Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTÓNIO JOSÉ SAÚDE BARROCA PENHA | ||
Descritores: | PRESCRIÇÃO LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 07/10/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | Sumário (do Relator) I. Em face do disposto no art. 311º, n.º 1, do C. Civil, mostra-se patente que o legislador veio prever uma maior proteção ao credor que, nos termos de uma sentença transitada em julgado ou de outro título executivo, possui o seu direito perfeitamente consolidado, o que é igualmente do conhecimento do devedor, pelo que a lei estabelece um prazo mais alargado para que exerça coativamente tal direito, independente do prazo a que estava inicialmente subordinado. II. Sendo assim, uma vez obtida sentença que reconheça a indemnização, ainda que a mesma esteja dependente de liquidação, só a prescrição ordinária (20 anos – art. 309º, do C. Civil) pode extinguir a obrigação dessa forma reconhecida. | ||
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Decisão Texto Integral: | Recorrente: António (…) Recorrido: João (…) Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Por apenso à ação executiva, para pagamento de quantia certa, proposta por João (…) contra António (…) veio este executado deduzir oposição à execução, mediante os presentes embargos, peticionando a sua absolvição do pedido exequendo e levantamento da penhora ou, caso assim não se entenda, requer a retificação da quantia exequenda. Para tanto, sustenta, em síntese, que a dívida exequenda, além de não ser líquida, certa e exigível, encontra-se prescrita, nos termos da Lei Geral Tributária; sendo que não se mostra correto o cálculo efetuado pelo exequente da quantia exequenda. O embargado/exequente apresentou contestação, invocando que a obrigação exequenda se encontra devidamente liquidada, bem como a obrigação exequenda não se mostra prescrita e inexiste fundamento legal para a oposição à penhora. Pugnou pela improcedência dos embargos. A solicitação do tribunal, o Serviço de Finanças ... emitiu certidão dando conta que, no processo de execução fiscal identificado nos autos com o n.º 2321200901001515, instaurado contra João, não foi proferido despacho nos termos e para os efeitos do disposto no art. 48º da Lei Geral Tributária (cf. fls. 19). Na sequência, foi proferido, em 17.05.2019, despacho saneador-sentença, lendo-se na sua parte final o seguinte: “Pelo exposto, o tribunal: a) Julga parcialmente procedentes os presentes embargos de executado e, consequentemente, determina a redução da quantia no montante de 818,03 € (oitocentos e dezoito euros e três cêntimos); b) Indefere liminarmente a oposição à penhora, por inadmissibilidade legal. c) Condena embargante e embargado no pagamento das custas processuais, na proporção do respectivo decaimento, fixando este em 91% para o embargante e 9% para o embargado, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário - cfr. artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil.” Inconformado com o assim decidido, veio o embargante/executado interpor recurso de apelação, nele formulando, no essencial, as seguintes CONCLUSÕES 1. Foram os RR./Executados condenados ao pagamento ao A. da quantia de 5.590,53€ relativa ao não pagamento do IRS do ano de 2004, relativas ao prédio vendido em 9/01/2004, respetivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; b) ao imposto de CA dos anos de 2001 e 2002 e de IMI de 2003, respectivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; c) às coimas, respetivos juros e custas processuais fiscais; as quais, nesta data, totalizam o montante ilíquido de € 5.590,53, mas cujo valor final deverá ser determinado em liquidação de sentença e deduzido do montante de € 818,03 bem como, nos juros compensatórios e de mora vincendos sobre tal quantia até efetivo e integral pagamento. 2. Como se depreende do teor da sentença condenatória trata-se de uma dívida fiscal resultante do não pagamento dos impostos devidos, e acima mencionados, à Autoridade Tributária. 3. Não obstante terem os RR./Executados sido condenados a pagar tal quantia ao A./Exequente, não é este o “credor” de tal quantia, mas sim a Autoridade Tributária, pois que, tal montante destina-se a ser entregue pelo ora Recorrido às Finanças para pagamento dos já supra mencionados impostos. 