ano de 1999, a um Sábado, em dia que não foi possível determinar, o arguido C pediu ao arguido A, que lhe levasse um menor, a um local entre ambos combinado. 103. O arguido A contactou então, no pátio do CZ, o menor Y, então com 13 anos de idade, tendo-lhe dito para ir ter consigo às garagens. 103.1. Quando o menor aí chegou o arguido A levou-o ao parque de estacionamento do supermercado “GN” em (…). 103.2. O arguido estacionou o veículo junto de uma outra viatura e ordenou ao menor que nela entrasse. 103.3. Ao volante desse carro encontrava-se o arguido C. 103.4. Após, o arguido C dirigiu-se com o Y para uma casa situada na zona de (…), cuja localização concreta não se apurou e da qual o arguido tinha a chave. 103.5. Após entrarem, o arguido conduziu o menor para um quarto onde disse ao Y para lhe manipular o pénis, o que o Y fez e o arguido mexeu também no pénis do Y. 103.6. De seguida o arguido C introduziu o seu pénis na boca do Y. 103.7. Após os actos o arguido deu dinheiro ao Y, em quantia não concretamente apurada e levou-o de volta. 103.8. Passadas umas semanas, o arguido C voltou a contactar com o arguido A a quem pediu que lhe levasse o menor Y a fim de nele praticar actos sexuais. 103.9. Assim, em dia em concreto não determinado, entre o mês Novembro de 1999 e Janeiro de 2000, tinha o menor 13 anos de idade, o arguido A dirigiu-se-lhe, no pátio do (...) e mandou-o ir ter consigo à garagem, onde lhe disse para entrar na sua viatura. 103.10. Dirigiram-se à zona de (…), onde estacionaram num parque de estacionamento pequeno e perto de uma placa com a indicação “(…)”. 103.11. No local estava estacionado o carro que o menor já conhecia e no seu interior, ao volante, encontrava-se o arguido C à sua espera. O arguido A disse ao menor que entrasse na viatura do arguido C, o que o mesmo fez, após o que foi conduzido à mesma casa onde havia estado anteriormente. 103.12. Quando aí chegaram e já no seu interior, o arguido C, após retirar o seu pénis para fora das calças, disse ao menor que lho chupasse, o que o mesmo fez, tendo o arguido chupado também o pénis do menor. 103.13. Depois, o arguido C introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 103.14. Após a prática de tais actos, o arguido deu ao menor 2 mil escudos e levou-o de novo ao estacionamento em (…), onde o esperava o arguido A. 103.15. Das duas vezes em que tais encontros ocorreram, o arguido A disse ao menor que não contasse o que se passara a ninguém, o que o menor acatou. 103.16. O arguido C estava ciente de que, enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 103.17. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava o tornavam conhecido e respeitado por tais alunos, que tinham, relativamente a ele, temor reverencial. 103.18. O arguido C sabia que o menor Y era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas ligadas funcionalmente àquela instituição – especialmente os seus dirigentes – inspiravam autoridade e dever de obediência. 103.19. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor Y prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 103.20. O arguido C agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita lhe era proibida pela lei penal. 103.21. O arguido A conhecia a idade do menor Y quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até ao arguido C. 103.22. Sabia que, mercê da sua intervenção, o menor Y seria sujeito, pelo arguido C, a actos de índole sexual que incluíam coito anal, coito oral e actos de masturbação. 103.23. Era ainda do conhecimento do arguido A que com a sua conduta contribuía para a concretização de tais actos. 103.24. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.1.4 – Ofendido AI, (…)) 104. Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, em local e hora não concretamente apurado. 104.1. Nesse dia, à hora marcada, o arguido A, conduzindo uma das carrinhas (…) da AX, compareceu no local que combinara. 104.2. Depois do menor ter entrado na viatura foi recolher mais rapazes, tendo passado nas imediações do CZ, onde se encontravam pelo menos mais 3 rapazes menores que entraram na carrinha. 104.3. Dirigiram-se, então, para uma casa sita na zona da (…), na (…), cuja localização exacta não foi possível apurar, onde se encontravam vários adultos do sexo masculino, entre os quais os arguidos K e C. 104.4. O assistente AI permaneceu na sala na companhia do arguido C, o qual, após ter tirado o pénis para fora das calças, introduziu-o na boca do menor, aí o tendo friccionado. 104.5. Tendo também o arguido C introduzido o seu pénis erecto no ânus do menor aí o tendo friccionado. 104.6. Após os factos descritos, o AI saiu da casa, estando o arguido A à sua espera à saída da referida casa, tendo dado ao assistente dinheiro em montante não concretamente apurado. 104.7. O arguido C estava ciente de que enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela Instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 104.8. O arguido C sabia que o menor AI era um aluno interno da AX, que tinha 13 anos de idade quando ocorreram os factos que se descreveram. 104.9. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AI prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 104.10. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita lhe era proibida pela lei penal. 104.11. O arguido A conhecia a idade do AI quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até à residência referida e onde estava o arguido C. 104.12. Sabia que o AI seria sujeito a actos de índole sexual que incluíam coito anal, coito oral e actos de masturbação. 104.13. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.2.1 - Ofendido AK, (…)) 105. AK nasceu a (…), ingressou como aluno da AX em 20.7.93 e no regime de internato em 9/3/95, tendo sido colocado no CW, do (...) DT. 105.1. Nessa data, foi também admitido como aluno interno o seu irmão CC, dois anos mais velho. 105.2. A sua família, composta pelos pais e vários irmãos tinha grandes dificuldades económicas, agravadas pelos hábitos alcoólicos do pai. 105.3. O problema de alcoolismo do progenitor reflectia-se no ambiente familiar. Eram frequentes as discussões e agressões mútuas entre os pais e as agressões aos menores pelo pai, quando estava sob o efeito do álcool. 105.4. AK pedia esmola na (...) e apresentava sinais de sub-nutrição, negligência, falta de higiene e saúde debilitada. 105.5. Por decisão do Tribunal de Menores e Família de (…) de 2.3.95 o AK foi confiado à guarda e aos cuidados da AX. 105.6. O menor passava a maior parte do tempo no Lar, só visitando os pais uma vez por mês, até que, em 1998, passou a visitá-los mais ou menos de 15 em 15 dias. 105.7. No ano de 1998 o pai do menor adoeceu gravemente, vindo a falecer em Dezembro desse ano. 105.8. As dificuldades económicas da família agravaram-se, motivo pelo qual o AK, aos fins de semana, quando se encontrava em casa, ia com frequência arrumar carros, na companhia dos seus irmãos CC e BY, nomeadamente para a zona do (…), no (…), (…). 105.9. Num fim de semana, em concreto não determinado, dos meses de Outubro ou Novembro de 1998, durante a tarde, o arguido E, conduzindo o um veículo automóvel, passou por aquela zona, abordando o CC a quem convidou para que fosse a sua casa com os irmãos. 105.10. O arguido E já conhecia o CC e o BY, estando a par das precárias condições económicas da família. 105.11. Em data não concretamente apurada, numa sexta feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999, inclusive, tinha o AK completado 12 anos de idade, foi, com os seus irmãos, com o arguido E e com um indivíduo de nome DU, jantar a um restaurante chinês localizado em Alcântara. 105.12. Terminado o jantar o arguido E foi com DU, com o AK e os irmãos deste BY e CC, para um andar situado num prédio localizado na (...) (…), em (…), com número de porta não concretamente apurado, mas localizado na lateral da (...) (…), onde se situam os números impares. 105.13. No interior desta o arguido E dirigiu-se ao AK e disse-lhe para o acompanhar a um quarto pois “tinha uma coisa que lhe queria mostrar”, que os seus irmãos já tinham visto. 105.14. Já nesse quarto sentou-se na cama junto do AK e começou a acariciar-lhe os ombros, costas e pernas. Depois, o arguido E empurrou a cabeça do menor na direcção da sua braguilha. 105.15. O arguido E disse a AK que podia ajudar a sua mãe. 105.16. Enquanto falava, o arguido E, abriu a braguilha e segurou novamente a cabeça do AK na direcção desta, tendo introduzido, de seguida, o seu pénis na boca do menor. 105.17. Depois o arguido baixou as calças, disse ao menor para baixar as dele, virou o AK de costas para si e o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor. 105.18. Após tais actos, o menor regressou a casa na companhia dos irmãos. 105.19. Em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999, a uma sexta-feira, o AK foi, na companhia dos irmãos, a uma casa sita na Av. (…), em (…), perto da zona (…), local onde o arguido E se encontrava quando o AK aí foi. 105.20. No interior dessa casa, encontravam-se quatro adultos do sexo masculino, sendo um o arguido E e outro o DU que o AK já tinha visto nas circunstâncias acima referidas. 105.21. O arguido E foi com o AK para um quarto, sentaram-se na cama, tendo aquele começado logo a mexer no pénis do menor. Depois o arguido abriu a braguilha das calças do menor, retirou-lhe o pénis para fora e manipulou-lho, masturbando-o. Simultaneamente, o arguido E retirou também o seu pénis para fora e disse ao AK que lho manipulasse, o que este fez. 105.22. De seguida, o arguido E e o AK despiram-se da cintura para baixo e o arguido introduziu o pénis do menor na sua boca, chupando-o . Também, o arguido E introduziu o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. 105.23. Depois, o arguido E virou o AK de costas para si, dobrou-o para a frente e introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 105.24. Após a prática de tais actos, o menor abandonou aquela casa na companhia dos irmãos. 105.25. Em dia não concretamente apurado, mas situado no período de férias escolares do Verão de 1999, quando o menor AK se dirigia à estação de comboios para ir visitar o seu avô a (…), foi abordado pelo arguido E, que passava pelo local, de carro. O arguido E disse ao AK que lhe dava boleia tendo o menor acedido. 105.26. O arguido E disse ao AK que lhe dava boleia tendo o menor acedido, tendo acompanhado este a uma (...) sita em (…). 105.27. No interior da residência estavam vários adultos, de identidade não apurada e, pelo menos, quatro menores, alguns deles seus colegas na (…). 105.28. Aí o menor AK foi abordado por um indivíduo de identidade não apurada, que o levou para um quarto onde manipulou o pénis do menor e o referido indivíduo introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 105.29. O arguido E, após a prática dos descritos actos, deu ao menor AK dinheiro em quantia não concretamente apurada e conduziu-o até à estação de comboios de (…). 105.30. O arguido E sabia que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 105.31. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 105.32. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AK prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 105.33. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 105.34. Também quando abordou e levou, nas circunstâncias descritas, o menor AK a uma residência, em (…), à presença de vários adultos do sexo masculino, o arguido tinha presente a idade do menor. 105.35. Sabia que, mercê da sua intervenção, o menor AK seria sujeito a actos de índole sexual que incluíam coito anal, coito oral e actos de masturbação. 105.36. Era ainda do conhecimento do arguido E que a sua conduta, era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 105.37. O arguido conhecia a precária situação económica do menor e da sua família, bem sabendo que tal o tornava especialmente vulnerável. 105.38. O arguido E agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.3.1 – Ofendido AT, (…)) 106. Em Dezembro de 1999 ou Janeiro de 2000, em dia em concreto não determinado, o arguido A, por contacto não concretamente apurado, levou a uma residência sita na (...) (…), numa fracção do prédio correspondente ao Lote (…), nº. (…), em (…), dois menores da AX, onde se encontrava o arguido H, a fim de este os sujeitar à prática de actos sexuais consigo. 106.1. O arguido A, no dia em causa, falou com o AP e levou-o, bem como o assistente AT. 106.2. AT, à data com 13 anos de idade, foi então levado nesse dia à noite, juntamente com o menor AP, pelo arguido A, à residência referida, utilizando um veículo. 106.3. Acompanhava também o grupo o menor AV. 106.4. Ao chegarem àquela casa, o arguido A, o AT e AP foram recebidos pelo arguido H, tendo também subido AV. 106.5. Depois de o arguido A e o AV desceram e o arguido H conduziu os menores AP e AT a um dos quartos. 106.6. O arguido H disse ao menor AT para esperar na sala, tendo ficado no quarto com o menor AP, que sujeitou à prática de actos sexuais. Após AP saiu do quarto. 106.7. O arguido H chamou, então, ao quarto, o menor AT, onde começou por manipular o pénis do menor, masturbando-o. 106.8. De seguida, o arguido introduziu também o pénis do menor na sua boca, chupando-o, enquanto, simultaneamente, manipulava o seu próprio pénis. Por seu turno, o menor AT, mexeu no pénis do arguido H, manipulando-o. 106.9. Depois, o arguido introduziu o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. De seguida, o arguido H introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até à ejaculação. 106.10. Após a prática de tais actos, ambos os menores saíram, estando à espera dos mesmos o arguido A, que lhes deu dinheiro, em quantia não determinada. 106.11. Como contrapartida por o arguido A ter conduzido à mencionada casa os menores, para que com eles praticasse os actos supra descritos, o arguido H entregou àquele uma quantia em dinheiro, em montante não apurado. 106.12. Decorridos cerca de um ou dois meses, o arguido A, por contacto não concretamente apurado, voltou a levar novamente ao arguido H e à morada mencionada, um menor da AX, a fim de o arguido H o sujeitar à prática de actos sexuais. 106.13. Na sequência desse pedido, o arguido A contactou outra vez o menor AT, ainda com 13 anos de idade, que novamente levou à mesma casa. 106.14. Também nesta ocasião o arguido H manipulou o pénis do menor, masturbando-o. 106.15. O arguido H introduziu ainda o pénis do menor na sua boca, tendo-o chupado, enquanto, simultaneamente, manipulava o seu próprio pénis. 106.16. O menor AT manipulou também o pénis do arguido H, masturbando-o. Depois o arguido introduziu o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. Também desta vez o arguido H introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até à ejaculação. 106.17. Após a prática dos actos supra descritos, o menor abandonou a casa onde se encontrava, regressando à AX. 106.18. Como contrapartida por o arguido A ter conduzido à mencionada casa o menor, para que com ele praticasse os actos supra descritos, o arguido H entregou àquele uma quantia em dinheiro, em montante não apurado. 106.19. O arguido H admitiu que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 106.20. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 106.21. O arguido H tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 106.22. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 106.23. O arguido A conhecia a idade do menor AT quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até à residência referida, à presença do arguido H para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito anal e coito oral. 106.24. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 106.25. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.4.1 – Ofendido AT, (…)) 107. No mês de Março ou Abril do ano de 2000, em data em concreto não determinada, o arguido K contactou com o arguido A e pediu-lhe que levasse a sua casa um menor da AX, a fim de o sujeitar à prática de actos sexuais consigo. 107.1. O arguido A pediu então ao AP que acompanhasse o AT, à data com 13 anos de idade, a casa do arguido K. 107.2. Nesse dia, da parte da tarde, o AP acompanhou o AT a moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam as (...) (…) e (...) (…) e na zona dessas (...). 107.3. Ao chegarem ao local descrito no ponto que antecede, AP e AT foram recebidos por uma pessoa de identidade desconhecida, que encaminhou o AT para a sala, tendo o AP abandonado o local. 107.4. Entretanto, o arguido K, que aguardava a chegada do menor, dirigiu-se ao mesmo e conduziu-o a um quarto da residência. Aí, o arguido K manipulou o pénis do menor, até este ejacular, tendo o menor também manipulado o pénis do arguido. De seguida, o arguido K introduziu o seu pénis na boca do menor, que o chupou, a mando daquele. 107.5. Depois, o arguido K virou o menor de costas para si, dobrando-o pela cintura e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado. 107.6. O arguido K sabia que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 107.7. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 107.8. O arguido K tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 107.9. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 107.10. O arguido A conhecia a idade do menor AT quando o mandou levar, nas circunstâncias descritas, até à residência referida, à presença do arguido K, para que este o sujeitasse a actos de índole sexual, que incluíam masturbação, coito anal e coito oral. 107.11. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual, uma vez o ascendente que tinha sobre o menor, o impedia de lhe desobedecer. 107.12. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.4.2 – Ofendido AI, (…)) 108. Em data em concreto não determinada, mas situada entre os meses de Outubro e Novembro de 1999, o arguido A, conduzindo uma carrinha da AX, (…), de cor (…), encontrou-se com o assistente AI, à data com 13 anos de idade, num local concretamente não apurado, mas previamente combinado com o assistente. 108.1. Depois, levando já consigo o menor AI, o arguido A seguiu para as imediações do CZ, onde pelo menos mais 3 rapazes menores entraram na carrinha, tendo o arguido A conduzido todos os rapazes para uma casa sita na zona da (…)que não foi possível localizar. 108.2. Nessa habitação encontravam-se vários adultos do sexo masculino, mas em número não concretamente apurado, entre os quais o arguido K. 108.3. O arguido K abordou o AI, tendo ficado com o assistente numa divisão da casa e após ter tirado o pénis para fora das calças, introduziu o seu pénis na boca do menor que o chupou. 108.4. Tendo também o arguido K introduzido o seu pénis erecto no ânus do menor aí o tendo friccionado. 108.5. Após a saída da casa referida no ponto “108.1” que antecede, o arguido A deu dinheiro ao AI. 108.5.1. Como pagamento por ter conduzido à residência referida o menor AI e outros menores alunos da AX, o arguido A recebeu, em circunstâncias não apuradas, uma quantia em dinheiro não determinada. 108.6. O arguido K sabia que o AI que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 108.7. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 108.8. O arguido K tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AI prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 108.9. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 108.10. O arguido A conhecia a idade do menor AI quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até à residência referida à presença do arguido K, para que o mesmos sujeitasse o menor a actos de índole sexual, que incluíam masturbação, coito anal e coito oral. 109. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.4.4 – Ofendido AC, (…)) 110. AC nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX em 7.8.92. 110.1. AC foi colocado no FA por ordem do Tribunal de Menores e Família de (…) (procº 921/89 do 1º Juízo). A mãe do menor faleceu em (…) não tendo o pai condições para tratar dele. No entanto, passou alguns fins de semana e férias em casa de familiares que lhe davam algum apoio. 110.2. O arguido K, em 1997, deu (…) sito na (...) (…), em (…), sendo aí levados os alunos da AX do FA, por se situar na área de intervenção. 110.3. Nesse (...), durante o ano de 1997, o arguido K observou, pelo menos três vezes AC, aluno interno na residência do FA, à data, com 9/10 anos de idade. 110.4. Durante, pelo menos, duas das (...) referidas nos pontos “110.3.” dos factos provados, o arguido K disse a AC para despir as calças e as cuecas, que se deitasse na marquesa e manipulou-lhe, enquanto, simultaneamente, o AC mexia no pénis do arguido, a seu pedido, também até à ejaculação. 110.5. Após a prática dos actos acima descritos, o arguido K dava rebuçados ao menor. 110.6. O arguido K sabia que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 110.7. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 110.8. O arguido K tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AC prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 110.9. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. (5.1 – Ofendido X, (…)) 111. Em datas em concreto não determinadas, uma no final do ano de 1996 e outra, pelo menos, até ao final de 1997, pelo menos em duas ocasiões o arguido A, a pedido do arguido K, levou o menor X ao (...) do arguido K, sito na (...) (…), nº. (…) , a fim de que o mesmo aí fosse sujeito à prática de actos sexuais. 111.1. Aí o arguido K conduzia o X à sala de (...) e, depois de lhe despir as calças, manipulava e chupava o pénis do menor e roçava o seu pénis erecto pelas nádegas daquele. 111.2. Obedecendo ao que lhe era dito pelo arguido K, o X manipulava e chupava o pénis daquele. 111.3. Por o X ter ido ao (...) do arguido K, o arguido A entregou ao educando, pelo menos, cerca de 4 mil escudos. 111.3.1. O arguido K entregou ao arguido A uma quantia não determinada, como pagamento por este levar ao seu (...) o X. 111.4. Depois de ser sujeito à prática de tais actos, o X era levado de regresso à AX, pelo arguido A, que aguardava pelo mesmo. 111.5. O arguido A conhecia a idade do X quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até ao (...) referido, à presença do arguido K, bem sabendo que este iria sujeitá-lo à prática de actos de índole sexual que incluíam masturbação e coito oral, tal como veio a acontecer. 111.6. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 111.7. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (5.2.1 - Ofendido AP, (…)) 112. Em data em concreto não determinada, situada entre meados do ano de 1997 e meados do ano de 1998, o arguido A foi contactado pelo arguido K que lhe pediu que levasse ao seu (...) um menor da AX, a fim de no mesmo praticar actos sexuais. 112.1. O arguido A abordou o menor AP, tinha AP 12/13 anos de idade e mandou-o ir ter com o arguido K ao (...) do mesmo, sito nas (...) (…), nº (…) em (…), o que o menor fez. 112.2. No interior do (...) o arguido K sentou o AP ao seu colo, deu-lhe diversos beijos na cara, tendo tentado beijar o menor na boca, sem que o conseguisse por o mesmo desviar o rosto. 112.3. O arguido K manipulou o pénis do menor, enquanto acariciava o seu próprio pénis que retirou para fora das calças. Também colocou o seu pénis na boca do menor que, obedecendo ao que lhe foi ordenado pelo arguido, o chupou. 112.4. O arguido K, depois de ter sujeitado o menor AP à prática de tais actos deu-lhe dinheiro, em quantia não concretamente apurada. 112.5. O arguido K pagou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, por este lhe ter mandado o menor AP para que o sujeitasse à prática de actos sexuais. 112.6. O arguido A conhecia a idade do menor AP quando o abordou e lhe disse que fosse, nas circunstâncias descritas, até ao (...) referido, à presença do arguido K. 112.7. Sabia que, mercê da sua intervenção, o menor AP seria sujeito a actos de índole sexual que incluíam coito anal, coito oral e actos de masturbação. 112.8. Era ainda do conhecimento do arguido A que com a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 112.9. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (Ponto 5.2.5. do despacho de Pronuncia – AP) 113. Em data em concreto não determinada, entre Outubro de 1996 e Outubro de 1997, na sequência de o arguido A ter dito a AP para ir ter à (...) que se situa nas traseiras do CZ, onde um veículo em que estava o arguido H o aguardava; 114. Após AP entrou no veículo onde estava o arguido H e foi transportado até (…), para uma casa. 115. No interior dessa casa, o arguido H manipulou e chupou o pénis do menor AP, introduziu o seu pénis na boca do AP . O arguido H também introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 116. O arguido H pagou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, por este lhe ter entregue o menor AP para nele praticar os actos sexuais descritos. 117. O arguido A conhecia a idade do AP quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, à presença do arguido H para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito oral e coito oral. 117.1. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 117.2. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática dos actos descritos, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património. 118. O arguido N residia na cidade de (…) onde exercia a sua actividade profissional como advogado e professor do ensino básico. 118.1. O arguido N tinha uma vida familiar aparentemente estável. 118.2. O arguido A tinha amigos residentes na zona de (…),(…) e na aldeia (…), onde se deslocava com alguma frequência. 118.3. Em data e circunstâncias em concreto não apuradas, a arguida Q foi contactada pelo arguido N no sentido de lhe conceder a troco de uma contrapartida, a utilização da sua residência sita na (...) (…) nº (…), em (…), a fim de aí poderem ter lugar encontros para práticas sexuais entre homens adultos e menores. 118.4. A arguida Q reside em (…) desde 1986, na (...) sita na (...) (…), nº (…), em (…) qual tem habitado continuamente, desde então. 118.5. Desde há cerca de 15 anos aluga a quartos a pessoas que, por razões das suas vidas profissionais, tinham de residir temporariamente em (…). Desde há 9 anos que está inscrita como ama da Segurança Social de crianças de 3 meses a 3 anos de idade. 118.6. A arguida vive com o seu marido, que foi motorista na Delegação de (…) do Centro Regional de Segurança Social, encontrando-se actualmente na situação de aposentação. 118.7. A (...) (…) situa-se à entrada da cidade de (…), tendo por referência a estrada na direcção de (…). É uma (...) de circulação reduzida, especialmente aos fins de semana, ocupada sobretudo por (...)s residenciais. Esta (...) tem construção apenas de um lado, sendo que do outro existe um terreno descampado, sem qualquer tipo de construção. 118.8. A (...) da arguida Q é composta por quatro pisos. 118.9. No piso térreo/rés-do-chão reside, desde 1993, a filha da arguida, GO. A filha da arguida é (…) na mesma escola da cidade de (…) onde o arguido N desempenha funções como Director do GP. 118.10. No 1º e 2º piso residem a arguida e o seu marido e o 3º piso da casa da arguida consiste em quartos para aluguer, fazendo-se o acesso a este piso pelo interior da casa da arguida. 118.11. Desde 1986, quando a arguida Q foi viver para a referida (...), o edifício não sofreu quaisquer obras que alterassem as suas características exteriores. 118.12. Desde há cerca de 6 anos que a arguida só aluga quartos ao mês, a (...) que vão trabalhar temporariamente em (…), 118.13. Alguns dos hóspedes que a arguida Q teve em sua casa não passavam ali os fins de semana e férias. 118.12. O arguido A combinava com os menores encontrarem-se à porta dos (...)s respectivos, a horas determinadas e geralmente aos fins de semana, e uma vez reunidos todos os menores, dirigiam-se à cidade de (…), utilizando a auto-estrada ou estradas secundárias, 118.13. O arguido A utilizava, em regra, as viaturas (…) de cor (…)e de matrícula (…) e (…) ou o (…) e com a matrícula (…), propriedade da AX conforme documentos de fls. 12814 a 12816 dos autos. 118.14. Os educandos da AX, quando iam com o arguido A para fora da AX, por vezes diziam que iam ao cinema e a jogos ou treinos desportivos. 118.15. Uma vez chegados a (…) o arguido A estacionava a viatura em que transportava os menores nas imediações da (...) da arguida Q, por vezes em artérias próximas e acompanhava os menores até à (...), onde chegou a entrar. 118.13. Em regra quem abria a porta era o arguido N, encontrando-se já no interior da residência os restantes arguidos. Depois o arguido A retirava-se para o exterior, onde aguardava os menores, geralmente junto à viatura que conduzia. 118.14. Por vezes, logo naquela ocasião, o arguido N entregava ao arguido A um envelope contendo dinheiro como pagamento pelo facto deste ter levado à residência os menores da AX para aí serem sujeitos a práticas de actos sexuais. 118.15. O arguido A retirava do envelope que lhe era entregue pelo arguido N, dinheiro que distribuía pelos menores, ficando o remanescente para si. Fazia-o ainda em (…), quando os menores chegavam à viatura ou na viagem de regresso a (…). (6.2.1 - Ofendido AN, (…)) 119. Num sábado indeterminado entre os meses de Dezembro do ano de 1999 e o início do ano seguinte, tinha o AN 13 anos de idade, o arguido A encontrou-se com o menor junto da garagem de CZ e depois de recolherem um outro menor junto ao (…), em (…), seguiram todos em direcção a (…), numa das carrinhas da AX que o arguido habitualmente conduzia. 119.1. Aí chegados, o arguido A estacionou a carrinha perto da (...) acima referida, dirigindo-se com os dois menores à mesma, tendo a porta sido aberta pelo arguido N. 119.2. Depois de os menores terem entrado na (...) o arguido N entregou ao arguido A um envelope com dinheiro, como pagamento pelo facto de o mesmo aí ter conduzido os menores da AX, a fim de serem sujeitos à prática de actos sexuais por homens adultos. 119.3. No interior da (...) o arguido N disse aos menores que se despissem, o que estes fizeram. O arguido N ficou na sala com o menor AN, enquanto o outro menor foi conduzido a um dos quartos por adulto não identificado. 119.4. O arguido N despiu-se e sentando-se com o menor no sofá começou a manipular o pénis deste, ao mesmo tempo que manipulava o seu próprio pénis. 119.5. Depois, o arguido introduziu o pénis do menor na sua boca, chupando-o, tendo também o menor chupado o pénis do arguido, que este lhe introduziu na boca. Seguidamente o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 119.6. Após a prática dos actos descritos e depois de se vestirem, os menores abandonaram a casa, tendo-se encontrado com o arguido A que os esperava no exterior, na carrinha. 119.7. Aí o arguido A abriu o envelope e deu a cada um dos menores dinheiro, tendo o AN recebido uma quantia não determinada. 119.8. O arguido C, por força das funções que exercia na AX, estava obrigado a cuidar e a proteger o menores confiados àquela Instituição. 119.9. O arguido N admitiu que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos, tinha idade inferior a 14 anos. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 119.10. O arguido N tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AN prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 119.11. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. (6.5.1 - Ofendido AT, (…)) 120. Em dia indeterminado do último trimestre do ano de 2000, o arguido A levou menores, alunos da AX, entre os quais o AT, então com 14 anos de idade, à casa de (…), para que os mesmos aí fossem sujeitos a práticas sexuais por indivíduos adultos do sexo masculino. 120.1. Ao chegarem à (...), os menores e o arguido A foram recebidos pelo arguido N que entregou um envelope com dinheiro ao primeiro, como pagamento pelo facto de o mesmo ter conduzido a tal casa os menores alunos da AX para, aí, serem abusados sexualmente, abandonando este arguido, de seguida a residência. 120.2. O arguido H disse a AT que o acompanhasse a um dos quartos. Aí o arguido H despiu-se e mandou o AT despir-se, tendo de seguida dito ao menor que lhe manipulasse o pénis, o que este fez. 120.3. Depois, o arguido H introduziu o seu pénis na boca do menor que o chupou até ficar erecto. Seguidamente, o arguido H introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 121. Depois da prática de tais actos, os menores abandonaram a referida residência, tendo sido conduzidos a (…) pelo arguido A que os aguardava na carrinha da AX, que estacionara nas proximidades da (...), tendo entregue a cada um dos menores a quantia de 5 mil escudos. 122. O arguido H admitiu que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 16 anos. 123. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. O arguido H tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 124.Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. (6.7.2 - Ofendido AI, (…)) 125. Num dia indeterminado do último trimestre do ano de 1999, antes do Natal, o arguido A marcou encontro com o menor AI, então com 13 anos de idade, junto à garagem de CZ, para um dos dias seguintes. 125.1. No dia combinado o AI chegou ao local de encontro, tendo o arguido A aparecido com uma das carrinhas brancas, da AX, de nove lugares, após o que foram apanhar, pelo menos, mais dois menores; 125.2. Tendo seguido para a cidade de (…), para casa da arguida Q, para que os menores aí fossem sujeitos a práticas sexuais por indivíduos adultos do sexo masculino. 125.3. Ao chegarem à (...), os menores e o arguido A foram recebidos pelo arguido N. 125.4. No interior da referida (...) encontravam-se os arguidos N, H e mais dois adultos cuja identidade não foi possível apurar. 125.5. Os menores sentaram-se num sofá, incluindo o AI, tendo o arguido H tirado o seu pénis para fora das calças, dito ao AI que lho chupasse, o que o AI fez. 125.6. Após o que antecede os jovens saíram da casa e foram ter com o arguido A que os aguardava. 125.7. Fizeram a viagem de regresso para (…), onde o arguido entregou ao AI dinheiro, em montante não determinado. 125.8. O arguido H admitiu como possível que o AI, que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos, tinha idade inferior a 14 anos. 125.9. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 126. O arguido H tinha perfeito conhecimento de que o acto de natureza sexual a que submeteu o menor AI prejudicava o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influía negativamente na formação da respectiva personalidade. 127. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita era proibida pela lei penal. 128. O arguido A conhecia a idade dos então menores AN, AT e AI, quando os abordou e os levou, nas circunstâncias descritas até à residência sita na (...) (…), nº. (…), em (…), à presença dos arguidos N e H, para que sujeitassem os menores a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito oral e coito anal. 129. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 130. O arguido A agiu por forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática dos actos descritos, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património nas situações em que lhe foram entregues. 131. O arguido N, ao contactar com a arguida Q no sentido de que esta disponibilizasse a utilização da casa sita na (...) (…), nº. (…), em (…), nas ocasiões e circunstâncias descritas nos pontos “125.” a “125.11.”, sabia que nela iam ser sujeitos a práticas sexuais menores de 14 e de 16 anos, alunos da AX, que para esse local eram transportados pelo arguido A, praticados por adultos do sexo masculino. 132. O arguido N agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. 133. A arguida Q, ao ceder a utilização da sua casa nas ocasiões e circunstâncias descritas nos pontos “125.5.” a “125.11” dos factos provados, sabia que a mesma se destinava a que adultos do sexo masculino ali estivessem com jovens do sexo masculino, admitindo que pudessem ser praticados actos com conteúdo sexual e admitindo que os jovens pudessem ter idades inferiores a 14 e 16 anos e cedeu-a para receber uma contrapartida. 134. A arguida Q agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. 135. Ao disponibilizar a utilização da casa referida, nas ocasiões e circunstâncias descritas, mediante prévio acordo por si estabelecido com a arguida Q, o arguido N visava que nela fossem sujeitos a práticas sexuais, que incluíam masturbação, coito oral e coito anal, menores de 16 ou de 14 anos, alunos da AX, que para esse local eram transportados pelo arguido A, perpetrados por si, pelo seu co-arguido H e por outros adultos de identidades não apuradas. 135.1. O arguido N agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. 135.2. A arguida Q consentiu ceder o imóvel referido, com o propósito de receber uma contrapartida. A arguida Q agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. 136. O assistente AP foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se constatado que à observação do ânus apresentava “um moderado apagamento das pregas da mucosa, erosões de coloração nacarada localizadas às 2, 6 e 9 horas, e congestão do plexo hemorroidário” bem como “hipotonia do esfíncter anal, que mantém, todavia, a sua eficácia”, sinais que se consideraram ser “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 137. O assistente AV foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus “constata-se um franco apagamento das pregas da mucosa, a qual apresenta uma tonalidade acastanhada e uma certa congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar a marcada hipotonia do esfíncter anal”. Os sinais físicos apresentados pelo menor “são amplamente compatíveis com a prática continuada de coito anal, de que terá resultado, entre outras consequências (como o tenesmo rectal), uma laxidão das fibras musculares do esfíncter anal de que resultam episódios de incontinência fecal, a justificar observação e acompanhamento por (...) gastroenterologista”. As “lesões descritas a nível do esfíncter anal denotam ter sido produzidas por instrumento de natureza contundente, podendo ter resultado da penetração repetida por pénis, constituindo, sob o ponto de vista (...)-legal, uma doença permanente (no sentido de duradoura) (...) ainda que, eventualmente, possam ter uma solução terapêutica a prazo...”. 138. O assistente Y foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus apresentava “um apagamento das pregas da mucosa, congestão do plexo hemorroidário e protusão hemorroidária (hemorróida), de coloração violácea, localizada às 12 horas. Hipotomia do esfíncter anal, que mantém a sua eficácia”, sinais “compatíveis com a prática repetida de coito anal”, sendo o relato fornecido pelo examinado “pela sua consistência, coerência e congruência afectiva, compatível com as práticas sexuais descritas”. 139. O assistente AT foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se constatado, ao exame do ânus, que o menor apresentava “um apagamento das pregas da mucosa e protusão das veias hemorroidárias, que se apresentam dilatadas e com uma coloração violácea”, sinais estes “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 140. O assistente AI foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se constatado, ao exame do ânus, que apresentava “um marcado apagamento das pregas da mucosa, que se apresenta descorada e com pequenas erosões, de coloração nacarada, a nível dos quadrantes inferiores. Moderada congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar uma apreciável hipotonia do esfíncter anal, ainda que com a manutenção da sua competência”, sinais estes “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 141. O assistente AN foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus apresentava “um claro apagamento das pregas da mucosa, algumas erosões da mucosa, de coloração nacarada e varizes hemorroidárias de coloração violácea. Hipotonia do esfíncter anal, que, todavia, conserva a sua eficácia, referindo o examinado dor ao toque rectal”. Estes sinais anais são “compatíveis com a prática repetido de coito anal”. 142. O assistente AU foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus apresentava “um apreciável apagamento das pregas da mucosa, que apresenta três pequenas erosões, de coloração nacarada, a nível dos quadrantes superiores, com significativa congestão do plexo hemorroidário”, sinais estes que são “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 143. O assistente AK foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus apresentava “um certo apagamento das pregas da mucosa e protusão das veias hemorroidárias, que se apresentam dilatadas e com uma coloração violácea, sendo particularmente volumosas as localizadas às 5 e 12 horas. Algumas pequenas erosões, de coloração nacarada. Vestígios de fezes na margem do ânus. Ligeira hipotonia do esfíncter anal, que se revela, todavia, eficaz”, sinais estes que são “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 144. O assistente AQ foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que “à observação do ânus, constata-se um claro apagamento das pregas da mucosa, sobretudo a nível dos quadrantes inferiores, uma erosão de forma elíptica, de coloração nacarada, às 6 horas, onde é evidente a congestão venosa do plexo hemorroidário. Verifica-se, ainda, uma hipotonia do esfíncter anal”, sinais estes que se “mostram compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 145. Todos os assistentes acima identificados, também em consequência dos actos sexuais a que foram sujeitos, necessitaram de apoio psicoterapêutico. 145.1. E apresentam uma significativa fragilidade afectiva e emocional que pode ser desestruturadora dos recursos ainda existentes, tanto mais que se encontravam no período da adolescência que, por si só, gera angústias, conflitos e transformações nem sempre fáceis de vivenciar. (9.1 - Ofendido AL, (…)) 147. AL ingressou na AX, como aluno semi-interno, no ano de 1995, com 6 anos de idade, tendo no ano seguinte passado a aluno interno e sido colocado no CW, do DT. O menor é órfão e passava os fins de semana, de quinze em quinze dias, com a avó, único familiar que lhe prestava algum apoio. (9.2 - Ofendido AD, (…)) 148. Por decisão do Tribunal de Menores e Família (Proc. 947/95 do 1º Juízo), o menor AD, (…), foi confiado ao Centro de Acolhimento da AX, tendo sido colocado em 7.03.96. no FK, do EY em regime de internato. 148.1. Os pais separaram-se e tinham ambos problemas de toxico-dependência. A admissão do menor na AX foi requerida porque este se encontrava “numa situação de risco”, sendo maltratado e negligenciado pelos pais que, em síndrome de abstinência, agrediam fisicamente o menor, o que acontecia com frequência. 148.2. Os fins de semana e férias eram passados no Lar, local onde, de vez em quando o menor recebia a visita das avós. 148.3. Em dia não concretamente apurado do mês de Agosto de 2000, tinha o menor 13 anos de idade, durante uma (...) realizada em (…), o arguido A acercou-se dele quando este se encontrava deitado numa cama de campanha tendo apenas vestidas umas cuecas e uma camisola e estando envolto num saco-cama. 148.4. O arguido foi-se sentar ao pé do menor e começou a conversar com o mesmo. A determinada altura, deitou-se ao seu lado e começou a acariciar-lhe os testículos e o pénis. 148.5. Depois baixou-lhe a cuecas e disse ao menor que se voltasse de costas para si, o que o mesmo fez. Nessa altura o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor aí o friccionando até ejacular. 148.6. Após os actos descritos o arguido A disse ao menor para não contar a ninguém o que tinha acontecido e passou a dar-lhe dinheiro e boleias dos treinos para o (...). 148.7. O arguido praticou todos os factos acima descritos, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do facto de ter, por isso, livre acesso às instalações das (...) e aos seus alunos. 148.8. O AD tinha também receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse tal arguido, que sabia ser um funcionário influente na AX, bem relacionado com os dirigentes da instituição. 148.9. Submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, verificou-se que o ofendido apresentava, a nível do ânus, sinais compatíveis com a prática repetida de coito anal, constatando-se à observação do ânus “um acentuado apagamento das pregas da mucosa, que se apresenta descorada e com soluções de continuidade a nível das pregas localizadas às 5,9 e 10 horas. Considerável congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar a marcada hipotonia do esfíncter anal”. Tais lesões denotam “ter sido produzidas por instrumento de natureza contundente, podendo ter resultado da penetração repetida por pénis”. 148.10. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 148.11. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 148.12. O arguido A sabia que o menor AD era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 148.13. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se, da relação de dependência que o menor AD havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 148.14. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.3 – Ofendido AW, (…)) 149. AW, nasceu em (…), ingressou como aluno interno da AX no dia (…), tendo sido colocado no Centro de Acolhimento do EY e transitado posteriormente para o FL, do mesmo (...). 149.1. A mãe do menor tinha problemas de saúde graves, o pai do mesmo cumpriu penas de prisão em várias ocasiões, não lhe prestando qualquer apoio. O menor encontrava-se numa situação de extrema carência, recorrendo frequentemente à mendicidade. 149.2. Em dia não concretamente apurado, na primeira quinzena do mês de Agosto do ano de 2002, tinha AW 13 anos, durante uma (...) da AX que teve lugar em (…), quando já todos estavam deitados, o arguido acercou-se do AW, que também estava deitado num saco cama, deitou-se ao seu lado e pediu-lhe que o masturbasse. 149.3. O AW obedeceu ao arguido e friccionou com a mão o pénis do arguido até que este o mandou parar. 149.4. O arguido disse-lhe para manter silêncio sobre tais factos. 149.5. Em dia indeterminado dos meses de Março ou Abril do ano de 2002, o arguido encontrou o menor AW, então com 13 anos de idade, num torneio de ténis de mesa que se realizou na (…), em (…). 149.6. O arguido ofereceu-se para lhe dar boleia até casa, na carrinha (…) de cor (…)da AX que habitualmente conduzia, o que o menor aceitou. 149.7. Contudo, o arguido levou o menor até uma habitação sita num prédio. 149.8. Aí o arguido levou o menor até um quarto e exibiu numa aparelhagem que ali se encontrava um filme, cujo conteúdo consistia em cenas de sexo explícitas com adultos mantendo relações sexuais entre si, que o menor visionou. 149.9. O arguido disse ao menor que se despisse e deitasse na cama, começando logo a acariciar o seu próprio pénis, pedindo ao menor que lhe “batesse punhetas”, o que este fez, manipulando o pénis do arguido. 149.10. Depois o arguido voltou o menor de costas para si, agarrou-o pela cintura e tentou introduzir o seu pénis erecto no ânus do AW. 149.11. O AW, porém, conseguiu libertar-se e fugiu para a sala, tendo o arguido levado o menor a casa e dado ao mesmo 20 euros. 149.12. O menor foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual, tendo-se concluído que “não apresentava sinais sugestivos de abuso sexual, nomeadamente de coito anal”, apesar de se considerar “como bastante provável a ocorrência de práticas sexuais como as que foram descritas pelo examinado, as quais, como é sabido, não deixam habitualmente vestígios físicos”. 149.13. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 149.14. O arguido A sabia que o menor AW era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha, entre 11 e 13 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 149.15. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 149.16. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AW prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 149.17. Sabia também que o conteúdo objectivo do filme que, na ocasião descrita, pôs em exibição, era idóneo a excitar sexualmente quem o visionasse, tendo visado com a respectiva projecção, produzir esse efeito no menor. 149.18. Era do conhecimento do arguido que o visionamento de filmes da natureza mencionada pelo menor AW, de idade inferior a 14 anos, tinha efeitos negativos na formação da sua personalidade. 149.19. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.4 - Ofendido AM, (…)) 150. AM nasceu a (…), ingressou na AX no dia 22 de Fevereiro de 1995, em regime de internato, tendo sido colocado no Centro de Acolhimento e frequentado o ano pré-escolar no DT. 150.1. A família do menor não tinha condições para cuidar do mesmo, tendo por isso sido confiado à AX por decisão do Tribunal de Menores de (…). 150.2. O AM depois de ingressar na AX, transitou do Centro de Acolhimento para o FX, onde até hoje se mantêm, frequentando o FA. 150.3. AM passava os fins de semana, quinzenalmente, com o pai, até à morte deste no ano de 2001. A partir dessa altura a mãe do menor passou a conviver mais com o mesmo, visitando-o com regularidade. 150.4. O arguido A começou a conversar com o menor AM logo que este ingressou na AX, tendo estabelecido com ele uma relação de amizade. Aos poucos foi-lhe oferecendo dinheiro, chegando a dar-lhe 5 contos, pedindo-lhe que não dissesse a ninguém que o fazia. 150.5. O arguido passou a oferecer boleias ao menor, levando-o do (...) até casa. 150.6. Durante o ano de 2002, no fim do segundo período escolar, por alturas de Março/Abril, tinha o menor 13 anos de idade, o arguido deu-lhe boleia numa das viaturas da AX que habitualmente conduzia. 150.7. O AM foi sentado no banco da frente, ao lado do arguido que, a determinada altura, lhe começou a acariciar o pénis por cima da roupa que vestia. O AM tentou retirar a mão do arguido, mas este voltou a fazer o mesmo, dizendo ao menor “não faças nada”. 150.8. Algum tempo depois, ainda antes das férias grandes, o arguido voltou a oferecer boleia ao menor que a aceitou, viajando sentado no banco da frente da viatura da AX que aquele conduzia. 150.9. No caminho, o arguido colocou a mão no pénis do menor, começando a acariciá-lo. O menor tentou retirar a mão do arguido, mas este insistiu, voltando a acariciar o pénis do mesmo. 150.10. Pouco tempo antes das férias do Verão de 2002, numa sexta-feira à tarde, o arguido deslocou-se ao FX e ali encontrou o menor que, nesse fim de semana, só foi para casa no Sábado de manhã. O arguido convidou-o, então, a ir consigo passear e assistir aos treinos de futebol, tendo o menor acedido em acompanhá-lo, dizendo aos educadores que iriam ao (...) entregar uma carta. 150.11. O arguido conduzia uma das viaturas da AX e o menor sentou-se ao seu lado. No caminho, o arguido tomou a direcção do (…), onde estacionou. 150.12. De seguida, o arguido começou a acariciar o pénis do menor, por cima das calças. O menor tentou resistir, mas o arguido insistiu e massajou-lhe o pénis até ficar erecto. 150.13. No final, o arguido deu ao menor € 5 (cinco euros). 150.14. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 150.15. O arguido A sabia que o menor AM era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha, 13 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 150.16. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 150.17. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AM prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 150.18. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.5 – Ofendidos AB, (…) e AR, (…)) 151. AB nasceu a (…), foi admitido como aluno interno da AX em Julho de 1998, por mandado de condução do Tribunal de Menores de (…), tendo sido colocado no FI, do EY. 151.1. A confiança do menor à AX foi decretada por sentença do Tribunal de Família e Menores de (…), de 10.07.1998, em virtude da situação de grave risco e perigo em que o menor se encontrava. 151.2. O pai do menor era toxicodependente, sem meios de subsistência para si ou para os filhos. A mãe dos menores negligenciava os filhos, uma vez que não tinha “condições sócio-económicas habitacionais, morais e psicológicas para lhes proporcionar os cuidados assistência e protecção necessários ao seu desenvolvimento (...) sujeitando-os a uma vida degradante e de grande precariedade.” 151.3. Antes de ingressar na AX o AB apresentava elevado absentismo e insucesso escolar, por não ter qualquer apoio familiar, nomeadamente da mãe que, frequentemente, o deixava e aos irmãos entregues a si próprios. 151.4. De acordo com uma avaliação psicológica efectuada ao menor em Abril de 1998, o AB apresentava um “quadro compatível com Deficiência mental ligeira, sendo o atraso de linguagem, o déficit cognitivo, a imaturidade psico-afectiva e o abandono os aspectos a merecerem maior atenção.” 151.5. Depois do internamento na AX, o menor AB passou a visitar a mãe aos fins de semana, de 15 em 15 dias. 151.6. AR nasceu a (…), ingressou na AX como aluno semi-interno do EY em 20 de Maio de 1998. 151.7. Àquela data o (…) do AR estava a cumprir pena de prisão e a (…) não tinha condições para tratar dele, batendo-lhe com frequência e não lhe prestando cuidado. 151.8. Em 16 de Junho de 1998 o AR passou ao regime de internato, tendo sido colocado no FI. A (…) do menor faleceu no início do ano de 1999, vítima de queimaduras graves provocadas por um incêndio na barraca onde morava. Desde o seu internamento na AX que o menor AR ia a casa da sua irmã consanguínea, aos fins de semana, de 15 em 15 dias e nalguns períodos de férias, tendo a partir de Julho de 2000 passado a alternar tais visitas com idas a casa do pai. 151.9. O AB e o AR conheceram o arguido por o mesmo conduzir carrinhas da AX e se deslocar às (...) e aos (...)s. 151.10. Durante uma (...) realizada em (…), no Verão de 2000, o arguido A encontrou-se com o AR e o AB no balneário da (...). 151.11. Quando o arguido viu os menores fechou a porta de entrada. Aproximou-se do AB e do AR, mexeu no pénis de cada um, tendo-os masturbado. 151.12. O AB disse que não queria, queria ir embora, tendo conseguido libertar-se do arguido que o tinha agarrado, abriu a porta do balneário e saiu. 151.13. O AR não conseguiu sair do balneário e o arguido agarrou-o firmemente pela cintura, o AR gritava e tentava fugir, mas o arguido baixou os calções que o menor trazia vestidos e introduziu-lhe o seu pénis erecto no ânus, aí o friccionando. Após libertou-o e disse-lhe para não contar o que se passara. 151.14. O AR ficou com medo e a chorar abandonou o balneário, não tendo tido coragem de contar a ninguém o que se passara. 151.15. Durante a (...) realizada em (…), no Verão de 2000, em circunstância não concretamente apuradas, o arguido A encontrou-se uma segunda vez com o AB no balneário da (...). 151.16. De seguida o arguido aproximou-se do AB e manietando-o, baixou-lhe os calções que trazia vestidos e contra o pedido do AB para que não o fizesse, introduziu-lhe o seu pénis erecto no ânus aí o friccionando. 151.17. Quando o arguido libertou o AB disse-lhe que lhe batia se ele contasse o que tinha sucedido. 151.18. Submetido a exame (...)-legal de natureza sexual, conclui-se que à observação do ânus, AB apresentava “um certo apagamento das pregas da mucosa, sobretudo ao nível dos quadrantes superiores, e uma considerável hipotonia do esfíncter anal que, todavia, mantém a sua eficácia”, sinais estes que são “compatíveis com a prática de coito anal”. 151.19. O AR foi igualmente sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que “apresentava sinais anais compatíveis com a prática de coito anal, embora sem carácter repetitivo” apresentando “ao exame do ânus, um certo apagamento das pregas da mucosa, verificando-se interrupção da continuidade de algumas dessas pregas, sem evidência de lesões erosivas ou de engurgitamento do plexo hemorroidário. O tónus do esfíncter anal apresenta-se ligeiramente diminuído, referindo o examinado dor ao toque rectal”. 151.20. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 151.21. O arguido A sabia que os menores AB e AR eram alunos internos da AX, sabia a sua idade à data dos factos, que ali haviam sido admitidos em virtude de terem uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 151.22. Sabia, igualmente, que a idade desses menores os impedia de se decidirem livremente e em consciência pela prática dos actos descritos – de masturbação - e de que foram vítimas. 151.23. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu os menores AB e AR prejudicavam o normal desenvolvimento físico e psicológico dos mesmos, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 151.24. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. 151.25. Ao manietar o menor AR, nas circunstâncias descritas no ponto “151.13” dos factos provados, e ao manietar o menor AB nas circunstâncias descritas nos pontos “151.15” e “151.16” dos factos provados, o arguido teve por objectivo sujeitá-los a relação sexual anal e assim satisfazer os seus apetites sexuais. Fê-lo por forma livre, consciente e deliberada, com pleno conhecimento da idade do AR e do AB e de que a sua superioridade física e o uso que da sua força fez impediriam os menores de lhe opor resistência. Bem sabia que a sua conduta era proibida por lei penal. (Ponto 9.6 do despacho de pronuncia – Ofendido AH) 152. AH, (…), ingressou como aluno interno da AX em 20 de Novembro de 1997, tendo sido colocado no BE do (...) BF. Em 2001 passou a frequentar o EY. 152.1. Quando ingressou na AX o AH era descrito como “extremamente carente de afecto, efectuando constantemente movimentos de sedução com o objectivo de obter mais atenção individual (...) Encontra-se muito deprimido e com elevados índices de ansiedade”. O pai do AH tinha uma relação distante com o mesmo, tendo-se separado da mãe quando o menor tinha 2 anos de idade. 152.2. O arguido A conheceu o AH numa das ocasiões em que fazia o transporte do correio e mercadorias para o Lar onde aquele se encontrava. Começou a oferecer-lhe dinheiro e chocolates, tendo, pelo menos uma vez, oferecido10 mil escudos ao mesmo. 152.3. Em dia indeterminado do mês de Julho ou Agosto de 1998, o menor, então com 12 anos, acompanhou o arguido A numa deslocação a uma (...) no (…). Durante a viagem o AH adormeceu, altura em que o arguido desapertou-lhe as calças e, por baixo das cuecas, começou a mexer-lhe no pénis, tendo o AH acordado neste momento. 152.4. Pelo menos no primeiro trimestre do ano lectivo 2000/2001 e em tempo de aulas, o arguido A procurou o AH, pelo menos, por três vezes, quando este se encontrava no (...). 152.5. Nessas ocasiões o arguido levou o AH para uma sala ou para o local onde se lava a loiça, contíguo ao refeitório do (...), onde o forçou a chupar-lhe o pénis. Depois, o arguido introduziu o pénis erecto no ânus do menor. 152.6. O AH foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual, tendo-se concluído que “apresentava sinais anais compatíveis com a prática de coito anal, embora sem carácter repetitivo” apresentando “ao exame do ânus, um certo apagamento das pregas da mucosa, verificando-se interrupção da continuidade de algumas dessas pregas, sem evidência de lesões erosivas ou de engurgitamento do plexo hemorroidário. O tónus do esfíncter anal apresenta-se ligeiramente diminuído, referindo o examinado dor ao toque rectal”. 152.7. Após os actos descritos nos pontos que antecedem, o AH ficou com receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse o arguido, o qual para si era um funcionário influente na AX 152.8. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 152.9. O arguido A sabia que o menor AH era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 152.10. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre da relação de dependência que o menor AH havia estabelecido com ele. 152.11. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.7 – Ofendido GQ, (…)) 153. GQ, nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX em 21.9.95, tendo sido colocado no FN do EY, onde permaneceu até princípios de 2003. (9.8 – Ofendido AJ, (…)) 154. AJ ingressou como aluno interno na AX em Março de 1997, tendo sido colocado no FV do (...) EZ. 154.1. O arguido conheceu o menor porque costumava ir ao seu (...) e falava com todos os amigos do menor, brincando com todos. 154.2. No Verão do ano de 2002, em dia indeterminado do mês de Julho, o arguido transportou o menor, à data com 13 anos de idade, na carrinha da AX que conduzia, a caminho da (...) que teve lugar no (…). (9.9 – Ofendido AG, (…)) 155. AG ingressou na AX em 04 de Setembro de 1998, como aluno semi-interno do CZ. 155.1. O AG residia, desde os seus 5 anos de idade, no GR da GS. O menor e os seus dois irmãos haviam sido abandonados pela mãe, tendo ficado ao cuidado da avó materna e do pai, ambos alcoólicos, até serem acolhidos, em Março de 1989, no GR. 155.2. Quando começou a frequentar o CZ o AG foi considerado um menor “fragilizado, com um suporte familiar insuficiente e inconsistente”. 155.3. Em Setembro de 1999 o AG passou para o regime de internato da AX, tendo sido colocado no FD. 155.4. Apesar de possuir um bom potencial intelectual, tal nunca se reflectiu no seu aproveitamento escolar, revelando o menor dificuldades de concentração e interferindo os factores de ordem emocional no desempenho cognitivo. 155.5. Quando o AG passou ao regime de internato na AX estava previsto um regime de visitas quinzenal com cada um dos progenitores. Tal regime, progressivamente, foi deixando de ter aplicação, face ao problema de alcoolismo do pai e à falta de condições da mãe para o receber. 155.6. Uma tia materna do menor deu ao mesmo algum apoio, durante os anos de 2000 a 2002, recebendo-o aos fins de semana e durante alguns períodos de férias. 155.7. O arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o AG, transportando-o aos treinos de hóquei que este praticava e dando-lhe boleias do (...) para casa ou para o Lar, granjeando assim a sua confiança. 155.8. Em número de vezes não concretamente determinado, o arguido A passou a oferecer ao AG quantias de dinheiro, entre 300$00 e 5 Euros. 155.9. Num dia indeterminado do período lectivo de 2000/2001, o arguido pediu ao AG que o ajudasse a transportar móveis para a garagem. 155.10. O AG foi ter com o arguido à garagem do CZ onde o arguido já se encontrava, tendo este fechado a porta da garagem. 155.11. De seguida, o arguido despiu as calças e as cuecas e aproximando-se do menor perguntou-lhe “se ele se vinha”. O menor tentou escapar-se, mas o arguido agarrou-o, começando a masturbar-se. 155.12. Depois o arguido forçou o menor a mexer-lhe no pénis, pegando-lhe na mão e colocando-a sobre o seu próprio pénis. Seguidamente, disse ao menor que se despisse, voltou-o de costas para si, e introduziu o seu pénis erecto no ânus do AG. 155.13. Após a prática de tais actos o arguido deu dinheiro ao AG, em montante não concretamente determinado. 155.14. Alguns meses depois, no ano lectivo de 2001/2002, em dia não determinado, mas a uma sexta-feira, o arguido encontrou o menor à porta do CZ, oferecendo-se para lhe dar boleia até casa. 155.15. O AG aceitou e no caminho o arguido apalpou-lhe as pernas e o pénis, insistindo se o AG lhe retirava a mão. O AG acabou por sair do carro longe de sua casa, para fugir ao arguido e evitar que o mesmo ficasse a saber onde o mesmo morava. 155.16. Após os actos descritos, o AG ficou com receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse o arguido A. 155.17. O AG foi submetido a exame (...) - legal de natureza sexual, tendo-se concluído que “à observação do ânus, constata-se um franco apagamento das pregas da mucosa, com soluções de continuidade a nível das pregas dos quadrantes superiores, algumas erosões de coloração nacarada e uma certa congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar a marcada hipotonia dos esfíncter anal”. Tais sinais físicos a nível do ânus são “compatíveis com a prática continuada de coito anal” e “ as lesões descritas a nível do esfíncter anal denotam ter sido produzidas por instrumento de natureza contundente, podendo ter resultado da penetração repetida por pénis”. 155.18. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 155.19. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 155.20. O arguido A sabia que o AG era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 155.21. Ao agir pela forma descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AG havia estabelecido com ele e que lhe havia limitado a possibilidade de opor resistência. 155.22. O arguido A agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.10 – Ofendido AA, (…)) 156. AA nasceu a (…), ingressou como aluno interno da AX em Setembro de 1997, tendo sido colocado no FC, do CZ. Nunca conheceu o pai e viveu sempre com o padrasto e a mãe a qual faleceu em Fevereiro de 1997. 156.1. Quando ingressou na AX, o menor AA a(...)va uma fase dolorosa de luto, com uma grande necessidade de afecto e protecção. 156.2. O AA desde o seu ingresso na AX passava os fins de semana, alternadamente, em casa de um tio e de uma tia maternos. A partir de meados do ano de 1998, passou a alternar as visitas aos fins de semana à tia materna com as idas a casa de uma senhora amiga, que conhecia o menor desde tenra idade. Esta, em finais de 1998, passou a residir a maior parte do tempo no norte do País, tendo o menor passado a ir a casa daquela somente quando a mesma se encontrava em (…) ou em períodos de férias. 156.3. Em Setembro de 2000, o menor AA foi legalmente confiado à AX, tendo sido nomeado seu tutor o (...) da Instituição. 156.4. Tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com o menor, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, decorridas poucas semanas depois de o mesmo ter ingressado na AX, com quem conversava amiúde, granjeando assim a sua confiança. 156.5. O arguido pedia ao menor, com frequência, que lhe fosse comprar tabaco e que lho entregasse na garagem do CZ. Nessas ocasiões, o arguido A gratificava sempre o menor, dando-lhe dinheiro pelos recados que lhe fazia. 156.6. Em data em concreto não determinada, de meados do ano de 1998, mas anterior ao mês de Julho, quando o menor tinha ainda 12 anos de idade, o arguido A chamou-o à garagem. 156.7. O arguido A, na garagem, aproximava-se do AA, despiu-lhe as calças, manipulou-lhe o pénis e com o seu pénis erecto pressionou a entrada do ânus do menor, sem que, contudo, tivesse conseguido penetrá-lo, face à reacção daquele, que conseguiu fazer força, impedindo tal acto, passando o arguido a roçar o seu pénis junto ao ânus do AA. 156.8. Após a prática dos actos descritos no ponto “156.7” dos factos provados, antes de o menor sair, o arguido A advertiu-o de que não poderia contar nada do que se tinha passado. 156.9. Cerca de um ano mais tarde, tinha o menor ainda 13 anos de idade, o arguido A voltou a chamá-lo à garagem. Nesse local o arguido segurou o menor AA, tendo-lhe baixado as calças, introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 156.10. Após os factos descritos no ponto “156.9” dos factos provados, o arguido A advertiu o menor para que não contasse nada a ninguém, tendo-lhe dado dinheiro em quantia não determinada. 156.11. Já em meados de Setembro do ano de 2001, quando o menor já 16 anos de idade, ao entardecer, o arguido A deu-lhe boleia, até à (...) da AX. 156.12. Após ter estacionado o veículo que conduzia no parque de estacionamento da (...), o arguido A quando o menor se preparava para sair, agarrou o mesmo, segurando-lhe a cabeça na direcção da sua braguilha. Simultaneamente, o arguido A tirou o seu pénis para fora das calças e tentou introduzi-lo na boca do menor para que este o chupasse, o que não conseguiu, pois o AA conseguiu desviar a sua boca. 156.13. Após os actos descritos, o menor ficou com receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse tal arguido, que sabia ser um funcionário influente na AX, bem relacionado com os dirigentes da instituição. 156.14. O menor foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que “à observação do ânus, constata-se um certo apagamento das pregas da mucosa, que não apresenta vestígios de lesões traumáticas, uma ligeira congestão do plexo hemorroidário, mais evidente nos quadrantes superiores, e uma moderada hipotonia dos esfíncter anal”. Tais sinais físicos a nível do ânus são “compatíveis com coito anal repetido”, conforme relatório pericial de fls. 178 a 187 vº do Apenso CG. 156.15. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 156.16. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 156.17. O arguido A sabia que o AA era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 156.18. Ao agir pela forma descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AA havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 156.19. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.11 – Ofendido AY, (…)) 157. AY (…), ingressou na AX em 20 de Maio de 1998 como aluno interno, tendo sido colocado no FD, do CZ. 157.1. O menor foi confiado a título provisório à AX face à situação de risco em que se encontrava, uma vez que os seus pais eram alcoólicos. O pai do menor, numa das ocasiões em que se encontrava alcoolizado, expulsou de casa o menor e a mãe do mesmo, depois de os ter agredido, tendo sido nessa sequência que o Tribunal de Menores de (…) interveio. 157.2. Na AX foi avaliado como um “adolescente com uma baixa auto-estima, muito ansioso, com uma má imagem de si, evidenciando uma problemática depressiva decorrente de experiências traumáticas no decurso da sua infância e adolescência por questões que se prendem com o alcoolismo dos progenitores.” 157.3. A partir de finais do ano de 1999 o menor passou a ir a casa com regularidade aos fins de semana. 157.4. Tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com o menor, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o mesmo, com quem começou a conversar amiúde, granjeando assim a sua confiança. 157.4.1. O arguido pedia também ao menor que lhe fizesse alguns recados, nomeadamente que lhe fosse comprar tabaco, dando-lhe dinheiro em troca desse favor. Começou também a oferecer boleia ao menor. 157.5. A determinada altura o arguido começou a dizer ao menor que ele era como se fosse um filho para si, começando este a ver o arguido como se fosse “um pai”. 157.6. Com efeito, quando conheceu o arguido o menor sentiu que tinha encontrado um “pai” com quem podia partilhar actividades e que lhe dava atenção e dinheiro, o que nunca tinha acontecido com o seu pai natural. 157.7. Num dia não concretamente determinando do primeiro trimestre do ano de 2000, o arguido pediu ao menor, que tinha na altura 14 anos, que lhe fosse levar tabaco à garagem do CZ. 157.8. Quando o menor ali chegou o arguido fechou o portão da mesma e aproximou-se do menor, colocando-lhe, então, a mão sobre o pénis e começando a masturbá-lo. O menor tentou reagir, mas o arguido insistiu e encostou-se a ele, enquanto acariciava o seu próprio pénis até ejacular. 157.9. Após a prática de tais actos, o arguido deu ao menor 500 escudos. 157.10. Uns dias depois, o arguido voltou a chamar o menor à garagem onde, de novo, começou, a acariciá-lo no pénis, ordenando-lhe que fizesse a mesma coisa. O menor assim fez, manipulando o pénis do arguido até ele ejacular. 157.11. Os actos descritos no ponto “157.10”, que antecede, repetiram-se, pelo menos, mais quatro vezes, tendo o arguido A, nessas ocasiões, forçado o menor a manipular o seu pénis, masturbando-o, enquanto o arguido manipulava, por sua vez, o pénis do menor. 157.12…e pelo menos em quatro dessas vezes o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor e aí o friccionava. 157.13. O menor por gostar do arguido “como um pai”, sentia-se dividido e acabava sempre por aceder a ir ter com ele. 157.14. Num dia do Verão do ano de 2000, o arguido A convidou o menor para ir consigo à praia na zona (…), perto da (…). 157.15. O menor acedeu ao convite, tendo passado a tarde com o arguido. Este comprou-lhe um gelado e quando uma pessoa que ali se encontrava lhe perguntou se o menor era seu filho, o arguido disse que sim. 157.16. No regresso da praia o arguido levou o menor até sua casa que se situava num barracão das instalações do DT. A casa estava toda desarrumada e o menor, para agradar ao arguido, arrumou a casa toda. 157.17. Então o arguido disse ao menor para tomarem banho juntos, onde o arguido começou a encostar-se ao corpo do menor. Após foram para a cama do arguido A, onde este forçou o AY a aproximar a boca do seu pénis e a chupá-lo, o que este fez, tendo-se começado a sentir mal. Perante esta situação o arguido levou o AY de volta ao Lar. 157.18. O menor foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que à observação do ânus se constatava um “considerável apagamento das pregas da mucosa, sem evidência de vestígios traumáticos” e “uma acentuada hipotomia do esfíncter anal”. Tais sinais físicos a nível do ânus são “compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 157.19. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 157.20. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 157.21. O arguido A sabia que o AY era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 157.21.1. Ao agir pela forma descrita, o arguido pretendeu valer-se e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor AY havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 157.22. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9. 12 – Ofendido AE, (…)) 158. AE (…), ingressou em 16 de Setembro de 1998 na AX, como aluno interno do GA do EX. 158.1. O menor, durante os anos em que viveu com a mãe e o companheiro desta era negligenciado e, segundo o Instituto de Reinserção Social da área da sua residência, era vítima de maus tratos, tendo chegado a fugir várias vezes de casa como consequência das agressões de que era alvo. 158.2. No âmbito de processo tutelar que correu termos no Tribunal de Menores de (…) foi, por isso, solicitado à AX que acolhesse, com urgência, o menor, dada a situação de risco em que se encontrava. 158.3. Após os seu internamento, o menor passou a ir, aos fins de semana, a casa da avó paterna, ficando na companhia desta e de uma tia. 158.4. No ano lectivo de 1999/2000 o menor transitou para o DT, onde frequentou o 4º. Ano. Em Abril de 1999, o pai do AE, que se encontrava preso, terminou o cumprimento da pena e foi viver para casa da sua mãe, avó paterna do menor. Depois de sair da prisão o pai do menor passou a dar todo o apoio ao filho, estando, desde essa altura, em curso no Tribunal de Família e Menores de (…) reavaliações sucessivas da situação familiar do menor, face ao interesse do pai em morar com o filho, com vista à alteração do regime de internato para o regime de semi-internato. 158.5. Aquando da sua entrada na AX o menor era descrito como “um garoto muito entregue a si próprio e que tenta ultrapassar a angústia dessa situação agindo sobre a realidade, às vezes com comportamentos que envolvem risco físico(...) A situação de desproteção em que se encontra esta criança correndo mesmo risco a sua integridade física, aconselha a admissão do AE em regime residencial”. 158.6. O menor recebia as visitas da mãe no Lar esporadicamente e passava alguns fins de semana em casa de uma tia. 158.7. Os Serviços Sociais da AX descreviam o menor como sendo “um pré-adolescente muito frágil do ponto de vista emocional, mostrando-se muito influenciável pelo meio”. 158.8. No ano de 1999 o menor passou a integrar a equipa de pingue-pongue da AX, sendo o arguido A quem assegurava o transporte para os treinos e os jogos. O menor tinha treino quase todos os dias e desse contacto quase diário com o arguido A nasceu uma relação de proximidade. 158.9. O arguido frequentava também o EX onde ia, sobretudo à hora do almoço, aproveitando a ocasião para conversar com o menor a quem passou a oferecer dinheiro várias vezes por semana, quase sempre que o encontrava. (9.13 – Ofendido AS, (…)) 159. AS (…), ingressou como aluno interno da AX em 10.2.99, tendo sido colocado no GF do EY. Passou depois para o FO do mesmo (...), onde se mantêm. 159.1. AS é órfão de pai e a mãe era pessoa muito doente. Quando foi admitido na AX manifestava “algumas dificuldades de orientação e estruturação espacial e de coordenação visuomotora. Denota alguma insegurança no seu traço (...) ,manifesta alguma insegurança nos seus desempenhos (...) Está bem presente o seu sofrimento por perdas e separações de que vem sendo alvo”. 159.2. O então menor conheceu o arguido A logo após a sua admissão na AX. O arguido aproximou-se do menor e passou a convidá-lo a assistir aos jogos de futebol e a tomar refeições fora do (...), oferecendo-lhe dinheiro com regularidade. 159.3. O arguido efectuava carregamentos de dinheiro no telemóvel do menor e a determinada altura pediu-lhe para ser seu padrinho, pedido que o menor rejeitou depois de ter conversado com a sua mãe. 159.4. A mãe do AS faleceu em Fevereiro de 2001, na sequência de doença prolongada, tendo o menor ficado muito perturbado e triste, facto de que o arguido teve perfeito conhecimento. 159.5. Depois do falecimento da mãe do menor, e quando este se encontrava particularmente vulnerável, o arguido convidou o menor a acompanhá-lo à casa que então ocupava, o barracão sito nas instalações do DT. 159.6. Uma vez aí, o arguido pôs em exibição, numa aparelhagem que aí se encontrava, uma cassete vídeo cujo conteúdo consistia em cenas explícitas de sexo com adultos mantendo relações sexuais entre si. 159.7. Depois, aproximou-se do menor e desapertou-lhe as calças e retirando-lhe o pénis para fora começou a manipulá-lo, masturbando-o. De seguida, retirou o seu próprio pénis para fora das calças e ordenou ao menor que o tocasse, masturbando-o também, o que aquele fez. 159.8. Após ter praticado os actos descritos, o arguido deu ao menor dinheiro, em quantia não concretamente apurada. 159.9. Algum tempo depois e ainda durante o ano de 2001, o arguido voltou a levar o menor, por duas vezes, a sua casa, onde voltou a visionar cassetes de vídeo cujo conteúdo consistia em cenas explícitas de sexo do mesmo teor. Também aí voltou a masturbar o menor, mexendo-lhe no pénis e obrigando o menor a mexer-lhe também no pénis. Após o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando. 159.10. No fim dos actos sexuais que acima se descreveram, o arguido entregava sempre dinheiro ao menor AS em quantia em concreto não apuradas, pagando-lhe também algumas refeições fora da AX. 159.11. Já na pendência do presente processo, o arguido escreveu ao menor AS e pediu ao menor que lhe escrevesse a contar o que dissera à Polícia Judiciária quando inquirido, pedindo-lhe para não contar a ninguém o que se tinha passado entre os dois, relembrando que era o seu padrinho e que tinham passado bons momentos juntos. Prometendo que os ajudaria em tudo quanto precisassem quando saísse da cadeia, o arguido dizia ao menor para pedir aos seus colegas (…) e ao “colega de escola” que não falassem do que se tinha passado, pedindo para não revelarem que tinham ido a casa do arguido e reafirmando a confiança e a amizade que tinha por eles. Explicava ainda ao menor que estava muito mal, desanimado, deprimido e sem vontade de comer, querendo com isso inspirar-lhe sentimentos de piedade de forma a impedi-lo de contar a verdade. 159.12. AS foi submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que “À observação do ânus, constata-se um certo apagamento das pregas da mucosa e uma ligeira turgescência das veias hemorroidárias” que, por ser incomum na faixa etária do menor são “compatíveis” com práticas de coito anal, uma vez que os sinais apresentados ao nível do ânus pelo mesmo embora não permitindo afirmar, sob o ponto de vista (...)-legal a prática de coito anal, “também não permitem excluir a sua ocorrência”. 159.13. O arguido A sabia que o menor AS era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha apenas 13 anos de idade, que quando ali foi admitido era órfão de pai e que a mãe do mesmo entretanto também falecera, e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 159.14. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 159.15. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AS prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 159.16. O arguido sabia que o conteúdo dos filmes que mostrou ao menor eram idóneos a excitar sexualmente quem os visse, tendo visado, ao exibir tais filmes ao menor, produzir esse efeito no mesmo. 159.17. Era do conhecimento do arguido que o visionamento de filmes da natureza dos mencionados, pelo AS, menor de 14 anos, era determinante de efeitos negativos na formação da sua personalidade. 159.18. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.14 - Ofendido AF, (…)) 160. AF (…), ingressou como aluno interno da AX em Novembro de 1996, tendo sido colocado no FK do EY. 160.1. O menor nunca conheceu o pai e a mãe reside longe de (…), nas (…), tendo um modo de vida que não lhe permitiu educar e apoiar o filho. 160.2. Quando entrou na AX o menor era avaliado como sendo “afectivamente é uma criança algo insegura, que revela uma baixa auto-estima. Transparece a falta de confiança em si própria(..) O AF parece formular um pedido de ajuda, transmitindo-nos uma necessidade de afectos”. 160.3. Tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com o menor, o arguido A, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o mesmo, com quem conversava amiúde e a quem entregava dinheiro, granjeando assim a sua confiança. 160.4. O menor foi baptizado na Igreja Católica no dia (…), tendo o arguido A sido o seu padrinho. 160.5. O arguido passou a dar boleias com regularidade ao menor, indo buscá-lo ao terminal de autocarros do (…), em (…), quando regressava do fim de semana que passava com a mãe nas (…). 160.6. Em Janeiro de 2002, tinha o AF 13 anos de idade, o arguido convidou o mesmo para ir a uma casa. O menor acedeu, tendo sido levado pelo arguido A, juntamente com o menor AS, (…) a tal casa. 160.7. Quando aí chegaram, o arguido levou os menores para o quarto e pôs uma cassete de vídeo cujo conteúdo consistia em imagens de sexo explícito de relações sexuais praticadas entre indivíduos adultos. 160.8. O menor foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual tendo-se constatado que “à observação do ânus, constata-se uma mucosa normalmente corada, mas com um certo apagamento das pregas e algumas pequenas erosões de coloração nacarada(...)Ligeira hipotomia do esfíncter anal”, sinais que “são compatíveis com a prática repetida de coito anal”. 160.9. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 160.10. O arguido A sabia que o menor AF era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha entre 13 e 14 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática, e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 160.11. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática do visionamento do filme a que se refere o ponto “160.7.” e que o arguido colocou. 160.12. O arguido sabia que o conteúdo dos filmes que mostrou ao menor eram idóneos a excitar sexualmente quem os visse, tendo visado, ao exibir tais filmes ao menor, produzir esse efeito no mesmo. 160.13. Era do conhecimento do arguido que o visionamento de filmes da natureza dos mencionados, pelo AF, menor de 14 anos, era determinante de efeitos negativos na formação da sua personalidade. 160.14. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, bem sabendo que as condutas descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.15. – Ofendido Z, (…)) 161. O menor Z, (…), id. a fls. 548, ingressou na AX em 25.09.96, como aluno interno do CZ, Lar FG, tendo sido confiado a essa Instituição, por decisão do Tribunal de Família e Menores de (…), de 06.11.96. 161.1. A mãe e o tio do menor são doentes do foro psiquiátrico, sendo a avó do mesmo a única pessoa da família capaz de lhe dar algum apoio. O menor, desde que é aluno interno da AX, vai com frequência, aos fins de semana, a casa da avó, onde vivem também a mãe e um tio. 161.2. Quando ingressou na AX, o menor revelava dificuldades de concentração e de coordenação motora, a exigir bastante acompanhamento da equipa educativa. 161.3. No ano lectivo de 1999/2000 o menor transitou para o DT, onde se mantêm. 161.4. O menor foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, tendo-se concluído que “À observação do ânus, constata-se um apagamento das pregas, algumas das quais apresentam soluções de continuidade, e pequenas lesões erosivas da mucosa, quase todas de coloração nacarada. Congestão hemorroidária, particularmente acentuada a nível dos quadrantes inferiores, evidenciando-se, ainda, marcada hipotonia do esfíncter anal, sem compromisso da sua competência”, sinais anais estes “compatíveis com a prática repetida de coito anal”, conforme relatório de fls. 276 a 283 do Apenso CG. (9.16 – Ofendido AO, (...)) 162. AO (…), foi confiado por decisão do Tribunal de Menores e Família de (…) de 21.2.92 à AX, tendo ingressado no Centro de Acolhimento daquela Instituição a quem passou a caber “zelar pela sua segurança, saúde, formação moral, educação, desenvolvimento e bem estar”. 162.1. O menor era oriundo de uma família com graves problemas, cresceu sozinho entre a toxico-dependência e o abandono dos pais. Em 21.7.92 o menor ingressou no FA, conforme decisão do (...) da AX. 162.2. O menor perdeu o contacto com os pais e quem o visitava, de vez em quando, eram os avós paternos e maternos, únicos familiares que se preocupavam com o seu bem estar. 162.3. Nas férias o menor era integrado nas (...) da AX, passando apenas uma ou duas semanas em casa dos avós e, a partir de 1995, também as férias do Natal e da Páscoa. 162.4. O menor começou a jogar (…) no “AX”, tendo conhecido o arguido A durante os treinos e os jogos. 162.5. Este começou a conversar com o menor e a partir de 1999 passou a oferecer-lhe boleia do campo de jogos até ao Lar. Aos poucos, começou a ganhar a confiança do menor a quem oferecia dinheiro. 162.6. O arguido sabia que o menor era órfão e que vivia com a avó, levando-o de boleia até casa desta aos fins de semana. 162.7. Num dia indeterminado de Setembro ou Outubro de 2001, tinha o menor 14 anos de idade, o arguido ofereceu boleia ao mesmo para o FA, onde se situa o seu Lar, quando este finalizou o treino de futebol no CZ. O menor aceitou, tendo-se sentado ao lado do arguido que, nesse dia, conduzia o seu veículo pessoal de marca “(…)” de cor (…), já referido. 162.8. No trajecto e quando passavam pelo (…), em (…), o arguido começou a apalpar o menor, nas pernas, junto ao pénis, tendo este ficado perturbado. 162.9. Passado uma semana o arguido voltou a propor boleia ao menor no fim do treino de futebol. 162.10. Era já de noite e o arguido voltou a utilizar a sua viatura pessoal. Quando passavam no (…) o arguido estacionou a sua viatura perto de um restaurante e começou de imediato a apalpar as pernas e o pénis do menor. 162.11. De seguida o arguido baixou os calções que o menor vestia e começou a acariciar-lhe o pénis o menor tentou esquivar-se. 162.12. Seguidamente o arguido virou-o de costas para si, despiu-se e introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 162.13. Depois disse ao menor que não deveria contar nada do que se passara a ninguém, o que o menor acatou. 162.14. AO foi sujeito a exame (...)-legal de natureza sexual, tendo-se concluído que “os sinais observados no exame físico do AO são compatíveis com a prática repetida de coito anal”, apresentando na observação do ânus “um acentuado apagamento das pregas da mucosa, sobretudo a nível dos quadrantes inferiores, uma erosão de forma elíptica e coloração nacarada, localizada às 9 horas, e uma certa congestão do plexo hemorroidário, sendo ainda de assinalar a marcada hipotonia do esfíncter anal.”. 162.15. O arguido A estava ciente de que enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 162.16. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência. 162.17. O arguido A sabia que o menor AO era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha 14 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência e pretendeu valer-se e valeu-se disso. 162.18. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 162.19. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AO prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 162.20. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9. 17 – Ofendido AC, (…)) 163. AC (…), ingressou como aluno interno da AX em 1992, tendo sido colocado no GL, do FA. 163.1. AC é órfão de mãe e não tem qualquer contacto com o pai. O menor passa alguns fins de semana em casa de uma irmã já maior, única familiar que lhe presta algum apoio. 163.2. O arguido A começou a conversar com o AC na escola que aquele frequentava, na (…). 163.3. AC tinha aulas de Educação Física no CZ. 163.4. Em dia indeterminado, anterior a Maio de 2002, do ano lectivo de 2001/2002, o arguido ofereceu boleia ao menor, então com 14 anos de idade, sentando-se este no banco ao seu lado. 163.5. No caminho o arguido disse ao AC que se o deixasse fazer sexo lhe dava dinheiro. De seguida o arguido abriu a braguilha e, pegando na mão do menor, ordenou-lhe que o acariciasse no pénis, “batendo-lhe uma punheta”. O menor assim fez, manipulando o pénis do arguido. 163.5.1. Seguidamente o arguido despiu o menor, virou-o de costas para si e introduziu-lhe o seu pénis no ânus, aí o friccionando. 163.5.2. Após a prática de tais actos o arguido entregou ao menor dinheiro, em quantia não concretamente apurada e levou-o para o (...). 163.6. Em consequência dos actos praticados pelos arguidos A e acabados de descrever, AC à observação do ânus apresenta “um acentuado apagamento das pregas da mucosa, com soluções de continuidade a nível das escassas pregas dos quadrantes superiores e uma certa congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar a marcada hipotonia do esfíncter anal, ainda que com manutenção da sua competência.” Estes sinais são “compatíveis com a prática repetida de coito anal” e ”denotam ter sido produzidas por instrumento de natureza contundente, podendo ter resultado de penetração repetida por pénis em erecção”, conforme relatório (...) legal de natureza sexual. 163.7. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 163.8. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 163.9. O arguido A sabia que o menor AC era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha 14 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 163.10. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre da relação de dependência que o menor AC havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 163.10.1. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 163.11. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AC prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 163.12. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.18 – Ofendido GT, (…)) 164. O menor GT, (…), ingressou como aluno interno da AX em 21 de Setembro de 1995, tendo sido colocado no FN, do EY. 164. 1. Foi ali colocado depois da separação dos seus pais que sofriam de problemas de alcoolismo, não tendo quaisquer condições que lhes permitissem cuidar do menor. 164.2. Aquando do seu ingresso na AX era uma criança que manifestava do ponto de vista psico-afectivo “uma grande fragilidade e insegurança com grandes dificuldades em abordar a temática familiar havendo confusão e inversão de papéis”. 165. O arguido A, no Verão de 1998, desempenhava funções de motorista na AX, passando em 06.03.2000, a exercer tais funções junto da (...) da AX, agindo também sob as ordens e direcção do arguido C, (...)-(...) daquela Instituição. 165.1. O arguido C no âmbito das suas funções, geria e administrava o património da AX, a tutela do pessoal e a autorização para a realização de despesas com material, bem como autorização para o pagamento de horas extraordinárias, ajudas de custo e gasolina. 165.2. No normal exercício das suas funções, o arguido A utilizava os veículos da AX, tendo livre acesso aos mesmos. 165.3. O arguido A utilizou os veículos da AX, de matrículas (…) e (…), da marca (…) e (…), da marca (…), no transporte de menores, alunos da AX, para casas onde os mesmos eram sujeitos a práticas sexuais com homens adultos. 165.4. O arguido A sabia que aqueles veículos automóveis apenas podiam ser utilizados no serviço normal da AX, não lhe sendo permitido o seu uso para fins particulares e estranhos à instituição. 165.5. O arguido A actuou de modo voluntário, livre e consciente, bem sabendo que não poderia dar aos veículos mencionados a utilização descrita e que a sua conduta era proibidas por lei penal. 166. O arguido A foi abusado sexualmente na AX logo após ter passado a ser aluno da AX, por alunos mais velhos e funcionários da AX. 166.1. O arguido cresceu no meio deste ambiente. 166.2. O arguido viveu sempre na AX, onde vivia numa barraca, onde trabalhava e onde tinha amigos. 166.3. O arguido A tem a 4ª classe, é solteiro e não tem apoio familiar. 166.4. … vive de uma reforma no montante, aproximado, de 400 euros mensais, os quais são absorvidos com as despesas da sua subsistência e medicação. 166.5. O arguido A não tem antecedentes criminais registados. 167. Os filhos do arguido C frequentaram (...)s da AX, onde, até ao ingresso no ensino superior, fizeram todo o seu percurso escolar: 167.1. GU ingressou no EZ em 1980 (com três anos de idade), transitando para o CZ em 1987, que frequentou até 1996, data em que conclui o 12º ano de escolaridade; 167.2. GV ingressou no EZ em 1984 (com três anos de idade), transitando para o CZ em 1993, que frequentou até 1999, data em que concluiu o 12º ano de escolaridade. 167.3. O Arguido sempre foi um pai empenhado no acompanhamento da vida e do percurso escolar de seus filhos. 167.3.1. Actualmente tem rendimentos mensais no valor de 3.400 Euros e despesas mensais, fixas, no valor de 1400 Euros. 167.3.2. O arguido C não tem antecedentes criminais registados. 167.4. As viaturas de serviço da AX recolhiam à garagem sita nas instalações do CZ, local de onde também saíam para efectuar qualquer deslocação. 167.5. O arguido C aos vinte anos casou com GW, ex aluna da AX, de quem teve dois filhos, da qual se separou de facto em 1984, embora só se tendo divorciado em 2003; 167.6. … em 1985/86 iniciou uma relação afectiva com GX, ex-aluna e antiga funcionária da AX, com a qual viveu em união de facto até 1997; 167.7. … e em 1997/98 iniciou uma relação afectiva com NY, também ex-aluna e funcionária da AX, com a qual viveu em união de facto e veio a casar, tendo uma filha, menor, desta relação; 167.8. As viaturas de serviço da AX recolhiam à garagem sita nas instalações do CZ, local de onde também saíam para efectuar qualquer deslocação. 167.9. A entrada e saída das viaturas fazia-se sempre por um único portão do (...), havendo um mapa de controlo que era preenchido à saída e à entrada. 167.10. A Divisão de Aprovisionamento e Logística elaborava semanalmente mapas de transportes, abrangendo também os fins de semana. De tais mapas consta a descrição do serviço e a indicação da(s) viatura(s) ao mesmo afecta(s), bem assim como o(s) nome(s) do(s) motorista(s) em escala de serviço. 167.11. Cada uma das viaturas de serviço da AX dispõe de um boletim próprio, no qual, para cada deslocação, o motorista que efectua o serviço deve anotar os kms. à partida e os kms. à chegada, o local da deslocação, o serviço efectuado e, se fosse esse o caso, qual a quantidade de combustível com que tinha abastecido a viatura. 167.12. Estes boletins possibilitavam o cruzamento dos dados ali registados com os constantes dos mapas semanais de transportes. 167.13. Os registos de kms. efectuados pelas viaturas eram mensalmente entregues na Divisão de Contabilidade e Património, onde eram regularmente conferidos e compilados para ser apurado o custo mensal por viatura. Os elementos assim coligidos eram enviados ao Ministério das Finanças. 167.14. Os boletins das viaturas encontravam-se no interior destas, sendo os motoristas que as conduziam responsáveis pelo seu preenchimento e conformidade. 167.15. Sempre que um motorista recebia uma viatura para efectuar qualquer serviço, deveria, antes de iniciar o percurso, conferir o n.º de kms. registado no conta-quilómetros da mesma, que deveria coincidir com o último lançamento no respectivo boletim. No final do serviço, o motorista que o efectuava registava no boletim o n.º de kms. lido no conta-quilómetros. 167.16. No ano lectivo de 2000/2001 o Arguido C leccionou, no GZ, a cadeira de (…), ali tendo comparecido regularmente, em regra às Segundas e Quartas-Feiras ao final da tarde. 168. O arguido K é considerado pela sua irmã e sobrinhos como uma pessoa amiga da família, fomenta a manutenção do espírito de família e presta a sua ajuda sempre que necessário. 168.1. Pelos seus doentes é tido como uma pessoas que os considera e presta atenção aos seus problemas, sempre disponível para os atender, trabalhador cuidadoso e competente. 168.2. Pelos amigos é considerado como um amigo disponível 168.3. O arguido K é (…) 168.4. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.5. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.6. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.7. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.8. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.9. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.10. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.11. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.12. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.13. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.14. (…) (percurso profissional do arguido K) 168.15. (…) (condição (...) do arguido K) 168.16. (…) (condição (...) do arguido K) 168.17. (…) (condição (...) do arguido K) 168.18. (…) (condição (...) do arguido K) 168.19. O arguido carece de acompanhamento (...) e medicamentoso permanente. 168.20. O arguido tem sido apoiado e acompanhado pela sua família, colegas, amigos e pacientes. 168.21. O arguido é respeitado e estimado pelos seus familiares, amigos e pessoas em geral. 168.22. O arguido K não tem antecedentes criminais registados. 168.23. O arguido K tem rendimentos mensais, provenientes da sua actividade profissional, em regime liberal, no montante de (…). 169. O arguido H tem uma longa carreira (…). 169.1. É estimado e respeitado pelos colegas (…). 169.2. O arguido é considerado pelos seus amigos um homem de bem, como profissional e como cidadão. 169.3. O arguido é casado e tem duas filhas, estando inserido no plano familiar e social. 169.4. O arguido é considerado pela sua família e amigos como um homem solidário. 169.5. O arguido H não tem antecedentes criminais registados. 169.5.1. O arguido H está reformado, tem rendimentos mensais no valor de 3.100 Euros e despesas mensais com o seu agregado familiar, constituído pela sua mulher e filha menor, no valor de 2.000/2.500 Euros. 169.6. A arguida Q é estimada e considerada pelos seus amigos e vizinhos. É apoiada pela sua família. 169.6.1. Vive de uma reforma do seu marido, o qual é doente. 169.6.2. A arguida Q não tem antecedentes criminais registados. 169.7. O arguido E tem formação académica superior. 169.7.1. Está jubilado, tendo rendimento mensal no valor de 3.045 Euros e despesas mensais no valor de 1.200 Euros. 169.7.2. O arguido E não tem antecedentes criminais registados. 169.7.3. O arguido E é estimado e considerado pelos seus amigos. 169.8. O arguido N é casado e tem um filho maior, que se encontra a estudar. 169.8.1. (…). 169.8.2. Tem rendimentos mensais no valor de 1.800 Euros, os quais são absorvidos com as despesas do seu agregado familiar e com os estudos do filho. 169.8.3. O arguido N tem registados antecedentes criminais pela prática de um crime de condução em estado de embriaguês, praticado em 21/02/08, cuja pena já se encontra extinta. 170. Em consequência dos actos praticados no Assistente X, este teve medos, temores. 170.1. Em consequência dos actos praticados no Assistente AA, este teve medos, temores. 170.2. Em consequência dos actos praticados no Assistente AB, este teve medos, temores. 170.3. Em consequência dos actos praticados no Assistente AC, este teve medos, temores. 170.4. Em consequência dos actos praticados no Assistente AD, este teve medos, temores. 170.5. Em consequência dos actos praticados no Assistente AE, este teve medos, temores. 170.6. Em consequência dos actos praticados no Assistente AF, este teve medos, temores. 170.7. Em consequência dos actos praticados no Assistente AG, este teve medos, temores. 170.8. Em consequência dos actos praticados no Assistente AH, este teve medos, temores. 170.9. Em consequência dos actos praticados no Assistente AI, este teve medos, temores. 170.10. Em consequência dos actos praticados no Assistente AJ, este teve medos, temores. 170.11. Em consequência dos actos praticados no Assistente AK, este teve medos, temores. 170.12. Em consequência dos actos praticados no Assistente AY, este teve medos, temores. 170.13. Em consequência dos actos praticados no Assistente AM, este teve medos, temores. 170.14. Em consequência dos actos praticados no Assistente AN, este teve medos, temores. 170.15. Em consequência dos actos praticados no Assistente AP, este teve medos, temores. 170.16. Em consequência dos actos praticados no Assistente AQ, este teve medos, temores. 170.17. Em consequência dos actos praticados no Assistente AR, este teve medos, temores. 170.18. Em consequência dos actos praticados no Assistente AS, este teve medos, temores. 170.19. Em consequência dos actos praticados no Assistente AT, este teve medos, temores. 170.20. Em consequência dos actos praticados no Assistente AV, este teve medos, temores. 170.21. Em consequência dos actos praticados no Assistente AW, este teve medos, temores. 170.22. Em consequência dos actos praticados no Assistente Y, este teve medos, temores. (B) – Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado (NUIPC 3137/01.5JDLSB): Da prova produzida e da discussão da causa, com relevância para a decisão da causa resultaram os seguintes factos (da Acusação de fls. 529 a 589, e da contestação de fls. 819 a 825) : I - FACTOS PROVADOS: 1. O arguido A foi funcionário da AX, desde o ano de 1975 até 30 de Setembro de 2002. 1.1. Em 15 de Janeiro de 2002 foi-lhe instaurado um processo disciplinar por factos relativos a assédio sexual e prática de actos sexuais com o aluno da AX, U. 1.2. Por despacho de 19 de Setembro desse ano, da Secretária de Estado da Segurança Social, o arguido foi aposentado compulsivamente. 2. Durante o período de tempo em que trabalhou na AX o arguido foi, várias vezes, sujeito a processos disciplinares, nomeadamente em 04 de Julho de 1989, em consequência de queixas de alunos, sendo imputado ao arguido a prática de actos de natureza sexual com os educandos. 2.1. No âmbito do processo disciplinar a que se refere o ponto “2.” que antecede, foi proposta a aplicação ao arguido da pena de aposentação compulsiva, que mereceu a concordância do (...) da AX e do Secretário de Estado da Segurança Social, conforme despacho publicado no Diário da República (…). 2.2. Por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (…) tal decisão foi anulada e ordenada a reintegração do arguido nas funções que exercia na AX, com efeitos a partir de 14 de Outubro de 1989, conforme Aviso publicado no Diário da República, (…). 3. À data da ocorrência dos factos que o Tribunal deu como provados, o arguido exercia funções de motorista da AX, correspondendo-lhe o estatuto de Funcionário Público, regime que se manteve até à data do seu afastamento. 3.1. Ao arguido competia, nomeadamente, a distribuição do correio interno entre os vários (...)s, o acompanhamento das viagens das crianças a passeios e para as (...), estando encarregue do transporte do material/equipamento necessário a tais deslocações. 3.2. Além das atribuições referidas no ponto “3.1.” que antecede, era frequente o arguido acompanhar alunos da AX, transportando-os aos eventos desportivos que tinham lugar em instalações próprias da AX, nomeadamente, no AX (...) ou noutros locais. 4. O arguido ingressou como aluno na AX quando tinha apenas 4 anos de idade, tendo vivido desde sempre na instituição e conhecia a maior parte do pessoal que ali trabalhava: monitores, educadores, (...), funcionários administrativos e auxiliares e membros da (...). 4.1. No que respeita aos alunos da AX (AX), era vulgar oferecer-lhes bebidas e guloseimas e disponibilizar-se para os transportar nos veículos que conduzia, pertença da AX, nomeadamente de um (...) para outro, do (...) para o Lar, do (...) para casa, do (...) para os treinos e vice-versa. 4.2. O arguido tinha uma relação de proximidade e confiança com os alunos da AX. 4.3. Era frequente o arguido comparecer nos treinos e nos jogos do AX (...). 5. Valendo-se do à vontade com que se deslocava na Instituição e do bom relacionamento que tinha com todos, o arguido decidiu aproveitar-se disso para estabelecer com os menores que ali eram alunos uma especial relação de confiança, em particular com aqueles que sabia, face ao comportamento que observava nos mesmos, ou face ao que os mesmos lhe contavam, serem especialmente vulneráveis, desprotegidos, carentes de afecto e, em muitos casos, sem uma referência parental masculina. 5.1. Com tal comportamento o arguido pretendeu ganhar a confiança dos alunos. 6. No ano de 1999 o arguido A iniciou uma relação de maior proximidade com o aluno, surdo-mudo, T, (…), internado no EX, da AX, especializado no ensino a crianças com deficiências auditivas; 7. Este aluno ingressara com 9 anos de idade na AX, em regime de internato, em virtude de, após a separação dos pais, ter ficado confiado a uma das bisavós, que entretanto deixara de poder cuidar de si. O T perdeu o contacto com o pai quando tinha 5 anos de idade e a mãe, que era adolescente quando ele nasceu, refez a sua vida com outro indivíduo, excluindo o T da sua nova família; 8. O arguido, quando via ao T, por vezes dava-lhe doces e pagava-lhe coisas no bar do EX; 9. … tendo-lhe dado dinheiro, em quantia que variou entre 10 (dez) e 20 (vinte) Euros, em número de vezes que não foi possível apurar, mas que ocorreram após ter praticado com o T alguns dos actos descritos no Ponto 10., 12., 13., 14., 15.. e 16., que se seguem; 10. No Verão de 1999, em dia não concretamente apurado, o arguido conduziu o T a uma casa de banho, localizada no interior do CZ, cujas instalações confinam com as do EX que o T frequentava. No interior de tal casa de banho o arguido segurou o T enquanto lhe baixava as calças. De seguida, o arguido baixou as calças e a roupa interior que vestia e, segurando a cabeça do T, introduziu o seu pénis erecto na boca deste, obrigando-o dessa forma, a chupá-lo. Seguidamente, o arguido levantou o T, voltou-o de costas para si e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado. 11. O T, enquanto decorriam as acções descritas no Ponto 10., que antecede, tentou sem êxito opor-se à sua prática, tendo gesticulado e tentado fugir. 12. Decorridos uns dias após o descrito no Ponto 10., que antecede, ainda durante o Verão de 1999 mas em data não concretamente apurada, o arguido conduziu de novo o T à mesma casa de banho, onde voltou a introduzir o seu pénis na boca do T, obrigando-o a chupá-lo. Seguidamente, o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do T, aí o tendo friccionado, apesar de o T ter-se novamente o(...) à prática dos actos de que era alvo, debatendo-se e gesticulando; 13. Em data não concretamente apurada do ano de 2002, mas situada entre Março e Abril, inclusive, de 2002, o arguido A convidou o T a acompanhá-lo, deslocando-se num carro, até uma casa localizada perto de (…), sita na (...) (…), nº. (…), que o arguido disse ser sua e onde se encontrava um outro rapaz, cuja identidade não se apurou; 14. No interior da residência com o T, o arguido começou a acariciar o pénis do T, mandou-o despir, enquanto baixava as calças que vestia, e introduziu e friccionou o seu pénis erecto no ânus do T; 15. No ano de 2000, em data em concreto não apurada, quando o T ia apanhar um transporte, o arguido A abordou-o, insistindo que lhe dava boleia de carro, tendo o T acabado por ceder a tal insistência e aceitado a boleia; Durante o percurso, o arguido estacionou o veículo numa mata pouco frequentada, obrigou o T a baixar as calças e, depois de o arguido também se ter despido da cintura para baixo, introduziu o seu pénis erecto no ânus do T, aí o tendo friccionado; 16. Durante o Verão de 2002, no período das férias escolares, numa casa onde estava instalada a (...) da AX, em (…), o arguido A, apercebendo-se de que o T se encontrava sozinho, na casa de banho, foi também à casa de banho e, aí, o arguido, depois de se despir da cintura para baixo e estando o T com as calças e roupa interior também para baixo, introduziu o seu pénis erecto no ânus do T, aí o tendo friccionado até ejacular. 17. Após os factos descritos no Ponto 16., que antecede, o arguido A não voltou a praticar com o T actos idênticos aos descritos ou a entregar-lhe quaisquer quantias em dinheiro. 18. Sempre que ocorreram os factos em que o T foi vítima de penetração anal, sofreu dores; 19. O T apresenta no ânus, também em consequência das descritas acções de que foi vítima, “um certo apagamento das pregas e algumas cicatrizes de erosões marginais, de coloração nacarada, bem assim como congestão do plexo hemorroidário, cujas veias se apresentam ligeiramente entumescidas e de coloração violácea” e “ligeira hipotonia do esfíncter anal” com “dor ao toque rectal”, conforme relatório de Exame (...)-Legal de Natureza Sexual; 20. No ano de 1998 o arguido A conheceu o U, (…); 21. U ingressou entre Agosto e Outubro de 1996, com nove anos de idade, como aluno interno, para o FA, pertencente à AX, onde esteve como interno até 18/05/00. 22. O internamento deu-se em virtude de a sua família ter dificuldades económicas, o U não conhecia o pai, vivia com a sua mãe e com uma irmã, sendo que a mãe era doente, trabalhando pontualmente e a irmã não tinha uma ocupação profissional estável susceptível de garantir com regularidade o sustento da família. 23. Devido à sua situação familiar o U manifestou sempre muitas dificuldades de aprendizagem. 24. Tempo depois de ter entrado para a AX, no ano de 1998 e numa viagem para uma (...) da Instituição que decorreu no (…), o arguido transportou o U na carrinha onde transportava o material logístico daquele evento, a pedido de uma Educadora, uma vez que o menor se tinha aborrecido com os colegas durante o percurso, quando juntamente com eles seguia de autocarro. 25. Durante a referida viagem o U contou ao arguido as dificuldades económicas com que a sua família vivia, as preocupações com o estado de saúde da sua mãe, a mágoa que sentia por nunca ter conhecido o pai e a falta que uma figura paterna lhe fazia, tendo-se iniciado uma relação de proximidade. 26. No ano lectivo de 2000/2001 U passou a frequentar o EZ, como semi-interno, onde o arguido ia muitas vezes entregar correio interno e fazer recados. 27. Aí, no EZ, o arguido A procurava o U e com ele mantinha conversas, ouvindo os seus problemas e estabelecendo uma relação de proximidade que progressivamente se foi estreitando. 28. A determinada altura, ciente da carência afectiva do menor e do vazio que o facto de não ter pai lhe provocava, o arguido propôs ao menor que lhe começasse a chamar pai e o U, confiante de que passaria a ter uma figura de referência afectiva masculina, começou a tratar o arguido por pai. 29. A partir dessa altura o arguido passou a entregar dinheiro ao U para este entregar à mãe, cerca de 5000$00 por semana, bem como produtos alimentícios. 30. Além do dinheiro que entregava ao U para que este o desse à sua mãe, o arguido dava mais 1000$00 por semana ao menor para os seus gastos pessoais. 31. HC, mãe do Mãe do U, tinha conhecimento que o arguido A era funcionário na AX e considerava que estava a ajudar economicamente a família. 32. Nos finais de Junho de 2001 o arguido convidou o U para o acompanhar à praia, em dias de fim de semana, o que aquele aceitou, com o conhecimento e o consentimento da sua mãe, não tendo esta tido qualquer hesitação. 33. Assim, o U acompanhou o arguido aos fins de semana, em passeios a várias praias, nalgumas das quais estavam instaladas (...) da AX e onde o arguido chegou a levar material. 34. Quando aconteceu levar material para as (...), deslocavam-se numa carrinha da AX e o U sentava-se no banco dianteiro, ao lado do arguido, que conduzia a viatura. 35. Numa das viagens a praias, o arguido mexeu na perna do U, após o que introduziu a sua mão através de um rasgo que o U tinha nos calções e apertou-lhe o pénis. 36. O U estranhou tal atitude e ficou confuso, mas confiava no arguido A e continuou a viajar com o arguido. 37. No início do mês de Agosto de 2001, o arguido convidou o U a acompanhá-lo durante um fim de semana a (…), a um casamento de uns amigos seus, cuja boda se realizaria nos dias 25 e 26 desse mês. 38. HC, mãe de U, concordou com o passeio e deixou o filho ir com o arguido A. 39. Ficaram alojados em casa de amigos do arguido, sita no Largo (…), sem número, em (…), tendo o arguido e o U, camas em dependências separadas. 40. Na noite de 24 para 25 de Agosto, noite em que houve uma trovoada, o U teve medo, não conseguindo dormir por causa disso. Em circunstâncias não concretamente apuradas, mas por insistência do arguido A, o U, nessa noite, passou para a cama do arguido A e esteve deitado com o arguido na cama deste. 41. Quando estavam deitados, o arguido começou a encostar-se ao U e este foi-se afastando, até que entalou-o entre o seu corpo e a parede, pois uma das partes laterais da cama e onde o U estava deitado, encontrava-se encostada à parede. Então o arguido agarrou na cabeça do U e conduziu-a até ao seu pénis, tendo-o introduzido na boca do U, fazendo com que o mesmo o chupasse. Decorridos uns momentos, o arguido agarrou o U, virou-o de costas para si, mas entalando-o de novo entre o seu corpo e a parede, de forma a que o mesmo não se conseguisse libertar e introduziu o seu pénis erecto no ânus do U, aí o tendo friccionado. 42. Em momento posterior aos factos descritos no ponto que antecede, o U foi para a casa de banho, estava perturbado com o que acabara de lhe acontecer e com dores no ânus causadas pela penetração que sofrera; 43. …tendo ido, seguidamente, para a dependência onde inicialmente tinha a sua cama. 44. Na viagem de regresso a (…) o arguido disse ao U que não deveria contar o que tinha acontecido, nem à mãe nem a ninguém e disse-lhe que confiava nele. 45. O U ficou perturbado com os factos descritos no “ Ponto 41.”, que antecede. 46. Quando o U sofreu a penetração anal supra descrita teve dores, apresentando no ânus, em consequência de tal penetração, “ligeira hipotomia do esfíncter anal que pode ter sido produzida por instrumento de natureza perfuro-contundente ou actuando como tal, como por exemplo, o pénis adulto em erecção”, conforme relatório de Exame (...)-Legal de Natureza Sexual, constante de fls. 15 a 18 dos autos. 47. Também como consequência dos actos descritos no “Ponto 41.”, que antecede, U continuou a ter acompanhamento pedopsiquiátrico e psicopedagógico, aparentando sofrer de uma perturbação da ansiedade, tendo sido acompanhado em (...) de pedopsiquiatria, pelo menos até 7/02/03. 48. HC, mãe de U, em 3 de Setembro de 2001 apresentou a queixa que deu origem ao presente processo apensado. 49. No Verão de 2001, o arguido A, a fim de transportar material de uma (...) dos alunos do BF, do BE da AX, que ocorreu no (…), deslocou-se a essa (...). 50. Um dos alunos que participava em tal (...) era o V, (…) e internado à data no BE, lar da AX e a frequentar o BF. 51. O V não tem paternidade determinada, ingressou com 11 anos de idade, na AX, em regime de internato, resumindo-se as suas referências familiares a uma irmã mais nova, também internada na AX. 52. A mãe do V faleceu no ano de 1997. Decorridos cerca de dois anos, faleceu o avô materno, que cuidara do V e de uma irmã após a morte da mãe. Depois da morte do avô materno, ainda foram nomeados tutores do menor e da sua irmã os tios-avôs maternos, que nunca mostraram qualquer disponibilidade no sentido de acolherem ou de apoiarem os sobrinhos-netos. 53. O V padece de atrasos no seu desenvolvimento cognitivo, sendo a sua idade mental inferior à real, não sendo por isso capaz, em função de tal incapacidade, de se determinar de acordo com os padrões de comportamento próprios da sua idade real, sofrendo limitações na capacidade de avaliar os seus actos e consequências dos mesmos. 54. Em dia indeterminado, mas situado na (...) referida nos pontos “49.” e “50.” que antecedem, à noite, o arguido A dirigiu-se ao local onde o V e outros alunos dormiam, em colchões no chão e deitou-se ao lado do V. 55. Quando o V estava a dormir, o arguido A segurou o V e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo; 56. … momento em que o V acordou. 57. Após ter praticado os actos descritos, o arguido disse ao V para não contar o que se tinha passado, pois se o fizesse bater-lhe-ia, ficando o menor receoso de que isso lhe pudesse acontecer. 58. Como consequência do comportamento descrito, o V teve, na altura em que o arguido introduziu o seu pénis no ânus do V, forte dor. 59. Em observação feita no dia 13 de Janeiro de 2003, no âmbito de Exame (...)-Legal de Natureza Sexual, o ânus do V apresentava “um certo apagamento das pregas da mucosa e um entumescimento das veias hemorroidárias, que se apresentam dilatadas e com uma coloração violácea, quer a nível do quadrante superior direito, quer dos quadrantes inferiores”. 60. A partir do mês de Setembro de 1999 W, (…), começou a jogar futebol no AX (...). 61. Esta instituição é uma dependência da AX, competindo-lhe desenvolver a prática do desporto, organizando torneios, e possibilitando a prática de várias modalidades desportivas, tendo, inclusivamente atletas federados que competem a nível de torneios e campeonatos nacionais. 62. O arguido costumava acompanhar os treinos e os jogos de futebol, sobretudo das camadas mais jovens, quer tais eventos acontecessem no Campo de Jogos do AX.A.C., que confina com o edifício do CZ, quer tais eventos se realizassem fora das instalações da AX, onde conheceu o W. 63. O arguido conheceu o pai do W na (…), em (…), onde o mesmo era vendedor. 64. Por forma não apurada, o arguido conseguiu obter o telemóvel do W, o nº (…). 65. No dia 03 de Agosto de 2002, um sábado, às 22.38 horas, o arguido telefonou para o telemóvel do W e começou a perguntar-lhe como era a sua casa, o que estava a fazer, se costumava ver televisão e que programas costumava ver. Perguntou-lhe onde estavam os seus pais e se estava no quarto com a porta fechada. 66. Depois de o menor lhe ter respondido que estava sozinho no quarto e que a porta estava fechada, o arguido perguntou-lhe se já se masturbava, se já “batia punhetas”, se via filmes pornográficos. 67. O arguido A disse ao W para não contar aos pais aquela conversa. 68. O W teve consciência do que é que o arguido queria dizer com aquela conversa, ficou pensativo sobre o que fazer e não contou essa conversa aos pais. 69. No dia seguinte, às 18.54 horas, o arguido voltou a telefonar ao W, para o mesmo telemóvel, perguntando-lhe se estava sozinho e onde é que estava o seu pai, voltando a perguntar-lhe se se costumava masturbar. 70. Na sequência da conversa descrita no ponto "69.”, que antecede, o W pensou que não tinha confiança com o arguido A e que aquilo não era uma conversa normal para um adulto ter com um adolescente. 71. Na segunda-feira seguinte o W contou a conversa ao pai, o qual ficou muito exaltado, tendo o W começado a chorar. 72. Na sequência da conversa que antecede, o pai do W decidiu apresentar queixa contra o arguido, o que fez em 07 de Agosto de 2002. 73. O arguido, voluntariamente, praticou/manteve com todos os então menores e acima referidos, os actos/conversas de natureza sexual que se descreveram, com intenção de satisfazer os seus instintos libidinosos. 74. O arguido actuou sempre de modo voluntário, livre e consciente, bem sabendo serem as condutas que adoptou proibidas por lei penal. 75. O arguido, voluntariamente, aproveitou-se do seu estatuto de funcionário da AX e das funções que aí desempenhava, as quais lhe permitiam uma grande mobilidade e fácil acesso a todos os Lares e (...)s da instituição e, por essa via, um contacto privilegiado com os alunos, para manter com os então menores, que sabia serem alunos internos da AX, T e V os descritos actos de natureza sexual. 76. Ao praticar com o T os actos acima descritos, o arguido actuou ainda com perfeito conhecimento da idade de tal menor e da incapacidade de que tal menor era portador. 77. Também ao praticar com o V os actos acima descritos, o arguido actuou com perfeito conhecimento de que tal menor padecia de um atraso do seu desenvolvimento cognitivo. 78. O arguido sabia que ao manter com os então menor V as mencionadas práticas sexuais, com perfeito conhecimento da idade de tal menor, afectava de forma grave o normal e saudável desenvolvimento psíquico, afectivo e sexual do mesmo. 79. O arguido sabia que ao manter com os então menores T e U as mencionadas práticas sexuais, com perfeito conhecimento das idades de tais menores, afectava de forma grave o normal e saudável desenvolvimento psíquico, afectivo e sexual dos mesmos. 80. O arguido conhecia a idade do menor W e quis manter com ele as conversas com o conteúdo acima referido. 81. Por essa via, ao manter conversas do aludido teor com um menor de apenas 13 anos, o arguido actuou com o propósito, concretizado, de satisfazer os seus instintos libidinosos. 82. O arguido A era tido pelos colegas como um bom funcionários e bom colega, disponibilizando-se para fazer os serviços que lhe pediam. 83. O arguido A foi internado na AX com 4 anos, onde sempre viveu até ter começado a trabalhar na instituição. 84. Não teve vivência e crescimento junto da família. 85. Tem o 6º ano de escolaridade. 86. Não tem antecedentes criminais registados.” Quanto aos factos não provados consignou-se no acórdão recorrido: Relativamente ao processo principal (Processo nº 1718/02.9JDLSB) “II – FACTOS NÃO PROVADOS: 1. O arguido C, na sua qualidade de (...), tinha fácil acesso aos controlos referidos no ponto “25.” dos factos provados, ficando a conhecer o estado de saúde de todos os alunos internos. 1.1. Sem prejuízo do dado como provado no ponto “26.1” dos factos provados, que todas as situações de doença detectadas através dos controlos analíticos ou diagnosticadas em (...) e observações (...)s eram referidas nas reuniões de direcção – (...) ((...) e (...)es (...)s) e Directores dos (...)s. 1.2. Em 22 de Julho de 1982, o Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família, com o comunicado que enviou para a Directoria de (…) da PJ, remeteu relatórios da AX, onde era dito que alguns alunos ali referenciados estavam a ser aliciados “para actividade marginal”, que “constantemente alunos nossos aparecem com bastante dinheiro, afirmando colegas seus que este é proveniente dos “picos” e que “alguns já chegaram a desaparecer durante dias vindo depois a saber-se que tinham estado em casa de um tal Sr. E, nome já nosso conhecido pela sua ligação ao caso de Março p.p.”. 2. Enquanto esteve na AX, ao arguido A foi sempre atribuída a classificação de Muito Bom, à excepção dos anos de 1989 e 1990; 3. Os factos dados como “provados” no “Ponto 66.”, dos “factos provados”, eram assim considerados por “muitos” funcionários da AX . 4. As justificações do arguido A, que o Tribunal deu como provadas no “Ponto 67.”, dos “factos provados”, ocorreram sempre que o arguido esteve ausente da instituição ou demonstrou indisponibilidade para prestar algum serviço; 5. A posição de motorista da (...) dava ao arguido A um “estatuto de facto” diferenciado em relação aos restantes motoristas da AX; 6. O arguido A pelo menos desde os anos 80 e até à altura em que obteve licença para conduzir, conduzia viaturas automóveis da AX, utilizando-as como queria, sem que alguma vez tivesse sido impedido de o fazer. 7. O arguido A, desde o início da década de 80, sujeitou menores, alunos da AX, a práticas sexuais consigo. 8. Nas situações a que se refere o ponto “82.” dos “factos provados”, era “habitual” o arguido A aparecer de surpresa para visitar os menores que ali se encontrassem. (2.1 - Ofendido X, (…)) 9 .Nas circunstâncias descritas no ponto 91.7, dos factos provados, quando o arguido A conversava com o assistente X dava-lhe, semanalmente, cerca de 3 ou 4 mil escudos; 9.1. Os factos descritos nos pontos “91.9” e “91.10”, dos factos provados, ocorreram diariamente. (2.2 – Ofendido AP, (…)) 10. Sem prejuízo do assente no ponto “92.” dos factos provados, AP abandonou a AX em 21 de Agosto de 2000; 10.1. Desde que entrou para a AX AP nunca mais teve qualquer tipo de contacto com os pais. 10.2. AP tinha apenas contactos esporádicos com uma tia avó. (2.3 – Ofendido AV, (…)) 11. Os factos descritos no ponto “93.16” a “93.18.” dos factos provados, ocorreram na casa do arguido A, que então era um barracão situado no interior das instalações do DT. 11.1. Após os factos descritos no ponto 93.18 dos factos provados, o arguido deu ao menor entre 5 a 10 mil escudos em dinheiro. 11.2. O arguido A aproveitou-se de AV para conhecer e angariar outros menores, seus colegas, para os mesmos serem sujeitos a actos de abuso de natureza sexual e confiou que perante este não necessitava de ter as mesmas cautelas relativamente à sua actividade, estando AV a par dos encontros que A organizava, dos menores que contactava. 11.3. Alguns dos arguidos contactavam AV directamente, através do telemóvel que o arguido A lhe tinha dado, marcando encontros com o mesmo. (2.4 – Ofendido Y, (…)) 12. Nas circunstâncias descritas nos pontos “94.8.” a “94.9” dos factos provados, o arguido A baixou as calças e as cuecas ao menor e introduziu-lhe o seu pénis erecto no ânus, aí o tendo friccionado até ejacular. 12.1. Nas circunstâncias descritas no ponto 94.10, dos factos provados, a quantia que o arguido A deu a Y foram moedas de 20 e de 100 escudos e advertiu-o de que não podia contar a ninguém o que se tinha passado, tendo dito expressamente “dou-te dinheiro mas não contes aos teus colegas”. 12.2. De todas as vezes descritas nos pontos 94.11 e 94.12 dos factos provados, o arguido o voltava o menor de costas para si, dobrava-o, introduzia o seu pénis erecto no ânus do mesmo até ejacular. 12.3. Os factos descritos nos pontos 94.11 e 94.12 dos factos provados, ocorreram todos os fins de semana e até Janeiro de 2000. (2.5 – AT, (…)) 13. De cada vez que cumprimentava o menor AT, o arguido A estendia-lhe a mão, com uma nota dobrada, que o menor recebia. 13.1. Dias depois, da ocorrência dos factos referidos nos pontos 95.7 a 95.10 dos factos provados, o arguido, mais uma vez, voltou a chamar o menor à mesma garagem. Aí, mais uma vez o arguido manipulou o pénis do menor e forçou-o a acariciar e a manipular e o seu próprio pénis. 13.2. De seguida, o arguido introduziu o seu pénis na boca do menor, aí o tendo friccionado. 13.3. Após, o arguido baixou as calças do menor, virou-o de costas para si e, dobrando-o para a frente, introduziu-lhe o seu pénis erecto no ânus, aí o tendo friccionado até ejacular. (2.6 – Ofendido AI, (…)) 14. AI ingressou como aluno interno na AX em 16.10.97. 14.1. Após ter sido abandonado pelos pais o AI foi entregue a uma família de acolhimento que, por dificuldades económicas, o internou na AX.; 14.2. A partir do seu internamento na AX, o menor passou a considerar o Lar onde se encontrava internado como “uma estrutura de apoio fundamental”. 14.3. Quando o arguido A travou conhecimento com o AI, nas circunstâncias descritas no ponto “96.8” dos “factos provados”, foi com o objectivo de se relacionar sexualmente com o educando, tendo pedido ao AI que o tratasse por Pai . 14.4. Sem prejuízo do assente no Ponto “96.13” dos factos provados, após os factos descritos no ponto “96.12.” (dos Factos provados) a quantia que o arguido A deu ao AI foram 1.000$00. 14.5. Os actos referidos no ponto “96.15” dos factos provados, repetiram-se três vezes por semana, desde Novembro de 1998 até Julho de 1999 e o ponto onde o AI se encontrava com o arguido A, para ir para casa deste, era sempre ao pé do (…); 14.6. Os actos descritos no ponto “96.16.” dos factos provados, ocorreram até Abril de 2001. 14.7. os actos descritos no ponto “96.16” dos factos provados deixaram de ocorrer em Abril de 2001, depois da instauração do processo disciplinar ao arguido. 14.8. Todos os actos descritos no ponto “96.16” dos factos provados, aconteceram, em regra, três vezes por semana; 15. O arguido A sabia também que o menor AI nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual, para além daquele a que foi pelo mesmo sujeito, aproveitando-se da especial fragilidade, vulnerabilidade e inexperiência do menor, para concretização das práticas sexuais descritas. (2.8 – Ofendido AU, (…)) 16. O arguido A voltou a repetir os comportamento descritos no ponto 98.8. dos factos provados, umas semanas depois, voltando a levar o menor a sua casa. 16.1. Aí, mais uma vez manipulou o seu próprio pénis à frente do menor, tendo depois introduzido o pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado. 16.2. Após aqueles actos, o arguido voltou a dar dinheiro ao menor, em quantia que não foi possível determinar, e disse-lhe para não contar a ninguém o que se passara. (2.9 – Ofendido AQ, (…)) 15. Valendo-se da confiança que foi conquistando, o arguido pediu ao menor que o tratasse por pai, o que este fez, tendo ficado feliz pelo facto de ter alguém, próximo de si, a quem chamar pai e que lhe dava atenção. 15.1. Assim, de forma a não serem vistos juntos, o arguido passou a deixar o menor nas imediações do (...) e a encontrar-se com o mesmo em cafés das imediações, chegando a transportá-lo escondido no interior da carrinha. 15.2. Em dia indeterminado do mês de Janeiro de 2001, tinha o menor 14 anos de idade, depois de o levar a lanchar, já de regresso ao Lar, pediu-lhe que fizesse ao seu pénis o que ele fazia à alavanca das mudanças. O menor, sentindo-se embaraçado e confuso, recusou, não tendo o arguido insistido. 15.3. Uns dias depois, no percurso entre o (...) e o Lar, o arguido perguntou ao menor se tinha pensado na proposta que lhe fizera. O menor ficou atrapalhado, tendo respondido que não sabia como tal se fazia. O arguido estacionou, então, a viatura da AX que conduzia, numa zona perto de (…), e começou a acariciar o pénis do menor, primeiro por cima das calças e depois, metendo a mão por dentro delas, directamente sobre o mesmo, manipulando-o. 15.4. Depois, o arguido pegou na mão do menor e colocou-a sobre o seu próprio pénis, primeiro por cima das calças e depois por dentro destas, dizendo-lhe que fizesse o mesmo que ele lhe fizera. Apesar de perturbado o menor assim fez, tendo manipulado o pénis do arguido. 15.5. Estes factos repetiram-se em mais duas ocasiões, sempre durante os passeios ou boleias que o arguido dava ao menor, no interior das carrinhas da AX que conduzia, tendo em todas elas o arguido manipulado o pénis do menor e este o pénis do primeiro, masturbando-se mutuamente. 15.6. Uns dias depois, o arguido, voltou a dar boleia ao menor na carrinha da AX que conduzia e, levando-o ao mesmo parque de estacionamento, repetiu os comportamentos acabados de descrever, tendo, mais uma vez, manipulado o pénis do menor, masturbando-o e introduzido o seu pénis na boca e no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 16. O arguido A, atenta a notoriedade de alguns dos indivíduos a quem levou educandos da AX, tinha especial cuidado na escolha dos menores que lhes levava. 17. Pelo menos desde os anos 80, o arguido A conhecia os arguidos E e H, aos quais, desde essa época, levava menores da AX a fim de por eles serem sujeitos à prática de tais actos. 18. Estes arguidos conheciam-se, também, desde há longa data, tendo participado, em conjunto, em encontros para a prática de actos sexuais de que foram objecto alunos e ex-alunos da AX. 18.1. Era habitual, desde os anos 80, nas sucessivas casas de que o arguido E teve a disponibilidade, ocorrerem encontros de indivíduos adultos do sexo masculino, para onde o arguido A, a troco de dinheiro, levava menores, alunos da AX, a fim de aí serem sujeitos à prática de actos de natureza sexual. 18.2. O arguido K foi também (…) da AX, passando a ter um acesso incondicionado às instalações da AX. 18.3. Era muito frequente tal arguido assistir aos jogos de futebol que se realizavam nas instalações do AXAC e do CZ, até porque vivia com um jovem que tinha sido aluno da AX e que jogava futebol no AXAC. 18.4. O arguido K conhecia os arguidos E e H desde, pelo menos, o início dos anos 90. 18.5. O arguido N conhecia o arguido A pelo mesmo desde 1996, uma vez que este levava habitualmente menores, alunos e ex-alunos da AX, a casas de que o arguido E tinha a disponibilidade, sitas em (…), a fim de serem por eles sujeitos a actos que incluíam a masturbação, o coito oral e o coito anal. 18.6. O arguido N era visita dessas casas. 18.7. Nelas se encontrando também com o arguido H. 18.8. o arguido N conhecia ainda o arguido C, pelo menos desde 1998. 18.9. Desde meados dos anos 90 os arguidos A, H e E reuniam-se com frequência numa casa denominada “Casa (…)”, sita nas imediações da AX, na (...) (…) nº (…), no (…), em (…). Nesta casa, decorreram na década de 90, encontros de indivíduos adultos do sexo masculino, com a única finalidade de sujeitarem crianças, alunos da AX, à prática de actos sexuais, que ali eram levados, a troco de dinheiro, pelo arguido A. 18.10. Os arguidos C, A, H, K, E e N decidiram unir esforços para poderem, em total reserva, continuar a sujeitar menores de 16 anos a actos sexuais. 18.11. Organizaram-se, então, numa estrutura informal que lhes permitiria obter, sempre que quisessem, mas com toda a segurança, crianças e jovens menores de 16 anos para as suas práticas sexuais. (4.1.1. - Ofendido AP (…)) 19. O arguido C conhecia o menor AP pelo facto de o ter visto numa casa sita na (...) (…) nº. (…), em (…), para onde o menor tinha sido conduzido pelo arguido A, a fim de aí ser sujeito à prática de actos sexuais por outros adultos do sexo masculino, conforme se descreverá nos capítulos seguintes do presente despacho. 19.1. AP não tinha qualquer ligação afectiva forte fora da instituição e o arguido C sabia-o. 19.2. Sem prejuízo do dado como provado no ponto “101.1.” dos factos provados, os mesmos ocorreram em período situado até Outubro de 1999. 19.3. e onde praticamente ninguém ia. 19.4. A quantia que o arguido C deu a AP, aquando dos factos descritos no ponto 101.5, dos factos provados, foi no montante de 3 mil escudos. (4.1.2 - Ofendido AV, (…)) 20. O arguido C conhecia o menor AV desde que este ingressou na AX, conhecendo o seu percurso pessoal e a relação de especial proximidade que o arguido A tinha conseguido estabelecer com aquele. 20.1. Era do seu conhecimento que o menor já havia sido sujeito a práticas sexuais perpetradas pelo arguido A. 20.2. O arguido C conhecia também o desejo especial que o menor acalentava de, tal como o arguido A, vir a ser motorista da AX. O arguido sabia, ainda, que o menor não tinha qualquer ligação familiar ou afectiva estável e contínua fora da AX. 20.3. Conhecia, assim, a sua especial vulnerabilidade e carência afectiva e ainda a sua particular dependência do vínculo que o ligava à AX. 20.4. Sabendo que o menor era da confiança do arguido A, que o levava a outros indivíduos adultos do sexo masculino para sujeitarem o mesmo à prática de actos sexuais, o arguido C passou, ele próprio, a contactar regular e directamente com aquele, combinando encontros, a fim de nele perpetrar actos sexuais. 20.5. A partir do mês de Novembro de 1998, tinha o menor 13 anos de idade, o arguido C passou a contactá-lo para que fosse ter consigo a uma casa, identificada pelas letras (…), sita na (…), perto do (…), em (…), descrita no auto de fls. 3302. 20.6. Tal casa tinha um aspecto exterior descuidado, parecendo abandonada, sem vizinhos, estando situada num um local discreto, isolado e seguro. 20.7. Essa casa era propriedade do arguido HD, que dela se ausentava por largas temporadas devido às suas actividades profissionais. 20.8. Nessas ocasiões, o arguido HD, a solicitação do arguido C, que conheceu em circunstâncias não apuradas, cedia-lhe as chaves dessa casa. 20.9. Quando o menor AV chegava à referida casa, o arguido C já se encontrava no seu interior, à sua espera. 20.10. Era nessas ocasiões que o arguido costumava perguntar ao menor como ia a sua vida e este contava-lhe as suas inquietações e problemas. Dizia-lhe que tinha o sonho de ser motorista da AX e contava-lhe os seus projectos para o futuro. O arguido ouvia-o e prometia ajudá-lo, chegando mesmo a dizer-lhe que quando o mesmo pudesse conduzir lhe ofereceria um carro. 20.11. Uma vez aí, o arguido conduzia o menor para um quarto, onde ambos se despiam e se deitavam na cama. 20.12. De seguida, o arguido dizia ao menor para lhe chupar o pénis, até o mesmo ficar erecto, o que este fazia. 20.12.1. Depois, o arguido introduzia o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando até ejacular. 20.13. Tais factos repetiram-se até Maio ou Junho do ano de 1999, durante cerca de 6 meses, sobretudo aos fins de semana e de quinze em quinze dias. 20.14. A partir de meados do ano de 1999, tais encontros passaram a ser mensais, prolongando-se sensivelmente até Junho de 2001, altura em que o arguido C começou a recear as repercussões do processo disciplinar instaurado ao arguido A. 20.15. Em cada um daqueles contactos sexuais, o arguido entregava ao menor entre 5 e 10 mil escudos ou quantia equivalente em euros. 20.16. Também, durante o ano de 2000, em dia não concretamente apurado, o arguido C disse ao menor AV e pediu-lhe que fosse ter consigo à (...). 20.17. Ali chegado, o menor foi conduzido pelo arguido até uma cave sita no piso inferior ao do vestíbulo de entrada, onde se situam arrecadações pouco frequentadas e escuras. 20.18. Nesse local, o arguido disse ao menor que lhe chupasse o pénis que, entretanto pusera fora das calças que vestia, o que o mesmo fez, introduzindo-o na sua boca e chupando-o. 20.19. Após este acto, o arguido mandou o menor sair, advertindo-o que não deveria falar a ninguém sobre o que se passara. 20.20. O arguido C praticou todos os factos acima descritos valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do facto de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos. 20.21. O menor, conhecendo o cargo que o arguido C detinha na AX, nunca relatou a prática dos actos sexuais de que foi objecto por parte deste arguido, só o tendo feito depois da instauração do presente inquérito, por recear que tal arguido o pudesse prejudicar, impedindo-o de concretizar os sonhos que acalentava. 20.22. O arguido C estava ciente de que, enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 20.23. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava o tornavam conhecido e respeitado pelos alunos, que tinham, relativamente a ele, um manifesto temor reverencial que os impedia de oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 20.24. Foi, aliás, por saber que as funções que exercia na AX, com carácter regular e contínuo, o colocavam em evidente destaque face aos demais e que os alunos receavam os especiais poderes que tais funções lhe conferiam, que decidiu agir pela forma descrita sobre o menor AV. 20.25. Com efeito, o arguido C sabia que o menor AV era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de não ter qualquer vínculo familiar estável fora da Instituição e a quem as pessoas ligadas funcionalmente àquela instituição – especialmente os seus dirigentes – inspiravam autoridade e dever de obediência. 20.26. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se efectivamente, da reverência e do temor que o menor AV tinha por ele e que anulavam totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 20.27. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AV prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 20.28. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe era proibida pela lei penal. (4.1.3 – Ofendido Y, (…)) 21. A viatura a que se refere o ponto 103.2., dos factos provados, era preto. 21.1. Nas circunstâncias descritas nos pontos 103. a 103.19. dos factos provados, Y já conhecia o arguido C, pelo facto do mesmo ser (...) - (...) da AX. e tinha temor em relação ao arguido C, o que anulavam totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 21.2. Nas circunstâncias descritas no ponto 103.5 dos factos provados, o arguido C disse ao menor que se dobrasse em cima da cama, ficando apoiado nas mãos e nos joelhos, com as nádegas viradas para o arguido, que introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 21.3. Nas circunstâncias descritas no ponto 103.7 dos factos provados, a quantia que o arguido deu a Y foram 2 mil escudos. 21.4. Os factos descrito no ponto 103.9 dos factos provados, ocorreram num sábado. 21.5. A cor do carro a que se refere o ponto 103.11 dos factos provados era (…). 21.6. O arguido C praticou todos os factos descritos aproveitando-se da sua qualidade de funcionário da AX e da autoridade que lhe conferia o facto de ser (…)da Instituição, pretendeu valer-se e valeu-se da reverência; 21.7. Nas circunstâncias descritas nos pontos “103.” a “103.26” dos factos provados, o educando Y tinha relativamente ao arguido C um manifesto temor reverencial, que o impedia de opor qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre ele praticava. (4.1.4 – Ofendido AI, (…)) 22. Que nas circunstâncias descritas no ponto “104.”, dos factos provados, a hora e local onde o arguido A combinou encontrar-se com o assistente AI foi “por volta das 15 horas” e “ junto ao (…)”, tendo-lhe dito que precisava que ele “fosse a uma casa”. 22.1. Nas circunstâncias referidas no ponto “104.2.” dos factos provados, o local onde o arguido A recolheu mais menores foi junto ao EY e que o número de rapazes recolhido foi mais 4 (quatro) ou cinco. 22.2. Aquando dos factos descritos no ponto “104.4” dos factos provados, na divisão onde estava o assistente AI e o arguido C estava também um homem adulto e um dos menores; e enquanto o arguido C praticava os factos descritos nos pontos “104.4” e “104.5” dos factos provados, o outro menor que ali se encontrava foi também sujeito a práticas sexuais, perpetradas pelo adulto que o acompanhava. 22.3. Aquando dos factos descritos no ponto “104.4” dos factos provados, o arguido C despiu-se e disse ao menor AI que fizesse o mesmo, tendo acariciado o corpo do AI. 22.4. Após os factos descritos nos pontos “104.4” e “104.5” dos factos provados, o dinheiro que o arguido A deu ao AI foi no montante de 2.000$00. (4.2.1 - Ofendido AK, (…)) 23. Nas circunstâncias descritas no ponto “105.9”, dos factos provados, o veículo que o arguido E conduzia era seu. 23.1. Nas circunstâncias descritas no ponto “105.9”, dos factos provados, o AK recusou, dizendo que tinha medo de ir a casa de desconhecidos. 23.2. Os factos descritos nos pontos “105.11.” a “105.17” dos factos provados, ocorreram em data em concreto não apurada, do mês de Novembro de 1999, num Sábado à noite, tinha o AK completado 13 anos de idade. 23.3. Nas circunstâncias descritas no ponto “105.12.” dos factos provados, o local para onde o AK foi era a casa do arguido E, sita na (...) (…), nº. (…), em (…), tendo sido o arguido E a fazer a proposta para irem para esse local. 23.4. Nas circunstâncias descritas no ponto 105.13 dos factos provados, o arguido E disse a AK que “tinha uma coisa que lhe queria mostrar”, que os seus irmãos já tinham visto. 23.5. Os factos descritos no ponto “105.19.” a “105.23” dos factos provados, ocorreram em dia em concreto não apurado, do mês de Junho do ano 2000, a uma sexta-feira. 23.6. Foi o arguido E que convidou o AK para ir com os seus irmão ao local descrito no ponto “105.19” dos factos provados. 23.7. Na sala o arguido E sentou-se ao lado do menor AK e começou por mexer-lhe nas pernas e no pénis, acariciando-o por cima das calças, dizendo-lhe que no quarto “lhe daria mais dinheiro” e “fariam a mesma coisa”. 23.8. Os factos descritos nos pontos “105.25.” a “105.29.” dos factos provados, ocorreram dias depois, ainda em Junho do ano de 2000. 23.9. Nas circunstâncias descritas no ponto “105.25” dos factos provados, durante o percurso até (…), o arguido E perguntou ao menor se queria ir conhecer a sua casa, tendo este, percebendo as intenções do arguido, respondido que não iria a sua casa porque não gostava de “fazer essas coisas”, insistindo o arguido para que o menor o acompanhasse a uma casa que disse ser sua, onde estavam uns amigos seus que lhe iria apresentar. 23.10. Nas circunstâncias descritas no ponto 105.28 dos factos provados, o adulto que abordou o AK forçou-o a chupar o seu próprio pénis até ficar erecto. 23.11. Nas circunstâncias descritas no ponto 105.29. dos factos provados, a quantia que o arguido E deu a AK foram 6 mil escudos . (4.3.1 – Ofendido AT, (…)) 24. Nas circunstâncias descritas no ponto 106.1., foi o arguido H que contactou com o arguido A. 24.1. O arguido A, nas circunstâncias descritas no ponto 106.2., dos factos provados, utilizou o seu veículo particular de marca (…), de cor (…). 24.2. Nas circunstâncias descritas no ponto 106.1., foi o arguido H que contactou com o arguido A. (4.4.1 – Ofendido AT, (…)) 25. Nas circunstâncias descritas no ponto “107.2.” dos factos provados, AP levou AT a uma casa sita na (...) (…), nº. (…),(…), em (…), onde AP já havia estado, aí tendo sido sujeito à prática de actos sexuais por tal arguido, casa esta que pertencia ao arguido K. 25.1. Nas circunstâncias descritas no ponto 107.3. dos factos provados, AP deixou AT sem que tivesse chegado a entrar na residência. 25.2. Após a prática dos actos descritos o arguido K deu ao menor cerca de 6 mil escudos, tendo este voltado ao (...). 25.3. Posteriormente, o arguido K entregou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, como pagamento por este lhe ter levado o menor AT nas condições descritas. (4.4.2 – Ofendido AI, (…)) 26. Que nas circunstâncias descritas no ponto “108.” dos factos provados, o local onde o arguido A combinou encontrar-se com o assistente AI foi “ junto ao (…)”. 26.1. Nas circunstâncias referidas no ponto “108.1.” dos factos provados, o local onde o arguido A recolheu mais menores foi junto ao EY, os quais eram alunos da AX e que o número de rapazes recolhido foi mais 4 (quatro) ou (cinco). 26.2. Na habitação a que se referem os factos descritos nos pontos “108.1” e “108.2” dos factos provados, o número de total adultos que ali se encontrava era de 4 ou 5 (cinco).. 26.3. Aquando dos factos descritos no ponto “108.3” dos factos provados, a divisão onde estava o assistente AI e o arguido K era uma sala, na qual estava também um homem adulto e enquanto o arguido K praticava os factos descritos nos pontos “108.3” e “108.4” dos factos provados, outro menor que ali se encontrava foi também sujeito a práticas sexuais por um outro adulto que permanecera na sala. 26.4. Após os factos descritos nos pontos “108.3” e “108.4” dos Factos Provados, o AI foi conduzido por um dos outros adultos que se encontrava na casa para um dos quartos da casa e aí tendo sido sujeito, de novo, ao mesmo tipo de práticas sexuais. 26.5. O dinheiro dado pelo arguido A ao assistente AI, nas circunstâncias descritas no ponto “108.5” dos factos provados, foi o montante de “cerca de 2 mil escudos”. (4.4.3 - Ofendido AN, (…)) 27. Em dia não concretamente apurado, mas seguramente situado nos meses de Setembro e Outubro de 1999, o arguido K contactou com o arguido A e pediu-lhe que levasse ao seu (...) um menor da AX, a fim de o sujeitar à prática de actos sexuais consigo. 27.1. O arguido A para satisfazer o pedido do arguido K, contactou, depois das aulas, da parte da tarde, com o menor AN e disse a este para o acompanhar, pois iriam “ali perto”. 27.2. O menor, que à data tinha 12 anos, havia estado já uma vez, levado pelo arguido A, numa casa em (…) a que se fará referência noutro capítulo deste despacho de acusação, aí tendo conhecido o arguido K. 27.3. O arguido, conduzindo uma das carrinhas das da AX, levou o menor ao (...) do arguido K, sito na (…), nºs (…) e (…) , em (…). 27.4. Quando chegaram foram recebidos pelo arguido K, tendo o arguido A abandonado o local depois de ter conversado com o primeiro. 27.5. Depois da saída do arguido A, o arguido K conduziu o menor à sala de (...), tendo-se ambos sentado na marquesa. Perguntou, então, ao menor se “alguém já lhe tinha feito um broche” e se “tinha gostado”, ao mesmo tempo que lhe acariciava o pénis. 27.6. Quando sentiu que o pénis do menor ficou erecto, o arguido K retirou-o para fora, abrindo o fecho das calças e começou a manipulá-lo, masturbando-o. 27.7. Depois, o arguido K introduziu o pénis do menor na boca, chupando-o, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis. 27.8. De seguida, o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 27.9. Depois daquela data e até Novembro de 2000, o menor AN, ainda com 13 anos de idade, deslocou-se, pelo menos, mais quatro vezes àquele (...), mediante prévio contacto estabelecido pelo arguido K com o arguido A. 27.10. Nessas datas, o menor umas vezes foi levado ao (...) pelo arguido A e outras vezes para ali se deslocou sozinho, a mando desse arguido. 27.11. Tal ocorreu sempre aos dias de semana e ao final da tarde. 27.12. No interior do (...), para onde o AN entrava, geralmente através da porta lateral de acesso directo à sala de (...), o arguido K acariciava-lhe o pénis, manipulando-o, depois de o retirar do interior das calças. 27.13. De seguida, o arguido K introduzia o pénis do menor na sua boca, chupando-o, até que o mesmo ejaculasse, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis. Depois, o arguido introduzia o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando até ejacular. 27.14. Sempre que sujeitou o menor à prática dos actos descritos, pelo menos cinco vezes, no seu (...), o arguido K deu ao mesmo quantias que variavam entre 5 e 10 mil escudos. 27.15. Durante o período de tempo em que ocorreram os actos supra descritos, o menor AN, deslocou-se também, pelo menos duas vezes, à residência do arguido K, sita na (...) (…), nº (…), no (…), em (…) e, pelo menos, outras duas vezes à residência sita na (...) (…), nº (…),(…), em (…). 27.16. Tais deslocações eram, também, sempre, precedidas de contactos que o arguido K estabelecia com o arguido A, pedindo-lhe que aí conduzisse o menor com vista a com ele manter actos sexuais. 27.17. O arguido A contactava então com o menor AN e levava-o às referidas residência, sempre em dias de semana, ao fim da tarde. Geralmente o arguido A utilizava para o transporte do menor uma das viaturas da AX que habitualmente conduzia. 27.18. Nessas casas o arguido K, o arguido K acariciava-lhe o pénis, manipulando-o depois de o retirar do interior das calças. 27.19. De seguida, introduzia o pénis do menor na sua boca, chupando-o, até que o mesmo ejaculasse, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis. 27.20. Depois, o arguido introduzia o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando até ejacular. 27.21. Sempre que sujeitou o menor à prática dos actos descritos, o arguido K deu ao mesmo quantias que variavam entre 5 e 10 mil escudos. 27.22. Como contrapartida por o arguido A ter conduzido ao seu (...) e às suas casas o menor, para que com ele praticasse os actos supra descritos, o arguido K entregou ao primeiro uma quantia em dinheiro, em montante não apurado. 27.23. O arguido K sabia que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 27.24. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 27.25. O arguido K tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AN prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 27.26. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 27.27. O arguido A conhecia a idade do menor AN quando, nas circunstâncias descritas, o abordou, o levou ou ordenou que se dirigisse ao (...) e às residências referidas à presença do arguido K, para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito anal e coito oral. 27.28. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual, uma vez que o ascendente que tinha sobre o menor, o impedia de lhe desobedecer. 27.29. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (4.4.4 – Ofendido AC, (…)) 28. No (...) da (...) (…), durante o ano de 1997, o arguido K observou, pelo menos mais quatro vezes, para além das referidas no ponto !110.3.” dos factos provados, o menor AC; 28.1. Sem prejuízo do dado como provado, nos pontos “110.3” e “110.4” dos factos provados, durante todas as (...), o arguido K dizia ao menor AC, a quem mandava despir as calças e as cuecas, que se deitasse na marquesa e manipulava-lhe o pénis, enquanto, simultaneamente, o menor mexia no pénis do primeiro, a seu pedido, também até à ejaculação. (5.1 – Ofendido X, (…)) 29. Os factos descritos nos pontos “111.” a “111.3.”, dos factos provados, ocorreram em mais três ocasiões, até 6/04/99 e ocorreram também no (...) do arguido K sito na (…), nºs. (…) e (…), em (…); 29.1. Nas circunstâncias descritas no ponto “111.3.” dos factos provados, o montante que o arguido A entregava a X era 5.000$00; (5.2.1 - Ofendido AP, (…)) 30. Depois o arguido K introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 30.1. Após a prática dos actos referidos no ponto 112.3., dos factos provados, a quantia que o arguido K deu a AP foi cerca de 2.000$00. (5.2.2 - Ofendido AP, (…)) 31. Em data em concreto não apurada, mas próxima à dos factos supra descritos, e ainda em meados do ano de 1998, o arguido A foi, novamente, contactado pelo arguido K que lhe pediu que levasse à sua residência, a (...) sita (...) (…), nº. (…),(…),(…), menores da AX a fim de os sujeitar à prática de actos sexuais. 31.1. O arguido A, mandou o menor AP, à data com 13 anos de idade, juntamente com outro menor, cuja identidade não se apurou, dirigir-se à residência do arguido K, tendo-lhe fornecido a morada e dado as indicações relativa ao transporte (autocarro) que deveria utilizar. 31.2. O AP, obedecendo ao que lhe fora determinado pelo arguido A, foi, na companhia de outro menor da AX, à referida residência, onde os aguardava o arguido K. 31.3. O arguido K conduziu o AP e o outro menor a um quarto onde manipulou os pénis dos menores, enquanto acariciava o seu próprio pénis. Seguidamente, o arguido K colocou o seu pénis na boca do AP e disse a este que o chupasse, o que o menor fez. 31.4. Depois, introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 31.5. Após terem sido sujeitos a tais actos, o AP e o outro menor regressaram à AX. 31.6. Posteriormente o arguido A entregou ao AP 5 mil escudos, pelo facto de o mesmo ter ido à residência do arguido K, para que este o sujeitasse à prática de actos sexuais. 31.7. O arguido K pagou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, como pagamento por este lhe ter entregue o menor AP para a prática dos actos descritos. 31.8. O arguido A conhecia a idade do menor AP quando o abordou e lhe disse que fosse, nas circunstâncias descritas, até à residência referida, à presença do arguido K. 31.9. Sabia que, mercê da sua intervenção, o menor AP seria sujeito a actos de índole sexual que incluíam coito anal, coito oral e actos de masturbação. 31.10. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual e que o ascendente que tinha sobre o menor AP, impediria este de lhe desobedecer. 31.11. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática do acto descrito, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património. (Ponto 5.2.3. do despacho de Pronuncia – AP) 32. Em datas em concreto não apuradas, entre finais do ano de 1997 e Setembro do ano de 1999, o arguido A levou o menor AP, pelo menos duas vezes, a uma residência sita na (...) (…), numa fracção do prédio correspondente ao Lote (…), nº. (…), em (…), a pedido do arguido H, a fim de aí, o sujeitar à prática de actos sexuais. 32.1. O arguido A, nessas ocasiões, conduzia o menor até à residência referida, onde entrava por breves momentos e recebia do arguido H um envelope com dinheiro, como pagamento por aquele arguido lhe entregar a fim de ser alvo de práticas sexuais, o AP. 32.2. No interior de tal residência o arguido H manipulava o pénis do AP, enquanto este, a pedido daquele, manipulava também o pénis do primeiro. O arguido H colocava também o seu pénis na boca do AP, de forma a que o mesmo o chupasse, o que o menor fazia. Depois o arguido H introduzia o seu pénis erecto no anus do menor, aí o friccionando até ejacular. 32.3. O AP era levado de regresso ao seu (...), pelo arguido A que o aguardava no exterior do edifício. 32.4. Na primeira das referidas ocasiões o menor AP contava 13 anos de idade, sendo que na última já tinha completado 14 anos. 32.5. Os factos descritos nos pontos “32.” a “32.4.” que antecedem, ocorreram em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e princípio de Abril de 2000, tinha AP 15 anos de idade. 32.6. O arguido A conhecia a idade do AP quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até á residência sita na (...) (…), à presença do arguido H para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito oral e coito oral. 32.7. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 32.8. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática dos actos descritos, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património. 33. Em igual período temporal, entre finais do ano de 1997 e Setembro do ano de 1999, pelo menos por duas vezes, o AP foi também conduzido pelo arguido A, a pedido do arguido H, ao Teatro (…), localizado junto à (…). 33.1. Tal como sucedia quando o menor era conduzido à casa da (...) (…), o arguido H entregava ao arguido A quantias em dinheiro não determinadas, como pagamento por este levar a tal teatro o menor AP a fim de ser alvo de práticas sexuais por aquele arguido. 33.2. No interior do teatro, o arguido H manipulava o pénis do AP, enquanto este manipulava também o pénis daquele. O arguido H colocava o seu pénis na boca do AP, de modo a que este o chupasse, o que o menor fazia. Depois, o arguido H introduzia o seu pénis erecto no ânus do AP, aí o friccionando até ejacular. 33.3. Após a prática de tais actos, o AP era conduzido de regresso ao seu (...) pelo arguido A, que ficava à sua espera nas imediações de tal teatro. 33.4. Na primeira das referidas ocasiões o menor AP contava 13 anos de idade, sendo que na última já tinha completado 14 anos 33.5. O arguido A conhecia a idade do AP quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até ao Teatro (…), à presença do arguido H para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito oral e coito oral. 33.6. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 33.7. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática dos actos descritos, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património. 34. Nas circunstâncias descritas no ponto “117.”, dos factos provado, foi o arguido A que levou o AP ao (…), em (…), onde o aguardava o arguido H. 34.1. Nas circunstâncias descritas no ponto “117.”, dos factos provado, foi o arguido H que havia contactado previamente com o arguido A a quem pedira que lhe levasse um menor da AX para com ele ter práticas sexuais. 34.2. Nas circunstâncias descritas no ponto “117.1.”, a casa para onde o AP foi era uma casa de que o arguido E tinha a disponibilidade, o qual tinha combinado com o arguido H que lhe cederia tal casa, a fim de o segundo aí sujeitar a práticas sexuais o menor AP, tendo saído da casa quando o arguido H chegou. 34.3. O arguido E ao ceder, nas circunstâncias descritas, ao arguido H, a casa referida, de que tinha a disponibilidade, sabia que a mesma se destinava, exclusivamente, a que o segundo ali mantivesse práticas de natureza sexual, nomeadamente masturbação, coito oral e coito anal, com o AP, que sabia ser menor de 14 anos. 34.4. Sabia também que a disponibilização da referida casa permitiria mais facilmente ao arguido H concretizar as práticas sexuais descritas, levando a tal residência o menor AP sem correr o perigo de ser visto e identificado. 34.5. O arguido E agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal. (5.3 –Ofendido AV,) 35. O arguido A, em data indeterminada do final do ano de 1998, ao fim do dia, decorrido pouco tempo desde que sujeitara o menor AV à pratica de actos sexuais, levou este, então com 13 anos de idade, juntamente com outros menores da AX, ao (...) do arguido K, sito na (…), em (…). 35.1. O arguido K contactara previamente com o arguido A, tendo-lhe pedido que levasse ao seu (...) alguns menores da AX, a fim de os sujeitar a práticas sexuais. 35.2. O AV, juntamente com os outros menores, entrou no (...) do arguido K pela porta lateral, tendo sido o primeiro menor a ser conduzido, pelo arguido K, à sala de (...). 35.3. No interior de tal sala, o arguido K manipulou o pénis do menor e chupou-o, tendo-o colocado na sua boca. Seguidamente, o arguido K introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 35.4. Posteriormente, em data em concreto não determinada, no início do ano de 1999, o arguido K pediu, mais uma vez, ao arguido A que levasse ao seu (...) um menor da AX a fim de o sujeitar a práticas sexuais. 35.5. O arguido A, satisfazendo tal pedido referido, levou, mais uma vez, o AV, ainda com 13 anos de idade, ao (...) daquele arguido K. 35.6. Aí, o arguido K, novamente, manipulou o pénis do menor e chupou-o, tendo-o colocado na sua boca e introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 35.7. O arguido K pagou ao arguido A uma quantia não determinada em dinheiro, por este lhe ter entregue o menor AV para que praticar os actos sexuais descritos nas situações referidas. 35.8. O arguido A conhecia a idade do AV quando o abordou e o levou, nas circunstâncias descritas, até ao (...) referido, à presença do arguido K para que este sujeitasse o menor a actos de índole sexual que incluíam masturbação, coito oral e coito oral. 35.9. Era ainda do conhecimento do arguido A que a sua conduta era determinante e essencial para a concretização de tais actos de índole sexual. 35.10. O arguido A agiu por forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei penal, com o propósito de receber, como contrapartida da prática dos actos descritos, quantias em dinheiro que fez ingressar no seu património. 36. O arguido N primava pela discrição 36.1. A arguida Q conhecia também o arguido A, sabendo, inclusivamente, que o mesmo se deslocava com frequência à (…), de onde era natural uma das suas vizinhas. 36.2. Quando o arguido N contactou a arguida Q para que lhe disponibilizasse a utilização da referida (...), pediu-lhe que a própria e os seus familiares saíssem da mesma quando chegassem os adultos e os menores levados pelo arguido A, recomendando-lhe que não falasse daqueles encontros a ninguém. 36.3. Quando se reuniam na residência da arguida Q, os arguidos C, E, H e K deixavam os veículos automóveis em que se faziam transportar estacionados em locais um pouco distantes da referida (...), de forma a evitar que se levantassem quaisquer suspeitas. 36.4. O arguido A utilizava, em regra, nas suas deslocações, o (…) de cor (…) e com a matrícula (…), propriedade da AX. 36.5. Era o arguido A que dizia aos menores que se justificassem perante os respectivos educadores, dizendo que iam ao cinema e a jogos ou treinos desportivos. 36.6. Em (…) o arguido A ordenava aos menores que o acompanhavam que se dirigissem individualmente e não em grupo até à referida casa. 36.7. Antes de abandonar a residência da arguida Q, o arguido N entregava-lhe sempre dinheiro, como pagamento por a mesma ter disponibilizado a sua casa para que nela ocorressem as práticas sexuais sobre os menores, alunos da AX, que para aí eram levados pelo arguido A. 6.2.1 - Ofendido AN, (…) 37. Umas semanas depois, em dia indeterminado, dos meses de Fevereiro/Março do ano de 2000, o arguido A voltou a contactar AN, marcando-lhe encontro para o Sábado seguinte junto das garagens do CZ. 37.1. Quando o menor ali chegou verificou que no local, e além do A, se encontravam os menores AP, AT e AV. Entraram na carrinha da AX que o A conduzia, tendo parado junto ao (…) onde recolheram mais três ou quatro menores. Deslocaram-se para (…), tendo o arguido A estacionado a carrinha nas imediações da (...) da (...) (…), n.º (…) que o menor já conhecia. 37.2. A porta foi aberta pelo arguido N e, no seu interior, encontravam-se os arguidos K, E, H e C e mais três ou quatro adultos do sexo masculino cuja identidade não foi possível apurar. 37.3. Depois de os menores terem entrado na (...), o arguido N entregou ao arguido A um envelope com dinheiro, como pagamento pelo facto de o mesmo aí ter conduzido os menores da AX, a fim de serem sujeitos à prática de actos sexuais, abandonando este arguido de seguida a residência. 37.4. De seguida os adultos mandaram os menores despirem-se tendo todos eles, incluindo os arguidos H, K, E, C e N agarrado nos pénis dos mesmos, manipulando-os. 37.5. O arguido N escolheu o menor AN, que levou para um dos quartos. Aí o arguido acariciou o pénis do menor e manipulou-o. Depois, o arguido colocou na sua boca o pénis do menor, chupando-o até que este ejaculou, tendo o menor, por sua vez, colocado o pénis do arguido na sua boca, chupando-o. A seguir o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor aí o tendo friccionado até ejacular. 37.6. No final e depois de se vestirem os menores abandonaram a casa e dirigiram-se ao arguido A que os aguardava junto da carrinha onde os transportou de regresso a (…). 37.7. O arguido abriu o envelope que tinha recebido e entregou uma quantia de dinheiro a cada um dos menores. 37.8. O arguido A voltou a transportar o menor à casa de (…), cerca de duas vezes por mês, aos sábados à tarde e até Outubro de 2000. A última vez que o menor foi àquela casa, ainda não tinha completado 14 anos. 37.9. Em todas essas ocasiões, e à excepção de quatro vezes no período da Páscoa do ano de 2000, o arguido N escolheu o menor AN, que levou para um dos quartos. 37.10. Aí o arguido acariciou o pénis do menor e manipulou-o. Depois, o arguido colocou na sua boca o pénis do menor, chupando-o até que este ejaculou, tendo o menor, por sua vez, colocado o pénis do arguido na sua boca, chupando-o. A seguir o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor aí o tendo friccionado até ejacular. 37.11. Em todas essas ocasiões a porta da casa supra referida foi aberta pelo arguido N, o qual entregava um envelope contendo dinheiro ao arguido A, como pagamento por este conduzir a essa casa menores da AX para aí serem sujeitos a abusos sexuais. 37.12. Igualmente, sempre que o menor AN, esteve na referida casa, quando o arguido N aí se encontrava, este entregou à arguida Q dinheiro, em quantias não apuradas, como pagamento pelo facto de a mesma ter disponibilizado a sua residência, deixando-a, nessas ocasiões, desocupada, para que aí os menores da AX fossem sujeitos à prática de actos sexuais, conforme combinara com o arguido N. 37.13. No interior da referida casa encontrava-se, pelo menos em duas ocasiões, o arguido C que o menor conhecia pelo facto de aquele ser o (...)- (...) da AX. 37.14. Este arguido sabia que o menor era aluno da AX e que havia sido levado pelo arguido A à referida casa, com a finalidade de ser sujeito aos actos sexuais que acima se descreveram pelos adultos que ali se encontravam. 37.15. O arguido C podia ter impedido que o menor AN sofresse os actos sexuais descritos praticados pelo arguido N, e nada fez. 37.16. Os arguidos H, K, E e C sabiam que o AN cujo pénis manipularam, nas circunstâncias descritas tinha idade inferior a 14 anos e que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 37.17. Os arguidos H, K, E e C tinham perfeito conhecimento de que o acto de natureza sexual a que submeteram o menor AN prejudicava o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influía negativamente na formação da respectiva personalidade. 37.18. Agiram de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. 37.19. Apesar de se encontrar no local, nas duas ocasiões que se referiram, o arguido C não impediu que o menor AN, aluno da AX, que conhecia pessoalmente e sabia ter 13 anos, se tivesse encontrado com o arguido N e que fosse, por este último, sujeito aos actos sexuais que atrás se descreveram. 37.20. O arguido C podia e tinha o particular dever de impedir a concretização das referidas práticas sexuais sobre o menor AN e, com vontade livre e consciente, nada fez, sabia que a lei penal prevê e pune tal comportamento. (6.3.1 – Ofendido AV, (…)) 38. Em dia indeterminado de Fevereiro/Março de 2000, a um Sábado, o arguido A levou, num dos carros da AX que habitualmente conduzia, à residência sita na (...) (…), n.º (…), o menor AV, à data com 14 anos de idade. 38.1. Nesse dia, o arguido A levou também à referida residência, além do AV, outros menores, entre os quais AP, AT e AN. 38.2. O arguido A e os menores entraram na referida casa, cuja porta foi aberta pelo arguido N. 38.3. O arguido N entregou um envelope com dinheiro ao arguido A, como pagamento pelo facto de o mesmo ter conduzido a tal casa os menores alunos da AX para, aí, serem sujeitos à prática de actos sexuais, abandonando este arguido, de seguida a residência. 38.4. No interior da casa estavam vários adultos do sexo masculino, entre os quais o arguido C, que já conhecia o menor AV e a quem tinha sujeitado à prática de actos sexuais, conforme já se descreveu, noutro capítulo deste despacho de acusação. 38.5. O arguido C escolheu o menor AV levando-o para um dos quartos da referida (...). 38.6. Aí, o arguido C despiu-se e disse ao menor que o masturbasse. Então o menor acariciou-lhe e manipulou-lhe o pénis. 38.7. De seguida, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor e ordenou-lhe que o chupasse, o que o menor fez. 38.8. Depois, disse ao menor que se dobrasse e introduziu-lhe o pénis erecto no ânus aí o tendo friccionado até ejacular. 38.9. Os menores, após a prática dos actos descritos, vestiram-se, saíram da residência e dirigiram-se à viatura da AX onde o arguido A os aguardava, tendo entregue a cada um cerca de 10 mil escudos. 38.10. Nesta ocasião, como habitualmente, o arguido N entregou à arguida Q dinheiro, em quantia não apurada, como pagamento pelo facto de a mesma ter disponibilizado a sua residência, deixando-a desocupada, para que aí os menores da AX fossem sujeitos à prática de actos sexuais, conforme combinara consigo. 38.11. O arguido C estava ciente de que, enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 38.12. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava o tornavam conhecido e respeitado pelos alunos, que tinham, relativamente a ele, um manifesto temor reverencial que os impedia de oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 38.13. Foi, aliás, por saber que as funções que exercia na AX, com carácter regular e contínuo, o colocavam em evidente destaque face aos demais e que os alunos receavam os especiais poderes que tais funções lhe conferiam, que decidiu agir pela forma descrita sobre o menor AV. 38.14. Com efeito, o arguido C sabia que o menor AV era um aluno interno da AX, nesta admitido em virtude de não ter qualquer vínculo familiar estável fora da Instituição e a quem as pessoas ligadas funcionalmente àquela instituição – especialmente os seus dirigentes – inspiravam autoridade e dever de obediência. 38.15. Foi por de tal ter conhecimento que o arguido agiu pela forma acima descrita, assim se valendo da reverência e do temor que o menor AV tinha por ele e que anulavam totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 38.16. O menor, conhecendo o cargo que o arguido C detinha na AX, nunca relatou a prática dos actos sexuais de que foi objecto por parte deste arguido, só o tendo feito depois da instauração do presente inquérito, por recear que tal arguido o pudesse prejudicar. 38.17. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AV prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 38.18. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe era proibida pela lei penal. 39. Conforme se descreve noutro capítulo deste despacho, a partir de data em concreto não apurada, da primeira metade do ano de 1999, o arguido A passou a levar o menor Y, que à data tinha 13 anos, à casa sita na (...) (…), em (…). 39.1. O menor Y, foi levado, juntamente com outros menores, pelo arguido A à referida casa quatro vezes, a última das quais ocorreu em dia indeterminado de finais do ano de 2000. 39.2. Na primeira vez que o menor esteve em tal casa encontravam-se no seu interior os arguidos N, que abriu a porta, C, E e H. 39.3. Nessa ocasião o menor foi abordado pelo arguido C que o conduziu a um dos quartos da referida casa. 39.4. Aí, o arguido C manipulou o pénis do menor, enquanto o menor, obedecendo ao que lhe era dito, manipulava também o pénis do primeiro. 39.5. Depois, o arguido C introduziu o seu pénis na boca do menor Y, tendo-o este chupado. 39.6. Seguidamente, o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 39.7. Após ter sujeitado o menor Y à prática dos descritos actos, o arguido C saiu do quarto e chamou o arguido H. Quando este entrou no quarto o arguido C retirou-se, ficando o menor a sós com aquele. 39.8. O arguido H manipulou, então, o pénis do menor Y e pediu ao mesmo que, por sua vez, manipulasse o seu. Depois, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. 39.9. Seguidamente, o arguido H introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 39.10. Após a prática dos actos descritos o menor, juntamente com os outros menores que haviam sido conduzidos pelo arguido A à (...) supra referida, abandonaram-na, tendo sido transportados de regresso a (…) pelo arguido A. Então este arguido entregou ao menor Y entre 5 e 8 mil escudos. 39.11. Na última vez que o menor Y foi levado pelo arguido A à referida casa em (…), tinha o menor 14 anos de idade, encontravam-se, também, no seu interior os arguidos C e N. 39.12. Nessa ocasião, o menor Y foi novamente encaminhado para a sala, onde, foi abordado pelo arguido N que o conduziu a um dos quartos da (...). 39.13. Aí, o arguido N manipulou o pénis do menor, enquanto o menor, obedecendo ao que lhe era pedido, manipulava também o pénis do primeiro. Depois, o arguido introduziu o seu pénis na boca do menor Y, de forma a que este o chupasse. Seguidamente, o arguido N introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 39.14. Após ter sujeitado o menor Y à prática dos descritos actos, o arguido N saiu do quarto, onde entrou, de seguida, o arguido C. 39.15. O arguido C manipulou, então, o pénis do menor Y e pediu ao mesmo que, por sua vez, manipulasse o seu. 39.16. Depois, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. 39.17. Seguidamente, o arguido C introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 39.18. Após a prática dos actos descritos o menor, juntamente com os outros menores que aí haviam sido conduzidos pelo arguido A, abandonaram a referida casa, tendo sido transportados a (…) pelo arguido A. Então este arguido entregou ao menor Y entre 5 e 8 mil escudos. 39.19. Nas duas ocasiões que se acabaram de descrever, o arguido N, como pagamento pelo facto de o arguido A ter levado a tal residência os menores, alunos da AX, entre os quais o menor Y, a fim de aí serem sujeitos à prática de actos sexuais, entregou ao segundo um envelope contendo dinheiro, em montante, em concreto, não determinado. 39.20. Também à arguida Q, nessas duas ocasiões, o arguido N pagou uma quantia não determinada pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, os menores da AX fossem sujeitos à prática de actos sexuais perpetrados pelos adultos que aí se deslocaram, entre os quais os arguido referidos. 39.21. O menor Y esteve ainda em duas outras ocasiões na casa supra descrita, conforme se descreverá noutro capítulo do presente despacho de acusação. 39.22. O arguido C estava ciente de que as funções que desempenhava na AX o tornavam conhecido e respeitado pelos alunos, que tinham, relativamente a ele, um manifesto temor reverencial que os impedia de oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava; e foi por saber que as funções que exercia na AX, com carácter regular e contínuo, o colocavam em evidente destaque face aos demais e que os alunos receavam os especiais poderes que tais funções lhe conferiam, que decidiu agir pela forma descrita sobre o menor Y em (…), sabendo que lhe anulava totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 39.23. Y conhecia o cargo que o arguido C detinha na AX, nunca relatou a prática dos actos sexuais de que foi objecto por parte deste arguido, só o tendo feito depois da instauração do presente inquérito, por recear que tal arguido o pudesse prejudicar. 39.24. O arguido C tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor Y em (…) prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe era proibida pela lei penal. (6.4.1 - Ofendido AN, (…)) 40. Em datas próximas da Páscoa do ano de 2000, em concreto não determinadas, aos sábados, o menor AN, então com 13 anos de idade, foi levado, juntamente com outros menores alunos da AX, pelo arguido A, numa das carrinhas da Instituição, à referida casa. 40.1. Nessas quatro ocasiões, a porta foi aberta pelo arguido N, tendo os menores entrado no interior da (...), onde o menor AN foi abordado pelo arguido E que ali se encontrava. 40.2. Depois, na sala da referida casa, o arguido E e o menor AN despiam-se, após o que se acariciavam mutuamente, manipulando o arguido E o pénis do menor. 40.3. O arguido E colocava, de seguida, o seu pénis na boca do menor, para que este o chupasse, o que o menor fazia. 40.4. Seguidamente, o arguido introduzia o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando até ejacular. 40.5. Após ser sujeito a tais práticas sexuais, o menor AN abandonava a (...), sendo conduzido numa carrinha da AX de regresso a (…), pelo arguido A que, já no interior da mesma, lhe entregava dinheiro, entre 5 e 6 mil escudos. 40.6. Nessas quatro ocasiões, o arguido N entregou ao arguido A um envelope com dinheiro pelo facto deste ali ter conduzido o menor AN e os outros menores da AX que o acompanhavam, para ali serem sujeitos a actos sexuais. 40.7. O arguido N entregou, posteriormente à arguida Q, uma quantia em dinheiro não determinada, pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, o menor AN e os outros menores que o acompanhavam fossem sujeitos à prática de actos sexuais. 40.8. O arguido E sabia que o menor que sujeitou à prática dos actos sexuais descritos tinha idade inferior a 14 anos. 40.9. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 40.10. O arguido E tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AN prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 40.11. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. (6.5.1 - Ofendido AT, (…)) 41. O arguido H sabia também que o menor AT nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual, fora do contexto das práticas sexuais a que fora sujeito por si e por outros seus co-arguidos, aproveitando-se da especial fragilidade, vulnerabilidade e inexperiência do menor, para concretização das práticas sexuais descritas. 41.1. O arguido N entregou, posteriormente à arguida Q, uma quantia em dinheiro não determinada pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, o menor AT fosse sujeito à prática dos actos sexuais pelo arguido H que se descreveram. (6.7.1 – Ofendido AT, (…)) 42. Em dia indeterminado dos meses de Fevereiro/Março do ano de 2000, o arguido A combinou com o menor AT, então com 13 anos de idade, encontrar-se com o mesmo no Sábado seguinte junto das garagens do CZ. 42.1. Nesse dia, o menor dirigiu-se às garagens do (...) onde já se encontravam o arguido A, acompanhado por três colegas seus, o AP, o AN e o AV. Dirigiram-se à carrinha de cor (…) da AX que o arguido habitualmente conduzia e, nas imediações de outros (...)s da AX, recolheram outros dois menores, alunos da Instituição. 42.2. Dirigiram-se, então, a (…), tendo o arguido A estacionado a viatura nas imediações da (...) já referida. 42.3. O arguido A acompanhado pelos menores bateu à porta que foi aberta pelo arguido N. 42.4. No seu interior encontravam-se também os arguidos C, H, K e E. 42.5. O arguido N mandou os menores despirem-se, tendo cada um dos arguidos presentes mexido sucessivamente nos pénis dos menores, manipulando-os. 42.6. Após a prática destes actos, chegou o A a quem o arguido N entregou um envelope, contendo dinheiro, como pagamento pelo facto de aquele ali ter levado os menores alunos da AX a fim de serem sujeitos a práticas sexuais pelos arguidos referidos. 42.7. Abandonaram a casa, regressando a (…) na viatura conduzida pelo A que os levou de volta aos respectivos (...)s. O arguido A à saída daquela (...) ou durante o trajecto abriu o envelope que tinha recebido do arguido N e entregou dinheiro aos menores, tendo o menor AT recebia entre 5 e 6 mil escudos. 42.8. Num Sábado indeterminado dos meses de Julho/Agosto do ano de 2000, o menor, então com 13 anos de idade, transportado pelo arguido A numa carrinha da AX, voltou à (...) de (…), cuja porta foi novamente aberta pelo arguido N. 42.9. No interior da residência encontrava-se também o arguido E. 42.10. O arguido N mandou os menores despirem-se, tendo os arguidos presentes mexido sucessivamente nos pénis dos menores, manipulando-os. 42.11. Após os actos descritos, o arguido N entregou um envelope ao arguido A, contendo dinheiro, como pagamento pelo facto de aquele ali ter levado os menores alunos da AX a fim de serem sujeitos a práticas sexuais pelos arguidos referidos. 42.12. No caminho o arguido A abriu o envelope e deu dinheiro a cada um dos menores, tendo o AT recebido uma quantia entre 5 e 6 mil escudos. 42.13. Quando chegaram a (…) e o arguido deixou o menor próximo do respectivo (...). 42.14. O arguido N entregou, posteriormente à arguida Q, uma quantia em dinheiro não determinada pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa, nas duas ocasiões descritas, para que, no seu interior, o menor AT fosse sujeito à prática dos actos sexuais que se relataram. 42.15. Os arguidos N, E, C, H e K sabiam que o menor que sujeitaram à prática do acto sexual descrito – manipulação do pénis - tinha idade inferior a 14 anos. 42.16. Sabiam, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos de que foi vítima. 42.17. Os arguidos referidos tinham perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteram o menor AT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 42.18. Agiram de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas eram proibidas pela lei penal. (6.7.2 - Ofendido AI, (…)) 43. O encontro a que se refere o ponto “125.” dos factos provados, foi para “ o sábado seguinte, depois de almoço”. 43.1. No dia a que se referem os factos descritos nos pontos “125.” a “125.5” dos factos provados, a carrinha que o arguido A levou para (…) era a da marca (…). 43.2. No local a que se refere o ponto “125.”, dos factos provados, o número de menores que ali estavam eram quatro e todos alunos da AX. 43.4. Aquando do referido no ponto “125.5” dos factos provados, foi o arguido H que disse aos menores para se sentarem. NP 43.5. Após o referido no ponto “125.5” dos factos provados, os adultos disseram aos jovens para abandonarem a casa um a um. 43.6. Após o regresso de (…), na sequência dos factos descritos no ponto “125.5.” dos factos provado, a quantia em dinheiro que o arguido A deu ao AI foram 5 mil escudos. 43.7. Na ocasião em que ocorreram os actos sexuais descritos nos pontos “125” a “125.5.” dos factos provados, o arguido N entregou, posteriormente à arguida Q, uma quantia em dinheiro não determinada pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, tivessem lugar práticas sexuais entre adultos do sexo masculino e menores, alunos da AX. 44. A arguida Q, ao ceder a utilização da sua casa, em todas as ocasiões e circunstâncias descritas nos pontos “125.5.” a “125.11” dos factos provados, não sabia quais os actos sexuais em concreto praticados. 44.1. A contrapartida da arguida Q, pela cedência da sua casa nas circunstâncias descritas nos factos “123.5.” a “125.11” dos factos provados, foram quantias em dinheiro. 44.2. Sabia que a disponibilização da referida casa permitiria mais facilmente aos arguidos referidos concretizarem as práticas sexuais descritas, porquanto, atenta a localização do imóvel, os mesmos não correriam o perigo de serem vistos e identificados. (7.1 - Ofendido X, (…)) 45. Entre finais do ano de 1998 e Abril do ano seguinte, o arguido A levou o menor X, então com 15 anos de idade, um número indeterminado de vezes, pelo menos em duas ocasiões, à (...) nº. (…) da (...) (…), em (…), propriedade da arguida Q, a fim de tal menor, juntamente com outros menores da AX, aí ser sujeito à prática de actos sexuais pelos arguidos destes autos e/ou outros adultos do sexo masculino não identificados que se encontrassem em tal residência. 45.1. No interior da residência, nas ocasiões em que aí foi levado pelo arguido A, o menor X foi sujeito a abusos sexuais perpetrados, nomeadamente, pelos arguidos H e N. 45.2. Nas ocasiões em que foi alvo de actos sexuais perpetrados pelo arguido H, este colocou o seu pénis na boca do X, de modo a que este o chupasse e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado até ejacular. 45.3. Nas ocasiões em que foi alvo de actos sexuais perpetrados pelo arguido N, este colocou o seu pénis na boca do X, de modo a que este o chupasse e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado até ejacular. 45.4. O arguido A, nas ocasiões em que levou à casa de (…) o menor X, juntamente com outros menores, recebeu um envelope com dinheiro, em montante que não foi possível determinar, entregue pelo arguido N, como pagamento por ter conduzido à casa mencionada esses menores, a fim de, aí, serem sujeitos à prática de actos sexuais. 45.5. Em todas as ocasiões em que ocorreram os actos sexuais acima descritos, o arguido N entregou, posteriormente à arguida Q, uma quantia em dinheiro que não foi possível determinar, pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, tivessem lugar práticas sexuais entre adultos do sexo masculino e menores, alunos da AX. (7.2 – Ofendido AP, (…)) 46. Nos anos de 1999 e 2000, até Agosto deste último ano, em datas em concreto não determinadas, aos fins de semana, o arguido A levou, pelo menos cinco vezes, o AP, até aos 15 anos de idade deste, à residência sita na (...) (…), nº. (…), em (…), propriedade da arguida Q, a fim de aí ser sujeito à prática de actos sexuais. 46.1. A primeira vez que foi levado a (…) pelo arguido A, encontravam-se na residência em causa os arguidos N, H, E, K e C, além de outros indivíduos cuja identidade se não apurou. 46.2. O arguido N disse aos menores para se despirem, tendo manipulado sucessivamente o pénis dos mesmos até ficarem erectos. 46.3. O arguido H abordou e conduziu o AP a um dos quartos da residência, tendo manipulado o pénis do menor, enquanto, simultaneamente, acariciava o seu próprio pénis. O arguido H chupou também o pénis do menor e, de seguida, colocou o seu pénis na boca do AP de forma a que este o chupasse. Depois o arguido H introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 46.4. Nas outras quatro ocasiões em que foi conduzido a (…), o arguido H manipulou sempre o pénis do menor AP, colocou o seu pénis na boca do menor de forma a que o mesmo o chupasse e introduziu o seu pénis erecto no ânus do mesmo, aí o tendo friccionado até ejacular. 46.5.De todas essas vezes que o menor AP se deslocou à residência em (…), além de se encontrarem aí sempre os arguidos H e N, estiveram também na mesma, pelo menos numa ocasião, os arguidos C, E e K. 46.6. Nas cinco vezes em que foi levado a (…), depois de ter sido sujeito à prática de actos sexuais pelo arguido H, o menor AP foi transportado de regresso à AX pelo arguido A, que, pelo facto de aquele ter sido sujeito à prática dos actos referidos, lhe entregou sempre dinheiro em quantias que se não logrou determinar. 46.7. Tal dinheiro, provinha de um envelope contendo dinheiro que o arguido N entregara, como era habitual ao arguido A, não só na primeira ocasião descrita mas também em todas as outras, como pagamento pelo facto de este ter conduzido à casa em causa menores da AX, a fim de os mesmos serem sujeitos à prática de actos sexuais pelo adultos que aí se encontravam. 46.8. Nas ocasiões descritas, o arguido N, além de ter entregue dinheiro ao arguido A como retribuição por este ter levado à casa em causa menores da AX, entregou também dinheiro à arguida Q por esta ter disponibilizado a sua residência, deixando-a desocupada durante o período previamente acordado com a mesma, para que, aí, tivessem lugar práticas sexuais entre adultos do sexo masculino e menores, alunos da AX. (7.3 - Ofendido AV, (…)) 47. Em data em concreto não determinada de finais do anos de 1998, o arguido A, conduzindo uma das carrinhas da AX, levou o menor AV, à data com 13 anos de idade, e outros menores da AX à residência referida, onde foram recebidos pelo arguido N. 47.1. No interior da residência, o arguido N manipulou o pénis do menor AV e colocou o seu pénis na boca do mesmo, de forma a que este o chupasse. 47.2. O arguido N introduziu também o seu pénis erecto no ânus do AV, aí o tendo friccionado até ejacular. 47.3. Depois de o arguido N e os restantes adultos que, nesse dia, se encontravam na residência em causa, terem sujeitado os menores da AX à prática de actos sexuais, o arguido A levou-os de regresso à AX, aos respectivos (...)s, tendo entregue a cada um dos menores, nomeadamente ao AV, um quantia de dinheiro não determinada. 47.4. Tal dinheiro provinha de um envelope contendo que o arguido N entregara, como era habitualmente, ao arguido A, como pagamento pelo facto de este ter conduzido à (...) em causa menores da AX a fim de os mesmos serem sujeitos à prática de actos sexuais pelo adultos que aí se encontravam. 48. Ainda no primeiro semestre do ano de 1999, em data em concreto não apurada, o menor AV foi, mais uma vez, juntamente com outros menores alunos da AX, levado pelo arguido A à residência mencionada, sita em (…), tendo sido recebidos pelo arguido N. 48.1. O menor AV foi abordado pelo arguido H, que já sujeitara anteriormente a práticas sexuais, numa casa sita em (…). 48.2. O arguido H, no interior de um dos quartos da residência, manipulou o pénis do menor, tendo também este, por sua vez, manipulado o pénis do arguido. De seguida, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor AV, de forma a que este o chupasse tendo depois introduzido o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 48.3. Depois de o arguido H e os restantes adultos que, nesse dia, se encontravam na residência em causa, terem sujeitado os menores da AX à prática de actos sexuais, o arguido A levou estes de regresso à AX, próximo aos respectivos (...)s, tendo entregue a cada um dos menores, nomeadamente ao AV, uma quantia em dinheiro não determinada. 48.4. Tal dinheiro provinha de um envelope que o arguido N entregara, como era habitual ao arguido A, como pagamento pelo facto de este ter conduzido à casa em causa menores da AX, a fim de os mesmos serem sujeitos à prática de actos sexuais pelos adultos que aí se encontravam. 49. Finalmente, já em data em concreto não determinada do ano de 2000, o menor AV, então com 14 anos de idade, juntamente com outros menores, alunos da AX, foi levado pelo arguido A à residência de (…), tendo sido recebidos pelo arguido N. 49.1. O menor AV foi abordado pelo arguido K, que já sobre ele perpetrara actos sexuais nas circunstâncias já descritas noutro capítulo deste despacho. 49.2. O arguido K conduziu o menor AV a um dos quartos onde manipulou o pénis do menor, tendo também este, por sua vez, manipulado o pénis do arguido. De seguida, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor AV, deforma a que este o chupasse, tendo depois introduzido o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 49.3. Depois de o arguido K e os restantes adultos que, nesse dia, se encontravam na residência em causa, terem sujeitado os menores da AX à prática de actos sexuais, o arguido A levou estes de regresso à AX, aos respectivos (...)s, tendo entregue a cada um dos menores, nomeadamente ao AV, uma quantia de dinheiro não determinada. 49.4. Tal dinheiro, provinha de um envelope que o arguido N entregara, como era habitual ao arguido A, como retribuição pelo facto de este ter conduzido à casa em causa menores da AX, a fim de os mesmos serem sujeitos à prática de actos sexuais pelos adultos que aí se encontravam. 49.5. Nas ocasiões descritas, o arguido N, além de ter entregue dinheiro ao arguido A como retribuição por este ter levado à casa em causa menores da AX, entregou também dinheiro à arguida Q por esta ter disponibilizado a sua residência, deixando-a desocupada durante o período previamente acordado com a mesma, para que no seu interior, tivessem lugar práticas sexuais entre adultos do sexo masculino e menores, alunos da AX. (7.4 – Ofendido Y, (…)) 50. Em data em concreto não apurada, entre a primeira metade do ano de 1999 e o fim do ano de 2000, o arguido A passou a levar o menor Y, a primeira vez com 13 anos completados há pouco tempo, à (...) sita na (...) (…), em (…), pelo menos em quatro ocasiões. 50.1. Para além das duas vezes que se descreveram noutro capítulo deste despacho de acusação, o arguido A levou ainda o menor Y a tal residência em duas outras ocasiões, a fim de, ai, ser alvo da prática de actos sexuais pelos indivíduos que se encontrassem, em cada uma dessas vezes. 50.2. Em ambas as ocasiões, encontrava-se em tal casa o arguido N, que abriu a porta aos menores que aí foram conduzidos pelo arguido A, o arguido C, o arguido E e o arguido H. 50.3. Numa dessas ocasiões, em meados do ano de 1999, depois de ter entrado e de ter ficado por breves momentos na sala, o menor Y, então com 13 anos de idade, foi abordado pelo arguido K que o conduziu a um dos quartos da (...). 50.4. Aí, tal arguido disse ao menor para se despir, enquanto, ao mesmo tempo, ele próprio também tirava a roupa. Depois de despidos, o arguido K manipulou o pénis do menor, enquanto o menor, obedecendo ao que lhe era pedido, manipulava também o pénis do primeiro. 50.5. O arguido K, de seguida, introduziu o seu pénis na boca do menor Y, de forma a que este o chupasse. Depois, o arguido K introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 50.6. Após ter sujeitado o menor Y à prática dos descritos actos, o arguido K saiu do quarto e chamou o arguido E. Quando este arguido entrou no quarto, o arguido K retirou-se, ficando o menor Y a sós com aquele. 50.7. O arguido E manipulou, então, o pénis do menor e pediu ao mesmo que, por sua vez, manipulasse o seu pénis. depois colocou o seu pénis na boca do menor, tendo-o este chupado. De seguida, o arguido E introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 51. Na outra ocasião acima referida, ainda em meados do ano de 1999, o menor Y, ainda com 13 anos de idade, foi novamente encaminhado para a sala, onde, mais uma vez, foi abordado pelo arguido K que o conduziu a um dos quartos da (...). 51.1. Aí, o arguido K disse ao menor para se despir, enquanto, ao mesmo tempo, ele próprio tirava também a roupa. Depois de despidos, o arguido K manipulou o pénis do menor, enquanto o menor, obedecendo ao que lhe era pedido, manipulava também o pénis do primeiro. 51.2. Depois, o arguido K colocou o seu pénis na boca do menor Y, tendo-o este chupado. De seguida, o arguido K introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 51.3. Após ter sujeitado o menor Y à prática dos actos descritos, o arguido K saiu do quarto e chamou o arguido N. Quando este arguido entrou no quarto o arguido K retirou-se, ficando o menor Y a sós com o arguido N. 51.4. O arguido N manipulou o pénis do menor enquanto este, obedecendo ao que lhe era pedido, manipulava também o pénis do primeiro. Depois, o arguido colocou o seu pénis na boca do menor de forma a que este o chupasse. De seguida, o arguido N introduziu o seu pénis erecto no anus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 51.5. Nas duas ocasiões que se acabaram de descrever, o arguido N, como pagamento pelo facto de o arguido A ter levado a tal residência os menores, alunos da AX, entre os quais o menor Y, a fim de serem sujeitos à prática de actos sexuais pelos adultos que aí se encontravam, entregou ao segundo um envelope contendo dinheiro, em montante, em concreto, não determinado. 51.6. Também, nessas duas ocasiões, o arguido N pagou à arguida Q uma quantia não determinada pelo facto de a mesma ter cedido a sua casa para que, no seu interior, os menores da AX fossem alvo de actos sexuais perpetrados pelos adultos que aí se deslocaram, entre os quais os referidos arguidos. 51.7. Nas dias ocasiões descritas, o arguido A conduziu os menores de regresso à AX, tendo retirado do envelope que lhe fora entregue pelo arguido N algum do dinheiro que continha e entregou, a cada um dos menores, cerca de 5 mil escudos. 52. O arguido A levou o assistente X à residência sita na (...) (…), nº (…) em (…), para aí ser sujeito a actos de índole sexual; 52.1. Nas ocasiões descritas em que o arguido C se deslocou também à (...) sita na (...) (…), nº. (…) em (…), agiu sempre por forma a permitir que o arguido A levasse à residência referida, a fim de serem sujeitos a actos sexuais por indivíduos adultos do sexo masculino, que incluíam actos de masturbação, de coito oral e de coito anal, alunos menores da AX. 52.2. O arguido C permitia que o arguido A levasse a tal residência, para esses fins, menores de idade inferior a 14 anos e de idade inferior a 16 anos. 52.3. Para tanto, o arguido C permitiu sempre que o arguido A retirasse os menores das instalações da AX e que utilizasse viaturas da AX para os transportar aos locais dos encontros com adultos, conhecendo com exactidão todas as características de tais encontros. 52.4. Agiu com vontade livre e consciente, apesar de saber que tal conduta lhe era proibida pela lei penal. 52.5. A contrapartida da arguida Q, ao ceder a utilização da sua casa, eram quantias em dinheiro. 52.6. A arguida Q, ao ceder a utilização da sua casa, em todas as ocasiões e circunstâncias descritas, não sabia quais os actos sexuais em concreto praticados. 53. Sabia que a disponibilização da referida casa permitiria mais facilmente aos arguidos referidos concretizarem as práticas sexuais descritas, porquanto, atenta a localização do imóvel, os mesmos não correriam o perigo de serem vistos e identificados. (9.1 - Ofendido AL, (…)) 54. O arguido A, tal como costumava fazer com todos os menores, e pelas formas já descritas, entabulou conversa com o menor AL, logo que este ingressou na AX, dando-lhe, com frequência, dinheiro e oferecendo-lhe boleias. 54.1. Em data em concreto não determinada, tinha o AL 8 anos de idade, o arguido A entrou na casa de banho onde este se encontrava retirando o seu pénis para fora da roupa que vestia e, enquanto o acariciava e exibia, erecto, ao menor, dizia-lhe que lhe mexesse “na pila”. 54.2. Em várias outras ocasiões, cujo número e circunstâncias em concreto não se logrou determinar, mas pelo menos, seguramente, nas (...) em (…), no ano de 1998 e em (…), no ano de 1999, tinha o menor, respectivamente, 9 e 10 anos de idade, voltaram a ocorrer situações idênticas àquela que se acabou de descrever. 54.3. O arguido A entrou nas casas de banho existentes em tais locais e, uma vez aí, exibiu o seu pénis erecto ao menor AL e a outros menores de identidade não apurada que se encontravam na sua companhia, repetindo sempre o pedido de que lhe mexessem “na pila”. 54.4. Em datas e circunstâncias em concreto não determinadas, pelo menos em duas ocasiões, entre os 8 e os 9 anos de idade do AL, o arguido A levou este menor à casa onde, então, residia, uma barraca sita no DT. 54.5. Nessas duas ocasiões, o arguido A introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor AL, aí o tendo friccionado até ejacular, depois de ter despido as calças e as cuecas do menor e de o ter dobrado para a frente, de costas para si. 54.6. Submetido a exame (...)-legal de natureza sexual no INML, verificou-se que o menor apresentava, a nível do ânus, sinais compatíveis com a prática repetida de coito anal, constatando-se à observação do ânus“um marcado apagamento das pregas da mucosa, que se apresenta descorada e com pequenas erosões de coloração nacarada ou acastanhada, a nível de todo o perímetro da porção distal do recto. Moderada congestão do plexo hemorroidário, sobretudo nos quadrantes inferiores, sendo de assinalar uma apreciável hipotonia do esfincter anal”. 54.7. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 54.8. O arguido A sabia que o menor AL era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha, apenas, entre 8 e 10 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ser órfão de pai e mãe e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 54.9. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 54.10. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AL prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 54.11. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.2 - Ofendido AD, (…)) 55. Aquando dos factos descritos no ponto “148.3.” dos factos provados, AD tinha 14 anos. (9.3 – Ofendido AW, (…)) 56. Em dia não apurado do mês de Agosto de 2000, durante uma (...) da AX realizada em (…), o arguido A convidou o menor AW, então com 11 anos de idade, para ir consigo dar uma volta à praia, na carrinha da AX em que habitualmente se deslocava ao serviço daquela Instituição. 56.1. Quando chegaram à praia estava a anoitecer. O arguido estacionou a carrinha e levou o menor para o banco traseiro da mesma. Aí, então, o arguido começou a acariciar o pénis do menor, depois de lho ter retirado para fora das calças. 56.2. Depois o arguido aproximou a sua boca do pénis do menor e começou a lambê-lo e a chupá-lo. 56.3. Seguidamente, o arguido disse ao menor que o masturbasse, o que o menor fez, manipulando o pénis do arguido até ejacular. 56.4. O arguido ordenou ao menor que não falasse com ninguém sobre o que se passara, o que este, com medo, acatou. 56.5. Os factos a que se refere o descrito no ponto “149.2.” dos factos provados, ocorreram no ano de 2001. 56.6. Nas circunstâncias descritas no ponto “149.10.” dos factos provados, o arguido A introduziu o seu pénis no ânus do AW. 56.7. Entre Abril e fins de Junho de 2002, o arguido esperava pelo menor, às Sextas-feiras, à saída do (...), estacionando a carrinha da AX que conduzia longe da porta, a fim de não ser reconhecido, dando boleias ao menor nas visitas que este efectuava à família. 56.8. No interior da carrinha, o arguido acariciava as pernas e o pénis do menor até ficar erecto. 56.9. Dizia-lhe que se contasse alguma coisa do que acontecera entre os dois lhe bateria. (9.4 - Ofendido AM, (…)) 57. Nas circunstâncias descritas no ponto “150.10.” a “150.13” dos factos provados, o arguido disse ao AM que , se contasse a alguém o que tinha acontecido, lhe bateria. 57.1. O arguido voltou a repetir os comportamentos descritos nos pontos “150.10” a “150.11.” dos factos provados, por duas vezes, durante as férias do Verão de 2002 e durante boleias que ofereceu ao menor, acariciando-lhe e massajando-lhe o pénis durante o caminho que realizaram, em viatura da AX, apesar da renitência do menor. 57.2. O arguido sempre que adoptava os comportamento acima descritos, ameaçava o menor de que se contasse a alguém o que se passava, lhe bateria, o que o menor, com medo do arguido nunca fez. (9.5 – Ofendidos AB, (…) e AR, (…)) 58. Quando o arguido libertou o AR, nas circunstâncias descritas no ponto “151.13” dos factos provados, disse-lhe que lhe batia se ele contasse o que tinha sucedido. 58.1.Nas circunstâncias descritas no ponto “151.13” dos factos provados, o arguido disse ao AR “pára quieto e não grites que eu não te vou fazer mal”. 58.2. Na (...) a que se refere o ponto “151.10.” dos factos provados, o arguido A esteve uma segunda vez com o AR no balneário da (...), onde lhe baixou os calções que vestia, virou-o de costas para si, prendeu-lhe os braços atrás das costas, imobilizando-o e encostou o seu pénis erecto ao ânus do menor, fazendo força para o penetrar. O menor tentava escapar-se, movendo-se e tentando desviar o ânus, ao mesmo tempo que chorava, pedindo ao arguido que parasse com tal conduta. A certa altura conseguiu escapar e correu, tentando sair do referido balneário. O arguido, perseguiu-o, correndo atrás dele, até que o arguido deixou-o sair, dizendo-lhe que se contasse alguma coisa a alguém lhe bateria. Quis sujeitá-lo a relação sexual anal e assim satisfazer os seus apetites sexuais, de forme livre e consciente, com pleno conhecimento de que a sua superioridade física e uso da força impediriam o menor de opor resistência, não tendo concretizado os seus propósitos por o menor ter fugido. 58.3. Quando ocorreram os factos descritos nos pontos “151.15” a “151.17” dos factos provados, o AR estava presente e o arguido A disse ao AR que que “lhe dava porrada” se contasse a alguém o que se passara. (Ponto 9.6 do despacho de pronuncia – Ofendido AH) 59. No ano de 1999, em dia indeterminado do mês de Julho ou Agosto , o AH voltou a acompanhar o arguido A numa viagem a uma (...) no (…). Aí e quando se encontravam a descarregar o veículo que o arguido conduzira, este apalpou o pénis e as nádegas do menor. 59.1. Em dia indeterminado do mês de Julho de 2000, durante uma paragem numa estação de serviço a caminho da (...) da AX que iria ter lugar no (…), o arguido A dirigiu-se a uma das casas de banho da mesma, chamando o AH. Quando o AH ali chegou o arguido levou-o para um dos compartimentos onde o agarrou pelo pescoço e empurrou a cabeça do menor até este ficar com a boca à altura do seu pénis. Introduziu, então, o seu pénis erecto na boca do menor, aí o friccionando até ejacular, enquanto lhe dizia “para o fazer vir”. 59.2. No ano de 2000, no Verão, em nova deslocação ao (…), o arguido voltou a repetir tal comportamento, parando o veículo que conduzia na mesma estação de serviço e voltando a chamar o AH à casa de banho. Aí o arguido introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o friccionando até ejacular. O menor AH gritou de dor, mas o arguido tapou-lhe a boca com as mãos, impedindo-o de gritar. 59.3. Os factos descritos nos pontos “152.4.” e “152.5” dos factos provados, ocorreram durante o ano lectivo de 2000/2001 cerca de três vezes por mês. (9.7 – Ofendido GQ, (…)) 60. O menor conheceu o arguido A durante uma (...) da AX, no Verão de 2002, tendo-lhe sido apresentado pelo seu irmão GT. 60.1. O arguido passou a perseguir o menor, andando atrás dele durante todo o dia, à procura de pretexto para conversar com o mesmo e ganhar a sua confiança. 60.2. À noite, os menores que estavam na (...) referida dormiam em sacos cama no chão, tendo o arguido – que também ali pernoitou – escolhido um lugar ao pé do menor GQ para dormir. Assim, estendeu o seu saco cama ao lado do menor. 60.3. Quando todos já se encontravam a dormir, o arguido abriu o saco cama do menor, então com 11 anos de idade, e começou a acariciar-lhe o pénis, o que assustou o menor que procurou afastar-se do arguido. No entanto, o arguido abraçou o menor, puxando-o para si, continuando a acariciar-lhe o pénis por baixo do saco cama e metendo a mão no interior do pijama do menor. 60.4. O arguido só parou com tal comportamento quando os dois monitores da (...) chegaram ao dormitório, cerca da meia noite para ali pernoitarem também. 60.5. O menor ficou muito perturbado e assustado, não referindo a ninguém o que se passara por receio que lhe chamassem mentiroso e não acreditassem em si. 60.6. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 60.7. O arguido A sabia que o menor GQ era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha apenas 11 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 60.8. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 60.9. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor GQ prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 60.10. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.8 – Ofendido AJ, (…)) 61. Durante o trajecto, o arguido pegou numa revista pornográfica com imagens homens e mulheres nus a praticarem actos sexuais explícitos e deu-a ao menor para que este a visse, o que o AJ fez, tendo o arguido comentado com o mesmo o conteúdo de tais imagens, dizendo, nomeadamente, “as gajas são boas” e disse-lhe para não contar a ninguém que o havia feito. 61.1. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 61.2. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 61.3. O arguido A sabia que o menor AJ era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha apenas 13 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 61.4. O arguido sabia que o conteúdo da revista que mostrou ao menor era idóneo a excitar sexualmente quem o visse, tendo visado, ao mostrar tal revista ao menor, produzir esse efeito no mesmo. 61.5. Era do conhecimento do arguido que o visionamento da revista da natureza mencionada, pelo AJ, menor de 14 anos, era determinante de efeitos negativos na formação da sua personalidade. 61.6. Agiu de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta descrita lhe era proibida pela lei penal. (9.9 – Ofendido AG, (…)) 62. A partir de certa altura o arguido pediu ao AG para o tratar por pai. 62.1. Então começou a ter conversas com o menor sobre sexo e a sugerir-lhe que “lhe batesse punhetas”. 62.2. A partir do início do ano de 2000, o arguido passou a massajar, o pénis do menor com a mão, por cima das calças, sugerindo-lhe a prática de outros contactos sexuais, o que fez pelo menos por duas vezes. 62.3. Os factos descritos no ponto “155.9.” a “155.13”, dos factos provados, ocorreram especificamente no final do terceiro período do ano lectivo de 2000/2001. 62.4. Após os factos descritos no ponto “155.13.”, dos factos provados, a quantia concreta que o arguido A deu ao AG foram 5 euros. 62.5. Os factos descritos no ponto “155.14.” dos factos provados, ocorreram no inicio do ano lectivo. (9.10 – Ofendido AA, (...)) 63. Os factos descritos no ponto “156.9” dos factos provados, ocorreram num interior de um autocarro que aí se encontrava estacionado. 63.1. Após os factos descritos no ponto “156.9” dos factos provados, o arguido A passou a convidar com frequência o menor AA para passar consigo os fins de semana, ao que o menor nunca acedeu. 63.2. Já depois de o menor AA ter completado 14 anos de idade, o arguido A convidou o mesmo a ir consigo à garagem supra referida, a fim de lhe mostrar o novo autocarro da AX. Perante as insistências do arguido A, o menor AA acabou por aceder a acompanhá-lo. 63.3. Naquela garagem o arguido A o arguido A introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. 63.4. Aquando dos factos descritos no ponto “156.12.” dos factos provados, o arguido conseguiu introduzir o seu pénis na boca do menor e este chupou-o. (9.11 – Ofendido AY, (...)) 64. Sem prejuízo do dado como provado nos pontos “157.7” a “157.12” dos factos provados, os actos descritos no ponto “157.10” dos factos provados repetiram-se mais seis vezes. 64.1. Quando o AY já tinha 15 anos começou a afastar-se do arguido, mas num dia, em data não determinada do ano de 2000, encontrou-se com ele num dos balneários do CZ. 64.2. Nessa altura, o arguido voltou a encostar-se ao menor, obrigou-o a baixar as calças e mexeu-lhe no pénis, enquanto se roçava por ele. Depois, o arguido obrigou o menor a introduzir os dedos no seu próprio ânus. 64.3. Após os actos descritos, o menor ficou, com receio das consequências que para si pudessem advir se contrariasse tal arguido, que sabia ser um funcionário influente na AX, bem relacionado com os dirigentes da instituição. (9. 12 – Ofendido AE, (…)) 65. O arguido A chegou a oferecer 5 euros, por alturas do Carnaval do ano de 2001, a AE. 65.1. A partir do Carnaval de 2001, pelo menos em duas ocasiões, enquanto conversavam o arguido pousava a mão na perna do menor, acariciando-a. As conversas passaram a versar sobre temas de sexo. Assim, enquanto lhe acariciava a perna, o arguido perguntava ao menor se já lhe tinham “feito um bico” – o que na linguagem de calão quer dizer sexo oral – e “se já batia punhetas”. Também lhe dizia para “comer as gajas todas”. Quando passavam por alguma rapariga ou mulher o arguido dizia ao menor “olha aquela gaja tão boa, fodia-a toda ...comia-a toda..”. 65.2. Durante tais conversas, o menor ficava bastante perturbado com o teor das mesmas. 65.3. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 65.4. O arguido A sabia que o menor AE era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha apenas 12 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 65.5. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de reagir ao teor de tais conversas e que não tinha maturidade para avaliar correctamente o seu conteúdo. 65.6. O arguido tinha perfeito conhecimento de que as conversas de natureza sexual a que submeteu o menor AE prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 65.7. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.13 – Ofendido AS, (…)) 66. Após os factos praticados no ponto “159.8” dos factos provados, a quantia que o arguido deu ao AS foram 2 mil escudos. 66.1. Os factos descritos no ponto 159.9, dos factos provados, ocorreram no barracão de DT; 66.2. ... e ocorreram mais duas vezes do que as descritas no ponto 159.9. dos factos provados. 66.3. Em Janeiro de 2002, em dia indeterminado, o arguido voltou a convidar o menor a acompanhá-lo a uma casa, sita perto do DW, em (…) que o arguido disse ser sua. Foram numa carrinha (…) da AX onde já se encontrava o menor AF, (…) e id. a fls. 3001. 66.4. Quando chegaram àquela casa o arguido levou ambos os menores para o quarto e pôs em exibição uma cassete de vídeo cujo conteúdo consistia em cenas explícitas de sexo com adultos mantendo relações sexuais entre si. 66.5. A seguir, o arguido despiu-se e ordenou aos menores que fizessem o mesmo. Depois dos menores estarem despidos começou a acariciar-lhes os pénis, manipulando-os. De seguida introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor AS até ejacular. Depois introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor AF até ejacular novamente. Então, ordenou ao menor AF que introduzisse o seu pénis no ânus do menor AS, mas ambos recusaram. Após a prática de tais actos, o arguido foi levar os menores, novamente na carrinha da AX supra referida, aos respectivos Lares, tendo dado a ambos dinheiro em quantias não apuradas. 66.7. A quantia que o arguido A deu ao AS foi entre 2 e 5 mil escudos. (9.14 - Ofendido AF, (…)) 67. AF foi baptizado na Igreja Católica no dia (…), tendo sido o AF que convidou o arguido A para padrinho. 67.1. O menor passou a tratar o arguido por padrinho e gostava muito dele. 67.2. O arguido despiu-se e ordenou aos menores que fizessem o mesmo. Depois dos menores estarem despidos começou a acariciar-lhes os pénis, manipulando-os. De seguida, introduziu o pénis erecto no ânus do AS até ejacular. Depois introduziu o pénis no ânus do AF até ejacular novamente. Após, ordenou ao menor AF que introduzisse o seu pénis no ânus do menor AS, mas ambos recusaram. O arguido foi, então tomar banho e foi levá-los, novamente na carrinha da AX referida aos Lares. 67.3. Uns dias depois, a um domingo, depois de ir buscar o menor AF ao autocarro, o arguido conduziu este até àquela casa. 67.4. Uma vez aí, o arguido começou a mexer no pénis do menor, acariciou-lhe o corpo e introduziu o seu pénis erecto no ânus do menor, aí o tendo friccionado até ejacular. Simultaneamente, o arguido exibiu um filme cujo conteúdo consistia em cenas explícitas de sexo com adultos mantendo relações sexuais entre si que pôs a passar no aparelho de vídeo e que o menor visionou. 67.5. Estas condutas repetiram-se, pelo menos, mais três vezes, entre Janeiro e Julho de 2002, sempre aos Domingos, sendo que, nas duas últimas vezes já o menor tinha completado 14 anos de idade, tendo em todas elas o arguido manipulado o pénis do menor e introduzido o seu pénis erecto no ânus do mesmo e exibido um filme cujo conteúdo consistia em cenas explícitas de sexo com adultos mantendo relações sexuais entre si. No fim o arguido dava ao menor dinheiro em quantia que variável, chegando a dar-lhe 15 euros. 67.6. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre da relação de dependência que o menor AF havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 67.7. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor AF prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. (9.15. – Ofendido Z, (…)) 68. Num dia do Verão do ano de 2001 o menor, então com 10 anos de idade, integrou uma (...) da AX, tendo sido para aí levado pelo arguido A numa carrinha da AX. O menor ia sentado ao lado do condutor. 68.1. A determinada altura do percurso, o arguido começou a acariciar o pénis do menor. O menor desviou a mão do arguido, mas este voltou a colocá-la sobre o pénis do mesmo, continuando a acariciá-lo. Depois abriu-lhe o fecho das calças, meteu a mão no interior das cuecas e continuou a manipular o pénis do menor. 68.2. Num dia indeterminado do Outono de 2001, o arguido encontrava-se na garagem do CZ, quando viu o menor sair do autocarro da AX que fazia o transporte dos alunos que regressavam das aulas em DT. 68.3. O arguido chamou o menor à garagem, fechando a porta assim que este entrou. 68.4. De seguida o arguido começou a acariciar o pénis do menor, primeiro por cima das calças e, depois de lhe ter aberto a braguilha, por baixo das cuecas que o menor vestia. Ao mesmo tempo o arguido mexia no seu próprio pénis, masturbando-se. 68.5. Depois, despiu as calças e as cuecas do menor, dobrou-o de costas para si e introduziu-lhe o seu pénis erecto no ânus e aí o friccionou. 68.6. O arguido voltou a repetir os mesmos comportamentos e actos, pelo menos, mais duas vezes, entre os meses de Setembro e Dezembro de 2001, sempre na garagem do CZ, à tarde e quando o menor regressava das aulas. 68.7. Em todas essas ocasiões, o arguido manipulou o pénis do menor, masturbando-o e masturbou-se a si próprio. Também em essas ocasiões, o arguido introduziu, depois, o seu pénis erecto no ânus do menor. 68.8. Após a prática de tais actos, o arguido dizia sempre ao menor que deveria manter-se calado, não contando nada a ninguém, “senão levava porrada”. 68.9. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 68.10. O arguido A sabia que o menor Z era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha apenas 10 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 68.11. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 68.12. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor Z prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 68.13. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. (9.16 – Ofendido AO, (....) 69. O arguido A oferecia ao AO prendas com regularidade, efectuando carregamentos no seu telemóvel. 69.1. O arguido percebeu que o arguido AO era emocionalmente frágil, triste e que se encontrava desamparado. 69.2. Nas circunstâncias descritas no ponto “162.11.” dos factos provados, o arguido disse a AO “então não gostas?” 69.3. Nas circunstâncias descritas no ponto “162.11.” dos factos provados, o AO com medo da reacção do arguido não ofereceu resistência. 69.4. Nas circunstâncias descritas no ponto “162.11.” a “162.13” dos factos provados, o AO não contou a ninguém por ter medo do que lhe pudesse acontecer. 69.5. O contacto e relação que o arguido A estabeleceu com o assistente AO, limitou a possibilidade de este último opor qualquer resistência aos actos que o arguido sobre ele praticou. 69.6. O arguido sabia também que o menor AO nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual, para além daquele a que foi pelo mesmo sujeito. (9. 17 – Ofendido AC, (...)) 70. Depois, o arguido estacionou a carrinha num local pouco iluminado e sossegado e obrigou o menor a chupar-lhe o pénis, introduzindo-o na sua boca. 70.1. A partir da data referida no ponto “163.4” dos factos provados, o arguido A passou a esperar AC à saída das aulas de Educação Física, no CZ, dando-lhe boleia até ao FA. No caminho o arguido mexia no pénis do menor e pegava-lhe na mão e punha-a sobre o seu próprio pénis, obrigando-o a masturbá-lo. 70.2. Pelo menos três vezes, para a lém da descrita no ponto “163.4” dos factos provados, o arguido estacionou a viatura da AX que conduzia num local pouco frequentado e depois de forçar o menor manipular-lhe o pénis, masturbando-o, baixava as suas calças e as do menor e introduzia-lhe o seu pénis erecto no ânus. 70.3. O arguido só parou com a prática destes factos, quando, em meados de 2001, foi proibido de transportar os menores dos vários (...)s da AX, medida que lhe foi aplicada no âmbito do processo disciplinar que lhe foi levantado na sequência do processo crime à ordem do qual se encontra preso preventivamente. 70.4. O arguido dava sempre dinheiro ao menor, entre 10 e 25 euros, e chegou a propor-lhe conhecer vários amigos, o que, no entanto, nunca chegou a acontecer. 70.5. Em consequência de actos de abusos sexuais praticados pelo arguido K, AC à observação do ânus apresenta “um acentuado apagamento das pregas da mucosa, com soluções de continuidade a nível das escassas pregas dos quadrantes superiores e uma certa congestão do plexo hemorroidário, sendo de assinalar a marcada hipotonia do esfíncter anal, ainda que com manutenção da sua competência.” Estes sinais são “compatíveis com a prática repetida de coito anal” e ”denotam ter sido produzidas por instrumento de natureza contundente, podendo ter resultado de penetração repetida. 70.6. O arguido A sabia também que AC nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual fora do contexto das práticas sexuais a que fora sujeito por adultos, aproveitando-se da especial fragilidade, vulnerabilidade e inexperiência do menor, para concretização das práticas sexuais descritas. (9.18 – Ofendido GT, (...)) 71. O menor passava alguns fins de semana com uma tia, única familiar que lhe prestava algum apoio. 71.1. Em dia indeterminado do Verão de 2001, tinha o menor ainda 13 anos de idade, o arguido A aproximou-se do mesmo que se encontrava numa (...) da AX, na praia (…). 71.2. O arguido começou por conversar com o menor, pagou-lhe guloseimas e, à noite, foi ter com ele ao colchão onde dormia, deitando-se a seu lado. 71.3. Uma vez aí, começou a acariciar o corpo do menor e mexeu-lhe no pénis. 71.4. Em dia indeterminado do mês de Setembro do ano de 2001, tinha o menor 14 anos de idade, o arguido procurou o mesmo no (...) que frequentava e ofereceu-lhe uma guloseima. Apercebendo-se de que o menor tinha acompanhamento psicológico no CZ o arguido, tendo por objectivo relacionar-se sexualmente com ele, valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do livre acesso às suas instalações e aos seus alunos, estabeleceu uma relação de proximidade com o menor, oferecendo-se para o transportar às (...) de psicologia a que ia no CZ. 71.5. Assim, o arguido numa das viagens de regresso ao FN, no interior da carrinha (…) de cor (…) que habitualmente conduzia, desapertou a braguilha do menor e manipulou-lhe o pénis, tendo depois forçado o menor a fazer-lhe o mesmo, colocando-lhe a mão sobre o seu próprio pénis, que aquele masturbou. 71.6. No final dos actos descritos o arguido deu ao menor um euro. 71.7. O arguido repetiu tais condutas nas viagens que fazia transportando o menor à consulta de psicologia, o que acontecia uma vez por semana. 71.8. Nessas ocasiões, o arguido mexia no pénis do menor, e obrigava este a fazer-lhe o mesmo, masturbando-o . 71.9. No final, o arguido dava ao menor cerca de um euro. 71.10. A partir de Outubro de 2001, nas viagens referidas, o arguido passou a forçar o menor a chupar-lhe o pénis, que retirava para fora das calças, enquanto conduzia. 71.11. Tal aconteceu até Janeiro de 2002, pelo menos uma vez por semana e no decurso das referidas viagens. Nessas ocasiões, o arguido depois de manipular o pénis do menor e de forçar este a manipular o seu pénis, introduzia seu pénis na boca do menor forçando-o a chupar-lho. 71.12. No final, o arguido dava ao menor cerca de um euro. 71.13. O arguido A estava ciente de que, enquanto trabalhador da AX, tinha o dever de zelar pelo bem estar e de cuidar dos alunos daquela instituição. 71.14. Estava também ciente de que as funções que ali desempenhava propiciavam um contacto estreito e frequente com tais alunos, gerando com eles relações de dependência que limitavam a possibilidade de estes últimos oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava. 71.15. O arguido A sabia que o menor GT era um aluno interno da AX, que à data dos factos tinha 13 e 14 anos de idade, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e a quem as pessoas funcionalmente ligadas àquela instituição inspiravam autoridade e dever de obediência. 71.16. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se sempre, da relação de dependência que o menor GT havia estabelecido com ele e que lhe havia anulado totalmente a possibilidade de opor resistência. 71.17. Sabia, igualmente, que a idade desse menor o impedia de se decidir livremente e em consciência pela prática dos actos descritos e de que foi vítima. 71.18. O arguido tinha perfeito conhecimento de que os actos de natureza sexual a que submeteu o menor GT prejudicavam o seu normal desenvolvimento físico e psicológico, e que influíam negativamente na formação da respectiva personalidade. 71.19. O arguido sabia também que o menor GT nunca mantivera qualquer relacionamento de natureza sexual, para além daquele a que foi pelo mesmo sujeito, aproveitando-se da especial fragilidade, vulnerabilidade e inexperiência do menor, para concretização das práticas sexuais descritas. 71.20. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que as condutas atrás descritas lhe eram proibida pela lei penal. 72. Ao arguido C cabia, em concreto, a gestão da frota automóvel. 72.1. O arguido A utilizou o veículo da AX, de marca (…), no transporte de menores, alunos da AX, para casas onde os mesmos eram sujeitos a práticas sexuais com homens adultos. 72.2. Os factos descritos no ponto 165.3., dos factos provados, ocorreram pelo menos desde 1998. 72.2. Os veículos referidos no ponto 165.3. dos factos provados, têm valor não inferior a vinte mil euros. 72.3. Os veículos descritos no ponto 165.3. dos factos provados, eram utilizados para esse fim com o conhecimento e com a autorização do arguido C. 72.4. O arguido C actuou de modo voluntário, livre e consciente, bem sabendo que não poderia dar aos veículos mencionados a utilização descrita e que a sua conduta era proibidas por lei penal. 73. O controlo de entradas e saídas dos veículos da AX, a que se refere o ponto “167.9”, dos factos provados, foi instituído por despacho do Arguido C. 74. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de X de ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.1. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de Y de ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.2. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de Y de ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.3. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AA ter uma vida equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.4. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AB ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.5. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AC ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.6. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AD de ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.7. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AE ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.8. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AF ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.9. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AG ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.10. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AH ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.11. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AI ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.12. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AJ ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.13. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AK ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.14. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AY ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.15. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AM de ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.16. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AN ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.17. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AP ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.18. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AQ ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.19. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AR ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.20. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AS ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.21. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AT ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.22. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AV ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.23. Em consequência dos factos deste processo as expectativas de AW ter uma vida feliz e equilibrada e ter uma sexualidade normal ficaram destruídas. 74.25. A AX é olhada com suspeição e descrédito por causa da actuação dos arguidos.” No que concerne ao processo apensado (Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – NUIPC 3137/01.5JDLSB) “II – FACTOS NÃO PROVADOS: 1. O arguido A foi funcionário da AX até 27 de Setembro de 2002. 1.1. O arguido conhecia vários familiares dos alunos da AX, que confiavam no arguido enquanto funcionário de uma instituição secular, com prestígio e mérito publicamente reconhecidos. O mesmo acontecia relativamente aos menores que, muito embora não sendo alunos daquela, colaboravam em actividades ligadas a ela e às outras instituições com ela relacionadas, nomeadamente com o AX (...), cujas instalações são contíguas às do CZ. 1.2. Nos treinos e jogos do AX (...) o arguido conversava com os familiares que os acompanhavam, pretendendo cultivar uma boa relação com todos. 2. O arguido A, sempre que via o T, abordava-o e dava-lhe entre 1.000$00 e 5.000$00; 3. … e deixava-lhe no bar do EX dinheiro, para que o T aí consumisse o que lhe apetecesse; 4. Os factos constantes do Ponto 10., dos “factos provados” , ocorreram durante o período de férias escolares; 5. Aquando dos factos constantes do Ponto 10., dos “factos provados” , no momento da ejaculação o arguido retirou o pénis do ânus do menor, tendo ejaculado para cima do corpo do mesmo ; 6. O arguido A, após ter consumado a penetração anal a que se refere o Ponto 10. dos “ factos provados”, disse ao T para ir tomar banho e abandonou-o no local; 7. Os factos descritos nos Pontos 13. e 14., do “factos provados”, ocorreram durante o ano de 2000; 8. O arguido A, aquando da situação descrita nos Pontos 13. e 14., dos “factos provados”, entregou dinheiro a um menor que se encontrava nessa casa , para que o mesmo fosse à (...) comprar gelados; 9. Aquando dos factos descritos nos Pontos 13. e 14., dos “ factos provados”, o arguido A obrigou o T a abrir a boca, onde introduziu e friccionou o seu pénis erecto; 10. Após os factos descritos no ponto 14., dos “ factos provados”, o arguido A foi ejacular para a casa de banho; 11. Os factos descritos no Ponto 15., dos “factos provados”, ocorreram no mesmo ano e algum tempo depois, dos factos descritos nos Pontos 13. e 14., dos “ factos provados”; 12. Aquando da abordagem a que se referem os factos constantes do Ponto 15., dos “ factos provados”, o arguido A convidou o T a ir novamente a sua casa, insistindo muito para que aceitasse; 13. Aquando dos factos descritos no Ponto 15., dos “ factos provados”, o arguido A forçou o T a ir para o banco traseiro do carro, aí começou a acariciar o pénis do T; 14. Aquando dos factos descritos no Ponto 15., dos “ factos provados”, o arguido A introduziu o seu pénis erecto na boca do menor; 15. Decorrido algum tempo após o factos descritos no “Ponto 15.” dos factos provados” e em datas não concretamente apuradas, por duas vezes, o arguido voltou a abordar o T, levando-o na sua viatura até à mesma mata pouco frequentada, referida no “ Ponto 15.” dos “ factos provados”, onde voltou a introduzir o seu pénis erecto na boca e no ânus do menor, aí o tendo friccionado. 16. Em Março de 2001, em dia em concreto não apurado, ao fim do dia, o arguido, conduzindo o seu veículo, passou junto a uma paragem de autocarro, localizada próximo do (…), onde se encontrava o menor T a aguardar a chegada de um autocarro. O arguido convidou o menor a entrar no carro e conduziu-o até uma zona mal iluminada e pouco frequentada das redondezas. Depois de estacionar o veículo que conduzia, o arguido A introduziu o seu pénis erecto na boca do menor, obrigando este a chupar-lho. 17. Na situação a que se refere o Ponto 16., dos “ factos provados”, o T estava sozinho na (...), sem colegas, tendo o arguido percebido isso; 18. Na situação a que se refere o Ponto 16., dos “ factos provados”, foi o arguido A que levou o T para a casa de banho; 19. Na situação a que se refere o Ponto 16., dos “ factos provados”, foi o arguido A que mandou o T baixar as calças e roupa interior; 20. Na situação a que se refere o Ponto 16., dos “ factos provados”, o arguido A introduziu o seu pénis na boca do menor; 21. Após os factos descritos no Ponto 16., dos “ factos provados”, o arguido A mandou o T lavar as mãos. 22. A situação a que se refere o Ponto 16., dos “ factos provados”, foi uma das ocasiões em que o arguido deu dinheiro ao T; 23. Os factos descritos no Ponto 19., dos “factos provados”, ocorreram exclusivamente em consequência dos actos praticados pelo arguido A; 24. O arguido A conheceu U no ano de 1997. 25. HC, mãe de U, pelo facto de o arguido A ser funcionário da AX, tinha plena confiança nele e considerava-o uma pessoa de bem. 26. HC, mãe de U, consentiu que o seu filho fosse com o arguido A nas deslocações a (…) e a (…), a que se referem os factos descritos nos Pontos 32. a 45., dos “ factos Provados”, pelo facto de o arguido ser funcionário da AX e, devido a essa qualidade, ter plena confiança nele. 27. Para além dos factos descritos nos Pontos 32. a 36., dos factos Provados, em pelo menos mais nove viagens a praias, o arguido acariciou as coxas e tocou nos órgãos genitais do U, masturbando-o, inicialmente por cima da roupa, depois já metendo a mão dentro dos calções do mesmo. 28. U gostava de A como se fosse seu pai. 29. Na noite de 25 para 26 de Agosto, a dona da casa disponibilizou um colchão para o U dormir. 30. Após os factos descritos no ponto 41., dos factos provados, o arguido voltou a querer introduzir o seu pénis no ânus do U. 31. Os factos a que se referem os Pontos 40. e 41, dos factos provados, passaram-se na noite de 25 para 26 de Agosto de 2001; 32. Quando arguido teve com o U a conversa a que se refere o ponto 44., dos factos provados, fê-lo num tom de voz ameaçador e U ficou receoso de contar o que tinha sucedido. 33. Após ao factos descritos no Ponto 37. a 45., dos factos provados, o arguido continuou a dar ao U dinheiro e a oferecer-lhe presentes de vária ordem, até que o menor conseguiu contar à sua mãe o que se passara. 34. Foi exclusivamente por causa da ocorrência dos factos descritos nos Pontos 32. a 45, dos factos provados , que U passou a ter acompanhamento pedopsiquiátrico e psicopedagógico. 35. A inferioridade da idade mental de V, em relação à real, é entre 6 a 7 anos. 35.1. O atraso do desenvolvimento cognitivo que o V sofria impedia-o completamente de opor-se à prática dos actos descritos nos pontos “55.” e “56”, dos factos provados, praticados pelo arguido A . 36. Aquando dos factos descrito nos Pontos 54. a 56, do “Factos Provados”, o arguido A apalpou o pénis e as nádegas do menor. 36.1. O arguido, voluntariamente, aproveitou-se da incapacidade do V para o sujeitar aos descritos actos sexuais. 37. Aquando dos factos descrito nos Pontos 54. a 56, do “Factos Provados”, o arguido A ejaculou. 37.1. A (...) onde ocorreram os factos descritos no ponto “54.” a “56” dos factos provados, ocorreu no mês de Setembro de 2001. 38. O descrito no Ponto 59. dos “Factos Provados”, quanto às características do ânus do V, foi consequência exclusivamente dos actos praticados pelo arguido A. 39. O arguido A começou a aproximar do W com o propósito de o seduzir, para com ele ter um relacionamento sexual e oferecia-se para o levar de boleia no fim dos treinos. 40. O W ficou “bastante” perturbado com a conversa descrita no ponto “66.” dos factos provados, tanto mais que se tratava de um funcionário da escola que frequentava. 41. O W, em consequência da conversa telefónica descrita no ponto “66.”, dos factos provados, passou a ter dificuldades em adormecer e não conseguia deixar de pensar no teor da conversa que o arguido mantivera consigo. ~ 42. Na sequência da conversa descrita no ponto "69.”, dos factos provados, O W ficou com dificuldade em adormecer e não conseguindo pensar noutra coisa. 43. Quando nas circunstâncias descritas no ponto “71.”, dos factos provados, o W foi ter com o pai, para lhe contar dos telefonemas do arguido, ia a chorar. 44. O menor W, ficou gravemente afectado no seu equilíbrio psicológico, uma vez que, atenta a sua idade, não tinha conhecimentos nem experiência que lhe permitissem enquadrar e reagir ao conteúdo das conversas que o arguido com ele manteve.” Relativamente à fundamentação da decisão de facto, ficou expresso no acórdão recorrido: “IV – MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO: (A) - Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal (NUIPC 1718/02.9 JDLSB): No apuramento da factualidade provada e não provada, o Tribunal formou a sua convicção com base na valoração crítica e conjunta, do seguinte: 1. Nas declarações dos arguidos: A, solteiro, funcionário público reformado, filho de B, H, N, K, E, C, Q, quer quanto aos factos constantes da acusação, quer quanto ao factos constantes da sua contestação, bem como condições pessoais e profissionais; 2. Nas declarações dos Assistente/Legal Representante da Assistente AX e depoimento das Testemunhas: (1) Neste momento do acórdão o Tribunal, em regra, enuncia o nome dos arguidos, declarantes e testemunhas que fundaram a convicção do tribunal, mas faz, também, normalmente, uma análise quanto à forma como globalmente produziram o seu depoimento, enuncia alguns aspectos em que foram particularmente relevantes e particularidades que se possam ter verificado em relação a algumas testemunhas ou declarantes e que, de alguma forma, tenham influído especialmente na valoração que o tribunal fez dos depoimentos ou como fez essa valoração. Posteriormente e em regra também, à medida que vamos fazendo a análise crítica da prova, são introduzidos os contributos específicos que cada testemunha ou grupo de testemunhas deu, para a prova ou não prova de determinados factos ou núcleos de factos. No entanto – e isto é uma questão prática e de método que se põe à relatora do acórdão -, o número de Assistentes e Testemunhas ouvidos pelo Tribunal, a diversidade e extensão dos factos em relação aos quais prestaram declarações ou depoimentos, a multiplicidade de situações, com simultaneidade de arguidos e assistentes numas situações, mas com total divergência noutras e a própria extensão de algumas audições, criaram, por vezes, dificuldades quanto à estruturação da presente fase do acórdão. Isto pelo seguinte: Podem haver razões especificas que levaram à atribuição ou não atribuição de isenção, objectividade e em consequência credibilidade, a algumas testemunhas e Declarantes, o que, consequentemente, influenciou o Tribunal quanto à atribuição ou não de veracidade ao que foi dito ou à medida em que foi atribuída ou não veracidade a alguns aspectos do depoimento ou das declarações. Contudo, há situações em que o Tribunal considerou ter mais sentido mencionar desde já e de forma global essas razões específicas – podendo assim manter melhor continuidade e fluidez da exposição na fase da análise crítica da prova -, pois os seus depoimentos ou declarações irão ser usados pelo tribunal para fundamentar diferentes núcleos de factos e, portanto, irão ser inseridos de forma fragmentada em diferentes partes da análise crítica da prova. No entanto, sempre que o tribunal estiver a usar tais depoimentos ou declarações de forma fragmentada, os juízos que foram feito quanto à forma como o depoimento ou as declarações foram prestadas aplicam-se sempre e são pressu(...) da sua utilização pelo tribunal. Mas há situações – e essencialmente no caso de assistentes que prestaram declarações por mais de uma sessão, tendo em atenção que houve Assistentes que as prestaram por oito, dez ou treze sessões – em que verificando-se exactamente a mesma necessidade de especificar os juízos, razões e considerações que acima dissemos, quanto à isenção, objectividade, avaliação, credibilidade e veracidade do que foi dito e como foi dito ao Tribunal, o Tribunal considerou ter mais sentido fazer essa avaliação específica, global e portanto mais completa não nesta fase, mas inseri-la na parte da análise crítica da prova. Assim, fica explicada, a razão de ser do diferente critério e da diferente metodologia usada pelo Tribunal, sendo que a presente parte do acórdão - sem prejuízo das especificidades próprias que tem -, deverá, sempre, ser tomada e utilizada como parte integrante, su(...) e pressu(...) da análise crítica da prova. (2) Prosseguindo – na enumeração das provas e meios de prova que contribuíram para o apuramento da factualidade provada e não provada e nos quais o Tribunal formou a sua convicção com base na valoração crítica e conjunta -, quanto à enunciação aos declarantes e testemunhas: (i) BP, professora, a desempenhar funções de (...)a na AX, ouvida na qualidade de Legal Representante da Assistente AX (ii) Dos Assistentes: AL, AD, AC, AM AW, AB, AR, U, AH, AJ, AG, AA, (…). AY, (…) AV, (…) AN, (…) AE, (…). AP, (…) AI, (…) AT, (…) W, (…) AS, (…) X, (…) AU, (…) Y, (…) V, (…) AF, (…) AK, (…) Z, (…) AQ AO, T, (…) (iii) Das testemunhas: - HE, (…), (…) na (...) da AX, desde há 13 anos na instituição e desde há 4/5 na (...) (prestou depoimento em 11/10/06). Na (...) era (…) (a sua colega era a ED), quando “rebentou o escândalo” estava nesse serviço desde fins de 2001, lembra-se de ter falado pouco com o arguido C. O Chaveiro estava ao pé das telefonistas, mas não tinham ordens para dar as chaves, a não ser as do arquivo da contabilidade, as outras chaves estavam com o (…)e não se recorda de ter dado chaves ao arguido C. Lembra-se de o arguido A ter ido algumas vezes ao gabinete do arguido C. Numa circunstância em que estava a trabalhar viu o arguido A a sair do gabinete do arguido C, o arguido C chamou o arguido A e este voltou-lhe as costas. Não se lembra de que palavras foram trocadas e no dia seguinte a secretária do arguido C, NY, disse-lhe que “esquecer” porque tinha “ficado sem efeito” (foi confrontada com o documento de fls. 12.350 e confirmou dizer respeito ao incidente). Disse que várias vezes tento contactar com o arguido A e este não atendeu o telefone, dava mensagem de desligado. Para si, pela maneira de falar, quando o arguido A falava com o arguido C, havia mais à vontade do que quando falava com outro dirigente, não era indelicado mas mais à vontade. Nunca viu o assistente AV com o arguido C. Foi um depoimento que o tribunal, pela proximidade que revelou do espaço da (...) e dentro da súmula que antecede, valorou globalmente, conjugado e acompanhado dos demais depoimentos que em sede de análise crítica da prova especificamente referimos. - HF, (…), (…) na área (...) no EY da AX. Em audiência de julgamento e por força das funções que exerceu na AX, demonstrou conhecimento sobre a vivência do assistente AI (tendo sido confrontada e prestado esclarecimentos, por exemplo, sobre o relatório de fls. 51.690, documentos do Apenso DD), AV e sobre o Educando CG. - HG, (…), a qual declarou residir numa casa situada “ no outro lado da (...)” da identificada nos autos como situada na Estrada (…), casa “(…)”, conhecendo de vista o proprietário da casa – a testemunha HD – desde que o mesmo foi viver para o local, há mais de 15 anos, tendo prestado esclarecimentos sobre o local e movimentação de pessoas naquela zona. O seu depoimento foi relevante para a prova dos factos referentes aos actos que o despacho de pronúncia diz terem sido praticados no prédio sito na Estrada (…) e foi prestado de forma que ao Tribunal aparentou isenta, não demonstrando interesse próprio ou outro nesta causa. - EB, (…), (…) na AX desde 1999, mas trabalhando na AX desde 1992. Disse estar na dependência hierárquica do arguido C, ligado à área dos recursos humanos. Desde 1994 o seu gabinete confinava com o gabinete do arguido C, a testemunha trabalhava sempre de porta aberta e por isso via sempre a porta do gabinete do arguido C (que disse trabalhar de porta fechada, mas havendo sempre pessoas a entrar e a sair.). Esclareceu, a instância feita, que quando o arguido C saía do gabinete não lhe dizia para onde ia. Pelo exercício das suas funções e pelo local onde trabalhava, demonstrou conhecimento directo de factos relacionados com a vivência profissional do arguido C. Assim e relacionado com a entrada ou saída de alunos do gabinete do arguido C, disse que só em alguma situação de algum aluno ir fazer um convite, é que os viu. A relação que viu entre o arguido C e o arguido A foi de respeito e nunca se apercebeu, nem lhe foi contado, qualquer situação em que o arguido A tenha sido malcriado para o arguido C. Para si o arguido A era o motorista afecto à (...) e por isso era o mais solicitado; mas não teve conhecimento de qualquer situação em que o arguido C tenha dado mais trabalho, ou mais horas extraordinárias ao arguido A. Disse ter conhecimento dos horários do arguido C, enquanto a filha do arguido esteve a estudar na AX, o arguido trazia a filha de manhã e levava-a à tarde, sendo o horário chegar às 8.30h e sair às 18.30h. Quanto a um outro aspecto perguntado pela Defesa do arguido C, a instalação do arquivo na cave da (...) e a abertura do refeitório também na cave da (...), não sabe o ano em que foi instalado o arquivo e o refeitório também não se recordou com segurança. Começou por dizer ano de 98/99, ou 2000, “mas mais” 98/99. Mas disse que almoçava “praticamente” quase todos os dias com o arguido C. Passando à utilização que o arguido C fazia quer do carro de serviço, quer do seu carro pessoal, começou por dizer que ao fim de semana o arguido C deixava o carro da instituição na garagem e saía com o carro pessoal; mas esclareceu, na sequência de pergunta feita, que nunca foi à garagem ao fim de semana. Prestou também esclarecimentos quanto à reunião que houve na AX em 27/11/2002. E prestou esclarecimentos quanto a um aspecto também referido pelo arguido C e que teve a ver com a disponibilização de telemóveis por parte de uma operadora, quando foi feita a instalação de uma antena na AX. Nessa altura - que não consegui precisar o ano -, confirmou que a operadora disponibilizou telemóveis para a AX, sabe que um foi entregue ao sr. HH, outro à testemunha e não sabe a quem foram entregues mais, tendo a dúvida se eram 3 ou 4 aparelhos. Desconhece se o telemóvel do arguido A era um destes, mas esclareceu que o arguido A “andava muito por fora” e não atendia o telefone, pois entendia que não tinha que utilizar o telefone pessoal para o serviço, relato que vai de encontro ao que foi dito ao Tribunal pelo arguido C. Foi uma das pessoas que também falou das características do arguido A como uma pessoa “ muito briosa”, descrevendo situações em que era preciso ajuda para trabalho ao fim de semana e foi o arguido A que se disponibilizou. Ficou espantado quando “soube do escândalo”, pois nunca lhe passou pela cabeça qualquer situação em relação ao arguido A. Quando a testemunha entrou para a instituição, o “discurso era” que A fora suspenso e teve que ser readmitido. A testemunha, no início do seu depoimento, declarou ser amigo do arguido C e ao longo do depoimento foi perceptível que tinha e manteve bom relacionamento com o arguido. No entanto o Tribunal não viu, no depoimento da testemunha, intencionalidade em omissão de factos ao Tribunal, que tenha contado facto criado por si ou faltado à verdade ao Tribunal para proteger algum dos arguidos, ou qualquer outra pessoa. Daí ter valorado o seu depoimento e o mesmo ter contribuído para a convicção do Tribunal. - HI, (…), tendo entrado para a AX em 1980 e tendo desempenhado as funções de responsável pelo curso de mecânica, responsável pela manutenção de viaturas e pela gestão da frota da instituição. Pelo exercício das suas funções demonstrou conhecimento directo do que era o serviço dos motoristas, incluindo do arguido A, a forma como o executava, utilização de veículos. Demonstrou, igualmente, conhecimento sobre transporte de alunos pelo arguido A, saídas deste com aluno das AX e sobre o relacionamento do arguido A com o arguido C, tendo o seu depoimento sido relevante quanto a tais factos. Declarou ter “razão de queixa” do arguido C, pois considera que este destituiu-o do cargo de gestor da frota, sem razão aparente quanto a si, o que ocorreu na sequência de uma reunião que houve em Janeiro de 2001 (mas acrescentando, que quando ocorreu a sua destituição, em Março, já lhe tinha sido anteriormente transmitido pelo arguido C, após a reunião de Janeiro, que iria ser substituído no cargo, por falta de tempo da testemunha, tendo a testemunha dito que na sequência disto pôs o seu lugar à disposição). Aquando da instância que lhe foi feita pela defesa do arguido C, disse que o arguido instaurou-lhe uma queixa crime, cerca de uma semana após terem sido conhecidos os factos referentes à AX. Não obstante esta declaração (quanto à razão de queixa que tinha do arguido C) e resultar do seu depoimento que tinha uma atitude crítica, negativa, em relação à forma como o arguido A estava e movimentava-se na instituição e a responsabilidade que imputou ao arguido C nesses factos, o Tribunal considerou que o seu depoimento foi globalmente objectivo. De facto e apesar da referida atitude crítica e negativa que demonstrou em relação ao arguido A e também em relação ao arguido C - pois do seu depoimento foi possível perceber que atribuída ao arguido C, pelo menos, a sua saída de encarregado da oficina da mecânica -, deu respostas que ao tribunal deixaram transparecer cuidado e responsabilidade para responder com verdade. Por exemplo, quando estava a responder às perguntas que lhe eram feitas sobre a utilização de veículos pelo arguido A na AX e esclareceu que não tinha conhecimento que o arguido A tivesse levado um carro ao sábado e só o tivesse trazido ao Domingo, o que demonstrou cuidado em responder com verdade quanto a tal pormenor, pois não foi evasivo, nem deu uma resposta dúbia: não teve conhecimento e disse-o; ou quando esclareceu, depois de primeiro ter dito que tinha sido destituído pelo arguido C, que afinal tinha (...) o seu lugar “à disposição” por o arguido ter-lhe sido dito que ia ser destituído, portanto, de qualquer forma já não ficava com o lugar, assumindo tal posição (o que para o tribunal foi sinal de cuidado em responder com verdade, pois não deixou de assumir as circunstâncias em que pôs o seu lugar “à disposição”); ou quando esclareceu que foram os motoristas que lhe disseram que o arguido A desculpava-se com serviços para o arguido C, mas a ele nunca lho disse. Assim, o Tribunal valorou o seu depoimento, mas cruzando-o e confrontando-o com os demais depoimentos, quantos aos factos para cuja prova o mesmo contribuiu. - HJ, o qual declarou ao tribunal ser motorista de ligeiros na AX, em CZ, desde o ano de 2000, embora tenha declarado trabalhar na instituição desde 1986 – tendo exercido funções na are da manutenção, garagens. Revelou ter conhecimento e “trato” directo com o arguido A, decorrente do facto de terem exercido as funções de motoristas na mesma altura e declarou conhecer o arguido C, pelas funções que exercia na AX. O seu depoimento foi particularmente relevante para esclarecer o Tribunal quanto ao modo como era feito a utilização, pelos motoristas da AX, dos veículos de serviço, controlo existente; bem como para esclarecer o tribunal quanto ao relacionamento do arguido A com o arguido C e quanto a um incidente que declarou ter presenciado na (...) da AX, entre o arguido A e em que, nas palavras da testemunha, o arguido A “virou” as costas ao arguido C, estando este a chamá-lo. O depoimento foi prestado de forma que o Tribunal considerou desinteressada, isto é, não revelando ou indiciando estar a prestar declarações e falar de factos para prejuízo ou benefício de alguém, mas com um discurso que revelava estar a relatar o que a sua memória conservava e “como o conservava” na altura em que foi ouvido - HK, (…) no CZ desde 2004, mas trabalhando na AX desde 1990, como auxiliar dos serviços gerais. Pelas funções que desempenhou na instituição - como auxiliar de serviços gerais esteve na portaria de CZ, no portão por onde entravam as viaturas de serviço -, demonstrou conhecimento directo sobre os factos relativos ao controlo de entrada e saída de veículos da instituição, pelo portão do CZ, pelo que foi relevante para o Tribunal. Descreveu ao Tribunal o controlo que então fazia das entradas e saídas dos veículos de serviços da Instituição, com registo do nome do motorista que conduzia o veículo e da respectiva matrícula, tendo especificado que inicialmente o controlo apenas era feito das viaturas de serviço e só posteriormente foi feito também aos veículos que entravam para os jogos que havia no pavilhão. Esclareceu que deixou de exercer estas funções com a entrada da Securitas e tendo demonstrado alguma confusão quanto à data em que tal ocorreu: inicialmente localizou a entrada da Securitas após o “reEAmento do escândalo”, isto é, após 25/11/2002, mas depois teve dúvidas se foi antes ou depois. Revelou, também, conhecimento do arguido A, o qual disse que conheceu em 1992, na condução de veículos desde 1994/1995 e lembrou-se, quando especificamente perguntado quanto a isso, que aconteceu o arguido A entrar com o veículo cerca das 23 horas e pedir à testemunha para anotar que entrara mais cedo, pedido a que a testemunha disse não ter acedido. O seu depoimento foi igualmente relevante quanto à utilização que, ao fim de semana, era feito por terceiros do espaço da AX, no CZ, para casamentos e baptizados, com a entrada de veículos e pessoas; e quanto à entrada e saída ou possibilidade de entrada e saída, de alunos da instituição. Foi um depoimento que o Tribunal avaliou como globalmente objectivo e isento, isto é, não demonstrando nem indiciando qualquer interesse pessoal ou de outra natureza, no desfecho ou em determinado desfecho, deste processo. - HL, (…), a qual declarou conhecer a arguida, por ter sido ama dos seus filhos entre 1997 e Junho/Julho de 2001. Entrava em casa da arguida, sempre pela porta das traseiras e ia pela cozinha para a sala onde estavam as crianças. Deixava os filhos de manhã, 9.30h/10h e ia buscar à tarde 17h/17.30h. Uma vez chegou a entrar na sala “ à esquerda”. A arguida tinha um neto da idade do seu filho. Nunca viu um (…) estacionado na (...) , carrinhas de “9 lugares” é possível. A avaliação e valoração deste depoimento será feita em sede da análise crítica da prova, a qual fará parte integrante do que fica dito. - HM, (…), disse ao Tribunal ser amiga da arguida Q desde há 20/21 anos. Declarou ter trabalhado de 99/2001 em casa do Dr. HN, o qual mora na casa geminada com a da arguida, em (…), nº nº (…). O seu horários era das 9h às 20h e ao sábado trabalhava todo o dia, mas ao Domingo só de manhã. Disse que ia “com muita frequência” a casa da arguida, por ser sua amiga, acrescentando que a arguida era uma “pessoa encantadora”. Entrava sempre pela porta de trás – mesmo ao sábado, sempre que podia ia a casa da arguida - , durante a semana a partir das 8.30h havia pais a deixarem as crianças em casa da arguida. Para além das pessoas de família – dizendo irmã, irmão, sobrinha, filha, genro -, que visse outras pessoas entrar “não se lembra”. E se houvesse barulho em casa da arguida tinha dado por isso, pois nas casas ouve-se tudo de uma para a outra. Confirmou a existência do cabeleireiro do genro da arguida, na parte de baixo do prédio onde a testemunha trabalhava, disse que esteve lá até 2000/2001, não sabe bem, mas tinha muito movimento. Não viu os demais arguidos em casa da arguida, sós os conhece da televisão, incluindo o arguido N. O Tribunal reserva para a análise crítica da prova a avaliação e valoração deste depoimento, o que fará parte integrante do que fica dito. - HO, (…) Q, ser comadre da arguida e mãe do genro da arguida, residindo na (...) (…) nº (…), em (…), na casa geminada com a da arguida (e explicou que o seu é o nº (…)e o Sr. HN, que vive por cima, no mesmo lado, é o nº (…)). Disse viver permanentemente naquele local há cerca de 16 anos e recordar-se da existência de um salão de cabeleireiro de homens que o seu filho teve na parte de baixo do prédio (disse (…)), trabalhava lá sozinho e do qual saiu para outro local no ano 1999/2000. Disse que o horário de trabalho, ao sábado, era o dia inteiro. A arguida Q teve hóspedes em casa, embora a partir de 1999 tenha deixado de os ter. Declarou ser grande amiga da arguida Q, sabe que a mesma toma conta de crianças e que o marido em 1999 teve um problema de saúde, que esteve meses de baixa, em casa sem sair, embora não saiba qual foi a doença que teve. Mas acrescentou que no ano de 1999 frequentava quase todos os dias a casa da arguida durante a semana, pois os seus netos viviam lá, indo pelas traseiras da casa. Continuou a dizer não se recordar qual foi a doença do seu compadre (marido da arguida Q). Descreveu o interior da casa da arguida e que não viu obras ou alterações. Disse não conhecer os demais arguidos, nem o arguido N, nunca viu em casa da arguido Q os demais arguidos, nunca viu carros de luxo à porta, só viu os carros dos vizinhos. Quanto à arguida disse considerá-la uma pessoa de bem e uma pessoa verdadeira. Foi um depoimento que o Tribunal valorou globalmente como objectivo e isento, dado que não obstante a relação de proximidade existente com a arguida - o seu filho é casado com a filha da arguida Q -, não aparentou ao Tribunal que não tivesses estado a relatar a percepção do que observou e o que viu. Isto sem prejuízo das observações que o Tribunal, em sede de análise crítica da prova, fez quanto a este depoimento, o que se convoca e faz parte integrante. - HP, (…), disse ser amiga da arguida Q há 18/19 anos, conhecem-se dos cursos de cristandade. Disse ao tribunal que a arguida alugava quartos as hospedes, não era habitual deslocar-se com o marido para fora . Conhece o arguido N como colega, relacionou-se com o mesmo nessas circunstâncias e os demais arguidos só da televisão. Nunca viu o arguido N em casa da arguida Q e às vezes ia lá. Também nunca lá viu a empregada do “Dr. HN, HM. A avaliação e valoração deste depoimento será feito em sede de análise crítica da prova, a qual fará parte integrante do que fica dito. - HQ, (…), o qual declarou ao Tribunal ter sido (…) desde 1991 no CZ da AX. Declarou, também, ter exercido funções de Porteiro na AX, inicialmente em substituição dos colega nas respectivas férias, isto ainda em 1991 e depois a tempo inteiro e até, aproximadamente, 2004. Do seu depoimentos resultou conhecimento directo (quando e porque referiu-se a factos que presenciou) e relevante (por estar directamente relacionado com factos integradores do objecto deste processo), quanto a três diferentes núcleos de factos que estão englobados e subjacentes nos factos “provados” e “não provados” acima enunciados, tendo contribuído essencialmente para a prova de factos relativos a : a) saídas do arguido A da AX, aos sábados e domingos, com alunos da AX; b) controlo das entradas e saídas de pessoas e veículos pelos portões da AX; c) ocupação dos espaços da AX/CZ aos fins de semana e controlo das entradas e saídas de pessoas e veículos nesse espaço, ao fim de semana; Demonstrou conhecimento directo das circunstâncias em que era feito o registo da entrada e saída de veículo da AX, bem como dos motoristas que conduziam tais veículos e como era feito esse controlo; da entrada e saída de demais veículos que não pertencessem à AX; da entrada e saída de pessoas e alunos pelos portões da Instituição; da entrada e saída do arguido A com alunos da AX, em veículos de serviço, aos fins de semana; pelo que o seu depoimento foi particularmente relevante nestes aspectos. E teve também um depoimento relevante para o esclarecimento do tribunal quanto à utilização, modo ou possibilidade de utilização de veículos de serviço por parte do arguido A, dado o conhecimento directo que demonstrou de tal facto, em consequência (também) de o arguido A ter vivido perto de si, tendo dito ao Tribunal que viu o estacionamento de veículos (carrinhas) da AX em frente à casa do arguido A. Em súmula - e aqui estamos perante uma daquelas situações que acima referimos, em que o Tribunal considera ter mais sentido mencionar desde já e de forma global, todo o depoimento e as razões específicas de atribuição de objectividade, credibilidade e veracidade, podendo assim manter melhor continuidade e fluidez da exposição na fase da análise crítica da prova, pois o depoimento desta testemunha irá ser usado pelo Tribunal para fundamentar diferentes núcleos de factos e, portanto, irá ser inserido de forma fragmentada em diferentes partes da análise crítica da prova -, do essencial do seu depoimento resulta que entrou para a AX em 1990/1991, tendo começado a sua carreira na instituição a exercer as funções efectivas de varredor - durante cerca de 3 anos -, após o que foi para as oficinas/manutenção (mas vindo, posteriormente, a exercer as funções de porteiro, no portão de acesso dos veículos de serviço no CZ, o que fez até, aproximadamente, 2004). No entanto, durante o período em que, nas suas palavras, “passou” de varredor para a manutenção, começou a exercer (parcialmente) as funções de porteiro nas folgas, feriados e férias dos colegas porteiros. Passou a ser porteiro, a tempo inteiro, desde, aproximadamente, 1996 - data anterior aos primeiros factos descritos no despacho de pronúncia -, no portão da saída e entrada de viaturas do CZ. A sua função, desde 1996, era anotar as entradas e saídas das viaturas da AX e só destas, pelo portão em que estava colocado. Esclareceu que as viaturas particulares, quer dizer, as que não eram da AX, entravam sem ser registadas, mas dizendo os seus condutores onde pretendiam ir. Confirmou ter visto carros da AX (carrinha (…) e a (…)), estacionados à noite junto da casa de A – casa que identificou situar-se na (...) (…), ao pé do DT -, mas não soube dizer ao tribunal se as carrinhas ficavam lá durante a noite ou não, pois a testemunha viu isto quando à noite, por volta das 23h (no máximo) passava por tal local, quando saía do turno da noite e ia para casa. Aos fins de semana, sábados e domingos, viu A sair de manhã cedo da AX com jovens da AX, no carro particular do arguido e nas carrinhas da AX que conduzia. Isto foi numa altura em que esteve a fazer – por troca ou para preenchimentos de faltas de algum colega - o turno da manhã, pois esclareceu o Tribunal que ou por ser o seu turno ou por fazer turnos de outros por causa de faltas, folgas, férias ou feriados, desde 1994/95, até há cerca de dois anos (em relação à data em que prestou depoimento), ao fim de semana fez turno das “16h/24h”, das “24h às 13h” ou das “8h às 14h”. Foi seguro quanto ao facto de nas alturas em que viu o arguido A, a sair com jovens da AX no seu carro particular - disse que levava entre um e quatro -, não ia qualquer professor ou treinador no carro. Pensa que iam para jogos do AX, futebol ou ténis de mesa, pois era o que o arguido A lhe dizia quando de manhã conversava com a testemunha, enquanto esperava pelos rapazes . Quanto aos jovens não sabia o nome, sendo que quando confrontado com os nomes dos assistentes AV, AN ou AT, os nomes nada lhe disseram. Pensa que eram do lar FD ou FC pela associação que faz de A dizer que iam para o ténis de mesa ou futebol e os jovens destes dois lares serem os destes desportos. Em geral parecia-lhe que eram sempre os mesmos “miúdos”. Mas esclareceu que isto era uma dedução sua, pelo facto de o arguido A os ir buscar ao lar e daí pensar que eram os mesmos. Quanto às idades, usou uma expressão: eram “miúdos grandes”, 12/13/14 anos, mas não deu a certeza. Quando viu o arguido A sair com jovens nas carrinhas de nove lugares que conduzia, houve vezes em que viu que no interior da carrinha iam os (...) ou treinadores e outras vezes não, embora tivesse a memória que, por regra, ia sempre o professor. Mas esclareceu, ainda, que às vezes os (...) ou treinadores iam nos próprios carros e acompanhavam a carrinha. Quanto ao regresso e por causa das horas do seu turno, só os via quando chegavam mais tarde e a testemunha estava a fazer o turno da noite. A não tinha hora de chegar ou de partir, mas não era o único motorista a sair cedo ou a chegar tarde. No que diz respeito ao controlo da entrada e saída de alunos da AX e isto no portão onde a testemunha estava, disse que o princípio era controlar as saídas e entradas dos alunos pelo cartão que tinham (eles deviam mostrar o cartão, para saber se era aluno com autorização para sair ou não, sendo que os do 5º e 6º ano não podiam sair sem autorização, mas os maiores disse que “podiam sair todos”). Mas acrescentou que não era com rigor que fazia este controlo, pois ao mesmo tempo tinha que atender o telefone na portaria, fazer o registo das viaturas e quando eram as alturas de intervalo das aulas, este controlo era difícil. Esclareceu que havia um outro portão, junto ao HR e na altura em que foram feitas as obras do centro – que a testemunha não conseguiu localizar no tempo e quanto à duração dizendo que decorreram durante 3 / 4 anos -, esse portão “ de baixo” não era usado e todos os alunos e viaturas entravam e saíam pelo portão “das viaturas”, o portão “de cima”, que era aquele em que a testemunha fazia o controlo. Disse que a confusão “era tanta”, que à hora de almoço tinham que por lá outro funcionário (notando o Tribunal que da sequência do seu depoimento foi perceptível que se esteve a referir ao “controlo” que acontecia durante a semana). Ao fim de semana, em regra sábado e domingo e por vezes sexta feira - e isto referente a alturas em que a testemunha esteve a fazer turnos e portanto factos que presenciou -, o espaço do refeitório da AX, no CZ, era “alugado” para casamentos, baptizados e festas (havia um restaurante, “ (…)”, que fazia esses eventos) e nessas alturas as entradas e saídas de pessoas e carros na AX, CZ era sem controlo. Disse que os portões estavam abertos, a cancela para os carros “para cima”, não havia registo de entrada ou saída de pessoas ou veículos. As pessoas andavam por todo o espaço do (...). Esta testemunha foi globalmente coerente e precisa no seu discurso – tendo em atenção o tempo já decorrido desde a altura em que começou a exercer as funções de porteiro, primeiro a tempo parcial e depois a tempo inteiro -, serena mas com vontade de esclarecer, não transparecendo dependência ou condicionamento do seu depoimento por temor reverencial ou outra situação limitadora, em relação à sua entidade patronal (AX) ou de qualquer arguido. Não resultou para o tribunal que tivesse tido contacto, simpatia especial ou menos simpatia com algum dos jovens identificados como vítima, ou com qualquer arguido no processo ou que tivesse preparado o seu depoimento com alguém. Foi, por isso - sendo sempre a presente análise completada com a que o Tribunal desenvolveu em sede de análise crítica da prova -, um depoimento prestado de forma que o Tribunal considerou globalmente objectiva, vincando quando em alguma parte do seu depoimento não se estava a referir a facto que tivesse presenciado ou se era dedução sua, com vontade de esclarecer e contar o que sabia e como o sabia e lembrava, não aparentando ou indiciando qualquer intenção de prejudicar ou beneficiar alguém. - HB, (…), da arguida Q. Disse que a casa da arguida não foi objecto de obras, descreveu-a quanto aos materiais e revestimentos. A arguida Q recebia visitas e falava muito com o Director do Hospital e a sua empregada. Não conhece qualquer um dos demais arguidos, nem o arguido N. O Tribunal relega para a análise crítica da prova a avaliação e valoração deste depoimento, a qual passará a fazer parte integrante do que fica dito. - HS, (…) na AX há mais ou menos 27 anos, o qual declarou ao Tribunal ter sido também aluno na instituição. Declarou ao Tribunal ter conhecido o arguido A na instituição, o qual considera ser uma pessoa correcta, sempre prestável, colaborante e não teve conhecimento de qualquer problema que tenha havido com o arguido. Soube que saiu da instituição e foi readmitido, mas não sabe o que se passou. Da sua vivência na instituição não teve conhecimento de problemas de prostituição ou de abusos sexuais. Quanto ao conhecimento do (...) ou dos (...)es (...)s por parte dos alunos, disse ao Tribunal que na sua perspectiva não tinham esse conhecimento, pois a sua experiência é que tinham que ajudá-los a identificá-los. Revelou conhecimento directo de o arguido A fazer transporte de alunos, embora no seu caso tenha associado esse transporte a serviço em que a testemunha também esteve presente. Prestou um depoimento que o Tribunal valorou globalmente como objectivo e isento, pois não demonstrou qualquer especial interesse, de natureza pessoa ou profissional, no presente caso ou qualquer reflexo que o desfecho pudesse ter em si. - HT, (…) no Hospital HU de (…). Disse ser amigo da arguida desde 1993, conheceu-a como ama da segurança social, a sua mulher teve um problema de saúde e a sua filha (…) (que “hoje”, quando a testemunha esteve a depor, em 22/01/07, tem 13 anos) ficou algumas noites em casa da arguida, a qual tratava por “…”. Falou da disposição interior da casa da arguida, pensa que o hall de entrada é revestido a azulejos, mas não tem a certeza, “nunca lhe constou frequências estranhas” em casa da arguida. Ia ao cabeleireiro do genro da arguida e quando ia ao sábado à tarde, às vezes deixava a filha em casa da arguida, mas não se conseguiu recordar desde quando o cabeleireiro deixou de estar ao pé de casa da arguida. Às vezes, ao fim de semana, visitava a arguida Q, para a filha a ver, tem bom relacionamento com a arguida, é como se fosse uma casa de família. O arguido N só o conhecia de “ver passar”. O Tribunal fará a avaliação e valoração deste depoimento em sede de análise critica da prova, a qual fará parte integrante do que fica dito. - HV, (…), pai do assistente AI, tendo prestado o seu depoimento essencialmente quanto a conversa que teve com o filhos, após terem sido conhecidos os factos dos autos. -HW, (…), a qual declarou conhecer o arguido K deste Centro, tendo prestado esclarecimentos sobre os horários do arguido no Centro – o qual disse pensar ser o da manhã – e sobre, por vezes, a falta de pontualidade do arguido na chegada. - HX, (…) no GB da AX desde há 5 anos, o qual disse ao Tribunal ser irmão do ex- (...) da Instituição, Dr. BQ. Declarou ao Tribunal não ter conhecimento de quaisquer factos , “foi um grande espanto” este processo, pois na sua perspectiva o arguido A era sempre uma pessoa disponível e bem educada, nunca tendo notado qualquer comportamento ou situação. Como director de um (...) confirmou a realização de análises pelos educandos, achava que eram duas vezes por ano mas isso era uma questão médica, com o Dr. HY, na qual não se meteu. Esclareceu também, em relação aos educando, a existência dos processos clínico, piscológico, o processo que estava no (...) e o da (...), relativos às diversas vivências. O seu depoimento foi valorado pelo Tribunal nos segmentos que antecedem, revelou-se objectivo, pelo que o Tribunal valorou-o. - BU, (…) na AX desde 1989. Declarou ao Tribunal dar aulas de tecnologia e mecânica, considera ter bom contacto com os alunos e nunca teve conhecimento de abusos de natureza sexual, segmento em que o Tribunal considerou relevantes as suas declarações. - HZ, (…), trabalhou na AX durante 32 anos, na secretaria da (...) desde 1986. Disse, em súmula e no que de mais relevante para o esclarecimento do tribunal, que na (...) raras vezes havia alunos, várias vezes viu o arguido A a falara com o arguido C, “tratavam-se normalmente” (eram todos os Chefe, quer o (...), quer o (...) (...)). Não viu o arguido A ser mal educado com o arguido C, “miúdos” no gabinete do arguido C só viu os filhos. Os “(...)es” ou os Directores podiam ver os processos dos alunos, pensa que “chamariam com certeza” a Chefe dos Serviços, mas não sabe se alguma vez isso aconteceu. Tinha a melhor impressão do arguido A, sempre disponível e bem dis(...). Levava o filho do Dr. BQ, fazia favores a toda a gente. Quem precisasse de ir às salas da cave da (...) iam buscar as chaves á telefonista. A testemunha chegou a ir aos arquivos na cave. A (...) tinha alarme, (…) é que tinha o código, mas não sabe se as telefonistas também o tinham. Foi um depoimento que o Tribunal, globalmente valorou como objectivo, embora a sua relevância dentro da súmula que antecede. - AI, (…), aposentado desde 2003/2004, o qual declarou ter sido porteiro na AX desde 1990, tendo exercido funções no portão de acesso em que era feito o controlo de entradas e saídas dos veículos da AX, tendo sido também vizinho do arguido A. O seu depoimento foi relevante para esclarecer o Tribunal quanto ao controlo que era feito, no portão de acesso às garagens e oficinas de CZ, da entrada e saída dos veículos de serviço da AX e dos motoristas que os conduziam (e a que se referem os elementos constantes do Apenso EJ, Volume 7); quanto ao controlo que era feito da entrada e saída de alunos internos das instalações; quanto ao movimento existente na AX, no espaço onde estava o CZ, ao fim de semana, quando havia casamentos, baptizados ou almoços em espaço cedido a terceiros para esses eventos. Revelou, também, algum conhecimento da vivência do arguido A, pois declarou ter sido vizinho do arguido. E declarou conhecer o arguido C enquanto (...) (...) e por causa do exercício dessas funções. Para o Tribunal o seu depoimento foi prestado de forma objectiva, não revelando ou indiciando interesse em narrar factos para prejudicar ou beneficiar alguém, ou que a forma como narrou os factos e as memórias que reavivou, não correspondesse aquilo de que se lembrava e como se lembrava. - IB, (…), a qual declarou ao Tribunal ter sido hóspede da arguida Q de Outubro de 1997 a Julho de 1998 (na casa da (...) (…), nº (…) em (…)) . Disse que nessa altura a arguida já era ama da segurança social, falou da sua vivência enquanto hóspede, estava em (…) de 2ª a 6ª feira e dizia sempre à arguida quando ia de fim de semana para a sua casa. Falou do conhecimento que teve da vida da arguida nessa altura, esclarecendo que não viu rapazes a frequentarem a casa ou qualquer um dos arguidos que veio a ver na televisão. Quanto a um salão de cabeleireiro do genro da arguida, lembra-se de ter funcionado enquanto a testemunha lá esteve, “acha” que funcionava ao sábado mas nunca lá entrou. Foi um depoimento que o Tribunal valorou globalmente como objectivo e isento, dado que não aparentou ao Tribunal que não tivesses estado a relatar a percepção do que observou e o que viu. IC, (…) ID, (…) IE, (…) IF, (…) IG, (…) IH, (…) IJ, (…) IK, (…) IL, (…) IM, (…) IN, (…) IO, (…) IP, (…) IQ, (…) IR, (…) IT, (…) IU, (…) IV, (…) IW, (…) IX, (…) IY, (…) IZ, (…) JA, (…) JB, (…) GE, (…) na AX, exerce funções na AX desde 01/10/1963 BX, (…), actualmente desempregada, irmã do assistente AK JC, (…) do assistente Y JC, (...), irmã do assistente Y e que também fpoi educando da AX, no DT, a qual falou ao tribunal sobre a vivência do irmão fora e dentro da AX, relacionamento com os pais e períodos que passava em casa, problemas que notava no irmão ao longo do seu crescimento; JD, (…), trabalhou na AX de Agosto de 1998 a Dezembro de 1999 JE, (…) a exercer funções na AX JF, (…) na AX desde 1999 JG, (…) no FA da AX JH, (…) JI, (…) na AX JJ, (…) no EZ da AX JK, (…) JL, (…) JM, (…) JN, (…) JO, (…) JP, (…) JQ, (…) JR, (…) JS, (…) JT, (…) JU, (…) JV, (…) JW, (…) JX, (…) JY, (…) JZ, (…) BJ, (…) KA, (…) KB, (…) KC, (…) KD, (…) KE, (…) KF, (…) KG, (…) KH, (…) KI, (…) KJ, (…) KK, (…) KL, (…) KM, (…) KN, (…) KO, (…) BS, (…) KP, (…) BZ, (…) EO, (…) KP, (…) KR, (…) KS, (…) KT, (…) KU, (…) KV, (…) KW, (…) KW, (…) do assistente Y, o qual foi ouvido na audiência de Julgamento de 11/03/08 e na de 27/03/08, tendo prestado esclarecimentos ao Tribunal quanto à vivência e crescimento do filho, quer dentro quer fora da AX e esclarecido que o seu filho nunca falou consigo sobre os factos deste processo. KX, (…) KY, (…) KZ, (…) LA, (…) LB, (…) LC, (…) LD, (…) LE, (…) LF, (…) LG, (…) LH, (…) LI, (…) LJ, (…) LK, (…) EA, (…) LL, (…) LM, (…) LN, (…) LO, (…) LP, (…) LQ, (…) LR, (…)da AX de 1988 a 2002, interna no FH – e irmã da testemunha LS -, a qual prestou esclarecimentos sobre a “ casa de (…)” da AX, bem como sobre factos relacionados com documentos que lhe foram exibidos, como fls. 30.045 vº, fotografia 1 e 3 e fls. 7.825; LT, (…) EL, (…), disse ao Tribunal que exerceu funções de Educadora na AX entre 1997/2002, no FD e FC (embora no FC . Declarou ter sido educadora do assistente AV nos dois lares, bem como ter sido educadora de Y, de AP (no FC), não se recordando de AT, nem de qualquer aluno com a alcunha de “ (…)”, tendo prestado esclarecimentos ao tribunal sobre a vivência do lar, colegas com trabalhou (no FC o colega (…) e o Colega (…)). EM, (…), presentemente é educador no CZ, no FD LU, (…) LV, (…) LW, (…) LX, (…) LY, (…), o qual declarou ao Tribunal ter vivido no prédio sito na (...) (…), nº (…), em (…), num período em que o arguido E também lá viveu , tendo demonstrado, por isso conhecimento directo sobre alguns factos relativos a tal vivência, aspecto em que o seu depoimento teve relevância para o Tribunal. Foi um depoimento que o Tribunal considerou globalmente isento e objectivo, não revelando qualquer interesse de natureza pessoal ou outro no desfecho deste processo. LZ, (…) MA, (…) MA, (...), gestor de empresas, o qual, devido à empresa em que exerceu funções, demonstrou conhecimento directo sobre o início e execução das obras que o arguido K executou na (...) (…), para instalação do (...) no nº (…) a (…); MB, (…), genro da arguida Q MB, (...), cabeleireiro, genro da arguida Q, tendo prestado esclarecimentos ao tribunal sobre a sua vivência no prédio sito na (...) (…), nº (…),(…), em (…), onde declarou habitar desde 1993 (ver a data de casamento, após ter casado com a filha da arguida Q. Prestou também esclarecimentos quanto ao exercício da sua actividade de cabeleireiro até Junho de 2001, no piso térreo da (...) geminada com a da arguida Q, que tem o nº (…). MC, (…) MD, (…), o qual teve intervenção na instrução do processo disciplinar movido ao arguido C, instaurado na sequência do conhecimentos dos factos objecto deste processo. Prestou esclarecimentos sobre a instrução e conclusão do processo e sobre documentos dos autos relacionados com tal processo. Para o Tribunal a sua relevância limitou-se a este objecto, em relação ao prestou um depoimento objectivo, relatando os factos de forma que ao tribunal aparentou ser destituída de interesse em determinado desfecho e, portanto, isenta. ME, (…) MF, (…) na AX desde Dezembro de 2002. Declarou ao tribunal ter sido motorista da (...)a Sra. BP, tendo entrado para a instituição apenas em Dezembro de 2002. O seu depoimento contribuiu, essencialmente, para o esclarecimento de factos relacionados com o encontro de assistentes no decurso do presente processo, pois falou ao tribunal dos jantares ou almoços que foram promovidos pela (...)a da instituição entre assistentes, por motivo de algum aniversário ou encontro de outra natureza. Falou, ainda, do transporte que fez do assistente AV para (…), a pedido da (...)a da AX e das circunstâncias em que ocorreu tal transporte. Foi um depoimento que o tribunal considerou globalmente objectivo, que não revelou interesse próprio ou outro neste processo e o tribunal não teve indícios de que a testemunha estivesse a relatar facto que não correspondesse ao que efectivamente tinha visto, feito ou percebido. MG, (…), o qual declarou ao tribunal ser motorista na AX desde 1993, conhecendo quer os arguidos A e C por essa razão. O seu depoimento foi especialmente relevante para esclarecer o tribunal quanto ao uso, distribuição e controlo, do serviço e das viaturas de serviço da AX, entre os motoristas, bem como quanto ao relacionamento do arguido A com os colegas de trabalho e com alguns superiores hierárquicos, entre os quais o arguido C e o sr. (...) BQ. O depoimento da testemunha, revelando conhecimento directo de factos que relatou, foi prestado para o tribunal de forma objectiva, demonstrando intenção de responder ao que se recordava e como se recordava, não indiciando interesse ou intenção de proteger ou prejudicar algum dos arguidos ou outras pessoas. MH, (…) MI, (…), disse ser amiga da arguida Q, confirmou ser ama da segurança social. O marido da arguida trabalhava no centro de saúde, nunca viu os arguidos em (…). Foi um depoimento em que as respostas não foram muito descritivas, já que respondia “sim” a perguntas longas e por vezes com respostas incorporadas, pelo que foi um depoimento que não assumiu particular relevância para esclarecer o tribunal. MJ, (…) MK, (…) ML, (…) no CZ da AX desde 1985 MM, (…) MN, (…) do arguido N MO, (…) MP, (…) a trabalhar na AX desde 1993 MQ, (…) MR, (…) na AX MS, (…) e é Chefe no Departamento de psiquiatria do DW MT, (…) MU, (...) da AX desde Setembro de 1999 MV, (…) MW, (…) MX, (…) MY, (…) MZ, (…) NA, (…), declarou ao Tribunal ter feito a construção da casa da arguida Q, falou sobre as alterações do edifício, depoimento que para o tribunal se revelou objectivo e isento, sendo que quanto à sua relevância específica, em sede de análise crítica da prova o tribunal enunciou-o. NB, (…) NC, (…) ND, (…) NE, (…) NF, (…) NG, (…) NH, (…) NI, (…) NJ, (…) NK, (…) NL, (…) na AX desde Janeiro de 1990. Disse ser educadora do FU, onde foi educadora do AI, mas por a testemunha ter estado no semi-internato do BF até ao ano 2000, conheceu-o quando este tinha 14/15 anos. Para além de um incidente do AI com uma educanda do mesmo lar (uma criança de 6 anos ), na casa de banho, nunca ouviu qualquer outra referência ao AI e que o envolvesse em actos de natureza sexual com outros educando, tendo confirmado a sua transferência para o CZ. A memória que tem é que o AI costumava ir às aulas – na (…) -, embora tivesse um episódio ou outro de faltas não justificadas. Ia de transportes públicos para a escola e saia sozinho. Quando a testemunha chegou ao Lar – dizendo que entrou em Setembro de 2000 - teve conhecimento que com a equipa anterior o AI ia aos fins de semana para casa de um amigo, ia à sexta feira e vinha ao Domingo para o lar, embora não soubessem quem era. Aconteceu também ter ido durante a semana para casa deste amigo. Foi a equipa da testemunha que tentou saber quem era este amigo e a família, mas a mãe ou o pai do amigo nunca apareceu. O AI deixou de ir e a testemunha disse ao tribunal não saber como aquela situação pode ter sucedido. Falou dos escuteiros que o AI frequentava, pensa que ainda foi no ano 2000, os quais eram ao pé da (…) e ia com outros colegas. Disse, ainda, que antes de estar no Lar esteve numa (...) em que o AI também esteve e “houve um episódio ou outro” em que o AI teve um problema de “não retenção de fezes”. Foi visto, levou o AI ao Dr. HY, foi observado e disse que não havia nada e não teve conhecimento de mais problemas. Disse, ainda, que nunca teve conhecimento de quaisquer rumores de abusos de natureza sexual na AX. Tendo em atenção a proximidade que revelou de alguns aspectos da vivência do AI no Lar, o seu depoimento foi essencialmente relevante neste aspecto, como contributo para a prova e não prova, dos factos objecto deste processo. Foi um depoimento globalmente valorado pelo Tribunal como objectivo e isento, não tendo dado indício de deliberadamente ter omitido ou deturpado factos, ou que não os tenha relatado da forma como se recordava. NM, (…) NN, (…) no EY da AX (ouvidas nas audiências de julgamento de 14/12/06 e 14/11/07), a qual falou ao Tribunal sobre o arguido A, as visitas que lhe fez depois de estar preso e conversas que teve com o arguido na prisão e como se encontrava. NO, (…) NP, (…) NQ, (…) NR, (...) NS, (…) NT, (…) NU, (…) NV, (…) NW, (…) no CZ da AX, a qual foi educadora num lar onde esteve o assistente AN, não tendo no entanto acrescentado contributo relevante para a matéria objecto deste processo. NX, (…) NY, (…), trabalha na AX desde 1981, casada com o arguido C NZ, (…) OA, (…) OB, (…) na AX EE, (…) na AX OC, (…) na AX durante 11 anos OD, (…) na AX até 2001 OE, (…) do arguido K OF, (…) OG, (…) OH, (…) EP, (…) OI, (…) OJ, (…) OK, (…) do arguido K OL, (…) OM, (…) ON, (…) OO, (…) OP, (…) OQ, (…), o qual foi educador na AX, no DT, tendo tido conhecimento directo de factos ocorridos em 1982 e relacionados com uma fuga da AX dos educandos (…) e (…), para uma casa em (…), relacionada com o arguido E, casa esta onde a testemunha se deslocou para ir buscar os jovens. OR, (…) OS, (…) OT, (…) HD, (…) OU, (…) durante 3 anos no CZ, mais ou menos desde Janeiro de 2002 a 2004. OV, (…), cujo depoimento não se revelou particularmente relevante para a prova dos factos objecto do processo. OW, licenciado (…), trabalha na (…) na coordenação de equipas de desenvolvimento de sistemas de suporte à decisão. OX, (…) OY, (…) OZ ((…) na AX, pelo menos desde 2001), tendo prestado depoimento quanto ao seu conhecimento da instituição, mas não tendo demonstrado conhecimento relevante para os factos deste processo. PA, (…), pertence aos quadros da AX desde 1991 PB, (...) da AX desde 1991 PC, (…) PD, (…) PE, (…) a exercer funções no Ministério da Saúde LS, (…), o qual esteve como aluno interno na AX até fim de 2007, tendo sido colega de lar da testemunha AZ e prestado esclarecimentos quanto à “ Casa (…)” da AX, onde declarou ter passado férias. Prestou também esclarecimento sobre factos relacionados com documentos com os quais foi confrontado, como fls. 30.045 vº, fotografia 3 e fls. 7.824 e sobre uma conversa havida com a testemunha NU, na qualidade de jornalista, encontro este na sequência de uma conversa que a testemunha AZ teve primeiro consigo; PF, (…), a qual, por força das suas funções, teve intervenção na fase de inquérito deste processo entre 25 de Março de 2003 até final de 2004. Participou na busca feita a casa da testemunha HD, do arguido C e do arguido E (cfr. Auto de busca de fls. 4.487). Sem prejuízo do que o Tribunal complementou em sede de análise crítica da prova – que se convoca, integrando, o que agora também dizemos - prestou um depoimento que para o Tribunal aparentou ser feito de forma serena, sem denotar subjacente interesse especifico ou próprio nos presentes autos e no seu resultado, dizendo quando não se recordava de diligência ou de aspecto específico de diligência e mantendo esta coerência ao longo do depoimento. Quando deparava com alguma situação que não se recordava ter ocorrido, se documentalmente se verificava nos autos que tinha acontecido essa situação ou diligência e a testemunha era confrontada com o auto ou documento respectivo, esclarecia o que entretanto se recordava, não tendo o Tribunal ficado com a convicção de a testemunha estar a ocultar algum facto ou diligência ao tribunal, ou a prestar depoimento com determinado intuito que não fosse o de exercer o seu dever como testemunha. Foi um depoimento que se revelou globalmente objectivo e isento, tendo o Tribunal ficado convicto que a testemunha respondeu com verdade e com a fidedignidade que a sua memória permitiu recuperar. PG, (…) na AX desde 1993 PH, (…) PI, (…) PJ, (…) PK, (…) PL, (…) na AX desde 1979 PM, (…) PN, (…) PO, (…) (Processo Apensado) PP, (…) PQ, (…), o qual disse ao Tribunal ter vivido na (...) (…) nº (…) (viveu na casa do seu pai), tendo sido vizinho da arguida Q. Entre 1996 a 2000 esteve a estudar fora de (…), tendo regressado em 2000. No entanto enquanto esteve a estudar ia a casa 1 fim de semana por mês. Disse que a (...) ao fim de semana é bastante movimentada, pois é um sítio onde estacionam os carros para os bares e cafés, mas acrescentando que isto era a partir das 21.30h. Ao fim de semana os miúdos que via em casa da arguida eram os netos, nunca viu entrar para lá outros jovens. Não conhece o arguido N. O seu pai é amigo da arguida Q. O seu depoimento foi valorado em sede de análise crítica da prova. PR, (…), presentemente aposentada, a qual exerceu funções num estabelecimento de ensino onde o arguido K foi Docente até à sua prisão, tendo demonstrado conhecimento directo de alguns aspectos e períodos, dos horários do arguido na Escola. Declarou, também ter sido doente do arguido K até este ter sido preso, tendo sido consultada pelo arguido quer no “ (...) antigo”, quer na “(...) nova”. BK, (…) na AX desde 1993 PS, (…) na AX desde 1978 PT, (…) - PU, (…) na AX , no GA, desde 1998), a qual declarou ter conhecido o arguido A e, reproduzindo as suas palavras, “só posteriormente ao escândalo” teve conhecimento de factos de abusos. PV, (…) PW, (…) na (...) da AX, a qual prestou depoimento essencialmente sobre o espaço da (...) e sua utilização, mas não tendo acrescentado contributo especialmente relevante para o esclarecimento do Tribunal. PX, (…), a qual foi aluna interna da AX de 1989/90 até 2000, tendo estado no FE. A testemunha que descreveu ao tribunal a sua vivência no (...) e conhecimento do arguido A, disse ao tribunal ter conhecido o arguido A e ter ficado “ espantada quando viu TV” as notícias referentes a este processo. O seu depoimento concorreu para a prova dos factos relativos a transportes de alunos por parte do arguido A , para jogos ao fim de semana e que os educadores tinham conhecimento de tais deslocações pois no seu caso pedia sempre autorização. Não tendo, contudo, revelado conhecimento de outros factos que directamente ou de forma próxima, pudessem contribuir para o esclarecimento do núcleo essencial dos factos objecto deste processo. Foi um depoimento que o Tribunal valorou como isento e objectivo, não tendo tido qualquer indício de que a testemunha não tivesse relatado ao Tribunal o que se tinha passado consigo e como se tinha passado. PY, (…) no (...) EY da AX, a qual disse ao Tribunal nunca ter ouvido falar de abusos dentro da AX. O seu depoimento versou, essencialmente, sobre a vivência do (...) em que era Directora, controlo de alunos e relacionamento dos alunos dentro da instituição. Falou sobre o controlo de análises que era feito aos educandos, periodicidade e universalidade. Disse ao Tribunal ter estado presente numa reunião que houve na instituição no dia 25/11/02, após o conhecimento dos factos deste processo, na qual esteve presente o arguido C e que a impressão com que ficou é que a ideia era de esclarecer a situação e não de abafar, mas não se recordando se esteve em alguma reunião no dia 27/11. Declarou ter conhecido o arguido A quando esteve em DT, era uma pessoa prestável e correcta. Quanto ao conhecimento de doenças contagiosas que quaisquer educandos tivessem, disse que os dados seriam conhecidos pelos educadores, pelo (...) e pela assistente social, sendo que os educadores “às vezes” diziam “lá vão os miúdos fazer outra vez análises”, dando a entender que o diziam por não concordarem. Para o Tribunal o seu depoimento foi objectivo e isento, não revelou qualquer interesse especial no processo e no seu desfecho, tendo sido valorado pelo Tribunal na medida do que ficou ex(...). PZ, (…) QA, (…) do arguido A QB, (…) QC, (…) no EX da AX desde 1991, educadora na AX desde 1991, no EX, declarou ter conhecido o arguido A, não ter tido conhecimento de quaisquer factos, não tendo o seu depoimento contribuído de forma relevante par o esclarecimento e prova dos factos objecto deste processo. QD, (…) QE (…) no FA da AX desde 1996 QF, …) no FA da AX desde 1987 QG, (…) na AX desde 01/02/1988, a qual disse ao Tribunal nunca ter ouvido falar de abusos dentro da AX, não tendo revelado conhecimento directo ou indirecto relevante, sobre os factos objecto do processo. QH, (…) QI, (…), foi casada com o arguido N durante 23 anos QJ, (…) QK, (…), cujo depoimento não foi particularmente relevante para a prova dos factos objecto do processo, dos quais não revelou conhecimento directo ou indirecto de particular importância. QL, (…) QL, , enfermeira, a qual trabalhou com o arguido K no Centro de saúde (…), tendo prestado declarações sobre factos do desempenho profissional do arguido nesse centro e sobre uma consulta que o arguido K fez ao assistente AT. QM, (…) QN, (…) no GL do FA, na AX QO, (…) QP, (…) QP, , gráfico, funcionário da AX e colega do arguido C até 1971, tendo prestado declarações também quanto ao carácter e vivência do arguido C. QQ, (…) no armazém de CZ na AX QR, (…), a qual foi vizinha até 2003, em (…), da arguida Q. Disse ao Tribunal ter carinho pela arguida, o prédio onde viveu tinha uma casa de “diferença” do prédio da arguida e ia “muitas vezes” a casa da arguida, “2 vezes por mãe” ia a casa da arguida, embora durante a semana ao fim do dia, porque trabalhava durante o dia. No entanto ao fim de semana era visita frequente, à tarde, batia-lhe à porta e entrava. Disse saber que a arguida era ama da segurança social, “pensa que tinha miúdos durante o dia”, esclarecendo que entre 1998/20001 “pensa que sim…”, embora não se lembrasse de ver alguém deixar lá os miúdos, mas pensar que sim, isso, acontecia. Também falou quanto ao salão de cabeleireiro que o genro da arguida tinha na “cave ” do prédio da mãe, “por baixo da casa do Dr. HN” (esclarecendo que a testemunha vivia no nº (…)). Isto aconteceu entre 98/2001, pois o seu marido ia lá cortar o cabelo, estava aberto ao sábado todo o dia. Nunca viu carrinhas com miúdos, nunca notou ao fim de semana que isso acontecesse. No descampado em frente à sua casa estacionavam carros, mas nunca viu aglomerado de carros ou um (...). E não viu os arguidos em (…). Em contra instância do MºPº acrescentou que não se “preocupava muito com quem entra e sai”. Disse que não “faz ideia” se o marido da arguida esteve algum tempo fora, sabe que tem uma saúde precária “mas não sabe nada de especial”, acrescentando - na avaliação do Tribunal, quanto ao que foi o sentido inicial e afirmativo das suas declarações - , afinal não haver tanta intimidade com a arguida quanto inicialmente parecia resultar do seu discurso e que “às vezes nem entrava” em casa da arguida. E acrescentando, nesta altura, não se recordar de o marido da arguida Q ter estado hospitalizado. Foi confrontada em audiência de julgamento com a fotografia constante do apenso TA (fotografia panorâmica da (...) (…), onde está retratada a casa da arguida Q) e onde indicou ao Tribunal a casa em que morava. Foi um depoimento que o Tribunal valorou globalmente como revelando menos conhecimento do que aquele que, inicialmente, deixava supor. Com efeito a testemunha começou por ser muito objectiva e afirmativa quanto à proximidade e convivência com a arguida, o que se foi esbatendo à medida que foi sujeita ao contra interrogatório, análise e valoração que o tribunal fará em sede específica de análise crítica da prova. BM, (…) QS, (…) na AX desde 01/04/1998 QT, (…) QU, (…) QV, (…) QW, (…) QX, a (…), segurança, actualmente reformado QY, a (…), estudante em CZ no curso de mecânico QZ, (…) RA, (…) RB, (…) RC, (…) RD, (…) RE, (…) RF, (…) RG, (…) RH, (…) na RI, foi funcionário na AX de Maio de 1999 a Dezembro de 2000 EI, (…), declarou ao Tribunal ter trabalho com a AX, no âmbito do apoio informático que era dado pela empresa “(…)”, tendo revelado conhecimento directo do sistema informático da instituição, sua organização e modo de funcionamento. No entanto esclareceu que não conhecia as bases de dados de alunos da instituição, não conhecia os conteúdos, não sendo o software da sua área. Declarou que conheceu o arguido C apenas na AX, teve uma relação de trabalho não diária mas frequente. Nas instâncias que lhe foram feitas descreveu o espaço físico das caves da (...), onde ficava a sala com o material informático (disse que era o seu “laboratório”, não tinha horas “para lá ir”, a chave da sala a que ia estava no departamento de informática) e falou quanto ao conhecimento que entendia que o arguido C tinha do sistema informático da instituição. Disse que o arguido C “faria” a análise do que era programado, pois “que se lembre” nunca lhe pediu ajuda. “Pensa” que o arguido C, em relação ao sistema informático, podia ter acesso “ quando quisesse” e “como quisesse”, “devia ter acesso a “passwords” mas este não era o âmbito da sua intervenção, tendo disto tudo isto - assim o entendeu ao Tribunal -, devido aos conhecimentos e à responsabilidade do arguido na implementação do sistema informático da instituição. Foi um depoimento globalmente objectivo, isento na medida em que o Tribunal não verificou ou detectou intenção de beneficiar ou prejudicar alguém ou interesse nesta causa, tendo por isso valorado pelo Tribunal. RJ, (…) RK, (…) RL, (…) RM, (…) no FW do FA da AX desde o ano de 1988, numa altura em que disse ser Directora do (...) a Dra. RN (de acordo com as suas declarações foi-o até 96/98). Falou dos processos do educando que existiam, disse que havia um processo individual e um processo relativo à saúde, o que estava à parte. Neste processo registavam as deslocações ao (...) - tendo sido confrontado com fls. 523 a 538 do Apenso Z-1, e confirmado que isto eram registos das deslocações ao (...) -, tendo havida uma altura em que levavam uma ficha para a consulta, onde o (...) escrevia as observações relativas a essa consulta. Estas fichas ficavam no processo de saúde do lar, que não era o processo individual. No lar onde estava (FW) os educadores tinham acesso aos resultados das análises que os educandos faziam. Disse ao Tribunal não conhecer o assistente AC. O seu depoimento foi avaliado como objectivo e isento pelo Tribunal, pois não revelou qualquer interesse pessoal ou profissional, que pudesse alertar o Tribunal para que o que disse não pudesse corresponder ao que tinha visto ou vivenciado. Pelo que o Tribunal valorou o seu Tribunal, essencialmente no âmbito dos procedimentos quanto a aspecto relativos à saúde dos educados no FA. RO, (…) RP, (…) RQ, (…) RR, (…), está a fazer um estágio profissional numa loja de conservação e restauro no (…) RS, (…) em 3º grau do assistente AP EC, (…), o qual declarou ao Tribunal ser funcionário da AX desde Maio de 1978 e motorista na AX há aproximadamente 20 anos. Pelas funções de motorista que desempenhava e pelo conhecimento directo que demonstrou do que era o serviço dos motoristas, nos quais estava incluído o arguido A, o seu depoimento foi relevante para o esclarecimento dos factos relacionados com a forma como os motoristas desenvolviam o seu serviço (escalas, conhecimento de serviços, trocas de serviços); controlo que era feito sobre os motoristas, distribuição de veículo, entrada e saído de veículos de serviço da instituição; para o esclarecimento de aspectos da vivência pessoal e profissional do arguido A na AX, seu relacionamento com o arguido C, seu relacionamento com alunos. Foi um depoimento que foi prestado deixando transparecer falta de à vontade e constrangimento em falar dos factos, perdendo objectividade. Relacionado com este aspecto da objectividade e também isenção - e da forma como a testemunha prestou o seu depoimento -, sucedeu que a determinada altura do depoimento da testemunha e por a mesma revelar, para o Tribunal, um aparente pouco à vontade em responder à instância que lhe estava a ser feita, o Tribunal interrompeu, para perguntar à testemunha se se sentia incomodado ou perturbado para prestar o seu depoimento, se havia alguma coisa que o impedisse de dizer a verdade, se precisasse de alguma pausa ou interrupção para o dizer, porque quem estava a avaliar e a julgar era o Tribunal, a responsabilidade da testemunha era só dizer a verdade. A testemunha respondeu que nada o impedia de dizer a verdade e que nada o limitava e que era, em súmula, apenas a questão ou a dificuldade de estar agora a recordar factos passados, continuando o seu depoimento. Mas num momento posterior, quando lhe estavam a ser feitas perguntas e insistências, sobre o relacionamento do arguido C com o arguido A e vice versa, a testemunha, ao dar as respostas, voltou a ter a atitude de retracção, falta de espontaneidade, como que não dizendo tudo o que efectivamente sabia ou tinha “pensado” - mas assinalando que as respostas às perguntas que lhe estavam a ser feitas continham, de algum modo, transmitir a avaliação que a testemunha fez de determinadas “coisas” que viu ou que ouviu e que, ao longo do tempo, foram-lhe criando determinada “ideia” em relação a pessoas, relacionamentos ou situações -, o que naturalmente pode causar alguma reserva a uma testemunha, em “avançar” com aquilo que “achou”. No entanto, não obstante o obstante os lapsos que revelou quanto à localização no tempo de alguns factos, as dificuldades que revelou quanto à recordação de certos factos, para o Tribunal foi um depoimento globalmente isento. A percepção do Tribunal foi que as aparentes dificuldades, lapsos ou incertezas, demonstrados ou perceptíveis no depoimento da testemunha, deverem-se essencialmente a problemas com a recuperação de memórias e não com qualquer intenção de alterar ou omitir informação, beneficiar ou proteger alguém. Daí ter sido um depoimento valorado pelo Tribunal. RT, (…) RU, (…) RV, (…) na AX desde 1992. Disse que desde Agosto ou Setembro de 2001 passou a trabalhar nas instalações da (...), no centro de informática, tendo trabalhado com a testemunha EF e conhecido, também pelo exercício das suas funções, o arguido C e a testemunha (…). Disse desconhecer se o arguido C tinha as chaves do centro de informática; tal como a testemunha (…) também disse ao Tribunal, confirmou que a chave da sala que a informática tinha na cave - onde faziam a manutenção do hardware - estava numa gaveta no Centro de informática; e falou sobre o que para si eram as condições de luminosidade ou visibilidade dentro da sala da cave durante o dia. Foi um depoimento globalmente objectivo e isento, não revelou ao Tribunal qualquer interesse nesta causa, ter relatado os factos com intenção ou o sentido de beneficiar ou prejudicar alguém, pelo que foi valorado pelo tribunal. RW, (…) RX, (…) no EY da AX RY, (…) na AX desde 1996 RZ, (…) RZ, (…) SA, (…) SB, (…) no restaurante (…) e (…) na Calçada (…), nº (…) SC, (…) na AX desde 1998 no DT SD, (…) na AX SE, (…), o qual declarou conhecer o arguido N. Disse ser proprietário de um quiosque situado no “lado o(...)” (…), situado perto da Casa da arguida Q, pois do seu quiosque disse ver-se o início da (...) da arguida. Confirmou ao tribunal ter frequentado desde 1995 o (…) do genro da arguida, o que se situa no prédio da arguida, que deixou de estar naquele sítio “ há ¾ anos” (prestou depoimento em 9/11/06). Conhece o arguido N e não o viu em casa da arguida Q. Também nunca teve referência ou conhecimento que o arguido H tivesse estado em (…). O depoimento foi valorado em sede de análise crítica da prova. SF, (…) SG, (…) EH, (…), o qual disse ao Tribunal ter sido docente na AX de 1976 a 2002. Exerceu funções no EY (entre 1976/1989), tendo demonstrado ter também conhecimento directo do espaço físico onde se situa a (...), no CZ, por ter estado ligado ao departamento de obras/arquitectura da instituição (com um departamento situado na (...)), sendo que, pelo exercício das suas funções, todas as semanas ia aos vários espaços ((...), CZ, EX, FZ, EY) da instituição . O seu depoimento foi, essencialmente, relevante para esclarecer os espaços físicos da (...), onde se situavam departamentos de registo ou informática, obras efectuadas. Falou ao Tribunal sobre as obras que foram feitas no refeitório da (...), esclarecendo que havia um refeitório no primeiro andar, o qual passou para as caves em data que não pôde precisar. A ideia que teve é que as obras duraram 6 meses a um ano, iniciavam-se às 8h da manhã e terminavam às 17horas e pensa que foram em finais de 1998 início de 1999. Às perguntas que lhe foram feitas pela defesa do arguido C, revelou algum conhecimento sobre os fins das salas que existiam nas caves das (...), essencialmente arquivo e depósito da informática, tendo a ideia que a remodelação do arquivo das caves foi feita antes das obras do refeitório, mas sabendo quando foi instalado o sistema “carril” na sala de arquivo. Prestou um depoimento em que o Tribunal não vislumbrou qualquer interesse próprio ou de outra natureza no desfecho do processo, tendo considerado, assim, globalmente objectivo e isento. SH, (…) EF, (…) a exercer funções na (...) da AX no Departamento de Organização Informática desde 05/02/1976. Pelo exercício das suas funções demonstrou conhecimento directo sobre factos que fizeram parte da linha de Defesa do arguido C , mas também da linha da Acusação. Em súmula e chamando o Tribunal a atenção para os aspectos em que o seu depoimento pôde ter relevância, disse ao Tribunal ter sido aluno da AX, não se lembra do arguido C como aluno e veio a trabalhar com o arguido cerca de 15 anos. Na sua avaliação o arguido C não tinha “muitos conhecimentos” de informática, mas sabia como analista de sistemas e o “resto” era com a testemunha (acrescentou que “pensa” que sabia bem do “circuito das coisas”) . Disse que era o arguido C que tinha a responsabilidade pela base de dados, incluindo quando havia necessidade de alterações das bases de dados. Falou sobre as redes existentes na AX na altura em que o arguido C lá estava, esclarecendo quais as suas responsabilidades e as do arguido C na gestão dessas redes (mas explicou que era o arguido C que dizia a que utilizadores eram afectos determinados módulos). Esclareceu, também, que entre as 18.30h e as 8h do dia seguinte, bem como ao fim de semana, o sistema ficava em “mono(...)”, sendo difícil de aceder ao sistema, pois o acesso ficava limitado; foi o arguido C que pediu este sistema de limitação de acesso durante este período. Disse, também, que na base de dados dos alunos estava previsto o registo dos dados biográficos dos alunos, a sua história, progresso escolar, mas não existiam dados (...)s ou psicológicos; explicou que os serviços do (…) lançavam os dados biográficos dos alunos e depois eram complementados no (...)s. Conheceu o Dr. HY como (...) da AX, nessa qualidade diz que podia ter acesso à base de dados clínicos , mas nunca teve conhecimento de que tivessem sido inseridos dados nessa base do “sistema central”. Ainda a instâncias da Defesa do arguido C disse que “pode” ter encontrado o arguido C na (...) ao fim de semana, no entanto não se recorda de isso ter sucedido; nunca assistiu a qualquer trato fora do normal entre o arguido C e o arguido A, não assistiu a tratarem-se por “tu”, o que a testemunha não teria estranhado se tivesse acontecido, pois considerava C uma pessoa simpática e o tratamento que tinha com ele era por “tu” (acrescentando que “relativamente bastantes pessoas” tratavam o arguido C por “tu”); nunca assistiu a qualquer tratamento preferencial do arguido C em relação ao arguido A e nunca viu situação de falta de respeito. Mas acrescentou - quando lhe foi perguntado sobre se tinha visto o arguido A a descarregar material informático com alunos na (...) -, que não tinha visto o arguido A a descarregar “coisas” com alunos, “pode ter acontecido”, mas a testemunha “ não passava muito tempo nos corredores”, entrava de manhã e não saía. Confirmou a existência de uma sala com material informático na cave (descendo as escadas era a porta em frente; descreveu a sala como com pouco espaço útil, espaço reduzido, portas com vidro, “antes” não tinha nada a proteger o vido, via-se de fora para dentro; esta sala ficava na cave para onde passou o refeitório, mas não se consegue recordar quando é que isto sucedeu), iam lá buscar consumíveis (mas não ia lá muito), confirmou que a chave estava no gabinete de informática (numa gaveta não fechada), mas desconhece se o arguido C lá ia sozinho ou não (embora tenha ido com a testemunha). Nunca viu alunos no gabinete do arguido C, a não ser a sua filha. E esclareceu - a perguntas que lhe foram feitas sobre o código do alarme da (...) - que nunca viu informação nos computadores sobre código de alarme distribuído a várias pessoas (pergunta esta relacionada com o documento de fls. 4.660 a 4.680, documentos com os quais foi confrontado, tendo esclarecido que nunca entregou este código ao arguido C, directa ou indirectamente). Avaliando globalmente o seu depoimento, para o Tribunal foi perceptível o bom relacionamento que teve com o arguido C enquanto funcionário da AX e a simpatia que ainda mantinha. No entanto não tivemos a percepção de que deliberadamente tivesse omitido informação ou não tivesse revelado ao Tribunal conhecimento de factos por causa dessa simpatia ou especial relacionamento. Assim, globalmente foi um depoimento que o Tribunal valorou, tendo a testemunha revelado conhecimento de factos, circunstanciais, mas com alguma relevância para a convicção do Tribunal. SI, (…), tendo desempenhado funções ma Secção de tratamento e análise de informação criminal, o qual prestou depoimento quanto aos “diagramas” referentes ao cruzamento de chamadas telefónicas existentes nos autos. SJ, (…) na AX no CZ SK, (…) SL, (…) SM, (…) no EY desde 1992 BI, (…), o qual declarou ao Tribunal ser licenciado em (…)a, tendo exercido funções na AX como (…) – com um contrato de 6 meses no ano de 2000 e a partir de Fevereiro de 2002 em regime de avença -, tendo trabalhado no internato da AX Declarou ao Tribunal ter tido contacto com o assistente AK, embora fora do âmbito de qualquer relação terapêutica, relação esta que, contudo, declarou ter tido como o Assistente AN a partir de Setembro de 2003. DF, (…) CF, (…) SN, (…) SO, (…) e (…) SP, (…), ex-aluno da AX SQ, (…) Na AX, CZ, o qual conheceu AV e AN – tendo os mesmos ido com a testemunha à exposição de (…), no âmbito de um projecto da AX -, bem como AP, X ; SR, (…) SS, (…) na AX ST, (…) SU, (…) SV, (…) SW, (…) SX, (…) SY, (…) do assistente W (Processo Apensado) SZ, (…), o qual disse ao tribunal ser motorista na AX desde 1979, tendo conhecido o arguido A como funcionário da instituição. O seu depoimento contribuiu, particularmente, para o esclarecimento do Tribunal quanto à utilização, distribuição e controlo dos carros de serviço e do serviço entre os motoristas da AX. Contribuiu, igualmente, para o esclarecimento do tribunal quanto à vivência do arguido A na AX, quer do ponto de vista pessoal, quer profissional, pois declarou conhecer o arguido há 26 anos, tendo demonstrado conhecimento próximo de situações relacionadas com o trabalho do arguido A e com o seu desempenho. Para o tribunal o seu depoimento foi objectivo, a testemunha relatou ao tribunal factos de que se recordava, sem indiciar a preocupação de poder estar a beneficiar ou a prejudicar alguém com o seu depoimento. TA, (…), ex-aluno da AX TB, (…) TC, (…) TD, (…) TD, (…), o qual exerceu funções de (…) no teatro (…), onde esteve de desde Outubro 92/93 e até 2000/01, onde conheceu o arguido H. TE, (…), fez segurança na AX durante 5 anos. Pelo exercício das suas funções, demonstrou conhecimento directo de factos relacionados com o controlo das entradas e saídas dos veículos de serviço da AX, de alguns aspectos do exercício da actividade profissional do arguido A e da sua saída com jovens da AX ao fim de semana na carrinha da instituição e no seu carro, um (…). Foi um depoimento globalmente isento, pois embora tenha demonstrado incertezas quanto a factos que começara por relatar com “segurança”, isso foi detectável no interrogatório e contra interrogatório a que foi sujeito. E percebendo-se que não se devia a qualquer invenção de factos ou intenção de prejudicar alguém, mas à natural diferença que existe quando as pessoas começam a falar de um facto e depois são sujeitas à peneira do contra interrogatório ou da aclaração do que disse e como disse. Pelo que foi um depoimento relevante e credível para o Tribunal. TF, (…) TG, (…) TH, (…) TI, (…) TJ, (…) TK, (…) TL, (…) TM, (…) TN, (…) TO, (…) na AX TP, (…) TQ, (…) da AX desde 1996 TR, (…) TS, (…) TT, (…) no FA TU, (…) TV, (…) TW, (…), actualmente reformado TW, (...), bancário, actualmente reformado, o qual declarou ser amigo do arguido C desde 1976, tendo prestado depoimento quanto ao seu conhecimento pessoal do arguido; TX, (…) TY, (…) TZ, (…) UA, (…) UB, (…), foi director do (...) EY da AX de 21/11/1974 a Fevereiro de 1999 UC, (…) na AX, tendo trabalhado na Instituição desde 1974 e aposentado “ há cerca de 3 anos”, em relação à data em que prestou depoimento perante o Tribunal (26/02/07). O seu depoimento foi relevante para esclarecer o tribunal quanto às funções que o arguido A tinha na AX, forma como as desempenhava, pois revelou conhecimento próximo e directo desse aspecto do “dia-a-dia” na AX, “voltas de serviço” que fazia e justificações que dava, ao “serviço” do arguido C. O depoimento foi prestado de forma que o Tribunal considerou objectiva, respondendo de forma espontânea e não indiciando qualquer sentimento ou intenção de prejudicar ou beneficiar, qualquer pessoa que estivesse a ser visada com as suas declarações. UD, (…) UE, (…) UF, (…) na (…), o qual, pelas funções que declarou ao Tribunal exercer no âmbito das telecomunicações e na (…), revelou conhecimento técnico e directo sobre os factos sobre os quais depôs, concretamente o funcionamento da captação e reencaminhamento de “antenas” pelo telemóvel quando faz uma chamada. Este depoimento, para além do já referido quanto ao conhecimento técnico e directo da testemunha sobre os factos sobre os quais depôs, revelou-se igualmente isento e objectivo, não demonstrando, por isso, qualquer interesse no desfecho deste processo. UG, (…)do assistente AV UH, (…) UI, (…) na AX desde há cerca de 12 anos UJ, (…) da AX durante 15 anos UK, (…) BT, (…) na AX desde 1990, educador no CZ da AX desde 1994 UL, a qual declarou ao Tribunal ser educadora na AX até à presente data - no DT desde 1 de Março de 1996, primeiro no FS e depois no FQ; em 2005 foi para CZ , embora tenha declarado estar em licença sem vencimento desde 1/11/2005. Declarou ser irmã da ex-mulher do arguido C – GW – e o ex-marido da testemunha, UM, ser também educador na AX . Pela natureza das funções que exerceu na AX demonstrou conhecimento directo da organização da AX , organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares, conhecimento do arguido A e do assistente AK. Essencialmente o seu depoimento foi relevante para a prova dos factos referentes à organização da AX , organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares, parte em que para o Tribunal se revelou objectivo e desinteressado. Isto sem prejuízo da específica avaliação que o Tribunal, em sede de análise crítica da prova, fez da globalidade deste depoimento e para a qual o Tribunal remete, como parte complementar e integrante do que agora ficou dito. UN, (…) na AX desde 1981 UO (…) no CZ da AX UP, (….) do arguido H há cerca de 30 anos, a qual prestou esclarecimentos ao tribunal - confirmando ter estado presente e as circunstâncias que rodearam a marcação do almoço -, sobre um almoço em 19/02/00, tendo sido confrontada e falado sobre os factos a que se referem os documentos de fls. 18.259 e 18.258, fls. 157 do Apenso EE, vol 2 e fls. 401/2, do Apenso EE, vol. 3 (eventos nos quais confirmou, por recordar-se, que o arguido H esteve presente). Prestou o seu depoimento ao Tribunal de forma isenta, pois tendo em atenção a instância e contra instância que lhe foi feita, a forma como respondeu, não resultou para o tribunal indício de que com as respostas estivesse a confirmar facto que, para si, não se tivesse passado da forma como o descreveu. UQ, (…) UR, (…) no FH da AX US, (…) UT, (…) UU, (…) UV, (…) UW, (…) UX, (…) UY, (…) da AX DB, (…) UZ, (…) na AX VA, (…) VB, (…), tendo prestado esclarecimentos sobre um processo instaurado na AX, tendo sido confrontado com os documentos constantes do Apenso Z-8, vol 1 (conforme consignado na respectiva acta da audiência de julgamento) VC, (…) EJ, aposentado, foi Director do CZ nos anos de 2000 a 2003 VD, (…) na AX desde 06 de Outubro de 1993 VE, (…) de (…), irmão do arguido N VF, (…) no FN desde 1994 VG, (…), o qual foi aluno da AX, de onde saiu em 1966, mas tendo pertencido ao Conselho de Alunos em 2003, conhecendo o arguido C desde 1997 e o arguido A, mas ambos só da instituição. Falou sobre a vivência na AX, tendo declarado nunca ter tido conhecimento de abusos de natureza sexual na instituição. VH, (…) BQ, presentemente (…) e, conforme declarou ao Tribunal, foi (...) da AX de Abril de 1986 a Novembro de 2002, embora tenha ingressado na AX em 1968 como educador. Declarou ter exercido as funções de Educador no EY até 27/10/74, altura em que saiu para o Serviço militar, tendo regressado à AX em 1/3/76, ainda com as funções de Educador. Em Agosto de 1976 passa a exercer funções na (...), como Chefe da secretaria Geral e em 1982 passa a exercer as funções de (...) (...). Pelas funções que exerceu na AX e pelo tempo durante as quais exerceu, demonstrou ao Tribunal conhecimento directo dos factos relativos à vida na Instituição, incluindo a carreira profissional do arguido A e do arguido C, o qual foi seu (...). No que diz respeito ao arguido A, a testemunha demonstro conhecimento directo dos processos disciplinares que o mesmo sofreu, sanções imposta, bem como as funções que exerceu ao longo do tempo, factos para os quais o seu depoimento foi particularmente relevante. Prestou um depoimento que o Tribunal considerou globalmente isento e objectivo – o qual foi avaliado pelo tribunal tendo sempre presente as funções que a testemunha exerceu dentro da AX desde 1968 -, mas sem prejuízo de, em aspectos pontuais, o tribunal ter tido dúvidas quanto à fidedignidade da memória que a testemunha revelou. O que o Tribunal assinalou em sede de análise crítica da prova e para a qual remetemos, completando o agora dito. VI, (…) VJ, (…), trabalhou na AX de Setembro de 1978 a Junho de 2006 VK, (…) VL, (…) VM, (…) VN, (…) VO, (…) na AX de 1990 ou 1991 até Outubro de 2005, estando aposentado quando ouvido pelo Tribunal. O seu depoimento, por ter demonstrado conhecimento directo de tais factos, decorrente quer do exercício das suas funções, quer por terem sido factos que observou, que se passaram ou que teve conhecimento dentro da AX, foi particularmente relevante para o esclarecimento do Tribunal: - quanto à utilização e controlo de utilização, bem como distribuição entre motoristas, dos veículos de serviço da AX, controlo da entrada e saída dos veículos no CZ onde estavam localizadas as garagens, distribuição de serviço pelos motoristas. - quanto à maneira de ser do arguido A, ao modo como este arguido desempenhava as suas funções na AX, seu relacionamento com outros colegas da instituição e com superiores hierárquicos, quer o (...) Dr. BQ, quer o arguido C, seu relacionamento com alunos – em particular o assistente AV - e transporte ou saídas que fazia com alunos. Foi um depoimento que o Tribunal sentiu, por vezes, ter que ser “puxado”, isto é - e como assinalámos em sede de análise crítica da prova -, houve respostas - identificámos isso, por exemplo, nas respostas relacionadas com a forma como o arguido A desempenhava as suas funções, o tempo que demorava ou o tempo que demorava “a mais” que os outros motoristas - que foram dadas a “custo”, pois foi patente para o tribunal que a testemunha não se quis comprometer com uma resposta. Isto não foi, para o Tribunal, por querer mentir ou estar a mentir, mas consideramos que relacionou-se com duas razões diferentes. A primeira tem a ver com um comportamento das testemunhas, que é usual observarmos nas audiências e que aqui neste processo foi observado frequentemente: as testemunhas dão uma resposta quanto a um facto e quando começam a ser questionadas quanto à forma como teve esse conhecimento ou ao efectivo conteúdo desse conhecimento - quanto ao que efectivamente viu ou ouviu; quanto ao que resulta de ter-lhe sido dito ou quanto ao que resulta de ter visto; e quanto ao grau de certeza do que está a dizer ter visto ou ter ouvido e como diz ter visto ou ter ouvido -, há normalmente e dizemos também naturalmente - até porque está em causa o reviver ou o contar e re-contar de uma memória e muitas vezes não recente -, um processo de recuo ou evasivo das certezas ou da forma como se fez a primeira declaração. A segunda tem a ver com a simpatia que a testemunha revelou ter em relação ao arguido A. Com referimos na análise crítica da prova, para a testemunha o arguido A era um bom colega - dando o exemplo de poder estar a regressar do (…), telefonar para o arguido A a dizer que no dia seguinte ia para (…) e precisava de determinado veículo e, quando chegava, o arguido A já tinha o carro lavado -, era incapaz de dizer que não fosse a quem fosse (acrescentando que “... como colega e serviçal, não há melhor, pode haver igual, mas não há melhor...”) e quando em Outubro de 2002 a testemunha esteve internada no hospital, com um AVC, o arguido A foi vê-lo quase todos os dias, pelo que a testemunha também o foi ver à prisão (dizendo, por causa desta visita, que “… a judiciária não gostou muito que o fossemos visitar lá à prisão... também deviam de ver que no Hospital e na prisão vamos visitar as pessoas…”). O que antecede, naturalmente - pois para o Tribunal tem a ver com a normalidade da natureza humana, como extraímos da referência que a testemunha fez, quando diz que “ao Hospital e à prisão visitam-se as pessoas” --, cria algum cuidado de ser afirmativo em determinadas situações que, de alguma forma, possam prejudicar ou ser entendidas como desvalor da pessoa pela qual se tem simpatia ou alguma simpatia e está em causa dizer e depor, quanto a um facto ou situação, em que está subjacente à resposta a testemunha dizer também o que “achou daquilo que viu ou do que ouviu” e não só o que “viu” (a reacção nestas situações pode ser a de pensar o Tribunal que julgue e “ache” o que entender que “aquilo quer dizer” e não eu…testemunha). Mas isto não constituiu, para o Tribunal que a testemunha tenha mentido. Aliás, quando lhe foi perguntado se a amizade que tinha pelo arguido A o impedia de dizer a verdade, respondeu de forma que o Tribunal considerou genuína: “…Não, Pão pão, queijo queijo (…). A amizade é uma coisa … a amizade entre aspas, sinto que fui visitado no Hospital por ele…”. Assim, prestou um depoimento que o Tribunal considerou globalmente isento e objectivo – sem intenção de deturpar o que viu ou o que ouviu e tentando reconduzir- se ao que se lembrava de ter visto ou ouvido, transmitindo assim preocupação de ser exacto e verdadeiro -, sendo a testemunha credível. Mas sem prejuízo da referência que acabámos de fazer, o que, em aspectos pontuais, retira espontaneidade ao depoimento e, em consequência, prejudica a aquisição da realidade e da verdade pelo Tribunal. VP, (…) VQ, (…) na AX desde 02/10/1991. VR, (…) VS, (…) VT, (…) na AX desde 01/04/1991 VU, (…) VV, (…) VW, (…)no CZ da AX desde 15/10/1990 – VX, (…) DJ, (…) VY, (…) ES, (…) VZ, (…), o qual disse ao Tribunal conhecer a arguida Q e o marido (e a viverem na casa identificada no despacho de pronúncia, sita em (…)). Ando com o marido da arguido num coro, o que sucedeu até 97/98. Esclareceu que os ensaios eram para dois coros, mas ao fim de semana (sábado e coro da Igreja) era quando a testemunha passava por casa da arguida para ir buscar o marido, para irem juntos para uns dos ensaios. Após 1997/1998, só uma vez por outra é que passou por casa da arguida. Disse que quando o marido da arguida deixou o coro, foi numa altura em que teve um problema de saúde e depois disso deixou de ir aos ensaios com tanta frequência. “Acha” que foi em 97/98, o problema de saúde foi uma “trombose num braço”, esteve em casa acamado porque o foi visitar, mas não sabe se esteve no Hospital. Acrescentou que a partir de “1998 para a frente” muito raramente passou por lá (por casa da arguida). Sabe que a arguida era ama da segurança social, pois teve uma sobrinha lá, numa altura em que lhe morreu a mãe (o pai da sobrinha é HT, testemunha que também foi ouvida pelo Tribunal). Conhece N de (…), mas não de lhe falar, mas também nunca o viu em casa da arguida Q. Quanto aos demais arguidos não os viu em (…). Foi um depoimento que o Tribunal valorou globalmente como objectivo e isento, dado que não obstante a relação de alguma amizade que deixou transparecer pela arguida e pelo seu marido, tanto que passou por casa deles a dar-lhes apoio, por causa do que estavam a passar, não aparentou ao Tribunal que não tivesses estado a relatar a percepção do que observou e o que viu. Isto sem prejuízo das observações que o Tribunal, em sede de análise crítica da prova, fez quanto a este depoimento, o que se convoca e faz parte integrante. WA, (…) WB, (…) WC, (…) UM, (…) na AX desde há 11 anos WD, (…) WE, (…) na AX, tendo declarado ao Tribunal ter entrado para a AX em 1974, para trabalhar, altura a partir da qual conheceu o arguido A e o arguido C. Na AX esteve primeiro como educador no EY, entre 1980 e ano em que foi para a (...), tendo dito que foi para a (...) em 1998. Declarou ser Presidente da Associação de Trabalhadores da AX, estando por isso ligado à organização da actividade desportiva de “futebol de 11”. Ligado a esta actividade e numa ocasião em que houve um actividade desportiva na AX, disse ao tribunal ter sido apresentado ao arguido K e de o ter visto na AX, por o mesmo ter ido assistir a jogos em que esteve presente o ex-aluno CY. No decurso do seu depoimento a testemunha declarou ter uma relação “inquinada” com a BP, na qualidade de (...)a da AX - por atitude que esta teve para consigo no âmbito deste processo ou relacionada com este processo, tendo-lhe dito não ter mais confiança na testemunha e tendo entendido a testemunha que a (...)a levantou a suspeição de a testemunha ter tido qualquer atitude de favorecimento do arguido K - o que, para o Tribunal, foi perceptível desde o primeiro dia em que a testemunha prestou depoimento. Esta percepção de alguma animosidade, por vezes deixando transparecer algum “interesse” pessoal quanto ao desfecho do processo - que foi sentido pelo Tribunal ao longo do depoimento da testemunha, pela forma como direccionava as suas respostas, não perdendo a oportunidade, mesmo que a pergunta feita não estivesse relacionada ou não o justificasse de imediato, de transmitir implícita alguma censura ou reprovação em relação a actuações da (...)a da AX, ou mesmo de outras pessoas envolvidas ou relacionadas com o processo – e que o Tribunal começou por considerar que se devia à explicação que a testemunha dera quanto ao relacionamento “inquinado” com a Sra. BP, veio a ter uma segunda explicação da testemunha. No ultimo dia em que prestou depoimento, a testemunha explicou um ressentimento que tinha em relação a uma testemunha do processo - JV –, explicação esta que dá sentido à percepção tida pelo Tribunal do “interesse pessoal” do depoente no desfecho deste processo. Sucedeu que a dada altura a testemunha sentiu-se envolvido com os factos que eram noticiados sobre a AX, através de uns artigos que foram escritos pela testemunha JV no jornal “WF” em que apesar de não referir o seu nome, fazia uma referência (a um “figurão” da AX) que a testemunha interpretou como dirigido à sua pessoa. Este ressentimento também se reconduzia para a Sra. Dra. BP, pois no dia em que saiu um artigo a testemunha JV esteve na AX, “de braço dado” com a Sra. BP, lamentando a testemunha que a (...)a não “tivesse tempo” para receber os funcionários da AX e já o tivesse para a referida testemunha. No entanto, apesar de o Tribunal ter tido a percepção de que a testemunha tinha, em alguma medida, um interesse no desfecho deste processo e quando respondia dava a sensação de querer justificar alguma coisa, o Tribunal não teve a percepção de que a testemunha tenha estado a mentir ao Tribunal: isto é, relatou os factos adicionando explicações que os permitissem interpretar de acordo com a sua visão dos mesmos ou com o sentido e censura com que pretendia que os factos fossem apreendidos pelo Tribunal. Mas não tivemos a percepção de que estivesse a relatar factos inventados e criados por si , ou que não correspondesse, o facto em si, aquilo que viu ou que lhe foi dito, nos casos em que isso possa ser valorado, mas sem prejuízo de os poder ter relatado tal como foram interpretados por si ao “vê-los” ou ao “ouvi-los”. Mas, como vimos pelas incidências do seu depoimento, a forma como ouviu ou viu os factos pode não ter correspondido exactamente ao que lhe foi dito. Daí, mas com a reserva que o Tribunal acabou de fazer, o Tribunal ter-lhe dado credibilidade. Não foi objectivo no relato, mas não tivemos a percepção de ter mentido ao Tribunal ou feito omissão de facto que tivesse conhecimento ser relevante para a descoberta do que se passou e que, intencionalmente, não o tivesse relatado. WG, (…) WH, (…) WI, (…) na AX de 1968 a 1982 ou 1983 WJ, (…), irmão do assistente AI WK, (…) WL, (…) WM, (…) WN, (…) na AX desde 1983 WO, (…) WP, (…) WQ, (…), trabalhou cerca de 8 anos na casa do arguido K WR, (…) WS, (…) do EX da AX WT, (…) ED, (…) (desde 1988) e (…) (desde “há oito anos” em relação à data em que prestou declarações, as primeiras, que foi em 18/09/06) na (...) da AX (tendo dito ser casada com o motorista EC). O seu depoimento foi relevante quanto a alguns aspectos relacionados com a forma como o arguido A desempenhou as suas funções ou a forma como se relacionava com o arguido C, tendo relatado ao Tribunal um episódio que presenciou, em que o arguido A desobedeceu ao arguido C, voltando-lhe as costas, remetendo o Tribunal para a análise crítica da prova, a valoração e avaliação que fez deste depoimento. WU, (…), mãe do assistente AT BN, (…) do FA da AX, desde o ano de 1999 até à presente data WV, (…) na AX desde 1986. Disse ao Tribunal que conheceu os arguidos A e C da (...) e conheceu também o arguido K, quando esteve em FA (de 1986 a Abril de 1991), por ter tido conhecimento que o mesmo era (...) dos internos, tendo passado a ir à consulta no Centro de Saúde, nas instalações da (...) (…). Falou do acompanhamento dos educando à consulta, disse que o fazia qualquer que fosse a consulta e que entrava no (...) - estava a falar da consulta do arguido K - do princípio ao fim. Disse que quando conheceu o (…). K pediu autorização para estar presente e nunca lhe foi negada essa autorização, (...) que eram feitas com a porta fechada. Não se recorda de o arguido K alguma vez ter pedido análises, a testemunha é que perguntava se podiam fazer análises e ia com os educando fazê-las a um (...) na (…), local que a testemunha conhecia. Também não se recorda de ter levado para a consulta qualquer “folha” onde ficavam registados os dados da consulta, ou de levar dossier do aluno. A testemunha anotava o que se passava na consulta e transmitia aos colegas do lar no “livro da passagem de serviço”. Foi confrontada com o documento de fls. 391 a 395, do Apenso Z-1, e disse que eram uma coisa “semelhante” ao que fazia quando passava o serviço. Foi também confrontada com fls. 247 a 249, do apenso Z-1 e esclareceu ser uma ficha individual de um aluno, mas não ter qualquer conhecimento de quem a preencheu. Foi também confrontada com os documentos de fls. 35.493/96, fls. 35.535/39 e fls. 35.541/49 e disse que nunca viu este tipo de documentos no FA. No entanto estes documentos são referentes ao assistente AC, o qual a testemunha disse não ter tido contacto, dizendo mesmo que o nome não lhe dizia nada. Só conheceu o arguido K como (...) de família dos alunos de FA, desconhecendo se na AX havia especialistas. Quanto ao nome Dr. HY, disse conhecer como o nome que “ouvia” do “(...) (…)”, não tendo revelado qualquer contacto ou outro conhecimento. Nunca viu qualquer comportamento do arguido K que lhe levantasse qualquer suspeita, nem ouviu queixas dos educandos. Disse, também que quando havia alguma situação de urgência falava para o(…) K e no “seu (...) “ - FA - “só viu “ o arguido K como (...), não teve conhecimento de outros (...) a darem assistência aos educandos. Falou do processo individual do aluno, que pensava que havia no FA, onde deviam estar os dados do alunos, mas disse que nunca viu nenhum. Depois de FA foi para o FC. Foi um depoimento que o Tribunal avaliou como globalmente objectivo e isento, nada fez indiciar qualquer especial interesse que tivesse levado a testemunha a alterar o seu depoimento em relação ao que tivesse efectivamente presenciado ou vivido, pelo que foi valorado pelo Tribunal essencialmente nos segmentos que reproduzimos por súmula. WW, (…) e também colabora na Junta de Freguesia (…) WX, (…) WY, (…) no prédio nº (…) da (...) (…), no (…) WZ, (…), casada com o pai do arguido N XA, (…) no prédio nº (…) da (...) (…) desde Outubro de 1998 XB, (…) no FC do CZ XC, (…) XD, (…) XE, (…) XF, (…) XG, (…) XH, (…) na AX desde 07/01/1997, presentemente é educadora no BF. Disse ao tribunal ter sido aluna da AX, mas enquanto aluna não ter ouvido qualquer referência em relação ao arguido A. No ano 200o foi exercer funções para o FU, onde conheceu o assistente AI, tinha 12/13 anos e as colegas da altura ((…),(…) e (…)) falaram-lhe numas situações de abuso entre alunos, em que o nome do AI estava referido. No entanto, no “tempo” da testemunha no lar, a situação em que o AI esteve envolvido foi com a educanda (…), tendo o AI sido transferido para o lar dos mais velhos por causa disso. Quanto ao arguido A, já como educadora lembra-se de uma situação em que o arguido A estava proibido de passar a portaria de BF, porque “iria ver” dois educandos irmão, um chamava-se (…) e outro a testemunha não se recorda, pelo que o arguido só podia ir à Secretaria para entregar o correio. A instâncias da Defesa do arguido C disse que não sabia quem era C, “nunca tinha ouvido falar dele”, disse “não ter mesmo recordação sequer de ouvir o nome dele”. Quanto à entrada e saída dos alunos no BF, entre 1998/2002, disse que durante a semana entravam e saiam sozinhos. Ao fim de semana já estava feito o contacto com a família pela equipa, durante a semana, pelo que “sabiam para onde iam”. Ainda quanto a AI e em súmula, quando a testemunha foi para o lar em Outubro de 2000, o AI ao fim de semana ( entre sexta e Domingo) ia para casa de um amigo. A equipa mudou e tentaram falar com a família e com o amigo, ainda conseguiram falar com o pai do amigo, mas como não foram ao (...), o AI deixou de ir para casa do amigo, o que a testemunha pensa ter ocorrido em “2001”. AI dava faltas às aulas, mas a memória da testemunha é que não era “nada de especial”, ele chegava a faltar dias inteiros às aulas, não sabia para onde ia, ele dizia que ia passear, mas a testemunha pensava que ele ia sózinho, pois não era educandos do Lar com quem faltava. Foi um depoimento que o Tribunal avaliou como globalmente isento e destituído de interesse pessoal ou profissional próprio, pelos que as imprecisões que a sua memória revelou quanto à localização no tempo de algumas situações – e isto quando confrontados com a análise que, em sede de análise crítica da prova o Tribunal fez quer dos documentos relativos ao AI, incluindo os registos dos livros de ocorrências do lar, quer dos depoimentos das testemunhas expressamente referidas quanto a este assistente -, não se deveu a qualquer intenção de distorcer a verdade, mas a lapso ou dificuldade da memória quanto a algumas circunstâncias dos factos. XI, (…) XJ, (…) na AX, está a estudar em CZ XK (…)do BF, na AX, Directora do EY desde 1/09/99. Em súmula e do que este depoimento constituiu especial aquisição em relação ao ouvido pelo Tribunal da demais prova testemunhal, disse recordar-se em 1999 de a avó de um educando, (…), estar preocupada por causa de uma aproximação constantes do arguido A com o neto, falou com o (...)BQ que lhe disse que o arguido A “estava muito melhor” e que ia falar com ele, tendo a testemunha ficado convicta que o BQ falou com o arguido. O arguido A era padrinho do educando AF, lembra-se da cerimónia e relatou também uma situação de aproximação com o educando AS. Não revelou conhecimento dos demais assistentes deste processo Falou sobre a organização e vivência do (...) de que era Directora. Das reuniões havidas na instituição após o conhecimento dos factos em Novembro de 2002 e interacção com a P.J. nessa altura, para os educando irem prestar depoimentos. Foi um depoimento que o tribunal, globalmente, valorou como isento e objectivo, tendo concorrido para o esclarecimento do tribunal, essencialmente no que diz respeito à proximidade do arguido A com os educandos. XL, (…), cujo depoimento foi relevante quanto às condições pessoais do arguido K, matéria aliás à qual foi apresentada. XM, (…) a mais ou menos 2000, mãe adoptiva do assistente X. O seu depoimento foi relevante para os factos que o Tribunal deu como provados quanto ao crescimento e vivência do assistente X, para o esclarecimento do tribunal quanto aos factos relacionados com o processo de destabilização emocional do assistente no seio da família adoptiva, processo que levou à sua institucionalização na AX, quanto ao modo como o assistente viveu dentro da instituição, fugas e como aí desenvolveu a sua vida. Foi ainda relevante, embora de forma circunstancial, para a prova/não prova dos factos relativos à participação do assistente X em deslocações a “(…)”, fazendo o Tribunal quer a avaliação quer a valoração deste depoimento em sede de análise crítica da prova. Foi um depoimento que o Tribunal globalmente avaliou como objectivo, pois a testemunha contou ao Tribunal, de forma que se nos aparentou como correspondendo ao que recordava e ao que sentia, o modo como o X entrou para a AX. A testemunha disse que também tinha sido da AX, o X não estudava, não tinha interacção em casa, não respeitava, em súmula, não o conseguia aguentar mais e na AX, palavras da testemunha, “sucedesse o que sucedesse” não o punham fora. Foi um depoimento em que para o Tribunal foi perceptível um total distanciamento emocional do X, foi perceptível que aquela mãe desistiu do filho e sem retorno, mas também não tivemos a percepção de que estivesse a inventar factos. A interpretá-los ou a avaliá-los sem qualquer margem de crédito para o filho, isso pareceu-nos que sim, mas não que os estivesse, pelo menos de forma que fosse perceptível para o Tribunal, a criá-los. EK, (…) na AX de 11 de Julho de 1995 a Setembro de 2004 XN, (…) XO, (…) XO, (…), empresária, a qual declarou conhecer a arguida Q e o arguido N de (…), tendo desde 1995 – com o seu marido, a testemunha SE -, um quiosque em (…), na (...) da “ cervejaria (…)”, (...) esta próxima da (...) (…). Prestou declarações quanto ao movimento da (...), tendo declarado nunca ter visto no local os arguidos A, H, K e mesmo N, nem um veículo (...). XP, (…) no CZ desde 1994 XQ, aposentada, trabalhou na AX entre 1966 a Março de 2006, tendo chefiado nos últimos 10 a 15 anos, a divisão de aprovisionamento e logística, onde desde 1997/1998 estavam inseridos os transportes da instituição. O seu depoimento contribuiu, essencialmente, para a convicção do Tribunal quanto aos factos referentes ao controlo e atribuição dos veículos da AX para efeitos de serviço; relacionamento do arguido A dentro da instituição com os demais funcionários e com o arguido C; forma como desempenhava as suas funções e sua avaliação na Instituição. A testemunha demonstrou, por vezes, o que o Tribunal interpretou como pouco “à vontade” em estar a falar dos factos. Isto foi notado pelo Tribunal, por exemplo, quando estava a responder a perguntas que lhe eram feitas quanto ao conhecimento que tinha sobre o transporte de alunos por parte do arguido A ou sobre o conhecimento que teve de quaisquer referências a situações de abuso de alunos e a que o arguido A estivesse ligado. A forma como respondeu e que em análise crítica da prova o Tribunal avaliou e registou, deu a noção de a testemunha não dizer logo tudo o que sabia, no primeiro momento após a pergunta, sendo necessário “puxar mais”. Mas o Tribunal não ficou com a convicção que tivesse mentido e ocultado a verdade ao tribunal. Teve movimentos que se traduziram em “respostas evasivas”, o que foi detectável pelo Tribunal noutras situações de inquirição de testemunhas funcionários da AX e não apenas nesta. Assim, por vezes não respondia logo a uma pergunta que era feita ou respondia de uma forma pouco espontânea. Exemplificando com esta testemunha, parecia um “ não toque que queima”: perguntada se teve conhecimento de factos relacionados com alunos e nos quais o arguido A tenha estado referido anteriormente, diz que não sabe nada; depois ouviu falar dos motivos do afastamento do arguido em 1989, mas “não tenho conhecimento de nada…”, sendo que resulta dos autos que fez-lhe uma avaliação se serviço em 1998 e, necessariamente, teve acesso ao seu registo biográfico na instituição. Assim, teve um depoimento que por vezes não foi espontâneo, filtrado e consequentemente translúcido. O que, no entendimento do tribunal, dificulta e dificultou a apreensão dos factos e da verdade. Mas foi um depoimento que o tribunal, em avaliação final, considerou que na essência descreveu os factos como se conseguiu recordar e como se recordava, mas embora não tinha sido um relato imediato ou espontâneo. Pelo que foi valorado. XR, (…) XS, (…) XT, (…) na AX desde 1985 XU, (…) , a qual declarou ter sido (…) no prédio sito na (...) (…), nº (…), em (…), durante 11 anos, tendo saído do prédio em 1999, prédio este em que o arguido E também viveu. O seu depoimento, pelo conhecimento directo que revelou dos mesmos – e sem prejuízo do especificamente dito em sede de análise crítica da prova -, foi essencialmente relevante para o esclarecimento e prova de tais factos. E foi prestado de forma que o tribunal considerou globalmente isenta e objectiva, não demonstrando qualquer animosidade ou especial relação em relação ao arguido E ou em relação a qualquer outra pessoa envolvida nestes autos. XV, (…), a qual disse ao Tribunal ter entrado inicialmente para a AX em 1987, esteve um ano fora tendo voltado em 1989, e estado na instituição até Novembro de 2000. Fazia orientação profissional e trabalhou com o CZ desde 1998. Falou dos processos dos alunos, não teve conhecimento que o arguido C alguma vez tenha pedido algum processo. Não teve conhecimento de qualquer situação de abuso dentro da instituição, nem conheceu qualquer dos assistentes deste processo. O seu depoimento não foi, por conseguinte, particularmente relevante para o esclarecimento do Tribunal. GW, (…), foi casada com o arguido C de 1974 a 1986, tendo falado ao tribunal sobre a vivência do arguido com os filhos após o divórcio (e tendo-se referido concretamente também ao ano de 1999), do carácter e personalidade do arguido, relacionamentos e amizades/inimizades no ambiente profissional e tendo também confirmado ao tribunal que o nº de telefone (…) era o da sua casa. XW, (…) na AX de Janeiro de 1988 a Dezembro de 2006, presentemente aposentada MMMM, (…) no EY desde 1983 MMMM, (…) na AX desde 1983, a qual declarou ao Tribunal ter sido educadora no BF, no internato de 1983 a 1990, de 1990 até ao ano 2000 no BF e de 2000 a 2003 no BE. A testemunha, pelo exercício das suas funções, revelou conhecimento directo sobre a vivência dos educandos na AX, não teve contacto directo com o arguido A e não teve conhecimento de quaisquer factos. Foi educadora do irmão do AI, tendo tido um conhecimento indirecto do assistente, dado que não foi seu educando. Prestou um depoimento objectivo e isento, embora não muito relevante para os factos a avaliar pelo Tribunal. XX, Procuradora Geral Adjunta, testemunha que demonstrou conhecimento directo sobre factos relacionados com um processo que se iniciou na Directoria da Polícia Judiciária como inquérito nº (…) e que foi remetido para a comarca de (…), tendo corrido nos Serviços do Ministério Público sob o nº (…) e do qual a testemunha foi titular e fez diligências, tendo o seu depoimento sido relevante para a prova ou não prova de tais factos. Teve um depoimento que para o Tribunal foi objectivo e isento, não demonstrando qualquer interesse de natureza pessoal ou outros neste processo ou quanto ao sentido do resultado deste processo e por isso foi valorado pelo Tribunal. XY, (…) XZ, (…) na AX de Outubro de 1968 a Julho de 2006, tendo declarado ao Tribunal ter estado desde 1981 no CZ, tendo exercido a suas funções em contacto directo com os educadores e falado sobre esse trabalho. Conheceu o arguido A na instituição, nunca tendo tido conhecimento que o mesmo tivesse estado proibido de fazer o transporte de alunos. No entanto referiu ao Tribunal que antes de se saberem os factos deste processo, um educador – (…) -, disse à testemunha que não queria que o arguido A se aproximasse dos educandos, embora não lhe tenha dito porquê e a testemunha também não tenha perguntado, explicando que não fez pois não é “curiosa”. Ficou “muito surpreendida” com o que veio a público sobre o arguido A, aquando deste processo. A testemunha nunca viu nada. Quanto ao arguido C via-o na instituição mas não nos lares, dizendo que não parecia “muito” nas festas de Natal, nem na festa do 3 de Julho. O arguido nunca lhe pediu qualquer processo de aluno, mas se o fizesse a testemunha era capaz de estranhar, sendo o (…) FB quem perguntava “mais sobre os alunos”. Quanto aos fins de semana dos alunos em casa, disse que eram combinados, mas acrescentou que “ não iam atrás dos alunos” e eles podiam ir para um lado e ir para o outro. Acrescentou que os educando não eram jovens que se “abrissem” muito “connosco”, o que o Tribunal interpretou não só com os educadores, mas também com as demais pessoas que faziam parte das equipas de internato. Demonstrou conhecimento directo do processo de vivência do assistente X na instituição - declarações que nesta parte foram cruzadas com os elementos que se encontram no processo psicossocial deste assistente, Apenso Z-15, volume 2º, fls. 658 a 769 -. Demonstrou, também, conhecimento directo do processo de vivência do AP na instituição. Disse que não os via “muito ligados” - o AP e o X - e quando lhe foi perguntado sobre um processo “(…)”, de forma afirmativa disse que o AP era o aluno que estava envolvido. Quanto aos livros de ocorrências dos Lares sabe que eram preenchidos, embora tenha dito que não tinha muito tempo para os ver, sendo a sua percepção que as coisas que os educadores escreviam eram mais recados entre os educadores, mas é claro referidos à vivência dos educandos. Apelidou-os de uns instrumento de trabalho, dizendo que havia falhas no preenchimento e dizendo ao Tribunal que não podia confirmar se as notas escritas correspondiam ou não à verdade. Falou também dos educando envolvidos neste processo, de quem soube e como. E disse que em relação ao assistente AV “soube logo” porque este manifestou-se. Referiu que a dada altura houve uma questão de terem sido pedidos (depreendeu-se para o processo) os livros de ocorrências do FC e soube que o assistente AP estava envolvido. X só soube “depois”, o qual conversava com a testemunha, mas sem falar deste assunto e deste processo. Do seu conhecimento o AV era um aluno “fechado”, só dizia o que queria e “também não falava verdade”. Inventava muitas coisas relativas à família, inventava uma vida em que era rico. Para a testemunha era mentiroso porque imaginava que ia ter uma vida que não tinha e não dizia o que fazia. Referiu a forma como se vestia, com um fato, era para imaginar que “era sempre mais do que era na realidade”, que mais tarde ia ser importante. Dizia que “fabulava” porque vivia num mundo que não era o seu, que ele imaginava e que não ia acontecer. E explicou, que o AV não diz, por exemplo, “ o meu pai tem um …”, era mais mais em relação à família : o irmão vivia em casa da tia com piscina e ele ia de 15 em 15 dias, tendo o Tribunal depreendido do seu depoimento que viver como o irmão era algo que AV tinha pena não lhe acontecer. Referiu o problema que este educando tinha de não retenção de fezes e os educadores queixavam-se que sujava a roupa. Tinha uma grande admiração pelo arguido A e queria também ser motorista. Ficou muito perturbado quando o arguido A foi preso, quis falar com a testemunha, mas a testemunha disse-lhe para falar com a polícia (esclarecendo que o AV não lhe quis “contar”, disse-lhe é que queria falar porque tinha coisas para contar). O que a testemunha entendeu é que AV queria ir em defesa do arguido A . No entanto, num segundo momento, esclareceu que esta conversa não foi com a testemunha mas com o (…). EJ, o director do CZ. Foi confrontada com o documento do “Apenso BX”, fls. 1 a 3 (documento que faz parte do processo individual do assistente AV), tendo esclarecido que não concordou com todo o teor do documento, não se recordando da razão concreta pelo qual foi feito, esclarecendo que se calhar foi para “esclarecer a situação” do AV. Em relação ao AV disse que após averiguação que fizeram de elementos do AV - averiguação que o Tribunal depreendeu ter ocorrido já depois do conhecimento dos factos deste processo e relacionando-a com registo de (...) do assistente -, chegou à conclusão que houve alturas em que o AV dizia que ia para casa da Tia e não ia (acrescentando que não faziam o controlo, “ele dizia que ia para casa da tia e pronto”.). Quanto a AP disse que era “mentiroso”, “roubava coisas” e não “se podia confiar”. Teve conhecimento da sua relação com o “processo (…)”. Falou também de AT, o qual considerava um miúdo mentiroso e difícil, desinteressado da escola. Tinha uma má relação com a mãe e na sua opinião era um rapaz traumatizado com esta relação. Era um educando que tinha más companhias, vivia no Bairro (…), mas a testemunha não sabe onde é que passava os fins de semana, dizendo no entanto que ia a casa de 15 em 15 dias. Explicou que foi para o FG porque a AX acabou com o FC, pois era um lar com alunos com problemas de comportamento, desorganizado. Tentou recordar-se de quais eram os problemas, interrogou-se se era de fugas de alunos, mas acabou por dizer que não se recordava. Embora tenha falado sobre factos da vivência dos educandos no lar ao fim de semana, resultou do seu depoimento que não era a testemunha que ao fim de semana os seguia, pois disse que sucedeu, de facto, ter ido a lares ao fim de semana, mas era quando tinha marcação de reuniões com pais de alunos. Mas também disse que às vezes os educadores não sabiam onde andavam os educandos, pois tinham seis ou sete para tomar conta e alguns saiam. Esclareceu que os alunos que passavam o fim de semana no (...) à tarde é que “estavam mais ocupados” e podia acontecer dizerem que iam ao cinema mas não irem. Ou dizerem que iam para casa e não irem, pois não havia a confirmação da família a dizer que já tinham chegado. E relacionado com o cinema, disse que apenas a partir de “certa altura”, que não precisou, é que passaram a ter que apresenta os bilhetes na tesouraria. Não associa AN e AT a este processo. Conheceu também o assistente Y o qual disse ser “ um miúdo mais espontâneo”, uma personalidade mais clara, transparente e mais brincalhão, considerando-o “um miúdo um bocado influenciável”. Ia para casa do pai e da madrasta e não lhe notou alterações. Quanto a CG, era “um miúdo muito magoado”, fugia, deu-lhe preocupações porque houve algum tempo que fugiu e que voltou muito magro. Foi o (…) EJ que o foi buscar à Polícia. Fugia “sem darem por isso” e “não o podiam trancar”. Era muito sozinho, não tinha Pai e Mãe. O CG não lhe referiu abusos. Face às funções que exerceu na instituição e ao conhecimento directo que em consequência disso revelou quer da vivência dos alunos, quer da vivência dos lares, realidades com as quais demonstrou ter tido um contacto próximo, não tendo revelado especial interesse na causa, por qualquer razão ou profissional, o Tribunal valorou globalmente o seu depoimento como objectivo e isento, tendo contribuído para esclarecer o Tribunal quanto ao que descreveu e concorrido para a convicção do Tribunal. YA, (…) na (...) (…) nº (…). Disse ao Tribunal ter sido vizinha, durante 37 anos, da mãe do arguido C. Num primeiro momento relatou lembrar-se de ver o arguido ao domingo em casa da mãe, a mãe dizia que ia lá almoçar, às vezes ia sozinho e às vezes acompanhado, não se recordava da forma como ia vestido. Num segundo momento disse que o via “quando via”, pois nem todos os Domingos estava em casa e não conseguiu ter uma noção exacta quanto à periodicidade com que via o arguido. Foi um depoimento que, embora impreciso, o Tribunal não ficou com a convicção que essa imprecisão viesse de estar a mentir, mas efectivamente de não se recordar. No entanto e face aos factos que relatou, a sua relevância foi meramente incidental. BH, (…) no HA YB, (…) YC, (…) YD, (…) YE, (…) YF, (…) YG, (…) JJB, (…) na AX YH (…), trabalhou no Teatro (…) de 1982 a 1996 ou 1997 YI, (…) na AX, no FA desde o ano 2000. Foi mais uma das testemunhas que não teve conhecimento de qualquer referência a abusos sexuais dentro da AX, praticados ou com suspeita da prática por qualquer pessoa. Revelou especial conhecimento da vivência do assistente AV, uma vez que trabalhou com o lar onde o assistente esteve internado e trabalhou de perto com a família de AV. Esclareceu o Tribunal que o assistente tinha duas tias, uma em (…) e outra fora de (…), não tendo conseguido recordar o local (com esta tia estava um irmão do AV). De acordo com o que se lembrava o princípio era o AV passar fins de semana com a tia de (…) e férias com a tia de fora. Havia no entanto uma resistência das tias e relacionado com o problema do AV de não retenção de fezes, sujava a roupa e escondia-a. Havia também alturas em que as tias não se entendia, pois de acordo com a sua percepção “…havia disputa…” entre as tias “para não terem o AV”, mas no entanto disse que havia afecto por ele, pois a atitude também não era de não quererem saber dele. Falou várias vezes com o AV, mas nunca abordou o problema de não retenção das fezes, nas suas palavras teve conhecimento da situação pelas educadoras e pelas tias. Disse, também, que AV tinha muita vontade de ir a casa e que se apercebeu da resistência das tias para o levarem. Disse que o FC era um lar problemático, o seu problema não era só “AV” - os problemas apontados pela testemunha, da avaliação global do seu depoimento, tiveram a ver com essencialmente com o estudo e o sujar da roupa, a dinâmica com a família, pois refere-se ao assistente como um “miúdo simpático” -, mas era um lar com comportamentos pré delinquentes e fugiam (disse que o seu trabalho era mais de uma intervenção como “bombeiro”, esclarecendo que na altura a equipa de educadores era (…), (…) e (…)). O seu depoimento foi valorado pelo Tribunal como objectivo e isento, não revelou especial interesse - pessoal ou profissional - que pudesse levantar suspeita ao Tribunal quanto a tal, pelo que foi relevante essencialmente no âmbito da súmula que fizemos. YJ, (…) no FA (antes de FA esteve no EZ), estando desde 1986 na AX. Conheceu o assistente AO, recebeu-o no FA tinha o mesmo 5 anos, educando em relação ao qual confirmou que o arguido A transportou, sózinho, para o Lar. O educando tinha 9/10 anos. Relatou uma conversa que teve com o educando, depois dos factos deste processo serem conhecidos. O AO começou por dizer, “sempre”, que nada se tinha passado com o arguido A, até que em 2003, quando estavam numa (...), contou à testemunha que tinham acontecido actos com o arguido, tendo descrito penetração anal. O AO agarrou-se à testemunha e chorava, dizendo-lhe que esta nunca mais ia confiar nele, pois tinha começado por mentir. Falou, também, sobre o assistente V. O educando era do lar onde a testemunha trabalhava, numa situação em 2002, quando estava a decorrer a notícia da detenção do arguido A, o V estava sentado a brincar, com colegas e disse (ouvindo a notícia da detenção) “Bem feito, Bem feito”. Tendo falado, de seguida, de uma situação contada pelo V, ocorrida numa (...) com o arguido A. Disse ter conhecido o arguido K como (...) de família dos jovens do (...). YK, (…), exerceu funções na AX de Maio de 1977 a Julho de 2003 YK, (…) YL, (…) YM, (…), a qual disse ao tribunal ter sido a “ Família de acolhimento” do AI, quando este saiu de uma instituição em que se encontrava internado, com o irmão WJ e antes de ter entrado para a AX. Explicou que esta situação de acolhimento foi transitória, apenas enquanto os serviços competentes procuravam uma instituição para os jovens, mas que a sua família continuou a receber o AI e o WJ aos fins de semana, embora tal não fosse de forma regular, tendo o tribunal concluído do seu depoimento, que no primeiro ano de internamento do AI na AX a ida a casa ao fim de semana foi “mais vezes” do que no segundo ano (tendo acrescentado que os fins de semana era com ida para casa da testemunha à sexta feira e regresso à AX ao Domingo; mas que no ano 2000 teve uma fase em que o AI só ia a sua casa ao domingo ao almoço). Descreveu o AI como um rapaz meigo e que até os funcionários da escola onde o AI esteve matriculado, antes de ir para a AX, gostavam dele. Pela proximidade que teve com o Assistente, revelou conhecimento de alguns aspectos da sua vivência, tal como os programas de televisão que o assistente via quando estava em sua casa e que era o “Cartoon network”, tendo utilizado a expressão “ de manhã à noite”. Relacionada com a televisão que o AI via – e respondendo na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido H - , disse que a “ pessoa H” era conhecida pela testemunha e pelo marido, mas pelos seus filhos – com idades próximas do AI -, não sabe se o conheciam. Do AI nunca se apercebeu qualquer comentário “à pessoa” do arguido H. Nunca notou alteração comportamental do AI, mas acrescentou que enquanto com o irmão do AI, se tivesse qualquer problema, “tudo ficava a saber”, com o AI era diferente, porque “ele não falava”. Quando o AI foi transferido de Lar na AX esteve “muito tempo” sem vir a casa e o que soube pelo WJ, por causa da mudança, é que “não tinha sido nada de especial”. Viu o AI e o irmão com roupa de marca. Não teve conhecimento dos factos deste processo – antes de terem sido divulgados - , mas depois de terem vindo a público um jornalista da DR tentou falar com o AI, bem como um jornalista chamado BO. Nunca se apercebeu que o AI se gabasse de coisas que fazia. Nunca lhe notou qualquer comportamento “antes de o escândalo rebentar”, nem depois. A primeira vez que ouviu que o AI tinha alguma coisa “ a ver com isto”, foi quando a “…” lhe telefonou e o AI também não lhe quis dizer. Da forma como o AI falou ficou com a ideia que não queria falar, a testemunha ainda tentou “falar com ele” mas o AI não quis falar e também não se abriu com o marido da testemunha. Prestou um depoimento que o Tribunal considerou objectivo e isento, não demonstrou qualquer especial interesse na presente causa, o Tribunal não teve qualquer indício de que tivesse alterado os factos que relatou ao tribunal, tendo em consequência merecido credibilidade e o seu depoimento valorado pelo Tribunal. YN (…), irmã do arguido K EG, (…) na AX desde 1974. Disse ao Tribunal ter tido relações de trabalho e de amizade com os arguido C e A. De 1974 a 1993 esteve como educadora no EZ e em 1993 foi para a (...), trabalhar para o serviço de aprovisionamento e logística. Neste serviço lembrava-se de ter vistas as folhas que eram colocadas nos veículos de serviços, para ser feito o registo da utilização pelos motoristas, mas não soube dizer ao tribunal quem as verificava. Falou sobre o relacionamento do arguido C e do arguido A, nunca viu qualquer falta de respeito do arguido A para o arguido C e disse ter conhecimento das duas alcunhas que o arguido A pusera ao arguido C - dizendo “(…)” e “(…)” -, mas esclarecendo que nunca viu o arguido A tratar assim o arguido C na frente deste, só tinha este tratamento com os colegas. No entanto disse que aconteceu a (…). XQ (ouvida como testemunha nos autos) ter pedido ao arguido A para este fazer algum serviço e este responder não poder, pois “o (…) pediu-me isto”. Disse que “às vezes” estava convencida que A dava “desculpas”, pois respondia que não podia fazer alguma coisa por estar em EY e aconteceu estar nessa altura a vê-lo, pela janela, ali no CZ. Disse que quem procurava o arguido A era a secretária do (...), a (…) HZ e o arguido C. Quanto ao tratamento por Chefe do arguido A, disse que era para toda a gente, até para a Chefe (…). XQ. Demonstrou conhecimento sobre as salas que existiam nas caves da (...). E disse ter ouvido a história de um aluno que se escondeu debaixo da Secretária do (...) (…) BQ e que lhe atou os sapatos, lembrando-se que foi a Colega MU que lho contou há 6 ou 7 anos (prestou depoimento em 24/01/07), mas a história já tinha acontecido antes. Falou, também, do assistente AV. Disse ao tribunal que uma vez foi à Despensa de CZ e estava lá “um miúdo”, sossegado e sempre pronto a ajudar, o que aconteceu antes da prisão do arguido A. A Colega MU disse-lhe que ele dava e tinha problemas na família e na escola, não conseguia aprender, estava ali a ajudar e era amigo de A. Acrescentou que, nessa altura, o AV ia muitas vezes ter com a colega MU, que estava no serviço de aprovisionamento, mas não conseguindo precisar quanto tempo é que o viu lá. Depois deste processo se ter iniciado voltou a ver AV na (...), estava com educadores mas não o viu com colegas. Quanto a AP só o conheceu depois deste processo, disseram-lhe quem era. Os nomes de AI, AN ou Y não lhe dizem nada. Fez um depoimento que o tribunal considerou globalmente objectivo e isento, não revelou interesse ou qualquer razão que levasse a concluir não ter respondido ao tribunal o que sabia e como sabia. DH, (…) YO, (…) na AX desde 1979 YP, (…), foi chefe de divisão de acção social na AX de Fevereiro de 1999 a Março de 2005 YQ, (…). Disse ao tribunal ser amiga da arguida Q, é madrinha de uma das netas da arguida, conhece a sua casa em (…) e conhece-a desde há 18 anos. Durante os anos de 89/2001 foi, pelo menos, uma vez por semana a casa da arguida e não viu que esta tivesse feito obras ou alterasse os revestimentos das paredes ou das escadas. Disse que ao fim de semana ia a casa da arguida com frequência, pois visitava a filha da arguida (a qual mora na c/v do prédio da arguida) e os filhos desta, os quais iam a casa da avó. Conheceu também o salão de cabeleireiro que o genro da arguida tinha na cave do prédio ao lado, pensando que se mudou em 2001. Conheceu o arguido N na Escola Secundária e nunca ouviu qualquer referência da arguida Q ou da família a N, não o viu lá em casa nem nas proximidades. Também nunca viu os demais arguidos em casa da arguida e não os viu em (…). Se entrassem grupos de jovens lá em casa dava por isso. Não obstante a relação de amizade que revelou em relação à arguida Q, o Tribunal não ficou com a convicção que a testemunha estivesse a relatar ao Tribunal uma memória diferente da que evocava, que estivesse a mentir. Pelo que valorou o seu depoimento, com o sentido que em sede de análise crítica da prova se complementará e que faz parte integrante do que aqui fica dito. YR, (…), exerceu funções na AX durante 35 anos, tendo saído mais ou menos em 1994. Prestou esclarecimento sobre uma fuga de dois alunos, em 1982 – o (…) e a (…) – para uma casa em (…), relacionada com o arguido E, casa esta onde se deslocou para ir buscar os jovens e a que se refere o relatório de fls. 21, do Apenso T, com o qual foi confrontada e que declarou ter sido feito por si, prestando esclarecimentos quanto ás circunstâncias em que o fez. YS, (…) da AX desde Maio de 1987. Declarou ao Tribunal ter trabalhados nos serviços do (…)., na (...) da AX, esclarecendo que o seu gabinete era no piso de cima da (...) e que o gabinete do arguido C era no piso de baixo. Disse ao Tribunal saber que o arguido C tinha dois filhos, os quais andaram na instituição e iam ter com o pai, por vezes, à (...). Falou quanto aos processos individuais - nos quais estavam as informações relativas à admissão dos jovens, ofícios do Tribunal e a parte da escola - existentes no (…), os quais disse que só as pessoas daquele serviço tinham acesso. O arguido C nunca lhe pediu qualquer processo e que se o arguido o tivesse pedido “teria estranhado” pois “não teria nada a ver com isso”. Quanto ao (…) FB pedia-os poucas vezes. Disse que havia também um “processo social” do aluno, o qual é junto ao individual quando o aluno sai. No entanto no seu serviço não havia informação quanto aos processo (...)s ou psicológico. Disse também não ter conhecimento que tivesse sido utilizada uma ficha que havia no sistema informático para lançar estes dados. Não teve conhecimento de qualquer processo instaurado ao arguido A, relacionado com abusos sexuais. Foi um depoimento globalmente objectivo e isento para o Tribunal, demonstrou conhecimento directo, pelo exercício das suas funções, dos factos em relação aos quais o Tribunal fez a súmula que antecede, medida em que o valorou e contribuiu para a matéria que foi dada como provada e como não provada. EQ, (…) YT, (…) YU, (…) na AX YV, (…) na AX de Março de 1997 a 2006. Esteve inicialmente no BE - onde disse ter estado muito “pouco tempo” -, tendo passado para o FU (ainda em 1997, de acordo com as suas palavras, mas quando chegou a este Lar o AI já lá estava, mas ainda ia às aulas a BF). Esteve neste lar quatro anos e foi educadora do assistente AI. A sua equipa de educadoras era com a educadora YW e YX. Em determinada altura saiu do FU e foi para um lar de CZ (o que esclareceu ter sucedido “passado algum” tempo depois de o AI ter-lhe “contado aquilo”, referindo-se a uma conversa que o AI teve consigo, relacionada com actos de natureza sexual e que iremos mencionar). Falou do controlo que era feito por análises aos educandos do Lar, de seis em seis meses, as quais, de acordo com o seu conhecimento, até “certa altura” eram guardadas no processos dos educandos e aos quais os educadores tinham acesso. Falou dos “livros de ocorrências dos Lares, explicando que eram registos de passagem de serviço, preenchidos pelas educadoras e onde anotavam o que se passava com os educandos, sendo que na sua perspectiva tinham cuidado em anotar o que fosse mais relevante. Quanto ao AI, disse que o educando viveu uma fase em que “estava transtornado sexualmente” - explicando que fazia jogos sexuais com educandos muito mais novos que ele, o que a testemunha considerava que não era normal e daí considerar que estava transtornado; e explicou a razão pela qual usou a palavra transtornado, pois o AI “abusou de alguns miúdos” - e que o próprio AI falou com a testemunha sobre ter abusado de um rapaz de outro lar. Diz que transmitiu à Directora do (...), à (…) YY (cfr. Apenso Z-10, fls. 2 e 3, Documentos relativos aos Educandos, Equipas de internato dos Lares e Mapas de directores, coordenadores (...)s, enfermeiros, dos (...)s e lares da AX) - tendo acrescentado, a esclarecimento que lhe foi pedido, que “naquela altura” não se faziam actas das reuniões da equipa do lar, tiravam apenas notas de trabalho; acrescentou e esclareceu que as duas psicólogas que fizeram parte da equipa do lar e que participavam nas reuniões, foi primeiro uma psicóloga chamada (…) e depois a (…). Na sequência deste acontecimento e conversa a testemunha marcou uma consulta de pedopsiquiatria para o AI. Localizou este incidente no tempo e disse “cerca” de um ano ou “quase” um ano, antes de terem sido conhecidos na comunicação social os factos deste processo. Disse que “antes” deste episódio andava a “sentir” o AI diferente e na altura em que lhe marcou a consulta falou com o educando, perguntou-lhe se “tinha acontecido alguma coisa com ele” e que respondeu que sim. Disse-lhe que foi “antes” de ter ido para a AX, tendo a testemunha ficado com a “impressão” que tinha sido um namorado da mãe (mas manifestando dúvida quanto à precisão da pessoa, pois depois de ter dito que teria sido um namorado da mãe, disse que o AI não lhe tinha dito concretamente quem tinha sido; num último momento, a pedido de esclarecimento do Tribunal, se tinha sido mesmo o AI que tinha identificado essa pessoa ou se o AI tinha dito alguma coisa da qual a testemunha tivesse deduzido que era isso que o AI queria dizer, respondeu: “... não... não, foi ele que me disse que, quando eu lhe perguntei se tinha sido ali na AX e ele disse-me que não, que tinha sido quando estava com a mãe ... um amigo, mas foi um bocadinho tirado a ... foi um bocado induzido não é ... e por isso é que eu não quis forçar mais ... naquela altura não era altura para se estar a forçar a criança para dizer ... e acho que isso também seria trabalho dos outros técnicos a continuidade ...”). Perguntou ao AI o que é que ele sentia quando fazia aquilo e o assistente respondeu-lhe que “sentia” que era como se estivesse a fazer aos outros, aquilo que lhe tinham feito a ele. Estava transtornado, a impressão que a testemunha colheu é que era quase como que uma vingança, como uma necessidade de castigar. Esclareceu que não pressionou o AI com mais pormenores, pois o AI estava a chorar. Quando a testemunha estava a falar destes factos ao Tribunal, estava visivelmente emocionada e percebia-se que era uma situação que lhe custava relatar. O Tribunal interpretou este sentimento e expressão da testemunha como genuínos. Mas não obstante a empatia que se percebeu que a testemunha tinha pelo AI - o que poderia retirar credibilidade ao seu depoimento e por isso veracidade, por poder ser tendencioso face à empatia demonstrada com o jovem -, a forma como falou e se exprimiu facialmente, criou ao Tribunal a convicção que a testemunha falou com o AI e este falou consigo, da forma como a testemunha relatou e no tempo em que disse ao Tribunal tê-lo feito. Disse que o AI era uma criança que “custava exteriorizar as coisas”, “sofre para dentro, muito com ele”. No princípio era revoltado, mas que a testemunha considerava que era o usual numa criança que já tinha tido uma má experiência num (...), referindo-se à instituição onde o AI tinha estado antes de ingressar na AX. Falou de um outro incidente, relacionado com a instabilidade crescente do AI enquanto esteve na AX e que foi uma situação em que o AI fora “apanhado” a tentar penetrar o ânus com uma peça da cama, explicando que era “maçaneta”. Não conseguiu localizar no tempo este episódio, dizendo que era difícil para si dar as datas. No entanto transmitiu a sua percepção da seguinte forma: após a testemunha ter entrada para o FU o AI já lá estava (no Apenso Z-10, fls. 7 - Documentos relativos aos Educandos, Equipas de internato dos Lares e Mapas de directores, coordenadores (...)s, enfermeiros, dos (...)s e lares da AX - o Tribunal tentou encontrar a data concreta em que a testemunha foi para o FU, pois como disse primeiro foi para o BE e só depois é que foi para o FU, mas sem sucesso, porque não tem esta última referência; no entanto temos que o AI entrou em Outubro de 1997, que a testemunha também entrou em 1997, mas que quando entrou o AI já lá estava, pelo que a entrada da educadora foi após 17/10/97). Quando diz que conversou com o AI, por este estar “perturbado”, depreende-se da dinâmica do seu depoimento que foi numa altura em que ele ficou “mais perturbado” e que a perturbação já vinha de momento anterior. Mas não consegue explicar mais quanto a datas e ao tempo, acrescentado - quanto aos “incidentes” ou momentos que descreveu - que “… isso é daquelas coisas que as pessoas juntam um mais um são dois…”. E, de facto, isto é muitas vezes a forma como a memória consegue, anos mais tarde, recuperar os factos… Deu no entanto elementos, o que consta da análise que o Tribunal fez a este depoimento, em sede de análise crítica da prova e para a qual remetemos. Relatou, também, que “mais tarde” - em relação à altura em que conheceu o AI - , a colega (educadora) YW disse-lhe que o AI sujava “ as cuecas com cocó” . Mas disse que isto aconteceu “meses, um ano” antes da conversa que teve com o AI e que acima relatou. Ainda relacionado com este educando, disse que foi discutido em reunião do lar, em que esteve presente, o facto de ter havido conhecimento que o AI andava a apanhar boleias do arguido A, foi a colega YW, também educadora no lar, que lho disse, foi dito ao educando para não apanhar boleia de ninguém e para fazer os percursos para a escola de transportes. Não viu o AI com “sinais de riqueza”, ténis, roupa de marca ou jogos electrónicos, tendo-se apercebido de uns ténis que o AI comprou e de uma mochila que não era dele, que lhe disse que tinha trocado com um colega. E de umas chuteiras que ele trouxe, que disse que tinha sido A que lhas dera. No que diz respeito a faltas à escola do AI, não se recordou de receber comunicações da escola a dizer que ele faltava, lembrando-se contudo que ele saía “muito cedo”, o que a testemunha pensava que era para apanhar os transportes, para a escola. Falou com o AI “depois de o escândalo rebentar”. Para o tribunal e repetindo o que acima já dissemos, a testemunha revelou ter simpatia pelo AI, o que poderia ter (...) em causa a objectividade e isenção do seu depoimento e, consequentemente, a sua veracidade. Mas, face ao que acima também já dissemos, o tribunal ficou convicto que a testemunha relatou ao tribunal os factos tal como os tinha vivido ou presenciado, não tendo indícios de que os tivesse alterado com vista a beneficiar ou prejudicar alguém. Daí ter concorrido para a convicção do tribunal. YZ, (…) na AX desde 12/03/1986 ZA, (…) ZB, (…) ZC, (…) na AX desde 1998, no GA, a qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A, lembrando-se de o ver a entregar o correio no EX. Quanto ao arguido C disse que apenas sabia o seu nome, não “ conhecia a pessoa”, só tendo tido conhecimento de quem era pela comunicação social, depois de terem aparecido os factos deste processo. A testemunha fez um depoimento que o Tribunal considerou desinteressado, não manifestou qualquer constrangimento por poder estar em causa qualquer acto que afectasse o seu desempenho na AX – o que poderia suceder, se a situação (que não resultou, de facto, do seu depoimento) fosse a de estarem em causa actos que se tivessem passado com educando que, especificamente, estivessem à sua guarda, pois isso, de algum modo, poderia tirar espontaneidade e mesmo verdade ao seu depoimento -. O seu depoimento, pela motivação e fundamentação que o Tribunal expôs na análise crítica da prova - e para a qual remetemos, como complemento do agora dito -, foi particularmente relevante para credibilizar as declarações dos assistente, no que diz respeito à forma como os mesmos se exprimiram quanto ao conhecimento do arguido C ou quanto ao momento, modo ou circunstâncias em que fizeram a identificação ou associação do nome à pessoa ou do nome a determinadas feições. ZD, (…) ZE, (…) ZF(…) na AX desde 1974 e no BF desde 1975. Disse ao tribunal conhecer o arguido A e o arguido C da AX. O arguido A conhece-o como motorista, antes sabia que existia mas não tinha contacto com ele. Costumava vê-lo em BF a distribuir o correio, com a testemunha chegou a fazer transportes com os jovens para um ensaio, numa altura em que o transporte que tinham falhou. Disse que telefonou para a garagem e foi o arguido A que veio. Descreveu um episódio que aconteceu no pátio de BF, o arguido A perguntou por uma criança, o (…), o miúdo foi ao pé dele e depois disse à testemunha que tinha um bolo pago no bar do (...), esclarecendo que foi a “única abordagem” que viu. Nunca presenciou a qualquer atitude estranha do arguido A com as crianças e nunca teve conhecimento de qualquer abuso de jovem por adulto ou entre jovens. Falou do AI, do tempo em que o mesmo esteve no FU e a testemunha era educadora (disse ter ido para este lar em 29/11/00). Numa altura o AI apareceu com uns ténis e uma mochila novos – esclarecendo, num segundo momento, que os ténis foi numa altura e a mochila noutra - , perguntaram-lhe sobre aqueles objectos e ele calava-se ou mentia (localizando este incidente da mochila em Setembro de 2001, no início do ano lectivo). Lembra-se, também, de umas ocorrência do AI com uma educanda – (…) -, recorda-se que assinou essa ocorrência mas não se tinha passado consigo, mas com outra colega. Fizeram a comunicação superiormente do que tinha acontecido, é o único incidente que se recorda com o AI, não sabendo se o AI foi transferido por causa deste incidente. Quando chegou ao Lar “havia uma dinâmica” de o AI ir uma vez por mês para uma família de acolhimento. No que diz respeito aos fins de semana no seu lar, estavam cerca de 6/7 alunos no (...) e os educando, quando iam fazer uma actividade para fora do lar, iam acompanhados pela testemunha. Falou dos horários do lar – almoço às 13h, jantar 19h./19.30h, banho ao fim da tarde – mas dependia da actividade que tinham. Nunca se apercebeu que o AI tivesse estado “desaparecido” durante um dia ou tarde de sábado, lembrando-se apenas de uma situação, durante a semana, em que ele não foi às aulas e a Directora (da Escola da (…)) telefonou para o Lar. Não tem, também, ideia de o AI ao fim de semana ir a casa de um amigo, tendo dito que “lembrava-se” de ter “ouvido” qualquer coisa, mas não revelou qualquer conhecimento concreto. Disse ao tribunal que houve uma situação de que teve conhecimento – quem deu conhecimento foi uma senhora do Apoio do Lar, de nome (…) - , que ao subir a rampa de (…) viu o AI num carro, não tendo conseguido no entanto dizer nem a matrícula nem a cor do carro. No entanto a testemunha não teve percepção directa destes factos, circunstância que o Tribunal teve em atenção, atento o regime processual subjacente à não valoração ou às circunstâncias em que o depoimento indirecto pode ser valorado, não o tendo valorado. Foi confrontada com os documentos constantes de fls. 4 (de 31/05/02), 10 e 16 do Apenso DD, tendo dito que os de fls. 4 e 10 foi a testemunha que assinou, tendo “participado” na sua elaboração e o documento de fls. 16 foi da situação que tinha relatado ao tribunal, do AI com uma educanda. Esclareceu que os documentos que estão no Apenso DD – e isto depois de os ter visto -, não era o “processo individual” que estava no Lar, o do Lar era outro. Disse, também, que não teve conhecimento que o AI tenha sofrido alguma situação de abusos sexuais ou de maus tratos, na instituição onde estivera anteriormente à AX. Quanto à saúde do AI, era saudável, apenas se lembrando de ter acompanhamento da Dra. GK. Quanto a qualquer alteração de comportamento, disse que ele deixou de ser alegre, teve o comportamento com uma educanda, tanto que pediram a sua transferência do lar, referindo que isto foi a partir da altura em que apareceu com a mochila (e que localizou no início do ano lectivo de 2001). Este depoimento, pela proximidade que a testemunha demonstrou ter do AI, pois foi sua educadora, foi relevante para o Tribunal como contributo para a prova dos factos relativos à vivência do jovem na instituição, depoimento este globalmente objectivo e isento, pois o tribunal não teve indício de que a testemunha tenha feito o seu depoimento desviando-se daquilo que se recordava e como recordava. ZG, (…) ZH, (…) ZI, (…) da AX, no EX, tendo estado também no FZ de 1980 a 2002, tendo conhecido o educando T e descrito aspectos da vivência do jovem na instituição), declarou ao Tribunal que nunca teve conhecimento, nem ouviu falar, de qualquer caso igual ao tratado neste processo. ZJ, (…) do arguido N ZK, (…) na AX desde 1996. Disse ao tribunal ter sido aluna da AX, de 1974/75 a 1979/80. A trabalhar esteve na lavandaria (em 2002), mas anteriormente no Bar do GB, para deficientes e no EX. Na lavandaria conheceu o assistente AV, nessa altura trabalhava no armazém e conversava com ele. Houve uma altura em que devido a uma avaria da máquina do FD, teve que dar apoio à lavagem da roupa e foi quando se apercebeu que havia roupa interior “suja de fezes”. Falou com a educadora do lar, que disse que já sabia, que era do AV que estava com “problemas intestinais” e que estava a ser acompanhado pelo (...). Mas foi uma situação que se continuou a verificar. AV não tinha amigos. A testemunha gostava do arguido A, era um irmão da AX, AV dizia que também gostava, tendo relatado as conversas havidas entre os dois. Acompanhou o AV em 25 de Novembro de 2002 (referindo-se à detenção do arguido A). Foi um grande choque e no dia seguinte o AV chorava, não queria voltar para o lar, a testemunha pensava que isto era só porque o AV era amigo de A. Relatou uma conversa que posteriormente o AV teve com a testemunha, disse-lhe que já tinha falado com N, que ia tirar A da prisão, que os amigos vão tirá-lo de lá, que não estava a mentir (tendo esclarecido que quando foi esta conversa, N já tinha sido referido na comunicação social, mas não se recordou do que foi dito. AV fez-lhe também uma referência ao nome do arguido H, por causa de uma notícia no jornal, altura em que a testemunha lhe disse que ele estava a mentir, porque não conhecia toda a gente; é também na sequência destas declarações que fala de ouvir dizer que AV mentia para os colegas, que com a testemunha não era assim ) . Falou também quanto à visita que fez do arguido A na prisão e ao estado em que o mesmo se encontrava. ZM, (…) ZN, (…) na AX desde mais ou menos há 20 anos (desde 1989), exercendo funções no EX – o qual confina com o CZ, onde se situa a (...) da AX -, a qual, entre o mais, disse ao tribunal que apenas conhecia o arguido C “ de vista”, das festas do “3 de Julho”. Este depoimento foi relevante - da forma que o tribunal especificará em sede de análise crítica da prova, complementando o agora dito - para a credibilização dos depoimentos dos Assistentes quanto ao momento, modo ou circunstâncias em que disseram ao tribunal ter feito o reconhecimento de arguidos, associando o nome a feições, entre os quais o arguido C. Foi um depoimento que o Tribunal considerou objectivo e isento, não tendo encontrado indícios de que a testemunha tivesse qualquer interesse pessoal ou de outra natureza, na resolução do presente processo. ZO, (…) na AX desde 1990, presentemente é educadora no CZ, no FC ZP, (…) na AX desde Outubro de 1995, a trabalhar presentemente no DT ZQ, (…) ZR, (…) ZS (…) ZT, (…) ZU, (…) na AX desde 1989, presentemente é educadora no FA ZV, (…), irmã do arguido K ZW, (…), a qual declarou ter exercido Funções como (…) entre Abril de 2002 e Maio de 2003, tendo assinado o Despacho que determinou a aposentação compulsiva do arguido A. Prestou esclarecimentos quanto às circunstâncias em que o arguido C foi nomeado, transitoriamente, (...) da AX, em 25 de Novembro de 2002 e esclarecimentos quanto à razão da sua substituição, com posterior nomeação da Sra. BP como (...)a da AX. O seu depoimento foi relevante dentro deste núcleo de factos, objectivo e não demonstrando interesse de natureza pessoa ou outro, no desfecho deste processo. ZX, (…) da AX - ZY (…) na AX, tendo exercido funções na Instituição de 1968 e 2005), tendo conhecido profissionalmente o arguido A em 1995, na altura em que a testemunha foi trabalhar para a (...) da AX – esclareceu que almoçavam no mesmo refeitório e o arguido chegou a acompanhá-la, como motorista, em deslocações profissionais -, só soube de qualquer processo relativo ao arguido no dia em que saiu nas notícias. ZZ, (…), irmã do arguido N AAA, (…) AAB, (…) AAC (…) AAD, (…), trabalhou na AX até ao ano de 2005 AAE, (…) GK, (…) Declarou ao tribunal não ter exercido quaisquer funções na AX, mas confirmou ter acompanhado o assistente AI e feito o relatório que se encontra a fls. 19 e 20, do Apenso DD, documento com o qual foi confrontada. Confirmou, também, ter acompanhado o Assistente Y e ter feito o relatório que se encontra a fls. 94 a 97 do Apenso DM, documento com o qual foi confrontada. Quer num caso, quer noutro, não demonstrou conhecimento dos assistentes por qualquer outra razão que não fosse o acompanhamento terapêutico, tendo o Tribunal limitado a relevância e valoração do seu depoimento, à confirmação que fez, quanto à autoria dos documentos com os quais foi confrontada. A testemunha não demonstrou qualquer interesse de natureza pessoal ou outro nos autos, tendo por isso o Tribunal considerado o seu depoimento isento e objectivo. AAF, (…) YW, (…), tendo entrado para a AX em Outubro de 1986. Disse ao Tribunal que o seu percurso foi entrada para a AX em Setembro/ Outubro de 1986 para o internato do CZ, para o FF, onde esteve três ou quatro anos; antes deste internato esteve um tempo a estagiar em DT; após o internato de CZ passou para o semi-internato de BF, o que aconteceu no início de um ano lectivo; voltou, de novo, para o internato, mas para BF (para o FU, cfr. Apenso Z-10, fls. 105, referente ao ano de 1997/1998; mas cfr. fls. 7, do Apenso Z-10, de onde consta como educadora de 1997 a 2000, no BF, no FU), tendo estado em BF desde 1997 e até ao ano 2000 ; e “ há cerca de 6 anos” - à data em que estava a prestar depoimento e prestou depoimento em 4/05/06 - passou para o FV, no internato de FA (cfr. Apenso Z-10, fls. 121, menção do nome da testemunha no FA, no Ano 2000, e fls. 130 no Ano de 2002 mas com a indicação do FW). O seu depoimento foi relevante quanto a dois aspectos essenciais: conhecimento do assistente AI e conhecimento da vivência do arguido A dentro da instituição, quer no seu relacionamento com colegas e superiores hierárquicos, quer no seu relacionamento com educandos. Disse que foi educadora do assistente AI no FU, conheceu o assistentes quando o mesmo tinha 12/13 anos, tendo revelado conhecimento directo da sua vivência diária e aos fins de semana (convocando aqui o Tribunal o que especificamente disse em sede de análise crítica da prova). Mas demonstrou, também, ter conhecimento directo da vivência do arguido A dentro da instituição e do seu contacto com os educando. Disse que o conheceu logo que entrou para CZ, o qual distribuía os mantimentos para o (...). Um colega educador, “(…)” e que já morreu, disse-lhe para não deixar que o arguido A andasse “ muito com os meninos”, mas nunca lhe explicaram porquê e a testemunha também não perguntou. Foi expressiva no que disse quanto ao não ter perguntado “…porque na altura nós estávamos assim um bocadinho ... também…era…o que era dito era dito…diziam para fazer , nós fazíamos, muitas vezes nem sequer questionávamos porquê…”. Lembra-se de ver o arguido A a lavar os carros em CZ, as crianças andavam a brincar nessa zona e o arguido convidava-os para ir dar uma volta no carro, para o carro secar e as crianças iam. No que diz respeito ao conhecimento de alunos, disse conhecer um “(…) de BF” - embora tenha esclarecido que, afinal, o (…) que “conhece” entrou para BF, mas para o BE, tem uma irmã chamada (…) - e conhece o AI que foi seu educando (cfr. Apenso Z-10, fls. 6, de onde consta o registo do nome do Assistente AI , entrada em 1997 e saída 2002, por transferência para o FD) . Foi seu educando desde o princípio do Lar, teria 12 ou 13 anos. Estava a estudar em BF e depois , após ter acabado o 2º ciclo foi para a (…). Para a (…) ia de transportes públicos. Ia “cedo”, a testemunha não sabia a hora certa mas antes das sete horas “de certeza”. Mas houve uma vez que veio para o Lar de boleia do arguido A, foi um dia que chegou mais tarde do que a hora estipulada. Esclareceu que isto foi-lhe dito pelo AI, nessa altura falaram com o AI e proibiram-no de aceitar a boleia, tendo o assunto sido comunicado à Directora. Mas não pode garantir ao tribunal que o AI não tenha continuado ou apanhado boleis, em vez de ir de transportes. Ainda em relação ao AI, relatou uma situação de um transporte que o arguido fez do jovem: a testemunha fez uma (...) em (…), combinou com o motorista que ia levar crianças para outras (...) que levasse um dos seus educandos para (…), esse educando era o AI. Ficou surpreendida por ter aparecido o arguido A no (...) para levar o jovem e já vinha acompanhado com outra criança do BE. A testemunha disse ao tribunal que ainda telefonou para a (...), mas disseram-lhe que não havia outro motorista. Localizou este episódio “ talvez” em 1999, foi a última (...) que fez naquele Lar em BF (foram os alunos do FU e do BE). Esclareceu que o AI “ ... não era, ele próprio não era um menino de faltar muito, isso não era ... tanto quanto eu me recordo disso, se algum educando faltasse ou chegasse com muita frequência ao lar, é prática (...) os directores de turma ou os (...) telefonarem ou os educadores de semi-internato (...) telefonarem para o lar a avisar... olha está a chegar atrasado, tínhamos esse cuidado....” acrescentando que eram os educadores do semi-internato que tinham este cuidado. Não se recorda de em relação ao AI ter recebido qualquer comunicação da escola a dizer que andava a faltar ou a chegar atrasado. Mas disse, também, que após o AI ter entrado no lar o arguido A, quando ia ao BF, dava ao AI e ao irmão um “dinheirito”, rebuçados, dava “sempre qualquer coisa” aos miúdos (declaração que confirmou na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido A). Após o AI ter saído do lar deixou de ter contacto com ele. Do contacto que teve com o AI disse que ele “não foi sempre o mesmo”, mas acrescentou que “ as pessoas também não podem ser sempre as mesmas”. Houve uma altura em que ele andava muito revoltado, porque não tinha muito contacto com a família. “...Houve alturas que ele estava muito mais irritado, nervoso... ele nunca foi assim um menino de ser muito mal educado, que respondesse mal, isso nunca foi....”