Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ALEXANDRA ROLIM MENDES | ||
Descritores: | DEVERES DO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO VIOLAÇÃO GRAVE DO DEVER DE INFORMAÇÃO PRESCRIÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 10/03/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I- O intermediário financeiro nas relações com o cliente tem de agir de acordo com padrões de diligência, lealdade e transparência superiores aos de um homem médio, o que se compreende atenta a progressiva complexidade dos produtos financeiros e a necessidade de proteção dos clientes que na maioria das vezes são a parte menos experiente na contratação. II- No caso em apreço, tendo o funcionário do Banco, que atuava em representação deste, persuadido o Autor, a adquirir um produto financeiro, convencendo-o de que era seguro, que o capital estava garantido, não lhe explicando as características do produto e o risco envolvido na sua aquisição e não lhe entregando qualquer informação sobre as características do papel comercial que estava a adquirir e sendo o A. um investidor não qualificado, a obrigação de esclarecimento que impendia sobre o intermediário era mais acentuada, pelo que se conclui que o Banco não cumpriu as exigências impostas pela lei e nomeadamente pelo CVM, violando as exigências de boa-fé e a confiança que o cliente depositava na instituição bancária, tendo prestado informação que não era verdadeira acerca da garantia de reembolso do capital investido. III- A conduta do Banco violou de forma grave o dever de informação, ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição previsto no art. 324º, nº 2 do Código dos Valores Mobiliários, e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos. IV- A violação do dever de informação situa-se no âmbito da responsabilidade pré-contratual, não obstando a este entendimento o facto de o contrato se ter realizado e constitui o Banco na obrigação de indemnizar caso estejam verificados os pressupostos gerais dessa obrigação. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: A. M., residente na Rua …, do concelho de Ponte da Barca veio intentar a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra Banco ..., SA, sito no … – Rua …, do concelho de Ponte de Lima alegando, sucintamente, que era cliente do banco réu; que foi abordado pelo gerente do banco réu da agência de Ponte de Lima para efetuar uma aplicação em tudo semelhante a um depósito a prazo, tendo-lhe sido transmitido que a aplicação financeira em causa tinha capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada; que ao autor não foi dado a conhecer o tipo de produto em causa e as condições da aplicação financeira, tão-pouco tendo recebido qualquer informação relativa à entidade emitente, nem foram entregues documentos comprovativos da aquisição do produto em causa; que o funcionário da ré sempre soube que o autor só aceitaria efetuar tal aplicação financeira se não se tratasse de um produto com risco; que na data de vencimento da subscrição não lhe foi devolvido o capital investido, nem tem sido cumprido o pagamento dos juros acordados e que a situação causou e causa ao autor preocupação e receio de que não venha a recuperar o seu dinheiro, acarretando-lhe instabilidade emocional. Terminou o autor pedindo a procedência da ação e, em consequência, a condenação do banco Réu a pagar ao Autor a quantia de € 50.000,00 e juros vencidos e garantidos que, na data da propositura da ação, ascendiam a € 7.000,00, bem como os juros vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento; e subsidiariamente, se declare nulo qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que o autor entregou ao réu, em obrigações subordinadas Sociedade... Rendimento Mais 2004; ser declarada ineficaz em relação ao autor a aplicação que o banco réu tenha feito desses montantes e condenar-se o banco réu a restituir ao autor a quantia de € 57.000,00 que aina não recebeu dos montantes que entregou ao réu e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento; e sempre a condenação do banco réu a pagar ao autor a quantia de € 3.000,00, a título de danos não patrimoniais. Contestou o Réu invocando a prescrição do direito do autor e que agiu de acordo com a vontade e as instruções recebidas do mesmo, tendo este subscrito um contrato para registo e depósito de valores imobiliários, após o réu ter prestado previamente toda a necessária e devida informação. Impugnou no mais a factualidade invocada na petição inicial, concluindo assim pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido. O Autor apresentou resposta à exceção invocada na contestação, arguindo para além do mais, que a nulidade do contrato de intermediação financeira e o reconhecimento do seu direito e impugnou os documentos juntos com a contestação, dizendo eu o contrato de fls. 18v e 19 nunca lhe foi entregue e explicado. Findos os articulados, foi realizada a audiência prévia e, na sequência, proferido despacho saneador, que relegou para final o conhecimento da exceção da prescrição. Após realização do julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos: “Por todo o exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a ação e, em consequência, condena-se o banco réu Banco ..., SA a pagar ao autor A. M. a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida dos juros à taxa legal vencidos desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento; e a quantia de € 300,00 (três mil euros) a título de danos não patrimoniais. Custas da ação a suportar pelo autor e pelo banco réu, na proporção dos respetivos decaimentos, nos termos do disposto no art.