4. Entende o tribunal a quo que “o montante exequendo é composto por diversas parcelas, para além daquelas que o Embargante invoca como prescritas sob o ponto de vista fiscal.” 5. Não assiste razão ao tribunal a quo, pois que, como entende o Apelante a dívida em causa nos presentes autos encontra-se prescrita. 6. Aquando da apresentação da Oposição à Execução o Executado, ora Apelante, invocou desde logo a prescrição de todas as parcelas reclamadas no Requerimento Executivo bem como da sentença condenatória. 7. Por informação do Serviço de Finanças ... o valor em dívida relativo a este processo era de 8.267,15€ o qual respeitava apenas ao IRS do ano 2004, mais-valias, juros de mora calculados sobre esse valor e encargos, tal como consta do Doc. junto com o Requerimento Executivo. 8. Tal quantia em dívida referia-se apenas ao IRS do ano 2004, mais-valias, juros de mora calculados sobre esse valor e encargos as restantes parcelas peticionadas (quantias referidas nos pontos 8 a 18 do Requerimento Executivo - 156,92€ + 149,10€ + 133,43€ + 266,43€ + 180,64€ e respectivos juros no valor de 41,38€ + 41,38€ + 35,21€ + 41,38€ + 66,21€, no montante global de 1.112,08€) estando, desde logo, prescritas. 9. A dívida que deu origem à instauração do processo executivo é tributo de IRS – mais-valias, do ano fiscal de 2004, instaurado em 23 – 01 – 2009. 10. O ora Embargado, e Executado no processo fiscal, João, foi citado em 16 – 11 - 2009, pelo ofício nº 5980 J de 10 – 11 – 2009, interrompendo-se aqui o prazo de prescrição, conforme disposto no art. 49º, n.º 1 da Lei Geral Tributária. 11. O referido Executado requereu o pagamento da dívida em prestações, o qual foi deferido, em 36 prestações, tendo sido disso notificado em 24 – 02 – 2010, suspendendo-se aí o prazo de prescrição nos termos do já referido art. 49º, n.º 1, da Lei Geral Tributária. 12. Em 14 - 09 – 2010, por despacho do Chefe do Serviço de Finanças, foi excluído do seu plano prestacional, prosseguindo o processo executivo os seus trâmites legais. 13. Sendo que, o processo esteve suspenso 202 dias, período esse compreendido entre 24 – 02 – 2010 e 14 – 09 - 2010, ou seja, enquanto vigorou o referido plano prestacional. 14. De acordo com o disposto no art. 48º da Lei Geral tributária, a prescrição, de conhecimento oficioso, dá-se no prazo de 8 anos, a contar, in casu, da data da citação, tendo em consideração o prazo de suspensão já referido. 15. A prescrição do presente processo fiscal verificou-se em 08 – 06 – 2018, tendo em consideração a data do inicio da prescrição, ou seja, 26 - 11 – 2009 acrescida do tempo a que alude o art. 48º da Lei Geral Tributária, 8 anos e o tempo de suspensão de 202 dias, art. 49º, n.º 4 do mesmo diploma legal. 16. Esta questão da prescrição da dívida foi já exposta ao Serviço de Finanças .... No entanto, como já se referiu, sendo a prescrição de conhecimento oficioso, o tribunal deve tomar dela conhecimento independentemente do objeto do processo e de a questão ter sido ou não colocada previamente à administração tributária. 17. Considera o tribunal a quo que não tem competência para conhecer desta matéria. 18. Porém, tal como requerido pelo Embargante, ora Apelante na sua Oposição à Execução, o tribunal a quo por despacho de fls… considerou “que a prova em causa no presente processo de embargos é documental e que a única que falta, por forma a ser possível proferir a decisão final, é a que consta do ponto B do requerimento probatório do Embargante, determino que se oficie ao Serviço de Finanças ... para enviar a pretendida certidão.” 19. Uma vez que a resposta a tal solicitação não foi conclusiva, o que o próprio tribunal a quo admite ao afirmar que “nada se apurou”, não devia este ter proferido a sentença agora em crise, sem antes apurar da efetiva prescrição da dívida ou não. 20. Refere também o tribunal a quo na sua fundamentação que “… No caso em concreto a decisão judicial exequenda considerou que os montantes em causa, ainda que indexados aos valores apurados de impostos, juros e outros encargos, são devidos ao A. a título de indemnização, por se ter considerado que reflectem o prejuízo que os executados causaram ao exequente com a sua actuação.” 