. E relatou o que disse terem sido (do AI) “...alguns comportamentos menos adequados em relação aos mais novos, na altura tínhamos três meninos novos pequeninos…”, comportamento este a que associou a transferência do educando para CZ, mas não sabe, em concreto, qual foi o motivo da transferência. O AI gostava muito da outra educadora (…) e a outra educadora (…). Relatou, também, que a partir de “...uma certa altura, ele começou a aparecer com fezes nas calças...”, o problema foi (...)s superiormente, a testemunha disse que “... eu própria quase no final da... de estar aqui assim, ele ia aqui ao Centro de Saúde aqui da zona...”, foram feitos exames pela médica de família, incluindo uma radiografia que foi vista pelo “...(...) da casa, mas depois eu já estava de saída e o que me disseram foi que pronto... não era nada de especial, podia ser que fosse só um problema de espinha bífida mais nada....”, tendo acrescentado que “... isto teve a ver com a (...) de (…), antes (...) de irem para a (...) eles faziam análises, de seis em seis meses sensivelmente…”. Esclareceu que terá sido aproximadamente um ano após ter conhecido o AI que se apercebeu deste problema e na (...) (mas acrescentado imediatamente a seguir que no Lar já acontecia). Confrontou o AI com este problema e ele nada disse (quanto a este aspecto do depoimento da testemunha, o Tribunal teve em atenção o documento e fls. 54.432 a 54.433 vº). E falou dos fins de semana do AI. A sua percepção é que ia casa da família de acolhimento “...talvez de quinze em quinze dias...”, mas acrescentando num segundo momento “... os fins-de-semana do AI, tanto quanto eu me recordo, ele ia ou de quinze em quinze dias ... no inicio não havia um grande ... não havia muita comunicação com a família biológica e só havia o contacto com a família de acolhimento (...),os dois irmãos iam à família de acolhimento (...), já não sei se ele ia todos os fins-de-semana ou se ia de quinze em quinze dias ... provavelmente ia de quinze em quinze dias ... mas isso eu não sei, não posso agora garantir, já não me lembro...”. Quando ia para a família de acolhimento ia sempre com o irmão (WJ e que é mais novo que o assistente). Apanhavam o comboio para (…), mas do (...) telefonavam previamente à família de acolhimento “... e havia um contacto assíduo, se eles se estavam a comportar bem ou não nesse fim-de-semana, com a família de acolhimento...”, acrescentando que para si garante que quando os educando saíram para ir de fim de semana para a família de acolhimento, foram mesmo para aí, porque “... se a família de acolhimento sabia que ele nesse fim-de-semana ia para casa, se não aparecesse o AI o que é que acontecia?...”, concluindo que “... não, mas isso nunca ... o que eu acho isso nunca aconteceu, eles iam sempre para a família de acolhimento porque havia o contacto com a família...” Aos fins de semana aconteceu o AI sair sozinho para ir a casa da avó, tendo acontecido passar lá a noite, ou ir de manhã e voltar “à tardinha”, podia ir sábado de manhã e voltar sábado à noite e estas visitas eram previamente combinadas. Por problemas familiares deixou de ir para a avó e esclareceu que houve alturas, quando ia a casa da Avó, que ia sozinho e não ia com o WJ, não se recordando se já vinha jantado para o lar ou se jantava no lar. E tinha uma actividade (já com os 12/13 anos), que era ir aos bombeiros, era quase sempre ao sábado e ia depois de almoço, sendo numa altura em que já estava na escola da (…). Esclareceu que o AI “ ... não era, ele próprio não era um menino de faltar muito, isso não era ... tanto quanto eu me recordo disso, se algum educando faltasse ou chegasse com muita frequência ao lar, é prática (...) os directores de turma ou os (...) telefonarem ou os educadores de semi-internato (...) telefonarem para o lar a avisar... olha está a chegar atrasado, tínhamos esse cuidado....” acrescentando que eram os educadores do semi-internato que tinham este cuidado. Não se recorda de em relação ao AI ter recebido qualquer comunicação da escola a dizer que andava a faltar ou a chegar atrasado. Quanto a amigos do AI, não se recorda com quem acompanhava mais frequentemente. E quanto aos educadores no lar ao fim de semana, disse que tentavam que um educador fizesse o sábado e outro o Domingo, sendo que durante a noite ficava um monitor, que entrava “à hora de jantar” ou “à hora de deitar”. Com a testemunha nunca aconteceu ter saído do Lar sem chegar o monitor. Não obstante ter dito ao Tribunal que estava “zangada” com o arguido A - e explicou que estava zangada com o arguido “pelo que soube posteriormente”, “ foi um choque” - , foi um depoimento que o Tribunal considerou globalmente isento e objectivo. O Tribunal não notou indícios que fosse motivado ou limitado por qualquer interesse pessoal ou de outra natureza da testemunha, pela “zanga” que manifestou, ou por especial relação de amizade ou outra com alguma pessoa envolvida no processo. Foi um depoimento que demonstrou sentida emotividade, o Tribunal ficou convicto que a testemunha relatou factos que observou e viveu, tendo por isso sido valorado pelo Tribunal. AAG, (…) AAH, (…) na AX desde 1988 ou 1989 AAI, (…) AAJ, (…), trabalhou na AX durante 29 anos AAK, (…) AAL, (…) na AX desde há mais ou menos 10 anos AAM, (…), presentemente presidente do Conselho de Administração do Casino (…) AAN, (...)AAN, (...), (...) psiquiatra, o qual declarou ter sido (...) do arguido K, mas estar desvinculado do sigilo profissional pelo seu paciente. Prestou esclarecimento sobre um dos períodos em que assistiu o arguido K, nomeadamente no período em que esteve preso preventivamente à ordem destes autos, tendo feito o relatório de fls 3.925 a fls. 3.926 e sobre o qual prestou esclarecimentos. AAO, (…), actualmente desempregada, irmã do assistente AC AAP (…), filha do arguido H AAQ, (…), enteado do arguido H AAR, (…) ER, (…) AAS, (…) AAT, (…) da AX AAU, (…) AAV, (…) AAW, (…) na AX AAX, (…), filho da proprietária da (...) sita no (…), na (...) (…) nº (…), com esquina para (...) (…), identificada nos autos, o qual prestou declarações sobre a ocupação do imóvel desde 1990 até à actualidade – tendo declarado que desde 1997 está arrendada pela empresa DK -, obras feitas no imóvel no interior e exterior; AAY, (…) GU, (…), filho do arguido C AAZ, (…), foi aluno na AX BBA, (…) BBB, (…) da Senhora BP da AX, trabalha na AX desde 07/12/2002 BBC, (…) BBD, (…) BBE, (…) BBF, (…) BBG, (…), o qual declarou ao Tribunal ter estado na AX desde 1989, tendo sido motorista da AX, embora aposentado desde 2005. O seu depoimento - em consequência das funções que exerceu como motorista na instituição -, contribuiu especialmente para o esclarecimento do tribunal quanto ao modo como era feita a distribuição, utilização, controlo de utilização e entrada e saída dos veículos de serviço por parte dos motoristas da AX, o modo como era feita a distribuição do serviço, bem como quanto à “maneira de ser”, vivência e concreto exercício de funções do arguido A na instituição, não só por o arguido A ter sido motorista, mas também por anteriormente ter exercido as funções de ajudante de motorista e em concreto da testemunha. O depoimento foi prestado de forma que o tribunal considerou objectiva e desinteressada, relatando o que se lembrava e como se lembrava, não revelando preocupação ou interesse em determinado sentido da causa, ou em beneficiar ou prejudicar alguém. BBH, (…) BBI, (…) BBJ, (…), actualmente desempregada, declarou ao Tribunal ter sido porteira num prédio sito no (…), nº (…), em (…). Pelo exercício das suas funções teve contacto com o arguido E nesse prédio, por o mesmo lá ter residido, matéria em que o seu depoimento foi relevante. Teve um depoimento que o Tribunal considerou globalmente objectivo, no sentido em que o Tribunal não teve sensação ou convicção que a testemunha tivesse prestado um depoimento criando ou alterando factos, com o objectivo de prejudicar ou beneficiar alguém. Pelo que o seu depoimento foi valorado. BBK, (…), filha da arguida Q BBL, (…) BBM, (…) na AX BBN, (…) BBN, , gerente comercial, o qual declarou conhecer o arguido K por ter feito a montagem de um aquário em sua casa (através da empresa (…)), tendo declarado que os contactos para a montagem do aquário ocorreram “ antes do Verão de 2002”. Também montagem aquário na (...), foi confrontado com os documentos de fls. 2.314 a 2.317 e com os documentos nºs 1 a 24 juntos na audiência de julgamento. BBO, (…) BBP, (…) BD, (…) BBQ, (…) BBR, (…) BBS, (…) DG, (…) CG, (…) BBT, (…) BBU, (…) sobrinho do arguido K BL, (...) BBV, (…) BBW, (…) BBX, (…) no EY da AX BBY, (…) no CZ da AX desde 1997 BBZ, (…) CCA, (…) na AX CCB, (…), actualmente detido no Estabelecimento Prisional de (…) BA, (…) CCC, (…) na (…), foi gerente da empresa (…) de 1999 a 2003 CCD, (…) CCE, (…) há 32 anos na AX CCF, (…), esposa do arguido H CCG, (…) CCH, (…), a qual trabalhou no (...) do arguido K. CCI, (…) CCJ, (…) CCK, (…) na AX em CZ CCL, (…) AZ, (…) CY, (…) CCM, (…) CCN, (…) CCO, (…), sobrinha do arguido K CCP, (…) BG, (…) no CZ da AX CCQ, (…)em (…), filha adoptiva do arguido H CCR, (…) CCS, (…) ET, (…) CCT, (…) CCU, (…) CCV, (…) CCW, (…) no FG, tendo declarado ter saído em meados de 2006, o qual declarou não conhecer, pelo nome, AV, AN, AT, X, mas tendo conhecido AP, AI, foi colega de lar de um rapaz que tinha a alcunha do “(…)” , lembrando-se de um rapaz que andava de fato e Gravata, o qual pensa ser do FD, CCX, (…) na AX CCY, (…) CCZ, (…) DDA, (…) da AX de 1966 a 1974 DDB, (…) HY, (...) DDC, (…), filho do arguido N DDD, (…) DDE, (...) DDF, (…), o qual utilizou um espaço, concretamente uma sala, no prédio sito na (...) (…), nº (…),(…), em (…), para estúdio de (…), durante cerca de um mês e em Novembro ou Dezembro de 2000; DDG, (…) DDH, (…) desde há 10 anos no FP da AX DDI, (…) no CZ no FC DDJ, (…) na AX DDK, (…) na AX, em CZ DDL, (…) DDM, (…) DDN, (…) DDO, (…) DDP, (…), está a tirar o curso de instrutora de condução DDQ, (…), a qual exerceu funções na AX até 2001, tendo trabalhado com a equipe do CZ (entre as quais com o FD, a qual teve a percepção que era uma equipe educativa que rodava muito e com o FG) e com o semi-internato do DT GV, (…), filha do arguido C DDR, (…) no DT DDS, (…) DDT, (…) DDU, (…) no CZ da AX desde 1987 DDV, (…), sobrinho do arguido K DDW, (…), estudante DDX, (….) DDY, (…) DDZ, (…) EEA, (…) (Processo Apensado) HH, (…), aposentado, o qual declarou ao Tribunal ter sido funcionário da AX entre 1964 e 30/06/2003. Pelas funções que desempenhou na AX e locais onde esteve - disse que começou a trabalhar no EY, tendo passado em 1980 para o CZ, onde exerceu funções de “supervisão” coadjuvando a direcção, orientando o pessoal especializado e da acção educativa, dando pareceres para a aquisição a aquisição de materiais e colaborando com o Director do (...) em tudo o que lhe fosse pedido -, revelou conhecimento próximo e directo do arguido A e do arguido C e de alguns aspectos da vivência no espaço onde se situava o CZ e, consequentemente, a (...). Revelou, ainda, conhecimento directo de factos relativos ao controlo de entradas e saídas dos veículos de serviço da AX (incluindo os registos que eram feitos no portão da entrada e saída de veículos no CZ), ao controlo da entrada e saída de alunos das instalações e as aspectos relacionados com a entrada de pessoas estranhas e utilização por essas pessoas, de alguns espaços onde se situava o (...) e a (...) (nomeadamente a ocupação de espaços, ao fim de semana, para a realização de eventos). Foi um depoimento que para o Tribunal se revelou sincero e objectivo, pois apesar de ter, por vezes, na primeira resposta dito que não se lembrava de determinado facto, quando num segundo momento dizia que “…já se estava a lembrar…”, fê-lo de forma que ao Tribunal aparentou genuíno. Isto é, a forma como o disse deixou transparecer que a sua memória, naturalmente, fez um percurso que lhe trouxe a “lembrança do facto”, não tendo o Tribunal detectado que tal movimento de “lembrança” resultasse de um “arrependimento” em ter escondido ou omitido alguma coisa. Foi, assim, para o Tribunal, um depoimento genuíno e destituído de interesse na solução do processo. EEB, (…) EEC, (…) EED, (…) EED, (…), a qual declarou ter andado na escola com AS, que tratava o arguido A por Padrinho, tendo presenciado o arguido A ir buscar o AS de carro, à escola, mas este nunca lhe contou qualquer abuso. EEE, (…) EEF, (…) EEG, (…) EEH, (…) EEI, (...) da AX, entrou para a AX em 1983/1984 (mas tendo exercido simultaneamente as funções de motorista e chefe de oficina) e tendo conhecido o arguido C e o arguido A. Disse ao tribunal que inicialmente esteve no EY, durante cerca de oito anos, sendo o seu superior, quem “lhe dava ordens”, o (…) UB (director do EY). Depois passou para o CZ, para a oficina de produção (corrigiu, quanto à ida para CZ, que deve ter sido em 1998), onde esteve 3 ou 4 meses, após o que ficou responsável da oficina, devido à saída do (…) HI, situação que se manteve 3 ou 4 anos. Conheceu o arguido A mesmo antes de ter ido para CZ, pois o arguido já era ajudante de motorista em EY e em CZ via-o todos os dias e o arguido já era motorista. A testemunha foi arrolada quer no processo “principal”, quer no processo “apensado”. No processo “principal” o seu depoimento foi essencialmente relevante para esclarecer o tribunal quanto a factos relacionados com a “oficina” e com as incompatibilidades ocorridas entre os mecânicos e o arguido A e a intervenção do arguido C nessas desavenças. Quanto ao concreto desempenho das funções do arguido A, o conhecimento directo que revelou, dos vários factos que relatou, foi restrito, relatando factos que tinha ouvido ou que lhe tinham sido contados por alguém, uns passando-se com essas pessoas, outros porque essas pessoas os tenham, por sua vez, ouvido. Daí a triagem que o Tribunal fez quanto ao conhecimento que a testemunha foi revelando, valorando-o de acordo com o que foi ex(...) em sede de análise crítica da prova. Demonstrou conhecimento directo do relacionamento, entre si e em relação a alguns aspectos, dos arguidos C e A Já quanto a factos relacionados com o grupo desportivo da Associação de Trabalhadores da AX, revelou conhecimento directo de alguns aspectos da vivência da associação ou indirectamente relacionados com a associação – participação da testemunha CY na equipa de futebol; treinos; controlo que era feito no acesso ao CZ, dos carros que iam para o Treino ou jogos de futebol da associação e implementação pelo Dr. EJ, director do CZ, do controlo de veículos; arranjo de um carro pertencente ao arguido K nas oficinas da AX (a substituição “ de uma bomba” do veículo “(…)” deste arguido, que relatou ter sido feita por si) -, associação da qual declarou ao tribunal ter sido dirigente. Não obstante, por vezes, começar a relatar factos que, numa primeira impressão, aparentavam ter sido factos presenciados pela testemunha, quando os explicava ou complementava referia - ou espontaneamente ou na sequência de interpelação -,aqueles que tinha presenciado e aqueles que lhe tinham sido contados na instituição, sendo, da análise do seu depoimento, fácil fazer a separação entre uns e outros. Durante a instância que foi feita pela defesa do arguido C, a pergunta desta Defesa a testemunha confirmou ter conhecimento que o arguido C tinha feito contra si queixa crime. Mas disse não “ter ressentimentos” e já tinha ido ao DIAP prestar declarações. E, face à espontaneidade com que falou, a forma como relatou os factos e explicações que deu – e não obstante alguma alteração e irritação que deixou transparecer, nomeadamente quando estava a responder às perguntas que lhe foram feitas pela Defesa do arguido C - o tribunal não teve indício de que a testemunha tivesse qualquer intenção de proteger ou de prejudicar alguém, incluindo o arguido C, que tenha criado factos para relatar ao tribunal, que tivesse interesse directo ou indirecto neste processo. Daí a valoração que o tribunal fez do seu depoimento – como isento e objectivo, credível - e que se traduz nas passagens que, ao longo da análise crítica da prova, o Tribunal foi fazendo deste depoimento e da atribuição de veracidade. EEJ, , o qual declarou ao Tribunal ser porteiro há nove anos (e prestou depoimento em 23/03/06) no prédio sito da (...) (…), em (…), onde o arguido E teve uma casa no (…)º andar. Disse ao Tribunal que o arguido deixou essa casa “há cerca de 3 ou 4 anos”, sendo que o seu depoimento, face ao que declarou, foi relevante na medida do que antecede e como concorrente para o esclarecimento dos factos relativos à vivência do arguido. Não demonstrou qualquer interesse nesta causa, depoimento que o Tribunal considerou objectivo e isento. EN, (…) no CZ da AX desde 15/10/1991 EEK, (…) EEL, (…) EEM, (…) EEN, (…) EEO, (…) EEP, (…) EEQ, (…) FB, (…) EER, (…) EES, técnico da (…), administrador de base de dados da (…) 3. Peritos: CM, (…), a exercer funções no Instituto Nacional de Medicina Legal – Delegação (…) EET, (…) CO, licenciado em (…), com especialidade em medicina legal, a exercer funções no Instituto Nacional de Medicina Legal BR, (...) especialista na Delegação de (…) no Instituto de Medicina Legal, Director do Instituto de Medicina Legal e professor na Faculdade de Medicina de Lisboa. EEU, a exercer funções no DM CQ, (…), a exercer funções no FFG CS, (…), a exercer funções no Hospital Dona Estefânia CR, médica psiquiatra da infância e da adolescência, a exercer funções no Hospital (…) CN, (…), a exercer funções no HHB CT, (...) CU, (…), a exercer funções no Centro Hospitalar Psiquiátrico de (…) CP, consultor técnico de informática CV, (…), a exercer funções no Centro Hospitalar Psiquiátrico de (…) – Pólo (…) EEV, a exercer funções no DM 4. Consultores Técnicos: CK, (...) CH, (…) CL, (…) CI, (...) BV, (...) CJ, (…) EEW, (...) urologista Depoimentos ou esclarecimentos que foram pontualmente valorados pelo Tribunal, tendo em atenção o conhecimento ou a proximidade que revelaram dos factos, dos assistentes ou dos documentos comos quais foram confrontados. 4. No teor dos documentos de fls.: (Processo Principal - Pº nº 1718/02.9JDLSB) - Fls. 192 a 193: Oficio da Operadora (…) com listagem das chamadas efectuadas pelo nº (…), desde Janeiro de 2002; - Fls. 197 a 216: Certidão da Acusação proferida no Processo 1815/97.0TAOER do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de (…), em que é Arguido DU; - Fls. 231 a 262: Lista dos Lares, educandos, Docentes, Educadores e demais equipa/pessoal dos Lares da AX - Fls. 479 a 487: Certidão da (…) do DIAP – Processo 15933/96.9TDLSB – Denúncia da prática de irregularidades várias no que respeita a pessoas singulares e colectivas relacionadas com a AX - Relatório de Despacho Final de Arquivamento; - Fls. 519 a 522: Ofício da (…) em resposta ao ofº 42 de 08/01/2003, a informar que por limitações de natureza técnica, as listagens de chamadas recebidas são compostas apenas por chamadas provenientes de nºs de telefone da rede (…); - Fls. 605 a 606: Auto de Reconhecimento de Local com AT (casa na zona (…)). - Fls. 710 e 711: Resposta da (…) ao ofº 12725 de 13/01/2003, informando que os cartões de acesso ao Serviço telefónico móvel com os nºs (…) e (…), são cartões pré pagos. No entanto podem informar que em relação ao cartão de acesso com o nº (…) o seu titular será o arguido N. Relativamente ao cartão de acesso com o nº (…) informam que apenas foi activado em Dezembro de 2002; - Fls. 817: Resposta da (…) ao ofº 224 de 24/01/2003, informando que o nº (…) está associado ao IMEI (…), que por sua vez está associado ao n.º (…); - Fls. 925: Resposta da (…) ao ofº 12752 de 24/01/2203, informando sobre os IMEI’s que funcionaram com os cartões com os nºs (…) e (…); - Fls. 931: Oficio da (…) a remeter Listagens dos nºs (…) (que se encontra no Apenso O-L), (…) (que se encontra no Apenso P-L) e (…) (que se encontra no Apenso N-L); - Fls. 933: Ofício da (…) a remeter listagem das chamadas referentes aos nºs (…) (que se encontra no Apenso R-L), (…) (que se encontra no Apenso Q-L) e (…) (que se encontra no Apenso S-L); - Fls. 934: (…) com a identificação do proprietário do n.º (…) – H; - Fls. 935: (…) com a identificação do proprietário do n.º (…) – AV; - Fls. 936: (…) com a identificação do proprietário do n.º (…) – EEX; - Fls. 1.036: Resposta da (…) ao ofº 109 de 14/01/2003, informando que relativamente aos nºs (…) e (…) não dispõem qualquer registo no período de 27/01/2002 a 14/01/2003. Quanto ao nº (…) encontra-se ainda pré activo, não tendo sido atribuído ainda a nenhum cliente; - Fls. 1.117: Auto de reconhecimento de local com AT – (…); - Fls. 1.324: Resposta da (…) ao ofº 224 de 24/01/2003, informando que o IMEI (…) se encontra associado ao nº (…); - Fls. 1.387: Resposta da Inspecção Geral de Saúde aos ofºs 17606 e 17716 de 2012/2002 e 09/01/2003, enviando certidão dos processos de inquérito 57/02-I e 62/02-I; - Fls. 1.392: Resposta da (…) ao ofº 224 de 24/01/2003, a informar que o IMEI (…) está associado ao nº (…); - Fls. 1.429 e 1.430: Auto de Reconhecimento com AV – Av.ª (…) /(…); - Fls. 1.466: Auto de Reconhecimento de local com AV – (…); - Fls. 1.515: Auto de reconhecimento de local - AP – (…); - Fls. 1.928: Informação (…) referente a AV (não consta que seja titular de qualquer conta); - Fls. 1.936 a 1.942: Certidão do Registo Predial da casa da (...) (…) nº (…),(…),(…); - Fls. 1.977 a 1.987: Conservatória do Registo Predial de (…) envia Certidão com o prédio situado na (...) (…) com os nºs (…) e (…) e (…) e (…); - Fls. 2.003 a 2.008: 2ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão da Av. (…), lote (…) e lote (…); - Fls. 2.009 a 2.010 e 2.012 a 2.014: Oficio do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a dar conhecimento da Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 2.044: Informação bancária do (…) sobre AV; - Fls. 2.051: Resposta do EEY ao ofº 548 de 18/02/2003 a informar sobre a dificuldade e a perturbação da permanência de AV naquela Instituição; - Fls. 2.130 a 2.139: Informação do CRSS (…) relativamente a Q; - Fls. 2.262 a 2.267: Ofício do (…) a enviar cópia dos extractos de conta do assistente AV; - Fls. 2.313 a 2.327: Reportagem fotográfica realizada em 07/03/2003, à residência do arguido K, na (...) (…), nº (…) – (…), em (…); - Fls. 2.499: Carta manuscrita de N para A; - Fls. 2.533: Auto de reconhecimento por AN – (…); - Fls. 2.604 e 2.605: Resposta do EEY ao ofº 800 a dar o parecer sobre a continuidade de AV naquela Instituição; - Fls. 2.626: Resposta da (…) ao oficio nº 672 de 25/02/2003, informando que não é possível identificar as BTS relativamente ao nº (…). Relativamente ao nº (…), foi desactivado no dia 16/12/2000. Informa ainda a identificação do titular do nº (…) (EEZ e a partir de 26/01/2002 passou a H), do nº (…) (FFA e a partir de 04/10/2002 passou a nº associado a produto vitamina) e nº (…) (FFB e a partir de 04/07/2001 passou a produto vitamina); - Fls. 2.643: Resposta do Ministério da Educação ao ofº 12781 de 19/02/2003 a remeter Processo Individual do arguido N (o Processo Individual encontra-se no Apenso AN); - Fls. 2.645: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar documentação sobre a Sindicância ao funcionamento da AX (documentos que se encontram no Apenso AH1); - Fls. 2.988: Auto de reconhecimento de local com AI – casa do arguido A; - Fls. 3.045 e 3.046: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar informação sobre FFC No âmbito da Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 3.122 a 3.139: Lista dos educandos internos da AX, Lares e (...)s a que pertencem; - Fls. 3.180 a 3.185: Resposta da CGD ao ofº 12770 de 11/02/2003 a remeter cópia das fichas de assinatura referentes às contas de AV e dos extractos; - Fls. 3.200 a 3.208: Relatório do Exame (...)-legal de natureza sexual de AV realizado pelo INML; - Fls. 3.289 a 3.290: Resposta da Operadora (…) ao ofº 12724 de 13/01/2003 a informar que o titular do nº (…) é NS e o titular do nº (…) é AG; - Fls. 3.418 a 3.427: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar informação sobre a Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 3.630 a 3.631: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar certidão do Processo de Inquérito nº 128/98 ao GG, em (…) que foi instaurado com base numa comunicação segundo a qual o menor AV teria sido vitima de abusos sexuais naquela Instituição (a certidão encontra-se no Apenso AH2); - Fls. 3.671: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar informação sobre a Sindicância ao funcionamento da AX (a documentação encontra-se no Apenso AH2); - Fls. 3.741 e 3.742: Resposta da (…) ao ofº 12819 de 08/04/2003 a informar que o nº (…) esteve associado aos equipamentos com os IMEI’s (…) e (…) e ainda associado ao IMEI (…) estiveram os nºs (…),(…),(…),(…) e (…) e ao IMEI (…) estiveram associados os nºs (…),(…),(…),(…) e (…); - Fls. 3.743: Resposta da (…) ao ofº 12827 de 10/04/2003 a informar que a titular dos cartões com os nºs (…),(…),(…),(…),(…),(…),(…) e (…) é a (...) Dr. K FFD Com morada na (…) nº (…), em (…). Ainda informa quais os IMEI’s dos nºs: - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - (…) – (…) - Fls. 3.746 a 3.750: Resposta da (…) ao ofício 12826 de 10/04/2003 a enviar a identificação dos titulares dos telefones solicitados naquele ofício; - Fls. 3.751 e 3.752: Resposta da (…)ao ofício 12829 de 10/04/2003 a enviar o detalhe de utilização do nº (…); - Fls. 3.807 a 3.811, 3.816, 4.147 a 4.171: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a enviar informação sobre a Sindicância ao funcionamento da AX (documentos encontram-se no Apenso AH3); - Fls. 4.051: Resposta da (…) ao ofº 12835 de 15/04/2003 a informar que o cartão com o nº (…) é um cartão pré-pago e encontra-se a funcionar no equipamento com o IMEI (…); - Fls. 4.179 a 4.182: Resposta da (…) ao ofº 12826 de 10/04/2003 a remeter listagens dos n.ºs (…),(…) e (…) e o nome do titular – K ; - Fls. 4.187 a 4.193: Relatório do Exame Medico-Legal de natureza sexual de AM; - Fls. 4.194 a 4.200: Relatório do Exame Medico-Legal de natureza sexual de AG; - Fls. 4.201 a 4.207: Relatório do Exame Medico-Legal de natureza sexual de OC; - Fls. 4.208 a 4.212: Resposta da (…) ao ofº 12828 de 10/04/2003 a remeter os nºs de IMEI associados ao nº (…); - Fls. 4.213: Resposta da (…) ao ofº 1221 de 21/04/2003 a remeter cópia das facturas referentes aos nºs (…) e (…) e quanto ao nº (…), entre 24/09/1999 a 29/01/2002 esteve associado a um serviço pré-pago (Listagem nos Apensos AY-L e AX-L); - Fls. 4.301: Oficio (…) – resposta ao nosso oficio 12826 - Fls. 4.304: Reconhecimento de local por AK (…) / (…) / (…) - Fls. 4.327: Cópia do Despacho 8495/2003 da 2ª Série do Diário da Republica de 02 de Maio a Determinar a criação do Conselho Técnico-cientifico da AX, multidisciplinar e a determinar as suas competências; - Fls. 4.371: Ofício da FFE em resposta ao nosso oficio 12838 de 22/04/2003 a juntar cópia do programa emitido no dia 13 de Junho de 1987; - Fls. 4.441: Auto de reconhecimento de local à zona da (…) – (…) – (…) –(…) ((…)); - Fls. 4.543 a 4.550: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual de AT; - Fls. 4.551 a 4.561: Resposta da CGD ao ofício 12823 de 10/04/2003 a enviar fotocópia dos talões de depósito do Assistente AV; - Fls. 4.562: Resposta da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho ao Oficio 12851 de 07/05/2003 a remeter os documentos constantes do Apenso AH3 – Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 4642 a 4644: Ofício do Instituto de Medicina Legal a remeter o Relatório do Exame (...)-Legal de natureza sexual do arguido N; - Fls. 4.645 a 4.651: Relatório do Exame (...)-Legal de natureza Sexual do Assistente AN; - Fls. 4.780: Ofício do Instituto de Reinserção Social a informar que tem vindo a desenvolver as diligências necessárias com vista à implementação do plano de inserção social do Assistente AV no EEY; - Fls. 4.822 a 4.832: Lista remetida pelo EX dos elementos que compunham os Lares, educadores e monitores entre 1997 e 2003 e informação sobre realização de análises; - Fls. 4.841 a 4.847: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a remeter informação relativamente à Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 4.857 a 4.860: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a remeter documentos relativamente à Sindicância ao funcionamento da AX (que se encontram no Apenso AH4); - Fls. 4.865 a 4.871: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AK; - Fls. 4.872 a 4.877: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AS; - Fls. 4.891: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a remeter certidão do relatório elaborado pelos assessores da área de informática no âmbito da Sindicância ao funcionamento da AX (que se encontram no Apenso AH5); - Fls. 4.974: Ofício da AX a remeter uma carta que o Assistente AS recebeu à Sra. Procuradora Adjunta Paula Soares; - Fls. 4.975 a 4.979: Carta de A a AS; - Fls. 5.023 a 5.029: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de FFF; - Fls. 5.030 a 5.037: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AF; - Fls. 5.189 a 5.201: Exame pericial da PJ ao móvel SIEMENS M50 (Arguido E); Fls. 5.202 a 5.208: Oficio da AX a enviar um documento encontrado no âmbito de uma doação interna relativa a donativos, legados ou heranças, a que diz respeito a valores vários recebidos da EEZ; - Fls. 5.218: Resposta ao oficio 12876 de 29/05/2003 da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a entregar o computador apreendido no gabinete do (...) (...) Dr. C nas instalações da AX; - Fls. 5.407 a 5.417: Documento da AX a enviar a Lista dos funcionários do DT, informar o nome dos laboratórios onde se realizavam as análises e o plano anual de análises (...)s para o ano de 2000/2001; - Fls. 5.628: Cópia da Carta de Condução do arguido A; - Fls. 5.629 a 5.637: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de Y; - Fls. 5.646 a 5.655: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AQ; - Fls. 5.683 a 5.700: Resposta ao oficio 12903 de 11/06/2003 do HA a remeter todas as fichas (...)s de AP; - Fls. 5.720: (…) – resposta ao nosso oficio n.º 12863 - Fls. 5.729 a 5.736: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AO; - Fls. 5.806: (…) – resposta ao nosso oficio n.º 12878 - Fls. 5.807: (…) – resposta ao nosso oficio n.º 12888 - Fls. 5.924 a 5.933: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AY; - Fls. 5.939: Autos de Reconhecimento de AI a (…); - Fls. 5.940: Autos de Reconhecimento de Y a (…); - Fls. 6.063: Ofício da GC da AX a enviar três documentos relativos a situações médicas (um é a informação vinda da (...) com a indicação das datas para realização das análises aos educandos internos e os outros dois também relativos ao Dr. HY; - Fls. 6.095 a 6.096: Ofício do EY da AX, a informar/explicar os procedimentos do (...) chefe da AX, Dr. HY naquele (...) relativamente a análises (...)s; - Fls. 6.097 a 6.100: Ofício da AX a remeter documentação médica referente aos educandos internos do FV e à política de saúde da AX (a carta de saúde da AX encontra-se no Apenso BH e a documentação (...) dos alunos internos encontra-se no Apenso Z-4, Z-5, Z-6 e Z-7); Fls. 6.101 a 6.102: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a remeter certidão com a designação de Relatório Final no âmbito da Sindicância ao funcionamento da AX (relatório final encontra-se no Apenso AH5); - Fls. 6.103 a 6.110: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AD; - Fls. 6.119 a 6.128: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AA; - Fls. 6.168: Of. (…) resposta ao of. 12862 - Fls. 6.200 a 6.201: Resposta ao ofício 12904 de 12/06/2003 do Ministério dos Negócios Estrangeiros a remeter informações individuais do E (documentos encontram-se no Apenso BJ); - Fls. 6.203: Of. (…) em resposta ao of. 12909 - Fls. 6.251 a 6.259: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AW; - Fls. 6.260: Resposta (…) ao of. 1862 - Fls. 6.460 a 6.464: Lista da Comissão Coordenadora de Apoio Psicológico para Intervenção na Crise – Avaliação e Acompanhamento Psicoterapêutico, das pessoas acompanhadas e técnico que fazia acompanhamento; - Fls. 6.502: Auto reconhecimento de local – AI – (…); - Fls. 6.521: Resp. da (…)ao of. 926 do TIC - Fls. 6.716 a 6.722: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AC; - Fls. 6.746 a 6.752: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AB; - Fls. 6.755 a 6.759: Resposta ao oficio 12915 de 30/06/2003 da 1ª Conservatória do registo Predial de (…) a remeter cópias da descrição e inscrições do prédio nº (…) – (...) (…), em (…); - Fls. 6.764 a 6.803: Resposta ao ofício 12911 de 20/06/2003 do HA a remeter informação (...) de AY; - Fls. 6.811 a 6.836: Resposta ao ofício 12914 de 30/06/2003 da 1ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão do registo, descrições, averbamentos e anotações do prédio urbano da Av. (…) nº (…), em (…); - Fls. 6.886: Resposta ao oficio 12927 de 04/07/2003 da AX sobre os vencimentos de A do ano de 1997 e de Janeiro 1998 a Junho de 2003 e informação do relativa ao NIB associado ao pagamento do vencimento (estes documentos encontram-se no Apenso BP); - Fls. 6.930: Auto de Reconhecimento de Local de AU à (...) (…), em (…) - Fls. 6.931: fotocópia de uma planta do local onde se situa a (...) (…), em (…); - Fls. 6.952 a 6959: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AU; - Fls. 6.960 a 6.966: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de Z; - Fls. 7.017 a 7.021: Resposta ao ofício 12928 de 04/07/2003 da JJM a enviar cópia do Contrato de Abastecimento de Água por Intermédio de Contador a A; - Fls 7.022: Resposta ao oficio 12906 de 18/06/2003 da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho a remeter a documentação que se encontra no Apenso BQ; - Fls. 7.096: Of. (…) inf. Sobre IMEI´s - Fls. 7.108: Of. (…) – envia CD rom e listagem de chamadas - Fls. 7.153: Of. (…) – resp. ao of. 12926 - Fls. 7.361: Ofício da 1ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão referente ao n.º (…) da Av. (…), em (…) (esta certidão encontra-se no Apenso BT); - Fls. 7.584 a 7.591: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AR; - Fls. 7.600 a 7.610: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AP; - Fls. 7.611 a 7.618: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto de Medicina Legal de AI; - Fls. 7.648: Oficio da (…) – remete os elementos em falta dos Mandados - Fls. 7.795 a 7.798: Relato de Diligência Externa da Policia Judiciária à (...) (…), nº (…), com reportagem fotográfica; - Fls. 7.864 a 7.883: Oficio da Conservatória de Registo Automóvel e enviar certidão de todas as inscrições relativas a veículos em nome da AX; - Fls. 7.942: Documento da Comissão Coordenadora de Apoio Psicológico para intervenção na Crise a declarar que foram observados e/ou se encontram em seguimento (...)-psicológico 146 alunos e ex-alunos da AX; - Fls. 8.070: Of. (…) resp. of. 926 – listagem (…) - Fls. 8.362 a 8.364: Auto de Reconhecimento de Local em (…) – (...) (…), nº (…)- por A; - Fls. 8.692 a 8.702: Ofício do FFG a remeter cópia do Processo Clínico de AC; - Fls. 8.780: Oficio (…) responde ao oficio 2394 do TIC Listagem do (…) – negativo - Fls. 8.782: Oficio (…)responde ao oficio 2393 do TIC Listagem do (…) - Fls. 8.984 a 8.991: Auto de Reconhecimento de Local por AV a (…)/(…), com Reportagem fotográfica; - Fls. 8.992 a 9.015: Reportagem fotográfica da (...) da AX em (…); - Fls. 9.016 a 9.017: Croqui do interior da (...) da AX em (…); - Fls. 9.020 a 9.053: Fichas de Sócios do AX (...); - Fls. 9.322: Informação da PJ, datada de 24/09/03, referente à recepção de dados da Operadoras telefónicas para análise pelo STAIC; - Fls. 9.396 a 9.411: Cópia do Decreto-Lei nº 50/2001de 13 de Fevereiro - Lei Orgânica da AX e Portaria nº 319/2003 de 21 de Abril – Aprova o Quadro pessoa não dirigente da AX; - Fls. 9.423 a 9.433: Resposta do Conselho Disciplinar da Ordem dos (...)s ao oficio 12978 de 25/07/2003, a remeter cópia do Parecer elaborado a pedido do (...) arguido no Processo Disciplinar nº 36/03, pelo (...) da Especialidade de Medicina Geral e Familiar da Ordem dos (...)s – Dr. HY; - Fls. 9.472: Oficio (…) – resposta ao nosso ofício 13030 - Fls. 9.897: Oficio (…) – resposta ao nosso ofício 13027 - Fls. 9.899: Oficio (…) – resposta ao nosso ofício 13031 - Fls. 9.901/2, fls. 9.903/6, fls. 9.899 a 9.900 e fls. 10.744/5: Documentos remetidos, respectivamente, pelas operadoras (…),(…)e (…), com a informação da alteração, em 1998 e 1999, do Plano Nacional de Numeração, e identificação da alteração da composição dos números de telefone da rede fixa e da rede móvel; - Fls. 9.903: Oficio (…)- resposta ao oficio 2205 - TIC - Fls. 9.921: Resposta ao ofício 13034 de 03/10/2003 da FFH a remeter mapas com os percursos de todos os autocarros da cidade de (…) desde o ano de 1997 (os mapas encontram-se no Apenso CH); - Fls. 10.476: Oficio (…) – resposta ao oficio 2722 do TIC de 16.10.03 DSJ/19169/2003/EA - Fls. 10.598: Oficio (…) – 17.10.03 – resposta ao nosso oficio 12889 e 12925 - Fls. 10.699: “Escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca”, de 29/4/03, em que N vende a FFI um andar no (…), Freguesia de (…) e Concelho de (…); - Fls. 10.132 a 10.148: Oficio da Procuradoria Geral da República a remeter a análise dos extractos bancários de Q, C, N, H e K; - Fls. 10.275: Resposta ao oficio 13.053 de 17/10/2003 do Instituto do Direito Penal Económico e Europeu – Faculdade de Direito a informar que o 2º curso de pós-graduação em Direito Penal Económico e Europeu da Faculdade de Direito de (…) teve lugar nas instalações da Faculdade de Direito da universidade de (…) (sala 8) com inicio em 08 de Janeiro de 1999 e término no dia 29 de Março do mesmo ano, com horário das 16h30m às 20h30m de sextas-feiras e das 09h00 às 13h00 de Sábado; - Fls. 10.276 a 10.282: Resposta ao oficio 17219 de 17/10/2003 da Brisa a informar a distância entre a barreira de (…) e a barreira portagem da (…) e entre a barreira de portagem de (…) e a área de serviço de (…) e remetem listagens com a posição quilométrica das barreiras de portagem e áreas de serviço; - Fls. 10.305 a 10.307: Resposta ao ofício 130 de 17/10/2003 da Brisa a remeter listagens de passagens entre 12/03/99 e 02/08/2002 de N; - Fls. 10.379: Resposta ao ofício 169 de 05/01/2003 da Direcção Geral dos im(...)s a remeter informação fiscal; - Fls. 10.395 a 10.430: Ofício do ITIJ a remeter listagem do historial do registo automóvel das viaturas de N e da sua mulher QI; - Fls. 10.591 a 10.592: Resposta ao ofício 13055 de 17/10/2003 da Faculdade de Direito de (…) a remeter todas as folhas de presença assinadas pelo arguido N na frequência do Mestrado na área de ciências Juridico-Criminais no ano lectivo de 98/99; - Fls. 10.593: Resposta ao ofício 13047 de 10/10/2003 da FFE a remeter a cassete com a gravação das imagens referentes à visita do general Ramalho Eanes, enquanto Presidente da República, às instalações da AX; - Fls. 10.658 a 10.671: Diligência Externa da Policia Judiciária em (…) ao apartamento de N, com reportagem fotográfica; - Fls. 10.676 a 10.679: Resposta ao ofício 13059 de 20/10/2003 da Repartição de Finanças de (…) a remeter certidão de todas as inscrições existentes, de todos os imóveis em nome de N - Fls. 10.680 a 10.694: Certidão do Registo Predial de (…) com as descrições 7 averbamentos e anotações do prédio urbano (…) “(…)”; - Fls. 10.698 a 10.709: Certidão do 1º Cartório Notarial de (…) do Contrato de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca da Venda da casa do (…), nº (…),(…), em (…) pelo arguido N; - Fls. 10.713 a 10.714: Contrato promessa de compra e venda, datado de 29/01/1999., em que N promete comprar andar no (…), Freguesia de (…) e Concelho de (…); - Fls. 10.744: Oficio (…) – 23.10.03 – resposta ao nosso oficio 13063 DSJ/19559/2003/EA - Fls. 10.746 a 10.757: Resposta ao oficio 13058 de 20/10/2003 da Via Verde Portugal a enviar a listagem de todas as passagens no sistema Via Vede do identificador nº (…) de N, entre 12/03/1999 e 18/11/2001; - Fls. 10.793: Oficio (…) – resposta ao ofício n.º 2722 do TIC – 21.10.03 DSJ/19453/2003/EA - Fls. 10.889 a 10.907: Informação 73 do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República, referente à análise da documentação bancária do arguido N; - Fls. 10.946: Resposta ao ofício 13061 de 21/10/2003 da EDP a informar os contratos em nome de N; - Fls. 10.986: Oficio (…) – 21.10.03 – resposta ao oficio 2723 do TIC - Fls. 11.003 a 11.046: Informação 74 e 75 do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República referente a movimentos bancários; - Fls. 11.183 a 11.184: Resposta ao ofício 13070 de 23/10/2003 do ministério dos Negócios Estrangeiros a remeter a relação de funcionários que ocuparam o cargo de Representante Permanente de Portugal junto das Nações Unidas, em Nova Iorque, nos anos de 1975 a 1977; - Fls. 11.185: PT – resposta ao nosso oficio 13062 - Fls. 11.236: Resposta ao ofício 13033 de 01/10/2003 da AX a remeter Organigramas da AX desde 1995 até 2003, Processo individual de BA (que se encontra no Apenso CM) e Listagem de alunos internos e semi-internos; - Fls. 11.265: Oficio da (…)– resposta ao oficio 2843 do TIC - Fls. 11.423 a 11.438: Informação do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República referente a movimentos bancários dos arguidos N, K e H, E; - Fls. 11.781: Oficio (…) – resposta ao nosso ofício 13085 – titularidade - Fls. 11.785: Oficio (…) – resposta ao ofício 2721 do TIC – titularidade - Fls. 11.845: Oficio (…) - resposta ao nosso oficio n.º 13084 - Fls. 11.851: Resposta ao ofício 13045 de 07/10/2003 da AX a remeter os processos individuais de alunos e ex-alunos (estes processos individuais encontram-se nos Apensos CR, CS, CT, CU, CV, CW, CX, CY, CZ, DA, DB, DC, DD, DE, DF, DG, DH, DI, DJ, DK, DL e DM); - Fls. 11.854: Resposta ao ofício 13045 de 07/10/2003 da AX a remeter os processos individuais de alunos e ex-alunos (estes processos individuais encontram-se nos Apensos DN e DO); - Fls. 11.861: Oficio ao (…) – resposta ao 13083 - Fls. 11.895: Auto de Reconhecimento de Local por AY à morada da residência do arguido A; - Fls. 12.362: Resposta ao ofício 13045 de 07/10/2003 da AX a remeter os processos individuais de alunos e ex-alunos (estes processos individuais encontram-se nos Apensos DP, DQ e DR); - Fls. 12.445 a 12446: Auto de Reconhecimento de Local por AN aos três locais em (…), relacionados com o arguido K; 12.447 a 15.449: Auto de Reconhecimento de Local por AP aos dois locais , em (…), relacionados com o arguido H e a (…), relacionado com o arguido E; Fls. 12.462: Auto de Reconhecimento de Local por AF às imediações da (...) (…); - Fls 12.466: Auto de Reconhecimento de Local por AS às residências do arguido A; - Fls. 12.545 a 12.547: Relatório do Exame Directo de (...) (...)-Legal do Instituto Nacional de Medicina Legal a H; - Fls. 12.562 a 12.563: Auto de Reconhecimento de Local por AT a (…); - Fls. 12.564 a 12.565: Auto de Reconhecimento de Local por AA à barraca do arguido A; - Fls. 12.636: Resposta ao oficio 13071 f«de 23/10/2003 da AX a remeter os Boletins de itinerários do arguido A nos anos de 1998 a 2001, as horas extraordinárias dos motoristas e as folhas de vencimento dos motoristas entre os anos de 1998 a 2001 (estes elementos encontram-se no Apenso BQ); - Fls. 12.638: (…) – resposta ao oficio 3121 do TIC - Fls. 12.692: (…) – Resposta ao nosso oficio 3119 do TIC - Fls 12.744: (…)– resposta ao oficio n.º 3122 do TIC - Fls. 12.760: (…) – Resposta ao oficio 3120 - Fls. 12.824 a 12.826: Auto de Reconhecimento de Locais por AV a locais relacionados com o arguido A; - Fls. 12.828 a 12.836: Auto de Reconhecimento de Locais por Y aos parques de estacionamento em (…); - Fls. 13.060: Oficio da (…) em resposta ao of. 3253 do TIC - Fls. 13.095: Resposta ao ofício 13.091 da AX a remeter os mapas globais dos planos de férias de Verão, identificação das (...) e Relatórios e Avaliações Psicológicas realizadas aos menores AD, AK e AU (estes elementos encontram-se no Apensos DX); - Fls. 13.096: Resposta ao ofício 13092 de 27/11/2003 da AX a remeter cópia dos processos dos alunos e ex-alunos que se encontram nos Apensos DT, DU, DV e DW; - Fls. 13.097: Resposta ao ofício 13.101 de 03/12/2003 da AX a remeter cópia do processo individual do aluno AL e cópia dos relatórios psicológicos do menor Z (estes elementos encontram-se no Apenso DS); - Fls. 13.099: Oficio s/n da (…)em reposta ao nosso of. 13118 - Fls. 13.130: (…) - Oficio 75/2003 em resposta ao nosso of. 13118 - Fls. 13.134: (…) – Oficio 23000 em resposta ao nosso of. 13119 - Fls. 13.151: (…) – Oficio 22955 em resposta ao nosso of. 13119 - Fls. 13.153: (…) – resposta ao nosso of. 13114 - Fls. 13.154: (…) – resposta ao nosso of. 13120 - Fls. 13.163: (…) – resposta ao of. 3235 do TIC - Fls. 13.167: (…) – resposta ao oficio *** do TIC - Fls. 13.168: (…) – resposta ao nosso oficio 13141 - Fls. 13.174: (…) – resposta ao nosso of. 13142 - Fls. 13.178: (…) – resposta ao nosso oficio 13140 - Fls. 13.188: (…) – resposta ao nosso of. 13112 - Fls. 13.192 a 13.198: Resposta ao ofício 13053 de 16/10/2003 do Instituto Nacional de Medicina Legal a enviar Resposta aos quesitos endereçados aos Peritos em Psicologia que realizaram as Perícias sobre a personalidade às crianças e jovens, solicitas no âmbito do Processo; - Fls. 13.249 a 13.261: Resposta ao ofício 13.117 de 12/12/2003 do HA a remeter cópia dos episódios de urgência referentes a AE; - Fls. 13.262 a 13.281: Ofício do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria Geral da República a remeter a análise realizada ao Apenso BQ; - Fls. 13.282: Ofício da AX a informar que a autorização para o pagamento das horas extraordinárias é dada nos respectivos boletins pela entidade competente e a carga horária dos motoristas; - Fls. 13.295: Resposta ao oficio 13143 de 19/12/003 da Conservatória do Registo Automóvel a informar que não existe qualquer registo de propriedade de veículos em nome de A; - Fls. 13.312: (…) – resposta ao contacto telefónico - Fls. 13.873: Ofício da (…) em resposta ao of. 3315 - Fls. 13.875: Ofício da (…) em resposta ao of. 13132 - Fls. 13.918: (…): resposta ao of. 3312 (informação das datas e horas de início e fim das intercepções solicitadas) - Fls. 13.921 a 13.937: Ofício do Instituto Nacional de Medicina Legal a remeter o Relatório do Exame Pericial Psiquiátrico relativo a K; - Fls. 14.430: (…) – novas listagens das chamadas (of. 2721 – 14.07.2003 e 08.10.2003); - Fls. 15.283: (…) – envio de CD-Rom com informação solicitada no of. 3249 de 5.12.03; - Fls. 15.300: Resposta ao oficio 13133 – (…); - Fls. 15.301 a 15.308: Oficio da Inspecção Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho - processo de averiguações n.º 254/2003 – Sindicância ao funcionamento da AX; - Fls. 15.438: (…) – informação relativa à titularidade dos n.ºs (…) e (…); - Fls. 16.948: Resposta ao ofício 649 de 24/02/2003 do Banco Internacional de Crédito a remeter os elementos constantes de fls. 16949 a 16960; - Fls. 17.240: Of. (…): resposta ao of. 3316 de 15.12.2003; resposta ao of. 3247 de 05.12.2003 ((…),(…) - N, (…),(…),(…),(…),(…),(…),(…),(…);(…),(…),(…),(…)); - Fls. 17.252: Of. (…): resposta aos of. 3248 de 05.12.2003 e 3322 de 15.12.2003 ((…),(…),(…),(…),(…); - Fls. 17.254: Of. (…): resposta ao of. 3246 de 05.12.2003; - Fls. 17.446: Of. (…): resposta ao of. 415 de 03.03.2004; - Fls. 17.499: Of. (…): resposta ao of. 417 de 03.03.2004; - Fls. 17.694: Resposta da AX ao oficio 401 de 02/03/2004 a indicar a escola que o ofendido AQ frequentou no ano lectivo de 2001/2002 e a remeterem cópia das actas das reuniões dos Conselhos Técnicos, documentação existente na Divisão de Aprovisionamento e Logística relativa ao planeamento de transportes e respectivos motoristas e cópia dos livros de ocorrências dos lares (estes elementos encontram-se no Apenso EJ); - Fls. 17.903: Resposta da TAP ao oficio 405 de 02/03/2004, a remeter cópias autenticadas dos bilhetes emitidos, nos anos de 1998 a 2000, em nome do E no âmbito do protocolo TAP/MNE (estes elementos encontram-se no Apenso EK); - Fls. 18.085: Resposta da AX ao ofício 614 de 17/03/2004 a informar que no período em referência não eram registadas as entradas e saídas de veículos ao serviço da AX em qualquer dos (...)s; - Fls. 18.524: Of. (…): resposta ao n/ of. 414 sobre os registos de chamadas efectuadas pelo (…); - Fls. 18.594: Of. (…): resposta aos n/ of. 404 e 704 sobre dados de tráfego: que já não têm; - Fls. 19.084: Ofício da AX em resposta ao ofício de 13/04/2004, a remeter os registos de entradas e saídas de veículos do CZ (juntos ao apenso EJ); - Fls. 19.085: Of. (…): req. tapes apreendidas – fornecer dados a outros inquéritos; - Fls. 19.160 a 19165: Auto de Reconhecimento de local efectuado pelo arguido A à Av. (…), n.º (…), em (…) (fls. 19160 a 19165); - Fls. 19.166 a 19.169: Auto de Reconhecimento de local efectuado pelo arguido A à (...) (…) e na (...) (…), no (…); - Fls. 19.179 a 19.182: Auto de Reconhecimento de local efectuado pelo arguido A à Av. (…), em (…); - Fls. 19.183 a 19.186: Auto de Reconhecimento de local efectuado pelo arguido A à Av. (…), em (…) - Fls. 19.187 a 19.193: Auto de Reconhecimento de local efectuado pelo arguido A à Av. (…) e ao (…), em (…); - Fls. 19.282: Ofício da Ordem dos (...)s em resposta aos ofícios 416, 816 e 903 de 03/03/2004, 20/04/2004 e 23/04/2004, a remeter o Parecer do (...) de Psiquiatria acerca da aptidão dos testes utilizados nas perícias à personalidade das testemunhas; - Fls. 19.293: Ofício Banco de Portugal em resposta aos ofícios 1905, 2011, 1887 e 1948 de 27/06/2003, 07/07/2003, 26/06/2003 e 02/07/2003 a informar sobre contas em nome dos arguidos; - Fls. 19.354: Ofício da AX a informar que o número de telemóvel atribuído ao arguido C até 7/10/2002 era o número (…); - Fls. 19.707 a 19.828: Ofício do Ministério Público a juntar certidão do processo disciplinar instaurado a UL, educadora do FQ do DT; - Fls. 20.020 a 20.048: Ofício da AX a remeter informação interna do Director do CZ referente a AP; - Fls. 20.159 a 20.221: Documentos apresentados pelo arguido H na acta do Debate Instrutório; - Fls. 20.222 a 20.345: Documentos apresentados pelo arguido C na acta do Debate Instrutório; - Fls. 20.346 a 20.363: Documentos apresentados pelo arguido E na acta do Debate Instrutório; - Fls. 20.458: Of. (…): envia a informação que faltava; - Fls. 20.463: Listagem da (…) (fls. 20458); - Fls. 23.354 a 23.535: Documentos juntos com a Contestação do arguido H; -Fls. 23.729 a 24.052: Documentos juntos com a Contestação do arguido C ; - Fls. 24.226 a 24.256: Documentos juntos com a Contestação do arguido K (25 documentos); - Fls. 24.803 a 24.805: Ofício da AX – Saúde Mental - em resposta ao ofício 789025 de 17/11/2004 a remeter o parecer sobre os assistentes; - Fls. 25.660 a 27.166: Registos de Entradas e saídas de viaturas da AX, no período compreendido entre Abril e Dezembro de 2000, Janeiro e Dezembro de 2001 e Janeiro e Setembro de 2002 e Mapas dos Registos dos Serviços de Transportes efectuados pelos motoristas durante os anos de 1999 a 2002; - Fls. 27.231 a 27.391: Documentos relativos aos registos do movimento diário/mensal das viaturas da AX, no período compreendido entre Março de 2000 e Setembro de 2002 das viaturas (…) ((…) e (…)),(…) ((…)) e (…) ((…)); - Fls. 27.629-A a 27.629-E : Documentos juntos pela AX referentes ao Mês de Março de 1999, relativamente ao serviço de transportes da AX; - Fls. 27.757 a 27.758: Ofício da Federação Portuguesa de Futebol em resposta ao ofício 844427 a informar que o assistente AI apenas se encontra inscrito na Federação desde a época desportiva 2002/2003; - Fls. 28.220 a 28.221: Declaração da AX a autorizar o arguido C conduzir os carros de matrícula (…) ((…)) e (…) ((…)); - Fls. 28.302 a 28.409: AX vem juntar aos autos: - os registos diários de saídas e entradas dos assistentes AP, AV, X, Y, AT, AN e AI no período compreendido entre Outubro de 1998 e Dezembro 2000; - Relatório da Equipa Técnico-Educativa do FD sobre o educando AV; - Comunicação de Ocorrências relativas ao educando AP; - Recomendação de 22/03/2000, subscrita por EJ, sobre os assistentes AP e X - Fls. 28.417 a 28.427: Errata da Lista Integrada junta aos autos com a Contestação do arguido C; - Fls. 28.560 a 28.561: Resposta da Mercedes Benz Portugal ao ofício 868024 a informar sobre alterações, designadamente nos conta-quilometros digitais dos modelos (…) e (…); - Fls. 28.762: Resposta do (...) de Abastecimento de combustíveis FFJ Ao ofício 890260 de 25/02/2005 a informar que à data de Fevereiro de 2000 não possuíam registo informático das vendas; - Fls. 28.777 a 28.778: Resposta do (...) de Abastecimento da BP ao ofício 890220 de 25/02/2005 a informar que não dispõe de registo informático das vendas/abastecimentos feitos com emissão de recibo relativo à venda de combustível; - Fls. 28.799: Oficio do Ministério dos Negócios Estrangeiros em aditamento ao oficio de 23/07/2003, com referência ao nosso oficio 12904 de 12/06/2003; - Fls. 28.998: Resposta da Brisa ao ofício 905406 a informar a data da abertura da (…) (Auto-estrada (…)/(…)); - Fls. 29.000 a 29.002: Resposta da AX ao oficio 905410 de10/03/2005 a informar que apenas a viatura (…) possui Via Verde desde Setembro de 1999 e a juntar cópia das deslocações da (…) com a matricula (…) no período compreendido entre 1998 a 2001; - Fls. 29.003 a 29.027: Resposta da AX ao ofício 905509 de 10/03/2005 a remeter informação relativamente a FFK; - Fls. 29.032 a 29.506: Resposta da AX ao ofício 905634 de 10/03/2005 a juntar cópia do processo de candidatura do arguido N; - Fls. 29.526 a 29.545: Resposta da AX ao oficio 905457 de 10/03/2005 a remeter o Processo Individual de A como aluno da AX; - Fls. 29.546 a 29.589: Documento da Associação dos Trabalhadores da AX, com cópia do documento de constituição da associação, informação sobre início de actividade, inscrição de CY e de A, jogos em que participaram, lista dos jogos realizados pela equipa de futebol de 11, boletins de jogos e fichas de inscrição de jogadores (documento que é completado com documento de fls. 29.889 a 29.930); - Fls. 29.546 a 29.589: Documentos referentes à Associação dos Trabalhadores da AX, de onde constam, por exemplo, a cópia da escritura de constituição da Associação; lista dos acontecimentos desportivos ou de outra natureza, levados a cabo no âmbito dos objectivos da Associação; boletins de actividades desportivas em que a associação se inscreveu anualmente na modalidade, com referência, por exemplo: (1) às instalações do CZ, na (...) (…) nº (…), para a prática de futebol 11 e treinos no “campo sintético do CZ (cfr. Fls. 29.587/8); (2) e em que na época de 2000/2001 estão inscritos como jogadores o arguido A (cfr. Fls. 29.570, fls. 29.586), a testemunha EM, educador da AX e ouvido em audiência de julgamento (cfr. Fls. 29.566, fls. 29.586), a testemunha EN, educador da AX e ouvido em audiência de julgamento (cfr. Fls. 29.567, fls. 29.586); e na época 2001/2002 e 2002/2003, a testemunha EN, educador da AX e ouvido em audiência de julgamento (cfr. Fls. 29.567, fls. 29.586/7/8), a testemunha EM, educador da AX e ouvido em audiência de julgamento (cfr. Fls. 29.575, fls. 29.583, fls. 29.588), a testemunha CY, ex -aluno da AX e ouvido em audiência de julgamento (cfr. Fls. 29.578 e 29.583, fls. 29.587); - Fls. 29.889 a fls. 29.930: Documento da Associação dos Trabalhadores da AX, com lista dos jogos realizados pela equipa de futebol de 11, nas épocas de 2000 a 2005, boletins de jogos e fichas de inscrição em que participaram A e CY, horários dos treinos (documento que completa o documento de fls. 29.546 a 29.589); -Fls. 29.889 a 29.930: Documentos igualmente referentes à Associação dos Trabalhadores da AX, de onde constam listas, boletins e fichas de equipas dos jogos de futebol realizados e nos quais participou a equipa da associação de trabalhadores; e dos documentos de fls. 55.909 a 55.946 dos autos, referentes às fichas dos jogadores que praticaram desporto federado pelo AX (...) (mas tendo-se em atenção que, de acordo com a comunicação que foi feita ao Tribunal, são as fichas que o clube conseguiu localizar e remeter para o Tribunal), relativamente aos anos de 1998 a 2002 e entre as quais está a ficha do(s) assistente(s) AD (cfr. fls. 55.914), AM (cfr. fls. 55.916), AO (cfr. fls. 55.938). - Fls. 30.330 a 30.332: Resposta do (...) de Abastecimento da BP da Av. (…) ao ofício 890220 de 25.0.2005 a remeter talão de pagamento por multibanco datado de 11/03/2000 no montante de 8.300$00; - Fls. 30.383: Resposta do Dr. BL ao ofício 949282 de 20/04/2005 a prestar informação médica relativamente a AC, AM e AR; - Fls. 30.523 a 30.534: Resposta da AX – Saúde Mental, ao oficio 949282, a remeter relatórios dos assistentes AC, AB, AJ, AG, AY, AN, X, AU, AF, Z e T; - Fls. 30.800 a 30.801: Relatório Clínico do HHB relativamente a V; - Fls. 30.812 a 31.561: Resposta da AX ao oficio 971149 a remeter cópia integral dos Processos de Funcionário e de Aluno de C; - Fls. 31.572: ofº (…) a dar resposta ao N/oficio 973746; - Fls. 31.575 a 31.579: Relatório (...) do assistente AC; - Fls. 31.600: ofº (…) a responder ao N/oficio 973543; - Fls. 31.681: ofº (…) a responder ao N/oficio 973475; - Fls. 31.896 a 32.396: Documentos juntos pela AX sobre a banda e programas de festas, relativo a AQ, Centro Educação Musical/Coro (fls. 31.841, ponto 7.); e Processo Individual do assistente AQ; - Fls. 32.503: Escrito emitido pela AX, referente às (...) de 1996, 1997 e 1998 em que esteve presente AD; - Fls. 32.735 a 33.107: Oficio da AX a remeter documentos encontrados nos arquivos dos Lares e Serviços Administrativos reportados a férias de educandos do EY, nos anos de 1996 a 1998 e lista dos aprendizes dos grupos musicais instrumentais de 1998 a 2002; - Fls. 33.244: Resposta da FFL ao oficio 1015659 de 24/06/2005 a informar que no arquivo da FFM nada consta acerca do aluno AQ; - Fls. 33.275 a 33.277: Resposta da AX ao ofício 1011308 de 21/06/2005 a remeter informações relativas a FFN; - 33.331: Ofício da FFO, referente a AQ; - Fls. 33.333 a 33.343: Fotocópia das fotografias constantes de fls. 10 a 20, do apenso AS, nas quais o Assistente AP identificou na audiência de julgamento de 06/07/2005, apontando no original e escrevendo nas fotocópias, as pessoas que identifica como o arguido C, FB e BQ - Fls. 33.429: Resposta da AX ao ofício 1011308 de 21/06/2005 a remeter informação sobre (...) (Ano, data da ida, data do regresso motorista e viatura e BE) e a remeter cópia dos registos do movimento diário/mensal das viaturas com matrícula (…),(…),(…),(…); - Fls. 33.432: Resposta da FFP a informar que não existe qualquer registo de AQ; - Fls. 33.546: Resposta da FFQ a informar que não existe qualquer registo de AQ; - Fls. 33.750 a 33.759: Resposta do FFR ao oficio 1037254 de 12/07/2005 a juntar cópia das fichas de internamento do assistente AC; - Fls. 33.762: Auto de recepção definitivo pelo CZ, da empreitada para execução de uma pista de Skate, datado de 24 de Setembro de 1997; - Fls. 33.796: Resposta do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social ao oficio 1038694 de 13/07/2005 a remeter o processo disciplinar movido ao arguido C que se encontra no Apenso Z-8; - Fls. 33.878 a 33.879: Resposta da DR ao ofício 1010457 a remeter a gravação da entrevista do arguido H em 28/11/2002; - Fls. 33.919 a 33.932: Resposta do Centro Hospitalar de (…) ao ofício 1037296 de 12/07/2005 a remeter cópia do processo clínico do assistente AC; -Fls. 34.175 e 34.176: Relatório Clínico de AC, referente ao período subsequente a 31/3/03; - Fls. 34.281: Capa de plástico para cheques, contendo dentro um calendário de 2005, um cartão da empresa (…), um Post-it escrito, uma folha com nomes e nºs. de telefone e uma carta da (…), dirigida a AV e datada de 8/6/03, entregue por AV na audiência de julgamento de 14/09/05. - Fls. 34.301: Duas agendas (uma de capa em tons de azul e outra de capa branca) entregues por AV na audiência de julgamento de 14/09/05; - Fls. 34.445: Mapa/planta de zona de (…), com indicação das (...) (…) e (...) (…), junta pelo arguido H em 29/9/05; - 34.557 a 34.567: Relatório do Hospital de Júlio de Matos, subscrito pela Psicóloga/Assistente Principal, Sra. D. CN relativamente ao arguido C; - Fls. 34.580 e 34.581, 34.701 e 34.702: Documento emitido pela AX, referente ao Processo Clínico de AC, incluindo durante o tempo que esteve na AX e relativo ao período que vai até 18/06/05; - Fls. 34.583 e 34.703: Documento emitido pela AX, referente à baixa provisória da AX de AC; - Fls. 34.679: Cópia do cartão referente ao telemóvel nº (…), entregue por AV na audiência de julgamento de 17/10/05; -Fls. 34.706: Fotocópia do documento de fls. 2.287 dos autos - fotografias do nº (…), da (…) -, com anotações feitas por AV na audiência de julgamento de 19/10/05; - Fls. 34.725: Ccroqui do interior da “Casa (…)”, feito por AV na audiência de julgamento de 20/10/05; - Fls. 34.937 e 34.938: Documentos relativos à inauguração da estação do Metro do (…), 18/04/98 (determinada junção AJ 11/03/08); - Fls. 34.939: Fotografia do passe de AK (determinada junção AJ 11/03/08); - Fls. 34.940: Fotografia de AK (determinada junção AJ 11/03/08); - Fls. 35.091/2: Cópia do Bilhete de identidade de AU; - Fls. 35.492 a 35.549: Documentos relativos a assistência médica, ficha (...) do Assistente AC na AX, com inclusão de registos de idas a (...) médicas, vacinação, tratamentos efectuados, com registos de 1987 a 2001; - Fls. 35.600: Croqui da “casa (…)”, feito em audiência de julgamento pelo assistente AI; - Fls. 35.764: Documento emitido pela (…), referente à data da entrega a A, das chaves do fogo municipal sito no Bairro (…), (...) (…), nº (…),(…)., em (…); - Fls. 35.801: Documento emitido pela (…), referente à identificação da titularidade do telefone nº (…); - Fls. 35.821 a 35.822: Resposta da AX ao ofício 1150372 de 29/11/2005 a enviar o nome de todos os educadores do GA, dos anos de 1999 a 2002; - Fls. 35.957 a 35.958: Resposta da FFE ao ofício 1175304 de 21/10/2005 a remeter cassete com a gravação das reportagens/entrevistas com alunos da AX; - Fls. 36.022 a 36.035-A: Documentos referentes a horário escolar de AI; - Fls. 36.130 a 36.132: Ofício da AX a remeter Livros de Registos de Ocorrências do FF, GL; Registos das (...) de 1999 e 2000, dos Lares FC, FD e FG do CZ; Informação de junção de Lares durante as férias; - Fls. 36.168/69 – Croqui da casa de (…) feito por AT na AJ de 25/01/06 - Fls. 36.170 – Croqui da Av. (…) feito por AT na AJ de 25/01/07 - Fls. 36.233 – Fotocópia das Fotografias de fls. 939, anotadas na AJ de 1/02/06 por AT - Fls. 36.243/4: Oficio enviado pelo HHB, com informação referente à consulta de exames, no âmbito da perícia feita ao arguido C; - Fls. 36.275/6: Ofício da AX, a enviar: Livros de Registos de Ocorrências do FU, FA, de 18/09/00 a 31/05/01, 1 de Junho de 2001 a 17 de Março de 2002, 18 de Março de 2002 a 8 de Dezembro de 2002; Horário de AH, no BF, anos lectivos 1998 a 2002 (fls. 36.277 a 36.289); Livro de Registos de Ocorrências do CW, DT, de 2002 a 2003, 2003 a 2004, 2004 a 2005, comunicando que não foram encontrados os anteriores a 2000 (fls. 36.290); - Fls. 36.291: Informação da AX, data de 17/01/06, sobre horários de AK e remetendo cópia de horários e pautas (fls. 36.292 a 36.297); - Fls. 36.312 – Croqui da (...) (…), feito por AT na AJ de 7/02/06 - Fls. 36.343: Ofício da AX, a remeter livros de registos de ocorrências do Lar FC, CZ, de Agosto 1997 a 29 Setembro 1999; 30 Setembro 99 a 22 Dezembro 00; 6 Agosto 2001 a 7 Agosto 2002; 2 Setembro 2002 a 3 Outubro 2003; 3 Novembro 2003 a 18 Novembro 2004; 18 Novembro 2004 a 19 Setembro 2005; 16 Julho 2005 a 1 de Janeiro 2006 (junção dos Lares FC e FE); 20 Setembro 2005 a 16 Janeiro 2006; - Livro Registo Ocorrências FD, CZ, de 15 Setembro 97 a 8 Junho 98; 2 Dezembro 98 a 4 Março 99; 13 Setembro 99 a 7 Agosto 2001; 5 Setembro 2001 a 28 Junho 2002; 15 Setembro 2002 a 3 Novembro 2003; 5 Novembro 2003 a 9 Julho 2004; 10 Julho 2004 a 22 Janeiro 2005; 23 Janeiro 2005 a 7 de Junho 2005; 8 Junho 2005 a 23 Novembro 2005; 23 Novembro 2005 a 18 Janeiro 2006; - Livro Registo Ocorrências da Junção dos Lares FC, FG, FE, FF e FD, do CZ, de 12 Julho 2004 a 12 Setembro 2004, Verão 2004; - Horários Escolares de educando internos CZ, AM; AG; AV; AI; Y; - Fls. 36.345/7 – Oficio da AX e Horário AV, (…), Ano Lectivo 99/00 - Fls. 36.345, 36.348/52 – Ofício da AX e Horário AI, (…), ano 02/03; 03/04; 05/06; - Fls. 36.345, 36.353/54 – Ofício da AX e Horário Y, (…) 00/01; - Fls. 36.345, 36.355/57- Ofício da AX e Horário AM 04/05; 03/04 - Fls. 36.345, 36.358/64 – Ofício da AX e Horário AG, 99/00; 00/0101/02; 03; 04; - Fls. 36.454 a 36.546: Ofício da AX e horários de AL, AD, AC, AB, AR, AT, AS, AU, V, AF, FFS, AK, AO, T e informação social de T; - Fls. 36.558: Ofício da DS as remeter 5 cassetes com as reportagens/entrevistas relacionadas com alunos e ex-alunos da AX (as cassetes encontram-se no Apenso Z-9); - Fls. 36.711: Comunicação da FFT, a informar do tempo em que teve ao seu serviço FFU (Admitida em 18/07/91; Mãe de AN); - Fls. 36.717 a 36.899: Oficio da Câmara Municipal de (…) a remeter a planta da (...) (…), com os números de policia e cópia dos processos de licença para obras/construção de uma moradia na (...) (…), nº (…) com a planta da casa; - Fls. 36.980 a 36.987: Ofício da 2ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão integral de todas as inscrições relativas ao prédio urbano identificado como Lote (…), nº (…) da Av. (…) em (…); - Fls. 37.102 a 37.143: Ofício do FFG a remeter o Relatório do Exame às Faculdades Mentais do arguido H; - Fls. 37.205 a 37.210: Ofício da 3ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão das Descrições/Averbamentos/anotações da (...) (…), nº (…) e da (...) (…), nº (…) e (…); - Fls. 37.442 a 37.449: Ofício da Policia Judiciária a remeter CD e fotografias de (…), concretamente da fachada da frente das casas da (...) (…) , pedidas pelo N/ofício 1228056 (a fotografia panorâmica encontra-se no Apenso T-2); - Fls. 37.636 a 37.686: Ofício da 2ª Conservatória do Registo Predial de (…) a remeter certidão de teor integral de todos os registos de todas as fracções respeitante ao lote (…) do nº (…) da Av. (…), em (…); - Fls. 38.070 a 38.084: Processo licenciamento do prédio da (...) (…), Lote (…), nº (…); - Fls. 38.378 a 38.384 : Plantas da (...) (…); - Fls. 38.588: Ofício da (…) a informar acerca da titularidade atribuída ao número (…); - Fls. 39.136 a 39.139: Cópia dos interrogatórios dos alunos HHS, em 9 de Março de 1982 e relatório com data de 2 de Março de 1982, com referência a NZ; - Fls. 39.211-A: Documento entregue pela testemunha NU na audiência de julgamento no dia 13/07/2006; - Fls. 39.284: DVD com o programa “(…)” entregue pelo arguido H na audiência de julgamento do dia 19/07/2006; - Fls 39.596/7: documente referente a AI, folha da agenda entregue pela testemunha YM, família de acolhimento, com os nºs. de telefone de AI (nº (…); (…)); -Fls. 40.067: Ofício enviado pela DR, sobre deslocação da testemunha IP ao (…), a acompanhar AP e deslocação de operadores de imagem ou jornalistas a (…) (cfr. também documento de fls. 41.660), - Fls. 40.934 a 40.935: Ofício da AX a remeter informação acerca do Assistente AI; - Fls. 41.129/30: Documentos entregues pela testemunha PJ; - Fls. 41.197: Fotocópia da fotografia panorâmica do Apenso T-2, que veio com o ofício de fls. 37.442 dos autos, com anotações pela testemunha SE, na AJ 9/11/06, sobre quem reside onde, no local retratado; - Fls. 41.387 a 41.401: documentos entregues pela testemunha DB, relativos a “contrato promessa de arrendamento” da fracção (…), (…), Bloco (…), Lote (…), do prédio sito na Av. (…) em (…), a DC, datado de 21 de Janeiro de 1992; “Autorização de obras” ao inquilino do (…) e (…), do lote (…), Bloco (…), da Av. (…), DC, datado de 21 de Janeiro de 1992; uma folha com “Contrato de Arrendamento” a DD, do (…), do prédio sito na Av. (…), Bloco (…), Lote (…), a(...) inicio em 1 de Outubro de 1995; Contrato promessa de arrendamento a DD, da fracção designada pela letra (…), correspondente à Loja, com entrada pelo nº (…) a (…), da Av. (…), torneando para a (...) (…), nº (…), datado de 2 de Fevereiro de 1998; Contrato Promessa de Arrendamento a DE, do (…), do prédio sito na Av. (…) Bloco (…), Lote (…), datado de 1 de Janeiro de 1987; Contrato de arrendamento a DE, da Fracção (…), do prédio sito na Av. (…), Bloco (…), lote (…),(…), datado de 6 de Julho de 1988; - Fls. 41.521 a 41.539: Documentos remetidos pela testemunha DF, relativos a obras feitas na Av. (…), (lote (…)), nº (…),(…), entre os quais orçamento datado de 18/05/01 (cfr. Fls. 41.522), cópia de escritura de mútuo com hipoteca datada de 15/10/01 (cfr. Fls. 41.528/39); - Fls. 41.562 a 41.571: Documentos entregues pela testemunha DB, referentes a contrato de trabalho da DD, sita na Av. (…), Bloco (…), lote (…),(…) e DG; contrato de trabalho da DE, sita na Av. (…), Lote (…), Bloco (…), 1º (…) e FFV, FFW e FFV; declaração de remunerações da DE referente a Maio de 2002, com data aposta de 15/06/02; declaração de rendimentos da DC, com data de recepção de 28/04/99; cópia de folha de modelo 10 da DE, com identificação de listagem de rendimentos para o ano de 1998; - Fls. 41.660: Oficio da DR, com informação sobre deslocação de operadores de imagem e testemunha CCN à cidade de (…), em Janeiro de 2003, e sobre registo de imagens da “Casa (…)” (cfr. também documento de fls. 40.067); - Fls. 41.975: Documento enviado pela testemunha UG, por causa de informação relativa a AV; - Fls. 42.117 a 42.179 – Documentos apresentados pela testemunha KH - Fls. 42.605 a 42.613 – Junção de documentos pela testemunha DH - Fls. 43.372: CD com a entrevista à DS da Drª AAG dia 25/11/2002 e 24/11/2002; - Fls. 43.373: CD com a entrevista telefónica à DS Noticias da Drª AAG dia 11/01/2007; - Fls. 43.521 a 43.791 – Documentos remetidos pela FFX relativamente ao Processo de Obras na (…) nº (…), (…) e (…), em (…); - Fls. 43.960 a 43.997 – Documentos remetidos pela DI, envio de projecto de arquitectura do Edifício da (...) (…), nº (…),(…) e (…) , em (…); - Fls. 44.561 a 44.563 – Documento entregue por SG na AJ de 8/03/07, relatório final (...) que refere o nome E; - Fls. 44.599-A: Ofício da Câmara Municipal de (…) a informar que não foi encontrado qualquer requerimento para a realização de obras no prédio sito no Largo (…), em (…), residência do Sr. PO; - Fls. 44.646/54: Ofício da AX e documentos, sobre financiamento de carta de condução a AV e AT; - Fls. 44.655: Ofício da FFE com informação sobre concurso “(…)”, como produzido e emitido pela FFE em 1994; - Fls. 44.660 a 44.666 – carta do arguido K, do Centro de Saúde (…), extensão da (...) (…), para Directora (…), Dra. RN, por causa da questão da autorização para fazer análise a utentes (13/04/96); Carta da AX para K, sobre a questão das análises, pois está em causa também o laboratório (25/09/96); Carta da K para Directora (…), em resposta carta que antecede, em que ficará apenas disponível para situações de urgência (25/9/06); e carta de 26/9/96 de K para Directora (…), sobre questão de análises, por Dr. HY não deixar os educandos fazerem as análises requisitadas por K ...sendo seu desejo continuar com as boas relações que sempre tem tido com AX; - Fls. 44.875: Informação da Junta de Freguesia de (…) sobre Rotundas; - Fls. 44.959: Informação da Câmara Municipal de (…) sobre Rotundas; - Fls. 45.213: Ofício da AX a enviar relação de educandos internos e equipas técnicas de cada um dos Lares da AX, de 1997 a 2002; Mapa dos Directores e Coordenadores dos estabelecimentos entre 1997 e 2002; Mapa dos (...)s e Enfermeiras afectos ou ligados aos Lares da AX (elementos que se encontram no Apenso Z-10); - Fls. 45.214: Oficio da AX, referente a cartas de condução parcialmente financiadas pela AX entre 1995 e 2004 (inclusive); - Fls. 45.243: Documento apresentado pela testemunha SG, referente a informação dirigida ao Sr. Director (...) da Directoria de (…) da PJ, com data aposta de 4/07/86; - Fls. 45.683 a 45.686 – Documentos juntos pelo arguido K, da agência FFY, viagem a Roma em 5 a 9 Abril 2001; - Fls. 46.888: Assinatura do arguido N desenhada pela testemunha QI na Audiência de Julgamento no dia 11/07/2007; - Fls. 46.970/5: Lista de serviços comerciais do FFZ, com a identificação dos seus balcões; - Fls. 47.033 a 47.035: Ofício da FFE a enviar uma lista de programas apresentados por H entre 1990 e 1999; - Fls. 47.655: Fotocópia do Cartão de estacionamento de viatura autorizado na AX, junto na audiência de julgamento no dia 10/09/2007 pela defesa do arguido K; - Fls. 47.877: Declaração da Associação dos Trabalhadores da AX onde declara que a testemunha CY esteve inscrito e participou em treinos naquela Associação (indica as datas); - Fls. 47.878: Declaração da GGA a indicar a data da compra e reparação da viatura (…) (documento apresentado pelo arguido K na Audiência de Julgamento no dia 24/09/2007); - Fls. 47.944: Declaração da DI a declarar que os projectos de arquitectura da (...) do arguido K foram realizados naquele gabinete; - Fls. 47.945 a 48.082: Documentos associados à construção da (...) Dr. K (entregues na audiência de julgamento no dia 27/09/2007 pela defesa do arguido K); - Fls. 48.166 a 48.173: Documentos apresentados pela testemunha DJ, referentes a factura de mesa de bilhar (fls. 48.167, 23/09/97, “DK.”, (...) (…)), compra de sofá (fls. 48.168, aposta a data 29/02/00, DK. e fls. 48.169, aposta a data 17/03/04), remoção da mesa de bilhar (fls. 48.170, aposta a data 13/04/04, DK., (...) (…)), factura de obras de entrada de hall (fls. 48.172, aposta a data de 22/11/05) e CD com fotografias de mesa de bilhar e interior de habitação, relacionados DK e com prédio sito na (...) (…), nº (…), em (…); - Fls. 49.110 a 49.115: Documentos entregues pela testemunha LF na audiência de julgamento no dia 20/10/2006; - Fls. 49.228 a 49.241: Documentos entregues pela defesa do arguido K na audiência de julgamento do dia 12/11/2007 – Facturas da GGB., Factura de GGC, Facturas de GGD; Factura de GGE e fotografias do aquário; - Fls. 49.453 a 49.456: documentos juntos na audiência de julgamento no dia 19/11/2007 – Entrada das viaturas do arguido K na AX e documento da AX com informação prestada pela Senhora Assistente Social, Dra. BG, em 31/08/1995, relativamente ao que apelida de “irmãos (…)” - Fls. 49.632 a 49.654: Ofício da AX a enviar comprovativo do pagamento de cartas de condução a alunos e ex-alunos da AX entre 2005 até à data do ofício; - Fls. 49.769: Fax da Assistente AX a informar o nº dos Processos que têm a ver com factos de idêntica natureza aos dos presentes autos; - Fls. 50.148 a 50.179: Documentos entregues pela testemunha MB, referente ao cabeleireiro situado na (...) (…) e novo cabeleireiro da testemunha; - Fls. 50.455: Documento junto pela testemunha RS - cópia do fax que enviou à FFE em 2003; - Fls. 50.551: Certidão emitida pela (...), do acórdão proferido no processo nº 15699/03.8TDLSB, pela (...), pelo Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Tribunal Constitucional, em que foi arguido GGF, com nota do trânsito em julgado; - Fls. 50.646: Ofício da AX, referente a GGG; - Fls. 50.655 a 50.723: Certidão emitida pela (...), do acórdão proferido no processo nº 15680/03.7TDLSB, pela (...), pelo Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Supremo Tribunal de Justiça, em que foi arguido GGH, com nota do trânsito em julgado; - Fls. 50.734 a 50.740 – Documentos enviados pelo FFZ, referente a identificação de balcões; - Fls. 50.750 – Informação da PJ, referente a registos de entradas e saídas de entidades Hoteleiras, constando que deixaram de ser obrigatórios a partir de 1999/2000; - Fls. 50.754 a 50.756 – Documento emitido pelo Hotel Astória referente a alojamento da testemunha Ana Maria Carvalho, de 19 a 21 de Março de 1999; - Fls. 50.759 a 50.761: Documentos remetidos pela AX, referentes á colocação de película anti-reflectora nos vidros do R/C da (...), com auto de recepção datado de 28/05/02; - Fls. 50.762 a 50.765: Documentos remetidos pela AX, referentes à abertura de processo para execução de refeitório na cave da (...), datado de 31/03/99; comunicação no processo de execução do novo refeitório, datada de 23/06/99; auto de consignação para inicio imediato dos trabalhos, datado de 22/07/99; e auto de recepção provisória datado de 12/09/01; - Fls. 50.794 a fls. 50.884 – Documentos remetidos pela Escola Superior de Educação, IP de (…), referente a candidatura do arguido N e CV; - Fls. 50.885 a 51.013 – Documentos remetidos pela Inspecção Geral de Educação, referentes a candidatura do arguido N; - Fls. 51.023 e 51.058 – Documento enviado pelas Escola Superior de Educação, relativo a candidaturas de N a lugares, anos 1998/9; - Fls. 51.031 – Documento enviado pela Escola Superior de Educação, IP (…), relativo a candidaturas do arguido N a lugares em 1998/9; - Fls. 51.033 – Documento informação Policial, relativa a diligências junto de Hotel GGI e GGJ; - Fls. 51.035- Documento emitido pelo Hotel GGJ, quanto a alojamento de N e JK de 19 a 21 de Março de 1999; - Fls. 51.037 – Documento emitido pelo Hotel GGJ, conta de alojamento de 19 a 21 de Março de 1999; - Fls. 51.038 – Documento emitido pelo Hotel GGJ, referente a alojamento de 19 a 21 de Março de 1999; - Fls. 51.039 – Informação da autoridade sobre alojamento da testemunha JK e do arguido N no Hotel GGK; - Fls. 51.040 e fls. 51.057 – Documento emitido pelo Hotel GGK, referente a alojamento da testemunha JK e arguido N; - Fls. 51.062 a 51.099: Documentos enviados pela Faculdade de Arquitectura, GGL, referente a candidatura a lugar de N em 2002 e CV; - Fls. 51.115 a 51.118 – Documento emitido pelo M.S, Instituto da Droga e da Toxicodependência, relativo a candidatura do arguido N; - Fls. 51.119 – Documento emitido pela GGL, GGM, relativo a candidatura do arguido N; - Fls. 51.135 a 51.136: Ofício da FFX a remeter a cópia da planta relativa à Estrada (…) – Planta da Casa (…); - Fls. 51.197 a 51.199 – Documentos emitidos pelo GGN, referentes a alojamento da testemunha JK; - Fls. 51.115/8, Informação Ministério da Saúde sobre candidatura do arguido N a lugares em 1998/9; - Fls. 51.119, Informação GGL sobre candidatura do arguido N a lugares em 1998/9; - Fls. 51.216 a 51.400: Processo remetido pelo Ministério do Trabalho e Solidariedade Social; - Fls. 51.516: Lista manuscrita dos alunos que participaram na (...) (…), de 27 de Março a 1 de Abril de 1999, do Lar FC (com educadora EL) e do FD (com educador RW); - Fls. 51.517: Comunicação do (...) (...) C para (...) da AX, datada de 12/11/2002, sobre mesadas e semanadas; - Fls. 51.518 a 51.520 (tb. a fls. 51.688, 51.689/91 e fls. 51.773, 51.774/6 – Relatório elaborado pela equipa Técnico-Educativa do FD, em 20/02/03, referente a AI, assinado por ZO, XZ e HF; - Fls. 51.568 a 51.576: Contrato de Locação Financeira de um empilhador da DC, sita na Av. (…) Bl (…) Lt (…) Em (…); - Fls. 51.692: Ofício da AX a informar que o Assistente AV fez parte de um agrupamento musical “(…)”; - Fls. 51.713: Documento do Ministério da Educação referente a CCD; - Fls. 51.717 a 51.725: Relatório do ano lectivo de 2002/3 de AI, contrato de trabalho de AI com Hospital GGO feito em 2 de Agosto de 2004, com talão de vencimento; informação de 27/02/05 da AX sobre AI elaborado; relatório de 31/05/02 sobre vinda tardia da escola da (…) e entrada tardia no Lar, acompanhamento Dra. GK; - Fls. 51.763: Documento GGP, sobre candidatura do arguido N no ano de 2000; - Fls. 51.769/71 Oficio da AX e documento sobre mesadas, semanadas, datado 12/11/02; - Fls. 51.772: Ofício da AX sobre integração de AV na “(…)” e actuações em que participou em 2000 (Hannover), 2001 (Grândola) e 2002 (Setúbal, Mosteiro dos Jerónimos e Parque das Nações); - Fls. 51.773 a 51.776: Ofício da AX a enviar cópia do relatório elaborado pela equipa do FD do CZ referente ao assistente AI; - Fls. 51.789: documento remetido por GGQ, referente a OM; - Fls. 51.790 a 51791: Ofício do INML a remeter os relatórios periciais dos assistentes que se encontram no Apenso Z-11; - Fls. 51.849: Oficio da AX, lista de alunos que participaram na (...) (…) entre 27/03/99 e 1/04/99, do FD e FC, ambos do CZ; - Fls. 52.053/4: Ofício da DS com envio de DVD com imagens de (…), casa do arguido N, determinado por despacho da AJ 28/01/08; - Fls. 52.179 a 52.180 vº: certidão referente a queixa apresentada por K, contra OM em 22/12/04; - Fls. 52.332: DVD da DS – peça do jornal nacional de 22.02.2006; -Fls. 52.418/23: Oficio da PJ, com informação sobre elementos recolhidos de vigilâncias, fotografias da casa (…) que tivessem servido de suporte a identificações fotográficas e análise pelo STAIC dos elementos do Processo AX, enviando o DVD de fls. 52.423; - Fls. 52.465 a 52.475: Oficio da Procuradoria Geral da República, com certidão do memorando remetido pelo Sr. Dr. GGR, sobre a investigação do Processo AX; - Fls. 52.508 a 52.526: Documentos Juntos pelo arguido C, com carta da Vodafone (fls. 52.509, 52.517/8, 52.521) sobre registos do telefone nº (…) do arguido C e correspondência remetida por si para a obtenção de registos de chamadas, com lista de elementos em falta sobre registos de chamadas a fls. 52.511, a fls. 52.522 a 52.525; - Fls. 52.527 a 52.570: Documento junto pelo arguido C, com cópia do documento do SIBS, com movimentos do cartão nº (…), conta nº (…), entre 19/09/98 e 24/02/99 (fls. 52.528 a 52.531); do cartão nº (…), conta nº (…), entre 4/03/99 e 3/08/01 (fls. 52.532 a 52.570); - Fls. 52.615/6: Contrato de arrendamento entre DL e K, do (…), andar (…), do nº (…) do prédio (…), em (…), com início em 1/01/93, datado de 2/12/92; - Fls. 52.617/9: Documento da JJM para fornecimento de água na (…) nº (…),(…), em nome de K e recibo de pagamento de fornecimento de contador, datado de 29/12/92; - Fls. 52.620: Documento da EDP referente a fornecimento na (…) nº (…),(…), em (…), em nome de K, datado de 29/12/92; - Fls. 52.621/2: Documento dos TLP, requisição de telefone para a (…) nº (…),(…), em (…), em nome de K, datado de 30/12/92; - Fls. 52.623/4: Documento da FFX, de cópia da informação do processo referente à (…) nº (…) e (…), datado de 24/07/96; - Fls. 52.625/6: certidão do certificado de Vistoria sanitária do prédio sito na (…) nº 17, (…), em (…), datado de 17/10/96; - Fls. 52.627/8: Documento do serviço Nacional de Bombeiros, para efeitos de concessão de alvará do prédio sito na (…) nº (…),(…)º, em (…), datado de 5/6/97; - Fls. 52.629/31: Documento emitido pela FFX, com informação sobre sinalização existente na (…) em (…), datado de 28/03/06; - Fls. 52.632: Documento das GGS, datado de 11/2000; - Fls. 52.633/8: Documento emitido por GGT, em nome de (...) Dr. K, e apostas as datas de 6/03/01, 13/03/01, 26/03/01; - Fls. 52.639/0: Documento emitido por GGU, em nome da GGV, datado de 23/04/01, referente a instalação eléctrica na (…) nº (…), (…) em (…); - Fls. 52.641: Documento da EDP, referente a contrato de fornecimento para K, (…) nº (…), (…), com data 01/05/07; - Fls. 52.642 a 52.706, 52.711 a 52.716: Documentos de fornecimentos de serviços, materiais, bens para (...) K, entre Abril de 2001 e Novembro de 2001; - Fls. 52.707 a 52.710: Documento GGW, datado de 14/02/02 e 15/02/02, referente às moradas (…), Lote (…), Edif. (…), (…), em nome de K e (…) nº (…), em (…); - Fls. 52.717 a 52.733: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a veículo (…); - Fls. 52.734 a 52.736: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a um veículo “ Dois Cavalos”, - Fls. 52.737: Documento apresentado pelo arguido K, referente a um veículo (…); - fls. 52.738 a 52.768 : Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a veículo (…), (…) / (…)/ (…); - Fls. 52.769 a 52.772: Documentos Apresentados pelo arguido K, referentes ao veículo (…)(…); - Fls. 52.773 a 52.773: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a viagem aos Estados Unidos com data de 26/02/00 a 11/03/00; - Fls. 52.778 a 52.781: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a viagem a Viena de Áustria com data de 1/07/00 a 6/07/00; - Fls. 52.782 a 52.783: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a viagem a Cuba e com datas de 16/08/00 e “ …início 12/08/00…” (cfr. Fls. 52.783); - Fls. 52.784 a 52.789: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a viagem a Orlando e Nova Iorque, tendo aposta a data de 26 de Fevereiro a 12 de Março de 2000; cruzeiro às Ilhas Britânicas e Fiordes da Noruega, tendo apostas as datas 29 de Julho a 11 de Agosto de 2001; Palma de Maiorca, tendo apostas as datas de 3 a 24 de Agosto de 2002; - Fls. 52.790 a 52.794: Documentos apresentados pelo arguido K, referente a viagem ao Brasil, tendo apostas as datas 25 de Agosto a 4 de Setembro de 2001; - Fls. 52.795 a 52.797: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a viagem a Palma de Maiorca, tendo apostas as datas 3 de Agosto a 24 de Agosto de 2002; - Fls. 52.798: Documento apresentado pelo arguido K, referente a bilhete de avião da Sata Internacional, tendo aposta as datas 25 e 29 de Setembro de 2002; - Fls. 52.799/80: documento apresentado pelo arguido K, referente a certidão emitida pela Ordem dos (...)s, referente a inscrição de K; - Fls. 52.801: Documento apresentado pelo arguido K, “certidão” emitida pela Coordenadora da Sub região de Saúde (…), da qual conta que K iniciou funções como clínico geral, no Centro de Saúde (…), em 1 de Agosto de 1985, colocado na extensão de Saúde (…) em 4/11/1985; - Fls. 52.944 a 52.952: Relatório (...) do arguido N – registo quantitativo somatossensitivo peniano; - Fls. 52.965/7: Documentos com o logótipo da Escola Superior de Educação (…) e “Acta do júri”, referente à exclusão de N do concurso para Assistente, datados de 16/07/01, 3/12/0111/07/01; - Fls. 53.162 a 53.164: Carta da Via Verde para o arguido C e carta do arguido para a Via Verde, referente ao identificador (…), enquanto afecto veículo (…)– com referencia do arguido ao facto de nos documentos das via verde encontrar-se afecto o identificador ao veículo (…), que o arguido diz ter sido em Setembro de 2005, mas não entre o período de 18 de Julho de 1998 a 5 de Dezembro de 2001 -, confirmando a Via verde, a fls. 53.164, que o identificador entre 18/07/98 e 5/12/01 estava afecto matricula (…), registado na base da Via Verde em nome de C; - Fls. 53.165, 53.167 a 53.181: Documentos entregues pelo arguido C, passagens via verde identificador (…), matrícula (…),GU, passagens entre 18/07/98 a 5/12/2001; estando a fls. 53.166 carta da via verde de 22/09/05, para MJA, da qual consta que à data das passagens o identificador encontrava-se associado à viatura matrícula (…), registado na base de dados em nome de C; - Fls. 53.182 a 53.518: Documentos entregues pelo arguido C, referentes a correcções à lista integrada apresentada aquando da contestação; - Fls. 53.519/20: Bilhetes de cinema entregues pelo arguido C, referentes a 13/02 (arguido declara 1999); - Fls. 53.541: Documento resposta do Instituto de Mobilidade e Transportes Terrestres, Departamento de Habilitação e Registo de Condutores sobre OM, - Fls. 53.701 a 53.703: Informação do DIAP sobre os Diagramas que se encontravam na 2ª secção, pedidos pelo Tribunal; - Fls. 53.768 a 53.782: Documentos entregues pelo arguido A, referentes aos Jogos do VI Mundialito de Futebol Feminino, realizado em 1999; - Fls. 53.791: Documento da Seguradora “GGX” relativamente à cedência de uma viatura ao arguido H no âmbito de um sinistro ocorrido no dia 04/11/2001; - Fls. 53.792: Documento da Seguradora “GGX” relativamente à cedência de uma viatura ao arguido H no âmbito de um sinistro ocorrido no dia 28/06/2002; - Fls. 53.793 a 53.813: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.814: Bilhetes de Avião em nome de CCF; - Fls. 53.815 a 53.817: Cópia de um extracto de milhas Navigator do arguido H; - Fls. 53.818 a 53.833: Listagem de passagens Via Verde das GNY - do arguido H; - Fls. 53.835: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.836 a 53.838: Documento da Brisa com a indicação das taxas de portagens; - Fls. 53.839: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.840: Fax da TAP Air Portugal a dar informação sobre bilhetes de avião em nome do arguido H; - Fls. 53.842: Cópia de um artigo sobre o programa (…); - Fls. 53.842: Fotografia de uma vaca no programa (…); - Fls. 53.843 a 53.865: Oficio da Vodafone com listagem de chamadas telefónica do nº (…) – arguido H; - Fls. 53.866 a 53.867: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.868: Listagem de passagens Via Verde das GNY - do arguido H; Fls. 53.869: Cópia do Anuncio do Jogo de Futebol Feminino de 14 a 20 de Março de 1999; - Fls. 53.870: Cópia de um extracto de milhas Navigator do arguido H; - Fls. 53.874: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.875: Cópia de um extracto de milhas Navigator do arguido H; - Fls. 53.876 a 53.879: Cópia de facturas de refeições do arguido H; - Fls. 53.881: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.882: Listagem de passagens Via Verde das GNY - do arguido H; - Fls. 53.883 a 53.887: Cópia de facturas de refeições e de combustíveis do arguido H; - Fls. 53.888: Copia da Listagem do movimento do cartão de combustível nº (…); - Fls. 53.890: Listagem de passagens Via Verde das GNY - do arguido H; - Fls. 53.891 a 53.895: Cópia de Facturas de refeições e de combustíveis apresentadas pelo arguido H; - Fls. 53.896: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.898: Cópia de uma factura de combustível apresentadas pelo arguido H; - Fls. 53.899 a 53.900: Listagem de passagens Via Verde das GNY - do arguido H; - Fls. 53.901: cópia da listagem dos movimentos do cartão de crédito do arguido H fornecido pela SIBS; - Fls. 53.902: Cópia de uma factura de combustível apresentadas pelo arguido H; - Fls. 53.903 a 53.916: Fotografias do programa (…) e do programa (…); - Fls. 53.969: Bilhetes de cinema entregues por C, com data de “18/03”; - Fls. 53.975 a 53.986: Documentos entregues pelo arguido H, referentes a extractos da conta nº (…), datas entre 29/01/99 e 30/09/99, com créditos e débitos; - Fls. 53.987/8: Documentos entregues pelo arguido H, referentes a pagamentos com cartão e extracto do débito, entre 10/02 e 18/02/2000; - Fls. 54.033: Documento do Instituto de Mobilidade e dos Transportes, referente a CCD; - Fls. 54.065/6 e 51.082: Informação da DR sobre pedido de informação de recolha de imagens em casa de N; - Fls. 54.067/8 e 54.081: Informação da DR sobre pedido de imagens que tenha do assunto AX; - Fls. 54.112/4, fls. 54.116 a 54.128: Prints e bilhetes apresentados por C, referentes a filmes que diz ter visto entre Janeiro de 1999 e Maio de 2001; - Fls. 54.129: Documento da Vodafone entregue pelo arguido C, com informação da Vodafone sobre antenas que nos anos de 1999/2000 operavam em zonas constantes da “lista integrada”; - Fls. 54.180 a 54.218: Relação e cópia dos cheques entregues por K, de pagamentos que declarou ter feito à sua empregada IC, entre 8/07/97 e 20/12/01; - Fls. 54.219: Fotografias/print entregue por K do portão de uma moradia sita na “(...) (…)”; - Fls. 54.220 a 54.223: Elementos clínicos referentes a CY, entregues por K; - Fls. 54.242 a 54.295: Documentos entregues por H, sendo a: a) Fls. 54.243/4, original dos documentos de fls. 53.797 a 53.798, recibos de portagens; b) Fls. 54.246 a 54.255, original dos documentos entregues a fls. 55.843 a 55.852 oficio da Vodafone e registo de chamadas do número (…), entre 1/3/99 e 31/3/99; c) Fls. 54.257 a 54.264, original dos documentos de fls. 53.853 a 53.860, referentes a registos da Vodafone do nº (…), entre 1/3/99 e 30/04/99; d) Fls. 54.266 a 54.270, original dos documentos de fls. 53.861 a 53.865, registos da Vodafone referentes ao nº (…) de 1/04/99 a 30/04/99; e) Fls. 54.272 a 54.287, originais dos documentos de fls. 53.876 (2 doc.), 53.872, 53.878 (2 doc.), 53.879 (4 doc.), 53.883 (3 doc.), 53.884 (2 doc.), 53.885 (2 docs.), 53.886 (2 doc.), 53.887(2 doc.), 53.891 (2 doc.), 53.892 (2 doc.), 53.893 (2 doc.), 53.894 (2 doc.), 53.895, 53.898, 53.902, talões de pagamentos de restaurantes, combustíveis…; f) Fls. 54.289 a 54.295, originais dos documentos de fls. 53.975 a 53.986, extractos do GGZ referentes à conta nº (…), datas entre 29/01/99 e 30/09/99, com créditos e débitos; - Fls. 54.432 a 54.433 vº: Relatório da AX, referente a AI, “ Confidencial”, do Sr. Dr. HY para Sra. Dra. QD, por causa de “… incontinência esporádica de fezes…”. - Fls. 54.480: Ficha de identificação de AC, com inscrição em 10/01/2000 no Centro de Saúde (…); - Fls. 54.481: Print de duas fotografias, apresentado pelo arguido K, referentes a sua habitação; - Fls. 54.482/3: Print de fotografias, apresentado pelo arguido K, referentes a placards com nomes de (...)s, dias e horários de atendimento no Centro de saúde; - Fls. 54.484: certidão emitida pela sub região de saúde (…), certificando a inscrição de AC em 10/01/2000, no Centro de Saúde (…). Extensão da (...) (…), como utente de Dr. HHA; - Fls. 54.485 a 54.546 vº: certidão emitida pela Sub região de saúde (…) das folhas de Ponto do arguido K de Fevereiro de 1998 a Janeiro de 2003, com indicação dos dias em que fazia atendimento complementar, na extensão de saúde da (...) (…); - Fls. 54.547: declaração emitida pela direcção do Centro de Saúde (…), referente ao funcionamento do Centro no dia 15/07/05; - Fls. 54.675 a 54.736: Documentos remetidos pela PJ, referentes a diligências feitas no âmbito do processo “ AX”, vigilâncias, inexistência de relatórios de vigilâncias, análise de informação, diagramas; sobre relatório enviado pelo Dr. LF para Dr. GGR, carta de Dr. GGR a pedir informação a Dr. LF (fls. 54.699) datada de 5/05/03 e resposta Dr. LF (fls. 54.700 a 54.703) (na qual manifesta incomodidade por ausência de informação sobre a investigação); (fls. 54.708) escalas de serviço em Fevereiro e Março de 2003; (fls. 54.731 a 54.736) impressão de memorando que estava no computador Dr. BBP sobre investigação Processo AX; - Fls. 54.748 a 54.808 e fls. 55.553 a 55.647: Relatório da perícia feita ao arguido A, DM, pelo Prof. Dr. EEU, e Sra. Dra. DO e cópia dos testes aplicados (fls. 55.553 a 55.647); - Fls. 54.830: Carta remetida pelo Vodafone ao arguido C, sobre a recuperação de registo do nº (…), referentes aos período entre 1/10/98 a 31/07/2001, não tendo conseguido recuperar 1/1/200 a 26/2/2000, 1/03/2000 a 21/05/2000, bem como do ano de 1999 as identificadas pelo arguido na sua carta de 26/02/08; - Fls. 54.844: Ofício da AX, a informar do local de arquivo da informação referente a (...), no período entre 1998 e 2002; - Fls. 54.873 a 54.880: oficio da AX com informação e documentos pedidos pelo arguido C sobre programa de comemorações do 3 de Julho de 1999, espectáculo realizado em 4 de Julho de 1999 na Fil, fotografias tiradas nestes dias com o arguido C em 3/07/99 e 4/07/99 (fls. 54.877 a 54.880); - Fls. 54.881 a 54.887: Ofício e documentos remetidos pela AX, da deslocação a (…) de AV, em 10/01/2003, com documentos de combustível na área de serviço de (…) (fls. 54.882 e fls. 54.884 às 9h.31m); - Fls. 54.888: Informação da AX, sobre livros de registos de ocorrências e resumos mensais, trimestrais ou anuais enviados pelos educadores; - Fls. 54.891 a 55.076: Documentos remetidos pela AX, a pedido do arguido C, pagamentos mensais relativos ao telefone nº (…), utilizado pelo arguido C e referentes ao período de 1999 a 2001 . - Fls. 55.077 a 55.225: Documentos remetidos pela AX, cópias dos mapas de movimento das viaturas (…), ao serviço da AX, anos de 1999, 2000, 2001, com as matrículas (…), (…), (…), (…), notas de reparação, folhas de registo de quilómetros das viaturas, “pessoas transportadas”, (...)s ou para quem o serviço; - Fls. 55.226: Ofício da AX a enviar os processos psicossociais de AI, X, Y, AN (os quais ficaram a integrar os Apensos Z-15, vol 1 e 2, termo de Apensação a fls. 55.227); - Fls. 55.395 a 55.427: Documentos remetidos pela AX, referentes a registos de contas correntes ou recebimento de mesadas, de AC (fls. 55.398, em Dez. 2003, fls. 55.399, 55.400, 55.401 a 18), AP, AV, AT (fls. 55.397 e fls. ? 55.398, 55.399, 55.400, 55.401 a 18, fls. 55.419 a 27), AN, Y e AI, desde 1998 até à sua saída da AX; - Fls. 54.428: Ofício da AX a enviar processos psicossociais de AC, AT, AV e AK, os quais se encontram no Apenso Z-15, vol. 3, 4 e 5; - Fls. 55.479: Oficio da Secretaria Geral das Varas Cíveis, dos Juízos Cíveis e dos Juízos de Pequena Instância Criminal de Lisboa a enviar certidão das Decisões Arbitrais, referentes a indemnizações das Vítimas da AX (Certidões no Apenso Z-16); - Fls. 55.529 a 55.535: Documentos apresentados pelo arguido H, referentes a faxes enviados para a Vodafone, a pedir facturação e BTS dos nºs. (…), (…); - Fls. 55.536: Documento apresentado pelo arguido H, referente a talão de visa, cartão nº (…) assinado, 27/09/00, 23.20h, (…), (…), - Fls. 55.537/8: Documento apresentado pelo arguido H, referente a extracto cartão business 5346 265, de Fevereiro e Janeiro de 2000; - Fls. 55.539: Documento apresentado pelo arguido H, referente a talão de pagamento no (…), 16/06/00, cartão (…); - Fls. 55.540: Documento apresentado pelo arguido H, referente a talão de pagamento no (…), 30/06/00, cartão (…); - Fls. 55.541: Documento apresentado pelo arguido H, referente a extracto cartão business (…), de Junho de 2000; - Fls. 55.542: Documentos apresentados pelo arguido H, referentes a dois talões de portagem com data de 7/06/00 e 8/06/00 - Fls. 55.543: Documento apresentado pelo arguido H, referente a extracto da conta nº (…) do GGZ, com data de 30/06/99; - Fls. 55.553 a 55.647: Ofício do DM a remeter cópia dos testes/elementos auxiliares de diagnóstico que foram aplicados e feitos na perícia do arguido A; - Fls. 55.722/3: Documento subscrito por CY, de consentimento para o Dr. K juntar aos autos relatórios (...)s referentes à sua pessoa e fotocópia do seu Bilhete de identidade; - Fls. 55.767: Ofício da Vodafone, datado de 27/08/08, referente ao nº (…), comunicando que todos os registos que foram possíveis recuperar, relativos ao período compreendido entre 1/10/98 e 31/7/01 foram remetidos para o Tribunal (…), não tendo conseguido recuperar os registos efectuados pelos nºs. (…), nos períodos indicados pelo arguido C a fls. 52.520, 52.522, 52.523, 52.524 e 52.525 dos autos. - Fls. 55.836 a 55.839: Documentos apresentados pelo arguido K, relativos a Registo Diário das Inscrições, Marcação de Consulta e Verbete de transferência de (...); - Fls. 55.862 a 55.898: Ofício e Relatório de perícia Colegial efectuada no HHB a U; - Fls. 55.909 a 55.946: Ofícios e documentos remetidos pela AX e pelo AX (...), referentes a fichas de alunos da AX jogadores no AX (...), com informação sobre calendários de jogos; - Fls. 55.951: Documento apresentado pelo arguido K, referente a impresso de ” transferência de processo clínico”; - Fls. 56.029 a 56.112: Documentos remetidos pela AX, referentes a (...) de (...)s, entre 1998 a 2002; - Fls. 56.113/4, fls. 56.126/7: Informação da AX sobre impossibilidade de localização de Livros de Ocorrências, Lares FC (de 23/08/2000 a Dezembro 2001), FG (de Setembro 1998 a Setembro 1999) e FD (4/03/99 a 13/09/99); - Fls. 56.154 a 56.177: Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a pedidos de transferência de (...)s em Centros de Saúde, pedido de processo clínico; - Fls. 56.189 a 56.198 e fls. 56.239 a 56.243: Parecer remetido pela Ordem dos Enfermeiros, relativo a segredo profissional, dever deontológico, por causa da inquirição de QL; - Fls. 56.200 a 56.232: Documentos remetidos pela AX, referentes a AI, número de turma nos anos lectivos de 1997/8, 1998/99, 1999/00, 2000/01 e registo de assiduidade, com fotografia a fls. 56.201 (aluno nº 23); - Fls. 56.244: Declaração médica junta pelo arguido H, referente à sua circuncisão; - Fls. 56.329 a 56.664: Documentos apresentados pelo arguido H, referentes a cópias do acórdão proferido no processo nº 18/15/97.0PBOER, pelo 3º Juízo Criminal da Comarca de Oeiras, em que foi arguido, entre outros, DU e cópia do acórdão, retirado da base de dados da DGSI, do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em tal processo; cópia do acórdão proferido pela 6ª Vara Criminal de Lisboa, no processo nº 1193/04.3TDLSB; - Fls. 60.313 e 60.410: Ofício da AX, a informar não existirem mais Livros de Ocorrências do Lar GL, frequentado por AC, para além dos já enviados para o Tribunal pelo ofício nº 0258, de 20/01/06; - Fls. 60.314/9 e 60.403/8 : Oficio da AX, a remeter os documentos de fls. 60.315/9, referentes a adjudicação e auto de recepção do arquivo de carril instalado na cave da (...), estando o auto de recepção de fls. 60.317 e 60.406 datado de 3/11/98; - Fls. 60.320: Ofício da DR a enviar 3 DVDs, contendo notícias sobre o processo AX, emitidas nos Jornais noticiosos durante Janeiro e Fevereiro de 2003; - Fls. 60.336 a 60.360: Documentos remetidos pela AX, referentes a despesas com cinema e actividades escolares, nos anos de 1999 e 2000, do Lar FG, frequentado por AN; - Fls. 60.409: Ofício da AX a enviar o dossier denominado “ Passagem de Serviço” do Lar FU, referente ao período de 26 de Junho de 1999 e 14 de Julho de 2000; - Fls. 60.412: Ofício da DR a enviar dois DVDs referentes a peças noticiosas do processo AX, emitidas nos serviços noticiosos durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2003 e de 14 a 21 de Fevereiro de 2003; - Fls. 60.421: Ofício da DS a remeter DVD com gravação pedida pelo Tribunal no ofício de 2/10/08; - Fls. 60.423 a 60.424: Oficio da AX e cópia de artigo da revista da AX, com informação sobre entrevistas feitas em 1991 a alunos da AX no âmbito de trabalho de investigação feito por HHC, HHD, BD; - Fls. 60.508 a 60.541: Oficio da AX e Manual do SIGA – Sistema Informático para a Gestão de alunos, com data aposta no canto superior esquerdo relativa a Abril de 1996; - Fls. 60.656 a 60.664: Certidão referente a condenação de AI. - Fls. 60.687: Ofício da DR a enviar 2 DVDs, com entrevistas concedidas por alunos da AX e emitidas entre 25 de Novembro de 2002 a 24 de Novembro de 2003; - Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos (…), modelo (…), de matrícula (…) (propriedade registada em 16/05/94); (…), Modelo (…) , 9 Lugares, de matrícula (…) (propriedade registada em 31/03/99 e auto de recepção em 13/01/99, cfr. fls. 60.839); (…), modelo (…), 9 lugares, matrícula (…) (propriedade registada em 21/03/2000 e auto de recepção em 30/01/99, cfr. Fls. 60.842 ); (…), modelo (…), 8 lugares, matrícula (…) (propriedade registada em 4/02/97); (…), Modelo (…), 8 lugares, matrícula (…) (propriedade registada em 6/11/97); (…), modelo (…), 9 lugares, matricula (…) (propriedade registada em 9/09/97); (…), modelo (…), 9 lugares, matrícula (…) (propriedade registada em 14/01/92 e auto de recepção em 30/12/91, cfr. Fls. 60.856); (…), modelo (…), 9 lugares, matrícula (…) (propriedade registada em 14/02/89 e auto de recepção em 7/12/88); foram registados e feitos autos de recepção para ficarem ao serviço da AX; - Fls. 60.864/5: Documento referente a número de Turma, Horário e faltas por disciplina de AI, entre 1/12/99 e 31/06/99; - Fls. 63.315: Documento remetido pela Panasonic, referente a comercialização de modelo; - Fls. 63.316: Documento remetido pela Motorola, referente a comercialização de modelo; - Fls. 63.317: Documento remetido pela NOKIA, referente a comercialização de modelo de telemóvel; - Fls. 63.334: Documento remetido pela Siemens referente a comercialização de telemóveis; - Fls. 63.400 a 63.401: Documento apresentado pelo arguido H sobre comercialização de telemóveis; - Fls. 63.417: Documento remetido pela NOKIA, referente a comercialização de modelo de telemóvel; - Fls. 63.506 a 63.515: Ofício da SonaeCom a remeter em papel e suporte informático a listagem das chamadas efectuadas pelo nº (…) (o CD encontra-se no Apenso V, Caixa 1, sobrescrito 43); - Fls. 63.547 a 63.549: Documento apresentado pelo arguido K referente a pedido elaborado em 29/01/2004, dirigido à TMN a solicitar a listagem das chamadas efectuadas e recebidas pelo seu telemóvel utilizado no período compreendido entre 01/07/1998 e 30/11/2000, bem como a resposta a esse pedido enviado pela TMN em 16/02/2004; - Fls. 63.861 a 63.871: Documento apresentado pelo arguido H na audiência de julgamento no dia 18/12/2009 – certidão da Conservatória do Registo Predial referente à Descrição/Averbamentos/Anotações do prédio urbano situado na Av. (…), nº (…), no (…) em (…); - Fls. 64.395 a 64.586: Documentos apresentados pelo arguido E – certidões do Registo Predial dos prédios da (…), em (…); - Fls. 65.813: Certificado de Registo Criminal do arguido A; - Fls. 65.814: Certificado de Registo Criminal do arguido C; - Fls. 65.815: Certificado de Registo Criminal do arguido E; - Fls. 65.816: Certificado de Registo Criminal do arguido H; - Fls. 65.817: Certificado de Registo Criminal do arguido K; - Fls. 65.819: Certificado de Registo Criminal da arguida Q; - Fls. 65.838 a 65.839: Certificado de Registo Criminal do arguido N de (…); - Apenso AB - Documentação bancária referente a H, K, N e A (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.701); - Apenso AB 1 a AB 8 - Documentação bancária referente a H, K, N e A; - Apenso ABA-a) - Documentação bancária remetida ao NAT – H; - Apenso ABA-b) - Documentação bancária remetida ao NAT – N; - Apenso ABA-c) - Documentação bancária remetida ao NAT – K; - Apenso ABA-d) - Documentação bancária remetida ao NAT – A; - Apenso ABA-e) - Documentação bancária remetida ao NAT – C; - Apenso ABA-f) - Documentação bancária remetida ao NAT – E - Apenso ABA-g) - Documentação bancária remetida ao NAT – Q - Apenso ABA-R - Informações 84,89,90,91,92,93/95,94 e 96 do NAT – análises das contas bancárias - CONCLUSÕES FINAIS; - Apenso AB-R - Relatório preliminar efectuado aos apensos AB a AB-8 (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.363); - Apenso AC-L - Listagem/facturação detalhada dos móveis n.º (…) e (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.000); - Apenso AD-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (remetida a fls. 1.538 pela Optimus) (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.000); - Apenso AE-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.000); - Apenso AF-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.000); - Apenso AH - Documentação Entregue por MSST relativa à sindicância ao funcionamento da AX - Apenso AH 1 - Doc. da Inspecção Geral do MSST relativa à sindicância ao funcionamento da AX (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.649); - Apenso AH 2 - Doc. da Inspecção Geral do MSST relativa à sindicância ao funcionamento da AX; - Apenso AH 3 (volume 1) - Doc. da Inspecção Geral do MSST – contêm, entre outros, originais da apreensão efectuada pela Insp. Geral no gabinete de C (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.817); - Apenso AH 3 (volume 2) - Doc. da Inspecção Geral do MSST – Original da alínea a) do auto de apreensão de 13.03.2003 a C (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.363); - Apenso AH 4 - Doc. da Inspecção Geral do MSST (cfr. Termo de Apensação de fls. 4.861); - Apenso AH 5 - Doc. da Inspecção Geral do MSST (cfr. Termos de Apensação de fls. 4.892 e 6.170); - Apenso AH 6 - Certidão do relatório final da sindicância ao funcionamento da AX pela IGMSST (fls. 6101 a 6102 -Proc. 479/02); - Apenso AH 7 - 5 certidões referentes ao processo 479/02 (sindicância ao funcionamento da AX) enviadas pela Inspecção-Geral do Ministério da Segurança Social e do Trabalho e cópia do ofício dirigido ao director Nacional da PJ (cfr. Termo de Apensação de fls. 17.656); - Apenso AI e AI-1 - Documentação entregue pela AX referente a C (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.688); - Apenso AL - Caderno SNOOPY (cfr. Auto Apreensão a ZV - fls. 2.283); - Apenso AM - Pasta apreendida a K aquando da realização da busca efectuada na residência, contendo plantas de uma habitação (Qt.ª (…)); - Apenso AN - Dossier remetido pelo Ministério da Educação referente a N (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.649); - Apenso AO - Documentação apreendida referente à busca efectuada em 18.03.03 à residência sita na (...) (…),(…)- fls. 1542. Contém igualmente reportagem fotográfica (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.197); - Apenso AP-L – 1 - Facturação enviada a Fls. 3407, 10/04/03, Oficio da PT, 2003/001(6)3 A, (PT envia em anexo os elementos de que dispõe) (termo de apensação de fls. 3.410) 2 – Facturação (Anexa sete folhas) do nº 214 184 122, que foi enviada com o ofício de fls. 5.875, Oficio GJC/conf., de 30/VI/03, DIRIGIDA ao inspector Chefe BZ e a responder ao ofício nº 926 de 24/03/03 do TIC, fazendo refer. a oficio 4066/DT STAI/03, de 25/03/03, (cfr. Termo de Apensação de fls. 5891) 3 – Facturação (Anexa duas folhas) do nº 214 184 122, que foi enviada com o ofício de fls. 6521 e 6522, Oficio GJC/conf., de 30/VI/03, DIRIGIDA ao inspector Chefe BZ e a responder ao ofício nº 926 de 24/03/03 do TIC , fazendo refer. a oficio 4066/DT STAI/03, de 25/03/03, (cfr. Termo de Apensação de fls. 6522); - Apenso AP-T - Auto de Transcrição de intercepções telefónicas do n.º (…) – alvo 20352 (C) (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.757); - Apenso AP-T1 - Auto de Transcrição de intercepções telefónicas do alvo 20351 (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.891); - Apenso AQ - Documentos apreendidos na Busca efectuada a fls. 2310 na residência do arguido K (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.410); - Apenso AQ-1 - Objectos e documentos apreendidos nas buscas efectuadas a fls. 2310 a 2.311 (busca efectuada na residência do arguido K, (...) (…), nº (…)., em (…)) e 2.278 a 2.2280 (busca efectuada na (...) do arguido K, (…), nº (…), em (…)) (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.213; cfr. Termo de Entrega de fls. 21.844; cfr. Despacho de fls. 63.558 a 63.561); - Apenso AR - Listagem fornecida pela BRISA referente a registos na Via Verde (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.561); - Apenso AS - Documentos apreendidos a C (fls. 3216-3220) Na (...) (…),(…),(…). Contém reportagem fotográfica e croquis (excepto a disquete que se encontrava a fls. 125, já entregue ao arguido C em 15.06.2004); - Apenso AS-1 - 2 chaves de marca SILCA; 1 porta-chaves com quatro chaves tipo YALE, uma de marca SILCA, 1 de marca SOFI e duas pequenas de gaveta de secretária e armário – auto de apreensão de fls. 3220 (Documentos da busca de fls 3216 e os objectos do auto de fls. 3220, excepto as 15 disquetes, um computador portátil de marca AIRIS e uma mala de nylon preta, já entregues ao arguido C em 15.06.2004) (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.213); - Apenso AT - Reportagem fotográfica da busca realizada na estrada (…),(…), em (…) – referente à busca de fls. 3302 (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.672); - Apenso AX-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 4.214); - Apenso AY-L - Listagem/facturação detalhada do n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 4.214); - Apenso AZ-L - Listagem das chamadas recebidas e efectuadas pelo n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.891); - Apenso B - Documentação entregue por GE (cfr. Termo de Apensação de fls. 144); - Apenso BB-L - Listagem/facturação detalhada do n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.042); - Apenso BE-L - Listagem dos registos de tráfego do n.º de telemóvel (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.727); - Apenso BF - Fotografias reveladas na PJ apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls.4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-1 a BF-6 - Fotografias reveladas na PJ apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls.4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-7 - 50 fotografias apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls. 4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-8 - Cinco cadernos; sete agendas; um dossier de argolas; um livro de capa preta. (fls. 4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-9 - Três revistas e todo o restante material/documentação apreendido a fls. 4487/4488, à excepção das fotos e negativos revelados/ máq. Fotográfica (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BG-L - Listagem das chamadas recebidas e efectuadas pelo n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.891); - Apenso BH - Carta de saúde da AX (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso BI-T - Auto de Transcrição de intercepções telefónicas do alvo 21194 (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.202); - Apenso BJ (Pasta 1) - Doc. remetida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros referente ao arguido H (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.202); - Apenso BJ (Pasta 2) - Doc. remetida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros referente aos arguidos H e E (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.202); - Apenso BK (Volumes 1 a 7) - Exame Pericial/Relatório efectuado pela PJ aos computadores referidos a fls. 6183 (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.202) (cfr. Tb. Apenso BR, sobrescrito 5 e 6) (Apenso BK - Computador 3 – arguido K - corresponde ao Apenso Apenso BR, sobrescrito 6) (cfr. Tb. Apenso BR, sobrescrito 6) - Apenso BK (Volume 8) - Impressão das páginas da internet de natureza sexual encontrados nos computadores analisados (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.202 e 8.616); - Apenso BO - Exame Pericial aos computadores apreendidos aos arguidos E e C (portátil) (cfr. Termo Apens. Fls. 6.879 – Apenso constituído por oito volumes e 10 CD´s rom´s de segurança) ( cfr. Tb. Apenso BR, sobrescrito 5 ) - Apenso BP - Lista de registos de vencimentos relativa a A (ano 1997 a Junho de 2003) e informação do respectivo NIB (entregues pela AX) (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.904); - Apenso BQ (Volumes 1 e 2) - Doc. do proc. 158/2003 da IGMSST relativamente ao processamento das horas extraordinárias de A e outros (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.026); - Apenso BQ (Volumes 3 e 4) - Boletins itinerários preenchidos pelo motorista/jardineiro A durante os anos de 1998 a 2001, onde constam as localidades; autorizações que permitiram a realização de horas extraordinárias; respectivos pagamentos e autorizações; bem como identificação idêntica referente aos restantes motoristas. Folhas de vencimento auferidos pelos restantes motoristas da AX (anos 1998 a 2001) (cfr. Termo de Apensação de fls. 12.637); - Apenso BQ (Volumes 5 a 7) - Boletins itinerários dos motoristas da AX, referentes aos anos 1998 a 2002. (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.368); - Apenso BR - Sobrescrito 1: 1 cassete VHS (cópia de segurança) com a inscrição “Sábado – 19.07.2003 – (…) / (…)” (cfr. Termo de fls. 7.026; original está no Apenso V, caixa 3, sobrescrito 12) (cfr. Termo Apens fls. 7.213) Sobrescrito 2: 1 ( uma) disquete com facturação detalhada do nº (…), enviada a Fls. 8.782, Ofic TMN DSJ/16352/2003/EA, de 3/09/03, em resposta ao n/ ofic 2393, de 2/09/03 (feita cópia em CD-R pelo tribunal); ( … nº 963 641 563…); (Fls. 8.783: no Apenso CD-L está a listagem em suporte papel) Sobrescrito 3: (contém 2 (dois) sobrescritos) 1 – Um sobrescrito: 3 (três) disquetes enviadas a fls. 9.130/2, Oficio VODAFONE de 16/9/03, na sequência da notif de 14/7/03 e dos elementos enviados a fls. 7.716, em 5/8/03 (feita cópia em CD R pelo Tribunal – 3 CDs), com registo de chamadas, efectuadas e recebidas. (Disq. Fich. Chamadas nº 3, 4, 6 e 7 – CD nº 3) (Disq. Fich. Chamadas nº 8 – CD nº 4): (Disq. Fich. Listagem Chamadas nº 9 – CD nº 5): 2 – Um sobrescrito: Duas cassetes áudio de segurança referidas a fls. 7.111 ( cfr. Termo apensação fls. 7.213) Sobrescrito 4: ( ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) (Cfr. Fls. 7.748) Disquete enviadas com ofic. de fls. 7.716/8, em 5/08/03, pela VODAFONE, em resposta à notificação do tribunal de 14/07/03 ( foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal) (contém registo de chamadas efectuadas e recebidas; …pelo menos de 30 “números”…). Sobrescrito 5: ( ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) - 9 (nove) CDs e 1 (um) mini CD, com exames feitos pela PJ a computadores apreendidos nos autos e duas disquetes com as indicações “ Departamento de telecomunicações … nº 20.222…- cópia…” e “Departamento de telecomunicações… nº 29.807…- cópia….” ; (CD Pequeno: contém acesso aos sites em 30/02/02 a 20/05/03 do arguido E; CD 1 a 5: “ Computador pessoal” - do arguido E; CD 1 a 4: “Computador portátil” - arguido C) (corresponde ao Apenso BO) Sobrescrito 6: ( ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) - 6 (seis) CDs com exames feitos pela PJ a computadores/material informático apreendido nos autos. (Computador 2 – arguido K Computador 3 – arguido K - corresponde ao Apenso BK; Computador 1 a 4 – arguido K; Computador 5 e 6 – arguido HD – Um pessoal e Um portátil (cfr. Tb Apenso BK ) Sobrescrito 7: -15 CD-R’s referentes às sessões de escutas cujas transcrições foram ordenadas nos autos - Apenso BS - Exame pericial ao computador de C (portátil de fls. 3320) (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.213); - Apenso BT - Certidão da 1ª conservatória reg. Predial de (…) referente ao n.º (…) da Av. (…), em (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.363); - Apenso BU-L - Listagem fornecida pela VODAFONE em 05.08.2003, oficio fls. 7.716/8, com origem nos Mandados de Busca e Apreensão àquela operadora (Listagem referida a fls. 7716, remetida em resposta à notificação do tribunal de 14.07.2003) (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.749); - Apenso BV - Documentação bancária referente a C, Q e E (cfr. Termo de Apensação de fls. 7.991); - Apenso BV-R - Relatório preliminar referente aos elementos bancários dos apensos BV (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.289-I); - Apenso BX - Processo individual de AV (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.616); - Apenso BY - Certidão da 3ª Secção DIAP – NUIPC 8419/03.9TDLSB – análises (...)s realizadas a alunos da AX pelos laboratórios Subtil e Labopac (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.616); - Apenso CA - documentos apreendidos a AV (fls. 3771) e duas agendas entregues voluntariamente pelo mesmo e uma agenda de cor verde e um telemóvel (fls. 302) (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.616); - Apenso CB - Certidões de nascimento das testemunhas (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.616); - Apenso CC - Relatórios de perícia e testes efectuados sobre a personalidade das testemunhas – IML (cfr. Termos de Juntada de fls. 15.400 e 17.724 e termo de Apensação de fls. 8.783 e 17.656); - Apenso CD-L - Listagem fornecida pela TMN das chamadas recebidas e efectuadas do móvel n.º (…) (cfr. 8.782, Ofic TMN DSJ/16352/2003/EA, de 3/09/03, em resposta ao n/ ofic 2393, de 2/09/03) (cfr. Termo de Apensação de fls. 8.783); - Apenso CE - Certidão do Proc. 133/02.9JDBLSB – 7ª Vara – 2ª Secção (cfr. Termo de Apensação de fls. 9.191); - Apenso CF - Apenso com cópias certificadas de partes dos processos 20/99 e 38/99 das varas criminais / certidão da 4ª vara 2ª sec. Conforme o ordenado a fls. 9311 (cfr. Termo de Apensação de fls. 9.312 e fls. 10.594); - Apenso CG (Volume 1) - Certidão de todos os exames (...)-legais realizados no INML e juntos ao presente inquérito até 07.10.2003 (cfr. Termo de Apensação de fls. 9.896); - Apenso CG (Volume 2) - Originais de exames sexuais realizados no âmbito do presente inquérito – ver despacho de fls. 9890 (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.264); - Apenso CH - Mapa da CARRIS com o percurso de todos os autocarros da cidade de (…) desde 1997 (resposta ao ofício 13034) (cfr. Termo de Apensação de fls. 9.922); - Apenso CI - Certidão remetida da 3ª Secção da 8ª Vara Criminal de Lisboa, extraída do apenso A do Proc. N.º 3137/01.5JDLSB, em reposta ao nosso oficio n.º 13044 de 06.10.2003 (cfr. Termo de Apensação de fls. 10.153); - Apenso CJ - Certidão do processo individual de AN + original do processo individual - oficio de19.11.03 n.º 236/03 (cfr. Termo de Apensação de fls. 10.393); - Apenso CK - Cópias certificadas das lista de presenças de N no 2º curso de pós-graduação em Direito Penal económico e Europeu da Universidade (…), em 1999, e 4º curso de pós-graduação em Direito da Medicina em 1999/2000 (cfr. Termo de Apensação de fls. 10.594); - Apenso CL (Pasta 1) - Documentação fiscal (IRS) remetida pela IGF , contendo, entre o mais, documentação referente a arguidos e delimitada a esse âmbito (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.246); - Apenso CL (Pasta 2) - Documentação fiscal (IRC) remetida pela IGF – empresas relacionadas com o arguido H (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.246); - Apenso CL (Pasta 3) - Documentação fiscal (IRC) remetida pela IGF – entre o mais, empresas relacionadas com o arguido K, N e delimitada a esse âmbito (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.246); - Apenso CM - Processo Individual BA (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.246); - Apenso CN - Processo individual de BQ ((...) da AX) (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.246); - Apenso CQ - Certidão do apenso “E” do inquérito 3137/01.5JDLSB – processo individual de A (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.540); - Apenso CR - Processo Individual de AD (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CS - Processo Individual de AC (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CT - Processo Individual de AB (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CU - Processo Individual de AR (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CV - Processo Individual de NS (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CW - Processo Individual de AG (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CX - Processo Individual de AA (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CY - Processo Individual de AY (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso CZ - Processo Individual de AE (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); -Apenso D, “Anexos”: fls. 97, documento datado de 2/05/00, do “(...) (...)” C para o Serviço de Contabilidade e Património, correspondente ao acordo da AX em compensar os motoristas no montante de 7.000$00 por semestre, pela utilização em serviço dos telemóveis pessoais; fls. 98, documento datado de 22/09/99, assinado pelo (...) (...) C e dirigido ao Sr. (...), a propor a abertura de conta bancária para a União de alunos depositar as suas receitas e não ficarem em cofre; - Apenso D, vol VII, fls. 1.643 – Despacho de BQ, datado de 17/04/2000, delegando a competência “... para autorizar, dentro dos limites para os quais detenho competência própria, a prestação de trabalho extraordinário e em dias de descanso e complementar por parte do pessoal docente, educativo e de acção social, no (...) do (...) Lic. FB e do restante pessoal no (...) do (...) Lic. C”. - Apenso DA - Processo Individual de AP (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DD - Processo Individual de AI (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DE - Processo Individual de AS (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DF - Processo Individual de X (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DG - Processo Individual de AU (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DH - Processo Individual de CG (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DI - Processo Individual de AF (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DJ - Processo Individual de AK (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DK - Processo Individual de Z (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DL - Processo Individual de AO (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DM - Processo Individual de Y (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.852); - Apenso DN - Processo Individual de AM (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.855); - Apenso DO - Processo Individual de AQ (cfr. Termo de Apensação de fls. 11.855); - Apenso DP - Processo Individual OC (cfr. Termo de Apensação de fls. 12.363); - Apenso DQ - Processo Individual CC (cfr. Termo de Apensação de fls. 12.363); - Apenso DS - Processo Individual AL (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DT - Processo Individual AH (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DU - Processo Individual AW (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DV - Processo Individual AJ (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DW - Processo Individual de GQ (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DX - Mapas dos planos de férias e identificação das respectivas (...) da AX, referentes aos anos 1998 a 2002 (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.098); - Apenso DZ - Expediente remetido pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros relativamente ao (…) E, obtidos através da consulta do respectivo processo individual (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.224); - Apenso E - Proc. 10/97 (averiguação à AX da IGMST) – Volumes I a IX (cfr. termo Ap. Fls. 356); - Apenso EA - Documentação referente ao sistema de fornecimento à AX de combustível, sua requisição e distribuição pelos motoristas daquela entidade (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.224); - Apenso EB - Documentação entregue pelo arguido N, no dia 16/10/2003 (conforme fls. 10267 dos autos), aquando do seu interrogatório judicial, a qual se encontrava até à presente data apensa por linha aos presentes autos (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.397); - Apenso EC - Processo Individual de GT (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.397); - Apenso ED - Relatório da peritagem efectuada aos dados fornecidos pelas operadoras de comunicações (cfr. Termo de Apensação de fls. 13.397); - Apenso EE, Volumes 1, 2, 3 e 4, fls. 3 a 658, correspondente a documentos entregues pelo arguido H em sede de instrução e concretamente no interrogatório de 12/01/2004. - Apenso EF - Doc. entregue pelo arguido H em 16.01.2004 (listagem de chamadas efectuadas) (cfr. Termo de Apensação de fls. 15.086); - Apenso EI - Documentos entregues pelo arguido C em 16.02.2004 aquando da entrega do requerimento de abertura de instrução constante a fls. 16695 (vol. 73) (cfr. Termo de Apensação de fls. 16.752); - Apenso EJ - Documentação remetida pela (...)a da AX solicitada pelos n/ ofícios 401 e 406 (cfr. Termo de Apensação de fls. 19.087); - Apenso EK – Cópia dos bilhetes emitidos em nome do arguido E, no âmbito do protocolo existente entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e a TAP, nos anos de 1998, 1999 e 2000, referentes a viagens entre Lisboa/Paris, Paris/Lisboa, Paris/Porto e Porto/Paris; - Apenso EL - Documentos entregues pelo arguido K junto com o requerimento de fls. 18495: cópias das 1.as páginas de jornais (cfr. Apensação por linha de fls. 18.501); - Apenso F - Proc. 10/97 (averiguação à AX da IGMST) – Volumes X a XIII (cfr. Termo Apensação fls. 356); - Apenso G - Proc. 1/80 da Inspecção-Geral do MSST à AX (cfr. termo Apensação fls. 356); - Apenso J - Documentação diversa remetida pelo MSST referente aos processos disciplinares instaurados a A (cfr. termo Apensa. Fls. 356); - Apenso K - Processos Disciplinares instaurados a A em 07.03.1980 - Proc. 10344/81 e em 05.11.1985 (cfr. termo Apens. Fls. 834); - Apenso L - Processos Disciplinares instaurados a A em 22.03.1988; em 19.10.2001 e em 15.01.2002 – Proc. 377-02/1856 (cfr. termo Apens. Fls. 834); - Apenso M1 - Inspecção-Geral de Saúde(cfr. Termo de Apensação de fls. 2.649 e 4.895); - Apenso N-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso N-T - Auto de Transcrição do alvo 20346 (N) (cfr. Termo de Apensação de fls. 4.320); - Apenso O-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso O-T - Auto de Transcrição do alvo 19385 (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.649); - Apenso P-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Despacho de 9/10/09, que rectifica termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso P-T - Auto de Transcrição do alvo 20348 (C) (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.757); - Apenso Q-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso Q-T - Auto de Transcrição do alvo 19246 (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.532); - Apenso R-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (Ver Despacho de rectificação de termo de Apensação de fls. 1.157, proferido na AJ de 1/06/09); - Apenso S-L - Elementos enviados com oficio da Vodafone de 31/01/03, fls. 933 (cfr. termo Apensação de fls. 1157, qual foi rectificado na AJ de 1/06/09, pois termo de fls. 1.157 dizia elementos de JLR) e contém Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) e IMEIS utilizados; - Apenso T - Documentação entregue pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros referente a E (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso T-1 - Documentos do assistente AV que estavam na posse da Sra. BP (cfr. Termo de Apensação de fls. 32.568); - Apenso T-2 - Fotografia panorâmica da (...) (…) que veio junta com o oficio de fls. 37.442 dos Autos Principais (cfr. Termo de Apensação de fls. 43.192); - Apemso U-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso U-1 - Documentos do assistente AV que estavam na posse do Sr. Inspector BZ (cfr. Termo de Apensação de fls. 32.568); - Apenso U-2 - Cópia da certidão do 2º Volume dos autos remetida pela Procuradoria Geral da República (Despacho proferido a fls. 38.642) - cfr. Termo de Apensação de fls. 38.659; - Apenso V (Caixa 1) – (Contém 20 sobrescritos + 7 sobrescritos dentro do “ Sobrescrito 25”) - Sobrescrito 2: Duas cassetes VHS, a que se refere fls. 1.156 e auto de visionamento de fls. 1.654 (Parte do jornal da Noite da DR, de 1/02/03, com entrevista “(…)” e “(…)” – Jornalista IP) (env. 2); - Sobrescrito 3: Duas disquetes enviadas pela TMN a fls. 1138, Ofic. DSJ/1649/2003EA (em complemento dos dados já enviados com o Ofic. DSJ/1392/2003/EA de 31/01/03) (cfr. Termos fls. 1156 e 1.157) (Referentes aos nºs de telefone (…) …(…) …(…)) Foi feita cópia em CD-R pelo tribunal - Sobrescrito 4: Duas disquetes enviadas pela PT a fls. 4.179, em 10/04/03, Ref. 2003/0464 (feita cópia em CD-R pelo Tribunal), respondendo ao n/Ofic. 12.826, de 10/04/03 (Pedido de facturação detalhada) - Sobrescrito 5: Dois telemóveis apreendidos a fls. 283, entregues por AAJ (de A: ericsson com o nº (…), modelo 5868 e ericsson modelo A10185 (env. 5); (cfr. Termo Apens fls. 4.183) - Sobrescrito 6: (Cfr. Termo fls. 4.302) 8 (oito) disquetes enviadas pela PT a fls. 4301, of. 2003/0464-A, de 12/5/03, respondendo ao ofic do trib nº 12826, de 10/04/03 (foi feita cópia em CD-R pelo tribunal) (facturação detalhada); -Sobrescrito 7: Uma cassete video contendo o prog. “ ((…)”) (env. 7) (cfr. Fls. 4.371; cfr. Termo Apens fls. 4.400) - Sobrescrito 8: Duas disquettes e um CD Rom (cfr. Auto de apreensão do MSST, de 13/03/03, Gabinete do arguido C AX, fls. 3.809 a 3.811, al. g; (cfr. Auto de Apens fls. 4.183) (env. 8); - Sobrescrito 9: (cfr. Termo fls. 6.170) Cinco disquetes remetidas a fls. 6168, pela PT, Oficio s/ Data mas ref 2003/386, responde ofic. nº 12 862, de fls. 4368, com os dados de facturação detalhada (Foi feita cópia em CD-R pelo tribunal) - Sobrescrito 14: Uma disquete entregue por A Silva em 04.08.2003, em interrogatório (cfr. fls. 7.823; cfr. Termo Apens fls. 7.827) (env. 14); - Sobrescrito 24: Uma disquete enviada pela TMN pelo Oficio de fls. 5.720, DSJ/939/2003, responde ao ofício nº 12.863, de fls. 4.369, e contém facturação detalhada (foi feita cópia em CD-R pelo tribunal); - Sobrescrito 25: Contém: 1. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) 1 (UM) CD remetido pela TMN a fls. 7072, Ofic TMN DSJ/14 056/2003/EA de 24/7/03, respondendo ao mandado de busca e apreensão do Tribunal de 14/7/03 (cfr. Fls. 6.577 a 6.601), e na sequência do ofício que enviou em 22/7/03 com ref. DSJ/13790/2003/ EA (que está a fls. 7096), identificado com “TMN 1” e contém: (…) Facturação de 1/1/98 a 30/9/00; (…) dos números de cartões que TMN juntou com o ofício de 22/7/03 (lista que está a fls. 7099 a 7109); Nota: (Fls. 7213, consignado que CDs referidos a fls. 7072, 7096 e 7108, foram guardados em local seguro e devidamente acondicionados; Fls. 7748, CDs referidos a fls. 7072 (um CD TMN), 7096 (um CD TMN), 7108 (um CD Optimus) e fls. 7648 (Dois CDs TMN), juntos ao Apenso BR- Envelope 5; ERRADO e rectificado pelo despacho de 9/10/09) 2. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) (ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) 1 (UM) CD remetido pela TMN a fls. 7096, Ofic TMN DSJ/13790/2003/EA de 22/7/03, respondendo ao mandado de busca e apreensão do Tribunal de 14/7/03 (cfr. Fls. 6.577 a 6.601), identificado com “TMN 2” e contém: (…) Facturação; (…) dos números de cartões que TMN indica no ofício de 22/7/03 (lista que está a fls. 7099 a 7109); Nota: (Fls. 7213, consignado que CDs referidos a fls. 7072, 7096 e 7108, foram guardados em local seguro e devidamente acondicionados; Fls. 7748, CDs referidos a fls. 7072 (um CD TMN), 7096 (um CD TMN), 7108 (um CD Optimus) e fls. 7648 (Dois CDs TMN), juntos ao Apenso BR- Envelope 5; ERRADO e rectificado pelo despacho de 9/10/09) 3. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) 1 (um) CD remetido pela PT a fls. 9.903, com o Of. PT 2003/0982, de 8/10/03, que responde ao of.do Trib. nº 2205 de 25/8/03, enviando facturação detalhada (foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal); 4. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) ( ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) 2 CDs enviados a fls. 7.648, oficio da TMN DSJ/14716/2003 EA de 4/8/03, na sequência dos ofícios que já remeteu em 22/7/03 (fls. 7.096) e 24/7/03 (fls. 7.072/3), com dados de tráfegos (CD “TMN 3” ; CD “TMN 4” – Foi feita cópia dos CDs pelo Tribunal) 5. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) (ver Despacho de 9/10/09, de rectificação do termo de Apensação de fls. 7.748) Um CD enviado pela Optimus a fls. 7.108 - Fls. 7108, Of. Optimus, na seq. Busca de 14/07/03, envia CD-Rom com listagem das chamadas efectuadas e recebidas; (…) e ainda números utilizados pelos respectivos IMEIS e listagem das chamadas efectuadas e recebidas dos números utilizados pelos respectivos IMEIS (Atenção que a listagem dos diversos números está sequencial por datas e misturada) - ( …) e titularidade dos nºs …indicados no(s) oficio(s); Nota: (Fls. 7213, consignado que CDs referidos a fls. 7072, 7096 e 7108, foram guardados em local seguro e devidamente acondicionados; Fls. 7748, CDs referidos a fls. 7072 (um CD TMN), 7096 (um CD TMN), 7108 (um CD Optimus) e fls. 7648 (Dois CDs TMN), juntos ao Apenso BR- Envelope 5; está ERRADO e rectificado pelo despacho de 9/10/09) 6. Um sobrescrito com: (Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25) “CD resultante da peritagem”, “STAIC”, onde: - Pasta “Optimus”, 6º ficheiro, identificado “ resposta ao ofic. nº 2.723” (cfr. Ofic fls. 10.986, Of. OPTIMUS de 21/10/03, responde n/ofico 2773 (cfr. fls. 9.887) e enviam disquete com chamadas efectuadas pelo nº 933 967 753, desde 1/12/01, data da 1ª Chamada efectuada; Fls. 11.189 disquete entregue à PJ, Inspector EER) - Pasta TMN, ficheiro 32º “ resposta ao oficio nº 2.722”, CD 5, e contém registo de chamadas (cfr. Fls. 10.793, Ofic. TMN DSJ/19453/2003/EA, de 21/10/03, reponde ao of. 2.722 - que está a fls. 9.882, em que pede elementos do nº indicados no ofício - e envia: (…) CD com elementos de tráfego (cfr. 10.848 CD enviado para DIAP; fls. 11.189, entregue PJ, ao Inspector EER) 7. Um sobrescrito: Com CDs de cópias de cópias de segurança feitas pelo Tribunal dos suportes informáticos existentes nos autos; - Sobrescrito 29: 1 (uma) disquete remetida a fls. 10476/7 pela TMN, Ofic TMN DSJ/19169/2003/EA, de 16/10/03, que responde ao oficio de fls. 9882, nº 2722, de 8/10/03, com facturação detalhada (…) (Foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal) - Sobrescrito 31: 1 telemóvel apreendido ao arguido E (IMEI (…) e cartão TMN nº (…) – termo de apreensão de fls. 4538, de 20/05/03 (env. 31); - Sobrescrito 34: Uma disquete enviada a fls. 11.389, Ofic OPTIMUS de 6/11/03, responde n/ ofic. 2849 de 22/10/03 (…nº (…)…); (Foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal); - Sobrescrito 37: Uma disquete enviada a fls. 11.265, Oficio TMN DSJ/20056/2003 EA, de 29/10/03, responde n/oficio 2843, de 22/10/03; (foi feita cópia em CD-R pelo tribunal) - Sobrescrito 38: Uma disquete enviada pela Optimus a fls. 12.638, em 4/12/03, a responder ao Ofício do tribunal nº 3121 de 20/11/03, com a listagem das chamadas efectuadas pelo nº (…) (…); (feita cópia em CD-R pelo Tribunal) - Sobrescrito 39: Uma disquete e um CD-R remetido pela TMN, of. TMN DSJ/22454/2003 EA, de 9/12/03, fls. 12.744/6, responde n/ofic 3122, de 12/11/03 ( foram feitas cópias em CD-R pelo Tribunal); - Sobrescrito 40: Uma disquete enviada a fls. 11.781, Ofic TMN DSJ/21106/2003/EA, de 13/11/03, responde n/ofic 13.085 de 12/11/03, com registo de tráfego (…nº (…)…nº (…)…) (foi feita cópia em CD-R pelo tribunal) - Sobrescrito 41: Uma disquete enviada a fls. 12.692 pela PT, Ofic. nº 75/2003 de 9/12/03, responde ao Ofício do tribunal nº 3.119 de 20/11/03, com registo das chamadas efectuadas pelo nº (…), entre 4/12/97 e 7/01/00 (feita cópia em CD-R pelo Tribunal) - Sobrescrito 42: 8 (oito) CDs e 1 (uma) unidade back up remetidas para o Tribunal pela TMN a fls. 63.458, ofic 160520097524 200924342, de 25/09/09, em resposta ao ofic do trib 2593878, de 11/09/09 e 16 (dezasseis) CDs correspondentes a duas cópias de seguranças dos oito CDs enviados pela TMN (cfr. Despacho fls. 63.436, 63.460 e 63.465) ( cfr. Termo Apens fls. 63.486) - Apenso V (Caixa 2) - (Contém 10 sobrescritos) - Sobrescrito 1: uma disquete enviada com o of. da Vodafone de fls. 1088 , datado 5/02/03, e respondendo ao despacho do tribunal de 4/02/03 ( referente aos nºs (…)… nº (…)…nº (…)…) (cfr termos de fls. 1089, 1090; e termo de Apens. fls. 1157) (Foi feita cópia de segurança pelo Tribunal em CD-R ) - Sobrescrito 18: Uma disquete mencionada no of. de fls. 14.430 da Vodafone (cfr. termo de fls. 14.435 e 14.443 - Foi feita cópia de segurança pelo Tribunal em CD-R) - Sobrescrito 28: Rolo fotográfico KODAK e um negativo de rolo apreendidos ao arguido K, em 07.03.2003, na residência do arguido (env. 28); (cfr. Termo Apens fls. 2.454) - Sobrescrito 33: Telemóvel apreendido ao arguido N a fls. 4.093 (auto de apreensão de telemóvel sony, IMEI (…), com o cartão nº (…) ao arguido N;) - Sobrescrito 35: Três disquetes remetidas com o ofício da Vodafone de fls. 11.785 , em 12/11/03, respondendo ao n/ ofício nº 2.721, de 8/10/03 foi feita cópia em CD-R pelo tribunal) , - Sobrescrito 36: Uma disquete enviada pela Vodafone com oficio de fls. 12.760, de 11/12/03, que responde ao nosso ofício nº 3.120, de 20/11/03, com registos de chamadas (…nº (…),) (Foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal) - Sobrescrito 43: Equipamento apreendido pela IGMSST no gabinete do arguido C, na AX, em 13.03.2003 (telefone Motorola; nº SIM (…)) (cfr. Fls. 2.486) (env. 43) (Cfr. Termo Apens fls. 2.487) - Apenso V (Caixa 3) - (Contém onze sobrescritos) - Sobrescrito 12: 1 cassete Hi8 com gravações feitas pela PJ em (...) (env. 12); (cfr. termo Apens. Fls. 7.026) - Sobrescrito 16: 1 cassete vídeo com a entrevista do arguido A antes da prisão (env. 16) ( cfr. Termo apens. Fls. 10.594) - Sobrescrito 19: 1 cassete vídeo entregue pelo arguido H como Doc. nº 128 (funeral (…)) (fls. 15.052), na mesma data em que foram entregues os documentos que integram o apenso EE (env. 19) (cfr. Termo de apensação fls. 15.086) - Sobrescrito 22: 1 (Um) CD enviado a fls. 15.283 (foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal), Ofic PT 2003/0075, de 22/1/04, responde oficio nº 3.249 e remete CD com informação: (…)Titulares (…) e registo de tráfego; ( ... nº (…)...nº (…) … nº (…)…) (cfr. Fls. 15.286; cfr. Termo fls. 16.918) - Sobrescrito 27: Objectos referidos a fls. 3817 - uma pasta com vários cartões de visita (env. 27); - Apenso W-L - Listagem/facturação detalhada do móvel n.º (…) (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso W-1 - Listagem das chamadas telefónicas recebidas e efectuadas pelo assistente AP (cfr. Termo de Apensação de fls. 33.603); - Apenso W-2 - Listagem das chamadas telefónicas efectuadas pelos nºs (…) e (…) e chamadas efectuadas pelo nº (…) para os números (…) e (…) (cfr. Despacho de fls. 34.547/8); - Apenso W-3 - Documentos enviados para o HHB para a realização da perícia do arguido C e devolvidos pelo Hospital após a junção aos autos da perícia; - Apenso W-4 - Cópia do Processo Individual do assistente AN (cfr. Termo de Apensação de fls. 36.018A); - Apenso W-5 - Cópia do Livro de Registos Diários do Lar FG – Despacho em acta no dia 12.01.2006 - (cfr. Termos de Apensação de fls. 38.018A e 38.090); - Apenso W-6 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FG – Despacho em acta no 12.01.2006 (cfr. Termos de Apensação de fls. 38.018A e 38.090); - Apenso W-7 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do FF – Despacho em acta no dia 12.01.2006 (cfr. Termos de Apensação de fls. 38.018A e 38.090); - Apenso W-8 - Livro de Registo de Ocorrências do Lar GL – FA – Despacho em acta no dia 06.02.2006 (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-9 - (...) de 1999 e 2000 – Despacho em acta no dia 15.02.2006 (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-10 - Livro de Registo de Ocorrências do FD – CZ (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-11 - Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC – CZ (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-12 - Livro de Registo de Ocorrências da junção dos Lares FC, FG, FE, FF e FD (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-13 - Livro de Registo de Ocorrências do Lar FU – BF - (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-14 - Livro de Registo de Ocorrências do CW – DT- (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-15 - Processo Clinico de AC (cfr. Termo de Apensação de fls. 38.090); - Apenso W-16 - Certidão do Livro de Ocorrências do Lar FU – documentos que acompanhavam o oficio da AX constante de fls. 60.409 - (cfr. Termo de Apensação de fls. 60.448 e Despacho de fls. 60.442); - Apenso X - Fotocópias certificadas dos Processos de Inquérito n.º 57/02-I e 62/02-I da Inspecção Geral de Saúde (factos relacionados com Dr. K) (cfr. termo Apens. Fls. 1.388); - Apenso Y - Processo Individual de AT (cfr. Termo de Apensação de fls. 1.157); - Apenso Z - Fotocópias da assistência médica referente a alunos da AX – CZ - (cfr. Fls. 1.396; cfr. termo Apens. Fls. 1.406); - Apenso Z-1 - Fotocópias da assistência médica referente a alunos da AX – DT, GC, HHE, BF, EX, GB, EZ e FA (cfr. fls. 1.396; cfr. termo Apens. Fls. 1.406); - Apenso Z-2 - Fotocópias de assistência médica referente a alunos da AX – (...)s EY, FZ, EX, BF, DT e CZ, FW (lista corrigida) - Lista de (...)s de alunos da AX - (cfr. Termo de Apensação de fls. 2.000); - Apenso Z-3 - Certidão extraída do apenso VI do Inq. 4287/02.6TDLS da 3.ª secção do DIAP, constituída por listagens de análises (...)s efectuadas a alunos da AX pelo laboratório (…). (cfr. Termo de Apensação de fls. 3.561); - Apenso Z-4 - Doc. clinica dos alunos internos do FA (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-5 - Doc. clinica dos alunos internos do EZ (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 1) - Doc. clinica dos alunos internos do EY e Lares; Doc. clinica dos alunos internos – FJ - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 2) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FH - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 3) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FH - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 4) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FL - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 5) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FK - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 6) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FI - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 7) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FI - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 8) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FP - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 9) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FM - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 10) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FO - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-6 (Pasta 11) - Doc. clinica dos alunos internos do EY – FN - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170 e 6.262); - Apenso Z-7 - Doc. clinica dos alunos internos do EX - DT e da GC; GB - (cfr. Termo de Apensação de fls. 6.170); - Apenso Z-8 - Processo Disciplinar do arguido C (cfr. Termo de Apensação de fls. 33.823); - Apenso Z-9 - 5 Cassetes VHS (enviadas pela Estação de televisão DS) com as reportagens das entrevistas que foram feitas a alunos da AX por causa deste Processo e por factos relacionados com este Processo (cfr. Despacho de 17/02/2006; cfr. Termo de Apensação de fls.36.616): - Apenso Z-10 - - Relação dos educandos internos e da equipa técnica de cada um dos Lares da AX, de 1997 a 2002; - Mapa dos(as) Directores(as) e/ou Coordenadores dos Estabelecimentos da AX entre 1997/2002; - Mapa dos(as) (...)s(as) e Enfermeiros(as) afectos directa ou indirectamente aos Lares da AX (cfr.Termo de Apensação a fls. 45.358 – Desp. Fls. 45.279); - Apenso Z-11 (Volume 1) - Relatórios de Perícias Colegiais sobre a personalidade dos assistentes AC, AK, X, Y, AN, AT, AI, AP e AV – realizados pelo INML - (cfr. Termo de Apensação de fls. 51.792 e Desp. Fls. 51.790) ; - Apenso Z-12 - Impressão dos registos que se encontram nas cinco disquetes do sobrescrito 9, da Caixa 1, Apenso V, relativos aos registos do telefone “chamador” com o número (…) – números de telefone abrangido pelo Despacho de fls. 3.146 a 3.146, proferido em 31/03/2003 pelo Mmº Juiz de Instrução – ordenado pelo Despacho proferido a fls. 51.742 na audiência de julgamento no dia 27/03/2008 (cfr. Termo de Apensação de fls. 51.922 e Desp. Fls. 51.742); - Apenso Z-13 - - Volume 1 a 8: Impressão dos suportes informáticos que vieram do TIC em 19/01/2006 (fls. 36.107) ( Despacho fls. 52.109 a 52.110 ponto 2 - 8 volumes mais 1 volume contendo os suportes informáticos) - Volume 9 (contém): 1 - Um sobrescrito: (cfrs. Despacho fls. 52.109/10, Ponto 2) - Sobrescrito com Disquete enviada pela OPTIMUS, com o ofício de fls. 17.252/3, de 6/1/04, a responder ao Oficio do Tribunal nº 3.248 de 5/12/003 e nº 3.322 de 15/12/2003 (foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal) e contém registo de chamadas (…); 2 - Um sobrescrito: (cfrs. Despacho fls. 52.109/10, Ponto 2) - Sobrescrito com disquete enviada pela Vodafone com o ofício de fls. 18.524, de 5/4/04, a responder ao ofício do Tribunal nº 414, de 3/3/2004 e contém listagem de chamadas(…) (Foi feita cópia en CD-R pelo tribunal); 3 - Um sobrescrito: (cfrs. Despacho fls. 52.109/10, Ponto 2) - Sobrescrito com Disquete enviada pela VODAFONE com o ofício de fls. 17.251, de 9/2/04, a responder ao Oficio do Tribunal nº 3.247 de 5/12/003 (foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal) e contém registo de chamadas (…); 4 - Um sobrescrito: (cfrs. Despacho fls. 52.109/10, Ponto 2) - Sobrescrito com Disquete e CD remetida pela TMN a fls. 17.254, com o oficio DSJ/ 23514/2003/EA, a responder ao Oficio do tribunal nº 3246, de 5/12/03 - tendo sido feita cópia em CD-R pelo Tribunal ; - Apenso Z-14 - Diagramas (números de telefones) vindos do TIC Inqº 5/06.8TELSB (cfr. Termo de Apensação de fls. 52.448 e Despacho fls. 52.390); - Apenso Z-15 (Dois volumes) - Processos Psicossociais dos Assistentes AI, X, Y e AN (cfr. Termo de Apensação de fls. 55.227 e 55.460 e Despacho fls. 52.226 e 55.428); - Apenso Z-16 - Certidão das Decisões do Tribunal Arbitral relativa aos assistentes AK, AY, AF, T, AP, AN, AC, V, AA, AS, Y, X, AV, AQ, AT, Z, AH, AO, AU, AG, AD e U (cfr. Termo de Apensação de fls. 55.488-A e Despacho fls. 55.479) ; - Apenso Z-17 - Documentação existente no CED do CZ relativa aos Assistentes AI, Y e AN (documentos que acompanhavam o oficio da AX constante de fls. 60.453 dos autos principais) (cfr. Termo de Apensação de fls. 60.548 e Despacho fls. 60.453). Processo Apensado – 1718/02.9JDLSB-F - Fls. 15 a 18: Relatório Pericial de (...) (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal relativamente a U; - Fls. 57 a 61: Relatório Final da Policia Judiciária relativamente a U; - Fls. 118 a 119: Ofício da 10ª Conservatória do Registo Civil (…) a remeter o Assento de Nascimento de U; - Fls. 144: Cópia do Bilhete de Identidade de W: - Fls. 183: Cópia do cartão de autorização de estacionamento do AX Altético Clube; - Fls. 198: Documento redigido pela Directora do Lar EX ao Director da Policia Judiciária sobre o educando T; - Fls. 199 a 200: Documento redigido pelo Educador ZL do Lar EX à Senhora Directora do Lar, sobre o educando T; - Fls. 213 a 215: Fotografias do Barracão-garagem, sito na (...) (…), em (…); - Fls. 254: Documento da AX do Lar HHF sobre ocorrência com o educando V; - Fls. 258: Fotocópia do Bilhete de Identidade de V; - Fls. 278 a 279: Resposta da Vodafone ao oficio 12.84-n de 03/12/2002 a remeter a identificação de titular do número de telefone (…); - Fls. 316 a 319: Relatório (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a W; - Fls. 347: Fotocópia do Bilhete de Identidade de T; - Auto de Reconhecimento de Local na (...) (…), em (…) por T; - Fls. 389 a 419: Documentos da AX relativamente a (...); - Fls. 436 a 444: Relatório (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a V; - Fls. 456: Assento de Nascimento de W; - Fls. 458 a 464: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a T; - Fls. 471: Assento de Nascimento de T; - Fls. 473 a 484: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a U; - Fls. 501: Assento de Nascimento de V; - Fls. 503: Carta do arguido A a declarar que não conhece pessoalmente H; - Fls. 514 a 515: Relatório (...) do Dr. BL relativamente a U; - Fls. 519: Ofício da AX a remeter o Processo Individual de V (o Processo Individual encontra-se no apenso G); - Fls. 535 a 536: Resposta da PT a ao ofício 12700 de 18/12/2002 a remeter informação dos assinantes que estavam registados desde Janeiro de 1995 na (...) (…), nº (…), em (…) e na (...) (…), nº (…), em (…); - Fls. 539 a 541: Informação de Serviço da Policia Judiciária relativamente a números de telefone; - Fls. 554: Resposta da Vodafone ao ofício 1737 de 20/12/2002 a remeter listagens dos números de telefone (…) e (…) (estas listagens encontram-se no Apenso H); - Fls. 561: Resposta da Vodafone ao ofício 12720-n de 10/01/2003 a remeter identificação de titular do número de telefone (…), (…), (…); - Fls. 569 e 571: Bilhete de avião de Lisboa para o Funchal com a data de partida a 14/06/2001 e com a data de regresso a 18/06/2001 em nome de A; - Fls. 733 a 734: Ficha Biográfica da Policia Judiciária referente ao arguido A; - Fls. 870 a 873: Resposta da AX ao oficio 329914 de 18/06/2003 a remeter Registo Biográfico, Registo Disciplinar, classificação de serviço e Declaração de Antiguidade do arguido A; - Fls. 1.048 a 1.072: Documentos apresentados pelo arguido A – recortes de jornais -; - Fls. 1.074 a 1.076: Documentos apresentados pelo arguido A – noticia da revista Focus e notícia de 6/10/2003 do jornal Correio da Manhã; - Fls. 1.198: Documento apresentado pelo arguido A – documento do arguido dirigido à AX a solicitar certidão dos boletins ou folhas de distribuição diária do serviço, onde constem os locais, os percursos e os quilómetros, bem como as horas de saída e de entrada das viaturas depois do serviço feito, desde que passou a desempenhar a função de motorista na AX; - Fls. 1.199 a 1.200: Documento apresentado pelo arguido A – resposta da AX ao pedido do arguido a solicitar certidão dos boletins ou folhas de distribuição diária do serviço, onde constem os locais, os percursos e os quilómetros, bem como as horas de saída e de entrada das viaturas depois do serviço feito, desde que passou a desempenhar a função de motorista na AX; - Fls. 1.201 a 1.206: Documento apresentado pelo arguido A – cópia da reportagem do Dr. BL na revista Visão; - Fls. 1.210 a 1.247: Documento apresentado pelo arguido A – Cópia do Acórdão do Processo 15467/99.0TDLSB do Tribunal Judicial (…); - Fls. 1.248: Documento apresentado pelo arguido A – cópia de um artigo do jornal Público de 13/02/2003 sobre um artigo do Dr. BL; - Fls. 1.249 a 1.256: Documento apresentado pelo arguido A – cópia de interposição de Processo de Intimação Judicial contra a Senhora (...)a da AX; - Fls 1.261: Documento apresentado pelo arguido A – cópia de um recorte de jornal; - Fls. 1.612 a 1.625: Documento apresentado pelo arguido A – Print de uma noticia do Correio da Manhã de 08/05/2004 sobre a prisão preventiva do arguido A; - Fls. 1.631 a 2.008: Ofício do 3º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal (…) a remeter Certidão da Decisão Instrutória do Processo 1718/02.9JDLSB; - Fls. 2.015 a 2.157: Ofício do 3º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal a remeter cópia das motivações dos recursos inter(...)s pelo Ministério Público e pela Assistente AX ao Despacho de Pronuncia do Processo 1718/02.9JDLSB. (IV – Motivação da decisão de facto - Cont. ) (B) Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado (NUIPC 3137/01.5JDLSB): 1. No apuramento da factualidade provada e não provada, o Tribunal formou a sua convicção com base na valoração crítica e conjunta, do seguinte: a) Na declarações do arguido, quer quanto aos factos constantes da acusação, quer quanto ao factos constantes da sua contestação, bem como condições pessoais e profissionais; b) nas declarações dos Assistentes T, U, V e W; c) Nas declarações de BP, na qualidade de Legal representante da AX, a qual não revelou conhecimento directo dos factos, tendo o seu contributo sido relevante para o esclarecimento do Tribunal quanto a aspectos circunstanciais do funcionamento da AX d) No depoimento das testemunhas: - HHG ( Professor do EX e na AX desde 1986), tendo conhecido profissionalmente o arguido A, factos em relação aos quais falou, mas tendo declarado perante o Tribunal que nunca ouviu nem teve conhecimento da ocorrência na AX de factos da natureza dos deste processo, utilizou a expressão “ nunca soube de nada”, só com o início deste processo. Foi um depoimento que o Tribunal valorou como objectivo e isento, não tendo a testemunha revelado indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos, e tendo o Tribunal tido a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - HHH ( funcionário na AX há cerca de 15 anos, em relação à data em que prestou depoimento, exercendo funções no CZ), tendo conhecido profissionalmente o arguido A, factos em relação aos quais falou e tendo dito que “ nunca viu nada”, não tendo revelado especial conhecimento dos factos.. - OZ ( Educadora de infância na AX, pelo menos desde 2001), tendo prestado depoimento quanto ao seu conhecimento da instituição, mas não tendo demonstrado conhecimento relevante para os factos deste processo. - PU( Educadora de Infância na AX , no GA, desde 1998), a qual declarou ter conhecido o arguido A e, reproduzindo as suas palavras, “só posteriormente ao escândalo” teve conhecimento de factos de abusos. Demonstrou conhecimento directo das deslocações do arguido A a (...) e ao contacto do arguido com os jovens nas (...), tendo o seu depoimento sido relevante nesta medida. Foi um depoimento que o Tribunal valorou como isento. - WI ( Juiz de Direito, Educador na AX de 1968 a 1982/3 e que conheceu o arguido A na Instituição ), tendo o seu depoimento sido particularmente relevante quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, em relação às condições pessoais do arguido. Foi depoimento que o Tribunal valorou como isento, não tendo a testemunha revelado indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos, e tendo o Tribunal tido a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - HHI ( Psicóloga e a trabalhar na AX, no (...) EY desde 1989), cujo depoimento foi relevante quanto a factos relativos à vivência do assistente U e ao relacionamento do arguido A com os jovens, conforme descrito na análise crítica da prova, depoimento que o Tribunal valorou como objectivo e isento, não tendo a testemunha revelado indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos, e tendo o Tribunal tido a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - ZI( Educadora da AX, no EX, tendo estado também no lar de FZ de 1980 a 2002, tendo conhecido o educando T e descrito aspectos da vivência do jovem na instituição), declarou ao Tribunal que nunca teve conhecimento, nem ouviu falar, de qualquer caso igual ao tratado neste processo. O seu depoimento foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos ao assistente T, mas também para os factos relativos ao relacionamento do arguido com os demais educandos da AX e relações que se estabeleciam, conforme valoração do depoimento feita em sede de análise crítica da prova. - ZN ( Educadora no EX e ligada à AX desde 1989), nunca teve conhecimento de qualquer proibição de A levar jovens para as (...) e disse ao tribunal que na (...) de 2002, em que o seu (...) foi de férias para (…), o arguido A transportou consigo nove educandos e a “Direcção” do (...) esteve presente à partida para a (...), tendo o seu depoimento sido particularmente relevante quanto aos factos relativos a transporte de alunos pelo arguido, bem como ao assistente T, conforme descrito na análise crítica da prova, depoimento que o Tribunal valorou como objectivo e isento, não tendo a testemunha revelado indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos e tendo o Tribunal tido a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - PX ( Aluna interna da AX de 1989/90 até 2000, tendo estado no lar FE, testemunha que descreveu ao tribunal a sua vivência no (...) e conhecimento do arguido A), a qual relatou ao tribunal ter conhecido o arguido A e ter ficado “ espantada quando viu TV” as notícias referentes a este processo. O seu depoimento concorreu para a prova dos factos relativos a transportes de alunos por parte do arguido A , para jogos ao fim de semana e que os educadores tinham conhecimento de tais deslocações pois no seu caso pedia sempre autorização. Foi um depoimento que o Tribunal valorou como isento e objectivo, não tendo tido qualquer indício de que a testemunha não tivesse relatado ao Tribunal o que se tinha passado consigo e como se tinha passado. - NG, irmã de U, a qual falou da vivência do irmão dentro e fora da AX, cujo depoimento foi relevante para a prova dos factos relativos a este assistente e na estrita medida em que o Tribunal o considerou de valorar, em sede de análise crítica da prova. - PO, o qual prestou o seu depoimento por videoconferência ( conhecido do arguido A há mais de 20 anos, dono da casa sita em (…), descrita na acusação, o qual falou do seu conhecimento do arguido e de uma deslocação a sua casa do arguido, com um jovem). O seu depoimento foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos ao assistente U, conforme valoração que o Tribunal expôs em sede de análise crítica da prova e para a qual se remete. - EEA, a qual prestou o seu depoimento por videoconferência ( conhecida do arguido A há 20 anos, dona da casa sita em (…), descrita na acusação, a qual falou do seu conhecimento do arguido e de uma deslocação do arguido a sua casa, aquando de um casamento, com um jovem. O seu depoimento foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos ao assistente U, conforme valoração que o Tribunal expôs em sede de análise crítica da prova e para a qual se remete. - ZC, Educadora na AX desde 1998, no GA, a qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A e não teve conhecimento de queixa de jovens contra o arguido A. Demonstrou conhecimento directo das deslocações do arguido A a (...) e ao contacto do arguido com os jovens nas (...), tendo o seu depoimento sido relevante nesta medida. Foi um depoimento que o Tribunal valorou como isento e objectivo. - EEI, (...) da AX, entrou para a AX em 1983/1984 ( mas tendo exercido simultaneamente as funções de motorista e chefe de oficina) e tendo conhecido o arguido A quer como ajudante de motorista quer como motorista. Revelou conhecimento do assistente U, mas o seu depoimento não foi particularmente relevante para a prova dos factos objecto deste processo. - ZL, (…) na AX, o qual foi educador directo do T, factos sobre os quais falou em audiência de julgamento e foram valorados pelo Tribunal, conforme consta na análise crítica da prova, o qual o Tribunal valorou como objectivo e isento, não revelou qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos e tivemos a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - HHJ, (…) FA, no Lar HHF, foi educadora do assistente V, factos em relação aos quais o seu depoimento foi particularmente relevante, conforme consta na análise crítica da prova, depoimento que o Tribunal valorou como objectivo e isento, a testemunha não revelou indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos, e tivemos a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - QE, (…) FA, da AX, desde 1996, tendo o seu depoimento sido particularmente relevante em relação aos factos que o Tribunal deu como provados em relação ao assistente V, conforme consta na análise crítica da prova, depoimento que o Tribunal valorou como objectivo e isento, a testemunha não revelou indícios de qualquer interesse pessoal ou profissional no sentido da decisão dos presentes autos, e tivemos a percepção que o que disse correspondia ao que se lembrava e como se lembrava. - AAJ ( trabalhou na AX durante 29 anos), a qual revelou conhecimento directo da vivência do arguido A quer após o momento em que saiu da AX como alunos, quer quando começou a trabalhar na instituição, tendo-o o acompanhado e sendo o arguido visita frequente da sua casa. O seu depoimento foi essencialmente relevante para a prova dos factos referentes às condições pessoais do arguido e sua evolução profissional. - JV, (…), trabalhava no (…), a qual declarou ao Tribunal ter sido aluna da AX e conhecido o arguido A desde 1970. Declarou ser sua amiga, tendo o seu depoimento sido particularmente relevante para a prova dos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido e vivência na AX, matéria em relação ao qual se afigurou ao Tribunal isento e objectivo. - QA, (…), tradutora interprete, a qual declarou ao Tribunal ser irmã do arguido A. O seu depoimento foi particularmente relevante para a prova dos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido, matéria em relação ao qual se afigurou ao Tribunal isento e objectivo. - NN, (…) EY da AX ( ouvidas nas audiências de julgamento de 14/12/06 e 14/11/07), a qual falou ao Tribunal sobre o arguido A, as visitas que lhe fez depois de estar preso, cujo depoimento foi particularmente relevante para os factos que o Tribunal deu como provados quanto as condições pessoais do arguido, parte em que se revelou isento e objectivo. - ZX, reformada da AX, a qual disse ao Tribunal conhecer o arguido A, ter tido de processos disciplinares mas não saber a causa, pelo que o seu depoimento concorreu para a prova dos factos relativos à vivência do arguido, âmbito em que foi relevante. - IA, (…) na AX desde 1990, tendo exercido funções no portão de acesso em que era feito o controlo de entradas e saídas dos veículos da AX, tendo sido também vizinho do arguido A. No âmbito dos factos objecto deste processo o seu depoimento foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos à vivência do arguido A, sendo que para o Tribunal o seu depoimento foi prestado de forma objectiva. - UC, (…) na AX, tendo trabalhado na Instituição desde 1974 e aposentado “ há cerca de 3 anos”, em relação à data em que prestou depoimento perante o Tribunal ( 26/02/07). O seu depoimento foi relevante para esclarecer o tribunal quanto às funções que o arguido A tinha na AX, forma como as desempenhava, pois revelou conhecimento próximo e directo desse aspecto do “dia-a-dia” na AX. O depoimento foi prestado de forma que o Tribunal considerou objectiva, respondendo de forma espontânea. - BQ, presentemente aposentado da administração pública, tendo declarado ao Tribunal ter sido (...) da AX de Abril de 1986 a Novembro de 2002, embora tenha ingressado na AX em 1968 como educador. Pelas funções que exerceu na AX e pelo tempo durante as quais exerceu, demonstrou ao Tribunal conhecimento directo dos factos relativos à vida na Instituição, incluindo a carreira profissional do arguido A e o seu relacionamento com os demais funcionários. Demonstrou conhecimento directo dos processos disciplinares que o mesmo sofreu, sanções imposta, bem como as funções que exerceu ao longo do tempo, factos para os quais o seu depoimento foi particularmente relevante, matéria em que foi particularmente relevante para a prova dos factos objecto deste processo. Prestou um depoimento que o Tribunal considerou globalmente isento e objectivo, o qual foi avaliado pelo tribunal tendo sempre presente as funções que a testemunha exerceu dentro da AX desde 1968. - HC, (…) do assistente U, a qual falou da vivência do filho, cujo depoimento foi relevante para a prova dos factos relativos a este assistente e na estrita medida em que o Tribunal o considerou de valorar, em sede de análise crítica da prova. - Quanto à testemunha BL, (...) psiquiatra, no âmbito deste processo o seu depoimento não se revelou importante, uma vez que em audiência de julgamento não demonstrou conhecimento directo dos assistentes aqui envolvidos ; e) No teor dos documentos de fls.: - Fls. 15 a 18: Relatório Pericial de (...) (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal relativamente a U; - fls. 93 : carta enviada por SY para o sub- Director da Polícia Judiciária (…) em 12/09/02, referindo telefonema do arguido A para o seu filho W; - Fls. 119: Assento de Nascimento de U; - Fls. 144: Cópia do Bilhete de Identidade de W: - Fls. 198: Documento redigido pela Directora do Lar EX ao Director da Policia Judiciária sobre o educando T; - Fls. 199 a 200: Documento redigido pelo Educador ZL do Lar EX à Senhora Directora do Lar, sobre o educando T; - Fls. 213 a 215: Fotografias do Barracão-garagem, sito na (...) (…), em (…); - Fls. 254: Documento da AX do Lar HHF sobre ocorrência com o educando V; - Fls. 258: Fotocópia do Bilhete de Identidade de V; - Fls. 278 a 279: Resposta da Vodafone ao oficio 12.84-n de 03/12/2002 a remeter a identificação de titular do número de telefone (…); - Fls. 316 a 319: Relatório (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a W; - Fls. 347: Fotocópia do Bilhete de Identidade de T; - fls. 387: Auto de Reconhecimento de Local na (...) (…), em (…) por T; - Fls. 389 a 419: Documentos da AX relativamente a (...) dos assistentes; - Fls. 436 a 444: Relatório (...)-legal do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a V; - Fls. 456: Assento de Nascimento de W; - Fls. 458 a 464: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a T; - Fls. 471: Assento de Nascimento de T; - Fls. 473 a 484: Relatório do Exame (...)-Legal de Natureza Sexual do Instituto Nacional de Medicina Legal referente a U; - Fls. 501: Assento de Nascimento de V; - fls. 510: Documento datado de 25 e 26 de Agosto, com indicação “ Casamento de (…) e (…)”; - Fls. 519: Ofício da AX a remeter o Processo Individual de V (o Processo Individual encontra-se no apenso G); - Fls. 554: Resposta da Vodafone ao ofício 1737 de 20/12/2002 a remeter listagens dos números de telefone (…) e (…) (estas listagens encontram-se no Apenso H); - Fls. 569 e 571: Bilhete de avião de Lisboa para o Funchal com a data de partida a 14/06/2001 e com a data de regresso a 18/06/2001 em nome de A; - Fls. 870 a 873: Resposta da AX ao oficio 329914 de 18/06/2003 a remeter Registo Biográfico, Registo Disciplinar, classificação de serviço e Declaração de Antiguidade do arguido A; - Apenso A – Documentação apreendida em buscas constantes de fls. 232 e 244; - Apenso B – Processo de Instituição de Tutela relativo a V e Processo de Promoção e Protecção relativo a U; - Apenso C – Documentação (...) de U e de V; - Apenso D – Processos Individuais de U e T; - Apenso E – Processo Individual e Disciplinar de A; - Apenso G – Processo individual de V - Apenso H – Listagem de chamadas telefónicas referentes aos números (…) e (…); V – DA MOTIVAÇÃO E ANÀLISE CRÌTICA DA PROVA A - Da estrutura da Motivação e Análise Crítica da Prova: 1. Este processo chocou a sociedade pela realidade Humana que lhe está subjacente, quer na vertente das “vítimas”, quer na vertente dos “abusadores”. Face à forma como o mesmo chegou a julgamento - com discussão no local próprio e com discussão na praça pública - e às linhas seguidas pelas Defesas nas suas contestações, para a descoberta da verdade material, tal como era apresentada e configurada quer pela Acusação, quer por cada uma das Defesas, na fase do julgamento o Tribunal viu-se confrontado com exaustiva actividade investigatória e probatória. Porque “ ERRO” é “uma suposição cedo demais e mantê-la”. Seja ela qual for. E a fase do julgamento começou com uma história de dois anos de “julgamento” e “comentário” na opinião pública. Do ponto de vista meramente formal - e, agora, cingindo-nos ao que diz respeito à sua estrutura como acto decisório -, este processo exige uma sucessiva e ao mesmo tempo entrecruzada análise de diferentes factos, circunstâncias de factos, provas e meios de prova, consideração de linhas de Acusação e de Defesa, conhecimentos e saberes de outra natureza que não jurídica. Isto de uma forma que seja perceptível, clara, lógica e racional para quem espera a Decisão e para o Povo, em nome de quem a JUSTIÇA é administrada. 1. 1. A extensão dos autos é um dado apreensível objectivamente pela extensão do Despacho de Pronúncia e das contestações apresentadas, pelos meios de prova arrolados e pelos elementos de prova juntos aos autos, pelo números de pessoas efectivamente ouvidas e pelo tempo que foram ouvidas na condição de arguidos, declarantes, testemunhas, Peritos ou Consultores Técnicos, pela extensão de volumes e Apensos do processo, pelo número de audiências de julgamento, pelo número de requerimentos apresentados, incidentes suscitados, Despachos proferidos e recursos inter(...)s. Assim, nesta fase da Decisão - da Motivação e análise crítica da prova -, um dos problemas que se põe ao tribunal é a questão da sua organização e estrutura. Isto porque a interligação dos mesmos factos ou de factos parcialmente comuns, que necessária e por vezes repetidamente o Tribunal vai ter que fazer e convocar a propósito de várias questões ou de questões que se repetem – mesmo que apenas parcialmente -, em relação a diferentes arguidos ou assistentes, ou núcleos de factos, levam a dificuldades práticas, para evitar repetições e manter coesão. Deste modo e dentro do que materialmente for possível ao Tribunal, a análise de factos ou núcleos de factos que possam ser sucessivamente convocados a propósito de outros factos ou núcleo questões ou, por exemplo, a propósito de diferentes arguidos, assistentes, locais, relações entre pessoas – tais como e meramente a título de exemplo, a vivência dos arguidos ( locais onde viveram, onde exerceram profissão, ou funções desempenhadas…), a vivências dos assistentes ( altura em que foram para a AX, Lares e (...)s em que estiveram, (...) a que foram …) -, começará por ser feita como “ tema” autónomo, possibilitando que quando o Tribunal precise de se referir, de novo, a esses factos ou questões, o faça já por mera “referência” a questão ou facto que já foi previamente tratado. 1.2. Passando a um outro aspecto, inerente à demonstração do processo lógico e racional pelo qual o Tribunal procedeu à análise e valoração da prova produzida em audiência de julgamento e chegou à matéria de facto que deu como “ provada” e “ não provada”, é igualmente a demonstração ou referência de/a aspectos ou circunstâncias que sendo colaterais ou circunstanciais da “prova” ou do “meio de prova” em si, são relevantes ou foram concorrentes para a análise, ponderação e valoração de determinada “prova” ou “ meio de prova”. Isto é, sendo aspectos colaterais ou circunstanciais da “prova” ou do “meio de prova” em si, são elementos ou circunstâncias que o Tribunal teve em consideração e, portanto, concorreram para a importância, relevância ou para o peso que o Tribunal, após ponderação, veio a dar a determinada “prova” ou “ meio de prova”. Então vejamos: 1.2.1. Das declarações/depoimentos dos Arguidos, Assistentes e testemunhas. Uma questão relevante para a sindicância da valoração da prova feita pelo Tribunal, prende-se com o modo como foram prestadas as declarações pelos arguidos, declarantes e testemunhas que foram ouvidos em audiência de julgamento, quer na sala de audiências do Tribunal de Santa Clara, quer no Tribunal de Monsanto e a forma como tal resulta reproduzido nos respectivos registos. A sala de audiências do Tribunal de Santa Clara era uma sala com condições difíceis de audição, quando estava em causa depoimentos que eram prestados com um tom de voz “mais baixo”. Várias vezes o Tribunal teve que dizer aos declarantes ou testemunhas para falarem um pouco mais alto, em algumas situações porque o Tribunal não percebeu claramente o que foi dito e noutras por o Ministério Público ou os Ilustres Mandatários dos Sujeitos processuais - e estes estavam, pela disposição da sala, mais próximos do local onde as testemunhas e declarantes depuseram que o Colectivo -, terem dito ao Tribunal não conseguir perceber o que foi dito. O mesmo se passou na sala do tribunal de Monsanto, embora aqui com menos frequência, devido à disposição da sala e ao local onde as testemunhas ou declarantes estavam sentados. No entanto, ouvindo as gravações há vicissitudes da audição ou cambiantes da audição que não são perceptíveis, dando mesmo, por vezes, uma noção errada da forma como foi prestado o depoimento. Sucede que quer os declarantes e testemunhas, quer os Ilustres Mandatários dos Sujeitos processuais, quer o Ministério Público, quer o Tribunal, falavam para microfones separados e colocados ao pé de si, pelo que quando se ouve a gravação parece, em regra, que tudo foi dito em voz alta, clara e perceptível por todos. Parece que os Assistentes falaram alto e claro quando respondiam ao tribunal, quando, em algumas das vezes, na sala falavam “baixinho”, por vezes respondiam quase em surdina, isto é, com uma voz que, devido à inclinação da cabeça, ia mais para o peito do que para a sala. Daí que, ouvindo as gravações, temos o Tribunal a dizer “ …o Sr. tem que falar mais alto porque não se ouve o que diz... ”, “ … por vezes o Tribunal não consegue ouvir bem o que os srs. responderam… daí pedir para repetir…” - bem como o Ministério Público ou os Senhores Advogados, a dizerem , para o Tribunal, que não conseguiram perceber o que foi dito -, quando, como dissemos, para quem ouve as gravações tudo parece claramente audível - ver, por exemplo, na sala do Tribunal de Monsanto, o que resulta da audição do Assistente AI, audível na gravação da forma “aparente” que indicámos, mas em que o Tribunal teve que, a determinada altura da audição, pedir ao assistente para falar mais alto, pois alguns Senhores Advogados não o ouvia com facilidade nessa altura -. Esta referência é relevante porque tem a ver com um aspecto essencial na avaliação e ponderação dos depoimentos ou testemunhos e que é a IMEDIAÇÃO. Não esteve em causa, nem está, que o Tribunal ou qualquer sujeito processual tenha ficado sem ouvir o que foi dito, pois quando o Tribunal ou qualquer Sujeito processual não percebeu claramente a resposta dada, o Tribunal pediu de novo a resposta. Mas quando o Tribunal, na fase de análise e avaliação da prova, procedeu à audição dos registos de declarações ou depoimentos prestados anteriormente na audiência e foi acompanhando essas audições com as notas e referências que escreveu na altura em que, perante si, ouviu as pessoas na audiência de julgamento, teve esta percepção: pela audição da gravação parece, como já dissemos e em regra, que tudo foi dito em voz alta, clara e perceptível por todos, quando a “declaração” e a “audição” na sala não foi assim; pela audição da gravação perde-se, por vezes, a real apreensão do “como foi dito”, pois ressalta uma noção de “audibilidade e clareza” que, por vezes, corresponde a uma percepção e noção distorcida quanto ao “ como foi dito”. E o “como foi dito” é, na perspectiva deste Tribunal, essencial para avaliar “ o que foi dito”. Em algumas situações o facto de uma resposta ser dada em voz “baixa”, por vezes quase em surdina, isto é, apreendendo-se uma voz que devido à inclinação da cabeça ia mais para o peito do que para a sala, pode ser significativo para a avaliação dum depoimento, para avaliação da emotividade (ou ausência dela) desse depoimento, da ressonância dos sentimentos que puderam estar agregados a determinado depoimento, a certa resposta ou esclarecimento. O que, pela audição das gravações, repetimos, por vezes não é possível detectar. E, concluímos, repetindo, o “como foi dito” é, na perspectiva deste Tribunal, essencial para avaliar “ o que foi dito”. B - Da Motivação e Análise Crítica da Prova (cont.): 1. A valoração da prova constitui uma das operações mais importantes e difíceis em todo o processo judicial. Pressu(...) indispensável da decisão, a qual se impõe ao julgador como uma tarefa inarredável. Esta exigência é reclamada pelo restabelecimento da paz jurídica do arguido e comunitária, o que faz com esta tarefa deva ser rodeada de especiais cuidados. No nosso sistema vigora o princípio da livre apreciação da prova, o qual se encontra consagrado no art. 127º do C.P.P., mas sendo submetido a regras e restrições, que constituem condicionantes da apreciação valorativa. Na verdade, como refere o Professor Figueiredo Dias (in “Direito Processual Penal (1988), 139-140), a valoração da prova há-de ser uma liberdade de acordo com um dever, de tal forma que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo. Ao contrário do que se passa no processo civil, em que basta a existência de uma «probabilidade prevalecente», em processo penal deve adoptar-se um padrão mais exigente, nomeadamente o de origem anglo-saxónica, da «prova para além de qualquer dúvida razoável», que se traduz na ideia de que o standard de prova exigido em processo penal é mais elevado do que o utilizado no processo civil. Embora qualquer sombra de dúvida ou qualquer hipótese fantasiosa, não sejam suficientes para obstar à condenação, para esse efeito tem de verificar-se um forte grau de probabilidade de que os factos tenham ocorrido daquela forma e que eles tenham sido praticados pelo arguido. Será, portanto, com base num tal grau de exigência que analisaremos este caso. “ (…) Em processo penal, a justiça, perante a impossibilidade de uma certeza, encontra-se na alternativa de aceitar, com base em uma probabilidade ou possibilidade, o risco de absolver um culpado e o risco de condenar um inocente. A solução jurídica e moral só pode ser uma: deve aceitar-se o risco de absolvição do culpado e nunca o da condenação de um inocente (…)” (cfr. Professor Cavaleiro de Ferreira, “Curso de Processo Penal”, Vol. 1º, 1986, pag. 216). Concretizando: (I) – Da Motivação e Análise Crítica da Prova quanto ao NUIPC 1718/02.9JDLSB (Processo Principal): 2. “ I – Dos factos referentes à AX”, sua “ Estrutura e finalidades” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados ): 2.1. Começando pelo núcleo de factos que no Despacho de Pronúncia estão identificados como “ I – Dos factos referentes à AX”, sua “ Estrutura e finalidades” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados ), o Tribunal deu como “Provados” os factos constantes dos Pontos “1.” a “30.” com base na valoração global e cruzamento entre si, dos documentos constantes do(s): - “Apenso D”, relativo a uma auditoria feita à AX pela Inspecção Geral do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social - a qual teve o nº 169/2001, resultante de um processo de averiguações nº 10/97) –, onde consta um relatório datado de 10/07/98 com conclusões do trabalho efectuado (cfr. Apenso D, I Volume, fls. 1 a 76), destacando o tribunal: - os documentos constantes do “vol. I” (cfr., por exemplo, fls. 8 a 22), com referência e necessária remessa para legislação inerente à Instituição AX; - os documentos constantes do “ vol. II” (cfr., por exemplo, fls. 162 a 198), onde encontramos o Manual de Gestão e Funcionamento dos Lares, onde estão enunciados os deveres dos educadores e dos monitores; os de fls. 301 a 314, referente à Listagem dos equipamentos e valências da AX, incluindo Lares e (...); os de fls. 315 a 442, 447 a 452, 453 vº a 464 vº, 466vº a 506, com elementos referentes e ilustrativos da forma de organização e funcionamento da AX enquanto Instituição, quer no que diz respeito à gestão e administração do seu dia-a-dia, quer no que diz respeito à orientação do internato ou frequência de educandos, organização e gestão dos espaços, dos lares, recrutamento dos monitores, linhas educacionais dos jovens, acompanhamento e controlo de saúde e doença, incluindo vacinação e rastreio); - os documentos do “ Vol. III” (cfr., por exemplo, fls. 517 a 556), referentes aos dados de internamento e condições de admissão de crianças e jovens na AX, incluindo filhos de funcionários da Instituição; os de fls. 556 a 578 – notando-se que o volume tem duas folhas numeradas com “578”, sendo que o Tribunal está a referir-se à “primeira”, mas a qual está aposta, decerto por lapso, antes da folha “577” - referentes a “semanadas/mesadas” e “salário estímulo” dos educando da AX, incluindo o dos que exerciam as funções de monitores nos lares; os de fls. 579 a 583, fls. 645 a 657, documentos referentes à contratação e condições da prestação dos serviços, de elemento(s) para o/do corpo clínico da AX ); - os documentos do “ vol. VII” (cfr., por exemplo, fls. 1.644 a 1.648); - os documentos do “ Vol. IX” (cfr., por exemplo, fls. 1936 a 1986), com relatório datado de 14/01/2002, relevante para a matéria de facto a que nos estamos a referir, na parte que diz respeito aos (...)s e educando que frequentavam a AX); - e documentos constantes nos “Anexos” (cfr., por exemplo, fls. 33 a 63), com elementos referentes ao acolhimento de crianças e jovens na Instituição. - Do “Apenso W9, Livro 1 e Livro 2”, do “Apenso DX” e dos constantes de fls. 51.516, 51.807/8, 51.844, 51.849/50, 56.029 a 56.112 dos autos, documentos referentes a (...) da AX e nos quais se encontram elementos que comprovam quer a existência das (...), quer a forma da sua organização ou repartição por (...)s/ lares /alunos e períodos de funcionamento; sendo concretamente os constantes do Apenso DX relativos aos anos de 1998 a 2002 . - Dos documentos dos Apensos “Z”, “Z 1” a ” Z 7”, constituídos por cópias de elementos relativos à assistência médica, incluindo análises realizadas, dos alunos da AX, nomeadamente dos que estavam internados e viviam nos Lares dos (...)s. Destes documentos constam, por exemplo, as datas em que eram realizadas as análises aos educandos; relação por ano lectivo, dos alunos que estavam nos lares e respectivas idades; ofícios entre as várias entidades da AX por causa de assuntos de saúde dos educando, entre os quais o Tribunal refere especialmente, por exemplo: (1) - do “ Apenso Z 1 “, fls. 14 a 18, com dados do GA entre os anos 1998/2003, indicação dos (...)s a que os educando iam, listas de educandos; de fls. 468 a 470, a relação dos (...)s assistentes dos educandos da Residência FA, dentro e fora da AX , para o ano de 2001/2002 e a fls. 471 a 484 para os anos 2000/2001, 1999/2000, 1998/1999, 1997, 1996, 1995; (2) - do “ Apenso Z 2 ”, fls. 51 a 59 vº, com relação de (...)s ou entidades , incluindo Hospitais, nos quais ou pelos quais foi prestada assistência médica aos educando internados nos lares do CZ e em relação às diferentes especialidades médicas; de fls. 119 a 255, cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FW, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (3) - do “ Apenso Z 3”, certidão extraída de NUIPC 4287/02.6TDLSB-03.01, com a listagem de alunos internos da AX que fizeram análises no Laboratório “ HHK” e datas em que foram feitas, elementos dos quais se extrai a periodicidade que o Tribunal veio a dar como provada quanto à realização de análises; (4) - do “ Apenso Z 4, Pasta 1”, fls. 3 e 11, com a identificação do corpo clínico no ano lectivo de 1998/99 do (...) FA; de fls. 68, comunicação datada de 10/10/2000, dos Serviços de promoção de saúde para Dr. FB, com a indicação do interlocutor da referida equipa em cada (...) e, a fls. 69, o mapa geral dos serviços de promoção de Saúde; de fls. 74 e 75, comunicação do Dr. HY – (...) Chefe da AX - para o Sr. (...) (...) Dr FB, datada de 9/03/2001, por causa de “…obstruções à realização de análises (...)s aos nossos educandos…” por parte dos Educadores, fazendo expressamente referência ao calendário dos rastreios e perfil de análises e ao critério subjacente; de fls. 91, comunicação do (...) FA para o gabinete de saúde, datada de 20/08/2001, com indicação da constituição da Equipa Técnica e, a fls. 93, comunicação datada de 7/08/2000, para o ano 2000/2001; de fls. 97 a 489, cópia dos relatórios de análises (...)s feitas aos educando, com data de realização, elementos dos quais se extrai a periodicidade com que as análises eram feitas; (5) - do Apenso “Z 5, Pasta 1”, fls 12., com a referência expressa ao rastreio laboratorial bi-anual dos alunos, em consequência do previsto na carta da saúde da AX; de fls. 15 do mesmo apenso, uma cópia do plano analítico para o ano escolar 2002/2003, com indicação das datas da colheitas (31 de Outubro e 31 de Maio) aos educando residentes nos lares e análises a fazer; elemento igualmente concorrente para os factos relativos à periodicidade das análises a que os alunos internos eram sujeitos; (6) - do “ Apenso Z 6, Pasta 1”, fls. 15 a 16, Plano anual de análises (...)s para o ano 2000/2001; de fls. 17/18, Relação de Estudos analíticos para o lar FK, de fls. 19/20 para o lar FN, de fls. 21/22 para o Lar FI, de fls. 23/24 para o FH; de fls. 37, circular com o Plano anual de análises para o ano 2000/2001 e de fls. 74 a 459, registo de documentos respeitantes a análises, com as respectivas datas, dos educando do lar FJ; (7) - do “ Apenso Z 6, Pasta 2 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FH, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames e de onde se extrai a periodicidade da sua realização aos educandos internos; (8) - do “ Apenso Z 6, Pasta 3 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FH, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (9) - do “ Apenso Z 6, Pasta 4 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do FL, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (10) - do “ Apenso Z 6, Pasta 5 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FK, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (11) - do “ Apenso Z 6, Pasta 6 e pasta 7 ”, integralmente constituídos por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FI, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (12) - do “ Apenso Z 6, Pasta 8 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FP, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (13) - do “ Apenso Z 6, Pasta 9 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FM, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (14) - do “ Apenso Z 6, Pasta 10 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FO, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (15) - do “ Apenso Z 6, Pasta 11 ”, integralmente constituído por cópias de documentos referentes a análises feitas aos educandos do Lar FN, com indicação das respectivas datas em que foram feitos os exames; (16) - do “ Apenso Z 7”, fls. 22, Plano de análises na AX para o ano 2002/2003 e, a fls. 23, para o ano 200/01 (documento datado de 12/03/01); de fls. 24, comunicação da escola GC para o Sr. (...). FB, datado de 30/08/99, por causa de avença médica para a referida escola e referindo a ausência de resposta por parte HY; de fls. 35, com o plano anual de análises para o ano 2000/01 , com o tipo de análises a fazer; de fls. 37, ofício do HY, (...) chefe da AX, para o (...)FB, datado de 9/03/01, por causa de “…obstruções à realização de análises (...)s aos nossos educandos…” por parte dos Educadores,fazendo expressamente referência ao calendário dos rastreios e perfil de análises e ao critério subjacente. Este grupo de documentos – os dos Apensos “Z” - foi particularmente relevante para a prova dos factos constantes nos pontos “24.” e “25.” dos "Factos Provados" (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados ), embora não exclusivo, pois os documentos do “Apenso BH”, do “ Apenso Y” e do Apenso “Z-10” – que seguidamente irão ser descritos -, concorreram de forma igualmente relevante para a formação do Tribunal sobre tais factos e no sentido que veio a dar como provado. - Dos documentos constantes do “Apenso BH”, contendo a “ Carta de saúde da AX”, datada de Outubro de 1999 e de onde consta, entre o mais, a relação do corpo (...) da instituição naquela data e sua distribuição ou relação com os vários (...)s, interacção com outras equipas da instituição e regras de saúde ou de prevenção a observar em relação ao internato. - Dos documentos constantes do “Apenso BY” , contendo certidão extraída do processo com o NUIPC 8419/03.9TDLSB, com a relação de análises (...)s realizadas a alunos da AX entre os anos de 1999 a 2001, nos laboratórios HHK e HHL, com indicação dos Lares e datas da realização. - Do documento de fls. 45.213 dos autos e dos documentos do “Apenso Z-10”, documentos estes referentes à forma de estruturação e organização da AX, bem como frequência pelos educandos, contendo especificamente : a Relação dos educandos internos e da equipa técnica de cada um dos Lares da AX, de 1997 a 2002; o Mapa dos(as) Directores(as) e/ou Coordenadores dos Estabelecimentos da AX entre 1997/2002; o Mapa dos(as) (...)s(as) e Enfermeiros(as) afectos directa ou indirectamente aos Lares da AX). - Dos documentos de fls. 55.909 a 55.946, documentos remetidos pelo AX (...), referentes a fichas de alunos da AX jogadores no AX (...), com fichas dos jogadores que praticaram desporto federado pelo AX (...) (mas tendo-se em atenção que, de acordo com a comunicação que foi feita ao tribunal, são as fichas que o clube conseguiu localizar e remeter para o Tribunal), relativamente aos anos de 1998 a 2002 e entre as quais está a ficha do(s) assistente(s) AD (cfr. fls. 55.914), AM (cfr. fls. 55.916), AO ( cfr. fls. 55.938). - Dos documentos de fls. 362 a 371, do Apenso D, II Volume (cfr. “Apenso D”, relativo a uma auditoria feita à AX pela Inspecção Geral do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, a qual teve o nº 169/2001, resultante de um processo de averiguações nº 10/97 e com relatório datado de 10/07/98, que está no Apenso D, I Volume, fls. 1 a 76), os quais correspondente à Acta nº 69, da reunião do Conselho-Técnico Administrativo da AX, datada de 19 de Dezembro de 2000 e na qual é feita referência quanto ao acordo celebrado pela AX com o C.P.A.C., com o objectivo, entre o mais, da prática de modalidades desportivas pelos alunos da AX no C.P.A.C., comparticipação da AX nos custos com o desporto dos alunos federados; e dos documentos de fls. 392 a 418 (estes concorrendo, também, para a prova dos factos constantes dos pontos “28” a “30” dos "Factos Provados"), referentes à acta nº 66, da reunião do Conselho Técnico-Administrativo da AX com o Conselho de ex-alunos, ocorrida em 12/04/2000, em que foi igualmente ponto da discussão o aluguer de campos da AX ao C.P.A.C.. Todos estes documentos foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos, isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam. Revestem, a título de exemplo, a forma de “relatório” emitido por “auditores” do M.T.S.S. no âmbito de auditoria (cfr. Apenso D, Anexos, fls. 33 a 63, sobre o acolhimento de crianças e jovens na Instituição), ou documentos feitos pela AX correspondentes a “ordem de pagamento”, a “operação de tesouraria”, a comunicações de “Serviço” entre funcionários ou dirigentes da AX, actas das reuniões do “Conselho de Direcção da AX”, actas das reuniões do “ Conselho Técnico-Administrativo com o Conselho de Ex-alunos da AX” , “Declaração”, “Contrato de Avença”, circulares, comunicações internas da AX; boletins de jogos de futebol, especificando dias de realização dos jogos e resultados, documentos de constituição de equipas do jogo, ficha individual de de desportista no AX A.C. ; o que conjugado com as assinaturas e datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 2.2. Por sua vez cruzou-os com a demais prova produzida em Audiência de Julgamento, concretamente com a prova testemunhal e com a prova por declarações, quer dos arguidos quer dos Assistentes. 2.2.1. Assim e particularizando alguns aspectos da prova testemunhal ou da prova por Declarações, quanto aos factos descritos sob os nºs. 1 a 30, dos “ Factos Provados” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados ), foram relevantes os seguintes depoimentosde testemunhas e/ou declarações: As declarações do arguido C quanto à génese, organização, objectivos e transformações ao longo do tempo da instituição e sua situação na actualidade, declarações que, neste aspecto, foram globalmente no sentido dos factos que o Tribunal veio a dar como provados e concordante com os documentos que existem nos autos, de entre os quais os acabados de mencionar pelo Tribunal neste ponto “2.”. Concorreram e no mesmo sentido, as declarações da Sra. Dra. BP, a qual foi (...)a da AX a partir de Novembro de 2005 e que, pela natureza dessas funções, revelou particular e especial conhecimento quanto à génese, organização, objectivos e transformações ao longo do tempo da instituição e na actualidade – e quando o Tribunal refere “actualidade” inclui, pelo menos, a “actualidade” reportada até ao momento em que foram publicamente conhecidos os factos deste processo, concretamente Novembro de 2004 -, bem como organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares. Também neste campo dos factos que o Tribunal deu como provados - quanto à organização da Instituição e vivência do dia-a-dia da AX -, dentro dos conhecimentos que revelou e com as limitações que por vezes revelou, contribuíram as declarações do arguido A, globalmente concordante, quanto a esta matéria, com as demais declarações e documentos já mencionados. As declarações do arguido A tiveram um especial contributo, por exemplo, quanto ao núcleo de factos referente ao transporte dos educando para as (...) – até porque foi uma das funções que exerceu, na qualidade de motorista de ligeiros da AX -, quanto à existência e fins da frota de veículos da AX, sendo que, nestes aspectos concretos, o seu depoimento foi globalmente concordante com o dos demais motoristas da AX, nomeadamente as testemunhas HJ, BBG, VO, SZ, EC, MG, UC, depoimentos que, por sua vez, mereceram igualmente relevância por parte do Tribunal para a formação da sua convicção e prova dos factos deste capítulo. Foram igualmente concorrentes os depoimentos das testemunhas: UL (educadora na AX) a qual, tendo em atenção as funções que declarou ter exercido na AX, educadora desde 1996 (tendo demonstrado conhecimento directo da organização da AX , organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares), teve um depoimento que contribuiu para a prova dos factos referentes à organização da AX , organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares, depoimento que nesta parte o Tribunal avaliou como objectivo e desinteressado. Esta testemunha demonstrou, contudo, especial conhecimento em relação aos lares do (...) DT e com a particularidade - no que diz respeito à vigilância dos alunos durante a noite -, de ter dito ao Tribunal que naquele (...), durante a noite, os alunos não ficavam exclusivamente ao cuidado dos monitores, mas também ao cuidado de 1 ou 2 Educadores, os quais, não estando nos Lares, faziam rondas pelos quatro lares. Daí o Tribunal, por tal ter sido diferente dos demais depoimentos dos educadores dos Lares de CZ - e acima mencionados - e por considerar relevante a constatação de que diferentes (...)s podiam ter, em alguns aspectos, diferentes procedimentos quanto à gestão e organização dos respectivos Lares, ter especificado tal factualidade nos “Factos Provados”. WE (técnico superior na AX, tendo entrado em 1974, quando ainda era estudante universitário, altura a partir da qual conheceu o arguido A e o arguido C e trabalhado com educador no (...) EY entre 1980 e 1998 e a partir de então na (...)), o qual, pelas funções que exerceu, demonstrou conhecimento directo da vivência da instituição desde 1974, tendo testemunhado, no que aqui importa, a situação de massificação em que foi feito o internato, pelo menos, até 1980; a situação, nas suas palavras, “generalizada” e do “dia-a-dia” de abusos dos alunos mais velhos sobre os mais novos no internato; as vivências e carências dos jovens que eram internados. YW (educadora do Internato, a qual disse ao tribunal ter entrado para a AX em Setembro/ Outubro de 1986 para o internato do CZ, para o FF; antes deste internato esteve um tempo a estagiar em DT; após o internato de CZ passou para o semi-internato de BF; voltou, de novo, para o internato, mas para BF (para o Lar FU, cfr. Apenso Z-10, fls. 105, referente ao ano de 1997/1998; mas cfr. fls. 7, do Apenso Z-10, de onde consta como educadora de 1997 a 2000, no BF, no Lar FU); e “ há cerca de 6 anos” - à data em que estava a prestar depoimento e prestou depoimento em 4/05/06 - passou para o Lar FV, no internato de FA (cfr. Apenso Z-10, fls. 121, menção do nome da testemunha no (...) de FA, no Ano 2000, e fls. 130 no Ano de 2002 mas com a indicação do Lar de “FW”), a qual confirmou ao tribunal o controlo bi-anual que os educandos faziam com análise (...)s, as quais eram prescritas pelo Dr. HY, (...) da instituição. As análises ficavam no processo do educando e também para quando fossem ao (...) de família do Centro de saúde. Disse que os educadores tinham acesso às análises, passado algum tempo, vindo – presumia - do gabinete (...) da (...), pelo correio interno. Guardava-as no processo do educando, no lar. Disse que no Lar FU foi sempre assim. Por sua vez – e focando agora a matéria de facto que o Tribunal deu como “provada” e como “não provada”, quanto ao conhecimento do arguido C dos dados de saúde dos alunos ou acesso a esses dados - , a testemunha PY (professora no (...) EY da AX), falou sobre o controlo de análises que era feito aos educandos, periodicidade e universalidade, pois era indiferentemente em relação a todos os educandos. E disse, quanto ao conhecimento de doenças contagiosas que quaisquer educandos tivessem, que os dados seriam conhecidos pelos educadores, pelo (...) e pela assistente social. A testemunha RM (educador no Lar FW do (...) de FA da AX desde o ano de 1988), falou dos processos “do educando” que existiam, disse que havia um processo individual e um processo relativo à saúde, o que estava à parte. Neste processo registavam as deslocações ao (...) - tendo sido confrontado com fls. 523 a 538 do Apenso Z-1, e confirmado que isto eram registos das deslocações ao (...) -, tendo havida uma altura em que levavam uma ficha para a consulta, onde o (...) escrevia as observações relativas a essa consulta. Estas fichas ficavam no processo de saúde do lar, que não era o processo individual. No lar onde estava (FW) os educadores tinham acesso aos resultados das análises que os educandos faziam. E a testemunha YS (técnica superior na (...) da AX desde Maio de 1987), declarou ao Tribunal ter trabalhados nos serviços do S.A.S.A., na (...) da AX, esclarecendo que o seu gabinete era no piso de cima da (...) e que o gabinete do arguido C era no piso de baixo. Falou quanto aos processos individuais - nos quais estavam as informações relativas à admissão dos jovens, ofícios do Tribunal e a parte da escola - existentes no SASA, os quais disse que só as pessoas daquele serviço tinham acesso. O arguido C nunca lhe pediu qualquer processo e que se o arguido o tivesse pedido “teria estranhado” pois “não teria nada a ver com isso”. Disse que havia também um “processo social” do aluno, o qual é junto ao individual quando o aluno sai. No entanto no seu serviço não havia informação quanto aos processo (...)s ou psicológico. Disse também não ter conhecimento que tivesse sido utilizada uma ficha que havia no sistema informático para lançar estes dados. Destes vários depoimentos – e quando dizemos vários tem a ver com o facto de serem relativos a diferentes (...)s ou serviços e, portanto, abrangendo uma diversidade de perspectivas -, mas que não são únicos, não resultou suficientemente assente para o tribunal que o arguido C tivesse “fácil acesso” aos mesmos, ficando a saber o estado de saúde de todos os alunos, como refere o despacho de pronúncia. *** 3. (II) – Dos factos referentes ao percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX (Factos constantes de fls. 20.837 a 20.842 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “ 2 - Percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX; 2.1 – Percurso e funções do arguido A na AX; 2.2 – Percurso e funções do arguido C na AX” ): Passando ao núcleo de factos identificados no Despacho de Pronúncia como “ 2 - Percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX; 2.1 – Percurso e funções do arguido A na AX; 2.2 – Percurso e funções do arguido C na AX” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados ), uma referência prévia. A análise crítica da prova quanto a este grupo de factos é igualmente relevante e por isso será convocada, pelo menos parcialmente, para a convicção e motivação quanto aos factos que estão descrito no Despacho de Pronúncia, fls. 20.842 a fls. 20.871 e a que correspondem os pontos “78.” a “90.” dos “factos provados” (cfr. factos enunciados sob a epígrafe: “ (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A (Factos constantes de fls. 20.842 (parte final) a fls. 20.871 do Despacho de Pronuncia, descritos sob: “II – DA ACTIVIDADE CRIMINOSA: 1 – Angariação ; 2 – Dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A; 2.1 – Ofendido X (fls. 20.845 a 20.847); 2.2 – Ofendido AP (fls. 20.847 a 20.850); 2.3 – Ofendido AV (fls. 20.850 a 20.853); 2.4 – Ofendido Y (fls. 20.853 a 20.856); 2.5 – Ofendido AT (fls. 20.856 a 20.859); 2.6 - Ofendido AI (fls. 20.859 a 20.863); 2.7 – Ofendido AN (fls. 20.863 a 20.865); 2.8 – AU (fls. 20.865 a 20.876); 2.9 – Ofendido AQ (fls. 20.867 a 20.871) )”. Assim e no sentido acima explicado, quanto à metodologia seguida pelo Tribunal na estrutura da motivação e da análise crítica da prova, o Tribunal fará - na parte em que determinados factos, documentos ou depoimentos possam ser sucessivamente convocados e interligados com outros que se encontrem articulados em diferentes capítulos e que tal articulação se mostre viável nesta altura -, a análise da prova produzida tendo em atenção o sentido e o alcance da prova sob a perspectiva e sentido que emerge deste ponto “ (II) – Dos factos referentes ao percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX”, mas também e em tudo o que o Tribunal desde já configure adequado, sob a perspectiva e sentido que emerge do mencionado ponto “(III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A”. Mais tarde, quando necessário, o Tribunal convocará a análise já feita neste momento ou a completá-la se for o caso. Dada esta explicação e prosseguindo, o Tribunal deu como “Provados” os factos constantes dos Pontos “31.” a “ 77.” com base na valoração global e cruzamento entre si: 3.1. Dos documentos constantes do(s) “Apenso CQ”, “Vol. I” e do “ Vol. II”, quer quanto aos factos referente à progressão na carreira do arguido A na AX , quer quanto aos processos disciplinares que lhe foram instaurados enquanto funcionário na AX. Assim temos e no que aos documentos deste “Apenso CQ” e volumes diz respeito, que quanto aos factos relativos à progressão na carreira e avaliações ao longo da carreira, foram particularmente relevantes os documentos do “volume II”, de onde resulta que exerceu funções como: vigilante de 3/11/75 a 23/11/75 (cfr. fls. 610 e fls. 1003, início funções 949, 948) em regime eventual (fls. 819, 1.002); como empregado auxiliar de 14/2/76 a 31/12/76 (fls. 610, em 14/12/76 referido de novo como auxiliar, fls. 991 e 994) e de 12 a 31 Janeiro 1977 (fls. 819, constando a referência que em 27/1/77 é feita admissão por 20 dias, e ver fls. 990); continua como empregado auxiliar de 12/1/77 a 7/4/81 (ver que em 24/2/77, Admissão por 20 dias , fls. 989; 25/2/77, admissão do arguido como empregado auxiliar em regime de prestação eventual de serviços, fls. 988; por Desp. Ministro de 28/2/77 é admitido como Empregado Auxiliar, fls. 758 e 759, 986; em 11/11/77 é feito um Provimento para o lugar, fls. 967 e 970, tendo tomado posse em 15/12/77 até 7/4/81, com excepção do serviço militar de 4/1/78 a 14/1/80, fls. 819, mas ver que em 13/12/77 consta um Termo Posse como empregado auxiliar, cont. prestação eventual de serviços, fls. 960); tendo prestado Serviço Militar, com incorporação em 19/09/77, até 7/4/81 ( ver fls. 754, 755, 763 e 764, com a incorporação em 19/09/77, fls. 817); ingressa no quadro como Jardineiro 3ª Classe de 8/4/81 a 3/1/85 (ver Provimento/contrato do Quadro, 29/12/80, Jardineiro 3ª Classe a fls. 941, posse em 8/4/81 como Jard. 3ª classe, fls. 765, 766, 819, 936; Provimento de 29/11/84, ver tb quanto ao Início Funções na AX fls. 885; constando ainda a proposta de 24/10/84, feita pelo Dr. BQ, (...) da AX, de A para Jardineiro, fls. 887); exerce funções como Jardineiro 2ª Classe de 4/1/85 a 30/9/89 e com a categoria de Jardineiro (como operário semi-qualificado) de 1/10/89 a 31/12/90 (ver Nomeação e posse a fls. 869, 870, 873, 877, 878). É nomeado Motorista de Ligeiros em 18/2/00 (ver fls. 628, Nomeação definitiva 6/3/00, Publicado em 6/3/00 no DR., fls. 629; sendo que a fls. 640 consta uma declaração assinada pelo então (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10 de Dezembro de 1999, certificando que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenha há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondem às necessidades permanentes da instituição e na sequenciada qual foi feita a reclassificação, conforme consta a fls. 636 ), funções que exerce até à sua demissão compulsiva, que lhe é comunicada pelo (...) da Instituição em 27/09/02. A par desta progressão na carreira resulta, objectivamente, do mesmo “Apenso CQ, Volume II”, que quanto à classificação do arguido A ao longos dos anos foi de: - em 1983, BOM (fls. 611); - de 1/1/84 a 31/12/84, BOM (fls. 867); - de 1/1/85 a 31/12/85, homologada em 3/4/86, BOM, Jard. 2ª classe (fls. 848); - de 1/1/86 a 31/12/86, homologada em 7/4/87, MB, Jard, 2ª classe (fls. 837); - de 1/1/87 a 31/12/87, homologada em 29/4/88, Jardineiro 2ª Classe, MB (fls. 750); - de 1/1/88 a 31/12/88, homologada em 24/2/89, Jardineiro 2ª Classe, MB (fls. 746); - no Ano de 1989 e 1990, estando no Apenso uma informação datada de 11/10/91 (fls. 724), que por causa reintegração do arguido na sequência do Ac. do STA, pois o arguido A esteve ausente a partir de 14/10/89 e foi reintegrado em 5/6/91 (fls. 614 e 672), a proposta foi de Bom para 1988 e BOM para 1989, nota esta que veio a ser homologada pelo (...) BQ (fls. 608); - de 1/1/91 a 31/12/91, além da informação de 15/10/91 quanto o descongelamento escalões ( fls. 607), em 15/1/92 é homologada a nota do arguido, Jardineiro 2ª Classe, MB (fls. 710); - de 1/1/92 a 31/12/92, homologada em 17/2/93, Jardineiro 2ª Classe, MB (fls. 692); - de 1/1/93 a 31/12/93, homologada em 9/2/94, Jardineiro, MB (fls. 682); - de 1/1/94 a 31/12/94, homologada em 10/1/95, Jardineiro, MB (fls. 604, 674); - de 1/1/95 a 31/12/95, homologada em 29/1/96, MB (fls. 666); - de 1/1/97 a 31/12/97, homologada em 31/8/98, Jardineiro, MB (fls. 598); - de 1/1/98 a 31/12/98, homologada em 30/1/99, Jardineiro, MB (fls. 594); - de 1/1/99 a 31/12/99, homologada em 28/2/00, Jardineiro, MB (fls. 590); - de 1/1/00 a 31/12/00, homologada em 28/2/01, motorista, MB (fls. 586); - de 1/1/01 a 31/12/01, homologada em 28/2/02, Motorista, MB (fls. 582), tendo sido esta a última nota do arguido pois, como resulta dos "Factos Provados", nomeadamente do seu ponto “57.”, por despacho da Sra. Secretária de Estado da Segurança Social, datado de 19/09/02 – e proferido na sequência de processo disciplinar instaurado em 15/01/2002 -, foi aplicada ao arguido A a pena de Aposentação compulsiva (cfr. Apenso CQ, II Volume, fls. 556 e Apenso J, fls. 11 a 31). Dos documentos mencionados resulta, objectivamente, que nos anos de 1983 a 1985 o arguido A também foi classificado com “BOM” – e não apenas nos anos de 1989 e 1990, como refere o Despacho de Pronúncia . 3.2. Passando aos factos relativos aos processos disciplinares de que o arguido A foi alvo na AX, consequências desses processos, incluindo participações feitas à Polícia Judiciária de actos imputados ao arguido, foram relevantes - para além dos elementos dos já mencionados “Apenso CQ”, Vol I e Vol.II” -, os documentos do “Apenso J”, do “Apenso K” e do “Apenso L”, em particular os que o Tribunal irá enumerar. De tais documentos resulta de forma objectiva o número de Processos Disciplinares a que o arguido A foi sujeito na AX, fundamentos e sanções aplicadas. E o Tribunal diz de ”forma objectiva” pois, para o Tribunal, correspondem a cópias de documentos que pelo seu conteúdo, pela forma que apresentam e pelo modo como estão agrupados, não criaram qualquer dúvida ao Tribunal quanto à sua genuinidade, isto é, não foram criados, forjados ou (...)s nos processos e remetidos para o Tribunal, para alterarem ou desvirtuarem a verdade do que se passou, na altura e pela razão que atestam. E porque estes factos - e os documentos referentes aos processos disciplinares do arguido A - concorrem, de forma relevante, também para a compreensão de outras questões colaterais ou incidentais que o Tribunal analisou e ponderou, relativamente a outros núcleos ou aspectos da matéria que veio a dar como “provada” ou “não provada” – por exemplo e no âmbito destas questões circunstanciais, como foi possível os factos descritos em audiência de julgamento terem acontecido na AX?; como foi possível os testemunhos sucessivos e generalizado dos educadores, elementos das equipas de internamento, directores de (...)s, demais pessoal da AX , de desconhecimento de situações de abuso sobre alunos, por parte de educadores/monitores ou funcionários da AX ou da existência de restrições do arguido A no acesso a CZ; qual a natureza e conteúdo das relações entre o arguido A e arguido C? -, o Tribunal vai deixá-los desde já graficamente ex(...)s, tão esquematizados quanto nos for possível ou adequado, sendo esta uma das situações em que, como referimos no início, o Tribunal optou por fazer neste momento o tratamento dos dados como “tema autónomo”, voltando a estes dados mais à frente, quando necessário. 3.2.1. Assim e especificando – mas, como dissemos, ainda no circulo das provas e meios de prova que concorreram para a convicção do Tribunal quanto à prova dos factos relativos aos processos disciplinares -, dos autos resulta que o arguido A foi objecto dos seguintes processos disciplinares e com as seguintes consequências: (1) - Processo instaurado por Despacho do (...) (na altura HHM) de 29/02/80, para averiguações , no qual foi feito relatório datado de 25/03/80, em que o instrutor propôs a abertura de processo disciplinar ao arguido A. A abertura do processo disciplinar foi confirmado por despacho de 16/06/80 - Despacho nº 28/80 - , da Secretária de Estado da Família, Dra. AAG (cfr. Apenso CQ, vol I, fls. 303 e 308; fls. 475 a 486; e Apenso G, fls. 190 a 201). O processo disciplinar veio a ser arquivado, por caducidade dos prazos legais para realização do mesmo (cfr. fls. 525, do Apenso CQ, Vol. II, comunicação datada de 14/08/80, do então (...) da AX HHM, para o Chefe de Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Família; cfr. tb Apenso K, fls. 116, Relatório datado de 7/10/80, quanto à caducidade de um procedimento disciplinar e expressa referência ao processo crime que entretanto corria e no qual o arguido A já fora ouvido; fls. 117 e 118, comunicação datada de 21/11/80, do gabinete do (...) para consideração superior e no qual é referido a existência de dois processos distintos a correr na altura, um referente ao Inquérito mandado instaurar pelo (...) e outro disciplinar, mandado instaurar pela Sra. Secretária de Estado da Família; e cfr. Apenso G). De acordo com os elementos constantes dos autos, o processo de averiguações foi instaurado na sequência de participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, denunciando situações de abuso sexual de menores, alunos da AX, praticadas pelo arguido (cfr. fls. 303 e 308 do Apenso CQ, Vol I.; e ver tb fls. 18 a 22, 123 e 124, 145, do Apenso G ). No Despacho nº 28/80, de 16/06/80, da Secretária de Estado da Família, AAG, foi determinado que enquanto não estivesse concluído o processo o arguido A ficava impedido de entrar nos estabelecimentos em que houvessem educandos (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 488 a 490 e 953). Relacionado com este processo, em comunicação datada de 21/11/80 o (...) da AX, HHM, determinou que “… o empregado auxiliar A continuará fazendo trabalhos de jardinagem e outros na (...), com a proibição de entrar nas Secções, portanto de ter quaisquer contactos com os alunos, até total esclarecimento do “caso” que se supõe será feito através do processo a decorrer na Polícia Judiciária…” (cfr. Fls. 117 a 118, Apensp K). Como vimos, os factos que deram origem a este processo disciplinar tinham sido participados à Polícia Judiciária por GE em 22 de Maio de 1981, tendo sido instaurado o inquérito com nº. 10344/81, na 4ª Secção da 4ª Brigada da Directoria de Lisboa, o qual ainda estava pendente em 21/11/80, quando foi feito o Despacho pelo (...) HHM e que referimos (cfr. Apenso K, fls. 5 a 34, 38, 45 a 69, 72 a 74, fls. 117 a 118, fls. 120). (2) - Processo instaurado por Despacho do (...) (na altura HHN) de 11/05/84, na sequência do que por Despacho do (...) de 28/6/84, foi aplicada ao arguido A a pena de repreensão escrita, ficando o arguido A igualmente proibido de participar em quaisquer actividades da Secção de CZ, desde que nelas estejam incluídos alunos (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119 ). O arguido C, na altura Técnico superior de 2ª, foi instrutor deste processo (cfr. Apenso K, fls. 356 e 356 vº). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, pelo facto de o arguido ter estado a jogar à bola com alunos de CZ, quando estava interditado de o fazer (cfr. Apenso K, fls. 356 vº; fls. 357 a 359 vº, Relatório; fls. 373, participação de GE datada de 3/5/84; fls. 374, Comunicação do (...) do (...) para os Serviços administrativos, na altura BQ, datada de 10/10/83, a determinar, entre o mais, a proibição de A frequentar quaisquer instalações da secção de CZ ). (3) - Processo instaurado por Despacho do (...) de 28/10/85 - autuação em 22/11/85 - na sequência do que por Despacho do (...) (na altura HHN) de 15/1/86, foi aplicada ao arguido A a pena de multa 5.000$00, suspensa por 2 anos e mais tarde amnistiada (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832, 850; Apenso K, fls. 320, 321; Apenso L, fls. 59, 119). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada por um aluno, de o arguido A ter-lhe chamado “filho da puta” (cfr. Apenso K, fls. 317 a 319, 347); (4) - Processo instaurado por Despacho do (...) de 17/11/86, na sequência do que por Despacho do (...) (na altura já Dr. BQ) de 2/2/87, foi aplicada ao arguido A a pena multa 5.000$00 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119 ); O arguido C, na altura Técnico superior de 1ª, foi instrutor deste processo (cfr. Apenso L, fls. 48, 50 a 51, 56, 61). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de participação feita no dia 24/9/86, por GE, Professor da Secção de CZ, por o arguido A, no dia 23/9/86, entre as 20 e as 21 horas, ter entrado em CZ, desobedecendo o Despacho do (...) do (...) de 10/10/83 e de que tomara conhecimento em 11/10/83, que o proibia de entrar em CZ, salvo motivo de serviço (cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; 56; 65, Despacho de Dr. BQ, datado de 10/10/83, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, a determinar a proibição do arguido A entrara em CZ, com excepção de motivo de serviço; fls. 66, comunicação feita ao arguido A da proibição, assinada por este; fls. 67, comunicação feita em 24/09/86 por GE ); (5) - Processo instaurado por Despacho do (...) de 23/02/88, na sequência do que por Despacho do (...) (na altura Dr. BQ ) de 4/7/88, foi aplicada ao arguido A a pena de 30 dias aposentação do serviço (cfr. fls. 287, do Apenso CQ, Vol. I, resultante do Pº disciplinar mandado instaurar por Despacho do (...) de 23/2/88; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805; cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). O arguido C, na altura Técnico Superior de 1ª, foi instrutor deste processo (cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada por um funcionário da AX contra o arguido A, por agressão durante as horas de serviço (cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). (6) - Processo instaurado por Despacho do (...) datado de 29/05/89, na sequência do que, por Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4/10/89 (sendo na altura (...) Dr. BQ, cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 35), o arguido foi demitido compulsivamente. O arguido recorreu da decisão para o S.T.A., o qual, por Acórdão do S.T.A., datado de 16/04/91, anulou o despacho do Secretário de Estado que aplicara a pena disciplinar de demissão compulsiva ao arguido, vindo este a ser reintegrado por despacho do (...) (Dr. BQ) de 5/06/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; bem como fls. 193, 213 a 218, 223 a 231, quanto aos factos especificamente descritos no ponto “52.”, do "Factos Provados" ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido ). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada pela mãe de um aluno ao Director do CZ, imputando a “nota de culpa” comunicada ao arguido, em súmula, ter o arguido mantido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...); ter dado dinheiro a dois alunos para comprarem rebuçados, bolos e revistas; ter tomado banho com um aluno na Cave da (...), mostrado revistas pornográficas, praticado actos de masturbação (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17; fls. 115, 116/117 e 195, do Apenso CQ, Vol. I, correspondentes à carta que em Maio de 1989 é escrita pela mãe do aluno (…), para a professora HHO, por factos relacionados com contactos do seu filho com o arguido A, aí referido como “(…)” e ao ofício de fls. 115, que o Director do (...) e CZ, na sequência de tal carta, envia em 26/5/89 para o (...)). (7) - Processo instaurado por Despacho do (...) de 12/10/01 (Dr. BQ), na sequência do que por Despacho do (...) de 27/12/01, foi aplicada ao arguido A a pena de multa, graduada em 100.000$00 (cfr. Apenso L, fls. 70 vº, 71 a 78, 88, 89 ; e cfr., também quanto a este processo, Apenso CQ, fls. 619 e 617; e Apenso J, fls. 58 a 86, o qual descreve a tramitação e percurso do processo instaurado). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada pelo mecânico HHP, funcionário da AX, contra o arguido A, por agressão durante as horas de serviço (cfr. Apenso L, fls. 91). (8) - Processo instaurado por Despacho do (...) de 15/01/02 (Dr. BQ), na sequência do que por Despacho da Secretária de Estado da Segurança Social, datado 19/09/02, foi aplicada ao arguido A a pena de aposentação compulsiva (cfr. Apenso L, fls. 184 a 185, 197, 200, 209). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada pela mãe do aluno da AX U, contra o arguido A, pela prática de actos de natureza sexual/abuso sexual na pessoa do seu filho (cfr. Apenso L, fls. 209, 210 a 213; Apenso CQ, Vol. II, fls. 556 e Apenso J, fls. 11 a 31, de onde constam os documentos e comunicações efectuadas dentro da AX, para a instauração do processo e respectivos motivos, tal como o Tribunal veio a dará como provado). Foi instrutora do Processo a testemunha ouvida em audiência de julgamento e Directora do (...) FA, Dra. BN (cfr. Apenso L, fls. 209). Há que dizer que foi por causa dos factos deste processo que a mãe do então menor U apresentou a queixa a que se refere o ponto “58.” dos "Factos Provados", como objectivamente resulta do “Apenso CI” dos autos. 3.3. Referindo agora (e tratando) alguns aspectos particulares dos factos que o Tribunal deu como “Provados” nos Pontos “59.” a “ 70.” , o Tribunal fundou globalmente a sua convicção nos documentos/meios de prova que acabou de referir, quando enunciámos e descrevemos a motivação/fundamentação da matéria de facto/e dos factos relativa(os) à progressão na carreira do arguido, classificação, processos disciplinares e sanções aplicadas . No entanto tiveram especial expressão alguns elementos que o Tribunal vai particularizar. Como vimos no ponto 3.1. (que antecede e conjugado também com o ponto “3.2”), até 31/12/01 o arguido A foi progredindo gradualmente na sua carreira. O Tribunal considera esta data, 31/12/01, por ter sido a do momento da última nota atribuída ao arguido pois, como já vimos, por Despacho da Sra. Secretária de Estado da Segurança Social, datado de 19/09/02 e proferido na sequência de processo disciplinar instaurado em 15/01/2002 (aquele que teve origem na queixa apresentada pela mãe do educando U, cfr., por exemplo, “Apenso CI” e “Apenso L” fls. 209, 210 a 213), foi aplicada ao arguido A a pena de Aposentação compulsiva, não tendo tido, em consequência, qualquer nota após o Ano de 2001 (cfr. Apenso CQ, II Volume, fls. 556 e 582; Apenso J, fls. 11 a 31; Apenso L, fls. 184 a 185, 197, 200, 209, 210 a 213). Assim, temos que o arguido progrediu gradualmente de vigilante em Novembro de 1975, eventual (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 610 e fls. 1003, início funções 949, 948, fls. 819, 1.002), a empregado auxiliar, funções que exerceu de 1976 a Abril de 1981, sendo de notar que de 4/1/78 a 14/1/80 prestou o serviço militar e, portanto, não exerceu funções na AX (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 610, em 14/12/76 referido de novo como auxiliar, fls. 991 e 994; fls. 819, constando a referência que em 27/1/77 é feita admissão por 20 dias, fls. 990; e ver que em 24/2/77 consta a sua Admissão por 20 dias, fls. 989; em 25/2/77 a admissão do arguido como empregado auxiliar em regime de prestação eventual de serviços, fls. 988; por Desp. Ministro de 28/2/77 é admitido como Empregado Auxiliar, fls. 758 e 759, 986; em 11/11/77 é feito um Provimento para o lugar, fls. 967 e 970, tendo tomado posse em 15/12/77 até 7/4/81; estando referido a excepção da prestação de serviços durante o período do serviço militar de 4/1/78 a 14/1/80, fls. 819). Em 8/4/81 ingressa no quadro como Jardineiro 3ª Classe, que exerce até 3/1/85 (ver, no Apenso CQ, Vol. II, Provimento/contrato do Quadro, 29/12/80, Jardineiro 3ª Classe a fls. 941, posse em 8/4/81 como Jard. 3ª classe, fls. 765, 766, 819, 936, bem como o Provimento de 29/11/84 e tb quanto ao Início Funções na AX, o fls. 885; constando ainda a proposta de 24/10/84, feita pelo Dr. BQ, (...) da AX, de A para Jardineiro, fls. 887). No entanto a fls. 919, do Apenso CQ, Vol. II, consta um ofício do Director de CZ para o (...), ofício este datado de 14/10/82, em que por despacho do (...) o arguido A passa a colaborar como ajudante de motorista na (...), até à transferência de um outro funcionário para esse lugar, transferência esta que estava em curso. Exerce funções como Jardineiro 2ª Classe de 4/1/85 a 30/9/89 e com a categoria de Jardineiro (como operário semi-qualificado) de 1/10/89 a 31/12/90 (cfr. Apenso CQ, Vol II, quanto à sua Nomeação e posse a fls. 869, 870, 873, 877, 878). Mas por Despacho do (...) da AX de 3/04/89, na sequência de informação e proposta datada de 19/12/88, feita pelo arguido C, na qualidade de Técnico Superior de 1ª, para vigorar a partir de 2/01/89 e para fazer face a necessidades concretas de serviço - e referindo nessa informação o facto de, quando chamados para serviços auxiliares, e os “chamados” eram um funcionário HHQ e o arguido A, invocam que são “…ajudantes de motorista, que é jardineiro e não carregadores, enfim, toda uma série de observações que acabam por aborrecer, quando não mesmo atingem proporções de impertinência…”-, o arguido A fica com as “funções de ocorrer a todos os serviços auxiliares da (...) e, sempre que necessário, executar o que lhe for determinado no âmbito dos serviços de transporte…”, passando a constar do “mapa semanal de transportes” que era feito pelo Serviço de Transportes e Logística, com a indicação do serviço atribuído. É nomeado Motorista de Ligeiros em 18/2/00 (ver, neste sentido, o Apenso CQ, Vol. II, fls. 628, com Nomeação definitiva em 6/3/00, Publicada em 6/3/00 no DR., fls. 629; sendo que a fls. 640 consta uma declaração assinada pelo então (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10 de Dezembro de 1999, certificando que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenha há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondem às necessidades permanentes da instituição e na sequenciada qual foi feita a reclassificação, conforme consta a fls. 636 ), funções que exerce até à sua demissão compulsiva, que lhe é comunicada pelo (...) da Instituição em 27/09/02. Cruzando com esta progressão - gradual e no sentido ascendente dos várias escalões que compõem a carreira da categoria atribuída -, temos as classificações que o arguido foi obtendo ao longo dos anos e que já enumerámos no ponto “3.1.” (que antecede). 3.3.1. No entanto, entrecruzando estes dois elementos “progressão nos escalões e categorias da carreira” e “classificação anual”, com os processos disciplinares a que o arguido foi sujeito - e com os documentos de fls. 534 a 554 e 563 a 577, do Apenso CQ, Vol. II, referentes à remuneração do arguido A, de 1976 a 2002 e dos quais resulta que o arguido, neste período, foi gradual e anualmente aumentado -, o Tribunal concluiu que apesar da prática de actos por parte do arguido, no exercício das suas funções, que o pudessem fazer incorrer em responsabilidade disciplinar e que, efectivamente, o fizeram incorrer nessa responsabilidade, conforme vemos pelas sanção que lhe foram efectivamente aplicadas, tal não se reflectiu na progressão na carreira, na classificação que foi obtendo e na forma como o arguido estava e movia dentro da AX. E esta conclusão resultou, desde logo, dos próprios documentos que, ao longo do tempo, foram sendo produzidos na AX, os quais permitiram ao Tribunal reconstituir uma parcela da vida da Instituição e da vida do arguido na instituição ao longo, pelo menos, de um período de cerca de 25 anos e aperceber-se do que foi o ambiente e o contexto, em que se passaram os factos que o Tribunal veio a dar como provados. Assim, vejamos o percurso seguido pelo Tribunal: (1) - Em 29/02/80, por Despacho do então (...) (HHM) é instaurado um processo para averiguações ao arguido A. Dá lugar a abertura de processo disciplinar – que veio a ser confirmado por despacho de 16/06/80, Despacho nº 28/80 , da Secretária de Estado da Família, Dra. AAG (cfr. Apenso CQ, vol I, fls. 303 e 308; fls. 475 a 486; e Apenso G, fls. 190 a 201), o qual veio a ser arquivado, por caducidade dos prazos legais para a sua realização (cfr. fls. 525, do Apenso CQ, Vol. II, comunicação datada de 14/08/80, do então (...) da AX HHM, para o Chefe de Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Família; fls. 117 e 118, do Apenso K; e Apenso G). O processo de averiguações foi instaurado na sequência de participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, denunciando situações de abuso sexual de menores, alunos da AX, praticadas pelo arguido (cfr. fls. 303 e 308 do Apenso CQ, Vol I.). No Despacho nº 28/80, da Secretária de Estado da Família, AAG, foi determinado que enquanto não estivesse concluído o processo o arguido A ficava impedido de entrar nos estabelecimentos em que houvessem educandos (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 488 a 490 e 953). Mas resulta dos autos que em 21/01/80 – e por causa de factos relacionados e da mesma natureza dos que vieram a dar origem a este processo disciplinar -, o Director da secção de CZ tinha decidido proibir a entrada de A naquela secção, pedindo ao (...) da altura (HHM), que confirmasse a decisão de proibição de entrada do arguido na secção de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 428 a 430). Posteriormente e por comunicação datada de 21/11/80, o (...) da AX, HHM, determinou que “… o empregado auxiliar A continuará fazendo trabalhos de jardinagem e outros na (...), com a proibição de entrar nas Secções, portanto de ter quaisquer contactos com os alunos, até total esclarecimento do “caso” que se supõe será feito através do processo a decorrer na Polícia Judiciária…” (cfr. Fls. 117 a 118, Apensp K). Os factos que deram origem a este processo disciplinar foram, como vimos, participados à Polícia Judiciária por GE em 22 de Maio de 1981, tendo corrido inquérito com nº. 10344/81, na 4ª Secção da 4ª Brigada da Directoria de Lisboa (cfr. Apenso K, fls. 5 a 34, 38, 45 a 69, 72 a 74; cfr. Tb fls. 303 e 308 do Apenso CQ, Vol I.; e ver tb fls. 18 a 22, 123 e 124, 145, do Apenso G). (1.1) Como vimos, o processo disciplinar não teve consequências a esse nível, uma vez que por caducidade não chegou ao fim e o Inquérito da P.J. - de acordo com os elementos dos autos relativamente ao mesmo e já enumerados -, também não teve conclusão neste ano de 1980 nem no seguinte (cfr. Apenso K, fls. 120; cfr. fls. 525, do Apenso CQ, Vol. II, comunicação datada de 14/08/80, do então (...) da AX HHM, para o Chefe de Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Família; cfr. tb Apenso K, fls. 116, Relatório datado de 7/10/80, quanto à caducidade de um procedimento disciplinar e expressa referência ao processo crime que entretanto corria e no qual o arguido A já fora ouvido; fls. 117 e 118, comunicação datada de 21/11/80, do gabinete do (...) para consideração superior e no qual é referido a existência de dois processos distintos a correr na altura, um referente ao Inquérito mandado instaurar pelo (...) e outro disciplinar, mandado instaurar pela Sra. Secretária de Estado da Família; e cfr. Apenso G). No entanto este período de 1980/1981, correspondeu aquele em que o arguido passou de “eventual” ou “auxiliar” e ingressa no quadro como Jardineiro de 3ª classe (cfr. Apenso CQ, Vol. II, ver Provimento/contrato do Quadro, 29/12/80, Jardineiro 3ª Classe a fls. 941, posse em 8/4/81 como Jard. 3ª classe, fls. 765, 766, 819, 936; Provimento de 29/11/84, ver tb quanto ao Início Funções na AX fls. 885; constando ainda a proposta de 24/10/84, feita pelo Dr. BQ, (...) da AX, de A para Jardineiro, fls. 887) . O Provimento para a passagem do arguido para o “quadro” é assinado em 29/12/80 pelo (...) HHM. Sendo que em Março desse ano e numa carta (datada de 20/03/80) que dirigiu ao instrutor do processo que estava a correr contra o arguido A - processo este instaurado na sequência de Despacho do (...) de 29/02/80, a determinar um processo para averiguações ao arguido -, o (...) manifestou a sua opinião quanto à “razão” dos “… factos surgidos ultimamente e de que o caso do empregado auxiliar A é um dos da série…”, formulando “… o parecer de que se trata de orquestração preparada no sentido de criar uma desestabilização institucional, tal como acontece com outros Organismos do Estado…”, descrevendo o que, na sua perspectiva, era o ambiente e situação institucional da AX e deixando emergir discordâncias que tinha com o Professor GE, notando “… que durante todo este tempo e com tantos problemas que houve na Secção o mestre GE só encontrou o caso de A para apresentar…” (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 441 a 445). Conjugando estes elementos: - o teor da carta de fls. 441 a 445, do Apenso CQ Vol. II; - com o Provimento do (...) para o ingresso do arguido A no quadro da AX; - tendo em atenção que embora em Dezembro de 1980 (altura em que o (...) decide que o arguido A entre para o quadro da AX) o processo disciplinar tinha sido arquivado por caducidade mas ainda estava em curso o processo de inquérito na P.J.; - e que em 21/11/80 (cerca de três semanas antes do Provimento do (...), para o ingresso do arguido A no quadro da AX) o (...) HHM proferira o despacho que proibia o arguido A de “entrar nas secções” e de “ter qualquer contacto com os alunos”, até esclarecimento dos factos que estava a ser feito no inquérito da PJ - cfr. Apenso K, fls. 117/118; e sem esquecer o teor do documento de fls. 231 e 232 do Apenso K , datado de 31/12/79, em que a “Comissão Directiva da secção de CZ” e na proximidade do regresso do arguido A para o exercício de funções (estando nos autos o pedido do arguido A, datado de 26/12/79, para ser transferido para o serviço de lubrificação e lavagem de viaturas, cfr. Fls. 234, do apenso K), comunicou ao (...) preocupação com a permanência do arguido A como funcionário auxiliar na Secção de CZ, por tal implicar proximidade com os alunos, pedindo a sua transferência para outro serviço fora da instituição, que já no ano anterior tinham pedido a tomada de medidas ao (...) e este nada tinha determinado, concluindo que esperavam que o novo alerta não fosse “ em vão” -; o Tribunal considerou que houve, por parte do (...) da AX, pelo menos uma desvalorização da segurança, dos riscos e consequentemente dos interesses dos educandos da AX. Mas notamos, contudo, o seguinte. O Tribunal está a valorar em 2010, uma acção que o (...) da AX tomou em 1980. Por força do artº 127º, do C.P.Penal, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, mas não pode ser desfocada do “tempo” e das circunstâncias que por força “desse tempo” rodearam a realidade que está a ser apreciada. Assim, o Tribunal tem que avaliar, valorar e aferir os factos, actuações e comportamentos – seja nesta situação, seja em qualquer outra que conste do objecto do processo -, de acordo com a experiência e livre convicção dos Juízes que estão a decidir a prova, mas sem perder a perspectiva do tempo e da realidade da sociedade, seus princípios e valores, em que os factos ocorreram. Os direitos dos menores – e no caso concreto dos menores institucionalizados -, o “superior interesse da criança”, o conceito de “risco” e o sentido de prevenção e protecção dos menores contra actos que possam afectar a sua formação, liberdade e autodeterminação sexual, são figuras, conceitos e princípios que têm tido diferente tutela e conteúdo ao longo dos tempos. Tudo isto permite “perceber” e por vezes concluir, porque é possível que determinados comportamentos ou factos podem ter ocorrido em determinado momento, quando à “luz” dos valores dos nossos dias, ou analisando os seus protagonistas como se apresentam no “dia de hoje”, isso possa “parecer” remoto ou mesmo inverosímil. O que, no caso concreto, foi procedimento que o Tribunal teve presente ao longo da análise e valoração da prova. (1.2) Regressando à exposição do percurso seguido na análise crítica da prova - relacionada com o tema “progressão na carreira” do arguido A, incluindo o “exercício de funções”, “forma como as exerceu” e seu relacionamento, forma e “modo de estar” dentro da AX e com os funcionários da AX – e interligando com o que se acabou de dizer quanto à valoração das “circunstâncias” e do “tempo” em que ocorreram os factos e as acções, a actuação do (...) HHM ao ter determinado – nas circunstâncias já referidas - o ingresso do arguido A no quadro da AX significou para o Tribunal, como dissemos, pelo menos uma desvalorização e sub-avaliação da segurança e consequentemente dos interesses dos educando da AX. Mas no “tempo” em que ocorreu este “facto” – e isso é perceptível não só pelo conteúdo da já citada “exposição” do (...) HHM (a que se refere o documento de fls. 441 a 445, do Apenso CQ Vol. I), mas também por todo o teor do Despacho nº 28/80, de 16/06/80, da então Secretária de Estado, Sra. Dra. AAG (e que se encontra a fls. 953 a 955, do Apenso CQ, Vol. II) -, os problemas internos da AX quanto à ordem, Direcção e disciplina eram vários e em vários sentidos, não só no campo da educação e dia a dia dos alunos, mas também com os (...) e demais funcionários (ver, também, como depoimentos esclarecedores da situação de desorganização, indisciplina e de despiste de problemas com que a instituição se defrontava nesta altura, o depoimento da testemunha WE, actualmente técnico superior na AX, mas que entrou em 1974 e entre 1980 e 1998 foi educador em EY). E quando falamos dos problemas no campo da educação e dia a dia dos alunos – que o Despacho da Sra. Secretária de Estado de 1980 refere sob a expressão “ problemas pedagógicos e educativos” -, incluímos o que, como se depreende da comunicação que em 22/07/82 o Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família veio fazer para a Directoria (…) da PJ - dizendo que os Jardins (…) estavam “infestados de homossexuais que procuram aliciar os menores a cargo da AX”, pedindo que a P.J. proceda ao “ desenvolvimento das acções necessárias a fim de evitar a continuação desta situação” -, eram então, também, os problemas com fugas de alunos da AX, relacionadas com a chamada “corrupção de menores” (cfr. “Apenso T”, fls. 27, documento(s) referente(s) ao Inquérito nº 16.868/82, que correu termos na P.J.; fls. 20 a 24, 25, 26 e 27, documentos estes que dizem respeito ao Inquérito nº 16.868/82, que correu termos na polícia Judiciária, sendo que o ofício da AX de fls. 20, do “Apenso T”, datado de 19/03/82, foi subscrito pelo então (...) da AX, HHR; cfr. Documento de fls. 37.172/37.173, tb no Apenso T, fls. 25 e 26, ofício subscrito pelo Dr. BQ, na altura na qualidade de (...) do (...) e testemunha ouvida nos autos). Concorrente para a sustentação da conclusão que antecede foi o depoimento do Dr. BQ – que, como já referido, declarou ao Tribunal ter sido (...) da AX de Abril de 1986 a Novembro de 2002, embora tenha ingressado na AX em 1968 como educador, tendo exercido as funções de Educador no (...) EY até 27/10/74, altura em que saiu para o Serviço militar; regressou à AX em 1/3/76, ainda com as funções de Educador, em Agosto de 1976 passa a exercer funções na (...), como Chefe da Secretaria Geral e em 1982 passa a exercer as funções de (...) (...) -, o qual e no âmbito dos esclarecimentos que prestou quanto à vivência dos alunos da AX, existência ou inexistência de problemas de disciplina, prostituição ou comportamentos relacionados, disse ao Tribunal que em 1981/1982 estes problemas deixaram “de existir” de forma “visível”, mas até ali eram um problema na instituição. No entanto – e dizendo, desde já, que os documentos que a seguir indicaremos foram, também, particularmente relevantes para a prova dos factos dados como “provados” nos pontos “39.” a “43.” -, cruzando e valorando o depoimento da testemunha Dr. BQ, nesta parte, com a comunicação que em 22/07/82 o Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família remeteu para a Directoria (…) da PJ, que já referimos e na qual dizia que os Jardins (…) estavam “infestados de homossexuais que procuram aliciar os menores a cargo da AX”, pedindo que a P.J. procedesse ao “ desenvolvimento das acções necessárias a fim de evitar a continuação desta situação” (cfr. Apenso T, fls. 27, documento(s) referente(s) ao Inquérito nº 16.868/82, que correu termos na P.J.; fls. 20 a 24, 25 e 26 , documentos estes que dizem respeito ao Inquérito nº 16.868/82, que correu termos na polícia Judiciária, sendo que o ofício da AX de fls. 20, do “Apenso T”, datado de 19/03/82, foi subscrito pelo então (...) da AX, HHR), com o teor do documento de fls. 37.172 a 37.173 (com que a testemunha Dr. BQ foi confrontado em audiência de julgamento e que se encontra também a fls. 25 e 26, do “Apenso T”) e que corresponde a uma carta que o Dr. BQ, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, dirigiu em 2/09/82 para o Director da Polícia judiciária, por causa da comunicação que a Secretaria de Estado da Família tinha feito para a PJ, “… de ocorrências graves que repetidamente se vêm verificando envolvendo alunos da secção de DT da AX e que se prendem com a corrupção de menores… ” - e fazendo a comunicação da fuga do aluno interno HHS, “ um dos intervenientes nas ocorrências anteriormente comunicadas”, tendo esclarecido em audiência de julgamento que esta era uma segunda fuga do HHS -, o Tribunal concluiu que, pelo menos, em Setembro de 1982 este problemas ainda eram, forçosamente, perceptíveis e visíveis na Instituição. Esta conclusão é sustentada pelo teor do ofício enviado pela testemunha, pois caso a situação não fosse actual e visível na instituição, não fazia sentido ter utilizado a expressão que usou na comunicação para a P.J., de “… ocorrências graves que repetidamente se vêm verificando envolvendo alunos da secção de DT da AX e que se prendem com a corrupção de menores…”. Contudo isto não quis dizer que a testemunha estivesse a mentir. O depoimento do Dr. BQ nesta parte e o que a sua memória ainda lhe conseguiu dizer quanto “aquele tempo” – quando disse recordar-se que em 1981/1982 estes problemas já tinham deixado “de existir” de forma “visível”, mas até ali eram um problema na instituição -, quando o tribunal concluiu que pelo menos em Setembro de 1982 estes problemas ainda ocorriam e de forma “visível”, pode ser explicado pela atitude de “desvalorização” ou “desconsideração” que a Instituição, na pessoa dos seus dirigentes, educadores ou demais funcionários, na altura fazia da gravidade de algumas condutas para a boa formação, saúde e crescimento do jovens que estavam em internato. O que, naturalmente, pode interferir no que hoje a testemunha consegue “buscar” na sua memória, como as “coisas” mais importantes. Para o Tribunal é esta a explicação. Assim - e reconduzindo-nos à questão da “desvalorização” de riscos que existiu dentro da AX -, o entendimento do Tribunal é que houve “desvalorização”, mas não deixámos de ter em atenção o contexto institucional em que ocorreu. Acresce, relacionado com o que antecede, que o sentido e consciência da sociedade em relação a actos de natureza sexual praticados em/com menores, expressava-se, pelo menos parcialmente, na punição criminal a que era reconduzida, com uma relevância e ressonância social inferior há que tem tido nos últimos dez anos. E isto, para o Tribunal, reflectiu-se ao longo do tempo na forma como a AX viveu e conviveu com a prática, intra muros, de actos desta natureza ou com a possibilidade dessa prática. (2) - No Ano de 1982 e no Ano de 1983 o arguido não tem qualquer processo disciplinar. Por Despacho do (...) (na altura HHR) datado de 14/10/82, o arguido A passa a colaborar como ajudante de motorista na (...), até à transferência de um outro funcionário (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 919; ). Mas nesse mesmo ano de 1982 (em 22/11/82) o Dr. BQ, então (...) do (...) para os serviços administrativos, faz uma comunicação “Confidencial” para o (...) da altura (HHR), demonstrando, na perspectiva do Tribunal, alguma preocupação em relação a uma nomeação definitiva que estaria em causa do arguido A – por este ter pendentes processos crime por causa de “corrupção de menores”, dizendo contudo que até aquele momento nada se provara no processo disciplinar instaurado – e levantando a possibilidade de a nomeação do arguido ser feita apenas a título provisório. Nesta altura, 1982, o inquérito na Polícia Judiciária estava ainda em curso, mas o processo disciplinar instaurado em 29/02/80 - em que fora feito o relatório de 25/03/80 e proferido o Despacho da Secretária de Estado, Dra. AAG nº 28/80 (cfr. Apenso CQ, vol I, fls. 303 e 308, fls. 475 a 486; Apenso G, fls. 190 a 201; fls. 525, do Apenso CQ, Vol. II, comunicação datada de 14/08/80, do então (...) da AX HHM, para o Chefe de Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Família; fls. 117 e 118, do Apenso K; e Apenso G) -, já tinha sido arquivado por caducidade dos prazos legais para a sua realização. Daí que, em rigor – e isto também extensivo a 1983 -, o conteúdo desta comunicação em 1982 não possa ser valorado para efeito de qualquer ressonância na avaliação que foi feita ao arguido em 1983 – isto é, não se pode em rigor defender que a AX pudesse fundamentar em tais factos, no sentido negativo, a avaliação que veio a fazer do arguido em 1983 -, sendo no entanto esta “comunicação” apreendida pelo Tribunal, como a constatação de uma “preocupação” que o Dr. BQ teve nessa altura, numa nomeação que viesse a ser feita ao arguido A enquanto o processo crime estivesse pendente. Mas a constatação desta “preocupação”, com a percepção/conhecimento da situação que estaria por detrás desta “preocupação”, foi no entanto relevante para a avaliação que o Tribunal veio a fazer das declarações prestadas em Audiência de julgamento pelo Dr. BQ – que veio a ser (...) da AX -, em relação ao arguido A, Daí o Tribunal estar a assinalá-la desde já. (2.1) Mas já foi relevante para o tribunal - para compreender o que era e como era a estrutura e a vivência da AX como Instituição e a forma como foi sendo feita a avaliação do Desempenho do funcionário A ao longo dos anos -, o ofício que em 10/10/83 o (...) do (...), Dr. BQ, faz para o Chefe dos Serviços Gerais e Económicos, na qual comunica que desde o início desse mês de Outubro deixou existir a volta do pão e do correio, o arguido A, que vinha exercendo funções ajudante motorista, deixa estar afecto ao serviço de transportes, regressa ao trabalho de jardineiro e NÃO pode frequentar as instalações de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 488 a 490 e Apenso CQ, Vol. II, fls. 908, 953). E é relevante porque o Dr. BQ refere expressamente, nesta comunicação, o deficiente cumprimento que o arguido vinha a fazer dessa ordem – proibição de entrar em CZ, decorrente do Despacho de 16/06/80 (Despacho nº 28/80) da Secretária de Estado da Família, Dra. AAG, que determinava que “… enquanto não estivesse concluído o processo o arguido A ficava impedido de entrar nos estabelecimentos em que houvessem educandos…” (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 488 a 490 e Apenso CQ, Vol. II, fls. 908, 953) –, determinando o então (...) do (...) que o funcionário A fosse informado que estava proibido de frequentar quaisquer instalações da secção de CZ e a desobediência a essa proibição seria punida com infracção disciplinar . Se o arguido vinha fazendo um “deficiente” cumprimento de uma ordem, se essa “deficiência” do cumprimento foi suficientemente forte para o Dr. BQ sentir a necessidade de, no seu despacho de 10/10/83, advertir expressamente o arguido que a desobediência a essa proibição seria punida com infracção disciplinar, é porque, do ponto de vista do cumprimento de todos os deveres a que o arguido A estava sujeito enquanto funcionário da AX, no Ano de 1983 não o fez com o zelo e cuidado a que um funcionário estaria sujeito e que lhe seria exigível (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119).. E isso, sim, é facto que o Tribunal pode valorar, para efeito da avaliação da ressonância que o cumprimento/ou não cumprimento dos deveres por parte do arguido A, enquanto funcionário da AX, teve na sua avaliação. Não obstante a comunicação que antecede, em Outubro de 1983, neste Ano de 1983 o arguido é classificado com BOM (cfr. fls. 611, Apenso CQ, Vol II). Para o Tribunal neste ano houve “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita, uma vez que foi avaliado com Bom. (3) - No Ano de 1984, por Despacho do (...) de 11/05/84 é instaurado um segundo processo disciplinar ao arguido. Na sequência do Despacho do (...) de 28/6/84, foi aplicada ao arguido a pena de repreensão escrita, mas ficando o arguido A igualmente proibido de participar em quaisquer actividades da Secção de CZ, desde que nelas estejam incluídos alunos (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119;). O processo foi instaurado na sequência de participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, por o arguido A ter estado a jogar à bola com alunos de CZ, quando estava interditado de o fazer (cfr. Apenso K, fls. 356 vº; fls. 357 a 359 vº, Relatório; fls. 373, participação de GE datada de 3/5/84; fls. 374, Comunicação do (...) do (...) para os Serviços administrativos, na altura BQ, datada de 10/10/83, a determinar, entre o mais, a proibição de A frequentar quaisquer instalações da secção de CZ) Como vimos no ponto anterior, por Despacho do (...) (...) Dr. BQ, datado de 10/10/83 - e em que o Dr. BQ referia concretamente que o arguido vinha fazendo um cumprimento deficiente da proibição e, portanto, transmitindo a ideia de que não se tratou de uma desobediência pontual, mas de uma atitude repetida, como acentuámos -, fora expressamente dito ao arguido que tinha mesmo que cumprir a ordem existente e, por estar proibido de frequentar quaisquer instalações da secção de CZ, se desobedecesse a essa proibição seria punida com infracção disciplinar (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119). No entanto, passados seis meses após esta “advertência”, em Maio de 1984, estava a ser aberto o processo disciplinar ao arguido, pela violação da proibição para a qual fora advertido. (3.1) Mas apesar de ter sofrido a punição disciplinar que antecede - e nas circunstâncias em que cometeu a infracção disciplinar -, cerca de cinco meses mais tarde, em 24/10/84, o Dr. BQ (na altura ainda na qualidade de (...) do (...) para os serviços administrativos) propõe ao então (...) a promoção do arguido A para Jardineiro de 2ª classe (o arguido tinha obtido a classificação de 10 valores no concurso), referindo mesmo o sentido de com tal proposta proporcionar o “justo direito à promoção” (Apenso CQ, Vol. II, fls. 887). Neste Ano de 1984 o arguido foi classificado de BOM (homologação em 19/3/85; cfr. Fls. 867, Apenso CQ, Vol II), ano em que tinha sido punido com uma pena de repreensão escrita, no âmbito de um processo disciplinar instaurado por desobediência a uma ordem de interdição de CZ – e para o que fora expressamente advertido seis meses antes, que se desobedecesse novamente a essa ordem de proibição seria punido disciplinarmente -, processo este em que é, de novo, determinada/reforçada a proibição de o arguido A participar em actividades da secção de CZ, em que estivessem incluídos alunos. E viu, ainda, ser proposta a sua promoção e com o sentido de com tal proposta proporcionar o “justo direito à promoção”, que se efectivou (Apenso CQ, Vol. II, fls. 887). Para o Tribunal houve (também) neste ano, “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita, continuando a ser classificado com Bom. (4) - No ano seguinte, em 1985, por Despacho do (...) de 28/10/85 - autuação em 22/11/85 – é instaurado outro processo disciplinar. No âmbito desse processo, por Despacho do (...) (na altura HHN) de 15/1/86, foi aplicada ao arguido A a pena de multa 5.000$00, suspensa por 2 anos e mais tarde amnistiada (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832, 850; Apenso K, fls. 320, 321; Apenso L, fls. 59, 119). Este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada por um aluno, de o arguido A ter-lhe chamado “filho da puta” (cfr. Apenso K, fls. 317 a 319, 347). Neste Ano de 1985 o arguido foi classificado de BOM (homologação em 3/04/86; cfr. Fls. 848, Apenso CQ, Vol II), ano em que - e tal como no ano de 1984 -, tinha sido objecto de processo disciplinar, que terminou em punição, embora posteriormente amnistiada. Houve, para o Tribunal, “desconsideração” e “desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita, continuando a ser classificado com Bom. (5) - No Ano de 1986 é instaurado novo processo disciplinar ao arguido – desta vez por Despacho do (...) de 17/11/86 -, processo em que, por Despacho do (...) (Dr. BQ) de 2/2/87, foi aplicada ao arguido A a pena multa 5.000$00 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119); Este processo foi instaurado na sequência de nova participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, por o arguido A, no dia 23/9/86, ter entrado em CZ, desobedecendo o Despacho do (...) do (...) de 10/10/83. Este Despacho, como resulta dos documentos dos autos e já vimos, fora notificado ao arguido A em 11/10/83, proibia-o de entrar em CZ salvo motivo de serviço, sendo feita a menção expressa que se não obedecesse a esta ordem, seria objecto de punição disciplinar (cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; fls. 56 e fls. 65, Despacho de Dr. BQ, datado de 10/10/83, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, a determinar a proibição do arguido A entrara em CZ, com excepção de motivo de serviço; fls. 66, comunicação feita ao arguido A da proibição, assinada por este; fls. 67, comunicação feita em 24/09/86 por GE). Estamos perante um despacho que repete e portanto reforça, uma proibição já determinada por despacho anterior, para além da referência feita no despacho, quanto à razão pela qual o Dr. BQ o proferiu, concretamente o “deficiente” cumprimento que o arguido A vinha fazendo de uma ordem, anterior, de interdição na secção de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119). Como vimos, também já no ano de 1984 o arguido tinha tido um processo disciplinar por desobediência à ordem de interdição em CZ e de actividades com os alunos de CZ, tendo nesse processo, por Despacho do (...) de 28/6/84, sofrido a pena de repreensão escrita, e sido expressamente proibido de participar em quaisquer actividades da Secção de CZ, desde que nelas estejam incluídos alunos (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119;). Não obstante o que antecede, neste Ano de 1986 o arguido foi classificado de MUITO BOM (homologação em 7/04/87; cfr. Fls. 837, Apenso CQ, Vol II), sendo de notar que quando a nota é proposta (23/3/87, fls. 837, Apenso CQ, Vol. II) e homologada (7/4/87, fls. 837, Apenso CQ, Vol. II), já tinha sido proferido o Despacho a aplicar a pena ao arguido, no processo disciplinar que lhe fora instaurado neste ano de 1986. Houve (também) neste ano, “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita: nesse ano o arguido tem subida de mérito na classificação, pois é avaliado com Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 837). E tem a nota de MUITO BOM, subindo na classificação, num ano em que foi sujeito e condenado em processo disciplinar, cujo objecto – a violação da ordem de entrada em CZ e/ou realização de actividades com alunos de CZ - foi exactamente o mesmo que deu origem ao processo disciplinar em que fora condenado no ano de 1984, tendo sofrido também uma pena disciplinar no ano de 1985. Houve repetição de infracção disciplinar – “reincidência, aliás, que não pode ter passado despercebida ao Dr. BQ, como resulta do teor do despacho transcrito a fls. 841, do Apenso CQ, Vol. II, pois este Despacho está datado de 2/02/87 e a nota do arguido, para o ano de 1986, foi proposta em 23/3/87 e homologada em 7/04/87 -, mas subida na classificação. E tenha-se em atenção que a imposição da “ proibição”, que esteve na base do processo deste ano, não estava relacionada com a prática de qualquer acto contra o património de CZ – por exemplo, suspeita de qualquer dano, ou outro acto de idêntica natureza -, mas com a suspeita da prática de actos que podiam pôr em risco os educandos, tanto que justificavam a medida preventiva da interdição nas instalações. (6) - No Ano de 1987 o arguido tem a classificação de MUITO BOM (homologada em 29/4/88; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 750) e não há registo de processo disciplinar neste ano. Notamos, contudo, que dos documentos dos autos também não resulta que no Ano de 1987 ou nos seguintes, tenha sido proferido qualquer Despacho a dar sem efeito e/ou a determinar a cessação da proibição de o arguido A frequentar a secção de CZ, salvo motivo de serviço e de participar em actividades com os educandos. (7) - No Ano de 1988 foi instaurado novo processo disciplinar ao arguido (por Despacho do (...) de 23/02/88), sendo que por Despacho de 4/7/88 foi aplicada ao arguido a pena de 30 dias aposentação do serviço (cfr. fls. 287, do Apenso CQ, Vol. I, resultante do Pº disciplinar mandado instaurar por Despacho do (...) de 23/2/88; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805; cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). Este processo foi instaurado por queixa apresentada por um funcionário da AX contra o arguido A, por agressão durante as horas de serviço (cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). Neste Ano de 1988 o arguido foi classificado de MUITO BOM (homologação em 24/02/89, cfr. Fls. 746, Apenso CQ, Vol II) ano em que - e tal como nos anos de 1984, 1985 e 1986 -, tinha sido objecto de processo disciplinar, que terminou em punição de 30 dias de aposentação. (7.1) Mas é também em relação a este ano de 1988 que o Tribunal encontrou um elemento nos autos (um documento) que, na perspectiva do Tribunal, contribuiu para apreendermos o que foi a cultura e a prática da AX ao longo dos anos, não só sob a perspectiva da sua organização e gestão como Instituição - pois a avaliação do arguido A ou a nomeação para diferentes escalões na carreira profissional, tem a ver com a Gestão e com as pessoas que estão próximas das Chefias -, mas ao nível das pessoas que estavam na área da educação e formação dos educandos da AX e que os tinham sob a sua responsabilidade. A fls. 828/829, do Apenso CQ, Vol. II, consta um “Louvor” que três (...) da Instituição – não sendo totalmente perceptível para o Tribunal os nomes, mas resultando do teor do documento que era essa a sua função – fazem em Maio de 1988 ao arguido A e enviam para o Sr. (...), por altura de um peregrinação a Fátima. Aí, entre o mais – e depois de uma introdução em que são feitas referências à dificuldades no acerto do recrutamento de pessoal de responsabilidade, quer sob a vertente da docência, quer sob a vertente educacional e formativa, “… já que é necessário aliar à especificidade da missão, a pedagogia desbloqueadora da forte inércia libertária e irreverente que à apanágio da grande parte da juventude de hoje …” - , elogiam a figura e destacam as qualidades do arguido A – que acompanhou o grupo de alunos e (...) na peregrinação – no campo do exercício da autoridade sobre os educandos, concluindo os subscritores dessa carta conveniente e oportuno, após alguma preparação complementar, aproveitar A no campo do acompanhamento e vigilância dos educandos. Ora quando foi feito este “Louvor” e recomendação dos (...), para o arguido A ser aproveitado no campo do acompanhamento e vigilância dos educando e quando o arguido acompanha um grupo de alunos e (...) numa peregrinação –, (...) que permitiram que o arguido desenvolvesse a sua autoridade sobre os educandos, da forma que descreveram na carta que remeteram ao (...) -, ainda estava em vigor a proibição imposta ao arguido A – e que vigorava desde 21/01/80, quando o Director da secção de CZ proibiu a entrada de A naquela secção, pedindo ao (...) da altura, HHM, que confirmasse a decisão de proibição de entrada do arguido na secção de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 428 a 430); do Despacho da Secretária de Estado nº 28/80, reafirmado em 10/10/83 pelo Despacho do (então) (...) do (...) Dr. BQ e de novo reafirmado pelo Despacho do (...) de 28/6/84 (no âmbito da homologação de uma pena disciplinar que foi aplicada ao arguido A) -, de entrar na secção de CZ (sem ser por motivo de serviço) e de participar em actividades da Secção de CZ, desde que nelas estivessem incluídos alunos. E dizemos que ainda estava em vigor pois o processo disciplinar que veio a ser instaurado no ano a seguir ao “Louvor”, em 1989 - na sequência do qual o arguido, por Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4/10/89, sendo na altura (...) Dr. BQ, (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 35) foi demitido compulsivamente, despacho este anulado pelo Acórdão do S.T.A. datado de 16/04/91 – , teve como um dos fundamentos o arguido ter tido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...) (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17 ). Esta situação - por um lado a permissão de o arguido acompanhar actividades com alunos e, por outro, os (...) que subscreveram a carta sobre as qualidades de A terem permitido que o arguido exercesse a interacção (que resulta da carta) com os alunos, quando vigorava uma proibição –, ligando-a com o que já assinalámos em 1980 em relação ao então (...) HHM (cfr. Ponto 3.3.1. (1.1), que antecede), com a “Promoção” do arguido em 1984 (cfr. Ponto 3.3.1. (3.1), que antecede) e com a classificação de MUITO BOM do arguido A em 1986 (nas circunstâncias em que a teve, cfr. Ponto 3.3.1. (5), que antecede) é, para o Tribunal, expressão da já referida falta de relevância que, ao longo do tempo, foi sendo dada na AX aos riscos a que os educando podiam estar ex(...)s dentro da Instituição, não só (potencialmente) em relação ao arguido A, mas em termos genéricos de prevenção, considerando que estava inerente à AX uma realidade de internato. E essa “desconsideração” explica, por sua vez, a situação com que o Tribunal se confrontou em Tribunal, do números de educadores, membros de equipes de internato, Directores de (...)s ou demais funcionários da AX, que declararam ao Tribunal não ter tido conhecimento – nem sob a forma de rumor, suspeita ou conversa entre Colegas e que em momento posterior está assinalado - de qualquer situação de abusos de menores dentro da AX ou relacionada com abusos, quer em relação ao arguido A – e aqui incluindo, também, a ausência de conhecimento que declararam de qualquer restrição de o mesmo acompanhar actividades de alunos -, quer em relação a qualquer outro funcionário da AX, nem da existência de restrições de mobilidade do arguido A dentro da Instituição ou de contactos com alunos. (7.2) Não obstante o que antecede, neste Ano de 1988 o arguido foi classificado de MUITO BOM (homologação em 24/02/89, cfr. Fls. 746, Apenso CQ, Vol II), ano em que - e tal como nos anos de 1984, 1985 e 1986 -, tinha sido objecto de processo disciplinar, o qual neste ano terminou em punição com 30 dias de aposentação. Para o Tribunal houve, também neste ano, “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita, pois foi classificado com Muito Bom. (8) – No ano de 1989 foi instaurado novo Processo Disciplinar - por Despacho do (...) datado de 29/05/89 - , na sequência do que, por Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4/10/89 (sendo na altura (...) Dr. BQ, cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 35), o arguido foi demitido compulsivamente. Este foi o processo em que o arguido recorreu da decisão para o S.T.A., que por Acórdão datado de 16/04/91 anulou o despacho do secretário de Estado que aplicara a pena disciplinar de demissão compulsiva ao arguido, o qual veio a ser reintegrado por despacho do (...) (BQ) de 5/06/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; bem como fls. 193, 213 a 218, 223 a 231, quanto aos factos especificamente descritos no ponto “52.”, do "Factos Provados" ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido). Como vimos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada pela mãe de um aluno ao Director do CZ, imputando a “nota de culpa” comunicada ao arguido, em súmula, o arguido ter tido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...); ter dado dinheiro a dois alunos para comprarem rebuçados, bolos e revistas; ter tomado banho com um aluno na Cave da (...), mostrado revistas pornográficas, praticado actos de masturbação (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17; e ver, também, fls. 116/117 e 195, do Apenso CQ, Vol. I, correspondentes à carta que em Maio de 1989 é escrita pela mãe do aluno (…), para a professora HHO, por factos relacionados com contactos do seu filho com o arguido A, aí referido como “(…)” e ao ofício que o Director do (...) e CZ, na sequência de tal carta, envia em 26/5/89 para o (...)). Durante o período que decorreu entre a demissão compulsiva do arguido e a sua reintegração após a decisão do S.T.A. – de 4/10/89 a 5/06/91 -, o arguido não exerceu funções na AX (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido). Assim, aquando da avaliação do arguido em relação aos anos de 1989 e 1990, a AX teve em atenção que o arguido não exerceu funções, mas não as exerceu porque tinha sido demitido no âmbito de uma sanção disciplinar, decisão esta que veio a ser anulada pelo S.T.A.. Não podia, em consequência, ser tido em conta este processo disciplinar para efeitos de notação do arguido, pelo que decerto por tudo isso a proposta de nota foi de BOM para o ano de 1989 e BOM para o ano de 1990, a qual veio a ser homologada (cfr. Apenso CQ. Vol. II, fls. 724, 614 a 672 e 608). No entanto, quando a proposta de notação do arguido foi apresentada ao (...) da AX em 11/10/91, pela Chefe de Repartição da Secretaria-Geral, esta refere os “motivos que originaram o processo de demissão”, mas também que “são conhecidas as qualidades profissionais deste funcionário” (cfr. Apenso CQ, vol. II, fls. 724). (8.1) Ora quanto a estas “qualidades profissionais” do arguido, dos depoimentos que foram prestadas em audiência de julgamento resultou que o arguido apresentava, em regra, a maior disponibilidade para fazer favores pessoais ou serviços que surgissem no dia a dia. Tal resultou, por exemplo, das declarações do arguido C, o qual confirmou ao Tribunal que confiava na “…competência…” e “…eficácia…”, esclarecendo - quando o Tribunal lhe pediu para esclarecer o que pretendia dizer com tais expressões - que queria dizer que o serviço que era prestado, era “… de facto bem prestado, não havia dúvidas …”, quando o arguido A regressava “… a tarefa estava cumprida…”, só lhe apontando um problema, que era o tempo que levava, em vez de “cinco minutos” era “meia hora”. E acrescentou o que, na sua perspectiva, era uma vantagem que o arguido A apresentava: é que enquanto os demais motoristas “… pediam sempre…” um ajudante de motorista, ou “… porque era difícil estacionar ou porque não sei quê …, em verdade o A fazia o serviço…” e não precisava que alguém fosse com ele, esclarecendo que isto correspondeu a uma constatação que o próprio arguido C fez no dia-a-dia da AX e não a um procedimento que lhe tivesse sido contado por alguém. Mas resultou, também, do depoimento das testemunhas que foram ouvidas em audiência de Julgamento, entre as quais e a título de exemplo, do depoimento da(s) testemunha(s): - Dr. BQ, (...) da AX desde 1986 até 2002, mas na instituição desde 1968 - o qual demonstrou ter tido conhecimento directo de todos os processos disciplinares a que o arguido A foi sujeito e fundamentos de tais processos - e disse ao Tribunal que o arguido A como funcionário, em termos de trabalho, era um funcionário dedicado, fazia serviços de natureza pessoal quer para o arguido C quer para si e que embora tivesse um “…feitio conflituoso…”, fosse “… muito interventivo…”, não assistiu a situações dessas; - WE - Técnico Superior da AX e presidente da Associação de Trabalhadores da AX, o qual ingressou na AX em 1974, altura a partir da qual conheceu os arguidos A e C -, o qual disse ao Tribunal que o arguido A era um funcionário muito disponível a nível de trabalho, dando exemplos que aconteceram consigo: quando era preciso ir levar alguma coisa para um (...) e não havia motorista disponível, era-lhe dito para perguntar ao arguido ao arguido A e “muitas vezes” pediu-lhe e este fez o que era necessário; - Dr. EJ – Director do CZ entre os anos de 2000 e 2003 - , o qual disse que o arguido A era “educadíssimo”, “trabalhador”, “disponível”, “generoso”, nunca tendo visto alguma coisa que o fizesse adivinhar que seria possível o arguido A estar envolvido neste processo; - HQ - o qual declarou ao Tribunal ter sido auxiliar de acção educativa desde 1991 no CZ da AX, tendo também exercido as funções de Porteiro na AX, inicialmente em substituição dos colega nas respectivas férias, isto ainda em 1991 e depois a tempo inteiro eaté, aproximadamente, 2004 -, tendo relatado factos que para o Tribunal demonstravam a disponibilidade do arguido A para o trabalho dentro da AX, entrando e saindo cedo ou tarde consoante necessário; - XQ – que trabalhou na AX entre 1966 a Março de 2006, tendo chefiado nos últimos 10 a 15 anos a divisão de aprovisionamento e logística, onde desde 1997/1998 estavam inseridos os transportes da instituição -, a qual disse ao Tribunal que o arguido A estava sempre disponível e prestável para favores; - YW - que trabalhou na AX desde 196, nos internatos dos (...)s de EZ, CZ e FA -, a qual disse ao Tribunal ter conhecido o arguido A assim que a testemunha entrou para a AX, porque fazia a distribuição dos mantimentos para os lares. Disse que era simpático, nunca o viu ser mal educado (embora, como referiremos por causa de outra questão concretamente da forma como o arguido estava dentro da AX, considerando que o mesmo tinha um “certo à vontade” dentro da casa, pela forma como falava com os colegas). - VO (motorista da AX desde 1990/1991), o qual considerava o arguido A um bom colega, dando o exemplo de poder estar a regressar do Algarve, telefonar para o arguido A a dizer que no dia seguinte ia para (…) e precisava de determinado veículo e, quando chegava, o arguido A já tinha o carro lavado, sendo incapaz de dizer que não, fosse a quem fosse ( acrescentando que “... como colega e serviçal, não há melhor, pode haver igual, mas não há melhor...”). - BBG (motorista na AX de 1989 a 2005), o qual disse ao tribunal que o arguido A era prestável, lavava-lhe o carro à noite, quando era preciso alguma coisa ele fazia o transporte. - EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, durante cerca de 20 anos), disse que o arguido A era “bem aceite por toda a gente”, estava sempre na brincadeira e as pessoas aceitavam as brincadeiras dele. Estava sempre “ a mentir de brincadeira”, era uma pessoa disponível e as pessoas gostavam dele. - EEI (mecânico na AX, para onde entrou em 1983/1984, tendo conhecido o arguido A e o arguido C), disse que o arguido A era “muito prestável” e relatou uma situação em que uma vez regressou por volta das “onze e pouco da noite” de uma viagem como um professor e com educandos, não havia motorista para ir pôr os educandos a casa, telefonaram ao arguido A e este apareceu com uma carrinha, para ir fazer a distribuição dos educandos. Relatou, também, por mais do que uma vez o arguido foi buscar o seu filho à natação, por a testemunha não ter tempo, por estar com os treinos da equipa da associação de Trabalhadores da AX. - XQ (que trabalhou na AX de 1966 a Março de 2006, na área administrativa e nos últimos 10/15 anos a Chefiar a Divisão de Aprovisionamento e Logística), disse ao Tribunal que uma das suas funções na divisão de aprovisionamento e logística era fazer o controlo da actividade dos motoristas, supervisionando as escalas que eram feitas por funcionários do seu serviço e conhecendo, por isso, o arguido A. Para si era A era uma pessoa muito prestável e a mais disponível para aceder a pedidos de serviços. EB, (…), director de Serviços na AX desde 1999, mas trabalhando na AX desde 1992, foi uma das pessoas que também falou das características do arguido A como uma pessoa “ muito briosa”, descrevendo situações em que era preciso ajuda para trabalho ao fim de semana e foi o arguido A que se disponibilizou. Ficou espantado quando “soube do escândalo”, pois nunca lhe passou pela cabeça qualquer situação em relação ao arguido A. Quando a testemunha entrou para a instituição, o “discurso era” que A fora suspenso e teve que ser readmitido. HS, técnico profissional principal na área de música na AX há mais ou menos 27 anos, o qual declarou ao Tribunal ter sido também aluno na instituição. Declarou ao Tribunal ter conhecido o arguido A na instituição, o qual considera ser uma pessoa correcta, sempre prestável, colaborante e não teve conhecimento de qualquer problema que tenha havido com o arguido. Soube que saiu da instituição e foi readmitido, mas não sabe o que se passou. HZ, reformada da função pública, trabalhou na AX durante 32 anos, na secretaria da (...) desde 1986. Disse que tinha a melhor impressão do arguido A, sempre disponível e bem dis(...), levava o filho do Dr. BQ, fazia favores a toda a gente e toda a gente recorria ao “(…)”. Esta faceta do arguido A – e que foi visível para o Tribunal, à medida que ia ouvindo os depoimentos das testemunhas que trabalharam com o arguido - teve, no entendimento do Tribunal, a capacidade e força para concorrer para a “desvalorização” que foi feita dentro da AX, quer por dirigentes quer por funcionários, do percurso de sucessivas infracções, com consequentes processos disciplinares a que foi sujeito algumas das vezes e em que resultaram punições disciplinares que temos vindo a referir e com os fundamentos descritos. Veja-se a forma como perante o Tribunal as testemunhas – por exemplo, as que enunciámos e referimos os depoimentos - falaram do arguido e os elogios que fizeram à sua disponibilidade e até trabalho, numa situação em que o arguido está pronunciado pela prática de crimes de natureza sexual, o que era do conhecimento das testemunhas que falaram das qualidades do arguido e que, neste contexto do julgamento, poderiam sentir alguma reserva em fazer “elogios”. Mas significa e traduz, também, a aceitação que o arguido A tinha juntos de alguns funcionários da AX, independentemente da posição que detinham na cadeia hierárquica da instituição, pois os elogios e reconhecimento de qualidades começam no (...). Aspecto este que é expressamente focado no ponto “64.” dos “factos provados”. (8.2) Mas sucedeu, também, neste ano de 1989, que por Despacho do (...) Dr. BQ, datado de 3/04/89, na sequência de informação e proposta datada de 19/12/88, feita pelo arguido C - na qualidade de Técnico Superior de 1ª - , para vigorar a partir de 2/01/89 e fazer face a necessidades concretas de serviço - e referindo o arguido C, nessa informação, o facto de, quando chamados para serviços auxiliares, e os “chamados” eram um funcionário HHQ e o arguido A, invocam que são “…ajudantes de motorista, que é jardineiro e não carregadores, enfim, toda uma série de observações que acabam por aborrecer, quando não mesmo atingem proporções de impertinência…” -, o arguido A, na altura com a categoria de Jardineiro, ficou com as “funções de ocorrer a todos os serviços auxiliares da (...) e, sempre que necessário, executar o que lhe for determinado no âmbito dos serviços de transporte…”, passando a constar do “mapa semanal de transportes” que era feito pelo Serviço de Transportes e Logística, com a indicação do serviço atribuído (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773 a 774). Se é certo que quando foi esta nomeação ainda não tinha sido instaurado o processo disciplinar de 1989 – como vimos, o Despacho a instaurar o processo foi de 29/05/89 -, o certo é que quando o arguido C em 19/12/88 faz a proposta para o arguido A, a partir de Janeiro do ano seguinte (1989), passar a exercer funções auxiliares na (...) e no serviço de transportes, nesse ano de 1988 o arguido A tinha sofrido, como vimos, uma pena disciplinar de 30 dias de aposentação do serviço. E pela análise que o Tribunal fez e conclusões que retirou do “Apenso CQ, Vol. I e II”, o trabalho na secção de transportes correspondia a uma trajectória de “subida” de exercício de funções na carreira profissional de A, tanto que o arguido, como vimos (remetendo o Tribunal para os documentos que atrás já expressamente enunciámos), no seu percurso profissional a trajectória foi de à medida que ia “evoluindo” na categoria de jardineiro – começa como “Jardineiro de 3ª classe” até “Jardineiro” -, vai também subindo na classificação de “BOM” para “MUITO BOM” e passa do exercício (efectivo) da jardinagem para o exercício de funções de auxiliar na (...) e nos transportes, embora numa primeira fase tenha coexistido o exercício efectivo dos dois tipos de trabalhos. Aliás, já em Dezembro de 1979 o arguido apresentara um requerimento para passar para esse serviço (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 412), o que conjugado com o teor do documento de fls. 691 e 688 (do Apenso CQ, Vol.lI; estando expressamente referido no documento de fls. 688 e relacionado com os litígios que em 1993 existiram entre o arguido A e os motoristas da AX, que se o arguido A queria continuar nos transportes teria que mudar de comportamento, tendo-lhe sido dito para pedir desculpa aos motoristas pelas suas atitudes, o que o arguido comunicou ter feito; sendo o documento de fls. 691 a “queixa” que em 1993 foi feita pelos motoristas da AX, pela ingerência do arguido A no seu trabalho; a testemunha EC, motorista da AX, foi confrontado com o documento e confirmou ter assinado o mesmo, lembrando-se que “às vezes havia instabilidade”, mas também que acrescentou que falou ao Sr. HHT, seu superior, para ser dada uma oportunidade ao arguido), com o teor do documento de fls. 66 do “Apenso L” (referente a uma comunicação do então (...) do (...), Dr. BQ, para o (...) Dr. HHN, datada de 2/01/1983, em que são enunciadas as condições que o arguido A teria que aceitar para continuar a exercer funções nos serviços de transportes, sob pena de voltar unicamente para as suas funções iniciais no âmbito da jardinagem, comunicação esta que diz que o arguido A optou pela alternativa que lhe era dada para a manutenção de funções também na área dos transportes, aceitando todas as condições de cumprimento e vigilância do seu trabalho que lhe foram impostas, tendo o arguido A assinado a comunicação, após a assinatura do (...) do (...)), com a nomeação do arguido como “motorista de ligeiros” que no ano 2000 veio a acontecer e com as declarações que o arguido A prestou em julgamento - quanto às funções que exerceu dentro da AX -, concorreu para o Tribunal concluir que para o arguido A “passar para os transportes” e não exercer as funções de jardineiro, não só era e foi uma promoção e progressão, como correspondia mesmo um desejo e objectivo dentro do seu percurso na Instituição (cfr., também, o teor do documento de fls. 214 a 221 vº, do Apenso J, que corresponde a uma exposição feita pelo arguido A, no âmbito do recurso do Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social que em 4/10/89 o demitiu compulsivamente - cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 35 - e que foi remetida pelo arguido para tal processo de recurso - cfr. Apenso J, fls. 200 e 201, quanto ao envio do documento para o processo que estava em curso -, na qual o arguido faz uma “exposição” do que foi a sua vida na AX e escreveu “… mais tarde cheguei ao final do curso, e da idade, eu comecei por mim próprio a pensar na minha vida, e no meu futuro, que na altura quando eu era aluno, ajudava muito os motoristas da AX…”, documento este que cruzado com o já enunciado, permitiu ao Tribunal extrair também deste elemento o desejo e vontade do arguido A, em trabalhar nos transportes da AX). (8.3) Mas para além de esta proposta do arguido C - que veio a ser homologada pelo (...) Dr. BQ -, para o exercício de funções auxiliares na (...) e no serviço de transportes, corresponder para o Tribunal à expressão de uma “ ascensão” do arguido A na sua carreira dentro da AX e, por isso, ter implícito um sinal de “recompensa” ou “reconhecimento de mérito”, ela é feita numa altura em que - como também vimos quanto ao “Louvor” que em Maio de 1988 foi feito ao arguido A por três (...) - ainda estava em vigor a proibição imposta ao arguido A – e que vigorava desde 21/01/80, quando o Director da secção de CZ proibiu a entrada de A naquela secção, pedindo ao (...) da altura, HHM, que confirmasse a decisão de proibição de entrada do arguido na secção de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 428 a 430); do Despacho da Secretária de Estado nº 28/80, reafirmada em 21/11/80 pelo (...) HHM, reafirmada em 10/10/83 pelo Despacho do (então) (...) do (...) Dr. BQ e de novo reafirmada pelo Despacho do (...) de 28/6/84 , no âmbito da homologação de uma pena disciplinar que foi aplicada ao arguido A -, de entrar na secção de CZ (sem ser por motivo de serviço) e de participar em actividades da Secção de CZ, desde que nelas estivessem incluídos alunos. Tal proibição ainda não tinha caducado pois, como acima vimos, o processo disciplinar que veio a ser instaurado neste ano de 1989 teve como um dos fundamentos o arguido ter tido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...) (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17 ). Ora o exercício de funções auxiliares na (...) – que se situa no CZ - ou o exercício de funções auxiliares na secção de transportes – como vimos com a situação da peregrinação a Fátima, a que se refere o “Louvor” de fls. 828/829 do Apenso CQ, Vol. II -, potenciavam o contacto e a permanência do arguido A em CZ e com os educando, fossem eles de CZ ou de outros (...)s. E quer o (...) Dr. BQ, quer o arguido C, na altura em que o segundo faz a proposta para o exercício das funções por A e o primeiro a homologou, tinham forçosamente conhecimento e consciência não só da existência da proibição, mas também das razões que estavam na base de tal proibição. E tinham conhecimento, objectivamente, pelo menos pelo seguinte. O Dr. BQ quer quando em 22/11/82 fez a comunicação “confidencial” para o então (...) da AX (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 904), quer quando proferiu o Despacho de 10/10/83 (cfr. Apenso L, fls. 50 a 51, 56, 65, 66) E o arguido C, por sua vez, quando na qualidade de Funcionário da AX foi instrutor em três Processos disciplinares instaurados ao arguido A - embora apenas dois dos por si instruídos estivessem relacionados com alunos e daí os que o Tribunal vai mencionar -, pois por essa circunstância teve objectivamente conhecimento da proibição e das razões que levaram à sua imposição. Com efeito e no que se refere aos processos disciplinares instruídos pelo arguido C - mas cingindo-se o Tribunal neste momento aos dois processos que tiveram a ver com factos relacionados com as “proibições” do arguido A entrar na secção de CZ, acompanhar ou ter actividades com alunos - resulta dos autos que: (a) Foi Instrutor do Processo disciplinar instaurado pelo Despacho do (...) (na altura HHN) de 11/05/84 - na sequência do que por Despacho do (...) de 28/6/84, o arguido A sofreu a pena de repreensão escrita, ficando o arguido igualmente proibido de participar em quaisquer actividades da Secção de CZ, desde que nelas estivessem incluídos alunos (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119 ; e cfr. Apenso K, fls. 356 e 356 vº, arguido C, na altura Técnico superior de 2ª, foi instrutor do processo). Relembramos que o processo fora instaurado na sequência de participação feita por GE, Professor da Secção de CZ, pelo facto de o arguido ter estado a jogar à bola com alunos de CZ, quando estava interditado de o fazer (cfr. Apenso K, fls. 356 vº; fls. 357 a 359 vº, Relatório; fls. 373, participação de GE datada de 3/5/84; fls. 374, Comunicação do (...) do (...) para os Serviços administrativos, na altura BQ, datada de 10/10/83, a determinar, entre o mais, a proibição de A frequentar quaisquer instalações da secção de CZ ). Neste processo pode ler-se, no “Relatório” elaborado pelo Instrutor C, em súmula, que ”…datam de 1980 os últimos acontecimentos que estão na origem da interdição do arguido entrar na secção de CZ, excepto em serviço e acompanhado por funcionário…, na suspeição de alegadas práticas homossexuais entre o arguido, já funcionário, e educando da AX…conduziu à instauração de processo disciplinar (…); registo disciplinar, que está limpo, infere-se que não tenha sido concluído efectiva culpabilidade; (…) foi iniciado um processo de inquérito na Polícia Judiciária (…) nada foi ainda comunicado à AX (…), este facto (…) justifica a interdição, a título preventivo; (…) A, no ( …) dia 2 de Maio, entrou na secção de CZ a fim de iniciar um serviço de transportes (…) teria lugar pelas 14 horas…” e concluindo pela falta de justificação para o arguido encontrar-se em CZ à hora referida na participação (cfr. Apenso K, fls. 356 vº e fls. 357 a 359 vº , Relatório). O arguido C escreveu, ainda, quando fez a proposta da sanção disciplinar – que foi homologada pelo (...) da AX - , que “… a interdição de entrar em CZ não se traduz necessariamente numa punição, outrossim ela assume como medida preventiva de integridade da Instituição – personalizada, se se quiser, nos seus educando – direito que inequivocamente lhe assiste (…), de futuro não serão atendíveis razões de boa vontade ou outras de carácter pessoal, a título de atenuantes(…)” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 890, documento cujo original está registado que foi entregue ao arguido A em 29/06/84, estando aposta a sua assinatura). (b) E foi Instrutor do Processo disciplinar instaurado pelo Despacho do (...) (na altura já Dr. BQ) de 17/11/86, na sequência do que por Despacho do (...) de 2/2/87 foi aplicada ao arguido A a pena multa 5.000$00 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119 ); Relembramos que o processo foi instaurado na sequência de participação feita no dia 24/9/86, pelo professo GE, da Secção de CZ, por o arguido A no dia 23/9/86, entre as 20 e as 21 horas, ter entrado em CZ, desobedecendo ao Despacho do (...) do (...) de 10/10/83 e de que tomara conhecimento em 11/10/83, que o proibia de entrar em CZ, salvo motivo de serviço (cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; 56; 65, Despacho de Dr. BQ, datado de 10/10/83, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, a determinar a proibição do arguido A entrara em CZ, com excepção de motivo de serviço; fls. 66, comunicação feita ao arguido A da proibição, assinada por este; fls. 67, comunicação feita em 24/09/86 por GE ). E relembramos a explicação e advertência que o próprio arguido C já fizera no Despacho de 25/06/84 - do processo disciplinar de 1984 e que acima assinalámos -, quanto à razão de ser e justeza da interdição e às consequências do seu não acatamento no futuro (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 890, documento cujo original está registado que foi entregue ao arguido A em 29/06/84, estando aposta a sua assinatura). Aliás, em audiência de julgamento o arguido C prestou declarações e confirmou a sua intervenção nos processos disciplinares, bem como conhecimento dos fundamentos dos mesmos, esclarecendo que foi o (então) (...) Dr. HHN que directamente e em 1984, lhe explicou a razão de ser do Despacho que dera quanto à interdição do arguido A em CZ . No entanto e não obstante tudo o que antecede, quer o Dr. BQ, quer o arguido C, consideraram, respectivamente, fazer e homologar, a proposta a que se refere o documento de fls. 773 a 774, do Apenso CQ, Vol. II, a qual, como já vimos, no entendimento do Tribunal potenciava a permanência do arguido A em CZ e o contacto com educandos. (8.4) E é também neste ano de 1989, concretamente em 7/09/89, que a Dra. HHU – na qualidade de Directora do DT -, faz uma comunicação para o (...) da AX, “louvando” o comportamento do arguido A para com os alunos, no apoio aos educadores e restante pessoal, no decorrer dos transportes para as (...) (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 806). Este “Louvor”, por causa do trabalho desenvolvido pelo arguido A com os alunos e educadores aquando do transporte para as (...) do Verão – e tal como aconteceu com a situação do “Louvor” feito por três (...) em Maio de 1988, aquando de uma peregrinação a Fátima, cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 828/829 -, refere-se a um período em que ainda estava em vigor a proibição imposta ao arguido A de entrar na secção de CZ (sem ser por motivo de serviço) e de participar em actividades da Secção de CZ, desde que nelas estivessem incluídos alunos (proibição que vigorava desde 21/01/80, quando o Director da secção de CZ proibiu a entrada de A naquela secção, pedindo ao (...) da altura, HHM, que confirmasse a decisão de proibição de entrada do arguido na secção de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 428 a 430); do Despacho da Secretária de Estado nº 28/80, reafirmada em 21/11/80 pelo (...) HHM, reafirmado em 10/10/83 pelo Despacho do então (...) do (...) Dr. BQ e de novo reafirmado pelo Despacho do (...) de 28/6/84, no âmbito da homologação de uma pena disciplinar que foi aplicada ao arguido A, cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; fls. 56 e fls. 65,66 ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; cfr. Apenso K, fls. 117/118, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119). E refere-se a um período em que já estava a decorrer o Processo disciplinar instaurado ao arguido nesse ano. Como vimos, o Processo Disciplinar de 1989 fora instaurado por Despacho do (...) de 29/05/89, embora o Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social, a demitir compulsivamente o arguido, só tenha sido dado em 4/10/89 (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido ). E os fundamentos que levaram à instauração do Processo Disciplinar foram, em súmula, a já imputação ao arguido de ter tido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...); ter dado dinheiro a dois alunos para comprarem rebuçados, bolos e revistas; ter tomado banho com um aluno na Cave da (...), mostrado revistas pornográficas, praticado actos de masturbação (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17 ). Mas também não obstante tudo o que antecede – estar em vigor a proibição de contactos com os alunos e as razões que estavam subjacentes a tal proibição; e estar a decorrer um processo disciplinar, por factos que, a comprovarem-se, punham em risco os educando da Instituição -, tal não foi suficientemente forte para, por um lado, o (...) da AX ou a pessoa com responsabilidade na competente área, impedirem que o arguido fizesse trabalhos que implicasse o acompanhamento de alunos, independentemente de estarem presentes educadores. E, por outro, que uma Directora do um (...) fomentasse – pois o Louvor de fls. 806, do Apenso CQ, Vol. II, para o Tribunal é interpretado nesse sentido -, pelo menos enquanto estivesse em curso o processo disciplinar, que o arguido A fizesse trabalhos junto dos educandos, apoiando mesmo esse trabalho. (8.5) E, por fim, é ainda neste ano que o arguido A, quando em 6/12/89 apresenta o seu recurso, a impugnar o Despacho do Secretário de Estado que o tinha demitido compulsivamente, remete com tal impugnação 191 assinaturas “ de abonação do seu comportamento”, tendo concluído o Tribunal, pela leitura do documento com que são enviadas as assinaturas, que eram assinaturas de funcionários da AX, correspondendo a aposição de uma assinatura a um acto voluntário de quem o faz, neste caso dos funcionários da AX (cfr. fls. 290 a 298, do Apenso CQ, Vol. I; cfr. Apenso Apenso J, fls. 313 a 327 ). (8.6) Uma última questão, relacionada com o processo disciplinar de “1989” e de que temos vindo a tratar, é que o Tribunal deu como provado que os factos que estiveram na origem deste processo não foram comunicados ao Ministério Público. E deu como provado porque não resultou de toda a prova testemunhal ou por declarações produzida, nem da análise que o Tribunal fez da prova documental dos autos , entre a qual os documentos que constam nos Apensos “CQ”, “G”, “J”, “K” e “L” e nos quais não existe referência a tal comunicação ou a processo crime que tenha sido instaurado por causa desses factos específicos. Estes Apensos são constituídos por documentos (embora na sua generalidade cópias) que o Tribunal concluiu terem sido produzidos nas datas neles apostas, por causa das circunstâncias, incidentes ou situações neles referidas. Esta asserção é corroborada pela sequência que em algumas situações é possível fazer, nos Apensos, dos “casos” ou dos “processos” a que se referem ou que testemunham, correspondendo por isso e como dissemos, a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Do que antecede a credibilidade que o Tribunal lhes deu. (9) - O ano de 1991 é aquele em que ocorre a reintegração do arguido A, na sequência do Acórdão do S.T.A. de 16/04/91. O Secretário de Estado da Segurança Social, por Despacho de 4/10/89, sendo na altura (...) Dr. BQ (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 35), demitira compulsivamente o arguido A. Por acórdão do S.T.A. de 16/04/91 este Despacho foi anulado e o arguido veio a ser reintegrado por despacho do (...) (BQ) de 5/06/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; bem como fls. 193, 213 a 218, 223 a 231, quanto aos factos especificamente descritos no ponto “52.”, do "Factos Provados" ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido ). Aquando desta reintegração o (...), Dr. BQ, demonstra preocupação pelo facto de o arguido poder estar em contacto com menores e em 27/06/91 envia um ofício para o Secretário de Estado da Segurança Social, solicitando a possibilidade de colocação do arguido noutro serviço da Secretaria de Estado da Segurança Social (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 714/715, fls. 718/719). Esta solicitação é renovada por ofício de 21/08/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 716/717). Na sequência de avaliação da possibilidade de transferência do funcionário pela Secretaria de Estado - (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 720), processo que ainda corre em Março de 1992 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 725) -, o arguido A não deu o acordo para a sua transferência. Não tendo dado o seu acordo, o Secretário de Estando determina que seja comunicado à AX , por Despacho de 7/10/92, o Parecer do Centro Regional da Segurança Social, que entendia que não estavam “criadas as condições necessárias à transferência pacífica do funcionário em causa por mera conveniência da Administração” e sem o acordo de A (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 697 a 699; cfr. Também, Apenso J, fls. 87 a 113). (9.1) Mas se com o ofício de 27/06/91 – aquele que o Dr. BQ, na qualidade de (...) da AX, aquando da reintegração do arguido A enviou para o Secretário de estado da Segurança social, solicitando a possibilidade de colocação do arguido para outro serviço da secretaria de estado da segurança Social (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 714/715, fls. 718/719) - o (...) Dr. BQ demonstrou preocupação pelo facto de o arguido poder estar em contacto com menores, nos autos encontra-se o registo de um LOUVOR, referente a esse ano de 1991 e publicado no D.R. (II Série) de 24/06/91 – três dias antes do Dr. BQ enviar o ofício para o secretário de Estado, a pedir a transferência do arguido -, em que o arguido A é “ Louvado Publicamente pelo labor e dedicação empenhados nas tarefas que precederam as inaugurações da (...) (…) e (…)” (cfr. Apenso L, fls. 119). O Tribunal equacionou que este trabalho que mereceu o “LOUVOR” pode não ter implicado o contacto ou actividades, mesmo no exterior, com educandos, pois tal estava expressamente proibido por despacho do (...) da AX, como resulta do documento de fls. 890, do “Apenso CQ, Vol. II”. Contudo, como já vimos, a existência dessa proibição de contacto ou actividades com educando não obviou a que tal tivesse acontecido e que o arguido tivesse feito trabalhos acompanhando actividades com educandos, o que veio a ser apoiado e agradecido por (...) e mesmo pela Directora do (...) DT (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 890, Despacho que homologou a proposta de sanção que o arguido C, na qualidade de Instrutor do processo disciplinar em causa, tinha pro(...) nessa altura, documento cujo original está registado que foi entregue ao arguido A em 29/06/84, estando aposta a sua assinatura). No entanto - e isto o Tribunal considera relevante para a avaliação do que foram os procedimento na AX, quanto à avaliação do desempenho profissional do arguido A e quanto ao controlo que foi feito desse desempenho profissional -, a reintegração do arguido A, em consequência do acórdão do S.T.A. de 16/04/91, veio a ocorrer por Despacho do (...) Dr. BQ de 5/06/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. tb Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido ). Dezanove dias depois da reintegração do arguido, no D.R. (II Série) de 24/06/91 está a ser publicado um “Louvor” ao arguido e é do conhecimento comum – e tal resulta objectivamente dos elementos que estão no apenso CQ, relativos a propostas de nomeação ou provimentos, ou mesmo aplicação de sanção disciplinar ao arguido A, pela dilação que se percebe em relação às datas das publicações no D.R.(cfr., por exemplo, fls. 615 e 616, do Apenso CQ, Vol. II) – que uma publicação de um Louvor no D.R., nesta altura, não era feita de um dia para o outro. Isto quer dizer, para o Tribunal, que no máximo por um trabalho de duas semanas, a ajudar com a inauguração de duas (...) da AX, a Direcção da AX, o (...) da AX, considerou proporcional, adequado e devido, que o especial “reconhecimento” que pudesse ser feito ao arguido por esse trabalho, devia ter a forma e a solenidade de um LOUVOR publicado no Diário da República. Mas estando o (...) da AX, Dr. BQ, três dias depois, a enviar um ofício para o Secretário de Estado - por causa das suas preocupações com a possibilidade do contacto do arguido A com alunos -, a pedir a transferência do arguido para outro serviço do Centro Regional de Segurança Social, portanto mesmo para fora da AX, não equacionando a possibilidade de o arguido continuar na Instituição, pois caso contrário tê-lo-ia sugerido ao Sr. Secretário de Estado. No Ano de 1991 o arguido A sobe (de novo) na classificação para MUITO BOM e é proposta e autorizada a sua progressão nos escalões (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 710 a 713, fls. 607). Tudo isto é, para o Tribunal, pelo menos, expressão objectiva da “desconsideração” ou “desvalorização”, que o próprio (...) continuou a fazer do risco que o arguido A podia importar ou comportar, no exercício de funções que potenciassem a proximidade ou acompanhamento de educandos, para esses educandos. Mas, neste caso, “desconsideração” e “desvalorização” também por parte da própria Tutela, pois como vimos o ofício do (...), para o Secretário de Estado da Segurança Social, está datado de 27/06/91 e a resposta (final) da Tutela é dada pelo Despacho datado de 7/10/92, cerca de 15 (quinze) meses depois. E é, também, expressão de “ sobrevalorização” do zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções, pois para o Tribunal é esse o significado do reflexo que teve na avaliação que lhe foi feita: sobe (de novo) na classificação para MUITO BOM e é proposta e autorizada a sua progressão nos escalões (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 710 a 713, fls. 607). (10) - No ano de 1993, concretamente em exposição datada de 15/09/93, cinco motoristas da instituição – UC, SZ, MG, VO, EC e BBG -, fazem uma exposição ao (...) Dr. BQ, na qual “queixam-se” que o arguido A, então com a função de “ajudante”, dificultava o trabalho dos motoristas, destabilizava o serviço programado semanalmente, executando-o de má vontade, sobrepondo-se às ordens que eram dadas aos motoristas pelos serviços administrativos, tendo mau relacionamento com os colegas. Pediram ao (...) que o arguido A deixasse de desempenhar qualquer função no serviço de transporte (Cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 691). Na sequência deste requerimento é feita uma informação pelo Chefe de Serviços dos Serviços Gerais e económicos para o Sr. (...), na qual expressamente diz que o arguido A “destabiliza e tem mau relacionamento com os Senhores Motoristas porque exige ser ele a programar e orientar o serviço, sobrepondo-se ao serviço de Transportes, e quando não se faz como ele quer, surgem insultos e ameaças verbais”; o arguido A várias vezes, “no átrio da (...) toma atitudes que não são correctas, discutindo ordens de serviço”, tendo a Chefe de Serviços já advertido o arguido que é apenas “ ajudante do motorista e nada mais”. Propondo a subscritora da informação, entre o mais, que futuramente o arguido A fique sob orientação directa do Chefe dos Serviços Gerais Económicos, “ não podendo invocar quaisquer desculpas para alterar e não cumprir as tarefas que lhe foram destinadas e sempre que recebesse ordens de outros Superiores, teria que dar conhecimento aos Serviços, não os abandonando e só depois quando lhe perguntam porque não executou este ou aquele serviço, alegar que foi com ordens do superior tal…”. Conclui requerendo ao (...) que fosse dada ao arguido A “…mais esta oportunidade, mantendo-se no Serviço de transportes.” (Cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 688 a 690). Por Despacho de 23/09/93 o (...) da AX (Dr. BQ) concede em dar “mais esta oportunidade ao A…”, tendo o cuidado de despachar no sentido de ser dada uma copia da informação e do despacho ao arguido, para que “…a tenha sempre presente…” (cfr. Fls. 691 e 688, do Apenso CQ., Vol. II). Do teor deste Despacho o tribunal concluiu que se o (...) da instituição escreve, expressamente, que concede em “dar mais uma oportunidade” e reforça para ser entregue ao arguido uma cópia da informação “para que a tenha sempre presente”, é porque aquela situação já era o culminar de mais alguma coisa, em relação ao comportamento que o arguido vinha tendo. Mas não obstante o que antecede, no Ano de 1993 e à semelhança do que já tinha sucedido em 1992, o arguido A é classificado com MUITO BOM (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 692 e fls. 682). (10.1) Mas este incidente com os motoristas e o que globalmente resulta dos dois documentos, isto é, por um lado a exposição dos motoristas, cujo teor no que estiver exacerbado - pois é natural que estando os motoristas “irritados” com o arguido A, o deixassem transparecer -, é contrabalançado com a informação do Chefe de serviços dos S.G.E. - informação esta que, pelo seu teor, permite perceber que já é o resultado de uma averiguação e esclarecimento dos factos junto do arguido A e, portanto, tendo já em conta o que este teve a dizer quanto às acusações que lhe eram feitas -, é relevante sob um segundo aspecto, pois permite-nos também ter, embora parcialmente, alguma percepção de como era, em 1993, a atitude do arguido dentro da instituição (Cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 688 a 690). E no que a esta atitude diz respeito, a mesma revela-nos o seguinte: o arguido A, embora exercendo apenas as funções de ajudante de motorista, de acordo com a informação que é dada em 22/09/93 pelo Chefe de Serviços dos S.G.E. para o (...) Dr. BQ - a tal informação que, como dissemos, pelo seu teor permite perceber que já é o resultado de uma averiguação e esclarecimento dos factos junto do arguido A e, portanto, tendo já em conta o que este teve a dizer quanto às acusações que lhe eram feitas -, tinha a confiança e iniciativa suficiente para “destabilizar” os serviços; “exigir” ser ele a programar e orientar os serviços, “sobrepondo-se” ao serviço de transportes; e quando não se fazia como o arguido “queria” surgiam insultos e ameaças verbais. Constando do ponto “3.” desta informação, que o arguido A já tinha sido avisado pelo chefe dos serviços, para não discutir na (...) ordens de serviço, pois a sua função era a de ajudante de motorista (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 688 a 691). Atitude esta que, em audiência de julgamento, a testemunha Dr. BQ ((...) da AX já na altura dos factos que estamos a referir) classificou, como já dissemos, de muito interventiva ” e por isso geradora de situações de conflito. Ora este comportamento e esta atitude, para o Tribunal, deve-se, parcialmente, à personalidade ou “maneira de ser” do arguido. Mas deve-se, também, à receptividade que o arguido foi tendo de diferentes superiores hierárquicos e funcionários da instituição . O Tribunal tratará posteriormente este aspecto, pois quanto a esta questão há ainda um incidente que será relevante falar e que é o “incidente” que ocorreu em 2001 entre os mecânicos da AX e o arguido A (cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69 e 70; fls. 13). Para o Tribunal, neste ano houve (também) “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que exerceu as suas funções, pois tal não teve reflexo na avaliação que lhe foi feita, pois continuou a ser classificado com Muito Bom. 3.3.2. Após a reintegração do arguido em Junho de 1991, dos elementos do processo - entre os quais os que expressamente temos vindo a enunciar -, não resultam mais advertências ou Despachos, relativamente a “proibições” de entradas do arguido em CZ sem ser em serviço ou incidentes por ter estado em contacto ou acompanhado educandos. E, como acima vimos, após 1991 (inclusive) e até à sua demissão compulsiva, comunicada pelo (...) da Instituição em 27/09/02, o arguido A continuou a ser classificado com MUITO BOM. (1) Mas, para além de não temos encontrado “novas” advertências ou Despacho com “proibições” em relação ao arguido A, pelo menos em 1997 encontramos mesmo o “movimento” contrário. Com efeito, da análise dos documentos de fls. 663 e 664, do Apenso CQ, Vol. II, resultou para o Tribunal que pelo menos em 1997, uma das competências atribuídas ao arguido A foi a de, como ajudante de motorista, acompanhar as deslocações de alunos de CZ, “zelando pelo seu comportamento”. Vejamos. O arguido A em 11/03/97 ou 12/03/97, fez um requerimento para o (...) da AX, dizendo que estando afecto ao serviço de transportes e tendo sido determinado por despacho do (...) que “… acompanhasse o motorista em serviço na deslocação de alunos do CZ, da Quinta (…) para o (...) às sextas-feiras e na volta ao (…) aos Domingos, com os mesmos alunos, a fim de o motorista realizar a sua tarefa sem ter a preocupação de zelar pelo comportamento dos alunos…”, solicitou ao (...) que fosse dispensado dessa tarefa “… por motivos de ordem pessoal…” (cfr. Apenso CQ. Vol. II, fls. 664). No documento que antecede encontra-se manuscrito um Despacho que, conjugando a pessoa a quem é dirigido o requerimento, o teor deste despacho manuscrito , a assinatura ou rubrica que se encontra após tal Despacho - e comparando-a, por exemplo, com a que se encontra no documento de fls. 696, deste Apenso CQ, Vol. II, após a referência “(...)” -, o Tribunal concluiu que foi feito pelo Dr. BQ, (...) da AX. Neste despacho o (...), Dr. BQ, pretende ouvir o parecer do director de CZ, perguntando expressamente “ … se tem alguém que possa fazer este trabalho…” e “… se acha que podemos prescindir dele durante algum tempo…”. O Director do CZ, na comunicação que em 13/03/97 fez para o (...) da AX, elogia e incentiva o desempenho do arguido, dizendo que “...não gostaria que o Sr. A fosse afastado deste trabalho porque (...) o faz bem(...) é empenhado(...) é responsável (...) tem bom relacionamento com os alunos e demais pessoas (...) é muito prestável...”, concluindo que o arguido teria, como tinha tido até aí, todo o seu apoio (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 663). Nesta comunicação há novo despacho, manuscrito, do (...) Dr. BQ, dizendo que falou com A “… que disse que alguns fins de semana poderá assegurar o serviço e outros não devido a compromissos particulares…”, tendo-o mandado falar com o Director de CZ (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 663). Dos autos o Tribunal não conseguiu identificar quais eram, em concreto, os “… compromissos particulares…” que impediam o arguido de assegurar, em todos os fins de semana, o serviço que vinha fazendo, mas resultando do referido documento que manteve a disponibilidade para assegurar o serviço em alguns fins de semana. Para o Tribunal o teor destes Despachos do (...) da AX e da comunicação do director de CZ, sustentam, pelo menos, as seguintes conclusões: (a) a dúvida que pudesse subsistir quanto ao referido pelo arguido A no requerimento que dirigiu ao (...) (e que transcrevemos parcialmente), de que tinha sido o (...) a determinar, por Despacho, que A “… acompanhasse o motorista em serviço na deslocação de alunos do CZ…”, “… a fim de o motorista realizar a sua tarefa sem ter a preocupação de zelar pelo comportamento dos alunos…”, desapareceu, tendo o Tribunal ficado com a convicção de que foi o (...) que o determinou e nos termos em que o arguido o referiu; (b) e que pelo menos desde o início de 1997 e por determinação do (...) da AX, Dr. BQ e com concordância e mesma intenção do Director do CZ, o arguido A passou a ter funções de - entre sexta feira e Domingo - acompanhar os alunos em transportes, como ajudante de motorista, para zelar pelo comportamento dos educandos; O que, por sua vez, contribuiu para o Tribunal concluir e fundamentar, a razão pela qual - como começámos por dizer neste ponto “3.3.2.” - não encontrámos , após a reintegração do arguido em Junho de 1991, quer nos elementos do processo, quer - adiantamos desde já - na prova testemunhal ou por declarações que foi produzida em audiência de julgamento, que tenham ocorrido advertências, Despachos, directivas ou acto sob qualquer outra forma, relativamente a “proibições” ou restrições de entradas do arguido em CZ sem ser em serviço ou a acompanhamento de alunos. E/ou que tenham sido suscitados incidentes, incluindo processos disciplinares, por o arguido A ter estado em contacto ou acompanhado educandos. Se, como vimos (pelo menos) em 1997 - e é início de 1997, tendo em atenção a data do requerimento do arguido A de fls. 664, do Apenso CQ. Vol. II - é o próprio (...) que determina que o arguido exerça efectivamente tal tipo de funções, faz “sentido” que, pelo menos desde 1997, não se detectem advertências ou restrições ao exercício de funções e não existam processos disciplinares relacionados com a violação de “restrições” ou “proibições”. (2) E em 18/2/00 o arguido foi oficialmente nomeado Motorista de Ligeiros, mas tendo começado a desempenhar essas funções pelo menos “…há mais de um ano…” - sendo de aferir esta referência temporal em relação a 10/12/99, o que numa primeira abordagem dá o início das funções, pelo menos, em Novembro de 1998, mas que do Apenso BQ, 3º volume, resulta que desempenhava as funções pelo menos desde Janeiro de 1998 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 628, com Nomeação definitiva como motorista de ligeiros em 6/3/00, Publicada em 6/3/00 no DR., fls. 629; sendo que a fls. 640 consta uma declaração assinada pelo então (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10 de Dezembro de 1999, certificando que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenha há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondem às necessidades permanentes da instituição e na sequenciada qual foi feita a reclassificação, conforme consta a fls. 636 ) - , funções que exerce até à sua demissão compulsiva, comunicada pelo (...) da Instituição em 27/09/02. Esta nomeação reforça a conclusão a que chegámos no ponto imediatamente anterior - quanto à razão de ser de termos deixado de encontrar qualquer rasto a advertências ou restrições imposta ao arguido A, quando estivesse em causa o exercício de funções relacionadas com o transporte ou acompanhamento de educandos -, não existindo também - e, neste aspecto, seguramente após 1991 - processos disciplinares relacionados com a violação de “restrições” ou “proibições” de contactos ou convivência com alunos, transportes ou outros serviços. Assim e ligando com o que dissemos no ponto anterior, se em 1997 o arguido passou a exercer funções de acompanhamento e controlo de alunos em deslocações, em 1998 passou mesmo a exercer, oficialmente, funções de transporte de alunos. E dos autos e da demais prova produzida em audiência de julgamento, também não resultou para o Tribunal que por causa do Despacho que nomeou o arguido para o cargo de motorista ou relacionado com tal despacho, tenha sido dada qualquer instrução, directiva ou o que quer que fosse, por parte da (...), da Direcção dos (...)s ou de qualquer outra pessoa com responsabilidades na educação, formação e saúde dos educandos, que limitasse ou impusesse qualquer regra ao arguido A, quando estivesse em causa o exercício das funções de motorista e que implicassem o transporte ou actividades com alunos. Nem resultou que anteriormente a esta nomeação oficial - pois, como vimos, o arguido começou efectivamente a exercer estas funções em data anterior à da sua nomeação oficial, que o Tribunal concluiu retroagir, pelo menos, a Janeiro de 1998 (cfr. Apenso BQ, 3º volume; cfr. fls. 640, do Apenso CQ, Vol. II, documento referente à declaração assinada pelo (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10 de Dezembro de 1999, certificando que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenha há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondem às necessidades permanentes da instituição) - tal tenha sido feito. No que diz respeito a um aspecto concreto que acabámos de referir - a data a partir da qual o arguido exerceu, efectivamente, as funções de motorista -, para além de o Apenso BQ, 3º Volume, conter os boletins de itinerário do arguido A “ como motorista” desde Janeiro de 1998, a testemunha WE disse ao Tribunal que quando foi trabalhar para a (...), em 1998, um dos trabalhos que pediu ao arguido A foi para fazer a distribuição de material pelos (...)s. (2.1) Mas esta nomeação significa também, por tudo o que já dissemos no ponto “3.3.1. (8.2) e (8.3)” - ponto para o qual expressamente nos reportamos, quer quanto aos documentos expressamente referidos quer quanto às conclusões retiradas dos mesmos, cfr. Apenso CQ, Vol.I, fls. 412; Apenso CQ, Vol. II, fls. 691 e 688; Apenso L, fls. 66; Apenso J, fls. 200 e 201, fls. 214 a 221 vº -, uma trajectória de subida de exercício de funções e na carreira profissional de A dentro da instituição. (2.2.) Aqui e com respeito a factos especificamente referentes ao arguido A - e relacionado, concretamente, com o exercício das funções de motorista -, está a matéria que o Tribunal deu como provada no ponto “69.” dos “factos provados” e que tem a ver a data em que o arguido teve a carta de condução e a data a partir da qual conduziu ou não, veículos dentro da AX. Embora seja um facto “singelo”, ele é-o aparentemente, pois tem peso e liga-se, com a avaliação que o Tribunal já fez e com a que irá complementar, quanto aos factos referentes “…à movimentação…” do arguido A dentro da AX, enunciada no capítulo “ (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A (Factos constantes de fls. 20.842 (parte final) a fls. 20.871 do Despacho de Pronuncia). Do elemento de fls. 643, do “Apenso CQ”, resulta que o arguido obteve a licença de condução em 24/11/94, embora a carta tenha sido emitida em 2/05/95. Contudo, da prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente dos documentos de fls. 26 a 28, do “Apenso L” – correspondente a uma exposição para o (...) da AX, manuscrita, do arguido A, por causa do processo disciplinar que lhe fora instaurado por Despacho do (...) de 23/02/88 e em que o próprio arguido relatou uma situação no dia 3 de Fevereiro de 1988, em que conduziu um carro pertencente a um stand que se situava em frente à AX e tendo dado “boleia” a três pessoas, sendo um funcionário da AX – e do teor do documento de fls. 116/117 do “Apenso CQ, Vol. I” – correspondente à carta que a mãe do educando “(…)”, em 1989 dirigiu à Professora HHO, por factos relacionados com o seu filho e com o arguido A -, resultou para o tribunal que pelo menos desde Fevereiro/Março de 1988 o arguido conduzia veículos automóveis. Mas do que antecede não resultou provado para o Tribunal que em 1988 ou 1989 – ou anteriormente, desde os anos 80, como refere o Despacho de Pronúncia - , o arguido já conduzisse veículos “da AX”. A testemunha UL - educadora na AX, no DT desde 1 de Março de 1996 -, declarou ter a “impressão” que em 1996 já via A a fazer a entrega do correio no Lar e de carro, pois lembra-se dele como motorista. Num segundo momento em que foi contra instada quanto a este facto e naturalmente pela insistência (inerente a uma contra-instância) a que foi sujeita - até porque dos autos resultava que o arguido só fora nomeado motorista de Ligeiros em 18/02/00 e daí a contra instância quanto ao que tinha declarado inicialmente (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 628 e 629, com Nomeação definitiva em 6/3/00 e Publicada em 6/3/00 no DR.) - passou a manifestar alguma incerteza quanto à data. Esta primeira “impressão” que a testemunha transmitiu ao Tribunal tem alguma corroboração no documento que se encontra a fls. 640, do Apenso CQ, Vol. II. (e que já mencionámos, o documento que corresponde à declaração assinada pelo então (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10/12/99, certificando, para efeitos de reclassificação do arguido, que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenhava há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondiam às necessidades permanentes da instituição; cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 636 e 640). A expressão “há mais de um ano” retroage, pelo menos, a meados de 1998 e no Apenso BQ, 3º Volume, como vimos, estão os “Boletins de Itinerário” do arguido A, como motorista, desde Janeiro de 1998. Mas analisando a expressão que o (...) usou na “declaração” de fls. 640, do Apenso CQ, Vol. II - que A desempenhava “há mais de um ano” as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondiam às necessidades permanentes da instituição -, face ao que foi o depoimento da testemunha UL - que entra para a AX em 1996 e a sua “impressão” foi a de sempre ter visto o arguido A na AX como motorista, a fazer a volta do correio -, a declaração que foi feita pelo Sr. (...) não afasta a possibilidade de que o arguido A, em 1996, já fizesse a volta do correio (ver, também o depoimento da testemunha VO, motorista da AX desde 1990/1991 e de quem o arguido A foi ajudante de motorista, o qual disse que lembrava-se de ver o arguido A conduzir carros da AX antes de ter tido a carta, mas apenas dentro da Instituição e para os levar de um lado para o outro, nas lavagens, mas dizendo que para fora da instituição nunca viu; e no mesmo sentido, mas reportando a data em que viu a condução de veículos dentro da instituição, a 1993, ver o depoimento da testemunha MG, motorista da AX desde 1993, tendo trabalhado com o arguido A, mas este como seu ajudante de motorista; destes depoimentos o Tribunal apenas retirou o sentido de uma condução pontual, dentro da instituição e para levar um veículo de um local para o outro e a isso o cingiu). No entanto e no que releva para o facto agora em causa – apesar da análise deste aspecto, as circunstâncias, incluindo as de tempo, em que o arguido A efectivamente procedeu à condução de veículos dentro da AX, ser relevante para a valoração e prova de factos descritos noutros capítulos do despacho de pronúncia, nomeadamente daqueles relacionados com o que o Tribunal concluiu ser o “à vontade” e a forma como o arguido A se movimentava e estava dentro da AX; e que, por sua vez, concorrem para a prova dos factos que demos como provados quanto aos abusos de natureza sexual praticados pelo arguido ou com o seu contributo -, não foi feita a prova do facto tal como estava alegado no despacho de pronúncia. (3) Em 2001 o arguido A tem um processo disciplinar – em que por Despacho do (...) de 27/12/01, é-lhe aplicada uma pena de multa, graduada em 100.000$00 (cfr. Apenso L, fls. 70 vº, 71 a 78, 88, 89 ; e cfr., também quanto a este processo, Apenso CQ, fls. 619 e 617; e Apenso J, fls. 58 a 86, o qual descreve a tramitação e percurso do processo instaurado) -, mas é um processo que foi instaurado na sequência de queixa apresentada pelo mecânico HHP, funcionário da AX, por agressão durante as horas de serviço (cfr. Apenso L, fls. 91). (3.1) Também neste ano de 2001, mas anterior ao processo disciplinar que acabámos de referir, há registo de um novo incidente entre o arguido A e funcionários da AX . Por uma comunicação datada de 19/02/01, subscrita pelo “Gestor da Frota e Responsável pela produção” da AX e por três mecânicos, é dado conhecimento ao Director do CZ, entre o mais, de situações “provocadas” e “criadas” pelo arguido A, o qual “… persegue os mecânicos quando saem das instalações em serviço (…); chamou ladrão ao mecânico VP (…), por duas vezes fez-se passar pelo Sr. Dr. C ao telefone, dando ordens ao porteiro para fiscalizarem as viaturas dos mecânicos (…), teve um acidente com a (…), mandou arranjá-la e não comunicou (…), mais tarde, quando esta veio à oficina, verificou-se que a transmissão do lado direito não era de origem mas sim da concorrência, a qual tivemos que substituir (…), o acidente foi de tal ordem que danificou a caixa ao ponto de se substituir por uma nova(…); ultimamente tem invadido as instalações … após horário laboral (…); as pessoas sentem ameaças pela parte dele com ameaças de alguém superior(…)” (cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69 e 70; e fls. 472 a 476 dos autos). A relevância da referência a este incidente, tem a ver com uma aspecto que já ressaltámos no ponto “3.3.1. (10) e (10.1)” - e que nessa altura da análise crítica da prova o Tribunal referiu que posteriormente trataria este aspecto - e que é o da percepção da atitude do arguido dentro da instituição ao longo do tempo. Na altura, isto é, quando tratámos o incidente que houve em 1993 entre os motoristas da AX e o arguido A, fizemos expressamente referência à “atitude” que na altura o arguido tinha dentro da AX - cfr. o que se disse no ponto “3.3.1. (10) e (10.1) e cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 688 a 691 -, ao que foi dito em audiência de julgamento pela testemunha Dr. BQ ((...) da AX já na altura dos factos que estamos a referir) quanto à atitude do arguido A (classificando-a como muito “interventiva ” e por isso geradora de situações de conflito”) e a valoração que o Tribunal fez de tal comportamento e atitude (no ponto “3.3.1. (10) e (10.1)”). Dissemos que tal devia-se não só à personalidade ou “maneira de ser” do arguido, mas também à receptividade ou à forma como o meio em que o arguido se movimentava, os dirigentes e funcionários da instituição, lidaram com a “maneira de ser” do arguido e os actos e factos que praticou (dizendo o Tribunal que posteriormente, quando referisse o incidente de 2001, cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69/70 , fls. 68 complementaria este aspecto). É que em 2001, mas tal como já acontecia em 1993 - cfr. Ponto “3.3.1. (10) e (10.1), da presente análise crítica da prova e o “incidente” com os motoristas da AX - e como já fora visível em 1988 - na informação que em 19/12/88 o arguido C fez para o (...) da AX, Dr. BQ (cfr. Ponto “3.3.1. (8) a (8.5) e em particular (8.2), da presente análise crítica da prova), em que ao mesmo tempo que fez a informação e proposta de alteração de funções do arguido A, o arguido C referiu nessa informação que quando chamados para serviços auxiliares e os “chamados” eram o funcionário HHQ e o arguido A, invocam que são “…ajudante de motorista, que é jardineiro e não carregadores, enfim, toda uma série de observações que acabam por aborrecer, quando não mesmo atingem proporções de impertinência…” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773 a 774) -, a atitude do arguido A era de “à vontade” dentro da instituição, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Consequência não só da sua “maneira de ser”, mas também da forma como ao longo do tempo foi tratado dentro da AX, como complementaremos no ponto “3.4.” a “3.4.3” da presente análise crítica da prova. Prosseguindo, na sequência da comunicação dos mecânicos (cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69 e 70; cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos) há a intervenção do arguido C, o qual fez uma reunião em 9/03/2001 com alguns dos funcionários envolvidos e conforme resulta do “MEMO” dessa reunião - que se encontra a fls. 68, do “Apenso EI, Vol. 1” -, foi referido que os motoristas - e aqui não só o arguido A de quem fora feita a participação, mas também os motoristas BBG e VO - “… metem-se nas questões dos mecânicos e mandam arranjar os carros, aqui e ali (…); (…) os Srs. Eng. HI e HHP referiram também que são maltratados pelo sr. A…”. Quanto, em concreto, ao arguido A, depreende-se do teor deste “memo” que o arguido C esclareceu que relativamente a esta “última questão” - de o arguido A maltratar os referidos funcionários - , os “ofendidos” deveriam sempre participar as ocorrências, mas “…não obstante…”, o arguido C decidiu “… de imediato providenciar à alteração dos mapas de transportes por forma a afastar mais o sr. A da oficina de mecânica, nomeadamente passando a fazer serviço quase em exclusivo na (...)…”. Seguem-se, no texto do “memo”, as considerações do arguido C quanto ao Engº HI - uma das pessoas que o arguido, em Audiência de julgamento, veio a associar à razão de ser do seu envolvimento e aparecer o seu nome neste processo e daí o estar a referir desde já tal pormenor - e as decisões que o arguido C tomou de imediato, face à abertura apresentada pelo Engº HI nesse sentido. Decidiu passar a coordenação e responsabilidade da oficina do Engº HI para o mecânico mais categorizado, o qual foi a testemunha EEI (a quem o arguido C pediu, de imediato, que apresentasse uma relação das modificações que entendesse necessárias para melhor funcionamento da oficina e também para o arguido C aferir da continuidade da oficina e com três funcionários a ela afectos - cfr. fls. 13, do “Apenso EI, Vol. 1”; bem como fls. 71, comunicação do (...) (...) C para o director do CZ, datada de 27/03/01, em que é comunicado pelo arguido C a restruturação da oficina da frota da AX, cessando as responsabilidades do Engº HI, passagem de tal responsabilidade para o mecânico EEI e a decisão de os três mecânicos da oficina ficarem na dependência directa da Divisão de aprovisionamento e Logística, passando a registar as suas entradas e saídas no sistema de registo de assiduidade instalado na (...); cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos). Mas, como vimos, no ano de 2001 o arguido continuou a ser classificado com Muito Bom. O que, para o Tribunal, significou que também neste ano houve “desconsideração” e “ desvalorização” da falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções, pois quer o processo disciplinar, quer o incidente que referimos, teve reflexo na avaliação que foi feita ao arguido, continuando a ser classificado com Muito Bom. (4) Em 2002 é instaurado o processo na sequência do qual, por Despacho da Secretária de Estado da Segurança Social datado 19/09/02, o arguido A foi aposentado compulsivamente (cfr. Apenso L, fls. 184 a 185, 197, 200, 209 ). De acordo com os elementos dos autos, este processo foi instaurado na sequência de queixa apresentada pela mãe do aluno da AX U, contra o arguido A, pela prática de actos de natureza sexual/abuso sexual na pessoa do seu filho (cfr. Apenso L, fls. 209, 210 a 213; Apenso CQ, Vol. II, fls. 556 e Apenso J, fls. 11 a 31, de onde constam os documentos e comunicações efectuadas dentro da AX, para a instauração do processo e respectivos motivos). 3.3.3. Neste processo de 2002, embora tenha acabado por ser o “fim do ciclo” do arguido A na AX, vemos, de novo, uma “reacção” vinda do “interior” da instituição, de repudio da demissão do arguido A e que é uma “atitude” que foi perceptível ao longo da reconstituição que o Tribunal fez da “vida” do arguido na instituição. O documento a que o Tribunal se está a referir e que encontrámos em processo anterior, é o que consta no “Apenso J”, fls. 7/8 e 9/10, no qual está aposta a data de Outubro de 2002, feito em nome de um grupo de alunos da AX e dos funcionários da AX, em que é pedido à Tutela que fosse feita a justiça da reintegração do arguido e reconhecida a falsidade das imputações, elogiando o trabalho e dedicação do arguido. Anteriormente e relacionado com o processo disciplinar que o arguido sofreu em 1989, encontramos também uma exposição que em Junho de 1990 foi apresentada pelo arguido A no processo que estava a correr no S.T.A. e ficou a fls. “66” a “69” desse processo – cfr. Apenso J, fls. 160 a 168, exposição que está dirigida ao “…Chefe de Gabinete (…)…”, em nome de “…nós alunos da AX…”, tendo o Tribunal retirado de fls. 160, do Apenso J, a conclusão de que, apesar de a exposição não ser feita em nome do arguido, nem estar assinada pelo mesmo, foi junta ao processo pendente no S.T.A. pelo arguido A, pois o ofício de fls. 160 faz referência à “…exposição de fls. 66 a 69, apresentada pelo recorrente A…”, a fls. 161 conta um Despacho a mandar extrair fotocópia da exposição de fls. 66 a 69, despacho este que está numa folha que no canto superior direito da página tem o nº 79, que se depreende ser o numero da folha nesses autos, e no documento que está a fls. 162 a 168, do Apenso J, nos cantos superiores direitos das folhas que o compõem, estão manuscritos o números referidos no despacho que manda extrair as cópias -, a qual é apresentada também em nome dos “Alunos e alunas” da AX e no mesmo sentido do documento que começámos por referir, de fls. 7 a 10, do “Apenso J” (ver, também, exposição remetida em 18/12/90 para o Ministro do Emprego e da Segurança Social, Dr. HHV, sob a forma de “exposição de alunos” sobre incidentes na AX e em que, entre o mais, é referido expressamente o arguido A e as referências à sua inocência e pedido de readmissão, dado até o seu trabalho e louvores recebidos - cfr. Fls. 152 a 159, do Apenso J). No entanto, por estes documentos não estarem assinados e apesar de o Tribunal ter concluído que o documento que está no “ Apenso J”, fls. 160 a 168, foi então junto aos autos pelo arguido A – e embora a testemunha WE, espontaneamente, tenha falado do documento que se encontra a fls. 152 a 159, do Apenso J, referiu-se ao mesmo como tendo-o visto sem assinaturas e, assim, nas mesmas “condições” em que está nos autos -, o Tribunal não os considerou para efeito da sua Motivação. Há, contudo, um documento que também foi junto ao processo disciplinar no qual o arguido recorreu para o S.T.A. - o processo disciplinar instaurado por Despacho do (...) datado de 29/05/89 e no qual o arguido fora demitido compulsivamente (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161, bem como fls. 193, 213 a 218, 223 a 231, quanto aos factos especificamente descritos no ponto “52.”, dos "Factos Provados" ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido) -, que corresponde a uma exposição que foi feita pelo arguido A e esse pode ser valorado pelo Tribunal. É o documento que se encontra a fls. 214 a 222, do “Apenso J “ – vendo-se ainda fls. 200 e 201, quanto ao envio do documento para o processo que estava em curso -, no qual o arguido faz uma “exposição” do que foi a sua vida na AX até aquele ano de 1990 e que, cruzando com os documentos que temos vindo a mencionar, contribuiu para o Tribunal ter uma visão mais completa neste campo da progressão, objectivos e vivência do arguido na AX dentro da Instituição e, de forma indirecta, como por sua vez a Instituição o “via”. 3.3.4. Feita a análise que antecede e concluindo o traçado, de forma tão objectiva quanto foi possível ao Tribunal, do percurso e da linha de raciocínio seguidos - nestes pontos “3.3.1.” a “3.3.3.” - no cruzamento e valoração dos documentos dos autos e da prova que foi produzida ao longo do Julgamento, temos que o Tribunal concluiu, num primeiro segmento, que: - apesar da prática por parte do arguido A de actos, no exercício das suas funções, que o pudessem fazer incorrer em responsabilidade disciplinar e que em algumas situações o fizeram incorrer nessa responsabilidade; - tal não se reflectiu na progressão na carreira, na classificação que foi obtendo e na forma como o arguido esteve e foi estando dentro da AX; Mas esta análise e cruzamento de elementos probatórios e tal como ressalta do que já ficou dito, permitiu concluir mais. Vejamos então. 3.4. Neste percurso seguido pelo Tribunal - e em que fizemos a reconstituição da “vida” do arguido na AX desde 1977 -, foi perceptível um padrão do que foi a “reacção” e “atitude” dos funcionários ou dirigentes da AX ao longo do tempo, em relação a incidentes ou actos em que o arguido A esteve directa ou indirectamente envolvido ou relacionado, quer aqueles em que esteve “em causa” ou “por causa” de educandos, quer os demais. E isto foi relevante para a matéria que o Tribunal deu como “provada”, em particular, nos pontos “59.” a “70.” dos “factos provados”, mas não só. Com efeito – e no mesmo sentido do já feito anteriormente -, decorre da estrutura do despacho de pronúncia e da forma como estão narrados e encadeados os factos nos diferentes “capítulos” com, por vezes, repetições, que a análise crítica da prova inerente ao presente núcleo de factos está, também, relacionada com aquela que o Tribunal fez para a prova/não prova dos factos descritos a fls. 20.842 a fls. 21.001 do Despacho de Pronuncia - e a que se refere (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados) o “Ponto (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A ” -. Assim e sem prejuízo do que o Tribunal vier a completar, com a análise crítica dos factos descritos a fls. 20.842 a fls. 21.001 do Despacho de Pronuncia (cfr. “Ponto (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A ”), vamos desde já fazer a fundamentação – pelo menos parcial -, dos factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “89.”, 89.1” e 91” dos “factos provados e ponto “....”, dos “ factos não provados”. 