º 527º, nºs 1 e 2, do NCPC.” * Inconformado veio o Réu recorrer formulando as seguintes Conclusões:1. Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, sendo que a presente decisão veio surpreender sobremaneira o aqui Recorrente, pois que, considerando o Tribunal Recorrido a presente ação parcialmente procedente, não julgou corretamente. 2. Com tal decisão, a Mm.ª Juiz a quo violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D do CdVM; 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Diretiva 2004/39/CE; 220º, 232º e 236º, 483º e ss., 595º e 615º do C.C; 615.º, n.º 1, al. e) do CPC. 3. Apesar da natural e compreensível consternação que é possível observar das peças apresentadas a juízo pelo A., importa lembrar que a pretensão pelos mesmos deduzida se encontra despida de qualquer fundamento provatório, bem como factual, além de ser manifestamente mal direcionada contra o Banco R. 4. Certo é que o Banco R., tal qual estava obrigado, prestou ao A. informações completas, verdadeiras, atuais, claras, objetivas e lícitas (nos termos e para os efeitos do art.7º do Código de Valores Mobiliários), quanto às obrigações por estes subscritas, dando cumprimento não só à lei, mas também a uma política de transparência e de confiança pela qual sempre se pautou. 5. Da prova produzida resulta, sem margem para dúvidas, que o A. sabia perfeitamente o que estava a subscrever, bem sabendo também das semelhanças e diferenças entre o instrumento financeiro subscrito e a figura do depósito a prazo (note-se que o próprio tratamento fiscal de um e de outro instrumento é inclusive diverso). Mas a “estranha” construção deste argumento ganha novas dimensões, se considerarmos o facto de o A. nunca ter reclamado de qualquer dos extratos bancários recebidos, onde o investimento em juízo aparecia referenciado individualmente tal e qual como fora realizado – e nunca enquanto depósito a prazo! –, bem como da ausência de qualquer reclamação junto do funcionário bancário que, alegadamente, lhe teria vendido um instrumento financeiro diverso do por si pretendido – é de facto estranho que tal intervenção junto do funcionário indicado nunca tenha ocorrido, pois se o sentimento de revolta era tal, cremos que sempre ditariam as regras comuns que o A. diligenciasse pelo contacto com o referido vendedor, o que nunca aconteceu. 6. O Apelante entende, por um lado, que os factos dados como provados nos números “2.; 6.; 7.;8.; 9.; 10.; 12.” não deveriam constar do corpo da Sentença nos termos ali propostos, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento. Nestes termos, é o Banco Apelante de pugnar pela alteração de tais números, de acordo com a redação adiante proposta. Por outro lado, o Apelante pugna pela inserção dos artigos 28., 32., 35. e 57., alegados na sua Contestação, no elenco dos factos dados como provados. 7. Em jeito de introito, cumpre, antes de mais, fazer referência a duas questões “prévias”, antes de nos debruçarmos cabalmente sobre a impugnação da matéria de facto. Por um lado, o facto que tem que ver com o email junto aos autos com a petição inicial. É que cremos ser fatal ver nesse email qualquer facto que possa servir de motivação de moldes a estribar uma putativa condenação do Banco Apelante. De facto, através de um olhar minimamente atento ao teor do mesmo ressaltam, imediatamente, dois importantes fatores: (i) o produto em questão no mesmo é “Papel Comercial da Sociedade ... Valor, SGPS, S.A.” e, portanto, escusado será dizer que se trata de um produto diferente daquele que é tratado no caso sub judice, que são Obrigações Sociedade ...; (ii) tal email é datado de 26 de Julho de 2008 e, assim, temporalmente muito posterior à subscrição do produto em causa (2004), pelo que, ver em tal “documento” qualquer proximidade de informação a prestar, sempre se dirá que incorre em erro manifesto. Sempre se concluindo pela impossibilidade objetiva de valorar tal “documento” como fundamentador de uma convicção. 8. Por outro lado, mas não menos importante, outra situação que tem bastante interesse para uma correta decisão da causa sub judice, e que o Tribunal a quo se limitou a fazer “tábua rasa” da mesma, tem que ver com o facto de o funcionário bancário que (teoricamente) colocou o produto ao A. – a testemunha J. M. – não se recordava de que informações é que foram (ou não) transmitidas no ato de subscrição. Pode concluir-se, então, que qualquer motivação, quanto à matéria de facto, estribada no seu depoimento, se encontraria, em concreto, prejudicada. 9. O produto – Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004 – terá sido vendido pela aludida testemunha, genericamente, que se tratava de uma aplicação segura e com rentabilidade acima da média. Referiu, posteriormente, que eram referidos o prazo de 10 anos e a respetiva remuneração. E, por fim, disse que era explicado que se tratava de uma aplicação emitida pela casa mãe do Banco R., ou seja, que era da empresa à qual o Banco pertencia. Concluindo que não tinha qualquer dúvida quanto ao facto de colocar o produto como assim sendo – como sendo da casa mãe do Banco – uma vez que, caso se tratasse de produto do próprio banco tratar-se-ia de um depósito a prazo e a subscrição seria, necessariamente, diferente. 10. Pelo que vem expendido, é ostensivo que os factos 2., 6. e 7. deveriam ter a seguinte redação adiante proposta: “2. Em data não concretamente apurada, o gerente do Banco Réu da agência de Ponte de Lima contactou o autor, propondo-lhe realizar uma aplicação com capital garantido e com rentabilidade assegurada.”; “6. Tendo assegurado ao autor marido que a referida aplicação não tinha risco e era melhor remunerada.