21. Bem como, que “Os Réus não cumpriram com as obrigações a que estavam vinculados com os Autores por isso estão obrigados a indemnizá-los pelos prejuízos que lhe causaram conforme o disposto no art.º 798º do C. Civil” e que (...) “os Réus violaram as disposição supracitadas por isso estão obrigados a indemnizar os Autores a que corresponde a quantia peticionas.” 22. Não se entende como é que o tribunal a quo chegou a esta conclusão. Isto porque, em primeiro lugar, os Executados não causaram qualquer prejuízo ao Exequente que os torne responsáveis perante aquele a título indemnizatório e segundo lugar, nunca o Exequente peticionou nestes autos qualquer quantia a título de indemnização nem tão pouco manifestou que tivesse sofrido qualquer prejuízo merecedor de tal instituto. 23. Sendo certo que, todos os valores apurados de impostos, juros e outros encargos constituem sim a quantia a pagar derivada da falta de liquidação devida e nunca poderão ser atribuídos a título de indemnização. 24. Mesmo no que toca à quantia apurada a título de juros sempre serão estes juros compensatórios ou remuneratórios de acordo com o art. 35º da LGT e não juros indemnizatórios. 25. Nunca os RR./Executados deveriam ter sido condenados a título de indemnização, não se colocando assim, sequer, a questão do prazo prescricional ser de 20 anos. 26. Apenas a prescrição desta obrigação poderá influenciar no decurso da execução, por torná-la judicialmente inexigível, facto este que, contrariamente ao entendimento do tribunal a quo é essencial para apurar se a obrigação tributária se encontra prescrita. 27. Também o Exequente/Embargado não entregou ao Estado o montante referente ao IRS de 2004 e demais encargos, nem o fará sabendo estar tal dívida prescrita e tornando-se a mesma, como tal, inexigível. 28. Se tal dívida se encontra prescrita e consequentemente inexigível, é evidente que o A. se locupletará injustificadamente com aquele valor. 29. Acrescenta o tribunal a quo que “… o embargante refere que o cálculo do valor em dívida está errado apenas traz aos autos um mero juízo conclusivo – desprovido da alegação de factos – o que não habilita o tribunal a pronunciar-se sobre a discordância do embargante com a liquidação (para além do que ficou dito a propósito da prescrição dos valores indicados no artigo 11.º da oposição que, como se disse, não podem ser excluídos com fundamento na sua prescrição).” 30. Não assiste razão ao Tribunal a quo porquanto, não faz o ora Apelante um juízo conclusivo tendo, isso sim, baseado a sua alegação em factos que lhe foram transmitidos pelo Serviço de Finanças ... e no próprio documento junto aos autos (no Requerimento Executivo), pelo que os valores indicados no art. 11º da Oposição estão prescritos de facto teriam de ser excluídos do cálculo da obrigação. 31. Deste modo, não estamos perante uma dívida certa, líquida e exigível. 32. No que respeita ao montante de € 818,03 que o tribunal a quo, e bem, entende serem da responsabilidade do Exequente e, como tal, manda deduzir à quantia exequenda, sempre se dirá que também deverão ser deduzidos os juros sobre este valor, calculados desde a data em que o negócio foi efetuado e que deram origem ao imposto (4 de Junho de 1993). 33. Assim, o tribunal a quo violou por errada interpretação e aplicação o disposto nos arts. 713º e 716º CPC, 35º, 48º e 49º da LGT, 798º, 309º, 311º e 798º do CC. Termina, pugnando pela procedência dos presentes embargos de executado, com as legais consequências. * O embargado/exequente apresentou contra-alegações, apresentando como CONCLUSÕES 1- Bem andou, quanto a este ponto, o tribunal a quo, ao decidir que não é competente para aferir da prescrição de uma dívida tributária. 2- A dívida tributária, como bem sabe o embargante ora recorrente, não se encontra prescrita, sendo que tal resulta da própria certidão junta aos autos pelo próprio doc. n.º 8, junto com a sua oposição à execução. 3- Consta também dos presentes autos, conforme notificação dirigida ao tribunal pela AT- Serviço de Finanças ..., à qual foi atribuída a ref.ª 2337420, mas datada de 18 de abril de 2019, de onde consta igualmente que “tendo compulsado os elementos constantes do processo de execução fiscal n.