3.4.1. Passando, então, a ilustrar o “padrão” que emerge para o Tribunal e que também contribuiu para a prova do grupo de factos que particularizámos no ponto imediatamente anterior, acentuamos o seguinte: (1) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1980 e os factos referentes ao ano de 1981 – concretamente no ponto “3.3.1. (1) a (1.2)” da presente análise crítica da prova -, o Provimento do (...) da AX, HHM, de 29/12/80, passando o arguido para o “quadro” como “Jardineiro de 3ª classe”, dado que até ali exercia funções como “eventual” e “auxiliar” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, ver Provimento/contrato do Quadro, 29/12/80, Jardineiro 3ª Classe a fls. 941, posse em 8/4/81 como Jard. 3ª classe, fls. 765, 766, 819, 936). O Tribunal reconduz-se, aqui, para o que já disse no ponto “3.3.1. (1) a (1..2)”, quanto às circunstâncias em que foi feito o Provimento (cfr., em particular, ponto “3.3.1. (1.1)”, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou pelo menos “sub-avaliação “ da segurança e consequentemente dos interesses dos educandos da AX. E relembramos a posição que em Março de 1980 o (...) da instituição expressava, quanto à “razão” dos “… factos surgidos ultimamente e de que o caso do empregado auxiliar A é um dos da série…”, formulando “… o parecer de que se trata de orquestração preparada no sentido de criar uma desestabilização institucional, tal como acontece com outros Organismos do Estado…” (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 441 a 445). (2) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao ano de 1982 e 1983 – concretamente no ponto “3.3.1. (2) e (2.1)” da presente análise crítica da prova -, a comunicação que 10/10/83 o (…) BQ ((...) do (...)) fez para o Chefe dos Serviços Gerais e Económicos, dizendo que A deixava de estar afecto ao serviço de transportes e regressando ao trabalho de jardineiro, não podendo frequentar as instalações de CZ. E referindo ainda, o Dr. BQ, o deficiente cumprimento que o arguido vinha fazendo dessa ordem, determinando que A fosse advertido que o incumprimento seria punido com infracção disciplinar (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 488 a 490 e Apenso CQ, Vol. II, fls. 908, 953). O Tribunal reconduz-se, aqui, para o que já disse no ponto “3.3.1. (2.1) ”, quanto às circunstâncias que estiveram na génese de tal comunicação, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita - da falta de zelo e cuidado, com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano -, na avaliação que lhe foi feita nesse ano (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 611). (3) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1984 – concretamente no ponto “3.3.1. (3) e (3.1) ” da presente análise crítica da prova -, a proposta de promoção do arguido, em 24/10/84, para “Jardineiro de 2ª classe”, com a referência expressa de que tal promoção correspondia ao “justo direito à promoção”(cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 887). O Tribunal reconduz-se, aqui, para o que já disse no ponto “3.3.1. (3) e (3.1)”, quanto às circunstâncias em que foi feita a proposta de promoção, quanto às circunstância e fundamentos do processo disciplinar sofrido nesse ano pelo arguido, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano, pois sofreu uma punição disciplinar, não se tendo reflectido na avaliação que lhe foi feita, nem na progressão na carreira (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; fls 867; fls. 887; e Apenso K, fls. 356 e 356vº; Apenso L, fls. 119). (4) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1985 – concretamente no ponto “3.3.1. (4) ” da presente análise crítica da prova -, a “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano - pois sofreu uma punição disciplinar -, na avaliação que lhe foi feita nesse ano (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 848). (5) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1986 – concretamente no ponto “3.3.1. (5)” da presente análise crítica da prova -, as circunstâncias e fundamento do processo disciplinar (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 832, 852, 890, 892; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119; Apenso K, fls. 356 e 356vº ). O Tribunal reconduz-se para o que já disse no ponto “3.3.1. (5) ”, quanto às circunstâncias em que foi cometida a infracção que deu lugar ao processo disciplinar - repetição de infracção disciplinar, pela qual já tinha tido idêntico processo em 1984 -. Bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano - em que sofreu uma punição disciplinar, reincidindo nos mesmos termos e fundamentos (violação da proibição de entrada em CZ, sem ser por razões de serviço e contacto com educando) do processo disciplinar sofrido em 1984 - na avaliação que lhe foi feita, pois não há qualquer reflexo: nesse ano o arguido tem subida de mérito na classificação, pois é avaliado com Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 837). (6) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1988 – concretamente no ponto “3.3.1. (7), (7.1) e (7.2)” da presente análise crítica da prova -, o “Louvor” que em Maio de 1988 é feito por três (...) às qualidades e potencialidades do arguido A, para ser aproveitado no campo do acompanhamento e vigilância dos educandos (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 828/829). O Tribunal reconduz-se, aqui, para o que já disse no ponto “3.3.1. (7.1) e (7.2)”, quanto às circunstâncias em que foi feito o “Louvor”, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, aos riscos a que os educando da instituição podiam estar ex(...)s. E reconduz-se, igualmente, às conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano - em que sofreu uma punição disciplinar, que terminou em 30 dias de aposentação - na avaliação que lhe foi feita, pois nesse ano o arguido continuou a ser avaliado com nota de mérito, Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 746). (7) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao processo disciplinar que o arguido teve em 1989 – concretamente no ponto “3.3.1. (8) a (8.6) ” da presente análise crítica da prova, processo em que o arguido foi demitido compulsivamente, decisão que veio a ser anulada pelo S.T.A. e o arguido reintegrado - : - o documento que em Dezembro de 1989 foi enviado para o Secretário de Estado da Segurança Social, conjuntamente com o recurso que o arguido A interpusera do despacho da sua demissão, contendo as cerca de 191 assinaturas de funcionários da AX, a abonarem o bom comportamento do arguido A (cfr. Fls. 313 a 327, do Apenso J); - a referência que em 11/10/91 foi feita pela Chefe de Repartição da Secretaria Geral, aquando da proposta de nota do arguido, às “… conhecidas (…) qualidades profissionais deste funcionário…” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 724); - o despacho do (...) Dr. BQ, datado de 3/04/89, a atribuir ao arguido as funções de serviços auxiliares na (...) e executar o que lhe for determinado no âmbito dos serviços de transportes (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773/774); - o “Louvor” que em 7/09/89 é feito ao arguido A, pela Directora do (...) DT, louvando o comportamento do arguido com os alunos e educadores, aquando do transporte para as (...) de verão (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 806); O Tribunal reconduz-se para tudo o que já disse no ponto “3.3.1. (8) a (8.5) ”, quanto às circunstâncias em que foi feito o “Louvor”, especial referencia a desempenho profissional ou atribuição de funções, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, aos riscos a que os educando da instituição podiam estar ex(...)s. E reconduz-se, igualmente, para o que disse e conclusões que tirou no ponto “3.3.1., em particular pontos (8.2) e (8.3) ”, quanto às circunstâncias em que: - em 19/12/88 o arguido C fez a proposta de nomeação do arguido A, para passar a executar novas funções na (...) e no serviço de transportes ; - e que em 3/04/89 o (...), Dr. BQ, a homologa (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773 a 774); - o seu significado como trajectória de “subida” na carreira profissional do arguido A dentro da instituição; - e (novamente) à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, aos riscos a que os educando da instituição podiam estar ex(...)s com o exercício dessas novas funções. (8) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes a 1991, na sequência da reintegração do arguido após o Acórdão do S.T.A. de 16/04/91 – concretamente no ponto “3.3.1. (9), (9.1) ” da presente análise crítica da prova, processo em que o arguido foi demitido compulsivamente, decisão que veio a ser anulada pelo S.T.A. e o arguido reintegrado - : - o ofício que o (...) enviou em 27/06/91 para o Secretário de Estado da Segurança Social, a demonstrar preocupação pelo facto de o arguido poder em contacto com menores e solicitando a possibilidade de colocação do arguido noutro serviço da Secretaria de Estado da Segurança Social, pedido que renova por ofício de 21/08/91 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 714/715, fls. 718/719; cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 716/717); - o “Louvor” que nesse mesmo ano de 1991 é publicado no D.R. (II Série) de 24/06/91 – três dias antes do Dr. BQ enviar o ofício para o secretário de Estado, a pedir a transferência do arguido -, em que o arguido A é “Louvado Publicamente pelo labor e dedicação empenhados nas tarefas que precederam as inaugurações da (...) (…) e (…)” (cfr. Apenso L, fls. 119). - a subida de classificação nesse Ano de 1991 para MUITO BOM (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 710 a 713, fls. 607). O Tribunal reconduz-se para tudo o que já disse no ponto “3.3.1. (9), (9.1)”, quanto às circunstâncias em que foi feito o “Louvor”, alteração da sua notação de mérito, bem como as conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, aos riscos a que os educando da instituição podiam estar ex(...)s. E reconduz-se, igualmente, às conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada à “preocupação” que o (...) demonstrou com o pedido de transferência do arguido A para fora da instituição, na avaliação que lhe foi feita, pois nesse ano o arguido sobe na classificação de mérito para Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 710 a 713). E ao que disse quanto à “sobrevalorização” - que para o Tribunal foi feita - do zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções e tal como a mesma se reflectiu na sua avaliação e classificação nesse ano. (9) Já assinalámos - concretamente no ponto “3.3.2.”, da presente análise crítica da prova - que após reintegração do arguido em 5/06/91 – na sequência do Acórdão do S.T.A. de 16/04/91, que anulou o Despacho do Secretário de Estado que em 4/10/89 tinha demitido compulsivamente o arguido A (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; bem como fls. 193, 213 a 218, 223 a 231, quanto aos factos especificamente descritos no ponto “52.”, do "Factos Provados" ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ; cfr. Também o Apenso L, fls. 119, embora seja um documento repetido ao longo de vários Apensos, relacionado com os registos disciplinares do arguido) - e até ao processo em que o arguido veio a ser demitido compulsivamente, por comunicação que lhe foi feita pelo (...) em 27/09/02, não encontrámos nos autos e para o Tribunal também não resultou da demais prova produzida em audiência de julgamento, a existência de imposição de novas proibições ou de restrições, do arguido entrar em qualquer sector da AX ou de exercer quaisquer funções que estivessem relacionadas com o acompanhamento de educandos. Mas para além do que antecede - da ausência de prova quanto a existência de imposição de limitações a contactos do arguido A com educando da AX ou de transporte de alunos; e da ausência de processos disciplinares com tal fundamento -, o Tribunal encontrou mesmo o movimento contrário, como já referimos. (10) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao ano de 1993 – concretamente no ponto “3.3.1. (10) e (10.1) ” da presente análise crítica da prova -, o teor da exposição que em 15/09/93 cinco motoristas da instituição fizeram ao (...), Dr. BQ, por causa do trabalho do arguido A (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 691). O Tribunal reconduz-se para o que disse e conclusões que tirou no ponto “3.3.1., pontos (10) e (10.1)”, quanto ao sentido e significado: - da informação que foi dada ao (...) pelo Chefe dos Serviços Gerais e económicos - o funcionário A “destabiliza e tem mau relacionamento com os Senhores Motoristas porque exige ser ele a programar e orientar o serviço, sobrepondo-se ao serviço de Transportes, e quando não se faz como ele quer, surgem insultos e ameaças verbais”; o arguido A várias vezes, “no átrio da (...) toma atitudes que não são correctas, discutindo ordens de serviço”, tendo a Chefe de Serviços já advertido o arguido que é apenas “ ajudante do motorista e nada mais”, propondo que futuramente A fique sob orientação directa do Chefe dos Serviços Gerais Económicos, “ não podendo invocar quaisquer desculpas para alterar e não cumprir as tarefas que lhe foram destinadas e sempre que recebesse ordens de outros Superiores, teria que dar conhecimento aos Serviços, não os abandonando e só depois quando lhe perguntam porque não executou este ou aquele serviço, alegar que foi com ordens do superior tal…”; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 680 a 690); - da referência feita pelo (...) no despacho de 22/09/93, quando decidiu “ dar mais uma oportunidade” ao arguido A e que o arguido tivesse sempre presente o decidido (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 691 e 688); - do significado das atitudes do arguido dentro da instituição (cfr., em particular, ponto “3.3.1. (10.1)”); E reconduz-se, igualmente, às conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano - pois este incidente, o que está escrito quanto ao que era a atitude e actuação do arguido na instituição e a advertência feita pelo (...) no Despacho de 22/09/93, fazem o Tribunal concluir nesse sentido - na avaliação que lhe foi feita, pois não teve qualquer reflexo, tendo o arguido continuado a ser avaliado com nota de mérito, Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 692 e 682). (11) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao ano de 1997 – concretamente no ponto “3.3.2. (1) ” da presente análise crítica da prova -, o requerimento que o arguido A fez em 11/03/97 ou 12/03/97, ao (...) da AX, para ser dispensado das funções que tinha ao “fim de semana”, de fazer o “acompanhamento” de alunos, “zelando pelo seu comportamento” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 664). O Tribunal reconduz-se, igualmente, para o que disse e conclusões que tirou no ponto “3.3.2., ponto (1)”, quanto ao sentido e significado: - do requerimento apresentado pelo arguido A em 11/03/97 ou 12/03/97, ao (...) da AX (para ser dispensado das funções que tinha ao “fim de semana”, de fazer o “acompanhamento” de alunos, “zelando pelo seu comportamento”, funções que o Tribunal concluiu terem sido atribuída pelo próprio (...)); - das considerações do (...) Dr. BQ e do director do CZ, quanto a tal pedido (no sentido, para o Tribunal, da sua imprescindibilidade); - bem como as conclusões que o Tribunal retirou quanto às funções que o arguido A tinha nessa altura e, pelo menos, a partir dessa altura, relacionadas com alunos; (12) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao ano de 2000 – concretamente no ponto “3.3.2. (2)” da presente análise crítica da prova -, a nomeação oficial, em 18/02/00, do arguido A como motorista de ligeiros na instituição (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 628, 629, 640 e 636). O Tribunal reconduz-se, igualmente, para o que disse e conclusões que tirou no ponto “3.3.2., ponto (2)”, quanto ao sentido e significado: - da nomeação oficial do arguido como motorista de ligeiros e do seu significado como uma progressão na sua carreira dentro da instituição; - do momento a partir do qual (pelo menos) o arguido começou a exercer efectivamente as funções de motorista, transportando educandos da AX; - da inexistência de qualquer instrução, directiva ou qualquer outro acto, que limitasse ou impusesse qualquer regra ao arguido A, no transporte de educandos; (13) Já assinalámos, quando analisámos os factos e documentos referentes ao ano de 2001, o processo disciplinar que o arguido teve nesse ano – concretamente no ponto “3.3.2. (3) e (3.1) ” da presente análise crítica da prova e processo disciplinar em que o arguido foi condenado numa pena de 100.000$00 de multa - e o incidente suscitado pelos mecânicos da AX, por causa de actuações do arguido A. O Tribunal reconduz-se para o que disse e conclusões que tirou no ponto “3.3.2., pontos (3) e (3.1)”, quanto ao sentido e significado: - da informação que foi dada ao (...) pelo Chefe dos Serviços Gerais e económicos - o funcionário A “destabiliza e tem mau relacionamento com os Senhores Motoristas porque exige ser ele a programar e orientar o serviço, sobrepondo-se ao serviço de Transportes, e quando não se faz como ele quer, surgem insultos e ameaças verbais”; o arguido A várias vezes, “no átrio da (...) toma atitudes que não são correctas, discutindo ordens de serviço”, tendo a Chefe de Serviços já advertido o arguido que é apenas “ ajudante do motorista e nada mais”, propondo que futuramente A fique sob orientação directa do Chefe dos Serviços Gerais Económicos, “ não podendo invocar quaisquer desculpas para alterar e não cumprir as tarefas que lhe foram destinadas e sempre que recebesse ordens de outros Superiores, teria que dar conhecimento aos Serviços, não os abandonando e só depois quando lhe perguntam porque não executou este ou aquele serviço, alegar que foi com ordens do superior tal…”; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 680 a 690); - da referência feita pelo (...) no despacho de 22/09/93, quando decidiu “ dar mais uma oportunidade” ao arguido A e que o arguido tivesse sempre presente o decidido (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 691 e 688); - do significado, para o Tribunal, das atitudes do arguido dentro da instituição (“à vontade”; “supremacia” em relação aos demais funcionários; não “acanhamento” face a superiores hierárquicos) e das causa de tal atitude (consequência da “maneira de ser” do arguido; e da forma como ao longo do tempo foi tratado dentro da AX) (cfr. em particular, ponto “3.3.2. (3.1)”); E reconduz-se, igualmente, às conclusões que aí retirou quanto à “desconsideração” que foi feita ou “falta de relevância” que foi dada, à falta de zelo e cuidado com que o arguido exerceu as suas funções nesse ano - pois este incidente, o que está escrito quanto ao que era a atitude e actuação do arguido na instituição e a advertência feita pelo (...) no Despacho de 22/09/93, fazem o Tribunal concluir nesse sentido - na avaliação que lhe foi feita, pois não teve qualquer reflexo, tendo o arguido continuado a ser avaliado com nota de mérito, Muito Bom (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 692 e 682). 3.4.2. Ora todo este percurso, traçado de forma tão objectiva quanto foi possível ao Tribunal, permitiu-nos concluir também o seguinte: (1) Quer os “Louvores”, quer as alterações de funções do arguido, quer as efectivas funções que foram sendo atribuídas ao arguido, subida na notação de mérito, nas circunstâncias e/ou momentos em que o foram, são expressão de “reacções” vindas do interior da instituição, de pessoas diversas e com diversas responsabilidades na Instituição, em relação: - às atitudes que A foi tendo ao longo do tempo dentro da instituição, relacionadas ou por causa das funções que exercia ou como as exercia; - aos procedimentos disciplinares a que foi sujeito; - e às sanções disciplinares que lhe foram impostas, incluindo mesmo a pena de demissão a que o arguido foi sujeito mas anulada em 1991 pelo S.T.A.. Contudo não são “reacções” esporádicas, que aconteceram por acaso ou coincidência, por uma convergência qualquer não explicável ou com uma origem em que não é possível detectar qualquer “intenção”, enfim, que se diga que aquela promoção ou que aquela avaliação, ou que aquela atribuição de funções, ou qualquer outra “acção” ou “reacção” “... aconteceu por acaso ...”. O que podia acontecer, por exemplo, se o Tribunal verificasse que em todo o percurso do arguido, aquelas situações que o Tribunal identificou como situações em que entendeu ter havido “desconsideração” ou “desvalorização” de riscos para os educando da AX, ou de “desvalorização” da forma como o arguido exerceu as suas funções e da forma como as “devia” ter exercido - para ter uma nota de mérito ou para ter uma progressão e promoção na carreira -, correspondessem a actos isolados, situações isoladas ou esporádicas. Pelo contrário. O que sucede é que o Tribunal vê um padrão consistente e repetitivo dessas “desconsiderações” ou “desvalorizações”, pois resulta da prova que foi produzida e que o Tribunal tratou, que as “avaliações”, as “alterações de funções”, a “progressão na carreira”, a forma como foi dada resposta a incidentes relacionados com atitudes, comportamentos ou actuações do arguido A dentro da instituição, sua relação com os outros colegas ou funcionários da AX, os “Louvores” que lhe foram feitos, corresponderam a acções ou atitudes decorrentes de decisões ponderadas e justificadas por quem as tomou ou subscreveu. E consecutiva e repetidamente tomadas ou adoptadas. Traduzem também, para o Tribunal, uma “atitude de descrédito” e/ou de “falta de relevância”, que pelo menos algumas pessoas dentro da Instituição deram - como, por exemplo, o (...) da AX, (...)s do (...), alguns (...) ou Directores de (...)s, chefes de departamentos, funcionários -, a qualquer possibilidade, séria, de o arguido A praticar actos que pusessem ou pudessem pôr em causa a boa educação, formação, saúde e bem estar dos educandos. (2) E é relevante referir tal “reacção” e “atitude” pois, no mesmo sentido que dissemos anteriormente (cfr., por exemplo, ponto “3.3.1. (8.1) e “3.3.1. (7.1)”, em particular o que dissemos quanto ao modo como o arguido era visto e, consequentemente aceite, dentro da AX pelos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos ), a análise e reconhecimento desta reacção ou atitude ao longo do tempo, concorreu para o Tribunal concluir e objectivamente sustentar, porque é que os factos que veio a dar como “provados”, em relação a actos de abuso de natureza sexual sofridos por alunos da AX, intra-muros ou fora da instituição, puderam ocorrer sem: - conhecimento; - percepção; - ou suspeita; de quem, aos vários níveis, tinha a responsabilidade da guarda, educação e formação dos educandos. Configurou, em consequência, um contributo que ao longo do tempo foi sucessivamente dado por pessoas com responsabilidades dentro da AX - mesmo que sem intenção nesse sentido ou percepção de que tal poderia acontecer -, para que os factos que o tribunal deu como “provados” nestes autos pudessem ter ocorrido. E porquê? Porque o arguido A, ao longo do tempo, foi ultrapassando frequentemente os limites que lhe eram im(...)s. Tinha processos e sanções disciplinares, advertências que se voltasse a infringir os seus deveres era sancionado disciplinarmente, eram-lhe impostas condições para ficar na secção de transportes mas, em paralelo - nos mesmos anos e períodos em que sofria sanções disciplinares e advertências -, progredia na carreira, era promovido, era avaliado com mérito, era aumentado e foi conseguindo exercer as funções que pretendia no serviço dos transportes. Assim, foi sofrendo sanções disciplinares ou advertências, mas não alterou - nem precisou de alterar - a sua atitude. Foi criando um sentimento de superioridade e de impunidade. E, ao mesmo tempo, como são expressão os actos de abuso que confessou ter praticado com alunos da AX e aqueles que o Tribunal deu como provados, afundando-se cada vez mais nessas práticas. E será tendo em consideração esta perspectiva que analisaremos, de forma mais individualizada e em momento sequente – mas tendo sempre presente o que deste capítulo possa concorrer para a prova de outros grupos de factos igualmente objecto do despacho de pronúncia, entre os quais aqueles em que está especificamente individualizada a imputação de actos de natureza criminal aos arguidos -, a actuação do arguido C - enquanto, também, funcionário da AX - em relação ao arguido A , pois em relação ao (ex) (...) (...) C neste processo estão imputados actos de natureza criminal. (3) E o que antecede liga-nos, ainda, com outra questão que foi colocada ao Tribunal durante o Julgamento e a que a análise que temos vindo a fazer contribuiu para dar resposta. Como foi possível, numa instituição como a AX: - com controlo e avaliação de funcionários; - departamentos ou sectores com competências próprias como, por exemplo, os Serviços de Aprovisionamento e logística na área da programação e controlo de transportes e viaturas; as Direcções dos (...)s, as equipes de internato na área do controlo de alunos; – (...) que, à partida, teriam, uns, a potencialidade e virtualidade de controlarem o exercício de funções dos funcionários com que lidavam ou a forma como eram exercidas as funções; e, outros, controlar os educandos que tinham sob a sua guarda; - que o arguido A se movimentasse dentro da instituição, junto dos alunos e com os veículos da AX, sem que isso fosse detectado pelos serviços respectivos, sem que fosse chamado a atenção, sem que isso fosse em alguma forma descoberto por qualquer sistema ou procedimento de controlo; - e que os educando se deslocassem para fora da instituição, da forma que o tribunal veio a dar como provado; E foi possível, dizemos desde já, por um lado, por tudo o que já expusemos quanto à “desconsideração” e “ desvalorização” - em vários planos, momentos e por diversas pessoas - que ao longo do tempo foi sendo, consecutivamente, feita do comportamento, da “maneira de estar” do arguido e da forma como o arguido A exerceu as suas funções dentro da AX Por outro, pelo que efectivamente foi a organização, controlo e funcionamento no “dia-a-dia” da instituição - quer quanto aos meios e serviços em si, quer quanto aos funcionários, quer quanto ao internato de alunos -, no tempo em que ocorreram os factos que o Tribunal veio a dar como provados (aspectos que estão especialmente tratados em momentos posteriores desta análise). 3.5. Passemos, então (como referido no ponto “3.4.2.”), a individualizar a actuação do arguido C em relação ao arguido A, questão repetidamente debatida pela Acusação por um lado e pela Defesa do arguido C por outro, durante o julgamento (a forma como o arguido A era tratado pelo arguido C e a forma como o arguido A tratava o arguido C dentro da AX; ou as atitudes que cada um assumiu por causa desse relacionamento). E ver o que o Tribunal considerou ter havido de diferente na actuação do arguido C face aos demais funcionários ou dirigentes da AX , em relação ao arguido A e que nos levou a concluir - nos precisos termos e com as limitações ou extensão que ficou a constar na matéria provada -, por uma situação de “protecção” do arguido C em relação ao arguido A. A exposição e motivação quanto a este(s) facto(s), liga-se ao que já dissemos no ponto “3.3.1. e “3.3.2. (3.1)”, pelo que para os factos que o Tribunal agora está a particularizar - os constantes dos pontos “66.” a “70” dos “factos provados”, pontos “89.”, 89.1” e 91” dos “factos provados e ponto “....”, dos “ factos não provados” -, o Tribunal convoca tal matéria. 3.5.1. Começamos por referir um facto que o Tribunal constatou ao longos dos depoimentos e que foi o número de pessoas ouvidas – incluindo os arguidos A e C -, que cresceram e trabalharam na AX, que estudaram e trabalharam na AX, que tinham familiares ou pessoas das suas relações a trabalhar na AX, que se casaram ou tiveram relações de idênticas natureza (sendo “da AX”) com pessoas “da AX”. Assim - e sendo meramente enunciativo, dado o número de testemunhas ouvidas e resultando o que se vai dizer, pelo menos, dos depoimentos das testemunhas ou das declarações dos arguidos que indicarmos – o Dr. BQ começou a trabalhar na AX em 1968 como educador, em 1976 passa a exercer funções na (...) como Chefe da secretaria Geral, em 1982 passa a exercer as funções de (...) (...) e em Abril de 1986 é nomeado (...) da instituição, onde está até Novembro de 2002. O seu irmão HX (cfr. Apenso D, 1º Volume, fls. 89), foi responsável pela Direcção do (...) GB, sendo que antes de assumir estas funções fora docente (até Julho de 1996; cfr. Apenso D, Vol. 1º, fls. 120/121). Quanto ao arguido A e ao arguido C, já vimos que o arguido A entrou para a AX aos 4 anos e aí fez toda a sua vida escolar e profissional, tendo mesmo vivido num local dentro das instalações da AX. O arguido C, por sua vez, declarou ao Tribunal que esteve interno na AX, onde fez a sua escolaridade, desde o ensino básico e aí ficou a trabalhar até ter saído, na sequência do processo disciplinar instaurado por causa dos factos deste processo. A sua carreira foi sendo sempre dentro da AX e o seu objectivo, de acordo com o que declarou ao Tribunal era ascender ao cargo de (...) da Instituição. Disse ao Tribunal que os seus dois filhos também estiveram a estudar na AX - o que foi corroborado pelos mesmos, as testemunhas GV e GU. Disse que a sua primeira mulher, GW - com quem declarou ter casado em 1974 e separado em 1984/1985 -, também era “(…)”. Em 1985 passou a viver com GX, que disse também ter sido aluna da AX e ter trabalhado na Instituição (na divisão de aprovisionamento e logística e no (...) FA). E declarou que em 1997/1998 estabeleceu “… a melhor relação estável com a NY, também funcionária da AX, tendo sido educadora em 1982 no (...) DT - o que foi corroborado pela testemunha NY, quando ouvida pelo Tribunal. A testemunha UL, entrou em 1996 para a AX como educadora, disse ser irmã da ex-mulher do arguido C – GW – e que o seu ex-marido, UM, também é educador na AX . WE (técnico superior na AX) declarou ao Tribunal ter entrado para a AX em 1974, para trabalhar, ainda se encontrando na instituição na altura em que prestou depoimento (mais de 20 anos na instituição). A testemunha HH entrou para a AX, para trabalhar, em 1964 e saiu em 30/06/2003, altura em que se reformou (38/39 anos a trabalhar na instituição). A testemunha EC, foi funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, o que disse ter feito por mais vinte anos. Disse ser casado com a testemunha ED (que também o confirmou ao tribunal), funcionário da AX, inicialmente como telefonista e depois na recepção, desde 1988. HJ, a trabalhar na AX desde 1986 – inicialmente na manutenção, depois esteve como ajudante nas garagens e em 2000 tomou posse como motorista -, estudou na AX durante cerca de 10 anos e os seus Pais eram funcionários na instituição. HS, técnico profissional principal na área de música na AX há mais ou menos 27 anos, o qual declarou ao Tribunal ter sido também aluno na instituição. EF, (...), funcionário público a exercer funções na (...) da AX no Departamento de Organização Informática desde 05/02/1976. Foi aluno da AX e durante 15 anos trabalhou com o arguido C, até à saída deste. Do que antecede - e conjugado com o que se pode extrair do que foi a vivência da AX como instituição, quando o Tribunal fez o tratamento do percurso do arguido A dentro da Instituição, concluímos que a AX era uma instituição grande mas um meio pequeno. E dizemos que era um “meio pequeno” porque tinha uma estrutura fechada e voltada para si. Isto é, a sua direcção, organização e estruturação como entidade de educação e “casa” de crianças e jovens em risco, como instituição substitutiva da Família, era feita em círculo. Este círculo delimitava - e naturalmente continha – as ondas que se formassem e as que se formaram, por causa de incidentes surgidos na instituição, fosse qual fosse a sua natureza. O que se reflectia, também, na sua organização e gestão como instituição (cfr. Apenso D. Vol. IX, fls. 1985, onde constam as conclusões que levaram à proposta de realização de auditoria, Pº nº 169/2001). E é relevante referir esta característica “própria da AX”, porque é uma circunstância que, na perspectiva do Tribunal, foi inerente às desvalorizações que ao longo do tempo foram feitas dos riscos ou dos interesses dos jovens internados e explica procedimentos que foram adoptados ou meramente seguidos na sua educação e guarda. É que sendo os “problemas” surgidos na instituição e as “soluções” encontradas para esses problemas tratados intra muros, pelos/e com os funcionários com o perfil que vimos - quanto à permanência e recrutamento; quer mesmo quanto à inexistência de formação, como se pode aferir do que as testemunhas disseram quanto à sua formação ou dos cargos que exerceram, com competências de educação ou acompanhamento de jovens em risco em regime institucional de internato, sem formação específica para o efeito -, é do senso comum que tendencialmente haverá lugar à automatização de procedimento e repetição de comportamentos, reprodução de soluções e aplicação dos mesmos critérios: fazia-se como era costume fazer. Neste sentido foi ilustrativo o depoimento da testemunha YW, educadora do Internato da AX desde de Outubro de 1986. Quando relatava uma conversa que teve com um colega, já falecido, de nome “(…)”, este disse-lhe para não deixar que o arguido A andasse “ muito com os meninos”. Mas nunca lhe explicaram porquê e a testemunha também não perguntou. Foi expressiva no que disse quanto à razão pela qual não perguntou: “…porque na altura nós estávamos assim um bocadinho ... também…era…o que era dito era dito…diziam para fazer , nós fazíamos, muitas vezes nem sequer questionávamos porquê…”. O que, necessariamente, deu lugar à sucessiva reprodução do que estivesse bem, mas também do que estivesse errado, esbatendo-se, ao longo dos anos, o sentido crítico, a capacidade de iniciativa para alterar o que estivesse errado ou simplesmente para pôr em causa que alguma coisa pudesse estar errada ou o que estivesse errado. O que antecede sustenta, também, o facto que o Tribunal deu como provado no ponto “14.” dos “factos provados”, embora para o mesmo sejam igualmente relevantes as conclusões já retiradas nos pontos “3.4.1.” e “3.4.2.” da presente análise crítica da prova, quando o Tribunal referiu: - o padrão consistente e repetitivo das “desconsiderações” e “desvalorizações” que foram sendo feitas nas “avaliações”, “alterações de funções” e “progressão na carreira” do arguido A; e na forma como foi dada resposta a incidentes relacionados com atitudes, comportamentos ou actuações do arguido A dentro da instituição, sua relação com colegas e funcionários da AX; - a consideração de tal padrão como expressão de uma “atitude de descrédito” e/ou de “falta de relevância”, que algumas pessoas dentro da Instituição - por exemplo o (...) da AX, (...) ou Directores de (...)s, chefes de departamentos, funcionários -, deram a qualquer possibilidade, séria, de o arguido A praticar actos que pusessem ou pudessem pôr em causa a boa educação, formação, saúde e bem estar dos educandos; - e concorrendo tal “reacção” e “atitude” como um contributo que, ao longo do tempo, foi sucessivamente dado por pessoas com responsabilidades dentro da AX, para que os factos que o tribunal deu como “provados” nestes autos pudessem ter ocorrido; Tendo contribuído, em consequência, para que os factos deste processo pudessem ter ocorrido na AX. 3.5.2. Em audiência de Julgamento o arguido C não admitiu qualquer protecção em relação ao arguido A, mesmo por qualquer motivo que em nada correspondesses aos descritos no despacho de pronúncia e o arguido A também não admitiu que isso sucedesse. Aliás, o arguido A só veio a fazer qualquer declaração que - directa ou indirectamente - pudesse implicar ou relacionar o arguido C com factos deste processo, já o julgamento estava na fase das alegações - tendo-as interrompido - e o que aconteceu nas audiências de julgamento de 26/11/08 de 9/12/08 . O arguido C, a dado momento das suas declarações - concretamente na audiência de julgamento de 31/01/05 - e aquando dos esclarecimentos que lhe estavam a ser pedidos, disse ao Tribunal que os factos objecto dos processos disciplinares instaurados ao arguido A em 1984 e em 1986 e as propostas de sanção que então apresentou nos processos em causa, deviam “…ser apreciados (…) em função do contexto em que eles aconteceram…”, acrescentando que “… com o conhecimento que tenho hoje era impossível, Sra. dra. Juíza … portanto obviamente que a actuação seria diferente…”, reforçando que se em 1986 (e isto quando falava do processo de “1987”) tivesse tido o conhecimento que tem “hoje”, “…naturalmente que as minhas conclusões seriam outras…”. Estas declarações do arguido C, tal como o Tribunal as interpretou , têm um duplo sentido: por um lado significam que o arguido C configura a possibilidade de, tendo em atenção o que estava em causa nos processos disciplinares de “1984” e de “1986” - cfr. Apenso L, fls. 48, 50, 53; e Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119; processos relacionados com a violação da ordem de interdição em CZ ou contactos com educados -, as sanções propostas ou aplicadas não foram as adequadas; e, por outro, extraímos que o arguido C não põe em causa a veracidade dos factos que “hoje” são imputados pelos assistentes ao arguido A (não defendendo, como o faz em relação a si e aos demais arguidos, que tal imputação é o resultado de uma invenção ou criação de história, pelos mesmos, pelos assistentes; ilação que voltaremos a convocar em momento posterior). Mas, para o aspecto que em concreto estamos a tratar e que é a admissão ou não admissão de tratamento “preferencial” ou “protecção”, mesmo estas declarações globalmente avaliadas não comportam, em si, qualquer admissão ou reconhecimento de uma situação de protecção por parte do arguido C. Para o Tribunal, não obstante a coincidência dos arguidos C e A terem sido internos na AX e de, após essa fase, continuarem a sua vida profissional dentro da AX, não resultou da prova produzida em audiência de julgamento que, por um lado, tivessem sido educandos internos do mesmo (...) e nas mesmas alturas e, por outro, que se tivessem conhecido em data anterior e por razão diferente, daquela que o arguido C disse em audiência de julgamento. E quanto à data deste conhecimento, o arguido C disse que apenas conheceu o arguido A em 1984 quando, após ter passado da Secretaria Escolar - onde exercia funções relacionadas com ex-alunos da AX - para os Serviços de Património, ingressou na carreira técnico superior, passou a desempenhar funções na área do “pessoal” e da “contabilidade” e foi pela primeira vez nomeado instrutor para um processo disciplinar aberto nesse ano a A. Das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, não foram produzidos depoimentos que levassem a concluir, com segurança, que o conhecimento tivesse ocorrido em momento anterior. Por exemplo, a testemunha WE (técnico superior na AX, tendo declarado ao Tribunal ter entrado para a AX em 1974, para trabalhar, altura a partir da qual conheceu o arguido A e o arguido C) disse ao Tribunal que conheceu o arguido A logo em 1974, mas teve dúvidas se conheceu o arguido C ainda como aluno ou se já como funcionário da instituição. A testemunha HH (funcionário da AX entre 1964 e 30/06/2003), disse ao Tribunal que também conheceu o arguido A ainda como aluno e conheceu o arguido C na instituição, com quem veio a trabalhar. No entanto, estas testemunhas não revelaram factos dos quais o Tribunal pudesse extrair o conhecimento entre os dois arguidos, desde data anterior aquela em que foi admitida pelo arguido C. 3.5.3. Partindo do que antecede, passemos para um segundo momento. Quando o Tribunal - na análise que fez do percurso do arguido A dentro da AX -, referiu aquelas situações em que, objectivamente, houve a intervenção do arguido C em situações que possam ter comportado a avaliação, desempenho profissional ou procedimento disciplinar do arguido A - cfr. Ponto 3.3.1. (8.1), (8.2), (8.3) e (8.4), relembrando o Tribunal tudo o que ficou escrito quanto à, por exemplo: (a) intervenção do arguido C quando fez a proposta em 19/12/88, para o arguido A passar a fazer todos os serviços auxiliares da (...) e quando necessário também no âmbito dos serviços de transporte (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773 a 774); (b) nas circunstâncias em que o foi, pois o arguido A tinha sofrido uma pena disciplinar de 30 dias de aposentação do serviço; e o exercício de funções auxiliares na (...) (no CZ) ou o exercício de funções auxiliares na secção de transportes (como vimos com a situação da peregrinação a Fátima a que se refere o “Louvor” de fls. 828/829 do Apenso CQ, Vol. II), potenciavam o contacto e a permanência do arguido A em CZ e com os educandos; (c) e tendo o arguido C, quando fez a proposta para o exercício das novas funções por A, objectivamente conhecimento não só da existência da restrição, em relação a A, de entrar em espaços da AX e de actividade com educandos, mas também das razões que estavam na base de tal proibição, decorrente de, pelo menos, de dois Processos disciplinares instaurados ao arguido A e em que C foi instrutor (cfr., quanto a tais processos disciplinares, Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119 ; Apenso K, fls. 357 a 359 vº, Relatório; fls. 374, Comunicação do (...) do (...) para os Serviços administrativos, na altura BQ, datada de 10/10/83, a determinar, entre o mais, a proibição de A frequentar quaisquer instalações da secção de CZ; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 890, documento cujo original está registado que foi entregue ao arguido A em 29/06/84, estando aposta a sua assinatura; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832, 850; Apenso K, fls. 320, 321; Apenso L, fls. 59, 119; Apenso K, fls. 317 a 319, 347; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119; cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; 56; 65, Despacho de Dr. BQ, datado de 10/10/83, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, a determinar a proibição do arguido A entrara em CZ, com excepção de motivo de serviço; fls. 66, comunicação feita ao arguido A da proibição, assinada por este); - concluímos, então, que o arguido C desvalorizou e desconsiderou, o risco que na altura tal decisão quanto ao “exercício de funções” podia importar para o crescimento, saúde e formação dos educandos da AX. Mas, como também dissemos (cfr. Ponto 3.3.1.(8.2) que antecede), quando em 19/12/88 o arguido C fez a proposta de nomeação de funções em relação ao arguido A, ainda não tinha sido instaurado o processo disciplinar de 1989 (como vimos, o Despacho a instaurar o processo foi de 29/05/89, cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161). Portanto, tinha conhecimento das “proibições” e “restrições” anteriores, mas ainda não tinha conhecimentos de “mais factos” entretanto ocorridos ou que fosse imputado que entretanto tinham ocorrido. No entanto, em audiência de Julgamento o Arguido C – quando prestou esclarecimentos ao Tribunal quanto ao conhecimento que teve, ao longo dos anos, de qualquer situação de abuso de natureza sexual dentro da AX, de qualquer funcionário, educador ou adulto em relação a educando -, declarou ao Tribunal que só em 1984 teve conhecimento de uma situação de abuso de natureza sexual de um funcionário da AX sobre educando e que o funcionário envolvido era o arguido A. Disse que teve conhecimento dessa situação por causa de ter sido instrutor do processo disciplinar que foi instaurado ao arguido A em 1984 (o Despacho do (...) a determinar a abertura do processo foi em 28/6/84; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119 ; cfr. Apenso K, fls. 356 e 356 vº), mas acrescentou que essa situação fora anterior a 1984. Tanto quanto se recordava teria ocorrido por altura de 1981, tendo dito que era uma situação que estava relacionada com o Despacho de 1980, da Sra. Secretária de Estado da Família (cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 303 a 308, fls. 475 a 486; e Apenso G, fls. 190 a 201). Mas declarou, também, que após este “conhecimento” em 1984, só em “... 1991 é que fui surpreendido com uma ... digamos um Acórdão que mandou apresentar o A de novo no serviço; soube então que o motivo do seu afastamento tinha sido por abusos...ou hipoteticamente por abusos sexuais; francamente eu não conheço o Acórdão do Supremo Tribunal administrativo...”. Num segundo momento em que foi questionado quanto a esta questão - sobre o processo de “1989” instaurado ao arguido A e da altura em que teve conhecimento da demissão do arguido e dos fundamentos de tal demissão (e neste “segundo momento” o Tribunal está a referir-se às explicações/declarações que o arguido prestou na audiência de julgamento de 31/01/06) -, confirma que foi apenas em 1991, aquando da reintegração do arguido, que soube o “porquê” do afastamento do arguido, tendo-o sabido através do (...) Dr. BQ (o arguido foi específico a dizer que “… o afastamento, o motivo do afastamento, resulta exactamente da conversa que houve entre mim e certamente…o Sr. (...)…”, esclarecendo que nesta altura não se pode recordar exactamente de quem estaria presente nessa conversa, quando foi dado conhecimento “… do que teria acontecido e do que vamos ter que fazer…”.). Ora, para o Tribunal, a versão que o arguido C apresentou, quanto ao momento e modo, em que teve conhecimento dos factos imputados a A no processo disciplinar de 1989, não foi credível. E esta atitude prende-se, na avaliação do tribunal, com o que foi uma das linhas de Defesa do arguido C durante a audiência e que consistiu em, recorrendo ao que era o contorno formal das suas competências, concluir que não tinha competências e portanto não o fazia, de ingerência no “dia-a-dia” das funções do funcionário A ou na determinação das funções e cargos exercidos pelo funcionário A. Pelo que não lhe poderia ser imputada, como diz o Despacho de pronúncia, qualquer prática de protecção ou favorecimento do arguido A dentro da instituição. Não foi, contudo, esta a percepção do Tribunal. Vejamos porquê. (1) Em audiência o arguido declarou que entre 1971 e 1983 trabalhou na secretaria escolar, desempenhando essencialmente funções que tinham a ver com ex-alunos da AX. A partir de 1983 passou para os serviços do património da AX, tendo a seu cargo a regularização dos inventários e manutenção de todo o património. A partir de 1984 - quando ingressou na carreira técnica superior -, manteve as suas funções na área do património, mas começou a desempenhar funções na área do “pessoal” e da “contabilidade” – a expressão que usou foi que “ ... a partir de 84, quando ingressei na carreira técnica superior.., mantendo no património, comecei a ser chamado para diversas actividades no âmbito do pessoal e no âmbito da contabilidade ...” - e em 1986 passa a exercer, também, funções na área da informática (em 1984 o (...) era HHN, o Dr. BQ ainda era (...) do (...) para os Serviços Administrativos e o arguido C é nomeado para instrutor de um processo disciplinar do arguido A, cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 887 e 893; cfr., também, quanto a todo este período do percurso profissional, Apenso AI, fls. 1, 2, 6, 9, 10, 15, 18 a 23, 27, 29, 32 a 35, 49, 108, 110, 111, 126 a 127, 130, 158 a 162, 164, 171). Ainda de acordo com as suas declarações até 1996 – referindo-se à altura em que passou a Director de Serviços, mas retroagindo esta passagem à altura em que (inicialmente) é nomeado director dos serviços administrativos em comissão de serviço - detinha todas estas competências, as quais exercia no “dia-a-dia” como Assessoria da Direcção, sendo que - tal resulta das suas declarações e dos documentos constantes nos autos (cfr., por exemplo, Apenso AI-1, fls. 600 a 605, 610 a 618, 620 a 625) - desde 22/11/90 o arguido C desempenhava, em comissão de serviço, as funções de Director dos Serviços Administrativos. E nessa qualidade as suas funções foram, entre o mais e de acordo com despacho do (...) Dr. BQ, as previstas “ … nos números 41 a 46 do Mapa II anexo ao Decreto Lei número 323/89 de 26 de Setembro…” e que incluíam a concessão de licenças, autorizar gozo de férias, justificar faltas, afectar o pessoal na área dos respectivos departamentos, competências estas que correspondiam às que o próprio arguido C propusera ao (...), na comunicação que lhe enviou em 15/05/91 (cfr. Apenso “ AI -1”, fls. 604/605, Despacho do (...) Dr. BQ, sem data, enumerando as áreas que foram afectas a C, na sequência da nomeação que fora feita do mesmo para o cargo de Director de Serviços Administrativos e no qual, no “Ponto 2.1.” refere expressamente estarem atribuídas ao arguido C as competências previstas “ … nos números 41 a 46 do mapa II anexo ao decreto lei número 323/89 de 26 de Setembro…” ; cfr. tb, neste Apenso “AI -1”, fls. 601 a 603; fls. 610/611, comunicação subscrita por C, datada de 15/05/91, na qualidade de Director de Serviços e referindo a sua “recente nomeação” nesse cargo, propondo ao (...) que, no cargo de Director dos Serviços Administrativos, lhe fossem atribuídas as competências que enumera na comunicação, entre as quais está a de “gerir pessoal” ; de fls. 608/609; fls. 616, comunicação do (...), Dr. BQ, para os (...)s, Directores dos (...)s e todos os serviços da (...), datada de 16/01/91, na sequência da nomeação por Despacho de 22/11/90 de C para “Director de Serviços Administrativos” da AX, enunciando as competência de C; de fls. 617, Termo de Posse de C como Director de Serviços, em comissão de serviço, datado de 18/12/90). Assim – e como resulta da prova documental dos autos, corroborada pelas declarações do arguido C na audiência de julgamento - quando em Dezembro de 1988 faz a proposta ao (...) Dr. BQ, para a nomeação de funções do arguido A, o arguido C já exercia desde 1984 funções na área do património, do “pessoal” e da “contabilidade” (e a que tinham acrescido, em 1986 as funções na área da informática). Aliás, se em 1988 não tivesse efectivamente competências na área do “pessoal”, não fazia sentido estar a apresentar ao (...) uma “proposta para o exercício de funções” do funcionário A. E essas competências na “área do pessoal” - que como vimos das declarações do arguido C tinha-se iniciado em 1984 - envolveram, necessariamente - como resulta dos documentos dos autos e atenta a normalidade das coisas, quando, por exemplo, se procede à leitura da informação feita pelo arguido C em 19/12/88 para o (...) Sr. Dr. BQ (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 773 a 774) -, conhecimento do funcionário A, das funções que exercia e como as exercia e das necessidades específicas dos serviços existentes na AX. Com efeito, na informação e proposta datada de 19/12/88 que o arguido C fez - na qualidade de Técnico Superior de 1ª - e enviou para o (...) BQ, para vigorar a partir de 2/01/89, refere duas coisas: que a proposta é feita para fazer face a necessidades concretas de serviço ; e que é feita, também, para ficarem determinadas e clarificadas as funções e deveres dos funcionários HHQ e A, pois é dito nessa informação que quando chamados para serviços auxiliares e os “chamados” eram um funcionário HHQ e o arguido A, invocam que são “…ajudantes de motorista, que é jardineiro e não carregadores, enfim, toda uma série de observações que acabam por aborrecer, quando não mesmo atingem proporções de impertinência…”. Se da informação consta que a mesma é feita tendo em atenção as “necessidades concretas de serviço”, tal pressupõe o conhecimento dessas necessidades. E se são invocadas e feitas considerações de valor quanto a atitudes concretas de determinados funcionários - e no que agora interessa do arguido A -, tal pressupõe o conhecimento dos funcionários, das atitudes e das circunstâncias em que tais atitudes foram tomadas. Sucede também, que o arguido C, que conhecia o arguido A dentro da instituição - mas, como dissemos, tendo resultado para o Tribunal que tal conhecimento apenas se encontra suficientemente assente, do ponto de vista probatório, a partir da data em que o arguido C o reconheceu ou seja “1984” e quando pela primeira vez foi nomeado instrutor para um processo disciplinar aberto a A -, foi instrutor de três processos disciplinares abertos a A e um dos quais, o último em que foi instrutor, tinha acontecido no ano anterior ao processo de 1989 (aquele em que o arguido A foi demitido compulsivamente e que o arguido C diz que só teve conhecimento em 1991). No que diz respeito (e relembrando) a esta intervenção do arguido C nos processos disciplinares movidos ao arguido A e aos fundamentos de tais processos, vimos que: (a) foi instrutor no processo instaurado por Despacho do (...) de 11/05/84 - na sequência do que por Despacho do (...) de 28/6/84, foi aplicada ao arguido A a pena de repreensão escrita, ficando o arguido A igualmente proibido de participar em quaisquer actividades da Secção de CZ, desde que nelas estejam incluídos alunos - cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805, 852, 890, 892; Apenso K, fls. 356 e 356 vº; Apenso L, fls. 119 ; cfr. Apenso K, fls. 356 e 356 vº; lembramos que o processo teve origem na participação feita por GE, por o arguido ter estado a jogar à bola com alunos de CZ, quando estava interditado de o fazer (cfr. Apenso K, fls. 356 vº; fls. 357 a 359 vº, Relatório; fls. 373, participação de GE datada de 3/5/84; fls. 374, Comunicação do (...) do (...) para os Serviços administrativos, na altura BQ, datada de 10/10/83, a determinar, entre o mais, a proibição de A frequentar quaisquer instalações da secção de CZ ); (b) foi instrutor no processo instaurado por Despacho do (...) de 17/11/86, na sequência do que por Despacho do (...) (na altura já Dr. BQ ) de 2/2/87, foi aplicada ao arguido A a pena multa 5.000$00 - cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 832; Apenso L, fls. 49, 50 a 51, 119; cfr. Apenso L, fls. 48, 50 a 51, 56, 61; lembramos que o processo teve origem na participação feita em 24/9/86 por GE, por o arguido A ter entrado em CZ, desobedecendo o Despacho do (...) do (...) de 10/10/83, que o proibia de entrar em CZ salvo motivo de serviço (cfr. Apenso L, fls. 50 a 51; 56; 65, Despacho de Dr. BQ, datado de 10/10/83, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, a determinar a proibição do arguido A entrara em CZ, com excepção de motivo de serviço; fls. 66, comunicação feita ao arguido A da proibição, assinada por este; fls. 67, comunicação feita em 24/09/86 por GE ); (c) e foi instrutor no processo instaurado por Despacho do (...) de 23/02/88, na sequência do que por Despacho do (...) de 4/7/88 (na altura Dr. BQ ), foi aplicada ao arguido A a pena de 30 dias aposentação do serviço - cfr. fls. 287, do Apenso CQ, Vol. I, resultante do Pº disciplinar mandado instaurar por Despacho do (...) de 23/2/88; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 805; cfr. Apenso L, fls. 6 a 13; cfr. Apenso L, fls. 6 a 13; lembramos que o processo teve origem na queixa apresentada por um funcionário da AX contra o arguido A, por agressão durante as horas de serviço (cfr. Apenso L, fls. 6 a 13). Portanto, em Dezembro de 1988 o arguido C, pelo exercício das suas funções dentro da AX e no âmbito da competência derivada dessas funções: - tinha conhecimento próximo da vivência profissional do arguido A na AX - incluindo o conhecimento de (pelo menos) quatro processos disciplinares que tinha sofrido e dos fundamentos de tais processos: o de “1980”, embora tenha explicado em audiência de julgamento as circunstâncias em que teve conhecimento do mesmo, localizando em 1984, quando foi nomeado instrutor no processo de “1984” e em que o então (...) e estando também presente nessa conversa o Dr. BQ, lhe explicaram a existência do Despacho do (...) HHN “… onde proibia o A de entrar no … salvo erro, no CZ sem ser em serviço, essa mesma determinação foi corroborada em Outubro do mesmo ano, 83 (oitenta e três). Por … por participação do Professor GE, onde constava que tinha encontrado A a jogar à bola durante a hora de almoço, as averiguações feitas …”; e os três processos disciplinares de que foi instrutor; - tinha conhecimento das funções exercidas por A; - e tinha alguma responsabilidade e interferência na supervisão e modo de execução dessas funções; Acresce que o arguido C disse ao Tribunal - e isto corrobora o que o Tribunal acabou de concluir -, quando ilustrou as suas funções, que “... em concreto, no “dia-a-dia” era uma espécie de bombeiro; para além das respostas que tinha que dar...ou dos Despachos que tinha que dar...”, naturalmente “... em função das competências que me foram atribuídas (...), havia obviamente no “dia-a-dia” que dar respostas às questões diárias que iam sendo postas a todos os níveis(...), contabilidade, património, pessoal, informática; (...) sobretudo a nível de faltas, sobretudo a nível de vencimentos...” (cfr. tb, “Curriculum Vitae” feito pelo próprio arguido em 30/09/1990 e que se encontra a fls. 622 a 625, do “Apenso AI – 1”) . (2) Ora exercendo o arguido C as funções e competências que acabámos de referir, tendo sido instrutor em três processos disciplinares sofridos pelo arguido A - o último dos quais em 1988 -, quando em 1989: - o (...) Dr. BQ, por Despacho de 29/05/89, determina a instauração de um processo disciplinar ao arguido A; - processo este que foi instaurado na sequência de queixa apresentada pela mãe de um aluno ao Director do CZ - imputando a “nota de culpa” comunicada ao arguido, em súmula, o arguido ter tido conversas com alunos de CZ quando estava proibido de falar com os mesmos no (...); ter dado dinheiro a dois alunos para comprarem rebuçados, bolos e revistas; ter tomado banho com um aluno na Cave da (...), mostrado revistas pornográficas, praticado actos de masturbação (cfr. Apenso CQ, Vol I, fls. 6, 8 a 17; e ver, também, fls. 116/117 e 195, do Apenso CQ, Vol. I, correspondentes à carta que em Maio de 1989 é escrita pela mãe do aluno (…), para a professora HHO, por factos relacionados com contactos do seu filho com o arguido A, aí referido como “(…)” e ao ofício que o Director do (...) e CZ, na sequência de tal carta, envia em 26/5/89 para o (...)) –; - e no âmbito do qual o arguido A foi demitido compulsivamente por Despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 4/10/89 (embora, na sequência do recurso do arguido para o S.T.A., em 16/04/91 é proferido acórdão a anular o despacho do secretário de Estado que aplicara a pena disciplinar de demissão compulsiva ao arguido, sendo o mesmo reintegrado por despacho do (...), Dr. BQ, de 5/06/91 - cfr. Apenso CQ, Vol. I, fls. 5, 7, 8 a 17, 34 a 45, 49, 57, 83, 84, 157 a 161; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 557, 558, 615, 616, especificamente quanto à sanção aplicada ao arguido neste processo, e fls. 714 a 723, 614 e 615, quanto à reintegração do arguido, matéria igualmente objectivamente documentada no “Apenso J, fls. 32 a 53 ); não é crível para este Tribunal que o arguido C, pelo exercício das suas funções, não tenha tido conhecimento em 1989 da abertura do processo disciplinar, dos motivos que estiveram na instauração do processo e do despacho do Secretário de Estado a demitir compulsivamente o arguido e motivos que levaram a essa demissão. Não é crível que tendo a sua competência na área da concessão de licenças, autorizar gozo de férias, justificar faltas, afectar o pessoal na área dos respectivos departamentos, gestão de pessoal, na área da contabilidade e serviços de tesouraria, sendo no “dia-a-dia”, de acordo com as suas palavras uma espécie de “bombeiro” que a tudo socorria – pois o próprio arguido foi expressivo ao dizer disse que “... no “dia-a-dia” era uma espécie de bombeiro; para além das respostas que tinha que dar...ou dos Despachos que tinha que dar...”, naturalmente “... em função das competências que me foram atribuídas (...), havia obviamente no “dia-a-dia” que dar respostas às questões diárias que iam sendo postas a todos os níveis(...), contabilidade, património, pessoal, informática; (...) sobretudo a nível de faltas, sobretudo a nível de vencimentos...” -, logo em 1989 não tivesse tido conhecimento, mesmo que através de alguém (da Repartição de Administração de “pessoal”, do (...)…) do que se passava com o arguido A, isto é, dos motivos pelos quais em Outubro de 1989 estava a ser demitido compulsivamente pelo Secretário de Estado. Aliás, tinha sido o próprio arguido C que tinha pro(...) ao (...) da AX que o arguido A exercesse as funções que estava a exercer em 1989 e se ele foi demitido compulsivamente, pelo menos teve que dizer alguma coisa, mesmo que informalmente, quanto a quem é que passaria a exercer as funções de A – pois ao arguido C, como vimos e o arguido confirmou, competia a gestão do pessoal e a sua afectação na área dos respectivos departamentos; não esquecendo que a cessação ou interrupção do vínculo laboral por parte do arguido A, na sequência da demissão compulsiva, implicou não receber vencimento de 14/10/89 a 5/06/91, altura em que foi reintegrado para todos os efeitos e retroagindo a 14/10/89; e ao arguido C, como vimos e o arguido confirmou, competia a gestão do pessoal, faltas e o processamento de vencimentos (cfr Apenso CQ, vol. II, fls. 760 a 761, fls. 778 a 801; cfr. Apenso CQ, vol. I, fls. 5 a 37). Não é normal e verosímil, que por causa disso não tivesse falado com o (...), Dr. BQ e do motivo que levava ao afastamento do funcionário A. E, de acordo com o que foi, por exemplo, o depoimento da testemunhas Dr. BQ, também não resultou para o Tribunal que a demissão compulsiva de um funcionário - e pelos motivos que fundamentaram a demissão, relacionados com actos de abuso de natureza sexual sobre um educando -, na altura em que ocorreu a demissão de A (1989) fosse o “dia-a-dia” da instituição. Isto de forma a podermos pôr a hipótese de ser uma situação tão “banal”, que por isso seria “normal” e “natural” o (...) não ter comentado, falado ou referido, com a pessoa que exercia as funções de Director de Serviços Administrativos e que tinha a competência da gestão do pessoal e exercício de funções nos diversos departamentos - e que era o arguido C -, sobre as razões da demissão do arguido A. (3) Mas, completando o que antecede - e no sentido da não verosimilhança, para o Tribunal, da versão apresentada pelo arguido C, quanto ao conhecimento dos factos que levaram à demissão compulsiva do arguido A em 1989 -, há que ter em atenção a “maneira de ser” do arguido, tal como o Tribunal o viu. Em audiência de julgamento o Tribunal perguntou ao arguido C se se considerava ou não, no dia-a-dia, no trabalho, uma pessoa cuidadosa, que vê os pormenores, que gosta de ter o domínio das várias circunstâncias. A esta pergunta o arguido respondeu que “…dentro dos possíveis…” considerava-se assim. Ora esta “forma de ser ” do arguido - e que o arguido admitiu -, foi perceptível para o Tribunal ao longo das declarações que prestou, tendo em atenção a forma como respondeu ao tribunal, os pormenores e explicações que por vezes sentiu necessidade de acrescentar. Mas foi igualmente perceptível, por exemplo, nos documentos de fls. 26 e 27 do “Apenso EI, Volume 1” (documento este datado de 5/5/91, em que o arguido C propõe a clarificação, por parte do (...) Dr. BQ, das competências que vinha exercendo desde que, em comissão de serviço, exercia as funções de Director para os Serviços Administrativos), de fls. 37 e 38 do “Apenso EI, vol. 1” (documento este datado de 8/04/97, em que o arguido C refere a reorganização de serviços, procede à extinção de uns, propondo ao (...) autorização para alterações funcionais ), de fls. 39 a 44 do “Apenso EI, vol. 1” (documento este datado de 23/11/98, em que o arguido C, referindo, entre o mais, reorganização de serviços que tem vindo a fazer, propõe ao (...) a atribuição de competências e responsabilidades a serviços vários), os quais, conjuntamente com o documento de fls. 773 a 774, do “Apenso CQ, Vol. II” (a proposta feita em 19/12/88 pelo arguido C para o (...), Dr BQ, em que propõe o exercício de funções do arguido A e justifica porque o faz) permitem, para o Tribunal, de alguma forma ilustrar e avaliar a “maneira de ser “ do arguido C na Instituição e no sentido em que o mesmo a reconheceu – juízo este que abrange e é aplicável ao período que mediou entre 1989 e 1991, data em que ocorreram os factos agora em análise - , como uma pessoa interventiva quanto às suas competências e naturalmente controlador dessas competências. Assim, por tudo o que antecede, não foi crível para o Tribunal que o arguido C só em 1991, após o acórdão que o S.T.A. proferiu em 16/04/91 - no âmbito do recurso que o arguido A interpôs para o S.T.A., da pena de demissão compulsiva que lhe fora aplicada no processo de 1989 – teve conhecimento, foi “…surpreendido…”, nas palavras do arguido e aquando da sua reintegração, dos motivos que estiveram na demissão compulsiva do arguido. O Tribunal ficou convicto que o arguido C mentiu quanto a este facto (ou circunstância de facto). (4) E porque é que o arguido teve esta atitude perante o Tribunal? Qual a relevância e sentido, de admitir que apenas teve conhecimento de determinado facto em 1991 e não em 1989, pois o arguido não diz que não teve conhecimento “de todo”, diz é que teve conhecimento mais tarde e quase por acaso, pois foi surpreendido com certa situação ? A explicação, para o Tribunal – e considerando o que o Tribunal deu como provado, quanto aos factos e actos em que o arguido C teve intervenção e a relação ou associação desses factos com o arguido A -, é que foi um acto de demarcação no presente processo do arguido C em relação ao arguido A. Como o foi, também, outra situação que à frente referiremos, relacionada com a explicação que o arguido C deu ao tribunal, para justificar nada ter feito, naquelas situações em que o arguido A não era contactável pelo serviço de transportes. É que independentemente do que for, realmente, o peso, significado ou inteligência que se atribua a esta “demarcação” - para a avaliação dos factos do processo e da responsabilidade do arguido ou da imputada facilitação e encobrimento do arguido A -, no caso concreto ela traduz, para o Tribunal, a atitude que o arguido pretendeu transmitir e a ideia que quis dar durante o julgamento, de que “o que soube” e “como soube”, em relação ao arguido A, não derivava: - de ter um contacto - mesmo que apenas institucional - próximo do arguido A; - e do poder de intervenção que o arguido C tinha, efectivamente, no “dia-a-dia”, nas funções que o arguido A exercia na AX; - mas que “o que soube” e “como soube”, derivou de uma situação meramente indirecta, em relação ao que eram as suas competências dentro da instituição e em relação ao que eram os seus poderes de intervenção e supervisão, do arguido A. E, por isso, o “valor” ou “desvalor” de poder ser “associado” ao arguido A e às suas práticas - porque o arguido C, na globalidade do que foi a sua posição perante o Tribunal incluindo a fase das alegações, não defendeu, como o fez em relação aos demais arguidos, que a imputação de factos ao arguido A também se devesse à invenção de uma história pelos assistentes, por causa da comunicação social ou de outra natureza - poderia ser, à partida, menor. (5) Há que fazer, aqui, uma referência e que está subjacente ao tratamento que o Tribunal fez das declarações de todos os arguidos (bem como dos assistentes ou das testemunhas): é que a avaliação que fazemos neste momento, é feita após o juízo global que (nesta altura) o Tribunal tem, quanto ao que foi a atitude e comportamento do arguido do arguido C perante si durante o julgamento. À medida que o Tribunal vai ouvindo um arguido, vai criando uma ideia da pessoa que tem na sua frente, do que diz, como diz e porque o diz, como é que funciona perante certas situações ou como é que reage a determinadas situações. Pelo que as conclusões que tira em relação a determinado arguido, do “porquê” de o mesmo ter adoptado determinada atitude perante o Tribunal e em determinada situação, é vista e aferida no quadro dessa ideia e imagem global que o Tribunal foi criando de determinada pessoa. Isto porque as reacções dos arguidos em Tribunal foram diferentes entre si, perante situações de confrontação com inconsistências que possam ter tido ou que lhes possam ter sido notadas, em algum momento das suas declarações. Diferença esta que é natural, seja isso motivado por maior ou menor fragilidade emocional ou física em determinado momento; por maior ou menor experiência de ser sujeito a um fogo cruzado de interrogatório e contra interrogatório; por maior ou menor inteligência; por maior ou menor formação; por maior ou menor habilidade para comunicar. Daí que, para quem “olha de fora”, determinada acção ou reacção possa não ter “sentido”, não ser lógica - por não ser uma reacção inteligente ou por não ser uma reacção que “ajude” ou “resolva” muito… - mas, para quem olhe “ de dentro”, tal fazer sentido e determinado sentido, face à pessoa que teve perante si. 3.5.4. Prosseguindo-com a questão repetidamente debatida pela Acusação por um lado, e pela Defesa do arguido C por outro, durante o julgamento, da forma como o arguido A era tratado pelo arguido C e da forma como o arguido A tratava o arguido C dentro da AX, ou de atitudes que assumiram por causa desse relacionamento -, já dissemos que o Tribunal criou a convicção e concluiu, que o arguido C tinha, em relação ao arguido A: - um contacto – pelo menos na instituição - próximo do arguido A; - e tinha poder de intervenção, no “dia-a-dia”, nas funções que o arguido A exercia na instituição; Isto resultou do raciocínio e fundamentação ex(...)s no ponto “3.5.3., (1) a (3)” que antecede - o qual, contudo, foca essencialmente o período que foi até 1991, por ter sido a altura em que o arguido disse ter tido o conhecimento das razões que tinham levado à demissão compulsiva do arguido A em 1989; e ponto “3.5.3., (1) a (3), da motivação e análise critica em relação ao núcleo de factos “ (II) – Dos factos referentes ao percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX (Factos constantes de fls. 20.837 a 20.842 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “ 2 - Percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX; 2.1 – Percurso e funções do arguido A na AX; 2.2 – Percurso e funções do arguido C na AX” ) -, bem como do ex(...) no ponto “3.3.2., (3.1.)” - em que relatámos o “incidente com os mecânicos” em 2001 e a intervenção do arguido C em tal incidente -, fundamentação que convocamos neste momento. Mas resultou, também, da prova testemunhal que foi produzida em audiência de julgamento. Com efeito, os depoimentos das testemunhas não só corroboraram as ilações e conclusões que o Tribunal retirou, quando fez a análise objectiva dos documentos do processo nos pontos “3.3.2” e “3.5.3” que individualizámos - preenchendo e complementando esta análise -, mas também permitiram concluir qual o tipo e conteúdo da relacionamento que havia entre o arguido A e C. Estamos, mais uma vez, numa daquelas situações em que o que já foi dito concorre para o que se está a dizer e o que se está a dizer preenche e complementa o que já foi dito. Assim: (1) A testemunha VO (motorista na AX de 1990/ 1991 até Outubro de 2005 e que disse ao Tribunal ter trabalhado com o arguido A), quando estava a responder a perguntas feitas pelo Ministério Público, sobre a forma como o arguido A desempenhava as suas funções na AX - e tendo sido a pergunta concretamente feita à testemunha, se teve conhecimento de alguém ter chamado a atenção ao arguido A, porque é que quando fazia a volta do correio demorava mais tempo que os outros motoristas -, começou por dizer “… bem, eu às vezes, ele não me deixa mentir…”, e passa a contar o que dizia a A “… ele tinha as suas atitudes, que eu às vezes dizia-lhe a nível particular: Ouve lá, olha que às vezes pões o pé na argola! « - Ah, eu sei». Prontos, e…”. Concluindo - quando perguntado porque é que dizia ao arguido A que ele andava a meter o pé na argola -, que “… ele às vezes era um bocado distraído, talvez demorasse um bocadinho mais de tempo do que os outros, tinha mais conhecimentos, como foi aluno…”. Quando começa a ser interrogado sobre o que observou, concretamente, quanto à maior demora do arguido A, em relação aos outros motoristas, a testemunha responde que “tinha o seu serviço”, não estava a guardar as entradas e saídas. Mas, porque lhe foi perguntado, esclareceu que a razão pela qual “chamava a atenção” ao arguido A, era porque ele às vezes saía-se com “atitudes menos correctas”. Nesta fase inicial do seu depoimento - em que estavam a ser feitas perguntas pelo Ministério Público -, as respostas que a testemunha deu quanto ao tempo que o arguido A levava a fazer a volta do correio, quanto ao que, em concreto, eram as atitudes “menos correctas” do arguido A e quanto ao que a testemunha tinha visto, no que diz respeito ao arguido A levar educando da AX para ver jogos de futebol no estádio do AX, foram respostas evasiva e pouco concretas. Começava a dizer… mas depois não completava ou concretizava, como que fechando-se. Quando passou a dar o seu testemunho quanto ao modo como o arguido A tratava o arguido C, à forma como tratava as Chefias e os Dirigentes da AX quando não estava na presença dos mesmos, retoma a expressão que usara anteriormente, que o arguido A “…falava assim um bocado mais extravagante. Era assim…assado…o chefe cá, o chefe lá…”, esclarecendo que, para si, o arguido usava esta expressão para se referir indistintamente ao (...) da Instituição ou aos seus (...)s, o arguido C ou o Dr. FB. Mas esclarecendo, imediatamente mais: que achava que quando o arguido A falava assim dirigia-se “… ao Sr. Dr. C ou ao Sr. Dr. BQ…”, acrescentado que deu a resposta com os nomes por esta ordem, pondo primeiro o nome do arguido C, “… sim, porque era o que ocupava mais as pessoas, o que tinha mais…o que estava mais dentro do assunto (…), o que trabalhava connosco directamente…”. (1.1) Aqui um parêntesis. Este segmento do depoimento da testemunha VO – a que se alia o depoimento da testemunha SZ (motorista da AX desde 1979, tendo trabalhado com o arguido A), para o qual o responsável pelos transportes era o “ Dr. C” - foi para o Tribunal revelador e expressão daquilo que atrás dissemos quanto ao que era, efectivamente, a intervenção que no “dia-a-dia” o arguido C tinha no exercício de funções dos motoristas, nos quais o arguido A estava incluído (facto relacionado, portanto, com uma das conclusões que acima referimos, como retirada pelo Tribunal da análise dos documentos “3.3.2” e “3.5.3” ). A expressão utilizada pela testemunha VO, que o arguido C era o que “ocupava mais as pessoas, o que tinha mais…o que estava mais dentro do assunto (…), o que trabalhava connosco directamente…” liga-se também e por exemplo, com o que para o Tribunal resulta do teor do documento de fls. 68, do “Apenso EI, Vol. I”, referente a uma reunião promovida pelo arguido C (cfr. o “MEMO” da reunião que o arguido C fez em 9/03/2001, na sequência da comunicação dos mecânicos em que se queixavam, entre o mais, de problemas causados pelo arguido A - cfr. tb, “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69 e 70 e cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos -) e na qual, para resolver problemas surgidos na AX, o arguido C tomou decisões imediatas, entre o mais, “… de imediato providenciar à alteração dos mapas de transportes por forma a afastar mais o sr. A da oficina de mecânica, nomeadamente passando a fazer serviço quase em exclusivo na (...)…”. Estas decisões imediatas que o arguido C tomou, quer: - quanto ao arguido A - que os serviços respectivos passassem a elaborar os mapas de transportes, de forma a que o arguido A passasse a fazer o seu trabalho de forma diferente da que fazia até aí, pois passava a ficar ao serviço da (...) -; - quer quanto à restruturação da oficina - cfr. Apenso EI, vol. I, fls. 68, o referido “ MEMO”, e no qual constam: - as decisões tomadas também de imediato naquela reunião pelo arguido C, de passar a coordenação e responsabilidade da oficina do Engº HI para o mecânico mais categorizado, o qual foi a testemunha EEI; - … a quem o arguido C pediu, de imediato, que apresentasse uma relação das modificações que entendesse necessárias para melhor funcionamento da oficina; -… e também para o arguido C aferir da continuidade da oficina e com três funcionários a ela afectos -; -sendo o arguido C, na qualidade de (...) (...), a comunicar ao director do CZ a restruturação da oficina da frota da AX, cessando as responsabilidades do Engº HI e passando tal responsabilidade para o mecânico EEI; - bem como a decisão de os três mecânicos da oficina ficarem na dependência directa da Divisão de aprovisionamento e Logística - passando a registar as suas entradas e saídas no sistema de registo de assiduidade instalado na (...) (cfr. fls. 472 a 476 dos autos; e “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 71, comunicação datada de 27/03/01) -; deram ao Tribunal a percepção do que era e em que se traduzia, a intervenção do arguido C nas funções do motorista A, nas funções dos demais motoristas - pois alterando as funções do arguido A, interferia nas funções dos demais motoristas - ou nas funções dos mecânicos. É claro que não era o arguido C que organizava ou supervisionava a organização dos mapas de transportes que a divisão de aprovisionamento e Logística fazia, para a distribuição dos diversos serviços e veículos entre os motoristas, nem resultou provado que fosse o (...) (...) C que decidisse e desse autorização para determinado serviço de transporte ser feito, pois a autorização de deslocações - visitas de estudo ou deslocações para fora (…) - competia, de acordo com o depoimento da testemunha XQ , ao (...) (...) ajunto Dr. FB e o transporte em si era tratado pelas secções competentes – pelo menos o Serviço de Aprovisionamento e Logística (cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 37 a 44 e cabendo a gestão da frota da AX também na dependência do serviço de Aprovisionamento e Logística). Mas, não fazendo formalmente parte das funções que estavam delegadas no (...) (...) C a tutela do serviço de Aprovisionamento e Logística - cfr. “Apenso EI, Vol. 1, fls. 24 e 25; e fls. 52 a 59, documentos dos quais resulta que tais atribuições estavam delegadas no (...) (...) Dr. FB -, o certo é que foi o arguido que tomou decisões desta área funcional e decisões que se repercutiam no exercício, no dia a dia, das funções do arguido A, dos demais motoristas ou dos mecânicos (vide as decisões tomadas em 9/03/2001, cfr. Apenso EI, Vol. I, fls. 68; ou em 27/03/01, cfr. Apenso EI, Vol. I, fls. 71, em que os três mecânicos da oficina passam a ficar na dependência directa da Divisão de aprovisionamento e Logística, passando a registar as suas entradas e saídas no sistema de registo de assiduidade instalado na (...)). Mas, apesar de estarmos a dar como exemplo a situação de “2001”, os autos demonstram que esta actuação não foi um acto isolado. De facto podíamos estar perante uma situação isolada a que o arguido C, por uma razão qualquer - que não se vislumbra nos autos e que também não resultou da audiência de julgamento - , teve que dar seguimento. Mas não é isto que os documentos demonstram e as testemunhas disseram. Para o Tribunal, a actuação do arguido C com as decisões que tomou em 9/03/2001 (cfr. Apenso EI, Vol. I, fls. 68), ou em 27/03/01 (cfr. Apenso EI, Vol. I, fls. 71, em que decide que os três mecânicos da oficina passam a ficar na dependência directa da Divisão de aprovisionamento e Logística), têm semelhança e são na linha de continuidade do que já vinha sendo, de facto, a sua actuação e as áreas em que tomava decisões, como resulta do documento de fls. 195 e 196, do “Apenso EI, vol. 1” (documento datado de 15/09/92 e que diz respeito às funções do arguido A e do Funcionário HHQ) ou da já citada proposta que em 19/12/88 o arguido C fez, para novas funções do arguido A (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 773 a 774). Acresce que o depoimento do motorista VO: - ao dizer que o arguido C era o que “ocupava mais as pessoas, o que tinha mais…o que estava mais dentro do assunto (…), o que trabalhava connosco directamente…”; - e ao dizer, quando a defesa do arguido C lhe perguntou quem era a “pessoa que estava acima” da Sra. D. XQ - que a testemunha dissera ser a Chefe dos Transportes -, que “… era o Sr. Dr. C e era o sr. (...)…”; - esclarecendo em relação ao (...) (...) Dr. FB (que, como acima vimos, formalmente era quem tinha a tutela da Direcção de aprovisionamento e Logística, na qual estava o Serviço de Transportes e do qual era Chefe a Sra. D. XQ), quando a Defesa do arguido C lhe perguntou se o Dr. FB “não tinha nada a ver” com os transportes, que “… não tinha assim tanta…só quando precisava de um carro : “olhe é preciso um carro para ir aqui…(…), era só isso. Não tinha nada a ver com os transportes”; sustenta e acolhe esta conclusão do Tribunal . E os demais depoimentos que foram prestados pelas testemunhas relacionadas ou próximas dos serviços de transportes - e que, por súmula, iremos enunciando -, também não excluem ou afastam esta conclusão do Tribunal, antes a corroboram (ver, por exemplo, o depoimento da testemunha EEI - mecânico na AX, para onde entrou em 1983/1984 -, quando relatou ao Tribunal o que foi a “sua vida” após ter sido nomeado pelo arguido C responsável pela oficina, com as idas que disse constantes ao gabinete do arguido C, por causa das “queixas” que o arguido A lhe fazia dos mecânicos). (2) Prosseguindo com o depoimento da testemunha VO, disse ao Tribunal que o arguido A punha alcunhas a colegas e chefias, sabendo que ao “… sr. Dr. C chamava-lhe «(…)»…”, e acrescentado que quando o arguido A usava aquela alcunha, já sabia que se estava a referir ao (...) (...) C. Lembrava-se, também, da alcunha que o arguido pôs ao (...) da instituição, mas não se recordava da aposta ao (...) (...) Dr. FB. Do que antecede o Tribunal concluiu (pelo menos) o seguinte: a frequência com que o arguido A se referia, por alcunhas, quer ao arguido C, quer ao (...) da instituição – pelo menos perante esta testemunha -, era maior do que aquela com que se referia ao (...) (...) Dr. FB. Isto porque a testemunha lembra-se das alcunhas de uns, mas não se recorda da alcunha do outro e sempre que o arguido A se referia à alcunha que pusera ao arguido C, a testemunha já sabia que o colega estava a referir-se ao (...) (...) C. (2.1) A testemunha VO falou, também, de outra questão que, durante o julgamento a Acusação sustentou durante o julgamento, como expressiva do diferente tratamento que o arguido A tinha dentro da AX em relação aos demais motoristas - e de um especial tratamento do arguido A por parte do arguido C - e que foi a atribuição de um telemóvel. Quanto a esta questão da atribuição de um telemóvel ao arguido A, o arguido C disse ao Tribunal que em momento que situa na Páscoa de 2001, a AX arrendou à Vodafone uma parcela de terreno para colocação de uma antena e a Vodafone uma série de telemóveis. Isto não foi directamente consigo, mas soube-o através do Sr. Dr. EB, Director dos serviços administrativos, bem como da existência dos telemóveis. Eram telemóveis que podiam ser utilizados e depois recarregáveis por quem os utilizasse. Disse que desde o ano de 2000 estava atribuído a cada motorista uma compensação paga semestralmente, para a despesas que pudessem ter com a utilização dos telefones pessoais em serviço. O arguido A também tinha um telemóvel, mas como a dado momento, que “… coincidiu com uma reclamação por parte do serviço de transportes … uma vez mais … serviço de transportes e posta a questão, a razão pela qual ele não atendia os telefonemas que lhe faziam ou as chamadas …os chamamentos que lhe eram feitos … ele respondeu que não tinha o telemóvel ou que tinha perdido o telemóvel ou estragado, não sou capaz de precisar … nessas circunstâncias penso que foi por conseguinte, talvez muito pouco tempo depois da Páscoa de 2001 … ou seja, praticamente um ano depois do arrendamento celebrado com a Vodafone … foi por conseguinte por minha ordem, efectivamente, emprestado um telemóvel da AX … aliás aconteceu o mesmo também com o Sr. Director dos Serviços, Dr. EB que também teve ou tem um telemóvel emprestado da AX … aconteceu o mesmo também com o Sr. Auditor, o Sr. IW e, tanto quanto me recordo, também o mesmo aconteceu com o Encarregado de Pessoal Auxiliar de CZ, Sr. HH … mas aí por instruções, digamos assim, ou por determinação do meu colega Dr. FB…”. A testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, durante cerca de 20 anos) disse que não teve telemóvel de serviço. O que havia era telemóvel de serviço para o carro do (...), pelo que quem estivesse ao serviço do (...), no carro da (...) - um (…), como resulta do depoimento das testemunhas motoristas que estamos a citar, entre os quais a testemunha BBG e das declarações do arguido A -, tinha que estar com aquele telemóvel. A testemunha BBG também referiu que, a dada altura - quando começaram a ser instalados os telemóveis nos carros do (...) e dos (...)s - os motoristas conversaram entre si apresentar um pedido à (...), para ser instalado em cada autocarro que fazia o transporte dos educandos um telemóvel. Esclareceu que o pedido foi apresentado ao arguido C - não foi a testemunha que falou com o arguido C, mas pensa que foi a testemunha EC - mas que a resposta dada foi a atribuição de uma “ pequena verba” (foi esta a expressão que usou) a cada motorista para “ajuda das chamadas”. E concluiu, quanto a esta questão, dizendo que do seu conhecimento não foi entregue telemóvel pela AX a qualquer motorista ou ajudante de motorista. A testemunha SZ (motorista da AX desde 1979, tendo conhecido o arguido A como funcionário da instituição), quanto a telemóveis da AX disse que em dado momento os motoristas pediram à AX que lhes fosse dado um telemóvel, o que foi recusado. No entanto ao arguido A foi dado um telemóvel, embora a testemunha depois não tenha inquirido porque é que foi dado ao arguido A. Das declarações do arguido C resultou, para o Tribunal, que ao arguido A foi atribuído pela AX - através do arguido C -, um telemóvel. O arguido disse, ainda, que esta atribuição do telemóvel foi feita em momento posterior aquele em que fora atribuído aos motoristas - incluindo o arguido A - uma verba para compensação com despesas de telefone (particular) em serviço. Esta declaração tem coincidência com o que foi dito pelos motoristas. Os motoristas, como vimos pelo testemunha BBG, quando começaram a ser instalados os telemóveis nos carros do (...) e dos (...)s, pediram que fosse instalado um telemóvel em cada autocarro que fazia o transporte dos educandos um telemóvel, por causa de fazerem esse transporte. Isso não se concretizou, tendo a AX decidido dar uma verba a cada motorista, para compensação das despesas que tivessem por telefonemas de serviço nos seus telemóveis. Verba esta, como resulta da avaliação que o Tribunal fez das declarações do arguido C, também foi dada ao arguido A. O arguido C diz que o telemóvel que foi disponibilizado ao arguido A, foi em data posterior à atribuição desta verba, tendo tomado esta decisão por causa de, mais uma vez, os serviços terem-se “queixado” da indisponibilidade do arguido A atender o telefone e o arguido ter dito que não tinha telefone ou estava avariado. Quanto a este facto, o arguido A disse que o arguido C emprestou-lhe um telefone da AX - aos outros motoristas não foi dado, mas havia mais pessoas na AX que tinham - e a razão foi por ter-se recusado a dar “… um número de telefone particular…nem aos meus colegas lhes dava, quanto mais ao Dr. C e à (...)…”. No que diz respeito a este último segmento das declarações, o arguido C disse ao Tribunal que na AX havia o número pessoal do arguido A e que ele próprio o tinha, tendo dito também que o número foi dado pelo próprio arguido. Mas e no que releva para o que, neste momento, estamos a tratar, faz sentido o momento em que o arguido C diz que o telefone foi disponibilizado ao arguido A - posteriormente à questão da atribuição da verba aos motoristas, para compensação de despesas de telefone -. Isto porque se tivesse sido na altura em que foi recusada a colocação de telemóveis nos veículos de transporte de alunos, atenta a normalidade das coisas - aqui, mais uma vez, fazemos a referência e convocamos o que já dissemos, quanto à AX ser uma instituição grande mas um meio pequeno -, os motoristas teriam sabido que o arguido teve um telefone disponibilizado ou dado pela AX e “eles” não tiveram um telefone colocado nos veículos de transporte de alunos, que era o que pediam (e tê-lo-iam dito ao tribunal dessa forma; mas também não resulta que tivessem pedido telefones para si, mas sim para serem instalados nos veículos). Mas não obstante a sequência e o diferimento no tempo, entre a “reivindicação” inicial dos motoristas - e com o objectivo que vimos - e a entrega do telefone ao arguido A, a decisão tomada pelo arguido C poderia traduzir um diferente tratamento deste arguido em relação aos demais. Não com o peso e valoração que poderia ter - se fosse uma situação em que todos os motoristas tivessem requerido um telemóvel e só a um tivesse foi atribuído -, mas sob a perspectiva do que foi, globalmente, o depoimento dos motoristas ou testemunhas que neste momento estamos a citar: como expressão do que diferente diziam notar, na prática, entre o modo como o arguido C tratava o arguido A,face aos demais funcionários. Mas não foi claro para o Tribunal, que os demais motoristas ou algum outro funcionário da hierarquia do arguido A, na altura em que o telemóvel foi disponibilizado ao arguido, tivesse requerido um telemóvel, justificando razões profissionais e lhe tivesse sido recusado. Pelo que o Tribunal não concluiu que, no caso concreto, tenha sido suficientemente evidenciado que a actuação do arguido C, ao ter disponibilizado um telemóvel ao arguido A, constitui um acto de diferente tratamento do arguido A em relação aos demais funcionários, sem justificação relevante do ponto de vista do serviço.(3) Partindo, agora, do depoimento da testemunha VO - para analisar a prova sob as perspectivas com que a mesma foi debatida na audiência de julgamento, quer pela Acusação quer pela Defesa - e começando pela questão do “tempo” que o arguido A levava a fazer as suas voltas, em relação aos demais motoristas, o Tribunal criou a convicção que o arguido A não tinha preocupação quanto ao tempo que levava a fazer as suas voltas: tanto podia levar o tempo que queria, como o que efectivamente era preciso. E porquê. A testemunha VO disse, em relação ao arguido A, que “… ele às vezes era um bocado distraído, talvez demorasse um bocadinho mais de tempo do que os outros, tinha mais conhecimentos, como foi aluno…”, resposta esta que para o tribunal foi dada a “custo”, pois foi patente para o tribunal que a testemunha não se quis comprometer com uma resposta. Isto porque quando começa a ser interrogado, sobre se foi a testemunha que observou (pois podia ter-lhe sido dito) que o arguido A demorava mais do que os outros a fazer serviços, a testemunha responde, como já assinalámos, que “tinha o seu serviço”, não estava a guardar as entradas e saídas. Mas também disse que as Chefias “... às vezes chamavam-nos, estávamos para fazer um serviço e queriam saber dele e não sabiam...”, completando que as Chefias eram os colegas “... o (…) por exemplo, a (…), a (…)...” e esclarecendo que se estava a referir à testemunha XQ Chefe dos Transportes e ao colega (…), coordenador do serviço. Relacionada com esta questão - de não saberem onde andava o arguido A -, disse ainda que o “(…)” e a “(…)”, dos serviços de transportes, “... procuravam-no e não sabiam dele, que ele não atendia o telefone e não sabiam onde é que ele andava...”. E disse que em relação aos outros motoristas estas situações não aconteciam. A testemunha UC (motorista da AX de 1974 a 2004), disse que “de vez em quando” o arguido A dizia que “estava ao serviço” do arguido C, mas a testemunha não sabia se estava ou não. Esta justificação ocorria quando lhe perguntavam se podia fazer determinado serviço, e ele dizia que não podia por ter “serviço do Dr. C”. A testemunha BBG (motorista na AX de 1989 a 2005), disse ao tribunal que acontecia o arguido A levar “mais um bocado” a fazer o giro do correio, mas que “ele dizia que tinha que fazer isto ou aquilo”. Relacionado com a resposta que antecede, na instância da Defesa do arguido C e a pergunta desta, esclareceu que a testemunha - tal como os demais motoristas, incluindo o arguido A -, quando fazia o “giro do correio” acontecia fazer favores a colegas, para ir buscar alguma coisa que lhes pediam, dizendo que era igual para todos. Perguntou-lhe então, esta Defesa, qual a razão pela qual tinha justificado com estes favores, o ter dito que o arguido A levava “mais um bocado” com a volta do correio, pois se todos os motoristas faziam igual, não havia razão para A levar mais tempo que os outros motoristas, a que a testemunha respondeu: “…isso não sei dizer…(…), normalmente demorava mais, mas quem sou eu para dizer…era ao serviço de transportes que cabia analisar…”. Esta resposta e tendo atenção a pergunta que concretamente a originou, leva o Tribunal a dizer - e o que se aplica às demais situações idênticas – que por vezes é difícil para a generalidade das pessoas estar a concretizar, objectivar, passados cinco ou seis anos de determinadas situações terem ocorrido, porque é que na altura tirou determinada conclusão, em relação a determinada situação. Não fazendo parte das funções da testemunha controlar o horário ou as voltas do arguido A, é razoável que a testemunha só possa transmitir o seu conhecimento da forma, algo imprecisa mas para o Tribunal expressiva, como o fez. E é expressiva porque, do modo como falou, não dando a impressão de estar a “esconder” ou a “acrescentar” alguma coisa “contra” ou a “favor de alguém”, o Tribunal ficou convencido que, de facto, os motoristas, na volta do correio, faziam como disse pequenos favores para os colegas, de ir buscar um documento, levantar alguma coisa - aliás, é um procedimento normal reportado a 10, 12 ou 15 anos atrás, numa instituição como a AX, com as características que já apontámos, uma instituição grande mas um meio pequeno, com funcionários com laços familiares entre si e com padrão de 10 , 15, 20 “anos de casa” -. Mas também ficou convencido que o arguido A levava “mais tempo” que os outros motoristas a fazer o “giro do correio”. Ora, sendo assim o tempo que o arguido A “levava a mais” não se justifica exclusivamente com esses favores, não faz sentido - como apontou a Defesa do arguido C. A testemunha MG (motorista na AX desde 1993, tendo trabalhado com o arguido A) quanto ao modo como o arguido A desempenhava as suas funções na AX, disse que “às vezes” o arguido saía da AX de manhã e “às vezes” só regressava “ ao fim do dia”, não o vendo à hora de almoço (não sabendo se estava de serviço ou não e acrescentando que por vezes tinham serviço para todo o dia). E disse – no sentido da testemunha anterior, quanto ao facto de aos motoristas serem pedidos “serviços” - que aconteceu o arguido C telefonar-lhe directamente, para lhe pedir para fazer um serviço, embora outras vezes o tenho feito através da telefonista. Esta testemunha, tendo começado por dizer que “não tinha nada a dizer” de A, declarou contudo que ele às vezes falava alto, no hall da entrada da (...) - o que disse ter acontecido ou com a Sra.D. XQ ou com o arguido C, pois com o Dr. BQ ou com o Dr. FB nunca o ouviu a falar alto -, mas nunca faltou ao respeito e estava sempre disponível. E disse, também, no mesmo sentido e registo que o disse a testemunha VO, que “às vezes procuravam” o arguido A e este dizia que estava a trabalhar “para o chefe”, sendo que para a testemunha “ chefe” na AX tanto podia ser o arguido C, como era o Dr. BQ ou o Dr. FB. Por causa de o arguido A dizer, às vezes, que “estava ao serviço do Chefe”, ficou convencido que o arguido A era “privilegiado”. Na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C - com pedidos de esclarecimentos quanto a justificações que o arguido dava, confirmou o que tinha dito, que às vezes marcavam um serviço para um transporte e o arguido A dizia que “não podia”, porque tinha que fazer “um serviço para o chefe”. E esclareceu - no âmbito de pedido de esclarecimentos que lhe foi feito primeiro pelos assistentes e depois pelo tribunal -, que para ele quando o arguido A dizia “Chefe”, estava a referir-se ao arguido C (esclarecendo que quando anteriormente respondera, como “Chefe”, os nomes do arguido C, do Dr. BQ e do Dr. FB, entendera que lhe estavam a perguntar “quem é que poderia ser Chefe” e não a quem é que o arguido C se referia, quando dizia “ o chefe”). Quanto à forma como o arguido A tratava o arguido C, disse que era por “Dr. C” e nunca o ouviu tratar por “tu”. Dos depoimentos que antecedem o Tribunal a concluiu que o arguido A - tal como referimos no início -, não tinha preocupação quanto ao tempo que levava a fazer as suas voltas, tanto podia levar o tempo “que queria”, como o que “efectivamente era preciso”. E uma das razões para essa “falta de preocupação”, quanto ao modo como exercia as suas funções, foi a ausência de consequências. Com efeito não resultou dos depoimentos prestados quanto a este facto - e aqui ver não só os que já enunciámos como os que se seguem -, nem da análise que já fizemos do que foram os processos ou incidentes na carreira do arguido, que desde a altura em que começou a conduzir veículos de serviço da AX, para fazer o giro do correio e transportes de pessoas – o que se iniciou, pelo menos, em Janeiro de 1998 -, até à altura em que em 2002 foi demitido compulsivamente, que por causa do “tempo” a mais que demorava na execução de determinadas tarefas - de interpelação que lhe tenha sido feita por causa disso -, tenha sofrido qualquer sanção disciplinar, que isso tenha tido qualquer repercussão no seu dia-a-dia, no exercício das suas funções e carreira profissional (cfr., como já vimos, Apenso CQ, Vol. II, fls. 607, fls. 710, fls. 692, fls. 682, fls. 604 e fls. 674, fls. 666, fls. 598, fls. 594, fls. 590, fls. 586, fls. 582, de 1991 a 202 o arguido A foi avaliado com a nota de Muito Bom, tendo sido em 2002 a última nota do arguido pois, como resulta dos "Factos Provados", nomeadamente do seu ponto “57.”, por despacho da Sra. Secretária de Estado da Segurança Social, datado de 19/09/02 – e proferido na sequência de processo disciplinar instaurado em 15/01/2002 -, foi aplicada ao arguido A a pena de Aposentação compulsiva; cfr., tb, Apenso CQ, II Volume, fls. 556 e Apenso J, fls. 11 a 31; ). E esse “tempo a mais”, o modo mais demorado que ele tinha de fazer determinado serviço que os outros motoristas, era conhecido dos superiores hierárquicos. Era conhecido pela testemunha XQ (Chefe da Divisãode Aprovisionamento e Logística e na qual estava o serviço de transportes, no qual se inseriam os motoristas e, portanto, hierarquicamente superior do arguido A), pois a mesma disse ao Tribunal que o arguido A levava mais tempo a fazer a volta do correio, embora dizendo também que o seu serviço era diferente (explicando que era diferente, porque era um serviço que era só feito com viaturas ligeiras, não podiam dar ao arguido serviços com veículos pesados, só lhe podiam dar a distribuição do correio, de géneros entre os (...)s, para uma residência) e acrescentado que “…se algum dia ele se demorava mais um bocado ou que precisássemos do funcionário que estava com esse serviço, perguntava…ou ligava para ele para o telemóvel, onde é que ele se encontrava…precisava de algum serviço…umas vezes conseguia-se localizá-lo…outras vezes não se conseguia…e quando era bordado, quando era abordado onde é que o Sr. Andou, ah! Eu tive de fazer uns serviços para o chefe…”. Disse que deduzia que o Chefe era o arguido C, explicando que deduzia isto “… porque era o nome que ele habitualmente tratava … o chefe…e portanto eu, evidente nunca fui interpelar o sr. (...) (...) C, era o meu chefe e eu não tinha esse…”. E era conhecido pelo arguido C, que disse ao Tribunal - quando falou da forma como o arguido A despenhava as tarefas que lhe eram pedidas, que qualificou, na sua avaliação, de eficaz e de confiança - que “… o serviço que era prestado , de facto, era bem prestado, não havia dúvidas…o A quando regressava a tarefa estava cumprida…só tinha, como disse na altura, um pequeno problema, que em vez de cinco minutos era meia hora…”. Para o Tribunal o arguido A tinha “à vontade” com esse procedimento, podendo utilizar – e tendo utilizado - tempo e carro de serviço para deslocações que não fossem/foram de serviço. Fazendo-se a ligação entre a questão que antecede e a forma como o arguido A se relacionava com o arguido C, o arguido C (na A.J. 27/01/05 disse que por vezes telefonava directamente para arguido A, quando precisava de alguma deslocação ou que ele lhe fizesse alguma coisa. E esclareceu que telefonava directamente, pois “ muitas das vezes” o arguido A recebia chamadas da (...), “deveria ver o número” no visor do seu telefone e não atendia as chamadas da (...). Assim, se era uma situação em que o arguido C queria sair e se sucedia o arguido A não atender a chamada feita da (...), o próprio arguido C ligava-lhe directamente. E disse ao Tribunal que “não tinha problema” em contactar , pois o arguido A sempre o atendeu. Que “se recordasse”, nunca teve uma situação em que o telefone tenha tocado e o arguido A não o tenha atendido. O Tribunal colocou-lhe uma questão: desde o início do seu depoimento o arguido fizera questão - e isto, evidentemente, na avaliação que o Tribunal fez das suas declarações -, de mostrar ser uma pessoa que não acedia a situações que lhe parecessem de abuso ou que não eram objectivamente correctas, independentemente de quem estivesse em causa. Neste sentido, por exemplo - e fazemos, desde já, uma súmula do que foram as declarações do arguido nesta matéria, pois convocá-la-emos em momento posterior - as suas declarações quanto às razões pelas quais está implicado neste processo, em que indicou pessoas - de diferentes sectores e percebendo-se, pelas suas ocupações, de diferentes posições na escala hierárquica da instituição - em relação às quais considerava ser “…incómodo…” e “…persona non grata…”, por ter apontado ao (...) da Instituição irregularidades ou má actuação dessas pessoas dentro da instituição e “…nefasta para a AX…”, como o Engº WE “… ainda hoje estou para entender alguns negócios que estão pouco … um pouco esclarecidos por mim, com a compra de milhares de contos de equipamentos (…)e que foram para … dedicados ao ensino e para os lares da AX … para alguns deles nem sequer funcionarem, estou-me a recordar do Eng. GY Departamento de Obras (…) que ainda hoje estou para saber … (…) é que o departamento não pertencia … não era da minha dependência, atribuída … era do Dr. BQ directamente … se trabalhava na AX ou se trabalhava para a AX. Se o (…) Eng. HI (…), Sr. EEI, com a situação que já aqui foi referida, dos carros arranjados sistematicamente, ao que parece na AX …(…) estou-me a recordar dos motoristas (…) BBG, VO, EC, porque de facto … embora tivessem tido a compensação do recebimento da comparticipação de horas (…), porque era justo (…), seguramente que ficaram muito tristes e muito aborrecidos quando as horas passaram a ser cortadas ou melhor, processadas meramente nos termos legais, tal como este registo de entradas e saídas, que vigorou a partir de Fevereiro de 2000, terá provocado incómodos a muita gente, estou-me a referir aos chamados Gestores de Área (…)… Prof. GE, Eng. TF (…)… o que se passa é que nessa reunião do centro de emprego (…), talvez em Setembro de 2001 …e eu fazia parte da Comissão Paritária, do protocolo existente da AX e o Centro de Emprego, dado que a AX recebia (…) tranches (…) com algum peso (…) para o ensino técnico-profissional e (…) nessa reunião (…), com vista a fazer uma espécie de balanço, como é que tinha corrido (…) o ano lectivo 2000/2001 e verifico (…) com vergonha que afinal de contas, não se percebe o que é que se passou, no ensino (…) técnico-profissional, os exames de aptidão profissional (…) decorreram com falhas ainda hoje por explicar (…), por parte dos júris havia dúvida se teriam feitos (…) por aqueles alunos que estavam a ser avaliados ou não …perguntava-se o que é que faziam às brocas, aos pregos, aos alicates, tenho impressão que aquela gente comia (…) essas coisas todas (…)…, Dietista HHW, também não percebo (…) qual é que era a função que a senhora desempenhava na AX (…) acho que não valia a pena termos lá uma dietista (…). Estou-me a recordar (…) que se passou com a estomatologia na AX, quando havia (...) para os alunos, mas já me pergunto hoje se não havia mais (...) para os funcionários e outros … onde é que está o dinheiro por um lado e porque é que quase que se inverteram os termos desta assistência médica aos alunos. Porque é que a Assistente Social HHX, embora não estamos lá … presente … na altura, mas … há sempre um rasto que fica e quando tive que acusar em Tribunal uma ex-Directora, pelo (…) cerca de 8.000 (oito mil) contos à AX, ainda hoje estou convencido que esta Senhora, enquanto assessora dessa Directora, deveria ter tomado providências, porque tudo me levou a crer (…) que ela saberia de alguma coisa, infelizmente ninguém quis saber disso. Dr.ª JE (…) diz que é advogada (…)ex-professora da AX, ficou como Advogada na AX (…), provocou (…) não digo desfalques, mas provocou despesas avultadas à AX (…) desleixos que, nesta matéria de dinheiros, que me dizia respeito, não foram propriamente trocos, estamos a falar em milhares de contos….(…)”. Estas são, como o arguido referiu, pessoas ligadas a situações em relação às quais considerava que havia uma actuação profissional prejudicial da Instituição e em relação às quais teve intervenção directa ou indirecta. A escala do prejuízo podia ser maior (um prejuízo monetários de 8.000 contos) ou aparentemente menor (o que faziam aos parafusos e brocas no ensino técnico profissional), mas o que está em causa avaliar é a atitude que o arguido disse ao Tribunal ter tido perante situações de abuso. No entanto, em relação ao arguido A não o aponta dentro deste grupo de pessoas. E não resulta de toda a prova já analisada - documental e testemunhal -, que o arguido tenha tido qualquer reacção, posterior aquelas situações em que o arguido A não atendia os telefones da (...), o arguido C telefonava-lhe directamente e o arguido A atendia (tal como não teve no facto que referimos anteriormente, em relação aquilo que se apercebia do tempo que o arguido A demorava “ a mais” a executar). Notamos que resultou das declarações do arguido C que este teve a percepção, nas situações a que se referiu, que o arguido A não atendia o telefone por ver que era da (...): não atendia porque não queria. E aqui - no contexto dos pedidos de esclarecimento que lhe estavam a ser feitos - o arguido C dá uma resposta que, na perspectiva do Tribunal, não se encaixa com o quadro que pretendeu dar de si – ver a análise feita pelo tribunal no ponto “3.5.3” do presente capítulo, em que nos sub-ponto “ 3.5.3.(3) a (5) “são referidas características relativas ao ”modo de ser” do arguido, bem como o que já dissemos no presente ponto “3.5.4.”): disse, em resumo, que não era uma questão que (ele, arguido C) tivesse que tratar, pois a competência para tratar dessa questão seria do serviço de transportes e do superior hierárquico nesses serviços. Quanto ao ser um assunto a ser tratado “pelo Serviço de Transportes”, é claro que isto também parece adequado ao tribunal, pois era um problema relacionado com a execução de serviços de transportes. Mas o arguido C, (...) (...) da AX, ter conhecimento, de forma próxima e actual, que o arguido A, motorista da AX: não atendia (nas declarações do arguido C) as chamadas da (...) porque não as queria atender; podendo estar em causa o transporte de qualquer membro da direcção da AX ou qualquer questão relacionada com o desempenho da actividade da AX; mas se fosse o arguido C a telefonar-lhe “de seguida” – e isto foram as palavras do arguido - o arguido A atendia; e apesar de ser (...) (...) nada faz, nada comunica, chama a atenção formal ou informalmente? E quando o tribunal perguntou ao arguido C, então porque é que mudou o arguido A para o “serviço da (...)”, em determinada altura em que o arguido A teve conflitos com os mecânicos, se o problema era só com os mecânicos e portanto não o afectava – mas tal como não o afectava, pelo menos foi a conclusão que o tribunal tirou das suas palavras, o arguido A não atender as chamadas da (...), pois quando o arguido lhe telefonava directamente o arguido A atendia sempre e portanto conseguia sempre comunicar com ele - respondeu que: “(...)Nós...” – e o “nós” não se tratará, decerto, do plural majestático, mas naturalmente de “nós”, entidades com posições superiores e com responsabilidades dentro da instituição -, na AX “ ... temos que evitar conflitos… é em termos de gestão…”. Esta resposta foi, para o Tribunal – e tal como já o tínhamos visto no ponto “3.5.3” que antecede, deste capítulo, quanto ao que o arguido disse ao Tribunal, sobre o momento em que tivera conhecimento dos motivos que tinham estado na base da demissão compulsiva do arguido A em 1989 - , mais uma vez um acto de demarcação no presente processo do arguido C em relação ao arguido A. Também aqui o arguido – e dentro do que, como vimos no decurso do julgamento, foi uma das linhas da sua Defesa e seja qual for o peso ou a lógica dessa demarcação -, recorrendo ao que era o contorno formal das suas competências, quis transmitir ao Tribunal que não tinha competências e portanto não o fazia, de ingerência no “dia-a-dia” das funções do funcionário A ou na determinação das funções e cargos exercidos pelo funcionário A. Não lhe podendo, por isso, ser imputada - como diz o Despacho de pronúncia -, qualquer prática de protecção ou favorecimento do arguido A dentro da instituição. O que para o tribunal não era a situação real, como o descrevemos - mais em particular, nos ponto “3.5.2.” e “3.5.3.” que antecedem; e também no já dissemos, até ao momento, no presente ponto “3.5.4.”, cuja análise e fundamentação aqui convocamos -, quanto ao que foram , efectivamente, as funções do arguido C, o seu conhecimento sobre as funções exercidas pelo arguido A e a responsabilidade e poder de interferência que tinha na supervisão e modo de execução dessas funções. Continuando, quanto à questão do “à vontade” ou revelação de “poder” por parte do arguido A dentro da instituição e do tratamento ou relacionamento com o arguido C , a testemunha VO - quando passou a dar o seu testemunho quanto ao modo como o arguido A tratava o arguido C, à forma como tratava as Chefias e os Dirigentes da AX quando não estava na presença dos mesmos -, retoma uma expressão que usara anteriormente, que o arguido A “…falava assim um bocado mais extravagante. Era assim…assado…o chefe cá, o chefe lá…”, esclarecendo que, para si, o arguido usava esta expressão para se referir indistintamente ao (...) da Instituição ou aos seus (...)s, o arguido C ou o Dr. FB. Mas esclarecendo, de imediato, que achava que quando o arguido A falava assim dirigia-se “… ao Sr. Dr. C ou ao Sr. Dr. BQ…”. Perguntado pelo Ministério Público, se alguma vez tinha sentido que o arguido A gozava de um estatuto diferente dentro da AX, a sua resposta foi que “... ele gozar, não gozava. Só que tinha um à vontade tal... que talvez eu não tivesse nem outros colegas meus...(...) talvez, porque penso que foi (…), foi aluno e era protegido...” (Tendo esclarecido, aquando da instância que lhe foi feita pela defesa do arguido C, que enquanto esteve na AX, “… que os (…) sempre se familiarizavam de outra forma…”). E perguntado também, pelo Ministério Público, se do que se apercebeu alguma vez achou que o arguido C pudesse proteger ou tratar o arguido A de uma forma diferente daquela que tratava os outros motoristas, respondeu “... talvez fosse diferente, porque eles foram alunos os dois...”, concretizando (ainda na instância do Ministério Público), quanto ao que era a “diferença” que encontrava em relação aos demais motoristas - quanto à forma como o arguido A falava com o arguido C e em que é que se traduzia -, que o arguido A “... falava mais à vontade, talvez eu não tivesse essa franqueza de falar com ele como ele falava...” , que falava “... então mais à vontade que eu. Era... pronto, fazia o meu serviço...e...(...) eu não sei explicar bem isso Sr. Dr....(...) eu não sei explicar bem isso. Sei que havia assim um... não é bem protecção, mas havia assim uma à vontade...(...)...à vontade mais... mais livre e eu ...(...) eu não ligava bem a isso, como foram os dois alunos...”. Posteriormente (na instância dos assistentes e no âmbito desta questão do tratamento e relacionamento entres os dois arguidos na AX ), disse que o arguido C era “… mais um bocadinho…” tolerante com o arguido A do que era com os outros, certamente por terem sido colegas e antigos alunos. “(…) Sentia que havia assim mais uma certa protecção que a nós, pois se eu fizesse o que ele fazia às vezes…” , esclarecendo, quanto ao que queria dizer “… …ele tava à vontade de não fazer de não fazer o correio tão depressa, tar à hora que era preciso tar e sem saber onde ele estava, era capaz disso acontecer. Se fosse comigo isso não acontecia ou se fosse com outro colega isso…” . E concluindo - perante a pergunta que lhe foi feita pela Defesa do arguido C, para dizer em que é que, afinal, o arguido C era mais tolerante, pois tinha acabado de dizer que não sabia se o arguido C sabia ou não da falta de horas do arguido A - , “… quer dizer agora que eu fizesse isso, talvez chegasse logo ao Ministro…”. No entanto - e continuando na instâncias da Defesa do arguido C, quando lhe perguntou se o “à vontade” do arguido A era só para o arguido C ou era para todos -, completou que o arguido A “… trabalhava com mais à vontade…”, mas era assim “… para toda a gente…” e para o (...) BQ também era assim “mais à vontade” que a testemunha - tendo a testemunha VO dito (considerar) “…ser mais acanhado…” que o arguido A no relacionamento com o (...). A Defesa do arguido C fez nova insistência de esclarecimento - por causa do que tinha dito quanto à diferença de tratamento, se fosse a testemunha a fazer uma coisa ou se fosse o arguido A -, e a testemunha responde que “… sim, se houvesse alguém à minha procura e não soubesse de mim, era logo perguntado “como é que era”…”, mas não sabendo “explicar” a razão porque com o arguido A não era assim. Mas não deu esta resposta com tom recriminatório ou fazendo qualquer insinuação de algo que sabia ou pensava que estava por trás e não queria dizer. Deu-a de forma que para o Tribunal foi aberta, como alguém que está genuinamente a expressar uma interrogação mas sem juízos ocultos quanto à sua resposta. E após ter dito que não sabia “explicar” porque é que com o arguido A era diferente do que achava que era consigo, acrescentou: “… não sei explicar(…), ele dizia as coisas, tudo se ria, não sei quê…(…), ele tinha à vontade em frente de qualquer pessoa, isso é verdade (…), notava que se fizesse certas e determinadas coisas que ele fazia…” . Nesta altura do seu discurso foi interrompido pela Defesa do arguido C, que lhe pergunta se o que estava a dizer era porque o arguido A “ era protegido por alguém”, a que a testemunha responde, no mesmo registo genuíno e franco que aqui apontámos : “…não sei quem. Não sei dar nomes (…). Não sei citar nomes de quem o protegia. Isso eu não sei dizer…”. Para o Dr. FB - e ainda na instância da Defesa do arguido C -, disse que o arguido A “… era mais fechado um bocadinho…(…).Era, tava lá em cima no primeiro andar, não se via tanto, só à saída e à entrada praticamente, não estava lá muito metido nos transportes, nem… só quando precisava de um carro para ir aqui ou ali…” (no que diz respeito a esta referência que a testemunha fez ao relacionamento do arguido A com o (...) (...) Dr FB - dizendo que o arguido A era mais “acanhado” com ele -, o Tribunal relacionou-a com o depoimento que foi feitos pela testemunha Engº HI, o qual foi responsável pela garagem de CZ, quando relatou uma conversa que teve ou que quis ter com o Dr. FB sobre o arguido A e o Dr. FB “pôs-se aos gritos”, quase lhe “deu uma coisa” e disse que “não queria ouvir falar” no nome do arguido A; conjugado, pelo menos, estes dois depoimentos, da testemunha VO e da testemunha Engº HI, o Tribunal concluiu que as relações ou contactos entre o Dr. FB e o arguido A e vice versa, eram diferentes e no sentido de mau relacionamento, das que o arguido tinha com o (...) (...) C ou com o (...) da instituição). Acrescentou, também - a pergunta do Ministério Público -, que o arguido C tratava o arguido A por “(…)” - o que voltou a confirmar, na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C, dizendo que uma vez, no “corredor” viu o (...) (...) C chamar o arguido A por (…) e por “tu”, dando exemplo da forma como se recordava dizendo “…olha anda cá que quero falar contigo…” -, dizendo que era o nome pelo qual tratavam A na AX. Mas o arguido A - quando o arguido C estava presente - , tratava o (...) (...) por “Dr. C”, não o tratava por “tu”.. Ainda no relacionamento do arguido A com o arguido C, disse que o arguido A às vezes tinha umas atitudes “... era assim um bocado mais para a frentex...como se costuma dizer...(...) se fosse outro, talvez fosse repreendido...”. A testemunha SZ (motorista da AX desde 1979, tendo conhecido o arguido A como funcionário da instituição), quando prestou os esclarecimentos a propósito do trabalho do arguido A na AX, relatou ao Tribunal que a Sra.D. XQ – testemunha que também foi ouvida em audiência de julgamento e que o motorista SZ disse na audiência ser a sua “superiora” -, dizia-lhe que ligava para o arguido A e que este dizia que estava ao serviço do “Chefe”. A testemunha XQ dizia-lhe que era o “Dr. C”, sendo que para a testemunha SZ - e tal como já vimos com a testemunha VO, motorista -, o responsável pelos transportes era o “ Dr. C”. Esclareceu, contudo, que nunca viu o arguido C dar ordens ao arguido A, pois para si pensava que as ordens vinham da Sra.D.XQ. A testemunha XQ, cujo depoimento já referimos parcialmente em momento anterior (e que trabalhou na AX de 1966 a Março de 2006, na área administrativa e nos últimos 10/15 anos a Chefiar a Divisão de Aprovisionamento e Logística), disse ao Tribunal que uma das suas funções na divisão de aprovisionamento e logística era fazer o controlo da actividade dos motoristas, supervisionando as escalas que eram feitas por funcionários do seu serviço (no entanto e em momento posterior, quando falou daquilo que efectivamente fazia e do que era na prática a sua supervisão, não fazendo a testemunha a confirmação das escalas de serviço, se os transportes eram feitos ou não, se o que constava nos boletins para efeitos de pagamentos de horas extraordinárias ou ajudas de custo correspondiam a serviços efectivamente feitos com a duração ou destino que neles constavam, o Tribunal conclui que o seu poder de supervisão era meramente formal, do que lhe era apresentado por outros funcionários da secção de transportes e dos quais era superiora hierárquica). Disse que das funções do arguido A fazia parte quer a distribuição do correio quer o transporte de alunos, mas tendo dito que o fazia “…principalmente ao fim de semana…”, relacionando tal transporte com o desporto escolar. Que a testemunha tivesse conhecimento o arguido A não transportava alunos durante a semana, mas fazendo a ressalva de “ a não ser” que fosse no desporto escolar (mas acrescentando que nunca o viu fazer transporte de alunos). Disse que o arguido A levava mais tempo a fazer a volta do correio, mas disse que o seu serviço era diferente (explicando que era diferente, porque era um serviço que era só feito com viaturas ligeiras, não podiam dar ao arguido serviços com veículos pesados, só lhe podiam dar a distribuição do correio, de géneros entre os (...)s, para uma residência) e “…se algum dia ele se demorava mais um bocado ou que precisássemos do funcionário que estava com esse serviço, perguntava…ou ligava para ele para o telemóvel, onde é que ele se encontrava…precisava de algum serviço…umas vezes conseguia-se localizá-lo…outras vezes não se conseguia…e quando era abordado, quando era abordado onde é que o Sr. Andou, ah! Eu tive de fazer uns serviços para o chefe…”. Esclareceu que deduzia que o Chefe era o arguido C, explicando que deduzia isto “… porque era o nome que ele habitualmente tratava … o chefe…e portanto eu, evidente nunca fui interpelar o sr. (...) (...) C, era o meu chefe e eu não tinha esse…”. Disse que se dessem o mesmo serviço do correio a outro motorista “… normalmente demorava menos tempo…”, mas não sabia porque é que o arguido A levava mais tempo ou o outro motorista demorava menos. Perguntada se alguma vez interpelou o arguido A, respondeu que “…ele dizia que lhe surgiam sempre coisas que lhe pediam nos (...)s para ele fazer…”. Do seu depoimento resulta que nunca perguntou ao arguido C - por ser superior hierárquico na instituição -, se o que o arguido A dizia correspondia à verdade ou não. É uma atitude admissível e que o Tribunal não estranhou: era um superior hierárquico, o arguido A desculpava-se com esse superior hierárquico e a testemunha não punha em causa a justificação. E isto liga-se, de alguma forma - no segmento específico do conhecimento que efectivamente tinha do que era o serviço de cada motorista -, com o que a testemunha disse ao Tribunal, que não fazia o controlo ou verificação das escalas de serviço dos motoristas, o que cada um fazia ou deixava por fazer, trocas entre motoristas que houvesse ou alteração de serviços. A testemunha fazia somente a “confirmação” das folhas que eram apresentadas ao (...) - ou ao (...) (...) Dr. C se o (...) não se encontrasse - para efeito de pagamento de horas extraordinárias ou ajudas, tendo explicado que esta “confirmação” não tinha subjacente qualquer verificação ou cruzamento de dados por si (das escalas de serviço, dos serviços feitos, das entradas e saídas dos veículos com os motoristas pelos portões da AX, dos transportes autorizados), mas significava a aposição da sua assinatura em documento que lhe era apresentado pelo funcionário da secção que fazia as folhas. Fazia, assim, um controlo essencialmente formal da actividade dos motoristas (cfr., quanto a esta questão do que era a “confirmação” que a testemunha fazia e em que consistia o controlo que era feito sobre o serviço e escalas dos motoristas, o que o Tribunal disse quando fez a análise crítica e o cruzamento dos dados referentes aos apensos “ Apenso EJ, Pasta 2, documentos referentes ao Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística”, “Apenso EJ, Pasta 3, documentos referentes ao registo do movimento diário/mensal dos veículos da AX”, “Apenso EJ, Vol. 7, documentos referentes ao registo do movimento de entradas e saídas no Portão de acesso às garagens e oficinas de CZ”; e Apenso BQ, Volumes 3, 5, 6 e 7, documentos referentes aos Boletins de itinerários preenchidos pelos motoristas da AX). O arguido C, quando lhe foi perguntado se alguma vez algum funcionário, alguma pessoa da AX o abordou ou perguntou se tinha dado alguma instrução ao arguido A - e o Tribunal faz esta referência relacionada com o depoimento da testemunha XQ -. o arguido respondeu: “…talvez tenha acontecido, não sei, mas talvez tenha acontecido…(…), por exemplo, a secretária do (...)…me tenha perguntado se eu mandei o A aqui ou acolá…ou se porventura saí com ele…não sei…acredito, mas não me recordo, não posso confirmar…”. Assim, não o tendo afastado categoricamente, como alguma coisa impensável ou que seguramente nunca se tenha passado consigo, também não o confirmou sem qualquer margem de dúvida. E, mesmo que indirectamente, contribuiu para a convicção que o tribunal criou quanto à veracidade da razão que deu ao Tribunal para não ter perguntado ao arguido C se tinha mandado fazer algum serviço ao arguido A, pois o arguido C não disse, nem pôs a hipótese, de ter sido a testemunha a pessoa que lhe pôs/ou pode ter (...) questões quanto ao arguido A. Continuando, a testemunha XQ falou, igualmente, das incompatibilidades que existiam entre os mecânicos e o arguido A - que atribuía a implicações por causa da reparação de veículos por parte dos mecânicos - , na sequência do que houve uma reunião entre o arguido C e pessoas da oficina, tendo o arguido A ficado adstrito ao serviço do sr. (...). Trabalho que diz ter feito durante seis meses, mas não tendo a certeza. Após este período o arguido A voltou para o serviço que fazia anteriormente, pois ao serviço do (...) tinha menos horas extraordinárias e ganhava menos, do que se estivesse a fazer o outro serviço (não só horas extraordinárias como ajudas de custo). E de acordo com o que se lembrava, o regresso do arguido às funções anteriores esteve relacionado com decisão do arguido C. O arguido C confirmou o que antecede em audiência de julgamento e explicou que a decisão foi tomada também para pôr fim a uma situação de desigualdade em que o arguido A estava em relação aos outros motoristas, pois ao serviço da (...) não tinha as horas extraordinárias ou ajudas de custo que tinham os demais motorista. O que concorreu, também, para a conclusão a que o Tribunal chegou, que para o arguido A o facto de estar ao serviço da (...) não lhe conferia estatuto especial, convocando o que acima dissemos quanto à despreocupação que o arguido tinha em relação ao tempo que demorava a fazer as suas tarefas - como vimos, no serviço “normal” o arguido não tinha preocupação quanto ao tempo que demorava, podendo levar o tempo que efectivamente precisava para a volta, como o tempo que queria e na (...) não só podia “ganhar menos” que os outros motoristas, como estava mais cingido ao espaço “(...)” e, parece-nos, de alguma forma mais sujeito a controlo . A testemunha YW (que trabalhou na AX desde 1986, nos internatos dos (...)s de CZ, BF e FA e disse ter conhecido o arguido A assim que a testemunha entrou para a AX, porque o arguido fazia a distribuição dos mantimentos para os lares), disse que o arguido A era simpático, nunca o viu ser mal educado, mas da maneira como falava com os colegas a testemunha sempre pensou que A tinha um certo “à vontade”, que atribuía ao facto de o mesmo ter sido aluno. Nunca viu o arguido A a ser interpelado por superiores ou em qualquer situação em que o mesmo estivesse com o arguido C, mas a ideia que tinha, da forma como o via, é que tinha “poder”. Embora não tendo concretizado muito mais, esta testemunha (YW) , na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido A, esclareceu que o arguido (e isto relacionado com a entrega de mantimentos que o viu fazer nos (...)s) entrava em todos os lugares com “à vontade” e que ouviu mesmo o arguido dizer – embora não tenha ouvido a conversa em que a frase foi dita, pois só ouviu a frase - : “... a mim ninguém me pode tocar...”. A testemunha HJ (a trabalhar na AX desde 1986 e como motorista de ligeiros desde o ano 2000) declarou em audiência de julgamento que presenciou uma situação no hall da (...) - acha que já era motorista e foi nomeado motorista no ano 2000, mas não se conseguindo recordar do ano em que aconteceu a situação que estava a relatar ou altura do dia -, em que o arguido C chamou o arguido A pelo nome “ …ó (…)…” e o arguido A “virou-lhe as costas”, dizendo “…eu sou um funcionário como você…” e não assistiu a qualquer desenvolvimento (se o houve). Não se conseguiu recordar de quem estava presente mas, nas suas palavras, “presumia” que estavam as telefonistas, pois era no hall da (...). Relatou também uma situação em que notou, na folha onde anotavam os quilómetros que faziam com a viatura de serviço que lhes estava distribuída, que o arguido A anotou mais 30/40kms que ele, para fazer o giro diário. E que sucedeu o arguido A dizer que estava a fazer serviço “ para o Chefe”, mas esclarecendo que “às vezes” podia acontecer ele dizer que andava a fazer um serviço para o arguido C e noutras para o (...) (para a testemunha “chefe” tanto podia ser o arguido C como o (...) Dr. BQ). A testemunha ED (telefonista - desde 1988 - e recepcionista - desde “há oito anos” em relação à data em que prestou declarações, as primeiras, que foi em 18/09/06 - na (...) da AX e tendo dito ser casada com o motorista EC), referiu-se a um episódio que apresenta semelhanças com este que a testemunha HJ relatou ao Tribunal. Disse que assistiu, uma vez, a uma desobediência do arguido A a um superior e que foi o arguido C. Num primeiro relato disse o arguido C tinha mandado chamar A e “ele desobedeceu”, “voltando as costas”. Completou, de seguida, dizendo que o arguido C pediu para a testemunha telefonar ao arguido A - este tinha ido fazer um serviço que não estava autorizado -, para que o mesmo fosse à (...) para falar com ele. O arguido A veio, não sabe o que o arguido C disse ao arguido A, mas este “saiu” e “voltou as costas”. O arguido C pediu-lhe para ser testemunha daquele incidente. No dia seguinte não viu o arguido A pedir desculpa, mas foi-lhe dito pela secretária do arguido C que já não era preciso ser testemunha, a questão já estaria resolvida. Lembra-se que o episódio foi na entrada da (...), mas não sabe se estava mais alguém a assistir, embora tenha acrescentado que “ acha” que se estivesse mais alguém tinha visto (no entanto, num segundo momento, fala de a testemunha e de um colega terem sido indicados como testemunhas do episódio). Ora e quanto a este aspecto, o Tribunal não teve indício de qualquer razão para pensar que a testemunha HJ – que relatou este episódio – estivesse a mentir, nem isso foi perceptível da forma como falou e contou este incidente. Pelo que o Tribunal ficou convencido que o mesmo presenciou o incidente e que a testemunha ED ou não o viu, ou a sua memória não o conseguiu relembrar. Após o seu depoimento - e a requerimento do Ministério Publico -, a testemunha ED foi confrontada com as suas declarações prestadas perante JIC – as de fls. 18.117 a fls. 18.118 - e disse recordar-se que o arguido A, após o arguido C ter falado com ele, disse que “não queria saber”, voltando-lhe as costas e indo-se embora. Disse, também nunca ouviu o arguido A tratar o arguido C por “tu”, embora soubesse que ele o tratava por uma alcunha – “(…)” -, mas só quando o arguido C não estava presente, só quando entre eles funcionários era referido o arguido C. Para si, o relacionamento do arguido C dentro da instituição, com os funcionários, era um “relacionamento normal”, Dirigente/funcionários e não se apercebeu de ele tratar alguém de forma diferente. E também não se lembra de o arguido C ter ficado aborrecido por o arguido A não atender o telefone. Pelo seu depoimento o Tribunal compreendeu que à testemunha o arguido atendia “quase sempre”, pelo que também não se recorda de situação em que tenha sido o arguido C a ligar directamente para o arguido A. No entanto disse que às vezes ligava para o arguido A e este dizia que estava “ao serviço” do arguido C e outras vezes ao serviço do (...). Quanto ao horário do arguido C, o que lembrava é que quando a testemunha entrava ele já lá estava e quando a testemunha saía, às 17h ou 18h, ainda ficava na (...). E quanto às chaves da (...) estavam num chaveiro “ao lado” de si – lembramos que a testemunha trabalhava na recepção, no hall de entrada da (...) – num chaveiro que estava aberto. Disse, ainda, que não sabe quem é o assistente AV – “ouve falar mas não sabe quem é” - e AP ouviu falar agora, acrescentando que “via os miúdos lá”, na zona do CZ, mas não sabia quem eram. A testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, durante cerca de 20 anos; e tendo dito ao Tribunal ser casado com a testemunha ED), disse que conhece o arguido A pelo menos desde que passou para motorista. A começou como ajudante de motorista e “a partir de certa altura” passou para motorista, o que localizou “ há cerca de oito anos mas sem ter a certeza” (tendo em atenção que a testemunha prestou depoimento em 21/04/06, disse que a ideia que tinha é que foi na altura em que “eles” passaram a “motoristas de transportes colectivos”; no entanto, pelo teor dos documentos de fls. 628, 629 e 636 do Apenso CQ, Vol. Ii, o Tribunal localiza esta passagem “para motoristas” em fins de 1999, princípio de 2000, pois foi a altura em que foi feita a “reclassificação” dos funcionários, estando por isso a testemunha equivocada quanto ao ano em que localiza o facto). Disse, quanto à forma como eram feita a planificação dos transportes, que inicialmente havia uma folha que era envidada com os serviços e mais tarde passaram a ter uma cópia do serviço para cada um, escala esta que era organizada pelo serviço de Transportes e dos quais foram chefes o Sr. HHY e depois a Sra. D. XQ (declaração esta que referimos aqui, tendo em atenção a globalidade do depoimento, mas que foi igualmente relevante quando o Tribunal fez a análise crítica da prova quanto à utilização dos veículos da AX pelos diversos motoristas, incluindo o arguido A). Para ele o arguido A era um motorista como os outros. Mas quanto à forma como desempenhava as suas funções, disse que aconteceu “às vezes” encontrar o arguido A num local, perguntar-lhe o que é que andava a fazer ali e ele dizer que tinha “ido fazer isto ou aquilo”, às vezes “desculpava-se com o Dr. C” e outras vezes “ com serviço”, acrescentando que “ele às vezes usava o nome do Dr. C para se desculpar” (mas tendo extraído o Tribunal desta declaração o sentido de que não se desculpava unicamente com o arguido C). Fez também referência ao uso, pelo arguido A, da expressão estar “ a fazer serviços para o Chefe” e desculpar-se com isso quando lhe era pedido algum esclarecimento quanto a trabalho, mas para a testemunha quando o arguido A dizia “ o chefe”, estava a referir-se tanto ao arguido C como ao (...) e “mais” ao (...). Relatou, também, uma situação que disse ter presenciado na (...): o arguido C “perguntou por A” e foi a testemunha que respondeu que tinha “ido ao EP” (esta situação, de acordo com o depoimento da testemunha, estava relacionada com a deslocação do arguido A com um educador ao EP, não sabia se ele tinha autorização ou não para aquela deslocação, mas sabia que o trabalho não estava escalado). Conheceu o arguido C quando este ainda era funcionário dos serviços Administrativos e começa por responder que o “relacionamento” do arguido C com o arguido A era um “relacionamento normal”: “ o Dr. C tinha autoridade” para dar ordens e eles obedeciam. E aqui referiu - quando lhe foi perguntado se o arguido A se justificava com o Dr. C - que era “uma situação normal” falar no nome do Dr. C. Quando lhe foi perguntado quanto à percepção de alguma “relação especial” entre o arguido C e A, respondeu de forma que para o Tribunal foi retraída, não espontânea e perdendo, por isso, objectividade. Aliás, ainda na instância que lhe foi feita pelo Ministério Público, o Tribunal - face ao constrangimento e alguma retracção que percebia na atitude da testemunha -, fez-lhe nova advertência do dever de falara verdade, perguntou-lhe se estava incomodado ou perturbado, se havia alguma coisa que o impedisse de falara verdade, tendo-lhe dito que se a testemunha precisasse de alguma pausa que o dissesse, tal não teria importância, e que quem estava para julgar e avaliar era o Tribunal, a testemunha só tinha que dizer o que sabia. A testemunha disse ao Tribunal que nada o impedia de dizer a verdade e prosseguiu o seu depoimento. Assim, quanto ao modo como o arguido A tratava o arguido C e vice versa, começou por ter um registo em alguns aspectos idêntico às testemunhas que temos estado a enunciar: o arguido tratava os colegas por alcunhas; tratava o arguido C, quando falava com este, por “Dr. C” – mas sabendo também da alcunha que o arguido A lhe tinha (...) “(…)” - e o arguido C tratava-o por “(…)”. Disse que “várias vezes” ouviu o arguido C falar com o arguido A mas começou por dizer não se recordar de situação em que, “cara a cara”, o arguido A tenha desrespeitado o arguido C: “… algumas vezes vi o Dr. C a chamar por ele e…algumas vezes…mas estar a dizer que via e não sei quê, não.. na frente dele não vi A faltar ao respeito….”. Perguntado pelo Tribunal - em concreto qual foi o comportamento do arguido A naquela situação - disse que ele (A) dizia “… tá bem, tá bem…mas virou as costas. Era uma atitude que ele às vezes fazia, mas com qualquer pessoa… também não sei o que o Dr. C estava a dizer…se lhe estava a dar uma ordem…se estava…sinceramente não posso precisar. Agora dizer assim, dar-lhe …e ele dizer não faço, ou tratá-lo mal, isso nunca vi…”. A Defesa do arguido C - aquando da sua instância -, voltou a esta questão do “voltar as costas” do arguido A, se alguma vez o viu fazer isso a outras pessoas, tendo a testemunha respondido que com o (...) nunca “assistiu a nada” e à Sra.D. XQ “ possivelmente” viu, mas não se recordava de o ter visto. E acrescentou que “ … só que aquela atitude do A, as pessoas nem levavam a mal…se ele tivesse uma atitude dessas as pessoas acabavam por desculpar, penso eu…”. Mas aqui não estava em causa se as pessoas levavam a mal ou não. Estava em causa esclarecer, por um lado, se o arguido A tinha aquela atitude para o (...) (...), Dr. C e/ou, por outro lado, se o (...) (...) as consentia e se não tinham consequências. Pelo que o Tribunal permitiu - no caso concreto a Defesa do arguido C, até porque era directamente afectado por esta questão - que voltassem a ser pedidos esclarecimentos quanto a esta questão, tendo a defesa do arguido C perguntado à testemunha se, do contacto que teve com ambos, tinha visto alguma relação especial de amizade, protecção, confiança. E aqui a testemunha, ao dar a resposta, voltou a ter a atitude de retracção, falta de espontaneidade, como que não dizendo tudo o que efectivamente sabia ou tinha “pensado” - mas o Tribunal não pode deixar de considerar que a resposta a esta pergunta tem em si, de algum modo, alguma avaliação que a testemunha fez de determinadas “coisas” que viu ou que ouviu e que, ao longo do tempo, foram-lhe criando determinada “ideia” em relação a pessoas, relacionamentos ou situações, o que naturalmente pode causar alguma reserva a uma testemunha, em “avançar” com aquilo que “achou”. A sua resposta foi, então, a seguinte (quanto à relação especial de amizade, confiança, protecção): “… às vezes uma pessoa, como é que eu devo dizer isto…a única coisa que eu notava é que de facto havia ali…mas o que eu pensava era que o facto de terem sido alunos que levasse, talvez, a um relacionamento mais…se bem que…”. Nesta altura a defesa do arguido perguntou-lhe “ mas o que é que via que traduzisse isso”, respondendo: “…se calhar na altura em que lhe dava uma ordem dava diferente de mim. Se calhar com mais agrado…diferente…penso eu…”. Nesta altura o Tribunal pediu à testemunha para concretizar e terminar o que estava a dizer - pois as respostas eram dada por “meias frases” -, havia ali o quê (?), a que a testemunha respondeu:”… se calhar a maneira como se dirigia a ele…sei lá…eu…chegava ao Dr. C e batia à porta, pedia para…quando tinha mesmo que ir ter com ele, para me assinar determinado documento…porque, dizia-lhe porque é que tinha feito aquela despesa, aliás até já ia escrito…mas pronto, uma relação de motorista e (...) (...). Se bem, que como disse há bocado, eu não tenho absolutamente, até pelo contrário, houve sempre um bom relacionamento e ele está aqui para o provar, penso que não tem razão de queixa(…), o A era um tipo muito extrovertido…muito mais…quando digo isso é neste contexto… que eu nunca notei que houvesse diferença…”. Perguntou-lhe o tribunal - dado que a testemunha tinha disto o que fazia, ao ir ter com o arguido C, se fosse a testemunha -, como é que fazia o arguido A: “… o A se calhar fazia isso, Mas só com mais à vontade…não sei…é a maneira de ser da pessoa (…)….também…não sei… que dizer…isto é um relacionamento de muito tempo…”. O Tribunal ainda insistiu com a testemunha, para concretizar o que havia de diferente entre a forma como a testemunha estava e a forma como o arguido A estava, tendo respondido: “… entrar dentro do gabinete, se calhar não…se calhar passar por ele e ele rir-se…dizer estas coisas…não quer dizer que fosse incorrecto com ele…”, não tendo conseguido concretizar mais. Esta testemunha - na instancia que lhe foi feita pela Defesa do arguido C -, falou ainda das caves da (...): lembrava-se que inicialmente o refeitório foi no primeiro andar do edifico da (...), sabe que houve obras para o refeitório passar apara a cave, mas não sabe durante quanto tempo nem quando foi a passagem do refeitório do 1º andar para a cave (sabia é que o arguido C já era (...) (...), o que ocorreu em 1/09/97; cfr. “ Apenso AI-1”, documentos de fls. 522 e 523, referente a Termo de posse de C como (...) do (...) da AX, datado de 1/09/97). Disse que na cave situavam-se os arquivos, as arrecadações e casa da caldeira e entrou algumas vezes nas salas, pois foi lá com “pessoas que iam buscar artigos “ que estavam guardados na cave. Todos os motoristas faziam estes serviços e viu o arguido A “várias vezes” com “coisas que traziam das caves. Confirmou que viu “várias vezes” o arguido A chamar alunos ou ir buscar alunos aos (...)s, para o ajudarem a carregar coisas, mas não podia “garantir” que isto tivesse ocorrido na (...), embora para si “é natural” que tivesse visto. A testemunha HI (engenheiro e professor, tendo entrado para a AX em 1980 e desempenhado, ao longo de 19 anos, funções de responsável pelo curso de mecânica, responsável pela oficina da mecânica e manutenção de viaturas e pela gestão da frota da instituição, o qual, pelo exercício das suas funções, demonstrou conhecimento directo do que era o serviço dos motoristas, incluindo do arguido A e teve relacionamento profissional com o arguido C), disse ao tribunal ter sucedido que o arguido A não acatava a escala de serviço que era feita para os motoristas, não só quanto à viatura a utilizar mas também quanto aos horários. Relatou uma situação em que havia um serviço marcado para a (…) e o arguido A andava com a carrinha, não lhe estando atribuída na escala, situação que lembrava-se ter relatado ao Dr. FB e que disse não ter sido única (depoimento este que vai ao encontro de um comportamento e atitude que já assinalámos, quando referimos ao incidente de “1993”, concretamente a exposição datada de 15/09/93, que os motoristas UC, SZ, MG, VO, EC e BBG fizeram ao (...), na qual “queixam-se” que o arguido A, então com a função de “ajudante”, dificultava o trabalho dos motoristas, destabilizava o serviço programado semanalmente, executando-o de má vontade, sobrepondo-se às ordens que eram dadas aos motoristas - Cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 691 –; e em que é feita uma informação pelo Chefe de Serviços dos Serviços Gerais e económicos para o Sr. (...), dizendo que o arguido A “destabiliza e tem mau relacionamento com os Senhores Motoristas porque exige ser ele a programar e orientar o serviço, sobrepondo-se ao serviço de Transportes, e quando não se faz como ele quer, surgem insultos e ameaças verbais”; o arguido A várias vezes, “no átrio da (...) toma atitudes que não são correctas, discutindo ordens de serviço”, tendo a Chefe de Serviços já advertido o arguido que é apenas “ ajudante do motorista e nada mais”, propondo que futuramente A fique sob orientação directa do Chefe dos Serviços Gerais Económicos, “ não podendo invocar quaisquer desculpas para alterar e não cumprir as tarefas que lhe foram destinadas e sempre que recebesse ordens de outros Superiores, teria que dar conhecimento aos Serviços, não os abandonando e só depois quando lhe perguntam porque não executou este ou aquele serviço, alegar que foi com ordens do superior tal…”; cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 680 a 690). Falou, também, sobre um aspecto que o Tribunal considerou relevante para aferir o acesso que o arguido A tinha aos veículos da AX. Disse que todos os motoristas tinham a chave da garagem, foi a testemunha que a deu e que o arguido A, a partir do momento em que foi motorista também passou a ter a chave. No entanto, anteriormente, o arguido A já tinha uma chave, a testemunha tentou tirar-lha mas sem sucesso. Relacionado com este segmento do seu depoimento - e no sendo da sua corroboração - temos o documento que se encontra a fls. 476 dos autos, referente a uma comunicação da testemunha, na qualidade de responsável pela garagem, para o Director do CZ. Nesta comunicação - datada de 1997, documento este que foi sujeito ao contraditório, não tendo resultado qualquer indício ou alegação de que não se tratasse de um documento feito na altura que o mesmo refere, com o conteúdo e objectivo que refere -, a testemunha escreveu que “… não se compreende como é que este Funcionário da (...)…”, o arguido A, “… entra e circula livremente neste (...) a qualquer hora do dia, da noite, de sábados, domingos e feriados, mantendo-se no interior do (...) o tempo que ele quiser sem qualquer controlo ou autorização superior. Como Responsável pela Frota e Garagem proíbo a entrada do auxiliar A nas instalações da Garagem (…) e inibição da condução de qualquer viatura…. O Sr. A deve entregar as chaves (alarme, Garagem e estação de Serviço) ao Responsável por estes serviços ou ao Sr. Director do (...)…”. Independentemente do que esta comunicação possa exprimir e ser motivada pelo que era o relacionamento da testemunha com o arguido A - que quer pelas declarações da testemunhas, quer pelas declarações que o arguido A prestou, imediatamente a seguir à testemunha ter prestado o seu depoimento, o Tribunal concluiu que eram conflituosas - , o certo é que relata situações que ilustram o que a testemunha disse ao Tribunal, quanto ao que era o “à vontade” do arguido A dentro da AX, utilização ou possibilidade de utilização de veículos e entrada nas instalações, durante a semana ou fim de semana. Esta testemunha contou, também, duas situações que testemunhou, do modo do relacionamento existente entre o arguido A e o arguido C (mas deixando bem vincado que não foram as únicas situações que presenciou). Passaram-se as duas situações na zona do hall da (...), onde a testemunha esclareceu ir com alguma frequência até 2001, pois ia a despacho inicialmente com o Dr. FB e algumas vezes, em 2001, com o arguido C. Numa das situações diz que ouviu o arguido A “mandar à merda” o arguido C, o qual não teve reacção de repreensão ou outra atitude idêntica em relação ao arguido A. Nas palavras da testemunha o arguido C voltou as costas ao arguido A e entrou no gabinete. Apesar de ter dito que não ouviu a conversa ou o contexto em que esta expressão foi proferida, foi seguro quanto ao facto de ter ouvido a expressão do arguido A para o arguido C. E afastou a hipótese - que lhe foi perguntada -, de ter sido proferida no contexto de uma anedota ou situação parecida, resultando do depoimento que afastava esta possibilidade, face à forma como disse ter presenciado o arguido C a - nas palavras da testemunha - “ meter-se no gabinete”, “nem refilou sequer” e voltar as costas ao arguido A. Conclusão que faz sentido para o Tribunal, pois a reacção do arguido C, tal como foi descrita pela testemunha, faz mais sentido para uma situação de insulto, mas a que o arguido não quis dar seguimento, do que para uma situação em que estivesse em causa uma história ou uma anedota (ver, por exemplo, a justificação que o arguido C deu em audiência de Tribunal e que já transcrevemos, para o arguido A não ter estado presente na reunião que o arguido C promoveu no dia 9/3/2001, para tratar, entre o mais, das questões havidas entre o arguido A e os mecânicos; o que vai, para o Tribunal, no sentido do que era a reserva do arguido C em afrontar ou confrontar o arguido A, em situação em que estivesse em causa alguma desavença ou desagrado para o arguido A). Uma outra situação, passada também na zona do hall da (...), mas em que a testemunha ia a passar para a zona do corredor e “viu e ouviu” o arguido A a tratar o arguido C por uma alcunha que lhe pusera “ (…)”. Passado uns minutos de ter ouvido este “tratamento”, a testemunha entrou no gabinete do arguido C e perguntou-lhe se ele sabia a alcunha que o arguido A lhe tinha (...) e o arguido C respondeu-lhe que não. A testemunha disse ao Tribunal que o arguido C teve que ouvir o arguido A a tratá-lo pela alcunha, tendo em atenção o local onde estavam e a proximidade entre os dois, pois a testemunha também a tinha ouvido. Mas negou-o. O Tribunal - e convocando aqui o que acima já dissemos, aquando da enunciação do nome das testemunhas que contribuíram para a convicção do Tribunal e o que o Tribunal em concreto disse quanto à atribuição de credibilidade a esta testemunha e veracidade do seu depoimento -, ficou convicto que a testemunha relatou factos a que assistiu e da forma como os assistiu. Acresce que a situação em que descreve o arguido A ter tratado o arguido C por uma alcunha, tem semelhanças com o episódio relatado pela testemunha EEI e que a seguir descrevemos. E não resultou da instância de um ou de outro, qualquer indício que o relato deste incidente pudesse ter resultado de alguma conversa, acordo ou criação entre os dois. Há, ainda, que notar o seguinte quanto a esta testemunha. Após a testemunha ter prestado depoimento, o arguido A prestou declarações perante o Tribunal. Expressou, por seu lado, uma atitude crítica em relação à testemunha, imputando-lhe comportamentos que punham em causa a forma como este exerceu as suas funções na AX, com o arranjo de veículos, aquisição de materiais e abate de veículos, em condições que, nas suas palavras, lesaram a AX. E atribuiu-lhe, também, má vontade e atitude de perseguição contra o arguido. Do depoimento da testemunha HI já tinha resultado o mau relacionamento que havia entre os dois. Mas avaliando o seu depoimento e conjugando-o com as declarações do arguido A - ou do arguido C, que quanto a esta testemunha foi uma das pessoas que identificou dentro da AX como querendo-lhe mal -, o Tribunal não criou a convicção ou a impressão, que a testemunha estivesse a criar factos ou a alterá-los intencionalmente, para prejudicar qualquer um dos arguidos . Aqui reproduzimos, parcialmente, o que acima já dissemos quanto à testemunha - quando o Tribunal enunciou os meios de prova nos quais fundamento a sua convicção quanto à matéria de facto - e onde dissemos que não obstante a declaração que a testemunha fez quanto à razão de queixa que tinha do arguido C e resultar do seu depoimento que tinha uma atitude crítica, negativa, em relação à forma como o arguido A estava e movimentava-se na instituição e a responsabilidade que imputou ao arguido C nesses factos, o Tribunal considerou que o seu depoimento foi globalmente objectivo. De facto e apesar da referida atitude crítica e negativa que demonstrou em relação ao arguido A e também em relação ao arguido C - pois do seu depoimento foi possível perceber que atribuída ao arguido C, pelo menos, a sua saída de encarregado da oficina da mecânica -, deu respostas que ao tribunal deixaram transparecer cuidado e responsabilidade para responder com verdade. Por exemplo, quando estava a responder às perguntas que lhe eram feitas sobre a utilização de veículos pelo arguido A na AX e esclareceu que não tinha conhecimento que o arguido A tivesse levado “um carro ao sábado e só o tivesse trazido ao Domingo”, o que demonstrou cuidado em responder com verdade quanto a tal pormenor, pois não foi evasivo, nem deu uma resposta dúbia: não teve conhecimento e disse-o; ou quando esclareceu, depois de primeiro ter dito que tinha sido destituído pelo arguido C, que afinal tinha (...) o seu lugar “à disposição” por o arguido ter-lhe sido dito que ia ser destituído, portanto, de qualquer forma já não ficava com o lugar, assumindo tal posição (o que para o tribunal foi sinal de cuidado em responder com verdade, pois não deixou de assumir as circunstâncias em que pôs o seu lugar “à disposição”); ou quando esclareceu que foram os motoristas que lhe disseram que o arguido A desculpava-se com serviços para o arguido C, mas a ele nunca lho disse. Assim - e convocada a explicação que o Tribunal deu quanto à valoração do depoimento da testemunha - a testemunha ao narrar os factos ao Tribunal deu a sua versão dos factos, como é natural, mas não ficámos com a convicção que os tivesse criado e, portanto, mentido ao Tribunal. A testemunha EEI (mecânico na AX, para onde entrou em 1983/1984, tendo conhecido o arguido A e o arguido C), declarou ao tribunal que começou por trabalhar no (...) EY, em que era Director o Dr. UB, trabalhou aí oito anos, após o que foi para o CZ. Corrigiu, quanto à ida para CZ, que deve ter sido em 1998. Relatou que esta ida foi na sequência de “requisição” para ir trabalhar para a “oficina de produção” e passados três ou quatro meses de lá estar , houve uma altura em que o Engº HI saiu e a testemunha ficou como responsável (disse “ de repente surgiu essa situação, não sei bem porquê, quando eu a pedi não ma solicitaram, mas depois de repente apareceu lá a carta e a comunicarem-me que eu no dia tal tinha que me apresentar no CZ”). Disse que conheceu o arguido A mesmo antes de ter ido para CZ, pois o arguido já era ajudante de motorista em EY. Em CZ via-o todos os dias e o arguido já era motorista. Durante a instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C, pormenorizou um episódio que afirmou ter presenciado na (...) e que já referira anteriormente. Não concretizando por não se recordar do ano, dia ou hora, disse ao tribunal que presenciou a uma situação na (...), em que o arguido A, dirigindo-se ao arguido C – e chamando-o por um nome que a testemunha disse ser uma alcunha que o arguido A lhe pôs – disse : “ ...«(…), (…)» estás nervoso, acalma-te que daqui a bocado a gente resolve, daqui a bocado já não é nada...”, após o que entraram os dois no gabinete do arguido C. Esclareceu que quando deparou com esta situação, tinha ido falar com o Sr. (...) . Como já referimos, no início da instância que foi feita pela defesa do arguido C a esta testemunha - e a pergunta desta Defesa -, a testemunha confirmou ter conhecimento que o arguido C tinha apresentado contra si uma queixa crime. Mas disse não “ter ressentimentos” e já tinha ido ao DIAP prestar declarações. Não obstante alguma alteração e irritação que deixou transparecer, nomeadamente quando estava a responder às perguntas que lhe foram feitas pela Defesa do arguido C – e a pergunta que lhe foi feita sobre o que a testemunha já dissera ter visto na (...), foi feita depois dessa pergunta sobre a existência da “queixa crime” -, atenta a forma como falou, como se exprimiu para o Tribunal, não ficámos com a impressão ou sensação de que a testemunha estivesse a relatar este facto para prejudicar o arguido C, que o estivesse a criar, que o tivesse inventado. A sua expressão transmitiu a ideia de um relato de situação vivida, pelo que o Tribunal ficou convencido que isto foi facto que a testemunha presenciou na (...), embora não sabendo o ano, dia ou hora. O que foi extensivo ao demais depoimento da testemunha e às situações que relatou - concretamente naquela parte em que incidiu a instância da Defesa do arguido C - e em que a testemunha concretizou o que, para si, exprimia a situação de “protecção” que disse que o arguido C tinha em relação ao arguido A. Acresce e como nota, que mesmo quando a testemunha - na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C - , relatou situações em que o arguido C lhe pediu para “fazer um favor” (uma situação relacionada com o arranjo do carro do filho do arguido e em que o arguido C pediu ao arguido A para levar a testemunha à sua casa, a (…), onde estava o carro do filho para arranjar e outra em que a testemunha arranjou o carro do arguido C e outra vez uma mota), o Tribunal não ficou com a impressão que o estivesse a relatar (também) com uma intenção de prejudicar o arguido C, aparentando expressar (também e apenas) uma intenção de mostrar que não teve mau relacionamento ou zanga com o arguido, nem estava motivado por tal. Mas - retomando a análise do relato do incidente que a testemunha EEI presenciou -, quanto ao correu o incidente que descreveu ao Tribunal a testemunha disse que foi para o CZ “oito anos após ter entrado no (...) EY”, corrigiu que afinal “deve ter sido em 1998”, fazendo “contas” para chegar a essa conclusão e localizou esta ida para CZ na sequência de “requisição” que foi feita para ir trabalhar para a “oficina de produção”. Disse que após 3 ou 4 meses o Engº HI saiu da oficina e a testemunha ficou como responsável (disse “ de repente surgiu essa situação, não sei bem porquê, quando eu a pedi não ma solicitaram, mas depois de repente apareceu lá a carta e a comunicarem-me que eu no dia tal tinha que me apresentar no CZ”). Tendo em atenção o teor dos documentos do “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 68, 69 e 70 e de fls. 472 a 476 dos autos - referentes, entre o mais, ao incidente que em 2001 ocorreu entre o arguido A e os mecânicos e em que houve a intervenção do arguido C, o qual fez uma reunião em 9/03/2001 com alguns dos funcionários envolvidos e conforme resulta do “MEMO” dessa reunião, o arguido C tomou de imediato a decisão de, face à abertura apresentada pelo Engº HI nesse sentido, passar a coordenação e responsabilidade da oficina do Engº HI para o mecânico mais categorizado, o qual foi a testemunha EEI (a quem o arguido C pediu, de imediato, que apresentasse uma relação das modificações que entendesse necessárias para melhor funcionamento da oficina e também para o arguido C aferir da continuidade da oficina e com três funcionários a ela afectos - cfr. fls. 13, do “Apenso EI, Vol. 1”; bem como fls. 71, comunicação do (...) (...) C para o director do CZ, datada de 27/03/01, em que é comunicado pelo arguido C a restruturação da oficina da frota da AX, cessando as responsabilidades do Engº HI, passagem de tal responsabilidade para o mecânico EEI e a decisão de os três mecânicos da oficina ficarem na dependência directa da Divisão de aprovisionamento e Logística, passando a registar as suas entradas e saídas no sistema de registo de assiduidade instalado na (...)), a testemunha está equivocada quanto a este lapso de “3 ou 4 meses”, que diz ter mediado entre a ida para CZ e a altura em que assumiu as funções de coordenação e responsabilidade das oficinas. De facto disse que foi em 1998 para CZ, dos documentos constantes do “Apenso EJ, Vol. 7” (referente aos registos da entrada e saída de veículos de serviço da AX, pelo portão de acesso às garagens de CZ) vemos que (pelo menos, pois só temos estes registos a partir do início de 2000) desde 3/02/2000 (cfr. fls. 510, do Apenso EJ, Vol. 7), o mecânico EEI tem registadas entradas e saídas de CZ com veículos de serviço, pelo que pelo menos desde essa altura já estava neste (...) (ver, também e neste sentido de estar equivocado e quanto ao lapso de tempo ter sido superior aos 3 ou 4 meses que disse, que no seu depoimento a testemunha relatou que ainda trabalhou cerca de 6 a 8 meses “com o Dr HI como meu chefe”). Pelo que, quanto “à data” do incidente que relatou ao Tribunal, apenas podemos concluir que este incidente ocorreu, pelo menos, em data posterior a 3/02/2000. O depoimento desta testemunha e o relato deste incidente, teve relevância não só pelo incidente em si, mas também pelo que a testemunha acabou por revelar de proximidade de relacionamento com o arguido A e com o arguido C, o que, para o Tribunal, contribuiu para dar expressão ao que era, por sua vez, o relacionamento dos dois arguidos entre si. Como vimos a testemunha EEI, por decisão do arguido C, em Março de 2001, passou para responsável das oficinas de mecânica de CZ, em substituição do Engº HI. A justificação do arguido C para a escolha do mecânico EEI, foi por ser “ o mecânico mais categorizado (cfr. Apenso EI, Vol. 1º, fls. 13, fls. 71 e fls. 472 a 476 dos autos, MEMO da reunião havida em 9/03/2001 e em que o arguido C tomou as decisões já referidas). Do depoimento da testemunha EEI não resultou que fosse uma pessoa que se relacionasse com o arguido C - nem tal resultou das declarações do arguido C -, no sentido de se dizer que era uma escolha da sua confiança profissional e pessoal e a testemunha deixou mesmo transparecer que não estava à espera daquele lugar. E disse, em súmula, que devidoàs incompatibilidades do arguido A com dois dos mecânicos da oficina - HHZ e HHP, o que já dera origem à queixa que os mecânicos em 19/02/01 fizeram contra o arguido A e na sequência da qual houve a reunião de 9/03/2001 (cfr. Apenso EI, Vol. I, fls. 69 e 70 e fls. 472 e 473 dos autos; e cfr. “Apenso D”, Vol. IX, fls. 1984, parte do relatório feito no Pº nº 169/2001, “Processo de auditoria à AX) -, os tempos que se sucederam após a sua nomeação foram de constantes e sucessivas idas à presença do arguido C, para esclarecer “queixas” que o arguido A fazia contra os mecânicos, (ver Apenso EI, Vol. 1º, fls. 72, Ofício da testemunha EEI, na qualidade de responsável da Oficina de Produção, para o (...) Dr. BQ e no qual pede ao (...) uma reunião, com urgência, para esclarecer, entre o mais “suspeitas de calúnias sobre os mecânicos, diferenças de tratamento para com os mecânicos, funcionamento da oficina”; ver tb fls. 73 a 76, 78 a 92 e 93). O seu depoimento foi expressivo quanto a este aspecto, na instância que lhe foi feita pela defesa do arguido C: “…parecia que o Sr. A estava ali a controlar os passos que o Sr. HHZ dava, que o Sr. HHP dava, se saía, se ia ao café, se ia com o carro, o que é que ia fazer e não sei quê, era assim coisas desse género …” e quando a testemunha falava com o arguido C, depreendendo-se do seu depoimento quando era chamado, este dizia-lhe o que é que o arguido A tinha dito em relação aos mecânicos (“… sim e eu dizia, olhe o HHZ saiu agora, saiu com a viatura, foi à Renault buscar peças ou fazer isto ou fazer aquilo, eram coisas assim deste género...” ). Acrescentou que em relação à incompatibilidade que o arguido A tinha com os dois mecânicos, antes de ir ao gabinete do arguido C não tinha conversas com o arguido A - “… eu não dizia nada…eu para ele dizia, eu não tenho nada a ver com isso ó A, e se tu queres fazer queixa vai fazer lá queixa, eu vou lá, respondo lá em cima não tem problema nenhum…” -, só quando “… eu, cá em baixo, geralmente à sexta-feira quando íamos treinar, eu dizia-lhe, fogo estás sempre a levar-me lá acima, por coisinhas que não têm jeito nenhum….”. A dado momento do seu depoimento relatou ao Tribunal um incidente que teve com o arguido A, em que se iam envolvendo fisicamente, por causa do arguido A ter feito uma insinuação de que a testemunha andava a “passar cheques carecas” e que ia dizer ao arguido C. Relatou que a situação ficou resolvida entre os dois, a testemunha disse ao arguido A que com ele “não o ameaçava” e tinha que ir “provar tudo”, no dia seguinte o arguido A pediu-lhe desculpa, tendo esclarecido que não se queixou ao Dr. C, porque com ele (testemunha) as coisas “resolviam-se na hora”, acrescentando que ia chegando a “vias de facto” com o arguido A. E acrescentou - na sequência das perguntas que lhe iam sendo feitas pela defesa do arguido C, incluindo se a testemunha tinha conhecimento, concreto, de alguma represália do arguido C face a alguma queixa que lhe fosse feita em relação ao arguido A - que “… tenho conhecimento e tenho a certeza disso (…). Tudo o que a gente fosse lá dizer em contra o Sr. A, o Dr. C dizia que era mentira. Chegou-me a dizer isso cara a cara…ele dizia isso é mentira, não é mentira é verdade, foi isto assim… assim que se passou. Não Sra., o Sr. A fez isso ? Fez isso sim sra.. Eu cheguei muitas vezes a ter …a conversar com o Dr. C no gabinete dele, que eu dava-me bastante bem com ele e ele sabe muito bem disso, inclusivamente fomos à Renault para ver, comprar, que isto não vem nada ao caso, fazia isso ao Dr. C como fazia a outro qualquer, quando saiu a (…) para vermos se o carro era bonito, ele estava com ideias de mudar de carro depois achava muito caro e não sei quê, como não utilizava o carro muito tempo, estar ali parado e não sei quantos, conversava muitas vezes com o Dr. C e eu chegava-lhe, cheguei-lhe a dizer essas coisas. Eu nunca fiz queixinhas, não gosto de fazer queixinhas…”. E disse também - como exemplo do que considerou serem “represálias sofridas” pelo facto de ter apresentado queixa do arguido A ao arguido C -, que “… concretamente a gente não podia dizer que era assim, que era preto, porque o Sr. Dr. C dizia que era amarelo, quando realmente era preto…agora lembrar-me de coisas que, eu sei lá o que é que se passou, tanta coisa…” Dissera também, em momento anterior - quando a Defesa do arguido C insistiu, quanto ao que sabia e porque dizia que o arguido A era protegido pelo Dr. C -, de forma expressiva: “…tudo indiciava que sim, às atitudes que tomava e as coisas que se faziam …”, atitudes que dizia serem “… do Sr. A e do Dr. C...”. E quando a defesa do arguido C lhe pediu para fazer “ um esforço de memória” e dizer quais foram as atitudes do Dr. C que para si foram um exemplo ou um indício de protecção ao arguido A, disse: “… ainda agora, ainda há pouco frisei atrás o exemplo daquele carro que o Sr. A disse que foi o HHP que pegou no carro e tinha sido o Sr. A que tinha pegado no carro; e o Sr. C chamou-me e que eu disse para se apurar a verdade; e ele quis-me levantar um processo disciplinar, é tão simples como isso…” e isto para a testemunha era protecção pois “… só porque eu disse, só porque eu disse Dr. apure-se a verdade, ele quis-me levantar um processo disciplinar, acha que isso é pouco ? Eu acho que, acho que não….(…). Sempre lidei frontal, olhos nos olhos com o Dr. C…quando ele me chamava lá acima eu ia lá e falávamos olhos nos olhos, ele dizia aquilo que o A lhe transmitia e que me dizia… e eu defendia conforme achava que devia defender, dizia, olhe isto é verdade, fez isto ou fez aquilo…(…). Nunca deixei de lá ir e sempre o enfrentei, não ia ser como o Sr. Dr. estava a dizer, fale com o Dr. FB a dizer olha, mais uma vez fui chamado ao Dr. C, nunca fiz isso…(…), resolvia os problemas na hora…olhe, a minha… pedido de exoneração do cargo…tudo derivado ao Sr. A e ao Dr. C, passou-se, já andava a ficar passado, não aguentava mais a pressão…” (declaração esta que vai no sentido e é corroborada pelo teor do documento que se encontra a fls. 93, do Apenso EI, Vol. 1º, datado de 11/10/2001, em que a testemunha apresenta o seu pedido de exoneração do cargo de responsável da oficina de produção, ao (...) (...) Dr. FB, constando do documento que em função dos problemas existentes na oficina e dos danos que vinha sentido na sua saúde por causa disso, não se sentia “…nas melhores condições psicológicas para exercer as competências enquanto responsável pela oficina…”). Acrescentando que isto era “… com o Dr. C e com o Dr., com o A…, o A chegava lá dizia uma coisa ao Dr. C, lá tinha que eu ir acima justificar…estava farto, estava pelos cabelos …” mas nunca falou disso com o Dr. FB. E isto era, para a testemunha, também um indício de que o “Dr. C na AX tinha mais poderes que os outros (...)es”, porque “… olhe esse caso, o Dr. FB é que era o meu chefe directo, era mais prático o Sr. A fazer queixas ao Dr. FB e ele chamar-me à atenção, não era ?...” , a que a Defesa do arguido C argumentou “mas isso é um caso pontual, mais coisas…”, respondendo a testemunha: “…é pontual, todos os dias é pontual ? …se todos os dias é pontual, está bem….”. A testemunha IIA (na AX, como Educadora, desde 1974 e no serviço de Aprovisionamento e Logística desde 1993), falou sobre o relacionamento do arguido C e do arguido A. Nunca viu qualquer falta de respeito do arguido A para o arguido C e disse ter conhecimento das duas alcunhas que o arguido A pusera ao arguido C - dizendo “(…)” e “(…)” -, mas esclarecendo que nunca viu o arguido A tratar assim o arguido C na frente deste, só tinha este tratamento com os colegas. No entanto disse que aconteceu a Sra.D.XQ (a testemunha acima referida) ter pedido ao arguido A para este fazer algum serviço e este responder não poder, pois “o (…) pediu-me isto”. Disse que “às vezes” estava convencida que A dava “desculpas”, pois respondia que não podia fazer alguma coisa por estar em EY e aconteceu estar nessa altura a vê-lo, pela janela, ali no CZ. Disse que quem procurava o arguido A era a secretária do (...), a Sra.D. HZ e o arguido C. Quanto ao tratamento por Chefe do arguido A, disse que era para toda a gente, até para a Chefe Sra.D.XQ. E a testemunha HE (assistente administrativa na (...) da AX, desde há 13 anos na instituição e desde há 4/5 na (...), prestou depoimento em 11/10/06), na (...) era telefonista, a sua colega era a ED - quando “rebentou o escândalo” estava nesse serviço desde fins de 2001 -, disse que várias vezes tento contactar com o arguido A e este não atendeu o telefone, dava mensagem de desligado. Para si, pela maneira de falar, quando o arguido A falava com o arguido C, havia mais à vontade do que quando falava com outro dirigente, não era indelicado mas mais à vontade. (6) A reprodução de algumas partes deste relato - tal como fizemos também com o depoimento das testemunha EC ou VO impunha(m)-se pela expressividade em si. É que ligando-os e cruzando-os com os demais depoimento assinalados, eles dão uma imagem do que era a relação do arguido C e do arguido A na Instituição. Já acima assinalámos que não é fácil para a generalidade das pessoas relatar certos factos ou a percepção que teve de determinados factos sem os subjectivar. De facto, o que as sucessivas instâncias foram pedindo às testemunhas foi o que para cada uma delas, exprimia ou deu-lhes a sensação e convicção de que o arguido A tinha protecção dentro da AX, de que o arguido C protegia o arguido A e de que este sentia-se confortável ou que tinha mais poder, por ter uma protecção do arguido C. Acontece também que um “favorecimento”, como “favorecimento” que é, tem em regra uma conotação negativa, logo não é algo que de forma clara e directa seja expressado e apreensível. É uma atitude ou actuação que naturalmente é feita sob outra aparência ou com tentativa de outra aparência. Mas os relatos que as testemunhas fizeram e que assinalámos, são para este Tribunal suficientemente expressivos de que, objectivamente, havia uma especial relação entre o arguido A e o arguido C e vice versa, tendo permitido concluir que o arguido C tinha uma atitude de protecção em relação ao arguido A e este tinha atitudes que demonstravam ascendente e poder face ao demais funcionários. Com efeito, a forma como perante o Tribunal foram prestados os depoimentos pelas testemunhas que especificamente indicámos – convocando aqui o Tribunal o que também pontualmente fomos indicando, quanto à razão da credibilidade que cada testemunha mereceu ao tribunal e/ou à razão da veracidade que foi atribuída às suas declarações, incluindo o que dissemos em sede de motivação da matéria de facto, quando indicámos o nome das testemunhas, declarantes, peritos e consultores técnicos que foram ouvidos pelo Tribunal -, bem como: - as expressões que usaram, como concretizaram em palavras o que eram as memórias de reacções que tiveram seis ou sete anos atrás, quando presenciaram aos episódios que descreveram (por exemplo, a testemunha VO, quando disse que se houvesse alguém à procura dele, como disse acontecer com o arguido A e não soubessem da testemunha, era logo perguntado “como é que era”, mas não sabendo explicar porque com o arguido A não era assim; se fosse com a testemunha ou com outro colega, o “à vontade” que disse que o arguido A tinha com as horas ou com o tempo que demorava a fazer os serviços, “talvez chegasse logo ao Ministro”; a testemunha YW, quando disse ter ouvido ao arguido A, embora não tenha ouvido a conversa em que a frase foi dita, que a ele A ninguém “podia tocar”); - e a convergência ou compatibilidade entre si, que para o Tribunal emergiu desses relatos, quanto à existência de determinados episódios e à forma como ocorreram; levaram o Tribunal a concluir que as testemunhas falaram verdade e com suficiente fidedignidade, quanto aos episódios ou atitudes, respostas e acções que disseram ter presenciado em relação aos dois arguidos e ao modo como disseram que se passaram. Acresce – e agora fazendo a ponte com matéria que já tratámos anteriormente - que: (i) o “à vontade” – como o Tribunal concluiu - que o arguido A tinha quanto ao tempo que demorava no cumprimento das suas tarefas e quanto à invocação do nome do “Dr. C” ou “do Chefe”, para se desculpar ou justificar o tempo que levava com as voltas, mesmo que com tal expressão pudesse estar a englobar não só o arguido C, mas também o (...) BQ - pois quanto ao (...) (...) Dr. FB, pelo que foram os depoimentos perante o Tribunal e que referimos alguns aspectos, resultou que com o mesmo o arguido A não tinha qualquer relação de “à vontade” ou proximidade profissional ou pessoal (vide, por exemplo, a expressão da testemunha VO e para além do que acima já referimos, quando disse que o arguido A tinha um “à vontade mais livre”); (ii) e a forma como, por exemplo, o arguido A se permitia responder ao arguido C e as atitudes que teve perante o mesmo ou as que tinha perante os colegas (vide, por exemplo, a expressão da testemunha HJ, quando relatou o incidente que presenciou na (...) e em que o arguido A, apesar de o arguido C o estar a chamar, virou-lhe as costas e foi-se embora, dizendo que era tão funcionário como o arguido C; ou da testemunha ED, quando descreveu o episódio que presenciou na (...), em que o arguido A voltou as costas ao arguido C; ou da testemunha EC, quando - embora a “custo” como o Tribunal já assinalou – relatou ter presenciado situação em que o arguido A dissesse ao arguido C “Tá bem, tá bem” e vira-lhe as costas; ou da testemunha YW, quando disse ter ouvido o arguido A dizer, embora a testemunha não tenha ouvido a conversa em que a frase foi dita, que a ele A ninguém podia tocar; ou da testemunha EEI, quando relatou ao Tribunal a situação que presenciou de o arguido A estar a tratar directamente o arguido C por uma das alcunhas que lhe pôs, “(…)”, dizendo-lhe para se acalmar e que “iriam resolver” (decerto, o que o estava a importunar), entrando os dois no gabinete do arguido C; ou a reacção que esta testemunha descreveu que o arguido C tinha, quando a testemunha tinha que ir falar com ele, por causa das queixas que o arguido A fazia dos mecânicos); ligam-se e vêm na trajectória do que já acima dissemos, pelo menos, quanto tratámos o incidente de 1993 - ocorrido entre os motoristas e o arguido A - e o incidente de 2001 - ocorrido (entre o mais) entre os mecânicos e o arguido A (cfr. Ponto 3.1. da presente análise crítica da prova). Lembramos que quando tratámos o incidente que houve em 1993 entre os motoristas da AX e o arguido A, referimos expressamente a “atitude” que na altura o arguido tinha dentro da AX - cfr. o que se disse no ponto “3.3.1. (10) e (10.1) e cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 688 a 691 -. Lembramos o que foi dito em audiência de julgamento pela testemunha Dr. BQ, (...) da AX, quanto à atitude do arguido A, classificando-a como muito “interventiva ” e por isso geradora de situações de conflito” e a valoração que o Tribunal fez de tal comportamento e atitude (no ponto “3.3.1. (10) e (10.1)”) . E lembramos que dissemos que esta “atitude” deveu-se não só à personalidade ou “modo de ser” do arguido, mas também à receptividade ou à forma como o meio em que o arguido se movimentava, os dirigentes e funcionários da instituição, lidaram com o “modo de ser” do arguido e os actos e factos que praticou . Quando tratámos o incidente de 2001, dissemos que nesta altura e tal já acontecia pelo menos em 1993 - cfr. Ponto “3.3.1. (10) e (10.1), da presente análise crítica da prova e o “incidente” com os motoristas da AX - e tal como já fora visível em 1988, na informação que em 19/12/88 o arguido C fez para o (...) da AX, Dr. BQ (cfr. Ponto “3.3.1. (8) a (8.5) e em particular (8.2)), em que ao mesmo tempo que fez a informação e proposta de alteração de funções do arguido A, o arguido C referiu nessa informação que quando chamados para serviços auxiliares e os “chamados” eram o funcionário HHQ e o arguido A, invocam que são “…ajudante de motorista, que é jardineiro e não carregadores, enfim, toda uma série de observações que acabam por aborrecer, quando não mesmo atingem proporções de impertinência…” (cfr. Apenso CQ, Vol. II, pag. 773 a 774) -, a atitude do arguido A era de “à vontade” dentro da instituição, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Mas dissemos que em momento posterior iríamos complementar esta conclusão, e é o que fazemos neste momento. Para o tribunal as observações que o arguido A fazia e áreas em que interferia junto dos funcionários da instituição – não só junto dos motoristas, área da sua função, mas estendendo a sua interferência à oficina de mecânica -, o modo como respondia, a forma como agia, o à vontade que demonstrava no modo de execução das funções, na forma como se deslocava dentro da instituição, como utilizava os veículos da instituição e como se permitia tratar o arguido C, traduzem uma despreocupação e sentimento de poder, que está aliado a uma ausência de consequências, no caso concreto por protecção. Para este Tribunal, a forma prestável ou bem disposta umas vezes ou brusca outras, do arguido A, não justifica tudo. Isto é, não justifica a tolerância com atitudes e comportamentos que foram apontados ao longo dos depoimentos que ouvimos. Porque é que a “maneira de ser” do arguido A – nas palavras do (...) Dr. BQ “muito interventiva”; e que o arguido C, como resulta do que disse ao Tribunal, quando explicou a razão pela qual o arguido A não tinha estado presente na reunião que promoveu em Março de 20001 com os mecânicos, na sequência da queixa que apresentaram, entre o mais, contra o arguido A, relatando que “... estiveram dois motoristas e de propósito, devo dizer, que excluí a presença do A e por uma razão muito simples ... porque o A tem um temperamento e daí um pouco ... se calhar... parecido com o meu, um pouco temperamental e às duas por três, em vez de haver ali uma reunião, havia para ali uma confusão ... de forma que optei por escolher … escolher enfim, pedir que comparecessem dois motoristas mais sensatos...” -, justifica a tolerância que o arguido A foi tendo? Considerando que na hierarquia da instituição o arguido A não pertencia a um escalão de chefia (ou responsável por algum departamento), nem era um funcionário especializado ou um Mestre, pois isso poderia justificar que em função da sua especial capacidade, mestria ou qualificação, o superior hierárquico, “optasse” ou “tivesse” que “ouvir” e “engolir”, para a instituição continuar a beneficiar da sua mais valia? Como já o dissemos o tribunal acreditou, por exemplo, no episódio que a testemunha EEI relatou ao Tribunal – aquela em que o arguido A tratou directamente o arguido C por uma alcunha “ (…)”, entrando os dois para o gabinete -, o qual transmite é objectivamente expressão de relação de proximidade e que exprime, também, o “ à vontade mais livre” que a testemunha VO referiu ao Tribunal ver na atitude do arguido A. Isto tem a ver com “protecção”. De quem? Da análise que fizemos da prova, a impressão digital que encontrámos, expressiva e associada a esta protecção no período a que se referem os factos objecto deste processo – particularmente desde 1997, altura também em que o arguido C foi nomeado (...) (...) - , foi a do arguido C. Das testemunha ouvidas pelo tribunal não houve relatos de factos dos quais o Tribunal pudesse concluir que com outros superiores hierárquicos – incluindo o (...) ou o (...) (...) – e no período a que nos estamos a referir, o arguido A tivesse tido as mesmas situações de desrespeito e à vontade de tratamento, no trato directo, como aconteceu com o arguido C. Embora não tenha resultado para o Tribunal, suficientemente assente, que o tratamento normal do arguido A para o arguido C, na presença de outras pessoas, fosse por “tu”, ou que o arguido A andasse pela AX a invocar para quem “quisesse ouvir” o nome do arguido C como seu protector, para o Tribunal e como já dissemos, as situações relatadas, por exemplo, pelas testemunhas EEI, HJ, YW, EC aconteceram. Tendo acontecido elas têm um significado. O arguido C - numa altura em que falou sobre o conflito que houve em 2001 (na parte que agora interessa) entre os mecânicos e o arguido A -, disse ao Tribunal que “… havia uma boa relação, eu considero que havia uma boa relação entre os motoristas da casa, comigo próprio, com o próprio (...) … haveria um … à vontade … digamos assim, eu diria mesmo informalidade, porventura …hoje diria se calhar excessiva, mas pronto …”. Por “informalidade excessiva” e “à vontade” depreendemos dois tipos de comportamento: o arguido C quer dizer que a sua relação com os motoristas da AX era uma relação de “tu cá tu lá”, sem diferenças hierárquicas; ou que a relação entre o arguido C, mantendo as diferenças hierárquicas no trato do “dia-a-dia”, permitia que cada funcionário lhe apresentasse as suas queixas, recriminações, pedidos ou o que fosse. Ora dos testemunhos que o Tribunal ouviu em audiência de julgamento e em particular dos que o Tribunal tem estado a enunciar, não extraímos que o arguido C, com os funcionários que estivessem na mesma categoria ou que exercessem as mesmas funções que o arguido A, ou com os mecânicos, tivesse um relacionamento “informal” ou de “à vontade” de “tu cá tu lá”, com o sentido que indicámos . É certo que a testemunha EF - ex aluno da AX, a exercer funções na AX no Departamento de Organização Informática desde 05/02/1976 e tendo trabalhado durante 15 anos com o arguido C, até à saída deste da instituição e convocando o Tribunal o que em sede de enunciação da fundamentação de facto já disse, quanto à valoração deste depoimento -, disse ao Tribunal que nunca assistiu a qualquer trato fora do normal entre o arguido C e o arguido A, não assistiu a tratarem-se por “tu”, o que a testemunha não teria estranhado se tivesse acontecido, pois considerava C uma pessoa simpática; o tratamento que a testemunha tinha com ele era por “tu”, acrescentando que “relativamente bastantes pessoas” tratavam o arguido C por “tu”; nunca assistiu a qualquer tratamento preferencial do arguido C em relação ao arguido A e nunca viu situação de falta de respeito. Mas acrescentou, por causa de uma pergunta que nada tinha a ver com “relacionamento” - e que foi se tinha visto o arguido A a descarregar material informático com alunos na (...) -, que não tinha visto o arguido A a descarregar “coisas” com alunos, “pode ter acontecido”, pois a testemunha “ não passava muito tempo nos corredores”, entrava de manhã e não saía. Deste depoimento e relacionado com o que agora está em causa e a declaração do arguido C, o Tribunal extraiu duas ilações e que avançamos: a primeira, é que é normal que com a testemunha, dada a sua função - de alguma parceria com o arguido C no exercício de funções, no que dizia respeito à execução concreta do sistema de informatização, embora tenha sido evidente para o Tribunal, a noção que a testemunha tinha de ter uma posição hierarquicamente inferior em relação ao arguido C -, existisse a “informalidade” e à vontade que a testemunha relatou; a segunda, é que não só este depoimento não exclui a conclusão que o Tribunal retirou e que vamos passar a descrever, quanto ao que era a expressão da “informalidade “ que o arguido C tinha os motoristas ou mecânicos (mas não incluindo o arguido A; sendo que com os demais motoristas e mecânico, como vamos ver, o Tribunal conclui que era “menor” e com “diferente sentido” da que tinha com a testemunha EF), como também não exclui que possam ter sucedido incidentes entre o arguido A e o arguido C, sem que a testemunha se tenha apercebido, dado que disse ser a sua vida, “ não andar nos corredores” (entrar no gabinete de manhã e não sair). Assim, resultou, para o Tribunal que com os demais motoristas (para além do arguido A), com os mecânicos ou, por exemplo, com a Chefe dos transportes - a testemunha XQ, que tinha uma posição hierárquica superior à dos motoristas ou dos mecânicos, mas inferior hierárquica do arguido C e, pelo seu depoimento, com menor “à vontade” daquele que transmitiu a testemunha EF -, o relacionamento era de respeito hierárquico e do que são expressões, por exemplo, o depoimento da testemunha VO ou EC. Mas isto sem prejuízo de cada um poder sentir-se com “à vontade” ou “no direito” de dizer o que tivesse a dizer quanto a algum assunto de serviço que o afectasse, do que é expressão, por exemplo, o depoimento da testemunha EEI ou EC (embora com a testemunha XQ a situação aparente ser diversa, pois a mesma demonstrou alguma reserva em interpelar o arguido C, quanto a saber se era verdade ou mentira a justificação que o arguido A dava com “serviço do Dr. C” , para demorar a fazer o giro ou para não estar na instituição quando era preciso). A relação com o arguido A era diferente. E dentro do que o Julgamento permitiu reconstituir - pelos depoimento das testemunhas que fazem parte do grupo que mais proximamente lidou com o exercício das funções do arguido A e com a interacção que o arguido C teve nesse exercício -, a pessoa que de forma expressiva está presente nos relatos das testemunhas que acima mencionámos, ligada ou associada à diferença , no sentido de superioridade, que o arguido A demonstrava - pelo menos a partir do momento em que o arguido A passou a exercer efectivamente as funções de motorista na instituição (e dizemos efectivamente pois, como vimos, antes de em 2000 ter sido reclassificado como motorista já exercia essa função) -, é o arguido C. Assim, o arguido C protegeu o arguido A dentro da AX, o que se exprimiu e consistiu na forma como o tratou e a tolerância que demonstrou para com atitudes que o arguido teve quer no o exercício das suas funções, quer no trato directo com ele C. A relevância ou a expressão desta protecção não foi através de lugar que o arguido A tenha alcançado ou favorecimento económico que tenha tido, decorrente e em função dessa protecção. A relevância e importância desta protecção traduziu-se em ter permitido ao arguido A dispor, sem preocupação, do tempo durante o período de serviço ou dos veículos da AX, pois ou não era questionado ou, se fosse, também não tinha consequências. E não tinha consequências porque o tratamento dos incidentes ou questões relacionadas com o exercício das funções de motorista do arguido estavam, na avaliação deste Tribunal, nas mãos do (...) (...) C, pois a ele eram reconduzidas estas situações. A relevância ou a expressão desta protecção foi, em conclusão, em o arguido A ter tido, à sua medida, aquilo que precisava. Esta atitude de protecção não precisou de «grande esforço diário» por parte do arguido C, pois da visão com que o Tribunal ficou da AX - do que foi a progressão da carreira do arguido A ao longo do tempo dentro da AX; e da desvalorização que diferentes pessoas, para além do arguido C e antes do arguido C, em diferentes e consecutivos momentos, foram fazendo da postura profissional do arguido; com a ausência de consequências para essa postura; o que tem consequências, pois o espírito de desvalorização e “deixa andar”, “não ligue”, “ não dê importância, há-de passar…e para quê aborrecimentos” instala-se - e da impressão que recolheu do depoimento da testemunha Dr. BQ, o que o arguido C fizesse no campo da supervisão ou controlo das funções do arguido A, estava bem feito para o (...) (cfr., por exemplo, o que dissemos quanto às decisões tomadas pelo arguido C, quando ao arguido A e sua passagem para o serviço da (...), na sequência da reunião de 9/03/2001 com os mecânicos; cfr. Apeno EI, Vol. 1, fls. 69 e 70; fls. 472 a 476 dos autos). E, por parte dos funcionários, a expressão que a dado momento do seu depoimento a testemunha EEI usou – testemunha a que demos credibilidade e depoimento a que demos veracidade, como já dito -, também traduz uma atitude de passividade quanto a tal questão. A testemunha EEI - quando estava a ser interpelado quanto a situações ligadas com actuações ou reacções de outros funcionários, em relação a queixas que tenham feito do arguido A e reacção que o arguido C tenha tido; e na sequência de ter sido perguntado à testemunha se para além de um funcionário BT, mais alguém lhe tinha contado ter feito queixas ao arguido C e/ou ter tido uma reacção adversa - respondeu ao Tribunal que “...muita gente sabia isso, simplesmente as pessoas acomodavam-se ... como eu já frisei aqui neste Tribunal, acomodavam-se porque era mais prático ouvir até não fazer sangue, aguentar ali a pancada, do que fazer as coisas desenvolverem ... que não valia a pena ... as pessoas eram, eram mais massacradas ... e depois eram com represálias por cima e assim era mais fácil ignorar...”. Resposta que exprime, também, o que na prática é a normalidade das coisas e a actuação das pessoas, no contexto de uma instituição como a AX – convocando o Tribunal o que já dissemos quanto a ser uma instituição grande mas um meio pequeno -: as pessoas vão trabalhando juntas ao longo do tempo e ao longo do tempo vão sabendo, apreendendo, quem é que favorece quem. Mas com as dificuldades inerentes e que teremos que ter sempre presente, do que é objectivar o favorecimento. Assim e retomando o que dissemos, o arguido C não necessitou de grande esforço diário, pois não teve que vencer nem resistência do seu superior hierárquico, nem resistência da demais estrutura da AX. Bastou-lhe seguir, com as diferenças que apontámos mas não se desviando -, o que era o rumo “normal” dentro da AX. 3.6. Prosseguindo no tratamento de outros aspectos particulares do ponto “(II) – Dos factos referentes ao percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX (Factos constantes de fls. 20.837 a 20.842 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “ 2 - Percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX; 2.1 – Percurso e funções do arguido A na AX; 2.2 – Percurso e funções do arguido C na AX” )”, a análise que já desenvolvemos - com o “sentido” e significado que concretizámos em todo o ponto “3.” a “3.4.2.” , que antecede - corroborada, por exemplo, com o teor do documento de fls. 214 a 222 do “Apenso J”, com as declarações que o arguido A prestou em audiência de julgamento – que, nesta parte, quanto à sua entrada e vivência na AX, local onde residiu, concretamente no (…), foram globalmente corroboradas pelos documentos do “Apenso CQ”, bem como pelos documentos de fls. 7018 e 7021 dos autos principais, quanto à data a partir da qual o arguido teve a disponibilidade de uma casa camarária que lhe foi atribuída, sita na (...) (…), Lote (…), em (…) – contribuiu, igualmente, para a matéria que o Tribunal deu como provada nos pontos “31.” e “64.”, dos “factos provados”. (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados). Para o Tribunal o arguido A viveu na AX de uma forma permanente e próxima, isto é: a AX era a sua “Casa Mãe”, viveu (…) nas instalações da instituição. Neste sentido da fundamentação e motivação dos factos referentes à “vivência” do arguido A no “(…)” situado nas instalações do (...) DT, há que dizer que contribuiu igualmente, o depoimento da testemunha IA - porteiro na AX desde 1990 e tendo saído da instituição por aposentação em 2003/2004 -, o qual declarou ter sido vizinho do arguido A quando o mesmo morava na (...) (…), a tal casa/barracão sito nas instalações do (...) DT -; e o depoimento da testemunha HQ - auxiliar de acção educativa desde 1991 no CZ da AX, tendo também exercido as funções de Porteiro na AX, inicialmente em substituição dos colega nas respectivas férias, isto ainda em 1991 e depois a tempo inteiro e até, aproximadamente, 2004 - , o qual declarou ao Tribunal ter passado por essa local onde o arguido A residia, quando saia da AX e regressava para a sua casa, que era perto. A motivação quanto à relação que o arguido A tinha dentro da AX com os demais funcionários - fosse qual fosse o seu nível na hierarquia dentro da instituição -, o fácil acesso e movimentação dentro da instituição - mas sob a perspectiva factual com que esta motivação é convocada no ponto “64.” dos "factos provados" e para além do que já ficou dito e analisado no ponto “3.” a “3.4.2.”, que antecede - decorre, igualmente, do depoimento das testemunhas VO, SZ, EC, BBG, MG, XQ, YW, HJ, ED, convocando o Tribunal as súmulas dos depoimentos que fez em ponto anterior. 3.7. Quanto ao núcleo de factos que o Tribunal deu como “Provados” (em particular ) nos Pontos “39.” a “49.” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados) e sempre sem prejuízo do acima já dito e analisado e que abrangeu parte desta matéria factual - quando falámos da “atitude” de “desvalorização” ou “desconsideração” que a Instituição AX, na pessoa dos seus dirigentes, educadores ou demais funcionários, fez ao longo do tempo da gravidade ou potencial gravidade de algumas condutas para a boa formação, saúde e crescimento do jovens que estavam em internato (cfr. Ponto 3.3.1. a 3.3.5 da presente análise crítica da prova) -, o Tribunal fundou também a sua convicção nos documentos constantes: (1) Do “Apenso K”, entre os quais os documentos de fls. 3 a 119 (correspondentes a documentação remetida em 1981 pela AX para a P.J., sendo na altura (...) HHM, no âmbito do inquérito crime nº 10.344/81, que correu na 4ª Divisão e em que A era arguido, pela prática de “crimes de atentado ao pudor de educando da AX”, documentação esta que diz respeito a peças do processo disciplinar que na AX foi instaurado contra o arguido A, na sequência das exposições feitas por GE, professor da Secção de CZ, em Junho de 1978 para o Director da Secção de CZ e em Fevereiro de 1980 para o Ministro dos Assuntos Sociais, encontrando-se entre estes documentos peças do processo de averiguações autuado em 29/02/80 e do processo disciplinar que se lhe seguiu) , incluindo a fls. 12 a 34 e isto referente ao processo disciplinar, o relatório efectuado pelo Instrutor do processo em 25/03/80; a fls. 37 a 39 e a fls. 93 a 95, o Despacho nº 28/80, da Sra. Secretária de Estado Dra. AAG, datado de 16/06/80 e já acima mencionado; a fls. 81 correspondência da P.J. para o (...) da AX, referindo expressamente o nome do aluno que seria ofendido no inquérito nº 10.344/81 que estava a correr; a fls. 81, 82 e 83, a comunicação que em 28/10/81 foi feita pelo “Sector de Serviço Social da Secção de DT”, subscrita pela técnica auxiliar IIB, para a Directora da Secção de DT, na sequência de incidentes ocorridos com um aluno IIC e o arguido A (estando neste documento identificado como “… o rapaz (…)…” e estando também manuscrito nesse documento um “Visto” para consideração superior e que “… o ex-aluno A trabalha na (...)); a fls. 84 e 85, a comunicação que em 23/10/81 foi feita pelo sector de serviço Social da secção de DT, subscrita pela técnica auxiliar IIB, para a Directora da Secção de DT, na sequência de incidentes ocorridos com um aluno IIC e o arguido A (nesse documento identificado como “… um rapaz de nome (…)…”, e o “incidente” relacionado com uma ida do aluno a uma festa num sábado, em (…), por convide de A, estando a(...) nessedocumento, manuscrito, “à consideração superior” ). (2) Do Apenso T, entre os quais os documentos de fls. 4 a 39, 54 a 56 e 61 a 89, sendo que quanto ao documento de fls. 27 - correspondente à comunicação que em 22/07/82 o Chefe de Gabinete da Secretária de Estado da Família, envia para o Director da Polícia Judiciária (…)-, encontra-se também a fls. 34, dos autos principais e aqui com a aposição do carimbo referente ao inquérito nº 16.044, que passou a correr na 4ª Secção da Directoria (…) da PJ. Estes documentos – os do Apenso T -, são globalmente referentes a um inquérito crime que correu termos no Tribunal (…), Pº nº 3788/83, o qual teve a sua génese num ofício que o (...) da AX, então HHR, enviou em 19/03/82 para o Chefe de Gabinete da Sra. Secretária de Estado da Família - ofício este que era acompanhado de um “relatório” e de um “interrogatório” feitos por educadores da AX, por causa de factos ocorridos nesse mês de Março de 1982 com alunos da AX e em que o arguido E foi referido, constando do ofício que os relatórios eram enviados por estarem relacionados “... com implicações que a ocorrência possa ter no exterior da AX e nível de representações estrangeiras no nosso país...” -, sendo visível neste ofício um carimbo da Polícia Judiciária, Directoria (…), com o “nº de Inquérito 16.868” (cfr. Apenso T, fls. 20 e 86). Contêm a requisição que a Delegação da Procuradoria da República, no Tribunal (…), fez ao Ministério dos Negócios Estrangeiros para a comparência do (ora) arguido E, para prestar declarações nos autos de inquérito preliminar; e os documentos relativos ao “processo Administrativo nº 182/83”, que correu nos Serviços do Ministério Público (…), figurando na capa deste processo a identificação como “Inquérito Preliminar” por eventuais crimes de corrupção de menores e de atentado ao pudor na pessoa de alunos da AX e em que era denunciado E e Outros (cfr. fls. 60, do Apenso T). (3) Dos autos principais – como particularmente relevantes para este núcleo de factos - os “relatório” e “interrogatório” que se encontram a fls. 13 a 16, o já mencionado documento de fls. 34 e o documento de fls. 37.172 a 37.173 (com o qual a testemunha Dr. BQ foi confrontado em audiência de julgamento). O documento de fls. 37.172 a 37.173 - e que se encontra também a fls. 25 e 26, do “Apenso T” -, corresponde o ofício que a testemunha Dr. BQ, na altura (...) do (...) para os Serviços Administrativos, dirigiu em 2/09/82 para o Director da Polícia judiciária, por causa da comunicação que a Secretaria de Estado da Família tinha feito para a PJ, de ocorrências com alunos de DT e que se prendiam com “corrupção de menores” e fazendo a comunicação da fuga do aluno interno HHS, “ um dos intervenientes nas ocorrências anteriormente comunicadas. 3.7.1. Mas ainda no que diz respeito ao núcleo de factos que estamos a referir - os Pontos “39.” a “49.” (cfr. “ Processo nº 1718/02.9JDLSB – Processo Principal/NUIPC 1718/02.9JDLSB – Factos Provados/ Factos Não Provados) – e pela especial relação e particular conhecimento que revelaram dos factos a que dizem respeito os documentos que acabámos de expressamente enunciar, o Tribunal valorou, particularmente, as declarações e o depoimento de: (1) Do arguido C, tendo em atenção o conhecimento que em audiência de julgamento revelou quanto aos processos disciplinares de que o arguido A foi alvo enquanto esteve na AX, incluindo o processo de inquérito que em 1984 já corria na Polícia Judiciária e que o arguido recordava-se ser relativo a factos de “1981”. (2) e das testemunhas: - XX - Procuradora Geral Adjunta, testemunha que demonstrou conhecimento directo sobre factos relacionados com um processo que se iniciou na Directoria da Polícia Judiciária como inquérito nº 16.868/82 e que foi remetido para a comarca (…), tendo corrido nos Serviços do Ministério Público sob o nº 3788/83 e do qual a testemunha foi titular e fez diligências -, cujo depoimento foi concorrente, essencialmente, para o núcleos de factos a que se referem os pontos “46.” a “49.” Dos "Factos Provados", a qual confirmou que o despacho de fls. 62, do “ Apenso T, foi feito por si, mas tendo igualmente esclarecido o Tribunal que enquanto foi titular do processo não foram remetidas quaisquer fotografias pela Directoria da PJ. Foi particularmente perguntada quanto a este último aspecto, tendo declarado ao tribunal que recordava-se que a ideia que teve quando teve o processo é que havia “fotografias”, pois lembra-se de ter perguntado ao funcionário que cumpria o processo onde é que estava “ a caixa” das “fotografias” e de este ter-lhe dito que não tinham sido remetidas (…) quaisquer fotografias. Em consequência nada soube dizer ao Tribunal quanto ao conteúdo dessas fotografias. - NZ (aluna da AX em 1982), cujo depoimento relevou, essencialmente, para a matéria que o tribunal deu como provada no ponto “48.”, dos “factos provados”. A relevância dos “factos de 1982”, tal como se encontram descritos no Despacho de Pronúncia e assim integrados no objecto do processo, deve ser vista sob a perspectiva de facto concorrente para a “prova” ou “não prova”, da matéria relativa ao conhecimento prévio entre os arguido. Foi sob esta perspectiva que o tribunal avaliou este depoimento. Como já assinalámos - quando enunciámos as testemunhas e declarantes, que concorreram para a prova dos factos deste processo e a para a convicção do tribunal, razões de credibilidade ou de atribuição de veracidade -, foi um depoimento em que a testemunha começou por apresentar-se descontrolada, tanto que o tribunal teve que interromper o seu depoimento. Mas à medida que a testemunha se foi acalmando e fazendo o seu discurso - e aqui a instância do Ilustre Mandatário de uma das Defesas teve, de facto, um contributo positivo para isso, face à forma como ia fazendo a instância e colocando as perguntas -, foi respondendo de forma que para o Tribunal revelou coerência quanto ao que ia dizendo e como ia dizendo. No entanto, quando a dada altura – factos da “casa (…)” “do” arguido E -, se viu ou não viu “fotografias do arguido” H, a instância desta Defesa foi colocando, sucessivamente, a questão do “viu ou não viu”, tem a certeza ou tem dúvida, foi aumentando a lente com que a testemunha ia explicando o que lembrava, como lembrava ou porque lembrava, até esta ter expressado uma noção turva do que era a sua memória quanto a um aspecto do facto originário (ter sido ou não, o arguido H, uma das pessoas que estava nessas fotografias). A dúvida que inicialmente não tinha (começo por dizer que para si era) ...afinal apareceu. E aqui uma referência: o que dissemos quanto à dinâmica deste depoimento e a forma como o Tribunal a apreendeu, foi relevante porque permitiu-nos ver como as pessoas agem e reagem em audiência de julgamento, quanto vão sendo encostadas contra si mesmo, como agem e reagem em stress, quando são confrontadas com a dúvida, quando são obrigadas a confrontarem o que vão dizendo com o que estão a pensar. E, da observação do que foi globalmente a atitude da testemunha, tendo em atenção a forma como a testemunha foi respondendo, a dinâmica da sua resposta após a sucessiva confrontação, o Tribunal criou a convicção que a testemunha respondeu com isenção e objectividade. Isto é - e no que pode contribuir para a prova dos factos objecto deste processo -, expressou de forma desinteressada a sua recordação de uma ida a uma casa em (…) com um colega da AX; casa esta que, para si, era do arguido E; e onde viu uma caixa com fotografias com jovens praticando actos de natureza sexual. Para a testemunha, a memória que começou por revelar ao Tribunal é que o arguido H estava numa das fotografias. Mas o movimento de dúvida que foi perceptível, nas sucessivas respostas que foi dando aos pedidos de esclarecimento que lhe eram feitos pela Defesa deste arguido e a dúvida final que acabou por expressar. Cruzando este depoimento com o que - quanto a tal matéria – foram os depoimentos das testemunhas, NY, YR, PL, OQ e as declarações do arguido H, o Tribunal não deu como suficientemente assente que era o arguido H que estava nessas fotografias. 3.8. Já quanto aos factos relativos especificamente ao percurso pessoal e estatuto funcional do arguido C na AX, bem como factos relativos á sua vida pessoal, nomeadamente os pontos “71.” a “77.” dos "Factos Provados", foram relevantes: (1) Os documentos constantes do “Apenso AI” e “AI-1”, documentos que foram remetidos para os autos pela AX e correspondem ao processo individual do arguido naquela instituição, incluindo o seu processo enquanto alunos. O Tribunal enumera, a título de exemplo do Apenso “AI”, os documentos constantes de fls. 1 a 10, 15 a 19, 27 a 35, 49, 70, 73 a 74, 83, 102 a 111, 130, 160 a 166, 245 a 254, 271 a 274. E, a título de exemplo do “ Apenso AI-1”, o documento de fls. 457 (referente à comunicação ao arguido da sua suspensão, documento datado de 22/01/2003), de fls. 458 a 460, de fls. 461 (publicação no DR, do despacho datado de 27/11/2002 da Secretária de Estado, dando por finda a comissão de serviço do arguido C e cessando a situação de substituição), de fls. 462 (publicação no DR, do despacho datado de 25/11/2002 da Secretária de Estado, determinando o desligamento ao Serviço do Dr. BQ, cessando funções como (...) e designando em regime de substituição o arguido C), de fls. 463 a 466, de fls. 483 a 486, de fls. 495 a 500, de fls. 521, 522 e 523 (este referente a Termo de posse de C como (...) do (...) da AX, datado de 1/09/97), de fls. 524 a 525, de fls. 526 (Termo de Posse de C como Assessor Principal, datado de 18/03/97), de fls. 527 a 529, de fls. 532, 534 (registo dos “Provimentos e Interrupções” relativos ao arguido C, enquanto funcionário da AX), de fls. 542 a 544, 566 a 567, de fls. 568 (registo da “ Formação Profissional Complementar” do arguido C na AX, de onde consta o “curso de introdução à informática”, “Recrutamento e selecção de Pessoal”, “Organização estrutural”, “Curso de Sistema operativo MS/DOS”, “ Curso de Segurança de Sistemas Informáticos”, e “participação no Seminário Os Media e a Escola”), de fls. 577 a 582 e 583 a 589, de fls. 590 a 592 (Requerimento do arguido C, datado de 9/02/93, na qualidade de Técnico Superior Principal mas nomeado em comissão de serviço no cargo de Director dos Serviços Administrativos, Dirigido ao (...) da AX, requerendo que lhe fosse atribuída uma gratificação mensal pelas funções que desempenhava acessoriamente na área informática, as quais descreve no requerimento e nomeando, entre o mais, que: (i) cabia-lhe … desde sempre (…) a administração das bases de dados, para além da concepção e modo das aplicações, (…) a concepção de todos os programas de gestão, (…) assegurar a coerência e integridade dos dados, definir acessos e modos de funcionamento, executar todas as alterações que devam ser efectuadas directamente sobre as bases de dados (…); (ii) que assegurava integralmente as funções das categorias que enuncia no requerimento, o que até aquela altura fazia com “…alguma facilidade…, uma vez que todo o sistema e estrutura das bases de dados está praticamente desenvolvido sobre as suas directivas específicas…”), de fls. 593 a 599 (elementos relativos à frequência nos cursos de informática e segurança de Sistemas), de fls. 600 (cópia do Termo de aceitação da nomeação do arguido C como Técnico Superior Principal, mantendo-se em comissão de serviço como Director de Serviços, datado de 22/2/92), de fls. 601 a 603 e de fls. 604/605 (Despacho do (...) Dr. BQ, sem data, enumerando as áreas que foram afectas a C, na sequência da nomeação que fora feita do mesmo para o cargo de Director de Serviços Administrativos; e estando a fls. 610/611, comunicação subscrita por C, datada de 15/05/91, na qualidade de Director de Serviços e referindo a sua “recente nomeação” nesse cargo, propondo ao (...) que, no cargo de Director dos Serviços Administrativos, lhe fossem atribuídas as competências que enumera na comunicação, entre as quais está a de “gerir pessoal”), de fls. 608/609, fls. 616 (comunicação do (...), Dr. BQ, para os (...)s, Directores dos (...)s e todos os serviços da (...), datada de 16/01/91, na sequência da nomeação por Despacho de 22/11/90 de C para “Director de Serviços Administrativos” da AX, enunciando as competência de C), de fls. 617 (Termo de Posse de C como Director de Serviços, em comissão de serviço, datado de 18/12/90), de fls. 618 a 627, fls. 656/657, fls. 671, fls. 693 (termo de Posse de C como Técnico Superior de 1ª Classe, datado de 14/01/87), de fls. 694 a 695, fls. 696 (Diploma de Provimento de C no cargo de Técnico Superior de 1ª Classe, datado de 20/10/86), de fls. 697 a 700, fls. 701 (Registo Biográfico de C), de fls. 702, fls. 711, fls. 716 a 718, fls. 724 a 726 e fls. 764 a 770. (2) Contribuíram, igualmente, os documentos constantes do “Apenso Z 8, 3º Volume” (documentos referentes ao Processo Disciplinar que foi instaurado ao arguido, por Despacho do ministro da S.S.T., datado de 16/01/2003), nomeadamente os elementos constantes de fls. 849, 857 a 861, 890 a 892, referentes à tramitação e instauração do Processo Disciplinar ao arguido por Despacho do Ministro do M.S.S.T. de 16/01/03 e os elementos constantes de fls. 915, referente ao Despacho de Delegação de competências, que o (...) da AX fez em 17/10/97, nos (...)s do (...) FB e C. São documentos que para o Tribunal e tal como temos referido noutras situações, afiguraram-se credíveis quanto ao seu conteúdo, isto é, não houve qualquer dúvida ou indício de que tivessem sido fabricados para distorcer a realidade dos factos que atestam ou que referem, foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Acresce – e no âmbito do contraditório feito em audiência de julgamento -, que são documentos que dizem respeito a factos globalmente referidos e corroborados pelo arguido C quando prestou declarações e, parcialmente pela demais prova produzida em audiência de julgamento - por exemplo, pelos documentos do Apenso CQ, Vol.I e Vol.II, na parte em que os documentos se referiram a situações em que teve intervenção o arguido C e dos quais consta quer a qualidade funcional em que teve intervenção, quer o conteúdo concreto da sua acção, da competência concreta que estava a exercer no desempenho das suas funções; ou, por exemplo, pelo depoimento do Dr. BQ, quando falou quanto aos poderes dos (...)es (...)s e, em concreto, quanto às questões de funcionamento da AX e exercício de funções do arguido C -. Esta corroboração do arguido, essencialmente em relação a dados e factos objectivos, foi naturalmente sujeita ao cruzamento e ponderação com a demais prova testemunhal e documental produzida e daí a credibilidade que o Tribunal deu às declarações do arguido nesta parte, contribuindo para a convicção criada pelo Tribunal, tal como veio a expressar nos pontos “71.” a “77.” dos "Factos Provados". (3) E foram, também, relevantes os depoimento das testemunhas que ou por relações de natureza pessoal ou por razões de natureza profissional, revelaram conhecimento directo e relevante destes factos. Assim e a título de exemplo, a testemunha EB (director de Serviços na AX desde 1999, mas trabalhando na AX desde 1992), o qual revelou conhecimento dos horários do arguido C enquanto a filha do arguido esteve a estudar na AX, tendo dito que trazia a filha de manhã e levava-a à tarde, sendo o horário chegar às 8.30h e sair às 18.30h, embora da avaliação do seu depoimento – face, por exemplo, ao depoimento das testemunhas GW e YS - o Tribunal ter valorado esta declaração como o sentido do que era normal acontecer, o que não afasta a possibilidade – atenta a normalidade das coisas, o que é a vida das pessoas -, não ter sido este o procedimento todos os dias em que a filha do arguido esteve na AX a estudar. A testemunha GW, disse ao Tribunal ter sido casada com o arguido C de 1974 a 1986, tendo falado ao tribunal sobre a vivência do arguido com os filhos após o divórcio (e tendo-se referido concretamente também ao ano de 1999), do carácter e personalidade do arguido, relacionamentos e amizades/inimizades no ambiente profissional. Por sua vez a testemunha YS (técnica superior na (...) da AX desde Maio de 1987) disse ao Tribunal ter trabalhados nos serviços do S.A.S.A., na (...) da AX, esclarecendo que o seu gabinete era no piso de cima da (...) e que o gabinete do arguido C era no piso de baixo, mas tendo relevado conhecimento directo dos filhos do arguido e do percurso escolar dos mesmos na instituição, os quais disse que iam ter com o pai, por vezes, à (...). *** 4. (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A (Factos constantes de fls. 20.842 (parte final) a fls. 20.871 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “II – DA ACTIVIDADE CRIMINOSA”: “ 1 – Angariação ; 2 – Dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A; 2.1 – Ofendido X (fls. 20.845 a 20.847); 2.2 – Ofendido AP ( fls. 20.847 a 20.850); 2.3 – Ofendido AV (fls. 20.850 a 20.853); 2.4 – Ofendido Y (fls. 20.853 a 20.856); 2.5 – Ofendido AT (fls. 20.856 a 20.859); 2.6 - Ofendido AI (fls. 20.859 a 20.863); 2.7 – Ofendido AN (fls. 20.863 a 20.865); 2.8 – AU (fls. 20.865 a 20.876); 2.9 – Ofendido AQ (fls. 20.867 a 20.871) ): Neste grupo de factos estamos, mais uma vez, perante uma situação em que a motivação dos factos que o tribunal deu como “provados” ou como “não provados”, está relacionada com a análise que temos vindo a fazer e, ao mesmo tempo, relacionada com a motivação de “grupos de factos” que será feita a seguir. Assim, o Tribunal convoca o que nos pontos “3.3.1”, “3.3.2.” e “3.3.3” - da presente análise critica da prova -, disse quanto ao percurso através do qual concluiu, entre o mais, que apesar da prática por parte do arguido A de actos no exercício das suas funções, que o pudessem fazer incorrer em responsabilidade disciplinar e que o fizeram incorrer nessa responsabilidade, tal não se reflectiu na progressão na carreira, na classificação que foi obtendo e na forma como o arguido esteve dentro da AX, quanto à especial relação e protecção do arguido C com o arguido A e quanto ao “à vontade” e movimentação do arguido A dentro da Instituição. Completando esta motivação - quanto aos factos que o Tribunal deu como “Provados” nos Pontos “78.” a “91” (dos “Factos Provados” ) , sendo que a presente análise crítica da prova abrange também e no sentido já expresso de completar, a motivação quanto aos pontos “66.” a “70.” dos “factos Provados” , dizemos (mais) o seguinte: Para a prova dos factos relativos ao relacionamento do arguido A no “dia-a-dia” com alunos, a forma como era acolhido ou visto junto dos jovens, deslocações a (...) – sendo, no que diz respeito ao relacionamento com os educando, vistos sob a perspectiva e com o sentido com que estão descritos nos factos “78.”, “81 a 89” e “90” dos Factos Provado -, foram igualmente relevantes: (1) O depoimento da testemunha EC (motorista da AX, funcionário na instituição desde 1978, tendo exercido as funções de motorista e trabalhado com o arguido A), disse ao tribunal que notava um comportamento mais afectivo e de brincadeira do arguido A com os alunos da AX, mas o que não estranhou, pois pensava que era por ele ter sido aluno da AX. Também VO (motorista da AX desde 1990/1991, tendo trabalhado directamente com o arguido A, quer quando este foi seu ajudante de motorista quer quando passou a motorista), relatou factos ao Tribunal que deram noção do contacto que o arguido tinha com os educandos, dizendo que o arguido A falava com os “miúdos” e dizendo-o de uma forma que o Tribunal interpretou como próxima: “… ora ele foi aluno, tinha vontade de falar com miúdos …que eu até nem ligava, nem bom dia nem boa tarde praticamente… e ele falava com este, com “a”, com “b”, com “c”…(…) como ele foi aluno e estava tão ligado a eles, o carro saia para um lado qualquer e ele punha-os na linha - tu vais para aqui, tu sentas-te ali - e não sei quê, não sei que mais…”. A testemunha YW (que trabalhou na AX desde 1986, nos internatos dos (...)s EZ, CZ, BF e FA e disse ter conhecido o arguido A assim que a testemunha entrou para a AX, porque o arguido fazia a distribuição dos mantimentos para os lares), disse que o arguido A, quando ia ao BF, “dava sempre alguma coisa aos miúdos”, tendo testemunhado, também, que o arguido dava “coisas” quer ao assistente AI, quer ao seu irmão WJ, comportamento a que, contudo, não deu relevância negativa. Lembra-se de ver o arguido A a lavar os carros em CZ, as crianças andavam a brincar nessa zona e o arguido convidava-os para ir dar uma volta no carro, para o carro secar e as crianças iam. Tendo descrito, também, um transporte que o arguido fez de dois alunos para a (...) (…), um dos alunos foi o assistente AI, que era do seu lar e o outro aluno era do BE, declaração esta relacionada com os factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao transporte de alunos por parte do arguido A. A testemunha ZN (Educadora no EX e na AX desde 1989), foi uma das pessoas que disse ao tribunal que nunca teve conhecimento de qualquer proibição de A levar jovens para as (...), tendo mesmo acontecido que na (...) que o seu (...) fez em e 2002, para (…), (...) a que a testemunha foi, o arguido A levou material para as (...) mas também fez o transporte de educandos – declarações que o arguido A confirmou, tendo dito que quanto a este transporte de alunos para a (...) (…), a Direcção do (...) até lhe agradeceu o transporte, pois não havia outro motorista que o pudesse fazer e o arguido tinha-se disponibilizado para isso. No mesmo sentido (do transporte de alunos) a testemunha OZ (Educadora de infância na AX), no GA pelo menos em 2001, a qual, embora tenha declarado não conhecer pessoalmente o arguido mas só de vista, viu-o transportar alunos, estando convencida que era para uma (...). Aliás, neste aspecto dos transporte de material, educandos e idas a (...), a testemunha VO (motorista da AX desde 1990/1991) disse que, quanto a (...), o arguido A “... se pudesse ir, ia a todas...(...)ele ia muito para as (...) levar géneros, cargas”). A testemunha UC (motorista da AX de 1974 a 2004),também confirmou ao Tribunal que o arguido A ia “... de vez em quando...” a (...), mas não ia “sempre” e quer a testemunha, quer o arguido, faziam transportes e chegaram a pernoitar nas (...). E no mesmo sentido foi o depoimento da testemunha ES (motorista da AX desde 1993, tendo trabalhado com o arguido A, mas este como seu ajudante de motorista), o qual disse que fez transportes para (...) em que o arguido A também ia, ficavam lá nesse dia e voltavam no seguinte (contrariando as declarações do arguido A quanto a este aspecto, pois durante a sua audição afirmou que não pernoitava nas (...) ). Confirmou que o arguido A por vezes transportava “um ou dois miúdos” para as (...). A testemunha BBG (motorista na AX de 1989 a 2005), também confirmou que o arguido, tal como a testemunha, ia fazer transportes para (...), não só de material mas também de educandos, mas não tendo conhecimento que o arguido A alguma vez tivesse aparecido nas (...) “ sem ser esperado”. Confirmou que, tal como acontecia consigo, quando necessário o arguido A também pernoitava nas (...) e por vezes ficava a dormir junto dos educandos. Explicou saber isto porque, “às vezes de manhã”, os “miúdos diziam” que A tinha ficado com eles na camarata na escola (ou no sítio) onde estavam. No entanto, o Tribunal não extraiu dos depoimentos das testemunhas que o arguido A aparecesse nas (...) para “fazer surpresa”, como o Despacho de Pronuncia referia. O arguido aparecia para levar ou buscar material, por vezes educandos e, por vezes, por ter ido levar ou buscar material a outras (...) e ter ficado a pernoitar numa das (...), para regressar a (…) no dia seguinte ou porque o trabalho assim se organizava. A testemunha HI (engenheiro e professor, tendo entrado para a AX em 1980 e desempenhado, ao longo de 19 anos, funções de responsável pelo curso de mecânica, responsável pela oficina da mecânica e manutenção de viaturas e pela gestão da frota da instituição, o qual, pelo exercício das suas funções, demonstrou conhecimento directo do que era o serviço dos motoristas, incluindo do arguido A e teve relacionamento profissional com o arguido C), disse ao Tribunal que viu o arguido A dar chocolates aos miúdos, no bar dos alunos do (...) e que os miúdos gostavam de estar com ele, localizando que isto acontecia ainda o arguido não era motorista (lembrando o Tribunal que pelo menos a partir de Janeiro de 1998 começou a exercer, de facto, as funções de motorista). Também a testemunha ZF (educadora na AX desde 1974 e no BF desde 1975), disse ao tribunal conhecer o arguido A da AX, conheceu-o como motorista e “costumava” vê-lo em BF a distribuir o correio. Chegou mesmo a fazer transportes com a testemunha, com jovens para um ensaio, numa altura em que o transporte que tinham falhou. Disse que telefonou para a garagem e foi o arguido A que veio. Descreveu um episódio que aconteceu no pátio de BF, o arguido A perguntou por uma criança, o (…), o miúdo foi ao pé dele e depois disse à testemunha que tinha um bolo pago no bar do (...), esclarecendo que foi a “única abordagem” que viu, mas nunca presenciou a qualquer atitude estranha. Estes depoimento são, globalmente avaliados, expressão do que era a relação de proximidade que o arguido A estabelecia com os jovens, o que da dinâmica dos sucessivos depoimentos que fomos ouvindo – e dos quais o Tribunal invoca expressamente os que antecedem -, dão a percepção de que esta abordagem do arguido A aos educandos não era esporádica, mas sim feita de forma constante e com uma multiplicidade de jovens. Acresce que, para o Tribunal, as próprias declarações do Arguido A (cfr., por exemplo, declarações da audiência de julgamento de 19/01/95, de 23/11/05), quando falou do conhecimentos que estabeleceu com os assistentes dentro da AX e vice versa, da ajuda que os educandos lhe davam na descarga das carrinhas, o dinheiro que lhes deu, dão consistência à conclusão que acabámos de expor. (2) E as declarações dos assistentes – para além de outros educandos da AX -, terceiro elemento a considerar, vão no mesmo sentido. Por exemplo, o assistente AI falou ao Tribunal da altura em que conheceu o arguido e começou a “falar mais com ele”, sendo que a este assistente o arguido ofereceu umas chuteiras e uma camisola de futebol, pois o AI gostava de jogar à bola. O assistente AH, o qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A através do AI, que ajudava o arguido a carregar e a descarregar a carrinha em BF, o qual lhe dava dinheiro - o que foi confirmado pelo arguido A, conforme as declarações proferidas pelo arguido na audiência de julgamento de 19/01/05, em que disse ao Tribunal que na altura e estamos a falar de 1998/99 - cfr. Apenso DT, em que o AH entrou para a AX em Novembro de 1997 -, dava ao Fábio “500$00” ou “1.000”000”, embora o AH tenha declara mais, dizendo que lhe dava o dinheiro ou por o educando o ter ajudado a carregar ou descarregar a carrinha ou por causa do sexo. Mas este assistente também deixou transparecer que gostava de estar com o arguido, pois disse ao Tribunal que gostava de o ajudar a carregar a carrinha (e o arguido quando chegava ao fim dava-lhe dinheiro, o que atenta a normalidade das coisas era um incentivo para o ajudar e gostar de ajudar) e quando relatou uma situação ocorrida com o arguido A numa (...) no (…), disse que tinha ido com o arguido na carrinha para o (…) e que tinha sido o próprio assistente a pedir à educadora para ir com o arguido. E este relato teve uma particularidade singular: o assistente estava a falar ao Tribunal do dinheiro que o arguido lhe dava, do que fazia com o dinheiro e que uma das vezes tentou dar o dinheiro de volta ao arguido, mas que este disse-lhe para ficar com o dinheiro. A única coisa que o arguido lhe dizia era para não contar a ninguém e “… é assim, o Sr. A chegava a ser ele mais respeitado na AX do que o sr. (...)…”. O Tribunal perguntou ao assistente porque é que dizia isto e responde”…é fácil, eu conto-lhe já …as empregadas da escola …prontos, não vale a pena dizer nomes porque eu não me lembro, mas … e não vale estar a inventar…cada vez que viam o sr, A…se um pacote de leite, um papel…a mínima coisa estava no chão, elas limpavam…”, resposta que, na altura, atenta a expressão que o assistente fez quando estava a explicar ao Tribunal aquela afirmação e a forma como o fez, o Tribunal ficou convicto que o assistente estava a expressar um sentimento que efectivamente tinha. Este depoimento, não só por si mas valorado e conjugado com o depoimento dos demais assistentes e que referimos ao longo desta análise crítica da prova - não só aqui, mas quando tratámos dos factos relativos a cada assistente com o arguido A -, bem como as declarações do próprio arguido, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: era um misto de gostar porque o arguido brincava com eles, dava-lhes dinheiro, levava-os na carrinha; de respeito porque o arguido dizia-lhes para não falarem do que se passava e os jovens não falavam; e de algum temor reverencial. (2.1) E quando dizemos isto - o que antecede -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Convocamos o que dissemos quanto às observações que o arguido A fazia e áreas em que interferia junto dos funcionários da instituição – não só junto dos motoristas, área da sua função, mas estendendo a sua interferência à oficina de mecânica -, o modo como respondia, a forma como agia, o à vontade que demonstrava no modo de execução das funções, na forma como se deslocava dentro da instituição, como utilizava os veículos da instituição e como se permitia tratar o arguido C, o que o Tribunal concluiu traduzir m uma despreocupação e sentimento de poder, que está aliado a uma ausência de consequências, no caso concreto por protecção. Convocamos o que dissemos quanto ao que foi a tolerância para com o arguido A pelos seus superiores hierárquicos - e pelos demais funcionários -, com um “maneira de ser” considerada pelo (...) da AX, Dr. BQ “muito interventiva” e que o arguido C, como resulta do que disse ao Tribunal, quando explicou a razão pela qual o arguido A não tinha estado presente na reunião que promoveu em Março de 20001 com os mecânicos, relatando que “... estiveram dois motoristas e de propósito, devo dizer, que excluí a presença do A e por uma razão muito simples ... porque o A tem um temperamento e daí um pouco ... se calhar... parecido com o meu, um pouco temperamental e às duas por três, em vez de haver ali uma reunião, havia para ali uma confusão ... de forma que optei por escolher … escolher enfim, pedir que comparecessem dois motoristas mais sensatos...” -, também evitava confrontar (apesar de, como dissemos, na hierarquia da instituição o arguido A não pertencia a um escalão de chefia, ou responsável por algum departamento, nem era um funcionário especializado ou um Mestre, pois isso poderia justificar que em função da sua especial capacidade, mestria ou qualificação, o superior hierárquico, “optasse” ou “tivesse” que “ouvir” e “engolir”, para a instituição continuar a beneficiar da sua mais valia). E convocamos, em concreto, o que a dado momento foi o depoimento da testemunha e que para o Tribunal traduziu a atitude dos demais funcionários em relação ao arguido A - e ao não terem feito queixa, no caso concreto era ao arguido C, de comportamentos do arguido e por causa das reacções deste arguido -que “...simplesmente as pessoas acomodavam-se ... como eu já frisei aqui neste Tribunal, acomodavam-se porque era mais prático ouvir até não fazer sangue, aguentar ali a pancada, do que fazer as coisas desenvolverem ... que não valia a pena ... as pessoas eram, eram mais massacradas ... e depois eram com represálias por cima e assim era mais fácil ignorar...” Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (3) Assim e concluindo, da avaliação de todos estes depoimentos e declarações, o Tribunal concluiu que o arguido A tinha gosto em relacionar-se com os educando da AX, ele próprio era um “irmão” (…) e alguns assistentes manifestaram - apesar das situações que revelaram de abuso por parte do arguido; e das que o arguido confessou ao Tribunal -, gostar do arguido. Falamos, por exemplo, face às declarações que prestaram em audiência de Julgamento, dos assistentes AV, AP, AA. O Tribunal não teve dúvidas que o arguido A quis aproximar-se e aproximou-se, ganhando a simpatia, dos educandos, entre os quais AI, AP, AV, AH, AA. E que as atitudes que tomou, ao dar os doces, pagar algumas coisas no bar do (...), dar dinheiro, levar a jogos de futebol, tiveram esse objectivo. 4.1. Os factos constantes deste capítulo relacionam-se, também, com o tratamento de factos relacionados com a possibilidade ou impossibilidade de o arguido A ter transportado os alunos da AX, em veículos da instituição, para os locais que o despacho de pronúncia refere E relaciona-se numa dupla perspectiva. Por um lado, considerando o que especificamente é focado nos factos deste capítulo, nomeadamente a existência ou inexistência de deslocações do arguido A, durante ou fora das horas de serviço para fora da AX, com veículos da AX, sem que o serviço de aprovisionamento e logística – que fazia e organizava os mapas dos transportes e deslocações dos motoristas em serviço, como veremos com mais pormenor –, ou a (...), tivessem conhecimento das deslocações e do paradeiro do arguido (cfr., por exemplo, os pontos “76.”, “81.”, “89.1”, “90” e “91” dos “factos provados” ). Por outro, considerando o que especificamente resultou das linhas de defesa apresentadas não só pelo arguido C mas, também, pelos arguidos E, H, K, N e Q, quanto à possibilidade ou impossibilidade de o arguido ter feito as deslocações que o despacho de pronúncia referia e, consequentemente, as que o tribunal deu como provadas. Assim - e com vista a, para o Tribunal, melhor concentração e continuidade do tratamento de questões que estão relacionadas entre si -, a matéria da possibilidade ou impossibilidade de os educandos saírem ou serem transportados da AX pelo arguido, a utilização e disponibilidade de veículos por parte do arguido A, sob as várias perspectivas focadas pelas Defesas e ainda não especificamente tratadas sob essas perspectivas, foi feita pelo Tribunal em momento posterior . Análise crítica que, contudo, convocamos, na medida da relevância concreta que a mesma tenha para a prova de factos deste capítulo e vice-versa. 5. Em audiência de julgamento o arguido A admitiu parcialmente a prática de alguns factos descritos no despacho de pronúncia, não só factos que apenas o envolviam ou incriminavam a si, mas também factos nos quais estavam envolvidos ou pelos quais os demais arguidos se encontram pronunciados. Por sua vez os arguidos C, E, H, K, N e Q negaram a prática dos factos, que se conhecessem entre si – com a ressalva que o arguido H fez em relação ao arguido E, de terem-se encontrado por razões de trabalho em Nova Iorque, há cerca de 20 anos, mas esclarecendo que não foi o arguido que se recordou disto, mas foi o arguido E que lho lembrou e que o arguido H disse ao Tribunal não pôr em causa - ou que conhecessem os assistentes em relação aos quais, no Despacho de pronuncia, lhes está atribuída a prática de crimes. Declararam que não estiveram nos locais e com os assistentes referidos no despacho de pronúncia, tendo juntado, invocado e analisado dados objectivos dos autos - entre os quais registos de conversações telefónicas, facturação detalhada, registos de vias verdes, Multibanco e visa – que, na sua perspectiva, dão-lhes credibilidade e retiram credibilidade às declarações que foram prestadas pelos assistentes em audiência de julgamento ou pelo arguido A, quando afirmam ou corroboram a ocorrência de factos, tal como descritos no Despacho de Pronúncia. Assim – e integrando com o anteriormente -, das linhas de Defesa apresentadas por estes arguidos, como concorrentes e demonstrativas: (i) da impossibilidade da ocorrência dos factos descritos no Despacho de Pronúncia – no que aos arguidos C, E, H, K, N e Q diz respeito -; (ii) e como factor descredibilizante quer das declarações dos assistentes - quando afirmaram ter estado em locais, fora da AX, com os arguidos para a prática de actos de natureza sexual -, quer das declarações do arguido A - quando declarou ter levado assistentes para encontros com arguidos -; resultou das suas contestações e das suas Alegações – e, aqui, enunciando de forma sintética, pois vezes, subdividem-se noutras questões, o que o Tribunal irá especificando à medida que for analisando a prova, tal como foi produzida em audiência de julgamento -, a impossibilidade objectiva de tal acontecer da forma que os declarantes afirmaram e que se encontra descrita no despacho de pronuncia por, pelo menos: - Ausência de conhecimento entre os arguidos: os arguidos, com excepção dos arguido A e do arguido C - e do que acima referimos quanto ao arguido H e ao arguido E - , não se conheciam entre si ; - O padrão de vida dos arguidos, - A organização e controlo da AX dos/e sobre os seus funcionários e sobre o serviço de transportes, não permitia que o arguido A fizesse deslocações nos veículos, por exemplo para (…) ou para outros locais, sem que a quilometragem fosse detectada ou sem que a utilização do veículo em deslocações de serviço fosse detectada (aspecto relacionado com capítulo anterior, cfr. a referência já feita em “4.2.”, do “ponto 4.”, onde o Tribunal faz o tratamento dos factos descritos em “ (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A (Factos constantes de fls. 20.842 (parte final) ); - O controlo que era exercido sobre os educandos da AX não permitia que os mesmos, aos fins de semana ou durante a semana, se ausentassem dos (...)s e lares para (…), ou para outros locais se tal acontecesse ao fim do dia, sem que tal fosse detectado pelos educadores; Acrescentando - e isto também em síntese e sem prejuízo de outras sub-questões que foram levantadas ao longo do julgamento e que o Tribunal irá especificando, como acima disse - quer em sede de contestação, quer em sede de Alegações, a ocorrência de circunstâncias que o Tribunal deve ter em conta aquando da análise e ponderação da prova, relacionadas com: - a “manipulação” das vítimas na fase de inquérito para acusarem os arguidos; - a “manipulação” por parte de algumas vítimas, de forma a os arguidos serem acusados, o que fizeram através da consciente criação de uma história, por parte de alguns assistentes, a que outros aderiram, consciente ou inconscientemente; Assim vejamos: 6. Dos factos relativos ao padrão de vida dos arguidos: Os arguidos, em maior ou menor extensão, focaram aspectos do seu “padrão de vida” que consideraram relevantes para demonstrar a impossibilidade ou a inverosimilhança, de terem praticado os factos que lhes são imputados. 6.1. (Do arguido E) Esta análise crítica da prova engloba não só os aspectos/factos focados no Despacho de Pronúncia, mas também o que resultou da Contestação do arguido, do que foi sendo a sua linha de Defesa ao longo do julgamento e do que resultou das suas Alegações. Assim, o arguido focou na sua Defesa e ao longo do julgamento, dois núcleos de factos da sua vida: casas que habitou entre 1995/2001; cargos que exerceu e onde esteve colocado entre 1996/2001. Acrescentou, de forma pontual mas que não entendemos como menos relevante da sua perspectiva, aspectos da sua vida pessoal. O tratamento destas questões foi relevante para o Tribunal não só para a “prova”/ou “não prova” dos factos relativos ao conhecimento ou relações entre arguidos, mas também para a análise e subsequente convicção, dos factos relativos à prática de actos de natureza sexual nos Assistentes, entre os quais está, no que diz respeito a este arguido, o assistente AK, deslocações a (…) e a actos ocorridos entre o arguido H e o assistente AP. (1) Começando por localizar as casa em que o arguido E viveu entre 1995/2001 - aspecto que a defesa do arguido E considerou concorrente, para a impossibilidade da procedência da versão apresentada pela Acusação, quanto às casa em que teve actos de natureza sexual com o assistente AK, ou que disponibilizou para prática de actos desta natureza -, resulta da prova produzida em audiência de Julgamento que o arguido E comprou uma fracção sita em (…), na (...) (…) nº (…), (…), no dia 4/04/1995, tendo-a vendido em 10/12/1999 (cfr. Doc. de fls. 60.377 a 60.381 e fls. 60.373 a 60.376 vº.) Para além do documento acabado de referir, a testemunha XU - que declarou ter sido Porteira neste prédio sito na (...) (…), nº (…), em (…), durante 11 anos, tendo saído do prédio em 1999, pois declarou que saiu em Janeiro após a morte do marido e o marido tinha adoecido em Dezembro de 1997, tendo vindo a falecer no mês de Julho do ano seguinte - disse que o arguido viveu no referido imóvel durante três anos e que quando a testemunha saiu do prédio o arguido ainda lá vivia. Disse que durante o tempo em que a testemunha esteve no prédio e o arguido E lá viveu, era frequente a entrada de rapazes no prédio – cuja idade disse parecer-lhe “… 15/16/17/19… anos, talvez…” – e que diziam que iam para a casa do arguido, o que causava incómodo junto de alguns condóminos (Foi esta testemunha XU, que declarou também em tribunal que, numa altura em que o seu marido ainda era vivo, o arguido H foi a este prédio, para ver o 7º andar que estava à venda). Este “ incómodo” foi corroborado pela testemunha LY - o qual declarou ao Tribunal ter vivido no prédio sito na (...) (…), nº (…), em (…), num período em que o arguido E também lá viveu -, pois relacionavam a (na sua expressão) “ crescente” entrada de jovens no prédio, jovens estes que diziam que eram sobrinhos do arguido E, com furtos que ocorreram na garagem, tendo a testemunha chegado mesmo a falar com o arguido E. Por sua vez, a testemunha EEJ (o qual declarou ao Tribunal ser porteiro há nove anos - e prestou depoimento em 23/03/06 - no prédio sito da (...) (…), em (…), onde o arguido E teve uma casa no (…)º andar), disse ao Tribunal que o arguido deixou essa casa “há cerca de 3 ou 4 anos”, pouco o via porque saía pela garagem, viu-o com um rapaz de “vinte e tal anos”, o qual dizia que era afilhado do arguido. A testemunha OM, e no que a esta questão importa, disse ao tribunal que conheceu E em (…), através de um amigo IID. O arguido E convidou-o para ir viver com ele, diz a testemunha que teria 14/15 anos, sendo que quanto esteve a viver com o arguido foi numa casa do arguido em (…), num (…)º andar. Disse ao Tribunal que teve relacionamento sexual com o arguido E, o qual estava quase sempre ausente em Paris. Da conjugação do que antecede – dos meios de prova e da prova enunciada - resulta para este Tribunal que o arguido E, entre data próxima e pelo menos posterior a 4/04/1995 (data em que fez a escritura de compra da casa) e data próxima de 10/12/1999 (data em que fez a escritura de venda da casa), teve residência numa casa sita em (…), na (...) (…) nº (…),(…). Após a venda da casa de (…) (escritura feita em 10/12/99, como vimos), o arguido alegou que mudou-se para o (…), nº (…),(…), em (…). A testemunha BBJ disse ao tribunal ter sido Porteira nesse prédio desde 1998 e o arguido E foi viver para lá em 2000/2001, para um andar arrendado, mas não se lembrando quem era o proprietário. Disse ainda que viu o arguido “ poucas vezes”, pois este viajava “ para fora” e quando o via era mais ao fim de semana. Apercebeu-se que no prédio entravam jovens - que disse 17/18 anos - que iam para o andar do arguido. A testemunha CCD, e no que a esta questão importa, declarou, por sua vez, que conheceu o arguido E em 1995, através do “ Dr. (…)”, na sequência do que veio a ter um relacionamento sexual com o arguido E, tendo acrescentado que continuou a encontrar-se com o arguido até um mês antes de serem conhecidos os factos deste processo. Declarou que encontrou-se com o arguido numa casa que disse ser “ ao pé da (…)”, num (…)º andar, tendo sido a única casa que conheceu ao arguido. Declarou não saber há quanto tempo o arguido vivia naquela casa, soube apenas que pertencia a um amigo do arguido, chamado (…). Cruzando tais depoimentos com os documentos constantes do Apenso BF-9 (Apenso BF-9, Documentos e objectos apreendidos na busca efectuada em 2/05/03 à residência do arguido E, sita na (...) (…), nº (…),(…), em (…); cfr. também auto de fls. 4.487/9 e termo apensação fls. 5.405), existe a fls. 14, do Dossier de documentos que integram tal apenso, um recibo referente ao pagamento do condomínio da fracção correspondente ao (…)º Dtº, emitido pela “ Administração do prédio do (…), nº (…)”, datado de Julho de 2001 e referente ao 3º trimestre de 2001 e a fls. 7 um documento referente à TV cabo, datado de 12/01/01, em nome do arguido e com a mesma morada no local da “morada para entrega da TV box”. Também fls. 225, do Apenso ABA F, Pasta 1, temos um “documento de liquidação de ordem de pagamento” datado de 4/9/01, em que a morada que consta é esta do “(…)”, e a fls. 429, 431, 433, 437, 439, 441, 445, 447, 451, 449, 451, 453, 455, 457, cópia de cheques da conta do arguido da CGD, no valor de 140.000$00 cada, cujas datas apostas vão entre 6/11/99 e 9/12/00, em nome de “ … Dr. IIE…”, os quais conjugados com as datas que lhes estão apostas e a referência ao nome “ (…)” que é feita pela testemunha CCD, levam o tribunal a concluir que se tratavam de cheques para o pagamento da “renda” do (…) º andar, no prédio sito no (…), nº (…). Assim, da conjugação do que antecede – dos meios de prova e da prova enunciada - resulta para este Tribunal que o arguido E, a partir de data próxima e pelo menos imediatamente posterior a 10/12/1999 (data em que fez a escritura de venda da casa de (…)), teve residência no (…)º andar Dtº do prédio sito no (…), nº (…). Quanto à data até quando o arguido E esteve no prédio sito no (…), nº (…), há que conjugar os documentos e meios de prova acabados de mencionar com o documento de fls. 60.369 a 60.372, certidão da escritura de compra, pelo arguido, de uma fracção sita na (...) (…), lote (…),(…), em (…), escritura esta que foi feita em 6/09/2001 (cfr. Documento de fls. 60.369 a 60.372). Com efeito, tendo o arguido adquirido a fracção em (…) em 6/09/01, diz-nos a experiência comum que pelo menos a partir da data em que os adquirentes assinam a escritura de compra – e no caso concreto na escritura não consta qualquer ressalva quanto a reserva de propriedade ou de outra natureza, depreendendo-se também do seu teor que é para habitação do arguido - ficam com a disponibilidade do imóvel. E normalmente (também), se a mesma é para habitação própria, mudam-se para a nova fracção. No entanto – e sem deixar de ter em atenção o conteúdo do documento de fls. 14 (do Dossier de documentos que integram o Apenso BF-9), recibo que diz respeito ao terceiro trimestre de 2001, que vai até Setembro de 2001 e a data que consta no documento de fls. 225, do Apenso ABA F, Pasta 1, “documento de liquidação de ordem de pagamento” datado de 4/9/01, em que a morada aposta ainda é a do “(…)” , há que considerar que o último cheque dos acima mencionados (do Apenso ABA F, Pasta 1, fls. 429, 431, 433, 437, 439, 441, 445, 447, 451, 449, 451, 453, 455, 457) ainda tem a data de 9/12/00 e os documentos de fls. 112 a 115, do Apenso DZ, vol. 1, datados de 30/11/01 e 3/12/01 (Requerimento/nota Biográfica, com o requisito da assinatura conforme BI), em nome do arguido, ainda têm a morada do “(…), nº (…),(…), em (…)”. Os referidos elementos, todos conjugados, levam este Tribunal a concluir que o arguido teve residência no (…)º andar (…)º, do prédio sito no (…), nº (…), até data não determinada do mês de Dezembro de 2001. Desta forma, em consequência e da conjugação do que antecede, a partir de data não determinada do mês de Dezembro de 2001, passou a ter residência no andar sito na (...) (…), lote (…),(…), em (…). (1) Mas questão relacionada com a análise que o Tribunal esteve a fazer, é saber se no período de tempo analisado o arguido viveu ou teve disponibilidade, exclusivamente, “nestas” e “destas” casas, de forma a encontrarmos um padrão de comportamento ou de vivência tão forte, que afaste a possibilidade de utilização, fosse a que título fosse, de qualquer outro espaço para fins diferentes de residência. Ora em relação ao arguido E, no Apenso DZ - constituído por 9 Volumes e constituído por documentos remetidos pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros para os autos, estando consignado no ofício de fls. 4 a 7, do volume 1, do Apenso DZ, que os documentos remetidos são certidão dos que se encontram nos arquivos/ processos do Ministério –, no Apenso ABA-F, Pasta 1 – elementos remetidos para o tribunal pela Caixa Geral de Depósitos, referentes a movimentos bancários e fichas de assinaturas de constas do arguido E - e no Apenso BF-9 – elementos apreendidos na busca efectuada a casa do arguido e a que se refere o auto de fls. 4.487/4.488 -, resulta a indicação/referência de outras moradas relacionadas com o arguido, por vezes expressamente indicadas como residência do arguido, em períodos diversos ou simultâneos com os acima já referidos. (i) Assim, aparece mencionada a “ (...) (…), nº (…),(…), em (…)”, no documento de fls. 1.058, do Apenso DZ, volume 7, com referência a 18/05/78. (ii) Aparece mencionada a “ (...) (…), lote (…), em (…)” , no documento de fls. 56, do Apenso DZ, vol. 1, datado de 6/6/84 (resposta da Direcção Geral do Ministério, para o Ministério Público junto do tribunal (…), com os dados do arguido; sendo esta morada também aquela a que refere o “ponto 48” dos factos provados - cfr. tb Apenso T, fls. 37) (iii) Aparece mencionada a “ (...) (…), nº (…),(…), no (…)”, no documento de fls. 30, do dossier de documentos constante do Apenso BF-9, datado de 1/07/91 (contrato de arrendamento do andar em causa, pelo período de 1 ano e com início em 1 de Julho de 1991, em que o arguido aparece como arrendatário). (iV) Aparece mencionada a “ (...) (…), nº (…),(…), em (…)”, no documento de fls. 810/811, do Apenso DZ, volume 5 (documento referente a transporte e inventário de móveis do arguido), datado de 2/10/62. (v) Mas em documentos posteriores e referente a datas posteriores, aparece de novo mencionada a “ (...) (…), nº (…)”, mas o “(…)” em vez de “(…), em (…). Aparece esta morada: - no documento de fls. 1.041, do Apenso DZ, volume 7, datado de 2/10/81; - no documento de fls. 940, do Apenso DZ, vol. 6 (uma declaração de inexistência de incompatibilidades em nome do arguido) datado de 20/04/95 (data em que o arguido já tinha feito a escritura de compra da casa sita em (…), na (...) (…) nº (…), embora apenas há 16 dias); - no documento de fls. 44, do Apenso DZ, vol. 1., datado de 16/05/95 (comunicação da Direcção dos R.H. do MNE, em resposta ao fax de fls. 45, em que pedia a morada “actual” de vários Senhores (…), entre os quais estava o nome do arguido E; data em que o arguido já tinha feito a escritura de compra da casa sita em (…), na (...) (…) nº (…), mas aqui há cerca de mês e meio); - no documento de fls. 26, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 13/04/98 (documento de compra de divisas na C.G.D.; data em que o arguido já tinha feito a escritura de compra da casa sita em (…), na (...) (…) nº (…), há cerca de três anos); - no documento de fls. 11 e 12 , do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 6/08/99 (ficha bancária “de assinaturas” da conta do arguido nº (…) da CGD; data em que o arguido já tinha feito a escritura de compra da casa sita em (…), na (...) (…) nº (…), há cerca de quatro anos); - no documento de fls. 142, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 17/09/99 (documento da CGD, da conta do arguido, com ordem de pagamento/transferência de verba para conta também do arguido mas em Paris, documento este que está manuscrito com o nome do arguido como requerente, embora no lugar da assinatura não seja legível o nome;data em que o arguido já tinha feito a escritura de compra da casa sita em (…), na (...) (…) nº (…), há cerca de quatro anos e meio); - no documento de fls. 204, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 16/03/01 (documento da CGD, da conta do arguido, com ordem de pagamento/transferência de verba para conta também do arguido mas em Paris, documento este que está manuscrito com o nome do arguido como Requerente e no lugar da assinatura também; data em que o arguido já estava na casa sita no (…), nº (…), desde meados de Dezembro de 1999); Assim, no que diz respeito à questão da “ exclusividade” de vivência ou disponibilidade de casas por parte do arguido, no período de 1995 a 2001, o significado das referências à morada na “(...) (…)”, na “ (...) (…), em (…)”, na “ (...) (…), no (…)” e na “ (...) (…), nº (…),(…), em (…)”, dadas as datas em que são feitas as referências, entre 1962 e 1991, no caso concreto fica com a relevância restrita a esse aspecto: que entre 1962 e 1991 há referência a quatro moradas. É certo que no documento de fls. 1.041, do Apenso DZ, volume 7, datado de 2/10/81, aparece uma “ segunda” morada na “ (...) (…), nº (…)”, mas o “(…)” em vez do “(…). No entanto, tendo em atenção que a “segunda” morada referida (ainda) é em 1981, não é particularmente significativo para o tribunal, até porque há que equacionar a possibilidade de primeiro, em 1962, ter sido o “(…)” e posteriormente ter havida uma mudança para o “(…)”. No entanto, já não se passa o mesmo com as referências que são feitas a esta morada “ (...) (…), nº (…)”,(…), em (…)” , nos anos de 1995 e seguintes. É que quando a fls. 940, do Apenso DZ, vol. 6 - uma declaração de inexistência de incompatibilidades em nome do arguido - datado de 20/04/95 e a fls. 44, do Apenso DZ, vol. 1., datado de 16/05/95 - comunicação da Direcção dos Recursos humanos do MNE, em resposta ao fax de fls. 45, em que pedia a morada “actual” de vários Senhores (…), por causa de um evento, entre os quais estava o nome do arguido E -, é declarada esta morada da (...) (…), o arguido já tinha adquirido a casa sita na (...) (…), em (…), escritura de compra feita em 4/04/95, como acima vimos. E quando no documento de fls. 26, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 13/04/98 (documento de compra de divisas na C.G.D.), no documento de fls. 11 e 12 , do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 6/08/99 (ficha bancária “de assinaturas” da conta do arguido nº (…) da CGD) e no documento de fls. 142, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 17/09/99 (documento da CGD, da conta do arguido, com ordem de pagamento/transferência de verba para conta também do arguido mas em Paris, documento este que está manuscrito com o nome do arguido como requerente, embora no lugar da assinatura não seja legível o nome), é declarada a morada da (...) (…), o arguido já tinha adquirido a casa sita na (...) (…), em (…), há (pelo menos e em relação à primeira data) cerca de três anos, pois a escritura de compra foi feita em 4/04/95, como acima vimos, local onde vivia como acima concluímos. E quando no documento de fls. 204, do Apenso ABA-F, Pasta 1, datado de 16/03/01 (documento da CGD, da conta do arguido, com ordem de pagamento/transferência de verba para conta também do arguido mas em Paris, documento este que está manuscrito com o nome do arguido como Requerente e no lugar da assinatura também), é declarada a morada da (...) (…), o arguido já estava a “viver” na casa sita no (…), nº (…),(…), em (…), há (pelo menos) cerca de um ano, como acima concluímos. Morada, nota o Tribunal, que o arguido E utilizou para documentos oficiais, como resulta dos documentos de fls. 112 a 115, do Apenso DZ, vol. 1, datados de 30/11/01 e 3/12/01 - Requerimento/nota Biográfica, em nome do arguido, com o requisito da assinatura do arguido conforme o Bilhete de identidade -, pois tais documentos têm a morada do “(…), nº (…),(…), em (…). Quanto a estes últimos elementos documentais – os dos Apenso ABA-F que o tribunal identificou - , há que referir, por um lado, que são elementos bancários – o que, para a normalidade das pessoas, significa especial atenção nos dados que são dados, pois os movimentos bancários e correspondência que é remetida para o titular são, em regra, aspecto com o qual há atenção; e não resultou da audiência de julgamento, nem, por exemplo, da análise dos elementos remetidos pelo Banco, indícios de que o arguido fosse uma pessoa com incidentes bancários, que pudesse supor alheamento em relação a tal questão – e, por outro, que a conta a que se refere o documento de fls. 11 e 12 , do Apenso ABA-F, Pasta 1 (ficha de assinatura da conta do arguido nº (…) da CGD) é anterior à data que está aposta nesta ficha. Ora sendo a conta anterior, esta ficha poderá ter sido de actualização ou alteração de elementos da conta, pois a ficha tem a data de 6/08/99 e a conta tem movimentos, pelo menos, desde 26/12/97 (cf. fls. 14, do Apenso ABA-F, Pasta 1). E sendo o documento em causa, por natureza, assinado pelo titular da conta, não resultando, da observação do documento qualquer indicação que no caso concreto o documento tenha sido assinado “ por procuração” ou outra situação jurídica que se pudesse aplicar, há que concluir que a morada (e única morada) manuscrita “ do titular da conta”, era uma morada de que o titular, o arguido, tinha disponibilidade, pois caso contrário é da experiência comum que não a daria para o fim em causa. Assim, entre 1995 e 2001, para além das casas sitas na (...) (…), nº (…),(…), em (…), no (…), nº (…),(…), em (…) e na Av. (…), nº (…), em (…), o arguido teve acesso, ao longo de todo o período e em simultâneo com as referidas moradas, ao imóvel sito na (...) (…), nº (…),(…), em (…). É certo que do que antecede o Tribunal não conclui que esta morada ou qualquer uma das referidas, é um dos locais indicados ou descritos pelo assistente AK. Mas o conhecimento deste aspecto da vida do arguido, permitiu concluir ao Tribunal que o arguido E - e lembramos que o arguido não prestou declarações, requereu ao Tribunal a leitura parcial de declarações que prestou perante J.I.C. e o que foi deferido, mas depois, no exercício de um direito legal, não prestou esclarecimentos ao Tribunal sobre tais declarações -, teve um padrão de vida que envolveu a existência e disponibilidade, por vezes em simultâneo, das sucessivas residência que apontámos. Porque pode ser diferente, tendo em atenção o sentido normal das coisas, analisar factos face a uma vida em que o comportamento da pessoa é relativamente singelo - por exemplo, disponibilidade/habitação de uma residência cada 10 anos -, ou face a uma vida em que o padrão comporta o que os factos dos autos apontam: disponibilidade de várias habitações e com possibilidade de simultaneidade (mas diversidade quanto ao aparente fim) de habitações. Mas isto, claro, sem prejuízo de que qualquer umas destas situações não exclui a possibilidade de a prática dos actos que estão imputados ao arguido, terem ocorrido em local acidental e diferente da residência do arguido ou de um destes locais conhecidos. Como dissemos - e dentro do exercício de um direito legal -, o arguido E não prestou declarações em audiência de julgamento, tendo no entanto requerido a leitura das declarações que prestara nos autos a fls. 13.023 a 13.030, mas restritas aos parágrafos que indicou no seu requerimento de fls. 55.958/9. A leitura foi deferida por Despacho proferido na audiência de Julgamento de 15/10/08 (cfr. Despacho de fls. 60.390 a 60.392, Ponto II) e feita nessa audiência (cfr. Fls. 60.395/6). No entanto, após a leitura das declarações do arguido – nos termos por si requeridos e deferidos pelo tribunal -, o Tribunal perguntou ao arguido se pretendia prestar algum esclarecimento, tendo o mesmo declarado - também no exercício de um direito legal -, não pretender prestar qualquer esclarecimento. O Tribunal tentou conhecer a pessoa que esteve e está perante si, o que fez através do que a análise dos documentos e dos depoimentos produzidos em audiência possa revelar. (2) Segundo aspecto a analisar, previamente ao conhecimento de outros factos, tem a ver com o percurso profissional do arguido E entre 1996/2001. Resulta dos autos (cfr. documentos de fls. 927 e 937, do Apenso DZ, volume 6) que por despacho assinado em 2/3/96 o arguido E, já com a categoria de (…), foi nomeado para o cargo de (…) em (…), nomeação esta que foi publicada no DR nº (…), de (…),(…) Série. Do Apenso DZ, volume 1, fls. 5 e 6 e do Apenso DZ, Vol. 7, pag. 999, o arguido iniciou funções em tal cargo em 1/07/96 e foi esperado em (…) nesse mesmo dia, sendo que dos documentos de fls. 370 e 371, do Apenso DZ, vol 3, resulta que em 5/08/96, quando comunicou ao (…) a sua partida para férias, já o fez da (…) junto da (…) (esteve de férias de 5/08/96 a 30/08/96, tendo assumido funções em 2/9/96, fls. 371 e 372 do apenso DZ, volume 3). Dos autos constam, igualmente, os documentos referentes a transporte de móveis do arguido, de (…) para (…), mas em datas diversas. Assim, há documentos a autorizar ou relativos ao transporte de móveis do arguido de (…), em dois momentos. Num primeiro momento, houve um transporte de móveis feito entre Junho e Agosto de 1996 (cfr. fls. 889 a 919, do Apenso DZ, volume 6). Posteriormente foi feito um segundo transporte, como resulta dos documentos datados de 23/2/00, referentes a um orçamento de 21/10/99 e certificado de seguro de 22/11/99, com Despacho de autorização de Despesa datado de 4/11/99 e comunicação de adjudicação da mesma data (cfr. Doc fls. 893/5 Apenso DZ vol 6), sendo que da conjugação do teor dos documentos acabados de enunciar, com os documentos de fls. 908 a fls. 917 , do Apenso DZ, vol 6, este transporte foi sequência do feito anteriormente, entre Junho e Agosto de 1996. Também dos documentos dos autos - nomeadamente de fls. 855 a 881, do apenso DZ, vol 6 e fls.5 e 6, do Apenso DZ, vol 1 -, resulta que o arguido cessou funções no cargo de (…) para que fora nomeado na (…), em (…), em 3/01/01, tendo o transporte dos seus móveis para (…) sido feito entre Novembro/Dezembro de 2000. Quanto, ainda, ao regresso do arguido, no documento de fls. 870, Apenso Dz, vol 6, consta um ofício do arguido para o Director Geral da Administração, datado de 7/11/00, em que o arguido pede autorização para antecipação do transporte dos seus bens pessoais, por estar previsto o seu regresso para (…) no início de Janeiro de 2001. Assim, entre 1/07/1996 e 3/01/2001 o arguido exerceu funções no cargo de (…), em (…). (3) Outro aspecto teve a ver com “modo de ser” na sua vida pessoal, alegação esta feita essencialmente no decurso do julgamento e em sede de alegações. Assim, a Defesa do arguido invocou perante o Tribunal que não fazia parte da sua maneira de ser a prática de actos de natureza sexual perante terceiros ou a exposição da sua intimidade. O arguido E não prestou declarações em audiência de julgamento, tendo no entanto requerido a leitura de declarações que prestara perante J.I.C. (fls. 13.023 a 13.030, mas restritas aos parágrafos que indicou no seu requerimento de fls. 55.958/9). A leitura foi deferida por Despacho proferido na audiência de Julgamento de 15/10/08 (cfr. Despacho de fls. 60.390 a 60.392, Ponto II), foi feita nessa audiência (cfr. Fls. 60.395/6), mas tendo o arguido, após a leitura, declarado não pretender prestar qualquer esclarecimento. Mas trouxe ao Tribunal duas testemunhas que depuseram sobre relacionamentos tidos com o arguido, nomeadamente as testemunhas OM e CCD. No entanto – e avançamos desde já, pois em sede de análise concreta das declarações dos assistentes tal será focado de forma específica -, dos seus depoimentos o tribunal não extraiu elementos que pudessem afastar a possibilidade de os actos que os assistentes imputaram ao arguido E terem ocorrido ou que tornassem inverosímil que tivessem ocorrido. A circunstância de o relacionamento tido com o arguido ter decorrido com maior ou menor continuidade, não afasta que o arguido não tivesse actos de natureza sexual com outras pessoas, incluindo os assistentes. Acresce que características do arguido, como ser uma pessoa reservada ou que preserve a sua intimidade, também não afasta, para o Tribunal, a possibilidade de isso ter ocorrido. E aqui cruzamos com os elementos que constam dos “Apensos BF”, e que são documentos apreendidos ao arguido, concretamente: - Apenso BF - Fotografias reveladas na PJ apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls.4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-1 a BF-6 - Fotografias reveladas na PJ apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls.4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-7 - 50 fotografias apreendidas ao arguido E (auto de apreensão de fls. 4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-8 - Cinco cadernos; sete agendas; um dossier de argolas; um livro de capa preta. (fls. 4487/4488) (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); - Apenso BF-9 - Três revistas e todo o restante material/documentação apreendido a fls. 4487/4488, à excepção das fotos e negativos revelados/ máq. Fotográfica (cfr. Termo de Apensação de fls. 5.405); Algumas das fotografias que estavam com o arguido ou nas revistas que estavam com o arguido, retratam situações em que jovens estão, lado a lado, em poses com conotação sexual. Sendo que a circunstância de serem fotografias que retratam alguma interacção de natureza ou com conotação sexual, algumas com cariz pornográfico, revela, na avaliação do Tribunal, uma atitude de “à vontade” e receptividade para, pelo menos, ver essas situações. Não se pode concluir - só pela posse das fotografias e revistas e pelo que o Tribunal concluiu de tal posse -, que o arguido praticaria actos idênticos. Mas revela uma atitude de maior disponibilidade, como assinalámos. O arguido pode, socialmente, ser uma pessoa reservada, como a sua Defesa invocou. Mas é da natureza das coisas, da experiência comum, que a intimidade do arguido pode ser mais expansiva do que o seu contacto social. 6.2. (Do conhecimento entre o arguido E e o arguido K) Como dissemos, o arguido E em sede de Defesa e o arguido K quando falou ao Tribunal, disseram que não se conheciam entre si. Sucede, contudo, que as testemunhas OM e CCD, ouvidas na audiência, foram relevantes para a convicção do Tribunal de que estes dois arguidos se conheciam. Estas testemunhas afirmaram ao tribunal ter tido contacto e relacionamento - embora com âmbito diverso, como veremos - com os arguidos E e K, sendo que em alguns períodos - cada uma das testemunhas -, com simultaneidade de contactos/conhecimento com os dois arguidos. 6.2.1. Na Audiência de Julgamento (AJ 19/07/06) a testemunha OM disse ao Tribunal que nasceu em (…), conheceu o arguido E em (…), através de um amigo IID. Disse que o arguido E convidou-o para ir viver com ele - diz a testemunha que teria 14/15 anos - e esteve a viver numa casa do arguido em (…), num (…)º andar . Teve relacionamento sexual com o arguido E, o arguido estava quase sempre ausente em Paris. Foi também a Paris, várias vezes, a casa de E. Acrescentou que quando viveu com o arguido E frequentou o Externato GGQ, pensa que no ano 97/98, só esteve um ano lectivo, mas que chumbou por faltas. Com 17 anos foi das últimas vezes que foi a Paris (foi confrontado com as fotografias de fls. 39.158 vº e39.159 e fala delas, referindo-as a uma estada em Paris). Por causa das idas a Paris foi com o “(…)” ao (…), para a mãe assinar uma declaração, por ser menor (o Tribunal depreendeu que o “(…)” era pessoa do conhecimento do arguido E, pois na “agenda de capa verde, com riscas a verde mais claro, 1997”, constantes do Apenso BF -8, elementos apreendidos ao arguido E, temos a anotação no dia 5 /07/97, Sábado, “ (…) e jantar e chegada Lx) 7.000(..)”. O arguido E foi uma pessoa, nas suas palavras “ … que me ensinou um pouco daquilo que eu sei….” e que após ter terminado a relação ainda lhe deu ajuda monetária, esporádica, tendo mantido contacto durante 3 a 4 anos. Passando a localizar no tempo a altura em que a testemunha OM conheceu ou viveu com o arguido E, já vimos que o Tribunal concluiu que o arguido E, entre data próxima e pelo menos posterior a 4/04/1995 e data próxima de 10/12/1999, teve residência numa casa sita em (…), na (...) (…) nº (…),(…). Por sua vez e na sequência do que já vimos do percurso profissional do arguido E (cfr. documentos de fls. 927 e 937, do Apenso DZ, volume 6) que por despacho assinado em 2/3/96 o arguido E, já com a categoria de (…), foi nomeado para o cargo de (…) em (…), nomeação esta que foi publicada no DR nº (…), de (…),(…) Série (cfr. Apenso DZ, Vol. 7, pag. 999, o arguido foi esperado em (…) no dia 1/7/96, sendo que dos documentos de fls. 370 e 371, do Apenso DZ, vol 3, resulta que em 5/08/96, quando comunicou ao (…) a sua partida para férias, já o fez da (…) junto da (…) (esteve de férias de 5/08/96 a 30/08/96, tendo assumido funções em 2/9/96, fls. 371 e 372 do apenso DZ, volume 3). Dos documentos dos autos - nomeadamente de fls. 855 a 881, do apenso DZ, vol 6 -, resulta que o arguido cessou funções no cargo de (…), em (…), em 3/01/01 (tendo o transporte dos seus móveis para (…) sido feito entre Novembro/Dezembro de 2000). Quanto à frequência do Externato GGQ – que a testemunha localizou em 1997 ou 1998, mas só esteve um ano lectivo, tendo chumbado por faltas - resulta dos autos, documentos de fls. 51.789, que OM frequentou o externato GGQ em (…), no ano lectivo 1998/1999, tendo feito a matrícula em 25 de Agosto de 1998 e desistido durante o mês de Novembro do mesmo ano. Assim, conjugando as declarações da testemunha com estes elementos, temos que o período em que a testemunha viveu com o arguido E pode ter ocorrido entre Abril de 1995 e Dezembro de 1999 (pois foi o período durante o qual o arguido E viveu na (...) (…), no (…)º andar). No entanto, em Novembro de 1998 - data em que sai do Externato -, tendo em atenção a data de nascimento que deu ao Tribunal (28/12/80), ainda tinha 17 anos mas ia fazer os 18 anos. Após ter saído de casa do arguido E, durante 3 a 4 anos ainda manteve contacto com o arguido. Quanto ao arguido K conheceu-o quando ainda tinha “algum contacto” com o arguido E, mas “… já tinha saído há pouco tempo…” de casa do arguido E. Era uma altura em que a testemunha andava no (…) a prostituir-se, tendo declarado que foi abordado por K. Disse que o arguido K convidou-o a ir a sua casa – nesta altura a testemunha ainda tinha algum contacto com o arguido E, tendo o arguido K oferecido trabalho à testemunha. Localizou o período em que teve contacto com o arguido K e disse “ …antes de começarem as obras na (...) nova…” e até ao fim de 2001. Disse que o seu pai era doente do arguido K, a testemunha também e a mulher. Foram consultados na (...) na nova, mas também foram “à velha”. (1) A testemunha CCD também declarou ter tido um relacionamento com o arguido E e K, mas disse ao Tribunal que não se apercebeu que os dois co-arguidos se conhecessem. 6.2.2. Passando ao arguido K declarou ao tribunal que até ao presente processo – e dizendo, expressamente, independentemente de qualquer indício que resulte no processo -, não conheceu nem teve qualquer contacto, directa ou indirectamente, com o arguido E. O arguido E (como referimos) não prestou declarações em audiência de julgamento, tendo no entanto requerido a leitura de declarações que prestara perante J.I.C. (fls. 13.023 a 13.030, mas restritas aos parágrafos que indicou no seu requerimento de fls. 55.958/9). A leitura foi deferida por Despacho proferido na audiência de Julgamento de 15/10/08 (cfr. Despacho de fls. 60.390 a 60.392, Ponto II), feita nessa audiência (cfr. Fls. 60.395/6), mas tendo o arguido, após a leitura, declarado não pretender prestar qualquer esclarecimento. Assim, prosseguindo com o arguido K (cfr. AJ 24/06/08), declarou ao tribunal que conhece OM, mas que este foi seu doente, assim como o pai, tendo restringido o seu conhecimento da testemunha a este contacto de natureza profissional. Declarou que OM contactou-o dias antes do julgamento começar, oferecendo-se para ser sua testemunha, mas tendo pedido dinheiro para pagar umas multas - uma questão relacionada com trabalhos que teria prestado para o arguido e que este negou, pois declarou que OM nunca trabalhou para si. Disse, ainda, que OM fez-lhe “ ameaças” caso não lhe fosse dado dinheiro, tendo-lhe falado pela primeira vez no “(…) (…) ”, com quem tinha vivido, facto que o arguido disse ao Tribunal desconhecer. 6.2.3. Passando à análise dos documentos dos autos, que permitem retirar elementos quanto à altura em que a testemunha OM saiu de casa do arguido E e quanto à altura em que travou conhecimento com o arguido K e quanto ao conhecimento do arguido K com a testemunha OM – se era apenas uma relação (...) paciente, ou se era um relacionamento com o conteúdo que a testemunha disse -, há que fazer o cruzamento do depoimento da testemunha com elementos constantes dos autos. Concretamente, neste caso, alguns registos telefónicos. (1) Começando pelos registos telefónicos das chamadas efectuadas pelo nº (…), pertence ao arguido E (cfr. Fls. 13.135 dos autos), temos que de acordo com tais elementos: - entre Agosto de 1999 e Março de 2001 existem chamadas do nº (…) do arguido E, para o nº (…) pertencente a OM (cfr. Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25 - ver fls. 7.748 -, 1 (UM) CD remetido pela TMN a fls. 7072, Ofic TMN DSJ/14 056/2003/EA de 24/7/03; ver Fls. 6.577 a 6.601; e ver ofício de 22/7/03 com ref. DSJ/13790/2003/ EA (que está a fls. 7096), identificado com “TMN 1”, contendo Facturação de 1/1/98 a 30/9/00, (…) dos números de cartões que TMN juntou com o ofício de 22/7/03, lista que está a fls. 7099 a 7109; cfr. Apenso V, caixa 1, Sobrescrito 42, 8 (oito) CDs e 1 (uma) unidade back up remetidas para o Tribunal pela TMN a fls. 63.458, ofic 160520097524 200924342, de 25/09/09, em resposta ao ofic do trib 2593878, de 11/09/09 e 16 (dezasseis) CDs correspondentes a duas cópias de seguranças dos oito CDs enviados pela TMN, cfr. Despacho fls. 63.436, 63.460 e 63.465 e Termo Apens fls. 63.486, concretamente os ficheiros constantes do CD 1/8; e cfr. também fls. 17.249 dos autos, ofício da Vodafone e do qual resulta que de 17/11/98 a 12/03/99, de 12/03/99 a 8/07/02 e desde 8/07/02, o nº (…) está em nome de OM, sendo a morada que consta no contrato a (...) (…), em (…)). - e olhando para o padrão de tais chamadas, aparecem-nos registos de chamadas em: dois dias de Setembro de 99; um dia de Outubro de 99; dois dias de Novembro de 99; dois dias de Dezembro de 99 (no dia 17/12 e no dia 31/12); no dia 1 de Janeiro de 2000; três dias de Fevereiro de 2000; um registo em Março de 2000; dois dias de Abril de 2000; dois dias de Maio de 2000; dois dias de Julho de 2000; quatro dias de Agosto de 2000; quatro dias de Setembro de 2000; um dia em Outubro de 2000; um dia em Novembro de 2000; um dia em Janeiro de 2001; um dia em Março de 2001; Maio de 2001; Junho de 2001; Julho de 2001; - como vimos o arguido E, desde Março de 1996 e até ao final de 2000, estava deslocado em Paris, como (…). Estes registos telefónicos dão consistência às declarações da testemunha OM, quando falou do tempo ao longo do qual manteve algum contacto com o arguido E, vão no sentido mais provável de ocorrerem em alturas em que o arguido vinha a Portugal (as chamadas até ao fim de 2000, naturalmente) e com a regularidade que acima resulta. (2) No entanto nos autos – para além deste nº (…) atribuído a OM , de 17/11/98 a 12/03/99, de 12/03/99 a 8/07/02 e desde 8/07/02, com a morada no contrato (...) (…), em (…), cfr. fls. 17.249 dos autos -, resultam ainda outros dois números associados a esta testemunha: (i) (…) (fls. 13.157, de 20/10/00 a 10/08/01; OM) (número este que desde 18/02/02 está associado a produto vitamina, sem identificação de titular); (ii) (…) (fls. 13.135, 17.255, cartão activado a 13/04/01 e expirado 29/08/03 (OM) (com morada em (…)); (iii) (…) (cfr. fls. 17.250; cartão activado de 13/10/00 a 9/02/02, de 5/07/02 a 11/01/03, de 10/02/03 a 14/06/03 e desde 7/10/03, activado não em nome de OM mas em nome de IIF; mas sendo a morada a mesma da de OM, (...) (…) em (…)); E do cruzamentos de dados resulta o seguinte: (2.1.) Do nº (…) pertencente ao arguido E, há chamadas também para os números que antecedem, concretamente (relação que é meramente indicativa, pois dado o volume de registos existentes nos autos, não é possível a este Tribunal garantir que estes registos são, exclusiva e unicamente os que existem): - para o nº (…) (nº de IIF, morada de OM) (cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42); - entre 15 e 20/12/2000; Janeiro de 2001; Março de 2001; Abril de 2001; Maio de 2001; Junho de 2001;Julho de 2001; - para o nº (…) (nº OM) (cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Setembro de 99; Outubro de 99; Novembro de 99; Dezembro de 99 ; Janeiro de 2000; Fevereiro de 2000; Março de 2000; Abril de 2000; Maio de 2000; Julho de 2000; Agosto de 2000; Setembro de 2000; Outubro de 2000; Novembro de 2000; Janeiro de 2001;Março de 2001; Maio de 2001; Junho de 2001; Julho de 2001; (2.2) Do nº (…) utilizado pelo arguido E (Fls. 13.135/6, cartões reutilizados c/dois titulares distintos 2/5/00 a 29/11/02 – Plano Personalizado de preços do Ministério dos Negócios Estrangeiros desde 26/9/03 - pré pago, sem indicação do titular e sem carregamentos, sendo que o arguido E alegou que o utilizou de 2/05/01 a 29/11/02 e ver fls. 26 e 27 Apenso DZ, pasta 1(cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): - para o nº (…) (nº OM) (cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Agosto 2001 (oito chamadas); Setembro 2001; Novembro 2001; Dezembro 2001; Janeiro 2002 - para o nº (…) (nº de IIF, morada de OM) : Agosto de 2001 - para o nº (…) (fls. 13.135, 17.255) (cartão activado a 13/04/01 e expirado 29/08/03 - OM)( cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Julho 2001 (27 chamadas); Setembro de 2001; Outubro de 2001 (2.3) Do nº (…) (na aj 30/06/01 o arguido K disse ser seu): - para o nº (…) (fls. 13.157, de 20/10/00 a 10/08/01; OM; desde 18/02/02 está associado a produto vitamina, sem identificação de titular)(cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Fevereiro 2001 ; Março 2001 (16/03; 25/3 ; 27/03 quatro chamadas; 28/03 três chamadas; 29/03 sete chamadas; 30/03 dezasseis chamadas; 31/03 uma chamada); Abril 2001 (2/4 treze chamadas; 3/04 dezasseis chamadas; 4/04 quatro chamadas; 5/04 duas chamadas; 6/04 dez chamadas; 8/04 onze chamadas; 9/04 sete chamadas; 10/04 oito chamadas; 16/04 três chamada; 17/04 três chamadas; 19/04 cinco chamadas; 20/04 quatro chamadas; 22/04 duas chamadas) ; Maio 2001 (quatro chamadas); Julho 2001 (seis chamadas) - para o nº (…) (fls. 13.135, 17.255) (cartão activado a 13/04/01 e expirado 29/08/03 - OM)( cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Agosto 2001; Dezembro 2001; (2.4) E por sua vez: - nº (…) (fls. 13.157; de 20/10/00 a 10/08/01; OM; desde 18/02/02 está associado a produto vitamina, sem identificação de titular) falou também para o número (…) (na aj 30/06/01 o arguido K disse ser seu): Maio 2001 (14/15/16/19, entre as 18h e as 22 horas) ; Julho 2001 (oito chamadas) - nº (…) (fls. 13.135, 17.255, cartão activado a 13/04/01 e expirado 29/08/03 (OM) (com morada em (…)) falou também para o número (…) (na aj 30/06/01 o arguido K disse ser seu): Julho 2001 (dezasseis chamadas) ; Agosto 2001; Setembro 2001; Novembro 2001; Dezembro 2001; Janeiro de 2002 - nº (…) (fls. 13.135, 17.255, cartão activado a 13/04/01 e expirado 29/08/03 (OM) (com morada em (…)) falou também para o número (…) utilizado pelo arguido E (Fls. 13.135/6, cartões reutilizados c/dois titulares distintos 2/5/00 a 29/11/02 – Plano Personalizado de preços do Ministério dos Negócios Estrangeiros desde 26/9/03 - pré pago, sem indicação do titular e sem carregamentos, sendo que o arguido E alegou que o utilizou de 2/05/01 a 29/11/02 e ver fls. 26 e 27 Apenso DZ, pasta 1 (cfr. CD1 de 8, Apenso V, cx 1, sob. 42): Agosto 2001 (oito chamadas) (2.5) Do nº (…) (número em nome de (...) K ): - para o nº (…) (fls. 13.157) (de 20/10/00 a 10/08/01; OM; desde 18/02/02 está associado a produto vitamina, sem identificação de titular): Abril 2001 Do que antecede resulta, para o tribunal, que durante o ano de 2001 quer o arguido E, quer o arguido K, contactavam, com coincidência de meses – portanto ao mesmo tempo -, com a testemunha OM e este contactava os arguidos, no sentido das declarações que prestou ao Tribunal. E que o relacionamento do arguido K com OM não foi, como o arguido disse ao tribunal, um relacionamento estritamente (...) paciente ou como (...) do pai da testemunha OM. Isto porque quer o número de contactos telefónicos, as horas a que alguns foram (tanto durante o dia como a partir das 22 horas) a sua sucessão por vezes no mesmo dia e em momentos seguidos, não faz sentido com a declaração do arguido. Faz sim mais sentido com as declarações da testemunha, no sentido de ter tido com o arguido K um relacionamento para além de (...) paciente. O que antecede, só por si, não permite, para o tribunal, concluir pelo conhecimento entre o arguido E e o arguido K. Mas cria a possibilidade desse conhecimento ocorrer. No entanto, valorado face a um outro elemento – e que é a existência de registo de chamadas telefónicas do arguido E, para o número da (...) do arguido K, associado ao depoimento da testemunha WQ- o Tribunal acabou por concluir que estes arguidos conheciam-se. A testemunha WQ disse ao Tribunal ter sido empregada doméstica do arguido K, esclarecendo que estava a trabalhar em casa do arguido numa altura em que este fez a mudança da casa da “(...) de cima”, para a (...) “ de baixo” no (…) e que é a sua actual casa (...) (…), nº (…)). E disse ao Tribunal, de forma que avaliando globalmente o seu depoimento foi segura, que viu um dia o arguido E, à hora do almoço, em casa do arguido K. Disse que isto sucedeu na “2ª casa”, o arguido K vinha almoçar a casa, era a testemunha que punha a mesa. Não disse que o arguido E tenha estado a almoçar com o arguido K, mas sim que foi lá a casa à hora do almoço. Conversaram na sala, a testemunha não presenciou a conversa. E disse que não foi só esta vez que o viu ir a casa do seu patrão. Quanto à localização no tempo disse que isto sucedeu “antes” dos factos deste processo, antes de ser conhecido, mas não conseguiu ser precisa quanto ao ano. Disse que soube o nome do arguido E quando o viu na televisão, por causa destes factos e foi aí que associou a pessoa que vira ao que passava na comunicação social. A Defesa do arguido K, em momento posterior, tentou abalar a credibilidade da testemunha, trazendo as razões que teriam levado ao despedimento da testemunha, relacionadas com desaparecimento de alguma coisa de casa. Com efeito o arguido, quando prestou declarações, confirmou que a testemunha foi sua funcionária, mas até ao máximo seis meses após ter ido para a sua casa actual (cfr. AJ 24/6/08), acrescentando que foi despedida em 1997/8 e substituída pela sua empregada IC. No entanto do depoimento da testemunha, e da forma como se apresentou em Tribunal, como falou, não ficámos com a percepção que a testemunha estivesse numa atitude de vingança para com o arguido. Isso não foi perceptível para o tribunal. E se embora tal depoimento, só por si, pudesse não ser suficiente para a convicção do Tribunal, associado ao que temos vindo a dizer e com os registos que se seguem, o Tribunal valorou o depoimento da testemunha como credível e verídico. Com efeito e como dissemos, dos elementos dos autos referentes a registos telefónicos e concretamente dos elementos constantes do CD 8, do Apenso a que temos estado a fazer referência, no dia 9/04/2001 existe o registo de três chamadas do nº (…), em nome de “(...) K”, para o nº (…) em nome do arguido E e uma chamada do nº (…), do arguido E, para o (...) do arguido K, como segue (constando o dia, hora e duração da chamada): (…) (clin. K) – 9/04/01 – (…)– 0 – (…) (E) (…) (E ) - 9/04/01 – (…)– 176 – (…) (K/Clinica) (…) (clin. K) – 9/04/01 – (…)– 114 – (…) (E) (…) (clin. K) – 9/04/01 – (…)– 48 – (…) (E) (…) (E ) - 9/04/01 – (…)– 48 –((…) /CXcorreio) (…) (E) (…) ( E ) - 9/04/01 – (…)– 3 – ((…)/CXcorreio) (…) (E) (…) (E ) - 9/04/01 – (…)- 33 – ((…)/CXcorreio) (…) (E) (Cfr. Correspondência entre registo dos 8 CDs TMN, Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 42 e elementos apreendidos na (...) do arguido K Apenso AQ-1, Caixa 1, Pasta 1). Em audiência de julgamento o arguido K disse não ter qualquer conhecimento desta chamadas, disse que pode ter sido um cliente da (...) a fazer (e a receber, acrescentamos) as chamadas. Acrescentou que independentemente destes registos e daquilo para que possam apontar, não conhece o arguido E. Mas para o Tribunal, face à análise de tudo o que antecede - avaliação do depoimento de OM e CCD, WQ e registos telefónicos das chamadas do arguido E e de número associado ao arguido K -, resultou suficientemente assente que o arguido E e o arguido K conheciam-se antes dos factos deste processo. 6.3. (Vivência do arguido C) Quanto à vivência do arguido C - e para além do que já ficou dito em momento anterior, na análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados e não provados, quanto ao percurso pessoal e profissional do arguido na AX -, neste momento analisamos três aspectos que, ao longo da sua Defesa e na avaliação do Tribunal, evidenciou de forma que nos pareceu mais relevante. Isto porque, de forma mais directa, ou indirecta, têm a ver com a “lista integrada” que o arguido fez e apresentou ao Tribunal, com os registo da utilização do seu telefone, cartões de crédito/débito, via verde. E quanto à utilização de veículos pelo arguido, em audiência de julgamento o arguido C falou ao Tribunal sobre os carros de serviço que lhe foram atribuídos, a utilização que fazia desses carro e a utilização que fazia de veículos particulares. Num primeiro momento disse que quando foi nomeado (...) do (...) teve um carro de serviço, um (…), que depois foi substituído por um (…), não sabendo no entanto precisar a data. Posteriormente, esclareceu o Tribunal que o “(…)” foi-lhe entregue em 15/09/97, matrícula (…), cor (…) e o (…) foi-lhe entregue em 15/12/00, matrícula (…), cor (…). O seu veículo particular era um (…) – disse que teve este veículo de 1995/2001 -, o qual ficava na garagem de CZ durante a semana, pois durante a semana andava com o carro de serviço e ao fim de semana é que levava o seu veículo. Disse que o carro era cinzento escuro, teve o carro até “…não se recorda bem…..Junho/ Julho 2001”, foi um veículo que esteve cerca de dois meses em (…) onde foi vendido. Em audiência de julgamento foram feitas perguntas às testemunha quanto ao conhecimento que tinham da utilização de veículos, por parte do arguido C. A testemunha ES (motorista na AX desde 1993), disse ao Tribunal lembrar-se que o arguido C tinha um “(…)”, mas não se recordou de ver o carro estacionado ao fim de semana, na garagem. Lembra-se de o ver na (...) durante a semana. A testemunha IA (aposentado desde 2003/2004 e porteiro na AX desde 1990, tendo exercido funções no portão de acesso em que era feito o controlo de entradas e saídas dos veículos da AX, em CZ, onde se situava a (...) - local de trabalho do arguido C -, mas tendo estado também “talvez uns seis meses” no portão de acesso à (...) ), não soube dizer ao Tribunal qual era o carro do arguido C. Diz que o viu entrar “umas vezes” na (...), mas não sabe o carro. Por sua vez, a testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, durante cerca de 20 anos), disse que conheceu dois carros de serviço ao arguido C – dois “(…)”(…) – e dois carros particulares – um (…) e um (…) “mais escuro”. Ao fim de semana pensa que o arguido C usava o carro de serviço, mas não tem a certeza. A testemunha A testemunha EEI (mecânico na AX, para onde entrou em 1983/1984, tendo conhecido o arguido A e o arguido C), mas chamando o Tribunal a tenção para a circunstância de a testemunha ter estado em CZ desde fins de 2000 e como chefe da Oficina desde Março de 2001, confirmou que o arguido tinha um carro de serviço (…) e que carro particular conheceu-lhe um (…) (achava que era um (…)). Este carro esteve “pouco tempo” na AX e o arguido andava com o carro de serviço pelo menos durante a semana, ao fim de semana não sabe. Para o Tribunal e do que relevante pôde retirar, é que face à prova produzida em audiência de julgamento, no espaço da AX o arguido foi visto a utilizar os veículos de serviços ((…)), um carro particular (…),(…) e um (…). 6.4. Da vivência do arguido H: O arguido prestou declarações ao tribunal quanto a vários aspectos da sua vida. 6.4.1. (“dia-a-dia” / Rotinas) (1) Esclareceu os períodos e locais onde viveu (cfr. AJ 14/02/05): viveu em (…), “terá vivido” entre oitenta e oitenta e cinco, “por aí… 86…”. Em (…), local a seguir, “terei vivido até 90…talvez 93”, dizendo que foi na altura em que teve um cancro na garganta “… portanto 93. Depois viveu…(…)… (…). Aqui uma breve referência. Quando o arguido localiza a altura em que foi viver para (…), começa por indicar uma data, “90” e depois, apesar de estar relacionado com um momento que foi seguramente marcante para si - o ter tido um cancro -, é que corrige para 93, apoiando esta correcção na associação que nesse momento fez para o Tribunal, com a referida situação de doença. A avaliação do que é dito e como é dito em audiência de julgamento, o significado das confusões, dos lapsos, dos erros de memória ou das discrepâncias, foi uma actividade que durante o julgamento foi consecutivamente abordada. E que, para o Tribunal, foi evidenciada durante a fase das alegações, dadas as valorações e sentidos que os diferentes Sujeitos Processuais deram às discrepâncias reveladas pelos assistentes. Daí o Tribunal estar a assinalar este aspecto da declaração do arguido. (2) Quanto ao seu “dia-a-dia” disse que não tinha rotinas (AJ 14/02/05). Nos anos 2000/2001/2002 - últimos três anos antes da sua detenção -, declarou que a sua vida passava-se muito em casa, pois não tinha praticamente produções. Apenas exercia profissionalmente as funções de (…), ia ao escritório quando era necessário, para reuniões ou para resolver algum assunto, mas muito expediente, mesmo do escritório, era-lhe levado a casa. Ficava a maior parte dos dias em casa e aproveitava para criar programas, escrever, arrumar um arquivo. No ano de 2001, ano que disser ter ocorrido a gravidez da sua mulher, no primeiro semestre apresentou um programa “(…)” e regressava a casa 2/3 da manhã e, em consequência, declarou ter passado 95% das manhãs em casa, pois neste período levantava-se muito tarde. Embora com excepções, em regra saía para o estúdio às tarde, 17h.30/18h/19h. Com o conhecimento da gravidez da sua mulher (disse ter sido em Junho) e para a poder acompanhar, deixou de apresentar o programa das “(…)”, tendo passado a, nas suas palavras, dedicar-se fortemente a acompanhar a gravidez, (...), ecografias, fazer companhia à mulher, o que lhe era possível devido ao tempo livre que tinha, pois era só (…). O Ano 1998 foi um ano “muito ocupado” com (…), foi um ano de muitas viagens e de muitas reuniões nesse âmbito, mantendo-se até Outubro de 99, (…). Em 1998 ainda apresentou (…) e quando este terminou apresentou (…), “(…)”, indo ao estúdio gravar o programa uma vez por semana. De 1998 para trás tinha várias produções, trabalhava na produção, tinha actividade ligada à publicidade que fazia. Mesmo nesta altura, quando estava na fase de produção, declarou (na Aj de 14/02/05) que “só por muita obrigação” e “só por inevitável” é que saía de casa de manhã. Normalmente gostava de passar as manhãs em casa e mesmo em casa trabalhava muito até tarde, dizendo que a noite era sua ajudante em algum tipo de trabalho, nomeadamente na criação, na criatividade. O seu hábito era passar as manhãs em casa – declarou o arguido que só não era assim, se tivesse uma reunião ou horário que não pudesse ser de outra maneira. Declarou mesmo, que nos últimos anos gostava mesmo de almoçar em casa com a sua mulher. Assim, o Tribunal conclui que naturalmente e em função da forma como o arguido descreveu a sua vida, pelo menos, desde 1998, a vida do arguido estava naturalmente organizada para as manhãs – fossem dias de semana, fossem dias de fim de semana, pois o arguido não o distinguiu – serem “passadas em casa”, não tendo, como regra, compromissos/tarefas/trabalhos estabelecidos com regularidade ou continuidade para essa parte do dia. 6.4.2. (sociedades) O arguido falou também ao Tribunal das sociedades que teve e relacionando tal actividades com a utilização de cartões de crédito/ou débito, o que estava relacionado com uma das suas linhas de Defesa. Começou por dizer (AJ 14/02/05) que criou a “EEZ”, dedicada exclusivamente a produção de televisão, disse ser sócio gerente da empresa. Usava cartões da empresa: dois cartões visa – um Prestige e outro “normal” – e quando o Banco lançou a modalidade Business, passou a utilizar também o Business card. Utilizava estes cartões para despesas de representação, relacionadas com a empresa: podia ser uma viagem de trabalho, um almoço de negócios, material que fosse necessário para a empresa. Um dos cartões pagou, até Junho de 99, inclusive, as portagens do carro da sua ex-mulher IIG, um (…), matrícula (…), identificador nº (…) (esclareceu que foram dois cartões, pois um caducou e foi substituído por outro). Esta sociedade tinha um telemóvel (…) (a utilização de telefones pelo arguido é factualidade que está tratada em momento posterior). Antes da “EEZ” existia as “GGY”, dedicada a publicidade. Houve uma empresa “IIH”, em que era um sócio um sobrinho, mas que praticamente não teve actividade. Houve outra empresa “ III”, em que diz ter sido meramente sócio, pois não geria a empresa, tendo vendido a quota já há muito tempo. Teve ainda uma sociedade com a ex-mulher IIG, dedicada a loja de animais, “IIJ”, tendo deixado de ser sócio aquando do seu divórcio. Esta sociedade disse ser gerida pela sua mulher IIG, declarou nunca ter tido qualquer cartão (de crédito/débito) desta empresa e declarou que não usou veículos que pertencessem a esta empresa. Disse que nunca teve portagem ou despesa sua paga por esta empresa. Teve ainda uma sociedade de discos, que diz ter desaparecido rapidamente , cujo nome disse achar ter sido “IIK”. Até aos factos deste processo foi ainda sócio de uma empresa em Londres e que tinha um ramo em Lisboa, “IIL”. Desta empresa disse ter sido um sócio com características parecidas da “IIM” – sem interferência na gestão – e que a única relação financeira que teve com a empresa foi o ter sido avalista de um pequeno empréstimo, que disse ter pago agora. Quem fazia a gestão desta empresa era um sócio seu. Declarou não ter tido qualquer cartão de crédito/débito desta empresa ou associado a contas bancárias desta empresa, não lhe pagaram portagens, nada recebeu fosse a que título fosse. Houve também a “IIM”, para eventos e espectáculos, em que o seu sócio era IIN em relação à qual disse ter assinado recentemente (e estava a prestar declarações em 14/02/05), uma acta de dissolução. Nesta sociedade declarou também não ter um papel activo na sua gestão, a única coisa que se lembrava era de ter participado em eventos organizados pela empresa. Declarou que desta empresa não teve remuneração, o que sucedeu foi que a última carrinha (…) que teve, foi comprada em leasing por essa empresa e foi-lhe entregue como carro de empresa. Esclareceu - depois de procurar nos seus elementos -, que a matrícula da carrinha (…) era (…), a qual disse ter sido vendida em Setembro de 2002, altura em que adquiriu o (…) que actualmente - à data em que estava a prestar declarações (14/02/05) -, disse ser o carro da casa. Quanto à matrícula do (…)disse ser (…), Quanto a esta carrinha, disse que as portagens e despesas de manutenção eram pagas pelas GGY. Acrescentou que da sociedade IIM pode ter recebido cachets como (…), nos eventos em que participou – três, quatro vezes no máximo -, mas não como sócio da empresa. Declarou nunca ter tido cartão de débito ou crédito desta empresa IIM. Estas as sociedades que disse ao Tribunal lembrar-se de ter tido ao longo de 20 anos. 7. Dos factos relativos à utilização de telefones pelos Arguidos: Continuando num aspecto já acima referido, a matéria de facto que o Tribunal deu como “provada” ou como não provada - quer no que diz respeito aos factos relativos ao conhecimento dos arguidos entre si, quer no que diz respeito aos factos que implicaram a deslocações a casas e locais, para a prática de actos de abuso -, teve também como pressu(...) a análise dos elementos dos autos referentes a registos de chamadas telefónicas e facturação. Da análise dos documentos dos autos e com a excepção de registos de chamadas telefónicas entre os números de telefone utilizados pelos arguidos C e A e de números relacionados com os arguidos K e E, o Tribunal não encontrou registo de chamadas telefónicas que conseguisse identificar como tendo sido feitas entre os demais arguidos que estão a ser julgados; ou entre os arguidos A, C, K e E e os demais arguidos que estão a ser julgados. Os arguidos C, H e N sustentaram, por sua vez – e de forma genérica tal também tenha sido corroborado pela Defesa dos arguidos E, K e Q em sede de alegações, aquando da análise que fizeram dos indícios e dos factos que consideraram provados e das conclusões a retirar de tais factos - , que as chamadas que se encontram registadas nos autos, nos documentos enviados pelas operadoras (e que o tribunal irá identificando à medida que se referir a tais elementos), foram feitas por si – com as excepções que o arguido H apontou no seu caso e que à frente o Tribunal mencionará -, e em local abrangido pelo raio das antenas identificadas pelas BTS que os documentos enviados pelas operadoras em alguns casos identificam. Sustentaram em termos genéricos os arguidos C, H e N – e o tribunal irá sustentar/integrar o que antecede com as declarações que os arguidos prestaram em audiência de julgamento -, a exclusividade da utilização dos telemóveis de cada um e por cada um e a presunção de que as chamadas constantes da facturação detalhada do “número de telefone” de cada um, foram feitas por si. O Tribunal vai, por conseguinte, analisar os dados relativos à utilização de telefones ou disponibilidade para a sua utilização, por parte dos arguidos. 7.1. No entanto e antes de passar a tal análise, há que fazer referência a dois aspectos: - Da obtenção e envio de dados por parte das operadoras de telefones; - Da análise e tratamento dos dados recebidos por parte da Polícia Judiciária e do Ministério Público na fase de inquérito; Assim vejamos: (1) Quanto à primeira questão, o Tribunal faz, desde já, a referência às circunstâncias, extensão e limitações, em que/ou como foi possível obter dados da Operadora Vodafone, situação que como veremos foi extensível às demais Operadoras. Partindo um caso concreto, por causa dos registo de chamadas efectuadas e recebidas “por” e “para” o número (…) e BTS utilizadas (número este relacionado com o arguido H), resultou dos ofícios de fls. 2.626, 7.716/8, 9.130/2, 14.430/1 que houve limitações técnicas por parte da operadora Vodafone para enviar tais elementos, não só em relação a este número mas em relação a todos os números em geral. Falando então da “Telecel/Vodafone”, tendo por referência os ofícios acima mencionados a operadora comunicou ao Tribunal que em consequência de uma deliberação da Comissão Nacional de Protecção de Dados (cfr. Autorização 8/97, da C.N.P:D.), a Vodafone só podia conservar nos seus ficheiros os dados relativos a facturação detalhada pelo prazo máximo de um ano, pelo que não poderia disponibilizar ao Tribunal as listagens de chamadas desde Janeiro de 2000. No entanto e não obstante o que antecede, a Operadora pôde recuperar alguma facturação de suportes existentes nos seus serviços – compreendeu o Tribunal que tal recuperação foi feita das cópias do sistema que ainda tinham em arquivo -, num processo que na altura comunicou ao tribunal ser moroso. Esclareceu que quanto a chamadas recebidas de outras redes, anteriores a Janeiro de 2000, não estavam registadas no seu sistema, mas em cópias de segurança que ainda não tinha destruído. Esclareceu, também - e este aspecto é importante para o Tribunal, no que diz respeito à avaliação e valoração dos elementos remetidos pela Operadora -, não poder garantir ao tribunal terem todos os elementos pedidos e pretendidos pelo Tribunal. Assim, quanto ao fornecimento ao Tribunal da informação referente a localização celular dos serviços chamados “pré-pagos” – os chamados serviços Vitamina -, em virtude da alteração do sistema de facturação, que disse ter ocorrido em Janeiro de 2000, a referida informação deixou de ser processada pelo seu serviço de Engenharia, pois deixou de ser utilizada para efeitos de facturação. Disse, contudo, poder ainda obter alguma informação de cópias de segurança do sistema – que criou para fazer face a eventuais anomalias no sistema informático -, pelo que os dados que enviou ao Tribunal resultaram na recuperação que fez dos registos respeitantes à localização celular dos serviços pré-pagos que ainda pudesse existir. Pela mesma razão da alteração do sistema de facturação, a Vodafone passou a ter dificuldade na identificação dos IMEIS associados aos serviços pré pagos, no período compreendido entre 14/04/2000 e 1/07/01, razão pela qual também não foi enviada toda a informação pedida pelo Tribunal. Comunicou, mesmo, no ofício de fls. 7.716/8, que o que não constasse dos registos enviados no suporte informático, é porque não encontraram o registo. Sucede que a operadora, se inicialmente comunicara que o processo de recuperação dos elementos, das cópias de segurança, iria ser moroso, a fls. 9.131 comunicou ao Tribunal que o processo iria ser mais complexo do que inicialmente tinha considerado – disse que as cópias de segurança continham mais de 700 mil ficheiros -, era necessário o desenvolvimento de programas informáticos específicos que possibilitassem a leitura dos ficheiros, o que implicava um investimento da Vodafone Telecel, quer em termos de recursos Humanos quer em termos de Hardware. Acrescia que testes realizados no sentido de recuperar a informação pretendida não foram bem sucedidos, dado que a informação extraída encontrava-se incompleta e ilegível devido à antiguidade das cópias de segurança. Voltou a comunicar que a recuperação de registos de chamadas recebidas de outras redes, anteriores a 2000, requeria a leitura de 890 mil ficheiros – o que significaria, de acordo com a sua avaliação, a disponibilização de três técnicos a tempo inteiro (24h) durante 140 dias -, situação que se estendia à dos registos de localização celular e IMEIs associados aos serviços pré pagos. Acrescia, mais uma vez, a impossibilidade de conservação dos registos, em virtude do que derivava da Autorização 8/97 da Comissão nacional de Protecção de dados. Pediu, por isso, ao Tribunal – na altura ao Senhor Juiz de Instrução -, a dispensa da obrigação de prestação e de conservação de informação pretendida pelo tribunal (e fazendo referência que quanto aos elementos relativos a “chamadas recebidas de outras redes”, por despacho de fls. 7.727, do Senhor Juiz de Instrução, a Vodafone já fora dispensada de fornecer informação anteriormente pedida pelo tribunal, devendo contudo manter os registos). (1.1) Há que registar que os próprios arguidos – quer o arguido C, quer o arguido H -, também insistiram junto das Operadoras para que lhes fosse remetida facturação que ainda faltava nos autos. O arguido H declarou-o ao tribunal na audiência de julgamento de 21/02/05 e face à impossibilidade que lhe foi comunicada pela Vodafone, para a recuperação de alguns dados da sua base de dados do cartão nº (…), o arguido disse ao Tribunal que juntou aos autos os documentos de fls. 618 a 621, do Apenso EE, volume 4º, para provar que durante períodos em que não foi fornecida a facturação e registo de chamadas pela Operadora , fez chamadas, pois pagou contas correspondentes a chamadas efectuadas pelo número em causa nos documentos. Dos autos resulta, quer dos documentos obtidos pelo tribunal – cfr. Apenso V, Caixa 2, sobrescritos 1 e 36 -, quer dos documentos juntos pelo arguido - cfr. Apenso EE, volume 4, fls. 548 a 614 -, que há períodos de facturação a que se referem os documentos de fls. 619 a 621, nomeadamente de 23/08/99 a 22/09/99, de 23/09/99 a 22/10/99, em relação aos quais não há registo de qualquer facturação, apesar de a operadora ter debitado valores do nº (…)(…) O arguido C – quanto ao nº de telefone (…), por exemplo, período compreendido entre 1/10/98 e 31/07/01, concretamente elementos referentes ao período 1/01/2000 a 26/02/2000 e de 1/03/2000 a 21/05/200o -, juntou aos autos os documentos de fls. 52.509, 52.510, 52.513, 52.514/5, 52.519, 52.520, 52.521 a 52.525, cartas e documentos que dirigiu ou remeteu para a Vodafone, a pedir esclarecimento quanto à obtenção de dados de facturação relativos aos períodos indicados a fls. 52.520 a 52.525 (de 5 a 8 de Junho de 1999, 26 de Junho de 1999, 3 e 4 de Julho de 1999, 20 a 22 de Julho de 1999, 22 a 24 de Setembro de 1999, 29 de Dezembro de 1999 a 26 de Janeiro de 2000 e 29 de Fevereiro a 22 de Maio de 2000). Juntou, igualmente, o documento de fls. 54.830 que lhe foi remetido em 23/06/08 pela Vodafone, no qual a operadora presta esclarecimentos quanto à obtenção de dados e confirma a sua impossibilidade de recuperar dados referentes aos períodos de 1/01/2000 a 26/02/2000 e de 1/03/200 a 21/05/2000, bem como as chamadas referentes ao ano de 1999 - e que o tribunal acima enunciou - e confirmando não poder assegurar que a informação remetida para o tribunal correspondia à totalidade das comunicações efectuadas (cfr. Fls. 54.830/1). O Tribunal, a requerimento do arguido C – e sem prejuízos dos ofícios/documentos já existentes nos autos a fls. 17.332, 18.524, 20.458 -, determinou igualmente que a Vodafone prestasse esclarecimentos quanto à possibilidade/impossibilidade de obtenção de dados, na sequência do que esta entidade remeteu para os autos o documento de fls. 55.767 , na qual confirmava que quanto ao nº (…), período compreendido entre 1/10/98 a 31/07/2001: - os dados que conseguiu recuperar enviou-os para o tribunal; - à data em que o J.I.C. requereu os registo de tal número, já não dispunha da informação no seu sistema, pelo que teve que recorrer a cópias de segurança para recuperação das comunicações e a antiguidade das cópias de segurança dificultou a recuperação dos dados, por haver informação ilegível; - pelo que nunca conseguiu recuperar os registos de chamadas efectuadas pelo nº (…) nos períodos referidos a fls. 52.520, 52.522, 52.523, 52.524 e 52.525 (e que o Tribunal acima já enunciou). Tal como sucedeu com o arguido H – que juntou aos autos documentos/facturas de “gastos” de telefone para fazer prova de que em determinado período houve chamadas efectuadas pelo seu número -, também no caso do arguido C e na sequência de requerimento apresentado pelo arguido e Despacho proferido pelo Tribunal, a AX juntou aos autos os documentos que estão a fls. 54.891 a 55.076, correspondentes às cópias das facturas mensais da TELECEL e nas quais se incluem os gastos do nº (…), utilizado pelo arguido C e que a AX pagou. No entanto, a ausência de registos de chamadas por parte da operadora não corresponde, em todos os casos, a um período (completo) mensal de facturação, o que o Tribunal não pode deixar de ter em atenção. Assim, quanto aos períodos indicados a fls. 52.520 a 52.525, o Tribunal considera que de 5 a 8 de Junho de 1999, dia 26 de Junho de 1999, de 3 a 4 de Julho de 1999, de 20 a 22 de Julho de 1999 e de 22 a 24 de Setembro de 1999, como são dias dispersos num período de facturação de 30 dias, os documentos juntos pela AX apenas permitem concluir, de forma directa, que no período de facturação que vai de 9/5/99 a 8/06/99 o arguido C “gastou” 47.471$00 mais IVA (fls. 54.913); no período de facturação que vai de 9/06/99 a 8/07/99 o arguido C “gastou” 45.554$00 mais IVA (fls. 54.918); no período de facturação que vai de 9/07/99 a 8/08/99 o arguido C “gastou” 49.403$00 mais IVA (fls. 54.923); no período de facturação que vai de 9/08/99 a 8/09/99 o arguido C “gastou” 61.671$00 mais IVA (fls. 54.927); no período de facturação que vai de 9/09/99 a 8/10/99 o arguido C “gastou” 42.994$00 mais IVA (fls. 54.932). Quanto ao período de 29/12/99 a 26/01/99, temos que na facturação que vai de 9/12/99 a 8/01/00 e de 9/01/00 a 8/02/00, o arguido C “gastou”, respectivamente em cada período, 45.000$00 mais IVA e 38.878$00 mais IVA (fls. 54.948 e fls. 54.954). Estes documentos e o seu conteúdo não apontam, de forma directa, para a conclusão alegada pelo arguido, que nestes períodos fez mais chamadas do que as que foram enviadas pela operadora. No entanto, analisando a padrão de gasto mensal do arguido - que ressalta dos documentos enviados pela AX -, com o número de dias que não têm registo (29 dias), com o número de chamadas que diariamente o arguido fez no período que antecedeu o dia 29/12/99 e que o Tribunal analisou nos documentos de fls. 54.892 a 54.956, bem como nos elementos constantes no Apenso Z-13, volume 9 (sobrescrito com disquete enviada pela Vodafone com o ofício de fls. 18.524, de 5/4/04, a responder ao ofício do Tribunal nº 414, de 3/3/2004 e contém listagem do nº (…), com localização de chamadas e BTS, entre 26/2/00 e 31/7/01, tendo sido feita cópia en CD-R pelo Tribunal), e conjugando tal análise com a explicação técnica dada pela Telecel, pelo menos a fls. 54.830 e 55.830/1, o Tribunal concluiu que neste período de 29/12/99 a 26/01/99, o arguido, como alega, fez mais chamadas do que aquelas cujo registo a operadora conseguiu enviar para o tribunal. Quanto ao período que vai de 29/02/00 a 22/05/00, tendo em atenção os “gastos” que decorrem de fls. 54.959 a 54.983 - período de facturação que vai de 9/02/00 a 8/03/00 o arguido C “gastou” 36.011$00 mais IVA (fls. 54.960); que vai de 9/03/00 a 8/04/00 o arguido C “gastou” 42.701$00 mais IVA (fls. 54.967); que vai de 9/04/00 a 8/05/00 o arguido C “gastou” 35.072$00 mais IVA (fls. 54.974); que vai de 9/05/00 a 8/06/00 o arguido C “gastou” 34.265$00 mais IVA (fls. 54.980) -, o Tribunal conclui, aqui de forma directa de tais documentos, que no período que vai de 29/02/00 a 22/05/00 e como alega, o arguido fez chamadas e mais chamadas do que aquelas cujo registo a operadora conseguiu enviar para o tribunal. (2) Quanto à segunda questão - a análise e tratamento dos dados recebidos por parte da Polícia Judiciária e do Ministério Público na fase de inquérito -, existe nos autos, a fls. 9.322, uma informação de serviço de um Inspector Chefe da Polícia Judiciária para o Coordenador do S.T.A.I.C., datada de 24/09/03 e da qual resulta a dificuldade que o grupo que estava a investigar o “ processo AX” teve na análise dos dados enviados pelas Operadoras pois, entre o mais, os ficheiros foram enviados em diferentes formatos, nem todos apareciam com o formato actual, as três operadoras não contemplam os mesmos campos. Era, por conseguinte, feita a comunicação que qualquer trabalho que fosse feito seria incompleto, sendo que dada a quantidade de dados de chamadas – refere a informação “ estamos a falar de milhões” - seria impraticável o STAIC colocar tais números correctamente, e sendo tal também tecnicamente incorrecto, pois corriam o risco de, a fazê-lo, inadvertidamente trocar algum número. No que diz respeito à questão do formato “ actual”, há que ter em atenção que, como resulta de fls. 9.899 a 9.900 e fls. 10.744/5 TMN, fls. 9.901/2 Vodafone e fls. 9.903/6 PT, pelo menos desde 30 de Agosto de 1997 e até, pelo menos, 31 de Outubro de 1999, entrou em vigor um novo Plano Nacional de Numeração, com a consequente alteração da composição dos números de telefone da rede fixa e da rede móvel, o que o Tribunal teve em atenção aquando da análise dos dados de registo de chamadas enviados pelas operadoras. No que se refere ao segundo aspecto, é relevante para este Tribunal, na avaliação que fez dos dados enviados pelas operadoras e sua fidedignidade, saber que a Polícia Judiciária não fez “manipulação” de dados. Isto é, quando analisou os registos de chamadas e dados enviados pelas Operadoras – e a que se refere o CD constante do “Apenso V, Caixa 1, Sobrescrito 25: “CD resultante da peritagem”, “STAIC”, onde: Pasta “Optimus”, 6º ficheiro, identificado “ resposta ao ofic. nº 2.723”; Pasta TMN, ficheiro 32º “ resposta ao oficio nº 2.722”, CD 5; - não introduziu alteração nos dados que foram fornecidos ao tribunal pelas diversas operadoras. Aliás, houve a preocupação que os dados fossem enviados em suporte informático e de leitura protegida, não permitindo alterações por quem os copiasse ou (...)se – cfr. fls. 9.322/3 -, o que foi possível verificar pelo Tribunal aquando da análise e verificação que fez dos suportes informáticos ao longo do processo. Mas há que referir o seguinte. Aquando da análise e verificação, por parte do tribunal, dos dados enviados pelas operadoras e dos elementos constantes dos Apensos relativos a registos de tráfego telefónico e facturação detalhada, o Tribunal teve a percepção que, na fase de inquérito, a Polícia Judiciária e consequentemente o Ministério Público, fez tal análise limitando-se a aplicar “ferramentas” informáticas de busca aos dados que permitiam tal aplicação. E dizemos “limitando-se” pois foi verificado pelo Tribunal que houve situações em que dados remetidos pelas operadoras em relação ao mesmo número, eventualmente por terem “formatação” ou “configuração” diferente, não foram “encontrados” pela investigação – pois não encontramos tal referência no processo -, tendo sido individualizados e considerados pelo Tribunal em fase de Julgamento. Em sede de julgamento e concretamente aquando da análise dos elementos do processo com vista à deliberação, pelo Tribunal foi feita uma verificação, dentro do que temporalmente foi possível e com os meios possíveis - pois objectivamente tivemos que a limitar -, quer dos dados remetidos pelas operadoras quer dos elementos remetidos pela Via Verde, Multibancos/visa, registos da AX. Foram milhares de dados verificados, muitos deles com a verificação de listagens atrás de listagens, o que implicou gasto de tempo ao longo do processo, mas que a descoberta da verdade material impunha. Com efeito, à luz do artº 355º, do C.P.Penal, o Tribunal não podia ter milhares de dados e informação no processo que, a final e à luz das diferentes posições que em sede de Alegações foram tomadas pelos sujeitos processuais, não tratasse e verificasse da forma mais precisa que lhe fosse possível. A descoberta da verdade material impunha-o. Mas, a final, deparámo-nos com uma segunda limitação, objectiva e directamente decorrente dos ofícios enviados para os autos pelas operadores. E que foi a impossibilidade de obter a identificações de titulares de números para os quais foram feitas chamadas - por diversos números identificados nos autos -, pois as operadores não conseguiram fornecer sempre ao tribunal, a identificação dos respectivos titulares. Houve situações em que não tinham identificação do titular do contrato, havendo também situações de números associados a produtos vitamina, em que não havia esse tal registo de titular. 7.2. Da utilização de telefones por parte do arguido H: Relembramos o que foi uma das linhas de Defesa do arguido – para credibilização da prova que juntou, para demonstrar a impossibilidade de ter praticado os factos que lhe eram imputados no Despacho de Pronuncia -, concretamente a alegação que (para além de não emprestar os carros que habitualmente conduzia; e não ceder o seu cartão de crédito a ninguém, com ressalva de por vezes ter pedido a um seu colaborador para lhe fazer levantamentos num ATM), que não emprestava o seu telemóvel, cedendo-o apenas algumas vezes à filha quando esta estava ao pé si e enquanto estava ao pé de si. Assim vejamos. (1) Quanto à utilização de aparelhos (telefones/IMEIs) e de cartões/números de telefone, o arguido H declarou em audiência (cfr. AJ de 14/02/05) - quando estava a falar sobre as sociedades de que tinha sido sócio e na sequência de pedido de esclarecimento do Tribunal quanto a telemóveis e telefones de empresas que tivesse utilizado -, que a empresa “EEZ” tinha um telemóvel (…), nas palavras do arguido “raríssimamente” usado, que o arguido utilizou algumas vezes e que era utilizado por várias pessoas. Declarou que o telefone esteve em nome da empresa de 16/03/95 até 25/01/02, sendo que em 2002 deu-se praticamente o desaparecimento da actividade da empresa. Declarou que de 26/01/02 a 21/01/03 o telefone passou para seu nome, tendo passado a usá-lo neste período basicamente para acesso à Internet, com um Cardphone ligado ao computador portátil. Na mesma audiência de julgamento de 14/02/05 - na sequência dos pedidos de esclarecimento que o Tribunal foi fazendo ao arguido, quanto à utilização de telemóveis de empresas e em que o mesmo começara por falar do nº (…) -, o Tribunal pediu ao arguido para, em complemento do que já dissera, esclarecer que telemóvel ou que telemóveis é que utilizou, desde quando e como era efectuado o pagamento. O arguido declarou que o seu telemóvel era o nº (…), o qual utilizou desde 1997 (sendo o pagamento feito pela sua conta pessoal nº (…), que veio a ser substituída pela conta nº (…)). O Tribunal perguntou ao arguido se em alguma circunstância usou outro telemóvel, ou tinha outro telemóvel que fosse por carregamentos ou que lhe tivesse sido cedido por alguém, ao que o arguido respondeu que o seu telemóvel, o que usava, era o nº (…). Mas completou que as empresas, as marcas de telemóveis, de vez em quando e quando aparecia um modelo novo, ofereciam-lhe telemóveis e também comprou um ou dois telemóveis, através do chamado “ sistema de pontos”. Disse que muitas vezes, associados a esse telemóveis, vinham uns cartões com “ xs” escudos ou euros de crédito, o qual terá também utilizado e em alguns casos declarou ter oferecido esses cartões à sua filha. Acentuou que só nessas circunstâncias utilizou outro número que não fosse o nº (…). (1.1) O tribunal perguntou ao arguido se não usava outro que estivesse, eventualmente, com assinatura em nome de outra pessoa, ou outro telemóvel que fosse de carregamentos – tirando os que lhe pudessem ter sido oferecidos pelas marcas de telemóveis ou adquiridos por pontos e que acabara de referir -, ao que este confirmou não ter usado. Na AJ 16/02/05, a perguntas suscitadas pelo MP, confirmou esta declaração: que usava, total ou parcialmente, o “saldo” que esse telemóveis traziam, podendo ter dado o saldo residual à sua filha ou à sua sobrinha. Acrescentou - quanto ao pedido de esclarecimento se voltava a fazer carregamentos nesses telemóveis, os que lhe eram dados ou que adquiria por pontos - que se os tivesse dado à sua filha pode ter acontecido tê-los carregado a pedido da filha. (1.2) Das declarações que antecedem, o Tribunal interpretou que o arguido admitiu ter feito carregamentos de telemóvel, a pedido da filha, nos telemóveis que lhe eram dados pelas operadoras ou que adquirira por pontos, mas naquelas situações em que os tivesse dado à sua filha. Foi perguntado pelo Tribunal quantos telemóveis terá recebido de operadoras ou adquirido por pontos, ou quanto a carregamentos terá feito no telefone ou telefones da filha, resposta que na altura (AJ de 16/02/05) o arguido não quis prestar, dentro de um direito que a lei lhe confere, de responder na medida em que o pretenda fazer. O que veio a responder na audiência de julgamento de 8/05/09. Respondeu quatro cinco, eventualmente meia dúzia. E completou na audiência de julgamento de 1/06/09, tendo declarado que lembrava-se de a Nókia ter-lhe oferecido 2, recebeu um Ericsson – que por motivo de avaria veio a ser substituído nas condições que já descrevera ao tribunal –, um Motorola (relacionado com o 25º Aniversário do Expresso) e um Siemens. Mas, num momento posterior, declarou que em relação ao Siemens SL-45 tinha dúvidas, não se lembrando se foi comprado ou oferecido. Nesta audiência de 1/06/09, o Tribunal perguntou ao arguido se as respostas que estava a dar, quanto ao número de telemóveis comprados por si ou oferecidos, eram já depois de ter analisados os elementos dos autos – pois para o tribunal é relevante saber se a resposta que está a ser dada é uma resposta de memória, de reviver ou tentar reconstituir o passado, ou se é uma reconstituição da memória com recurso a documentos -, ao que o arguido respondeu ser depois de ter analisado o Apenso S-L, acrescentando que na última sessão (a de 8/05/09) não sabia de cor quantos IMEIS estavam no Apenso S-L e depois de os conferir é que chegou a essa conclusão. Nestas circunstâncias – memória coadjuvada por documentos -, concluiu que entre 1998 e 2002 terá comprado oito telemóveis, sendo os restantes oferecidos. (1.3) (cartão gémeo) Ainda quanto ao nº (…), na audiência de julgamento em que falou de tal número declarou ter tido um cartão gémeo/cartão duo deste nº (…), desde 14/02/98 e que se lembrava durante dois a três anos. A pedidos de esclarecimentos do Ministério Público e dos assistentes, quanto ao modo de utilização deste cartão, ou do telemóvel onde este cartão “gémeo” estava, esclareceu que se o cartão estivesse no telemóvel que deixasse no carro, este telemóvel, em princípio, estava desligado. E para o utilizar era preciso saber o PIN do telemóvel e nunca se apercebeu que alguém tivesse utilizado esse PIN. Afastou, assim, na avaliação do Tribunal, a possibilidade de o seu telefone/e número – mesmo numa situação de utilização com “cartão gémeo” ou com “cartão duo” -, ser utilizado por outra pessoa. 2. Dos autos resulta (cfr. fls. 2628) que a EEZ, foi titular do nº (…) de 31/10/99 a 26/01/02 e que a partir desta data (26/01/02) passou para a titularidade do arguido H. Quanto aos registo de chamadas efectuadas e recebidas por e para este número (…) e BTS utilizadas, resultou dos ofícios de fls. 2.626, 7.716/8, 9.130/2, 14.430/1 as limitações técnicas por parte da operadora Vodafone para enviar tais elementos, não só em relação a este número mas em relação a todos os números em geral, como o Tribunal acima já referiu. Passando à análise dos elementos constantes nos autos relativos ao nº (…), com o ofício de fls. 7.716/8 a Vodafone, em 5/08/03, remeteu para os autos a informação que diz ter conseguido recuperar em relação ao nº (…), de 30/04/01 a 6/02/03, quer quanto a registos de chamadas, quer quanto a localizações celulares, comunicando que o que não constar no suporte enviado (disquete) é porque não foi possível recuperar ou encontrar (Cfr. Fls. 7.748, elementos da Disquete que se encontra no Apenso BR, sobrescrito 4, e que se encontram na cópia feita em CD-R pelo tribunal). Com o ofício de fls. 9.130/2, a Vodafone enviou em 16/9/03 - na sequência da notificação que lhe fora feita pelo Tribunal em 14/7/03 e dos elementos enviados a fls. 7.716 -, os elementos que recuperou relativos a chamadas de 22/01/03 a 23/01/03, com BTS das chamadas efectuadas (cfr. Fls. 9.130/2, elementos constantes das 3 disquetes remetidas pela Operadora, das quais foi feita cópia em CD R pelo Tribunal – 3 CDs, que estão identificados como “CD 3”, “CD4” e “CD 5” – e que se encontram no Apenso BR, Sobrescrito 3, sendo o ficheiro referente o (…) o identificado como “ Disq. Fich. Chamadas nº 8” – CD nº 4 -, nº (…) de 22/1/03 a 23/1/03, com BTS das chamadas efectuadas). Com o ofício de fls.14.430/1, a Vodafone enviou em 5/01/04 – e na sequência do enviado em 5/08/03 e 12/11/03 e por tais elementos estarem incompletos -, mais elementos que recuperou relativos ao período de 1/1/98 a 20/05/05 e de 2/01/98 a 30/05/99 (cfr. fls.14.430/1; fls. 14.435, cota a consignar agrafado na contracapa a disquete do ofício de fls. 14.433, mas que foi rectificado a paginação para fls. 14 430; fls. 14 443, cota de entrega da disquete no DIAP; estando a Disquete no Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 18 e tendo sido feita cópia em CD-R pelo Tribunal, contendo quanto ao nº (…), Chamadas entre 1/1/98 e 20/05/00, com nº Chamador, Chamado, IMEI chamador, localização chamada e BTS chamador; e ainda quanto ao nº (…), chamadas entre 2/1/98 e 30/05/99, sem localização de chamadas, BTS ou indicação de IMEI, havendo que notar que resulta da análise do documento, que está trocada a identificação das colunas). Comunicou a Vodadfone que com o envio destes elementos, deu integral cumprimento ao que o tribunal lhe tinha ordenado e notificado em 14/07/03 e 8/10/03. 3. Na sequência das declarações que prestou – e face aos elementos que resultavam dos documentos dos autos – foram pedidos vários esclarecimentos ao arguido, quanto a números de telefone (cartões) que estavam relacionados com os aparelhos que reconheceu ser seus (IMEIS) ou vice versa, quanto a aparelhos (IMEIS) em que os números (cartões) que reconheceu ser seus ou ter usado, foram utilizados. Assim e fazendo um resumo tão conciso quanto possível: (1) (nº (…)) Na audiência de julgamento de 16/02/05 esclareceu não conhecer o nº (…) e que a referência a tal número deveria dever-se a um erro de simpatia, pois a IIM tinha o nº (…). Esclareceu nunca ter utilizado este cartão, pois era o número do seu então sócio. (2) (nº (…)) Na audiência de julgamento de 16/02/05, perguntado se conhecia o nº (…), deixou a resposta para mais tarde. De acordo com os elementos dos autos, fls. 2.629, documento remetido pela Vodafone, este nº (…) foi activado em 16/02/200 e esteve até 27/07/2001 em nome de FFA, (…). A partir de 4/10/02 passou a estar associado a um produto Vitamina, relativamente ao qual não foram fornecidos à Operadora dados de identificação do titular. O arguido H, na audiência de julgamento de 21/02/05, declarou que o número nada lhe dizia e dos elementos que consultou também não conseguiu obter mais elementos, tendo “colocado” a hipótese de se tratar de um cartão usado nas mesmas circunstâncias em que eventualmente terá usado outros – e isto são palavras utilizadas pelo arguido e que o Tribunal está a reproduzir -. Na audiência de julgamento de 8/05/09 o Tribunal – e em parte, mas não unicamente, para esclarecer o sentido das declarações prestadas anteriormente pelo arguido quanto ao nº (…)-, perguntou ao arguido H se se lembrava de alguma vez ter usado nos seus telemóveis, nos aparelhos, algum cartão que estivesse associado “ a produtos vitaminas”, cartões que não tivessem identificação do titular e a resposta do arguido foi inequívoca: ele próprio não, só se a sua filha tivesse feito tal utilização, aquando de uma das situações em que o arguido diz ter-lhe emprestado telemóveis. Na audiência de julgamento de 1/6/09 esclareceu pensar que se tratava de um cartão dado à filha e que colocou no seu telemóvel para experimentar, para ver se estava em funcionamento. (3) (nº (…)) Na audiência de julgamento confirmou que o nº (…) era da sua mulher. Passemos a ver os IMEIS UTILIZADOS PELO ARGUIDO com o nº (…). 1. Como dissemos, em audiência de julgamento o arguido H declarou que o seu telemóvel é o nº (…), o qual utilizou desde 1997. Resulta dos elementos dos autos - cfr. Apenso S-L, fls. 113 a 137, onde consta a indicação dos IMEIS em que o cartão (…) efectuou chamadas entre 2/11/99 e 30/01/03; e cfr. Tb suporte informático no Apenso V, caixa 2, sobrescrito 1 e 36 - que o cartão nº (…) efectuou chamadas entre 2/11/99 e 30/01/03, nos seguintes IMEIS (cfr. em concreto fls. 113, do Apenso S-L, em que é dada para o nº (…) a Identificação de IMEI por nº de telefone “regulares”): 1. IMEI (…) - entre 02/11/99 a 21/12/99 - Nokia 8810 2. IMEI (…) - entre 02/11/99 a 20/03/00 - NoKia 9110 3. IMEI (…) - entre 21/12/99 a 21/12/99 - Nókia 6150 4. IMEI (…) - entre 21/12/99 a 23/01/00 .- Nókia 8810 5. IMEI (…) - entre 24/01/00 a 06/06/02 - Nókia 8850 6. IMEI (…) - entre 31/03/00 a 18/10/02 - Nókia 7110 7. IMEI (…) - entre 20/04/00 a 07/01/01 - Ericsson 1888 World 8. IMEI (…) - entre 08/11/00 a 17/02/01 - Ericsson R380s/R380sc 9. IMEI (…) - entre 10/04/01 a 11/04/01 - Siemens SL 45 10. IMEI (…) - entre 11/04/01 a 13/12/02 - Siemens SL 45 11. IMEI (…) - entre 12/05/01 a 04/06/01 - Ericsson R380s/R380sc 12. IMEI (…) - entre 01/12/01a 02/12/01 - FT SLF 1483A Motorola 13. IMEI (…) - entre 14/02/02 a 27/01/03 - Nokia 9210 14. IMEI (…) - entre 02/11/02 a 15/01/03 - Nókia D211 15. IMEI (…) - entre 03/11/02 a 03/11/02 - Nókia card Phone 2.0 16. IMEI (…) -entre 13/12/02 a 30/01/03 - Panasonic GD87, EB-GD87 a) Com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº “1.” , (Nokia 8810), estão registadas chamadas (cfr. fls. 115 do Apenso S-L, sendo que todas as fls. que se vão mencionar neste item dizem respeito a tal Apenso e Apenso V, Caixa 2, Sobrescrito 1): (fls. 115) com o nº (…) entre 4/10/99 e 28/10/99; com o nº (…) entre 2/11/99 e 21/12/99; (1) Não há elementos nos autos quanto a registo (específico) de titularidade do nº (…) e o arguido H declarou ao Tribunal, na audiência de julgamento de 8/5/09, que de memória o número não lhe era familiar. No entanto – e tal foi também posteriormente referido pelo arguido -, este nº (…) corresponde ao número do arguido nº (…), antes de alterada a numeração dos telemóveis, ocorrida (pelo menos) em 1999 e que abrangeu todas as redes. Mas, como podemos ver pela análise dos documentos do IMEI (…)- cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 122; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1 -, o cartão nº (…) começou a ser utilizado nesse IMEI em 24/07/99, mais de dois meses antes de ter começado a se utilizado no IMEI (…) que estamos a tratar e prolongando-se o registo de utilização neste IMEI até 12/09/99. E como podemos ver pela análise dos documentos do IMEI (…) - cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 116; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1 -, o cartão nº (…) também foi utilizado neste (terceiro) IMEI, tendo registado o início de utilização em 31/8/99, prolongando-se até 28/10/99. Só em 4/10/99 começou a ser utilizado no IMEI (…) que estamos a tratar. Assim, o cartão nº (…) começou a ser utilizado noutros dois equipamentos – distintos do que agora estamos a tratar -, em data anterior aquela em que é activado este IMEI (…) e continuou a ser utilizado num desses IMEI (no IMEI (…)) , em data posterior aquela em que foi activado no IMEI (…) que estamos a tratar. Se foi utilizado em data anterior à activação deste IMEI (…), num outro equipamento e se continuou a ser utilizado num desses equipamentos (por exemplo, no IMEI (…)) , em data posterior aquela em que foi activado no IMEI (…) que estamos a tratar, quer dizer que o cartão andou a passar de aparelho para aparelho. Podia-se equacionar a hipótese de tal ter-se devido a troca de aparelhos por avaria, pois o arguido referiu a situação de equipamento que após a aquisição se verificou ter avariado e foi trocado por outro. Mas o cartão nº (…) tem registado, como vimos e em três equipamentos diferentes, utilização entre 24/07/99 e 28/10/99, o que não nos parece compatível com tal hipótese. De facto, sucede que o equipamento/IMEI (…) tem registada a utilização do cartão do arguido nº (…) entre 20/04/00 e 7/01/01 e o registo da primeira utilização do cartão nº (…) neste IMEI – e que corresponde à primeira utilização do cartão em qualquer um dos três IMEIS que já identificámos – ocorreu em 24/07/99, cerca de nove meses antes. Acresce que o cartão nº (…) foi utilizado no aparelho/ IMEI (…) pelo arguido durante o período de 4/10/99 a 28/10/99, mas foi também utilizado noutros dois equipamentos, em data anterior aquela em que é activado este IMEI (…) (e sendo que no IMEI (…), o cartão continuou a ser utilizado em data posterior aquela em que foi activado no IMEI (…) que estamos a tratar). E sucede que nos dois equipamentos/IMEI (…) e IMEI (…) - em que cartão nº (…) foi utilizado em data anterior aquela em que se deu o início da utilização, pelo arguido, do equipamento/IMEI (…) e do seu cartão nº (…) nesse equipamento -, há também o registo de utilização do cartão nº (…) do arguido. Assim, no IMEI (…), a utilização do nº (…) ocorreu entre 2/11/99 e 20/03/00 (sendo que o nº (…) tem registada utilização entre 31/8/99 e 28/10/99; estando também registada neste IMEI a utilização do nº (…) entre 18/02/02 e 20/02/02, número este que o arguido H, em audiência de julgamento, declarou ser da sua mulher e utilizado por ela - havendo o elemento de fls. 11.787 da Vodafone, do qual resulta que a titularidade inscrita em nome de H, de 24/1/98 a 7/03/98 e de CCF, desde 7/03/98). E no IMEI (…), a utilização do nº (…) ocorreu entre 20/04/00 e 7/01/01 (sendo que o nº (…) tem registada utilização entre 24/07/99 e 12/09/99). Acresce que o arguido declarou em audiência de julgamento e disse-o de forma expressa e segura na audiência de 8/05/09, por um lado, que não tinha o hábito e não o fazia, de andar a retirar o cartão nº (…) do telemóvel que usava normalmente e colocá-lo em telemóveis terceiros, para fazer chamadas. E quanto ao retirar e mudar o cartão de equipamento/telemóvel disse que o podia fazer – ressalvando é claro uma situação de avaria -, para experimentar um equipamento/telemóvel novo que lhe tivesse sido oferecido ou que tivesse comprado. Tais declarações, conjugadas com a distância temporal que vai entre a data em que está registado o início de activação dos IMEIS (…), (…),(…) e a utilização pelo arguido, nesses telemóveis, do cartão nº (…) e do cartão nº (…) , conjugada com a frequência e ordem de utilização pelo arguido desses IMEIS/equipamentos para fazer chamadas - e que resulta, por exemplo, do registo de chamadas do nº (…) constantes do registo de chamadas constantes do Apenso V, Caixa 2, Sobrescrito 36 , em que vemos que são equipamentos/IMEIS com os quais o arguido fez chamadas e utilizou o seu cartão nº (…) com continuidade, com frequência -, levam o Tribunal: - a concluir e criar a convicção que qualquer um destes aparelhos a que corresponde os IMEIS (…), (…) e (…), foram aparelhos em relação aos quais o arguido tinha o domínio da utilização, eram aparelhos que eram utilizados por si, em momentos intercalados; b) Com o IMEI (…) – acima identificado sob o nº 2 (NoKia 9110) -, estão registadas chamadas (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 116; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): (fls. 116) com o nº (…) entre 20/8/99 e 20/08/99; (fls. 116) com o nº (…) entre 31/8/99 e 28/10/99 (fls. 116) com o nº (…) entre 7/9/99 e 7/9/99 (fls. 116) com o nº (…) entre 2/11/99 e 20/03/00 (fls. 116) com o nº (…) entre 18/02/02 e 20/02/02 (1) O IMEI começa a ser utilizado em 20/08/99 com o nº (…), o qual só o utiliza nesse dia. Dos autos não consta a identificação da titularidade deste cartão nº (…), mas na audiência de julgamento de 1/06/2009 o arguido disse ao Tribunal pertencer à assistência técnica da rede móvel. O tribunal procurou nos autos outros registos referentes a este nº (…), concretamente o registo de outros IMEIS com que tivesse sido utilizado e não encontrou. Seguindo os registos da activação deste telemóvel, só em 2/11/00 é que há o registo da primeira utilização deste IMEI (…) com o cartão do arguido nº (…) e o nº (…) – que a fls. 11.787 consta a titularidade registada de 24/01/98 a 7/03/98 em nome de H e desde 7/03/98 em nome de CCF, tendo o arguido confirmado nas suas declarações, na audiência de julgamento de 21/02/05, que era o número da sua mulher -, só começa a utilizar este IMEI em 18/02/02 e por três dias. (1.1.) Em 1/08/99 é utilizado neste IMEI o nº (…), número este que tem registada a última utilização em 28/10/99. Como vimos na alínea anterior, o nº (…) é o número do arguido antes da alteração da numeração em 1999. - entre 24/07/99 e 12/09/99 é também utilizado no IMEI (…), onde o cartão do arguido nº (…), também foi utilizado entre 20/04/00 e 7/01/01; e - entre 4/10/99 e 28/10/99 é também utilizado no IMEI (…), onde o cartão do arguido nº (…) também foi utilizado entre 2/11/99 e 21/12/99. 1.1. Em 7/09/99 é também utilizado neste IMEI o nº (…), número este que só tem registada a utilização neste dia. Também não há registo nos autos da titularidade do nº (…), sendo que o único registo que existe quanto à utilização deste número é referente a este IMEI (…). 1.2. Em 2/11/99 é também utilizado neste IMEI o cartão do arguido nº (…), tendo o último registo em 20/03/00 1.3. Entre 18/02/02 e 20/02/02, portanto durante três dias, é também utilizado neste IMEI o cartão nº (…). De acordo com os elementos constantes dos autos – cfr. Fls. 11.787 – este cartão teve a titularidade registada de 24/01/98 a 7/03/98 em nome de H e desde 7/03/98 em nome de CCF. É o número que o arguido nas sua declarações, na audiência de julgamento de 21/02/05 disse ser da sua mulher (cfr., também, declarações da testemunha CCF). c) com o IMEI (…) – acima identificado sob o nº 3., como utilizado no dia 21/12/99, Nókia 6150 - funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 117; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) no dia 25/9/00. - nº (…) no dia 2/03/99. d) com o IMEI (…)– acima identificado sob o nº 4, como utilizado entre 21/12/99 a 23/01/00, Nókia 8810 – funcionou também o nº (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 118; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 25/1/00 e 26/1/00; e) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 5, como utilizado entre 24/01/00 e 6/06/02 , Nokia 8850 – funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 119 e 120; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 31/1/02 e 4/2/02 (o qual foi também usado com o IMEI de fls. 121, do Apenso S-L). - nº (…) entre 12/09/01 e 3/10/01 (o qual foi também usado com o IMEI de fls. 121, do Apenso S-L). - nº (…) entre 26/08/02 e 5/1/03. f) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 6, como utilizado entre 31/03/00 a 18/10/02, Nókia 7110 - funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 121; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 30/1/02 e 2/11/02 (o qual foi também usado com IMEI de fls. 119 do Apenso S-L). - nº (…) entre 11/5/01 e 15/5/01 (o qual foi também usado com o IMEI de fls. 119, do Apenso S-L). g) com o MEI (…) – acima identificado sob o nº 7, como utilizado entre 20/04/00 a 07/01/01, Ericsson 1888 World – funcionou também o nº (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 122; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 24/07/99 e 12/09/99. h) com o IMEI 520 249 690 112 730 – acima identificado sob o nº 8, como utilizado entre 08/11/00 a 17/02/01, Ericsson R380s/R380sc - funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 123 e 124; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 6/11/00 e 6/11/00 - nº (…) entre 12/10/01 e 7/6/02 - nº (…) entre 8/8/02 e 8/8/02 - nº (…) entre 7/8/02 e 7/8/02 ; i) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 9, como utilizado entre 10/04/01 a 11/04/01, Siemens SL 45 - funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 125 e 126; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 7/04/01 e 7/04/01. - nº (…) entre 14/7/02 e 17/7/02. j) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 10, como utilizado entre 11/04/01 a 13/12/02, Siemens SL 45 -, funcionaram também os nºs (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 127, 128, 129, 136, 137; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 13/12/02 e 31/1/03. - nº (…) entre 31/10/01 e 24/04/02 (o qual foi também usado com o IMEI de fls. 129, do Apenso S-L). l) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 11, como utilizado entre 12/05/01 a 04/06/01, - Ericsson R380s/R380sc - funcionou também o nº (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 127 e 136; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 20/06/01 e 19/09/01 (o qual foi tb usado com IMEI de fls. 127 e 136, do Apenso S-L). m) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 13, como utilizado entre 14/02/02 a 27/01/03, Nokia 9210 -, funcionou também o nº (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 131; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 18/01/03 e 19/01/03 (o qual foi também usado com IMEI de fls. 133 e 135, do Apenso S-L). n) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 15, como utilizado no dia 03/11/02, Nókia card Phone 2.0 - funcionaram também os nºs. (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 133; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 20/05/00 e 10/06/01 - nº (…) entre 3/3/02 e 26/9/02. o) com o IMEI (…) - acima identificado sob o nº 16, como utilizado entre 13/12/02 a 30/01/03 , Panasonic GD87, EB-GD87 -, funcionaram também os nºs. (cfr. fls. 115 a 137 do Apenso S-L, identificação de nº de telefone por IMEI “regulares”, fazendo-se referência mais específica a fls. 131, 133, 134, 135; e Apenso V, Caixa 2, sobrescrito 1, em relação a todos os números que se vão mencionar nesta alínea): - nº (…) entre 22/01/03 e 23/01/03 (o qual foi também usado com IMEI de fls. 131 e 133, do Apenso S-L). - nº (…), no dia 13/12/02. 2. Assim, para o Tribunal, resulta igualmente dos elementos do processo que entre 2/11/99 e 30/01/03, o arguido, para fazer chamadas com o seu cartão nº (…), utilizou e teve activos para utilização (pelo menos) dezasseis telefones (aparelhos/IMEIs). E utilizou ou teve activos para utilização, em alguns casos: - mais do que um telefone (aparelhos com IMEIS diferenciados) em períodos coincidentes e mantendo por vezes o seu “uso” ou “disponibilidade para usar” por períodos dilatados; - telefones (aparelhos com IMEIS diferenciados) nos quais foram utilizados outros cartões que, em algumas situações, dos elementos dos autos resulta que a sua titularidade não estava em nome do arguido ou este não reconheceu em audiência de julgamento tê-los utilizado, embora outros tenha identificado a titularidade; - utilização esta de cartões de “terceiros” – e quando dizemos terceiros, estamos a referir cartões que o arguido ou não reconheceu, ou não reconheceu terem sido usados por si, ou expressamente declarou que não foram usados por si -, que em algumas situações ocorreu antes de o arguido ter começado a utilizar o cartão com o nº (…) ou qualquer outro que tenha reconhecido ter sido utilizado por si (mas tendo sempre presente as declarações do arguido, quanto à possibilidade de serem cartões da assistência técnica, aqueles que têm uma utilização limitada a um dia, por exemplo). 1.2.1. De facto - e sempre reportado à utilização do nº (…) e à utilização ou disponibilidade para utilização por parte do arguido de mais do que um telefone (aparelhos com IMEIS diferenciados) em períodos coincidentes e mantendo por vezes o seu “uso” ou “disponibilidade para usar” por períodos dilatados - temos que: Em 2/11/99 o arguido começa a usar dois telefones: o correspondente ao IMEI (…) e que utiliza até 21/12/99 (um Nokia 8810) e o correspondente ao IMEI(…), que utiliza até 20/03/00 (um NoKia 9110). Quando está a utilizar estes dois telefones - o IMEI (…) e o IMEI (…) -, faz chamadas durante o dia 21/12/99 com um terceiro telefone, o IMEI (…) (um Nókia 6150). Em 21/12/99 o arguido começa a utilizar um outro telefone , o IMEI (…), que utiliza apenas até 23/01/00 (um Nókia 8810). Mas há o registo de estarem activos três telefones: neste dia 21/12/99 há o registo da ultima chamada com o IMEI (…); há o registo de utilização nesse e durante esse dia 21/12/99, do IMEI (…); e está activo até 20/03/00 o IMEI (…). Em 24/01/00 – quando há o registo de estar activo até 20/03/00 o IMEI (…) e tendo terminado de utilizar na véspera o IMEI (…) -, o arguido começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 06/06/02 (um Nókia 8850). Em 31/03/00 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 18/10/02 (um Nókia 7110). Está também activo, até 6/06/02, o IMEI (…), mas tendo terminado em 20/03/00 a utilização do IMEI (…). Em 20/04/00 começa a utilizar o IMEI (…), o qual está activo até 07/01/01 (Ericsson 1888 World). Nesta altura estão também activos os IMEI (…) (até 06/06/02) e IMEI (…) (até 18/10/02). Em 8/11/00 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 17/02/01 (um Ericsson R380s/R380sc). Nesta altura estão também activos os IMEI (…) (até 07/01/01), o IMEI (…) (até 06/06/02) e o IMEI (…) (até 18/10/02). Em 10/04/01 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz apenas até 11/04/01 (um Siemens SL 45). Nesta altura estão também activos os IMEI (…) (até 06/06/02) e o IMEI (…) (até 18/10/02). Mas no dia 11/04/01 começa a utilizar um outro IMEI, o IMEI (…), o qual utiliza até 13/12/02 (um Siemens SL 45). Assim, no dia 11/04/01 estão activos os IMEI (…) (até 06/06/02), o IMEI (…) (até 18/10/02) e o IMEI (…) (até 13/12/02). No dia 12/05/01 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz apenas até 04/06/01 (um Ericsson R380s/R380sc). Mas estão activos o IMEI (…) (até 13/12/02), o IMEI (…) (até 06/06/02) e o IMEI (…) (até 18/10/02). No dia 1/12/01 e utilizando apenas até 2/12/01, começa a utilizar o IMEI (…) (um FT SLF 1483A Motorola). Mas estão activos o IMEI (…) (até 13/12/02), o IMEI (…) (até 06/06/02) e o IMEI (…) (até 18/10/02). No dia 14/02/02 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 27/01/03 (um Nokia 9210). Mas estão activos o IMEI (…) (até 13/12/02), o IMEI (…) (até 06/06/02) e o IMEI (…) (até 18/10/02). No dia 2/11/02 começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 15/01/03 (Nókia D211). Mas estão activos o IMEI (…) (até 27/01/03), o IMEI (…) (até 13/12/02). No dia 3/11/02 utiliza apenas e durante esse dia o IMEI (…) (Nókia card Phone 2.0). No dia 13/12/02 – já após o início dos relatos na comunicação social dos factos relacionados com a AX e que vieram a dar também origem a este processo -, começa a utilizar o IMEI (…), o que faz até 30/01/03 (Panasonic GD87, EB-GD87). Mas estão activos o IMEI (…) (até 15/01/03) e o IMEI (…) (até 27/01/03), o IMEI (…) terminou a utilização nesse dia 13/12/02 e a utilização do IMEI (…) foi apenas durante o dia 3/11/02. 1.2.2. E sempre reportado à utilização do nº (…) e à utilização ou disponibilidade para utilização por parte do arguido de: - telefones (aparelhos com IMEIS diferenciados) nos quais foram utilizados outros cartões que, em algumas situações, dos elementos dos autos resulta que a sua titularidade não estava em nome do arguido ou este não reconheceu em audiência de julgamento tê-los utilizado; - e utilização esta de cartões de “terceiros” (quando dizemos “terceiros” estamos a referir cartões que o arguido ou não reconheceu, ou não reconheceu terem sido usados por si, ou expressamente declarou que não foram usados por si ) que, em algumas situações, ocorreu antes de o arguido ter começado a utilizar nesses o cartão com o nº (…) ou qualquer outro que tenha reconhecido ter sido utilizado por si –, temos que: a) Em relação ao IMEI (…) (Nokia 8810), estão registadas chamadas: (fls. 115 do Apenso S-L, sendo que todas as fls. que se vão mencionar neste item dizem respeito a tal Apenso e Apenso V, Caixa 2, Sobrescrito 1) com o nº (…) entre 2/11/99 e 21/12/99; e (fls. 115) com o nº (…) entre 4/10/99 e 28/10/99; Como já dissemos, estes dois números são os do arguido. b) Em relação ao IMEI (…) (NoKia 9110) chamadas (fls. 116) com o nº (…) entre 7/9/99 e 7/9/99 (fls. 116) com o nº (…) entre 31/8/99 e 28/10/99 (fls. 116) com o nº (…) entre 2/11/99 e 20/03/00 (fls. 116) com o nº (…) entre 18/02/02 e 20/02/02 (fls. 116) com o nº (…) entre 20/8/99 e 20/08/99; - C/ IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 21/12/99 a 21/12/99 Nókia 6150) chamadas (fls. 117) com o nº (…) entre 21/12/99 e 21/12/99 (fls. 117) com o nº (…) entre 25/9/00 e 25/9/00 (fls. 117) com o nº (…) entre 2/3/99 e 2/03/99 - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 21/12/99 a 23/01/00 .- Nókia 8810) chamadas (fls. 118) com o nº (…) entre 21/12/99 e 23/1/00 (fls. 118) com o nº (…) entre 25/1/00 e 26/1/00; - C/ IMEI (…) (repetido em cima como utilizado entre 24/01/00 e 4/06/02, Nokia 8850) chamadas (fls. 119) com o nº (…) entre 31/1/02 e 4/2/02 (usado tb com IMEI de fls. 121) (fls. 119) com o nº (…) entre 24/01/00 e 6/6/02 (fls. 119) com o nº (…) entre 12/09/01 e 3/10/01 (usado tb com IMEI de fls. 121) (fls. 120) com o nº (…) entre 26/08/02 e 5/1/03 - C/IMEI (…(repetido em cima, como utilizado entre 31/03/00 a 18/10/02 - Nókia 7110) chamadas (fls. 121) com o nº (…) entre 30/1/02 e 2/11/02 (usado tb com IMEI de fls. 119) (fls. 121) com o nº (…) entre 31/3/00 e 18/10/02; (fls. 121) com o nº (…) entre 11/5/01 e 15/5/01 (usado tb com IMEI de fls. 119) - C/IMEI (…)(repetido em cima, como utilizado entre 20/04/00 a 07/01/01 - Ericsson 1888 World) chamadas (fls. 122) com o nº (…) entre 24/07/99 e 12/09/99 (fls. 122) com o nº (…) entre 20/04/00 e 7/01/01; - C/IMEI (…(repetido em cima, como utilizado entre 08/11/00 a 17/02/01 - Ericsson R380s/R380sc) chamadas (fls. 123) com o nº (…) entre 6/11/00 e 6/11/00 (fls. 123) com o nº (…) entre 8/11/00 e 17/02/01 (fls. 124) com o nº (…) entre 12/10/01 e 7/6/02 (fls. 124) com o nº (…) entre 8/8/02 e 8/8/02 (fls. 124) com o nº (…) entre 7/8/02 e 7/8/02 ; - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 10/04/01 a 11/04/01 - Siemens SL 45) chamadas (fls. 125) com o nº (…) entre 7/04/01 e 7/04/01 (fls. 125) com o nº (…) entre 10/4/01 e 11/04/01; (fls. 126) com o nº (…) entre 14/7/02 e 17/7/02 - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 11/04/01 a 13/12/02 - Siemens SL 45; e tb repetido Identificação de IMEI por nº de telefone “vitaminas” (…), com utilização entre - 18/10/01 a 24/01/02 - Siemens SL 45) chamadas (fls. 127) com o nº (…) entre 11/4/01 e 13/12/02; ( fls. 128) com o nº (…) entre 18/10/01 e 24/1/02 ( fls. 128)(fls. 137) com o nº (…) entre 13/12/02 e 31/1/03 (fls. 127, fls. 136) com o nº (…) entre 31/10/01 e 24/04/02(!) (usado tb com IMEI de fls. 129) - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 12/05/01 a 04/06/01 - Ericsson R380s/R380sc) chamadas (fls. 129) com o nº (…) entre 20/06/01 e 19/09/01 (!) (usado tb com IMEI de fls. 127 e 136) ( fls. 129) com o nº (…) entre 12/05/01 e 4/06/01; - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 01/12/01a 02/12/01 - FT SLF 1483A Motorola) chamadas (fls. 130) com o nº (…) entre 1/12/01 e 2/12/01; - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 14/02/02 a 27/01/03 - Nokia 9210) chamadas (fls. 131) com o nº (…) entre 18/01/03 e 19/01/03(!)(usado tb com IMEI de fls. 133 e 135) (fls. 131) com o nº (…) entre 14/02/02 e 27/01/03; - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 02/11/02 a 15/01/03 - Nókia D211) chamadas (fls. 132) com o nº (…) entre 2/11/02 e 15/01/03; - C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 03/11/02 a 03/11/02 - Nókia card Phone 2.0) chamadas (fls. 133) com o nº (…) entre 20/05/00 e 10/06/01 (fls. 133) com o nº (…) entre 3/3/02 e 26/9/02(!) (fls. 133) com o nº (…) entre 3/11/02 e 3/11/02; -C/IMEI (…) (repetido em cima, como utilizado entre 13/12/02 a 30/01/03 - Panasonic GD87, EB-GD87) chamadas (fls. 135) com o nº (…) entre 13/12/02 e 30/01/03 (fls. 135) com o nº (…) entre 22/01/03 e 23/01/03 (usado tb com IMEI de fls. 131 e 133) (fls. 134) com o nº (…) entre 13/12/02 e 13/13/02 (ver tb. fls. 1088, of Vodafone, Ap V, caixa 2, sobrescrito 1)(fls. 2. 629 e 13.161, Vodafone: de 16/02/00 a 27/07/01, titular FFA, (…); a partir de 4/10/02, associado a produto vitamina e não há dados do titular;) O significado desta análise é o que já dissemos: o arguido utilizou ou teve activos para utilização, em alguns casos: mais do que um telefone (aparelhos com IMEIS diferenciados) em períodos coincidentes e mantendo por vezes o seu “uso” ou “disponibilidade para usar” por períodos dilatados. 8. Dos factos relativos ao conhecimento entre o arguido E e H: O arguido E não prestou declarações na presente audiência de julgamento (tendo requerido, como referido noutro momento da presente análise crítica da prova, a leitura pontual de declarações prestadas perante J.I.C., e nas precisas circunstâncias em que o requereu). Pelo que, por si, nada sabemos quanto ao conhecimento do arguido H. Mas o arguido H, quanto ao conhecimento do arguido E, disse ao Tribunal não conhecer o arguido, mas “... admito como verdadeira a versão do Sr. (…), de que me foi apresentado em 1975 (mil novecentos e setenta e cinco), em Nova Iorque, enquanto eu desempenhava as funções de (…), da (…) ... e que durante uma Assembleia Geral ele terá lá estado e que me foi apresentado....”. E acrescentando “...e primeiro digo que admito como verdadeira, primeiro não tenho a mínima razão para duvidar da palavra do Sr. (…) ... mas porque mesmo assim eu não tenho ideia e quando vi na televisão como o começo deste processo, não consigo recordar a cara do Sr. (…) E nem em Nova Iorque, nem em qualquer outro sítio ... nunca soube tão pouco onde ele morava...”, esclarecendo que a conversa que o arguido E tivera consigo , ocorrera já no decurso deste processo. Neste momento convocamos as explicações que o arguido deu quanto ao “processo de 1984” e que atrás já referimos, em que o arguido disse que foi ao DIAP prestar declarações, mas na altura não procurou saber quem era o dono da casa na qual era referido que tinha estado, com menores. Para o Tribunal, tendo em atenção a matéria que estava em causa - e partindo da declaração do arguido que nada tinha a ver com aquela situação -, mesmo considerando que era uma altura em que a criminalização de actos praticados com menores, rapazes, em alguma medida era desvalorizada face ao quadro actual, não é um comportamento normal, face ao que já era o percurso profissional do arguido nesse momento - como disse tinha estado em Nova Iorque a desempenhar funções, que implicavam o contacto com diplomatas -, não ter tido qualquer contacto com o diplomata (ou pessoa que já exercia funções nessa área) dono da casa em que “diziam” que tinha estado, com jovens rapazes. Para esclarecer, para perceber o que se passava. No entanto esta é a perspectiva do Tribunal . O arguido teve outra reacção, como disse ao Tribunal, que foi preferir o confronto com o “rapaz” que dizia que os factos se tinham passado - seria uma acareação no processo, eventualmente -, o que não se concretizou, pois ter-lhe à sido dito pelo inspector ou inspectora que não haveria base para o processo seguir. A testemunha XU - que foi apresentada pelo arguido E , quanto aos locais onde viveu - declarou ao tribunal que numa altura em que o seu marido ainda era vivo o arguido H foi ao prédio da (...) (…) (local referido na análise da vivência do arguido E), para ver o (…)º andar que estava à venda, prédio este onde o arguido E vivia na altura. No entanto não deu a percepção de que os arguidos se conhecessem, ou que tivesse tido essa sensação, nem que o arguido H tivesse ido ver o andar por indicação do arguido E. 9. Tratando outro aspecto dos que constituiu uma das linhas de defesa adoptadas (essencialmente ) pelos arguidos C, E, H, K, N e Q - em sede de contestação (uns), mas também audiência de julgamento e reafirmado em sede de Alegações -, temos a imputada manipulação que os arguidos dizem que foi feita neste processo, de pessoas, factos e testemunhos, com vista à criação de uma história, falsa, que veio a ser transportada para o Despacho de Pronuncia, imputando aos arguidos a prática de crimes. Seguindo as linhas de manipulação indicadas, o Tribunal procurou indícios e factos da possibilidade de a polícia judiciária ter criado ou ter ajudado a criar e ter feito crescer esta “história”. E da possibilidade - e efectividade - de as pessoas que foram identificadas como vítimas nestes autos, terem igualmente indo criando uma história - à medida que se encontravam ou que saiam notícias na comunicação social - , uns conscientemente e a que outros foram aderindo inconscientemente, movimento em que - para os arguidos que defendem esta linha - foi relevante a perspectiva que os jovens tiveram de um “ganho secundário”, podendo traduzir-se este ganho (apenas) em “notoriedade” - que foi estatuto que estes assistentes, enquanto jovens internados na AX naturalmente não tinham - ou mesmo a expectativa de ganharem indemnizações. Ponderou estas hipóteses e daí ter permitido, em algumas situações, amplitude com esse objectivo nas instâncias às testemunhas ou nas declarações dos assistentes ou dos arguidos. Ver, por exemplo, a amplitude que foi dada aos Sujeitos Processuais na audição dos assistentes; a amplitude que foi dada na inquirição de testemunhas, como foi o caso - e a título meramente de exemplo, dado o número de testemunhas ouvidas nestas circunstâncias, com a amplitude de instância pedida pelos sujeitos processuais, para tentar despistar ou encontrar o facto da “manipulação -, da testemunha SG, dos inspectores da Polícia Judiciária, da testemunha Dr. LF, da testemunha Dr. NC, da testemunha Dr. QT; a amplitude que foi dada nas instâncias aos assistentes, com a permissão de referências (em relação a práticas de actos de natureza sexual com quem estava a depor; ou do conhecimento da prática de actos de natureza sexual com assistentes destes autos) a nomes que não fossem expressamente referidos no despacho de pronúncia, para que as declarações dos assistentes ou testemunhas não perdessem espontaneidade, caso fizesse parte da normal dinâmica do respectivo discurso essas referências. Vejamos então. 9.1. (Da imputada manipulação pela Polícia Judiciária; da sua contribuição para a criação de uma história). Dissemos que um dos aspectos sob o qual foi configurada a criação de uma história vertida para a acusação e posteriormente para o Despacho de Pronúncia, foi através da actuação da Polícia Judiciária. Por isso o Tribunal analisou os depoimento dos inspectores da Polícia Judiciária - que em audiência de julgamento foram interrogados e contra interrogados -, sendo que na motivação que vamos expor englobaremos, desde já, referências que embora não sejam imprescindíveis para a análise sob a qual, neste momento, estamos a tratar os depoimentos, são relevantes para outros segmentos ou núcleos de factos, especialmente quando relacionados com o tratamento dos depoimentos dos assistentes, sua credibilidade e veracidade. E analisando os depoimentos prestados perante o Tribunal, com o mencionado objectivo de despistar e isolar indícios da possibilidade ou da eventualidade de contribuição dos Inspectores da Polícia Judiciária, com os actos e diligências que efectuaram na fase de Inquérito - os quais identificam a qualidade e quantidade das intervenções que tiveram no processo; e configurando-se também aqui, que o “contributo” possa ter sido consciente ou inconsciente -, para a criação de uma “historia” vertida na Acusação e posteriormente no Despacho de Pronúncia, as conclusões do tribunal foram as seguintes: (1) A testemunha Inspectora PF, por força das suas funções teve intervenção na fase de inquérito deste processo entre 25 de Março de 2003 até final de 2004. Participou na busca feita a casa da testemunha HD, do arguido C e do arguido E (cfr. Auto de busca de fls. 4.487). Prestou um depoimento que para o Tribunal aparentou ser feito de forma serena, sem denotar subjacente interesse especifico ou próprio nos presentes autos e no seu resultado, dizendo quando não se recordava de diligência ou de aspecto específico de diligência e mantendo esta coerência ao longo do depoimento. Quando deparava com alguma situação que não se recordava ter ocorrido, se documentalmente se verificava nos autos que tinha acontecido essa situação ou diligência e a testemunha era confrontada com o auto ou documento respectivo, esclarecia o que entretanto se recordava, não tendo o Tribunal ficado com a convicção de a testemunha estar a ocultar algum facto ou diligência ao tribunal, ou a prestar depoimento com determinado intuito que não fosse o de exercer o seu dever como testemunha. A testemunha foi questionada - em sede de interrogatório/contra interrogatório das Defesas - quanto à sua experiência profissional e de todo o seu depoimento, face aos elementos que globalmente constam nos autos, o Tribunal não ficou com a ideia de deficit de competência profissional ou inadequação para a intervenção nos actos em que participou nos presentes autos (cfr, a titulo de exemplo fls. 4.487, 12.824). Nem houve, para o tribunal, o conhecimento de facto que levasse a concluir que a sua actuação tivesse condicionado - por ter omitido diligência que lhe tivesse sido determinada, por ter feito diligência com violação dos deveres de obediência à lei que estão inerentes ao exercício da sua função, ou por ter praticado acto com intuito de defender interesse específico de alguém - ou prejudicado a descoberta da verdade material em audiência de julgamento. Esclareceu a forma como decorreram as inquirições que fez a testemunhas educandos da AX, no que diz respeito à deslocação e logística da audição das testemunhas, esclarecendo que o critério, em regra, foi o de não trazer crianças do mesmo lar ao mesmo tempo, tendo o cuidado de as testemunhas a ouvir não contactarem entre si nas instalações, por razões que o Tribunal depreendeu estarem ligadas à intenção de ouvir cada um ao que sabia e como sabia. Esclareceu qual a intervenção dos Inspectores BZ e CCU nas inquirições, dizendo que presidiam aos autos, mas afastando intervenção directa destes inspectores no conteúdo da inquirição. Ainda no que diz respeito à forma como foram feitas as inquirições - e o Tribunal faz esta referência tendo em atenção a linha de defesa, pelo menos, dos arguidos K e H -, esclareceu que quando ia fazer uma inquirição de algum jovem que já fora inquirido anteriormente, tinha indicação das Chefias (Inspectora CCU ou Inspector BZ) do conteúdo das declarações anteriores, mas não foi precisa, por não se recordar, se tinha efectivamente cópia ou certidão das declarações anteriores ou apenas uma súmula feita pelas Chefias. É certo que disse que quanto à “credibilidade” dos depoimentos que ouviu, para si existia. Esclareceu que era a “sua convicção” e apenas esse e nesse sentido o tribunal deu relevância à sua declaração - a qual foi feita na sequência de interrogação que, sobre tal convicção, foi feita (pelo menos) pela Defesa do arguido H, como linha de defesa e necessária à sua Defesa -. Mas também esclareceu que as diligências que fossem necessário fazer, na sequência dessas inquirições, cabia à chefia decidir. O que para o Tribunal criou a convicção que a testemunha, Inspectora PF, não tinha o domínio ou autonomia em relação à direcção do inquérito, não tendo resultado indícios para o Tribunal – e avaliando também a forma como a testemunha falou, como se exprimiu, sempre com expressão facial serena -, que essa sua “convicção” quanto ao que ouviu das pessoas identificadas como vítimas, contribui para influenciar ou manipular a investigação. Acresce que ao Tribunal aparentou ser (também) genuína a sua declaração que, em relação aos arguidos, tinha uma posição de neutralidade e limitava-se a proceder ás investigações que lhe eram determinadas. Não era a testemunha que fazia confrontações entre depoimentos de testemunhas ou declarações de arguidos, para determinar as estratégias ou vértices de investigação . Essa avaliação era feita pelas chefias, facto ou procedimento que o Tribunal ficou convicto ser assim, pelo confronto ou corroboração neste sentido do depoimentos dos demais inspectores, a título de exemplo a testemunha Inspector EEC. (1.1) Quanto aos “reconhecimentos de locais” em que participou, esclareceu que as referências que constam nos autos de reconhecimento quanto aos locais onde foram, de onde partiram ou por onde seguiram, resulta de indicações que foram dadas pelas pessoas que iam fazer os reconhecimentos. E que a ordem que consta nos autos é a ordem pelos quais foram feitos os reconhecimentos, tendo sido especificamente confrontada e prestado esclarecimentos quanto ao auto de fls. 12.824 (datado de 27/11/03) com o Assistente AV. Aqui especificou que quando a testemunha que estava a fazer o reconhecimento dizia “vamos tentar por ali” ou “por aqui”, isso não escreviam ou pelo menos não o faziam sempre. Esclarecendo isto, para o Tribunal tal forma de depor vai no sentido de reforçar a ausência de “interesse próprio” ou outro ligado a um “eventual êxito da acusação”, pois será esse “interesse” que está em causa na Defesas dos arguidos que enveredaram por esta vertente (a da manipulação das vítimas e consequentemente da Verdade, por parte da Policia Judiciária, de forma consciente por uns ou inconsciente por outros, consoante as situações, actuação esta concorrente, na perspectiva destas defesa, paras as imputações que lhes foram feitas na Acusação e pelas quais vieram a ser pronunciados). (2.) A testemunha Inspector EEC, exerceu funções no processo na fase de inquérito, de Janeiro de 2003 até ao fim do inquérito. Durante o seu depoimento foi uma constante o não recordar-se de pormenores de diligências. Fez uma diligência de deslocação a (…) com o Assistente AV, tendo ido também os Inspectores BZ e Inspector AAY, tendo esclarecido estar convicto que foi a primeira vez que foi a (…) no âmbito da investigação deste processo. Não conseguiu recordar-se dos pormenores da diligência – se o Assistente AV indicou o caminho de (…) até (…) ou se partiram de um ponto específico. Mas recordava-se que AV já estava no EEY pois foi de lá que disse recordar-se - embora com algumas reservas por não ter demonstrado certeza absoluta - terem saído para a diligência e que o colega AAY ia também consigo. Inquirido pelo Ilustre mandatário do arguido H, quanto ao facto de não se conseguir recordar de pormenores destes “…num processo tão importante de uma diligência tão importante…”, pois era a primeira vez que levavam AV a (…) para fazer um reconhecimento, deu a resposta justificando o número de processo que, na altura da inquirição do assistente AV, tinha em mãos, que o número de diligência que faz (e fez) neste processos e nos demais é tão grande que não se recorda dos pormenores. Esclareceu que não se estava a “defender” de qualquer problema de memória, o número de diligências é que não lhe permitiram recuperar mais do que o que disse ao tribunal. Por a questão da “primeira” ida a (…) com AV (no caso concreto) ter sido uma questão insistente e recorrente – por estar relacionada com a estratégia de Defesa dos arguidos - esclareceu que a ideia que teve é que aquela diligência foi a primeira vez que AV foi a (…) no âmbito do inquérito. Assim, quando confrontado com o auto/documento de fls. 583, último parágrafo, esclareceu que não teve conhecimento desta diligência, acrescentando que não teve conhecimento de “inúmeras” diligências que foram feitas no processo, pois era-lhe atribuídas tarefas para serem cumpridas e que executava, mas “... tendo a certeza...” que foram também feitas inúmeras diligências por outros colegas, das quais contudo não teve conhecimento concreto. Confrontado com o percurso que consta no auto de fls. 1.466 - confirmou que esteve neste auto, apesar de por lapso não estar lá o seu nome - e de fls. 8.366, quanto aos percursos feitos com A e AV. Após ter analisado os autos esclareceu que o início (o ponto de partida) dos reconhecimentos são diferentes, mas começa a ser igual a aprtir do momento em que é referido (...) (…). O que em Aj veio a ser verificado olhando para Planta fls. 1.477 ou 1.467 , que foram reconhecimentos em que nos reconhecimentos como a testemunha disse, “ um entrou por um lado” e outro por outro. Participou ainda na busca efectuada a casa da arguida Q, não se lembrando de particulariddaes desta busca. Foi igualmente com o arguido A a (…) para fazer o reconhecimento a que se refere fls. 8.362, em 28/08/03, tendo esclarecido que não se recordava dos pormenores da diligência, mas concluido dizendo que a memória que tem é que foi o arguido A que indicou o caminho desde o “início” de (…) até casa da arguida Q . E sendo claro quanto ao facto de não ter sido dada qualquer indicação por si ou seu colega ao arguido A. Foi também ao prédio sito na Av (…) com AV e depois com A, sendo que desta diligência, quando perguntado sobre porque porte ou como entraram no prédio não se recordar. Quanto a estas diligências teve um registo uniforme: lembra-se da diligência quanto ao seu objecto em si, mas não se recordando globalmente dos pormenores das diligências de reconhecimento, concretamente quanto a indicações de percursos por de AV ou do arguido A. Esclareceu que nas inquirições feitas por si não houve intervenção dos inspectores CCU ou BZ, pois consigo não aconteceu entraram na sala onde a testemunha estivesse a fazer inquirições e sugerirem perguntas Também em relação a este Inspector o Tribunal ficou com a convicção que cumpriu as funções e diligências que lhe foram determinadas, não aparentou ter intervenção directa na escolha de diligência a fazer – esclareceu que a filmagem da (...) (…), foi o Inspector BZ que disse para o fazer , tendo mesmo esclarecido que “ num processo normal é o titular que junta o expediente ao processo, mas aqui não saber como foi feito, pois conclui-se das suas declarações que não foi decisão ou tarefa executada por si. não era o titular e não tinha o domínio do. Foram palavras suas que lhe eram-lhe atribuída tarefas e executava-as. Fez um depoimento com um registo sempre muito igual, calmo, com o registo que já foi referido de recordo-me de diligência não me recordo de pormenor de diligência, mas com situações em que ao ser confrontado com determinado documento ou auto, se se lembrava de algum pormenor esclarecia-o. Também em relação a esta testemunha a Defesa do arguido H pediu esclarecimentos quanto à sua experiência profissional. A testemunha esclareceu que antes de ter sido colocado por ordem do Director Nacional da PJ na brigada que investigou os factos objecto deste processo, estava na brigada que investigava os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, mas fazia a área do tráfico de pessoas e homicídio agravado. Para a testemunha a maioria das diligências que executou neste processo foram comuns ás das outras áreas de investigação. Quanto às inquirições, especificamente em relação ao abuso sexual de menores não lhe foram indicados procedimentos específicos ou metodologia. Para se prepara para as entrevistas que fez a testemunhas, falou com colegas mais antigos e com experiência na área em causa. Não se recorda em concreto como é que as chefias fizeram consigo a preparação da inquirição de testemunhas identificadas como vítimas, mas recorda-se que teve reuniões com o Inspector BZ e Inspectora Dra. CCU, recorda-se que teve acesso ao historial das pessoas identificadas como vítimas, mas não conseguindo concretizar mais. Quanto a um auto de fls. 31, que foi aberto na AJ de 29/06/06 exclusivamente para identificação das pessoas que presidiram/executaram a diligência, auto este que teve lugar em 27/11/02 e portanto em data anterior aquela em que a testemunha dissera que começara a participar na brigada, esclareceu que o fez por ordem do sr. Director nacional (...), Sr. Dr. LF, por a testemunha pertencer como dissera à 2ª Secção que investigava lenocínio e Tráfico de pessoas, e foi fazer o auto por ordem do identificado Sr. Director. Esclarecido o que, no início da instância do ilustre mandatário do arguido poderia parecer/parecia alguma coisa diferente. (3) A testemunha Inspector CF também, ao longo do seu depoimento, por várias vezes respondeu não se recordar de actos em que, de acordo com os documentos autos constantes dos autos tinha participado. No entanto, nas quatro sessões em que foi ouvido – embora, essencialmente, nas três primeiras sessões - demonstrou coerência na sua atitude perante o tribunal, pois continuou a dizer quando não se recordava, que não se recordava; quando, depois de ler um auto, a sua memória ficava avivada dizia-o e explicava aquilo de que se lembrava, o que fez de uma forma que, ao Tribunal aparentou ser genuína. Isto é, não aparentou ao tribunal que quando a testemunha dizia “ não me recordo”, se estava a refugiar numa forma relativamente fácil de se esquivar a qualquer resposta pois, por vezes, os esclarecimentos pedidos pelos sujeitos processuais naturalmente punham em causa a forma como a testemunha executou actos processuais na fase do inquérito pondo, em consequência, em causa a qualidade do desempenho profissional da testemunha. Ou que, com essa resposta “ não me recordo”, se estava a esquivar a assumir a sua responsabilidade profissional perante autos que a Defesa pôs em causa, como “estando mal feitos”, ou aqueles que o Ministério Público também referiu como necessitando aperfeiçoamento, para melhor contribuírem para o esclarecimento da verdade, ou aqueles em que, potencialmente, tivesse havido algum erro quanto à hora de início das diligências ou ordem das diligências. Por exemplo, de uns e outros - “defeitos” apontados pelos sujeitos processuais; autos com eventual errada descrição da ordem dos reconhecimentos ou diligências; ou de autos qualificados como mal feitos” para algumas Defesas -, foi apontado à testemunha o facto de os autos não terem as horas de início e de terminus das diligência de reconhecimentos de locais, ou a descrição prévia por parte do assistente/testemunha do local ou dos acessos a local ou locais que iriam ser reconhecidos. E também a título de exemplo, de autos/documentos apontado pelos sujeitos processuais em Audiência de Julgmaneto - embora nem todos referidos pela razão de estarem “mal feitos” -, foram apontados e pedidos esclarecimentos à testemunha sobre os documentos constantes de fls. 179, 435, 1.117, 4.441, 4.440. Resultou do seu depoimento que criou alguma empatia com, pelo menos, um assistente que ouviu em declarações na fase do inquérito – o Assistente AN -, pois confirmou o que este Assistente dissera em AJ, que lhe pedira para pintar o quarto do seu filho que ia nascer, pois era a profissão do AN ou a área em que este trabalhava, pagando-lhe o trabalho. Mas também esclareceu que isto ocorreu numa altura em que a testemunha estava de baixa, por ter sido sujeito a uma intervenção cirúrgica e quando voltou a trabalhar já o processo estava noutra fase ou para outra fase. No entanto, da valoração global do seu depoimento, da atitude de coerência ao longo do seu interrogatório e acima assinalada, da forma como explicou os seus procedimentos, admitiu a necessidade de alteração de alguns e defendeu outros, não resultou para o tribunal que tal ressonância positiva criada pelo menos com o assistente AN – pois se não fosse positiva não o tinha contratado para fazer os trabalhos de pintura em sua casa -, tivesse conduzido a actos da sua parte de viciação de qualquer acto, indução de reconhecimentos positivos quando a testemunha/Assistente estivesse em dúvida quanto a locais, ou indução dos Assistentes/testemunhas na identificação de qualquer arguido. Isto é, que tivesse (...) em causa a sua objectividade como investigador. Aliás, no auto de reconhecimento de local de fls. 1.117 – diligência em que AT é levado a (…) para fazer o reconhecimento de um imóvel, a casa que no Despacho de pronúncia é identificada como a casa da arguida Q -, o Assistente AT apontou o nº (…) da (...) (…), o que ficou consignado no auto. Como resulta do apenso T-2 e do que o tribunal pôde observar quando se deslocou em Audiência de julgamento à casa da arguida Q, a arguida vive numa (...) “geminada”, o lado ocupado por si é o nº (…) – quem olha para a fotografia do apenso T-2 e de fls….