“; “7. Na sequência, o autor veio a autorizar a aplicação da quantia de € 50.000,00 em obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, sem que, contudo, soubesse em concreto o que era, sabendo que a Sociedade ... era a empresa dona do Banco.” 11. No que concerne ao denominado “risco banco”, a testemunha (teoricamente) vendedora das Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004 foi assertiva, dizendo que esta afirmação tinha subjacente a ideia de que a sociedade emitente ser a dona do banco. 12. Parece meridianamente claro ao Apelante que o facto dado provado 9. deveria ter a seguinte redação: “9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura na casa mãe do banco e que, por isso, num produto com risco Banco.” 13. Já no que concerne à garantia de capital, a testemunha foi, igualmente, incisiva e referiu que, a propósito da questão da garantia, só transmitiam que era capital garantido, até porque a questão de quem prestaria a garantia não se colocava. 14. Assim, resulta à saciedade que os factos deveriam ter tido a redação que de seguida o Apelante propõe: “8. O que motivou a autorização para tal operação, por parte do autor, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo banco réu, com pagamento de juros semestrais. “; “10. Se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido, não o autorizaria.“; “12. O réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha garantia de capital.“. 15. Numa lógica de complementaridade daquele “risco” que acima a testemunha referiu, corroborando ainda com a sua inexistência à data, servem de base os seguintes factos (alegados na Contestação) que deveriam ter sido dados como provados, porquanto a aludida testemunha referiu que a Sociedade ..., ao longo dos anos, emitiu vários produtos de dívida diferentes e foram sendo todos pagos. Devia, assim, o artigo 32. da Contestação ter sido dado como provado. 16. Não era previsível à data que houve risco de que a aplicação pudesse vir a não ser paga. Devia, assim, o artigo 28. da Contestação ter sido dado como provado. 17. Não havia qualquer previsibilidade que houvesse a nacionalização e a forma como a mesma foi feita. Devia, assim, o artigo 35. da Contestação ter sido dado como provado. 18. Por fim, a testemunha foi perentória quando referiu que o A. recebia extratos periódicos no seu domicílio com a descrição de todos os produtos que tinha, aparecendo os mesmos perfeitamente discriminados. Devia, assim, o artigo 57. da Contestação ter sido dado como provado. 19. Os contratos de intermediação financeira implicam relações jurídicas que se estabelecem em níveis diferentes. O negócio de cobertura é o concreto contrato de intermediação financeira celebrado entre o intermediário e o cliente e que tem por objeto imediato conceder ao intermediário os poderes necessários para celebrar o negócio de execução. O negócio de execução, por seu turno, é o contrato celebrado entre o intermediário e o terceiro, no interesse e por conta do cliente (ou também o negócio celebrado diretamente entre o terceiro e o cliente, com a intermediação do intermediário financeiro), e tem a maioria das vezes por objeto a aquisição, alienação ou qualquer outro negócio sobre valores mobiliários. 20. Claro está, que o dever de informação relativo ao negócio de cobertura deve ser prestado em momento anterior ao contrato de intermediação e o dever de informação relativo ao negócio de execução será cumprido já na vigência daquele, tal como sucederá, aliás, com os deveres de informação relativos aos instrumentos financeiros escolhidos! Os deveres de informação a prestar pelo intermediário financeiro, previstos no art. 312º nº 1 do CdVM, são os deveres de informação relativos ao próprio contrato de intermediação financeira, v.g., ao negócio de cobertura! 21. Já os arts. 323º, 323º-A, 323º-B e 323º-C do CdVM tratam dos deveres de informação próprios, relativos, inerentes ou decorrentes dos negócios de execução, levados a cabo ao abrigo dos negócios de cobertura, como aliás decorre das epígrafes dos artigos. 22. Daí que não se possa retirar qualquer consequência jurídica da afirmação do incumprimento dos deveres previstos no art. 312º do CdVM, tendo antes que se buscar na densificação desses preceitos o conteúdo do dever de informação aí genericamente afirmado. 23. O RISCO que a sentença associa maioritariamente a um fenómeno de incumprimento da obrigação assumida (neste caso incumprimento do reembolso da obrigação) ou até à insolvência do emitente, NÃO É NEM PODE SER CONSIDERADO UM RISCO ESPECIAL! O risco de incumprimento ou risco de insolvência de um devedor são RISCOS GERAIS de qualquer obrigação, precisamente porque são características nucleares de toda e qualquer obrigação. 24. Versando como versa aquele art. 312º do CdVM sobre os deveres de informação a cumprir quanto ao contrato de cobertura, a menção aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar, refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira (no caso a execução de ordens) enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução. 25. Parece-nos assim por demais evidente que a disposição do art. 312º nº 1 alínea e) relativa aos “riscos especiais nas operações a realizar” em nada se relaciona com a matéria em crise nos presentes autos pois o que é invocado na P.I. é a prestação de uma informação falsa quanto ao instrumento financeiro em si e esta disposição, como vimos, diz respeito à prestação de informação acerca do negócio de intermediação ou de cobertura. 