º 2321200901001515, instaurado contra João, não consta dos autos, na presente data, despacho proferido nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 48.º da Lei Geral Tributária.” 4- Não prescreveu também a obrigação pois, como bem sustenta o tribunal a quo, pois “a decisão judicial exequenda considerou que os montantes em causa, ainda que indexados aos valores apurados de impostos, juros e outros encargos, são devidos ao A. a título de indemnização, por se ter considerado que refletem o prejuízo que os executados causaram ao exequente com a sua atuação.” 5- Isto porque, como fundamento, pode ler-se na mesma douta sentença que “os Réus não cumpriram com as obrigações a que estavam vinculados com os Autores por isso estão obrigados a indemniza-los pelos prejuízos que lhe causaram conforme o disposto no art. 798.º do C.Civil.” 6- Ponto fulcral quanto à prescrição, é o entendimento, por nós tido por correto, segundo o qual, “condenados os RR., por decisão judicial transitada em julgado, a pagar ao A. indemnização, o prazo de prescrição do direito de indemnização é de 20 anos – artigos 309.º e 311.º do C. Civil.” 7- Bem andou por isso ao referir que a prescrição que releva nos presentes autos é a prescrição da obrigação exequenda. 8- Quanto à liquidação da obrigação, 9- é diferente não existir liquidação e não se concordar com o teor da mesma. 10- Que houve liquidação não restam dúvidas, nem ao próprio tribunal, que o afirma na douta sentença, nem sequer, segundo estamos em crer, ao embargante ora recorrente que afirma que a mesma “não está correta”. 11- E quanto à afirmação de que a mesma não está correta, bem andou o tribunal a quo ao concluir nos termos em que concluiu, ou seja, “quando o embargante refere que o cálculo do valor em dívida está errado apenas traz aos autos um mero juízo conclusivo – desprovido da alegação de factos.” 12- Pelo que, do supra exposto, retira-se, com o devido respeito e salvo melhor opinião, que deve improceder in totum a presente apelação, pois que não foram violados os artigos 713.º e 716.º do CPC e os artigos 309.º, 311.º e 798.º do C. Civil. Finaliza, pugnando, no essencial, pela confirmação da decisão recorrida. * Após os vistos legais, cumpre decidir. * II. DO OBJETO DO RECURSO:O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, n.º 4, 637º, n.º 2 e 639º, nºs 1 e 2, do C. P. Civil), não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, n.º 2, in fine, ambos do C. P. Civil). No seguimento desta orientação, cumpre fixar o objeto do presente recurso. Neste âmbito, as questões decidendas traduzem-se nas seguintes: - Saber se ocorre prescrição da dívida exequenda. - Saber se a obrigação exequenda se mostra devidamente liquidada. * III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO* FACTOS PROVADOS O tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos: 1. Por sentença de 15.11.2016, transitada em julgado, proferida no processo declarativo n.º 600/10.0TBPTL, foram os ali RR. António e J. R., condenados ao pagamento solidário ao Autor João das quantias referentes: a) ao imposto de IRS do ano de 2004, relativas ao prédio vendido em 09/01/2004, respetivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; b) ao imposto de CA dos anos de 2001 e 2002 e de IMI de 2003, respetivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; c) às coimas, respetivos juros e custas processuais fiscais; as quais, nesta data, totalizam o montante ilíquido de € 5.590,53, mas cujo valor final deverá ser determinado em liquidação de sentença e deduzido do montante de € 818,03 bem como, nos juros compensatórios e de mora vincendos sobre tal quantia até efetivo e integral pagamento. 2. Nos autos de execução da referida sentença, o exequente liquidou a quantia exequenda, resumidamente, nos seguintes termos: “O Autor ora exequente tem direito a receber dos Réus ora executados solidariamente, a quantia total de € 9.379,23, à qual deve ser subtraída a quantia de € 818,03, conforme decisão judicial. Tal quantia resulta do montante em capital em dívida, que é € 4.704,01 + € 156,92 + € 149,10 +€ 133,43 + € 266,43 + € 180,64 = € 5.590,53 E; A título de juros de mora e encargos, que correspondem, conforme supra exposto, às quantias: € 3.142,61 + € 420,53 + € 41,38 + € 41,38 + € 35,21 + € 41,38 + € 66,21 = € 3.788,70. 