Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
36/11.6T8MCD.G2
Relator: PAULA RIBAS
Descritores: AUTORIDADE DE CASO JULGADO
REJEIÇÃO DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
EMPREITADA
CADUCIDADE
DEVER DE DENÚNCIA DOS DEFEITOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO DA RÉ IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 –As exceções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à exceção do caso julgado.
2 – Estamos assim perante a invocação da mesma exceção e, como tal, estando definitivamente decidida a exceção de litispendência, não pode apreciar-se a exceção dilatória de caso julgado, se estiver em causa a alegação da mesma repetição de ações, apenas porque inicialmente estavam ambas ainda pendentes e, agora, uma delas está já transitada em julgado.
3 – Não existe também autoridade de caso julgado quando, na sentença proferida na primeira ação, a dona de obra, que foi demandada pela empreiteira exigindo o pagamento do preço que está por pagar, se decide deduzir o valor do preço devido pelos trabalhos que estavam acordados ser realizados pela empreiteira e que esta não realizou, e, na segunda ação, a mesma dona de obra invoca a existência de defeitos, conhecidos em data posterior à contestação oferecida naquela primeira ação, relativamente à construção que foi efetivamente realizada pela empreiteira.
4 - É de rejeitar a impugnação da matéria de facto em que se visa um conjunto de factos provados, em bloco, não relacionados entre si, sem que seja efetuada qualquer avaliação crítica da prova indicada pelo próprio recorrente, no confronto com a motivação da decisão da matéria de facto constante da decisão sob recurso.
5 – Cumpre o dever de denúncia dos defeitos da obra a propositura da ação judicial pela dona de obra visando a sua eliminação pela empreiteira.
Decisão Texto Integral:
Relator: Paula Ribas
1ª Adjunta: Maria da Conceição Correia Ribeiro da Cruz Bucho
2ª Adjunta: Sandra Melo
Processo 36/11.6T8MCD.G2
Juízo Central Cível e Criminal ... - Juiz ... - da Comarca ...

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório (elaborado tendo por base o da sentença da 1.ª instância):

EMP01..., Unipessoal, Lda. intentou a presente ação comum contra EMP02..., Lda., fundando a sua pretensão na responsabilidade civil contratual, mais concretamente no cumprimento defeituoso de contrato de empreitada outorgado entre ambas, respetivamente, na qualidade de dona da obra e empreiteira, peticionando a condenação da ré a:
- logo após o trânsito em julgado da sentença, proceder à correção e à execução da obra em total obediência e na observância escrupulosa dos projetos de licenciamento, bem como dos projetos de especialidades e de alterações, designadamente a:
1. Substituir as caleiras, os algerozes e os tubos de queda de água na casa de repouso;
2. Refazer a rede de esgotos (retirar a dupla sifonagem e criar um sistema separativo de drenagem de águas residuais), de acordo com o que está projetado;
3. Escorar toda a estrutura do edifício;
4. Proceder à aplicação de argamassas de reforço estrutural no edifício;
5. Escorar todo o edifício, acrescentar armadura, aumentar a secção e reparar as fissuras visíveis na casa;
6. Escorar e recalcar a fundação até à profundidade ativa e reparar as fissuras;
7. Rearmar os varões cortados e repor a secção dos elementos;
8. Aterrar a periferia das sapatas até à altura das mesmas e compactar o terreno;
9. Reforçar a laje e criar apoios intermédios;
10. Refazer os lintéis de fundação;
11. Elaborar novo dimensionamento hidráulico para a presente conceção adotada e refazer toda a rede de coletores prediais;
12. Proceder à eliminação dos sifões dos coletores prediais, bem como à criação de uma nova rede de recolha seletiva do edifício;
13. Recalcular e refazer toda a rede de abastecimento de água;
14. Proceder à colocação das tubagens que se encontram soltas na sua devida posição e criar meios para o seu correto posicionamento;
15. Refazer a rede de tubagens.

Em alternativa, se assim não fosse julgado concretizável, ser a ré condenada a pagar à autora indemnização pelos danos ou prejuízos referenciados nos arts.ºs 17.º a 159.º da petição inicial, num valor global nunca inferior a €2.100.000,00, a liquidar em execução de sentença.
Devidamente citada, veio a ré empreiteira contestar, invocando a exceção dilatória de litispendência e as exceções perentórias de caducidade do direito da autora à eliminação dos defeitos, a exigir nova construção, à redução do preço, à resolução do contrato e à indemnização peticionada.
Para além de se defender por exceção e impugnação motivada, a ré deduziu reconvenção contra a autora, alegando, para o efeito, que foi a autora que incumpriu culposamente o contrato de empreitada entre ambas celebrado, na medida em que do preço total da empreitada, que ascendeu aos €1.025.070,93, apenas lhe pagou a quantia de €905.000,00, achando-se em dívida a quantia de €120.070,93, a que acrescem €28.096,97, com IVA incluído.
Alegou, ainda, que a culposa atuação da autora, que culminou com a propositura deste processo injusto, lhe causou danos de índole não patrimonial que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito, assistindo-lhe, pois, o direito a ser indemnizada pela lesante, em montante não inferior a €3.000,00.
Alegou, por fim, que a autora litigou de má-fé, peticionando a sua condenação no pagamento de uma multa.
A autora apresentou articulado de réplica, pugnando pela não verificação da invocada exceção dilatória de litispendência, e, bem assim, das apontadas exceções perentórias de caducidade.
No articulado de réplica a autora e reconvinda, no que ao pedido reconvencional dizia respeito, invocou ainda exceção dilatória de litispendência, sem prejuízo da defesa por impugnação que apresentou quanto à matéria de facto que servia de base àquele articulado.
Alegou ainda a inexistência de fundamento para se considerar que litiga de má-fé.
A ré reconvinte treplicou, respondendo à invocada exceção dilatória de litispendência, reafirmando o alegado e as posições e pretensões sustentadas na contestação/reconvenção que apresentou.

Findos os articulados, o tribunal proferiu despacho saneador, nos termos do qual:
- julgou não verificada a exceção dilatória de litispendência invocada pela ré/reconvinte em sede de contestação, com reporte à ação;
- por verificação da exceção dilatória de litispendência, absolveu a autora/reconvinda de parte da instância reconvencional, designadamente na que tange com o pedido de condenação no pagamento da quantia de €178.991,61, acrescida do pagamento dos juros vincendos, à taxa legal em vigor desde a notificação da contestação/reconvenção à autora/reconvinda, até integral e efetivo pagamento;
- admitiu a reconvenção:
a) na parte atinente ao pedido de condenação da autora/reconvinda no pagamento de uma indemnização à ré/reconvinte, a título de ressarcimento de danos não patrimoniais, em quantia não inferior a €3.000,00, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal em vigor desde a notificação da contestação até integral e efetivo pagamento;
b) na parte concernente ao pedido formulado pela ré/reconvinte de condenação da autora/reconvinda como litigante de má-fé, no pagamento de uma indemnização de quantia não inferior a €3.000,00, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal em vigor desde a notificação da contestação até integral e efetivo pagamento.
No mais, relegou para a sentença o conhecimento das exceções perentórias de caducidade invocadas pela ré em sede de contestação, tendo, por último, selecionado a matéria de facto relevante para a boa decisão da causa, enunciando os factos assentes e elaborando a base instrutória.
A ré reclamou da seleção da matéria de facto operada no despacho saneador, reclamação essa que foi atendida nos exatos termos constantes do despacho constante de fls. 731 e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
*
Ao abrigo do disposto no art.º 588.º do C. P. Civil (doravante C. P. Civil), a fls. 1268 e ss., a autora apresentou articulado superveniente, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
O articulado superveniente apresentado pela autora foi liminarmente admitido, ao abrigo do disposto no art.º 588.º, nºs 1 a 4 do C. P. Civil, por despacho judicial de fls. 1277 e ss. dos autos.
Exercendo o seu direito ao contraditório, ao abrigo do disposto no art. 588.º, n.º4, do C. P. Civil, a ré respondeu à matéria objeto do articulado superveniente apresentado pela autora através do articulado constante de fls. 1280 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
Em face da admissão do articulado superveniente apresentado pela autora, os factos aí articulados pela mesma, com interesse para a boa decisão da causa, passaram a constituir tema de prova, como decorre do art.º 588.º, n.º 6, do C. P. Civil e se deixou consignado no despacho de fls. 1293 e ss. dos autos.
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Em momento anterior ao início do julgamento, proferiu-se despacho no qual se fez consignar que os temas da prova da audiência final seriam (naturalmente para além dos factos articulados no sobredito articulado superveniente apresentado pela autora que interessem à boa decisão da causa - por imposição legal do art.º 588.º, n.º6, do C. P. Civil e do consignado e decidido no despacho de fls. 1293 e ss.) os pontos de facto que integram a base instrutória do despacho saneador, bem como estes seguintes dois pontos:
- Foi operado um desvio à liga de água/ribeiro junto ao edifício obra objeto de empreitada dos autos? e,
- Os vícios ou defeitos alegadamente existentes no edifico obra em que se reportam os pontos 4, 5, 15, 17, 18, 21, 57, 58, 59, 60, 61, 64 e 66 da base instrutória foram provocados exclusivamente por um desvio à liga de água/ribeiro e/ou por um mal emanilhamento efetuado acima das cotas das fundações da casa de repouso?
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No prazo de 10 dias para a ré produzir, por escrito, as suas alegações, de facto e de direito, por via do requerimento com a referência eletrónica n.º...65, veio a autora ampliar o pedido que primitivamente aduziu.

Com a ampliação do pedido, passou a autora a peticionar a condenação da ré a:
- Logo após o trânsito em julgado da sentença, proceder à correção e à execução da obra em total obediência e na observância escrupulosa dos projetos de licenciamento, bem como os projetos de especialidades e de alterações, designadamente a:
1. Substituir as caleiras, os algerozes e os tubos de queda de água, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor;
2. Refazer a rede de esgotos (retirar a dupla sifonagem e criar um sistema separativo de drenagem de águas residuais), de acordo com o que está projetado;
3. Escorar toda a estrutura do edifício;
4. Proceder à aplicação de argamassas de reforço estrutural;
5. Escorar todo o edifício, acrescentar armadura, aumentar a secção e reparar as fissuras visíveis na casa;
6. Escorar e “recalcar” a fundação até à profundidade ativa e reparar as fissuras;
7. Rearmar os varões cortados e repor a seção dos elementos;
8. Aterrar a periferia das sapatas até à altura das mesmas e compactar o terreno;
9. Reforçar a laje e criar apoios intermédios;
10. Refazer os lintéis de fundação;
11. Elaborar novo dimensionamento hidráulico para a presente conceção adotada e refazer toda a rede de coletores prediais, respeitando igualmente todos os decretos regulamentares em vigor;
12. Proceder à eliminação dos sifões dos coletores prediais, bem como à criação de uma nova rede de recolha seletiva no edifício, respeitando igualmente todos os decretos regulamentares em vigor;
13. Recalcular e refazer toda a rede de abastecimento de água, respeitando igualmente todos os decretos regulamentares em vigor;
14. Proceder à colocação das tubagens que se encontram soltas na sua devida posição e a criar meios para o seu correto posicionamento;
15. Refazer a rede de tubagens, respeitando igualmente todos os decretos regulamentares em vigor;
16. Reparar o solo da casa das máquinas;
17. Colocar ventilação adequada e suficiente no desvão sanitário;
18. Substituir todo o pavimento flutuante, colocando o da marca ... com manga plástica;
19. Reparar o pavimento exterior do edifício de modo a que o mesmo fique com a inclinação necessária e drenagem suficiente para o correto escoamento das águas pluviais;
20. Colocar bocas de limpeza em cada troço retilíneo e em cada interceção, de acordo com os decretos regulamentares em vigor;
21. Substituir o desumidificador modelo CPD3+E pelo desumidificador CDP5 ou por um equivalente a este último;
22. Substituir o permutador de placas, acumuladores e caldeira de aquecimento pela Bomba de Calor AR/Água da marca ... ou por uma equivalente a esta;
23. Colocar sifões em todas as instalações sanitárias;
24. Refazer a rede de ventilação das instalações sanitárias, de acordo com o respetivo projeto de especialidade e os decretos regulamentares aplicáveis;
25. Escorar e rearmar os varões cortados e repor a secção dos elementos resistentes, nomeadamente as vigas e vigotas perfuradas e as suas armaduras que no desvão sanitário foram alvo de diversos cortes;
26. Aterrar a periferia das sapatas até à altura das mesmas e compactar terreno;
27. Reforçar a laje e criar apoios intermédios;
- Em alternativa, assim não se julgando concretizável, ser a ré condenada a pagar à autora a indemnização dos danos ou prejuízos referenciados de 17 a 159 da petição inicial, num valor global nunca inferior a €2.100.000,00, a liquidar em execução de sentença.
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Na sequência de despacho judicial nesse sentido, a secretaria notificou a ré para, em prazo fixado, esclarecer e informar o tribunal sobre se dava ou não o seu acordo à ampliação do pedido perpetrada pela autora, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 264.º do C. P. Civil.
No prazo que lhe foi fixado a ré veio declarar, perante o tribunal, que não dava o seu acordo à ampliação do pedido perpetrada pela autora, tendo o Tribunal considerado que o ato foi praticado até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, constituindo o desenvolvimento do pedido primitivo, admitindo assim a ampliação do pedido (cf. despacho com a referência eletrónica n.º...64, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que decidiu:
* Condenar a ré “EMP02..., Lda.” a, logo após o trânsito em julgado da sentença, proceder à correção/eliminação dos vícios e/ou defeitos notados em obra, em total obediência e na observância escrupulosa dos projetos de licenciamento, bem como dos projetos de especialidades e de alterações, designadamente a:
- Substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior; a substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro; a substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro; e, bem assim, a colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor;
- Eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha;
- Reparar as fissuras visíveis no edifício e a garantir o recobrimento das armaduras;
- Refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício;
- Substituir, integralmente, o solo da casa máquinas;
- Substituir todo o soalho flutuante aplicado no ... e no ... andar do edifício por pavimento flutuante da marca ..., incluindo manga plástica ou uma solução equivalente;
- Reparar o pavimento exterior do edifício, eliminando as zonas com deformações e inclinação insuficiente, de modo a que o mesmo fique com a inclinação necessária e drenagem suficiente para o correto escoamento das águas pluviais;
- Reparar globalmente a rede de drenagem de águas residuais, colocando, em cada troço retilíneo e em cada interceção, as bocas de limpeza em falta nas tubagens de recolha de águas residuais;
- Praticar os atos necessários a fazer com que todos os aparelhos sanitários sejam sifonados individualmente, e, bem assim, que os ramais de descarga, com exceção dos da sanita, sejam reunidos em caixas de reunião sifonados com tampas metálicas facilmente amovíveis.
* Absolver a ré “EMP02..., S.A.” do mais peticionado pela autora “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, a título principal, ou seja, no que concerne a eliminação de vícios e/ou defeitos.
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Uma vez que se julga concretizável a eliminação dos vícios e/ou defeitos da obra, em face da procedência (ainda que parcial) do pedido aduzido pela autora “EMP01..., Unipessoal, Lda.” a título principal, nos termos do disposto no art. 554, n.º1 do Código de Processo Civil, decide o tribunal não tomar em consideração o pedido subsidiário aduzido pela autora, consistente na condenação da ré “EMP02..., Lda.” a pagar à autora uma indemnização pelos danos ou prejuízos referenciados nos artigos 17.º a 159.º da petição inicial, num valor global nunca inferior a €2.100.000,00 (dois milhões e cem mil euros), a liquidar em execução de sentença.
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Mais se decide julgar totalmente improcedente, por não provada, a reconvenção (na parte admitida) aduzida pela ré/reconvinte “EMP02..., Lda.”, e, em consequência:
- Absolver a autora/reconvinda “EMP01..., Unipessoal, Lda.” do pedido contra si formulado pela sobredita ré/reconvinte de condenação, como litigante de má-fé, no pagamento de uma quantia indemnizatória não inferior a €3.000,00 (três mil euros);
- Absolver a autora/reconvinda “EMP01..., Unipessoal, Lda.” do pedido contra si formulado pela sobredita ré/reconvinte de condenação, a título de compensação por danos não patrimoniais, de uma quantia indemnizatória não inferior a €3.000,00 (três mil euros);
- Absolver a autora/reconvinda “EMP01..., Unipessoal, Lda.” do pedido contra si formulado pela sobredita ré/reconvinte de condenação no pagamento dos juros de mora calculados, à taxa legal em vigor, sobre as sobreditas quantias indemnizatórias peticionadas, desde a notificação da contestação/reconvenção à autora/reconvinda e até integral e efetivo pagamento.
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Custas da ação, por autora e ré, na proporção do decaimento. (cf. art. 527, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil)
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Custas da reconvenção pela ré/reconvinte. (cf. art. 527, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil)”.
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Inconformada, veio a ré interpor recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:

“1 – (reproduz na íntegra o dispositivo da sentença).
2 - Conforme se encontra provado, a aqui recorrente intentou ação declarativa contra a recorrida correspondente ao Proc. 144/09.3TBMCD que correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo Central Cível e Criminal ... – Juiz ... e implicou a produção de três sentenças., conforme consta das certidões juntas aos autos.
3 - Já na contestação oferecida nestes autos a recorrente invocou a exceção dilatória de litispendência e as exceções perentórias de caducidade do direito da autora à eliminação dos defeitos, a exigir nova construção, à redução do preço, à resolução do contrato e à indemnização peticionada.
4 - Na pendência destes autos decorreram outros conflitos entre recorrente e recorrida que motivaram as ações que atrás se identificam.
Conforme consta da sentença recorrida, é objeto do presente litigio;
“A questão de fundo, perante a complexa pretensão jurídica formulada pelo lado ativo da lide, num quadro de responsabilidade contratual emergente de contrato de prestação de serviços, na modalidade de empreitada, consiste em saber se a ré, na qualidade de empreiteira, culposamente, cumpriu defeituosamente o contrato de empreitada que outorgou com a autora/dona da obra, em causa nestes autos, mais concretamente a sua obrigação principal e fundamental de executar a obra em conformidade com o que foi convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato de empreitada. Isto, em ordem a decidir se assiste à autora o direito a exigir e obter da ré, nos termos peticionados, a reparação/eliminação dos vícios e/ou defeitos, ou, assim não se julgando concretizável, o direito a obter a condenação da ré a indemnizá-la pelos danos ou prejuízos referenciados nos artigos 17.º a 159.º da petição inicial, num valor nunca inferior a €2.100.000,00 (dois milhões e cem mil euros), a liquidar em execução de sentença.”
5 - Repete-se assim nesta ação o que foi discutido nas ações atrás identificadas.
6 – Na sentença recorrida verifica-se a violação de caso julgado e autoridade de caso julgado, tendo em consideração as ações a que atrás se alude e cujas certidões das respetivas decisões integram já estes autos.
7 - A exceção de caso julgado e autoridade de caso julgado são duas vertentes, a primeira negativa e a segunda positiva, sobre a mesma realidade - o caso julgado.
8 - Na vertente negativa impede-se que se repita uma nova ação.
9 - Na positiva impõe-se ao tribunal que não decida e aceite ou se vincule à decisão anterior.
10 - O certo é que cada uma das vertentes assenta na força do caso julgado, isto é, no seu fundamento – economia processual (evitar repetição de decisões) e segurança nas decisões jurisdicionais (evitar contradições de julgados).11 - E este princípio está consagrado no artigo 619 n.º 1 do CPC “Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702”.
12 - Este princípio, aqui consagrado legalmente, conexiona-se com os limites do caso julgado, isto é, com a sua eficácia ou extensão.
13 - Assim, o caso julgado, tanto na vertente negativa, como positiva, implica uma tríplice identidade, para que possa vincular o tribunal e as partes. Na verdade, se se colocar apenas ênfase na vertente objetiva ou positiva, estamos a descurar a eficácia subjetiva, ou seja, a vinculação da decisão aos intervenientes, que não tiveram oportunidade de exercerem o direito do contraditório.
14 - O que não se pretende é que as mesmas partes, no plano jurídico, estejam sujeitas a repetição de ação idêntica e a contradição de julgados sobre questões que já foram decidas anteriormente (Cfr. – Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora Lda., 1976, pag. 308 a 334; Alberto dos Reis, CPC. Anotado, Vol. V, pag. 174 a 179; Anselmo de Castro Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, 1982, pag. 385 a 396; Rodrigues Bastos, Notas ao CPC. Vol. III, 1972, anotação ao artigo 671 e 673; Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pag. 704 a 729; Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, pag. 578 a 587).
15 - No caso em apreço, temos três decisões transitadas em julgado, que se se conexionam com a decisão impugnada, nas quais intervirem recorrente e recorrida e tiveram sempre por fundamento o mesmo contrato de empreitada.
16 - No plano subjetivo constata-se que quer a recorrente quer a recorrida são partes nas identificadas ações se encontra em discussão o contrato de empreitada.
17 - Daí que aquelas decisões vinculem ambas as partes, impondo-se a autoridade de caso julgado àquele.
18 - Na verdade, a segurança jurídica nas decisões, que alicerça a autoridade do caso julgado, passaria a gerar uma forte insegurança, na medida em que os cidadãos se poderiam confrontar com situações imutáveis, violadoras dos seus direitos, sem que tivessem oportunidade de se defenderem, o que não se verifica no caso sob apreciação.
19 - Por outro lado, a decisão transitada insere-se num processo cuja causa de pedir e pedido não são diferentes dos elencados na causa em apreço.
20 - Para que se verifique a identidade do pedido e da causa de pedir, é indiferente que os pedidos formulados numa e em outra ação não sejam rigorosamente iguais. O que é relevante é que emergem do mesmo contrato.
21- Daí que nesta parte haja identidade de causa de pedir e pedido, pelo que a autoridade do caso julgado, neste plano, também se impõe.
22 - Nesta ação discutem-se os mesmos direitos da recorrida dos processos em que foram proferidas as decisões transitadas.
23 - A exceção de caso julgado e autoridade do caso julgado são duas vertentes da mesma realidade – o caso julgado.
24 - Cada uma das vertentes assenta na força do caso julgado, isto é, no seu fundamento – economia processual (evitar repetição de decisões) e segurança nas decisões jurisdicionais (evitar contradições de julgados).
25 - Este princípio conexiona-se com os limites do caso julgado, isto é, com a sua eficácia ou extensão.
26 - No plano subjetivo, a decisão transitada em julgado impõe-se às partes intervenientes ou legalmente citadas, com oportunidade para deduzirem o contraditório.
27 - No plano objetivo, as decisões impõem-se na parte em que houve decisão de uma ou várias questões em que haja identidade do objeto da decisão, em conexão com os fundamentos de facto que a sustentaram, como resulta do artigo 621º do CPC.
28 - Face a tudo o que aqui se alega tem de se concluir que a sentença recorrida tem de ser revogada e julgada procedente a exceção de caso julgado e autoridade de caso julgado.
29 – A recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto com reapreciação da prova gravada.
30 - Em conformidade com o disposto nos nºs 1 e 2 do artº 640º do C.P.Civil, impugnando-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente especifica:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
Pelo aqui se identificam os seguintes pontos, por referência à identificação que consta da sentença recorrida.
“32. No sobredito troço subdimensionado executado pela ré, quando chove intensamente, as caleiras podem transbordar, em razão de não possuírem capacidade para recolha de toda a água que chega da cobertura do edifício.”
“33. O pavimento exterior do edifício apresenta deformações de tal forma acentuadas, com pontos de inclinação insuficiente (nomeadamente no pátio traseiro), que colocam em causa o correto escoamento das águas pluviais.
“34. Por esse motivo, no caso se verificar chuva intensa, podem ocorrer inundações no interior do edifício.”
“42. São percetíveis maus-cheiros numa instalação sanitária de serviço de um quarto do edifício.”
(…)
“68. Para eliminar as anomalias existentes em obra, é necessário:
- Substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior;
- Substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro;
- Substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro;
- Colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor;
- Eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha;
- Reparar as fissuras visíveis no edifício e a garantir o recobrimento das armaduras; - Refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício;
- Substituir, integralmente, o solo da casa máquinas;
- Substituir todo o soalho flutuante aplicado no ... e no ... andar do edifício por pavimento flutuante da marca ..., incluindo manga plástica ou uma solução equivalente;
- Reparar o pavimento exterior do edifício, eliminando as zonas com deformações e inclinação insuficiente, de modo a que o mesmo fique com a inclinação necessária e drenagem suficiente para o correto escoamento das águas pluviais;
- Reparar globalmente a rede de drenagem de águas residuais, colocando, em cada troço retilíneo e em cada interceção, as bocas de limpeza em falta nas tubagens de recolha de águas residuais;
- Praticar os atos necessários a fazer com que todos os aparelhos sanitários sejam sifonados individualmente, e, bem assim, que os ramais de descarga, com exceção dos da sanita, sejam reunidos em caixas de reunião sifonados com tampas metálicas facilmente amovíveis;
- Impermeabilizar a cobertura da zona da capela; e, - Reforçar o sistema de ventilação das instalações sanitárias. “
“69. O custo estimado para a reparação das anomalias varia entre os €32.500,00 (trinta e dois mil e quinhentos euros) e os €60.000,00 (sessenta mil euros).”
(…)
“78. As deformações existentes no pavimento exterior do edifício não permitem que as águas superficiais sejam devidamente escoadas pelos sumidouros existentes.
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunha decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
Para o efeito indicam-se os depoimentos da testemunha AA, que se encontra registado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática Habilus Média Studio entre os pontos 10:1055 e 12:37:43 e 14:20:33 a 14:34:52 em conformidade com a ata de audiência final de 11 de janeiro de 2021; e o depoimento de BB que se encontra registado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática Habilus Média Studio entre os pontos 10:09:02 e 12:35;12 e 15:41:0 a 17:05:31 em conformidade com a ata de audiência final de 04 de Fevereiro de 2022.
c) a decisão: tendo em consideração a conjugação dos depoimentos de ambas as testemunhas conjugados com os documentos que integram estes autos, designadamente os projetos e o livro de obras, a factualidade objeto de impugnação deve passa a ser considerada como não provada.
31 – A modificação da decisão objeto de impugnação justifica-se e encontra fundamento, por se verificar errada ponderação da prova produzida.
32 – Ambas aquelas testemunhas foram os técnicos que acompanharam o decurso do contrato de empreitada e comprovaram que este foi executado em conformidade com as peças escritas e desenhadas fornecidas pela recorrida, na qualidade de dono da obra.
33 – Além de que, a recorrida esteve permanentemente representada na obra através do seu sócio-gerente e aceitou todos os trabalhos no termo da obra no estado em que se encontram.
34 – Sem prejuízo do que se alega e conclui relativamente à exceção de caso julgado e força de caso julgado, contrariamente ao que é decidido na sentença recorrida, deve ser julgada procedente a exceção perentória de caducidade do direito de eliminação dos defeitos de construção.
35 - Desde logo há que sublinhar que na ação que correu seus termos por este Tribunal sob o nº 144/09.3TBMCD, a aqui recorrida optou por suscitar o incumprimento do contrato em lugar de peticionar a eliminação e/ou reparação de defeitos de construção.
36 - Por conseguinte, está desde logo vedada a possibilidade de a recorrida reclamar a eliminação/reparação de defeitos de construção
37 - A presente ação fundamenta-se na celebração de contrato de empreitada celebrado entre recorrente e recorrida.
38 – Tendo em consideração a factualidade discutida e as sentenças proferidas nas ações atrás identificadas, entre recorrente e recorrida, cujas certidões se encontram juntas a estes autos, está demonstrada a caducidade do direito invocado na presente ação,
39 - Tendo em consideração que a obra correspondente ao contrato de empreitada foi concluída em 17 de outubro de 2008, em conformidade com as telas finais e com o projeto aprovado, com os registos do livro de obra, com as condições de licenciamento e uso previsto no alvará de autorização de construção – alínea H) dos factos assentes;
40 - E, que a presente ação deu entrada em Juízo no dia 28 de janeiro de 2011;
É inevitável concluir pela caducidade do direito invocado pela recorrida para fundamentar a presente ação.
41 – Sem prejuízo, a recorrente executou a empreitada em conformidade com as plantas desenhadas, documentos escritos e em conformidade com as instruções da recorrida através do seu sócio-gerente e dos seus técnicos;
42 – E, nenhum dos defeitos que a recorrida invocou podem ser designados de defeitos ocultos. O que vem reforçar a suscitada caducidade da eliminação dos alegados defeitos de construção.
43 – Acresce que, face ao que é alegado pela recorrida, não estamos perante defeitos de construção mas, desconformidades em relação ao que alegadamente constitui as peças escritas e desenhadas;
44 – A existirem esta desconformidades, que a recorrente não admite, não podem esta ser agora retificadas, por já terem sido expressamente aceites pela recorrida.
45 – A este respeito recorde-se que, a recorrente há foi condenada na ação atrás identifica na redução de preço relativamente á execução de trabalhos que ainda hoje cumprem a sua funcionalidade.
46 – Significa isto que a recorrida não pagou os trabalhos executados no âmbito do contrato de empreitada mas beneficia-se com estes. Nunca tendo procedido a qualquer retificação da obra.
47 - Não podendo ser imputada qualquer responsabilidade à Ré por quaisquer dos alegados defeitos ou desconformidades na empreitada.
48 - Na sentença recorrida decide-se condenar a recorrente a
- Substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior; a substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro;
Todavia a recorrente executou este trabalho em conformidade com o que lhe solicitado pela recorrida estando demonstrado que tais coletores desempenham a correta função a que se destinam.
49 – E, a substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro; e, bem assim, a colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor;
O mesmo se aplica ao que se alude relativamente ao ponto antecedente;
50 – Bem assim a eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha;
Como resulta destes autos, a dupla sifonagem não é da responsabilidade da recorrente. Isto porque colocação o sifão que se encontra projetado, e o segundo sifão resulta da instalação do equipamento da cozinha que não foi fornecido e instalado pela recorrente. E, tudo mais, depende da alteração dos projetos, que não foram executados pela recorrente, pelo que, não pode esta proceder a alterações que não lhe são permitidas pelas peças escritas e desenhadas.
51 – Foi ainda decido que a recorrente terá de “Refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício;
Mas, também não é da competência da recorrente a elaboração dos projetos, pelo que está impedida de dar execução a este ponto. Refazer e recalcular a rede de abastecimento é uma competência dos técnicos responsáveis pelos projetos. A recorrente apenas executou a obra. Sendo nesta parte impossível a execução por iniciativa da recorrente.
52 – A decisão recorrida faz erra interpretação das disposições legais que se identificam no corpo destas alegações.