26. Entendemos que nada ficou por dizer ou explicar quanto à natureza dos instrumentos financeiros. Da remissão feita para o art. 312º-E nº 1 resulta que o legislador manda também o intermediário financeiro informar o cliente sobre os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa. São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação! 27. O investimento efetuado foi feito em obrigações da Sociedade ... que é um instrumento do mercado monetário (art.º 1 alínea b) do CdVM). Não é um investimento sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso! 28. A informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ se tais riscos de facto existirem! E não se pode confundir a advertência sobre o risco de perda do investimento com a análise de qualquer qualidade e robustez (ou falta dela) do emitente do título! É que a este respeito, impõem-se clarificar, que em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na atividade de intermediação financeira de receção e transmissão de ordens. 29. O risco de incumprimento não constitui qualquer risco especial da operação! A ser alguma coisa, o risco de incumprimento de uma obrigação de compra (subjacente naturalmente ao cumprimento da opção potestativa de venda) é um RISCO GERAL de qualquer obrigação! 30. Na data do endosso das referidas obrigações, a redação do CdVM era aquela resultante das sucessivas alterações do D.L. 486/99 de 13/11 até ao D.L. 52/2006 de 15/03. À data da contratação das aplicações não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312º-E nº 2 alínea a)! Ao contrário do que hoje sucede, não havia na anterior redação do CdVM qualquer norma que taxativamente obrigasse o interessado financeiro em que se pretendia investir. Essa foi a grande inovação da D.M.I.F. e do diploma que a transpôs! 31. As Obrigações eram então, como é ainda, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu. Assim, dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro como a subscrição daquela Obrigação. Pelo que o mesmo era então adequado a alguém como os Recorridos. Tanto mais que o risco de um DP no Banco seria, então, semelhante a uma tal subscrição de Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, porque pertencendo todas as empresas ao mesmo Grupo, o risco da Sociedade ... estava indexado ao risco do próprio Banco. O investimento efetuado era assim um investimento seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”. 32. O dever de informação neste contrato será um dever secundário, genérico ou acessório da prestação principal, por estar umbilicalmente ligado àquela (não resistindo autonomamente sem ela) e podendo até condicioná-la. 33. Ou seja, e em conclusão, A VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO IMPLICA QUALQUER PRESUNÇÃO DE ILICITUDE! E, portanto, tinha que ser o A. a alegar e provar que concretas informações é que o Banco Réu deveria ter dado, que não deu! Não o tendo feito, tem a presente ação necessariamente que claudicar! 34. Não está alegado, e muito menos provado, que se tenha tornado impossível receber (total ou parcialmente) o montante investido pelo A. nas Obrigações. Daí resulta, portanto, que a condenação do Banco Réu no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelo Autor é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério teoria da diferença prevista no art. 566º nº 2 do CC. 35. Não há qualquer matéria provada que permita a conclusão que o comportamento R. foi decisivo e causal na produção dos danos, pois que foi com base na informação que foi transmitida ao Autor, que deu o seu acordo na aquisição da Obrigação Sociedade ... Rendimento Mais 2004 – numa primeira e segunda fase, respetivamente. Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou. Num segundo momento é necessário provar que aquele negócio produziu um dano. E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objetiva ao tempo da lesão. 36. Não podendo, por fim, o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães olvidar que a falta de reembolso ocorreu por efeito da insolvência da emitente e não por causa de qualquer deficiente informação ou atuação do intermediário financeiro. 37. O A. foi recebendo, periodicamente, as quantias relativas aos cupões, que sempre lhe foram pagos até à insolvência da emitente e recebia mensalmente os extratos bancários com indicação expressa de carteira de obrigações e nada reclamou durante o referido período. Não se verificando, assim, o nexo de causalidade adequada entre a atuação do Recorrente enquanto intermediário financeiro e, o não reembolso, na maturidade, do capital investido. 38. Assim, ou o A. alegava e provava que se tivesse sido cumprido o dever de informação, não teria realizado o investimento, ou então, tem que arcar com as normais consequências de um investimento que se tornou ruinoso, pois não há forma de corrigir a titularidade do risco, pela responsabilidade — the risk lies where it falls! 39. Ainda que se censure a conduta do Banco Réu (o que não se concede), essa censura NUNCA poderá ser reconduzível a um dolo ou a uma culpa grave. De facto, lida e relida a matéria de facto, a sensação que fica é que o funcionário envolvido do Banco Réu sequer concebeu a possibilidade de estar a faltar ao dever de informação acerca da aplicação financeira e que, com essa falta, poderia estar a determinar o investimento do cliente num produto que este não quereria se estivesse devidamente informado. 