2- A tal quantia acrescem os juros vincendos, calculados sobre as quantias em dívida, à taxa de 4,857%, calculados de acordo com o aviso 139/2017 de 4 de Janeiro de 2018 para o ano de 2018 e ainda nas taxas de juro que vierem a ser fixadas pela República Portuguesa para os anos subsequentes, até efetivo e integral pagamento. 3- E ainda as custas processuais fiscais que possam acrescer a partir da presente data.”. 3. No Serviço de Finanças ... corre termos contra o exequente o processo de execução fiscal n.º 2321200901001515 relativo ao imposto de IRS do ano de 2004, ascendendo a quantia exequenda ao valor de € 8.267,15, valor esse calculado até ao dia 11 de Janeiro de 2018; 4. No âmbito do supra referido processo executivo os aqui executados foram notificados pela Repartição de Finanças ... para procederem ao depósito do crédito no montante de € 8.195,89 pertencente ao executado (nestes autos exequente) João, resultante da penhora de créditos efetuada através de ofício 268 de 28 de Janeiro de 2016. * FACTOS NÃO PROVADOSPor sua vez, o tribunal a quo consignou que: “Com relevância para a decisão inexistem factos por provar.” * IV) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO* A) Da prescrição Conforme resulta das alegações de recurso do recorrente, este insurge-se contra a decisão recorrida, invocando que todas as parcelas reclamadas no requerimento executivo, bem como da sentença condenatória, se mostram prescritas, porquanto estamos perante uma dívida fiscal prescrita nos termos do disposto no art. 48º da Lei Geral Tributária, prescrição essa que ocorreu em 08.06.2018. Como fundamento essencial deste seu raciocínio, o recorrente alega que se depreende do teor da sentença condenatória dada à execução que estamos perante uma dívida fiscal resultante do não pagamento de impostos devidos à autoridade tributária e, como tal, o exequente não é o “credor” de tal quantia, mas sim aquela autoridade tributária. Todavia, como é fácil de ver, não é isto que resulta do teor da sentença condenatória que o exequente deu à execução. Da mesma decisão judicial, já devidamente transitada em julgado, proferida, a 15.11.2016, no processo declarativo principal apenso, foram os ali réus António e J. R., condenados ao pagamento solidário ao autor João das quantias referentes: a) ao imposto de IRS do ano de 2004, relativas ao prédio vendido em 09/01/2004, respetivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; b) ao imposto de CA dos anos de 2001 e 2002 e de IMI de 2003, respetivos juros compensatórios e de mora e custas processuais fiscais; c) às coimas, respetivos juros e custas processuais fiscais; as quais, nesta data, totalizam o montante ilíquido de € 5.590,53, mas cujo valor final deverá ser determinado em liquidação de sentença e deduzido do montante de € 818,03 bem como, nos juros compensatórios e de mora vincendos sobre tal quantia até efetivo e integral pagamento. De acordo com o disposto no art. 306º, n.º 4, 1ª parte, do C. Civil, “se a dívida for ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja lícito promover a liquidação.” Por sua vez, estabelece o disposto no n.º 1 do art. 311º, do C. Civil, que: “O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo.” Neste caso, mostra-se patente que o legislador veio prever uma maior proteção ao credor que, nos termos daquela sentença transitada em julgado ou de outro título executivo, possui o seu direito perfeitamente consolidado, o que é igualmente do conhecimento do devedor, pelo que a lei estabelece um prazo mais alargado para que exerça coativamente tal direito, independente do prazo a que estava inicialmente subordinado. Explicitando a razão de ser do alargamento do prazo prescricional, salientou-se no Ac. STJ de 19.02.2004 (1) que: “A conversão do prazo de prescrição explica-se pela nova certeza e estabilidade do direito derivado da sentença, e porque o seu titular se sente mais à vontade para o não exercer com a prontidão com que o faria valer antes do reconhecimento judicial.” Ademais, deixa-se de verificar um dos fundamentos do instituto: penalizar a inércia do titular do direito. (2) Por outro lado, não é pressuposto da aplicabilidade deste regime jurídico, a existência de uma sentença de condenação, cabendo aplicá-lo mesmo relativamente a sentenças de mera declaração ou apreciação. (3) Porém, quando “a sentença ou o outro título se referir a prestações ainda não devidas, a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo” (art. 311º, n.