Termos em que, deve o presente recurso merecer provimento e por via disso, revogada a sentença recorrida, substituindo-a por decisão que julgue a presente ação totalmente improcedente por não provada com todas as demais consequências legais, como é de inteira J U S T I Ç A”.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - Questões a decidir:

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente – arts.º 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil -, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:
1 - Se se verifica a exceção de caso julgado ou de autoridade de caso julgado.
2 - Da impugnação da matéria de facto suscitada pela ré recorrente.
3 - Da caducidade dos direitos da autora, invocada pela ré.
4 - Se, alterada ou não a decisão sobre a matéria de facto, deve ser alterada a decisão de direito.
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III - Fundamentação de facto:

Os factos que foram dados como provados na decisão proferida são os seguintes:
“1. A autora dedica-se à assistência a idosos.
2. A ré dedica-se à atividade empresarial de construção civil, ou seja, tem como atividade comercial e empresarial o sector da construção civil e obras públicas.
3. No exercício das respetivas atividades, a autora contactou a ré para que esta lhe construísse todo o edifício da sua sede na aldeia de ..., freguesia ..., concelho ....
4. No seguimento desse contacto, a ré apresentou à autora, no início do mês de abril de 2007, uma proposta orçamental, na qual se propunha a executar a obra, pelo preço global de €1.040,258,62 (um milhão, quarenta mil, duzentos e cinquenta e oito euros e sessenta e dois cêntimos), proposta que a autora aceitou.
5. O orçamento referido no ponto 4.º contemplava o fornecimento de materiais e mão-de-obra necessária à execução da obra, designadamente arquitetura; estabilidade e betão armado; rede de abastecimento de águas; rede de esgotos domésticos; rede de esgotos pluviais; rede de combate a incêndios; rede de gás; telecomunicações; aquecimento e instalação elétrica interior.
6. A ré, através dos seus funcionários e sob a fiscalização do seu técnico responsável, iniciou a execução da obra no dia 6 de junho de 2007, começando os trabalhos de betonagem das fundações do edifício da sede da autora.
7. Para a execução da obra a autora entregou à ré projetos executados pelo EMP03..., Lda. (EMP03...), sito na Rua ..., em ..., sendo que toda a obra deveria ser executada de acordo com tais projetos, designadamente o projeto de licenciamento de arquitetura, de licenciamento de ventilação, de licenciamento da rede de drenagem de águas pluviais, de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais e de licenciamento da estrutura.
8. No dia 17 de outubro de 2008, AA, na qualidade de técnico responsável pela direção da obra das instalações da autora, emitiu, por escrito, uma declaração na qual diz "...que a construção da Casa de Repouso com o alvará de licença n.º ...07, cujo titular é a firma EMP01... Unipessoal, Lda., se encontra concluída desde o dia .../.../2008, em conformidade com as telas finais e com o projeto aprovado, com os registos do livro de obra, com as condições de licenciamento e uso previsto no alvará de autorização de construção".
9. Foi projetado um sistema de ventilação primário das instalações sanitárias com a ligação de tubos de ventilação à cobertura, servidos de um extrator com a referência ... da EMP04....
10. Na zona da piscina interior estava prevista a instalação de desumidificador marca ..., modelo ... ou um equivalente, com capacidade de desumidificação de 5 litros, mas a ré instalou um desumidificador de marca ..., modelo ..., com capacidade de três litros.
11. Bem como uma bomba de calor ar/água de marca ... com um ventilador axial de instalação no exterior, tendo a ré, não obstante, instalado um permutador de placas em vez da referida bomba de calor.
12. O projeto de licenciamento prevê que "todos os aparelhos sanitários são sifonados individualmente, sendo os ramais de descarga, com exceção dos da sanita, reunidos em caixas de reunião sifonados com tampas metálicas facilmente amovíveis", tendo a ré efetuado ligações de aparelhos sanitários a coletores prediais sem passarem por caixas de reunião, como indicado em memória e projeto da especialidade.
13. Quanto ao traçado da rede de drenagem de águas pluviais, o projeto de licenciamento prevê que toda a rede separativa seja encaminhada para a caixa de reunião, a ser aplicada no exterior do edifício, e toda essa rede seria encaminhada pelo exterior através de uma rede de caixas de reunião e coletores prediais.
14. Algumas tubagens da rede de abastecimento de água do edifício da autora não se encontram embutidas nas paredes do edifício.
15. A rede de recolha e drenagem de águas sanitárias encontra-se toda suspensa no teto do desvão sanitário.
16. O projeto da especialidade prevê a existência de ligações nas fachadas, de forma a ventilar as instalações sanitárias, mas na obra as admissões de ar à rede foram executadas pela ré em floreiras existentes no exterior do edifício, o que obriga a percorrer um comprimento excessivo e com demasiadas curvas.
17. A ação deu entrada em juízo no dia 28 de janeiro de 2011.
18. A autora aceitou a proposta referida no ponto 4.º no dia 27 de abril.
19. Durante o mês de junho de 2010, o representante legal da autora apercebeu-se de que o solo da casa das máquinas estava a ceder.
20. Para além dos projetos referidos no ponto 7.º, a autora entregou à ré as alterações aos mesmos.
21. Na zona da entrada e da biblioteca, localizada no ... do edifício, de acordo com o projeto inicial, devia ser utilizada laje aligeirada de vigotas pré-esforçadas.
22. De acordo com o projeto inicial, a cave do edifício do edifício devia ser executada em laje térrea.
23. No piso da cave do edifício, onde, de acordo com o projeto inicial, estava prevista a utilização de laje térrea, foi aplicada laje aligeirada de vigotas pré-esforçadas, com a consequente criação de um desvão sanitário, com exceção da casa das máquinas.
24. No entanto, por força de alteração nele introduzida em junho de 2007 (não acompanhada pela alteração correspondente no projeto de arquitetura), o projeto de estabilidade corresponde a solução presente em obra, a qual foi acordada entre autora e ré.
25. O projeto original de estabilidade contemplava a introdução de lajes aligeiradas de vigotas pré-esforçadas em todo o teto da cave do edifício, o que implicava a criação de um desvão sanitário nessa zona.
26. O flutuante a aplicar no chão do edifício da autora seria o da marca ..., incluindo manga plástica ou uma solução equivalente.
27. No ... e no ... andar do edifício a ré aplicou pavimento flutuante Easy Click 8,3x1215x193, não tendo aplicado e/ou colocado manga plástica.
28. O projeto de licenciamento da rede de escoamento de águas pluviais determinava a colocação de caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro, bem como a aplicação de 24 tubos de queda de água com o mesmo diâmetro das caleiras referidas.
29. Todavia, o mapa de quantidades e orçamento fazem referência a caleiras em chapa zincada pintada com diâmetro de 90 mm, omitindo qualquer referência aos tubos de água.
30. A ré colocou tubos de queda com o diâmetro de 75 mm e em número inferior ao referido no ponto 28.º dos factos provados, mais concretamente apenas colocou 15 dos 24 tubos de água previstos no projeto de licenciamento da rede de escoamento de águas pluviais.
31. Na zona da biblioteca, a ré executou um troço subdimensionado de caleiras.
32. No sobredito troço subdimensionado executado pela ré, quando chove intensamente, as caleiras podem transbordar, em razão de não possuírem capacidade para recolha de toda a água que chega da cobertura do edifício.
33. O pavimento exterior do edifício apresenta deformações de tal forma acentuadas, com pontos de inclinação insuficiente (nomeadamente no pátio traseiro), que colocam em causa o correto escoamento das águas pluviais.
34. Por esse motivo, no caso se verificar chuva intensa, podem ocorrer inundações no interior do edifício.
35. Sendo necessário substituir as caleiras subdimensionadas e os tubos de queda de água. 36. Brotaram e são visíveis fungos nas paredes do edifício, bem como no desvão sanitário, ainda que em zonas não visíveis à utilização normal do edifício pelos utentes.
 37. A existência dos fungos referidos no ponto 36.º dão má imagem ao edifício.
38. Na casa das máquinas verificou-se um assentamento dos solos de tal ordem acentuado que deu origem a que algumas das tubagens ali existentes já estejam sujeitas a grandes esforços, podendo quebrar a qualquer momento e ocasionar inundações no interior do edifício.
39. No projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais está previsto um sistema separativo de águas negras e saponáceas, devendo o circuito da mesma permanecer separado até à última caixa de reunião designada de caixa geral.
40. As águas negras e as águas saponáceas reúnem-se ou misturam-se logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha.
41. A ré fez a ligação direta de cada aparelho individual ao ramal advindo da bacia da retrete.
42. São percetíveis maus-cheiros numa instalação sanitária de serviço de um quarto do edifício.
43. Na correta execução da obra deveriam ser criadas bocas de limpeza, a colocar em cada troço retilíneo e em cada interceção.
44. A ré executou bocas de limpeza, mas não em número suficiente.
45. É aconselhável rever a globalidade da rede de drenagem de águas residuais, mostrando-se necessário acrescentar as bocas de limpeza em falta.
46. O extrator referido no ponto 9.º é composto por célula fotoelétrica.
47. A ré aplicou extratores simples com ligação através de interruptor de luz.
48. A ré instalou o desumidificador referido no ponto 10.º com o consentimento da autora, por sugestão do representante da empresa contratada pela ré para a sua instalação, com o argumento de que se tratava da solução técnica mais adequada.
49. A ré instalou o permutador de calor referido no ponto 11.º com o consentimento da autora e o acordo da ré, por sugestão do representante da empresa contratada pela ré para a sua instalação, com o argumento de que se tratava da solução técnica mais adequada.
50. A ré realizou uma sifonagem na tubagem de drenagem das águas residuais da pia do lava-louça, sendo que aquando da posterior colocação da mesma, esta ficou numa situação de dupla sifonagem.
51. A rede separativa referida no ponto 39.º dos factos provados seria fundida na última caixa de reunião, designada por caixa geral, a qual descarregaria para a rede pública de drenagem de águas residuais.
52. No desvão sanitário a estrutura respetiva foi alvo de diversos cortes para a passagem das tubagens de água e cablagem elétrica, de telecomunicações e orifícios feitos com recurso a broca craniana de diferentes diâmetros ou pela simples rotura por moto precursão.
53. Conforme as boas regras de construção, as ditas tubagens e cablagens deviam passar por coretes, ou seja, aberturas nas lajes feitas antes da betonagem das mesmas, que a ré não fez.
54. No entanto, não existe nenhuma referência a estes elementos nos projetos de especialidades.
55. Atendendo ao referido em 53º, a ré não teve em conta o facto de tais orifícios intercetarem os elementos resistentes, estando várias vigas e vigotas perfuradas e as suas armaduras cortadas.
56. É, por isso, necessário garantir o recobrimento de armaduras que se mostram à vista (e algumas já com oxidação), para que não sejam postos em causa os elementos estruturais.
57. Em determinados locais do edifício há sete tubos sobrepostos.
58. A tubagem da rede de abastecimento de água anda a par da tubagem de água quente. 59. A tubagem visível no desvão sanitário está solta e assente sobre o solo e sobre o entulho ali existente.
60. As tubagens que não se encontram embutidas nos elementos do edifício deveriam estar fixas por braçadeiras ou assentes numa superfície regular e contínua.
61. Em determinados pontos singulares, é visível no edifício a rotura do betão junto ao apoio das vigas, com desenvolvimento tendencialmente diagonal de grande inclinação junto ao apoio e progredindo na horizontal.
62. O referido no ponto 61.º deve-se, no essencial, a alguma falta de cuidado na realização dos elementos estruturais.
63. Pelo que é necessário reparar as fissuras visíveis no edifício e garantir o recobrimento das armaduras.
64. A armadura dos elementos resistentes encontra-se exposta em diversos/alguns locais, designadamente no desvão sanitário, acabando por oxidar.
65. O que conduz à oxidação do interior do betão e origina o desgaste do mesmo na periferia dos elementos estruturais e prejudica o funcionamento destes.
66. A ré não aterrou todas as sapatas, estando expostas nas suas faces laterais, achando-se uma visível.