40. A ideia que perpassa é que o funcionário do Banco Réu estava absolutamente convencido da segurança do investimento e da adequação do mesmo ao perfil de investidor do A. Terá havido, portanto (e quando muito) uma indução do A. em erro, sem que por parte do funcionário do Banco Réu houvesse intenção ou consciência de o fazer – trata-se, portanto, de uma indução negligente em erro. 41. Tal conduta apenas pode ser reconduzível à mais leve das formas de negligência - a negligência inconsciente. Esta graduação da culpa do intermediário financeiro tem particular interesse, sobretudo em sede da prescrição, pois o art. 324º do CdVM. 42. Parece-nos evidente e manifesto que o A. conheceu os termos em que o negócio foi concluído, designadamente a inexistência de garantia de capital e juros e a subordinação da obrigação aquando da receção dos extratos bancários no seu domicílio, ou pelo menos em novembro de 2008, data da nacionalização do Recorrente! Não obstante, a ação apenas foi proposta em Novembro de 2018! E, portanto, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do Banco Réu! 43. Não havendo declaração negocial, bem ou mal emitida, não pode haver obrigação jurídica – seja ela qualquer for - de fonte contratual, pelo que não pode, em qualquer circunstância, entender-se que o Banco assumiu uma obrigação de reembolso ou que a afiançou! Termos em que, da modéstia de quanto fica, e do muito que doutamente será suprido, deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença, e consequentemente, substituir-se por outra que julgue totalmente improcedente a ação proposta pelo a./recorrido. * O Autor apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões:I. Do recurso da matéria de facto: 1) A douta sentença recorrida deve ser mantida uma vez que nela se faz adequada interpretação dos factos e correta aplicação do direito. 2) No nosso entender, a douta sentença da qual o réu/recorrente discorda, está plenamente fundamentada de acordo com a (toda) prova produzida em julgamento, tendo sido minuciosamente apreciada e conjugada com as regras da experiência comum, não padecendo de nenhum vício ou obscuridade. 3) Quanto à pretendida alteração à resposta à matéria de facto, diga-se que seria necessário que a Recorrente demonstrasse, através dos concretos meios de prova que foram produzidos, que existiu um erro na apreciação do seu valor probatório, o que não fez. 4) Depois, nos termos da 1ª parte do art. 607.º n.º5 do Código de Processo Civil, “O Juiz aprecia livremente as provas, segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”. 5) No caso vertente, foi possível perceber como é que, de acordo com as regras da experiência comum e da lógica, se formou a convicção do tribunal a quo, num sentido e não noutro e, bem assim, porque é que o tribunal teve por fiável determinado meio de prova e não outro. 6) A sentença recorrida contém os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituíram o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse no sentido de considerar provados e não provados os factos em discussão, ou seja, um exame crítico sobre as provas que concorrem para a formação da convicção do tribunal coletivo num determinado sentido, cuja fundamentação acima se transcreveu. 7) A sentença em crise não enferma de qualquer erro notório na apreciação da prova, pelo que inexiste fundamento para a pretendida pelos Recorrentes alteração à resposta à matéria de facto. 8) A verdade é que o Tribunal da Relação só deve alterar a decisão recorrida perante uma situação probatória de imposição de decisão diversa, como decorre, clara e inequivocamente, do disposto no nº 1 do art.º 662º, do CPC; ou seja, quando se verifique, relativamente a cada facto impugnado, uma prova impositiva, determinante, que torne imperioso o afastamento do facto segundo as boas regras da apreciação da prova. 9) Não existe fundamento legal para a alteração da resposta aos factos dados como provados nos números 2, 6, 7, 8, 9, 10 e 12, nem da inserção dos artigos 28, 32, 35 e 57, alegados na contestação, para o elenco dos factos dados como provados, porquanto a decisão da matéria de facto, para além de não enfermar de erro notório e evidente, foi proferida em respeito pelo princípio da livre apreciação da prova e resultou da conjugação da prova documental e testemunhal produzida na audiência de julgamento, apreciada à luz das regras da experiência comum e de normalidade. 10) Ora, o recorrente, nas conclusões, não deu indicação de qualquer prova que sustente aquela margem de dúvida ou faça questionar, por qualquer forma, os factos dados como provados. 11) No fundo, a discordância da recorrente radica no seu inconformismo face ao modo como o Tribunal valorou a prova, valoração essa, livremente formada e fundamentada. 12) Para fundamentar a alteração, o recorrente defende sobretudo que o Tribunal a quo não fez uma análise criteriosa e rigorosa do depoimento da testemunha J. M., prestado em sede de audiência e discussão de julgamento, pois entende que qualquer motivação estribada no seu depoimento, se encontraria prejudicada. 13) Porém, salvo o devido respeito, a pretensão do recorrente não colhe. 14) Na verdade, no que diz respeito ao depoimento da aludida testemunha, o recorrente fazendo uso de artifício evidente, apenas transcreveu de forma truncada e incompleta, pequenos excertos cirurgicamente selecionados em função dos seus interesses, sem os enquadrar na matéria de facto sob censura, fazendo e tirando conclusões totalmente descontextualizadas. 