º 2, do C. Civil). A este propósito, cumpre igualmente trazer à colação a anotação a este preceito legal elaborada por Pires de Lima e Antunes Varela (4), designadamente ao considerarem que: “A sentença, ou outro título executivo, transforma a prescrição a curto prazo, mesmo que só presuntiva, numa prescrição normal, sujeita ao prazo de vinte anos (…) Para tanto é necessário que a sentença já tenha transitado em julgado. Pode, porém, acontecer que haja condenação em prestações ainda não vencidas, como se se condena o devedor a pagar, para futuro, certa prestação alimentar. Em relação às prestações vincendas já não vale a regra do n.º 1. (…) É necessário, porém, distinguir entre as prestações ainda não devidas e as prestações que são já devidas, que constituem já objecto dum direito actual, embora só devam ser efectuadas no futuro.” Volvendo ao caso em apreço, cumpre referir que, conforme é salientado na sentença recorrida, “a decisão judicial exequenda considerou que os montantes em causa, ainda que indexados aos valores apurados de impostos, juros e outros encargos, são devidos ao A. a título de indeminização, por se ter considerado que reflectem o prejuízo que os executados causaram ao exequente com a sua actuação. Com efeito, lê-se nela, além de tudo mais, que “Os Réus não cumpriram com as obrigações a que estavam vinculados com os Autores por isso estão obrigados a indemnizá-los pelos prejuízos que lhe causaram conforme o disposto no art.º 798º do C. Civil” e que (…) “os Réus violaram as disposição supracitadas por isso estão obrigados a indemnizar os Autores a que corresponde a quantia peticionas [peticionada]”. Daqui se conclui, pois, que, uma vez transitada em julgado, aquela decisão judicial condenatória, o direito de indemnização do exequente – único credor da mesma indemnização – consolidou-se, passando o respetivo prazo de prescrição de tal direito de indemnização a ser o prazo ordinário de 20 anos (arts. 309º e 311º, do C. Civil). Tal como afirma Menezes Cordeiro “obtida sentença que reconheça a indemnização, só a prescrição ordinária pode extinguir a obrigação dessa forma reconhecida – art. 311º, n.º 1.” (5) Este mesmo Autor, enumerando alguns dos exemplos contemplados no art. 311º, n.º 1, do C. Civil, refere-se exatamente ao caso da “condenação em indemnização a liquidar em execução de sentença, em que o prazo passa dos 3 (artigo 498º/1) para os 20 anos (artigos 309º e 311º/1).” (6) Também a jurisprudência tem vindo uniformemente a sufragar esta mesma posição, salientando-se designadamente o Ac. RL de 13.01.2016 (7), onde se pode ler do seu sumário que: “Fica sujeito ao prazo ordinário de prescrição, o crédito reconhecido por sentença transitada em julgado, ainda que a obrigação seja ilíquida e, por consequência, o título executivo não seja suficiente para fundamentar uma execução (art. 311º, n.º 1, do C. Civil).” (8) Realce-se que a invocada prescrição das prestações tributárias em causa poderiam, quando muito, constituir objeto de apreciação no âmbito do referido processo declarativo, sendo que, no âmbito do presente processo executivo apenas cumprirá apreciar a prescrição da obrigação exequenda, emergente da apontada sentença condenatória, em respeito dos princípios de segurança e certeza jurídicas. Não pode, pois, o recorrente vir agora pôr em causa a sentença condenatória proferida, designadamente invocando que os réus nunca poderiam ser condenados a título de indemnização e/ou que tal quantia indemnizatória não poderia nunca abranger os juros de mora indemnizatórios, mas unicamente os juros compensatórios ou remuneratórios. Não vemos igualmente como podemos concluir que a sentença condenatória se encontra prescrita. Ademais, mesmo a considerar-se que, após aquela decisão judicial, o direito de indemnização que a mesma pretendeu salvaguardar já não se justificaria, porque as dívidas tributárias em causa já se mostram prescritas e, como