é a parte da moradia do lado esquerdo – e o assistente AT apontou a moradia imediatamente a seguir a este nº (…), que é o nº (…). Ora se tivesse havido intenção de adulterar qualquer elemento, ou qualquer actuação viciada ou subjectiva do Inspector CF nos actos que praticou no inquérito - e se a sua actuação nos actos que praticou no inquérito estivesse afectada por qualquer empatia ou simpatia estabelecida com qualquer um dos assistentes identificados como vítimas no Despacho de pronúncia -, o resultado espelhado no auto de fls. 1.117 decerto não teria sido o que foi: um reconhecimento não positivo, pois o assistente AT o nº (…) e em audiência de julgamento o Inspector CF esclareceu que quando foi fazer este reconhecimento com o AT, já tinha conhecimento que a residência apontada por outro Assistente era o nº (…) e já sabia que a (posteriormente) arguida Q vivia no nº (…). O Tribunal deve referir que este reconhecimento de atitude de “Boa Fé” na realização das diligências por parte deste Inspector da PJ, é expressamente referida em Audiência de Julgamento pelo Ilustre Mandatário do arguido H. No entanto não deixa de interpretar como necessidade de “justificação” por parte do Inspector em causa, a menção que consta no auto de fls. 1.117 de que “…na (...) existem (...)s todas iguais, enfatizando que o Inspector quis justificar o reconhecimento negativo do AT . Mas, como acentuou o Ministério Público, a menção de circunstâncias do local no auto de fls. 1.717 não foi caso único, pois o auto de fls. 1.515 também o faz, ao referir a existência de descampado e refere circunstância quanto ao enquadramento/local. E o Tribunal não interpreta ou avalia que a inclusão de tal menção tenha o sentido, fim e potencialidade de adulterar, viciar ou induzir qualquer acto pré-adquirido de prova e que tivesse comprometido ou comprometa a descoberta da verdade em audiência de julgamento. (4) Test. VM, Inspector da Polícia judiciária (ouvido em 31/05/06 e 15/10/07), o qual declarou ter exercido funções no inquérito desde uns dias antes à detenção do arguido H (a qual resulta dos autos ter ocorrido em 31/1/03) até à extinção da equipe que esteve adstrita à investigação deste processo. Anteriormente à investigação deste processo esteve, nos 6 meses anteriores, na equipe do inspector BZ, a brigada da investigação de crimes de abuso de natureza sexual e esclareceu, quanto à sua actuação profissional e procedimentos, a experiência dos colegas mais antigos era a melhor forma para adquirir conhecimento. Licenciado em Direito Prestou esclarecimentos quanto às intervenções processuais que teve no processo: Auto de fls. 2.988/9, um auto de reconhecimento a local feito por AI, com a Inspectora CCP. Tal como aconteceu com alguns dos Inspectores e que o tribunal assinalou aquando da análise crítica dos seus depoimentos, a recordação que tinha dos pormenores das diligências – porque é que foram por aquele lado ou por outro numa diligência de reconhecimento de local, era uma memória já difusa. Disse, contudo, que não se lembrando concretamente se foram por aqui ou por ali, se no auto está descrito determinado percurso é porque a pessoa que estava a fazer o reconhecimento o indicou, pois era o procedimento normal. Auto de Busca “à casa de (…)”, fls. 3.193,diligência ocorrida em 18/03/06 – auto do qual resulta terem estado presentes na diligência os inspectores BZ, CCP, VM, EEC e AAY -, tendo esclarecido que foi a primeira vez que foi aquela casa, não se recordando se foi feita reportagem fotográfica da busca. Recordava-se de terem estado a ver plantas em cima de uma mesa, que (de acordo com a sua memória) estavam dentro de um armário na sala, não se recordando se tinham sido apreendidas ou não e não se recordava se tinham levado plantas do interior da casa. Confrontado com os documentos do Apenso AO, não se recordou dos documentos de fls. 19 e 42, mas recordou-se das plantas “grandes” que estão no final do Apenso, imediatamente a seguir a fls. 51 e que não estão numeradas. Quanto à diligência a que se refere o auto de fls. 4.304, um reconhecimento de local feito em 6/05/05 com AK, com o Colega CF, declarou que se recordava da diligência por lhe ter sido referido na audiência que estava também o seu Colega CF, mas não se recordando do nome do aluno da AX que ia fazer o reconhecimento a uma (...) em (…) e outro reconhecimento em (…). Quanto ao reconhecimento em si, conseguia lembra-se que a pessoa que ia fazer o reconhecimento indicou o local em (…) e em (…), recordando-se que foram sempre por indicação do jovem que ia fazer os reconhecimentos, foram a um imóvel frente à (…), na (...) (…) e um prédio sito na (...) (…). Mas em concreto não conseguiu esclarecer mais do que o que disse, acrescentando que o normal era isso, não era os Inspectores indicarem os caminhos. No que diz respeito ao local “prédio em frente à (…)”, recordava-se de terem entrado num prédio que foi indicado pelo jovem que estava a fazer o reconhecimento, mas não conseguindo assegurara se foi neste prédio ou no sito na (...) (…), que subiu a um andar por indicação da pessoa que estva a fazer o reconhecimento, AK. Não conseguiu dizer ao tribunal se AK teve hesitações ou não, que indicações deu. Após ter feito a leitura do auto de fls. 4.304, conseguiu recordar-se de o assistente AK ter indicado um corrimão e dos degraus. Quanto ao auto fls. 12.828, Y, ((…) e (…)) não conseguindo associar o nome à cara de alguém, lembrava-se do nome, dizia-lhe alguma coisa. Confirmou que as fotografias de fls. 12.829 a 12.836 correspondiam ao local do auto de reconhecimento de fls. 12.828. Não se recordou que percursos fizeram no parque (…), embora olhando para a a fotografia do “GN” declarou lembrar-se que o parque do GN de (…) foi indicado pela testemunha a fazer o reconhecimento e por isso terem ido lá. No entanto, quando contra interrogado esclareceu não se recordar se o acesso ao local, ou as indicações dadas por Y, se foi “directo” ou se andarem às voltas por (…). Auto fls. 6.502, com AI, em relação a este reconhecimento teve uma recordação mais concreta, de estarem num quarteirão com diversos prédios semelhantes, de estarem parados no outro lado da estrada, os prédios tinham estacionamento em frente aos mesmos, e da testemunha não ter conseguido identificar qual o prédio em concreto, mas fazer a referências que seria um daqueles. Começou por dizer que recordava-se que a testemunha teria referido que o prédio tinha elevador e de terem verificado que aqueles prédios não tinham elevador, para num momento posterior ter esclarecido não ter a certeza se foi naquela situação a menção do elevador, mas também não se conseguindo recordar em que diligência teria sido. A testemunha VM foi especificamente perguntado pelo Ministério Público – após a confrontação com o auto de fls. 6.930, do qual resulta o reconhecimento negativo nas circunstâncias já descritas, se alguma vez deu algum “ jeitinho” quanto ao resultado da diligência, a testemunha respondeu que não o que, face à forma como se exprimiu, quer verbalmente quer facialmente, o Tribunal acreditou que a testemunha respondeu com verdade. Esclareceu que nunca, de forma alguma, deu voltas com o objectivo de colocar determinado local à vista ou aproximar-se de um local, a pessoa que estava a fazer (com insucesso ou dificuldade ) o reconhecimento. As voltas que iam dando nos locais, no âmbitos destas diligências de reconhecimento, era de acordo com as indicações que iam sendo dadas. Mas este foi um dos depoimentos que foi corrido por um repetido não me recordo. Mas o que fez de forma que ao Tribunal aparentou desinibida neste sentido: não me recordo e assumo que não me recordo. Tendo em atenção esta atitude e para o tribunal, tendo em atenção a experiência que vai adquirindo aos longo dos anos de trabalho a ouvir pessoas, não se afigurou a este Tribunal que este inspector tivesse actuado nas diligências em que teve intervenção ou tivesse prestado depoimento em audiência de julgamento, com ou motivado por interesse próprio ou para conduzir a investigação para um resultado especifico. Obter determinado resultado, ou nas diligências que efectuou ou no resultado deste processo, Foi sujeito a um interrogatório e contra interrogatório em que por vezes vinha ao de cima alguma crispação e tensão, quer na forma como as perguntas foram feitas (por exemplo, durante o contra interrogatório feito pelo Ilustre mandatário do arguido H), quer nas perguntas que deu a tais perguntas. E, mesmo durante esta crispação, em que a testemunha foi objectivamente posta em causa quanto ao bom desempenho da sua função (concretamente e a título de exemplo, quanto aos autos de reconhecimento de fls. 4.441, 8.994, 12.828, 6.502, 7.165 ), o Tribunal não se apercebeu de indicios de que a sua actuação tenha viciado ou manipulado acto, ou diligência. (5) Test. Inspectora CCP, depoimento sereno, aparentando ao tribunal objectivo dado o que se lembrava dizia, o que não se lembrava dizia que não se lembrava. Podia não ter acontecido assim, pois em data anterior já tinha sido ouvida uma testemunha (inspector) que com alguma frequência dizia “não se lembrava”, o que na sala foi feito sentir. Facto que, se tivesse havido comunicação entre ambos, podia ter levado a que os que viessem depois, de algum modo, perdessem espontaneidade, pois estar sujeito a um fogo cruzado, de verificação meticulosa da investigação, do que foi feito, porque foi feito, verificação à posteriori da adequação ou boa prática dos procedimentos, pode alterar a espontaneidade de quem presta o depoimento. Explicou a função da entidade que presidia à inquirição e que conta nos autos de inquirição, a forma como eram redigidos pela testemunha e verificados pela entidade que presidia e papel ou intervenção que tinha no conteúdo do acto. Aconteceu consigo a inspectora CCU ou o inspector BZ darem indicações para serem feitas mais algumas perguntas. Mas resultou para o tribunal que a intervenção não interferiu de forma implicita ou explicita, a revelar conteúdos ao jovem de outras inquirições. Esclareceu, porque foi pedido pela defesa, como começavam as inquirições no caso de um jovem ter negado anteriormente, tentativa de ganho da confiança…nãos se recorda que alguma vez tenha feito referências a um jovem diz lá, porque tenho conhecimento por x que aconteceu…não o faz, porque isso revelaria o que outro dissera. Esclareceu o exame crítico que interiormente ia fazendo nos interrogatórios…mas nuca aconteceu não ter escrito um nome que lhe tivesse sido dito por não acredita, ou por BZ ou CCU ter-lhe dito para não escrever. As sessões em que estas testemunhas, inspectores da PJ prestaram depoimentos foram sessões abertas à comunicação social, o comportamento das testemunhas foi relatado e tal, porque estavam a ser ouvidos pelo exercício das suas funções e em função desse exercício, podia ter afectado ou alterado também a espontaneidade e por arrastamento a objectividade dos depoimentos. Mas, repetimos, para o Tribunal, da forma como prestaram depoimentos as testemunhas CF, CCP, inspectores da PJ isso não aparentou ter acontecido: os depoimentos aparentaram ser desinteressados, objectivos, com ausência de “manha” ou conivência entre inspectores em relação a procedimentos ou actos da investigação que foram (...)s em causa. O tribunal não encontrou sinais de que a actuação da PJ tivesse manipulado ou procurado resultado. 9.1.1. Analisada a actuação dos Inspectores da Polícia Judiciária que antecedem, o tribunal não encontrou indícios, factos, que sustentem uma preparação, condução ou de qualquer forma conjugação por parte da Policia Judiciária, dos depoimentos que vieram a ser prestados em audiência de julgamento pelos jovens identificados como vítimas. Nem encontrou que tal procedimento tivesse sido adoptado nos elementos de prova pré adquiridos na fase de inquérito e que nos termos do artº 355º, do C.P.Penal, podem validamente sustentar ou concorrer para a absolvição ou condenação de um cidadão. 9.2. (Da criação de uma história pelos Assistentes; com e através da comunicação social; da adesão de uns à história de outros). Passando para o outro aspecto suscitado pelas Defesas, o Tribunal analisou e indagou a possibilidade - e efectividade – do que atrás sumariámos: de alguns dos assistentes deste processo terem criado uma história - quer à medida que se encontravam entre eles, quer à medida que saiam notícias na comunicação social -, exercício de criatividade que para uns foi consciente e que para outros traduziu-se numa adesão inconsciente; mas movimento em que - dizem os arguidos - foi relevante a perspectiva que os jovens tiveram de um “ganho secundário”, podendo traduzir-se este ganho (apenas) em “notoriedade” - que foi estatuto que estes assistentes, enquanto jovens internados na AX, naturalmente não tinham - ou mesmo a expectativa de ganharem indemnizações. Esta indagação passou pela análise das declarações dos assistentes – mas tendo em atenção que nestes autos há factos integradores de abusos que dizem respeito, exclusivamente, ao arguido A, não tendo qualquer relação ou conexão com os demais arguidos e o arguido A não enveredou de forma uniforme, pela linha de defesa que estamos a tratar -, cruzando-as com as dos arguidos, com os documentos que constam nos autos, sendo que de alguns é possível extrair dados objectivos de procedimentos e funcionamento de valências da AX, e com os depoimentos das testemunhas que de perto - quer por razões profissionais como são os educadores ou funcionários da AX , quer por razões de amizade ou de laço familiar – viveram e lidaram com os assistentes. 10. Na linha do que antecede, um dos factores apresentado pela Defesa dos arguidos como concorrentes e demonstrativas da impossibilidade da ocorrência dos factos descritos no Despacho de Pronúncia (no que aos arguidos C, E, H, K, N e Q diz respeito) e como factor descredibilizante quer das declarações dos assistentes (quando afirmaram ter estado em locais, fora da AX, com os arguidos para a prática de actos de natureza sexual), quer das declarações do arguido A (quando declarou ter levado assistentes para encontros com arguidos) e, consequentemente, demonstrativo da mentira da história, foi : - a organização e controlo da AX dos/e sobre os seus funcionários e sobre o serviço de transportes; - que os arguidos dizem - e concluíram também em sede de Alegações - não permitir que o arguido A fizesse deslocações nos veículos, por exemplo para (…) ou para outros locais, sem que a quilometragem fosse detectada ou sem que a utilização do veículo em deslocações de serviço fosse detectada; A análise das questões suscitadas por este aspecto concreto das Defesas dos arguidos e dos factos em causa neste momento, relacionam-se, também, com a motivação de factos do capítulo anterior - conforme a referência já fizemos em “ponto 4., 4.2”, onde o Tribunal faz o tratamento dos factos descritos em “ (III) – Dos factos referentes à movimentação do arguido A na AX, relacionamento com educando e funcionários da AX, incluindo o arguido C e dos crimes de abuso sexual praticados pelo arguido A (Factos constantes de fls. 20.842 (parte final) -. Pelo que e como já dito, o tratamento de factos relacionados com a possibilidade ou impossibilidade de o arguido A ter transportado os alunos da AX, em veículos da instituição, para os locais que o despacho de pronúncia refere, irá ser feito pelo Tribunal numa dupla perspectiva. Considerando o que especificamente é focado nos factos do capítulo anterior, nomeadamente a existência ou inexistência de deslocações do arguido A, durante ou fora das horas de serviço para fora da AX, com veículos da AX, sem que o serviço de aprovisionamento e logística – que fazia e organizava os mapas dos transportes e deslocações dos motoristas em serviço, como veremos com mais pormenor –, ou a (...) tivessem conhecimento das deslocações e do paradeiro do arguido (cfr., por exemplo, os pontos “76.”, “81.”, “89.1”, “90” e “91” dos “factos provados”) , mas considerando, também, a demais matéria que especificamente é focada nestes capítulos. 10.1. Assim, para a prova do núcleo de factos relativos a deslocações do arguido A a (…) ou a outros locais, em veículos da AX – com o sentido e extensão ou limitações que o Tribunal o fez nos “factos provados” -, concorreu o cruzamento que o Tribunal fez entre as declarações de arguidos e assistentes, depoimento de testemunhas e documentos, os quais passamos a descriminar quer quanto aos meios concretos em si, quer quanto ao raciocínio seguido para as conclusões tiradas. O arguido A disse ao Tribunal que foi a (…) nas carrinhas da AX - (pelo menos) disse que foi duas vezes numa (…), tendo “desligado a bicha” do conta quilómetros para alterar o registo dos quilómetros -, tendo levados jovens da AX, onde os mesmos estiveram para a prática de actos de natureza sexual com arguidos dos autos. E os assistentes (por exemplo, AP, AT, AN, AI, X, Y), disseram ter sido levados pelo arguido A a (…), em carrinhas “(…)” ou “(…)” da AX, tendo estado com adultos para a prática de actos de natureza sexual. 10.1.1. Começando pela questão dos veículos da AX, dos documentos dos autos - atenta a sua natureza, não tendo sido (...)s em causa quanto à fidedignidade do conteúdo pelos Sujeitos Processuais e por serem globalmente congruentes -, resulta para o Tribunal que a AX, nos anos de 1997 a 2002 teve a disponibilidade, pelo menos, dos seguintes veículos: - (…), matricula (…), registado em nome da AX em 10/12/98 ( cfr. Docs. de fls. 12.816 ; fls.161 a 166 do Apenso AR, passagens na Via verde); - (…), modelo (…), ligeiro de passageiros, de matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 16/05/94 (cfr. Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos atribuídos à AX); - (…), Modelo (…) , (…), de matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 31/03/99, mas auto de recepção em 13/01/99 e sendo o livrete do veículo de 27/11/98 (cfr. fls. 60.839; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; fls. 12.815; fls. 60.840); - (…), modelo (…),(…), matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 21/03/2000, mas auto de recepção em 30/11/99, sendo o livrete de 15/11/99 (cfr. Fls. 60.842; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; e fls. 12.814; fls. 60.844 ); - (…), modelo (…), (…), matrícula (…) (propriedade registada em 4/02/97, mas Auto de recepção em 23/12/96, sendo o livrete de 21/11/96 (Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; fls. 60.848 ); - (…), Modelo (…),(…), matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 6/11/97, mas auto de recepção em 23/09/97, sendo a data do livrete de 11/09/97 (cfr. Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; e fls. 60.852); - (…), modelo (…),(…), matricula (…), propriedade registada em nome da AX em 9/09/97, sendo a data do livrete 23/09/99 (cfr. Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição); - (…), modelo (…),(…), matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 14/01/92, auto de recepção em 30/12/91 e sendo o livrete de 5/03/92 (cfr. Fls. 60.856; fls. 55.077; fls. 55.128 a 55.173, documentos estes referentes ao registo de movimento entre Janeiro de 1999 e Dezembro 2001; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; fls. 60.858); - (…), modelo (…),(…), matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 14/02/89, mas auto de recepção em 7/12/88 (cf. fls. 55.174 a 55.225, referentes ao movimento do veículo entre Janeiro de 99 e Dezembro de 2001, com a indicação de FP; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição; fls. 60.862); - (…), modelo (…), matrícula (…), a qual deixou de estar atribuída à AX em Junho de 1999 (cfr. Fls. 55.077 a fls. 55.085, com a indicação de (...) EY; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição); - (…), modelo (…), matrícula (…) (cf. Fls. 55.077 e 55.086 a 55.127, referentes a movimento do veículo entre Janeiro de 1999 e Dezembro de 2001, com a indicação (...) EY; Fls. 60.831 a 60.863: Documentos remetidos pela AX, referentes às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição); Referimos que estes foram, pelo menos, os veículos que a AX, nos anos de 1997 a 2002, teve a disponibilidade porque, como também resulta da análise e cruzamento dos elementos constantes do: - “ Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística”; - “Apenso EJ, Pasta 3 – registo do movimento diário/mensal dos veículos da AX”; - “Apenso EJ, Vol. 7 – registo do movimento de entradas e saídas no Portão de acesso às garagens e oficinas de CZ”; a AX, durante o referido período de 1997 a 2002, teve a disponibilidade de mais veículos de serviço, ligeiros e pesados, do que aqueles a que se referem os elementos de fls. 12.814 a 12.816, fls.161 a 166 do Apenso AR, Fls. 60.831 a 60.863, remetidos para os autos pela AX e acabados de mencionar. E os seus motoristas, incluindo o arguido A, conduziram tais veículos (por exemplo, veículos de matrícula (…); veiculo de martricula (…), que o arguido C, nas suas declarações, disse ser um (…), cor (…), que lhe foi entregue como carro de serviço em 15/09/97, o qual veio a ser substituído em 15/12/00, por um (…) de cor (…), matrícula (…); veículos de matrícula (…), (…), (…), (…), (…), (…), (…), (…), tendo sido perceptível pela análise dos mapas de planeamento dos serviços, que alguns são veículos pesados, os autocarros para transporte de alunos;) 10.1.2. Os veículos da AX, de acordo com o depoimentos das testemunhas HJ, BBG, VO, SZ, EC, MG, UC (motoristas da AX) e das declarações do arguido A, coerentes entre si quanto a esta questão, eram conduzidos pelos diversos motoristas da AX, não havendo, por regra, veículo exclusivo de um ou de outro. As testemunhas disseram, também, que em relação a motoristas e a veículos, era feita uma planificação quer do serviço, quer do veículo atribuído a cada motorista, planificação esta que, de acordo com os referidos depoimentos e declarações, era feita para períodos semanais e conhecida dos motoristas com antecedência (cfr. Depoimento da testemunha EC, da testemunha VO e da testemunha MG, dizendo este último que recebia o mapa à sexta feira; e cf. “ Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística”). Mas quer o arguido A, quer as referidas testemunhas, globalmente esclareceram ainda o Tribunal quanto ao procedimento que cada um tinha que adoptar sempre que andava com um veículo da AX e que era o de anotar, numa folha que existia no veículo, os quilómetros que o veículo marcava na altura em que o motorista pegava no veículo e os que marcava na altura em que deixava de utilizar o veículo (cfr. Apenso EJ, Pasta 3 – registo do movimento diário/mensal” dos veículos da AX). E esclareceram, também – e aqui referindo, também, o(s) depoimento(s) da(s) testemunha(s) IA, porteiro na AX desde 1990 e tendo saído da instituição, por aposentação, em 2003/2004, o qual declarou ter exercido funções de controlo e saída dos veículos de serviço da AX num dos portões de acesso; HQ, porteiro na AX (embora inicialmente em regime de substituição de porteiros na férias) desde 1991, tendo feito o controlo não portão da entrada e saída de viaturas de serviço da AX -, que quanto à movimentação de motoristas e veículos, era feito um registo por um porteiro, que se encontrava na portaria do portão que dá acesso às garagens e oficinas do CZ, dos veículos de serviço da AX que entravam e saiam por tal portão e dos motoristas que conduziam tais veículos. Este registos sãos os que constam dos documentos que constituem o Apenso EJ, Vol. 7 (registo do movimento de entradas e saídas no Portão de acesso às garagens e oficinas de CZ), mas em relação aos quais a AX, no ofício que se encontra a fls. 2, do Apenso, comunicou ao Tribunal não ter conseguido localizar os registos referentes aos anos de 1998 e 1999. No entanto esta informação – de que a AX não conseguiu localizar os registos referentes aos anos de 1998 e 1999 pedidos pelo Tribunal -, tanto podia dever-se ao facto de não haver registos em data anterior ao ano 2000 e não ter havido essa percepção por parte dos serviços que enviaram o ofício para o Tribunal - o que para o Tribunal não seria “estranho” esta falta de “percepção” ou “conhecimento”, pois ao longo do processo, por situações de envio de informações ou documentos referentes, por exemplo, até aos educandos, foi perceptível para o Tribunal alguma desorganização quanto ao arquivo e controlo de documentos ou da sua existência - ou ao facto de, efectivamente, não os encontrarem. O Tribunal ficou convencido que antes de 2000 já existiam registos, só que neste momento ou já não existem ou extraviaram-se. Isto porque a testemunha VO – motorista da AX desde 1990 -, disse ao Tribunal que “dantes” não havia controlo da saída e entrada dos carros com que faziam os serviços – “… até aí, a gente pegava no carro que tinha serviço na escala, pegava no carro e ia fazer o serviço… entravamos e saiamos quando queríamos e apetecíamos …” -, pois o controlo só passou a haver “ cá em cima, na portaria…nestes últimos anos, dantes não havia…”, tendo acrescentado que o controlo da entrada e saída de veículos, a “marcarem numa folha” a hora de entrada e saída dos veículos, tanto quanto se conseguiu recordar, foi desde “98…99”. E esclarecendo que inicialmente quem fazia este controlo eram porteiros funcionários da AX e que ultimamente, “ …há 4 ou 5 anos…” (e a testemunha prestou depoimento em Tribunal em 12/05/06), esse trabalho passou a ser feito pelos seguranças de “uma empresa” “(…)”. A testemunha HQ (o qual exerceu funções de Porteiro na AX, fazendo o controlo das entradas e saídas de veículos de serviço pelo portão das viaturas de CZ), também disse ao Tribunal que a sua função, desde 1996, era anotar as entradas e saídas das viaturas da AX e só destas, pelo portão em que estava colocado, anotando as matrículas dos veículos e o motorista que as conduzia e tendo um depoimento concordante com o motorista VO quanto a este aspecto. Contudo o arguido C disse ao tribunal que em Janeiro de 2000 e por despacho seu, que pensa ter sido verbal (e comunicado às testemunhas XQ e HH), com efeitos a partir de Fevereiro, decidiu que esse registo passasse a ser feito e os registos entregues diariamente nos serviços de aprovisionamento e logística, deixando a ideia de que anteriormente esse registo não existia. E dando também a ideia, quando analisadas as suas declarações na globalidade, da associação dessa sua ordem a, também, uma necessidade de controlo das horas extraordinárias ou outras remunerações suplementares dos motoristas. A testemunha XQ começou por localizar que esse registo deve ter ocorrido “… a partir talvez de 1998, não sei precisar a data que começou realmente isso a ser mencionado em folhas…”, estando convicta que na altura em que entrou uma empresa de segurança para a AX, esse controlo da viaturas “… já se fazia, julgo, já se fazia antes, que os porteiros de CZ faziam…”. Esclareceu que primeiro houve uma altura em que esse controlo não era muito eficiente e depois passou a haver umas folhas com o registo das viaturas, “achando” que foi o arguido C que impôs que essas folhas fossem feitas, embora não tendo recordação de alguma coisa escrita sobre essa imposição (tendo em audiência de julgamento sido confrontada com a fl. 516, do Apenso EJ, Vol. 8, e confirmado que eram essas as folhas de registo de controlo da entrada e saída de veículos de serviço da AX). E, por sua vez a testemunha HH - o qual esteve no CZ de 1980 até à sua reforma, que já ocorreu após Novembro de 2002 onde exerceu funções de “supervisão” coadjuvando a direcção, orientando o pessoal especializado e da acção educativa - disse ao Tribunal recordar-se de um dia o arguido C o ter chamado para dar uma volta pelo (...), para verem o que estava bem e estava mal e ter-lhe dito que, a partir daquele dia, o controlo das viaturas do Estado que entrassem e saíssem, passasse a ser registado, tendo sido oficiado para a “Securitas” nesse sentido e indo as folhas para o gabinete da testemunha. Quanto à localização, no tempo, destes factos, não conseguiu ser preciso, localizando-os 2000 e depois em 2001. A testemunha TE (o qual fez segurança no portão da entrada é saída de veículos de serviço da AX, tendo entrado em 99/00 e estado nesse serviço 5/6 anos), disse ao Tribunal que quando entrou para o serviço de segurança na portaria - em que anotava numa folha o registo da entrada e saída dos veículos de serviço e motoristas -, esse procedimento já existia. E a testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista), também disse ao tribunal que “houve uma fase em que havia um porteiro, mas sem controlo”, depois “passou a ser registado” e ainda com “porteiros da instituição”e depois é que passou para uma empresa de segurança, mas não se conseguindo recordar se esta empresa foi “pouco antes” deste processo rebentar” ou só depois. Esta testemunha revelou alguma confusão quanto à altura a partir da qual passaram a fazer o registo das entradas e saídas. Isto porque num momento diz que “ até à data da empresa (...) e talvez um pouco antes...” (e interpretando o Tribunal que se estava a referir à entrada de uma empresa de segurança para fazer o controlo dos acesos à instituição) , não havia registo daquele controlo que era feito na portaria, da entrada e saída dos veículos. Mas, a seguir – e isto durante a instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C -, diz que quando o arguido C era (...) (...) já se fazia o registo da entrada e saída de veículos na AX, apontando, assim – na interpretação do sentido das suas palavras e tendo ficado com essa ideia -, para um momento mais próximo daquele que foi apontado pelas testemunhas HQ, XQ ou VO, do que para momento mais próximo da entrada da empresa de segurança. Analisando estes depoimentos e cruzando-os com os elementos que constam dos autos, a forma como as testemunhas HQ, XQ ou VO falaram destes registos e a memória que revelaram dos mesmos, reportada a momento “anterior a 2000” e o depoimento de TE, levou o Tribunal a concluir que anteriormente ao ano 2000 já havia um sistema de registo, escrito, da entrada e saída de veículos de serviço da AX E levou-nos também a concluir que quer o arguido C, quer a testemunha HH, estavam a referir-se a um procedimento, eventualmente mais rigoroso, que tenha sido implementado na sequência do “incidente de 2001” , entre os mecânicos e o arguido A e que já referimos - ou na sequência de alguma reorganização que tenha sido feita pelo Dr. EJ, quando em 2000 entra para o cargo de Director do CZ, pois o arguido C também referiu esta reorganização e faz algum sentido que a conversa e a “volta” que a testemunha HH conta, tenha sido relacionada com a referida reorganização. Isto porque se tal procedimento de controlo, da forma como o Tribunal interpretou que o arguido C o referiu, estivesse relacionado com o controlo das horas extraordinárias, pelo menos em 31/3/99 (cfr. Apenso D, Vol. VIII, fls. 1807) já vemos a preocupação do arguido C com o limite e controlo das horas extraordinárias (bem como no Ano 2000 - cfr. Apenso EI, Vol. 1, fls. 68 a 93; cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos; cfr. Apenso D, Vol. VI, fls. 1.643, Despacho de BQ, datado de 17/04/2000, delegando a competência “... para autorizar, dentro dos limites para os quais detenho competência própria, a prestação de trabalho extraordinário e em dias de descanso e complementar por parte do pessoal docente, educativo e de acção social, no (...) do (...) Lic. FB e do restante pessoal no (...) do (...) Lic. C”; e cfr. Apenso D, Vol II, fls. 387 e 388, acta de reunião de 29/6/00, do Conselho Técnico Administrativo, em que o arguido C fala das horas extraordinárias em relação aos educadores, tendo pedido que os educadores lhe explicassem a situação e rejeitando genericamente a atribuição de horas extraordinárias aos educadores nas circunstancias referidas na reunião). Faz mais sentido, na dinâmica das várias declarações e do cruzamento destes documentos, que o controlo a que o arguido C se referia, eventualmente mais rigoroso, tenha sido em 2001 (na sequência do “incidente de 2001” , entre os mecânicos e o arguido A e que já referimos ou a “re-organizção do (...)” de CZ em 2000, como referimos), estando o arguido C equivocado quanto à localização no tempo do facto. E, consequentemente, parcialmente quanto ao facto em si, pois já havia controlo escrito anteriormente à data em que diz que o mesmo começou (até porque e isto quanto à plausibilidade de “2001”, foi nesta altura, Março de 2001, que o arguido C, no âmbito da restruturação da oficina de mecânicos, determinou que os mecânicos afectos à oficina passassem a registar as suas entradas e saídas no sistema de assiduidade da (...); cfr. pontos “3.3.2. (3)”, da presente análise crítica da prova e cfr. Apenso “ EI, Vol. 1, fls. 68 a 93” cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos). (1) Mas, prosseguindo, estes depoimentos - na parte em que falaram sobre tais factos, controlo e utilização de veículos, procedimento adoptados quando andavam com veículos da AX, escalas e trocas de serviços -, tomaram especial relevância para a avaliação de um aspecto e linha de argumentação apresentada pelas Defesas - para descredibilização, na perspectiva das Defesas -, relacionado com o facto de, na sua perspectiva, havendo todos estes procedimentos do controlo e não havendo (repetimos, na perspectiva das Defesas), desconformidade entre os quilómetros anotados nas folhas do registo do movimento diário/mensal dos veículos (cfr. Apenso EJ, Pasta 3 – registo do movimento diário/mensal” dos veículos da AX), ou rectificação na folha do Planeamento de transportes e Motoristas (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), o arguido A e/ou os assistentes, não falaram verdade quando disseram que foram a (…) nas carrinhas (…) e/ou (…) da AX. O próprio arguido C, em sede de contestação – e também em sede de Alegações, posição igualmente adoptada pelos arguidos E, H, K, N e Q -, põe em causa a possibilidade de o arguido A ter utilizado veículos da AX para as deslocações a que se refere o Despacho de Pronúncia, apontado a sua Defesa dados objectivos que considerava sustentarem a sua afirmação e relacionados com os procedimentos de controlo existentes na AX para a utilização de veículos de serviço. Estes dados objectivos eram, na sua perspectiva e como aponta na sua contestação, que: - as viaturas de serviço, após as utilizações, recolhiam às garagens da AX, de onde “ …também necessariamente saiam para efectuar qualquer deslocação…”; - a entrada e saída de veículos era feita sempre por um único portão, “ …havendo um mapa de controlo que era preenchido à saída e à entrada…”, procedimento que disse ter sido instituído por si; - a Divisão de aprovisionamento e logística elaborava semanalmente os mapas de transportes com escalas de veículos e motoristas; - cada veículo de serviço tinha um boletim próprio, no qual os motoristas anotavam os Kms do veículo à partida e à chegada; - estes boletins possibilitavam o cruzamento de dados com os mapas semanais de transportes; os registos de kms efectuados pelas viaturas eram mensalmente entregues na Divisão de contabilidade e património, “…onde eram regularmente conferidos e compilados…” e remetidos para o Ministério das Finanças. Na sua perspectiva “…estes procedimentos conduziam a um controlo sucessivo da utilização dos veículos por parte dos diversos motoristas, uma vez que aqueles eram indistintamente conduzidos por vários motoristas…”., pelo que, conclui o arguido C “… seria praticamente impossível ao A efectuar as deslocações referidas na pronúncia, de (…) a (…) e no sentido inverso (cerca de 400 Kms.), aos fins-de-semana, utilizando as viaturas (…) da AX, sem que os correspondentes Kms. ficassem registados no conta-quilómetros…”. Ora o Tribunal procedeu à avaliação e valoração destes vários elementos de prova, cruzou-os entre si e a conclusão que retirou dos elementos objectivos do processo, quanto a saber: a) em que medida os elementos que constam das folhas de planificação do Apenso EJ, Pasta 2, quanto ao trabalho ou indicação das (previsíveis) deslocações dos motoristas para os dias planificados, corresponde efectivamente aos locais onde os motoristas foram e aos veículos que efectivamente utilizaram; b) em que medida os elementos que constam no Apenso EJ, Pasta 3 (correspondentes às folhas de registo do movimento diário/mensal de viaturas), correspondem efectivamente: - a todas as deslocações feitas pelo arguido A ou pelos demais motorista com veículos; - a um controlo que era feito pelos motoristas, quando pegavam num veículo, dos quilómetros que estavam registados no conta quilómetros, ou se os registos constantes do apenso EJ, Pasta 3, podem corresponder a um procedimento do motorista anotar, “ à partida”, os quilómetros que na folha tinham sido marcados “ à chegada” pelo motorista que o antecedeu e assim sucessivamente; - ou a uma utilização, única e exclusivamente, pelo motorista que anotou o Kms e pelos Kms que anotou; foi em sentido diverso do alegado pelas Defesas dos arguidos C, E, H, K, N ou Q. 10.1.3. Assim vejamos. No Apenso EJ, Pasta 2, constam os mapas do serviço de transportes remetidos pela AX, os quais correspondem à planificação Semanal/mensal do trabalho dos diversos motoristas, bem como dos veículos utilizados. Este elemento, no entanto, quando confrontado com os elementos constantes no Apenso EJ, Pasta 3 - referente ao registo do movimento diário/mensal de cada viatura, em que o motorista que utilizava determinado veículo escrevia os quilómetros que a viatura tinha quando iniciou a sua utilização e os quilómetros que tinha quando a deixou de utilizar -, bem como com os documentos constantes no Apenso EJ, Volume 7 – referentes às anotações das entradas e saídas de veículos num dos Portões da AX -, e com os documentos constantes dos Apenso BQ, Volumes 3, 5, 6 e 7 – referentes aos Boletins de itinerários preenchidos pelos motoristas da AX -, permitiram o Tribunal verificar e a título de exemplo, as seguintes situações: (I) Dia 11/09/00 (segunda-feira): No mês de Setembro de 2000, semana de 11 a 17/09, na folha do serviço de planificação diário de transportes a efectuar pelos motorista da AX, apenas está registada a utilização, no dia 11/09/00, de carrinha modelo (…) pelo arguido A (cfr. fls. 753, do Apenso EJ, Pasta 2). Da folha do Movimento diário/mensal das viaturas, a fls. 868, do Apenso EJ, Pasta 3, consta o registo do movimento da (…)(…) entre os dias 11 e 30 de Setembro de 2000 (não havendo registo de movimentos anterior ao dia 11/09/00) e a fls. 898 consta o registo do movimento da (…) (…), entre os dias 5 e 30 de Setembro de 2000. Analisando os três elementos acabados de referir – registo de planificação diária dos transportes para a semana de 11 a 17/09 (cfr. fls. 753, Ap. EJ Pasta 2), registo do movimento diário/mensal da carrinha (…) (…) (cfr. fls. 868, Ap. EJ Pasta 3) e da carrinha (…)(…) (cfr. Fls. 898, Ap. EJ Pasta 3) -, no dia 11/09/00 temos que : a) Na Planificação de transportes apenas está registada utilização de (…) pelo arguido A. O arguido A utilizou a (…) (…), tendo registado ter andado com a mesma 116 Km. b) O motorista MG, que na folha de planificação tem registada a utilização do (…) e do veiculo (…), utilizou também uma (…)matricula (…), o que não foi anotado ou rectificado na folha 753, do Apenso EJ, Pasta 2. No Apenso EJ, vol. 7, fls. 174 (referente ao registo das entradas de veículos no portão do CZ), está também registado que este motorista MG saiu e entrou pelo portão com um outro veículo, o de matrícula (…), o que pode corresponder, este sim, a um dos veículos que lhe estava atribuído. (II) No dia 12/09/00 (terça-feira) o arguido A era o único motorista que na planificação tinha atribuída uma carrinha (…) e tem registado que andou com a (…)(…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fl. 898). O motorista (…)na folha de planificação (cfr. fls. 753, Apenso EJ, Pasta 2) tem atribuído um “veículo ligeiro” e o veículo (…). Mas na folha de registos da (…)(…) tem registado que andou com este veículo e nesse dia registou ter feito 36 km com o veículo (cfr. Fls. 868, Apenso EJ, Pasta 3, sendo que no Apenso EJ, vol. 7, fls. 172 e 173, referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ, está registado o movimento do motorista MG com o veículo de matrícula (…) e com o de (…)). A utilização da (…)(…) pelo motorista MG não foi anotada ou rectificado registo, na folha 753, do Apenso EJ, Pasta 2. É certo que o motorista MG tinha distribuído um “ veículo ligeiro” e o veículo (…) é um veículo ligeiro de passageiros. Mas resulta do conteúdo do Apenso EJ, Pasta 2 (referente ao planeamento de transportes e motorista, feito pela Divisão de Aprovisionamento e logística da AX), que quando o veículo atribuído na planificação era uma (…) ou uma (…), tal era, em regra, expressamente identificado. E era, em regra, expressamente identificado com o pormenor, quanto às carrinhas (…), se era um (…),(…) ou (…) (cfr. fls. 766, Apenso EJ, Pasta 2). Quanto aos demais veículos ligeiros de passageiros (não carrinhas (…) ou (…)), no Apenso EJ, Pasta 2, o Tribunal encontrou expressamente identificado o veículo ligeiro de passageiros “(…)” - cfr. Fls. 753, Apenso EJ, Pasta 2 . Mas face à análise que fez da globalidade das folhas deste Apenso EJ, Pasta 2, esta individualização já não acontecia quando, por exemplo, era feita a utilização do veículo de matrícula (…), o (…) ao serviço da (...) – e que, de acordo com o depoimento, por exemplo, da testemunha EC – motorista da AX - e do arguido A, era utilizado não só para o transporte do Sr. (...) mas também para outros serviços da AX. (III) 1. No dia 13/09/00 (quarta-feira), na folha de planificação (cfr. fls. 753, Apenso EJ, Pasta 2) só o arguido A tem atribuído o veículo (…). a) O arguido A tem registado ter andado com a (…)(…), onde anotou ter percorrido 122Km, para “(…), Vários locais” (cfr. Fls. 898, Apenso EJ, pasta 3). b) Na folha de registos da (…)(…) o motorista SZ, que na folha de planificação semanal/diária tem indicado estar ao “serv. (...) gar.”, não estando anotado qualquer veículo, tem registada a utilização da (…)(…) (cfr. Fls. 868, Apenso EJ, Pasta 3). A utilização da (…)por este motorista SZ não foi anotada ou rectificado registo, na folha 753, do Apenso EJ, Pasta 2. c) Mas no Apenso EJ, vol. 7, fls. 171 - referente ao registo das entradas de veículos no portão o CZ e respectivos motoristas -, está registado não só o movimento do motorista SZ, mas também o movimento do motorista MG com a (…)(…). O motorista SZ tem um registo de entrada com a (…)(…) às 12.44h e saída às 14.30h, não tendo registada a hora em que voltou a entrar. Na folha do registo dos Kms do veículo o motorista SZ registou que andou 91 km com a carrinha (cfr. Fls. 868, Apenso EJ, Pasta 3). O motorista MG tem registado que entrou com a (…)(…) às 9.15h, estando imediatamente registado que o veículo saiu às 10.35h, havendo que notar que o registo tem MG/SZ (cfr. fls. 171, do Apenso EJ, Pasta 3). O motorista MG tem também registado que saiu às 10h e entrou às 12h, tendo voltado a sair às 14.25h – mas não tendo registo de nova entrada -, mas com o veículo de matrícula (…). Conjugando os registos de saída e entrada dos motoristas MG e SZ, com a anotação “MG/SZ” para a entrada ou saída na Portaria da (…)(…) – e chamando o Tribunal a atenção para o facto de os registos constantes do Apenso EJ, pasta 3, dizerem respeito ao registo do movimento de veículo e do motorista que os conduzia -, o Tribunal concluiu que: - o motorista MG entrou às 9.15h no Portão do CZ com a (…)(…), mas não sabendo o tribunal a que horas a carrinha, anteriormente a esta entrada, tinha saído do (...), pois tal saída não está registada nem neste dia 13/09/00, nem no anterior; - às 10h o motorista MG sai com o veículo (…) - e volta a entrar com o veículo às 12h -, pelo que não é o motorista MG que às 10.35h sai com a (…)(…); - às 10.35h é o motorista SZ que sai com a (…)(…) e daí, para o Tribunal (sendo este o sentido, pois, como dissemos, os registos constantes do Apenso EJ, Pasta 3, dizem respeito ao registo do movimento de veículo e do motorista que os conduzia), estar registado na folha 171, do Apenso EJ, Vol. 7, a tal referência “MG/SZ”: é o motorista MG que às 9.15h entra com a (…)(…), mas é o motorista SZ que às 10.35h sai com esta (…), voltando a entrar às 12.44h, voltando a sair às 14.30h e não havendo registo da hora a que voltou a entrar. O motorista MG, apesar de a ter conduzido, não registou na folha do movimento diário da (…)(…) quaisquer Kms neste dia 13/09/00 (cfr. Fls. 868, Apenso EJ, Pasta 3). E o motorista SZ, quando anotou os 91kms que percorreu com a carrinha no dia 13/09/00, registou na folha de “registos do movimento diário/mensal” da (…)(…) como os quilómetros que a carrinha tinha “à partida”, exactamente os kms que constavam na folha como os da “chegada” do movimento do dia anterior (cfr, Apenso EJ, pasta 3, fl. 868), apesar de, na conclusão do tribunal, não ter sido o motorista que às 9.15h entrou a carrinha. É certo que dos documentos consta que no dia anterior, o dia 12/09/00, o motorista MG andou com a (…)(…), anotou ter percorrido com a mesma 36 kms, tendo registado no portão de acesso às garagens de CZ que saiu com a (…) às 10h e entrou às 11.05h. Mas não há registo que tenha voltado a sair com a carrinha – pois podia-se por a hipótese de no dia 12/09 a ter levado para algum lugar e, assim, justificar a entrada às 9.15h no dia 13/09 – e há o registos que nesse dia 12/09 o veículo que voltou a conduzir foi o (…), estando registado ter saído às 13.15h e voltado a entrar às 20.30h (cf. Apenso EJ, Pasta 3, fl. 868 e Apenso EJ, Volume 7, fls. 172 e 173). 2. E aqui referimos, na sequência do que antecede, que a análise deste dia 13/09/00 - nomeadamente quanto aos registos das entradas e saídas de veículos e motoristas pelo portão de acesso às garagens e oficinas de CZ, no caso concreto o arguido A, o motorista MG e o motorista SZ -, foi um dos dias que levantou ao tribunal uma questão já acima equacionada, relevante para aferir não só da credibilidade das declarações do arguido A - a que o Tribunal deu, quando o arguido disse ao Tribunal que alterava “ a bicha” do conta quilómetros, para “retirar” quilómetros que tinha feito com o veículo; sendo que quanto a esta possibilidade (“viciar a bicha do conta quilómetros”), a instâncias do arguido C a testemunha EC declarou ao tribunal que embora não tivesse tido conhecimento de que alguém o tivesse feito, “ achava” que era possível fazê-lo, com restrições em relação às “(…)” mas dizendo que estava a “falar de cor”; a testemunha HI, professor de mecânica e que foi gestor da frota da instituição, para além de responsável pela oficina de mecânica, disse que quanto às carrinhas (…) via alguma dificuldade nessa viciação, mas quanto às carrinhas (…) considerava que este procedimento era mais fácil; mas a fls. 28.560 e 28.561, conta uma informação da (…), pedida pelo Tribunal na sequência de diligência de prova concretamente requerida pelo arguido C, na qual consta que a Marca “…admite sempre como possível a alteração das características dos veículos da marca (…) dos modelos (…) e (…)…”, mas desconhecendo “… os termos em que porventura são efectuadas alterações das características dos veículos…designadamente conta-quilómetros digitais, por pessoas ou entidades alheias à rede de Oficinas Autorizadas…” -, mas também das declarações dos motoristas, por exemplo, EC, SZ, EC, MG, quando disseram haver uma verificação efectiva dos registos de quilómetros nas viaturas, dos serviços efectivamente feitos pelas viatura, do uso de viaturas por parte dos motoristas ou troca de serviços entre motoristas. Transmitindo ao Tribunal a ideia de um controlo efectivo do “serviço de transportes”, não só quanto à forma de utilização dos veículos pelos motoristas, mas também quanto à possibilidade de utilização. E levantou esta análise na dupla perspectiva também acima referida: - em que medida os elementos que constam das folhas de planificação do Apenso EJ, Pasta 2, quanto ao trabalho ou (previsíveis) deslocações dos motoristas para os dias planificados, corresponde efectivamente aos locais onde os motoristas foram e aos veículos que efectivamente utilizaram; - apurar/verificar, com recurso a dados objectivos do processo, em que medida os registos de quilómetros que constam das folhas do Apenso EJ, Pasta 3: a) correspondem, efectivamente, a um controlo que era feito pelos motoristas, quando pegavam num veículo, dos quilómetros que estavam registados no conta quilómetros, ou se os registos constantes do apenso EJ, Pasta 3, podem corresponder a um procedimento do motorista anotar, “ à partida”, os quilómetros que na folha tinham sido marcados “ à chegada” pelo motorista que o antecedeu e assim sucessivamente; b) correspondem à utilização, única e exclusivamente, pelo motorista que anotou o Kms e pelos Kms que anotou; c) e correspondem a um controlo efectivo, a uma verificação folha a folha, pela AX, da concordância entre o anotado pelo motorista nos boletins de itinerário, nas folhas do registo do movimento diário/mensal da viatura e nas folhas de planificação dos transportes (os dados constantes nos Apensos BQ, EJ Pasta 3 e EJ Pasta 2) e o trabalho que o motorista efectuou. Portanto, não só uma questão de correspondência entre a Planificação do Apenso EJ, Pasta 2, dos registos do Apenso EJ Pasta 3 ou dos Apensos BQ, com a realidade, mas também uma questão de fiabilidade de que o que está anotado no Apenso EJ, Pasta 3, no Apenso EJ Pasta 2 e nos Apensos BQ, corresponde única e exclusivamente ao que aconteceu na realidade quer com os motoristas, quer com os veículos. Assim e prosseguindo: 2.1. Neste dia 13/09/00 (quarta-feira) o arguido A (com a (…) de matrícula (…)), tem registado saída às 8.10h e entrada às 12.40h, nova saída às 12.50h, não estando registada a hora a que entrou após esta segunda saída (cfr. fls. 171, do Apenso EJ, Pasta 3). Verificamos que para 13/09/00 o mapa de planificação diz que o arguido A tinha a volta do Lar FX , que é do (...) FA (cfr. Fls. 245 dos autos), tinha a volta do correio às 9.h e, às 18h, de novo, o Lar FX. No Portão de entrada e de saída de veículos da AX os registos são os que já foram mencionados, não estando anotada a hora a que o arguido A regressou ao (...) com o veiculo. Nos Boletins de itinerário constantes de fls. 463, do Apenso BQ, 3º volume, o arguido registou que teve “ Deslocação em serviço c/ Dr. C, (…)”, tendo registado que iniciou o serviço às 8.30h e regressou às 21.30h. Se o arguido fez esta deslocação a (…), com o início e fim que indicou no Boletim de itinerário – sair às 8.30h e regressar às 21.30h -, não pôde cumprir, pelo menos na totalidade, o que está referido a fls. 753. E tendo ido fazer um serviço “ com Dr. C”, é pouco plausível que o tenha transportado na (…)(…), de (…), sendo que da audiência de Julgamento em momento algum das declarações dos arguidos C e A, ou das testemunhas HJ, BBG, VO, SZ, EC, MG, UC (motoristas da AX), resultou indício ou confirmação, de que tal tivesse ou pudesse ter acontecido. Aliás, o arguido C, em audiência de Julgamento esclareceu que o arguido A transportou-o várias vezes em serviço, tendo o arguido C, para esse efeito e nessas circunstâncias, acesso ao transporte no carro de serviço do (...). O tribunal verificou os elementos de fls. 938, do Apenso EJ, Pasta 3, concretamente os referentes ao (…) de matrícula (…), pois a deslocação podia ter sido feita nesse veículo e também não resulta - até pela rubrica que está aposta no lado direito -, que o arguido A o tivesse conduzido e tivesse transportado o sr. (...) (...), o arguido C, nesse veículo. De fls. 753, do Apenso EJ, Pasta 2, era o motorista UC que estava ao serviço do (...) - como já dissemos, resultou da audiência de julgamento que o (…)de matrícula (…) era, de facto, o veículo que estava ao serviço da (...) e do Sr. (...) - e a rubrica do lado direito, de fls. 936, do Apenso EJ, Pasta 3, não é, para o Tribunal, a do arguido A. 2.1.1. Quanto a esta questão da identificação da rubrica do arguido A, ela resulta da análise que o Tribunal fez de todas as folhas do Apenso EJ, Pasta 3, face aos elementos (e concordância entre elementos) que constam também do Apenso EJ, Pasta 2 (o planeamento semanal/mensal de transportes feito pela AX, com a indicação de motorista e veículo atribuído) e do Apenso EJ, volume 7 - em que está registada a entrada de veículos, matrícula e motorista que o conduzia, pelo portão que dá acesso às garagens de CZ -, tendo o Tribunal concluído, com a necessária segurança e para além de qualquer dúvida razoável, que a rubrica que se encontra (por exemplo) a fls. 898, do Apenso EJ, Pasta 3 (registo do movimento diário da (…)(…)), à frente dos dias 5/09/00, 11/09/00, 12/09/00, 13/09/00, 14/09/00, 15/09/00, é do arguido A. Acresce que na Audiência de Julgamento de 22/03/2010 o arguido A confirmou a sua rubrica, como a correspondente à que o tribunal indica. 2.1.2. Continuando com as deslocações do arguido A, podia-se pôr a hipótese de o arguido A ter conduzido o arguido C a (…) no carro de serviço do arguido C. Mas esta hipótese não é compatível com o registo de entrada e saída do arguido A (com veículos) pelo portão de acesso às garagens e oficinas do CZ, onde está registado que o arguido A sai às 8.10h com a (…)(…) – está referido “(…)”, em vez de “(…)”, o que o tribunal interpreta como lapso de escrita, pois dos elementos remetidos pela AX e adquiridos pelo Tribunal, cfr., por exemplo, fls. 60.839, fls. 60.831 a 60.863, referentes a Documentos remetidos pela AX, relativos às datas em que os veículos foram registados ou (...)s à disposição, fls. 12.815, fls. 60.840, há existência de uma (…),(…),(…), de matrícula (…), propriedade registada em nome da AX em 31/03/99, auto de recepção em 13/01/99, sendo o livrete do veículo de 27/11/98, mas não de veículo com matrícula (…) -, entra às 12.40h com a carrinha, volta a sair às 12.50h e não tem registada a hora a que volta a entrar nesse dia (cfr. fls. 171, Apenso EJ, volume 7). Nem é compatível com as declarações do arguido C. Assim, o Tribunal verificou que a realização desta deslocação a (…) pelo arguido A, não foi anotada/ou rectificado registo na folha de Planificação (fls. 753) do Apenso EJ, Pasta 2, bem como não foi anotada/ou rectificado nessa folha o registo da utilização de qualquer outro veículo pelo arguido, para além da (…) de matrícula (…). Dos elementos dos autos o tribunal não conseguiu apurar com que o veículo o arguido A terá feito esta deslocação. E, por outro lado, no Boletim de itinerário que consta a fls. 463, do Apenso BQ, 3º volume - em que o arguido A registou a deslocação a (…) com saída às 8.30h e chegada às 21.30hh -, não foi feita qualquer rectificação pelo Serviço da AX que fez o controlo e conferência do documento, quanto à hora de início e de regresso do serviço, o qual, pelos registos que acima vimos, não pôde ter ocorrido com a duração que está aposta no boletim (ver que está a(...) no boletim o carimbo do serviço da Divisão de pessoal e vencimentos, e na parte de baixo da folha, a seguir a “RESUMO”, está feita uma chamada que a deslocação foi “ serviço c/ Dr. C). O Tribunal chama a atenção para o facto de que quer os depoimentos das testemunhas HJ, BBG, VO, SZ, EC, MG, UC (motoristas da AX), quer as declarações do arguido C, foram no sentido, repetido, de que havia uma verificação efectiva pelos serviços administrativos da AX das deslocação que davam origem ao pagamento de despesas, horas extraordinárias ou ajudas de custo, o que a análise dos documentos, no entendimento deste Tribunal, objectivamente contraria. (IV) No dia 20/09/00 (quarta-feira) na Planificação apenas está registada a utilização de carrinha (…) pelo arguido A (cf. fls. 754, do Apenso EJ, Pasta 2) e a fls. 898 do Apenso EJ, Pasta 3, está registada a utilização do arguido A da carrinha (…)(…). Mas a fls. 869, deste Apenso EJ, Pasta 3, o motorista SZ, que neste dia estava ao serviço “Prov. Serv.Gar., utiliza uma (…), matrícula (…). A utilização da (…) por este motorista não foi anotada/ou rectificado registo na folha 753, do Apenso EJ, Pasta 2. (V) 1. No dia 29/09/00 (sexta-feira) na folha de planificação (cfr. fls. 757, Apenso EJ, Pasta 2), está escrito que o motorista “EC” tem atribuído um veículo (…) e vai para o (…). Está manuscrito – rectificando, depreendeu o Tribunal da leitura do documento, uma planificação inicial -, que o motorista SZ vai para o (…), com uma (…). E o arguido A tem também atribuída uma (…), tendo previsto, das 8.30h às 18h, serviço de Lares e Correio e às 18.45 “(…)”. 1.1. Da folha de Boletim de itinerário do Apenso BQ, 5º volume, pag. 1109, consta que neste dia 29/09/00 o Motorista EC anotou deslocação a (…),(…) e não ao (…), como programado. Na folha de registos da (…)(…) - constante de pag. 868, do Apenso EJ, Pasta 3 -, está anotada uma deslocação a (…),(…) e (…)– 650 Km – o que, conjugado com o elemento que antecede (de fls. 1.109, do Apenso BQ, 5º volume), levou o Tribunal a concluir que a rubrica aposta à frente da anotação do dia “29” é a do motorista “ EC”. Este motorista EC no Apenso EJ, vol. 7, fls. 153/154 - referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens do CZ -, apenas tem registada a entrada no (...) às 17.25h, com o veículo (…), não tendo registada a saída (decerto de manhã). Mas na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotada a deslocação deste motorista ao Porto (cfr. Fls. 757, do Apenso EJ, Pasta 2 ), não foi feita qualquer rectificação quanto ao facto de o serviço efectuado por este motorista ter sido a (…) e não ao (…). 1.2. Quanto ao motorista “ SZ”, da conjugação do que consta manuscrito na folha de planificação para o dia 29/09/00 (cfr. fls. 757, Apenso EJ, Pasta 2, em que está manuscrito “(…) 8.30h (…)”), com os registos da (…)(…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 898) e com o Boletim de itinerário de fls. 1.008, do Apenso BQ, 5º Volume, resulta que foi ao (…) em vez do motorista EC (que afinal foi a (…)) e foi no veículo (…) de matrícula (…). No entanto este motorista SZ no Apenso EJ, vol. 7, fls. 153/154, referente ao registo das entradas de veículos no portão do CZ, não tem registada a entrada ou saída do (...), pelo portão de acesso às garagens e oficinas, com o veículo (…), veículo com que foi ao (…). 1.3. Quanto ao arguido A, de acordo com o que consta da folha de planificação do dia 29/09/00 (cfr. Fls. 757, do Apenso EJ, Pasta 2), tem atribuída uma (…). Da conjugação do que consta da folha de planificação do dia 29/09/00 (cfr. Fls. 757, do Apenso EJ, Pasta 2), com os registos da (…)(…) (cfr. Fls. 868, do Apenso EJ, pasta 3) e com o Boletim de itinerário de fls. 463, do Apenso BQ, 3º volume, nesse dia, à tarde, foi para (…). No entanto, teve que ir apenas após o motorista EC voltar de (…) com a (…)(…), pois foi neste veículo (cf. Fls. 868, do Apenso EJ, Pasta 3). Mas quanto ao veículo com que o arguido A andou durante o dia, a fazer as voltas dos Lares e do correio (cfr. Fls. 757, Apenso EJ, Pasta 2), no Apenso EJ, vol. 7, fls. 153/154, referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens do CZ, está registado o movimento do motorista A com a saída, às 9h.20m, com um veículo de matrícula (…), não estando registada a hora a que entrou com tal veículo. 1.3.1. Um parêntesis quanto a este veículo de matrícula (…). Este veículo de matrícula (…) não é um dos que a AX a fls. 60.831 a 60.863 - ou noutro momento -, tenha expressamente identificado como um dos que estava à sua disposição e, por conseguinte, tenha remetido os documentos referentes ao veículo. Mas da análise e cruzamentos dos elementos constantes no Apenso EJ, Volume 7 (as folhas referentes ao registo do movimento de entradas e saídas no portão de acesso às garagens e oficinas de CZ e motorista que o conduzia; e, como vimos, era por este portão que era feita a entrada e saída dos veículos de serviço da AX ), com os elementos constantes no Apenso EJ, Pasta 2 (as folhas referentes ao Planeamento de Transportes e Motoristas na divisão de Aprovisionamento e Logística, em que estava feita a previsão do veículo a usar por cada motorista), resultou para este tribunal que o veículo de matrícula (…) era uma carrinha (…). Esta conclusão foi retirada da confrontação, a título de exemplo: a) dos elementos constantes no (i) Apenso EJ, Volume 7, em que temos o registo da entrada e saída deste veículos, com os motorista da AX, como segue : - 2/02/00, 4/02/00, 7/02/00, 11/02/00, 14/02/00, 15/02/00, 21/02/00, 22/02/00, 8/03/00, 13/03/00, 14/03/00 (neste dia utiliza também a (…)(…), cfr. fls. 444), 15/03/00, 16/03/00, 20/03/00, 21/03/00, 27/03/00, 30/03/00, 31/03/00, 1/04/00, 7/04/00, 18/04/00, 20/04/00, 28/04/00, 7/06/00, 8/06/00, 9/06/00, 12/07/00, 17/07/00 (neste dia o arguido A utiliza também a (…)(…), cfr. fls. 225), 25/07/00, 22/08/00, 23/08/00, 24/08/00, 25/08/00 A sai 9.07h e entra às 13h ; volta a sair às 13.41h e entra às 18.54h (cfr. Fls. 190); 4/09/00, A saída às 12.25h, entrada 14.37h, (fls. 181/182), mas tendo também o arguido A registada a utilização da (…)(…) neste dia, pois está registada a saída do arguido A às 8.15h com a (…) de matrícula (…) e entrada às 12.50h (cf fls. 182); 21/09/00, A saída 8.50 e não tem entrada fls. 163 (cf. fls. 163); 26/09/00 pelo arguido A, com entrada às 13.30h; saída 13.35h e nova entrada às 17.45h, dia em que também utiliza a (…)(…), pois neste dia está também registada a saída do arguido A às 8.20h com a (…) de matrícula (…) (devendo ser lapso de escrita a indicação (…), como já assinalado) e entrada apenas às 17.40h (cf fls. 157); 27/09/00, 2/10/00, 6/10/00, 9/10/00, 10/10/00, 11/10/00, 6/11/00, 7/11/00, 9/11/00, 12/12/00, 15/12/00, 19/12/00, 27/12/00, 28/12/00, A utiliza este veículo (…) (cfr. Fls. 6, 7, 8, 16, 25, 29, 79, 83, 84, 132, 133, 134, 141, 148, 191, 192, 193, 216, 225, 232, 282, 283, 285, 287, 356, 369, 373, 390, 391, 399, 400, 401, 408, 418, 422, 433, 435, 441, 442, 156, 444, 446, 454, 478, 480, 487, 488, 498, 502, 508, 509, 512); - 22/07/00, 15/11/00, 30/11/00, 4/12/00, 12/12/00 o motorista MG utiliza este veículo (cfr. fls. 30, 42, 49, 70, 213); - 28/03/00, 12/06/00, 3/07/00, 7/07/00, 19/07/00, 24/07/00, 23/10/00, 24/10/00, 25/10/00, 26/10/00, 27/10/00, 30/10/00, 2/11/00, 3/11/00, 10/11/00, 22/11/00, 28/11/00, 29/11/00, 13/12/00, 4/12/00, 5/12/00, 6/12/00, 7/12/00 o motorista HJ utiliza este veículo (cfr. fls. 28, 38, 40, 41, 42, 50, 51, 60, 78, 90, 91, 96, 102, 104, 105, 107, 110, 217, 240, 244, 277, 417); - 30/06/00, 5/07/00 (e neste dia 5/07 também o arguido A e os motoristas EC, e motorista VO utilizam o veículo, cfr. fls. 242), 21/07/00 (e o arguido A também o utiliza neste dia 21/07, cfr. fls. 222), 19/10/00, 27/10/00, 10/11/00, 29/11/00, 30/11/00, 10/12/00, 16/12/00, 17/12/00, o motorista BBG utiliza este veículo (cfr. fls. 19, 23, 32, 37, 48, 50, 77, 78, 103, 118, 222, 242, 248);. - 6/07/00 (neste dia também é utilizado o veículo pelo arguido A, cfr. fls. 241), 13/11/00, 14/11/00, 23/11/00, 27/11/00, 30/11/00, 6/12/00, o motorista VO utiliza este veículo (cfr. fls. 40, 49, 52, 59, 71, 72, 241); - 29/06/00, 3/10/00, 16/11/00, 24/11/00, 18/12/00, o motorista EC utiliza este veículo (cfr. fls. 18, 57, 69, 146, 249); - 22/03/00, 10/10/00, 11/10/00, 18/10/00, 31/10/00, 12/11/00, 17/11/00, 18/11/00, 20/11/00, 21/11/00, 14/12/00, o motorista UC utiliza este veículo (cfr. fls. 27, 61, 62, 66, 67, 74, 95, 119, 132, 133, 431); - 17/03/00, 27/09/00, 27/10/00, 2/11/00, 3/11/00, 19/11/00, 22/11/00, 23/11/00, 17/12/00, 20/12/00, 21/12/00, o motorista SZ utiliza este veículo (cfr. fls. 13, 15, 21, 59, 60, 64, 90, 91, 102, 156, 438); b) com os elementos do (II) Apenso EJ, Pasta 2, em que, por exemplo, a fls. 710, 711, 712, 713, 715, 716, 717, 718, 722, 724,734, 736, 741, 742, 743, 744 é feita a atribuição e identificação de veículo aos referidos motoristas, nos dias acabados de assinalar e especificando (…). 1.3.2. Assim e prosseguindo com a análise deste dia 29/09/00 - concretamente quanto ao veiculo em que o arguido A andou, durante o dia e antes de ir para (…), a fazer as voltas dos Lares e do correio (cfr. Fls. 757, Apenso EJ, Pasta 2) - , como vimos no Apenso EJ, vol. 7, fls. 153/154 (referente ao registo das entradas de veículos no por como tão de acesso às garagens do CZ), está registado o movimento do motorista A com a saída às 9h.20m com o veículo de matrícula (…) - (…), como o Tribunal concluiu -, não estando registada a hora a que entrou com tal veículo. No entanto – e prosseguindo na análise objectiva da existência ou inexistência de controlo efectivo quanto à utilização de veículos, pela Divisão de transportes e de acordo com a planificação dessa Divisão -, na folha de planificação semanal/diária não foi feito qualquer registo da utilização de uma carrinha (…) pelo arguido A (cfr. Fls. 757, do Apenso EJ, Pasta 2). E nas folhas do Apenso EJ, Volume 7 (registos das entradas e saídas no portão de acesso às garagens de CZ), não está registada a saída do arguido A para (…) com a (…). 2. Quanto ao movimento dos demais motoristas neste dia 29/09/00 e porque tal é relevante, na perspectiva do tribunal, para a avaliação “do que era” e “como era” a utilização ou a possibilidade de utilização de veículos por parte dos motoristas, controlo por parte dos serviços de transportes da AX ou anotação nos mapas de planificação dos transportes, temos quanto ao Motorista VO a seguinte situação: Da folha de planificação do Apenso EJ, Pasta 2, fls. 757, o motorista VO estaria ao serviço do Sr. (...), não estando anotada a atribuição de qualquer veículo. Dos depoimentos globalmente prestados em audiência de Julgamentos pelas testemunhas HJ, BBG, VO, SZ, EC, MG, UC (motoristas da AX) e das declarações dos arguidos A e C, o veículo (…), de matrícula (…), era o veículo que estava ao serviço da (...), mas era utilizado não só para o transporte do Sr. (...), mas também para outros serviços da (...) da AX. Ora no Apenso EJ, vol. 7, fls. 153/154, referente ao registo das entradas de veículos no portão do CZ, está registado o movimento deste motorista VO com o veículo: - de matrícula (…), que era o (…) da (...) e ao serviço da (...) como vimos (cfr. Fls. 12.816); - de matrícula (…); - de matrícula (…), uma carrinha (…) de (…), da AX (cfr. Fls. 60.856, 60.831 a 60.863); Verificamos que com este ultimo veículo (…),(…), o motorista VO tem registada a saída às 17h.10m e não tem registada a entrada. E consultando a folha do registo do movimento diário/mensal desta carrinha (cfr. Fls. 55.149), no mês de Setembro esta carrinha (…)(…) apenas tem registado movimento no dia 2/09/00, com a indicação “ Serv. (...)”. Não tem registado qualquer movimento no dia 29/09/00 com/pelo motorista VO, o qual, como vimos, tem registado ter saído pelo portão do (...) com a carrinha. 2.1. Mas há mais um dado objectivo a analisar quanto a este veículo. Na folha do registo diário/mensal do veiculo (…) está anotado, à “mão”, que a carrinha “ não foi atestada por se encontrar na oficina” (cfr. Fls. 55.149). A caligrafia desta anotação e a rubrica aposta, por comparação com as apostas, por exemplo, nos documentos do Apenso EJ, Pasta 3, fls. 868, 869, 870 - conjugados com a planificação de fls. 754 a 758, do Apenso EJ, Pasta 2 e com as declarações que o arguido A prestou na audiência de julgamento de 22/03/2010 -, fez o Tribunal concluir, com segurança, que se trata da caligrafia e rubrica do arguido A. Assim – e este (o) mais um elemento de facto a ter em conta na avaliação da prova produzida em audiência de julgamento, quanto à utilização, possibilidade de utilização ou controlo de utilização de veículos da/e na AX e no que se traduzia esse “controlo” ou ausência dele -, se o motorista VO utilizou este veículo no dia 29/09/00, veículo este que não tem qualquer outro registo de movimento no mês de Setembro de 2000 para além do de fls. 55.149 no dia 2/09/00, também o arguido A o pode ter utilizado em outra circunstância. Acresce, no que diz respeito ao registo de quilómetros feitos pelo veículo (…) (na folha que se encontrava para o efeito no veículo), que a carrinha tem registado no dia 2/09/00, como Quilómetros “à partida” e “à chegada” no percurso que fez nesse dia, respectivamente “33.391” kms (os kms com que está registado ter sido deixada em 31/07/00, última utilização anotada antes da de 2/09/00, cfr. Fls. 55.147) e “33.435” kms (os quilómetros com que está registado ter sido deixada após a utilização de 2/09/00, cfr. Fls. 55.149). E na primeira utilização registada no mês de Outubro de 2000, no dia 3/10/00, como quilómetros “à partida” tem registado “33.435” kms, ou seja, aqueles com que tinha sido “deixada” no dia 2/09/00, ultima utilização registada (cfr . fls. 55.149/55.160). Mas, como vimos, esta (…)(…) teve registada a sua saída (pelo portão de acesso às garagens de CZ) no dia 29/09/00 com o motorista VO (cf. fls. 153, do Apenso EJ, volume 7), forçosamente teve que andar metros ou quilómetros e nada foi anotado no registo do movimento diário/mensal do veículo (cfr. fls. 55.149), nem na folha de Planeamento de transportes (cfr. Fls. 757, Apenso EJ, Pasta 2). Este primeiro registo da utilização do veículo em 3/10/00, bem como o subsequente no dia 4/10/00 (cf. fls. 55.150) - e na sequência do que o Tribunal acima já disse quanto ao raciocínio utilizado e motivação para a identificação da rubrica do arguido A -, é do arguido A. E o arguido A, quanto ao registo de quilómetros dos veículos, disse em Audiência de julgamento que alterou o registo do conta quilómetro da carrinha em que confessou ao Tribunal ter feito deslocação a (…). Declaração – quanto à possibilidade de adoptar um procedimento que altere a quilometragem registada no conta quilómetros do veículo - a que este elemento objectivo vem dar credibilidade. Como dissemos, se o motorista VO utilizou este veículo no dia 29/09/00, veículo este que não tem qualquer outro registo de movimento no mês de Setembro de 2000 para além do de fls. 55.149, no dia 2/09/00, também o arguido A o pode ter utilizado em outra circunstância. E, para o tribunal, pode ter utilizado o veículo neste mês ou noutro, pois face à análise que temos estado a fazer (e que fizemos, previamente ao que agora está a ser vertido para o papel) dos elementos constantes dos autos, os dados objectivos que existem apontam para um controlo meramente formal e não efectivo, por parte do serviço competente da AX, da utilização das carrinhas (…)e (…) por parte dos motoristas da AX . (VI) 1. No dia 1/11/00 (quarta-feira), feriado, na Planificação do serviço de transportes (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls.763 e 764) o arguido A tem atribuído, manuscrito e no local do serviço distribuído ao arguido A, “(…)” e mais uma referência que não é perceptível para o tribunal (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 764). No registo da entrada e saída de veículos do portão de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 92 e 93), está registada a saída da carrinha (…), matrícula (…), com o arguido A às 8.40h, entrada às 12h, nova saída do arguido às 13.05h e nova entrada às 17h. Nos Boletins de Itinerário do arguido A (cfr. Apenso BQ, 3º volume, fls. 465) está anotado neste dia 1/11/00 deslocação em serviço (…), saída às 8h e entrada às 23h. Mas na folha de registo do movimento da carrinha (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866), no dia 1/11/00 o arguido A apenas tem registada deslocação a (…)e (…), 174km, “EY, (…)” e a rubrica do arguido A à frente. Assim, temos que se foi a (…) e à (…), tal número de deslocações é compatível com o registo de entradas e saídas do arguido A nesse dia pelo portão de CZ: “duas” saídas com a carrinha (…), matrícula (…), a primeira às 8.40h e entrada às 12h; a segunda às 13.05h e nova entrada às 17h. Mas, tendo ido a (…) – como diz no Boletim de itinerário -, percorreu pelo menos (ida e volta) 286 Kms, dado que a distância (…) – de acordo com o Google earth e sendo a distância entre localidades facto público e notório -, é de 143 Kms. Contudo esta deslocação a (…) não está registada nas folhas dos registos do movimento diário/mensal dos veículos da AX, quer da (…) – com que o arguido tem registadas as duas entradas e saídas da AX neste dia -, quer das demais carrinhas em relação às quais existem registos, como a (…), a (…), a (…)ou da (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866, 896 e fls. 55.108, 55.151, 55197). E o Tribunal, dos elementos que constam nos autos – nos quais se incluem, concretamente, as folhas constantes do Apenso EJ, Pasta 2, referentes ao planeamento de Transportes e Motoristas, pela Divisão de Aprovisionamento e Logística -, não apurou que neste dia 1/11/00 o arguido A tenha feito deslocações com outro veículo. Acresce que se foi a (…) e à (…), as horas indicadas nos Boletim de itinerário de fls. 465, do Apenso BQ, 3º Volume, como início e fim do serviço em (…), não podem estar correctas Sendo que no Boletim de itinerário que consta a fls. 465, do Apenso BQ, 3º volume - em que o arguido A registou a deslocação com “(…)”, com saída às 8.00h e chegada às 23.00h -, não foi feita qualquer rectificação pelo Serviço que fez o controlo e conferência do documento (ver que está a(...) no boletim o carimbo do serviço da Divisão de pessoal e vencimentos, no lado direito da folha, na primeira linha, a seguir ao registo desta deslocação a (…), está manuscrita a percentagem a aplicar para efeitos de pagamento). 1.1. O que antecede leva à análise de um outro aspecto a considerar nas deslocações do arguido A neste dia (e que o Tribunal verificou suceder noutros dias, não sendo exclusivo deste). Como vimos, neste dia o arguido A tinha atribuído uma carrinha (…), não tendo sido perceptível para o tribunal qual o serviço atribuído (cfr. Fls. 763/4, Apenso EJ, Pasta 2). Na folha do registo do movimento diário/mensal do veículo (…) anotou que foi a (…) e à (…) - tendo registado que nessa deslocação percorreu 174Kms -, mas no Boletim de itinerário referente a este dia anotou que saiu para uma deslocação a (…) às 8h e voltou às 23h (cfr. Apenso BQ, 3º volume, fls. 465). Como vimos, no portão do CZ está registado que o arguido saiu com a carrinha (…), matrícula (…), às 8.40h e entrou às 12h, voltou a sair às 13.05h e a entrar às 17h., registo que o Tribunal considerou “compatível” com as duas deslocações à (…) e a (…) (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls. 92 e 93). Quanto a este registo das “horas” das entradas e saídas do veículo, face ao depoimento da testemunha HQ – que declarou ao tribunal estar a exercer funções como porteiro, nesta altura, no portão a que se referem os documentos que integram o Apenso EJ, volume 7, tendo explicado o procedimento de registo de entradas e saídas dos motoristas da AX com veículos -, o Tribunal considera estar mais próximo da realidade do que aquele que o arguido A apôs no Boletim de itinerário. Isto porque é um registo feito na “altura” e a anotação que o arguido A fez no Boletim de itinerário (mas apenas para uma deslocação a (…)) foi, seguramente, em momento posterior à deslocação, pois o Boletim é, de acordo com o seu próprio propósito, preenchido e apresentado no fim do mês a que disserem respeito as deslocações (cfr . fls. 465, Apenso BQ, 3º volume). Ora olhando para os registos das chamadas telefónicas feitas pelo arguido A no dia 1/11/00, com o nº (…) – que, no ano de 2000 e pela fundamentação e análise já feita, o Tribunal concluiu que foi utilizado pelo arguido A -, a deslocação à (…) terá sido feita na parte da manhã e a deslocação a (…) na parte da tarde. Isto porque na parte da manhã, pelo menos às 9.06h, 11.39h, 11.40h (e depois às 14.43h), tem accionadas BTS de (…) o que, conjugado com o facto de o arguido ter registado, na parte da manhã, a saída da AX com a viatura às 8.40h e a entrada às 12h., não permite, na perspectiva do Tribunal, concluir por uma deslocação a (…) na parte da manhã. Às 15.06h tem accionada a BTS do (…) ((…),(…)), o que é compatível com uma deslocação para Sul. Tendo ido a (…) após o almoço, embora às 13.05h o arguido estivesse a sair da AX, pela conjugação do accionar da BTS de (…) às 14.43h e às 15.06h da BTS do (…) ((…),(…)), não foi para (…)logo às 13.05h. Mas também do conjugar destas BTS o tribunal concluiu que terá partido para (…) após as 14 horas, pois às 14.43h acciona uma BTS de (…) e às 15.06h a BTS do (…) ((…),(…)). Considerando o depoimento da testemunha UF, técnico da TMN, o accionamento de um antena (BTS) - incluindo neste conceito o reencaminhamento que possa ser feito para uma antena “seguinte”, se a célula da antena inicialmente accionada e que seria a mais próxima do telemóvel, estiver congestionada - pode ser feito até um raio, aproximado e máximo, de 30 (trinta) kma a contar do local onde está o telemóvel. Assim, ao accionar às 14.43h a BTS de “(…)”, o arguido podia estar num raio de 30 Kms dessa antena, mas no sentido Sul, pois às 15.06h já está a accionar a BTS do (…) ((…),(…)). Mas às 17 horas o arguido está a entrar com (…), matrícula (…), no portão de CZ (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls. 92 e 93). Quer isto dizer que entre as 14h e as 17h , o arguido foi e veio com a carrinha (…) a (…), percorreu pelo menos os 286 KMs (que é o calculo do percurso, ida e volta, da “saída” de uma localidade até à entrada da outra localidade e vice versa), que não anotou na folha do veículo (…) com que foi a (…) e algum tempo teve que despender no local. De facto e atenta a normalidade das coisas, se foi a (…) fazer um serviço da AX com “(…)”, terá entrado na cidade ou ido a algum sítio em especial, o que implica sempre alguma demora e em regra percorrer mais distância do que aquela que é calculada para o percurso “porta a porta” de localidades, pois é não só entrar num centro urbano e ir para um local específico, mas também o parar num sítio específico (uma questão de mais distância e uma questão de mais tempo). Quer tudo isto dizer, para o Tribunal, que o arguido A podia percorrer com a carrinha (…) ((…)) da AX, mesmo no tipo de percurso que antecede (estrada e cidade e em dia feriado), em média, cerca de 100 Km numa hora. 2. Mas há outra situação a apontar neste dia, como contributo para aferição e verificação do paradigma de controlo na utilização de veículos, nas diferentes vertentes já referidas. Neste dia 1/11/00, na Planificação do serviço de transportes (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls.763 e 764) só o arguido A tinha a(...), manuscrito e no local do serviço distribuído ao arguido A, a atribuição de um veículo “(…)” (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 764). Os demais motoristas com serviço distribuído para este dia, os motoristas SZ, VO e BBG tinham atribuído, respectivamente, os veículos pesados “(…)”, “(…)” e “(…)”. Mas no registo da entrada e saída de veículos do portão de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 92 e 93), está registada a entrada da carrinha (…), matrícula (…), com o motorista (…) às 17h, não estando registada as horas a que o motorista tinha saído com a (…). Não está registada a entrada e saída deste motorista com qualquer outro veículo. Nos Boletins de Itinerário do motorista SZ (cfr. Apenso BQ, 5º volume, fls. 1010) está anotado neste dia 1/11/00 deslocação em serviço (...) EY à FP, início às 9h e regresso às 18h. E na folha de registo do movimento da carrinha (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 896), no dia 1/11/00 tem registada deslocação a (…) FP, 165km, “Alunos (...) EY” e uma rubrica à frente que, conjugada com o que antecede, o Tribunal concluiu ser “ SZ”. No entanto, na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotada o serviço deste motorista SZ para o dia 1/11/00 (cfr. Fls. 764, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de o motorista ter andado com uma carrinha (…), para a ida à FP, quando só lhe estava atribuído o veículo (…). E face aos registo da entrada e saída deste motorista em CZ, com veículos (cfr. Apenso BQ, 5º volume, fls. 1010), há desconformidade entre a hora em que no Boletim de itinerário anotou ter regressado do serviço e a hora em que foi anotada a sua entrada no (...). Sendo que no Boletim de itinerário que consta a fls. 1.010, do Apenso BQ, 5º volume - em que o motorista SZ registou a deslocação à FP, com saída às 9.00h e chegada às 18.00h -, não foi feita qualquer rectificação pelo Serviço que fez o controlo e conferência do documento (ver que está a(...) no boletim o carimbo do serviço da Divisão de pessoal e vencimentos, no lado direito da folha, na primeira linha, a seguir ao registo desta deslocação à FP, está manuscrita a percentagem a aplicar para efeitos de pagamento e “FERIADO”). (VII) 1. No dia 4/11/00 (sábado), no local do serviço distribuído ao arguido A está a(...) “(…)” , “levar grupo ao aeroporto” e mais alguma coisa que não é perfeitamente legível mas que ao tribunal aparenta ser “ FP”. No entanto, no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 87 e 88), está registada a saída do arguido A com a carrinha (…),(…), matrícula (…) – e não de uma (…) - às 8h, entrada às 12.15h, nova saída do arguido às 13h e nova entrada às 13.30h, nova saída às 14h.15h, entrada às 17h.25h e saída às 18.55h. Não tem registada a hora a que entrou após esta última saída. Nos Boletins de Itinerário do arguido A (cfr. Apenso BQ, 3º Volume, fls. 465) está anotado neste dia deslocação em serviço à FP, com saída às “06” – o que o Tribunal, face ao movimento da entrada e saída do veículo (…) no portão de acesso às garagens de CZ, interpretou e considerou que significava 18h - e entrada às “22h”. Por sua vez, na folha de registo do movimento da carrinha (…) (cfr. fls. 55.151), neste dia tem registada deslocação a “(…), etc.”, 147km, sendo o serviço “(…)” e a rubrica do arguido A à frente. Esta carrinha é a única com que, nos registos do portão, estão anotadas entradas e saídas do arguido A neste dia. E verificando os registos que existem no processo de outras carrinhas da AX, nomeadamente da (…), da (…), da (…)(…), da (…)(…), neste dia não existe o registo de deslocações nestes veículos feitas pelo arguido A (cfr. fls. 866, 896, do Apenso EJ, Pasta 3 e fls. 55.108, 55.151, 55.197). Assim, o arguido A tinha atribuída, na planificação, uma (…) e saiu com uma (…), matrícula (…). Mas na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotada a deslocação deste motorista para o dia 4/11/00 (cfr. Fls. 764, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de o arguido ter andado com uma carrinha (…) em vez da (…). 2. Mas há um segundo aspecto a considerar. Na folha de registo do movimento da carrinha (…) (cfr. fls. 55.151), está registado que o arguido foi à (…) (registo compatível com a ida à FP) com a (…)(…), tendo registado 147km como os Kms percorridos nesse dia com a carrinha. Estes Kms apenas podem corresponder à deslocação (…) e regresso, pois a distância entre as localidades (…) – que, no entendimento do Tribunal, é um facto público e notório -, pela consulta do Google earth é de 85,5 Km. Quanto a esta questão da distância (…), note-se que neste dia 4/11/00 o arguido A anotou serem 147 kms, mas no dia 1/11/00, na deslocação que fez com a (…) anotou serem 174 kms (sendo ainda de notar que o motorista SZ, em 1/11/00, também tem uma deslocação para a FP, com a (…), tendo anotado 165 kms, pelo que para o tribunal a distância, ida e volta, situar-se-á entre os 165/174 kms.) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866 e fls. 896) Mas, de acordo com o registo de entradas e saídas da carrinha (…) com o arguido A, pelo Portão de acesso às garagens de CZ (cfr. Apenso EJ, Volume 7, fls. 87 e 88), a carrinha não esteve imobilizada durante parte do dia, andou a entrar e a sair pelo portão. No entanto, na folha referente ao movimento desta carrinha (cfr. fls. 55.151), não estão registados mais quilómetros que a carrinha tenha percorrido neste dia, para além dos já referidos 147km. Ora cruzando estes elementos com os registo das chamadas do nº (…) (que o Tribunal já conclui ser o número do cartão de telemóvel que o arguido A usou nesta altura) temos que o arguido tem anotado, para as chamadas feitas por si, a utilização das seguintes BTS, às (cfr. Apenso V, Envelope 25 – Registo de chamadas do número (…)): E-09:22 horas – BTS de (…) E-09:26 horas – BTS de (…) E-09:53 horas – BTS de (…) E-10:26 horas – BTS de (…) E-11:09 horas – BTS de (…) E-11:46 horas – BTS de (…) E-13:33 horas – BTS de (…) E-14:29 horas – BTS de (…) E-14:35 horas – BTS de (…) E-17:04 horas – BTS de (…) E-20:20 horas – BTS de (…) E-20:23 horas – BTS de (…) Para o tribunal estes elementos, no que diz respeito ao accionar de várias BTS em círculos geográficos distintos – por exemplo, (…),(…)-(…),(…),(…),(…) -, significam que o arguido A não esteve sempre no mesmo local. Andou a deslocar-se e não andou a pé, pois as horas a que são accionadas, por exemplo, as BTS de (…) e de (…), com intervalo de 27 minutos, assim o fazem concluir. Poder-se-ia pôr sempre a hipótese de as deslocações que o arguido tivesse feito durante o período que antecedeu a ida para a (…)– às “06” horas de acordo com o registo do arguido no Boletim de itinerário e às 18.55h, de acordo com o registo da saída da viatura (…) no portão de CZ -, terem sido no seu veículo particular. Mas isso não é compatível, na perspectiva do tribunal e de acordo com a normalidade das coisas, com a saída às 8h, entrada às 12.15h, nova saída do arguido às 13h e nova entrada às 13.30h, nova saída às 14h.15h, entrada às 17h.25h e saída às 18.55h, pois não é verosímil que o arguido saísse com a carrinha, fora da AX trocasse com o seu carro e, assim, sucessivamente, de acordo com o registo de entradas e saídas. Assim, no dia 4/11/00 o arguido A anotou, no registo do movimento diário/mensal da viatura, ter percorrido 147 km com a carrinha (…)(…) (cfr. Fls. 55.151 ), mas fez mais deslocações com o veículo nesse dia, não tendo anotado os Kms percorridos com essas deslocações. E note-se que no dia 6/11/00, primeiro dia em que está registada a utilização do veículo após 4/11/00, o motorista BBG utilizou o veículo e no local da anotação dos Kms “ à partida” anotou os “34.200” Kms que o arguido A tinha deixado registados “à chegada” no fia 4/11/00 (cfr. Fls. 55.151 ), apesar de o arguido A ter andado com a carrinha mais do que os 147Kms que apontou. O que é que isto quer dizer mais para o Tribunal (situação que, como já objectivamente apontado, não é única)? A “verificação”, o “controlo” ou o procedimento que era adoptado pelo funcionário da “Divisão de Aprovisionamento e Transportes” ou da “Divisão de Pessoal e Vencimentos”, das folhas “ dos Kms” que se encontravam nos veículos de serviço (aquelas a que se referem os documentos que estão no Apenso EJ, Pasta 3), ou do cumprimento do planeamento de serviços e de utilização dos veículos que era previamente feito (e a que se referem as folhas que estão no Apenso EJ, Pasta 2), ou dos Boletins de Itinerários feitos pelos motoristas para efeitos de pagamentos de “horas” ou de “ajudas de custo”(a que se referem os documentos que estão no Apenso BQ, pelo menos volumes 3 a 6), não detectou qualquer uma das desconformidades que o Tribunal apontou e que considera existirem. 3. E há, por fim, um terceiro aspecto a considerar na análise das deslocações do arguido A neste dia e que os documentos dos autos permitem verificar suceder noutros dias. Como vimos, neste dia 4/11/00 o arguido A tinha programada uma ida à “FP” (cfr. Fls. 764, Apenso EJ, Pasta 2), na folha do registo do movimento diário/mensal do veículo (…) anotou que foi à (…) – anotação que é compatível com a deslocação à FP (cfr. Fls. 55.151) -, tendo no Boletim de itinerário referente a este dia anotado que saiu para a deslocação às “06” horas o que, como acima já vimos e pela análise já feita, o Tribunal concluiu ser “18” horas. No portão do CZ está registado que o arguido saiu às 18.55h com o veículo (…) (cfr. 87, Apenso EJ, volume 7), registo que, face ao depoimento da testemunha HQ – que declarou ao tribunal estar a exercer funções como porteiro, nesta altura, no portão a que se referem os documentos que integram o Apenso EJ, volume 7, tendo explicado o procedimento de registo de entradas e saídas dos motoristas da AX com veículos -, o Tribunal considera estar mais próximo da realidade. Isto porque e como já referimos noutra situação, é um registo feito na “altura” e a anotação que o arguido A fez no Boletim de itinerário foi, seguramente, em momento posterior à deslocação, pois o Boletim é, de acordo com o seu próprio propósito, preenchido e apresentado no fim do mês a que disserem respeito as deslocações (cfr . fls. 465, Apenso BQ, 3º volume). Ora olhando para os registos das chamadas telefónicas feitas pelo arguido A no dia 4/11/00, com o nº (…) – que, no ano de 2000 e pela fundamentação e análise já feita, o Tribunal concluiu que foi utilizado pelo arguido A -, por altura da hora em que saiu de CZ para ir para a (…) (FP), as já referidas 18.55h, o arguido não tem accionada qualquer BTS e a primeira que tem após as 18.55h é a de (…), às 20.20h. Quer isto dizer que entre as 18.55h e as 20.20h, o arguido foi e veio com a carrinha (…) à/da FP, percorreu pelo menos os 147 KM que anotou na folha do registo do veículo - sendo que dos elementos obtidos pelo Tribunal a distância é, pelo menos, 165/170 Kms e não 147km - e algum tempo teve que despender no local. De facto e atenta a normalidade das coisas, se foi à FP onde a AX tem instalações, fazer alguma coisa pela/para a AX (e a anotação de fls. 465, do Apenso BQ, 3º volume, tem referido, com um “ * “, ter ido com “Dª IIO), pelo menos 20/30m demorou a estacionar o veículo, deixar alguém ou alguma coisa, ou dar algum recado, voltar a pegar no veículo para regressar e sair das instalações ou local. Tendo em atenção que de acordo com o depoimento da testemunha UF - engenheiro de telecomunicações na TMN, o qual, pelas funções que declarou ao Tribunal exercer no âmbito das telecomunicações e na TMN, revelou conhecimento técnico e directo sobre os factos sobre os quais depôs, concretamente o funcionamento da captação e reencaminhamento de “antenas” pelo telemóvel quando faz uma chamada -, o accionamento de um antena pode ser feito até um raio, aproximado, de 30 Kms, ao accionar às 20.20h a BTS de (…), o arguido podia estar num raio de 30 kms dessa antena e ainda no sentido do regresso do arguido (mas notando que às 20.23h já está a accionar a BTS de (…)). Há também que referir que estamos a falar de um sábado, em que o trânsito nas estradas da zona para onde o arguido se deslocou, em regra, pode ser mais demorado que nos dias úteis, por haver mais veículos em “passeio”. Assim, em cerca de 1h, descontando (pelo menos) 20 m para a paragem no local, o arguido A andou, seguramente, mais de 100 km com a carrinha. Num percurso que e estamos a falar de facto público e notório, no ano 2000 não era todo feito em auto estrada. Tudo isto para concluir que o arguido A podia percorrer com a carrinha (…) ((…)) da AX, mesmo no tipo de percurso que antecede, em média, mais de 100 Km numa hora. (VIII) No dia 11/11/00 (sábado), na folha de planificação do serviço para esse dia não está atribuído qualquer serviço ao arguido A CZ (cf. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 765 e 766). No local do serviço distribuído aos motoristas UC, EC, VO, BBG e MG, estão atribuídos, respectivamente, os veículos Pesados “(…)”,(…),(…),(…) e (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 765 e 766). Mas no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 75 e 76), está registada a saída do motorista EC, às 15.45h, com a (…), não estando registada a entrada após esta saída. Por sua vez, na folha de registo do movimento da carrinha (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866), neste dia está registada a deslocação a “(…),(…)”, 48km, “Atletas de CZ” e uma rubrica à frente, a qual o tribunal não conseguiu identificar. É provável que seja a rubrica do motorista EC, pois verificando os registos que existem no processo de outras carrinhas da AX - nomeadamente da (…), da (…), da (…)-, esta é a única em relação à qual o Tribunal encontrou registo de deslocações em serviço com motoristas. Mas neste dia, tal como outros que temos referido, na folha de planificação semanal/diária em que estava anotado o serviço e veículo do motorista EC para o dia 11/11/00 (cfr. Fls. 765 e 766, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de o motorista ter andado com uma carrinha (…), quando lhe estava atribuído o (…). (IX) 1. No dia 12/11/00 (Domingo), no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamente e logística, não está distribuído qualquer serviço ao arguido A (cfr. Fls. 766, Apenso EJ, Pasta 2). No entanto, no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 73 e 74), está registada a saída do arguido A com a carrinha (…),(…), matrícula (…) às 9.30h, entrada às 10.25h, nova saída do arguido às 10.50h e nova entrada às 11.30h. Está também registada a entrada do arguido com a (…),(…), matrícula (…), às 17.10h, mas não está registada a hora a que o arguido tinha saído com esta carrinha. Nos Boletins de Itinerário do arguido A (cfr. Apenso BQ, 3º Volume, fls. 465) não está anotada qualquer deslocação de serviço neste dia. Por sua vez, na folha de registo do movimento diário/mensal do veículo (…), neste dia está anotado pelo arguido A – a rubrica aposta é a sua, de acordo com a análise/fundamentação já acima exposta – ter percorrido 25 Km (kms à partida 34.485 e à chegada 34.510), para “(…),(…)”, ao serviço do CZ e abastecido o veículo com 8.000$00 (cfr. Fls. 55.151). E na folha da (…), neste dia está também anotado pelo arguido A – a rubrica aposta é a sua, de acordo com a análise/fundamentação já acima exposta – ter percorrido 16 Km, para “(…)”, ao serviço “(…)” e abastecido o veículo com 8.000$00 (cfr. Fls. 896, Apenso EJ, pasta 3). Mas na folha de planificação semanal/diária, em que não estava anotada qualquer deslocação do motorista A para o dia 12/11/00 (cfr. Fls. 766, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de o arguido ter feito deslocações e ter andado com uma carrinha (…) e com uma carrinha (…). 2. Mas neste dia 12/11/00 (Domingo), no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamente e logística, também não está distribuído qualquer veículo (…) ou (…) aos restantes motoristas que têm serviço neste dia (cfr. Fls. 766, Apenso EJ, Pasta 2). a) O motorista EC tem anotado um serviço, às 16h, para (…)e (…) e atribuído o veículo (…). No entanto, no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 73 e 74), está registada a entrada do motorista EC, às 15.15h, com a (…) matrícula (…) , não estado registada a hora a que tinha saído com o veículo. Tem registada também a saída, às 16 horas, com o veículo (…) e entrada às 20.40h. E nova saída às 20.50h com a (…), não estando registada nova entrada do veículo nesse dia com este motorista (nem no dia a seguir) (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.72, 73 e 74). b) Na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), neste dia está anotado - por motorista cuja rubrica não é legível para o tribunal, ter percorrido 72 Kms para “(…),(…)”, pessoas transportadas “ Dra. IIP” (cfr. Fls. 866, Apenso EJ, Pasta 3). No Boletim de itinerário preenchido pelo motorista EC no mês de Novembro de 2000, no dia 12/11/00 tem anotada deslocação a “(…) e (…), levar alunos”, tendo iniciado o serviço às 9h e regressado às 23h, não tendo registada qualquer deslocação ao (…), pelo que o tribunal não obteve certeza quanto a quem fez esta deslocação (cf. Apenso BQ, 5º volume, fls. 1112). Não obstante o que antecede, na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotado o serviço a deslocação do motorista EC para o dia 12/11/00 (cfr. Fls. 766, do Apenso EJ, Pasta 2 ), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de o motorista EC ter andado com uma carrinha (…). E não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de um motorista – tenha sido o motorista EC, ou outro motorista, cuja entrada e saída não tenha sido registada no portão de CZ - ter feito uma deslocação de serviço ao (…), numa carrinha (…). 3. Mas sucedem mais duas situações neste dia. Como referido, no dia 12/11/00, Domingo, no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamento e logística, não está distribuído qualquer veículo (…) ou (…) aos motoristas que têm serviço neste dia (cfr. Fls. 766, Apenso EJ, Pasta 2). Mas: a) Para além da utilização pelo arguido A da carrinha (…), nos termos em que vimos, após a utilização desta (…) pelo arguido A está registada a utilização da (…) por um outro motorista, cuja rubrica não é legível, como tendo percorrido 18 kms com a carrinha, em (…), ao serviço da (...) (cfr. Fls. 55.151). No entanto, no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 73 e 74), não está registada a entrada ou saída da (…), com qualquer outro motorista para além do arguido A e dos elementos de fls. 55.151 resulta que a carrinha andou com outro motorista. Também não obstante o que antecede, na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotado o serviço dos motoristas e veículos atribuídos para o dia 12/11/00 (cfr. Fls. 766, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto de um motorista – para além da também já apontada falta de registo/anotação quanto ao arguido A - ter andado com uma carrinha (…). Para além de (e como já mencionado) no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 73 e 74) não estar registada a entrada ou saída da (…), com qualquer outro motorista para além do arguido A (quando dos elementos de fls. 55.151 resulta que andou com outro motorista). b) No registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 73 e 74), está ainda registada a saída, às 13.20h, do motorista UC com a (…) matricula (…), não estando registada a hora em que este veículo, com este ou outro motorista voltou a entrar. O motorista UC tem registada a saída às 20.50h e a entrada às 23.25h, com o veículo de matrícula (…), sendo que no mapa de fls. 766, do Apenso EJ, Pasta 2, tinha distribuído serviço com o veículo (…) (Pesado) e não era referida qualquer carrinha (…). Não obstante o que antecede, na folha de planificação semanal/diária, em que estava anotado o serviço dos motoristas e veículos atribuídos para o dia 12/11/00 (cfr. Fls. 766, do Apenso EJ, Pasta 2), não foi feita qualquer anotação/rectificação quanto ao facto do motorista UC ter efectuado serviço com uma carrinha (…). (X) No dia 18/11/00 (Sábado), no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamente e logística, não está distribuído qualquer serviço ao arguido A, estando anotados nos dias anteriores (de 13 a 17/11/00 “Férias”). Quanto aos motoristas que têm serviço atribuído, ao motorista SZ está atribuído o Pesado (…), ao motorista UC o pesado (…), ao motorista VO o pesado (…), ao motorista Duarte o Pesado (…), ao motorista HJ uma carrinha (…) e aos motorista EC e BBG (cfr. fls. 767) não está atribuído qualquer veículo (cfr. Fls. 767, 768 e 769, Apenso EJ, Pasta 2). 1. Neste dia o motorista HJ tem anotado um serviço às 9h para (…) e uma carrinha (…), sendo que corresponde com tal serviço quer os registos da entrada e saída da (…) pelo portão de CZ, quer os registo na folha do movimento diário da viatura (cfr. Fls. 768 e 769, Apenso EJ, Pasta 2; fls. 65 e 66, Apenso EJ, Volume 7; e fls. 866, Apenso EJ, Pasta 3). 1.1. No entanto, no registo da entrada e saída de veículos do portão de acesso às garagens de CZ (Apenso EJ, vol. 7, fls. 65 e 66): a) Está registada a entrada do motorista UC, às 8.15h, com a (…) matrícula (…), não estado registada a hora a que a carrinha tinha saído anteriormente do CZ, sendo que no dia anterior, 17/11/00, também nada está anotado quanto à entrada e saída desta carrinha (embora na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), no dia 17/11/00, dia anterior ao que agora estamos a tratar, esteja anotado a carrinha ter percorrido 39 kms, Serviço FA, portanto fez um serviço) (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.65, 66 e 67; e Apenso EJ, Pasta 3, fls. 896). No entanto, apesar de estar registado este movimento de entrada da carrinha pelo Portão de CZ, com o motorista UC, na folha de “registo do movimento diário/mensal” que se encontrava dentro da (…) (e onde cada motorista devia registar quanto andava com a carrinha), neste dia 18/11/00 não está anotada qualquer utilização por motoristas e, portanto, não está anotada a utilização pelo motorista UC (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 896). b) Está registada a saída do motorista EC às 9.30h, com entrada às 12.10h, com a (…) matrícula (…) (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.65 e 66). E a saída do motorista UC às 20.55h (não estando anotada posterior entrada nesse mesmo dia, mas estando anotada uma entrada no dia 19/11, às 8.35h), com a (…) matrícula (…) (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.65 e 66; e 64). Na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), neste dia 18/11/00 está anotada a utilização da carrinha por dois motoristas diferentes (conclusão que o Tribunal retirou do facto de, para o Tribunal, as rubricas que estão apostas à frente de cada deslocação serem diferentes). Há uma primeira anotação do serviço correspondente a 131 kms, “ Futebol de 5, (…)”; e uma segunda anotação de serviço correspondente a 31kms, em (…), “ Serviço (…)” (cfr. Fls. 55.151). No Boletim de itinerário preenchido pelos motorista EC e UC, no mês de Novembro de 2000, no dia 18/11/00 nada têm anotado quanto a serviços, pelo que por este elemento nada esclareceu quanto a “quem” terá feito o “quê” (cf. Apenso BQ, 5º volume, fls. 1112 e 6º volume, fls. 1189). Assim, não obstante para o motorista UC, na folha de planificação semanal/diária em que estava anotado o serviço e veículo atribuído ao motorista para o dia 18/11/00 (cfr. Fls. 767 a 769, do Apenso EJ, Pasta 2), não estar prevista a utilização de carrinha (…) ou (…), não foi feita qualquer anotação/rectificação na folha quanto ao facto de o motorista UC ter utilizado uma carrinha (…) e uma carrinha (…) neste dia. E, como vimos, apesar de estar registado o movimento do motorista UC com a (…) a entrar no portão de CZ (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls. 65, 66 e 67), na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), neste dia 18/11/00 não está anotada qualquer utilização por motoristas e, portanto, não está anotada a utilização pelo motorista UC (cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 896). A carrinha circulou e o motorista que andou com a mesma, neste caso o motorista UC, não anotou a distância que percorreu com a mesma, nem onde foi com o veículo. Não obstante o que antecede, o registo dos Kms “à partida” e “à chegada” - na folha dos “Kms” que se encontrava no interior da carrinha, e a que se referem os elementos do Apenso EJ, Pasta 3 - são concordantes com as anotações do movimento anterior (dia 17/11/00) e com o movimento posterior (21/11/00). Isto apesar de na fls. 65, 66 e 67 do Apenso EJ, vol. 7 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), estar registado que o motorista UC no dia 18/11/00 circulou com a carrinha. (XI) 1. No dia 25/11/00 (Sábado), no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamento e logística, está distribuído um serviço ao arguido A, numa anotação manuscrita, “2.30h”, CZ, Ténis de mesa, (…) (cf. fls. 770,771, 772 do Apenso EJ, Pasta 2), mas não está escrita atribuição de veículo. Quanto aos demais motoristas que têm serviço atribuído, ao motorista SZ está atribuído o Pesado (…), ao motorista UC o pesado (…), ao motorista EC o pesado (…), ao motorista VO o Pesado (…), ao motorista BBG a (…), ao motorista MG o veículo (…) e ao motorista HJ, manuscrito (cfr. fls. 772), está atribuída uma (…) (cfr. Fls. 770, 771, 772, Apenso EJ, Pasta 2). a) No registo de entradas e saídas de veículos, pelo portão que dá acesso às garagens do CZ, não está registada a entrada ou saída do arguido A com qualquer veículo (cfr. Fls. 55 e 56, Apenso EJ, Volume 7). Na folha de registo do movimento diário/mensal das carrinhas da AX – em relação às quais foram remetidos elementos para os autos -, não está anotada a utilização de qualquer veículo pelo arguido A. E nos boletins de itinerário do arguido, também não está registada qualquer deslocação neste dia (Cfr. Apenso BQ, 3º Volume, pag. 465). Pelo que o Tribunal concluiu que apesar da anotação de serviço, manuscrita, a fls. 770 (do Apenso EJ, Pasta 2), o arguido neste dia não fez serviço para a AX. b) Na folha de registo do movimento diário/mensal da carrinha (…), matricula (…), não está anotada a utilização da carrinha neste dia 25/11/00. No entanto, no registo de entradas e saídas de veículos, pelo portão que dá acesso às garagens do CZ, está registada a entrada da carrinha às 13 horas com o motorista SZ, não estando registada a hora a que saiu anteriormente (cfr. Fls. 55 e 56, Apenso EJ, Volume 7). Assim, não obstante para o motorista SZ, na folha de planificação semanal/diária em que estava anotado o serviço e veículo atribuído ao motorista para o dia 25/11/00 (cfr. Fls. 770, 771, 772 do Apenso EJ, Pasta 2), não estar prevista a utilização da carrinha (…), não foi feita qualquer anotação/rectificação na folha quanto ao facto de o motorista SZ ter utilizado a carrinha (…). E, como vimos, apesar de estar registado o movimento do motorista SZ com a (…) a entrar no portão de CZ (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.55 e 56), na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), que se encontrava dentro da carrinha, neste dia 25/11/00 não está anotada a utilização da carrinha pelo motorista SZ, nem quanto andou ou que serviço foi fazer (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866). Sendo que quando nessa folha são anotados como Kms “ à partida” no dia 27/11/00 – primeiro dia em que consta a utilização da carrinha após 25/11/00 -, foram a(...)s os Kms que o veículo “tinha” “à chegada” no dia 24/11/00, como se a carrinha não tivesse tido qualquer movimento no dia 25/11/00 (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866). 2. No registo de entradas e saídas de veículos, pelo portão que dá acesso às garagens do CZ, está registada a entrada da carrinha (…), matrícula (…), às 8 horas com o motorista EC, não estando registada a hora a que saíra anteriormente (cfr. Fls. 55 e 56, Apenso EJ, Volume 7). Este motorista volta a sair às 8.15h, entrar às 11.40h, sair de novo às 11.45h, não estando registado hora a que volta a entrar, mas com o veículo (…). Na folha de registo do movimento diário/mensal da carrinha (…) (folha esta que se encontrava dentro da carrinha), matricula (…), não está anotada a utilização da carrinha neste dia 25/11/00. Assim, não obstante para o motorista EC, na folha de planificação semanal/diária em que estava anotado o serviço e veículo atribuído ao motorista para o dia 25/11/00 (cfr. Fls. 770, 771, 772 do Apenso EJ, Pasta 2), não estar prevista a utilização de carrinha (…) pelo motorista, não foi feita qualquer anotação/rectificação na folha quanto ao facto de o motorista EC ter utilizado a carrinha (…). E, como vimos, apesar de estar registado o movimento do motorista EC com a (…), a entrar no portão de CZ (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.55 e 56), na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), que se encontrava dentro da carrinha, neste dia 25/11/00 não está anotada a utilização da carrinha pelo motorista EC (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 896). Sendo que quando nessa folha são anotados como Kms “ à partida” no dia 27/11/00 – primeiro dia em que consta a utilização da carrinha após 25/11/00 -, foram a(...)s os Kms que o veículo “tinha” “à chegada” no dia 24/11/00, como se a carrinha não tivesse tido qualquer movimento no dia 25/11/00 (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866). (XII) 1. No dia 26/11/00 (Domingo), no mapa do planeamento de transportes e Motoristas, feito pela Divisão de aprovisionamento e logística, não está distribuído serviço ao arguido A (cfr. fls. 770,771, 772 do Apenso EJ, Pasta 2) nem está escrita atribuição de veículo. Quanto aos demais motoristas que têm serviço atribuído, ao motorista SZ está atribuído (manuscrito a fls. 770) um serviço mas não está atribuído veículo; ao motorista UC está atribuído o pesado (…); ao motorista EC o pesado (…); ao motorista VO, manuscrito (cfr. fls. 771), uma (…); ao motorista BBG a (…); ao motorista MG não está atribuído serviço; e ao motorista HJ também não está atribuído serviço (cfr. Fls. 770, 771, 772, Apenso EJ, Pasta 2). 1.1. Na folha de registo do movimento diário/mensal da carrinha (…), matricula (…), não está anotada a utilização da carrinha neste dia 26/11/00. Está anotada a utilização da carrinha no dia 27/11/00, anotação esta que se verifica estar rectificada de “26” para “27”, num percurso “(…)/(…)”, rectificação que o Tribunal concluiu que se deve a lapso, não detectado pelos serviços de transportes aquando da verificação dos serviços efectuados pelos motoristas e veículos. Com efeito, no registo de entradas e saídas de veículos, pelo portão que dá acesso às garagens do CZ, está registada a saída da carrinha às 10.20 horas e entrada ás 12h com o motorista VO (cfr. Fls. 55 e 56, Apenso EJ, Volume 7). Como na folha de planeamento para o dia 26/11/00 o serviço atribuído ao motorista VO era uma deslocação a (…), não estando planificada qualquer deslocação a (…) no dia 27/11/00 (cf. fls. 771, 773, 774 e 775 Apenso EJ, Pasta 2), a anotação “rectificada” dever resultar de um lapso. 1.2. Sucede, também, que no registo de entradas e saídas de veículos, pelo portão que dá acesso às garagens do CZ, está registada a saída da carrinha (…), matrícula (…), às 13.50h com o motorista EC, não estando registada a hora a que volta a entrar nesse dia (cfr. Fls. 53 e 54, Apenso EJ, Volume 7). Na folha de registo do movimento diário/mensal da carrinha (…), matricula (…), folha esta que se encontrava no interior da carrinha, não está anotada a utilização da carrinha neste dia 26/11/00, tal como não estava a utilização da carrinha no dia 25/11/00, como vimos dia (cfr. Fls. 53 e 54, Apenso EJ, Volume 7). Assim, não obstante ao motorista EC, na folha de planificação semanal/diária em que estava anotado o serviço e veículo atribuído ao motorista para o dia 26/11/00 (cfr. Fls. 770, 771, 772 do Apenso EJ, Pasta 2), não estar prevista a utilização de carrinha (…) pelo motorista, não foi feita qualquer anotação/rectificação na folha quanto ao facto de o motorista EC ter utilizado a carrinha (…). E, como vimos, apesar de estar registado o movimento do motorista EC com a (…) a entrar no portão de CZ (cfr. Apenso EJ, vol. 7, fls.53 e 54), na folha de registo do movimento diário/mensal da (…), neste dia 26/11/00, não está anotada a utilização da carrinha pelo motorista EC ou por qualquer outro motorista (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866). Sendo que quando nessa folha são anotados, como Kms “ à partida” no dia 27/11/00 – primeiro dia em que consta registada a utilização da carrinha após 26/11/00, mas sendo o ultimo registo de utilização em 24/11/00 -, são anotados os Kms que o veículo “tinha” “à chegada” no dia 24/11/00. E, como acima vimos, a carrinha circulou no dia 26/11/00 e também tinha circulado no dia 25/11/00 embora desconhecendo o Tribunal quanto percorreu ou para onde (Cfr. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 866). (XIII) No dia 1/02/00 (terça- feira) temos que : 1. Na Planificação de transportes (cf. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 710) está atribuída a utilização de um veículo “ligeiro” ao arguido A, para uma deslocação à (…). O arguido A registou ter utilizado a (…), tendo registado ter andado com a mesma 447 Km (cf. Apenso EJ, Pasta 3, fls. 905; sendo que no Boletim de itinerário que consta a fls. 456, do Apenso BQ, 3º volume, registou a deslocação a (…) com saída às 8.30h e chegada às 23.00h). 1.1. Mas no Apenso EJ, vol. 7, fls. 513/514, referente ao registo das entradas de veículos no portão do CZ, está registado que o veículo de matrícula (…), entrou às 8.15h e voltou a sair às 8.45h com o motorista SZ, não estando registada a posterior entrada do veículo com o motorista SZ. Este tem no entanto registado que às 8.45h saiu com o veículo (…) e voltou a entrar às 15.42h (cf. fls. 514, Apenso EJ volume 7), pelo que o Tribunal desconhece a hora da sua entrada com a (…) (o que causa alguma dúvida quanto à fidedignidade, só por si e desacompanhados de outros elementos, destes registos de movimentação de veículos e com quem, tendo em atenção que está registado que este motorista saiu às 8.45h com dois veículos: a carrinha (…) e o veículo (…)). No Apenso EJ, vol. 7, fls. 514/515, não está registada a saída do arguido A com o veículo (…), estando apenas registada a entrada do arguido com o veiculo às 23.30h (cf. fls. 513, Apenso EJ, Volume 7). Esta utilização pelo motorista SZ da (…) de matrícula (…), não foi anotada ou rectificada na folha 710, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista SZ tinha prevista deslocação a (…) e (…), com o veículo (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro (deslocação que no Boletim de itinerário que se encontra a fls. 1001, do Apenso BQ, vol. 5, se encontra registada como tendo sido feita pelo motorista (a (…)), com saída às 9h e regresso às 18h). Acresce que no Apenso EJ, Pasta 3, fls. 905 (correspondentes às folhas de registo do movimento diário/mensal de viaturas), o motorista SZ não anotou a utilização do veículo por si e, consequentemente, na folha do veículo não apôs os quilómetros que andou com a viatura (…). E o motorista A, quando na folha 905, do Apenso EJ, Pasta 3, anotou os 447 Kms que nesse diz fez com a (…), anotou como “Kms à partida” o número de quilómetros que o veículo registava no movimento anterior, que fora no dia 31/01/00 (cfr. fls. 906, do Apenso EJ, Pasta 3) e como Kms “ à chegada” o somatório dos “Kms à partida” com os 447 Kms. Estes 447 Kms são compatíveis com a deslocação (ida e volta) a (…) e algum percurso que tenho feito dentro da localidade, para se dirigir ao sítio concreto onde ia , pois de acordo com o Google Earth a distância (…)/(…) é de 193 Kms. 1.2. Em consequência da análise que antecede, para o Tribunal, no dia 1/02/00 a carrinha (…): - foi utilizada por dois motoristas, tendo apenas um registado na folha que se encontrava no veículo a sua utilização. - a carrinha percorreu quilómetros, metros ou que medida fosse, com dois motoristas, pelo que forçosamente percorreu mais metros ou Kms do que aqueles que foram a(...)s pelo arguido A a fls. 905, do Apenso EJ, Pasta 3; - …mas na folha do veiculo continuou a existir uma correcta correspondência entre os “Kms à partida” e os “Kms à chegada”, com o movimento anterior (o do dia 31/1/00) e com o movimento posterior (o do dia 3/02/00). 2. Mas há uma segunda questão e que tem a ver com a “disponibilidade” ou possibilidade de “disponibilidade” de veículos de veículos por parte dos motorista, no caso concreto do arguido A e com o controlo – ou tipo de controlo - que a AX fazia da efectiva utilização dos veículos e sua correspondência com os serviços atribuídos. Nos elementos referentes aos registos que existem nos autos das chamadas feitas pelo nº (…) - que, como acima referido, o Tribunal concluiu que, pelo menos, no ano de 2000 foi utilizado pelo arguido A, cfr. Apenso V, Envelope 25, Registo de chamadas do número (…) -, temos os seguintes registos de chamadas feitas por este número e BTS accionadas: E-12.26 horas – BTS de (…) E-15.43 horas – BTS de (…) E-15.44 horas – BTS de Alcácer do Sal Lx E- 16.25 horas – BTS de (…),(…) E-16.45 horas – BTS de (…),(…) E-16.50.13 horas – BTS de (…),(…) E-16.50.59 horas – BTS de (…),(…) E-19.13 horas – BTS (cx correio) E-19.14 horas – BTS (cx correio) E-20.39 horas – BTS de (…),(…) Estes registos são compatíveis com o serviço que o arguido tinha atribuído de uma deslocação a (…), sendo que com estes elementos o Tribunal concluiu que o arguido iniciou este serviço de manhã e às 16.25h, no regresso, accionou a BTS do (…) e às 16.45h a BTS de (…), em (…). Mas como vimos, no Apenso EJ, vol. 7, fls. 514/515, não está registada a saída do arguido A com o veículo (…), estando apenas registada a entrada do arguido com o veiculo às 23.30h (cf. fls. 513, Apenso EJ, Volume 7). O que o arguido fez com o veículo entre a hora que chegou a (…) vindo de (…) – que terá sido, aproximadamente, perto das 16.45h – e a hora a que tem registada a entrada com o veículo em CZ – 23.30h -, não resulta, nem foi anotado, na folha de planificação do serviço de transportes (cfr. Fls. 710 Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística). Sendo que no Boletim de itinerário que consta a fls. 456, do Apenso BQ, 3º volume - em que o arguido A registou a deslocação a (…) com saída às 8.30h e chegada às 23.00h -, não foi feita qualquer rectificação pelo Serviço que fez o controlo e conferência do documento (ver que está a(...) no boletim o carimbo do serviço da Divisão de pessoal e vencimentos, no lado direito da folha, manuscrita a percentagem a aplicar para efeitos de pagamento). 2.1. Ligado, ainda, com esta questão da “disponibilidade” ou possibilidade de “disponibilidade” de veículos de veículos por parte, no caso concreto, do arguido A, concorreu para a convicção que o Tribunal criou - quanto à efectiva possibilidade, por parte do arguido A, de utilização das carrinhas (…) da AX, sem que tal fosse notado e/ou chamada a atenção -, o depoimento da testemunha HQ (o qual foi porteiro, a tempo inteiro, desde aproximadamente 1996, no portão da saída e entrada de viaturas do CZ, sendo que quanto à sua isenção, objectividade e forma como prestou o depoimento, o Tribunal convoca o que já disse anteriormente, quando enunciou, em sede de meios de prova, o rol das pessoas ouvidas em audiência), que disse ao tribunal conhecer o arguido A da instituição e morar próximo do mesmo. Confirmou ter visto carros da AX (carrinha (…) e a carrinha (…)), estacionados à noite junto da casa de A – casa que identificou ser a que se situava na (...) (…), ao pé do (...) DT -, mas não sabendo dizer, contudo, se as carrinhas ficavam lá durante a noite ou não, pois a testemunha viu isto quando à noite, por volta das 23h (no máximo) passava por tal local, quando saía do turno da noite e ia para casa. Disse, também - depoimento que, nesta parte, será referido com mais pormenor, quando tratarmos os aspectos ligados ao controlo de alunos dentro da instituição -, que aos fins de semana, sábados e domingos, viu A sair de manhã cedo da AX com jovens da AX, no carro particular do arguido e nas carrinhas da AX que conduzia. O Tribunal tentou localizar no tempo este facto, tendo a testemunha conseguido precisar que isto foi numa altura em que esteve a fazer – por troca ou para preenchimentos de faltas de algum colega - o turno da manhã, pois esclareceu o Tribunal que ou por ser o seu turno ou por fazer turnos de outros por causa de faltas, folgas, férias ou feriados, desde 1994/95, até há cerca de dois anos (e a testemunha foi ouvida em 31/05/06), ao fim de semana fez turno das “16h/24h”, das “24h às 13h” ou das “8h às 14h” abrangendo, embora com a amplitude que numa primeira abordagem resulta do depoimento da testemunha, o período temporal a que se referem os factos objecto deste processo. Mas cruzando este depoimento com o que já dissemos no ponto “3.3.2., (2) e (2.1)” - quando fizemos a análise crítica da prova em relação a “ …3. (II) – Dos factos referentes ao percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX (Factos constantes de fls. 20.837 a 20.842 do Despacho de Pronuncia, descritos sob “ 2 - Percurso pessoal e estatuto funcional dos arguidos A e C na AX; 2.1 – Percurso e funções do arguido A na AX; 2.2 – Percurso e funções do arguido C na AX”)…” -, o Tribunal retroagiu o início deste período temporal, com segurança, a Janeiro de 1998. Isto porque em 18/2/00 o arguido foi oficialmente nomeado Motorista de Ligeiros. No entanto vimos que o então (...), no seu Despacho de 10/12/99, para nomeação do arguido, disse que o mesmo tinha começado a desempenhar essas funções pelo menos “…há mais de um ano…” - sendo, como então referimos, de aferir esta referência temporal em relação a 10/12/99, o que numa primeira abordagem daria o início das funções, pelo menos, em Novembro de 1998 -, mas que do Apenso BQ, 3º volume, resulta que o arguido desempenhava as funções pelo menos desde Janeiro de 1998 (cfr. Apenso CQ, Vol. II, fls. 628, com Nomeação definitiva como motorista de ligeiros em 6/3/00, Publicada em 6/3/00 no DR., fls. 629; sendo que a fls. 640 consta uma declaração assinada pelo então (...) Sr. Dr. BQ, datada de 10 de Dezembro de 1999, certificando que o arguido A, com a categoria de operário, da carreira de Jardineiro, desempenha há mais de um ano as funções próprias da carreira de Motorista de Ligeiros, as quais correspondem às necessidades permanentes da instituição e na sequenciada qual foi feita a reclassificação, conforme consta a fls. 636 ; cfr. Apenso BQ, correspondente aos boletins de itinerário do arguido A “ como motorista” desde Janeiro de 1998 e ainda o depoimento da testemunha WE, o qual disse ao Tribunal que quando foi trabalhar para a (...), em 1998, um dos trabalhos que pediu ao arguido A foi para fazer a distribuição de material pelos (...)s). (XIV) No dia 7/02/00 (segunda feira) o arguido A tem anotado a fls. 711, do Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de aprovisionamento e Logística (cfr. Apenso EJ, Pasta 2), a atribuição de uma (…) e como serviço a volta do “Correio”. O motorista VO tem atribuído um veículo ligeiro, não havendo na planificação a expressa atribuição de carrinhas (…) ou RENAULT aos demais motoristas (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 711). a) O arguido A, que na folha de planificação e transportes tem previsto o início do serviço do “Correio” para as 9.00h, na folha do registo da entrada e saída de veículos (cfr. fls. 502/503, do Apenso EJ, Volume 7), tem registada a saída às 8.55h com o veículo (…) (a referida (…), mas da qual não existem nos autos as folhas que em princípio existiriam no veículo, para a anotação pelos motoristas dos kms percorridos por cada um com o veículo) e a entrada às 18.30h. Não há o registo de qualquer outra entrada ou saída do motorista A com este ou com outro veículo. b) O motorista UC na folha de planificação apenas tem atribuído um “veículo pesado” (…) (cfr. fls. 711, Apenso EJ, Pasta 2). No Apenso EJ, vol. 7, fls. 502 e 503 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado que às 10.10h saiu com o veículo (…), entrou às 11.07h; voltou a sair e a entrar com o mesmo veículo às 13.10h e às 14h; voltou a sair e a entrar com o mesmo veículo às 16.20h e às 17.15h. Mas às 17.25h está registado que o motorista UC saiu com a (…), não estando registada a entrada deste motorista com o veículo. Esta utilização pelo motorista UC da (…) de matrícula (…), não foi anotada ou rectificada na folha 711, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista UC tinha previsto deslocações apenas com o veículo (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro. c) A entrada da (…) está registada às 19.30h, mas com o motorista SZ (cf. fls. 502/503, do Apenso EJ, vol. 7). O motorista SZ, por sua vez, na folha de planificação do serviço e de veículos (cfr. fls. 711, Apenso EJ, Pasta 2) apenas tem atribuído um “veículo pesado” (…). No Apenso EJ, vol. 7, fls. 502 e 503 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado que às 8.25h saiu com o veículo (…), entrou às 9.05h; voltou a sair com este veículo, pois embora não esteja registada “esta” saída, tem registada uma nova entrada com o veículo às 17.15h. Mas, como vimos, às 19.30h tem registada uma entrada com a (…), não estando registada a anterior saída do veículo com este motorista. Há registada uma saída da (…) às 17.25h, mas com o motorista UC, como vimos, sem que tenha sido registada a posterior entrada deste motorista com o veículo (cfr. fls. 502/503, do Apenso EJ, vol. 7). Às 20.00h o motorista SZ tem registada outra saída, mas desta vez com a (…), não estando regista a entrada. Esta utilização pelo motorista SZ da (…) de matrícula (…) e da (…) de matrícula (…), não foi anotada ou rectificada na folha 711, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista SZ tinha previsto deslocações apenas com o veículo (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro. d) Por sua vez , na folha 875, do Apenso EJ, Pasta 3 (correspondente à folha do registo do movimento diário/mensal do veículo da (…) de matrícula (…)), apenas está registado um movimento de 66 Kms ao “Serviço de BF”, sem qualquer rubrica à frente (embora de acordo com a fl. 711, do Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística, esteja destinado o serviço de BF para o motorista SZ, pela análise dos registos da sua entrada e saída com veículos pelo portão de CZ (com o (…) e com a (…)), não se pode concluir, para além de qualquer dúvida, que a rubrica seja a sua). Isto apesar de nas fls. 502/503, do Apenso EJ, vol. 7 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), estar registado que a (…) teve movimentos com dois motoristas: o motorista SZ e o Motorista UC. (XV) No dia 8/02/00 (terça feira) o arguido A tem anotado a fls. 711, do Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de aprovisionamento e Logística (cfr. Apenso EJ, Pasta 2), a atribuição de um veículo Ligeiro e como serviço, apenas “ (...) (…)”. O motorista EC tem atribuído um veículo (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 711). E o Motorista UC tem atribuído o (…) e o (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 711). 1. a) O arguido A, que na folha de planificação e transportes tem previsto o início do serviço “ (...) (…)” para as 9.30h, na folha do registo da entrada e saída de veículos (cfr. fls. 501, do Apenso EJ, Volume 7), tem registado um único movimento nesse dia, de saída às 17.05h e entrada às 18.30h, com a (…). Não há o registo de qualquer outra entrada ou saída do motorista A com este ou com outro veículo. A fls. 55.142 (correspondente à folha do registo do movimento diário/mensal da (…) de matrícula (…)), o arguido A registou ter percorrido com este veículo 44 Km (com a identificação do serviço (…), (…) etc…/ Alunos da (…)). Esta deslocação do arguido A à (…), em serviço com Alunos da (…), não foi anotada ou rectificada na folha 711, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista A apenas tinha previsto o serviço da “(...), (…)”. b) Pôs-se ao Tribunal a questão de verificar se o arguido A tinha feito, efectivamente, uma deslocação a (…), como estava planeado pela Divisão de Transportes (cfr. Fls. 711, do Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística). De acordo com o Boletim de itinerário que consta a fls. 456, do Apenso BQ, 3º volume, o arguido A registou a deslocação a (…), tendo registado a saída às 8.30h e chegada às 23.00h. Recorrendo aos elementos referentes aos registos que existem nos autos das chamadas feitas pelo nº (…) - que, como acima referido, o Tribunal concluiu que, pelo menos, no ano de 2000 foi utilizado pelo arguido A, cfr. Apenso V, Envelope 25, Registo de chamadas do número (…) -, temos os seguintes registos de chamadas feitas por este número e BTS accionadas, neste dia: E-11.20 horas – BTS de (…) E-12.31 horas – BTS de (…) E-12.42 horas – BTS de (…) E-12.50 horas – BTS de (…) E-13.45 horas – BTS de (…) E-13.46 horas – BTS de (…) E-13.54 horas – BTS de (…) E-14.33 horas – BTS de (…) E-14.54 horas – BTS de (…) E-15.37 horas – BTS de (…),(…) E-15.38 horas – BTS de (…),(…) E-15.45 horas – BTS de (…),(…) E-16.09 horas – BTS de (…),(…) E-16.15 horas – BTS de (…),(…) E-16.46 horas – BTS de (…),(…) E-18.18 horas – BTS de (…),(…) E-18.53 horas – BTS (…) E-19.11 horas – BTS de (…),(…) E-19.14 horas – BTS de (…),(…) E-22.15 – BTS de (…),(…) Estes registos são compatíveis com o serviço que o arguido tinha atribuído de uma deslocação a (…), sendo que da conjugação do planeamento do serviço de transportes, do Boletim de itinerário e destes elementos, o Tribunal concluiu que o arguido fez este serviço, tendo-o iniciado de manhã – mas ao fim da manhã, pois tem accionada a BTS de (…) às 11.20h e às 12.31h a BTS em (…)- e às 15.37h estava de regresso, pois a partir desta hora acciona a BTS de (…), em (…). Não fez este serviço, contudo, com a hora de início e a hora de regresso que apôs no Boletim de itinerário que consta a fls. 456, do Apenso BQ, 3º volume - em que o arguido A registou a deslocação a (…) com saída às 8.30h e chegada às 23.00h – e não foi feita qualquer rectificação pelo Serviço que fez o controlo e conferência do documento (ver que está a(...) no boletim o carimbo do serviço da Divisão de pessoal e vencimentos, no lado direito da folha, manuscrita a percentagem a aplicar para efeitos de pagamento). Mas como vimos, no Apenso EJ, vol. 7, fls. 501, não está registada a saída do arguido A na parte da manhã, nem a sua (provável) entrada por volta das 15.37h, pois, como já visto, o arguido A apenas tem registado um (único) movimento nesse dia, de saída às 17.05h e entrada às 18.30h, com a (…). Este movimento de entrada e saída com a (…) de matrícula (…), conjugado com o registo de quilómetros que se encontra a fls. 55.142 dos autos - correspondente à folha do registo do movimento diário/mensal da (…) de matrícula (…), em que o arguido A registou ter percorrido com este veículo 44 Km, com a identificação do serviço (…), (…) etc…/ Alunos da (…) -, é compatível com o mencionado serviço com/para os alunos da (…). Com já referi, com a (…) de matrícula (…) apenas está registado, pelo arguido, a deslocação de 44 km para (…) e (…). Dos registos referentes às carrinhas (…) de matrícula (…) e (…), ao (…) de matrícula (…) (que os motoristas já acima identificados e ouvidos em audiência de julgamento, referiram ser o veículo, normalmente, ao serviço da (...)) e das carrinhas (…) de matrícula (…),(…) e (…), em relação às quais existem as folhas do registo de quilómetros feitos pelas viaturas, não consta o registo da deslocação do arguido A a (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 3 - correspondente à folha do registo do movimento diário/mensal dos veículos, fls. 875 e fls. 945; e fls. 55.078 a 55.085, fls. 55.099, fls. 55.142, fls. 55.188). Assim, o Tribunal não conseguiu apurar com que veículo é que o arguido fez a deslocação a (…) ((…)). 2. Passando aos demais motoristas – análise que se considera relevante na perspectiva do esclarecimento do que e era e como era, efectivamente, a disponibilidade/ou possibilidade de disponibilidade dos motoristas da AX dos veículos de serviço e controlo que era feita pela AX –, temos que: a) O motorista UC na folha de planificação apenas tem atribuído o (…) e o (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 711), no Apenso EJ, vol. 7, fls. 501 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado que às 9.50h saiu com o veículo (…) e entrou às 11.50h. Às 14.20h saiu com o veículo (…) e entrou às 15h. Voltou a sair com este veiculo às 16.49h e entrou às 18h. Mas às 12.21h está registado que o motorista UC saiu com a (…) e entrou às 13.10h. Esta utilização pelo motorista UC da (…) de matrícula (…), não foi anotada ou rectificada na folha 711, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista UC tinha previsto deslocações apenas com o veículo (…) e com o (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro. Acresce que na folha 501 do Apenso EJ, vol. 7, (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado um outro movimento desta carrinha (…) com “HHP”, saída às 15.25h e entrada às 16.30h. b) O motorista EC, por sua vez, na folha de planificação apenas tem atribuído um veículo (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 711), no Apenso EJ, vol. 7, fls. 501 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado que às 9.15h saiu com o veículo (…) e entrou às 14.40h. Mas às 15.32h está registado que o motorista EC saiu com a (…) e entrou às 16.53h (veículo este com que o arguido A saiu às 17.05h e entrou às 18.30h, como vimos). Esta utilização pelo motorista EC da (…) de matrícula (…) não foi anotada ou rectificada na folha 711, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista EC apenas tinha previsto deslocações com (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro. c) No entanto, apesar de haver registos de movimentos do motorista UC e de “HHP” com a (…), na folha 875, do Apenso EJ, Pasta 3 (correspondente à folha do registo do movimento diário/mensal do veículo da (…) de matrícula (…)), apenas está registado um movimento de 14 Kms ao “Serviço da (...) ”, com uma rubrica à frente que aparenta ser UC (embora de acordo com a fl. 711, do Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística, não lhe estar destinado o serviço da (...)). O registo dos Kms “à partida” e “à chegada” são concordantes com as anotações do movimento anterior (dia 7/02/00) e com o movimento posterior (11/02/00). Isto apesar de na fl. 501, do Apenso EJ, vol. 7 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), estar registado que a (…) teve movimentos com dois motoristas/pessoas: o motorista UC e “HHP”. (XVI) No dia 24/02/00 (quinta feira) o arguido A tem anotado a fls. 713, do Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de aprovisionamento e Logística (cfr. Apenso EJ, Pasta 2), a atribuição de uma (…) e como serviço “9.00 – Correio; 14.00- Géneros (…)”. O motorista EC tem atribuído um veículo (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 713). O arguido A, na folha do registo da entrada e saída de veículos (cfr. fls. 476, do Apenso EJ, Volume 7), tem registado um único movimento nesse dia, com a saída às 8.35h e entrada às 8.00h, com o veículo de matrícula “(…)”, embora o Tribunal, pela análise que fez de todos os elementos constantes do Apenso EJ, Volume 7 e dos elementos já referidos - quando acima fez a análise da utilização de um veículo de matrícula (…) -, tenha concluído que neste registo existe um lapso de escrita (quando consta “(…)), pois refere-se ao veículo (…) ((…) atribuída na planificação e com volta do Correio e (…)). O motorista EC na folha de planificação apenas tem atribuído o (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 713), no Apenso EJ, vol. 7, fls. 476 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), está registado que às 9.10h saiu com o veículo (…) e entrou às 13h. Voltou a sair com este veiculo às 14.15h e entrou às 14.50h. Mas às 14.55h está registado que o motorista EC saiu com a (…) e entrou às 16.45h. Esta utilização pelo motorista EC da (…) de matrícula (…), não foi anotada ou rectificada na folha 713, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista EC tinha previsto deslocações apenas com o veículo (…), não lhe estando atribuído qualquer veículo ligeiro. (XVII) No dia 25/02/00 (sexta feira) o arguido A tem anotado a fls. 713, do Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de aprovisionamento e Logística (cfr. Apenso EJ, Pasta 2), a atribuição de uma (…) e como serviço “9.00 – Correio”. O motorista BBG tem atribuído uma (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 713), com serviço previsto para “(…) –(…)-(…)”. 1. O arguido A, na folha do registo da entrada e saída de veículos (cfr. fls. 475, do Apenso EJ, Volume 7), tem registado a saída às 9.22 h e a entrada às 22.30h, com a (…) de matrícula (…) e não com a (…) atribuída na planificação. Na folha do registo dos Kms da (…), o arguido A registou neste dia ter percorrido 441 Kms com o veículo, com uma deslocação a “(…), etc.” (cfr. Fls. 905, Apenso EJ, Pasta 3), quando na planificação do serviço de transportes apenas tinha previsto a volta do correio (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fls. 713). A utilização pelo arguido A da (…), em vez de uma (…) e a deslocação a (…), não foi anotada ou rectificada na folha 713, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista A tinha um veículo e serviço atribuído. 2. Na folha de registo de Kms da (…) o arguido A anotou, como serviço, “(…), etc.” e como tendo percorrido 441 Kms (cfr. Fls. 905, Apenso EJ, Pasta 3). A distância (…)/(…), de acordo com valor obtido no Google Earth, é de 143 Kms, o que soma (ida e volta) 286 Kms. Para o total de 441Kms anotados – e descontando 50Kms para deslocação ao local específico a que o arguido terá ido, valor abstractamente razoável – e conjugando com o “etc.” que o arguido anotou à frente de “(…)”, resulta que o arguido andou por mais locais ou deu mais voltas que não foram anotadas ou rectificadas folha 713, do Apenso EJ, Pasta 2 (cfr. Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística), onde o motorista A tinha um veículo e serviço atribuído. Podem, no entanto, ser as “voltas do correio”, serviço que lhe estava atribuído e os kms que tenha feito “dentro” de (…) para chegar ao local específico que era o seu destino, ficando assim “justificada” a aparente diferença de quilometragem entre o percurso a (…) (com a quilometragem obtida pelo Tribunal no Google earth, mas que corresponde em regra à distância entre os “limites de entrada/saída” das localidades) e o registo feito pelo arguido. No Boletim de itinerário do arguido A, no dia 25/02/00 não está registada qualquer deslocação a (…) (cfr. Apenso BQ, 3º Volume, fls. 456). 3. O motorista BBG, que na folha de planificação tem atribuído uma (…) e com deslocação para (…) e (…) (cfr. Apenso EJ, Pasta 2, fl. 713), no Apenso EJ, vol. 7, fls. 475 (referente ao registo das entradas de veículos no portão de acesso às garagens e oficinas do CZ), tem registada a saída com o veículo às 8.30h e não tem registada a entrada com o veículo. Na folha de registo de Kms da (…), o motorista BBG anotou que percorreu 850 Kms com a carrinha, em deslocação a (…) e (…)com alunos (cfr. Fls. 875, Apenso EJ, Pasta 3). 10.1.4. A análise que antecede em relação ao ano de 2000, embora longa é apenas exemplificativa e não exaustiva dos elementos constantes dos “Apenso EJ, Pasta 2 – Planeamento de Transportes e Motoristas na Divisão de Aprovisionamento e Logística”, “Apenso EJ, Pasta 3 – Registo do movimento diário/mensal dos veículos da AX” e do “Apenso EJ, Vol. 7 – registo do movimento de entradas e saídas no Portão de acesso às garagens e oficinas de CZ” levou e permitiu ao Tribunal a concluir, pelo menos, o seguinte: (1) Numa primeira perspectiva, que os dados constantes do registo de entrada e saídas dos veículos de serviço, pelo portão de CZ (“Apenso EJ, Vol. 7 – registo do movimento de entradas e saídas no Portão de acesso às garagens e oficinas de CZ”), podem não corresponder – e o Tribunal fez a demonstração de algumas situações em que não correspondem -, aos únicos movimentos do veículo em determinado dia. Pode ter ocorrido a entrada e saída de veículos, nomeadamente com as carrinhas (…) e com as carrinhas (…) que estavam ao serviço da AX , sem que tal entrada e/ou saída tivesse sido registada. A folha de registo de Kms que se encontrava dentro de cada viatura e onde cada motorista devia anotar os percursos/quilómetros que fazia com a viatura (Apenso EJ, pasta 3 – Registo do Movimento Diário/Mensal das viaturas), não corresponde única, exclusivamente e sem margem de erro, aos kms/deslocações efectivamente feitos por cada motorista, com cada um dos veículos e que só esse motorista tivesse andado naquele dia com o veículo. Como objectivamente demonstrado, houve motorista que conduziram e utilizaram as carrinhas (…) e (…) – mesmo por percursos pequenos que fossem -, que não anotaram tais utilizações ou percursos na folha de registo de quilómetros do veículo. E isso – a utilização do veículo por um motorista e o não registo de percurso feito -, nada transpareceu na forma como eram registados os kms “à chegada” e “à partida” pelos demais motoristas que anotaram terem andado com os veículos. Com efeito e como vimos nos exemplos analisados, nas folhas dos veículos em que se verificaram tais situações houve sempre uma correcta correspondência entre os “Kms à partida” e os “Kms à chegada”, com o movimento anterior e com o movimento posterior, aquele em que houve utilização do veículo e não houve registo do motorista dessa utilização. (2) Numa segunda perspectiva, o que antecede permitiu também ao Tribunal sustentar e concluir – e, em consequência, dar como provados os factos inerentes a tal conclusão -, que o arguido A podia andar e andou 400 Kms com uma carrinha da AX , sem ser detectado. Esta conclusão e facto, é suportada também no seguinte: O arguido A declarou ao Tribunal que viciava a “bicha” do conta quilómetros da carrinha da AX em deslocações que fez com veículo da AX e sem ser em serviço. Esse procedimento traduzia-se em alterar a quilometragem que o “conta quilómetros” do veículo mostrava, “retirando” quilómetros. A empresa Mercedes Benz, na sequência de diligência de prova requerida pelo arguido C, a fls. 28.560 e 28.561, enviou uma informação para os autos, na qual consta que a Marca “…admite sempre como possível a alteração das características dos veículos da marca Mercedes-Benz dos modelos (…) e (…)…”, mas desconhecendo “… os termos em que porventura são efectuadas alterações das características dos veículos…designadamente conta-quilómetros digitais, por pessoas ou entidades alheias à rede de Oficinas Autorizadas…” Esta informação - em relação aos veículos Mercedes - admite a possibilidade técnica de ocorrer a viciação que o arguido A disse ter feito. E o documento de fls. 69 e 70, do “Apenso EI, Vol. 1” - que também se encontra a fls. 473 474 dos autos e que acima já referimos e tratámos, cfr. ponto “3.3.2., (3) e (3.1)” da presente análise crítica da prova -, conjugado com o documento de fls. 68 do mesmo apenso, e conjugado com o depoimento da testemunha HI (o qual foi responsável pela garagem da mecânica e manutenção das viaturas da AX, durante 19 anos, tendo deixado de exercer tais funções, de acordo com o seu depoimento, em “2002”, embora pelo teor dos documentos de fls. 475 e 472 dos autos, o Tribunal tenha ficado convencido que foi em 2001), permitiu ao Tribunal concluir que o arguido A acedeu, com uma carrinha de serviço da AX e para fazer uma reparação nesse veículo, a serviços de oficina que nada tinha a ver com as oficinas da AX. Com efeito, quando vimos o “incidente de 2001”, aquele em que os mecânicos da AX fizeram uma comunicação para o director do CZ em 19/02/01 (cfr. “Apenso EI, Vol. 1”, fls. 69 e 70; cfr. tb fls. 472 a 476 dos autos; e cfr. Ponto “3.3.2., (3) e (3.1) da presente análise crítica de prova), nessa comunicação é dito que o arguido A “...10 – Teve um acidente com a (…), mandou arranjá-la e não comunicou à oficina. Mais tarde, quando esta veio à oficina, verificou-se que a transmissão do lado direito não era de origem mas sim da concorrência, a qual tivemos de substituir por outra de origem devido aos foles não coincidirem. O acidente foi de tal ordem que danificou a caixa ao ponto de se substituir por uma nova....” Do “MEMO” da reunião que foi feita pelo arguido C, na sequência da participação dos mecânicos - que se encontra a fls. 13, do “Apenso EI, Vol. 1” e fls. 475 dos autos -, não resulta qualquer referência a que este episódio, relativo ao acidente da carrinha (…), tenha sido inventado. E em audiência de julgamento a testemunha HI - que, como dissemos, foi responsável pela garagem da mecânica e manutenção das viaturas da AX, tendo deixado de exercer tais funções, de acordo com o seu depoimento, em “2002”, embora pelo teor dos documentos de fls. 475 e 472 dos autos, o Tribunal tenha ficado convencido que foi em 2001 -, quando lhe foi feita a instância pela defesa do arguido A foi interrogado quanto a este incidente do arranjo do veículo acidentado e confirmou-o, tendo acrescentado que a viatura não teve reparação possível e a testemunha deu mesmo o parecer para ir para abate. Assim, era algo que não era único no comportamento do arguido A, se o quisesse fazer, levar um veículo a uma oficina para qualquer alteração (ou mesmo obter qualquer ensinamento ou esclarecimento técnico que precisasse, independentemente da marca do veículo ser (…) ou (…)). Cabe referir que a testemunha VO (motorista da AX desde 1990/1991 e tendo trabalhado directamente com o arguido A), disse ao Tribunal que nunca se apercebeu ou ouviu dizer que isso tivesse sido feito, que alguém tivesse acrescentado ou escondido quilómetros . Mas tal depoimento não afasta a possibilidade de isso ter sido feito, nem as conclusões que o Tribunal tem estado a retirar e retirou, do cruzamento que está a fazer dos elementos e documentos dos autos. (3) Numa terceira abordagem (repetimos), a análise que o Tribunal fez dos dados, objectivos, referentes à planificação, movimentação e utilização de veículos e à atribuição e efectivação de serviços (aos ou) por parte dos motoristas da AX, permitiu-nos concluir e sustentar que o controlo que a AX fazia - concretamente o seu serviço de transportes – e o controlo que efectivamente tinha, sobre os veículos utilizados pelos motoristas e os percursos realmente feitos por cada um, era um controlo essencialmente formal. Isto é, de correspondência meramente formal entre os dados que constava em cada elemento per si – fossem boletins de itinerário, folhas de anotação de quilómetros ou folhas de registo de entradas e saídas de veículos no portão de acesso às garagens em CZ –, não fazendo, na avaliação do Tribunal, a verificação efectiva dessa correspondência. Isto é: - se os km anotados nas folhas que estavam nos veículos, correspondiam aos serviços efectivamente feitos ou a que serviços; - se os veículos utilizados por cada motorista foram os que estavam no planeamento, ou se utilizaram mais para além dos que estavam no planeamento, - se as horas de saída e chegada apostas nos Boletins de itinerários pelos motoristas correspondiam, efectivamente, à hora de início e chegada dos serviços; E não fazendo, também, o controlo e cruzamento dos dados que antecedem com os registo de entradas e saídas dos veículos pelos portões. O depoimento da testemunha XQ (que trabalhou na AX de 1966 a Março de 2006, na área administrativa e nos últimos 10/15 anos a Chefiar a Divisão de Aprovisionamento e Logística, onde estava o serviço de transportes) vai no sentido e sustenta esta conclusão do Tribunal. Disse que era o serviço de contabilidade (que estava sob a competência do arguido C) que verificava a folha que estava nos veículos e onde os motoristas anotavam os quilómetros percorridos, não era o serviço de transportes que fazia tal verificação. Do seu depoimento o Tribunal compreendeu que esta “verificação” que disse ser feita tinha a ver não com o controlo do que era o efectivo exercício de funções pelos motoristas – até porque tal não era da competência de tal departamento de contabilidade -, mas com o controlo das horas extraordinárias ou ajudas que eram pagas aos motoristas e que tinham limite legal. E disse, também, que a portaria do CZ, por onde entravam e saíam os veículos de serviço da AX, não tinha conhecimento das escalas de serviço dos motoristas ou dos transportes autorizados, pelo que a sua função era, exclusivamente – e como resulta do depoimento dos motoristas e porteiros que acima assinalámos -, de registo das entradas e saídas. Acrescentando que da garagem dos veículos – onde estavam os carros que os motoristas iam buscar para fazer as suas voltas -, alguém ligado à gestão da frota ou do serviço de contabilidade, também não ia qualquer funcionário à secção de transportes fazer as conferências das escalas de serviço, para ver quais os serviços e veículos atribuídos ou qualquer outro cruzamento de dados. Explicou, quanto à “confirmação” das folhas para pagamento das horas extraordinárias ou de ajudas – e que necessariamente estavam relacionadas com os serviços efectuados por cada motorista – a mesma tinha a seguinte finalidade: “ ...as folhas eram apresentadas no final de cada mês, também como já disse, folhas, horas extraordinárias e ajudas de custo... acontece que o funcionário que tinha responsabilidade de fazer essas folhas, que as fazia ... ia confrontando conforme os serviços existentes ao longo desse ... desse mês, eu só lhe perguntava, está tudo correcto ? Está tudo bem feito, está tudo de acordo ?...Está tudo, confere ... o que ele não poderia confirmar mas ... confirmar isto é, não havia um relógio de ponto, ele ...se o motorista dizia que saía às sete, partia-se do pressu(...) que tinha que se confiar nisso... se não havia um mecanismo para saber se ele tinha saído às sete, nós trabalhávamos...”. E acrescentou que desde 1997, no que diz respeitos às folhas que a testemunha mensalmente punha à consideração do (...) para autorizar as horas extraordinárias ou ajudas dos motoristas - e nas quais punha o seu visto como disse ao Tribunal, depois da “confirmação” que fazia, da forma que acima explicou -, nunca houve qualquer situação em que o seu superior hierárquico a tivesse chamado, por qualquer dúvida surgida quanto à conferência ou quanto ao que estava escrito no boletim. A única vez que se recordou de uma folha que “ter vindo para trás”, foi por não ter a confirmação da testemunha. E a não ser assim - este controlo meramente “formal” e com as limitações que indicámos -, como se explicaria, por exemplo, a situação acima referida com uma deslocação do arguido C “ a (…)” (de acordo com os boletins de itinerário preenchidos) e a deslocação do arguido A com a “deslocação a (…)”? Para o Tribunal, pelo que viu e ouviu no decurso da audiência e do que retirou dos dados que temos estado a analisar, a imposição dos procedimentos que vimos para a utilização de veículos de serviço da instituição deveu-se, essencialmente, à preocupação de controlar que os limites legais para o pagamento de horas extraordinárias ou quaisquer suplementos, não fossem ultrapassados e para controlar tais limites. Vide, por exemplo, as declarações do arguido C, quanto à directiva que emitiu quanto às horas extraordinárias e, por exemplo, o depoimento da testemunha XQ, no segmento que mencionámos. O “crivo fininho” era dirigido ao controlo da conformidade formal e legal, deste aspecto – pagamento de horas extraordinárias e ajudas de custo - inerente à utilização e movimentação de veículos e motoristas na Instituição. Da avaliação que fizemos - quanto aos cruzamentos dos elementos constantes dos Apensos “EJ, Pasta 3”, “EJ, Volume 7”, EJ, Pasta 2” e “BQ” -, essa era realmente a preocupação pois, caso contrário, não poderiam ter sido validades quer pelo serviço de transportes, quer pelo arguido C (quando fosse o caso) quer pelo (...), quer por qualquer pessoa que tivesse tal serviço à sua responsabilidade, (pelo menos) os Boletins de itinerários que acima assinalámos, em que estão assinaladas saídas às 9.30h ou entradas às 23h,, quando, como vimos, objectivamente tal não podia ter acontecido. Quanto à troca de serviços, resultou também objectivamente para o Tribunal que tal a pode ter ocorrido – e ocorreu - entre motoristas, sem que isso tivesse sido vertido para as folhas em que era feito o planeamento mensal ou semanal dos transportes, com a atribuição de serviço e veículo a cada motorista. Vimos, por exemplo, a “ida a (…)” e a “ida ao (…)”, com a troca de serviços e nada constando das folhas de planeamento. (4) E, por fim, a análise que fizemos permitiu verificar que o arguido A, utilizou, ao longo do tempo e indistintamente, quer uma carrinha (…) de “(…)”, quer uma carrinha (…) de “(…)”. Resulta dos documentos dos apensos expressamente mencionados - e que analisámos, embora o Tribunal não tenha, por razões obvias de limitação, mencionado expressamente cada folha e a ilação resultante de cada folha - que no mesmo dia o arguido A utilizou os dois modelos de carrinha, que num dia podia andar com uma (…) mas no dia a seguir ou passados alguns dias, andava com a (…). A relevância de assinalarmos este aspecto tem a ver com o que foram as declarações dos assistentes, pois houve situações em que um assistente disse que só andou na (…), outro só (…), outro que andou numa ou andou noutra. O que gerou, ouvindo os depoimentos e a interpretação que algumas Defesas fizeram de tal discrepância, a que a Defesa atribuísse o sentido de tais discordâncias - ou nas declarações de assistentes entre si, ou dentro da declaração de um assistente -, significasse e fosse um indício de mentira, quer por traduzir inconsistência entre assistentes, quer por traduzir inconsistência intrínseca de um depoimento. Para o Tribunal e pelo que ficou dito, o significado das declarações dos assistentes que tenham preenchido tal padrão de discrepância, não é, à partida, revelador de mentira. O padrão de utilização de veículos por parte do arguido A - e da forma que enunciámos -, permite considerar como plausível, verosímil, que uns retenham e refiram uma marca e modelo de veículo e outros retenham e refiram outro. Como em concreto o referimos, na avaliação e valoração das declarações de cada assistente e nos casos em que tal foi necessário. 11. Do controlo sobre os educando da AX: Outra dos aspectos da linha de Defesa apresentada pelos arguidos - quer nas suas contestações, quer em audiência de julgamento e reafirmado nas Alegações –, para a não prova dos factos relativos aos encontros de assistentes com arguidos para a prática de actos integradores de abuso de natureza sexual, transportados pelo arguido A ou por si mandados e, na perspectiva dos arguidos, demonstrativa da impossibilidade objectiva de tal acontecer da forma que os declarantes afirmaram - e que se encontra descrita no despacho de pronuncia -, foi o controlo que disseram ser exercido sobre os educandos da AX. Controlo este que, de acordo com estas Defesas, não permitia que os Assistentes, aos fins de semana ou durante a semana, se ausentassem dos (...)s e lares para (…) ou para outros locais se tal acontecesse ao fim do dia, sem que tal fosse detectado pelos educadores. 11.1. Comecemos por um dado circunstancial. Uma constatação decorrente da prova produzida em audiência de julgamento, foi o número de educadores, do internato ou sem ser do internato, técnicos vários e funcionários de vários níveis e funções, da AX, que declararam ao Tribunal nunca ter ouvido, suspeitado, ter-lhe sido referido ou constatada, qualquer situação em que o arguido A tivesse sido relacionado com a prática de actos de natureza sexual sobre educando ou educandos da AX, nem em relação a qualquer outro funcionário da Instituição. (1) Assim e neste sentido – não sendo exaustiva esta indicação, como decorre da audição dos depoimentos que foram prestados em audiência de julgamento - , as testemunhas: - HJ, funcionário da AX desde 1986 e exercendo as funções de motorista de ligeiros, incluindo o transporte de alunos para actividades e dos centros de acolhimento, desde o ano 2000 e em CZ, o qual declarou ao Tribunal nunca se ter apercebido de actos relacionados com abusos de natureza sexual com alunos da AX. - IA, porteiro na AX desde 1990 e tendo saído da instituição, por aposentação, em 2003/2004, o qual declarou ter sido vizinho do arguido A, ter exercido funções de controlo e saída dos veículos de serviço da AX num dos portões de acesso ao CZ, ter demonstrado conhecimento directo da forma como era feita a entrada e saída de alunos internos das instalações de CZ (incluindo ao sábado) devido às funções que exercia como porteiro – primeiro no portão de acesso dos veículos e depois no portão da (...), tendo também exercido funções ao pé do Director, na secretaria -, disse ao Tribunal que “…tudo ficou admirado com isto…”, mesmo a vizinhança, chegou a ir com o arguido A ao futebol e nunca foi nenhuma criança com ele, nunca viu nada de “anormal” com alguma criança. - PU, Educadora de Infância na AX , no GA, desde 1998, a qual declarou ter conhecido o arguido A e, reproduzindo as suas palavras, “só posteriormente ao escândalo” teve conhecimento de factos de abusos. - PX, aluna interna da AX de 1989/90 até 2000, tendo estado no lar FE, a qual relatou ao tribunal ter conhecido o arguido A e ter ficado “ espantada quando viu TV” as notícias referentes a este processo. - EH (mestre de arquitectura), o qual disse ao Tribunal ter sido docente na AX de 1976 a 2002, exerceu funções no (...) EY entre 1976/1989, conhece o arguido A há “mais de 20 anos”, pelo exercício das suas funções (por ter estado no departamento de obras/arquitectura da instituição) todas as semanas ia aos vários espaços ((...), CZ, EX, FZ, EY) e frequentava vários (...)s da instituição, pelo que tinha contacto directo com diferentes departamentos do Mundo que era a AX e nunca lhe foi dito por educador ou qualquer outra pessoa, qualquer coisa que relacionasse o arguido A com abusos de alunos. - UL, a qual declarou ao Tribunal ser educadora na AX até à presente data - no DT desde 1 de Março de 1996, o ex-marido da testemunha, UM, também era educador da AX e enquanto esteve na AX a testemunha não ouviu, nem lhe foi referido por alguém, qualquer abuso de adulto, monitor ou educador da AX sobre educandos. - Dr. EJ – Director do CZ entre os anos de 2000 e 2003 - , o qual disse que o arguido A era “educadíssimo”, “trabalhador”, “disponível”, “generoso”, nunca tendo visto alguma coisa que o fizesse adivinhar que seria possível o arguido A estar envolvido neste processo. Disse que na AX de “...Pedofilia não se falava...”, “...longe de mim imaginar...”. Mas também disse e consideramos relevante assinalá-lo, que “havia quem dissesse” que o arguido A “andava para ali envolvido com jovens”. Isto foi-lhe dito 8 ou 15 dias após ter entrado na AX - e quando começou a visitar as várias áreas de gestão do (...) -, pelo Mestre GE, o qual falou-lhe do processo que o arguido A tivera anteriormente. Um educador também lhe referiu uma situação que - esse educador - considerava anormal e que foi a de o arguido A, depois de um desafio de futebol, ter levado um jovem a casa, o que a testemunha Dr. EJ disse ao Tribunal não ter considerado anormal. Que na AX não se falasse de Pedofilia, no sentido de ser uma preocupação presente ou subjacente, o tribunal acredita pois as testemunhas ouvidas confirmam-no. Mas que na AX, ao Dr. EJ, na qualidade de Director do CZ, foi falado de situação que poderia comportar o risco de pedofilia foi, pelo menos pelo mestre GE. Mas, para o tribunal, o Dr. EJ não deu importância ou relevância ao que lhe foi dito, desvalorizou que, efectivamente, o arguido A pudesse ser um risco para os educandos. Aliás e como já vimos, esta atitude ou sentimento era necessariamente partilhado pelo topo da Direcção da instituição, como foi, por exemplo, pelo (...) Sr. Dr. BQ, pois o próprio disse ao tribunal que confiou algumas vezes ao arguido A o transporte do seu filho que, como foi referido em audiência, tinha uma deficiência – e, portanto, à partida uma criança ou jovem com menor capacidade de defesa, sendo uma deficiência do foro mental . - WE, técnico superior na AX, tendo declarado ao Tribunal ter entrado para a AX em 1974, para trabalhar, altura a partir da qual conheceu o arguido A e o arguido C. Na AX esteve primeiro como educador no (...) EY, entre 1980 e 1998, altura em que foi para a (...), fazendo parte das suas funções o contacto com vários (...)s. Não teve conhecimento, pelo menos a partir de 1990, de casos de abusos de adulto, monitor , educador ou outra pessoa da AX sobre educandos. - ZF, (…) na AX desde 1974 e no BF desde 1975. Disse ao tribunal conhecer o arguido A e o arguido C da AX. O arguido A conhece-o como motorista, antes sabia que existia mas não tinha contacto com ele. Costumava vê-lo em BF a distribuir o correio, com a testemunha chegou a fazer transportes com os jovens para um ensaio, numa altura em que o transporte que tinham falhou. Disse que telefonou para a garagem e foi o arguido A que veio. Descreveu um episódio que aconteceu no pátio de BF, o arguido A perguntou por uma criança, o (…), o miúdo foi ao pé dele e depois disse á testemunha que tinha um bolo pago no bar do (...), esclarecendo que foi a “única abordagem” que viu. Nunca presenciou a qualquer atitude estranha do arguido A com as crianças. Nunca teve conhecimento de qualquer abuso de jovem por adulto ou entre jovens na instituição. - NL, (…) na AX desde Janeiro de 1990, nunca teve conhecimento de qualquer rumor de abusos de natureza sexual na AX.. - XZ, assistente social na AX e reformada desde Julho de 2006, a qual trabalhou na AX desde Outubro de 1968 a Julho de 2006, tendo declarado ao Tribunal ter estado desde 1981 no (...) de CZ, tendo exercido a suas funções em contacto directo com os educadores do CZ, com os Lares, revelado contacto directo com o arguido A e tendo declarado ter ficado muito surpreendida com “ o que veio a público” sobre o arguido A. - ZC, Educadora na AX desde 1998, no GA, a qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A e não teve conhecimento de queixa de jovens contra o arguido A. - HH, funcionário da AX entre 1964 e 30/06/2003 - tendo declarado ao Tribunal ter começado a trabalhar no (...) EY, onde esteve até 1980, após o que passou para o CZ, onde exerceu funções de “supervisão” coadjuvando a direcção, orientando o pessoal especializado e da acção educativa, dando pareceres para a aquisição a aquisição de materiais e colaborando com o Director do (...) em tudo o que lhe fosse pedido -, o qual declarou ao Tribunal, pelo menos a partir de 1980, não ter tido conhecimento ou ouvido falar de situações de abuso de natureza sexual de alunos da AX. - EB, (…) na AX desde 1999, mas trabalhando na AX desde 1992, foi uma das pessoas que também falou das características do arguido A como uma pessoa “ muito briosa”, e disse ter ficado espantado quando “soube do escândalo”, pois nunca lhe passou pela cabeça qualquer situação em relação ao arguido A. Quando a testemunha entrou para a instituição, o “discurso era” que A fora suspenso e teve que ser readmitido. - HS, técnico profissional principal na área de música na AX há mais ou menos 27 anos, o qual declarou ao Tribunal ter sido também aluno na instituição. Declarou ao Tribunal ter conhecido o arguido A na instituição, o qual considera ser uma pessoa correcta, sempre prestável, colaborante e não teve conhecimento de qualquer problema que tenha havido com o arguido. Soube que saiu da instituição e foi readmitido, mas não sabe o que se passou. Da sua vivência na instituição não teve conhecimento de problemas de prostituição ou de abusos sexuais. - BU, (…) na AX desde 1989. Declarou ao Tribunal dar aulas de tecnologia e mecânica, considera ter bom contacto com os alunos e nunca teve conhecimento de abusos de natureza sexual, segmento em que o Tribunal considerou relevantes as suas declarações. - HX, (...), professor e director no (...) GB da AX desde há 5 anos, o qual disse ao Tribunal ser irmão do ex- (...) da Instituição, Dr. BQ. Declarou ao Tribunal não ter conhecimento de quaisquer factos relacionados com este processo, “foi um grande espanto” , pois na sua perspectiva o arguido A era sempre uma pessoa disponível e bem educada, nunca tendo notado qualquer comportamento ou situação. - JZ (assistente social na AX desde Março de 1970 e que trabalhou nos (…), que se situavam na (...) da AX , serviços ligados à admissão e internamento dos educandos ), nunca teve conhecimento de quaisquer situações de abuso de alunos dentro da AX, tendo dito que quando estes factos foram conhecidos interrogou-se a si própria “onde tinha estado?”, pois esteve ligada ao internamento de alunos, tinha reuniões com as equipas do (...) e não se apercebeu de nada, não teve qualquer indício. - XV, psicóloga, a qual disse ao Tribunal ter entrado inicialmente para a AX em 1987, esteve um ano fora tendo voltado em 1989 e estado na instituição até Novembro de 2000. Fazia orientação profissional e trabalhou com o CZ desde 1998, não teve conhecimento de qualquer situação de abuso dentro da instituição, nem conheceu qualquer dos assistentes deste processo. - ZI Educadora da AX, no EX, tendo estado também no lar de FZ de 1980 a 2002, tendo conhecido o educando T e descrito aspectos da vivência do jovem na instituição, declarou ao Tribunal que nunca teve conhecimento, nem ouviu falar, de qualquer caso igual ao tratado neste processo. - ZY (Assistente Social na AX, tendo exercido funções na Instituição de 1968 e 2005), tendo conhecido profissionalmente o arguido A em 1995, na altura em que a testemunha foi trabalhar para a (...) da AX – esclareceu que almoçavam no mesmo refeitório e o arguido chegou a acompanhá-la, como motorista, em deslocações profissionais -, só soube de qualquer processo relativo ao arguido no dia em que saiu nas notícias. - YI, (…) na AX, no (...) FA desde o ano 2000. Foi mais uma das testemunhas que não teve conhecimento de qualquer referência a abusos sexuais dentro da AX, praticados ou com suspeita da prática por qualquer pessoa. (1.1) Em sentido contrário - isto é, aqueles que revelaram ao Tribunal ter tido conhecimento ou ter-lhe sido feita referência, a situações em que pudessem estar em causa actos de natureza sexual praticados pelo arguido A com educando da AX ou em que devia haver alguma reserva do contacto de educandos com o arguido A -, tivemos a(s) testemunha(s): - YW (que trabalhou na AX desde 1986, nos internatos dos (...)s EZ, CZ, BF e FA e disse ter conhecido o arguido A assim que a testemunha entrou para a AX, porque o arguido fazia a distribuição dos mantimentos para os lares), que disse que na altura em que entrou para a AX um colega do Lar FF, IIQ – já falecido -, disse-lhe para estar atenta, para não deixar o arguido A “ andar com os meninos”. Não lhe foi explicado o porquê e a testemunha disse que também não o questionou. - A testemunha HI, o qual disse que em 1982 sabia, por ter-lhe sido dito, de factos relacionados com actos de abuso de natureza sexual com alunos, mas nessa altura teve dúvidas quanto à veracidade do que era dito, tanto que assinou um documento a “favor” do arguido, documento este que3 era para ser junto a um processo. - A testemunha XQ (aposentada, trabalhou na AX entre 1966 a Março de 2006, tendo chefiado nos últimos 10 a 15 anos, a divisão de aprovisionamento e logística, onde desde 1997/1998 estavam inseridos os transportes da instituição), teve um depoimento peculiar. Isto porque disse, à semelhança do que vimos com outras testemunhas funcionários da AX, que o arguido A era sempre disponível e prestável para favores, em 39 anos de AX nunca ouvira falar nada sobre o arguido relacionado com abusos de educando da AX. Sucede, contudo, que em 1998 a testemunha tinha feito uma avaliação ao arguido, para efeitos de atribuição de notação anual (cfr. análise crítica da prova quanto à evolução e carreira do arguido A dentro da AX) , tendo concluído que, afinal, tinha tido conhecimento dos motivos que tinham levado ao afastamento do arguido A da instituição em 1989. - A testemunha YV, educadora na AX de Março de 1997 a 2006, disse que quando entrou para a AX, passados uns tempos, soube que o arguido A tinha tido um processo, por causa de abusos a menores, mas que fora indemnizado e que não tinha dado em nada. E pensou, se a pessoa continuava a trabalhar com crianças e se foi indemnizada, é porque se calhar erraram. (2) Para o Tribunal constituiu alguma estranheza, tendo em atenção as situações que foram descritas - quanto aos processos disciplinares que o arguido A teve dentro da instituição, por causa de lhe serem imputados factos relacionados com práticas de natureza sexual com educando da AX ou por violação de proibições de entrada em CZ ou de se dar com alunos, derivadas da imputação dessas prática - e tendo em atenção a actuação que o (...) da AX teve em 1991, aquando da reintegração do arguido A – cfr. análise crítica da prova, concretamente a referência aos procedimentos tido pelo então (...) da AX, Dr. BQ, pedindo à Tutela que o arguido A fosse transferido para outro local; mas também, em contraposição, o aí referido quanto ao Louvor e funções que, efectivamente, o arguido A passa a exercer desde então -, o total desconhecimento que foi revelado ao tribunal pelas testemunhas, quanto a qualquer referência a essas imputações. E criou estranheza porque, convocado o que já dissemos em momento anterior, a AX era uma instituição grande mas era um meio pequeno, o que, atenta a experiência da vida, potencia que as pessoas falem entre si, ou comentem o que se passa ou o que se passou de “mal” com alguma pessoa. E, neste caso, não estamos a falar de “coscuvilhice”. Estamos a equacionar a normalidade de as pessoas falarem entre si ou comentarem, coisas que “ de mal” se passaram com alguém – e atenção, não estamos a falar, apenas, de situação em que o arguido A pudesse estar envolvido, mas de situações em que pudessem estar envolvidos quaisquer outros funcionários -, ou de suspeitas que houve de situações que se tenham passado, mas em que estavam em causa actuações que podiam por em risco a educação, saúde e formação dos educandos internados e ao cuidado da AX. O tribunal não criou a convicção que aquelas testemunhas que disseram desconhecer, de todo, a ocorrência de factos anteriores ou a referência a ocorrência de factos anteriores com o arguido A – ou com qualquer outro funcionário – dentro da AX ou com educando da AX, tenham mentido ao Tribunal. Mas este silêncio dentro da instituição - quanto a qualquer referência a su(...) ou pensado envolvimento do arguido A com educandos, ou quanto às proibições a que o arguido esteve sujeito, de entrar em CZ, fazer o transporte de alunos ou ter contactos com educandos - , que gerou este desconhecimento das testemunhas, teve consequências. E uma das consequências, tendo em atenção: - o número de actos de abuso de natureza sexual que o arguido A admitiu ao Tribunal ter praticado, o número de alunos envolvido em tais actos e o tempo pelo qual se prologaram; - os actos de abuso de natureza sexual que o tribunal veio a dar como provados em relação ao arguido A e em relação ao arguido C e nas circunstâncias em que os deu; - e o que resulta dos documentos constantes de fls. 50.555 a 50.629 e de fls. 50.655 a 50.723 (referentes à certidão dos acórdãos proferidos, respectivamente, no processo nº 15.699/03.8TDLSB, da (...), em que o arguido GGF, funcionário na AX, foi condenado pela prática, entre Dezembro de 1999 e Maio de 2000, de dois crimes de abuso sexual em educando da AX; e no processo nº 15.680/03.7TDLSB, da (...), em que o arguido GGH, funcionário da AX, foi condenado pela prática, no Ano Lectivo de 2001/2002 numa situação e entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003, de um crime de abuso sexual e dois de violação em educandos da AX), em que funcionários da AX foram condenados, por decisão transitada em julgado, pela prática de actos de abuso de natureza sexual em educandos da AX no “Ano Lectivo de 2001/2002” (numa situação) e “entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003” (noutra); foi - na convicção do Tribunal - de que se desenvolveu, em quem praticou tais actos dentro da instituição, um forte sentimento de confiança de que os actos não eram descobertos e de que os EDUCANDOS NÃO FALAVAM de tais actos. Mas também criámos a convicção que quem praticou tais actos dentro da instituição – e quando dizemos “dentro da instituição” abrangemos, também, aquelas situações que ocorreram foram dos muros da instituição mas com os seus educando -, não precisou de criar “esquemas”, artifícios elaborados ou modos de procedimento muito conjecturados, para que os jovens escapassem à vigilância dos educadores e os actos pudessem ser praticados ou para que tais actos não fossem descobertos. Para o tribunal dentro da AX instalou-se e naturalmente desenvolveu-se um sentimento surdo de impunidade, por parte de quem praticou tais actos. (2) Isto ultrapassa que tais factos possam ser avaliados e valorados - para efeitos da descoberta da verdade em sede de processo penal, que é o que estamos a tratar -, apenas à luz do que a experiência nos diz o que seria o comportamento de um homem médio e comum e apenas à luz de critérios de razoabilidade. Face ao senso comum – ao que já dissemos quanto ao que foi o percurso do arguido A dentro da instituição, pelo menos até 1989; e ao que descrevemos no ponto que antecede, quanto ao número de pessoas que disseram não ter qualquer conhecimentos de que o arguido A tivesse estado associado a situações de abuso de natureza sexual com educandos da AX -, à partida é razoável pensar como possível que o número de educadores ou pessoas que lidavam com os educandos e que enunciámos – profissionais da AX, com as funções que exerceram e pelo tempo e nos períodos em que as exerceram -, nunca tivessem ouvido qualquer referência ou ter-lhes sido feita qualquer referência (sempre por causa dos educandos) pelas pessoas responsáveis pelo internato ou outras, quanto aos incidentes que foram falados ter ocorrido entre o arguido A e educandos e as proibições de contactos com alunos e de entrar em CZ? Face ao senso comum, à partida seria razoável pensar que o arguido A poderia praticar o número de actos de abuso de natureza sexual que admitiu e aqueles que o tribunal veio a dar como provados, pelos períodos e com o número de alunos que resultou provado, sem que os educadores ou técnicos de outras áreas se apercebesse e sem que algum aluno falasse? Entendemos que, à partida, para o senso comum a resposta seria: “dificilmente” tal seria possível. Mas as concretas especificidades ou particularidades que estão subjacentes ao cometimento e ao sofrimento de crimes da natureza dos que estão em causa nestes autos – quer falando de quem os comete, quer falando de que é sujeito a essas práticas - e o ambiente concreto – AX – em que os mesmos foram praticados ou que permitiu que os mesmos fossem praticados, levaram este Tribunal a concluir, como vimos, que tal foi possível acontecer e que aconteceu. (3) A relevância de estarmos a dizer o que antecede tem a ver, também, com dar a perceber a quem é dirigida a decisão, do que esteve subjacente ao pensamento de quem avaliou os factos, do que também foi pressu(...) da sua valoração e da possibilidade e consistência de os mesmos terem acontecido. Isto porque o que agora dissemos não está exclusivamente relacionado com o arguido A ou com o arguido C – e com o ambiente e sentimento de impunidade que, ao longos dos anos e do modo que assinalámos, foi-se sedimentando dentro da AX para o arguido A e para aos (demais) funcionários que praticaram factos desta natureza (cfr. Doc. fls 50.555 a 50.629 e de fls. 50.655 a 50.723, referentes à certidão dos acórdãos proferidos, respectivamente, no processo nº 15.699/03.8TDLSB, da (...), em que o arguido GGF, funcionário na AX, foi condenado pela prática, entre Dezembro de 1999 e Maio de 2000, de dois crimes de abuso sexual em educando da AX; e no processo nº 15.680/03.7TDLSB, da (...), em que o arguido GGH, funcionário da AX, foi condenado pela prática, no Ano Lectivo de 2001/2002 numa situação e entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003, de um crime de abuso sexual e dois de violação em educandos da AX -, mas está relacionado, também, com os demais arguidos. A montante, independentemente do que esteve ou está certo ou errado na vida destes arguidos, independentemente da experiência, valorização profissional ou social, independentemente de estilos de vida, circunstâncias de uma vida ou opções legítimas de vidas com que possamos ser confrontados, estes crimes podem ser praticados por pessoas com enquadramento e relevo social, vida familiar e profissional reconhecida. E, a jusante, independentemente da fragilidade ou degradação moral ou social, de quem se possa apresentar como vítima, pode haver um crime e essas pessoas, quanto a esse crimes, devem ser ouvidas sem prejuízo ou preconceito, quanto à possibilidade ou probabilidade de poderem falar verdade. E de, genuinamente, poderem sofrer com tais factos. 11.2. Passemos, agora à questão do controlo dos alunos por parte dos educadores. Da audição das testemunhas que exerceram funções de educadores no internato, numa primeira abordagem resultou um registo, quase unânime, de que não seria possível os educando internos saírem dos lares manhãs, tardes ou mesmo durante todo o dia aos fins de semana, ou se se tratassem de saídas durante a semana, ao fim da tarde, sem que os educadores dessem por isso. (1) A testemunha EL (socióloga, tendo dito ao Tribunal que exerceu que exerceu funções de Educadora na AX entre 1997/2002, no FD e FC, embora no lar FC não tenha “chegado a um ano”), foi educadora do assistente AV nos dois lares, bem como ter sido educadora de Y, de AP (no lar FC). Não se recorda do AT, nem de qualquer aluno com a alcunha de “ (…)” - alcunha esta pela qual o assistente AT era tratado na AX, como resultou das declarações do próprio assistente a das declarações , tendo prestado esclarecimentos ao tribunal sobre a vivência do lar, colegas com trabalhou (no FC o colega (…) e o Colega (…)). A testemunha VW, educador da AX, de 1990 a 1999 no Lar FE e no FD desde 1999. Disse ao Tribunal que foi educador de Y e de AV. Trabalhou com o colega RW e com a Educadora IB do FD, o colega RW era raro fazer fins de semana, tinham horários divididos e quando esteve a educadora IB aí faziam a divisão dos fins de semana. Disse que o arguido A ia com AV ver aos jogos do AX, “era costume”, e “ pelo menos era o que diziam”. Iam de carro e não se recorda de irem outros alunos. Nos livros de ocorrências registava as saídas dos alunos, havia o costume de escrever para onde os educandos iam, a não ser que já estivesse combinado o aluno ir à actividade a aí pensa que não o faziam. Demonstrou um conhecimento não muito seguro quanto a factos concretos da vivência do assistente AV: aos fins de semana pensa que terá participado em actividades, mas não pode precisar, AV não se integrava muito em actividades. Que se recorde só viu duas vezes a tia do educando, raramente iam ao (...), às vezes ia a casa da tia ao fim de semana (tendo falado especificamente da tia da (…), com quem AV tinha uma “relação complicada”, que houve uma zanga entre as duas tias do AV, queixava-se que era conflituoso, mentia e problemático). Quando a testemunha se referia aos educandos (AV, Y) dizia “eles já eram crescidos”, tendo falado das suas saídas ao fim de semana. Não se recorda se os “outros” educando foram com A ver o futebol, mas “podiam ter ido”. Disse, em relação aos educandos, “objectivamente” saber onde eles andavam ninguém poderá saber. 11.3. Estes depoimentos foram, contudo, avaliados e valorados pelo tribunal face aos documentos que existem nos autos e com relevância para esta matéria – entre os quais estão os “livros de ocorrências” que foi possível obter do internato, concretamente os elementos que constam dos apensos, por exemplo, (…) ou (…) – e face à demais prova testemunhal ou por declarações que foi produzida, incluindo, portanto, as declarações que os assistentes prestaram em audiência de julgamento. Quanto à prova documental, relembramos que um dos trabalhos do Tribunal no reconstituir e apurar a verdade - para a verificação, dentro do que lhe for possível, da possibilidade de “mentira” – foi, em relação à questão (sempre subjacente) “Como foi possível na AX?”, ir vendo os elementos que dos documentos se extraem, ao longo do tempo, do que foi a vivência da instituição. Isto porque os documentos são um dado que nos dão uma componente importante: é que embora o seu conteúdo possa dizer respeito a avaliações ou percepções dos factos por quem é o seu autor e, portanto, ser uma visão e interpretação dos factos desse autor, ao mesmo tempo têm um dado muito objectivo que é a datação. E a datação foi, neste processo, um elemento importante, pois em algumas situações permitiu, através do “quando”, interpretar, avaliar e valorar os factos para chegar ao “como”. 11.3. Ora neste trabalho de cruzamento destes depoimentos, com a avaliação da demais prova e dos demais depoimentos das testemunhas (no que diz respeito ao “controlo de alunos”), Convocamos o que já atrás dissemos, aquando da análise do percurso do arguido A dentro da AX. Incidentes, percurso, reacções da instituição a incidentes ou actos de outra natureza e a avaliação que o Tribunal fez de tais actos, reacções, atitudes ou comportamentos. Assim, passando às testemunhas, HQ (convocando o tribunal o que já disse quanto à forma como a testemunha prestou o seu depoimento e a avaliação que fez do mesmo como objectivo e isento; e tendo a testemunha declarado que entrou para a AX em 1990/1991, tendo exercido as funções de porteiro, no portão de CZ pelo qual era feito o acesso das viaturas de serviço da instituição, pelo menos desde 1996 a “tempo inteiro”), falou ao Tribunal quer do controlo de alunos, quer da saídas dos jovens com o arguido A, em carrinhas da AX . Disse ao Tribunal que aos fins de semana, sábados e domingos, viu o arguido A sair de manhã cedo da AX com jovens da AX, no carro particular do arguido e nas carrinhas da AX que conduzia. Isto foi numa altura em que esteve a fazer – por troca ou para preenchimentos de faltas de algum colega - o turno da manhã, pois esclareceu o Tribunal que ou por ser o seu turno ou por fazer turnos de outros por causa de faltas, folgas, férias ou feriados, desde 1994/95, até há cerca de dois anos, ao fim de semana fez turno das “16h/24h”, das “24h às 13h” ou das “8h às 14h”. Foi seguro quanto ao facto de nas alturas em que viu o arguido A, a sair com jovens da AX no seu carro particular - disse que levava entre um e quatro -, não ia qualquer professor ou treinador no carro. Pensa que iam para jogos do AX, futebol ou ténis de mesa, pois era o que o arguido A lhe dizia quando de manhã conversava com a testemunha, enquanto esperava pelos rapazes . Quanto aos jovens não sabia o nome, sendo que quando confrontado com os nomes dos assistentes AV, AN ou AT, os nomes nada lhe disseram. Pensa que eram do Lar FD ou FC, pela associação que faz de o arguido A na altura dizer que iam para o ténis de mesa ou futebol e os jovens destes dois lares serem os destes desportos. Em geral parecia-lhe que eram sempre os mesmos “miúdos”. Mas esclareceu que isto era uma dedução sua, pelo facto de o arguido A os ir buscar ao lar e daí pensar que eram os mesmos. Quanto às idades usou uma expressão: eram “miúdos grandes”, 12/13/14 anos, mas não tem a certeza. Nas saídas do arguido A com jovens, nas carrinhas de nove lugares da instituição, às vezes viu que no interior da carrinha iam os (...) ou treinadores e outras vezes não, embora tivesse a memória que, por regra, ia sempre o professor. Esclareceu ainda que às vezes os (...) ou treinadores iam nos próprios carros e acompanhavam a carrinha. Quanto ao regresso, só os via quando chegavam mais tarde e a testemunha fazia o turno da noite. No que diz respeito ao controlo da entrada e saída de alunos da AX e falando do controlo no portão onde a testemunha estava – o da entrada e saída dos veículos de serviço da AX - , embora o princípio fosse controlar as saídas e entradas dos alunos pelo cartão que tinham (eles deviam mostrar o cartão, para saber se era aluno com autorização para sair ou não, sendo que os do 5º e 6º ano não podiam sair sem autorização, mas os maiores disse que “podiam sair todos”), afirmou que não era com rigor que fazia este controlo, pois ao mesmo tempo tinha que atender o telefone na portaria, fazer o registo das viaturas e quando eram os intervalos este controlo era difícil. Num segundo momento das suas declarações – a instâncias do Ministério Público e para o Tribunal a forma como começara a fazer as suas declarações quanto ao controlo de alunos, dava a ideia que a testemunha fazia este controlo – disse que sobre os alunos que estavam no lar não fazia controlo. Estavam lá os educadores para isso e nunca recebeu instruções para não deixar entrar ou sair estes alunos. Referiu contudo uma situação, de uma vez em que foi posta uma fotografia de um aluno na portaria, para não o deixarem entrar, mas não identificou quem era o aluno. Por causa das entradas e saídas na instituição, disse que havia um outro portão, junto ao HR e na altura em que foram feitas as obras do centro – que de acordo com a testemunha diz terem durado 3 / 4 anos -, esse portão “ de baixo” não era usado e todos os alunos e viaturas entravam e saíam pelo portão “das viaturas”, o portão “de cima” (aquele em que a testemunha fazia o controlo). Disse que a confusão era tanta, que à hora de almoço tinham que por lá outro funcionário. À noite disse que os alunos não saiam pelo portão onde estava, mas podiam saltar o muro “... sem a gente se aperceber...”. Aos fins de semana o movimento de alunos era dos internos, os quais muitas vezes saíam à tarde. Os “mais novos” disse que saiam com os educadores. Mas disse mais. Ao fim de semana, em regra sábado e domingo e por vezes sexta feira - e em alturas em que a testemunha esteve a fazer turnos -, o espaço do refeitório da AX, CZ, era “alugado” para casamentos, baptizados e festas e nessas alturas as entradas e saídas de pessoas e carros na AX, no CZ – onde se situavam os lares dos assistentes AP, AV, AT, Y, AN -, eram sem controlo. Disse que os portões estavam abertos, a cancela para os carros “para cima”, não havia registo de entrada ou saída de pessoas ou veículos. A testemunha HI (engenheiro e professor, tendo entrado para a AX em 1980 e desempenhado, ao longo de 19 anos, funções de responsável pelo curso de mecânica, responsável pela oficina da mecânica e manutenção de viaturas e pela gestão da frota da instituição, o qual, pelo exercício das suas funções, demonstrou conhecimento directo do que era o serviço dos motoristas, incluindo do arguido A e teve relacionamento profissional com o arguido C), também revelou conhecimento sobre o transporte que o arguido A fazia de alunos da AX. Para além de ter relatado ao Tribunal a utilização que o arguido fazia dos veículos da instituição, tendo dito - como já vimos em momento anterior - que havia uma carrinha (…) que o arguido utilizava mesmo que não lhe estivesse atribuída para realizar serviço programado, declarou que aos fins de semana viu o arguido A aparecer nos jogos da associação de trabalhadores da AX com jovens da instituição, transportando-os numa carrinha. Referiu que uma das vezes foi a um Domingo, não se consegue recordar do ano, mas nessa situação verificou que o arguido não estava escalado para qualquer serviço. A testemunha MG (motorista da AX desde 1993, tendo trabalhado com o arguido A, mas este como seu ajudante de motorista), disse que fez transportes para (...) em que o arguido A também ia e confirmou que o arguido A por vezes transportava “um ou dois miúdos” para as (...), indo sozinho com os educandos. Viu também um transporte que o arguido fazia regularmente e que era o transporte para FA e vice versa, dos jovens que estavam num dos Lares de acolhimento, transporte este que fazia sozinho, sem qualquer educador ou outro funcionário da instituição. Mas fora destas situações disse que não viu o arguido A fazer transporte de alunos sozinho. A testemunha IA (aposentado desde 2003/2004 e porteiro na AX desde 1990, tendo exercido funções no portão de acesso em que era feito o controlo de entradas e saídas dos veículos da AX), disse que viu o arguido A fazer transporte de alunos, mas da avaliação global da instância e contra instância a que foi sujeito, não resultou para o Tribunal que ele se conseguisse lembrar, objectivamente, se viu ou se não viu o arguido A sair sozinho com alunos da instituição. Refugiou-se - aquando da instância da Defesa do arguido H -, que “é possível” ter visto o arguido A sair sozinho com alunos (acrescentou que quando “ele” ia levar os alunos, “muitas vezes” era “possível que não levasse ninguém”) , mas não podia “garantir”, pois o seu trabalho e compreendemos querer dizer o que o preocupava reter, era registar as matrículas dos carros de serviço que saíam e quando saiam “depreendia” que iam em serviço. E não conseguia também para esclarecer, distinguir entre os dias da semana e os de fim de semana. Quanto à entrada e saída de alunos da instituição - e respondeu isto na instância que lhe estava a ser feita pela Defesa do arguido C, e quando lhe estavam a ser pedidos esclarecimentos quanto aos assistentes AP, se os via junto, saídas do (...) - , disse que os alunos podiam sair do (...) sem ele saber, porque “não andava sempre em cima deles” e só quando “havia uma indicação” para “fulano não sair”, concluímos, é que tinha um cuidado especial em ver ou controlar (até porque os alunos podiam sair sem ser pela porta). Tal como a testemunha VO, também esta testemunha confirmou que ao fim de semana, sábados e Domingos, havia festas organizadas no espaço do CZ - de pessoas de fora - e não havia controlo dos carros “de fora” que entravam ou saiam. A testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista, durante cerca de 20 anos), disse que conhece o arguido A pelo menos desde que passou para motorista e que A era um motorista como os outros. Esclareceu que no exercício das suas funções fez o transporte de educando da AX e que às vezes fazia esse transporte sem o acompanhamento de (...) ou educadores, mas em relação ao arguido A, começou por responder que “não sabia”. No entanto - e aquando da instância que lhe foi feita pelos “Assistentes” -, disse que viu o arguido A, “algumas vezes” , a fazer sozinho o transporte de jovens, mas esclarecendo que “não era para fora de (…)”. Do depoimento das testemunhas, por exemplo, ZO, JJ, EM, IU, KE, KU, IB, ML, NL, NM, QF, SS, UL, UM, EN, RW, AAJ e referindo-nos em particular aos educadores dos Lares que ficam no espaço do (...) CZ, resultou globalmente para o Tribunal um sentimento de controlo sobre os jovens e, por isso, a impossibilidade de os factos descritos neste processo ocorrerem, face ao referido controlo. No entanto, esse sentimento de controlo não é compatível com o ambiente vivido nesse mesmo espaço da AX, onde ficavam situados os Lares FD e FC, aos fins de semana – abrangendo por vezes sextas feiras e em regra sábados e domingos -, tal como resulta do depoimento das testemunhas que acima mencionámos. O ambiente de ordem, controlo e sossego que podia resultar do depoimento dos educadores não é compatível com o que foi descrito. E aqui convocamos o depoimento da educadora EL, que já não exerce funções na AX, em que relatou ao Tribunal uma situação em que AV esteve fora do lar, numa actividade, sem que tivesse havido a necessária noção e controlo por parte dos educadores. 11.4. Aqui entra a análise de elementos documentais. (1) Num dos documentos que se encontra a fls. 346 a 360, do Apenso D, II Volume – cfr. “Apenso D”, relativo a uma auditoria feita à AX pela Inspecção Geral do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, a qual teve o nº 169/2001, resultante de um processo de averiguações nº 10/97 e com relatório datado de 10/07/98, e que está no Apenso D, I Volume, fls. 1 a 76 -, está a acta nº 70, do Conselho de Direcção com o Conselho de Ex-alunos da AX, datada de 13 de Março de 2001, tendo como um dos pontos da “agenda” para discussão, concretamente o “Ponto 11.”, a necessidade de recrutar educadores para o Internato. Nesta reunião - em que, como resulta de fls. 2 da acta que está a ser referida, estiveram presentes, entre os demais, os Directores dos diversos (...)s da AX , nomeadamente pessoas ouvidas em audiência de julgamento como testemunhas, como o dr. EJ, Dra- XK, Drª WS, o Dr. BQ na qualidade de (...) da AX , os Srs. (...)es (...)s Dr. FB e Dr. C, a Chefe de divisão da acção social e a Chefe da Divisão de educação e ensino - o Sr. Capelão Chefe da AX, Padre TQ, manifestou a sua preocupação pelo facto de constatar, aquando das visitas que fez ao internato de CZ, a seguir ao jantar, haver apenas um educador a acompanhar os alunos, “… considerando que há falta de atendimento personalizado…”, tendo-se seguido a discussão quanto à inexistência de recursos humanos na altura, concretamente de um quarto educador por Lar, para que não estivesse apenas um educador por “turno”, quanto aos problemas então existentes com a coordenação e conjugação de horários entre os educadores, com os pagamentos do subsídio de turno, com a necessidade ou desnecessidade de um educador na parte da manhã. Também nesta acta o sr. (...) (...), Dr. FB, chamou a atenção para o elevado absentismos dos educandos, pondo em causa se o educador estava a cumprir plenamente a sua missão. Do teor deste documento, embora seja referente a uma situação apontada em Março de 2001, resultou a convicção para o Tribunal que não era uma situação “recente” o que estava em causa. Para o Tribunal, sendo o ponto de partida que temos Março de 2001 e a forma como a discussão “ocorreu”, relacionada com problemas de verbas, pagamentos de turnos, ficámos convictos que era uma situação que, razoavelmente, já se devia sentir desde o ano anterior, 2000. (2) Outro elementos analisado foram os “Livros de Registos de Ocorrências” dos Lares (documentos a que se referem os apensos W-10 e W-11). De acordo com o depoimento das testemunhas (cfr., a título de exemplo, o depoimento da testemunha YW, que disse que “escrevia o que acontecia diariamente no lar, em termos de saúde, de comportamento, de aulas; da testemunha YV, também quanto ao sentido dos registos que fazia), nestes “livros” os educadores registavam tudo o que acontecia de mais significante com os educandos dos lares. No entanto, conjugando os depoimentos prestados neste sentido com, por exemplo, o depoimento da testemunha EL, que relatou um incidente relativo ao assistente AV, que foi dois dias, sem saberem, para (…) e não está registado no livro de ocorrências do FD. O educando ter estado fora do lar por dois dias, sem os educadores saberem onde estava é, na perspectiva do tribunal – e face ao que foi dito pelas testemunhas, quanto ao critério que tinham para fazer ou não registo de ocorrências nos livros - facto suficientemente importante para estar registado. Mas mesmo que se configurasse que este facto não o fosse, por o educando, no fundo, estar a cargo do “Grupo”, o não ter avisado e alguém (pelo menos a educadora EL não sabia que o educando tinha saído), seguramente que era facto suficientemente relevante para ficar registado. Pelo que o tribunal ficou com a convicção que, não obstante os depoimentos prestados, pelo menos nem todos os educadores registavam tudo o que de significante se passava com os educando do lar. E isto para concluir, no que diz respeito ao controlo dos educadores sobre educando, entradas e saídas do (...) em dia de semana ou ao fim de semana, que o Tribunal ficou com a convicção que podiam sair sem que fosse dada relevância, para registo no livro de ocorrências ou que fizessem sempre a comunicação aos colegas, à saída. 12. Passemos, agora, à exposição do caminho seguido pelo Tribunal – e na parte em que ainda não foi feito -, na avaliação que fez das declarações dos assistentes quanto aos factos que o tribunal deu como “provados” e como “não provados”, face às declarações dos arguidos e à demais prova – testemunhal ou documental - produzida na audiência de julgamento. 12.1. Como dissemos anteriormente, umas das linhas de Defesa apresentadas pelos arguidos - quer em sede de contestação, quer em sede de audiência de julgamento, quer em sede de Alegações -, foi a existência de uma “manipulação” por parte de algumas vítimas, com vista à Acusação dos arguidos: este processo consiste numa história combinada entre alguns assistentes, num “plano”, a que outros aderiram consciente ou inconscientemente - mas notando que no que diz respeito ao arguido A, este o arguido faz tal Defesa apenas em relação a alguns factos ou assistentes, não o fazendo nos termos genéricos em que os demais arguidos o fazem . (1) Ponderando esta questão, este plano, para ser “Plano” e “história a contar”, tendo em atenção os factos que estão descritos no Despacho de Pronúncia, teria que envolver: (i) numa primeira abordagem, concordância quanto às pessoas envolvidas e locais; (ii) alargando-se o plano a situações em que não houvesse coincidência de “abusadores” ou “locais”, mas entre o círculo de “Xs” abusados, embora cada uns com histórias só parcialmente comuns com os outros - isto é, os assistentes acordarem entre si que um dizia que tinha sido no local y e z, com o arguido A; o outro no local y e z com o arguido A e B, e noutro local w com o arguido C; e assim sucessivamente, de forma a abranger toda a multiplicidade de situações que o despacho de pronúncia contempla, de diversidade de “locais”, de “abusadores” nesses locais e de “abusados” nesses locais). Para o Tribunal e em termos genéricos, uma situação seria, por exemplo, 9 (nove) jovens acordarem entre si criar uma história - pois é este o número dos assistentes que, de entre os 32 (trinta e dois) a que dizem respeito estes autos, acusam em comum ou separado os arguido C, E, H, K, N, Q -, num local comum, com pessoas em comum, com um procedimento mais ou menos uniforme e num espaço de tempo mais ou menos coincidente entre todos. Isto é, uma história que desde o princípio até ao fim, fosse globalmente coincidente e comum a todos. Mas a situação que o presente Despacho de Pronúncia descreve - e configurando-a como o resultado de um “plano”, com adesões “faseadas” dos assistentes a esse “plano” - é, na perspectiva do Tribunal, subir um degrau em exigência de capacidade intelectual e sofisticação de raciocínio. Capacidade e sofisticação não só aquando do desígnio de “engendrar uma história”, mas também para conseguir manter uma linha comum entre os vários relatos, isto é, a “impressão digital” de que aquilo que está a ser contado por um, faz parte “daquilo” (da mesma realidade) que o outro contou. Que faz parte do plano. E passando esta “impressão digital”, também, no momento em que a descrição dos assistentes fosse sendo alargada a situações em que, para além do primeiro nível (a coincidência de abusadores, abusados e locais, com Xs abusados, como é (…)), passa para um outro nível: - com coincidência de “abusadores” ou “locais”, mas diversificando consoante os abusadores e os locais, e o círculo dos abusados (como é o caso da casa na (…), tendo como “abusadores” o arguido K e o arguido C e apenas o assistente AI; a casa em (…) com o arguido E e o arguido H, em que apenas há intervenção do assistente AP; a "casa da (...) (…)" com os assistentes AP, AT, AV e como abusador o arguido H); - com “abusado”/”abusador” que não tem coincidência com os demais, como é o caso de AC (no caso do (...) no Centro de saúde) e o arguido K; ou AK e o arguido E (no caso da situação na "(...) (…)" ou da "(...) (…)"); Isto é, como dissemos, na nossa perspectiva, elevar o nível e a exigência de sofisticação para outro patamar. (2) Mas, para além desta configurada possibilidade da criação da história, motivada por, entre o mais, um desejo dos assistentes de notoriedade, reconhecimento, mas também ganho material com busca de indemnizações, os arguidos C e K juntaram ainda um outro elemento. É que – da sua perspectiva - a razão de ser da sua inclusão nesta história pelos assistente, deve-se não só ao “motivo” geral que moveu os assistentes em relação aos demais arguidos - a notoriedade e ganho de indemnizações, indo buscar os seus nomes, para “abusadores”, à comunicação social e às notícias que iam saindo – mas, também, a motivos próprios que, de via indirecta, influenciaram os assistentes. Quanto ao arguido K, os motivos que declarou ao Tribunal em audiência de julgamento foram a influência ou movimento de alguém ligado a tráfico de droga, que não identificou e que - de acordo com o que o Tribunal compreendeu das suas declarações -, de alguma forma fez sair o seu nome na comunicação social como ligado a este processo, tendo o seu nome, assim o depreendemos, sido captado pelos assistentes por esta via para lhe imputarem abusos. Quanto ao arguido C, os motivos que também declarou em audiência de julgamento - mas imputando nomes -, concretamente as pessoas que na AX não lhe quereriam bem, por ter tido atitudes de defesa dos interesse da instituição, mas que foram contra os interesses próprios destas pessoas (relembramos e convocando a súmula das declarações do arguido que já tínhamos feito em momento anterior e que dissemos que mais tarde iríamos convocar , apontou o Engº WE “… ainda hoje estou para entender alguns negócios que estão pouco … um pouco esclarecidos por mim, com a compra de milhares de contos de equipamentos (…)e que foram para … dedicados ao ensino e para os lares da AX … para alguns deles nem sequer funcionarem, estou-me a recordar do Eng. GY, Departamento de Obras (…) que ainda hoje estou para saber … (…) é que o departamento não pertencia … não era da minha dependência, atribuída … era do Dr. BQ directamente … se trabalhava na AX ou se trabalhava para a AX. Se o (…) Eng. HI (…), Sr. EEI, com a situação que já aqui foi referida, dos carros arranjados sistematicamente, ao que parece na AX …(…) estou-me a recordar dos motoristas (…) BBG VO, Cacholas, porque de facto … embora tivessem tido a compensação do recebimento da comparticipação de horas (…), porque era justo (…), seguramente que ficaram muito tristes e muito aborrecidos quando as horas passaram a ser cortadas ou melhor, processadas meramente nos termos legais, tal como este registo de entradas e saídas, que vigorou a partir de Fevereiro de 2000, terá provocado incómodos a muita gente, estou-me a referir aos chamados Gestores de Área (…)… Prof. GE, Eng. TF (…)… o que se passa é que nessa reunião do centro de emprego (…), talvez em Setembro de 2001 …e eu fazia parte da Comissão Paritária, do protocolo existente da AX e o Centro de Emprego, dado que a AX recebia (…) tranches (…) com algum peso (…) para o ensino técnico-profissional e (…) nessa reunião (…), com vista a fazer uma espécie de balanço, como é que tinha corrido (…) o ano lectivo 2000/2001 e verifico (…) com vergonha que afinal de contas, não se percebe o que é que se passou, no ensino (…) técnico-profissional, os exames de aptidão profissional (…) decorreram com falhas ainda hoje por explicar (…), por parte dos júris havia dúvida se teriam feitos (…) por aqueles alunos que estavam a ser avaliados ou não …perguntava-se o que é que faziam às brocas, aos pregos, aos alicates, tenho impressão que aquela gente comia (…) essas coisas todas (…)…, Dietista HHW, também não percebo (…) qual é que era a função que a senhora desempenhava na AX (…) acho que não valia a pena termos lá uma dietista (…). Estou-me a recordar (…) que se passou com a estomatologia na AX, quando havia (...) para os alunos, mas já me pergunto hoje se não havia mais (...) para os funcionários e outros … onde é que está o dinheiro por um lado e porque é que quase que se inverteram os termos desta assistência médica aos alunos. Porque é que a Assistente Social HHX, embora não estamos lá … presente … na altura, mas … há sempre um rasto que fica e quando tive que acusar em Tribunal uma ex-Directora, pelo (…) cerca de 8.000 (oito mil) contos à AX, ainda hoje estou convencido que esta Senhora, enquanto assessora dessa Directora, deveria ter tomado providências, porque tudo me levou a crer (…) que ela saberia de alguma coisa, infelizmente ninguém quis saber disso. Dr.ª JE (…) diz que é advogada (…)ex-professora da AX, ficou como Advogada na AX (…), provocou (…) não digo desfalques, mas provocou despesas avultadas à AX (…) desleixos que, nesta matéria de dinheiros, que me dizia respeito, não foram propriamente trocos, estamos a falar em milhares de contos….(…)”. 12.2. Para despistar a possibilidade de tudo ter sido uma história criada, o Tribunal analisou e avaliou as declarações dos assistentes, cruzando-as com as do arguido A, com os elementos e documentos que constam nos autos; com os depoimentos das testemunhas que de perto - quer por razões profissionais como são os educadores ou funcionários da AX , quer por razões de amizade ou de laço familiar, como foram os depoimentos de algumas testemunhas – viveram e lidaram com os assistentes. O Tribunal teve presente os esclarecimentos que os Senhores Peritos prestaram em audiência de julgamento, em relação às perícias que fizeram aos Assistentes. Mas não só, pois teve também presentes os ensinamentos que os Senhores Peritos e Consultores Técnicos transmitiram ao Tribunal, quanto à memória e aos cuidados a ter pelo tribunal na avaliação de um depoimento, quanto à capacidade do uma pessoa para inventar, para construir uma história e sustentar essa história. E essa capacidade de sustentação e manutenção de uma história, com alguma coerência intrínseca, por pessoas com a capacidade intelectual que os assistentes apresentam, de acordo com as perícias constantes do Apenso Z-11. 12.3. Dada a extensão dos depoimentos que avaliou e a diversidade e multiplicidade das situações descritas no despacho de pronúncia - quer em relação aos arguidos, quer em relação aos assistentes, quer em relação aos locais, quer em relação aos tempos -, o Tribunal diz, desde já, que não concluiu que as pessoas indicadas como vítimas tivessem, entre si: - criado factos e depoimentos, para construírem uma história comum e concordante entre si e testemunharem-nos, pelos quais os arguidos C, E, H, K, N e Q - porque são estes os arguidos que invocam tal Defesa - foram apresentados a julgamento neste processo; - ou preparado entre si o depoimentos de factos que tivessem vivido, mas atribuindo-os e recriando-os em relação aos arguidos; No entanto - e pelo que dissemos quanto à extensão dos depoimentos, diversidade e multiplicidade das situações descritas quanto a arguidos, assistentes, locais e temos - , o raciocínio que o Tribunal seguiu para chegar a estas conclusão em relação aos assistentes, irá sendo ex(...) à medida que o Tribunal for tratando os depoimentos, os factos e as circunstâncias de facto que as objectivam e sustentam. O que o Tribunal irá assinalando, tentando manter a melhor continuidade e ligação que nos for possível, embora a forma de abordagem e de análise de assistentes entre si tenha sido por vezes diferente. 12.4. Um dos factores que foi indicado pelas Defesas dos arguidos C, E, H, K, N e Q, como identificador e expressão da invenção dos assistentes de toda uma história – e em concreto desta “história” em relação a estes arguidos -, teve a ver com a forma como alguns assistentes declararam ao tribunal ter feito a “identificação” dos arguidos - a associação do nome à pessoa ou à cara -, como sendo os seus “abusadores”. Um exemplo, a forma como os assistentes AI e AT descreveram a identificação do arguido C, o qual era (...) (...) da AX, instituição onde estavam internados o que, à partida e atenta a normalidade das coisas, potenciava um conhecimento pelos assistentes deste arguido. Numa primeira abordagem podia ser inconsistentes e não credível, que (pelo menos) os educando internos nos (...)s dos Lares do CZ - espaço onde se situava, confinando, as instalações da (...) e onde trabalhava o arguido C -, não soubessem, ao tempo em que o tribunal deu como provado terem ocorrido os actos com, por exemplo, os assistentes AT ou AI, o nome do arguido C e a sua qualidade de (...) (...) da AX. Ou mesmo, passando para um outro arguido, que não soubessem, por exemplo, o nome do arguido H, dado que era uma pessoa que em determinados períodos (…). No entanto - e em particular o caso da identificação do arguido C - , o tribunal convoca o depoimento da testemunha ZN - Educadora da AX desde 1989, no EX, que confinava com o CZ, onde se situava a (...) da AX e onde trabalhava o arguido C com (...) (...) -, a qual declarou que só conhecia o arguido C “de vista”, das festas do (…), que são as festas do aniversário da AX. Convoca o depoimento da testemunha YV - educadora na AX de 1997 a 2006, tendo estado no Lar FU onde foi educadora de AI; notando o Tribunal que entrou para a AX no mesmo ano em que entrou o AI -, a qual disse ao Tribunal que não conhecia o arguido C, sabia que existia e sabia o nome, mas só o conheceu quando o viu na televisão. A testemunha XH - educadora na AX desde 1997, no BF, a qual declarou ao Tribunal também ter sido aluna da AX durante 9 anos, mas não se recordar de ter ouvido falar no arguido A, nunca tendo ouvido falara de abusos na AX -, disse ao Tribunal não saber quem era o arguido C, nunca tinha ouvido falar nele e não se recorda do arguido, mas apenas do Dr. FB e do Dr. BQ. A testemunha YU, professora no CZ há “ cerca de 8/9 anos”, só se lembra do arguido C das festa do “(…)”. E convoca, também, o depoimento da testemunha ZC (Educadora na AX desde 1998, no GA), a qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A, lembrando-se de o ver a entregar o correio no EX. Mas já quanto ao arguido C, apenas sabia o seu nome, não “ conhecia a pessoa”, só tendo tido conhecimento de quem era pela comunicação social, depois de terem aparecido os factos deste processo. Para o Tribunal, esta forma de “ contar” o conhecimento que cada uma tinha do arguido – quer a primeira testemunha, educadora na AX desde 1989 e que diz que apenas conhecia o (...) (...) C “de vista”, o que ao tribunal deu ideia de um conhecimento distante, não envolvendo contacto mesmo que ocasional; quer a segunda, que apenas “conhecia a pessoa”, só tendo tido conhecimento de quem o arguido C era dentro da AX pela comunicação social - é similar à que foi “utilizada”, por exemplo, pelo assistente AI. Ora esta narração é usada por educadoras da AX, pessoas adultas que, pelo exercício das suas funções, teriam um maior dever, possibilidade e disponibilidade para conhecer o (...) (...) da AX, tanto que, como vimos, o arguido C foi (...) (...) da AX desde 1997. Isto quer dizer, para o Tribunal, que a versão deste facto, tal como foi contada, por exemplo, pelo assistente AI ou pelo Assistente AT, é plausível no caso concreto tem cabimento. Com efeito, no mesmo ambiente AX e nas mesmas circunstâncias de tempo, educadoras da AX tiveram a mesma percepção dos assistentes e narraram-na de forma similar, quanto ao conhecimento ou identificação do arguido C, (...) (...) da AX. E as idades de uns e outras era diferente. Durante o interrogatório e contra interrogatório a que estas testemunhas foram sujeitas pelos arguidos - ou em sede de Alegações de qualquer um dos arguidos -, não foi posta em causa a credibilidade das testemunhas, a sua objectividade ou suscitada qualquer dúvida quanto à veracidade do que narraram ao Tribunal, que estivessem a mentir ao Tribunal. Assim, também na ausência de outros indícios de que os assistentes estivessem a “mentir” quanto ao conhecimento/identificação – no caso concreto - do arguido C, a narração que os assistentes fizeram quanto à identificação de quem os abusou, da forma que enunciámos (cfr., por exemplo, o dito aquando da análise das declarações do assistente AI, Y) e que foi coincidente com a usada pelas testemunhas que apontámos, não põe em causa, só por si, a credibilidade dos Assistentes e a veracidade do seu depoimento quanto a tal facto. 13. O Tribunal vai, então, proceder à exposição do percurso seguido na avaliação que fez das declarações dos assistentes. 13.1. (Assistentes AC - factos descritos no ponto “4.4.4.” ; factos descritos no ponto “9.17.” do Despacho de Pronúncia; ): Começando pelos factos pessoais do assistente AC, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, elementos do T.F.Menores, situação de saúde, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CS”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 8 a 93, 121 a 128, 132 a 133, 139 a 145). No que diz respeito aos factos relacionados com seguimento (...) e relação com o arguido K, como (...) de família do assistente AC – e, também, para os demais factos que o tribunal deu como provados, quanto ao arguido K ter sido (...) de família de alunos da AX -, foram ainda relevantes os documentos constantes de fls. 35.492 a 35.549, documentos de fls. 54.480 (também documento de fls. 14, pasta 2, do Apenso X) e de fls. 44.660. Quanto aos factos relativos ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 6.716 a 6.722. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram ainda factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente AC, pela testemunha AAO (irmã do assistente) e pelas testemunhas YZ, QN, BK e QF. 13.1.1. (factos descritos no ponto “9.17.” do Despacho de Pronúncia – imputados ao arguido A): Em audiência de julgamento o arguido A não admitiu a prática dos factos em relação a AC. O assistente prestou as suas declarações por vídeo conferência, o que à partida levou sempre o Tribunal a ter particular cuidado na avaliação destas declarações, uma vez que a imediação e a percepção da ressonância emocional dos depoimentos pode ser diferente, da que é apreendida em audiência e com a presença da vítima. Acresce que as conclusões constantes da perícia constante do Apenso Z-11, também impunham particular atenção à forma como as declarações eram prestadas. E em audiência o assistente AC disse ao Tribunal que conheceu o arguido A, especificando “ começou a conhecê-lo” por o arguido entregar o correio no (...) do assistente, que era o (...) de FA. Depois o assistente passou para a escola IIR, com 14 anos e no 7º ano “, onde disse ter reprovado. Quando andava na IIR “... foi quanto tudo começou...”. O arguido A ia lá muitas vezes, mas “... na IIR nunca me apanhou...”, sendo perceptível pelas declarações que presta a seguir, que o sentido da sua declaração foi que dentro do espaço da IIR o arguido não o “apanhou”, mas sim fora. E conta que tinha Educação Física em CZ, “...ele apanhou-me cá fora...” e “... perguntou-me se eu queria boleia para (…), que eu ia apanhar o autocarro a (…), e eu aceitei a boleia. Das boas intenções não esperei que o A me tivesse, tentasse assediar. Chegámos a (…) ele não parou, levou-me para um sítio que eu não reconheci, eu não conhecia o sítio... (...) ele quis-me oferecer 2 (dois) e 5 (cinco) contos para... para “peternação” do ânus e masturbação....”. O Tribunal perguntou-lhe se chegando a esse sítio que disse não conhecer, o que sucedeu, contando “...eu lembro-me que ia na camioneta com ele e ele disse-me que, eu disse que eu descia em (…) e ele disse, ele perguntou se eu queria ir passear com ele e eu aceitei. E começou-me a assediar, oferecendo-me dinheiro para fazer sexo com ele....(...)Dessa vez ele levou-me para um sítio desconhecido, onde não havia casas, nem prédios, eu não conheço esse sítio, eu não me lembro nada desse sítio, e... e houve penetração no ânus e masturbação....o A a mim...” especificando que a penetração foi com o pénis. Disse que aceito dinheiro do arguido “...sim, sim....e eu aceitei porque é assim, eu fazia uma colecção de (...)s da Shell, e todo o dinheiro que ele me deu eu comprava (...)s....”, explicando que era uma colecção de carros em miniatura. Disse que houve os “actos de violação mais três vezes”, mas não se consegue lembrar do que é que aconteceu dessas vezes, dizendo que só se “ lembrava mesmo” da primeira vez. O Ministério Público e a Defesa do arguido insistiram quanto às demais vezes que o assistente referiu, como é que se tinham passado – e quando dizemos insistiram, é que o assistente foi perguntado em diferentes momentos e de forma diferente, incluindo pelo Tribunal – e AC respondeu, sempre “ sinceramente não me lembro”, acrescentando que o arguido levava-o para os sítios que ele não conhecia. Foi visível o esforço que o assistente fez para se recordar, quanto interpelado sucessivamente quanto a estas vezes. Mas AC não “recria”. Ele transmite a impressão que tem, que para si é uma certeza, que houve por mais 3 vezes “ actos de violação”, mas não os consegue identificar. A alguma coisa há-de, decerto, associar esses actos, essa memória que lhe ficou, mas não se consegue recordar do quê. Mas, como dissemos, não recria. Não tenta preencher – face à insistência a que foi sujeito -, o que lhe falta para quem o estava a ouvir ficar com uma resposta e parara de o interpelar e diz “sinceramente não me recordo”. AC foi um educando da AX com um percurso de vida sofrido, após Novembro de 2002 fez duas tentativas de suicídio, tem um quadro clínico que exige medicação e acompanhamento próximo, mas sendo uma história de vida já “antiga” – ver, neste sentido, o que foi o depoimento do Dr. BL, quer quando foi ouvido pelo Tribunal começou por dizer que teve dúvidas quanto às alegações que AC lhe começou por fazer em relação a abusos sofridos, devido à sua estrutura psicológica (conforme resulta do seu depoimento na AJ de 26/04/06), mas no ano de 2004 inverte a sua opinião e diz o porquê ao Tribunal; o depoimento de AAO, irmã do assistente, a qual viveu também com ele no (...) FA, pois estiveram os dois no internato, tendo a testemunha saído em 1997; o depoimento da educadora QF; e os documentos constantes de fls. 35.492 a 35.549 -. A insistência em audiência, a necessidade que por vezes é perceptível nas vítimas que são ouvidas em audiência, para contar coisas, de modo a que quem as está a ouvir acredite nelas, podia ter levado AC a preencher, a ir mais além do que foi. Mas, dentro da sua fragilidade, que mesmo através da videoconferência foi perceptível para o Tribunal, disse o que, para o tribunal, conseguiu recordar. Para o tribunal a sua atitude não foi de quem esteve a contar uma coisa inventada, até porque não tinha, para nós – e lembramos as conclusões constantes da perícia do Apenso Z-11 – a argúcia e estrutura necessária para, com a simplicidade com que acabou por falar, fazê-lo da forma que fez. Ele não preencheu os vazios, apesar da forte impressão que tinha das “mais três vezes” os actos que disse de “violação”. Quanto à localização dos factos no tempo, dos elementos de fls. 10, 19, 29, 37, 46 a 49, 51, 55, 56, 64 e fls. 93, do “Apenso CS”, até ao ano lectivo de 2000/01 o assistente fez os seus estudos primeiro em FA e depois no (...) EY e apenas no ano lectivo 2001/2002 passou para a IIR, para frequentar o curso técnico Profissional. No ano 2002/2003 ainda frequentava o 1º ano deste curso (cfr. fls. 93, do “Apenso CS”) e AC, quando começou a relatar os factos, quanto ao que se tinha passado com o arguido A, referiu que foi quando passou para a IIR, que tinha reprovado esse ano, foi nos 14 ia fazer os quinze anos, localizando os factos a “meio do ano lectivo”. Acresceu ainda, para convicção do tribunal, as conclusões constantes do relatório do exame de natureza sexual constante de fls. 6.716 a 6.722. Assim e por tudo o que antecede, os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “163.” a “163.6” dos factos provados, embora limitando a prova a uma situação, em consequência do que foi a memória do assistente destes factos e a negação do arguido A. (1) Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que já dissemos anteriormente quanto a esta matéria (Ponto “4., (2), (2.1), da presente análise crítica da prova, quando analisámos a prova quanto ao percurso e relacionamento do arguido A na AX) . E concretamente, no que diz respeito ao assistente AC, as suas declarações foram expressivas quanto ao modo como via o arguido, pois disse que apesar de o arguido A nunca o ter ameaçado, tinha medo que o arguido lhe batesse. Mas as declarações do próprio arguido, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. De facto o arguido disse ao tribunal - numa altura em que falou dos factos que se tinham passado com um outro assistente (AA) e na sequência de pergunta que lhe foi feita, se após terem ocorrido os actos que tinha descrito tinha dito aos assistentes que se eles contassem que “lhes batia” - , que não dizia isso. Acrescentando (cfr. aj de 19/01/05) , que tinha confiança nos rapazes, eles eram seus amigos e “... viam-me como um amigo...portanto eles não contavam a ninguém...”, confirmando que ia vendo “isso”, que os rapazes não contavam e repetia os comportamentos. Admitindo que para si era importante não contarem. Mas também disse – na sequência de pergunta que especificamente lhe foi feita -que não aconteceu ter deixado de abordar algum rapaz com medo que ele contasse alguma coisa, por não lhe inspirar confiança, pois “... Sra. Dra...como disse ...como disse era normal, portanto de os homens não contarem...portanto eu depois não fazia mais nada...portanto... mais aos alunos ...”. (2) E quando dizemos o que antecede – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, também a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (3) Já quanto aos factos que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido não confessou os factos, mas o Tribunal deu-os parcialmente como provados. Mas sem prejuízo da não confissão, valem as considerações que o Tribunal faz nos referidos pontos “13.3.”, “13.3.2”, “13.2.4.” da presente análise da prova, quanto à forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto de reconhecimento da prática dos factos e em algumas situações o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. (4) Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “70.” a “70.6”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência. Acresce que, em concreto, em relação ao ponto “ 70.3.” dos factos não provados, o processo em causa foi instaurado por Despacho do (...) de 15/01/02 (Dr. BQ), na sequência do que por Despacho da Secretária de Estado da Segurança Social, datado 19/09/02, foi aplicada ao arguido A a pena de aposentação compulsiva (cfr. Apenso L, fls. 184 a 185, 197, 200, 209 ). Em consequência, funcionou o princípio do in dubio pro reo. 13.1.2. (Factos descritos no ponto “4.4.4.” do Despacho de Pronúncia – imputados ao arguido K): Quanto aos factos pelos quais o arguido K vem pronunciado em relação a este assistente, AC, em audiência de julgamento o arguido negou a prática dos factos. Em audiência de julgamento o assistente AC, por videoconferência, relatou ao Tribunal factos que se passaram consigo e com o arguido K, durante o atendimento numa consulta médica. O assistente prestou as suas declarações por vídeo conferência, o que à partida levou sempre o Tribunal a ter particular cuidado na avaliação destas declarações, uma vez que a imediação e a percepção da ressonância emocional dos depoimentos pode ser diferente, da que é apreendida em audiência e com a presença da vítima. O assistente AC disse ao Tribunal que conhecia o arguido K, era o seu (...) na (...) (…). Ia à consulta com a educadora QF e o arguido não deixava a educadora entrar no (...) “...nunca deixou nenhum educador entrar no escritório... Juíza Presidente – Mas quem é que não deixava? AC – O Dr. K. Juíza Presidente – Mas o senhor alguma vez ouviu o senhor K a dizer a alguém para não entrar? AC – Não...eu “lembra-me” de entrar para a consulta e para dentro do escritório dele e ele mandava a minha educadora esperar lá fora. Juíza Presidente – E recorda-se dessas (...)? AC – Um bocado. Juíza Presidente – Do que é que se recorda dessas (...)? AC – Recordo-me que o K ... eu ia a uma consulta com, várias (...) com dor de coluna e ele mandava-me despir as calças e as cuecas e mexia no meu pénis. Juíza Presidente – Mas isto durante a consulta? AC – Sim, sim. Juíza Presidente – E disse alguma vez à sua educadora? AC – Não...tive sempre medo. Juíza Presidente – Mas medo de quê? AC – Para explicar não sei muito bem, mas... Juíza Presidente – Explique como conseguir, Sr. AC. AC – Eu tinha medo que ele me fizesse mal e... se as minhas educadoras falassem com ele. Juíza Presidente – Mas porque é que o senhor lhe fazia mal? AC – Porque também houve masturbação...uma das (...). Juíza Presidente – O que é que quer dizer com masturbação? AC – Ele mexia no pénis dele....e eu ia lá com dores de coluna e ele mexia sempre no meu pénis, também. (...) Juiza Presidente – Isto aconteceu o quê, uma vez? AC – Sim, uma vez masturbação, mas nas outras vezes ele mexia sempre na minha pila, no meu pénis. Juíza Presidente – E ao todo, a quantas (...) em que o Sr. K tenha mexido no seu pénis é que o senhor se lembra de ter ido? AC – Não me lembro, sinceramente, não me lembro. Juíza Presidente – Pelo menos duas vezes? AC – Sim, sim. Juíza Presidente – Três? AC – Ah, ah, creio que foi duas ou três vezes? Juíza Presidente – Mas Sr. AC, quantas vezes é que se lembra de ter ido a estas (...) com o Sr. K a queixar-se das dores na coluna? AC – Pelo menos umas três vezes ele mandou-me fazer uns raios-X num outro hospital que não me lembro qual era ... e mandou-me lá ir entregar os raios-X, mas dessa vez não conseguiu fazer nada porque a minha educadora entrou comigo. Juíza Presidente – E o Sr. K alguma vez falou consigo? Disse-lhe alguma coisa nessas (...)? AC – Nunca, nunca. Juíza Presidente – Lembra-se em que classe é que andava quando isto aconteceu? AC – Com o K? Juíza Presidente – Na escola em que ano é que... Sim, com o Sr. K, sim. Na escola em que ano é que andava, ou...? AC – Eu lembro-me quando comecei as (...) com ele eu tinha, não me “lembra” bem a minha idade, mas lembro-me que "tava" na terceira ou quarta classe, dentro de FA... Após isso, mudei de (...) para o Dr. HHA....”. Disse que recebeu doces do arguido. O Ministério Público tentou precisar com o assistente o número de vezes em que foi à consulta do arguido, mas o assistente, sucessivamente, disse “... lembro-me que foram algumas, mas não me lembro quantas....(...) sinceramente não lhe sei responder...(...) disse e volto a dizer outra vez, eu não me lembro quantas vezes é que lá fui...eu era pequenino...”. A Defesa do arguido K tentou localizar no tempo as (...) por causa da coluna a que o assistente se lembrava de ir, e AC responde que não, “...mas foi de pequenino....eu creio que isso começou depois de eu sair do (...)... foi quando passei para o quinto ano, acho eu....e sinceramente, não me lembro que idade tinha....”. Pediu para o assistente descrever o gabinete do arguido no (…), o qual disse, estando à porta do gabinete, “... lembro-me que à minha direita tinha uma marquesa com uns panos a tapar, uns panos em ferro e pano... e lembro-me que à minha esquerda, um bocado mais à frente, tinha a secretária do (…) K e a cadeira....e não me lembro de mais nada....”. O Tribunal perguntou-lhe se sabia o que era um biombo – pois tinha feito a referência dos ferros com panos – e responde “...não, não....” e explicou o que queria dizer com os “panos com ferros” : “...é umas armaduras de ferro, três pegadas umas às outras, que dobram (...) e tem um pano branco a meio, cada uma...”. Juíza Presidente – E serve para quê? AC – Para quando, eu creio que é para quando o (…) está a examinar os doentes tapar para ninguém ver. Mas nesse caso, ele não deixava ninguém entrar....”. A Defesa do arguido K pediu, ainda, para o assistentes descrever os actos tidos com o arguido. Respondeu que o arguido mandava-o despir as calças e as cuecas, nunca deu que usasse luvas. A insistências da Defesa, quanto aos actos praticados: “(...) Juíza Presidente – Em concreto, o que é que o senhor se lembra do Sr. K ter feito no seu pénis? AC – No meu pénis? (...)Mexer nele para cima e para baixo. MMMMMM – Srª Drª, se é isso a que chama, se é a vez que... o assistente distinguiu, antes das instâncias do seu ilustre mandatário, distinguiu mexer no pénis, de masturbação. E o que eu quero saber é se agora engloba tudo na masturbação? Se mexer no pénis é masturbação também? Porque distinguiu perfeitamente. Juíza Presidente – Srª Drª, disse “mexeu no pénis para cima e para baixo”. MMMMMM – Pronto. Mas anteriormente disse “houve uma vez em que houve masturbação”, até disse que era do arguido para com o próprio arguido. O resto, foi mexer no pénis. Disse-o várias vezes, aliás. (...) Juíza Presidente – Das vezes em que o senhor diz que o Sr. K lhe mexeu no seu pénis, dessas vezes disse mexer no seu pénis, “mexeu nele para cima e para baixo”. De todas as vezes foi assim, ou foi diferente? AC – Também já mexi no dele...e ele veio-se. Juíza Presidente – Quando diz “ele veio-se”, o que é que quer dizer? AC – Eu não sei dizer bem a palavra e... Juíza Presidente – Diga como souber. AC – Ahn... esperma. MMMMMM – Porque é que só diz isso agora, Srª Drª? (...) MMMMMM – De todas as vezes?... Já agora, Srª Drª. Juíza Presidente – Quantas vezes é que o senhor se lembra, Sr. AC, de ter mexido no pénis do Sr. K? O senhor, no dele. AC – Sinceramente, não me lembro. (...) Foi mais do que uma, mas não sei quantas. MMMMMM – Pronto. Então e como é que isso se passava, Srª Drª? Concretizar. Como é, onde é que se encontrava o assistente? Como é que as coisas se processavam, uma vez... Juíza Presidente – Onde é que o senhor estava, em que sítio do gabinete é que estava? AC – "Tava" na maca. Juíza Presidente – E o Sr. K estava onde? AC – "Tava" de pé. MMMMMM – Então, na medida em que o assistente já disse mais do que uma vez que o Dr. K nada lhe dizia, nunca falou nada com ele, nunca, nunca, até uma das vezes disse “nunca, nunca”, como é que chegavam a esse ponto, a esse estado de coisas? Juíza Presidente – Pode responder. AC – Ele falava comigo sobre a coluna e eu tinha... e mexia no meu pénis. Mas enquanto eu lhe fazia, enquanto eu lhe batia, ele não dizia nada, nunca me disse nada...dava-me apenas goluseimas para me, para ficar contente, para me calar. Juíza Presidente – Mas Sr. AC, porque é que o senhor foi tocar no pénis, foi mexer da forma que descreveu no pénis do Sr. K? AC – Foi ele que pediu....”. Sem deixar de ter em atenção as fragilidades que à partida estavam apontadas a este assistente, em audiência teve um discurso, uma forma de explicar, que fez sentido, que para o tribunal deu a sensação e a percepção de relato de algo vivenciado. Pela instância e contra instância a que foi sujeito, pelas particulares e especificas perguntas que foram feitas pela Defesa do arguido K e pela forma explicativa e adequada à realidade como respondeu, não ficámos com dúvidas quanto à vivência dos factos que estão em causa neste momento. Mas o Tribunal cruzou as declarações do assistente com os elementos, circunstanciais em alguns dos casos, que resultaram do depoimento das testemunhas e com os documentos dos autos. Quanto aos documentos, resulta de fls. 37, 46 a 49, 51, 55, 56, 60, 64, do “Apenso CS”, que os anos entre os quais o assistente esteve no (...) de FA a estudar – pois o assistente diz que tem memória de estar em FA quando isto aconteceu, embora dissesse “5º ano”, mas 5º ano já foi no (...) EY - foram entre 1993 e 1998. Quanto às testemunha, a assistente social JP disse ao tribunal que falou com os AC na altura em que estes factos foram conhecidos e o AC dizia que com ele nada se tinha passado. Apesar do educando lhe ter dito isto, a testemunha ficou com “muitas dúvidas” por causa da forma como se exprimia e da angústia que mostrava. No entanto e em concreto, a testemunha não conseguiu perceber porque era a angústia. A testemunha QN – educadora na AX desde 1988, no Lar GL -, disse que conheceu o arguido K como (...) de família dos educandos, tendo relatado situações concretas de educandos que o tinham como (...). No entanto esclareceu que nunca fez o acompanhamento dos educandos ao (...), pois por causa do seu horário era uma outra colega que o fazia (tendo dito ter a impressão que era a colega YZ), não tendo relatado qualquer situação como AC. A testemunha YZ, disse ao tribunal ter sido educadora em FA de 1986 a 1999. Conheceu o assistente como aluno interno e confirmou que o mesmo ia às (...) ao centro de Saúde da (...) (…). Disse que de certeza que acompanhava os educandos ao (...) e confirmou que o arguido K era o (...) de família dos alunos de FA. O procedimento da testemunha era entrar no gabinete (...), enquanto os educandos eram consultados e “ de certeza” que acompanhou AC ao Centro de saúde da (...) (…). Uma outra colega que também acompanhou os educandos do lar ao (...) foi a educadora QF. Disse que os educandos tinham uma rotina de ir ao (...) no início do ano escolar e enquanto esteve em FA não se recorda de o arguido ter deixado de ser (...) de família dos educandos. Lembra-se que AC tinha problemas respiratórios, pelo que para além de ir ao Centro de saúde da (...) (…) também ia ao Dispensário. Não se recorda de qualquer situação anormal na consulta do arguido K. Foi confrontada com o documento de fls. 35.537, referente a registos de idas ao (...) do assistente AC e que a anotação “ consulta de rotina no Dr. K” é a sua letra (registo datado de 14/01/93). Mas acrescentou que a partir de 93/94 deixou de fazer o acompanhamento ao (...). Acrescentou também que, em concreto, não se recorda de ter estado presente numa consulta de AC (embora tenha acentuado que o seu procedimento, durante anos, era estar sempre presente na consulta). Este aspecto do seu depoimento tem relevância, tendo em atenção a data em que estão imputados os factos ao arguido K – ano de 1997 – e a consulta ser de 1993. No entanto a fls. 35.547 vº dos mesmos documento, registo datado de 16/12/97, está registado uma passagem de credencial “pelo Dr. K” para uma TAC CE, para o educando AC e a testemunha não se recorda de quem fazia o acompanhamento em 1997. Já não foi na altura da testemunha. Era sempre o Dr. K que fazia a consulta e só substituíam o (...) em alguma situação em que o Dr. K não estivesse. No seu lar aconteceu que alunos mais velhos, 16/17 anos, recusarem-se a ir ao Dr. K, disse mesmo “ as queixas eram tantas” - tendo esclarecido, a perguntas da defesa do arguido K, não se recordar se as queixas eram por examinar todos os orgãos (incluindo os genitais, depreendeu-se do seu depoimento) para além do que os alunos se queixavam ou se era por examinar os orgão genitais em vez do que se queixavam. Completou que as queixas foram reportadas à Dra. RN, Directora do (...), mas disse, também, que os alunos tinham um bom relacionamento com o arguido K. A testemunha QF confirmou ter sido educadora em FA desde Fevereiro de 1997, substituiu a educadora YZ no acompanhamento dos educandos ao (...). Lembra-se de AC, mas não se recorda de ter sido falado alguma coisa em especial. Confirmou que quando entrou em Fevereiro de 1997 o (...) de família dos educandos de FA era o arguido K e pensa que nessa altura não havia mesmo (...) no (...). Confirmou ter acompanhado AC à consulta do arguido neste ano. Tendo começado por dizer que os educandos iam sempre acompanhados pela educadora à consulta, disse que podia suceder serem acompanhados por um aluno mais velho e o educador ir lá ter. Isto vai no sentido do depoimento da testemunha AAO, irmã do assistente e que também esteve internada no (...), que disse ao tribunal ter acompanhado o seu irmão e outros educandos, à consulta do Dr. K e sem a educadora (a testemunha QF também disse que a AAO saiu do (...) algum tempo depois de a testemunha ter entrado e não sabe se a mesma acompanhou, ou não, colegas ao (...); também disse não saber qual era o procedimento dos demais colegas, quanto ao acompanhamento das (...); e disse, ainda, que o arguido K fez palestras no (...), mas não tendo ideia de o ter visto noutras situações). AC teve um percurso de vida em que as problemáticas se foram acentuando ao longo do crescimento (falou de situação de tentativa de suicídio do assistente). Confirmou que no ano de 1997 o levou várias vezes à consulta do arguido, embora não saiba explicar porque é que não está registado nos documentos de fls. 35.537 e segs. que lhe foram exibidos. Esta parte do seu depoimento teve especial relevância, pois resultou claro que estas (...) a que o acompanhou e das quais não viu o registos, não eram (...) por causa da asma, ou dos problemas de visão que AC tinha, pois nestas problemáticas não era o arguido K que o seguia. E o recordar-se que foram várias (...) afasta que estivessem em causa apenas (...) de rotina, pois estas – como a sua colega tinha dito - faziam no início do ano escolar, o que tem sentido. E esta particular parte do seu depoimento, associada ao teor do documento de fls. 35.547 vº, levou o Tribunal a dar como plausível e , em consequência, suficientemente assente, que os factos relatados por AC passaram-se de facto em 1997. O facto de ter dito que sempre acompanhou os educandos, face ao que disse também a irmã do assistente, não exclui a possibilidade de o que o assistente relatou ter ocorrido e ter estado na consulta sózinho com o arguido. Os educadores explicaram que iam com vários educandos à consulta e é da experiência do dia a dia, de quem vai com crianças ao (...), que entre a ida à casa de banho de um, entre uma qualquer inscrição que fosse necessário fazer, ou carimbo de receita ou documento (estamos a falar de 1997), ou pós consulta com a enfermeira de um outro educando, que a situação de um educando poder ter estado sozinho na consulta, como o AC diz que esteve, ocorresse. Por fim e um pouco no sentido do que antecede, a testemunha TT, educador também na AX, foi ao Centro de saúde da (...) (…), foi lá com um educando que estava doente e o arguido K apresentou-se como (...) de família (mas não se conseguiu recordar quem era o educando e a idade). Esteve presente na consulta, mas sabe que o colega que fazia a manhã chegou a não estar presente na consulta dos primeiros educandos. E disse, pois sucedeu quando estava a testemunha no lar, o arguido K ter telefonado para o seu lar para falar com alunos, dos mais velhos e tê-los deixado ir ao café conversar com o arguido. Há ainda que fazer uma referência. O arguido K juntou um documento para comprovar que o assistente AC só foi inscrito no Centro de saúde (…), na extensão da (...) (…), em 10/01/2000 (cfr. fls. 54.480). O Tribunal não põe em causa que essa inscrição tenha sido feita. Mas anteriormente a esta data, pela prova que foi produzida e independentemente do registo de fls. 54.480, o assistente AC foi seguido pelo arguido como (...) de família e foi-o também, pelo menos, nos anos de 1993 a 1997 inclusive, enquanto educando interno do (...) FA. Quanto ao número de vezes que os factos ocorreram, das declarações do assistente, conjugadas com as das educadora QF – que apenas permitem configura a possibilidade de não estar presente na consulta como uma excepção e não com uma regra -, o Tribunal apenas pode dar como suficientemente provadas duas vezes (pois as (...) foram pelo menos, três vezes, mas uma delas foi aquela em que a educadora esteve presente por causa de mostrar o raio-x) . Face a tudo o que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “110.” a “110.5.” dos factos provados. Quanto aos factos constantes nos pontos “110.6” a “110.9”. dos factos provados – factos relativos à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes -, o arguido era o (...) de AC, pelo que necessariamente tinha o conhecimento da sua idade, sendo que pela circunstância de ser (...) tinha também, necessariamente, plena consciência e conhecimento dos efeitos dos seus actos. (1) Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “28.” a “28.1.”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 13.1.3. (Assistente AP - factos descritos nos pontos “2.2”, “4.1.1.”, “4.3.1.”, “5.2.1.”, “.5.2.2.”, “5.2.3.”, “5.2.4.”, “5.2.5.”, “7.2” e parcialmente “7.5” do Despacho de pronúncia): O assistente AP foi ouvido em audiência de Julgamento durante onze sessões. Nestas onze sessões AP apresentou um discurso calmo, às vezes elaborado, percebendo o Tribunal que pretendeu transmitir uma imagem positiva de si. Para o Tribunal o assistente teve a preocupação de transmitir que era uma pessoa sensível embora, também, sendo perceptível algum apelo à sensibilização de quem o estava a ouvir, pela sua situação de desfavorecimento face a outros e – avaliação do Tribunal -, naturalmente receber alguma simpatia. Por exemplo, a justificação que deu ao Tribunal para as suas fugas quando estava no Lar FC , “ … porque desde que eu entrei para a AX sempre fui revoltado…porque qualquer sonho de um rapaz é crescer junto dum pai…de uma mãe, ter um carinho, um afecto e eu não…eu ali não tinha, quer dizer, os educadores davam mas não é o mesmo…não é o mesmo carinho, o mesmo afecto que uma mãe e um pai pode dar a um filho…”; quando fala em (…) e diz que o arguido A dava 5.000$00 aos outros e a si 2.000$000, portanto menos dinheiro do que aos restantes. Teve a preocupação de transmitir que era uma pessoa educada. Por exemplo, quando explicou ao tribunal as circunstâncias em que conheceu o arguido A e os actos praticados, quando o estava a fazer pediu previamente desculpa ao tribunal por usar a “expressão pénis” e utilizando várias vezes as expressões “...se faz favor Sra. Dra...”, “... peço perdão a este Tribunal...”, quando se enganou em alguma coisa que emendou, mesmo quando espontaneamente logo a seguir; tendo o cuidado de dizer “...se a Sra. Dra. dá licença...”, antes de tirar o casaco, quando 24/6/05 lhe disse que podia tirar o casaco, pois era foi um dia em que esteve muito calor na sala de audiências; na A.J. de 6/7/05, a explicação que deu para não reproduzir palavras que ouviu ao arguido A, numa conversa com o arguido C, por serem “ asneira”. E transmitiu, também – na avaliação do tribunal -, a sensação de que era “ importante” ou “relevante” para alguém, porque deu-se com pessoas “ importantes” ou foi escolhido por pessoas “ importantes”. Por exemplo, após falar dos actos de natureza sexual que se passaram consigo e com o arguido A e passa a relatar outros actos com outras pessoas, exprimiu-se de uma forma que não deixa de ser peculiar: “ … o que se passou com o Sr. A é que o próprio nos levava para encontros com pessoas famosas da nossa sociedade…”; “...H estava de olhar muito atento em mim...”, em (…), altura em que o “chamou” e “levou” para um quarto e falou que tinha “... pele de bebe e era o rapaz mais bonito dos colegas que estavam ali...” (A.J. 20/6/05); e quando na A.J. de 24/06/05 fala da ida à Praia (…) e de novo refere que o arguido H disse que era “...o mais bonito…”. E, por exemplo, quando na A.J. de 4/07/05 (a pedido de esclarecimento quanto ao conhecimento que teve com o (...) da AX, Sr. D. BQ), fala de um episódio ocorrido com o Sr. (...) da AX BQ, contando que desde pequeno “…ia brincar para a (...)…uma certa altura eu escondi-me debaixo da secretária desse Senhor (...)… onde lhe atei os sapatos um ao outro…e brincava, tipo miau, miau a imitar um gato …e aonde ele olhava e o que é que estás aqui a fazer moço? Vai-te embora. Simplesmente coisas assim, mas nunca me tratou mal e sempre tratei esse senhor com o devido respeito…”. Ainda na sequência do que antecede – e ilustrando em que se traduziu a verbalização de AP quanto à necessidade de expressar ao tribunal como era reconhecido pelos outros -, quando a Defesa do arguido C aprofunda um pouco esta questão das idas de AP para o espaço da (...) (perguntando se tinha alguém na (...) que fosse seu amigo ou conhecido e que o convidasse para ir lá), respondeu que “ … aquilo é um local de trabalho…nós alunos só podíamos lá ir se tivéssemos alguma coisa para tratar…eu não tinha nada para tratar. Ia para ali, simplesmente…numa desportiva…tinha ali amigos…toda a gente gostava de mim…eu era pequenino…atendiam-me bem … eu dizia que não tinha aulas, só para tar ali, na (...)…”. A necessidade de atenção, o apelo à atenção, a necessidade de contar estou aqui e sou alguma coisa, foi patente e evidente. (1) E não pode este patente apelo à atenção, ter levado à invenção dos actos de abuso com estes arguido? Aqui ligamo-nos com o que já dissemos - na presente análise crítica da prova -, quanto à linha de defesa seguida pelos arguidos, da manipulação que foi feita pelas vítimas, para a Acusação dos arguidos por factos que não praticaram – e o assistente AP, como notámos, é um dos que, em sede de Alegações, a defesa do arguido H imputa a criação intencional de uma história para o envolver. É claro que o Tribunal teve que equacionar todas as hipóteses, pelo que, face à interrogação que colocámos, a resposta é: poder corresponder a uma invenção pode. Mas, no caso concreto, o Tribunal criou a convicção que não foi o que aconteceu com AP quanto aos factos que o Tribunal deu como provados. Se queria notoriedade, se queria ser falado? Isso para o Tribunal foi perceptível que, em certa altura ou a partir de certa altura sim. Mas ouvindo as suas declarações sessão após sessão – e estamos a falar de 11 (onze) sessões, interrogatório após interrogatório pelo Tribunal, pelo Ministérios Público, por 7 (sete) Ilustres Advogados -, é claro que vemos que o seu relato é confuso e baralhado nas datas, nas sequências - o que numa primeira resposta disse ter sido o primeiro acto após a garagem e os actos com o arguido A depois já não era… -, nas descrições dos locais e mesmo, quando comparado com declarações de outros assistentes, por vezes divergentes com o que outros disseram (cfr., por exemplo, a descrição do interior de um andar sito no prédio da Av. (…) que o assistentes AP faz e a descrição do mesmo local pelo assistente AT). No entanto, não obstante o que antecede, pareceu transmitir e estar a contar uma coisa que efectivamente lhe aconteceu. Ouvindo – ou antes, re-ouvindo, pois o Tribunal, dado o tempo que distanciou entre a audição do assistente e o fim da audição de toda a prova testemunhal, teve que proceder a nova audição das declarações -, quando falou a primeira vez dos factos que se passaram com o arguido A e dos factos que se passaram em (…) (por ex. A.J. de 20/06/05), revelou uma voz embargada, tanto que o tribunal teve que interromper a sessão por alguns minutos, pois percebia-se que estava a chorar (interrupção esta que, nessa altura, tratámos com alguma cautela, como explicaremos à frente). A necessidade de interromper não voltou a repetir-se e as declarações que prestou ao longo das demais sessões, o tom de voz calmo e por vezes contendo a impaciência ou cansaço que em determinadas alturas teve, necessariamente, que sentir - pois as instâncias foram seguidas e, por norma, esmiuçando ainda mais o que tinha sido dito e como tinha sido dito ou na sessão anterior ou na instância feita por outro sujeito processual -; a atitude de querer colaborar, traduzida na forma como foi sempre e consecutivamente, respondendo e esclarecendo o que tinha dito, baralhado ou confundido; a expressão facial que por vezes se via traduzindo emotividade; transmitiu ao tribunal uma noção de existência de uma espinha dorsal naquilo que estava a dizer, de existência de uma correspondência emocional entre o que estava a contar e o que tinha vivido e com as pessoas e nos locais que disse ao tribunal. (2) AP revelou ter problemas com a localização no tempo e no espaço, de factos e acontecimentos que narrou ter vivido. Demonstrou, por vezes, insegurança, dúvida e mesmo contradição quanto à data, ou período da sua vida, em que ocorreram factos que relatou. Vamos ver, então, o que para o tribunal foi perceptível da memória e da noção de tempo do assistente AP e o que o Tribunal concluiu quanto à existência ou inexistência de mentira. E começamos por dizer que nesta avaliação houve uma circunstância que notámos quanto ao que é a noção de “tempo” deste assistentes e que nos fez interrogar: se era tudo uma invenção ou se, não sendo tudo uma invenção, era-o no entanto, o nome das pessoas a quem AP imputava abusos (como alguns arguidos defendem), porque é que em relação a aspectos que seriam fáceis de memorizar ou em que pareceria ser fácil ter a noção do tempo, por serem coisas da sua comprovada vivência, AP demonstra que também não tem noção do tempo? Face a esta circunstância e que para o Tribunal foi evidente - e considerando o que dissemos quanto ao que foi um dos aspecto da Defesa dos arguidos, a criação de uma história entre alguns assistentes, a que outros aderiram consciente ou inconscientemente, para a Acusação dos arguidos -, optámos, não só no caso do assistente AP, mas também extensível a outros assistentes, por começar por analisar vários aspectos da vivência dos assistentes na AX - partindo da prova documental -, cruzando-os e justapondo-os com outros elementos que resultam das declarações e dos depoimentos das testemunhas, com o objectivo de aferir a consistência ou a inconsistência do que foi dito e como foi dito, aferir da credibilidade do declarante e veracidade do declarado. Houve que sinalizar, despistar e equacionar – dentro do que nos foi possível - a capacidade, probabilidade e ocorrência (se fosse o caso), de os assistentes se conluiarem ou de alguma forma coordenarem-se, consciente ou inconscientemente, para criarem, total ou parcialmente, os factos que são o objecto do presente processo. Assim e prosseguindo. 13.1.4. (Percurso de AP na AX): Para os factos que o tribunal deu como “ Provado” ou “ Não Provado”, respeitantes a dados pessoais do assistente, nascimento, ingresso e vivência na AX, vivência anterior ao seu ingresso na AX, bem como data da saída da AX – cfr. Pontos “ 92.” a “92.4” e, consequentemente, a matéria que o Tribunal deu como não provada nos pontos “10.” a “10.3” dos factos não provados - , foram relevantes as declarações do Assistente, o qual falou de forma clara sobre a sua infância e sobre os sentimentos e emoções que experimentou. (1) Do ponto de vista da prova documental, foram particularmente relevantes os documentos constantes do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) e os documentos do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), Dos documentos de fls. 72 e 81, do Apenso DA (cópia da certidão de nascimento e da cédula pessoal) resulta que o assistente nasceu em (…). Da análise de fls. 777 a 784, 823 do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) e fls. 2, 48 a 49, 76 e 128, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) , resulta que entrou para a AX de (…) na sequência de Despacho de 7/08/92, tendo-se concretizado a sua entrada, para o Lar FC, concretamente em 18/07/92. Assim, entrou na AX com 7 anos de idade, mas fazendo 8 anos em 1/10/92. As razões da sua entrada e o estado de desenvolvimento do assistente na altura em que entrou para a AX e posteriormente - que o Tribunal deu como provado nos pontos “92.” a “92.4” dos factos provados - , resultam suficientemente explicitadas dos documentos de fls. 55 a 60, 85 a 86 (embora este documento refira que entrou em 1982, em vez de 1992, o que se percebe que é manifesto lapso, face desde logo à data de nascimento do Assistente) do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) e fls. 776 a 779 e 818, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), sendo o documento de fls. 777 a 779, em que é feita uma avaliação psicológica da (na altura) criança, em Julho de 1992, subscrito por uma psicóloga e resultando do teor de tal relatório que observou e esteve em contacto com o AP para fazer o relatório, o que para o Tribunal assumiu especial peso probatório. É um documento contemporâneo da situação que estava a ser analisada, permitindo-nos efectiva proximidade com o que AP era em Julho de 1992 e com a sua vivência como (então) criança . Acresce que o documento não foi impugnado pelos sujeitos processuais, foi sujeito ao contraditório, tal como os demais que o tribunal está a enunciar. Quanto à saída da instituição, resulta dos documentos de fls. 1 e 2, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX), que o mesmo teve baixa definitiva da AX em 21/08/00. No entanto, resulta igualmente do teor de fls. 4 a 10, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) e fls. 840 a 845, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), que pelo menos desde 14/04/2000 AP já não estava na AX, pois tinha sido conduzido, depreende-se do documento por decisão judicial, primeiro para o (...) EW e daí para o (...) IIT, para observação, sendo que por Despacho de 9/06/00 foi determinado que a observação fosse feita em ambulatório e ficando o (então) menor a residir com a Tia Avó EA. Mas conjugando a informação que antecede com os registos que estão a fls. 203 (referente a Segunda Feira, 3/04/00) a 221 (referente a Sexta-feira, 14 de Abril de 2000), do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00), resulta que, “de facto”, desde a noite de 3/04/00 AP não esteve no Lar, tendo andado “ fugido” e em casa da Tia, até ter sido conduzido em 14/04/00 do (…) para um (...) do IRS (cfr. Fls. 221, do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Daqui, também, o facto que o Tribunal deu como “ não provado” no ponto “10.” destes factos. A baixa definitiva foi, efectivamente, em 21/08/00, mas desde a noite de 3/04/00 e até ter sido conduzido em 14/04/00 para um (...) do I.R.S., AP já não dormia na AX, já não estava sob qualquer controlo diário dos educadores da AX. (1.1) Em relação aos elementos constantes do Apenso W-11 (Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e acabados de mencionar, há que ter em atenção que são registos diários da vivência do Lar, resultando do seu teor que se destinavam a ser, por uma lado, “ uma passagem de serviço” entre os educadores e, por outro, uma forma de os educadores falarem entre si sobre os educandos. Assim, são um meio importante – mas com limitações também relevantes, que ao longo da análise crítica da prova iremos assinalando - para o tribunal se aperceber como era a vivência diária do Lar, em relação a aspectos que cada educador considerou mais marcante, sendo um instrumento que, a par da prova testemunhal, permite ao Tribunal ter proximidade com o que os educandos, de alguma forma, foram no Lar. Feita esta referência, ainda neste primeiro núcleo de factos da vivência de AP, quanto aos factos que o tribunal deu como provados relativos às férias e fins de semana do educando na AX, contactos com os pais ou familiares e competências profissionais, foram relevantes, por um lado, os documentos de fls. 109 (referente a Sexta feira, 21/01/00, embora no registo de 22/1/00, conste que afinal o AP estava no (...), portanto nesse fim de semana não foi, afinal, a casa da tia, mas o que não afasta a conclusão de que ia também a casa da tia em alguns fins de semana), 163, 175, 185, 186, 187, 213, 214, 278 do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e os documentos de fls. 817 e 817vº, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), dos quais resulta que AP, pelo menos entre 24/11/96 e Abril de 2000, não passou as férias e fins de semana exclusivamente na AX, tendo ido em algumas alturas a casa da Tia EA, pessoa que manifestou interesse pelo Jovem ao longo do seu internamento na AX – pois caso contrário não se tinha predis(...) a acolhê-lo na sequência do seu internamento em 14/4/00 no (...) do IRS (cf. fls. 4 a 10, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX- e fls.830, 840 a 845, 846 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Mas sendo os contactos com os Pais esporádicos – mas existiram - , conforme resulta de fls. 17 a 18, 23 a 25, 37 a 38, 41, 85 a 86, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX), de fls. 776 a 779, 786, 789, 797, 818, 823, 831, 837 a 839 do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) e, a título de exemplo, fls. 416vº, 434, 451, 501, 360vº, 232, 149 do Apenso W -11, Livro 1 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) e fls. 81, 145 do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00)., (2) (Percurso escolar) Como dissemos AP entrou para a AX em Agosto de 1992. De acordo com a prova produzida em audiência de Julgamento, para a qual foram concorrente as declarações de AP (e cfr., quanto a elementos documentais, Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6 - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX - e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX), a sua frequência escolar enquanto esteve na AX, englobando o (...), ano lectivo e ano escolar, foi a seguinte: - 92/93, 1º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 93/94, 2º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 94/95, 3º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, DT; - 95/96, 4º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, DT; - 96/97, 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, DT, - 97/98, 5º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma E, nº 15), Col. CZ ; - 98/99, 5º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma B, nº 6), Currículo Alternativo Col. CZ; - 99/00, 6º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma B, nº 6), Currículo Alternativo Col. CZ, sendo que em Abril de 2000 deixou de estar na AX, como já vimos. (3) (Processo de crescimento) Paralelamente a este percurso escolar e por o considerar relevante para a avaliação das declarações do assistente – porque como já referimos, AP nas suas declarações, para localizar acontecimentos no tempo, faz referência a aspectos ou períodos concretos da sua vida - , o Tribunal apurou a evolução do AP quanto à sua estabilidade, integração e comportamento na AX. Quando é feita a proposta para internamento na AX, em Julho de 1992, a Psicóloga que o observa diz que AP é um rapaz simpático, realiza de forma rápida as proposta de trabalho que lhe são propostas, desempenho cognitivo médio para o grupo etário, evidencia dificuldades grafo-perceptivas, são notórias as sequelas de primeiros tempos de vida com privações várias (cfr. Fls. 777 a 779 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Na avaliação escolar que lhe é feita em 20/12/93 gosta de participar nas actividades da área de expressão dramática e criativo nos trabalhos efectuados na expressão plástica, não gosta de trabalhar na área da língua portuguesa, dificuldades na área da matemática, fazendo com dificuldade contagens em ordem crescente e decrescente, não tendo adquirido plenamente as noções temporais. Não gosta de trabalhar e se lhe fosse permitido passava o tempo a brincar (cfr. Fls. 796/796vº do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 10/01/94 a Pedopsiquiatra que o seguia na altura diz que apresenta perturbações psicológicas graves na área afectivo emocional (cfr. Fls. 794 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). E na avaliação que lhe é feita em 28/03/94, no segundo período do mesmo ano, AP é tido como um aluno que se distrai com facilidade, continua a apresentar dificuldades na área da Matemática com a memorização da tabuada e resolução de problemas, não gosta de trabalhar na área da Língua Portuguesa, continua a gostar de participar nas actividades da área de expressão dramática e a ser criativo nos trabalhos efectuados na expressão plástica (cfr. Fls. 795795º do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 4/03/97 – AP tem 12 anos de idade e está a frequentar 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT -, a Equipa Técnica do internato faz um relatório sobre o educando, com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico até ao fim do ano lectivo em curso e diz que a sua integração no lar foi difícil, com fugas sucessivas entre Dezembro 1992/Março 1993 e Dezembro 1993/Janeiro de 1994, problema que a Equipa diz estar ultrapassado “ …desde há sensivelmente 2 anos…”. Refere que AP é uma criança muito infantil e imatura, “… necessidade constante de atenção por parte dos adultos, o que lhe permite suprir em parte a imagem desvalorizada e deformada de si próprio…”. Por vezes é impulsivo e agressivo consigo e com os outros. Diz, também, este relatório, que AP começou a ter consulta de Pedopsiquiatria em 22/02/94 no Hospital IIU ((...) da Juventude a funcionar no HHB, sendo a Pedopsiquitra a sra. Dra. IIV), a qual foi até Maio de 1996, sendo que a equipa do internato, por o entender necessário para o AP, diligenciou pela continuação do acompanhamento do jovem nesta área, na sequência do que este retomou as (...) em 20/02/97, com o Dr. BL, periodicidade de uma vez por semana (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 29/09/97 é feito novo relatório pela Equipa Técnica do internato, com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico do AP no ano lectivo 1997/1998, pelo dr. BL, sendo referida a evolução positiva do jovem decorrente deste apoio e a continuar com a periodicidade de uma vez por semana (cfr. Fls. 809 a 810, 812 a 813, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). No início do ano lectivo 98/99, da anotação de 23/9/98 (resultante de um reunião com os (...) do Currículos alternativos - cfrs, fls. 819 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), AP está participativo, sendo referido “ miúdo muito cativador …meigo e carinhoso”. Mas na avaliação escolar que lhe é feita no fim do 1º período, desse ano lectivo 98/99, é referido pelos (...) que é “ emocionalmente muito instável”, “ requer frequentemente a atenção do professor”, às disciplinas de História e Ciências demonstra interesse e participa nas actividades propostas. Mas a EVT já é feita a observação que é “ muito instável, não consegue estar na sala de aula e participar nas actividades curriculares”, mas sendo na síntese dito que é um aluno “ desinteressado, malcriado, que acaba por destabilizar a turma”. Na avaliação do Segundo período é referido a Ciências da Natureza e Educação Musical que piorou (bastante) o comportamento. E na avaliação do terceiro período que piorou as relações com os outros, desinteressado mesmo às disciplinas em que no 1º período manifestava interesse, piorou a sua instabilidade e rendimento (cfls. Fls. 27 e 27 vº, 28, 29 e 29 vº, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX). Em 13/01/00 é feito novo relatório pela Equipa Técnica do internato, com vista ao recomeço de apoio pedopsiquiátrico ao AP para o ano lectivo 1999/2000, pois tal apoio, que anteriormente foi dado pelo Dr. BL, tinha sido interrompido no ano lectivo 1998/1999 por desinteresse do AP nessa relação (resultando do relatório de fls. 837 a 839, datado de 26/07/00, que tal desinteresse traduziu-se na recusa do jovem em continuar a ir às (...) – cfr. Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). O pedido da Equipa Técnica é feito com carácter de urgência, devido à baixa auto estima do jovem e às “ grandes dificuldades de relacionamento interpessoal “ que manifestava, com falta de controlo dos impulsos agressivos e frequentes passagens ao acto, apresentando, na altura em que é feito o relatório, “ comportamentos de risco que podem comprometer, inclusivamente, a saúde física” (cfr. Fls. 824/825, 827/826 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Conjugando esta referência de “ risco” que é feita pela Equipa Técnica, com a avaliação escolar do ano lectivo 99/00 - em que no segundo período é referido como tendo “ graves problemas emocionais…falta de concentração …instável…”, com absentismo escolar (por exemplo, a Educação Moral 20 faltas nesse periodo e a E.V.T. 25 faltas) ( cfrs. Fls. 30 e 31, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX) - , resulta para este tribunal que desde o ano lectivo 1998/1999 e até à data em que é feito o relatório pela equipa técnica em 13/01/00, o processo de adaptação, educação, vivência social de AP foi em sentido de crescente desinteresse pela escola, pelos educadores ou colegas, manifestação de comportamentos inadequados para a vivência com os outros e consigo, sendo que já estava (1/00) com 15 anos de idade. Esta conclusão do Tribunal, quanto ao processo de acentuada degradação da vivência e de crescente problemas de integração de AP na AX, desde o ano lectivo de 1998/99 – até à sua saída em Março/Abril de 2000, nas circunstâncias que o Tribunal já referiu (fuga do lar e integração num (...) do IRS em 14/4/00) –, foi integrada e sustentada com a análise que o tribunal fez do dia-a-dia do AP no Lar FC, movimentos de integração no Lar, processos de fugas. (4) Passemos, então, à co-análise desta parcela da vida de AP - até porque resultou da prova produzida em audiência de julgamento que o Educando foi expulso da AX, na sequência, também, de um processo de fugas -. No que diz respeito a esta problemática das fugas do AP - o Relatório de 4/03/97 e que acima referimos (cfr. Fls. 804 e 805, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), diz ser um problema ultrapassado “ …desde há sensivelmente 2 anos…” -. Considerando o que ressalta dos relatórios feito sobre o AP e acima já referidos, quanto à carência afectiva que o jovem demonstrava desde que entrou para a AX, conjugado com o que foram as declarações do assistente sobre as razões pelas quais fazia fugas da AX (dizendo, de forma que o Tribunal sentiu emotiva, como expressão de algo que o fez sofrer, que desde que entrou para a AX sempre efectuou fugas, “… porque desde que eu entrei na AX sempre fui revoltado, porque qualquer sonho de um rapaz é crescer junto de um pai, de uma mãe, ter um carinho, um afecto e eu não.. eu ali não tinha…quer dizer, os educadores davam, mas não é o mesmo.., o mesmo afecto que uma mãe e um pai pode dar ao filho…”), para este Tribunal e atenta as regras da experiência comum, foi relevante para que tais fugas (“as primeiras”) cessassem o movimento de aproximação do jovem com a mãe, com as irmãs e com a tia EA, que resulta ter sido feito e trabalhado pela AX, pelo menos, entre Outubro de 1996 e Abril de 1997, conforme se conclui das anotações de fls. 817 e 817 vº, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Mas neste mesmo documento há uma anotação de 3/06/98, de um pedido de AP para contactar as irmãs. Aqui (re)começa, na análise do tribunal, o período de instabilidade que acentuadamente AP revela desde o ano lectivo 1998/1999 e que culmina com a sua expulsão da AX. Como dissemos, no dia 3/06/98 há a anotação do pedido do AP para contactar com as irmãs e no dia seguinte, 4/06/98, uma anotação da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo. Cruzando esta informação com o relatório que em 17/07/98 é feito sobre o AP – proposta para ingressar nos currículos alternativos (cf. fls. 798/799, 801, 806, 818/818 vº, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) -, assinado pela Sra. Dra. XZ, a qual foi assistente social na AX de Outubro de 1968 a Julho de 2006, tendo declarado ao Tribunal ter estado desde 1981 no (...) de CZ, tendo exercido a suas funções em contacto directo com os educadores e falado sobre esse trabalho - , com o relatório de 4/03/97 que já mencionámos e com os registos do livro de ocorrências do lar em que o educando estava (cfr., como primeiro registo de fuga encontrado, Fls. 386) do Apenso W -11, Livro 1 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) , esta fuga de 4/06/98 é a primeira que o Tribunal encontrou nos diversos elementos do Assistente após o início de 1995 (altura aproximada em que, de acordo com a Equipa Técnica, como vimos, teria sido ultrapassado o problemas das “fugas sucessivas” entre “Dezembro 1992/Março 1993 e Dezembro 1993/Janeiro de 1994”). Após 4/06/98 (data da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo), o Tribunal encontra apenas um registo de fuga do AP em 1/07/98 (cfr. Fls. 405 vº, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99). Após 1/7/98 e até 20/4/99, não há registo a dizer que AP fugiu. Surge, em 20/04/99, um registo no livro de registo de ocorrências (cfr. Fls. 115, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), no qual consta “ …Houve uma BOMBA acerca do AP,…depois amanhã falamos… O telefone não para com a família do AP a querer saber notícias…Ultima hora, telefonou a Tia EA a dizer que os avós do AP não o quiseram lá. Vamos ver o que isto dá….”. Esta anotação coincide com a que (também) em 20/04/99 foi feita no seu processo psicossocial , dizendo que AP foi com um irmão, o IIW, que apareceu no Lar dizendo que o queria levar para sua casa. Em 22/04/99 há a anotação de uma reunião com a Tia EA, AP “ deu nota de não se estar a sentir bem ” e acabou por aceitar ficar no lar, indo a casa da Tia mais frequentemente (cf. fls. 846, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). São estas duas anotações que nos permitem perceber o que é que se passou com o AP, qual era a “ BOMBA” que o Educador anotou no Livro de Ocorrências. Isto porque das anotações seguintes do Livro de ocorrências – cfr. fls. 116, 21/4/99, Quarta: …O AP telefonou ao irmão para avisar que estava tudo bem… Apareceu cá a tia EA dos (…) e amanhã vai haver reunião…; Fls. 116, 22/4/99, Quinta: O AP veio cá com um recado da Prof IIX. À tarde, não disse a hora, quer reunir-se com vocês e com o AP... Ele disse tb que receberam um telefonema do padrinho com ameaças.. (Fls. 117)… O problema do AP está resolvido. Ao fim de muito custo ele acedeu cá ficar...O primo dos lavaredas veio cá buscar o (…) para irem a (…) buscar a mala do AP… (cf. Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) - , não se fica a perceber o que efectivamente aconteceu. Há que abrir um parêntesis. (4.1) Esta referência do Tribunal aos registos do Livro de Ocorrências do Lar FC, da forma como a está a fazer – isto porque só pela leitura dos registos do Livro de ocorrências não se conseguia saber o que, efectivamente, tinha acontecido -, prende-se com a observação que já acima fiz, quanto à importância para o Tribunal, mas com limitações, do contributo probatório dos livros de registos de ocorrências dos Lares. É que, pelas lacunas de informação que em algumas situações revelam – e de que é exemplo esta em relação à “ Fuga” de AP, não deixando o Tribunal de indicar outras que existem, quando for a circunstância própria -, o Tribunal considera as anotações constantes dos livros de registos como um elemento de prova importante, mas limitado. Isto é, apenas descrevem partes da vida do lar, têm que ser integrados com os demais meios e elementos de prova. (5) Prosseguindo a análise da vivência de AP, a partir desta altura (20/04/99) percebe-se, pelos registos dos Livros de Ocorrências (cfr. Fls. 314, 315, 121, 129, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), que AP passou a ir com mais “regularidade” para casa da Tia EA. Mas em 12/5/99 e 13/05/99 há novos registos, dos quais resulta nova fuga do AP do (...), para ir procurar um irmão ao aeroporto, tendo regressado ao (...) em 13/5/99 (cf. Fls. 139, 12/05/99, Quarta: …O AP são 19 horas e ainda não chegou da consulta, estamos desorientados, já telefonámos para todo o lado e não está em lado nenhum, vamos aguardar mais um bocado. …Se ele não vier eu amanhã venho mais cedo e faço um ofício ao director… …Vou à Polícia dar parte do desaparecimento do AP e depois continuamos a aguardar… AP apareceu por volta da meia noite e meia. Vinha chamar o (…) e o (…) interveio a tentar trazê-lo para dentro. Disse ao (…) para vir porque tinha um carro à sua espera. Como o (…) não foi e estava a ser pressionado para ficar, o AP fugiu e ninguém mais o viu. …Antes disso diz o (…), o AP telefonou para cá a dizer que estava no aeroporto, eram 11.30h; (…) Fls. 136, 13/5/99, Quinta: …telefonei para Dr (…) marcar consulta do (…)… Estive também a falar sobre o AP e ele mostrou-se muito preocupado, pois tem a certeza que ele foi para o irmão… Novidades: às 10.55 a avó do AP telefonou a dizer que estava lá em casa. Chegou sozinho ás 2.30h e foi ao aeroporto à procura do irmão, mas este já não trabalha lá. Depois foi para casa da avó e passou por aqui… O AP chegou ao lar eram 14.30h…; do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99). Após esta fuga em 12/5/99, percebe-se pelas anotações de fls. 149, 151, 172, 188, 201 (do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) o esforço que foi feito até meados de Setembro desse ano, quer pela família do AP, quer pela AX, para manter os contactos do AP com a família, indo a casa dos Avós, da Tia EA, ver as irmãs e a mãe. Mas resulta também das anotações dos livros de registo de ocorrências do Lar que após o reinício do ano escolar 99/00 – e pela anotação de fls. 213, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99, resulta que AP regressou para o lar, após o período de férias, em 13/9/99 -, até 24/10/99 não há registo de AP ter ido a casa da Tia ou outros familiares. E, quanto a “fugas”, apenas em 18/10/99 há registo de AP ter fugido, embora tenha regressado nesse mesmo dia (cfr. Fls. 21, “ 18/10/99, 2ª feira...AP encontra-se de castigo...O AP fugiu para casa da D. (…), mas está tudo resolvido, chegou eram 19.45h... no entanto continua de faxina a fazer tudo o que puder...”, do Apenso W -11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) No dia 24/10/99 há o registo de ter ido almoçar a casa da Tia EA (cfr. Fls. 27, do Apenso W -11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00, sendo que a fls. 25, registo datado de 22/10/99, Sexta feira, consta: ... o AP telefonou para casa a ver se podia ir de fim de semana e padrinho respondeu que a casa dele era aqui... ficam no lar ... AP...), havendo depois registos de ter ido a casa da Tia EA em 29/10/99, 19/11/99, 28/11/99 (aqui depreende-se pela redacção da anotação), 21/12/99, 5/02/00, de ter ido almoçar com a mãe em 20/02/00, de ter ido a casa (da irmã) 25/00/00 e para casa da Tia EA em 25/03/00 (cf. Fls. 33, 50, 62, 81e 82, 127, 144, 150 e 152, 186 do Apenso W -11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). No Relatório da Equipa Educativa do lar FC de 30/03/00, é relatado que AP ausentou-se do lar às 14 horas do dia 29/03/00, apesar de estar proibido de sair do lar e suspenso das actividades lectivas (cf. Fls. 820, Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) Esta informação é complementada com a participação policial de fls. 36, do Apenso DA (Apenso DA - Processo individual de AP na AX), datada de 29/3/00, em que à 01.40h AP está em (…) e contacta a entidade policial, pois fora à procura da irmã (…) e esta não o recebeu. O ano de 2000 foi, na conclusão deste Tribunal, o ano do descontrolo total do jovem. O que, aliás, vai no sentido do que acima foi apreendido e concluído pelo Tribunal, quando ao percurso escolar, crescente em sentido negativo, de AP. Uma referência. O Tribunal tem estado a convocar documentos, os contribuíram para a sua convicção quanto aos factos que deu como provados ou não provados. São documentos que para o Tribunal e tal como temos referido noutras situações, afiguraram-se credíveis quanto ao seu conteúdo, isto é, não houve qualquer dúvida ou indício de que tivessem sido fabricados para distorcer a realidade dos factos que atestam ou que referem, foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Tendo sido, também, sujeitos ao contraditório do Julgamento. 13.1.5. (conhecimento de outros Assistentes): Passando ao conhecimento do assistente AP com os demais assistente, entre os quais AT, AV, Y, AN, X, AI, vejamos: (1) Em audiência de Julgamento (cfr. A.J. 4/07/05, mas já o dissera na A.J. 29/06/05), o assistente AP declarou que conheceu AT quando este entrou no lar FC, onde o Assistente (AP) vivia. E diz que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Perguntado pelo Tribunal qual a memória que tinha quanto ao tempo que decorreu entre a entrada do assistente na AX e a do AT, respondeu ao Tribunal “ …eu entrei e julgo que semanas depois, ou dias depois, entrou o AT…”. E, quanto à sua saída, disse (AJ 4/07/05) a pedido de esclarecimento que é feito, que saiu da AX em 2000, mas não se recordando se foi no decurso do ano lectivo 99. Mas olhando para os documentos dos autos, entre os quais os que temos estado a citar relativamente ao percurso do AP na instituição, AP entrou na AX em Agosto de 1992 e AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99, conforme resulta de fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Estamos a falar, no que diz respeito à distância que ocorreu entre a entrada de um e a entrada de entrada de outro, de um período de tempo de sete anos e a memória que AP consegue reproduzir em relação a aspecto, relativamente ao qual não tinha qualquer necessidade de mentir ou inventar, é que AT entrou “ dias” ou “semanas” depois de si. Mas esclareceu, porque foi-lhe perguntado, quanto a uma questão que já não era uma circunstância de “tempo”, mas uma questão relacionada com acontecimentos na sua vida, que “ achava” que quando AT entrou para o FC o assistente já estava a estudar no CZ. O que correspondia, de facto à realidade, pois como vimos durante a audiência AP esteve a estudar no (...) DT do anos lectivo 92/93 até ao ano lectivo 96/97 e foi para CZ no ano lectivo 97/98 (e cfr., quanto a elementos documentais, Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6 - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX - e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX). E, quanto ao tempo que esteve como AT na AX, a sua memória foi que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Mas como dissemos, AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99 (cfr. fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e cerca de seis meses depois AP está a sair da AX. Ainda nesta instância (na AJ de 4/7/05) e no sentido de ilustrarmos a dinâmica ou a estrutura do que é a memória ou a noção de AP em relação ao tempo e aos factos ocorridos na sua vida, recordava-se que em relação ao acompanhamento (de pedopsiquiatria) que teve, enquanto na AX, primeiro foi “… acompanhado por uma Senhora, no HHB, em (…), onde vim depois a ser acompanhado pelo Dr BL…”. E, como vimos nos elementos dos autos, esta sequência está correcta. No relatório de 4/03/97 (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), AP tem 12 anos de idade e está a frequentar 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT. A Equipa Técnica do internato faz um relatório com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico até ao fim do ano lectivo em curso, dizendo que AP começou a ter consulta de Pedopsiquiatria em 22/02/94 no Hospital IIU ((...) da Juventude a funcionar no HHB), a Pedopsiquitra era a sra. Dra. IIV, a qual foi até Maio de 1996, sendo que a equipa do internato “…diligenciou pela continuação do acompanhamento do jovem nesta área…, este retomou as (...) em 20/02/97, com o Dr. BL, periodicidade de uma vez por semana...” (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). No entanto, quando a seguir lhe são feitas perguntas quanto à localização no tempo do “acompanhamento” ou sua contemporaneidade com outros factos, não conseguiu dizer ao Tribunal quando começou o acompanhamento pelo Dr. BL, quantas sessões teve, nem mesmo se quando teve as sessões já tinha sido sujeito a actos de abuso sexual. Por exemplo, quanto à data da entrada na AX. Começa por dizer que entrou em 1991. Perguntado com que idade e a pergunta foi repetida, é seguro a responder “ 7 anos”. E perguntado pelo tribunal porque é que dizia sete anos, se tinha estado a fazer alguma conta, esclareceu com (para o Tribunal) naturalidade: “…não, eu já há muito tempo que fiz uma conta para saber quanto tempo é que eu estive na AX. E fiz essas contas e deu que eu entrei em 1991…” (cfr., também, declarações da AJ 4/07/05, em que diz “ … eu entrei para a AX com sete anos e como faço anos no dia um de Outubro…eu não sei em que mês é que eu entrei, mas sei que dias depois…ou meses depois, foi a minha festa de aniversário, onde fiz os meus oito anos…”. É uma das situações em que em relação ao “facto” ter “entrado com 7 anos” na AX está seguro, mas em relação a datas não. Diz 1991 porque fez contas…e fez mal as contas, porque se há coisa que AP não era bom era em contas, como se pode ver pelos seus elementos escolares (e que acima referimos). AP tem noção dos factos que ocorreram na sua vida, não tem noção do tempo em que ocorreram os factos na sua vida. Quanto ao conhecimento com o assistente AN, na audiência de julgamento de 20/06/05, espontaneamente e quando falava dos seus amigos, disse ter (como amigos) o X e o “AN”, ambos do Lar FG. Mas na audiência de Julgamento de 7/07/05, respondendo ao pedido de esclarecimento sobre se conhecia algum aluno da AX com o nome AN, disse ao tribunal que conheceu um AN, “… no FF…um jovem mulato…”, respondendo, a pergunta da Defesa do arguido C, que este jovem foi consigo a (…), “supondo” que de todas as vezes, acrescentando “…pelo menos das vezes que eu lá fui vi o AN…”. No entanto este “ AN”, “…jovem mulato…”, do “…Lar FF …” e que AP referiu, não é o AN Assistente nestes autos pois, como o tribunal pôde ver, por o ter tido perante si, o AN (Assistente neste processo) não é mulato e dos documentos dos autos, nomeadamente do Apenso CJ, resulta que esteve no lar FG. Quando em audiência de julgamento AP se referiu a AI - por ter-lhe sido perguntado se conhecia um aluno da AX com o nome AI -, o Assistente declarou que o conhecia “apenas agora”, não podendo “…citar ao Tribunal se esteve lá (em (…)) , se não esteve…”. Para o tribunal, tendo em atenção a forma como respondeu – acrescentado, quanto à altura em que o conheceu que “ …salvo erro…” nos anos da Dra. BP, (...)a da AX; o que confirma na AJ 22/07/05, a instâncias da defesa do arguido H, dizendo que só se recordava de ter visto AI na festa de anos da BP -, o conhecimento do nome AI e a identificação deste nome com um rosto, foi processo que ocorreu ao Assistente AP no decurso e por causa deste processo (e AI teve declarações no mesmo sentido, quanto à razão e altura em que conheceu o assistente AP). E AP – tal como aconteceu com AI -, não o escondeu ao Tribunal . Este comportamento, para o Tribunal e numa primeira abordagem, não é o mais “normal” se estivesse a criar e contribuir para o forjar de uma história entre vários Jovens e com os contornos que as Defesas lhe imputaram, pois poderia ter o impulso para esconder. É certo que também pode ter equacionado que era “melhor” nada esconder quanto aos conhecimentos, porque facilmente poderia ser descoberto.... Quanto a Y declarou, na instância feita pela Defesa do arguido C que “… posso conhecer…mas não tou a ver agora pelo nome quem é, quem seja…” e na AJ 22/07/05 voltou a dizer, quando perguntado se estava a ver quem era este aluno “…Sra. Dra., pelo nome tou a ver mais ou menos…um aluno interno do CZ…salvo erro…”. Passando para AV, das declarações de AP (cfr. Aj de 4/7/05), resulta que conheceu AV quando este foi para o lar FC, onde o assistente já estava, sabendo que AV vinha de outro (...), mas de fora. Das suas declarações de 4/07/05, em que falou dos quartos em que esteve, resulta pela dinâmica da sua descrição, quanto à altura em que esteve no mesmo quarto no Lar com AV e com AT, resulta que foi antes de ter ficado outra vez com o seu irmão, sozinhos, num quarto. E que esta altura em que mudou, para ficar outra vez sozinho com o irmão, foi na altura em que fazia mais fugas e onde “… cheguei a sair…” e “… a não comparecer mais…”. Quanto a fugas, convocamos o que acima já dissemos (cfr., (i) que após 4/06/98, data da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo, o Tribunal encontra apenas um registo de fuga do AP em 1/07/98 - cfr. Fls. 405 vº, do Apenso W -11, Livro 1, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99 -; (ii) após 1/7/98 e até 20/4/99, não há registo a dizer que AP fugiu; (iii) Surge, em 20/04/99, um registo no livro de registo de ocorrências (cfr. Fls. 115, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), no qual consta “ …Houve uma BOMBA acerca do AP,…depois amanhã falamos… O telefone não para com a família do AP a querer saber notícias…Ultima hora, telefonou a Tia EA a dizer que os avós do AP não o quiseram lá. Vamos ver o que isto dá….” Esta anotação coincide com a que (também) em 20/04/99 foi feita no seu processo psicossocial , dizendo que AP foi com um irmão, o IIW, que apareceu no Lar dizendo que o queria levar para sua casa. Em 22/04/99 há a anotação de uma reunião com a Tia EA, AP “ deu nota de não se estar a sentir bem ” e acabou por aceitar ficar no lar, indo a casa da Tia mais frequentemente (cf. fls. 846, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX; (iv) e que em Abril de 2000 dá-se a saída do AP da instituição, na sequência de nova fuga, conforme resulta dos registos que estão a fls. 203, referente a Segunda Feira, 3/04/00, a fls. 221, referente a Sexta-feira, 14 de Abril de 2000, do Apenso W -11, Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00; resulta que, “de facto”, desde a noite de 3/04/00 AP não esteve no Lar, tendo andado “ fugido” e em casa da Tia, até ter sido conduzido em 14/04/00 do (…) para um (...) do IRS; cfr. Fls. 221, do Apenso W -11, Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Da ponderação das suas declarações não resultou para o Tribunal que tivesse uma relacionamento próximo ou conhecimento intimo com (…). Em audiência de julgamento (cfr. AJ 4/07/05), quando lhe são pedidos esclarecimentos quanto ao seu relacionamento com AV, é-lhe perguntado se conheceu a testemunha AAT (testemunha de de cujo depoimento resultou, para Tribunal, que AV tinha um especial sentimento, pelo menos de amizade; como aliás é perceptível da conversa telefónica que esta testemunha confirmou ter tido com o assistente AV, quando este lhe telefonou em 1/02/03 e cuja transcrição se encontra no Apenso O-T, factos sobre os quais a testemunha AAT foi perguntada), disse que conheceu uma colega (…) (não sabe se AAT). Se o relacionamento que AP teve com AV fosse de intimidade, era normal que tivesse algum conhecimento sobre, por sua vez, o que era AAT para AV. Não o teve e AAT também não revelou ter conhecido AP associado a AV. É certo que AP podia, intencionalmente, ter omitido a “informação” sobre AAT, para despistar o Tribunal quanto ao que era, efectivamente, o seu relacionamento “intimo” com AV. Mas isto implicaria, na avaliação do Tribunal, que naquela audiência de julgamento de 4/07/05 em que estava a responder a estas questões - já tinha sido inquirido em 20/06/05, 24/06/05, 29/06/05, 30/06/05 -, AP tivesse a capacidade para estar, no meio do contraditório a que efectivamente foi sujeito, a fazer a triagem do que era a informação que queria dar ao Tribunal e a que queria reservar para si. Isto porque, nessa mesma altura, fala do que para si era AV, dizendo que era o “ braço direito do A, entre aspras…” e explicando o que queria dizer com as “aspras” : dizia-o porque AV “… se acompanhava sempre do A, tinha acesso à sua agenda, simplesmente foi isso que me levou a dizer que era o braço direito do A…”. O que para o Tribunal, não só atentas as inquirições muito pormenorizadas, facto a facto, a que foi sujeito, bem como o que era o AP - como resulta do que no início dissemos quanto à sua evolução, avaliações psicológicas e crescimento -, não se nos afigura que tivesse capacidade para tanto. Disse ainda saber que foi Colega de AV na escola, mas não se consegue recordar quanto tempo. Localizou que isto foi quando esteve nos currículos alternativos, esclarecendo que com AT esteve na escola no seu primeiro quinto ano, pois depois chumbou. Quanto a X, (cfr. AJ 4/07/05) disse que conheceu X mas não foi do seu lar ou turma. Afastou que fossem amigos. Conhecia-o porque X “ … também ia para os mesmos actos que eu…”, tendo dito para (…), mas nada referindo quanto a outros actos ou locais. Mas quando lhe é perguntado pela defesa do arguido C X se o conhecia e se eram amigos, começa por dizer “… Sraº Dra., em relação ao X…aah…eu posso adiantar a este Tribunal que eu sou amigo do meu amigo. E na AX nós somos um grupo. Portanto, não temos que ter desavenças uns com os outros…e …sempre me dei bem com toda a gente, como toda a gente se deu bem comigo…não quer dizer que às vezes …haja intrigas…porque qualquer família tem intrigas…”. Para o Tribunal esta resposta estava a ser evasiva, pelo que perguntado directamente pelo Tribunal se eram amigos, se confidenciavam coisas um ao outro, respondeu que não eram amigos, “simplesmente conheci o X porque também ia para os mesmos actos que eu” (e confirmando que X nunca tinha sido do seu lar). Esclareceu que os actos a que se estava a referir eram “actos sexuais”. Quando o Tribunal lhe perguntou, em concreto, a que sítios se estava a referir, pois tinha dito ao Tribunal ter ido a vários sítios, respondeu “(…)”. Na sequência desta resposta foi-lhe perguntado pela Defesa do arguido C se este foi o único sítio a que fora com o X e este respondeu que sim. Foi-lhe perguntado se X tinha alguma relação com “DU”, confirmou saber que X conhecia “DU”, foi visível que não queria responder quanto ao processo “DU” - dizia “… isto foi um processo que já…foi cancelado…e acho que não tem…não tem nada a ver com o Processo AX…” - . Dos elementos do autos - cfr certidão constante de Fls. 62.539 a 62.747, referente ao acórdão proferido no processo nº 1815/97.0TAOER, pelo 3º Juízo Criminal da Comarca (…), em que foi arguido, entre outros, DU, incluindo Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Constitucional em tal processo -, resulta que AP e X estiveram relacionados com o processo acabado de identificar, cujos factos, relacionados com actos de natureza sexual, o Tribunal deu como assente terem-se passado em “1999”, tendo declarado, a esclarecimento que lhe foi pedido, que foi o X que o apresentou aquela pessoa. E em relação a estes actos ocorridos com DU, a pedido de esclarecimento quanto à localização no tempo desses factos – se anteriores, contemporâneos ou posteriores aos que audiência de julgamento relatou como tendo-se passados em (…) -, responde que foram antes (cfr. AJ 6/07/05) (Voltaremos no entantoassim, em momento posterior a estes factos, até porque isso tem a ver com a defesa especificamente apresentada pelo arguido H, pelo menos quanto aos factos descritos nos pontos “5.2.5” e “7.2” do despacho de Pronúncia). 13.1.6. Passemos à forma como encadeia os factos: Como dissemos, o relato de AP foi por vezes confuso e contraditório - quer entre si, quer com os demais assistentes - quanto a datas, pessoas ou locais. Assim, comecemos por ver a forma como descreveu e encadeou os actos e situações que viveu. A súmula que, neste momento, vai ser feita pelo tribunal, limitar-se-á a identificar os locais/pessoas que o assistente começou por falar, actos ocorridos e forma como, temporalmente, o assistente os descreveu. 13.1.7. Na primeira audiência em que prestou declarações (AJ 20/06/05), o Assistente AP começou a falar dos actos de abuso de natureza sexual sofridos por si, enquanto aluno interno da AX. (1) Começou por falar no primeiro acto de abuso por parte do arguido A, ocorrido na garagem de CZ. Após ter falado neste acto, o Tribunal perguntou-lhe se tinha acontecido mais alguma coisa com o arguido A, após estes actos na garagem, na sequência do que o assistente respondeu que sim, que o arguido levava-o, conjuntamente com outros colegas, para uma (...) em (…), para encontros com outros arguidos. E passou a descrever, sem qualquer interrupção pelo Tribunal, o que se passou a seguir ao abuso do arguido A. Relatou ter ido uma 1ª vez a (…), referindo - aquando do relato desta “1ª vez” e, portanto, aparentemente como referido a esta “ 1º vez” - o transporte numa carrinha (…), da AX e que já se encontravam na carrinha os colegas AV, AT e AN. Não se recordava se foi de manhã, de tarde ou à noite “… sei que estava no lar…em frente…onde fui abordado pelo Sr. A para entrar…”. Em (…) viu viaturas “topo de gama”, “ …onde se encontrava um (…), um (…) e um (…), pertencente ao Dr. K….”. Descreveu que “ …chegando a essa casa éramos recebidos por uma senhora D. Q…pela qual dava um beijinho a mim e ao (…)…”, que esclareceu ser o colega AV (“…recebidos por essa senhora éramos encaminhados até ao interior da casa, onde estava o Sr. H, o sr. N”). O relato foi interrompido neste momento, por o Assistente estar a chorar. Reiniciada a sua audição, disse que no interior da casa eram levados para uma sala, onde estavam, para além de outro adulto, os arguidos N, H , K e C. Acrescenta que eram encaminhados para o interior da casa pelo arguido A, continuando que no interior da casa o arguido N perguntou se queriam tomar sumos ou água. Após os jovens foram (...)s num quarto, arguido N disse-lhes para tirarem a roupa. Nesta altura o seu discurso não era “corrido”, da forma que fora anteriormente e aqui há que fazer um parêntesis e dizer o seguinte. (1.1) O Tribunal começou por tratar com alguma reserva a emoção que o assistente aparentou, naquela situação em que tinha começado a chorar e na sequência da qual o Tribunal interrompera a audiência. Um choro pode ser simulado e AP, como já chamamos a atenção, ao começar a ser ouvido era uma pessoa que deixava transparecer algum apelo à atenção e também uma certa vitimização, de que são expressão o já referido quanto ao seu “sonho de crescer junto de um pai”, as “justificações” que começou por apresentar para as suas fugas. Este apelo à atenção e à necessidade, natural, de captar os olhares dos outros, poderia levar a alguma encenação de teatralidade e na altura em que começou a chorar a sua expressão facial, imediatamente anterior, não deixava prever para o Tribunal aquele choro. No entanto, reiniciadas as suas declarações o seu discurso começou a ser menos “corrido”, a sua expressão facial foi diferente da anterior, mais fechada, começando a deixar transparecer um ar apreensivo e mais sério que o Tribunal anotou no momento. Se, inicialmente, AP se apresentou perante o tribunal com uma expressão e uma atitude que o Tribunal sentiu demasiado “à-vontade” para quem iria e começou a relatar factos de violação da sua pessoa e intimidade – percebia-se que se sentia ansioso mas, ao mesmo tempo, o Tribunal denotou alguma gratificação por estar ali a ser o ponto de interesse de todos -, após esta quebra - em que o tribunal, como dissemos, pusera inicialmente alguma reserva quanto ao grau de emoção que efectivamente estava por detrás de tal choro -, tivemos a percepção de um semblante diferente, de um discurso com uma ressonância diferente, de uma atitude global com emotividade que não chegara até aí ao Tribunal. E este registo ressentiu-se na forma como falou, com um relato confuso e por vezes contraditório quanto a sequências ou actos, como o Tribunal irá analisar, mas não tendo o Tribunal a sensação de estar a ouvir um relato decorado ou simulado (como iremos fundamentando). (1.2) Assim, prosseguindo, disse que nesta altura o arguido N tocou no pénis dos jovens que estavam na sala e o assistente AP foi levado para um quarto pelo arguido H. Nesse quarto praticou actos de coito oral e coito anal com o arguido H. O arguido A recebeu um envelope do arguido N. Dentro da carrinha, de regresso para o (...), recebeu dinheiro desse envelope. As viagens a (…) foram”…se não estou em erro, cinco vezes que eu lá fui , entretanto, já no (...), fui levado pelo sr. A ao (…), se não estou em erro, onde me fui encontrar com o Sr. H…”. Nesta ida ao “(…)” o arguido H estava acompanhado por EV, num (…) preto, tendo o arguido H levado AP a um passeio no Jardim (…) “… e mostrou-me um estúdio que havia na (…), que não sei dizer a este Tribunal o nome daquele estúdio… ahaa…ainda e por várias vezes…o…encontrei-me nesse…meses depois…ou dias…não me recordo Sra. Juíza…o…encontrei-me outra vez com o Sr. H, onde fui com este e com o seu Assessor EV …até uma praia de (…), que fica na “(…)”, para um encontro com o Sr. E…”. Nesta praia o arguido E deu uma chave de um apartamento ao arguido H, foram até (…), para um apartamento, que o Assistente disse pertencente “…ao Sr. E... aaahh…entretanto, já nas instalações da AX, o Sr. A pediu-me para que eu fosse ao (...) do Sr. K…”. Disse ter ido ao (...) “ antigo” do arguido K, onde sofreu actos de penetração anal por parte do arguido. Após descrever os actos disse ”…saí e fui para o (...). Mais tarde…o sr. A pediu-me para que levasse um aluno da AX , colega, de nome AT, a casa do sr. K…no (…), onde eu levei…”. Declarou ter entrado nessa casa com o AT, onde “… o Sr. K, mais uma vez, abusou de mim e do meu colega AT. Saímos e fomos para a Instituição. Mais tarde…fui levado pelo sr. A e pelo AV a uma casa em (…). Não sei explicar se era a casa das (…) ou não…porque se era a casa das (…) eu nunca descobri esse nome…”. Disse que foi também o AT, subiram “ lá acima”, tendo AV descido com o arguido A. “…Fui …aí ninguém abusou de mim, fui lá por mero acaso, não sei bem porquê…talvez o sr. A possa explicar a este Tribunal o porquê de eu ter ido à casa das (…)…se é esse o nome, porque eu não sei bem explicar porque é que eu lá fui. Sai daquela casa, entrei outra vez dentro da carrinha da AX e fui outra vez para a Instituição…” Aos “… quinze anos …foi pela última vez em que eu estive em (…) e onde estive com os mesmos arguidos…”. Tendo terminado o seu relato, o Tribunal perguntou-lhe se tinha mais alguma coisa a dizer ao Tribunal, ou se todos os factos que se passaram consigo estavam relatados, e acrescenta que, em relação à casa de (…) “…. porque eu na altura, como a sra. Dra. pode julgar, eu era pequenino e não sabia diferenciar o que era droga ou o que era outra coisa doutro tipo…mas hoje sei que quando entrei na casa de (…) existiam traços de branca ou cocaína…em cima de uma mesa, da sala de jantar…onde constavam também cervejas…”. Após o seu relato, sem qualquer interrupção pelo tribunal, começaram-lhe a ser pedidos esclarecimentos pelo Tribunal e, depois, pelos diversos Sujeitos Processuais foram-lhe pedido esclarecimentos quanto às diversas situações referidas no despacho de pronúncia. 13.1.8. (Actos com o arguido A, ponto 2.2 do despacho de pronuncia). Continuando, a partir deste relato inicial, a avaliar a forma como decorreram as declarações de AP, o contra interrogatório a que foi sujeito, a avaliar o que disse, como disse e quando disse e a descrever o percurso seguido pelo tribunal - na análise crítica de todos os meios de prova e provas -, para os factos que veio a dar como “provados” ou como “não provados”, passamos aos actos ocorridos com o arguido A. (1) Em audiência de julgamento o arguido A (A.J. 17/05/05) confessou ter estado na garagem com o AP e praticado os actos de coito oral e anal descritos no despacho de pronúncia. Fez, contudo, uma confissão parcial dos factos – essencialmente divergente quanto ao número de situações ocorridas e idade de AP quando ocorreram os factos -, tendo em atenção o que estava descrito no despacho de pronúncia no ponto “2.2.”. Quanto à localização no tempo destes factos com o arguido A, o assistente AP começou por dizer ao tribunal que “ …na entrada, na minha própria entrada na AX, foi quando as coisas começaram…”, tendo, no entanto, passado a relatar actos com outro funcionário. Por seu lado o arguido A disse recordar-se que estes actos foram uma ou duas vezes – no entanto, anteriormente, tinha dito não se recordar quanto tempo decorreu o relacionamento -, tendo dito também (na AJ 10/01/05) que conheceu AP teria este 14/15 anos, e conheceu-o com um irmão mais velho. Estavam os dois no Lar em CZ e este irmão (IIY) tinha cerca de 16 anos quando o arguido conheceu o assistente AP. Na localização temporal de factos avançamos - desde já – que para o Tribunal a referência que o arguido A fez à idade de IIY é a que está mais próxima da altura em que ocorreram os abusos e não a que fez da idade de AP. Isto porque, pela análise global da declarações de AP, os factos ocorreram numa fase da sua vida em que já estava há algum tempo na AX mas ainda não estava de saída e o relato que faz de outros sítios a que foi, é posterior a estes actos com o arguido A. Do “Apenso DA” resulta que AP nasceu em (…) e o seu irmão IIY nasceu (…), pelo que quando IIY tinha 16 anos, o irmão AP poderia ter, no máximo, 12/13 anos, situando-nos, portanto, em 1996/1997. Para o tribunal - pela forma como o arguido reagiu ao longo do julgamento, em relação à idade dos jovens -, a preocupação (natural) do arguido A foi a de mostrar que os rapazes – em relação aos quais admitiu ter praticado actos integradores de abusos de natureza sexual -. não eram tão pequenos como isso. Daí, também, a maior fidedignidade que o tribunal considerou haver da memória que o arguido revelou em relação à idade de IIY, pois em relação a este não tinha qualquer preocupação de responsabilização e, naturalmente, deixaria fluir a sua memória de forma menos condicionada. Acresce - quanto à análise crítica da prova por parte do Tribunal – e no que diz respeito à prova da data dos factos e ao número de actos à praticados – cfr. Pontos 92.6 a 92.8. dos “factos provados” -, que o relatório de 4/3/97 (cfr. Fls. 804 e 805, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), situa o agravamento da instabilidade de AP a partir, pelo menos, de meados/fins de 96. A ocorrência de factos de abuso, pelo conhecimento que nos advém da ciência, gera instabilidade, o que dá consistência à localização dos factos entre Outubro de 1996 e Agosto de 1997. Quanto ao número de vezes em que ocorreram os actos, AP disse ao tribunal (AJ 20/06/05) que na garagem não foi só uma vez, houve mais, “…como hei-de falar…de dizer a este Tribunal…mas não me consigo recordar os dias…nem os tempos em que se ocorreram estas coisas…”, acrescentando“… e depois as outras vezes era por tempo…eram…tinham tempos pelo meio. Era uma vez e…ficava um tempo… e chamava outra vez…”. Foi percebido pelo Tribunal uma dificuldade real de AP conseguir localizar no tempo quantas vezes e com que distância “esteve” com o arguido A, para a prática de actos de abuso de natureza sexual. No entanto, para o caso concreto (ponto 2.2.) do Despacho de Pronuncia, apenas está imputada a prática de um crime ao arguido, pelo que, para este efeito, fica prejudicada a necessidade de análise crítica complementar (no entanto e face também à admissão que o arguido fez destes factos, acrescentamos que por tudo o que estivemos a dizer, o Tribunal não ter valorado no seu sentido literal a resposta que o AP deu ao MºPº, na audiência de julgamento de 29/6/05, que o “primeiro abuso” do arguido A foram”… julgo ter sido semanas depois ter entrado na AX”, porque como vimos acima, a forma como reconduz o tempo leva a ter que recorrer a elementos, para perceber, dentro do possível, o sentido possível e plausível do que diz). (2) Por o considerarmos relevante, vamos referir, neste momento, um dado e facto que o assistente AP mencionou ao Tribunal (na A.J. de 29/6/05), associando tal dado quer à sua entrada na AX, quer aos abusos ocorridos com o arguido A. AP fez referência à existência de uma pista de skate, associando a existência dessa pista a “pouco tempo” após a sua entrada para a AX. A menção desta declaração é relevante não tanto para a fundamentação do tempo em que o Tribunal deu como provado terem ocorridos os abusos praticados pelo arguido A – e, neste momento, o referido no ponto 2.2, do despacho de pronúncia - mas porque ilustra e por isso preenche, o padrão da memória de AP quanto ao “tempo” - ou seja, quanto à falta de noção do tempo de AP - e que acima referimos como tendo emergido, ao longo do seu depoimento, de forma uniforme em situações diversas. O que, conjugando esta uniformidade de padrão, com a diversidade das situações em que se verificou, revelou-se um padrão globalmente coerente e correspondendo a uma reacção genuína. O Tribunal chama a atenção que estamos numa situação em que o arguido A reconheceu a prática dos factos - embora com discrepância, em relação ao que disse o assistente, quanto ao tempo e número de vezes em que os actos correram; dizendo, quanto ao tempo, o arguido A que AP teria 15/16 anos e AP que foi “pouco tempo” após a sua entrada na AX -, não se pondo, portanto, uma hipotética situação de “invenção” de abuso e/ou de falsa imputação da identidade do abusador. Foi, por isso, relevante encontrar também este padrão numa situação com estes pressu(...)s, uma vez que tal uniformidade de padrão, na diversidade de situações, pesou na motivação do Tribunal para concluir pela credibilidade e pela veracidade das declarações prestadas por AP noutras situações. A referência de AP à pista de skate e o que disse, foi: (i) a pista de skate não existia na altura em que entrou para a AX, “... veio a existir pouco tempo depois ...”. (ii) em relação ao último acto de abuso que teve com o arguido A, perguntado se essa pista existia “há pouco” ou se já existia “há muito” tempo, disse “... não me recordo, mas julgo que seja pouco tempo que esteja ali...”, esclarecendo, quando diz “pouco tempo”, tal corresponder a “... poucos meses ...p’raí... que aquela pista tava feita....”. Quanto à existência da pista de skate na AX, temos nos autos o documento de fls. 33.762, o qual tem a data de recepção da obra em 24/09/97. Ora nesta altura AP tinha ainda 12 anos e quando entrou para a AX tinha 8 anos. Começando pelo que importa ao “padrão da memória” demonstrado por AP - quanto ao tempo e à localização dos factos nesse tempo -, AP disse que a pista de skate veio a existir “pouco tempo depois” de ter entrado para a AX. Como vimos a pista foi recepcionada em 24/09/97 (cfr. fls. 33.762) e AP entrou para a AX em 1992 . Ora o “ pouco tempo depois”, neste caso, corresponde à partida a uma incongruência, no tempo, de cerca de 5 (cinco) anos. Mesmo que a construção da pista de skate tenha levado um ano ou dois anos, em relação à data da recepção, o seu início não poderá ser situado antes do fim de 1995, o que são três anos após a entrada de AP na AX. Assim, a matéria de facto que o Tribunal deu como provada nos pontos “82.6” e “92.7” dos factos provados. (3) Passando aos factos que o tribunal deu como provados (quer no âmbitos dos factos passados dentro da AX, quer nos demais) relativamente ao conhecimento deste arguido da vivência dos assistentes, idade dos assistentes, da consciência e conhecimento que tinha das consequências dos seus actos ou dos actos que eram praticados por terceiros nos assistentes - entre os quais o presente assistente - e na motivação da sua conduta, convocamos as declarações do arguido quando confessa, mesmo que parcialmente, a prática dos factos e quando tem o movimento de pedir Desculpa aos assistentes, como foi no caso concreto. Assim - e remetendo-nos para a fundamentação que fazemos e para o que dizemos quanto a esta matéria, em particular na análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2” -, para o Tribunal as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado” – e no caso concreto fê-lo em relação ao assistente AP -, significaram reconhecimento e consciência do arguido do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos. Significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. Quanto a conversas tidas com o assistente, a prova de tais factos e com o sentido e limitação que o Tribunal lhes deu, resultou quer das declarações do assistente quer das declarações do arguido. No que diz respeito ao arguido, este revelou conhecer alguns aspectos da vida do assistente na instituição – conhecia também o seu irmão -, conhecimento que foi perceptível ter resultado de conversas tidas com o jovem. O tribunal ficou convencido, como aliás já o dissemos em momento anterior, que isto foi uma forma de aproximação do arguido com este assistente e com os demais e, atenta a normalidade das coisas, para os conhecer e receber a sua confiança dentro da instituição. No entanto, no caso concreto, face às declarações do assistente e do arguido, quanto à multiplicidade (e frequência) de locais onde o arguido levou o assistente e a frequência com que foi perceptível algum contacto, o Tribunal ficou convicto que o arguido fez esta aproximação, desde o seu início, com o objectivo de se relacionar sexualmente com o educando (o que, de qualquer forma, não releva para efeitos de elemento constitutivo do ilícito) . Mas aqui convocamos o que o arguido A disse ao Tribunal, numa altura em que falou dos factos que se tinham passado com um outro assistente (AA) e na sequência de pergunta que lhe foi feita, se após terem ocorrido os actos que tinha descrito tinha dito aos assistentes que se eles contassem que “lhes batia”, o arguido respondeu ao Tribunal que não dizia isso. Acrescentando (cfr. aj de 19/01/05) , que tinha confiança nos rapazes, eles eram seus amigos e “... viam-me como um amigo...portanto eles não contavam a ninguém...”, confirmando que ia vendo “isso”, que os rapazes não contavam e repetia os comportamentos. Admitindo que para si era importante não contarem. Mas também disse – na sequência de pergunta que especificamente lhe foi feita -que não aconteceu ter deixado de abordar algum rapaz com medo que ele contasse alguma coisa, por não lhe inspirar confiança, pois “... Sra. Dra...como disse ...como disse era normal, portanto de os homens não contarem...portanto eu depois não fazia mais nada...portanto... mais aos alunos ...”. E quando lhe foi perguntado se havia algum código de honra na AX, respondeu “... antigamente pelo menos ... como a BP dizia, os gansos não se chibam, desculpe a expressão ... mas era assim que se falava, mas portanto eles como não eram … portanto eles são gansos... mas como não sabiam destas palavras, a BP veio para televisão em público dizer que os gansos não se chibavam, portanto uns aos outros, nem se chibavam portanto às pessoas de fora, qualquer coisa que houvesse ... era por isso que aquilo andava tudo como anda e continua a andar penso eu....”. Estas declarações do arguido foram particularmente relevantes para a prova dos factos relativos ao relacionamento que o arguido estabelecia com os jovens, intenção com que o fazia e a relação de dependência e proximidade que estabelecia com os educandos dentro da instituição. 13.1.9. (Actos (...) arguido K, ponto 5.2.1. do Despacho de pronuncia): O assistente AP começou a falar dos factos ocorridos (consigo) no (...) do arguido K na audiência de Julgamento de 20/06/05. Estava, como acima dissemos, numa altura em que o seu relato era “livre”, no sentido de que o Tribunal apenas lhe dissera, momentos antes, para continuar o relato, se tivesse mais alguma coisa para dizer. Dentro da dinâmica do relato ocorreu numa sequência em que já tinha falado ao tribunal dos factos com o arguido A; feito também uma referência a uns factos ocorridos com um segurança da AX ; falado de factos ocorridos em (…); falado de factos ocorridos com o arguido H, um encontro no (…), seguido de um passeio no jardim (…) e uma ida a um estúdio na (…) para conhecer o estúdio; um novo encontro (“meses” ou “dias” depois, não se recordava) com o arguido H, mas desta vez passando pela praia (…), onde o arguido H se encontrou com o arguido E (para este lhe entregar uma chave), seguida da ida do assistente com o arguido H para uma casa em (…). É, assim (e como acima vimos), na sequência deste último relato que diz “…entretanto, já nas instalações da AX, o Sr. A pediu-me para que eu fosse ao (...) do Sr. K, que fica junto dos (…)…”. (1) Pela dinâmica do seu discurso (nesta AJ de 20/06/06), numa primeira impressão os factos no (...) do arguido K (a que se refere o ponto 5.2.1, fls. 20.906 e segs., do Despacho de Pronúncia) ocorreram depois de “(…)”, “ida ao (…)”, ao “Jardim (…)”, “ida à (…) apenas para conhecer um estúdio “, “ida a (…) (passando primeiro pela Praia (…), para “encontro” entre o arguido H e E”). Até porque quando o Tribunal (AJ 20/06/05) começa a fazer perguntas ao Assistente para esclarecer a localização no tempo, de acordo com a sua memória, dos actos - concretamente quais os actos que se seguiram à “ primeira situação” em que esteve na garagem de CZ com o arguido A -, a sua primeira resposta é “(…)”. Mas conjugando com as declarações que presta a seguir (ainda no âmbito dos esclarecimentos que lhe estavam a ser pedidos pelo Tribunal), a sua descrição dos factos e as resposta que vai dando a esclarecimentos pontuais que lhe são colocados pelo Tribunal, levaram o Tribunal a concluir que, apesar da sua primeira resposta “ Garagem de CZ” e a seguir “(…)”, a sua memória não era isso que dizia. Assim, quando presta esclarecimentos quanto às pessoas que viu pela primeira vez em (…), as que nunca tinha visto antes e que foi ali que “ viu alguém que não conhecia”, respondeu “só” o arguido N e a arguida Q. Os demais – e com excepção do arguido A, por essa excepção ter sido desde logo introduzida pelo Tribunal no pedido de esclarecimento, dado as respostas que já tinha dado quanto aos factos ocorridos na Garagem de CZ -, esclareceu que o arguido H já o tinha visto no (…), dizendo que essa vez em que o arguido A o levou ao (…), para se encontrar com o arguido H, foi a primeira vez que viu este arguido. Mas posteriormente (cfr. AJ 24/06/05), perguntado pelo Tribunal quando estava a relatar estes factos - e pela necessidade que o Tribunal sentiu de ir percebendo a memória do Assistente; tendo considerado que a melhor forma seria, naturalmente, na fluência do seu discurso, ir confirmando aspectos respondidos antes mas que, para o tribunal, face à avaliação que nesse momento ia fazendo da globalidade das suas declarações, precisavam de ser esclarecidos; embora com a noção de uma avaliação ainda muito limitada, pois o assistente ainda não estava a ser sujeito ao contraditório dos Sujeitos processuais - , se este episódio que estava a relatar fora a primeira vez que viu o arguido H, respondeu que não, já o tinha visto antes, descrevendo uma situação em que o arguido A o mandara ir a uma local “atrás da instituição” onde estava um carro mercedes à sua espera, relatando de seguida um encontro com o arguido H (relatando de seguida uma ida à Praia (…)). Na audiência de julgamento de 24/06/05, quando é especificamente perguntado quanto aos factos passados na “primeira vez” que foi ao (...) do arguido K, perguntado se a primeira vez que o arguido A lhe pediu para ir ao (...) já tinha ido a (…), responde “ julgo que não”. A sua memória, quando perguntado de forma como se fosse “ irrelevante” a pergunta, sem lhe criar qualquer pressão especial por não ser essa a questão enfoque no momento – no momento a sua questão enfoque era relatar o abuso, como se depreende do seu discurso -, localizando (…) depois da ida ao (...). E na sequência deste relato de um primeiro abuso no (...) do arguido K (AJ 24/06/05), relata uma segunda vez no (...) do arguido. No entanto desta vez disse que não foi com intervenção do arguido A, pelo que não se estava a referir a facto objecto deste processo (disse que aconteceu quando vinha a passar junto ao (...), quando vinha do (...) e o arguido K chamou-o). E diz, ainda nesta mesma audiência (AJ 24/06/05), que voltou a encontrar o arguido K no (…), onde foi com AT. Para o Tribunal o seu discurso, quando prestava estes esclarecimentos que lhe iam sendo pedidos, não foi forçado, não foi perceptível um sentido de dar qualquer impressão de que estava a reproduzir alguma coisa criada, sozinho ou com outra pessoa, criação esta - como é argumentado pelas defesas, que foi sendo feita à medida que iam saindo as notícias da Comunicação social: e, no que diz respeito ao assistente AP, reproduzindo e transpondo para o arguido H, uma situação vivida no processo em que foi arguido DU -. Para o tribunal foi perceptível, apesar da sequência que, aparentemente, AP começou por dar, depois dos actos da Garagem de CZ e antes das idas a (…), passaram-se factos relacionados com o arguido H e com o arguido K, no ponto concreto que o Tribunal está a tratar agora (factos relacionados com o Ponto 5.2.1., do despacho de Pronúncia), no seu (...) (...) (acresce, de alguma forma neste sentido, mas o que deve ser complementado com o que mais à frente diremos, na audiência de julgamento de 14/07/05, quando a defesa do arguido E pergunta entre os actos com o arguido A e os actos com o arguido H, “se teve qualquer encontro”, com “ qualquer outra pessoa deste processo”, respondeu com o arguido K). (2) Passando a um segundo momento, localizar no tempo e consequentemente na vida do assistente AP, os factos passados no “ (...)” do arguido K, analisemos as suas declarações. Na audiência de julgamento de 24/06/05 relata factos ocorridos com o arguido H, numa casa em (…) e diz, após terem saído dessa casa “ …tomámos o rumo ao (...)…aaa…nesse…chegámos ao (...) e … Sra. Dra., não, não me recordo bem mas sei que … talvez semanas ou fins de semanas depois, o Sr. A pediu-me para que eu fosse ao (...) do Sr. K. E eu fui (…)”. Esclareceu que não era o mesmo (...) onde “ é agora”, era um pouco “ mais acima” e diz “…eu dirigi-me a esse (...), toquei à campainha …uma empregada do Sr. K abriu a porta, eu subi umas escadas e podia ter entrado logo na porta em frente, pois ia dar ao (...) do Sr. K, fui na …entrei por outra porta que essa empregada do Sr. K abriu, a senhora questionou-me o que é que eu ia lá fazer e eu disse que vinha falar com o Sr. K, onde ela me mandou esperar, indo de seguida falar com o Sr. K….onde minutos depois … ou segundos, essa senhora apareceu e disse que o Sr. K podia-me receber…” e relata o que sucedeu após ter entrado no (...). Quando fez a descrição do local, AP disse que após ter subido as escadas “… podia ter entrado logo na porta em frente, pois ia dar ao (...) do Sr. K, fui na …entrei por outra porta que essa empregada do Sr. K abriu…”. AP foi o primeiro assistente a ser ouvido e quando prestou declarações perante o Tribunal, ainda não tinha sido produzida prova por declarações ou testemunhal, quanto ao interior do (...) (antigo, neste caso) do arguido K. E esta particularidade que o assistente referiu ao Tribunal, que podia ter entrado “logo na porta da frente” pois ia dar ao (...) do arguido, mas entrou “por outra porta” que a empregada do arguido abriu, ainda não tinha sido referida no julgamento e, pelo menos para o Tribunal, não era apreensível dos documentos existentes nos autos em relação a tal espaço. E confrontando esta descrição que AP fez do local, com o que foi dito, por exemplo, com as testemunhas apresentadas pelo arguido K EEP, YG e DDP, o Tribunal ficou com a convicção que o assistente esteve no local que descreveu. Neste sentido e apenas referindo aspectos pontuais, a testemunha EEP, disse ao Tribunal residir no nº (…) da (...) (…), no (…)º (…)., e o (...) do arguido K ser no (…)ª (…), tendo explicado como era o acesso às duas habitações/fracções. Explicou que o acesso às duas fracções era pela porta do prédio, subia-se uma escada e havia um corredor para o lado direito, onde era o (...) do arguido K, mas o (...) tinha uma outra porta “ logo em frente”. As janelas da fracção da habitação da testemunha dão para a “frente”, (...) (…) e as do (...) para a (...) de trás. Esta testemunha refere, expressamente, a existência destas duas portas de acesso ao espaço/(...) do arguido K e fez a descrição de forma similar à que foi feita por AP. Também a testemunha CCH, a qual declarou ao Tribunal ter trabalhado no (...) do arguido K desde Fevereiro de 2001 (foi testemunha apresentada pelo arguido), tendo em Setembro desse ano passado para a (...) nova, confirmou a existência de duas portas para entrar no (...), sendo que uma delas dava directamente para o gabinete do arguido e enquanto a testemunha lá esteve a trabalhar (no (...) antigo, mas dizendo que no novo também havia uma porta de entrada no (...), que dava directamente para o gabinete do arguido), o arguido tanto podia entrar por uma porta como por outra. E disse isto, na avaliação que o Tribunal fez do seu depoimento, não como uma mera “possibilidade” mas como uma coisa que sucedia. E a testemunha OK, sobrinha do arguido K e que disse ao Tribunal ter começado a colaborara com o tio em 1996, ainda no (...) antigo ((...) (…) nº nº (…)), confirmou a existência de duas portas para entrar no (...), sendo possível do gabinete do tio ter acesso directo para as escadas, pois o gabinete tinha uma porta que dava acesso directo para essas escadas e confirmando que era possível sair por essa porta sem ser visto (mas acrescentado que a porta não utilizada, afirmação que, contudo, foi expressamente contrariada pela testemunha CCH, como vimos). A testemunha YG, disse ao Tribunal residir “há 50 anos” no andar ao lado do “antigo” (...) do arguido K, concretamente vive no (…)º (…) da (...) (…), nº (…) e disse ser doente do arguido, bem como o seu marido e a sua filha, quer no antigo quer no novo (...). Explicou que o (...) do (…)º (…)º, de que era vizinha, tinha duas portas de acesso, o que permitia entrar “por dentro de casa” ou “pelas escadas”. Falou sobre uma “placa exterior” que identificava o (...) e explicou onde era o segundo (...), na mesma (...), onde foram demolidas umas habitações térreas. O depoimento da testemunha DDP, embora tenha dito ao Tribunal que só foi recepcionista no (...) do arguido K de 1999 a princípios de 2001, não resultou da prova produzida em audiência de julgamento e o (...) “antigo” tenha sofrido obras, de forma a que pudesse ter sofrido alterações em relação à altura em que a testemunha lá esteve. Fez a descrição do acesso ao (...) (o do nº (…), o antigo): porta de entrada, subiam escadas, corredor estreito, do lado do corredor gabinete do arguido K, a seguir sala de espera, a seguir “cantinho” com máquina de café e telefone, wc e sala de observação. Falou da existência de uma sala de observação (referindo a existência de marquesas), uma sala de tratamentos e uma outra “salinha” ao lado da sala de tratamentos, descreveu o mobiliário existente. Foi confrontada com a fotografia de fls. 2.287 dos autos, tendo dito que a do (...) era a “de cima”. É claro - e isto sempre na perspectiva das Defesas, da criação deste enredo de histórias de abuso entrecruzadas, por parte dos assistentes, criadas à medida que iam saindo os factos na comunicação social e a que uns iam sucessivamente aderindo -, que podemos sempre equacionar que AP, por alguma circunstância ou em alguma circunstância diferente esteve naquele (...) e no relato ao Tribunal introduziu este pormenor para dar credibilidade. Mas e configurando a possibilidade da “criação da história” - como é defendido pelos arguidos -, quando os factos deste processo foram do conhecimento público, o arguido K já não estava no (...) “antigo” há mais de um ano, pois a prova produzida em audiência de julgamento foi no sentido, seguro para o Tribunal, que em Setembro de 2001 o arguido mudou-se do “(...) antigo”, no nº (…), da (...) (…), para o “(...) novo”, que é situado na mesma (...), mas no nº (…) a (…) (cfr., por exemplo, declarações do arguido, testemunhas CCH, OK; cfr. fls. 43.521 a 43.791 – (…) – Processo de Obras da (...) (…),(…) e (…)). Assim, já não estava em actividade como tal. E do depoimento da irmã do arguido, ZV, resultou que após terem feito a mudança continuaram a dispor do espaço antigo, a própria testemunha em Janeiro de 2007 colocou lá coisas. No entanto não soube dizer ao Tribunal qual foi a utilização do espaço entre a mudança e ter lá colocado as suas coisas, mas confirmou que continuaram com a chave e a pagar a renda. Pelo que para o Tribunal não resultou plausível, nem teve qualquer indício que lhe pudesse criar tal ideia, que o assistente AP após Novembro de 2002 foi ao local que descreveu e por essa via retirou e reteve, o pormenor de haver duas possibilidades de acesso ao (...) e ao gabinete do arguido, da forma que descreveu. Por outro lado, a explicação dada pelo assistente AP para o conhecimento da localização do (...) fez sentido e foi coerente com alguém que estava a contar alguma coisa efectivamente acontecida daquela forma: conhecia o (...) porque tinha estado a estudar no (...) DT, dos sete até aos nove anos se não estava “em erro” - embora resulte dos documentos do Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6, documentos estes constantes do processo psicossocial de AP na AX e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX, que foi entre o ano lectivo de 92/93, em que tinha 8 anos e o ano lectivo 96/97, em que (no fim do ano lectivo) tinha 12 anos, que frequentou o (...) DT - e fazia, conjuntamente com colegas, o trajecto do (...) para CZ, onde era o seu lar, passando pela (...) onde fica o (...) do arguido K (cfr., também, as declarações do arguido K quanto à localização do (...); cfr., quanto ao (...) do nº (…), da (...) (…), documentos de fls. 2.284, fotografia da porta da (...) (…) nº (…); fls. 2.285, fotog. da porta da (...) (…), nº (…), onde se vê por cima retirada uma placa; Fls. 2.286, fotog da caixa do correio do (…)º (…) da (...) (…) nº (…), onde diz “ é favor entregar no nº (…)”; fls. 2.287, fotog da porta da (...) (…), nº (…); Fls. 2.307, Croqui da (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, que tem a ver com busca de fls. 2.305). (2.1.) É nesta altura (na AJ 24/06/05) que o assistente começa por fazer a descrição de um facto, ligado a um episódio que descreve num segundo momento, que para o Tribunal concorreu para a credibilização do relato do assistente não só quanto a estes factos, bem como quanto a outros factos que referiremos, pelo que fazemos um parêntesis para relatar tal descrição. AP declarava o “motivo” e “como” conhecia o local do (...) do arguido K, o caminho para o (...) e dizendo que, na altura “… eu estudei, como já disse à Srª Drª Juíza, dos sete anos até nove …se não estou em erro, no (...) DT…e muitas das vezes vinha acompanhado por mais elementos do meu, do meu lar e do CZ … e fazíamos o trajecto passando pelo (…). Tem a esquadra, subíamos, íamos por essa (...), sempre em frente, onde passávamos pelo (...) do Sr. K que, na altura, tinha uma viatura, um (…) vermelho, descapotável….”. Acrescentando (quando o Tribunal lhe perguntou “…E então o Sr. A disse-lhe para ir a esse (...)?) “… a partir daí, o Sr. A disse que era para eu ir ao (...) do Sr. K … onde eu já sabia o nome do mesmo, visto que na altura em que ele tinha lá o (…) e que se estava aberto, um colega meu foi mexer no carro e o alarme disparou….onde o Sr. K apareceu e questionou esse meu amigo … ou irmão do lar, se este não queria dar uma volta com ele no (…)….onde ele disse que não, que ia bem a pé….onde fomos para o (...) e nesse, nesses “fim de semanas” já seguintes, que eu referi agora ao Tribunal, foi quando o Sr. A me pediu para ir ao (...) do Sr. K….”. (notamos, quanto a este episódio relatado pelo AP, que foi elemento credibilizante para o Tribunal também pelo seguinte: esta reacção do arguido K, não ralhar ou enxotar o colega do AP por estar a mexer no carro que, certamente, era apelativo para um jovem, parece consentânea e enquadra-se no que ao tribunal foi revelado pelas testemunhas e que o arguido apresentou quanto à sua personalidade e vivência, de ser uma pessoa compreensiva com os outros e com facilidade de contacto). Estas declarações foram prestadas antes de o arguido K, por sua vez, também ter prestado declarações. E quando as prestou (cfr. AJ 24/06/08), confirmou ao Tribunal ter tido um (…), que diz ter vendido cerca de dois meses depois de ter tido o (…). O (…), pelos elementos que entretanto juntou aos autos e pela prova testemunha que foi produzida quer pela testemunha MH, quer pela Testemunha CY (cfr., tb. os documentos de fls. 47.878, Declaração da GGA a indicar a data da compra e reparação da viatura (…); fls. 52.738 a 52.768, Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a veículo (…), matrícula (…)), só a partir de Julho de 1999 esteve na posse do arguido K. Assim, o (…) terá sido vendido entre Julho/Outubro 99. (i) Este pormenor, da narração do episódio com o (…) por parte do AP, teve relevância para o Tribunal para uma outra situação, concretamente para a avaliação das declarações de AP quanto à ida “à casa do (…)” com o AT e que assinalamos desde já. Quando AP fez esse relato, da ida à casa do (…), disse ter visto o (…) do arguido na casa do (…). Tendo o arguido K recebido o (…) apenas em Julho de 1999, este pormenor tem que levar, numa primeira análise, à colocação dos factos na casa do (…) em 1999, depois do AT ter entrado para a AX. E dizemos “numa primeira análise” porque o tribunal, face à forma como AP demonstrou conseguir captar e conservar os factos, não ficou convencido que AP “viu” mesmo o carro na casa do (…), mas era uma altura em que já associava o carro ao arguido, pois com AP não vemos que haja qualquer hipótese de ter confundido um (…) com o (…). Isto porque foi espontâneo a contar ao episódio do (…), na AJ de 30/06/05 fala dos (…), dizendo os carros que conheceu como pertencentes ao arguido K. E relata, também, um episódio em que o educador EM convidou CY, ex-aluno da AX - numa altura em que, como resulta das declarações prestadas pela testemunha CY e pelo arguido K, CY estava a viver em casa do arguido -, para ir à festa de Natal dos lares. AP contou que o CY foi e levou o (…) do arguido K, tendo o educador dado instruções aos alunos do lar para “marcarem um lugar” para o (…), com a colocação de pinos. E neste relato diz que, antes do (…), lembrava-se de ver , como pertencente ao arguido K, um (…) vermelho, “…vindo a ter depois um (…) ou (…) (…) só vindo a ter mais tarde o (…)…” e lembrando-se de ver também guiados por CY uma “ MOTO 4” e uma “DT”. Aqui há um aspecto relevante para este padrão de AP, a sequência como conta lembrar-se dos carros que o arguido teve e que é, na perspectiva do Tribunal, compatível com a prova documental dos autos: o doc. de fls. 53.737, é referente à reparação de um (…), factura de 23/12/97, logo antes do (…); e o (…), que AP podia fazer alguma confusão quanto à sequência com que se recordava dos carros, não faz, pois a fls. 52.770 temos o contrato de compra e venda a prestações do veículo, datado de 5/7/02, documento que foi junto pelo arguido, não foi impugnado nem (...) em causa quanto à sua fidedignidade pelos sujeitos processuais, tendo merecido credibilidade ao Tribunal, inexistindo indício que leve em sentido contrário. Também, ainda, quanto à coerência intrínseca de aspectos do relato de AP – e ainda relacionado com aquele episódio que relatou, da ida do (…) ao Lar -, a anotação que se encontra no Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, Apenso W11, Livro 2, Fls. 67, anotação de 3/12/99, Sexta feira: “... como apaixonado dos automóveis hoje realizei um sonho... guiei um (…), esteve cá o CY....” anotação esta assinada (EM). Aqui emerge, mais uma vez, o padrão que para o Tribunal foi coerente ao longo do depoimento de AP. Consegue associar de forma certa (para o Tribunal) o facto: quando vai à Casa do (…) com AT, já havia (…). Mas, quando lhe é pedido, não consegue associar o facto à data certa e erra quanto à data que diz ao Tribunal: como vimos, não “havia” na altura em que localiza o facto no tempo (quando lhe são pedidas datas). Assim, a ida à casa do (…) com o AT não foi na sequência que acima começou por dizer, mas foi quando AT estava na AX (sendo que AT entrou para a AX, para o Lar FC, onde estava AP , em 28/10/99, cfr. Apenso W11, Livro 2 , fls. 34; e, repetimos, AP não faz confusão entre (…) e (…)). (3) Prosseguindo com a localização no tempo dos factos no (...), ao esclarecer os factos (AJ 24/06/05), AP relata duas idas. A primeira, pelo seu discurso resulta ter sido “pouco tempo”depois ao episódio do (…) (mas já vimos o que é a noção de tempo para AP). E uma segunda, quando vinha do (...) e estava a passar pela frente do (...). Temos visto, objectivamente, que AP não tem qualquer noção “ do tempo”. Mas já quanto à sua noção de sequência de factos apresenta coerência. Assim, relaciona as idas ao (...) - em que descreveu factos que se passaram consigo - com o percurso para DT e quando fazia esse percurso (como vimos, AP esteve em DT até ao ano lectivo 1996/1997, pois no ano lectivo 1997/1998 foi para o CZ). Isto é, não descreve estes factos com pormenores que possam sugerir a ideia que ocorreram quando já não estava em (…), pois a descrição global deixa emergir uma linha de contemporaneidade entre a ida (ou as idas, pois descreve mais do que uma situação consigo) ao (...) do arguido e as deslocações para a escola. Dando a ideia de que já conhecia o local do (...), por causa das deslocações para o (...) (…) (mas dando também a ideia que as idas ao (...) foram depois de andar no (...) (…)). E aqui voltamos ao episódio do (…). A explicação que deu na audiência de julgamento de 24/06/05, quanto à razão porque sabia onde era o (...) antigo do arguido K e o relato do episódio com o (…), para ser invenção do assistente - ou para resultar a introdução deste episódio no seu discurso , como uma “manobra” pensada por AP para dar consistência à história -, exigia, na avaliação do Tribunal, muita elaboração e capacidade intelectual para fixar e sustentar, que o Tribunal não consegue ver no assistente. E não reconhecemos tal capacidade não só face ao que foram sendo as avaliações da pessoa de AP enquanto esteve na AX e que atrás referimos, mas também quanto ao que consta das conclusões (antecedidas pela avaliação psicológica, análise de resultados e impressão diagnostica) da Perícia colegial constante do Apenso Z-11 - e os esclarecimentos que quanto a tal perícia foram dados ao Tribunal pelo(s) Sr(s). Peritos Dra. CV , Dr. CT -, mas também quanto ao que foi a forma como o assistente se explicou em audiência de julgamento, nunca se furtando a responder, mesmo em alturas que era visível, mesmo para ele, que tinha baralhado datas ou pessoas, num contraditório que, para o Tribunal, foi objectivamente exigente para o assistente AP. E quando (cfr. AJ 22/07/05) a defesa do arguido K lhe pergunta se quando foi a primeira vez ao (...) já tinha ocorrido o episódio com o colega e com o (…) responde “…Sraª Dra. Juíza, não recordo…sei que…e na minha recordação, tenho apenas que ainda estudava no (...) DT….” E identifica o colega do Lar com quem se passara a história do (…), IIZ (o educando IIZ foi do Lar FC 1997/98, 1998, 1999, 2000 e passa em 10.09.01 para o Lar FG, cfr. fls. 32 a 35, Apenso Z-10). É certo que também fez uma descrição do interior do (...) do arguido K (cfr. AJ 22/07/05), respondendo a um pedido de precisão que lhe era feito, que para o Tribunal - face ao tempo decorrido, ao que naturalmente é a memória dos espaços; e estamos a falar de um jovem, em que os factos foram percepcionados em determinada fase do seu crescimento e são relatados noutra - afigurou-se-nos difícil que pudesse corresponder a uma reprodução fiel do que lá existia. Mas isso não retira, no caso concreto, credibilidade e veracidade ao resto do que disse. Assim e face a tudo o que antecede, os factos que o Tribunal deu como provados quanto à localização, no tempo, dos actos passados no (...) do arguido K com AP. (4) Quanto aos actos em si, AP relatou-os de forma que para o Tribunal foi credível: fazia sentido no todo que narrava do acto do abuso, deu pormenores sobre a dinâmica do abuso que não parecerem colados, pois quando volta a ser perguntado, quer na instância feita pelo Ministério Público, quer na instância feita pelas Defesas dos arguidos A e K, manteve a coerência intrínseca do relato que tinha feito. Disse ao Tribunal que mexeu com a mão no pénis do arguido e que este introduziu-lhe o pénis na sua boca. Não relatou, contudo, actos de coito anal, sendo que foi perguntado mais do que uma vez quanto a tal questão. É certo que pode dizer-se que AP foi abusado e o que estava a contar ali era uma experiência de um outro abuso qualquer, que transportou para ali. Mas a percepção, o que o Tribunal apreendeu daquele assistente, ao longo do seu relato, da forma como respondia, reagia e explicava não deixaram o colectivo com essa percepção ou dúvida. Diz que recebeu dinheiro directamente do arguido K, não sendo no entanto preciso quanto ao montante efectivamente recebido. Quanto ao arguido A, disse, ao longo das suas declarações, que este deu-lhe sempre dinheiro após ter ido aos locais e actos que relatou ao Tribunal. E disse, no caso concreto da ida ao (...), não só que foi o arguido que o mandou ir, como lhe perguntou, quando regressou ao (...), se tinha ido, o que o assistente confirmou. Numa primeira fase, em audiência de julgamento o arguido A começou por dizer que não tinha mandado o AP ao (...) do arguido K. No entanto, num segundo momento, já o assistente AP tinha prestado declarações, também lhe pediu desculpa quanto aos actos que tinha praticado com ele e locais onde o tinha levado. (i) Aliás, cabe aqui fazer uma referência ao que foram as declarações do arguido A quanto ao arguido K e quanto ao, no caso concreto, ter mandado ou ter levado educando ao (...) do arguido K ou a outros locais. O que vamos dizer nesta altura é completado ao longo da presente análise crítica de prova, com referências que fazemos de idêntica natureza, a propósito de outros assistentes ou de outras situações. isto quer dizer que, em alguma parte, são referências repetidas, mas que o Tribunal vai tentando completar ou individualizar com as especificas circunstâncias de cada caso (se as houver, com relevo para ilustrarem alguma diferença, pois caso contrário será, necessariamente, repetição do já dito por causa de outro assistente ou circunstância). Quando prestou inicialmente declarações, o arguido A disse que sabia que o (...) do arguido K era em (…), mas não sabia o local certo. Nunca lá tinha ido e nunca lá tinha entrado. Ficou a saber onde era o (...) pelos Inspectores da P.J. Só conhecia o arguido K de o cumprimentar, quando o arguido K ia ver o afilhado jogar (futebol) onde o arguido também jogava algumas vezes. Mas acrescentou que toda a gente o conhecia na zona de (…), por causa do (…) (cfr. que o (…), como o Tribunal concluiu, na posse do arguido K em Julho de 1999, doc. de fls. 52.738 a 52.768). Num segundo momento confirma que não sabia onde era o (...) do arguido K. Volta a dizer que foi o AP que transmitiu aos Inspectores da Judiciária onde era o (...), nunca levou os educando nem ao (...), nem a casa do arguido, mas admite que uma vez deu uma boleia (referindo-se aos educandos) “a eles”, para perto da casa do arguido K. Disse que em (…) ficou “ de boca aberta”, tendo o Tribunal depreendido que se estava a referir aos carros ou pessoas que o educandos lhe tinha referido estar “lá”. Num terceiro momento, em que o Tribunal lhe perguntou se em relação ao arguido K, se se lembrava de alguma situação em tivesse estado ou visto este arguido e relacionado com alunos da AX, o arguido - depois de relatar uma conversa que diz ter sido tida pela “Dra. ZH”, mas que na audição da testemunha ZH não foi feita instância quanto a tal conversa em concreto, pelo que nesta parte não relevou para o Tribunal -, começa por dizer “…eu levei lá…”, mas corrige imediatamente “…nunca levei lá nenhum, portanto, dei boleia a dois rapazes, ao AP e ao AT, perto da casa dele, que eles…portanto não me diziam onde é que era a casa, ali para ao pé (…) depois do estádio (…), deixei-os ali encostados, portanto na paragem do autocarro, eles foram a apé depois para a casa do sr. K…nunca fui a casa do sr. K, nem nunca entrei no (...) do sr. K…”. Acrescenta que o arguido nunca o contactou, mas sabe que iam lá rapazes, lá ao (...) (...) e até jogadores. O arguido foi, sucessivamente, como vemos, rejeitando qualquer conhecimento ou qualquer contacto com o arguido K. No entanto, quando presta posteriormente declarações quanto ao assistente AI (cfr. A.J. de 15/12/05), já disse ao Tribunal que deu boleia ao AI para a (…) e que ia ter com o Sr. K (convocamos o que o Tribunal diz, em sede de análise crítica da prova, quanto analisou estes factos na (…) com o assistente AI, em relação às conclusões que retirou das declarações do arguido, quanto ao efectivo conhecimento do arguido K). Na audiência de julgamento de 17/01/07, admite ao Tribunal ter ido à (...) do arguido K - mas localiza em 99/00 - e disse que deixou rapazes na esquina da (...) do (...). As declarações do arguido A, na sua globalidade, não foram declarações fáceis analisar. O Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. O que, reconhecemos, não foi imediato, pois - aliás, tal como sucede com a generalidade das situações - por vezes só à distância é que se conseguiu ver o que a confusão do momento escondia. Isto é, em algumas situações, quando vistas logo no momento as suas declarações tornavam-se incompreensivelmente inconsistentes entre si, mas quando vistas e analisadas na globalidade, foi perceptível o porquê e o sentido daquelas declarações. A forma como o arguido declarou os factos ao Tribunal - e cruzando com a análise concreta dos pontos que estávamos a assinalar, relacionados com os factos do assistente AP -, o que foi perceptível ao longo do seu depoimento, de negar ter sido da sua iniciativa levar educando a locais, mas dizer que apenas lhes deu boleias porque lhe pediram ou porque, por acaso, os encontrou, mas de, em momentos posteriores, pedir desculpa aos educando, pelos locais onde os levou, teve o sentido (mais plausível e coerente com o que foi, para nós, a atitude global do arguido face à admissão dos factos que foi fazendo), o de envolver-se o menos possível como pessoa responsável pelo que aconteceu (…). Para o Tribunal e do que percebeu da sua atitude em audiência de julgamento, o arguido A sentiu responsabilidade no que fez aos jovens da AX, (…) como ele. E teve reacções que traduziram aligeirar da sua culpa, mas sem “deixar” cair “os rapazes” como se lhes referiu por vezes. E este aligeirar de culpa traduziu-se, por vezes, em meias verdades (afirmação que ao longo desta análise crítica o Tribunal vai ilustrando e preenchendo, com referências concretas e situações concretas). Isto é, a percepção que tivemos é que o arguido não deixou de contar com verdade uma parte do facto, mas introduz elementos que não se verificaram, para justificar - pelo menos para si - os que se verificaram. Por exemplo, na situação que estamos a analisar, começa por negar conhecer o (...) e ter levado ou ter mandado lá ir AP. Em momento posterior admite conhecer o (...) e ter deixado miúdos na “esquina” para irem ao (...) e admite ter levado o AP e o AT a um local, a “casa do arguido” K no (…), mas dizendo que os deixou apenas ao pé de um local para irem a essa casa. Que apenas lhes deu boleia porque estes lhe pediram, afastando assim a responsabilidade da sua iniciativa nessas idas. Mas este (...) - face à prova que foi produzida em audiência de julgamento, entre a qual as declarações do próprio arguido K e o depoimento da testemunha LE -, é numa transversal da (...) onde se situa a Pastelaria (…), vindo da AX e entrando na (...) (…), o acesso é ligo na primeira transversal (se for de carro), (...) que não tem saída contornando para a (...) do (...) (e que vem dar, de novo, à (...) (…)). A testemunha LE disse ao Tribunal ter sido proprietário de um restaurante e pastelaria “(…)”, o (...) do arguido fazia “traseiras” com o seu restaurante. Disse que para ir para o (...) do arguido K, era subir pela (...) do seu Restaurante “(…)”, subir e contornar (porque a (...) só tinha um sentido) e a saída era pela (...) do (...) do arguido K (que vinha dar de novo à (...) (…), como dissemos). Disse, também, esta testemunha que conhecia quer o arguido A, quer o arguido K, pois este frequentaram um restaurante ((…), que no entanto não era no mesmo sítio da “(…)”) que teve também naquela zona, e onde agora é um Banco. Mas nunca os viu juntos. Disse que o arguido A ia sempre acompanhado com miúdos, normalmente ia de manhã e o arguido K ia ao lanche. Pelo que, para o Tribunal e também pelo que foi este depoimento, que nos mereceu credibilidade, aquela zona não era estranha ao arguido A, como as suas declarações iniciais poderiam fazer supor. Mas o próprio arguido em momento posterior, como referimos, veio dizer que afinal já tinha ido ao (...) e sabia onde era, que tinha deixado miúdos na esquina para irem ao (...). E embora não tenha dito que levou ou mandou lá ir especificamente AP, a conjugação das declarações do assistente AP, com estas últimas declarações do arguido, foram suficientes para o Tribunal dar como provado que o AP foi a esse (...) a “mando” do arguido A. (5) Quanto aos factos que o tribunal deu como provados quanto ao recebimento de dinheiro por parte do arguido A, o AP disse que recebeu dinheiro do arguido K, mas também disse que recebia dinheiro do arguido A, depois de ter ido a locais que este lhe indicou para ir. O Tribunal deu como assente que foi o arguido A que mandou o assistente AP ir ao (...) do arguido K, para a prática, por parte deste, de actos de natureza sexual no assistente. Assim, tendo o assistente recebido dinheiro do arguido K e sendo também dinheiro o que o arguido A dava ao assistente após este ir aos locais onde o arguido o mandava (caso concreto (...)), tendo os actos sido praticados pelo arguido K, não havendo interferência ou associação de qualquer outra pessoa aquela acção - e embora não haja qualquer admissão por parte do arguido A deste recebimento, nem registos de depósitos na conta bancária do arguido A e o educando não viu o arguido receber o dinheiro -, é da experiência comum e da natureza das coisas, que o arguido K deu alguma recompensa ao arguido A, coisa essa que, no caso concreto, o Tribunal conclui ser dinheiro, porque foi a mesma espécie, dinheiro, o que o assistente disse ao Tribunal receber do arguido A, após ter ido onde este o mandava.. Acresce que as declarações que na audiência o arguido prestou, quanto aos envelopes que disse ter recebido em (…) e num prédio sito na (...) (…), dizendo que o dinheiro quando lhe foi entregue foi para dar aos “rapazes” (cfr. a.j. de 10/01/2005), negando saber quanto dinheiro estava dentro dos envelopes, dizendo “…não sabia, eu nunca fiquei com nenhum tostão (…), o AV é que distribuía o dinheiro por eles (…), nunca, nunca, nunca fiquei com nenhum tostão … por isso mesmo, estava a viver numa barraca e não tinha dinheiro para uma (...), nem para um apartamento….”, “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto … (…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”, foram para o Tribunal um reconhecimento de que recebia dinheiros nessas situações. E recebeu na que está em causa. 13.1.10. (Actos na (...) da AX com o arguido C, ponto 4.1.1. do Despacho de pronuncia): Para localizar no tempo a ocorrência destes factos, foi relevante a análise do modo como o assistente AP falou destes factos em audiência de julgamento, encadeados com os demais. dai a repetição que o Tribunal, em alguma medida, vai ter que fazer de algumas passagens já ditas. Na audiência de julgamento de 24/06/05, AP falou de factos passados no (...) do arguido K e de vários factos passados numa (...) que disse ser do arguido K. Na dinâmica deste relato e após ter-se referido aos mesmos, o Tribunal pediu-lhe para localizar se um episódio que relatou - em que disse ter ido “ a casa “ do arguido K levar o assistente AT e ter voltado para trás -, se passou antes ou depois dos factos de (…), a que o assistentes respondeu “ …foram antes…”. Perguntado se tudo o que tinha relatado foi “ antes de (…)”, o assistente respondeu “…sim, sim, foram antes…” e começa, de seguida, a relatar uns factos relativos ao arguido C, passados consigo nas caves da (...) da AX e que não tinha relatado no dia 20/06/05, dia em que começou a prestar declarações. E começa este relato, notamos, na sequência do esclarecimento que acabara de dar quanto ao tempo em que ocorreram os factos “ do (...)” e da “ casa” do arguido K e com tal arguido. Na sua narração diz - na audiência de julgamento de 24/06/05, quanto à localização no tempo dos factos na “(...)” -, que após ter levado AT “ a casa” do arguido K “…entretanto voltei para o (...)…fiz a minha vida normal, onde mais, um pouco mais tarde, o Sr. A me fez outra…fez-me outra vez uma abordagem, onde como eu sempre…eu em pequenino ia para a (...), pois o Sr. (...) BQ, uma pessoa de quem eu tenho muita admiração, nunca me tratou mal, sempre com o devido respeito, como eu tratava com o devido respeito…e então andava sempre ali pela (...). Entretanto, quando eu fui abordado pelo Sr. A, foi o Sr. A abordou-me chegando-se ao pé de mim e disse “Olha, vai à (...) e vai ao gabinete do Sr. C”… “tá bom, Sr. A”… dirigi-me a esse gabinete que quem entra na (...), do seu lado direito tem um balcãozito da telefonista e tem uma secretaria….o gabinete ficava deste lado (…)fui, bati à porta, cumprimentei o Sr. C dizendo um boa-tarde e dizendo que o Sr. A me tinha pedido para lá ir… ele “ah, sim, tá bem”. Pegou pela minha mão, descemos as escadas da (...) que vão dar o acesso à cave, onde descendo essas escadas entrámos numa porta em frente e onde o…o Sr. C abusou de mim (…), … chegámos lá a essa cave … o Sr. C tirou o seu pénis para fora, forçando a minha cabeça para baixo, obrigando-lhe a fazer sexo oral e mast … e acariciando-lhe o pénis até este ejacular.”. O assistente ainda não tinha relatado tais factos, pelo que o Tribunal perguntou-lhe porque é que não tinha dito nada sobre tais factos na sessão anterior (que fora a primeira) , respondendo “…Srª Drª, e vou... falar agora o porquê de nunca ter contado a este Tribunal…porque o Sr. A, como o Sr. C, davam-se muito bem e eu sempre “manti” este …o silêncio, com medo, porque o Sr. A muitas das vezes batia-me e ameaça … e fazia-me ameaças nesse sentido em que me batia se eu dissesse alguma coisa a alguém. Entretanto, foi por isso que eu nunca “relevei” estes factos..”. Falou do que , para ele, eram os arguidos que estavam em causa “… estamos a falar de pessoas muito grandes, com várias posses…e eu sinto receio…”. Explicou ao Tribunal, porque lhe foi perguntado, se alguma vez tinha dito que aqueles factos, que agora estava a relatar, não se tinham passado, que eram mentira. Disse que sim, que o tinha feito e explicou a razão. Disse que após ” … um encontro inesperado na (...) da AX, por uma senhora chamada NY, salvo erro é companheira, ou esposa do Dr. C….pela qual me deu uma palmada nas costas e disse que… pa eu desmentir tudo o que tinha acont … o que eu tinha dito…” em relação ao arguido C e que o arguido nada tinha a ver com o processo. AP relatou que respondeu “…mas ele tem, ele é culpado…desculpe a expressão, se posso usar uma asneira, e peço imensa desculpa ao Tribunal e aos advogados, a senhora disse “é culpado uma merda! E quando lá fores, vais negar tudo.”..”, explicando assim a razão pela qual veio efectivamente a dizer que os factos com o arguido C não se tinham passado. Pela defesa do arguido C foi ainda perguntado ao assistente, porque é que só naquela altura relatava tal “pressão”, tendo declarado “ … Srª Drª, nunca tinha relatado porque não queria adiantar…esperei que essa pergunta surgisse, para assim a responder…”. Foi-lhe ainda perguntado, face à reacção que disse ter tido na altura - e porque o relato de uma situação que diz ter deparado na (...) da AX entre o arguido C e o assistente AT, mas que o assistente AT em audiência de julgamento disse que não ter acontecido -, qual a razão para só ter desmentido factos passado com o arguido C em relação a si e ter mantido em relação a AT, tendo esclarecido “…Srª Drª, é assim… a senhora dirigiu-se a mim e falou só em mim…para eu dizer que não tive nada com o Dr. C… não me disse “olha, vais lá e dizes que nem tu, nem o AT tiveram”…em que eu respondi ao que a senhora me mandou… com medo, nunca se sabe o que é que essa senhora pudesse fazer..” (tendo acrescentado num segundo momento, em relação a perguntas que lhe foram feitas pelo Tribunal, quanto ao medo que tinha dito ter do “poder” do arguido C e porque é que apesar disso não tinha tido medo para relatar o episódio em relação ao AT “… Srª Drª, porque são coisas completamente diferentes…eu estou a falar de mim, e é por mim que eu tenho que zelar…também tenho que zelar pelos meus colegas, e zelo por eles, para que não lhes aconteça nada…mas... o que tá aqui em causa sou eu, não são, não é o meu colega AT….”). (i) Aqui introduzimos dois depoimentos. O da testemunha NY - a qual dise ao Tribunal ser casada com o arguido C e trabalhou também na (...) da AX - e da testemunha UL - a qual declarou ao Tribunal ser educadora na AX até à presente data, no DT desde 1 de Março de 1996 e em 2005 foi para CZ, embora esteja em licença sem vencimento desde 1/11/2005 - e que disse ao Tribunal ser irmã da ex-mulher do arguido C – GW – e o ex-marido da testemunha, UM, ser também educador na AX . A testemunha NY disse ao Tribunal que não conhecia AP até este processo. Soube quem era numa altura em que uma colega JJA, telefonista - e na sequência de ter passado uma entrevista na televisão de um aluno, com cara tapada -, disse-lhe que era AP. Diz que isto é o conhecimento que tem do assistente e nunca falou com AP. Embora a reacção que o AP descreveu ao Tribunal seja plausível, da parte de alguém que estivesse próximo do arguido C como a testemunha NY estava, o assistente AP podia ter estado a mentir e inventar o incidente que contou ao Tribunal. No entanto o depoimento da testemunha UL, embora nada tendo a ver com AP, foi relevante para avaliar da credibilidade e da veracidade deste incidente relatado pelo assistente. A testemunha UL apresentou um depoimento que para o Tribunal não foi uniforme quanto à sua objectividade e, consequência disso, quanto à sua isenção e desinteresse na causa. O facto de ser irmã da ex-mulher do arguido C, só por si, não relevou para o Tribunal para pôr em causa a sua isenção, objectividade e verdade do que disse ao Tribunal. Sucede, contudo, que relatou ao Tribunal um incidente que ocorreu em 5 ou 6 de Outubro de 2003, relacionado com a consulta do processo do assistente AK no CW – educando que não era seu educando e lar onde não trabalhava -, que com as explicações que deu quanto às circunstâncias em que fez essa consulta – indo ao lar e dizendo à Colega que estava de serviço, “tu não viste nada” – e justificações que deu e emendas que fez a essas justificações, para ter feita essa consulta, levaram o Tribunal a avaliar o seu depoimento com reserva e cautela. Assim, relatou ao Tribunal uma conversa que teve com o assistente AK, em que lhe perguntou o seu conhecimento sobre dois nomes de alunos e fez-lhe um pedido para o AK contactar o assistente AN, para saber o nome dos educadores do lar do AN. Admitiu que fez isto na sequência de pergunta que lhe tinha sido feita directamente pelo sobrinho GU (filho do arguido C), se ela testemunha sabia o nome dos educadores do internato do CZ, istoo numa altura em que o arguido ainda estava em prisão preventiva. Justificou-se que teve curiosidade de ver com que idade é que o AK tinha entrado lá para o (...). Contra interrogada disse que o sobrinho não lhe pediu para fazer essa consulta, depois que não lhe “pediu directamente”, “…foi uma dúvida que surgiu, como é que os alunos saiam e ele (o sobrinho) soube pelos jornais que surgiu o nome do AK, que era aluno do lar…”, o que a testemunha pretendia com a consulta era “…concretamente, queria saber a data em que ele tinha entrado para o (...)…”. A alternância que veio a fazer entre a justificação da sua “curiosidade”, com a natureza das dúvidas do sobrinho para que “indirectamente” a testemunha admitisse que o pedido da consulta lhe fora feita pelo sobrinho – e tenha-se também em atenção a dinâmica das suas resposta nas perguntas que lhe foram feitas pela própria defesa do arguido C: o Ilustre Mandatário do arguido pergunta à testemunha, num segundo momento, se tinha alguma ideia para que é que o sobrinho queria esta informação, respondendo a testemunha: “A informação?...(pausa)…isto foi uma curiosidade que surgiu, não foi…” e fica calada; vindo o Ilustre Mandatário em sua ajuda, pois diz-lhe, entre o que, face à entoação, ficou entre uma pergunta ou um “acabar” da frase da testemunha, “e não foi mais do que isso (?)”, a que a testemunha “adere”, respondendo e repetindo “ Não foi mais do que isso ” -, não fez qualquer sentido para o Tribunal. E não fez qualquer sentido porque para o Tribunal, atenta a natureza das coisas, “foi mais do que isso”. Isto é, a testemunha não foi fazer a consulta do processo individual de um educando que não era seu, num lar que não era o seu, dizendo à colega que estava de serviço “tu não viste nada”, sabendo que não estava a fazer “ agir bem ” como disse ao Tribunal – e sujeitando-se a um processo disciplinar como veio a acontecer, tendo a testemunha dito que resultou a sua suspensão por um ano -, para satisfazer a sua curiosidade quanto à data em que um assistente deu entrada num lar e para saber, como a testemunha também declarou, que idade teria o educando quando ocorreram os factos. Acrescente-se que a testemunha não teve idêntica curiosidade – afirma o Tribunal, porque especificamente fez essa pergunta à testemunha e ela confirmou-o - quanto a “saber a data de entrada no lar” ou a “idade” de outros assistentes do processo, os quais, de acordo com o que resulta dos elementos constantes dos autos - cfr., por exemplo, documentos de fls. 60.043/4, na parte em que diz respeito aos anos de 2002 e 2003, este até início de Outubro de 2003, documento da “DQ”, junto pelo arguido H, relativo a contagem de notícias e tempo de emissão, ano de 2002, 2003, 2004, referentes a H e AX; docs. de fls. 60.194, 60.321, 60.322, 60.323, 60.413, 60.414, 60.550, 60.551, DVDs remetidos para os autos pela DR com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DR com assistentes destes autos e sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março; docs. de fls. 52.054 (DVD DS) e de fls. 60.050 a 60.056, remetidos para os autos pela DS com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DS sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março de 2003; Docs. de fls. 57.463 a 58.633, recortes de artigos saídos na Imprensa com entrevistas e reportagens sobre os factos destes autos, respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente de Dezembro de 2002 a Março de 2003 -, foram falados e mais falados que o AK na comunicação social e alguns desses sim, tinham directamente a ver com os factos que na Acusação vieram a ser atribuídos ao arguido C. Sucede que a testemunha também foi “pedir” ao AK para contactar o assistente AN - que, de acordo com as declarações da testemunha, o AK disse-lhe que estava no (…) e não em CZ – para saber quem tinham sido os educadores do AN no lar de CZ, pedido que fora feito pelo sobrinho da testemunha e filho do arguido C porque “… havia educadores que na altura já não estavam no internato, ou não estavam nesse (...) ou na altura já tinham sido transferidos para o semi-internato…”– justificação dada pela testemunha -. E reconhecendo, quando tal lhe foi perguntado pelo Ministério Público, que a identificação dos educadores era uma questão que poderia saber com mais facilidade através dos Colegas educadores de CZ, mas argumentando com o já acima dito, que “… havia educadores que na altura já não estavam no internato…”. Também nesta parte não faz qualquer sentido para o Tribunal a “desculpa” dada pela testemunha, para o motivo pelo qual tentou obter uma informação do AN através do assistente AK, quanto à identificação dos educadores. O Tribunal conclui que na primeira situação – a da sua ida ao CW consultar o processo individual do assistente AK -, a testemunha foi consultar o processo porque o sobrinho GU, filho do arguido C, lho pediu directamente, não sabendo contudo o Tribunal a razão que em concreto esteve na origem desse pedido (se um interesse específico do arguido C, se um interesse e pedido de outro arguido, que tivesse contactado o arguido C para obter a informação). As explicações e “amálgama” de justificações que a testemunha deu para explicar e justificar este episódio, colando-se a uma versão que para o Tribunal, da análise que fez dessas explicações – e em que teve em conta a forma da entoação, pausas ou expressão facial que a testemunha apresentou quando respondeu nesta parte -, significaram um “embrulhar” de desculpas para a verdadeira razão da consulta, um pedido do sobrinho GU. O qual, por sua vez, atenta a natureza das coisas e o que decorre da experiência comum, teve necessariamente origem no arguido C. Atitude e comportamento que para o Tribunal, à semelhança do que acima se disse quanto à testemunha NY, é plausível em relação a alguém que tivesse uma relação próxima com o arguido e o quisesse ajudar no desembrulhar da situação em que se encontrava. Embora em tempos diferentes, o comportamento destas duas testemunhas e o que o mesmo implicou, para o Tribunal é uma reacção similar. E esta similitude de comportamentos, no caso concreto, para o Tribunal conferiu credibilidade e veracidade ao episódio que AP contou. Ele contou um incidente que, para o tribunal e pelo que já dissemos, é possível e plausível ter acontecido naquela situação e tem similitude de procedimento - o procedimento de “acto de contacto” com assistentes envolvidos no processo - , com o que aconteceu com o AK. Por isso, também, a razão pela qual o Tribunal acreditou que o que AP relatou aconteceu. E mesmo que o seu “medo” pudesse ter sido menor do que aquele que relatou ao Tribunal, é uma justificação plausível para o ter reconhecido que em dado momento, depois de ter acusado o arguido C de ter praticado os actos que agora estamos a tratar, veio a desmentir o que tinha dito. (2) Prosseguindo, após descrever os factos na (...) com o arguido C e o tribunal ter-lhe perguntado o que sucedeu a seguir a estes factos, disse que foi para o lar “…e…semanas, fins de semanas depois, ou nas férias, éramos levados para essa tal casa de (…) onde revíamos…outra vez…os arguidos.” Numa primeira análise destas declarações, os factos que o Assistente AP disse terem-se passado com o arguido C nas caves da (...), parece que passaram-se “ depois” de todos os factos no (...) e na “ casa” do arguido K, mas em data anterior aos “ factos de (…)” (sendo no mesmo sentido as suas declarações aquando da instância da defesa do arguido C, na AJ de 7/07/05). Mas na audiência de julgamento de 29/06/05 (na sequência de ter prestado esclarecimentos a pedidos do Ministério Público, quanto à data dos actos de (…)), diz que quanto a estes actos na cave da (...) – perguntado se ocorreram antes ou já depois de ter começado a ir a (…)- disse “ … não me recordo, mas… julgo que tenha sido antes de ir para (…)…sei que foi a mando do sr. A…”. E quando perguntado porque é que julgava que tinha sido antes de ter começado a ir a (…), dá a seguinte resposta “ …como eu já nomeei a este Tribunal, comecei por ser abusado pelo sr. A. Após os abusos dele…julgo que pelo meio da…dos entervalos da primeira, da segunda para a terceira…julgo que tenha sido aí que o Sr. A me mandou ir ter com o Sr. C ao seu (...), ó gabinete, na (...)…” (tendo esclarecido, a pedido do Ministério Público, que quando se estava a referir da “ segunda para a terceira” era dos abusos do arguido A). Esta descrição da dinâmica que AP faz – começa por ser abusado pelo arguido A e depois é que este o manda ir ter com o arguido C – tem consistência face ao que resulta, para o tribunal, da avaliação global da actuação do arguido A: primeiro o jovem é abusado por si e depois “ leva-o” para outras situações. AP localiza, assim, estes actos já após o inicio de abusos do arguido A, mas o refeitório que existia no edifico da (...) ainda não estava “ cá em baixo”, na cave e não deu por haver obras. Do depoimento de várias testemunhas ouvidas foi difícil encontrar alguém que tivesse dito ao Tribunal ter uma noção precisa e segura da altura em que o refeitório passou para a cave e começou a funcionar nesse local. A testemunha NY localizou em 2000 ou 2001, não tendo precisão. A testemunha JJB, que trabalhou no edifico da (...), disse que lembrava-se das obras na cave, em Junho 1999 andavam com obras na cave e ainda “faltavam obras”. A testemunha JR disse que começou a explorar o refeitório no fim de 1999 início de 2000, tendo precisado num segundo momento do seu depoimento que quando voltou de férias, “em 2 de Agosto” (e aqui, aparentou dizer que então teria que ser 1999 e não 2000, como dissera anteriormente), foi já fazer a exploração do refeitório. A testemunha EH (mestre de arquitectura, o qual disse ao Tribunal ter sido docente na AX de 1976 a 2002), disse ao Tribunal que exerceu funções no (...) EY (entre 1976/1989), tendo demonstrado ter também conhecimento directo do espaço físico onde se situa a (...), no CZ, por ter estado ligado ao departamento de obras/arquitectura da instituição (com um departamento situado na (...)), sendo que, pelo exercício das suas funções, todas as semanas ia aos vários espaços ((...), CZ, EX, FZ, EY) da instituição . Falou ao Tribunal sobre as obras que foram feitas no refeitório da (...), esclarecendo que havia um refeitório no primeiro andar, o qual passou para as caves em data que não pôde precisar. A ideia que teve é que as obras duraram 6 meses a um ano, iniciavam-se às 8h da manhã e terminavam às 17horas e pensa que foram em finais de 1998 início de 1999. Ora quanto a este facto, resulta do documento dos autos referente a tal obra, que o local foi entregue “para inicio da obra” em 22 de Julho de 1999, estando previsto terminar a 20/10/99, mas estando o auto de recepção provisória datado de 12/09/01.” (cfr. doc. fls. 50.764). Não é, de acordo com as regras da experiência comum, estando em causa a construção de um local, de raiz, para refeitório - pois do depoimento das testemunhas resultou que na cave não havia refeitório, o local foi adaptado para tal fim -, que a obra tenha levado só 40 dias, para estar aberto em 2 de Setembro de 99, como disse a testemunha JR (como vimos o local foi entregue em 22/07/99). Antecipando a conclusão da obra, pois como vimos a previsão da conclusão era para 20/10/99. Aliás, o auto de recepção (provisório) datado de 12/09/01, afasta essa possibilidade para o Tribunal. A testemunha JR estava equivocada, a sua gestão deve ter sido em Setembro de 2000. Como vimos AP saiu em Março/Abril 2000, da AX e disse que não deu por haver obras ali no refeitório. Mas disse que havia obras por todo o lado na AX e havia “sempre”. E de facto houve obras no lar onde estava em 1998 (ver Apenso W11, livro 1, anotação de fls. 364, de 22/4/98). A questão do refeitório e a ressonância ou o que emerge do depoimento de AP, quanto a factos ou circunstâncias que são exteriores ao abuso, tem relevância para o Tribunal. Porque tendo tais descrições (dos factos exteriores) coerência intrínseca dentro da dinâmica que AP descreve, criaram no Tribunal a convicção de que esses factos estão certos. E criam no Tribunal a convicção da plausibilidade de estarem certos como referências dos actos de abuso descritos. Assim temos que quanto à existência de um refeitório na AX, na audiência de julgamento de 7/7/05 AP demonstrou ter noção da existência de dois refeitório: durante o tempo em que foi aluno na AX, o refeitório era no 1º andar. Sabendo que, actualmente, o refeitório é na cave. Não se recordou se viu obras na cave da (...), mas acrescentou que soube ter havido obras na (...) “… mas não sei se era pó refeitório…porque ali foram feitas muitas obras…e eu nunca perguntei o que era…não era do meu interesse… mas sei que havia obras…”. Disse mesmo que havia obras por todo o lado. Pelo que esta associação que fez da altura dos factos do abuso a “obras por todo o lado”, mas não na cave da (...), levou o Tribunal a localizar os actos em data indeterminada de meados de 97 – pois abusos de A já tinham começado -, a Junho de 1999 (sendo que em 1998 havia obras por todo o lado, ver o registo do livro de ocorrências que acima referimos, em que em Abril 1998 há obras no lar e as do refeitório ainda não tinham começado, as quais começaram em Julho de 1999; cfr. Fls. 50.762 a 50.765: Documentos remetidos pela AX, referentes à abertura de processo para execução de refeitório na cave da (...), datado de 31/03/99; comunicação no processo de execução do novo refeitório, datada de 23/06/99; auto de consignação para inicio imediato dos trabalhos, datado de 22/07/99; e auto de recepção provisória datado de 12/09/01). (3) A defesa do arguido C apontou, como elemento descredibilizante das declarações do assistente, a referência que a Defesa diz que o assistente começou por fazer, quando disse que (na altura em que ocorreram os factos) os vidros da entrada da (...) eram “espelhados”, e que a versão foi alterada quando, pelos documentos dos autos, resultava que nessa altura “ o espelhado não estava lá” (cfr. Fls. 50.759 a 50.761: Documentos remetidos pela AX, referentes á colocação de película anti-reflectora nos vidros do R/C da (...), com auto de recepção datado de 28/05/02). No entanto e ouvindo as declarações do assistente, não é essa a avaliação do Tribunal. Na audiência de julgamento de 7/07/2005 - quando o assistente AP estava a relatar uma situação na (...) -, pela Defesa do arguido C foi pedido ao assistente para dizer como é que se tinha passado esse episódio e AP diz que entrou na (...) “… pela porta principal, espelhada, que se encontrava aberta…”, e onde me dirigi ao gabinete deste senhor, referindo-se ao arguido C. A Defesa do arguido refere, nessa altura, que o assistente tinha dito por duas vezes que as portas eram espelhadas, se o confirmava, o que AP disse que sim. O Tribunal perguntou-lhe quando dizia “portas espelhadas” o que é que queria dizer e AP respondeu “…são portas de vidro…”. A Defesa, em momento posterior, voltou a pedir a AP para esclarecer: “JJQ – …Srª Drª, só relativamente, um pormenor. Relativamente às portas que o assistente usou a expressão “portas espelhadas” e relativamente às portas que o assistente usou a expressão “portas espelhadas”, e depois disse que eram de vidro. O que eu gostava de esclarecer é se quando ele diz espelhadas, isso significa que é aquele vidro que quando se está de fora, se vê a imagem reflectida, como num espelho? Portanto, que só permitem a visão do lado de dentro para fora; mas do lado de fora para dentro, não permitem a visão. Portanto, reflectem a imagem de quem está à frente da porta? Juíza Presidente – Compreendeu a pergunta, Sr. AP? AP – Compreendi sim, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Pode responder. AP – Estava-me a referir a portas de vidro. Porque... Juíza Presidente – Portas que se via de um lado para o outro? AP – Sim. Ahn... Até um vidro que existe na lateral, que dava acesso, dava para ver as escadas. Esse vidro, hoje em dia também é espelhado, o que na altura não era. Juíza Presidente – Portanto, o que está a dizer é, na altura era um vidro que se via, através desse vidro da porta, via-se para o outro lado. É isso? AP – Exacto, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Obrigada.” Para o Tribunal resultou claro que quando AP usou inicialmente a expressão “portas espelhadas”, estava-se a referir a portas de vidro “normal”, que se vê de dentro para fora e de fora para dentro. Até porque demonstra ter noção que, “agora”, é que as portas são de vidro diferente, pois disse que na altura o vido lateral dava para ver para as escadas e agora é que não dá (“… hoje em dia também é espelhado, o que na altura não era…”). Houve para o Tribunal, no caso concreto, uma deficiente forma de expressão por parte de AP. Tanto que na audiência de julgamento de 29/06/05, já tinha referido esta expressão em relação à descrição das carrinhas da AX, dizendo “…havia outra carrinha, não sendo uma (…), mas... julgo uma (…), não sabendo agora exemplificar a …se era (…), se não era…, também de (…) lugares, espelhada. Não de caixa fechada, tipo “(…)”, mas igual à (…), com os vidros a fazer a cobertura….” (e utilizou, também, a expressão portas espelhadas numa referência à casa (…)). (4) Na AJ de 7/7/05, quando AP falou sobre estes factos, não se conseguiu recordar da altura do dia em que o arguido A o contactou, para ir ter com o arguido C à (...). Disse que entrou pela porta da (...) e que não viu ninguém. Foi ter ao gabinete do arguido C e este levou-o para uma sala na cave da (...). Declarou que o arguido C o obrigou a praticar sexo oral e a acariciar-lhe o pénis, mas que se recorde o arguido C não lhe mexeu. Foi a única vez que teve contacto com o arguido C. Esta é a sessão em que para o Tribunal foi manifesto o cansaço do assistente, mas sempre respondendo ao Tribunal de forma serena e a tudo o que lhe era perguntado, não se escusando a responder e esclarecer pormenor após pormenor. A ressonância deste depoimento, no que diz respeito ao acto de abuso em si, ao que aconteceu e como aconteceu, foi para o Tribunal o relato de algo vivido. A forma, expressão e tom de voz que AP usa para contar o que aconteceu, quando a defesa do arguido C pergunta, após já ter feito perguntas quanto aos actos que foram praticados naquela circunstância (“…se o Dr. C despiu alguma peça de vestuário ou não”, respondendo o Assistente “… a única coisa que ele fez foi puxar as suas calças para baixo … e retirar o seu pénis para fora…”), as respostas que foi dando quanto ao que se lembrava, por exemplo, não foi, para o Tribunal, o relato de uma situação não vivida. É certo que a linha da Defesa não afasta que as situações de abuso que AP descreve tenham sido vividas pelo então jovem, mas diz que não foram é vividas com o arguido. Mas aqui, em altura alguma houve qualquer indício pelo qual pudesses ter dúvida quanto ao motivo pelo qual o assistente estava a imputar a este arguido este abuso concreto (foi feita esta pergunta à testemunha NY e em relação a este assistente também não conhecia qualquer motivo, mas tendo apontado pessoas que não tinham boas relações ou que não gostavam do arguido). AP demonstrou conhecer os (...)es e (...)es (...)s da AX (cfr. audiência de julgamento 4/07/05), falou ao Tribunal do Dr. BQ, do Dr. FB, do Director KK (em relação ao Dr. FB foi-lhe pedida a sua descrição e AP disse, a dada altura, que ainda continuava a ser (...) (...) da AX; aqui era uma situação em que estava objectivamente confundido, o que vem dizer ao Tribunal logo no início da sessão de 6/07/05, dizendo que confundiu o “ …habitual (...) (...) da AX…”, que é o arguido C, “… pelo antigo (...) (...), Sr. FB…”). Na audiência de julgamento (audiência de julgamento de 4/07/05 e logo no início de 6/07/05), são-lhe feitas perguntas pela defesa - naturalmente na procura de indícios quanto a motivos, razões, para AP estar a acusar o arguido C -, AP presta esclarecimentos sobre uma situação em que o Dr. EJ o chamou ao seu gabinete (e estamos a falar da altura em que AP foi expulso da AX) , perguntando a Defesa se se lembrava de ter dito alguma coisa ao Sr. director do (...) - estando a Defesa a referir-se, naturalmente, ao que doc. de fls. 134, do Apenso DA, em que é feito o relato do incidente de AP com o Director Dr. EJ - e AP responde que não se recordava de ter dito alguma coisa. Quanto à plausibilidade de isto significar mentira, encobrimento, temos a referir que o sr. Dr. EJ, quando perguntado sobre a mesma questão, com o documento. Ora AP não acusou nem imputou factos a qualquer outro dos Sr. (...)es ou Directores referidos. E em relação ao Dr. EJ, pessoa contra a qual poderia ter zanga e razões para “lembrar-se de acusar” - se estivesse a fazer imputações falsas -, pois foi na sequência da intervenção do Dr. EJ que foi expulso da AX. E AP não acusa o Dr. EJ (e aqui dizemos que a expulsão do AP , pelo que foi o seu percurso na AX e que acima já referimos e pelo que o Tribunal percebeu da forma de estar do Director de CZ na AX, a sua expulsão deve ter-se devido mesmo ao Dr. EJ, que disse “basta” porque não aproveitou as oportunidade e “já chega”; lembramos o depoimento da mãe adoptiva de X, XM, que disse, quando falou no internamento de X na AX, que fizesse ele o que fizesse não o punham na (...)