15) Partindo-se, pois, de uma visão global, integrada e contextualizada do aludido depoimento, como garantia de uma decisão de facto o mais próxima possível da realidade, não ficamos com qualquer dúvida sobre o acerto da decisão do tribunal recorrido quanto à matéria de facto ora impugnada, e daí o Tribunal recorrido ter valorado positivamente o seu depoimento. 16) Como é possível apurar, a testemunha J. M., pelas funções que exercia no Banco Réu, e tendo sido o responsável pela contratação do referido produto financeiro, revelou ter um conhecimento pessoal e direto da forma como o mesmo foi apresentado ao Autor. 17) Com efeito, a aludida testemunha prestou um depoimento de forma muito precisa e coerente, desenrolando-se com naturalidade e – repete-se – com a sinceridade própria de quem não teme a verdade, explicando ao Tribunal “a quo” que transmitiu ao Autor a informação de que se tratava de uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada. 18) Além de que, assegurou ainda que, o produto era colocado perante o cliente, como sendo um produto seguro, segundo as instruções que recebiam da hierarquia do banco. 19) Ao Autor não foi dado a conhecer o tipo de produto em causa, nem as condições da aplicação financeira, tão-pouco tendo recebido qualquer nota informativa ou informação relativa à entidade emitente, desconhecendo inclusive, que a Sociedade ... era uma empresa. 20) E, muito embora, o email em causa seja datado de 2008, e se reporte à colocação de uma emissão de papel comercial da Sociedade ... Valor, portanto, produto diverso das Obrigações Sociedade ... 2006, que estão em causa nos autos, a verdade é que o referido e-mail revela uma estratégia delineada pelo banco … para vender produtos destinados a capitalizar-se, transmitindo aos seus colaboradores que o produto a vender é equivalente a um depósito a prazo com uma taxa excelente, por ser um produto da Sociedade ..., que é a entidade que detém 100% do capital do banco …, ou seja, a mesma estratégia que foi seguida pelo Banco nos negócios de venda das Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, como evidencia o depoimento escrito de J. P.. 21) Com efeito, os argumentos usados pelos funcionários junto dos clientes para aquisição das obrigações eram, precisamente, a segurança do produto no sentido do reembolso total do capital investido e a sua equivalência a um depósito a prazo, aqueles que estão evidenciados no e-mail supra mencionado, o qual, segundo a testemunha J. P. surge «num momento extremamente difícil do grupo Sociedade ..., em geral, e do Banco … em particular, porquanto tinha acabado de chegar ao Grupo a equipa liderada pelo Dr. M. C., com a missão de o recuperar (o Grupo e o Banco … atravessavam graves problemas de liquidez) […]». 22) Tratando-se de promover a subscrição de um produto emitido pela sociedade detentora da totalidade do capital do Banco …– agindo num quadro de conflitos de interesses, o Banco Réu terá montado uma campanha agressiva de promoção de tais obrigações, pois a relação de domínio da Sociedade ..., SGPS, SA, relativamente ao intermediário financeiro motivou que os interesses económicos do investidor não fossem valorizados, como se compreende através do email escrito enviado por J. P.. 23) Por outro lado, insurge-se o recorrente, quanto ao facto de ter sido dado como provado que era o próprio Banco que garantia o capital, porém, para além de resultar de forma clara do depoimento da testemunha J. M., também decorre da própria Nota Interna que o Banco Réu transmitia a informação aos seus funcionários, da garantia de 100% do capital investido, em papel timbrado do Banco. 24) Ora, se os próprios documentos internos do Banco, são no sentido da garantia do capital, é inequívoco que foi esta informação que o Banco Réu quis transmitir e transmitiu ao Autor através dos seus funcionários, ao ter dito que o reembolso do capital investido era garantido. 25) Ora, atendendo a que a Nota Interna, é um documento superveniente (superveniência subjetiva), pois só agora chegou ao conhecimento do Autor e adveio à sua posse, o que impossibilitou a sua apresentação anteriormente na petição inicial, mas que se revela imprescindível, requer-se a junção de tal documento aos autos. Cfr. Nota Interna de 2004 26) Além de que, o próprio boletim de subscrição, que foi subscrito pelo Autor, surge também ele, com uma clara referência ao Banco …, com o respetivo logotipo, omitindo-se no mesmo qualquer referência à sociedade ..., ou aos respetivos firma, denominação ou logotipo, induzindo assim o Autor em erro. 27) Acresce que, o funcionário do Banco Réu nunca alertou o Autor para o facto de haver risco de insolvência e de nunca mais poder reaver o seu dinheiro, sendo esta uma informação relevante para a formação de vontade desta, e que na verdade nunca lhe foi transmitida. 28) Do supra exposto, resulta de forma unânime, a superficialidade das informações que prestavam aos clientes, onde estrategicamente eram realçados os aspetos positivos do produto em causa, mormente, o facto de ser equiparado a um depósito a prazo, com uma taxa mais atrativa, e com capital garantido pelo próprio Banco, e omitindo claramente outros aspetos relevantes. 29) Da prova produzida, resulta de forma inequívoca que o Banco Réu não prestou capazmente ao Autor a informação a que estava obrigado, nomeadamente de que as obrigações que iria subscrever eram dívida emitida pela Sociedade ..., e que aquele contrato celebrado com o Banco … afinal era cumprido por outra empresa totalmente distinta daquela, pela Sociedade .... 30) No nosso entender, extrai-se insofismavelmente da prova testemunhal, que ocorreu clara desconformidade entre as informações e esclarecimentos prestados (por parcos aqueles, e singelos estes), e a realidade das aplicações financeiras em causa. 