67. As vigotas de betão pré tencionado não se destinam à organização de lintéis de fundação, destinam-se, antes, ao arranque de paredes de contenção entre a cota natural do terreno e o teto da cave e do ....
68. Para eliminar as anomalias existentes em obra, é necessário:
- Substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior;
- Substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro;
- Substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro;
- Colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor;
- Eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha;
- Reparar as fissuras visíveis no edifício e a garantir o recobrimento das armaduras;
- Refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício;
- Substituir, integralmente, o solo da casa máquinas;
- Substituir todo o soalho flutuante aplicado no ... e no ... andar do edifício por pavimento flutuante da marca ..., incluindo manga plástica ou uma solução equivalente;
- Reparar o pavimento exterior do edifício, eliminando as zonas com deformações e inclinação insuficiente, de modo a que o mesmo fique com a inclinação necessária e drenagem suficiente para o correto escoamento das águas pluviais;
- Reparar globalmente a rede de drenagem de águas residuais, colocando, em cada troço retilíneo e em cada interceção, as bocas de limpeza em falta nas tubagens de recolha de águas residuais;
- Praticar os atos necessários a fazer com que todos os aparelhos sanitários sejam sifonados individualmente, e, bem assim, que os ramais de descarga, com exceção dos da sanita, sejam reunidos em caixas de reunião sifonados com tampas metálicas facilmente amovíveis;
- Impermeabilizar a cobertura da zona da capela; e,
- Reforçar o sistema de ventilação das instalações sanitárias.
69. O custo estimado para a reparação das anomalias varia entre os €32.500,00 (trinta e dois mil e quinhentos euros) e os €60.000,00 (sessenta mil euros).
70. Foi operado um desvio à liga de água/ribeiro junto ao edifício obra objeto de empreitada dos autos.
71. A ré entregou à autora a obra referida no ponto 3.º dos factos provados, no dia 17 de outubro de 2008, assinando o termo de encerramento da mesma.
72. Em 6 de novembro de 2008, a autora solicitou a vistoria da obra junto Câmara Municipal ..., com vista a obter a necessária autorização para a sua utilização.
73. Por transferência bancária operada no dia 6 de março de 2009, a autora liquidou à ré a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros).
74. A autora só tomou conhecimento dos defeitos e/ou vícios da obra, que elenca na petição inicial e resultaram provados, em junho de 2010, mais concretamente após lhe ter sido entregue o relatório técnico constante de fls. 1946 e ss. dos autos.
75. Em momento anterior à propositura desta ação e à data da citação da ré para os seus termos, a autora não comunicou à ré a existência dos defeitos/ou vícios da obra, que elenca na petição inicial e resultaram provados.
76. A ré foi citada para os termos desta ação declarativa aos 24 de fevereiro de 2011.
77. Alguns dos sumidouros existentes na parte frontal do espaço exterior do edifício encontram-se ligados em série, com um só coletor de ligação à rede de drenagem em PVC 110 mm, quando o diâmetro mínimo a acautelar devia ser de 200 mm.
78. As deformações existentes no pavimento exterior do edifício não permitem que as águas superficiais sejam devidamente escoadas pelos sumidouros existentes.
79. Não foi efetuado o prolongamento da tubagem de ventilação das instalações sanitárias (saídas de ar) para o exterior do edifício, conforme o previsto na planta da cobertura do projeto aprovado na especialidade, na medida em que essa tubagem foi prolongada, apenas, até ao espaço de desvão sanitário fracamente ventilado e situado sob a cobertura inclinada.
80. Nalguns casos, a tubagem de entrada de ar do sistema de ventilação das instalações sanitárias não foi prolongada para o exterior do edifício, mas antes, diretamente, para os espaços de desvão sanitário que foram criado, motivo pelo qual foi necessário efetuar a sua tamponagem para que não surgissem maus cheiros no interior dos wc´s.
81. Algumas das instalações sanitárias do edifício não possuem, no seu interior, grelhas para assegurar a ventilação do espaço.
82. Numa das instalações sanitárias, a grelha para ventilação do espaço aí existente não está provida de conduta de ligação ao exterior (saída de ar).
83. A circunstância de as admissões de ar à rede terem sido executadas pela ré em floreiras existentes no exterior do edifício, num circuito com demasiadas curvas, reduzem a capacidade de ventilação, mas não condicionam a utilização salutar das instalações sanitárias.
84. Correu termos o extinto Tribunal Judicial da Comarca ..., uma outra ação declarativa intentada pela aqui ré “EMP02..., Lda.” contra a aqui autora “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, mais concretamente a ação n.º144/09.3TBMCD, nos termos da qual a aí autora, aqui ré, peticiona a condenação da aí ré, aqui autora, a reconhecer a existência e validade do contrato de empreitada em causa nestes autos, bem como pagar a título de capital em dívida (preço da empreitada) a quantia de €148.167,90 (cento e quarenta e oito mil cento e sessenta e sete euros e noventa cêntimos), acrescida de juros de mora comerciais vencidos, no montante de €10.680,43 (dez mil seiscentos e oitenta euros e quarenta e três cêntimos), e, bem assim, de juros de mora comerciais vincendos até integral e efetivo pagamento.
85. Contestando essa ação n.º144/09.3TBMCD, a aí ré, aqui autora, reconhecendo a existência e validade do contrato de empreitada, entre o mais, para o que aqui interessa, invocou que a empreiteira “EMP02..., Lda.”, ao arrepio da sua obrigação contratual, não colocou os tubos de ventilação das instalações sanitárias e dos coletores das sanitas previstos para a cobertura (tendo posto, em vez dos coletores, telhas de ventilação, desadequadas), aquilo a que a aí ré, aqui autora, naqueloutra ação apelida de “ventilações”.
86. Na sentença proferida nos autos n.º144/09.3TBMCD, transitada em julgado em 27 de novembro de 2013, o tribunal julgou provado tal facto, designadamente no ponto 109.º dos factos provados, o qual tem o seguinte teor: “A autora não colocou os tubos de ventilação das instalações sanitárias e dos coletores das sanitas que estavam previstas para a cobertura, tendo optado por colocar telhas de ventilação perfuradas.” (cf. cópia certificada da sentença em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2133 e ss. dos autos).
87. Nessa sentença, proferida nos autos n.º144/09.3TBMCD, transitada em julgado em 27 de novembro de 2013, pelo tribunal foi decidido, para o que aqui interessa, o seguinte: “No mais, julgo parcialmente procedente a ação e, consequentemente, condeno a ré “EMP01..., Unipessoal, Lda.” a pagar à autora “EMP02..., Lda.” a quantia referida supra em II.B) 3.8 (referente ao remanescente do preço imputado das deduções aí referidas), cujo exato quantum será apurado em liquidação anterior, absolvendo a ré do mais pedido a tal título.” (cf. cópia certificada da sentença em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2133 e ss. dos autos).
88. No ponto II.B) 3.8 da sobredita sentença é afirmado o seguinte: “Em suma: Uma vez que o montante peticionado corresponde ao faturado (factos provados nºs 59 a 72), ascendendo a 1.025.070,93 €, visto que a R pagou, dessa quantia, o montante de 905 mil euros, remanesce a quantia de 120.070,93 €. A este montante deverão ser deduzidas: - as quantias líquidas de 1980,00 €; 2450,00 €; 483,00 €; - os valores ilíquidos a apurar em liquidação ulterior e referidos em 3.4. e 3.5.3. (cf. cópia certificada da sentença em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2133 e ss. dos autos).
89. O teor do ponto 3.4. referido no ponto II.B) 3.8 da sentença em causa é o seguinte: “Relativamente aos casos referidos em b) 1.ª parte e c), aceitamos que podemos estar perante um incumprimento parcial, na medida em que os específicos trabalhos não foram integralmente realizados. Por isso, quanto à pendente não realizada do terraço do ... andar, e quanto à falta de colocação dos tubos de ventilação das instalações sanitárias e dos coletores das sanitas previstos para a cobertura, como a A não logrou provar (antes se provou o contrario) a realização de tais trabalhos, o respetivo valor, cujo quantum não se consegue apurar (nem face aos autos de medição), deverá ser imputado ao remanescente do preço, relegando-se aquele apuramento para liquidação ulterior.” (cf. cópia certificada da sentença em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2133 e ss. dos autos.
90. O teor do ponto 3.5.3 mencionado no ponto II.B) 3.8 da sentença referida é o seguinte: “O mesmo vale em relação às telhas de ventilação, que foram colocadas em vez dos respetivos tubos de ventilação, não logrando a A o facto constitutivo do direito ao recebimento do montante a elas referente (não foram acordadas e nem sequer desempenham adequadamente a sua função) pelo que deve ser imputado ao remanescente do preço. Como o valor correspondente não resulta especificadamente dos autos de medição/faturação, o mesmo deve ser apurado em liquidação ulterior.” (cf. cópia certificada da sentença em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2133 e ss. dos autos).
91. Na sequência do trânsito em julgado da sobredita sentença, cuja cópia certificada consta de fls. 2133 e ss., nos próprios autos n.º144/09.3TBMCD, quando estes já corriam termos neste Juízo Central Cível e Criminal ... – J..., a aí autora, aqui ré, “EMP02..., Lda.” deduziu incidente de liquidação, peticionando a condenação da aí ré, aqui autora, “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, no pagamento, a título de remanescente do capital em dívida da empreitada, do montante líquido de €112.929,45 (cento e doze mil novecentos e vinte e nove euros e quarenta e cinco cêntimos), acrescido de juros de mora comerciais vincendos, à taxa legal em vigor, contados desde o chamamento para o incidente e até integral e efetivo pagamento.
92. Por decisão judicial final transitada em julgado em 18 de setembro de 2017, foi o incidente de liquidação julgado parcialmente procedente, e, em consequência, foi a aí ré, aqui autora, “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, condenada a pagar à aí autora, aqui ré, “EMP02..., Lda.”, a quantia líquida de €35.827,93 (trinta e cinco mil oitocentos e vinte e sete euros e noventa e três cêntimos), acrescida de juros de mora comerciais vincendos, à taxa legal em vigor, contados desde a prolação da decisão em causa até integral e efetivo pagamento. (cf. cópia certificada da decisão final em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2094 e ss. dos autos)
93. Para alcançar o montante líquido respetivo, o tribunal, em tal libelo decisório, deduziu ao montante de €120.070,93 (cento e vinte e setenta mil euros e noventa e três cêntimos) as seguintes quantias:
- €1.980,00 – correspondente a trabalho faturado à dona da obra e não executado pela “EMP02..., Lda.” referente à construção de anexos isolados;
- €2.450,00 – correspondente a trabalho faturado à dona da obra e não executado pela “EMP02..., Lda.” referente a escavações para a fundação do edifício;
- €483,00 – correspondente ao valor de uma eletrobomba submersível instalada pela “EMP02..., Lda.” (faturado à dona da obra), em ordem a suprir falha a si imputável, consistente na ausência de colocação de um dreno e de impermeabilização do fundo do poço do elevador;
- €3.650,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 5.º dos factos provados) à falta de colocação pela “EMP02..., Lda.” de uma das duas pendentes do terraço do ... andar e à existência de caixas de areia danificadas e de tubos horizontais soltos (redes de águas pluviais);
- €75.500,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 6.º dos factos provados) à falta de colocação pela “EMP02..., Lda.” dos tubos de ventilação das instalações sanitárias e dos coletores de sanitas previstos para a cobertura;
- €180,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 7.º dos factos provados) à colocação de um tubo a partir do teto com a instalação de uma girandola para permitir uma ventilação adequada nas instalações sanitárias. (cf. cópia certificada da decisão final em causa, com nota do seu trânsito em julgado, constante de fls. 2094 e ss. dos autos).
94. No piso da cave não se justifica substituir a laje aligeirada de vigotas pré-esforçadas por laje térrea, porque a solução existente em obra é a que se revela mais adequada à localização do imóvel e tem uma qualidade técnica muito superior à prevista no projeto”.
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Na decisão proferida, resultaram ainda não provados os seguintes factos:

“1. A autora aceitou a proposta referida no ponto 4.º dos factos provados no dia 7 de abril de 2007.
2. A zona da entrada e da biblioteca, localizadas no ... do edifício, devia ser executada em laje térrea.
3. Para além do troço referido no ponto 31.º dos factos provados, as restantes caleiras executadas pela ré acham-se subdimensionadas.
4. A ré executou sarjetas em número inferior ao previsto e subdimensionadas.
5. Quando chove intensamente, as restantes caleiras (excetuadas aquelas que integram o troço referido no ponto 31.º dos factos provados) podem transbordar, porque não têm capacidade de recolha de toda a água que chega da cobertura do edifício.
6. Quando chove intensamente, necessariamente, as caleiras transbordam, porque não têm capacidade de recolha de toda a água que chega da cobertura do edifício.
7. Para efeitos de um correto escoamento das águas pluviais, a ré não procedeu à inclinação necessária de todo o pavimento exterior do edifício.
8. É necessário substituir as caleiras não subdimensionadas e os algerozes.
9. O surgimento dos fungos referidos no ponto 36.º dos factos provados são consequência do descrito nos pontos 34.º e 35.º dos factos provados.
10. Os fungos referidos no ponto 36.º dos factos provados originam maus-cheiro.
11. E podem provocar doenças ou reações alérgicas aos utentes e funcionários da instituição.
12. Estava prevista uma laje térrea para o pavimento do ..., mas foi aplicada uma laje estrutural.
13. Facto que representa um grande acréscimo de carga.
14. A circunstância de a ré ter efetuado a ligação direta de cada aparelho individual ao ramal advindo da bacia da retrete origina situações de sucção dos sifões individuais dos aparelhos quanto ocorre a descarga da bacia de retrete.
15. Para solucionar as situações de sucção dos sifões individuais dos aparelhos, quando ocorre a descarga da bacia da retrete, ter-se-ão que eliminar os sifões dos coletores prediais e criar uma nova rede de recolha seletiva no edifício.
16. Em consequência de as águas negras e as águas saponáceas se misturarem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha, e, bem assim, da sucção dos sifões individuais dos aparelhos quando ocorre a descarga da bacia da retrete, a autora viu-se obrigada a encerrar algumas das instalações sanitárias do edifício, dado que não drenam de forma eficaz as águas residuais.
17. São percetíveis maus cheiros nas outras instalações sanitárias do edifício (que não aquela referida no ponto 42.º dos factos provados).
18. O referido no ponto 15.º dos factos provados foi executado a pedido da autora.
19. A ré não executou qualquer boca de limpeza.
20. É necessário elaborar novo dimensionamento hidráulico e refazer toda a rede de coletores prediais.
21. A ré executou o referido no ponto 16.º dos factos provados a pedido da autora e porque assim estava previsto no projeto.
22. A ré instalou o permutador de calor referido no ponto 11.º dos factos provados por exigência da autora.
23. A ré não colocou as caixas de reunião referidas no ponto 12.º dos factos provados devido a alterações efetuadas em obra pela autora.
24. A ré executou ligações de aparelhos sanitários a coletores prediais, devido a alterações efetuadas pela autora em obra.
25. Para além da situação descrita no ponto 50.º dos factos provados, a ré executou outras duplas sifonagens e caixas de reunião sifonadas com ligações a aparelhos já sifonados.
26. A situação retratada no ponto 55.º dos factos provados pode dar origem a que a estrutura do edifício ceda nos pontos de maior fragilidade caso haja uma concentração mais elevada de pessoas no seu edifício ou de outro tipo de cargas.
27. É, por isso, necessário escorar a estrutura do edifício através da aplicação de argamassas de reforço estrutural, bem como escorar e rearmar os varões cortados e repor a secção dos elementos referidos no ponto 55.º dos factos provados.
28. Quanto à rede de abastecimento de água, o número de tubagem existentes condiciona o bom funcionamento da rede de drenagem de águas pluviais.
29. O referido no ponto 61.º dos factos provados deve-se: - ao assentamento diferencial das fundações
- ao betão deficiente;
- à armadura insuficiente e mal colocada pela ré;
- à falta de comprimento de amarração;
- à falta de amarrações; e,
- à colocação de varões em número e diâmetro inferior ao projetado.
30. Em razão do descrito no ponto 61.º dos factos provados é necessário escorar o edifício, acrescentar armadura e aumentar a secção.
31. Há assentamentos perimetrais no edifício.
32. Os assentamentos perimetrais verificados no edifício originam assentamentos diferenciais nas fundações da estrutura daquele.
33. O terreno circundante ao edifício é de solo argiloso e tem pequenos vestígios de estratos arenosos.
34. Pelo que o local onde o edifício está implantado foi alvo de um aterro de quantidade considerável com deficiente compactação do mesmo por parte da ré e deficiente dimensionamento das fundações.
35. Em consequência da factualidade vertida nos pontos 33.º e 34.º dos factos não provados, é necessário escorar e recalcar a fundação até à profundidade ativa e reparar a fissuração, bem como gatear as fissuras mais acentuadas.
36. Existem diversas poças de água no interior do desvão sanitário.
37. A existência de poças de água no interior do desvão sanitário resulta da deficiente drenagem periférica do edifício, da impermeabilização ineficaz e das fugas das tubagens de água.
38. O referido acelera a degradação do solo e dos elementos em contacto com o mesmo, afetando a estabilidade da estrutura do edifício.
39. Em razão da falta de aterro das sapatas, em caso de sismo, as mesmas podem sofrer um deslizamento, comprometendo a estabilidade do edifício.
40. É necessário aterrar a periferia das sapatas até à altura das mesmas e compactar o terreno.
41. Em diversos locais do edifício começam a surgir fissuras resultantes da retração da argamassa de assentamento de alvenarias.
42. O que se deve ao excesso de cimento utilizado pela ré na construção do edifício.
43. Algumas lajes apresentam flechas excessivas.
44. Em razão de algumas lajes apresentarem flechas excessivas o pavimento fica torto e dá-se o mau funcionamento de portas e mobiliário.
45. Em razão de algumas lajes apresentarem flechas excessivas, ter-se-ão de reforçar as lajes respetivas e criar apoios intermédios.
46. A ré organizou os lintéis de fundação por vigotas de betão pré tencionado.
47. Mostra-se necessário refazer os lintéis de fundação.
48. O custo total com a reparação do edifício, em conformidade com o projetado, não é inferior a €2.100,000,00 (dois milhões e cem mil euros).
49. Durante o período de reparação o imóvel terá de ser desocupado.
50. Durante o período de reparação do imóvel, os trabalhadores da autora deixarão de prestar-lhe os seus serviços.
51. Os vícios ou defeitos alegadamente existentes no edifico obra em que se reportam os pontos 4, 5, 15, 17, 18, 21, 57, 58, 59, 60, 61, 64 e 66 da base instrutória foram provocados exclusivamente por um desvio à liga de água/ribeiro e/ou por um mal emanilhamento efetuado acima das cotas das fundações da casa de repouso.
52. A ré viu denegrida, em praça pública, a sua imagem profissional, sofrendo de desgosto, transtorno, revolta, angústia, mal-estar psicológico e insónias.
53. Nenhuma instalação sanitária se encontra provida de sifão.
54. Na rede de drenagem de águas pluviais provenientes da cobertura:
a) Não foram construídas as câmaras do ramal de ligação, o que facilitaria não só o funcionamento da rede, assim como a sua limpeza e manutenção;
b) As caixas de ramal ligam diretamente numa caixa de pluvial, num coletor com diâmetro de 125 mm, quando o diâmetro mínimo a acautelar devia ser de 200 mm;
c) As caixas existentes e adaptadas não têm dimensões adequadas, nem em altura, nem em largura, e não se encontram ceresitadas, sendo que os tubos de queda não estão providos de curvas de concordância, para uma melhor entrada de água nas caixas.
55. Na zona de drenagem de águas pluviais da zona em calçada:
a) Existem poças de água e zonas de drenagem para partes do edifício, nomeadamente para as paredes;
b) A água não entra nas caixas de sumidouros, existentes em obra, em consequência do abatimento do pavimento;
c) A degradação do pavimento exterior em calçada de granito é visível, tendo em conta a deficiente drenagem devido ao abatimento do pavimento.
56. Na rede de ventilação dos WC´s:
a) Os ventiladores instalados têm cerca de 30% da capacidade de extração do previsto em projeto, o que implica menor capacidade de tiragem do ar viciado;
b) As condutas de admissão de ar aos wc´s estão executadas em tubo PVC de 90 mm de diâmetro, o que permite uma taxa de renovação diária muito baixa, quando o definido em projeto é um tubo de secção redonda com 110 mm de diâmetro;
c) As condutas de saída do ar viciado dos wc´s estão executadas, na horizontal, em tubo PVC de 75 mm de diâmetro, o que dificulta muito a saída, pois que o definido em projeto era um tubo de secção redonda com 110 mm de diâmetro, com saída na vertical acima do nível da cobertura.
d) A circunstância de as condutas de saída e de admissão de ar se encontrarem distanciadas do edifício, localizadas em floreiras, não permite sequer a entrada de ar, tendo em conta os desníveis e curvas com que essa rede foi executada.
e) As condutas de saída e de admissão de ar nos wc´s do primeiro piso, encontram-se paralelas, coincidindo o seu alinhamento inicial, o que provoca o retorno dos mais cheiros por depressão de abertura das portas, para o interior do wc.
57. No piso 1 do edifício norte, na instalação sanitária da casa de banho, não foi colocada admissão de ar, nem foi assegurada a extração com a montagem do extrator previsto.
58. No piso 0 do edifício norte, na instalação sanitária da casa de banho, não foi colocada admissão de ar, nem foi assegurada a extração com a montagem do extrator previsto.
59. No piso -1 do edifício norte, no WC da piscina destinado a pessoas com deficiência, não foi colocada admissão de ar, nem foi assegurada a extração com a montagem do extrator previsto.
60. No piso -1 do edifício norte, no wc da piscina, não foi colocada admissão de ar e o extrator aí colocado não era o previsto no projeto.
61. No piso 0 do edifício sul, no gabinete médico, não foi colocada admissão de ar, nem assegurada a extração com a montagem do extrator previsto.
62. No piso 0 do edifício sul, no 2.º wc da sala de convívio, não foi colocada admissão de ar, nem assegurada a extração com a montagem do extrator previsto.
63. No piso 0 do edifício sul, no salão de cabeleireiro, não foi colocada admissão de ar, nem assegurada a extração com a montagem do extrator previsto”.
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IV - Do objeto do recurso:

1 – Da questão da exceção de caso julgado e da autoridade de caso julgado.
Começou a ré por alegar nas suas conclusões que já na sua contestação havia invocado a existência da exceção de litispendência, invocando agora a exceção de caso julgado (sem que se perceba se a configura como exceção dilatória ou perentória).
Agora, como então, o que está em causa é a relevância da ação que correu termos sob o n.º144/09.3TBMCD e em que eram partes as destes autos, embora aí fosse autora a aqui ré, estando as posições processuais invertidas.
A exceção que então foi invocada pela ré, porque aquela ação estava então ainda pendente, foi a de litispendência, tendo a mesma sido julgada improcedente no despacho saneador (fls. 690 dos autos físicos) e, relativamente à mesma, não interpôs a ré agora recorrente qualquer recurso.
Tal decisão transitou assim em julgado.
Ora, a questão do caso julgado, entendida como exceção dilatória, é precisamente a mesma.
Com efeito, o n.º 1 do art.º 580.º do C. P. Civil dispõe que as exceções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à exceção do caso julgado. O art.º 581.º do mesmo diploma acrescenta que:
1. Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4. Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (...).
A decisão de improcedência da exceção de litispendência, tendo transitado em julgado, impede este Tribunal de apreciar a mesma exceção dilatória, agora sob a veste de caso julgado, nos termos do art.º 620.º do C. P. Civil.
 Admitindo que a ré pretende invocar a autoridade de caso julgado, exceção que, não sendo dilatória, antes não invocou, ainda assim não lhe assiste razão.
Aliás, relativamente à prolação das decisões do processo 144/09.3TBMCD, e apreciando requerimento que a ré formulou em 07/01/2023, visando que fosse declarada a inutilidade superveniente da lide e que o Tribunal procedesse à junção de certidão daquelas, ref. citius ...89, foi proferido o seguinte despacho (datado de 04/02/2021):
“a este propósito, há que ter presente que toda a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado. Depois da contestação só podem ser deduzidas exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente. (cf. art. 573, n.º2 do Código de Processo Civil).
As exceções dilatórias de litispendência e caso julgado são de conhecimento oficioso, conforme decorre do art. 578.º do Código de Processo Civil, todavia, como acima se referiu, os réus não as invocaram expressamente, a título superveniente, através do requerimento em apreciação, nem alegaram factos que permitam ao tribunal concluir pela verificação dos conceitos de litispendência e caso julgado, enunciados no art. 580, n.º1 do Código de Processo Civil. A ré limite-se a afirmar que correm e/ou correram termos outras ações entre as partes aqui em litígio e nas quais foram proferidas decisões (posteriores à instauração desta ação) onde se apreciaram e julgaram factos (que não identifica) que, no seu entendimento, são coincidentes, pelo menos em parte, com aqueles que se apreciam nesta lide declarativa.
Por conseguinte, inexistindo fundamento legal para declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e não tendo a ré deduzido por forma superveniente as exceções de litispendência ou caso julgado, ao abrigo do disposto no art. 573, n.º2 do Código de Processo Civil, nem alegado factos concretos que apontem para a verificação dos conceitos de litispendência e caso julgado, enunciados no art. 580, n.º1 do Código de Processo Civil, nenhum motivo existe para o tribunal diligenciar pela junção aos autos de um conjunto de decisões proferidas no âmbito do Processo n.º144/09.3TBMCD (incluindo nos seus apensos A e B) que corre termos no J... deste Juízo Central e Cível e Criminal ...”.
Perante este despacho, veio a ré a juntar certidão das decisões proferidas, em 16/04/2021, alegando que “permitirá apreciar as questões que a Ré tem vindo a suscitar ao longo destes autos, ou seja a identidade dos sujeitos, da factualidade alegada, ou seja, da causa de pedir, entre esta ação e a que correu termos por este Tribunal sob o proc. 144/09.3TBMCD e o que foi requerido com a ref. ...49”.
Ora, na sentença proferida, o Tribunal julgou improcedente o pedido formulado no que se reportava ao ponto 24 (condenação da ré a refazer a rede de ventilação das instalações sanitárias, de acordo com o respetivo projeto de especialidade e os decretos regulamentares aplicáveis), por via da autoridade do caso julgado resultante das decisões proferidas no processo 144/09.3TBMCD.
Então, após extensa fundamentação, e dando como provados os factos relevantes desse processo e do incidente de liquidação, escreveu assim o Mmº Juiz que realizou a audiência de julgamento: “transitada em julgado a sobredita sentença proferida no âmbito dos autos n.º144/09.3TBMCD (mediante a qual se decidiu pela redução do preço da empreitada, a pagar pela dona da obra - aqui autora -, em virtude de a empreiteira - aqui ré -, além do mais, não ter executado a rede de ventilação das instalações sanitárias do edifício objeto da empreitada dos autos, de acordo com o previsto e projetado), incidente sobre a relação material em causa, ficou a mesma ter força obrigatória dentro do próprio processo em que foi proferida e fora dele, nos termos previstos no art. 619, n.º1 do Código de Processo Civil.
A autoridade do caso julgado impõe, assim, a aceitação da decisão judicial (globalmente considerada) proferida nos autos n.º144/09.3TBMCD, de modo a obstar a que a relação ou situação jurídica material por ela definida possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, designadamente por esta.
Por conseguinte, pese embora não se esteja diante de uma exceção dilatória de caso julgado, prevista no art. 577, alínea i) do Código de Processo Civil, por não verificação da tríplice identidade de sujeitos, causa de pedir e pedido entre esta ação e a ação n.º144/09.3TBMCD, in casu, terá que prevalecer o respeito pela autoridade do caso julgado decorrente da sentença proferida no âmbito dos sobreditos autos n.º144/09.3TBMCD, facto que será conducente à absolvição da ré do pedido de sua condenação a refazer a rede de ventilação das instalações sanitárias, de acordo com o respetivo projeto de especialidade e os decretos regulamentares aplicáveis. (vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 28.03.2019, consultável in www.dgsi.pt. e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 20.09.2018, consultável in www.dgsi.pt.)
Havendo de respeitar a autoridade do caso julgado formado com o trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do processo n.º144/09.3TBMCD, nos termos o disposto no art. 619, n.º1 do Código de Processo Civil, e tendo a dona da obra e aqui autora “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, na sobredita ação declarativa, por via de tal decisão judicial, obtido a redução do preço a pagar pela empreitada, além do mais, em resultado de a empreiteira “EMP02..., Lda.” não ter executado a rede de ventilação das instalações sanitárias do edifício objeto da empreitada dos autos, de acordo com o previsto e projetado, não pode agora exigir da mesma a eliminação desse vício e/ou defeito, tanto assim que com a redução do preço da empreitada ficou a empreiteira e aqui ré “EMP02..., Lda.” desobrigada de executar a rede de ventilação das instalações sanitárias do edifício objeto da empreitada dos autos, de acordo com o previsto e projetado. Doutro modo, a dona da obra não pode obter cumulativamente a redução do preço da empreitada (decorrente da não realização do trabalho respetivo de acordo com o previsto e projetado) e a eliminação do correspondente vício e/ou defeito, porquanto a permitir-se a realização cumulativa desses direitos estar-se-ia a dar cobertura a uma situação de enriquecimento injustificado da dona da obra, já que iria ver executado determinado trabalho compreendido na empreitada sem ter de cumprir a obrigação que constitui a sua contrapartida contratual, ou seja, de pagar o respetivo preço da sua execução.
Em suma, pelos argumentos expostos, não assiste à dona da obra, aqui autora, o direito a exigir e a obter a condenação da empreiteira, aqui ré, a refazer a rede de ventilação das instalações sanitárias, de acordo com o respetivo projeto de especialidade e os decretos regulamentares aplicáveis, pelo que se impõe a absolver a ré deste pedido, expressamente aduzido pela autora”.
O que pretende agora a ré é que este Tribunal de recurso considere que existe também autoridade de caso julgado decorrente das decisões proferidas, em relação aos pedidos que foram julgados procedentes e que, por essa via, sejam os mesmos julgados improcedentes.
Note-se que a recorrente faz referência ao processo executivo intentado na sequência do incidente de liquidação e ao apenso de embargos em que a aqui autora deduziu exceção de compensação, mas a certidão das decisões proferidas nesse apenso do processo 144/09.3TBMCD não se encontram juntas aos autos e, assim, o que nesses processos foi decidido não se encontra provado e não pode, por isso, ser considerado em sede de recurso (sendo que a ré não invocou, quanto a esta matéria, qualquer omissão na matéria de facto considerada pelo Tribunal de 1.ª Instância).
Os pedidos que foram julgados procedentes nesta ação foram:
- Substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior; a substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro; a substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro; e, bem assim, a colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor (pedido 1);
- Eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha (pedido 2);
- Reparar as fissuras visíveis no edifício e a garantir o recobrimento das armaduras (parte do pedido 6);
- Refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício (pedidos 13, 14 e 15);
- Substituir, integralmente, o solo da casa máquinas (pedido 16);
- Substituir todo o soalho flutuante aplicado no ... e no ... andar do edifício por pavimento flutuante da marca ..., incluindo manga plástica ou uma solução equivalente (pedido 18);
- Reparar o pavimento exterior do edifício, eliminando as zonas com deformações e inclinação insuficiente, de modo a que o mesmo fique com a inclinação necessária e drenagem suficiente para o correto escoamento das águas pluviais (pedido 19);
- Reparar globalmente a rede de drenagem de águas residuais, colocando, em cada troço retilíneo e em cada interceção, as bocas de limpeza em falta nas tubagens de recolha de águas residuais (pedido 20);
- Praticar os atos necessários a fazer com que todos os aparelhos sanitários sejam sifonados individualmente, e, bem assim, que os ramais de descarga, com exceção dos da sanita, sejam reunidos em caixas de reunião sifonados com tampas metálicas facilmente amovíveis (pedido 23).
Como nota Jacinto Rodrigues Bastos (Notas ao Código de Processo Civil, 2ª edição, Vol. III, pág. 253), foi propósito do legislador, quanto à questão do caso julgado, ao eliminar o § único do art.º 660.º do C. P. Civil de 39 (que dispunha deverem considerar-se resolvidas tanto as questões sobre que recair decisão expressa, como as que, dados os termos em causa, constituírem pressuposto ou consequência necessária do julgamento expressamente proferido), deixar à doutrina o seu estudo mais aprofundado e à jurisprudência a sua solução, caso a caso, mediante os conhecidos processos de integração da lei.
E, continuava o referido autor (obra e local citados), afirmando que a economia processual, o prestígio das instituições judiciárias, reportado à coerência das decisões que proferem e o prosseguido fim de estabilidade e certeza das relações jurídicas, são melhor servidos pelo critério eclético que, sem tornar extensiva a eficácia do caso julgado a todos os motivos objetivos da sentença, reconhece essa autoridade à decisão das questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado.
Para Vaz Serra (RLJ, Ano 112, pág. 278), a autoridade de caso julgado, em princípio, não cobre os motivos ou pressupostos da decisão proferida sobre o objeto da ação, ainda que se trate de questão que seja antecedente lógico indispensável da parte dispositiva do julgado, admitindo, porém, que quando a decisão da questão preliminar for tal que se deva considerar como solicitada pela parte, ainda que não expressamente de modo a poder e dever ser entendida pela parte contrária como questão submetida a julgamento, deve entender-se que a autoridade e força do caso julgado abrange a decisão.
Assim, todas as questões que devam considerar-se antecedentes lógicos e indispensáveis do julgado, devem considerar-se abrangidas pela autoridade do caso julgado, obrigando as partes (identidade de partes referida no art.º 581.º, nº2, do C.P. Civil, não importando as diferentes posições que assumam nas ações) quanto ao efeito jurídico que delimita a ação e quanto à causa de pedir.
Refira-se, ainda, que apesar de não podermos confundir a questão da força ou autoridade do caso julgado com a exceção dilatória do caso julgado, devemos considerar que o conhecimento e decisão da questão da força do caso julgado deve estar sujeita aos mesmo moldes e condicionalismos desta última, já que ambas visam a mesma finalidade (se bem que com amplitudes diferentes, pois a exceção abrange toda a matéria da segunda ação, e daí que o tribunal pura e simplesmente se deva abster de conhecer do pedido, enquanto que a força do caso julgado implica apenas que se dê como decidida e assente uma questão - ou várias - que estão em causa, juntamente com outra ou outras na nova ação e que são pressupostos ou fundamentos jurídicos da decisão a proferir) - qual seja a de evitar que a contradição entre decisões judiciais sobre a mesma questão, relativamente às mesmas partes e quando estas repetem os mesmos fundamentos.
Miguel Teixeira de Sousa (in “O Objeto da Sentença e o Caso Julgado Material” - BMJ nº 325, pág. 49 e segs.) distingue esses mesmos conceitos da seguinte forma: “quando o objeto processual anterior é condição para a apreciação do objeto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente releva como autoridade de caso julgado material no processo subsequente; quando a apreciação do objeto processual antecedente é repetido no objeto processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como exceção do caso julgado” (cfr. pág. 171).
Mais adiante acrescenta: “a exceção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior” (cfr. pág. 176).
Quando vigora a autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspeto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando da ação ou proibição de omissão respeitante à vinculação subjetiva e à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente” (cfr. pág. 179).
Hoje em dia esta distinção não suscita dúvidas.
A exceção de caso julgado, cuja finalidade é a de evitar a repetição de causas, tem como requisitos os que se mostram definidos no art.º 581.º do C. P. Civil (identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir).
A autoridade de caso julgado, por seu turno, funciona independentemente da verificação daquela tríplice identidade, pressupondo, porém, a decisão de determinada questão que não pode voltar a ser discutida.
Citando-se de novo Miguel Teixeira de Sousa (in Estudos sobre o Novo Processo Civil, 1997, págs. 578/9): “como toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto ou de direito) o respetivo caso julgado encontra-se sempre referenciado a certos fundamentos. Assim, reconhecer que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha, com esse valor, por si mesma e independentemente dos respetivos fundamentos. Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão”.
E mais adiante acrescenta (in ob. e loc. cit.) que “o caso julgado também possui um valor enunciativo: essa eficácia do caso julgado exclui toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada”.
De tal modo que se deverá concluir que na expressão “precisos limites e termos em que julga, utilizada no art. 673º do Cód. do Proc. Civil [atual art. 621.º] para definir o alcance do caso julgado, estão compreendidas todas as questões solucionadas na sentença e conexas com o direito a que se refere a pretensão do autor (…)”.
Assim, o que há assim que verificar é se estes defeitos de obra foram ou não apreciados nos processos referidos, salientando-se que a ré se limita a alegar a exceção da autoridade de caso julgado, sem que, em momento algum, tenha indicado em que segmento decisório de cada decisão se apreciou qualquer das questões que legitimaram a procedência dos pedidos desta ação.
Ora, nos autos referidos, a aqui ré demandou a dona de obra peticionando o pagamento da parte do preço acordado que entendia ser-lhe ainda devida.
Nessa ação, no que ora interessa, foi a dona de obra condenada a pagar à empreiteira, aqui ré recorrente, a quantia que se viesse a liquidar em incidente ulterior deduzindo-se ao preço acordado ainda em falta (€ 120.070,93), as quantias de:
- €1.980,00 – correspondente a trabalho faturado à dona da obra e não executado pela “EMP02..., Lda.” referente à construção de anexos isolados;
- €2.450,00 – correspondente a trabalho faturado à dona da obra e não executado pela “EMP02..., Lda.” referente a escavações para a fundação do edifício;
- €483,00 – correspondente ao valor de uma eletrobomba submersível instalada pela “EMP02..., Lda.” (faturado à dona da obra), em ordem a suprir falha a si imputável, consistente na ausência de colocação de um dreno e de impermeabilização do fundo do poço do elevador;
- €3.650,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 5.º dos factos provados) à falta de colocação pela “EMP02..., Lda.” de uma das duas pendentes do terraço do ... andar e à existência de caixas de areia danificadas e de tubos horizontais soltos (redes de águas pluviais) – valor resultante do incidente de liquidação;
- €75.500,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 6.º dos factos provados) à falta de colocação pela “EMP02..., Lda.” dos tubos de ventilação das instalações sanitárias e dos coletores de sanitas previstos para a cobertura – valor resultante do incidente de liquidação – valor resultante do incidente de liquidação.;
- €180,00 – correspondente ao valor atribuído (por provado – ponto 7.º dos factos provados) à colocação de um tubo a partir do teto com a instalação de uma girandola para permitir uma ventilação adequada nas instalações sanitárias – valor resultante do incidente de liquidação.
Não vemos, assim, nem a ré recorrente indica, no contexto do que foi decidido no referido processo 144/09.3TBMCD e incidente de liquidação, qualquer referência aos defeitos que, aqui, aquela ré foi condenada a reparar.
E, não existindo, não é pelo facto de naquela ação ter sido também discutido o contrato de empreitada e o preço devido e, a título de exceção, a não execução de trabalhos que estavam faturados pela empreiteira e a execução de ventilação em termos diferentes dos acordados, que a dona de obra está impedida de, em futura ação, discutir os defeitos da obra executada.
Uma palavra, apenas, para referir que o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que foi proferido no apenso de embargos à execução do processo 144/09.3TBMCD se encontra publicado (in www.dgsi.pt, Acórdão da Relação de Guimarães de 21/01/2021, da Juiz Desembargadora Fernanda Proença). Da leitura do mesmo facilmente se percebe que o crédito da aqui ré que estava reconhecido no incidente de liquidação – € 35.827,93 – foi extinto por compensação com o crédito da aqui autora de € 4.900,00 + € 20.233,50, estando este relacionado com obras realizadas no e por causa do poço de elevador.
Ou seja, também aqui, o que se discutiu, nada tem a ver com os defeitos que estão em causa nesta ação.
Acresce que, como resulta do facto provado 74 – que não foi impugnado pela ré recorrente no seu recurso sobre a matéria de facto –, a autora apenas teve conhecimento dos defeitos que elencou na sua petição inicial e resultaram provados em junho de 2010.
Ora, o articulado de contestação do processo 144/09.3TBMCD foi apresentado em 26/06/2009 e, como tal, está provado que os defeitos que deram origem a estes autos não eram sequer conhecidos da aqui autora quando apresentou aquele articulado e não podiam, como tal, ter sido então invocados.
Alega ainda a recorrente que a autora optou por suscitar o incumprimento do contrato de empreitada e que, por isso, não podia nesta ação requerer a eliminação/reparação dos defeitos. Não se percebe exatamente o que está a alegar a ré. Naqueles autos, a dona de obra limitou-se a alegar que não estava integralmente cumprido o contrato por parte da autora empreiteira e que, assim sendo, o preço reclamado não era devido na totalidade.
 Não estava impedida de reclamar, em futura ação, os defeitos da obra realizada que fossem supervenientes.
Não existe assim entre a decisão proferida no processo 144/09.3TBMCD e a matéria que determinou a procedência parcial desta ação qualquer autoridade de caso julgado que implique a improcedência total da ação, sendo, pois, improcedente a exceção invocada.