…). Porquê? Pode-se sempre equacionar que escolheu uma pessoa e não outra, porque o seu artifício e malícia era tão elaborado, que preferiu congeminar contra uma pessoa que com ele teve menos relacionamento (ver, por exemplo, o que disse quanto ao arguido C, que “ vagamente” tem uma ideia do arguido desde que entrou para a AX “…não me recordo, mas julgo que tenha sido quando entrei para a AX…salvo erro, sei que vi, eu via sempre o Sr. C, como via o sr. Dr. BQ, como via o Dr. FB…”), do que contra o Dr. EJ, pois sempre poderia ser associada a sua Acusação a vingança e, assim, a ratoeira descoberta (cfr. doc fls. 134, do Apenso DA, relato do incidente de AP com Director EJ) Mas, para ser assim, a ressonância de verdade que em aspectos já focados encontramos nas Declarações de AP, em algum momento, se a Acusação falsa e inventada, não resistia ao contraditório da instância a que foi sucessivamente sujeito. É certo que este argumento – o da ressonância de verdade que emergiu para o Tribunal -, é aquilo que resulta da imediação, que não conseguimos objectivar mais do que já fizemos. Mas é aquilo que faz com que se acredite numa pessoa e não se acredite noutra, que leva à convicção, que afasta a dúvida, para além de qualquer dúvida razoável. Mesmo a questão que acima referimos com a testemunha NY - e a explicação dada pelo assistente para a forma como agiu -, que a defesa do arguido considerou “sem pés nem cabeça”, para o tribunal teve algum sentido. Algum sentido face à pessoa que o tribunal teve em frente, com a vida que teve, mas porque também não soube aproveitar o que lhe foi proporcionado dentro da AX, pois o defeito não é, seguramente, apenas da forma como lhe foi proporcionada a vivência pela AX. AP foi um jovem que teve casa, tecto, com deficiências de certo, mas com família que continuava a ter algum apego por ele. A tia EA - ouvida como testemunha nestes autos, depoimento este que foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos à vivência do assistente não só na AX, como no período após ter saído da AX -, quis que o mesmo fosse para sua casa, na sequência do internamento no (...) do IRS, em 14/4/00 – e AP teve acompanhamento pedopsiquiatrico. O sentido da resposta foi e reconheceu-o, que preocupou-se foi consigo e pelo que lhe pudesse suceder. 13.1.11. O arguido A, na audiência de julgamento de 26/11/08, disse ao Tribunal que AP tinha-lhe falado dos actos que se tinham passado com o arguido C na (...). Quanto a situa a conversa no tempo, disse ao Tribunal que inicialmente tinha referido que isto tinha sido há “ 6 anos” antes deste processo começar, mas queria corrigir e dizer que AP contou-lhe isto cerca de três anos antes do processo começar. E disse-lhe que AP contou-lhe estes factos duas semanas após os factos terem acontecido. Voltou a prestar esclarecimentos na audiência de julgamento 9/12/08 quanto a estas declarações, pois foi nessa altura que lhe foram pedidos esclarecimentos pela defesa do arguido C quanto ao que o arguido A dissera ao Tribunal. Nestas declarações o arguido A continua a negar ter sido ele a dizer ao AP para ir ter com o arguido C , ou ter sido o arguido C a dizer-lhe para mandar-lhe um educando. (1) Vamos voltar a fazer referência a dois aspectos das declarações do arguido A. O arguido A, durante as suas declarações, inicialmente não quis falar do arguido C e a sua atitude, até quase ao inicio das alegações, foi globalmente de desconhecimento de factos em relação ao arguido C (cfr. audiência de julgamento de 10/01/2005). Outro dos aspectos das suas declarações e que acima já referimos pelo menos parcialmente - sendo que, por vezes, tornou-se necessário repetir noutros momentos da presente análise crítica da prova -, é que o arguido há situações em que admite alguma participação nos factos descritos pelos assistentes. Por exemplo, admite ter transportados os assistentes para determinados locais - situações de (…), (...) (…),(…), Teatro (…), (...) do arguido K -, mas acrescenta que se limitou a dar boleia aos assistentes que na altura lha pediram. Deste modo, pode confirmar as declarações dos assistentes quando estes dizem que foram aos locais, para ter actos de natureza sexual, mas negando sempre que tenha sido o arguido a contactar os jovens para aí irem ou ter sido contactado por algum arguido para lhe mandar algum educando. Por vezes acrescenta o que é que os rapazes lhe disseram e com quem disseram ter estado nesses locais, por vezes admite ter-lhes dado dinheiro depois de terem ido a esses locais, mas (caso do dinheiro em (…) ou após a ida a um prédio sito na (...) (…)) esclarecendo que o dinheiro, quando lhe foi entregue em envelope por alguém, foi para dar aos “rapazes” - dando a ideia que “aquilo” foi-lhe parar às mãos por mero acaso -, não sabendo dizer porque é que lhe foi entregue a si. Neste sentido, por exemplo, as declarações que prestou na audiência de julgamento de 10/01/2005, em que o arguido negou ao Tribunal saber quanto dinheiro estava dentro dos envelopes que disse terem-lhe sido entregues, dizendo “…não sabia, eu nunca fiquei com nenhum tostão (…), o AV é que distribuía o dinheiro por eles (…), nunca, nunca, nunca fiquei com nenhum tostão … por isso mesmo, estava a viver numa barraca e não tinha dinheiro para uma (...), nem para um apartamento….” . E quando perguntado, afinal, o que é que ganhava com aquelas boleias que andava a dar, acrescenta “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto … isso agora …, portanto agora é a Sr.ª Doutora depois perguntar a eles….” E insistido - pois pelo menos andava a perder tempo enquanto ficava à espera dos “rapazes”, quando disse que os levou e depois trouxe de volta -, responde “ (…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”, dizendo que tal não lhe “faz confusão”, “…não, não faz confusão Sr.ª Doutora (…), nunca, nunca entrei em casa de ninguém … nunca recebi dinheiro de ninguém, ninguém mesmo, quer dizer, do dinheiro dos envelopes que me deram, nunca fiquei com nenhum tostão, assim é que é….”. Este foi o seu movimento ao longo das suas declarações. (2) Já o dizemos noutro momento, porque não somos psicólogos ou psiquiatras, nem temos os conhecimentos específicos desses profissionais ou de outros nessa área, não podemos fazer a interpretação, justificação e avaliação das atitude do arguido perante o Tribunal, com intenção de ter o cariz técnico ou científico com que tais profissionais podem falar, quando avaliam a mente, a estrutura, o comportamento, a personalidade de uma pessoa. Só esses, de facto, têm propriedade para falar e avaliar com a competência que essas ciências, que estudaram e nas quais adquiriram conhecimentos e competências profissionalmente reconhecidas, lhes atribui. O Tribunal tem que analisar e perceber o sentido do contributo que esses profissionais podem dar. No entanto estes profissionais, os pareceres, os contributos, não se sobrepõem nem colidem com a função do Tribunal e no caso concreto dos Juízes. Pois nem só as competências e as regras que são pressu(...) do exercício de tais competências são diferentes, como o objecto sobre os quais se debruçam são diferentes. Apesar de a pessoa observada ser a mesma, o objecto, as perspectivas e as regras subjacentes à observação são diferentes. Assim e reconduzindo-nos ao que estávamos a dizer sobre o arguido A, o Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. O que, reconhecemos, não foi imediato, pois - aliás, tal como sucede com a generalidade das situações - e como já dissemos, por vezes só à distância é que se conseguiu ver o que a confusão do momento escondeu. A forma como o arguido declarou os factos ao Tribunal - e cruzando com a análise concreta que o Tribunal faz não só em relação a este assistente, mas em relação a TODOS os demais assistentes - tem uma justificação para o Tribunal. Deste modo, as declarações do arguido, quando confirma ter levado os jovens ou narra o que estes lhe contaram depois de ter estado nos locais, tiveram para o Tribunal o sentido mais plausível - por ser o mais coerente com o que foi, para nós, a atitude global do arguido face à admissão dos factos -, de envolver-se o menos possível como responsável pelo que aconteceu ao educandos. Mas, ao mesmo tempo, não deixar que lhes chamem mentirosos. Quando o arguido, por exemplo, se referiu à idade em que conheceu os assistentes, de uma forma quase padrão surgiu no seu discurso a idade “13/14” anos. para o Tribunal o arguido A sentiu responsabilidade no que fez aos jovens da AX, (…) como ele. E teve reacções que traduziram aligeirar da sua culpa, mas sem “deixar” cair “os rapazes” como se lhes referiu por vezes. E este aligeirar de culpa traduziu-se, por vezes, em meias verdades (afirmação que ao longo desta análise crítica o Tribunal vai ilustrando e preenchendo, com referências concretas e situações concretas). Isto é, a percepção que tivemos é que o arguido não deixou de contar com verdade uma parte do facto, mas introduz elementos que não se verificaram, para justificar - pelo menos para si - os que se verificaram. Por exemplo e já na fase seguinte a admitir ter dado as boleias, quanto aos dias ou situações em que diz ter dado as boleia associa a “aproveiatr” transportes que por alguma circunstância estava a fazer em serviço. Assim, se as deslocações ocorreram ao fim de semana, ao fim do dia, ou mesmo durante o dia, (…), associa (como já dissemos) a deslocações que também estava a fazer em serviço. Querendo deste modo dizer, para o Tribunal, que não foi com a carrinha da AX fazer uma deslocação que não podia ou devia, mas sim que deu a boleia aos alunos, dizendo algumas vezes “com muito gosto”, porque ficava no caminho do serviço que ia fazer para a instituição. Assim, não usou indevidamente os bens da AX o que foi - na percepção do Tribunal - um movimento repetido do arguido, não só para demonstrar que ele não se aproveitou da instituição, mas para demonstrar que outros é que se aproveitaram. Foram visíveis, ao longo das suas declarações, as sucessivas e repetidas imputações que fez de pessoas ligadas à oficina da instituição, usarem abusivamente os bens da AX (o óleo, os arranjos de carros de fora), pelo que houve mesmo uma vez nas suas declarações e em que o arguido pediu para acrescentar alguma coisa ao que já tinha dito, que o Tribunal disse-lhe que se fosse outra vez para falar do óleo dos carros e dos mecânicos, já estávamos esclarecidos (aliás, o que já vem desde data anterior a 2001, como resultou da análise que fizemos dos documentos dos autos, quando analisámos o percurso do arguido A na instituição, a incompatibilidade com outros funcionários, entre os quais motoristas e mecânicos e referimos os incidentes de “1993” e de “2001”). Nas alturas em que disse ter dado boleia foi com o seu carro, fim do dia ou fim de semana, não envolvia AX, as boleias não prejudicaram a instituição e que as deu para fazer um favor aos rapazes. Mas foi visível e perceptível que, com este discurso, o arguido foi introduzindo alterações sucessivas às justificações que dava para ter ido a determinados locais ou agarrou-se a dados, referências, de deslocações de serviço que disse ir fazer naquelas ocasiões, repetindo-as sempre que surgia o facto/evento” que as fazia espoletar. No entanto e em regra, as alterações que introduz não têm a ver com o número de boleias, local para onde as deu e a quem as deu - porque esta estrutura mantém-se -, mas com as circunstâncias em que ele arguido A as deu (cfr, por exemplo, neste sentido as suas declarações “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto …”, “(…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”). (i) E aqui introduzimos duas situações que notámos nas declarações do arguido, noutros momentos – concretamente declarações relacionadas com o arguido E -, mas que da perspectiva do Tribunal dão sustentabilidade à análise que fazemos das declarações do arguido. Relacionado com uma morada do arguido E - (...) (…), lote (…),(…)º (…), em (…) - a fls. 19.179 consta uma auto de reconhecimento de local feito pelo arguido A em 21/04/04, estando a fls. 19.180 a planta do local. O arguido A falou em audiência sobre este reconhecimento, tendo dito que este local era um em que deixava jovens para irem a casa do arguido E. Disse que isto foi “muito antes” de ser motorista - e já vimos que pelo menos desde Janeiro de 1998 passou a exercer, de facto, as funções de motorista na AX, apesar da sua requalificação como tal só ter ocorrido em 2000 -, dizendo 1996/1997 e que levou, entre o mais, a testemunha AZ. Analisando as declarações do arguido, com a análise que o Tribunal acabou de fazer, as mesmas não têm consistência face à localização que o arguido faz no tempo da deslocação a essa casa e da altura em que o arguido E passou a ter a disponibilidade dessa casa, o que o Tribunal não pode deixar de dizer (cfr. que quanto à testemunha AZ, este foi ouvido em audiência de Julgamento e o local que indicou foi o que se encontra identificado no auto de fls. 6.136, croqui de fls. 6.137, que é diferente do indicado pelo arguido A, mas corresponde à morada a que se refere o ponto “48” dos factos provados ). Pode ter feito confusão com outro local em (…) onde o arguido viveu, ou pode estar a mentir? À partida pode ser qualquer uma das situações, mas a par desta situação de inconsistência e também relacionado com um reconhecimento, há outros elementos que também não podemos deixar de assinalar e que têm relevância para avaliar da credibilidade e veracidade global do que o arguido A disse em audiência de julgamento. E, consequentemente, para graduar o peso e sentido desta discrepância, face a outra situação ocorrida, o que passamos a fazer. Assim, ainda em relação ao arguido E, vimos na análise já feita que aparece mencionada (relativamente ao arguido) a “ (...) (…), nº (…),(…)º andar (…), no (…)”, concretamente no documento de fls. 30, do dossier de documentos constante do Apenso BF-9, datado de 1/07/91 (contrato de arrendamento do andar em causa, pelo período de 1 ano e com início em 1 de Julho de 1991, em que o arguido aparece como arrendatário). Quanto a esta morada - e agora ligando com o que acima dissemos, quanto ao sentido e concreto significado da incongruência demonstrada pelo arguido A, face à análise que o Tribunal fez dos demais elementos dos autos, nas declarações que prestou em audiência de julgamento quanto ao reconhecimento de fls. 19.179 - , encontra-se a fls. 19.166 dos autos um auto, com croqui/planta do local e fotografias a fls. 19.167 a 19.169, de um reconhecimento que o arguido A fez de um local na (…)/(…). De acordo com as declarações que prestou em audiência de julgamento - o arguido A foi confrontado com estes documentos -, este reconhecimento foi para indicar o local onde deixou jovens para o arguido E. No entanto disse ao Tribunal que não se lembrava “muito bem” das datas em que isso acontece, mas que foi antes e depois de ter passado a ser motorista da AX (e, como já vimos, começou a exercer efectivamente funções de motorista em Janeiro de 1998). Se olharmos para a planta do local de fls. 19.167, o ponto onde está assinalado o local que na altura foi indicado/reconhecido pelo arguido, local que o arguido em audiência de julgamento confirmou ter indicado e esclareceu ser o sítio onde deixou jovens para o arguido E, é na “(...) (…)”. Ora o documento de fls. 30, do dossier de documentos constante do Apenso BF-9 - documentos que foram apreendidos ao arguido E, cfr. fls. 4.487/9 - é um contrato de arrendamento de uma habitação sita na “ (...) (…), nº (…),(…)º andar (…), no (…)”, pelo período de 1 ano e com início em 1 de Julho de 1991, em que o arguido aparece como arrendatário. Este documento foi apreendido ao arguido numa busca efectuada em 20/05/2003, data esta que é anterior ao reconhecimento do arguido A, pelo que era um documento que já estava nos autos quando foi feito o reconhecimento pelo arguido A. Mas das declarações do arguido, a forma como foi explicando os reconhecimentos que fez e porque os fez, as explicações que foi dando, se é certo que por vezes, objectivamente, demonstrava confusão quanto a datas e jovens em causa - a sensação que dava, quanto à identificação dos jovens ou datas, era que repetia o seu discurso, fazendo um agrupamento, numa só vez, de um conjunto de nomes e datas, que ia repetindo mais ou menos indistintamente em todas as situações -, mas quando fazia a identificação do local, deu e transmitiu ao Tribunal, a percepção e a noção de que os locais diziam a situações distintas, deslocações efectivamente vivenciadas pelo arguido. A explicação que dá, por exemplo (cfr. Audiência de julgamento 10/01/05), para o facto de no (…) deixar os jovens ao pé de umas escadas e não ir exactamente à casa onde vivia o arguido E - dizendo que era assim, “… deixava-os ali e eles subiam o resto a pé, muitas vezes não queriam que eu fosse lá em cima, para não dar nas vistas aos vizinhos que andavam sempre à janela … as pessoas de idade … ficavam na janela a ver, portanto …” (Juiz Presidente - Não dava nas vistas … porque é que o senhor dava nas vistas?) “…por causa de eu deixar lá os miúdos para as festas, com o meu carro …eles pediam-me para deixar ali nas escadinhas…” -, para o Tribunal fez sentido, atenta a zona que é (facto público e notório)uma zona de habitação antiga. Isto é uma daquelas situações que, para o Tribunal, foi apreensível a identificação que acima referimos, de o arguido estar a fazer a descrição de um local, com a correspondência a uma situação concreta - levar rapazes, para o arguido E - efectivamente vivenciada assim por si. Mas não tendo o Tribunal - pelo que já dissemos, quanto à junção que o arguido faz de datas e rapazes, numa só expressão que repete - ficado com a suficiente percepção de quem (dos jovens) é que foi onde e quando, para o afirmar para além de qualquer dúvida razoável. Mas também não ficámos com a percepção e não tivemos indício, de que o arguido A tivesse ido fazer aquele reconhecimento, àquele local no (…), por previamente ter tido conhecimento do contrato de arrendamento do arguido E (constante de fls. 30, do Apenso BF-9 e que mencionámos). O que, para o Tribunal deu credibilidade e consequentemente veracidade, às declarações do arguido A, no que diz respeito aos reconhecimentos que efectuou e que mencionámos, quanto à razão pela qual o arguido foi a tais locais e quanto ao conhecimento do arguido E em data anterior a este processo. Isto sem prejuízo da assinalada confusão quanto a períodos ou jovens que levou aos locais, como acima expusemos. E permitindo, a análise que antecede, o Tribunal concluir que as situações em que objectivamente ocorrem discrepâncias nas declarações do arguido A quanta a datas, locais, dias, momentos do dia, particularidades de locais – como é uma das situações, por exemplo, da (...) (…) -, não têm como única explicação a mentira. E suportam a interpretação que o Tribunal fez do movimento e do sentido das declarações do arguido A. (2.1) Continuando, confirmando o arguido A que deu boleias aos assistentes e para os locais que estes disseram, pelo menos (para si) está a confirmar o que “os rapazes” disseram. Neste sentido, por exemplo, as suas declarações no dia 26/11/08, quando disse ao Tribunal que “ acreditava nos rapazes que levou a (…)” e que lhe disseram que o arguido C estava em (…) ou quando falou do transporte (boleia) do Y ao (…), para se encontrar com o arguido C. O que temos estado a dizer tem a ver com o que foram, para este Tribunal, as declarações do arguido A durante a audiência, não só em relação a este assistente mas em relação aos demais. Isto é, o arguido A quando implica outros arguidos em situações que reconhece ter ocorrido ou quando faz declarações que possam permitir a inclusão de outros arguidos nessas situações, em regra não se exclui dessas situações. O arguido A não inclui outras pessoas e exclui-se de todo a si. O que faz é contar, quanto a si, a história de forma incompleta ou com outros contornos. Mas em algumas situações não deixa de dar elementos que nos permitem, em conjugação com demais meios de prova, chegar à sua real responsabilidade. E este foi o seu movimento global: o arguido admite a sua participação, embora configurando-a em termos diferentes do que está descrito no despacho de pronúncia ou do que foi dito pelos assistentes; como dissemos, admite ter levado jovens a (…), à (...) (…), à (…), mas foi sempre e apenas dar boleias que lhes pediram; só deu boleis, nega contactos ou conhecimentos com arguido, dizendo que isso eram os educandos que sabiam e contactavam; quando admite ter-lhe sido entregue um sobrescrito com dinheiro, não era para si, era para os jovens, dando uma ideia de que nem sabia porque é que aquilo lhe era entregue a ele; e associando, também em regra, que as boleias que deu em veículo da AX, foram dadas aproveitando serviços que ia fazer (entrando em contradição, neste aspecto, com a estrutura intrínseca do seu discurso ou com o discurso dos assistentes). E transpondo isto para a declaração que foram prestadas para TODOS os assistentes - portanto, não só com os assistentes que têm a ver com os arguido C, E, H, K, N, Q -, o arguido não fez mais do que repetir o movimento que teve nas suas declarações ao longo do julgamento: cola os transportes que admite ter feito dos jovens - mas chamando-lhe “boleias” - com deslocações que na altura, ou por razão profissional ou por razão pessoal, por “acaso” na altura em que lhe pedem a boleia ia fazer ou tinha programado fazer. (2.2.) Em sede de alegações as demais defesas, uns de forma mais explicita outros de forma menos explicita, apontaram esta fragilidade das declarações do arguido A, apontando tais declarações como uma falsa ou débil corroboração. Retomando o que acima dissemos sobre o arguido A, o Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. E como dissemos não foi imediato. As fragilidades de cada prova ou de cada meio de prova, são tão relevantes do ponto de vista do seu significados como a sua solidez. Mas há circunstâncias do “modo como declarou” que temos que assinalar: o arguido A em regra respondeu a todas as questões que o Tribunal lhe colocou e em regra não prestou declarações com elementos na sua frente, que o fossem ajudando a fazer referências a factos ou datas - normalmente declarava primeiro e depois eram-lhe exibidos documentos, quando foi o caso -, pelo que embora por vezes com um discurso repetitivo, com a inconsistência de data ou de referência temporal em relação a declaração que já tinha feito anteriormente, por vezes com alteração do que já tinha dito quanto a tais elementos, teve uma atitude espontânea perante o Tribunal. Quanto aos demais arguidos que prestaram declarações sobre os factos – com excepção da arguida Q, cuja análise da forma como prestou as suas declarações fizemos após a análise das declarações do assistente AI -, a preparação académica e a capacidade de discurso entre o arguido A e os arguidos C, H e K é objectivamente superior nestes últimos. O arguido K falou, essencialmente, de factos relacionados com o exercício da sua vida profissional e com factos da sua vida pessoal, pois quanto aos factos objecto do despacho de pronúncia negou a sua prática (declarações esta que relevaram para a prova dos factos relacionados com as suas condições pessoais). Não teve e não foi, por isso, sujeito ao contraditório quanto ao dia, a hora, com quem foi, quem levou, quem viu, por onde passou, como estava vestido, por onde entrou, por onde saiu, se subiu as escadas ou se ficou só à porta, se usou o carro ou a carrinha, se foi a (…) ou se foi a (…). Demonstrou, para o Tribunal, capacidade e qualidades de discurso – o que, aliás, esteve de acordo com o que disse ao Tribunal quanto à sua formação, licenciatura em medicina e a facilidade de comunicação que revelou, tanto que prestou colaboração num programa de rádio (cfr. depoimento das testemunhas ZV, CCH, VR, bem como a testemunha ZR, a qual disse que a colaboração era na JJC, tendo o arguido começado a sua colaboração há 15/17 anos e até à altura em que foi detido)- e não esteve, nem quanto ao volume da informação, nem quanto à diversidade da informação, sujeito a um contraditório como o foi o arguido A, o arguido C ou o arguido H. O arguido C – e para além do que o Tribunal já disse, quando fez a análise crítica da prova quanto à evolução pessoal e profissional do arguido A na AX e ao relacionamento com o arguido C, quanto à atitude do arguido perante o tribunal -, com uma formação académica (Licenciatura e Mestrado) superior à do arguido A (foi até ao 6º ano de escolaridade), mesmo prestando declarações com recurso a elementos que tinha consigo, nomeadamente tendo tido a possibilidade de prestar as suas declarações com recurso a uma “lista integrada” que tinha juntado com a sua contestação e onde estavam os elementos dos seus registo de multibanco/visa, via verde, registos telefónicos, teve situações de dificuldade em explicar os seus próprios registos, por não se conseguir recordar, por não conseguir naquele momento, em plena audiência, explicar o que estava na base daquele registo ou da inclusão de determinado elemento. Não soube, em algumas circunstâncias, explicar o critério utilizado para o que estava a dizer. Tanto que, por vezes, o arguido pediu ao tribunal para lhe dizer quis eram os esclarecimentos que o Tribunal pretendia, para o arguido, em casa, esclarecer as suas dúvidas e no dia seguinte prestar o esclarecimento. O que aconteceu, tendo ficado gravadas as referências que o tribunal fez, quanto ao que isso também podia implicar na avaliação das declarações do arguido, quanto à sua espontaneidade. Isto, é evidente, sem prejuízo de o Tribunal ter tido em atenção a quantidade e diversidade de elementos e informação que estavam em causa. Mas, por exemplo, com o que aconteceu com os números que o arguido, na sua lista integrada, tinha identificado como números de telefone do arguido A, as explicações que o arguido deu ao tribunal num primeiro momento, quanto ao como e porquê desses números, o que veio depois a rectificar e a dizer quanto ao que inicialmente tinha dito, foram necessariamente notadas pelo Tribunal. E aí estava em causa uma informação que o arguido, necessariamente, tinha que estar a par e era-lhe próxima, pois estavam em causa chamadas feitas pelo arguido C, do seu telemóvel, para números (diferentes), de telemóvel, que na referida lista integrada começara por atribuir ao arguido A. E se o facto dessa lista integrada ter sido feita enquanto esteve em prisão preventiva com ajuda de familiares, portanto um período difícil para si – pelo que foi perceptível pelas suas palavras -, o certo é que o arguido confirmou ter visto e analisado a lista para prestar declarações na audiência de julgamento. E se o período de prisão preventiva foi um período difícil para si, de modo a perturbar a sua capacidade de análise crítica de tais dados, ou afectar a sua memória quanto a tais elementos, das declarações do arguido A também resultou, para o tribunal, que a prisão também foi um período difícil para o arguido A. E o arguido A, como dissemos, prestou as suas declarações, em regra, sem recurso a elementos ou suporte documental. Quanto ao arguido H, o seu conhecido percurso profissional não fazia esperar menos do que foi perceptível em audiência de julgamento: foi perceptível que preparou os dados sobre os quais prestou declarações; prestou as suas declarações com possibilidade de recorrer aos elementos documentais que estavam em causa, concretamente registos de tráfego telefónico, pagamento Visa/multibanco, registos de via verde; demonstrou, ao longo do seu depoimento, um discurso lógico, em regra sem contradições dentro do raciocínio que fazia ou das explicações que apresentava. Foi evidente, para o tribunal, a qualidade de discurso, de preparação e competência que o seu percurso, repetimos, fazia esperar. No entanto e não obstante tais qualidades, mesmo num quadro com estas características a contradição (ou aparência de contradição), a inconsistência (ou aparência de inconsistência) pode ocorrer. Como foi o caso - para o tribunal e como acima já referimos -, quando deu explicações sobre os cartões de telemóvel que pode ter utilizado (daqueles que lhe eram oferecidos com telemóveis pelas operadoras) ou que deu à sua filha, ou quanto à utilização de cartões no seu telemóvel, que não fosse o que disse ser o seu número usual. É claro que o facto de um arguido apresentar fragilidades nas suas declarações, não justifica as fragilidades que outro possa ter tido. Porque o que pode justificar a fragilidade de uma situação e levar o tribunal a concluir que apesar de frágil não é inconsistente, pode não levar à justificação noutro caso. Depende, naturalmente, das circunstâncias concretas “em” e “como” é feita a declaração. (3) Passamos, então, a fazer uma referência específica às declarações que o arguido A prestou nas audiências de julgamento, mas dando neste momento especial relevância às prestadas nas audiência de julgamento de 26/11/08 e de 9/12/08. Mas começamos por fazer a seguinte referência. Na audiência de julgamento de 9/07/2010 foi ouvido pelo Tribunal o Sr. Dr. JJD, psiquiatra, o qual disse ao Tribunal recordar-se de acompanhar o arguido, no âmbito de uma relação terapêutica (na audiência de julgamento foi prestado o consentimento pelo arguido A, para o seu psiquiatra falar sobre a relação terapêutica; CV do Sr. Dr. JJD a fls. 27.543 a 27.547 ), desde Novembro de 2004. E falou do acompanhamento que fez ao arguido durante o julgamento, da medicação a que o mesmo esteve sujeito para - pelo menos o Tribunal assim o compreendeu - controlar as crises de ansiedade que tinha durante as audiências, para evitar mesmo episódios de desmaio e poder continuar a prestar declarações. E houve, de facto, audiências em que o arguido pediu para prestar breves declarações e em que era perceptível uma voz pouco clara, enrolada, em que o arguido acabava por repetir o que já tinha declarado anteriormente, parecendo, ao Tribunal - e porque foi apontamento que registámos - que o arguido estava sob efeito de medicação. É claro que esta observação é como leigos, mas por vezes, no contacto directo, é perceptível quando alguém tem um comportamento, atitude, expressão facial, voz, que (de novo como leigos) atribuímos a efeito de uma medicação que esteja a fazer. E referimos isto porque na audiência de julgamento de 26/11/08 o arguido A estava com uma voz clara, não estava arrastada ou “embrulhada”. E neste dia, em súmula, declarou que queria dizer ao Tribunal que acreditava nos rapazes que levou a (…) “ … e que dizem que viram o Dr. C em (…). Quero dizer ao Tribunal que sou muito amigo do Dr. C, da esposa do Dr. C, a quem eu chamava pai ao pai da mulher do Dr. C. E por isso mesmo tenho vindo a arrecadar, como o Sr. Procurador diz que eu não tinha nada a ver com o Dr. C, eu quero explicar que trouxe, transportei o Y para o (…). Ele disse ia ter com o Sr. C e o Sr. C é o Dr. C. Aqui para o (…) é a mesma coisa, quando ele ia para o jogo da bola, também disse que ia ter com o Dr. C. Quero dizer que o AP me transmitiu muito antes deste processo, que tinha tido problemas com o Dr. C da AX nas caves da (...)…” (quanto ao relacionamento do arguido com o pai da testemunha NY, mulher do arguido C, adiantamos desde já que esta em audiência de julgamento disse ao Tribunal que o seu pai trabalhou na AX como servente, cozinheiro, ajudante de motorista, motorista, o arguido A dava-se bem com o seu pai, o arguido esteve uma vez em (…) em casa do pai, mas nunca presenciou o arguido a chamar o seu pai por “Pai” e não acredita que isso tivesse sucedido; já quanto ao arguido C disse que não se dava com o seu pai, em convívio social fora da AX). Nos esclarecimentos que prestou, na sequência de perguntas feitas pelo Tribunal, disse que não tinha dito antes ao Tribunal porque o arguido C era o seu chefe. Mas diz que no “(…)”, quando foi levar o Y, o carro que viu era um (…) escuro e em (…) não sabe que marca era o carro (mas rectifica que foi ao contrário, o (…) foi em (…) e no (…) foi um carro que não sabe a marca). Disse que não viu quem era a pessoa que estava dentro do carro, mas volta a dizer que Y disse-lhe que era o arguido C. Disse que estas situações foram com 3 semanas de intervalo (acrescentou no seu “pensar”) , foi à tarde nas duas situações e associa a casualidade de ir para os lados de (…), na altura em que deu boleia ao Y (para este ir para (…), para o local onde o deixou e entrou para o carro) porque ia ver um jogo do AXA.C. (repete, aqui, o movimento que já vimos, por exemplo, quanto aos factos relacionados com AI e que assinalámos quando fizemos a análise crítica da prova quanto a tal assistente: está naquela zona porque vai ao estádio do AX (...), embora nesta situação, com o Y, aparenta que ia só ver o jogo e não ia fazer qualquer serviço para a AX). Quando estava a prestar esclarecimentos - num segundo momento, quanto à ida ao (…), para dar boleia ao Y -, disse que não tinha visto a pessoa que estava dentro do carro para onde o Y entrou, mas que era um homem. E diz (quanto ao momento em que soube quem era a pessoa que estava no (…)), que “…quando o Y me diz é quando vem embora. Só me diz que era o Sr. C aqui no (…). Do (…) não me disse nada. Eu perguntei quem era o Sr. C e ele disse-me que era o sr. C da AX… ” (mas ter em atenção que quanto a este episódio de ter dado “boleia” a Y, para o “(…)” de (…), na audiência de julgamento de 20/02/06 o arguido já tinha dito que tinha dado esta boleia ao Y e que este lhe dissera que ia ter com o “Sr. C”; e para (…), referiu que foi passado duas semanas, referiu um serviço da dança que fez, Y pediu-lhe boleia e como o arguido ia para o AXA.C., para um jogo, deu a boleia). Quanto a AP, disse que este tinha-lhe dito que tinha tido problemas de abuso sexual dentro da AX, nas caves (com o arguido C) e o arguido respondeu-lhe que não tinha nada a ver, para se queixar ao educador. Disse que a conversa tinha sido também à frente de um educador VD. Ainda respondendo a perguntas do Tribunal - quanto à razão pela qual estava naquela altura a relatar aqueles factos - diz “… como eu tinha dito, o Dr. C foi meu Chefe de serviço. Somos “(…)” e como eu era muito amigo dele e da futura esposa do Dr. C, não quis portanto…” e esclareceu - na sequência de insistência do Tribunal, quanto ao porquê do contar naquele momento -, com o discurso que tinha tido antes, porque acreditava nos rapazes que levou a (…), quando lhe disseram que o arguido C estava lá. Na audiência de julgamento de 9/12/08 a defesa do arguido C pediu esclarecimento ao arguido A, quanto às declarações que tinha prestado em 26/11/08. E confrontou-o com a carta que se encontra a fls. 20.195, uma carta que o arguido A reconheceu ter sido feita por si, em resposta a uma carta que o arguido C lhe enviara (numa altura em que estavam em prisão preventiva) e onde o arguido A escreveu ter conhecimento que AP andava a ser pago para acusar várias pessoas. O arguido disse saber qual é carta (mas foi-lhe na mesma exibida).Nesta carta consta, a dado momento, “... penso eu que foi o (…), que pagaram a um jovem de nome AP, para ele dizer que tinha visto o Sr. Doutor, na tal cave ou armazém da (...). Mas isto todas as pessoas que me visitam dizem que esse tal jovem foi pago para fazer esse tal papel de artista...”. O arguido A disse, referindo-se à carta, que enquanto estava detido estava sob pressão e não quis comentar nada. Confirmou o que o AP lhe tinha dito quanto ao ocorrido nas caves da (...) com o arguido C, mas acrescentando que “não tinha passado cartão” a isso. “...Eu disse que ele foi pago, porque na altura recebia também cartas do H... e não estava em condições...do Dr. C...”. E afirmou que nunca teve conhecimento que AP andava a receber alguma coisa de alguém, isso tinha saído da sua cabeça. Declarou, quanto ao que dissera na sessão anterior, de quando foi a (…) os assistentes terem-lhe dito que também estava lá o arguido C, que “... eu não o quis dizer abertamente porque era ... e sou, muito amigo do Dr. (…) e da família...”. E quando disse isto estava a olhar directamente para o mandatário do arguido C, que lhe estava a pedir os esclarecimentos. Não desviou o olhar para baixo, não desviou o olhar para o tribunal. Na nossa avaliação, esta atitude, este modo como disse, teve o significado que o arguido estava a dizer e a enfrentar o que estava a dizer. Não foi, para o tribunal, uma atitude de simulação. E quanto ao motivo com o qual o arguido justificou, também, ter dito o que disse, ter mentido/inventado, na referida carta de fls. 20.195, pelo depoimento das testemunhas NN ( Assistente de acção educativa no (...) EY da AX, a qual falou ao Tribunal sobre o arguido A, as visitas que lhe fez depois de estar preso e conversas que teve com o arguido na prisão e como se encontrava) e ZK, auxiliar de serviços gerais na AX desde 1996, foi perceptível o estado em que o arguido estava quando as testemunhas o foram visitar ao estabelecimento prisional. A testemunha NN disse ao Tribunal que foi visitar o arguido várias vezes à prisão, resultando das suas declarações que o foi ver desde os primeiros tempos da sua prisão, ainda o indo ver quando o julgamento já estava a decorrer. Disse que no inicio o arguido negava ter alguma coisa a ver com os rapazes, que nunca lhes tinha feito mal, dizia que tinha a consciência tranquila de que nunca tinha feito nada a ninguém, referindo-se aos jovens e de que não tinha ofendido o Dr. C. No entanto, em momento posterior - que a testemunha não conseguiu localizar com precisão, mas que disse ter sido mais perto do final, já dizia que tinha ido a (…) e que tinha visto lá os carros, mas não lhe disse as pessoas. Esclareceu que o arguido não lhe deu qualquer justificação para primeiro ter dito uma coisa e depois ter dito outra, mas a testemunha também disse que a partir de certa altura já não falavam dessas coisas. Quanto à testemunha ZK, disse ao Tribunal ter ido ver o arguido à prisão, “achando” que foi entre Fevereiro e Março. Da primeira vez que o visitou tentou dar o seu apoio ao arguido, mas este só chorava. Da segunda vez disse ao arguido para dizer a verdade, o arguido continuava a chorar. A testemunha perguntou-lhe se conhecia H, e o arguido disse que não. A testemunha disse que não dava para perceber qual foi a reacção do arguido à sua pergunta, porque o arguido deu-lhe a resposta mas chorava muito Disse, ainda, que o arguido A telefonou-lhe “várias vezes”. Ao telefone pedia “ajuda-me” e chorava, a testemunha sempre lhe disse para dizer a verdade, mas a si nada contou. Quer de um depoimento, quer de outro, resulta para o Tribunal que o arguido A, pelo menos na altura em que estas testemunhas o foram visitar, também não assumia ter praticado estes factos, sendo que à testemunha NN, começou mesmo por dizer que tinha a consciência tranquila, que nada tinha feito aos rapazes. E o estado em que o arguido estava, que o arguido explicou ao Tribunal de “muita pressão”, em audiência de julgamento a testemunha ZK foi expressiva quanto ao que foi o choro do arguido quando o foi ver e aos pedidos de ajuda pelo telefone (tanto que a testemunha ficou preocupada que disse que, da primeira vez, até foi falar com o advogado de então do arguido) , disse mesmo que o arguido não falava só chorava, criaram, no Tribunal, a convicção de que o arguido estava, de facto, num estado de “ muita pressão” ou de depressão.. Pelo que, para o Tribunal, o arguido ao ter enviado ao arguido C a carta de fls. 20.195, não fez mais, em relação ao arguido C, do que fez também para si perante a testemunha NN. Negou expressamente qualquer envolvimento e responsabilidade nos factos. O que veio a alterar e a justificar, em relação a algumas situações - como é o caso concreto do conhecimento do envolvimento do arguido C com educandos da AX -, da forma que já dissemos. E que para o Tribunal, pelo que já acima dissemos, quanto à credibilidade e veracidade que mereceram ao Tribunal as declarações do arguido e a medida ou o sentido com que o mereceram, são declarações que avaliadas face a outros meios de prova, têm a capacidade e plausibilidade de corroborarem os depoimentos dos assistentes. Ou mesmo em situações que não os corroborem em toda a sua extensão, de lhes conferir credibilidade e, consequentemente, veracidade. 13.1.12. Prosseguindo e ainda quanto aos factos que o Tribunal deu como provados ou não provados, em relação ao ponto “4.1.1.” do despacho de pronúncia, dizemos o seguinte: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “101.”, “101.2”, “101.6” a “101.10” e aos que deu como não provados nos respectivos pontos “19.1” a 19.4”, a testemunha JZ (assistente social na AX desde Março de 1970 e que trabalhou nos SASA, que se situavam na (...) da AX ), disse que na altura da admissão dos alunos faziam um relatório no qual, para além da situação familiar do aluno, constavam os demais elementos relevantes para o acolhimento, como situações especificas de doença ou outras em relação às quais fosse necessária qualquer especial atenção. essa informação ficava nos (…) e qualquer pessoa que pudesse aceder ao processo tinha conhecimento dessa informação (embora tivesse admitido a existência de informação específica em algum sobrescrito fechado). Mas disse, também, que este processo não era o processo clínico do aluno e que esse não estava nos (…) na (...), não sabendo também o que se passava e onde ficava a informação, de qualquer doença que surgisse após o internamento. Não tem ideia que o arguido C alguma vez lhe tenha pedido qualquer processo, embora para o Tribunal, pela inerência das próprias funções, o (...), ou um (...) (...), se pretendesse ter acesso a um destes processos de alunos, dos que estavam no (…), podia ter. A testemunha HZ (reformada da função pública, trabalhou na AX durante 32 anos, na secretaria da (...) desde 1986), disse os “(...)es” ou os Directores podiam ver os processos dos alunos, pensa que “chamariam com certeza” a Chefe dos Serviços, mas não sabe se alguma vez isso aconteceu. Conhecia as salas na cave da (...), quem precisasse de ir às salas da cave da (...) ia buscar as chaves à telefonista, a testemunha chegou a ir aos arquivos na cave. EI (gerente comercial), declarou ao Tribunal ter trabalho com a AX, no âmbito do apoio informático que era dado pela empresa “Influxo”, tendo revelado conhecimento directo do sistema informático da instituição, sua organização e modo de funcionamento. No entanto esclareceu que não conhecia as bases de dados de alunos da instituição, não conhecia os conteúdos, não sendo o software da sua área. Declarou que conheceu o arguido C apenas na AX, teve uma relação de trabalho não diária mas frequente. Nas instâncias que lhe foram feitas descreveu o espaço físico das caves da (...), onde ficava a sala com o material informático (disse que era o seu “laboratório”, não tinha horas “para lá ir”, a chave da sala a que ia estava no departamento de informática ) e falou quanto ao conhecimento que entendia que o arguido C tinha do sistema informático da instituição. Disse que o arguido C “faria” a análise do que era programado, pois “que se lembre” nunca lhe pediu ajuda. “Pensa” que o arguido C, em relação ao sistema informático, podia ter acesso “ quando quisesse” e “como quisesse”, “devia ter acesso a “passwords” mas este não era o âmbito da sua intervenção, tendo disto tudo isto - assim o entendeu ao Tribunal -, devido aos conhecimentos e à responsabilidade do arguido na implementação do sistema informático da instituição. JJE (aposentada, foi oficial administrativa principal na AX – trabalhou na AX durante mais ou menos 35 anos) , esteve a trabalhar na secretaria de Alunos da (...), trabalhando com os processos individuais de alunos que aí existiam. Nesses processos existiam os dados pessoais, características dos alunos, informação escolar. No entanto disse que em relação à saúde dos alunos, apenas tinham o boletim de vacinas (mas tendo dito depois que iam para os (...)s) , grau de deficiência se existisse. Hepatites e outras doenças, começou por dizer que não estavam nestes processos. Acrescentou que podia haver informação (...) no processo individual, mas o processo clínico não estava ali. Quanto aos processos que existiam nos SASA, o acesso era apenas destes serviços e dos serviços sociais, os quais podiam levar os processos, deixando uma indicação de que o tinham feito. Disse que o arguido C nunca lhe pediu qualquer processo, nem ouviu referência de que o tivesse feito, embora quer o Sr. (...), quer o (...) (...) FB o tenham feito com “frequência”. Quanto aos “ficheiros informáticos” existentes, em relação aos alunos, foi a testemunha que inseriu os dados dos alunos. O arguido C tinha acesso a tais dados e quando a testemunha tinha dúvidas, pedia ajuda ao arguido. Disse que na fase em que foi feita a informatização (dos dados dos alunos) , era o arguido C que dava apoio. mas disse, em relação a esta informatização, não saber se foram inseridos dados clínicos ou psicológicos. Esclareceu, também, que depois de os alunos entrarem para a AX, os dados que iam dos (...)s para o (…) eram os elementos escolares, bem como a informação que os (...)s mandavam sobre o internamento dos alunos, que depois era reenviada para os Tribunais e vice versa. A testemunha OB, disse ao Tribunal ter sido o coordenador dos serviços para a saúde a partir de Julho de 2000. A informação (...) sobre os educando estava no gabinete do Dr. HY, havendo também um processo clínico na enfermaria. Era o Dr. FB que tinha contacto com a testemunha, para o tratamento de questões de natureza profissional, sendo que se o (...) (...) considerasse que o assunto não era consigo reencaminhava para o (...). Os resultados das análises e dados clínicos eram confidenciais, em Abril de 2001 a testemunha fez um trabalho de levantamento das doenças existentes no universo dos educando, numa reunião - em que pensa que estava presente o arguido C - foi indicado o resultado quantitativo desse estudo, mas não foram indicados nomes de alunos. YS (técnica superior na (...) da AX desde Maio de 1987), declarou ao Tribunal ter trabalhados nos serviços do (…), na (...) da AX, esclarecendo que o seu gabinete era no piso de cima da (...) e que o gabinete do arguido C era no piso de baixo. Falou quanto aos processos individuais - nos quais estavam as informações relativas à admissão dos jovens, ofícios do Tribunal e a parte da escola - existentes no (…), os quais disse que só as pessoas daquele serviço tinham acesso. O arguido C nunca lhe pediu qualquer processo e que se o arguido o tivesse pedido “teria estranhado” pois “não teria nada a ver com isso”. Quanto ao Dr. FB pedia-os poucas vezes. Disse que havia também um “processo social” do aluno, o qual é junto ao individual quando o aluno sai. No entanto no seu serviço não havia informação quanto aos processo (...)s ou psicológico. Disse também não ter conhecimento que tivesse sido utilizada uma ficha que havia no sistema informático para lançar estes dados. A testemunha RV, técnico de informática (...) na AX desde 1992, disse que desde Agosto ou Setembro de 2001 passou a trabalhar nas instalações da (...), no centro de informática, tendo trabalhado com a testemunha EF e conhecido, também pelo exercício das suas funções, o arguido C e a testemunha EI. Disse desconhecer se o arguido C tinha as chaves do centro de informática; tal como a testemunha EI também disse ao Tribunal, confirmou que a chave da sala que a informática tinha na cave - onde faziam a manutenção do hardware - estava numa gaveta no Centro de informática. A testemunha EF (funcionário público, a exercer funções na (...) da AX no Departamento de Organização Informática desde 05/02/1976), disse ao Tribunal ter sido aluno da AX, não se lembra do arguido C como aluno e veio a trabalhar com o arguido cerca de 15 anos. Na sua avaliação o arguido C não tinha “muitos conhecimentos” de informática, mas sabia como analista de sistemas e o “resto” era com a testemunha (acrescentou que “pensa” que o arguido C sabia bem do “circuito das coisas”). Disse que era o arguido C que tinha a responsabilidade pela base de dados, incluindo quando havia necessidade de alterações das bases de dados. Falou sobre as redes existentes na AX na altura em que o arguido C lá estava, esclarecendo quais as suas responsabilidades e as do arguido C na gestão dessas redes (mas explicou que era o arguido C que dizia a que utilizadores eram afectos determinados módulos). Disse, também, que na base de dados dos alunos estava previsto o registo dos dados biográficos dos alunos, a sua história, progresso escolar, mas não existiam dados (...)s ou psicológicos; explicou que os serviços do (…) lançavam os dados biográficos dos alunos e depois eram complementados no (...)s. Confirmou a existência de uma sala com material informático na cave (descendo as escadas era a porta em frente; descreveu a sala como com pouco espaço útil, espaço reduzido, portas com vidro, “antes” não tinha nada a proteger o vido, via-se de fora para dentro; esta sala ficava na cave para onde passou o refeitório, mas não se consegue recordar quando é que isto sucedeu), iam lá buscar consumíveis (mas não ia lá muito), confirmou que a chave estava no gabinete de informática (numa gaveta não fechada), mas desconhece se o arguido C lá ia sozinho ou não (embora tenha ido com a testemunha). Nunca viu alunos no gabinete do arguido C, a não ser a sua filha. E esclareceu - a perguntas que lhe foram feitas sobre o código do alarme da (...) - que nunca viu informação nos computadores sobre código de alarme distribuído a várias pessoas (pergunta esta relacionada com o documento de fls. 4.660 a 4.680, documentos com os quais foi confrontado, tendo esclarecido que nunca entregou este código ao arguido C, directa ou indirectamente). Começando pelos conhecimentos informáticos do arguido C - que a testemunha EF disse “não serem muitos” -, o Tribunal teve em conta para a sua avaliação as próprias declarações do arguido C, quando falou ao Tribunal sobre o seu percurso dentro da AX. Tendo dito que a partir de 1984 - quando ingressou na carreira técnica superior -, manteve as suas funções na área do património, mas começou a desempenhar funções na área do “pessoal” e da “contabilidade” – a expressão que usou foi que “ ... a partir de 84, quando ingressei na carreira técnica superior.., mantendo no património, comecei a ser chamado para diversas actividades no âmbito do pessoal e no âmbito da contabilidade ...” - e em 1986 passa a exercer, também, funções na área da informática. Neste campo foi igualmente relevante para o Tribunal o que resulta do teor dos documentos do Apenso AI-1, fls. 542 a 544, 566 a 567, de fls. 568 (registo da “ Formação Profissional Complementar” do arguido C na AX, de onde consta o “curso de introdução à informática”, “Recrutamento e selecção de Pessoal”, “Organização estrutural”, “Curso de Sistema operativo MS/DOS”, “ Curso de Segurança de Sistemas Informáticos”, e “participação no Seminário Os Media e a Escola”), de fls. 577 a 582 e 583 a 589, de fls. 590 a 592 (Requerimento do arguido C, datado de 9/02/93, na qualidade de Técnico Superior Principal mas nomeado em comissão de serviço no cargo de Director dos Serviços Administrativos, Dirigido ao (...) da AX, requerendo que lhe fosse atribuída uma gratificação mensal pelas funções que desempenhava acessoriamente na área informática, as quais descreve no requerimento e nomeando, entre o mais, que: (i) cabia-lhe … desde sempre (…) a administração das bases de dados, para além da concepção e modo das aplicações, (…) a concepção de todos os programas de gestão, (…) assegurar a coerência e integridade dos dados, definir acessos e modos de funcionamento, executar todas as alterações que devam ser efectuadas directamente sobre as bases de dados (…); (ii) que assegurava integralmente as funções das categorias que enuncia no requerimento, o que até aquela altura fazia com “…alguma facilidade…, uma vez que todo o sistema e estrutura das bases de dados está praticamente desenvolvido sobre as suas directivas específicas…”), de fls. 593 a 599 (elementos relativos à frequência nos cursos de informática e segurança de Sistemas). Assim, mesmo que não fossem conhecimentos que tivessem a abrangência dos que tinha a testemunha EF, para o Tribunal os mesmos eram os necessários e suficientes para ter acesso ao sistema informático da AX, bases de dados, concretamente as bases de dados onde foram inseridos os dados a que se referiu a testemunha JJE. E tanto assim era que a testemunha se tivesse alguma dúvida era ao arguido C que pedia ajuda. Não era a um dos técnicos, na área da informática e que existiam na (...), como vimos pelos depoimentos das testemunhas que acabámos de mencionar. Na sequência do que antecede, o arguido não precisava de consultar os processos em suporte papel - aqueles que as testemunhas YS, HZ ou JZ referiram -, pois tinha acesso a dados informatizados. Mas mesmo que quisesse ter acesso a tais processos, ou porque os dados dos alunos não estivessem informatizados ou por outra razão qualquer, do depoimentos das testemunha ouvidas em Tribunal, entre as quais os Tribunal destacou as que antecedem, não resulta para o Tribunal facto que exclua tal possibilidade. Tendo o Tribunal concluído que o arguido tinha acesso aos dados dos alunos, nos termos que antecedem - pois já quanto aos dados clínicos, para além do que resultou destes depoimentos, o Tribunal não pôde concluir, com a necessária segurança, que o arguido tinha “fácil” acesso a tais dados, tal como o configurava o despacho de pronúncia, pois os depoimentos das testemunhas não permitem concluir relação próximo de acesso, ou por via informática ou por outro meio aos dados clínicos; e daí o que deu como não provado no respectivo ponto “1.”, dos factos não provados -, não temos, contudo, prova directa de que o arguido consultou esses dados. No entanto, é inerente e subjacente ao internamento dos jovens na AX, situações de maltrato, abandono, negligência, com a consequente carência afectiva e ausência de figuras familiares que suportem os educandos. Pelo que, pela natureza das coisas, pelas regras da experiência comum, tendo o arguido acesso a dados relativos à história de vida dos educandos internos, estando em causa a prática dos actos de natureza sexual que o assistente AP relatou - que o arguido A, embora da forma que o fez, confirmou ao Tribunal que AP relatou-lhe tal acontecimento antes deste processo ter sido conhecido - e que o Tribunal concluiu terem ocorrido, concluímos também, com a necessária segurança, que o arguido C teve conhecimento das circunstâncias de vida do assistente. Quanto ao local onde os factos ocorreram, o Tribunal não ficou convicto que fosse um local onde “praticamente ninguém ia”. No entanto, pelo depoimento das testemunhas que ouvimos e enunciamos, era um local onde iam “poucas” pessoas. Isto é, na altura em que o Tribunal deu como provado terem ocorrido os factos, ainda não estava instalado o refeitório nas caves da (...). Pelos depoimentos das testemunhas resulta que o hall para onde dão as portas, das salas da cave da (...), não era um local de passagem. Mas era um local onde iam as pessoas da informática, onde iam as pessoas ao arquivo ou buscar alguma coisa que estivesse armazenada. A percepção que o Tribunal teve é que era um local frequentado por poucas pessoas e quando era frequentado era do horário de funcionamento da (...). E pelo que foi o depoimento das testemunhas ouvidas e refridas, os funcionários, em regra, não ficavam para além das 18 horas (e lembramos aqui, no que diz respeito à utilização do sistema informático, o que disse a testemunha EF quando falou sobre as redes existentes na AX na altura em que o arguido C lá estava, esclarecendo quais as suas responsabilidades e as do arguido C na gestão dessas redes, mas tendo explicado que era o arguido C que dizia a que utilizadores eram afectos determinados módulos; e disse, também, que entre as 18.30h e as 8h do dia seguinte, bem como ao fim de semana, o sistema ficava em “mono(...)”, sendo difícil de aceder ao sistema, pois o acesso ficava limitado, tendo sido o arguido C que pediu este sistema de limitação de acesso durante este período). Quanto à sala em si onde ocorreram os factos, era uma sala que habitualmente encontrava-se fechada, pois as testemunhas disseram que para irem à sala da informática, era necessário levar a chave e não era uma sala que ficasse aberta. Quanto aos factos dados especificamente como provados pelo Tribunal nos pontos “101.6” a “101.10.” dos factos provados, o Tribunal deu como provado que os factos foram praticados na pessoa de AP, praticados dentro das instalações da AX e AP era educando interno da AX. No caso concreto não resulta que AP tivesse um especial conhecimento ou contacto com o arguido C. Mas passando-se os actos na AX, estando o educando perante alguém que era funcionário na (...) - e convocamos o que no inicio dissemos quanto ao AP, o que resultou das suas declarações como à forma como se sentia na (...), “todos” gostavam dele -, esta situação tinha, atenta a normalidade das coisas, face até à idade do assistente, a potencialidade de causar temor reverencial no educando da AX. E isto, também, porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas frágeis para reagir ou agir em relação ao arguido. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - o assistente, em função e por causa de ser um funcionário da AX, o considerasse uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, que se estabelecesse no educando um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensar que poderia reagir contra o arguido. Não é que tal reacção tivesse, no caso concreto, até atenta a idade do assistente, à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância como expressão do que foi a situação, de facto, por parte do assistente. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - na situação expressamente descrita nos “factos provados” - , que para o assistente o arguido C inspirava autoridade, dever de obediência, temor reverencial, criando uma relação de dependência e limitativa da liberdade de agir do educando. Situação que o arguido, pessoa adulta, quis aproveitar-se. 13.1.13. (Dos factos numa (...) no (…)) (Assistente AP - factos descritos no ponto 5.2.2. do despacho de Pronúncia); (1) (Assistente AP - factos descritos no ponto 5.2.2. do despacho de Pronúncia); Na audiência de julgamento de 24/06/05 AP relata a ida com AT a uma casa do (…), onde disse ao Tribunal terem ocorrido actos de abuso por parte do arguido K, quer a si quer ao AT. E é aqui (cfr. AJ 24/06/05) e na sequência de ter relatado factos que se passaram consigo no (...) do arguido K (e da forma que antecede), que diz “ ….voltei a encontrar o Sr. K na sua casa …”, no “(…)”, onde levou o AT e onde ele AP também foi. Logo, dando esta sequência - como a dinâmica que a sua memória aparenta recordar - os factos a que diz respeito o ponto “ 5.2.2.” dos Despacho de Pronuncia, pela avaliação que o Tribunal faz, não se podem situar na data que o Despacho de pronúncia refere (meados de 1998; cfr. data de entrada de AT para a AX, sendo das declarações do assistente não é possível extrair o sentido que os factos ocorreram, em momento anterior à entrada de AT para o internato de CZ). Acresce, também, que para o Tribunal não resulta suficientemente claro, da análise que fazemos do discurso do assistente, que tenha sido naquela data. Vejamos então. Convocamos o que atrás já dissemos - quanto a esta ida a uma (...) no (…) -, quando falámos no episódio do (…). Quando AP explicava ao Tribunal o “motivo” e “como” conhecia o local do (...) do arguido K, fez referência à altura em que estudava em DT, o caminho para o (...) e dizendo que, na altura “… eu estudei, como já disse à Srª Drª Juíza, dos sete anos até nove …se não estou em erro, no (...) DT…e muitas das vezes vinha acompanhado por mais elementos do meu, do meu lar e do CZ … e fazíamos o trajecto passando pelo (…). Tem a esquadra, subíamos, íamos por essa (...), sempre em frente, onde passávamos pelo (...) do Sr. K que, na altura, tinha uma viatura, um (…) vermelho, descapotável….”. Acrescentando (quando o Tribunal lhe perguntou “…E então o Sr. A disse-lhe para ir a esse (...)?) “… a partir daí, o Sr. A disse que era para eu ir ao (...) do Sr. K … onde eu já sabia o nome do mesmo, visto que na altura em que ele tinha lá o (…) e que se estava aberto, um colega meu foi mexer no carro e o alarme disparou….onde o Sr. K apareceu e questionou esse meu amigo … ou irmão do lar, se este não queria dar uma volta com ele no (…)….onde ele disse que não, que ia bem a pé….(…)”. Estas declarações foram prestadas antes de o arguido K, por sua vez, também ter prestado declarações. E quando as prestou (cfr. AJ 24/06/08), confirmou ao Tribunal ter tido um (…), que diz ter vendido cerca de dois meses depois de ter tido o (…). O (…), pelos elementos que entretanto juntou aos autos e pela prova testemunha que foi produzida quer pela testemunha MH, quer pela Testemunha CY (cfr., tb. os documentos de fls. 47.878, Declaração da GGA a indicar a data da compra e reparação da viatura (…); fls. 52.738 a 52.768, Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a veículo (…),(…)), só a partir de Julho de 1999 esteve na posse do arguido K. Assim, o (…) terá sido vendido entre Julho/Outubro 99. Com então dissemos, este pormenor da narração do episódio com o (…) por parte do AP, teve relevância para a avaliação das declarações de AP quanto à ida “à casa do (…)” com o AT. Quando AP fez esse relato, da ida à casa do (…), disse ter visto o (…) do arguido na casa do (…). Tendo o arguido K recebido o (…) apenas em Julho de 1999, este pormenor tem que levar, numa primeira análise, à colocação dos factos na casa do (…) em 1999, depois do AT ter entrado para a AX. E dizemos “numa primeira análise” porque o tribunal, face à forma como AP demonstrou conseguir captar e conservar os factos, não ficou convencido que AP “viu” mesmo o carro na casa do (…), mas era uma altura em que já associava o carro ao arguido, pois com AP não vemos que haja qualquer hipótese de ter confundido um (…) com o (…). Isto porque foi espontâneo a contar ao episódio do (…). Na AJ de 30/06/05 fala dos (…), dizendo os carros que conheceu como pertencentes ao arguido K e relata também um episódio em que o educador EN convidou CY, ex-aluno da AX - numa altura em que, como resulta das declarações prestadas pela testemunha CY e pelo arguido K, CY estava a viver em casa do arguido -, para ir à festa de Natal dos lares. E neste relato diz que, antes do (…), lembrava-se de ver , como pertencente ao arguido K, um (…) vermelho, “…vindo a ter depois um (…) ou (…) (…) só vindo a ter mais tarde o (…)…” e lembrando-se de ver também guiados por CY uma “ MOTO 4” e uma “DT”. Aqui há um aspecto a ressaltar, para a sequência com que AP “conta” a memória dos carros que o arguido teve: o doc. de fls. 53.737, é referente à reparação de um (…), factura de 23/12/97, logo antes do (…); e o (…), que AP podia fazer alguma confusão quanto à sequência com que se recordava dos carros, não faz, pois a fls. 52.770 temos o contrato de compra e venda a prestações do veículo, datado de 5/7/02, documento que foi junto pelo arguido, não foi impugnado nem (...) em causa quanto à sua fidedignidade pelos sujeitos processuais, tendo merecido credibilidade ao Tribunal, inexistindo indício que leve em sentido contrário . Também, ainda, quanto à coerência intrínseca de aspectos do relato de AP – e ainda relacionado com aquele episódio que relatou, da ida do (…) ao Lar -, a anotação que se encontra no Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, Apenso W11, Livro 2, Fls. 67, anotação de 3/12/99, Sexta feira: “... como apaixonado dos automóveis hoje realizei um sonho... guiei um (…), esteve cá o CY....” anotação esta assinada (EM). Aqui emerge, mais uma vez, o padrão que para o Tribunal foi coerente ao longo do depoimento de AP. Consegue associar de forma certa (para o Tribunal) o facto: quando vai à Casa do (…) com AT, já havia (…). Mas, quando lhe é pedido, não consegue associar o facto à data certa. E erra quanto à data que diz ao Tribunal em que os factos se passaram pois, como vimos, não “havia” (…)na altura em que localiza o facto no tempo. Assim, a ida à casa do (…)com o AT, de acordo com a prova produzida nesta audiência de julgamento, não foi na sequência com que acima começou por dizer, mas foi quando AT estava na AX (sendo que AT entrou para a AX, para o Lar FC, onde estava AP , em 28/10/99, cfr. Apenso W11, Livro 2 , fls. 34; e, repetimos, AP não faz confusão entre (…) e (…)). (1.1) Quanto a esta ida à (...) do (…), disse que “ foi mais uma vez” a essa (...), a pedido do arguido A, mas apenas para encaminhar o AT, por este já não se reordar do caminho. Confirmou, a pedido de esclarecimento do tribunal, que esta vez em que levou o AT foi antes dos factos de (…) (cfr audiência de julgamento 24/06/05), enxertando aqui, nesta audiência, o relato da ida à (...) com o arguido C, que acima já analisámos. E na audiência de julgamento de 22/07/05, a instância da defesa do arguido K, disse que foi três vezes à (...), uma das quais apenas para indicar o caminho a AT e que com o AT só tinha entrado duas vezes na (...). Na audiência de julgamento de 22/07/05, o assistente disse que nem sequer foi fazer o reconhecimento da (...), pois na altura em que falou com os inspectores da PJ não conseguia identificar onde ficava a habitação. Que se recorde nem nunca foram à procura da (...), pois não se recordava e manteve que não se recordava de nenhum trajecto para a (...). A Defesa do arguido K pede-lhe para dar uma imagem da (...) e só consegue dizer que tem cor amarela e fica no (…), uma sala com uma mesa enorme, esteve na sala e foi para um quarto, “do CY” ou do arguido K e sabe que viu o (…) na garagem. Nesta mesma audiência (cfr. audiência de julgamento 22/07/05), explicou o reconhecimento que fez do prédio onde morava o arguido K (cfr. fls. 12.440) e explica como soube que aquele era o prédio onde morava o arguido. E perguntado se a esse prédio foi o Assistente que levou a polícia ou se foram os Inspectores que lhe mostraram o prédio, respondeu que a este prédio foram os Inspectores da PJ que o levaram, para ver se reconhecia o prédio. No entanto, quando o Tribunal se deslocou ao local identificado no ponto “5.2.2.” do Despacho de pronúncia, diligência em que o assistente esteve presente, pois conduzido para o local, reconheceu sem qualquer dúvida a casa que o Tribunal estava a inspeccionar, como a (...) onde tinha estado com o arguido K. Mas o Tribunal, face também ao que foram as declarações que AT nessa diligência, não ficou com certeza que a casa fosse aquela. Em relação às declarações de AT, já as iremos analisar. Quanto ao descrédito que emerge para AP - do que disse numa altura ao Tribunal e do que afirmou em momento posterior no local, quanto à identificação deste local e dos factos passados “numa casa” no (…) -, entendemos que esse descrédito tem que resultar, em primeira linha, da análise da espinha dorsal das suas declarações. Sendo que os aspectos circunstanciais ou os episódios colaterais, têm que ser visto à luz dessa espinha dorsal. Não desvalorizando-o, mas visto face à estrutura do depoimento do abuso em si. E, no caso concreto, os factos descritos no ponto “5.2.2.” do despacho de Pronúncia , não aparentavam referir-se à narração que AP fez da ida com o AT. Podem ser uns factos que o assistente referiu, numa vez em que disse não ter ido com o AT. Mas nessa situação deu a entender ter ido sozinho e durante a audiência não disse ao Tribunal ter ido a este local “(...)”, com outro jovem, para além de AT. Os factos descritos no despacho de Pronúncia, no ponto “5.2.2.”, podem dizer respeito a uma “história de vida”, mas a uma história de vida que, para o Tribunal, não foi suficientemente assente ser aquela que AP relatou ao Tribunal e a que estivemos a investigar em audiência. E o arguido A, quando admitiu ao Tribunal ter dado “boleia” ao AP para uma casa do arguido K, no (…), só falou da “boleia” com AT. Estava AP a mentir quanto a este episódio que relatou? Mas qual o sentido e utilidade desta mentira, no meio do relato que, pelo que temos vindo a apontar, temos considerado verídico? Estava a inventar e a preencher, por não conseguir ter memória e não querer que pensem que estava a mentir? Não foi de “mentira” a percepção do Tribunal. Mas fica apontada a discrepância. E foi, face ao que antecede, a razão pela qual o Tribunal - justificação que agora pode e deve dar - , não ter feito qualquer comunicação nos termos do artº 358º, do C.P.penal, em relação a estes factos. E também, face ao que antecede, o Tribunal ter considerado que a Acusação, em relação a estes factos, não produziu prova suficiente, para além de qualquer dúvida razoável, pelo que o Tribunal deu tais factos como para não provados (cfr. pontos “31.” a “31.11” dos factos não provados). (2) (Assistente AT - factos descritos no ponto 4.4.1. do Despacho de pronúncia); Entrecruzando, agora, com os actos a que se refere o ponto “4.4.1”, do despacho de pronúncia, AT disse ao Tribunal que “...depois de um tempo de ir às (…) ... eu e um colega meu, o AP ... faltámos às aulas da parte da tarde e fui com o AP ao (…)…(...) entretanto o AP disse para ir a casa de um amigo dele… a gente foi, um senhor abriu-nos a porta, eu e o AP entrámos. Depois o AP foi-se embora… foi quando eu vi pela primeira vez o Sr. K....”. Disse que nessa casa houve sexo oral, sexo anal. O AP foi-se embora, não se recorda do que foi dito, “...mas que houve… entre actos, sexo oral, sexo anal (...)... o Sr. K a mim (...)...introduziu o pénis na boca, o pénis no ânus... e de seguida fui-me embora....”, tendo ido para o (...) a pé. Esclareceu, nas instâncias que lhe foram feitas, que o arguido introduziu o pénis na boca e no ânus de AT, “... a parte que ficou nu foi as calças, o resto fiquei de T-shirt...”. O arguido também tirou as calças, rectificando “.. .refiro-me baixou as calças…o que aconteceu foi de pé…apoiados num sofá…”. Neste momento o Ministério Público pergunta que há pouco não se recordava de mobiliário e o assistente responde “ …há pouco respondi que não me lembrava muito bem…referi-me agora ao sofá porque foi onde me apoiei…não se recorda de mais…”. Quando fazia esta descrição, a forma, a entoação, a pausa que fez quando disse “de pé…sim de pé,…”, deram-nos a ideia de que se está a lembrar, pois o mais natural, se um discurso preparado, uma situação criada, era ter a história completa, podendo ser básica mas de resposta pronta. Não falou depois com o AP sobre o que se tinha passado…teve vergonha….Que se recorde não recebeu nada desta vez. Para o Tribunal AT relatou com dificuldade os actos de abuso. Por exemplo e quando relatou os primeiros factos, aqueles ocorridos com o arguido A, foi notória a dificuldade com que utilizou a palavra “broche” para descrever os actos ocorridos, ou concretizar que parte do corpo tocou em quem. Podia ser vergonha ou podia ser por estar a inventar que tinha aquele registo de narração. Mas neste momento, em que estava a descrever os actos ocorridos naquela casa do (…), volta a ser perceptível dificuldade em relatar os actos em si. E volta, nesta situação, a dar um registo que já dera anteriormente: vai a um sítio porque AP lhe diz para ir (cfr. Aj 25/01/05, (...) Juíza Presidente – O senhor lembra-se de ter perguntado alguma coisa? Quem era esse amigo? AT – Não. Fui atrás do AP ...”, sendo que em relação à situação que descreveu do prédio das (…) tem o mesmo registo). Mas aqui e quanto à questão do sentido da forma como estava a prestar o seu depoimento, introduzimos o testemunho da Dra. BN, Técnica Superior e Directora do (...) FA da AX, desde o ano de 1999. Resulta de fls. 943/4, que em 31/01/03, por Despacho do JIC AT foi então declarado testemunha especialmente vulnerável e determinada a sua colocação no JJF, por 15 dias eventualmente prorrogável, sendo acompanhado pelo Dr. BL (AT também falou sobre este facto). Quando saiu deste Centro foi a testemunha Dra. BN que o recebeu na AX. Disse que recebeu este jovem em 20003 (embora a sua memória fosse Janeiro) e o seu depoimento foi impressivo: não teve conversas com ele sobre os factos, ele vinha “muito doente” disse que o AT só chorava, era um miúdo muito doente, o seu objectivo foi “só conseguir que ele dormisse de noite, comesse” e fosse às aulas. Este depoimento foi, para o Tribunal, expressão do sofrimento que o AT sentia em (para o Tribunal, dada a altura em que AT foi para o (...) IIT) Fevereiro de 2003 e este sofrimento tem sentido, e ressonância, com alguém que está mal, pelo processo que estava a passar. Porque se o sofrimento fosse por escrúpulos de estar a mentir, o mais plausível era revelar essa mentira em algum momento e não resistia, na avaliação do Tribunal, ao fogo cruzado do contraditório. Continuando, AT explicou quando é que soube que aquela pessoa se chamava K, dizendo que “....soube que esta pessoa se chamava K…numas das voltas à noite, com o AP que a gente passávamos por volta, dos (…) e o AP indicou como o (...)....depois voltámos a falar nisso, mas coisa de dois minutos…”. Esta ida foi um tempo depois de ter ido à (...) do (…), cerca de três semanas, mas não tendo a certeza e acrescentou que AP “... referiu-se ao Sr. K como sendo o (...) daquele (...), depois disse-me que tinha, quem tinha sido, quem eu tinha visto na (...) do (…)....”. E por ter relatado esta conversa, a Defesa do arguido K confrontou o assistente com as fotografias de fls. 2287, tapando legenda (fotografias com a fachada do “actual” e do antigo (...) do arguido K, aquele para onde se mudou em Setembro de 2001, como já vimos, sito no nº (…) a (…), da (...) (…)) e não identificou nessa fotografia a casa retratada como o (...) que o AP lhe mostrou. Foi-lhe pedida a descrição do (...) que AP lhe tinha mostrado e a descrição que deu corresponde ao “(...) antigo”, de onde o arguido se mudou em Setembro de 2001, sito na (...) (…), mas no (…) andar do nº (…), dessa (...) (cfr. documento de fls. 52.615). Para o tribunal, se este episódio relatado pelo AT não tivesse ocorrido na altura em que o assistente o disse – no ano de 2000, aproximadamente Abril, pelas declarações do Assistente, mas seguramente antes dos factos deste processo serem conhecidos -, não era provável que o assistente respondesse como fez: não identificou o (...) “novo” pela fotografia que lhe foi exibida e que era aquele que, à data em que os factos deste processo vieram para a comunicação social, era conhecido como o (...) do arguido. E deu uma descrição que, como dissemos, para o Tribunal coincide com o (...) “antigo”, o do nº (…). É certo que também não reconheceu o antigo na fotografia, mas também a testemunha LE (apresentada pelo arguido K) - e que disse ao Tribunal ter sido proprietário de um restaurante e pastelaria “(…)”, o (...) do arguido fazia “traseiras” com o seu restaurante, para ir para o (...) do arguido K, era subir pela (...) do seu Restaurante “(…)”, subir e contornar (porque a (...) só tinha um sentido) e a saída era pela (...) do (...) do arguido K (que vinha dar de novo à (...) (…), como dissemos; cfr. croqui ou planta de fls. 52.631) -, que disse conhecer quer o arguido A, quer o arguido K, até pela frequência do seu restaurante/pastelaria, quando lhe foi exibida a fotografia da (...), com a fachada dos (...)s, não conseguiu reconhecer a (...). O que tem uma explicação para o Tribunal e que se aplica a AT. A (...), antes de ter construído o (...) “novo” construído, o com o nº de porta (…), da (...) (…), tinha duas casas baixas nesse sítio. As quais foram demolidas e construída a (...) (cfr. fls. 43.740, 43,741, 43.739). Isto ocorreu, início da demolição, obra e abertura de novo (...), face à prova produzida em audiência de julgamento, após 13/03/2000 (cfr. especificamente fls. 43.704/5) e Setembro de 2001 e a (...), as fachadas, ficaram com um aspecto diferente (cfr., por exemplo, Fls. 43.521 a 43.791 – Documentos remetidos pela FFX relativamente ao Processo de Obras na (...) (…) nº (…),(…), em (…); Fls. 43.960 a 43.997 – Documentos remetidos pela DI, envio de projecto de arquitectura do Edifício da (...) (…), nº (…),(…), em (…); Fls. 52.633/8: Documento emitido por GGT, em nome de (...) Dr. K, e apostas as datas de 6/03/01, 13/03/01, 26/03/01; Fls. 52.639/0: Documento emitido por GGU, em nome da GGV, datado de 23/04/01, referente a instalação eléctrica na (...) (…) nº (…),(…) em (…); Fls. 52.641: Documento da EDP, referente a contrato de fornecimento para K, (...) (…) nº (…),(…), com data 01/05/07; Fls. 52.642 a 52.706, 52.711 a 52.716: Documentos de fornecimentos de serviços, materiais, bens para (...) K, entre Abril de 2001 e Novembro de 2001; Fls. 52.707 a 52.710: Documento GGW, datado de 14/02/02 e 15/02/02, referente às moradas R. (…), Lote (…), Edif. (…),(…), em nome de K e (...) (…) nº (…), em (…); e depoimentos das testemunhas YG, SV, LH ) Daí a plausibilidade da não identificação mesmo do (...) antigo, quer pela testemunha, quer pelo AT. O que não afecta a credibilidade e veracidade das declarações de AT. Era necessária uma capacidade intelectual que não reconhecemos ao assistente – tendo em atenção o que foi o ser percurso de vida e o que resulta perícia do Apenso Z-11 -, para raciocinar e ter a esperteza e presença de espírito para, na altura em que lhe estava a ser exibida a fotografia do (...) “novo”, lembra-se que tinha que indicar o “antigo”, pois em 2000 o arguido estava nesse local, e o assistente localizou o abuso nesse ano. Isto foi, para o Tribunal, um sinal de credibilidade e de veracidade do que estava a dizer ao Tribunal. A memória que revelou quanto à conversa com AP sobre o (...) e o arguido K, era uma memória da época em que o facto se passou. O que também concorreu para a credibilidade e veracidade do seu relato do abuso. (i) Mas quanto à descrição da casa AT disse que era uma (...), não é um edifício de andares, a casa era cor de rosa por fora, assim um bocado escuro, “…resto, referências não me recordo…”, a casa não dava logo para a (...), tinha um portão pequeno, “…transpondo esse portão a havia um género de um pátio e a gente dirigia-se à casa…”, se havia quintal ou flores não se recorda. A (...) tinha dois pisos “…a sala onde foi era no R/C…logo que se abria a porta deparava-se com hall e via umas escadas…para ir para a sala tinha que se passar por uma porta e estava-se na sala…tinha mobiliário mas a descrição do mobiliário não me recordo…”. Já tinha passado por essa (...) …era um atalho para ir para a escola do (…), (secundária…fica quando se sobe a (...) (…), fica do lado direito, chegando cá acima, quase ao pé do hospital HA mas do outro lado…). Acha que foi a pé, não tem a certeza “… porque a gente íamos quase todos os dias à escola do (…), umas vezes íamos de autocarro outras a pé…o (…) passava nas imediações da casa o (…) ia por fora…imediações tipo perto, não passava em frente à casa, quando passava no (…) não via a casa…o terminal do (…) era perto da casa e depois tínhamos que andar cerca de 100, 150, 200 metros…”. Desta descrição, mas essencialmente da forma como a ia fazendo, em audiência de julgamento ficámos com a percepção de que descrevia um espaço que conhecia. A fls.605 encontra-se o auto de reconhecimento da “casa (…)”. O assistente disse que acha que partiu da PJ para fazer esse reconhecimento, pensa que foi com o Inspector CF, “não tenho a certeza, e lembro-me que quando chegamos ali perto da escola do (…), quem começou a dar indicações fui eu…lembro-me termos chegado à escola do (…) e ficarmos do outro lado, onde a Escola do (…) tem paragens à frente mesmo à saída do portão e depois tem uma outra paragem do outro lado. Recordo-me perto dessa paragem ter dito ao Inspector, que eu não recordo quem era, ter virado aí e depois seguimos um bocado em frente, lembro-me de ter dado uma curva ou duas.”. “…Foi à segunda tentativa que conseguiu localizar a (...), a gente teve cerca de uma hora no (…)…se bem me lembro hesitei um bocado …”. (ii) O Tribunal deslocou-se à (...) (…) nº (…), no (…). Fez esta diligência com a presença dos assistentes AP e AT. Em relação a esta diligência e para assegurar que durante o percurso para a diligência e na diligência os Assistentes não se viam um ao outro, o Tribunal determinou que os assistentes fossem transportados em separado para o local, pela autoridade policial que fazia a respectiva segurança, sendo que primeiro o Tribunal ouviu e fez deslocar ao interior da moradia o assistente AP e depois deste sair do local o Tribunal ouviu e fez deslocar ao interior da moradia o assistente AT. Quer um , quer outro, na audiência de julgamento começaram por identificar o exterior de tal moradia como sendo aquela em que ocorreram os abusos que descreveram por parte do arguido K na pessoa de AT. Mas tiveram versões divergentes quanto ao portão por onde entraram, AP disse que foi pelo portão que se situa na (...) (…) e tem a(...) o nº (…) e o AT no portão que se situa na (...) (…) e que tem a(...) o nº nº (…). Os assistentes entraram na moradia em causa – embora em separado, como acima referi – e AP após transpor a porta de entrada apontou uma área à direita, dizendo que ali era uma sala. Quando o Tribunal lhe perguntou se o aspecto da sala e a configuração era tal como estava a ver, declarou não conseguir dizer se o aspecto era assim, declarando não se recordar de mais. A percepção que tivemos é que, aqui, AP disse que era aquela moradia, mas não sabia realmente se era aquela ou não, Mentiu deliberadamente? Ou tomou por certo que se foi levado pelo Tribunal era porque devia estar certo e assim confirmou? Não sabemos, mas, no caso concreto e pelo que já dissemos quanto ao que AP dizia recordar ter visto na “garagem”, o (…), estava baralhado. Quanto a AT, após transpor a porta de entrada, foi dizendo que entrou ali e dirigiu-se para o lado direito, que era uma sala. Mas uma sala que tinha uma porta. A área apontada pelo Assistente, tal como o Tribunal pôde observar e se pode ver na gravação em vídeo da diligência, tinha acesso aberto sem qualquer porta. A pedido de esclarecimento do Tribunal, quanto à configuração do local, o assistente acrescentou “…mas isto está totalmente diferente…”. E esclarecendo quanto à configuração da escada que existe na entrada da casa e que dá acesso a um andar superior – tendo o Tribunal presente a descrição e desenho do interior da casa que o assistente AT já fizera em audiência de julgamento, em que referiu e desenhou umas escadas. AT, posicionando-se num local próximo da escada que existia dentro da casa que o Tribunal estava a inspeccionar, no lado esquerdo de quem transpõe a porta de entrada, disse “… a escada…não era bem assim…mais direita…não havia esta curva…”. Também quanto ao conjunto de quatro fiadas de “janelas estreitas em vidro”, que na vertical existem na zona da escada, separadas entre si por uma pequena área de alvenaria, esclareceu que não era assim, dizendo que era uma janela completa com três faixas, havia três vidros pegados, não havia a separação em alvenaria. Passando para o exterior da moradia, disse que as janelas que referiu eram diferentes daquelas, repetindo que era uma janela completa, com as já referidas três faixas (de vidro) e tinha três fileiras de pedra por fora. Insistia que não era assim configuração daquelas “janelas”, insistiu e insistiu. Andou à volta da casa e na moradia não encontrou as janelas iguais às que disse que a moradia onde esteve com o arguido K tinha. Assim, embora tenha começado por dizer que a casa era aquela quando o Tribunal ali se dirigiu, insistia nas diferenças que referimos. Para o Tribunal esta contradição entre a afirmação que faz e as diferenças que teima existirem, tem um sentido, face ao que foi a avaliação global das declarações do assistente e ao reconhecimento de fls. 605. O local, a zona de moradias em que a inspeccionada pelo Tribunal se encontra, é um bairro com moradias muito idênticas quanto à sua arquitectura. A teimosia de AT que as “janelas das escadas” eram diferentes e as apontadas diferenças no interior, fizeram o Tribunal ter dúvidas quanto ao local ser aquele. E era mais “fácil” para o assistente – pelo menos esse é o sentido do tribunal -, no “aparato” em que a diligência de deslocação inevitavelmente se tornou, face ao número de pessoas necessariamente presentes, naquele momento aderir a que a casa era sem sombra de dúvida aquela. E da prova produzida em audiência de julgamento - cfr, por exemplo, os depoimentos das testemunhas DJ (cfr. também os documentos juntos a fls. 48.73 dos autos), AAX, não resultou para o Tribunal prova suficiente de que a moradia em que ocorreram os actos foi a morada identificada no Despacho de pronúncia, o nº (…) da (...) (…). Mas, para o Tribunal, da conjugação do que foram as declarações de AT e AP quanto ao local, do que foram as declarações do arguido A e que atrás já referimos, quando disse (a pergunta do Tribunal, se em relação ao arguido K, se se lembrava de alguma situação em tivesse estado ou visto este arguido e relacionado com alunos da AX), “…eu levei lá…”, mas corrige imediatamente “…nunca levei lá nenhum, portanto, dei boleia a dois rapazes, ao AP e ao AT, perto da casa dele, que eles…portanto não me diziam onde é que era a casa, ali para ao pé (…) depois do estádio (…), deixei-os ali encostados, portanto na paragem do autocarro, eles foram a apé depois para a casa do sr. K…nunca fui a casa do sr. K, nem nunca entrei no (...) do sr. K…” (acrescentado que o arguido nunca o contactou, mas sabe que iam lá rapazes, lá ao (...) (...) e até jogadores), que os actos ocorreram em moradia não concretamente apurada, mas localizada no (…), em (…), no Bairro de moradias onde se situam a (...) (…) e a (...) (…) e na zona dessas (...) (aliás, zona próxima da (...) onde então o arguido residia, (...) (…)). Desta declarações do arguido A resultou, também, a convicção que o Tribunal formou quanto aos factos descritos nos pontos “107.” A “107.1”, “107.12” a “107.14.”. Sendo que, quanto ao tempo em que ocorreram os factos, concorreram as declarações do assistente quanto à dinâmica dos factos, quando explicou que foi após ter ido à “casa (…)” e as declarações que prestou para a localização dos factos, que para o Tribunal foram consentâneas com o descrito no despacho de Pronúncia. Referimo-lo nesta análise crítica, que a “dúvida” que se pode instalar na avaliação dos factos, no sentido dos factos e na verdade que é reconstituída perante o Tribunal, é algo que naturalmente surge a cada um quando se tem que confrontar com situações limite. Para o Tribunal, as regras estão definidas: se a dúvida ultrapassar “ a dúvida razoável” quanto ao facto, quanto ao acontecimento de vida que está sob prova, a decisão do Tribunal tem que ser pela não prova dos factos. No caso concreto, para o Tribunal subsiste a dúvida relevante quanto à circunstância local. Mas quanto à prova da ocorrência dos factos do abuso, tal como foi descrito por AT e com o arguido K, aí, face ao que acima já dissemos quanto ao que foi o depoimento deste assistente perante o Tribunal, a emoção e expressividade que transmitiu – valorada face ao que o Tribunal retirou do depoimento da testemunha BN, quanto à emoção e sofrimento do assistente em Fevereiro de 2003 -, o Tribunal ficou com a convicção que os factos ocorreram. Não houve indício ou circunstância, que nos levasse a desconfiar que a expressão emocional que AT transmitiu ao tribunal, de contar situação vivida e vivida com aquele arguido, fosse inventada e criada em acordo com outros jovens. Pode-se equacionar se a dúvida do Tribunal quanto à circunstância lugar, nas condições em que a mesma surgiu e que expusemos, não afecta de forma inevitável a prova quanto ao abuso e com o arguido K. O interrogatório e contra interrogatório a que AT foi sujeito teria trazido ao de cima a inconsistência daquele abuso com o arguido K (notamos que a instância da Defesa do arguido K ocorreu em dois dias diferentes). Relembremos o que dissemos acima, quanto ao episódio que AT relatou, de AP ter-lhe “mostrado” a (...) (antiga) do arguido K, em momento posterior aos factos ocorridos no (…). Como vimos AT disse que AP apontou “o andar de cima”. É certo que AT a dada altura, introduz a palavra “(...)” no seu relato (normalmente a referência ao “(...) antigo”, durante o julgamento, foi feita por “(...)” e a palavra “(...)” foi utilizado para o local onde em Setembro de 2001 o arguido K passou a dar consulta), o que para o Tribunal pode ter sido uma palavra introduzida pelo ruído da comunicação social (o Tribunal faz esta referência específica, tendo em atenção a instância que pela Defesa foi feita ao assistente). Mas, como vimos, a descrição que fez foi do “(...) antigo”. Se estivéssemos perante uma situação de AT ter criado este abuso com o arguido K, após o “rebentar do processo”, ter combinado a história e o relato com AP e nessa altura ter ido ao local, para ilustrar o relato que mais tarde iria fazer e se AP lhe tivesse mostrado a “(...)” (a expressão que AT começara por referir), então teria identificado a (...) “nova” em audiência de julgamento. Se AP lhe tivesse mostrado as duas, dizendo-lhe atenção que esta é a (...) “nova”, mas “temos” é que falar da antiga, então naturalmente, quando confrontado com a fotografia de fls. 2.287, AT teria explicado que aquilo era a (...) nova, mas que estava era a referir-se à antiga. Mas, como vimos, o relato de AT, para o Tribunal, é simples: ele não reconhece a fotografia e diz que AP apontou para um primeiro andar. O seu discurso é coincidente com a realidade que diz ter vivido: a sua memória é o primeiro andar, a “(...)” ou (...) a que se estava a referir era no 1º andar. A criação de uma história, a criação de um discurso, para o tribunal teria levado a uma resposta diferente. Face a tudo o que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provados os factos constantes nos pontos “107.” a 107.14” dos factos provados. (2.1) Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados - , que o arguido K sabia a idade do AT, o arguido K é (...), elemento que, no caso concreto, foi o necessários e suficientes para o Tribunal concluir pela prova de tais factos. Mas quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia que o Tribunal deu como não provados em relação a este ponto e que especificamente não estejam mencionados na análise que antecede, tal derivou de o assistente AA não os ter relatado e admitido que aconteceram consigo, sendo que os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência – factos 25. a 25.3, dos factos não provados, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 13.1.14. (Ponto 5.2.3. do Despacho de Pronúncia – AP/ Factos sito numa casa na (...) (…)): Prosseguindo com a análise dos factos relacionados com AP, como dissemos o assistente começou por falar nos actos de abuso por parte do arguido A, ocorridos na garagem de CZ. O Tribunal perguntou-lhe se tinha acontecido mais alguma coisa com o arguido A, após estes actos na garagem, na sequência do que o assistente respondeu que sim, que o arguido levava-o, conjuntamente com outros colegas, para uma (...) em (…), para encontros com outros arguidos. E passou a descrever, sem qualquer interrupção pelo Tribunal, o que se passou a seguir ao abuso do arguido A. Relembrando, relatou ter ido uma 1ª vez a (…), referindo - aquando do relato desta “1ª vez” e, portanto, aparentemente como referido a esta “ 1º vez” - o transporte numa carrinha (…), da AX e que já se encontravam na carrinha os colegas AV, AT e AN. Não se recordava se foi de manhã, de tarde ou à noite “… sei que estava no lar…em frente…onde fui abordado pelo Sr. A para entrar…”. E relata “(…)”. Quando termina o relato de (…), diz as viagens a (…) foram”…se não estou em erro, cinco vezes que eu lá fui , entretanto, já no (...), fui levado pelo sr. A ao (…), se não estou em erro, onde me fui encontrar com o Sr. H…”. Nesta ida ao “(…)” o arguido H estava acompanhado por EV, num (…), tendo o arguido H levado AP a um passeio no Jardim (…) “… e mostrou-me um estúdio que havia na (…), que não sei dizer a este Tribunal o nome daquele estúdio… ahaa…ainda e por várias vezes…o…encontrei-me nesse…meses depois…ou dias…não me recordo Sra. Juíza…o…encontrei-me outra vez com o Sr. H, onde fui com este e com o seu Assessor EV …até uma praia (…), que fica na “(…)”, para um encontro com o Sr. E…”. Nesta praia o arguido E deu uma chave de um apartamento ao arguido H, foram até (…), para um apartamento, que o Assistente disse pertencente “…ao Sr. E….ahaaa…entretanto, já nas instalações da AX, o Sr. A pediu-me para que eu fosse ao (...) do Sr. K…”. Disse ter ido ao (...) “ antigo” do arguido K. Após descrever os actos no (...) disse ”…saí e fui para o (...). Mais tarde…o sr. A pediu-me para que levasse um aluno da AX , colega, de nome AT, a casa do sr. K…no (…), onde eu levei…”. “(...) Mais tarde, fui levado pelo Sr. A e pelo AV a uma casa em (…)....não sei explicar se era a casa (…) ou não, porque se era a casa (…), eu nunca descobri esse nome.... Ahn... fomos levados a essa casa...eu subi até lá acima, com o AT também, onde o AV desceu com o Sr. A....fui, aí ninguém abusou de mim, fui lá por mero acaso, não sei bem porquê....talvez o Sr. A possa explicar a este Tribunal o porquê de eu ter ido à casa (…), se é esse o nome, porque eu não sei explicar bem porque é que eu lá fui....saí daquela casa, entrei outra vez dentro da carrinha da AX e fui outra vez para a Instituição...”. Respondendo, num segundo momento, a pedidos de esclarecimentos quanto a esta situação, disse que foi levado “... pelo Sr. A e pelo AV a essa, à casa que, supostamente, é a casa (…)....chegando a essa casa o Sr. A saiu da carrinha comigo e com o AV e com outro aluno, AT, onde subimos ...(...)...sempre andámos na carrinha (…), Srª Drª Juíza...(...)....entretanto saí da carrinha, eu... o Sr. A, o AV e o AT e dirigimo-nos à entrada principal dessa suposta casa (…)....”. O tribunal perguntou-lhe “quando dizia porta principal” o que é que queria dizer e acrescentou “ ...Srª Drª, havia uma ca ... uma porta principal e havia uma porta das traseiras onde também chegávamos várias vezes, por vezes, a entrar por aí ... e outras vezes entrávamos pela frente....só que no dia em que eu fui, entrei pela frente....entretanto, quando nós estávamos a deslocar à entrada desse prédio, do lado superior direito encontrava-se um caixote do lixo onde eu, como miúdo, dei um chuto nesse caixote entornando o lixo todo pelo chão....de seguida subimos as escadas, não me recordo se haviam elevadores ou não porque eu, sempre que fui, subi sempre umas escadas....(...) subimos as escadas e fomos até ao segundo andar....chegando ao segundo andar, virávamos assim um bocadinho à esquerda, logo em frente tinha uma porta no seu canto superior esquerdo, onde era para essa porta que nós íamos....batendo a essa porta, fomos recebidos pelo Sr. H, onde de seguida forneceu um envelope ao Sr. A e onde o Sr. A, de seguida, desceu com o AV, ficando lá eu e o AT....(...) entretanto o Sr. H abusou de mim sempre da mesma maneira, obrigando a fazer sexo oral....”. Quanto à descrição da casa disse “... passando a porta principal da casa fomos por um lado esquerdo, supostamente, um quarto....aquilo mais parecia escritório, porque não se via cama, não tinha nada.... Ahn... entrámos nesse, nesse compartimento, onde o Sr. A, peço imensa desculpa, o Sr. H me “molestrou” sempre da mesma maneira, obrigando-lhe a fazer sexo oral até à ejaculação do mesmo....”. Disse que nesse quarto “... de momento estava só eu e o Sr. H....onde eu acabei por sair, ficando ... e ficando lá só o AT....mas não posso dizer a este Tribunal se o Sr. H chegou a “molestrar” o AT, ou não....”. Convocando – embora neste momento por questão de princípio – as referências que acima já fizemos ao que foi para o tribunal o sentido temporal das declarações prestadas pelo assistente, notamos que no ponto “5.2.3.” do Despacho de Pronúncia, os factos são localizados entre finais do ano de 1997 e Setembro do ano de 1999 e a descrição dos factos diz respeito a uma situação em que apenas se pode depreender ter estado presente AP. E as declarações de AP em audiência de julgamento, quanto à ida à (...) (…), foram o relato de uma vez que foi a esse sítio “ não sabendo bem para quê”, porque aí não lhe aconteceu nada e a ida com AT, em que relata abusos. Como já referimos – ver análise crítica da prova quanto aos factos relacionados com o assistente AT -, AT entrou para a AX em Outubro de 1999 e das declarações de AP o Tribunal não depreendeu que antes de AT ter entrado para o internato da AX, o AP tivesse ido a algum local com o AT. Foram colegas de escola, mas não relatam idas em conjunto a qualquer local nessa altura. Assim, a ida de AP com AT à casa (…), aquela que ele relatou em audiência de julgamento, teve que se localizar após a data de entrada deste último para a instituição. O que, aliás, AP relata, pois conta primeiro a ida em “ que foi lá não sabe bem para quê” e depois a ida com AT. Das suas declarações depreende-se que antes de ter ido com AT já estivera naquele local, o que poderíamos equacionar ter sucedido no período a que se refere o ponto “5.2.3.” do despacho de Pronuncia. Mas desta vez AP diz que nada lhe sucedeu, pelo que afasta a possibilidade de se configurar que pudesse estar a referir-se aos factos deste ponto “5.2.3”. É certo que o Tribunal equacionou a possibilidade destes factos poderem ter ocorrido em datas em concreto não determinadas, situadas entre finais do ano de 1999 e princípio de Abril de 2000, tinha AP 15 anos de idade. Tanto que fez tal comunicação ao arguido A, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal. No entanto, na avaliação e ponderação global do que num segundo momento fizemos, quando à avaliação dos factos face às declarações de AP e de AT, de facto o “ acontecimento de vida” a que se refere este ponto “5.2.3.”, não é nenhum daqueles a que AP se referiu. Porque só se o Tribunal estivesse suficientemente seguro que era do mesmo “acontecimento de vida” que estávamos a falar, embora num tempo ou num local diferente do descrito no Despacho de Pronúncia, podia dar prosseguimento à alteração dos factos, da forma que equacionou fazer. Assim e face a tudo o que antecede, os factos que o tribunal deu como não provados em relação a este ponto “5.2.3.” do despacho de pronúncia – pontos “32.” a “32.8” dos factos não provados -, dado que a demais prova produzidos em audiência de julgamento não permitiu ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, da forma como está descrita, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 13.1.15. (Ponto 5.2.5. e 5.2.4. do Despacho de Pronúncia): Prosseguindo nas declarações de AP, na primeira vez que relatou ao Tribunal a ida ao (…) (AJ 20/06/05) e a ida ao estúdio da (…), factos relacionados com os arguidos A, E e H, começa por dizer que o arguido A o levou ao (…) “... se não estou em erro onde me fiu encontrar com o Sr. H, onde este se acompanhava do Sr. EV, num (…) preto....”. Disse que o arguido levou-o a um estúdio que havia na (…), E acrescentou que “...ainda e por várias vezes... o... encontrei-me... nesse... meses depois... ou dias... não me recordo Srª Srª Juíza, o... encontrei-me outra vez com o Sr. H, onde fui com este e com o seu assessor EV, até uma praia (…) que fica na linha, para um encontro com o Sr. E, onde este lhe entregou umas chaves que supostamente eram do apartamento do mesmo. O Sr. H recebida esta, esta chave, tomou viagem até (…), a um apartamento do Sr. H. Do Sr. H, peço im...peço perdão a este Tribunal, pertencente ao Sr. E....”. Apenas refere que o arguido H levou-o a um estúdio na (…) e não refere qualquer abuso. Na AJ de 24/06/05 esclareceu que o episódio que relatou (em que o arguido A o levou ao (…) e onde estava o arguido H) foi antes de ter ido a (…) e introduz uma alteração ao que aparentemente dissera antes: é que nesta audiência de 24/06/05 diz que já tinha visto o arguido H anteriormente ao “encontro” no (…). Para o Tribunal o seu discurso, quando prestava estes esclarecimentos que iam sendo pedidos, não foi forçado, no sentido de dar qualquer impressão de que estava a reproduzir. Aqui convocamos e remetemos para o que atrás dissemos, quanto à forma como AP prestou as suas declarações, quanto ao sentido de tempo e de localização no tempo. (i) Com dissemos (cfr. A.J. 4/07/05, mas já o dissera na A.J. 29/06/05), o assistente AP declarou que conheceu AT quando este entrou no lar FC, onde o Assistente (AP) vivia. E diz que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Perguntado pelo Tribunal qual a memória que tinha quanto ao tempo que decorreu entre a entrada do assistente na AX e a do AT, respondeu ao Tribunal “ …eu entrei e julgo que semanas depois, ou dias depois, entrou o AT…”. E, quanto à sua saída, disse (AJ 4/07/05) a pedido de esclarecimento que é feito, que saiu da AX em 2000, mas não se recordando se foi no decurso do ano lectivo 99. Mas olhando para os documentos dos autos, entre os quais os que temos estado a citar relativamente ao percurso do AP na instituição, AP entrou na AX em Agosto de 1992 e AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99, conforme resulta de fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Estamos a falar, no que diz respeito à distância que ocorreu entre a entrada de um e a entrada de entrada de outro, de um período de tempo de sete anos e a memória que AP consegue reproduzir em relação a aspecto, relativamente ao qual não tinha qualquer necessidade de mentir ou inventar, é que AT entrou “ dias” ou “semanas” depois de si. Mas esclareceu, porque foi-lhe perguntado, quanto a uma questão que já não era uma circunstância de “tempo”, mas uma questão relacionada com acontecimentos na sua vida, que “ achava” que quando AT entrou para o FC o assistente já estava a estudar no CZ. O que correspondia, de facto à realidade, pois como vimos durante a audiência AP esteve a estudar no (...) DT do anos lectivo 92/93 até ao ano lectivo 96/97 e foi para CZ no ano lectivo 97/98 (e cfr., quanto a elementos documentais, Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6 - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX - e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX). E, quanto ao tempo que esteve como AT na AX, a sua memória foi que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Mas como dissemos, AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99 (cfr. fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e cerca de seis meses depois AP está a sair da AX. Ainda nesta instância (na AJ de 4/7/05) e para ilustrarmos a dinâmica ou a estrutura do que é a memória ou a noção de AP em relação ao tempo e aos factos ocorridos na sua vida, recordava-se que em relação ao acompanhamento (de pedopsiquiatria) que teve, enquanto na AX, primeiro foi “… acompanhado por uma Senhora, no HHB, em (…), onde vim depois a ser acompanhado pelo Dr BL…”. E, como vimos nos elementos dos autos, esta sequência está correcta. No relatório de 4/03/97 (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), AP tem 12 anos de idade e está a frequentar 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT. A Equipa Técnica do internato faz um relatório com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico até ao fim do ano lectivo em curso, dizendo que AP começou a ter consulta de Pedopsiquiatria em 22/02/94 no Hospital IIU ((...) da Juventude a funcionar no HHB), a Pedopsiquitra era a sra. Dra. IIV, a qual foi até Maio de 1996, sendo que a equipa do internato “…diligenciou pela continuação do acompanhamento do jovem nesta área…, este retomou as (...) em 20/02/97, com o Dr. BL, periodicidade de uma vez por semana...” (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). No entanto, quando a seguir lhe são feitas perguntas quanto à localização no tempo do “acompanhamento” ou sua contemporaneidade com outros factos, não conseguiu dizer ao Tribunal quando começou o acompanhamento pelo Dr. BL, quantas sessões teve, nem mesmo se quando teve as sessões já tinha sido sujeito a actos de abuso sexual. Por exemplo, quanto à data da entrada na AX. Começa por dizer que entrou em 1991. Perguntado com que idade e a pergunta foi repetida, é seguro a responder “ 7 anos”. E perguntado pelo tribunal porque é que dizia sete anos, se tinha estado a fazer alguma conta, esclareceu com (para o Tribunal) naturalidade: “…não, eu já há muito tempo que fiz uma conta para saber quanto tempo é que eu estive na AX. E fiz essas contas e deu que eu entrei em 1991…” (cfr., também, declarações da AJ 4/07/05, em que diz “ … eu entrei para a AX com sete anos e como faço anos no dia um de Outubro…eu não sei em que mês é que eu entrei, mas sei que dias depois…ou meses depois, foi a minha festa de aniversário, onde fiz os meus oito anos…”. É uma das situações em que em relação ao “facto” ter “entrado com 7 anos” na AX está seguro, mas em relação a datas não. Diz 1991 porque fez contas…e fez mal as contas, porque se há coisa que AP não era bom era em contas, como se pode ver pelos seus elementos escolares (e que acima referimos). Assim e retomando os factos “(…)” e “ ida as (…)”, para o Tribunal, apesar da sequência que, aparentemente, AP começou por dar, depois dos actos da Garagem de CZ e antes das idas a (…), localizam-se os factos que estamos a tratar agora. (1) E quanto a estes factos (ida a uma casa em (…)), disse que se encontrava nas instalações da AX, quando o arguido A lhe disse para ir às traseiras do Instituto EX, onde estavam à sua espera. Disse que “….passei o ferro...” referindo-se ao que em audiência de julgamento foi chamado por “prerceptor fininho”, umas grades cerradas na vedação do (...), por onde os alunos saiam, disse que cá fora estava estacionado o (…) preto e foi levado praia de (…)….”, disse que essa praia ficava ao pé “ de uns prediozitos” e ao pé do (…), onde morava DU, que “...também me molestrou, abusou de mim em processo que já foi feita justiça...a(...)ram por um túnel...”, acedeu à praia e foi a primeira vez que viu o arguido E. Chamamos a atenção que esta situação foi aquela em que na aj de 20/06/05 o assistente descrevera ” meses depois”, “ ou dias” , não se recordava, do encontro no campo pequeno, (cfr. declarações prestadas na AJ 20/06/05, “... encontrei-me nesse…meses depois…ou dias…não me recordo Sra. Juíza…o…encontrei-me outra vez com o Sr. H, onde fui com este e com o seu Assessor EV …até uma praia de (…), que fica na “linha”, para um encontro com o Sr. E…”). E dizendo agora ao tribunal que a primeira vez que vira o arguido H, fora na altura em que foi com o mesmo “ à Praia (…)” e depois a “(…)”, é claro que mais uma vez tivemos que equacionar a possibilidade da invenção. Ou da colagem desta situação a actos passados com o cidadão DU, que o assistente AP não omitiu e que, como já referimos anteriormente, foi objecto de um processo crime que correu no Tribunal (…). Resultando ainda da certidão que conta nos autos, que efectivamente a casa de DU situa-se em frente à Praia (…). No entanto a convicção do Tribunal não veio a ser nem no sentido da invenção desta situação, nem no sentido da colagem de uma situação à outra. O sentido das declarações de AP, ao longo do interrogatório a que é sujeito pelas Defesas do arguido H e E, continua a ser este último que deu ou que surgiu do seu discurso (cfr., quanto ao interrogatório do arguido E, AJ 18/07/05). E passemos aqueles factos ou descrições que na dinâmica do discurso do assistente, quando fala livremente, surgem como factor de credibilidade e de veracidade do que relata, como associado a uma experiência vivida da forma que a relata. O assistente disse que foi ter ao portão das traseiras do EX, por instruções do arguido A onde um carro estava à sua espera. Esse carro era um (…) preto, o que estava à sua espera, tendo complementado, quando lhe foi perguntado se sabia identificar ao Tribunal quem eram essas pessoas, que era o arguido H e um seu colaborador EV. Ora AP disse ao Tribunal que o carro que o esperava era um (…) Preto e associou-o ao arguido H. Na altura em que foram conhecidos os factos deste processo, o “rebentar do escândalo” como normalmente as testemunhas referiam, o carro que o arguido H tinha e portanto, o que seria mais plausivelmente conhecido pelo assistente, era um (…). E o arguido H confirmou em audiência de julgamento que teve um (…) Preto, até Maio de 2000, com a matrícula (…). Isto apesar de, simultaneamente, ter tido o (…). E confirmou também, em audiência de julgamento, que a pessoa EV colaborava consigo, acontecendo conduzir o seu veículo para a oficina, para fazer recados, quando ia a algum local e evitar fazer o estacionamento. Esta referência ao (…) e a existência de tal veículo nas circunstâncias em que vimos, no tempo em que estes factos são imputados e AP o refere, foram para o Tribunal um sentido de credibilidade. Não era possível que AP conseguisse, no universo de factos que relatou, ter a perspicácia para indicar o carro que, efectivamente, o arguido tinha e que não era o carro que tinha e foi conhecido, quando os factos deste processo, por sua vez, também foram conhecidos. Por outro lado, o assistente refere um encontro com o arguido E num local – como dissemos e resultou da audiência -, ao pé da casa do referido cidadão DU. E introduz a participação do arguido E. É certo, vimos, que AP esteve envolvido num processo em que foi referido este cidadão. Mas em relação a DU AP não fez anteriormente qualquer associação ao arguido E, nem resulta da certidão que temos nos autos, dos Acordão proferidos em tal processo, que aí conste. Quem faz essa associação nestes autos - DU/E - é AK e este nada tem a ver com AP. Não resultou do seu discurso, nem dos elementos que constam nos autos, que para além da coincidência de internos da AX – embora em Lares e (...)s diferentes e espacialmente distintos -, tenham tido contacto, convivência. Já o referimos e convocamos. A verbalização de AP quanto a estes factos passados numa casa em (…), a sua verbalização do acto do abuso, as explicações que deu quanto aos enganos e desenganos, quanto à confusão que gerou na descrição, a forma como fisicamente se apresentava perante o tribunal, ao mesmo tempo teve humildade perante a humilhação que poderia ser a confrontação com as suas incoerências de discurso, e esclareceu sempre, explicou, mantendo respeito por cada um que lhe fazia as perguntas. E aqui o Tribunal refere, embora de forma meramente incidental, a desvalorização que fez das declarações da Sra. BP, quanto à fidedignidade de que o que reproduz, quanto a circunstâncias que rodearam os actos, corresponde exactamente aos relatos que lhe foram feitos por AP, pelo seguinte. A Sra. BP disse ao Tribunal que ouviu os jovens da AX, a sua secretária, a Sra. Dra. BBB retirava notas, posteriormente passava-as para um texto que entregava à declarante. Esta cadeia que se estabelece na comunicação, a diversidade entre quem anotou e escreveu e quem por sua vez o reproduz frente ao Tribunal, potencia a existência de lapso, de diferente percepção entre o que foi ouvido e depois escrito. Daí que, para o Tribunal, podendo estas declarações levar o Tribunal a tentar localizar o sentido ou momento do erro, não significam só por si, elemento que importe ausência de veracidade e de credibilidade para o que foi dito por AP. AP, quanto a esta situação e na convicção do tribunal, descreveu pequenos elementos que dão credibilidade, pois são aqueles que dão uma ressonância acrescida de que é uma situação efectivamente conhecida. É certo que descreveu outros que podem ter tido o sentido de preencher o que dizia, com elementos que pudessem dar ênfase ao que relatava, para que o Tribunal acreditasse em si. Por exemplo, quando relata os diálogos que disse que o arguido H teve consigo, quanto ao que iam fazer à Praia (…), mas isso, avaliado na dinâmica e na globalidade do relato feito, criou dúvida forte ao Tribunal, quanto à ocorrência deste acto de abuso que relatou, com a intervenção do arguido A da forma que descreveu. Dizemos, ainda, que na AJ de 18/07/05 a defesa do arguido H pediu que o assistente explicasse porque é que anteriormente dissera diferente, quanto à ordem dos locais (relacionados com o arguido H) onde foi. Tentando e com calma, o Tribunal pediu a AP para dizer a sequência do que se lembrava em relação ao arguido H e AP diz (…)/(…). E quando o tribunal lhe pergunta quando voltou a encontrar o arguido H, o assistente refere “ vi-o em (…)…cheguei a vê-lo em (…)…e estúdio…confusão…sei que..não sei dizer se fui antes ou depois…sei que fui lá....”. Concluindo o que acima dissemos, esta confusão é por mentira ou outra coisa? Isto porque volta a repetir (…),(…),(…) e Jardim (…). Mas quando calmamente interrogado e sem dar a ideia de que o estava a pôr em causa e perguntado se essa ida ao (…) foi antes ou depois de (…), responde “ acho que foi antes”. E diz, porque interpelado, posso ter feito confusão. Para o Tribunal houve confusão na ordem, mas essência do discurso, quando observado de fora, é esta: (…),(…) e (…) antes de (…). No entanto, quanto ao papel do arguido E neste factos, a acusação não sustentou suficientemente as afirmações que fez, pois do que foi dito por AP não se extrai, para além da dúvida razoável, quer a razão da intervenção do arguido E, quer a propriedade do imóvel sito em (…). Assim, e face a todo o ex(...), incluindo a motivação do Tribunal quanto ao percurso do assistente na AX e quanto à análise do que foi o padrão de memória do assistente quanto aos demais factos, a razão pela qual o Tribunal deu como provados os factos constantes dos pontos “113.” a 117.2” dos factos provados. E também a razão pela qual o tribunal, por insuficiência de prova segura, deu factos como não provados os factos constantes dos pontos “33.” a “34.5” dos factos não provados. (2) Prosseguindo e quanto ao (…)/(…), na primeira vez que relatou ao Tribunal a ida ao (…) (AJ 20/06/05) e a ida ao (…) da (…), apenas refere que o arguido levou-o a esse (…) e não refere qualquer abuso. Na AJ 20/07/05 a Defesa do arguido H faz perguntas quanto a esta ida ao (…) – Teatro (…) – e o assistente faz a descrição do interior do teatro. Há uma parte que esta descrição é coincidente com o que o Tribunal viu no local, a existências das duas escadas, a subida para o 1º andar e a descrição de uma “cabinezinha”. Não vimos espelhos, nem palco no local onde AP dizia, pois o palco está no o(...) do que disse. Mas o efeito que a testemunha TB descreveu nos vidros da cabine referida, quando havia o acendimento de luzes, foi para o Tribunal uma descrição coincidente com a dada por AP. No entanto, a forma como o assistentes descreveu ao Tribunal os factos no Teatro (…), primeiro a inexistência de abuso e depois a referência a abuso, introduz uma discrepância que referimos noutras situações, quanto à plausibilidade de o acto, o pedaço de vida que o AP está a contar em relação ao teatro (…), ser exactamente o mesmo que está descrito no Despacho de pronúncia, ou ter sido exactamente assim como o descreve. É uma situação em relação à qual o Tribunal não foi seguro quanto ao que se passou e quando se passou com AP naquele local. Não ficou seguro quanto ao que efectivamente se passou. E, daí, não ter dados os actos como provados e, consequentemente, não fazer qualquer outra análise complementar. Não criámos a convicção de que aqueles factos ocorreram da forma descrita. Assim e quanto aos demais factos que o Tribunal deu como não provados em relação às situações descritas neste ponto – pontos “33.” a “33.7” dos factos não provados -, os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre os mesmos, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 13.1.16. (Ponto 4.3.1. do Despacho de Pronúncia – AT/ Factos sito numa casa na (...) (…)): Na primeira audiência de julgamento em que prestou declarações (AJ 23/01/06) AT disse que foi com AV e AP à “Av. (…)”. Foi levado pelo arguido A, no seu carro, (…) (Nesta altura disse que foi sempre só no (…), mas em momento posterior disse que na segunda vez não se recordava da viatura). Pensava que ia dar uma volta normal com AV e AP , como “a gente fazia todas as noites depois do jantar”, dizendo que estes dois assistentes eram as pessoas mais próximas que tinha no lar. Disse que no apartamento da Av. (…) foi a primeira vez que viu o arguido H (cfr. audiência de julgamento 30/01/06). Subiu para o apartamento com AP, entraram num quarto, o assistente saiu e ficou AP com o arguido H. O assistente foi para a sala e o arguido H veio ter com ele. Disse que o arguido H praticou actos de sexo oral e sexo anal no assistente (o arguido introduziu o pénis na boca do assistente, o arguido introduziu o pénis no ânus do assistente). O arguido o arguido H também pôs o pénis de AT na sua boca. Quando relata estes actos foi perceptível o que já assinalámos anteriormente, quanto à alteração de voz, a forma como falou, que o Tribunal interpretou como dificuldade em relatar os factos. No entanto, é claro que também poderia ser um relatar mais devagar por estar a inventar, circunstância a que o Tribunal foi estando atento no relato. Após estes actos foram para o (...); quando saiu da sala AP estava à porta à sua espera. O arguido A e AV estavam cá em baixo, dentro do carro. Em momento posterior prestou esclarecimento quanto ao modo como entraram no prédio subiram pelas escadas, existiam mais duas portas, o arguido A tocou à porta e apareceu o arguido H. Limitou-se a seguir o AP , não lhe disseram nada. Entraram os quatro, A e AV ficaram a falar com o arguido H e ele e o AP foram para um quarto, “…foi atrás do AP , não fazia a mínima ideia do que ia fazer…”. Disse que não conhecia a casa e pedida a descrição disse que “conheceu” um corredor, seguiram até ao fundo do corredor e depois entrámos num quarto e recorda-se da sala onde esteve. Tem memória de um corredor e depois várias portas, mas o assistente só esteve no quarto e na sala. Em audiência de julgamento (AJ 30/01/06) prestou esclarecimentos quanto a um desenho da casa que tinha feito (cfr. fls. 1.115), dizendo que o ponto de interrogação no desenho fls. 1115, fê-lo porque “… só vi de relance, não vou afirmar uma coisa que não tenho a certeza…” e quanto às divisões que assinalou no lado direito do croqui “…as portas estavam entreabertas e vi só uns azulejos e supus que fosse uma casa de banho e a outra a cozinha, já que todas as casas têm uma casa de banho e uma cozinha…as casa têm uma casa de banho e uma cozinha…as portas estavam umas fechadas e outras entreabertas…” (no entanto tinha respondido ao Tribunal - aquando dos esclarecimentos que prestou quanto ao desenho que fez em audiência de julgamento -, que havia divisões que não tinha identificado porque as portas estavam fechadas, daí ter só feito divisórias; e quando é confrontada dá a resposta que assinalámos, que quando fez o desenho na PJ “… eu recordo-me ter visto algumas portas abertas, abertas tipo encostadas, entreabertas. …”). Quanto ao mobiliário da casa disse que no quarto “ recordo-me da cama e de um guarda-fatos”, na sala “ recordo-me só de sofás”, não se lembra de ter visto janelas. Demonstrou conhecer a área em que o prédio se encontrava. Disse que soube que era a Av. (…) pois situou-se através da (…), onde tinha ido tratar os dentes (cfr. apenso EJ, fls. 1122, registo do Livro de ocorrências do seu Lar, datado de 14/1/00, onde está registado consulta na medicina dentária ). Disse que muitas vezes ia de táxi aos tratamentos e ouvia mais ou menos a informação que a senhora dava ao taxista. Saíram do prédio pelas escadas e saíram pela porta da frente; (1) Disse, a dada altura, que das duas vezes entrámos por uma porta nas traseiras. No entanto, ao longo do seu depoimento teve flutuações quanto à entrada pela porta das “traseiras” (o que foi assinalado pela Defesa, na aj de 1/02/06). Com efeito, na audiência de julgamento de 25/1/05 o assistente faz uma referência a uma porta por onde entrou, fazendo também uma referência a caixotes do lixo, o que com aquela descrição e com o que foi perceptível para o Tribunal, da deslocação que fez ao local, podia estar a referir-se à porta “ da frente” (quando o Tribunal se deslocou ao local, quando passou para o patamar das escadas que davam acesso aos andares, junto a uma porta que estava fechada nesse patamar e que dava também para a “frente” do prédio, isto é, para a parte dos jardins e não para o lado onde se situa o Hospital DW, estavam caixotes guardados; no entanto a distância temporal entre a altura em que o Tribunal foi ao local e a altura em que são localizados os factos, pode importar uma total alteração de procedimentos quanto quer á existência, quer ao sítio dos caixotes). Mas há, efectivamente, flutuações no discurso quando fala (de forma livre e aberta) dos locais por onde entrou e saiu e há esta aparência, a dada altura, de estar a chamar “porta das traseiras” à “porta da frente”. Porquê? Ou porque a dada altura foi introduzido o termo “porta das traseiras”, hipótese esta referida pela Defesa, apontando o momento em que tal ocorre. Diz a defesa que foi a partir de 19/03/04, após uma notícia saída num orgão de comunicação social (documento que se encontra a fls. 60.749) e dizendo, consequentemente e tal como interpretamos o que nos parece ter sido a posição assumida, que os assistentes que inventaram esta história, a partir dessa notícia, também aderem a esta “sugestão”. Ou pode haver outra razão, que as declarações do assistente comportam, na interpretação do tribunal: o chamar “porta das traseiras” até pode ser, neste momento, um efeito da contaminação de coisas ouvidas, como diz a Defesa. Mas não ficámos com a percepção que foi a noticia e a comunicação social que levou à criação, por parte do assistente, da existência deste prédio e da referência a um abuso neste prédio. Como vimos, a dada altura e na sessão de 25/01/2005, AT chama porta das traseiras a uma porta que, para o tribunal, é a porta da frente. E o prédio da (...) (…) não é um prédio “típico” de “frente” e “traseiras” pois o edifício, quando se faz a aproximação vindo da direcção (…), sentido (...) (…) (a que seria a “chamada” fachada das “traseiras”) , tem uma fachada que pode aparentar uma fachada frontal (cfr. fls. 1.431; 1.432). Isto para dizer que a descrição ou a narrativa do assistente, podendo estar contaminada quanto a alguma circunstância, no que diz respeito à entrada ou saída neste prédio, não exclui o verosimilhança do que o assistente disse, que esteve naquele prédio e nas circunstâncias em que o esteve. Prosseguindo, o assistente disse que entravam por uma porta, andávamos cerca de uns quatro cinco passos, tínhamos uns cinco seis degraus, dávamos a um pequeno patamar e subíamos depois uns quatro lances de escadas…um pequeno patamar para virarmos para as outras escadas…não tinha portas. Quando “a gente saía das escadas” tínhamos um elevador e três portas; Passaram por um conjunto de portas, foi no segundo conjunto de portas; passei por umas três portas mais um piso e continuaram a subir até ao piso seguinte (cfr. desenho de fls.36.170; e alterações da audiência de julgamento de 25/01/05) . Disse (em relação ao desenho) que “…entrou na porta do lado direito…não tem a certeza se foi nessa se foi na porta a seguir….”, mas dizendo uma porta de madeira castanho escuro. Quanto à porta (das traseiras) tinha uns pequenos vidros que só dava para ver as sombras, não se consegue nem ver para dentro nem ver para fora; não se recorda cor da porta (disse que havia caixotes do lixo, “que supostamente por volta das dez e meia onze horas deviam por na (...)”). Esclarecendo o croqui que fez, disse “…lance de escadas com parte sombreada, refiro-me ao lance de escadas que vai dar a um patamar…não sei o que era esse patamar, mas supostamente subindo umas escadas dava-se à porta da entrada da frente…”. Os caixotes do lixo estão no croqui direita, do lado das escadas e “…este lance, parte sombreada, era depois de terem entrado pela porta das traseiras…”. O arguido A ou AV deram-lhe dinheiro, “cinco contos”. E relata uma segunda vez. Fevereiro ou Março, não se recorda bem qual o mês. Voltou cerca de um tempo depois (da primeira), “…em concreto não sei dizer….duas semanas … três, não me recordo bem….”. Disse que tinha esta noção porque logo nessa altura é o Carnaval e lembra-se ter ido a casa de férias no Carnaval. Esta segunda ida foi um tempo depois de ter ido a casa no Carnaval. Foi de novo com AP, disse que iam dar uma volta, foi com o arguido A, mas agora disse que não se recorda da viatura. Mas desta vez só o assistente entrou, pois AP disse para entrar e entrou; AP e A ficaram cá fora , foram só até à entrada de entrada do apartamento. Disse que os actos praticados foram sexo oral e sexo anal, no quarto, o mesmo quarto da primeira vez. O arguido H introduziu o pénis na boca do assistente; o arguido introduziu o pénis no ânus do assistente. Subiram pelas escadas. Quem abriu a porta foi o arguido H, não se recorda conversa que tenha havido. Após os actos saiu e dirigiu-se à viatura para ir para o (...). Recebeu “cinco contos”, mas não se recorda quem lhos deu. Diz que após esta segunda vez só voltou à Av. (…) com Polícia Judiciária para o reconhecimento. Diz que não foi nem com jornalistas, nem com colegas. (2) Neste processo, a descrição das situações em relação às quais o tribunal tem que decidir quanto à prova, são todas elas diferentes da realidade que normalmente está subjacente aos processos de abuso de natureza sexual. Quer a descrição dos abusos imputados ao arguido A, quer a descrição dos abusos imputados aos demais arguidos, são descrições que saem do que é comum julgar. A prova, para o tribunal – e na situação concreta chamamos a atenção que apenas é imputado ilícito criminal ao arguido A, que admitiu os factos, mas afectam o arguido H, que os nega -, assentou em três diferentes elementos: o que resultou para o Tribunal da audição dos assistentes, no caso concreto AT e de forma concorrente AP; o que resultou das declarações dos arguidos, quer o arguido A, quer o arguido H ; o que resultou da prova testemunhal conjugada também com a prova documental. E quanto às declarações de AT, já o referimos, esteve em audiência de julgamento sujeito ao contraditório durante 7 (sete) sessões, sendo que a Defesa do arguido H, arguido directamente afectado com a prova dos factos deste capítulo, instou-o em (3) três sessões da audiência de julgamento. AT, durante todo o interrogatório, respondeu sempre ao que lhe foi perguntado e por vezes foi perguntado sobre a mesma coisa, embora de forma aparentemente diferente. Houve alturas em que foi perceptível para o tribunal a saturação do assistente, por vezes deu como resposta o “não me recordo”, por vezes foi perceptível que a resposta era um “eu já respondi”. Para o Tribunal e tal como já dissemos aquando da análise das declarações do assistente, quer quanto aos actos de abuso cometidos pelo arguido A, quer quanto aos actos passados numa (...) no (…), quanto à descrição do abuso, AT relatou com dificuldade os actos de abuso, foi um relato em que houve emoção, por vezes mesmo expressão de sofrimento. Por exemplo e quando relatou os primeiros factos, aqueles ocorridos com o arguido A, foi notória a dificuldade com que utilizou a palavra “broche” para descrever os actos ocorridos, ou concretizar que parte do corpo tocou em quem. Como dissemos podia ser vergonha ou podia ser por estar a inventar que tinha aquele registo de narração. Mas no momento em que descreveu os actos ocorridos numa casa no (…), volta a ser perceptível dificuldade em relatar os actos em si. E volta, nesta situação que estamos a analisar, a dar o mesmo registo para o Tribunal. (3) Mas aqui e como já o fizemos anteriormente, quanto à valoração e avaliação do do sentido e da forma como o AT prestou o seu depoimento, introduzimos de novo o testemunho da Dra. BN, Técnica Superior e Directora do (...) FA da AX, desde o ano de 1999. Resulta de fls. 943/4, que em 31/01/03, por Despacho do JIC AT foi então declarado testemunha especialmente vulnerável e determinada a sua colocação no Centro Educativo (…), por 15 dias eventualmente prorrogável, sendo acompanhado pelo Dr. BL (AT também falou sobre este facto). Quando saiu deste Centro foi a testemunha Dra. BN que o recebeu na AX. Disse que recebeu este jovem em 20003 (embora a sua memória fosse Janeiro) e o seu depoimento foi impressivo: não teve conversas com ele sobre os factos, ele vinha “muito doente” disse que o AT só chorava, era um miúdo muito doente, o seu objectivo foi “só conseguir que ele dormisse de noite, comesse” e fosse às aulas. Este depoimento foi, para o Tribunal, expressão do sofrimento que o AT sentia em (para o Tribunal, dada a altura em que AT foi para o (...) IIT) Fevereiro de 2003 e este sofrimento tem sentido, e ressonância, com alguém que está mal, pelo processo que estava a passar. Porque, como já dissemos, se o sofrimento fosse por escrúpulos de estar a mentir, o mais plausível era revelar essa mentira em algum momento e não resistia, na avaliação do Tribunal, ao fogo cruzado do contraditório. E que foi minucioso e cerrado. Para o Tribunal, face à pessoa que teve à sua frente, como contou, como olhou, como esteve sempre a responder, esclarecer ou emendar quando o fez, AT criou uma ressonância de veracidade no que dizia. (4) Diz a Defesa que não está em causa que AT tivesse sido abusado, uma das expressões utilizadas pela Defesa foi que AT tinha uma vida desgraçada, mas que estes factos que estamos a analisar foram uma invenção e uma criação dos assistentes. A grande dificuldade neste tipo de crimes, é o facto de a prova ser essencialmente a narração que a vítima faz dos factos. É certo que, no caso concreto, não estamos numa situação de crime praticado em ambiente familiar. Assim, sendo os factos praticados fora desse circulo, em princípio poderia ser mais “fácil” tentar encontrar elementos que possam corroborar uma ou outra versão. Vamos então aos elementos seguintes. AP disse que foi à (...) (…) com AT e AT também o diz, uma das vezes estiveram os dois dentro do apartamento. O arguido A diz que os levou, confirma contacto com o arguido H nesse local e “entrega” dos educando. Mas com discrepâncias e contradições. (i) AT e AP tem discrepâncias e contradições, por exemplo, quanto ao interior do apartamento. Para AT tem alguma mobília, para AP é como se fosse um escritório... uma alcatifa. Para o tribunal a descrição de AT, apesar do que aparentou ir preenchendo quanto ao que se recordava da casa (e estamos a referir-nos à explicação que deu em audiência de julgamento, quanto ao desenho que fez da casa e ao que preencheu não por ter visto mas por ter “su(...)” ter visto) deu e transmitiu uma dinâmica de alguma interiorização do espaço, de perspectiva do espaço. Quanto a AP o interior da casa é o que já referimos, mas dá uma referência, que para o Tribunal foi de forma casual no seu discurso, dizendo que da varanda viam-se os aviões a passar baixinho. É certo que este elemento podia ser dado por quem tivesse passado naquele local e na (...), mas a noção, a perspectiva e a forma como relata é diferente. E a noção que deu ao Tribunal foi de quem olhou, como disse, da varanda (esclareceu que a casa tinha uma varanda onde se viam os aviões a voar baixinho, e se via a estrada cá em baixo, esclarecendo também que parecia um escritório porque não tinha mobílias). A dado momento da instância da Defesa do arguido H ao assistente AT, foi-lhe perguntado se a situação ocorrida nas (…), foi a primeira situação de sexo anal que teve e AT disse que sim. Isto estava ligada, tanto quanto interpretámos, à questão da memória espacial, ou ausência dela, de AT. Sendo a primeira situação de sexo anal seria uma situação mais traumática, logo reteria mais. De facto resultou da audiência que em relação ao abuso ocorrido com o arguido A, o que foi situado em data anterior a estes factos, o assistente disse que aí só houve sexo oral. No entanto, podendo ser a presente situação mais traumática que a anteriormente sofrida, não exclui que o registo que fique para o assistente ao longo do tempo seja o da ocorrência do abuso em si e que os elementos espaciais vão perdendo registo de detalhes. Isto pareceu ser, ao Tribunal, o sentido do que foi a memória dos Assistentes ouvidos, portanto não só AT mas os cerca de 30 que vieram ao processo. Quanto ao arguido A, como dissemos confirma ter levado AP e AT, confirma ter visto o arguido H e o recebimento de dinheiro. Mas diz que foi ao fim de semana - quando os assistentes dizem que foi durante a semana e após o jantar do (...) - , justifica ter “dado” boleia aos jovens quando ia fazer transporte de alunos da AX., sendo que como vimos o veículo em que foi feito o transporte pode ser diferente para uns e para outro. E dizemos “pode” porque AT inicialmente fala no (…) do arguido e depois não tem a certeza. (ii) E aqui convocamos o que dizemos noutros locais da presente análise, quanto ao que foram para o Tribunal as declarações do arguido A e como o Tribunal as valorou. Como já referimos, o arguido A o arguido há situações em que admite alguma participação nos factos descritos pelos assistentes. Por exemplo, admite ter transportados os assistentes para determinados locais - situações de (…), (...) (…),(…), Teatro (…), (...) do arguido K -, mas acrescenta que se limitou a dar boleia aos assistentes que na altura lha pediram. Deste modo, pode confirmar as declarações dos assistentes quando estes dizem que foram aos locais, para ter actos de natureza sexual, mas negando sempre que tenha sido o arguido a contactar os jovens para aí irem ou ter sido contactado por algum arguido para lhe mandar algum educando. Por vezes acrescenta o que é que os rapazes lhe disseram e com quem disseram ter estado nesses locais, por vezes admite ter-lhes dado dinheiro depois de terem ido a esses locais, mas (caso do dinheiro em (…) ou após a ida a um prédio sito na (...) (…)) esclarecendo que o dinheiro, quando lhe foi entregue em envelope por alguém, foi para dar aos “rapazes” - dando a ideia que “aquilo” foi-lhe parar às mãos por mero acaso -, não sabendo dizer porque é que lhe foi entregue a si. Neste sentido, por exemplo, as declarações que prestou na audiência de julgamento de 10/01/2005, em que o arguido negou ao Tribunal saber quanto dinheiro estava dentro dos envelopes que disse terem-lhe sido entregues, dizendo “…não sabia, eu nunca fiquei com nenhum tostão (…), o AV é que distribuía o dinheiro por eles (…), nunca, nunca, nunca fiquei com nenhum tostão … por isso mesmo, estava a viver numa barraca e não tinha dinheiro para uma (...), nem para um apartamento….” . E quando perguntado, afinal, o que é que ganhava com aquelas boleias que andava a dar, acrescenta “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto … isso agora …, portanto agora é a Sr.ª Doutora depois perguntar a eles….” E insistido - pois pelo menos andava a perder tempo enquanto ficava à espera dos “rapazes”, quando disse que os levou e depois trouxe de volta -, responde “ (…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”, dizendo que tal não lhe “faz confusão”, “…não, não faz confusão Sr.ª Doutora (…), nunca, nunca entrei em casa de ninguém … nunca recebi dinheiro de ninguém, ninguém mesmo, quer dizer, do dinheiro dos envelopes que me deram, nunca fiquei com nenhum tostão, assim é que é….”. Este foi o seu movimento ao longo das suas declarações. O Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. O que, reconhecemos, não foi imediato, pois - aliás, tal como sucede com a generalidade das situações - e como já dissemos, por vezes só à distância é que se conseguiu ver o que a confusão do momento escondeu. A forma como o arguido declarou os factos ao Tribunal - e cruzando com a análise concreta que o Tribunal faz não só em relação a este assistente, mas em relação a TODOS os demais assistentes - tem uma justificação para o Tribunal. Deste modo, as declarações do arguido, quando confirma ter levado os jovens ou narra o que estes lhe contaram depois de ter estado nos locais, tiveram para o Tribunal o sentido mais plausível - por ser o mais coerente com o que foi, para nós, a atitude global do arguido face à admissão dos factos -, de envolver-se o menos possível como responsável pelo que aconteceu ao educandos. Mas, ao mesmo tempo, não deixar que lhes chamem mentirosos. Quando o arguido, por exemplo, se referiu à idade em que conheceu os assistentes, de uma forma quase padrão surgiu no seu discurso a idade “13/14” anos. para o Tribunal o arguido A sentiu responsabilidade no que fez aos jovens da AX, (…) como ele. E teve reacções que traduziram aligeirar da sua culpa, mas sem “deixar” cair “os rapazes” como se lhes referiu por vezes. E este aligeirar de culpa traduziu-se, por vezes, em meias verdades (afirmação que ao longo desta análise crítica o Tribunal vai ilustrando e preenchendo, com referências concretas e situações concretas). Isto é, a percepção que tivemos é que o arguido não deixou de contar com verdade uma parte do facto, mas introduz elementos que não se verificaram, para justificar - pelo menos para si - os que se verificaram. Por exemplo e já na fase seguinte a admitir ter dado as boleias, quanto aos dias ou situações em que diz ter dado as boleia associa a “aproveiatr” transportes que por alguma circunstância estava a fazer em serviço. Assim, se as deslocações ocorreram ao fim de semana, ao fim do dia, ou mesmo durante o dia, para fora ou dentro de (…), associa (como já dissemos) a deslocações que também estava a fazer em serviço. Querendo deste modo dizer, para o Tribunal, que não foi com a carrinha da AX fazer uma deslocação que não podia ou devia, mas sim que deu a boleia aos alunos, dizendo algumas vezes “com muito gosto”, porque ficava no caminho do serviço que ia fazer para a instituição. Assim, não usou indevidamente os bens da AX o que foi - na percepção do Tribunal - um movimento repetido do arguido, não só para demonstrar que ele não se aproveitou da instituição, mas para demonstrar que outros é que se aproveitaram. a instituição e que as deu para fazer um favor aos rapazes. Mas foi visível e perceptível que, com este discurso, o arguido foi introduzindo alterações sucessivas às justificações que dava para ter ido a determinados locais ou agarrou-se a dados, referências, de deslocações de serviço que disse ir fazer naquelas ocasiões, repetindo-as sempre que surgia o facto/evento” que as fazia espoletar. No entanto e em regra, as alterações que introduz não têm a ver com o número de boleias, local para onde as deu e a quem as deu - porque esta estrutura mantém-se -, mas com as circunstâncias em que ele arguido A as deu (cfr, por exemplo, neste sentido as suas declarações “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto …”, “(…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”). (iii) E aqui relembramos as duas situações que notámos nas declarações do arguido, noutros momentos – concretamente declarações relacionadas com o arguido E -, mas que da perspectiva do Tribunal dão sustentabilidade à análise que fazemos das declarações do arguido. Como dissemos, relacionado com uma morada do arguido E - (...) (…), lote (…),(…), em (…)- a fls. 19.179 consta uma auto de reconhecimento de local feito pelo arguido A em 21/04/04, estando a fls. 19.180 a planta do local. O arguido A falou em audiência sobre este reconhecimento, tendo dito que este local era um em que deixava jovens para irem a casa do arguido E. Disse que isto foi “muito antes” de ser motorista - e já vimos que pelo menos desde Janeiro de 1998 passou a exercer, de facto, as funções de motorista na AX, apesar da sua requalificação como tal só ter ocorrido em 2000 -, dizendo 1996/1997 e que levou, entre o mais, a testemunha AZ. Analisando as declarações do arguido, com o que acabámos de dizer, as mesmas não têm consistência face à localização que o arguido faz no tempo da deslocação a essa casa e da altura em que o arguido E passou a ter a disponibilidade dessa casa, o que o Tribunal não pode deixar de dizer (cfr. que quanto à testemunha AZ, este foi ouvido em audiência de Julgamento e o local que indicou foi o que se encontra identificado no auto de fls. 6.136, croqui de fls. 6.137, que é diferente do indicado pelo arguido A, mas corresponde à morada a que se refere o ponto “48” dos factos provados ). Pode ter feito confusão com outro local em (…) onde o arguido viveu, ou pode estar a mentir? À partida pode ser qualquer uma das situações, pelo que vejamos os passos seguintes. Mas a par desta situação de inconsistência, a outra situação parecida que ocorreu quanto a um reconhecimento e que já referimos, teve relevância para avaliar da credibilidade e veracidade global do que o arguido A disse em audiência de julgamento. E, consequentemente, para graduar o peso e sentido desta discrepância, face a outra situação ocorrida, o que passamos a fazer. Ainda em relação ao arguido E, vimos na análise já feita nos autos que aparece mencionada (relativamente ao arguido) a “ (...) (…), nº (…),(…) andar (…), no (…)”, concretamente no documento de fls. 30, do dossier de documentos constante do Apenso BF-9, datado de 1/07/91 (contrato de arrendamento do andar em causa, pelo período de 1 ano e com início em 1 de Julho de 1991, em que o arguido aparece como arrendatário). Quanto a esta morada - e agora ligando com o que dissemos, quanto ao sentido e concreto significado da incongruência demonstrada pelo arguido A, face à análise que o Tribunal fez dos demais elementos dos autos, nas declarações que prestou em audiência de julgamento quanto ao reconhecimento de fls. 19.179 - , encontra-se a fls. 19.166 dos autos um auto, com croqui/planta do local e fotografias a fls. 19.167 a 19.169, de um reconhecimento que o arguido A fez de um local na (…)/(…). De acordo com as declarações que prestou em audiência de julgamento - o arguido A foi confrontado com estes documentos -, este reconhecimento foi para indicar o local onde deixou jovens para o arguido E. No entanto disse ao Tribunal que não se lembrava “muito bem” das datas em que isso acontece, mas que foi antes e depois de ter passado a ser motorista da AX (e, como já vimos, começou a exercer efectivamente funções de motorista em Janeiro de 1998). Se olharmos para a planta do local de fls. 19.167, o ponto onde está assinalado o local que na altura foi indicado/reconhecido pelo arguido, local que o arguido em audiência de julgamento confirmou ter indicado e esclareceu ser o sítio onde deixou jovens para o arguido E, é na “(...) (…)”. Ora o documento de fls. 30, do dossier de documentos constante do Apenso BF-9 - documentos que foram apreendidos ao arguido E, cfr. fls. 4.487/9 - é um contrato de arrendamento de uma habitação sita na “ (...) (…), nº (…),(…) andar (…), no (…)”, pelo período de 1 ano e com início em 1 de Julho de 1991, em que o arguido aparece como arrendatário. Este documento foi apreendido ao arguido numa busca efectuada em 20/05/2003, data esta que é anterior ao reconhecimento do arguido A, pelo que era um documento que já estava nos autos quando foi feito o reconhecimento pelo arguido A. Mas das declarações do arguido, a forma como foi explicando os reconhecimentos que fez e porque os fez, as explicações que foi dando, se é certo que por vezes, objectivamente, demonstrava confusão quanto a datas e jovens em causa - a sensação que dava, quanto à identificação dos jovens ou datas, era que repetia o seu discurso, fazendo um agrupamento, numa só vez, de um conjunto de nomes e datas, que ia repetindo mais ou menos indistintamente em todas as situações -, mas quando fazia a identificação do local, deu e transmitiu ao Tribunal, a percepção e a noção de que os locais diziam a situações distintas, deslocações efectivamente vivenciadas pelo arguido. A explicação que dá, por exemplo (cfr. Audiência de julgamento 10/01/05), para o facto de no (…) deixar os jovens ao pé de umas escadas e não ir exactamente à casa onde vivia o arguido E - dizendo que era assim, “… deixava-os ali e eles subiam o resto a pé, muitas vezes não queriam que eu fosse lá em cima, para não dar nas vistas aos vizinhos que andavam sempre à janela … as pessoas de idade … ficavam na janela a ver, portanto …” (Juiz Presidente - Não dava nas vistas … porque é que o senhor dava nas vistas?) “…por causa de eu deixar lá os miúdos para as festas, com o meu carro …eles pediam-me para deixar ali nas escadinhas…” -, para o Tribunal fez sentido, atenta a zona que é (facto público e notório)uma zona de habitação antiga. Isto é uma daquelas situações que, para o Tribunal, foi apreensível a identificação que acima referimos, de o arguido estar a fazer a descrição de um local, com a correspondência a uma situação concreta - levar rapazes, para o arguido E - efectivamente vivenciada assim por si. E tudo o que antecede permite, para o Tribunal, concluir que as situações em que objectivamente ocorrem discrepâncias nas declarações do arguido A quanta a datas, locais, dias, momentos do dia, particularidades de locais – como é por exemplo a situação da (...) (…), não têm como única explicação a mentira. E suportam a interpretação que o Tribunal fez do movimento e do sentido das declarações do arguido A. O que temos estado a dizer tem a ver com o que foram, para este Tribunal, as declarações do arguido A durante a audiência, não só em relação a este assistente mas em relação aos demais. Isto é, o arguido A quando implica outros arguidos em situações que reconhece ter ocorrido ou quando faz declarações que possam permitir a inclusão de outros arguidos nessas situações, em regra não se exclui dessas situações. O arguido A não inclui outras pessoas e exclui-se de todo a si. O que faz é contar, quanto a si, a história de forma incompleta ou com outros contornos. Mas em algumas situações não deixa de dar elementos que nos permitem, em conjugação com demais meios de prova, chegar à sua real responsabilidade. E este foi o seu movimento global: o arguido admite a sua participação, embora configurando-a em termos diferentes do que está descrito no despacho de pronúncia ou do que foi dito pelos assistentes; como dissemos, admite ter levado jovens a (…), à (...) (…), à (…), mas foi sempre e apenas dar boleias que lhes pediram; só deu boleis, nega contactos ou conhecimentos com arguido, dizendo que isso eram os educandos que sabiam e contactavam; quando admite ter-lhe sido entregue um sobrescrito com dinheiro, não era para si, era para os jovens, dando uma ideia de que nem sabia porque é que aquilo lhe era entregue a ele; e associando, também em regra, que as boleias que deu em veículo da AX, foram dadas aproveitando serviços que ia fazer (entrando em contradição, neste aspecto, com a estrutura intrínseca do seu discurso ou com o discurso dos assistentes). E, como dissemos, transpondo isto para a declaração que foram prestadas para todos os assistentes - portanto, não só com os assistentes que têm a ver com os arguido C, E, H, K, N, Q -, o arguido não fez mais do que repetir o movimento que teve nas suas declarações ao longo do julgamento: cola os transportes que admite ter feito dos jovens - mas chamando-lhe “boleias” - com deslocações que na altura, ou por razão profissional ou por razão pessoal, por “acaso” na altura em que lhe pedem a boleia ia fazer ou tinha programado fazer. (5) Da prova produzida em audiência de julgamento não resultou – para além das declarações dos assistentes e do arguido A – relato de qualquer outra pessoa que tivesse visto o arguido H naquele prédio e o arguido H refere nunca ter estado no local ou sequer visitado. Tendo declarado expressamente, em sede de audiência de julgamento, que nunca entrou em nenhum prédio particular na Avª (…). Disse conhecer a testemunha DF, director (…), que mora de facto no nº (…) da Avª (…), mas que não sabe em que andar (ao lado morava a Sra. JJG) e com quem almoçou uma vez, mas não no nº (…). Conhece-o desde 1979. Por seu turno, inquirida a testemunha DF, jornalista, declarou ter trabalhado na FFE desde 1976 a 2001, inclusive, com o arguido H. É amigo pessoal deste, mas afirmou que mora no (…), do nº (…), da Avª (…) desde Junho de 1998 e que nunca lá viu ou ouviu dizer que H lá tenha sido visto. Disse ainda que no (…) vivia uma enfermeira doente que entretanto faleceu. Era a porteira JJH que lhe levava a comida. No outro apartamento ficava um escritório. No (…)º andar são escritórios (e percebeu-se pela testemunha ER que um apartamento de habitação desde 2003/20049. Em 2001 ou 2002 fez obras de alteração de todo o seu apartamento, mudando inclusivamente a porta que até então era igual à de todos os apartamentos. O empreiteiro que fez as obras era o JJI. O nome da empresa não recorda. Quanto à porta das traseiras, em 1998 diz que estava fechada de certeza e que a partir de 2002 vê a porta com mais movimento (a empresa de estafetas). Ouvida a testemunha DA, engenheiro, pela mesma foi dito que mora na Avª (…), nº (…), há cerca de 13 anos. Primeiro no (…), até 1998, depois no (…)º andar. Nunca lá viu o H, nem ninguém lhe disse tê-lo lá visto. Sabe que no (…)º andar morava uma enfermeira, mas nunca falou com ela. Já faleceu. As únicas crianças que lá via eram os filhos dos proprietários, sendo que nunca ninguém lhe referiu ter lá visto outros miúdos que não aqueles. Raramente passa pelas escadas do prédio, usando geralmente o elevador. O prédio era maioritariamente ocupado por empresas. Crê que o vizinho do (…)º andar direito trabalha na FFE. Alterou a porta quando foi para lá. Não sabe se tornou a alterar a porta após o escândalo. Veio testemunhar porque recebeu uma carta da mulher do arguido H pedindo-o para o fazer. Não a conhece nem sabe como ela obteve o seu nome. EQ vive no (…)º (…) do (…), desde 1998. Em frente vivia uma senhora muito velhinha e à esquerda há um escritório. É casada com a testemunha DF. Não conhece nem nunca viu o arguido H. Miúdos no prédio só os seus e os do (…)º andar. “Naquele prédio a maior parte são escritórios. Vive lá pouca gente”. As portas dos estafetas que dão para o elevador estão sempre fechadas, mas para as traseiras não sabe.” Por seu turno ET, lava as escadas do prédio das (…) há cerca de 10 anos. Vai praticamente ao prédio todos os dias. Está lá entre 2 a 3 hs diárias. Nunca lá viu nenhum dos arguidos. Nunca viu ninguém a entrar no (…)º (…). Só lá viu uma senhora que chegou a pedir-lhe ajuda para ser levada ao hospital, isto antes da “bomba rebentar” (a bomba é para a testemunha a pedofilia na casa da Sra JJG). Foi a 1ª vez que entrou na casa da senhora. O chão era de madeira, tal como o era quando ficou encarregada de dar comida aos passarinhos da Dª JJG quando esta ficou internada em DW. ER, administrador de sistemas, mora no nº (…) da Avª (…). Irmão da testemunha DA, declarou, em suma, que nada de estranho viu no prédio. DG, administrativo a trabalhar na Empresa DC, no (…),(…), Avª (…), nada acrescentou a este contexto. Quanto a WR, criadora de cavalos, trabalhou para o arguido H como assistente, no programa (…), no cinema (…) durante 9 anos. É mulher da testemunha DB, dono empresa estafetas do prédio das (…). Quanto ao prédio nada sabe de concreto, pois é muito raro frequentar os escritórios do marido. Sabe que os funcionários entravam sempre pelas traseiras, mas ela e os restantes moradores do prédio entravam sempre pela frente. Depois de terminar a relação profissional com o arguido H não manteve com ele qualquer tipo de relação. JJJ, igualmente ouvido em sede de audiência, tem um estabelecimento comercial na Av. (…), onde trabalha desde 1973. Refere que a porta das traseiras do nº (…) era por onde entravam os estafetas, mas que durante um período estiveram noutro edifício. Não conseguiu precisar o período. Declarou que no nº (…), antes da Expo 98, quando o edifício se pôs em aluguer, funcionou ali uma “casa de raparigas” chamada JJK, com anúncio no jornal. Nessa altura houve no edifício várias empresas “que entraram e saíram”. DH, empresária, é inquilina de várias fracções do (…), através da JJL. O (…)º (…), há 17/18 anos, (…)º (…) 12/13 anos, o (…)º há “muito menos tempo”. Das pessoas que conhece nunca ninguém lá viu o arguido H, nem a própria o viu. Comentava-se que havia um “bordel” no prédio, ou era no (…)º (…). ou no (…)º andar. Está demonstrado que ao anterior do dito prédio, bem como a qualquer um dos seus andares, se pode aceder pela porta das traseiras. No entanto tal pressupunha que a porta estivesse aberta ou fosse aberta por alguém, o que quer o dono da empresa, quer a testemunha que trabalhava na empresa que se situa no espaço que tem acesso pela porta das traseiras afastam, durante o período em que estão imputados os factos. Dizem que durante esse período a empresa das estafetas não esteve a laborar, pois dizem que durante esse tempo estiveram noutras instalações e as motas não terão estado lá. Mas a percepção das testemunhas moradores/utilizadores do prédio, quanto a tal circunstância - a ausência total de motas nas traseiras do prédio, durante o periodo referido pela testemunha DB -, não foi certa quanto a este facto. Por outro lado o arguido e os assistentes nas declarações que fazem, indicam a porta do a (…)º andar onde morava a Sra. D. JJG, como o sítio onde estiveram. Embora o despacho de pronúncia não diga qual o andar onde os factos se passaram, tendo os assistentes e o arguido indicado um local, há que falar sobre essa plausibilidade. E pelos documentos dos autos, relativos a fotografias do interior do apartamento desta senhora, a sua descrição não se coaduna com a descrição dos assistentes, para o Tribunal ficar com a convicção, segura, que foi na casa desta senhora que os factos ocorreram. Aparentemente vivia sozinha, embora os documentos que foram apreendidos na sua casa e que estão a fls. 2.027 a 2.030 faça, supor que teria convivência com mais alguém, pois pelo depoimento das testemunhas não resultou que fosse provável ser esta senhora a adquirir um Range Rover. Mas o certo é que isto não permite concluir, sem dúvida, que o apartamento fosse aquele - cfr. que de acordo com os elementos dos autos, o prédio é constituído por R/C e 6 andares, cada andar com três fracções (frente, esquerdo e direito), sendo o R/C com(...) por Loja , com saída directa para a via pública e anexo; R/C Esq. e F e habitação porteira; Loja R/C: correspondente à fracção A, esteve arrendado desde 1/1/87 para fins comerciais à DE, DC, DD; R/C Dto, R/C Esq., 1º andar Frente, 1º andar direito, 1º andar Esquerdo, 2º andar Frente, 2º andar direito, 2º andar Esquerdo, 3º andar Frente, 3º andar direito, 3º andar Esquerdo,4º andar Frente, 4º andar direito, 4º andar Esquerdo, 5º andar Frente, 5º andar direito, 5º andar Esquerdo, 6º andar Frente, 6º andar direito, 6º andar Esquerdo; cfr. documentos de fls. 1.430: Planta da Av. (…), a que se refere auto de fls. 1.429; Fls. 1.431: fotografia da casa da Av. (…), a que se refere 1.429 e 1.430; Fls. 1.432: fotografia da porta verde a que se refere fls. 1.431; Fls. 1.433: fotografia da porta do 2º andar a que se refere fls. 1.429; Fls. 2.003 a 2.008: certidão da CRP referente prédio Av. (…); fls. 2.026: croqui do 2º andar F da (...) (…) (a que se refere busca de fls. 2.025 ); fls. 2.142 reportagem fotográfica 2º andar F da (...) (…) (a que se refere busca de fls. 2.025, feita em 25/02/03 ); Fls. 2.149 a 2.166: fotografias do interior Av. (…), lote 3, 2º Frente; Fls. 2.268: certidão DGI, Av. (…), lote 3, 2º andar letras A,B,C,D; Fls. 18.185: foto das portas da Av. (…); Fls. 19.160: Auto reconhecimento CSS, 23/04/04, BZ e EP: (...) (…) nº (…); Fls. 19.162: Planta do local a que se refere auto de fls. 19.160; Fls. 19.163: Fotog. De exterior Av (…); Fls. 19.164: Fotog da porta da frente nº (…) das (…); Fls. 19.165: fotog das traseiras do nº (…) da Av. (…); fls. 38.070 a 38.084: Processo licenciamento do prédio da (...) (…), Lote (…), nº (…); Fls. 42.605 a 42.613 – Junção de documentos pela testemunha DH; fls. 41.387/9: Contrato arrendamento da DC, Fracção A, correspondente ao R/C Loja, do Lote (…), Bloco (…), Av (…), com inicio em 1/1/92 e autorização de Obras de 21/1/92; fls. 41.394: Contrato arrendamento da DE, correspondente ao R/C Dtº, Av. (…), Bloco (…), Lote (…) com data 1/1/87; fls. 41.391: Contrato arrendamento da DD, Fracção A, correspondente à Loja, com entrada pelo (…) A a C, da Av. (…), torneando para a (...) (…), nº (…), com data 2/2/98; fls. 41.522 a 41.539: Documentos entregues pela testemunha DF, referentes à Av. (…),(…), 2º Dto, orçamento de 18/05/01…escritura de Mútuo de 15/10/01; fls. 41.390, contrato arrendamento DD, Fracção designada pela letra C, Av. (…), Bloco (…), Lote (…), 1º F, com início em 1/10/95; fls. 41.396 a 41.401: escritura de arrendamento à DE, 1º andar Frente, Av. (…), Bloco (…), Lote (…), Fracção D, com inicio em 1/06/86; fls. 41.562: documento referente a contrato de Trabalho da test. DG, com DD, 1/1/95; (Av. (…), Bloco (…), Lote (…), 1º F); fls. 41.563 : documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, 1/11/96; (Av. (…), Bloco (…), Lote (…), 1º F); fls. 41.564 : documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, com início em 1/1/89; fls. 41.565: documento referente a contrato de Trabalho feito pela DD, 1/1/95; fls. 41.566 : documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, 1/11/96; fls. 41.567 : documento referente a contrato de Trabalho feito pela DE, com início em 1/1/89; fls. 41.568/9 : documento referente a declaração de remunerações para SS, pela DE, mês Maio de 2002; fls. 41.570 : documento referente a declaração IRC, DC, 28/04/99; fls. 41.571 : documento referente a Modelo 10, DC, rendimentos 1998;) (6) O Tribunal, quando teve que pesar o que foi dado pela Acusação e o que foi dado pelas Defesas dos arguidos A e H quanto a estes factos, acreditou e deu peso ao depoimento de AT. Mas temos que dizer que não pode ser visto este depoimento isolado, mas este depoimento englobado nos demais que prestou. Em audiência, quando esteve frente ao Tribunal, a globalidade da forma como falou e como disse, quer em relação aos actos de abuso sofridos pelo arguido A, quer em relação aos demais, foi um depoimento globalmente sofrido e intrinsecamente consistente quanto à existência de abuso e da natureza de abuso. E mesmo quanto à identificação dos seus abusadores. O Tribunal manteve distanciamento em relação aos depoimentos. Não fizemos o exercício mais fácil de em tudo acreditar ou de tudo negar. Face ao que nos foi demonstrado em audiência de julgamento, houve situações em que o Tribunal, explicando, acreditou e houve outras que não ficou seguro, para além da dúvida razoável e não deu os factos como provados. E, no caso concreto o Tribunal teve, por um lado, o depoimento do assistente e do arguido A, com a avaliação acima feita, nos quais acreditou, face a uma negação do arguido H. Embora, invocando também as contradições das declarações quanto às portas, e circunstâncias de tempo, momento do dia e dia da semana/fim de semana em que descrevem ter ido (nesta parte divergência entre o arguido A e o assistente). O facto de o arguido H não ter sido visto naquele prédio, não exclui a possibilidade de lá ter estado, como afirma o assistente e o arguido A. Como vimos resulta de dois dos depoimentos das testemunhas que ali funcionou uma casa relacionada, eventualmente, com prostituição e não foi notada pela maioria dos moradores ou utilizadores e várias fracções do prédio eram ocupadas por escritórios, como referiram as testemunhas. Não demos relevância significativa à coincidência de neste prédio residirem pessoas ligadas à FFE, ligadas ao arguido H por razões de conhecimento profissional, pois também foram ouvidas testemunhas que nada tinham a ver com o arguido. (7) Mas convocamos o que atrás dissemos, quanto à estranheza que foi para o Tribunal, tendo em atenção as situações que foram descritas - quanto aos processos disciplinares que o arguido A teve dentro da instituição, por causa de lhe serem imputados factos relacionados com práticas de natureza sexual com educando da AX ou por violação de proibições de entrada em CZ ou de se dar com alunos, derivadas da imputação dessas prática - e tendo em atenção a actuação que o (...) da AX teve em 1991, aquando da reintegração do arguido A – cfr. análise crítica da prova, concretamente a referência aos procedimentos tido pelo então (...) da AX, Dr. BQ, pedindo à Tutela que o arguido A fosse transferido para outro local; mas também, em contraposição, o aí referido quanto ao Louvor e funções que, efectivamente, o arguido A passa a exercer desde então -, o total desconhecimento que foi revelado ao tribunal pelas testemunhas, quanto a qualquer referência a essas imputações. E criou estranheza porque, como dissemos, a AX era uma instituição grande mas era um meio pequeno, o que, atenta a experiência da vida, potencia que as pessoas falem entre si, ou comentem o que se passa ou o que se passou de “mal” com alguma pessoa. E, neste caso, não estamos a falar de “coscuvilhice”. Estamos a equacionar a normalidade de as pessoas falarem entre si ou comentarem, coisas que “ de mal” se passaram com alguém – e atenção, não estamos a falar, apenas, de situação em que o arguido A pudesse estar envolvido, mas de situações em que pudessem estar envolvidos quaisquer outros funcionários -, ou de suspeitas que houve de situações que se tenham passado, mas em que estavam em causa actuações que podiam por em risco a educação, saúde e formação dos educandos internados e ao cuidado da AX. Houve um silêncio dentro da instituição - quanto a qualquer referência a su(...) ou pensado envolvimento do arguido A com educandos, ou quanto às proibições a que o arguido esteve sujeito, de entrar em CZ, fazer o transporte de alunos ou ter contactos com educandos -, que gerou este desconhecimento das testemunhas, teve consequências. E uma das consequências, tendo em atenção: - o número de actos de abuso de natureza sexual que o arguido A admitiu ao Tribunal ter praticado, o número de alunos envolvido em tais actos e o tempo pelo qual se prologaram; - os actos de abuso de natureza sexual que o tribunal veio a dar como provados em relação ao arguido A e em relação ao arguido C e nas circunstâncias em que os deu; - e o que resulta dos documentos constantes de fls. 50.555 a 50.629 e de fls. 50.655 a 50.723 (referentes à certidão dos acórdãos proferidos, respectivamente, no processo nº 15.699/03.8TDLSB, da (...), em que o arguido GGF, funcionário na AX, foi condenado pela prática, entre Dezembro de 1999 e Maio de 2000, de dois crimes de abuso sexual em educando da AX; e no processo nº 15.680/03.7TDLSB, da (...), em que o arguido GGH, funcionário da AX, foi condenado pela prática, no Ano Lectivo de 2001/2002 numa situação e entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003, de um crime de abuso sexual e dois de violação em educandos da AX), em que funcionários da AX foram condenados, por decisão transitada em julgado, pela prática de actos de abuso de natureza sexual em educandos da AX no “Ano Lectivo de 2001/2002” (numa situação) e “entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003” (noutra); foi - na convicção do Tribunal - que se desenvolveu, em quem praticou tais actos dentro da instituição, um forte sentimento de confiança de que os actos não eram descobertos e de que os EDUCANDOS NÃO FALAVAM de tais actos. Mas, como dissemos, criámos a convicção que quem praticou tais actos dentro da instituição – e quando dizemos “dentro da instituição” abrangemos, também, aquelas situações que ocorreram foram dos muros da instituição mas com os seus educando -, não precisou de criar “esquemas”, artifícios elaborados ou modos de procedimento muito conjecturados, para que os jovens escapassem à vigilância dos educadores e os actos pudessem ser praticados ou para que tais actos não fossem descobertos. Para o tribunal dentro da AX instalou-se e naturalmente desenvolveu-se um sentimento surdo de impunidade, por parte de quem praticou tais actos. Isto ultrapassa que tais factos possam ser avaliados e valorados - para efeitos da descoberta da verdade em sede de processo penal, que é o que estamos a tratar -, apenas à luz do que a experiência nos diz o que seria o comportamento de um homem médio e comum e apenas à luz de critérios de razoabilidade. Face ao senso comum – ao que já dissemos quanto ao que foi o percurso do arguido A dentro da instituição, pelo menos até 1989; e ao que atrás já descrevemos quanto ao número de pessoas que disseram não ter qualquer conhecimentos de que o arguido A tivesse estado associado a situações de abuso de natureza sexual com educandos da AX -, à partida é razoável pensar como possível que o número de educadores ou pessoas que lidavam com os educandos e que enunciámos – profissionais da AX, com as funções que exerceram e pelo tempo e nos períodos em que as exerceram -, nunca tivessem ouvido qualquer referência ou ter-lhes sido feita qualquer referência (sempre por causa dos educandos) pelas pessoas responsáveis pelo internato ou outras, quanto aos incidentes que foram falados ter ocorrido entre o arguido A e educandos e as proibições de contactos com alunos e de entrar em CZ? Face ao senso comum, à partida seria razoável pensar que o arguido A poderia praticar o número de actos de abuso de natureza sexual que admitiu e aqueles que o tribunal veio a dar como provados, pelos períodos e com o número de alunos que resultou provado, sem que os educadores ou técnicos de outras áreas se apercebesse e sem que algum aluno falasse? Entendemos que, à partida, para o senso comum a resposta seria: “dificilmente” tal seria possível. Mas as concretas especificidades ou particularidades que estão subjacentes ao cometimento e ao sofrimento de crimes da natureza dos que estão em causa nestes autos – quer falando de quem os comete, quer falando de que é sujeito a essas práticas - e o ambiente concreto – AX – em que os mesmos foram praticados ou que permitiu que os mesmos fossem praticados, levaram este Tribunal a concluir, como vimos, que tal foi possível acontecer e que aconteceu. E a relevância de dizer, neste momento o que antecede – em que estamos a falar de um crime fora do círculo AX, embora com educando da AX -, tem a ver, também, com dar a perceber a quem é dirigida a decisão, do que esteve subjacente ao pensamento de quem avaliou os factos, do que também foi pressu(...) da sua valoração e da possibilidade e consistência de os mesmos terem acontecido. Isto porque o que agora dissemos não está exclusivamente relacionado com o arguido A ou com o arguido C – e com o ambiente e sentimento de impunidade que, ao longos dos anos e do modo que assinalámos, foi-se sedimentando dentro da AX para o arguido A e para aos (demais) funcionários que praticaram factos desta natureza (cfr. Doc. fls 50.555 a 50.629 e de fls. 50.655 a 50.723, referentes à certidão dos acórdãos proferidos, respectivamente, no processo nº 15.699/03.8TDLSB, da (...), em que o arguido GGF, funcionário na AX, foi condenado pela prática, entre Dezembro de 1999 e Maio de 2000, de dois crimes de abuso sexual em educando da AX; e no processo nº 15.680/03.7TDLSB, da (...), em que o arguido GGH, funcionário da AX, foi condenado pela prática, no Ano Lectivo de 2001/2002 numa situação e entre finais do ano de 2001 e início do Ano de 2003, de um crime de abuso sexual e dois de violação em educandos da AX -, mas está relacionado, também, com os demais arguidos. Repetindo, a montante, independentemente do que esteve ou está certo ou errado na vida destes arguidos, independentemente da experiência, valorização profissional ou social, independentemente de estilos de vida, circunstâncias de uma vida ou opções legítimas de vidas com que possamos ser confrontados, estes crimes podem ser praticados por pessoas com enquadramento e relevo social, vida familiar e profissional reconhecida. E, a jusante, independentemente da fragilidade ou degradação moral ou social, de quem se possa apresentar como vítima, pode haver um crime e essas pessoas, quanto a esse crimes, devem ser ouvidas sem prejuízo ou preconceito, quanto à possibilidade ou probabilidade de poderem falar verdade. E de, genuinamente, poderem sofrer com tais factos. (i) Uma das testemunhas apresentadas pelo arguido H e que foi uma das testemunhas que prestou depoimento quanto às condições pessoais do arguido, o Senhor CCG, disse que tinha respeito e amizade pelo arguido, não estava a ver a vida do arguido nestes “campos”. Disse que o arguido H é um homem muito inteligente, podia ser chantageado e não acredita que desse esse passo (referindo-se aos factos deste processo). São coisas que não “lhe passam pela cabeça”, mas dizer se “sim” ou “não” não pode. É, de facto, um depoimento em que se vê ausência de preconceito. Há determinados factos que podem ocorrer na vida de uma pessoa, independentemente da consideração que o mesmo tenha social ou familiarmente, o que é uma percepção que o Tribunal não pode deixar de ter. E aqui introduzimos também o que dizemos noutro local, quanto ao que está subjacente à valoração da prova. (8) Reportando-nos - e reproduzindo, por súmula, também para maior facilitação e concisão de exposição, o dito e citado no Ac. do S.T.J. de 23/04/2008 (Pº 05P3199, relatado pelo Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Soreto de Barros, www.dgs.pt; citação cfr. “Cristina Líbano Monteiro, In Dúbio Pró Reo, Coimbra, 1997) ), sendo da nossa responsabilidade a escolha dos segmentos citado - e fazendo esta referência relacionado não só com a análise crítica da prova que imediatamente antecede, mas com o que anteriormente já expusemos e com o que consta das exposições posteriores, mesmo que para núcleos de facto diversos dos que agora estamos concretamente a tratar, para a descoberta da verdade “(…) o juiz lança-se à procura do «realmente acontecido», conhecendo, por um lado, os limites que o próprio objecto impõe à sua tentativa de o «agarrar»(…). (…) «Verificar cada um dos enunciados factuais pertinentes para a apreciação e decisão da causa é o que se chama a prova, o processo probatório» e que «para levar a cabo esta tarefa, o tribunal está munido de uma racionalidade própria, em parte comum só a ela e que apelidaremos de razoável». E isto porque a «prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade»: « no trabalho de verificação dos enunciados factuais, a posição do investigador-juiz pode, de algum modo, assimilar-se à do historiador: tanto um como outro , irremediavelmente situados num qualquer presente, procuram reconstituir algo que se passou antes e que não é reprodutível». Donde que « não seja qualquer dúvida sobre os factos que autoriza sem mais uma solução favorável ao arguido», mas apenas a chamada dúvida razoável (“ a doubt for which reason can be given”). Pois que « nos actos humanos nunca se dá uma certeza contra a qual não militem alguns motivos de dúvida». «Pedir uma certeza absoluta para orientar a actuação seria, por conseguinte, o mesmo que exigir o impossível e, em termos práticos, paralisar as decisões morais». Enfim, «a dúvida que há-de levar o Tribunal a decidir tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do Tribunal»(…)”. O concreto trabalho de análise crítica da prova que este processo implicou, face ao que são os factos objecto do processo, as provas e meios de prova em concreto produzidos, a sua exposição tão próxima quanto possível do que foi o nosso processo lógico, racional, de exposição de dúvidas ou de razoabilidade da opção de avaliação tomada, foi duro e difícil. Ora face à natureza e diversidade da prova que chegou aos autos através das testemunhas, os seus depoimentos, pelo menos no que diz respeito aos actos de abuso em si e com estes arguidos - independentemente do tipo de participação ou contributo de cada um deles -, não forneceram uma prova directa dos factos a dar como provados ou não provados pelo Tribunal. Deram, sim o conhecimento de factos, com maior ou menor relevância, que conjugados entre si e com a demais prova em apreciação pelo Tribunal, concorreram para o Tribunal chegar à sua decisão de facto e dizer porque é que deu maior credibilidade ou valor a um depoimento em detrimento de outro, ou a uma declaração em detrimento de outra. Mas e esta uma das dificuldades objectivas no tratamento da prova, dada a sua extensão, sempre conjugadas numa unidade de sentido. Assim, cada elemento per si pode ser pouco, mas conjugado com outros assume peso, sentido e força intrínseca quanto à sua força probatória. Como pode haver núcleos de elementos probatórios que ligados entre si tenham uma aparência de consistência intrínseca - especialmente quando se aferem face a critérios de racionalidade pura, do que é o normal do dia-a-dia -, mas quando valorados face a outros, que em termos de racionalidade pura, do que é o dia a dia da vida do comum das pessoas, não têm força suficiente para retirar a convicção que o Tribunal formou quanto a estes últimos. E por uma razão que não deixamos de expor. A convicção do julgador não é uma convicção arbitrária, mas é objectivada até onde pode ser. Isto porque no processo pelo qual explicamos porque é que chegámos a determinada conclusão, interpretámos determinado gesto, modo de estar ou de falar, com determinado sentido, há necessariamente uma componente de convicção não inteiramente objectivavel. É aquilo que advém da imediação - e o que estamos a dizer aplica-se, como é evidente, ao que foram as análise que o Tribunal fez das declarações dos Assistentes ou dos arguidos - e que os critérios de racionalidade pura, os conhecimentos científicos, teses ou teorias quanto à mente, à memória ou à sua recuperação, ou o que é a experiência comum por vezes não podem afastar. E, no caso concreto, as divergências e contradições apresentadas nas declarações prestadas pelos assistente e pelo arguido A, quanto às circunstâncias em que ocorreram os abusos, face ao que foi, por sua vez, a convicção do Tribunal quanto à consistência concreta da descrição do abuso por parte de AT e face ao que foi a negação do arguido e a prova produzida quanto ao prédio da (...) (…), excluem a convicção do Tribunal quanto à ocorrência do abuso? AT, como dissemos, demonstrou sofrimento no que disse e quando disse. Demonstrou uma proximidade com aquele abuso, naquele prédio, na altura em que foi e com a pessoa que foi. E as declarações do arguido A, dentro do que foram e como o Tribunal as analisou, corroboraram as declarações do assistente AT. Esta convicção, no caso concreto, pesou mais. (9) O Tribunal deu ainda como provado que o arguido H admitiu que o AT tinha menos de 14 anos. Foi visível para o Tribunal, quando ouviu o assistente perante si, que este tinha uma estatura pequena e já tinham decorridos cerca de cinco anos sobre os factos. Não é um jovem com barba “cerrada”, ou expressão pesada, aparentando menos idade do que aquela que tinha quando esteve perante o tribunal. Daí que, necessariamente, em 1999/2000 o arguido teve de equacionar a possibilidade de AT ter menos de 14 anos. Quanto aos demais factos relacionados com o conhecimento do arguido da consequência da prática dos actos no assistente, a idade do arguido, o seu percurso profissional e a capacidade que demonstrou em audiência de julgamento de compreensão e capacidade de valoração das situações, foram suficientes para o Tribunal. (9) Quanto aos factos relacionados com o recebimento de dinheiro por parte do assistente e do arguido A, os dois confirmaram-no. E embora o arguido A tenha dito que o dinheiro não era para si, tendo o Tribunal concluído que foi o arguido que levou o assistente e que lhe deu dinheiro - e lembramos as declarações do arguido A quando disse, respondendo a perguntas do Tribunal, neste sentido as suas declarações “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto …”, “(…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”). Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). Por todo o ex(...), a motivação e razão pela qual o Tribunal deu como provados os factos constantes dos pontos “106.” a “106.25” dos factos provados. E quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados – pontos 24. a 24.2. -, os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre os mesmos, sendo que quanto à questão do contacto, se foi o arguido H a contactar o arguido A, ou se poderá ter sido outra pessoa por si, é uma dúvida que ocorre. Aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 13.1.17. (Factos ponto 7.2. do despacho de Pronúncia /AP:) Na A.J. 20/06/05 - sessão em que, como já referimos, o assistente estava a responder a pedidos de esclarecimento do Tribunal e em que o seu relato era “livre”, no sentido de que o Tribunal apenas lhe dissera par contar o que tivesse e se tivesse alguma coisa para dizer - o Assistente AP descreveu, sem qualquer interrupção pelo Tribunal, o que se passou a seguir ao abuso do arguido A (aqui e no sentido de manter a maior clareza possível quanto à dinâmica do que foi o discurso do assistente, o Tribunal vai reproduzir parte do que já dissemos anteriormente). (1) AP relatou ter ido uma 1ª vez a (…), referindo - aquando do relato desta “1ª vez” e, portanto, aparentemente como referido a esta “ 1º vez” - o transporte numa carrinha (…), da AX e que já se encontravam na carrinha os colegas AV, AT e AN. Não se recordava se foi de manhã, de tarde ou à noite “… sei que estava no lar…em frente…onde fui abordado pelo Sr. A para entrar…”. Em (…) viu viaturas “topo de gama”, “ …onde se encontrava um (…), um (…) e um (…), pertencente ao Dr. K….”. Descreveu que “ …chegando a essa casa éramos recebidos por uma senhora D. Q…pela qual dava um beijinho a mim e ao AV…”, que esclareceu que era o colega AV. “…Recebidos por essa senhora éramos encaminhados até ao interior da casa, onde estava o Sr. H, o sr. N”. O relato foi interrompido neste momento por o Assistente estar a chorar. Reiniciado, disse que no interior da casa eram levados para uma sala, onde estavam, para além de outro adulto, os arguidos N, H , K e C. Acrescenta que eram encaminhados para o interior da casa pelo arguido A, continuando que no interior da casa o arguido N perguntou se queriam tomar sumos ou água. Após os jovens foram (...)s num quarto, arguido N disse-lhes para tirarem a roupa. Nesta altura - e como já notado anteriormente - o seu discurso não era “corrido” da forma que fora anteriormente à interrupção, convocando (e reproduzindo) o Tribunal o que já disse quanto à forma como tratou o choro do assistente e à avaliação que fez da atitude que o assistente transmitiu antes e a que transmitiu depois da interrupção. (1.1) Prosseguindo, disse que nesta altura o arguido N tocou no pénis dos jovens que estavam na sala e o assistente AP foi levado para um quarto pelo arguido H. Nesse quarto praticou actos de coito oral e coito anal com o arguido H. O arguido A recebeu um envelope do arguido N. Dentro da carrinha, de regresso para o (...), recebeu dinheiro desse envelope. As viagens a (…) foram”…se não estou em erro, cinco vezes que eu lá fui , entretanto, já no (...), fui levado pelo sr. A ao (…), se não estou em erro, onde me fui encontrar com o Sr. H…”. Nessa mesma audiência de 20/06/05 o tribunal pede esclarecimentos ao assistente AP quanto a alguns aspectos dos factos que de forma livre e sem interrupções no discurso descrevera ao tribunal (tendo em atenção que quando fora perguntado, em relação à primeira situação que descreveu na Garagem de CZ com o arguido A, quais foram de entre as outras situações que relatou – “(…)”, uma situação “fora de (…)” ou uma “casa em (…)”-, os factos que se passaram depois da “ Garagem”, que AP respondera “ …a ida a (…).”) . O tribunal pediu-lhe esclarecimento pontuais quanto à forma como se recordava de ter sido contactado da “ 1ª vez” que foi a (…) (AJ 20/06/05), e AP repete o que já dissera, que estava a brincar em frente ao lar, que foi o arguido A que o abordou, entrou dentro de uma carrinha, já lá estavam AV e AT. E aqui acrescenta “… o AT, o X, o AN, AZ … e mais alunos que presumo eu tenham sido de outros (...)s…” e, porque perguntado, disse que “ presumia” que eram de outros (...)s, porque não os conhecia dos lares (do (...) onde estava) e nunca “ …os tinha visto uma única vez na vida…”. Na AJ de 20/6/05, quando o Tribunal lhe pediu esclarecimentos para tentar localizar no tempo as vezes que foi a (…), períodos que distanciaram entre as diversas vezes (perguntando o tribunal se se lembrava se algumas das vezes foi próxima de algum acontecimento), respondeu de forma que, para o tribunal, preenche o padrão que temos estado a referir, de ausência ou incapacidade de ter noção do tempo, dizendo “… aaa…não sei Sra. Dra….tenho uma vaga ideia que tenha sido perto do Natal, porque eu sei que fomos uma vez a (…) e…meses depois…sei lá…já “ távamos” no Natal…”. A noção de “tempo” é: perto do Natal, porque meses depois estávamos no Natal…. Na audiência de julgamento de 22/07/05 volta a dizer que foi “sempre a (…) com AT” , corrigindo num segundo momento que sabe também foi com AT. (2) Assim, tentando localizar na vida de AP quando ocorreu a “1ª” ida a (…), AP responde neste momento (AJ 20/06/05), que devia estar na 4ª classe, “…se não estou em erro…4º, 5º ano…não recordo Sra. Dra..”. Acrescentando (quando lhe é pedido esclarecimento sobre se lembrava se tinha aulas só de manhã, só de tarde…), e a título de exemplo do seu horários “… eu tava nos currículos alternativos, se é este o nome…e tínhamos aulas de manhã até à tarde…digamos das 8 às 6 horas, um exemplo…”, “…um exemplo, porque não sei se era este o horário concreto…”. Na audiência de julgamento de 29/06/05, quando estava a responder aos pedidos de esclarecimentos por parte do Ministério Público, diz que quando foi a (…) a 1ª vez já se encontrava no currículo alternativo. Como acima vimos, o “4º/5º ano” para AP pode significar entre o ano lectivo 95/96 e o ano lectivo 98/99 e os “ currículos alternativos” podem abranger o “5º ano” do ano lectivo 98/99 ou o “6ºano” do ano lectivo 99/00, que AP ainda começou na AX. Se se fizesse uma valoração literal das declarações do assistente, se este diz que da “ 1ª ida a (…)” estavam na carrinha AV e AT, esta primeira vez teria que ter ocorrido a partir de Outubro ou Novembro de 1999, altura em que AT entra como interno na AX. Quando o tribunal tentou localizar com mais precisão o período do dia ou dia da semana/fim de semana em que ocorreu ou ocorreram deslocações a (…), na AJ de 20/06/05 AP repete o que já tinha dito anteriormente, que “ …não se recorda…” quanto a se tinha aulas ou não, “ …julgo que sim…mas não tenho a certeza, Sra. Dra…”. A relevância de ressaltar este tipo de resposta de AP neste primeiro dia (AJ 20/06/05), em que ainda estava, apenas, a ser perguntado pelo tribunal, tem a ver com o seguinte: é que se esta resposta do “ não me recordo”, fosse dada numa fase em que o assistente já estivesse a ser sujeito ao contraditório, que foi pormenorizado, detalhado, cerrado, quer por parte do Ministério Público, quer por parte dos demais Sujeitos Processuais, o Tribunal poderia interpretar que o “ não me recordo” ou “ não me consigo recordar” era um refúgio por cansaço/saturação ou para não dar uma resposta que pudesse vir a ser apontada como contraditória. Mas nesta altura ainda estava a ser perguntado apenas pelo tribunal de forma livre, aberta, tendo sido a intenção de identificar as situações mas, numa primeira abordagem, sem que tivesse ainda a noção do contraditório ou a sensação de que estava a ser apanhado em qualquer contradição. Para dar confiança, para falar livremente e assim, espontaneamente, deixar o assistente revelar as suas fragilidades, contradições ou o que houvesse. O tribunal teve a preocupação de deixar emergir o que fosse para emergir para, assim, tentar perceber a invenção, o que é recriado ou influência da comunicação social ou uma hipótese que foi apontada por alguns arguidos, pelo menos pela Defesa do arguido E e H, a “transferência” de situações de abuso vividas com outras pessoas para estes arguidos. Quando o tribunal (na AJ 20/06/05), lhe pede esclarecimentos quanto a pormenores da viagem para (…) – se passou por alguma Ponte, se foram por estrada ou auto estrada, se passaram por via verde -, AP disse que não se recordava. Pedido para dar uma descrição do que se recordasse da “ 1ª vez” que foi a (…), pois a “ 1ª vez” poderia ter sido a mais marcante para AP e, eventualmente, ser a que desse ao Tribunal uma referência mais próxima do que se passou quanto à apreensão do espaço e das pessoas , da resposta que AP deu nesse momento (na AJ de 20/06/05) - valorada face à análise da globalidade dos esclarecimentos que já dera e dos que deu posteriormente -, resultou para o tribunal que AP, apesar de estar a responder a uma pergunta que tinha como pressu(...) “ a 1ª vez”, foi dando respostas que avaliadas globalmente e com a distância que o fim do julgamento permite (pois temos a visão de tudo o que foi respondido), foram uma confusão de pormenores e referidos a diferente situações ocorridas. Assim e falando da primeira vez que foi a (…)diz: Num primeiro momento (AJ 20/06/05) fala da carrinha (…), mas faz a referencia à (…) em termos genéricos (“…. A ia-nos buscar numa carrinha (…)) e repete na AJ 20/06/05 que “sempre” foi na carrinha (…)”. Aqui convocamos o que já dissemos anteriormente quanto à utilização de veículos por parte do arguido A, tanto utilizava veículos (…) como veículos (…), pelo que a referência a um veículo ou a outro, não foi elemento de descredibilidade. Concretiza que A entra da 1ª vez na casa, tendo chegado mesmo a dizer que A entrou numa sala que existia na casa. Acrescenta que o arguido A entrou de todas as vezes na casa O arguido N abriu a porta. Diz que viu a arguida Q, acrescentando que de todas as vezes que foi a (…) viu a arguida Q (AJ 20/06/05) e que esta lhe falava directamente. Quanto aos actos com o arguido H manteve os mesmos que já referira, diz que viu N a falar com o arguido A. Quanto a Colegas , disse que não sabia o apelido do AN que disse ter ido consigo e repete a afirmação quanto aos demais e já mencionámos. E Tribunal pediu-lhe o croqui da casa, face à descrição que estava a fazer. E foi nesta AJ 20/06/05 que passou a falar da “ 2ª vez” que foi a (…). Disse que não se conseguia recordar do tempo que passou entre a 1ª vez e a 2ª vez que foi a (…). Acrescentou “ julgo que semanas…p´raí” Mas aqui, mais uma vez e tendo em atenção o que foi a noção do tempo de AP - diz que uma vez próximo Natal…porque meses depois já estava no Natal e situa ultima vez que foi a (…) disse que “ tinha 15 anos, antes de ser expulso da AX” -, temos que estas declarações situam o fim das idas a (…) de AP, de acordo com a sua memória, em Março/Abril 2000. Mas na AJ 6/07/05 declarou que os factos com DU (que o acórdão desse processo deu como provado “ data não apurada do ano de 1999, desde esse dia e durante mais de um ano” – X – e “data não determinada de 99, situada entre os meses de Setembro e Dezembro” – AP) ocorreram antes dos factos de (…). Na AJ 29/06/06 diz que a primeira vez que foi a (…) já estava nos currículos alternativos, o que - de acordo com os elementos constantes dos Apenso Z-15 e DA -, o primeiro ano nos currículos alternativos é 98/99 e ainda começa a frequentar no ano 99/00, quando saiu da AX. Disse, também (AJ 20/06/05), que de todas as vezes que foi a (…) foi com o arguido A e não se recordava de alguma vez ter sabido na véspera que ia a (…). Foi expressivo pois disse ” sempre fui abordado pelo sr. A. Nunca nos disse: olha, amanhã vamos a (…) ou…foi sempre, era sempre no dia que eles nos pegava e levava”. E quando Tribunal (AJ 20/06/05) faz-lhe perguntas para tentar localizar se os factos aconteceram no Verão ou no Inverno (perguntando-lhe se se recordava se fazia frio, se era Verão, se era Inverno….), responde: “Sra. Dra. eu na altura tinha 7 anos”, “não consigo recordar”. Convocamos a análise que anteriormente foi feita em relação a AP, a sua noção de tempo e como o exprimiu, quando falámos dos factos passados no (...) do arguido K. Mas quanto a esta questão da idade e do “ser pequenino”, que se repetiu ao longo de todos os interrogatórios, diz na ultima instância, AJ 22/07/5, “… Sra. Dra. …eu…gostaria, desde já, dizer ao tribunal que não consigo…aaah…infiltrar-me nas datas, anos, não tenho memória para isso, e…falei em idades que…não sei se são as que….as idades concretas, na altura, porque…Srª Dra, foram tantas coisas que me aconteceram e não consigo…sei lá…indicar naquela altura tinha “x” anos, foi no ano tal, não consigo e…e como o Sr. Dr. Advogado disse, é…houve contentação porque eu não consigo….”. Continua a falar quanto à 2ª vez em (…) (AJ 20/06/05), refere os mesmos arguidos, outro adulto, volta a identificar o (…) do arguido K em (…), dizendo que viu o arguido K e que já o conhecia do seu (...). Diz que sempre recebeu dinheiro do arguido A. (2) Quanto à ida de AP a casa de (…), o Tribunal ficou convicto que foi e também pela diligência que fez com o assistente a esse local. O Assistente, em audiência de julgamento, foi com o Tribunal à (...) (…), nº (…). Em relação a este local o assistente tinha feito a descrição do interior e a deslocação foi feita após a descrição. No despacho proferido para essa deslocação o Tribunal determinou ao elementos da PSP/corpo de segurança pessoal, a quem cabia a deslocação dos Assistente, que a mesma fosse feita em carros diferentes, de forma a que não tivessem qualquer contacto antes da realização da diligência. Para a diligência os Assistentes foram chamados, separadamente, pelo Tribunal (pois ia também AV). Quanto à diligência, a AP foi pedido que demonstrasse os locais onde disse que A o deixou das várias vezes que disse ter ido aquela casa, o percurso que fizeram para chegar à casa depois de saírem do carro, em que dependência ou dependências da casa estiveram e o que fizeram em cada uma da/s dependencias. Da diligência feita com este assistente há um aspecto que foi impressivo para o tribunal: o assistente, ao iniciar a diligência, depois de ter dito onde o arguido A parou o carro no exterior da casa, seguido por mim e pelas demais pessoas presentes na diligência, subiu as escadas exteriores da moradia e que dão acesso à porta (da frente) de entrada da moradia e, ao entrar na casa, pela porta principal, num gesto imediato, sem qualquer hesitação, sem olhar em redor, a cara estava inclinada para baixo, num gesto que ao Tribunal aparentou mecânico e natural – que para o Tribunal pareceu de quem sabia como era o que estava depois de entrar na porta, de quem já tinha estado para dentro daquela porta principal de entrada -, começou imediatamente a dirigir-se para subir as escadas que estão imediatamente à esquerda de quem entra na casa. O Tribunal verificou que estas escadas são as que, no interior da casa, dão acesso do piso por onde entrámos (que identificamos como R/C) para o piso superior, onde ficam as divisões que estão mobiladas como quarto (uma das quais com uma casa de banho privativa), uma casa de banho e uma divisão que está mobilada como sala e da qual parte uma escada para um outro piso acima (que identificamos como sotão). Foi a relatora, por estar a presidir à audiência e por seguir imediatamente o Assistente aquando da sua entrada no interior da casa, que lhe disse para aguardar e para descer os dois ou três degraus que já tinha subido da escada de acesso ao “piso dos quartos”, esperando no local por onde estávamos a entrar, um hall de entrada. Durante as diligências todas as portas das dependências da casa estavam fechadas, só tendo permitido que fossem sendo abertas pelo Assistente, pelo Tribunal ou num caso pela própria arguida Q - por dificuldade com a abertura de uma fechadura -, à medida que o ia autorizando. Isto para que o assistente não pudesse, previamente, ver que dependência ou o que estava para além de cada porta. A determinada altura o Assistente AP – e quando nos encontrávamos no piso por onde entrámos (o R/C) -, após ter estado numa dependência que está mobilada como sala (localizada à direita de quem entra na residência pela porta da (...) que foi utilizada pelo Tribunal para entrar na residência), descreve que havia uma escada para as traseiras da casa, para o jardim, escada esta a que se tinha acesso pela cozinha. O assistente sai da sala onde estava e desloca-se para um pequeno corredor, vindo da sala e indicou uma porta como sendo a da cozinha. Aberta a porta entrámos numa cozinha, na qual havia uma porta em alumínio ou metal, que dava acesso a um varandim, do qual partia uma escada de acesso a um quintal, situado a um nível inferior ao daquele em que estávamos. É certo, também, que o assistente disse que a “cozinha era mais para a direita e a escada era mais para a esquerda” e, entrando na cozinha, a porta de alumínio ou metal que dá acesso a essas escadas “do jardim” são em frente quando entramos na cozinha. No entanto também verificámos que estando nessa porta de alumínio ou metal, com as costas voltadas para a cozinha, temos que andar para a esquerda para aceder ao lance de degraus pelos quais se pode descer para o jardim. Ainda dentro da casa e numa parede onde existiam duas portas, fechadas, foi perguntado ao assistente se sabia o que estava atrás daquelas portas e disse, em relação a uma delas, que era a casa das bolachas, ou onde estavam as bolachas. Aberta a porta aquela divisão era uma despensa. Quanto ao mobiliário da casa , no piso por onde entrámos (o R/C),o Assistente AP declarou que uma cómoda que se encontrava no hall de entrada já a tinha visto lá, bem como objecto em metal, com o formato de um vaso, com uma cor idêntica ao do cobre, que estava nesse hall com umas flores dentro, no entanto podia ser uma afirmação “arranjada” na altura, pelo que não teve especial valorização por parte do Tribunal. O Tribunal ficou com a convicção que AP esteve lá, no interior daquela casa: o gesto na entrada foi mecânico demais para quem não soubesse o que ia fazer. AP não ficou à espera que a porta se abrisse para ver o que estava lá dentro; e a localização das dependências no R/C, a localização da despensa, foi um pormenor que criou convicção ao Tribunal, de que AP esteve ali. Havendo que determinar o quando, com quem e o efectivamente ocorrido. (3) E é aqui que o Tribunal assume a posição que já anteriormente tomou e (…) foi uma das situações em que isso mais ocorreu, até pelo cruzamento dá multiplicidade de memórias que teve que equacionar quanto a tal local. Assim, ou a descrição do assistente, cruzada com os documentos e com os demais depoimentos, permite uma certeza processual de que os factos e situações que relata são aquelas a que se referem os factos objecto do processo, que o que estivemos a ouvir é a realidade trazida para o processo – o que permite a aplicação do artº 358º, do C.P.Penal, quanto a, por exemplo, alterações de datas – ou é diferente. E no presente caso, face às declarações que globalmente foram produzidas pelo assistente, esta alteração, a comunicá-la e a fazê-la, significaria mais uma plausibilidade que uma certeza para além de dúvida razoável. O assistente diz que “sempre” que foi a (…) estavam lá todos os arguidos, o que atenta a normalidade das coisas também não nos parece plausível que a disponibilidade profissional ou pessoal de cada um dos arguidos, permitisse uma convergência da forma que AP refere. Mas os elementos dos autos e trazidos pela Defesa - quer os elementos dos Apensos EE, do Apenso EB, dos registos referentes a chamadas telefónicas quer do arguido A, quer do arguido C, quer do arguido H (cfr. registos do Apenso V, sobrescrito 25) -, não permitem chegar a essa conclusão. Acresce que AP faz a convergência das idas a (…) sempre com AT, relaciona-as em data posterior aos factos com DU e AP sai da AX no fim do primeiro trimestre de 2000. Pelo que, avaliando toda a prova produzida quanto aos factos constantes do ponto “7.2” do Despacho de Pronúncia, não foi produzida prova suficiente para o Tribunal quanto a tais factos, pelo que, aplicando o princípio do in dubio pro reo, os factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos “46.” A “46.8”. 13.2. (Assistente X - factos descritos nos pontos “2.1”, “5.1”, “7.1” e parcialmente “7.5” do Despacho de pronúncia): O Assistente X foi ouvido por videoconferência. Passamos, então, a fazer a análise crítica da prova quanto aos factos relacionados com este assistente. 13.2.1. Começando pelos factos relativos à entrada do assistente para a AX, vivência pessoal antes e depois de ter entrado na instituição, percurso escolar e processo de desvinculação da instituição foram relevantes os elementos constante do Apenso DF (Documentos referentes ao processo individual do assistente) e ) “Apenso Z-15, 2º Volume” (documentes referentes ao processo psicossocial do assistente). São documentos que foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos, isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam. Elementos estes que conjugados com as assinaturas e datas que lhes são apostas, ou de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, pelo que nas situações em que tenha sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, ou que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram, ou que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere, tal foi suficientemente contraditado, entro o mais, com a prova testemunhal. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 13.2.2. Mas tais elementos foram também corroborados não só pelas declarações do assistente, mas também pela prova testemunhal produzida em audiência. O Depoimento da testemunha XM, mãe (adoptiva) do assistente X, por exemplo, foi particularmente relevante para o esclarecimento do tribunal quanto aos factos relacionados com o processo de destabilização emocional do assistente no seio da família adoptiva, processo que levou à sua institucionalização na AX, quanto ao modo como o assistente viveu dentro da instituição, fugas e como aí desenvolveu a sua vida. Foi um depoimento que, como atrás já dissemos, o Tribunal globalmente avaliou como objectivo - pois contou ao Tribunal, de forma que se nos aparentou como correspondendo ao que recordava e ao que sentia, o modo como o X entrou para a AX, a própria testemunha disse que também tinha sido (…), o X não estudava, não tinha interacção em casa, não respeitava, em súmula, não o conseguia aguentar mais e na AX, palavras da testemunha, “sucedesse o que sucedesse” não o punham fora - e tendo sido perceptível um total distanciamento emocional do X, aquela mãe desistiu do filho e sem retorno, não tivemos no entanto e como já o mencionámos, a percepção de que estivesse a inventar factos (a interpretá-los ou a avaliá-los sem qualquer margem de crédito para o filho, isso pareceu-nos que sim, mas não que os estivesse, pelo menos de forma que fosse perceptível para o Tribunal, a criá-los). Também a testemunha VQ, educadora na AX desde 2/10/91, revelou ao Tribunal conhecimento de alguns aspectos da vivência do X, dado que foi sua educadora, tendo sido particularmente relevante para a prova dos factos relacionado com a falta de entendimento entre o educando e a mãe adoptiva e consequência desse facto na vida do X. 13.2.3. Quanto aos factos que o tribunal deu como provados em relação aos actos de abuso praticados pelo arguido A na pessoa do assistente X, nas instalações da AX, o Tribunal fundou a sua convicção na confissão parcial do arguido o qual, de forma livre e espontânea, admitiu ter praticado actos de penetração anal no X, embora tendo dito que foi no seu carro e não no local referido pelo assistente (a garagem de CZ e na parte de trás de um veículo). O ano e altura em que os actos se iniciaram foi confirmado pelo arguido – bem como a idade que o assistente tinha - , tal como se encontra descrito no Despacho de Pronuncia, sendo no entanto que quanto à sua duração, a versão do arguido não foi consistente com a do assistente. Com efeito e quer quanto ao elemento local dos abusos, quer quanto ao elemento duração, o assistente disse que ocorreram na garagem de CZ e que ocorreram até ao Natal de 1996. As declarações do assistente, nesta parte, para o Tribunal foram globalmente consistentes, pois fez uma narração espontânea quer quanto à sequência, quer quanto ao local e tempo que duraram. Mostrou memória do facto e ao mesmo tempo, a circunstância de terem ocorrido na garagem de CZ faz sentido para o que era a vivência do arguido, pois - e como vimos aquando da análise crítica da prova dos factos relativos à vivência do arguido A na Instituição, fundamentação que convocamos e para a qual remetemos -, embora o Tribunal não tenha apurado que em 1996 o arguido já exercesse, mesmo que apenas de “facto”, funções de motorista, exercia as funções de ajudante de motorista, a garagem eram um local da sua vida profissional (ver, por exemplo, o que o Tribunal nessa sede apurou quanto ao incidente de “1993 com os motoristas”, em que eram feitas queixas contra a ingerência do arguido A no trabalho dos motoristas) . No que diz respeito ao número de actos praticados pelo arguido, o assistente não os conseguiu determinar com certeza, o que é compreensível, avaliando a globalidade da sua declaração (a sua memória é de repetição e sucessão, de forma próxima, umas vezes das outras). No entanto o Tribunal extrai das suas declarações, com suficiente segurança, que os factos correram pelo menos uma vez por semana, durante o tempo em que este contactos se mantiveram. O assistente disse em audiência de julgamento que estes actos foram durante os últimos dois meses e meio do ano de 1996, no entanto o Despacho de pronúncia descreve e imputa a acção apenas ao período de um mês, pelo que o Tribunal limita a sua a acção ao objecto do processo. O arguido admitiu ter dado dinheiro ao assistente, mas apenas “250$00” e o assistente, quanto ao dinheiro recebido do arguido A nos actos que teve com este, não revelou memória precisa, pelo que não foi possível para o tribunal determinar este montante em concreto. 13.2.4. Passando aos factos que o tribunal deu como provados (quer no âmbitos dos factos passados dentro da AX, quer nos demais) relativamente ao conhecimento deste arguido da vivência do assistente, da consciência e conhecimento que tinha das consequências dos seus actos ou dos actos que eram praticados por terceiros nos assistentes - entre os quais o presente assistente - e na motivação da sua conduta, reconduzimo-nos e reproduzimos, a avaliação que o tribunal fez das declarações do arguido quando confessa – mesmo que parcialmente -, a prática dos factos ou quando tem o movimento de pedir Desculpa aos assistentes, como foi no caso concreto. Como dissemos, em audiência de julgamento o arguido A, após o assistente X ter prestado declarações, pediu-lhe desculpa pelos actos praticados e pelos locais onde o tinha levado, o que para o Tribunal foi relevante e suficiente, para a prova dos factos quanto à consciência e conhecimento que o arguido tinha das consequências dos seus actos e das motivações que o levaram a praticar tais actos. Para o tribunal tal significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. Quanto a conversas tidas com o assistente, a prova de tais factos e com o sentido e limitação que o Tribunal lhes deu, resultou quer das declarações do assistente quer das declarações do arguido. No que diz respeito ao arguido, este revelou conhecer alguns aspectos da vida do assistente na instituição, conhecimento que foi perceptível ter resultado de conversas tidas com o jovem, O tribunal ficou convencido – como aliás já o dissemos em momento anterior -, que isto foi uma forma de aproximação do arguido com este assistente – mas, aliás, com o mesmo significado com os demais assistentes em geral - e, atenta a normalidade das coisas, para os conhecer e receber a sua confiança dentro da instituição. No entanto não resultou suficientemente provado que o arguido fez esta aproximação, desde o seu início, com o objectivo de se relacionar sexualmente com o educando (o que, de qualquer forma, não releva para efeitos de elemento constitutivo do ilícito) . Do que foi o que já atrás assinalámos, quanto ao que as testemunhas disseram da forma como o arguido se relacionava com os jovens da AX e da forma como os jovens se relacionavam com ele - cfr. por exemplo, depoimento das testemunha já anteriormente referidas e de diversos sectores da instituição, as testemunhas YW, EC, VO, HI - , o que o tribunal concluiu, de forma segura, é que o arguido gostava de se relacionar com todos os jovens, tendo vindo, no entanto, a praticar actos de abuso de natureza sexual com alguns. 13.2.5. Quanto aos factos relativos ao(s) abuso(s) sofridos pelo assistente no (...) do arguido K, levado pelo arguido A, os factos em alguma medida foram admitido pelo arguido A, pois após ter ouvido as declarações do assistente, pediu-lhe desculpa não só pelo que lhe fez, mas por o ter levado para outros locais. O assistente diz que os factos ocorreram, pelo menos uma vez, antes do Natal de 1996, foi o arguido A que o levou. E ocorreram três ou quatro vezes, depois desta primeira. É certo que começa por misturar nestas idas ao (...) - pois diz que não foi sozinho mas foi com mais colegas – os assistentes AP e AV, para dizer mais à frente que conheceu AV em altura manifesta e objectivamente posterior a 1996 (pois diz que conheceu AV dois anos a dois anos e meio/três , depois de ele assistente ter entrado para a AX, logo nunca seria em 1996). Rectifica e diz que foi engano seu, mas esta rectificação – que é sempre um dito por não dito – não criou contradições posteriores, não interferiu naquilo que foi a linha global do relato quanto aos factos do (...), relato que ao tribunal aparentou ser espontâneo e assim o valorou. Pelo que ficámos com a percepção que pode, efectivamente, ter sido um lapso da memória do assistente a associação de AV a esta situação, pois é da nossa experiência que quando recuperamos uma memória, não estamos a recuperar a memória original, estamos a apanhá-la na última vez em que a “deixámos” . E nessa “ultima vez”, pelo que foi a exposição deste processo na comunicação social – e o assistente X disse ao Tribunal que deu entrevistas, pelo que se as deu também as leu; e como leu isso pode ter lido notícias nas quais conseguisse perceber, pelos relatos, que tinham a ver com AV -, pode ter reconfigurado ou acrescentado à sua memória AV. Mas importante para o tribunal foi perceber se esse – nas palavras do assistente – lapso foi mesmo um lapso, um incidente justificável ou se foi mais alguma coisa. E avaliando as declarações do assistente X, ele fez um relato dos actos de abuso neste (...) que tem sentido, transmite dinâmica de quem relata não um qualquer acto de abuso sofrido - uma coisa colada ou intencionalmente preenchida com outra, porque a história foi construída assim -, mas um abuso ocorrido naquele local e com aquela pessoa. E, concorrendo para ilustrar o que dizemos, por o considerarmos relevante nesta altura - face ao que iremos dizer quanto a outra situação posterior -, transcrevemos o que foram as declarações do assistente quando o Tribunal lhe perguntou o que é que se tinha passado no (...): “ (X) – “...o Sr. A... pronto ... entrou connosco para dentro do (...) do Dr. K, falando ao guichet que nós íamos para uma consulta e... fui mandado para dentro do (...) do Dr. K....onde me pediu para deitar na ... numa marquesa preta que tinha um... um, uma toalha de papel, pronto, daquelas toalhas de, de papel...onde me mandou tirar a roupa, começou-me a ... pronto, a tocar no corpo e a acariciar a parte, a parte sexual....mais tarde, obrigou, tirou as calças e obrigou-me a fazer sexo oral a ele....” . (Juíza Presidente) – Depois dessa situação, o que é que se passou? (X) – Depois dessa situação ... foi ... tive o sexo anal....foi o mesmo que eu descrevi com o Sr. A....e o sexo manual, a seguir. (Juíza Presidente) – Quando diz sexo anal, em concreto, neste caso, o que é que se passou? (X) – Houve sexo, pronto ... foi o mesmo que eu referi há pouco, mas com alguma penetração. (Juíza Presidente) – Mas quem é que fez a quem? (X) – O Dr. K a mim. (Juíza Presidente) – Quando diz com alguma penetração, o que é que quer dizer? (X) – Colocou mesmo, o pénis dentro do meu ânus. (Juíza Presidente) – E depois o que é que sucedeu? (X) – Depois houve a parte de ... de prática de sexo manual, onde nessa prática, houve a ejaculação. (Juíza Presidente) – Quem é que tocou em quem? E com que parte do corpo? (X) – ...o, eu com a minha mão na parte, no sexo, pronto, no pénis do Dr. K. (Juíza Presidente) – Depois destes factos, o que é que ocorreu a seguir? (X) – Saí ... pronto, saí do, do (...)... e o ... pronto, o Dr. A, pronto, o Sr. A foi ... foi dentro, ter com o Dr. K e saiu cá para a (...) com um envelope...e já cá na (...), abriu um envelope onde me deu a mim, quatro mil a cinco mil escudos ... mas o envelope era um envelope branco, onde se notava bem que ainda tinha bastante dinheiro lá dentro.” Quando é feita a instância pela Defesa do arguido K complementa: (Dr.ª IIS) – Pronto, quando refere uma marquesa dentro desse gabinete ... e que o local em que se teriam lugar as relações que referiu, o que eu queria saber é se só o assistente estava nessa marquesa ou se também o arguido K estava nessa marquesa? (Juíza Presidente) – Pode responder. (X) – Inicialmente fui sempre eu a estar nessa marquesa e depois, depois quando ocorriam outro tipo de prática de abuso sexual mais violenta ... ou seja, refiro-me ao anal, é que essa prática era sucedida. (Dr.ª IIS) – Ou seja ... o que o Sr. X está a dizer é que nem sempre houve prática de sexo anal ... é isso? (Juíza Presidente) – Esclareça Sr. X o que é que quer dizer? (X) – O que eu citei foi que só quando passava à prática de sexo anal é que também se encontrava na marquesa ... mas que todas as vezes isso aconteceu. (Dr.ª IIS) – Pronto, se notou…, se o Sr. X notou alguma particularidade física que ... no corpo do arguido? (Juíza Presidente – Pode responder Sr. X. (X) – Não recordo desse tipo de pormenores.(...)” Esta descrição do assistente e que é feita em dois momentos distintos - pois a primeira parte foi quando esteve a prestar esclarecimentos ao Tribunal; e a segunda foi quando esteve a responder à Defesa do arguido K, tendo entretanto, nos dois dias anteriores, respondido ao Ministério Público e à Defesa dos arguidos A, E e H - tem, na avaliação do tribunal, natural ligação entre si, faz sentido com a descrição de uma coisa vivida e acontecida assim como a contou, com as pessoas, com os objectos e com os actos descritos. Apesar de a audição do assistente ter sido por videoconferência, para o Tribunal as declarações do assistente quanto a esta situação tiveram a potencialidade e deram ao Tribunal essa percepção. E a emoção que aparentava e que o tribunal começou por tomar com alguma reserva - pois o assistente não estava na sala de audiências, mas estava a ser ouvido por videoconferência, pelo que a imediação é naturalmente diferente; e tínhamos presente o que consta das conclusões (antecedidas pela avaliação psicológica, análise de resultados e impressão diagnostica) da Perícia colegial constante de fls. 48 a 73 do Apenso Z-11 e os esclarecimentos que quanto a tal perícia foram dados ao Tribunal pelo(s) Sr(s). Peritos Dra. CV , Dr. CT --, a forma como o assistente depunha, aparentando alguma dificuldade ou relutância por estar a falar nestes factos, quando agora (neste momento processual) analisámos estas declarações, teve correspondência e consistência intrínseca com a declaração de um abuso vivido e daquele abuso concretamente vivido. E não são só estes segmentos que dão esta percepção ao tribunal, mas são estes segmentos complementados com a forma como o assistente descreve a participação do arguido A, os esclarecimentos que dá de forma que para o Tribunal não foi ensaiada, sendo que à medida que vai explicando aos vários sujeitos processuais e vai sendo contra instado, não introduz dissonância que altere a avaliação da credibilidade do relato (e consequentemente de veracidade). 13.2.6. Relacionada com esta última afirmação a Defesa do arguido K, na sua instância, evidenciou um aspecto que tinha a ver com a descrição que o assistente fez do (...). Vejamos: “(X) – O Sr. A fazia-se acompanhar até, pronto, dentro do (...) ... e depois é que nos mandava para dentro do espaço onde o Dr. K procedia às (...). (...) (Dr.ª IIS) – Há pouco disse que o Sr. A dirigia-se à recepcionista...se os senhores o acompanhavam à recepcionista? (Juíza Presidente) – Pode responder. (X) –Se os senhores...? Peço desculpa? (Dr.ª IIS) – Se o Sr. X e os seus colegas o acompanhavam à recepcionista? Se acompanhavam o Sr. A quando ele falava com a recepcionista? (Juíza Presidente) – Pode responder. (X) – Não. (Dr.ª IIS) – Onde é que ficavam? (Juíza Presidente) – Pode responder. (X) – Dentro do hall do (...). (Dr.ª IIS) – Pronto, então, entrando pela porta do (...), a minha pergunta é se o hall era ali, logo ali ... e também já ... onde é que se situava o guichet, uma vez que referiu que havia um guichet onde estava a recepcionista, em relação a esse hall? (Juíza Presidente) – Eu fiz essa pergunta Srª Drª, é só… pode descrever Sr. X. (X) – Como eu já tinha citado ao tribunal ... eu não recordo de pormenores nem… nem consigo descrever, rigorosamente, mais nada do que aquilo que já descrevi. (Dr.ª IIS) – Muito bem, pormenores não recorda e já o tinha dito...mas referiu expressamente a existência de um hall, de um guichet e como depois iam para o gabinete ... e só em relação a esse aspecto é que eu peço, tentando concretizar e apelando à memória, se esse hall… e referiu também que no hall havia umas cadeiras...se se recorda das dimensões desse hall, por aproximação, obviamente, e onde é que estava o guichet em relação a esse hall? Uma vez que se lembra. (Juíza Presidente) – Quando o senhor estava na porta de entrada do, desse, do (...), portanto, aquela porta que vinha da (...), que dava a entrada da (...) para dentro do edifício, dava logo para o hall ou não? Para esse hall de entrada? (X) – Confirmo, Srª Drª Juíza. (Juíza Presidente) – E depois o guichet que o senhor referiu, estando ainda na porta de entrada, portanto ... o senhor imagine que neste momento está na porta de entrada a olhar para dentro do, da casa ... esse guichet onde é que se lembra de o ver?... Pense que como está agora é exactamente na porta de entrada a olhar para dentro, de costas para a (...), atrás de si está a (...) e o senhor está virado para esse hall. Lembra-se onde é que estava o guichet? (X) – Não consigo precisar com certeza, mas penso que era à minha frente.”. Nesta descrição o assistente não introduz um elemento que existia no primeiro (...) do arguido K – pois na altura em que o assistente localiza os factos no (...) só poderia ser o “(...) antigo”, assim foi sendo referido ao longo do Julgamento, sito na (...) (…) nº (…),(…)º andar (cfr. Documentos de Fls. 43.521 a 43.791 – Documentos remetidos pela FFX relativamente ao Processo de Obras na (...) (…) nº (…),(…), em (…); Fls. 43.960 a 43.997 – Documentos remetidos pela DI, envio de projecto de arquitectura do Edifício da (...) (…), nº (…),(…), em (…); Fls. 52.615/6: Contrato de arrendamento entre DL e K, do (…)º, andar (…)º, do nº (…) do prédio da (...) (…), em (…), com início em 1/01/93, datado de 2/12/92; Fls. 52.617/9: Documento da JJM para fornecimento de água na (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em nome de K e recibo de pagamento de fornecimento de contador, datado de 29/12/92; Fls. 52.620: Documento da EDP referente a fornecimento na (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em (…), em nome de K, datado de 29/12/92; Fls. 52.621/2: Documento dos TLP, requisição de telefone para a (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em (…), em nome de K, datado de 30/12/92; Fls. 52.623/4: Documento da FFX, de cópia da informação do processo referente à (...) (…) nº (…), datado de 24/07/96; Fls. 52.625/6: certidão do certificado de Vistoria sanitária do prédio sito na (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em (…), datado de 17/10/96; Fls. 52.627/8: Documento do serviço Nacional de Bombeiros, para efeitos de concessão de alvará do prédio sito na (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em (…), datado de 5/6/97; Fls. 52.632: Documento das GGS, datado de 11/2000; Fls. 52.633/8: Documento emitido por GGT, em nome de (...) Dr. K, e apostas as datas de 6/03/01, 13/03/01, 26/03/01; Fls. 52.639/0: Documento emitido por GGU, em nome da GGV, datado de 23/04/01, referente a instalação eléctrica na (...) (…) nº (…),(…) em (…); Fls. 52.641: Documento da EDP, referente a contrato de fornecimento para K, (...) (…) nº (…),(…), com data 01/05/07; Fls. 52.642 a 52.706, 52.711 a 52.716: Documentos de fornecimentos de serviços, materiais, bens para (...) K, entre Abril de 2001 e Novembro de 2001; Fls. 52.707 a 52.710: Documento GGW, datado de 14/02/02 e 15/02/02, referente às moradas R. (…), Lote (…), Edif. (…),(…), em nome de K e (...) (…) nº (…), em (…); - e que é o facto, apurado em audiência, que este (...) situava-se num primeiro andar e o acesso ao 1º andar era feito por umas escadas. Neste sentido foi o depoimento da testemunha EEP, o qual disse ao Tribunal residir no nº (…) da (...) (…), no (…)º (…)., e o (...) ser no (…)ª (…), tendo explicado como era o acesso às duas habitações/fracções, da forma que o Tribunal acima assinalou. Mas explicou mais, pois disse que o acesso às duas fracções era pela porta do prédio, subia-se uma escada e havia um corredor para o lado direito, onde era o (...) do arguido K, mas o (...) tinha uma outra porta “ logo em frente”. As janelas da fracção da habitação da testemunha dão para a “frente”, (...) (…) e as do (...) para a (...) de trás. A testemunha disse, também, conhecer o arguido K, chegou mesmo a ser consultado por ele e quanto à ida de crianças ao (...) não se recordou de ter visto, mas também disse ao Tribunal que não acharia estranha essa situação. A testemunha YG, disse ao Tribunal residir “há 50 anos” no andar ao lado do “antigo” (...) do arguido K, concretamente vive no (…)º (…) da (...) (…), nº (…). Mas disse também ser doente do arguido, bem como o seu marido e a sua filha, quer no antigo quer no novo (...). Explicou que o (...) do (…)º (…)º, de que era vizinha, tinha duas portas de acesso, o que permitia entrar “por dentro de casa” ou “pelas escadas”. Quanto a elementos de descrição do espaço e perguntas que lhe foram feitas sobre particularidades de um (...) e de outro, disse que no (...) antigo não se lembrava de ter visto algum aquário, no “segundo” (...) há um aquário do lado esquerdo, existe desde “que abriu” e dá-lhe a sensação que é o mesmo. Nem no “primeiro (...)”, nem no “segundo” se sentou numa cadeira que se transformasse em “marquesa”. Disse que no primeiro (...) não se recorda de ter visto uma “marquesa”, mas dizendo que já o viu no gabinete novo, numa zona “ao lado” do (...) em si. E foi, também, o depoimento da testemunha DDP - depoimento do qual fazemos, desde já, uma súmula, pois o mesmo é relevante para a análise crítica da prova em relação a outros assistentes - foi recepcionista no (...) do arguido K de 1999 a princípios de 2001. Fez a descrição do acesso ao (...) (o do nº (…), o antigo): porta de entrada, subiam escadas, corredor estreito, do lado do corredor gabinete do arguido K, a seguir sala de espera, a seguir “cantinho” com máquina de café e telefone, wc e sala de observação. Disse que não tinha balcão de recepcionista, tinha um secretária pequena, uma parede à sua frente e uma mesa encostada. Durante o tempo em que esteve no (...) o arguido dava consulta todos os dias, à tarde, chegava por volta das 14 horas. De manhã o arguido estava no Hospital e ao sábado de manhã não sabe o que fazia. Esclareceu não saber onde é que o arguido fazia serviço. Julga que não viu alunos da AX a ser atendidos pelo arguido K, nunca viu o arguido A – mas no que diz respeito aos presentes factos, passaram-se antes de a testemunha ter começado a trabalhar no (...) - ou o arguido H no (...), nem o arguido lhe falou no arguido H. Falou da existência de uma sala de observação (referindo a existência de marquesas), uma sala de tratamentos e uma outra “salinha” ao lado da sala de tratamentos. A sala de espera tinha um sofá de verga, dois sofás individuais e um sofá de dois lugares, mesa no centro. O gabinete do arguido K tinha uma secretária grande, duas cadeiras e a cadeira do arguido. O (...) tinha plantas em todas as divisões. Foi confrontada com a fotografia de fls. 2.287, a “fotografia de cima” e disse que o (...) era onde está o nº (…). Disse, antes de lhe ser mostrada a fotografia, que a placa de identificação estava “ do lado esquerdo”, não se recordando que estivesse em cima da porta. No entanto, depois de olhar para a fotografia verificou que afinal a placa estava “por cima” da porta. Disse, também, que quando esteve a trabalhar no (...) a (...) não estava assim, como se via na fotografia (o pavimento, foi uma das diferenças que o Tribunal depreendeu do seu depoimento). Quanto ao segundo (...) – sito na (...) (…) nº (…) -, esse sim tinha o acesso feito pelo piso térreo, pelo que para aquela Defesa o assistente esteve a referir um local (o segundo) quando só poderia ser o primeiro. Efectivamente o assistente não referiu este facto – escada – na sua descrição, mas isso não significou, para o tribunal, dissonância em relação ao que tinha dito e descrito anteriormente e, mais relevante, não introduz dissonância na avaliação da credibilidade. Isto porque a sua descrição do local, as referências que fez, embora poucas foram no sentido de dar um pormenor e surgiram espontaneamente no seu discurso. E para o Tribunal – e aqui temos que recorrer à experiência de quem julga, à vivência ou percepção profissional de situações que permitiram observar casos, concretos, que vão no sentido do que vamos dizer –, o facto de não ter introduzido a escada é plausível com o não se recordar, não reter como relevante ou não o reter de todo na sua memória a existência dessa escada (que ia da porta da (...) até ao primeiro andar, onde se encontravam duas fracções; de um dos lados, tanto quanto o Tribunal o apreendeu das testemunhas EEP e DDP, ficava a porta do (...) do arguido e do outro uma fracção que não tinha a ver com o arguido (cfr. tb., docs. Fls. 52.615/6: Contrato de arrendamento entre DL e K, do (…)º, andar (…)º, do nº (…) do prédio da (...) (…), em (…), com início em 1/01/93, datado de 2/12/92; e fls. 52.617/9: Documento da JJM para fornecimento de água na (...) (…) nº (…),(…)º (…)º, em nome de K e recibo de pagamento de fornecimento de contador, datado de 29/12/92). Face às declarações produzidas em audiência de julgamento pelo assistente, na avaliação do tribunal as declarações do assistente não estão a relatar o (...) “novo” – o do nº (…), da (...) (…) -, mas permitem a conclusão de que estava a falar do (...) sito no “nº (…)”, embora falte a escada. 13.2.7. Há ainda um outro aspecto que devemos referir e que tem a ver com a associação que o assistente X fez do momento em que conheceu o arguido K, a vê-lo com um (…). Em audiência de Julgamento o Ministério Público pediu ao tribunal para exibir ao assistente um desenho que está a fls. 198 e 199 do “Apenso DF” – o processo individual do Assistente na AX - , o qual o assistente confirmou que foi feito por si. O desenho retrata um carro e tem escrito (…), o assistente diz que não sabe porque o fez e diz que “... era frequente vê-lo dentro do CZ, na (...) do refeitório, ao pé da saída da parte de cima do CZ, encostado ao refeitório....” e que viu o arguido K a conduzi-lo. Pela análise dos elementos do Apenso DF e concretamente desta folha 198, o desenho está datado de “1998”. Resultou da prova produzida nos autos que o arguido K teve um “(…)”. Mas resultou também da prova produzida em audiência de Julgamento, que o mesmo foi importado em Julho de 1999 (sendo que também não resultou da audiência, que em data anterior o arguido tivesse tido outro (…); cfr. docs. de fls. 47.878: Declaração da GGA a indicar a data da compra e reparação da viatura (…), documento apresentado pelo arguido K na Audiência de Julgamento no dia 24/09/2007; fls. 52.738 a 52.768 : Documentos apresentados pelo arguido K, referentes a veículo (…), matrícula (…); depoimento da testemunha CY e declarações do próprio arguido K). O (…) do arguido K entrou, efectivamente, em CZ – local a que o assistente associa tê-lo visto, mas só existe prova suficiente de que foi em data posterior à sua importação, em Julho de 1999. Concretamente, temos que pelo menos em 3/12/99 esteve na instituição, conforme resultou, por exemplo, do depoimento da testemunha EM, educador no CZ e do registo que se encontra a fls. 67, datado de 3/12/99, Sexta feira, do “Apenso W11, Livro 2” – Apenso Referente ao Livro do registo de Ocorrências do Lar FC -, registo que foi feito pelo educador EM, e do qual consta “ ... como apaixonado dos automóveis hoje realizei um sonho. Guiei um (...), este cá o CY....” (sendo que CY foi ouvido em audiência de Julgamento, é um ex educando da AX, que residia à data - 3/12/99 - e reside em casa do arguido K e que conduzia o veículo (…) do arguido; cfr. declarações do arguido K e depoimento da testemunha EM e CY). Esta é uma situação - tal como apontámos no princípio, quando falámos do momento das declarações em que o assistente X associou o assistente AV a idas consigo ao (...) do arguido K -, em que o assistente produz uma declaração, como uma memória, mas que é uma memória equivocada, porque preenche-a com conhecimentos que teve posteriormente ao facto que recorda. Assim vejamos: em 1998 o assistente desenha o (…), não sabe porque é que o desenhou, mas diz que era o (…) que via estacionado em CZ, do arguido K. Para o tribunal – pela análise do documento de fls. 198 e pela credibilidade que os documentos constantes do Apenso DF mereceram ao tribunal e que já assinalámos -, não ficou dúvida que o desenho do (…) foi feito pelo assistente e foi feito na altura com que está datado. O assistente e numa expressão que consideramos de movimento de veracidade das suas declarações, diz que não se recorda porque é que fez o desenho daquele carro. E apesar de a seguir o associar o (…) ao arguido K e de o associar naquela altura em que fez o desenho – memória objectivamente equivocada, como resultou do que já dissemos quanto à prova a que o Tribunal chegou em audiência de julgamento - também não diz ao tribunal que fez aquele desenhou porque, por exemplo, era o carro de alguém que abusara de si. Se estivesse a mentir quanto ao quadro deste abuso, o passado no (...) do arguido K e para onde foi levado pelo arguido A, atenta as características descritas nas conclusões - mas antecedidas pela avaliação psicológica, análise de resultados e impressão diagnostica e os esclarecimentos que quanto a tal perícia foram dados ao Tribunal pelo(s) Sr(s). Peritos Dra. CV , Dr. CT - da Perícia colegial constante de fls. 48 a 73 do Apenso Z-11, mais facilmente tinha dito, por exemplo, que tinha feito o desenho porque estava a recordar o carro do seu abusador ou qualquer outra justificação parecida, pois assim “comporia” com mais consistência a história. O que, no caso concreto – e se estivesse a mentir -, podia ser expectável deste assistente, como vimos pelo que sucedeu com as suas declarações quanto ao documento que se encontra a fls. 202 do “Apenso DF” e que a seguir mencionaremos. Estava, na avaliação e ponderação do Tribunal, a reproduzir uma memória equivocada e que o contraditório permitiu detectar. Mas atenção e para além do que já dissemos quanto ao que em concreto foi e como foi, a associação que o assistente fez entre o seu desenho e o arguido K, não é uma memória que faça parte da descrição que o assistente fez do abuso ou que tenha integrado, associado, como facto circunstancial do abuso. 13.2.8. Mas há outra situação a referir, pois foi situação que levou o Tribunal a ter especial atenção na avaliação das declarações deste assistente. Em audiência de julgamento o Ministério Público pediu ao Tribunal que o assistente prestasse esclarecimentos quanto a documentos que se encontram no seu processo individual – cfr. “ Apenso DF” -, concretamente dos documentos de fls. 198, que atrás já referimos e fls. 202. Reproduzimos a instância feita ao Assistente X: “(...) (Procurador) – ...198 (cento e noventa e oito), 200 (duzentos) verso e 201 (duzentos e um)…(...)202 (duzentos e dois) e 222 (duzentos e vinte e dois). (Juíza Presidente) – ...198 (cento e noventa e oito) um desenho datado de 25/03/98 (vinte e cinco, do três, de noventa e oito). Sr. X a pergunta, o pedido de esclarecimento é: documento folhas 202 (duzentos e dois), se o Sr. o reconhece como tendo sido todo feito por si, isto é, o desenho e o que está escrito ter sido feito por si? (X) - Tanto o desenho como a elaboração do texto também. (Procurador) – Ó Sra. Dra. e lamentando naturalmente, enfim, ter que fazer esta pergunta, é apenas esta: no texto fala-se da dor, e há uma expressão que é “a dor que ainda dói”, o que é que motivou esta dor? O que é que motivou esta dor para o assistente escrever isto? (Juíza Presidente) – Por que é que escreveu esse texto? (X) – Talvez, talvez uma forma de ... de desabafo sobre o que se tinha passado comigo ... e toda aquela dor que sentia. (Juíza Presidente) – Mas em concreto nesse texto o que é que se tinha passado consigo? A que é que se estava a referir? (X) – Tanto a nível de dor familiar ... como a nível de dor de abusos dos quais já se ... já se faziam sentir. (Juíza Presidente) – …não ouvi a sua última resposta, portanto disse tanto de dor a nível familiar… (X) – Como a nível de toda a prática de que eu já era vítima aí, dentro do CZ. “ O Assistente quando foi ouvido em audiência de julgamento já tinha 22 anos, tinha perfeita noção do que lhe estava a ser perguntado quanto à autoria daquele texto. Na sequência de diligência de prova requerida pela Defesa do arguido H foi junto aos autos o documentos que se encontra a fls. 35.745 a 35.747, correspondentes à letra de uma canção “Beija Amor” e CD onde consta uma música com o nome “beija Amor” (cuja letra corresponde à de fls. 35.745/6 ), de onde resulta que o texto do documento de fls. 202 (documento este que tem no cimo, manuscrito, “ O Ganso - Natal/96) , do Apenso DF, não foi escrito pelo assistente. Foi transcrito por si para o documento de fls. 202 e atenta a datação do documento, a idade que o assistente tinha na altura - nasceu em (…), pelo que tinha 13 anos -, a escolha dessa letra teve necessariamente que corresponder a um estado de espírito de tristeza, a uma situação que não é usual e normal numa criança ou num jovem com 13 anos, a não ser que esteja num processo de crescimento infeliz. O Tribunal, no entanto, não podia deixar de referir este incidente na audição do assistente. 13.2.8. Passemos ao número de crimes que o Tribunal dá como suficientemente provados. O Despacho de Pronúncia, tal como descreve os factos quanto a esta conduta – factos descritos no ponto “5.1”, de fls. 20.905 do despacho de Pronuncia -, diz que ocorreram “ em datas em concreto não determinadas, desde o final do ano de 1996 e até 6/04/99”, período em que “ pelo menos em cinco ocasiões”, o arguido A levou o X ao (...) do arguido K “ sito na (...) (…), nº (…)e, posteriormente, nos nºs. (…) em (…)”. Face ao que foram as declarações do assistente, entre as quais os segmentos que acima reproduzimos, no caso concreto o Tribunal apenas pode dar como assente, para além de qualquer dúvida razoável e com convicção objectivamente sustentada, que os factos ocorreram pelo menos duas vezes. Isto porque as declarações do assistente foram seguras quanto à primeira vez, no sentido em que conseguiu dar ao Tribunal uma memória nítida e individualizada dessa vez, a que ocorreu antes do Natal de 1996. Quanto à totalidade das vezes, disse que foram 3 ou 4, com uma distância de mês/mês e meio e fazendo, a determinada altura, uma referência a um processo com outro adulto “(…)”, para tentar esclarecer quanto à localização no tempo dos factos deste processo. Face à avaliação global que o Tribunal fez do sentido das declarações do assistente - quanto às referência que fez aos factos que se passaram com um outro adulto “(…), um processo que correu em (…) e que já identificámos em capítulo anterior, cfr. certidão de fls. 62.540 a 62.747, factos ocorridos em 1999 -, este faz uma associação, em termos de aproximação temporal de uns factos ((...)) e outros (adulto (…)). Pelo que o Tribunal tendo assente a data da primeira vez (antes do Natal de 1996) e localizando o assistente a segunda situação após o Natal de 1996 (e que terá ocorrido, diz o assistente, entre mês a mês e meio após a primeira vez), o Tribunal concluiu que a segunda vez terá ocorrido, com suficiente segurança, no ano de 1997, mas seguramente antes de o assistente ter feito 16 anos (o assistente fez 16 anos em 6/04/99). 13.2.9. Quanto aos factos que o tribunal deu como provados quanto ao recebimento ou à entrega de dinheiro por parte do arguido A, o Tribunal deu como provado que o arguido deu dinheiro ao assistente. O arguido A levou o X ao (...) do arguido K, para a prática, por parte deste, de actos de natureza sexual no assistente. Assim, tendo o assistente recebido dinheiro do arguido A após ter estado no (...), tendo os actos sido praticados pelo arguido K, não havendo interferência ou associação de qualquer outra pessoa aquela acção - e embora não haja qualquer admissão por parte do arguido A deste recebimento, nem registos de depósitos na conta bancária do arguido A e o educando não viu o arguido receber o dinheiro - e tendo o Tribunal dado como assente que foi o arguido A que levou o assistente ao (...), é da experiência comum e da natureza das coisas, que o arguido K deu alguma recompensa ao arguido A, por ter-lhe mandado o educando. E, no caso concreto, tendo sido dinheiro o que o assistente recebeu do arguido A, o Tribunal conclui que foi também dinheiro o que o arguido A recebeu. 13.2.10. Passemos para a última situação descrita no despacho de Pronuncia (factos descritos no Ponto “7.1” e parcialmente no ponto “7.5”). O assistente X disse ao tribunal que foi a (…) – à casa da arguida Q - onde relatou ter sofridos actos de penetração anal por parte do arguido H. Disse que foi após uns actos no (...) do arguido K (e este actos, como vimos, localizou uma situação antes do Natal de 1996, que o Tribunal deu como provado e três ou 4 situações a seguir). O assistente foi ouvido pelo Tribunal por videoconferência, como também já referimos. A descrição que o assistente fez dos actos ocorridos em (…) tiveram uma ressonância de enquadramento emocional e narrativo, diferente do que foi feito por estes assistente quanto aos demais actos que anteriormente descrevera ao Tribunal – e que estivemos a analisar -. E, acrescemos, daquele que foi feito por outros assistentes, em relação aos quais o tribunal deu como provados factos passados em (…). E quando dizemos diferente não foi por “não ter contado o mesmo”, porque isso até podia ser um elemento que lhe desse credibilidade. Isto é, a singularidade de cada um pode ser uma impressão digital de credibilidade e veracidade. Dizemos diferente porque o assistente não revelou ao Tribunal - ou pelo menos não o conseguiu transmitir ou o Tribunal não o conseguiu apreender e disso depende, muitas vezes, a prova do facto -, a “impressão” de quem estava a reproduzir, mesmo que com dificuldade, um sofrimento passado naquele local, uma vivência passada naquele local. Descreveu ao Tribunal o exterior da casa. Mas essa descrição, tal como a deu, era facilmente apreensível pelas imagens que passaram na comunicação social – ver, por exemplo, os documentos de fls. 57.031, fls. 58.450, fls. 58.452 -, não tendo acrescentado lembrança ou memória de algum pormenor que nos desse a sensação de que o assistente estava a dizer, de forma especial, alguma particularidade que tivesse notado. Mesmo que fosse uma coisa “óbvia” de tal exterior, podia ser contada de forma especial (um exemplo de uma coisa “óbvia”, que podia ser apreensível por qualquer pessoa através de uma fotografia, mas que foi dita de forma particularmente evocativa da memória: o assistente AI, quando descreveu o exterior da casa de (…), refere-se às escadas exteriores - e relacionando a posição das escadas da habitação da arguido Q, com a posição das escadas da moradia geminada -, como “gémeas; é claro que a posição das escadas é visível em algumas fotografias publicadas na comunicação social e que acima referimos, mas a forma expressiva como o assistente relatou esta particularidade, a ênfase que deu a este pormenor, a sua escolha, deu-nos a impressão de evocação e reprodução de “coisa” efectivamente trazida pela sua memória; é claro que só por si é pouco, até porque podia ser a evocação de pormenor apreendido quando fez o reconhecimento ao local “casa de (…)”, mas quando somado ao resto do seu depoimento ganha relevância e concorre para a consistência da veracidade da sua narração). Isto aconteceu – a ausência de relato vivido - não só quando foi inquirido pelo Tribunal, mas também quando foi instado pelas Defesas. Há um pedido de esclarecimento que lhe é feito pela terceira Defesa a instá-lo, quanto à casa de (…) e diz que se lembra de uma sala, mas nada mais diz quanto a essa divisão, faz a afirmação da divisão dissociada de descrição (impressiva) de dinâmica consigo ou com outra pessoa. Dentro da casa de (…) não conseguimos apreender o que é a sua memória. A narração não revela noção de espaço interior, podia não saber descrever bem, mas transmitir vivência, o que não conseguimos obter. A dada altura refere uma porta e um corredor, mas a seguir diz não saber dizer mais, relacionando essa omissão de memória com as marcas do abuso. É claro que o Tribunal tem que equacionar que não consiga recordar, passados 5/6//7 anos um espaço, mas o Tribunal tinha que apreender a vivência do espaço, mesmo que totalmente distorcida. Não foi por um assistente dizer que a casa tinha um quarto e uma sala, ou só uma sala, que o tribunal deixou de lhe dar credibilidade e veracidade à globalidade do que disse, pois essas situações ocorreram. Mas foram situações em que conseguimos apreender, pela forma como a pessoa que esteve à nossa frente falou, a emoção, a expressão, aquilo que ao olhar para alguém – quando o estamos ao mesmo tempo a ouvir -, que nos estava a ser transmitida uma experiência “ocorrida ali”. Como já notámos, o assistente disse ao tribunal não conseguir recordar o interior da casa de (…) e justifica não o conseguir fazer por causa das marcas daquela situação. O Tribunal tem que equacionar e respeitar que isto possa, de facto, corresponder ao que se passava na memória do assistente naquele momento, mas também não podemos ir para além daquilo que a imediação nos permite chegar com segurança, quanto à avaliação global do facto. 13.2.11. Assim e relacionado com o relato do acto de abuso em si – ocorrido em (…) - foi difícil para o Tribunal apreender esta vivência concreta. Isto é, as emoções e os sentimentos que o assistente teve e que ainda consegue transmitir em relação a essa experiência, elemento que permite dar consistência às suas declarações quando em situações em que não há confissão expressiva, como é o caso concreto por parte do arguido A, pois em relação aos demais arguidos que têm imputação por estes factos não há confissão. Esta dificuldade pode estar relacionada com o que o assistente transmitiu ao Tribunal, que quis esquecer estes factos, quis fechar uma porta das vivências de abuso. Em audiência de julgamento o arguido A confessou ter praticado actos de coito oral e anal em relação ao assistente - declaração a que o tribunal deu credibilidade e veracidade, tendo em atenção a forma espontânea e livre como o arguido a fez -. Acresce que o próprio assistente disse ao Tribunal que antes de ter entrado para a AX já tinha sido sujeito a abusos. Assim, o Tribunal tem a percepção que existe uma vivência de abuso e pode ser, de facto, uma dificuldade de exteriorização. Também sabemos que a prova dos factos de situações de abuso, tendo em atenção o natural secretismo ou ausência de testemunhos directos que envolvem tais situações, tem que ser feita para além de qualquer dúvida razoável, mas tendo em atenção a especificidade do que é a forma, o ambiente e o contexto em que estes actos em regra ocorrem. Mas, no caso concreto para além desta ausência de impressão de consistência, por ter a concordância intrínseca de um relato de abuso, por ser perceptível uma ressonância emocional como olha, como fala, como exprime, como explica, como por vezes o corpo se movimenta para ajudar a fala – que, por exemplo, quanto ao ocorrido no (...) do arguido K, o Tribunal conseguiu apreender ressonância emocional de uma forma natural no relato, como expusemos – , há outros elementos que surgiram das próprias declarações do assistente e que levaram o Tribunal a criar algumas dúvidas quanto à consistência do depoimento do assistente nesta parte e, em consequência, ter especial atenção na avaliação destas declarações. A sua descrição, quando acrescenta pormenores, desvia-se de uma forma atípica do que foram os demais relatos sobre (…): e dizemos atípica porque não tem a ver, por exemplo, com o dizer que determinada divisão era à direita ou à esquerda, que uma sala era no meio ou no cimo das escadas, que ia à semana ou ao fim de semana, que estavam todos no sofá ou todos em pé. No relato de (…) o assistente acrescenta pormenores quando está sujeito ao contraditório, que interpretamos como uma fuga para não responder e para ficar “justificado” por não responder. Assim, para justificar ou explicar porque é que não se recorda de factos/acções em (…), introduz o medo que tinha dos arguidos, pois eles ameaçavam que “o matavam se falasse”. Isto sai de qualquer relato que ouvimos, a “ameaça” na casa de (…), pelos arguidos que estavam em (…). Pode ter sucedido, mas para o Tribunal não existem elementos concorrentes ou mesmo circunstanciais, que nos permitam concluir com segurança que assim foi. Sucede, também, que o depoimento da testemunha IN - também conjugado com o depoimento da mãe adoptiva do X, XM, sendo que quanto a esta testemunha, embora não tenha sido perceptível para o Tribunal que estivesse a inventar o seu relato, quando contou a conversa que teve com o X e as resposta que este lhe deu às perguntas que a testemunha fez quanto ao arguido H, foi perceptível o seu prejuízo que a testemunha tinha quanto à mentira dos factos relatados pelo X, em relação ao arguido H -, fez o Tribunal ter especial cuidado na ponderação das declarações do assistente. A testemunha disse ao Tribunal que o assistente X foi seu hóspede, deveria ter uns 17/18 anos. Nessa altura conviveu com ele, embora a testemunha não habitasse no local onde era esse quarto alugado. A testemunha era, também, proprietária de um restaurante, onde o assistente X, em altura que a testemunha localizou “ no início do escândalo” - referindo-se ao conhecimento dos factos deste processo na comunicação social - a foi visitar. E nessa visita o assistente disse-lhe, em súmula, que tinha vindo nesse dia de França, que vinha de prestar declarações da PJ e que estava a ser pago para envolver o arguido H, para dizer que tinha estado na cama como o arguido. Quando a testemunha lhe perguntou se isso era verdade, o X sorriu, fez um gesto com o dedo “polegar” e o “indicado” - esfregando-os, como a significar dinheiro - e disse “este já cá canta”. Esclareceu, na instância do Ministério Público, que quando o X lhe falou, o processo já era falado e o nome do arguido H também. Para o Tribunal o depoimento desta testemunha pareceu objectivo. Isto é, o Tribunal não ficou com a percepção que a testemunha não estivesse a contar alguma coisa que não se tivesse passado na sua frente, que não lhe tivesse sido dito pelo X nos termos em que o relatou ao Tribunal . Que demonstrou indignação pelo que o assistente lhe disse, demonstrou. Mas para o Tribunal não foi por ser o arguido H pois, de facto, não ficámos com a percepção de que a testemunha tivesse uma opinião formada de inocência ou culpabilidade do arguido, que o defendesse em função da opinião que tinha em relação ao mesmo e independentemente do que quer que fosse. A indignação da testemunha e tal como o Tribunal avaliou o seu depoimento, foi por ter entendido das palavras do X que estava a falar no nome deste arguido, porque estava a ser pago para isso. Também disse que X era um fala barato, falava de tudo. E disse, também, que conheceu a mãe adoptiva do X no Tribunal e que “acha” que esta lhe disse que conhecia o arguido H, por ter sido funcionária da FFE. Face ao depoimento da testemunha e como dissemos, o Tribunal acreditou que a mesma relatou ao Tribunal uma conversa que existiu entre o X e a testemunha e que existiu nos termos em que a mesma relatou. Questão diferente é apurar se, efectivamente, o que o X lhe disse significava o que a testemunha interpretou: que o assistente estava a mentir e a dizer o nome do arguido H para ganhar dinheiro; mas temos também que equacionar que o assistente se estivesse “ a gabar” do que tinha feito, mas que isso tivesse um fundo de verdade. E porque é que ponderamos esta hipótese? Esta situação de o assistente ter tido a conversa com a testemunha IN, no Restaurante e da forma que a mesma descreveu, exprime, na nossa avaliação, uma atitude de “gabarolice”. E esta atitude não deixou de criar alguma interrogação quanto a uma eventual motivação que o assistente tivesse contra este arguido, para dizer o seu nome. E procurando essa motivação, foi manifesto para o Tribunal os sentimentos negativos que o assistente exprimiu em relação à sua mãe adoptiva (a testemunha XM), o que foi recíproco. Pelo depoimento da sua mãe adoptiva foi impressiva a situação de afastamento entre os dois, aquela mãe desistiu do filho e o X também reagiu com o que nos aparentou ser dor, tanto que disse ao Tribunal que não tinha mãe biológica ou adoptiva. E quer pelas declarações do assistente, quer pelo depoimento da testemunha XM, o Tribunal não teve dúvida que esta interferiu junto do assistente para que ele desmentisse qualquer envolvimento do arguido H, o qual era pessoa que conhecia por razões de natureza profissional e que a testemunha descreveu. Intervenção em relação à qual o assistente reagiu negativamente, como resulta, pelo menos, da valoração global das declarações do Assistente e do depoimento da testemunha. O ter tido conhecimento que a mãe adoptiva conhecia o arguido H, que eventualmente manifestasse algum sentimento de apreço pelo arguido motivou, por alguma razão, que o assistente tenha tido um movimento dizer o nome do arguido como pessoa que abusou de si, para de algum modo atingir a mãe? E esta dúvida, valorada face ao que foi a análise crítica da prova que o Tribunal fez das declarações do assistente quanto aos factos de (…), a ausência da ressonância emocional que o Tribunal sentiu na descrição dos factos em (…) – quando comparada com a descrição dos factos passados com o arguido A e/ou com o arguido K -, não foi objectivamente ultrapassada pelo Tribunal de forma razoável. Assim, para o Tribunal, a Acusação não conseguiu produzir prova suficientemente forte que nos permitisse concluir, para além de qualquer dúvida razoável, que estes factos que o assistente relatou em (…), com o arguido H, ocorreram tal como estão descritos no despacho de Pronuncia. Daí o Tribunal não os ter dado como provados. 13.3. (Assistente AI - factos descritos nos pontos “2.6”, “4.1.4.”, “4.4.2.” e “6.7.2.” ) : O assistente AI foi ouvido em audiência de Julgamento durante oito sessões. Partindo com uma primeira avaliação da forma como se apresentou a falar perante o tribunal, teve um discurso em que, em regra, falava pausado, o Tribunal fazia perguntas e seguiam-se por vezes silêncios, os quais o tribunal tentava ultrapassar desdobrando a pergunta feita, ou pedindo esclarecimento apenas em relação a determinada parcela, para que o interrogatório fosse prosseguindo. Mas por vezes e antes de responder às perguntas, fazia um gesto com a cara que podia ser interpretado como um sorriso. E, por vezes, demonstrava o que para o tribunal tanto podia ser interpretado como arrogância – quando, por exemplo, é-lhe feita uma pergunta e responde que essa era “fácil” -, ou como falta de espontaneidade, podendo-se supor estar a dar uma resposta pensada para ser dada “dessa forma” – quando, por exemplo, explica porque é que em relação ao arguido E, não disse ao tribunal, no início das suas declarações, o que veio a dizer depois quanto ao erro que cometeu quanto à sua associação -. Quanto ao “sorriso” e porque tal foi-lhe directamente perguntado – concretamente quando começou a ser instado pelo Ministério Público -, explicou que era uma reacção que tinha quando estava nervoso, explicação esta que, da avaliação que o Tribunal foi fazendo do seu depoimento - pois esteve alerta para este aspecto da sua expressão facial - pareceu verdadeira, corresponder realmente a uma forma de reagir. Quanto ao segundo aspecto que referimos – falar de forma pausada, com o objectivo de dar uma resposta “previamente pensada” para ser dada “dessa forma” - avançamos, desde já, que face à avaliação que o Tribunal fez da dinâmica verbal e não verbal das declarações do assistente e à análise destas declarações face ao que, por sua vez, resulta dos documentos dos autos - quanto ao que foi o processo de crescimento e desenvolvimento do AI na instituição -, ficámos convencidos que aquele “modo” de estar perante o Tribunal foi, entre o mais, uma expressão e reacção de Defesa por sentir ou supor que estava ou podia estar a ser atacado. Não foi, na convicção criada pelo Tribunal, uma expressão de “certa aparência” para proteger uma mentira. E dizemos isto, desde já, pelo seguinte. O assistente, quando esteve perante o tribunal tinha 19 anos. O seu crescimento, a sua consistência ou inconsistência emocional, a estrutura que revelou como pessoa, teve como pano de fundo - como vamos ver, na prova documental e testemunhal que o Tribunal vai enunciar - um rapaz abandonado pela mãe e rejeitado pelo pai e pelos avós. Um rapaz de que desde os onze anos teve necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico consecutivo, com tratamento com anti-depressivos desde 2001, tinha a idade de 15 anos. Teve, desde os onze anos, um processo de crescimento com dificuldade de interiorização de regras e de respeito face aos educadores, aos colegas e mesmo na escola, intercalando com períodos de sofrimento e com outros de comportamentos considerados desviantes. Demonstrou, de acordo com os técnicos que o acompanharam no ambiente da AX, necessidade de atenção, comportamentos com esse fim e com esse objectivo, mas intercalando com comportamentos de agressividade. Quando foi ouvido em tribunal foi interrogado e contra interrogado pelo Colectivo do Tribunal, um Procurador da República e oito Advogados, sete dos quais das Defesas dos arguido, profissionais em relação aos quais o Tribunal presume uma maior capacidade e técnica argumentativa que a do assistente AI. Foi sujeito, na avaliação do Tribunal, a um crivo suficientemente fino que permitiu detectar qualquer conjectura ou combinação que existisse quanto à criação de factos e falsas imputações. Vejamos então, o percurso seguido pelo Tribunal, para a prova e não prova, dos factos referentes aos actos praticados pelos arguidos na pessoa do Assistente AI. 13.3.1. (Percurso de AI na AX): Para os factos que o tribunal deu como “ Provado” ou “ Não Provado”, respeitantes a dados pessoais do assistente, nascimento, ingresso e vivência na AX, vivência anterior ao seu ingresso na AX, bem como data da saída da AX, foram relevantes as declarações do Assistente - o qual falou do seu crescimento na AX e relacionamento familiar, declarações estas que tiveram correspondência com a prova documental e testemunhal analisada -, a prova documental e a prova testemunhal. (1) Começando pela prova documental, foram particularmente relevantes os documentos constantes do Apenso DD (Processo individual de AI na AX) e os documentos do Apenso Z-15, 1º Volume (fls. 175 a 487, documentos constantes do processo psicossocial de AI na AX). Dos documentos de fls. 34 e 39, do Apenso DD (cópia da certidão de nascimento do assistente e da cédula pessoa ) resulta que o assistente nasceu em (…). Da análise de fls. 176, 184 a 188, 192 a 194, 210 a 214, 217 a 218, 303 a 316 do Apenso Z-15, 1º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AI na AX) e dos documentos fls. 35, 4, 9, 10 e 10vº, 13, 15 e 16, do Apenso DD (Processo individual de AI na AX) , resulta que entrou para a AX de (…) na sequência de Despacho de 17/10/97, tendo entrado para o Lar FU, do BF e transferido em 2002 para o FD, do CZ (transferência autorizada em 9/07/2002). Assim, entrou na AX com 11 anos de idade. As razões da sua entrada e o estado de desenvolvimento do assistente na altura em que entrou para a AX e posteriormente – com o sentido e extensão que o Tribunal deu como provado -, resultam suficientemente descrito nos documentos de fls. 37 e 38 do Apenso DD (Processo individual de AI na AX) e fls. 176, 184 a 188, 192 a 194, 210 a 214, 217 a 218, 303 a 316 do Apenso Z-15, 1º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AI na AX), constando a fls. 37 e 38 do Apenso DD, um relatório em que é descrita a situação familiar e pessoal do jovem e também a avaliação psicológica que lhe foi feita em Julho de 1997., subscrita por uma psicóloga e resultando do teor de tal relatório que observou e esteve em contacto com o AI para realizar este relatório, o que para o Tribunal assumiu especial peso probatório. É um documento contemporâneo da situação que estava a ser analisada, permitindo-nos efectiva proximidade com o que AI era em Julho de 1997 e com a sua vivência da altura e relacionamento com os outros. Acresce que o documento não foi impugnado pelos sujeitos processuais, foi sujeito ao contraditório, tal como os demais documentos que o Tribunal está a mencionar, não tendo resultado qualquer indício ou suspeita para o tribunal, que os documentos em causa não correspondem a documentos efectivamente feitos nas datas que estão apostas nos mesmos, pelas pessoas que os subscrevem e para os fins que especificamente referem. São, por isso, documentos a que o tribunal deu credibilidade. Deste documentos resulta que AI ingressou na AX com um irmão mais novo, o WJ – que nasceu em (…) - , tinham estado os dois institucionalizados num (...) em (…), o qual fora encerrado pelo C.R.S.S. por falta de condições. No processo de transição após o encerramento do (...) e a entrada na AX, estiveram numa família de acolhimento em (…) – constituída por YM e JJN – e que continuaram a visitar após a entrada na AX (Cfr. fls. 31 e 33, 36, 37 e 38, 42 e 43, 45 e 46, 48 a 56; fls. 24 a 27, do Apenso DD – Processo individual de AI na AX). Notamos que neste relatório é referido o bom relacionamento que o AI tinha com a família de acolhimento – bem como são expressamente referidas as circunstâncias em que o AI, conjuntamente com o seu irmão, foi para esta família em Fevereiro de 1997, a título meramente transitório enquanto não fosse encontrada saída institucional – cfr. também, relatório de fls. 49 a 52, e informações de fls. 53 e 54 do Apenso DD - , factos que o Tribunal deu como provados, como resulta dos pontos “96.3” dos “Factos provados” e, consequentemente, não deu como provada a versão constante no Despacho de pronúncia. No sentido acolhido pelo Tribunal foi igualmente relevante não só o depoimento da testemunha YM (a mãe da família de Acolhimento em que o AI esteve), mas também as declarações do próprio AI, congruentes entre si e no sentido do que diz o relatório de fls. 37 e 38. (2) Quanto ao percurso escolar desde que o assistente AI ingressou na AX (em 17/10/97, cfr. Apenso DD, fls. 24, 29,35,55), de acordo com a prova produzida em audiência de Julgamento - e para a qual foram concorrente as declarações de AI e, quanto a elementos documentais, cfr. Apenso Z-15, 1º Volume, fls. 176, 184 a 188, 192 a 194, 210 a 214, 217 a 218, 303 a 316 (documentos constantes do processo psicossocial de AI na AX) e fls.2, 5, 6 a 12, 21, 24 a 27,31 e 32, do Apenso DD (Processo individual de AI na AX) - , a sua frequência escolar foi a seguinte: - 1997/98, no Semi-internato BF – frequenta o 5º ano; - 1998/99, Escola GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, Operador de Pecuária Nível II – 1º ano; - 1999/00, Escola GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, Operador de Pecuária Nível II – 2º ano (cfr., também, fls. 60.864 a 60.865, documento este referente ao horário e faltas de AI no período de 1/01/99 a 31/06/99); - 2000/01, Escola GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, Operador de Pecuária Nível II – 2º ano; - 2001/02, Escola GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, Operador de Pecuária Nível II – 3º ano, ano este em que, no decurso do ano escolar, foi pedida e efectuada a sua transferência para o 1º ano Curso de Design de Equipamento; (3) (Processo de crescimento): Paralelamente a este percurso escolar - e aqui ligamo-nos ao que acima dissemos quanto à relevância desta análise, para a avaliação da veracidade das declarações do assistente, até porque este assistente, tal como aconteceu com os demais e decorrente das instâncias que lhe foram feitas, para localizar acontecimentos no tempo faz referência a aspectos ou períodos concretos da sua vida -, no que diz respeito à evolução do AI, sua estabilidade ou instabilidade, integração e comportamento na AX, foram relevantes e suficientemente convincentes, os documentos constantes do Apenso DD - em particular os que, a seguir, iremos destacar -, bem como os documentos constantes de fls. 338 a 477, do Apenso Z-15, 1º volume (documentos integrantes do processo psicossocial do assistente), para os factos relativos ao seu percurso desde a entrada na instituição até à data em que foram conhecidos os factos a que dizem respeito os presentes autos e os de fls. 280 a 337, para os factos relativos ao ser percurso na instituição, após o conhecimento dos factos a que dizem respeito os presentes autos. Assim e quanto ao percurso do assistente após a sua entrada na instituição, quando é feita a proposta para internamento na AX, em Julho de 1997, a Psicóloga que o observa diz que “ ... o AI é um garoto muito simpático, brincalhão, que estabelece uma relação agradável como adulto. A sua adesão às provas foi imediata...com bom ritmo de trabalho e bom tempo de atenção(...). O seu desenvolvimento cognitivo situa-se dentro dos parâmetros considerados médio-altos, quando comparado com uma população do mesmo nível etário. A prova menos conseguida, embora dentro da média, tem a ver com a memória visual imediata, a previsão associativa e a rapidez motora. Não obstante as vicissitudes porque esta criança tem passado apresenta-se bem estruturada e, de momento, emocionalmente estável(...)” (cfr. Fls. 37 a 38, do Apenso DD e reproduzindo o que acima dissemos quanto ao especial peso probatório do relatório, por ser um documento contemporâneo da situação que estava a ser analisada, permitindo-nos efectiva proximidade com o que AI era em Julho de 1997 e com a sua vivência da altura e relacionamento com os outros). Notamos que neste relatório é referido o bom relacionamento que o AI tinha com a família de acolhimento – bem como são expressamente referidas as circunstâncias em que o AI, conjuntamente com o seu irmão, foi para esta família em Fevereiro de 1997, a título meramente transitório enquanto não fosse encontrada saída institucional, factos que o Tribunal deu como “provados”. Directamente relacionado com este relatório está, também, o que se encontra a fls. 49 a 52 do Apenso DD - Relatório social feito pelo IRS, nos termos do artº 25º da OTM, datado de 22/05/97 -, do qual consta, entre o mais, a boa integração escolar do AI, na sequência da transição, em 4/02/97, da instituição onde se encontrava para a família de acolhimento. Apresenta comportamento adequado na sala de aula, mas no recreio há queixas de ser agressivo “... e não aceitar a autoridade dos outros funcionários da escola, respondendo agressivamente e sendo desadequado nas suas verbalizações...”. Em 31/03/98 foi feita uma informação do “Serviço Social – JP” para a Directora do BF, resultando deste documento que se destinava a reenviar para o Tribunal de Menores (cfr. Fls. 31 a 33 do Apenso DD). Esta informação refere que o AI está bem integrado no Lar, mantendo com “...adultos e colegas uma relação positiva. O AI é uma criança meiga e participativa que gosta de agradar ao adulto...”. Está no 5º ano, do semi-internato de BF, está bem integrado, mas com aproveitamento negativo a Matemática e ciências. Refere, ainda, que o AI passa um fim de semana por mês com a família de acolhimento. A fls. 375 (do Apenso Z-15, 1º Volume), documento este datado de 26/03/98 - e de cujo teor se depreende dizer respeito quer ao AI quer ao seu irmão -, consta que o AI está bem integrado e gosta de agradar. A fls. 374 (documento datado de 4/06/98, três meses depois do anterior e cerca de 7/8 meses após a entrada na AX) é dito que a família de acolhimento acha que o AI mente muito, está revoltado (com o pai), garoto fechado. A fls. 372 (documento de 14/10/98) o AI continua a parecer uma panela de pressão, o que, face à leitura dos documentos que se seguem, o tribunal interpretou como expressão de instabilidade, agressividade e impulsividade. Fls. 371 vº (documento datado de 9/11/98), informação referente à escola, disseram que o garoto está bem e tem aproveitamento razoável; fls. 369 (datado de 20/11/98), onze dias após a informação anterior, é dito que o AI parece uma panela de pressão prestes a explodir, desinteressado, não cuida da higiene, fica contente quando a família de acolhimento aparece, bate nos mais novos e é agressivo, tem dificuldade em reconhecer autoridade. Fls. 364 (27/05/99) o AI é muito fechado; fls. 360 (14/10/99) a professora considera que anda mais triste que o ano passado, as educadoras referem que durante as férias chorou com saudades da mãe; fls. 362 (28/10/99) o Educador BBX diz que chega atrasado de manhã, tem bom comportamento e está bem integrado, não tem faltas intercalares e a DT telefonou, acha-o muito triste; fls. 359 (15/12/99) a família de acolhimento não está tão envolvida com ele; fls. 361 (10/12/99) não falta intercalarmente nem sai da escola, apenas um dia em que não houve aulas foi para o (…); Dos documentos de fls. 444 a 446 vº (do Apenso Z-15, 1ºvolume), encontra-se, por ordem sequencial de datas: a necessidade de encontrar forma de ajudar o AI (fls. 446, 25/01/00); em reunião na (…), AI é sossegado mas pouco atento, está mais contente (fls. 446 vº, 3/02/00); AI utiliza o desenho para comunicar, é muito defensivo, controla de forma deformada os impulsos sexuais e é agressivo (cfr. fls. 445 vº, 23/02/00); AI vai começar nos Bombeiros ao sábado e ao Domingo (fls. 445 vº, 9/03/00); Em 7/07/2000 foi feita uma informação do “Serviço Social – JP” para a Directora do BF, resultando deste documento que se destinava a reenviar para o Tribunal de Menores (cfr. Fls. 24 a 29 do Apenso DD). Esta informação refere que o AI era seguido na consulta de Pedopsiquiatrio desde Abril de 1999, pela Dra. GK, mas também diz que o jovem gosta de estar no Lar, revela-se ora imprevisível e agressivo ora meigo e submisso, mas “...nota-se um maior autocontrole do comportamento, conseguindo manter boa relação com a maioria dos colegas e adultos. Mostra-se mais participativo e disponível para as actividades quotidianas do Lar...”. Diz, ainda, que o AI é Bombeiro Voluntário; passa os fins de semana, uma vez por mês, com a família de acolhimento; em Dezembro de 1998 o (...) contactou a avó materna do AI para acompanhar o jovem e o irmão ao fim de semana, o que foi suspenso por decisão da avó (devido ao comportamento irrequieto e agressivo dos jovens), foi retomado em Abril de 1999 mas só em relação ao AI e traduzindo-se “... em visitas esporádicas do educando à casa da Avó...” . Quanto ao comportamento escolar refere ser um aluno com “Bom comportamento”(cfr. Fls. 24 a 29 do Apenso DD; e cfr. Apenso Z-15, 1º volume, fls. 432 a 443). Em 16/05/02 (cfr. fls. 17 do Apenso DD) foi feito um relatório Psicológico assinado pela Psicóloga JJO e do qual conta que “... o AI tem acompanhamento pedopsiquiátrico pela dra. GK...desde Abril de 1999.(vide relatório em anexo). As avaliações com a Dra. GK têm tido carácter periódico, estando a médica ao corrente de todas as ocorrências que têm marcado o ser percurso. A avaliação psicológica do AI vai ao encontro do parecer da Pedopsiquiatra, apresentando o jovem um perfil intelectual dentro dos parâmetros médios para a sua faixa etária, circunscrevendo-se a sua problemática em torno dos afectos, caracterizando-se a nível comportamental por passagens ao acto frequentes e não mediatizadas, aliadas à sua forte tendência depressiva. (...) Está a ser medicado pela Dra. GK desde Outubro de 2001 com anti-depressivos...”. Imediatamente a seguir está o relatório Pedopsiquiátrico que está assinado pela Dra. GK, mas datado de 12/09/2001 - cerca de oito meses antes em relação ao relatório da psicóloga e que é mencionado por esta (cfr. Fls. 19 e 20 do Apenso DD) -, o qual diz que o AI é seguido na consulta desde Abril de 1999, por “...comportamentos de oposição e agressividade...”, fala das marcas que revela pelo abandono familiar, que tem um “... sofrimento depressivo importante que só raramente é expresso directamente pela sua atitude, tendendo a manifestar-se através de comportamentos de revolta, com passagens ao acto impulsivas e descontroladas...(...)”, mantendo a necessidade de tratamento pedopisiquiátrico. Em 30/04/02 é feita uma comunicação do BF para o (...) da instituição (cfr. Fls. 15, do Apenso DD, comunicação esta assinada pela Directora ), em que é pedida a transferência do AI, com urgência, para um Lar masculino e de alunos mais velhos. Esta comunicação foi acompanhada de um relatório de uma ocorrência em que o AI teve intervenção, sucedida no dia 27/04/02 (cfr. Fls. 16, do Apenso DD, relatório este assinado pelas educadoras NL, ZF e XH e datado de 29/04/02). No relatório é descrita uma situação em que AI foi encontrado na casa de banho do quarto de uma educanda de 7 anos, quando a referida educanda também aí se encontrava. Na sequência de a educadora o ter “descoberto”, o AI “ ...reagiu violentamente numa postura de agressão e ameaça que a educadora teve dificuldade em controlar. Deu pontapés no armário... e de olhos esbugalhados e descontrolado nos seus movimentos saiu do quarto...(...). (...) As educadoras, muito atenta ao comportamento do AI em virtude de ocorrências anteriores, por outras vezes o terem visto com atitudes de desco0ntrolo na sua postura perante as educandas mais jovens(...).”. As educadores concluem o relatório dizendo que consideram não terem resposta adequada aos comportamentos que o AI vinha tendo – comportamentos, no caso concreto, com cariz sexual com educandas de 7/8 anos, tendo o AI na altura 15 anos – e pedem resposta para a situação. Em 31/05/02 foi feita uma comunicação pela equipa educativa do Lar FU (comunicação esta assinada por ZF, XH e NL, cfr. Fls. 4, do Apenso DD) para a Directora do BF, fazendo referência à ocorrência que relataram de 27/04/2002 e dizendo que tem-se verificado a entrada no Lar, vindo da Escola da (…) “... quase sempre tardiamente, geralmente depois das 19 horas (só às terças feiras tem horário escolar até às 18 horas), e na passada sexta-feira dia 24 de Maio, chegou às 20.40 horas, as justificações não são credíveis...”. Recusa-se a ir ao acompanhamento Pedopsiquiátrico , está medicado com “Zolof” e interrompeu a medicação a 17 de Maio, por não ter a receita da Pedopsiquiatra. As Educadoras dizem, mais uma vez, não ter “resposta adequada” para o AI. Por Despachos datados de 9/07/2002, foi autorizada a transferência do AI para o CZ, tendo o mesmo entrado para o FD (cfr. Fls. 13, do Apenso DD e Despachos manuscritos a(...)s no documento e ver, também, documento de fls. 15; cfr. Fls. 51.518 a 51.520 e fls. 51.774 a 51.776, embora este documento tenha sido feito já em 20/02/2003, no decurso da fase de inquérito do presente processo; e ver também documento de fls. 51.717, de onde consta que o assistente AI entrou no Lar do CZ em 15/09/2002 ). (4) Mas no processo psicossocial do AI (Apenso Z-15, 1º Volume) encontram-se também documentos posteriores a 25/11/2002 (data em que o arguido A foi detido e começaram a ser referidos na comunicação social os factos relacionados com este processo, primeiro processo apensado e posteriormente processo principal), os quais o Tribunal refere pela relevância que os mesmos podem assumir na avaliação da credibilidade do assistente e da veracidade das declarações por si prestadas. São os documentos que se encontram a fls. 322 a 337, datados de 12/12/2003 a Março de 2005 - feitos pela Psicóloga (...) que o acompanhou nesta altura (Dra. YK), pela equipa de Internato e pela Assistente Social -, dos quais é possível observar alguns aspectos do comportamento do AI neste período. Não só retratam o que foi, neste período, o percurso de “instabilidade para estabilidade” ou vice versa, vivida pelo AI - o documento de fls. 322, subscrito em 9/03/2005 pela Psicóloga (...), Dra. YK, diz que “…o AI tem comparecido às sessões marcadas e tem mostrado uma evolução comportamental. Está mais sereno do ponto de vista emocional...”; mas do documento de fls. 333, datado de 17/06/2003, extrai-se o sentido de preocupação em relação ao acompanhamento do AI, que estava a ser feito pela dra. GK, com dificuldade de estabelecimento de relação terapêutica, manifestando o jovem resistência a falar sobre os seus comportamentos, nomeadamente sobre actos de cariz sexual -, como referem a medicação a que o AI deveria estar sujeito - anti depressivos; ver, também, a referência feita em relação a tal tratamento já em Outubro de 2001, no documento de fls. 13, do Apenso DD; e no documento de fls. 4 do Apenso DD, relatório datado de 31/05/2002, em que é referida a falta de adesão do AI ao tratamento pedopsiquiátrico e a preocupação da equipa educativa em tal facto, dado que o assistente estava medicado com o anti-depressivo “Zolof” e, como faltou às (...) de pedopsiquiatria não tinha receita para a medicação; medicamente este que é igualmente referido a fls. 340 vº, numa anotação datada de 23/01/01 - e os efeitos decorrentes dessa medicação que, sendo dados para estabilizar o assistente, são “… desinibidores e podem estimular a passagem ao acto…” o que, consequentemente, traduzir-se-ia no seu modo de estar no dia-a-dia, naqueles períodos em que esteve medicado. E qual a relevância que o que antecede pode ter, também, para a avaliação das declarações do assistente e para os factos que o Tribunal deu como provados ? É que, atenta a normalidade das coisas, alguém nestas condições, com a idade, história de vida, formação e escolaridade do Assistente e que esteja sujeito a um interrogatório e a um contra interrogatório como o AI esteve em audiência de julgamento, pelo tempo, pelas pessoas e com o padrão concreto que foi adoptado – Magistrados e Advogados, pergunta atrás de pergunta, pormenor atrás de pormenor, subdividindo as questões em parcelas mais pormenorizadas –, mais facilmente será apanhado na mentira que tiver construído, se for esse o caso e mais dificilmente conseguirá dar explicações que tenham sentido, para aquelas situações em que houver incongruências no que disser. Liga-se ao que acima dissemos, quanto ao “crivo suficientemente fino” a que o assistente foi sujeito em audiência de julgamento, liga-se ao contraditório a que efectivamente foi sujeito. Quando o AI esteve a prestar declarações perante o Tribunal, a última referência que temos é de estabilidade precária, estando a ser seguido pela psicóloga (...) (cfr. Apenso Z-15, 1º Volume, fls. 210 a 214; fls. 322, documento datado de 9/03/2005 e que refere o acompanhamento que o AI estava a ter pela psicóloga (...); tendo o assistente em audiência de julgamento confirmado que “ ainda hoje” fala com a psicóloga). No entanto uma estabilidade mesmo precária pois, como resulta dos elementos dos autos - nomeadamente de fls. 196 a 199 do Apenso Z-15, 1º volume e de fls. 60.656 a 60.664 dos autos -, os factos praticados pelo AI em 27/02/05 e pelos quais foi condenado, para o Tribunal disso são uma expressão. E o Tribunal teve sempre isso em atenção - estabilidade, instabilidade, percurso de vida e vivências, incluindo as contemporâneas da altura em que esteve perante o Tribunal - quando avaliou as declarações do Assistente. 13.3.2. Passemos, agora, a analisar – mas referindo alguns pontos essenciais meramente por súmula, dada a extensão e multiplicidade das declarações - as declarações do assistente quanto aos factos de abuso que o Tribunal deu como provados (e, consequentemente, quanto aos que deu como não provados). Na primeira audiência em que prestou declarações (AJ 29/11/05), o Assistente AI começou a falar dos actos de abuso de natureza sexual sofridos por si, enquanto aluno interno da AX. (1) Começou por falar da altura em que conheceu o arguido A, “… foi em BF à saída da escola…”. Estava a sair para o lar, o arguido estava com uma carrinha e pediu-lhe ajuda para levar equipamento informático para a sala de informática. Como vimos, o assistente esteve no semi-internato de BF no ano lectivo 1997/1998. Este comportamento - o arguido pedir ajuda a educandos para descarregar material para os (...)s -, é referido de forma globalmente semelhante por outros assistentes – por exemplo, AP - , foi-o também pela testemunha EC (funcionário da AX desde Maio de 1978, tendo estado a trabalhar nos serviços auxiliares durante 8 anos, após o que passou a exercer as funções de motorista) , o qual confirmou que viu “várias vezes” o arguido A chamar alunos ou ir buscar alunos aos (...)s, para o ajudarem a carregar coisas, mas não podia “garantir” que isto tivesse ocorrido na (...), embora para si “é natural” que tivesse visto. Depois (deste conhecimento em BF), o assistente disse que via o arguido A quando este ia entregar correspondência ao BF e houve uma altura em que o assistente começou a falar mais com o arguido. Disse que após a ajuda com o material informático, “…passaram alguns meses….depois de começar a falar mais com ele…”. Relatou que a partir deste momento esteve “…uma vez com o Sr. A no (...)...no refeitório da escola (…) houve abusos sexuais…sexo oral…masturbação...”. Perguntado, em concreto, o que sucedeu, em que parte do corpo é que quem tocou em quem, respondeu, entre o mais, que “…numa situação... fui eu que lhe toquei a ele … e no sexo oral foi ele que… meteu o sexo na minha boca….”, mas acrescentando que o assistente também tocou no pénis do arguido. Disse que “… a partir daí …depois … fomos várias vezes para casa dele….”, esclarecendo que quando começou a ir para a escola da (…) o arguido A ia buscá-lo, às vezes, à escola “…e passávamos por casa dele….”. Voltou a ter actos de “abuso sexual” com o arguido A, concretizando “…o sexo oral… a masturbação e o sexo anal...(…)eu fiz o sexo oral a ele e masturbação… e o sexo anal foi feito por ele a mim….”, explicando o que queria dizer, com “sexo anal”, “…é meter o sexo no ânus….”. Contou que voltou a ir “... várias vezes a casa do arguido A...”, o que acontecia durante a semana, “…era quando ia para a escola….antes de ir para a escola passávamos sempre por casa dele, do Sr. A….”. Disse que “… às vezes como eu ia para casa do Sr. A ele ia-me buscar de carro….”, os actos foram sempre “…sexo oral, sexo anal e masturbação…”, dizendo que todas as vezes que foi para casa do arguido A estes actos foram sempre praticados. Mas corrigiu “…quer dizer… não foram bem sempre...às vezes era só sexo oral e masturbação... (…) eu fazia sexo oral a ele... e masturbação ...e sexo anal era feito por ele a mim...”. Tendo acrescentado, aquando da instância do Ministério Público, que “algumas vezes” com o arguido A houve “apenas actos de masturbação”, foi “mais no princípio” e era quando o arguido “metia filmes pornográficos”. Disse que, de manhã, encontrou-se com o arguido A, para apanhar as boleias para ir para casa do arguido, junto ao (…). O Tribunal perguntou-lhe qual a ideia que tinha quanto ao tempo que “isto durou”, tendo o assistente respondido que “ ...foi em 98 (noventa e oito)… para aí…”, acrescentando que em relação ao ano em que foi para a (…) “…foi quase todo esse ano lectivo ...era quase todo esse ano lectivo….” (como já acima vimos, o AI foi para a escola da (…) no início do ano lectivo de 1998/1999; fez 12 anos em 26/09/98). Não se recorda quantas vezes, quantas manhãs, por semana ou por mês isto aconteceu, dizendo “…depende… dependia..ou acontecia durante… semana a semana, ou semana sim semana não….”, lembrando-se que dentro da mesma semana tem ideia de ter ido mais do que uma manhã a casa do arguido A e que isto aconteceu mais do que uma vez. Disse “ter ideia” que esta situação com o arguido A passou “…para o ano lectivo seguinte….”. Não aconteceu durante as férias, pois esteve nas (...) e nas (...) nada aconteceu, tendo feito a mesma afirmação quanto às férias da Páscoa. Na instância feita pela Defesa do arguido A e referindo-se às idas a casa do arguido, esclareceu que o arguido dava-lhe dinheiro antes de o assistente entrar para o (...), embora o Tribunal não tenha apurado o montante concreto. (1.1) O arguido A falou do assistente AI, pelo menos, em dois momentos diferentes: num primeiro momento disse que o conheceu tinha o assistente “13/14 anos” e tinha um irmão WJ, que era mais novo dois anos (embora num segundo momento refira que o conheceu com 11/12 anos). Disse que o AI estava no BF, não se recordava do ano em que entrou para este Lar, mas sabia que o jovem “teve problemas” no Lar e foi transferido para CZ, para o FD. A ideia que tinha é que isto sucedeu em “... 2001 (dois mil e um) talvez....” (mas, como já vimos, a transferência do AI do Lar FU para o CZ ocorreu por Despacho de 9/07/2002, o que assinalamos apenas como nota das fragilidade do arguido quanto à memória do “tempo”; mas quanto a esta memória do “tempo” e como iremos assinalar de forma mais expressiva noutro momento, o Tribunal teve em atenção o depoimento que o Professor JJD prestou em audiência de julgamento - o psiquiatra que acompanhou o arguido desde 2004, mantendo-se o acompanhamento em 2010 -, que desde 2004 o arguido foi sujeito a medicação para controlo de ansiedade e ter condições para prestar declarações perante o Tribunal, referindo que houve alturas em que, devido à ansiedade, o arguido teve episódios de tremuras e ameaça de desmaios, o que a testemunha tentava controlar com medicação ). Disse ao tribunal saber que o AI “... andava numa escola, não sei quê … (…), da (…)....” e começando por responder que o AI não conversara com ele sobre a “sua vida”, acrescentou que “... não, não me falou... queria era jogar futebol, queria ser professor de ginástica, não sei quê... mais tarde....”, mas nada sabia da sua família. Quanto a este aspecto – das conversas quanto à vida do assistente -, quer das declarações do arguido quer das declarações do AI, não resultou para o tribunal suficientemente assente que os mesmos tivessem conversado, com frequência, da vida “familiar” do AI, da forma como o despacho de Pronúncia o configurou. No entanto, o que o arguido revelou ao Tribunal conhecer da vida do AI ou relacionado com o AI - e que estivemos a referir - e a forma como o arguido A se exprimiu, deixa transparecer que teve conversas com o assistente quanto aos seus desejos, ao seu dia-a-dia, procurou algum conhecimento da sua vida - diz, por exemplo, que o AI gostava de jogar futebol, tanto que lhe comprou uma camisola e umas botas -, sabia a escola em que o AI andava e o Lar em que estava, tendo necessariamente tido conhecimento da sua idade O tribunal ficou convencido – como aliás já o dissemos em momento anterior -, que isto foi uma forma de aproximação do arguido com este assistente – mas, aliás, com o mesmo significado com os demais assistentes em geral - e, atenta a normalidade das coisas, para os conhecer e receber a sua confiança. No entanto não resultou suficientemente provado que o arguido fez esta aproximação, desde o seu início, com o objectivo de se relacionar sexualmente com o educando (o que, de qualquer forma, não releva para efeitos de elemento constitutivo do ilícito) . Do que foi o que já atrás assinalámos, quanto ao que as testemunhas disseram da forma como o arguido se relacionava com os jovens da AX e da forma como os jovens se relacionavam como ele - cfr. por exemplo, no caso concreto as declarações do próprio assistente AI e das testemunha já anteriormente referidas e de diversos sectores da instituição, as testemunhas YW, EC, VO, HI - , o que o tribunal concluiu de forma segura é que o arguido gostava de se relacionar com todos os jovens, tendo vindo, no entanto, a praticar actos de abuso de natureza sexual com alguns. Assim e embora facto circunstancial, a matéria que o Tribunal deu como provado no ponto “96.8”, dos “ factos Provados”, no segmento que tem a ver com o que antecede. Sendo que quanto à matéria que o Tribunal deu como “não provada”, no(s) respectivo(s) ponto(s) “14.2” e “14.3” (dos factos não provados), deve-se a tal, na avaliação do Tribunal, não ter resultado suficientemente assente quer das declarações do assistente, quer das declarações do arguido (e no que diz a conversas da vida familiar, que tal tivesse sido falado ou abordado entre os dois da forma descrita no despacho de Pronúncia). (1.2) Prosseguindo, quanto aos factos passados com o AI em casa do arguido A, o arguido confirmou que o AI esteve em sua casa, na “... barraca … sim, sim, a tal barraca....”, a qual, como já vimos, situava-se na (...) (…) (quanto a este local, o assistente fez uma diligência de reconhecimento do local, auto que se encontra a fls. 2.988 dos autos e disse também que sabia onde era, no espaço do (...) DT). No entanto não admitiu ter sido o arguido a ter a iniciativa de convidar o AI para sua casa, dizendo que foi o assistente que “... quis ver um filme, eu portanto aluguei uma cassete e … não aluguei... pedi a um vizinho emprestado, ele emprestou-me uma cassete e ele portanto... esteve a ver um filme...(...) era uma cassete portanto, de mulheres nuas....”, tendo visto o filme com o assistente. Não se recorda se isto aconteceu logo que conheceu o AI ou se isto foi passado algum tempo, mas dizendo que foi a “única vez” que o AI esteve em sua casa. O arguido A prestou declarações, também, sobre o conhecimento de aspectos do dia a dia da vida do AI. Disse ao Tribunal que o AI ia de autocarro para a escola e de metro – o que reforça o sentido de estar-se a referir à altura em que o AI estava na escola da (…), pois quando o assistente frequentou a escola no semi-internato de BF, não tinha necessidade deste tipo de deslocação -, sendo que a testemunha YV (educadora do AI no Lar FU, de 1997 a 2000), confirmou que o AI ia de autocarro para a escola da (…). Quanto a “boleias”, o arguido disse que deu boleia ao AI para a escola, “... porque tinha que entregar lá uns … uns livros …(...) os livros escolares que eram lá da escola que ele … foi o serviço marcado ... e dei-lhe boleia a ele ... e dei boleia ao outro, ao (...) (...)”. Foi num segundo momento e após o AI ter prestado declarações em Tribunal, o arguido disse ao Tribunal querer pedir desculpa ao AI pelas “... quatro ou cinco vezes que ele foi a minha casa...”, mas acrescentando que o AI andava atrás de si “... para eu lhe comprar umas botas... e comprei-lhe umas botas e uma camisola de futebol...”. Este movimento do pedido de desculpa que o arguido apresentou, nesta altura, ao assistente AI, foi semelhante ao que o arguido teve noutras situações em que quis reconhecer, perante o tribunal e perante alguns jovens, ter praticado factos em relação aos mesmos. O que, no caso concreto, o Tribunal também valorou com esse sentido e como admissão da prática de alguns factos dos que tinham sido relatados pelo AI e que o arguido ouviu, pois esteve sempre presente na sala de audiências, tendo por isso as suas declarações concorrido para “alguns factos” da matéria que o Tribunal deu como “provada” neste campo (actos do arguido A em relação ao Assistente AI). E dizemos alguns factos, porque o arguido não admitiu os factos com a duração que o AI descreveu ao Tribunal. (1.3) Perguntado ao assistente se tinha ideia quando é que terminou, quando é que deixou “esta vida” de passar “estas manhãs” por casa do arguido A, se foi a meio do ano lectivo seguinte, se foi no princípio, se foi no fim do ano ou se foi mais tarde, respondeu “…mais tarde….essa história acabou mais tarde…(…) ... aí para 2001 (dois mil e um)…”. E disse que isso acabou porque “…primeiro (…) eu já não queria…. Já queria deixar isso. Acho que parecia, prontos, já me estava a tornar mais homem. Para mim, foi mais essa razão porque acabou…”. O Tribunal perguntou-lhe se queria dizer que os factos que tinha vivido tinham passado ainda para o 3º ano lectivo em que esteve na escola da (...), tendo o assistente respondido “ Exacto”. O Tribunal perguntou-lhe se durante esta altura, durante o período de tempo em que disse ter ido a casa do arguido A, de manhã, se aconteceu ter ido ou ter estado com o arguido A em qualquer outro lugar. E aqui o assistente diz que “…Fui à (...)….” (2) Começando pela valoração das declarações do Assistente e do arguido A - quanto aos factos descritos no ponto “2.6”, fls. 20.859 a 20.863, do despacho de pronúncia, factos ocorridos exclusivamente com o arguido A -, dizemos que quando o assistente AI passou a falar dos abusos e começou pelos factos ocorridos com o arguido A, o Tribunal viu quer na sua expressão facial, quer na sua voz, uma atitude que interpretámos como controlada, cautelosa, que não falou com à vontade. O discurso era menos fluído que o que até ali tinha tido - mas até aí tinha estado a responder ao Tribunal sobre factos da sua vivência, não relacionados com abusos, pelo que o discurso inicial, mais fluído, faz sentido – e a entoação, a forma como respondia, devagar, deu a sensação de nervosismo, mas de forma diferente daquele que apontámos no início das suas declarações (e a reacção que acima referimos, de antes de responder esboçar um gesto com a cara, como se fosse um sorriso, não era tão pronunciada). Esta atitude – e tendo sempre em atenção as linhas de Defesa apresentadas pelos arguidos -, podia ser por perturbação devido à natureza dos factos que estava a narrar, mas também podia ser uma voz cautelosa para não falar “errado”, para não “errar”. Ou para - na hipótese que equacionámos no início -, ter cuidado par responder aquilo que “tinha pensado” anteriormente. Mas, no caso concreto, o assistente estava a falar de factos que o arguido A admitiu parcialmente – divergindo, essencialmente, quanto à quantidade de actos praticados -, pelo que não faz sentido que a voz e o incómodo que deixou transparecer para o Tribunal, fosse por causa de estar a mentir. O que concorreu para o Tribunal ter interpretado e criado a convicção, que a forma como o assistentes estava a depor perante o Tribunal - inicialmente começando pelos factos passados com o arguido A, mas depois tendo passado para os factos passados com os arguido C e K numa “casa na (...)”; e com os arguidos N, H e Q numa “casa em (...)” - devia-se ao constrangimento e à dificuldade, por ser qualquer coisa negativa, que reproduzir aqueles factos lhe causava. Acresce - avançando desde já - que as declarações do assistente são parcialmente corroboradas pelo Ponto “1º” das “Conclusões (...) legais”, do Exame (...) Legal de Natureza Sexual feito ao assistente AI em 8/05/2003 (cfr. fls. 7.611 a 7.618 dos autos), onde consta a conclusão que o Assistente AI apresenta “ … sinais a nível do ânus compatíveis com a prática repetida de coito anal…”, o que contribui para a convicção do Tribunal, de que o assistente foi sujeito a actos de coito anal (embora, é claro, questão diversa é a prova de quem foram os seus autores). (2.1) Passando à localização no tempo da prática dos actos que o tribunal deu como provados - quanto ao arguido A num primeiro momento, mas sendo a presente análise também relevante para a convicção do Tribunal quanto aos factos que veio a dar como provados ou não provados, em relação aos demais arguidos -, a convicção do Tribunal decorreu, também, da análise e da conjugação: - das declarações do assistente quanto ao momento em que o primeiro acto ocorreu, a forma como descreve a sua duração e o momento que dá para o fim dos actos; - com a data em que entrou para a AX (que o tribunal fixou em 17/10/97), – e com os documentos de fls. 375 (do Apenso Z-15, 1º Volume), documento este datado de 26/03/98 e do qual consta que o AI está bem integrado e gosta de agradar, dando a ideia de uma situação de estabilidade; o documento de fls. 374, documento datado de 4/06/98, três meses depois do anterior e cerca de 7/8 meses após a entrada na AX e em que se percebe uma alteração em relação ao anterior, pois é dito que a família de acolhimento acha que o AI mente muito, está revoltado (identificando essa revolta com o pai) e apresenta-se um garoto fechado; e o documento de fls. 372 (documento de 14/10/98), que diz que o AI continua a parecer uma panela de pressão, o que, face à leitura dos documentos que se seguem, o tribunal interpretou como expressão de instabilidade, agressividade e impulsividade e, também, como uma evolução no sentido negativo em relação à situação anterior. Estes elementos - que descrevem um percurso progressivo de instabilidade do assistente - levaram o Tribunal a concluir que os primeiros actos, no refeitório, com o arguido A passaram-se, efectivamente, no início ou em data anterior mas próxima do Verão de 1998 – o assistente disse que já estava o tempo quente, faltava pouco tempo para as férias do Verão o que aponta para esta altura; o documento de fls. 374, do Apenso Z-15, 1º Volume, datado de 4/06/98, revela uma alteração, para negativo, no comportamento do AI, o que pode estar associado a algo de diferente que ocorreu no seu dia a dia e que o perturbou; sendo que, em consequência também do que temos vindo a dizer, o arguido A conheceu o AI tinha este 11 anos de idade e não os 13/14 que o arguido dissera - , mas não sendo, no entanto, suficientemente assente para o Tribunal o mês exacto. Quanto aos factos que se passaram em casa do arguido A, o assistente localiza-os “a seguir aos do refeitório” e a memória que tem é que ocorreram durante “quase” todo o ano lectivo, naquele em que foi para a (...) (mas sem deixar de ter em atenção a sua declaração, em que aponta para 2001 o fim de “essa história). Como vimos o AI foi para a (...) no ano lectivo 1998/1999 – tendo lá estado até ao ano lectivo 2001/2002 – e quando o Tribunal lhe perguntou quando deixara “esta vida” de passar “estas manhãs” por casa do arguido A, se foi a meio do ano lectivo seguinte, se foi no princípio, se foi no fim do ano ou se foi mais tarde, respondeu “…mais tarde….essa história acabou mais tarde…(…) ... aí para 2001 (dois mil e um)…”. Assim e quanto ao início destes factos, o Tribunal, face ao que para si foi o sentido das declarações do assistente, concluiu que só podem ter começado após o mês de Setembro de 1998 – pois este é o mês em que começam em regra as aulas e no caso concreto o ano lectivo 1998/1999 -. Mas como o assistente deu como referência “após” terem começado as aulas desse ano lectivo – sendo facto público e notório que nas Escolas Públicas as aulas começam, em regra, a meio do mês de Setembro, mas deslocando-se, com frequência, para a última semana de Setembro; e não sendo inequívoco, das declarações do assistente, que o “após” terem começado as aulas signifique imediatamente após terem começado as aulas -, o Tribunal localizou o início dos factos, como seguro, pelo menos desde Novembro desse ano. Para o tribunal as declarações e esclarecimentos do assistente, quanto a tal questão, não permitiram ao Tribunal de forma segura que já ocorreram em Setembro ou Outubro . Quanto ao fim deste factos - com o arguido A -, conjugando as declarações do Assistente AI com os elementos dos “livros de ocorrências” do Lar FU que foi possível obter para os autos, assinalamos com especial relevância os seguintes: (do Apenso W-16, 1º volume, os de:) - (fls 61 e 62) registo datado de 27/10/99, que diz que o AI tem chegado atrasado à escola, embora aqui seja referido que é porque diz que não é acordado; - (de fls. 63) registo datado de 27/10/99, que diz que parece que o ralhete ao AI deu resultado, pois quando a educadora chegou o AI já estava acordado, cama feita e saiu antes das 7.30h; - (de fls. 82 e 83) registo datado de 11/11/99, o AI tem chegado atrasado às aulas ; - (de fls. 100) registo datado de 26/11/99, dizendo que com tantas faltas que o AI tem não deve receber nenhum dinheiro do salário estímulo; - (de fls. 113) registo datado de 10/12/99, contando que a educadora telefonou para a Escola do AI, o professor da Disciplina da área de integração disse que, na sua disciplina, o AI já não estava a faltar, (fls. 114) o AI foi à assistente social, (...), a qual chamou-lhe a atenção por causa das faltas; - (fls. 125) registo datado de 20/12/99, não sendo claramente perceptível qual o assunto ou o incidente que estava em causa, o registo deste dia diz “... foi pena este assunto não ter sido abordado na reunião de equipa porque assim não era apanhada de surpresa qdo houve a conversa com o AI” e (fls. 127) o AI foi à assistente social e foram abordadas as questões (...) chegar atrasado; - (fls. 134) registo datado de 3/01/2000 - 4/01/2000, como é que AI recebe prémio de assiduidade se chega sempre atrasado e até foi chamada a atenção pelos (...)?; (fls. 138) registo datado de 7/01/2000, o AI hoje não teve aulas?; - (fls. 153) registo datado de 17/01/2000, o AI do Lar saiu às 7.30h, deve chegar tarde à escola, a educadora telefonou para a (...), falou com o BBX, o qual não tinha conhecimento do AI não ter tido aulas na semana passada e vai-se informar; - (fls. 154) registo datado de 20/01/2000, quando a educadora chegou AI ainda na cama, tinha aulas; - (fls. 155) O AI comprou dois pares de ténis, uns para ele e outros para o irmão, havendo um outro registo a fls. 157, datado de 24/01/00, em que a educadora pergunta com que dinheiro é que o AI comprou os ténis ; - (fls. 156) registo de 23/01/2000 “...vim dormir ao lar, quando de manhã acordei o AI e o Z já tinham saído para o jogo de Basquetebol; - ( fls. 184) registo datado de 12/02/00, AI, AC e Z foram ao quarto de uma educanda e o AI “apalpou-a”; - (fls. 190) AI castigado; (fls. 191) registo 17/02/00, AI manteve a dele como se fosse estranho a tudo, sempre com uma postura de gozo e a fls. 192, tivemos reunião com o AI e o que surgiu/ se descobriu era que havia casos de abusos/agressões físicas sobre o (…), além de outros factos; - (fls. 194) registo de 20/02/2000, aquilo a que o Z se referiu de pior foi o que o AI nos disse; - (fls. 194) registo de 21/02/2000 telefonei para a equipa Pedopsiquiatria sobre consulta do AI; - (fls. 208) registo 28/02/00 AI chegou ao lar passavam das 19.15h, disse terem ficado a ver filme com Professora e a 29/02/2000, educadora telefonou para a (...) a confirmar o que o “menino” disse ontem, falou com Educador BBX e não sabia de nada, ficou de confirmar com professora, mas história esquisita; ontem este menino estava no quarto e fui espreitar, estava de joelhos na cama “ a fazer não sei o quê ou nem quero saber ao certo, porque já estou a achar que ele está com pancada e não é na «cabeça de cima»...”; - (fls. 253) 21/04/00 – 28/04/00, a conversa que a (…) teve com a Psicóloga foi sobre o perdoar ou não o AI; Foi colocado o assunto sobre as boleias do AI o “A” já lhe deu boleia. Ver muito bem com a Directora de turma sobre o que de facto aconteceu. Segundo o Ed. da escola da (…) a Directora foi notificada mas este assunto tem que ser esclarecido; (e do Apenao W-13, Livro 1; cfr. tb Apenso EJ, Volume 5.1, fls. 1877 a 1979): - (fls.6) 25/09/00, AI resolveu sair antes das 7.30h, só tem aulas às 10h, saiu a correr por aí abaixo; - (fls.9) 27/09/00, David foi à médica, tem que ir ter com Dr. HY para ir a uma consulta com um cirurgião; - (Apenso EJ, Volume 5.1, fls. 1887) 22/10/00, vieram todos menos o AI; - (Apenso EJ, Volume 5.1, fls. 1889 vº) 1/11/00, o AI queria sair para comprar qualquer coisa, não deixei; - (fls. 55) 10/01/2001 telefonei ao pai do amigo do AI para combinarmos um dia para falarmos, havendo outra referência a fls. 59, 15/01/01, a dizer que AI comunicou que os pais do amigo iriam ao (...) na 4ª feira para os conhecerem; - (fls. 122) 9/03/01, o AI continua a insistir nas faltas injustificadas, teve um atrito um pouco grave com um professor; - (Apenso EJ, Volume 5.1, fls. 1958 vº) 24/04/01, Falei com a orientadora do curso do AI, tem bom comportamento; temos que, para o Tribunal, os episódios ou referências que nestes registos são feitas ao AI – fundamentalmente quanto a atrasos na saída para a escola ou no seu regresso, faltas à escola, boleia do arguido A - e o período de tempo pelo qual se estendem, são compatíveis e dão consistência às declarações do assistente, nomeadamente - e agora falando quanto aos factos com o arguido A - que os factos com o arguido A e em casa deste, decorreram após o início do ano lectivo 1998/1999 - e que o Tribunal localizou, pelo menos, a partir de Novembro de 1998 - até, seguramente, ao fim de 2000. Isto porque em 2001 o Tribunal não conseguiu encontrar elementos - quer das declarações do assistente (e o Ministério Público tentou fazer o percurso de recuperação da memória, pelo recurso às (...) dos vários anos em que o assistente esteve, tendo o Tribunal feito o cruzamento das declarações do assistente com os elementos do Apenso DX), quer das declarações do arguido, quer dos depoimentos das testemunhas, quer da prova documental; e lembramos que o AI, por exemplo, disse ter a percepção que os actos tinham ocorrido até ao terceiro ano lectivo em que esteve na (...), mas não conseguiu concretizar mais - que, com força suficiente, objectivamente (nos) permitissem encontrar o mês ou período do ano 2001, em que os actos com o arguido A pudessem ter terminado (embora seja de notar que avaliando os registos que encontrámos, a partir de Abril de 2001 o AI aparenta ter melhorado o seu comportamento). (2.3) Continuando na análise crítica da prova - quanto à matéria que o Tribunal deu como provada e não provada, quanto à localização e delimitação no tempo dos primeiros actos praticados pelo arguido A na pessoa de AI; mas que é também relevante e concorre para a análise da prova dos demais actos de abuso sofridos pelo assistente, quer os ocorridos numa “casa na (...)”, quer os ocorridos numa “casa em (...)”, estes praticados também pelos demais arguidos - se cruzarmos as informações que foram feitas ao longo do tempo, sobre a vivência do AI na instituição - concretamente os elementos que já referimos do Apenso Z-15, 1º volume, nomeadamente fls. 375, 374, 372, 371 vº, 369, 364, 360, 362, 359, 446 vº, 445 vº, e fls. 17 a 20, do Apenso DD -, com os registos que mencionámos (dos Livros de ocorrência, mas sem prejuízo dos demais que não foram expressamente mencionados pelo Tribunal), resulta um movimento, desde 1998, quanto ao que foi sendo a dinâmica de desenvolvimento do AI na instituição, com um sentido crescente, continuado e consistente de desequilíbrio e instabilidade emocional, com atraso/ou absentismo a nível escolar. E quanto a este aspecto do absentismo escolar - e no sentido de estes elementos contribuírem para dar consistência às declarações do Assistente AI, quanto ao ter sofridos actos de abuso também numa casa na (...) e numa casa em (...) -, o Tribunal analisou e teve em atenção os elementos que se encontram a fls. 415 a 427, do “Apenso Z-15, 1º Volume”, referentes a elementos de avaliação escolar e registo de faltas do assistente, do ano lectivo de 1997/1998 a 2000/2001 (mas ver, também, elementos escolares constantes do Apenso EJ, Pasta 5, fls. 2.343 a 2.571; e Apenso EJ, Pasta 6, fls. 2.572 a 2.732). A fls. 427 temos o registo de avaliação do ano lectivo 1997/1998, em que é referida a desatenção e falta de bases do aluno, mas o número de faltas não é significativo, tal como se encontram registadas. A fls. 426, temos as faltas do 1º período de 1998/1999, estando registadas 15 faltas. A fls. 425, as faltas do 1º período do ano 1999/2000, estando registadas 32 faltas; a fls. 424 as do segundo período, estando registadas 21 faltas; a fls. 423 as do terceiro período, estando registadas 60 faltas. Conjugando estes registos de faltas nos anos escolares, com os horários do assistente - e os horários do assistente encontram-se a fls. 36.001 e 60.865 para o Ano 1998/1999; a fls. 36.002 Ano 1999/2000; a fls. 36.003 para o Ano 2000/2001 -, temos que no ano Lectivo 1998/1999 o AIA tem número de faltas espalhado por várias disciplinas e tempos, tanto ao 1º tempo da manhã como a tempos intercalares (cfr. tb. Fls. 60.865). No ano lectivo de 1999/2000 – ver também elementos escolares constantes do Apenso EJ, Pasta 5, fls. 2.343 a 2.571; e Apenso EJ, Pasta 6, fls. 2.572 a 2.732 -, temos que o AI tem o maior número de faltas a Matemática, quer ao 1º tempo de 2ª feira, quer de 4ª feira. Fazemos contudo uma chamada de atenção: do horário que se encontra a fls. 36.002 - que corresponde ao horário escolar do curso e ano do AI, como podemos ver pelos elementos que acima já mencionámos, aquando do tratamento dos factos relativos ao ser percurso escolar -, temos que, por exemplo, à “4ª feira” ao “primeiro tempo” está indicada a disciplina de “Físico Química”. No entanto conjugando com os elementos constantes do Apenso EJ, Pasta 5 (Apenso respeitante ao registo das faltas da Turma do AI, no ano lectivo 1999/2000) , por exemplo fls. 2.344, temos que ao “primeiro” tempo da manhã de 4ª feira, dia 24/11/99, a disciplina é de “M” (Matemática) e não “FQ” (Físico Química), tal como está assinalado no horário de fls. 36.0002 (e neste dia o AI, que é o “nº (…)”, tem assinalada falta ao 1º tempo de Matemática). O que quer dizer, para o Tribunal, da conjugação destes elementos, que houve alteração no horário que se encontra a fls. 36.002. Mas continuando - com a análise das faltas registadas no Apenso EJ pasta 5 e EJ pasta 6 -, o AI também tem faltas em aulas intercalares ou em mais do que uma aula seguida (cfr. 13/10/99, 4ª feira; 22/10/99, 6ª feira; 15/10/99, 6ª feira; 15/12/99, 4ª feira; 10/12/99, 6ª feira; 29/11/99, 2ª feira, sendo que neste dia vemos que a falta está assinalada ao 2º tempo, mas houve o 1º tempo e não tem falta marcada e há alunos que tiveram falta no 1º tempo e não têm no segundo, o que pode significar e o Tribunal assim o interpretou, que o professor fez a chamada ao primeiro tempo e ao segundo). Em relação às faltas assinaladas no primeiro período de 1999/2000, vemos que a totalidade das faltas que se encontram registadas a fls. 425, do Apenso Z-15, 1º Volume - onde estão registadas as faltas do 1º período do ano 1999/2000, 32 faltas -, não constam na sua totalidade nos elementos constantes do Apenso EJ, Pasta 5, fls. 2.343 a 2.571 e Apenso EJ, Pasta 6, fls. 2.572 a 2.732, pelo que não podemos e não conseguimos concluir se as faltas “a mais” foram ao 1º tempo ou em tempo intercalar. Conjugando estes elementos, com os registos do Livro de ocorrências e que atrás mencionámos, em relação às faltas do assistente neste ano lectivo – cfr., em concreto, Apenso W-16, 1º volume: fls. 61 e 62; fls. 82 e 83; fls. 100, aqui registo de 26/11/99, em que é feita referência às “tantas” faltas que o AI tem; fls. 113; fls. 125; fls. 134, registo datado de 3 a 4/01/2000, em que é feita uma interrogação, como é que o AI recebe um prémio de assiduidade; fls. 138; fls. 153 a 154; fls. 208; fls. 253; e Apenso W-13, Livro 1: fls. 6, fls. 122 -, eles confirmam e corroboram o facto de absentismo em sentido crescente neste ano 1999/2000. Acresce que em Abril de 2000 encontramos mesmo uma referência específica a boleia do arguido A ao Assistente, facto que as testemunhas YV e YW, educadoras do AI no Lar, disseram ao Tribunal ter sido discutido numa reunião de equipe de internato (cfr. Fls. 253, do Apenso w-16, 1º Volume; bem como o depoimento das mencionadas testemunhas). A fls. 422 temos o registo das faltas do ano lectivo 2000/2001, 1º Período, com 26 faltas; fls. 416, as faltas do 2º período, com 20 faltas; e a fls. 417 e 419, faltas do terceiro período, com 9 faltas. E a fls. 418, 420, 421, temos as faltas do ano lectivo 2001/2002, com 12 faltas no 1º período e com 23 faltas no 2º período, mas período de tempo que já sai do abrangido pelas declarações do assistente. De tudo o que antecede resultou, para o Tribunal, que o ano de maior absentismo do assistente – no período que estamos a considerar - foi o ano lectivo 1999/2000, o qual está englobado no período durante o qual o assistente disse ao Tribunal que ocorreram os factos . O que assume um indício de “eco”, na nossa perspectiva, de que alguma coisa ocorreu, como facto destabilizador do crescimento do assistente, concretamente não só os factos ocorridos com o arguido A, mas também os que o tribunal veio a dar como provados na casa da (…) e em (…). (2.4) Quanto ao local dos encontros para as “boleias”, o AI começou por dizer que era no “(…)” quando ia a casa do arguido A. Isto não foi assim admitido pelo arguido A e das declarações do assistente, quando começou a falar do “ponto de encontro” para os outros locais onde o arguido o levou, o Tribunal ficou com alguma dúvida quanto ao facto se era “sempre” o encontro ali ou não (factos cuja análise voltamos a focar em momento posterior, quanto tratarmos de forma mais individualizadas as declarações do assistente quanto à casa da (…)). Assim, considerando a globalidade das declarações do assistente, a proximidade do (…) com o Lar do assistente – no BF -, de facto faz sentido que esse tenha sido um local de “encontro” para as “boleias” ao educando, tal pode ter ocorrido. Mas pode ter acontecido que em alguma altura ou nas deslocações para outros locais - por ser a uma hora diferente, por ser num dia diferente por exemplo -, o encontro entre os dois tenha sido em local diferente. As declarações do assistente não o afastam, como resulta quando prestou declarações quanto à “casa da (…)” e daí, não obstante ser um facto circunstancial, o Tribunal não ter dado como suficientemente assente que o ponto de encontro do assistente, para todas as situações em que se deslocou com o arguido, incluindo para casa do arguido, tenha sido sempre ao pé do (…). (2.5) Passando ao número de vezes que o arguido esteve com o assistente em sua casa, para a prática dos actos, o arguido A disse (e fazendo o Tribunal a referência por mera súmula) que os factos com o AI aconteceram “... quatro ou cinco vezes que ele foi a minha casa...”.. O AI disse ao Tribunal - e fazendo o Tribunal esta referência também por súmula -, que após o acto no refeitório “… a partir daí …depois … fomos várias vezes para casa dele….”, o arguido A ia buscá-lo, às vezes, à escola “…e passávamos por casa dele….”. Voltou a ter actos de “abuso sexual” com o arguido A, concretizando “…o sexo oral… a masturbação e o sexo anal...(…)eu fiz o sexo oral a ele e masturbação… e o sexo anal foi feito por ele a mim….”, voltou a ir “... várias vezes a casa do arguido A...”, o que acontecia durante a semana, “…era quando ia para a escola….antes de ir para a escola passávamos sempre por casa dele, do Sr. A….”. Disse que os actos foram sempre “…sexo oral, sexo anal e masturbação…”, dizendo que todas as vezes que foi para casa do arguido A estes actos foram sempre praticados, mas tendo corrigido “…quer dizer… não foram bem sempre...às vezes era só sexo oral e masturbação... (…) eu fazia sexo oral a ele... e masturbação ...e sexo anal era feito por ele a mim...”. E tendo dito, como já referimos e quando o Ministério Público passou a pedir-lhe esclarecimentos, que houve vezes, “mas poucas”, em que houve só actos de masturbação, foi “mais” no princípio, quando o arguido punha os filmes pornográficos. Esta correcção que o assistente fez quanto aos actos praticado, foi para o Tribunal uma das expressões que revelam que o assistente estava a falar, de facto, do que se passou consigo e não estava a inventar ou a aumentar actos em relação ao arguido A. Com efeito, se estivesse a aumentar o período de tempo ou o número de actos, se o que disse ao Tribunal fosse uma coisa que tivesse criado dizer - mesmo, repetimos, que a criação se restringisse a aumentar o número de actos e o período de tempo, por uma razão qualquer que pudesse ser configurada - o assistente teria sido preciso, não saía da versão preparada. E, atenta a normalidade das coisas, não teria tido a preocupação de precisar, corrigindo-se - pois já tinha dito de forma diferente - que houve encontros em que nuns não ocorreram actos de penetração oral, mas só penetração anal e vive versa e que houve outros em que “apenas “ houve actos de masturbação, sendo que uma correcção é algo que pode ser visto de forma negativa, pois associa-se à dúvida ou ao erro . Respondeu - quanto à ideia que tinha do tempo que “isto durou” - que “ ...foi em 98 (noventa e oito)… para aí…”, acrescentando que em relação ao ano em que foi para a (…) “…foi quase todo esse ano lectivo ...era quase todo esse ano lectivo….” (como já acima vimos, o AI foi para a escola da (…) no início do ano lectivo de 1998/1999; fez 12 anos em 26/09/98). Não se recorda quantas vezes, quantas manhãs, por semana ou por mês isto aconteceu, dizendo “…depende… dependia..ou acontecia durante… semana a semana, ou semana sim semana não….”, dentro da mesma semana tem ideia de ter ido mais do que uma manhã a casa do arguido A e que isto aconteceu mais do que uma vez. Disse “ter ideia” que esta situação com o arguido A passou “…para o ano lectivo seguinte….”. Não aconteceu durante as férias, pois esteve nas (...) e nas (...) nada aconteceu, tendo feito a mesma afirmação quanto às férias da Páscoa. O Tribunal não omite a dificuldade que é e que foi, determinar o número de vezes (concretas) em que os factos correram, face ao que foram as declarações do assistente. Mas as declarações do assistente - e no sentido e para além do que já dissemos -, atenta a forma como explicou e descreveu os factos, por vezes falando de uma forma tão “normal” das idas a casa do arguido A, como se fosse algo que tivesse interiorizado que acontecia “ e pronto…”, que fazia parte da sua vivência, foram credíveis para o Tribunal (e convocamos, também, o que já dissemos quanto às conclusões do exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente e que se encontra a fls. 7.611 a 7.618). Acresce que estamos perante uma situação em que há uma repetição, continuada, sempre com as mesmas características de ambiente e intervenientes, dos factos (situação diferente da que se passou no refeitório, em que há uma repetição dos mesmos actos, mas isolado por ter características de ambiente próprias), o que, atenta a normalidade das coisas, em regra leva à interiorização de uma rotina. A que acresce o facto de o assistente ter estado a falar de factos que aconteceram há cinco, seis ou sete anos em relação à data em que o assistente esteve a falar deles, quando tinha entre 11 e 13 anos e com um percurso de instabilidade, incluindo emocional, que já descrevemos. E é desta noção de rotina que o Tribunal, interpretando o que foram as declarações do assistente, extraiu que os factos ocorreram, pelo menos - em relação aos meses em que o Tribunal deu como provado terem ocorrido - duas vezes por mês (… não se recorda quantas vezes, quantas manhãs, por semana ou por mês isto aconteceu, dizendo “…depende… dependia..ou acontecia durante… semana a semana, ou semana sim semana não….”, dentro da mesma semana tem ideia de ter ido mais do que uma manhã a casa do arguido A e que isto aconteceu mais do que uma vez…) e que os actos que aconteceram nestas vezes foram sempre como descrito no ponto “96.17” dos “factos provados”. E valorando e analisando globalmente as declarações do assistente - incluindo a declaração que fez que nas férias escolares não ocorreram quaisquer factos - e na sequência do que o Tribunal acima já disse quanto à convicção a que chegou quanto à altura em que começaram os factos e a altura em que terminaram, o Tribunal criou a convicção, segura, que esses actos - que ocorreram pelo menos duas vezes por mês -, aconteceram, pelo menos: (i) em Novembro, Dezembro (aqui fora do período de férias, pois as declarações do assistente assim o apontam) de 1998; (ii) de Janeiro a Junho (inclusive) e de Setembro a Dezembro (inclusive) dos anos de 1999 e de 2000, mas dizendo-se que nos meses em que ocorreram as férias escolares da Páscoa e do Natal, os encontros com o jovem foram em período foras dessas férias; e nos meses de Junho e Setembro, em que começaram ou terminaram as férias de Verão, os encontros com o jovem foram ainda ou já, em período de aulas; (iii) e duas vezes por mês; Quanto ao ano de 2001 e pelo que o Tribunal acima disse quanto à dificuldade da prova para esta ano, para além de qualquer dúvida razoável, o Tribunal não deu como provados factos ocorridos neste ano. 13.3.3. E agora, pela relevância que alguns depoimentos - entre os quais os depoimentos das educadoras do Assistente AI, ou da sua “mãe” da família de acolhimento - assumiram para a convicção do Tribunal, quanto à matéria de facto assente, quer em relação aos actos de abuso praticados pelo arguido A, quer em relação aos praticados pelos demais arguidos na pessoa do AI - sendo que no que diz respeito à análise crítica dos factos relacionados com os demais arguidos, fazemos desde já a ponte com essa análise -, vamos, por súmula, expor o que foram estes depoimentos e como o Tribunal os interpretou. Isto porque, não obstante de forma fragmentada os tenhamos vindo a invocar e os iremos invocando, a sua globalidade – cruzando com os dados que resultam da prova documental - dá uma imagem mais coesa da vivência do assistente e dá, por outro lado, uma imagem do que era, efectivamente, o controlo que o assistente tinha no lar, a proximidade e o conhecimento que as educadoras tinham da vivência do AI. Mas também importante – porque se as questões da memória, dos lapsos ou dos esquecimentos, são relevantes para aferir da credibilidade e da veracidade das declarações dos assistentes, também o são para as testemunhas e demais declarantes -, dá-nos uma ideia do que hoje as testemunhas conseguem recordar e transmitir dessa vivência e proximidade. (1) A testemunha YV (educadora na AX de Março de 1997 a 2006), foi educadora do AI no Lar FU (ainda em 1997, de acordo com as suas palavras, mas quando chegou a este Lar o AI já lá estava, mas ainda ia às aulas a BF), durante quatro. A sua equipa de educadoras era com a educadora YW e YX. Falou do controlo que era feito por análises aos educandos do Lar, de seis em seis meses, as quais, de acordo com o seu conhecimento, até “certa altura” eram guardadas no processos dos educandos e aos quais os educadores tinham acesso (depoimento que, nesta parte, foi relevante para a prova desses factos, pelo que expressamente o mencionamos). Falou dos “livros de ocorrências dos Lares”, explicando que eram registos de passagem de serviço, preenchidos pelas educadoras e onde anotavam o que se passava com os educandos, sendo que na sua perspectiva tinham cuidado em anotar o que fosse mais relevante. (1.1) Quanto ao AI, disse que o educando viveu uma fase em que “estava transtornado sexualmente” - explicando que fazia jogos sexuais com educandos muito mais novos que ele, o que a testemunha considerava que não era normal e daí considerar que estava transtornado; explicou a razão pela qual usou a palavra transtornado e foi porque o AI “abusou de alguns miúdos” -. Disse que o próprio AI falou com a testemunha sobre ter abusado de um rapaz de outro lar . Transmitiu à Directora do (...), à Dra. YY (cfr. Apenso Z-10, fls. 2 e 3, Documentos relativos aos Educandos, Equipas de internato dos Lares e Mapas de directores, coordenadores (...)s, enfermeiros, dos (...)s e lares da AX) - tendo acrescentado, a esclarecimento que lhe foi pedido, que “naquela altura” não se faziam actas das reuniões da equipa do lar, tiravam apenas notas de trabalho – elementos que o Tribunal depreendeu serem os que se encontram a fls. 429 a 446, do Apenso Z-15, 1º Volume - , acrescentando que as duas psicólogas que fizeram parte da equipa do lar e que participavam nas reuniões, foi primeiro uma psicóloga chamada YS e depois a (…). Na sequência deste acontecimento e conversa a testemunha marcou uma consulta de pedopsiquiatria para o AI. (1.2) Este depoimento contribui para a percepção e convicção do Tribunal, quanto ao processo de degradação - no que diz respeito à sua estabilidade - que o AI viveu desde que entrou para a AX. Processo este, de degradação, que tem consistência com os actos de abuso de natureza sexual que relatou ao Tribunal ter sofrido. Assim vejamos. A testemunha localizou no tempo este incidente do “abuso sexual” de um colega mais novo: “cerca” de um ano ou “quase” um ano, antes de terem sido conhecidos na comunicação social os factos deste processo, o que aponta para terceiro trimestre de 2001. Disse que foi pouco antes da sua saída do Lar, o que aponta para o mesmo período. E do teor do documento de fls. 229 - do Apenso Z-15, 1º Volume, (ponto III, 1.) - resulta que o (...) BQ mandou instaurar, em 7/09/2001, um processo de averiguações, por situação relacionado com o educando AI e o educando PM, o que aponta para período anterior, embora próximo, da data do despacho. Mas a testemunha disse que “antes” deste episódio andava a “sentir” o AI diferente, extraindo-se do seu depoimento que, para si, este incidente foi o agravar de uma situação. Disse que o AI era uma criança que “custava exteriorizar as coisas”, “sofre para dentro, muito com ele”, no princípio era revoltado, mas o que a testemunha considerava que era o normal numa criança que já tinha tido uma má experiência num (...), referindo-se à instituição onde o AI tinha estado antes de ingressar na AX. E transmitiu a sua percepção – quanto ao processo degradativo da estabilidade do AI - da seguinte forma: após a testemunha ter entrada para o Lar FU o AI já lá estava (no Apenso Z-10, fls. 7 - Documentos relativos aos Educandos, Equipas de internato dos Lares e Mapas de directores, coordenadores (...)s, enfermeiros, dos (...)s e lares da AX - o Tribunal tentou encontrar a data concreta em que a testemunha foi para o lar FU, pois como disse primeiro foi para o BE e só depois é que foi para o FU, mas sem sucesso, porque não tem esta última referência; no entanto temos que o AI entrou em Outubro de 1997, que a testemunha também entrou em 1997, mas que quando a testemunha entrou o AI já lá estava, pelo que a entrada da educadora foi após 17/10/97). Quando conversou com o AI, por este estar “perturbado”, depreendeu-se da dinâmica do seu depoimento que foi numa altura em que ele ficou “mais perturbado” e a perturbação já vinha de momento anterior. Não conseguiu explicar mais quanto a datas e ao tempo, dos episódios anteriores de perturbação, dizendo que “… isso é daquelas coisas que as pessoas juntam um mais um são dois…” e, de facto, isto é muitas vezes a forma como a memória consegue, anos mais tarde, recuperar os factos… Deu no entanto elementos. Disse que AI “… era uma criança prestável…era uma criança que se via que era sofrida….(…) Eu notei que a partir de certo momento, a equipa começou a notar que o comportamento do AI era diferente…(….). À medida que se foi agravando, que nós demos por isso…como sabe são vinte crianças, os lares são grandes… (…) é como os nossos filhos, não andamos sempre em cima deles (…) e eu tive conhecimento disso…desses…(…) da masturbação…(…), da cama pronto, comecei a achar aquilo tudo muito estranho, porque não é normal uma criança estar a masturbar-se numa sala onde qualquer pessoa pode entrar …(…). Depois foi quando ele me disse, quando houve aquele facto e que eu falei com ele, porque foi com uma criança do outro lar…e eu falei com as duas crianças(…)”. E voltou a dizer que foi na sequência desta última conversa com o AI que falou com a Directora do (...) e marcou a consulta de pedopsiquiatria para o educando (para a Dra. GK). No entanto do seu depoimento depreende-se que esta não foi a primeira consulta do AI com a Dra. GK, ele já tinha ido a (...) anteriores. Disse que nesta altura a testemunha saiu do internato e soube “mais tarde” que o AI não tinha ido mais às (...) (lembramos que a testemunha no início do seu depoimento dissera que esteve quatro anos no lar, tendo entrado após 17/10/1997, pelo que a sua saída ocorreu no final de 2001). Falou de um outro incidente relacionado com a instabilidade crescente do AI enquanto esteve na AX – mas ocorrido em momento anterior aquele em que houve o abuso sexual” de um colega mais novo - e que foi uma situação em que o AI fora “apanhado” a tentar penetrar o ânus com uma peça da cama, explicando que era “maçaneta”. Não conseguiu localizar no tempo este episódio, dizendo que era difícil para si dar as datas, não só deste episódio mas da outra situação que referiu, a do “abuso sexual” do AI em relação a um colega mais novo de outro lar. (1.3) Cruzando este segmento do depoimento da testemunha com os elementos documentais que já citámos – quanto à evolução do AI após a entrada na AX -, eles corroboram esta percepção da testemunha da evolução do AI, de um processo de evolução de “perturbação” para “perturbação mais grave”. Como vimos, a fls. 375 (do Apenso Z-15, 1º Volume), documento datado de 26/03/98 - e de cujo teor se depreende dizer respeito quer ao AI quer ao seu irmão -, consta que o AI está bem integrado e gosta de agradar. A fls. 374 (do Apenso Z-15, 1º Volume), documento datado de 4/06/98, três meses depois do anterior e cerca de 7/8 meses após a entrada na AX, é dito que a família de acolhimento acha que o AI mente muito, está revoltado (com o pai), garoto fechado; fls. 372 (documento de 14/10/98) o AI continua a parecer uma panela de pressão, o que, face à leitura dos documentos que se seguem, o tribunal interpretou como expressão de instabilidade, agressividade e impulsividade. A fls. 371 vº, documento datado de 9/11/98, informação referente à escola, disseram que o garoto está bem e tem aproveitamento razoável; mas a fls. 369 (datado de 20/11/98), onze dias após a informação anterior, é dito que o AI parece uma panela de pressão prestes a explodir, desinteressado, não cuida da higiene, fica contente quando a família de acolhimento aparece, bate nos mais novos e é agressivo, tem dificuldade em reconhecer autoridade - narração esta que tem alguma ressonância/correspondência com o momento em que o Tribunal localizou, embora dizendo que foi pelo menos nessa altura, o início da série de actos em casa do arguido A. A fls. 364 (27/05/99) o AI é muito fechado; a fls. 360 (14/10/99) a professora considera que anda mais triste que o ano passado, as educadoras referem que durante as férias chorou com saudades da mãe; fls. 362 (28/10/99) o Educador BBX diz que chega atrasado de manhã, mas tem bom comportamento e está bem integrado, não tem faltas intercalares e a DT telefonou, acha-o muito triste; fls. 359 (15/12/99) a família de acolhimento não está tão envolvida com ele. A fls. 444 a 446 vº (do Apenso Z-15, 1ºvolume), encontra-se (por ordem sequencial de datas): a necessidade de encontrar forma de ajudar o (…) (fls. 446, 25/01/00); em reunião na (…), AI é sossegado mas pouco atento, está mais contente (fls. 446 vº, 3/02/00); AI utiliza o desenho para comunicar, é muito defensivo, controla de forma deformada os impulsos sexuais e é agressivo (cfr. fls. 445 vº, 23/02/00); fls. 348, 24/02/00, a FA (Família de Acolhimento) não tem confiança no AI, não o deixa ficar sozinho porque mexe nas coisas sem autorização, só quer ver TV ; fls. 347, 28/02/00, necessidade de controlo da sexualidade e da agressividade. No “Apenso W-16, 1º Volume” e “ Apenso W-13, Livro 1”, em 12/02/00 (fls. 155, Apenso W-16, Livro 1º) temos o registo da referência ao incidente com uma colega (..), havendo o registo de 21/02/00, de um telefonema para a equipa de pedopsiquiatria sobre consulta do AI, o que exprime o sentido de estar a ocorrer situação suficientemente preocupante, para o educando necessitar de acompanhamento. A fls. 208, o registo de 28/02/00, em que a educadora escreveu que o educando chegou ao Lar passavam das 19.15h, disse terem ficado a ver filme com Professora e a 29/02/2000, educadora telefonou para a (…) a confirmar o que o “menino” disse ontem. Falou com Educador BBX e não sabia de nada, ficou de confirmar com professora, mas história esquisita; e escreveu, ainda, que ontem este menino estava no quarto e fui espreitar, estava de joelhos na cama “ a fazer não sei o quê ou nem quero saber ao certo, porque já estou a achar que ele está com pancada e não é na «cabeça de cima»...” (descrição esta que tem alguma correspondência com o percurso de crescente instabilidade que a testemunha disse ter pressentido no AI, ao longo do tempo em que esteve no lar e relacionada também com comportamentos de natureza sexual). Em 7/07/2000 foi feita uma informação do “Serviço Social – JP” para a Directora do BF, resultando deste documento que se destinava a reenviar para o Tribunal de Menores (cfr. Fls. 24 a 29 do Apenso DD). Esta informação refere que o AI era seguido na consulta de Pedopsiquiatrio desde Abril de 1999, pela Dra. GK, mas também diz que o jovem gosta de estar no Lar, revela-se ora imprevisível e agressivo ora meigo e submisso, mas “...nota-se um maior autocontrole do comportamento, conseguindo manter boa relação com a maioria dos colegas e adultos. Mostra-se mais participativo e disponível para as actividades quotidianas do Lar...” (cfr. Fls. 24 a 29 do Apenso DD; e cfr. Apenso Z-15, 1º volume, fls. 432 a 443 ). De fls. 17, do “Apenso DD”, consta que o AI “(...) está a ser medicado pela Dra. GK desde Outubro de 2001 com anti-depressivos...”. Estando anexo a este documento o relatório feito pela Dra. GK e datado de 12/09/2001 (a Pedopsiquiatra que acompanhou o AI desde Abril de 1999; cfr. Fls. 19 e 20 do Apenso DD), o qual diz que o AI é seguido na consulta desde Abril de 1999, por “...comportamentos de oposição e agressividade...”, fala das marcas que revela pelo abandono familiar, que tem um “... sofrimento depressivo importante que só raramente é expresso directamente pela sua atitude, tendendo a manifestar-se através de comportamentos de revolta, com passagens ao acto impulsivas e descontroladas...(...)”, mantendo a necessidade de tratamento pedopisiquiátrico” (a Dra. GK foi confrontada em audiência de julgamento com este documento e confirmou ter sido feito por si, embora não se recordasse qual a situação concreta que levou à sua feitura; no entanto acentuamos que alguma alteração, para “pior”, aconteceu no processo de estabilidade do AI, pois passou a esta medicado com anti-depressivos). Para o tribunal este relatório de 12/09/2001, face à sua data - e conjugando-o com os elementos que acima já referimos, para a determinação da “altura” em que ocorreu o incidente do “abuso sexual” do AI em relação a um educando mais novo -, deve corresponder com a altura em que a testemunha YV disse sentir o AI “mais transtornado”, altura em que ocorre uma situação que é configurada como de abuso do AI em relação a um aluno mais novo. E tanto assim era que, a partir de Outubro de 2001, o AI passou a ser medicado com anti-depressivos, medicação que devia tomar em Junho de 2003, mas não estando o Assistente a aderir ao acompanhamento (cfr. fls. 333, do Apenso Z-15, 1º Volume). Mas o seu ciclo de transtorno e com transtorno relacionado também com comportamento sexual, que a testemunha disse que já vinha de trás, tem reflexo para o Tribunal em fins de 1998 (ver a informação de fls. 368, do Apenso Z-15, 1º Volume, que referimos), que se desenvolve em 1999 (ver a informação de fls. 364, de 27/05/99; a de fls. 360, de 14/10/99; com o registo de fls. 362, de 28/10/99, em que o educador da escola diz que tem bom comportamento, mas a DT acha-o muito triste) e que pelo menos em Janeiro de 2000 apresenta uma evolução, que pelo menos pontualmente, interpretamos como mais grave, com o registo de fls. 446, de 25/01/00, em que é dito que há necessidade de encontrara forma de ajudar o AI (associamos o que antecede, ao seguimento do AI pela Dra. GK desde Abril de 1999). (1.4) Prosseguindo com o depoimento da testemunha YV, a educadora disse ao Tribunal que na altura em que marcou a consulta do AI para a Pedopsiquiatra falou com o educando. Perguntou-lhe se “tinha acontecido alguma coisa com ele” e que respondeu que sim. Disse-lhe que foi “antes” de ter ido para a AX, tendo a testemunha ficado com a “impressão” que tinha sido um namorado da mãe. Mas manifestou dúvida quanto à precisão da pessoa, pois depois de ter dito ao tribunal que teria sido um namorado da mãe, disse que o AI não lhe tinha dito concretamente quem tinha sido. Num terceiro momento, a pedido de esclarecimento do Tribunal - se tinha sido mesmo o AI que tinha identificado essa pessoa ou se o AI tinha dito alguma coisa da qual a testemunha tivesse deduzido que era isso que o AI queria dizer - respondeu: “... não... não, foi ele que me disse que, quando eu lhe perguntei se tinha sido ali na AX e ele disse-me que não, que tinha sido quando estava com a mãe ... um amigo, mas foi um bocadinho tirado a ... foi um bocado induzido não é ... e por isso é que eu não quis forçar mais ... naquela altura não era altura para se estar a forçar a criança para dizer ... e acho que isso também seria trabalho dos outros técnicos a continuidade ...”. Perguntou ao AI o que é que ele sentia quando fazia aquilo – e “aquilo” foi o acto de “abuso sexual” de um colega mais novo - e o assistente respondeu-lhe que “sentia” que era como se estivesse a fazer aos outros, aquilo que lhe tinham feito a ele. Estava transtornado, a impressão que a testemunha colheu é que era quase como que uma vingança, como uma necessidade de castigar. Esclareceu que não pressionou o AI com mais pormenores, pois o AI estava a chorar. Relatou, também, que “mais tarde” - em relação à altura em que conheceu o AI - , a colega (educadora) YW disse-lhe que o AI sujava “ as cuecas com cocó”, mas disse que isto aconteceu “meses, um ano” antes da conversa que teve com o AI e que acima contou ao Tribunal (sobre os actos com um colega mais novo) . Ainda relacionado com este educando, disse que foi discutido em reunião do lar, em que esteve presente, o facto de o AI andar a apanhar boleias do arguido A. Foi dito ao educando para não apanhar boleia de ninguém e para fazer os percursos para a escola de transportes. A razão de ser desta proibição, embora tal não tenha sido explicado desta forma ao jovem, foi a percepção que a testemunha teve que “havia pessoas” na AX que não confiavam no comportamento do arguido A, compreendendo-se no trato com os alunos, pois caso contrário não tinha falado com o jovem. Quanto a este facto relatado pela testemunha – boleia do arguido A -, encontramos o registo no Livro de ocorrência datado de “21/04/00 -28/04/00, a fls. 253, Apenso W-16, 1º Volume. No entanto no Apenso Z-15, 1º volume, documentos referentes ao processo psicossocial do assistente e onde estão as anotações das reuniões da Equipa de internato ou no Apenso DD, o processo individual do educando, não encontramos registo deste episódio. A testemunha disse que não viu o AI com “sinais de riqueza”, ténis, roupa de marca ou jogos electrónicos, tendo-se apercebido de uns ténis que o AI comprou e de uma mochila que não era dele, que lhe disse que tinha trocado com um colega. E de umas chuteiras que ele trouxe, que disse que tinha sido A que lhas dera. Relacionado com estes factos relatados pela testemunha – ténis ou chuteiras e lembrando que quanto às chuteiras, o arguido A disse espontaneamente ao tribunal que deu uma camisola e umas chuteiras ao AI, porque o AI gostava muito de futebol -, convocamos um registo no Livro de ocorrência datado de “24/01/00”, referente a “ténis”, dizendo que o AI comprou uns ténis para si e para o irmão, interrogando a educadora onde é que arranjou o dinheiro, cfr. fls. 155, Apenso W-16, 1º Volume. Mas no entanto no Apenso Z-15, 1º volume, ou no Apenso DD, também não encontramos registos deste episódio, sendo que quanto às chuteiras não há qualquer registo nem no livro de ocorrências, nem nas anotações do processo psicossocial, relativas às reuniões da equipa de internato. Em relação às faltas à escola do AI, a testemunha não se recordou de receber comunicações da escola a dizer que ele faltava, lembrando-se contudo que ele saía “muito cedo”, o que a testemunha pensava que era para apanhar os transportes, para a escola. Mas relacionado com este segmento do depoimento da testemunha, “faltas” e “chegar atrasado à escola”, temos os registos no livro de ocorrências que confirmam este facto de forma que o Tribunal considera globalmente sequencial e repetida, desde 27/10/99 a, pelo menos (tendo em atenção o período que está em análise, face aos factos imputado ao arguido A) 16/05/2001 (lembrando que não temos os registos dos livros de ocorrência anteriores a Junho de 1999 –, cfr, fls. 185, Apenso W-13, Livro 1). Mas aqui chamamos a atenção para dois factos – relevantes não só para análise dos elementos relativos a registo de faltas escolares do assistente AI, mas também dos demais assistentes e para outros factos – e que é, por um lado, o da fidedignidade dos registos dos livros de ocorrências e, por outro, o que é a memória das testemunhas. Do que foi a memória desta testemunha, por exemplo, quanto às faltas do AI – e como veremos acontece situação idêntica nas testemunhas seguintes -, face aos registos que constam no livro de ocorrências há, efectivamente, uma situação sequencial de anotações relacionadas com faltas do assistente e da qual a testemunha não tem, neste momento, a percepção. E do que é a fidedignidade dos livros de registo de ocorrência, não encontrámos registo de referência à situação das chuteiras dadas pelo arguido A ao assistente (embora tenhamos que equacionar que tal possa ter ocorrido em data anterior aquela de que temos registos), nem encontramos referência ao “problema” do AI de sujar a roupa interior com fezes, o que, de acordo com o seu depoimento, ocorreu em período em relação ao qual temos os registos dos livros (nem à situação referida pela testemunha LN, de o AI ir aos fins de semana para casa de um amigo que não sabiam quem era, pois o registo que existe no livro de ocorrências é à proibição de o AI ir para casa do amigo ao fim de semana, enquanto os pais do amigo não fossem falar ao lar, pois as educadoras a determinada altura aperceberam-se que o AI passava o fim de semana fora do Lar, em casa de um amigo que não sabiam quem era). Esta testemunha disse, ainda, que falou com o AI “depois de o escândalo rebentar” , perguntou-lhe porque é que este não lhe contara e o AI respondeu -lhe “Para quê (…)?”. Mas acrescentando a testemunha - quando a defesa do arguido H repetiu a sua resposta, em jeito de interrogação, “ ...e ele disse para quê?” -, explicando o sentido da pergunta que fizera ao AI e a resposta que ele dera, “…como quem diz, porque é que não me disseste que tinha sido ali, disseste lá fora, que tinha sido antes… e ele disse para quê?...”. Aqui voltamos um pouco atrás. Quando a testemunha falou da conversa que teve com o AI, por causa do abuso do colega mais novo – em que o AI “justificava” o que fez por vingança pelo que lhe tinham feito a ele, chorava, manifestava sentimento de vingança e, pelo que foi o depoimento da testemunha, estava em sofrimento -, a testemunha ligou tal estado do AI a uma situação de abuso sexual que o educando tinha sofrido, mas “pelo namorado” da mãe do AI, embora tenha esclarecido que não foi o AI que lho disse, foi a testemunha que o induziu . A situação descrita pela testemunha foi, para o Tribunal, expressão e testemunho do sofrimento em que o AI estava nessa altura, sofrimento este relacionado a uma situação de abuso que tinha sofrido. E, na convicção do tribunal, abuso este relacionado com os factos que o Tribunal deu como provado nestes autos e não com a suposição da testemunha, de abuso de um namorado da mãe do AI. Dizemos isto pelo seguinte. A conversa que a testemunha relatou ter tido com o AI, já depois do conhecimento dos factos deste processo – a que acima referimos e que surgiu na instância à testemunha da Defesa do arguido H -, na avaliação do Tribunal aponta para isso. Do processo individual do AI prévio ao seu internamento – e lembramos que o AI já vinha de uma institucionalização anterior e, em regras, as situações de abuso sofridas pelas crianças fazem parte do seu processo -, dos registos e relatórios que existem na AX e que transcrevemos, do depoimentos de todas as testemunhas que contactaram com o AI e/ou foram suas educadoras, não há qualquer referência ou conhecimento de na sua história, anterior à entrada na AX, na sua vivência familiar, já houvesse situação de abuso sexual. E lembrando que a testemunha esclareceu que não foi o AI que directa e claramente disse à testemunha a “identificação” da pessoa que tinha sido o autor do abuso, mas foi, nas palavras da testemunha, “induzido” pela sua conversa. (2) A testemunha YM (a “mae” da “Família de acolhimento” do AI, quando este saiu de uma instituição em que se encontrava internado, com o irmão WJ e antes de ter entrado para a AX), explicou que acolheu como família e transitoriamente o AI e o irmão, apenas enquanto os serviços competentes procuravam uma instituição para os jovens, mas que a sua família continuou a receber o AI e o WJ aos fins de semana. Disse que tal foi de forma regular, tendo o tribunal concluído do seu depoimento que, no primeiro ano de internamento do AI na AX, a ida a casa ao fim de semana foi “mais vezes” do que no segundo ano (tendo acrescentado que os fins de semana era com ida para casa da testemunha à sexta feira e regresso à AX ao Domingo; mas que no ano 2000 teve uma fase em que o AI só ia a sua casa ao domingo ao almoço). Descreveu o AI como um rapaz meigo e que até os funcionários da escola onde o AI esteve matriculado, antes de ir para a AX, gostavam dele. A pergunta que lhe foi feita pela Defesa, corroborou uma declaração que o AI tinha feito ao tribunal sobre os programas que via na televisão – declaração esta relacionada com o conhecimento ou possibilidade de conhecimento do AI, através da televisão, do arguido H -, dizendo que os programas de televisão que o assistente via quando estava em sua casa, eram do “Cartoon network”, tendo utilizado a expressão que via este canal “ de manhã à noite”. Respondendo a pergunta que lhe foi feita pela Defesa do arguido H, disse que a “ pessoa H” era conhecida pela testemunha e pelo marido, mas pelos seus filhos – com idades próximas do AI -, não sabe se o conheciam, dizendo que do AI nunca se apercebeu qualquer comentário “à pessoa” do arguido H. Disse ao Tribunal que nunca notou alteração comportamental do AI (embora notemos o registo que atrás referimos, da menção por parte da Família de acolhimento de o AI mexer nas coisas sem autorização), mas acrescentou que enquanto com o irmão do AI (o WJ) se tivesse qualquer problema, “tudo ficava a saber”, com o AI era diferente, porque “ele não falava”. Esta parte do depoimento da testemunha, que viveu de perto com o WJ – vimos que em 1997, por exemplo, o AI vai para sua casa em Fevereiro e só entra na AX em Outubro – vai ao encontro do que acima vimos, nos documentos e relatórios em que o AI é visto como um rapaz fechado e ao encontro do que foi o depoimento da testemunha YV, quando falou da dificuldade do AI em exteriorizar os seus sentimentos. Disse, também, que quando o AI foi transferido de Lar na AX, quando passou para o FD esteve “muito tempo” sem vir a casa e o que soube pelo WJ, por causa da mudança, é que “não tinha sido nada de especial” . Foi perceptível para o Tribunal que a testemunha não teve conhecimento de todos os problemas que acompanharam o crescimento do AI, a partir do momento que entrou para a AX. O que também permitiu ao tribunal ter a percepção de que o relacionamento que o AI tinha com esta família, apesar de ser de certeza gratificante para si, pois foi perceptível do seu depoimento que gostava de ir para esta família, não foi de intimidade e que o AI não partilhava com eles as suas dificuldades. O que, em alguma medida, concorre para se perceber a reacção e sofrimento do AI, quando teve a conversa “sobre” abusos, com a testemunha YV. Disse que viu o AI e o irmão com roupa de marca, embora não revelando mais conhecimento quanto à sua proveniência . E disse, também, que não teve conhecimento dos factos deste processo antes de terem sido divulgados. Mas disse que depois de terem vindo a público uma jornalista da DR tentou falar com o AI, bem como um jornalista chamado BO. Nunca se apercebeu que o AI se gabasse de coisas que fazia, nunca lhe notou qualquer comportamento “antes de o escândalo rebentar”, nem depois. A primeira vez que ouviu que o AI tinha alguma coisa “ a ver com isto”, foi quando a “jornalista IP” lhe telefonou e o AI também não lhe quis dizer o que se passava. Da forma como o AI falou ficou com a ideia que não queria falar, a testemunha ainda tentou “falar com ele” mas o AI não quis e também não se abriu com o marido da testemunha. Do seu depoimento resultou que o AI não quis falar para a comunicação social, o que foi confirmado pelo AI. Este aspecto tem relevância atenta uma das linhas de defesa dos arguidos, a referida criação de uma história por parte dos assistentes, a que uns foram aderindo consciente ou inconscientemente. Para o Tribunal este depoimento concorre para demonstrar que o AI não se quis exibir, não viu a comunicação social como um meio para se sentir importante, querido, herói ou gratificado. O que retira algum sentido e lógica, na perspectiva do Tribunal, à tese que imputa ao assistente estas motivações para estar a mentir e a criar uma história - no fim de 2002 princípio de 2003, altura em que começou a investigação do processo -, envolvendo os arguidos C, K e H, bem como N e Q mas dividindo a imputação de crimes aos arguidos por locais: aos primeiros numa casa na (…) e ao segundo numa casa em (…). (3) A testemunha ZF (educadora na AX desde 1974 e no BF desde 1975), falou do AI, do tempo em que o mesmo esteve no Lar FU e a testemunha era educadora (disse ter ido para este lar em 29/11/00, o que corresponde, de acordo com a convicção do Tribunal e que acima expusemos, ao período até ao qual o Tribunal deu suficientemente assente os actos de abuso praticados pelo arguido A no AI). Disse que numa altura o AI apareceu com uns ténis e uma mochila novos – esclarecendo, num segundo momento, que os ténis foi numa altura e a mochila noutra - , perguntaram-lhe sobre aqueles objectos e ele calava-se ou mentia (localizando este incidente da mochila em Setembro de 2001, no início do ano lectivo). Lembra-se, também, de umas ocorrência do AI com uma educanda – JJP -, recorda-se que assinou essa ocorrência mas não se tinha passado consigo, mas com outra colega. Fizeram a comunicação superiormente do que tinha acontecido, é o único incidente que se recorda com o AI, não sabendo se o AI foi transferido por causa deste incidente (para um Lar de CZ, sendo que dos documentos que acima mencionámos, quanto ao pedido da equipa técnica, em 2002, da transferência do AI para um lar de educandos mais crescido e masculino, na perspectiva do Tribunal são explícitos os problemas e a natureza dos problemas, com que as educadoras não conseguiam lidar; e ver que a testemunha foi confrontada com os documentos constantes de fls. 4, de 31/05/02, 10 e 16 do Apenso DD, tendo dito que os de fls. 4 e 10 foi a testemunha que assinou, tendo “participado” na sua elaboração e o documento de fls. 16 foi da situação que tinha relatado ao tribunal, do AI com uma educanda; esclareceu que os documentos que estão no Apenso DD – e isto depois de os ter visto -, não era o “processo individual” que estava no Lar, o do Lar era outro). Quando chegou ao Lar “havia uma dinâmica” de o AI ir uma vez por mês para uma família de acolhimento. No que diz respeito aos fins de semana no seu lar estavam cerca de 6/7 alunos no (...) e os educando, quando iam fazer uma actividade para fora do lar, iam acompanhados pela testemunha. No entanto, vemos que nos livros de ocorrências deste lar e de onde retirámos os registos quanta a faltas ou comportamentos do AI, existem os registos das idas do AI e/ou de outros colegas, sozinhos, sem educador, ao cinema ou jogar à bola para o (…) (cfr. a título de exemplo, Apenso W16, 1º Vol. Fls. 27, em 19/09/99; fls. 2036, Apenso EJ, Vol. 5.2, de 22 ou 23/10/99; Apenso W16, 1º Vol. fls. 142 em 8/01/00; fls. 155, registo 21 ou 22/01/00; fls. 259, registo de 28/04/00; fls. 283, em 12/05/00; mas havendo continuidade deste procedimento, conforme registo, por exemplo, do Apenso W-13, Livro 1, a fls. 51, de 7/01/01; fls. 79, de 28/01/01; fls. 140, em 25/03/01). Nunca se apercebeu que o AI tivesse estado “desaparecido” durante um dia ou tarde de sábado, lembrando-se apenas de uma situação, durante a semana, em que ele não foi às aulas e a Directora (da IIR) telefonou para o Lar. Não tem, também, ideia de o AI ao fim de semana ir para casa de um amigo, tendo dito que “lembrava-se” de ter “ouvido” qualquer coisa, mas não revelou qualquer conhecimento concreto (ver registo Apenso EJ, Vol. 5.1., fls. 1887, de 20/10/00; fls. 1899, registo de 20/12/00 embora o mesmo refira que foi combinada a ida, mas não se percebe com quem; e depoimento da testemunha NL e as anotações que referimos por causa do conhecimento da família de um amigo para onde o AI ia). Disse, também, que não teve conhecimento que o AI tenha sofrido alguma situação de abusos sexuais ou de maus tratos, na instituição onde estivera anteriormente à AX, o que teve relevância para o que atrás dissemos, aquando da análise do depoimento da testemunha YV, quanto ao (nas palavras dessa educadora), ter sido “induzido” por si a relação de “um namorado” da mãe do AI, com a situação de sofrimento em que o AI estava, por causa de um abuso (há que ver, também, que de acordo com os elementos dos autos, de 1997 a 2000 o AI não conviveu com a mãe, não passou os fins de semana com a mãe - cfr. Apenso Z-15, 1º volume). Quanto à saúde do AI, era saudável, apenas se lembrando de ter acompanhamento da Dra. GK. Quanto a qualquer alteração de comportamento, disse que ele deixou de ser alegre, teve o comportamento com uma educanda, tanto que pediram a sua transferência do lar, referindo que isto foi a partir da altura em que apareceu com a mochila (e que localizou no início do ano lectivo de 2001). (4) A testemunha YW (educadora do Internato, tendo entrado para a AX em Outubro de 1986, tendo sido educadora no AI no Lar FU de 1997 a 2000), disse ao tribunal que um colega educador, de nome “(…)” e que já morreu, disse-lhe para não deixar que o arguido A andasse “ muito com os meninos”, mas nunca lhe explicaram porquê e a testemunha também não perguntou. Foi expressiva no que disse quanto ao não ter perguntado “…porque na altura nós estávamos assim um bocadinho ... também…era…o que era dito era dito…diziam para fazer , nós fazíamos, muitas vezes nem sequer questionávamos porquê…”. O AI foi seu educando desde o princípio do Lar, teria 12 ou 13 anos. Estava a estudar em BF e depois , após ter acabado o 2º ciclo foi para a (…). Ia de transportes públicos, ia “cedo”, a testemunha não sabia a hora certa mas antes das sete horas “de certeza”. Mas houve uma vez que veio para o Lar de boleia do arguido A, foi um dia que chegou mais tarde do que a hora estipulada. Esclareceu que isto foi-lhe dito pelo AI, nessa altura falaram com o AI e proibiram-no de aceitar a boleia, tendo o assunto sido comunicado à Directora. Mas não pode garantir ao tribunal que o AI não tenha continuado ou apanhado boleis, em vez de ir de transportes. Ainda em relação ao AI, relatou uma situação de um transporte que o arguido fez do jovem: a testemunha fez uma (...) em (…), combinou com o motorista que ia levar crianças para outras (...) que levasse um dos seus educandos para (…), esse educando era o AI. Ficou surpreendida por ter aparecido o arguido A no (...) para levar o jovem e já vinha acompanhado com outra criança do BE. A testemunha disse ao tribunal que ainda telefonou para a (...), mas disseram-lhe que não havia outro motorista. Localizou este episódio “ talvez” em 1999, foi a última (...) que fez naquele Lar em BF (foram os alunos do Lar FU e do BE; e pelos elementos do Apenso DX, fls. 11, a (...) de (…) foi no Verão de 2000). Esclareceu que o AI “ ... não era, ele próprio não era um menino de faltar muito, isso não era ... tanto quanto eu me recordo disso, se algum educando faltasse ou chegasse com muita frequência ao lar, é prática (...) os directores de turma ou os (...) telefonarem ou os educadores de semi-internato (...) telefonarem para o lar a avisar... olha está a chegar atrasado, tínhamos esse cuidado....” acrescentando que eram os educadores do semi-internato que tinham este cuidado. Não se recorda de em relação ao AI ter recebido qualquer comunicação da escola a dizer que andava a faltar ou a chegar atrasado (convocamos, aqui, o que acima dissemos quanto ao que foi o absentismo escolar e períodos em que tal ocorreu, do Lar, as referências no Livro de ocorrências às faltas e atrasos do AI) . Mas disse, também, que após o AI ter entrado no lar o arguido A, quando ia ao BF, dava ao AI e ao irmão um “dinheirito”, rebuçados, dava “sempre qualquer coisa” aos miúdos (declaração que confirmou na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido A). Após o AI ter saído do lar deixou de ter contacto com ele. Do contacto que teve com o AI disse que ele “não foi sempre o mesmo”, mas acrescentou que “ as pessoas também não podem ser sempre as mesmas”. Houve uma altura em que ele andava muito revoltado, porque não tinha muito contacto com a família. “...Houve alturas que ele estava muito mais irritado, nervoso... ele nunca foi assim um menino de ser muito mal educado, que respondesse mal, isso nunca foi....”. E relatou o que disse terem sido (do AI) “...alguns comportamentos menos adequados em relação aos mais novos, na altura tínhamos três meninos novos pequeninos…”, comportamento este a que associou a transferência do educando para CZ, mas não sabe, em concreto, qual foi o motivo da transferência. Relatou, também, que a partir de “...uma certa altura, ele começou a aparecer com fezes nas calças...”, o problema foi (...)s superiormente, a testemunha disse que “... eu própria quase no final da... de estar aqui assim, ele ia aqui ao Centro de Saúde aqui da zona...”, foram feitos exames pela médica de família, incluindo uma radiografia que foi vista pelo “...(...) da casa, mas depois eu já estava de saída e o que me disseram foi que pronto... não era nada de especial, podia ser que fosse só um problema de espinha bífida mais nada....”, tendo acrescentado que “... isto teve a ver com a (...) de (…), antes (...) de irem para a (...) eles faziam análises, de seis em seis meses sensivelmente…”. Esclareceu que terá sido aproximadamente um ano após ter conhecido o AI que se apercebeu deste problema e na (...) (mas acrescentado imediatamente a seguir que no Lar já acontecia). Confrontou o AI com este problema e ele nada disse (quanto a este aspecto do depoimento da testemunha, o Tribunal teve em atenção o documento e fls. 54.432 a 54.433 vº, mas ver também o registo constante do Apenso EJ, Vol. 5.1, fls. 1881 vº, de 27/09/00 ). E falou dos fins de semana do AI. A sua percepção é que ia casa da família de acolhimento “...talvez de quinze em quinze dias...”, mas acrescentando num segundo momento “... os fins-de-semana do AI, tanto quanto eu me recordo, ele ia ou de quinze em quinze dias ... no inicio não havia um grande ... não havia muita comunicação com a família biológica e só havia o contacto com a família de acolhimento (...),os dois irmãos iam à família de acolhimento (...), já não sei se ele ia todos os fins-de-semana ou se ia de quinze em quinze dias ... provavelmente ia de quinze em quinze dias ... mas isso eu não sei, não posso agora garantir, já não me lembro...”. Quando ia para a família de acolhimento ia sempre com o irmão (WJ e que é mais novo que o assistente). Apanhavam o comboio para (…), mas do (...) telefonavam previamente à família de acolhimento “... e havia um contacto assíduo, se eles se estavam a comportar bem ou não nesse fim-de-semana, com a família de acolhimento...”, acrescentando que para si garante que quando os educando saíram para ir de fim de semana para a família de acolhimento, foram mesmo para aí, porque “... se a família de acolhimento sabia que ele nesse fim-de-semana ia para casa, se não aparecesse o AI o que é que acontecia?...”, concluindo que “... não, mas isso nunca ... o que eu acho isso nunca aconteceu, eles iam sempre para a família de acolhimento porque havia o contacto com a família...” Aos fins de semana aconteceu o AI sair sozinho para ir a casa da avó, tendo acontecido passar lá a noite, ou ir de manhã e voltar “à tardinha”, podia ir sábado de manhã e voltar sábado à noite e estas visitas eram previamente combinadas. Por problemas familiares deixou de ir para a avó e esclareceu que houve alturas, quando ia a casa da Avó, que ia sozinho e não ia com o WJ, não se recordando se já vinha jantado para o lar ou se jantava no lar. E tinha uma actividade (já com os 12/13 anos), que era ir aos bombeiros, era quase sempre ao sábado e ia depois de almoço, sendo numa altura em que já estava na IIR. Quanto a amigos do AI, não se recorda com quem acompanhava mais frequentemente. E quanto aos educadores no lar ao fim de semana, disse que tentavam que um educador fizesse o sábado e outro o Domingo, sendo que durante a noite ficava um monitor, que entrava “à hora de jantar” ou “à hora de deitar”. Com a testemunha nunca aconteceu ter saído do Lar sem chegar o monitor. (5) A testemunha NL (educadora na AX desde Janeiro de 1990), disse ser educadora do lar FU, onde foi educadora do AI, mas por a testemunha ter estado no semi-internato do BF até ao ano 2000, conheceu-o quando este tinha 14/15 anos. Para além de um incidente do AI com uma educanda do mesmo lar (uma criança de 6 anos ), na casa de banho, nunca ouviu qualquer outra referência ao AI e que o envolvesse em actos de natureza sexual com outros educando, tendo confirmado a sua transferência para o CZ. A memória que tem é que o AI costumava ir às aulas – na (…) -, embora tivesse um episódio ou outro de faltas não justificadas. Ia de transportes públicos para a escola e saia sozinho. Quando a testemunha chegou ao Lar – dizendo que entrou em Setembro de 2000 - teve conhecimento que com a equipa anterior o AI ia aos fins de semana para casa de um amigo, ia à sexta feira e vinha ao Domingo para o lar, embora não soubessem quem era. Aconteceu também ter ido durante a semana para casa deste amigo. Foi a equipa da testemunha que tentou saber quem era este amigo e a família, mas a mãe ou o pai do amigo nunca apareceu. O AI deixou de ir e a testemunha disse ao tribunal não saber como aquela situação pode ter sucedido (ver, quanto a esta situação, os registos constantes de Apenso W-13, Livro 1, fls. 55, registo de 10/1/2001; fls. 59, registo de 15/01/2001). Disse, ainda, que antes de estar no Lar esteve numa (...) em que o AI também esteve e “houve um episódio ou outro” em que o AI teve um problema de “não retenção de fezes”. Foi visto, levou o AI ao Dr. HY, foi observado e disse que não havia nada e não teve conhecimento de mais problemas. Disse, ainda, que nunca teve conhecimento de quaisquer rumores de abusos de natureza sexual na AX. 13.3.4. (Dos factos na “casa da (…)” e na “casa de (…)”). Feita a súmula que antecede, quanto ao depoimento das testemunhas, passemos, agora a fazer, de forma mais individualizada a análise crítica da prova em relação aos factos que o Tribunal deu como provado, como tendo ocorrido numa “casa na (…)” e em “(…)” com este assistente. Após ter falado nos factos ocorridos com o arguido A, o Tribunal pediu para o assistente dizer locais, se é que tivesse havido mais algum, em que se recordasse de ter estado, tendo o Assistente respondido “…foi na (…) e em (…)….”. (1) Comecemos, então, pelos factos da (…). O Tribunal, quando iniciava o pedido de esclarecimentos aos assistente, ia fazendo perguntas o mais abertas possível, para lhes deixar fluir o discurso com a sequência e da forma que os mesmos quisessem. Assim, vamos fazer a análise crítica da prova e consequentemente das declarações do assistente, tentado deixar transparecer, com a maior fidedignidade possível, a forma e a sequência com que o assistente falou. E dizemos isto - a preocupação do Tribunal em deixar transparecer com a maior fidedignidade possível a forma como o assistente falou -, porque a análise crítica da prova pode ser e em regra é, uma fase difícil de um processo. Não só por causa da análise da prova em si quanto ao volume de prova produzida ou quanto à natureza da prova produzida, mas para encontrar a forma mais adequada e suficiente para o fazer. Porque (e embora possa não ser a melhor técnica jurídica fazer esta referência neste momento, face ao enquadramento doutrinal que no início fizemos do que está subjacente à motivação da decisão de facto e à análise crítica da prova, mas a extensão dos autos leva a que, por vezes, essas passagem ao fim de 300 ou 400 páginas já não estejam naturalmente presentes…) “… a fundamentação adequada e suficiente da decisão constitui uma exigência do moderno processo penal e cumpre uma dupla finalidade: em projecção exterior (extraprocessual), de legitimação externa da decisão pela possibilidade que permite de verificação dos pressu(...)s, critérios, juízos de racionalidade e de valor e motivos que determinaram a decisão e, em outra perspectiva (intraprocessual), de realização da finalidade de reapreciação das decisões dentro do sistema de recurso…” (cfr. Ac. STJ, 27/09/2006, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Henriques Gaspar, Pº 06P2158). No entanto, tem que ser concisa tanto quanto possível, não pode ser um substituto da oralidade e da imediação, nem pode reflectir exaustivamente todos os factores probatórios , argumentos ou intuições que fundamentaram a convicção (cfr. Ac. STJ 30/06/1999, Pº 285/99-3ª; Ac. R.E. 26/03/2006, relatado pelo Exmo. Sr. Juiz Desembargador Pires da graça, www.dgsi.pt). Assim e prosseguindo. (1.1) Perguntado como é que começou a ir à (…) respondeu “… foi feito um convite, entre aspas….pelo Sr. A….”. O arguido não lhe disse o que ia fazer “…ele não me disse, disse-me para ir com ele, simplesmente...e eu fui…”. Quem o levou foi, então, o arguido A, não se lembrava se o arguido tinha entrado dentro dessa casa, acrescentando “… eu sei que me deixou perto dessa casa, mas não me lembro se entrou…”. Num segundo momento, quando explicava o acesso à habitação (dentro do prédio) onde tinha ido, o Tribunal perguntou-lhe se o arguido A ia com o assistente, tendo respondido “…levou-me até à porta…(…) à porta da casa …do apartamento….”