31) Estamos, pois, em condições de afirmar, que as informações prestadas ao Autor sobre as caraterísticas das Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004 foram insuficientes e mesmo falsas, e motivou o assentimento da Autora, que se estivesse munida da informação completa e verdadeira, nunca subscreveria tais obrigações. 32) Assim, dessa prova referida, resulta que a convicção do julgador, expressa na decisão da matéria de tem sustentabilidade, sendo razoável, aceitável, sendo por isso compreensível o modo como fixou tal matéria de facto, não se mostrando, por outro lado, infirmada por outra prova de apreciação livre suficientemente convincente. 33) Em face de tudo o precedentemente exposto, as alegações do Recorrente são totalmente destituídas de fundamento, uma vez que não apontam qualquer erro na obtenção dos dados fornecidos pela prova. 34) Pelo que, os factos constantes dos factos dados como provados nos números 2, 6, 7, 8, 9, 10 e 12, devem manter-se inalterados, mantendo-se também inalterada a demais factualidade, sem a inserção de quaisquer novos artigos. 35) Em suma, bem andou o Tribunal da 1ª instância. 36) Improcedem, deste modo, as conclusões de recurso no que toca à impugnação da matéria de facto. II. Do recurso da matéria de direito: a) Da intermediação financeira 37) A aplicação do direito aos factos, efetuada na douta sentença recorrida é intocável, não merecendo qualquer reparo, a qual corroboramos na íntegra. 38) Sendo certo que o recorrente sustentou-a no pressuposto da alteração da matéria de fato por si preconizada, o que vimos não ocorre. 39) Com efeito, o Banco, na sua relação com o Autor, intervinha como instituição de crédito e como intermediário financeiro, por conta da Sociedade ..., apesar de este não o saber. 40) Como instituição de crédito, estava sujeito às regras de conduta que o RGICSF – em vigor na altura da subscrição das obrigações, nomeadamente os artigos (art.73º e 74º do RGICSF), e ainda o critério de diligência previsto no artigo 76.º, segundo o qual devia atuar nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição dos riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos investidores. 41) Por sua vez, enquanto intermediário financeiro (cf. arts. 289º, nº1, al. a) e 290º, nº1, al. c), do Código dos Valores Mobiliários) encontrava-se vinculado às normas que estabelecem regras próprias quanto aos deveres dos intermediários financeiros (cf. arts. 304º a 342º, do CVM). 42) O CVM (desde a sua redação originária conferida pelo DL 486/99, de 13.11), aplicável ao caso dos autos, continha (e contém) várias normas de proteção ao investidor, impondo ao intermediário financeiro uma multiplicidade de deveres visando permitir ao cliente formar um juízo esclarecido acerca da adequação do investimento. 43) A obrigação de informação está inscrita no artigo 312º do CVM e o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada. 44) Sendo certo que, o critério em função do qual se afere o cumprimento dos deveres que recaem sobre o intermediário financeiro há-de ser o seguinte: quanto menor o conhecimento e experiência do cliente em relação ao objeto do seu investimento maior será a sua necessidade de informação, contrariando assim de modo evidente, a decisão do pleito. 45) E é indiscutível que a qualidade da informação deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, conforme ressalta do guião diretivo imposto pelo artigo 7º do CVM. 46) De acordo com a disciplina consagrada no artigo 304º do Código dos Valores Mobiliários os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado e nesse relacionamento devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. 47) A responsabilidade do intermediário financeiro, no caso do Banco Réu decorre, desde logo, do disposto no artigo 314.º do CVM. 48) Com efeito, a responsabilidade do intermediário financeiro a que alude o art.º 314º do CVM, apresenta-se desde logo como uma responsabilidade contratual, cujos pressupostos estão definidos pelo art.º 798º do CC, sendo a causa de tal responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos, e presume-se nos termos do artigo 799º do CC. 49) A factualidade do caso concreto, demonstra que o comportamento do Réu/recorrente esteve, inequivocamente, longe de preencher os critérios ético-normativos decorrentes das normas do CVM supra citadas. 50) O Banco Réu tem um dever de diligência ativa, no sentido de se inteirar, atenta a experiência e conhecimentos do cliente, da razoabilidade e adequação da aplicação financeira. 51) Ora, do acervo dos factos dados como provado, resulta que, o gerente do Banco Réu sabia que o Autor era um investidor não qualificado e de perfil conservador, ou seja, não possuía conhecimentos nem experiência no funcionamento do mercado de valores mobiliários. 52) No entanto, o gerente do Banco Réu não se inibiu de aconselhar o Autor, a investir e aplicar as suas poupanças em Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, informando-o [erroneamente] e assegurando que a aplicação em causa era em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo Banco e com rentabilidade assegurada (o que não correspondia à realidade), demonstrando a violação do dever de informação e adequação por parte do Banco Réu. 53) Daí que, e em face das referidas informações [inexatas], tenha o Autor, prima facie confiante, dado autorização para aplicação de fundos seus no valor de 50.000,00€ em obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco. 54) É que, e em rigor, não sabendo sequer o Autor em concreto o que era a Sociedade ..., acabou por seguir a sugestão do gerente do Banco, subscrevendo uma aplicação em obrigações Sociedade ..., e aceitando como boa a informação do referido gerente no sentido de que o risco era mínimo, tratando-se de produto idêntico a um depósito a prazo. 