2 - Da impugnação da matéria de facto:

2.1. Em sede de recurso, a ré apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.
Dispõe o art.º 640.º do C. P. Civil, que:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo, de poder proceder à transcrição do excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes;
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636º.”.
A jurisprudência tem entendido que desta norma resulta um conjunto de ónus para o recorrente que visa impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto.
Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/10/2015, da Juiz Conselheira Ana Luísa Geraldes, proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1 in www.dgsi.pt, das normas aplicáveis resulta que “recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão”.
Estes ónus exigem que a impugnação da matéria de facto seja precisa, visando o regime vigente dois objetivos: “sanar dúvidas que o anterior preceito ainda suscitava e reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expressa a decisão alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova” (cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, pág. 198).
Recai assim sobre o recorrente o ónus de, sob pena de rejeição do recurso, determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretendem questionar (delimitar o objeto do recurso), motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação (fundamentação) que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre cada um dos factos que impugnam e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No âmbito da impugnação da matéria de facto não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento da alegação, ao contrário do que se verifica quanto às alegações de direito (vide, por todos, Abrantes Geraldes, no livro já citado, pág. 199).
Veja-se, por todos, a jurisprudência citada no Acórdão recente do Supremo Tribunal de Justiça de 12/10/2023, da Juiz Conselheira Maria da Graça Trigo, proc. 1/20.2T8AVR.P1.S1, e em particular o Acórdão do mesmo Tribunal de 10/12/2020 (proc. n.º 274/17.8T8AVR.P1.S1), nele citado, que estabelece que “na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no art. 640.º do CPC, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal”.
Estão em causa os factos 24, 32, 33, 34, 42, 68, 69 e 78.
A recorrente fundamenta a sua posição nos depoimentos de AA e BB e nos documentos que integram estes autos, designadamente o projeto e o livro de obras, entendendo que tais factos devem ser considerados não provados.
Alega que aqueles foram os técnicos que acompanharam o decurso do contrato de empreitada e que comprovaram que este foi executado em conformidade com as peças escritas e desenhadas fornecidas pela recorrida, na qualidade de dono de obra, além de que a recorrida esteve permanentemente representada na obra através do seu sócio gerente e aceitou todos os trabalhos no termo da obra no estado em que se encontram (conclusões 30 a 32).
Nada mais de relevante foi referido pela recorrente nas alegações, a não ser a enumeração de momentos da gravação dos depoimentos daquelas duas testemunhas, sem qualquer menção ao que referiram sobre os factos em causa ou contraponto com a motivação da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença proferida.
Citando o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/12/2017, referiu-se no Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 05/05/2022, do Juiz Desembargador José Flores, proc. 221/18.0T8CBG.G1, in www.dgsi.pt, “não são admissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar”.
Está em causa a seguinte factualidade:
- o facto 24 diz respeito às alterações introduzidas ao projeto inicial (já referidas no facto 20, que não foi colocado em causa);
 - o facto 32 reporta-se ao troço das caleiras subdimensionadas (já referidas no facto 31 que não foi colocado em causa);
- os factos 33 e 34 referem-se às deformações do pavimento exterior e as inundações delas decorrentes;
- o facto 42 reporta-se a maus cheiros das instalações sanitárias de um dos quartos;
- o facto 68 refere-se às obras necessárias para reparação de todas a anomalias;
- o facto 69 reporta-se ao custo dessas reparações;
- o facto 72 diz respeito à vistoria obtida junto da Câmara Municipal.
Assim sendo, considerando os termos em que foi efetuada a impugnação da matéria de facto – em bloco – para um conjunto extenso de factos que não têm relação entre si, sem nenhuma valoração crítica do conjunto da prova produzida e nenhuma menção concreta à que foi considerada pelo Tribunal da 1.ª Instância, aquela não respeita os critérios definidos na lei processual para que se considere validamente impugnada a decisão sobre a matéria de facto provada.
Rejeita-se, pois, a impugnação da matéria de facto que foi efetuada pela ré recorrente.

3 – Da caducidade do direito da autora para requerer a eliminação / reparação dos defeitos.

Alegando existirem três prazos de caducidade, afirma ser inevitável concluir pela caducidade do direito invocado pelo autor, considerando que a ação entrou em 28/01/2011 e que a obra foi concluída em 17/10/2008.
A fundamentação das alegações de recurso está em manifesta discordância com a conclusão apresentada.
Considerando os três prazos de caducidade que a recorrente indica nas suas alegações (um ano para a denúncia dos defeitos, um ano para a propositura da ação e cinco anos desde a data da entrega do imóvel), e cujo enquadramento legal está correto, resulta claro que não se verifica qualquer caducidade, pois que está dado como provado – sem que tenha sido colocado em crise pela recorrente -, que a autora só tomou conhecimento dos defeitos e vícios da obra em junho de 2010.
Cai assim por terra a sua alegação – contraditória com o facto dado como provado e não impugnado – de nenhum daqueles defeitos poderem ser considerados defeitos ocultos (conclusão 42).
Está absolutamente correta a fundamentação da decisão, para a qual remetemos, e que assim decidiu a questão suscitada:
sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos 1221.º, 1222.º e 1223.º do Código Civil, o dono da obra deve denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu descobrimento, equivalendo à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito. (cf. art. 1220, nºs 1 e 2 do Código Civil)
Ademais, os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista no artigo 1220.º (cf. art. 1224, n.º1 do Código Civil) Todavia, se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da obra. (cf. art. 1224, n.º2 do Código Civil).
Sem prejuízo dos normativos legais citados, previstos nos artigos 1219 .º e ss. do Código Civil, se a empreitada tiver por objeto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente. (cf. art. 1225, n.º1 do Código Civil).
Em qualquer dos casos, a denúncia deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia (cf. art. 1225, n.º2 do Código Civil), sendo certo que os prazos previstos em tal normativo legal são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previsto no art. 1221.º do Código Civil, tal qual resulta do disposto no n.º3 do art. 1225.º do mesmo diploma legal.
Do exposto resulta que, como mui bem se salienta no douto acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 18 de fevereiro de 2017, consultável in www.dgsi.pt., “Existindo defeitos da empreitada, os direitos que a lei atribui ao dono da obra estão sujeitos a um duplo prazo de caducidade, um relativo à denúncia dos defeitos e outro à instauração da ação corresponde.”
Na verdade, analisando e interpretando o conjunto de normas legais enunciadas temos que, para lá das regras gerais respeitantes ao incumprimento das obrigações, o Código Civil ao regulamentar o contrato de empreitada dedica uma secção aos “Defeitos da Obra”, atribuindo ao dono da obra os seguintes direitos: i) eliminação dos defeitos ou nova construção (cf. art. 1221.º do Código Civil); ii) redução do preço ou resolução do contrato (cf. art. 1222.º do Código Civil); iii) indemnização nos termos gerais (cf. art. 1223.º do Código Civil).
Contudo, sob pena de “caducidade” de qualquer um desses direitos, impõe o Código Civil ao dono da obra o ónus de denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos 30 dias seguintes ao seu descobrimento (cf. n.º1 do art. 1220º do Código Civil), prazo este que passa para um ano no caso de edifícios ou imóveis de longa duração (cf. n.º2 do artigo 1225.º do Código Civil).
Os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam se não forem exercidos dentro do prazo de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, ou no ano seguinte à denúncia, no caso de edifícios ou imóveis de longa duração (cf. art. 1224, nº1 do Código Civil).
A responsabilidade do empreiteiro, no caso de edifícios ou imóveis de longa duração, abarcará os defeitos que se venham a revelar no decurso de cinco anos a contar da entrega ou no decurso do prazo de garantia convencionado (cf. art. 1225, n.º1 do Código Civil).
Temos, assim, a consagração de três tipos de prazos: a) um prazo para a denúncia de cada um dos defeitos, da qual se encontrará dependente a possibilidade de escolha e de exercício de qualquer um dos direitos conferidos por lei (prazo geral de 30 dias e de um ano para os imóveis);
b) um prazo para o exercício de qualquer um dos direitos que lhe são concedidos por lei (eliminação dos defeitos ou nova construção, redução do preço ou resolução do contrato, e indemnização); c) estas pretensões só existem relativamente aos defeitos que se manifestem durante o prazo de dois anos, ou de cinco anos, no caso de edifícios ou imóveis de longa duração.
A previsão de tais prazos significa que, caso se manifeste determinado defeito na obra durante os cinco anos seguintes à entrega, e denunciado o vício ao empreiteiro dentro do prazo de um ano seguinte ao seu conhecimento, o dono da obra terá um prazo para exercer as suas pretensões, de entre os meios de reação que lhe são facultados, uns com caráter alternativo ou sucessivo e outros com caráter cumulativo, escolhendo e comunicando a sua pretensão ao empreiteiro, sob pena de perder os seus direitos.
Estabelecem aquelas normas diversos prazos durante os quais o dono da obra tem de exercer os seus direitos sob pena de extinção dos mesmos por caducidade, o que tem levantado na doutrina e na jurisprudência a questão de saber se nos encontramos perante prazos de propositura de ação judicial – prazos para a invocação de tais direitos por via de ação ou de reconvenção – ou meros prazos de exercício de tais direitos, independentemente do modo como este é exercido.
Não exigindo a lei qualquer formalidade especial para o exercício de quaisquer desses direitos especificamente previstos para a empreitada defeituosa – eliminação dos defeitos, construção de uma nova obra, redução do preço e resolução do contrato – bem como para aquelas pretensões que para o dono da obra resultariam das regras gerais de incumprimento dos contratos (por ex., exceção de incumprimento), encontram-se sujeitos à regra geral da liberdade da forma (cf. art. 219.º Código Civil).
Qualquer daqueles direitos pode, assim, ser exercido mediante declaração unilateral (ainda que verbal) dirigida ao empreiteiro, não carecendo de recurso judicial para a sua eficácia, sendo que para o direito de resolução em geral, tal liberdade de forma encontra-se expressamente prevista no n.º1 do art. 436.º Código Civil.
Os artigos 1224.º e 1225.º do Código Civil limitam-se a estabelecer qual o prazo durante o qual tais direitos têm de ser exercidos por parte do dono da obra sob pena de caducidade, sem que de tais normas se consiga extrair se são, ou não, prazos de propositura de ação, ou seja, se o exercício dos direitos a que se reportam têm de ser efetuado por via de ação judicial, questão para cuja resposta se terá de ir buscar ao regime geral do incumprimento dos contratos.
Negando tratar-se de prazos de caducidade para a propositura da ação, João Cura Mariano sustenta que “Podendo os direitos do dono da obra serem exercidos judicialmente, a simples declaração de redução do preço ou de resolução do contrato, ou mesmo a interpelação extrajudicial do empreiteiro para eliminação dos defeitos, realização de obra nova ou pagamento de indemnização, impedem a caducidade destes direitos. Em nenhum lado a lei exige que o ato impeditivo da caducidade deva ser a propositura de ação judicial, nomeadamente o disposto no art. 1224.º do Código Civil. Daí que a invocação destes direitos, posteriormente às mencionadas declarações de exercício, em ação judicial, por via de ação, reconvenção ou exceção, já não está sujeita a qualquer prazo de caducidade, estando apenas o exercício dos direitos não potestativos (direito à eliminação, realização de nova obra ou pagamento de indemnização), ou dos direitos resultantes da alteração provocada pelo exercício dos direitos de natureza não potestativa (v.g., o direito à devolução do preço pago, em consequência do exercício do direito de resolução ou de redução do preço), sujeitos ao prazo de prescrição geral.
E, no sentido de que tais direitos não têm necessariamente de ser exercidos por via de ação judicial, sob pena de caducidade, aponta o facto de os direitos do dono da obra nem sequer serem estáticos, evoluindo ou alterando-se em função das respostas que às suas pretensões venham a ser dadas pelo dono da obra: por ex., se, denunciado o efeito, o dono da obra conceder ao empreiteiro um prazo razoável para a eliminação dos defeitos e se este, após tentativas várias, não os conseguir eliminar (por incompetência do empreiteiro ou por os mesmos não serem elimináveis), o incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos por parte do empreiteiro atribuirá ao dono da obra novos direitos, como seja, o direito à eliminação dos defeitos por terceiro a expensas do devedor, no caso de a eliminação ser ainda possível, o direito à redução do preço ou, mesmo, à resolução do contrato.
Ora, este diálogo constante entre as pretensões do dono da obra e as contrapropostas do empreiteiro não é compatível com a exigência de que, independentemente do facto de ter atempadamente comunicado extrajudicialmente quais as suas pretensões, o teria de fazer, novamente e necessariamente, por via de ação judicial (por via de ação ou de reconvenção) dentro daqueles prazos, sob pena de caducidade. (cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 22 de junho de 2020, consultável in www.dgsi.pt.)
Ademais, com relevo para o caso vertente, importa notar que à denúncia dos defeitos equivale a citação do empreiteiro no âmbito da ação judicial intentada pelo dono da obra com vista tornar efetivos quaisquer dos referidos direitos que a lei lhe confere. Aliás, nesse sentido decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães, no já referenciado acórdão datado de 18 de fevereiro de 2017, consultável in www.dgsi.pt, assim sumariado, em parte:“ (…) Equivale à denúncia a citação do empreiteiro para a ação destinada a tornar efetivos quaisquer dos aludidos direitos.”
Revertendo ao caso, temos que a empreitada em causa nestes autos teve por objeto a construção de edifício ou imóvel destinado, pela sua natureza, a longa duração, pelo que nos cinco anos que se seguiram à data da entrega da obra, a ré, enquanto empreiteira, é responsável pelo prejuízo causado à autora, enquanto dona da obra, decorrente da obra, nesse período temporal, apresentar defeitos, é o que resulta do art. 1225, n.º1 do Código Civil.
Todavia, sob pena de caducidade dos seus direitos, designadamente do direito à eliminação dos defeitos que a autora exerce, a título principal, nesta lide, sobre ela, enquanto dona da obra, impendia o dever de denunciá-los à ré, empreiteira, dentro do prazo de um ano a contar do seu descobrimento, devendo a ação respetiva, destinada a fazer valer os seus direitos (mormente o referido direito à eliminação dos defeitos), ser intentada dentro do prazo de um ano a contar da data em que denunciou os defeitos, conforme decorre das disposições conjugadas dos artigos 1225, nºs 2 e 3 e 1221.º do Código Civil.
Coligindo os factos provados, temos que a ré, enquanto empreiteira, entregou a obra à autora, na qualidade de dona da obra, no dia 17 de outubro 2008, assinando o respetivo termo de encerramento da mesma, sendo certo que a autora somente teve conhecimento dos defeitos e/ou vícios da obra, que se apuraram, em junho de 2010, ou seja, dentro dos cinco anos seguintes à data em que se efetivou a entrega da obra.
Como se salientou supra, sob pena de caducidade dos seus direitos, designadamente do direito à eliminação dos defeitos que a autora exerce, a título principal, nesta lide, sobre ela, enquanto dona da obra, impendia o dever de denunciá-los à ré, empreiteira, dentro do prazo de um ano a contar do seu descobrimento, equivalendo à denúncia a citação do empreiteiro para a ação destinada a tornar efetivos quaisquer dos direitos que lhe cabiam nos termos da lei.
Ora, ainda que se tenha provado que em momento anterior à propositura desta ação, extrajudicialmente, a autora não denunciou os defeitos respetivos à ré, o certo é que a denúncia de tais defeitos se tem por concretizada e realizada com a citação da ré, empreiteira, para os termos desta ação declarativa, por via da qual a autora pretende tornar efetivo o seu direito à eliminação dos defeitos e/ou vícios verificados na obra objeto da empreitada.
Neste cenário, tendo a citação da ré para os termos desta ação declarativa ocorrido dentro do prazo de um ano a contar da data em que a autora descobriu os defeitos e/ou vícios da obra que se vieram a apurar nesta lide (a autora tomou conhecimento dos defeitos e/ou vícios da obra em junho de 2010 e a ré foi citada para os termos desta ação em 24 de fevereiro de 2011), conclui-se que, ao arrepio do sustentado pela ré, a autora denunciou-lhe atempadamente os defeitos e/ou vícios da obra.
Não ocorreu, pois, a caducidade do direito da autora à eliminação dos defeitos da obra pelo decurso de prazo legalmente previsto para a denúncia dos defeitos e/ou vícios da obra.
Isto posto, como se referiu supra, também sob pena de caducidade dos seus direitos, designadamente do direito à eliminação dos defeitos, a autora teria que intentar a ação respetiva, destinada a fazer valer os seus direitos (mormente o referido direito à eliminação dos defeitos), dentro do prazo de um ano a contar da data em que denunciou os defeitos.
Ora, considerando, como se considera, que a denúncia dos defeitos e/ou vícios da obra ocorreu, tempestivamente, com a citação da ré, empreiteira, para os termos desta ação, a ação destinada a fazer valer o seu direito à eliminação dos defeitos, que corresponde à presente, foi instaurada até em momento anterior à respetiva denúncia dos defeitos e/ou vícios da obra.
Doutro modo, a ação por via da qual a autora, enquanto dona da obra, faz valer o seu direito à eliminação dos defeitos e/ou vícios da obra, que é a presente, foi instaurada antes de decorrido um ano sobre a data em que se considera ter sido efetivada a denúncia, o que equivale por dizer que, ao arrepio do sustentado pela ré, não caducou o direito da autora à eliminação dos defeitos da obra pelo decurso do prazo legalmente previsto para o exercício do direito respetivo.
Em suma, julga-se não verificada a invocada exceção perentória de caducidade do direito da autora à eliminação dos defeitos da obra, quer pelo decurso de prazo de denúncia quer pelo decurso do prazo para o exercício do direito respetivo”.
Nada mais pode acrescentar este Tribunal de recurso, pois que a decisão proferida é a correta e está irrepreensivelmente fundamentada, não se verificando a caducidade do direito da autora.