. (1.2) O Assistente disse que foi a uma casa duas vezes “…e nessas duas vezes estive com duas pessoas…”. Na “… primeira vez estive com o Sr. Dr. C…”. O Tribunal perguntou-lhe se foi a primeira vez que o viu ou se já o tinha visto e respondeu que já o tinha visto na AX. Foi-lhe perguntado se sabia o cargo que o arguido tinha na AX e o assistente respondeu que era (...) (...), que se recordasse nunca lhe tinha falado. Quanto ao que sucedeu com este arguido “…o que é que sucedeu?... sucedeu… abusos sexuais….”, completando, quando o Tribunal lhe pediu para, em concreto, dizer os actos que tinha ocorrido “…eu fazia a masturbação e o sexo oral… e o sexo anal era praticado pelo indivíduo em questão….”, concretizando que com sexo anal referia-se “ … à penetração do sexo no ânus….”. Os factos com o arguido C lembra-se que “… foi no quarto, se bem me lembro…” e a após os actos “… depois fui para o (...)…” com o arguido A, que estava num local fora da casa. Esclareceu que foi durante o dia. Nessa casa estavam mais pessoas para além do arguido C, adultos, do sexo masculino. Quanto a se tinha identificado ou se veio a saber o nome de alguém mais tarde, respondeu “…não, o segundo indivíduo é uma pessoa…” - e quando perguntado se era algum dos senhores que estava a ser julgado - , que sim “… consigo identificar o Sr. Dr. K…”, como uma das pessoas que estava dessa primeira vez na casa. (1.3) Depois de se terem passado os factos voltou para o (...) e foi o arguido A que o levou (explicação que complementou na audiência de julgamento de 5/12/05). O Tribunal perguntou-lhe como é que à saída tinha encontrado o arguido A , tendo respondido “…é assim…ele provavelmente podia estar à minha espera… à espera…e quando saí ele levou-me ao (...)….”. Pedimos-lhe esclarecimentos sobre a casa onde fora, sobre o local, tendo respondido “… como é que eu lhe posso explicar isso …aaah… a (…) fica para ali para aqueles lados ao pé do (…)… só assim consigo dar essa informação….”. Completou que era um prédio, subiu alguns andares não se lembrando se foi por escadas ou elevador “…não… não me lembro… mas sei que subi andares….” (foi neste momento que o Tribunal perguntou-lhe se o arguido A ia com o assistente, tendo respondido, como acima já assinalámos, “…levou-me até à porta…(…) à porta da casa …do apartamento….”). (1.4) Quanto à segunda vez na casa da (…)- e às pessoas que lá estavam - “… que eu tivesse reconhecido… foram as mesmas pessoas…que eu tivesse reconhecido….”, concretizando o arguido C e o arguido K. Estavam mais adultos, tendo acrescentado, a pergunta do Tribunal, “… eu não ia sozinho… ia com mais um ou dois amigos…”, acrescentando que da primeira vez “…também fui com mais… com mais pessoas da minha idade….(…) com mais amigos meus…”. Não se recorda quanto jovens eram, “… pelo menos três…”, foram todos juntos com o arguido A. Descreveu os actos que se passaram consigo nessa segunda vez: “…abusos sexuais…”, “…estive com o Sr. Dr. K…”, os actos praticados pelo assistente foram “… a masturbação e sexo oral… e o sexo anal…”, o arguido K penetrou o sexo no ânus do assistente e o sexo oral foi o arguido que penetrou o sexo na boca do assistente. Não se lembra que estivesse mais alguém no local onde esteve com o arguido K, teve dúvidas se foi no quarto ou não. Disse ter a certeza que viu o arguido C e o arguido K naquela casa. (1.5) Em relação ao arguido K, perguntado se foi a primeira vez que o viu, respondeu “…acho que sim….não sei…não me lembro…”. Perguntado quanto à altura em que se lembra de ter conseguido “… identificar, isto é, de àquele rosto ter atribuído um nome de Sr. K…”, respondeu que “… não tenho a certeza…mas foi…acho que foi quando fui dar, fazer declarações à Polícia Judiciária...”. Esclareceu que quando olhou para “ele” – arguido K - dentro daquela casa, não sabia o nome do arguido. Também não resultou das suas declarações que já o tivesse visto antes, mas resultou que após a casa da (…) fixou o seu rosto, pois veio a dizer que não sabia o nome do arguido, mas “sabia reconhecer o seu rosto”. O arguido K estava, também, na segunda vez que foi a esta casa e até ao início deste processo “acha” que só voltou a ver o arguido K na comunicação social. Disse ainda, na instância do Ministério Publico disse não se recordar de ter visto, dentro dessa casa, pessoas a praticarem sexo uns à frente de outros. (1.6 ) Após os actos, da segunda vez - perguntado o que sucedeu -, “… o procedimento normal… eu vinha-me embora e ia para o (...)….”, com o arguido A, o qual estava fora da casa com uma carrinha. Esclareceu que o local onde o arguido A o apanhava foi “… quase sempre no…ao pé do (…)…”, mas em relação aos outros rapazes disse que eram recolhidos ao pé do CZ. Na instância do Ministério Público esclareceu que, aquando das deslocações que fez à casa da (…) – já tinha respondido onde é que era “apanhado” - , “...às vezes era deixado em (…)...(...) a maior parte das vezes...”. O Ministério Público pediu para precisar qual era o procedimento aquando da “casa da (…)” e respondeu “... sim, sim... então, quando fui, pronto, as duas vezes que fui lá... houve ... fui uma vez deixado em (…) e outra vez fui deixado lá mais em cima, ao pé do (...).” Quando chegamos à instância da defesa do arguido C (cfr. audiência de julgamento de 5/12/2005), o que avançamos desde já, é-lhe pedido mais uma vez para esclarecer onde é que se encontrava com o arguido A (Dr. JJQ – Srª Drª, posso insistir, pedir que o Tribunal peça só a confirmação do local, para depois formular um esclarecimentozinho?; Juíza Presidente – Sr. AI, as duas vezes que diz ter ido à casa da (…), onde é que o Sr. A o apanhou? Portanto, o recolheu das duas vezes?) e o assistente diz “… ao pé do (…), ao pé do (…)….”. Aqui convocamos o que já dissemos anteriormente: Se é certo que quanto ao local dos encontros para as “boleias”, o AI começou por dizer que era no “(…)” – declaração inicialmente relacionada com as idas para casa do arguido A -, isto não foi assim admitido pelo arguido A. E das declarações do assistente, quando começou a falar do “ponto de encontro” para os outros locais onde o arguido o levou - declaração que em dois momentos foi “misturada” com o local onde era o “ponto de encontro” para ir para casa do arguido -, o Tribunal ficou com dúvida quanto ao facto se era “sempre” o encontro ali ou não. Mas também como já dissemos, considerando a globalidade das declarações do assistente, a proximidade do (…) com o Lar do assistente – no BF -, faz sentido que esse tenha sido um local de “encontro” para as “boleias” que o arguido deu ao educando. Mas pode ter acontecido, mesmo que a versão não seja exactamente a apresentada pelo arguido A, que em alguma altura ou nas deslocações para outros locais - por ser a uma hora diferente, por ser num dia diferente por exemplo -, o encontro entre os dois tenha sido em local diferente. As declarações do assistente também não o afastam, quando globalmente avaliadas. Mas quanto a ter sido junto ao “(…)” - aquelas situações em que o arguido A se encontrou com o assistente AI para ir à casa da (…)-, como o Despacho de pronúncia descreve, as declarações do assistente não o permitem na avaliação do tribunal. Assim e não obstante ser um facto circunstancial, o Tribunal não ter dado como suficientemente assente a versão do despacho de Pronúncia, quanto ao local onde o arguido se encontrava “sempre” com o assistente para o “transporte”. (1.7) Quando começam as instâncias dos Sujeitos Processuais - após a audição inicial pelo Tribunal e que atrás está referido - disse que conhecia a (…) “... mais ou menos (...)tenho lá colegas meus...colegas que estudam em CZ…”. Esclareceu - a pergunta se alguma vez, para além destas duas vezes que tinha relatado ter ido à (…), por qualquer outra razão se ses lembrava de lá ter ido à (…)?, tendo respondido – “... quando... se me lembro bem, foi quando tive, quando fui fazer um trabalho de grupo com um colega meu....”, mas que isto foi depois de ter ido com o arguido A à (…) Não soube indicar o trajecto completo para essa casa, não a conseguiu localizar - ver auto de reconhecimento de local de fls. 6.503 -, dizendo que sabia que era na (…), porque lembrava-se de ter visto uma placa com esse nome, só que a última letra estava grafitada com um “o” e lia-se “(…)”. Na instância do Ministério Público foi-lhe exibido o auto de fls. 6.503, para reconhecimento de um local na (…). Disse que não se conseguia recordar das indicações que deu à PJ, para além de irem directos à (…) “...e foi quando vi, foi quando vi a tal placa e sabia que tava no caminho certo...”, a tal placa que dizia “(…)”, pois tinha o último “a” grafitado com um “o”. Aqui uma referência: durante o julgamento foi perceptível para o tribunal a interpretação dada por alguns arguidos a esta declaração do assistente (e relacionando-a, evidentemente, com o que já tinha dito anteriormente sobre esta placa), que foi neste momento, em que fez o reconhecimento, que viu a placa grafitada, apontando isto como sinal de inconsistência e de falta de verdade do que estava a contar em relação à (…). No entanto, tal como o tribunal ouviu as declarações do assistente, o sentido (e a declaração em si) foi outro: na altura em que foi levado à (…) pelo arguido A viu a placa grafitada; quando foi fazer o reconhecimento com a PJ voltou a vê-la e viu que estava no sentido certo, porque viu a placa grafitada. Na diligência de reconhecimento o assistente não conseguiu encontrar o prédio. Disse que a sua referência era um parque infantil, “...quando fui lá existia, acho que um parque infantil, novo ... e "tava" a dar indicações e fui dar a esse parque infantil, só que não me lembrava de ver, de ter visto isso antes....e fiquei um bocado baralhado (...), nem sei se era um parque infantil...ou era uma escola. Sei que aquilo tinha um aspecto de ser recente...e fiquei um bocadinho baralhado...até me enganei nessa... nesse reconhecimento e tudo....”. Do auto de fls. 6.502 não resulta a referência a qualquer parque infantil. O Inspector da Polícia judiciária VM - que teve intervenção nesta diligência e convocando o Tribunal o que atrás já disse quanto à valoração deste depoimento, credibilidade e veracidade - em audiência de julgamento foi confrontado com este auto de fls. 6.502, e a recordação que teve em relação a este auto foi de estarem num quarteirão com diversos prédios semelhantes, de estarem parados no outro lado da estrada, os prédios tinham estacionamento em frente aos mesmos e da testemunha não ter conseguido identificar qual o prédio em concreto, mas fazer a referências que seria um daqueles. Começou por dizer que recordava-se que a testemunha teria referido que o prédio tinha elevador e de terem verificado que aqueles prédios não tinham elevador, para num momento posterior ter esclarecido não ter a certeza se foi naquela situação - com o reconhecimento do AI - a menção do elevador, mas também não se conseguindo recordar em que diligência teria sido. O Inspector CF - que teve intervenção nesta diligência e convocando o Tribunal o que atrás já disse quanto à valoração deste depoimento, credibilidade e veracidade - em audiência de julgamento foi confrontado com este auto de fls. 6.502 e a recordação que teve em relação à forma como a diligência se desenrolou é que o assistente não teve a certeza do local, o assistente referia um nome parecido com (…), dizia “(…)”. Aqui entrou o pedido de esclarecimento relacionado com a declaração do assistente, quanto a saber se quando foi fazer a diligência com o assistente a placa que indicava a entrada na povoação (…) tinha um “a” ou um “o” no fim. Disse que o assistente reconheceu a placa, a que dizia “(…)”. Começa por dizer que a placa tinha um “a” no fim, para depois dizer que afinal não conseguia ter a certeza. O que para o Tribunal foi compreensível que já não conservasse a memória, certa, do que tinha visto, tendo em atenção o tempo já decorrido em relação à diligência e que a sua vida profissional é preenchida com isso mesmo, sucessão de diligências e de natureza diferente. No entanto foi seguro quanto ao facto de que o que o assistente na altura dizia era “(…)”, quando explicava a identificação da localidade, o que vem no sentido do que o assistente disse em audiência, dois anos e meio depois (a diligência de fls. 6.502 ocorreu em 7/07/2003). Dentro da perspectivas das Defesas - de criação de uma história pelo assistente - este podia ser ido um pormenor que na altura o assistente criou e fixou para dar sustentabilidade, como um critérios de veracidade por haver referência a pormenores de dêem sentido à recordação de um facto? E qual o sentido desta particularidade na avaliação das declarações do assistente? É claro que este pormenor podia ser uma ficção intencional do assistente - embora para o Tribunal seja difícil conceber, face à escolaridade, formação e vivência do assistente, que tivesse a noção que isso era tecnicamente adequado referir, para dar “cientificamente” credibilidade e veracidade a um relato seu - , mas pelas declarações do assistente não ficámos com a percepção, impressão, indício ou desassossego que tivesse ficado com cópia deste auto para si, que o tivesses estado a rever antes de ter vindo a julgamento. E mesmo que o tivesse feito, do auto não consta esta referência ao “(…)” em vez de “(…)” na placa de identificação da localidade, pelo que por aí também não tinha sido auxiliar de memória ler o auto. A conclusão do Tribunal é que foi algo que o assistente fixou, recordou ao longo do tempo e, mesmo desgarrado, é um pormenor de contribui para a convicção do Tribunal de que o assistente se está a referir a um local físico onde esteve, o pormenor está relacionado com isso. O que na avaliação do Tribunal contraria uma lógica de este local ter sido colado a uma história de abuso acontecida noutro sítio qualquer e concorreu para a convicção que o local e o pormenor do local, tem a ver com o relato de um abuso acontecido naquele local. (1.8) Quanto a receber dinheiro, disse que sempre recebeu do arguido A antes de chegar ao (...), quer quando esteve com o arguido A quer quando foi à (…), mas não foi seguro quanto ao montante. Disse, também (cfr. audiência de julgamento 5/12/05) que na sua memória não tinha a certeza de ter visto o arguido A a receber dinheiro de alguém, quando foi à (…). Mas em relação ao ele, assistente, receber dinheiro foi seguro, pois das suas declarações resulta que recebia sempre. 13.3.5. Introduzimos, agora, as declarações do arguido A quanto aos factos passados com o assistente AI na “Casa da (…)”. O arguido A (na audiência de julgamento 15/12/05, após ter ouvido sa declarações do assistente AI ) confirmou ao Tribunal ter levado o assistente AI a uma casa na (…) e a (…). O seu discurso foi idêntico ao das demais situações, não levou por qualquer combinação que tivesse feito directa ou indirectamente com os arguidos, foi dar boleias pedidas pelos jovens. À “casa da (…)” disse que levou o AI e mais dois colegas, que eram da (…) mas não sabia os nomes, não tinham aulas, eles passaram pela garagem, iam apanhar o autocarro para a (…) e pediram ao arguido, que passava por ali, para lhes dar boleia para a (…). Esclareceu que os jovens disseram-lhe que iam ter com o Sr. JJR, que o arguido disse não saber quem era, mas que os jovens disseram-lhe ser um grande amigo deles. O arguido ia buscar equipamentos dos iniciados do AX, que jogavam no CZ e levou-os. Diz que os levou duas vezes, num sábado e a uma sexta feira. Disse que na (…) deixou-os mesmo ao pé do sítio onde diz “(…)”, deu meia volta e voltou para o estádio do CZ, tanto na 1ª situação como na segunda (mas temos que notar que, anteriormente, mas nesta sessão, tinha dito que uma das vezes tinha dado boleia no seu carro particular, pois a seguir ia ver o jogo do AX com o (…), no campo do (…), não sendo, portanto, no campo do AX; e num terceiro momento volta a dizer que deu boleia, “com muito gosto”, porque ia para o Estádio do CZ e dizendo que isto sucedeu na primeira e na segunda vez). Disse também que não foi buscá-los, tanto da primeira como da segunda vez. E aqui justifica, de novo, o que tinha ido fazer da primeira vez (mas dizendo que da primeira vez tinha ido buscar os equipamentos e tinha que ir fazer um transporte dos alunos da Banda, com o Professor de BF, às 17 h). Relacionado com estes factos, afirmou que nunca falou ao telefone com o AI nem com qualquer outro aluno, isso era uma mentira dos alunos. Mas notamos que anteriormente (cfr. audiência de julgamento 13/01/05), dissera que tinha falado ao telefone com o assistente AV e com o assistente AI, embora, quanto a este, “…foi muito pouco tempo…” (localizando em 2000, 2001, e algum tempo de 2002). (1) Estas declarações do arguido A vão no sentido de admitir alguma participação nos factos descritos pelo assistente AI - e concordância com alguns dos factos que o AI descreveu -, embora com um sentido diferente daquele dado pelo assistente. O arguido diz que limitou-se a dar boleia ao AI e a outros rapazes para a (…): confirma a declaração do assistente que era ele e mais rapazes, o transporte foi feito pelo arguido A e o local era (…). Diz que não foi ele arguido que os contactou, não sabia ao que iam, não sabia o prédio em concreto, pois diz que se limitou a deixá-los na localidade, mas acrescenta - o que fez de forma espontânea no seu discurso, sem ter sido perguntado pelo Tribunal, pelo que é coisa que tinha presente - que os jovens disseram-lhe que iam ter com “o sr. JJR”, mas que o arguido não sabia quem era. Quanto a esta referência, a pessoa K é um dos nomes referidos pelo AI e durante a audiência de julgamento o Tribunal não percebeu ou pressentiu qualquer animosidade ou especial problema do arguido A em relação à pessoa do arguido K, de forma a ficarmos alerta que o nome pudesse ter sido ali plantado no discurso pelo arguido A, para prejudicar o arguido K. Mas também não percebemos especial relação do arguido A com este arguido - como foi perceptível com o arguido C -, para que não dissesse claramente o nome do arguido K e tenha dito apenas o “Sr. JJR” e que não sabia quem era. (2) Dizemos desde já que não estamos, porque não somos psicólogos ou psiquiatras, nem temos os conhecimentos específicos desses profissionais ou de outros nessa área, a fazer uma interpretação, justificação e avaliação das atitude do arguido perante o Tribunal, com intenção de ter o cariz técnico ou científico com que tais profissionais podem falar, quando avaliam a mente, a estrutura, o comportamento, a personalidade de uma pessoa. Só esses, de facto, têm propriedade para falar e avaliar com a competência que essas ciências, que estudaram e nas quais adquiriram conhecimentos e competências profissionalmente reconhecidas, lhes atribui. O Tribunal tem que analisar e perceber o sentido do contributo que esses profissionais podem dar. No entanto estes profissionais, os pareceres, os contributos, não se sobrepõem nem colidem com a função do Tribunal e no caso concreto dos Juízes. Pois nem só as competências e as regras que são pressu(...) do exercício de tais competências são diferentes, como o objecto sobre os quais se debruçam são diferentes. Apesar de a pessoa observada ser a mesma, o objecto, as perspectivas e as regras subjacentes à observação são diferentes. Assim e reconduzindo-nos ao que estávamos a dizer sobre o arguido A, o Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. O que, reconhecemos, não foi imediato, pois - aliás, tal como sucede com a generalidade das situações - por vezes só à distância é que se conseguiu ver o que a confusão do momento escondeu. A forma como o arguido declarou os factos ao Tribunal - e cruzando com a análise concreta dos pontos que estávamos a assinalar, relacionados com os factos do assistente AI - tem uma justificação para o Tribunal e ligando com o que estávamos a dizer – e com essa justificação -, o arguido declarou que os jovens disseram-lhe que iam ter com “o sr. JJR”, mas que o arguido não sabia quem era. O sentido com que o Tribunal interpretou esta referência do arguido - o que quis transmitir com a sua a sua declaração nesta parte e com a forma como se referiu ao “Sr. JJR” -, o sentido mais plausível e coerente com o que foi, para nós, a atitude global do arguido face à admissão dos factos, foi o de envolver-se o menos possível. No mesmo sentido do que atrás já referimos, quando falámos sobre a forma como o arguido se referia à idade em que conhecia os assistentes e a idade “padrão “ 13/14 anos que surgia no seu discurso, o arguido A sentiu responsabilidade no que fez aos jovens da AX, (…) como ele. E teve reacções que traduziram aligeirar da sua culpa, mas sem “deixar” cair “os rapazes” como se lhes referiu por vezes. E este aligeirar de culpa traduziu-se, por vezes, em meias verdades (afirmação que ao longo desta análise crítica o Tribunal vai ilustrando e preenchendo, com referências concretas e situações concretas). Isto é, a percepção que tivemos é que o arguido não deixou de contar com verdade uma parte do facto, mas introduz elementos que não se verificaram, para justificar - pelo menos para si - os que se verificaram. Por exemplo, na situação que estamos a analisar. Quanto aos dias em que disse ter dado boleia ao AI e a outros rapazes para a (…), aqui e pela leitura da simula foi feita, foi à sexta feira e um sábado, dizendo que uma das vezes foi com o seu carro - e associando esta vez, tal como o Tribunal percebeu o sentido das suas declarações, a uma ida a um jogo de futebol do AX A.C. - e pelas suas declarações aparecendo assim associada a um dia de fim de semana, ao sábado. A outra foi com a carrinha da AX, mas associando esta ida ao facto de ir fazer uma deslocação de serviço ao campo do AX A.C.. Querendo assim dizer, para o Tribunal, que não foi com a carrinha da AX fazer uma deslocação que não podia ou devia, mas sim que deu a boleia aos alunos, “com muito gosto”, porque ficava no caminho do serviço que ia fazer para a instituição (e a referência a uma sexta feira pelo menos comporta a associação a um dia de trabalho). Assim, não usou indevidamente os bens da AX o que foi - na percepção do Tribunal - um movimento repetido do arguido, não só para demonstrar que ele não se aproveitou da instituição, mas para demonstrar que outros é que se aproveitaram. Foram visíveis, ao longo das suas declarações, as sucessivas e repetidas imputações que fez de pessoas ligadas à oficina da instituição, usarem abusivamente os bens da AX (o óleo, os arranjos de carros de fora), pelo que houve mesmo uma vez nas suas declarações e em que o arguido pediu para acrescentar alguma coisa ao que já tinha dito, que o Tribunal disse-lhe que se fosse outra vez para falar do óleo dos carros e dos mecânicos, já estávamos esclarecidos (aliás, o que já vem desde data anterior a 2001, como resultou da análise que fizemos dos documentos dos autos, quando analisámos o percurso do arguido A na instituição, a incompatibilidade com outros funcionários, entre os quais motoristas e mecânicos e referimos os incidentes de “1993” e de “2001”). Na outra altura em que disse que a outra boleia foi com o seu carro, ia para o futebol e logo foi um fim de semana (a referência ao sábado), aqui não envolvia AX, as boleias não prejudicaram a instituição - mas não esqueçamos que nunca negou ter dado as duas boleias para a (…)- e que as deu “com muito gosto”, pois depreendeu o Tribunal desta expressão que estava a fazer um favor aos rapazes. Mas em momento posterior e como já assinalámos, as duas boleias para a (…) - que se mantêm em número, sítio para o qual foram dadas e aos rapazes -, já foram por ocasião de duas vezes que ia ao estádio do AX A.C. fazer serviços e introduz que ia buscar uns equipamentos de alunos e mistura um serviço que tinha que ir fazer a seguir com os alunos da banda de BF. As alterações que introduz não têm a ver com o número de boleias, local para onde as deu e a quem as deu - porque esta estrutura mantém-se -, mas com as circunstâncias em que ele A as deu, depreendendo-se das suas declarações nesta parte que utilizou por duas vezes a carrinha da AX, mas porque estava em serviço e a (…) é ao pé do estádio do AX A.C., local com o qual relacionou o serviço que estava a fazer. E entra, temos que o dizer, em contradição com o que disse anteriormente, quanto a factos ou circunstâncias dos factos e, consequentemente, entra em contradição, no caso concreto, com o que o assistente AI. Quanto ao arguido C o arguido A nada refere, mas isso não afecta, nem retira à partida, credibilidade ou veracidade à declaração do assistente AI, pois esta omissão de referência do arguido A faz sentido com a sua posição ao longo do julgamento. Aliás nas declarações que prestou perante o Tribunal o sentido global da sua declaração foi que quanto ao arguido C nada sabia, nada falava com excepção do que veio a dizer e das declarações que prestou já em 2008, no decurso das Alegações, como já assinalámos (cfr. declarações do arguido A ma audiência de julgamento de 26/11/20008 e 9 /12/20008). (3) Continuando, confirmando o arguido A que deu boleias ao assistente e outros alunos da (…), não está a falar de alunos de CZ/dos lares de CZ e dos que desses lares/(...) são assistentes nestes autos. O que neste segmento coincide com o sentido da declaração do assistente AI, que não identificou ao Tribunal os jovens que foram consigo como alguém que conhecesse ou que tivesse vindo a identificar, pois se fossem alguns dos assistentes - por exemplo, os que os arguidos envolvem na criação da história comum para os incriminar, AP, AV, AN, AT, Y -, que tivessem ido consigo à (…), levados pelo arguido A, com o interrogatório e contra interrogatório a que assistente foi sujeito na audiência de julgamento pelos sujeitos processuais - e tendo por referência, sempre, o que são as características do assistente e que temos vindo a mencionar, quanto a vivência, processo de crescimento, escolaridade e o reflexo que isso em termos de normalidade pode ter na ponderação do que são as suas capacidades intelectuais -, para o Tribunal o assistente de alguma forma e em algum momento tinha-o dito, acrescentado ou descaído na descrição. O que temos estado a dizer tem a ver com o que foram, para este Tribunal, as declarações do arguido A durante a audiência, não só em relação a este assistente mas em relação aos demais. Isto é, o arguido A quando implica outros arguidos em situações que reconhece ter ocorrido ou quando faz declarações que possam permitir a inclusão de outros arguidos nessas situações, em regra não se exclui dessas situações. Isto é, o arguido A não inclui outras pessoas e exclui-se de todo a si. O que faz é contar, quanto a si, a história de forma incompleta. Mas em algumas situações não deixa de dar elementos que nos permitem, em conjugação com demais meios de prova, chegar à sua real responsabilidade. E este foi o seu movimento global: o arguido admite a sua participação, embora configurando-a em termos diferentes do que está descrito no despacho de pronúncia ou do que foi dito pelos assistentes: por exemplo, admite ter levado jovens a (…), à (...) (…), à (…), mas foi sempre e apenas dar boleias que lhes pediram; quando admite ter-lhe sido entregue um sobrescrito com dinheiro, não era para si, era para os jovens, dando uma ideia de que nem sabia porque é que aquilo lhe era entregue a ele; e associando, também em regra, que as boleias que deu em veículo da AX, foram dadas aproveitando serviços que ia fazer (entrando em contradição, neste aspecto, com a estrutura intrínseca do seu discurso ou com o discurso dos assistentes). Transpondo isto para a declaração que em concreto estamos a analisar, o arguido não fez mais do que repetir o movimento que teve nas suas declarações ao longo do julgamento: cola os transportes que admite ter feito dos jovens - mas chamando-lhe “boleias” - com deslocações que na altura, ou por razão profissional ou por razão pessoal, por “acaso” na altura em que lhe pedem a boleia ia fazer ou tinha programado fazer. Retomando o que acima dissemos sobre o arguido A, o Tribunal teve que compreender, entender e observar a pessoa que teve na sua frente a falar. E como dissemos não foi imediato. Mas há circunstâncias do “modo como declarou” que temos que assinalar: o arguido A em regra respondeu a todas as questões que o Tribunal lhe colocou e em regra não prestou declarações com elementos na sua frente, que o fossem ajudando a fazer referências a factos ou datas - normalmente declarava primeiro e depois eram-lhe exibidos documentos, quando foi o caso -, pelo que embora por vezes com um discurso repetitivo, com a inconsistência de data ou de referência temporal em relação a declaração que já tinha feito anteriormente, teve uma atitude espontânea perante o Tribunal. (4) Ainda quanto às declarações que o arguido A prestou nesta altura - i.e., após o assistente AI ter prestado declarações - e relacionado com os factos do AI, o arguido A afirmou que nunca falou ao telefone com o AI nem com qualquer outro aluno, isso era uma mentira dos alunos. Mas notamos que anteriormente (cfr. audiência de julgamento de 13/01/05) dissera que tinha falado ao telefone com o assistente AV e com o assistente AI, embora quanto a este “… foi muito pouco tempo…” (localizando em 2000, 2001 e algum tempo de 2002). A relevância de notarmos esta declaração neste momento, para a prova dos factos relativos ao AI - e na avaliação do Tribunal -, tem a ver com o facto de o arguido, mantendo o padrão de confusão e incerteza que manifestou, pelo menos quanto a datas, ao longo das suas declarações, escudando-se na noção de “pouco tempo” (aquele durante o qual falou com o assistente AI), dá uma noção de continuidade de dois anos a dois anos e meio; o que, embora deslocado em relação à data em que o Tribunal deu como assente o início dos factos passados entre o arguido A e o assistente AI, é consentâneo com a duração que o Tribunal apurou, através da análise objectiva dos documentos dos autos e das declarações do assistente. O assistente AI afirmou ao tribunal que falou ao telefone com o arguido A, era pelo telefone que combinava as “coisas” para o dia seguinte, pelo que da avaliação global das declarações do arguido A, com as declarações do assistente AI, o Tribunal considerou suficientemente assente quer a existência dos telefonemas quer o seu objecto. 13.3.6. E aqui introduzimos uma questão suscitada por algumas Defesas, relacionadas com os telefonemas do AI e como, na perspectiva dessas Defesas, expressão de falta de credibilidade e veracidade do que disse. Foi perguntado ao assistente se alguma vez tinha falado ao telemóvel/telefone com o assistente AV e o assistente disse que não. Foi perguntado ao assistente se o número de telemóvel (…) lhe dizia alguma coisa ou se o identificava como seu (cfr., por exemplo, audiência de julgamento 7/12/2005). O assistente respondeu que não, quando confrontado com um elemento que se encontra na parte da identificação de um auto seu de inquirição, o de fls. 648 dos autos - datado de 20/01/2003, auto que foi usado estritamente nessa medida -, confirma que tinha dado o número quando foi ouvido, mas pediu para lhe ser confirmado quando é que foi essa audição na PJ. E referiu uma situação relacionada com perda de telemóvel “há pouco tempo” - em relação à data em que tinha ido prestar declarações - , embora não se recordando se tinha dado mais do que um número de telemóvel à PJ. A seguir foi dito pela Defesa que o estava a instar - tendo sido audível para o assistente -, que dos autos, nomeadamente dos elementos do Apenso W-2, havia o registo de chamadas telefónicas do assistente AV “para si”, para o tal nº (…) a partir de 22/02/2003 e prolongando-se para Março, persistindo o assistente que nunca tinha falado com AV ao telefone. O AI podia ter vacilado, porque estava a ouvir, é evidente, todo o conteúdo da pergunta, mas não e persistiu que não lhe tinha falado. No dia a seguir (audiência de julgamento 12/12/2005) a Defesa que fizera a instância que antecede comunicou ao Tribunal que dissera o nº (…), mas que tinha vários elementos que lhe suscitaram dúvidas sobre esta matéria, mas enganara-se no número (do AI) em relação ao qual queria pedir os esclarecimentos de chamadas. O nº pretendido era o (…) , que está identificado também na parte da identificação do AI no auto de fls. 1637 dos autos (o qual foi usado neste preciso limite e objecto). Em relação a este número o assistente declarou que não se recordava do mesmo, isto é, quando lhe foi perguntado se este número lhe dizia alguma coisa, respondeu que “sinceramente não”. Este número é um que, de facto, na identificação do assistente no auto de fls. 1637 está anotado como sendo do assistente, a seguir aquele que inicialmente referimos, constando escrito “(…)/(…)”. Conjugando esta anotação com a que está no auto anterior (o de fls. 648, datado de 20/01/2003, em que só consta o primeiro número) e conjugando com a declaração espontânea que o assistente fizera na primeira sessão em que fora perguntado pelos telefonemas, que se lembrava que quando foi prestar declarações perdera o telemóvel - e chamamos a atenção que quando fez esta declaração o assistente não vira e ainda não fora referido na audiência de julgamento o auto de fls 1637, datado de 18/02/2003, em que está referido o segundo número - , para o Tribunal assumiu veracidade a declaração que o assistente fizera quanto à perda de telemóvel, pois ela faz sentido com a forma como estão anotados os dois números a fls. 1637. E nesta segunda sessão, em relação ao “novo” número do assistente, mantém declaração de não ter feito chamadas para AV. É-lhe perguntado sobre envio de SMS para a testemunha AAT, disse que não, tendo a Defesa convocado e invocado para o efeito os elementos constantes do Apenso AC-L - onde consta o registo de mensagens escritas enviadas do nº (…) de 2/09/2002 a 12/02/2003 - e manteve que não, tinha a certeza não ter contactado tal pessoa. A testemunha (…) veio posteriormente a ser ouvida em audiência de julgamento - declarou ser amiga do assistente AV, mas confirmou não ter ou ter tido relacionamento com AI e não ter recebido SMS do AI. Das suas declarações confirmou o nº (…) como seu, confirmou ter recebido telefonemas de AV para esse número em Fevereiro de 2003 (cfr. Apenso O-T; e cfr. Apenso AC-L, de onde consta o registo de sms do (…) para o número da testemunha ). Embora no ofício de fls. 7.108, enviado pela “OPTIMUS” para o Tribunal, conste que a operadora tem identificado o nº (…) em nome de “(…)”, o que aponta para o AI, até porque o mesmo prestou declarações nesse sentido, face aos elementos constantes do Apenso AC-L, as declarações do assistente quanto à perda do telemóvel e data em que tal ocorreu e conjugando ainda com as declarações da testemunha AAT - em relação à qual o Tribunal não teve qualquer percepção, não “desconfiou” ou teve indício de que estivesse a mentir ao Tribunal, sendo que a avaliação que fizemos do seu depoimento foi mesmo em sentido inverso, quer de noção do que dizia, quer de objectividade e desinteresse pessoal ou outro com que o disse -, tivemos fortes dúvidas que pelo menos em Fevereiro de 2003 fosse o assistente AI a utilizar o número (…). A segurança e persistências com que o assistente respondera, quando ouvindo as perguntas que lhe eram feitas havia a aparência de uma evidência que, de facto, havia “registos” de que os contactos tinham sido “feitos por si”, mas mantendo a sua certeza, criaram a convicção no Tribunal que o assistente falou com verdade. E que pode ter havido a utilização de cartões/número de telemóveis que tenha reconhecido como seus, por outras pessoas. (1) Ainda ligado com a questão da altura em que o assistente AI teve telemóvel, no contraditório a que foi sujeito - e de acordo com a percepção que o Tribunal teve das suas declarações -, disse que tinha tido o primeiro telemóvel quando ganhou o seu primeiro salário estímulo em Setembro de 2001. estaria no 9º ano (cfr. audiência de julgamento 5/12/2005). Isto significava, para uma das defesas, inconsistência no seu depoimento, uma vez que já dissera que anteriormente combinava pelo telefone com o arguido A os encontros para idas a locais. Mas aqui os elementos dos autos apontam que o AI está equivocado quanto à memória que tem da altura em que recebeu o primeiro salário estímulo. Isto porque consultando o Apenso W-16 (Livro de registo de ocorrências do seu lar), concretamente o registo de fls. 113, datado de 10/12/99, já é feita a referência ao salário estímulo que o mesmo recebia, estranhando os educadores como é que recebia alguma coisa, face às faltas que tinha. E este registo dá sentido e consistência à declaração que o assistente fizera perante o Tribunal, que no primeiro ano na (…) (1998/1999) não tinha telemóvel, mas que no segundo (1999/2000) tem a “certeza” que o arguido A telefonava-lhe às vezes para o telemóvel para combinar o lugar onde se encontravam (cfr. audiência de julgamento 12/12/2005). 13.3.7. Retomando agora a análise das declarações do AI - e em momento em que foi sujeito ao contraditório pelos sujeitos Processuais -, na instância da defesa do arguido A esclareceu - quanto ao modo como o arguido A o levara aquela casa, se tinha levado ou não à porta do apartamento -, “ …não me lembro ao certo do que se passou…e assim, o Sr. A levava-nos lá…mas e provavelmente levou-nos à porta da casa…mas não me lembro” e esclarecendo que dizia “provavelmente” porque “…não me lembro bem...”. Isto tem a ver com uma situação que também se verifica quando o assistente dá respostas quanto ao regresso da casa da (…), se tinha sido o arguido que o transportara também ou se tinha ido de transportes. Há situações em que se consecutivamente vamos aumentando a especificidade do que se pergunta, isto naturalmente potencia que a certeza quanto à memória que se esvai. E dizemos, que tendo em atenção o pormenor que está em causa na dinâmica de descrição, o tempo decorrido em relação à data em que o assistente localiza os factos e a idade do assistente também em relação a essa altura - decorridos cerca de seis anos - , para o Tribunal não é estranho, nem levanta “suspeita” de inverosimilhança que o assistente dê esta resposta, não é inverosímil que não se recorde. E assentamos também, que face ao que foram as declarações prestadas pelo assistente e pelo arguido A, quanto a um segmento de facto que está relacionado com este tipo de questões - concretamente se o arguido disse ao assistente “ que precisava que ele fosse a uma casa”, com está este com este detalhe descrito no despacho de pronúncia, no ponto “4.1.4” -, não resultou suficientemente assente que o arguido A, quando disse ao assistente para “ir com ele”, na situação a que se referem os factos descritos no ponto “4.1.4.” do Despacho de Pronúncia, tenha utilizado a expressão concretamente escrita no Despacho de Pronúncia. Aqui referimos - e como parâmetro coadjuvante para a avaliação da credibilidade e veracidade do que foram as declarações do assistente AI e que é extensivo aos demais; e para ilustrar o que pode ser o esforço de alguém estar a recordar o que se passou cinco ou seis anos atrás - e a título de exemplo, o depoimento do Dr. EJ, Director do CZ desde o ano 2000, pessoa com vivência, formação académica e experiência de vida objectivamente diferente da do assistente AI, testemunha que ao Tribunal não mereceu qualquer dúvida quanto ao facto de ter falado com verdade quanto ao que lhe foi perguntado e que quando foi ouvido, disse ser um esforço e ser difícil conseguir recordar situações que se tinham passado no (...) em 2000. E chamamos a atenção que estava a prestar depoimento sobre situações de “fora do normal” tinham acontecido, como eram as situações relacionadas com a expulsão do assistente AP do CZ, o seu envolvimento de natureza sexual com um adulto de fora do (...) e a interacção havida com tal educando na altura (ano 2000). 13.3.8. Prosseguindo com o contraditório a que as declarações do assistente foram sujeitas, na instância do Ministério Público foram pedidos esclarecimentos ao assistente quanto ao interior da casa. Disse que não se lembrava se os estores da casa estavam fechados ou abertos, a casa “…não tinha assim muita luz, mas conseguia-se ver bem…”. Foi-lhe exibido o desenho de fls. 2.987, tendo confirmado ter sido o assistente a fazê-lo, dizendo “…isto é …a casa da (…), se bem me lembro…” (foi-lhe igualmente exibido o desenho de fls. 2.986, tendo dito que foi igualmente feito por si e que correspondia à casa do arguido A). Fez a “leitura” do desenho: os rectângulos que estão nas extremidades são janelas, o Ministério Público quis saber se as janelas tinham “uma ou duas portas”, tendo respondido “…sim, tou a compreender…eu agora, não tenho bem a certeza se era janelas…abertas, que se abria normal…ou se eram correntes…”, tendo acrescentado, por ter-lhe sido perguntado, que eram duas janelas de cada lado. Perguntado se o que desenhou foi efectivamente o que tinha visto na casa e esclareceu “… é assim, esta planta não …não “tá” perfeita, eu simplesmente limitei-me a desenhar aquilo que via da sala... do resto das divisões….sabia onde é que era os quartos…limitei-me, simplesmente, a meter na minha cabeça aquilo que era dentro de casa... não me entendeu?...”. Das suas declarações resultou, por exemplo, que apesar de ter desenhado uma casa de banho, não tinha ido efectivamente a essa divisão, tendo esclarecido a razão de a ter desenhado: “… porque reparei…eu quando entrei, olhei para os cantos da casa…não decorei bem como é que era a casa, mas aah... desenhei aquilo que me entrou a primeira vez na cabeça….” . Confirmou que as divisões onde tinha estado foram um quarto e numa sala e quanto às demais divisões que desenhou no croqui “…ver, de ver, eu não vi nenhuma….”, mas “… eu reparei em todas as divisões da casa …”, acrescentando ter reparado numa casa de banho e num quarto mais pequeno. Foi-lhe perguntado porque é que tinha desenhado uma cozinha - uma vez que só tinha “reparado” em mais duas divisões - e o assistente, aqui com um ar de “à-vontade” em relação à atitude que vinha demonstrando, respondeu “… já estava à espera que me fizesse essa pergunta…” - (Juíza Presidente) - Pois, eu até já tinha falado em cozinha, era normal, porque está no desenho e depois da resposta que deu ... - e acrescentou “…não ... é que foi assim, eu quando reparei que havia a casa de banho e havia mais um quarto pequeno, uma pessoa não fica sem comer. E uma casa não pode ter... não pode ter, não pode ficar sem cozinha. E... quando fui para um quarto, para o quarto maior... reparei de longe que havia, podia haver mais uma divisão e eu daí, parti daí que era uma cozinha….”. Foi visível, pela dinâmica do discurso do assistente nesta altura, que o “desenho” que estávamos a ver, com divisões com mobília, tapetes no chão, não era exclusivamente a reprodução de uma memória, mas a reprodução de alguma coisa que o assistente tinha colorido em função da convicção que tinha do que era normal suceder. E acrescentamos, quanto à forma menos pesada que o Tribunal notara nesta resposta - que saía do registo que o assistente tinha tido, quando esteve inicialmente a relatar ao tribunal os factos ocorridos -, que a explicação teve a ver com o que o assistente disse a seguir, isto é, com a formação que estava a ter (o Ministério Público pediu para o assistente dizer que curso estava a tirar, o qual disse “…tou a tirar Design de Equipamento (…) é arquitectura, design de interiores, design de equipamento, design gráfico...”). Aqui referimos que quando houve esta alteração de registo, da forma como o assistente tinha estado a falar e como falou neste momento, o Tribunal ficou atento, pois as cambiantes são importantes para avaliar o conteúdo. Mas também temos que dizer que quando o assistente terminou, a percepção que nos ficou não foi de ligar esta sua alteração pontual no discurso a sobranceria, mas a uma situação em que por alguma razão - e que ligámos com o facto de ser algo em relação ao qual sentia que conseguia explicar a “contradição” - isto é, sabia explicar porque é que tinha feito “aquilo” tão completo, apesar de dizer que não tinha visto e era uma suposição -. De qualquer forma, quanto a esta descrição e identificação, é elemento que per si e à partida, tinha valia relativamente diminuta para o tribunal, pois a coerência intrínseca e o valor do que disse quanto à descrição do local, só assume sentido quando avaliado face a toda a sua descrição do facto abuso, dado que a casa, o seu interior ou o seu exterior, não foi passível de corroboração em audiência de julgamento por qualquer outro meio. Das suas declarações, à partida, tanto podia estar a descrever uma habitação que “estava a ver”, apesar de “colorida” com pormenores, como podia ser, como a Defesa de um dos arguidos defendeu, uma casa que nada tinha a ver com abusos e que o assistente conhecia e colou a esta situação. No entanto a percepção do Tribunal, à medida que foi ouvindo o assistente quanto ao relato dos factos passados naquele local, a forma como foi sujeito ao contraditório por todos os sujeitos processuais e a forma como o assistente naturalmente no seu discurso e nas explicações que dava, foi integrando ou relacionando o local com o resto do relato quanto ao abuso - e, na nossa avaliação, de forma similar ao longo da descrição para o Tribunal, pois não andou a mudar os sítios onde esteve, manteve a sua dinâmica de discurso quanto ao que tinha sido com(...) por si no desenho e porquê -, é que aquele local tinha a ver com aquele relato, com aquela situação. O desenho está preenchido pela sua imaginação do assistente – com a cozinha, com o tapete, com a mobília -, mas o “local” não foi “colado” ao relato do abuso. Tem a ver com aquela situação, dá como a perspectiva daquele local. Ligando-se e tendo a ver (pelo que o convocamos) com a percepção que o Tribunal teve e que referimos - quando tratamos as declarações do assistente quanto à localidade (…), porque é que sabia que era na (…) e diligência de reconhecimento de tal local, confrontação com auto de fls. 6.502 -, de que os pormenores ou identificação que o assistente fez do local do abuso e da razão pela qual tinha a certeza do local, tinham a ver com um relato da situação descrita pelo assistente. (1) Quanto à localização no tempo destes factos na (…)- o Tribunal perguntou-lhe se em relação “aos primeiros factos” com o arguido A, no refeitório e depois em casa do arguido, quando é que sucederam os da (…)-, disse que foram depois. Localizou-os em 1999, “…ainda estava na (…)…”, tendo acrescentado que foi no primeiro ano em que entrou para a (…), foi no sétimo ano, antes de ter reprovado (como acima vimos, em 1998/99 o assistente foi para a GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 1º ano; em 1999/00, GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 2º ano, ano este em que reprova, pois no ano 2000/01, está de novo GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – no 2º ano). Estas duas vezes não foram “muito espaçadas”, foram “mais próximas do que espaçadas”, “… duas, três semanas para aí…”. Foram durante a semana, a recordação que tem é que faltou às aulas, o que correspondia ao que já tinha dito anteriormente. Introduzindo os esclarecimentos que o assistente AI foi dando, em função dos esclarecimentos que lhe foram pedidos pelos sujeitos Processuais, o assistente disse que a sua memória era que tinha ido de manhã a esta casa na (…), tendo esclarecido - na sequência de instância do arguido C - “… se bem me lembro e como já referi, foi de manhã…”, “… de manhã estive lá de certeza… nas não… de certeza estive lá de manhã, isso tenho a certeza…agora da parte de tarde, acho que fui almoçar à escola… sei que tive uma data de faltas, sei que tive faltas esse dia todo, o dia todo não, a manhã inteira…”. Acrescentando, face aos esclarecimentos que lhe iam sendo feitos pela defesa: “… foi… foi assim, se bem me lembro….mas houve um dia, na segunda vez, que já cheguei atrasado à segunda … à primeira hora da tarde …não tenho a certeza …“ - (Juíza Presidente) – Porque é que diz isso, porque é que tem essa memória? - , “… porque quando cheguei à escola… não estava ninguém no pátio e foi antes à sala…mas não tenho a certeza se ainda faltei dessa aula na primeira hora da manhã, da tarde….”, mas concluindo ter a certeza que foi em dia de semana e em que teve aulas. E dizendo, de seguida, que “depois voltou para a escola de transportes”. Aqui novo pedido de esclarecimento por parte da Defesa do arguido C - pois o assistente tinha dito, em sessão anterior, que o arguido A é que o tinha levado de volta; embora também tivesse dito, noutro momento, que tinha voltado de transportes - esclarecendo o assistente: “…como eu já tinha dito, eu fui de transportes para a escola….” - (Juíza Presidente) Não, no regresso, o que eu lhe estou a pedir é: diz que esteve na (…) e depois que o Sr. A o trouxe de regresso - “…sim, eu estava a explicar…”, “…eu já tinha, eu acabei de dizer como ia para a escola, fui de transportes, no entanto deixavam-me em (…) ou perto do (...)…” de BF. Esta é uma das situações - e na linha do que referimos anteriormente - em que o consecutivo esclarecimento em relação a circunstâncias, segmentos de factos que rodeiam o acto do abuso - ou o acto que se esteja a investigar, pois não é específico deste tipo de crimes - e em que também consecutivamente se vai aumentando a especificidade do que se pergunta, potencia em regra - quanto à certeza de quem responde e quanto à memória que inicialmente se revelou - divergência e/ou contradição em relação ao “modo exacto” como anteriormente tinha dito ou relembrado. Isto é a experiência comum, o que a vivência do dia-a-dia nos diz e que o Tribunal não deixou de ter em atenção na avaliação global das declarações do assistente. E, no caso concreto, tendo em atenção a forma como o assistente foi sucessivamente explicando, não o faz com ligeireza, a sua voz e a expressão que o Tribunal percebia denotava que queria explicar o que tinha dito e como tinha dito, demonstrava que tinha noção do que dissera e o significado com que para si o disse (voltava com o arguido A, que naquele caso o deixava ao pé de (…) e depois o Assistente ia de transportes para a escola). E, de facto, a declaração do assistente quanto a este aspecto vista na sua globalidade quanto aos vários momentos em que foi perguntado e em que respondeu, foi intrinsecamente concordante. Pois explicando e complementando em momentos diferentes - o que normalmente dificulta a narração, para manter o nexo do que se diz nos vários momentos - , o sentido do que disse teve nexo e concordância : ele foi de transportes para a escola; mas foi o arguido A que o deixou no local para apanhar esses transportes, pois deixou-o em (…) ou perto do BF; e a sua escola era (…) nesta altura. (2) Destas declarações do assistente – quanto à localização no tempo dos factos ocorridos na (…)-,conjugando com o que acima já analisámos e dissemos, quando procedemos à localização no tempo dos factos do arguido A – fundamentação que convocamos e que faz parte integrante da presente análise, no que diz respeito aos documentos, prova testemunhal, por declarações expressamente referida e análise feita - não só no que diz respeito aos primeiros factos (aquele que ocorrereu no refeitório), mas também quanto ao início dos segundos (os factos que ocorreram em casa do arguido A) - e conjugando com os elementos escolares do assistentes, o Tribunal criou a convicção que os factos numa casa na (…) ocorreram nos períodos descritos no Despacho de Pronúncia (cfr., quanto a elementos escolares, como acima vimos em 1998/99 o assistente foi para a GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 1º ano; em 1999/00, GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 2º ano, ano este em que reprova, pois no ano 2000/01, está de novo GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – no 2º ano) . 13.3.9. Acima já referimos o que foi a primeira descrição do assistente quanto à identificação dos arguidos C e K. Assim e quanto à identificação do arguido C, enunciámos, referindo-se à casa da (…) disse na “… primeira vez estive com o Sr. Dr. C…”, o Tribunal perguntou-lhe se foi a primeira vez que o viu ou se já o tinha visto e respondeu que já o tinha visto na AX. Foi-lhe perguntado se sabia o cargo que o arguido tinha na AX e o assistente respondeu que era (...) (...), que se recordasse nunca lhe tinha falado. Na instância da defesa do arguido C (cfr. audiência de julgamento 5/12/05), foi perguntado ao assistente, em relação à entrada do assistente na AX, a primeira vez que se lembra de ter visto o arguido C, o assistente diz : (Juíza Presidente) – Consegue localizar a primeira vez em que se lembra de ter visto o Sr. C? Localizar no tempo em relação à sua entrada para a AX. (AI) – Se bem me lembro, acho que foi a primeira vez que fui à Casa da (…). ..se bem me lembro. (Juíza Presidente) – Mas eu perguntei-lhe, em relação ao Sr. C, descreveu-me factos na casa da (…) e a uma pergunta que eu lhe fiz, disse que já o tinha visto na AX. (AI) – Se o vi foi de relance, mas quem eu via mais era o Sr. Dr. FB, que também era (...) (...)…mas o Sr. C, quando eu o vi mesmo, quando eu dei mesmo de caras com ele, foi na casa da (…). (Juíza Presidente) – E alguma vez, então eu volto-lhe a fazer a pergunta: e alguma vez, antes da Casa da (…), o senhor lembra-se de ter visto o Sr. C? Mesmo sem ter dado de caras com, como… (AI) – Tal como eu disse, se o vi foi mesmo (Juíza Presidente) – Não é “se”, não é “se” Sr. AI, do que tiver a certeza. (AI) – É o que eu estou a dizer. (Juíza Presidente) – Então pode prosseguir. (AI) – Se bem me lembro… se vi o Dr. C foi de relance, não dando de caras com ele. (Dr. JJQ) – Srª Drª, mas de relance aonde? Em que circunstâncias é que terá visto o Dr. C de relance? (Juíza Presidente) – Utilizando a expressão que usou, isto é, antes da casa da (…) “se” - foi a expressão utilizada por si -, “se” viu o Sr. C foi de relance, onde é que terá sido isso ou onde é que foi? (AI) – Em (…), na festa da AX.” Na sequência do que antecede, a Defesa do arguido C continuou a fazer perguntas ao assistente quanto a festas do “(…)” a que tinha ido desde que entrou para a AX, conhecimento do assistente em relação ao Dr. FB - o outro (...) (...) da AX -, conhecimento do assistente do (...) da instituição. Da avaliação que o Tribunal fez das respostas que sucessivamente o assistente foi dando, da avaliação das primeiras declarações que o assistente tinha feito, quando falou ao Tribunal pela primeira vez sobre a casa da (…) - e em que disse que já tinha visto o arguido C anteriormente, na AX -, com o esclarecimento que posteriormente prestou quanto a esta afirmação - explicando “… mas o Sr. C, quando eu o vi mesmo, quando eu dei mesmo de caras com ele, foi na casa da (…)….” -, para o Tribunal não foi indício de inverosimilhança. Faz sentido o ter visto o arguido C nas festas do (…), a noção que o assistente tinha de poder ter visto o arguido C nessas festas foi uma vez e quando começa sucessivamente a dar esclarecimentos sobre as idas a festas, os discursos que ouviu ou pode ter ouvido nessas festas, cria mesmo a dúvida e transmite-a, se terá mesmo sido mesmo antes da casa da (…) que viu o arguido C (de relance) na festa do (…). A explicação quanto ao que quis dizer, explicação que foi dada logo no momento em que lhe foi pedida, para o Tribunal foi plausível e não foi indício de que o assistente estivesse a arranjar alguma saída para qualquer coisa que tivesse dito antes e que fizesse parte de um guião. Acresce que o assistente disse - quando lhe foi perguntado quando teve a certeza que a pessoa que tinha visto na casa da (…) era o (...) (...) C - , que o momento foi quando foi prestar as declarações à Polícia Judiciária. Foi nessa altura que ou por ter visto fotografias ou por ter sabido o nome de pessoas - que na sua cabeça sabia identificar, mas não sabia quem eram ou como se chamavam – que, nas suas palavras, conseguiu olhar para trás e dizer que esta era a pessoa que estava nos sítios que indicou. Mas esclareceu - na instância que lhe foi feita pela Defesa do arguido C - que nessa altura, da Polícia Judiciária, já sabia que o arguido C era o Sr. (...) (...) da AX. E não foi por lho terem dito, nessa altura “...fui eu que disse o nome. E era eu que sabia.” É normal, pelo menos a experiência de quem neste momento está a julgar assim o diz, que quando começamos a recordar alguma coisa revelamos, por vezes, uma memória reconfigurada pelo presente, pois o que sabemos agora ou o que estamos a equacionar agora, invade aquilo que nos lembramos de ter acontecido. E o processo de contraditório que faz parte da audiência e a que o assistente foi sujeito, naturalmente propicia isso. E no meio disto, a estrutura da narração do assistente e a explicação que deu quanto à aparente contradição entre o que disse inicialmente e o que veio dizer depois, foi plausível e adequada para o Tribunal, pelo que foi verosímil. O assistente não se furtou a responder a explicar ao Tribunal como é que aconteceu o ter conseguido dizer como é que chegou à associação da cara ao nome do arguido C. Não se furtou a responder, mas a responder tentado explicar, o que não era fácil, dada a forma cerrada e minuciosa como lhe era feita a instância (como podemos aferir pela instância de 5/12/2005, em que a própria Defesa que o estava a instar, quando há a intervenção do Tribunal para dizer que a instância terminaria às 12.30h, essa intervenção levou a que momentaneamente tivesse “passado” a essa Defesa qual era a pergunta que ia formular). E isto é relevante, como mero apontamento, mas para demonstrar a forma como o assistente conseguiu manter a consistência intrínseca quanto ao que ia respondendo, quando estava a ser perguntado daquela forma fragmentada. E o assistente responde sempre, pode introduzir desvios pontuais quanto ao que tinha dito, mas responde com continuidade, quanto ao fio condutor que estava em causa. (1) Passemos então para o outro momento, que foi a explicação quanto à identificação do arguido K, pois quer uma identificação, quer outra, tem ainda a ver com um outro aspecto do interrogatório que foi feito ao assistente e que iremos falar em conjunto. Convocando o que acima já foi ex(...) - quanto ao que o assistente falou sobre o arguido K -, quanto à identificação do arguido K, perguntado se foi a primeira vez que o viu, respondeu “…acho que sim….não sei…não me lembro…”. Perguntado quanto à altura em que se lembra de ter conseguido “… identificar, isto é, de àquele rosto ter atribuído um nome de Sr. K…”, respondeu que “… não tenho a certeza…mas foi…acho que foi quando fui dar, fazer declarações à Polícia Judiciária...”. Esclareceu que quando olhou para “ele” – para o arguido K - dentro daquela casa, não sabia o nome do arguido. Para o Tribunal também não resultou das suas declarações que já o tivesse visto antes, mas resultou que após a casa da (…) fixou o seu rosto, pois veio a dizer que não sabia o nome do arguido, mas “sabia reconhecer o seu rosto”. O arguido K estava na primeira e na segunda vez que foi à casa da (…) - disse ter sido abusado por este arguido na segunda vez que esteve nesta casa - e até ao início deste processo “acha” que só voltou a ver o arguido K na comunicação social. Na instância da defesa do arguido C (audiência de julgamento 5/12/2005) e a pergunta sugerida por esta Defesa, foi perguntado ao assistente se antes da casa da (…) e mesmo que não o identificasse pelo nome “K”, se se recordava de em alguma circunstância já o ter visto: (2) E aqui passamos a um terceiro momento quanto à identificação dos adultos na casa da (…). Nas instâncias que lhe foram feitas pelas defesas dos arguidos - e concretamente às pessoas que estavam na casa da (…) -, o assistente reconheceu que a forma viu os adultos “da casa da (…)”, foram uns “velhos e gordos”, considerando a Defesa - pelo menos assim o interpretámos - que tal descrição não era compatível com a forma como faz a identificação dos arguidos C e K, a referência que faz a ter visto o arguido C na AX, o que significaria uma possibilidade de o identificar diferente da tal referência a “velhos e gordos”, para além de uma eventual questão de a idade dos arguidos não ser compatível com tal descrição. No entanto, na avaliação do Tribunal, esta referência aos adultos que estavam nessa habitação e referência que se pode interpretar como uma identificação de que quem lá estava eram “velhos e Gordos”, não afasta o que o assistente esteve a dizer em audiência de julgamento. É compatível uma acção e a outra. A dinâmica desta descrição ou referência é verosímil para o Tribunal. Atenção que o assistente não se exime a dizer que soube o nome só depois das fotografias, mas as suas declarações globalmente vista e avaliadas, foram na afirmação que as feições “sabia-as”, sem prejuízo de lhes chamar velhos, feios e gordos. Tinha sido mais “fácil” ter dito logo ao Tribunal “eu sabia o nome”, pelo menos em relação ao arguido C, pois era uma pessoa que estava ali “ao pé”, na AX. Mas do que resultou da análise das suas declarações - e correndo o risco de repetir em alguma medida o já dito - quando o assistente AI conseguiu olhar para trás e dizer que era “esta pessoa”, foi da forma que antecede. Aqui voltamos ao que já dissemos noutra ocasião. O assistente foi perguntado de “trás para a frente” e de “frente para trás”, em situações diferentes e pelo menos por quatro pessoas, quanto à identificação destes arguidos. E uma explicação com uma lógica, como deu (mas sendo, é claro, a sua lógica), que é feita de forma espontânea - pois não percebemos que a resposta seja ensaiada, ou que o assistente tenha andado às voltas até chegar a esse resultado - , se o que estivesse a dizer não fosse a expressão do que sentia e do que fora o seu processo interno de raciocínio, parece-nos que tal não era compatível com o tipo de interrogatório a que foi sujeito. 13.3.10. Em relação aos factos na “casa da (…)” há ainda os seguintes aspectos a referir. O arguido K invocou, no sentido da inverosimilhança e da impossibilidade da imputação de tais factos ao arguido, os seus horários profissionais, pois (pelo menos) as manhãs passava-as a trabalhar no Centro de saúde. Quanto a este aspecto da Defesa do arguido, a testemunha HW, assistente administrativa no Centro de Saúde (…), declarou conhecer o arguido K deste Centro, tendo prestado esclarecimentos sobre os horários do arguido no Centro – o qual disse pensar ser o da manhã – e sobre, por vezes, a falta de pontualidade do arguido na chegada. O arguido juntou aos autos as folhas de ponto do Centro de Saúde (…), Extensão da (...) (…) em que prestou serviço - cfr. fls. 54.486 a 54.546 -, referentes aos anos de 1998 a Janeiro 2003. Por exemplo, as fls. referentes ao ano de 1999 têm a(...), manuscrito “Horário 10-14h”, e as fls. estão rubricadas nos respectivos dias úteis, sem rasuras e com excepção dos locais onde está carimbado “Falta”. Mas destas folhas, das rubricas apostas e do horário manuscrito, não resulta a certeza que o arguido tenha estado todos os dias em que está aposta uma rubrica, exactamente durante todo o período, com início e fim, que a anotação manuscrita do horário refere. O depoimento da testemunha HW vai também neste sentido. E os documentos que se encontram a fls. 51 a 58, do “Anexo A”, inseridos no “Apenso X”, pasta 1 - sendo, por exemplo, que no documento de fls.58, datado de 30/06/98, está anotada uma referência a que foi feita a assinatura de folhas do livro de ponto fora do local onde o serviço foi prestado -, também permite sustentar esta afirmação (sendo que quanto às reclamações de utentes neste Anexo A, por atrasos do arguido, dos documentos resulta também que nesses dias estão feitas comunicações de falta do arguido). E a testemunha CCH, a qual declarou ao Tribunal ter trabalhado no (...) do arguido K desde Fevereiro de 2001 (foi testemunha apresentada pelo arguido), disse ao Tribunal que o arguido dava (...) no seu (...) “todos os dias”, com excepção da 4ª feira, pois de manhã trabalhava noutro local e à tarde tinha um programa de rádio. O que foi confirmado pela testemunha ZV, irmã do arguido K, a qual disse ao Tribunal que à 4ª feira o irmão não dava consulta na (...)/(...) privado, pois de manhã tinha a consulta no Centro de saúde e à tarde tinha um programa de rádio (a testemunha VR também confirmou a existência do programa de rádio, mas referindo uma colaboração ao sábado de manhã, mas “há 10 anos” já não a fazia ao sábado de manhã; mas já a testemunha ZR disse que a colaboração era na JJC, tendo o arguido começado a sua colaboração há 15/17 anos e até á altura em que foi detido). Também a testemunha CCO, sobrinha do arguido e que disse ao Tribunal ter começado a colaborar como recepcionista no (...) do tio em 1996 quando começou a estudar na faculdade, disse que o arguido à quarta feira não ia ao (...), não dando consulta nesse dia (a quarta feira, como vimos, foi o dia da semana que o AI referiu, como aquele em que faltava às aulas e ia com o arguido A). O Tribunal deu como provado que o arguido K e o arguido C sabiam que o AI tinha idade inferior a 14 anos e que o arguido C sabia que o AI era aluno interno da AX. E deu-o como provado com fundamento no seguinte: o AI foi levado à “casa da (…)” pelo arguido A. A relação de proximidade do arguido A com o arguido C - nos termos em que vimos no início da presente análise crítica da prova, quando o Tribunal analisou e valorou a prova produzida quanto às relações do arguido A e C, tendo concluído pela especial relação de proximidade entre estes dois arguidos -, o facto de o assistente AI ser aluno interno da AX e o facto, no que diz respeito ao arguido K ser (...), foram elementos necessários e suficientes para o Tribunal concluir pela prova de tais factos. Quanto ao facto de o Tribunal ter dado como “provado”, que o arguido A recebeu dinheiro, quando levou o AI à casa da (…), reproduzimos o que já dissemos em situação anterior. O Tribunal deu como provado que o arguido A deu dinheiro ao assistente. O arguido levou o AI a esse local para a prática, por parte dos arguido C e K, de actos de natureza sexual no assistente. Assim, tendo o assistente recebido dinheiro do arguido A após estes actos, não havendo interferência ou associação de qualquer outras pessoas aquela acção de o assistente ter recebido o dinheiro - e embora não haja qualquer admissão por parte do arguido A deste recebimento, nem registos de depósitos na conta bancária do arguido A, nem o educando viu o arguido receber o dinheiro - e tendo o Tribunal dado como assente que foi o arguido A que levou o assistente à casa na (…), é da experiência comum e da natureza das coisas, que o arguido A recebeu alguma quantia monetária ( porque foi dinheiro o que o assistente recebeu do arguido A), por ter levado o AI. Razão pela qual o tribunal deu tal matéria como provada. 13.3.11. (Dos factos em (…)) O Tribunal perguntou ao assistente sobre o outro local a que dissera ao Tribunal ter ido - (…)-, tendo começado por fazer as perguntas, tal como nas outras situações, de forma a que o assistente tivesse o discurso o mais livre possível e deixando transparecer qual a sua “lógica” na forma como recordava, a relevância como recordava e contava os factos. Assim, nesta parte da análise crítica da prova e quanto aos factos passados em (…), o Tribunal optou também por fazer a narração de uma forma global e sequencial do que o assistente falou e como falou pela primeira vez dos factos em Tribunal, como foi dando os esclarecimentos. Isto porque, como é possível perceber pela audição das declarações prestadas pelo assistente, nas sucessivas instâncias que lhe foram feitas pelos sujeitos processuais, os factos foram sendo sucessiva e consecutivamente fragmentados, pedido esclarecimentos fragmento a fragmento, passo a passo. Assim e para se perceber o que foi a estrutura inicial do discurso do assistente - pois está em causa avaliar a sua credibilidade, coerência, consistência e veracidade do seu discurso - , o Tribunal optou por esta forma, que se torna mais demorada, mas que permite conservar e isolar, de forma mais fiel, o que foi o discurso e o sentido do discurso inicial. (1) O assistente AI começou por dizer que a (…) foi duas vezes. Foi com o arguido A, recorda-se que era dia de semana, foi depois das duas idas à casa da (…) e que foi no mesmo ano de 1999. Perguntado porque é que dizia que tinha sido “no mesmo ano de 99”, disse “… porque…foi no mesmo ano lectivo, foi no mesmo ano lectivo…” - mas de quê? - “… 98/99 (noventa e oito/ noventa e nove)…”. O Tribunal insistiu quanto à clarificação de uma resposta que o assistente tinha dado - e perguntou-lhe se tinha sido no mesmo ano lectivo das idas à casa da (…) ou se foi no ano lectivo a seguir - e respondeu “…foi no ano lectivo… se bem me lembro foi no ano lectivo 99/2000 (noventa e nove / dois mil)… que eu até chumbei o ano…”, tendo repetido que foi no ano em que chumbou de ano (como acima vimos, em 1998/99 o assistente foi para a GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 1º ano; em 1999/00, GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – 2º ano, ano este em que reprova, pois no ano 2000/01, está de novo GC ((…)) Ensino Técnico Profissional, (…) Nível II – no 2º ano). Destas declarações do assistente – quanto à localização no tempo dos factos ocorridos em (…)- , conjugando com o que acima já dissemos, quando procedemos à localização no tempo dos factos do arguido A – fundamentação que convocamos, quer quanto aos primeiros, aqueles que ocorreram no refeitório, quer quanto ao início dos segundos, os factos que ocorreram em casa do arguido A - , estes factos descritos em (…) pelo assistente AI situam-se no período descrito no Despacho de pronúncia. Quanto ao modo como “combinou” com o arguido A a ida a (…) - o Tribunal perguntou-lhe como é que, pelo menos na primeira vez, sabia o que é que ia fazer a (…), tendo o Ministério Público acrescentado “ ou se desconfiava? -, respondeu “…tinha uma vaga ideia….” - e perguntado porque é que tinha uma vaga ideia - “… por causa do que já se tinha passado anteriormente…”. Na sequência de perguntas que com esse objecto lhe foram feitas, respondeu que não teve qualquer conversa com o arguido A sobre a “ida a (…)” - e então como é que tinha sabido que ia (…)? - explicando “…imagine…não, eu …é assim… não tinha a certeza, mas tinha uma pequena ideia….”. E insistido, quanto à primeira vez que foi a (…), sobre qualquer conversa tida pelo arguido A, respondeu “… disse … se me disse qualquer coisa, não me lembro … não me recordo bem, mas... se foi qualquer coisa, disse-me, provavelmente… demoraria mais tempo do que a… do que das outras vezes….”. Mas perguntado se se lembrava de ter mesmo havido alguma conversa nesse sentido, respondeu que não, nem da primeira nem da segunda vez. O Tribunal insistiu um pouco mais tarde que, pelo menos da primeira vez, o arguido deve ter-lhe dito alguma coisa para entrar na carrinha ou para sair do (...) e o assistente respondeu - e dizendo-o de uma forma que deixava transparecer que par si era uma evidência - “… foi uma combinação normal…”, explicando o que queria dizer, “… como se … como se eu fosse para casa dele... de manhã….só que... depois, depois fomos apanhar os outros colegas….” (mas esclareceu ainda, na audiência de julgamento de 5/12/05, que quando combinou as idas a (…) com o arguido A ainda não tinha telemóvel, e que depois das idas a (…) ainda continuou a ir a casa do arguido A, disse também que as idas a (…) foram “muito antes” de jogar futebol no AX A.C., dizendo “… muito antes… eu só entrei para o AX (...) quando fui para CZ….”). (2) Foram-lhe perguntados pormenores quanto ao percurso para (…). Não se lembrava se o arguido A tinha passado pela portagem ou não - embora tivesse feito um movimento, que para o Tribunal foi claramente um movimento reflexo, no sentido de se perceber que queria que achava que sim, mas porque também achava que carrinhas da AX deviam ter o dispositivo para a portagem, pois confirmou que lembrar, não se lembrava -, que achava que sim Durante o caminho - se falavam ou não uns com os outros - disse “…eu manti-me sempre calado…”, os “…meus colegas… alguns falavam….” E o regresso era igual. Não se recorda de o arguido A ter-lhe dado qualquer indicação sobre o que deveria dizer no (...) quando regressasse, 13.3.12. Como referimos, o assistente começou por dizer que foi duas vezes a (…). (1) O Tribunal disse-lhe para descrever o que se passou da primeira vez que lá foi - com quem é que se lembra de ter ido, nessa casa quem viu ou com quem esteve -, tendo começado por responder que “…o Sr. A foi-me buscar ao (...), depois… fomos buscar mais jovens da minha idade para aí (…)… encontrámo-nos perto do CZ…”. “Acha” que foram pela auto estrada, não se consegue recordar do tempo que demoraram. Foi a “…. uma (...), aquilo parecia uma (...)…” - e na sequência de pergunta, lembra-se como é que era essa (...)?, disse - “…lembro-me da fachada, só…”, que descreveu “…tinha escadas gémeas… e era branca…branca e azul….”. E passou a relatar o que se recordava ter acontecido, depois de ter chegado a (…): “… aahh … fui levado até …com os meus colegas, até à porta … aaah … depois abriram a porta e a gente entrámos todos….” Ficaram na sala, onde estavam adultos - perguntado se identificou alguém, ou se identifica alguém neste momento, disse - “…identifico…(…) o Sr. N… e o Sr. H….”. O Tribunal perguntou-lhe se identificava mais alguém - se das pessoas que estavam na sala a ser julgadas identificava mais alguém -, tendo dito “… consigo identificar mas não se encontra na sala….”. Foi-lhe perguntado concretamente em relação à arguido Q - se a identificava -, tendo o assistente dito “…a Srª Q… também…consigo identificar também uma pessoa, só que não se encontra na sala…”, não sendo, portanto, nenhum dos arguidos que estavam a ser julgados. Voltado a perguntar se de todas as pessoas que estavam na sala a ser julgadas - e estavam presentes todos os arguidos -, se as pessoas que viu foram só as três que referiu e o assistente confirmou que eram só essas. O Tribunal pediu-lhe para dizer onde é que tinha visto cada um e disse “..então é assim… eu… ouvi a Sr.ª Q, ouvi a voz dela a falar …e depois vi-a … mas via-a só de passagem… assim de relance. O Sr. N… vi-o a abrir a porta … quando abriu a porta … e o Sr. H vi-o lá dentro…”. Pedido o esclarecimento se das duas vezes viu sempre estas três pessoas que tinha referido, disse “…a Dª Q, se bem me recordo, só lhe vi uma vez….”, não se recordando se foi da primeira ou da segunda vez que lá foi. Mas acrescentou - a pergunta se em concreto se recordava quando a tinha visto - “… sim, foi quando era …quando estava na sala…quando entrei … dez minutos depois… para aí…”, “…foi quando era … quando estava na sala …quando entrei, dez minutos depois, para aí…(…) quando estava na sala …eu vi vi a Sr.ª Q a passar… na sala….foi na sala… mas foi só de passagem mesmo….”. esclareceu que a arguido Q não esteve mesmo na sala onde o assistente estava, “…não, não esteve…passou….foi só de passagem, mesmo….”, tendo-a visto através de uma porta. (2) Foi-lhe perguntado, então, onde é que ficava a sala, tendo respondido “ …não me lembro….”, mas dizendo posteriormente - estando na porta de entrada, se a sala ficava da sua direita, da sua esquerda, em frente, ou onde é que se lembra de vera sala - “…acho que é para o meu lado direito….”. Não se lembra se para aceder a essa sala por onde é que tinha que passar, quanto a mobília “…se me lembrar é só mesmo do sofá…” na sala…” - e lembra-se de mais algum mobiliário dessa sala? - “…não… uma mesa….assim, não me consigo lembrar….”. Mas assinalamos, desde já, que quando deu estas respostas demorou tempo a responder, a expressão que ficou para o Tribunal era que estava a tentar ver, buscar na memória (busca esta que pode, é evidente, ter sempre um duplo significado: estava a fazer um esforço sério para tentar lembrar, ou estava a ser cauteloso para reproduzir bem o que tinha fixado “para contar”, questão que o Tribunal irá referir em momento posterior, por causa da descrição do interior da casa). Aqui uma explicação - ligando-nos ao que acima dissemos, quanto à forma como o Tribunal optou por estruturar esta parte da análise crítica da prova -, é que a relevância e razão de ser de o Tribunal estar a reproduzir, da forma tão fiel quanto nos é possível, segmentos das declarações do assistente - mas fazendo o Tribunal a transcrição do segmento de forma a que fique consignado qual foi o pressu(...), i.e. a pergunta concreta, que deu origem aquela resposta e qual foi, igualmente, a pergunta concreta que deu origem a determinado esclarecimento, de forma a não isolar a “resposta” ou o “esclarecimento” do contexto e do sentido em que/com que efectivamente foram dados - , tem a ver com as declarações que presta em momento posterior, quando lhe são feitas perguntas na instância do Ministério Público ou dos demais sujeitos processuais, destacando em concreto a contra instância da identificação da arguida. E tem a ver, também, com a forma como o assistente se exprimiu quando lhe foram feitas as sucessivas instâncias dos vários arguido, quanto à identificação de arguidos, descrição do local, descrição dos actos e como essa expressão contribuiu para a motivação do tribunal. (3) Pedidos mais esclarecimentos pelo Tribunal quanto ao que tinha sucedido em (…), da primeira vez, disse “…primeira vez que fui a (…)… cheguei lá com os meus colegas … não ia sozinho, claro, e… foi-nos aberta a porta e dirigimo-nos para a sala…”. “…O que é que sucedeu ?... sentámo-nos no sofá….pediram-nos para esperar e ficamos lá sentados…depois… depois…”, “…vieram ter connosco…(…) aah…o sr. dr., o Sr. H veio ter connosco… depois fiquei lá eu com mais dois ou três colegas, não me lembro…”, “…depois, não sei quantos colegas meus é que saíram de ao pé de nós … fiquei lá, pelo menos eu …e mais três colegas…ou dois, não me recordo bem …e o Sr. H sentou-se ao nosso lado…” - mas não se recorda se o arguido H lhe disse alguma coisa nesta altura -. “…De seguida deu-se a prática de abusos….”, “… só sexo oral…” - perguntado quando diz sexo oral, quem tocou em quem e em que parte do corpo? - “… entrada do sexo na boca…”, “…foi comigo…(…) e … com os outros, com os outros meus colegas…” - e perguntado quem colocou o sexo na boca de quem? - “…foi o Sr. H que meteu na minha boca….”. Disse que com os outros colegas foi igual e tendo acrescentado que “dessa vez” consigo passaram-se mais factos, mas com adulto que não é arguido nos presentes autos. Confirmou que os actos com os outros colegas foram, também, com o arguido H, na mesma sala - e perguntado se à vista de todos? - “… só estava lá eu e mais dois, três colegas…” - e perguntado todos os que lá estavam viram o que aconteceu a cada um? - “ ..não, todos não….todos não….era só eu e mais dois ou três colegas que estávamos lá…” e todos estes viram o que aconteceu a cada um deles. Após os actos “…eu saí dessa sala…”. Não conseguiu identificar ao Tribunal quem eram os colegas que estavam consigo, “… não…por acaso não.. eu não falava com ninguém….(…) provavelmente, deviam ser da AX … mas não tenho a certeza….”. O Tribunal passou a pedir alguns esclarecimentos quanto a aspectos das declarações até então prestadas, tendo esclarecido que a porta (da casa em (…)) foi aberta pelo arguido N, o arguido A estava com o assistente, mas não se apercebeu de qualquer conversa entre os dois arguidos, nem reparou em qualquer pormenor que tivesse ocorrido. Foi o arguido N que lhes disse para “esperarem”, quando estavam na sala. Quanto a estarem adultos na sala - quando entrou para a mesma - “… não me lembro, mas acho que não…”. Perguntado - na sequência de terem-se sentado no sofá e de lhes ter sido pedido para esperar (anteriormente dissera “vieram ter connosco”) , quem é que foi ter com eles? - “… foi o Sr. H…” eum outro adulto, completou com “… o Sr. N… e agora de repente não estou a lembrar de mais ninguém….”. Face a esta resposta o Tribunal perguntou-lhe se havia mais algum adulto que não soubesse o nome, ao que o assistente respondeu “ … houve uma vez que fui lá que havia lá uma pessoa, mas não tenho a certeza se foi na primeira ou na segunda… mas não reconheço….”. No regresso para (…) lembra-se de ter encontrado o arguido A fora da casa “…era sempre fora da casa…”. (4) E passou a relatar a segunda vez que foi a (…). Dessa segunda vez “… foi praticamente igual à primeira….tirando a parte dos meus colegas….”. Foi com o arguido A, “… fui com os meus colegas….(…) pareciam ser outros….”, mas não soube dar ao Tribunal os nomes., nem os veio a reconhecer mais tarde. Quanto a se eram da AX, “…dois apercebi-me que eram, de resto…”. Eram “…no máximo dos máximos, para aí seis, sete…”, foi sempre na carrinha (…), branca, a qual conhecia “…de lá da AX….”. Depois de terem chegado a (…), nesta segunda vez, foi-lhes “ …aberta a porta (…), pelo mesmo indivíduo…pelo Dr. N….”. Não se recorda se da segunda vez o arguido A os acompanhou à porta da casa, depois de ter sido aberta a porta “… sucedeu a mesma coisa da primeira vez…ficámos na sala … só que desta vez os meus colegas e eu … eu fiquei primeiro na sala, depois fui para um quarto…”. Quanto aos adultos que nesse dia estavam na casa - para além do arguido N que já referira -, disse “ …o Sr. H…”, referiu um outro adulto “… e não me lembro assim de mais ninguém…provavelmente, acaba por ser uma pessoa que eu tinha dito há bocado que não reconheço….”. Para o Tribunal, aqui o assistente está a fazer - no seu discurso -, a ligação com a referência que anteriormente tinha a um adulto, quando o Tribunal lhe pediu para relatar os factos ocorridos na primeira vez que foi a (…) e em que o assistente disse que “ … houve uma vez que fui lá que havia lá uma pessoa, mas não tenho a certeza se foi na primeira ou na segunda… mas não reconheço….”. Nesta segunda vez - perguntado se esteve com algum adulto? - disse ter estado “…com os mesmos da primeira vez… com o Sr. H…” e com um outro adulto. Com o arguido H houve “…sexo oral….”, esteve sozinho na sala com o arguido, não estavam mais colegas “…não, estava sozinho…dessa vez estava sozinho…(...) fui eu que fiz sexo oral….(…) foi-me introduzido o sexo na boca….”. (5) Na instância da Defesa do arguido H (audiência de julgamento 6/12/2005) disse que quando foi para (…) com o arguido A na carrinha foram mais rapazes do que aqueles que entraram consigo na casa de (…). Mas quanto à explicação do que lhes aconteceu disse: “(AI) – Não sei o que fizeram, mas provav… eu e mais os meus colegas entrámos primeiro, tipo… mais parecia que se tinham dividido em dois grupos…entrámos primeiro, depois os outros rapazes entraram depois… mas... (Dr. JJS) – Mas esses… (Juíza Presidente) – Entraram depois onde, esses rapazes? (AI) – Em casa. (Juíza Presidente) – Qual casa? (AI) – De (…). (Dr. JJS) – O senhor viu-os entrar? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) – Não…suponho que entraram. (Juíza Presidente) – Viu-os lá dentro? (AI) – Não…foi o que eu disse… suponho que entraram. (Dr. JJS) – E porque é que supõe? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) – Porque, provavelmente … não ficaram na (...)…eu “tou” a fazer… (Juíza Presidente) – É só por isso? (AI) – Eu “tou” a fazer uma suposição.” Das suas declarações o Tribunal não ficou com a percepção que AI estivesse a referir-se - quando falou dos outros colegas -, a AP, Y, AN, AT ou mesmo AV. Porque por uma razão ou por outra veio a referi-los ou revelar conhecê-los, e o que contou ao Tribunal, da avaliação que o Tribunal fez, não tive a ver com estes assistentes. 13.3.13. Por ter referido uma outra dependência para além da sala, concretamente um quarto, o Tribunal pediu-lhe para, estando na porta da sala onde dissera ter estado inicialmente, onde é que se situava o quarto, o assistente respondeu “…do lado direito…”. Disse que não viu, nem esteve em mais dependências dessa casa e o Tribunal fez-lhe perguntas mais pormenorizadas quanto ao que acabara de dizer: se para além do quarto do lado vira mais alguma dependência desta casa?, a que responde “…não….”; se quando respondeu a localização do quarto ( o Tribunal tinha-lhe perguntado estando na porta da sala) “do meu lado direito”, é estando em que porta, na da (...) ou na da sala?, a que responde “… na da sala….porque no lado direito a partir da porta estava a sala….”; se, portanto, estando na porta da sala, de costas para a sala, este quarto é do seu lado direito?, responde “…exacto…”. (1) Na instância do Ministério Público voltou a da explicações quanto ao interior da casa de (…), tendo-lhe sido perguntado como era o “percurso” entre a sala onde começara por dizer que estivera e a segunda dependência, um quanto, que também identificou. Respondeu “… não tenho a certeza se tinha um corredor, mas... quando se saía da sala (…) e virava-se à direita (…) tinha uma divisão. Da sala para a... para o quarto... provavelmente podia ser um corredor.”. Perguntado se se lembrava de nessa divisão ter visto alguma porta ou portas?, responde “… não, tinha a sala (…) e a seguir tinha o quarto.”. Perguntado se o quarto era logo a seguir? – se quando dizia diz virava à direita, virava à direita e tinha uma divisão, essa divisão era o quarto? - responde “… acho que não, porque eu não me lembro de ter saído e entrado logo a seguir”. Então de que é que se lembra? E esclarece “…eu lembro-me de ter andado só um bocadinho, mas não foi muito... provavelmente tinha um corredor.” Continuaram os pedidos de esclarecimento (estamos na instância do Ministério Público). Na altura em que o AI estava a prestar depoimento perante o Tribunal, o Tribunal já se tinha deslocado em 3/11/05 à casa da arguida Q, em (…). Era o local que o assistente estava a descrever, pelo que estes pedidos de esclarecimento tinham a ver, naturalmente, com o que já era a percepção de cada um dessa casa e do seu interior (cfr. acta da Audiência de julgamento de 3/11/2005, fls. 34.958 a 34.962; sendo que a diligência, com deslocação à casa, foi gravada em vídeo, conforme Despacho de fls. 34.737 a 34.749, “Ponto III”, de 21/10/05). Quanto a este local temos a planta que se encontra a fls. 19, do “Apenso AO”, onde é possível ver a implantação do R/C da casa da arguida Q. E nesta planta vemos, em concreto, as divisões que no documento estão identificadas como “S. Jantar” e “S. Estar”. Quando o Tribunal foi ao local começámos por entrar na divisão que está identificada como “S.Jantar”, a qual, na “parede” que separa as duas divisões (e fazendo essa separação), estava um móvel alto, ocupando quase a totalidade da “parede” e dando a ideia de que havia, de facto, aí uma parede. De facto este móvel que fazia efectivamente a separação entre as duas divisões, não era uma parede como resulta da planta, pois quando fomos à divisão que na planta está identificada como “S.Estar”, foi possível ver uma abertura em forma de arco, entre as duas divisões, vendo-se as costas do móvel que referimos a tapar totalmente essa abertura. E quando o Tribunal foi ao local, em Novembro de 2005, a divisão que está identificada como “S.Jantar” estava mobilada com uma zona de estar, com televisão e com uma zona de refeições, com mesa e cadeiras (como sala comum). A divisão ao lado (“S.Estar”), estava mobilada como zona de estar para crianças, sendo que resultou da audiência e das declarações da arguida Q, que tomava conta de crianças para a segurança social. Mas isto, repetimos, quando o tribunal foi à casa em 2005. Assim e continuando com a instância do assistente e para reproduzir de forma tão fidedigna quanto possível a forma como se exprimiu, pelo menos quanto às palavras, transcrevemos: (Procurador) – …Se para entrar nessa tal divisão, quando entrava nessa divisão, se transpunha ou não alguma porta? (Juíza Presidente) – Compreendeu?... Está de costas está na porta da sala, costas voltadas para a sala para o interior da sala e o senhor voltado para o resto da casa. Disse à direita havia um quarto (…) e agora disse também virava à direita e tinha uma divisão. Disse… lembrava-se de ter que andar um pouco e tinha o quarto; (…) essa divisão à direita era o quarto? (AI) – Como eu já tinha referido, não me lembro de sair e entrar novamente… logo. não me lembro. (Juíza Presidente) – Para entrar nessa divisão tinha alguma porta ou não? (AI) - ...Tá a falar do quarto, verdade? (Juíza Presidente) – Estou a falar na divisão que o senhor diz que é à direita e que identificou como quarto. (AI) – Sim….se passava uma porta para o quarto? (Juíza Presidente) – Se para entrar nessa divisão à direita, que identificou como quarto, se passava alguma porta? (AI) – Eu para entrar no quarto passava pela porta do quarto. (Juíza Presidente) – Pela porta do quarto. E para entrar da sala para o quarto... passava directamente? (AI) - ...Sim…não me lembro de transpor nenhuma porta. (Juíza Presidente) – Não tinha de transpor nenhuma porta? (AI) – Não, não me lembro... (Procurador) – Srª Drª, mas então, se para ir para o quarto, eu peço desculpa porque a pergunta parece um pouco ridícula mas é-me imposta pela resposta, ou, pelo menos, pela percepção que eu estou a ter dela. Para ir para o quarto, tinha que sair da sala. Sim ou não? (Juíza Presidente) – Pela resposta que já deu sim porque estava à porta do... (Procurador) – Portanto, saía a porta da sala, sim ou não e depois é que ia para o quarto? (Juíza Presidente) – A porta da sala dava directamente para o quarto? Isto é, o senhor estava na porta da sala e tinha o quarto à frente? Entrava no quarto? (AI) – O quarto era à direita da sala, eu saía da porta...” Como vimos, a dada altura desta sucessão de perguntas e respostas, o assistente disse “…como eu já tinha dito…” e responde ao que lhe fora perguntado. E, de facto, o assistente já tinha “respondido”, já tinha falado na sessão anterior - quando descreveu o que se tinha passado na “segunda vez” que foi a (…) -, tendo na altura localizado o quarto também (estando na porta da sala, de costas para a sala) no lado direito, fazendo um relato, desta segunda vez, que quanto à sua estrutura, quanto à linha principal foi idêntico ao anterior . E nesta sessão da audiência o assistente estava a ser perguntado de forma segmentada, pormenor a pormenor, parando a declaração e perguntando quanto a pormenor, quanto à localização do quarto, como é que ia da sala para o quarto, se saindo da sala entrava directamente para o quarto - como se fosse passagem directa de uma divisão para a outra - e, para o Tribunal, mantém o seu discurso de forma consistente. O assistente revela e mantém a imagem que tinha dado no dia anterior quanto à localização e proximidade das duas divisões. Quando lhe foi perguntado se “da sala para o quarto passava directamente?” ou se “ a porta da sala dava directamente para o quarto?” , fez pausa, pensou e responde com uma voz natural, mas ao mesmo tempo interrogativa - como quem se interroga porque é que aquilo lhe estava a ser perguntado assim, porque percebia-se que para ele era “evidente” o que tinha dito -. E nesta multiplicidade de interrogações de “direita” ou de “esquerda” das portas e divisões, se entrava directamente ou se passava por uma porta - o diálogo é o acima transcrito, na instância do MºPº, no dia 30/11/05 -, manteve a memória que tinha revelado inicialmente. Memória que, para o Tribunal, é compatível com o que viu no R/C da casa, com o sítio onde era a “sala” (que na planta está identificada como “S.Jantar”) e com o acesso à divisão contígua, que quando fomos ao local era uma quarto ou sala de estar para crianças (e que na planta está identificada como “S.Estar”). Pode não ter memória, quando respondeu ao Tribunal, se tinha cadeiras ou sofás, estores ou copos, se as luzes estavam acesas ou apagadas, se se via “bem” ou “mal”, mas revelou-nos, esta foi a percepção do Tribunal, um relato de algo presenciado e não de algo ficcionado ou decorado. Teria sido possível manter esta continuidade e correspondência do relato - e da forma como o fez, a explicação que deu quanto ao acesso de uma divisão para a outra e a forma como se exprimiu para o explicar -, quanto à memória que tinha das divisões da casa, em dias diferentes e momentos diferentes, com perguntas minuciosas e intervenção de pessoas diferentes, se não estivesse a reproduzir uma recordação vivida e se fosse algo decorado? Para o Tribunal, no caso concreto, não tivemos a percepção de que o que esteve a descrever, a forma como descreveu e como se exprimiu para o descrever, fosse o resultado de uma fantasia (ver, também croqui do interior da casa que o assistente fez na audiência de julgamento e que se encontra a fls. 33.600 dos autos). Mas sempre sem prejuízo de o assistente estar a revelar uma recordação. E a imagem que se tem no presente pode não corresponder, com fidedignidade, ao que foi o espaço percepcionado há 6 anos atrás. Se tivesse decorado a planta, para descrever o local e colocar ali a sua “história”, ou se estivesse a contar mais coisas dos que as que tinha visto, as coisas que tinha imaginado que deviam estar numa casa por ser uma casa, na avaliação do tribunal mais facilmente tinha dado pormenores de “fidedignidade”. (2) E dizemos isto pelo seguinte. Nos autos e como acima já referimos, a fls. 2.987 encontra-se um croqui da “casa da (…)”, que o assistente fez na fase de inquérito e em relação ao qual prestou esclarecimentos na Audiência de julgamento de 30/11/05. Este é um desenho em que estão divisões, com mobília desenhada, tapetes no chão e reproduzindo o que o assistente disse quanto àquele desenho - perguntado se o que desenhou foi efectivamente o que tinha visto na casa e esclareceu - “… é assim, esta planta não …não “tá” perfeita, eu simplesmente limitei-me a desenhar aquilo que via da sala... do resto das divisões….sabia onde é que era os quartos…limitei-me, simplesmente, a meter na minha cabeça aquilo que era dentro de casa... não me entendeu?...”. Das suas declarações resultou, como dissemos, que apesar de ter desenhado uma casa de banho, não tinha ido efectivamente a essa divisão, a razão pela qual a desenhou foi “… porque reparei…eu quando entrei, olhei para os cantos da casa…não decorei bem como é que era a casa, mas aah... desenhei aquilo que me entrou a primeira vez na cabeça….”. Confirmou que as divisões onde tinha estado foram somente um quarto e numa sala e quanto às demais divisões que desenhou no croqui “…ver, de ver, eu não vi nenhuma….”, mas “… eu reparei em todas as divisões da casa …”, acrescentando ter reparado numa casa de banho e num quarto mais pequeno. Foi-lhe perguntado porque é que tinha desenhado uma cozinha - uma vez que só tinha “reparado” em mais duas divisões - e o assistente, diz “…não, é que foi assim, eu quando reparei que havia a casa de banho e havia mais um quarto pequeno, uma pessoa não fica sem comer, e uma casa não pode ter... não pode ter, não pode ficar sem cozinha. E... quando fui para um quarto, para o quarto maior... reparei de longe que havia, podia haver mais uma divisão e eu daí, parti daí que era uma cozinha….”. Como acima já mencionámos, deu esta resposta com um “ à vontade” diferente do registo que tinha dado até ali e cuja explicação já acima demos e por isso reproduzimos. Na sequência do que antecede e na instância do Ministério Público, foi perguntado ao assistente se tinha feito algum desenho da “casa de (…)”, tal como tinha feito para a “casa da (…)” ou para a casa do arguido A (cfr. fls. 2.986 e fls. 2.987). O assistente disse que não “…porque... primeiro, porque não… não me lembrava da… do interior dessa casa, e ... e só consigo... como é que eu hei-de explicar? Só desenho aquilo que me chama mais a atenção, e se me pedissem para desenhar a casa de (…), a única coisa que eu desenhava era a fachada….”. Foi uma altura em que deixou denotar uma voz diferente, menos contraída, aparentando alguma descompressão. Fez de seguida uma descrição da fachada da casa, mas temos que notar que na altura em que fez a descrição, o assistente já tinha ido fazer o reconhecimento do local a (…) e a “casa de (…)” já tinha aparecido em fotografias de jornais e passado mesmo na televisão. Pelo que não foi descrição a que o Tribunal, na altura em que foi feita, pudesse dar particular relevância probatória. Foi-lhe perguntado, então, porque é que o interior da casa de (…) “não lhe chamou a atenção”, pois de acordo com a sua explicação nem o conseguia descrever. De facto não era à partida perceptível porque é que tendo relatado abusos nos dois locais, em (…) até relatou ter ido pelo menos mais uma vez do que foi à (…), num sítio ((…)) desenhava o interior e no outro nem o conseguia recordar. E responde (audiência de julgamento 30/11/05), fazendo uma pausa, “… é difícil explicar isto, mas... quando eu fui, quando eu fui para a casa da (…), foi a primeira vez que tinha ido mais longe do que... pronto, do que normalmente ia … para casa do Sr. A, e ... pronto, foi, foi aquela primeira sensação de conhecer o... o sítio….mas depois, quando fui para (…), aah... não me chamou a atenção porque já tinha ido uma vez mais longe do que aquilo que já tinha ido, do que... do que a casa do Sr. A….por isso... como é que eu hei-de explicar?... É difícil explicar, mas não me chamou a atenção…não... já tinha ido uma vez mais longe….e por isso… só... só me lembro das primeiras, das primeiras vezes que vou, que faço qualquer coisa de diferente….”. Há particularidades dos depoimentos que quando escrevemos sobre eles, por vezes é difícil ilustrar exactamente o que se quer dizer. Esta era uma das sessões em que o Tribunal teve que pedir ao assistente para falar mais alto, pois globalmente foi perceptível a voz pesada e por vezes dificuldade em responder. Mas quando estava a tentar explicar ao tribunal o porquê da diferença, para si, entre a (…) e (…) – que acabámos de reproduzir -, a explicação é dada com um tom normal e adequado de quem tenta mesmo explicar, vê-se que faz um esforço para isso, não se refugia em desculpas de maior ou menor “choque emocional” – que poderia ser no entanto credível -, mas explica com o que para si fez sentido na altura. Dá a sua explicação, manteve um registo de simplicidade na forma como o estava a tentar fazer. A criação de uma história ou de um enredo comum com outras pessoas, é mais compatível, na opinião do tribunal, com uma atitude mais apelativa à pena e à emoção, o que não foi a avaliação que fizemos da atitude do assistente. 13.3.14. Ainda relacionado com a ida a (…), quanto à altura da semana ou do dia em que foi a (…), a sua resposta é um misto entre não se lembrar em que parte do dia foi, se de manhã se de tarde: isto porque numa altura refere que era de manhã, pois era como se fosse para a escola; e quanto ao regresso diz que quando regressava já tinha passado a hora da escola. Voltou a afirmar que das duas vezes que foi a (…) foi em dias de semana. Explicou dizer isso porque “…porque primeiro… porque nesse ano tinha chumbado o ano e tinha muitas faltas...(...) e nos dias em que eu faltava ficava de castigo, como acontecia na casa da (…)….”. Nestas duas vezes que foi a (…) disse “não ter recebido dinheiro”, não reparou se alguém entregou dinheiro a alguém, declaração que mais tarde veio a rectificar, explicando que recebeu dinheiro sempre, após o regresso (e tendo sido perceptível, pelo menos para o Tribunal, que de facto quando deu esta primeira resposta deveu-se a má compreensão ou audição da pergunta, pois como se pode ouvir na gravação do dia 30/11/05, embora a gravação seja perfeitamente audível, na sala as condições de audição eram substancialmente diferentes, estando mesmo gravada uma voz, que não é identificável, a dizer que o assistente “estava mesmo a falar baixinho”, tendo o Tribunal pedido ao assistente AI para falar mais alto). Disse que a “primeira vez” que relatou ao Tribunal ter ido a (…), foi mesmo a primeira vez que foi a tal local; entre a primeira e a segunda vez que relatou que relatou ao Tribunal, não foi a (…); e depois desta segunda vez - perguntado se voltara a ir a (…) depois desta segunda vez, por qualquer outra razão, com alguém? disse - “…por qualquer outra razão não…, “……sem qualquer outra razão não estive mais em (…)….”, mas tendo acrescentado de imediato “… e quando fui fazer reconhecimento (…), …fui fazer o reconhecimento com os senhores Inspectores…”, tendo ido uma vez fazer um reconhecimentos. 13.3.15. E ligando com o que antecede, quanto ao reconhecimento que o AI fez de (…) e quanto ao reconhecimento que fez deste local, em comparação com outros reconhecimentos de locais que fez – e estamos nos a falar dos reconhecimentos que se encontram a fls. fls. 2.988; fls. 6.503; e fls. 5.939 -, o Tribunal analisou a forma como o assistente AI fez uns e fez outros. E isto relacionado com o seguinte. Aos três locais onde disse ter ido com o arguido A – ao barracão onde o arguido vivia na (...) (…) e que o assistentes dissera ao Tribunal saber que se localizava ao pé de um campo de futebol, que identificou, fls. 2.988; à “casa da (…)”, fls. 6.503; e a à “Casa de (…)”, fls. 5.939 -, o local onde, de acordo com a descrição do auto, aparenta maior facilidade de localização, é a casa localizada em (…). O assistente disse que a este local foi só (antes de este processo se ter iniciado) com o arguido A. A descrição que deu do local, no exterior, foi: “… tipo uma (...) assim… sem caminho…(…) é como se fosse uma (...) cortada (…), porque não tinha mais caminho para a frente…”. Se era uma (...) com prédios, com casas?, “… não….era de casas…tinha um descampado à frente….”. Soube que aquele local era (…) “…eu soube porque via as placas….”. Perguntado se quando lá foi a primeira vez ficou a saber que esteve em (…), disse que sim, “… não foi logo quando lá cheguei…foi ao vir-me embora…”. Na instância do Ministério Público continuou a prestar esclarecimentos quanto a diligências que fez de reconhecimentos a locais, concretamente os autos de fls. 2.988, 5.939, 6.502. O assistente lembrava-se de ter feito as diligências e começando pelo auto de fls. 2.988, esclareceu “…então … fui à Polícia Judiciária e disseram que... que íamos fazer um reconhecimento à... casa do Sr. A…aah... lembro-me de me ter enganado uma vez, porque a gente fazíamos um caminho um bocado diferente daquilo que eu fiz…lembro-me de me ter enganado uma vez, que não, não sabia em que direcção ia…mas fomos lá ter, rapidamente…”, dizendo que quando se enganou, foi o assistente que voltou a dar as indicações do caminho. O auto de fls. 5.939 foi exibido ao assistente e confirmou ser a sua assinatura. Descreveu a diligência, os caminhos que indicou em (…) até chegar à casa. Disse que foi o assistente que deu a indicação aos inspectores que foram consigo que era para ir pela auto estrada, mas não se conseguiu recordar se no reconhecimento tinham passado sobre algum rio, embora tivesse dito que sabia que tinham que passar a Ponte (…), pois tinham que ir “pelo (…)”. Nesta altura o Tribunal perguntou-lhe se se conseguia recordar se quando foi com o arguido A tinham passado por algum rio, mas não conseguiu (dizendo “... se não me consigo recordar do reconhecimento que foi há menos tempo, não...sinceramente não me recordo...”). (1) O Tribunal não deixou de se interrogar quanto à, como acima dissemos, aparente maior facilidade de localização da “Casa de (…)” (cfr. fls. 5.939), em relação aos outros locais que o assistente reconheceu. Mas quando uma das Defesas lhe pediu para fazer, por exemplo, a descrição do caminho para as (...) de “(…)” onde disse ter ido pelo menos 2 vezes – e aqui chamamos a tenção que o assistente chamou-lhes “(...) em (…)” e dissera, nas suas declarações, que no Verão de 1998 tinha ido para (…) e (…), no Verão de 1999 para (…),(…), no Verão de 2000 para (…) a trabalhar e (…) e no Verão de 2001 (…) e depois (…); mas de acordo com os elementos dos autos, concretamente de fls. 9, 11 ou 28 do Apenso DX, as (...) do lar do AI ocorreram em 1998/ (…),(…); 1999/ (…),(…),(…); 2000/(…); 2001/ (…) e (…) -, começa por descrever e indicar o caminho com aparente lembrança viva, mas a partir de certo momento começa a ter dúvidas. Para o Tribunal o discurso do AI, na descrição do caminho para “(…)”, bem como o sítio exacto onde era a (...), não foi nem quanto à estrutura, nem quanto à forma de descrever, muito diferente do que fez para (…). As referências foram dispersas em determinada altura e as idas a (...) no (…) ou a (…) (a que o assistente também se referiu), eram um facto reconhecido da vivência do assistente. No entanto, repetimos, não deixou de haver, de facto uma aparente maior facilidade do assistente a descrever o caminho para (…) em relação, por exemplo, à casa da (…). Mas analisados e avaliados outros elementos de prova – concretamente o depoimento das testemunhas YM, a “mãe de acolhimento” do AI, do qual não resulta conhecimento que o assistente alguma vez tenha ido a (…); e o depoimento das jornalistas CCN, IP e JJT -, não há indício que o assistente AI tenha ido a (…) com a comunicação social ou em outra altura que não fossem aquelas que disse ao Tribunal. O tempo que distancia entre o inicio do conhecimento dos factos deste processo – Novembro de 2002 – e o reconhecimento com a PJ, permitia que lá tivesse ido em alguma altura e que na AX não se tivessem apercebido, pois o AI continuou internado na Instituição. Mas não há indício que isso tenha sucedido. Mas a explicação para esta aparente maior facilidade de memória pode ser outra: a memória, à medida que vamos falando ou percepcionando uma ou sobre uma situação passada, vai evocando e trazendo recordações. No sítio, vendo, olhando, percepcionando, o assistente pode ter ido evocando, passo a passo, o caminho e ter conseguido efectivamente reconhecê-lo. Mas mesmo que a explicação não seja esta, mesmo que a certeza com que “chegou à casa” tenha sido diversa, não afasta a percepção que o Tribunal teve e que já descreveu, que o AI esteve no interior daquela casa. 13.3.16. Na sequência da descrição da diligência de reconhecimento a (…) o Ministério Público perguntou ao assistente se tinha dado alguma entrevista à comunicação social – disse que não; falou do contacto que uns jornalistas fizeram para casa da sua “família adoptiva”, a família de acolhimento e da recusa da sua “mãe adoptiva”, de acolhimento mas acrescentando que mesmo ele não quis dar qualquer entrevista, o que foi confirmado pela testemunha YM, como atrás já descrevemos -, e disse que não foi a (…) com qualquer jornalista. Tinha ido exclusivamente com a Polícia judiciária. Foi nesta altura que o Ministério Público perguntou ao assistente se, então, ao todo tinha ido três vezes a (…) e em que o assistente responde: (Juíza Presidente) – Tanto quanto se lembre, em toda a sua vida e do que se lembre, quantas vezes é que foi a (…)? (AI) – (pausa, suspira) ... as vezes que me lembro?... Eu ontem referi que tinha ido duas vezes... Verdade?... Ontem referi que tinha ido duas vezes. (Juíza Presidente) – Quantas vezes é que se lembra de ter ido a (…)? (AI) – “Tou” a raciocinar... (Juíza Presidente) – Pronto, então raciocine e responda. (AI) - ... (pausa, suspira)... todas as vezes que me lembro, foram quatro vezes. (juíza Presidente) – Quatro vezes a (…)? (AI) – Exacto. (Juíza Presidente) – Então quando é que foi para eu ficar, eu Tribunal … para ficarmos esclarecidos. Quando é que foi a primeira vez, a segunda, a terceira e a quarta? (AI) – A primeira vez foi quando... foi quando fui a primeira vez com o Sr. A... depois foi quando fui outra vez com o Sr. A...só que houve uma vez que eu não referi no Tribunal porque... pensava que só se "tava" a relacionar ao Sr. H e... prontos, a ida mais, as idas mais, mais importantes....eu não relatei uma ida que fui… não foi por esquecimento, foi porque pensava que não era tão... como é que eu hei-de explicar?... nem eu sei. (Juíza Presidente) – Tente saber, porque agora o Tribunal quer que o senhor explique. (AI) – Claro, claro...não...mas é, não sai a palavra... (...)(AI) - ...Pensava que era...aah... tão importante... (Juíza Presidente) – Portanto, foi uma primeira vez com o Sr. A. Falou ao Tribunal a segunda vez com o Sr. A. Que foi mais uma vez que não disse … (com a justificação que agora disse). E outra vez quando é que foi? (AI) – Foi com os agentes da Polícia Judiciária. (Juíza Presidente) – E essa vez que não disse ao Tribunal no dia de ontem e eu perguntei-lhe quantas vezes é que o senhor tinha ido a (…) por qualquer outra razão, essa vez que não disse ao Tribunal com quem foi, o que é que foi fazer? (AI) – Fui com o Sr. A também...aah ... mas não “tive” com o Sr. H...tive com um outro, uma outra pessoa que não se encontra na sala....” Esclareceu que essa terceira vez foi com adulto que nada tem a ver com os arguidos que estão a ser julgados, foi depois das duas vezes que relatou ao tribunal ter estado com o arguido H. O assistente explicou porque no dia anterior não tinha referido esta terceira vez, a sua explicação estava relacionada com o facto de ter pensado que o tribunal só lhe estava a perguntar sobre as idas relacionadas com o arguido H que estava a ser julgado, explicação esta que atenta a dinâmica das suas declarações e da justificação, o tribunal considerou plausível. Acresce que a investigação quanto a circunstâncias concretas desta terceira vez estava fora do objecto deste processo, não tendo o Tribunal retirado desta omissão um desvalor de não credibilidade ou de falta de veracidade, do relato que o assistente tinha feito quanto às primeiras duas idas a (…) que tinha contado ao Tribunal e que estão em julgamento. 13.3.17. Introduzimos, agora, as declarações do arguido A quanto aos factos passados com o assistente AI na “Casa em (…)”. O arguido A (na audiência de julgamento 15/12/05, após ter ouvido as declarações do assistente AI ) e como já dissemos, confirmou ao Tribunal ter levado o assistente AI a uma casa na (…) e a (…). O seu discurso foi idêntico ao das demais situações, não levou por qualquer combinação que tivesse feito directa ou indirectamente com os arguidos, foi dar boleias pedidas pelos jovens. Quanto a, em concreto, (…) (nesta audiência de julgamento 15/12/05) disse que, que se lembre, levou o AI duas vezes, com mais colegas. Disse da primeira vez terão idos uns quatro colegas - justificando que iam mais 4 do ténis, depreendeu-se das suas declarações um transporte que ia fazer e ao todo eram oito, ficando 9 pessoas com o arguido, a lotação da carrinha - e da segunda terão ido seis ou sete. Disse que “desta” 1ª vez que levou o AI “viu “ todos os arguidos, menos o arguido C e reconta uma situação que já contara anteriormente, relacionada com o assistente AP e dando a ideia, no início desta parte das suas declarações, que se estava a referir a essa vez em que levou o AI (conta a situação em que disse ter visto a arguida Q cumprimentar com beijinhos o assistente AP e um segundo, aqui não se lembrando muito bem quem era). Referimos que quando o arguido começou a prestar declarações quanto à vez em que levou o assistente AI a (…) e a relatar quem viu ou quem não viu, como é que foi, relata dando a ideia, no início desta parte das suas declarações, que se estava a referir a essa vez em que levou o AI. Mas pelo seu relato concluímos que o arguido estava a reproduzir o que já tinha dito, quanto às vezes que tinha ido a (…) com os assistente AV, AP, AT ou Y. E concluímos isso pela estrutura do relato, pois diz que viu “todas as outras pessoas lá” (arguidos), menos o arguido C, preocupação que foi constante ao longo das suas declarações, com excepção em Novembro de 2008, quando prestou declarações já estava o processo em fase de Alegações. Volta a falar de uma pessoa “EV”, que associou anteriormente às idas a (…) com os assistentes AP, AV, AT e Y. Mas quando relata que levou o AI – refere duas vezes, “se não se engana” - diz que da primeira vez foi com mais 4 colegas e da segunda 6 ou 7 (dizendo de novo, “que eu me lembre”), mas da dinâmica do discurso do arguido A neste dia, o Tribunal interpretou as declarações do arguido como o AI ter ido com outros colegas que o arguido não identifica (o que quer dizer que não identificou como AV, AT, AP ou Y, por exemplo). Dá assim a ideia - na confusão do que foi, é inegável, algumas vezes a estrutura das suas declarações -, o AI não foi sempre com os outros assistentes que agora mencionámos. E isto - dentro desta confusão que aparenta esta parte das declarações do arguido A - faz sentido com as declarações do assistente AI, pois este também não consegue identificar os colegas com que foi a (…), como os já referidos assistentes nestes autos. O Tribunal perguntou-lhe (ao assistente AI) se não os tendo identificado na altura se os reconheceu mais tarde, pergunta que tinha, para nós, implícitos dois sentidos: (i) sob a perspectiva da criação de uma história - mas lembramos que nesta altura do julgamento a linha das Defesas ainda não era, de forma tão nítida como a que veio a ser adoptada nas alegações, isto é, a criação de uma história, pelo menos, por AV, AP e a que outros, consciente ou inconscientemente aderiram, entre os quais estava AI , mas era a da criação de uma história através da manipulação ou concertação de depoimentos, com origem na investigação do processo e que levou à incriminação dos arguidos -, era relevante saber a resposta do assistente, pois a mesma poderia permitir o despistar de indícios de uma concertação; (ii) sob a perspectiva da verdade dos factos, podia acontecer que, no decurso do processo ou posteriormente às idas a (…), o assistente os tivesse vindo a reconhecer ou conhecer. E, aqui, introduzimos as declarações do assistente. (Quanto ao conhecimento de demais assistentes) O assistente disse que conhece o AN, o AG, o AT (AT), são seus amigos e veio a conhecer o AP, descrevendo as circunstâncias em que os conheceu. O AV conheceu-o quando foi transferido para o Lar de CZ e quando o conheceu este já trabalhava, não era aluno, fazendo a referência aos transportes Urbanos, como local de trabalho do AV (cfr. audiência de julgamento 5/12/2005). O AP conheceu-o num almoço promovido pela Senhora (...)a, Sra. Dra BP. Disse que como aluno interno nunca conheceu o assistente AP (cfr. tb audiência de julgamento 5/12/2005). Quanto ao AN conheceu-o quando foi para CZ, tendo respondido que antes desta altura - e como vimos o assistente AI foi para o Lar no CZ, saindo do BF, na sequência de um Despacho de Julho de 2002 - não se lembrava de ter estado anteriormente em algum lugar com o AN. A instâncias da Defesa do arguido C disse que o AT (“(…)”) conheceu-o na Paiã, no segundo ou terceiro ano que estava lá, “… ele entrou para o primeiro ano e aí começámos a dar como amigos… a partir daí”. Y conheceu-o quando entrou para o FD, foi um dos colegas com que se começou a dar. Quanto a CG, disse ser um “grande amigo” seu. AA também é seu amigo Na audiência de julgamento - cfr. audiência de julgamento 5/12/05 e em diferentes instâncias -, o Tribunal perguntou ao Assistente, face a declarações que já tinha prestado anteriormente, se tinha encontrado AP, AV, AN, AG, AT “(…) - que como resultou da audiência é o assistente AT - em algum local dos que descreveu ter ido com o arguido A e disse que se lembrasse que não. Acrescentou tenho “quase a certeza” que não. Esta resposta foi no mesmo sentido da que já dera anteriormente, embora pudesse ocorrer que no decurso deste processo ou mesmo no decurso do julgamento, o assistente entretanto tivesse tido memória de alguma coisa neste sentido, que anteriormente não tivesse conseguido recordar. Esclareceu que com o AN e com o AG, falava às vezes “por alto” sobre os factos que estivera a relatar ao Tribunal e esclareceu que “achava” que isto foi quando “se começou a ir à Polícia judiciária”. Perguntado quando dizia “falava muito por alto” o que é que queria dizer e em concreto do que é que falou(?), respondeu “…então, a gente perguntávamos quem é que estava metidos…(…) perguntávamos uns aos outros se tínhamos ido à Polícia Judiciaria prestar declarações sobre o processo… e coisa mínima, mesmo.” O Tribunal perguntou se tinham dito uns aos outros o que é tinha sucedido a cada um disse “…não….a gente nunca falava sobre isso...”. Mas completando na dinâmica do seu discurso - quanto a se não falaram sobre o que cada um tinha dito à Polícia Judiciária, primeiro responde “…não, por acaso não, que eu me lembre, não….” - que conversavam “…quando estávamos sozinhos, quando estávamos assim ou no quarto, ou na sala…”, mas que não conversavam sobre o que tinham dito ou sobre os pormenores - a pergunta que em concreto lhe foi feita foi “ e porque é que não entravam em pormenores? Se já toda a gente falava nisto …os senhores tinham todos ido à PJ prestar declarações e entre vocês não falavam em pormenores porquê?” - porque “…não gostávamos de falar nisso.”. Se o relato do assistente fosse criado, no meio de tanto esclarecimento essa “invenção” potenciava que, naturalmente, pudesse misturar algum dos demais assistente na sua vez em que foi a (…). Até porque poderia pensar que isso lhe dava consistência. Mas não, mantém a sua versão, o que, aliada à singularidade de manter a sua referência que foi a (…) num dia de semana, declaração que foi sempre coerente e contínua ao longo de todas as vezes em que foi perguntado, o Tribunal criou a convicção que o assistente esteve a descrever uma ida a (…), que não corresponde às idas que os demais assistentes descreveram. Mas não tendo o Tribunal, face ao que foram as declarações do assistente e a contradição com as do arguido A, dado como provado qual o dia concreto em que os factos ocorreram. 13.3.18. O Tribunal perguntou ao Assistente quando é que soube que o senhor que lhe abrira a porta ou a senhora que disse ter visto a passar uma das vezes quando estava na sala, se chamavam, respectivamente , “Sr. N e Srª Dª Q?”, tendo respondido: “…da Srª Q foi pela comunicação social, não fazia a mínima ideia do nome da senhora …do Sr. N foi quando… quando fui à PJ, quando fui à Polícia Judiciária fazer, quando fui fazer declarações….”. O Tribunal perguntou-lhe se o nome da “Srª Dª Q pela comunicação social” foi antes de ir prestar declarações, ou quando foi prestar declarações “já sabia?”, tendo respondido “… não….não estou… não estou a… como é que hei-de explicar?...inteirado no tempo….”. Perguntámos, também, se tinha falado destes factos com alguém, se antes do processo ter começado, antes do assistente ter começado a ouvir falar neste processo e antes de ter ido à Polícia Judiciária, se tinha falado sobre o que estivera a contar ao Tribunal e o assistente respondeu “…não, simplesmente contei que… que tinha ido prestar declarações à minha família adoptiva….” E quando foi prestar declarações. (1) Na dinâmica do que antecede, passamos a descrever e analisar a situação que se passou na instância do Ministério Público, a qual foi particularmente relevante para o Tribunal, para a avaliação da credibilidade e da veracidade do que o assistente esteve a relatar ao Tribunal. Foi perguntado ao assistente - em instância sugerida pelo Ministério Público e em relação à arguida Q -, dado que tinha dito ao Tribunal tê-la visto de relance na casa de (…), se o reconhecimento que disse ter feito da arguida “ foi por aquela vez em que diz tê-la visto de relance”, ou se foi pelo reconhecimento de alguma fotografia que lhe veio a ser exibida ou que tenha visto na comunicação social. Nesta altura o Tribunal disse ao assistente para responder, perguntou-lhe se já tinha olhado para a senhora que estava no Tribunal a ser julgada, o assistente respondeu que não, olhou e o Tribunal perguntou-lhe se tinha ideia da arguida assim ou com uma aparência diferente. O assistente fez uma pausa e respondeu “tenho a certeza”. E explicou que tinha a certeza da seguinte forma: “…aaah…porque primeiro... o, quando a gente, quando távamos no ... quando távamos na sala ouvia-se, ouvi uma senhora a falar…(…), e aquela casa tinha só homens. Depois vi a senhora, vi uma senhora a passar e... quando começou o processo a passar na comunicação social... a primeira vez que vi…tive a certeza que... que era a senhora da casa de (…)….”. O Ministério Público continua a sugerir esclarecimentos quanto ao reconhecimento da arguida - órgão de comunicação social em que o assistente a tinha visto -, razões pela qual tinha a certeza e o assistente foi sempre respondendo. Passamos a transcrever o que se passou de seguida, pois vamos partir deste “momento” para explicar o que fez o Tribunal criar convicção de veracidade quanto ao que foi relatado pelo AI: (Procurador) – ... Srª Drª, relativamente agora à arguida Q, eu ontem confesso que não, ... não percebi bem se o reconhecimento que o assistente diz ter feito, embora de relance, da arguida... se foi por aquela vez em que diz tê-la visto de relance... ou se foi pelo reconhecimento que depois foi, pelas fotografias, enfim, que foram exibidas, ou pela comunicação social?... Se tem a certeza hoje, uma vez que a arguida Q está aqui, se a pessoa que viu de relance daquela vez, é a senhora que está aqui? (Juíza Presidente) – Pode responder... Já olhou para a senhora que está aqui sentada a ser julgada? (AI) – Não. (Juíza Presidente) – Srª D. Q, vou pedir o favor de se... exacto... eu até já tinha pedido ao Sr. N para ficar um pouco para trás. (AI) – Tenho a certeza. (Juíza Presidente) – Tem a certeza? E porque é que tem a certeza? (AI) – aah... porque primeiro..., quando a gente, quando “távamos” no... quando “távamos” na sala ouvia-se ... ouvi uma senhora a falar. (Juíza Presidente) – Sim. (AI) – E... aquela casa tinha só homens...depois vi a senhora, vi uma senhora a passar e... quando começou o processo a passar na comunicação social... a primeira vez que vi, tive a certeza que... que era a senhora da casa de (…). (Juíza Presidente) – E lembra-se qual foi ou...(...) se foi em alguma reportagem na televisão ou se foi em alguma fotografia no jornal, que diz ter visto a primeira vez essa senhora na televisão? (AI )- ... eu não sigo muito, muito aah... o processo pela televisão, porque sinto-me mal... mas se foi, foi pela televisão...se foi. (Procurador) – Srª Drª, se recorda de alguma vez, das vezes ou da vez que diz ter visto a arguida Q na televisão, se alguma vez a viu com a cara completamente descoberta? (Juíza Presidente) – Alguma vez... lembra-se de alguma vez numa reportagem na televisão ter visto a Srª D. Q de cara descoberta?... Ter visto a sua cara na tele ... sua da Srª D. Q, na televisão? (AI) - ...Não...não me lembro. (Juíza Presidente) – Não se lembra? ...e em alguma fotografia no jornal ou numa revista, lembra-se de ter visto a cara da senhora? (AI) – Como eu já tinha dito, eu não sigo muito o processo pela comunicação social. (Procurador) – Srª Drª, mas eu peço ao... (Juíza Presidente) – Mas disse, mas quando a viu na comunicação social ... (AI) – Sim, sim. (Juíza Presidente) – ... que teve a certeza que era a senhora, por isso... (AI) – Sim, sim...eu disse isso. (Procurador) – Srª Drª, mas então eu insisto, para se poder ter a certeza é preciso ver uma cara. Por isso é que eu perguntei como perguntei: se viu ou não, alguma vez a cara da arguida Q a descoberto? (Juíza Presidente) – Portanto, na televisão já disse que não. E eu perguntei-lhe: em alguma reportagem, alguma fotografia, numa revista ou num jornal? (Procurador – Oh Srª Drª, eu posso... (Juíza Presidente) – Eu faço a pergunta... faço-lhe antes uma outra pergunta: quando diz que viu a Srª D. Q em (…)... (AI) – Sim. (Juíza Presidente) – ...lembra-se de a ter visto e que viu de passagem. Viu a cara da senhora de frente, de ter olhado? Ás vezes há “de passagem” mas as pessoas conseguem olhar uma para a outra apesar de ser de passagem...ou lembra-se de ter visto a senhora de lado, a passar de um sítio para o outro? (AI) – Vi a senhora de perfil. (Juíza Presidente) – De perfil? (AI) – De perfil. (Juíza Presidente) – E que ideia... e se eu lhe .. e pedindo-lhe para descrever qual era a recordação que tinha, que recordação é que podia dar dessa pessoa, que recordação é que pode dar? (AI) - ...Uma recordação muito vaga, "memo". (Procurador) – Muito bem. (Juíza Presidente) – Mas mesmo sendo vaga, qual era o elemento que o senhor reteve na sua memória para lhe permitir recordar a senhora? (AI) - ... ... (Juíza Presidente) – Houve alguma particularidade, alguma... algum aspecto dessa pessoa?... (Procurador) – A Srª Drª permite-me que eu concretize um aspecto? Dentro do que a Srª Drª está a perguntar, eu não quero induzir, Srª Drª, a idade, por exemplo? (AI) – Idades? Idades não é comigo...não... (Juíza Presidente) – ... Sr. Procurador é difícil. Mantendo o que eu lhe tinha pedido: alguma particularidade? Quando pensava nessa pessoa... qual, qual era a característica ou qualquer coisa que fizesse lembrar essa pessoa? (AI) - ...(suspira)...Uma característica?... ( Juiz (...))– Oh Sr. AI! (AI) – Diga. (Juiz (...)) – O senhor disse... disse agora que tinha uma vaga ideia da pessoa. (AI) – Sim. (Juiz (...)) – Não é? Mas quando olhou para a senhora diz que não tem dúvida nenhuma. (AI) – Sim, sim. Eu sei, eu sei. (Juiz (...)) – Há aqui uma contradição. Tenho uma vaga ideia. Depois olha para a pessoa, não tem dúvida nenhuma? Porquê? (AI) – Primeiro:... eu era um miúdo, e normalmente, as pessoas mudam, conforme o tempo. (Juiz (...)) – Sim. (AI) – E se formos a ver o, o tempo já passado, quando eu fui a (…), a contar com agora, provavelmente a senhora... pode não “tar”... tão igual como era antes. (Juiz (...)) – Mas não teve dúvida nenhuma? (AI) – Não. Olhei de perfil, primeiro…eu decorei foi de perfil, não foi... assim de... de frente. (Juiz (...)) – Sim. E porque é que teve necessidade de ir buscar a televisão e jornais? Se a pessoa em questão, eventualmente, será está que está aqui em presença? (AI) - ...Eu (Juiz (...)) – Diz que a viu na comunicação social. (AI) – Sim. É assim, eu de manhã eu... saio sempre, tipo, vou sempre fora da escola…e tenho uma mania que é sempre ver os jornais…a capa dos jornais. (Juiz (...)) – Sim... E alguma vez viu a senhora, esta senhora de perfil nos jornais? Ou de frente? Com a cara descoberta? (AI) - ... (suspira e pausa)... (Juiz (...)) – Diga só do que se lembra. O senhor quando olhava para as capas dos jornais e via a fotografia da senhora, o que é que lhe vem imediatamente à ideia? (AI) – O que é que me vem imediatamente à ideia? A casa de (…). (Juiz (...)) – Não, em relação à pessoa. (AI) – Ah! Em relação à pessoa… (Juiz (...)) – Imagine que está em frente a uma dessas bancas que esteve, com os jornais ex(...)s e vê lá a senhora que diz identificar em (…), que diz estar em (…), o que é que lhe vem à ideia?... Se é que lhe vem alguma coisa à ideia. Se não lhe vier nada à ideia, o senhor diz, pura e simplesmente, não me vem nada à ideia. (AI) – Sim. Não…eu “tou”... o que me vem à ideia é uma senhora na casa de (…)… como “tá” ligado, entre aspas. (Procurador) – Oh Srª Drª, dá-me licença? (Juíza Presidente) – Mas já agora peço-lhe um outro um esclarecimento prévio, que há pouco não me conseguiu responder ou pelo menos eu assim o não consegui perceber. Lembra-se, em algum jornal, de ter visto esta senhora, a Srª D. Q, fosse de perfil ou fosse de frente? Ter visto uma fotografia da senhora em algum jornal?... Jornal ou revista... Lembra-se de alguma vez isso ter acontecido? (AI) - ...Se vi no jornal, foi "memo" assim de repente. (Juíza Presidente) – Mas mesmo de repente, tem a certeza de alguma vez ter visto a senhora? (AI) - ... (suspira, pausa)... (Juíza Presidente) – Portanto, ter visto aquela senhora que diz lembrar-se da casa de (…)? (AI) – Sim (Juíza Presidente) – Não é se… já não é a pergunta se alguma vez se lembra de a ter visto de frente, de cara descoberta. Não é isso. Se alguma vez se lembra de ter visto uma fotografia desta senhora, da senhora e que o senhor identifica como sendo essa senhora da casa de (…)? Nos jornais ou em revistas? (AI) – Eu penso que sim. (Juíza Presidente) – Pensa que sim?... Em relação a esta questão (imperceptível)? (Procurador) – Sim, Srª Drª. Oh Srª Drª, se quando viu de relance, a pessoa que diz ter visto na casa de (…), quem é que pensou que era esta senhora? (Juíza Presidente) – Pode responder, caso tenha pensado alguma coisa. (AI) – Por acaso... não, não pensei nada. (Procurador) – Se alguma vez pensou que ela pudesse ali ou que tivesse a ver com aquela casa? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) – Nunca me passou pela ideia. (Procurador) – Então essa ideia que no momento não lhe passou pela cabeça... ter-lhe-á passado pela cabeça quando viu as tais notícias na comunicação social e fez então a associação, não porque se recordasse da cara, mas porque ela era apres, a Srª D. Q era apresentada como a dona da casa de (…)? (Juíza Presidente) – Está a compreender a pergunta? (AI) – Mais ou menos. (Procurador) – Ou seja, eu vi uma pessoa, uma senhora, creio que a única senhora que o assistente referiu até agora, na casa de (…). Vi-a de relance. Vi-a só assim de perfil e por um momento... A certa altura aparece na comunicação social uma senhora, que a comunicação social, de quem diz o nome e que diz é a proprietária, é a dona da casa de (…). Se o que aconteceu foi, ou não, o assistente, esta senhora é a dona da casa de (…), foi a única senhora que eu lá vi, então a senhora que eu lá vi é esta senhora D. Q. (Juíza Presidente) – Compreendeu? (AI) – Compreendi. (Procurador) – Pode ter sido isso que aconteceu? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) – Deve ter sido isso que aconteceu. (ocorre reacção de arguidos) (Juíza Presidente) – Os senhores arguidos não se manifestam e o senhor arguido N não se manifesta dessa forma numa altura que eu acho que é essencial para uma das arguidas, para um dos arguidos, nomeadamente a Srª D. Q. O senhor tem consciência da importância do que está aqui a ser feito neste momento e que o Tribunal tem sempre que o fazer e o Sr. Procurador tem o dever, e por isso fá-lo, em relação a todas as situações. E o senhor sabe-o por formação profissional. Alguma pergunta em relação a esta questão? (Procurador) – …Srª Drª, posso pedir um intervalo? (Juíza Presidente) – Eu ia fazer um intervalo, Sr. Dr.. Uma pergunta ainda? (Juiz (...)) - Só uma. (Juíza Presidente) – Só uma pergunta ainda. O Sr. Dr. vai-lhe fazer ainda uma pergunta em relação a esta questão. (Juiz (...)) – Para acabar esta, Sr. AI, vamos lá ver. Nós não queremos aqui jornais, nem televisões, nem nada disso. O senhor tem que olhar para a pessoa que está aqui na sua presença, olhar bem para ela e saber se é a mesma pessoa que viu em (…), ou não. Se foi à banca de jornais, se viu fotografias nos jornais, de cara tapada, de cara descoberta, isso para aqui não interessa. O que interessa para aqui é se o senhor olhando para esta pessoa, é a mesma que estava em (…). Na casa de (…). É isso que lhe pergunto. E o que é que o senhor responde? (AI) – Que fiz uma associação quando vi. (Juiz (...)) – Fez uma associação...? (AI) – Quando vi. (Juiz (...)) – Quando viu agora? (AI) – Exacto…e anteriormente. (Juiz (...)) – E quando diz fiz uma associação, quer dizer que...? (AI) – Associei a Srª D. “Q” à pessoa que vi na casa de (…), quando vi nos jornais. (Juiz (...)) – Pronto. Mas deixe lá os jornais. Os jornais não interessam. O senhor quando diz que associou, quer dizer o quê? Diz que associou à casa de (…). (AI) – Sim. (Juiz (...)) – Associar à casa de (…) é...? Que estava na casa de (…), ou que estava fora? Ou... (AI) – Que estava lá na casa de (…). (Juiz (...)) – Foi a pessoa que viu dentro da casa de (…)? (AI) – Sim. (Juiz (...)) – Sem dúvida nenhuma? (AI) - ...(pausa e suspira) (Juiz (...)) – Esta pergunta é muito importante e a resposta igualmente. Mais a resposta que a pergunta. …(pausa do assistente sem resposta)… Está? Não tem dúvida nenhuma? (continua pausa do assistente) (Juíza Presidente) – … ou associou, em complemento ao que o Sr. Dr. está a perguntar, essa associação que fez foi por não ter dúvida que a cara da senhora era aquela ou pergunto de novo, ou associou porque era uma senhora e porque viu uma senhora em (…)? (AI) - ... (suspira e continua pausa)... (Juíza Presidente) – … o que verdadeiramente o senhor sente …o que verdadeiramente pensa. Compreende Sr. AI? (AI) – Compreendo. (Juíza Presidente) – Porque é isso que o Tribunal lhe pede. (AI) – Eu sei. (Juíza Presidente) – …neste momento. E é importante que responda ao que efectivamente se passou consigo, se passou no seu interior, se passou na sua mente. (AI) - .... Eu … é assim: se tiver alguma dúvida sobre aquilo que agora disse, é muito mínima. (Juíza Presidente) – Se tiver alguma dúvida? (AI) – É mínima. (Juíza Presidente) – Sobre quê? (AI) – Sobre a D. “Q”. (Juíza Presidente) – Sobre ser esta senhora? (AI) – Sim. Se tiver é mínima. (Juíza Presidente) – E se tiver essa dúvida muito mínima é porquê?... Porque é que tem receio ou porque é que pensa que pode ter uma dúvida muito mínima? (AI) – Por só a ter visto de passagem. (Juíza Presidente” – Srs. Drs., vamos interromper cinco minutos a audiência neste momento.”. Quando o assistente AI estava a responder a esta interpelação, a sua voz é acabrunhada, as respostas são dadas após pausas, por vezes respira fundo antes de responder, tendo sido perceptível para o tribunal que o assistente se apercebeu que estava numa situação de confrontação. Por exemplo, quando a dada altura respondeu que vira a arguida Q “de perfil”, di-lo baixo, com uma voz pensativa. Quando responde qual era a recordação que tinha da senhora, pensa e responde “uma recordação muito vaga”, vendo-se que o diz com dificuldade, pois fica em silêncio, primeiro pensa e só depois responde. Foi perceptível para o tribunal, face à forma como se desenrolou a dinâmica das perguntas e das respostas nesta altura, que o assistente estava aflito e tinha dificuldade em exprimir o que queria dizer. Mas se fosse aflição por estar a mentir, o mais natural era ter arranjado uma desculpa, ou “atirado”uma resposta, até porque o que lhe estava a ser perguntado era o “ que é que lhe vinha à ideia “ em relação à arguida e a casa de (…) e responde, com a expressão de quem está a tentar exprimir o que estava mesmo a pensar , “ o que me vem à ideia é uma senhora na casa de (…)”. Quando explica qual era a “dúvida” que tinha em relação à identificação da arguida - e não era fácil responder nas circunstâncias em que o estava a fazer, como se depreende da dinâmica do discurso -, esforçou-se por explicar e exprimir o sentido dessa dúvida. E quando passa a prestar esclarecimentos ao Tribunal, num momento em que lhe é apontada uma “contradição” no que estava a dizer, a justificação que dá é - para o Tribunal - com o sentido de se justificar de não “saber” responder melhor do que estava a fazer. E aqui fala dos jornais, não se esquiva a mencionar o que via e como via na comunicação social. Continuou a ser perceptível a aflição em responder e explicar e esta dificuldade, a entoação da voz, as pausas, tiveram um sentido para o tribunal. Viu-se que o assistente debateu-se entre uma “impressão forte” que tinha, de que a arguida Q é quem viu em (…) e uma dúvida que lhe fica, depois de ter sido confrontado com o “elemento comunicação social”, introduzido naquela altura pelo Ministério Público. Aqui retrocedemos um pouco. A primeira descrição do assistente, quanto à memória da arguida Q foi linear: “…aaah…porque primeiro... o, quando a gente, quando távamos no ... quando távamos na sala ouvia-se, ouvi uma senhora a falar…(…), e aquela casa tinha só homens. Depois vi a senhora, vi uma senhora a passar e... quando começou o processo a passar na comunicação social... a primeira vez que vi…tive a certeza que... que era a senhora da casa de (…)….”. Quando o Ministério Público introduz o “elemento perturbador” comunicação social - elemento que, para algumas Defesas é a génese e/ou a fonte de uma “história” que alguns assistente criaram em relação ao arguidos; e a que o assistente se tinha referido nos termos que antecedem - , o assistente fica com a noção que a impressão forte que tinha em si, quanto à certeza da arguida, pode ser pelo que viu ou ouviu na comunicação social. E, em frente ao tribunal, prefere ceder e expor-se a dizer que tem dúvida, que pode ter feito uma associação, porque só viu a arguida de passagem. Quando está a ser interrogado, interrogatório esse que vai aumentando progressivamente a ampliação da memória que está a tentar reproduzir, o assistente não consegue “ver” na sua memória a cara da arguida, só a consegue ver de “passagem” e revela-o e di-lo ao tribunal. O significado, para o Tribunal, é que o assistentes estava a falar com verdade quer quanto à “impressão forte que tinha”, quer quanto à dúvida que o contra interrogatório lhe tinha criado e preferiu expor-se e responder com verdade, apesar de termos percebido que tinha a noção de que era uma fragilidade para si . Isto porque, entre o mais, tinha ouvido a forma como o arguido N se manifestara durante as suas declarações - tanto que o tribunal teve a intervenção que acima reproduzimos, quanto à necessidade de o arguido se conter, pela fragilidade da situação -, era impossível que pelo menos mesmo infimamente isso não o tivesse perturbado e mesmo assim AI expôs-se. E aqui cruzamos com o que foi possível extrair das referências que constam no seu processo psicossocial ou no seu processo individual – cfr. Apenso Z-15, Volume 1º; e Apenso DD -, quanto ao que foi a sua maneira de ser e crescimento dentro da AX e a personalidade que aí foi revelando: o AI era um educando que gostava de agradar aos adultos, era apelativo. Em audiência podia-se ter agarrado a alguma pergunta do Tribunal, como “ajuda” para se proteger, mas expôs-se. Com o que vimos e como ouvimos, não conseguimos configurar que naquele momento de tensão – e a reprodução do diálogo havido demonstra-o de alguma forma -, aquela pessoa que estava ali, com o percurso de vida, escolaridade e perfil que lhe foi traçado, com o percurso que de forma circunstanciada e com recurso a documentos atrás descrevemos, tivesse a capacidade de raciocinar, editar e escolher a forma como se apresentou perante o Tribunal. Para o Tribunal correspondeu, efectivamente, a uma expressão do que estava “a ser” por dentro. 13.3.19. Mas quanto a dúvidas ou questão relacionada com identificação de arguidos, passamos a analisar uma outra situação ocorrida nas declarações do assistente, em relação ao arguido E. Em audiência de julgamento (AJ de 30/11/05) o assistente, respondendo ao Ministério Público, referiu-se ao arguido E, o qual até ali ainda não tinha mencionado como tendo estado presente em qualquer local dos por si descritos. Assim sigamos a dinâmica da inquirição: (Procurador) – Srª Drª Juíza, como eu dizia há pouco, o assistente até agora referenciou seis dos sete arguidos. E excluindo, como eu também dizia, as situações de comunicação social ou aqui mesmo, se em alguma situação o assistente se recorda de ter visto o arguido E? (Juíza Presidente) – Compreendeu a pergunta? (AI) – Compreendi. (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) - ... Não... (Juíza Presidente) – Sabe que é o Sr. E? (AI) – Sei, sei. (Juíza Presidente) – Aqui na sala está sentado em que lugar? (AI) – No segundo a contar... (Juíza Presidente) – Portanto, a seguir a que senhor? (AI) – Ao Sr. C. (Juíza Presidente) – então pode responder. (AI) – Lembro-me de o ter visto, de ter visto o Sr. “(…)”... “(…)”... fogo...aah... uma, um dia em (…). (Procurador) – E Srª Drª... (Juíza Presidente) – Quando é que foi esse dia e em (…) em que local? (AI) – Na casa, na casa de (…). (Juíza Presidente) – E quando é que isso foi? (AI) – (pausa/suspira) Não me recordo bem se foi no primeiro, segundo... (Procurador) – Srª Drª... se pode garantir que era o arguido E, ou se o está a dizer tendo alguma dúvida relativamente à identidade do arguido E? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) – Tenho uma pequena dúvida. (Juíza Presidente) – Tem...? (AI) – Tenho uma pequena dúvida. (Juíza Presidente) – E porquê? (AI) – Não tenho bem a certeza. (Juíza Presidente) – E porquê Sr. AI? (AI) – Porquê?... ... É porque na casa de (…) havia vários adultos, não é verdade? E... os adultos que eu vi... não tenho bem a certeza, pelo menos de um, se é o Sr. E. (Juíza Presidente) – Porque é que não o, não referiu este nome anteriormente? Quando eu lhe perguntei sobre as pessoas que viu na casa de (…) e as que tivesse identificado ou conseguido identificar posteriormente, o Sr. E o senhor não referiu. (AI) – Não tinha a certeza. Por isso mesmo. (Juíza Presidente) – E porque é que mesmo não tendo a certeza não o disse ao Tribunal? (AI) - ...Porque, primeiro, pensei que "tava" a falar das pessoas que eu tinha a certeza que tinha visto lá e como eu não tinha a certeza do Sr. E... (Juíza Presidente) – Pode prosseguir Sr. Procurador, por ora. “ Uma primeira referência que se impõe, é que em circunstância alguma o Tribunal, pelo menos conscientemente, tomou qualquer atitude de evitar a confrontação de algum assistente com incongruências ou inconsistências que as suas declarações aparentassem. Teve sempre presente que a protecção de qualquer um dos declarantes - assistentes ou arguidos -, enquanto tal, passava por garantir o respeito pela sua dignidade como pessoas e não por protegê-los - e aqui voltamos a dizer, assistentes ou arguidos - de situações em que pudessem ser ex(...)s a fragilidades do discurso ou da atitude. Mas isto liga-se a uma outra questão e que também não podemos deixar de ter sempre em perspectiva. É que nos presentes autos está em causa a prova e a decisão da prova, quanto à prática de crimes de abuso de natureza sexual em menores, em menores de 14 anos (na altura do abuso) e institucionalizados. Esta é uma realidade que, na avaliação e ponderação da prova concreta que foi produzida nesta audiência de julgamento, significa, pelo menos, ter em consideração a perspectiva do abusador e a perspectiva do abusado: não só quem pratica estes factos procura fazê-lo de forma que não seja - ou mesmo nunca seja - descoberto; são factos, tal como se encontram descritos no Despacho de pronúncia e tal como o Tribunal deu como provado (e na medida em que o deu) , praticados em local privado e em que os assistentes são levados a esse local (não é, por exemplo, uma situação em que são os próprios autores que vão a um local público, conhecido por ser um local de prostituição e expondo-se a serem mais facilmente vistos, contactar menores para práticas sexuais e levando-os para outros locais); e resulta dos textos científicos, nesta área de crimes de natureza sexual sofridos por menores, que as vítimas de crimes sexuais tendem a não verbalizar o que sucedeu, remetem-se a silêncios, defendem-se da situação traumática que viveram e quando falam sobre o que se passou, fazem-no por vezes com retalhos de memória selectivos. Mas isto, também sempre, sem perder de vista o que é a linha de Defesa e de afirmação de alguns arguidos: é que independentemente de os assistentes terem sido abusados, negam é que tenham sido eles os abusadores. Retomando as declarações do assistente AI, esta situação de as declarações virem, por vezes “aos bocados”, não foi, contudo, situação única do AI. De facto, o Tribunal fazer uma pergunta, que para o tribunal era evidente quanto ao sentido pretendido, mas que quer os assistentes ou quer testemunhas, respondiam parcialmente, completando posteriormente a acrescentando pormenor ou elemento relevante, foi situação que ocorreu. Mas o na audiência de julgamento de 5/12/05 o Ministério Público voltou a esta questão da referência do AI ao arguido E. Passamos então a transcrever: (Procurador) – (…) Srª Drª por fim, o assistente na última sessão fez referência ao arguido E e explicou, enfim, em que circunstâncias é que crê ter visto este arguido. A pergunta é, quando é que… primeira pergunta: se quando o viu ou julga ter visto no local que referiu, se já tinha visto a cara dessa pessoa nalgum sítio, se o reconheceu de algum sítio? Ou se, pelo contrário, esse reconhecimento foi posterior? (Juíza Presidente) – Referiu na sessão passada em relação ao Sr. E, referiu que o viu em (…), na casa de (…) e depois acrescentou tem uma pequena dúvida, não tem a certeza. E acrescentou ainda mais, disse mais alguma coisa. O que o tribunal lhe pergunta neste momento é, este senhor porque é que o identifica, porque é que o identificou na última sessão como o tendo visto na casa de (…)? Compreendeu a pergunta? (AI) – Acho que sim. ..é assim, eu disse que tinha uma certa dúvida sobre o Sr. E, e como eu já tinha dito, não tenho bem a certeza se era ele. (Juíza Presidente) – E porque é que disse o nome deste senhor? (Procurador) – Srª Drª, dá-me licença? Talvez possa ajudar reformulando a pergunta. (Juíza Presidente) – Porque é que na última sessão referiu o nome, o que é que na sua memória ou como se costuma dizer às vezes, na sua cabeça fez com que dissesse naquela altura o nome, na última sessão? (AI) – Por o ter identificado como sendo outra pessoa que estava… por poder parecer outra pessoa que estava dentro da casa de (…). (Juíza Presidente) – E lembra-se quando é que pela primeira vez fez essa identificação? Isto é, quando é que para si uma pessoa que diz ter visto na Casa de (…) podia parecer ou parecia, ou podia ser o Sr. E? Em todo este processo lembra-se quando é que isto aconteceu? (AI) – Acho que foi quando fui fazer declarações à Polícia Judiciária, quando vi fotografias. (Juíza Presidente) – Sr. Procurador. (Procurador) – Portanto se bem percebo, se bem compreendo, o que o assistente acaba de dizer é que a pessoa que admite poder ser o arguido E como sendo uma das pessoas que estava em (…), essa questão só se lhe colocou quando foi confrontado depois, mais tarde, já no âmbito do processo, com uma fotografia dessa mesma pessoa. É isso? (Juíza Presidente) – Pode esclarecer. (AI) – Exacto.” Na instância da Defesa do arguido E foram pedidos novos esclarecimentos quanto a esta questão. Foi perguntado ao assistente quando é que teve a dúvida sobre se a pessoa que anteriormente referira como sendo o arguido E era ou não o arguido e respondeu, responde que pode ter sido antes desta audiência, “…mas nesta audiência tive a certeza que tinha dúvidas… “ (Tribunal) – Mas já antes desta audiência tinha pensado que…? (AI) – Exacto.). E disse, a pergunta se alguma vez tinha dito a alguém que tinha sido abusado pelo arguido E, AI – Se disse foi mesmo por engano completo. Drª JJU – Isso foi por engano? AI – Completo. Posso ter falado sobre isso. Juíza Presidente – E a quem? Se o disse foi a quem, Sr. AI? AI – Quando fui, como é que posso dizer? Juíza Presidente – Diga pelas suas palavras (imperceptível). AI – Quando fui prestar declarações a… não sei como é que se diz. Juíza Presidente – Foi perante um senhor, perante uma senhora, era Juiz, não era Juiz? AI – Perante uma senhora. Uma ou duas senhoras. Juíza Presidente - O Ministério Público, não Ministério Público? AI – Posso? Juíza Presidente – Sim. AI – Se bem me lembro, foi perante aquelas duas senhoras. Juíza Presidente – Mas alguma vez o senhor se lembra de ter dito isso em relação ao Sr. E? AI – É como eu estava a dizer. Disse, tinha estado a falar sobre o Sr. E, disse mas foi um engano completo. Dr.ª JJU – Sr.ª Drª portanto, neste momento o que eu gostaria de saber, portanto, se essa referência essa afirmação foi um engano, em consciência tem certeza que não foi abusado por este senhor? Juíza Presidente – Já disse que não Srª Drª. Dr.ª JJU – Pronto. É essa Neste momento - e sem prejuízo do que o Tribunal irá dizer, quanto a outros aspectos de demais momentos da instância do assistente - retomamos o que acima e em sucessivos momentos dissemos quanto à forma como o assistente AI esteve perante o Tribunal. E isto, lembramos, tendo sempre em atenção as linhas de Defesa que imputaram aos assistentes a criação de uma história para os incriminar. Este depoimento foi um daqueles em que - como dissemos mesmo no início da análise crítica da prova - , ouvindo as gravações das declarações que foram prestadas em audiência de julgamento a voz do assistente aparenta ser “alta”, facilmente audível, mas tal não corresponde à atitude e ao que, em audiência de julgamento se passou. A gravação - pelo que já no início explicámos, por ser feita com um microfone posicionado junto de cada uma das pessoas que estava a falar - distorce e não reproduz, o que foram as vicissitudes da audição ou as cambiantes da audição dos assistentes. Dá uma noção errada da forma como foi prestado o depoimento, o que é objectivamente sustentado, por exemplo, numa observação que o Tribunal teve que fazer na audiência de julgamento de 30/11/2005 - e que já acima mencionámos -, para o assistente tentar falar mais alto, pois falava “mesmo baixinho”. Para o Tribunal - e na sequência do que já dito -, quando o Assistente começou a falar dos abusos e isto logo no primeiro dia em que prestou declarações, viu-se quer na sua expressão - tinha um semblante um pouco duro, mas com trejeitos que pareciam um sorriso em determinada altura quando dava respostas -, quer na sua voz - não falou com à vontade, o discurso era menos fluído do que tinha tido até aí, tinha silêncios antes de responder, respirava fundo -, que alguma coisa tinha mudado em relação à forma como se apresentara ao Tribunal. Foi-nos visível que estava nervoso, que havia alguma retracção. Mas como também dissemos, podia ser uma atitude cautelosa para medir o que dizia e como dizia, para não errar no guião e o Tribunal não deixou de ter esta perspectiva em vista. Ao mesmo tempo e durante as suas declarações, parecia ir tendo alguma dificuldade em falar, o que por vezes interpretámos como cansaço em falar. Começou a contar o que se passou com o arguido A e depois passou para a “(…)”. Aí fala do arguido C e do arguido K (nesta altura das suas declarações o Tribunal disse-lhe para se expressar sem reservas, explicando que o Tribunal estava preparado para ouvir aqueles relatos, que os factos tinham que ser contados como aconteceram, com os actos que aconteceram), estava a falar com os arguidos na sala e o Tribunal notou que quer o arguido C, quer o arguido N num segundo momento, olhavam e fixavam o assistente enquanto falava. Era impossível, tal como o Tribunal o percepcionou, que o assistente não o estivesse a “sentir” e sentindo-o, em maior ou menor grau alguma coisa teve que afectar a confiança que o assistente tivesse para estar a prestar as declarações. Aliás, no início da instância por parte do Ministério Público, o Magistrado do Ministério Público começou por perguntar ao assistente se estava nervoso e se a presença das pessoas que tem estado a referir o “intimidavam”. O assistente, de uma forma na qual o Tribunal não viu sobranceria, nem tom de desafio, mas como se correspondesse a algo espontâneo, natural, respondeu que “…não intimida…eu falo aquilo que tenho a falar…”. Foi na sequência desta afirmação que se referiu a algo que já mencionámos anteriormente - e que foi a percepção de uma expressão que o assistente fazia, antes de responder, como se fosse um sorriso -, dizendo ao Tribunal que se apercebia disse “… eu apercebo-me disso… e eu sorrio… um sorriso porque quando estou nervoso ou fumo um cigarro … ou tento sorrir….”. A resposta foi plausível para o Tribunal, é uma reacção que por vezes é apreensível nas pessoas e a forma como respondeu, pergunta atrás de pergunta, instância atrás de instância, Magistrado ou Advogado uns a seguir aos outros, deram a percepção ao Tribunal que se tratava de uma reacção, como um tique. Porque se a sua situação fosse a de estar a contra uma coisa “criada” a atitude normal seria tentar criar “simpatia” com um ar grave e não esboçar como que um sorriso antes de responder. E continuando na imagem global da expressividade e emotividade revelada pelo assistente, quando fala em (…) - por exemplo logo na primeira sessão - e fala do arguido H, tem uma forma de responder com pausas, a sua voz era baixa, respirava fundo antes de responder e por vezes fazia silêncios que o Tribunal tinha que ir tentando cortar, perguntando um pormenor ou esclarecimentos. Por exemplo, quando o Tribunal lhe perguntou, “em (…) o que é que aconteceu?”, responde “...ficámos todos na sala...”, respira forte e fica calado. O Tribunal fez-lhe então uma outra pergunta, não pela pergunta em si mas para que o assistente continuasse a falar. O mesmo se passou, com as pausas e momentos “parados”, por exemplo com a descrição da casa. O discurso era monossilábico, o que nos fez interrogar: se fosse inventado era assim? Esta atitude foi perceptível para o Tribunal ao longo do seu depoimento e em momentos em que estava em causa relatar actos concretos de abuso. E relembremos que alguns arguidos disseram em sede de alegações - por exemplo, a Defesa do arguido H - que não punham em causa que estes assistentes tivessem sido abusados, punham é em causa, como uma mentira criada, a identificação que fizeram de si - arguidos - como os autores de tais abusos. Ora não estando em causa a verdade do facto que o assistente AI foi sujeito a actos de coito anal - os pontos “1º” e “4º”, das conclusões constantes do exame (...) legal de natureza sexual, que se encontram a fls. 334, do Apenso CG, Volume 1, corroboram tal facto -, esta atitude que o Tribunal valorou como dificuldade em exprimir e contar os actos de abuso, tem consistência e ressonância emocional, com a valoração feita pelo Tribunal: correspondia a uma reacção por estar a contar uma coisa que viveu; não correspondia a uma atitude defensiva, por estar a contar uma experiência que inventou e ter cuidado para não ser apanhado na própria mentira. É certo que pode-se sempre dizer que a sua emotividade tinha um fundo de verdade, mas também tinha um lado de mentira - a identificação do abusador - e era esse lado que, naquela altura, emergia e dava sentido à dificuldade/cautela. O Tribunal não criou tal convicção e vamos continuar a expor porquê. 13.3.20. Acima transcrevemos o momento em que o assistente falou da identificação da arguida Q. Quando descreveu os factos em (…), quando foi sujeito ao contra interrogatório dos arguidos, por vezes fazia pausa, silêncios e também deu respostas de não me recordo ou não me lembro. O assistente começou por falar em (…) e descrever o que se passou, no primeiro dia em que esteve perante o Tribunal (Aj 29/11/05). Voltou a falar quando na instância do Ministério Público (AJ 30/11/05) e voltou a falar qu ando nas instâncias dos sucessivos arguidos. Quando responde na instância do arguido H, explicando de novo com quem “esteve” e como esteve (cfr. AJ 6/12/05), o assistente responde “que eu me lembre eu já disse” e repete o que já tinha dito três sessões atrás, mantendo, para o Tribunal, a estrutura do que tinha contado e como tinha contado. É claro que duas possibilidades se abrem sempre: ou tem o guião muito decorado, ou está a reproduzir uma vivência. E foi neste contexto que o assistente não se esquivou a expor-se de uma forma que, no momento em que estava a prestar declarações, seguramente tinha noção que podia ser prejudicial à sua imagem. A sequência do interrogatório foi a seguinte: (Dr. JJS) – O senhor disse que da primeira vez foi o primeiro a ser buscado, foi o primeiro a entrar para a carrinha. E das outras duas vezes, foi também o primeiro, ou quando entrou já havia alguém na carrinha? (Juíza Presidente) – Pode responder. (AI) - ...Lembro-me de, pelo menos uma vez, ser o ... ter sido o primeiro. (Juíza Presidente) – Sim. (AI )– Pelo menos, de certeza, pelo menos uma vez ter sido o primeiro. (Juíza Presidente) – E consegue identificar essa vez, em que diz ter a certeza de ter sido o primeiro? (AI) – Não, não consigo...não consigo. E já as outras duas, não tenho a certeza absoluta se já "tava" lá alguém ou... ou fui o primeiro a ... fui o primeiro a... a entrar para a carrinha... “tou-lhe” a falar como não tendo a certeza. (Dr. JJS) – E os locais de en... e a ser largado, no regresso? Era o primeiro a ser largado, era o último? (Juíza Presidente) – Compreendeu a pergunta? Pode responder. (AI) – Acho que já referi ao Tribunal que... fui sempre o primeiro a ser largado. (Juíza Presidente) – Regresso de (…). (AI) – Sim. (Juíza Presidente) – Sempre o primeiro? (AI) – Se bem me lembro, sim. (Dr. JJS) – O Sr. AI ia contrariado para estas idas a (…)? (Juíza Presidente) – Diz que foi três vezes a (…). Pode dizer ao Tribunal da primeira, da segunda e da terceira vez... o que é que sentiu? Se é que sentiu alguma coisa, nestas idas para (…). (AI) – Ia nervoso... a primeira vez fui um bocado mais...não com medo, claro que não ... mas ia nervoso sobre o que... pensando o que ia acontecer. (Dr. JJS) – Mas a pergunta é: se ia contrariado? (Juíza Presidente) – Para além de nervoso, mais algum sentimento? (AI) – É assim, naquela idade... uma pessoa como eu e como alguns colegas meus que andavam na AX ...ou que andam, não tenho bem a certeza...aah... iam mais por causa daquilo que podiam receber. (Juíza Presidente) – O senhor, em concreto. (AI) - ... Ia, contrariado ... não muito ... mas ia mais por causa daquilo que podia receber. (Dr. JJS) – E para a (…), também?... para a (…) também ia por causa daquilo que ia receber? (Juíza Presidente) – Em relação às duas vezes que diz ter ido à (…), pode dar ao Tribunal alguma ideia dos seus sentimentos em relação a essas idas, quer à primeira, quer à segunda? (AI) – Igualmente...e igualmente... da “mema” forma que fui “pá” casa de (…).(...)” Este diálogo, entre o mais, para o tribunal revelou uma resposta sincera do assistente: esta resposta podia não dar uma imagem positiva de si, assume que ia “lá” para receber dinheiro, não ia porque era “obrigado “ pelo arguido A. Não disse que ia com medo. Assumiu que ia nervoso por causa daquilo que ia acontecer, mas ia, voltamos ao início, por causa do dinheiro que recebia. Esta resposta dá credibilidade. Se o assistente AI estivesse a criar uma história e a aderir a uma história, motivado por uma indemnização – pois o AI não revelou, pelo menos para o Tribunal, sentir o apelo pela comunicação social, pelas entrevistas – tinha naturalmente que se vitimizar e não expor, porque queria ganhar dinheiro e se tem inteligência para inventar uma história e sustentá-la em audiência de julgamento, então naturalmente também tem inteligência para criar um cenário mais propício a essa sua intenção. Outro exemplo, em relação aos actos que descreveu ao Tribunal terem-se passado consigo em (…), com o arguido H, exclusivamente actos de coito oral, naturalmente – pois descreve actos de coito anal em relação aos arguido C e K -, se a sua intenção fosse a indemnização, teria dito actos de coito anal também com este arguido. E dizemos “naturalmente” porque o assistente, em respostas que deu ao Tribunal, demonstrou que para si os actos de coito anal tinham “mais” importância que os actos de coito oral. E não foi o único com esta reacção. O AI, apesar de o seu depoimento ter tido incidências que podem revelar inconsistência, expôs-se. E este comportamento, para o tribunal, atenta a normalidade das coisas, é mais compatível com quem relembra uma verdade, do que quem reproduz uma mentira criada com terceiros. 13.3.21. Há ainda a acrescentar o seguinte. Quanto ao depoimento do assistente quanto aos actos que se passaram em (…), com o arguido H e da sua identificação deste arguido, um dos aspectos a que o Tribunal esteve atento - e nas sucessivas instâncias a que o assistente esteve sujeito - e que o Tribunal verificou, foi que quando lhe eram pedidos esclarecimentos de forma segmentada em relação aos vários factos que relatou em (…), conseguiu ligar o que lhe estava a ser perguntado com esclarecimentos que já dera, por exemplo, duas sessões atrás. Por exemplo, na instância da Defesa do arguido H foram-lhe pedidos esclarecimentos quanto a se o arguido A tinha entrado ou não na casa de (…). Responde só até à porta, sinceramente não se lembrava. É insistido com outro pedido de esclarecimento e diz: “ …AI – Eu penso que já referi a este Tribunal que a primeira vez acompanhou-nos à porta e a segunda vez…aah... não. Juíza Presidente – Foi a pergunta minha. AI – Que eu até disse que tinha sido eu... Juíza Presidente – Responda. AI – Eu até disse que tinha sido eu a ir à frente. Juíza Presidente – Dia 29 (vinte e nove), Sr. Dr.. A segunda vez não se lembra de o Sr. A o ter acompanhado à porta. Dr. JJS – Sim, sim, Srª Drª. Eu tenho isso. Aberta a porta pelo Sr. N, o que é que foi dito? O que é que se recorda de ter sido dito pelo Sr. N, pelo Sr. A, ou por algum dos senhores? E aqui recomeçamos no que tinha ouvido, se não se recordava de conversas. E o assistente continua a responder: (Dr. JJS) – Sim, sim, Srª Drª., eu tenho isso. Aberta a porta pelo Sr. N, o que é que foi dito? O que é que se recorda de ter sido dito pelo Sr. N, pelo Sr. A, ou por algum dos senhores? (Juíza Presidente) – Entre o Sr. A e o Sr. N perguntei-lhe expressamente se foi ouvida alguma conversa e disse que não, que não ouviu. (Dr. JJS) – Então o que é que se recorda? Abriu a porta, estava lá dentro o Sr. N... não se recorda de ninguém ter dito coisa nenhuma? Ou um dos senhores, ou um dos rapazes? (Juíza Presidente) – Da primeira vez, depois de aberta a porta, diz que foi o Sr. N que abriu a porta. Lembra-se de alguém ter dito alguma coisa para alguém, ou mesmo que não fosse para alguém, entre os senhores que estavam a entrar ou que iam entrar e o Sr. N? (AI) - ...Não, mas quer dizer... penso que já referi que... foi-nos dito para nos dirigirmos para a sala. (Juíza Presidente) – Isso já disse. (AI) – Exacto. (Juíza Presidente) – Mas o que o Sr. Dr. estava agora a perguntar, em concreto, de alguma coisa que se possa lembrar? (AI) – Não. (Juíza Presidente) – De alguma conversa, alguma palavra trocada entre alguém? (AI) – Não. (Juíza Presidente) – De algum colega ter falado com o senhor N, ou o Sr. N com qualquer colega ou dos jovens? (AI) – Nada….nada. (Dr. JJS) – E quem é que vos disse para ir para a sala? Isto, os dois exemplos que antecedem, são situações que não são únicas, de o assistente ser re-perguntado e de pegar no que dissera duas sessões atrás, ou na anterior e continuar a esclarecer. Pegar o seu discurso nessa parte, onde o tinha deixado e responder de forma que, para o Tribunal, teve um coerência global. E responder com um registo em que não é perceptível que a resposta tenha sido ensaiada, não se nega a esclarecimentos, não responde com ligeireza e quando explica percebe-se que tentava mesmo fazer-se compreender, mostrar o caminho que estava a seguir. Não apresentas recordações detalhadas, mas fez a descrição dos actos de abuso, pelo que já dissemos, de forma que para o Tribunal foi coerente. 13.3.26. Passemos, agora, à confrontação que o Tribunal fez em audiência de julgamento, do assistente com as declarações que tinha prestado perante JIC: Começou por dizer ao Tribunal que não se recordava de ter prestado declarações perante a Sra. Juíza de Instrução criminal. Lembrava-se de ter prestado perante as Sras. Procuradoras, perante a P.J. , mas não se conseguiu recordar perante quem foi a última pessoa que prestou declarações, antes de ter vindo a Tribunal. Foi-lhe exibido o auto de fls. 19.043, referente às declarações que prestou perante JIC no dia 22/04/2004, viu a sua assinatura, foi-lhe lido o auto, após o que disse lembrar-se de ter prestado as declarações. No entanto continuou a não se recordar de onde as tinhas prestados, nem da pessoas - a Senhora juíza - perante as quais tinha prestado. E ficámos convictos que estava a dizer a verdade, pois foi perguntado mais do que uma vez sobre este aspecto, mas mais importante de formas diversas, o que podia levar a que tivesse uma lembrança diferente ou se estivesse a “fingir”, “descair-se” pois estava a dar uma resposta a uma pergunta diferente e é normal que a sua atenção se desviasse para o que era diferente (e assim “poder ser apanhado”; e no sentido do que dizemos, acresce o facto de as declarações perante a Sra. juíza de Instrução terem ocorrido nas instalações da P.J., como resulta do auto, local onde o assistente durante o inquérito fora sempre ouvido). E o que foi a entoação da sua voz, o que a dada altura foi uma expressão facial de impotência, a sensação que o Tribunal teve, com o que viu, pois o corpo estava mais direito, os olhos mais direccionados para o Tribunal do que estivera no início, foi de alguém que quer dizer mais mas não consegue explicar mais. Quando esteve a ser interpelado porque razão tinha indicado e com particularidades físicas e de modo de agir o arguido E, quando em Tribunal veio dizer que afinal não tinha sido abusado por este arguido, que se tinha enganado; porque razão referiu que viu o arguido K na casa da (…) e não referiu que tinha sido abusado pelo mesmo, quando em Audiência de julgamento veio a descrever um abuso, numa segunda vez em que foi a este local; ou porque razão não referira o arguido H como seu abusador, quando em audiência de Julgamento disse que este arguido abusou de si, na casa de (…), tendo praticado actos de coito oral. O assistente deu explicações ao Tribunal - e chamamos a atenção que todos os sujeitos processuais puderam pedir esclarecimentos, através do Tribunal, quanto a estas discrepâncias - e foi-lhe feito sentir da responsabilidade que as suas declarações podiam ter na prova de factos e que podiam levar à condenação de arguidos, o que o assistente disse ter consciência disso e não ter dúvida sobre o que tinha dito perante o Tribunal. E há dois momento que o Tribunal não despreza e com o sentido que acima lhes deu e que foram os momentos em que o assistente, em relação à arguida Q e em relação ao arguido E, reconheceu perante o Tribunal algo que podia significar estar a “desmentir-se”. O primeiro momento, é aquele em declara ao Tribunal que poder identificar, sem qualquer dúvida, a arguida Q não o podia fazer. E convocamos as circunstâncias que o Tribunal considera que naturalmente terão sido difíceis para o assistente, ao ter tido aquele movimento que objectivamente podia significar recuo - dar o “dito por não dito” - e ter mantido esse movimento, mesmo depois do desassossego gerado com a exteriorização de reacção que o arguido N teve na audiência (e da intervenção do Tribunal). Para este Tribunal e como já o dissemos, face à idade, formação, percurso de vida dentro e fora da AX - e ao que foi a “avaliação psicológica”, “análise de resultados”, “impressão diagnostica” e “conclusões” constantes da perícia colegial que foi feita ao assistente AI e que se encontra a fls. 142 a 164, Apenso Z-11, 1º volume , bem como pelos esclarecimentos que quanto a tal perícia foram dados pelo(s) Sr(s). Peritos Dra. CV , Dr. CT, Dra. CR - , não é normal e provável que o assistente, em audiência de julgamento e sujeito ao contra interrogatório a que efectivamente foi sujeito (três juízes, um Ministério Público, oito Advogados), conseguisse introduzir este “incidente” - a revelação da sua incerteza - em audiência de julgamento como um acto pensado por si - que forçosamente teria que ter sido ensaiado, o que implica alguma encenação - , para obter um efeito de credibilidade e veracidade, se não fosse, efectivamente, uma expressão do que efectivamente tinha vivenciado e como tinha vivenciado. O segundo momento, foi aquele em que o assistente reconheceu dúvida anterior e erro em relação ao arguido E. O Tribunal tem presente que a forma como na altura questionou o assistente, por não ter declarado essa dúvida ao Tribunal logo que começou a falar, o que, atenta a normalidade das coisas, estando perante o Tribunal, arguidos na sala, Senhores Advogados na sala, naturalmente deve ter sentido algum desconforto. E aguentou. Para o Tribunal e já o dissemos, a explicação não foi encenada e dentro da lógica que o assistente exprimiu ao Tribunal, quanto ao momento e como teve a consciência que se tinha enganado em relação a este arguido após as últimas declarações que tinha prestado - e aqui transcrevemos uma excerto das suas declarações (audiência de julgamento 15/12/2005), a pergunta feita pelo tribunal: “(Juíza Presidente) – Mas referiu mesmo, em relação a este senhor, particularidades. Em relação ao senhor (…) E disse que este senhor, conjuntamente com um outro, despia só as calças e as cuecas, portanto, deu uma particularidade quanto a alguma coisa feita por este senhor. (AI) – Exacto…não…mas é o que eu "tava" a dizer…eu... assim... "tava" cansado de muitas, de tanta declaração que tinha dado, já "tava" um bocado até enervado das declarações que já tinha dado tanto, tantas vezes e... e aquilo que disse foi um engano meu … e continuo a dizer que os... por quem fui abusado já “tá” dito neste Tribunal, sem mais nem menos. (Juíza Presidente) – E quando é que o senhor se apercebeu desse engano? Do que tinha dito à Senhora Juíza de Instrução, que se tinha enganado? (AI) – Depois disso….quando deixei de ir à... à Polícia Judiciária, quando deixei de prestar declarações … pensei naquilo que tinha dito anteriormente e... e vi que me tinha enganado em alguma coisa e que provavelmente disse... que tinha sido mal.” - e a explicação quanto à opção que tomou de só o dizer agora, é plausível (cfr. audiência de julgamento 15/12/2005): (Procurador) – Srª Drª, uma última, uma última pergunta... quando o assistente refere que teve consciência que tinha dito uma coisa que não era... se teve a consciência da gravidade dessa... do facto de ter dito uma coisa que afinal não era? E que incriminava uma pessoa? (Juíza Presidente) – Pode responder... teve alguma consciência… (AI) – Tive. (Juíza Presidente) – …de que isso era grave? (AI) – Tive. Tive consciência, daí ter... ter ficado... mais ou menos... em baixo. (Juíza Presidente) – E falou com alguém por causa disso? Disse a alguém? (AI) – Não. Fiquei, pensei para mim, fiquei só, falei comigo mesmo, só. (Procurador) – Srª Drª… (Juíza Presidente) – Não tentou dizer a alguém, a alguma pessoa que já o tivesse ouvido ou a alguém que o senhor conhecesse, “eu enganei-me”? (AI) – Não…falei para mim. (Juíza Presidente) – Preciso dizer que me enganei? (AI) – Não…nem pensei nisso. (Procurador) – Srª Drª, se pensou, nessa altura... que... mais tarde, que nunca iria ter oportunidade de reparar esse engano ou se pensou que mais tarde, ou mais cedo, o iria fazer?... Como é que pensou nesta altura, vou calar isto, olha enganei-me... é grave... (Juíza Presidente) – O senhor disse que tinha consciência da gravidade desse engano. Diz que não falou, não pensou em falar com alguém para dizer que se tinha enganado. O que é que o senhor pensava fazer, então? (AI) – ... Comecei a pensar no pior. (Juíza Presidente) – E o que era o pior? (AI) – Comecei a pensar que... que me tinha enganado e que não tinha …e que não haveria modo de emendar esse erro. (Juíza Presidente) – Que não havia? (AI) – Modo de emendar esse erro…fiquei em baixo, completamente. (Juíza Presidente) – E mesmo tendo consciência do, tendo começado a pensar que não havia modo de emendar esse erro, não tentou falar com alguém? Não lhe passou pela cabeça falar com alguém? (AI) – Não. Não…não….eu falei, eu andava até, os meus educadores até achavam estranho porque é que eu "tava" tão em baixo, tão sozinho…nunca me pergunt… perguntaram-me sempre o que é que se passava e eu escondia para mim e dizia que não se passava nada... (Juíza Presidente) – E tem consciência neste momento que em qualquer, em relação a qualquer erro em que tenha incorrido o pode emendar? Pode sempre emendar esse erro neste momento? (AI) – Sim, tenho. Tenho consciência, mas tenho a certeza que não errei em algo.”. Mas sendo relevante acrescentar, para uma visão global do que foram as explicações dadas pelo assistente e a forma como as expressou, o que esclareceu nos pedidos de esclarecimento de uma das Defesas: (Juíza Presidente) – O senhor declarou há pouco, em relação ao ter indicado o nome do Sr. E que se tinha enganado, tendo expressado ao Tribunal palavras que queriam exteriorizar ou que queriam comunicar sofrimento, angústia, por ter dito isso. No entanto há uma coisa que é certa, é que quando se iniciou o julgamento, quando eu lhe comecei a fazer perguntas, o senhor não me respondeu, não me referiu o Sr. E como pessoa tendo abusado de si. Mas também não disse, não fez qualquer declaração, atenção eu enganei-me, eu quero dizer que me enganei. Porquê? (AI) – ... Porquê?...primeiro, eu só respondo àquilo que me, respondo àquilo que me perguntam, e... que eu me lembre, neste julgamento... não me lembro de algo... de alguma pergunta que... que tenha, que se tenha feito que eu pudesse dizer esse facto. (Juíza Presidente) – Estamos a falar de outra coisa Sr. AI. Estamos a falar de um peso de consciência que o senhor disse ao Tribunal ter tido em relação à incriminação de uma pessoa. (AI) – Sim. (Juíza Presidente) – Porque é que não sentiu necessidade no início da audiência ou se é que alguma vez pensou, no início quando começou a falar, quando estava perante o juiz dizer: eu enganei-me em relação a esta pessoa?... Se a resposta for a que deu anteriormente, é dizê-lo. Mas o Tribunal pergunta de novo porque é que sendo um peso de consciência, sendo algo que diz que lhe pesava, que queria reparar, não o fez dessa , não o fez no início da audiência, não o fez quando começou a falar com os juízes aqui? (AI) – Primeiro, porque... não me lembrei de tal coisa….e também não me lembrava daquilo que já tinha dito à Srª Juíza de... às declarações que fiz anteriormente. (Juíza Presidente) – Mas lembrava-se que tinha, tinha acusado alguém em relação ao qual se enga… se diz ter enganado ou não? (AI) – Quando entrei nesta sala não pensava em mais nada sem dizer aquilo que... me aconteceu….por isso, não me lembrei... não me lembrei de... de que tinha feito uma coisa errada... Sabia que tinha feito, mas não me lembrei. (Dr. JJS) – Mas quando na sessão... de dia 30 (trinta), o Dr. JJV, que é aquele senhor que ali está, perguntou se tinha visto o Dr. E em (…), o senhor começou por dizer assim, se tinha visto alguma vez o (…) E, o senhor começou por dizer assim: “ lembro-me de o ter visto um dia em (…).” A Srª Drª Juíza perguntou-lhe: “quando?” e ele, e o senhor respondeu: “não me recordo bem se da primeira, se da segunda.” Depois o Dr. JJV perguntou: “tem a certeza?” e o senhor então sim, à terceira pergunta disse: “tenho uma pequena dúvida.” Depois a Srª Drª Juíza perguntou porquê, “não tenho bem a certeza se foi o (…) E.” Ou seja, quando lhe perguntaram a primeira vez se tinha visto, a sua resposta foi: sim, uma vez em (…). Segunda vez, segunda pergunta: não me recordo bem se foi da primeira, se foi da segunda. E só à terceira, é que admitiu que tinha uma pequena dúvida. Como é que isto é conciliável com uma pessoa que tem um grande peso na consciência? (Juíza Presidente) – Compreendeu o pedido de esclarecimento? Quando começou a falar do Sr. E ou quando falou do Sr. E nessa altura, o senhor também não disse, da forma que disse hoje, também não disse: eu em relação a esse senhor, a dada altura, tenho aqui um peso na consciência porque tenho a certeza que o incriminei e que me enganei. O senhor não fez essa declaração. Porquê? E se passou-lhe pela cabeça fazê-la dessa forma. Caso tenha passado pela cabeça, porque é que não o fez? (AI) – ... Primeiro, não me passou pela cabeça….e ... falando a sério, uma pessoa quando “tá” deste lado e que aconteceu o que aconteceu, não se lembra de mais nada e não diz mais nada do que o que se passou com ele….podia ter tido esse, posso ter esse peso, podia ter esse peso na consciência, mas... só queria dizer aquilo que aconteceu e aquilo que se passou comigo…”. Não tinha sido a opção tomada por alguns dos presentes na sala, seguramente não tinha sido a opção tomada por outros, mas a explicação do assistente tem a ver com a sua lógica e que exprimiu. E tem o seu sentido. E repetimos o que dissemos quanto à idade, formação, percurso de vida dentro e fora da AX - e ao que foi a “avaliação psicológica”, “análise de resultados”, “impressão diagnostica” e “conclusões” constantes da perícia colegial que foi feita ao assistente AI e que se encontra a fls. 142 a 164, Apenso Z-11, 1º volume, bem como pelos esclarecimentos que quanto a tal perícia foram dados pelo(s) Sr(s). Peritos Dra. CV , Dr. CT, Dra. CR -, para também aqui não ser normal e provável que o assistente, em audiência de julgamento e sujeito ao contra interrogatório a que efectivamente foi sujeito (três juízes, um Ministério Público, oito Advogados), conseguisse introduzir este “incidente” - a revelação e confissão do seu engano, mas expondo que a sua incerteza já vinha de momento anterior - em audiência de julgamento, como um acto pensado por si - que forçosamente teria que ter sido ensaiado, o que implica alguma encenação - , para obter um efeito de credibilidade e veracidade, se também aqui não fosse, efectivamente, uma expressão do que efectivamente tinha vivenciado e como tinha vivenciado. E não faz sentido, na lógica da avaliação global que fazemos do seu depoimento e por isso não o fazemos, interpretar que a omissão perante a Sra. JIC quer do nome do arguido H e de ter sofrido abusos por parte do arguido H, quer do abuso do arguido K, tenha como explicação o facto de ter sido algo criado durante ou em momento imediatamente anterior ao julgamento pelo assistente. De acordo com as suas declarações, o assistente “desvalorizou” o relato à Senhora Juíza de Instrução dos factos com o arguido H, porque foram actos de coito oral e o Tribunal teve a percepção, ao longo da inquirição dos assistentes - neste processo foram inquiridos cerca de 31 assistentes -, que a desvalorização do acto de coito oral, face ao de coito anal foi por vezes evidente. Acresce que se o significado destas omissões – nome do arguido H e abuso por parte do arguido H e o abuso do arguido K -, tivesse como explicação o facto de ter sido algo criado durante ou em momento imediatamente anterior, isso - e partindo de um pressu(...) das Defesas, que os actos descritos por estes assistente foram actos criados e invenção, se não quanto ao abuso em si, pelo menos quantos aos locais e às pessoas a quem imputa os abusos -, não faz sentido com as declarações que o assistente veio a prestar quanto aos arguidos Q e E. Pois se a lógica do assistente tivesse sido a de acrescentar abusadores durante o julgamento - por exemplo, o arguido H e o arguido K -, não faz sentido retirar de “certeza absoluta” a presença da arguida Q em (…) (e quando começou o julgamento a arguida podia não ter a sua fotografia na comunicação social, mas o nome tinha e tinha-o ligado à casa de (…); pelo que não era uma situação em que se pudesse dizer que o assistente retirava o nome durante a audiência, porque entretanto deixara de ser falado ou havia alguma notícia que lhe pudesse dar a indicação de que o nome estava errado ) e expor-se com um engano, da forma como o fez, quanto ao arguido E. Não nos parece, face a tudo o que foi dito, incluindo quanto à vivência e características pessoais do assistente, que tivesse capacidade intelectual para tanto e com a consistência global que o Tribunal encontrou, após o contraditório exercido pelos sujeitos processuais. Convocamos aqui o que atrás dissemos quanto à avaliação que o Tribunal fez das declarações do assistentes quantos a tais factos e a avaliação que fez das declarações quanto às circunstâncias dos factos. E a explicação que o assistente também deu ao Tribunal para as discrepâncias que lhe foram apontadas - o cansaço; a falta de relevância que aparentemente deu a ter ido “falar mais uma vez, pois é dado objectivo que resulta dos autos e que o Tribunal pode usar nesta precisa e limitada medida, que anteriormente ao auto de fls. 19.042/4, de declarações perante JIC, em relação ao assistente existem ainda mais 9 (nove) autos intitulados de inquirição de testemunha; para além dos três autos de reconhecimento de local que acima já mencionámos -, também tem plausibilidade para concorrer para o sentido e explicação que deu ao Tribunal. E, embora do auto de fls. 19.042 não seja possível avaliar quanto tempo o assistente esteve a falar - pois apenas tem referido que a diligência se iniciou às 16.28h, foi ouvido um outro assistente a seguir, mas o auto não tem hora de início ou encerramento (cfr. fls. 19.045 a 19.047), não havendo qualquer outra diligência a seguir que nos permita calcular o tempo destas duas inquirições -, vemos que ao todo, incluindo identificação, o auto do assistente tem duas folhas e meia. Comparando com o auto do assistente anterior - o de fls. 19.039/41 -, que também tem duas folhas e meia, que começou às “15.49h” e que às “16.28h” estava a começar o do assistente AI, é plausível pensar que deverá ter levado aproximadamente o mesmo tempo, ou seja cerca de 30/40 minutos (sendo que é do conhecimento comum que a redacção do auto, antes de ser assinado, leva algum tempo; e se na inquirição do assistente AI tivesse havido qualquer incidente, por o mesmo não conseguir falara ou ter ficado em silêncio, tendo havido necessidade de intervenção do Tribunal fora do que é normal nestas diligências, decerto teria ficado consignado). Este “tempo”, seguramente relativamente “pouco” para o assistente - face às nove vezes que vimos em que há autos de inquirição de testemunha com o seu nome -, conjugado com a análise que o Tribunal acima fez, quanto à razão pela qual deu credibilidade às declarações do assistente para a prova dos factos e a medida em que a deu, dá sentido à segunda parte da justificação do assistente quanto “ ao que não disse” - pois quanto ao arguido E, já acima consignámos essa “primeira” parte -. A saber, que não disse “tudo” - , quanto ao arguido K na (…) e às vezes que foi à (…); e ao arguido H em (…) -, pois “…. como eu disse anteriormente ao depoimento, eu disse que achava…e no achar é não ter a certeza…aaah... mas agora tenho a certeza que fui só duas vezes…” , “ (…) ... o que tudo... porque... o que disse aqui, para mim, é uma etapa final….e daí dizer simplesmente tudo o que me aconteceu e o que sei….e daí referir todas as pessoas que já referi…”, “(…) …simplesmente "tava" cansado de “tar” a dizer as mesmas coisas …e daí podendo não ter explicado... tudo o que já tinha dito antes….”. Tendo acrescentado, no pedido de esclarecimento sugerido por uma das defesas, “…eu falei do Dr. K associando à casa da (…), não... falei sobre... sobre contactos sexuais que tive com o Sr. K... porque para mim, pelo menos, parecia óbvio aquilo que "tava" a dizer…” - (Juíza Presidente – O que é que quer dizer com isso, parecia óbvio o que é que estava a dizer?) -, “…para mim, parecia que se podia perceber aquilo que... que estava a associar… o Dr. K à casa da (…)... por isso não expliquei tudo porque, como também já disse, "tava" farto de prestar declarações…” - (Juíza Presidente) – E foi-lhe perguntado o que é que se passou na casa da (…)?; (AI) – hum... não….não me lembro disso.) - . E quanto ao arguido H - (Juíza Presidente – Mesmo não achando, começou por dizer em relação ao Sr. H que não fez qualquer referência porque achava que por não achar … porque não achava tão grave os actos de sexo oral como de sexo anal….mas em nenhum lugar das suas declarações referiu o Sr. H. Porquê? - “…porque eu só me referia, também quando referi os senhores arguidos, só me referia a... aos actos de natureza anal…aos actos sexuais de natureza anal…não referindo assim o Sr. (…), o Sr. H... por também não achar, não achando que fosse tão grave….” (mas consignando o Tribunal que a reprodução que fez dos excertos que antecedem, não são as únicas explicações que deu, sem prejuízo de o demais, na avaliação do Tribunal, não alterar o sentido do ex(...)s pelo Tribunal). De tudo o que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu prevalência, credibilidade e veracidade, às declarações prestadas na audiência. 13.3.22. Ainda relacionado com o que antecede, concretamente com a omissão do nome do arguido H e do abuso deste arguido perante a Sra. Juiza de Instrução Criminal, como “significando” que o nome e o abuso por parte deste arguido foi “ficcionado pelo assistente”, a Defesa deste arguido invocou por um lado, o depoimento do pai biológico do AI, o qual disse ao tribunal que falou com o filho e este não lhe falou no nome do arguido H. E, por outro, o facto de o arguido ser uma pessoa conhecida da televisão, onde o AI pode ter ido buscar o seu nome. Começamos por dizer que não obstante o AI não ter mencionado perante a Sra. Juiza de Instrução quer o nome, quer o abuso do arguido H - ou, acrescentamos, o abuso do arguido K -, tal não foi suficiente para que a Sra. Juíza de Instrução, que ouviu o assistente, não pronunciar tais arguidos e por tais factos. Passando ao depoimento do pai biológico do assistente, a testemunha HV, dizemos que resultou das declarações do assistente, dos depoimentos das educadoras do AI - e cuja súmula fizemos acima – dos registos dos livros de ocorrências do Lar onde o AI esteve – cfr. Apenso W-16, 1º volume e Apenso W-13-Livro 1 -, do processo individual do assistente – Apenso DD -, do processo psicossocial do AI – constante do Apenso z-15, 1º volume - e do depoimento de YM, que o AI cresceu sem a presença do pai, este não teve contacto ou intimidade com o filho, tendo a aproximação ocorrido já após o inicio deste processo. Como resulta destes elementos o pai não tinha o filho consigo, pelo menos, porque a sua mulher, que não era a mãe do AI, não se entendia com o AI, tendo no entanto outros filhos consigo. É certo que também resulta de tais elementos que o pai do AI esteve sujeito a internamentos e aparentemente relacionados com o foro psiquiátrico - a própria testemunha disse que teve dois internamentos em FFG -, o que pode ter limitado a sua capacidade para agir de outra forma e estar mais presente na vida do filho. Mas, o que releva, neste momento, é que não esteve, e para o Tribunal não tinha intimidade com o filho, pelo que a conversa que teve com o AI e o que este lhe disse na conversa que relatou ao Tribunal, pode ser uma parte do que se passou consigo. Assim, é verosímil que o AI não tenha falado “de tudo” ao seu pai, nem tenha tido à vontade para isso, na conversa que este relatou ao tribunal. Pois não tendo intimidade com o Pai biológico, não é provável e normal que se fosse “abrir” com ele de forma incondicional. Aliás, o depoimento do pai do AI permite esta conclusão, tendo em atenção a forma como contou a conversa com o filho e as perguntas que lhe fez: disse que só lhe pediu dois nomes, porque segundo as notícias havia mais nomes; a testemunha só queria dois nomes, não queria ouvir falar muito, porque dado o “estado” em que viu o AI, chorava – choro de quem não estava à vontade para contar ao pai - , nunca mais quis falar com o filho acerca disso. Acresce e voltando à família de acolhimento, que a testemunha YM também disse que quando estes factos foram conhecidos o AI não quis falar consigo, nem com o seu marido, sobre o assunto. Não era um assunto de que falasse ou de que quisesse falar. Pelo que o facto de o assistente não ter falado ao pai no nome, por exemplo, do arguido H, para o tribunal não é, por isso, significado de mentira e de invenção do nome e do abuso. Quanto ao segundo aspecto focado pela Defesa - o AI conhecer o arguido H (…) -, a testemunha YM confirmou o que o AI tinha dito ao tribunal: (…), os seus filhos (que eram da idade do AI) não sabe se conheciam a “pessoa H”, a testemunha e o marido conheciam. E atenta a diferença de gerações, dizemos que é natural que o AI não tivesse como imagem (…) o arguido H. Acrescentamos, também, que o facto de o AI, quando estava a ser interrogado, ter falado, associando, a imagem do arguido H a (…) – “JJW” -, resulta de forma inequívoca da audição das suas declarações, que (…) foi dita ao AI. É certo que este aderiu, pois das suas palavras resultou, efectivamente, associar o arguido (…). Mas o nome (…) não foi dito por si de forma espontânea, não partiu de si, pelo que equívoco que possa haver quanto ao nome (…) que, efectivamente, o arguido fez, não é, para o Tribunal, no caso concreto sinónimo de mentira do assistente. 14. (Da possibilidade da ocorrência dos factos na casa sita na (...) (…), nº (…), em (…)). Para a convicção dos factos que o Tribunal deu como provados e como não provados, quanto a este segmento do Despacho de pronúncia (capítulo 6.7.2., mas também quanto aos demais factos e segmentos do despacho de pronúncia, em que o Tribunal deu como provados factos ocorridos na casa (...) (…), nº (…), em (…) e cuja exposição, por “assistente/vítima” é feita em momentos posteriores da presente análise crítica da prova, foi também concorrente a análise que o Tribunal fez da prova produzida, quanto a um outros aspecto da possibilidade ou impossibilidade, de os factos terem ocorrido na casa de (…). A saber, neste momento, da sua possibilidade ou impossibilidade, sob a perspectiva da arguida Q e da possibilidade da ocorrência dos factos na sua casa. É análise relevante, como dissemos, para os factos constantes de outros capítulos do Despacho de Pronúncia, pelo que o Tribunal opta por o fazer desde já, ficando a presente análise extensiva ás demais situações. 14.1. Quanto a esta questão, descrição da Casa de (…), possibilidade ou impossibilidade de os factos terem ocorrido, em função da vida e da vivência da arguida Q, os arguidos apresentaram testemunhas que em audiência de julgamento fizeram a sua descrição do local, falaram sobre a arguida e sobre o conhecimento que tinham da sua vida. Começando pela testemunha NA (o qual foi o construtor da casa da arguida Q, descrita no despacho de Pronúncia), disse que a casa desde 1982 não teve alterações. As alterações ao projecto foram feitas por si aquando da construção e consistiram na ligação das duas salas com um arco (as divisões que já referimos identificadas na planta como Sala de estar e Sala de jantar) e fechar uma porta que existia no corredor para uma das salas (o que foi visível na parede do tal corredor que dá acesso à cozinha, quando o Tribunal se deslocou ao local). Disse contudo que os painéis solares que estão colocados no telhado não foram colocados por si. O Tribunal, do que viu, também não ficou com a percepção que, na sua estrutura, a casa tivesse sofrido obras recentes que alterassem a localização das divisões, de forma a que onde anteriormente fosse uma sala agora fosse uma escada, por exemplo. Esta referência tem a ver com declarações que foram prestadas por um assistente, concretamente AV, avançando o tribunal, desde já, que não considerou verosímil que a casa tivesse sofrido alterações no sentido dito pelo assistente. Esta questão da ausência de obras na casa desde a sua construção, foi corroborada pelas testemunha HB – disse que a sua mulher é irmã do marido da arguida Q -, testemunha que também falou e demonstrou conhecimento quanto à vida da arguida, dada a relação familiar existente. Disse que nunca viu qualquer um dos arguidos em casa da arguida e mesmo o arguido N, apesar de ser de (…), nunca o tinha visto. Das suas declarações o Tribunal depreendeu que visitava a arguida, embora do seu discurso o Tribunal não tenha extraído ser uma visita “frequente”, mas pelas ocasiões festivas de aniversário ou Natal. A testemunha HT, assistente administrativo no HU de (…), disse ser amigo da arguida Q desde 1993, conheceu-a como ama da segurança social, a sua mulher teve um problema de saúde e a sua filha (…) (que “hoje”, quando a testemunha esteve a depor, em 22/01/07, tem 13 anos) ficou algumas noites em casa da arguida, a qual tratava por “(…)”. Falou da disposição interior da casa da arguida, pensa que o hall de entrada é revestido a azulejos, mas não tem a certeza, “nunca lhe constou frequências estranhas” em casa da arguida. Ia ao cabeleireiro do genro da arguida e quando ia, ao sábado à tarde, às vezes deixava a filha em casa da arguida, mas não se conseguiu recordar desde quando o cabeleireiro deixou de estar ao pé de casa da arguida. Às vezes, ao fim de semana, visitava a arguida Q, para a filha a ver, tem bom relacionamento com a arguida, é como se fosse uma casa de família. O arguido N só o conhecia de “ver passar”. Não localizou no tempo quando foram estas idas, ao fim de semana, ao cabeleireiro do genro da arguida. A testemunha HP, professora aposentada, disse ser amiga da arguida Q há 18/19 anos, conheceram-se nos cursos de cristandade. A arguida alugava quartos a hospedes, não era habitual deslocar-se com o marido para fora. Conhece o arguido N como colega, relacionou-se com o mesmo nessas circunstâncias e os demais arguidos só da televisão. Nunca viu o arguido N em casa da arguida Q e às vezes ia lá. Também nunca lá viu a empregada do “Dr. HN, HM (HM; testemunha esta que, como veremos, também falou sobre idas a casa da arguida). A testemunha MI também disse ser amiga da arguida Q. O marido da arguida trabalhava no centro de saúde, nunca viu os arguidos em (…). Não acrescentou muito mais, do ponto de vista do Tribunal, pois foi um depoimento em que as respostas não foram muito descritivas, já que respondia “sim” a perguntas longas e por vezes com respostas incorporadas. Foi, por isso, um depoimento que não assumiu particular relevância para esclarecer o tribunal. YQ disse ao tribunal ser amiga da arguida Q, é madrinha de uma das netas da arguida, conhece a sua casa em (…) e conhece-a desde há 18 anos. Durante os anos de 89/2001 foi, pelo menos, uma vez por semana a casa da arguida e não viu que esta tivesse feito obras ou alterasse os revestimentos das paredes ou das escadas. Ao fim de semana ia a casa da arguida com frequência, pois visitava a filha da arguida (a qual mora na c/v do prédio da arguida) e os filhos desta, os quais iam a casa da avó. Conheceu também o salão de cabeleireiro que o genro da arguida tinha na cave do prédio ao lado, pensando que se mudou em 2001. Conheceu o arguido N na Escola Secundária e nunca ouviu qualquer referência da arguida Q ou da família a N, não o viu lá em casa nem nas proximidades. Também nunca viu os demais arguidos em casa da arguida e não os viu em (…). Se entrassem grupos de jovens lá em casa dava por isso. A testemunha HM, disse ao Tribunal ser amiga da arguida Q desde há 20/21 anos. Declarou ter trabalhado de 99/2001 em casa do Dr. HN, o qual mora na casa geminada com a da arguida, em (…), no nº (…). O horário de trabalho da testemunha era das 9h às 20h e ao sábado trabalhava todo o dia, mas ao Domingo só de manhã. Disse que ia “com muita frequência” a casa da arguida, por ser sua amiga, acrescentando que a arguida era uma “pessoa encantadora”. Entrava sempre pela porta de trás – mesmo ao sábado, sempre que podia ia a casa da arguida - , durante a semana a partir das 8.30h havia pais a deixarem as crianças em casa da arguida. Para além das pessoas de família – dizendo irmã, irmão, sobrinha, filha, genro -, que visse outras pessoas entrar “não se lembra”. E se houvesse barulho em casa da arguida tinha dado por isso, pois nas casas ouve-se tudo de uma para a outra. Confirmou a existência do cabeleireiro do genro da arguida, na parte de baixo do prédio onde a testemunha trabalhava, disse que esteve lá até 2000/2001, não sabe bem, mas tinha muito movimento. Não viu os demais arguidos em casa da arguida, sós os conhece da televisão, incluindo o arguido N. HO, vizinha da arguida Q, disse ser comadre da arguida (o seu filho é casado com a filha da arguida), residindo na (...) (…) nº (…), em (…), na casa geminada com a da arguida (e explicou que o seu é o nº (…) e o Sr. HN, que vive por cima, no mesmo lado, é o nº (…)). Disse viver permanentemente naquele local há cerca de 16 anos, o seu filho teve um salão de cabeleireiro de homens na parte de baixo do prédio (disse R/C), trabalhava lá sozinho, saiu para outro local no ano 1999/2000. Disse que o horário de trabalho, ao sábado, era o dia inteiro. A arguida Q teve hóspedes em casa, embora a partir de 1999 tenha deixado de os ter. Declarou ser grande amiga da arguida Q, sabe que a mesma toma conta de crianças e que o marido em 1999 teve um problema de saúde, que esteve meses de baixa, em casa sem sair, embora não saiba qual foi a doença que teve. Acrescentou que no ano de 1999 frequentava quase todos os dias a casa da arguida durante a semana, pois os seus netos viviam lá, indo pelas traseiras da casa. Continuou a dizer não se recordar qual foi a doença do seu compadre (marido da arguida Q). Descreveu o interior da casa da arguida e que não viu obras ou alterações. Disse não conhecer os demais arguidos, nem o arguido N, nunca viu em casa da arguido Q os demais arguidos, nunca viu carros de luxo à porta, só viu os carros dos vizinhos. Quanto à arguida disse considerá-la uma pessoa de bem e uma pessoa verdadeira. IB, educadora de infância, disse ao Tribunal ter sido hóspede da arguida Q de Outubro de 1997 a Julho de 1998 (na casa da (...) (…), nº (…) em (…)). Disse que nessa altura a arguida já era ama da segurança social, falou da sua vivência enquanto hóspede, estava em (…) de 2ª a 6ª feira e dizia sempre à arguida quando ia de fim de semana para a sua casa. Falou do conhecimento que teve da vida da arguida nessa altura, esclarecendo que não viu rapazes a frequentarem a casa ou qualquer um dos arguidos que veio a ver na televisão. Quanto a um salão de cabeleireiro do genro da arguida, lembra-se de ter funcionado enquanto a testemunha lá esteve, “acha” que funcionava ao sábado mas nunca lá entrou. MB é genro da arguida Q. Falou sobre a sua vivência no prédio sito na (...) (…), nº (…), R/C, em (…), onde declarou habitar desde 1993, após ter casado com a filha da arguida Q (é o andar térreo que fica por baixo da casa da arguida). Prestou também esclarecimentos quanto ao exercício da sua actividade de cabeleireiro até Junho de 2001, no piso térreo da (...) geminada com a da arguida Q, que tem o nº (…). QR, foi vizinha da arguida até 2003, em (…). Disse ao Tribunal ter carinho pela arguida, o prédio onde viveu tinha uma casa de “diferença” do prédio da arguida e ia “muitas vezes” a casa da arguida, embora durante a semana fosse ao fim do dia, porque trabalhava durante o dia. No entanto ao fim de semana era visita frequente, à tarde, batia-lhe à porta e entrava. Disse saber que a arguida era ama da segurança social, “pensa que tinha miúdos durante o dia”, esclarecendo que entre 1998/20001 “pensa que sim…”, embora não se lembrasse de ver alguém deixar lá os miúdos, mas pensar que sim, isso, acontecia. Também falou quanto ao salão de cabeleireiro que o genro da arguida tinha na “cave ” do prédio da mãe, “por baixo da casa do Dr. HN” (esclarecendo que a testemunha vivia no nº (…)). Isto aconteceu entre 98/2001, pois o seu marido ia lá cortar o cabelo, estava aberto ao sábado todo o dia. Nunca viu carrinhas com miúdos, nunca notou ao fim de semana que isso acontecesse. No descampado em frente à sua casa estacionavam carros, mas nunca viu aglomerado de carros ou um (…). E não viu os arguidos em (…). Em contra instância do MºPº acrescentou que não se “preocupava muito com quem entra e sai”. Disse que não “faz ideia” se o marido da arguida esteve algum tempo fora, sabe que tem uma saúde precária “mas não sabe nada de especial”, acrescentando - na avaliação do Tribunal, em contraposição com o que foi o sentido inicial e afirmativo das suas declarações, e no sentido que afinal não tinha tanta intimidade com a arguida quanto inicialmente parecia resultar do seu discurso - , que “às vezes nem entrava” em casa da arguida. E acrescentando, nesta altura, não se recordar de o marido da arguida Q ter estado hospitalizado (foi confrontada em audiência de julgamento com a fotografia constante do “apenso TA”, fotografia panorâmica da (...) (…), onde está retratada a casa da arguida Q e onde indicou ao Tribunal a casa em que morava). Quanto a este depoimento, registamos aqui o que já dissemos anteriormente: é que ele revela, efectivamente, menos conhecimento do que aquele que, inicialmente, deixava supor. Com efeito a testemunha começou por ser muito objectiva e afirmativa quanto à proximidade e convivência com a arguida, o que se foi esbatendo à medida que foi sujeita ao contra interrogatório. VZ, empregado de escritório e reformado, disse ao Tribunal conhecer a arguida Q e o marido (e a viverem na casa identificada no despacho de pronúncia, sita em (…)). Andou com o marido da arguido num coro, o que sucedeu até 97/98. Esclareceu que iam a ensaios para dois coros, mas ao fim de semana (sábado, coro da Igreja) era quando a testemunha passava por casa da arguida, para ir buscar o marido para os ensaios. Após 1997/1998, só uma vez por outra é que passou por casa da arguida. Disse que quando o marido da arguida deixou o coro, foi numa altura em que teve um problema de saúde e depois disso deixou de ir aos ensaios com tanta frequência. “Acha” que foi em 97/98, o problema de saúde foi uma “trombose num braço”, esteve em casa acamado porque o foi visitar, mas não sabe se esteve no Hospital. Acrescentou que a partir de “1998 para a frente” muito raramente passou por lá (por casa da arguida). Sabe que a arguida era ama da segurança social, pois teve uma sobrinha lá, numa altura em que lhe morreu a mãe (o pai da sobrinha é HT, testemunha que também foi ouvida pelo Tribunal). Conhece N de (…), mas não de lhe falar, mas também nunca o viu em casa da arguida Q. Quanto aos demais arguidos não os viu em (…). XO, empresária, declarou conhecer a arguida Q e o arguido N de (…), tendo desde 1995 – com o seu marido, a testemunha SE -, um quiosque em (…), na (...) da “(…)”, (...) esta próxima da (...) (…). Prestou declarações quanto ao movimento da (...), tendo declarado nunca ter visto no local os arguidos A, H, K e mesmo N, nem um veículo (…). HL, empresária, declarou conhecer a arguida por ter sido ama dos seus filhos entre 1997 e Junho/Julho de 2001. Entrava em casa da arguida, sempre pela porta das traseiras e ia pela cozinha para a sala onde estavam as crianças. Deixava os filhos de manhã, 9.30h/10h e ia buscar à tarde 17h/17.30h. Uma vez chegou a entrar na sala “ à esquerda”. A arguida tinha um neto da idade do seu filho. Nunca viu um (…) estacionado na (...) , carrinhas (…) é possível. SE, (…), empresário de hotelaria, o qual declarou conhecer o arguido N. Disse ser proprietário de um quiosque situado no “lado o(...)” à (…), situado perto da Casa da arguida Q, pois do seu quiosque disse ver-se o início da (...) da arguida. Confirmou ao tribunal ter frequentado desde 1995 o cabeleireiro do genro da arguida, o que se situa no prédio da arguida, que deixou de estar naquele sítio “ há ¾ anos” (prestou depoimento em 9/11/06). Conhece o arguido N e não o viu em casa da arguida Q. Também nunca teve referência ou conhecimento que o arguido H tivesse estado em (…). PQ, (…), professor, o qual disse ao Tribunal ter vivido na (...) (…) nº (…) (viveu na casa do seu pai), tendo sido vizinho da arguida Q. Entre 1996 a 2000 esteve a estudar fora de (…), tendo regressado em 2000. No entanto enquanto esteve a estudar ia a casa 1 fim de semana por mês. Disse que a (...) ao fim de semana é bastante movimentada, pois é um sítio onde estacionam os carros para os bares e cafés, mas acrescentando que isto era a partir das 21.30h. Ao fim de semana os miúdos que via em casa da arguida eram os netos, nunca viu entrar para lá outros jovens. Não conhece o arguido N. O seu pai é amigo da arguida Q. 14.1.1. Passando às testemunhas apresentadas pelos arguidos da Esquadra da PSP de (…), o Tribunal procedeu à audição de algumas. Assim, a testemunha IO, (…), chefe da P.S.P. de (…), foi ouvido por videoconferência, não teve conhecimento de qualquer ocorrência na (...) (…), não tem ideia de ter visto um (…), mas carros “topo” de gama é “normal” naquela zona. KJ, (…), reformado, foi agente da P.S.P. em (…) de 1989 a 1997, KL, (…), Chefe da P.S.P. de (…), KN, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1998, KR, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 1995 KS, (…), agente principal da P.S. P. em (…) LI, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 08/10/1985 LL, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1990 ME, (…), agente da P.S.P. em (…) desde Setembro de 1995 NE, (…), agente da P.S.P. em (…)desde Agosto de 1993 OO, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 01/07/1995 PI, (…), chefe da P.S.P. de (…) QW, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1994 RB, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 02/08/1991 RC, (…), agente da P.S.P. em (…) desde Agosto de 1997 RU, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1990 SF, (…), chefe da P.S.P. de (…) ST, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde Janeiro de 1995 SX, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 1989 TG, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 03/02/1985 TH, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde Agosto de 1992 TY, (…), agente da P.S.P. em (…) TZ, (…), chefe da P.S.P. de (…) UK, (…), agente da P.S.P. em (…) desde Agosto de 1997 UU, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 1989 VC, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 1993 VV, (…), chefe da P.S.P. de (…) VY, (…), agente da P.S.P. em (…) desde Janeiro de 1991 WB, (…), agente da P.S.P. em (…) desde Agosto de 1992 WC, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1981 WK, (…), agente principal da P.S.P. em (…) desde 1990 AAE, (…), subcomissária da P.S.P. de (…) DDB, (…), agente da P.S.P. em (…) desde 1996 DDM, (…), chefe da P.S.P. na Esquadra de Investigação Criminal de (…) EEG, (…), Policia de Segurança Pública em (…) desde 1991, não viram factos, nem tiveram conhecimento de factos, relativos à presença dos arguido C, N, E, H ou K na casa da arguida Q. 14.2. A primeira avaliação destes depoimentos – e começamos pelas testemunhas referidas no ponto “14.1.”, é que não deixa de ser relevante o número de pessoas que disseram ao tribunal ter relações de proximidade ou com a arguida ou com o local/(...) onde residia e nada ter visto quanto a idas de pessoas, jovens, homens a casa da arguida. E sendo pelo menos um dos arguidos uma pessoa (…) – o arguido H -, nenhuma destas testemunhas disse ao tribunal ter visto este arguido no local, proximidades, ou em (…). No entanto, quando olhamos para estes depoimentos não cada um por si, mas de forma global – e agora estamos a falar das testemunhas que demonstraram pelas suas declarações ter tido relações que proximidade com a testemunha -, há um aspecto que ressalta ao tribunal: as testemunhas foram globalmente afirmativas no sentido de serem visitas da casa da arguida, algumas afirmando dias de semana, dias de fim de semana. Afirmando, assim, proximidade com a arguida, com frequência e assiduidade. Mas quando perguntadas, por exemplo, quanto ao conhecimento de um problema de saúde que o marido da arguida Q teve, a testemunha HO - o seu filho é casado com a filha da arguida – , que disse viver numa das fracções da casa geminada com a da arguida há cerca de 16 anos, ia a casa da arguida para ver os netos, disse que a doença ocorreu no ano de 1999 e não se recordou de qual a doença. A testemunha QR - que começara por afirmar que ia “muitas vezes” visitar a arguida a sua casa, embora durante a semana fosse ao fim do dia pois trabalhava durante o dia, no entanto ao fim de semana era visita frequente, à tarde batia-lhe à porta e entrava ; para num segundo momento, como assinalámos, na contra instância do Ministério Público, ter-se esbatido a proximidade da convivência com a arguida que afirmara inicialmente, pois acabou a dizer que “não se preocupava muito com quem entra ou quem sai” da casa dos outros, “que às vezes nem entrava” na casa da arguida -, disse não fazer ideia se o marido da arguido teve algum tempo fora, sabe que tem uma saúde precária mas “não sabe nada de especial”, não se recordar se o marido da arguida esteve hospitalizado. Por sua vez a testemunha VZ - e tanto quanto o Tribunal depreendeu do seu depoimento, pois relacionou o fim das idas do marido da arguida a ensaios do coro, à situação de doença - , localizou a doença do marido da arguida em 1997/1998 (uma trombose num braço). Em audiência de Julgamento a arguida Q disse ao Tribunal que a doença do seu marido foi no ano em que a sua neta nasceu, deu a referência ano 2000 e a doença do seu marido foi o “inicio de um AVC”, tendo estado cerca de um ano em casa a recuperar. Sendo, atenta a normalidade das coisas, face ao que podem ser as consequências de um AVC, um episódio marcante - e no caso concreto o marido da arguida esteve em casa a recuperar, tendo a arguida dito cerca de um ano - releva, face aos depoimento específicos que prestaram quanto a tal questão, o facto de a testemunha HO ou QR não se recordarem a primeira testemunha, de que doença foi e a segunda testemunha de que o marido da arguida esteve doente, ou a localização no tempo que a testemunha VZ fez da doença. Não para dizermos que as testemunhas estiveram a mentir de forma deliberada ao Tribunal, porque não foi essa a percepção do Tribunal, mas para dizermos que a sua proximidade com a arguida era menor daquela que, numa primeira apreciação, as suas declarações deixavam supor. E a explicação de uma generalização que sobressaiu dos seus depoimentos, quanto à proximidade com a arguida, pode estar na amizade que revelaram demonstrar pela arguida ou pela sua família e na inverosimilhança de que estes factos pudessem ter ocorrido com a arguida ou na sua casa. Outro aspecto tem a ver com a frequência com que as testemunhas iam visitar a arguida e os períodos em que disseram ao Tribunal ter tido maior contacto com a arguida. A testemunha HT situa o maior contacto na altura em que a arguida foi ama da sua filha (da segurança social). A testemunha depôs em 22/01/07, disse que a sua filha “actualmente” tinha 13 anos, pelo que terá nascido em 1994. A arguida disse ao Tribunal que foi ama da segurança social dos “0 aos 4 anos”, pelo que situamos o maior contacto entre a testemunha e a arguida até 1998. É certo que também disse que ia ao cabeleireiro do genro da arguida e que às vezes ao fim de semana ia com a filha visitar a arguida. O Tribunal não tem motivos para duvidar que isto não correspondesse à verdade e embora não tenha ficado assente qual a frequência destas visitas, do depoimento das demais testemunhas (que também disseram visitar a arguida) não resulta que se tenham encontrado com esta testemunha, ou vice versa. O que, se fossem visitas “regulares” e com proximidade no tempo, naturalmente tal surgiria do depoimento. A testemunha HP também disse ao Tribunal visitar a arguida, embora tenha acrescentado “às vezes” e disse que nunca viu em casa da arguida a testemunha HM (nem referiu ter encontrado qualquer outra). A testemunha HM - que disse de 1999/2001 ter trabalhado em casa do Dr. HN, que vivia num andar geminado com a casa da arguida -, foi uma das pessoas que disse ir com “muita frequência” a casa da arguida. No entanto diz que em casa da arguida, visitas apenas se lembra de ter visto a irmã, o irmão, a sobrinha a filha e o gero da arguida, afastando assim qualquer encontro com as demais testemunhas que disseram visitar a arguida. Não tendo o Tribunal concluído que as demais testemunhas ou esta, tenham estado a mentir deliberadamente ao Tribunal quando falaram quanto à proximidade com a arguida, quanto às idas a casa da arguida - ver também o depoimento da testemunha YQ, QR ou HL - como já acima dissemos a explicação “desta generalização”, que sobressaiu dos seus depoimentos, está para o Tribunal na amizade e consideração que revelaram demonstrar pela arguida e pela sua família e na inverosimilhança, para si testemunhas - pois isso foi claro da sua audição, de que estes factos pudessem ter ocorrido com a arguida ou na sua casa e com a proximidade das testemunhas. Para o Tribunal foi perceptível, como já o afirmámos, a consideração e estima que as testemunhas revelaram pela arguida e os seus “veredictos “ quanto à impossibilidade de estes factos terem ocorrido com a sua amiga ou vizinha, e nas suas (...) ou vizinhanças (aspecto que está de alguma forma relacionado com a avaliação que noutra sede o Tribunal fez, da possibilidade de estes factos poderem ocorrer na vida de pessoas com o padrão e enquadramento social que alguns dos arguidos demonstraram ao Tribunal ter). 14.2.1. Quanto aos depoimentos das testemunhas elementos da esquadra da PSP - sendo que alguns deles, como referimos, fizeram patrulhas/rondas pela cidade, abrangendo a (...) da arguida Q -, não trazem qualquer elemento que permita retirar, de forma directa, veracidade às declarações do arguido A, quanto a ter ido a (…) com assistentes e a casa da arguida Q, ou às declarações de assistentes, quando disseram ter ido a (…) com o arguido A, nas circunstâncias em que o disseram, a casa da arguida Q e ter estado com os demais arguidos e praticado os actos que o Tribunal deu como provados. Mas contribuíram para que o Tribunal tivesse especial atenção aos sinais, aos indícios de que determinada declaração dos assistentes ou do arguido A pudesse ter como pressu(...)s o que (pelo menos) as defesas dos arguidos C, E, H e K especificamente alegaram, alegaram e que atrás já analisámos, da “manipulação das vítimas na fase de inquérito para acusarem os arguidos” e da “manipulação por parte de algumas vítimas, de forma a os arguidos serem acusados, o que fizeram através da consciente criação de uma história, por parte de alguns assistentes, a que outros aderiram, consciente ou inconscientemente”. O Tribunal, pela natureza das coisas, faz a avaliação do que lhe é dito e como é dito com um distanciamento diferente dos arguidos, dos assistentes e das testemunhas, configura e cruza os demais elementos de prova levados para o processo. O pré - juízo, quer num sentido quer noutro, tem sempre que estar ausente da avaliação dos factos. O Tribunal teve que configurar, sempre, a possibilidade da criação da história (tese da Defesa) e a possibilidade de os factos terem ocorrido (tese da Acusação). Mesmo que a história saia da realidade, até aí, conhecida pelo Tribunal. Um quadro como o que é descrito nestes autos, não é o “normal” de ocorrência nos processos de abuso sexual que normalmente julgamos. O que foi, efectivamente, uma dificuldade acrescida de compreensão da realidade que é contada. Não é uma realidade que, à partida, se configure facilmente. E, concluindo quanto aos depoimentos que estávamos a tratar, na ponderação destes depoimentos - testemunhas “de (…)” e da esquadra da PSP de (…)- não resultou para o Tribunal que os mesmos, só por si, tivessem a capacidade de afastar as conclusão a que o Tribunal chegou, quanto à credibilidade e veracidade das declarações do assistente AI, em relação ao factos que o Tribunal deu como provados, como tendo ocorrido com este assistente em (…). Nem, completamos – avançando desde já -, para as conclusões a que o Tribunal chegou noutros capítulo da presente análise crítica da prova, em relação a outros assistentes e aos factos que, em consequência disso, o Tribunal deu como assentes, em relação a factos de abuso ocorridos na casa sita na (...) (…), nº (…), em (…) com os assistentes, por exemplo, AP, AT ou Y. Quanto à factualidade que temos estado a referir em relação ao AI, o Tribunal teve o assistente na sua frente, foi interrogado e contra interrogado pelos sujeitos processuais e o Tribunal - por tudo o que acima disse - criou a convicção que os actos descritos pelo assistente ocorreram. Mas não deixámos de expor o caminho seguido. 14.3. Passemos, então e relacionado com o que antecede, a analisar as declarações que a arguida Q prestou perante o Tribunal. (1) Em audiência de julgamento a arguida disse ao Tribunal que, anteriormente ao início deste processo, não conhecia qualquer um dos arguidos, nem mesmo o arguido N. Negou a prática de qualquer uma das condutas que lhe são imputadas, disse que nada têm a ver com a sua natureza, sempre viveu a sua vida de forma honesta, viu-se envolvida neste processo sem saber a razão de tal envolvimento e do porquê da sua casa ser apontada. O Tribunal perguntou-lhe se ao longo deste tempo tinha pensado em alguma justificação, explicação, alguma questão com algum vizinho, alguma razão, mesmo que considerasse imaginativa, para este envolvimento, se alguma vez tinha “ouvido” alguma coisa que pudesse apontar para uma situação parecida com a que estava em neste processo, em (…), na sua (...) e disse que não. Começou por falar ao Tribunal da sua vivência pessoal e familiar - declarações que o Tribunal valorou para os factos que deu como assentes quanto às condições pessoais da arguida -, dos hóspede que teve e durante quanto tempo os teve, que foi ama da segurança social durante 10 anos (crianças dos 0 aos 4 anos, podendo haver alguma excepção até aos cinco anos, em alguma situação de não haver vaga para a criança passara para a pré/jardim infantil), tomava conta de cinco crianças. O que recebia dos hóspedes ou das crianças, era para a sua vivência. Disse ao Tribunal que o seu marido esteve doente - declaração já acima mencionada, aquando da análise crítica da prova dos depoimentos das testemunhas vizinhos ou amigos da arguida -, teve um princípio de AVC, esteve hospitalizado alguns dias e esteve em casa durante um ano. Disse ao Tribunal que tal ocorreu tinha a sua neta poucos dias de vida e a sua neta tinha (quando “começou” este processo) cerca de dois anos e meio, situando o seu nascimento no ano 2000 (13/05). O Tribunal perguntou-lhe sobre os seus vizinhos, quem eram, dizendo ao Tribunal que os conhecia, mas não sabia dizer exactamente os nomes de todos. Conhecia “muito bem” a Sra. D. YE, o Dr. HN que vive num andar da casa geminada com a sua, o Sr. JJX que “morava na outra casa pegada” com a sua. Das suas declarações resultou que este vizinho não era o que vivia na casa geminada com a da arguida, mas vivia, estando de frente para a moradia da arguida, na que se situa do lado esquerdo. Aqui temos que notar o que foram os problemas de lateralidade ou de lapso de comunicação entre o Tribunal e a arguida, pois a arguida, dando-lhe o Tribunal como referência posicionar-se “de frente para a sua casa” e perguntando-lhe de que lado é que se situava a casa deste vizinho, por várias vezes insistiu respondendo “do lado direito”. Dizendo “… é o do lado direito, pegada com a minha casa, estando aquele portão largo…”, com uma parede subida, tendo no entanto o equívoco ficado desfeito ao fim de alguns esclarecimentos. O número de porta da casa deste vizinho era o nº (…). Na casa a seguir vivia um vizinho que tinha uma panificadora. Descreveu a sua (...) como sendo uma (...) “calma”, tem mais movimentos às 6ª e Sábados a partir das “sete da noite”, por causa dos jovens que vão para bares e discotecas. Durante o ano de 99/2002 o que se apercebeu - em relação à pergunta que lhe foi feita se durante este período se apercebeu se os carros estacionados eram só os das pessoas que moravam na (...), ou se se apercebia se havia outros carros ou se não tinha noção - é “…que era uma (...) calma e os carros que dei estarem eram das pessoas que moravam ali…”, tirando as sextas e sábados, como já tinha referido. Disse que a sua (...) não era uma “(...) de passagem”, no sentido de ser uma (...) que para as pessoas irem para determinado local, para o centro ou situação no género, tinham forçosamente que passar, era uma (...) “…pouco movimentada…”. Na sua (...) as crianças que ali andavam eram as “… que moravam na (...), iam para o largo em frente jogar à bola, vinham das casas da (…) às vezes brincar…”. O Largo que havia em frente da sua casa também servia para estacionamento de carros ao fins de semana. Relatou ao Tribunal como é que os inspectores da Polícia Judiciária a contactaram pela primeira vez, dizendo que tudo “… começou em meados de Fevereiro de 2003…”. Disse que a partir daí “… foi um buraco que se abriu no chão até hoje, que eu não consigo ver a luz do dia…”, o que disse de forma visivelmente emocionada para o tribunal. Relatou uma situação em que o Inspector BZ apareceu com um rapaz à sua porta, que disse chamar-se AV, o qual dizia que era ali, naquela casa, que tinha sido levados os rapazes para estarem “…com estes senhores…”. Não se lembra se foi neste dia ou no seguinte que foi ouvida na Polícia, mas associou este momento com aquele após o qual e pela primeira vez, viu a fotografia da sua casa na comunicação social. Quanto à sua casa, disse que em relação ao interior da casa nunca viu qualquer fotografia na comunicação social, quer nesta altura, quer anterior, quer posterior, nem teve conhecimento que alguém tivesse fotografado o interior da sua casa em momento anterior a este processo. Para o Tribunal foi seguro que o interior da sua casa não andou a ser divulgado na comunicação social e, portanto, não foi por esse meio apreensível pelos assistentes. Na sequência de pergunta que lhe foi feita - se alguma vez pensou na casa do nº (…), da sua (...), como casa onde se passavam coisas estranhas, a casa do vizinho JJX - , disse que não, “… nunca vi nada que fosse estranho, nunca pensou.” Também disse que não se apercebeu de movimentações nessa casa, da saída ou entrada de pessoas, jovens, ao fim de semana. Nem se apercebeu disso na (...). Para essa casa não “… era normal entrarem jovens…”. Respondendo a pedidos de esclarecimentos que lhe foram feitos, disse que “…nunca viu…” no descampado, em frente ao nº (…), que estivessem “grandes máquinas”, como também respondeu que não viu entrara para este “nº (…)” homens que não “fossem dali”. Respondeu que as “grandes máquinas” viu-as só depois, relacionando com o momento em que a sua casa foi conhecida na comunicação social, a andarem “… para a frente e para trás, a minha (...) parecia uma romaria, carros grandes, carros pequenos…”. Especificamente em relação ao arguido A e a pergunta do tribunal, disse que “… A ou nome (…) só o viu na TV…”. Não sabia de onde era e nos pedidos de esclarecimentos que lhe foram feitos pelo Ministério Público - a pergunta feita em concreto e que deu origem a esta resposta, foi qual “…a primeira vez que ouviu falar de N?” - disse que a primeira vez que ouviu falar de “N” “… acho que foi quando foi para ser Advogado do (…). Viu através da comunicação social. Antes não tinha ouvido falar…” . O Tribunal não pode deixar de assinalar o que, na altura, esta resposta deixou transparecer, tendo em atenção a forma e a entoação que a arguida deu a esta resposta e que nos pareceu ser, de facto, uma forma natural de a arguida se exprimir. A arguida quando prestou estas declarações ao Tribunal, foi no dia 9/10/20008. Até aí - e o Tribunal fez a verificação do que vai dizer da forma mais precisa que lhe foi possível - , a referência por parte dos demais arguidos ao arguido A (dos que prestaram declarações), foi feita por A ou A, com excepção do arguido C, que em algumas situações usou o “nome” (…). Quanto ao Tribunal, sempre se referiu pelo nome A ou A. A naturalidade, para o Tribunal - atenta a dinâmica da pergunta que em concreto foi feita e a resposta que foi dada e como foi dada -, com que a arguida utilizou a palavra “(…)” para se referir ao arguido A , foi perceptível na resposta dada. É claro que isto não permite dizer, só por si, que ao referir-se assim ao arguido é porque a arguida já o conhecia. Mas deu-nos a percepção de que a arguida, de forma natural, referiu-se ao arguido de uma forma mais informal. E tendo em consideração o que a arguida declarou do que tem sido para si este processo, o mal que fez na sua vida e na sua família - sendo que o arguido em audiência de julgamento disse ao Tribunal ter ido a casa da arguida levar rapazes -, esta “informalidade” pode ser, associada a outros elementos, valorada como indicio de que a arguida conhecia ou contacto com o arguido A, como este disse ao Tribunal. (2) Após ter prestados as declarações - e conforme resulta da acta da audiência de julgamento de 9/10/2008, Despacho de fls. 60.249 a 60.250 e do consignado a fls. 60.250/1 - , a arguida foi confrontada com as declarações anteriormente prestadas perante o sr. J.I.C., auto de fls. 7.374, concretamente declarações constantes do 6º ao 8º parágrafo. E confrontada com tais declarações, perante este Tribunal disse que ao sr. Juiz de instrução: - não disse saber de onde o arguido A era natural (§6, de fls. 7.374); - não disse ocorreram movimentações de entrada de indivíduos com “grandes máquinas” no nº (…) da sua (...) - a casa que acima foi referida ser do vizinho Sr. JJX e que estando de frente para a casa da arguida, é a que se situa ao lado esquerdo da casa da arguida - (§7, de fls. 7.374); - sendo que quanto aos muros, a arguida referiu-se ao esclarecimento que tinha dado ao tribunal, que o muro foi levantado mas por causa dos cães (§8, de fls. 7.374). Perante esta negação da arguida o Tribunal perguntou-lhe se o seu Advogado tinha estado sempre presente consigo, se quando a arguida prestou declarações o seu advogado esteve sempre presente, a que a arguida respondeu que sim. Se no fim das declarações as mesmas foram-lhe lidas, respondeu que sim, não sabendo no entanto se quem lhas leu foi o Sr. J.I.C. ou se foi o Sr. Funcionário que estava na diligência. Se pediu para ser alterada alguma coisa do que lhe fora lido e respondeu que não. Na sequência destas perguntas do Tribunal foram-lhe pedidos esclarecimentos por parte dos demais Sujeitos Processuais, incluindo pelo Ilustre Mandatário da arguida, incidindo sobre o estado em que a arguida se encontrava no momento em que prestou estas declarações, se estava perturbada, incomodada, enervada, o que a arguida esclareceu quer quanto à perturbação sentida, quer quanto ao motivo da sua perturbação e enervamento. Após o que antecede o Tribunal perguntou à arguida se naquele dia, por causa da perturbação, incómodo ou enervamento que sentiu, disse alguma coisa que não queria dizer e a arguida respondeu que não. E voltou a confirmar que o seu Advogado esteve sempre presente na diligência. É certo que em resposta dada - também na sequência de pergunta sugerida pelo seu Ilustre Mandatário -, disse que quando acabou a sua inquirição estava enervada, sentia-se “muito mal”. Esta pergunta destinar-se-ia, depreendemos, para demonstrar ao Tribunal que o “enervamento era tal”, que a arguida não teve “capacidade” para avaliar o que estava a ouvir ler, como aquilo que tinha dito. Mas dizemos o seguinte: pela forma como a arguida se exprimiu perante este Tribunal, como explicou a razão de ser do seu enervamento - relacionado com questão colocada e insistência, quanto ao seu conhecimento da naturalidade, de onde era o arguido A -, como afirmou ao Tribunal que por causa do seu mal estar, enervamento ou desassossego não disse coisas que não queria dizer, não alterou as suas declarações para alguma coisa que não queria dizer, não ficámos com a impressão de que aquela diligência foi “uma branca” para a arguida, no sentido de não saber o que tinha dito ou o que lhe tinha sido dito. Aliás e ligando com o que antecede, se o seu estado de enervamento fosse tal que não lhe permitisse ter qualquer noção de ouvir o que lhe estava a ser lido, de se lembrar do que lhe tinha sido perguntado e o que tinha respondido - como foi perguntado pelas Defesas -, então também não seria verosímil que na audiência de julgamento de 9/10/2008 se conseguisse recordar do que é que tinha dito, que “aquilo” que estava no auto não foi dito por si. Provavelmente não tinha conseguido explicar a causa do seu enervamento e descrever a diligência da forma que o fez. E, repetimos, a arguida foi segura perante o Tribunal, a responder que nunca disse nada que não quisesse dizer, ficando assim de fora a hipótese de ter dito o que consta no auto, em “relação o nº (…)”, por ter sido obrigada, coagida ou na expectativa de alguma “recompensa” processualmente relevante, se a mesma pudesse ocorrer. Acresce e não menos importante, a arguida esteve sempre representada por Advogado (constituído), o auto foi lido e o Tribunal não admite que o seu Mandatário “deixasse ficar” a constar as declarações em causa, com o teor que têm, se tal não correspondesse ao que foi dito pela arguida. Face ao que antecede, a explicação dada pela arguida para a divergência das versões, entre o que disse em audiência de julgamento e o que tinha dito em sede de 1º interrogatório perante J.I.C., não fez sentido, não tem uma lógica que nos permita dar credibilidade à sua justificação e, consequentemente, dar crédito às declarações que prestou perante o Tribunal em detrimento das que prestou anteriormente perante JIC. Acresce que a versão que deu em Tribunal dos factos em relação aos quais havia a contradição - e que motivou a leitura das declarações prestadas anteriormente perante J.I.C. -, revela-se incompatível com o que foram as declarações prestadas em audiência de julgamento ou por assistentes ou pelo arguido A e em relação às quais os Tribunal considerou credíveis e verosímeis. Com efeito, conjugando com o que o Tribunal disse em sede de análise crítica da prova, por exemplo, nos pontos em que analisámos as declarações dos assistentes AI ou AP, quanto aos factos que o Tribunal deu como assentes terem ocorrido em (…), por um lado; conjugando com a análise que o Tribunal fez das declarações do arguido A quanto aos factos relativos a (…), o já mencionado movimento do arguido de quando implica outros arguidos em situações que reconhece ter ocorrido ou quando faz declarações que possam permitir a inclusão de outros arguidos nessas situações, em regra não se exclui dessas situações, embora o que faça, quanto a si, é contar a história de forma incompleta, mas não deixando de dar elementos que nos permitem, em conjugação com demais meios de prova, chegar à sua real responsabilidade; a versão primeiramente apresentada pela arguida é compatível. E não é excluída pela prova que a arguida e os demais arguidos, entretanto vieram a apresentar, conforme se disse em sede de análise crítica da prova, dos depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas quanto à casa de (...), vivência da arguida Q e relacionamento com esta arguida. Assim, a razão pela qual o Tribunal deu mais crédito à versão dada pela arguida perante JIC, em relação aos factos constantes das declarações com os quais foi especificamente confrontada, em detrimento da versão que deu em audiência de julgamento. E que, perante o Sr. Juiz de Instrução Criminal, a arguida prestou as declarações que constam no §6, de fls. 7.374 e no §7, de fls. 7.374, sabendo o que estava a dizer. (3) E qual a relevância de a arguida, em audiência de julgamento, ter omitido a verdade quanto ao que tinha dito em sede de interrogatório perante J.I.C.? Para o Tribunal o sentido foi o de desligar-se da declaração que em altura anterior tinha feito, de que na sua (...) tinha visto “grandes máquina”, mas dizendo que se destinavam para a casa do vizinho. É certo - e ligando-nos com o que acima dissemos, quanto à análise que o Tribunal fez dos depoimentos das testemunhas que falaram sobre a arguida Q, sobre a casa da arguida, sobre as relações de proximidade que mantinham com a arguida -, que atenta a normalidade das coisas não deixa de criar interrogação como é que alguém se disponibiliza a proporcionar o espaço da sua casa para os actos que o Tribunal deu como provados, tendo a sua filha e neto ou netos, crianças, a viver por baixo. E que “ a vizinhança” de nada se tenha apercebido. E porque é que foi escolhida uma casa em (…), vindo os seus “utilizadores” de (…). No entanto estas interrogações – e pelo menos a que diga respeito ao “desconhecimento da vizinhança”, na parte em que possa não ser respondida com o recurso à análise que o Tribunal acima fez, dos depoimentos das testemunhas apresentadas em relação “à casa de (…)” -, não invalidam e não afastam, não “pesam mais” para o Tribunal, que o que foi a demais prova produzida e as conclusões a que o Tribunal chegou quanto à ocorrência dos factos. E quanto ao “desconhecimento da vizinhança”, acresce ao que já foi dito, que foi a própria arguida, nas declarações que prestou em sede de primeiro interrogatório e que em sede de audiência de julgamento alterou, de forma não credível para o Tribunal, que admitiu ter visto “grandes máquinas” na sua (...). O que não foi, contudo, relatado pelas testemunhas que por sua vez apresentou. 14.4. Já o referimos anteriormente, embora não de forma exactamente igual como agora o fazemos - e reproduzindo, por súmula, também para maior facilitação e concisão de exposição, o dito e citado no Ac. do S.T.J. de 23/04/2008 (Pº 05P3199, relatado pelo Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Soreto de Barros, www.dgs.pt; citação cfr. “Cristina Líbano Monteiro, In Dúbio Pró Reo, Coimbra, 1997) ), sendo da nossa responsabilidade a escolha dos segmentos citado - e fazendo esta referência relacionado não só com a análise crítica da prova que imediatamente antecede, mas com o que anteriormente já expusemos e com o que consta das exposições posteriores, mesmo que para núcleos de facto diversos dos que agora estamos concretamente a tratar, para a descoberta da verdade “(…) o juiz lança-se à procura do «realmente acontecido», conhecendo, por um lado, os limites que o próprio objecto impõe à sua tentativa de o «agarrar»(…). (…) «Verificar cada um dos enunciados factuais pertinentes para a apreciação e decisão da causa é o que se chama a prova, o processo probatório» e que «para levar a cabo esta tarefa, o tribunal está munido de uma racionalidade própria, em parte comum só a ela e que apelidaremos de razoável». E isto porque a «prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade»: « no trabalho de verificação dos enunciados factuais, a posição do investigador-juiz pode, de algum modo, assimilar-se à do historiador: tanto um como outro , irremediavelmente situados num qualquer presente, procuram reconstituir algo que se passou antes e que não é reprodutível». Donde que « não seja qualquer dúvida sobre os factos que autoriza sem mais uma solução favorável ao arguido», mas apenas a chamada dúvida razoável (“ a doubt for which reason can be given”). Pois que « nos actos humanos nunca se dá uma certeza contra a qual não militem alguns motivos de dúvida». «Pedir uma certeza absoluta para orientar a actuação seria, por conseguinte, o mesmo que exigir o impossível e, em termos práticos, paralisar as decisões morais». Enfim, «a dúvida que há-de levar o Tribunal a decidir tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do Tribunal»(…)”. O concreto trabalho de análise crítica da prova que este processo implicou, face ao que são os factos objecto do processo, as provas e meios de prova em concreto produzidos, a sua exposição tão próxima quanto possível do que foi o nosso processo lógico, racional, de exposição de dúvidas ou de razoabilidade da opção de avaliação tomada, foi duro e difícil. Ora face à natureza e diversidade da prova que chegou aos autos através das testemunhas, os seus depoimentos, pelo menos no que diz respeito aos actos de abuso em si e com estes arguidos - independentemente do tipo de participação ou contributo de cada um deles -, não forneceram uma prova directa dos factos a dar como provados ou não provados pelo Tribunal. Deram, sim o conhecimento de factos, com maior ou menor relevância, que conjugados entre si e com a demais prova em apreciação pelo Tribunal, concorreram para o Tribunal chegar à sua decisão de facto e dizer porque é que deu maior credibilidade ou valor a um depoimento em detrimento de outro, ou a uma declaração em detrimento de outra. Mas e esta uma das dificuldades objectivas no tratamento da prova, dada a sua extensão, sempre conjugadas numa unidade de sentido. Assim, cada elemento per si pode ser pouco, mas conjugado com outros assume peso, sentido e força intrínseca quanto à sua força probatória. Como pode haver núcleos de elementos probatórios que ligados entre si tenham uma aparência de consistência intrínseca - especialmente quando se aferem face a critérios de racionalidade pura, do que é o normal do dia-a-dia -, mas quando valorados face a outros, que em termos de racionalidade pura, do que é o dia a dia da vida do comum das pessoas, não têm força suficiente para retirar a convicção que o Tribunal formou quanto a estes últimos. E por uma razão que não deixamos de expor. A convicção do julgador não é uma convicção arbitrária, mas é objectivada até onde pode ser. Isto porque no processo pelo qual explicamos porque é que chegámos a determinada conclusão, interpretámos determinado gesto, modo de estar ou de falar, com determinado sentido, há necessariamente uma componente de convicção não inteiramente objectivável. É aquilo que advém da imediação - e o que estamos a dizer aplica-se, como é evidente, ao que foram as análise que o Tribunal fez das declarações dos Assistentes ou dos arguidos - e que os critérios de racionalidade pura, os conhecimentos científicos, teses ou teorias quanto à mente, à memória ou à sua recuperação, ou o que é a experiência comum por vezes não podem afastar. 14.4.1. E aqui fazemos a ponte, para um dos segmentos da análise que o Tribunal fez, em relação aos depoimentos das testemunhas apresentadas por todos os arguidos - A, C, E, H, K, N e Q -, quanto às suas qualidades pessoais, padrão de vida, enquadramento social, reputação. E em relação às declarações dos arguidos que perante o Tribunal disseram estar inocentes. Não deixa de ser relevante ter arguidos que perante o Tribunal e da forma que o fizeram os arguidos C, H, K, N e Q, com vidas familiares , profissionalmente cada um com a sua relevância e repercussão dizerem ao Tribunal, da forma que cada um fez, que estavam inocentes. Acompanhados, por sua vez, pelo número de testemunhas que cada um apresentou, algumas familiares e próximas dos arguidos - ou por razões de amizade ou por razões profissionais -, transmitindo, por vezes, um sentimento de incredulidade, impossibilidade, de aquele em relação ao qual tinha proximidade pudesse ter praticado os factos que lhe estão imputados. Mas, por vezes e a sociedade em que vivemos tem-nos mostrado isso - e referindo-nos também ao tipo de ilícito que está em causa -, nem sempre o senso comum, a natural racionalidade que advém do que é o senso comum e a experiência de vida de cada um, tem a potencialidade de afastar que determinados factos, em determinadas circunstâncias, possam ter ocorrido. Convocando aqui o que já dissemos num capítulo anterior, quanto ao número de pessoas que em audiência de julgamento depuseram quanto às qualidades profissionais e pessoais do arguido A, quanto ao total desconhecimentos dentro da AX de que tivesse ocorrido ou pudessem ocorrer os factos que o próprio arguido veio a confessar, ou que este os pudesse ter cometido, se não tivesse havido a confissão do arguido, o senso comum, a experiência comum, a razoabilidade, a racionalidade, excluía o sentido que o Tribunal deu à prova e os factos que veio a dar como provados? Entendemos que não. E não dizemos isto por o arguido ter confessado parcialmente os factos, porque o facto de o Tribunal dar como provado determinado facto, decorrente da confissão ou não do arguido, não quer dizer que dê como provado outros similares. Como os não deu e do que é demonstrativo situações concretas nos autos. Este Tribunal tem é que expor a lógica, os caminhos, as motivações, que permitam a sindicância pelo Tribunal Superior. E que permita a esse Tribunal aferir se a prova produzida em audiência de julgamento permite, ou não, o sentido dado pela primeira instância. 14.4.2. Assim e por tudo o que antecede, os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “125.” A “153.2” dos factos provados. (i) Sendo que em relação aos factos constantes nos pontos “125.8” a “127”, dos factos provados, o Tribunal deu ainda como provado que o arguido H admitiu que o AI tinha menos de 14 anos. Foi visível para o Tribunal, quando ouviu e viu o assistente perante si, que este tinha uma estatura magra e pequena, e já tinham decorridos cerca de cinco anos sobre os factos. Não é um jovem com barba “cerrada”, ou expressão pesada, aparentando menos idade do que aquela que tinha quando esteve perante o tribunal. Daí que, necessariamente, em fim de 1999 o arguido teve de equacionar a possibilidade de AT ter menos de 14 anos. Quanto aos demais factos relacionados com o conhecimento do arguido da consequência da prática dos actos no assistente, a idade do arguido, o seu percurso profissional e a capacidade que demonstrou em audiência de julgamento de compreensão e capacidade de valoração das situações, foram suficientes para o Tribunal. (ii) Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido A da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). (iii) Quanto à arguida Q, há factos que o Tribunal deu como provados em relação à mesma, que têm a ver com o presente ponto do Despacho de Pronúncia, mas também com outras situações relacionadas com factos ocorridos em (…). Assim e por forma a concentrar a fundamentação em relação a tais factos, o Tribunal conhece-os em conjunto, concretamente os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “118.3” a “118.13.”, “133”, “134”, “135.2”, quanto aos factos relacionados com a vivência da arguida, eles resultaram provados quer das declarações da arguida, quer da audição das testemunhas que já assinalámos anteriormente, vizinhas, amigos e parentes da arguida. Quanto aos elementos do dolo, das declarações dos assistentes não resulta, de forma segura, tendo em atenção as circunstâncias em que, por exemplo, AI disse que “viu “ a arguida - embora AP possa dar um contributo diferente, mas não esquecendo a idade que já tinha em 1999/2000 - suficientemente assente que a arguida tenha visto os demais assistentes de uma forma que, inequivocamente, o Tribunal pudesse concluir pelo dolo directo quanto à idade. Daí que o Tribunal tenha apenas dado como suficientemente assente que a arguida Q admitiu que os jovens pudessem ter idades inferiores a 14 e 16 anos. A arguida trabalhava com crianças, pelo que naturalmente teria uma maior sensibilidade para o calculo das idades. Quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados - em relação ao descrito no ponto “6.7.2. do despacho de pronuncia” - , no ponto “43.7.” dos factos não provados, há que dizer que não resultou de qualquer declaração prestada em audiência de julgamento, quer pelo assistente que teve intervenção nestes factos, quer pelos arguidos, incluindo o arguido A, que tenha sido visto o arguido N ou qualquer outro, a entregar dinheiro à arguida Q. E também não há qualquer admissão por parte do arguido A ou da arguida Q de recebimentos, não há registos de depósitos na conta bancária do arguido A ou da arguida, o educando não viu os arguidos receber, razão pela qual o tribunal deu tal matéria como não provada. É certo que o Tribunal deu como assente que o arguido A levou o AI a esse local para a prática de actos de natureza sexual no assistente. Deu ainda como assente que os actos passaram-se na casa da arguida. E deu também como provado que o arguido A deu dinheiro ao assistente, em montante que, contudo, não foi possível determinar, pois as declarações do assistente não foram seguras e suficientes quanto ao montante, quanto a tal facto, no dia e ocasião a que se referem os pontos “125.” a “125.11” dos factos provados e com os quais está relacionado o ponto “43.7” dos factos não provados. Mas o facto de o AI ter recebido dinheiro, ter sido remunerado pela sua ida a (…) e sendo a casa da arguida, atenta a natureza das coisas e à luz das regras da experiência comum, a arguida não iria ceder a sua casa para que os arguidos lá estivessem sem ter qualquer ganho. Mas esse ganho pode ser dinheiro ou pode ser outra qualquer vantagem. E o Despacho de pronúncia refere expressamente que a arguida recebeu dinheiro. Nos casos em que o Tribunal, não obstante o arguido A não ter sido “visto” a receber dinheiro de qualquer outro dos arguidos, deu como provado o recebimento de dinheiro, foram situações em que demos também como provado que o arguido, por sua vez - e na sequência de ter levado assistentes (ou dito para irem) a arguido - lhes deu dinheiro. E tendo os assistentes recebido concretamente dinheiro das mãos do arguido A (facto conhecido e dado como assente pelo Tribunal) após estes actos, não havendo interferência ou associação de qualquer outra pessoa aquela acção (do recebimento do dinheiro), sendo à luz das regras da experiência comum e da natureza das coisas que o arguido A deve ter recebido alguma recompensa por ter levado os assistentes, o Tribunal conclui que essa recompensa, tal como estava alegado no Despacho de pronúncia, foi monetária (dinheiro). Com efeito, dando dinheiro aos assistentes, pode-se concluir razoavelmente que o que recebeu foi dinheiro. Mas já não se pode fazer idêntica dedução e chegar a idêntico resultado, que a compensação que a arguida recebeu foi uma quantia em dinheiro, tal como estava alegado no despacho de pronúncia, pois em relação à arguida nem foi vista a receber dinheiro de alguém, nem resultou provado que deu dinheiro a alguém. Acresce que dos elementos bancários da arguida e que se encontram nos autos, também não permite concluir que o ganho que a mesma teve, por ter cedido a sua casa aos arguido, foi dinheiro, nem a Acusação, durante a audiência de julgamento, produziu prova que pudesse sustentar este facto que, especificamente tinha alegado. Daí o facto que o Tribunal deu como não provado no ponto “43.7” dos factos não provados e nas demais situações em que não deu como provado que a contrapartida concretamente recebida pela arguida foi dinheiro. Quanto ao arguido N e os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos 118., 118.1., 118.3., 118.13. a 118.15., 131., 132., 135., 135.1., quer das (poucas) declarações do arguido, quer do depoimento das testemunhas que já indicámos e que falaram sobre a vivência do arguido, resultou a prova para o Tribunal quanto à vivência do arguido em (…). Quanto as factos relativos ao seu dolo, bem como ao seu envolvimento como pessoa responsável pelo contacto da arguida Q para a cedência da sua casa, da conjugação das declarações do arguido A - que admitiu ter recebido do arguido N sobrescritos com dinheiro, mas dizendo que posteriormente os entregava aos jovens -, das declarações de AI, AT ou AN, foi globalmente consentâneo que era o arguido N que lhes abria a porta ou que dava os sobrescritos ao arguido A. O Tribunal, tendo ficado convicto que ocorreram factos naquela casa e face à aparente atitude de maior disponibilidade em relação ao espaço por parte do arguido N, que as declarações dos assistentes permite concluir, ficou convicto que foi o arguido N a contactar a arguida Q, para que esta disponibilizasse a sua casa, com o conteúdo que consta nos factos provados. (iv) E quanto aos demais factos que o Tribunal deu como não provados em relação a este ponto “6.7.2.”, ou em relação aos concretos aspecto do dolo dos arguidos e que acabámos de referir, tal resulta de não ter sido produzida prova suficiente pela Acusação quanto aos mesmos e, por isso, o Tribunal ter aplicado o princípio do in dúbio pró reo. 14.5. No seguimento do que acima já dissemos, os factos descritos na casa de (…) criam, numa primeira abordagem, interrogação e apreensão. Interrogámo-nos porque razão os arguidos iriam para (…), sendo quase todos de (…), quando poderiam encontrar outro local, discreto, mais perto das suas residências. E interrogámo-nos porque iriam os assistentes e o arguido A inventar (…), quando poderiam construí uma história, se se tratasse de invenção, mais perto da AX Porquê “(…)” é resposta que o Tribunal não pode dar. Mas quando chegámos ao momento em que o Tribunal, com as limitações que não deixará de expor, deu factos como provados em (…), fê-lo afastando, para si, a dúvida razoável que a lei exige. Porque há um aspecto do qual não nos podemos afastar. É que se o Tribunal acabou por acreditar nos assistentes e no arguido A, de forma que, para si, afastou a dúvida razoável, é também nisso que se funda a convicção. 14.5.1. E porque tem a ver com elementos de convicção, ou elementos coadjuvantes de convicção, é certo, como já dissemos inicialmente, que nos autos - e com excepção do que acima já referimos quanto ao arguido A e o arguido C e quanto ao arguido A e os demais arguidos, ou quanto aos demais arguido entre si, não consta o registo de chamadas entre si. Este elemento, que inicialmente não deixa de impressionar, após o Tribunal ter analisado os elementos remetidos pelas operadoras em relação ao telefones dos arguidos, incluindo os do arguido A, o número de ligações com (por sua vez) outros números cujo titular não é possível identificar, não exclui a possibilidade de haver contactos que, de forma simples e sem necessidade de artifícios complicados, fossem feitos. E quanto à utilização de telefones, no que diz respeito ao arguido H e na sequência do que acima já referimos, a circunstância da manutenção de vários aparelhos/IMEIS, onde foram funcionando cartões, de forma alternada, ao longo do tempo, afastam para o Tribunal a convicção da afirmação que o arguido fez ao Tribunal, que os seus registos telefónicos eram, exclusivamente, aqueles que constam em relação ao nº (…). No entanto isto não afasta que o Tribunal tenha considerado os registos telefónicos juntos aos autos pelo arguido, ou cuja junção requereu, porque o Tribunal considerou-os. Não ficou, contudo, convicto, que o arguido não tivesse a possibilidade e não fosse plausível, que pudesse usar outros cartões ou aparelhos, diferentes dos que foram apurados nos autos. O mesmo se passa em relação ao arguido K, face à multiplicidade de números que resultou da prova produzida em audiência, (…). No entanto e porque isso são as regras processuais, em todas as situações em que a Acusação não afastou, de forma segura para o tribunal, que os registos invocados pelo arguido - facturação, via verde ou Multibanco/visa - em determinada situação, não correspondem a utilizações feitas pelos arguidos, tal ausência de prova naturalmente funciona em beneficio do arguido. Outra circunstância que temos que referir, é que com exclusão, naturalmente, dos arguidos N e Q, a prova da Acusação da colocação de arguidos em (…) resulta, exclusivamente, das declarações dos assistentes e do arguido A. Há uma testemunha EEQ, que disse ao Tribunal que o arguido H, por uma ou duas vezes, não tendo a certeza se uma ou duas, almoçou no seu restaurante em (…), No entanto não foi seguro quanto à localização no tempo. Também aqui o Tribunal teve que decidir entre o peso do que foi adquirido em Tribunal. E nos casos - contados, tendo em atenção a forma como os factos estavam descritos no Despacho de Pronúncia -, em que o Tribunal deu como provado que se passaram factos em (…), fê-lo para além da dúvida razoável e avaliando o que foi a globalidade dos depoimentos quanto a tal local. E acrescentamos o seguinte. O Tribunal expôs o caminho pelo qual concluiu pela prova dos factos e não teve preocupação por dar uma situação como provada e a outra, a seguir, parecida, com mesmos intervenientes e mesmo modo de procedimento, como não provada. Se isso pode ser entendido como um sinónimo de fragilidade da prova, é circunstância que em situação alguma nos podia preocupar. Avaliar e analisar sim, não desconsiderar, mas de modo algum limitar. Os depoimentos foram extensos, com contraditórios minuciosos, o que naturalmente potencia o aparecimento de contradições entre o que os 10, 20, ou 30 assistentes disseram, memórias recuperadas de 5/6/7 anos atrás e por sua vez acompanhadas das declarações do arguido A, das quais já acima fizemos a sua análise. Recorro a um texto que li (a relatora), que de forma simples dá a percepção do que é, no dia a dia aquilo com os juízes se deparam nos tribunais. Reconstituir o passado, mesmo documentalmente é difícil, quanto mais apenas através da memória. O passado não nos deixa, mas o presente pode invadir o passado e quando recordamos alguma coisa, o que sabemos agora está a “colorir” o passado. As Defesas falaram na questão da contaminação do relato dos assistentes, quer pela comunicação social, quer por aquilo que foram falando entre si. E de facto - dizia o referido texto e pensamos que é da experiência de cada um -, que quando recordamos alguma coisa, o que sabemos agora de alguma forma muda aquilo que recordamos. Quando recuperamos uma memória não estamos a recuperar o “original”, mas estamos a recuperar o que vivemos, reconfigurado por aquilo que ao longo do tempo e sempre que pensámos nessa situação, fomos acrescentando, perdendo ou de algum modo alterando. E às vezes confrontados com um documento - aquilo a que nos agarramos pois se é documento, é porque foi o registo da altura -, em vez de “avivarmos” a memória mudamos alguma coisa. Outras vezes permite corrigir aquilo que “colorimos”. Isto para dizer que o não dar uma situação como provada e dar outra como provada, se “fragiliza”…foi a prova feita. Todas as outras situações podem ter ocorrido, mas a forma como foram expressas, exposta e reveladas perante o Tribunal, face à pronúncia que constituía o objecto do processo, não permitiram ao Tribunal, de forma segura, dizer que o “episódio de vida” que hoje nos foi contado, era exactamente aquele que a pronúncia descrevia. Porque não está em causa um critério de probabilidade prevalecente, mas decidir para além da dúvida razoável. É claro que a lei consagra o mecanismo do artº 358º, do C.P.Penal. Mas o Tribunal só o pode usar - na nossa perspectiva - para aquelas situações, como acima já o dissemos, em que temos o indício seguro que o “ acontecimento” é exactamente o mesmo. Não quanto à natureza do episódio - por exemplo, são tudo abusos e a pessoa referida como abusador até é a mesma -, mas à identidade do episódio. Ilustremos: o assistente em Tribunal disse que foi no Verão e na pronúncia diz que foi no Inverno; se o Tribunal tem a percepção que o episódio a que se estava a referir era “aquele” que está localizado no “Inverno” e só podia ser aquele, a alteração da circunstância tempo não descaracteriza o episódio pelo qual o arguido vem pronunciado. Mas se é perceptível, porque por exemplo houve uma multiplicidade de situações, que aquela a que o assistente se está a referir no “Verão”, pode ser uma das outras que ocorreram, mas não é necessariamente aquela que está identificada no “Inverno”, aí , integrar uma situação na outra, porque o episódio não era o mesmo, seria descaracterizar o episódio. Vamos dizer, então, aqueles factos em relação aos quais o Tribunal considerou que proceder a alterações não substanciais de factos, para enquadrar relatos dos assistentes, integravam a situação que antecede. 14.6. (Assistente AV - Factos descritos nos pontos “4.1.2.”, “6.3.1.”, “7.3. - 7.3.1., 7.3.3., 7.3.4. do Despacho de pronúncia): Passemos então ao Assistente AV. Já dissemos, no início desta análise critica da prova, que “Erro” é fazer um juízo cedo demais e mantê-lo. Em relação ao assistente AV, pode ter havido um prejuízo em relação a este assistente. Do que foi perceptível em audiência de julgamento, pelo menos assim o extraímos quer das declarações da Testemunha Inspector BZ, quer das declarações da Sra. BP, quer das declarações de outros assistentes, o assistente AV tinha uma particular referência: era referido como “o braço direito” do arguido A. E com esta distinção este rapaz foi posicionado no processo. O Tribunal não sabe se este pressu(...) prejudicou a investigação do processo. O que sabemos é que após termos ouvido este assistente em Audiência de Julgamento, o Tribunal não conseguiu captar, decifrar o seu modo de funcionar intelectualmente, não conseguimos distinguir o porquê do que disse e como disse. Começamos pela sessão da audiência de julgamento de julgamento em que AV disse ao Tribunal que tinha na sua posse umas agendas. O Tribunal interrompeu a audiência par AV trazer para o Tribunal as agendas que disse ter na sua posse, e que poderiam dar elementos e esclarecer factos em relação ao arguido A. Veio a agenda e de forma facilmente perceptível, vêm elementos que são datados de momento posterior ao início deste processo. Em audiência de julgamento foram juntos aos autos documentos confiados por AV à Sra. Dra. BP (cfr. Apensos U-I e T-1). Olhando para os documentos, partes deles, aqueles que são uns escritos com ordens de serviço, parecem os escritos que às vezes as crianças fazem quando inventam ser uma coisa que não são. Mas é claro com uma diferença e que não é pequena: é que os demais documentos podem ser interpretados como comportando a suspeita de alguém estar envolvido com factos de idêntica natureza aos destes autos e AV não era uma criança. Mas não são, para o Tribunal, mais de que papéis do assistente AV. AV conta a história de viagem a aeroportos, para levar documentos, sem que tenhamos conseguido perceber a mando de quem e para quem e o quê, com um modus operandi que não nos pareceu real, tendo em atenção a forma como disse que ia e a idade que devia ter. E chegamos a (…) e situa uma sala no meio das escadas. E daí não saiu e não percebemos qualquer gozo, desafio ou desprezo na sua atitude, pois podia ser qualquer sentimento contra o Tribunal ou com quem estava ali consigo, mas não percebemos essa atitude. E esta atitude não se pode justificar, na nossa perspectiva, com alguém que estava a mentir, porque aquilo não pode tratar-se de uma mentira, mas de alguma coisa diferente, que eventualmente um (...) ou pessoa com competência específica pode identificar. Porque se fosse de mentira que se tratasse, compunha o seu discurso com a sala que viu no R/C da (...) (…), ou com a sala que estava ao cimo das escadas , no lado direito e que fazia a passagem para o sótão onde eram os quartos dos hóspedes. É certo que AV demonstrou emoção quando em algumas situações falou ao Tribunal, os olhos ficaram vermelhos e húmidos, foi visível como alguém que teve uma reacção contida. Por vezes olhava para o Tribunal com ar impotente, como se quisesse dizer o que não conseguia explicar. Mas o Tribunal não conseguiu perceber AV e a dificuldade em perceber qual a motivação, qual o raciocínio, qual a razão de dizer o que diz, levou o Tribunal que em relação aquelas situações em que as suas declarações não estivessem acompanhadas de elementos que nos pudessem dar noção de credibilidade e, consequentemente, de veracidade, as tivesse dado como não provadas. É certo que em relação a (…), por exemplo, quer o assistente AP, quer o arguido A, dizem que AV foi a (…). Mas os relatos que AV faz de (…), relacionados com situações em que possa ter sofrido abusos, se avaliarmos globalmente as suas declarações têm que se situar em data anteriores às descritas no Despacho de Pronúncia e reportadas a episódios diferentes dos que são relatados. Isto porque após 1999 e da avaliação que fizemos deste assistente, ele já não conta estar a viver uma situação de abuso, mas ir a locais a acompanhar o arguido A. É a altura em que se descreve, ou pelo menos assim o interpretamos, como o braço direito do arguido A. Face ao que antecede, o Tribunal não ter dado como provados os factos em que o assistente AV está identificado como vítima, com excepção da situação de abuso com o arguido A, o qual expressamente confessou. Em consequência e face ao que antecede, os factos que o tribunal deu como não provados em relação ao ponto “4.1.2.”, “5.3”, “6.3.1”, “7.3” do despacho de pronúncia, dado que a demais prova produzidos em audiência de julgamento não permitiu ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, da forma como está descrita, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 14.7. Prosseguindo nas situações que o Tribunal acima referiu, como não provadas em (…), passamos aos factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos “42.” a “42.18.”. Quer o assistente AT, quer o assistente AP relataram ao Tribunal uma ida a (…) em que disseram ter ocorridos toques no corpo de assistentes entre si, sendo que AT não conseguiu recordar qual foi o adulto que o tocou, mas disse que não foi qualquer uma das pessoas arguidas nestes autos. Sucede, também, que face à forma como a matéria de facto está alegada e tendo em atenção o que foram as declarações dos dois referidos assistentes, tais factos mesmo que se provassem não poderiam integrar, no entendimento do Tribunal, todos os elementos constitutivos dos ilícitos imputados neste ponto. Seria fazer um raciocínio de plausibilidade que, para além do mais, as declarações dos assistentes não permitem. Assim, torna-se inútil fazer qualquer outra análise complementar. Em consequência e face ao que antecede, os factos que o tribunal deu como não provados em relação ao ponto “6.7.1.” do despacho de pronúncia, dado que a demais prova produzidos em audiência de julgamento não permitiu ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, da forma como está descrita, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 15. (Assistente AK - factos descritos no ponto “4.2.1” do Despacho de pronúncia): 15.1. Começando pelos factos relativos à entrada do assistente para a AX, vivência pessoal antes e depois de ter entrado na instituição, percurso escolar , elementos do T.F.Menores, foram relevantes os elementos constante do Apenso DJ (Documentos referentes ao processo individual do assistente). São documentos que foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos, isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam. Elementos estes que conjugados com as assinaturas e datas que lhes são apostas, ou de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, pelo que nas situações em que tenha sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, ou que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram, ou que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere, tal foi suficientemente contraditado, entro o mais, com a prova testemunhal. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Tais elementos foram também corroborados não só pelas declarações do assistente, mas também pela prova testemunhal produzida em audiência. Concretamente pela testemunha BX (irmã do assistente) e parcialmente pela testemunha UL. 15.2. Quanto aos factos que o tribunal deu como provados em relação aos actos de abuso praticados pelo arguido E, na pessoa do assistente AK, o arguido não prestou declarações e em momento algum – quer em sede de contestação, quer em qualquer requerimento, quer em sede de alegações -, admitiu a prática dos factos ou conhecer o assistente AK. Quanto ao Assistente prestou declarações durante dois dias e foi sujeito a um interrogatório cerrado, a perguntas muito minuciosas, a esclarecimentos sucessivos de subdivisão do facto. As suas declarações, globalmente vistas e analisadas pelo tribunal, tiveram (em súmula) o seguinte sentido: (1) Conheceu o arguido E em 1998, quando andava a arrumar carros com o irmão. No entanto disse que na altura não o reconheceu. “(...) Na altura que o meu pai estava doente do ano de 98 a...eu nessa vez não o identifiquei, não o consegui identificar claramente quando eu e o meu irmão estávamos a arrumar carros no (…), no (…)...”. O irmão WJ estava lá, mas “... era mas era eu e o meu irmão CC... nessa altura eu estava arrumar carros com ele vêem...um carro vermelho a...estaciona o meu irmão, eu e o meu irmão fomos lá ter pedir uma moeda ...”. Disse que a pessoa do carro começou a falar com o irmão, “... depois eu fui lá e convidou-nos a entrar no carro para irmos fazer...dar uma volta, eu na altura a...comecei a falar com o meu irmão que era bom nós irmos para ajudarmos a nossa mãe umas moedas ou assim e vi que ele tinha um, que ele tinha um aspecto normal essa...essa...abriu-me a porta, eu entrei mas o meu irmão CC disse que não era...não era bom nós entrarmos e era melhor irmos para casa...”, tendo acabado por sair do carro e ir para casa. Disse que era frequente estar ali, junto ao (…), com o irmão a arrumar carros “...como deve entender nós éramos umas crianças a...com problemas financeiros de família, não tínhamos nada para comer em casa o meu pai estava doente e queríamos ajudar a nossa mãe...”. Passado algum tempo “...nós estávamos em casa a eu estava...a minha mãe...o meu pai faleceu nessa altura, em Dezembro ficamos sem meio de subsistência em casa que os meus irmãos tiveram de sair à (...) e conseguir dinheiro para nos alimentarmos...para me alimentar a mim...(...)...numa das vezes que eu estive em casa não tínhamos nada para comer em casa o meu irmão recebe uma chamada de um tal (...) ...passado pouco tempo depois a...o meu irmão WJ convidou-me a mim ir jantar fora no qual eu não, raramente saía de casa mas tive que ceder...porque eu não tinha mais nada para comer em casa...”. Foram ao (…), onde estava um homem chamado DU, chegou um veículo de onde saiu uma pessoa - que disse ter sido o arguido E – e “... os meus irmãos e o senhor DU e o senhor E a...íamos para (…), a...fomos para um restaurante chinês que fica ali perto da linha do comboio que tinha ao lado uns prédios em obras a...jantamos, fomos jantar a...pouco tempo depois aparece uma pessoa a cumprimentar o senhor E de imediato sai, não fica connosco sentados...”. Nesta altura, em que relatava estes factos, a sua voz na audiência era lenta, pausada, aos solavancos. Depois do jantar o “... DU (...) disse que nós íamos ainda a um lugar que não descreveu de imediato ... que fica ali perto, perto da (…) o que eu trato por campo de futebol, campo de futebol que fica na (…) a...fomos para esse local à noite depois de jantar a...entramos num prédio que fica perto da paragem que desce ... que desce a (...) do canto superior direito, entramos numa porta de ferro a...subimos até mais ou menos, até ao (…),(…) andar do lado direito ...”. Não viu quem abriu a porta, “... o apartamento era pequeno, nós entramos para a sala eu e os meus irmãos, sentamo-nos no sofá a...o meu irmão e eu estávamos a falar de repente foi-nos perguntado se nós queríamos alguma bebida ao qual respondemos que sim e disseram o que queriam o que queriam beber eu disse que era cola o meu irmão também bebeu cola, a bebida vinha em copo já a...o senhor DU veio falar comigo, começou a falar comigo, coiso que um bocado esquisitas para o meu gosto, se eu queria ir ao quarto ou não, ir a um quarto ver um quarto...(...). JP – Disse-lhe o quê, não consegui... AK – Se queria ir ver um quarto ...na altura hesitei e depois fui com o senhor E para o quarto. JP – Mas quem é que veio falar consigo, disse que tinha sido, tanto quanto eu entendi o senhor DU? AK – O senhor E. JP – E diz que foi com o senhor E para um quarto? AK – Sim...ah...entramos começou-me a por a mão em cima (...), começou a pôr-me a mão na perna a...começou-me a mexer no pénis também quis que eu acariciasse o dele e que eu lhe fizesse sexo oral o qual fiz pouco tempo depois ele começou-me apalpar o rabo, agarrou-me por trás, abaixou-me as calças e ele abaixou as dele e fez-me sexo anal..(..)., lembro-me que estava um bocado em pé um bocado deitado digamos isso, por cima da cama ele agarrou-me por trás e penetrou o pénis dele no meu ânus”. Acrescentou que o arguido agarrou a cabeça do assistente “... e direccionou para o pénis (...)...ele masturbou-se à minha frente...”. Foi para a sala, onde estavam os irmãos BY e CC, BY recebeu dinheiro do individuo DU e deu uma quantia ao assistente. Foram-lhe pedidos esclarecimentos quanto à localização destes factos no tempo, e esclareceu que quando isto aconteceu o seu pai já tinha falecido em Dezembro (fls. 14 do Apenso DJ e fls. 1244, Z-15 JJY faleceu em 11/12/98). Antes destes factos tinha feito anos e o individuo DU tinha-lhe dado comprado um blusão no Jumbo (AK faz anos em (…); embora numa instância posterior, da Defesa do arguido A, diz que a ida ao Jumbo já o pai tinha morrido, o que no entanto, pela análise do depoimento da testemunha BX e do contexto da globalidade das declarações do assistente, pareceu-nos lapso manifesto esta segunda declaração). Relaciona, num momento posterior, estar no 4º ano quando estes factos ocorreram (cfr. fls. 49, do Apenso DJ, em 11/03/99 frequenta o 4º ano; fls. 1090 do Apenso Z-15, em 20/03/00 estava no 5º ano). (2) Passado “... algum tempo já, já no final do ano lectivo, do 5ºano ... estava na época de testes a...o meu irmão BY levou-nos a passear para perto da (…), de autocarro, que não fomos passear, fomos sair a um apartamento que fica em frente da (…) que e a casa, nessa altura também subimos a pé para um (…) andar, lembro-me porque subimos mais degraus não fomos de elevador também, a casa já era um pouco maior, quem nos abriu a porta foi o senhor DU a...na altura estava mais gente na casa cerca de 4 pessoas, nós fomos para a sala que ficava em frente. JP – Quando diz que ficava em frente, ficava em frente de quê? AK – Da porta de entrada. A casa tinha mais artigos decorativos do que a outra ... eu e o meu irmão sentamo-nos ...o BY ficou ali perto de nós a...foi-nos oferecido nessa altura também uma bebida, que também era... bebi Coca-Cola com o meu irmão, não ai no bebeu Coca-Cola foi outra bebida qualquer... lembro-me que eu bebi Coca-Cola a...na altura a...o CC estava um pouco nervoso a...o DU entra e vai ter comigo leva-me para o quarto que ficava na segunda porta, sentamo-nos, sentamo-nos, voltou a fazer aqueles gestos nas pernas, nos ombros, nas costas a...começou a dar-me beijinhos no pescoço, voltamos a fazer os mesmos actos que na primeira casa, que na altura também me foi doloroso a...ele começou-me a fazer...a mexer-me no pénis eu no dele, fiz-lhe sexo oral e depois de eu lhe ter feito sexo anal, ele fez-me sexo anal. Eu não me lembro nessa altura como é que ele se masturbou, só me lembro de ter regressado à sala com o meu irmão, descemos as escadas com o meu irmão mais novo, regressei a casa. JP – Mas neste dia, neste dia não viu o senhor E, viu só o senhor DU? AK – Eu vi o senhor E. JP – Como? AK – A segunda vez vi o senhor E. JP – Onde é que estava o senhor E? AK – Estava na casa. JP – Mas consigo os factos passaram-se com o senhor DU? AK – O senhor DU só me tentou (imperceptível)... JP – Quando o senhor começou a dizer...começou por dizer que o senhor DU abriu a porta, estavam mais 4 ou 5 pessoas dentro de casa... AK – sim... JP – ...e disse ao Tribunal que foi para um quarto com o senhor DU. AK – Não me lembro desse facto. JP – Como? AK – Não me lembro disso... JP – Pronto... com quem é que foi para o quarto nesse dia? AK - Com o senhor E, E, se me enganei peço imensa desculpa. (Interpolação imperceptível).” Acrescentou que o arguido E “...foi ele agarrou na minha cabeça... agarrei-lhe no pénis e meti-o na boca...(...)...ele fez-me sexo anal (...)...como a Senhora Doutora Juiz deve entender sexo anal é penetração com o pénis no ânus, no meu ânus...”. (cfr. fls. 49, do Apenso DJ, em 11/03/99 frequenta o 4º ano; fls. 1090 do Apenso Z-15, em 20/03/00 estava no 5º ano). (3) Refere ter encontrado o arguido E numa terceira situação. Estava de férias, o avô tinha sido operado, mãe pediu-lhe para eu ir ver o avô, tendo dito que fica na localidade de (…). Foi pela (…) a pé, para ir apanhar o comboio na (…) (como resulta dos elementos dos autos, AK vivia no (…), fls. 1254 do Apenso Z-15). “...No caminho antes de chegar à (…) a...parou ao meu lado um carro preto da marca (…) também... no qual no interior do veiculo encontrava-se o senhor E (...) a conduzir o veículo...eu de momento não me apercebi tanto chamou atenção que olhei para dentro do veículo, perguntou-me para que lado eu ia, se ia algum lado ou não, no qual eu lhe disse que ia ver o meu avô para os lados de (…)... entretanto ele chamou ... pediu para ir com ele porque ele dava boleia isso, é assim, como eu podia ter poupado algum dinheiro, eu pensei pode voltar acontecer os mesmos acontecimentos que aconteceram anterior a este ... levou-me de carro pela (…) a...ele começou a dar uma voltas, a vir pelo interior de (…),(…),(…), passámos pelo um jardim que...que era acho que dentro da localidade de (…)...(...)...ao fundo da (...) há umas (...)s (...)...que íamos só ver uma casa ali num instante, a...no qual paramos ao lado de uma (...) ... nas traseiras de uma (...) que tinha um gradeamento em bico da côr verde (...) no interior da casa quando entramos, estava mais gente...”. Disse que estavam crianças da idade do assistente, que conheceu mesmo um colega que andou consigo. Nessa casa esteve com uma pessoa que não era o arguido “... era sim um senhor mais forte, maior de estrutura, maior que a minha de altura, tinha cara, parecia um animal da raça Buldogue, forte com bochechas, essa pessoa foi tão simpática comigo e falou bem comigo, o qual me ofereceu uma bebida, nós...eu fui com ele para um quarto da (...), ele acariciou-me eu acariciei o dele, pénis (...) ... eu na altura estava tão influenciado com ele, que me lembro dessa altura a que fiz-lhe, fiz-lhe, ele fez-me sexo anal (...) ... eu baixei as calças, ele baixou as dele e penetrou o pénis dele no meu ânus ...”. Após o arguido E deu-lhe uma quantia de dinheiro, “... este dinheiro algum dei à minha mãe outro comprei guloseimas...”. 15.3. A reconstituição processual que é feita com o Julgamento, de uma realidade histórica ou dos factos humanos, não pode ser a expressão perfeita e acabada dos meios de prova, sejam eles prova documental ou testemunhal. É da experiência do dia-a-dia, o conhecimento da dificuldade, a divergência e por vezes a contradição, de cada um reproduzir de forma fiel e completa o que viveu, o que sentiu ou o que viu. Assim, cada depoimento não pode ser visto “ às frases”, transcritas ou citadas. Tem que ser visto e analisado no seu contexto, pelo que qualquer citação ou extracto de declaração/depoimento deve, dentro do possível e necessário, ser explicada e valorada face ao sentido de toda a declaração, evitando-se a citação retirada, sem mais, do contexto. As passagens que assinalámos, são as primeiras que foram prestadas pelo assistente ao tribunal, quando as fazia de forma aberta: aquilo que já noutras situações referimos, de ir falando e ir contando de acordo com a sua sequência, com a sua relevância. E depois de o Tribunal ter analisado, de forma global, todo o depoimento do assistente, para o tribunal as declarações do assistente foram globalmente consistentes, pois fez uma narração espontânea quer quanto à sequência, quer quanto ao local e tempo que duraram. Mostrou memória do facto e ao mesmo tempo memória de circunstâncias que fazem sentido no quadro em que estes factos ocorreram. Mas teve equívocos, dúvidas, por vezes aparência de incongruências como iremos, dentro do possível, assinalar. Começamos por referir que os factos descritos pelo assistentes, pelo menos os dois primeiros, nas casas em (…), ocorreram num quadro especial: foi perceptível que o assistente para estas duas situações pelo próprio irmão. O assistente conheceu o arguido E através do seu irmão, como conheceu o individuo DU – DU, cfr. por exemplo, instância da Defesa em 6/11/07, à testemunha Inspector Chefe BZ – e houve passagens do depoimento do AK em que o Tribunal depreendeu e percebeu que, apesar de o dizer, não era algo que estivesse a fazer “à vontade”. Mas não deixou de, sucessivamente, ir esclarecendo, dizendo e explicando de forma, para nós, intrinsecamente consistente com o que dissera anteriormente. Assim vejamos. (1) Nas suas declarações de AK, por duas vezes, quando se referia aos factos na “ casa da (…)” e na casa que identificava ao pé da “(…)”, referiu o nome (…) como a pessoa com que “estava”, tendo rectificado de seguida. O arguido, nas suas alegações, referiu que não afastava a possibilidade de o assistente ter sido abusado, no entanto estava a ser feita uma “transferência” de abusos praticados por outra pessoa, para o arguido. Pelo que estas referências que AK fez, por duas vezes, ao individuo DU, poderiam significar alguma coisa no sentido apontado pelo arguido. Mas ouvindo como AK fez a rectificação – e o tribunal fez a transcrição dessas passagens, que embora não sendo uma transcrição, é evidente, um substituto da imediação, permite ter alguma percepção de como e em que momento foi feita a rectificação -, no caso concreto, foi feita de forma espontânea ou na sequência de interpelação feita na altura. E ouvindo o assistente, o tribunal não ficou com a impressão de que aquele rectificação deixasse transparecer que o assistente tinha sido “apanhado” em alguma coisa, pois o registo da voz, a forma como responde deu ao Tribunal uma sensação de normalidade da rectificação que estava a fazer. É claro que o assistente poderia ser portador de um “sangue frio tal”, que conseguisse fazer aquele “papel” da forma que foi perceptível para o tribunal. Mas a instância não se ficou por ali, o AK foi ouvido durante dois dias e, objectivamente, o tribunal não encontrou qualquer sentido ou indício, que levasse à convicção de que AK estivesse a forjar a identificação do seu abusador, referindo uma pessoa quando os actos foram com outra. (1.1) Vamos então analisar os depoimentos que, para o Tribunal foram particularmente relevantes, para aferir da credibilidade e veracidade do que foi dito por AK. Começamos pela testemunha cujo depoimento terá uma relevância indirecta, mas é concorrente. A testemunha UL (que também referimos na análise crítica da prova em relação ao assistente AP), disse ao Tribunal ser educadora na AX, no DT desde 1 de Março de 1996 e em 2005 foi para CZ -, embora esteja em licença sem vencimento desde 1/11/2005 . Declarou ser irmã da ex-mulher do arguido C – GW – e o ex-marido da testemunha, UM, ser também educador na AX . Pela natureza das funções que exerceu na AX demonstrou conhecimento directo da organização da AX , organização dos alunos nos lares, actividades, vivência do dia-a-dia dos educandos e dos educadores nos lares, conhecimento do arguido A e do assistente AK. A testemunha apresentou um depoimento que para o Tribunal não foi uniforme quanto à sua objectividade e, consequência disso, quanto à sua isenção e desinteresse na causa. O facto de ser irmão da ex-mulher do arguido C, só por si, não relevou para o Tribunal para pôr em causa a sua isenção, objectividade e verdade do que disse ao Tribunal. Sucede, contudo, que relatou ao Tribunal um incidente que ocorreu em 5 ou 6 de Outubro de 2003, relacionado com a consulta do processo do assistente AK no CW – educando que não era seu educando e lar onde não trabalhava -, que com as explicações que deu quanto às circunstâncias em que fez essa consulta – indo ao lar e dizendo à Colega que estava de serviço, “tu não viste nada” – e justificações que deu e emendas que fez a essas justificações, para ter feita essa consulta, levaram o Tribunal a avaliar o seu depoimento com reserva cautela e a dividi-lo em duas partes. Relatou também ao Tribunal uma conversa com o assistente AK, em que lhe perguntou o seu conhecimento sobre dois nomes de alunos e um pedido para contactar o assistente AN, para saber o nome dos educadores do lar do AN – isto já admitindo que o fez na sequência de pergunta que lhe tinha sido feita directamente pelo sobrinho GU, se a testemunha sabia o nome dos educadores do internato do CZ - que também pelas justificações que deu para essa conversa e pedido que fez ao AK, contribuíram para a já referida reserva e cautela que o Tribunal teve na avaliação deste depoimento. Quando falou da referida consulta do processo do AK, disse ao Tribunal que o fez na sequência de uma conversa com o sobrinho GU - filho do arguido C, arguido este que na altura se encontrava em prisão preventiva – dizendo, no decurso da narração “livre” que estava a fazer quando referiu essa conversa e para justificar a razão dessa consulta, “ …entretanto foi-me…” , mas fazendo imediatamente uma ligeira pausa e emendando a frase para “…portanto tive curiosidade de ver com que idade é que o AK tinha entrado lá para o (...)…”. Contra interrogada disse que o sobrinho não lhe pediu para fazer essa consulta, depois que não lhe “pediu directamente”, “…foi uma dúvida que surgiu, como é que os alunos saiam e ele (o sobrinho) soube pelos jornais que surgiu o nome do AK, que era aluno do lar…”, o que a testemunha pretendia com a consulta era “…concretamente, queria saber a data em que ele tinha entrado para o (...)…”. A alternância que veio a fazer entre a justificação da sua “curiosidade”, com a natureza das dúvidas do sobrinho para que “indirectamente” a testemunha admitisse que o pedido da consulta lhe fora feita pelo sobrinho – e tenha-se também em atenção a dinâmica das suas resposta nas perguntas que lhe foram feitas pela própria defesa do arguido C: o Ilustre Mandatário do arguido pergunta à testemunha, num segundo momento, se tinha alguma ideia para que é que o sobrinho queria esta informação, respondendo a testemunha: “A informação?...(pausa)…isto foi uma curiosidade que surgiu, não foi…” e fica calada; vindo o Ilustre Mandatário em sua ajuda, pois diz-lhe, entre o que, face à entoação, ficou entre uma pergunta ou um “acabar” da frase da testemunha, “e não foi mais do que isso (?)”, a que a testemunha “adere”, respondendo e repetindo “ Não foi mais do que isso ” -, não fez qualquer sentido para o Tribunal. E não fez qualquer sentido porque para o Tribunal, atenta a natureza das coisas, “foi mais do que isso”. Isto é, a testemunha não foi fazer a consulta do processo individual de um educando que não era seu, num lar que não era o seu, dizendo à colega que estava de serviço “tu não viste nada”, sabendo que não estava a fazer “ agir bem ” como disse ao Tribunal – e sujeitando-se a um processo disciplinar como veio a acontecer, tendo a testemunha dito que resultou a sua suspensão por um ano -, para satisfazer a sua curiosidade quanto à data em que um assistente deu entrada num lar e para saber, como a testemunha também declarou, que idade teria o educando quando ocorreram os factos. Acrescente-se que a testemunha não teve idêntica curiosidade – afirma o Tribunal, porque especificamente fez essa pergunta à testemunha e ela confirmou-o - quanto a “saber a data de entrada no lar” ou a “idade” de outros assistentes do processo, os quais, de acordo com o que resulta dos elementos constantes dos autos - cfr., por exemplo, documentos de fls. 60.043/4, na parte em que diz respeito aos anos de 2002 e 2003, este até início de Outubro de 2003, documento da “DQ”, junto pelo arguido H, relativo a contagem de notícias e tempo de emissão, ano de 2002, 2003, 2004, referentes a H e AX; docs. de fls. 60.194, 60.321, 60.322, 60.323, 60.413, 60.414, 60.550, 60.551, DVDs remetidos para os autos pela DR com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DR com assistentes destes autos e sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março; docs. de fls. 52.054 (DVD DS) e de fls. 60.050 a 60.056, remetidos para os autos pela DS com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DS sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março de 2003; Docs. de fls. 57.463 a 58.633, recortes de artigos saídos na Imprensa com entrevistas e reportagens sobre os factos destes autos, respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente de Dezembro de 2002 a Março de 2003 -, foram falados e mais falados que o AK na comunicação social e alguns desses sim, tinham directamente a ver com os factos que na Acusação vieram a ser atribuídos ao arguido C. Sucede que a testemunha também foi “pedir” ao AK para contactar o assistente AN - que, de acordo com as declarações da testemunha, o AK disse-lhe que estava no (…) e não em CZ – para saber quem tinham sido os educadores do AN no lar de CZ, pedido que fora feito pelo sobrinho da testemunha e filho do arguido C porque “… havia educadores que na altura já não estavam no internato, ou não estavam nesse (...) ou na altura já tinham sido transferidos para o semi-internato…”– justificação dada pela testemunha -. E reconhecendo, quando tal lhe foi perguntado pelo Ministério Público, que a identificação dos educadores era uma questão que poderia saber com mais facilidade através dos Colegas educadores de CZ, mas argumentando com o já acima dito, que “… havia educadores que na altura já não estavam no internato…”. Também nesta parte não faz qualquer sentido para o Tribunal a “desculpa” dada pela testemunha, para o motivo pelo qual tentou obter uma informação do AN através do assistente AK, quanto à identificação dos educadores. Da factualidade acima descrita o Tribunal conclui que na primeira situação – a da sua ida ao CW consultar o processo individual do assistente AK -, a testemunha foi consultar o processo porque o sobrinho GU, filho do arguido C, lho pediu directamente, não sabendo contudo o Tribunal a razão que em concreto esteve na origem desse pedido (se um interesse específico do arguido C, se um interesse e pedido de outro arguido, que tivesse contactado o arguido C para obter a informação). As explicações e “amálgama” de justificações que a testemunha deu para explicar e justificar este episódio, colando-se a uma versão que para o Tribunal, da análise que fez dessas explicações – e em que teve em conta a forma da entoação, pausas ou expressão facial que a testemunha apresentou quando respondeu nesta parte -, significaram um “embrulhar” de desculpas para a verdadeira razão da consulta, um pedido do sobrinho GU. Atitude e comportamento que para o Tribunal traduz um interesse - mesmo que indirecto -, de em alguma medida “proteger” o arguido C se ser “envolvido” nesse episódio. Quanto à segunda situação – aquela em que a testemunha pede ao assistente AK para obter informações do AN -, também aqui a justificação que deu para ter optado por aquele procedimento e não ter sabido, por exemplo, directamente junto dos demais educadores dos Lares de CZ a informação que pretendia, não faz sentido. Para o Tribunal a testemunha não quis obter a informação directamente junto de pessoas da AX – educadores ou alguém da secretaria - por razão específica que o Tribunal desconhece, mas que, pelo menos, tinha ínsita a intenção de evitar que dentro da AX o arguido C fosse envolvido na obtenção de informações sobre (pelo menos) um educando da instituição e que estava relacionado com o processo. Atitude e comportamento que, para o Tribunal, também traduz um interesse - mesmo que indirecto -, de em alguma medida proteger o arguido C. Interesse e comportamento que o Tribunal avaliou e ponderou, quando valorou todo o depoimento da testemunha. Passando, de entre as questões que abordou, às que directamente tiveram a ver com AK, a instância da Defesa deste arguido disse que falava com o educando, conhecia-o da AX e ficou com conhecimento mais próximo depois de uma (...) em (…), em 1999 ou 2000, não sabe, em que foi uma (...) conjunta do lar do AK (Lar FQ e o educado KE) e do lar da testemunha. Porque as questões da memória são sempre relevantes, quanto a esta localização no tempo das (...) referidas por esta testemunha, dos elementos dos autos resulta o seguinte: (i) Ano 2001: - doc. de fls. 56.042, referente às despesas das (...) de 2000/2001, dos lares do (...) de DT os Lar FQ em (…) e (…); CW e FS em (…) - doc. de fls. 56.038, (...) verão 2001: Lar FQ em (…) de 5 a 9/9 - doc. de fls. 56.036, (...) férias 2001: Lar FQ 3 a 14 Agosto (…); 5 a 9 Set (…); 17 a 29 de Agosto JJZ; CW e FS (…) 3 a 15 de Agosto; (ii) Ano 2000: - Apenso W-9 , fls. 14 e 134: CW não tem registo; Lar FQ (…); Lar FS (…); (iii) Ano 1999: -Apenso DX, fls. 15: Lar FQ : (…),(…); CW, (…); Lar FS: (…), FP, (…); (iv) Ano 1998: -Apenso DX, fls. 20 (pois na pagina, canto inferior direito 2/6/98, logo documento feito nessa altura): Lagos de 1/8 a 1/9, Lar FQ e CW e Lar FS). Assim, a testemunha localiza a (...) de (…) em 1999/2000. No entanto, dos elementos dos autos, da conjugação de - para as (...) de 2001 -, fls. 56.036, 56.038, 56.042, o Lar do AK (CW) esteve com o Lar FS em (…), de 3 a 15 de Agosto; para as (...) de 2000, Apenso W9, Livro 2, fls. 14 e 134, o Lar FS esteve em (…), mas não há registo de que o Lar CW tenha estado; para as (...) de 1999, Apenso DX, fls. 15, Lar FQ, FS ou CW não estiveram em (…); Ano 1998 (Apenso DX, fls 20, que no canto inferior direito tem impresso 2/6/98, concluindo o Tribunal que se refere às (...) do Verão de 1998), em (…), de 1/8 a 1/9 estiveram os três lares de DT, Lar FQ, CW e FS. Deste modo, o conhecimento do AK pela testemunha ou foi no ano de 1998 ou no ano de 2001, caso a testemunha nessa altura ainda estivesse no lar FS. Mas da narração da testemunha, dizendo que já conhecia AK do Lar de DT, mas “melhor” foi quando foram fazer uma (...) juntos em (…), a forma como descreve dá a ideia de ser uma memória de algo mais “recente” do que “antigo” e a forma como descreve a recordação que tem – e há que ver que está a prestar depoimento em Maio de 2006 -, leva o Tribunal a concluir que a testemunha estará a referir-se à (...) que ocorreu em 2001, em que já estava no lar (…). Até porque quando prestou depoimento, disse que de início, quando entrou para a AX ,foi para o lar FS e depois passou para o Lar FQ (isto, repetimos, embora a sua memória fosse 1999 ou 2000). Disse que AK procurou-a várias vezes para falar disto tudo, esclarecendo que isto foi antes, muito antes, de a testemunha o ter procurado para saber a informação; ele vinha quase todos os dias ter comigo, falava desta situação toda: o irmão é que o pôs nisto, penso que o irmão mais velho, acrescentando mais tarde o nome BY, pois a testemunha não o conhecia porque não era do (...); que desta situação o irmão é que teve a culpa, porque depois levou o CC. Mas a testemunha perguntou-lhe se o AK também esteve metido nisto, “foste abusado?” e AK disse-lhe que não. (1.2) A irmã do AK – a testemunha BX – relatou ao tribunal que os seus irmãos BY, CC e AK estiveram todos na AX, primeiro foi o BY e depois o CC e o AK. O irmão AK dava-se bem com o CC e andavam sempre juntos. Por sua vez o BY era um modelo para o CC. A morte do pai teve influencia nos irmão, especialmente o CC ficou mais revoltado do que já era. O AK foi sempre reservado, não “demonstrava tanto as coisas”. Quando o pai era vivo o CC saía sempre com o AK, andavam muito os dois. Depois da morte do pai, muito pouco tempo após a morte do pai, o CC começou a andar muito com o BY, faziam o que queriam. E nesta altura, como o AK já não tinha tanta companhia do CC, sentia-se sozinho e chegou-se mais à testemunha. Mas entretanto, por causa do seu trabalho (tinha começado a trabalhar aos 17 anos, feitos em 18/02/98) e também por estar a estudar, a testemunha não podia dará atenção ao AK e este chegou-se um pouco mais para o BY. Pouco tempo depois da morte do pai os irmãos deixaram de ir com frequência a casa (isto o AK e o CC, que eram os que na altura estavam na AX). Houve uma altura em que se deu conta que o BY levou o CC e o AK para um jantar, foi a um fim de semana e foi depois da morte do pai. Disse que, nesta altura, o BY já tinha telemóvel, era quem tinha telemóvel em casa, recebia telefonemas que a testemunha ouvia (acrescentou que um dia, já depois deste caso ser conhecido, o irmão CC disse-lhe que o arguido E telefonava para o BY). Quem lhe falou neste jantar foi o AK. Disse-lhe que o BY o tinha levado a jantar fora, nem ela nem a mãe estavam em casa (acrescentando que era uma altura em que não tinham comida em casa), e o BY levou-o a jantar fora com E. O AK contou isto já depois deste processo ser conhecido, porque voltou a estar mais próximo da testemunha. Disse que estava lá “o E”, o BY, o CC e “…também acho o DU…”. O BY dizia que trabalhava, houve uma altura em que disse que trabalhava numa Panificação e trazia “bastante” dinheiro cada vez que saía. Nunca viu dinheiro com o AK. Era sempre com o CC e com o BY e o BY é que dava ao CC. Mas a testemunha relatou, também, que “um tempinho antes do processo ser divulgado” (e esclareceu que, para si, o processo foi divulgado quando se começou a falara do arguido A), o AK contou-lhe que tinha sido abusado. Tinha sido o BY “ que o tinha levado para essa situação”. Aqui uma referência ao modo como a testemunha estava a depor. Desde o início apresentou um discurso calmo e claro. Neste momento, em que relatava esta conversa, demonstrou alguma dificuldade em falar, no aspecto em que a sua atitude não era de que estava a relatar qualquer coisa “e pronto!”, estava dito. Foi algo que se viu que a incomodava, custava reproduzir, decerto porque envolvia os dois irmãos. Prosseguindo, o AK disse-lhe que tinha sido abusado “pelo E”, falou-lhe de locais, de uma casa ao pé da (…), uma (...) em (…) e num outro local, cujo nome da (...) a testemunha não sabia, um apartamento já antigo (tendo a testemunha feito o relato do que foi a conversa que o irmão teve consigo, quanto ´´a localização deste ultimo local). O AK disse-lhe que “ isto” tinha acontecido “logo após”, “passados uns tempos” da morte do pai, pediu à testemunha para não contar à mãe porque tinha vergonha. Esclareceu que foi o AK que teve a iniciativa da conversa e as circunstâncias em que ocorreu essa conversa: disse que esta conversa foi na sequência de uma discussão com o irmão BY, sobre o dinheiro que o irmão tinha e de onde vinha. O que faz sentido, à luz da experiência comum, que na sequência de uma troca de palavras que a testemunha disse ter sido agressiva, em que ela disse ao irmão que o dinheiro do irmão ou era da droga ou era “dos miúdos”, que o AK tenha falado de algo que estava relacionado com a discussão, “os miúdos”. À luz das regras da experiência comum não é normal, nem plausível, que numa situação de discussão e necessária tensão entre irmãos, a BX e o BY – em que como dissemos a irmã BX acusava o BY de a origem do dinheiro deste ser da “Droga” ou de “Miúdos” -, discussão de que o AK necessariamente se apercebeu – pois como a irmã disse, “na nossa casa ouvia-se tudo”, referindo-se de umas divisões para as outras -, fosse contar uma mentira, uma invenção quanto a ter sofrido três abuso de natureza sexual, com identificação do arguido E (duas vezes como abusador, na casa da (…) e na da Av. (…) e uma terceira, numa casa para onde foi levado pelo arguido). E o contasse de forma que, para a testemunha BX, foi sentida como o AK estar com vergonha e tristeza a falar. Tudo isto numa altura em que o presente processo ainda não era falado, tendo a testemunha BX esclarecido que quando teve esta conversa, ainda não se falava de A na televisão, ficando assim afastada, para o Tribunal, a hipótese de já ser do conhecimento público os factos “ do primeiro processo”, aquele que veio para o conhecimento do público através de uma reportagem no KKA. Do que disse BX, para o Tribunal resultou que ainda não eram conhecidos os factos e as pessoas, do processo em que o seu irmão viria a ser referido. Pelo que esta conversa entre o AK e a sua irmã BX – o depoimento desta testemunha, apesar de ser irmã do assistente, foi um depoimento que para o Tribunal foi objectivo e verídico; não notámos interesse próprio a relatar o que relatou ao Tribunal, de receber algum dinheiro ou qualquer ganho - , quer quanto ao seu conteúdo quer quanto ao tempo e circunstâncias em que correu, foi um elemento que concorreu, de forma relevante, para a convicção do Tribunal quanto à credibilidade e veracidade do que AK disse ao tribunal. Quanto a abusos sofridos pelo irmão, a testemunha disse ainda só ter conhecimento dos praticados por um tio e pelo arguido E. Quanto a um DU o AK não lhe contou ter sofrido abusos por essa pessoa, disse-lhe apenas que “estava lá”. É certo que a testemunha UL disse que o AK, a si, referiu que não esteve envolvido nestes factos. Mas em audiência de julgamento AK revelou ao Tribunal vergonha em relação a esse período da sua vida e quando lhe foi perguntado o que é que sentia “hoje” em relação a esse período (de abusos) e como é que “se vê hoje”, disse “... eu já me vi pior, já me vi bastante porco, nojento, da minha parte...(...), eu agora sinto-me ainda bastante tímido, envergonhado comigo mesmo, mas finalmente consegui experimentar o outro lado e gostei bastante...”. Para o Tribunal teve emotividade, ressonância de um sofrimento efectivamente tido. E a sua resposta justifica a resposta que deu à testemunha UL e não afasta, para o Tribunal, a credibilidade e veracidade que o Tribunal deu ao depoimento de BX. (2) Quanto ao tempo em que ocorreram os factos, reproduzimos parcialmente o que acima já expusemos, quanto ao que foram, globalmente, as declarações do assistente: - (1ª situação): (i) Conheceu o arguido E em 1998, quando andava a arrumar carros com o irmão. No entanto disse que na altura não o reconheceu. “(...) Na altura que o meu pai estava doente do ano de 98 a...eu nessa vez não o identifiquei, não o consegui identificar claramente quando eu e o meu irmão estávamos a arrumar carros no (…), no (…)...” (ii)Passado algum tempo “...nós estávamos em casa a eu estava...a minha mãe...o meu pai faleceu nessa altura, em Dezembro ficamos sem meio de subsistência em casa que os meus irmãos tiveram de sair à (...) e conseguir dinheiro para nos alimentarmos...para me alimentar a mim...(...)...numa das vezes que eu estive em casa não tínhamos nada para comer em casa o meu irmão recebe uma chamada de um tal (...) ...passado pouco tempo depois a...o meu irmão BY convidou-me a mim ir jantar fora no qual eu não, raramente saía de casa mas tive que ceder...porque eu não tinha mais nada para comer em casa...”. Foram ao (…), estava um homem chamado DU, chegou um veículo de onde saiu uma pessoa - que disse ter sido o arguido E – e “... os meus irmãos e o senhor DU e o senhor E a...íamos para (…), a...fomos para um restaurante chinês que fica ali perto da linha do comboio que tinha ao lado uns prédios em obras a...jantamos, fomos jantar...”. Foram-lhe pedidos esclarecimentos quanto à localização destes factos no tempo, e esclareceu que quando isto aconteceu o seu pai já tinha falecido em Dezembro. Resulta dos elementos de fls. 14 do Apenso DJ e fls. 1244, Z-15, que o pai do Assistente, JJY faleceu em 11/12/98, pelo que estes factos ocorreram após 11/12/98. Disse que antes destes factos tinha feito anos e o individuo DU tinha-lhe dado comprado um blusão no Jumbo. AK faz anos em (…) e embora numa instância posterior, da Defesa do arguido A, diz que a ida ao Jumbo já o pai tinha morrido, o que no entanto, pela análise do depoimento da testemunha BX e do contexto da globalidade das declarações do assistente, pareceu-nos lapso manifesto esta segunda declaração. Foi seguro quanto ao facto de esta situação ter ocorrido após a morte do pai e relacionou mesmo com uma situação em que a família estava ainda com menos para viver, do que acontecia quando o pai estava vivo (confrontar, também, com o depoimento de BX, não só quanto às dificuldades que a família viveu após a morte do pai, bem como ao maior “abandono” do AK nesta altura, acompanhando mais com os irmãos; disse que “um tempo” depois da morte do pai a testemunha deixou de ir a casa da mãe e o AK passou a acompanhar mais com os irmãos). O AK relaciona ainda, num momento posterior das instâncias, estar no 4º ano quando estes factos ocorreram e de acordo com fls. 49, do Apenso DJ, em 11/03/99 frequenta o 4º ano; e de fls. 1090 do Apenso Z-15, em 20/03/00 estava no 5º ano. Assim, o Tribunal ter localizado este factos não no período descrito no Despacho de Pronúncia, mas “... em dia não concretamente apurado, numa Sexta Feira ou num sábado à noite, situado entre 12/12/98 e Janeiro de 1999 (inclusive)...” (tendo sido feita a comunicação ao arguido, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal). - (2ª situação): Passado “... algum tempo já, já no final do ano lectivo, do 5ºano ... estava na época de testes a...o meu irmão BY levou-nos a passear para perto da (…), de autocarro, que não fomos passear, fomos sair a um apartamento que fica em frente da (…) que e a casa, nessa altura também subimos a pé para um quarto/quinto andar, lembro-me porque subimos mais degraus não fomos de elevador também...”. Do seu relata resulta que foi o irmão BY que o levou e foi também o irmão CC. O AK disse que foi passado algum tempo da primeira situação, mas refere no fim do ano lectivo do 5º ano. De acordo com o documento de fls. 49, do Apenso DJ, em 11/03/99 frequenta o 4º ano e de fls. 1090 do Apenso Z-15, em 20/03/00 estava no 5º ano. Da dinâmica do relato do assistente, embora com a diversidade de lugares entre aquele onde foi da primeira vez e este, resulta uma noção de algum distanciamento, que se adequa com o facto de dizer que foi no fim do ano lectivo (em relação à primeira vez). Mas não se adequa, nem o seu depoimento dá essa ideia, a um lapso de tempo de um ano ou ano e meio, entre a primeira vez e a segunda. E também não resulta do seu depoimento que, nesta altura, o irmão CC, que foi consigo à “segunda” casa, já não estava consigo na AX (em 10/03/00 o irmão CC já não estava na AX, tinha ido para o (...) IIT, fls. 10, Apenso DJ). Acresce uma outra situação. O assistente refere a idas às casas com o arguido E e com um individuo DU, que das suas declarações e do depoimento que acima já referimos, da testemunha BZ, resultou suficientemente assente para o Tribunal ser DU. É o mesmo nome do individuo que referimos aquando da análise crítica da prova em relação a AP - cfr certidão constante de Fls. 62.539 a 62.747, referente ao acórdão proferido no processo nº (…), pelo 3º Juízo Criminal da Comarca (…), em que foi arguido, entre outros, DU, incluindo Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Constitucional em tal processo -, tendo o Tribunal concluído com a necessária segurança que se trata da mesma pessoa. E da certidão acabada de mencionar resulta que AP e X estiveram relacionados com o processo identificado na certidão, cujos factos, relacionados com actos de natureza sexual, o Tribunal (onde o processo correu) deu como assente terem-se passado em “1999”. Pelo que, pelo menos no ano de 1999, esta pessoa estava em Portugal. Assim e face a todo o enquadramento que antecede, o Tribunal ter dado como provado que os factos referentes à segunda situação, passaram-se no mesmo ano dos primeiros. Pelo que o Tribunal localizou este factos não no período descrito no Despacho de Pronúncia, mas “... em dia não concretamente apurado, mas situado entre Abril e Julho de 1999...”(tendo sido feita a comunicação ao arguido, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal). - (3ª situação): Refere ter encontrado o arguido E numa terceira situação. Estava de férias, o avô tinha sido operado, mãe pediu-lhe para eu ir ver o avô, tendo dito que fica na localidade de (…). Foi pela marginal a pé, para ir apanhar o comboio na (…) (como resulta dos elementos dos autos, AK vivia no (…), fls. 1254 do Apenso Z-15). “...No caminho antes de chegar à (…) a...parou ao meu lado um carro preto da marca (…) também... no qual no interior do veiculo encontrava-se o senhor E (...) a conduzir o veículo...eu de momento não me apercebi tanto chamou atenção que olhei para dentro do veículo, perguntou-me para que lado eu ia, se ia algum lado ou não, no qual eu lhe disse que ia ver o meu avô para os lados de (…)... entretanto ele chamou ... pediu para ir com ele porque ele dava boleia isso, é assim, como eu podia ter poupado algum dinheiro, eu pensei pode voltar acontecer os mesmos acontecimentos que aconteceram anterior a este ... levou-me de carro pela (…) a...ele começou a dar uma voltas, a vir pelo interior de (…),(…),(…), ...”. A referência temporal em relação a esta terceira situação é que estava de férias. Não temos elementos documentais que nos permitam localizar uma eventual operação de um avô. As declarações do assistente dão ideia do mesmo espaço temporal que as anteriores, a dinâmica não dá ideia de distância de um ano entre as primeiras situações e esta, e o AK disse que quando voltou para o (...) para o 6º ano (ano lectivo 00/01, Apenso DJ, fls. 4), pediu para não ir a casa ao fim de semana. Assim e face a todo o enquadramento que antecede, o Tribunal ter dado como provado que os factos referentes à terceira situação, passaram-se no mesmo ano dos antecedentes. Pelo que o Tribunal localizou este factos não no período descrito no Despacho de Pronúncia, mas “... em dia não concretamente apurado, mas situado no período de férias escolares do Verão de 1999...” (tendo sido feita a comunicação ao arguido, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal). (2.1) O arguido E, em sede de alegações, invocou os elementos que se encontram a Fls. 17.240/46 oficio da Vodafone e elementos remetidos na sequência de tal ofício (cfr. fls. 17251/2, Ofico da Vodafone de 9/02/04; cfr. tb Apenso Z-13, volume 9: Um sobrescrito com Disquete enviada pela VODAFONE com o ofício de fls. 17.251, de 9/2/04, a responder ao Oficio do Tribunal nº 3.247 de 5/12/003 (foi feita cópia em CD-R pelo Tribunal), e contém: Registo de chamadas, com identificação de IMEI do Chamador, localização do chamado e BTS dos números: (...)(…), de 18/12/99 a 26/6/00...) e dos quais resulta que o nº (…), entre 29/10/99 a 16/05/01, esteve em nome de BY, (...) (…),(…),(…)º (…).,(…) (irmão do AK) e que de 29/10/02 a 31/07/03, o número associado a produto vitamina, sem identificação de titular. Invocando, por sua vez, a listagens das chamadas telefónicas que existem nos autos em relação ao seu número de telemóvel nº (…) (cfr. fls. 13.135, E, (…) – (…)(…); cartão activado em 29/7/99 e expirado em 19/4/03, mas a fls. 13134 fora dada informação cartão Pré-pago, sem indicação do titular; a fls. 18.594, Ofico TMN SGC/7234/04, de 12/04/04, respondendo aos ofícios nº 404 de 2/3/04 e 704, de 26/03/03, dizendo que … já não tem os dados diposíveis em relação aos períodos de 1999 e 2000, Lei 69/98; mas posteriormente nova diligência para TMN, sobre informação das chamadas telefónicas de e para este número, meses de Novembro 1999 e todo o ano de 2000, determinada pelo Tribunal e a fls. 18.594 foi recebido o ofício da TMN SGC/7234/04, de 12/04/04, respondendo aos ofícios do Tribunal nº 404, de 2/3/04 e 704, de 26/03/03, comunicando que já não tinham disponíveis os dados referentes aos períodos de 1999 e 2000, em consequência dos procedimentos determinados pela Lei nº 69/98; mas nos elementos remetidos e que estão no Apenso V, envelope 25, STAIC TMN, no ficheiro “ efectuadas 2-3 de 2000 CD1”, estão registos das chamadas efectuados pelo arguido E) e das quais resultam chamadas do seu nº (…) (do arguido) para o número do BY (nº (…)), a partir de Maio de 2000. E invocando, também, os elementos que se encontram ABA-R, fls. 215, dizendo e admitindo que se referem a um carregamento do telemóvel do BY, feito pelo arguido no dia 8/05/2000, concluindo, assim, por não provável o contacto e conhecimento entre o arguido E e o irmão do AK, o BY, em data anterior a 2000. No entanto, sem prejuízo de tais elementos darem como assentes os contactos entre o arguido E e o irmão BY, do AK, no ano de 2000, não excluem a possibilidade de os contactos terem ocorrido em alturas anteriores. Isto porque a data de activação do telefone do BY é de 29/10/99 a 16/05/01 (BY, (…),(…),(…)º (…).,(…)), de 29/10/02 a 31/07/03 o número associado a produto vitamina, sem identificação de titular, o que pode ter sido na posse do (…) ou não, e sendo da experiência dada pelos elementos remetidos para estes autos pelas operadoras e da experiência comum, que a utilização o uso de telefones associados a produtos vitamina, sem identificação de titular é comum e não deixa qualquer rasto. Aliás, nas listagens de facturação detalhada existentes em relação ao nº (…) pertencente ao arguido E, há exemplos de chamadas do número do arguido para números associados a produto vitamina, sem identificação de titular. (3) Passemos aos locais onde ocorreram os factos. Quanto aos locais - (...) (…), (...) (…) e (…)-, onde o Despacho de Pronúncia imputa a prática dos factos, da prova produzida em audiência de julgamento o Tribunal não ficou com a convicção de que tais locais fossem sítios onde o arguido habitasse, onde tivesse a sua residência (convocamos, aqui, o que o Tribunal acima disse quanto aos locais onde o arguido teve a sua residência ao longo dos anos, ou com os quais teve referências). Convocando que já acima dissemos e por súmula (quando analisámos os factos relativos à vivência do arguido), que resultou da prova produzida em audiência de Julgamento que o arguido E comprou uma fracção sita em (…), na (...) (…) nº (…),(…)º (…), no dia 4/04/1995, tendo-a vendido em 10/12/1999 (cfr. Doc. de fls. 60.377 a 60.381 e fls. 60.373 a 60.376 vº.) Após a venda da casa de (…) (escritura feita em 10/12/99, como vimos), o arguido alegou que mudou-se para o (…), nº (…),(…)º (…), em (…), sendo que da conjugação dos elementos que então analisámos, o Tribunal concluiu que o arguido E, a partir de data próxima e pelo menos imediatamente posterior a 10/12/1999 (data em que fez a escritura de venda da casa de (…)), teve residência no (…)º andar (…)º do prédio sito no (…), nº (…). Quanto à data até quando o arguido E esteve no prédio sito no (…), nº (…), da análise que o Tribunal fez dos documentos dos autos concluiu, como vimos, que o arguido teve residência no (…)º andar (…)º, do prédio sito no (…), nº (…), até data não determinada do mês de Dezembro de 2001. E a partir de data não determinada do mês de Dezembro de 2001, passou a ter residência no andar sito na (...) (…), lote (…),(…)º (…), em (…). Mas o Tribunal também já disse, que questão relacionada com a análise das residências do arguido, é saber se no período de tempo analisado o arguido viveu ou teve disponibilidade, exclusivamente, “nestas” e “destas” casas, de forma a encontrarmos um padrão de comportamento ou de vivência tão forte, que afaste a possibilidade de utilização, fosse a que título fosse, de qualquer outro espaço para fins diferentes de residência. E na sequência da análise feita pelo Tribunal –quanto à questão da “ exclusividade” de vivência ou disponibilidade de casas por parte do arguido, no período de 1995 a 2001 -, encontrámos referências a outras moradas. Mas dissemos, também, que o significado das referências à morada na “(...) (…)”, na “ (...) (…), em (…)”, na “ (...) (…), no (…)” e na “ (...) (…), nº (…),(…)º (…)º, em (…)”, dadas as datas em que são feitas as referências, entre 1962 e 1991, no caso concreto fica com a relevância restrita a esse aspecto: que entre 1962 e 1991 há referência a quatro moradas. Mas já quanto às referências que são feitas à morada “ (...) (…), nº (…)”,(…)º (…)º, em (…)” , nos anos de 1995 e seguintes, - pela análise que então fizemos e que convocamos - o Tribunal concluiu que esta referência tem um sentido diferente. E, por isso, entre 1995 e 2001, para além das casas sitas na (...) (…), nº (…),(…)º (…), em (…), no (…), nº (…),(…)º andar, em (…) e na Av. (…), nº (…), em (…), o arguido teve acesso, ao longo de todo o período e em simultâneo com as referidas moradas, ao imóvel sito na (...) (…), nº (…),(…)º (…), em (…). É certo que do que antecede o Tribunal não conclui que esta morada ou qualquer uma das referidas, é um dos locais indicados ou descritos pelo assistente AK. Mas o conhecimento deste aspecto da vida do arguido, permitiu concluir ao Tribunal que o arguido E - e lembramos que o arguido não prestou declarações, requereu ao Tribunal a leitura parcial de declarações que prestou perante J.I.C. e o que foi deferido, mas depois, no exercício de um direito legal, não prestou esclarecimentos ao Tribunal sobre tais declarações -, teve um padrão de vida que envolveu a existência e disponibilidade, por vezes em simultâneo, das sucessivas residência que apontámos. Porque pode ser diferente, tendo em atenção o sentido normal das coisas, analisar factos face a uma vida em que o comportamento da pessoa é relativamente singelo - por exemplo, disponibilidade/habitação de uma residência cada 10 anos -, ou face a uma vida em que o padrão comporta o que os factos dos autos apontam: disponibilidade de várias habitações e com possibilidade de simultaneidade (mas diversidade quanto ao aparente fim) de habitações. Mas isto, claro, sem prejuízo de que qualquer umas destas situações não exclui a possibilidade de a prática dos actos que estão imputados ao arguido, terem ocorrido em local acidental e diferente da residência do arguido ou de um destes locais conhecidos. (3.1) Ora e quanto aos locais referidos no despacho de Pronuncia, o assistente localiza a casa num apartamento em frente à (…), num quarto ou quinto andar. Como já referimos, no ano de 1999 a residência conhecida do arguido foi na (...) (…), em (…) e após esta casa vai para o (…), mas para um (…)º andar. O prédio onde os factos ocorreram não se encontra expressamente identificado no Despacho de Pronúncia e com a prova que foi produzida em audiência de julgamento o Tribunal também não o identificou. Ficámos convictos que, na (...) (…), era um prédio com proximidade da (…). O mesmo dizemos em relação aos factos passados num local em (…). Quanto ao Prédio da (...) (…), nº (…), o assistente disse lembrar-se de subir duas plataformas, já estava a subir as escadas a caminho do terceiro. As suas declarações foram, para o tribunal, no sentido de localizar os factos entre o segundo e o terceiro andar de um prédio que – inequivocamente para o tribunal, face a forma como fez a descrição para ir ter ao local e do local -, se situa na (...) (…), na lateral onde se situa o nº (…), que era a porta especificamente imputada pela pronúncia. Sucede, contudo, que face à prova produzida em audiência e invocando em concreto o depoimento das testemunhas Inspector CF, Inspector VM, JQ, XA, CCC, UH, UX, XY , AAC, SH, XY, ZG, CCC, NX, ZA, LJ, o Tribunal não pode dar como provado, para além de qualquer dúvida razoável, que os factos ocorreram concretamente no nº (…). (3.2.) Mas importante para o tribunal foi perceber se esta circunstância abala a sua convicção quanto à ocorrência do abuso. E avaliando as declarações do assistente AK, convocando o que já dissemos quanto ao depoimento da testemunha BX, o AK fez um relato dos actos de abuso com, para o Tribunal, coerência e consistência intrínseca com as explicações que foi dando aos esclarecimentos que lhe eram pedidos. Transmitiu dinâmica de quem relata não um qualquer acto de abuso sofrido - uma coisa colada ou intencionalmente preenchida com outra, porque a história foi construída assim -, mas um abuso ocorrido naquele local que descreve e com aquela pessoa. E a emoção que aparentava à medida que foi falando, a forma como o assistente depôs, aparentando em algumas alturas dificuldade por estar a falar nestes factos, quando agora (neste momento processual) analisámos estas declarações, teve correspondência e consistência intrínseca com a declaração de um abuso vivido e daquele abuso concretamente vivido. Os esclarecimentos que sucessivamente deu, a forma como tentou explicar, para o Tribunal não foi uma forma ensaiada, sendo que à medida que vai explicando aos vários sujeitos processuais e vai sendo contra instado, não introduz dissonância que altere o que anteriormente tinha dito e com o sentido que anteriormente tinha dito, não introduz dissonância que altere a avaliação da credibilidade do relato (e consequentemente de veracidade). O que, no caso concreto – e se estivesse a mentir -, podia ser expectável, pois foi sujeito a um contraditório efectivamente minucioso e difícil. O assistente revela noção de espaço interior, pode estar equivocado quanto ao nº (…), mas a vivência que transmitiu quanto ao acto de abuso em si e quanto ao acto de abuso com a pessoa do arguido, a forma como a pessoa que esteve à nossa frente falou, a emoção, a expressão, aquilo que ao olhar para alguém – quando o estamos ao mesmo tempo a ouvir - sentimos, criou-nos a convicção que nos estava a ser transmitida uma experiência “ocorrida ali”. Assim, o Tribunal ter concluído, também, que os locais onde ocorreram os factos que o Tribunal deu como provados, foram sítios onde o arguido foi ou onde naquela situação se encontrava: no caso da “casa da (...) (…)”, quando o AK foi com os irmãos a tal local; ou para onde o Arguido se deslocou com o AK, no caso da casa da (…) e de (…). Não era o sítio onde o arguido E tinha a sua “residência”, foram locais onde, por alguma circunstância, aí se encontrava na altura dos factos. (4) E o que antecede prende-se, ainda, com uma linha de Defesa do arguido E, no sentido de não ter qualquer verosimilhança, face à sua personalidade e modo de estar, o relato de situações de contacto sexual em locais fora da sua casa ou com a presença de terceiros, ou em locais onde estivessem mais pessoas. Disse o arguido em sede de Alegações orais – e para o Tribunal a fase das Alegações foram, efectivamente, uma fase importante do Julgamento, pois a visão que o arguido (que no caso concreto não admitiu a prática dos factos) deu ao Tribunal, sobre a sua valoração e credibilidade dos meios de prova e das provas produzidas na audiência, são um contributo sério para o Tribunal ver ou ponderar aspectos que possa ter entendido de forma diferente e, assim, evitar o erro -, que o arguido E, à data em que o factos são atribuídos ao arguido (quer na versão inicial do despacho de pronúncia, quer após a comunicação que foi feita ao arguido na audiência de julgamento de 23/11/09, nos termos do artº 358º, nº 1 a 3, do C.P.Penal), tinha habitação em 1996/1999 em (…), de 1999/2000 a 2001 no (…) e desde 2001 em (…). Acrescentando, como elemento que o Tribunal deveria ter em conta para concluir (nas suas palavras) pelo falta de credibilidade e veracidade dos factos relatados por AK, que vivendo o arguido sozinho e tendo “ uma postura relacional” reservada, não preferisse para os seus relacionamentos intímos a sua casa e optasse por outros locais. O Tribunal não põe em causa a postura reservada do arguido. No entanto face aos elementos constantes do “Apenso BF” (cx 1 a 7), face ao teor de alguns documentos (fotografias) que foram apreendidas ao arguido, nas quais estão retratados jovens/indivíduos do sexo masculino, em algumas situações estando retratados mais do que um, levam o Tribunal a considerar que quer a alegação do arguido, quer o depoimento que foi produzido pela testemunha CCD, não tiveram a força suficiente e a potencialidade, de afastar a convicção do Tribunal quanto aos factos ocorridos como AK e da forma que o Tribunal os deu como provados. (5) Quanto aos factos que o tribunal deu como provados em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, das declarações do assistente resultou suficientemente assente que o arguido contactou mais do que uma vez com o AK, conhecia os seus irmãos e a história de vida da família, na altura dos factos o AK tinha 12 anos, pelo que o Tribunal ficou convicto que, no caso concerto sabia a idade do educando e teve conscienecia das consequências dos seus actos. 15.4. Mas quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia que o Tribunal deu como não provados e que especificamente não estejam mencionados na análise que antecede, tal derivou de o assistente não os ter relatado ou admitido e/ou de os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 16. (Assistente AV - factos descritos no ponto “2.3.” do Despacho de pronúncia): 16.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AV, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, processo do T.F.M., o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso BX”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 62, 78, 93, 97, 130, 251). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento, bem como pelas testemunhas VW, educador da AX e no FD desde 1999 e que foi educador de AV no FD; AAH, professora de AV e que falou sobre o seu dia-a-dia na escola; NS, colega de Lar de AV; AAU, Educador; SJ colega de AV; BBA, também colega de AV; JD, da equipa técnica de CZ; EG, assistente administrativa na AX desde 1974 e que contactou com AV quando esteve a trabalhar; KH (da empresa Transportes Urbanos). 16.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido disse ao Tribunal saber quem era, o Lar de onde era, falou do relacionamento com AV. Confessou ter praticado actos de masturbação, coito oral e coito anal no AV, mas disse que os actos correram na garagem e não na sua casa. Não lhe deu dinheiro e disse que os factos ocorreram só uma vez. Foi um dos assistentes a quem o arguido pediu desculpa pelos actos praticados. Em audiência de Julgamento o assistente foi ouvido. Disse que conheceu o arguido quando foi para o lar, confirmou as idas e saídas com o arguido A para o futebol e outros locais, disse que os actos agora em análise foram na garagem de CZ e não na casa do arguido, também não confirma ter recebido dinheiro. Das suas palavras foi visível e perceptível para o tribunal o ascendente que o arguido A exercia sobre este educando, a ambição do assistente de poder vir a ser motorista como o arguido e o gosto que o assistente tinha em estar com o arguido. Neste aspecto foi particularmente relevante o depoimento da testemunha ZK, (…), auxiliar de serviços gerais na AX desde 1996 (disse ao tribunal ter sido aluna da AX, de 1974/75 a 1979/80. A trabalhar esteve na lavandaria (em 2002), mas anteriormente no Bar do (...) GB, para deficientes e no EX). Na lavandaria conheceu o assistente AV, nessa altura trabalhava no armazém e conversava com ele (houve uma altura em que devido a uma avaria da máquina do FD, teve que dar apoio à lavagem da roupa e foi quando se apercebeu que havia roupa interior “suja de fezes”. Falou com a educadora do lar, que disse que já sabia, que era do AV (…) que estava com “problemas intestinais” e que estava a ser acompanhado pelo (...). Mas foi uma situação que se continuou a verificar). AV não tinha amigos. A testemunha gostava do arguido A, era um irmão (…), AV dizia que também gostava, tendo relatado as conversas havidas entre os dois. Acompanhou o AV em 25 de Novembro de 2002 (referindo-se à detenção do arguido A). Foi um grande choque e no dia seguinte o AV chorava, não queria voltar para o lar, a testemunha pensava que isto era só porque o (…) era amigo de A. Relatou uma conversa que posteriormente o AV teve com a testemunha, disse-lhe que já tinha falado “com N”, que ia tirar A da prisão, que os amigos vão tirá-lo de lá, que não estava a mentir (tendo esclarecido que quando foi esta conversa, o arguido N já tinha sido referido na comunicação social, mas não se recordou do que foi dito. AV fez-lhe também uma referência ao nome do arguido H, por causa de uma notícia no jornal, altura em que a testemunha lhe disse que ele estava a mentir, porque não conhecia toda a gente; é também na sequência destas declarações que fala de ouvir dizer que AV mentia para os colegas, que com a testemunha não era assim ) . Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos, a confirmação do AV na medida em que o fez, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “93.” a “93.23.” dos factos provados. 16.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu ter praticados actos e o Tribunal deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 16.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “11.” a “11.3”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 17. (Assistente Y - factos descritos no ponto “2.4.” do Despacho de pronúncia): 17.1. Começando pelos factos pessoais do assistente Y, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, processo do T.F.M., o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DM”, e “Apenso Z-15, 2º volume”, fls. 488 a 656, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado. No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o exame (...) legal constante dos autos. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. 17.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido Em audiência de julgamento o assistente Y declarou ter conhecido o arguido A no CZ. Conheceu-o junto à pista de Skate, falou também da zona da garagem, fazia-lhe recados. Disse que sofreu abusos de natureza sexual por parte do arguido A. Localizou o primeiro num fim de semana de Janeiro de 1999, foi na garagem, na sequência de ter ido fazer um recado ao arguido. Diz que os actos praticados foram actos de masturbação e coito oral, tendo sido o assistente a sofrer a penetração. Houve uma segunda vez na garagem, em que aí houve actos de coito anal, tendo sido o assistente a sofrer a penetração por parte do arguido. Após estas duas situações os actos repetiram-se de “dois em dois” fim-de-semana ou de “três em três” fim de semana, dizendo que com o arguido A tais actos terminaram após a primeira (...) que foi para (…), nas férias do verão. Os actos foram sempre sexo oral e masturbação - com excepção de uma vez em que referiu o coito anal -, sendo o assistente a sofrer a penetração. O arguido dava-lhe dinheiro após os actos, embora não tenha sido preciso quanto a montante. Não confirmou que o arguido o tivesse mandado não falar, mas disse que para si não era preciso, pois tinha medo. O arguido A começou por dizer que não se recordava de Y, tendo posteriormente falado quanto aos factos ocorridos com este assistente. Disse que quando esteve com o educando tinha “...12 (doze) anos Sr.ª Doutora ... mais ou menos...”. Admitiu que os actos prolongaram-se pelo tempo descrito no Despacho de pronúncia, mas dizendo que foram durante a semana e não admitindo actos de penetração anal, mas só masturbação e coito oral (penetração do assistente). Completou que “... nunca lhe disse a ele para não contar, mas ele acho que não contou a ninguém....”, o que foi confirmado pelo assistente, como referimos. Para a prova quanto à localização dos factos no tempo, para além das declarações do arguido e do assistente, o Tribunal teve em conta ainda o seguinte. Y entrou na AX, como interno, em 26/11/98, para o FD, do CZ. Disse que os factos com o arguido A terminaram após a primeira em que foi para (…). Olhando para as (...) deste lar, do Apenso DX (Documento com os mapas das (...) e planos de férias dos (...)s da AX, de 1998 a 2002 e que foram remetidos para o processo em 15/12/03, com o ofício DAS/214) , no ano de 1999, ano do Verão imediatamente a seguir à entrada de Y na AX, não consta a realização de (...) em (…) pelo FD, não constando igualmente no ano de 2000 ou 2001. Apenas constavam (...) deste Lar no (…),(…) e (…) em 1999, em (…) no ano 2000 e em (…) no ano 2001 (cfr. Fls. 8 a 16, do Apenso DX - Documento com os mapas das (...) e planos de férias dos (...)s da AX, de 1998 a 2002 e que foram remetidos para o processo em 15/12/03, com o ofício DAS/214 ) Mas na sequência de diligências de prova determinadas na fase do julgamento, de acordo com os elementos de fls. 51.516, 51.849/50, 51.807/8, 56.032 a 56.037 e do “Apenso W9 - Livro 1” e “ Apenso W9 - Livro 2”, no ano de 1999 o FD teve, efectivamente (...) no (…) (de 5/07 a 15/07, cfr. Fls. 23, 56 a 58, 79, 18 do Apenso W9 - Livro 1 e fls. 96 do Apenso W9 - Livro 2), (…) (de 30/07 a 10/08, cfr. Fls. 29, 49 a 51 e 79 do Apenso W9 - Livro 1” e fls. 96 do Apenso W9 - Livro 2) e (…) (de 5/07 a 15/07, de 10/08 a 17/08 cfr. Fls. 53, 79 do Apenso W9 - Livro 1 e fls. 96 do Apenso W9 - Livro 2), mas teve também (...) em (…) (na Páscoa, de 27 /03 a 1/04, conjuntamente com o Lar FC, em que consta o nome do Y e AP do Lar FC e outra no Natal, de 17/12 a 23/12, cfr. Fls. 79, 77, 66, 60, 61 do Apenso W9 - Livro 1” e fls. 70, 71, 73, 96, 112, 113 do Apenso W9 - Livro 2), (...) em (…) (de 30/08 a 10/08, cfr. Fls. 18, 26, 59 a 61 do Apenso W9 - Livro 1) e na FP (de 29/10 a 7/11, cfr. Fls.67, 68, 70, 79 do Apenso W9 - Livro 1” e fls. 96 do Apenso W9 - Livro 2). No ano de 2000 o FD teve, para além da (...) de (…), duas (...) em (…) (de 3/03 a 12/03, cfr. Fls. 35, 36, 37, 38, 39, 53, 54, 55, 57 do Apenso W9 - Livro 2; e de 15/12 a 21/12, cfr. Fls.3, 5, 7 do Apenso W9 - Livro 2), uma (...) na FP (de 1/08 a 15/08, cfr. fls. 16, 22, 23 do Apenso W9 - Livro 2) e uma (...) em (…) (de 15/04 a 20/04, cfr. fls. 43, 45, 48, 49, 50 do Apenso W9 - Livro 2). Y disse ao Tribunal que os actos terminaram após a primeira (...), de verão, em que foi para (…). Pelo que, face à prova produzida em audiência de julgamento, os actos ocorreram não até Janeiro de 2000, mas até Setembro de 2000 (inclusive), tendo terminado após esta altura. Isto porque a (...) do ano 2000, em (…), não foi no Verão. E das declarações do assistente resulta uma memória que associa o fim dos actos após a (...) de Verão. Quanto ao acto de penetração anal que o Tribunal deu como provado e que o arguido A não admitiu, as declarações do assistente, globalmente avaliadas, como explicou, como relatou aquele desvio em relação ao que era o “usual” consigo, criou a convicção no Tribunal que foi efectivamente assim que os factos se passaram. Assim, o Tribunal deu como suficientemente assente terem ocorridos dois actos no mês de Janeiro de 1999, um dos quais com penetração anal. E nos meses seguintes (Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, e Setembro), ocorreram actos, pelo menos, uma vez por mês. Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos, a confirmação do assistente na medida em que o fez, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “94.” a “94.18.” dos factos provados. 17.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu ter praticados actos e o Tribunal deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 17.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “12.” a “12.3”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.1. (Assistente AH - factos descritos nos pontos “9.6”): 18.1.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AH, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DT”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado e saída para o semi-internato (cfr., por exemplo, fls. 2, 4 21, 18, 46, 64, 96, 133, 137, 148, 159, 196, 199). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar. Com efeito o assistente disse que esteve na AX desde os 11 anos e durante 5 anos - num segundo momento corrige dizendo que esteve na AX desde os 12 anos, correcção que, embora esteja errada (pois se entrou em Novembro de 1997 para a AX tinha ainda 11 anos, cfr, fls. 141 e 142 do Apenso DT), faz algum sentido, pois o assistente fez os 12 anos a 21 de Dezembro, cerca de um mês após ter entrado para a AX - e estavam consigo na instituição mais 3 irmãos, (…). Esteve no Lar BE e a estudar no BF até ao 6º ano (cfr. fls. 166, do Apenso DT). Após, foi para o (...) EY tirar o curso de cozinha e pastelaria. Declarou ter 14 anos na altura em que foi para EY e não acabou o curso. Como educadores teve o Educador RD, a Educadora JI e a Educadora YZ, ia quase todos os fins de semana a casa, com excepção dos dois que se seguiram ao seu internamento e em algum outro que os seus pais não o pudesse ter com ele, por problemas “ … incluindo económico…” (cfr. fls. 17, do Apenso DT, relacionado com carência económica). Disse que não tinha uma relação muito íntima com os educadores, que eram quem organizava as tarefas no dia-a -dia, durante as férias foi para várias (...) da AX e quando vinha da (...) ia passar uma ou duas semanas de férias a casa. Esta referência teve relevância, face ao que disse ao Tribunal, quanto à razão pela qual não falou com os educadores sobre os factos que se passaram consigo. Revelou uma memória globalmente correcta e orientada quer no tempo, quer quanto aos factos, tal como decorria dos documentos e com coerência intrínseca com tais documentos. 18.1.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AH, começamos por referir que o arguido em audiência de julgamento admitiu a prática de actos com este educando. Admitiu os factos que estão descritos no caminho de uma (...) para (…) (o ter mexido no pénis do educando, durante a viagem) e os actos de penetração oral e anal, ocorridos no BF. Disse ao Tribunal ter-lhe dado dinheiro - entre 500$00 e 1.000$00 -, mas acrescentando que parte do dinheiro que deu ao AH foi por causa de o AH o ter ajudado a descarregar o carro no (...) e a outra parte “… para coiso de sexo também…já disse à Sra. Dra…” (na audiência de julgamento de 10/01/05 também já tinha dito ao Tribunal dar-lhe rebuçados e pastilhas, pelo facto de o AH o ajudar a descarregar a carrinha). Não admitiu, contudo, os actos que o despacho de Pronúncia descreve numa estação de serviço a caminho do (…) e os factos numa (...), ocorridos quando o AH estava a ajudar o arguido a descarregar uma carrinha. Lembrava-se que o educando era do BF, a altura em que o conheceu tinha 11/12 anos “ mais ou menos” e a noção de tempo que deu quanto à prática dos factos, foi que a primeira vez não “foi logo” que o AH entrou para o (...), foi “noutra altura …mais tarde…”. Num segundo momento o arguido veio dizer ao Tribunal que os factos no caminho para as (...) não tinham ocorrido, pondo em causa ter transportado o assistente para uma (...) no (…), pois apenas o tinha transportado para outras (...). (1) O assistente AH disse ao tribunal que conheceu o arguido A através do AI e ajudava o arguido a carregar e a descarregar a carrinha em BF, com coisas para o (...)s (ou por ocasião das (...)). Disse que no carregar e descarregar do carro era em regra o assistente e o AI que ajudavam o arguido A. Como resulta do Apenso DT, fls. 142, o educando entrou para a AX em 20/11/97 e resulta da análise crítica da prova que já fizemos quanto ao assistente AI, que este entrou para a AX na sequência de Despacho de 17/10/97, entrou o Lar FU, do BF. O BE, para onde entrou o assistente AH, localiza-se no BF, onde estava também o AI e embora, como vimos, o AI só tenha estado a estudar no BF no primeiro ano em que entrou para a AX - pois no segundo passou para a IIR -, o facto de os lares serem no mesmo (...) não retira credibilidade à declaração do assistente, que ajudava o arguido A a carregar ou descarregar a carrinha e que o fazia com o assistente AI. E esta referência dos dois assistentes, quanto ao facto de ser “normal” ajudar o arguido A a carregar e descarregar a carrinha, por razões diversas, tem relevância num duplo sentido. Não só na parte em que um depoimento concorre para a credibilidade e coerência intrínseca do outro, mas porque concorre para a consistência - no sentido da veracidade -, da afirmação que foi feita por outros assistentes, entre os quais, por exemplo, o assistente AP, de que era “normal” era um comportamento que “acontecia” ajudarem o arguido a carregar e descarregar “coisas” nos e para os (...)s. (1.1) O AH disse que o arguido dava-lhe dinheiro pela ajuda com a carrinha, mas dava-lhe também dinheiro após os actos sexuais que contou ao Tribunal (no sentido do que o arguido já dissera). O assistente disse, contudo, que o arguido começou por dar-lhe 1.000$00, 1.500$00, 2.000$00 e chegou mesmo a dar-lhe 6.000$00. No entanto não referiu os “10.000$00” que constam no despacho de pronúncia, facto que o Tribunal não considerou suficientemente assente e, por isso, deu como não provado. No que diz respeito à questão dinheiro, a relevância de dar como provado um montante ou outro, do ponto de vista da imputação do ilícito ao arguido, é diminuta. No entanto tem alguma relevância convocar as declarações do arguido - em que para uma ajuda de carregar e descarregar veículo admite ter dado, pelo menos, 500$00 - pois concorrem para a credibilidade global e avaliação de veracidade, das declarações prestadas pelos demais assistentes. Os assistentes, em regra - e quando o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação a cada assistente referiu-o - , disseram que o arguido deu-lhes dinheiro, quer após os actos que o arguido teve (ele próprio) com os assistentes, quer na sequência de terem sido levados pelo arguido a outros locais. Mas tendo em atenção as datas e os montantes referidos - estamos a falar dos anos de 1998/1999/2000, ano em que ainda não tinha entrado em circulação como moeda única o Euro e de montantes (por exemplo) de 3.000$00/4.000$000 ou 5.000$00, dado a “miúdos” -, poderia não fazer qualquer sentido que esse montantes fossem dados a estes jovens. E essa ausência de sentido, pelo menos aparente, poderia ser indício de mentira (apesar de ter sido uma declaração sensivelmente idêntica ao longo dos diversos depoimentos). No entanto e agora reconduzindo-nos às declarações do arguido, dizendo o mesmo que para a ajuda de carregar e descarregar veículo deu 500$00 a um aluno, tem “sentido” que a “recompensa” que desse aos educando, após tê-los levado a locais, para a prática de actos de natureza sexual com adultos, fosse superior e na grandeza dos 3.000$00/4.000$000 ou 5.000$00 que disseram. (1.2.) Passando aos factos que o Tribunal deu como “provado” ou como “não provado”, em relação aos actos de natureza sexual, as declarações do assistente são globalmente compatíveis e de alguma forma coincidentes com as declarações do arguido A. É certo que, como acima referimos, o arguido num segundo momento veio dizer que não tinha levado o assistente para uma (...) do (…), pois só o tinha levado para outras (...). No entanto, avaliando globalmente o sentido das declarações do arguido, o Tribunal interpretou que o arguido estava a referir-se aos factos que o despacho de Pronúncia lhe imputa numa estação de serviço, a caminho de (...) para o (…). E esses factos, como vamos referir, também não foram relatados pelo arguido da primeira vez que falou ao Tribunal, nem foram relatados pelo assistente, pelo que a negação do arguido, quanto aos factos e transporte para (...), para o Tribunal cingiu-se a estes episódios. Acresce que como resulta de fls. 436, do Apenso BQ, 3º volume (apenso relativo aos Boletins de itinerário apresentados pelo arguido A), em Julho de 1998 existe um registo do arguido de deslocação ao “(…)” e em Julho/Agosto de 1999 e Julho/Agosto de 2000, existem referência de deslocação ao (…), mas (…) não está expressamente indicado (cfr. fls. 448/9 e 461/2 do Apenso BQ, 3º volume) . No entanto, não é que a menção “(…)” não possa englobar uma deslocação ao (…). Mas, no caso concreto, com a ausência de referência do assistente as factos nos anos de 1999 e 2000 e aos factos numa “estação de serviço”, em “deslocação para (...) no (…)”, tal análise não se mostra necessária. Da globalidade das declarações do assistente o Tribunal concluiu que este localiza os factos ocorrido no “caminho para uma (...)” - a (...) do (…) e foi no primeiro Verão após ter entrado para a AX, 1998 (cfr., quanto ao Transporte, como dissemos o de fls. 436, do Apenso BQ, 3º volume, apenso relativo aos Boletins de itinerário apresentados pelo arguido A), em Julho de 1998 existe um registo do arguido de deslocação ao “(…)” -, como os “primeiros” e os actos em si confirma-os no mesmo sentido do arguido. O arguido A diz que os factos com este assistente não sucederam “logo” que ele entrou, mas mais tarde, o BE teve uma primeira (...) no (…) em 16/07/98 a 14/08/98 (cfr. Apenso DX, fls. 49), tendo o Tribunal concluído a prática dos factos como ocorrida no caminho para esta (...). Das declarações do arguido e das declarações do Assistente, o Tribunal deu ainda como provados três situações, das que o despacho de Pronuncia refere durante o ano lectivo 2000/2001, no BF. O arguido A admitiu os actos de penetração oral e anal no BF, embora não os tenha localizado no tempo. O assistente começou por localizar estes factos no (...) quando passou do 5º para o 6º ano, depois rectifica que foi no 5º ano, pois associa com uma situação em que o arguido lhe reteve a mochila e o assistente voltou atrás para apanhar a mochila, pois tinha trabalhos de grupo. Conjugando estas declarações com os elementos que se encontram a fls. 165 e 166, do Apenso DT, o Tribunal concluiu que os factos passaram-se, pelo menos, no ano de 2000. O assistente descreveu que os factos no (...) foram junto ao refeitório - entraram junto à porta secundária do refeitório, a porta por onde saiam do refeitório, tendo explicado que havia uma sala contígua ao refeitório onde estava a máquina da loiça -. Da primeira vez, o arguido fechou a porta e começou a mexer-lhe nos órgãos genitais, tendo-lhe despertado a braguilha. Tentou evitar mas o arguido desapertou a sua própria braguilha, tirou o “orgão genital” para fora e penetrou com o seu pénis no ânus do declarante. Disse que doeu-lhe, ficou com dores no ânus e deitou sangue. Não disse a alguém pois não contava a ninguém. Ficou com raiva do arguido. Após este acontecimento não viu o arguido A no (...) durante uns dias, umas duas semanas. Decorrido este tempo voltou a aparecer no (...) e a encontrar-se com o declarante no corredor do refeitório. Levou-o para a sala das máquinas de lavar a loiça, que está ao pé do refeitório, baixou-lhe as calças e o arguido penetrou com o seu pénis no ânus do declarante. Declarou que lhe doeu e chorou. Voltou a suceder uma terceira vez, no mesmo local junto ao refeitório, tendo o arguido penetrado com o seu pénis no ânus do menor. Na 1a e 2ª vex o arguido deu-lhe 3.000$00 e na terceira vez 4.000$00, dinheiro com que comprou bonecos para os irmão, uma luvas e meias para si. O arguido A disse-lhe para não dizer o que se tinha passado. Foi um depoimento em que, na parte em que descreveu nos factos ocorridos no BF, concretamente quando descrevia os actos sexuais em si, demonstrou dificuldade em contá-los ao Tribunal. Fez pausas nestes momentos, foi perceptível uma respiração mais funda, que o Tribunal interpretou como dificuldade em continuar. Foi um depoimentos que avaliámos e valorámos como verídico. No entanto das declarações do assistente não resulta que estes factos tenham ocorrido três vezes por mês, durante o ano lectivo de 2000/01, também não resulta das declarações do arguido, pelo que nesta parte o Tribunal deu os factos como não provados (cfr. ponto 59.3. dos factos não provados). (1.3) Quanto aos demais factos imputados ao arguido com este assistente - numa (...) no (…), numa estação de serviço, a caminho do (…) ou aquando de uma deslocação ao (…) -, quer das declarações do assistente, quer das declarações do arguido, não resultou prova bastante e suficiente, para o Tribunal os poder dar como provados (cfr. pontos 59., 59.1 e 59.2., dos factos não provados). 18.1.3. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. (1) E concretamente, no que diz respeito ao assistente AH, foram particularmente relevantes as declarações que prestou quanto a tais factos. O assistente disse que os actos de penetração anal praticados pelo arguido doeram-lhe, ficou com dores no ânus e deitou sangue - descreveu a “saída que encontrou para as pessoas não darem pelo que lhe tinha acontecido, dizendo que se atirou para o chão no jogo de futebol, para assim associar a forma como estava a essa queda -, não disse a alguém pois não contava a ninguém, ficou com raiva do arguido e este disse-lhe para não contar a ninguém (tendo relatado o assistente que o arguido disse-lhe que, se o AH contasse, desmentia e dizia a toda a gente que o jovem é que pedia estas coisas). Mas este assistente também deixou transparecer que gostava de estar com o arguido, pois disse ao Tribunal que gostava de o ajudar a carregar a carrinha (e o arguido quando chegava ao fim dava-lhe dinheiro, o que atenta a normalidade das coisas era um incentivo para o ajudar e gostar de ajudar) e quando relatou uma deslocação com o arguido A para uma (...) no (…), disse que tinha ido com o arguido na carrinha para o (…) e que tinha sido o próprio assistente a pedir à educadora para ir com o arguido. E este relato, como já dissemos, teve uma particularidade singular: o assistente estava a falar ao Tribunal do dinheiro que o arguido lhe dava, do que fazia com o dinheiro e que uma das vezes tentou dar o dinheiro de volta ao arguido, mas que este disse-lhe para ficar com o dinheiro. A única coisa que o arguido lhe dizia era para não contar a ninguém e “… é assim, o Sr. A chegava a ser ele mais respeitado na AX do que o sr. (...)…”. O Tribunal perguntou ao assistente porque é que dizia isto e responde”…é fácil, eu conto-lhe já …as empregadas da escola …prontos, não vale a pena dizer nomes porque eu não me lembro, mas … e não vale estar a inventar…cada vez que viam o sr, A…se um pacote de leite, um papel…a mínima coisa estava no chão, elas limpavam…”, resposta que, na altura, atenta a expressão que o assistente fez quando estava a explicar ao Tribunal aquela afirmação e a forma como o fez, o Tribunal ficou convicto que o assistente estava a expressar um sentimento que efectivamente tinha. Este depoimento, como referimos anteriormente, não só por si mas valorado e conjugado com o depoimento dos demais assistentes e que referimos ao longo desta análise crítica da prova -, bem como as declarações do próprio arguido, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: era um misto de gostar porque o arguido brincava com eles, dava-lhes dinheiro, levava-os na carrinha; de respeito porque o arguido dizia-lhes para não falarem do que se passava e os jovens não falavam; e de algum temor reverencial. (1.1) E quando dizemos isto, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Convocamos o que dissemos quanto às observações que o arguido A fazia e áreas em que interferia junto dos funcionários da instituição – não só junto dos motoristas, área da sua função, mas estendendo a sua interferência à oficina de mecânica -, o modo como respondia, a forma como agia, o à vontade que demonstrava no modo de execução das funções, na forma como se deslocava dentro da instituição, como utilizava os veículos da instituição e como se permitia tratar o arguido C, o que o Tribunal concluiu traduzir uma despreocupação e sentimento de poder, que está aliado a uma ausência de consequências, no caso concreto por protecção. Convocamos o que dissemos quanto ao que foi a tolerância para com o arguido A pelos seus superiores hierárquicos - e pelos demais funcionários -, com um “maneira de ser” considerada pelo (...) da AX, Dr. BQ “muito interventiva” e que o arguido C, como resulta do que disse ao Tribunal, quando explicou a razão pela qual o arguido A não tinha estado presente na reunião que promoveu em Março de 2001 com os mecânicos, relatando que “... estiveram dois motoristas e de propósito, devo dizer, que excluí a presença do A e por uma razão muito simples ... porque o A tem um temperamento e daí um pouco ... se calhar... parecido com o meu, um pouco temperamental e às duas por três, em vez de haver ali uma reunião, havia para ali uma confusão ... de forma que optei por escolher … escolher enfim, pedir que comparecessem dois motoristas mais sensatos...” -, também evitava confrontar (apesar de, como dissemos, na hierarquia da instituição o arguido A não pertencia a um escalão de chefia, ou responsável por algum departamento, nem era um funcionário especializado ou um Mestre, pois isso poderia justificar que em função da sua especial capacidade, mestria ou qualificação, o superior hierárquico, “optasse” ou “tivesse” que “ouvir” e “engolir”, para a instituição continuar a beneficiar da sua mais valia). E convocamos, em concreto, o que a dado momento foi o depoimento da testemunha EEI e que para o Tribunal traduziu a atitude dos demais funcionários em relação ao arguido A - e ao não terem feito queixa, no caso concreto era ao arguido C, de comportamentos do arguido e por causa das reacções deste arguido -, que “... simplesmente as pessoas acomodavam-se ... como eu já frisei aqui neste Tribunal, acomodavam-se porque era mais prático ouvir até não fazer sangue, aguentar ali a pancada, do que fazer as coisas desenvolverem ... que não valia a pena ... as pessoas eram, eram mais massacradas ... e depois eram com represálias por cima e assim era mais fácil ignorar...”. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). E, relembrando, o Tribunal tratou esta questão quando o arguido falou da idade dos assistentes e por causa da forma como o falou. Por vezes, numa primeira declaração, o arguido disse 13/14 anos (o que divergia, em algumas situações, da conclusão e análise em concreto feita pelo Tribunal; por exemplo, no caso do AH o arguido começa por dizer que o conheceu com 14/15 anos). Com então dissemos, pela forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”, esta referência aos “13/14 anos” - que foi semelhante em alguns assistentes como, por exemplo, o assistente AP; o assistente AI; o assistente X, embora neste assistente o Tribunal tenha concluído que a idade fora os 13 anos - tem ver, também, na avaliação do Tribunal, com o sentimento de culpa que manifesta em relação ao jovens. E, por isso, colocar “o mal que lhes fez” numa idade “mais crescida”. E dizemos isto pelo seguinte. Nas situações em que o arguido referiu esta idade “13/14 anos” como aquela em que conheceu os assistentes e em que reconheceu ter praticado com os mesmos actos de que lhes pediu desculpa - e em que o Tribunal concluiu a idade estar objectivamente errada, por ser inferior - o Tribunal não interpretou esta declaração do arguido como uma mentira que quis contar ao Tribunal. Tal não fazia qualquer sentido face às suas declarações: reconheceu ter praticado actos com um assistente, pediu-lhe desculpa e se se equacionasse que o arguido estava a fazer esta referência à idade, por qualquer questão legal, isto é, fazê-lo para que a sua conduta pudesse ser enquadrada num período em que o assistente já tivesse feito os 14 anos, não fazia sentido estar a referir os 13/14 anos, pois para tal objectivo o sentido era referir apenas os 14 anos. O significado para o Tribunal foi outro. O arguido contou ao Tribunal o sofrimento que teve pelos actos de abuso a que foi sujeito na AX, quando era criança, pelo que tem percepção daquilo por que os assistentes passaram em relação aos actos que o arguido praticou. A forma como o disse criou essa convicção ao Tribunal - quanto ao ter tido sofrimento quando actos foram praticados quanto a si; e outras declarações e depoimentos que foram prestadas perante o Tribunal, por exemplo, as declarações do próprio arguido C, do Dr. BQ, da testemunha Dr. UA, foi perceptível para o Tribunal que a AX, no seu internato, teve um passado em que a ocorrência de actos de violência, incluindo sexual entre alunos, foi uma realidade -. E quando falámos - em momento anterior da presente análise crítica da prova -, do relacionamento do arguido A com os educandos da AX, dissemos - fundamentando, entre o mais, com recurso a declarações do próprio arguido; e fundamentação que agora convocamos - que o arguido tinha gosto em relacionar-se com os educando da AX, ele próprio era um “irmão” (…) e os próprios assistentes manifestaram gosto em estar com o arguido. O que em alguma medida contribuiu para o seu movimento de reconhecimento de culpa e de pedido de desculpa aos assistentes. A conjugação do que antecede - e tal como o Tribunal viu o arguido, findas as suas declarações - levou-nos a concluir que o arguido, quando esteve a prestar declarações perante o Tribunal retinha, em relação a alguns assistentes, a idade padrão “13/14 anos” – uma idade em que a criança entra na adolescência, é mais autónomo e independente - como aquela em que teve “actos de abuso” para com os jovens, idade (que hoje, na altura em que prestou declarações perante o tribunal) configura, na análise do Tribunal, como a de um “menos mal” ou de um mal “mais pequeno”. Mas isto não afasta a convicção que o Tribunal criou, que na altura em que os factos ocorreram o arguido sabia a idade exacta dos assistentes, convicção esta que resulta e é sustentada, pelo que era a atitude do arguido na altura em que se passaram os factos. Isto porque, por um lado temos o que já dissemos quanto às conversas e proximidade que o arguido estabelecia com os jovens da AX e o significado que o Tribunal deu a tal proximidade – intenção de aproximar-se dos jovens, ganhar a confiança, sendo que em relação a alguns mais tarde veio a praticar os actos que o Tribunal deu como provados -. Estas conversas, naturalmente, passavam por um primeiro contacto de “apresentação”, de “conhecimento”, em que, atenta a normalidade das coisas - pois estavam em causa os educandos que entravam de novo para os Lares, ou que o arguido via pela primeira vez -, a conversa passa, por sua vez, pelo normal “como te chamas?”, “ que idades tens?”, “onde andas na escola?” (vide, por exemplo, declarações do assistente AH). Por outro, temos o que o arguido era e como era, na altura em que os factos se passaram. Convocamos aqui o que dissemos em momento anterior da presente análise crítica da prova, em relação ao que “o arguido era”, quando analisámos a evolução do arguido A dentro da AX, as suas relações com o arguido C, a forma como era visto dentro da AX, como se movimentava e comportava. Dissemos, entre o mais e a título de exemplo, que sobrepunha-se às ordens que eram dadas por pelos serviços de transportes, interferia nas oficinas, tinha à vontade a utilizar os veículos da AX, era um funcionário expedito a fazer o que lhe fosse pedido, tanto que o arguido C confiava na “…competência…” e “…eficácia…” do arguido A para a execução de serviços, esclarecendo - quando o Tribunal lhe pediu para esclarecer o que pretendia dizer com tais expressões - que queria dizer que o serviço que era prestado era “… de facto bem prestado, não havia dúvidas …”, quando o arguido A regressava “… a tarefa estava cumprida…”, só lhe apontando um problema, que era o tempo que levava, em vez de “cinco minutos” era “meia hora”; e tendo acrescentado que na sua perspectiva era uma vantagem que o arguido A apresentava, pois enquanto os demais motoristas “… pediam sempre…” um ajudante de motorista, ou “… porque era difícil estacionar ou porque não sei quê …, em verdade o A fazia o serviço…” e não precisava que alguém fosse com ele, tendo também esclarecido que isto correspondeu a uma constatação que o próprio arguido C fez no dia-a-dia da AX e não a um procedimento que lhe tivesse sido contado por alguém. Tinha um à vontade e uma atitude de domínio do facto que o rodeava. Tanto que, como dissemos, ao longo do tempo foi ultrapassando frequentemente os limites que lhe eram im(...)s, apesar dos processos, sanções disciplinares ou advertências, foi criando um sentimento de superioridade e de impunidade dentro da instituição e face aos seus colegas. Quando visionámos a entrevista que se encontra no sobrescrito 16, Apenso V, Caixa 3, entrevista dada pelo arguido a uma estação de televisão antes da sua detenção, é esta imagem gestual de “à vontade” e “domínio” do arguido que o Tribunal capta. Pelo que, por toda esta “atitude” e “modo de estar”, o Tribunal estar convicto que o arguido sabia, à data dos factos, a idade dos assistentes de que se aproximava. Aqui o Tribunal acrescenta um outro significado e consequência, ao reconhecimento e consciência que o arguido A revelou perante o Tribunal, do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos e os pedidos de desculpa que fez. É que, para o tribunal, tal significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. Mas uma última referência, porque tal interfere na avaliação da “verdade” e da “mentira” do que foi dito ao Tribunal pelo arguido. Quando o arguido comparece em audiência de julgamento, é uma pessoa diferente da que acabámos de descrever. É uma pessoa que o seu Psiquia tra – a testemunha Dr. JJD – descreveu ao tribunal estar sujeito a medicação desde, pelo menos, 2004, tremuras, episódios de ansiedade, necessidade de medicação contínua para conseguir controlar os episódios de ansiedade e por vezes de ameaça de desmaio e, assim, prestar declarações perante o Tribunal. É a pessoa que está tratada e retratada nas conclusões da Perícia que lhe foi feita, concretamente o que se encontra a fls. 54.777 a 54.784 (subscritas pelos Sra. Peritos Dra. DO e Prof. Doutor DN, os quais prestaram esclarecimentos em audiência de julgamento quanto à perícia efectuada). (3) Quanto aos factos decorrentes do exame (...) legal feito ao assistente, foram relevantes as conclusões constantes do exame de fls. 300 a 305, do Apenso CG. 18.2. (Assistente GQ - factos descritos nos pontos “9.6” ): 18.2.1. Começando pelos factos pessoais do assistente GQ, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DW”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos escolares, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 8, 13 a 20, 23 a 25, 70 a 71, 129). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 18.2.2. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, o GQ não esteve presente na audiência de julgamento, o arguido A não admitiu a prática de factos em relação a este assistente e das suas declarações depreendemos que nem se recordava quem era (cfr. audiência de julgamento de 10/01/2005) e não foi produzida outra prova que permitisse ao Tribunal concluir pela verificação dos factos, tal como vinham imputados ao arguido. Assim e porque os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “60.” a “60.10”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 18.3. (Assistente AG - factos descritos nos pontos “9.9”, (...)): 18.3.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AG, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CW”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, frequência do semi internato e passagem para internato, FD (cfr., por exemplo, fls. 3 a 5, 17, 18, 22 a 25, 28 a 29, 37 a 46, 49 a 56, 58 a 60, 70 a 71, 73, 80, 82, 84 a 85, 86 a 90, 92 a 95, 99, 103, 112). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e, embora de forma limitada, relação familiar, declarações que neste segmento não reclamam menção especial em sede de análise crítica da prova, pois foram concordantes com os elementos existentes. Revelou uma memória globalmente correcta e orientada quer no tempo, quer quanto aos factos, tal como decorria dos documentos e com coerência intrínseca com tais documentos. 18.3.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AG, o arguido em audiência de julgamento admitiu a prática de actos com este educando. Admitiu que ocorreram factos com o assistente na garagem de CZ, disse duas vezes, meteu-lhe “…a mão por cima das calças e outros contactos sexuais…”, embora num segundo momento tenha dito que os “outros contactos sexuais” foi tocar-lhe no pénis. Disse ao Tribunal ter-lhe dado dinheiro - admitiu ter-lhe dado o montante de 5 euros -, mas acrescentando que este dinheiro que deu ao AG foi por o AG o ter ajudado a lavar os autocarros da AX, dizendo que ele era um dos principais nessa ajuda. Por “causa do sexo” disse que lhe deu “300$00/400$00” (cfr. audiência de julgamento de 19/01/05). Não referiu, contudo, mais factos passados com este assistente, o qual disse que conheceu como “12 anos”. Sabia, contudo, o Lar de onde o educando era e disse que teve conversas com ele, sobre se ele já se masturbava. (1) O assistente AG disse ao tribunal que conheceu o arguido A por este o levar para os jogos do hóquei. Disse que não teve conversas com o arguido sobre a sua família, das suas declarações também não resultou que tenha tido conversas com o arguido A “sobre sexo”, embora o arguido o tenha referido, como enunciámos. No entanto foi perceptível que estabeleceu algum relacionamento com o arguido A dentro da instituição, pois referiu os transportes para o hóquei, uma ida à garagem de CZ ter com o arguido A, por este o ter chamado para lhe ir fazer um recado, o que significa alguma proximidade. E referiu, também, que o arguido lhe deu dinheiro “por várias vezes”, embora não tenha especificado o montante, tendo sido uma das vezes após a prática, pelo arguido, de actos de abuso na garagem de CZ. Quanto ao que se passou com o arguido A, relatou os actos descritos no Despacho de pronuncia na garagem de CZ, com a prática de actos de coito anal, penetração do arguido A em si. A forma como falou em audiência de julgamento quanto ao abuso - conjugado com o facto de o arguido também ter admitido ter estado com o assistente na garagem de CZ, embora não relatando a prática de coito anal, mas dizendo que lhe deu dinheiro a seguir -, levou o Tribunal a dar como assente que os actos incluíram a penetração anal descrita pelo assistente. Quanto à localização dos factos no tempo, o AG localizou-os no ano lectivo 2000/2001, o qual corresponde ao terceiro ano em que estava na AX , a estudar em CZ, embora o AG não tenha conseguido dizer o mês ou período concreto (pelo que o Tribunal não deu como provado tal particularidade - e cfr. fls. 38, do “Apenso CW”). Mas no que à circunstância tempo diz respeito, esta é uma situação em que, ao contrário da generalidade das demais, o arguido diz que conheceu o AG com 12 anos, quando o mesmo entrou para a AX no ano lectivo em que fez 14 anos, como resulta dos elementos documentais acima referidos. O AG relatou ainda ao Tribunal que após os factos da garagem e durante boleias que o arguido lhe deu para casa, quando ia de fim de semana, o arguido, por duas vezes tocou-lhe no pénis, apalpando-o (factos que, pelo menos parcialmente, são corroborados pelo arguido A). No entanto das declarações do assistente não resulta que tenham ocorrido os factos que o Despacho de Pronuncia refere “ a partir do início do ano 2000”, tal também não resulta das declarações do arguido, pelo que nesta parte o Tribunal deu os factos como não provados. (2) O AG disse que o arguido dava-lhe dinheiro, que lhe deu por várias vezes, mas não soube precisar ao Tribunal o montante exacto. Dai que, conjugando com as declarações do arguido A e que acima assinalámos, o Tribunal ter dado apenas como assente que uma das vezes o arguido deu 1.000$00 ao assistente (os 5 Euros que o arguido A disse em relação à lavagem dos carros) e os “300$00/400$00” por “causa do sexo”, embora aqui em vezes não concretamente apuradas. Como já assinalámos noutras situações, no que diz respeito à questão dinheiro, a relevância de dar como provado um montante ou outro, do ponto de vista da imputação do ilícito ao arguido, é diminuta. No entanto tem alguma relevância convocar as declarações do arguido - em que, no caso concreto, para uma ajuda a lavar um autocarro admite ter dado “5 Euros” - pois estas declarações concorrem para a credibilidade global e avaliação de veracidade, das declarações prestadas pelos demais assistentes. Os assistentes, em regra - e quando o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação a cada assistente referiu-o - , disseram que o arguido deu-lhes dinheiro, quer após os actos que o arguido teve (ele próprio) com os assistentes, quer na sequência de terem sido levados pelo arguido a outros locais. Mas tendo em atenção as datas e os montantes referidos por esses assistentes - estamos a falar dos anos de 1998/1999/2000, ano em que ainda não tinha entrado em circulação como moeda única o Euro e de montantes (por exemplo) de 3.000$00/4.000$000 ou 5.000$00, dado a “miúdos” -, poderia não fazer qualquer sentido que esse montantes fossem dados a estes jovens. E essa ausência de sentido, pelo menos aparente, poderia ser indício de mentira (apesar de ter sido uma declaração sensivelmente idêntica ao longo dos diversos depoimentos). No entanto e agora reconduzindo-nos às declarações do arguido no caso concreto, dizendo o mesmo que para a ajuda do AG na lavagem de um autocarro deu-lhe “5 Euros”, tem “sentido” que a “recompensa” que desse aos educando, após tê-los levado a locais, para a prática de actos de natureza sexual com adultos, fosse superior e na grandeza dos 3.000$00/4.000$000 ou 5.000$00 que alguns disseram. (3) Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito ao assistente AG, o assistente disse ao Tribunal que tinha medo de se aproximar do arguido e foi perceptível que esse medo foi na sequência da prática dos actos pelo arguido. isto porque, na sequência do que acima referimos, o contacto do arguido com o assistente e vice versa, teve alguma proximidade. tanto que o assistente ajudava o arguido na lavagem dos autocarros, embora houvesse, pelo que foram as declarações do próprio arguido, uma recompensa por isso. Este depoimento, como referimos anteriormente, não só por si mas valorado e conjugado com o depoimento dos demais assistentes e que referimos ao longo desta análise crítica da prova -, bem como as declarações do próprio arguido, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: era um misto de gostar porque o arguido brincava com eles, dava-lhes dinheiro, levava-os na carrinha; de respeito porque o arguido dizia-lhes para não falarem do que se passava e os jovens não falavam; e de algum temor reverencial. (3.1) E quando dizemos isto, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Convocamos o que dissemos quanto às observações que o arguido A fazia e áreas em que interferia junto dos funcionários da instituição – não só junto dos motoristas, área da sua função, mas estendendo a sua interferência à oficina de mecânica -, o modo como respondia, a forma como agia, o à vontade que demonstrava no modo de execução das funções, na forma como se deslocava dentro da instituição, como utilizava os veículos da instituição e como se permitia tratar o arguido C, o que o Tribunal concluiu traduzir m uma despreocupação e sentimento de poder, que está aliado a uma ausência de consequências, no caso concreto por protecção. Convocamos o que dissemos quanto ao que foi a tolerância para com o arguido A pelos seus superiores hierárquicos - e pelos demais funcionários -, com um “maneira de ser” considerada pelo (...) da AX, Dr. BQ “muito interventiva” e que o arguido C, como resulta do que disse ao Tribunal, quando explicou a razão pela qual o arguido A não tinha estado presente na reunião que promoveu em Março de 20001 com os mecânicos, relatando que “... estiveram dois motoristas e de propósito, devo dizer, que excluí a presença do A e por uma razão muito simples ... porque o A tem um temperamento e daí um pouco ... se calhar... parecido com o meu, um pouco temperamental e às duas por três, em vez de haver ali uma reunião, havia para ali uma confusão ... de forma que optei por escolher … escolher enfim, pedir que comparecessem dois motoristas mais sensatos...” -, também evitava confrontar (apesar de, como dissemos, na hierarquia da instituição o arguido A não pertencia a um escalão de chefia, ou responsável por algum departamento, nem era um funcionário especializado ou um Mestre, pois isso poderia justificar que em função da sua especial capacidade, mestria ou qualificação, o superior hierárquico, “optasse” ou “tivesse” que “ouvir” e “engolir”, para a instituição continuar a beneficiar da sua mais valia). E convocamos, em concreto, o que a dado momento foi o depoimento da testemunha EEI e que para o Tribunal traduziu a atitude dos demais funcionários em relação ao arguido A - e ao não terem feito queixa, no caso concreto era ao arguido C, de comportamentos do arguido e por causa das reacções deste arguido -, que “... simplesmente as pessoas acomodavam-se ... como eu já frisei aqui neste Tribunal, acomodavam-se porque era mais prático ouvir até não fazer sangue, aguentar ali a pancada, do que fazer as coisas desenvolverem ... que não valia a pena ... as pessoas eram, eram mais massacradas ... e depois eram com represálias por cima e assim era mais fácil ignorar...”. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (4) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido até confirmou saber a idade do assistente, embora objectivamente a idade que disse era inferior à que o educando efectivamente tinha, pelo que ficam prejudicadas parte das considerações que fizemos para outros assistentes, quanto a este aspecto. Mas convocamos as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. (5) Quanto aos factos decorrentes do exame (...) legal feito ao assistente, foram relevantes as conclusões constantes do exame de fls. 6.119 a 6.122 dos autos. Mas quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia que o Tribunal deu como não provados e que especificamente não estejam mencionados na análise que antecede, tal derivou de os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.4. (Assistente AL - factos descritos nos pontos “9.1” do despacho de pronúncia):18.4.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AL, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DS”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos escolares, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 7, 15 a 16, 46 a 48, 50 a 52, 54 a 62). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 18.4.2. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, AL esteve presente na audiência de julgamento, não tendo contudo relatado os factos ao Tribunal. O arguido A disse ao Tribunal saber quem era o assistente, num primeiro momento apenas refere o transporte que terá feito com o assistente, mas acompanhado por um educador. Num segundo momento admite a prática de factos, mas fá-lo de forma que não permitiu ao Tribunal, com segurança, individualizar quais os actos e em que momentos foram efectivamente os praticados com este assistente. Assim e porque os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “54.” a “54.11”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.5. (Assistente AJ - factos descritos nos pontos “9.8” do despacho de pronúncia):Começando pelos factos pessoais do assistente AJ, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DV”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos do internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 3 a 9, 14 a 30, 163, 166; cfr., também, Apenso DX, fls. 4., quanto a (...) frequentadas pelo assistente). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 18.5.1. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, AJ esteve presente em audiência de julgamento, falou do transporte que o arguido A fez consigo, que de facto o arguido deu-lhe uma revista, mas disse que a revista tinha “raparigas” e “homens” em fato de banho, afastando que tivesse qualquer conteúdo pornográfico. O Tribunal tentou perceber se estas declarações do AJ se deviam a qualquer sentimento de vergonha, que tivesse falta de à vontade para perante o Tribunal dizer que o conteúdo da revista era outro e não aquele que relatou, mas o assistente manteve as suas declarações e não foi perceptível que o estivesse a dizer para não relatar alguma coisa que lhe custasse ou de que tivesse vergonha. Com efeito disse ao Tribunal que conheceu o arguido A quando foi para (...) (…), foi uma vez para o (…),(…), não se lembra em que ano da escola estava... uma carrinha levava a alimentação e outra os alunos e as malas... Como costumava enjoar, educadora PS perguntou a A se podia ir com ele.. Só o encontrou nessa vez na carrinha, antes, no lar ou noutro lugar não o encontrou.... Sr. A mostrou-lhe revistas com raparigas em biquini e homens semi-nus...tinham o tronco nu...e calção... A perguntou-lhe só em que escola andava... a revista estava ao lado “do coiso das mudanças”... pararam numa bomba de gasolina e ele disse para a eu ficar a ver enquanto ia lá pagar... Os rapazes estavam um grupo de rapazes em duas folhas... como se estivessem a tirar uma fotografia ... não havia nenhum homem ou rapariga nu ... ou como se estivessem a namorar... não viu nada que lhe parecesse que tivesse natureza sexual... havia também uma revista decoração da casa. Quando a testemunha estava a ver a revista A perguntou se os rapazes eram bonitos...em relação às raparigas não lhe fez comentários, não perguntou “se as gajas eram boas” , só “se os gajos eram bons, se eram bonitos”...Acha que a revista era portuguesa (....). Assim e porque os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como “não provados” nos respectivos pontos “61.” a “61.6”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.6. (Assistente GT - factos descritos nos pontos “9.18” ):Começando pelos factos pessoais do assistente GT, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso EC”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos escolares, internamento e lar onde esteve internado. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. 18.6.1. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, o GT não esteve presente na audiência de julgamento, o arguido A não admitiu a prática de factos em relação a este assistente e das suas declarações resulta mesmo que não se recordava de quem era e não foi produzida outra prova que permitisse ao Tribunal concluir pela verificação dos factos, tal como vinham imputados ao arguido. Assim e porque os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “71.” a “71.20”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.7. (Assistente AA - factos descritos nos pontos “9.10.” do despacho de Pronúncia ):8.7.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AA, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundo a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CX”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 11, 13, 14, 16 a 35, 38 a 42, 44 a 47, 49 a 53, 57 a 61, 63 a 109). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar. Com efeito o assistente mostrou uma recordação viva quanto à altura em que entrou para a AX, escolas que frequentou e anos escolares em cada uma das escolas (primeiro CZ e depois IIR), bem como o acompanhamento familiar que teve, após a morte da sua mãe e a entrada na instituição. Revelou uma memória globalmente correcta e orientada quer no tempo, quer quanto aos factos, tal como decorria dos documentos e com coerência intrínseca com tais documentos. 18.7.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AA, começamos por referir que o arguido em audiência de julgamento admitiu a prática de actos com este educando. Admitiu factos que se passaram em sua casa, o visionamento de um filme pornográfico, actos de masturbação e actos de coito anal (penetração do educando por parte do arguido). Admitiu factos passados na garagem de CZ, admitiu duas vezes, os actos foram os mesmos que em sua casa, mas esclareceu “... sem a cassete...”, referindo-se ao visionamento do filme pornográfico. Não se conseguiu no entanto recordar durante quanto tempo é que duraram os factos, não se recorda de factos passados no estacionamento do (...), Num segundo momento acrescenta que dentro de um autocarro não se recorda de terem-se passado factos, mas sim na garagem de CZ. Lembrava-se da altura e lar para que o AA entrou, a idade (12/13 anos). Disse ao Tribunal ter-lhe dado dinheiro, entre 500$00 e 600$00. No segundo momento em que falou quanto a estes factos - e na sequência de pergunta que lhe foi feita, não só quanto ao assistentes AA, mas também em relação a AM e o DY, se após terem ocorrido os actos se lhes disse que se eles contassem que “lhes batia” e em relação ao AA que se ele contasse alguma coisa que estaria “lixado” -, respondeu ao Tribunal que não disse isso. Mas acrescentou e esclareceu, na sequência de perguntas que lhe foram feitas pelo Tribunal (cfr. aj de 19/01/05) , que tinha confiança nos rapazes, eles eram seus amigos e “... viam-me como um amigo...portanto eles não contavam a ninguém...”, confirmando que ia vendo “isso”, que os rapazes não contavam e repetia os comportamentos. Admitindo que para si era importante não contarem. Mas também disse – na sequência de pergunta que especificamente lhe foi feita -, que não aconteceu ter deixado de abordar algum rapaz com medo que ele contasse alguma coisa, por não lhe inspirar confiança, pois “... Sra. Dra...como disse ...como disse era normal, portanto de os homens não contarem...portanto eu depois não fazia amis nada...portanto... mais aos alunos ...”. E quando lhe foi perguntado se havia algum código de honra na AX, respondeu “... antigamente pelo menos ... como a BP dizia, os gansos não se chibam, desculpe a expressão ... mas era assim que se falava, mas portanto eles como não eram … portanto eles são gansos... mas como não sabiam destas palavras, a BP veio para televisão em público dizer que os gansos não se chibavam, portanto uns aos outros, nem se chibavam portanto às pessoas de fora, qualquer coisa que houvesse ... era por isso que aquilo andava tudo como anda e continua a andar penso eu....”. Estas declarações do arguido foram particularmente relevantes para a prova dos factos relativos ao relacionamento que o arguido estabelecia com os jovens, no caso concreto o AA, intenção com que o fazia e a relação de dependência e proximidade que estabelecia com os educandos dentro da instituição. (1) O assistente AA relatou ao Tribunal as circunstâncias em que conheceu o arguido, a aproximação consigo – fazia recados ao arguido e estes dava-lhe uns “trocadinhos”; depois o arguido ia ao lar FC, onde o assistente estava, ia buscar restos para os animais, pedia aos educadores para o AA lhe ir fazer algum recado e eles deixavam; quando fazia alguma coisa “mal” o arguido chamava-o e dizia-lhe que não podia fazer aquilo, tinha que ter respeito -, associando os primeiros actos e factos descritos no Despacho de pronuncia, numa altura em que já “havia alguma intimidade”, não foi logo de início, numa altura em que já havia mais confiança. Aponta, avaliando globalmente o seu depoimento e a dinâmica do depoimento, para a primeira parte do ano de 1998 (cfr. ponto “156.” dos factos provados, que o assistente entrou para a AX em Setembro de 1997), o que se afigura globalmente plausível, como aliás está descrito na pronúncia. Também da globalidade do seu discurso depreende-se que os actos que aconteceram neste primeiro momento “foram acontecendo” de forma gradual e sucessiva – inicialmente actos de manipulação, tocar no corpo do assistente na zona genital, até que o arguido passou a tentar a penetração com o seu pénis no ânus do assistente -, e aconteceram durante um período dilatado no tempo, mas que o assistente não conseguiu delimitar com exactidão, mas dizendo cerca de um ano (acrescentando, mas percebe-se com dúvida, a possibilidade de estes factos terem ocorrido durante ano e meio), o que se compreende. É certo que o arguido não refere estes primeiros factos, mas o que pode ser compreensível: o arguido reconhece actos de penetração anal, estes primeiros actos podem ter assumido, para si, uma relevância menor, pelo que pode nem sequer recordar-se para os referir. No entanto as declarações do assistente foram globalmente coerentes e consistentes quando à ocorrência e sucessão destes actos, a forma como descreveu os factos faz sentido na dinâmica de aproximação do arguido ao assistente, até passar para actos de penetração oral ou anal. Pelo que o tribunal deu tais factos como provados. Quanto aos demais actos que o despacho de pronúncia imputa ao arguido, para a sua localização no tempo o tribunal, mais uma vez, teve que olhar à dinâmica global das declarações. O assistente começa a falar destes factos - dos que se passaram após os iniciais “na garagem” -, mas passa logo para contar o que se passou quando “ quando as coisas acabaram mesmo”. Situa, primeiro no seu 7º/8º ano na (…) e depois rectificando para 8º ano (cfr. “Apenso CX”, fls. 5, onde temos o 7º ano no ano lectivo 99/00; e 8º ano no ano lectivo 00/01). Assim e depois de ouvidas as suas declarações e extraído a dinâmica temporal que para o Tribunal deles ressaltou, descreve e situa um acto de penetração anal na zona da garagem, dizendo que o arguido o tinha convidado para ir à garagem ver a carrinha nova e que no dia seguinte iam para a feira (…) - como vimos o arguido admitiu que na zona da garagem aconteceram factos e de penetração anal; embora para o Tribunal não tenha ficado suficientemente assente que tais factos ocorreram dentro de um veículo, razão pela qual o Tribunal não deu como provado a circunstância especifica de o abuso ter ocorrido dento do autocarro -. Tendo em atenção a descrição inicial que o assistente deu, o Tribunal depreendeu das suas declarações que os primeiros factos terminaram “ao fim de um ano, ano e meio” de terem começado. Este foi o sentido que o tribunal retirou da declaração que o assistente fez logo no início: que quando se referia a “isto deve ter tudo ocorrido” durante um ano, ano e meio - dado que tal resposta inseria-se nas declarações que estava a prestar e perguntas que lhe estavam a ser feitas, como foi a forma de aproximação do arguido, actos que foram acontecendo e como foram acontecendo -, que estava a referir-se a tais factos. Assim, foi esta a baliza temporal que o tribunal deu como assente para terem terminado os actos relativos às “primeiras tentativas e actos seguinte” e acontecerem os “segundos actos” (e referindo-nos aos factos tal como estão descritos no despacho de pronúncia, faz sentido a localização temporal, pois o assistente fez 13 anos 17/07/98 e, consequentemente, os 14 anos em 17/07/99; disse também que ainda estava no Lar FC, ainda não tinha passado para o Lar FG, cfr. fls. 3.122 a 3.139 e fls. 19, do Apenso Z-10, mas resultando que o AA só foi para o lar FG no ano lectivo 2001/2002) (cfr. factos constantes dos pontos “156.9.” e “156.10” dos factos provados). Quanto ao último acto que o assistente refere ter acontecido - que da descrição inicial parecia ter sido um segundo ou terceiro acto, mas ao qual o assistente se veio a referir posteriormente dizendo que este fora mesmo o último acto, pois a partir daí sempre que via o arguido desviava-se dele e evitava-o -, os factos acontecidos no estacionamento da (...), o AA descreveu que o arguido tentou introduzir o seu pénis na boca do assistente, mas que o assistente - dizendo que como já era mais velho já tinha mais resistência -, conseguiu evitar a introdução. Diz que ainda tocou com os seus lábios no pénis do arguido mas não entrou. Face ao que antecede, os factos que o Tribunal deu como provados no ponto “156.12” dos factos provados e no ponto “63.4” dos factos não provados. E também face à descrição do assistente, último acto ocorrido, já era mais velho e conseguiu ter resistência para evitar a introdução, ainda no Lar FC (mas só entrou para FG em 10/09/2001, cfr. fls. 19, do Apenso Z-10), a matéria factual que o Tribunal deu como provada quanto à localização temporal. É certo que o arguido A confessou actos de penetração anal, mas não referiu actos de penetração oral, mas tal acto enquadra-se dentro da dinâmica da confissão dos factos que o arguido fez em relação a este assistente. O assistente disse ao Tribunal que o arguido dizia-lhe para não dizer o que se passava, o assistente reconheceu ser um pouco medroso, pelo que não contava mesmo, declaração que aparentou ser verídica na dinâmica do seu discurso, e na dinâmica das reacções que ia expressando ao Tribunal quanto ao que lhe tinha acontecido, em que foi patente alguma vergonha. O assistente AA referiu, também, ter ajudado o arguido A no transporte de uma televisão de casa de uma senhora para casa de outra e que recebeu dinheiro, referência esta que vai de encontro à de outros assistentes, no sentido de ser “normal” o facto de educandos ajudarem o arguido A a carregar e descarregar coisas ou materiais. A relevância que assume é num duplo sentido. Não só na parte em que um depoimento concorre para a credibilidade e coerência intrínseca do outro, mas porque concorre para a consistência - no sentido da veracidade -, da afirmação que foi feita por outros assistentes, entre os quais, por exemplo, o assistente AP, AI, AH, de que era “normal” era um comportamento que “acontecia” ajudarem o arguido a carregar e descarregar “coisas” nos e para os (...)s. O AA disse também que o arguido dava-lhe dinheiro, os “trocadinhos” dos recados, para comprar um bolo na escola (no sentido do que o arguido já dissera), declaração relevante no que diz respeito à prova dos factos relativos à relação de proximidade estabelecida com o arguido. Assim e concluindo, no que diz respeito aos factos que o Tribunal deu como “provado” ou como “não provado”, em relação aos actos de natureza sexual, as declarações do assistente são globalmente compatíveis e de alguma forma coincidentes com as declarações do arguido A. Assinalámos as discrepâncias, mas não são contradições ou divergências que afastem a segurança que os factos ocorreram e da forma que o tribunal deu como provada. (2) Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito ao assistente AA, convocamos a forma como descreveu a relação que tinha com o arguido, como este o repreendia quando fazia alguma coisa “mal” e como o passou a evitar após terem acontecido os factos, sendo perceptível, pelas suas declarações, que este evitar passava também por medo do arguido. Mas este assistente – tal como aconteceu noutras situações - também deixou transparecer que inicialmente gostava de estar com o arguido, pois fazia-lhe os recados (e o arguido dava-lhe o “troco” do que ele fora comprar, ou dinheiro para um bolo na escola, o que atenta a normalidade das coisas era um incentivo para o ajudar e gostar de estar com o arguido) e disse mesmo que no princípio gostava do arguido, o arguido parecia ser uma pessoa carinhosa. Mas as declarações do próprio arguido, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. (2.1) E quando dizemos isto – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (3) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido até confirmou saber a idade do AA. Mas convocamos as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. (4) Quanto aos factos decorrentes do exame (...) legal feito ao assistente, foram relevantes as conclusões constantes do exame de fls. 78, “Apenso CG”. Mas quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia que o Tribunal deu como não provados e que especificamente não estejam mencionados na análise que antecede, tal derivou de o assistente AA não os ter relatado e admitido que aconteceram consigo, sendo que os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.8. (Assistente Z - factos descritos nos pontos “9.15” do despacho de pronúncia):18.8.1. Começando pelos factos pessoais do assistente Z, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DK”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos escolares, internamento e lar onde esteve internado (cfr. fls. 2, 16 a 20, 22, 23, 29 a 31, 42 a 60, 68 a 71, 74 a 78, 80 a 133, 136 a 144). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma limitada, foram também parcialmente confirmados pelos assistente em audiência de julgamento. Foi ainda relevante o documento de fls. 6.960 a 6.966. 18.8.2. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, Z esteve presente na audiência de julgamento, não tendo contudo relatado os factos ao Tribunal. O arguido A disse ao Tribunal saber quem era o assistente, saber quem era a sua família mas não se recordou nem admitiu por isso, a prática de actos neste assistente. Assim e porque os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento também não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “68.” a “68.13”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.9. (Assistente AF - factos descritos nos pontos “9.14.” ):18.9.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AF, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DI”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 8, 11 a 13, 18), os elementos escolares os documentos de fls. 36.525 a 36.531 e convocando ainda o Apenso Z-10, fls. 185 e 185 vº, 191, 203 , 210, 217 (e fls. 227 a 242, quanto à composição das equipas técnicas do lar). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. Foi ainda relevante o documento de fls. 5.030 a 5.037, referente ao exame (...) legal feito ao assistente. 18.9.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado, em audiência de julgamento o arguido começou por negar ter tido qualquer situação com o AF. Era seu afilhado de Baptismo - facto este também confirmado pelo assistente -, disse que estava de consciência tranquila pois não lhe tinha “tocado”. Confirmou conhecer a família, pois os irmão do AF também estiveram na AX, e que o arguido às vezes telefonava-lhe para casa. Confirmou também que o AF esteve na sua “casa nova”, foi numa altura em que o arguido estava a descarregar coisas para a casa e que o AF viu aí um filme pornográfico com o AS. Num segundo momento veio pedir desculpa ao AF pelo filme pornográfico, mas continuou a negar ter feito qualquer outro acto. 18.9.3. Quanto ao AF, disse ao tribunal que conheceu o arguido A quando estava no 4º ano, mas já o conhecia antes, pois ele ia ao (...) carregar e descarregar coisas. Como dissemos confirmou que o arguido foi seu padrinho de baptismo, mas não sabe quem é que escolheu o arguido para seu padrinho, foi o (...) que o escolheu. Disse ter sido baptizado no dia 31/05, sabia porque era o dia dos anos da sua mãe e quando perguntado de que ano, disse quando estava no “4º” ano da escola, tendo acrescentado posteriormente que foi na primeira vez que andou no 4º ano (cfr. fls. 36.527, esteve no quarto ano nos anos lectivos 1998/1999 e 1999/2000). Antes disto falava com o arguido mas era raro, só bom dia boa tarde e a partir do baptismo o arguido passou a ir levá-lo e buscá-lo à camioneta, quando ia a casa à 6ª feira e vinha ao Domingo. Era mais nessa altura que falava com o arguido, quando vinha das (…), antes de ir para o (...) iam passear e nessas alturas falavam da vida do assistente na escola. Disse que houve uma altura que foi com o arguido a uma casa, que o arguido disse que era da tia, tinha umas varandas azuis e era para os lados da (…), mas não se lembrava bem do prédio. Foi a essa casa duas vezes, depois rectificou para uma ou duas, para acabar por dizer foi uma, com uma voz em que era perceptível a dúvida. Foi a um Domingo em que vinha das (…) e o arguido foi lá buscá-lo com um colega do (...), AS. O arguido disse que tinha que ir buscar umas coisas a casa e na casa disse ao AF e ao AS para irem para o quarto e deitarem na cama, pôs um filme pornográfico, o arguido saiu, pois disse que tinha que fazer alguma coisa e quando regressou disse para irem embora. O Tribunal perguntou-lhe se tinha sucedido mais alguma coisa e disse “aí” não. Acrescentou, num segundo momento, que tinham sucedidos coisas mas das primeiras vezes que esteve com o arguido. Estas primeiras vezes relacionou-as com a data em que foi baptizado (como vimos 31/5/1999). E disse que nos fins de semana seguintes, em que o arguido o começou a ir buscar à camioneta, ao Domingo (lembramos que tinha dito que estas idas à camioneta começaram após o baptismo), iam para parques, e relatou que o arguido mexeu-lhe no corpo e praticou actos de coito anal. factos que não foram admitidos pelo arguido, conforme já referimos. (1) Como vimos o arguido admitiu ter levado o assistente a sua casa, com o AS e ter (...) o filme pornográfico. Disse que foi na casa nova e da dinâmica da descrição do AF o Tribunal deduziu que se tratava de uma altura em que o arguido estava a levar coisas. Isto tem relevância para colocar os factos em Janeiro de 2002 - os primeiros descritos no despacho de Pronúncia, em que está descrita uma ida do AF e do AS a casa do arguido e que coincide com o que o arguido, por sua vez, também disse -, o que é compatível com uma altura em que o arguido A estivesse a fazer uma mudança de coisas para a “casa nova” (o arguido usou mesmo esta expressão). E recorrendo aos elementos dos autos, resulta dos documentos de fls. 7.017, 7.018, 7.019 e 7.020, que o contrato com a JJM para fornecimento de água no fogo sito na (...) (…), Lote (…), Bloco (…),(…)º (…), em (…) e em nome de A, está datado de 26/12/2001. Do documento de fls. 7.021 (nos autos principais) , emitido pela Câmara Municipal (…), Direcção Municipal de Habitação, resulta que por despacho de 6/12/01 foi atribuído a A o fogo acabado de identificar. E do documento de fls. 35.764 (dos autos principais), emitido pela KKB, consta que o arguido recebeu as chaves do apartamento em 14 de Dezembro de 2001. Estes elementos acolhem a possibilidade de o facto que estamos a tratar ter ocorrido em Janeiro de 2002 (embora o arguido, numa altura em que prestou declarações, tenha dito que só foi viver para a casa em Março, pois mandou arranjar o chão, isso não afasta a possibilidade de em Janeiro 2002 ainda não a estar a habitar mas já ter lá as suas coisas e estar a levar coisas para lá). No entanto, quanto aos demais factos que o despacho de pronúncia descreve terem-se passado nessa casa, quer na primeira vez quer nas seguintes, o assistente não os confirma, diz mesmo que não sucederam para além do visionamento do filme e o assistente AS (que no ponto 9.13. do despacho de pronúncia está também referido como tendo participado com o AS nestes factos), disse ao Tribunal que não os praticou com o AF. (1.1) É certo que o assistente AF relatou ao Tribunal factos que diz terem-se passado consigo e com o arguido A “nuns parques de (…)”. Mas das suas declarações e na análise que fizemos dessas declarações, a terem-se passados tais factos, das declarações do assistente não resultou para o Tribunal que estivesse a referir-se às situações que estamos a tratar. Não ficámos convictos que fossem as situações descritas no despacho de pronúncia, de modo a configurar a hipótese de estarmos perante a “mesma história de vida”, mas com alteração quanto ao local ou quanto ao tempo, o que a lei sempre permitiria configurara a este Tribunal. E não é pelo local ser “diferente” (parques) ou pelo tempo ser outro (o assistente, aparentemente, aponta para o ano de 1999, após o seu baptizados e a testemunha XK relatou ao Tribunal uma queixa da avó do AF, mas em 1999, por haver aproximação do arguido A com o seu neto), mas sim porque, a terem ocorrido tais factos - e a estarem suficientemente assentes para este Tribunal que assim ocorreram (caso em que o Tribunal sempre poderia considerar a hipótese de fazer uma comunicação nos termos do artº 359º, do C.P.Penal), o que também não ficou para o Tribunal -, a “história de vida” seria ou poderia ser outra, mas não a agora e aqui imputada ao arguido. Quanto ao facto que o Tribunal deu como provado no ponto “160.8.” dos factos provados, foi relevante o documento de fls. 77 a 84 do Apenso CG dos autos. 18.9.4. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito a este assistente AF, o assistente AA, convocamos a forma como descreveu a relação que tinha com o arguido, como falava com este sobre a escola, quando o arguido o ia buscar e levar ao fim de semana à camioneta, o arguido falava mesmo para casa do assistente, o que revela para o Tribunal proximidade. Mas as declarações do próprio arguido, quando explicou numa situação que acima já referimos o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. (1) E quando dizemos isto – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, no caso concreto o próprio arguido reconheceu-o, quando pediu desculpa pela exibição do filme, o que o Tribunal considera no caso concreto suficiente. (3) Mas quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia que o Tribunal deu como não provados e que especificamente não estejam mencionados na análise que antecede, tal derivou das declarações do assistente, sendo que os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se,em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.10. (Assistente AD - factos descritos no ponto “9.2.” do Despacho de Pronúncia ):18.10.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AD , quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo no T.F.M. o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CR”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 1 a 3, 7 a 10, 14 a 27, 30 a 36, 38 a 60, 64 a 106). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. Foi ainda relevante o documento de fls. 71 a 179 do “Apenso CR”, referente ao exame (...) legal feito ao assistente. 18.10.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado, em audiência de julgamento o arguido - e após ter ouvido as declarações do AD -, confessou estes factos e pediu desculpa ao AD. Acresce que o assistente em audiência de julgamento também tinha descrito os factos no sentido em que veio a ser admitido pelo arguido. No entanto e quanto à localização dos factos no tempo, foi levantada a questão quanto ao ano em que os factos teriam ocorrido, pois o AD disse que foi na “primeira (...) em que foi para (…)” e “achava” que a seguir tinha ido para a (...) de (…), mas manifestando dúvida. Mas face aos elementos dos autos tal coincide com o ano 2000, pois embora o lar do AD - Lar FK - tenha tido uma (...) em (…) no Ano de 1998, não resulta dos documentos dos autos que o AD tenha ido a esta (...). No ano de 1999 resulta que foi para a (...) de (…) e no ano de 2000 foi (pela primeira vez de acordo com os elementos dos autos) para uma (...) em (…) (cfr. Apenso DX, fls. 32 e 33; sendo que no Apenso BQ, 3º Volume, referente aos Boletins de itinerário do arguido A, a fls. 462, folha referente ao mês de Agosto, constam deslocações do arguido ao (…) para fazer transportes). Face ao que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos - depois de ter ouvido o assistente -, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “148.” a “148.14” dos factos provados. *** 18.11. (Assistente AW - factos descritos nos pontos “9.3.” do Despacho de Pronuncia ): 18.11.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AW, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DU”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 57 a 86, 91 a 96, 99 a 130, 138 a 155). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente AW, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar, tendo mostrado recordação quanto à altura em que entrou para a AX, frequência escolar, com global coerência intrínseca com tais documentos. 18.11.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AW, o Tribunal começa por fazer referência aos factos que foram dados como provados nos pontos “149.2” a “149.11” e “149.13” a “149.19”, os quais foram expressamente confessados pelo arguido da forma que o Tribunal deu como provada - foi uma das situações em que o arguido, quando é inquirido a primeira vez, diz que nada aconteceu (cfr, audiência de julgamento 19/01/05) mas num na sequência de ouvir as declarações do assistente o arguido pediu desculpa, reconheceu os factos e foi o próprio arguido, como iremos referir, que disse a altura exacta e disse-o de forma consistente com os documentos dos autos, em que os factos aconteceram -, tendo esclarecido que a (...) de (…) em que praticou os factos não foi no ano de 2001 mas sim no ano de 2002. E tendo também confirmado que os factos em sua casa - que ocorreram num dia em que houve um torneio de ténis -, foram também no ano de 2002, pois foram no mesmo ano da (...) de (…). Por sua vez as declarações do assistente tinham também confirmado os factos tal como o Tribunal os veio a dar como provados, sendo que quanto à questão do ano da (...) em (…) (o assistente situava-a em 2001), resulta dos elementos constantes do Apenso DX, fls. 3, que o FL - onde o AW estava - foi fazer (...) em (…) em 2002 e não em 2001 (como resulta de fls. 7, em 2001 o Lar do AW foi para uma (...) em (…); e quanto ao arguido A, não obstante este ter sido o ano em que lhe foi instaurado o processo na sequência do qual, por Despacho da Secretária de Estado da Segurança Social datado 19/09/02, o arguido A foi aposentado compulsivamente, nas (...) o arguiodo ainda estava a trabalhar - cfr. Apenso L, fls. 184 a 185, 197, 200, 209, 210 a 213; Apenso CQ, Vol. II, fls. 556 e Apenso J, fls. 11 a 31, de onde constam os documentos e comunicações efectuadas dentro da AX, para a instauração do processo e respectivos motivos). Esta é uma das situações que ilustra que, de facto, os assistentes podem ter lapsos, enganos, quanto ao tempo em que localizam os factos, dão referências que para si parecem seguras, mas que podem estar equivocados. Sem que isso signifique mentira e tire, portanto, veracidade ao resto do seu depoimento. Assim e pelo que antecede, o Tribunal ter dado os factos como provados, tal como o arguido os admitiu e com a alteração introduzida quanto ao ano em que os mesmos ocorreram (aliás, comunicação que foi feita ao arguido em audiência de julgamento, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal, conforme consignado no relatório do presente acordão). 18.11.3. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito ao assistente AW, convocamos a forma como descreveu a relação que tinha com o arguido quando este ia a EY, as conversas que tinha com o AW, o que revelou alguma confiança e proximidade. Mas as declarações do próprio arguido - e que já assinalámos expressamente em momento anterior -, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. (1) E quando dizemos isto – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). Convocamos as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. (3) Quanto aos factos decorrentes do exame (...) legal feito ao assistente, foram relevantes as conclusões constantes do exame de fls. 6.251 a 6.259. 18.11.4. Mas quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “56.” a “56.9”, o assistente não os admitiu, não os confirmou mesmo, sendo que os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.12. (Assistente AM - factos descritos nos pontos “9.4.” do Despacho de Pronuncia ):18.12.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AM, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundo a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DN”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 1 a 7, 10 a 21, 26 a 39, 41 a 57, 61). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente AM, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar, tendo mostrado recordação quanto à altura em que entrou para a AX, frequência escolar, com global coerência intrínseca com tais documentos, havendo que ter em atenção a idade com que entrou para a AX - ainda com 5 anos - e a recordação que mantém dessa vivência. 18.12.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AM, começamos por referir que num primeiro momento o arguido, quando o Tribunal lhe pergunta sobre se conhecia o AM, o arguido A responde que não, só vendo a cara do assistente é que podia dizer. No entanto num segundo momento (cfr. Audiência de julgamento de 19/01/05), começa a recordar-se de quem era este assistente, localiza que o AM foi para o centro de Acolhimento da (…), pertencente a FA e que os irmão também andavam na AX, o que tem consistência com o documento de fls. 57, do Apenso DN (em que é referido que em 21/02/95 o AM entra para o Centro de Acolhimento; sendo que deste Apenso DN consta ainda a confirmação que os irmãos do AM entraram também para a AX; cfr, por exemplo, fls. 34). E é neste segundo momento que o arguido confirma - mas fá-lo de forma expressa e consciente de tudo o que lhe estava a ser perguntado, pois o seu Ilustre Mandatário pediu para o arguido ler a parte concreta do Despacho de pronúncia que estava em causa, o que o Tribunal permitiu e o arguido fez - que os factos que o Despacho de Pronuncia localiza e descreve “…pouco tempo antes das férias do Verão de 2002…”, nas idas para assistir a treinos de futebol e “…durante as férias de Verão de 2002…”, durante as boleias que deu ao AM, aconteceram. O Tribunal perguntou-lhe se se lembrava concretamente desta situação e o arguido disse que sim. Pelo que, quanto a este núcleo de factos, o Tribunal deu-os como assentes, não se revelando necessário qualquer outra análise. Quanto aos demais factos, o arguido admitiu ter dado dinheiro ao AM, “para o ajudar”, acrescentando “… portanto porque estavam na casa da avó, iam passar o Natal…”. Num segundo momento admite que também lhe deu dinheiro relacionado com “sexo” e fez uma referência a 5 Euros. Nesta parte e avançamos desde já, o AM disse que o arguido às vezes dava-lhe “1.000$00”, pelos que as suas declarações são coincidente quanto a tal facto (mas já não quanto ao arguido ter-lhe dado “ 5 contos”, facto que o assistente referiu e que fez de uma forma que para o Tribunal deixou transparecer que estava, de facto, a dizer algo que tinha acontecido consigo, não houve indício de que estivesse a inventar este montante por uma razão qualquer). No entanto e quanto aos primeiros factos descritos no despacho de pronúncia e quanto aos que estão descritos “…durante as férias de Verão de 2002…”, durante as boleias que deu ao AM - ocorridos uns antes e outros depois daqueles que o arguido expressamente admitiu -, o arguido A não os referiu ou admitiu expressamente. Mas aqui o Tribunal valorou as declarações do assistente. O AM disse que conheceu o arguido no 5º ano e de acordo com o relatório de fls. 6, do Apenso DN, frequentou o 5º ano no ano lectivo de 2001/2002, no (...) DT da AX, o arguido levava-o da escola para o Lar - o que foi corroborado pela testemunha DDR, colega de (...) do AM, a qual disse também que viu uma vez o arguido A dar dinheiro ao AM - e dava-lhe boleias. Quanto aos primeiros factos confirmou que os mesmos passaram-se, os primeiros numa situação em que o arguido lhe deu boleia quando ia para casa e uma outra situação em que lhe deu bolei de DT para o lar. Mas em relação aos factos que o Despacho de pronuncia diz terem ocorrido “…durante as férias do verão de 2002…”, já não confirmou que os mesmos se tivessem passado. Quanto à localização no tempo dos “primeiros factos”, o AM localiza-os, como vimos, após ter conhecido o arguido (conhecimento que ocorreu no ano lectivo 2001/2002, como vimos e o assistente revelou uma memória viva quanto à sua entrada e percurso na instituição ), diz que os factos aconteceram antes de ter ido à (...) da (…) (e cruzando o momento em que o assistente diz que conheceu o arguido e os elementos do Apenso DX, fls. 9, em “2001” o Lar FX não foi para a (…), mas foi em 2002, conforme resulta de fls. 5). Pelo que o Tribunal ter considerado que quer das declarações do assistente, quer da conjugação das mesmas com os factos que o arguido admitiu e a idade com que diz “ter conhecido” o assistente, os factos ocorreram no período referido no despacho de pronúncia. Assim e por tudo o que ficou dito, os factos que o Tribunal deu como assentes nos pontos “150.” a “150.14.” dos factos provados. 18.12.3. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito ao assistente AM, convocamos a forma como descreveu a relação que tinha com o arguido quando este ia ao seu (...), o depoimento da testemunha DDR (educanda e colega do Daniel, que chegou a ver o arguido dar dinheiro a este), as boleias que lhe dava, o que revelou alguma confiança e proximidade. O próprio arguido disse que deu dinheiro ao AM para ajudar a avó, o que revela conhecimento e alguma proximidade com a sua vivência familiar. Mas as declarações do próprio arguido - e que já assinalámos expressamente em momento anterior -, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. (1) E quando dizemos isto – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, também a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido disse que conheceu o AM quando este tinha 13 anos - embora das suas declarações, quando começou a falar do AM e o relacionou com o Centro de acolhimento e a sua entrada na instituição para esse centro (tinha o Daniel 5 anos como vimos) fosse perceptível para o Tribunal que aos 13 anos não foi a primeira vez que o viu, mas terá sido efectivamente, até porque nesse sentido vão as declarações do AM, quando o arguido decidiu ter proximidade com o assistente). Convocamos as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.12.4. Mas quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “57.” a “57.2”, o assistente não admitiu e não confirmou mesmo uns, sendo que quanto aos demais os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se,em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.13. (Assistente AE - factos descritos nos pontos “9.12” do despacho de pronúncia):18.13.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AE, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CZ”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, elementos escolares, internamento e lar onde esteve internado (cfr. fls. 1, 4 a 8, 11 a 104, 108). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora parcialmente, foram confirmados pelos assistente em audiência de julgamento. 18.13.2. Quanto aos demais factos constantes do Despacho de pronúncia e referentes a este assistente, AE, o arguido A negou-os, tendo admitido contido ter dado 200$00 ao educando, uma vez na (…). O AE em audiência de julgamento relatou factos que disse terem-se passado consigo e com o arguido na (…), os quais não faziam parte do objecto deste processo. O Ministério Público requereu na altura ao Tribunal que fosse feita uma comunicação de factos ao arguido nos termos do artº 359º, do C.P.Penal, o que foi feito, o arguido opôs-se ao prosseguimento quanto a tais factos neste processo, tendo o Tribunal determinado a extracção de certidão e remessa para eventual procedimento criminal (cfr. audiência de julgamento de 6/05/2005, fls. 30.564 a 30.578-D; Despacho de fls. 30.572). Quanto aos demais factos objecto deste processo e tirando aqueles que o Tribunal deu como provados, em relação aos contactos, conhecimento e alguma proximidade estabelecida entre o arguido e o assistente - que teve uma expressão que pensamos ser significativa da forma como o arguido era visto pelo educando, pois o Tribunal perguntou-lhe se considerava o arguido A um amigo e respondeu que não o considerava um amigo “… era um senhor da AX…” -, o Tribunal deu-os como provados com base nas declarações do assistentes, que foram coerente e fizeram sentido tendo em atenção a forma como se expressou e relatou (cfr. pontos “158.8” e “158.9” dos factos Provados) . Quanto aos factos que em concreto eram o objecto deste processo, o assistente não os confirmou e o que relatou sobre conversas tidas com o arguido ou que o arguido teve consigo não permitiu ao Tribunal - nem quanto ao tempo, nem quanto às circunstâncias e pelo menos parcialmente quanto ao conteúdo - considerar, interpretar e por conseguinte reportar ao “episódio de vida” a que se refere o relatado no despacho de pronúncia e objecto deste processo. Estamo-nos a referir aos factos que o AE relatou ao Tribunal - depois de ter contado os factos que deram origem à comunicação feita pelo Tribunal, nos termos do artº 359º, do C.Penal - , relacionados com conversas ou comentários tidos pelo arguido “sobre mulheres” e as perguntas feitas pelo arguido, quanto a qualquer acto que o assistente tivesse praticado com outro colega, factos estes que não foram consideradas nessa altura (a da comunicação anteriormente feita), nem se revelam neste momento, susceptíveis de levar o Tribunal a fazer uma comunicação de alteração de factos, nos termos do artº 359º, do C.P.Penal. Isto porque, para o Tribunal não estaríamos em presença de uma situação enquadrável no artº 358º, do C.P.Penal. Isto porque, como já o referimos noutra sede, nomeadamente nos Despachos em que o Tribunal procedeu anteriormente a comunicações aos arguidos, de alteração não substancial de factos descritos no Despacho de Pronuncia, nos termos do artº 358º, do C.P.Penal, só estamos perante uma “ alteração não substancial dos factos” quando se verifica: uma divergência ou diferença de identidade; que não transformam o quadro factual da acusação em outro diverso no que se refere a elementos essenciais; mas apenas de modo parcelar e mais ou menos pontual e sem descaracterizar o quadro factual da acusação; e que, de qualquer modo, não tem relevância para alterar a qualificação penal ou para a determinação da moldura penal. E, em consequência, que não seja uma situação que implique uma modificação estrutural dos factos descritos na acusação, de modo a que a matéria de facto provada seja diversa, com elementos essenciais que agravem a posição processual do arguido, ou a tornem não sustentável, fazendo integrar consequências que se não continham na descrição da acusação, pois neste caso estaremos perante uma alteração substancial de factos (Alteração substancial: diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço; que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso; ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual; e que determine a imputação de crime diverso; ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis). Assim e porque os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento também não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, os factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “65.” a “65.7.”, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.14. (Assistente AY - factos descritos nos pontos “9.11.” do Despacho de Pronuncia ):18.14.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AY, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundo a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CY”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 4, 6 a 89). Foram igualmente relevantes os registos constantes dos “Apensos W-10, Livro 2” e “Apenso W-10, Livro 3”, referentes aos livros de registos de ocorrências do FD onde o educando esteve internado. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do assistente AY, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar, tendo mostrado recordação viva da altura em que entrou para a AX, relacionamento familiar, com global coerência intrínseca com tais documentos. 18.14.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AM, foi uma das situações em que a admissão que o arguido fez quanto a factos que cometeu foi particularmente relevante. E quando dizemos particularmente relevante, é porque essa admissão, quando foi feita antes de o próprio educando ter prestado declarações, permitiu - pelo menos quanto a esse factos já admitidos - poupar o assistente a uma descrição mais detalhada e no caso concreto mais difícil, pois foi patente a dificuldade demonstrada pelo AY em relatar de novo o que se passou. Assim e logo da primeira vez que foi perguntado, o arguido A disse ao Tribunal que os factos em sua casa passaram-se e passaram-se tal como o Tribunal lhos tinha lido. Disse que teve sexo com o AY, “ de tudo”, o AY é que “lhe praticou o oral”, repetindo que “lhe fez sexo ” da mesma forma “ que ele me fez”. Confirmou ter-lhe dado dinheiro, o que fez para ajudar a mãe e também por causa do sexo. Entretanto o AY prestou declarações. Falou quanto à sua relação com o arguido, a forma como o via, que era de facto como um pai. Falou dos recados, das lavagens dos carros, contou um episódio na praia de terem perguntado ao arguido A se o AY era seu filho. Foi uma das situações em que a relação estabelecida entre o educando e o arguido foi, efectivamente, com uma afectividade parecida com um laço parental, o que o Tribunal deu, em consequência, como provado (cfr., tb, fls. 69 do Apenso w-10, Livro 2, onde é feita uma referência à ida do arguido A com o AY a um jogo, livro este onde estão também anotadas as visitas da mãe do AY ao (...) e as vezes em que o educando foi a casa; cfr. pontos “157.4” a “157.6.” dos factos provados, quanto à relação estabelecida entre o educando e A ). Relatou os factos ocorridos na casa do arguido - factos que já estavam confessados pelo arguido - e relatou os factos ocorridos na garagem do CZ, que o despacho de pronúncia referia e em relação aos quais o arguido A não se tinha pronunciado especificamente. Após o AY ter prestado declarações o arguido A prestou de novo declarações, confirmou que os factos tinham-se passado e pediu desculpa ao AY. Da conjugação destes dois elementos, declarações do assistente que para o Tribunal tiveram expressividade de verdade e de vivência efectivamente ocorrida consigo, com a admissão e pedido de desculpas do arguido, o Tribunal ter dado os demais factos como provados. É certo que o arguido não os conseguiu localizar no tempo. Mas o AY disse que passaram-se na segunda vez em que fez o “6º ano” - o que foi no ano lectivo 1999/2000, cfr. fls. 33 a 39 e 40, 41 do Apenso CY - , os factos na garagem foram antes de ter ido à praia com o arguido e a casa do arguido, sendo que da dinâmica como os descreve - os da garagem foram acontecendo, antes dos da praia, mas não dando a noção de que tivessem sido “tanto tempo antes” que o Tribunal configurasse a hipótese de terem ocorrido no ano de 1999, nem que tivessem ocorrido “imediatamente antes” dos da praia -, o Tribunal deu como suficientemente seguro que ocorreram durante o primeiro trimestre de 2000. Para este núcleo de factos - os da ocorrência de abuso -, foram também relevantes as conclusões constante do exame (...) legal de natureza sexual que se encontra a fls. 5.924 a 5.933. Tendo o assistente AY declarado ao Tribunal que não teve qualquer relação de natureza de coito anal ou coito oral com qualquer outra pessoa que não tivesse sido com o arguido A , declaração que o arguido A não pôs em causa e que o Tribunal, não só face à forma como foi prestada - como ao facto de não haver qualquer indício da demais prova produzida em audiência de julgamento, que tal não pudesse corresponder à verdade, considerou credível e verídica. Quanto aos demais factos descritos no despacho de pronúncia, o arguido admitiu ter dado dinheiro a AY (como acima já referimos para ajudar a mãe e “por causa do sexo”). No entanto e quanto aos “últimos factos” referidos, no balneário, o arguido não os admitiu mas o AY disse também ao Tribunal que não se recordava de terem ocorrido. 18.14.3. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, à relação de dependência que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. E concretamente, no que diz respeito ao assistente AY, as suas declarações foram suficientemente expressivas quanto ao modo como via o arguido, como um pai, o que acima já assinalámos. Mas as declarações do próprio arguido - e que já assinalámos expressamente em momento anterior -, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio”, dão uma noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava. (1) E quando dizemos isto – referência que fazemos em relação a cada um dos diferentes assistentes e das diferentes situações descritas no Despacho de pronúncia -, temos também em atenção a forma como o arguido era e como foi descrito pelos próprios adultos, funcionários da AX. Convocamos aqui o que acima dissemos - e as passagens que expressamente transcrevemos, concretamente no capítulo em que o Tribunal fez a análise crítica da prova em relação à progressão do arguido A na AX, sua relação com o arguido C e com os demais funcionários, por exemplo pontos “3.4” a “3.6” - dos depoimentos das testemunhas e dos quais o Tribunal concluiu que o arguido A, dentro da AX, tinha uma atitude de “à vontade”, sentimento de “supremacia” em relação aos demais funcionários e “não acanhamento” face a superiores hierárquicos. Se o arguido, nos demais funcionários e mesmo superiores hierárquicos causava o efeito que antecede, por maioria de razão e atenta a normalidade das coisas, tinha a potencialidade de causar temor reverencial nos educandos da AX. E isto porque os educandos da AX, como resulta da matéria de facto que o Tribunal deu como provado em relação a cada um deles - e da análise crítica da prova que fez, quanto aos factos relativos ao seu ingresso e vivência na instituição -, eram educando oriundos de famílias disfuncionais, com histórias de abandono ou maltrato, uns com vivência, mesmo dentro da instituição, de absentismo escolar, falta de aproveitamento escolar, com necessidade de acompanhamento pedopsiquiátrico, organizados em lares, mas que não deixavam de ser um núcleo de internato. Eram, à partida, pessoas mais frágeis que os adultos que descrevemos, para reagir ou agir em relação ao arguido A. E os adultos reagiram como vimos. E, por conseguinte, essa fragilidade contribuiu, na avaliação do Tribunal, para que naturalmente - e sem necessidade de qualquer ameaça ou outra atitude expressa por parte do arguido - os assistentes, em função e por causa das funções que o arguido A, da forma como o mesmo andava dentro da AX, como falava, o considerassem uma pessoa importante “lá dentro”, dando lugar, também, a que se estabelecesse “dos jovens” para “com o arguido”, um sentimento de dependência, de limitação da sua capacidade de pensarem que poderiam reagir contra o arguido. Não é que tal reacção, atenta a idade dos assistentes, nos casos em que os factos qualificados como crime foram praticados em menores de 14 anos, tivesse à partida relevância para desqualificar como crime a prática do arguido. Não é essa a perspectiva do Tribunal. Mas tem relevância, para o Tribunal, como expressão do que foi a situação de facto, por parte dos assistentes, em que os factos qualificados como crime foram praticados pelo arguido A. Face à análise e valoração que antecede, também a razão pela qual o Tribunal deu como provado - nas situações expressamente descritas nos “factos provados” - , que para os assistentes o arguido A era “ … um funcionário influente na AX…”, que a relação do arguido A com os educandos era uma relação de “…dependência, que limitava a possibilidade…” de o educando opor resistência aos actos praticados pelo arguido e que o arguido A, enquanto funcionário da instituição, “…inspirava autoridade e dever de obediência …” aos educandos. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu saber a idade que o assistente tinha quando esteve com ele e depois quando o levou a sua casa, o que atenta a proximidade que no caso concreto havia entre um e outro, necessariamente isso tinha que acontecer. Mas convocamos também as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. Sendo que, no caso concreto do AY, foi umas das situações em que o arguido pediu desculpa pelo que tinha feito. 18.14.4. Mas quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “64.” a “64.3.”, o assistente não os admitiu e não confirmou mesmo, sendo que os demais os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.15. (Assistente AO - factos descritos nos pontos “9.16.” do Despacho de Pronuncia ):18.15.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AO, a sua vivência familiar antes da entrada na AX, entrada na AX, avaliação que lhe foi feita, o Tribunal fundo a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DL”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, peças do processo que correu no T.F.Menores e relativo à situação parental do jovem, as avaliações que lhe foram feitas dentro da instituição, elementos escolares com a identificação dos anos frequentados pelo assistente, lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 1, 3 a 61; tendo sido ainda relevante o documento de fls. 5.729 a 5.736, concretamente quanto às suas conclusões). São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, embora parcialmente, corroborados pelo assistente AO, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e relação familiar, tendo mostrado recordação viva da altura em que entrou para a AX, relacionamento familiar, de forma globalmente coincidente com tais documentos. 18.15.2. Quanto aos factos praticados pelo arguido A na pessoa do AO, o arguido negou-os. Disse que conhecia o AO, era jogador de futebol e dava-lhe boleias do AXAC para o (...). Essas boleias eram no seu carro e o AO trazia os calções sempre molhados para dentro do carro, o que “lhe dava cabo da napa” . Disse que lhe deu dinheiro, uma vez “400$00” e outra “250$00”, foi depois dos treinos para beber sumos e “comer uma sandes”. O AO disse que entrou para a AX aos 5 anos, tendo ido para o (...) FA. Frequentou a escola no (...) DT, em que ainda se encontrava quando prestou declarações perante o tribunal, no 11º ano. Aos 10 anos foi para o futebol – está a referir-se a 1997 - , sendo que a fls. 12, do “Apenso DL”, aparece um relatório feito em 13/1/98, depreendendo-se para enviar para o Tribunal, o qual refere que o AO está a praticar esta actividade (futebol) nesse ano lectivo. Mas sendo perceptível quer dos documentos de fls. 12 e 3 do mesmo apenso, quer das declarações do assistente e do próprio arguido A (aquelas que prestou após o assistente ter falado), que esta actividade prolongou-se pelo menos até 2002. Foi no AX (...) que conheceu o arguido A. Os treinos eram durante a semana e começou por ir de autocarro. Passado cerca de dois meses passou a apanhar boleia de A, que o levava dos treinos para o Lar, deixando um outro Colega em DT . Estes factos foram também referidos pela testemunha KKC, que foi Educadora do AO, disse ao tribunal que o arguido A, quando o educando tinha 9/10 anos, transportava-o sozinho para o Lar, o que teve conhecimento quando, um dia, o AO chegou ao pé de si e disse que não precisava dos módulos do autocarro, pois o arguido A trazia-o). Cerca dos seus 13/14 anos – o que se situa em 2000/2001 - e quando lhe dava boleias dos treinos para o (...), A tocava-lhe nas pernas e colocava-lhe o telemóvel entre as pernas, mexeu-lhe no pénis. Começa por localizar estes factos quando andava no seu 8º/9º ano (o que pelos elementos de fls. 3/4/6 do Apenso DL, o educando frequentou o oitavo ano em 2001/2002). Mas num segundo momento localiza os factos no ano lectivo 2001/2002 - referindo inicialmente o seu 10º ano e, em momento posterior, embora dizendo que não tinha a certeza, o 9º/10º ano – . E acrescenta que cerca de uma semana mais tarde e quando regressava também de um treino, o arguido A deu de novo boleia ao declarante, de carro. Parou o carro em (…), junto ao (…), tocou no corpo do declarante, tirou-lhe os calções e o arguido A introduziu o seu pénis no ânus do declarante. Disse-lhe para não dizer nada. Num momento o declarante disse que estes últimos factos passaram-se no fim do ano lectivo que tinha referido, à entrada das férias grandes, tendo esclarecido, em momento posterior, que passaram-se em Outubro de 2001. Declarou que o arguido A dava-lhe por vezes dinheiro, mas que não lhe tinha comprado qualquer cartão de telemóvel. Declarou que o acto de penetração que descreveu foi o primeiro que lhe sucedeu. Declarou que após esse não teve outro acto idêntico. Relatou os actos de forma aparentemente pouco emotiva. E dizemos isto porque a audição deste assistente foi uma das situações em que, na sala, o assistente falava de forma baixa, não dava muita sequência ao seu relato, mas como se houvesse algum distanciamento do que estava a relatar. Ouvindo a gravação das declarações tal não é perceptível, pois a gravação, pelas razões que explicámos logo no início da presente análise crítica da prova, aparenta uma sonoridade e um tom de voz que não foi, de todo, aquele que se deu na audiência. No entanto esta aparente falta de emoção, este distanciamento que parecia ressaltar das declarações do assistente, à medida que ia sendo sujeito ao contraditório não se foi tornando mais “emotivo”, mas foi revelando uma coerência intrínseca nas explicações que ia dando e repetindo. Pelo que este modo de se apresentar perante o tribunal pode corresponder, de facto, à forma como se consegue expressar ou exteriorizar. E isto liga-se com o facto de, em audiência de julgamento, ter havido uma circunstância, o tempo em que os factos correram, que foi claramente perceptível que o assistente não conseguia ter memória, lembrança certa. Ora deu uma referência, ora dava outra, o que poderia significar estar a mentir, estar até a relatar alguma coisa que lhe tivesse sucedido mas não com o arguido A. Tal falta de referência ou memória do tempo foi especialmente perceptível quando passou a ser instado pela Defesa do arguido A, onde foi requerida e deferida, a confrontação do assistente com as declarações que prestou na fase de inquérito. No entanto, feita essa leitura, ouvidas as explicações do assistente, resultou para o Tribunal que esta leitura correspondeu, quanto à circunstância tempo, efectivamente a um avivamento da memória e o assistente reconduziu os factos para a data que consta no Despacho de pronúncia. E dizemos que foi efectivamente um avivamento, pois num dos autos que foi lido o assistente tinha situado os factos, explicou ao tribunal que só tinha decidido falar depois de saber o resultado do exame de natureza sexual que lhe foi feito – pois por causa do resultado não podia esconder o que se tinha passado – e a testemunha KKC, que foi educadora do AO, relatou ao tribunal que numa (...) no Verão de 2003, o AO contou-lhe o que lhe tinha acontecido, descreveu o acto de penetração anal e agarrou-se à testemunha, chorava, dizendo-lhe que esta nunca mais ia confiar nele, pois tinha começado por mentir. Esta reacção do AO, o chorar quando contava à educadora o que se tinha passado e a preocupação por a educador poder não voltar a confiar nele, revelam, na perspectiva do Tribunal, uma emoção que é compatível e adequada com quem está a falar verdade. Assim e por tudo o que antecede, o que o tribunal deu como provado quanto à ocorrência dos actos de abuso. 18.15.3. Passando à análise crítica da prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provados/ ou os que deu como não provados, relativos ao modo como o assistente via o arguido, ao tipo de relação que estabeleceu com o arguido A, à consciência que o arguido tinha da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, convocamos e remetemos para tal fundamentação, o que atrás já dissemos quanto a esta matéria. Mas concretamente, no que diz respeito ao assistente AO, as suas declarações não permitiram ao tribunal concluir, com a suficiente certeza, que a relação de dependência e limitação que o arguido estabeleceu com este assistente, teve o efeito de lhe anular qualquer tipo de resistência face ao arguido. Com efeito, das declarações do assistente resultou para o tribunal que o AO nada disse sobre o que se passou, porque o arguido lho disse e porque tinha vergonha. Mas no caso concreto não resultou o temor reverencial, o medo ou a situação de dependência que noutras situações verificámos, do assistente em relação ao arguido. Sem prejuízo do que acima já dissemos, quanto ao que resultou das declarações do próprio arguido, quando explicou o que era a sua relação com os jovens e o seu “silêncio” e que deram ao tribunal a noção do que era a relação do arguido com os educandos: um misto de amizade, de respeito e de algum temor reverencial, pois o arguido tinha confiança que os jovens não falavam do que se passava, no caso concreto há algo de específico. Isto porque, com o educando AO, a percepção do tribunal foi que a relação não teve todos este elementos: para o tribunal foi perceptível algum temor – tanto que o arguido disse-lhe para não contar e não contou -, mas não consideramos que tenha ocorrido o medo, o domínio que não permitia ao educando agir de outra maneira, resistir. Este assistente não demonstrou, para o tribunal, proximidade e dependência como vimos na globalidade dos demais assistentes que já analisámos. Demonstrou, mesmo, atitude e comportamento que revelam o sentido o(...). Assim, notamos e convocamos as suas declarações quando, por exemplo, disse que o arguido várias vezes o convidou para ir a sua casa, telefonava-lhe para casa para o convidar para ir conhecer os seus amigos e o assistente recusou e não foi. Tendo dito que agiu assim e não foi porque não quis, tendo revelado alguma independência em relação ao que era o domínio do ponto de vista emocional, do arguido sobre si. (2) Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido não admitiu os factos, mas o Tribunal deu-os como provados. Mas valem na mesma e por isso convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.15.4. Assim, face a todo o ex(...) e agora especificamente quanto aos factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “69.” a “69.6.”, as declarações do assistente e os demais os meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.16. (Assistentes AB e AR - factos descritos no ponto “9.5.” do Despacho de Pronúncia ): 18.16.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AB, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo no T.F.M. o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CT”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 3, 8 a 43, 46 a 67, 69, 70, 77 ). Quanto aos factos pessoais do assistente AR, relativos à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo no T.F.M. o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CU”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 1 a 42 ). No que diz respeito às (...) frequentadas pelos assistentes, fora, relevantes os factos constantes do Apenso DX, fls. 43. E no que diz respeito aos exames (...) legal de natureza sexual feitos aos assistentes, foram relevantes os elementos constantes do Apenso CG, fls. 300 a 305 e fls. 359 a 364 vº. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelos assistentes em audiência de julgamento. 18.16.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a estes dois assistentes, em audiência de julgamento o arguido começou por dizer ao tribunal que sabia quem eram – o AR e o AB -, o Lar de onde eram e as idades (embora a dada altura não se recordasse de quem era o mais novo). Confirmou, quando o tribunal lhe referiu que os actos imputados tinham-se passado numa (...) em (…), no ano 2000 , “... sim senhora, já sei...”, que “teve o coiso” com o AB, da primeira vez “...toquei-lhe só no pénis...” e quando o Tribunal lhe perguntou sobre a segunda vez, no balneário, disse “... tentei manipulá-lo mas ele fugiu...”. Quanto ao AR diz que fez-lhe sexo oral e anal, não se lembrava de mais coisas e foi no mesmo lugar (balneário). Lembrava-se de ter dado dinheiro ao AB, mas não se recordava em relação ao AR. Após ter ouvido as declarações do AR e do AB, quis pedir Desculpa aos assistentes, movimento este do arguido que, aliás, não foi único em relação a estes assistentes, como já temos referido. Em audiência de Julgamento os assistentes foram ouvidos. As declarações do AB foram prestadas de forma visivelmente difícil. Para conseguir falar o Tribunal teve que ter uma maior proximidade com o assistente, mas a que, certamente, também não foi alheio o que resulta nos factos dados como provados no ponto “151.4” dos factos provados, quanto ao défict cognitivo e quadro compatível com Deficiência mental ligeira, que o assistente apresentava na avaliação que lhe foi feita em Abril de 1998. O AB relatou uma “primeira vez” no balneário com o arguido em que este “...bateu-me a punheta...” e uma segunda vez, também no balneário, em que o arguido o chegou mesmo a penetrar. É certo que o arguido, inicialmente, não tinha admitido, expressamente, ter praticado o acto de penetração anal no assistente AB. Mas não só teve o movimento de pedido de Desculpa, em momento já posterior ao assistente ter prestado as suas declarações, bem como a expressão que inicialmente usou “teve o coiso” com o AB, não afastam de todo essa possibilidade. Mas as declarações do AB, pela emotividade, dificuldade de expressão associado a visível sofrimento em contar, não deixaram dúvida ao tribunal de que os factos passaram-se como o AB os relatou e com o acto de penetração anal. Quanto ao AR, o arguido confessou expressamente o acto de penetração anal e o AR também os relatou. Foi um depoimento em que foi patente, a determinada altura, uma certa ingenuidade a falar, mas no fim do seu depoimento uma certa raiva, mas não se nos afigurou que mentisse ou inventasse. No entanto o AR não se recorda de ter estado ao mesmo tempo que o AB na situação que descreveu. Assim e fazendo uma súmula das suas declarações, disse que conheceu o arguido A porque levava os colchões para as (...) e às vezes levava-os aos jogos de futebol, pois o assistente jogava no AXAC. Eram amigos, o arguido levava-o para (...)...levar não foi bem levar...íamos numa carrinha grande....Na (...), no balneário, ele tentou despir-me e aconteceu ... agarrou-me nos braços e pôs-me em cima de um banco... penetrou a pilinha dele no meu rabo...eu estava a gritar ele estava sempre a querer dar dinheiro e eu não aceitava...depois só o via nos jogos de futebol.... Não viu o arguido “fazer aquela coisa ao AB”, consigo diz que “foi muito repentino o que aconteceu” e fala dos sonhos... sonha tudo preto e só voz... embora num segundo momento lembra-se que o lhe aconteceu foi depois de o AB ter saído do balneário, pelo que em algum momento estiveram juntos. Disse que aquilo foi a primeira e única vez que lhe aconteceu – afastando assim a possibilidade de ter havido uma outra vez, nessa (...), em que o arguido tivesse praticado ou tentado praticar os mesmos actos -, sente dor e raiva pelo que aconteceu. Disse também que o arguido não “ameaçava de porrada”, mas era para não contar porque podia acontecer alguma coisa muito má. A testemunha JT (educadora do AR), embora não tenha tido conhecimento directo dos factos, teve um depoimento relevante, pois testemunhou ao tribunal a alteração que sentiu (no lar) no comportamento do AR, no ano 2000/2001, mas na altura atribuíram ao facto de o irmão ser semi-interno, ir à noite para casa e pensou que se devia a essa situação. Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos - depois de ter ouvido o assistente AR -, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “151.9” a “151.25” dos factos provados. 18.16.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu ter praticado actos e o Tribunal deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.16.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “58.” a “58.3.”, as declarações dos assistentes e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.17. (Assistentes AS - factos descritos no ponto “9.13.” do Despacho de Pronúncia ):18.17.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AS, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DE”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 1 a 41, 49, 50, 52). No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 4.872 a 4.877. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento, bem como pelas testemunhas JW e YO, educadoras da AX e que conviveram directamente com o educando. 18.17.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido disse ao Tribunal saber quem eram, o Lar de onde era, disse que o AS convidou-o para ser padrinho de baptismo, mas que isto não acabou por acontecer, porque a mãe do educando faleceu nesta altura. Confessou ter praticado actos de masturbação, coito oral e coito anal no AS. Disse que os actos correram em sua casa, na “velha” e também referiu na “nova”, tendo dito que nesta também esteve presente o AF. Disse que lhe deu dinheiro, embora não tenha especificado o montante, quer “pelo sexo” quer por o AS o ter ajudado a descarregar coisas. Após ter ouvido as declarações do AS quis pedir desculpa ao educando, pelo mal que lhe fez. Em audiência de Julgamento o assistente foi ouvido. Disse que conheceu o arguido quando foi para o lar FO, conheceu-o nos jogos de futebol, o arguido falava com ele, depois dos jogos convidava-o para lanches fora do (...), deu-lhe dinheiro e uma vez carregou-lhe o telemóvel. O arguido quis ser seu padrinho, mas o AS não quis. A testemunha YO, que foi educadora do AS no Lar FO, a partir de 2001, disse que quando foi para o Lar o AS falou-lhe que o arguido dizia que ia ser seu padrinho, o que a testemunha não estranhou, pois o arguido era padrinho de mais educandos. Disse que acontecia o AS receber telefonemas do arguido no Lar, o AS tinha telemóvel e disse-lhe que o arguido lho carregou. A testemunha EED, educanda na AX, disse ao tribunal ter sido colega do AS na AX, o arguido A conhecia-o como padrinho do AS e ia buscá-lo à escola. Não era bem à porta da escola, mas “um pouco mais acima”. Por sua vez a testemunha JW, educadora do AS, também confirmou que os contactos do arguido com o AS, quer o tratamento por Padrinho. Quanto aos factos em si – o Despacho de pronúncia refere-se a factos passados após a morte da Mãe do AS, no barracão e na casa ao pé do hospital DW -, confirmou que após a morte da sua mãe foi com o arguido A à casa de DT e duas vezes a uma casa sita ao pé do Hospital DW e confirmou os actos de coito anal praticados pelo arguido nas situações seguintes à primeira. Sendo que para o tribunal não foi suficientemente seguro que, na primeira situação que o tribunal deu como provada, o AS se conseguisse recordar que tivessem ocorrido mais factos do que os actos de masturbação. O AS não confirmou, contudo, ter ocorrido a terceira situação que o despacho de Pronúncia refere na casa ao pé do Hospital DW e que tenha estado aí com o AF. É certo que para o tribunal foi perceptível a dificuldade com que relatou os factos, a voz apagada que a certa altura era de difícil audição e o tribunal teve mesmo que interromper o seu depoimento. O não relato desta terceira pode ter-se devido a vergonha ou dificuldade em relatar, mas o AF, quando foi ouvido pelo tribunal, também não o confirmou, pelo que o tribunal deu tais factos como não provados. E dando como provado, face às declarações do assistente, a ocorrência, ao todo, de três situações: duas na casa nova e uma em DT. Quanto à localização dos factos no tempo, de fls. 4., do “Apenso DE”, conjugado com as declarações do assistente, resulta que a sua mãe morreu no seu quinto ano. Frequentou o quinto ano nos anos escolares 99/2000 (fls. 7, do Apenso DE) e 2000/2001 (fls. 4 do Apenso DE). A testemunha YO disse ao tribunal que foi no ano de 2001 para o Lar do AS, ano em que a sua mãe faleceu, pelo que o Tribunal deu como provado que a morte da mãe do AS ocorreu em 2001 (cfr. tb documentos de fls. 42/43 do Apenso DE, onde está referido que o AS é pensionista pelo menos desde 9/01). O AS referiu o barracão de DT e uma casa ao pé do Hospital DW, o que corresponde o primeiro local à casa que o arguido ocupava nas instalações de DT e o segundo à casa que foi atribuída ao arguido (e recorrendo aos elementos dos autos, resulta dos documentos de fls. 7.017, 7.018, 7.019 e 7.020, que o contrato com a JJM para fornecimento de água no fogo sito na (...) (…), Lote (…) Bloco (…),(…)º (…), em (…) e em nome de A, está datado de 26/12/2001; do documento de fls. 7.021, emitido pela Câmara Municipal (…), Direcção Municipal de Habitação, resulta que por despacho de 6/12/01 foi atribuído a A o fogo acabado de identificar; e do documento de fls. 35.764, emitido pela KKB, consta que o arguido recebeu as chaves do apartamento em 14 de Dezembro de 2001). Esta localização dos factos no tempo e a data da atribuição da casa ao arguido pela KKB, é compatível com a dinâmica descrita no despacho de pronúncia: após a morte da mãe do AS, em 2001, uma vez no barracão de DT e duas vezes na casa “nova”, dado que a atribuição da casa ocorreu por Despacho de 6/12/01, recebeu as chaves em 14/12/01 e o contrato da água é de 26/12/01). Para os factos dados como provados foi ainda relevante o documento de fls. 4.977 a 4.979. Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos - depois de ter ouvido o assistente AS -, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “159.” a “159.18.” dos factos provados. 18.17.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu ter praticados actos e o Tribunal deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.17.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “66.” a “66.7”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.18. (Assistentes AU - factos descritos no ponto “2.8.” do Despacho de Pronúncia ):18.18.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AU, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DG”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado (cfr., por exemplo, fls. 2 a 29, 31 a 45, 52 a 66). No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 6.952 a 6.959. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente AU em audiência de julgamento. 18.18.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido disse ao Tribunal saber quem era DT (...), o seu (...). Num primeiro momento confessou ter praticado actos na (...) do (…), disse que não se lembrava em que sítio foi da praia, recordava-se de actos de masturbação e coito oral no DT, mas não se lembrava se praticou coito anal ou não. Quanto aos demais actos referidos no despacho de pronúncia, não se lembrava se o DT foi a sua casa ou não, “…talvez sim, talvez sim, mas não me lembro…”. Estes actos foram confirmados pelo AU o qual, quer em relação à situação que o despacho de pronúncia descreve na Praia (…), quer em relação aos primeiros factos em casa do arguido, teve um discurso globalmente coerente, relatou os factos tal como o Tribunal deu como provados, demonstrou alguma expressividade e fazer reparos ou ter expressões, que deram a noção ao Tribunal de estar, efectivamente, a contar alguma coisa passada consigo. Por exemplo, quando lhe é perguntado quanto aos factos passados em “casa” do arguido A, “corrigiu” dizendo que “era mais um barracão” e estava-se, na altura, a referir aos espaço em que o arguido viveu nas instalações do (...) DT, que foi descrito por ouros assistentes também como um barracão. O AU confirmou, também, a proximidade que estabeleceu com o arguido A e este consigo, confirmo que o arguido deu-lhe dinheiro e guloseimas. Não referiu, contudo, que tivesse ocorrido a ultima situação descrita no despacho de pronúncia. O arguido também não a confirmou inicialmente ou em qualquer outro momento, razão pela qual o Tribunal deu tais factos como não provados. Num segundo momento, após a terceira sessão em que o AU prestou esclarecimentos, o arguido A veio dizer ao Tribunal que afinal nunca tinha tido relações com qualquer aluno na (...) (…) e nunca tinha levado o AU a uma gruta. Num entanto, avaliando globalmente a forma espontânea e precisa como o arguido A inicialmente fez a admissão - e dizemos precisa porque soube distinguir, com segurança, aquilo de que se lembrava e aquilo de que não se lembrava, disse que os factos não foram dentro da gruta mas na praia, não se recordando no entanto o local, dizendo que se lembrava dos actos de coito oral, mas não se lembrava se coito anal tinha praticado ou não -, o Tribunal não conclui que tal admissão de factos tenha-se devido a qualquer gesto de “ admissão global de factos”, sem ter a suficiente noção do que estava a dizer. E cruzando o que foram as declarações iniciais do arguido, com o que foram nesta parte as declarações do assistente, o Tribunal não teve dúvidas de que estes factos ocorreram e que ocorreram da forma que o Tribunal deu como provada. Daí ter dado relevância às primeiras declarações do arguido, em prejuízo das segundas. Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido inicialmente fez a admissão dos factos e as declarações do assistente, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “98.” a “98.15.” dos factos provados. 18.18.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o Tribunal deu relevância à admissão que inicialmente o arguido fez de ter praticado os actos e deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto de reconhecimento da prática dos factos e em algumas situações o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.18.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “16.” a “16.2”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.19. (Assistentes AQ - factos descritos no ponto “2.9.” do Despacho de Pronúncia ):18.19.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AQ, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso DO”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado. No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 5.640 a 5.655. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. 18.19.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido disse ao Tribunal saber quem era AQ. Num primeiro momento confessou ter praticado os actos “ junto à salsa latina”, mas não tendo confessado os demais. Falou ao Tribunal sobre o seu conhecimento com o assistente e demonstrou ao Tribunal uma memória exacta sobre quem estava a falar. Estes actos foram confirmados pelo AQ, embora também tenha relatado os demais que constam no Despacho de Pronúncia. Num segundo momento o arguido A veio dizer ao Tribunal que afinal nada tinha havido com este AQ, enganou-se na pessoa e estava a pensar que era “outro (…)”. O Tribunal não percebeu a razão pela qual o arguido deu o dito por não dito quanto a este Assistente. No entanto, face à forma como o arguido inicialmente foi assertivo e receptico quanto aos factos e à identificação do assistente e conjugando com as declarações deste, o Tribunal deu como provados os factos constantes dos pontos “99.11” a “99.21”. Quanto aos demais factos, face a este movimento de recuou do arguido, não tendo admitido outros factos que não esses e valorando o depoimento do assistente – por vezes com alguma emotividade não totalmente genuína, para o Tribunal, face à descrição fácil que aparentava – o Tribunal não considerou que foi feita prova suficiente sobre os mesmos. Daí ter dado como não provados os factos constantes dos pontos “15.1.” a “15.6”. O AQ confirmou, também, a proximidade que estabeleceu com o arguido A e este consigo, confirmo que o arguido deu-lhe dinheiro e presentes. 18.19.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o Tribunal deu relevância à admissão que inicialmente o arguido fez de ter praticado os actos e deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto de reconhecimento da prática dos factos e em algumas situações o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.19.4. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “15.” a “15.6”, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18.20. (Assistentes AN - factos descritos no ponto “2.7.”, “4.4.3.”, “6.2.”/”6.2.1”, “6.4.1” do Despacho de Pronúncia ):18.20.1. Começando pelos factos pessoais do assistente AN, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso CJ”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado. No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 4.645 a 4.651. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. 18.20.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente no ponto “2.7” do Despacho de Pronuncia, em audiência de julgamento o arguido disse ao Tribunal saber quem era o AN e o seu (...). Admitiu os factos praticados por si com o assistente, os quais foram também confirmados pelo assistente, pelo que foi uma das situações em que o Tribunal considerou relevante a admissão dos factos pelo arguido. Face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos e as declarações do assistente, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “97.” a “97.20.” dos factos provados. 18.20.2. Quanto aos factos constantes do ponto “4.4.3” do despacho de Pronúncia, imputados entre os meses de Setembro e Outubro de 1999 e até Novembro de 2000, factos estes imputados ou no (...) do arguido K, sito na (...) (…) nº (…) ou em duas casa no (…), uma na (...) (…) nº (…) e outra na residência do arguido, sita na residência do arguido, sita na (...) (…), esta é uma das situações em que o Tribunal avança, desde já, que face à prova que foi produzida em audiência de julgamento, a Acusação não sustentou suficientemente estes factos. O arguido A não confirmou ter levado ou ter mandado este assistente a algum destes locais, pois apenas confirmou tê-lo levado a (…). Os factos são negados pelo arguido e apresentou prova em audiência de julgamento - nomeadamente quanto à altura em que passou a funcionar a sua (...) no nº (…) da (...) (…), a partir de Setembro de 2001; cfr. cfr. especificamente fls. 43.704/5) e Setembro de 2001 e a (...), as fachadas, ficaram com um aspecto diferente (cfr., por exemplo, Fls. 43.521 a 43.791 – Documentos remetidos pela FFX relativamente ao Processo de Obras na (...) (…) nº (…),(…), em (…); Fls. 43.960 a 43.997 – Documentos remetidos pela DI, envio de projecto de arquitectura do Edifício da (...) (…), nº (…),(…), em (…); Fls. 52.633/8: Documento emitido por GGT, em nome de (...) Dr. K, e apostas as datas de 6/03/01, 13/03/01, 26/03/01; Fls. 52.639/0: Documento emitido por GGU, em nome da GGV, datado de 23/04/01, referente a instalação eléctrica na (...) (…) nº (…),(…) em (…); Fls. 52.641: Documento da EDP, referente a contrato de fornecimento para K, (...) (…) nº (…),(…), com data 01/05/07; Fls. 52.642 a 52.706, 52.711 a 52.716: Documentos de fornecimentos de serviços, materiais, bens para (...) K, entre Abril de 2001 e Novembro de 2001; Fls. 52.707 a 52.710: Documento GGW, datado de 14/02/02 e 15/02/02, referente às moradas R. (…), Lote (…), Edif. (…), em nome de K e (...) (…) nº (…), em (…); e depoimentos das testemunhas YG, SV, LH ; e convocando o Tribunal o já dito em sede de análise crítica da prova em relação a AP e AT, aquando da referência à situação em que AP lhe mostrou onde era o (...) do arguido K -, que afasta a possibilidade de os factos no “(...)” terem ocorrido em 1999 ou 2000, no local que o despacho de pronuncia indica. Quanto aos factos passados na residência do arguido, também aqui o arguido apresentou prova - nomeadamente com a junção da documentação referente à instalação de um aquário em sua casa e à data em que o mesmo foi instalado, bem como a prova testemunhal que quanto a tais factos foi produzida por CY e por BBN, gerente comercial, o qual declarou conhecer o arguido K por ter feito a montagem de um aquário em sua casa (através da empresa GGE), tendo declarado que os contactos para a montagem do aquário ocorreram “ antes do Verão de 2002”; prestou também depoimento sobre a montagem aquário na (...), foi confrontado com os documentos de fls. 2.314 a 2.317 e com os documentos nºs 1 a 24 juntos na audiência de julgamento; cfr, também fls. 2.315 -, que criam dúvida quanto à possibilidade de estes factos terem ocorridos na data que o despacho de pronúncia refere. Os factos são negados também pelo arguido quanto às ocorrências que o Despacho de pronuncia situa numa moradia do (…). Sucede também que não há qualquer outro assistente que tenha ido com o AN a algum destes locais. Passando ao assistente AN, o seu depoimento foi um depoimento calmo, esteve sempre com um semblante fechado e aparentemente triste perante o Tribunal. Inicialmente o Tribunal interpretou-o como alguma falta de expressividade. Mas à medida que foi decorrendo o interrogatório e contra interrogatório do assistente, a forma como por vezes pedia desculpa por não se lembrar de pormenores que lhe eram pedidos, respondendo sempre a tentar esclarecer, apesar de em algumas situações ter sido perceptível o seu cansaço, o Tribunal ficou convicto que era uma maneira de ser aquela aparência fechada. Sucede, contudo, que quanto à localização dos factos no tempo, das declarações AN o Tribunal não consegue extrair que possam ter ocorrido noutra altura que não situadas entre os anos de 1999/2000. Por outro lado e face à forma como o Tribunal avaliou as declarações deste assistente, também não configuramos a possibilidade - no que diz respeito aos factos imputados no (...) -, de os mesmos terem ocorrido no nº (…) e não onde o despacho de pronúncia imputa. Estava a mentir? Se estivesse a mentir parece-nos que seria mais provável que quando foi confrontado, por exemplo, com a fotografia de fls. 2.315 - e se estivesse a mentir, ao ser confrontado com essa fotografia percebia que estava a ser apanhado em falso ! -, se agarrasse ao aquário que a fotografia mostrava e dissesse que efectivamente havia esse aquário. Era mais fácil dizer que o aquário era aquele e terminar com o interrogatório contra interrogatório que se sucedeu e prolongou. Por outro lado e se fosse uma história colada a outras, seria mais natural dizer que conhecia o arguido K de CZ - este seria um depoimentos mais perto dos que foram ouvidos em audiência de julgamento e mais colado às notícias da comunicação social do início de 2003 -, mas não, diz que a primeira vez que o viu foi no (...). Não tivemos a percepção de que o assistente ensaiasse as respostas. E não responde com ligeireza, porque quando lhe eram pedidos e insistidos os esclarecimentos quanto ao interior dos imóveis, via-se que pensava para responder, mas que lembrava-se apenas do que respondia. No entanto, para o Tribunal não foi possível face à prova que foi produzida perante si, criar a convicção suficientemente segura, para dar estes factos como provados. Por vezes há depoimentos que por razões que o Tribunal não consegue apreender e que podem não ter a ver com a mentira, não convencem suficientemente o Tribunal, pois o exercício que fizesse sobre os mesmos poderia cair num juízo de plausibilidade e não num juízo de certeza. Face ao que antecede, os factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos “27.” A “27.29” dos factos não provados. 18.20.3. Passamos, então, ao factos descritos no ponto “6.2.1” e “6.4.1.” do despacho de pronúncia. E o Tribunal optou por tratar aqui estes factos - e não na sequência de outros que tratou anteriormente quanto ao local (…) -, face ao que acabou de dizer no ponto que antecede. (1) A valoração de um depoimento, em que em relação a uns factos o Tribunal os dá como provados e em relação a outros, apesar de serem afirmados pelo assistente, o Tribunal não os dá como provados, tem a ver com o critério e o distanciamento que o Tribunal tentou manter ao longo da análise da prova. Pode ser mais fácil um registo de continuidade em relação às situações de credibilidade, veracidade e suficiência da prova. Isto porque, naturalmente, umas situações podem concorrer para a convicção do Tribunal em relação a outras, se o registo for mais coeso e uniforme. Porque cria menos dúvida ou dá mais consistência intrínseca à sucessão dos relatos. Mas só se o Tribunal ficar suficientemente convencido, pode avançar para a prova. Em relação aos factos em (…), AN descreveu que foi a este local e localiza os factos poucos meses depois de ter estado com o arguido A, foi no ano em que não foi a casa e face aos elementos constantes de fls. 96 do Apenso CJ, a partir de 8/10/99 ficou na AX sem ir a casa. O arguido A confirmou ter levado o assistente, convocando o Tribunal a análise que sucessivamente temos vindo a fazer quanto ao sentido e avaliação das declarações do arguido. O interrogatório e contra interrogatório deste assistente foi minucioso. Convocamos o que dissemos quanto à forma como se apresentou perante o Tribunal, sendo que quanto aos factos na casa de (…), o assistente fez uma descrição da casa que para o Tribunal foi congruente com o espaço que conhecemos. É certo que quando AN tentou localizar no tempo, dar outra referência para além das que já tinha dado, quanto à altura em que vai a (…), refere-se à (...) de (…), e gera confusão quanto ao ano da ocorrência dos factos. Isso foi patente na audiência de julgamento, mas analisando os registos das (...) do Apenso W9 Livro 1 e 2, quer do Apenso DX, face às declarações do assistente, o Tribunal ficou seguro que pelo menos na altura do Natal de 1999/2000, as declarações do assistente comportam o sentido de ter ido a (…) entre Dezembro de 1999 e Janeiro de 2000. Quanto às demais situações o Tribunal não as deu como provadas. E não deu porque o arguido E apresentou ao Tribunal prova suficiente, para criar a dúvida ao Tribunal se os factos que estão imputados ao arguido se passaram efectivamente na Páscoa do ano 2000 e com o arguido N até Outubro de 2000, pois é o próprio assistente a dizer que após a ida à feira de (…) não foi mais a (…). AN descreveu os factos que se passaram consigo em (…) com o arguido N, únicos que o Tribunal está a considerar. Sendo repetitivo, o relato de abuso que o assistente descreveu ao Tribunal o que se passou com o arguido N, falou perante o Tribunal com sofrimento, assumiu a , para o Tribunal, humilhação de reconhecer que praticava actos porque recebia dinheiro. E mostrou-se zangado consigo por isso mesmo. Para o Tribunal criou a convicção de que os actos com o arguido N passaram-se. Mas limitados ao período em que o Tribunal teve a certeza, para além de dúvida razoável, que há uma correspondência entre a situação concreta que o assistente relata e o que são os factos objecto deste processo. Uma última referência. Este assistente foi um dos que referiu que compravam ou apanhavam bilhetes de cinema, para justificarem as saídas à tarde. Em audiência foi sucessivamente questionada a razoabilidade de apanharem bilhetes que não fosse de uma sessão específica ou de uma fora específica, pois não fazia sentido que assim os educadores os recebessem. No entanto é o próprio registo de um dos livros de ocorrências que confirma e corrobora a possibilidade de esse bilhetes servirem para entregar aos educadores. Estamos a falar do registo que se encontra a fls. 481 vº, 23/11/97, “Domingo: (…)…CONSEGUI ARRANJAR UNS BILHETES DE CINEMA e uma factura de lanches no sr, (…). É a ultima vez que faço isto para a próxima não quero saber, pois a responsabilidade deste dinheiro é grande alguém de nós anda CONSECUTIVAMENTE A FALHAR…Só hoje arranjei 10.250$00 em facturas…”, constante do Apenso W11- Livro 1, do lar FC. (2) O Tribunal deu ainda como provado que o arguido N admitiu que o AN tinha menos de 14 anos. Foi visível para o Tribunal, quando ouviu o assistente perante si, que este tinha uma estatura média, era magro e já tinham decorridos cerca de cinco anos sobre os factos. Não é um jovem com barba “cerrada”, embora tenha uma expressão fechada, mas mesmo assim aparentando menos idade do que aquela que tinha quando esteve perante o tribunal. Daí que, necessariamente, em 1999/2000 o arguido teve de equacionar a possibilidade de AN ter menos de 14 anos. Quanto aos demais factos relacionados com o conhecimento do arguido da consequência da prática dos actos no assistente, a idade do arguido, o seu percurso profissional e a capacidade que demonstrou em audiência de julgamento de compreensão e capacidade de valoração das situações, foram suficientes para o Tribunal. (3) Quanto aos factos relacionados com o recebimento de dinheiro por parte do assistente e do arguido A, os dois confirmaram-no. E embora o arguido A tenha dito que o dinheiro não era para si, tendo o Tribunal concluído que foi o arguido que levou o assistente e que lhe deu dinheiro - e lembramos as declarações do arguido A quando disse, respondendo a perguntas do Tribunal, neste sentido as suas declarações “… não fico a ganhar, portanto como eram alunos, como eram meus amigos … eu assim dou boleia a eles, nunca os obriguei, portanto eles é que iam portanto …”, “(…) mas muitas vezes … pois, mas algumas vezes … não ganho nada Sr.ª Doutora…”). Já quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos - e remetemos - a fundamentação que atrás já fizemos e para o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). Por todo o ex(...), a motivação e razão pela qual o Tribunal deu como provados os factos constantes dos pontos “119.” a “119.11” dos factos provados. E por não ter sido produzida prova suficiente, os demais factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos 37. a 37.20 e “40.” A “40.11”. *** 18. (Assistente AT - factos descritos nos pontos “2.5.”, 6.5.1. do Despacho de pronúncia):(1) Começando pelos factos pessoais do assistente AT, quanto à sua data de nascimento, entrada na AX e lar onde foi colocado, processo de admissão na AX, processo do T.F.M., o Tribunal fundou a sua convicção nos elementos constantes do “Apenso Y”, e “Apenso Z-15, volume”, no qual constam os documentos relativos à entrada do assistente na instituição, elementos relativos à situação parental do jovem, internamento e lar onde esteve internado. No que diz respeito ao exame (...) legal de natureza sexual feito ao assistente, foi relevante o elemento constante de fls. 4.543 a 4.550. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Foram factos que, embora de forma parcial, foram confirmados pelo assistente em audiência de julgamento. 18.2. Quanto aos factos pelos quais o arguido vem pronunciado em relação a este assistente, em audiência de julgamento o arguido disse saber quem era o assistente, a idade e o lar de onde era. Num segundo momento também lhe pediu desculpa pelos sítios onde o levou. Em audiência de julgamento o assistente disse que conheceu o arguido A na AX e através de AP. Antes de ter entrado como interno para a AX já tinha ouvido falar de A, “a gente conhecia-o pelo motorista, pela pessoa que nos levava aos jogos da AX, aos jogos do Belenenses”. A primeira vez que falou com o arguido ele foi no Lar FC, um “normal boa noite”. Três quatro semanas após ter entrado para a AX, passou a falar com ele com mais regularidade. Via-o com mais regularidade no (...) e muitas vezes ele ia ao lar, às vezes, depois da hora do jantar. A às vezes dava algumas moedas a ele e ao AP para comprarem tabaco. Antes dos factos que se passaram com o arguido A (o primeiro abuso do arguido que descreveu), uma vez “... tava eu de castigo a lavar a loiça…” o arguido costumava ir buscar lá o saco do pão e dessa vez deu-lhe uma nota de 500$00. Nessa altura falou apenas com o assistente “ disse-me boa noite e o assistente pediu ao AP para ir comprar tabaco. Disse que muitas vezes ia ao bar com o AP e este dizia que “o A” tinha lá deixado qualquer coisa para a comprarem coisas no bar. Aos fins de semana o arguido aparecia no (...), chegou a ajudá-lo a carregar coisas. Quanto ao arguido “…por um lado fiquei contente com a prisão (de A) por outro com pena… porque todos nós, apesar do que tivesse acontecido, a gente estava habituado a ver o A, como a gente lhe chamava, no (...). E ele levava-nos à bola, levava-nos a vários sítios…”. “...A gente considerava-o como amigo, tanto no FC como no FG a gente considerava-o um amigo, mesmo apesar dos actos que tinha acontecido e não sei quê, a gente considerava-o um amigo…”. Quanto aos actos que sofreu, “... uma duas semanas antes do Natal, de 99 para 2000...”, doi com AP à garagem, após o jantar, já noite, pois o arguido tinha pedido um favor a AP para comprar tabaco. AP foi fazer o recado e o AT ficou. A deu-lhe beijos, carícias, mexeu em partes do corpo da testemunha e vice versa, A “... começou-me a mexer no pénis e sexo oral...”, tendo explicado que o arguido obrigou-o “a fazer um broche…é pénis de A na minha boca…”. Depois chegou AP. Houve uma segunda situação “…Depois do Natal, do Ano Novo, já em Janeiro 2000..”. Foi com AP à garagem , AP saiu, e aconteceu a mesma coisa anterior, o assistente fez sexo oral ao arguido. A deu-lhe entre 3 e cinco contos. Disse que “…Só foram estas duas vezes com A...”. Via o arguido “... como uma pessoa que a gente víamos, víamos como um amigo, nunca sentimos receio dele, porque víamos sempre no (...) e mesmo apesar dos factos, a gente continuava a vê-lo como amigo até... (...) O único receio, que acho que não só eu tinha como todos os...(...) O único receio que tinha era, de se falar que acontecesse alguma coisa, alguma coisa assim....” E disse que o arguido, por sua vez, disse-lhe para não contar o que se tinha passado. Teve um discurso coerente, o arguido pediu desculpa ao assistente pelo que, face a tudo o que antecede e tendo em atenção as circunstâncias em que o arguido fez a admissão dos factos, a confirmação do assistente na medida em que o fez, a razão pela qual o Tribunal deu como assente a matéria constante dos pontos “95.” a “94.15.” dos factos provados. 18.3. Quanto ao que o Tribunal deu como provado em relação à consciência e conhecimento do arguido da consequência dos seus actos nos assistentes, ao conhecimento das condições pessoais dos assistentes, incluindo a idade, para além das declarações que concretamente produziu quanto a este assistente, convocamos a fundamentação que atrás já fizemos e o que dissemos quanto a esta matéria (ver, em particular, a análise que o Tribunal fez quanto a este aspecto, no momento em que fez a análise crítica da prova em relação ao assistente AI, pontos “13.3.” e “13.3.2”, ou no ponto “13.2.4” quanto ao assistente X). No caso concreto o arguido admitiu ter praticados actos e o Tribunal deu-os como provados. Valem assim e por isso as convocamos, as considerações que anteriormente fizemos, quando ao que então dissemos, da forma como o Tribunal interpretou as declarações do arguido A, quando teve um acto e o “movimento” de pedir desculpa a alguns assistentes pelo que lhes tinha feito, tendo utilizado mesmo a expressão pelo “mal que lhes tinha causado”. Significou, para o Tribunal, reconhecimento e consciência do arguido A do “mal” que os seus actos provocaram nos educandos, significou que o arguido teve também consciência e sabia, que os seus actos afectavam o bom crescimento e desenvolvimento dos educandos. 18.3. Quanto aos factos descritos no ponto “6.5.1.” dos despacho de Pronúncia, convocamos tudo o que o Tribunal já disse na presente análise crítica da prova, quer no ponto “4.3.1.”, quer no ponto “4.4.1”, quanto à avaliação e valoração que o Tribunal fez das declarações do assistente AT perante o Tribunal. E em relação a estes factos, o registo para o Tribunal não foi diferente, quanto ao sentido e expressão dada e percebida pelo Tribunal, quanto à descrição dos abusos que fez ao Tribunal. E não foi diferente quer no sentido da expressão emocional, quer no sentido da confusão quanto ao tempo, ou com quem foi. AT descreveu estes factos como tendo acontecido passado as férias de Verão…começa por dizer cerca de três semanas depois de começarem as aulas, voltámos a (…), para rectificar “para aí um mês depois de começarem as aulas”. No entanto, quando o Ministério Pública tenta relacionar com algum facto, concretamente com os seus anos, responde que foi antes dos anos. O que, sendo no fim de Setembro, gera contradição com o que disse anteriormente. Começa por dizer que foi AP que falou com ele “…falámos à parte num quarto…éramos do mesmo quarto…ele disse que a gente ia a (…) outra vez…falou um dia antes…ele disse-me para eu estar pronto ás dez e meia que a gente ia embora também…”, mas AT estava objectivamente equivocado, pois AP não estava no (...) desde Abril desse ano. Em momento posterior, quando é confrontado com essa contradição, naturalmente diz que AP pode não ter ido. Mas AT teve uma particularidade: Na audiência de julgamento de 1/02/06 a defesa do arguido H pediu ao Tribunal que confrontasse o assistente com o auto de Reconhecimento da Casa (…), fls. 1.117, onde está referido que foi indicado o “nº (…)” e não o nº (…)”. Refere o auto que “percorridas várias artérias da zona, a testemunha indicou a (...) referente ao número (…) da (...) (…) (,,,)” como sendo a (...) de N. Perguntava-lhe a Defesa do arguido se quando indicou este número (…), teve alguma dúvida a identificar o número da porta que foi registado no auto. AT responde “… não, indiquei só a casa….apontando”. E reproduzimos aqui o diálogo havido: “Dr. JJS – E se eu lhe disser que num conjunto de casas que são duas juntas, seja esta ou que seja outra qualquer, as duas casas juntas, que o número (…) deste Auto, que o senhor assinou , corresponde à casa do lado direito e não à casa do lado esquerdo. O senhor em função desta, disto que eu lhe estou a dizer, admite ou não que a casa onde entrou seja a do lado direito e não a do lado esquerdo? Juíza Presidente – Sr. Dr. JJS, o assistente disse que não indicou qualquer número de porta… Dr. JJS – Não Srª Drª, não indicou, indicou um número. Juíza Presidente – E aqui em tribunal diz, para ele é uma casa, indicou uma casa. Aqui em Tribunal, olhando para determinada fotografia diz que é uma do lado esquerdo…agora se é o (…), se é (…), o (…) ou seja o que for… Sr. Dr..Dr. JJS – Mas este Auto faz fé, não?...”. A Defesa pediu-lhe para dizer se mantinha o que tinha dito, - se foi a casa do lado esquerdo que indicou e não a do lado direito - , o Tribunal perguntou ao assistente se tinha alguma dúvida se a casa que tinha apontado era a casa onde tinha estado e o assistente, não obstante estar a assistir ao diálogo, à possibilidade de estar equivocado quanto à casa ou a estar a ser posta em dívida a sua identificação, manteve a sua afirmação que não tinha dúvida. O Tribunal perguntou-lhe se a fotografia que lhe tinha sido exibida, a de fls. 939 (novecentos e trinta e nove) se era a casa para onde tinha entrado, se tinha alguma dúvida e o assistente continuou a responder que não. No dia seguinte o Ilustre Mandatário da defesa comunicou ao Tribunal ter ocorrido um lapso quando à sua localização do nº (…) - mas tendo nós sempre em atenção que a casa da arguida é o nº (…) e não o nº (…)-, disse o Ilustre Mandatário da Defesa que poderia ter induzido em erro o assistente, o que de facto podia ter acontecido. Mas AT, apesar da turbulência que foi aquele momento da identificação, não hesitou e manteve, para o Tribunal, que tinha apontado uma casa e que a casa que apontou foi aquela onde esteve. Sendo que foi confrontado, como vimos, com a fotografia de fls. 939, tendo-lhe ainda sido exibidas as fotografias de fls. 12452 (doze mil quatrocentos e cinquenta e dois) a 12457 (doze mil quatrocentos e cinquenta e sete). Foram-lhe exibidas sempre tapando as legendas e, para o Tribunal, em audiência de julgamento o assistente identificou a casa da arguida como a casa onde esteve e fez essa identificação de forma segura, tendo em atenção a turbulência do contraditório a que foi sujeito. AT confirmou a permanência naquela casa do arguido N, confirmou ter recebido dinheiro por ter ido aquela casa, não teve a percepção da arguida Q . “A gente dirigiu-se à casa acompanhado de A , mal entrámos na casa dirigimo-nos a um quarto…”, (veio uma senhora à porta, mas eu já lhe disse que não consigo associar se era a senhora Q se não… a gente entrámos, o arguido N mandou-nos dirigir a um quarto e indicou-nos…o caminho… A também entrou e ficou no hall da parte de dentro, mas se ficou a conversar não me recordo) Dirigimo-nos a um quarto, ficámos nesse quarto Disse que desta vez esteve com o arguido H, descreveu actos de sexo oral e sexo anal. Fez a descrição da casa, estando na porta de entrada , “… a gente entrava, tínhamos a sala do lado direito, tínhamos umas escadas do lado esquerdo…na parte de baixo não me recordo de mais nenhuma divisão…poderia existir mas não me recordo de mais nenhuma divisão….”. “(…) …lembro-me que o Sr. N indicou-nos para a gente subir umas escadas e entrarmos numa porta do lado direito…dava acesso a um quarto…” (onde diz ter estado após ter subido uma escada, para além dessa porta do lado direito) “…Havia mais duas portas mas não... não sei se eram quartos, se o que é que eram…”. Não recorda ter estado noutro quarto que não nesse. Disse que os adultos raramente falavam com os jovens” …adulto chamaram um jovem… não pelo nome e dirigiram-se com ele a outra parte da cas…eu refiro-me a outra divisão da casa porque depois de sairem fechavam a porta…”. Confirmou o recebimento de dinheiro do arguido A . Foi sujeito a contra interrogatório que, na valoração do Tribunal, se estivesse a criar uma história com alguém, não tinha resistido. Isto apesar das contradições apontadas, entre as quais o ter começado por dizer que AP tinha ido consigo e de ora dizer que foi três semanas um mês após o início das aulas, ora ter dito que foi antes dos seus anos. Da avaliação global das declarações deste assistente, os factos colocam-se no último trimestre de 2000, porque as três semanas a um mês depois das aulas começarem - a data que disse quando falava livremente, quando dizia qual a impressão que tinha -, aponta para esse período. O arguido A confirmou ter levado o assistente, embora quanto a datas o arguido, como foi visível em audiência de julgamento, não consegue ter noção do o tempo, entrando em inconsistência. 18.4. No caso de AT e convocando o que dissemos nos outros pontos, o depoimento que prestou, o que expressou ao longo das declarações, por vezes via-se com uma incapacidade para conseguir explicar mais, apresentou, quanto à narração do abuso, sinais de emoção e, consequentemente, veracidade. Por isso e face à prova produzida em audiência de julgamento, os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “120” a “127” dos factos provados. Quanto aos factos que factos que o Tribunal deu como não provados nos respectivos pontos “13.” a “13.3”, “41.” A “41.1” , as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. *** 18. (Assistente Y - factos descritos nos pontos “6.3.2.”, “7.4” “4.1.3” do Despacho de pronúncia):18.1. Quanto aos factos descritos nos pontos “6.3.2.”, “7.4” do Despacho de pronúncia, o Tribunal deu-os como não provados. E a razão tem a ver, em primeira linha, com a identidade de situações que já indicámos anteriormente. A disparidade quanto ao tempo em que, das declarações do assistente, resulta que os factos podem ter ocorrido, a dificuldade ou o não ter querido relatar ao Tribunal mais sobre a identificação de quem esteve consigo, quando e como, as consequentes alterações que, no caso concreto, quer a questão do tempo . quer também a identificação do abusador - , podem importar quanto à descrição daquele episódio, isto é, quanto aquilo que foi contado ser o que está no objecto deste processo, naturalmente ressente-se na convicção do Tribunal. No caso concreto, o Tribunal considerou que a Acusação não sustentou suficientemente os factos objecto do processo e, por isso, as declarações do assistente e os demais meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência, aplicando-se, em consequência, o princípio do in dubio pro reo. 18.2. Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados no ponto 4.1.3. do despacho de pronúncia, a convicção do Tribunal assentou nas declarações de Y - que para o Tribunal tiveram uma linearidade de discurso, coerência intrínseca quando sujeito ao apertado contraditório. Y não mostrou ao Tribunal conhecer o arguido C de forma próxima, ou sabendo mesmo, nessa altura, que era (...) (...) da AX, prestou as suas declarações de forma que aparentou se sincera e expressiva. Não demonstrou ser uma pessoa elaborada, antes demonstrou alguma simplicidade na forma de expressão e compreensão. Mas as declarações do arguido A corroboraram, no caso concreto, os factos narrados pelo assistente. Passamos, então e convocando o que já dissemos, a fazer uma referência específica às declarações que o arguido A prestou nas audiências de julgamento, mas dando neste momento especial relevância às prestadas nas audiência de julgamento de 26/11/08 e de 9/12/08. Mas começamos por fazer a seguinte referência. Na audiência de julgamento de 9/07/2010 foi ouvido pelo Tribunal o Sr. Dr. JJD, psiquiatra, o qual disse ao Tribunal recordar-se de acompanhar o arguido, no âmbito de uma relação terapêutica (na audiência de julgamento foi prestado o consentimento pelo arguido A, para o seu psiquiatra falar sobre a relação terapêutica; CV do Sr. Dr. JJD a fls. 27.543 a 27.547), desde Novembro de 2004. E falou do acompanhamento que fez ao arguido durante o julgamento, da medicação a que o mesmo esteve sujeito para - pelo menos o Tribunal assim o compreendeu - controlar as crises de ansiedade que tinha durante as audiências, para evitar mesmo episódios de desmaio e poder continuar a prestar declarações. E houve, de facto, audiências em que o arguido pediu para prestar breves declarações e em que era perceptível uma voz pouco clara, enrolada, em que o arguido acabava por repetir o que já tinha declarado anteriormente, parecendo, ao Tribunal - e porque foi apontamento que registámos - que o arguido estava sob efeito de medicação. É claro que esta observação é como leigos, mas por vezes, no contacto directo, é perceptível quando alguém tem um comportamento, atitude, expressão facial, voz, que (de novo como leigos) atribuímos a efeito de uma medicação que esteja a fazer. E referimos isto porque na audiência de julgamento de 26/11/08 o arguido A estava com uma voz clara, não estava arrastada ou “embrulhada”. E neste dia, em súmula, declarou que queria dizer ao Tribunal que acreditava nos rapazes que levou a (…) “ … e que dizem que viram o Dr. C em (…). Quero dizer ao Tribunal que sou muito amigo do Dr. C, da esposa do Dr. C, a quem eu chamava pai ao pai da mulher do Dr. C. E por isso mesmo tenho vindo a arrecadar, como o Sr. Procurador diz que eu não tinha nada a ver com o Dr. C, eu quero explicar que trouxe, transportei o Y para o GN de (…). Ele disse ia ter com o Sr. C e o Sr. C é o Dr. C. Aqui para o (…) é a mesma coisa, quando ele ia para o jogo da bola, também disse que ia ter com o Dr. C. Quero dizer que o AP me transmitiu muito antes deste processo, que tinha tido problemas com o Dr. C da AX nas caves da (...)…” (quanto ao relacionamento do arguido com o pai da testemunha NY, mulher do arguido C, adiantamos desde já que esta em audiência de julgamento disse ao Tribunal que o seu pai trabalhou na AX como servente, cozinheiro, ajudante de motorista, motorista, o arguido A dava-se bem com o seu pai, o arguido esteve uma vez em (…) em casa do pai, mas nunca presenciou o arguido a chamar o seu pai por “Pai” e não acredita que isso tivesse sucedido; já quanto ao arguido C disse que não se dava com o seu pai, em convívio social fora da AX). Nos esclarecimentos que prestou, na sequência de perguntas feitas pelo Tribunal, disse que não tinha dito antes ao Tribunal porque o arguido C era o seu chefe. Mas diz que no “GN”, quando foi levar o Y, o carro que viu era um (…) escuro e em (…) não sabe que marca era o carro (mas rectifica que foi ao contrário, o (…) foi em (…) e no GN de (…) foi um carro que não sabe a marca). Disse que não viu quem era a pessoa que estava dentro do carro, mas volta a dizer que Y disse-lhe que era o arguido C. Disse que estas situações foram com 3 semanas de intervalo (acrescentou no seu “pensar”) , foi à tarde nas duas situações e associa a casualidade de ir para os lados de (…), na altura em que deu boleia ao Y (para este ir para (…), para o local onde o deixou e entrou para o carro) porque ia ver um jogo do AX.A.C. (repete, aqui, o movimento que já vimos, por exemplo, quanto aos factos relacionados com AI e que assinalámos quando fizemos a análise crítica da prova quanto a tal assistente: está naquela zona porque vai ao estádio do AX (...), embora nesta situação, com o Y, aparenta que ia só ver o jogo e não ia fazer qualquer serviço para a AX). Quando estava a prestar esclarecimentos - num segundo momento, quanto à ida ao GN, para dar boleia ao Y -, disse que não tinha visto a pessoa que estava dentro do carro para onde o Y entrou, mas que era um homem. E diz (quanto ao momento em que soube quem era a pessoa que estava no GN), que “…quando o Y me diz é quando vem embora. Só me diz que era o Sr. C aqui no (…). Do GN não me disse nada. Eu perguntei quem era o Sr. C e ele disse-me que era o sr. C da AX… ” (mas ter em atenção que quanto a este episódio de ter dado “boleia” a Y, para o “GN” de (…), na audiência de julgamento de 20/02/06 o arguido já tinha dito que tinha dado esta boleia ao Y e que este lhe dissera que ia ter com o “Sr. C”; e para (…), referiu que foi passado duas semanas, referiu um serviço da dança que fez, Y pediu-lhe boleia e como o arguido ia para o AX.A.C., para um jogo, deu a boleia). 18.3. face ao que antecede, da conjugação das declarações do assistente com as declarações do arguido A, os factos que o Tribunal deu como provados nos pontos “102.” A “103.24”. E por não ter sido produzida prova suficiente, os demais factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos “21.” a “21.7”. *** 18.4. Da Motivação quanto a factos do pedido cível:Quanto aos factos do pedido cível e na medida em que não estejam abrangidos pela prova produzida quanto aos factos objecto do processo, foram relevantes as próprias declarações dos assistentes, as Declarações da Sra. Dra, BP e o depoimento do Sr. Dr. BL. * 19. Da Motivação quanto às condições pessoais, vivência dos arguidos, formação académica: A – Arguido A: Quanto ao factos que p. Tribunal deu como provados em relação às condições pessoais do arguido, foram relevantes as declarações do arguido e as declarações do se (...) ouvido em AJ, a testemunha Sr. Dr. JJD. No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relevante o certificado constante dos autos. B – Arguido C: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido C, foram relevantes as declarações do arguido, bem como o depoimento das testemunhas WA, KKD, QP, GW No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relevante o certificado constante dos autos. C – Arguido K: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido K, formação académica e profissional, estado de saúde, foram relevantes os depoimentos das testemunhas LK, WX, BBO, BBH, CCO, WH ((...), que trabalhou com o arguido e uma das testemunhas que disse que nunca ouviu qualquer referência a atendimento inapropriado de doentes; teve também o arguido como doente, tendo sido por isso uma das testemunhas que falou quanto ao seus estado de saúde), MZ, NO, VR, KKE, ZR, BBU, XL, No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relavanto o certificado constante dos autos. D – Arguido E: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido E, formação académica e profissional, foram relevantes os depoimentos das testemunhas No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relavanto o certificado constante dos autos. E – Arguido N: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais do arguido N, foram relevantes as declarações do arguido e o depoimento das testemunhas VE, NH, JK, IH, TP, KI, ZJ. No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relavanto o certificado constante dos autos. F - Arguida Q: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados quanto às condições pessoais da arguida, foram relevantes as suas declarações e os depoimentos das testemunhas que já acima assinalámos, essencialmente vizinhos e pessoas de quem tomava conta dos filhos. No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relavanto o certificado constante dos autos. G – Arguido H: Quanto ao factos que p Tribunal deu como provados em relação às condições pessoais do arguido, foram relevantes as declarações do arguido e as declarações das testemunhas AAM, CCG, LU, AAP, CCF, QZ, NB. No que diz respeito aos antecedentes criminais foi relavanto o certificado constante dos autos. (II) – Da Motivação e Análise Crítica da Prova quanto ao NUIPC 3137/01.5JDLSB, Processo Apensado (Pº 1718/02.9JDLSB-F) (cont.): Em audiência de julgamento o arguido A começou por não falar dos factos que lhe são imputados neste processo. Num segundo momento e após terem sido prestadas declarações pelos assistentes T, U, V, negou a práticas dos factos que a Acusação lhe imputa em relação a tais assistentes. Sem prejuízo do que acima já ficou dito quanto à valoração dos depoimento – referente à prova testemunhal ou por declarações produzida e que são também extensivas ao “processo Apensado” -, o Tribunal passa a expor, de forma tão individualizada quanto possível, o percurso do Tribunal para chegar à convicção que formou quanto aos factos que deu como provados e como não provados. No entanto, dado que a Acusação destes autos e os meios de prova que foram apresentados pelos Sujeitos Processuais ao Tribunal, são consideravelmente menos extensos e menos numerosos que os dos “autos principais” – para além da estrutura da acusação ser mais simplificada que a do Despacho de Pronúncia -, o tribunal adaptou a estrutura da sua motivação e da análise crítica da prova a esta realidade processual. Daí as divergências – quanto à estrutura e ao método - que possam verificar-se em relação ao trabalho que foi feito para o “processo principal. No entanto o Tribunal fará, também, a exposição “por Assistente”, no que diz respeito à análise e valoração da prova produzida , quanto aos factos relativos a cada um. Começamos, contudo, pelos factos relativos ao arguido A. (A) - Dos factos relativos ao arguido A: 1. No que diz respeito ao arguido A, o Tribunal deu como provados os factos relativos ao seu percurso na AX, processos disciplinares, funções exercidas no estabelecimento – incluindo o transporte de alunos dos (...)s -, saída da instituição, com base nos documentos do Apenso E (dois volumes/ processo Apensado), em particular os documentos constantes de fls. 21, 23, 103, 123/124, 160 a 162, 170 a 177, 213/214, 220, 248, 274/275, 280, 303, 371 a 374, 384, 418, 560 a 562, 593, 594, 735 a 747, 878 a 880, 963. São documentos que quando analisados revelam coerência intrínseca entre si, foram ponderados e valorados pelo Tribunal não só tendo em atenção o seu conteúdo, mas também as circunstâncias em que foram produzidos. Isto é, tendo em atenção a entidade que os emitiu ou a forma que os mesmos apresentam e conjugando com as assinaturas e/ou datas que lhes são apostas, de quem resulta ter feito o documento, do conteúdo e do que (para o Tribunal) objectivamente resulta desse conteúdo - quanto às circunstâncias ou razões pelos quais os documentos foram feitos -, o Tribunal considerou que correspondem a documentos feitos com o objectivo, pela razão ou pelas circunstâncias que o seu conteúdo atesta e na data, com a presença ou pela pessoa que o seu conteúdo atesta. Acresce que todos os documentos foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Daí serem documentos aos quais o Tribunal deu credibilidade. Estes documentos foram, também, em diferentes segmentos, corroborados pelas declarações do arguido, particularmente no que diz respeito a factos relativos à sua vivência na instituição e valorados face à prova testemunhal produzida em audiência de Julgamento. Assim, foram relevantes, por exemplo, os depoimentos das testemunhas ZC (Educadora na AX desde 1998, no GA), a qual disse ao tribunal ter conhecido o arguido A, lembrando-se de o ver a entregar o correio no EX, mas não se recordando de o ter visto a transportar alunos, ou de HHG (Professor do EX e na AX desde 1986), o qual disse ao Tribunal ter conhecido profissionalmente o arguido A, tendo falado desse conhecimento, mas esclarecido que nunca ouviu nem teve conhecimento da ocorrência na AX de factos da natureza dos deste processo, utilizou a expressão “ nunca soube de nada”, só com o início deste processo. A testemunha HHH (funcionário na AX há cerca de 15 anos, em relação à data em que prestou depoimento, exercendo funções no CZ), também falou ao Tribunal sobre o conhecimento profissional que teve do arguido A, tendo acrescentado que “nunca viu nada” em relação a comportamentos do arguido. A testemunha BQ, (...) da AX de Abril de 1986 a Novembro de 2002, mas tendo ingressado na AX em 1968 como educador, também demonstrou ao Tribunal conhecimento directo dos factos relativos à vida na Instituição, incluindo a carreira profissional do arguido A e o seu relacionamento com os demais funcionários. Demonstrou conhecimento directo dos processos disciplinares que o mesmo sofreu, sanções impostas No que diz respeito ao transporte de alunos, foram várias as testemunhas que falaram com conhecimento directo destas funções do arguido. Por exemplo, a testemunha HHG (Professor do EX e na AX desde 1986), tendo declarado, como referimos, que conhecia profissionalmente o arguido, confirmou que o arguido A fazia o transporte de alunos e materiais para as (...), do (...) onde a testemunha estava. A testemunha HHH (funcionário na AX há cerca de 15 anos e a trabalhar no CZ), esclareceu que o arguido, por exemplo, levava os equipamentos do (...) para o Estádio do CZ ou vice versa, aquando dos jogos. A testemunha ZN (Educadora no EX e na AX desde 1989), disse ao tribunal que nunca teve conhecimento de qualquer proibição de A levar jovens para as (...), tendo mesmo sucedido que na (...) de 2002, em que o seu (...) foi de férias para (…) e a testemunha também foi, o arguido A transportou educandos para a (...) – para além de ter ido lá levar material - e a “Direcção” do (...) esteve presente à partida para a (...). Aliás, o arguido A, quanto a este transporte de alunos para a (...) de (…), relatou que a Direcção do (...) até lhe tinha agradecido o transporte, pois não havia outro motorista que o pudesse fazer e o arguido tinha-se disponibilizado para isso. No mesmo sentido (do transporte de alunos) a testemunha OZ (Educadora de infância na AX), no GA pelo menos em 2001, a qual, embora tenha declarado não conhecer pessoalmente o arguido mas só de vista, viu-o transportar alunos, estando convencida que era para uma (...). A testemunha HHI (Psicóloga na AX, no (...) EY desde 1989), declarou ao tribunal recordar-se de ser o arguido A a levar o educando U a (...) que este tinha no Hospital IIU, isto no ano lectivo de 2001/02. 1.2. Quanto aos factos de natureza pessoal, sua vivência e situação familiar e económica, foram essencialmente relevantes as declarações que o arguido prestou em audiência de julgamento. Concorreu, também, o depoimento da testemunha JV, dado que revelou algum conhecimento directo sobre quer a vivência pessoal do arguido - pois declarou ao Tribunal que o arguido frequentou a casa da sua mãe -, quer sobre a vivência profissional, pois foi aluna da AX, numa altura em que o arguido A já trabalhava na instituição. O depoimento da testemunha AAJ (trabalhou na AX durante 29 anos), a qual revelou conhecimento directo da vivência do arguido A quer após o momento em que saiu da AX como alunos, quer quando começou a trabalhar na instituição, tendo-o o acompanhado e sendo o arguido visita frequente da sua casa, tendo falado ao Tribunal da sua vivência, incluindo como aluno. O depoimento da testemunha NN, (...), assistente de acção educativa no (...) EY da AX, pois falou ao Tribunal sobre a vivência do arguido A e as que lhe fez depois de estar preso. Também o depoimento da testemunha QA, irmão do arguido, foi relevante neste aspecto. Quanto as antecedentes criminais do arguido, foi relevante o certificado do registo criminal junto aos autos. (B) – Dos factos relativos a T: 1. T prestou o seu depoimento presencialmente, na Audiência de Julgamento, estando o arguido A na sala. Tal audição foi feita com interprete de língua gestual. A intervenção de um terceiro na comunicação entre o Tribunal e o T e vice versa, concretamente do intérprete de língua gestual, pode, de algum modo, gerar lapsos na comunicação. Isto é, algum desvio quanto ao sentido do que é perguntado, quanto ao sentido como é traduzido e quanto ao sentido com que é recebido e vice versa. Isto tendo em atenção a explicação que em audiência de julgamento foi dada pelo intérprete, que a linguagem gestual passa não só pela interpretação dos gestos que são feitos mas, em algumas situações, pela interpretação que o receptor faz de expressões faciais e, por outro lado, a língua gestual não se traduz “palavra a palavra”, mas traduzem-se também ideias, sendo a gramática da língua gestual diferente, tendo muitas vezes que começar pelo fim da frase. Assim, o Tribunal teve sempre presente esta possibilidade de desvio na comunicação e em qualquer situação em que teve dúvida quanto à incompreensão da pergunta ou quanto ao sentido da resposta que era dada – por a expressão facial e corporal do T, que é visível no DVD em que está gravado o seu depoimento ou pelo sentido do que era traduzido pelo intérprete, levar a tal -, o Tribunal não deixou de fazer/pedir os esclarecimentos complementares que entendeu adequados e necessários. 2. Como acima dissemos o T prestou o seu depoimento na audiência – sem recurso ao uso de videoconferência – e com o arguido A presente. O arguido A ouviu o que foi declarado pelo T e no fim do depoimento pediu para prestar declarações, quanto ao que ouviu. Prestou as declarações – na audiência de 23/11/05 - e, no agora relevante, negou ter praticado qualquer acto de abuso de natureza sexual com o T. Ora em audiência de julgamento o T descreveu a actuação do arguido A e os actos por si suportados, através de um depoimento que o Tribunal considerou globalmente coerente e consistente e verdadeiro: como alguém que estava a contar o que se passou consigo. Esta coerência e consistência advém não só da forma como o T prestou o seu depoimento - e que a seguir o Tribunal irá descrever em relação a factos ou núcleo de factos que exigem especial referência -, mas também da forma como certos pormenores foram dados pelo depoente, os quais foram avaliados e valorados pelo tribunal face ao teor de documentos existentes nos autos e face à convergência, ou divergência, com outros depoimentos que o tribunal irá enunciar. 3. O Tribunal deu como provados os factos descritos nos Pontos “6.” a “18.” dos “ factos provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ 1. T), os quais integram actos que foram negados pelo arguido A, dizendo mesmo que se os tivesse praticado pedia desculpa, como o fez em relação a outros rapazes. Uma característica do depoimento do T foi a de ser um depoimento com uma expressão corporal muito forte, em que o Tribunal pôde aperceber-se que o T, quando descrevia os actos que o arguido A praticou na sua pessoa, fazia-o com uma expressão facial por vezes carregada, deixando transparecer sofrimento em algumas situações e, por vezes, deixando transparecer a sensação de impotência ou ansiedade de quem não consegue dizer mais. Quando o Tribunal lhe pedia para esclarecer – nas situações em que dizia que tinham sido praticados actos de “sexo oral” ou “ sexo anal” -, em concreto, o que é que queria dizer, “… que parte do corpo de quem é que tocou em quem…”, percebia-se que quando concretizava o que lhe era pedido, fazia-o com custo, com a incompreensão de quem tem que repetir o que, para si, já estava dito, com gestos rápidos como quem quer dizer tudo o que lhe aconteceu. Esta forma de estar perante o tribunal, que foi apreendida pelo tribunal ao longo de todo o depoimento, incluindo durante o contra interrogatório a que foi sujeito aquando da contra instância do arguido, foi um dos factores que levou o tribunal a criar a convicção e concluir que o T estava dizer o que se recordava e estava a falar verdade, quanto aos actos que descreveu como tendo sido praticados pelo arguido A na sua pessoa e nos locais em que disse. Mas houve mais. Houve pormenores na sua descrição que foram sinal de que não estava a “ construir” uma história, para daí tirar um qualquer “proveito” (fosse ele qual fosse…) ou “notoriedade” (fosse ela qual fosse…). Por exemplo, quando falou dos factos que a acusação identifica como tendo-se passado numa “ casa de banho de CZ”, o T referiu sempre o local assim: “uma casa de banho em CZ”. Quando lhe foram pedidos esclarecimentos sobre esses factos, disse que a casa de banho era no sítio onde à noite se guardavam os veículos da AX e que às vezes estavam a lavar os carros no sítio perto dessa casa de banho. Se estivesse a inventar a “história” para incriminar o arguido A – como o arguido declarou e argumentou -, teria sido mais normal ter dito, desde o início, que os factos passaram-se “ numa casa de banho nas garagens de CZ”, pois este local está assim “identificado” em várias situações na acusação e despacho de Pronúncia no processo principal. Logo seria provável que assim fosse também mencionado pelo T, por assim ter “ouvido” referir, nas notícias ou de outro modo. Mas não e há uma explicação plausível para isso. O T não era dos lares de CZ, só a(...)va CZ para ir para o EX e o local identifica-o como se recorda e como alguém que não é exactamente “ dali”. Quando fala da forma como aconteceu ter sido abordado em CZ pelo arguido A, di-lo de uma forma particularmente expressiva, de quem está a reproduzir uma situação vivida, experimentada: quando estava a passar para o EX A “ aparecia de repente, eu dizia que me queria ir embora, mas ele acabava por me conduzir à casa de banho” ou “ ele aparecia de repente e apanhava-me”. Quando fala dos factos que se passaram com o arguido dentro de um carro, a forma como descreve a abordagem do arguido - “ ele apanhou-me lá”, na zona de (…), eu não queria (a boleia) e ele foi muito teimoso -; descrevendo de seguida o que aconteceu no carro, mas dizendo inicialmente apenas “ ele violou-me” e mostrando dificuldade, quando o Tribunal lhe teve que perguntar, em concreto, que actos foram praticados, ele responde “… dentro do carro pegou em mim… e meteu o seu sexo por trás…” , mas sem deixar de dizer ao tribunal que estava envergonhado por estar ali a falar assim. Demonstrou dificuldade e vergonha por estar a falar daquela forma dos actos em causa. Demonstrou estar a exprimir uma vivência que o marcou e não uma qualquer situação inventada. Mas, como acima o Tribunal referiu, houve mais. E quando digo que “ houve mais” é que houve também desvios no seu depoimento, quanto a algumas datas ou circunstâncias do modo como ocorreram os factos, em relação à descrição que constava na acusação. Mas estas divergências, que o tribunal veio a acolher e a dar como provadas – e, consequentemente, como não provada a versão da acusação -, para o Tribunal não foram sinal de que o T estava a inventar e a mentir. Assim, o Tribunal passa a concretizar o que, em relação a estes específicos núcleos de factos ou circunstâncias, foi também particularmente relevante para a prova ou não prova do facto. 3.1. Quanto à aproximação do arguido A a T, o Tribunal deu tal facto como provado tendo em atenção as declarações de T, o qual descreveu como A aparecia no (...) FZ ou no EX, como mostrava ser uma pessoa simpática, as “ coisas” que lhe deu. Declarou que A deu-lhe doces e pagou-lhe coisas para comer no bar do instituto EX, mas não disse que tinha “ conta aberta” pelo arguido A no bar do EX, como é referido pela acusação, facto que (o ter “ conta aberta” no bar), apesar de meramente acessório, o tribunal veio a dar como não provado. O próprio arguido admitiu ter-lhe pago doces, bolos e chocolates, embora dizendo que pagou a ele e a outros, por o terem ajudado a carregar um furgon. Do que para o tribunal transpareceu das declarações prestadas pelo arguido A, mesmo analisando exclusivamente as prestadas quanto ao T – mas analisando-as independentemente do “ mal” que tenha feito, ou de intenções que tenha tido de o fazer -, ressalta um aspecto: A tinha gosto em relacionar-se com os rapazes (…) (ver, por exemplo, as suas declarações do dia 23/11/05 e acima já referidas, quando fala das confidência que os rapazes lhe faziam), ele próprio era um “irmão” (…) e o próprio T disse que achava-o uma pessoa simpática e já o via e conhecia desde que estava em FZ (residência e (...)) e não só quando passou a ter aulas no Instituto EX. Mas como também resultou do depoimento da testemunha ZI(Educadora da AX, no EX e tendo estado também o lar de FZ de 1980 a 2002), o T quando estava no EX tratava o arguido A por Pai e, nas palavras da testemunha – que conheceu directamente o T no Instituto e no Lar -, o T tinha uma relação de amizade muito grande com o arguido A, pensando a testemunha que era por ser uma criança carente. Disse ainda - e tudo isto na instância que lhe foi feita pela Defesa do próprio arguido -, que A às vezes deixava (no (...)) uma moeda ou um mimo para o T. Aliás, as fotografias de fls. 19 e 20, do Apenso A (do processo Apensado – Documentos apreendidos na busca a que se refere o auto de busca e apreensão de fls. 244 a 244, em que o local buscado foi a residência do arguido A, na (...) (…), nº (…),(…), em (…)), são, na perspectiva do tribunal, pela expressão facial do arguido, um exemplo da relação de empatia que o arguido estabelecia com os jovens e, pela expressão de alguns nessas fotografias, destes com o arguido. Assim, o Tribunal não teve dúvidas que o arguido A quis aproximar-se e aproximou-se, ganhando a sua simpatia, do T. 3.1.1. Mas esta conclusão não se restringe ao assistente T. Com efeito, na sequência do que antecede, quer das declarações deste assistente - quer das declarações dos demais assistentes U e V quanto ao relacionamento, ao dar dinheiro por parte do arguido -, quer das declarações do arguido quanto ao relacionamento com os jovens em geral, quer do depoimento da testemunha ZI ou da testemunha HHI quanto a esta questão, o Tribunal ficou convicto que esse movimento de aproximação era geral, em relação a todos os jovens. Esta percepção foi também corroborada pelo depoimento das testemunhas PU e ZC, quando falaram do contacto do arguido com os jovens em (...) e referindo-se a (...) em que estiveram presente. E pelo depoimento da testemunha PX, a qual foi aluna da AX, mas tendo passado a trabalhar na instituição, conheceu ainda o arguido enquanto aluna e falou dos transportes que o arguido ao fim de semana fazia para levar os educados para jogos, mas como alguma coisa que era também do agrado dos alunos. Todos revelaram elementos que permitiram ao Tribunal percepcionar a referida proximidade do arguido com os educandos, o conhecimento que tinha dos mesmos e – especialmente pelas declarações dos assistentes -, de aspectos da sua vivência. Pelo que, também, a matéria que o Tribunal deu como provada nos pontos “4.1”, “4.2”, “5.” e “5.1” e concorrendo, também, para o que o Tribunal veio a dar como provado nos pontos “73” a “79” dos factos provados (e quanto ao ponto “4.3”, foram concorrentes as declarações do arguido e do assistente W). . 3.1.2. Uma questão que foi suscitada pelo arguido A e que, de algum modo, tem relevância com a questão da “ aproximação”, é a da “comunicação” entre o arguido e o T, uma vez que este é surdo-mudo. O T disse ao tribunal que o arguido A sabia alguma coisa de língua gestual, falava coisas simples e fazia alguns gestos. O arguido A, quando prestou declarações no já referido dia 23/11/05, disse que não sabia língua gestual. Mas, ao mesmo tempo, também disse que um dos jovens surdos-mudos a quem uma vez deu “boleia” de CZ para FZ, a pedido do educador KKF, contou-lhe que o T teria tido relações de natureza sexual com outros três jovens. Esclareceu – quanto à questão da “ comunicação” -, que os rapazes “ falavam um bocado”, que o T também “ falava um bocado”, que ele arguido sabia ver eles falarem entre si, mas não sabia “falar”. Mesmo não sabendo “falar” a língua gestual, como declarou, se o arguido A soube entender o relato que lhe foi feito pelo jovem surdo mudo – a tal referência ao T e mais três jovens - é porque sabia entender a forma como os surdos-mudos comunicavam consigo e sabia comunicar com os mesmos. Quanto a receber dinheiro de A, T declarou ao tribunal que tal aconteceu após algumas situações de abuso, mas não, como a acusação refere, “ sempre” que o arguido via o menor. Não conseguiu, contudo, concretizar após que situações de abuso e qual a quantia exacta em relação às situações em que recebeu dinheiro, o que para o Tribunal é normal não conseguir recordar-se. Quando estava a depor já tinham decorrido entre três e seis anos, em relação à data em que os factos tinham ocorrido – os factos imputados ao arguido A situam-se entre 1999 e Agosto de 2002 -. O facto mais marcante para o T (quanto a esta circunstância do dinheiro) terá sido, naturalmente, o ter recebido dinheiro, não é exigível – e, por isso, para o tribunal o não conseguir recordar-se não é sinal de que está a mentir -, saber exactamente que quantia recebeu e exactamente quando. 3.2. Passando a outros aspectos, do que o tribunal deu como provado nos Pontos “10.” a “19.” dos “factos provados” e ao como “ não provado” nos Pontos “4.” a “22”, o Tribunal reproduz o que já disse até ao momento (cfr., por exemplo, Ponto 2., 3. e 3.1. ) , quanto à forma como o depoimento do T foi prestado perante si, avaliação que está sempre presente e subjacente a tudo o que se diz, quanto à ponderação do depoimento do T e análise crítica da prova. Tal é complementado com os aspectos concretos, pormenores, concordância de elementos ou desvios que o Tribunal já enunciou e com os que vai continuar a descrever. 3.2.1. Assim e quanto ao factos passados “ no Verão de 1999”, numa casa de banho de CZ (cfr., por exemplo, pontos 10., 11. e 12., dos “factos provados” e pontos 4. a 6., dos factos “não provados”), o T localizou-os em 1999. Perguntado pelo tribunal porque dizia 1999, disse que os factos ocorreram após a morte do avô, que disse ter sido no dia 15 de Abril de 1999, não tendo a certeza se ocorreram dois ou três meses após a morte do Avô. Em súmula, disse que foi num ano em que já não estava (na escola), em FZ mas no EX; a(...)va CZ para ir para o EX, por um portão que havia de CZ para o Instituto EX, o que todos faziam, pois caso contrário tinham que dar uma volta muito grande para entrar pela “ entrada do EX” – e o tribunal, em deslocação do tribunal à AX, pôde verificar que o Instituto EX confina com CZ - e tal resulta, também (o passar para o Instituto EX por um portão de CZ) das declarações do arguido A prestada em audiência de julgamento. Disse, também, que foi no Verão de 1999, não se conseguindo lembrar do mês, mas que tinha a certeza que ainda estava em aulas. Para o Tribunal e falando da localização dos factos no tempo, foi um depoimento seguro, em que o T deixou transparecer o raciocínio que fazia quanto ao momento em que os primeiros factos ocorreram. A sua grande referência foi a data da morte do Avô. Embora dos autos não resulte documento que confirme o falecimento do avô, disse a data sem dúvidas. É certo que poderá ter sido uma data “apreendida e retida” na memória já no decurso deste processo – portanto, após/aquando/durante ter prestado declarações em fase anterior ao julgamento -, mas o T deu outros elementos. Das suas declarações o Tribunal depreendeu que os factos que relatou numa casa de banho de CZ, não foram logo no início de ter entrado para a AX, pois começa por falar no conhecimento e contacto com A em FZ e, na dinâmica do seu discurso, só depois é que começa a falar da ida para o instituto EX. Disse ao tribunal que primeiro esteve a residir e estudar em FZ, mas depois passou a estudar no Instituto EX, mantendo-se o Lar em FZ. Também não resulta, da análise do seu depoimento, que a sua memória tenha sido a de os factos terem-se passado logo que foi transferido para o Instituto EX, pois disse que foi numa altura em que (já ) ia de transportes públicos de FZ para o EX e acentuou que “ … foi no Verão…”. Como resulta dos documentos dos autos e que o tribunal irá indicar, o T entrara na AX no Inverno de 1997/1998. 3.2.1.1. Analisando os documentos dos autos e em particular documentos a que o Tribunal recorreu para formar a sua convicção quanto ao tempo em que ocorreram os factos com o T, temos que começar por mencionar o documento constante de fls. 36.545 e 36.546. É uma informação sobre o T (quanto a horários escolares e processo psicossocial do jovem) , feita pela AX em 6/01/06 e remetida pela AX para o tribunal, na sequência de Despacho proferido pelo Tribunal. Desta informação, feita em 6 de Janeiro de 2006 - já com o julgamento a decorrer há um ano e dois meses -, consta que T do ano lectivo de 1998/99 ao ano lectivo de 2001/02 frequentou as aulas no (...) de FZ, das 9h às 18h, mas sem autorização para se ausentar das instalações sozinho, sendo que as aulas e a residência estavam instaladas no mesmo edifício. Consta que só no ano lectivo de 2002/03 passou a frequentar aulas no EX e só no ano de 2003 teve autonomia para efectuar o percurso Lar/Escola sozinho (cfr., também, fls. 36.546, quanto a deslocações do T acompanhado ou sozinho). As informações de fls. 36.545 e 36.546 estão assinadas pela Sra. Directora do EX, Sra. Dra. WS. Estas datas contrariam, de forma frontal, as declarações de T quanto à altura em que passou a frequentar o Instituto T e quanto à autonomia ou ausência dela, nas deslocações para fora de FZ. No entanto há elementos nos autos, feitos em datas anteriores ao início ou ao conhecimento dos factos que deram origem ao presente processo, que dão consistência/corroboram as declarações de T e expressamente contrariam, nesta parte, o teor do documento de fls. 36.545/6. Do “Apenso D” (do Processo Apensado), constam alguns elementos do processo individual de T na AX, os quais o tribunal teve em atenção para compreender o percurso – ou a formalização do percurso – do T na AX. Assim: a) a fls. 196, documento datado de 24/11/97, encontra-se a proposta de admissão do T no EX, FZ. E a fls. 198 e fls. 199, datados de 25 de Novembro de 1997, estão o Relatório Social e relatório Psicológico do T, compreende-se para a sua admissão na AX. b) A fls. 191, mas já datada de 2/06/98, está uma proposta de admissão do T para o EX, FZ. E a fls. 192, datada do dia anterior, 1/06/98, está a informação da equipa de Admissões do EX, FZ, para consideração superior, propondo o internamento do T. c) No entanto, a fls. 195, datado de 26/02/98, está um documento da AX, de FZ para SASA e do qual consta que “ … para os devidos efeitos se envia o pedido de admissão de T…”. E a fls. 194 está um documento intitulado “ Equipa de Admissões em Internato”, referente ao T, em que está a(...) o dia 26/02/1998 como data do processo e entidade proponente o EX. Há, no entanto, outros dois documentos que contribuem e permitem compreender globalmente o percurso escolar do T na AX. Assim e continuando: d) A fls. 190 está um documento de “ Guia de Admissão” do T no FZ, datado de 4/12/97, com indicação dos “ elementos de matrícula” para o ano lectivo de 97/98, no 1º ciclo, escola 802, FZ. e) Mas a fls. 202 e datado de 11/12/97, está um “Boletim de Transferência” do T, também para o ano lectivo de 97/98 e para frequentar o “2º ano”, mas já para “ estabelecimento de Ensino EX”, sendo o motivo da transferência “… para ter melhor comportamento a nível da deficiência auditiva …”. f) A fls. 172/173 e 178/179, datada de 6/11/01, está uma informação (da AX) sobre o T, da qual consta que o mesmo frequenta o EX desde o ano lectivo de 1997/98. Estes documentos, analisados globalmente, corroboram as declarações do T e levaram o Tribunal a concluir o seguinte: o T entrou para a AX entre meados de Dezembro de 1997, princípio de 1998, na sequência dos procedimentos desencadeados com os documentos de fls. 196, 198 e 199, pois a fls. 190 e datada de 4/12/97, já está a “guia de admissão” do T. Foi primeiro para FZ, Lar e escola (cfr. Fls. 190), mas em momento posterior, mas muito próximo da sua admissão, passou a estudar no EX, pois o pedido de transferência de matrícula já foi para o Instituto (cfr. Fls. 202) e a informação de fls. 173/173 e 178/179 diz que desde o ano lectivo de 1997/98 frequenta o EX. Quanto às datas apostas nos documentos de fls. 191, 192, 195 e 194, do “Apenso D” e que temos vindo a enunciar, tal corresponde, face à análise que o tribunal faz da sequência de todos os documentos enunciados nas alíneas “a)” a “f)”, que antecedem, à “formalização” que a AX entendeu fazer quanto ao percurso do T na instituição, mas que não afastam a conclusão que o tribunal tirou quanto à entrada do T na Instituição e quanto à altura em que foi estudar para o EX. 3.2.1.2. Há um outro aspecto que o Tribunal tem que mencionar e tem a ver com a autonomia do T nas suas deslocações do/e para o lar de FZ. Um dos argumentos apresentados pelo arguido A para a impossibilidade de abordagem do T e consequentemente para a impossibilidade de ocorrência dos actos que o T descreveu, foi o de que o T, bem como os demais colegas, eram sempre acompanhados por um educador nos percursos, por exemplo, de FZ para o EX e vice versa. Das declarações do T resultou que andava de transportes públicos, sozinho, declaração esta que ao Tribunal mereceu credibilidade, face ao modo como naturalmente fluía a narração – dentro da forma como a mesma foi transmitida ao tribunal - e o facto se enquadrou na declaração do T quanto às abordagens do arguido A, dentro ou fora do (...). Não resultou da narração do T, do seu discurso e do contexto do que disse, que fosse uma “ bucha” para compor a história. Acresce que mesmo o facto de, eventualmente, em alguma altura ter ido acompanhado durante o percurso nos transportes público, de FZ para o EX e vice versa, por um educador, não exclui a possibilidade do T, dentro de CZ, ter sido abordado pelo arguido A como descreveu ao Tribunal. Mas no que diz respeito à descrita (por si) autonomia do T nas deslocações fora do (...), o Tribunal convoca de novo o documento de fls. 36.546 (nos autos principais). É a já referida informação sobre o T (quanto a horários escolares e processo psicossocial do jovem) , feita pela AX em 6/01/06 e remetida pela AX para o tribunal, na sequência de Despacho proferido pelo Tribunal, informação esta que está assinada pela Sra. Directora do EX, Sra. Dra. WS. Desta informação - como dissemos feita em 6 de Janeiro de 2006, com o julgamento a decorrer há um ano e dois meses -, consta nos três primeiros parágrafos (e no que para o aspecto da credibilização das declarações do T quanto às suas deslocações sozinho interessa), que o T até Abril de 2003 não efectuava qualquer percurso “ … sem o devido acompanhamento de um educador responsável…”, sendo que as deslocações que fazia para casa da bisavó materna, eram feitas com o acompanhamento da bisavó. O Tribunal não pôde deixar de notar a ênfase que a AX apôs na informação, quando ao “devido acompanhamento do menor por educador responsável”. No entanto e sem deixar de mencionar o que consta de: a) fls. 185 do Apenso D (do processo apensado), em que em informação feita pela AX em 18/07/01, já é referido que a bisavó do T faleceu em Abril de 2001 (e não 2003, como é referido pela AX a fls. 36.546), data a partir da qual o T ficou sem qualquer encarregado de educação; b) fls. 187 do mesmo apenso, informação datada de 26/04/01, que diz que a bisavó do T falecera no dia 13 de Abril; c) e fls. 192 do mesmo apenso, informação da AX datada de 1/06/98, que diz que a bisavó encontra-se muito doente (sendo por isso, para o Tribunal, difícil e pouco normal que a Bisavó se pudesse deslocar com facilidade de (…), onde morava - cfr. Fls. 198, do mesmo Apenso D -, para ir buscar e levar o neto ao FZ, como a AX informa a fls. 36.546) ; verificamos também que no quatro parágrafo do documento de fls. 36.546 (o que começa “…Em Dezembro de 2001…”), a AX diz que em Dezembro de 2001 o T “… começou a passar alguns fins-de-semana (com uma periodicidade que variava entre semanal e quinzenal) em casa da ama… altura em que começou a efectuar o percurso entre o Lar e a residência desta “ família amiga” de forma autónoma…”. É o próprio documento agora (em 2006) enviado para o tribunal pela AX que contém, objectivamente, contradição quanto à informação que dá. Assim, considerando o que acima já ficou dito sobre a avaliação que o Tribunal fez das declarações do T sobre (concretamente) a forma como fazia as suas deslocações para fora do lar, considerando o teor de fls. 185, 187 e 192 do “Apenso D” (do processo Apensado) e o teor de fls. 36.546, com a contradição apontada quanto às informações que dá nos diversos parágrafos, este documento, apesar de estar subscrito pela Sra. Directora do EX, em nada desvaloriza ou fragiliza a credibilidade que o Tribunal deu ao que o T declarou na audiência de julgamento. 3.2.2. Passando aos factos que a acusação descreve na habitação do arguido A, sita na (...) (…), o Tribunal começa por enunciar uma questão essencial e que tem a ver com o tempo em que os factos ocorreram: a acusação diz terem-se passado durante o ano de 2000, em data não concretamente apurada. Em audiência de julgamento e meramente em súmula, o T localizou tais factos - os passados na casa do arguido A -, como tendo ocorrido ao Domingo, no ano de 2000. Disse, também – e ainda antes da contra-instância que foi feita pelo arguido A -, que esta situação ocorreu antes, mas no mesmo ano, em que ocorreram os factos na (...) de (…) onde disse só ter ido uma vez e onde também disse terem ocorrido os últimos factos consigo. A dada altura do seu depoimento e quando ainda estava a responder a pedido de esclarecimentos do tribunal, o intérprete de língua gestual comunicou ao Tribunal que o T estava com alguma dúvida em relação à data da (...) de (...) – disse o intérprete que notava a dúvida pela expressão facial do T -, tendo traduzido o que o T disse de seguida: não tinha a certeza se a (...) foi no ano de 2000, mas pensava que sim; não tinha a certeza, mas tinha a ideia de que quando se ouviu falar “ deste processo”, a (...) fora algum tempo antes. Foi seguro quanto à localização da casa, perto de (…), tendo confirmado e esclarecido, quando confrontado com o auto de fls. 387 (do processo Apensado), que foi ele T que, após chegados a (…), indicou aos Inspectores da PJ as direcções para chegar ao prédio que ia identificar. Aquando da contra-instância do arguido A, a Defesa do arguido confrontou o T com o “facto” (na referência então feita pelo Ilustre Mandatário do arguido, quando estava a fazer a contra instância), de a casa só ter sido entregue ao arguido em “ Janeiro de 2002”, pretendendo a Defesa retirar a conclusão, perante o tribunal, de que o T estava a mentir. A forma como o T reagiu a tal contra interrogatório e à possibilidade de estar enganado quanto à data, foi esclarecedora para o Tribunal. Com uma expressão corporal que se foi tornando agitada, fazendo muitos gestos em algumas alturas, mas mantendo sempre o corpo direito apesar da situação de dúvida em que se encontrava, o T esclareceu que a (...) de (…) foi em Julho e a casa de (…) foi pouco tempo antes – foi neste momento da audiência que o intérprete de língua gestual explicou e esclareceu o tribunal, que a língua gestual não se traduz palavra a palavra, mas traduzem-se ideias e que a gramática da língua gestual é diferente, começando muitas vezes pelo fim da frase; este esclarecimento surgiu, também, porque nesta altura comunicara ao tribunal que tinha feito um erro de tradução, pois primeiro traduzira que o T teria dito que a (...) de (…) teria sido em Abril e “ isto” teria sido um pouco tempo depois “ Maio Julho de 2000”, quando o que o T dissera e que passou a traduzir, foi que a (...) teria sido em Julho e os factos de (…) antes -. T esclareceu que estava confuso quanto a datas, se foi em 2000, 2001 ou 2002, mas as coisas aconteceram, “sei que estive naquela casa”, “eu tinha a certeza que era 2000 mas não tenho a certeza”, “não sei porque fiquei confuso”, “ eu relaciono é com a (...), tenho a certeza”. Recorrendo, desde já, aos elementos dos autos, resulta dos documentos de fls. 7.017, 7.018, 7.019 e 7.020 (do Processo Principal, onde os autos passaram a ser tramitados após o Despacho a determinar a apensação dos processos), que o contrato com a JJM para fornecimento de água no fogo sito na (...) (…), Lote (…), Bloco (…), (…), em (…) e em nome de A, está datado de 26/12/2001. Do documento de fls. 7.021 (nos autos principais) , emitido pela Câmara Municipal de (…), Direcção Municipal de Habitação, resulta que por despacho de 6/12/01 foi atribuído a A o fogo acabado de identificar. E do documento de fls. 35.764 (dos autos principais), emitido pela KKB, consta que o arguido recebeu as chaves do apartamento em 14 de Dezembro de 2001. Estes elementos afastam a possibilidade de os factos terem ocorrido no ano de 2000. Mas da análise e valoração da globalidade das declarações do T, confrontadas e valoradas também face às declarações que o arguido A prestou na audiência de julgamento, resultou para o tribunal que o T estava equivocado quanto ao ano em que disse que os factos se passaram. Mas deu elementos que permitiram concluir que estava unicamente equivocado quanto ao ano em que pensava que os factos se passaram, mas sabia localizá-los correctamente na dinâmica da sua vida, não tendo mentido ao tribunal quanto ao facto ter ocorrido. Assim vejamos. O T, desde a primeira declaração perante o Tribunal, foi seguro quanto ao facto de os actos na “ Casa de (…)” terem ocorrido antes da (...) de (…) e que só foi uma vez a (…). Dos documentos juntos aos autos, nomeadamente dos documentos de fls. 398 e 405 (do processo apensado), resulta que o Lar do T teve uma (...) em (…) entre 1 e 20 de Agosto de 2002 e o T esteve nessa (...). Aliás, de forma coincidente com o que está nestes documentos, em audiência de julgamento o T soube dizer o nome de educadores e colegas, que estiveram consigo na (...). Disse, também, que a (...) de (…) foi pouco tempo antes de se começar a ouvir falar neste processo, sendo que, como resulta de fls. 122 vº (do processo apensado) , o arguido A foi detido, em cumprimento de mandado judicial, no dia 25/11/02. O T esclareceu que, em relação à (...), os factos na casa do arguido A foram pouco tempo antes, em Março ou Abril, dizendo isto porque houve um período de férias. Descreveu a casa como tendo um quarto, uma sala, cozinha e casa de banho – e do documento de fls. 7.021 (acima referido), resulta que o apartamento atribuído ao arguido foi um “T1” -, disse que quando lá foi a casa estava com muita confusão, chamou-lhe a atenção roupa espalhada e caixas com coisas metidas lá dentro, mas não sabia se tinha havido alguma mudança. Esta descrição é compatível com uma casa para quem alguém se tenha mudado e foi, neste aspecto, o próprio arguido A que veio dar um contributo para a corroboração do depoimento do T, quando este localizou os factos em “Março ou Abril”, antes da (...) de (…). De facto, após o T ter prestado depoimento o arguido A prestou declarações e, para corroborar que “ nada tinha a ver com ele (T)”, disse que só foi viver para a casa em Março, pois mandou arranjar o chão. O T quando localizou para o Tribunal os factos, em Março ou Abril, não tinha ouvido a Declaração do arguido A. Tudo avaliado e valorado, contribuiu para a convicção do Tribunal que o T, embora com uma memória errada quanto ao ano em que disse ao tribunal que os factos se passaram, tinha uma memória exacta quanto à localização dos factos na dinâmica da sua vida: em Março ou Abril, do ano da (...) em que foi para (…), pouco tempo antes de serem conhecidos e falados os factos deste processo. Daí o Tribunal ter dado como provado os factos em Março ou Abril de 2002. 3.2.3. No que diz respeito aos factos passados na (...) (…), para a prova do elemento temporal descrito na acusação, “ Verão de 2002”, o Tribunal reproduz a análise que fazer e documentos que a sustentam, quanto à permanência do T na (...) (…) no Verão de 2002. Quanto a este núcleo de factos o arguido diz que foi à (...), não põe em causa que o T lá estava, diz é que não praticou qualquer facto dos descritos na acusação. Aliás, no sentido da presença do arguido na (...) e de ter lá estado a almoçar, foi o depoimento da Educadora ZN, embora tenha também dito ao tribunal que o T não lhe contou qualquer incidente que tivesse acontecido com o arguido A. Mas também aqui a narração dos factos por parte do T, pela dinâmica do seu comportamento não verbal aos descrever o que se passou na (...), a forma como reagiu (com ansiedade de quem tenta esclarecer ) ao contra-interrogatório da Defesa do arguido A – que perguntava, “ se não estava sozinho, como é que A o abordou?...” – respondendo o T “… que quando disse que estava sozinho na casa de banho (da (...)), não queria dizer que estivesse sozinho na (...),… havia outros colegas, não estavam era imediatamente ali… e que A é que entrou na casa de banho quando ele estava sozinho…”, foram factores que também contribuíram para o tribunal consolidar a convicção que o T estava a contar uma situação que viveu, da forma como a viveu e que o marcou. 3.3. Há, contudo, quanto ao T, factos enunciados na acusação e imputados ao arguido e que o tribunal deu como “não provados” , como são, por exemplo, os Pontos “5.”, “6.”, “7.” a “10.”, “12. a 15.”, “20. a 22”, dos “ factos não provados”, e alguns estão em estreita ligação com outros ocorridos nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, que o tribunal deu como “ provados”. São, contudo, factos que o T não descreveu – por exemplo, o facto constante do Ponto 15. e 16., dos factos “não provados” -, ou não descreveu com o pormenor ou com as particularidades que estão descritas na acusação – por exemplo, os factos constantes dos Pontos 5., 6., 8., 9., 10., 13., 14., 19. e 20., dos factos “ não provados”. Tal pode ter acontecido porque se esqueceu, porque os esqueceu ou porque já não conseguiu falar neles. Mas foi sujeito a instância por todos os Sujeitos processuais, quanto a tais factos constantes na Acusação e mesmo após tais instâncias, que se seguiram ao pedido de esclarecimentos inicialmente feito pelo Tribunal, não foi possível para o Tribunal conhecer mais do que o que resultou nos “ factos provados”. Deste modo e mesmo tendo em conta os demais depoimentos que foram prestados em audiência de julgamento quanto aos factos descritos na acusação – e na medida em que tais depoimentos pudessem contribuir para a prova destes factos, pois estes factos dizem respeito, essencialmente, a actos de natureza sexual que a acusação imputa ao arguido A na pessoa do T e nenhuma das testemunhas, directa ou indirectamente, presenciou ou teve conhecimento de tais factos, com exclusão da conversa relatada pela testemunha ZL -, os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitem uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência e, em consequência, os factos que o tribunal deu como “ não provados” em relação ao T. Mas isto não foi, para o tribunal, motivo para desvalorizar ou tirar credibilidade ao depoimento do T, nem o afectou na sua essência. Como resultou do depoimento da testemunha ZI(Educadora da AX, no EX e tendo estado também o lar de FZ de 1980 a 2002), depoimento este já acima mencionado pelo tribunal, o T tinha uma relação de afectividade próxima com o arguido A, tratando-o mesmo por “Pai”. Nas palavras das testemunha – que lidou directamente com o T no Instituto e no Lar, sendo até uma das Educadoras que foi para a (...) (…) -, o T tinha uma relação de amizade muito grande com o arguido A, pensando a testemunha que era por ser uma criança carente. O sofrimento que o T demonstrou ao dizer o que sentiu e sente com os factos que relatou, dizendo que “ … a penetração doeu-me…não muito, mas doeu algo…”, “ … o que sobressai, apesar da dor física é a emocional, que vem até hoje …”, “… sinto-me triste quando aparecem notícias…da AX e do A…”, foi para o tribunal real e sincero. Acresce que o depoimento da testemunha ZL, educador do T desde a sua entrada no Lar de FZ - o que declarou ter sido em 97/98 -, até à sua saída em 2005, foi igualmente importante para o Tribunal ter a percepção do sofrimento do T e da genuinidade desse sofrimento. Embora o T nunca lhe tenha contado qualquer facto antes de serem noticiados pela comunicação social, passado uma semana (nas suas palavras) do “ escândalo rebentar” e após a prisão do arguido A, o T passou a ter um comportamento mais perturbado (utilizou a expressão, alterava-se em termos expressivos), face ás notícias, pelo que a testemunha falou com o T. Na sequência da sua abordagem o (...) falou-lhe dos “ abusos” do arguido A. A perturbação e a alteração de expressão do T face às notícias, que foi testemunhada pelo educador e na altura em que o foi - imediatamente após a prisão do arguido A -, são próprias de quem está com sofrimento interior e isto devido ao que veio a descrever ao Tribunal ter vivido com o arguido A. Com quem, em alguma altura do seu percurso, teve uma relação de amizade. 3.4. Quanto aos factos relativos à data de nascimento do T, parentesco, situação de incapacidade, factos relativos à sua infância e vivência fora e dentro da AX, foram particularmente relevantes os documentos de fls. 172 a 175, 185 a 187, 190 a 192, 198, 199, 201, 205 a 210, 213 e 214 do Apenso D (do processo apensado), e fls. 471 e 744 a 750 dos autos (do processo apensado). O relatório do Exame (...) Legal de Natureza Sexual, feito a T, que se encontra a fls. 458 a 464 (dos autos Apensados), foi relevante para a prova dos factos constantes do “ Ponto 19., “ do “ factos provados”. No entanto, o T disse ao Tribunal, na audiência de Julgamento, que antes dos factos passados com o arguido A já tinha sofridos “ factos iguais”, de penetração anal, de um Monitor da AX, que identificou. Daí o Tribunal ter dado como provado que o que consta do Ponto 19, dos “ factos provados”, foi também em consequência da actuação da conduta do arguido A, mas não exclusiva (cfr. Ponto 23., dos factos “ não provados”). (C) – Dos factos relativos ao Assistente U: 1. U prestou o seu depoimento em audiência de julgamento e o arguido A estava na sala. O depoimento do U foi, desde o princípio até ao fim, prestado de forma serena, com uma linguagem corporal pouco expressiva, tom de voz sem alterações significativas e com um discurso explicativo ou justificativo, minucioso em alguns pormenores. Aliada a esta homogeneidade na forma de estar e de falar, o Tribunal sentiu que em algumas situações, nomeadamente a situação em que relatou actos de penetração anal e oral por parte do arguido A, a ressonância emocional que o Tribunal esperava observar no U, não foi obviamente perceptível quer na sua expressão facial, quer no tom de voz, quer na demais expressão ou linguagem corporal. No entanto, avaliando globalmente o depoimento do U – e isto logo imediatamente ter prestado o seu depoimento -, a “impressão”, a marca que ficou para o Tribunal foi a de que havia ausência de alguma “emoção” na narração, o que o Tribunal, face aos actos que estavam a ser relatados pelo U, naturalmente esperava perceber de uma forma mais óbvia. Mas, ao mesmo tempo, quanto à estrutura da narração – a sequência e a dinâmica com que descreveu os factos, referências que deu para a localização no tempo, a normalidade com que descreveu a dinâmica dos actos essências do abuso -, o Tribunal não ficou com a “impressão”, com a “ marca”, de que, quanto à ocorrência do abuso, estivesse perante um discurso forjado, uma história inventada que não tivesse qualquer ressonância com situação vivida. Mas os seres humanos são diferentes, a forma de exprimir a sua intimidade e as suas emoções, de reagir às frustrações ou de se exporem são diferentes e U teve sempre uma grande preocupação no seu discurso: justificar, explicar e desculpar a actuação da sua mãe no período a que se referem os factos; dar uma imagem de si como Pessoa com princípios e valores sãos. Assim e dentro do que lhe é possível, o Tribunal tentou conhecer a pessoa que esteve à sua frente. 1.1. Olhando para as avaliações que foram feitas do U, pelas pessoas que o observaram e/ou que com ele contactaram durante o seu crescimento, desde Julho de 1995 (cfr., por exemplo, Documentos de fls. 144 a 149, do Apenso D, do processo apensado), até 4/09/08 (cfr. Documento de fls. 55.862 a 55.898, dos Autos principais, onde o processo apensado passou a ser tramitado após a despacho de apensação), era uma criança que em 1995 apresentava risco de depressão e era agredido pela mãe, deixando-lhe marcas no corpo (cfr., por exemplo, Fls. 145 e 146, do Apenso D); apresentava discrepância entre as suas capacidades, não conseguindo apreensão e reprodução correctas do mundo externo, sendo que as capacidades onde não estivesse implícita a necessidade de evocação de conteúdos internos, encontravam-se em franco desenvolvimento (cfr., por exemplo, Fls. 142 do Apenso D). Resulta do relatório de fls. 141/2 do Apenso D (do processo Apensado), que naquela altura afectivamente o U era uma criança que vivia uma carência acentuada de modelos de identificação, falha de auto estima muito conflitual, que impediram o desenvolvimento de uma auto-imagem positiva, que proporcionasse uma base segura para a aprendizagem, vacilando entre o crescer, que implica segurança e confiança no outro e o permanecer fechado sobre si mesmo, com medo da crítica, do fracasso e do abandono. Isto, ressalto, numa altura em que foi proposta a sua entrada na AX. Mas em 2000, por exemplo, em relatório feito após internamento na AX, embora sendo notada uma maior confiança do jovem, à medida que iam sendo elaborados certos aspectos relativos à depressão precoce que sofria, os contactos com a mãe e com a irmã, ao fim de semana, pareciam ser factores de confusão para o jovem, sentia problemas de identidade e identificação sexual entre os pares, apresentava permanente ausência de limites, bem como de suporte afectivo. Nesta altura é registada a manifestação do U de que não precisa de psicólogo, porque tudo o que acontece de mau ele esquece (cfr., por exemplo, Fls. 125 a 126, do Apenso D). Nesta fase da sua vida descreve de forma idealizada os “amigos” a quem presta serviços ao fim de semana no Centro Comercial (…), na sala de aula apresenta atitudes de descontrolo, é conflituoso, poder de atenção reduzido, confronta com frequência adultos e colegas. Aparenta ser um jovem desgostoso com a sua vida, revelou ansiedade em corresponder às expectativas de quem o estava a observar, ora se descrevendo de forma idealizada, ora desvalorizando-se. Aparenta identidade desorganizada, com dificuldade de integrar dados acerca de si e dos outros, pensamento rígido e rigoroso, sem capacidade para investir a nível afectivo (cfr., por exemplo, Fls. 125 e 129, do Apenso D). Em 2001, numa altura em que estava apenas semi-interno na AX por a mãe o ter retirado da instituição (cfr., por exemplo, Fls. 90 a 92, 119 e 118 do Apenso D), é relatada degradação da sua situação, expressando o U confusão e desorganização do contexto familiar, manifestando conflito entre a “ obrigatoriedade” de permanecer com a mãe e a irmã, doentes, como tentativa de reparação das mesmas e as suas necessidade (cfr., por exemplo, Fls. 73 a 76, 80 a 81, 91 a 102, 116, do Apenso D). Em 2002 continua a apresentar instabilidade emocional, comportamentos desajustados dentro e fora da sala de aula, necessidade de ter um acompanhamento psicoterapêutico e psiquiátrico sistemático, tendo a AX dificuldade em mobilizar a família do U para o apoiar efectivamente (cfr., por exemplo, Fls. 34 a 42, 56 a 58, 63, 67 a 70, do Apenso D). Em 2008, na sequência de Perícia que foi determinada pelo Tribunal – na sequência, por sua vez, de requerimento apresentado pelo arguido A e que foi deferido -, U apresenta, entre o mais: capacidades cognitivas de nível médio, embora tais capacidades sejam mais limitadas, em operações mentais mais complexas que requeiram pensamento conceptual; acentuação da anulação da agressividade; capacidade intelectual de nível médio, mas com alguma limitação, devido a fracos recursos conceptuais e uma personalidade com estrutura frágil e afectividade superficialmente elaborada, onde predomina a centração em si e a autoconfiança como compensação de lacunas relacionais básicas, o que potencia a manifestação de atitudes de tipo anti-social (cfr., Fls. 55.862 a 55.898, dos autos principais, onde o processo apensado passou a ser tramitado após o despacho que determinou a apensação). Ora esta avaliação que aos longo dos anos foi feita de U, bem como o que em 2008 - data embora posterior mas relativamente próxima daquela em que prestou declarações perante o tribunal, foi dito pelos Senhores Peritos quanto à sua personalidade -, foi um instrumento relevante para ajudar o Tribunal a analisar e compreender a forma como o U fez as suas declarações em audiência de Julgamento, com eventual desvio da emotividade esperada. O Tribunal está perante um jovem com “acentuação da anulação da agressividade”, “ capacidade intelectual de nível médio, mas com alguma limitação, devido a fracos recursos conceptuais” e “uma personalidade com estrutura frágil e afectividade superficialmente elaborada, onde predomina a centração em si e a autoconfiança como compensação de lacunas relacionais básicas”. Características que o Tribunal teve que ter em conta na avaliação deste jovem. 2. Assim e preenchendo o que acabo de dizer, U apresentou um discurso globalmente estruturado. A narração dos factos foi feita com uma sequência cronológica e com uma dinâmica de descrição - dando referências quanto a acontecimentos da sua vida e não, em regra, quanto a datas “ só por si”, para localizar os factos no tempo -, da qual resultou uma normalidade e uma naturalidade quanto à efectiva ocorrência dos factos de abuso que o tribunal deu como provados. 2.1. Integrando o que antecede, com aspectos concretos – e para a relevância da prova dos factos constantes nos Pontos 20. a 47., dos “ Factos Provados” e nos Pontos 24. a 33., do “ Factos não provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), - o U apresentou uma narração quanto aos elementos estruturais dos factos – isto é, quanto àqueles que integram a “coluna vertebral” que permite ao Tribunal concluir pela prova ou não prova dos actos de abuso –, que permite ser complementada por documentos existentes no processo e que, na convicção do tribunal, corroboram e dão veracidade ao que diz. O U localiza o seu conhecimento com o arguido A no segundo ano em foi para (...) na AX, para (…) e refere a circunstância de ter ido na carrinha com o arguido, por ter entrado em conflito com um colega, tendo a sua educadora pedido ao arguido para o transportar. De acordo com os elementos dos autos, U entrou entre Agosto e Outubro de 1996 para a AX. A acusação dizia Setembro de 1996, mas se é certo que os documentos de fls. 98 e 105, do Apenso D (do processo apensado), referem o mês de Setembro, também é certo que o de fls. 137 e 139, do mesmo Apenso D, têm apostas datas de Agosto de 1996 e a guia de admissão no FA como aluno interno, de fls. 152, do mesmo Apenso D, tem aposta a data de 1/10/96. Daí o que o Tribunal deu como provado no Ponto 21., dos factos provados. Tendo entrado entre Agosto e Outubro de 1996 na AX, o segundo Verão a que foi a (...) e em (…), foi em 1998 (cfr. Fls. 26 e 27, do Apenso DX dos autos principais, em que constam os mapas dos planos de férias e (...) da AX, mas que em a.j. foi também determinado como elemento de prova para os presentes autos, ao abrigo do artº 340º, do C.P. Penal). Dos elementos dos autos, concretamente dos relatórios da AX, constantes do Apenso D e já referidos e, em particular, do de fls. 131/2 do mesmo Apenso, U era conflituoso com os Colegas, pelo que o pormenor que dá como justificação para ter ido com o arguido A, é normal ter ocorrido. Pelo que antecede, também, o Tribunal ter dado como provada a data do conhecimento do arguido pelo U, ano de 1998 e como “não provada” a data de 1997, referida na acusação. Na dinâmica do seu discurso U diz que, de facto, nessa viagem contou ao arguido A factos da sua vida, mas diz que um contacto mais regular e um conhecimento mais próximo, ocorreu quando foi para o EZ. Ora sucede que U esteve interno em FA de 1996 a 18/05/00, data a partir da qual teve baixa como aluno interno, por a mãe o ter retirado da AX (Cfr. Doc. de fls. 119, 131 a 133, 121 a 130, do Apenso D, do processo apensado). Imediatamente após a mãe o ter retirado da AX passou a frequentar uma escola na área da sua residência e no ano lectivo de 2000/2001 passou a frequentar, como aluno semi-interno, o (...) da AX EZ (Cfr. Doc. de fls. 89 a 92, 98, 105, 118, 115 a 116, 131 a 133 e 121 a 130 do Apenso D, do processo apensado). Esta dilação entre a data em que o U diz ter conhecido o arguido A (Verão de 1998) e a data em que começa um relacionamento mais próximo (ano lectivo 2000/01, como semi-interno), tem mais sentido, atenta a normalidade das coisas, para alguém que conta o que efectivamente aconteceu, não demonstrando preocupação de querer “construir” uma história. Porque mais “ fácil” de enquadrar e sustentar numa “ história” seria dizer, por exemplo, “conheceu-me e não mais me largou”. 2.1.1. U relatou ao tribunal as conversas que teve com o arguido A sobre a sua vida, dificuldades da mãe, ausência de pai. Disse também ao tribunal que foi o arguido A que lhe disse se não o queria tratar por pai, o que diz ter feito, embora esclarecendo que quando era perante terceiros, o tratamento era de padrinho/afilhado. Disse, também, que foi a partir destas conversas, no EZ, que o arguido A lhe passou a dar dinheiro, para si e para entregar à sua mãe e géneros alimentícios. Ora no que diz respeito a este núcleo de factos descritos na Acusação, o relato do U - embora sempre dentro da linha de “serenidade e homogeneidade”, com alguma ausência de emoção que acima assinalei - fez sentido, não só face aos elementos dos autos dos quais resulta o vazio afectivo em que o U vivia, a necessidade de uma figura masculina/paterna de referência, o descontrolo de afectos e de limites, a necessidade de laços familiares e o sentimento de necessidade de “reparação” para com a mãe e a irmã, as necessidades económicas da família, como face a depoimentos que foram prestados em audiência de Julgamento. De facto, quer os relatórios, quer os documentos de fls. 125 a 129, fls. 90 a 92, fls. 73 a 76, 80 a 81, 91 a 102, 116 (do Apenso D, do processo apensado) - os quais, no Ponto 1.1., o Tribunal já fez a reprodução de algumas passagens relevantes para a análise que está em causa -, contribuem para a conclusão de que a fragilidade emocional e familiar, a desorganização como pessoa, a ausência de projecto de vida do U era tanta, que difícil era um jovem com, na altura (2000/01) 13/14 anos, com tais necessidades, “ não se agarrar” a quem lhe dava atenção e ajudava a mãe, no caso concreto o arguido A. Pelo que, atenta a normalidade das coisas, nestas situações, se as conversas e as ajudas se vão mantendo, naturalmente foi-se criando uma relação de maior proximidade entre o U e o arguido A e vice versa, embora, cada um com motivações diferentes. E o arguido A, ao continuar essas conversas e ao dar dinheiro ao U e à sua família, forçosamente apercebeu-se da carência afectiva do U, quis estabelecer uma maior proximidade, da qual é expressão o facto de lhe ter pro(...) que o tratasse por pai. Acresce que, quanto ao tratamento por “pai”, resultou também do depoimento da testemunha ZI(Educadora da AX, no EX e tendo estado também o lar de FZ de 1980 a 2002), que isso era normal acontecer na AX. Quanto ao dinheiro e géneros alimentícios - que o Tribunal deu como provado o arguido ter dado ao U e a mãe -, tal resultou não só da, já referida, declaração do U e da dinâmica da declaração, como da corroboração que, nesta parte, para o tribunal foi feita em audiência de julgamento por HC e por NG – respectivamente mãe e irmã de U. 2.1.2. Há, no entanto, um aspecto a ressaltar e tem a ver com o que consta no Ponto 28, dos “Factos Provados” e no (também) Ponto 28, dos factos “ Não provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U). Pelo que já ficou dito e pelo que transpareceu das avaliações que foram sendo feitas ao U na AX (cfr. Ponto 1.1. e reprodução de algumas passagens), o U tinha carência de modelos de identificação, de figuras familiares de referência e de figuras que lhe dessem estabilidade, problemas de identidade e identificação sexual entre os pares, pelo que é natural ter querido tratar o arguido A por Pai. O arguido A, atenta a normalidade das coisas nestas situações de “ estabelecer relações”, se foi fomentando e mantendo as conversas e as ajudas, criando naturalmente uma relação de maior proximidade com o U, foi-se apercebendo das fragilidades e carências afectivas do U, querendo, repetimos, estabelecer essa maior proximidade, da qual é expressão o facto de lhe ter pro(...) que o tratasse por pai. Mas das declarações do U não resultou para o Tribunal que o U “visse” o arguido A como um verdadeiro pai, como uma verdadeira figura parental securizante. Quando relatou ao tribunal os factos que se passaram numa ida à Praia – o arguido A ter-lhe tocado no pénis, metendo as mãos dentro dos calções -, ou numa ida a (…) – em que o arguido A praticou actos de penetração oral e anal no U -, a perturbação ou os sentimentos revelados, a forma como se exprimiu foi de quem sofreu perturbação (o U utilizou mesmo a expressão nojo, quando se referiu aos actos de (…)) mas não exprimiu o sentimento, a raiva ou a desilusão que seria espectável, se sentisse a ofensa como vindo de uma pessoa que o U tivesse “adoptado como um verdadeiro pai”. Assim e por exemplo, de acordo com o que o U exprimiu em audiência de julgamento e que o Tribunal veio a dar como provado no Ponto 36., dos factos provados (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), após o que se passou nesse dia o U estranhou tal atitude e ficou confuso, mas continuou a viajar com o arguido. E continuou porque, mesmo apesar de, nas suas palavras, não saber se aquilo era normal ou não, A era a sua companhia. Há que ter em atenção a vivência e o percurso familiar deste jovem, pois ele é, naturalmente, uma expressão disso. Resulta, por exemplo, do relatório de fls. 105 a 108 do Apenso D (do processo apensado), relatório este datado de 8/06/01, data contemporânea daquela em que ocorreram as idas à praia, e da informação de fls. 98 a 102 do Apenso D (do processo apensado), a família do U continuava com dificuldades de organização, incapacidade de orientação educativa do jovem, mãe e irmã doentes do foro psiquiátrico, o U com falta de controlo, frequentemente a recorrer a provocações e conflitos mas, em relação ao “ Adulto”, procura-o numa busca de apoio e afecto. 2.2. Continuando com a análise do depoimento do U, temos que quanto aos factos que o tribunal deu como provados e que consubstanciam a prática de actos de natureza sexual - concretamente os que constam nos Pontos “34.” e “35.”, e “40.” e “41.”, dos “ Factos provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U) - , quanto à localização dos primeiros (Cfr. Pontos 34. e 35., dos factos provados), o U disse ao Tribunal que tais factos passaram-se numa altura do Verão, já não estava em tempo de aulas e foi no mesmo Verão (mas antes) de ter ido a (…) com o arguido. Disse, também, que tal verão foi aquele em que deixou de estudar no EZ, tinha acabado de sair de EZ, tendo transitado para o EY. Esta afirmação do U tem particular relevância porque quando fala dos factos que se passaram em (…), começa por dizer que se passaram no ano de 2002, tendo depois declarado que não tinha a certeza, não conseguia precisar o ano. Mas manteve, sempre, durante instância e contra instância a que foi sujeito, a certeza no seu discurso quanto à ocorrência e sequência da ocorrência dos actos da (…) e de (…): no mesmo Verão, mas primeiro idas à (…) e depois ida a (…). De acordo com os elementos dos autos, nomeadamente dos documentos constantes de fls. 36 a 39, 40 a 42, 56 a 59, 67 a 70, 73 a 76, 80 a 81, 95 a 96, do Apenso D (dos autos apensados), o U no ano lectivo 2000/2001 esteve a estudar no EZ e no ano lectivo de 2001/2002 passou a estudar no EY, integrando um Curso Técnico Profissional de Nível 1, de pintura e construção civil. Assim e tendo em atenção que a queixa que deu origem aos presentes autos foi apresentada em 3 de Setembro de 2001 (cfr. Fls. 2 a 4, dos autos apensados), resulta que os factos passaram-se em 2001. A incerteza do U quanto ao ano em que os factos ocorreram – pois começa por dizer 2002, para depois dizer que não tem a certeza -, é uma daquelas situações em que estando equivocado quanto à memória que tem da data, não está equivocado quanto ao momento na sua vida em que se passaram os factos: no Verão em que deixou de estudar no EZ, tinha acabado de sair de EZ e transitado para o EY, primeiro passaram-se os factos da (…) e depois a ida a (…). Isto é Verão de 2001. 2.2.1. Em relação a (…) U diz que passou duas noites na casa onde foi abusado, tinham ido para um casamento que era dias e os factos passaram-se na primeira noite. Este relato do U diverge do que consta na acusação, que apenas refere uma noite em (…) e diz que os factos passaram-se na noite de 25 para 26 de Agosto. Mas é também uma daquelas situações que acima referi, em que a sequência cronológica, a dinâmica da descrição, a forma como o discurso do U fluía, deixava emergir uma linha sequencial de verdade no que estava a dizer. Com efeito, o documento de fls. 1058 (dos autos Apensados) refere a data do casamento, em (…), no dia “ 25 e 26 de Agosto”, com jantar no dia 25 e almoço no dia 26, dias estes que no ano de 2001 foram respectivamente, sábado e Domingo. O U disse que foram no dia 24 para (…) e voltaram no dia 26, no dia em que se vieram embora de (…) ainda foi com o arguido A ver um jogo de futebol no AX (...) , pelo que, sendo normalmente os jogos em dias de fim de semana, a sua declaração leva a concluir que o regresso para (…) ocorreu, de facto, no dia 26 de Agosto, Domingo. Quanto a se pernoitaram uma noite ou duas em (…), ouvidas em audiência de julgamento as testemunhas EEA e PO - os donos da casa onde o arguido A ficou com o U -, EEA disse que só dormiram uma noite lá em casa e PO disse que dormiram duas noites, pois estiveram lá três dias, mas não se conseguindo lembrar da data. U foi seguro quando disse que dormiu duas noites naquela casa, disse que os factos aconteceram na primeira noite e deu a descrição do que fez enquanto lá esteve – a dona da casa levou-o a ver animais, na manhã seguinte ao factos acontecerem. E se esta memória quanto às noites que passou em (…) e ao momento em que ocorreram os factos não fosse uma memória sua, de algo vivido e que tinha presente, U poderia ter “ ido atrás” da versão que está na acusação, que apenas refere uma noite e que os factos passaram-se na noite de sábado (dia 25) para Domingo (dia 26). Assim e conjugados todos estes elementos e depoimentos – e tendo em atenção que o casamento foi dois dias -, o Tribunal criou a convicção de que a versão dos factos dada pelo U, quanto ao número de noites que passou em (…) e quanto à noite (a primeira em que lá esteve) em que ocorreram os factos, corresponde ao que efectivamente aconteceu. Daí ter dado tal versão como provada e, consequentemente, que os factos descritos pelo U passaram-se na noite de 24 para 25 de Agosto e como não provada a versão constante da acusação. 2.2.2. Outro pormenor que contribuiu para a convicção do tribunal quanto aos factos passados em (…), tem a ver com a descrição da casa e locais onde dormiam. Embora facto meramente instrumental, considerando a forma como em audiência de julgamento a defesa do arguido A pôs em causa o conhecimento da casa por parte do U, a descrição que este veio a fazer quanto à casa, o local onde tinha a sua cama para dormir, o local onde o arguido A tinha a respectiva cama, que foi coincidente com a descrição das (já referidas) testemunhas PO e EEA, foi um factor concorrente para a sua credibilidade. Aliás, nem o U referiu – como refere a acusação – que foi o arguido A que logo de inicio insistiu para que dormissem na mesma cama. U declarou sempre que cada um tinha uma cama e por causa da trovoada, por estar com medo, é que foi para a cama do arguido, por insistência do arguido A. Ora quanto às circunstâncias da “ passagem “ do U para a cama do arguido A, U disse que após terem-se deitado levantou-se com medo, a senhora da casa apareceu, A também, a dona da casa perguntou-lhe se queria ir dormir para o seu quarto, A diz que o U vai para o local onde o arguido estava a dormir (uma sala em que foi posta uma cama para o arguido dormir, de acordo com o depoimento da testemunha EEA e das declarações de U) e o U disse “ tanto faz”. Ouvidos os donos da casa em audiência, EEA disse que nessa noite não se levantou, o U teve medo da trovoada mas isso foi antes de se deitarem e não deu que em alguma circunstância o jovem tivesse ido para a cama do arguido. O seu marido, PO, disse que deitaram-se por volta das “ 11 horas”, a mulher levantou “ logo a seguir”, “ uma hora, não sabe”, “ porque o miúdo estava assustado”. O Tribunal não ficou com a convicção de que EEA estivesse a mentir, mas que, de forma genuína, não se recordava do que acontecera naquela noite. E o Tribunal ficou convicto que, de facto, corroborada de alguma forma pelo testemunho de PO, a memória do U quanto à sequência do que se passara na primeira noite que dormiu em (…) e em que ocorreram os abusos, estava certa. 2.2.3. Acresce que o relato dos actos que o Tribunal deu como Provados, no Ponto 41. dos “ Factos provados” (os factos passados em (…)), foram descritos pelo U de uma forma que, não deixando transparecer um grau de emotividade que à partida fosse óbvio – como aconteceu com outros assistentes que o tribunal ouviu em audiência de julgamento -, teve uma descrição que deixou transparecer dor. O U descreveu que quando o arguido A começou a encostar-se a si, tentou chegar-se para a frente, até não conseguir mais por ter ficado encostado contra a parede. Disse ao tribunal que foi a resistência que tentou, que ficou em estado choque, que teve dor com a penetração anal. Foi, sempre, no registo mais ou menos constante de “ serenidade” e “homogeneidade” que acima já falámos. Mas, da observação que o Tribunal fez, naquele momento o seu comportamento deixou transparecer sofrimento, que viveu algo de mau. 2.3. Assim e porque neste momento o que antecede, na avaliação do Tribunal, já permite reconduzir ao que acima disse - quanto à luz sob a qual o Tribunal avaliou e identificou as atitudes do U na audiência -, uma pessoa com as limitações a nível das capacidades cognitivas que a perícia de fls. 55.862 a 55.898 assinalou, teria dificuldade em manter a atitude que demonstrou perante o tribunal ao longo do seu depoimento, se não estivesse a relatar situações vividas. No caso deste jovem, a ressonância que emerge das suas declarações - e da forma como as prestou em Tribunal - com a situação vivida, advém não obviamente de uma linguagem corporal ou expressão de emotividade, como acontece na maioria das situações que se deparam ao tribunal, mas, repetindo, da estrutura narração em si. A imagem que o Tribunal pode dar do que, globalmente, resultou da imediação com o U na audiência de julgamento, é que se aplicarmos um filtro, por exemplo, à sua narração dos factos ocorridos em (…) e fizermos emergir toda a factualidade que forma a espinha dorsal da situação do abuso, a narração tem uma sequência lógica e globalmente coerente, atenta a normalidade das coisas: estava uma noite de trovoada, U teve medo dos trovões; a dona da casa naturalmente levanta-se e pergunta se o U não quer ir dormir para o seu quarto – era um miúdo que estava ali… -; A diz que vai para o seu quarto, deitam-se, começa a empurrar o U de encontro à parede e ocorrem os actos de penetração oral e anal. U narrou os factos de forma que, face ao encadeamento da descrição em si, deixam transparecer que foram reais, de alguém que os viveu assim. É certo que, por vezes, U apresenta um discurso muito elaborado, preenchido com justificações e com a tentativa de dar uma imagem positiva da sua pessoa. Por exemplo, quando descreve que a senhora da casa perguntou-lhe se não queria ir dormir para o seu quarto, o U disse que não foi pois “ …. se fosse para o quarto da senhora ia incomodar um pouco a privacidade dos senhores e uma coisa que sempre me ensinaram é que cada pessoa tem a sua privacidade e eu não queria incomodar a privacidade dos senhores… e deixei ir para o quarto do arguido A…”; ou quando fala de duas caçadeiras que viu na parede do “ quarto” onde estava o arguido a dormir, transmitindo a ideia de que não reagiu por medo; ou quando fala de um telemóvel que mantinha na manga, para o caso de precisar, dizendo que, a partir do momento em que teve telemóvel, teve-o sempre ligado à noite, por causa da mãe que era doente… ; situações em que o Tribunal teve que dizer-lhe que não precisava de se justificar. Mas isto são, na avaliação do Tribunal, expressões do que acima foi reproduzido da avaliação dos Senhores Perito que observaram o U, concretamente expressão de “ … uma personalidade com estrutura frágil e afectividade superficialmente elaborada, onde predomina a centração em si e a autoconfiança como compensação de lacunas relacionais básicas, o que potencia a manifestação de atitudes de tipo anti-social …” (cfr., Fls. 55.862 a 55.898, dos autos principais, onde o processo apensado passou a ser tramitado após o despacho que determinou a apensação), ou dos técnicos que acompanharam o crescimento do U, que sinalizaram uma “ … ansiedade em corresponder às expectativas de quem o estava a observar, ora se descrevendo de forma idealizada, ora desvalorizando-se…” (cfrs. Por exemplo, Fls. 125 e 129, do Apenso D, do processo apensado). O que emerge para o Tribunal, da avaliação de tudo o que ouviu e da imediação, do “ como ouviu”, é uma narração globalmente estruturada, com uma sequência e dinâmica de descrição dos factos; dando referências para localização dos factos no tempo, no espaço e em relação a acontecimentos da sua vida; com uma normalidade de descrição da dinâmica dos actos essenciais do abuso, com um fio condutor, da qual resultou, em consequência, uma credibilidade quanto à efectiva ocorrência dos factos e dos actos de abuso que o tribunal deu como provados. 2.4. Há, também, que fazer referência aos factos que o tribunal deu como provados nos Pontos 31., 32., 33. e 38. dos “ Factos provados” e nos Pontos 25., 26. e 33., dos “ Factos não provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ Factos Não Provados/ U). Das declarações do U, da sua mãe HC e da irmã NG, resultou sem qualquer dúvida que as deslocações do U à (…) ou a (…), com o arguido A, eram do conhecimento da mãe do U e com o seu consentimento e que a mãe do U sabia que o arguido A trabalhava na AX. No entanto o Tribunal não deu como provado os factos constantes dos Pontos 25., 26. e 33 dos “ Factos não Provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ Factos Não Provados/U). Vamos então ao que o U disse e explicações que deu, quanto à ajuda económica do arguido à sua família e ao conhecimento que a mãe tinha do arguido A e ao que a sua mãe também disse. Quando o U relatou ao tribunal o dinheiro que o arguido A dava para a sua família – os 5.000$00, mais os 1.000$00 para si e que o U disse que dava à mãe – e a ajuda com alimentos, o Tribunal perguntou-lhe, concretamente, se a mãe não pediu para falar com o arguido, se não o quis e foi conhecer, qual foi a reacção da mãe na primeira vez em que o U lhe entregou o dinheiro dado por A, quais foram as reacções seguintes. E, aqui, as resposta do U foram, na avaliação do Tribunal, uma sucessão de justificações da mãe, preocupação de valorização da imagem desta, de “ desculpabilização” da mãe. Aqui houve expressão de sentimento, pois foi patente a preocupação e o cuidado em preservar a imagem da mãe. A título de exemplo e ilustrando o que foi a reacção do U neste aspecto, diz que a mãe e a irmã conheciam A “só de ele falar”, “ salvo erro” a mãe deve de o ter visto uma vez que o foi levar à carrinha para uma (...), a mãe “ só falou pelo telefone” com A, a mãe dizia para ele (U) convidar o A “para um dia ir lá a casa”, mas ele (U) esquecia-se de o convidar. Quanto à reacção da mãe - em relação ao dinheiro que o U trazia para casa e ao U sair com o arguido A -, desdobrou-se em justificações elaboradas: a minha mãe, como sabia que ele trabalhava na AX e que lidava com crianças, pensava que eu estava seguro; perguntado como é que a mãe sabia que A lidava com crianças, responde “ … por eu lhe dizer que trabalhava na AX…”. Em relação ao dinheiro, A sabia das dificuldades económicas “ por eu lhe dizer”; a minha mãe “ pensava que também era gentil da parte dele” dar o dinheiro, “ como ela me disse”, mas perguntava sempre “... ele pediu-te alguma coisa para fazer isso? E eu dizia a verdade, que não”; a minha mãe “achava estranho… mas ela também precisava”; “ achava estranho A dar-me o dinheiro” e perguntado pelo tribunal porque dizia isso, respondeu “ porque como se costuma dizer, ninguém dá nada a ninguém. Quando a esmola é demais o pobre desconfia. Mas como a minha mãe pensava, como ele sabia as nossas dificuldades económicas, ajudava-nos, como tenho uma vizinha que nos ajuda…”. Em audiência de julgamento a mãe do U, a testemunha HC, disse que conheceu A nos anos 90, precisando noutro momento 1999 e que o conheceu ao pé da sua residência. Cruzando estas declarações com os elementos que constam nos autos, quanto ao crescimento e vivência familiar do U, temos, por exemplo, que no relatório de 31/07/95, feita pela AX com vista ao ingresso do jovem na instituição, é referido que o U, de 8 anos de idade, vivia com a mãe, numa família desorganizada e que, por isso, tinha sido objecto de intervenção social, o jovem nunca encontrou no meio familiar padrões de referência (cfr. Doc. de fls. 147 a 149, do Apenso D, do processo Apensado). No relatório da AX de 3/05/2000, numa altura em que a mãe retira o U do internato da AX, é referido, quanto à sua situação familiar, que a mãe não exerce actividade profissional, está abrangida pelo rendimento mínimo garantido, a relação que a família mantém com os adultos que acompanham o filho no (...) é conflituosa, desautoriza educadores (cfr. Doc. de fls. 131 a 133, do Apenso D, do processo Apensado). Na informação para o Tribunal de Família e Menores de 15/11/00 e relatórios anexos – numa altura em que o U vive com a mãe, mas estando a frequentar, em semi-internato, o EZ (cfr. Doc. de fls. 119 e 118, do Apenso D, do processo Apensado) - é dito que o U vive com a mãe e com uma irmã, a mãe beneficiária do Rendimento Mínimo garantido, ambas doentes do foro psiquiátrico, a relação da mãe com o (...) é conflituosa, desautorizando a equipa educativa, o Fábio esteve internado durante 4 anos na AX e manifesta dificuldades de adaptação e acatamento de regras. À segunda feira apresenta-se ansioso e instável, tem havido dificuldade em entender como é organizado o quotidiano da criança. A mãe desvaloriza junto do filho a intervenção da equipa de saúde mental, tendo uma atitude considerada bloqueadora da relação psicoterpêutica do filho. É pedido ao tribunal o internamento do jovem e em zona de difícil acesso da mãe, de forma a restringir a influência negativa que tem no filho e junto da estrutura enquadradora (cfr. Doc. de fls. 121 a 130, do Apenso D, do processo Apensado). No relatório de 28/01/02, mais uma vez referidas as dificuldades da família a nível organizativo, dificuldade do U em acatar instruções e ordens do (...), o U foi sujeito a uma penalização, na sequência do que a encarregada de educação telefonou para a Assessoria do (...), acusando de não proteger o filho. São relatados incidentes no comportamento do U e é descrita a reacção da mãe, em reunião havida no (...), dizendo que o filho fez bem pois a mãe teria feito pior. O relatório refere que nessa mesma reunião e por causa dos valores que eram transmitidos ao jovem, a estupefacção das pessoas presentes perante a afirmação da mãe do U, que autorizava e incentivava o filho a ver filmes pornográficos de um canal da TV cabo, afirmando que lhe fazia bem (cfr. Doc. de fls. 36 a 39, do Apenso D, do processo Apensado). Tudo avaliado, o Tribunal não teve qualquer dúvida que a mãe do U não tinha uma relação de confiança e respeito institucional ou funcional pela AX. O facto de A ser funcionário da AX não era, só por si, nem para si, motivo gerador de plena confiança, de o considerar uma pessoa de bem e, por isso, confiar-lhe o filho. Acresce que o Tribunal ficou convicto que a mãe do U viu uma, no máximo duas vezes, o arguido A, mas não teve com o mesmo conversas sobre o filho ou sobre o acompanhamento que o arguido fazia ao filho. O deixar o filho andar com o arguido A e deslocar-se a (…), não foi por causa da AX, ou das funções que o arguido exercia na AX. E não há elementos que objectiva ou subjectivamente, levem o Tribunal a concluir que a mãe do U fez mesmo um juízo de valor sobre a pessoa, sobre a personalidade do arguido A e que foi na sequência disso que decidiu deixar o seu filho andar com o arguido. O U trazia dinheiro para casa, que era dado pelo arguido e o dinheiro era preciso em casa. As próprias declarações do U e já acima reproduzidas, são esclarecedoras quanto ao que, efectivamente se passava: a minha mãe “achava estranho… mas ela também precisava”. Para o Tribunal, não foi produzida prova em audiência de julgamento que permita concluir mais do que o que antecede. 3. Há, contudo, quanto ao U, factos enunciados na acusação e imputados ao arguido e que o tribunal deu como “não provados” , como são, por exemplo, os Pontos 27., 30., 32. e 33., do Factos “Não provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ Factos Não Provados/U) e alguns estão em estreita ligação com outros ocorridos nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar que o tribunal deu como “ provados”. São, contudo, factos que o U não descreveu – por exemplo, o facto constante do Ponto 27, dos factos “não provados”, em que o U disse que nas deslocações a praias apenas sucedeu o que relatou, quando tinha os calções rasgados -, ou não descreveu com o pormenor ou com as particularidades que estão descritas na acusação – por exemplo, os factos constantes dos Pontos 30., 32. e 33, dos factos “ não provados”. No que diz respeito à conversa que o arguido A teve com o U, aquando do regresso de (…), o declarante nada acrescentou quanto ao tom da voz, que levasse a concluir que ficou receoso de contar à mãe. Aparentou ao tribunal, tendo em atenção o seu discurso – que se limitou a encolher os ombros, quando o arguido falava consigo -, que o sentimento era de não querer falar e não de medo. Quanto ao aspecto do dinheiro, o U disse que depois de (…) não quis receber mais dinheiro do arguido. Assim e mesmo tendo em conta os demais depoimentos que foram prestados em audiência de julgamento quanto aos factos descritos na acusação – e na medida em que tais depoimentos pudessem contribuir para a prova destes factos dados como não provados -, os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitem uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência e, em consequência, os factos que o tribunal deu como “ não provados” em relação ao U. 4. Por último, o Tribunal deu como provados os factos relativos à data de nascimento do U, com o documento de fls. 135, do Apenso D (do processo apensado). Para os factos constantes nos Pontos 21 a 23, do factos Provados (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), e para além do que acima já foi analisado, foram igualmente relevantes os documentos de fls. 2 a 162, dos Apenso D (do processo apensado). Para os factos do Ponto 46, dos “ Factos Provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), foi igualmente relevante o relatório de fls. 15 a 18 (do “ Processo Apensado”). Quanto aos factos do Ponto 47, dos “ Factos Provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), resulta dos autos que o U, pelo menos desde os oito anos, teve acompanhamento pedopsiquiátrico e psicopedagógico (cfr., por exemplo, Documentos de fls. 144 a 149, do Apenso D, do processo apensado, Documento de fls. 55.862 a 55.898, dos Autos principais, onde o processo apensado passou a ser tramitado após a despacho de apensação, 140 a 142, 125 a 129, 91 a 102, 73 a 76, 80 a 81, 116, 34 a 32, 56 a 58, 63, 67 a 70, do Apenso D, do processo apensado). Para o acompanhamento a que se refere o documento de fls. 514 e 515 (dos autos Apensados) – e até à data aposta em tal documento, 7/02/03 -, tendo em atenção os actos de abuso que o Tribunal deu como provados e considerando o que resulta dos documentos referidos no parágrafo anterior, nomeadamente a fragilidade do U, os factos praticados pelo arguido A foram causa concorrente, mas não causa exclusiva, do acompanhamento que o U continuou a ter após o verão de 2001. Quanto aos factos constantes no Ponto 48, dos “ Factos Provados” (cfr. “Processo nº 1718/02.9JDLSB-F – Processo Apensado/NUIPC 3137/01.5JDLSB/ I - Factos Provados/ U), foi também relevante o documento de fls. 2 a 4 (do Processo Apensado), conjugado com as declarações do U e das testemunhas HC (mãe de U) e NG (irmã de U). (D) – Dos factos relativos ao assistente V: 1. Começando pela fundamentação dos factos relativos à entrada e vivência do V na AX, data de entrada, lar onde esteve, referências familiares e vivência familiar, foram relevantes os elementos constantes do “Apenso C”, fls. 73 a 96 - Apenso contendo documentos clínicos sobre o V, relatório psicológico e relatório social feito pela AX -, do “Apenso B”, fls. 2 a 105, encontrando-se a fls. 40 cópia do assento de nascimento do assistente - Apenso contendo cópia do processo de tutela do V -, e do “Apenso G”, fls. 2 a 111 - Apenso contendo documentos referentes ao processo de tutela do assistente, mas também ao processo individual na AX, incluindo entrada do assistente e elementos familiares -. Tais documentos foram valorados globalmente face às declarações do assistente e da prova testemunhal produzida em relação ao V. Assim, a testemunha HHJ, educadora na AX, disse ao Tribunal que nessa qualidade teve contacto directo com o assistente e a sua vivência na instituição. A testemunha QE - psicóloga, mas que disse ao tribunal não ter tido qualquer relação terapêutica com o V, por não ser essa a área em que estava integrada -, falou do conhecimento e contacto que teve com o educando, sobre a sua vivência na AX, pois esteve integrada na equipa “técnico educativa” do internato de FA para onde o V passou, depois do BE (tendo esclarecido que quando o educando precisava de acompanhamento psicoterapêutico, tal acompanhamento era feito por clínicos externos à instituição). Disse que o conheceu no princípio de 2002, quando o educando foi do internato de BF para o HHF. Esclareceu que o V é um jovem que intelectualmente tem um deficit cognitivo, tem menos 3 ou 4 anos que o nível de desenvolvimento normal para a sua idade. A intervenção da testemunha junto do V foi ao nível da orientação escolar, pois por causa do seu deficit cognitivo apesar de ter feito o 9º ano, não o fez com todas as competências, mas sabe ler e escrever. O depoimento desta testemunha, no que diz respeito às capacidades cognitivas do V, foi corroborado pelo teor do relatório clínico feito por (...) do HHB e que se encontra a fls. 73 a 75, do “Apenso C”. Deste relatório resulta, entre o mais, que apesar de na altura em que foi observado ter 16 anos, aparenta uma idade inferior à real, tem um atraso estato-ponderal, com discurso e postura que não são consonantes com a sua idade cronológica, sofrendo de “debilidade mental”. Da valoração global destes dois elementos – depoimento da testemunha QE e do relatório citado – os factos que o Tribunal deu como provados no “ponto 53.” dos “factos provados”. No entanto de tal relatório não resulta a medida concreta da “inferioridade” do assistente, em relação à idade cronológica. E não resulta também que em função da debilidade que sofre, que o limita, o V tenha uma total incapacidade para reagir ou avaliar os actos que o Tribunal concluiu que o arguido A praticou na pessoa do V, razão pela qual o Tribunal deu como “não provada” tal matéria. 2. Passemos, então, a analisar a prova quanto aos factos que o Tribunal deu como provado, em relação aos actos praticados pelo arguido. O arguido A não admitiu a prática destes factos (cfr. AJ 14/11/05). Disse ao tribunal conhecer “muito bem” o V e a irmã desde que entraram para a AX, pensando mesmo que foi o arguido que os levou à primeira consulta com a assistente social. O V andava numa escola especial, teve problemas no lar quando tinha 14/15 anos, pois “violou um rapaz mais novo”. Destas declarações, que foram prestadas depois de o assistente ter prestado declarações, o Tribunal ficou convicto que o arguido sabia efectivamente quem era o V e as suas características específicas: quer a idade, acompanhou-o logo na entrada e faz referência a um episódio nos 14/15 anos do educando, quer o seu atraso, pois sabia que andava numa escola especial (cfr. quanto a este facto documento de fls. 36.518 a 36.520, fls. 76 a 84 do “Apenso C”). Disse que não dormiu na (...) onde os factos lhe são imputados, pois dormiu foi na carrinha. Andou a jogar com os jovens à bola, mas não foi à sala onde dormiam. Acrescentou que não se recorda se deu dinheiro ao V, “...posso ter dado... mas não me lembro...”, declaração que o Tribunal interpretou com este sentido. Para o arguido não era estranho o dar dinheiro ao V, no caso concreta é que não se recorda se deu ou não. E conclui dizendo que o V foi instruído por alguém para o acusar. 2.1. O V foi ouvido pelo Tribunal através de videoconferência. Começa a responder por responder ao Tribunal essencialmente através monossílabos e com “sins”, revelando alguma dificuldade de orientação no tempo. Diz que quando foi para a AX estava no 5º ano e que “agora está no 9º”, sendo que pelos elementos de fls. 79 a 84 do Apenso C, resulta que quando entrou para a AX (Novembro de 1997) estava no 3º ano, a transição para o 5º ano ocorreu no ano 2001/2002. Pelo Tribunal foi perceptível as pessoais limitações perceptivas/cognitivas do V. Assim, depois de lhe fazermos algumas perguntas sobre a família mais próxima, o Tribunal começou por perguntar ao assistente se tinha ido a (...), disse que sim, recordava-se de ter ido ao (…), lembrava-se de ter ido a mais (...) mas não se recordava de mais nomes, não se conseguindo recordar também dos nomes dos Colegas. No entanto percebíamos que o V, apesar de responder de uma forma monossilábica, compreendia o que lhe estava a ser perguntado. O Tribunal perguntou-lhe se conhecia “ o sr. A” e o V responde “...é o A...”, dizendo que o conheceu na (...). Não se recorda como o conheceu, “... ele depois foi na carrinha...”. Na sequência de perguntas que iam sendo feitas, sobre se tinha visto o arguido em algum sítio, se tinha estado com ele em algum sítio, disse que esteve com o arguido dentro de casa, já à noite. E, num relato com silêncios, com pausa, com resposta com “Sins”, o Tribunal perguntou-lhe onde é que se lembrava ter “ estado com o sr. A”. Não responde e mantém-se em silêncio. Perguntámos-lhe se estava a penas, responde “sim”, mantém silêncio, dizendo-lhe o tribunal para, aos “bocadinhos” ir contado do que se lembrava. E disse que se lembrava de o arguido ter dormido lá consigo, “num quarto”, corrigindo para “numa sala”, aquilo era mais uma sala”. Dormiram nos colchões, estavam colegas, os educadores não dormiam ali. O arguido dormiu ao pé de si e de um colega, mas “estava perto de mim”, não havia colchão no meio. O Tribunal perguntou-lhe se tinha acontecido alguma coisa, responde “sim”, perguntado o que foi, silêncio. Perguntado de novo (foi o quê?), deu uma resposta que - devido a dificuldades de acústica da sala, mas que pela audição da gravação foi perceptível que a sua resposta foi “ pôs-me a pila no rabo” - , o Tribunal percebeu “pôs-me a mão no rabo”. O Tribunal disse-lhe “ pôs a mão ...” e o V atalhou, de forma rápida, viva: “Não foi isso que eu disse!”. Acrescentando: “ Foi a pila”. E explicou, de forma faseada, que estava a dormir, acordou nessa altura – e na instância da Defesa do arguido A, a perguntas desta Defesa e do Tribunal - , que sentiu dor (quando o arguido lhe “pôs a pila no rabo”), perguntado se dor “forte” ou “pequena” e respondeu “ forte”, quando acordou “não viu nada”, “só sentiu a pila no rabo”, e viu o arguido A. Disse, também, que o arguido disse-lhe para não dizer nada e que não disse à educadora porque “... ele batia-me se eu dissesse...”. E que no fim da (...) deu-lhe dinheiro para comprar doces (o que foi admitido como possibilidade pelo arguido, nos termos que acima indicámos). Foi um depoimento em que o assistente revelou dificuldade em contar o que se tinha passado consigo. E apesar da debilidade mental que foi perceptível, o que dificultou a comunicação ou a expressão do assistente – por vezes dava as respostas de forma inexpressiva, com alguma apatia -, a vivacidade que revelou, a intervenção rápida e expressiva a corrigir o que tinha sido a percepção do Tribunal quando ele (“finalmente”, dado os silêncios que tinha tido até aí) tinha contado “ o abuso”, criaram no Tribunal a convicção que estava a contar uma situação ocorrida consigo e com o arguido. E que essa situação envolveu penetração anal do assistente pelo arguido, dada a forma como descreveu o acto, a dor que sentiu. Tendo ficado efectivamente com receio que, se contasse o que se tinha passado, o arguido batia-lhe (o que é plausível, atenta a natureza da debilidade mental do assistente, que é um defict cognitivo com idade mental inferior à real, que tenha levado mais “a sério” essas palavras do arguido, do que um rapaz que não tivesse qualquer limitação). Quanto à localização dos factos no espaço, das declarações do assistente não resulta, sem margem de dúvida, que tenha sido na (...) no (…), embora tenha sido seguro para o tribunal que foi na (...) de Verão da AX e pelo discurso do assistente discurso depreendeu-se no (…). Assim e quanto à localização dos factos quer no espaço, quer no tempo, foi relevante o depoimento da testemunha HHJ (educadora do lar do FA, para onde o V transitou em Janeiro de 2002 – cfr. fls. 76, do Apenso C), a qual contou ao Tribunal o comportamento que o V teve no lar, quando na televisão estava a dar uma entrevista do arguido A (dizendo a testemunha que essa entrevista fora dada antes de ser preso e lembrava-se de uma imagem do arguido com um blusão vermelho, a dizer que não tinha feito nada). O V até aí não tinha dito nada e naquele momento disse “mentiroso”, referindo-se ao arguido A. Falou com o V, o qual (cabisbaixo), disse-lhe que o arguido era “um grande mentiroso”, que já lhe tinha feito “mal”, já lhe “tinha ido ao rabo”. Foi numa (...), mas não lhe disse o nome da (...), tendo referido as educadoras JI e ZC nessa (...). Foi consultar os registos das (...) e relacionou o relato do V – associado a uma fase de maior perturbação porque passou -, a (...) do BE, no (…), no Verão de 2001 (cfr., quanto a registos das (...), fls. 418 e 419 dos autos apensados e Apenso DX, fls. 49, a qual decorreu de 1/08/01 a 30/08/01, em (…), no (…), não estando referido (…), razão pela qual o Tribunal não considerou suficientemente assente que os factos tenham ocorrido concretamente no (…) e concretamente no mês de Setembro ). A perturbação e a alteração em termos comportamentais do V face às notícias, o que verbalizou, o que foi testemunhado pela educadora e na altura em que o foi – quando estava a passar uma entrevista do arguido A, a falar sobre os factos que na altura eram noticiados e consigo relacionados -, são próprias de quem está a ter uma reacção espontânea, um impulso em consequência de alguma coisa verdadeira, o que veio a descrever ao Tribunal ter acontecido com o arguido A. E tendo em atenção o que resultou nos autos quanto à debilidade mental do V, não se nos afigura verosímil que tal reacção tivesse correspondido a uma reacção preparada e fingida. Não tinha, na avaliação do Tribunal, capacidade para tal. Quanto à prova dos factos constantes no ponto “59.” dos factos provados, foi relevante o documento de fls. 436 a 444 dos autos. No entanto e atento o teor do relatório de fls. 79 a 84, do “Apenso C” – em que é referida, apesar de não ter sido confirmada pelas testemunhas que foram ouvidas pelo Tribunal, uma situação em que o V terá sido abusado, com acto de penetração anal, por um educando mais velho -, a matéria que o Tribunal deu como “não provado” no ponto “38” dos factos não provados. (E) – Dos factos relativos ao assistente W: Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados em relação ao assistente W, foram essencialmente relevantes as declarações do assistente (cfr. que as testemunhas KKG e SY foram prescindidas no âmbito do objecto deste processo, cfr. fls. 35.235), embora o arguido A, nas declarações que veio a prestar após o assistente ter falado, tenha admitido ter tidos as conversas, mas não admitindo o conteúdo da forma descrita pelo W. Com efeito o assistente relatou as circunstâncias em que conheceu o arguido, as conversa e conteúdo das conversas da forma que o Tribunal deu como provado nos pontos “60” a “68.” dos factos provados, foi um discurso que para o Tribunal apresentou-se como seguro, revelando uma memória suficientemente viva. Mas acresce que quanto a estes factos e na sequência do que dissemos - não só quanto ao conhecimento do arguido A com o assistente, os jogos no AX A.C., o conhecimento do arguido do pai do Assistente e a existência de telefonema do arguido para o assistente -, o próprio arguido também o confirmou em audiência de julgamento, quanto quis prestar declarações quanto a tal matéria pois inicialmente e como já dissemos, nas as quis prestar. Quanto aos factos que o Tribunal deu como provados especificamente nos pontos “68.”, “70.” e “71.”, resultaram das declarações do assistente, o qual disse ao Tribunal de forma que nos pareceu esclarecida, isto é, sabia o que estava a dizer, que tinha tido consciência do que é que o arguido queria dizer com as perguntas que lhe fez, denotando assim percepção, saber o que eram os actos a que o arguido se referia. Acresce que das declarações do assistente, o Tribunal ficou com a percepção que após as conversas ficou “pensativo” - foi a expressão usada pelo assistente -, não resultando do seu discurso que tivesse sofrido uma perturbação nos termos que estavam descritos na Acusação. Aliás, a situação do choro do assistente - e a que se referem os pontos “73” dos factos provados e “43” dos factos não provados –, que era referida na Acusação como sendo anterior ao W ter ido falar com o pai - isto é, diz a Acusação que quando o W foi contar ao pai a conversa com o arguido, já ia a chorar -, pela forma como o W relatou os factos na audiência de julgamento o Tribunal ficou convencido que o choro surgiu depois de ter contado ao pai os telefonemas e, pelo menos, por causa da reacção exaltada do pai. (F) – Dos demais factos: 1. Dados como provados: O Tribunal deu como provado que o arguido, atenta a idade do T, do U e do V, então menores, sabia que a sua descrita conduta afectava de forma grave o normal e saudável desenvolvimento psíquico, afectivo e sexual dos mesmos. Em complemento do que acima já dissemos, quanto à valoração da proximidade que o arguido estabeleceu com os assistentes enquanto educandos da AX, em audiência de julgamento o arguido apresentou um discurso coerente, revelou estar a perceber perfeitamente o sentido do que estava a ser dito, não tendo, em qualquer altura, o Tribunal ficado com a impressão (sequer), de que este não teria uma normal capacidade de entendimento e apreensão. Assim, forçosamente teve a consciência de que praticando os actos que o Tribunal deu como provados, afectava o são crescimento e desenvolvimento dos educandos, afectava os bens que a lei pretende tutelar. Tanto que o arguido, como resultou, por exemplo, das declarações do U ou do V, o arguido disse-lhes para não contarem o que se tinha passado. 2. Dados como “não provados”: Relativamente aos factos que o Tribunal deu como “não provados” e em relação aos quais não se referiu de forma individualizada na análise crítica que antecede, os meios de prova produzidos em audiência de julgamento não permitiram ao Tribunal uma afirmação convicta sobre a sua ocorrência. Ou porque as declarações proferidas pelos assistentes e os depoimentos das testemunhas não permitiram ir mais além, no que diz respeito ao afastamento de qualquer dúvida razoável, ou porque os documentos dos autos também não permitiram esclarecer mais, sendo que nestes casos e por força do princípio do in dubio pro reo, o Tribunal tenha que dar os factos ou determinadas circunstâncias da sua prática, como não assentes.” 2. Delimitação do objecto dos recursos É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, do conhecimento das questões oficiosas (art. 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP). As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente A, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; b) - A invocada nulidade do art. 119.º, al. e), do CPP; c) - A inconstitucionalidade do art. 358.º do CPP na interpretação feita pelo Tribunal a quo; d) - O crime continuado; e) - A medida das penas parcelares e única. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente C, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Perda de eficácia da prova por inobservância do art. 328.º, n.º 6, do CPP; b) - Nulidade parcial do acórdão (art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP) por ter havido omissão de pronúncia ao não conhecer da questão, expressamente suscitada pelo recorrente na sua contestação, da ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que se refere ao crime de abuso sexual de criança, na pessoa do assistente AI, menor relativamente ao qual estava caducado o direito de queixa; c) - Nulidade parcial do acórdão por violação do dis(...) nos arts. 127.º e 374.º, n.º 2, do CPP (violação do princípio da livre apreciação da prova); d) - Valor nulo das declarações do arguido A enquanto pretensa corroboração das versões dos factos apresentados pelos assistentes AP e AI; e) - A alteração não substancial de factos existentes na pronúncia, não comunicada ao recorrente, nos termos do art. 358.º, n.º 1, do CPP, e consequente nulidade do acórdão; f) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto relativa ao assistente AP (pontos 101. a 101.10. dos factos dados por provados no acórdão recorrido); g) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto relativa ao assistente AI (pontos 104. a 104.13. dos factos dados por provados no acórdão recorrido); h) - Da excessividade da medida das penas parcelares e única e dos pedidos para a sua redução e suspensão na sua execução; i) - A condenação no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais ao assistente AP; j) - A condenação no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais ao assistente AI. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente E, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Verificar-se caducidade do direito de queixa e ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, acrescendo que o art. 115.º, n.º 1, do CPP, na interpretação subjacente à não declaração oficiosa de caducidade do direito de queixa e de ilegitimidade do Ministério Público, é inconstitucional, por violação do princípio da legalidade consagrado no n.º 1 do art. 29.º da CRP. Inconstitucionalidade que arguiu; b) - Houve violação da norma do art. 343.º, n.º 1, do CPP, que estabelece que o silêncio do arguido não pode desfavorecê-lo, acrescendo ser inconstitucional a interpretação e aplicação feitas pelo Tribunal a quo de tal norma. Inconstitucionalidade que arguiu; c) - As sucessivas alterações de factos feitas na pronúncia e as alterações de factos comunicadas pelo Tribunal de julgamento negaram ou dificultaram inadmissivelmente as possibilidades de defesa; d) - Verificar-se insuficiência de fundamentação e exame crítico das provas, exigências consignadas no n.º 2 do art. 374.º do CPP, o que implica a nulidade do acórdão, nos termos da al. a) do n.º 1 do art. 379.º, porquanto o Tribunal a quo não valorou nem sequer mencionou no douto acórdão o depoimento prestado em audiência de julgamento pela testemunha BO; e) - Impugnação da matéria de facto vertida nos pontos 105.9. a 105.30. dos factos dados como provados no acórdão recorrido; f) - Impugnação da matéria de facto vertida no ponto 100.4. dos factos dados como provados no acórdão recorrido, devendo, contrariamente ao ali decidido, ser considerado não provado que o arguido K conhecia o arguido E; g) - Na fixação da matéria de facto confundiu-se a livre apreciação da prova, estabelecida no art. 127.º do CPP, com a mera impressão gerada pelos diversos meios de prova, confusão que não é admissível. Esta norma processual, na real interpretação feita pelo Tribunal, é inconstitucional, por violação das garantias de defesa, incluindo o recurso, e da presunção de inocência, estabelecidas nos n.ºs 1 e 2 do art. 32.º da CRP. Inconstitucionalidade e ilegalidade dos critérios do Tribunal a quo na apreciação da prova que arguiu; h) - O Tribunal, ao condenar o recorrente pelo crime de lenocínio de menores, violou a norma do art. 175.º, n.º 1, do CP, ao interpretá-la no sentido de que a prática de um só acto sexual de relevo a troco de um preço é exercício da prostituição. No entendimento do recorrente, essa norma devia ter sido interpretada no sentido de que o exercício da prostituição significa uma reiteração e não resultando essa reiteração dos factos provados, não está preenchido o tipo legal de crime, devendo o recorrente ser absolvido da prática desse crime; i) - A medida das penas aplicadas é excessiva, devendo aplicar-se o regime da atenuação especial às penas parcelares e ser a nova pena única assim apurada suspensa na sua execução; j) - O valor da indemnização ao assistente AK, em cujo pagamento foi condenado, é excessivo. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente H, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Nulidade do acórdão nos termos do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. b), do CPP, por violação do dis(...) no art. 358.º do mesmo diploma legal; b) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; c) - Violação do princípio da presunção de inocência consagrado no art. 6.º da CEDH; d) - Medida das penas parcelares e única. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente K, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal relativamente ao assistente AI, que o recorrente configura como nulidade insanável do acórdão; b) - Nulidade do Acórdão, por omissão de pronúncia, quanto à inexistência e nulidade do “reconhecimento” ou identificação do recorrente e valoração de tal reconhecimento como prova – art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP; c) - Nulidade do Acórdão, por omissão de pronúncia, quanto à requerida leitura das declarações do assistente AC prestadas em inquérito – art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP; d) - Nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia, nos termos previstos no art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, decorrente de o Tribunal a quo não ter julgado o facto de o recorrente ter voltado à casa da (…) cerca de um mês depois da primeira vez; e) - Nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia, nos termos previstos no art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, por não aplicação do perdão previsto na Lei n.º 29/99 de 12/5; f) - Nulidade do Acórdão decorrente da condenação do recorrente por factos diversos dos constantes da pronúncia sem que tenha sido feita a comunicação de tais alterações nos termos e para os efeitos previstos no art. 358.º, n.º 1, do CPP – art. 379.º, n.º 1, al. b), do CPP; g) - O vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão; h) - O vício do erro notório na apreciação da prova; i) - A nulidade resultante da valoração de provas proibidas; j) - A impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; l) - Medida concreta das penas parcelares e única; m) - A condenação em indemnização civil. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente N, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Vícios previstos nas alíneas a) e c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP; b) - A violação do dis(...) no n.º 2 do art. 163.º do CPP; c) - Nulidade do acórdão nos termos do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. b), do CPP, por violação do dis(...) nos arts. 358.º e 424.º, n.º 3, do CPP; d) - Nulidade do acórdão por violação do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. a), do CPP; e) - A impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; f) - Violação do dis(...) no art. 127.º do CPP; g) - Medida da pena parcelar relativa ao crime em que é assistente AN, que no entender do recorrente é desproporcionada, impondo-se a sua redução, com efeitos no cúmulo global, sendo de ponderar a suspensão da execução da pena única; h) - Indemnizações civis, que no entender do recorrente devem ser reduzidas equitativamente. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelo recorrente Ministério Público, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Nulidade do acórdão nos termos do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. b), do CPP, por violação do dis(...) no art. 358.º do mesmo diploma legal, no tocante aos arguidos A, H e N, todos com referência ao assistente AI; b) - Erro na condenação do arguido H, por referência ao item “6.7.2”, do despacho de pronúncia, pela prática de um crime de abuso sexual de crianças, previsto no art. 172.º, n.º 1, do CP (na redacção da Lei 65/98, de 2 de Setembro), a qual deveria ter sido feita pelo n.º 2 daquele preceito; c) - Erro na absolvição do arguido C, pela prática de dois crimes de abuso sexual de pessoa internada, previstos no art. 166.º, n.ºs 1 e 2, do CP, por referência a factos relativos ao assistente Y, por considerar não ser requisito do tipo previsto na norma em causa a diminuição/anulação da capacidade de resistência da vítima; d) - Erro na absolvição da arguida Q, porquanto encontrando-se o crime de lenocínio, ab initio, numa relação de concurso aparente com o crime de abuso sexual de crianças, deveria ter sido condenada como comparticipante nos crimes de abuso sexual de crianças pelos quais foram condenados os arguidos N e H (relativos a (…)), após comunicação da alteração da qualificação jurídica dos factos dados como provados e da alteração do período temporal dado como provado, relativamente ao descrito na pronúncia, nos termos e para os efeitos do dis(...) no art. 358.º, n.ºs 1 e 3, do CPP; e) - Medida de algumas das penas parcelares e únicas aplicadas aos arguidos C, E, H, K e N; f) - Erros, lapsos, obscuridades e ambiguidades (supríveis), cuja eliminação/alteração não importa modificação essencial (art. 380.º, n.º 1, al. b), do CPP) em segmentos do acórdão recorrido relativos aos arguidos A, K, N e Q. As questões suscitadas no recurso inter(...) da decisão final pelos recorrentes AX, Y, AN e AI, segundo as conclusões da sua motivação, são as seguintes: a) - Erro na absolvição do arguido C, pela prática de dois crimes de abuso sexual de pessoa internada, previstos no art. 166.º, n.ºs 1 e 2, do CP, por referência a factos relativos ao assistente Y; b) - Erro na absolvição da arguida Q relativamente aos factos constantes dos itens 6.2.1 e 6.72, porquanto encontrando-se o crime de lenocínio numa relação de concurso aparente com o crime de abuso sexual de criança, deveria ter sido condenada como comparticipante nos crimes de abuso sexual praticados pelos arguidos H (em relação ao assistente AI) e N (relativamente ao assistente AN) devendo consequentemente, em cumprimento do dis(...) no art. 358.º do CPP, tal implicar a comunicação da alteração temporal dada como provada relativamente ao descrito na pronúncia; c) - Erro na absolvição da arguida/demandada Q relativamente aos pedidos de indemnização civil contra si deduzidos pelos assistentes AN e AI; d) - Erro na absolvição dos arguidos/demandados A, C, E, H, K, N e Q relativamente ao pedido de indemnização civil contra aqueles deduzido, por danos não patrimoniais, pela assistente AX. A análise destes recursos será efectuada de forma a serem conhecidas previamente as questões que venham a ter influência na sorte dos demais recursos, sendo certo que o conhecimento de algumas delas ficará prejudicado pela procedência dada a outras que as antecedem. No que respeita aos recursos do Ministério Público e assistentes as questões neles suscitadas serão apreciadas aquando da análise dos recursos inter(...)s pelos arguidos sempre que tais questões se mostrem com eles interligados ou numa relação de dependência ou de causa e efeito. 3. Apreciando A) RECURSO DO ACÓRDÃO INTER(...) PELO ARGUIDO C (incluindo os recursos do MºPº e dos assistentes quanto à absolvição do arguido da prática de 2 crimes de abuso sexual de pessoa internada na pessoa do menor Y e do recurso do MºPº no que concerne à medida das penas) 1. Da motivação do recurso extrai o arguido C as seguintes (transcritas) conclusões: 1. Vem o presente recurso inter(...) do Acórdão proferido nos presentes autos, no âmbito do qual foi o Recorrente condenado pela autoria material de um crime abuso sexual de crianças e de um crime de abuso sexual de pessoa internada, previstos e puníveis (p. e p.) nos termos dos arts. 172.º, nrs. 1 e 2e 166.º, n.º 1, ambos do CP, respectivamente nas penas de 4 anos e 6 meses de prisão e de 3 anos de prisão, a que correspondeu, em cúmulo jurídico, a pena única de 5 anos e 9 meses de prisão e, consequentemente, no pagamento de indemnizações civis, por danos não patrimoniais causados aos Assistentes/Demandantes AP e AI, no montante de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros) a cada um deles. 2. Nos termos e para os efeitos do dis(...) no art.º 412.º, n.º 5 do CPP, o Recorrente desde já declara manter interesse na apreciação dos seguintes recursos por si inter(...)s nos presentes autos, aos quais foi fixada subida a final, conjuntamente com o presente recurso: - Recurso do despacho de fls. 17.042 a 17.046 (a fls. 17.916 a 17.953 dos autos); - Recurso do despacho de fls. 25475 a 25488, integrado no Apenso N; - Recurso do despacho de fls. 64055 a 64112 (a fls. 64.783 a 64.827), integrado no Apenso ZG. 3. Impõe-se desde logo afirmar, clara e peremptoriamente, que para a decisão da matéria de facto provada no Acórdão sob recurso (no que tange ao preenchimento da factualidade típica dos crimes pelos quais foi o ora Recorrente condenado), a prova determinante consistiu, exclusivamente, nas declarações dos Assistentes AI e AP. 4. Trata-se do que, com instante apelo à imediação, o Tribunal a quo qualificou como a “ressonância de verdade” dos depoimentos dos Assistentes, querendo com isto significar a ponderação que globalmente retirou no sentido da credibilidade e da veracidade intrínsecas de algumas das declarações por aqueles prestadas em julgamento. 5. Segundo repetidamente se sustentou na fundamentação da decisão da matéria de facto, a apreciação deste meio de prova assentou, não raro, em subtilezas do discurso, atitudes, olhares, movimentos e expressões dos depoentes, só inteiramente perceptíveis e avaliáveis presencialmente. 6. Chega a referir-se, por várias vezes, que o registo fonográfico não permite captar fielmente a dinâmica dos depoimentos, apresentando-os com matizes susceptíveis de deturpar o modo como foram prestados e, assim, de confundir ou mesmo de induzir em erro o eventual ouvinte. 7. Porém, este entendimento encerra contradições e consequências inaceitáveis, pelo que deve ser decididamente refutado. 8. Observe-se, por um lado, que é o próprio Tribunal a quo a reconhecer que sentiu a necessidade de ouvir as gravações dos depoimentos ao elaborar a decisão, o que, dado o lapso de tempo decorrido, se afigura absolutamente compreensível (neste caso fazendo apelo a notas que foram sendo tomadas ao longo dos depoimentos). 9. Só que, desta feita, esvai-se a percepção vívida dos depoimentos, perdendo-se as proclamadas virtudes da imediação no que ao convencimento do Tribunal respeita. 10. Mas, mais do que isto, caberá perguntar como poderá o Recorrente ou o Tribunal ad quem – que não dispõem, naturalmente, das notas de que o julgador se socorreu – alcançar e avaliar o “como foi dito” a partir da audição da prova gravada. 11. Por outro lado – e certamente essa não foi a intenção subjacente àquele reiterado entendimento – não se terá querido cercear os poderes de cognição das instâncias de recurso no que à sindicância da decisão da matéria de facto se refere. 12. O Tribunal ad quem – ressalvada a hipótese de renovação da prova – reapreciará os depoimentos prestados em audiência a partir da audição da prova gravada (e no caso concreto de audição se trata, uma vez que a prova por declarações dos Assistentes não foi gravada em registo videográfico). 13. Ora, a insistência na ideia de que só a apreciação presencial destes depoimentos permite alicerçar a convicção do julgador parece ter implícita a insusceptibilidade de reapreciação da prova a partir dos registos áudio efectuados, o que imporia, como consequência, a inevitabilidade da renovação da prova perante o Tribunal de recurso sempre que se impugne a decisão da matéria de facto com fundamento na errónea valoração das declarações dos Assistentes. 14. Esta consequência, que decorre logicamente do que vem se expor, afigura-se legalmente inaceitável, porque contrária ao preceituado no art.º 412.º, nrs. 3 als. a) e b), 4 e 6 do CPP. 15. Ainda em sede de apreciação crítica da prova, afigura-se que em alguns casos o Tribunal a quo terá perdido aquele substrato mínimo de racionalidade e objectividade necessário à fundamentação da decisão da matéria de facto. 16. É o que perpassa – ao menos de forma subliminar – do trecho a seguir transcrito, relativo à análise crítica das declarações do Assistente AP a propósito do crime de que teria sido vítima nas caves da (...) da AX:“Mas, para ser assim, a ressonância de verdade que em aspectos já focados encontramos nas Declarações de AP, em algum momento, se a Acusação falsa e inventada, não resistia ao contraditório da instância a que foi sucessivamente sujeito. É certo que este argumento - o da ressonância de verdade que emergiu para o Tribunal -, é aquilo que resulta da imediação, que não conseguimos objectivar mais do que já fizemos. Mas é aquilo que faz com que se acredite numa pessoa e não se acredite noutra, que leva à convicção, que afasta a dúvida, para além de qualquer dúvida razoável.” (Cfr. a p. 991 do Acórdão, sublinhados nossos). 17. Ora, convirá ter presente que a livre apreciação da prova não se confunde com um juízo de índole meramente subjectiva, com base em impressões não objectiváveis nem racional e logicamente apreensíveis. 18. A ser assim a prova redundaria ou em puro arbítrio ou numa questão de fé, o que, em sede processual penal é inadmissível (V., a este respeito, o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 07/04/2010, Proc. n.º 83/03.1TALLE.E1.S1 e o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 24/09/2008, Proc. n.º 0814008, ambos disponíveis in www.dgsi.pt). 19. Assim, no trecho supra transcrito do Acórdão, a p. 991, através do qual o Tribunal a quo fundamenta aquele segmento da decisão da matéria de facto em considerações de índole estritamente subjectiva, não enunciando de forma objectiva o percurso lógico e racional em que assenta a sua decisão, resultará, nessa parte, violado o dis(...) nos arts. 127.º e 374.º, n.º 2 do CPP, o que importa a nulidade parcial do Acórdão, por falta da fundamentação, ex vi do dis(...) no art.º 379.º, n.º 1 al. a) do mesmo diploma legal. 20. Ainda na análise crítica da prova, o Tribunal recorrido pretendeu extrair de algumas declarações do Arguido A (das várias e contraditórias que prestou em audiência de julgamento) um vislumbre de corroboração de versão sustentada pelos Assistentes. 21. Porém, se bem se atentar no teor daquelas declarações do Arguido A, facilmente se conclui que delas não resultará corroboração alguma. 22. Efectivamente, o que relatou em audiência – pela forma e no momento em que o fez – limitou-se, no que ao ora Recorrente releva, a “reproduzir” o que lhe teria sido contado pelos próprios Assistentes. 23. Na verdade, o Arguido A nunca afirmou ao Tribunal que o Recorrente lhe pedira para que lhe levasse alunos fosse a que local fosse para com eles manter contactos de natureza sexual. 24. Como também nunca declarou ter visto o Recorrente em qualquer dos locais para onde reconheceu ter transportado alunos e onde estes teriam sido sujeitos a abusos sexuais, limitando-se a dizer que, em alguns casos, os Assistentes lhe contaram que ele estava lá. 25. As declarações do Arguido A – quanto à intervenção do Recorrente nos factos que lhe são imputados – não traduzem, assim, o relato de factos que este tenha, pessoal e directamente, presenciado. 26. Em suma, as declarações prestadas em audiência pelo Arguido A nada de atendível acrescentam à prova por declarações dos Assistentes, uma vez que se limitam ao relato daquilo que este Arguido lhes terá ouvido contar a propósito dos factos em que implicam o ora Recorrente. 27. Traduzem, nitidamente, um depoimento indirecto ou “de ouvir dizer” de nulo valor probatório. 28. Haverá que ter presente que a prova por declarações do arguido obedece, no que ao thema probandum respeita, ao dis(...) no art.º 128.º, n.º 1 do CPP (para o qual remete o art.º 140.º, n.º 2), devendo o depoimento incidir sobre factos de que o depoente “possua conhecimento directo”. 29. A este propósito, deve salientar-se que a norma constante do art.º 129.º do CPP (“Depoimento indirecto”) não é aplicável ao depoimento indirecto de arguidos. 30. Desde logo por força de um argumento literal, qual seja o de, no art.º 140.º, n.º 2 do CPP – que rege em matéria de declarações do arguido – não haver remissão para o art.º 129.º, remetendo-se expressamente e apenas para o art.º 128.º, que consagra o princípio geral segundo o qual o depoimento deve traduzir o conhecimento pessoal e directo do depoente acerca dos factos que constituem o objecto da prova. 31. Por outro lado, o carácter de norma excepcional de que se reveste o art.º 129.º do CPP impede a sua aplicação analógica a outros meios de prova por declarações que não a prova testemunhal. 32. Assim, ao depoimento indirecto poderá ser conferido valor probatório, nos termos do art.º 129.º do CPP, no domínio restrito do que uma testemunha possa ter ouvido dizer a outra testemunha. 33. Mas já não se revestirá de valor probatório algum o depoimento indirecto de um arguido acerca do que ouviu dizer a um assistente [“(…) não vale como meio de prova: 1. o depoimento indirecto de arguido sobre o que ouviu dizer a co-arguido, um assistente, uma parte civil, uma testemunha ou perito (…)”, cfr. ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, in Comentário do Código de Processo Penal, 2.ª Ed., Universidade Católica Editora, Lisboa (2008), a pp. 347 e s., nota 10]. 34. Assim, ao valorar, em sede de apreciação crítica da prova, as declarações prestadas pelo Arguido A na parte em que lhes confere relevância como meio de corroboração do depoimento prestado pelo Assistente AP, o Tribunal a quo violou o dis(...) nos arts. 125.º, 128.º, n.º 1, 129.º (por inaplicável) e 140.º, n.º 2, todos do CPP. 35. Termos em que deverá ser declarado sem qualquer valor probatório o depoimento do Arguido A, na parte mencionada na fundamentação da decisão da matéria de facto que se refere à prova dos factos constantes dos nrs. 101 a 101.10 dos factos provados, enquanto meio de corroboração das declarações do Assistente AP, nos termos descritos a pp. 992 a 1010 (“Da motivação e análise crítica da prova”) do Acórdão. 36. Impõe-se seguidamente tecer algumas considerações sobre as declarações do Arguido A, na parte em que o mesmo se referiu ao ora Recorrente. 37. Comece-se pela carta que o Arguido A dirigiu ao ora Recorrente enquanto ambos estavam presos preventivamente (cfr. fls. 20.195 e 20.195 v. dos autos), na qual o Arguido A se dirige ao ora Recorrente, sem qualquer intimidade, por “Dr. C”, e onde aventa a possibilidade de o Assistente AP estar a ser pago para incriminar o Recorrente, ao dizer que o vira na cave (presume-se que com um aluno). 38. É interessante intercalar aqui que, mais tarde, na sessão da audiência de julgamento de 13 de Janeiro de 2005 (cfr. acta de fls. 27.630 e ss., e DVD dos 0 aos 28m + dos 28m às 3h 15m e DVD das 3h 15m às 3h 30m + das 3h 30m às 3h 6m), quando o Arguido A descreve o encontro com a ex-(...)a BP, perto da (…), quando estava preso, refere que a mesma lhe levou uns pastéis de Belém e uma camisola, e que lhe disse para contar tudo e para não se incriminar sozinho. 39. O Arguido, confrontado com a supra referida carta, na audiência de julgamento de 26 de Novembro de 2008 (cfr. acta de fls. 62.314 e ss., e DVD dos 0 aos 43'), reconheceu tê-la escrito, pelo que a sua autoria não foi posta em causa. 40. Ora, ao contrário da conclusão a que chegou o Tribunal a quo, o Arguido A não parecia estar perturbado ou excessivamente medicado quando redigiu tal carta. A simples observação do texto revela uma caligrafia absolutamente legível, não tremida nem hesitante, sem rasuras ou emendas, e um conteúdo coerente e claramente provido de sentido e lógica. 41. E tenha-se em conta que, quando escreveu esta carta, o Arguido A nem sequer estava em contacto pessoal com os outros Arguidos (entre os quais o Recorrente). 42. Para bem compreender a importância deste ponto, repare-se como, na sessão de Julgamento de 10 de Janeiro de 2005 (cfr. acta de fls. 27.589 e ss., e 1ª cassete, lado A, dos 0 aos 23m do lado B + … aos 45m e 2ª cassete, lado A, dos 0 aos 31m do lado B da 3ª cassete), a propósito do empréstimo de um telemóvel que lhe fora feito, a si e a outros funcionários, por ordem do ora Recorrente, o Arguido A refere “(…) eu neguei-me a dar um número de telefone particular, nem aos meus colegas lhe davam, quanto mais agora ao Dr. C e à (...).” 43. Desta frase resulta, claramente, que não só os dois Arguidos não seriam próximos ou amigos, como que o Arguido A, com o seu feitio em certa medida arrogante, não queria “intimidades” com o seu superior. 44. O Tribunal a quo, porém, acolhe sem reserva a ideia de que o Recorrente e o Arguido A mantinham um contacto próximo e informal. 45. Ora, no que diz respeito às declarações propriamente ditas, na sessão de Julgamento de 21 de Dezembro de 2004 (cfr. acta de fls. 25.640 e ss., e 1ª cassete dos 0 até 1h 14m + 1h 14m até 1h 49m e 2ª cassete dos 0 aos 30m + dos 30m até a 1h 4m), o Arguido A diz que conheceu o Assistente AP quando este tinha 14 ou 15 anos, e que este nunca lhe contou factos da vida dele, acrescentando que viu todos os Arguidos em (…) menos o Recorrente. 46. Na sessão de julgamento de 8 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.480 e ss., e 1ª faixa do CD1), o Arguido A refere “(...) queria dizer que ontem, o que o Sr. AP disse de eu transmitir para ele ir, portanto, ao, ao gabinete do Dr. C e, ao mesmo tempo, ajudar-me a carregar e descarregar computadores e caixas de, de coisos, é pura mentira (…) É tudo pura mentira, o que o AP disse. Ele está a ser pressionado por alguém da AX, ou por algum advogado da AX. (…) Nunca transportei ninguém para o Dr. C, nem nunca o vi em (…). ... O que a maior parte das testemunhas vêm aqui dizer, são pressionados por alguém da AX. Ou por advogados, ou pelos Polícias, Polícias da Judiciária. (…) 47. Mais tarde, na sessão de julgamento de 12 de Setembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.659 e ss., e 1ª cassete, lado A das 0 às 795 rotações), o Arguido mais uma vez afirma: “(...) queria dizer a Vª Exª que nunca vi, nem nunca levei, mais uma vez digo a Vª Exª do fundo do meu coração, nunca levei ninguém para o Dr. C, nem nunca vi o Dr. C em (…), nem em casa nenhuma, portanto, que eu levasse os rapazes. Nem em sítios em que eu levasse os rapazes como o (…), à (…)... Nunca vi o Dr. C.” 48. Na sessão de julgamento de 15 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.731 e ss., e DVD1, das2h0m às 2h05m), a meio das declarações do Assistente AI, o Arguido A reitera essa sua versão: “(...) quero dizer, queria dizer à frente dele que todos os arguidos, menos o Dr. C, que não vi em (…) (…) A primeira vez foram quatro e a segunda vez foram seis ou sete, não me lembro, Srª Drª. A primeira vez foram quatro porque com quatro dos alunos do ténis eram oito, comigo eram nove e a carrinha só levava nove jogadores. E eu confirmo, portanto, a este Tribunal, mais uma vez, que as pessoas que “tavam”, portanto, lá, só menos o Dr. C é que eu não vi lá, nem posso justificar que o Dr. C estivesse lá (...)”. 49. Na sessão de julgamento de 20 de Fevereiro de 2006 (cfr. acta de fls. 36.598 e ss., e CD3, 2ª faixa; CD4, 1ª faixa), a meio das declarações do Assistente Y, o Arguido reconhece ter dado boleia a este último, em dois sábados, até ao (…) e a (…), declarando que o Assistente lhe dissera que ia ter com “o Sr. C”. O Assistente entrou num carro e o Arguido, por sua vez, não viu mais nada. 50. Sendo que, passando a referir-se a (…), diz que os rapazes falavam do Dr. C, mas que nunca o lá viu nem ao seu carro. 51. Na sessão de julgamento de 8 de Março de 2006 (cfr. acta de fls. 37.089 e ss., e CD2, 6ª faixa), o Arguido, na sequência do depoimento do educador RW, volta a dizer que não fazia o que queria na AX, que nunca chamou nenhum nome ao ora Recorrente, nunca o tratou mal nem por tu ou pela alcunha. 52. Na sessão de julgamento de 19 de Maio de 2006 (cfr. acta de fls. 38.360 e ss., e CD5, 2ª faixa), o Arguido A volta a dizer que nunca viu o ora Recorrente em (…). 53. Na sessão de julgamento de 13 de Setembro de 2006 (cfr. acta de fls. 39.499 e ss., e CD3, 3ª faixa e CD4, 1ª e 2ª faixa), na sequência do depoimento da testemunha HI, repete que nunca tratou mal o ora Recorrente e que o que move a testemunha é um desejo de vingança contra si e contra o ora Recorrente. 54. Na sessão de julgamento de 26 de Novembro de 2008 (cfr. acta de fls. 62.314 e ss., e DVD dos 0 aos 43'), o Arguido A refere que os Assistentes (não especifica quais) lhe disseram ter visto o C da AX em (…), que ele era seu chefe e é amigo dele e da mulher e que o Assistente AP lhe contou do abuso na cave por parte do Recorrente seis ou sete anos antes deste processo (o que remeteria para meados dos anos 90). 55. Por outras palavras: não sabe, mas ouviu dizer. 56. O Arguido diz, aliás, que o Assistente lhe contou isto na presença do educador VD, e que disse que o Recorrente lhe fizera a ele “actos sexuais”, usando essa expressão, nomeadamente sexo oral e anal. 57. Mais adiante, corrige e diz que afinal estes factos se passaram três anos antes deste processo, e que o Assistente lhos contou duas semanas depois de terem acontecido, e que isto foi antes de (…). 58. Sendo que perguntado se não estranhou quando soube que o Recorrente estaria envolvido em abusos, a resposta foi: “Estranhei, mas eu não passei cartão a isso.” 59. De facto, na sessão de julgamento de 21 de Maio de 2007 (cfr. acta de fls. 45.687 e ss., e DVD, dos 52' até 1h03m), o Arguido diz que o seu anterior advogado queria que ele não acusasse os Arguidos, mas sim o KKH, o KKI, o KKJ, o OA e o KKK, e ele, estando de “consciência tranquila” quanto ao ora Recorrente, não quis ilibar os outros. 60. Na sessão de julgamento de 26 de Novembro de 2008 diz também que viu um carro (…) de marca (…) no (…) (que, refira-se, nunca foi atribuído ao Recorrente por nenhuma testemunha) e um carro (…) em (…) que já vira no (…). Quanto a estes aspectos, declara que acredita nos rapazes, muito embora nunca tenha visto o ora Recorrente nos locais pelos mesmos descritos. 61. Ou seja, o Arguido não confirma que tais factos sucederam. 62. O Arguido, com efeito, nunca refere ter visto o ora Recorrente ou sequer o seu carro no local dos abusos, relatando apenas que o Assistente AP lhe disse que tinha estado com ele. 63. Reitera-se assim a conclusão de que, ao contrário do defendido pelo Tribunal a quo, dos depoimentos do Arguido A não resulta qualquer corroboração – válida do ponto de vista probatório – quanto às histórias contadas pelos Assistentes AP e AI. 64. Na sessão da audiência de julgamento de 23 de Abril de 2010, na qual tiveram lugar as últimas declarações dos Arguidos, foi proferido, a final, o seguinte despacho: “(…) 2. Encerro a presente audiência nos termos do art.º 361.º, n.º 2 do C. P. Penal, sendo que para a leitura do Acórdão já se encontra designado o dia 09 de Julho de 2010, às 09horas e 30 minutos.” (cfr. a acta de fls. 65.666 a 65.674 dos autos). 65. Ou seja, a sessão de 23 de Abril de 2010 correspondeu ao encerramento da discussão da causa, terminologia a que a lei expressamente recorre na epígrafe do art.º 361.º do CPP e na letra do seu n.º 2. A deliberação deve ter lugar logo após o encerramento da discussão da causa, de acordo com o art.º 365.º, n.º 1 do CPP. 66. A única excepção é a contemplada nos arts. 361.º, n.º 2 e 371.º do CPP, destinando-se a reabertura da audiência à produção da prova suplementar que o tribunal entenda necessária à determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar. 67. A supra descrita tramitação processual foi observada pelo Tribunal a quo, como evidenciam os autos, uma vez que: o Tribunal Colectivo reuniu, a 14 de Maio de 2010, para deliberar, ali tendo decidido “(…) proceder a prova suplementar, nos termos do art.º 369.º, n.º 2 do C. P. Penal com a consequente reabertura da audiência, tal como está prevista no art.º 371.º, n.º 1 e 2 , do C. P. Penal.” (cfr., sic, a acta de fls. 65.759 e s. dos autos); as sessões subsequentes à reabertura da audiência de julgamento, ao abrigo do art.º 371.º do CPP, tiveram lugar a 21 de Maio (cfr. a acta de fls. 65.805 a 65.810), a 14 de Junho (cfr. a acta de fls. 65.855 a 65.862) e a 9 de Julho de 2010 (cfr. a acta de fls. 66.048 a 66.058). 68. No final da sessão de 9 de Julho de 2010, encerrada a produção de prova suplementar, foi proferido despacho determinando a continuação da audiência em 5 de Agosto de 2010, pelas 9:30 h., para leitura do Acórdão (data que havia já sido previamente designada, em despacho de 26 de Junho, exarado a fls. 65.911 dos autos). 69. No caso de especial complexidade da causa – situação que corresponde à dos presentes autos – o art.º 373.º, n.º 1 do CPP prescreve que a leitura do Acórdão deverá ter lugar em data a fixar nos 10 dias seguintes (o que não ocorreria ainda que se tivesse mantido a data de 5 de Agosto de 2010 para a leitura do acórdão). 70. Porém, em despacho subsequente, o Tribunal veio determinar a alteração da “(…) data para leitura do Acórdão para o dia 3 de Setembro de 2010, às 9h.30m”; ii) manter a sessão da audiência de julgamento agendada para data anteriormente designada para a leitura do Acórdão, 5 de Agosto de 2010 “(…) para efeitos de continuidade da audiência, não considerando no entanto o Tribunal imprescindível a presença dos arguidos.” (Cfr. o ponto 3 do despacho de fls. 66.108 dos autos). 71. Este despacho, na parte em que adiava a leitura do Acórdão e determinava a realização de uma sessão da audiência de julgamento, na data de 5 de Agosto de 2010, “para efeitos de continuidade da audiência”, foi objecto de arguição de irregularidade por parte do Recorrente (cfr. o requerimento de fls. 66.157 a 66.162). 72. Em suma, invocou-se que, encerrada que foi a discussão (art.º 361.º, n.º 2 do CPP) e esgotada a produção de prova suplementar ao abrigo do art.º 371.º do CPP, não poderia a audiência ser retomada a não ser para a leitura do Acórdão, único acto processual cuja prática seria legalmente admissível no presente estado dos autos. 73. Arguiu-se também a irregularidade daquele despacho, na parte em que ali se designara a data de 3 de Setembro de 2010 para a leitura do Acórdão, porquanto esta data deveria ter sido designada em obediência ao dis(...) no art.º 373.º, n.º 1 do CPP. 74. Concluindo-se que, não sendo legalmente admissível a realização da sessão de julgamento agendada para 5 de Agosto (cuja irregularidade se arguira), a leitura do Acórdão designada para a data de 3 de Setembro de 2010 violaria o dis(...) no primeiro período da norma constante do art.º 328.º, n.º 6 do CPP, por o adiamento exceder o prazo de 30 dias contados sobre a data da última sessão da audiência de julgamento, que teve lugar a 9 de Julho de 2010. 75. A sessão da audiência de julgamento de 5 de Agosto de 2010 veio efectivamente a ter lugar (cfr. a respectiva acta, de fls. 66.167 a 66.169) e, no seu decurso, o Recorrente arguiu a irregularidade de todos os actos praticados nessa sessão da audiência de julgamento, bem assim como prescindiu de se prevalecer de quaisquer prerrogativas relativas a esse acto (cfr. a fls. 66.172 a 66.175 e a declaração que fez exarar em acta, constante de fls. 66.186, para as quais se remete). 76. As arguições de irregularidade deduzidas pelo ora Recorrente foram, consequentemente, tempestivas, não devendo qualquer daquelas irregularidades considerar-se sanada, ex vi do dis(...) no art.º 121.º do CPP. 77. Assim, a sessão da audiência de julgamento que teve lugar a 5 de Agosto de 2010 foi irregular, nos termos do art. 118.º, nrs. 1 e 2, por violação do dis(...) nos arts. 361.º, n.º 2, 369.º, n.º 2 in fine, 372.º, n.º 1, 373.º, n.º 1 e 328.º, nrs. 1 e 4, todos do CPP, sendo, consequentemente inválidos todos os actos nela praticados, de harmonia com o dis(...) no art. 123.º, n.º 1 do mesmo diploma legal. 78. A sessão da audiência de julgamento seguinte foi a de 3 de Setembro de 2010, de leitura do Acórdão, sendo que entre esta última sessão e a anterior validamente realizada, a 9 de Julho de 2010, mediou um lapso de tempo superior a trinta dias, o que, nos termos do art.º 328.º, n.º 6 do CPP, determina a perda de eficácia da prova produzida em audiência de julgamento. 79. No que diz respeito à condenação do Recorrente pelos factos relativos ao Assistente AP, a descrição dos mesmos, consubstanciada na acusação e na pronúncia, resultou exclusivamente das declarações prestadas pelo próprio Assistente. 80. O Assistente prestou declarações no processo diversíssimas vezes, em inquérito, tanto perante a Polícia Judiciária como perante o Ministério Público e, já em sede de instrução, perante a Meritíssima Juíza de Instrução Criminal, tendo ainda sido ouvido em sede do processo disciplinar movido pela AX ao ora Recorrente, para além de haver, igualmente, referências a relatos seus constantes dos relatórios elaborados pelos peritos do INML. 81. O Assistente AP prestou por duas vezes depoimento em sede de processo disciplinar instaurado ao Recorrente, respectivamente em 24 de Janeiro de 2003 e em 22 de Novembro de 2004. 82. Na primeira vez, refere o Assistente que, quando teria 11 ou 12 anos de idade (o que remonta ao período de Outubro de 1995 a Outubro de 1997), estando ele a ajudar o Arguido A a transportar caixas de uma carrinha (…) para as caves da (...) da AX, surpreendeu o Recorrente em actos de masturbação mútua com o também Assistente AT (cfr. fls. 93 do Apenso Z8). 83. Referindo ainda que, mais tarde, veio a encontrar o Recorrente em (…), numa casa particular, com outras pessoas e educandos, mas que nessa altura este não manteve qualquer contacto de natureza sexual consigo. 84. Por fim, refere que, com 14 anos de idade (o que remonta ao período de Outubro de 1998 a Outubro de 1999), foi forçado a praticar sexo oral ao Recorrente, depois de este lhe ter pedido que fosse ter com ele à (...), esperando-o à porta, após o que o levou à cave e a praticar tais actos, tendo, dois dias depois, chamado o Assistente ao seu gabinete para lhe dar a quantia de 3 mil escudos (cfr. fls 93 e ss. do Apenso Z8). 85. Porém, na segunda vez que prestou declarações nessa sede, o Assistente AP confirmou ter surpreendido o Recorrente com o colega AT na cave da (...), assim como ter visto aquele na casa de (…), mas negou ter sido ele próprio abusado pelo ora Recorrente nas caves da (...). 86. E afirmou que, se assim se consignara no primeiro auto de declarações, tal se teria ficado a dever a lapso de entendimento do Instrutor do processo disciplinar, uma vez que nunca tivera contactos sexuais com o ora Recorrente, C (cfr. fls. 1576 do Apenso Z8). 87. Nestas segundas declarações o Assistente veio assim alterar o que anteriormente havia dito, afirmando agora que não fora abusado pelo Recorrente, ao contrário do que se consignara no auto de declarações em processo disciplinar, de 24 de Janeiro de 2003. 88. No entanto, em audiência de julgamento voltaria à primeira versão dos factos, afirmando ter sido abusado pelo Recorrente nas caves da (...), apresentando para as sucessivas alterações dos seus depoimentos a explicação mirabolante que adiante se analisará. 89. Sucede que o próprio Assistente AT sempre negou ter sido abusado pelo Recorrente nas caves da (...). 90. Fê-lo em audiência de julgamento, mas negou-o, desde logo, no referido processo disciplinar, quando nessa sede foi ouvido em declarações, a 11 de Fevereiro de 2003 (cfr. fls. 166 e s. do Apenso Z8). 91. Não se vê que razão teria o Assistente AT, caso tivesse sido abusado nas caves da (...) da AX pelo ora Recorrente – como afirma o Assistente AP – para reiteradamente declarar nunca ter sido abusado por aquele nesse local. 92. O Assistente AP negou, na sessão da audiência de julgamento de 25 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.780, e 1ª cassete, das 0 às 4000 rotações do lado A), ter tido relações de natureza homossexual depois dos abusos sofridos no âmbito deste processo, que teriam terminado, no máximo, antes de sair da AX – em Abril de 2000 – com a última ida a (…). 93. Ora, tal não se compatibiliza com a afirmação do Senhor Perito do INML, no seu relatório, ao fazer constar que o Assistente “apresenta sinais a nível do ânus compatíveis com a prática repetida de coito anal” (cfr. fls. 7600 a 7610 dos autos). 94. Efectivamente, face aos esclarecimentos tomados ao Dr. BR na sessão da audiência de julgamento de 28 de Setembro de 2006 (cfr acta a fls. 39.719 e ss., e CD1, 2ª faixa e CD2, 1ª e 2ª faixa e CD2, 3ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa; CD4, 1ª, 3ª e 4ª faixa), os sinais observados no ânus do Assistente foram provavelmente provocados por relações anais ocorridas menos de seis meses antes da realização da perícia, efectuada em 31 de Março de 2003, ou em período aproximado desse. 95. Perguntado sobre as “incongruências que fragilizam a consistência global” do relato, que “resulta algo defensivo” (cfr. a fls. 7609), o Perito BR, na sessão da audiência de julgamento de 27 de Setembro de 2006 (cfr. acta de fls. 39.684 e ss., e CD1, 1ª faixa e CD2, 1ª faixa e CD2, 2ª faixa; CD3, 1ª, 2ª e 3ª faixa; CD4, 1ª faixa) refere que “(…) tem a ver com uma falha narcísica muito grande, que, no caso do AP (…) me fez pôr em causa, parcialmente… reconhecer expressamente alguma fragilidade e assinalá-la, como o fiz em relação a outros.” 96. Por seu turno, no relatório de perícia sobre a personalidade (de fls. 17 do Apenso CC dos autos), elaborado pelo Serviço de Psiquiatria Forense do INML em 23 de Julho de 2003, consta: “A eficiência intelectual avaliada através da WAIS-R, situa-se no nível normal médio (Q.I. = 95). (…) No perfil das escalas (...)s, verifica-se a elevação da escala do Desvio-Psicopático, seguida das escalas da Depressão, Histeria, Paranóia e Esquizofrenia (…) Em suma, todo o protocolo é extremamente pobre e remete para uma espécie de vazio ideativo, que o sujeito tenta preencher através de objectos concretos, reais. (…)” 97. A este propósito, na sessão de 26 de Outubro de 2007 (cfr. acta de fls. 48.858 e ss., e DVD dos 0 às 4h20m), a Perita BB concorda também que o Assistente AP tem uma perturbação de personalidade estado-limite (ou borderline). 98. Relativamente às declarações que prestara em instrução, em 22 de Abril de 2004 (cfr. auto de declarações de fls. 19.034 a 19.038, lido na sessão da audiência de julgamento de 17 de Julho de 2008 a partir de fls. 19.036), constata-se que, para além da referência a mais do que uma casa em (…) (negada em audiência de julgamento, durante as perguntas que lhe foram dirigidas na sequência dessa leitura – cfr. DVD da sessão 393, não melhor identificado na acta), entre várias outras contradições, o Assistente AP não referiu ter sido abusado pelo Recorrente quer em (…) quer na (...) da AX, embora tendo feito expressa referência ao mesmo, afirmando tê-lo visto em (…). 99. Aliás, quanto ao Recorrente, afirmou perante a Senhora Juíza de Instrução que: “Conhecia o Dr. C da (...), dizia-lhe bom-dia e boa-tarde e nada mais”. 100. A explicação que apresentou para esta incongruência, nessa sessão da audiência de julgamento (de 17 de Julho de 2008), mais de quatro anos volvidos sobre as declarações prestadas em instrução, foi a de que não disse tudo à Senhora Juíza de Instrução por não confiar nela. 101. Mais bizarra se torna a omissão quando, na sequência do seu depoimento, faz alusão às caves da (...) – local onde dizia ter sido abusado pelo Recorrente – e se limita a declarar que: “[F]oi várias vezes à (...) com o A ajudá-lo a descarregar caixas com material (dossiers, computadores, etc.) que depositavam numa sala grande da cave, com prateleiras e estantes e que pensa que costumava estar fechada à chave. Iam geralmente à hora do jantar ou à noite fazer essas descargas e costumava lá estar a senhora da limpeza que lhes abria a porta (uma senhora baixinha de cabelo grisalho que ainda deve trabalhar na AX). Esses arquivos da cave contêm nomes de alunos e coisas relativas aos mesmos.” 102. Quanto às declarações prestadas em sede de processo do Assistente AP contra o Estado, a decisão do Tribunal Arbitral (cfr. fls. 27 e ss. do apenso Z-16) incluiu, entre os factos provados, que o Assistente fora repetidamente abusado por um funcionário com as funções de motorista, dentro das instalações da AX, e que este o levara para encontros com outros adultos do sexo masculino “estranhos à AX”. 103. Neste grupo de adultos “estranhos à AX” não se pode, naturalmente, incluir o ora Recorrente, funcionário da mesma desde a juventude, pelo que, tendo tal facto considerado provado resultado necessariamente do depoimento do próprio Assistente (perante o Tribunal Arbitral), a única conclusão plausível é a de que este não terá, uma vez mais, incluído o Recorrente C no rol dos que alegou terem sido os seus abusadores. 104. A todas estas incongruências não terá aliás sido alheio o facto de, nas suas alegações finais, em Dezembro de 2008, o Ministério Público ter “sugerido” alterações substanciais e alterações não substanciais de factos, ao abrigo do dis(...) nos arts. 358º e 359º do CPP. 105. Entre várias dezenas de outras alterações, que configuraram um verdadeiro reescrever da pronúncia, incluía-se a alteração não substancial dos factos relativos ao crime alegadamente perpetrado pelo Recorrente nas caves da (...) sobre o Assistente AP, consistindo a alteração na passagem da referência temporal de “dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999” para dia indeterminado situado entre Outubro de 1997 e Outubro de 1998. 106. Mais tarde, por promoção a que deu entrada em 5 de Fevereiro de 2009, o Ministério Público veio então requerer alterações, embora diferentes das que havia sugerido em Dezembro de 2008, nomeadamente no respeitante aos factos agora em questão. Assim, a fls. 62.884 dos autos, veio requerer a alteração da data dos factos para “dia indeterminado situado entre Setembro de 1997 e Junho de 1998, tinha o menor 12/13 anos de idade”. 107. E a verdade é que, sem que lhe fosse adiantada qualquer fundamentação, o Recorrente veio mesmo a ser confrontado com a comunicação, oficiosamente deliberada pelo Tribunal a quo, na sessão da audiência de julgamento de 23 de Novembro de 2009 (cfr. acta da sessão n.º 448, concretamente a fls. 63.632), da alteração da data de um ano (Outubro de 1998 a Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade) para um período de quase dois anos, abrangendo assim um lapso de tempo em que a idade do Assistente poderia ser de 13 ou 14 anos de idade. 108. Debalde se requereu ao Tribunal a quo que fundamentasse tal comunicação, uma vez que o resultado – após várias arguições de irregularidade e de nulidade nesse sentido, e uma nova comunicação, em 11 de Janeiro de 2010 (cfr. acta da sessão n.º 451, a fls. 64.097 a 64.107) – foi o de se ter procedido a nova comunicação, reparando a irregularidade suscitada com a singela explicação de que a “fundamentação” para as alterações se baseara em todas as declarações prestadas pelos arguidos, pelos assistentes, pela quase totalidade das testemunhas ouvidas e pela quase totalidade dos documentos juntos ao processo. 109. Nessa sede, o Recorrente chegou mesmo a apresentar, para defesa quanto a esta alteração concreta, um requerimento de prova (cfr. fls. 64.915 a 64.921 dos autos), requerendo, entre outras coisas, a leitura em audiência de todas as declarações prestadas pelo Assistente AP em sede de inquérito à Polícia Judiciária e ao Ministério Público, para que fossem tidas em contas as acima expostas incongruências, o que, mais uma vez, não obteve o necessário acordo do Ministério Público e do Assistente. 110. Contudo, o Tribunal a quo entendeu que não era relevante perder mais tempo com a defesa do ora Recorrente, indeferindo in totum o seu requerimento de prova. 111. Ora, o que o Recorrente não compreende até hoje é o porquê de tal alteração temporal, como também não compreende que a única prova que poderia ter presidido a tal alteração, i.e., as declarações do Assistente, tenham sido totalmente desconsideradas na datação dos alegados factos. 112. Na sessão da audiência de julgamento de 4 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 29.757 e ss., e CD1 1ª faixa, 62,31' + ? e ? + ? + 2ª faixa, CD2, 23,50' e 1ª faixa CD3, 19,44' + 2ª faixa, CD3, 59,35' e 1ª faixa CD4, 22,58' e 2ª faixa CD4, 1,37'), BP refere que o Assistente AP lhe contou que vira o Recorrente a ter relações sexuais com o colega AT, que eles conhecem por “(…)”, na arrecadação da cave da (...) (“descendo a escada, à esquerda” – o que correspondia, diga-se, à sala da caldeira). 1. E que, seguidamente, o Assistente passou a relatar os abusos sobre si próprio por parte dos outros arguidos e de DU (do processo de (…)), mas não se referindo a qualquer abuso por parte do ora Recorrente. 2. Ora, não se compreende por que razão o Assistente AP, que insistia em contar os pormenores à depoente e a quem relatou o alegado abuso do Recorrente sobre o também aqui Assistente AT, terá omitido no relato qualquer alusão ao abuso de que diz ter sido vítima por parte do Recorrente. 3. A depoente refere também que quando o Assistente AP começou a falar com ela já falara com vários órgãos de comunicação social antes, e ainda: “(…) Quer o X quer o AP, quer dizer … quase todos os ex-alunos da AX que foram envolvidos no processo de (…) foram expulsos da AX, não sendo o argumento que eu li … eu li o processo … não foi o processo de (…), mas o processo deles (…) individual, era-lhes atribuído um conjunto de comportamentos disruptivos que punham em causa o normal funcionamento do internato, era dito pelas equipas técnicas do (...) ao qual pertenciam estes vários jovens, o AP, o X e o AV … que não foi expulso, e quando eu lhe perguntei porque é que os outros tinham sido expulsos e ele não, ele disse que tinha protecção e que, portanto, como ele sabia demais, não se atreviam a expulsá-lo.” 4. O AV referido nas declarações supra transcritas é o AV, também Assistente nos presentes autos. 5. Ora, não poderá deixar de se assinalar a incongruência que resultaria do tratamento diferente dado ao Assistente AP, que acabou por efectivamente ser expulso, e não se compreende que, se este Assistente tivesse mesmo sido abusado pelo então (...)-(...), o ora Recorrente C, este o tivesse “deixado cair”, permitindo a sua expulsão. 6. Em tais circunstâncias é pertinente perguntar se o Recorrente se arriscaria a ser denunciado e descoberto pelo Assistente AP, nada fazendo para evitar a expulsão deste da AX, ao contrário do que teria feito com o Assistente AV. 7. Na sessão de julgamento de 14 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 29.961 e ss., e CD1 1ª faixa, 27,08' + 2ª faixa CD1, 51,07' e 1ª faixa CD2, 13,02' e CD2 2ª faixa, 45,32' + 3ª faixa CD2, 20,52' e 1ª faixa CD3, 27,08' e 2ª faixa CD3, 51', BP reafirma que o Assistente AP nunca lhe disse ter sido abusado pelo ora Recorrente, insistindo que não se tratou de esquecimento e que das suas notas também não consta tal relato 8. A depoente disse ainda que o Assistente AT não lhe referiu qualquer abuso por parte do Recorrente nas caves da (...). 9. Na sessão de julgamento de 18 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 30.173 e ss., e CD1 1ª faixa, 47,24' + ? e CD1 3ª faixa, 13,41' + 1ª faixa CD2, 5,15' + ? + 2ª faixa CD2, 36,35' + 3ª faixa CD2, 38,05' e 1ª faixa CD3, 8,38'), reafirma que o Assistente AP apenas lhe referiu haver sido abusado pelos Arguidos A, H e K, sendo que apenas surpreendera o abuso de C ao colega AT, não tendo ele próprio sido abusado por ele. 10. Quanto aos documentos de fls. 30.141 e ss., referentes à expulsão do Assistente AP e que não foram juntos aos autos quando solicitado pelo Ministério Público, a depoente afirma que o processo que foi entregue às autoridades foi organizado e fotocopiado pela sua assistente BBB, desconhecendo a razão para não estar completo. 11. Sendo certo que de tal documentação contém referências de (i) queixas do director de CZ, EJ, por mau comportamento, violência, fugas, vandalismo, ameaças, agressão verbal e envolvimento do Assistente em tráfico de droga dentro da Instituição e prostituição, que o descreve como “um delinquente altamente perigoso”; (ii) ameaças do Assistente ao próprio director EJ; (iii) necessidade urgente de o separar dos colegas; (iv) proposta de suspensão imediata e posterior expulsão da Instituição (datada de 22 de Março de 2000); (v) participações do mau comportamento, agressividade, vandalismo, furtos, insultos e ameaças do Assistente, dentro e fora das instalações da AX, por parte dos educadores do Lar, do director de turma, da gestora do 2º ciclo, do conselho de turma, de um vigilante, de um funcionário do KKL. 12. Quanto ao próprio Assistente AP, na sessão da audiência de julgamento de 20 de Junho de 2005 (cfr. acta de fls. 32.520 e ss., e CD1, 1ª faixa + CD1, 2ª faixa + CD2, 1ª faixa), desde logo situa o tal abuso que diz ter visto por parte do Recorrente ao Assistente AT depois de ter ido à casa (…) e quando já havia carrinhas (…) ao serviço da AX. 13. O Assistente declara que, ao deparar com a porta aberta (não explicando de qual das salas), empurrou a porta com o pé, entrou na sala com uma caixa nas mãos e, ao virar-se para a direita, deparou com o colega a praticar sexo oral ao Recorrente (o que, por sua vez, é diferente do que dissera em sede de processo disciplinar, já que aí referira que se havia tratado de masturbação mútua). 14. Ora, tendo em conta os depoimentos das testemunhas a quem foi colocada a questão e o exame efectuado à (...) pelo Tribunal (em sede de exame ao local em 8 de Julho de 2005, cfr. acta de fls. 33.480 e ss.), não é de forma alguma verosímil que alguém pudesse, no silêncio da noite (depreende-se a hora tardia das declarações do Assistente, que refere que a (...) estava fechada à chave e que, a seguir ao episódio, voltou para o lar para se ir deitar), com a (...) vazia, ter descido as escadas e entrado dentro de uma sala do tamanho das salas da cave, com um caixote na mão, sem ter sido ouvido e visto pelas pessoas que lá estariam dentro. 15. Para além do mais, há vários depoimentos (cfr., por ex., os depoimentos de EF, RV, etc., cuja indicação das sessões da audiência de julgamento em que foram ouvidos se referirá abaixo) segundo os quais a sala da informática, que era a sala em frente quando se descia as escadas para a cave (e que o Assistente vem a identificar posteriormente como sendo a sala onde viu os abusos), estava repleta de objectos, pelo que não haveria espaço para duas pessoas estarem sem ser logo junto à porta dessa sala. 16. Quanto à sala que fica à esquerda quando se desce, segundo os vários depoimentos das testemunhas a quem tal foi perguntado (EG, em 24 de Janeiro de 2007; MU, em 20 de Setembro de 2006, cfr. acta de fls. 39.582, e CD1, 2ª faixa; EH, 9 de Novembro de 2006, com suporte áudio abaixo identificado), essa sala era a sala da caldeira, na qual apenas havia uma enorme caldeira e que estava sempre fechada, não correspondendo à descrição da sala com objectos que o Assistente vem a referir. 17. Acresce que o Assistente declara que a porta abre para fora e não para dentro, o que também não corresponde à verdade, como o Tribunal pôde verificar aquando do exame ao local. 18. Por fim, repare-se: o Assistente AT apenas entrou para a AX como aluno interno em 28 de Outubro de 1999 (cfr. fls. 126 do Apenso Y), data já não compreendida no período pelo qual o Recorrente vem condenado por abuso ao Assistente AP, sendo que este último situa o seu abuso poucos dias depois daquele a que diz ter visto ser sujeito o AT. 19. O Assistente reproduz conversas em que trata o Arguido A pelo nome, quando diz em julgamento apenas ter sabido o nome dele depois do início deste processo, conhecendo-o, antes disso, por “A”. 20. O Assistente esclareceu que o primeiro abuso que sofreu foi pelo Arguido A na garagem de CZ, e que a primeira vez que foi a (…) frequentava o 4º ou 5º ano dos currículos alternativos. 21. Entre outros, estava lá o ora Recorrente, que já conhecia por ser (...). Diz que tinha sete anos na primeira vez que foi à casa de (…) (o que levaria os outros factos para antes da sua entrada na AX, que aconteceu em 7 de Agosto de 1992, aos sete anos de idade! – cfr. Apenso DA, fls. 2), e quinze na última (que foi a quinta vez). 22. Sendo que, quanto ao Recorrente, esclarece que “(..) vi-o a passar na (...), mas, como já referenciei a este Tribunal, nós na AX aprendemos a ter boas educações, sempre o cumprimentei com bom dia, boa tarde, mas nunca parei, nunca “tive” a falar com o, com o Sr. C”. 23. Dúvida não resta, portanto, de que o abuso que diz ter visto nas caves da (...) (e o seu próprio abuso naquele local, que só mais tarde refere na audiência de julgamento de 24 de Junho de 2005) só poderia ter ocorrido depois da primeira vez que foi a (…) e de todos os outros abusos, tal como referira no início da sessão espontaneamente, dado que antes disso só havia visto o Recorrente de passagem. 24. Na sessão da audiência de julgamento de 24 de Junho de 2005 (cfr. acta de fls. 32.652 e ss., e CD1, 1ª e 2ª faixas e CD2, 1ª e 2ª faixas), o Assistente AP refere que a ida à casa (…) foi, ao que julga, depois da ida a (…), a (…) e ao estúdio (com o Arguido H), tendo ainda ido ao (...) do Arguido K e à casa do (…), tudo antes da primeira ida a (…). 25. Ora, não deixa de se estranhar, face a tudo o que relatara antes e à referência pormenorizada ao abuso que diz ter visto o Recorrente perpetrar sobre o Assistente AT, que o Assistente AP só neste momento do seu depoimento se tenha “lembrado” de relatar o abuso de que ele próprio teria sido vítima nas caves da (...). 26. O Assistente diz ter ido ter à (...) com o Recorrente por ordem do Arguido A, relatando inclusive ter entrado no gabinete do mesmo e falado com ele – o que é substancialmente diferente do que consta da Pronúncia e do que foi dado como provado no Acórdão sob recurso (que o Recorrente o teria encontrado nas instalações da (...)); 27. O Assistente reproduz novamente conversas em que trata o Arguido A pelo nome, quando diz em julgamento apenas ter sabido o nome dele depois do início deste processo, conhecendo-o, antes disso, por “A”; 28. O Assistente diz que o Recorrente lhe deu a mão e o levou para a cave, e não que o Recorrente lhe disse para o acompanhar (ao contrário do que foi dado como provado); 29. O Assistente nega ter sido tocado pelo Recorrente no pénis, ao contrário do que vem na Pronúncia e que foi dado como provado; 30. O Assistente descreve ter sido abusado na sala que fica em frente de quem desce as escadas para as caves, o que corresponde à sala da informática (cfr. depoimentos de RV, em 15 de Dezembro de 2006, cfr. acta de fls. 42.304 e ss., e CD1, 1ª, 2ª e 3ª faixa; CD2, 1ª faixa; EF, em 26 de Fevereiro de 2007, e MU), mas dirá mais tarde que nessa sala se guardavam documentos relacionados com os alunos, o que não corresponde a essa sala da informática (e muito menos corresponderia à sala da caldeira, que era a sala ao lado, à esquerda de quem desce as escadas da cave), o que leva a desconfiar que não tenha, na verdade, entrado nunca em tais salas. 31. O Assistente não consegue dar uma explicação verosímil para o facto de não ter relatado o abuso de que fora vítima por parte do Recorrente nas caves da (...) senão no fim do segundo dia em que prestou declarações e após ter repetido a indicação dos locais e arguidos que haviam abusado de si; diz que o Arguido A o costumava ameaçar se falasse e que se trata de pessoas muito poderosas (sem referir porque estivera à vontade para relatar todos os outros abusos, incluindo o abuso do Recorrente sobre o Assistente AT, que diz ter visto também nas caves da (...)), mas acabando a referir que os Arguidos de quem tem mais medo são os Arguidos H e K. 32. O Assistente diz ter sido sempre obrigado a praticar os abusos, introduzindo até o facto de o Arguido A o ameaçar e lhe bater quando ele se negava, mas reconhece que não foi este arguido quem o mandou ter práticas sexuais com o professor DU. 33. O Assistente tão depressa diz ter muito medo do Arguido A como o elogia por este estar a colaborar e a confessar os factos, o que não se coaduna com o medo que diz sentir de que este lhe venha ainda a fazer mal. 34. O Assistente introduz, de forma algo forçada, o facto de ter presenciado discussões entre o Recorrente e o Arguido A, trazendo à colação a questão da relação de proximidade e desrespeito por parte deste último, que todas as testemunhas que não gostam do Recorrente parecem ter sido as únicas a presenciar, ainda que sem se terem visto umas às outras (cfr. depoimentos de HI, EEI, AAT, Assistente AV, respectivamente nas sessões de julgamento de 13 de Setembro de 2009, acta a fls. 39.499, e CD1, 1ª faixa e CD2, 1ª, 2ª e 3ª faixa e CD2, 4ª faixa e CD3, 1ª faixa e CD4, 3ª faixa; 17 de Maio de 2006, acta a fls. 38.322, e CD1, 1ª e 2ª faixa; CD2, 1ª faixa; 3 de Maio de 2006, acta a fls. 38.126, e CD1, 1ª faixa;CD2, 1ª e 2ª faixa e CD2, 3ª e 4ª faixa; CD3, 1ª faixa; 19 de Setembro de 2005, acta a fls. 34.331, e DVD1, dos 0 às 02h11m e DVD1, das 02h11m às 04h00m). 35. Na sessão de julgamento de 29 de Junho de 2005 (cfr. acta de fls. 32.713 e ss., e 1ª, 2ª e 3ª faixa CD1 e 4ª faixa CD1 + 1ª faixa CD2), o Assistente diz ser um “apaixonado por carros de alta cilindrada” e distinguir bem as marcas e os logótipos, assim como os diferentes modelos de cada marca, como os modelos da (…) e da (…). 36. Contudo, cabe esclarecer que, tendo o Assistente referido estar a descarregar material de uma (…) quando presenciou o abuso na cave ao Assistente AT, tal apenas poderia ter ido lugar após 16 de Novembro de 1998 (não fora o singelo facto de o AT não ser ainda aluno à altura, senão a partir de 28 de Outubro de 1999), dado que apenas a partir dessa data passou a (...) a dispor de carrinhas deste modelo (cfr. registos a fls. 877 e 919, do Apenso EJ3). 37. O Assistente declara ainda que conheceu o Assistente AT quando este entrou para o seu lar, o que, segundo o documento de fls. 41 e ss. do Apenso Y, aconteceu em 28 de Outubro de 1999. 38. Declara que tanto a (…) como à casa das (…) sempre foi com o AT, o que, necessariamente, coloca tais factos, assim como o abuso que diz ter surpreendido na cave, após 28 de Outubro de 1999, data em que o Assistente AT ingressou como aluno interno da AX, tendo sido colocado no seu lar. 39. Se viu o abuso ao AT poucos dias antes de ter ocorrido o seu próprio abuso, este nunca poderia ter tido lugar antes de Novembro de 1999, muito depois do período pelo qual vem o Recorrente condenado quanto a estes factos. 40. O Assistente AP mentiu ao Tribunal, ao relatar um abuso que o colega AT sempre negou, como já mentira em sede de processo disciplinar, tendo inclusive nessa sede desdito o seu próprio abuso nas caves, pelo que não podia merecer credibilidade pelo Tribunal, pelo menos para além da dúvida razoável. 41. Na sessão da audiência de julgamento de 4 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.279 e ss., sem referência ao CD que foi gravado nessa sessão), o Assistente AP, perguntado sobre as razões para a sua expulsão da AX, apenas refere a posse de estupefaciente para consumo, negando o tráfico ou a prostituição fora da AX (caso DU) como outras causas – isto é, mais uma vez mentindo ao Tribunal. 42. Na sessão de julgamento de 6 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.344 e ss., e CD2, 3ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa e 1ª, 2ª e 3ª faixa do CD1 e 1ª e 2ª faixa do CD2), o Assistente nega ter respondido alguma coisa ao director EJ quando este lhe comunicou a decisão de expulsão. 43. Porém, a testemunha EJ confirmou integralmente o conteúdo do documento de fls. 850 e ss. do Apenso Z15, na sessão de 10 de Maio de 2006 (cfr. acta de fls. 38.219 e ss., e CD1, 1ª faixa; CD2, 1ª e 2ª faixa e CD2, 3ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa), desmentindo o Assistente AP e referindo outras ameaças e traços de carácter. 44. Na sessão de julgamento de 7 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.421 e ss., e 1ª e 2ª faixas CD1 e 1ª faixa CD2, 1ª e 2ª faixas CD1 e 1ª faixa CD2), o Assistente confirma que os episódios da cave da (...) (com AT e com ele próprio) aconteceram antes de ir a (…) a primeira vez, e entre o segundo e o terceiro abuso do Arguido A. 45. Diz agora que o Arguido A o chamou através de um telefonema para o lar (o que antes não havia dito). 46. Diz que as luzes estavam ligadas e não teve que acender nada, e que a porta da sala era em madeira e abria para dentro. 47. O Assistente declarou que, depois de ter contado ao Arguido A o que vira, continuou a descarregar os caixotes todos, que deixou na cave, no átrio “memo ao lado da porta”. 48. Ora, podia este descarregamento ter sido feito sem que os intervenientes no acto o ouvissem? Como podem estas declarações fazer sentido? 49. O Assistente declarou ainda que relatou este episódio numa entrevista emitida em 21 de Janeiro de 2003 no Jornal Nacional da DR (cfr. DVD de fls. 60.413, visionada em audiência de julgamento de 14 de Abril de 2009, cfr. acta de fls. 63.160). 50. Contudo, na mesma nunca refere ter sido ele próprio abusado pelo ora Recorrente. 51. Estranhamente, em 1 de Fevereiro de 2003, uma vez mais no Jornal Nacional da DR, o Assistente concede nova entrevista, desta feita em conjunto com outros Assistentes, dando pelo pseudónimo “(…)”, mas sem se referir ao ora Recorrente em qualquer dos locais de abuso, ou ao AT (cfr. peça transcrita a fls. 1654 e ss. dos autos, nomeadamente a partir de fls. 1658). 52. Relativamente ao seu próprio abuso na cave, o Assistente declara nesta sessão de audiência que o Arguido A foi ter com ele não sabe onde e lhe disse que fosse ter com o Recorrente ao gabinete deste (o que contraria a versão da Pronúncia e os factos provados). 53. Diz agora que entrou pela porta espelhada da (...), que estava aberta (o que imediatamente leva à interrogação de como é que um (...)-(...) iria arriscar dedicar-se a tais práticas, com um aluno menor, na (...), especialmente numa altura em que a porta do edifício ainda estava aberta). 54. E diz, aliás, que não chegou a entrar no gabinete do ora Recorrente. 55. Confirma ainda que o seu próprio abuso foi na mesma sala em que vira ser abusado o Assistente AT e que, de resto, nem sequer se recorda se a sala da cave estava aberta ou fechada. 56. O Assistente declara também que o Recorrente nunca lhe tocou no pénis, ao contrário do que vem descrito na Pronúncia (pelo que tal facto não podia ter sido considerado provado) e diz que o Recorrente pôs as calças para baixo, o que não corresponde ao que vem descrito na Pronúncia (da qual resulta que não baixou as calças, mas sim que pôs o pénis fora das calças) e nos factos provados. 57. O Assistente refere ainda que o seu próprio abuso ocorreu cerca de uma semana depois do abuso a que diz ter visto ser submetido o Assistente AT. 58. Diz ainda que o Recorrente lhe deu, na ocasião, cerca de quinhentos a mil escudos (ao contrário dos três mil escudos descritos na Pronúncia), quanto em sessão anterior referira não se lembrar se o Recorrente ou o Arguido A lhe haviam dado dinheiro após este abuso, muito menos a quantia em questão, pelo que tal facto não podia ter sido considerado provado. 59. Confirma que a luz da sala da cave estava acesa também no dia do seu próprio abuso, e julga que a sala não tinha janelas, quando as testemunhas que utilizavam aquela sala, EF, RV e EI (a cujos depoimentos adiante se alude), referiram que a sala tem (tal como a sua porta) e tinha janelas bem grandes, que davam para as traseiras do lar FE, no CZ. 60. Refere ainda o Assistente que o material que transportou para a cave da (...) dentro dos caixotes consistia em ecrãs e torres de computadores, em vez dos documentos que referira anteriormente, o que leva a interrogar como poderia o jovem, com a compleição física e idade que teria, proceder a tal transporte, dado também que, à data, este equipamento tinha um peso superior ao que tem actualmente. 61. Na sessão de 7 de Julho de 2005, relativamente ao vidros da entrada da (...), a primeira coisa que disse, espontaneamente e sem que alguém lhe tivesse chamado a atenção, foi que eram “espelhados”. 62. Vindo posteriormente a corrigir estas declarações no sentido de dizer que, na altura dos factos, os vidros da entrada da (...) eram apenas de vidro transparente. 63. Sendo certo que, na sessão de 30 de Junho de 2005, o Assistente esclareceu saber bem qual a diferença entre “espelhado” e “de vidro”, usando a expressão “vidro espelhado” para descrever a sala das instalações da Polícia Judiciária onde terá comparecido para fazer o reconhecimento da Arguida Q. 64. Ora, quanto a este aspecto, é relevante o depoimento do arquitecto EH, responsável pela colocação daquela película reflectora, que depôs na audiência de julgamento de 9 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls.41.198 e ss., CD4, 1ª e 3ª faixa), e a documentação junta aos autos a fls. 50.759 e ss, da qual resulta que a película reflectora foi aposta nos vidros da (...) em 28 de Maio de 2002. 65. Assim, a descrição inicial e espontânea do Assistente AP demonstra a impossibilidade de a história se ter passado antes disso (ou, obviamente, depois, por já não ser aluno há muito) 66. Aliás, a datação dos alegados factos tanto mais impossível se torna (por não corresponderem à verdade) dado o Assistente localizar o abuso a seguir ao do Assistente AT, que entrou para a AX no fim de Outubro de 1999, sendo que as obras no refeitório das caves (cfr. a documentação junta a fls. 50. 762 e ss.) começaram em 22 de Julho de 1999 (tendo acabado em 12 de Setembro de 2001), e as obras de instalação do arquivo de carril decorreram muito antes, de 17 de Junho de 1998 a 3 de Novembro de 1998 (cfr. fls. 60.315, com cópia a fls. 60.406), e o Assistente afirmar que nunca viu obras nenhumas nas caves da (...). 67. E mais se acrescenta que, tal como pôde ser observado quando o Tribunal fez o exame ao local, e também cfr., por ex., o depoimento das testemunhas EG (sessão da audiência de julgamento de 24 de Janeiro de 2007) e EF (sessão da audiência de julgamento de 26 de Fevereiro de 2007), as escadas que dão para as caves da (...) e para a porta da sala em frente, em que terá alegadamente acontecido o abuso ao Assistente AP (e o que este diz ter visto dias antes, ainda que negado pelo Assistente AT) são visíveis da parte de fora da (...), especialmente ao fim do dia e com as luzes acesas, com película reflectora ou sem ela. 68. A realidade, de facto, é que os vidros da entrada da (...) só passaram a ser espelhados em fins de 2002 (não na altura dos alegados factos) e, por isso, quando o Assistente AP, depois de expulso e ausente da AX há mais de dois anos, volta à (...) para falar com a (...)a BP, na sequência da combinação feita pela jornalista IP, é essa realidade que vê, e constrói a sua história com base nela. 69. É de facto surpreendente que se possa acreditar num só dos factos relatados pelo Assistente AP, quer os que ele conta ter visto quer os que relata ter vivido. 70. O Assistente foi repetindo sucessivamente que foi ao gabinete do Recorrente. 71. Contudo, perguntado aos funcionários que trabalhavam no hall da (...) (onde se situava o gabinete do Recorrente), que trabalhavam no gabinete perpendicular ao gabinete deste, bem assim como aos funcionários que iam com muita frequência ao gabinete do Recorrente, se era habitual alunos irem ao seu gabinete, a resposta foi negativa. 72. Logo, a ida repetida do Assistente a esse gabinete, se tivesse sido verdade, teria sido notada e, possivelmente, estranhada. 73. Na sessão de julgamento de 13 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.593, e 1ª, 2ª e 4ª faixas – não se refere a 3ª – do CD), veio o Assistente referir que a razão pela qual negou o seu próprio abuso nas caves da (...), na segunda vez que foi prestar declarações no processo disciplinar instaurado ao Recorrente, resulta do facto de ter encontrado, num dia em que se deslocou à (...) para tratar de algum assunto (recorde-se que já desde 2000 era ex-aluno), a ora mulher do Recorrente (a testemunha NY), que lhe deu uma pancada nas costas e lhe disse para negar tudo o que tinha dito na primeira vez que lá fora prestar declarações. 74. Não se compreende, entre várias outras coisas, como podia a mulher do Recorrente, que não trabalhava na (...), saber quem era o Assistente AP, que fora ele a acusar o Recorrente, em que sede e quando fora depor, nem quando o iria encontrar para o poder ameaçar com uma palmada (sendo que escolheu fazê-lo na (...), em horário de exp 75. ediente, onde podiam estar a passar pessoas, mas estranhamente não estava ninguém, já que nenhuma testemunha corroborou esta história em julgamento). 76. Tão pouco poderia saber como é que o Assistente AP teria oportunidade de negar os factos – anote-se que não partiu do Assistente a iniciativa para ser ouvido pela segunda vez no processo disciplinar movido ao Recorrente. 77. Também não se compreende porque não relatou essa conversa com a mulher do Recorrente à então (...)a BP, com quem ia ter várias vezes à (...) – onde supostamente teria sido ameaçado por ela. 78. Quanto ao facto de não ter referido, em sede de processo disciplinar, que fora o Arguido A a dizer-lhe para ir ter com o Recorrente ao gabinete, aquando do seu abuso, não avança com explicação alguma. 79. Assim sendo, não podia ter sido considerado provado que o Recorrente encontrara o Assistente na (...), sem a intervenção do Arguido A, o que redunda em mais um facto erradamente dado como provado. 80. Na sessão de julgamento de 18 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.654 e ss., e 1ª cassete, lado A, das 0 às 44,75 rotações), o Assistente repete que ia para os locais dos abusos por ser obrigado pelo Arguido A, que lhes batia e os ameaçava, para logo a seguir reconhecer que este Arguido nunca lhe bateu, apenas o puxou uma vez na garagem. 81. Na sessão de julgamento de 25 de Julho de 2005 (cfr. acta de fls. 33.780, e 1ª cassete, das … rotações do lado A), o Assistente nega ter tido relações de natureza homossexual depois dos abusos sofridos no âmbito deste processo, o que não se afigura que corresponda à verdade. 82. O resultado do seu exame físico no INML, em conjugação com os esclarecimentos tomados ao perito Dr. BR, revela lesões anais provavelmente ocorridas menos de seis meses antes da realização da perícia, ou pelo menos, não apenas três anos antes, o que indicia práticas de coito anal, por parte do Assistente AP, bastante tempo depois da data dos abusos descritos neste processo. 83. O Assistente esclarece ainda que o Recorrente nunca o tratou mal, mas que tem medo dele porque tem um grande poder na AX (ainda que já não seja aluno e que saiba que o Recorrente há muito que foi afastado da Instituição). 84. Foram aliás prestados vários depoimentos relevantes que corroboram tudo o que acima se expõe, e que impunham decisão diversa da constante do Acórdão recorrido, entre eles os seguintes: (i) depoimento de EA, a tia do Assistente AP, com quem morou - Sessão de julgamento de 2 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 40.920, e CD2, 2ª faixa, CD3, 1ª faixa); (ii) depoimento do ex-director do CZ EJ - Sessão de julgamento de 10 de Maio de 2006 (cfr. acta de fls. 38.219, e CD1, 1ª faixa; CD2, 1ª e 2ª faixa e CD2, 3ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa); (iii) depoimento de EH, docente na AX e arquitecto – Sessão de julgamento de 9 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 41.198, e CD4, 1ª e 3ª faixa); (iv) depoimento de EG, funcionária do serviço de compras da AX - Sessão de julgamento de 24 de Janeiro de 2007 (cfr. acta de fls. 43.299, e CD2, 1ª faixa); (v) depoimento de EI, da empresa informática de apoio à AX - Sessão de julgamento dia 14 de Dezembro de 2006 (cfr. acta de fls. 42.257 e ss., e CD2, 3ª faixa e CD4, 4ª e 5ª faixa); (vi) depoimento de RV, técnico informático na AX - Sessão de julgamento de 14 de Dezembro de 2006, (cfr. acta de fls. 42.257 e ss., e CD5, 1ª faixa); (vii) depoimento de EF, funcionário do Departamento de organização informática da AX - Sessão de julgamento de 26 de Fevereiro de 2007 (cfr. acta de fls. 44284 e ss., e DVD, dos 17' às 2h12m); (viii) depoimento de OJ, fotocopista e uma espécie de “guarda-mor” das instalações da (...) – Sessão de 3 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 40963 e ss., e CD2, 5ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa); (ix) depoimento da mesma testemunha - Sessão de julgamento de 27 de Outubro de 2006 (cfr. acta de fls. 40.808 e ss., e CD1, 3ª faixa); (x) depoimento da mesma testemunha - Sessão de julgamento de 3 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 40.963 e ss., e CD2, 5ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa); (xi) depoimento de PW, funcionária dos serviços auxiliares, que durante o dia fazia de contínua e que ao fim da tarde esvaziava os cestos de papéis e cinzeiros – Sessão de julgamento de 2 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 40.920 e ss., e CD2, 1ª faixa); (xii) depoimento de UN, telefonista/recepcionista – Sessão de julgamento de 16 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 41.454, e CD2, 2ª faixa); (xiii) depoimento de EB, Director de Serviços na AX - Sessão de julgamento de 25 de Outubro de 2006 (cfr. acta a fls. 40.719 e ss., CD3, 1ª faixa; CD4, 1ª faixa); (xiv) depoimento de DDG, Chefe da Contabilidade – Sessão de julgamento de 26 de Setembro de 2007 (cfr. acta de fls. 47.906 e ss., e DVD, de 1h23m às 2h48m); (xv) depoimento de NY, então secretária do Recorrente, ora sua mulher – Sessão de julgamento de 30 de Abril de 2007 (cfr. acta de fls. 45.334, e DVD, dos 5' até 2h25m); (xvi) depoimento de SP, colega do Assistente – Sessão de julgamento de 16 de Novembro de 2006 (cfr. acta de fls. 41.454 e ss., e CD2, 2ª faixa ?; CD3, 2ª faixa); (xvii) depoimento de EO, colega do Assistente – Sessão de julgamento de 24 de Setembro de 2007 (cfr. acta de fls. 47.879 e ss., e DVD2, dos 0 aos 45m); (xviii) depoimento de EN, Educador – Sessão de julgamento de 13 de Dezembro de 2006 (cfr. acta de fls. 42.230 e ss., e CD2, 2ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa; CD4, 1ª e 2ª faixa); (xix) depoimento de BQ, ex-(...) da AX – Sessão de julgamento de 13 de Março de 2006 (cfr. acta de fls. 37.219 e ss. e CD1, 1ª e 2ª faixa; CD2, 1ª faixa e CD2, 2ª e 3ª faixa; CD3, 1ª faixa; CD4, 1ª e ? 3ª faixa); (xx) depoimento de JG, Assistente social - Sessão de 25 de Outubro de 2006 (cfr. acta de fls. 40.719 e ss., e CD2, 7ª e 8ª faixa); depoimento de WE (sessão de julgamento de 24 de Setembro de 2007, cfr. acta a fls. 47.879 e ss., e DVD1, das 3h56m às 4h23m), entre muitos outros. 85. No que diz respeito a prova documental, entre outros os seguintes elementos corroboram, igualmente, o acima alegado: (i) do processo individual do Assistente (cfr. Apenso DA, fls. 17, 23 e s.) constam informações da equipa técnica que referem que já em 1994 tinha perturbações psicológicas graves, em onde se descreve o caso DU e se prevê um futuro delinquente, dando-se conta também de uma grande dificuldade de adaptação logo desde que entrou para a AX, assim como da prática de furtos; (ii) consta, por seu turno, do apenso Z15, a fls. 850 e ss., a proposta de expulsão do director EJ, que refere que Assistente é violento, vândalo, que se encontra com um pedófilo, que faz ameaças, que tem comportamentos infames, que é um delinquente altamente perigoso e que trafica estupefacientes; (iii) finalmente, a fls. 856 consta participação da Gestora do 2º ciclo por muito mau comportamento e furtos; a fls. 870, refere-se “comportamentos perversos”. 86. Todos estes meios de prova e, muito especialmente, as próprias declarações do Assistente AP, permitem fundadamente pôr em causa a conclusão que o Tribunal a quo alcançou quanto à “ressonância de verdade” que descortinou no depoimento deste e na credibilidade e verosimilhança que lhe tributou. 87. É inequívoco que o Assistente AP mentiu em Tribunal – e fora deste – quando inventou a história de um abuso envolvendo o aqui também Assistente AT, que descreveu com traços idênticos àquele de que se diz vítima. Abuso que o AT – sem razão que o justificasse – sempre negou em todas as instâncias em que foi ouvido e, naturalmente também, no julgamento dos presentes autos. 88. O Tribunal não valorizou a circunstância de o Assistente ter mentido quando foi ouvido no processo disciplinar instaurado ao ora Recorrente (mentido, entenda-se, quanto à versão dos factos que sustentou em julgamento e que negou no segundo depoimento que ali prestou). 89. O Tribunal aceitou aqui como boa a mirabolante explicação do Assistente, que alegou o receio que teria sentido ante a ameaça que diz ter sofrido por parte da agora mulher do Recorrente (a testemunha NY), e não ponderou criticamente por que razão esse receio levaria o Assistente AP a negar o abuso cometido sobre si, continuando a reiterar a afirmação de que vira o Assistente AT ser abusado pelo ora Recorrente. 90. Não valorizou o Tribunal a quo as discrepâncias evidenciadas nas declarações prestadas pelo Assistente AP em instrução, nas quais em lugar algum alude a abusos por parte do Recorrente, embora se refira à sua pessoa e mencione expressamente as caves da (...) da AX. 91. Não atentou o Tribunal recorrido nas circunstâncias que rodearam a expulsão do Assistente AP da AX – maugrado o “extravio”, nas circunstâncias já referidas, da parte do seu processo individual que correspondia ao processo de expulsão – nem nas omissões intencionais que este, nas declarações que prestou em julgamento, fez para se escusar a esclarecer cabalmente os factos que estiveram na origem da sua expulsão. 92. Na verdade, e bem esclarecidos estes – que incluem, como está provado nos autos, o envolvimento do Assistente no denominado “processo de (…)” – é absolutamente incompreensível como teria podido acontecer a expulsão do Assistente AP da AX, em meados de 2000, quando antes disso este andaria a ser submetido a abusos sexuais por parte do Recorrente, ao tempo (...)-(...) da Instituição. 93. É inexplicável que se tais abusos tivessem na verdade acontecido – e não aconteceram – o Recorrente nada tivesse feito para evitar a expulsão, com receio de ser denunciado pelo Assistente, como também é inexplicável que este não procurasse a ajuda do Recorrente para evitar a expulsão (ainda que ameaçando-o de revelar os abusos de que diz ter sido vítima). 94. E como terá sido possível ao Tribunal – e os diversos depoimentos que acima se transcreveu e referiu são elucidativos – aceitar que os factos que o Assistente AP situa nas caves da (...) da AX ali pudessem ter ocorrido nas circunstâncias descritas? 95. Tais caves correspondem ao piso térreo do edifício da (...) e são providas de amplas escadas e de amplas janelas que dão para um lar a poucos metros, e de boa iluminação, com boas vistas, quer de dentro para fora quer de fora para dentro (sobretudo se for de noite e as luzes estiveram acesas, como afirma o Assistente nos seus depoimentos). 96. A (...) é um local movimentado durante o horário de expediente e não é um lugar de fácil acesso fora deste (não é por acaso que nenhuma das testemunhas tenha corroborado a ideia de que o Arguido A tivesse fácil acesso àquelas instalações fora do seu horário de funcionamento). 97. A descrição que o Assistente dá do edifício e da sala onde situa os abusos é, como se viu, errada e imprecisa, falhando em vários detalhes (como, por exemplo, os vidros espelhados ou o modo de abertura da porta). 98. Anote-se, ainda, que a versão dos factos relatados pelo Assistente AP não coincide, no que respeita à participação nos mesmos do Arguido A, com a versão deste último. 99. O Tribunal desconsiderou em absoluto todos os depoimentos e prova documental que apontam no sentido de o Assistente AP ser uma pessoa mentirosa, pouco escrupulosa e pouco fiável – o que, não diminuindo os seus direitos como Assistente nos presentes autos – deveria ter sido devidamente ponderado na aferição da sua credibilidade. 100. O que vem de se alegar afecta, in totum, a fundamentação em que o Tribunal recorrido assenta a decisão de considerar provados os factos constantes dos nrs. 101 a 101.10, dependente da credibilidade que erroneamente atribuiu às declarações do Assistente AP e à verosimilhança que reconheceu à versão que apresentou daqueles factos. 101. Em suma, mal andou o Tribunal a quo ao considerar credível o depoimento do Assistente AP, tomando exclusivamente as suas declarações – conforme se demonstrou – como fundamento bastante para a decisão de considerar provados os factos constantes dos nrs. 101 a 101.10 dos factos provados, assim condenando o ora Recorrente pela sua prática. 102. Deverá, em consequência, ser revogada a decisão do Tribunal a quo quanto a este segmento da decisão da matéria de facto, devendo esta ser substituída por outra, tomada por esse Venerando Tribunal ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo art.º 431.º als. a) e b) do CPP, que venha a considerar como não provados os factos constantes dos nrs. 101 a 101.10 do Acórdão sob recurso, com a consequente absolvição do Recorrente pelo crime por que foi condenado. 103. O Acórdão recorrido, com fundamento nos factos provados a que acima se fez referência, condenou o ora Recorrente no pagamento ao Assistente/Demandante AP de uma indemnização no valor de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), por danos não patrimoniais por este sofridos em consequência de tais factos (cfr. a p. 1742 do Aresto). 104. No articulado que apresentou, o Assistente/Demandante refere- -se aos factos ora em apreço no art.º 4.º, liquidando a indemnização que peticiona pelos danos que alega ter sofrido em consequência dos mesmos, no art.º 34.º al. b), no valor de € 10.000,00 (dez mil euros), que é o do pedido a este título deduzido contra o ora Recorrente (cfr. a fls. 14.819 e 14822 dos autos). 105. Ora, atendendo ao princípio do pedido, que vigora igualmente no domínio do processo penal, não é legalmente admissível o arbitramento pelo tribunal de indemnização em montante superior ao peticionado. Esta razão levaria, só por si, a que o valor arbitrado pelo Tribunal a quo devesse ser revogado, por violação do dis(...) no art.º 661º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do dis(...) no art.º 4.º do CPP, reduzindo-se a indemnização a montante equivalente ou inferior ao valor peticionado. 106. Porém, em conformidade com o que supra se vem de alegar quanto à responsabilidade criminal, também no domínio da responsabilidade civil o ora Recorrente pugna, consequentemente, pela sua absolvição do pedido de indemnização civil contra si deduzido pelo Assistente/Demandante AP e pelo qual foi condenado ao pagamento de indemnização no valor de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros). 107. Caso assim se não entenda, requer-se subsidiariamente que seja revogado o Acórdão recorrido na parte em que condenou o Recorrente ao pagamento daquela indemnização ao Assistente/Demandado AP, reduzindo-se equitativamente o montante arbitrado, em todo o caso sempre para valor inferior ao peticionado no pedido de indemnização civil deduzido nos autos (de 10.000,00 €). 108. Relativamente ao Assistente AI, sustentou e continua a sustentar o ora Recorrente a falta de legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que respeita ao crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art.º 172.º, nrs. 1 e 2 do CP[1]. 109. Tal excepção foi suscitada logo no requerimento para abertura de instrução e, por despacho de fls. 17.042 a 17.046 dos autos, foi julgada improcedente, decidindo-se no sentido da legitimidade do Ministério Público por se ter entendido que o direito de queixa foi tempestivamente exercido. 110. De tal despacho foi inter(...) o recurso de fls. 17.916 a 17.953, admitido, com subida a final, pelo despacho de fls. 18.351 dos autos, na apreciação do qual o ora Recorrente mantém interesse. 111. Ora, as alterações legislativas entretanto introduzidas ao regime a que se vem de fazer referência, resultantes da Reforma de 2007 – superveniente àquela decisão judicial e ao recurso dela inter(...) – vêm reforçar o entendimento sustentado pelo ora Recorrente. 112. A Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro alterou a redacção dos arts. 113.º e 115.º do CP, sendo particularmente relevantes para a questão em apreço a alteração ao n.º 6 do art.º 113.º e o novo n.º 2 do art.º 115.º. 113. Tais alterações normativas modificaram profundamente o regime legal relativo ao exercício do direito de queixa e à extinção deste no caso de os ofendidos serem, à data dos factos, menores de 16 anos de idade. 114. É notória a ampliação do prazo de caducidade do direito de queixa, cujo terminus a quo é agora fixado na data em que o ofendido completar 18 anos de idade. 115. Das disposições conjugadas dos arts. 113.º, n.º 6 e 115.º, n.º 2 actualmente vigentes, resulta que o ofendido, após perfazer 16 anos de idade, passa a dispor de um período de 2 anos e 6 meses para, querendo, exercer o direito de queixa. 116. O prazo de caducidade do direito de queixa agora previsto no art.º 115.º, n.º 2 do CP é, assim, objectivamente delimitado por referência ao momento em que o ofendido complete 18 anos de idade. 117. Mas esta disposição não tinha paralelo em qualquer das que vigoravam ao tempo dos factos que constituem o objecto dos presentes autos. 118. Por um lado, a única norma aplicável ao caso era, então, a constante do art.º 115.º, n.º 1 do CP (cuja redacção se manteve inalterada): “O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores, ou a partir da morte do ofendido, ou da data em que ele se tiver tornado incapaz”. 119. Por outro lado, parece evidente que as disposições constantes dos arts. 113.º, nrs. 1 e 3 e 115.º, n.º 1 do CP, invocadas no despacho de fls. 17.042 a 17.046 dos autos, não eram aplicáveis aos factos dos autos, porque nem o direito de queixa foi exercido pelo legal representante nem se pode sustentar que o ofendido AI só tomou conhecimento dos factos após completar 16 anos de idade (pelas razões oportunamente aduzidas no recurso a que se fez alusão e para o qual se remete). 120. Assim sendo, resulta cristalino que a interpretação que naquele despacho se fez das normas aplicadas ao caso, maxime da constante do art.º 115.º, n.º 1 do CP, foi a de que o direito de queixa se extingue no prazo de 6 meses contados da data em que o ofendido perfizer 16 anos de idade. 121. Repare-se que esta interpretação não encontra qualquer arrimo na letra daquele preceito legal, pelo que não traduz de modo algum uma interpretação extensiva do mesmo. 122. Pelo contrário, o que as alterações legislativas evidenciam relativamente ao regime anteriormente vigente é a existência de uma verdadeira e própria lacuna. 123. Entendeu por bem o legislador da Reforma de 2007 colmatar tal lacuna – por via legislativa, como inevitavelmente teria que ser – inovando através da introdução das normas constantes dos arts. 113.º, n.º 6 e 115.º n.º 2 do CP. 124. O que vem assim de se alegar demonstra bem que a decisão – oportunamente impugnada – no sentido de considerar que a queixa deduzida pelo Assistente AI fora tempestivamente apresentada e que, consequentemente, assistia ao Ministério Público legitimidade para exercer a acção é ilegal, por se fundar em errada interpretação dos arts. 113.º, nrs. 1 e 3 e 115.º, n.º 1 do CP (na redacção ao tempo vigente). 125. Tal interpretação atenta, aliás, contra o princípio da legalidade, previsto no art.º 1.º, nrs. 1 e 3 do CP e no art.º 29.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), por redundar na integração de uma lacuna in malam partem, o que, naturalmente, é legal e constitucionalmente vedado ao julgador. 126. Reitera-se a já anteriormente arguida inconstitucionalidade da interpretação das normas constantes dos arts. 113.º, nrs. 1 e 3 e 115.º, n.º 1 do CP[2], subjacente à aplicação que delas foi feita no despacho de fls. 17.042 a 17.046 dos autos (sufragada a pp. 90 e ss. e 95 e ss. do Acórdão recorrido), segundo a qual o direito de queixa se extingue no prazo de 6 meses contados da data em que o ofendido perfizer 16 anos de idade, por a mesma violar o dis(...) no art.º 29.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP). 127. Por fim, também se afigura de todo inadmissível a hipótese de aplicação aos factos em apreço nos presentes autos do novo regime introduzido pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro. Tal aplicação retroactiva de um regime jurídico manifestamente desfavorável, violaria o dis(...) no art.º 2.º, n.º 1 do CP e nos arts. 18.º, n.º 3 e 29.º, nrs. 1 e 4, ambos da CRP. 128. O Tribunal a quo não se pronunciou acerca da questão da prévia da legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, embora esta tenha sido expressamente suscitada pelo Recorrente na sua contestação. 129. Assim, independentemente de o Recorrente ter inter(...) recuso do despacho interlocutório proferido em sede instrução, uma vez suscitada expressamente a questão perante o Tribunal de julgamento, este deveria tê-la apreciado e decidido, à semelhança do que fez relativamente a idênticas questões prévias suscitadas pelos Arguidos E e K (respectivamente a pp. 90 e ss. e 95 e ss. do Acórdão). 130. Não seria a circunstância de haver um recurso anteriormente inter(...) pelo Recorrente, com subida diferida com o recurso que viesse a ser inter(...) da decisão final, que constituiria, para tanto, qualquer entrave. 131. Tanto mais que, como bem se assinalou no decisão sob recurso, o facto de o Tribunal ter proferido decisão genérica sobre a verificação dos pressu(...)s processuais, nos termos do art.º 311.º, n.º 1 do CPP, não tem valor de caso julgado formal, podendo, até à decisão final, conhecer-se de tais questões (invocando-se, para tanto, a jurisprudência firmada no Acórdão do STJ n.º 2/95, de 16 de Maio) [cfr., em sentido concordante, ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, in Comentário do Código de Processo Penal, cit., a p. 801, nota 28]. 132. Consequentemente, ao não conhecer da questão da ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que se refere ao crime de abuso sexual de criança, expressamente suscitada pelo Recorrente na sua contestação, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questão que lhe foi suscitada e que tinha o dever de apreciar e decidir, assim cometendo uma omissão de pronúncia geradora da nulidade do Acórdão, ex vi do dis(...) no art.º 379.º, n.º 1 al. c) do CPP. 133. Termos em que, deveria ter sido julgado extemporâneo o exercício do direito de queixa por parte do Assistente AI (atenta a data da declaração do mesmo exarada a fls. 2976, no auto de inquirição de fls. 2973 e ss.), e, em consequência, nula a acusação deduzida e a subsequente pronúncia do ora Recorrente, pela prática de um crime de abuso sexual de criança, p. e p. pelo art.º 172.º, nrs. 1 e 2 do CP[3], o que, só por si, sempre deveria ter determinado a absolvição deste pelo crime por que veio a ser condenado no Acórdão sob recurso. 134. Ainda no que respeita a este crime, o Tribunal a quo considerou provado (sob os nrs. 104 e 104.1 dos factos provados – cfr. p. 147 do Acórdão) que os factos terão ocorrido entre os meses de Novembro ou Dezembro de 1999, a uma quarta-feira, em hora não concretamente apurada. 135. Na pronúncia a descrição deste facto não é rigorosamente coincidente com o que resultou provado, porquanto o que ali se consignou foi, exactamente, o seguinte: “Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, por volta das 15 horas, junto do (…), tendo-lhe dito que precisava que ele “fosse a uma casa.” (Sublinhado nosso.) 136. Como se pode concluir, a pronúncia aponta uma hora aproximada – o encontro entre o Arguido A e o Assistente teria ocorrido cerca das 15 horas – o que delimita (mais que não seja por exclusão), o período do dia em que os factos teriam acontecido. 137. Fica fora da descrição factual da pronúncia o período da manhã, já que só após o encontro com A, cerca das 15 horas, o Assistente teria sido por este conduzido ao local onde viria a ser abusado. 138. Assim, ao eliminar a referência à hora do dia que constava da descrição do facto constante da pronúncia, a decisão recorrida ampliou o período temporal em que teriam ocorrido os factos, uma vez que neste se passa forçosamente a incluir também os períodos da manhã ou da noite [“(…) local e hora não concretamente apurado” – cfr., sic, o facto provado n.º 104], rectius o dia todo (a totalidade das 24 horas das quartas-feiras dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999). 139. Esta ampliação do lapso de tempo da possível ocorrência dos factos, por contraposição à sua precisa referenciação temporal – a que, ainda que com alguma latitude, se procedeu na pronúncia – configura uma verdadeira alteração não substancial dos factos, atinente às circunstâncias de tempo do cometimento dos factos. 140. Na verdade, não é indiferente ao exercício dos direitos de defesa que os factos imputados na acusação ou na pronúncia sejam temporalmente situados no período da manhã ou da tarde ou da noite. 141. Bastará pensar na hipótese de o arguido, acusado de haver cometido o crime em determinado dia durante a tarde, apresentar em juízo um álibi que demonstre a impossibilidade de tal ter sucedido. Naturalmente que se assim o fizer, estará a defender-se do facto circunstanciado por que foi acusado. 142. Não será concebível que, sem lhe vir a ser dada efectiva possibilidade de se defender – em respeito ao inalienável princípio do contraditório – o arguido venha, a final, a ser condenado pela prática desse crime, nesse dia, mas perpetrado a hora indeterminada. 143. No caso sub judice não foi indiferente à defesa apresentada em juízo pelo Recorrente a delimitação do facto que lhe era imputado na pronúncia através daquela específica referenciação temporal. 144. De facto, a estratégia de defesa assentou, em larguíssima medida, na demonstração do que o Recorrente fez nos períodos temporais em que lhe era imputada a prática de crimes – tendo, para isso, coligido um impressionante acervo de registos com os quais elaborou a lista integrada que apresentou na sua contestação – e, também, no carrear para os autos diversos elementos documentais relativos à vivência dos Assistentes, com o propósito de que através do cruzamento de uns e outros pudesse contribuir para o esclarecimento dos factos e assim demonstrar a sua inocência. 145. No caso dos factos relativos ao Assistente AI, em que as circunstâncias de tempo do cometimento dos factos são de alguma forma enunciadas (às quartas-feiras, entre Novembro e Dezembro de 1999, cerca das 15 horas) é efectivamente possível fazer o confronto dos registos relativos ao Recorrente e os diversos documentos respeitantes aquele Assistente, entre os quais avultam os seus horários escolares, registos de faltas e livros de registo de ocorrências do lar. 146. Por essa razão, a alteração das circunstâncias de tempo do cometimento do facto, concretamente da hora do dia a que o mesmo tenha ocorrido, é susceptível de violar o princípio do contraditório e bulir com o exercício do direito de defesa. 147. Tal verificar-se-á sempre que a alteração em causa não seja indiferente ao modo como foi deduzida a defesa, de tal sorte que essa alteração pressuponha, por parte do Tribunal a quo, a valoração de prova relativamente à qual não foi dada ao Recorrente a possibilidade de se defender em juízo [v., neste sentido e versando questão análoga, o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08/02/2010, Proc. nº 246/07.0GAAMR.G1 in www.dgsi.pt]. 148. Termos em que, ao condenar o Recorrente nos termos em que fez, dando como provados factos – os constantes dos nrs. 104 e 104.1 dos factos provados (cfr. a p. 147 do Acórdão) – que configuram uma alteração não substancial dos factos constantes da pronúncia (cfr. fls. 20885 a 20887 dos autos), sem ter previamente procedido à comunicação dessa alteração e dado ao Recorrente a oportunidade de exercer o contraditório, o Tribunal a quo violou o dis(...) nos arts. 358.º, n.º 1 e 379.º, n.º 1 al. b), ambos do CPP, com a consequência, cominada nesta última disposição legal, da nulidade do Acórdão recorrido. 149. Relativamente aos factos com base nos quais vem o Recorrente condenado pela prática de um crime contra o Assistente AI, a prova dos mesmos assenta, exclusivamente, nas declarações prestadas pelo Assistente e não no relato de quaisquer testemunhas ou em qualquer outro meio de prova. 150. Tal Assistente prestou declarações no processo diversíssimas vezes, em inquérito, tanto perante a Polícia Judiciária como perante o Ministério Público e, já em sede de instrução, perante a Meritíssima Juíza de Instrução Criminal. Há, igualmente, referências a relatos seus constantes dos relatórios elaborados pelos peritos do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML). 151. Lamenta-se, porém, e à semelhança do que aconteceu relativamente ao Assistente AP, que por falta do necessário acordo para a leitura em audiência das declarações do Assistente em inquérito (art.º 356.º, nrs. 2 al. b) e 5, do CPP), ao que este reiteradamente se opôs, não tenha sido possível proceder à leitura integral dessas declarações e, assim, valorá-las em julgamento. Certamente que o esclarecimento dos factos e, consequentemente, a verdade material, em muito teriam beneficiado. 152. A fls.6502 dos autos consta o auto de reconhecimento de local, respeitante à deslocação do Assistente AI com a Polícia Judiciária, em 7 de Julho de 2003, à zona da (…), para localização da casa onde teria sido submetido a abusos. 153. Nesse auto foram consignadas declarações do Assistente, que referiu ter sido levado a essa casa pelo Arguido A para a prática de actos sexuais com um indivíduo adulto que não identificou. 154. Sendo de notar que não se fez constar do auto que o Assistente tivesse dado qualquer indicação para que se chegasse à (…), nem que tivesse feito alusão a que se recordava da existência de uma placa “grafitada”, com a inscrição “(…)”. 155. Na sessão de julgamento de 5 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.550 e ss., e 1ª cassete, dos 0m a 1h45m e 2ª cassete, dos 0m a 1h33m), o Assistente negou ter tido relações de natureza homossexual depois dos abusos sofridos no âmbito deste processo, que teriam terminado no Verão de 2001 (por parte do Arguido A). 156. Contudo, do relatório do exame (...)-legal de natureza sexual (fls. 7611 a 7618 dos autos), consta que “(…) os sinais observados no exame físico do AI são compatíveis com a prática repetida de coito anal (apagamento das pregas da mucosa anal, com erosões e uma apreciável laxidão das fibras musculares do respectivo esfíncter)”. 157. Em esclarecimentos tomados ao Dr. BR na sessão de 28 de Setembro de 2006 (cfr acta a fls. 39.719 e ss., e CD1, 2ª faixa e CD2, 1ª e 2ª faixa e CD2, 3ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa; CD4, 1ª, 3ª e 4ª faixa), referiu o mesmo que se pode concluir que os sinais observados no ânus do Assistente foram provavelmente provocados por relações anais ocorridas menos de seis meses antes da realização da perícia, efectuada em 8 de Maio de 2003. 158. Por outras palavras, o Assistente terá sido sujeito a sexo anal no período de Novembro de 2002 até Maio de 2003, ou pelo menos em data aproximada dessas. 159. Tal não é de todo compatível com o afirmado pelo Assistente, o que abala necessariamente a credibilidade que deve merecer o seu depoimento, avaliado como um todo. 160. Por outro lado, a fls. 7617, o Perito faz constar que “À observação do ânus, constata-se um marcado apagamento das pregas da mucosa, que se apresenta descorada e com pequenas erosões, de coloração nacarada, a nível dos quadrantes inferiores.” 161. Sendo que, a este propósito, esclareceu o Dr. BR, na referida sessão de julgamento, que “(...) normalmente o nacarado é menos duradouro do que outro tipo de alterações”. 162. O relatório aponta, assim, no sentido de o Assistente mostrar lesões recentes, dificilmente compatíveis com o alegado termo das relações anais dois anos antes da realização da perícia, em meados de 2001. 163. O Dr. BR, no seu relatório de exame sexual a fls. 7617, fez ainda a seguinte observação: “(…) sugerindo, além do mais, uma deficiente interiorização de interditos sociais e normas morais.” 164. O Perito explica este observação, em audiência de julgamento, da seguinte forma: “(...) este jovem estava justamente numa fase pré-convencional (…) tinha alguma dificuldade em perceber os limites daquilo que era permitido e que não era permitido, o que era mal, o que era bem, o que era socialmente admitido ou o que não era socialmente admitido. (…) Portanto, se antecipam, se percebem que são punidos, ou o receio de ser punidos é próximo, agem de uma determinada maneira; se, de facto, não têm essa percepção, têm uma latitude, em temos da violação da norma, daquilo que é socialmente permitido e legalmente admitido, bastante lata. Portanto, fazem um pouco aquilo que lhes ocorre ou de que lhes surge a oportunidade, violando normas (…)”. 165. O Assistente, de facto, foi condenado por dois crimes de roubo, praticados em 2005, na pena de 10 meses de prisão substituída por 300 dias de multa, à taxa diária de 1,0 €, no âmbito do Proc. nº 263/05.5 SELSB, (...) (cfr. certidão junta aos autos a fls. 60.656 e ss.) 166. Quanto ao relatório de Perícia sobre a personalidade (cfr. fls. 31 e ss. do Apenso CC), refere-se no mesmo que: “(...) depois fomos à (…) com uns gajos (…) estava escuro, não se conseguia ver… reparei no C, a voz e tudo (…) íamos na (…)… depois por uns dias não tive nada e depois fui outra vez à (…) e aconteceram as mesmas coisas que da outra vez… desta vez foi outra pessoa, era diferente a voz e a maneira de ele falar, essa pessoa até era o C (…) a primeira vez que AI vai a (…) tem cerca de 14 anos. (…) o A ligava-me… (…) senti um ódio tremendo por ele, que era capaz de o matar… (…) Desenvolvimento psicomotor (…) sendo negados problemas (…) de controlos dos esfíncteres (…) Não se apuraram problemas em termos de memória (imediata, recente e remota). (…) Q.I. = 101 (…).” 167. No que diz respeito ao facto de o Assistente ter dito à Perita que reconhecera o Recorrente na casa da (…) pela voz e pela maneira de falar, não se pode deixar de ter em conta que o Assistente, quando declarou em julgamento que, a tê-lo visto antes alguma vez, fora ao longe na festa do 3 de Julho, referiu que o Recorrente não discursava. 168. De modo algum, portanto, poderia tê-lo reconhecido pela voz e pela maneira de falar. 169. Sendo interessante constatar que, no âmbito dos presentes autos, ora se dá credibilidade a este Assistente, ora se considera que a descrição que o mesmo faz dos factos se encontra absolutamente desligada da realidade. 170. A este propósito cumpre trazer à colação o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, 3ª Secção (Rec. n.º 6882/04), de 9 de Novembro de 2005 (cfr. Apenso EI, de fls. 25339 a 25562), no qual se refere que: “(…) Quando ouvido em instrução, a 22/04/04 (fls. 19.293, vol. 82), declarou que “foi abusado pelo… e pelo BD. Antes do processo só sabia os nomes do A e do Dr. C”. “Soube os nomes do … e do BD primeiro porque os viu na televisão e depois nas fotografias que lhe foram mostradas na PJ. O… e o BD despiam só as calças e as cuecas. O declarante só foi à casa de (…), à casa da… e à casa do… Na casa de (…) estava sempre tudo muito escuro, com os estores fechados para os arguidos não serem reconhecidos. Quando os viu na televisão reconheceu o… e o BD pela voz e pela forma da cabeça que nunca mais se esquece.” (Sublinhados nossos). 171. A p. 154 do Acórdão menciona-se que “(…) as declarações do AI, também são em princípio e pelas mesmas razões muito comprometedoras para o arguido BD, mas não podemos deixar de lembrar quanto atrás – em 20.2.2 – anotámos (“As flutuações e hesitações nas declarações do ofendido AI tornam-se evidentes, afigurando-se que há uma inescapável margem de sugestão... nas inquirições que lhe foram efectuadas. O reconhecimento de alguém pela “forma da cabeça” - quando as características desta não evidenciam para ninguém especiais características e nenhumas foram referenciadas no exame (...)-legal a que este arguido foi sujeito – é algo no mínimo curioso e que não pode deixar de suscitar fortes dúvidas”)”. 172. Mais: o Assistente também nunca mencionou em julgamento que tivesse visto filmes pornográficos na casa da (…), nem que outros homens o tivessem mandado despir. 173. Quando o Assistente foi confrontado, em audiência de julgamento, com as declarações que prestara em instrução, as quais foram parcialmente lidas (a partir do terceiro parágrafo de fls. 19.043), mais uma vez apresentou uma versão dos factos diferente das anteriores. 174. Alegou também ter sido abusado pelo Arguido H, e não pelo Arguido E, para além de ter reduzido a idas à casa da (…) a duas e de ter dito, ainda, não saber o nome do ora Recorrente antes de ir à Polícia Judiciária. 175. Além disso, disse que fora abusado pelo Arguido K, e situou o abuso do ora Recorrente na casa da (…) (o que não fizera em instrução, dado que apenas associa o Arguido K àquele local). 176. Da certidão da Decisão do Tribunal Arbitral para indemnização deste Assistente/Demandante em 24 de Março de 2006, a fls. 56.199 e ss., consta que se deu como provado, entre outros factos, que o Assistente “foi alvo de práticas repetidas de masturbação, coito anal e coito oral no interior das instalações da AX, e fora delas, por parte de funcionários da AX, designadamente por parte de um com as funções de motorista”, não se compreendendo a omissão feita quanto ao também funcionário, o ex-(...)-(...) C, que nunca é identificado, assim como aos outros Arguidos deste processo que o Assistente também acusa. 177. Certamente não indiferente a estas incongruências, nas suas alegações finais, em Dezembro de 2008, o Ministério Público viria “sugerir” alterações substanciais e alterações não substanciais de factos, ao abrigo do dis(...) nos arts. 358º e 359º do CPP. 178. Entre várias dezenas de outras alterações que configurariam um verdadeiro reescrever da Pronúncia, incluía-se a alteração não substancial dos factos relativos ao crime alegadamente perpetrado pelo Recorrente na casa da (…), sobre o Assistente AI, consistindo a alteração na passagem da referência de “quarta-feira indeterminada situada entre Novembro e Dezembro de 1999, pelas 15h”, para dia indeterminado do ano lectivo de 98/99, a partir de meados de Setembro de 1998 (sem qualquer referência a quartas-feiras ou à hora aproximada dos factos). 179. Mais tarde, por promoção a que deu entrada em 5 de Fevereiro de 2009, o Ministério Público (cfr. fls. 62.886 e s.) veio requerer a alteração da data dos factos para “Em dia indeterminado do ano lectivo de 1998/99 (Setembro de 1998 a Junho de 1999), o arguido A telefonou ao menor AI, à data com 12/13 anos de idade, (…)” – pelo que manteve a restante factualidade constante da pronúncia, nomeadamente quanto ao dia da semana e à hora. 180. Na sessão de 31 de Março de 2005, na parte da tarde (cfr. acta de fls. 29.678 e ss., eCD2 2ª faixa, 52,59' e 1ª faixa CD3, 12,25') e sessão de 14 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 29.961 e ss., e CD2 2ª faixa, 45,32' + 3ª faixa CD2, 20,52' e 1ª faixa CD3, 27,08' e 2ª faixa CD3, 51'), BP refere que o Assistente AV lhe contara ter sido abusado pelo Recorrente na casa da (…) o que não corresponde ao que o mesmo declarou em audiência de julgamento nem ao que consta da Pronúncia, pelo que fica a dúvida acerca da razão por que o terá feito, e se tal relato acabou, por algum motivo, por ser transferido para o Assistente AI (mais à frente, na sessão de 14 de Abril, a depoente “corrige” este seu depoimento, referindo que o Assistente AV associava o Recorrente à casa da (…), mas não lhe dissera que fora abusado por ele lá). 181. Na sessão de 15 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 29.995 e ss., e CD1 1ª faixa, 68,19' e CD2 1ª faixa, 41,52') e sessão de 18 de Abril de 2005 (cfr. acta de fls. 30.173 e ss., e CD1 1ª faixa, 47,24' + ? e CD1 3ª faixa, 13,41' + 1ª faixa CD2, 5,15' + ? + 2ª faixa CD2, 36,35' + 3ª faixa CD2, 38,05'), a depoente refere que o Assistente AV lhe terá narrado que o Assistente AI fora abusado pelo educador de um CZ, o educador BT, que teria abusado dele próprio e ainda de outros colegas. 182. Afirma que os colegas de que falara o Assistente AV – o Assistente AI e outro – não confirmaram os factos, tendo o Assistente AV insistido em contradizê-los, e, depois de ter falado com o educador BT, a depoente ficou com muitas dúvidas quanto aos factos, duvidando que não tivesse havido nada. 183. Quanto às declarações prestadas pelo Assistente AI em julgamento, referiu o mesmo, na sessão de julgamento de 29 de Novembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.454 e ss., e 1ª cassete, dos 0m à 1h10m e 1ª cassete, de 1h10m às 2h16m), que foi abusado sexualmente pelo Arguido A durante anos e semanalmente, em casa deste, pelo menos entre os 11 / 12 e os 15 anos de idade. 184. De permeio, refere ter sido convidado pelo mesmo a ir a uma casa situada na (…), “ao pé do bairro da (…)”, pelo menos duas vezes, onde esteve sempre com duas pessoas. 185. Na primeira vez que foi a essa casa da (…) refere ter sido abusado pelo ora Recorrente, que já tinha visto na AX (sexo oral e masturbação da parte dele, sexo anal da parte do Recorrente). 186. Quanto ao Arguido A, levou-o lá perto, não se lembrando se entrou na casa ou não. 187. Estavam mais homens, sendo um deles o Arguido K. Soube o nome desta pessoa quando foi prestar declarações à Polícia Judiciária. 188. Esteve com o Recorrente no quarto (o que é diferente do facto dado como provado no ponto 104.4., que situa o abuso na sala, pelo que este facto não poderia ter sido assim considerado), após o que voltou para o (...) com o Arguido A, que “provavelmente” estava à espera dele. 189. Diz que foi uma segunda vez à casa da (…), também a convite do Arguido A, estando lá outra vez o Recorrente, o Arguido K (por quem dessa segunda vez foi abusado) e outros adultos, com outros três amigos da sua idade. 190. Esclarece, na sequência da descrição deste segundo abuso na casa da (…), que também da primeira vez fora com outros amigos, todos eles sempre levados pelo Arguido A, à ida e à volta. 191. Declara que estas duas idas à casa da (…) aconteceram no ano lectivo de 1998/1999, estando ele a estudar na IIR pela primeira vez, no seu sétimo ano de escolaridade. 192. Adiante, esclarece que afinal nunca antes tinha visto os “amigos” a que acabara de se referir, e que esteve com as duas pessoas em cada uma das vezes, tendo sido abusado por cada uma delas numa das vezes. 193. Esclarece, quanto a esse aspecto, que na primeira vez esteve só com o Recorrente, e na segunda só com o Arguido K. 194. Quanto à casa de (…), deslocou-se à mesma também no ano lectivo de 1998/1999, já depois das idas à (…). 195. Contudo, após insistência da Meritíssima Juíza Presidente, rectifica e diz que foi a (…) no ano lectivo de 1999/2000, em que chumbou, tendo ido duas vezes. 196. Ora, desde logo não se compreende por que razão foi o Recorrente condenado por este crime localizado na (…), algures numa quarta-feira de Novembro ou Dezembro de 1999, e o Arguido K condenado pelo crime de abuso na (…) num dia não apurado de Outubro ou Novembro de 1999 (o que inverte a cronologia dos factos referidos pelo Assistente). 197. De facto, se o Assistente declara ter sido abusado primeiro pelo ora Recorrente, e só na segunda vez pelo Arguido K, estes períodos temporais, desde logo, não fazem qualquer sentido (como já não o faziam na Acusação nem na Pronúncia). 198. Na sessão de audiência de julgamento de 30 de Novembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.469 e ss., DVD1, dos 0 aos 1h22m e DVD1, de 1h22m às 2h50m), o Assistente declara que quando foi à (…) foi apanhado pelo Arguido A junto do (…) (o que contraria a Acusação e a Pronúncia, que localizam estes encontros junto ao (…), pelo que não deveria ter sido dado como provado que o encontro se deu em local não concretamente apurado). 199. À volta, numa vez diz que foi deixado por este Arguido junto da estação de (…), e, na outra, que foi deixado um pouco mais acima, perto do BF. 200. Ora, carece absolutamente de sentido o referido pelo Assistente AI no que respeita ao regresso da (…), uma vez que, se o Assistente afirma que voltou ao fim da manhã, tendo tido faltas toda a manhã na IIR, onde pensa que ainda foi almoçar, isso significa que foi às aulas no período da tarde. 201. Assim, estando ele na (…), no concelho da (…), não teria qualquer sentido ser levado para o BF, perto de (…), para ir para as aulas na IIR, que fica na (…), perto da (…) – cfr. o sítio da Escola, em www.(...) – tentando não perder mais aulas. 202. O Tribunal, porém, deu relevo ao facto de o Assistente haver identificado o pormenor da placa a dizer “(…)”, com a letra “A” “grafitada” para parecer um “O”, como sustentando que o mesmo, de facto, realmente fora à tal casa da (…). 203. Confrontado, contudo, com o auto de reconhecimento da deslocação para localização da casa da (…), a fls. 6502 dos autos, o Assistente diz que deu à Polícia todas as indicações para irem para a (…), até ter “bloqueado” quando chegou a uma escola, que não conheceu, nem sequer tendo conseguido encontrar o prédio. 204. O Assistente declara que dentro da casa não havia muita luz, mas que se via bem, e que não viu outros contactos sexuais entre outras pessoas enquanto estava a ser abusado. 205. Diz que, por causa dos vários abusos que sofreu nos vários locais, o que sempre aconteceu durante a semana, faltou várias vezes às aulas, mas não chegou atrasado a nenhuma (o que não é verdade, bastando verificar os seus vários registos de atrasos no Apenso EJ, por exemplo nas pastas 5 e 6). 206. Lembra-se ainda que as janelas da casa tinham mais do que uma vidraça cada uma, o que se estranha, dado ter referido que a casa não tinha muita luz, e depois vindo dizer que lá tinha ido de manhã, logo levando a presumir que a casa teria que estar escurecida, com os estores para baixo ou as cortinas fechadas, sem se ver os vidros. 207. Na sessão de julgamento de 5 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.550 e ss., e 1ª cassete, dos 0m a 1h45m e 2ª cassete, dos 0m a 1h33m), diz que na saída da casa da (…) o Arguido A ficava à porta enquanto ele e os outros rapazes iam para a carrinha, provavelmente a receber dinheiro de alguém, mas não viu. 208. Logo, o facto do ponto 104.1. dos factos provados não podia haver sido considerado como tal, uma vez que o Assistente não esclareceu especificamente a marca da carrinha em foi transportado nas idas à casa. 209. Logo a seguir o Assistente mente, dizendo que foi transferido do lar FU para o FD por causa da idade, já que todos os mais velhos estavam a ser transferidos para outros lares com pessoas de idades mais próximas da sua. 210. Não refere que a sua transferência se ficou a dever, isso sim, ao abuso perpetrado sobre colegas mais novos. 211. Seguidamente, o Assistente refere ter visto o Recorrente C pela primeira vez na casa da (…), o que contraria o que dissera antes, na primeira sessão em que foi ouvido em audiência de julgamento. 212. Confrontado, diz que se o vira antes na AX, fora de relance, mas que “quando eu o vi mesmo, quando eu dei mesmo de caras com ele, foi na casa da (…).” 213. Acrescenta que se o vira antes, fora na festa da AX, de 3 de Julho, recordando que nas mesmas há sempre o discurso do director do (...) onde a mesma se realiza e do (...), mas não refere ter ouvido o Recorrente discursar. 214. Relembre-se que o Assistente havia referido à perita BB, em sede de exame de personalidade no INML, ter reconhecido o Recorrente na (…) pela voz e pela maneira de falar. 215. Ora, tendo o Assistente entrado para a AX em Novembro de 1997, só poderia ter assistido a duas festas do 3 de Julho antes de ter ido à casa da (…). 216. No entanto, o Assistente declara que, a ter visto o Recorrente nessas festas, terá sido só uma vez, se é que o viu. 217. O Assistente, aliás, refere em audiência que não se lembra se quando o viu na casa da (…) já o vira antes na festa ou não. 218. Do ex(...) decorre, necessariamente, que o Assistente seguramente não reconheceu nem podia reconhecer o Recorrente C na casa da (…). 219. O Assistente declara, aliás, que foi quando prestou declarações na PJ que associou a cara à fotografia, tendo sabido dizer o nome e que era o (...)--(...) da AX. 220. Contudo, nessa sede, apenas lhe mostraram a fotografia do ora Recorrente, mas não a do outro (...)-(...), FB, ou a do (...) BQ (que seguramente também conheceria das festas do 3 de Julho). 221. Sendo que, enquanto lhe eram feitas perguntas sobre a identificação do ora Recorrente e do ex-(...), o Assistente esquece-se do nome do ora Recorrente (que diz conhecer há tanto tempo), tendo sido relembrado pela Senhora Juíza Presidente do mesmo: “(…) e… esqueci-me do nome… Esqueci-me agora completamente do nome”. 222. Continuando, o Assistente mantém a versão completamente nova de ter sido apanhado pelo Arguido A junto ao (…) das duas vezes em que foi à casa da (…) (em vez do (…), como consta da Pronúncia), e diz também que foi sempre de manhã (em vez da tarde, a partir das 15h, como consta da Pronúncia) e que teve faltas a manhã inteira (o facto do ponto 104. dos factos provados no Acórdão não podia, portanto, ter sido considerado provado). 223. Não se lembra de como estava vestido o Recorrente, se estava sequer de gravata ou, de resto, se o ora Recorrente usou preservativo ou lubrificante na relação anal que manteve consigo. 224. Não explica, assim, se o Recorrente se despiu ou se manteve as calças vestidas, pelo que a segunda parte dos factos do ponto 104.4. também não podia ter sido considerada provada. 225. Esta falta de memória de todas as circunstâncias do abuso, que não foi sequer referida no Acórdão, parece extremamente relevante para a aferição da credibilidade e verosimilhança da história contada pelo Assistente, uma vez que não recordar tais pormenores necessariamente abala a credibilidade do relato. 226. Falamos de uma pessoa que mentiu em Tribunal. Que perguntado directamente se alguma vez abusara de colegas de 6 ou 7 anos de idade, mente, respondendo “não”. 227. Na sessão de julgamento de 6 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.601 e ss., e DVD1, dos 0 aos 17m e DVD1, dos 17m a 1h55m), o Assistente refere, com dúvida, ter falado no nome do Recorrente depois de ter visto a sua fotografia na Polícia Judiciária, o que abala, mais uma vez, a credibilidade do seu relato no que respeita à fiabilidade do reconhecimento do Recorrente. 228. Diz também não ter a certeza se disse o nome do Recorrente quando viu a sua fotografia, mas acha que já saberia o nome (no que recua face ao que dissera antes). 229. De facto, na sessão de julgamento de 7 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.623 e ss., e DVD1, dos 0m a 1h31m) esclareceu que não se recorda se os adultos que abusaram dele falaram consigo, nem o que disseram, e que “O que eu me lembrava vagamente da face, era o suficiente, foi o suficiente para reconhecer na... nas fotografias, as pessoas que... que vi.” (Sublinhado nosso.) 230. Salta à evidência o facto de o Assistente ter errado ao descrever o Recorrente como “gordo”, conforme consta de fls. 9 a 20 do Apenso AS. 231. Na sessão de julgamento de 12 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.659, e DVD1, dos 0 35; CSS, 1minuto; dos 36m a 1h47m e DVD1, de 1h47m 3h37m), o Assistente é claro ao dizer que no primeiro ano que esteve na (…) não tinha telemóvel de certeza, pelo que não poderia, portanto, o contacto do Arguido A ter sido feito para um seu telefone. 232. Contudo, consta da Pronúncia que este lhe telefonou a marcar o encontro para a quarta-feira seguinte. 233. Refere ainda ter estado num jantar com os outros Assistentes, após o início do processo, para comemoração do aniversário de um deles dentro da AX, assim como em outros, para comemoração de aniversários ou de fim de prestação de depoimentos no julgamento (o que nos leva a novos encontros até aqui não referidos pelo Assistente AP, nos mesmos presente, ou pela ex-(...)a BP, por exemplo). 234. E refere, também, ter falado “por alto” do processo com Assistentes (como o AN) enquanto prestava depoimento na Polícia Judiciária, nomeadamente dos adultos que estavam no processo. 235. Ora, o Assistente refere que as fotografias do álbum da Polícia Judiciária (Apenso AJ) tinham o nome das pessoas por trás, e que ele viu esses nomes ao folheá-lo, tendo identificado o Recorrente depois de ter visto o álbum mais que uma vez: “Eu antes de, de ir reconhecer alguém eu vejo sempre primeiro as fotografias... vi primeiro as fotografias para depois quando for apontar o dedo não ter dúvida daquilo, da pessoa que era. Quando folheei outra vez o álbum não tive dúvidas e fui começando a apontar o dedo, simplesmente.” 236. Termos em que se conclui que o reconhecimento que fez do Recorrente a partir da fotografia que lhe foi exibida na Polícia Judiciária é, para todos os efeitos, de nulo valor probatório. 237. O Assistente acaba por revelar, nesta sessão, ter ido ao bairro da (…) (perto da (…)) algumas vezes, no autocarro 43, ter com raparigas que lá residiam. 238. Contudo, quanto à questão da placa “grafitada” a dizer “(…)”, refere que antes de ter feito o reconhecimento, não se recorda de a ter visto alguma vez. 239. Na sessão de julgamento de 15 de Dezembro de 2005 (cfr. acta de fls. 35.731, e DVD1, dos 0m a 2h0m), o Assistente volta a ser confrontado com o facto de ter acusado o Arguido E, sobre quem deu pormenores como os da forma da cabeça ou de que descia as calças aquando dos abusos, tendo concluído anos antes do início do julgamento que afinal se enganara quanto a esta pessoa, sem no entanto desmentir tal acusação até vir prestar depoimento em julgamento, audiência em que começara por acusá-lo novamente, o que muito revela do seu carácter. 240. Seguidamente, o Assistente confirma que apenas viu o Arguido C uma vez numa festa do 3 de Julho, e duas vezes na casa da (…). 241. Se dúvidas houvesse, fica assim clara a falta de fiabilidade de que se reveste o reconhecimento que o Assistente AI fez do Recorrente na casa da (…), “até pela voz e pela maneira de falar”, dado que não só nunca tinha ouvido o Recorrente falar antes como, depois das idas à casa, se lembrava apenas vagamente das caras que lá vira, e apenas apontou o dedo ao Recorrente na Polícia Judiciária depois de a sua imagem passar por todos os media e, mesmo assim, apenas depois de ver o álbum mais que uma vez (com o nome por trás da fotografia). 242. O Assistente AI afirma ter sido abusado sexualmente pelo ora Recorrente numa quarta-feira de Novembro ou Dezembro de 1999, de manhã, tendo tido faltas às aulas durante toda a manhã, pelo que foi (...) de castigo depois, pelos educadores. 243. Porém, dos elementos respeitantes às faltas do Assistente nesse período que constam dos autos, a fls. 60.992 e ss., não há qualquer quarta-feira em Novembro ou Dezembro de 1999 em que o Assistente tenha tido faltas a manhã inteira. 244. A única referência que se faz a um castigo não está relacionada com uma manhã com faltas, mas parece estar relacionada com algum atraso à noite ou algo mais grave, que motivou uma punição de ir para a cama logo após o jantar ou de ficar na cozinha, de domingo a terça-feira, o que não corresponde sequer ao castigo de lavar a loiça durante uma semana inteira, que o Assistente refere ter sido o que lhe foi aplicado pelas faltas a manhã inteira. 245. Passando a analisar os livros dos sumários das aulas, em que estão registados os números dos alunos faltosos a cada tempo (e aqueles que apenas chegaram atrasados), verifica-se que as faltas que o Assistente deu nos períodos da manhã das quartas-feiras desses dois meses foram as seguintes, tendo-se resumido a faltas de atraso: (i) Quarta-feira, dia 24 de Novembro de 1999, das 8,15 às 9,15 (Matemática) (cfr. fls. 2344 do Apenso EJ, pasta 5); (ii) Quarta-feira, dia 15 de Dezembro, das 11,30 às 12,20 (Mecanização) (cfr. fls. 2670 do Apenso EJ, pasta 6). 246. Cumpre ainda lembrar que, em 1999, as quartas-feiras de Dezembro estão naturalmente desde logo postas de parte, com excepção do dia 15 de Dezembro, dado que dias 1 e 8 de Dezembro foram feriado (sem aulas), e dias 22 e 29 já eram período de férias de Natal, também sem aulas (veja-se, por ex., a fls. 2665 e s. do Apenso EJ6, referente à turma do AI, que o dia 17 de Dezembro de 1999 foi o último dia de aulas do 1º período). 247. Quanto ao ora Recorrente, a lista integrada junta aos autos a fls. 53.191 e ss., e que foi elaborada com base nos documentos juntos em instrução (cfr. Apenso EI) e nos elementos que a Vodafone enviou directamente aos autos, comprova que na primeira quarta-feira de Novembro de 1999 o Recorrente foi trabalhar para a AX, não tendo registos apenas até às 11.46 da manhã, altura em que se pode constatar que estava no seu local de trabalho (accionando a antena telefónica do (…)). 248. No dia 10 de Novembro de 1999, o Recorrente não tem registos durante o período de trabalho, tendo provavelmente utilizado apenas o seu telefone fixo da AX. 249. No dia 17 de Novembro de 1999, o Recorrente também não tem registos durante o horário de trabalho, excepto à hora do almoço, em que estava na AX ou lá muito perto. 250. No dia 24 de Novembro de 1999, o Recorrente tem registos que o localizam fora da casa da (…) toda a manhã. 251. No dia 1 de Dezembro de 1999, o Recorrente naturalmente não foi trabalhar, tendo-se ausentado de (…) (com probabilidade para visitar a filha, que estudava em (…), como ficou demonstrado nos autos). 252. No dia 8 de Dezembro de 1999, o Recorrente mais uma vez não foi trabalhar, tendo ficado por (…) (visitando centros comerciais), mas não indo à zona da (…). 253. No dia 15 de Dezembro de 1999, o Recorrente tem registos que o situam na AX toda a manhã. 254. No dia 22 de Dezembro de 1999 (em que já os alunos estavam de férias), o Recorrente tem registos que o situam na AX pelo menos às 12.39. 255. No dia 29 de Dezembro de 1999, o Recorrente estava fora de (…), provavelmente de férias. 256. Refira-se ainda que no Acórdão recorrido, a p. 1138, o Tribunal faz referência a uma suposta troca no horário do Assistente AI. Contudo, tal referência não prejudica em nada o que vem de se dizer, dado que efectivamente houve uma alteração no horário, mas isso está reflectido nos últimos documentos que a AX enviou ao processo, com o seu ofício de 17 de Novembro de 2008, que foram os documentos aqui referidos. 257. E, de facto, o horário correcto é o que está a fls. 60.995, e não a fls. 36.002, pelo que não resta qualquer dúvida de qual era o horário e de que o Assistente terá dado várias faltas ao longo do seu percurso escolar, mas não durante uma manhã inteira de uma quarta-feira de Novembro ou Dezembro de 1999 (ou sequer a um só dos tempos, dado que apenas se atrasou por duas vezes). 258. Durante o julgamento várias testemunhas confirmaram que o Assistente AI, para além de manipulador, mentia com muita frequência: por ex., (i) depoimento de EN, Educador – Sessão de 14 de Dezembro de 2006 (cfr. acta de fls. 42.257 e ss., e CD1, 1ª faixa); (ii); e (iii) depoimento de CG, colega de internato do Assistente AI – Sessão da audiência de julgamento de 29 de Março de 2006 (cfr. acta de fls. 37.617 e ss., e CD1, 1ª e 2ª faixa; CD2, 1ª faixa e CD2, 2ª faixa; CD3, 1ª e 2ª faixa). 259. No que diz respeito à prova documental, importa ter em conta o constante do processo psicossocial da AX relativa ao Assistente (apenso Z15, volume 1), que corrobora igualmente este aspecto da personalidade do Assistente: 260. No mesmo, a fls. 374 refere-se que na escola ele “mente com muita frequência” e de que a sua família de acolhimento refere, em Junho de 1998, que “acha que ele mente muito”. 261. A fls. 342 consta uma nota de Maio de 2000 que refere que a informação da pedopsiquiatria é de que ele se “põe no papel de vítima”. 262. A fls. 201 ss consta, entre outros relatórios sobre o Assistente, um relatório da Inspecção-Geral do MTSS de 18 de Novembro de 2003 (documentação que apenas foi junta aos autos no Verão de 2008, antes das alegações finais, por insistência da defesa) quanto ao seu abuso de alunos mais novos e quanto ao seu relacionamento com A, em que se refere, por ex., a fls. 242, que as equipas educativas unanimemente consideram que ele é apelativo e sedutor, mas sempre em benefício próprio, aproximando-se só por interesse, e a fls. 244 que o Assistente não mostra culpa ou arrependimento e que parece padecer de uma severa perturbação da personalidade; a fls. 179 e s. (Relatório intercalar de baixa provisória, de Janeiro de 2007), consta que o AI continua irresponsável, não cumpre as regras e que vai viver com a namorada, pagando-lhe a AX 350€ por mês e o passe durante 2007 se ele não faltar às aulas. 263. A fls. 186 e s. consta de um relatório psicossocial de 2007 que o Assistente tem dificuldade em reservar a sua condição de testemunha no processo da AX e que ostenta na escola e no lar os bens que adquiriu com a indemnização sem esconder a sua proveniência (o que contraria a versão sofrida que dá em Tribunal, de que não quis falar dos factos com as pessoas por vergonha de estar envolvido no processo, e de que a sua única motivação é a de que se faça justiça com a condenação dos arguidos). 264. A fls. 281 a 283 consta relatório da equipa técnico-educativa, de 20 de Fevereiro de 2003, que descreve as suas características de personalidade como sendo “a manipulação, sedução, mentiras e carências afectivas muito precoces", e a preocupação com a crescente proximidade do Assistente com os colegas AV e CG. 265. Finalmente, do Apenso W10 – 5 (livro de ocorrências do FD), a fls. 98, consta uma nota de um educador, de Março de 2003, em que se refere que “O AI está completamente louco, não é que agora diz que é o “chibo profissional da PJ””. 266. Ora, a impugnação da decisão da matéria de facto considerada provada no que respeita aos factos relativos ao Assistente AI – através da descrição e análise de diversos meios de prova que acima se levou a cabo – assenta, essencialmente, no questionar da credibilidade que o Tribunal a quo reconheceu a este Assistente e da verosimilhança que entendeu conferir à sua versão dos factos. 267. Conforme acima se demonstrou, este Assistente mentiu por diversas vezes em Tribunal, como se verificou, por exemplo, na tentativa de omitir o seu conhecimento da zona da (…) (por outras razões que não os abusos a que ali diz ter sido sujeito) ou na situação em que, perguntado acerca da causa da sua transferência de lar, dá como resposta razões respeitantes à sua idade e não revela os reais problemas (relacionados com abusos e tentativas de abusar de colegas mais novos) que estiveram na origem da transferência. 268. A nível do perfil da sua personalidade este Assistente revela problemas vários, patentes nos relatórios do INML e nos relatórios e informações internas da AX acima referenciados. 269. Mais impressionante é o facto de que, na enunciação dos factos provados, o Tribunal a quo tenha sentido a necessidade de modificar ou suprimir as circunstâncias de tempo e de modo que constavam da Pronúncia, como sejam o local dos encontros com o Arguido A e a hora do dia a que os mesmos ocorriam, refugiando-se na fórmula de cómodo “em local e hora não concretamente apurado” (facto provado 104). 270. É que esta “descaracterização” dos factos é tanto mais estranha quanto o Assistente, pese embora desviando-se absolutamente do que da Pronúncia constava, tenha de(...) de forma circunstanciada, localizando os encontros no (…) e situando-os (bem como os abusos) na parte da manhã. 271. Mais (embora isso tenha escapado ao Tribunal, que assim manteve o facto provado 104.4), o Assistente refere ter sido abusado num quarto e não na sala da casa (o que é mais uma alteração ao facto consignado na Pronúncia). 272. Relativamente à prova documental constante dos autos – cuja genuinidade e fidedignidade não foi posta em causa – foram absolutamente desconsiderados pelo Tribunal os registos de faltas do Assistente (naturalmente, às quartas-feiras dos meses de Novembro e Dezembro de 1999), bem como as menções constantes do livro de ocorrências do seu lar, que, longe de serem – no mínimo – consentâneas com as declarações daquele, acabam por infirmá-las. 273. Na verdade, ao contrário do declarado pelo Assistente, não há, nesse lapso de tempo, nenhuma quarta-feira em que tenha faltado às aulas toda a manhã. 274. Aspecto também absolutamente decisivo, e de que o Tribunal a quo fez tábua rasa, é o das fragilidades do reconhecimento e identificação pelo Assistente da pessoa do ora Recorrente como sendo o seu abusador na casa da (…). 275. O Assistente refere expressamente que antes do abuso apenas terá visto (“se é que vi”) uma vez o Recorrente, “de relance”, numa festa da AX, e que o reconheceu pela voz e pelo modo de falar – mas não o tinha ouvido falar antes de o ver na (…) (até porque a casa teria pouca luz, conforme relatou). 276. Ao mesmo tempo, reconhece ter tido dúvidas quando visionou as fotografias que lhe foram exibidas na Polícia Judiciária. 277. Por último, o Tribunal desconsiderou em absoluto todos os depoimentos e prova documental supra referidos que apontam no sentido de o Assistente AI ser manipulador (reconhece-se-lhe, também, uma vertente sedutora da personalidade) e de mentir com muita frequência – o que, não diminuindo os seus direitos como Assistente nos presentes autos, deveria ter sido devidamente ponderado na aferição da sua credibilidade. 278. Em suma, mal andou o Tribunal a quo ao considerar credível o depoimento do Assistente AI, tomando exclusivamente as suas declarações – conforme se demonstrou – como fundamento bastante para a decisão de considerar provados os factos constantes dos nrs. 104 a 104.13 dos factos provados, assim condenando o ora Recorrente pela sua prática. 279. Deverá, em consequência, ser revogada a decisão do Tribunal a quo quanto a este segmento da decisão da matéria de facto, devendo esta ser substituída por outra, tomada por esse Venerando Tribunal ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo art.º 431.º als. a) e b) do CPP, que venha a considerar como não provados os factos constantes dos nrs. 104 a 104.13 do Acórdão sob recurso, com a consequente absolvição do Recorrente pelo crime por que foi condenado. 280. No que diz respeito à condenação do Recorrente no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais ao Assistente/Demandante AI, refira-se que este último deduziu contra o Recorrente e outros Arguidos o pedido de indemnização civil constante de fls. 14.697 a 14.707 dos autos, o qual foi recebido pelo Tribunal a quo. 281. Ora, o Acórdão remete, a fls. 1692, para a factualidade que fundamenta a decisão sobre o pedido de indemnização civil deduzido pelo Assistente/Demandante, mas de cujas folhas citadas da Acusação não constam os factos pelos quais foi o Recorrente condenado. 282. É que, na verdade, do pedido de indemnização civil deduzido pelo Assistente AI contra os vários Demandados, incluindo o ora Recorrente, não constam os factos referentes ao alegado crime de abuso sexual por este perpetrado na casa da (…). 283. Assim, não podia o Tribunal a quo condenar o Recorrente por pedido de indemnização civil destituído de causa de pedir, no que aos factos da casa da (…) respeita (uma vez que o pedido indemnizatório deduzido pelo Assistente/Demandante nos autos apenas articula os factos relacionados com a alegada presença do Recorrente numa casa em (…), pelos quais este não foi condenado). 284. Esta razão leva, só por si, a que a decisão recorrida, na parte em que condena o Recorrente no pagamento de uma indemnização ao Assistente/Demandante AI, deva ser revogada, por violação do dis(...) no art.º 661.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do dis(...) no art.º 4.º do CPP. 285. Em todo o caso, em conformidade com o que supra se vem de alegar quanto à responsabilidade criminal, também no domínio da responsabilidade civil o ora Recorrente pugna, consequentemente, pela sua absolvição do pedido de indemnização civil contra si deduzido pelo Assistente/Demandante AI e pelo qual foi condenado ao pagamento de indemnização no valor de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros). 286. A título meramente subsidiário e por elementar cautela, admitindo – o que só por hipótese de raciocínio concebe – a eventual improcedência do presente recurso, não pode, no entanto, deixar de igualmente impugnar a sanção que concretamente lhe foi aplicada, traduzida, após o cúmulo jurídico operado, na pena de 5 anos e 9 meses de prisão. 287. No que respeita à fundamentação da escolha das penas concretamente aplicadas a cada um dos crimes por que foi o Recorrente condenado, bem assim como quanto à fixação da medida concreta da pena única em sede de concurso efectivo (cúmulo jurídico), foi o Tribunal a quo sumamente parco na fundamentação, limitando-se aos considerandos que consignou a pp. 1672 e s. do Acórdão. 288. E desde logo impressionará a circunstância de o Tribunal ter valorado negativamente a atitude do Recorrente, de negação peremptória dos factos que lhe eram imputados e de acérrimo empenhamento na sua defesa, ao afirmar que a “(…) postura do arguido em nada foi colaborante com o Tribunal, antes se tendo remetido a uma absoluta negação dos factos.” (Cfr. a p 1673 do Acórdão). 289. Não se vê como o legítimo exercício dos direitos de defesa, entre os quais naturalmente se inclui o de negar os factos que lhe são imputados – direitos fundamentais constitucionalmente tutelados, sublinhe-se – possa ser apodado de “postura pouco colaborante com o Tribunal” e erigido em critério que contra o Recorrente milita no momento da determinação da medida concreta da pena. 290. Ora, o Recorrente empenhou-se denodadamente na sua defesa, nunca se remetendo ao silêncio nem se furtando a prestar todos os esclarecimentos que lhe foram sendo pedidos. 291. Ofereceu em julgamento tudo o que dispunha – assim se expondo, inclusive na sua intimidade, ao escrutínio público – e só mais não ofereceu porque lhe foi absolutamente impossível obter o que mais fosse, sempre no propósito de demonstrar a sua inocência. 292. Coligiu um impressionante acervo de registos (cerca de 15 milhares de dados) relativos à sua vivência, abrangendo um período de três anos, que submeteu ao contraditório, expondo-se à crítica e às inevitáveis incompletudes, lapsos e incongruências que uma massa de dados de tal natureza inevitavelmente importa. 293. Esforçou-se, porventura mais do que qualquer outro sujeito processual, na procura da verdade material, oferecendo e requerendo ao Tribunal abundante prova documental relativa à AX (cuja relevância para a descoberta da verdade é bem patente na própria fundamentação da decisão, que, em ampla medida, se socorre de tais elementos de prova), numa atitude sem paralelo com a da própria Instituição, que, maugrado ter-se constituído Assistente nos autos, pouco contribuiu para o esclarecimento dos factos que directamente lhe diziam respeito. 294. Em suma, ofereceu o ora Recorrente ao Tribunal uma defesa aberta e leal. Mas nunca se reconheceu culpado nem confessou os factos! 295. É quanto basta para demonstrar a profunda injustiça que redunda em qualificar de “pouco colaborante” a atitude do Recorrente em juízo. 296. Aceita-se que a confissão dos factos, se relevante, funcione com atenuante geral em benefício do arguido. Mas a inversa – a falta de confissão e mesmo a negação dos factos – não poderá nunca prejudicá-lo na determinação da medida concreta da pena, sob pena de violação grosseira das garantias de defesa em processo penal, consagradas, desde logo, no art.º 32.º, n.º 1 da CRP. 297. Igualmente incompreensível é a razão por que não foi valorado a favor do Recorrente o lapso temporal decorrido desde a data da prática dos factos por que foi condenado – que remontam ao período compreendido entre Julho de 1997 e o final de 1999 – e o momento da decisão, tendo aquele mantido um comportamento irrepreensível ao longo do tempo. 298. O decurso do tempo, que é significativo, algum peso terá no que respeita ao mitigar das exigências de prevenção geral e especial e à consequente necessidade da pena. De nada disto curou o Tribunal ao fixar as penas concretamente aplicadas ao Recorrente. 299. Por último, não deixará de se estranhar que relativamente a crimes da mesma natureza mas qualificados ou perpetrados em circunstâncias susceptíveis de revelar maior gravidade (desde logo pela impressionante reiteração da sua prática), o Tribunal a quo tenha optado por condenar o Arguido A em penas concretas inferiores àquelas que aplicou ao ora Recorrente. 300. A título exemplificativo, o Arguido A foi condenado por um crime de abuso sexual de pessoa internada, p. e p. pelo art.º 166.º, nrs. 1 e 2[4] do CP, na pessoa do Assistente AP, na pena de 3 anos de prisão (cfr., a p. 1725 do Acórdão). 301. Respeita a condenação aos factos provados sob os nrs. 92.7 a 92.15 (cfr. a p. 122 e s. do Acórdão) nos quais se inclui a prática de actos de coito anal, pelo que a moldura penal cominada a este facto, correspondente n.º 2 daquele art.