tal, não irão ser pagas, daí resultando um injustificado enriquecimento do credor exequente à custa do património do executado, tal situação nunca poderia ser sindicada no âmbito do presente processo, podendo eventualmente dar lugar à instauração de uma ação por “enriquecimento sem causa” (art. 473º, do C. Civil), o que, em todo caso, extravasa claramente o objeto da presente ação. Por conseguinte, não se encontrando prescrita, à data da propositura da execução principal apensa e, concomitantemente, subsequente notificação do executado, a obrigação exequenda emergente daquela sentença condenatória – que é a única que aqui releva –, forçoso é concluir que é de manter a decisão do tribunal a quo que decidiu julgar improcedente a referida exceção perentória de prescrição da obrigação exequenda. Termos em que se conclui pela improcedência, neste segmento, da apelação em presença. * B) Da liquidação da quantia exequenda* Insurge-se igualmente o apelante contra a decisão recorrida, porquanto entende que a liquidação efetuada pelo exequente não se mostra correta. Desde logo, porque os valores referidos no art. 11º da oposição (num total de € 1.112,08) se mostram prescritos e, como tal, deveriam ter sido excluídos do cálculo da obrigação. Sucede, porém, que tais valores estão incluídos na indemnização devida ao credor exequente, a qual, por sua vez, não se mostra prescrita, conforme já concluímos supra. O recorrente veio ainda invocar, na sua oposição, que o exequente/embargado fez um cálculo errado das quantias em dívida, bem como não procedeu à contabilização do valor dos juros sobre a quantia de € 818,03, quantias estas que deverão ser subtraídas ao total da quantia exequenda. Daí conclui que não estamos perante uma dívida líquida, certa e exigível (cfr. arts. 12º e 13º da oposição). Como se depreende com facilidade, a dívida exequenda calculada pelo exequente mostra-se claramente líquida e certa, podendo é, quando muito, ser em parte inexigível, face à decisão judicial exequenda. Disso mesmo o tribunal a quo deu conta, dando razão ao embargante e determinou a dedução ao montante exequendo do valor de € 818,03, correspondente ao valor de imposto que sempre seria da responsabilidade do exequente e, como tal, não compreendido na indemnização a que tem direito. Nesta medida, o valor da quantia exequenda ascende somente a € 8.561,20 (€ 9.379,23 - € 818,03), sobre o qual se vencem os respetivos juros de mora, à peticionada taxa, até efetivo e integral pagamento; não havendo lugar a qualquer outra dedução, designadamente em termos de cálculo de juros, conforme aliás resulta da respetiva sentença condenatória dada à execução (cfr. ponto I-c) da parte decisória da mesma sentença). Deste modo, improcede na sua totalidade a apelação em presença. * V. DECISÃOPelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se, pois, a sentença recorrida. Custas pelo apelante (art. 527º, n.º 1, do C. P. Civil). * * Guimarães, 10.07.2019 Este acórdão contem a assinatura digital de: Relator: António José Saúde Barroca Penha. 1º Adjunto: Desembargadora Eugénia Marinho da Cunha. 2º Adjunto: Desembargador José Manuel Alves Flores. 1. Proc. n.º 04A095, relator Afonso de Melo, disponível em www.dgsi.pt. 2. Neste sentido, vide Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade, Anotação aos artigos 296º a 333º do Código Civil, Coimbra Editora, 2008, pág. 88. 3. Neste sentido, cfr. Vaz Serra, Prescrição extintiva e caducidade, BMJ 106, pág. 139. 4. Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, 4ª edição, pág. 281. 5. Direitos das Obrigações, 2º Volume, AAFDL, 2001, pág. 431. 6. In Tratado de Direito Civil, Vol. V, Parte Geral – Exercício Jurídico, Almedina, 2ª edição, pág. 211. 7. Proc. n.º 2342/14.9TTLSB-C.L1-4, relatora Paula Santos, disponível em www.dgsi.pt. 8. No mesmo sentido, cfr., por todos, Ac. STJ de 08.04.2008, relator Fonseca Ramos; Ac. STJ de 16.06.2009, proc. n.º 43/07.3TBPTL.S1, relator Urbano Dias; Ac. STJ de 09.06.2016, proc. n.º 190/98.0TBCMN-B.G1.S1, relator Oliveira Vasconcelos; Ac. RG de 02.02.2017, proc. n.º 1151/12.4TTGMR-B.G1, relatora Vera Sottomayor; e Ac. RP de 15.09.2014, proc. n.º 881/13.8TTBRG-A.P1, relatora Paula Leal de Carvalho, todos acessíveis em www.dgsi.pt. |