4 -  Reapreciação de direito:

Não tendo sido introduzidas quaisquer alterações na decisão relativa à matéria de facto, mantêm-se como provados os factos acima transcritos.
Ainda assim entende a recorrente que a decisão não pode manter-se.
Vejamos os fundamentos apresentados.
Começa a recorrente por alegar que não estamos perante defeitos de construção, mas desconformidades em relação ao que alegadamente constitui as peças escritas e desenhadas.
Não logra sequer perceber-se o fundamento da irresponsabilidade invocado pela ré.
A existência de desconformidades entre o que está construído e o que constava das peças escritas e desenhadas é, em si mesmo, um defeito de construção, pois que estava acordado que a construção deveria respeitar os projetos entregues, como decorre do ponto 7 da matéria de facto provada.
Alega ainda que os defeitos não podem ser retificados, porque foram aceites pela autora e que tendo havido redução de preço na ação 144/09.3TBMCD em relação a trabalhos que ainda hoje cumprem a sua funcionalidade, a autora não pagou os trabalhos executados mas deles beneficia.
Não vislumbramos na matéria de facto provada, o facto que a ré recorrente alega de terem os defeitos / vícios da obra, reconhecidos na sentença, sido aceites pela autora, sendo certo que, mais uma vez, nessa parte, não houve impugnação da matéria de facto (com efeito, a ré não impugnou a matéria de facto, alegando a omissão de tal facto na factualidade considerada provada em sede de 1.ª Instância).
Quanto à “redução de preço” a que a ré se reporta, está a mesma, mais uma vez, equivocada quando entende que a mesma se reporta ao que está em causa nesta ação, nos pedidos que foram julgados procedentes. Não está.
O preço da empreitada não foi reduzido.
Ao preço da empreitada foi, apenas, retirado o valor dos trabalhos que estavam incluídos nesse preço e que não foram realizados pela ré ou não eram devidos pela autora, como decorre do ponto 93 da decisão.
Assim, não é verdadeira a afirmação de não ter a autora procedido ao pagamento dos trabalhos que foram executados defeituosamente. Estes estão pagos. Os que não foram, porque o seu valor foi deduzido ao valor do preço ainda em falta, no processo 144/09.3TBMCD, foram apenas os que estão em causa no facto 93 da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto (e, em fase de execução daquela sentença, como vimos já, que está relacionado com o poço do elevador e que aqui também não está em causa).
Concretamente quanto a parte dos pedidos julgados procedentes, alega a ré recorrente que executou os trabalhos em conformidade com o que lhe foi solicitado pela recorrida, estando demonstrado que os coletores e os tubos desempenham as suas funções (primeiro parágrafo do pedido julgado procedente – “substituir os coletores de drenagem das águas pluviais existentes por coletores de diâmetro superior; a substituir as caleiras subdimensionadas existentes por caleiras, em chapa zincada, com 110 mm de diâmetro; a substituir os tubos de queda de água existentes por tubos de queda de água com 110 mm de diâmetro; e, bem assim, a colocar os tubos de queda de água em falta, cumprindo integralmente o projeto da especialidade drenagem de águas pluviais, assim como os decretos regulamentares em vigor”.
Estão em causa os factos provados em 29, 30 e 68.
Não está demonstrado que estas desconformidades foram solicitadas pela autora e muito menos que, tal como estão, desempenham a sua função. E, ainda que desempenhassem, não poderia a ré alterar os termos do acordo celebrado, colocando em obra equipamento diferente, em número e dimensões, do que estava contratualmente previsto, no que se refere aos coletores e tubos de queda.
Quanto ao segundo segmento condenatório – “eliminar/retirar a situação de dupla sifonagem descrita no ponto 50.º dos factos provados, bem como a criar o sistema separativo de águas negras e saponáceas previsto no projeto de licenciamento da rede de drenagem de águas residuais, devendo o circuito do mesmo permanecer separado até à ultima caixa de reunião, designada de caixa geral, a qual descarregará para a rede pública de drenagem de águas residuais, impedindo, desse modo, que as sobreditas águas negras e saponáceas se reúnam ou misturem logo após a ligação dos aparelhos, mais concretamente no coletor da linha” – alega a recorrente que a dupla sifonagem não é da sua responsabilidade, pois que o segundo sifão resulta da instalação do equipamento da cozinha que não foi por si fornecido ou instalado.
Os factos alegados pela recorrente para fundamentar a alteração da decisão não estão dados como provados (e, mais uma vez, se repete, nenhuma omissão foi invocada relativa a essa factualidade, a título de impugnação da decisão sobre a matéria de facto).
Alega ainda que “tudo o mais, depende da alteração dos projetos, que não foram executados pela recorrente”. 
Ora, como decorre expressamente da fundamentação da decisão, o que aqui está em causa é precisamente a desconformidade entre o que estava previsto no projeto de licenciamento e o que foi executado pela ré, estando esta condenada a executar precisamente o que estava projetado.
Não está assim em causa qualquer alteração de projeto, mas a sua correta execução.
Por último, alega ainda a recorrente que não pode ser condenada a “refazer e recalcular a rede de abastecimento de água, mediante a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água - do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício”, pois que tal implicaria elaborar projetos, não sendo da sua responsabilidade a sua elaboração.
O que se pretende que seja efetuado é, apenas, a regularização da superfície de passagem dos tubos da rede de abastecimento de água, do aquecimento e de retorno, e, bem assim, da fixação por abraçadeiras ou assentamento numa superfície regular e contínua das tubagens da rede de abastecimento de água que não se encontram embutidas nos elementos do edifício.
Não vemos de onde se retire que tenha que ser alterado qualquer projeto da obra, estando aqui em causa, como resulta da sentença, que, “por força do executado pela ré, a tubagem da rede de abastecimento de água anda a par da tubagem de água quente, sendo certo que em determinados locais do edifício há sete tubos sobrepostos. Mais se provou que a tubagem visível no desvão sanitário está solta e assente sobre o solo e sobre o entulho ali existente, sendo certo que as tubagens que não se encontram embutidas nos elementos do edifício deveriam estar fixas por braçadeiras ou assentes numa superfície regular e contínua, o que não sucede”.
O que a ré está assim obrigada a fazer é, apenas, a executar a obra, que, quanto à rede de abastecimento de água, tem de ser refeita nos aspetos referidos, “em total obediência e na observância escrupulosa dos projetos de licenciamento, bem como dos projetos de especialidades e de alterações”, como resulta do primeiro parágrafo do segmento condenatório.
Improcede, assim, na totalidade, a apelação apresentada pela ré.
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Sumário (ao abrigo do disposto no art.º 663º, n.º 7, do C. P. Civil):

1 –As exceções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à exceção do caso julgado.
2 – Estamos assim perante a invocação da mesma exceção e, como tal, estando definitivamente decidida a exceção de litispendência, não pode apreciar-se a exceção dilatória de caso julgado, se estiver em causa a alegação da mesma repetição de ações, apenas porque inicialmente estavam ambas ainda pendentes e, agora, uma delas está já transitada em julgado.
3 – Não existe também autoridade de caso julgado quando, na sentença proferida na primeira ação, a dona de obra, que foi demandada pela empreiteira exigindo o pagamento do preço que está por pagar, se decide deduzir o valor do preço devido pelos trabalhos que estavam acordados ser realizados pela empreiteira e que esta não realizou, e, na segunda ação, a mesma dona de obra invoca a existência de defeitos, conhecidos em data posterior à contestação oferecida naquela primeira ação, relativamente à construção que foi efetivamente realizada pela empreiteira.
4 - É de rejeitar a impugnação da matéria de facto em que se visa um conjunto de factos provados, em bloco, não relacionados entre si, sem que seja efetuada qualquer avaliação crítica da prova indicada pelo próprio recorrente, no confronto com a motivação da decisão da matéria de facto constante da decisão sob recurso.
5 – Cumpre o dever de denúncia dos defeitos da obra a propositura da ação judicial pela dona de obra visando a sua eliminação pela empreiteira.

VI – Decisão:

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando, em consequência, a decisão recorrida.
Custas do recurso pela ré, nos termos do art.º 527.º do C. P. Civil, considerando o seu decaimento na apelação apresentada.
Guimarães, 18 de janeiro de 2023
(elaborado, revisto e assinado eletronicamente)