º, era de 1 a 8 anos de prisão. 302. Ora, pelo crime de abuso sexual de pessoa internada, embora só pelo dis(...) no art.º 166.º, n.º 1 (dado que os factos imputados não incluíam a prática de coito anal), punido, por conseguinte, com uma moldura abstracta de 6 meses a 5 anos de prisão, praticado sensivelmente no mesmo lapso de tempo e relativamente ao mesmo Assistente, foi aplicada ao Recorrente, a pena de 3 anos (cfr. a p. 1734 do Acórdão), exactamente igual àquela que foi aplicada ao Arguido A pela prática do ilícito típico mais grave. 303. O Arguido A foi, pela prática de quarenta e três crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art.º 172.º, nrs. 1 e 2[5] do CP na pessoa do Assistente AI, condenado na pena de 4 anos de prisão para cada um dos crimes (cfr. a p. 1722 do Acórdão). Trata-se aqui dos factos provados sob os nrs. 96.14 a 96.25 (cfr., a pp. 133 e s. do Acórdão). 304. Ora, pelo mesmo crime, sensivelmente no mesmo lapso de tempo e relativamente ao mesmo Assistente, foi aplicada ao Recorrente, por um único crime, a pena de 4 anos e 6 meses de prisão (cfr., novamente, a p. 1734 do Acórdão), mais grave, por conseguinte, do que a aplicada a cada um dos crimes cometidos pelo Arguido A. 305. No que tange ao grau de culpa do Arguido A, que o Tribunal observou foi o seguinte: No caso, a culpa do arguido A apresenta-se em elevadíssimo grau desde logo pela especial censurabilidade em cada ilícito, assente nas circunstâncias que rodearam a prática dos mesmos, agravada pela então qualidade e idade das vítimas e pelo tempo que duraram os abusos - sendo relativamente a algumas das vítimas desde o início da infância até pré-adolescência -; a desconsideração do valor fundamental da liberdade e autodeterminação sexual.” (Cfr. p. 1671, sublinhado nosso). 306. Por contraposição, anotou-se, no respeitante ao grau de culpa do Recorrente, que este “(…) apresenta-se em elevado grau (…)” (cfr. p. 1672 do Acórdão). 307. Ora, se o grau de culpa do agente é, a um tempo, o elemento delimitador do limite máximo da pena e um dos critérios de graduação da medida concreta desta, de harmonia com o dis(...) nos arts. 40.º, n.º 2 e 71.º, n.º 1 do CP, são incongruentes e iníquos os critérios de determinação das medidas concretas das penas aplicadas ao Recorrente, por contraposição com aquelas em que, em mais graves ou análogas situações, o Tribunal veio a condenar o Arguido A. 308. Termos em que, caso a medida concreta da pena aplicada ao Recorrente venha a ser reduzida por via do provimento parcial presente recurso e assim o admitir, que seja ponderada a suspensão da sua execução, ao abrigo do dis(...) no art.º 50.º do CP, por se entender que (à excepção da medida concreta da pena aplicada no Acórdão sob recurso), militam a favor do ora Recorrente todos os pressu(...)s de facto de que depende aquela suspensão. Termos em que deverá ser concedido integral provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogado o Acórdão recorrido na parte em que condenou o Recorrente pela prática de um crime de abuso sexual de pessoa internada, perpetrado na pessoa do Assistente AP, e de um crime de abuso sexual de crianças, perpetrado na pessoa do Assistente AI, bem assim como na parte em que o condenou no pagamento, aos mesmos, de indemnizações por danos não patrimoniais, no valor, cada uma delas, de € 25.000,00, como é de JUSTIÇA!” (fim de transcrição). 2. Respondeu o Ministério Público na 1.ª instância extraindo as seguintes conclusões: “RECURSO DO ARGUIDO C 168. - Quanto ao Recurso do Arguido C, para além do que tivemos oportunidade de, a este respeito, referir, infra, em “CA).2.”, e que ora se convoca, permitir-nos-emos, não obstante, tecer umas breves considerações, relativamente a algumas especificida-des suscitadas pela Defesa do Recorrente; 169. - Invocando a nulidade parcial do Acórdão ex vi do dis(...) no art.º 379.º, n.º 1, a), por falta da fundamentação e violação do dis(...) nos artºs. 127.º e 374.º, n.º 2, ambos do CPP, bem como a violação do preceituado no art.º 412.º, nºs. 3, a) e b), 4 e 6 do CPP, ao contrário do que vem afirmado, para o Tribunal, tal como resulta do Acórdão, a prova determinante não consistiu, exclusivamente, nas declarações dos Assistentes AP e AI, pese embora, como não poderia deixar de ser e é timbre nos crimes sexuais, tais declarações tenham sido particularmente relevantes; 170. - Para além de ter analisado, exaustiva e perspicazmente, os respectivos depoi-mentos, investindo-os na importância de que, efectivamente, se revestem, o Acórdão, no que ao Assistente AP diz respeito, convocou ainda, analisando-os criticamente, inúmeros depoimentos, para além de múltipla prova documental; 171. - E quanto ao Assistente AI, para além de ter analisado, detalhadamente, o seu percurso de vida, anterior à, e contemporâneo da, AX, bem como o seu percurso escolar e, de entre outra prova documental, os registos de faltas, a que o próprio Recorrente tanta relevância reconhece, e aos registos dos Livros de Ocorrências dos Lares, a que acresceu a ponderação exaustiva de depoimentos de várias Testemunhas que identifica e, casuisticamente, analisou; 172. - A condição de prova indirecta, ou circunstancial, não a desqualifica, nem a diminui, enquanto tal, impondo-se, isso sim, que se alcance o que resulta da conju-gação de toda ela, sem deixar de anotar os diversos níveis de relevância que foi atri-buído a cada um dos elementos de prova mencionados; 173. - Por outro lado, ao contrário do que se alega, o Tribunal jamais refere, nem tal se infere do que escreveu, ter sustentado a sua convicção num “juízo de índole mera-mente subjectiva, com base em impressões não objectiváveis nem racional e logicamente apreensíveis”; 174. - O que no Acórdão, expressamente, se consigna e dele se retira, é que, a pro-pósito de um segmento preciso, recolhido por via da imediação, “não conseguimos objec-tivar mais do que já fizemos” (destaque nosso), expressão que, ao invés do que se pre-tende, não traduz reconhecimento de qualquer subjectivismo espúrio, nem, tão pouco, qualquer deficiência omissiva, mas, antes, humildade, honestidade e seriedade inte-lectual; 175. - Acresce que se imputa nulo valor probatório, às declarações do Arguido A, enquanto pretensa corroboração das versões dos factos apresentadas pelos As-sistentes AP e AI, tal como resulta das "Conclusões 33ª, 34ª e 35ª", do Recurso, cu-jo conteúdo, para uma melhor compreensão do que aqui se trata, se convoca; 176. - De acordo com o texto em que o Arguido se louva, a respectiva argumentação sustenta-se, exclusivamente, nos elementos literal, sistemático e histórico (fonte do preceito contido no artº 129º, do CPP), sem que, para além deles, se expendam quaisquer outros considerandos relevantes; 177. - Uma das características decisivas do modelo, essencialmente, acusatório, que enforma o processo penal, é uma separação clara entre as diferentes fases proces-suais (Inquérito, Instrução e Julgamento); 178. - Daí decorrem, além do mais, disciplinas próprias de cada uma delas, sem pre-juízo das remissões expressas que determinam a aplicação, mais ou menos extensiva, do regime específico de uma fase, a fase diversa, sem prejuízo do tempero investiga-tório que complementa, sem o descaracterizar, o modelo matricial, a tanto acrescendo o facto de, em cada uma das referidas fases, não poucas vezes, se consagrarem remissões, dentro da disciplina que diz respeito a uma fase processual, e só a ela; 179. - Prova de que assim é, atesta-o, desde logo, a fase de Inquérito, na qual o artº 145º, nº 3, do CPP, manda, expressamente, sujeitar, a prestação de declarações do Assistente e das Partes Civis, “ao regime de prestação da prova testemunhal”, acres-centando que tal só não se verificará “no que lhe for manifestamente inaplicável e no que a lei dispuser diferentemente”, sem que se veja, quanto à aplicabilidade do dis(...) no artº 129º, aos depoimentos de Assistentes e Partes Civis, qualquer ressalva de inaplicabili-dade, ou seja que disposição for que o proíba; 180. - Todavia, se assim é, no que àquela fase diz respeito, o mesmo não se passa, na fase de Julgamento, (...) que, nos termos do artº 346º, nº 2 (declarações de assistente) e do art. 347º, nº 2 (declarações das partes civis), ambos do CPP, é correspondentemente aplicável, a umas e outras, tão só, o dis(...) nos nºs. 2 e 4, do art. 145º, do referido Código, que não o nº 3, do art. 145º, justamente, aquele que sujeita, ao regime da prova testemunhal, as declarações do Assistente; 181. - Logo, não sendo aplicável às declarações do Assistente e das Partes Civis, em Julgamento, o regime da prova testemunhal, tão pouco o é o dis(...) no artº 129º, do CPP; 182. - E, se assim é, quanto a tais intervenientes processuais, mais se diga quanto ao interrogatório do Arguido, sem que desconsiderar se possa o facto de aqui se imporem especiais cuidados de abordagem ao respectivo estatuto, (...) tratar-se do actor prin-cipal da trama processual, a cujos direitos é garantida uma mais impressiva tutela constitucional; 183. - Dispõe o art. 144º, nº 1, do CPP, que “os subsequente interrogatórios de arguido… são feitos… em julgamento… obedecendo, em tudo quanto for aplicável, às disposições des-te capítulo.” - cfr. Capítulo II, do Título II, do Livro III, do CPP, artºs. 140º a 144º, ao passo que o nº 2, do art. 140º, torna aplicáveis, às declarações do Arguido, o dis(...) no artº 128º e 138º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente; 184. - Se tivemos a preocupação de destacar, num e noutro dos preceitos, a ressalva que em ambos se expressa, mais não foi do que para enfatizar a relevância de que a mesma se reveste, tendo em conta, como referido, as particulares especificidades do estatuto processual do Arguido, nomeadamente, no que ao regime das declarações que preste na fase de Julgamento diz respeito; 185. - Os artº 343º, nºs. 1 a 3 e 361º, nº 1, ambos do CPP, reconhecem e consagram, ao depoimento do Arguido, uma amplíssima latitude, restringindo esta em situações- -limite, absolutamente excepcionais, postulando, como regra (artº 343º), o direito a ser ouvido “em tudo quanto disser, nos limites assinalados no número anterior” (nº 2), ou a sê-lo em tudo o que declarar a bem da sua defesa (artº 361º), estabelecem-se, como únicas excepções, os casos em que o Arguido, ao depor, se afaste do objecto do processo (nºs. 1 e 3, do artº 343º); 186. - Por outro lado, no que concerne à valoração do depoimento de Arguido, no âmbito do qual se implique, favorecendo-o ou prejudicando-o, outro qualquer co-argui-do, vale, tão só, a restrição constante do nº 4, do artº 345º, do CPP (“não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar”); 187. - Daqui decorre que, ao regime que disciplina o depoimento do Arguido, em sede de Julgamento, só, supletivamente, se aplicam as disposições relativas a outras fases processuais, sendo de afastar qualquer norma que condicione, ou limite, a amplitude do declarado, para além das referidas excepções; 188. - Acresce que o Recorrente, na senda de uma descaracterização, amiúde, vulgarizada, desfoca a verdadeira natureza do depoimento indirecto, engrossando o rol dos crêem ver nele uma proibição; 189. - Ora, mesmo tendo em conta que, em processo penal, “são admissíveis as provas que não forem proibidas” (cfr. artº 126º), a disciplina do artº 129º, não só não estabelece qualquer proibição, como, ao invés, disciplina um direito; 190. - Trata-se de uma permissão condicionada, como, desde logo, resulta do corpo do nº 1, do preceito (“Se o depoimento resultar do que se ouviu dizer a pessoas determina-das, o juiz pode chamar estas a depor.”). Se o não fizer, tal terá como cominação uma proibição de valoração de prova, ainda que, nesse caso, sejam admitidas excepções (a inquirição não ser possível por morte, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade de as pessoas indicadas serem encontradas); 191. - A Defesa de C, paradoxalmente, assinala que “a norma constante do art.º 129.º do CPP (“Depoimento indirecto”) não é aplicável ao depoimento indirecto de arguidos.”; 192. - Mas, então - seguindo o que se crê ser a linha de raciocínio do Arguido -, se o não é, onde estará consagrada, para o Recorrente, a proibição de valoração de depoi-mento indirecto de co-arguido ?!; 193. - É que, de acordo com o princípio atrás enunciado, emergente do art. 126º, do CPP, se não é proibido, porque não aplicável, aos co-arguidos, haverá que, inexoravel-mente, concluir-se, ser ele… permitido; 194. - O que é certo é que o Arguido A identificou o autor da declaração (o Assistente AP) e confirmou o respectivo teor, sendo certo que o Assistente AP foi ouvido em audiência e confirmou ter dito ao Arguido A o que este reconheceu ter-lhe sido referido pelo Assistente; 195. - Todos os requisitos foram cumpridos, pelo que o depoimento do Arguido A, na parte em que possa ser tido como depoimento indirecto, é plenamente válido e valorá-vel; 196. - Consigna-se, finalmente, que as 2 situações a que o Recorrente se reporta, não são idênticas; 197. - Na epígrafe do(s) capítulo(s) a que ora se responde (cfr. fls. 69.238 a 69.240/ /69.256), pese embora se aluda a 2 dos Assistentes (AP e AI), todo o desenvolvi-mento se reporta - com excepção de duas episódicas e difusas referências a AI -, ao Assistente AP (“com particular relevo no que respeita ao Assistente AP e também ao Assistente Y, embora quanto aos factos atinentes a este último o Recorrente não haja sido condenado.” - cfr. fls. 69.238/9); 198. - Estão em causa os itens “4.1.1.” e “4.1.4.”, do Despacho de Pronúncia, a que correspondem, respectivamente, os factos “101.” a “101.10.” e “104.” a “104.13.”, dos “Factos Provados”, no Acórdão; 199. - O Arguido C estava incriminado numa e noutra situação, tendo sido condena-do em ambas, ao passo que o Arguido A estava pronunciado e foi condenado, tão só, no que diz respeito aos factos que integravam o item “4.1.4.”, do Despacho de Pronúncia; 200. - Significa isto que, se A é co-arguido em crime conexo, ao qual se reporta AI (“4.1.4.”), não o é no que se relaciona com AP. Tratar-se-á, no primeiro caso, de co-arguição material, e, no segundo, de co-arguição meramente formal; 201. - A Defesa de C, estranhamente, não invoca o dis(...) no art. 133º, nº 1, a), do CPP, nos termos do qual estão impedidos de depor como testemunhas “o arguido e os co-arguidos no mesmo processo ou em processos conexos, enquanto mantiverem aquela qualidade”. -arguição material, e, no segundo, de co-arguição meramente formal; 202. - Para Medina de Seiça, “o âmbito do impedimento deve determinar-se atendendo ao nexo existente entre as imputações dos vários arguidos «hoc sensu, ao conceito material de co-arguido»”, ao passo que “nos casos em que existe” mera “comunhão processual entre os arguidos, estes não se encontram impedidos de testemunhar relativamente aos factos autónomos de outro arguido, isto é, factos que não apresentem o nexo determinante do impedimento (o mesmo crime ou crime conexo).”, (...) que as imputações sejam, como foram, corroboradas por outro(s) elemento(s) de prova; 203. - Pelo que, no que aos factos que envolvem o Assistente AP, a questão nem se-quer se coloque. Seja na qualidade de testemunha (e A nunca foi ouvido nessa condi-ção, mas, in casu, poderia tê-lo sido), seja como arguido, a declaração do Arguido A, confirmando o que AP lhe havia dito, é plenamente válida e valorável, (...) que ne-nhuma norma processual o proíba; 204. - Quanto aos factos que se relacionam com o Assistente AI, o Arguido A não poderia ter sido (e não foi) ouvido como testemunha, mas o seu depoimento, prestado na qualidade de co-arguido na parte em que confirma o que lhe foi dito por AI, é, igualmente, lícito e, consequentemente, valorável, por inexistência de preceito que o impeça; 205. - Ao prosseguir, a Defesa de C alinhava uma pretensa impugnação (segmenta-da) da matéria de facto, na qual o Recorrente se propõe, não só, descredibilizar o referido depoimento, como ainda, abalar o facto dado como provado, segundo o qual o Arguido C protegia A, dentro da AX, refutando a exaustiva análise que, a esse respeito, o Acórdão produziu e invocando, a despropósito, de entre outras, declarações relativas a factos pelos quais o Arguido C nem sequer foi condenado ((…), Assis-tente Y); 206. - Todavia, o Acórdão analisa, por um lado, o relacionamento do Arguido A, com o Arguido C e, por outro, como foi entendido e valorado, pelo Tribunal, o depoimento do primeiro, sem escamotear, antes avaliando criticamente, algumas contradições, ou fragilidades, que patenteia, análise para a qual o MºPº remete, aqui a dando por reproduzida (cfr. fls. 67.051 a 67.119, 67.404 a 67.417, 67.419 a 67.431); 207. - Por fim, a Defesa do Arguido C assinala pretensas “intrínsecas incongruências” entre os “Factos Provados“ ”66.”, “67.”, “68.” e “70.”, por um lado, e “3.” e “4.”, dos “Fac-tos não Provados”, por outro; 208. - Em primeiro lugar, não se lobriga que relevância seja de retirar do facto de o Tri-bunal der dado como assente o que alguns, que não muitos, dos funcionários da AX, pensavam do relacionamento existente entre os Arguidos A e C, tão pouco existindo qualquer incongruência na circunstância de o Acórdão ter dado como assente a protecção de que A gozava, da parte de C, a qual, não só não é contrariada pelos factos provados “66.” a “68.”, como é certo que, estes, se constituem em pressu(...)s lógicos do consignado no facto provado “70.”; 209. - Aliás, estranha-se que a Defesa de C não tenha invocado, como seria natural que fizesse, a verificação formal de qualquer vício, nomeadamente, o previsto no artº 410º, nº 2, b), do CPP. Quiçá, porque se tenha (pres)sentido que o alegado carecia de convicção bastante!; 210. - A Defesa de C invoca, de seguida, a pretensa perda de eficácia da prova por inobservância do prazo estatuído no artº 328º, nº 6, do CPP, não se alcançando, no entanto, o sentido do que, nesta sede, o Recorrente invoca; 211. - Após relatar, circunstanciadamente, toda a trama processual desencadeada a partir de 4 (cfr. fls. 66.157 e ss.) e 5 (cfr. Acta da Sessão de Julgamento, da data em causa) de Agosto de 2010, o Arguido consigna (cfr. fls. 69.260) que as irregularidades por si arguidas naquelas datas, relativamente à pretensa perda de eficácia da prova, por ultrapassagem do prazo previsto no art. 328º, nº 6, do CPP, “… foram julgadas impro-cedentes por despacho prolatado a fls. 68.217 e s. dos autos.”; 212. - Notificado deste Despacho, proferido em 13.9.2010 ([6]), o Arguido C não só não arguiu qualquer irregularidade, como não interpôs qualquer recurso, pelo que outra conclusão daí não possa retirar-se, senão a de que o Despacho em causa transitou em julgado; 213. - Nem se diga que o faz agora, no âmbito do presente Recurso, (...) que, se é de uma irregularidade que se trata - como o próprio reconhece -, ela ficou sanada, não por força do invocado art. 121º, que trata das nulidades, mas a coberto do art. 123º, nº 1, um e outro, do CPP, que disciplina a sanação das irregularidades, nos termos do qual a alegada irregularidade sempre teria ficado sanada, (...) que não arguida no prazo de 3 dias, subsequentes à notificação do Arguido; 214. - Se assim é, como, cristalinamente, se crê, igualmente improcede a impugna-ção/arguição (se de nulidade ou irregularidade se trata, o Recorrente não esclarece), da Sessão de Julgamento de 3 de Setembro, justamente, aquela em que foi lido o Acórdão; 215. - Em primeiro lugar, porque, como referimos, a Sessão de 5 de Agosto não foi ir-regular, tendo sido declarada a sua validade, por Despacho transitado em julgado; 216. - Em segundo lugar, porque, ainda que assim não se considerasse, estando sanada a alegada irregularidade da Sessão de 5 de Agosto, entre esta e 3 de Setem-bro não mediaram, sequer, 30 dias; 217. - Por outro lado, o Despacho proferido no dealbar da Sessão de 5 de Agosto, invocando, expressamente, o dis(...) nos artºs. 361º, nºs. 1 e 2, 371º, nºs. 1 e 2, 323º, a) e 328º, nºs. 2, 3, a), b) e c), 4 e 6, todos do CPP, e consignando que “o Tribunal procede à (re)abertura da audição com produção de prova”, completa, reparando-o, o Despacho proferido em 27 de Julho, sem que, para qualquer sujeito processual, resulte qualquer prejuízo; 218. - Ainda que assim não se entendesse, o próprio decurso da audiência e, sobre-tudo, os actos que nela tiveram lugar, sempre convalidariam a precariedade do acto ori-ginário, por apelo ao princípio da conservação dos actos imperfeitos. De acordo com o respectivo postulado, tal “consiste em reconhecer-lhes capacidade para provocar os efeitos correspondentes aos actos válidos, mediante a sua coligação com outros factos sucessivos, que vêm suprir, ou tornar irrelevantes, as deficiências cometidas.”; 219. - Assim não entenderam, num primeiro momento, a Defesa do Arguido C, e, acto contínuo, no essencial, por adesão, as Defesas de todos os restantes Arguidos, as quais, logo após a “abertura” dos documentos referenciados na Acta que se seguiu à prolação do Despacho “reparador”, reiteraram a arguição de irregularidade do mesmo, bem como de todos os actos praticados no decurso da audiência; 220. - Bem vistas as coisas, a bem pouco se cinge a argumentação com a qual se procura inquinar os actos processuais impugnados; 221. - Partindo de uma interpretação redutora, nomeadamente, dos artºs. 369º, nº 2, e, sobretudo, do artº 371º, do CPP, e valendo-se de uma concepção restritiva do que consideram ser o “carácter excepcional” da reabertura da audiência, quando determinada ao abrigo das disposições conjugadas dos artºs. 361º, nº 2, 369º, nº 2 e 371º, do CPP; 222. - acaba por, contraditoriamente, concluir-se, por um lado, que ao Tribunal estaria vedado reabrir a audiência, para efeitos de produção de prova suplementar, (...) que as Alegações produzidas pelos sujeitos processuais, na 460ª sessão de julgamento, pressuporiam estar finda tal produção de prova e, consequentemente, encerrada a discussão da causa, 223. - admitindo, no entanto, por outro lado, que a produção de tal prova suplementar seja aquela “que o tribunal entenda necessária à determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar.”; 224. - Pinto de Albuquerque, expressamente, admite a possibilidade de, no âmbito da audiência reaberta, nos termos do dis(...) naquela norma, serem tomados em consi-deração “os factos novos que constituam alteração não substancial da acusação ou da pronúncia…, devendo então ser aplicado o dis(...) no artº 358, nº 1, do CPP.”, sem que se exclua que tal possa ocorrer após o encerramento da produção de prova suplementar e subsequentes Alegações - cfr. nº 4, do artº 371º; 225. - Na verdade, é ao Tribunal que, em primeira linha, é conferido o poder-dever de produzir a prova que considere necessária, não estando vedado, aos sujeitos proces-suais, influenciar a ponderação dessa necessidade, designadamente, por meio das Alegações orais que produzam ao abrigo da referida norma; 226. - Sendo, tendencialmente, desejável que a produção de prova obedeça a critérios de concentração temporal, as incidências próprias do processo deliberativo poderão impor a reabertura da audiência, tantas vezes quantas as necessárias à boa decisão da causa, não sendo, consequentemente, sustentável que, tal como pretendido pelo Arguido, o Despacho de fls. 65.674 tenha constituído caso julgado formal; 227. - Por forma a salvaguardar a prova produzida, o Tribunal, concomitantemente, precaveu os efeitos que o decurso do tempo e a ultrapassagem do período de 30 dias poderiam implicar, sustentando o agendamento das sessões de julgamento, em primei-ro lugar, na necessidade de produção de prova, como, ainda, no que, expressamente, invocou como “continuidade da audiência”, assim agindo com a prudência que se lhe impunha, acautelando a conservação e validade da prova produzida; 228. - Daqui decorre, desde logo, que, a ter-se verificado qualquer irregularidade - o que, como se viu, não foi o caso -, ela sempre ficaria sanada por força, quer da aceita-ção expressa dos efeitos do acto alegadamente irregular, quer pelo facto de um Argui-do se ter prevalecido da faculdade a cujo exercício o acto, pretensamente, irregular, se dirigia - cfr. artº 121º, , nº 1, b) e c), do CPP, norma que, reportando-se às nulidades sanáveis, por maioria de razão, é aplicável às irregularidades; 229. - Acresce que a Defesa de C convoca um entendimento assente numa interpretação segundo a qual o prazo de 30 dias se impõe, não só ao prazo que medeia entre sessões de produção de prova, como, também, ao prazo que decorre entre o termo desta e a prolação da sentença (no pressu(...), que não admitimos como verificado, que a Sessão de 5 de Agosto de 2010 fosse irregular); 230. - Tal entendimento não é, a nosso ver, defensável, (...) que, ao encerrar a produção de prova, o Tribunal inicia o processo de análise e valoração da mesma, mantendo com esta um contacto continuado, o qual, pela própria natureza das coisas, ao invés de levar ao esquecimento, fortalece e reaviva a memória da prova produzida; 231. - Assim se conclui, igualmente, no Ac. do STJ, de 28.10.2009, no qual se dispõe que “… a regra do nº 6 do art. 328º do CPP refere-se apenas à fase da produção da prova,… A sentença constitui uma nova fase do julgamento, que pressupõe a prévia deliberação, nada obstando a que seja ela lida e depositada para além do prazo de 30 dias após a deliberação. Não constitui, pois, nenhuma nulidade ou irregularidade o facto de, no caso dos autos, o acórdão ter sido lido mais de 30 dias depois do encerramento da produção da prova.”; 232. - Por tudo o que se deixa ex(...), entende-se que, também aqui, falece razão ao Recorrente C; 233. - Quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, em especial dos fac-tos constantes dos nºs. 101 a 101.10, dos Factos Provados (relativos ao Assistente AP), a Defesa de C começa por invocar o conteúdo de declara-ções prestadas pelo Assistente AP, no âmbito de um processo disciplinar instaurado ao próprio Arguido, declarações, essas, que foram, efectivamente, "abertas" em audiência; 234. - O Acórdão, pese embora sem convocar, directamente, o conteúdo de tais declarações, fundamenta, exemplarmente, porque considerou plausível e convincente a explicação dada pelo Assistente quando confrontado com algumas contradições entre tais declarações e as que, a tal respeito, produziu em audiência (cfr. fls. 67.391, a partir de linha 5, a fls. 67.395); 235. - Acto contínuo, o Recorrente invoca, transcrevendo-as, parte das "declarações" (a colocação entre aspas releva do facto de se entender que o que os Assistentes disseram ao Perito não pode ser considerado, formalmente, como declarações, (...) que as partes transcritas nos Relatórios Periciais, para além de terem resultado da selecção do próprio Perito, não foram, em caso algum, revistas e/ou assinadas pelos próprios "declarantes") que, nos Relatórios Periciais, são atribuídas ao Assistente AP; 236. - Como facilmente se pode constatar, a invocação de tais "declarações" não visa, implícita ou explicitamente, impugnar, ou colocar em crise, a validade cien-tífica e, consequentemente, a probidade probatória das próprias Perícias, único caso em que tal lhe seria consentido, por força do decidido, quer no Ac. do TRL, de 21.3.2007, quer no Despacho recorrido, por aquele confirmado, onde, recorde-se, se conclui não ser "… permitido ao Tribunal do Julgamento fazer uso livremente das declara-ções prestadas pelas alegadas vítimas na fase de inquérito perante um Perito, a não ser no âm-bito da valoração dessa Perícia como meio de prova."; 237. - O que procura alcançar-se mais não é, tão só e uma vez mais, do que o mero confronto de declarações, na insana procura de alegadas (reais ou putativas) contra-dições; 238. - Em conformidade, e porque não se alcance que conclusões pretenda o Recor-rente retirar do que invoca acerca da personalidade do Assistente AP, o MºPº não se pronunciará sobre o segmento em causa, assinalando-se, como ininvocáveis, fls. 69.266, de linha 10, a final e fls. 69.267, desde o início até linha 12, fls. 69.270, linha 23 até final, 69.271, até linha 11, 69.272, linhas 5 a 11; 239. - Aliás, estranho seria que o declarado, por todos e cada um, formasse um "puzzle" harmonioso, em que todas as peças harmoniosamente encaixassem; 240. - Foi à luz desta evidência que o Acórdão dá conta dos critérios com base nos quais avaliou os depoimentos, ouvindo o que literalmente encerravam, mas, também e não menos importante, tentando compreender e chegar à verdade de cada um; 241. - A Defesa de C, como as restantes, limitam-se a uma abordagem literal, redu-tora e intelectualmente pobre, das declarações, esquecendo, ou não lhes interessando recordar, que os depoimentos de tais Vítimas não são, na maior parte das vezes, línea-res, que, nas mais das vezes, se iniciam por processos de negação, a que se sucedem avanços e recuos, determinados por sentimentos que os penalizam e envergonham, que a sujeição a diligências de prova se constitui como vitimização secundária, poten-ciadora do trauma, que o assumir ter sido vítima de abuso implica a reorganização dos modelos de socialização, etc., etc.; 242. - Não obstante, o que para as Defesas importa é que o declarante aqui disse, onde além omitira, que o depoente a este descreveu assim, àquele contou "assado", que o depoente, então, referiu 5 vezes, ao passo que 5 anos volvidos alude, tão só, a 3, e assim por diante…; 243. - Tão pouco se afigura relevante qualquer referência a pretensas declarações do Assistente AP, alegadamente produzidas em sede de Tribunal Arbitral, (...) que, o que se invoca, para além de absolutamente inócuo, assenta em meras especulações; 244. - No capítulo subsequente (Da alteração não substancial dos factos), a Defesa de C mais não faz do que reabrir uma questão que, ou está decidida, ou pendente de apreciação de Recurso por si inter(...) e no qual manifestou interesse em que seja apreciado (cfr., infra, "A).4.3."); 245. - Daí que se afigure absolutamente deslocada, por prejuízo, a invocação referida, à qual, consequentemente, nos dispensamos de responder, sem prejuízo do que, em sede e momento próprios, o MºPº teve já oportunidade de dizer (cfr. Apenso de Recur-so "ZG"); 246. - Sob a epígrafe " Factos considerados provados pelo Tribunal a quo quanto ao Assis-tente AP.", e após se transcreverem os factos provados no Acórdão, relativos ao Capítulo "4.1.1.", do Despacho de Pronúncia, a Defesa do Arguido C dá início a uma porfiada pesquisa de declarações prestadas pelo Assistente AP, em Julgamento, complementada com o "exemplo" (sic) de vários documentos e a selecção de alguns depoimentos prestados por Testemunhas, que referencia 247. - Conclui, com uma "análise de cada um dos factos considerados provados quanto ao Assistente AP.", que remata da seguinte forma: "O que vem de se alegar afecta, in totum, a fundamentação em que o Tribunal recorrido assenta a decisão de considerar provados os factos constantes dos nrs. 101 a 101.10…", concluindo requerendo que seja "revogada a decisão do Tribunal a quo quanto a este segmento da decisão da matéria de facto"; 248. - (...) isto, responder-se-á, com recurso ao Acórdão, nos trechos correspon-dentes, o qual, uma vez mais, desfaz quaisquer dúvidas, no modo como abordou, es-clarecendo-o, o depoimento do Assistente AP, sem escamotear o que, neste, foi omis-so ou, mesmo, contraditório; 249. - Todavia, tendo em conta que, na Motivação, se transcreveram os segmentos do Acórdão que se consideraram relevantes, tendo em conta as questões que foram sendo, sucessivamente, suscitadas, o MºPº, por forma a não tornar intoleravelmente extensas as presentes "Conclusões" - que, de resto, a Lei não lhe impunha que elabo-rasse -, fará, tão só, referência individualizada às folhas do Acórdão em que se contenham os trechos que se convocam. Assim:; 250. - (Acórdão - fls. 67.336/7) - "A personalidade de AP e o modo como depôs" ; 251. - (Acórdão - fls. 67.337/9) - "O modo como AP depôs (cont.), as instâncias a que foi sujeito, a confusão nas datas" ; 252. - (Acórdão - fls. 67.339 67.340) - "A memória de AP" ; 253. - (Acórdão - fls. 67.354 a 67.356) - "A memória de AP" (cont.)" ; 254. - (Acórdão - fls. 67.360 a 67.363) - "O relato dos factos e as emoções" ; 255. - (Acórdão - fls. 67.389 67.403) - "Os factos na (...) e as inflexões na narrativa" ; 256. - (Acórdão - fls. 67.458) - "A razão de ser, segundo o Acórdão, da desva-lorização do depoimento da Drª BP" ; 257. - E quanto à prova documental, que sustenta os factos dados como provados, ainda aqui, o Acórdão é, igualmente, exaustivo, não se limitando a indicá-la, mas anali-sando-a criticamente, no contexto global de toda a prova:; 258. - (Acórdão - fls. 67.340 a 67.353) - "A Prova Documental" ; 259. - O Acórdão, como se pode constatar, fala por si, rebatendo e clarificando, uma a uma, todas as questões suscitadas pelo Recorrente, no que a este Capítulo diz respei-to; 260. - A prova, com base na qual a matéria de facto dada como provada, relativamen-te ao item "4.1.1.", do Despacho de Pronúncia, foi criticamente analisada, através de uma fundamentação exaustiva e coerente, razão pela qual se entende dever improce-der a correspondente impugnação; 261. - No Capítulo subsequente, o recurso trata da pretensa ilegitimidade do exerci-cio da acção penal por parte do MºPº, por alegada falta de apresentação tempestiva de queixa, quanto ao crime de abuso sexual de crianças de que teria sido vítima o Assis-tente AI e consequente nulidade da Acusação, da Pronúncia e do Acórdão recorrido, na parte em que condena o Recorrente; 262. - O MºPº não alcança a razão de ser do segmento, em epígrafe, do Recurso do Arguido C, (...) que, tal como referido na própria Motivação, o Recorrente, ao abrigo do dis(...) no artº 412º, nº 5, do CPP, declarou, expressamente, manter interesse na apreciação do Recurso por si inter(...), do “Despacho de fls. 17.042 a 17.046, proferido em Instrução, atinente à legitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que se refere ao Assistente AI (Recurso de fls. 17.916 a 17.953)"; 263. - O Recurso em causa foi, por nós, assinalado, já no âmbito da presente Resposta (cfr., infra, Capítulo “A).4.1.”), como sendo um dos Recursos pendentes, admitido para subir a final, com o Recurso da decisão que viesse a pôr termo à causa, e a que, nesta sede, cumpriria responder, constando a respectiva Resposta do Capítulo “B).1.”, da presente peça processual; 264. - Acresce que, na própria Motivação, o Arguido dá por reproduzido o que, no âm-bito do Recurso que havia já inter(...) e no qual reitera interesse, ali alegara e concluíra (cfr. fls. 69.364); 265. - Mais! Na Contestação, o Arguido, aludindo à questão da pretensa falta de legitimidade do MºPº, fá-lo, tão somente, para relembrar que “esta é matéria que constitui objecto de recurso oportunamente inter(...) pelo ora Arguido e já admitido, com subida a final, de decisão interlocutória proferida em sede de instrução” - cfr. item nº 209, da Contestação, a fls. 24.990 -, sem que formule qualquer conclusão que obrigasse o Tribunal a pronunciar-se, no que a si respeitava, sobre a matéria; 266. - O Acórdão, por seu lado, apreciou e decidiu a questão em apreço, nomeada e expressamente, no que ao Assistente AI diz respeito, pese embora reportando-se aos Arguidos E e K, (...) que, como referido, não lhe cumpria fazê- -lo, relativamente ao Arguido C, inexistindo, assim, qualquer omissão de pronúncia (a qual, sintomaticamente, nem sequer é referida no enunciado da epígrafe do correspon-dente capítulo da Motivação); 267. - Haverá, pois, que concluir-se que, a eventual procedência do Recurso interlocu-tório, inter(...) pela Defesa de C, a fls. 17.916 e ss. - pela qual o MºPº não pro-pugna -, sempre acarretaria as correspondentes consequências, no que ao Acórdão diz respeito, pelo que, o Recurso deste inter(...), pelo Arguido C, na parte em apreço, configura um acto inútil, porque redundante, o que implicará, em conformidade, que, como tal, deva ser considerado, declarando-se prejudicada a respectiva apreciação; 268. - Relativamente à pretensa alteração não substancial de factos (circunstâncias de tempo) constantes da Pronúncia, não comunicadas ao Recorrente, nos termos do art.º 358º, n.º 1 e da consequente nulidade do Acórdão, ex vi do dis(...) no art.º 379º, n.º 1, b), ambos do CPP, ao contrário do alegado, não se verificou nenhuma alteração relevante; 269. - Com referência aos factos descritos no item “4.1.4.”, do Despacho de Pronún-cia, o Acórdão deu como provado o que resulta dos itens “104.” a “104.13.”, dos “Factos Provados”, tendo considerado, como não provados, os factos constantes dos itens “22.” a “22.4.”, do “Factos não Provados”; 270. - Na Pronúncia, dispunha-se que “Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o Arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, por volta das 15 horas, junto ao (…), tendo-lhe dito que precisava que ele “fosse a uma casa”. E, ainda, que "O Arguido A, anteriormente, já havia sujeitado o menor a práticas sexuais consigo, conforme já se descreveu noutro capítulo deste despacho" e que "Nesse dia, à hora marcada, o Arguido A, conduzindo uma das carrinhas (…) da AX, compareceu no local que combinara.”; 271. - Por sua vez, o Acórdão considerou como provado, que “Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o Arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, em local e hora não concretamente apurado. E ainda que "Nesse dia, à hora marcada, o Arguido A, conduzindo uma das carrinhas (…) da AX, compareceu no local que combinara.”; 272. - - e, como não provado, “Que nas circunstâncias descritas no ponto “104.”, dos factos provados, a hora e local onde o Arguido A combinou encontrar-se com o assistente AI foi “por volta das 15 horas” e “ junto ao (…)”, tendo-lhe dito que precisava que ele “fosse a uma casa”; 273. - O Recorrente imputa, ao Acórdão, a pretensa verificação da nulidade prevista no art. 379º, nº 1, b), do CPP, (...) que considera ter-se verificado, entre parte da factualidade descrita na Pronúncia e a que foi acolhida no Acórdão, uma alteração não substancial de facto atinente ao enquadramento temporal, não comunicada ao Arguido C, nos termos do dis(...) no art. 358º, nº 1, do CPP; 274. - Onde, na primeira, se referia que o encontro entre o Assistente AI e o Arguido A, ocorrera a uma 4ª Feira, “por volta das 15 horas”, dos meses de No-vembro, ou Dezembro, de 1999 (daí resultando que o abuso sexual teria ocorrido após essa hora) resultou provado, no Acórdão, que o encontro entre ambos ocorreu, em dia indeterminado, a uma 4ª Feira, dos referidos meses e ano; 275. - O que visa acautelar-se, na disciplina do art. 358º, do CPP, mais não é do que a possibilidade de, aos Arguidos, ser dada a possibilidade de adaptarem a estratégia de defesa que haviam adoptado, face a uma alteração do objecto do processo (não 276. - Tal comunicação implica, em princípio e por natureza, uma inovação surpreen-dente, a qual, por isso mesmo, impõe uma disciplina processual que não colida, antes se conforme, com a tutela constitucional das garantias de defesa, consagradas no artº 32º, nº 1, da CRP) que lhes seja comunicada pelo Tribunal; 277. - A caracterização de uma modificação, como alteração substancial, ou não substancial, que implique o accionamento dos procedimentos postulados, respectiva-mente, nos artºs. 359º e 358º, do CPP, há-de fazer-se, em última análise, por reporte ao caso concreto; 278. - Dependendo das circunstâncias, uma alteração de tempo, ou de lugar, pode, ou não, configurar uma alteração processualmente relevante, impondo-se, no primeiro ca-so, a comunicação formal da alteração, sem que tal se mostre necessário, na segunda hipótese; 279. - Como ensina o STJ, “uma alteração não substancial dos factos descritos na acu-sação ou na pronúncia pressupõe uma modificação com relevância para a decisão da causa, não bastando para tal que a matéria de facto provada não seja inteiramente coincidente com a vertida na acusação ou na pronúncia.”; 280. - No que ora importa, a modificação temporal em causa, per se, é irrelevante, tendo em conta que não descaracteriza o facto, seja por referência a uma abordagem naturalística, seja por força de uma concepção normativa; 281. - Não obstante, tal não implica, só por si, que não possa ter-se por verificada uma alteração não substancial, uma vez que, para que, assim, se possa concluir, há-de ainda avaliar-se se a modificação factual teve, ou não, a virtualidade de comprimir, desfavorecendo-a, a estratégia de defesa do Recorrente, o que, como se demonstrará, não sucedeu; 282. - O Arguido C, na sua Motivação, consigna, além do mais, o seguinte: “No caso sub judice não foi indiferente à defesa apresentada em juízo pelo Recorrente a delimitação do facto que lhe era imputado na Pronúncia através daquela específica referencia-ção temporal. Atente-se que a estratégia de defesa assentou, em larguíssima medida, na de-monstração do que o Recorrente fez nos períodos temporais em que lhe era imputada a prática de crimes - tendo, para isso, coligido um impressionante acervo de registos com os quais elaborou a lista integrada que apresentou na sua contestação - e, também, no carrear pa-ra os autos diversos elementos documentais relativos à vivência dos Assistentes, com o propó-sito de que, através do cruzamento de uns e outros, pudesse contribuir para o esclarecimento dos factos e assim demonstrar a sua inocência.”; 283. - O Arguido, tal como por si referido, juntou, com a Contestação, um documento (que designou por Lista Total Integrada, doravante designada por LTI), com base no qual procurava demonstrar a impossibilidade de ter estado nos locais e nas datas em que a Pronúncia o colocava; 284. - Dessa LTI resulta, com clareza, que o Recorrente não se limitou a apresentar registos que cobrissem os períodos adjacentes às 15 horas, de todas as 4ªas Feiras, dos meses de Novembro/Dezembro de 1999, antes abrangendo, tais registos, todas as horas dos referidos dias, manhãs, tardes e noites incluídas; 285. - Ou seja, os períodos, a que se reporta o Acórdão, abrangidos pela distensão do período temporal em apreço, foram, em primeira linha, invocados pela própria Defesa do Arguido C, a qual, de resto, transcreve, na própria Motivação, os registos constantes da LTI, correspondentes às referidas 4ªs. Feiras; 286. - A tanto acresce o facto de, nas questões que dirigiu, em Julgamento, ao Assis-tente AI, a Defesa de C não se ter coibido de alargar as instâncias a outros períodos dos dias, que não, apenas, os que se reportavam aos períodos próximos das 15 horas, das 4ªas Feiras, compreendidas nos meses e ano em apreço, naquelas in-cluindo, ainda, perguntas relacionadas com os registos das faltas às aulas, por parte do Assistente AI, relativas a períodos do dia diversos do descrito na Pronúncia; 287. - Fica, assim, claro, que a Defesa de C, chamando à colação, no âmbito das suas instâncias, períodos de tempo, diversos e mais abrangentes, do que os descritos no Despacho de Pronúncia, teve, desde logo, ensejo de, sem quaisquer limitações, se defender, exercendo o respectivo contraditório; 288. - Daí que, não lhe assista qualquer razão quando invoca surpresa, ou, quando alega não ter tido “a possibilidade de se defender em juízo”, (...) que as garantias de Defesa que, enquanto Arguido, lhe assistem, foram, e estão, completamente assegura-das, pelo que não é lícito concluir-se ter-se verificado qualquer alteração (relevante) não substancial dos factos descritos na Pronúncia, a qual impusesse qualquer comuni-cação, ao abrigo do art. 358º, nº 1, do CPP; 289. - Acresce, em qualquer caso, que, ainda que assim não se considerasse - o que por mero exercício se admite -, o facto de o alargamento temporal ter sido suscitado, antes de tudo e todos, pelo próprio Recorrente, sempre imporia que, nos termos do dis-(...) no nº 2, da referida norma, a necessidade de comunicação ficasse prejudicada, (...) que a alteração emergiu, em primeiro lugar, de factos alegados pela Defesa; 290. - Retornando à impugnação da matéria de facto, diga-se que a Defesa de C sabe bem que, ao Tribunal da Relação, estará vedado, na presente fase processual, avaliar se a Acusação e a Pronúncia se basearam, ou não, exclusivamente, nas decla-rações do Assistente; 291. - Tal facto, porém, não o inibe de dizer o que diz, sendo certo - sentimo-nos no direito de o fazer -, além do mais, que o que afirma não é verdade. Inúmeros elementos de prova, que não apenas as declarações do Assistente AI, foram recolhidos, todos tendo confluído na avaliação que culminou, quer com a Acusação, quer com o Despa-cho de Pronúncia; 292. - Acto contínuo, e uma vez mais, o Recorrente invoca, transcrevendo-as, parte das "declarações que, nos Relatórios Periciais, são atribuídas ao Assistente AI, sendo certo que, como facilmente se pode constatar, a invocação de tais "declara-ções" não visa, implícita ou explicitamente, impugnar, ou colocar em crise, a validade científica e, consequentemente, a probidade probatória das próprias Perícias; 293. - Único caso em que tal apenas lhe seria consentido por força do decidido, quer no Ac. do TRL, de 21.3.2007, quer no próprio Despacho recorrido, por aquele confirma-do, onde, recorde-se, se conclui não ser "… permitido ao Tribunal do Julgamento fazer uso livremente das declarações prestadas pelas alegadas vítimas na fase de inquérito perante um Perito, a não ser no âmbito da valoração dessa Perícia como meio de prova."; 294. - O que procura alcançar-se mais não é, tão só e uma vez mais, do que o mero confronto de declarações, na insana procura de alegadas (reais ou putativas) contra-dições; 295. - Ao que acresce o facto de se retirarem conclusões das partes transcritas do depoimento do Prof. BR, que o respectivo conteúdo não consente (o Perito apenas refere que "o nacarado pode ir-se apagando" e que não pode, " de forma alguma, excluir a hipótese – e até, em alguns casos, eventualmente admitir – que alguns tenham prosseguido com a sua actividade... com esse tipo de actividade."; 296. - Todavia, a Defesa de C logo infere que as lesões correspondentes serão recentes, facto que - pasme-se! -, seria confirmado pela circunstância, segundo a qual, "o Assistente continuava a receber presentes suspeitos muito depois do alegado fim dos contactos sexuais com adultos"; 297. - Por outro lado, e por muito que tal possa espantar, o Recurso convoca, transcrevendo, partes do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que decidiu o Recurso do MºPº, sobre a parte do Despacho de Pronúncia que não pronunciou 2 dos Arguidos inicialmente acusados (já agora, o mesmo Despacho de Pronúncia que, com base nos mesmos critérios de exigência, pronunciou os ora Recorrentes); 298. - O que assim se pretenda, salta à evidência: mais uma vez, o que verdadeira-mente, se visa, é devassar, tão sub-reptícia, quão ilicitamente, os depoimentos das fases de Inquérito e de Instrução, que não foram lidos em Julgamento, e que, como tal, são prova proibida, (...) que não produzida. Daí que, toda a transcrição constante de fls. 69.381, seja insindicável; 299. - Ademais, patenteia-se, a cada passo, uma total incompreensão acerca do que sejam depoimentos de Vítimas de crimes sexuais, tratando-se, como se trata, em não poucos casos, de pessoas com percursos de vida crudelíssimos, psicologicamente ins-táveis e a quem não se poderá exigir uma memória infalível no reavivar de aconteci-mentos profundamente traumatizantes. Estranho seria que o declarado, por todos e cada um, formasse um "puzzle" harmonioso, em que todas as peças harmoniosamente encaixassem; 300. - Foi à luz desta evidência que, ainda no que ao Assistente AI diz respeito, o Acórdão dá conta dos critérios com base nos quais avaliou as suas declarações, ouvindo o que literalmente encerravam, mas, também e sobretudo, tentando compreen-der e chegar à verdade, por meio de critérios de exigência na aferição da prova; 301. - No capítulo subsequente (Da alteração não substancial dos factos), o Recorrente dá conta do seguinte: "Já o Tribunal a quo não comunicou qualquer alteração não substancial ao Recorrente no que respeita a estes factos, pelo que – com surpresa – se deparou a defesa com um elenco de factos provados discrepante da Pronúncia e das declarações do próprio Assistente em audiência de julgamento, como seguidamente haverá ocasião de se demonstrar."; 302. - Esta questão - que só para o Recorrente o é -, (...) que já por si abordada noutro item do seu Recurso, foi correspondentemente tratada e respondida, pelo MºPº, na presente Resposta, infra, em "CB).3.4.2.", para onde ora nos permitimos remeter, e na qual se conclui não se ter verificado, relativamente aos factos constantes do Capítu-lo "4.1.4.", da Pronúncia, qualquer discrepância entre a narração que, nesta e no Acór-dão, se faz dos respectivos factos, que impusesse a comunicação, ao Arguido, de qual-quer alteração, nos termos do dis(...) no art. 358º, do CPP; 303. - Sob a epígrafe " Factos considerados provados pelo Tribunal a quo quanto ao Assis-tente AI.", e após se transcreverem os factos provados no Acórdão, relativos ao Capítulo "4.1.4.", do Despacho de Pronúncia, a Defesa do Arguido C dá início a uma porfiada pesquisa de declarações prestadas pelo Assistente AI, em Julgamento, complementada com a referência a vários documentos e a selecção de alguns depoimentos prestados por Testemunhas, que referencia, concluindo com uma "análise de cada um dos factos considerados provados quanto ao Assistente AI."; 304. - A tanto responder-se-á, ainda e sempre, com recurso ao Acórdão, nos trechos correspondentes, o qual, uma vez mais, desfaz quaisquer dúvidas, no modo como abordou, esclarecendo-o, o depoimento do Assistente AI, sem escamotear o que, neste, foi omisso ou, mesmo, contraditório; 305. - (Acórdão - fls. 67.525/6) - "A personalidade de AI e o modo como depôs" ; 306. - (Acórdão - fls. 67.542) - "O Assistente AI e o Arguido A" ; 307. - (Acórdão - fls. 67.549 a 67.553) - A análise crítica da Prova, o percurso escolar do Assistente, os registos das faltas às aulas, o tempo e o lugar dos factos ocorridos na denominada «casa da (…)»" ; 308. - (Acórdão - fls. 67.556 a 67.575) - "A Prova Documental e Testemunhal" ; 309. - (Acórdão - fls. 67.575 a 67.584) - "Ainda os factos da «Casa da (…)» - análise crítica (cont.)" ; 310. - (Acórdão - fls. 67.584 a 67.595) - "O depoimento do Arguido A - a medida da corroboração" ; 311. - (Acórdão - fls. 67.595 a 67.602) - "O depoimento do Assistente AI - recensão crítica" ; 312. - (Acórdão - fls. 67.602 a 67.605) - "A identificação do Arguido C" ; 313. - (Acórdão - fls. 67.606 a 67.609) - "A identificação do Arguido C (cont.)" ; 314. - Quanto à escolha e determinação da medida da pena, o MºPº, no Recurso que, oportunamente, interpôs do Acórdão, impugnou as medidas das penas, pugnando por um agravamento geral das mesmas, nomeadamente, no que ao Arguido C diz respeito, considerando-se, assim, prejudicada, a necessidade de rebater este segmento do Recurso da Defesa do referido Arguido, remetendo para as considerações expendidas no seu próprio Recurso; (fim de transcrição) 3. Responderam igualmente os assistentes AX, Y, AN e AI, concluindo da forma seguinte: I. A "ressonância da verdade" mais não é do que a sensação que fica, para o julgador, após declarações, do que terá acontecido; II. O tribunal, ao longo da página expressamente refere que esta "ressonância da verdade" é o resultado possível de um esforço de objectivação efectuado pelo mesmo. E a conclusão óbvia retirada pelo tribunal de todo o esforço que antes fez, demonstrou e a justificação objectivamente possível do seu esforço de julgamento. III. Tanto é como se disse que, mesmo na conclusão vertida na página 991 do acórdão, o tribunal exemplifica com a ressonância de verdade que retira do facto de o assistente AP ter tido a atitude que teve relativamente à testemunha NY (mulher do arguido C). IV. Ao longo das páginas do acórdão, o tribunal demonstra, à evidência, que a "ressonância da verdade" não é motivada por critérios meramente subjectivos mas sim, por critérios objectivos e conformes com o princípio e, não menos importante, os seus limites. V. Ao longo do julgamento e como bem plasma o acórdão, é evidente o temor reverencial do arguido A face ao arguido C - não fala efectivamente deste arguido mas coloca-o nos locais e nos factos por reprodução do que lhe disseram os jovens. Foi o único em relação a quem o arguido A o fez. VI. As vítimas, colocam os arguidos nos locais dos crimes e envolvem-nos nas suas práticas. Esses mesmos arguidos que o arguido A acusa e a quem reconhece, seja directamente, seja por reporte ao que lhe dizem as vítimas, um papel nos factos que constituem o iter criminis. VII. É manifesta a envolvência do arguido C e bem andou o tribunal e quo ao valorar, como valorou, as declarações do arguido A. VIII. O artigo 229º do CPP contém uma proibição aplicável às testemunhas, não ao arguido ou assistente. IX. O facto de o arguido A referir o que as vítimas/assistentes lhe contaram, no caso concreto, não impede que o tribunal valore a prova por essas declarações proferida. X. E nem sequer se trata de uma questão de aplicabilidade analógica do preceito como pretende o arguido mas, tão só, da inaplicabilidade da proibição ao arguido e/ou assistente da previsão do artigo 129° do CPP. Razão porque, também aqui falece a razão do arguido. XI. A Carta do arguido A ao arguido C quando estava na cadeia é escrita num contexto de "limpeza " do nome do arguido C. Não se entende outro sentido outra forma de ser para quem, que nada tinha a ver com esta história, resolvesse limpar a imagem do outro. XII. 16 de Dezembro de 2004 "(...) tanto eu como os co-arguidos somos os culpados XIII. 10 de Janeiro de 2005: "só falará do C mais para a frente." (o que nunca conseguiu). XIV. 20 de Fevereiro de 2006 - o arguido A "abre" o seu discurso em relação ao arguido C. XV. Relata que o Y lhe tinha dito que ía ter com "o Sr. C" e que, quanto a (…), "os rapazes falavam do Dr. (…), mas que ele nunca o lá viu nem ao seu carro". XVI. Devemos entender as declarações do arguido A como o Tribunal a quo bem fez: aquilo que foi conseguindo ao longo dos seus depoimentos. XVII. As "alcunhas" postas pelo arguido A ao arguido C, são contrariadas pelos depoimentos de inúmeras testemunhas e assistentes que ao longo de todo o julgamento foram familiarizando o tribunal com os nomes de "bate-mal" e "ali-a-latas" e a sua ligação à pessoa do arguido C XVIII. A norma inserta no nº 6 do artigo 328º do CPP diz respeito apenas à fase de produção de prova. XIX. O risco de perda de memória da prova produzida em audiência, nesta fase, deliberativa, ao invés do ocorrido na sua fase imediatamente anterior, por força da concentração exigida ao tribunal no processo deliberativo, reforçam a sua impressão na memória do tribunal não sendo, por isso necessário e já exigível tal prazo. XX. O facto de a leitura do acórdão ter sido feita mais de 30 dias após o fim da produção da prova também não constitui nulidade. XXI. Conforme jurisprudência uniforme do STJ a regra do n.º 6 do art. 328.º do CPP refere-se apenas à fase da produção da prova, pretendendo o legislador que esta seja concentrada, de forma a proporcionar ao julgador a evocação fácil do conjunto das provas produzidas oralmente, vd. Ac. STJ, Proc. 121/07.9 PBPTM.E1.S1. XXII. Com relevo, porque quase ignóbil, a postura do arguido relativamente às razões da expulsão do assistente AP da AX, XXIII. Prostituição vs. abuso: os conceitos do arguido sobre o que é prostituição e o que, pese embora seja efectuado a troco de dinheiro, constitui um abuso sexual são bem patentes nas alegações a que ora se responde; XXIV. Apenso Z15 -, fls 850 e segts proposta de expulsão do director EJ - que é bem demonstrativa da animosidade em relação aos assistentes que relataram uma história de abusos passada na AX; XXV. Este depoimento e estes documentos são muito importantes para se perceber a influência do arguido C. Para se perceber porque quase todos os depoimentos e excertos chamados à colação pelo aqui recorrente o são como são e para demonstrar a falta de cuidado que muitos profissionais da AX não tomaram para que se chegasse a este cúmulo. Os jovens serem continuamente abusados sem que ninguém visse, ouvisse ou denunciasse! XXVI. Este comportamento pôs em causa o bom-nome da instituição e fragilizou obviamente a sua posição. XXVII. O arguido defende-se, na sua contestação, relativamente às 4.as feiras contidas entre os meses de Novembro ou Dezembro de 1999, não apenas de qualquer hora circundante das 15:00 (como resultava da pronúncia), mas sim de todo o dia. XXVIII. Preenche a sua defesa com períodos temporais que vão das 07:00 da manhã quase à meia-noite dos referidos dias. XXIX. Tendo apresentado defesa prévia e, por isso, tendo tornado possível a alteração, será de ressalvar esta circunstância, por aplicação do n° 2 do artigo 358º do CPP. XXX. Ac. do TRL, de 29.6.1999, in xxiv, 3, 14.9 - "quando a alteração de facto (não substancial) e/ou de direito, operada pelo julgamento, relativamente à pronúncia, derivar de "factos alegados pela defesa" na sua contestação, ou no seu requerimento para abertura de instrução, não haverá - antes de se avançar para a sentença - que comunicar ao arguido a alteração dos factos e/ou da sua qualificação jurídica, nem que lhe conceder um tempo suplementar de defesa." XXXI. Falece a razão do arguido aqui recorrente, não padecendo o acórdão de qualquer nulidade resultante da falta de comunicação da alteração não substancial de factos, a qual não devia ser, como não foi, comunicada. XXXII. Quanto ao auto de reconhecimento de local de fls 6502: é verdade e não se percebe a relevância que o arguido retira do facto de o assistente não ter sido capaz de localizar a casa onde foi abusado pelo arguido C. XXXIII. Quanto às perícias (...)-legais: o perito esclareceu cabalmente a distinção entre lesões e alterações. E, esclareceu que só e apenas "num sentido estrito" (que, aliás, é um sentido bastante consentâneo com as posições assumidas pelo arguido) se pode distinguir; XXXIV. Se existiram situações de abuso mais prolongadas para além das demonstradas nos autos, mormente perpetradas pelo arguido C, infelizmente e considerando a sua não assunção, não se conseguiram os mesmos demonstrar. XXXV. Quanto à condenação do assistente por 2 crimes de roubo – pese embora a irrelevância para caracterizar o assistente –, é verdade. O assistente assumiu os factos. Fala verdade, não mente nem oculta. Termos em que, negando-se provimento ao recurso, deve ser confirmada a decisão recorrida por ser a única conforme à lei fazendo-se, assim, inteira justiça.” (fim de transcrição). 4. Analisando a) - Perda de eficácia da prova por inobservância do art. 328.º, n.º 6, do CPP O recorrente C veio suscitar a questão de que a prova produzida em julgamento perdeu eficácia por inobservância, por parte do Tribunal a quo, do prazo de 30 dias previsto no art. 328.º, n.º 6, do CPP, pelos fundamentos expressos nas suas conclusões de recurso 64.ª a 78.ª, acima transcritas e que aqui se voltam a dar por integralmente reproduzidas. Vejamos, antes de mais, a cronologia dos acontecimentos neste domínio: Na sessão da audiência de julgamento de 23 de Abril de 2010, na qual tiveram lugar as últimas declarações dos arguidos, foi proferido, a final, o seguinte despacho: “(…) 2. Encerro a presente audiência nos termos do art.º 361.º, n.º 2 do C. P. Penal, sendo que para a leitura do Acórdão já se encontra designado o dia 09 de Julho de 2010, às 09horas e 30 minutos.” (cfr. a acta de fls. 65666 a 65674 dos autos). Entretanto, o Tribunal Colectivo reuniu para deliberar a 14 de Maio de 2010, tendo, nessa ocasião, decidido “(…) proceder a produção de prova suplementar, nos termos do art.º 369.º, n.º 2 do C. P. Penal com a consequente reabertura da audiência, tal como está prevista no art.º 371.º, n.º 1 e 2 , do C. P. Penal.” (cf. a acta de fls. 65759 e seg. dos autos). Reaberta a audiência de julgamento, ao abrigo do mencionado art. 371.º do CPP, tiveram lugar sessões a 21 de Maio (cf. a acta de fls. 65805 a 65810), a 14 de Junho (cf. a acta de fls. 65855 a 65862) e a 9 de Julho de 2010 (cf. a acta de fls. 66048 a 66058). No final da sessão de 9 de Julho de 2010, encerrada a produção de prova suplementar, foi proferido despacho em que se consignou que a leitura do acórdão teria lugar em 5 de Agosto de 2010, data que havia já sido previamente designada, em despacho de 26 de Junho, proferido a fls. 65911 dos autos. Porém, em despacho subsequente (cf. 3. do despacho de fls. 66108 dos autos), o Tribunal veio a decidir alterar a "(…) data para leitura do Acórdão para o dia 3 de Setembro de 2010, às 9h.30m", bem como manter a sessão da audiência de julgamento agendada para data anteriormente designada para a leitura do acórdão, 5 de Agosto de 2010, “para efeitos de continuidade da audiência, não considerando no entanto o Tribunal imprescindível a presença dos arguidos.” E, efectivamente, tiveram lugar sessões da audiência de julgamento quer a 5 de Agosto de 2010, em que, inclusive, prestou declarações, a seu pedido, o arguido K, quer a 3 de Setembro de 2010, em que foi lido o acórdão revidendo (cf. as respectivas actas, de fls. 66167 a 66189 e de fls. 66373 a 66379). Finalmente, para o que ora interessa, foi, em 13 de Setembro de 2010 proferido o despacho judicial de fls. 68215, no qual se apreciaram pedidos de desistência de recursos, de alteração de medida de coacção de co-arguido e outras diversas questões, expendendo-se e decidindo-se no seu ponto III (fls. 68217 e 68218) o seguinte: "Fls. 66.157 a 66.163 (Arguido C-Arguição de irregularidade); Fls. 66.172 (Arguido C - Arguição de irregularidade); Fls. 66.175 (Arguido H - Arguição de irregularidade); Fls. 66.176 (Arguido K - Arguição de irregularidade); Fls. 66.177 (Arguido A - Arguição de irregularidade); Fls. 66.178 (Arguido E - Arguição de irregularidade); Fls. 66.178 (Arguido E - Arguição de irregularidade); Fls. 66.185 (Arguido H - Arguição de irregularidade); 1. A fls. 66.157 a 66.163, 66.172, 66.175, 66.176, 66.177, 66.178, 66.185, os arguidos e pelos fundamentos ex(...)s nos requerimentos acabados de enunciar, arguíram a irregularidade do Despacho de fls. 66.106 a 66.108 e de todos os actos praticados na Audiência de Julgamento de 5/08/2010, fls. 66.167 a 66.189. Os Assistentes pronunciaram-se a fls. 66.197 e segs. O Ministério Público pronunciou-se a fls. 66.250 e segs .. Cumpre apreciar e decidir. 1.1. De acordo com o dis(...) no art° 118°, nº 1 e 2, do C.P. Penal, a "… a violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei .. .". sendo que" ... nos casos em que a lei o cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular .. .". Quanto às irregularidades refere-se o art° 123°, do C.P.Penal. No caso concreto o Tribunal, quer no Despacho de fls. 66.106 a 66.108, quer no Despacho de fls. 66.171 a 66.172, fundamentou as razões de facto e de Direito,em função das quais procedia à alteração da data, abertura e prática de actos na AJ de 5/08/2010. Acresce que a própria defesa do arguido K, na Audiência de Julgamento de 5/08/2010, requereu ao Tribunal que o arguido estivesse presente na audiência e fosse ouvido quanto ao teor de documentos que apresentara anteriormente- e que o Tribunal abriu nessa audiência -, o que foi deferido pelo Tribunal. O arguido tem direito a prestar declarações em qualquer altura do processo-artº 343°, nº 1 e 2, do C.P. Penal -, no caso concreto requereu o exercício de tal direito e prestou as declarações. Pelo que, também em função do que antecede, os actos praticados pelo Tribunal na Audiência de Julgamento de 5/08/2010 foram válidos e legalmente praticados. 2. Assim e pelo que antecede, o Tribunal entende que não ocorreu violação de preceito legal ou praticou que legalmente não o pudesse fazer, não tendo cometido,em consequência, as irregularidades invocadas pelos arguidos. Custas do incidente pelos arguidos Requerentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 Ucs - art° 513°, nº 1 e nº 3, do C.P.P e art 84°, nº1, do C.C.J .." (fim de transcrição). Vejamos. Sob a epígrafe “Continuidade da audiência”, estabelece o n.º 6 do art. 328.º do CPP, relativo ao princípio da concentração no tempo da produção de prova em audiência de julgamento e da consequente continuidade desta: «O adiamento não pode exceder trinta dias. Se não for possível retomar a audiência nesse prazo, perde eficácia a produção de prova já realizada». Como se expendeu no acórdão da Relação de Évora de 12 de Setembro de 2006 (proferido no processo n.º 984/06-1 e consultável em www.dgsi.pt): "Esta disposição legal visa salvaguardar os benefícios da imediação e da oralidade na produção da prova, de modo a que esta «seja o mais possível genuína e captada no contacto directo com o julgador em período de tempo precedendo a deliberação sobre a decisão de facto que não prejudique a impressividade de todos os elementos na sua mente, em ordem à correcta formação da sua convicção sobre os factos." Entretanto, no acórdão de fixação de jurisprudência do STJ, de 29 de Outubro de 2008, publicado no DR Iª Série n.º 239, de 11 de Dezembro de 2008, precisando, vir-se-ia a decidir que: "Nos termos do artigo 328.º n.º 6 do Código de Processo Penal, o adiamento da audiência de julgamento por prazo superior a 30 dias implica a perda da eficácia da prova produzida com sujeição ao princípio da imediação; Tal perda de eficácia ocorre independentemente da existência de documentação a que alude o artigo 363º do mesmo diploma". Posteriormente, no acórdão da Relação de Coimbra, de 4 de Novembro de 2009, proferido no processo n.º 2205/04.6PBAVR.C1 e consultável em www.dgsi.pt, em que se alude àquele acórdão de fixação de jurisprudência, expendeu-se: "Fundando-se na valência processual dos princípios da oralidade e imediação como estruturas que condicionam o princípio da concentração da audiência, ambos pertencendo ao núcleo de princípios fundamentais do processo penal, o referido acórdão, pese embora as posições de vencimento, não deixa nenhuma dúvida sobre a relevância do que está em causa na opção legislativa: assegurar que os riscos que o tempo e a duração do processo podem provocar na memória do julgador, como elemento fundamental do princípio da concentração, sejam minimizados. A ausência e a distância, que vão além do prazo razoável fixado pelo legislador, provocam necessariamente modificações na memória de quem julga e que podem trazer inconvenientes no processo de decisão e de fundamentação da decisão. O que justifica a opção clara do que foi decidido. Daí que, não só em obediência ao acórdão de fixação referido, como também por se entender ser essa a interpretação que melhor se compraz com o funcionamento do conjunto de princípios que subjazem à produção e valoração da prova no processo penal português, defende-se que a ultrapassagem do prazo normativamente estabelecido para a continuação da audiência não pode ter outra solução que não o que está estabelecido na lei: a perda da eficácia da prova produzida.” Lembre-se que o STJ já se havia anteriormente pronunciado sobre esta questão, em termos que mantêm actualidade e inteiramente subscrevemos, por entendermos não contenderem com o acórdão de fixação de jurisprudência de 2008. Assim, no sumário do acórdão proferido em 30 de Março 2006 e consultável em www.dgsi.pt, pode ler-se: "(…) II - Nada obsta a que a leitura de sentença ocorra depois de decorridos trinta dias da última sessão de audiência de julgamento - art. 328.º, n.º 6, do CPP. III - A simples leitura da sentença, em regra, não contenderá com a eficácia da prova, a qual já foi oportunamente registada aquando da pressuposta elaboração daquela, e por isso, pouco importará, para tal efeito, que a leitura venha a ter lugar depois dos falados trinta dias. IV - O mesmo sucederá quando confrontados que sejam os momentos de produção da prova e da elaboração e/ou prolação da sentença, por um lado, e da deliberação que a precede, por outro, já que, independentemente da data em que aquela seja proferida, a deliberação é logo seguida (art. 365.º, n.º 1) e ninguém pode garantir que o não foi no caso sub judice. V - A perda de eficácia da prova está ligada a uma presunção legal implícita, segundo a qual o decurso de tal prazo apagará da memória do julgador os pormenores do julgamento, prejudicando desse modo a base da decisão factual, de tal modo que, aí sim, será possível o entendimento de que o único remédio para um tal esquecimento presumido passará pela repetição da audiência. VI - Aliás, sintomaticamente, o art. 328.º citado, insere-se no título relativo à audiência, perfeitamente autonomizado da disciplina da sentença a qual integra um título autónomo - arts. 365.º e ss. do CPP. VII - Aquele art. 328.º dispõe é certo que a audiência é contínua, decorrendo sem qualquer interrupção ou adiamento até ao seu encerramento, salvas as interrupções estritamente necessárias (...), e que se a audiência não puder ser concluída no dia em que tiver sido iniciada é interrompida para continuar no dia útil imediatamente posterior». E no texto daquele mesmo acórdão do STJ de 30 de Março 2006 expendeu-se a dada altura: "(…) a desconformidade do acto com o modelo legal, o vício, não acarreta sempre a nulidade, podendo acarretar mera irregularidade. O sistema legal português não se limita a decretar a invalidade e ineficácia de todo o acto desconforme ao modelo estabelecido em abstracto. Exigências de economia processual impõem, de facto, que a lei não considere todas as imperfeições sob o mesmo plano e antes gradue os efeitos dos vícios em razão da sua gravidade – cfr. Germano Marques da Silva – Curso de Processo penal II, pág. 75. O art. 118 nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal, dispõe que a violação ou inobservância das disposições da lei só determina nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular. Se para que o acto possa ser declarado nulo é necessário que a lei expressamente comine a nulidade, também para que a nulidade seja considerada insanável importa que a lei expressamente o preveja. Na verdade, o art. 120 nº 1 do Código de Processo Penal, dispõe que qualquer nulidade diversa das referidas no art. 119, que prevê as nulidades insanáveis, deve ser arguida. Ou seja, quando a lei expressamente comina a nulidade de um acto sem dispor que se trata de nulidade insanável ela é uma nulidade dependente de arguição, no prazo que a lei prescreve, sob pena de se considerarem sanadas. (…) O nº 6 do art. 328 refere que “Se não for possível retomar a audiência neste prazo, perde eficácia a produção de prova já realizada” e o art. 373, não prevê especialmente qualquer cominação para a sua inobservância. Alega o recorrente que a sentença tinha de ser proferida no referido prazo de 30 dias e só o foi passados 99 dias. Mas aplicar-se-á também aquele prazo à leitura da sentença, quando existe uma norma específica para aquele acto, fixando-lhe prazo (?). Cremos que não. A interpretação literal da norma do nº 6 do art. 328, dá-nos conta que a audiência está a decorrer com a produção de prova. Daí o falar em “retomar a audiência” e em “perde eficácia a produção de prova já realizada”. Pretende a referida norma não quebrar a continuidade da oralidade e da imediação que a produção de prova vem seguindo em sede de audiência de julgamento, presumindo a lei que com um interregno superior a 30 dias aqueles princípios ficam descaracterizados e violados. Mas quando se trata da leitura da sentença, aquele normativo não se lhe dirige. De notar que a expressão “retomar a audiência” pressupõe que aquela se encontra pendente e quando se aguarda a leitura da sentença, a audiência já teve os formalismos dos arts. 360 e 361 do Código de Processo Penal, referindo esta disposição legal (nº 2) “Em seguida o presidente declara encerrada a discussão … e o tribunal retira-se para deliberar”. À deliberação e elaboração da sentença seguem os trâmites dos arts. 372 e 373, não havendo que voltar ao dis(...) no art. 328 do Código de Processo Penal. De notar que é o próprio art. 373 que impõe prazos para a leitura da sentença, prevendo a possibilidade de a causa poder ser de especial complexidade. Ora no caso dos autos, a causa é de especial complexidade e é humanamente impossível deliberar-se e elaborar acórdão nos prazos previstos na referida norma – “10 dias em causas de especial complexidade”. Entendemos que tal situação não pode acarretar a invalidade nem do acórdão nem da prova levada a efeito. Aliás cairíamos num impasse processual porque a impossibilidade de elaborar o acórdão em tão curto espaço de tempo ir-se-ia sempre repetir. Acompanhamos, pelo ex(...) a posição de Manuel Simas Santos, Leal Henriques e Borges Pinho, Código de Processo Penal, Anotado, nota ao art. 373, segundo a qual a inobservância do prazo fixado no art. 373 constitui mera irregularidade, a qual não pode afectar o valor da sentença e, portanto é inócua (também neste sentido o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 15-10-1997, Colectânea de Jurisprudência, Ano V, III, 197). Não se aplicando à situação dos autos o nº 6 do art. 328 mas o dis(...) no art. 373, ambos do Código de Processo Penal, temos assim que a inobservância do prazo im(...) por este último não acarreta qualquer consequência jurídica. Tudo se passando no âmbito do princípio da celeridade processual, analisado caso a caso, e eventualmente susceptível de apreciação disciplinar." (fim de transcrição) Mais recentemente, já depois do citado acórdão de fixação de jurisprudência, o STJ voltou a tratar desta questão, de forma lapidar e completamente esclarecedora, no seu acórdão de 28 de Outubro de 2009 (proferido no proc. 121/07.9PBPTM.E1.S1 e consultável em www.dgsi.pt) onde se diz: "(…) o facto de a leitura do acórdão ter sido feita mais de 30 dias após o fim da produção da prova (…) não constitui nulidade. Com efeito, conforme jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal de Justiça (…), a regra do nº 6 do art. 328º do CPP refere-se apenas à fase da produção da prova, pretendendo o legislador que esta seja concentrada, de forma a proporcionar ao julgador a evocação fácil do conjunto das provas produzidas oralmente, devendo a deliberação seguir-se imediatamente ao termo da produção da prova (art. 365º, nº 1 do CPP). A sentença constitui uma nova fase do julgamento, que pressupõe a prévia deliberação, nada obstando a que seja ela lida e depositada para além do prazo de 30 dias após a deliberação. Não constitui, pois, nenhuma nulidade ou irregularidade o facto de, no caso dos autos, o acórdão ter sido lido mais de 30 dias depois do encerramento da produção da prova.". (fim de transcrição) Afirma o recorrente C que, em síntese, a prova é ineficaz, por força do art. 328.º, n.º 6, do CPP, por terem mediado mais de 30 dias entre a sessão de julgamento de 9 de Julho de 2010 e a da leitura do acórdão, realizada em 3 de Setembro de 2010 e bem assim que a sessão de julgamento de 5 de Agosto de 2010 foi irregular e inválidos todos os actos nela praticados. Na realidade, encerrada (inicialmente) a produção de prova a 9 de Julho de 2010, a leitura do acórdão, ora sob recurso, teve apenas lugar em 3 de Setembro de 2010, isto é passados quase dois meses. Porém, como já acima se assinalou, houve uma sessão da audiência de julgamento em 5 de Agosto de 2010, na qual tal leitura deveria ter ocorrido, o que não sucedeu, mas onde se reabriu a audiência para produção de prova (para tomada de declarações ao arguido K - a pedido deste -, quanto ao teor de documentos que apresentara anteriormente), como explicitado no citado ponto III do despacho de fls. 68215, acima transcrito. Assim, contrariamente ao que defende o recorrente, não se verificou aqui qualquer violação ao art. 328.º, n.º 6, do CPP, bem como aos arts. 361.º, n.º 2, 369.º, n.º 2 in fine, 372.º, n.º 1, 373.º, n.º 1 e 328.º, n.ºs. 1 e 4, todos do mesmo diploma legal, porquanto, face à cronologia traçada e às interpretações jurisprudenciais supra indicadas, que partilhamos, constatamos que a descrita tramitação processual foi observada pelo Tribunal a quo, como evidenciam os autos. Com efeito, entre as sessões da audiência de julgamento de 23 de Abril, 21 de Maio, 14 de Junho, 9 de Julho e 5 de Agosto de 2010 (em que foi encerrada a produção de prova [suplementar]) - bem como em todas as demais sessões da audiência de julgamento destes autos ocorridas ao longo de vários anos - nunca se passaram mais de 30 dias entre cada uma delas, pelo que foi respeitado o prazo de 30 dias, estabelecido no art. 328.º, n.º 6, do CPP, e, como tal, não perdeu qualquer eficácia a produção de prova até aí realizada. Mas mesmo que se considerasse encerrada a produção de prova em 9 de Julho de 2010, o certo é que entre essa sessão e a imediatamente anterior, ocorrida a 14 de Junho de 2010, não mediaram mais de 30 dias e, nessa hipótese, mediando mais de 30 dias entre a sessão de 9 de Julho e a de 3 de Setembro de 2010, em que foi lido o acórdão, tal seria irrelevante por ser, nesse caso, inaplicável o prazo estabelecido no art. 328.º, n.º 6, do CPP, como acima demonstrámos. Refira-se também que, no caso dos autos, a causa é de especial complexidade e é humanamente impossível deliberar-se e elaborar acórdão nos prazos previstos na referida norma (art. 373.º, n.º 1, CPP – “10 dias em causas de especial complexidade”). Por todo o ex(...), e na esteira da mencionada jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, entendemos que tal situação não pode acarretar a invalidade nem do acórdão nem da prova levada a efeito, constituindo quanto muito mera irregularidade, a qual não afecta o valor da sentença, sendo inócua e, como tal, não acarretando qualquer consequência jurídica. Em suma: Não constitui, pois, nenhuma nulidade ou relevante irregularidade o facto de, no caso dos autos, o acórdão ter sido - porventura -lido mais de 30 dias depois do encerramento da produção da prova. Mas mesmo que assim não se entendesse e se considerasse irregularidade relevante, afigura-se-nos que a questão ora suscitada sempre deveria soçobrar, porquanto o arguido C já havia oportunamente suscitado irregularidades que levariam à pretendida perda de eficácia da prova, por ter sido alegadamente excedido o prazo previsto no art. 328.º, n.º 6, do CPP, as quais foram julgadas improcedentes pelo despacho proferido a 13 de Setembro de 2010 (vd. fls. 68217 e seg), com o qual, tendo-lhe sido notificado, se conformou, não arguindo, tempestivamente, qualquer irregularidade (que mesmo a existir teria ficado sanada, porquanto não arguida no prazo de 3 dias a que alude o art. 123.º, n.º 1, do CPP), nem interpondo recurso, pelo que o mesmo transitou em julgado. Por todo o ex(...), improcede o recurso nesta parte. b) - Nulidade do acórdão (art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP) por ter havido omissão de pronúncia ao não conhecer da questão, expressamente suscitada pelo recorrente na sua contestação, da ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que se refere ao crime de abuso sexual de criança, na pessoa do assistente AI, menor relativamente ao qual estava caducado o direito de queixa Alega o arguido C, nas suas conclusões de recurso 220.ª a 245.ª, haver nulidade do acórdão recorrido, por estar verificada omissão de pronúncia, ao não ter este conhecido da questão, expressamente suscitada pelo recorrente na sua contestação, da ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal no que se refere ao crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172.º, n.ºs 1 e 2, do CP, que lhe era imputado ter praticado na pessoa do assistente AI, menor relativamente ao qual estava caducado o direito de queixa. Porém, não é verdade que na sua contestação o ora recorrente tenha suscitado a questão da ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal, nos termos em que agora, em sede de recurso da decisão final, pretende fazer crer este Tribunal ad quem tê-lo feito correcta e tempestivamente em primeira instância, bem como não é verdade que tenha havido qualquer omissão de pronúncia no acórdão recorrido, consubstanciada na circunstância de não ter apreciado a referida questão colocada na contestação, pois, efectivamente, o Colectivo a quo apreciou-a. Senão vejamos. Na sua contestação, o arguido C, como se alcança de fls. 24990 dos autos, consignou: "207. Mas, mais do que isso, relativamente aos crimes de abuso sexual de crianças, sempre se dirá que o Ministério Público não dispunha de legitimidade para prosseguir a acção penal. 208. Na verdade tais crimes revestem inequivocamente, no caso dos autos, natureza semi- pública, nos termos do dis(...) no art.º 178.°, n.º 1 do CP. Invoca o Ministério Público o regime estatuído no n.º 4 do mesmo art.º. Porém, olvida que, à data da instauração do presente processo - 26/1112002, ou, mais precisamente, a 29/11/2002 (cfr. despacho a fls. 44 dos autos) - todas as alegadas vítimas eram já maiores de dezasseis anos de idade, e, portanto, capazes de exercer o direito de queixa, nos termos do art.º 113°, n,º 3, a contrario, do CP. 209. Acresce que, nenhuma das alegadas vitimas exerceu tempestivamente os seus direitos de queixa, os quais estão, assim, inelutavelmente precludidos, nos termos do dis(...) no art.º 115°, n.º 1 do CP, Esta é matéria que constitui objecto de recurso oportunamente inter(...) pelo ora Arguido e já admitido, com subida a final, de decisão interlocutória proferida em sede de instrução." (fim de transcrição) Por seu turno, no acórdão recorrido lavrou-se, nas págs. 36 a 39 (fls. 24987 dos autos): "3.2. Arguido C: 3.2.1. A fls. 23.541 a 23.725, o arguido C apresentou contestação quanto aos factos objecto dos Despacho de Pronúncia de fls. 20.828 a 21.014. Arrolou testemunhas, requereu a tomada de declarações a Assistentes, audição de peritos e consultores técnicos, requereu diligências com vista à obtenção de documentos e/ou Pareceres, requereu a realização de novas Perícias a Assistentes, a realização de perícia ao arguido, inspecção/exame a locais, juntou documentos ( fls. 23.703 a 24.052). 3.2.2. A fls. 24.826 o arguido C requereu a rectificação de lapsos de escritas existentes na contestação que apresentara a fls. 23.541 a 23.725, apresentando novo articulado devidamente rectificado a fls. 24.827 a 25.013. Por Despacho de “ fls. 25.266/7, ponto 6.”, transitado em julgado, o Tribunal admitiu o articulado de fls. 24.827 a 25.013, contestação esta que passou a substituir, para todos os efeitos legais, o articulado anteriormente apresentado a fls. 23.541 a 23.725, mas mantendo-se os documentos apresentados inicialmente pelo arguido a fls. 23.729 a 24.052. 3.2.3. Na contestação de fls. 24.827 a 25.013, o arguido negou a prática dos factos de natureza criminal que lhe são imputados no Despacho de Pronúncia de fls. 20.828 a 21.014. Em síntese, alegou que (…) 3.2.4. Quanto à discussão jurídica da causa, na contestação pôs também em causa o enquadramento jurídicos dos factos no Despacho de Pronúncia. Relacionou o enquadramento feito, na parte em que imputou ao arguido a prática de crimes de abuso sexual de pessoa internada, com (o que para si era) o facto de nessas situações as alegadas vítimas não terem exercido, nos seis meses subsequentes a terem completados os 16 anos de idade, o direito de queixa. Sem prejuízo, defendeu que em qualquer uma das qualificações jurídicas escolhidas pela acusação, o Ministério Público não tinha legitimidade para o exercício da acção penal e nenhuma das alegadas vítimas exerceu atempadamente o seu direito de queixa, estando mesmo precludido nos termos do artº 115º, nº 1, do C.Penal. Consignou que tal questão é já objecto de recurso inter(...) pelo arguido, já admitido com subida a final, de decisão interlocutória proferida em sede de instrução. Concluiu pela sua Absolvição." (fim de transcrição) Ou seja, o Tribunal a quo entendeu que o arguido C referiu na contestação que o Ministério Público não tinha legitimidade para o exercício da acção penal e que nenhuma das alegadas vítimas exerceu tempestivamente o seu direito de queixa (estando o mesmo precludido nos termos do art. 115.º, n.º 1, do CP), mas que não estava agora ali de novo o arguido a suscitar a questão em moldes que implicassem que o Colectivo de primeira instância a apreciasse, mas tão só a consignar, em jeito de lembrança, que tal questão era objecto de recurso por si inter(...) - da decisão proferida em sede de instrução - e que já havia sido admitido, com subida a final, enquanto recurso interlocutório. Sufraga este Tribunal ad quem esse entendimento do Tribunal a quo. Com efeito, o arguido havia anteriormente suscitado a questão, aquando do seu requerimento para abertura de instrução, vendo a sua pretensão ser então julgada improcedente, pelo despacho de fls. 17042 a 17046, por se ter entendido que o direito de queixa foi tempestivamente exercido pelo Ministério Público. E, de tal despacho, interpôs recurso, como se alcança de fls. 17916 a 17953, o qual foi admitido, com subida a final, pelo despacho de fls. 18351 dos autos. Entretanto, veio o ora recorrente dizer manter interesse na apreciação desse recurso, que já apreciámos no início do presente acordão, ao analisar os recursos interlocutórios, julgando-se o mesmo improcedente, bem como à arguida inconstitucionalidade da interpretação da norma constante do art. 115.º, n.º 1, do CP. Importa, pois, concluir que a questão teve no acórdão recorrido a devida abordagem, não sendo apreciada de fundo, por não ser isso que estava em causa, tal como era colocada pelo arguido na contestação. Sendo, finalmente, de registar que o Tribunal a quo não se furtou a tratar no acórdão recorrido, e enquanto questões prévias, a suscitada, pelos arguidos E e K, extinção do direito de queixa pelos ofendidos e consequente ilegitimidade do Ministério Público para o exercício da acção penal (vd., respectivamente, pág. 90 e segs. e 95 e segs. da decisão revidenda), porquanto, esses sim, face à forma como deduziram o incidente (arguindo correcta e formalmente a excepção), colocaram o assunto em termos tais que impunham fosse nele tomada uma decisão de fundo, como, aliás, o foi, longa e fundamentadamente. Pelo ex(...), não foi cometida a alegada omissão de pronúncia, inexistindo, nesta conformidade a invocada nulidade, improcedendo o recurso nesta parte. c) - Nulidade parcial do acórdão por violação do dis(...) nos arts. 127.º e 374.º, n.º 2, do CPP (Violação do princípio da livre apreciação da prova) Pelos fundamentos vertidos nas suas conclusões de recurso 3.ª a 19.ª, acima transcritas e que aqui se voltam a dar por integralmente reproduzidas, o recorrente C entende, em síntese, ter havido violação do dis(...) nos arts. 127.º e 374.º, n.º 2, do CPP, o que importaria a nulidade parcial do acórdão, por falta de fundamentação, ex vi do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma legal, porquanto, o acórdão recorrido, na análise crítica da prova, faz um apelo constante à importância da imediação, bem como àquilo a que chama de "ressonância de verdade". Refere, ainda, o recorrente que o Tribunal a quo na pág. 991 fundamenta aquele segmento da decisão da matéria de facto (referente ao abuso que aquele apurou ter sido cometido pelo ora recorrente na pessoa do assistente AP nas caves da (...) da AX) em considerações de índole estritamente subjectiva, não enunciando de forma objectiva o percurso lógico e racional em que assenta a sua decisão. Mais se insurge o recorrente contra o facto de, em sua opinião, o Colectivo de primeira instância parecer, com aquela fundamentação, quase querer vedar a reapreciação fáctica por parte deste Tribunal superior, contrariando o preceituado no art. 412.º, n.ºs. 3, als. a) e b), 4 e 6 do CPP. Relembre-se que, na referida pág. 991, o trecho em causa, relativo às declarações do assistente AP a propósito do crime de que teria sido vítima nas caves da (...) da AX, é o seguinte: “Mas, para ser assim, a ressonância de verdade que em aspectos já focados encontramos nas Declarações de AP, em algum momento, se a Acusação falsa e inventada, não resistia ao contraditório da instância a que foi sucessivamente sujeito. É certo que este argumento – o da ressonância de verdade que emergiu para o Tribunal -, é aquilo que resulta da imediação, que não conseguimos objectivar mais do que já fizemos. Mas é aquilo que faz com que se acredite numa pessoa e não se acredite noutra, que leva à convicção, que afasta a dúvida, para além de qualquer dúvida razoável.”. (fim de transcrição) O art. 374.º do CPP (epigrafado "Requisitos da sentença") estabelece no seu n.º 2 - que o recorrente C considera ter sido violado - que: "Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal." Por seu turno, o princípio processual da livre apreciação da prova - que o mesmo recorrente também entende ter sido violado - está consagrado no art. 127.º do CPP onde se preceitua que "Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.". Por outro lado, importa não esquecer que, nas causas de maior relevância penal, e tal não sucede por acaso, a decisão da matéria de facto é feita por um colectivo de juízes ou de juízes e jurados, como ocorre nos julgamentos com intervenção de júri, por forma a que, também na decisão da matéria de facto, em que todos participam, haja unanimidade ou maioria na interpretação dos ditos ecos, sinais e ressonâncias da prova pessoal, que, como se disse, cabem na cena e deliberação judiciária, na margem de subjectividade e livre convicção, permitida pelo princípio processual da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127.º do CPP. E, acrescente-se, tal subjectivismo não é sindicável, desde que não viole os critérios legais de apreciação vinculada e/ou as regras da experiência comum. Sobre o sistema das provas tarifárias trazemos aqui à colação o que a este propósito expendeu Érica de Oliveira Hartmann in "Os Sistemas de Avaliação da Prova e o Processo Penal Brasileiro" publicado na Revista da Faculdade de Direito da UFPR, Vol. 39 (2003), pág.s 111 e seg.s e consultável em http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/direito/article/viewArticle/1749 : "Segundo esse sistema, cada prova tem um valor certo e constante, predeterminado pelo legislador, sendo defeso ao juiz valorar as provas de acordo com seus critérios pessoais e subjetivos, que afronte o que foi determinado pela lei. Existia uma hierarquia nítida entre as provas. Havia, conforme aduz NILO BAIRROS DE BRUM (in Requisitos retóricas da sentença penal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 55.) "tabelas prévias de valoração das provas. Dependendo da natureza do fato ou da qualidade da pessoa acusada, a lei previa o tipo e a qualidade de provas que deveria ser consideradas pelo juiz". Essas regras de apreciação da prova, ressalta JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, (in Direito processual penal. Coimbra: Coimbra Editora, v. I, 1981, p. 199) eram baseadas em regras da vida e da experiência que eram tidas tradicionalmente como seguras pela sociedade. Para HELIO TORNAGHI (in Instituições de processo penal .... , v. IV, p. 215), vale ressaltar, "o sistema das regras legais não é inerente à forma inquisitória, mais foi no processo inquisitório medieval que teve mais largo desenvolvimento"." Mas por que no processo inquisitório? Porque em tal sistema se desconfiava do julgador, e o legislador, de antemão, determinava a hierarquia entre as provas, que fundaria a estrutura do julgamento. Como o acusado era bastante ex(...) ao inquisidor, retirava-se dele a tarefa de avaliar, valorar a prova, a responsabilidade caso houvesse avaliado, pois estava tudo predeterminado. O fundamento da adoção deste sistema por muitos ordenamentos jurídicos, segundo JACINTO NELSON DE MIRANDA COUTINHO (in Introdução aos princípios gerais do processo penal brasileiro publicado na Revista da Faculdade de Direito. Curitiba: UFPR, ano 30, n. 30, p. 196, 1998), baseava-se no fato de que "muitas legislações aceitaram a previsão da possibilidade de o juiz incorrer em erro, no momento de valoração dos meios de prova utilizados, razão pela qual se fixou, na lei, uma hierarquia de valores referentes a tais meios. Veja-se, neste sentido, o sistema processual inquisitório medieval, no qual a confissão, no topo da estrutura, era considerada prova plena, a rainha das provas (regina probationum), tudo como fruto do tarifamento previamente estabelecido. Transferia-se o valor do julgador à lei, para evitar-se manipulações; e isso funcionava, retoricamente, como mecanismo de garantia do arguido, que estaria protegido contra os abusos decorrentes da subjetividade. Sem embargo, a história demonstrou, ao revés, como foram os fatos retorcidos, por exemplo, pela adoção irrestrita da tortura"." Exemplo da tarifação era o fato de que, segundo narra OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA (in Curso de processo civil. São Paulo: Saraiva, v. I, 2000, p. 348) o depoimento de um servo não tinha, em absoluto, o mesmo valor do depoimento de um nobre. Entretanto, o depoimento de dez servos equivalia ao depoimento de um nobre ou o de um senhor feudal. E o juiz deveria assim considerar, ainda que estivesse convencido de que o nobre tivesse mentido e o servo não. Outras regras ainda eram bem conhecidas: testis unus testis nulus, testibus duobus fide dignis credentum, entre outras. O juiz, então, não passava de sujeito passivo, ao qual incumbia somente reconhecer na sentença o valor predeterminado pela lei a cada prova produzida sem que pudesse apreciar tais provas de acordo com a sua convicção. Nas palavras de MOACYR AMARAL SANTOS (in Primeiras linhas de direito processual civil .... , v. II, p. 382) "no sistema da prova legal, a instrução probatória se destinava a produzir a certeza legal. O juiz não passava de um mero computador, preso ao formalismo e ao valor tarifado das provas, impedido de observar positivamente os fatos e constrangido a dizer a verdade conforme ordenava a lei que o fosse. No depoimento de uma só testemunha, por mais idônea e verdadeira, haveria apenas prova semiplena, enquanto que nos de duas testemunhas, concordes e legalmente idôneas, ainda que absurdos os fatos narrados, resultaria prova plena e, pois, certeza legal" (Sobre prova plena e semiplena, ver, por exemplo: MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A lógica das provas em matéria criminal. Trad. Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 2001, p. 87 e ss.). A prevalência deste sistema deu-se, sobretudo, no processo inquisitório. Vale ressaltar que, ao mesmo tempo em que o juiz (inquisidor) estava preso à prévia valoração das provas, ele era, antes de tudo, o gestor das provas. "O sistema inquisitório, regido pelo princípio inquisitívo (Princípio unificador do sistema inquisitório. Sobre a definição de sistemas, ver: KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Trad. Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão, 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 657 e ss.), tem como principal característica a extrema concentração de poder nas mãos do órgão julgador, o qual detém a gestão da prova. Aqui, o acusado é mero objeto de investigação e tido como detentor da verdade de um crime, da qual deverá dar contas ao inquisidor" . Uma das grandes críticas feitas a esse sistema está no fato de que, ante a obrigatoriedade de decidir segundo os valores das provas anteriormente estabelecidos pelo legislador, o juiz deveria, em algumas situações, decidir contra aquilo que podia entender ser a verdade. Neste sentido, afirma OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA: "o juiz, segundo este sistema, deverá decidir rigorosamente com base no que foi alegado e provado pelas partes ... , embora sua convicção pessoal sobre aquilo que fora provado nos autos lhe indique que a prova produzida não retrata a verdade". (obra citada pág. 349). Apesar de apontar o mesmo defeito do sistema acima mencionado, HELIO TORNAGHI alerta "que o inconveniente do sistema das provas legais não está na adoção de regras de avaliação da prova, mas na imposição delas ao juiz. Nenhum estorvo existe em que elas sejam propostas, como regras técnicas, não impostas como regras jurídicas. Os preceitos que formam o arcabouço deste sistema são o resultado de longa observação, cristalizam grande experiência e estão impregnados daquela sabedoria e daquela prudência que o tempo e o trato com os homens trouxeram aos práticos e aos juristas de muitos séculos. Nenhuma desvantagem em que os juízes os sigam ou em que as leis aconselhem a observância deles". (obra citada pág. 216). Não há uma indicação temporal precisa que indique a data específica do fim da vigência deste sistema tarifário de avaliação das provas no processo. Alguns autores o identificam, na maioria das vezes, com o início do processo de humanização do Direito, em que há o declínio do antigo regime e uma prevalência das decisões pelos juízes, muito mais independentes e ligados aos ideais democráticos, que passam a viver sob uma racionalidade bastante diferenciada daquela que intensamente vigorava anteriormente e também pela modificação do conceito de verdade até então ex(...). MICHEL FOUCAULT, por exemplo, identifica o fim do antigo sistema das provas legais com a necessidade verificada pelo poder de punir de que, através das provas colhidas, se chegasse a um estado de certeza irrefutável, a fim de que a realidade do castigo efetivamente acompanhasse a realidade do delito, de acordo com meios válidos para todos. É o que ele chama de regra da verdade comum. O indivíduo deveria ser reputado inocente até que efetivamente se comprovasse que tinha praticado um delito e, para chegar a tal conclusão, o juiz deve usar não formas rituais, mas instrumentos comuns. "Agora, a prática penal vai-se encontrar submetida a um regime comum da verdade, ou antes a um regime complexo em que se misturam para formar a intima convicção do juiz elementos heterogêneos de demonstração científica, de evidências sensíveis e de senso comum. A justiça penal, se conserva formas que garantem sua equidade, pode-se abrir agora às verdades de todos os ventos, desde que sejam evidentes, bem estabelecidas, aceitáveis por todos. O ritual judiciário não é mais em si mesmo formador de uma verdade partilhada. É recolocado no campo de referência dos discursos científicos, uma relação difícil e infinita, que a justiça penal hoje ainda não está apta a controlar. O senhor da justiça não é mais o senhor de sua verdade" (in Vigiar e punir. Trad. Raquel Ramalhete. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 89.). FRANCO CORDERO, por sua vez, indica uma data precisa para o abandono do sistema das provas legais: o fim do Ancien régime, com o aparecimento (para o processo penal, especificamente), em 1808, do Code d'Instruction Crimininel. Vale dizer, momento em que os ideais iluministas estavam absolutamente em voga e a repulsa por todas as práticas judiciárias desumanas encontrava-se em seu apogeu. Almejava-se, sobretudo, a adoção de um processo penal (especialmente) verdadeiramente justo e democrático, e a prática advinda da adoção do sistema tarifário não correspondia a este objetivo, pois estava ligada essencialmente à aceitação da tortura como meio de prova. (in Guida alia procedura penale. Torino: UTET, 1986)." (fim de transcrição, sendo da nossa autoria os parentesis com as referências bibliográficas, neles se contendo as que no texto constavam em notas de pé-de-página). A este propósito, convocamos aqui também o que diz Rosa Vieira Neves in “Livre Apreciação da Prova e a Obrigação de Fundamentação da Convicção (na decisão final penal)”, Ed. Coimbra Editora, 2011, que nas págs. 151 e segs. expende: “As provas podem ser valoradas segundo o princípio da prova legal ou segundo o princípio da livre apreciação da prova. O paradigma processual penal pode assentar em uma estrutura inquisitória, acusatória ou ecléctica. O nosso sistema processual penal foi sofrendo as influências dos movimentos jurídicos vigentes em dada época, apresentando actualmente uma estrutura acusatória integrada pelo princípio da investigação. O princípio da livre apreciação da prova é um princípio basilar do processo penal português, e é o critério de valoração das provas em todas as fases processuais. Uma das finalidades do processo penal português é a descoberta da verdade material, na senda da qual o julgador deve orientar a sua actividade probatória, mas não uma verdade absoluta, antes aquela "processualmente valida", firmada através da produção da prova, que constitui o seu substrato, a sua ratio materialis. A prova é o pressu(...) da actividade decisória do julgador, e tambérn o seu próprio fundamento e limite. O princípio da livre apreciação da prova, ainda que afirmado genericamente, sofre as limitações decorrentes do valor probatório atribuído à prova pericial, aos documentos autênticos e aos documentos autenticados, à confissão do arguido e ao casa julgado. (...) O princípio da legalidade da prova é o precedente lógico do principio da livre apreciação, que rege a valoração da prova e que significa a não vinculação a critérios de valoração probatória pré-estabelecidos. O juízo valorativo inerente à livre apreciação da prova, enquanto critério da decisão penal, constitui um momento de legalidade vinculada, na medida em que só é admissível como válida uma única solução: aquela que contém o acerto jurídico, quer a decisão se consubstancie em uma condenação ou em uma absolvição, O princípio da livre apreciação da prova é uma condictio para bem julgar. A vinculação legal que encerra o princípio da livre apreciação da prova assenta na obrigação do dever de fundamentação. A margem discricionária que a decisão penal poderá apresentar, assume uma dimensão própria na questão atinente à determinação concreta da medida da pena, ainda que vinculada ao cumprimento dos requisitos legais que deverão presidir àquela aplicação. O acto de julgar não é apenas e exclusivamente o acto processual através do qual se concretiza o processo volitivo ou, ao invés, aquele que resulte da automaticidade da realização de uma operação lógica. A essencialidade do acto de julgar em sede penal tem de ser entendida no quadro das finalidades axiológicas traçadas e da forma específica de alcançar a valoração da prova em que se sustenta a decisão penal. A dimensão do sentido axiológico da livre apreciação da prova ganha intencionalidade própria, na medida em que se exige ao julgador que a sua decisão seja motivada e espelhe a relação entre o substrato (a sua ratio materialis) e o juízo valorativo.” (fim de transcrição) Como se expendeu no acórdão da Relação de Coimbra de 25 de Novembro de 2009, proferido no proc. 219/05.8GBPCV.C1 e consultável in www.dgsi.pt: "Na valoração individual da prova examina-se a fiabilidade de cada uma das provas em concreto reconhecendo-se que toda a prova, antes de provar deve ser provada. No decurso do processo analítico efectuado não pode prescindir-se da perspectiva conjunta do modo como cada uma das provas é integrada no quadro probatório global. Se cada um dos elementos de prova tem de exigir uma disponibilidade para ser avaliado como se realmente «tivesse sido o único disponível», a articulação das provas entre si e a sua avaliação conjunta permitem o conhecimento global dos factos que, por sua vez se irá reflectir no resultado da totalidade da prova atendível, sendo por isso reciprocamente necessários os dois momentos de valoração. (…) O princípio da livre apreciação da prova, como princípio estruturante do direito processual do continente europeu e, especificamente do direito processual penal português, assume, na dinâmica do processo de fundamentação da sentença penal simultaneamente, uma dupla função de ordenação e de limite. Vinculado ao princípio da descoberta da verdade material, contrariamente ao sistema probatório fundado nas provas tabelares ou tarifárias que estabelece um valor racionalizado a cada prova, possibilita-se ao juiz um âmbito de discricionariedade na apreciação de cada uma das prova atendíveis que suportam a decisão. Trata-se de uma discricionariedade assente num modelo racionalizado, na medida em que implica que o juiz efectue as suas valorações segundo uma discricionariedade guiada pelas regras da ciência, da lógica e da argumentação. Ou seja, «o princípio da livre convicção libertou o juiz das regras da prova legal mas não o desvinculou das regras da razão» cf. Michelle Taruffo, «Conocimiento cientifico y estándares de prueba judicial», Jueces para la Democracia, Información y debate, nº 52, Marzo, 2005, p. 67." (fim de transcrição) Para melhor esclarecimento da questão relativa à fundamentação das decisões judiciais, não será despiciendo fazermos aqui uma incursão histórica sobre esta problemática, socorrendo-nos do lapidarmente escrito pelo Exmº Conselheiro Raul Borges, no acórdão do STJ de 12 de Setembro de 2007 (proferido no proc. 07P2583 e consultável in www.dgsi.pt): "O legislador constituinte em 1976 a este específico respeito omitiu qualquer referência. A consagração na Lei Fundamental do dever de fundamentação das decisões judiciais veio a verificar-se com a primeira revisão constitucional operada pela Lei Constitucional nº 1/82, de 30/09, prescrevendo então o nº 1 do artigo 210º que «As decisões dos tribunais são fundamentadas nos casos e nos termos previstos na lei», redacção que se manteve no nº 1 do artigo 208º na revisão da Lei Constitucional nº 1/89, de 08/07, bem como na revisão da Lei Constitucional nº 1/92, de 25/11, sofrendo alteração na 4ª revisão constitucional – Lei Constitucional nº 1/97, de 20/09 – passando então a dispor o nº 1 do artigo 205º que «As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei». A propósito desta alteração pode ler-se no acórdão nº 680/98 do Tribunal Constitucional, processo nº 456/95, de 02/12/98, in DR, II série, de 05/03/1999: “A Constituição revista deixa perceber uma intenção de alargamento do âmbito da obrigação constitucionalmente imposta de fundamentação das decisões judiciais, que passa a ser uma obrigação verdadeiramente geral, comum a todas as decisões que não sejam de mero expediente, e de intensificação do respectivo conteúdo, já que as decisões deixam de ser fundamentadas «nos termos previstos na lei» para o serem «na forma prevista na lei». A alteração inculca, manifestamente, uma menor margem de liberdade legislativa na conformação concreta do dever de fundamentação”. Vejamos qual o regime que vigorava antes desta consagração constitucional. No plano da lei ordinária, quer a lei adjectiva penal - Código de Processo Penal de 1929 – quer a lei processual civil – Código de Processo Civil de 1939 – não admitiam a indicação dos fundamentos da decisão sobre matéria de prova. No processo civil veio a ser introduzida a especificação dos fundamentos decisivos para a convicção do julgador no CPC de 1961. O nº 2 do artigo 653º do CPC, após a reforma operada pelo Decreto - Lei 44129, de 28-12-1961, passou a dizer: «A matéria de facto é decidida por meio de acórdão: de entre os factos quesitados, o acórdão declarará quais o tribunal julga ou não julga provados e, quanto àqueles, especificará os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador». Passou então a exigir-se a fundamentação das respostas em matéria de facto, mas apenas em relação aos factos considerados como provados, esclarecendo o art. 712º, nº 3 como a fundamentação era feita - as respostas aos quesitos deveriam conter, como fundamentação, a menção pelo menos dos meios concretos de prova em que se houvesse fundado a convicção dos julgadores. Diverso era o regime no processo penal. Na sua versão originária dispunha o artigo 469º do CPP de 1929: «O tribunal colectivo julga de facto, definitivamente, segundo a sua consciência, com plena liberdade de apreciação, e de direito, com recurso para a respectiva relação» e após a redacção que lhe foi dada pelo Decreto 20147 de 01-08-1931 passou a dizer que «O tribunal colectivo responderá especificadamente a cada um dos quesitos, assinando todos os vogais, sem qualquer declaração». Então em processo de querela funcionava o sistema de questionário previsto nos artigos 446º, 468º e 469º, segundo o qual havia que formular quesitos sobre os factos e suas circunstâncias, alegados pela acusação ou defesa, ou que resultassem da discussão da causa. Diversamente do que acontecia, como vimos, no processo civil desde 1961, em processo penal as respostas aos quesitos não eram fundamentadas em virtude do referido art. 469º. Pese embora alguma doutrina (Eduardo Correia, «Les preuves en droit penal portugais», Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XIV (1967), pp.1 e ss., Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal, p. 54 e Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1974, vol. 1º, p. 206, sustentando que “na produção da prova em processo penal nada desaconselha, bem ao contrário, a exigência de motivação”) tenha sustentado a aplicação subsidiária do art. 653º do CPC, tal posição não teve acolhimento na jurisprudência, defendendo-se que não era necessária ou até mesmo proibida - cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 07-05-1963, de 21-05-1969, de 29-02-1984 e de 29-10-1986, in BMJ 128, 187, 334 e 360, a pág. 378, 59, 359 e 494 e Maia Gonçalves no BMJ 129, p. 348 e Código de Processo Penal, 4ª edição, Almedina, pág. 559. O Tribunal Constitucional pronunciou-se várias vezes pela não inconstitucionalidade do art. 469º do CPP de 1929 - acórdãos nº 55/85, de 25/03, DR. II de 28/05/1985, nº 61/88, de 09/05/1988, DR.II de 20/08/1988 (e BMJ 375,138), nº 207/88, de 12/10/88, DR.II de 03/01/1989 (e BMJ 380,158), nº 304/88, de 14/12/1988, DR.II de 11/04/1989 e nº 219/89 de 15/02/1989, DR.II de 30/06/1989 (e BMJ 384, 265). Esta abordagem foi feita em paralelo e a propósito de toda a querela que envolveu a questão dos poderes de cognição da Relação nos recursos inter(...)s das decisões condenatórias dos tribunais colectivos criminais face à disposição do artigo 665º do CPP de 1929 (na versão dada pelo Decreto com força de lei nº 20147, de 01-08-1931 e na sobreposição interpretativa do assento de 29-06-1934, in Diário do Governo, I Série, de 11-07-1934 e antes, pois, da recriação/reformulação da norma levada a efeito pelos acórdãos do STJ de 18 de Dezembro de 1991 e de 22 de Janeiro de 1992), que veio a ser declarado inconstitucional com força obrigatória geral, na interpretação dada pelo assento de 29-06-1934, pelo acórdão do Tribunal Constitucional nº 401/91, de 30/10, in DR-I Série A, de 08/01/1992 e BMJ 410, 236 (a propósito de toda esta questão acerca do art. 665º do CPP de 1929, que tinha a ver com o princípio do duplo grau de jurisdição em processo penal, cfr. os acórdãos do Tribunal Constitucional 219/89, 124/90, 340/90, 401/91, 190/94, 430/94, 184/96, 420/96, 264/98 e 291/98). Já em 2000, o acórdão nº 13/2000 de 11 de Janeiro, in DR. II Série de 15/11/2000 e o acórdão nº 251/2000 de 12 de Abril, que logrou publicação anterior ao antecedente, in DR.II Série de 07/11/2000, decidiram julgar inconstitucional o citado art. 469º, na medida em que dispensava a fundamentação das respostas aos quesitos em processo de querela por violação do art. 208º, nº 1, da CRP (versão que vigorava à data em que foi definida a matéria de facto na primeira instância). A motivação em processo penal é introduzida apenas no Código de Processo Penal de 1987 (Decreto-Lei nº 78/87, de 17/02), estabelecendo-se no nº 4 do art. 97º que os actos decisórios são sempre fundamentados e no que respeita à sentença dispunha então o nº 2 do art. 374º: «Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal». Como assinalava Maia Costa na Revista do Ministério Público, ano 20, 1999, nº 78, p.150, em anotação ao já referido acórdão do TC nº 680/98, de 2 de Dezembro de 1998, relatado por Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, este normativo constituía sem dúvida uma ruptura com a tradição legislativa portuguesa, que não impunha ao tribunal qualquer obrigação de fundamentar (isto é, de explicar ou justificar) a convicção formada quanto à matéria de facto. Nessa altura ressaltou a posição assumida por Marques Ferreira, O novo Código de Processo Penal, Jornadas de Direito Processual Penal, (CEJ), p.229/230: “Estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (thema decidendum) nem os meios de prova (thema probandum) mas os elementos que em razão das regras de experiência ou de critérios lógicos constituem o substracto racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência”. Diferentemente do que acontecia com o processo civil - art. 653º do CPC de1961 - no processo penal a fundamentação da decisão sobre prova impunha-se não só em relação aos factos provados como abarcava igualmente a matéria de facto não provada. A formulação constante do artigo 374º do CPP foi objecto de vários acórdãos do Tribunal Constitucional, nomeadamente na relação deste preceito com o nº 2 do artigo 410º, como os acórdãos n.º 322/93, DR, II, de 29-10-1993 e n.º 573/98, DR, II, de 13-11-1998, julgando este não enfermarem de inconstitucionalidade o nº 2 do art. 410º e o nº 2 do art. 433º, no pressu(...) de que o nº 2 do art. 374º impunha uma obrigação de “fundamentação «completa», permitindo a transparência do processo e da decisão”. A jurisprudência do STJ abordou a questão da obrigatoriedade de indicação na sentença das provas que serviram para formar a convicção do tribunal com graus de exigência diversos. De forma maioritária, no sentido de que a exigência legal se bastava com a mera indicação ou enumeração das categorias das diversas fontes de prova, com o mero arrolamento dos meios probatórios, ou resumo dos tipos de prova de que o tribunal se servira, de que é exemplo o acórdão de 5 de Junho de 1991, in CJ1991, tomo 3, p. 29, (citando acórdão do Supremo de 12 de Dezembro de 1990, processo nº 41383 e sumariado in A.J., ano 2, tomo 13/14): 1- A fundamentação da sentença ou acórdão é uma actividade complexa onde se enquadram funções de enumeração, exposição e indicação. 2- A «indicação» destina-se a assegurar a inexistência de violação do princípio da inadmissibilidade das proibições de prova. E, no pressu(...) de que a normal e diligente actuação dos interessados não deixará de denunciar a utilização, pelo tribunal, de provas proibidas, a lei não exige a «especificação da prova na sentença», reduzindo, a respeito, a nulidade a uma simples falta de «referência às chamadas pièces à conviction». Para esta corrente a indicação das provas não visa o controlo da convicção do tribunal a quo, destinando-se a assegurar a inexistência de violação do princípio da inadmissibilidade das proibições de prova e a evitar que um cidadão possa ser condenado sem apoio de qualquer dos meios de prova admitidos na lei. A enumeração sucinta dos meios de prova que determinaram a decisão da matéria de facto era suficiente para afastar a nulidade do art. 379º, alínea a), do CPP. E sustentava a não exigência de exame crítico das provas com a circunstância de o art. 374º, nº 2 CPP ser omisso quanto à última parte da sua fonte, de que é praticamente mera tradução - o art. 546º, nº 1, alínea e) do CPP italiano – quando neste se manda que o juiz enuncie as razões pelas quais considera não atendíveis as provas contrárias - cfr. acórdãos do STJ de 10-07-96 e de 09-01-1997, in CJSTJ1996, T2, p.242 e CJSTJ1997, T1, p.172. Neste sentido pronunciaram-se então os acórdãos de 15-07-1989, processo nº 40094, de 06-03-1991, processo nº 40874, de 23-04-1992, processo nº 42221, de 04-11-1992, BMJ 421,186, de 20-05-1993, processo nº 43859, de 07-07-1993, CJSTJ1993, T3, p.195, de 26-01-1994, BMJ 437,424, de 20-03-1995, BMJ 443,335, de 03-05-1995, BMJ 447,67 (objecto de apreciação no acórdão do TC 680/98), de 20-06-1996, BMJ 458,187, de 09-01-1997, CJSTJ1997, T1, p.172, de 13-01-1998, BMJ 473,307, de 11-03-1998, CJSTJ1998, T1, p.220, de 27-05-1998, BMJ 477,303, de 03-06-1998 (objecto de apreciação no acórdão do TC nº 546/98, DR, II, de 15-03-1999). Em sentido inverso, o acórdão de 13 de Fevereiro de 1992, in CJ1992, tomo I, p. 36 e BMJ 414, 389, interpreta o dever de fundamentação no sentido de que a sentença, para além de dever conter a indicação dos factos provados e não provados e a indicação dos meios de prova, há-de conter também os elementos que, em razão das regras de experiência ou de critérios lógicos, constituíram o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal colectivo se formasse no sentido de considerar provados e não provados os factos da acusação, ou seja, ao cabo e ao resto, um exame crítico sobre as provas que concorrem para a formação da convicção do tribunal colectivo num determinado sentido. Para esta corrente mais exigente a fundamentação não se compadece com uma simples enumeração dos meios de prova utilizados, sendo necessária uma verdadeira reconstituição e análise crítica do iter que conduziu a considerar cada facto como provado ou não provado. Neste entendimento, seria nulo o acórdão que não contivesse um exame crítico sobre as provas que concorreram para a formação do tribunal - cfr. acórdãos do STJ de 18-12-1991, BMJ 412,383, de 25-05-1992 e de 28-05-1992, ambos no BMJ 417,613 e 619, de 21-10-1998, BMJ 480,276, de 02-12-1998, BMJ 482,142, de 14-01-1999, CJSTJ1999, T1, 188, de 08-04-1999, CJSTJ1999, T2, 171, de 07-07-1999, CJSTJ1999, T2, 241, da Relação de Lisboa, de 26-05-1999, BMJ 487,361 e do Porto, de17-12-1997, BMJ 472,567. A este nível de fundamentação das decisões judiciais, o STJ fixou, com carácter obrigatório, jurisprudência no sentido de que nos processos de transgressão era aplicável o regime de fundamentação em matéria de facto previsto no art. 374º, nº 2 CPP- Acórdão de 24-10-1996, in DR.I-A, de 19-11-1996 (e BMJ 460,191). Mais tarde, em 2 de Dezembro de 1998, o Tribunal Constitucional no acórdão nº 680/98 - processo nº 456/95, em recurso inter(...) do acórdão do STJ de 03-05-1995, supra aludido - in DR, II Série, de 05-03-1999, julga inconstitucional a norma do nº 2 do art. 374º do CPP, na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões em matéria de facto se basta com a simples enumeração dos meios de prova utilizados em 1ª instância, não exigindo a explicitação do processo de formação da convicção do tribunal, por violação do dever de fundamentação das decisões dos tribunais previsto no nº 1 do art. 205º da Constituição, bem como, quando conjugada com a norma das alíneas b) e c) do nº 2 do art. 410º do mesmo Código, por violação do direito ao recurso consagrado no nº 1 do art. 32º da CRP. Entretanto, no processo civil avançara-se no sentido da exigência de análise crítica das provas e de especificação dos fundamentos decisivos para a convicção do julgador, tanto em relação aos factos julgados provados como não provados, o que ocorreu com a nova redacção dada ao nº 2 do art. 653º do CPC pelo Decreto - Lei nº 39/95, de 15 de Fevereiro. Com a 4ª revisão constitucional - Lei 1/97 - passou a ter consagração expressa a garantia do recurso com o aditamento final no nº 1 do art. 32º: «O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso». As exigências de fundamentação passam a ser maiores com a reforma de 1998 - Lei nº 59/98, de 25 de Agosto - manifestando-se no aditamento ao nº 4 do art. 97º do CPP: «Os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão», no nº 3 do art. 194º com a exigência da enunciação dos motivos de facto da decisão no despacho de aplicação de medidas de coacção (à excepção do TIR), no nº 4 do art. 213º respeitante à fundamentação das decisões sobre substituição, revogação ou manutenção da prisão preventiva e finalmente no art. 374º, nº 2, com a exigência do exame crítico das provas, a qual já existia no processo civil, como vimos desde 1995 - art. 653º, nº 2 e 659, nº 3 do CPC - tendo aqui tal exame lugar não em sede de sentença, mas em momento anterior quando é fixada a matéria de facto controvertida com as respostas ao questionário ou à matéria inserta na base instrutória, ou nos casos em que esta é dispensada ao abrigo do artigo 787º do CPC, a seguir ao encerramento da discussão - artigo 791º CPC. Como é hoje ponto assente, a partir da reforma de 1998, entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1999, a fundamentação não se compadece com uma simples enumeração dos meios de prova utilizados, sendo necessária uma verdadeira reconstituição e análise crítica do iter que conduziu a considerar cada facto como provado ou não provado. A questão tem sido bastas vezes aflorada e tratada em vários arestos, quer do Tribunal Constitucional, quer do STJ e das Relações. No acórdão de 18-11-1998, processo nº 932/98-3ª dizia-se: «Dos termos da lei resulta que não basta a simples indicação dos meios de prova produzidos em audiência de julgamento para que a ratio legis seja alcançada. Com efeito, não foi finalidade da lei processual penal o contentar-se, apenas, com a referência, seca, a declarações do arguido, a depoimentos de testemunhas, ou a certos documentos. Esta é a prova em abstracto, comum a todos os processos. É necessário algo mais». - cfr. ainda acórdãos do STJ de 12-05-1999, processo nº 406/99-3ª, de 15-03-2000, processo nº 16/00-3ª, in CJSTJ2000, T2, 226, de 30-01-2002, processo nº 3063/01, de 04-10-2006, processo nº 2324/06-3ª, de 08-02-2007, processo nº 28/07-5ª, de 28-02-2007, processo nº 3646/07-3ª, de 21-03-2007, processo nº 24/07-3ª, de 09-05-2007, processo nº 247/07-3ª, de 16-05-2007, processo nº 1395/07-3ª. A fundamentação deve também abranger a convicção do tribunal, sendo a razão de ser da motivação garantia da legitimação da decisão. O Tribunal Constitucional por diversas vezes cita Michele Taruffo (“Note sulla garantizia constituzionale della motivazione”, in Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, vol. LV, pp. 29 e segs.) - cfr. acórdãos nº 55/98, DR, II, de 28-05-1985, nº 135/99, DR, II, de 07-07-1999, nº 422/99, DR, II, de 29-11-1999 (este versando questão suscitada em embargos de executado) - a propósito das duas funções que a fundamentação cumpre: a) uma, de ordem endoprocessual, que visa essencialmente impor ao juiz um momento de verificação e controlo crítico da lógica da decisão, permitir às partes o recurso da decisão com perfeito conhecimento da situação e ainda colocar o tribunal de recurso em posição de exprimir, em termos mais seguros, um juízo concordante ou divergente; b) outra, de ordem extraprocessual, já não dirigida essencialmente às partes e ao juiz ad quem, que procura, acima de tudo, tornar possível um controlo externo e geral sobre a fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão - que procura, dir-se-á por outras palavras, garantir a transparência do processo e da decisão. A fundamentação da decisão judicial constitui um elemento indispensável para assegurar o efectivo exercício do direito ao recurso, que de forma explícita foi constitucionalmente garantido com o aditamento da parte final do nº 1 do art. 32º CRP, com a Lei Constitucional 1/97. Como assinala Michele Taruffo, a motivação da sentença é necessária com vista à impugnação, com o fim de tornar funcional a relação entre o primeiro e o segundo graus de jurisdição; não só as partes podem valorizar melhor a oportunidade da impugnação e individualizar os seus motivos específicos quando, através da motivação, conhecem as razões por que o juiz decidiu de certo modo, como ainda o juiz de recurso está em posição de formular melhor o seu juízo sobre a sentença impugnada quando conhece a argumentação de facto e de direito de que ela é resultado. Constitui ainda factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre o qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto, sendo garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões – citado acórdão TC 680/98. Por outro lado, a fundamentação não tem de ser uma espécie de assentada em que o tribunal reproduza os depoimentos das testemunhas ouvidas, ainda que de forma sintética, não sendo necessária uma referência discriminada a cada facto provado e não provado e nem sequer a cada arguido, havendo vários. O que tem de deixar claro, de modo a que seja possível a sua reconstituição, é o porquê da decisão tomada relativamente a cada facto - cfr acórdão do STJ, de 11-10-2000, processo nº 2253/2000-3 begin_of_the_skype_highlighting 2253/2000-3 end_of_the_skype_highlightingª, acórdãos do TC nº 102/99, DR, II, de 01-04-1999 e nº 59/2006, DR, II, de 13-04-2006. Como foi referido nos acórdãos do TC nº 322/93, DR, II, de 29-10-1993 e nº 172/94, DR, II, de 19-07-1994, citados posteriormente nos acórdãos nº 102/99, DR, II, de 01-04-1999, nº 288/99, DR, II, de 22-10-1999, nº 258/01, DR, II, de 02-11-2001 e nº 232/02, DR, II, de 18-07-2002, a fundamentação da decisão há-de permitir ao tribunal superior uma avaliação segura e cabal do porquê da decisão e do processo lógico-mental que serviu de suporte ao respectivo conteúdo. É recorrente nestes acórdãos a citação de Taruffo de que a fundamentação da sentença há-de permitir a transparência do processo e da decisão. Actualmente não basta uma declaração genérica e tabelar que lesaria as garantias de defesa do arguido, por não assegurar a apreciação pelo tribunal de toda a matéria de acusação e de defesa, proporcionando julgamentos implícitos, subtraídos a qualquer tipo de fiscalização, afrontando as exigências de fundamentação das decisões judiciais – citado acórdão TC 288/99. Passou a ser imprescindível que a fundamentação, como base do juízo decisório, seja exteriorizada em termos de permitir desvelar o iter «cognoscitivo» e «valorativo» justificante da concreta decisão jurisdicional - acórdão TC nº 281/05, DR, II, de 06-07-2005." (fim de transcrição) Como também se expendeu no acórdão do STJ, de 27 de Maio de 2010, proferido no proc. 11/04.7GCABT.C1.S1 e consultável in www.dgsi.pt: "VI - O processo penal fundamenta-se e, é conduzido, de harmonia com as exigências legais da produção e exame de provas legalmente válidas, com vista à determinação da existência de infracção, identificação do seu agente e definição da sua responsabilidade criminal. VII - A actividade probatória consiste na produção, exame e ponderação dos elementos legalmente possíveis a habilitarem o julgador a formar a sua convicção sobre a existência ou não de concreta e determinada situação de facto. VIII- O modo de valoração das provas, e o juízo resultante dessa mesma valoração, efectuados pelo ”tribunal a quo”, ao não coincidir com a perspectiva do recorrente nos termos em que este a analisa e consequências que daí derivam,, não traduz omissão de pronúncia, pelo que não integra qualquer nulidade, uma vez que ao tribunal apenas incumbe valorar as provas de harmonia com o critério legal. IX - No sistema processual penal português, vigora a regra da livre apreciação da prova, em que, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, sendo admissíveis as provas que não forem admitidas por lei.- artºs 125º e 127 do CPP. X - O princípio in dubio pro reo, diz respeito à matéria de facto e sendo um princípio fundamental em matéria de apreciação e valoração da prova, só pode ser sindicado pelo STJ dentro dos seus limites de cognição, devendo, por isso, resultar do texto da decisão recorrida em termos análogos aos dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, e, só se verifica quando seguindo o processo decisório evidenciado através da motivação da convicção se chegar à conclusão de que o tribunal, tendo ficado num estado de dúvida, decidiu contra o arguido, ou quando a conclusão retirada pelo tribunal em matéria de prova se materialize numa decisão contra o arguido que não seja suportada de forma suficiente, de modo a não deixar dúvidas irremovíveis quanto ao seu sentido, pela prova em que assenta a convicção. XI - Inexistindo dúvida razoável na formulação do juízo factual que conduziu à decisão condenatória, e não tendo esse juízo factual por fundamento, uma imposição de inversão da prova - ónus da prova a cargo do arguido -, mas, resultando do exame e discussão livre das provas produzidas e examinadas em audiência, como impõe o artigo 355º nº 1 do CPP, subordinadas ao princípio do contraditório, conforme artº 32º nº 1 da Constituição da República., fica afastado o princípio do in dubio pro reo e da presunção de inocência. XII - A fundamentação das decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente tem raiz constitucional, conforme artº 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa. XIII - O modo de fundamentação das sentenças penais subordina-se ao critério constante do artº 374º nº 2 do CPP: “uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”. XIV - Não dizendo a lei em que consiste o “exame crítico das provas”, esse exame tem de ser aferido com critérios de razoabilidade e de prudência na inter relação dos factos e comportamentos,, compatíveis com as regras da experiência da vida e das coisas, que permitam ao julgador esclarecer objectivamente quais os elementos probatórios que, o elucidaram, porquê, e de que forma, com vista a possibilitar a compreensão racional da decisão." (fim de transcrição) Como igualmente se consignou no acórdão da Relação de Évora de 11 de Novembro de 2007, proferido no procº n.º 1972/07-1 e consultável in www.dgsi.pt, transcrevendo a fundamentação da sentença revidenda proferida pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial Santa Maria da Feira, por sua vez integralmente disponível in www.verbojuridico.com: “Nos termos do art. 205°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa as decisões dos tribunais são fundamentadas na forma prevista na lei. O Código de Processo Penal consagra a obrigação de fundamentar a sentença nos artigos 97°, nº 4 e 374°, nº 2 exigindo que sejam especificados os motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção. São admissíveis as provas que não forem proibidas por lei (art. 125°, CPP). A prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade: o juiz lança-se à procura do «realmente acontecido» conhecendo, por um lado, os limites que o próprio objecto impõe à sua tentativa de o «agarrar» e, por outro, os limites que a ordem jurídica lhe marca - derivados da (s) finalidade(s) do processo - veja-se Cristina Líbano Monteiro, "Perigosidade de inimputáveis e «in dubio pro reo»", Coimbra, 1997, pág, 13. A prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, salvo quando a lei dispuser diferentemente (art. 127°, CPP). [1] Na redacção vigente ao tempo, introduzida pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro. [2] Na redacção vigente ao tempo da prolação do despacho de fls. 17.042 a 17.046 dos autos, anterior à entrada em vigor da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro. [3] Na redacção vigente ao tempo, introduzida pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro. [4]. Na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 49/85, de 15 de Março. [5]. Na redacção introduzida pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro. [6] Que não 13/08/2010, como, por lapso, se assinalou no Despacho em causa (cfr. fls. 68.220), facilmente verificável, quer pela data da respectiva “Conclusão” (cfr. fls. 68.215), quer pelo facto de, sobre as questões decididas no Item III, o próprio Despacho consignar que o MºPº se pronunciara a fls. 66.250 e ss., tendo em conta que a posição do MºPº foi apresentada em 16.8.2010. A livre apreciação da prova não se confunde com apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressu(...)s valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio su(...) pela ordem jurídica - veja-se Maia Gonçalves, "CPP anotado”, 4. edª 1991, pág. 221, com citações de A dos Reis, Cavaleiro de Ferreira, Eduardo Correia e Marques Ferreira. Daqui resulta, como salienta Marques Ferreira, um sistema que obriga a uma correcta fundamentação fáctica das decisões que conheçam a final do objecto do processo, de modo a permitir-se um efectivo controle da sua motivação - veja-se “Jornadas de Direito Processual Penal”, pág. 228. Quando está em causa a questão da apreciação da prova não pode deixar de dar-se a devida relevância à percepção que a oralidade e a mediação conferem ao julgador. Na verdade, a convicção do tribunal é formada, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, serenidade, “olhares de súplica” para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência de raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, porventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (para maiores desenvolvimentos sobre a comunicação interpessoal - veja-se Ricci Bitti / Bruna Zani, “A comunicação como processo social”, editorial Estampa, Lisboa, 1997). Com efeito, é ponto assente que a comunicação não se estabelece apenas por palavras e que estas devem ser apreciadas no contexto da mensagem em que se integram. O juiz - para além da documentação, ainda que sonora, da audiência - deve ter uma atitude crítica de “avaliação da credibilidade do depoimento” não sendo uma mera caixa receptora de tudo o que a testemunha disser, sem indicar razão de ciência do seu pretenso “saber” - veja-se ac. de 17.01.94, do 2º Jz Criminal de Lx, p. 363/93. 1ªsec, in “Sub Judice" n.º 6-91. No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16.12.1998 diz-se que a apreciação da prova, ao nível do julgamento de facto, "há-de fundar-se numa valoração racional e crítica de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas de experiência e dos conhecimentos científicos, por modo que se comunique e se imponha aos outros mas que não poderá deixar de ser enformada por uma convicção pessoal”. Como ensina o Sr. Prof. Enrico Altavilla, "o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à critica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras" - veja-se "Psicologia Judiciária”, vol. II, Coimbra, 3ª ed., pág. 12 citado no referido ac. do pº 363/93. Um testemunho não é necessariamente infalível nem necessariamente erróneo como salienta Carrington da Costa, advertindo para que "todo aquele que tem a árdua função de julgar, fuja à natural tendência para considerar a concordância dos testemunhos como prova da sua veracidade"." (fim de transcrição) Por seu turno, expendeu-se no acórdão do STJ de 23 de Fevereiro de 2011 (proferido no procº 3612/07.6TBLRA.C2.S1 e consultável in www.dgsi.pt, repetindo, parcialmente, os argumentos avançados no acórdão daquele Supremo Tribunal de 7 de Abril de 2010, proferido no procº 83/03.1TALLE.E1.S1, igualmente consultável in www.dgsi.pt, sendo em ambos relator o Exmº Conselheiro Santos Cabral): "I - Momento fundamental em processo penal é o julgamento com o objectivo de produzir uma decisão que comprove, ou não, os factos constantes do libelo acusatório e, assim, concretizar, ou não, a respectiva responsabilidade criminal. Nessa concretização o julgador aprecia livremente a prova produzida com sujeição às respectivas regras processuais de produção aos juízos de normalidade comuns a qualquer cidadão bem como às regras de experiência que integram o património cultural comum e decide sobre a demonstração daqueles factos, extraindo, em seguida, as conclusões inerentes à aplicação do direito. II - Perante os intervenientes processuais, e perante a comunidade, a decisão a proferir tem de ser clara, transparente, permitindo acompanhar de forma linear a forma como se desenvolveu o raciocínio que culminou com a decisão sobre a matéria de facto e, também, sobre a matéria de direito. Estamos assim perante a obrigação de fundamentação que incide sobre o julgador, ou seja, na obrigação de exposição dos motivos de facto e de direito que há-de fundamentar a decisão. III - A mesma fundamentação implica um exame crítico da prova que se situa nos limites pro(...)s, ente outros, pelo Ac. do TC 680/98, e que já tinha adquirido foros de autonomia também a nível do Supremo Tribunal de Justiça com a consagração de um dever de fundamentação no sentido de que a sentença há-de conter também os elementos que, em razão da experiência ou de critérios lógicos, construíram o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse num sentido, ou seja, um exame crítico sobe as provas que concorrem para a formação da convicção do tribunal num determinado sentido IV - Como refere Letizia Gianformaggio motivar significa justificar. E justificar significa justificar-se dar a razão do trabalho produzido admitindo como linha de princípio a legitimidade das críticas formuladas ou seja a legitimidade de um controle. V - A exigência de motivação responde, assim, a uma finalidade do controle do discurso, neste caso probatório, do juiz com o objectivo de garantir até ao limite de possível a racionalidade da sua decisão, dentro dos limites da racionalidade legal. Um controle que não só visa uma procedência externa como também pode determinar o próprio juiz, implicando-o e comprometendo-o na decisão evitando uma aceitação acrítica como convicção de algumas das perigosas sugestões assentes unicamente numa certeza subjectiva. VI - Também Paulo Saragoça da Mata se pronuncia sobre o tema referindo que a fundamentação das sentenças consistirá num elenco das provas carreadas para o processo que se consubstanciará numa análise crítica e racional dos motivos que levaram a conferir relevância a determinadas provas e a negar importância a outras; numa concatenação racional e lógica das provas relevantes e dos factos investigados (o que permitirá arrolar e arrumar lógica e metodologicamente os factos provados e não provados); e numa apreciação dos factos considerados assentes à luz do direito vigente. VII - A motivação existirá, e será suficiente, sempre que com ela se consiga conhecer as razões do decisor. É evidente que o dever de fundamentação da decisão começa, e acaba, nos precisos termos que são exigidos pela exigência de tornar clara a lógica de raciocínio que foi seguida. Não conforma tal conceito uma obrigação de explanação de todas as possibilidades teóricas de conceptualizar a forma como se desenrolou a dinâmica dos factos em determinada situação e muito menos de equacionar todas as perplexidades que assaltam a cada um dos intervenientes processuais, no caso o arguido, perante os factos provados. VIII - O tribunal tem o dever de indicar os factos que se provam e os que não se provam e a forma como alcançou a respectiva conclusão. Por seu turno, aquele que discorda da forma como se formou tal conclusão e caso lhe assista o respectivo direito de recurso virá indicar aquilo de que discorda e o motivo que discorda. IX - Se em face das premissas que constituem a matéria de facto, o julgador ensaia um salto lógico no desconhecido dando por adquirido aquilo que não é suportável à face da experiência comum pode-se afirmar a existência do vício do erro notório. Mas existe igualmente erro notório na apreciação da prova quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras da experiência ou as legis artis” (Simas Santos e Leal Henriques, C. P. Penal Anotado, II vol., pág. 740). X - A compreensão e a possibilidade de acompanhamento do percurso lógico e intelectual seguido na fundamentação de uma decisão sobre a matéria de facto, quando respeite a factos que só podem ter sido deduzidos ou adquiridos segundo as regras próprias das presunções naturais, constitui um elemento relevante para o exercício da competência de verificação da (in)existência dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, especialmente do erro notório na apreciação da prova, referido na al. c).do citado normativo. XI - Não faz a nossa lei processual penal qualquer referência a requisitos especiais em sede de demonstração dos requisitos da prova indiciária, pelo que o funcionamento e creditação desta estão dependente da convicção do julgador que, sendo uma convicção pessoal, deverá ser sempre objectivável e motivável. XII - Para Jaime Torres, Presuncion de incencia y prueba en el processo penal, pág 65, importa distinguir dois tipos diferentes de regra de experiência: as regras de experiência de conhecimento geral ou, dito por outra forma, as regras gerais empíricas cujo conhecimento se pressupõe existente em qualquer pessoa que tenha um determinado nível de formação geral e, por outro lado, as máximas de experiência especializada cujo conhecimento só se pode supor em sujeitos que tenham uma formação especifica num determinado ramo de ciência, técnica ou arte. XIII - Usando tais regras de experiência entendemos que o juiz pode utilizar livremente, sem necessidade de prova sobre elas, as regras de experiência cujo conhecimento se pode supor numa pessoa com a sua formação (concretamente formação universitária no campo das ciências sociais). O próprio ordenamento jurídico parte da liberdade do juiz para utilizar estas máximas da experiência de conhecimento geral sem que as mesmas se inscrevam no processo através da produção de prova. XIV - As razões que fundamentam a liberdade do juiz para a utilização dos seus conhecimentos de máxima da experiência são as mesmas que impõem a desnecessidade de fixação de factos notórios. Em qualquer um destes casos o que se pede ao juiz é que utilize os seus conhecimentos sobre máximas da experiência comum sem que importe a forma como os adquiriu. XV - A necessidade de controle dos instrumentos através dos quais o juiz adquire a sua convicção sobre a prova visa assegurar que os mesmos se fundamentam em meios racionalmente aptos para proporcionar o conhecimento dos factos e não em meras suspeitas ou intuições ou em formas de averiguação de escassa ou nula fiabilidade. Igualmente se pretende que os elementos que o julgador teve em conta na formação do seu convencimento demonstrem a fidelidade as formalidades legais e as garantias constitucionais. XVI - As regras da experiência, ou regras de vida, como ensinamentos empíricos que o simples facto de viver nos concede em relação ao comportamento humano e que se obtém mediante uma generalização de diversos casos concretos tendem a repetir-se ou reproduzir-se logo que sucedem os mesmos factos que serviram de suporte efectuar a generalização. Estas considerações facilitam a lógica de raciocínio judicial porquanto se baseia na provável semelhança das condutas humanas realizadas em circunstâncias semelhantes a menos que outra coisa resulte no caso concreto que se analisa ou porque se demonstre a existência de algo que aponte em sentido contrário ou porque a experiência ou perspicácia indicam uma conclusão contrária. XVII - O princípio da causalidade significa formalmente que a todo o efeito precede uma causa determinada, ou seja, quando nos encontramos face a um efeito podemos presumir a presença da sua causa normal. Dito por outra forma, aceite uma causa, normalmente deve produzir-se um determinado efeito e, na inversa, aceite um efeito deve considerar-se como verificada uma determinada causa. O princípio da oportunidade fundamenta a eleição da concreta causa produtora do efeito para a hipótese de se apresentarem como abstractamente possíveis várias causas. A análise das características próprias do facto permitirá excluir normalmente a presença de um certo número de causas pelo que a investigação fica reduzida a uma só causa que poderá considerar-se normalmente como a única produtora do efeito. Provado no caso concreto tal efeito deverá considerar-se provada a existência da causa. XVIII - Num hipotético conflito entre a convicção em consciência do julgador no sentido da culpabilidade do arguido e uma valoração da prova que não é capaz de fundamentar tal convicção será esta que terá de prevalecer. Para que seja possível a condenação não basta a probabilidade de que o arguido seja autor do crime nem a convicção moral de que o foi. É imprescindível que, por procedimentos legítimos, se alcance a certeza jurídica, que não é desde logo a certeza absoluta, mas que, sendo uma convicção com géneses em material probatório, é suficiente para, numa perspectiva processual penal e constitucional, legitimar uma sentença condenatória. Significa o ex(...) que não basta a certeza moral mas é necessária a certeza fundada numa sólida produção de prova. XIX - A forma como se explana aquela prova fundando a convicção do julgador tem de estar bem patente o que se torna ainda mais evidente no caso da prova indiciária pois que aqui, e para alem do funcionamento de factores ligados a um segmento de subjectividade que estão inerente aos principio da imediação e oralidade, está, também, presente um factor objectivo, de rigor lógico que se consubstancia na existência daquela relação de normalidade, de causa para efeito, entre o indicio e a presunção que dele se extrai. XX - Como tal a enunciação da prova indiciária como fundamento da convicção do juiz tem de se expressar no catalogar dos factos base ou indícios que se considere provados e que vão servir de fundamento á dedução ou inferência e, ainda, que na sentença se explicite o raciocínio através do qual e partindo de tais indícios se concluiu pela verificação do facto punível e da participação do arguido no mesmo. Esta explicitação ainda que sintética é essencial para avaliar da racionalidade da inferência. XXI - Na prova indiciária devem estar presentes condições relativas aos factos indiciadores; à combinação ou síntese dos indícios; à indiciária combinação das inferências indiciárias; e à conclusão das mesmas. XXII - Assim: - 1 ) Os indícios devem estar comprovados e é relevante que esta comprovação resulte de prova directa, o que não obsta a que a prova possa ser composta, utilizando-se, para o efeito, provas directas imperfeitas ou seja insuficientes para produzir cada uma em separado prova plena. - 2) Os factos indiciadores devem ser objecto de análise crítica dirigida à sua verificação, precisão e avaliação o que permitirá a sua interpretação como graves, média ou ligeiras. - 3) Os indícios devem também ser independentes e, consequentemente, não devem considerar-se como diferentes os que constituam momentos, ou partes sucessivas, de um mesmo facto. - 4) Quando não se fundamentem em leis naturais que não admitem excepção os indícios devem ser vários. - 5) Os indícios devem ser concordantes, ou seja, devem conjugar-se entre si, de maneira a produzir um todo coerente e natural, no qual cada facto indiciário tome a sua respectiva colocação quanto ao tempo, ao lugar e demais circunstancias. - 6) As inferências devem ser convergentes ou seja não podem conduzir a conclusões diversas. - 7)- Por igual forma deve estar afastada a existência de contra indícios pois que tal existência cria uma situação de desarmonia que faz perder a clareza e poder de convicção ao quadro global da prova indiciária. (fim de transcrição) Releva também aqui o acórdão do STJ de 6 de Julho de 2011 (proferido no procº 3612/07.6TBLRA.C2.S1 e consultável in www.dgsi.pt) onde se expendeu: "A necessidade de evitar que o princípio da livre apreciação da prova não conduza à arbitrariedade, pressupõe a exigência legal de que a prova (…) seja apreciada pelo juiz, com observância das regras de experiência comum, prudência e bom senso, mas sem se encontrar vinculado a quaisquer regras, medidas ou critérios legais, utilizando como método de avaliação da aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente, susceptíveis de motivação e controlo. As regras da experiência não são meios de prova, mas antes raciocínios, juízos hipotéticos do conteúdo genérico, assentes na experiência comum, independentes dos casos individuais em que se alicerçam, com validade, muitas vezes, para além do caso a que respeitem, adquiridas, em parte, mediante observação do mundo exterior e da conduta humana, e, noutra parte, mediante investigação ou exercício científico de uma profissão ou indústria, permitindo fundar as presunções naturais, mas sem abdicar da explicitação de um processo cognitivo, lógico, sem espaços ocos e vazios, conduzindo à extracção de facto desconhecido do facto conhecido, porque conformes à realidade reiterada, de verificação muito frequente e, por isso, verosímil." (fim de transcrição) Ainda a este propósito importa referir o decidido no acórdão do STJ de 14 de Abril de 2011 (proferido no procº 117/08.3PEFUN.L1.S1 e consultável in www.dgsi.pt) onde se expendeu: "I - No recurso da matéria de facto, haverá que ter por objectivo o passo que se deu, da prova produzida aos factos dados por assentes, e/ou o passo que se deu, destes, à decisão. O recorrente poderá insurgir-se contra o modo como teve lugar um ou ambos os momentos deste trânsito: desde logo, impugnando a própria matéria de facto devido ao confronto entre a prova que se fez e o que se considerou provado, lançando mão do dis(...) no nº 3 do art. 412.º do CPP. Foi o caso. II - Ou, então, invocando um dos vícios do n.º 2 do art. 410.º do CPP, o que o recorrente também fez. III - Em qualquer das hipóteses, haverá que ter em conta que uma coisa é considerar objecto do recurso ordinário o acontecimento histórico sobre que incidiu a decisão recorrida, e outra, ter por objecto do recurso o modo como essa decisão se desenvolveu. No primeiro caso haverá que decidir de novo a questão que foi levada a julgamento, podendo inclusive atender-se a factos novos e produzir prova nunca antes produzida. No segundo caso, haverá que apreciar da bondade da decisão recorrida só a partir dos dados de que o(s) julgador(es) recorrido(s) à data dispuseram. Acresce que a avaliação da decisão é a resposta, enquanto remédio jurídico, para incorrecções e ilegalidades concretamente assinaladas. Porque uma coisa é não agradar ao recorrente o resultado da avaliação que se fez da prova, e outra é detectar-se no processo de formação da convicção desse julgador, erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório. IV - Ora, ao apreciar-se o processo de formação da convicção do julgador, não pode ignorar-se que a apreciação da prova obedece ao dis(...) no art. 127º do CPP, ou seja, assenta (fora das excepções relativas a prova legal que não interessam ao caso), na livre convicção do julgador e nas regras da experiência. Por outro lado, também não pode esquecer-se o que a imediação em 1.ª instância dá, e o julgamento da Relação não permite. Basta pensar, naquilo que, em matéria de valorização de testemunhos pessoais, deriva de reacções do próprio ou de outros, de hesitações, pausas, gestos, expressões faciais, enfim, das particularidades de todo um evento que é impossível reproduzir. V - Serve para dizer, que o trabalho que cabe à Relação fazer, na sindicância do apuramento dos factos realizado em 1.ª instância, se traduz fundamentalmente em analisar o processo de formação da convicção do julgador, e concluir, ou não, pela perfeita razoabilidade de se ter dado por provado o que se deu por provado. VI - Os vícios da sentença hão-de resultar da própria decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, e tanto podem incidir sobre a precariedade, no sentido de insuficiência, daquilo que se considerou provado para se ter decidido como se decidiu [art. 410.º, al. a), do CPP], como sobre contradições no seio da própria fundamentação ou entre esta e o decidido [al. b)], como ainda sobre a discrepância entre a prova efectivamente produzida e o que se considerou provado [al. c)]. VII - Em suma, o art. 410.º, n.º 2, do CPP reporta-se a vícios que são da matéria de facto e não a erros da subsunção jurídica. VIII - A invocação da violação do princípio in dubio pro reo arranca da consagração constitucional do princípio da presunção de inocência do art. 32.º, n.º 2, da CRP e o que o princípio diz é que não recai sobre quem é considerado inocente, a obrigação de ilidir a presunção dessa mesma inocência. IX - Se a acusação, e em última instância o próprio juiz, não conseguem reunir prova da culpabilidade do arguido, a ponto de o tribunal ficar numa situação de dúvida, então impor-se-á a absolvição. O tribunal não pode decidir-se por um non liquet: ou absolve ou condena. As limitações com que se debateu o funcionamento do ius puniendi não poderão prejudicar o arguido. X - Só que a situação de dúvida tem que se revelar de algum modo, e designadamente através da sentença. A dúvida é a dúvida que o tribunal teve, não a dúvida que o recorrente acha que, se o tribunal não teve, deveria ter tido." (fim de transcrição) Antes de prosseguirmos convoquemos o que a propósito da livre apreciação da prova escreveu Rosa Vieira Neves (ob. supra citada, pág. 14): “A visibilidade que, no presente momento histórico, o direito penal tem vindo a alcançar, através do relato persistente da sua violação feita pelos media, convocando uma envolvência da comunidade, cada vez mais intensa, na vivificação da realização da justiça penal, agudiza a premência de pensar os modelos e mecanismos conducentes a essa finalidade, a qual surge motivada, sobretudo, pela necessária mediação do direito processual penal para que o direito penal se efective. As mutações sociais impelem para a reflexão do paradigma em que se sustenta o sistema processual penal português, designadamente, o prescrito a jusante pela emanação da decisão final proferida no âmbito de um concreto processo, e que encerra em si, naturalmente, a manifestação de uma específica estrutura processual. A indagação da "bondade" das decisões penais que são produzidas em cada processo submetido à apreciação jurisdicional - mormente a de determinados casos que poderemos designar por mediáticos, por parte da comunidade de um modo geral e dos intervenientes processuais, em particular - exige que a expressão do ius puniendi que aquelas decisões representam seja o reflexo da actividade probatória, isenta, séria e racional desenvolvida endo-processualmente.” E mais adiante a pág. 132: “A livre apreciação da prova enquanto modo de valoração consagrado no nosso direito processual traduz, como referimos, uma liberdade de emanação de um juízo científico, não confundível com um acto arbitrário praticado pelo órgão jurisdicional. A apreciação realizada pelo julgador há-de ancorar-se no suporte material que representa a prova produzida em sede de um concreto processo penal (...), não podendo decorrer de um acto voluntarista daquele, absolutamente distante do pressu(...), limite e fundamento da decisão final que atribuímos à prova. Nesta medida, a liberdade de apreciação da prova é condicionada para a prossecução das finalidades processuais. Destarte, e em frontal oposição à prática de não motivação ou de realização de uma motivação genérica da decisão final, que vinha sendo observada na vigência do CPP de 1929, o nosso actual CPP impôs a obrigatoriedade de fundamentação, para concretização do imperativo constitucional consagrado na Revisão Constitucional de 1982 e reforçado na 4.a Revisão Constitucional, ocorrida em 1997, redacção que se mantém actualmente.”(...) “Reconhecendo à obrigatoriedade de fundamentação imposta ao julgador quer uma intencionalidade manifestada no próprio processo (finalidade intraprocessual), mas que não se queda por ela, quer vislumbrando-se uma outra intencionalidade, ancorada naquilo que designamos por efeito externo da fundamentação (finalidade extraprocessual), traçamos a operacionalidade funcional daquele dever. No que concerne à primeira finalidade referida, a fundamentação ou motivação factica é condictio sine qua non para o exercício do direito de sindicância da própria decisão final por parte dos sujeitos processuais em um primeiro momento, permitindo ao tribunal superior, em um segundo momento, apreciar se, atento o princípio da imediação, segundo o qual a prova há-de produzir-se em sede de audiência de discussão e julgamento realizada em primeira instância, em face da matéria tida por provada, o juízo emitido pelo julgador resulta de um processo relacional lógico, coerente e congruente, no sentido de se permitir a solução efectivamente contida na decisão final. A exigência de fundamentação extravasa a mera indicação quer dos elementos probatórios, quer da mera descrição factual, impondo ao julgador que, de modo objectivo, exteriorize o desenvolvimento do iter juizo valorativo conducente ao acerto juridico da sua decisão, devendo referir quais os factos que considerou provados e a respectiva fonte de onde brotam - o mesmo será dizer, indicar os meios de prova, um por um, que perrnitiram aquela conclusâo -, evidenciando a coerência interna do seu raciocínio e fazendo a análise crítica em relação a cada um dos meios de prova utilizados, de modo a, inequivocamente, demonstrar, agora externamente, a coesão do juízo valorativo que presidiu à tomada da decisão final. A fundamentação permite esta alteridade do julgador e, ao mesmo tempo, traz consigo a marca da responsabilidade técnica na elaboração da decisão final. Já no tocante à segunda finalidade apontada, porque a própria sociedade também é destinatária, ainda que reflexivamente, da decisão tomada, o dever de fundamentação aparece, como dissemos, como a veste legitimadora do exercício do poder jurisdicional, evidenciando a realização da ideia de justiça, de modo que, através dele se expresse a manifestação da soberania popular pelo respeito pelos valores fundamentais que a própria comunidade erigiu coma pertença do patrimonio axiológico do seu edifício penal. Consequentemente, partindo da conjugação das finalidades mencionadas, o dever de fundamentação realiza-se em cada processo penal sempre que a decisão final reflicta, fazendo apelo ao efeito de espelho, todo o seu processo formativo, de modo expresso, claro, suficiente e coerente, de tal modo que a torne apreensível não somente para os sujeitos processuais, mas também para a prépria comunidade, entendendo-se, aqui, que tal decisão promanara de um feixe complexo, entre a factualidade vertida no processo - aquela que resulta provada, assim coma a matéria de facto não provada, quer conste da acusação, quer tenha sido alegada na contestação apresentada pelo arguido no exercício do seu direito de defesa - e o acerto jurídico alcançado pelo julgador.” (fim de transcrição) Atenta a estrutura do acórdão recorrido, verifica-se que neste, dando cumprimento ao dis(...) no art. 374.º do CPP, após o relatório (ab initio) – págs. 1 a 101 - e antes do dispositivo (a final) – págs. 1719 a 1759 - fundamenta longamente de facto – págs. 102 a 1495 - e de direito – págs. 1495 a 1719. Ou seja, a fundamentação ocupa 1618 páginas do acórdão. É evidente que quantidade não significa qualidade, mas um sinal de que não se poderá sem mais falar em falta de fundamentação, seja de facto seja de direito, no acórdão sub judice, sobretudo no que concerne à fundamentação de facto, que ora nos ocupa, é a circunstância de bem mais de três quartos da decisão ser exclusivamente dedicada a essa mesma fundamentação. Fundamentação que, acrescente-se, no respeito pelo dis(...) no n.º 2 do art. 374.º do CPP, começa por enumerar os factos provados e não provados, seguindo-se-lhe uma detalhadíssima e extensa exposição dos motivos, de facto (e posteriormente de direito), em que se alicerça a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, sendo que aquele preceito apenas obrigava o Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa a uma fundamentação "tanto quanto possível completa, ainda que concisa". Também no que respeita ao exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal a quo afigura-se-nos, como adiante melhor se verá, que a prova foi apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção daquele Colectivo, no respeito pelo princípio da livre apreciação da prova, ínsito no art. 127.º do CPP, acima transcrito, e sobre o qual se impõe ora proceder a diversas clarificações. Dir-se-á que a valoração da prova é uma liberdade de acordo com um dever, de tal forma que a apreciação terá de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, motivada e susceptível de controlo. Não se pode confundir a livre apreciação da prova com um juízo de índole meramente subjectiva, com base em impressões não objectiváveis nem racional e logicamente apreensíveis, pois, a não ser assim, a apreciação da prova, como diz o recorrente, "redundaria ou em puro arbítrio ou numa questão de fé, o que, em sede processual penal é inadmissível" (vd. conclusão de recurso 18.ª). Importa recordar que "o exame probatório traduz-se na análise em globo das provas, a respectiva crítica, a forma de inteligenciar, intuir, racionalizar e conceber, para formular, a final, um juízo definitivo, na meta de um processo justo, que assegure todos os direitos de defesa, como vem proclamado pelo art. 32.º, n.º 1, da CRP. A motivação das decisões judiciais é um autêntico momento de verdade do perfil do juiz, que deve situar-se à margem de qualquer blindagem, no dizer de Perfecto Andrés Ibañez, in Jueces y Ponderacion Argumentativa, pág. 73." (cf. Ac. do STJ, de 17 de Fevereiro de 2011, proferido no Proc. 227/07.4JAPRT.P2.S1 e consultável in www.dgsi.pt) É constatável que, para a decisão da matéria de facto provada no acórdão sob recurso (no que tange ao preenchimento da factualidade típica dos crimes pelos quais foi o ora recorrente C condenado), a prova consistiu de forma determinante, mas não exclusiva, nas declarações dos assistentes AI e AP, como se retira da globalidade da fundamentação, em que o Tribunal a quo - ao contrário do que entende o recorrente - enuncia de forma objectiva o percurso lógico e racional em que assenta a sua decisão. Os dois parágrafos da pág. 991 do acórdão revidendo, que o recorrente questiona, não podem ser apartados do contexto e da totalidade da fundamentação em que se inserem, pois deles desgarrados, podem, de facto, parecer, perderem-se em considerações de índole muito subjectiva. Melhor se aperceberá o que ora acabamos de afirmar quando, mais adiante, se apreciar detalhadamente da impugnação da decisão sobre a matéria de facto em questão. Insurge-se o recorrente com o que o Tribunal a quo qualificou como a “ressonância de verdade” dos depoimentos dos assistentes, querendo com isto significar a ponderação que globalmente retirou no sentido da credibilidade e da veracidade intrínsecas de algumas das declarações por aqueles prestadas em julgamento. Mais se insurge o recorrente contra o facto de, em sua opinião, o Colectivo de primeira instância parecer, com aquela fundamentação, quase querer vedar a reapreciação fáctica por parte deste Tribunal superior, contrariando o preceituado no art. 412.º, n.ºs. 3, als. a) e b), 4 e 6 do CPP. Não foi esse, nem podia ser, o propósito do Tribunal a quo. Aliás, lendo-se as actas das muitas sessões da audiência de discussão e julgamento e todo o processado dos autos nessa fase, é patente que sempre pautou a sua conduta no estrito respeito pelos direitos, liberdades e garantias legalmente consagrados aos arguidos e ao exercício da adequada defesa por parte dos ilustres advogados, seus mandatários. De resto, se assim não tivesse sucedido por certo que se teria ganho em economia e celeridade processual. Porém, não foi esse o caminho seguido. O direito ao recurso inscreve-se numa manifestação fundamental do direito de defesa, no direito a um processo justo, decidido em tempo razoável, por um tribunal independente, imparcial e regulado por lei, como resulta dos arts. 8.º e 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e dos arts. 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que, por via de regra, não demanda o seu exercício em mais de um grau e é decidido por um tribunal superior àquele de que se recorre. E isto, o Tribunal a quo bem o sabe, nada tendo feito - tanto quanto é possível aquilatar do que resulta dos autos - para cercear os direitos da defesa, mormente obstando à subida deste e dos demais - e foram muitos - recursos que subiram imediatamente ou a final, com o presente. É facto que o Colectivo aludiu na fundamentação da decisão da matéria de facto, que a apreciação da prova pessoal "assentou, não raro, em subtilezas do discurso, atitudes, olhares, movimentos e expressões dos depoentes, só inteiramente perceptíveis e avaliáveis presencialmente". Sendo também certo que enalteceu as virtudes da imediação e mencionou as limitações que se colocam em geral ao registo fonográfico, registo que inclusive admite ter-se socorrido no momento em que teve de elaborar a decisão ora sub judice, tendo, sempre que tal foi tido por conveniente, procedido à audição da prova gravada. Mas, com essas referências, de modo algum, ao contrário do que alega o recorrente, condicionou os poderes de cognição das instâncias de recurso, designadamente a reapreciação da matéria de facto por parte deste Tribunal superior. Afigura-se-nos, que na formação da sua convicção, o Tribunal a quo atendeu aos meios de prova disponíveis, atentando nos dados objectivos fornecidos pela documentação dos autos e fazendo uma análise dos depoimentos prestados. Toda a prova produzida foi apreciada segundo as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposta pelo ordenamento jurídico, fazendo o tribunal de primeira instância, no uso da sua liberdade de apreciação, uma análise critica das provas. Os factos provados relativamente ao recorrente C resultaram dessa análise crítica da prova produzida em audiência de julgamento tendo em conta os parâmetros referidos. Aliás, o acórdão recorrido explicou-o quando sob o título "Da Motivação e Análise Crítica da Prova" escreveu a págs. 541/542: "A valoração da prova constitui uma das operações mais importantes e difíceis em todo o processo judicial. Pressu(...) indispensável da decisão, a qual se impõe ao julgador como uma tarefa inarredável. Esta exigência é reclamada pelo restabelecimento da paz jurídica do arguido e comunitária, o que faz com esta tarefa deva ser rodeada de especiais cuidados. No nosso sistema vigora o princípio da livre apreciação da prova, o qual se encontra consagrado no art. 127º do C.P.P., mas sendo submetido a regras e restrições, que constituem condicionantes da apreciação valorativa. Na verdade, como refere o Professor Figueiredo Dias (in “Direito Processual Penal (1988), 139-140), a valoração da prova há-de ser uma liberdade de acordo com um dever, de tal forma que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo. Ao contrário do que se passa no processo civil, em que basta a existência de uma «probabilidade prevalecente», em processo penal deve adoptar-se um padrão mais exigente, nomeadamente o de origem anglo-saxónica, da «prova para além de qualquer dúvida razoável», que se traduz na ideia de que o standard de prova exigido em processo penal é mais elevado do que o utilizado no processo civil. Embora qualquer sombra de dúvida ou qualquer hipótese fantasiosa, não sejam suficientes para obstar à condenação, para esse efeito tem de verificar-se um forte grau de probabilidade de que os factos tenham ocorrido daquela forma e que eles tenham sido praticados pelo arguido. Será, portanto, com base num tal grau de exigência que analisaremos este caso. “ (…) Em processo penal, a justiça, perante a impossibilidade de uma certeza, encontra-se na alternativa de aceitar, com base em uma probabilidade ou possibilidade, o risco de absolver um culpado e o risco de condenar um inocente. A solução jurídica e moral só pode ser uma: deve aceitar-se o risco de absolvição do culpado e nunca o da condenação de um inocente (…)” (cfr. Professor Cavaleiro de Ferreira, “Curso de Processo Penal”, Vol. 1º, 1986, pag. 216)." (fim de transcrição) O recorrente considera que o Tribunal a quo ao usar a expressão ressonância de verdade terá "perdido aquele substrato mínimo de racionalidade e objectividade necessário à fundamentação da decisão da matéria de facto" (cf. conclusão de recurso 15.ª). Todavia, não tem qualquer razão, sendo que a expressão “ressonância de verdade” - e o que desta se retira - não nos merece reparo. O recorrente compreendeu perfeitamente o que o Tribunal a quo quis dizer com aquela expressão, pois na sua 4.ª conclusão de recurso o próprio refere "querendo com isto significar a ponderação que globalmente retirou no sentido da credibilidade e da veracidade intrínsecas de algumas das declarações por aqueles prestadas em julgamento", sendo "aqueles" os assistentes AP e AI. O Colectivo de primeira instância também explicou o que pretendeu dizer com a expressão ressonância de verdade, a que chamou de "argumento", avançado ser "aquilo que resulta da imediação, que não conseguimos objectivar mais do que já fizemos. Mas é aquilo que faz com que se acredite numa pessoa e não se acredite noutra, que leva à convicção, que afasta a dúvida, para além de qualquer dúvida razoável." Mas mesmo que o não tivesse explicitamente dito, tal retirar-se-ia do contexto das muitas vezes em que na fundamentação do acórdão usou, com idêntico sentido, expressões integrando a palavra ressonância. Assim sucedeu, nas págs. 541 ("ressonância dos sentimentos que puderam estar agregados a determinado depoimento, a certa resposta ou esclarecimento. O que, pela audição das gravações, repetimos, por vezes não é possível detectar. E, concluímos, repetindo, o “como foi dito” é, na perspectiva deste Tribunal, essencial para avaliar “ o que foi dito”"), 1106 ("ressonância de enquadramento emocional e narrativo"), 986 ("ressonância ou o que emerge do depoimento de AP"), 989 ("A ressonância deste depoimento, no que diz respeito ao acto de abuso em si, ao que aconteceu e como aconteceu, foi para o Tribunal o relato de algo vivido. A forma, expressão e tom de voz que AP usa para contar o que aconteceu, quando a defesa do arguido C pergunta, após já ter feito perguntas quanto aos actos que foram praticados naquela circunstância (“…se o Dr. C despiu alguma peça de vestuário ou não”, respondendo o Assistente “… a única coisa que ele fez foi puxar as suas calças para baixo … e retirar o seu pénis para fora…”), as respostas que foi dando quanto ao que se lembrava, por exemplo, não foi, para o Tribunal, o relato de uma situação não vivida."), 1046 ("AP, quanto a esta situação e na convicção do tribunal, descreveu pequenos elementos que dão credibilidade, pois são aqueles que dão uma ressonância acrescida de que é uma situação efectivamente conhecida"), 1055 ("Para o Tribunal, face à pessoa que teve à sua frente, como contou, como olhou, como esteve sempre a responder, esclarecer ou emendar quando o fez, AT criou uma ressonância de veracidade no que dizia."), 1468 ("o Tribunal não ficou com a “impressão”, com a “marca”, de que, quanto à ocorrência do abuso, estivesse perante um discurso forjado, uma história inventada que não tivesse qualquer ressonância com situação vivida"), 1480 ("a ressonância que emerge das suas declarações - e da forma como as prestou em Tribunal - com a situação vivida"), 572 ("ressonância social"), 573 ("ressonância na avaliação"), 574 ("avaliação da ressonância"), 800 ("ressonância positiva" ["do cumprimento/ou não cumprimento dos deveres profissionais por parte do arguido A"]), 908, 914, 1109, 1112, 1239 e 1468 ("percepção da ressonância emocional dos depoimentos"), 951 ("um discurso com uma ressonância diferente"), 1148 ("narração esta que tem alguma ressonância/correspondência com o momento em que o Tribunal localizou") e 1308, 1055 e 1026 ("ressonância de um sofrimento efectivamente tido") (negritos nossos). Não se tratou por isso de dificuldade interpretativa. É certo que, nunca encontrámos a expressão "ressonância de verdade" usada na jurisprudência. Porém, se por ressonância se entender o eco, reflexo, repercussão ou o modo de transmissão de algo (vd. significado do termo ressonância, entre outros, no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa in www.priberam.pt/dlpo, bem como no Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, Edª de 2011, onde se pode ler "PSICOLOGIA uma das três componentes do carácter, além da actividade e da emotividade, na caracterologia de Heymans-Le Senne (Heymans, (...) fisiologista belga, 1892-1968; Le Senne, filósofo francês, 1882-1954), que é a maneira como as impressões experimentadas ressoam na consciência do sujeito", consultável in http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/resson%C3%A2ncia, e o emprego desta palavra feita pelo STJ, entre outros, nos seus acórdãos de 20 de Outubro e 9 e 16 de Dezembro de 2010 e 7 e 27 de Abril, 4 de Maio e 16 de Junho de 2011, proferidos, respectivamente, nos processos n.ºs 845/09.6JDLSB, 59/07.0PEBRG.S2, 966/08.2GBMFR.L1-A.S1, 1839/06.9TBMTS.P1.S1, 2/03.5GBSJM.S1, 1702/09.1JAPRT.P1.S1 e 600/09.3JAPRT.P1.S1) então a ressonância de verdade, utilizada por duas vezes no acórdão revidendo (precisamente na passagem que o recorrente cita e acima ficou de novo transcrita) é perfeitamente entendível e mais do que isso adequada. Adequada a explicar que, para além do que é objectivável na decisão do julgador, existe sempre uma margem compreensível de subjectivismo na apreciação da prova, em vista da fixação dos factos a dar por provados e não provados, resultante da imediação das declarações de arguidos, assistentes, partes civis e testemunhas, em que para além do que é dito importa o como é dito, aqui relevando, por isso, as subtilezas do discurso, das atitudes, olhares, movimentos, interjeições e expressões dos depoentes, só inteiramente perceptíveis e avaliáveis presencialmente ou em adequado registo. Como se expendeu no acórdão da Relação de Lisboa de 18 de Janeiro de 2006, em que foi relator o Exmº Desembargador Carlos Rodrigues de Almeida, proferido no proc. 7071/2005-3 e consultável em www.dgsi.pt: “A literatura especializada (Ver, nomeadamente, VRIJ, Aldert, in «Detecting Lies and Deceit», Wiley, Chichester, 2000, e MEMON, Amina, VRIJ, Aldert, e BULL, Ray, in «Psychology and Law – Truthfulness, Accuracy and Credibility», Wiley, 2ª edição, Chichester, 2003) dá conta de que não existem técnicas suficientemente seguras (Sobre o “Statement Validity Assessment” (SVA), as suas três fases e os 19 factores incluídos no “Criteria-based Content Analysis” (CBCA), veja-se, entre outros, VRIJ, Aldert, ob. cit., Capítulo V, p. 113 e segs.) ou indicadores fiáveis que permitam distinguir uma declaração sincera (Independentemente de a narração feita corresponder ao não aos acontecimentos presenciados pela testemunha e ser, portanto, verdadeira ou falsa) duma enganosa (Considerando-se enganosa aquela que corresponde a «uma bem ou mal sucedida tentativa deliberada de, sem aviso prévio, criar noutra pessoa uma crença que quem comunica considera não ser verdadeira» (in MEMON, Amina, e outros, ob. cit. p. 7).), limitando-se os estudos realizados nos últimos anos a indicar comportamentos que são mais frequentes no primeiro caso que no segundo (Sobre a possibilidade de se descobrir uma falsidade nas respostas verbais e não verbais, veja-se, nomeadamente, GULOTTA, Guglielmo, e outros, in «Elementi di Psicologia Giuridica e di Diritto Psicológico», Giuffrè Editore, Milano 2002, p. 504 e segs. e NEUBURGER, Luisella de Cataldo, e GULOTTA, Guglielmo, in «Trattato della Menzogna e dell’inganno», Giuffrè Editore, Milano, 1996, p. 217 e segs.). Porém, para a utilização dos critérios apontados pela investigação psicológica não basta a análise racional do conteúdo das declarações prestadas, sendo necessário tomar em consideração as formas de comunicação não verbal às quais um tribunal de 2ª instância, mesmo ouvindo as gravações efectuadas, não tem, em grande medida, acesso. Daí que a reapreciação da matéria de facto pouco mais possa ser do que uma análise racional do conteúdo das declarações prestadas e da prova documental e pericial junta.” (fim de transcrição, sendo da nossa autoria os parêntesis com as referências bibliográficas, neles se contendo as que no texto constavam em notas de pé-de-página). O importante é que aquilo que só as palavras dos declarantes não conseguem transmitir e que resultando da linguagem não verbal, mormente da corporal, caiba na margem de subjectividade de apreciação, que cabe - e é reconhecidamente aceitável que caiba - nos poderes cognitivos do tribunal de julgamento, desde que não seja contrário às regras da experiência. Concluiremos, no sentido de que, por todo o ex(...), no que respeita ao recorrente C não houve violação do dis(...) nos arts. 127.º e 374.º, n.º 2, do CPP, nem, consequentemente, a invocada nulidade parcial do acórdão, por falta da fundamentação, ex vi do dis(...) no art. 379.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma legal, improcedendo, por isso, o recurso deste nesta parte. d) - Valor nulo das declarações do arguido A enquanto pretensa corroboração das versões dos factos apresentados pelos assistentes AP e AI Das conclusões apresentadas e já acima transcritas ressalta que o recorrente C suscita a questão controvertida da falta do valor probatório das declarações prestadas em audiência pelo arguido A, defendendo que o Tribunal a quo conferiu-lhes indevida relevância como meio de corroboração da versão dos factos sustentada pelos assistentes AI e AP. No recurso inter(...), o recorrente C defende, muito em síntese, que as declarações do arguido A consubstanciam um depoimento indirecto, de nulo valor probatório, na medida em que aquele, na audiência de julgamento, limitou-se simplesmente a reproduzir o que lhe foi transmitido pelos próprios assistentes, o que traduz violação das disposições conjugadas dos arts. 125.º, 128.º, n.º 1, 129.º e 140.º, n.º 2, todos do CPP. Face ao modo como foi delimitado o recurso inter(...), importa, pois, apreciar se o arguido A, quanto à factualidade imputada ao recorrente C, tinha efectivamente conhecimento indirecto dos factos que transmitiu em sede de audiência de julgamento e, em caso afirmativo, que consequências importa retirar para o caso vertente. Passemos, então, à análise da questão controvertida. O art. 140.º do CPP ─ inserido no Capítulo II, do Título II, do Livro III, do CPP, sob a epígrafe “Declarações do arguido: regras gerais” ─ estabelece, no seu n.º 2, que “às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o dis(...) nos artigos 128.º e 138.º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente”. Perante a inserção sistemática deste artigo (inalterado com a entrada em vigor da Lei 48/2007), resulta incontestável que em processo penal as declarações do arguido constituem meio de prova, a par da prova testemunhal (arts. 128.º a 139.º), das declarações do assistente e das partes civis (art. 145.º), da prova por acareação (art. 146.º), da prova por reconhecimento (arts. 147.º a 149.º), da reconstituição do facto (art. 150.º), da prova pericial (arts. 151.º a 163.º) ou ainda da prova documental (arts. 164.º a 170.º do CPP). Para além de servirem a defesa, as declarações prestadas pelo arguido em audiência podem ser valoradas pelo tribunal, enquanto meio de prova, para a formação da sua convicção, inclusive para a demonstração dos factos que se mostrem desfavoráveis à defesa, particularmente quando o arguido confesse parcial ou integralmente os factos que lhe são imputados (art. 344.º do CPP). As declarações do arguido ganham particular acuidade quando respeitam a factos imputados a outros co-arguidos no processo, quando um dos arguidos acusa ou iliba em audiência de julgamento o(s) outro(s) acusado(s), atribuindo-lhe(s) a autoria ou a co-autoria dos factos delituosos em apreciação ou excluindo qualquer forma de participação nesses factos. Nestes casos, poder-se-ia questionar a validade das declarações do arguido enquanto meio de prova, se as mesmas assumem valor probatório relativamente a factos imputados a terceiros ou, se pelo contrário, só podem ser valoradas para a apreciação dos factos atribuídos ao próprio declarante. Em suma, se consubstanciam (ou não) um meio proibido de prova. A jurisprudência mostra-se pacífica a este respeito. Os tribunais superiores têm vindo a entender que as declarações de co-arguido constituem um meio admissível de prova (com excepção das situações que acabaram por ser contempladas pelo actual n.º 4 do art. 345.º do CPP), ainda que a sua consideração, para a formação da convicção do tribunal, deva ser particularmente ponderada e tenha de assumir especiais cuidados e atenções. Ao depor, o co-arguido pode não estar desinteressado no desfecho do processo. Estando também acusado (ou pronunciado) pela prática de crimes, que em abstracto podem determinar a imposição de penas privativas da liberdade, o co-arguido pode, por exemplo, excluir a sua própria participação na prática dos factos, ao mesmo tempo em que atribui a outro(s) arguidos(s) a inteira responsabilidade pelo empreendimento da conduta delituosa. Ou ao invés, pode assumir a inteira condução do processo criminoso, de modo a que concertadamente seja obtida a absolvição do(s) restante(s) arguido(s). Daí que a valoração das declarações do co-arguido deva ser especialmente ponderada, seja em benefício ou em prejuízo do(s) outro(s) arguido(s) acusados no processo, sobretudo quando não se mostre possível a sua conjugação, a sua apreciação concertada, com outros meios de prova, de modo a aferir a sua consistência e a sua credibilidade. Conforme se defendeu a este propósito no Ac. do STJ de 25-06-2008, Proc. n.º 2046/07 (in Sumários de Acórdãos do STJ): “(…) O STJ tem realçado que não existe obstáculo legal à valoração dessas declarações, por aplicação do princípio da livre apreciação da prova. Não obstante, como decorrência do estatuto do arguido, salienta que é exactamente porque este não é ajuramentado, goza do direito ao silêncio e não é obrigado a responder às perguntas que lhe forem feitas, que deve existir uma especial ponderação quanto à credibilidade das mesmas (…)”. “Por isso, o enfoque situa-se, não ao nível de qualquer proibição de prova, mas estritamente no da apreciação – como meio de prova para a formação da convicção do Tribunal – da prova emergente das declarações de co-arguido. A decisão condenatória baseada somente nas declarações do co-arguido deve rodear-se de particulares cautelas.” Ou no mesmo sentido o Ac. do STJ de 12-03-2008 (in www.dgsi.pt): “As declarações de co-arguido, sendo um meio de prova legal, cuja admissibilidade se inscreve no art. 125.º do CPP, podem e devem ser valoradas no processo. Questão diversa é a da credibilidade desses depoimentos, mas essa análise só em concreto, e face às circunstâncias em que os mesmos são produzidos, pode ser realizada. Por isso, dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova, sem qualquer apoio na letra ou espírito da lei. A admissibilidade como meio de prova do depoimento de co-arguido, em relação aos demais co-arguidos, não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada.” Aliás, em processo penal, vigora o princípio da legalidade da prova. Isto significa que, de acordo com o dis(...) no art. 125.º do CPP, “são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei”. Estando expressamente previstas como meio de prova e nada impedindo a sua valoração em benefício ou em prejuízo do co-arguido(s) do mesmo processo, em abstracto, deve ser atribuído valor probatório às declarações prestadas pelo arguido em sede de audiência de julgamento, naturalmente ressalvados os casos em que o depoente se recuse a responder às perguntas que lhe sejam dirigidas, conforme já se viu. Nesta perspectiva, nenhuma reserva de princípio merece ser colocada quanto à consideração, inclusive para a formação da convicção do tribunal, das declarações prestadas pelo arguido A, em audiência de julgamento, sobretudo na parte em que estas comportam eventual prejuízo para a defesa do recorrente C. Não estando em causa a aludida situação excepcional ─ já no passado reconhecida pela jurisprudência e de momento acolhida pelo legislador no n.º 4 do art. 345.º do CPP ─ nenhumas dúvidas se suscitam de que as declarações do arguido A, relativamente a factos de que tinha conhecimento directo, podiam e deviam ter sido valoradas pelo Tribunal a quo, enquanto válido meio de prova. Mas o recorrente C enfatiza que as declarações prestadas pelo arguido A correspondem na sua perspectiva a um depoimento indirecto, carente de qualquer valor probatório, afirmando que este arguido se limitou a reproduzir em audiência de julgamento tudo aquilo que, na altura da prática dos factos, lhe foi transmitido pelos assistentes. Desde já se adianta que se adere inteiramente à fundamentação teórica apresentada pelo recorrente C, aliás na esteira do entendimento perfilhado pela doutrina citada no recurso, o que não significa que in casu lhe assista razão, que esta premissa permita atingir a pretendida conclusão da falta de valor probatório das declarações prestadas pelo arguido A. Como o n.º 2 do art. 140.º do CPP remete única e exclusivamente para os precedentes arts. 128.º e 138.º, parece incontornável que não é aplicável às declarações do arguido, ainda que com as devidas adaptações, o regime previsto pelo art. 129.º do mesmo código quanto ao depoimento indirecto de testemunhas. Caso contrário, o legislador teria incluído este último preceito no leque daqueles para que remete o mencionado art. 140.º, n.º 2, do CPP. Deste modo, partindo do pressu(...) que o legislador processual penal soube transmitir o seu pensamento em termos adequados (cf. art. 9.º, n.º 3, do CC), o co-arguido apenas pode ser interrogado sobre os factos de que possua conhecimento directo, por si percepcionados, conforme imposição estabelecida pelo art. 128.º. Em caso algum, mesmo nos casos previstos pelo n.º 1 do art. 129.º do CPP, as declarações indirectas de arguido merecem valor probatório, ou seja, estas declarações não podem servir como meio de prova quando o arguido se limita a transmitir o que ouviu dizer a outras pessoas. Mesmo nos casos excepcionais de morte, de anomalia psíquica superveniente ou de impossibilidade de virem a ser encontradas as pessoas que directamente percepcionaram os factos, não está legalmente previsto o reconhecimento da valia probatória dessas declarações indirectas do co-arguido, ao contrário do que está regulado para a prova testemunhal. Por falta de expressa remissão para o regime previsto pelo n.º 1 do art. 129.º, as declarações do arguido não valem como meio de prova quando reproduz simplesmente aquilo que ouviu dizer a outras pessoas, sejam estas co-arguidos, assistentes, partes civis, testemunhas ou quaisquer outras pessoas determinadas que não assumam no processo nenhuma destas qualidades. Nas palavras da lei, de acordo com o dis(...) no n.º 1 do art. 129.º do CPP, o depoimento indirecto caracteriza-se por “resultar do que se ouviu dizer a pessoas determinadas”. Quando o depoente não atingiu, não percepcionou, por si próprio os factos em apreciação, através dos seus sentidos. No depoimento indirecto o conhecimento dos factos deriva daquilo que foi transmitido ao depoente por outra pessoa. Por isso, o depoente só pode garantir o que lhe foi transmitido, mas não que os factos tenham ocorrido conforme foram relatados. Conforme se escreveu no “Código de Processo Penal – Comentários e Notas Práticas”, dos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, Coimbra Editora, 2009, pág. 347: “Entende-se haver conhecimento directo dos factos quando destes se obteve percepção através dos sentidos, apreendendo-se os factos por contacto imediato com os mesmos, nomeadamente, através dos olhos, dos ouvidos e até mesmo do tacto. Pelo contrário, o conhecimento indirecto provém de percepção que é extrínseca aos sentidos do depoente, chegando os factos ao seu conhecimento através de outros meios, designadamente por intermédio de outrem, ou por elementos informativos que não obteve de forma imediata, seja através de um documento, de uma fotografia, ou de um filme”. Todavia, no caso vertente, ao contrário do expendido pelo arguido C no recurso inter(...), o acórdão impugnado não atribuiu indevido valor probatório às declarações prestadas pelo arguido A ou, dito por outras palavras, o Tribunal a quo não formou a sua convicção com base em factos de que aquele não tinha conhecimento directo. Como decorre da fundamentação da matéria de facto, o arguido A “admite ter transportado os assistentes para determinados locais ─ situações de (…), (...) (…), (…), Teatro (…), (...) do arguido K ─ , mas acrescentando que se limitou a dar boleia aos assistentes que na altura lha pediram”. No acórdão recorrido, acrescenta-se, um pouco mais à frente, que “admite ter-lhes dado dinheiro depois de terem ido a esses locais, mas (caso do dinheiro de (…) ou após a ida a um prédio sito na (...) (…)) esclarecendo que o dinheiro, quando lhe foi entregue em envelope por alguém, foi para dar aos «rapazes» ─ dando a ideia de que «aquilo» foi-lhe parar à mãos por mero acaso ─ , não sabendo dizer porque é que lhe foi entregue a si”. Também aí se escreve que “o arguido A, na audiência de julgamento de 26/11/2008, disse ao Tribunal que AP tinha-lhe falado dos actos que se tinham passado com o arguido C na (...)”. Dos transcritos segmentos do acórdão recorrido desde logo resulta que não se mostra inteiramente correcto afirmar, como faz o recorrente C, que o arguido A se tenha simplesmente limitado a reproduzir em audiência o que lhe foi contado pelos próprios assistentes e que o recorrente tenha sido condenado exclusivamente com base nas declarações dos assistentes AI e AP. Em audiência de julgamento, para além de ter relatado factos que lhe foram transmitidos por alguns dos assistentes, inclusive quanto ao envolvimento do ora recorrente C na prática de actos sexuais com alunos da AX, o arguido A também mencionou em julgamento factos de que tinha conhecimento directo e que de modo nenhum são irrelevantes para a formação da convicção do tribunal. O Tribunal recorrido não parece que tenha atribuído alguma relevância aos primeiros, àqueles que integram as declarações indirectas desse arguido. Da fundamentação da matéria de facto resulta que o Tribunal a quo valorou factos de que o arguido A tinha efectivo conhecimento directo, o que permitiu a confirmação das declarações prestadas pelos assistentes. Tudo aponta que efectuou uma análise crítica e conjugada da prova, que valorou todas as provas produzidas ou examinadas em audiência de julgamento, com base no seguinte raciocínio: a versão dos factos apresentada pelos assistentes mereceu reforçada credibilidade porquanto o arguido A admitiu ter-lhes dado boleias, ter recebido envelopes com dinheiro e ter tido com eles conversas sobre actos sexuais praticados pelos ora arguidos. Deve ser interpretada neste sentido a tirada do Tribunal recorrido quando afirma, ainda na fundamentação da matéria de facto, que “as declarações do arguido (…) têm a capacidade e plausibilidade de corroborarem os depoimentos dos assistentes. Ou mesmo em situações que não corroborem em toda a sua extensão, de lhes conferir credibilidade e, consequentemente, veracidade”. Aliás, A não é uma pessoa qualquer no que toca aos factos que integram o objecto do processo. Para além de ter a qualidade de arguido e de ter sido condenado na 1.ª instância pela prática de crimes de abuso sexual de menores, importa também não esquecer que desde sempre esteve ligado à AX, que exerceu as funções de motorista e que reconhecidamente transportou alunos da instituição para variados locais, pelo que não podia ignorar ou desconhecer a factualidade em referência. Nesta parte concorda-se com a análise da prova efectuada pelo Tribunal de 1.ª instância. Muito embora se aceite que não tenha relatado todos os factos de que tinha conhecimento com verdade, muito particularmente para aligeirar as suas próprias responsabilidades, não se mostra plausível que tenha transmitido falsamente ao tribunal as boleias que deu aos assistentes, o recebimento de envelopes com dinheiro ou as conversas que com eles teve. De acordo com a versão apresentada em sede de audiência de julgamento, não subsistem dúvidas de que o arguido A percepcionou o transporte dos assistentes para determinados locais (aliás, ele próprio admite ter-lhes dado boleia) e de que foi também ele quem recebeu envelopes com dinheiro para distribuir pelos alunos da AX. Deste modo, pelo menos nesta parte, não se pode afirmar que o arguido A se tenha limitado a reproduzir o que lhe foi transmitido pelos próprios assistentes. Nestas matérias tinha conhecimento directo dos factos sobre os quais depôs, por os ter presenciado e por inclusive neles ter participado. Como resulta da matéria de facto considerada como provada pelo acórdão recorrido, o arguido C foi condenado pela prática dos actos sexuais a que submeteu o assistente AI numa casa localizada na (…), na (…), tendo sido o arguido A quem transportou o menor para esse local, utilizando uma carrinha da marca “(…)”, pertencente à AX. O Tribunal a quo acreditou na versão dos factos apresentada pelos assistentes, mais particularmente, no que diz respeito ao recorrente C, naquilo que os assistentes AI e AP transmitiram em audiência e que acabou por ser valorado de acordo com o princípio da livre apreciação da prova. Mas esses factos foram também confirmados pelas declarações prestadas pelo arguido A, o que veio reforçar a sua credibilidade e a sua veracidade. Seja porque este reconheceu ter participado nos factos descritos pelos assistentes, admitindo tê-los transportado para determinados locais (v.g. (…), (...) das (…), (…), Teatro (…), (...) do arguido K) e admitindo ter recebido envelopes com dinheiro. Seja porque estas circunstâncias permitem confirmar, de acordo com as regras da experiência comum, a submissão dos educandos da AX à prática de actos de natureza sexual. A versão apresentada na acusação ganha consistência quando os alunos da AX são transportados para locais alheios à instituição sem qualquer justificação válida. E mais ainda sai reforçada quando a posteriori são entregues e recebidos envelopes com dinheiro para ser distribuído pelos rapazes que para aí se deslocaram. A prática de actos sexuais com menores, relatada em audiência pelos assistentes em referência, consegue explicar estas circunstâncias. A rejeição da factualidade que fez vencimento no Tribunal de 1.ª instância, deixaria sem explicação as boleias e a divisão do dinheiro entre todos. Seria então caso para perguntar o que teria motivado a deslocação dos alunos da AX para esses locais e o que teria justificado a atribuição e o recebimento de dinheiro. Frequentemente, o dinheiro serve como retribuição de uma actividade e como reparação de um prejuízo causado. Para o apuramento destes factos circunstanciais contribuíram, de modo decisivo, as declarações prestadas pelo arguido A em audiência de julgamento, com base na percepção directa desses mesmos factos. E estas circunstâncias vieram confirmar as declarações prestadas pelos assistentes, quando afirmaram que se deslocaram para os locais acima mencionados, a fim de aí serem submetidos à prática de actos sexuais. Também a conversa que o arguido A disse ter tido com o assistente AP a respeito do recorrente C, ainda antes da pendência do presente processo, denota relevância para aferição da autenticidade das declarações que este último prestou em sede de audiência de julgamento. Nesta parte, reconheça-se, as declarações do arguido A não são susceptíveis de demonstrar que o recorrente C praticou os factos que lhe são imputados. Mas servem para corroborar o relato que aquele assistente apresentou ao tribunal. Dito por outras palavras: haveria indevida valoração de declarações indirectas caso o Tribunal a quo viesse a utilizar o teor da conversa do assistente para provar os factos imputados ao recorrente C. Mas, com o devido respeito, não foi isso que sucedeu. A conversa em apreço serviu para aferir e para avaliar a credibilidade e a veracidade das declarações prestadas em audiência pelo assistente AP. Ainda que de um modo acessório e reflexo, o Tribunal convenceu-se da prática dos factos imputados ao arguido C por, muito tempo ainda antes da pendência deste processo, o assistente ter transmitido ao arguido A aquilo que se passou com o ora recorrente, vindo posteriormente aquele a reproduzir em audiência o teor da conversa em causa. Essa conversa não permite a prova dos factos imputados ao recorrente C, sob pena de valoração de declarações indirectas. Mas permite confirmar que o assistente AP falou verdade em audiência de julgamento, na medida em que já anteriormente, ainda antes da pendência deste processo, tinha conversado sobre o assunto com o arguido A. E, nesta parte, as declarações são directas, este arguido sabia por si próprio, sem interposta pessoa, aquilo que conversaram, o que o assistente lhe transmitiu, então, a respeito do recorrente C. Reafirma-se que a decisão recorrida não considerou na fundamentação quaisquer factos que os assistentes transmitiram ao arguido A. Nem tão pouco este último se limitou a reproduzir em audiência tudo aquilo que lhe foi contado pelos primeiros. O declarante sabia, de conhecimento próprio, que os assistentes foram transportados para locais que não pertenciam à instituição onde estavam acolhidos e que aí recebiam dinheiro, bem como as conversas que manteve com os menores da AX. E essas declarações foram validamente utilizadas pelo Tribunal, de uma forma concertada e conjugada com os demais meios de prova, conforme aliás se impõe, para reforçar a consistência e a credibilidade da versão apresentada pelos assistentes e para, deste modo, dar como provado esse quadro factual. Tudo sem ofensa para as normas jurídicas a que deve obediência quer a produção de prova quer a fundamentação das decisões finais de mérito. Nenhum obstáculo merece ser apontado ao valor probatório das declarações prestadas pelo co-arguido A, por estas, inegavelmente na nossa perspectiva, comportarem um relato de factos de que o declarante tinha conhecimento directo. As declarações do arguido constituem meio válido de prova, conforme já se escreveu. Também o Tribunal a quo não valorou, para efeitos de formação da sua convicção, declarações indirectas, não atendeu a factos de que o declarante não tivesse percepcionado, que lhe tenham sido transmitidos por outrem. Só assistiria razão ao recorrente C se o co-arguido viesse a relatar em audiência aquilo que ouviu dizer a outras pessoas e se o tribunal de julgamento viesse a valorar essas declarações para a formação da sua convicção. Só aqui é que ocorreria depoimento indirecto, ou melhor dizendo, declarações indirectas, e indevida valoração desse meio de prova. Mas o Tribunal a quo não deu como provada a prática dos abusos sexuais com fundamento naquilo que os assistentes transmitiram ao arguido A e que este não presenciou directamente. O quadro factual ficou demonstrado com base nas declarações das vítimas, dos menores da AX que foram abusados, corroboradas por outros meios de prova, muito em particular pelas declarações prestadas em audiência de julgamento pelo arguido A, sobre factos por si presenciados ou participados. Por todo o ex(...), improcede o recurso nesta parte. e) - A alteração não substancial de factos existentes na pronúncia não comunicada ao recorrente nos termos do art. 358.º, n.º 1, do CPP e consequente nulidade do acórdão. O arguido C nas suas conclusões de recurso 246.ª a 260.ª vem alegar o seguinte: "Ainda no que respeita a este crime, o Tribunal a quo considerou provado (sob os nrs. 104 e 104.1 dos factos provados – cfr. p. 147 do Acórdão) que os factos terão ocorrido entre os meses de Novembro ou Dezembro de 1999, a uma quarta-feira, em hora não concretamente apurada. Na pronúncia a descrição deste facto não é rigorosamente coincidente com o que resultou provado, porquanto o que ali se consignou foi, exactamente, o seguinte: “Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, por volta das 15 horas, junto do (…), tendo-lhe dito que precisava que ele “fosse a uma casa.” (Sublinhado nosso.) Como se pode concluir, a pronúncia aponta uma hora aproximada – o encontro entre o Arguido A e o Assistente teria ocorrido cerca das 15 horas – o que delimita (mais que não seja por exclusão), o período do dia em que os factos teriam acontecido. Fica fora da descrição factual da pronúncia o período da manhã, já que só após o encontro com A, cerca das 15 horas, o Assistente teria sido por este conduzido ao local onde viria a ser abusado. Assim, ao eliminar a referência à hora do dia que constava da descrição do facto constante da pronúncia, a decisão recorrida ampliou o período temporal em que teriam ocorrido os factos, uma vez que neste se passa forçosamente a incluir também os períodos da manhã ou da noite [“(…) local e hora não concretamente apurado” – cfr., sic, o facto provado n.º 104], rectius o dia todo (a totalidade das 24 horas das quartas-feiras dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999). Esta ampliação do lapso de tempo da possível ocorrência dos factos, por contraposição à sua precisa referenciação temporal – a que, ainda que com alguma latitude, se procedeu na pronúncia – configura uma verdadeira alteração não substancial dos factos, atinente às circunstâncias de tempo do cometimento dos factos. Na verdade, não é indiferente ao exercício dos direitos de defesa que os factos imputados na acusação ou na pronúncia sejam temporalmente situados no período da manhã ou da tarde ou da noite. Bastará pensar na hipótese de o arguido, acusado de haver cometido o crime em determinado dia durante a tarde, apresentar em juízo um álibi que demonstre a impossibilidade de tal ter sucedido. Naturalmente que se assim o fizer, estará a defender-se do facto circunstanciado por que foi acusado. Não será concebível que, sem lhe vir a ser dada efectiva possibilidade de se defender – em respeito ao inalienável princípio do contraditório – o arguido venha, a final, a ser condenado pela prática desse crime, nesse dia, mas perpetrado a hora indeterminada. No caso sub judice não foi indiferente à defesa apresentada em juízo pelo Recorrente a delimitação do facto que lhe era imputado na pronúncia através daquela específica referenciação temporal. De facto, a estratégia de defesa assentou, em larguíssima medida, na demonstração do que o Recorrente fez nos períodos temporais em que lhe era imputada a prática de crimes – tendo, para isso, coligido um impressionante acervo de registos com os quais elaborou a lista integrada que apresentou na sua contestação – e, também, no carrear para os autos diversos elementos documentais relativos à vivência dos Assistentes, com o propósito de que através do cruzamento de uns e outros pudesse contribuir para o esclarecimento dos factos e assim demonstrar a sua inocência. No caso dos factos relativos ao Assistente AI, em que as circunstâncias de tempo do cometimento dos factos são de alguma forma enunciadas (às quartas-feiras, entre Novembro e Dezembro de 1999, cerca das 15 horas) é efectivamente possível fazer o confronto dos registos relativos ao Recorrente e os diversos documentos respeitantes aquele Assistente, entre os quais avultam os seus horários escolares, registos de faltas e livros de registo de ocorrências do lar. Por essa razão, a alteração das circunstâncias de tempo do cometimento do facto, concretamente da hora do dia a que o mesmo tenha ocorrido, é susceptível de violar o princípio do contraditório e bulir com o exercício do direito de defesa. Tal verificar-se-á sempre que a alteração em causa não seja indiferente ao modo como foi deduzida a defesa, de tal sorte que essa alteração pressuponha, por parte do Tribunal a quo, a valoração de prova relativamente à qual não foi dada ao Recorrente a possibilidade de se defender em juízo [v., neste sentido e versando questão análoga, o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08/02/2010, Proc. nº 246/07.0GAAMR.G1 in www.dgsi.pt]. Termos em que, ao condenar o Recorrente nos termos em que fez, dando como provados factos – os constantes dos nrs. 104 e 104.1 dos factos provados (cfr. a p. 147 do Acórdão) – que configuram uma alteração não substancial dos factos constantes da pronúncia (cfr. fls. 20885 a 20887 dos autos), sem ter previamente procedido à comunicação dessa alteração e dado ao Recorrente a oportunidade de exercer o contraditório, o Tribunal a quo violou o dis(...) nos arts. 358.º, n.º 1 e 379.º, n.º 1 al. b), ambos do CPP, com a consequência, cominada nesta última disposição legal, da nulidade do Acórdão recorrido." (fim de transcrição) Desde logo, há que chamar à colação o já decidido em sede de recurso interlocutório inter(...) também pelo arguido, quanto a esta matéria. Com efeito, disse-se acima “não é toda e qualquer alteração de factos que assume o relevo processual suficiente para desencadear a necessidade de comunicação a que aludem os arts. 303º, n.º 1, e 358.º, n.º 1, do CPP. Vinício A. P. Ribeiro, em anotação ao art. 1.º do CPP, esclarece que “«A jurisprudência dos Tribunais superiores tem sido constante no entendimento de que, não há alteração, substancial ou não, para os efeitos dos arts. 358.º e 359.º do CPP, quando os factos considerados provados representam um minus relativamente aos da acusação e nenhuns novos são introduzidos – cfr. Ac. STJ, de 3.4.1991, CJ, tomo II, pág. 17; Ac. STJ, de 5.7.2001, proc. n.º 4000/00-3.ª, SASTJ n.º 53, 62; Ac. STJ, de 7.11.2002, proc. n.º 3158/02-5.ª, SASTJ n.º 65, 67; Ac. STJ, de 12.11.2003, proc. n.º 1216/03-3.ª; SASTJ, n.º 75,93.» (Extracto do Ac. RP de 14 de Junho de 2006, Proc. 0612048, Rel. Borges Martins). «Nesta conformidade podemos assentar que a comunicação prevista no citado art. 358.º, apenas tem lugar quando se tratar de uma alteração não substancial relevante, o que sucede quando essa modificação divirja do que se encontra descrito na acusação ou na pronúncia e a subsequente comunicação se mostre útil à defesa. Mas quando é que isso sucede? Para o efeito tem-se considerado que não existe uma alteração dos factos integradora do art. 358.º, quando a factualidade dada como provada no acórdão condenatório consiste numa mera redução daquela que foi indicada na acusação ou na pronúncia, por não se terem dado como assentes todos os factos aí descritos – Ac. TC n.º 330/97 [DR, II Série 1997/Julho/03] (…)” (Código de Processo Penal, Notas e Comentários, Coimbra Editora, 2008, pág. 73).” O arguido insurge-se contra a circunstância de no acórdão se ter dado como provado que determinados factos ocorreram entre os meses de Novembro ou Dezembro de 1999, a uma quarta-feira, em hora não concretamente apurada, quando no despacho de pronúncia se especificava que os factos tinham ocorrido nessas mesmas circunstâncias, mas cerca das 15 horas. O que se passou, verdadeiramente, como em muitos outros processos que já correram ou ainda correm termos nos nossos tribunais, foi a impossibilidade de se provar a concreta hora a que os factos aconteceram, embora se tenha demonstrado o demais que constava na pronúncia. Ou seja, o que aconteceu foi a não demonstração indiciária de um horário mais preciso (cerca das 15h), numa quarta-feira, para se deixarem os factos indiciados apenas como tendo ocorrido numa quarta-feira, sem excluir qualquer horário concreto. E isto corresponde a uma redução, por falta de demonstração, dos factos de que o arguido estava pronunciado e, logo, a um minus do que constava da pronúncia, sem introdução de novos factos. Não há, pois, necessidade de operar qualquer tipo de comunicação de alteração de factos, porque a que ocorreu, por falta de demonstração de um facto que constava do despacho de pronúncia, não é relevante. Argumenta o arguido que a sua defesa ficou assim muito dificultada. No entanto, o que o arguido tem que ter presente é que quando prepara a sua defesa inicial deve ter em conta todo o acervo factual constante – quanto ao que aqui releva – do despacho de pronúncia, não podendo deixar de ter presente que alguns desses factos poderão não se demonstrar. Uma coisa é a defesa ficar dificultada porque ocorreu uma alteração de factos, em que são introduzidos novos elementos circunstanciais (com que o arguido é confrontado pela primeira vez já no decurso do julgamento), outra é apenas não se provar parte do que lhe era imputado. Em qualquer julgamento, o arguido tem de ter presente que a não demonstração parcial da acusação/pronúncia pode acontecer (e acontece frequentemente) e deve acautelar isso na preparação da sua defesa. Se não acautela só a ele podem ser imputadas as agora invocadas dificuldades de defesa. E tanto assim é que o arguido preparou a sua defesa em termos mais abrangentes do que aqueles que agora parece querer demonstrar. Na verdade, se o Tribunal a quo não conseguiu apurar que, tal como descrito na pronúncia, o arguido A combinou encontrar-se com o menor AI na quarta-feira seguinte, por volta das 15 horas, ficando apenas convencido de que tal encontro ficou telefonicamente combinado entre ambos para a quarta-feira seguinte, outra solução não lhe restava que consignar que tal encontro teria (e teve) lugar mas “em hora não concretamente apurada”. E, com tal conduta do Colectivo de primeira instância, não se vê que tenham sido postergados quaisquer direitos de defesa do arguido. Sempre assim sucede em todas as situações em que vindo indicada uma concreta hora para a ocorrência dos factos a mesma não fica provada. Isto, sem embargo de provado ficar que tal facto ou factos ocorreram em determinado dia (in casu numa quarta-feira indeterminada dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999). Acresce que, tal pode ser decisivo se a hora ou período do dia/noite fizerem parte do tipo, o que, sublinhe-se, não era o caso do crime porque vinha pronunciado. E mesmo que, eventualmente, colhesse o argumento, que já acima vimos que não colhe, de que o arguido preparou toda a sua defesa para demonstrar que tal encontro - entre A e AI - não tinha ficado combinado para cerca das 15 horas (o que releva porque o encontro entre A e AI precedia o que C estava pronunciado de ter tido com o assistente AI na “casa da (…)”, portanto necessariamente ocorrido durante o período da tarde daquele dia de quarta-feira), vendo agora alargado aquele período temporal também à manhã, e até mesmo à noite, sempre se dirá que tal assim não sucedeu, pois da prova, por este carreada para os autos, a defesa tentou fazer a demonstração da impossibilidade de tal encontro – do arguido C com o assistente AI na “casa da (…)” – ter ocorrido a qualquer hora de todas as quartas-feiras dos meses de Novembro e Dezembro de 1999. Com efeito, podendo o arguido C juntar aos autos apenas os registos das suas comunicações de telemóvel nos períodos da tarde dos dias em causa (uma qualquer quarta-feira dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999), com os quais pretendia comprovar que a sua localização terrestre o não podia situar na zona da (…), fê-lo incluindo nesses registos todo o dia, cobrindo, portanto, também os períodos da manhã e da noite. Ou seja, assegurou, desde logo, a defesa de todos os períodos possíveis (manhã, tarde e noite). Teve, deste modo, a possibilidade de, cabal e globalmente, se defender não só quanto a um encontro próximo das 15 horas como também relativamente a um encontro ocorrido em qualquer outra hora das possíveis quartas-feiras em causa. É isso que resulta inequivocamente das provas (registos das comunicações de telemóvel de fls. 23734 a 24028) que juntou como DOC. 2 aos autos com a sua contestação (apresentada em 4 de Novembro de 2004 e constante de fls. 23541 a 23725) e bem assim da listagem que no ponto 108. daquela sua peça processual efectua de fls. 28 a 140 (fls. 23568 a 23680 dos autos). Atente-se que a lista do referido DOC. 2 cobre a totalidade das comunicações do seu telemóvel entre 1 de Outubro de 1998 e 31 de Julho de 2001. Lembre-se aqui que tais registos, efectuados a partir das antenas das operadoras das redes de telecomunicação móveis accionadas, permitem detectar, quer nas chamadas recebidas quer nas efectuadas, não só quem ligou a quem e quando, mas também a localização terrestre da área geográfica onde se encontram os portadores dos telemóveis envolvidos. O próprio mandatário do arguido durante a instância ao menor AI varreu as hipóteses manhã e tarde, como resulta da gravação da sessão da audiência de julgamento de 5 de Dezembro de 2005. Ou seja, a estratégia da defesa do arguido C não se focalizou apenas no período pós-15 horas, pelo que, tendo sido esta também a alargar o período temporal em causa, não pode vir agora alegar ter sido surpreendida pela decisão e consequente redacção dada pelo Tribunal a quo ao facto provado sob o n.º 104. e, em consonância, ao não provado sob o n.º 22. Destarte, procedeu o Colectivo a quo, quanto muito, a uma alteração não substancial de facto referente ao enquadramento temporal existente na pronúncia, a qual, porém, por irrelevante para a decisão da causa, não tinha de in casu ser comunicada ao recorrente nos termos e para os efeitos do art. 358.º, n.º 1, do CPP. No mais, sobre as alterações substanciais e não substanciais de factos constantes da acusação/pronúncia remete-se aqui para o que anteriormente dissemos ao decidirmos o recurso interlocutório sobre esta matéria. Pelo ex(...), improcede, assim, nesta parte, o recurso do recorrente, não estando o acórdão recorrido ferido da invocada nulidade (a prevista no art. 379.º, n.º 1, al. b), do CPP). f) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto relativa ao assistente AP O arguido C veio colocar em crise a decisão sobre a matéria de facto decidida na 1.a instância no que concerne à sua apurada conduta relativamente ao assistente AP. Em conformidade com o dis(...) na al. b), do art. 431.°, do CPP, e sem prejuízo do dis(...) no art. 410.°, do mesmo Código, a decisão sobre a matéria de facto só pode ser modificada, havendo documentação da prova, se esta tiver sido impugnada nos termos do art. 412.° n.° 3 do CPP. Recorde-se que, para esse efeito, haverão de ser cumpridas as regras contidas naquele art. 412.°, n.° 3, de acordo com o qual "quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas." Por seu turno, o n.º 4 da citada disposição exige que: "Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do dis(...) no n.º 2 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação." Discutindo o acerto da factualidade dada como provada na decisão recorrida deu o recorrente cumprimento às exigências enunciadas, pelo que, assim sendo, o cumprimento daquele ónus possibilita que o tribunal de recurso modifique a decisão proferida sobre a matéria de facto (al. b), do art. 431.°, do CPP). No que ora importa apreciar, no acórdão sub judice, foi dada por assente, nos pontos 101. a 101.10. dos factos provados, matéria que o recorrente impugna, a seguinte factualidade: "101. O arguido C sabia que o então menor AP era um aluno interno da AX, que ali havia sido admitido em virtude de ter uma situação familiar problemática e que o mesmo era carente e vulnerável. 101.1. Em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos idade, o arguido C encontrou-o nas instalações da (...) da AX, onde se situava o seu Gabinete. 101.2. Valendo-se do ascendente que a sua posição lhe conferia, disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave daquele edifício que habitualmente se encontrava fechada. 101.3. Aí, o arguido C começou a acariciar o pénis do menor, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis que, entretanto, tinha (...) fora das calças. 101.4. Depois, segurou a cabeça do menor, forçando-o a dobrar-se e introduziu-lhe o pénis erecto na boca, aí o tendo friccionado. De seguida, pegou na mão do menor e forçou-o a manipular-lhe o pénis. 101.5. Após a prática dos actos descritos, o arguido C deu dinheiro ao menor, em quantia não concretamente apurada. 101.6. O arguido C praticou os factos descritos valendo-se da sua qualidade de funcionário da AX e do facto de ter, por isso, livre acesso às suas instalações e aos seus alunos. 101.7. O arguido C estava ciente de que, enquanto (...)-(...) da AX, estava especialmente obrigado a zelar pela educação e pelo desenvolvimento físico e psicológico de cada um dos menores que frequentavam aquela instituição, tanto mais que isso constituía o objecto social da mesma. 101.8. Estava ciente que as pessoas ligadas funcionalmente à AX – especialmente os seus dirigentes – inspiravam autoridade e dever de obediência, pelo que as funções que ali desempenhava o tornavam conhecido e respeitado por tais alunos, que tinham, relativamente a ele, um manifesto temor reverencial que os impedia de oporem qualquer resistência aos actos libidinosos que sobre eles praticava, tendo decidido agir pela forma descrita sobre o então menor AP. 101.9. Ao agir pela forma acima descrita, o arguido pretendeu valer-se, e valeu-se efectivamente da reverência e do temor que o menor AP tinha por ele e que anulavam totalmente a possibilidade de lhe opor resistência. 101.10. Agiu sempre de modo voluntário, livre e consciente, querendo satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que a conduta atrás descrita lhe era proibida pela lei penal." (fim de transcrição) Pese embora o recorrente não impugne tal matéria, por ser relevante para a apreciação do presente recurso, assinala-se que, no acórdão revidendo, foi dada também por assente, nos pontos 92. a 92.5. dos factos provados, a seguinte factualidade referente a dados pessoais do assistente AP: "92. AP (…), ingressou como aluno interno da AX em 7.8.92, tendo sido colocado no Lar FC do CZ, onde permaneceu até meados de Abril de 2000, mas tendo tido baixa definitiva na AX apenas em 21.8.00. 92.1. O AP foi abandonado pelos pais, com quem apenas teve contactos esporádicos na instituição, tendo sido criado num ambiente violento que afectou o desenvolvimento da sua personalidade e o seu equilíbrio psicológico e afectivo apresentando “perturbações psicológicas graves na área afectivo-emocional” . 92.2. Em 1997 era apresentado como sendo “uma criança extremamente infantil e imatura com tendência para adoptar comportamentos regressivos como mecanismo de defesa. Tem uma necessidade constante de atenção por parte dos adultos, o que lhe permite suprir em parte a imagem desvalorizada e deformada de si próprio. Face a estas dificuldades tem comportamentos pouco adaptados à realidade, sendo por vezes impulsivo e agressivo em relação a si próprio e aos outros”. 92.3. AP passava alguns períodos de férias e fins de semana no Lar da AX. 92.4. Em 2000 AP acabou por sair da AX, tendo-se reconhecido que a problemática do AP se relacionava “com experiências abandónicas por parte das figuras parentais (...) o que o impossibilitava de se desenvolver de forma harmoniosa”.. 92.5. Acabou por ingressar num dos (...)s do Instituto de Reinserção Social, tendo saído da AX e procurado apoio junto da tia avó, e ingressado no mercado de trabalho de forma precária." (fim de transcrição) A propósito dos descritos factos provados (101. e segs.) o recorrente C expendeu, nas suas conclusões de recurso 79.ª a 214.ª, já acima integralmente transcritas, diversas críticas, dúvidas e reservas quanto aos critérios de apreciação da prova produzida que conduziu a que tais factos fossem dados por assentes. Começa a defesa do arguido C por afirmar que: "No que diz respeito à condenação do Recorrente pelos factos relativos ao Assistente AP, a descrição dos mesmos, consubstanciada na acusação e na pronúncia, resultou exclusivamente das declarações prestadas pelo próprio Assistente.". A este respeito, importa, por um lado, reter que, no contexto dos crimes de natureza sexual, mormente no abuso sexual de crianças e jovens, muitas vezes, a par das perícias (...)-legais, físicas e/ou psicológicas sobre a pessoa do ofendido, a prova baseia-se, em primeira linha, quiçá mesmo de modo quase exclusivo, nas declarações da vítima, já que os actos de abuso sexual não são por regra cometidos na presença de olhares de terceiros, sem que isso implique qualquer capitio diminutio, no tocante à aceitação da credibilidade e veracidade do depoimento da vítima (sem embargo obviamente de ser assegurado o devido contraditório), pois longe vão os tempos em que vigorava o princípio do testis unus testis nullus (remetemos para o que a propósito das provas tarifárias acima dissemos e tenham-se também aqui presentes as palavras de Bacon: «os testemunhos não se contam, pesam-se» - vd. "Psicologia do testemunho”, in Scientia Iuridica, pág. 337) e, por outro lado, verifica-se resultar dos autos, muito em particular da fundamentação expendida no acórdão revidendo, que não foi isso que in casu sucedeu, porquanto o Tribunal a quo explica claramente, na sua fundamentação dos factos dados por assentes, que a prova se baseou não só nas declarações do ofendido, mas em todo um conjunto de provas que criteriosamente detalhou e apreciou, cruzando dados, sobre estes reflectindo ponderadamente e formulando juízos lógicos, com base nas regras da experiência, como adiante melhor se verá. Mais refere o recorrente C que o assistente AP prestou declarações no processo diversíssimas vezes, em inquérito, tanto perante a Polícia Judiciária como perante o Ministério Público, e em sede de instrução, perante a Meritíssima Juíza de Instrução Criminal, tendo ainda sido ouvido em sede do processo arbitral (AP versus Estado Português) e, por duas vezes (em 24 de Janeiro de 2003 e em 22 de Novembro de 2004), em sede do processo disciplinar movido pela AX ao ora recorrente, para além de haver, igualmente, referências a relatos seus constantes dos relatórios elaborados pelos peritos do INML, escalpelizando, seguidamente, o que este terá dito naqueles diversos momentos e instâncias no tocante aos factos vivenciados na (...) da AX e em (…), explorando as incongruências que encontra nessas declarações de AP e aquelas que o mesmo viria a prestar na audiência de julgamento, em que "voltaria à primeira versão dos factos, afirmando ter sido abusado pelo Recorrente nas caves da (...), apresentando para as sucessivas alterações dos seus depoimentos (…) explicação mirabolante". (vd. conclusões de recurso 80ª a 91ª e 102ª/103ª) Como, igualmente, bem se sabe, são às declarações prestadas perante o Colectivo de Juízes durante a audiência de julgamento que o Tribunal de primeira instância se tem de ater em primeira linha, não ficando este vinculado, nem podendo sequer considerar, por vezes, aquelas prestadas fora do processo ou dentro deste em fases processuais anteriores (cfr. arts. 356.º e 357.º do CPP). Recorde-se que não se procedeu à leitura em audiência de todas as declarações prestadas pelo assistente AP em sede de inquérito à Polícia Judiciária e ao Ministério Público por falta do necessário acordo nesse sentido por parte do Ministério Público e do assistente. O que o recorrente pretende, em suma, é descredibilizar todas as declarações prestadas pelo assistente AP, incluindo as produzidas em julgamento, aspecto em que o arguido C baseia grande parte do seu recurso no tocante aos factos dados por provados nos pontos 101. a 101.10. do acórdão recorrido. O conteúdo de diversas das suas conclusões, em que formula meros juízos de valor, é disso bem elucidativo, vejam-se, entre outras, as 152.ª, 198.ª a 200.ª, 211.ª a 213.ª e 181.ª, afirmando-se nesta última: "É de facto surpreendente que se possa acreditar num só dos factos relatados pelo Assistente AP, quer os que ele conta ter visto quer os que relata ter vivido" e na primeira: "O Assistente AP mentiu ao Tribunal, ao relatar um abuso que o colega AT sempre negou, como já mentira em sede de processo disciplinar, tendo inclusive nessa sede desdito o seu próprio abuso nas caves, pelo que não podia merecer credibilidade pelo Tribunal, pelo menos para além da dúvida razoável." Porém, o Tribunal a quo explicou, devida e cabalmente, na fundamentação do acórdão o percurso pessoal e declarativo do ofendido AP, em vista de tais divergências, em termos que se percebem e fazem todo o sentido. E passa-se a transcrever o que de mais relevante neste domínio se consignou no acórdão revidendo: "O assistente AP foi ouvido em audiência de Julgamento durante onze sessões. Nestas onze sessões AP apresentou um discurso calmo, às vezes elaborado, percebendo o Tribunal que pretendeu transmitir uma imagem positiva de si. Para o Tribunal o assistente teve a preocupação de transmitir que era uma pessoa sensível embora, também, sendo perceptível algum apelo à sensibilização de quem o estava a ouvir, pela sua situação de desfavorecimento face a outros e – avaliação do Tribunal -, naturalmente receber alguma simpatia. Por exemplo, a justificação que deu ao Tribunal para as suas fugas quando estava no Lar FC , “ … porque desde que eu entrei para a AX sempre fui revoltado…porque qualquer sonho de um rapaz é crescer junto dum pai…de uma mãe, ter um carinho, um afecto e eu não…eu ali não tinha, quer dizer, os educadores davam mas não é o mesmo…não é o mesmo carinho, o mesmo afecto que uma mãe e um pai pode dar a um filho…”; quando fala em (…) e diz que o arguido A dava 5.000$00 aos outros e a si 2.000$000, portanto menos dinheiro do que aos restantes. Teve a preocupação de transmitir que era uma pessoa educada. Por exemplo, quando explicou ao tribunal as circunstâncias em que conheceu o arguido A e os actos praticados, quando o estava a fazer pediu previamente desculpa ao tribunal por usar a “expressão pénis” e utilizando várias vezes as expressões “...se faz favor Sra. Dra...”, “... peço perdão a este Tribunal...”, quando se enganou em alguma coisa que emendou, mesmo quando espontaneamente logo a seguir; tendo o cuidado de dizer “...se a Sra. Dra. dá licença...”, antes de tirar o casaco, quando 24/6/05 lhe disse que podia tirar o casaco, pois era foi um dia em que esteve muito calor na sala de audiências; na A.J. de 6/7/05, a explicação que deu para não reproduzir palavras que ouviu ao arguido A, numa conversa com o arguido C, por serem “ asneira”. E transmitiu, também – na avaliação do tribunal -, a sensação de que era “importante” ou “relevante” para alguém, porque deu-se com pessoas “importantes” ou foi escolhido por pessoas “importantes”. Por exemplo, após falar dos actos de natureza sexual que se passaram consigo e com o arguido A e passa a relatar outros actos com outras pessoas, exprimiu-se de uma forma que não deixa de ser peculiar: “ … o que se passou com o Sr. A é que o próprio nos levava para encontros com pessoas famosas da nossa sociedade…”; “...H estava de olhar muito atento em mim...”, em (…), altura em que o “chamou” e “levou” para um quarto e falou que tinha “... pele de bebe e era o rapaz mais bonito dos colegas que estavam ali...” (A.J. 20/6/05); e quando na A.J. de 24/06/05 fala da ida à Praia (…) e de novo refere que o arguido H disse que era “...o mais bonito…”. E, por exemplo, quando na A.J. de 4/07/05 ( a pedido de esclarecimento quanto ao conhecimento que teve com o (...) da AX, Sr. D. BQ), fala de um episódio ocorrido com o Sr. (...) da AX BQ, contando que desde pequeno “…ia brincar para a (...)…uma certa altura eu escondi-me debaixo da secretária desse Senhor (...)… onde lhe atei os sapatos um ao outro…e brincava, tipo miau, miau a imitar um gato …e aonde ele olhava e o que é que estás aqui a fazer moço? Vai-te embora. Simplesmente coisas assim, mas nunca me tratou mal e sempre tratei esse senhor com o devido respeito…”. Ainda na sequência do que antecede – e ilustrando em que se traduziu a verbalização de AP quanto à necessidade de expressar ao tribunal como era reconhecido pelos outros –, quando a Defesa do arguido C aprofunda um pouco esta questão das idas de AP para o espaço da (...) ( perguntando se tinha alguém na (...) que fosse seu amigo ou conhecido e que o convidasse para ir lá), respondeu que “ … aquilo é um local de trabalho…nós alunos só podíamos lá ir se tivéssemos alguma coisa para tratar…eu não tinha nada para tratar. Ia para ali, simplesmente…numa desportiva…tinha ali amigos…toda a gente gostava de mim…eu era pequenino…atendiam-me bem … eu dizia que não tinha aulas, só para tar ali, na (...)…”. A necessidade de atenção, o apelo à atenção, a necessidade de contar estou aqui e sou alguma coisa, foi patente e evidente. (1) E não pode este patente apelo à atenção, ter levado à invenção dos actos de abuso com estes arguido? Aqui ligamo-nos com o que já dissemos - na presente análise crítica da prova -, quanto à linha de defesa seguida pelos arguidos, da manipulação que foi feita pelas vítimas, para a Acusação dos arguidos por factos que não praticaram – e o assistente AP, como notámos, é um dos que, em sede de Alegações, a defesa do arguido H imputa a criação intencional de uma história para o envolver. É claro que o Tribunal teve que equacionar todas as hipóteses, pelo que, face à interrogação que colocámos, a resposta é: poder corresponder a uma invenção pode. Mas, no caso concreto, o Tribunal criou a convicção que não foi o que aconteceu com AP quanto aos factos que o Tribunal deu como provados. Se queria notoriedade, se queria ser falado? Isso para o Tribunal foi perceptível que, em certa altura ou a partir de certa altura sim. Mas ouvindo as suas declarações sessão após sessão – e estamos a falar de 11 (onze) sessões, interrogatório após interrogatório pelo Tribunal, pelo Ministérios Público, por 7 (sete) Ilustres Advogados –, é claro que vemos que o seu relato é confuso e baralhado nas datas, nas sequências - o que numa primeira resposta disse ter sido o primeiro acto após a garagem e os actos com o arguido A depois já não era… -, nas descrições dos locais e mesmo, quando comparado com declarações de outros assistentes, por vezes divergentes com o que outros disseram ( cfr., por exemplo, a descrição do interior de um andar sito no prédio da Av. (…) que o assistentes AP faz e a descrição do mesmo local pelo assistente AT). No entanto, não obstante o que antecede, pareceu transmitir e estar a contar uma coisa que efectivamente lhe aconteceu. Ouvindo – ou antes, re-ouvindo, pois o Tribunal, dado o tempo que distanciou entre a audição do assistente e o fim da audição de toda a prova testemunhal, teve que proceder a nova audição das declarações -, quando falou a primeira vez dos factos que se passaram com o arguido A e dos factos que se passaram em (…) (por ex. A.J. de 20/06/05), revelou uma voz embargada, tanto que o tribunal teve que interromper a sessão por alguns minutos, pois percebia-se que estava a chorar (interrupção esta que, nessa altura, tratámos com alguma cautela, como explicaremos à frente). A necessidade de interromper não voltou a repetir-se e as declarações que prestou ao longo das demais sessões, o tom de voz calmo e por vezes contendo a impaciência ou cansaço que em determinadas alturas teve, necessariamente, que sentir - pois as instâncias foram seguidas e, por norma, esmiuçando ainda mais o que tinha sido dito e como tinha sido dito ou na sessão anterior ou na instância feita por outro sujeito processual -; a atitude de querer colaborar, traduzida na forma como foi sempre e consecutivamente, respondendo e esclarecendo o que tinha dito, baralhado ou confundido; a expressão facial que por vezes se via traduzindo emotividade; transmitiu ao tribunal uma noção de existência de uma espinha dorsal naquilo que estava a dizer, de existência de uma correspondência emocional entre o que estava a contar e o que tinha vivido e com as pessoas e nos locais que disse ao tribunal." (…) "(Percurso de AP na AX): Para os factos que o tribunal deu como “Provado” ou “Não Provado”, respeitantes a dados pessoais do assistente, nascimento, ingresso e vivência na AX, vivência anterior ao seu ingresso na AX, bem como data da saída da AX – cfr. Pontos “ 92.” a “92.4” e, consequentemente, a matéria que o Tribunal deu como não provada nos pontos “10.” a “10.3” dos factos não provados - , foram relevantes as declarações do Assistente, o qual falou de forma clara sobre a sua infância e sobre os sentimentos e emoções que experimentou. (1) Do ponto de vista da prova documental, foram particularmente relevantes os documentos constantes do Apenso DA ( Processo individual de AP na AX) e os documentos do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), Dos documentos de fls. 72 e 81, do Apenso DA (cópia da certidão de nascimento e da cédula pessoal) resulta que o assistente nasceu em (…). Da análise de fls. 777 a 784, 823 do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) e fls. 2, 48 a 49, 76 e 128, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX), resulta que entrou para a AX de (…) na sequência de Despacho de 7/08/92, tendo-se concretizado a sua entrada, para o Lar FC, concretamente em 18/07/92. Assim, entrou na AX com 7 anos de idade, mas fazendo 8 anos em 1/10/92. As razões da sua entrada e o estado de desenvolvimento do assistente na altura em que entrou para a AX e posteriormente - que o Tribunal deu como provado nos pontos “92.” a “92.4” dos factos provados - , resultam suficientemente explicitadas dos documentos de fls. 55 a 60, 85 a 86 (embora este documento refira que entrou em 1982, em vez de 1992, o que se percebe que é manifesto lapso, face desde logo à data de nascimento do Assistente) do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) e fls. 776 a 779 e 818, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), sendo o documento de fls. 777 a 779, em que é feita uma avaliação psicológica da (na altura) criança, em Julho de 1992, subscrito por uma psicóloga e resultando do teor de tal relatório que observou e esteve em contacto com o AP para fazer o relatório, o que para o Tribunal assumiu especial peso probatório. É um documento contemporâneo da situação que estava a ser analisada, permitindo-nos efectiva proximidade com o que AP era em Julho de 1992 e com a sua vivência como (então) criança. Acresce que o documento não foi impugnado pelos sujeitos processuais, foi sujeito ao contraditório, tal como os demais que o tribunal está a enunciar. Quanto à saída da instituição, resulta dos documentos de fls. 1 e 2, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX), que o mesmo teve baixa definitiva da AX em 21/08/00. No entanto, resulta igualmente do teor de fls. 4 a 10, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX) e fls. 840 a 845, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), que pelo menos desde 14/04/2000 AP já não estava na AX, pois tinha sido conduzido, depreende-se do documento por decisão judicial, primeiro para o (...) EW e daí para o (...) IIT, para observação, sendo que por Despacho de 9/06/00 foi determinado que a observação fosse feita em ambulatório e ficando o (então) menor a residir com a Tia Avó EA. Mas conjugando a informação que antecede com os registos que estão a fls. 203 (referente a Segunda Feira, 3/04/00) a 221 (referente a Sexta-feira, 14 de Abril de 2000), do Apenso W-11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00), resulta que, “de facto”, desde a noite de 3/04/00 AP não esteve no Lar, tendo andado “fugido” e em casa da Tia, até ter sido conduzido em 14/04/00 do COAS para um (...) do IRS (cfr. Fls. 221, do Apenso W-11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Daqui, também, o facto que o Tribunal deu como “não provado” no ponto “10.” destes factos. A baixa definitiva foi, efectivamente, em 21/08/00, mas desde a noite de 3/04/00 e até ter sido conduzido em 14/04/00 para um (...) do I.R.S., AP já não dormia na AX, já não estava sob qualquer controlo diário dos educadores da AX. (1.1) Em relação aos elementos constantes do Apenso W-11 ( Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e acabados de mencionar, há que ter em atenção que são registos diários da vivência do Lar, resultando do seu teor que se destinavam a ser, por uma lado, “uma passagem de serviço” entre os educadores e, por outro, uma forma de os educadores falarem entre si sobre os educandos. Assim, são um meio importante – mas com limitações também relevantes, que ao longo da análise crítica da prova iremos assinalando – para o tribunal se aperceber como era a vivência diária do Lar, em relação a aspectos que cada educador considerou mais marcante, sendo um instrumento que, a par da prova testemunhal, permite ao Tribunal ter proximidade com o que os educandos, de alguma forma, foram no Lar. Feita esta referência, ainda neste primeiro núcleo de factos da vivência de AP, quanto aos factos que o tribunal deu como provados relativos às férias e fins de semana do educando na AX, contactos com os pais ou familiares e competências profissionais, foram relevantes, por um lado, os documentos de fls. 109 ( referente a Sexta feira, 21/01/00, embora no registo de 22/1/00, conste que afinal o AP estava no (...), portanto nesse fim de semana não foi, afinal, a casa da tia, mas o que não afasta a conclusão de que ia também a casa da tia em alguns fins de semana), 163, 175, 185, 186, 187, 213, 214, 278 do Apenso W -11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e os documentos de fls. 817 e 817vº, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), dos quais resulta que AP, pelo menos entre 24/11/96 e Abril de 2000, não passou as férias e fins de semana exclusivamente na AX, tendo ido em algumas alturas a casa da Tia EA, pessoa que manifestou interesse pelo Jovem ao longo do seu internamento na AX – pois caso contrário não se tinha predis(...) a acolhê-lo na sequência do seu internamento em 14/4/00 no (...) do IRS (cf. fls. 4 a 10, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX - e fls.830, 840 a 845, 846 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Mas sendo os contactos com os Pais esporádicos – mas existiram –, conforme resulta de fls. 17 a 18, 23 a 25, 37 a 38, 41, 85 a 86, do Apenso DA (Processo individual de AP na AX), de fls. 776 a 779, 786, 789, 797, 818, 823, 831, 837 a 839 do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) e, a título de exemplo, fls. 416vº, 434, 451, 501, 360vº, 232, 149 do Apenso W-11, Livro 1 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) e fls. 81, 145 do Apenso W-11, Livro 2 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00)." (…) "(Percurso escolar) Como dissemos AP entrou para a AX em Agosto de 1992. De acordo com a prova produzida em audiência de Julgamento, para a qual foram concorrente as declarações de AP (e cfr., quanto a elementos documentais, Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6 - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX - e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX), a sua frequência escolar enquanto esteve na AX, englobando o (...), ano lectivo e ano escolar, foi a seguinte: - 92/93, 1º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 93/94, 2º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 94/95, 3º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 95/96, 4º ano, 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT; - 96/97, 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, DT, - 97/98, 5º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma E, nº 15), Col. CZ ; - 98/99, 5º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma B, nº 6), Currículo Alternativo Col. CZ; - 99/00, 6º ano, 2º Ciclo do Ens. Básico (Turma B, nº 6), Currículo Alternativo Col. CZ, sendo que em Abril de 2000 deixou de estar na AX". (…) "( Processo de crescimento) Paralelamente a este percurso escolar e por o considerar relevante para a avaliação das declarações do assistente – porque como já referimos, AP nas suas declarações, para localizar acontecimentos no tempo, faz referência a aspectos ou períodos concretos da sua vida - , o Tribunal apurou a evolução do AP quanto à sua estabilidade, integração e comportamento na AX. Quando é feita a proposta para internamento na AX, em Julho de 1992, a Psicóloga que o observa diz que AP é um rapaz simpático, realiza de forma rápida as proposta de trabalho que lhe são propostas, desempenho cognitivo médio para o grupo etário, evidencia dificuldades grafo-perceptivas, são notórias as sequelas de primeiros tempos de vida com privações várias (cfr. Fls. 777 a 779 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Na avaliação escolar que lhe é feita em 20/12/93 gosta de participar nas actividades da área de expressão dramática e criativo nos trabalhos efectuados na expressão plástica, não gosta de trabalhar na área da língua portuguesa, dificuldades na área da matemática, fazendo com dificuldade contagens em ordem crescente e decrescente, não tendo adquirido plenamente as noções temporais. Não gosta de trabalhar e se lhe fosse permitido passava o tempo a brincar (cfr. Fls. 796/796vº do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 10/01/94 a Pedopsiquiatra que o seguia na altura diz que apresenta perturbações psicológicas graves na área afectivo emocional (cfr. Fls. 794 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). E na avaliação que lhe é feita em 28/03/94, no segundo período do mesmo ano, AP é tido como um aluno que se distrai com facilidade, continua a apresentar dificuldades na área da Matemática com a memorização da tabuada e resolução de problemas, não gosta de trabalhar na área da Língua Portuguesa, continua a gostar de participar nas actividades da área de expressão dramática e a ser criativo nos trabalhos efectuados na expressão plástica (cfr. Fls. 795795º do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 4/03/97 – AP tem 12 anos de idade e está a frequentar 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT -, a Equipa Técnica do internato faz um relatório sobre o educando, com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico até ao fim do ano lectivo em curso e diz que a sua integração no lar foi difícil, com fugas sucessivas entre Dezembro 1992/Março 1993 e Dezembro 1993/Janeiro de 1994, problema que a Equipa diz estar ultrapassado “ …desde há sensivelmente 2 anos…”. Refere que AP é uma criança muito infantil e imatura, “… necessidade constante de atenção por parte dos adultos, o que lhe permite suprir em parte a imagem desvalorizada e deformada de si próprio…”. Por vezes é impulsivo e agressivo consigo e com os outros. Diz, também, este relatório, que AP começou a ter consulta de Pedopsiquiatria em 22/02/94 no Hospital IIU ((...) da Juventude a funcionar no HHB, sendo a Pedopsiquitra a sra. Dra. IIV), a qual foi até Maio de 1996, sendo que a equipa do internato, por o entender necessário para o AP, diligenciou pela continuação do acompanhamento do jovem nesta área, na sequência do que este retomou as (...) em 20/02/97, com o Dr. BL, periodicidade de uma vez por semana (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Em 29/09/97 é feito novo relatório pela Equipa Técnica do internato, com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico do AP no ano lectivo 1997/1998, pelo dr. BL, sendo referida a evolução positiva do jovem decorrente deste apoio e a continuar com a periodicidade de uma vez por semana (cfr. Fls. 809 a 810, 812 a 813, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). No início do ano lectivo 98/99, da anotação de 23/9/98 (resultante de um reunião com os (...) do Currículos alternativos - cfrs, fls. 819 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), AP está participativo, sendo referido “ miúdo muito cativador …meigo e carinhoso”. Mas na avaliação escolar que lhe é feita no fim do 1º período, desse ano lectivo 98/99, é referido pelos (...) que é “emocionalmente muito instável”, “requer frequentemente a atenção do professor”, às disciplinas de História e Ciências demonstra interesse e participa nas actividades propostas. Mas a EVT já é feita a observação que é “muito instável, não consegue estar na sala de aula e participar nas actividades curriculares”, mas sendo na síntese dito que é um aluno “desinteressado, malcriado, que acaba por destabilizar a turma”. Na avaliação do Segundo período é referido a Ciências da Natureza e Educação Musical que piorou (bastante) o comportamento. E na avaliação do terceiro período que piorou as relações com os outros, desinteressado mesmo às disciplinas em que no 1º período manifestava interesse, piorou a sua instabilidade e rendimento (cfls. Fls. 27 e 27 vº, 28, 29 e 29 vº, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX). Em 13/01/00 é feito novo relatório pela Equipa Técnica do internato, com vista ao recomeço de apoio pedopsiquiátrico ao AP para o ano lectivo 1999/2000, pois tal apoio, que anteriormente foi dado pelo Dr. BL, tinha sido interrompido no ano lectivo 1998/1999 por desinteresse do AP nessa relação (resultando do relatório de fls. 837 a 839, datado de 26/07/00, que tal desinteresse traduziu-se na recusa do jovem em continuar a ir às (...) – cfr. Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). O pedido da Equipa Técnica é feito com carácter de urgência, devido à baixa auto estima do jovem e às “grandes dificuldades de relacionamento interpessoal" que manifestava, com falta de controlo dos impulsos agressivos e frequentes passagens ao acto, apresentando, na altura em que é feito o relatório, “comportamentos de risco que podem comprometer, inclusivamente, a saúde física” (cfr. Fls. 824/825, 827/826 do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Conjugando esta referência de “risco” que é feita pela Equipa Técnica, com a avaliação escolar do ano lectivo 99/00 - em que no segundo período é referido como tendo “graves problemas emocionais…falta de concentração …instável…”, com absentismo escolar (por exemplo, a Educação Moral 20 faltas nesse período e a E.V.T. 25 faltas) (cfrs. Fls. 30 e 31, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX) - , resulta para este tribunal que desde o ano lectivo 1998/1999 e até à data em que é feito o relatório pela equipa técnica em 13/01/00, o processo de adaptação, educação, vivência social de AP foi em sentido de crescente desinteresse pela escola, pelos educadores ou colegas, manifestação de comportamentos inadequados para a vivência com os outros e consigo, sendo que já estava (1/00) com 15 anos de idade. Esta conclusão do Tribunal, quanto ao processo de acentuada degradação da vivência e de crescente problemas de integração de AP na AX, desde o ano lectivo de 1998/99 – até à sua saída em Março/Abril de 2000, nas circunstâncias que o Tribunal já referiu (fuga do lar e integração num (...) do IRS em 14/4/00) –, foi integrada e sustentada com a análise que o tribunal fez do dia-a-dia do AP no Lar FC, movimentos de integração no Lar, processos de fugas. (4) Passemos, então, à co-análise desta parcela da vida de AP - até porque resultou da prova produzida em audiência de julgamento que o Educando foi expulso da AX, na sequência, também, de um processo de fugas -. No que diz respeito a esta problemática das fugas do AP - o Relatório de 4/03/97 e que acima referimos (cfr. Fls. 804 e 805, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), diz ser um problema ultrapassado “…desde há sensivelmente 2 anos…” -. Considerando o que ressalta dos relatórios feito sobre o AP e acima já referidos, quanto à carência afectiva que o jovem demonstrava desde que entrou para a AX, conjugado com o que foram as declarações do assistente sobre as razões pelas quais fazia fugas da AX (dizendo, de forma que o Tribunal sentiu emotiva, como expressão de algo que o fez sofrer, que desde que entrou para a AX sempre efectuou fugas, “… porque desde que eu entrei na AX sempre fui revoltado, porque qualquer sonho de um rapaz é crescer junto de um pai, de uma mãe, ter um carinho, um afecto e eu não.. eu ali não tinha…quer dizer, os educadores davam, mas não é o mesmo.., o mesmo afecto que uma mãe e um pai pode dar ao filho…”), para este Tribunal e atenta as regras da experiência comum, foi relevante para que tais fugas (“as primeiras”) cessassem o movimento de aproximação do jovem com a mãe, com as irmãs e com a tia EA, que resulta ter sido feito e trabalhado pela AX, pelo menos, entre Outubro de 1996 e Abril de 1997, conforme se conclui das anotações de fls. 817 e 817 vº, do Apenso Z-15, 2º Volume (documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). Mas neste mesmo documento há uma anotação de 3/06/98, de um pedido de AP para contactar as irmãs. Aqui (re)começa, na análise do tribunal, o período de instabilidade que acentuadamente AP revela desde o ano lectivo 1998/1999 e que culmina com a sua expulsão da AX. Como dissemos, no dia 3/06/98 há a anotação do pedido do AP para contactar com as irmãs e no dia seguinte, 4/06/98, uma anotação da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo. Cruzando esta informação com o relatório que em 17/07/98 é feito sobre o AP – proposta para ingressar nos currículos alternativos (cf. fls. 798/799, 801, 806, 818/818 vº, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) -, assinado pela Sra. Dra. XZ, a qual foi assistente social na AX de Outubro de 1968 a Julho de 2006, tendo declarado ao Tribunal ter estado desde 1981 no (...) de CZ, tendo exercido a suas funções em contacto directo com os educadores e falado sobre esse trabalho -, com o relatório de 4/03/97 que já mencionámos e com os registos do livro de ocorrências do lar em que o educando estava (cfr., como primeiro registo de fuga encontrado, Fls.386) do Apenso W-11, Livro 1 (Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), esta fuga de 4/06/98 é a primeira que o Tribunal encontrou nos diversos elementos do Assistente após o início de 1995 (altura aproximada em que, de acordo com a Equipa Técnica, como vimos, teria sido ultrapassado o problemas das “fugas sucessivas” entre “Dezembro 1992/Março 1993 e Dezembro 1993/Janeiro de 1994”). Após 4/06/98 (data da fuga do AP para Setúbal, para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo), o Tribunal encontra apenas um registo de fuga do AP em 1/07/98 (cfr. Fls. 405 vº, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99). Após 1/7/98 e até 20/4/99, não há registo a dizer que AP fugiu. Surge, em 20/04/99, um registo no livro de registo de ocorrências (cfr. Fls. 115, do Apenso W-11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), no qual consta “…Houve uma BOMBA acerca do AP,…depois amanhã falamos… O telefone não para com a família do AP a querer saber notícias…Ultima hora, telefonou a Tia EA a dizer que os avós do AP não o quiseram lá. Vamos ver o que isto dá….”. Esta anotação coincide com a que (também) em 20/04/99 foi feita no seu processo psicossocial , dizendo que AP foi com um irmão, o IIW, que apareceu no Lar dizendo que o queria levar para sua casa. Em 22/04/99 há a anotação de uma reunião com a Tia EA, AP “deu nota de não se estar a sentir bem” e acabou por aceitar ficar no lar, indo a casa da Tia mais frequentemente (cf. fls. 846, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). São estas duas anotações que nos permitem perceber o que é que se passou com o AP, qual era a “BOMBA” que o Educador anotou no Livro de Ocorrências. Isto porque das anotações seguintes do Livro de ocorrências – cfr. fls. 116, 21/4/99, Quarta: …O AP telefonou ao irmão para avisar que estava tudo bem… Apareceu cá a tia EA dos (AP e IIW) e amanhã vai haver reunião…; Fls. 116, 22/4/99, Quinta: O AP veio cá com um recado da Prof IIX. À tarde, não disse a hora, quer reunir-se com vocês e com o AP... Ele disse tb que receberam um telefonema do padrinho com ameaças.. ( Fls. 117)… O problema do AP está resolvido. Ao fim de muito custo ele acedeu cá ficar...O primo dos (AP e IIW) veio cá buscar o IIY para irem a (…) buscar a mala do AP… (cf. Apenso W-11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) - , não se fica a perceber o que efectivamente aconteceu." (…) "Prosseguindo a análise da vivência de AP, a partir desta altura (20/04/99) percebe-se, pelos registos dos Livros de Ocorrências (cfr. Fls. 314, 315, 121, 129, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99), que AP passou a ir com mais “regularidade” para casa da Tia EA. Mas em 12/5/99 e 13/05/99 há novos registos, dos quais resulta nova fuga do AP do (...), para ir procurar um irmão ao aeroporto, tendo regressado ao (...) em 13/5/99 (cf. Fls. 139, 12/05/99, Quarta: …O AP são 19 horas e ainda não chegou da consulta, estamos desorientados, já telefonámos para todo o lado e não está em lado nenhum, vamos aguardar mais um bocado. …Se ele não vier eu amanhã venho mais cedo e faço um ofício ao director… …Vou à Polícia dar parte do desaparecimento do AP e depois continuamos a aguardar… AP apareceu por volta da meia noite e meia. Vinha chamar o IIY e o MD interveio a tentar trazê-lo para dentro. Disse ao IIY para vir porque tinha um carro à sua espera. Como o IIY não foi e estava a ser pressionado para ficar, o AP fugiu e ninguém mais o viu. …Antes disso diz o MD, o AP telefonou para cá a dizer que estava no aeroporto, eram 11.30h; (…) Fls. 136, 13/5/99, Quinta: …telefonei para Dr BL marcar consulta do AV… Estive também a falar sobre o AP e ele mostrou-se muito preocupado, pois tem a certeza que ele foi para o irmão… Novidades: às 10.55 a avó do AP telefonou a dizer que estava lá em casa. Chegou sozinho ás 2.30h e foi ao aeroporto à procura do irmão, mas este já não trabalha lá. Depois foi para casa da avó e passou por aqui… O AP chegou ao lar eram 14.30h…; do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99). Após esta fuga em 12/5/99, percebe-se pelas anotações de fls. 149, 151, 172, 188, 201 (do Apenso W-11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99) o esforço que foi feito até meados de Setembro desse ano, quer pela família do AP, quer pela AX, para manter os contactos do AP com a família, indo a casa dos Avós, da Tia EA, ver as irmãs e a mãe. Mas resulta também das anotações dos livros de registo de ocorrências do Lar que após o reinício do ano escolar 99/00 – e pela anotação de fls. 213, do Apenso W -11, Livro 1 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 08/97 a 20/09/99, resulta que AP regressou para o lar, após o período de férias, em 13/9/99 -, até 24/10/99 não há registo de AP ter ido a casa da Tia ou outros familiares. E, quanto a “fugas”, apenas em 18/10/99 há registo de AP ter fugido, embora tenha regressado nesse mesmo dia (cfr. Fls. 21, “18/10/99, 2ª feira... AP encontra-se de castigo...O AP fugiu para casa da D. KKM, mas está tudo resolvido, chegou eram 19.45h... no entanto continua de faxina a fazer tudo o que puder...”, do Apenso W-11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) No dia 24/10/99 há o registo de ter ido almoçar a casa da Tia EA (cfr. Fls. 27, do Apenso W -11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00, sendo que a fls. 25, registo datado de 22/10/99, Sexta feira, consta: ... o AP telefonou para casa a ver se podia ir de fim de semana e padrinho respondeu que a casa dele era aqui... ficam no lar ... AP...), havendo depois registos de ter ido a casa da Tia EA em 29/10/99, 19/11/99, 28/11/99 (aqui depreende-se pela redacção da anotação), 21/12/99, 5/02/00, de ter ido almoçar com a mãe em 20/02/00, de ter ido a casa (da irmã) 25/00/00 e para casa da Tia EA em 25/03/00 (cf. Fls. 33, 50, 62, 81e 82, 127, 144, 150 e 152, 186 do Apenso W-11, Livro 2 - Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). No Relatório da Equipa Educativa do lar FC de 30/03/00, é relatado que AP ausentou-se do lar às 14 horas do dia 29/03/00, apesar de estar proibido de sair do lar e suspenso das actividades lectivas (cf. Fls. 820, Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX) Esta informação é complementada com a participação policial de fls. 36, do Apenso DA (Apenso DA - Processo individual de AP na AX), datada de 29/3/00, em que à 01.40h AP está em (…) e contacta a entidade policial, pois fora à procura da irmã KKN e esta não o recebeu. O ano de 2000 foi, na conclusão deste Tribunal, o ano do descontrolo total do jovem. O que, aliás, vai no sentido do que acima foi apreendido e concluído pelo Tribunal, quando ao percurso escolar, crescente em sentido negativo, de AP. Uma referência. O Tribunal tem estado a convocar documentos, os contribuíram para a sua convicção quanto aos factos que deu como provados ou não provados. São documentos que para o Tribunal e tal como temos referido noutras situações, afiguraram-se credíveis quanto ao seu conteúdo, isto é, não houve qualquer dúvida ou indício de que tivessem sido fabricados para distorcer a realidade dos factos que atestam ou que referem, foram sujeitos ao exercício do contraditório pelos Sujeitos Processuais, não tendo sido posta em causa durante a audiência de julgamento a fidedignidade da forma como o documento foi produzido, que os documentos não correspondam ao acto ou acção que configuram e que não correspondam a documento emitido por quem e pela circunstância que o documento refere. Tendo sido, também, sujeitos ao contraditório do Julgamento." (fim de transcrição) E mais adiante, quando o acórdão relata como o assistente AP depôs relativamente aos factos por si vivenciados nas suas deslocações à casa de (…), pode ler-se: "Nesta altura o seu discurso não era “corrido”, da forma que fora anteriormente e aqui há que fazer um parêntesis e dizer o seguinte. (1.1) O Tribunal começou por tratar com alguma reserva a emoção que o assistente aparentou, naquela situação em que tinha começado a chorar e na sequência da qual o Tribunal interrompera a audiência. Um choro pode ser simulado e AP, como já chamamos a atenção, ao começar a ser ouvido era uma pessoa que deixava transparecer algum apelo à atenção e também uma certa vitimização, de que são expressão o já referido quanto ao seu “sonho de crescer junto de um pai”, as “justificações” que começou por apresentar para as suas fugas. Este apelo à atenção e à necessidade, natural, de captar os olhares dos outros, poderia levar a alguma encenação de teatralidade e na altura em que começou a chorar a sua expressão facial, imediatamente anterior, não deixava prever para o Tribunal aquele choro. No entanto, reiniciadas as suas declarações o seu discurso começou a ser menos “corrido”, a sua expressão facial foi diferente da anterior, mais fechada, começando a deixar transparecer um ar apreensivo e mais sério que o Tribunal anotou no momento. Se, inicialmente, AP se apresentou perante o tribunal com uma expressão e uma atitude que o Tribunal sentiu demasiado “à-vontade” para quem iria e começou a relatar factos de violação da sua pessoa e intimidade – percebia-se que se sentia ansioso mas, ao mesmo tempo, o Tribunal denotou alguma gratificação por estar ali a ser o ponto de interesse de todos -, após esta quebra - em que o tribunal, como dissemos, pusera inicialmente alguma reserva quanto ao grau de emoção que efectivamente estava por detrás de tal choro -, tivemos a percepção de um semblante diferente, de um discurso com uma ressonância diferente, de uma atitude global com emotividade que não chegara até aí ao Tribunal. E este registo ressentiu-se na forma como falou, com um relato confuso e por vezes contraditório quanto a sequências ou actos, como o Tribunal irá analisar, mas não tendo o Tribunal a sensação de estar a ouvir um relato decorado ou simulado (como iremos fundamentando)."(fim de transcrição) De tudo o supra ex(...), e que não é transcrição integral, e do que mais adiante se dirá, verifica-se que o Tribunal a quo escalpelizou todo o percurso de vida, então ainda curta, do assistente AP, para compreender perante quem se estava, à luz de tentar entender, para além da verosimilhança, da credibilidade das suas declarações, que, naqueles e noutros passos, detalhadamente analisa, concluindo, e bem, que no caso que ora nos ocupa - o abuso sexual de que foi objecto por parte do recorrente C -, pese embora alguns lapsos temporais (a sua falta de noção do tempo, em termos de memória, é reconhecida) e circunstanciais, no que é essencial o seu depoimento em julgamento, a partir da segunda sessão em que foi ouvido - aquela em que começou a falar daquele concreto abuso -, afigura-se verdadeiro e consentâneo com a realidade dos factos praticados. E recorde-se que o assistente AP foi ouvido em audiência de julgamento durante dezassete sessões, a saber: 20, 24, 27, 29 e 30 de Junho, 4, 6, 7, 13, 14, 18, 20, 22 e 25 de Julho e 25 de Novembro de 2005, 9 de Fevereiro de 2006 e 17 de Julho de 2008. Ainda para descredibilizar o declarado pelo assistente AP, refere o recorrente C que aquele "negou, na sessão da audiência de julgamento de 25 de Julho de 2005 (…), ter tido relações de natureza homossexual depois dos abusos sofridos no âmbito deste processo, que teriam terminado, no máximo, antes de sair da AX – em Abril de 2000 – com a última ida a (…). Ora, tal não se compatibiliza com a afirmação do Senhor Perito do INML, no seu relatório, ao fazer constar que o Assistente “apresenta sinais a nível do ânus compatíveis com a prática repetida de coito anal” (cfr. fls. 7600 a 7610 dos autos). Efectivamente, face aos esclarecimentos tomados ao Dr. BR na sessão da audiência de julgamento de 28 de Setembro de 2006 (…), os sinais observados no ânus do Assistente foram provavelmente provocados por relações anais ocorridas menos de seis meses antes da realização da perícia, efectuada em 31 de Março de 2003, ou em período aproximado desse." (vd. conclusões de recurso 92.ª a 101.ª e 194.ª). A este respeito dir-se-á que saber se o assistente AP teve, posteriormente aos factos em apreço nestes autos, outras relações de natureza homossexual, incluindo sexo anal, é, com o devido respeito, perfeitamente irrelevante para o que ora interessa apreciar e, tendo estas porventura ocorrido, se as nega, não se vê o que daí se possa retirar, para além de que pretende esconder esses comportamentos da sua esfera íntima, sem que dessa circunstância se possa de per se retirar que é um mentiroso nato, compulsivo e reiterado, por via da falha narcísica e da personalidade borderline assinaladas pelos peritos que o recorrente refere, os Drs. BR e CM, respectivamente. Se porventura não falou verdade sobre aspectos da sua vida privada ulterior, não se pode concluir que, sobre os factos da pronúncia destes autos, não tenha de(...) com verdade quanto aos abusos sexuais anteriormente contra si praticados pelo recorrente C. Foi isso mesmo que o acórdão amplamente considerou. O recorrente alude a "alterações, que configuraram um verdadeiro reescrever da pronúncia" especificando apenas a relativa à "não substancial dos factos relativos ao crime alegadamente perpetrado pelo Recorrente nas caves da (...) sobre o Assistente AP, consistindo a alteração na passagem da referência temporal" e às "várias vicissitudes" que tal referência temporal foi sofrendo ao longo dos autos, acrescentando não entender até hoje "o porquê de tal alteração temporal, como também não compreende que a única prova que poderia ter presidido a tal alteração, i.e., as declarações do Assistente, tenham sido totalmente desconsideradas na datação dos alegados factos." (vd., entre outras, as conclusões de recurso 104.ª a 111.ª, 149.ª a 151.ª e 156.ª). Contudo, não lhe assiste razão, pois o Tribunal a quo fundamentou tal alteração, nos seguintes termos, que, do acórdão revidendo, se passam a transcrever, os quais, não nos merecem reparo e sustentam à saciedade um padrão de comportamento de veracidade quanto aos factos relatados por este ofendido e respectiva sequência cronológica: "AP revelou ter problemas com a localização no tempo e no espaço, de factos e acontecimentos que narrou ter vivido. Demonstrou, por vezes, insegurança, dúvida e mesmo contradição quanto à data, ou período da sua vida, em que ocorreram factos que relatou. Vamos ver, então, o que para o tribunal foi perceptível da memória e da noção de tempo do assistente AP e o que o Tribunal concluiu quanto à existência ou inexistência de mentira. E começamos por dizer que nesta avaliação houve uma circunstância que notámos quanto ao que é a noção de “tempo” deste assistentes e que nos fez interrogar: se era tudo uma invenção ou se, não sendo tudo uma invenção, era-o no entanto, o nome das pessoas a quem AP imputava abusos (como alguns arguidos defendem), porque é que em relação a aspectos que seriam fáceis de memorizar ou em que pareceria ser fácil ter a noção do tempo, por serem coisas da sua comprovada vivência, AP demonstra que também não tem noção do tempo?" (…) "Ainda nesta instância (na AJ de 4/7/05) e no sentido de ilustrarmos a dinâmica ou a estrutura do que é a memória ou a noção de AP em relação ao tempo e aos factos ocorridos na sua vida, recordava-se que em relação ao acompanhamento (de pedopsiquiatria) que teve, enquanto na AX, primeiro foi “… acompanhado por uma Senhora, no HHB, em (…), onde vim depois a ser acompanhado pelo Dr BL…”. E, como vimos nos elementos dos autos, esta sequência está correcta. No relatório de 4/03/97 (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX), AP tem 12 anos de idade e está a frequentar 4º ano, do 1º Ciclo do Ens. Básico, Col. DT. A Equipa Técnica do internato faz um relatório com vista à continuação do apoio pedopsiquiátrico até ao fim do ano lectivo em curso, dizendo que AP começou a ter consulta de Pedopsiquiatria em 22/02/94 no Hospital IIU ((...) da Juventude a funcionar no HHB), a Pedopsiquitra era a sra. Dra. IIV, a qual foi até Maio de 1996, sendo que a equipa do internato “…diligenciou pela continuação do acompanhamento do jovem nesta área…, este retomou as (...) em 20/02/97, com o Dr. BL, periodicidade de uma vez por semana...” (cfr. Fls. 804 e 805, 807 a 808, do Apenso Z-15, 2º Volume - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX). No entanto, quando a seguir lhe são feitas perguntas quanto à localização no tempo do “acompanhamento” ou sua contemporaneidade com outros factos, não conseguiu dizer ao Tribunal quando começou o acompanhamento pelo Dr. BL, quantas sessões teve, nem mesmo se quando teve as sessões já tinha sido sujeito a actos de abuso sexual. Por exemplo, quanto à data da entrada na AX. Começa por dizer que entrou em 1991. Perguntado com que idade e a pergunta foi repetida, é seguro a responder “7 anos”. E perguntado pelo tribunal porque é que dizia sete anos, se tinha estado a fazer alguma conta, esclareceu com (para o Tribunal) naturalidade: “…não, eu já há muito tempo que fiz uma conta para saber quanto tempo é que eu estive na AX. E fiz essas contas e deu que eu entrei em 1991…” (cfr., também, declarações da AJ 4/07/05, em que diz “ … eu entrei para a AX com sete anos e como faço anos no dia um de Outubro…eu não sei em que mês é que eu entrei, mas sei que dias depois…ou meses depois, foi a minha festa de aniversário, onde fiz os meus oito anos…”. É uma das situações em que em relação ao “facto” ter “entrado com 7 anos” na AX está seguro, mas em relação a datas não. Diz 1991 porque fez contas…e fez mal as contas, porque se há coisa que AP não era bom era em contas, como se pode ver pelos seus elementos escolares (e que acima referimos). AP tem noção dos factos que ocorreram na sua vida, não tem noção do tempo em que ocorreram os factos na sua vida." (…) "Foi percebido pelo Tribunal uma dificuldade real de AP conseguir localizar no tempo quantas vezes e com que distância “esteve” com o arguido A, para a prática de actos de abuso de natureza sexual. No entanto, para o caso concreto (ponto 2.2.) do Despacho de Pronuncia, apenas está imputada a prática de um crime ao arguido, pelo que, para este efeito, fica prejudicada a necessidade de análise crítica complementar (no entanto e face também à admissão que o arguido fez destes factos, acrescentamos que por tudo o que estivemos a dizer, o Tribunal não ter valorado no seu sentido literal a resposta que o AP deu ao MºPº, na audiência de julgamento de 29/6/05, que o “primeiro abuso” do arguido A foram "… julgo ter sido semanas depois ter entrado na AX", porque como vimos acima, a forma como reconduz o tempo leva a ter que recorrer a elementos, para perceber, dentro do possível, o sentido possível e plausível do que diz). (2) Por o considerarmos relevante, vamos referir, neste momento, um dado e facto que o assistente AP mencionou ao Tribunal (na A.J. de 29/6/05), associando tal dado quer à sua entrada na AX, quer aos abusos ocorridos com o arguido A. AP fez referência à existência de uma pista de skate, associando a existência dessa pista a “pouco tempo” após a sua entrada para a AX. A menção desta declaração é relevante não tanto para a fundamentação do tempo em que o Tribunal deu como provado terem ocorridos os abusos praticados pelo arguido A – e, neste momento, o referido no ponto 2.2, do despacho de pronúncia - mas porque ilustra e por isso preenche, o padrão da memória de AP quanto ao “tempo” - ou seja, quanto à falta de noção do tempo de AP - e que acima referimos como tendo emergido, ao longo do seu depoimento, de forma uniforme em situações diversas. O que, conjugando esta uniformidade de padrão, com a diversidade das situações em que se verificou, revelou-se um padrão globalmente coerente e correspondendo a uma reacção genuína. O Tribunal chama a atenção que estamos numa situação em que o arguido A reconheceu a prática dos factos - embora com discrepância, em relação ao que disse o assistente, quanto ao tempo e número de vezes em que os actos correram; dizendo, quanto ao tempo, o arguido A que AP teria 15/16 anos e AP que foi “pouco tempo” após a sua entrada na AX -, não se pondo, portanto, uma hipotética situação de “invenção” de abuso e/ou de falsa imputação da identidade do abusador. Foi, por isso, relevante encontrar também este padrão numa situação com estes pressu(...)s, uma vez que tal uniformidade de padrão, na diversidade de situações, pesou na motivação do Tribunal para concluir pela credibilidade e pela veracidade das declarações prestadas por AP noutras situações. (…) Temos visto, objectivamente, que AP não tem qualquer noção “ do tempo”. Mas já quanto à sua noção de sequência de factos apresenta coerência." (…) "(Actos na (...) da AX com o arguido C, ponto 4.1.1. do Despacho de pronuncia): Para localizar no tempo a ocorrência destes factos, foi relevante a análise do modo como o assistente AP falou destes factos em audiência de julgamento, encadeados com os demais. dai a repetição que o Tribunal, em alguma medida, vai ter que fazer de algumas passagens já ditas. Na audiência de julgamento de 24/06/05, AP falou de factos passados no (...) do arguido K e de vários factos passados numa (...) que disse ser do arguido K. Na dinâmica deste relato e após ter-se referido aos mesmos, o Tribunal pediu-lhe para localizar se um episódio que relatou - em que disse ter ido "a casa" do arguido K levar o assistente AT e ter voltado para trás -, se passou antes ou depois dos factos de (…), a que o assistentes respondeu “ …foram antes…”. Perguntado se tudo o que tinha relatado foi “antes de (…)”, o assistente respondeu “…sim, sim, foram antes…” e começa, de seguida, a relatar uns factos relativos ao arguido C, passados consigo nas caves da (...) da AX e que não tinha relatado no dia 20/06/05, dia em que começou a prestar declarações. E começa este relato, notamos, na sequência do esclarecimento que acabara de dar quanto ao tempo em que ocorreram os factos “do (...)” e da “casa” do arguido K e com tal arguido. Na sua narração diz - na audiência de julgamento de 24/06/05, quanto à localização no tempo dos factos na “(...)” -, que após ter levado AT “a casa” do arguido K “…entretanto voltei para o (...)…fiz a minha vida normal, onde mais, um pouco mais tarde, o Sr. A me fez outra…fez-me outra vez uma abordagem, onde como eu sempre…eu em pequenino ia para a (...), pois o Sr. (...) BQ, uma pessoa de quem eu tenho muita admiração, nunca me tratou mal, sempre com o devido respeito, como eu tratava com o devido respeito…e então andava sempre ali pela (...). Entretanto, quando eu fui abordado pelo Sr. A, foi o Sr. A abordou-me chegando-se ao pé de mim e disse “Olha, vai à (...) e vai ao gabinete do Sr. C”… “tá bom, Sr. A”… dirigi-me a esse gabinete que quem entra na (...), do seu lado direito tem um balcãozito da telefonista e tem uma secretaria….o gabinete ficava deste lado (…) fui, bati à porta, cumprimentei o Sr. C dizendo um boa-tarde e dizendo que o Sr. A me tinha pedido para lá ir… ele “ah, sim, tá bem”. (…)"Numa primeira análise destas declarações, os factos que o Assistente AP disse terem-se passado com o arguido C nas caves da (...), parece que passaram-se “ depois” de todos os factos no (...) e na “casa” do arguido K, mas em data anterior aos “factos de (…)” (sendo no mesmo sentido as suas declarações aquando da instância da defesa do arguido C, na AJ de 7/07/05). Mas na audiência de julgamento de 29/06/05 (na sequência de ter prestado esclarecimentos a pedidos do Ministério Público, quanto à data dos actos de (…)), diz que quanto a estes actos na cave da (...) – perguntado se ocorreram antes ou já depois de ter começado a ir a (…) - disse “ … não me recordo, mas… julgo que tenha sido antes de ir para (…)…sei que foi a mando do sr. A…”. E quando perguntado porque é que julgava que tinha sido antes de ter começado a ir a (…), dá a seguinte resposta “ …como eu já nomeei a este Tribunal, comecei por ser abusado pelo sr. A. Após os abusos dele…julgo que pelo meio da…dos entervalos da primeira, da segunda para a terceira…julgo que tenha sido aí que o Sr. A me mandou ir ter com o Sr. C ao seu (...), ó gabinete, na (...)…” (tendo esclarecido, a pedido do Ministério Público, que quando se estava a referir da “segunda para a terceira” era dos abusos do arguido A). Esta descrição da dinâmica que AP faz – começa por ser abusado pelo arguido A e depois é que este o manda ir ter com o arguido C – tem consistência face ao que resulta, para o tribunal, da avaliação global da actuação do arguido A: primeiro o jovem é abusado por si e depois “leva-o” para outras situações. AP localiza, assim, estes actos já após o inicio de abusos do arguido A, mas o refeitório que existia no edifico da (...) ainda não estava “cá em baixo”, na cave e não deu por haver obras. Do depoimento de várias testemunhas ouvidas foi difícil encontrar alguém que tivesse dito ao Tribunal ter uma noção precisa e segura da altura em que o refeitório passou para a cave e começou a funcionar nesse local. A testemunha NY localizou em 2000 ou 2001, não tendo precisão. A testemunha JJB, que trabalhou no edifico da (...), disse que lembrava-se das obras na cave, em Junho 1999 andavam com obras na cave e ainda “faltavam obras”. A testemunha JR disse que começou a explorar o refeitório no fim de 1999 início de 2000, tendo precisado num segundo momento do seu depoimento que quando voltou de férias, “em 2 de Agosto” (e aqui, aparentou dizer que então teria que ser 1999 e não 2000, como dissera anteriormente), foi já fazer a exploração do refeitório. A testemunha EH (mestre de arquitectura, o qual disse ao Tribunal ter sido docente na AX de 1976 a 2002), disse ao Tribunal que exerceu funções no (...) EY (entre 1976/1989), tendo demonstrado ter também conhecimento directo do espaço físico onde se situa a (...), no CZ, por ter estado ligado ao departamento de obras/arquitectura da instituição (com um departamento situado na (...)), sendo que, pelo exercício das suas funções, todas as semanas ia aos vários espaços ((...), CZ, Instituto EX, FZ, EY) da instituição . Falou ao Tribunal sobre as obras que foram feitas no refeitório da (...), esclarecendo que havia um refeitório no primeiro andar, o qual passou para as caves em data que não pôde precisar. A ideia que teve é que as obras duraram 6 meses a um ano, iniciavam-se às 8h da manhã e terminavam às 17horas e pensa que foram em finais de 1998 início de 1999. Ora quanto a este facto, resulta do documento dos autos referente a tal obra, que o local foi entregue “para inicio da obra” em 22 de Julho de 1999, estando previsto terminar a 20/10/99, mas estando o auto de recepção provisória datado de 12/09/01.” (cfr. doc. fls. 50.764). Não é, de acordo com as regras da experiência comum, estando em causa a construção de um local, de raiz, para refeitório - pois do depoimento das testemunhas resultou que na cave não havia refeitório, o local foi adaptado para tal fim -, que a obra tenha levado só 40 dias, para estar aberto em 2 de Setembro de 99, como disse a testemunha JR (como vimos o local foi entregue em 22/07/99). Antecipando a conclusão da obra, pois como vimos a previsão da conclusão era para 20/10/99. Aliás, o auto de recepção (provisório) datado de 12/09/01, afasta essa possibilidade para o Tribunal. A testemunha JR estava equivocada, a sua gestão deve ter sido em Setembro de 2000. Como vimos AP saiu em Março/Abril 2000, da AX e disse que não deu por haver obras ali no refeitório. Mas disse que havia obras por todo o lado na AX e havia “sempre”. E de facto houve obras no lar onde estava em 1998 (ver Apenso W11, livro 1, anotação de fls. 364, de 22/4/98). A questão do refeitório e a ressonância ou o que emerge do depoimento de AP, quanto a factos ou circunstâncias que são exteriores ao abuso, tem relevância para o Tribunal. Porque tendo tais descrições (dos factos exteriores) coerência intrínseca dentro da dinâmica que AP descreve, criaram no Tribunal a convicção de que esses factos estão certos. E criam no Tribunal a convicção da plausibilidade de estarem certos como referências dos actos de abuso descritos. Assim temos que quanto à existência de um refeitório na AX, na audiência de julgamento de 7/7/05 AP demonstrou ter noção da existência de dois refeitório: durante o tempo em que foi aluno na AX, o refeitório era no 1º andar. Sabendo que, actualmente, o refeitório é na cave. Não se recordou se viu obras na cave da (...), mas acrescentou que soube ter havido obras na (...) “… mas não sei se era pó refeitório…porque ali foram feitas muitas obras…e eu nunca perguntei o que era…não era do meu interesse… mas sei que havia obras…”. Disse mesmo que havia obras por todo o lado. Pelo que esta associação que fez da altura dos factos do abuso a “obras por todo o lado”, mas não na cave da (...), levou o Tribunal a localizar os actos em data indeterminada de meados de 97 – pois abusos de A já tinham começado -, a Junho de 1999 (sendo que em 1998 havia obras por todo o lado, ver o registo do livro de ocorrências que acima referimos, em que em Abril 1998 há obras no lar e as do refeitório ainda não tinham começado, as quais começaram em Julho de 1999; cfr. Fls. 50.762 a 50.765: Documentos remetidos pela AX, referentes à abertura de processo para execução de refeitório na cave da (...), datado de 31/03/99; comunicação no processo de execução do novo refeitório, datada de 23/06/99; auto de consignação para inicio imediato dos trabalhos, datado de 22/07/99; e auto de recepção provisória datado de 12/09/01)." (fim de transcrição). Prossegue o recorrente com a análise do depoimento da testemunha BP na parte em que teria referido "que o Assistente AP lhe contou que vira o Recorrente a ter relações sexuais com o colega AT, que eles conhecem por “(…)”, na arrecadação da cave da (...)", bem como teria aludido a que este assistente lhe "passou a relatar os abusos sobre si próprio por parte dos outros arguidos e de DU (do processo de (…)), mas não se referindo a qualquer abuso por parte do ora Recorrente." sem compreender "por que razão o Assistente AP, que insistia em contar os pormenores à depoente e a quem relatou o alegado abuso do Recorrente sobre o também aqui Assistente AT, terá omitido no relato qualquer alusão ao abuso de que diz ter sido vítima por parte do Recorrente.", bem como na parte do seu depoimento relativa aos contornos que rodearam a expulsão do AP da AX (vd., entre outras, conclusões de recurso 112.ª a 123.ª, 203.ª e 205.ª). A este propósito dir-se-á que a testemunha BP, quando depôs - desempenhava as funções de (...)a na AX, sendo ouvida na qualidade de legal representante da assistente AX -, segundo o próprio Colectivo de primeira instância, nas suas declarações em julgamento, por regra, "não revelou conhecimento directo dos factos, tendo o seu contributo sido relevante para o esclarecimento do Tribunal quanto a aspectos circunstanciais do funcionamento da AX" (cf. acórdão revidendo a pág. 527), acrescentando noutro passo: "E aqui o Tribunal refere, embora de forma meramente incidental, a desvalorização que fez das declarações da Sra. BP, quanto à fidedignidade de que o que reproduz, quanto a circunstâncias que rodearam os actos, corresponde exactamente aos relatos que lhe foram feitos por AP, pelo seguinte. A Sra. BP disse ao Tribunal que ouviu os jovens da AX, a sua secretária, a Sra. Dra. BBB retirava notas, posteriormente passava-as para um texto que entregava à declarante. Esta cadeia que se estabelece na comunicação, a diversidade entre quem anotou e escreveu e quem por sua vez o reproduz frente ao Tribunal, potencia a existência de lapso, de diferente percepção entre o que foi ouvido e depois escrito." (cfr. acórdão revidendo a pág. 1046). Ou seja, também aqui, face ao supra ex(...), não assiste razão ao recorrente. O recorrente C explora em seguida detalhes das declarações do assistente AP, relativas às instalações da (...) da AX e da cave em que este terá sido abusado por aquele, que em seu entender também descredibilizam a globalidade do seu depoimento e anteriores declarações. Para tanto, alude ao facto de que quando o menor entrou na sala, na situação em que afirmou aí ter anteriormente encontrado o referido recorrente com o menor AT, por levar uma caixa nas mãos (questionando inclusive que sendo esta com material informático - ecrãs e torres de computadores -, mas a nosso ver sem razão, como poderia fazê-lo o jovem, com a compleição física e idade do AP à época), ter empurrado a porta com o pé, quando esta abriria de dentro para fora e não inversamente. Questiona também o facto do menor referir ter-se deparado, nessa mesma ocasião, com o colega a praticar sexo oral ao recorrente, quando, em sede de processo disciplinar, dissera que se havia tratado de masturbação mútua. Estranha, ainda, o facto do assistente AT ter apenas entrado para a AX como aluno interno em 28 de Outubro de 1999, data já não compreendida no período pelo qual o recorrente vem condenado por abuso ao assistente AP, sendo que este último situa o seu abuso poucos dias depois daquele a que diz ter visto ser sujeito o AT. Mais estranha, ter o assistente AP aludido ao facto dos vidros das portas da entrada daquela (...) serem espelhados, quando o espelhamento destes ocorreu ulteriormente. Finalmente, menciona ainda o facto do menor referir que a luz da sala da cave estava acesa no dia do seu próprio abuso e julgar que a sala não tinha janelas, quando as testemunhas que utilizavam aquela sala referiram que esta tem e tinha (tal como a sua porta) janelas bem grandes, que davam para as traseiras do lar FE (vd., entre outras, as conclusões de recurso 125.ª a 130.ª, 158.ª a 160.ª, 171.ª a 180.ª, 207.ª e 209.ª). Todavia, também aqui não lhe assiste razão, pois o Tribunal a quo, no acórdão recorrido, fundamentou devida e exaustivamente, nos seguintes termos, que se passam a transcrever, aquelas declarações e a factualidade que delas e dos demais meios de prova, retirou: "Passando ao conhecimento do assistente AP com os demais assistente, entre os quais AT, (…) vejamos: (1) Em audiência de Julgamento (cfr. A.J. 4/07/05, mas já o dissera na A.J. 29/06/05), o assistente AP declarou que conheceu AT quando este entrou no lar FC, onde o Assistente (AP) vivia. E diz que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Perguntado pelo Tribunal qual a memória que tinha quanto ao tempo que decorreu entre a entrada do assistente na AX e a do AT, respondeu ao Tribunal “…eu entrei e julgo que semanas depois, ou dias depois, entrou o AT…”. E, quanto à sua saída, disse (AJ 4/07/05) a pedido de esclarecimento que é feito, que saiu da AX em 2000, mas não se recordando se foi no decurso do ano lectivo 99. Mas olhando para os documentos dos autos, entre os quais os que temos estado a citar relativamente ao percurso do AP na instituição, AP entrou na AX em Agosto de 1992 e AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99, conforme resulta de fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2 ( Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00). Estamos a falar, no que diz respeito à distância que ocorreu entre a entrada de um e a entrada de entrada de outro, de um período de tempo de sete anos e a memória que AP consegue reproduzir em relação a aspecto, relativamente ao qual não tinha qualquer necessidade de mentir ou inventar, é que AT entrou “dias” ou “semanas” depois de si. Mas esclareceu, porque foi-lhe perguntado, quanto a uma questão que já não era uma circunstância de “tempo”, mas uma questão relacionada com acontecimentos na sua vida, que “\achava” que quando AT entrou para o FC o assistente já estava a estudar no CZ. O que correspondia, de facto à realidade, pois como vimos durante a audiência AP esteve a estudar no (...) DT do anos lectivo 92/93 até ao ano lectivo 96/97 e foi para CZ no ano lectivo 97/98 (e cfr., quanto a elementos documentais, Apenso Z-15, 2º Volume, fls. 795/6 - documentos constantes do processo psicossocial de AP na AX - e fls. 2, 11 a 12, 13 a 15, 17 a 18, 23 a 25, 26 a 31, 85 a 86, do Apenso DA - Processo individual de AP na AX). E, quanto ao tempo que esteve como AT na AX, a sua memória foi que conviveu com AT durante “muitos anos”, “… não sei quantos, mas sei que foram alguns…”. Mas como dissemos, AT entrou na AX como interno, para o Lar FC, em 28/10/99 (cfr. fls. 34, do Apenso W -11, Livro 2, Cópia do Livro de Registo de Ocorrências do Lar FC, CZ, de 30/09/99 a 22/12/00) e cerca de seis meses depois AP está a sair da AX." (…) "A defesa do arguido C apontou, como elemento descredibilizante das declarações do assistente, a referência que a Defesa diz que o assistente começou por fazer, quando disse que (na altura em que ocorreram os factos) os vidros da entrada da (...) eram “espelhados”, e que a versão foi alterada quando, pelos documentos dos autos, resultava que nessa altura “o espelhado não estava lá” (cfr. Fls. 50.759 a 50.761: Documentos remetidos pela AX, referentes á colocação de película anti-reflectora nos vidros do R/C da (...), com auto de recepção datado de 28/05/02). No entanto e ouvindo as declarações do assistente, não é essa a avaliação do Tribunal. Na audiência de julgamento de 7/07/2005 - quando o assistente AP estava a relatar uma situação na (...) -, pela Defesa do arguido C foi pedido ao assistente para dizer como é que se tinha passado esse episódio e AP diz que entrou na (...) “… pela porta principal, espelhada, que se encontrava aberta…”, e onde me dirigi ao gabinete deste senhor, referindo-se ao arguido C. A Defesa do arguido refere, nessa altura, que o assistente tinha dito por duas vezes que as portas eram espelhadas, se o confirmava, o que AP disse que sim. O Tribunal perguntou-lhe quando dizia “portas espelhadas” o que é que queria dizer e AP respondeu “…são portas de vidro…”. A Defesa, em momento posterior, voltou a pedir a AP para esclarecer: “Dr. JJQ – …Srª Drª, só relativamente, um pormenor. Relativamente às portas que o assistente usou a expressão “portas espelhadas” e relativamente às portas que o assistente usou a expressão “portas espelhadas”, e depois disse que eram de vidro. O que eu gostava de esclarecer é se quando ele diz espelhadas, isso significa que é aquele vidro que quando se está de fora, se vê a imagem reflectida, como num espelho? Portanto, que só permitem a visão do lado de dentro para fora; mas do lado de fora para dentro, não permitem a visão. Portanto, reflectem a imagem de quem está à frente da porta? Juíza Presidente – Compreendeu a pergunta, Sr. AP? AP – Compreendi sim, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Pode responder. AP – Estava-me a referir a portas de vidro. Porque... Juíza Presidente – Portas que se via de um lado para o outro? AP – Sim. Ahn... Até um vidro que existe na lateral, que dava acesso, dava para ver as escadas. Esse vidro, hoje em dia também é espelhado, o que na altura não era. Juíza Presidente – Portanto, o que está a dizer é, na altura era um vidro que se via, através desse vidro da porta, via-se para o outro lado. É isso? AP – Exacto, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Obrigada.” Para o Tribunal resultou claro que quando AP usou inicialmente a expressão “portas espelhadas”, estava-se a referir a portas de vidro “normal”, que se vê de dentro para fora e de fora para dentro. Até porque demonstra ter noção que, “agora”, é que as portas são de vidro diferente, pois disse que na altura o vido lateral dava para ver para as escadas e agora é que não dá (“… hoje em dia também é espelhado, o que na altura não era…”). Houve para o Tribunal, no caso concreto, uma deficiente forma de expressão por parte de AP. Tanto que na audiência de julgamento de 29/06/05, já tinha referido esta expressão em relação à descrição das carrinhas da AX, dizendo “…havia outra carrinha, não sendo uma (…), mas... julgo uma (…), não sabendo agora exemplificar a …se era (…), se não era…, também de nove lugares, espelhada. Não de caixa fechada, tipo “(…)”, mas igual à (…), com os vidros a fazer a cobertura….” (e utilizou, também, a expressão portas espelhadas numa referência à casa das (…))." (fim de transcrição) Como se vê o Tribunal a quo encontrou razoáveis e verosímeis explicações, as quais não nos merecem qualquer crítica, quer quanto ao período de tempo em que os menores AP e AT conviveram na AX, que justificam os lapsos temporais assinalados pelo recorrente, quer quanto à questão do espelhamento ou não espelhamento dos vidros das portas da entrada da (...) da AX. Quanto à questão das luzes da sala da cave, socorremo-nos a este respeito do que expenderam e bem, a AX e demais assistentes na sua resposta ao recurso inter(...) do acórdão final pelo arguido C: “Quanto a existir luz acesa ou não acesa na sala onde ocorreram os abusos do arguido C sobre o assistente AP, são factos completamente irrelevantes e nem sequer são acessórios para credibilizar ou descredibilizar quem quer que seja. É um "facto" completamente inócuo e de reduzidíssima ou mesmo nula expressão valorativa. A luz podia estar acesa, podia estar fechada e, tendo a sala luz natural directa, a “luz” vista na memória do assistente pode ser perfeitamente a oriunda da janela.” (vd. fls. 71199). O recorrente, ainda na exploração de divergências em vista da descredibilização das declarações de AP, diz estranhar que "Na sessão da audiência de julgamento de 24 de Junho de 2005 (…), o Assistente AP refere que a ida à casa das (…) foi, ao que julga, depois da ida a (…), a (…) e ao estúdio (com o Arguido H), tendo ainda ido ao (...) do Arguido K e à casa do (…), tudo antes da primeira ida a (…). Ora, não deixa de se estranhar, face a tudo o que relatara antes e à referência pormenorizada ao abuso que diz ter visto o Recorrente perpetrar sobre o Assistente AT, que o Assistente AP só neste momento do seu depoimento se tenha “lembrado” de relatar o abuso de que ele próprio teria sido vítima nas caves da (...)". (vd. as conclusões de recurso 136.ª e 137.ª) Acrescentando: "O Assistente não consegue dar uma explicação verosímil para o facto de não ter relatado o abuso de que fora vítima por parte do Recorrente nas caves da (...) senão no fim do segundo dia em que prestou declarações e após ter repetido a indicação dos locais e arguidos que haviam abusado de si; diz que o Arguido A o costumava ameaçar se falasse e que se trata de pessoas muito poderosas (sem referir porque estivera à vontade para relatar todos os outros abusos, incluindo o abuso do Recorrente sobre o Assistente AT, que diz ter visto também nas caves da (...)), mas acabando a referir que os Arguidos de quem tem mais medo são os Arguidos H e K." (vd. conclusão de recurso 143.ª). O Tribunal a quo explicou cabalmente, na fundamentação do acórdão recorrido, porque motivo o assistente foi algo relutante e tardio a falar no seu próprio abuso perpetrado pelo ora recorrente C. E fê-lo nos termos que subscrevemos e se passam a transcrever: "O assistente ainda não tinha relatado tais factos, pelo que o Tribunal perguntou-lhe porque é que não tinha dito nada sobre tais factos na sessão anterior (que fora a primeira), respondendo “…Srª Drª, e vou... falar agora o porquê de nunca ter contado a este Tribunal…porque o Sr. A, como o Sr. C, davam-se muito bem e eu sempre “manti” este …o silêncio, com medo, porque o Sr. A muitas das vezes batia-me e ameaça … e fazia-me ameaças nesse sentido em que me batia se eu dissesse alguma coisa a alguém. Entretanto, foi por isso que eu nunca “relevei” estes factos..”. Falou do que , para ele, eram os arguidos que estavam em causa “… estamos a falar de pessoas muito grandes, com várias posses…e eu sinto receio…”. De facto, apenas na segunda sessão em que prestou declarações (24 de Junho de 2005, sendo que a primeira em que as prestou foi a realizada no dia 20 de mesmo mês e ano) o assistente AP começou a falar no abuso por parte do arguido C na cave da (...), explicando que só então o fazia por medo de represálias, como se alcança do respectivo registo fonográfico (cf. CD 2 de 24.6.05 - Tracks 1 e 2). Disse, nessa ocasião: “AP – (...) “o Sr. A abordou-me chegando-se ao pé de mim e disse “Olha, vai à (...) e vai ao gabinete do Sr. C”. “Tá bom, Sr. A”. Dirigi-me a esse gabinete que quem entra na (...), do seu lado direito tem um balcãozito da telefonista e tem uma secretária. O gabinete ficava deste lado. A secretária fica junto à parede, ao terminal da parede, o gabinete do Sr. C ficava logo ali do seu lado, do lado esquerdo da secretária. Fui, bati à porta, cumprimentei o Sr. C dizendo um boa-tarde e dizendo que o Sr. A me tinha pedido para lá ir. Ele “Ah, sim, tá bem.” Pegou pela minha mão, descemos as escadas da (...) que vão dar o acesso à cave, onde descendo essas escadas entrámos numa porta em frente e onde o, o Sr. C abusou de mim, forçando. Juíza Presidente – O que é que quer dizer com isso, Sr. AP... AP – Srª Drª, chegámos lá a essa cave, o Sr. C tirou o seu pénis para fora, forçando a minha cabeça para baixo, obrigando-lhe a fazer sexo oral e mast, e acariciando-lhe o pénis até este ejacular. Juíza Presidente – Esses factos que está agora a relatar, na última vez que esteve em Tribunal não disse nada sobre esses factos. Porquê? AP – Srª Drª, e vou... falar agora o porquê de nunca ter contado a este Tribunal. Porque o Sr. A, como o Sr. C, davam-se muito bem e eu sempre “manti” este, o silêncio, com medo, porque o Sr. A muitas das vezes batia-me e ameaça, e fazia-me ameaças nesse sentido em que me batia se eu dissesse alguma coisa a alguém. Entretanto, foi por isso que eu nunca “relevei” estes factos. Juíza Presidente – Então e o que é que se passou entre segunda feira, que foi o dia que esteve aqui em Tribunal e o dia de hoje, o que é que se passou que o levou a contar hoje estes factos? AP – Srª Drª, o que se passou foi que eu na segunda-feira, eu estava um pouco nervoso e abatido, e não "tava" em condições de continuar este julgamento. O que peço imensa desculpa não ter “relevado” antes estes factos. Juíza Presidente – Não tem que pedir desculpa. só tem que declarar os factos que se passaram. E porque é que não disse ao Tribunal que não estava em condições de continuar, Sr. AP? AP – Srª Drª, e também tinha vergonha de... também relatar estes actos, pois estamos a falar de pessoas muito grandes, com várias posses... e eu sinto receio. (...) Juíza Presidente – Porque é que está a chorar? AP – Srª Drª, porque tenho medo. Juíza Presidente – Porque tem...? AP – Porque estamos a falar de pessoas muito importantes para esta sociedade, e se eles são detidos não sei o que vai ser da minha vida, Srª Drª. Juíza Presidente – Estes senhores não estão detidos. AP – Mas se forem detidos, Srª Drª, o que é que vai ser da minha vida e da da minha tia? Se eu já sofri ameaças do Sr. CY... Juíza Presidente – O senhor neste momento, nesta sala e nesta altura do processo, tem medo de alguém? AP – Tenho sim, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E tem medo de quem, Sr. AP? AP – Medo do Sr. K, por causa que sofri ameaças do Sr. CY na altura em que eu fui bombeiro e que prestava o, estava a prestar o meu serviço de saúde nos Bombeiros Voluntários (…). E onde o CY era habitual ir lavar o seu, o (…) do (...) ao KKO, que é uma bomba de lavagem de carros junto ao (…). Eu estava a vir de casa, a ir em direcção ao (…) quando o Sr. CY a(...) o (…) à minha frente e diz que era para eu não falar mais no processo, senão ia ter graves problemas. Juíza Presidente – Isso quando é que foi, Sr. AP? AP – Srª Drª, não sei recordar. Sei que ainda vivi, "tava" na casa da minha tia. Ainda não tinha ido para a tropa. Juíza Presidente – Quando é que foi para a tropa, recorda-se? AP – Julgo no, que no dia vinte de Maio. Juíza Presidente – De que ano? AP – De dois mil e quatro, se não estou em erro. Juíza Presidente – Então e para além do Sr. K, tem medo de mais alguém, neste momento? AP – O Sr. H. Juíza Presidente – Porquê? AP – Srª Drª, porque são pessoas que têm várias posses. Têm muito dinheiro e, tenho, não quer dizer que isso possa acontecer, mas tenho medo que possam contratar alguém para me... para me calar, ou fazer, tentar fazer mal à minha família. Juíza Presidente – Tem medo de mais alguém para além destas duas pessoas que já referiu? AP – Medo de mais alguém, Srª Drª? Eu tenho medo de todos os arguidos, mas mais, mais, do Sr. K porque sofri as ameaças do CY e do Sr. H (...) Juíza Presidente – Então e do Sr. C, também tem medo? AP – Tenho sim, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E porquê? AP – Srª Drª, porque é assim: o Sr. A dava-se muito bem com o Sr. C, e, tanto que eu cheguei a presenciar na (...) da AX, discussões entre os dois em que não eram discussões de tra, via-se que não eram discussões de trabalho, em que se tratava de outra coisa qualquer... Em que o Sr. A, sendo motorista, e o Sr. C o (...) (...) da AX, as coisas pareciam ter invertido e o Sr. A ser o (...) (...) e o Sr. C estar abaixo dele. Isto pela maneira de o Sr. A tratar o Sr. C. Juíza Presidente – E do outro senhor, E. Tem medo também deste senhor? AP – Sim, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E porquê? AP – Srª Drª, porque foram pessoas que nos fizeram mal... E obrigavam-nos a fazer coisas que a gente não queria. E... tanto um, tanto o Sr. A, como os restantes, podem tentar fazer qualquer coisa para nos calar. Quem diz a mim, diz aos outros meus colegas. Porque é assim: eu... infelizmente, não, eu não gosto, mas infelizmente, tem que ser, tenho que andar protegido pelo Corpo de Segurança Pessoal, pelo que elogio, desde já, o trabalho deles, são prestáveis. (...) Porque eu não tenho medo aqui dentro, porque, eu tenho medo é o que é que me pode acontecer das portas deste Tribunal para fora. Porque um dia a segurança pessoal vai acabar.” (fim de transcrição) E o assistente AP voltaria a falar nesta questão, das ameaças e medo que sentia em prestar algumas declarações em tribunal, na sessão de 22 de Julho de 2005, como se alcança do respectivo registo fonográfico (cf. CD 3 de 22.7.2005 - Tracks 1 e 2). Explicitou, nessa ocasião: “Advogado da AX – Relativamente às... às ameaças que o AP já referiu aqui em Tribunal ter sofrido por parte do CY, se não estou em erro, eu gostava que ele esclarecesse o Tribunal, se para além destas ou, existiram outras e quais? Juíza Presidente – Para além do que referiu, já referiu ao Tribunal, houve mais alguma coisa? AP - Houve sim, Srª Drª Juíza. Ahn... vou passar a descrever ao Tribunal (...) Juíza Presidente – Então descreva ao Tribunal, Sr. AP. AP – Srª Drª, eu... como já nomeei a este Tribunal, ou referenciei a este Tribunal, eu vivia numa habit, numa habitação da minha tia-avó, no Bairro (…), e onde me encontrava a passar na (...) com um amigo meu, de etnia cigana e onde deparei com uma viatura (…), cor (…), idêntica à viatura que era guiada pelo Sr. EV, pertencente ao Sr. H e onde se encontravam dois indivíduos de fatinho e óculos escuros. A matrícula era estrangeira, o qual eu não consegui tirar apontamentos. Ao passar por essa viatura, um dos indivíduos virou-se “é este!”, onde o outro, onde o motorista perguntou: “mas qual?, “o mais alto.” Que era eu. E onde eu virei-me para o meu colega, ouvindo aquilo e disse: “olha, anda mais rápido porque isto vai dar problemas”, e vira-se ele “então, anda para a minha porta que na minha porta tás seguro. Se houver alguma coisa, chamo o meu pai”. Sentei-me à porta dele e essa viatura passou e vira-se o meu colega: “olha para cima”. E quando eu olhei, tava a viatura a passar e eles a olharem muito devagarinho. Ahn... Houve uma outra situação em que eu (...) Srª Drª Juíza, gostaria de acrescentar ainda que já eu era bombeiro (...) e (...) habitava numa habitação paga pela AX, em (…) e onde fazia deslocações ao bairro, para estar com os meus amigos. E onde, entrando na Associação, que é um café do bairro, uns rapazes viraram-se “olha que os teus seguranças andam aí à tua procura.” Eu eu: “ai é? Então e em que carro é que eles andam?”, “Ah, eles tão num (…), (…).” “Não. Os meus seguranças não são.” “Ah, é que como eles and, eram assim entroncados e entraram aqui à tua procura... portanto, tem cuidado. Vê lá se não são teus seguranças, tem cuidado porque a gente não sabe quem é.” O qual, eu fiquei assustado, porque na altura em que eu fui ouvido na esquadra do (…), havia um... uns documentos em que comprovavam uma viatura idêntica, um (…), (…), com indivíduos que andavam a ameaçar as testemunhas. Mas daí não posso tirar factos porque não sei de quem é que vinham.” (fim de transcrição) Releva ainda neste contexto o que o assistente AP acrescentou na sessão de 25 de Julho de 2005. Nesse momento, como se alcança do respectivo registo fonográfico (cf. CD 1 de 25.7.2005 - Track 1), concretizou: “Dr. JJQ – Srª Drª, agora quanto ao pedido cível, a seguinte pergunta: portanto, daquela única vez que esteve, que alega ter estado com o Dr. C, não é, nas caves da (...), o que eu lhe ia perguntar é, porque motivo é que aceitou ir com o Dr. C para as caves da (...)? Quer dizer, se se sentiu coagido? Pressionado? Enfim, por que razão acedeu a este pedido? Juíza Presidente – Pode esclarecer, Sr. AP. (...) AP – Porque... tenho medo do Sr. C. Dr. JJQ – Srª Drª, mas na altura, tanto quanto me recordo, foi a primeira vez que terá estado com o Dr. C, na altura, porque é que tinha esse medo? Era só por ser (...) (...)? Era por outro motivo qualquer? Porque foi ameaçado? O A ameaçou-o? Por que motivo? Juíza Presidente – Esclareça um pouco mais, Sr. AP, se puder. AP – Srª Drª, é uma pessoa que tem um grande poder dentro da AX. Pelo qual, tenho medo, e limitei-me a respeitar.” (fim de transcrição) Está assim, devidamente explicado, a nosso ver, o porquê de apenas na segunda sessão de julgamento em que prestou declarações o assistente AP ter começado a falar no abuso por parte do arguido C na cave da (...). Aliás, as suas declarações na primeira sessão foram longas, mas quase todas centradas nas deslocações à “casa de (…)”, deixando pouco tempo para as restantes situações de abuso em que esteve envolvido ou vivenciou, a que aludiria de passagem, pelo que a estas teria de voltar nas susbsequentes sessões. Afirma, ainda, a defesa do arguido C que: "O Assistente diz ter ido ter à (...) com o Recorrente por ordem do Arguido A, relatando inclusive ter entrado no gabinete do mesmo e falado com ele – o que é substancialmente diferente do que consta da Pronúncia e do que foi dado como provado no Acórdão sob recurso (que o Recorrente o teria encontrado nas instalações da (...))" (vd. conclusão de recurso 138.ª). Acrescentando: "O Assistente diz que o Recorrente lhe deu a mão e o levou para a cave, e não que o Recorrente lhe disse para o acompanhar (ao contrário do que foi dado como provado)", bem como que: "O Assistente nega ter sido tocado pelo Recorrente no pénis, ao contrário do que vem na Pronúncia e que foi dado como provado." (vd. conclusões de recurso 140.ª e 141.ª). E, finalmente, ainda quanto a este aspecto, afirma o recorrente: "O Assistente declara também que o Recorrente nunca lhe tocou no pénis, ao contrário do que vem descrito na Pronúncia (pelo que tal facto não podia ter sido considerado provado) e diz que o Recorrente pôs as calças para baixo, o que não corresponde ao que vem descrito na Pronúncia (da qual resulta que não baixou as calças, mas sim que pôs o pénis fora das calças) e nos factos provados. (…) Diz ainda que o Recorrente lhe deu, na ocasião, cerca de quinhentos a mil escudos (ao contrário dos três mil escudos descritos na Pronúncia), quanto em sessão anterior referira não se lembrar se o Recorrente ou o Arguido A lhe haviam dado dinheiro após este abuso, muito menos a quantia em questão, pelo que tal facto não podia ter sido considerado provado." (vd. conclusões de recurso 168.ª e 170.ª). Também aqui o Tribunal a quo explicou devidamente, na fundamentação do acórdão recorrido, os motivos de assim ter decidido em sede de matéria de facto dada por provada e não provada. E fê-lo, adequada e convincentemente, no que respeita à descrição que AP faz de como chegou às instalações da (...) e ao gabinete do recorrente C e à forma como foi conduzido e abusado por este na cave. O Tribunal a quo avaliou o que o assistente AP disse em julgamento ao Colectivo, mormente quanto às eventuais razões para estar a acusar aquele arguido e ao modo como, atendendo ao nem sempre convergente depoimento ao longo das diversas sessões em que foi ouvido, relevou ou não os pequenos esquecimentos e confusões de factos instrumentais por parte deste ofendido, nos termos que se passam a transcrever (sendo "eu" AP): "quando eu fui abordado pelo Sr. A, foi o Sr. A abordou-me chegando-se ao pé de mim e disse “Olha, vai à (...) e vai ao gabinete do Sr. C”… “tá bom, Sr. A”… dirigi-me a esse gabinete que quem entra na (...), do seu lado direito tem um balcãozito da telefonista e tem uma secretaria….o gabinete ficava deste lado (…)fui, bati à porta, cumprimentei o Sr. C dizendo um boa-tarde e dizendo que o Sr. A me tinha pedido para lá ir… ele “ah, sim, tá bem”. Pegou pela minha mão, descemos as escadas da (...) que vão dar o acesso à cave, onde descendo essas escadas entrámos numa porta em frente e onde o…o Sr. C abusou de mim (…), … chegámos lá a essa cave … o Sr. C tirou o seu pénis para fora, forçando a minha cabeça para baixo, obrigando-lhe a fazer sexo oral e mast … e acariciando-lhe o pénis até este ejacular.”." (…) "Na AJ de 7/7/05, quando AP falou sobre estes factos, não se conseguiu recordar da altura do dia em que o arguido A o contactou, para ir ter com o arguido C à (...). Disse que entrou pela porta da (...) e que não viu ninguém. Foi ter ao gabinete do arguido C e este levou-o para uma sala na cave da (...). Declarou que o arguido C o obrigou a praticar sexo oral e a acariciar-lhe o pénis, mas que se recorde o arguido C não lhe mexeu. Foi a única vez que teve contacto com o arguido C. Esta é a sessão em que para o Tribunal foi manifesto o cansaço do assistente, mas sempre respondendo ao Tribunal de forma serena e a tudo o que lhe era perguntado, não se escusando a responder e esclarecer pormenor após pormenor. A ressonância deste depoimento, no que diz respeito ao acto de abuso em si, ao que aconteceu e como aconteceu, foi para o Tribunal o relato de algo vivido. A forma, expressão e tom de voz que AP usa para contar o que aconteceu, quando a defesa do arguido C pergunta, após já ter feito perguntas quanto aos actos que foram praticados naquela circunstância (“…se o Dr. C despiu alguma peça de vestuário ou não”, respondendo o Assistente “… a única coisa que ele fez foi puxar as suas calças para baixo … e retirar o seu pénis para fora…”), as respostas que foi dando quanto ao que se lembrava, por exemplo, não foi, para o Tribunal, o relato de uma situação não vivida. É certo que a linha da Defesa não afasta que as situações de abuso que AP descreve tenham sido vividas pelo então jovem, mas diz que não foram é vividas com o arguido. Mas aqui, em altura alguma houve qualquer indício pelo qual pudesses ter dúvida quanto ao motivo pelo qual o assistente estava a imputar a este arguido este abuso concreto (foi feita esta pergunta à testemunha NY e em relação a este assistente também não conhecia qualquer motivo, mas tendo apontado pessoas que não tinham boas relações ou que não gostavam do arguido). AP demonstrou conhecer os (...)es e (...)es (...)s da AX (cfr. audiência de julgamento 4/07/05), falou ao Tribunal do Dr. BQ, do Dr. FB, do Director KK (em relação ao Dr. FB foi-lhe pedida a sua descrição e AP disse, a dada altura, que ainda continuava a ser (...) (...) da AX; aqui era uma situação em que estava objectivamente confundido, o que vem dizer ao Tribunal logo no início da sessão de 6/07/05, dizendo que confundiu o “ …habitual (...) (...) da AX…”, que é o arguido C, “… pelo antigo (...) (...), Sr. FB…”). Na audiência de julgamento (audiência de julgamento de 4/07/05 e logo no início de 6/07/05), são-lhe feitas perguntas pela defesa - naturalmente na procura de indícios quanto a motivos, razões, para AP estar a acusar o arguido C -, AP presta esclarecimentos sobre uma situação em que o Dr. EJ o chamou ao seu gabinete (e estamos a falar da altura em que AP foi expulso da AX), perguntando a Defesa se se lembrava de ter dito alguma coisa ao Sr. director do (...) - estando a Defesa a referir-se, naturalmente, ao que doc. de fls. 134, do Apenso DA, em que é feito o relato do incidente de AP com o Director Dr. EJ - e AP responde que não se recordava de ter dito alguma coisa. Quanto à plausibilidade de isto significar mentira, encobrimento, temos a referir que o sr. Dr. EJ, quando perguntado sobre a mesma questão, também começou por responder que não se recordava, tendo depois a sua memória sido avivada com o documento. Ora AP não acusou nem imputou factos a qualquer outro dos Sr. (...)es ou Directores referidos. E em relação ao Dr. EJ, pessoa contra a qual poderia ter zanga e razões para “lembrar-se de acusar” - se estivesse a fazer imputações falsas -, pois foi na sequência da intervenção do Dr. EJ que foi expulso da AX. E AP não acusa o Dr. EJ (e aqui dizemos que a expulsão do AP , pelo que foi o seu percurso na AX e que acima já referimos e pelo que o Tribunal percebeu da forma de estar do Director de CZ na AX, a sua expulsão deve ter-se devido mesmo ao Dr. EJ, que disse “basta” porque não aproveitou as oportunidade e “já chega”; lembramos o depoimento da mãe adoptiva de X, XM, que disse, quando falou no internamento de X na AX, que fizesse ele o que fizesse não o punham na (...)…). Porquê? Pode-se sempre equacionar que escolheu uma pessoa e não outra, porque o seu artifício e malícia era tão elaborado, que preferiu congeminar contra uma pessoa que com ele teve menos relacionamento (ver, por exemplo, o que disse quanto ao arguido C, que “vagamente” tem uma ideia do arguido desde que entrou para a AX “…não me recordo, mas julgo que tenha sido quando entrei para a AX…salvo erro, sei que vi, eu via sempre o Sr. C, como via o sr. Dr. BQ, como via o Dr. FB…”), do que contra o Dr. EJ, pois sempre poderia ser associada a sua Acusação a vingança e, assim, a ratoeira descoberta (cfr. doc fls. 134, do Apenso DA, relato do incidente de AP com Director EJ) Mas, para ser assim, a ressonância de verdade que em aspectos já focados encontramos nas Declarações de AP, em algum momento, se a Acusação falsa e inventada, não resistia ao contraditório da instância a que foi sucessivamente sujeito. É certo que este argumento – o da ressonância de verdade que emergiu para o Tribunal -, é aquilo que resulta da imediação, que não conseguimos objectivar mais do que já fizemos. Mas é aquilo que faz com que se acredite numa pessoa e não se acredite noutra, que leva à convicção, que afasta a dúvida, para além de qualquer dúvida razoável" (fim de transcrição). Na pronúncia a situação de abuso em causa era descrita do seguinte modo: "Num dia indeterminado situado entre Outubro de 1998 e Outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, o arguido C encontrou-o nas instalações da (...) da AX, onde se situava o seu Gabinete. Valendo-se do ascendente que a sua posição lhe conferia, disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave daquele edifício que habitualmente se encontrava fechada e onde praticamente ninguém ia. Aí, o arguido C começou a acariciar o pénis do menor, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis que, entretanto, tinha (...) fora das calças. Depois, segurou a cabeça do menor, forçando-o a dobrar-se e introduziu-lhe o pénis erecto na boca, aí o tendo friccionado. De seguida, pegou na mão do menor e forçou-o a manipular-lhe o pénis até ejacular." (vd. pág. 148). Porém, face à prova produzida e com base na fundamentação supra, o Tribunal a quo viria a dar apenas por assente que: "Em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e Julho de 1999, tinha AP 13/14 anos idade, o arguido C encontrou-o nas instalações da (...) da AX, onde se situava o seu Gabinete. Valendo-se do ascendente que a sua posição lhe conferia, disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave daquele edifício que habitualmente se encontrava fechada. Aí, o arguido C começou a acariciar o pénis do menor, ao mesmo tempo que acariciava o seu próprio pénis que, entretanto, tinha (...) fora das calças. Depois, segurou a cabeça do menor, forçando-o a dobrar-se e introduziu-lhe o pénis erecto na boca, aí o tendo friccionado. De seguida, pegou na mão do menor e forçou-o a manipular-lhe o pénis." (cfr. factos provados sob os n.ºs 101.1 a 101.4.) Ou seja, o Colectivo, sem que tal nos mereça reparo, alargou em alguns meses o período temporal em que aqueles factos ocorreram (matéria que já se apreciou supra), e, consequentemente, diz que o menor teria 13/14 anos de idade e não 13 anos de idade, bem como suprimiu que a arrecadação, situada na cave do edifício onde se deu o abuso, era local "onde praticamente ninguém ia" (matéria que passou aos factos não provados sob o ponto 19.3.), suprimindo também que no final o recorrente ejaculou, o que não foi dado por provado e é irrelevante. O ter-se dado por provado no acórdão, como constava na pronúncia, que o recorrente encontrou o menor AP nas instalações da (...) - que é um dado objectivo e inquestionável face à prova produzida - em nada colide com o facto de porventura o assistente AP, como afirmou, se ter deslocado àquela (...) por ordem do arguido A e aí ter entrado no gabinete do (...)-(...) C e falado com este. Também, ter-se dado por provado no acórdão, como constava na pronúncia, que C disse ao AP para o acompanhar, levando-o até uma arrecadação, situada na cave - que igualmente é um dado objectivo e inquestionável face à prova produzida - em nada colide com o facto de porventura aquele ter pegado na mão deste quando o levou para a cave, tal como, naturalmente, tiveram de descer, o que foi referido, mas não precisava de constar da acusação, da pronúncia ou do acórdão, por ser da experiência comum, que quem vai a uma cave desce e não sobe, salvo se estiver numa sub-cave. Quanto ao facto do assistente haver negado ter sido tocado pelo recorrente no pénis, ao contrário do que vem na pronúncia e que foi dado como provado, o Tribunal a quo bem explicou nesse e noutros momentos o quão difícil que é às vítimas crianças, por pudor e vergonha, falarem nisso ou sequer admitirem-no, sem que, por tal motivo isso possa deixar de se considerar por provado, pois decorre da experiência comum que naquele tipo de abuso sexual obviamente que o agressor tem de forçosamente tocar no pénis da criança, seja para o manipular, chupar ou, no mínimo, acariciar, como terá sucedido neste caso concreto, assim satisfazendo os seus instintos libidinosos. Também se insurge o recorrente contra o facto de, tal como vinha na pronúncia, no acórdão recorrido se ter dado por provado que pôs o seu próprio pénis fora das calças quando o assistente AP terá dito em julgamento que C pôs as calças para baixo. Ora, com o devido respeito, o que importa reter foi que o recorrente pôs o seu pénis de fora, retirando-o de dentro das calças. O tê-lo (...) de fora inculca a ideia de que o fez através da braguilha, mas não exclui a outra hipótese que seria a de ter (...) o seu pénis de fora pondo as calças para baixo. Finalmente, quanto ao dinheiro que o recorrente deu na ocasião a AP, a pronúncia indicava terem sido três mil escudos (vd. pág. 148). Em audiência, aquele assistente, a este propósito, começou por não se lembrar se o recorrente lhe havia dado dinheiro após este abuso, recordando-se mais tarde que, de facto, havia recebido daquele, e na ocasião em causa, cerca de quinhentos a mil escudos. Neste contexto, o Tribunal a quo ficou com a convicção, que não nos merece reparo, de que AP, após o abuso, recebeu dinheiro do ora recorrente, mas sem que fosse possível estabelecer com precisão a exacta quantia que lhe terá sido dada, pelo que no ponto 101.5. dos factos provados o Colectivo deu apenas por assente que "Após a prática dos actos descritos, o arguido C deu dinheiro ao menor, em quantia não concretamente apurada." e no ponto 19.4. dos factos não provados foi dado como não provado que "A quantia que o arguido C deu a AP, aquando dos factos descritos no ponto 101.5, dos factos provados, foi no montante de 3 mil escudos." E, a nosso ver, bem andou o Tribunal a quo ao assim decidir, pelo que não tem razão o recorrente nas suas conclusões de recurso relativas a estes aspectos da prova. Alude ainda o recorrente que "Na sessão de julgamento de 29 de Junho de 2005 (…), o Assistente diz ser um “apaixonado por carros de alta cilindrada” e distinguir bem as marcas e os logótipos, assim como os diferentes modelos de cada marca, como os modelos da (…) e da (…). Contudo, cabe esclarecer que, tendo o Assistente referido estar a descarregar material de uma (…) quando presenciou o abuso na cave ao Assistente AT, tal apenas poderia ter tido lugar após 16 de Novembro de 1998 (…), dado que apenas a partir dessa data passou a (...) a dispor de carrinhas deste modelo" (vd. conclusões de recurso 147.ª e 148.ª). Sucede que não foi dado por provado qualquer abuso ao assistente AT por parte do recorrente C, portanto é perfeitamente inútil tentar estabelecer a datação de um facto cuja existência não se apurou. Ainda, e sempre na tentativa de descredibilizar as declarações do assistente AP, alude o recorrente C à circunstância daquele, na sessão da audiência de julgamento de 4 de Julho de 2005, quando perguntado sobre as razões para a sua expulsão da AX, ter apenas referido "a posse de estupefaciente para consumo, negando o tráfico ou a prostituição fora da AX (caso DU) como outras causas – isto é, mais uma vez mentindo ao Tribunal", bem como ao facto de, na sessão de julgamento de 6 de Julho de 2005, ter negado haver "respondido alguma coisa ao director EJ quando este lhe comunicou a decisão de expulsão" (vd. conclusões de recurso 152.ª a 156.ª). O assistente AP quando perguntado sobre os motivos da sua expulsão da AX explicou, na sessão de julgamento de 4 de Julho de 2005, como se alcança do respectivo registo fonográfico (cf. CD 2 de 4.7.2005 - Track 1), que: “AP – Srª Drª, na altura, como qualquer jovem da idade que eu tinha, na altura, ahn... sempre experimentou, desculpe o termo, chamon, uma ganza. E eu na altura, por azar meu, fui apanhado com uma pedra de chamon, para consumo, e onde fui mal interpretado e me acusaram de tráfico de droga, na AX. Onde fui ao Sr. Director e me expulsou da AX. Dr. JJQ – Se foi só esse o motivo de que o assistente se recorda, Srª Drª? Juíza Presidente – Conhece mais algum motivo AP – Não Srª Drª. Juíza Presidente – para, ou é só esse o motivo que se recorda? AP – Sim. É o único motivo. Eu não vejo mais nenhum motivo... simplesmente foi só por ter sido apanhado com uma pedrinha que nem era Juíza Presidente – Pronto. Já respondeu. AP – nem chegava a cinco contos. Juíza Presidente – Já respondeu, Sr. AP. Dr. JJQ – Srª Drª, se por essa altura, o colega X também teve algum problema disciplinar na AX? Se ele sabe disso? Juíza Presidente – Tem conhecimento? AP – Não, Srª Drª Juíza. Não posso dizer ao Tribunal se o Sr. X, se foi expulso também da AX. Juíza Presidente – Não. Se teve algum problema disciplinar. Não é que tenha sido expulso. Teve algum problema disciplinar ao mesmo tempo que o seu? AP – Acho que não. Dr. JJQ – Srª Drª, se o director do (...), falou pessoalmente com o assistente, nesta altura do problema disciplinar que ele acabou de relatar? Juíza Presidente – Este senhor director, EJ, falou consigo sobre, antes da sua expulsão, sobre os motivos, ou o porquê, a razão de o senhor ir sair da AX? AP – Perdão. Posso falar? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Ahn... Na altura em que eu fui, em que me foi apreendido a pedra de chamon e que foi posta num envelope e mandada para o senhor director, eu fui chamado a este senhor, Dr. EJ, onde ele disse que tava farto de... de ter, de eu efectuar fugas do (...) e... de ter sido apanhado com aquela pedra de chamon e onde me acusaram de tráfico de droga. Coisa que eu nunca, nunca me passou pela cabeça, traficar droga. Consumi, sim, chamon, nada mais do que isso. Dr. JJQ – Srª Drª, se o director, Dr. EJ, fez alguma alusão ao relacionamento do assistente com o DU, há pouco referido? Nessa conversa. Juíza Presidente – Fez, Sr. AP? Se o Sr. Director, fez também alguma referência, nessa conversa, em que disse que o senhor ia ser expulso, a, ao Sr. DU? AP – Srª Drª, que eu me lembre não. Porque, ahn... quando foi o... que se passou com o Dr. “DU” Juíza Presidente – Que se lembre, não! É isso? AP – Não.” (fim de transcrição). A questão voltar-lhe-ia a ser colocada na sessão de julgamento de 7 de Julho de 2005. E, como se alcança do respectivo registo fonográfico (cf. CD 1 de 7.7.2005 - Track 1), o assistente AP explicitaria então que: “Dr. JJQ – Esclarecimento seguinte, Srª Drª, é este: se o assistente se recorda de, tempos antes de ter sido expulso da AX, de ter sido chamado na companhia de uma educadora, à presença do director do CZ, Dr. EJ? Juíza Presidente – Pode responder, Sr. AP. AP – Sim, fui chamado ó gabinete do Sr. Director, EJ, na companhia da educadora, EK, onde... o senhor director, EJ, me transmitiu que iria ser expulso do CZ e do lar FC, não podendo estudar mais naquele (...), nem permanecer mais naquele (...). Dr. JJQ – Se nessa altura, o assistente disse alguma coisa ao Sr. Director do (...), Dr. EJ? Juíza Presidente – Pode responder. AP – Que me recorde, não. Simplesmente ouvi o que ele tinha a dizer e saí, acompanhado da directo, da preceptora EK. Dr. JJQ – Srª Drª, eu requeria que fosse exibido ao assistente, o documento que consta de fls. 134 (cento e trinta e quatro), do Apenso DA, e que também lhe fosse exibido o mesmo documento, a fls. 135 (cento e trinta e cinco) do mesmo Apenso. A fls. 134 (cento e trinta e quatro) o excerto que eu pretendia que fosse exibido é o que aparece no topo da página, sob a alínea e). Depois, de fls. 134 (cento e trinta e quatro) para 135 (cento e trinta e cinco), era a leitura do último parágrafo de fls. 134 (cento e trinta e quatro) e o primeiro parágrafo de fls. 135 (cento e trinta e cinco). Juíza Presidente – É uma carta assinada, Sr. Dr., pelo Sr. Director, EJ, vinte e dois de Março de dois mil, para Sr. (...) da AX, Dr. BQ. ... E qual é o pedido de esclarecimento, Sr. Dr., em relação a esta, ao teor desta carta? Dr. JJQ – Srª Drª, são dois pedidos de esclarecimento. Primeiro, e relativamente, à tal alínea e) que aparece no início de fls. 134 (cento e trinta e quatro), é se o assistente confirma, ou não, ter, segundo o relato que consta do mesmo documento, ter confessado o seu envolvimento em actos de pedofilia? Primeiro esclarecimento. Segundo esclarecimento: se confirma se nessa altura, se terá dirigido ao director do (...), afirmando que, o seguinte “se me denuncia, eu mando tratar de si.”? Fls. 135 (cento e trinta e cinco), parte final do primeiro parágrafo. Juíza Presidente – Sr. AP, há uma car, um documento nos autos, que é uma carta, a carta que eu referi, fls. 134 e 135 (cento e trinta e quatro e cento e trinta e cinco), da qual consta um relato, em relação a factos que lhe dizem respeito. Nessa reunião que teve com o Sr. Dr., o Sr. director EJ e a Srª Drª, a Srª educadora, EK, lembra-se de ter dito alguma coisa ao senhor director? AP – Não, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – Ouviu calado o que estava a ser dito e saiu calado? AP – Eu penso que sim. E em relação à pergunta que o Sr. Advogado Juíza Presidente – Não. Agora responda ao pedido de esclarecimento que eu lhe estou a fazer, Sr. AP. Entrou calado? Saiu calado? Lembra-se de ter respondido alguma coisa? Ter esclarecido alguma coisa? AP – Na... Eu obviamente que falei. Mas não me lembro o que é que eu disse. Foi, já foi há tanto tempo que eu falei com o Sr. EJ. Juíza Presidente – E essa conversa, e essa conversa, foi sobre o quê? AP – Não me recordo. É... eu ia responder a uma pergunta feita, que foi... em actos de pedofilia, se aconteceu alguma coisa? É assim, em relação a esse... essa pergunta, eu falei com um educador, o EN, pelo qual, levou-me no seu carro à casa do tal agressor, e deveria ter sido ele que comunicou isso ao Dr. EJ. Juíza Presidente – Ao Sr. Director, o senhor AP, disse-lhe alguma coisa sobre envolvimento em qualquer, em quaisquer actos, como o senhor disse agora, de pedofilia? AP – Que eu me recorde, não, Srª Drª Juíza. Juíza Presidente – E as, umas palavras que estão referidas “se me denuncia, eu mando tratar de si”, o senhor proferiu estas palavras? AP – Srª Drª, peço imensa desculpa, mas isso é completamente falso. Eu nunca... ameacei ninguém. Posso na minha infância ter tido confrontos Juíza Presidente – Tem, tem a certeza que nesta reunião AP – Sim. Juíza Presidente – estando a senhora educadora, não disse estas palavras? AP – Sim, tenho a minha consciência tranquila, que não ameacei ninguém. Posso ter tido muitos problemas na AX, mas partir daí a ameaçar pessoas, nunca me coube isso na, na minha pessoa. Fiz muitos disparates, sim senhora, mas Juíza Presidente – Pronto. Já está respondido, Sr. AP.” (fim de transcrição). Aliás, logo na primeira sessão de julgamento em que o assistente AP foi ouvido, explicou, como resulta do respectivo registo fonográfico (cf. CD 1 de 20 de Junho de 2005 - Tracks 1 e 2), que: “Juíza Presidente – E depois, a seguir ao 5º ano? Fez mais, ou não? AP – Não, não, não porque com uns 15 anos eu saí da AX e onde fui (...) num... numa casa de correcção. (...) – Ahn... Eu efectuei várias fugas do (...) derivado a pressões, e... derivado também a revolta, mágoas... de ter sido violado... Não queria usar este termos mas... por um funcionário da AX. (...) – Eu desde que entrei para a AX, eu sempre efectuei algumas fugas, para o exterior, mas comecei a efectuar mais fugas, desde que fui violado. Juíza Presidente – E estas primeiras que diz que fez, porque é que fugia? AP – Porque desde que eu entrei na AX, sempre fui revoltado, porque qualquer sonho de um rapaz é crescer junto dum pai, de uma mãe, ter um carinho, um afecto, e eu não... eu ali não tinha, quer dizer, os educadores davam, mas não é o mesmo, não é o mesmo carinho, o mesmo afecto que uma mãe e um pai pode dar ao filho. (...) – Já com esses 15 anos, eu fui retirado da AX, porque... na juventude nós experimentamos coisas, que pensamos que estamos a fazer bem para nós sem saber o que aquilo pode causar um dia mais tarde. E então fui apanhado com uma pedra de chamon, onde os educadores fizeram um relatório a dizer que tinham-me apanhado com uma pedra de chamon e onde enviaram ao Sr. director, onde eu fui, acabei por ser expulso do CZ e (...) na casa de correcção (...) EW, em (…).” (fim de transcrição) Chegados aqui o que se pode avançar, face à convicção com que se fica neste Tribunal ad quem, é que o assistente AP descreveu factos que no seu entender consubstanciavam a posse de estupefaciente para consumo e não o tráfico, como - a par das recorrentes fugas da instituição - um dos motivos para a sua expulsão da AX, sendo que não é nestes autos que cabe apreciar tal matéria, acrescendo que os arguidos, ofendidos e testemunhas devem descrever factos e não qualificá-los juridicamente subsumindo-os ao direito penal. Por outro lado, das declarações do assistente AP não se retira que tenha estado excluída como causa da sua expulsão da AX o caso DU e outros actos de pedofilia, o que sucede é que o assistente AP aparentemente disso se não recordava. De todo o modo, o caso DU foi alvo de processo crime autónomo, não estando nestes autos em apreciação, funcionando apenas como referencial temporal e como elemento chamado à colação para identificação de determinado local (a praia de (…)). A mesma falha de memória ter-se-á verificado no tocante à conversa que teve com o director EJ quando este lhe comunicou a decisão de expulsão e de cujo integral conteúdo disse não se lembrar, o que é verosímil atento o lapso de tempo decorrido (cerca de cinco anos) (“Srª Drª... gostaria de dizer ao Tribunal que... e como já disse várias vezes, há coisas em que, na vida em que a gente consegue esquecer; outras, eu não consigo esquecer e, como já disse, vou guardar para a minha vida inteira. Vou ficar com marcas. E as quais é que não, nunca me vou esquecer que fui abusado pelo Sr. H, pelo Sr.... ahn... A, Sr. C, Sr. K. Isso são coisas que vão ficar na minha vida e que um dia mais tarde, vou contar com muita mágoa aos meus filhos” – declaração de AP na sessão de julgamento de 22 de Julho de 2005 registada in CD 3, Track 1). Como se disse na fundamentação do acórdão recorrido: “Aqui (re)começa, na análise do tribunal, o período de instabilidade que acentuadamente AP revela desde o ano lectivo 1998/1999 e que culmina com a sua expulsão da AX. Como dissemos, no dia 3/06/98 há a anotação do pedido do AP para contactar com as irmãs e no dia seguinte, 4/06/98, uma anotação da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo. Cruzando esta informação com o relatório que em 17/07/98 é feito sobre o AP (...), com o relatório de 4/03/97 que já mencionámos e com os registos do livro de ocorrências o lar em que o educando estava (...), esta fuga de 4/06/98 é a primeira que o Tribunal encontrou nos diversos elementos do Assistente após o início de 1995 (altura aproximada em que, de acordo com a Equipa Técnica, como vimos, teria sido ultrapassado o problemas das “fugas sucessivas” entre “Dezembro 1992/Março 1993 e Dezembro 1993/Janeiro de 1994”). Após 4/06/98 (data da fuga do AP para (…), para procurar a mãe, tendo o (...) ido buscá-lo), o Tribunal encontra apenas um registo de fuga do AP em 1/07/98 ( ...). Após 1/7/98 e até 20/4/99, não há registo a dizer que AP fugiu. Surge, em 20/04/99, um registo no livro de registo de ocorrências ( ...), no qual consta “ …Houve uma BOMBA acerca do AP,…depois amanhã falamos… O telefone não para com a família do AP a querer saber notícias…Ultima hora, telefonou a Tia EA a dizer que os avós do AP não o quiseram lá. Vamos ver o que isto dá….”. Esta anotação coincide com a que (também) em 20/04/99 foi feita no seu processo psicossocial , dizendo que AP foi com um irmão, o IIW, que apareceu no Lar dizendo que o queria levar para sua casa. Em 22/04/99 há a anotação de uma reunião com a Tia EA, AP “deu nota de não se estar a sentir bem ” e acabou por aceitar ficar no lar, indo a casa da Tia mais frequentemente (...). São estas duas anotações que nos permitem perceber o que é que se passou com o AP, qual era a “ BOMBA” que o Educador anotou no Livro de Ocorrências. (...) ... foi na sequência da intervenção do Dr. EJ que foi expulso da AX. (...) e aqui dizemos que a expulsão do AP, pelo que foi o seu percurso na AX e que acima já referimos e pelo que o Tribunal percebeu da forma de estar do Director de CZ na AX, a sua expulsão deve ter-se devido mesmo ao Dr. EJ, que disse “basta” porque não aproveitou as oportunidade e “já chega””(fim de transcrição - cf. pág. 937 do acórdão recorrido). E quanto ao caso DU lavrou-se na fundamentação do acórdão recorrido: “actos passados com o cidadão DU, que o assistente AP não omitiu e que, como já referimos anteriormente, foi objecto de um processo crime que correu no Tribunal de (…). Resultando ainda da certidão que conta nos autos, que efectivamente a casa de DU situa-se em frente à Praia de (…).” E, mais adiante, referindo-se ao assistente AP: “Por outro lado, o assistente refere um encontro com o arguido E num local – como dissemos e resultou da audiência -, ao pé da casa do referido cidadão DU. (...) É certo, vimos, que AP esteve envolvido num processo em que foi referido este cidadão.” “Mas aqui, mais uma vez e tendo em atenção o que foi a noção do tempo de AP - diz que uma vez próximo Natal…porque meses depois já estava no Natal e situa ultima vez que foi a (…) disse que “tinha 15 anos, antes de ser expulso da AX” -, temos que estas declarações situam o fim das idas a (…) de AP, de acordo com a sua memória, em Março/Abril 2000. Mas na AJ 6/07/05 declarou que os factos com DU (que o acórdão desse processo deu como provado “data não apurada do ano de 1999, desde esse dia e durante mais de um ano” – X – e “data não determinada de 99, situada entre os meses de Setembro e Dezembro” – AP) ocorreram antes dos factos de (…).” “Acresce que AP faz a convergência das idas a (...) sempre com AT, relaciona-as em data posterior aos factos com DU e AP sai da AX no fim do primeiro trimestre de 2000. Pelo que, avaliando toda a prova produzida quanto aos factos constantes do ponto “7.2” do Despacho de Pronúncia, não foi produzida prova suficiente para o Tribunal quanto a tais factos, pelo que, aplicando o princípio do in dubio pro reo, os factos que o Tribunal deu como não provados nos pontos “46.” A “46.8”.” (fim de transcrição - cf. pág. 1044, 1045, 1083 e 1088 do acórdão recorrido). Mais estranha o recorrente C que o assistente AP, na sessão de julgamento de 13 de Julho de 2005, tenha referido "que a razão pela qual negou o seu próprio abuso nas caves da (...), na segunda vez que foi prestar declarações no processo disciplinar instaurado ao Recorrente, resulta do facto de ter encontrado, num dia em que se deslocou à (...) para tratar de algum assunto (…), a ora mulher do Recorrente (a testemunha NY), que lhe deu uma pancada nas costas e lhe disse para negar tudo o que tinha dito na primeira vez que lá fora prestar declarações. Não se compreende, entre várias outras coisas, como podia a mulher do Recorrente, que não trabalhava na (...), saber quem era o Assistente AP, que fora ele a acusar o Recorrente, em que sede e quando fora depor, nem quando o iria encontrar para o poder ameaçar com uma palmada (sendo que escolheu fazê-lo na (...), em horário de expediente, onde podiam estar a passar pessoas, mas estranhamente não estava ninguém, já que nenhuma testemunha corroborou esta história em julgamento)." (vd. conclusões de recurso 182.ª a 188.ª e 201.ª) Ora, o acórdão recorrido não se furta ao tratamento desta questão, muito antes pelo contrário, expendendo a este propósito, na sua fundamentação, o seguinte: "Explicou ao Tribunal, porque lhe foi perguntado, se alguma vez tinha dito que aqueles factos, que agora estava a relatar, não se tinham passado, que eram mentira. Disse que sim, que o tinha feito e explicou a razão. Disse que após ” … um encontro inesperado na (...) da AX, por uma senhora chamada NY, salvo erro é companheira, ou esposa do Dr. C….pela qual me deu uma palmada nas costas e disse que… pa eu desmentir tudo o que tinha acont … o que eu tinha dito…” em relação ao arguido C e que o arguido nada tinha a ver com o processo. AP relatou que respondeu “…mas ele tem, ele é culpado…desculpe a expressão, se posso usar uma asneira, e peço imensa desculpa ao Tribunal e aos advogados, a senhora disse “é culpado uma merda! E quando lá fores, vais negar tudo.”..”, explicando assim a razão pela qual veio efectivamente a dizer que os factos com o arguido C não se tinham passado. Pela defesa do arguido C foi ainda perguntado ao assistente, porque é que só naquela altura relatava tal “pressão”, tendo declarado “ … Srª Drª, nunca tinha relatado porque não queria adiantar…esperei que essa pergunta surgisse, para assim a responder…”. Foi-lhe ainda perguntado, face à reacção que disse ter tido na altura - e porque o relato de uma situação que diz ter deparado na (...) da AX entre o arguido C e o assistente AT, mas que o assistente AT em audiência de julgamento disse que não ter acontecido -, qual a razão para só ter desmentido factos passado com o arguido C em relação a si e ter mantido em relação a AT, tendo esclarecido “…Srª Drª, é assim… a senhora dirigiu-se a mim e falou só em mim…para eu dizer que não tive nada com o Dr. C… não me disse “olha, vais lá e dizes que nem tu, nem o AT tiveram”…em que eu respondi ao que a senhora me mandou… com medo, nunca se sabe o que é que essa senhora pudesse fazer..” (tendo acrescentado num segundo momento, em relação a perguntas que lhe foram feitas pelo Tribunal, quanto ao medo que tinha dito ter do “poder” do arguido C e porque é que apesar disso não tinha tido medo para relatar o episódio em relação ao AT “… Srª Drª, porque são coisas completamente diferentes…eu estou a falar de mim, e é por mim que eu tenho que zelar…também tenho que zelar pelos meus colegas, e zelo por eles, para que não lhes aconteça nada…mas... o que tá aqui em causa sou eu, não são, não é o meu colega AT….”). (i) Aqui introduzimos dois depoimentos. O da testemunha NY - a qual dise ao Tribunal ser casada com o arguido C e trabalhou também na (...) da AX - e da testemunha UL - a qual declarou ao Tribunal ser educadora na AX até à presente data, no DT desde 1 de Março de 1996 e em 2005 foi para CZ, embora esteja em licença sem vencimento desde 1/11/2005 - e que disse ao Tribunal ser irmã da ex-mulher do arguido C – GW – e o ex-marido da testemunha, UM, ser também educador na AX . A testemunha NY disse ao Tribunal que não conhecia AP até este processo. Soube quem era numa altura em que uma colega JJA, telefonista - e na sequência de ter passado uma entrevista na televisão de um aluno, com cara tapada -, disse-lhe que era AP. Diz que isto é o conhecimento que tem do assistente e nunca falou com AP. Embora a reacção que o AP descreveu ao Tribunal seja plausível, da parte de alguém que estivesse próximo do arguido C como a testemunha NY estava, o assistente AP podia ter estado a mentir e inventar o incidente que contou ao Tribunal. No entanto o depoimento da testemunha UL, embora nada tendo a ver com AP, foi relevante para avaliar da credibilidade e da veracidade deste incidente relatado pelo assistente. A testemunha UL apresentou um depoimento que para o Tribunal não foi uniforme quanto à sua objectividade e, consequência disso, quanto à sua isenção e desinteresse na causa. O facto de ser irmã da ex-mulher do arguido C, só por si, não relevou para o Tribunal para pôr em causa a sua isenção, objectividade e verdade do que disse ao Tribunal. Sucede, contudo, que relatou ao Tribunal um incidente que ocorreu em 5 ou 6 de Outubro de 2003, relacionado com a consulta do processo do assistente AK no CW – educando que não era seu educando e lar onde não trabalhava -, que com as explicações que deu quanto às circunstâncias em que fez essa consulta – indo ao lar e dizendo à Colega que estava de serviço, “tu não viste nada” – e justificações que deu e emendas que fez a essas justificações, para ter feita essa consulta, levaram o Tribunal a avaliar o seu depoimento com reserva e cautela. Assim, relatou ao Tribunal uma conversa que teve com o assistente AK, em que lhe perguntou o seu conhecimento sobre dois nomes de alunos e fez-lhe um pedido para o AK contactar o assistente AN, para saber o nome dos educadores do lar do AN. Admitiu que fez isto na sequência de pergunta que lhe tinha sido feita directamente pelo sobrinho GU (filho do arguido C), se ela testemunha sabia o nome dos educadores do internato do CZ, istoo numa altura em que o arguido ainda estava em prisão preventiva. Justificou-se que teve curiosidade de ver com que idade é que o AK tinha entrado lá para o (...). Contra interrogada disse que o sobrinho não lhe pediu para fazer essa consulta, depois que não lhe “pediu directamente”, “…foi uma dúvida que surgiu, como é que os alunos saiam e ele ( o sobrinho) soube pelos jornais que surgiu o nome do AK, que era aluno do lar…”, o que a testemunha pretendia com a consulta era “…concretamente, queria saber a data em que ele tinha entrado para o (...)…”. A alternância que veio a fazer entre a justificação da sua “curiosidade”, com a natureza das dúvidas do sobrinho para que “indirectamente” a testemunha admitisse que o pedido da consulta lhe fora feita pelo sobrinho – e tenha-se também em atenção a dinâmica das suas resposta nas perguntas que lhe foram feitas pela própria defesa do arguido C: o Ilustre Mandatário do arguido pergunta à testemunha, num segundo momento, se tinha alguma ideia para que é que o sobrinho queria esta informação, respondendo a testemunha: “A informação?...(pausa)…isto foi uma curiosidade que surgiu, não foi…” e fica calada; vindo o Ilustre Mandatário em sua ajuda, pois diz-lhe, entre o que, face à entoação, ficou entre uma pergunta ou um “acabar” da frase da testemunha, “e não foi mais do que isso (?)”, a que a testemunha “adere”, respondendo e repetindo “ Não foi mais do que isso ” -, não fez qualquer sentido para o Tribunal. E não fez qualquer sentido porque para o Tribunal, atenta a natureza das coisas, “foi mais do que isso”. Isto é, a testemunha não foi fazer a consulta do processo individual de um educando que não era seu, num lar que não era o seu, dizendo à colega que estava de serviço “tu não viste nada”, sabendo que não estava a fazer “ agir bem ” como disse ao Tribunal – e sujeitando-se a um processo disciplinar como veio a acontecer, tendo a testemunha dito que resultou a sua suspensão por um ano -, para satisfazer a sua curiosidade quanto à data em que um assistente deu entrada num lar e para saber, como a testemunha também declarou, que idade teria o educando quando ocorreram os factos. Acrescente-se que a testemunha não teve idêntica curiosidade – afirma o Tribunal, porque especificamente fez essa pergunta à testemunha e ela confirmou-o - quanto a “saber a data de entrada no lar” ou a “idade” de outros assistentes do processo, os quais, de acordo com o que resulta dos elementos constantes dos autos - cfr., por exemplo, documentos de fls. 60.043/4, na parte em que diz respeito aos anos de 2002 e 2003, este até início de Outubro de 2003, documento da “DQ”, junto pelo arguido H, relativo a contagem de notícias e tempo de emissão, ano de 2002, 2003, 2004, referentes a H e AX; docs. de fls. 60.194, 60.321, 60.322, 60.323, 60.413, 60.414, 60.550, 60.551, DVDs remetidos para os autos pela DR com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DR com assistentes destes autos e sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março; docs. de fls. 52.054 ( DVD DS) e de fls. 60.050 a 60.056, remetidos para os autos pela DS com cópias das entrevistas e reportagens feitas pela DS sobre os factos destes autos, todas respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente Fevereiro e Março de 2003; Docs. de fls. 57.463 a 58.633, recortes de artigos saídos na Imprensa com entrevistas e reportagens sobre os factos destes autos, respeitantes a períodos anteriores a Outubro de 2003, essencialmente de Dezembro de 2002 a Março de 2003 -, foram falados e mais falados que o AK na comunicação social e alguns desses sim, tinham directamente a ver com os factos que na Acusação vieram a ser atribuídos ao arguido C. Sucede que a testemunha também foi “pedir” ao AK para contactar o assistente AN - que, de acordo com as declarações da testemunha, o AK disse-lhe que estava no (…) e não em CZ – para saber quem tinham sido os educadores do AN no lar de CZ, pedido que fora feito pelo sobrinho da testemunha e filho do arguido C porque “… havia educadores que na altura já não estavam no internato, ou não estavam nesse (...) ou na altura já tinham sido transferidos para o semi-internato…”– justificação dada pela testemunha -. E reconhecendo, quando tal lhe foi perguntado pelo Ministério Público, que a identificação dos educadores era uma questão que poderia saber com mais facilidade através dos Colegas educadores de CZ, mas argumentando com o já acima dito, que “… havia educadores que na altura já não estavam no internato…”. Também nesta parte não faz qualquer sentido para o Tribunal a “desculpa” dada pela testemunha, para o motivo pelo qual tentou obter uma informação do AN através do assistente AK, quanto à identificação dos educadores. O Tribunal conclui que na primeira situação – a da sua ida ao CW consultar o processo individual do assistente AK -, a testemunha foi consultar o processo porque o sobrinho GU, filho do arguido C, lho pediu directamente, não sabendo contudo o Tribunal a razão que em concreto esteve na origem desse pedido ( se um interesse específico do arguido C, se um interesse e pedido de outro arguido, que tivesse contactado o arguido C para obter a informação). As explicações e “amálgama” de justificações que a testemunha deu para explicar e justificar este episódio, colando-se a uma versão que para o Tribunal, da análise que fez dessas explicações – e em que teve em conta a forma da entoação, pausas ou expressão facial que a testemunha apresentou quando respondeu nesta parte -, significaram um “embrulhar” de desculpas para a verdadeira razão da consulta, um pedido do sobrinho GU. O qual, por sua vez, atenta a natureza das coisas e o que decorre da experiência comum, teve necessariamente origem no arguido C. Atitude e comportamento que para o Tribunal, à semelhança do que acima se disse quanto à testemunha NY, é plausível em relação a alguém que tivesse uma relação próxima com o arguido e o quisesse ajudar no desembrulhar da situação em que se encontrava. Embora em tempos diferentes, o comportamento destas duas testemunhas e o que o mesmo implicou, para o Tribunal é uma reacção similar. E esta similitude de comportamentos, no caso concreto, para o Tribunal conferiu credibilidade e veracidade ao episódio que AP contou. Ele contou um incidente que, para o tribunal e pelo que já dissemos, é possível e plausível ter acontecido naquela situação e tem similitude de procedimento - o procedimento de “acto de contacto” com assistentes envolvidos no processo - , com o que aconteceu com o AK. Por isso, também, a razão pela qual o Tribunal acreditou que o que AP relatou aconteceu. E mesmo que o seu “medo” pudesse ter sido menor do que aquele que relatou ao Tribunal, é uma justificação plausível para o ter reconhecido que em dado momento, depois de ter acusado o arguido C de ter praticado os actos que agora estamos a tratar, veio a desmentir o que tinha dito." (…) "Mesmo a questão que acima referimos com a testemunha NY - e a explicação dada pelo assistente para a forma como agiu -, que a defesa do arguido considerou “sem pés nem cabeça”, para o tribunal teve algum sentido. Algum sentido face à pessoa que o tribunal teve em frente, com a vida que teve, mas porque também não soube aproveitar o que lhe foi proporcionado dentro da AX, pois o defeito não é, seguramente, apenas da forma como lhe foi proporcionada a vivência pela AX. AP foi um jovem que teve casa, tecto, com deficiências de certo, mas com família que continuava a ter algum apego por ele. A tia EA - ouvida como testemunha nestes autos, depoimento este que foi particularmente relevante para a prova dos factos relativos à vivência do assistente não só na AX, como no período após ter saído da AX -, quis que o mesmo fosse para sua casa, na sequência do internamento no (...) do IRS, em 14/4/00 – e AP teve acompanhamento pedopsiquiatrico. O sentido da resposta foi e reconheceu-o, que preocupou-se foi consigo e pelo que lhe pudesse suceder." (fim de transcrição). Concorda-se inteiramente com o Colectivo de 1.ª instância na apreciação que fez da explicação do assistente AP para o facto deste ter negado, na segunda vez que foi prestar declarações no processo disciplinar instaurado ao recorrente C, o seu próprio abuso nas caves da (...) (ter encontrado na (...) a mulher do recorrente, a qual lhe deu uma pancada nas costas e lhe disse para negar tudo o que tinha dito na primeira vez que lá fora prestar declarações); explicação que para o Tribunal a quo fez sentido, conferindo-lhe credibilidade e veracidade, como o faz (sentido) para este Tribunal ad quem. A convicção do Tribunal é formada, através dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas produzidas e, também, pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e, ainda, das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, ansiedade, embaraço, desamparo, serenidade, olhares para alguns dos presentes e risos ou choros, como linguagem silenciosa e de comportamento, a coerência de raciocínio e de atitude, a serenidade e seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, e as coincidências e inverosimilhanças que, porventura, transpareçam em audiência, de tais declarações e depoimentos. Com efeito, é ponto assente que a comunicação não se estabelece apenas por palavras mas também pelo tom de voz e postura corporal dos interlocutores, sendo apreciadas no contexto da mensagem em que se integram. Trata-se de um acervo de informação não verbal e dificilmente documentável face aos meios disponíveis, mas imprescindível e incidível para a valoração da prova produzida e apreciada, segundo as regras de experiência comum. Atentemos mais uma vez no ensinamento de Rosa Vieira Neves, com a qual se continua a concordar, de novo se constatando que o por si defendido foi aqui plenamente respeitado pelo Tribunal a quo no acórdão recorrido, em sede de fundamentação e exame crítico das provas que acabámos de apreciar (obra citada, pág. 147 e segs.): “A prolação de uma decisão que verse sobre o objecto do processo, ou seja, sobre a existência de responsabilidade criminal pela prática de um ilícito típico, ou ausência dela, pressupõe a prévia formação da convicção do julgador nesse preciso sentido. A objectividade decorrente da prova produzida é intermediada, na decisão final, pela natural subjectividade do julgador, na medida em que se consubstancia em um acto humano. O quid de onde brota o convencimento ou a convicção do julgador pode ser constituído pelos factos carreados e produzidos em um determinado processo, isto é, derivados da actividade probatória desenvolvida naquele âmbito, ou em outros elementos de natureza extraprocessual, pelo que importa definir se todos têm a mesma relevância processual. O critério orientador sobre a identificação das fontes do convencimento pode invocar-se por apelo a dois princípios, que naturalmente revelam uma concepção específica sobre a estrutura processual penal: o principio iudex debet iudicare secundum allegata et probata e o princípio iudex debet iudicare secundum conscientiam. O primeiro destes princípios determina que esta vedado ao julgador não somente a realização de qualquer prova, mas, sobretudo, a invocação de qualquer facto que não tenha sido produzido e demonstrado intra-processualmente. O segundo convoca uma actividade probatória desenvolvida autonomamente pelo julgador na descoberta da verdade, para além e independentemente da factualidade levada ao seu conhecimento pela acusação ou pela defesa. A aplicação do princípio iudex debet iudicare secundum allegata et probata não se coaduna com o nosso paradigma processual penal nem com os instituídos nas sociedades hodiernas assentem em um Estado de Direito Democrático, com respeito pelos direitos fundamentais, apresentando-se como limite inaceitâvel ao poder-dever de investigação autónoma da verdade material, por parte do julgador, erigida como uma das finalidades processuais. O princípio iudex debet iudicare secundum conscientiam, entendido em termos absolutos, conduziria à insustentabilidade da própria existência do processo penal; erigido em critério último e único, transformaria a actividade jurisdicional desenvolvida em pura arbitrariedade, cujo produto derivaria apenas e tão-somente da vontade exclusiva do julgador, podendo este ancorar o seu convencimento fora do processo e, in extremis, para além do processo. Por isso, este princípio foi sofrendo alterações de conceptualização, de modo a permitir que a convicção do julgador se forme de acordo com a sua consciência, mas tendo por referência o resultado probatório obtido intra-processualmente. Os factos adquiridos pelo julgador no seio do processo relevam para efeitos de sustentação de uma decisão condenatória ou absolutória.” (fim de transcrição) Foi, assim, à luz de tais princípios, que se formou a convicção do Tribunal a quo e, consequentemente, se procedeu à selecção da matéria de facto positiva relevante. O recorrente não o alega, mas antes de prosseguirmos, por tal ser matéria de conhecimento oficioso (vd. acórdão do STJ de 19/10/95, publicado in DR I Série de 28/12/95), desde já se afirma considerarmos não existir nenhum dos vícios constantes do art. 410.°, n.º 2, do CPP no que concerne à matéria fáctica que ora estamos a apreciar. Recorde-se que a mencionada norma adjectiva respeita aos vícios da decisão, verificáveis pelo mero exame do seu (dela, decisão) próprio texto, ou por esse exame conjugado com as regras da experiência comum. Por outras palavras, a livre apreciação da prova implica uma valoração racional e crítica e de acordo com as regras da experiência comum, tendo em conta o homem médio su(...) pela ordem jurídica. Elementos estranhos à decisão não podem ser invocados ou chamados a fundamentar esses vícios que, repete-se, têm de resultar do próprio texto, e apenas deste. Da leitura do acórdão recorrido ressalta a enorme clareza do texto e do sentido da decisão no que concerne ao abuso sexual de AP por parte de C, não existindo a mais ténue obscuridade ou contradição. Trata-se de um texto integralmente lógico, bem estruturado e devidamente fundamentado nesta parte. Lembre-se que erro notório na apreciação da prova é aquele de que o homem médio facilmente dá conta. O facto do Tribunal a quo ter acreditado no depoimento do assistente AP em detrimento da versão do arguido C, tendo desvalorizado o depoimento deste último quanto aos factos integradores do abuso ocorridos na (...) entre aquele ofendido e o recorrente C, é um poder que lhe assiste e lhe é exigível, uma vez que tem de decidir, como já explicitámos, segundo a sua livre convicção e as regras da experiência, nos termos do dis(...) no art. 127.° do CPP. Realce-se que o Colectivo de primeira instância reconheceu que na descrição dos factos o assistente AP se mostrou algo "confuso e baralhado nas datas" e "nas sequências", logo acrescentando na sua fundamentação que "No entanto, não obstante o que antecede, pareceu transmitir e estar a contar uma coisa qe efectivamente lhe aconteceu." e mais adiante "(…) as declarações que prestou ao longo das demais sessões, o tom de voz calmo e por vezes contendo a impaciência ou cansaço que em determinadas alturas teve, necessariamente, que sentir - pois as instâncias foram seguidas e, por norma, esmiuçando ainda mais o que tinha sido dito e como tinha sido dito ou na sessão anterior ou na instância feita por outro sujeito processual -; a atitude de querer colaborar, traduzida na forma como foi sempre e consecutivamente, respondendo e esclarecendo o que tinha dito, baralhado ou confundido; a expressão facial que por vezes se via traduzindo emotividade; transmitiu ao tribunal uma noção de existência de uma espinha dorsal naquilo que estava a dizer, de existência de uma correspondência emocional entre o que estava a contar e o que tinha vivido e com as pessoas e nos locais que disse ao tribunal." Em suma, não ocorreu o vício de erro notório na apreciação da prova uma vez que os factos descritos se apresentam internamente coerentes e articulados entre si de acordo com as regras da lógica, sendo plausíveis de acordo com as regras da experiência comum. Como atrás se disse - e não é demais repeti-lo - o julgador decide segundo a sua livre convicção, isto é, segundo a sua consciência e, obviamente, também segundo a lei. A discordância do arguido C perante a prova produzida quanto ao ofendido AP mais não é do que a sua discordância relativamente à convicção do Tribunal a quo. Por outro lado, verifica-se o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a decisão de direito. E só existe quando o tribunal deixar de investigar o que devia e podia, tornando a matéria de facto insusceptível de adequada subsunção jurídica, concluindo-se pela existência de factos não apurados que seriam relevantes para a decisão da causa. É por demais evidente que todos os factos à boa decisão - sempre por reporte ao que se passou na (...) entre o assistente AP e o recorrido C - foram devidamente apreciados pelo Tribunal a quo, sendo os demonstrados, objectiva e subjectivamente típicos, suficientes para a conclusão de direito. Refira-se, finalmente, afigurar-se-nos não existir contradição insanável da fundamentação e entre esta e a decisão no domínio ora em apreço. Como é sabido, a melhor impugnação do julgado, nomeadamente, no plano da valoração da prova produzida e subsequente estruturação da factualidade apurada, não se basta com juízos meramente opinativos ou de mera discordância, devendo assentar, isso sim, na avaliação de todo o material probatório recolhido, não deixando de recorrer aos critérios de racicínio lógico e da experiência comum do homem médio. Tal exercício arredará arbitrariedade e afastará as conclusões sobrevindas a meras impressões geradas no espírito do julgador. Sob tal contexto referencial cumprir-se-á, na sua melhor dimensão, o princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127.° do CPP. O facto da convicção do recorrente/arguido C, perante a prova produzida, ser diferente da do Tribunal, não permite, sem mais, que ponha em crise a decisão. Estando o recurso constitucionalmente assegurado, como garantia de defesa, não foi intenção do legislador que aquele fosse exercido sem regras, designadamente, por a convicção de quem recorre ser diversa da do julgador. Não existe contradição insanável da matéria de facto dada como provada e a decisão proferida. Assim, quanto aos factos que se deram como provados e às circunstâncias em que os mesmos ocorreram, foram considerados conjugadamente, e bem, todos aqueles que importavam serem-no e que o Colectivo de primeira instância explicitou na decisão revidenda no âmbito da sua fundamentação relativa à factualidade apurada e à não provada no que respeitou ao abuso de que o assistente AP foi alvo por parte do arguido C nas instalações da (...) da AX, improcedendo o seu recurso nesta parte, e dando-se, consequentemente, por definitivamente assente a factualidade dada por provada nos pontos 101. a 101.10. do acórdão recorrido, matéria que ficou acima integralmente reproduzida. Antes de concluirmos, no tocante à apreciação da fundamentação da matéria de facto e a esta, não podemos deixar de aqui reproduzir mais uma passagem do acórdão revidendo, bem ilustrativo do cuidado e ponderação que na análise da prova o Colectivo de primeira instância colocou, com a preocupação de bem explicar a quem o lesse qual o percurso lógico e os raciocínios que formulou para dar por assentes os factos provados e não provados, neste e noutros abusos, quer nos aspectos objectiváveis quer naqueles que, como acima expendemos a propósito da livre apreciação da prova, que cabem na margem de subjectividade resultante de aspectos emotivos e outros dos depoimentos e é não-só reconhecidamente aceitável como insindicável. E passamos a transcrever: "(…) considerando o que dissemos quanto ao que foi um dos aspecto da Defesa dos arguidos, a criação de uma história entre alguns assistentes, a que outros aderiram consciente ou inconscientemente, para a Acusação dos arguidos -, optámos, não só no caso do assistente AP, mas também extensível a outros assistentes, por começar por analisar vários aspectos da vivência dos assistentes na AX - partindo da prova documental -, cruzando-os e justapondo-os com outros elementos que resultam das declarações e dos depoimentos das testemunhas, com o objectivo de aferir a consistência ou a inconsistência do que foi dito e como foi dito, aferir da credibilidade do declarante e veracidade do declarado. Houve que sinalizar, despistar e equacionar – dentro do que nos foi possível - a capacidade, probabilidade e ocorrência ( se fosse o caso), de os assistentes se conluiarem ou de alguma forma coordenarem-se, consciente ou inconscientemente, para criarem, total ou parcialmente, os factos que são o objecto do presente processo." (fim de transcrição). Antes de terminarmos a apreciação da matéria de facto dada por assente quanto aos factos integradores de abuso sexual a AP nas cave da (...) da AX por parte do recorrente C e da impugnação desta por este arguido, lembramos, pela sua pertinência, o ensinamento de Rosa Vieira Neves, com que não só plenamente se concorda, mas também se verifica – por tudo o que se deixou supra ex(...) – ter sido inteiramente seguido pelo Tribunal a quo no acórdão recorrido, em sede de fundamentação e exame critico das provas, in obra citada, pág. 139 e segs.: “O imperativo legal que determina ao julgador a exame critico das provas permite a convolação, por parte daquele, do "estado de convencido" a "convincente" na actividade de valoração da prova revelando, ainda, a natureza vinculada do conteúdo do dever de fundamentação à observância das regras da lógica, da razão e da experiência em que fundamenta o acerto final, devendo este encerrar um grau de certeza que, salvo inequívoca dernonstração em contrário, não se afaste de um quadro de razoabilidade e normalidade compatível com aquelas regras. Para além do mais, a analise crítica impõe que o julgador explicite o modo coma considera, v. g., em sede de valoração de prova testemunhal, isento e credível o depoimento produzido, para além da forma como o mesmo é prestado, pois somente daquele modo - pela verificação in concreto das referidas características reportadas ao conteudo do depoimento - se poderá revelar a consistência e veracidade do mesmo, bem como a explicitação do processo formativo da sua convicção em relação aos demais meios de prova efectivamente utilizados, manifestando a congruência entre aqueles e os factos que firmam, para, em seguida, poder ser possível avaliar o resultado emergente do juízo valorativo. Desta forma, transpondo para a decisão final não somente o resultado da avaliação que realizou sobre a prova produzida, mas também a construção lógica, pormenorizadamente demonstrada, encetada para chegar àquele, o julgador permite o conhecimento do processo formativo do juizo valorativo aos sujeitos processuais - podendo, inclusive, ter o efeito de afastar a sindicância, através do exercício do direito ao recurso da decisão, porquanto logrou demonstrar e convencer os sujeitos da justeza daquela -, e à própria comunidade. A fundamentação com a densidade axiológica apontada permite caracterizar a decisão final como um acto comunicacional do julgador, acto este que configuramos geometricamente como um triângulo, posicionando-se em um dos seus vértices o julgador, em um outro os sujeitos processuais e, no terceiro, por fim, a comunidade, estabelecendo-se entre eles a comunicação, sendo que entre os primeiros dois o acto comunicacional é biunívoco (com o reconhecimento do direito ao recurso como uma garantia efectiva que integra o conjunto dos direitos de defesa, constitucionalmente atribuídos ao arguido, nos termos do dis(...) no n.º 1 do artigo 32.º da Lei Fundamental) e que, entre o julgador e a comunidade, a comunicação só se efectiva de modo unívoco, pois somente de modo reflexo pode a comunidade manifestar a sua aceitação ou discordância, considerando que a decisão fere o sentimento de justiça por inobservância do dever de fundamentação, manifestação que não comporta qualquer consequência jurídica intraprocessual.” E mais adiante na pág. 145: “A obrigatoriedade da fundamentação fáctica da decisão final, pela densidade axiológica que traçámos, não se apresenta coma um limite ao princípio da livre apreciação da prova, pese embora a decisão final promane do julgador, cuja condição humana é inegável e indissociável do ser-pessoa, e, por isso, necessariamente pessoal. Partilhamos, assim, o entendimento de acordo com o qual a livre convicção "não poderá ser uma convicção puramente objectiva, emocional e ponanto imotivável", mas "uma convicção objectivável e mnotivável, portante capaz de impor-se aos outros" Por conseguinte, a fundamentação da decisão final, não sendo a ratio essendi da livre apreciação da prova surge, no nosso sistema processual penal, coma a ratio fundante, isto é, como o seu pilar, visível para todos os sujeitos processuais e para a comunidade em geral, tornando cognoscível o caminho, lógico e racional, percorrido pelo julgador e a apreciação in concreto do substrato material da decisão, o mesmo será afirmar, da prova.” (fim de transcrição) g) - Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto relativa ao assistente AI O arguido C veio também colocar em crise a decisão sobre a matéria de facto decidida na 1.a instância no que concerne à sua apurada conduta relativamente ao assistente AI, e fê-lo, nos termos legais, nas suas conclusões de recurso 261.ª a 391.ª. Dá-se aqui por integralmente reproduzido tudo o que, em sede de considerações genéricas, se disse supra, aqui se aplicando mutatis mutandis. No que ora importa apreciar, no acórdão sub judice, foi dada por assente, nos pontos 104. a 104.13. dos factos provados (todos especificadamente impugnados pelo recorrente, se bem que o último destes não lhe diga qualquer respeito e o penúltimo e antepenúltimo apenas de forma indirecta), a seguinte factualidade: "104. Em dia indeterminado dos meses de Novembro ou Dezembro de 1999, o arguido A telefonou ao menor AI, à data com 13 anos de idade, e combinou encontrar-se com o mesmo na quarta-feira seguinte, em local e hora não concretamente apurado. 104.1. Nesse dia, à hora marcada, o arguido A, conduzindo uma das carrinhas (…) “(…)” da AX, compareceu no local que combinara. 104.2. Depois do menor ter entrado na viatura foi recolher mais rapazes, tendo passado nas imediações do CZ, onde se encontravam pelo menos mais 3 rapazes menores que entraram na carrinha. 104.3. Dirigiram-se, então, para uma casa sita na zona da (…), na (…), cuja localização exacta não foi possível apurar, onde se encontravam vários adultos do sexo masculino, entre os quais os arguidos K e C. 104.4. O assistente AI permaneceu na sala na companhia do arguido C, o qual, após ter tirado o pénis para fora das calças, introduziu-o na boca do menor, aí o tendo friccionado. 104.5. Tendo também o arguido C introduzido o seu pénis erecto no ânus do menor aí o tendo friccionado. |