55) Portanto, a informação prestada no sentido de que era uma aplicação equivalente a um depósito a prazo quando em verdade não o era, assume tanto maior gravidade quanto se sabe que o funcionário em causa sabia que o Autor não faria aplicações que não tivessem capital garantido e que não pudessem ser resgatadas em qualquer altura – ou seja, no sentido de que a informação prestada foi afinal determinante da vontade contratual do Autor. 56) Sendo certo que, esta referenciação ao DP não é, evidentemente, inocente, uma vez que se trata de um produto muito divulgado, de todos conhecido, e sobretudo, reconhecido pela sua segurança, sobre ele recaindo invariavelmente conforme o réu sabia e resultou provado, a preferência do Autor. 57) Por outro lado, o facto de ter sido dito ao Autor que o capital estava garantido pelo Banco, veio dar ainda mais confiança e segurança para aplicar o seu dinheiro, pois o Banco é uma entidade bancária de todos conhecida no mercado financeiro e com credibilidade, na qual o Autor confiava plenamente. 58) Portanto, o Autor estava convicto de estar a contratar com o Banco e a subscrever produto desse mesmo Banco. 59) Resulta claramente da matéria de facto provada, que a comunicação contratual efetuada não foi completa nem é integralmente verídica, estando igualmente patenteado que foram subtraídos elementos informativos que não permitiram que o cliente compreendesse os riscos essenciais envolvidos na operação financeira realizada. 60) Como já ficou sublinhado na impugnação da matéria de facto, por força das instruções recebidas das chefias e da estrutura comercial, no desenvolvimento das operações de financiamento promovidas pela Sociedade ..., os funcionários bancários receberam instruções no sentido de que deveriam passar «por cima» das questões relativas ao negócio obrigacionista e foram instruídos para enfatizar e evidenciar as características atrativas. 61) Acresce que, o facto de ter sido transmitida ao Autor a informação de que o Banco Réu é o garante da aplicação financeira, sobretudo quando o mesmo nem sequer sabia o que era a Sociedade ..., só pode ser compreendido, pelo declaratário normal, como uma efetiva garantia de pagamento e que este lhe seria restituído a 100% pelo Banco (art.236º, nº1 do CC). 62) Temos, pois, que no caso dos autos, o banco Réu assumiu perante o Autor aquando da aquisição do produto financeiro (2006), o compromisso da garantia do capital que havia sido investido. 63) Trata-se, neste caso, de um compromisso contratual em que o banco réu assume perante o Autor o pagamento do capital investido na aludida aquisição dos ativos financeiros e nessa medida verifica-se uma situação de responsabilidade contratual que o banco réu não pode deixar de assumir e com as consequências decorrentes do art. 798 do C. Civil. 64) Donde e relativamente à responsabilidade pelo reembolso do capital investido na aplicação financeira em causa do banco réu, na qualidade de intermediário financeiro, a mesma só existe, no caso em apreço, porque o banco réu assumiu, segundo o que vem provado, proceder ao pagamento do valor nominal dos títulos em causa, o que consubstancia um compromisso contratual, ao qual não pode fugir, como acima já se referiu. 65) No caso dos autos, o banco réu, na qualidade de intermediário financeiro em que aqui operou, não podia deixar de pautar o seu comportamento contratual em nome do relacionamento de confiança existente entre si e o Autor pelo princípio da boa-fé (cfr. art. 762º nº2 do C. Civil). 66) O Banco Réu incumpriu em toda a linha o dever de informação que sobre si recaia, omitindo informação relevante e prestando informação incorreta, determinando o Autor à subscrição de um produto que não conhecia, não tendo sido esclarecido quanto às suas características, antes lhe tendo sido descrito enganadoramente como um produto com capital garantido pelo Banco, como equivalente a um depósito a prazo, mas com uma remuneração mais vantajosa, pelo que o Autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura, com risco exclusivamente do Banco. 67) Também não podemos olvidar, que no caso dos autos o funcionário do Banco Réu não explicou ao Autor que se tratavam de «obrigações subordinadas» e a consequência dessa mesma subordinação, o que passava por lhe dizer que em caso de insolvência da sociedade ..., o Autor só seria pago depois de satisfeitos os credores que não tivessem créditos subordinados, como resultava do disposto na al. c) do art.48º do CIRE (DL nº53/2004), de 18 de Março). 68) Ora, a informação prestada pelo funcionário do Banco de que os riscos eram os mesmos de um depósito a prazo, colide de forma vertiginosa, com o caráter subordinado de tais obrigações, pois coloca os investidores (neste caso o Autor), numa posição bem mais desvantajosa do que os simples depósitos a prazo, informação esse que lhe foi claramente e intencionalmente ocultada. 69) Por outro lado, o facto de não ser previsível, à época, o colapso do sistema financeiro, não justifica o facto de o Banco Réu ter omitido ao Autor o risco de insolvência da Sociedade ..., e a possibilidade de nunca mais virem a reaver o dinheiro investido, pois as obrigações do intermediário financeiro acima referidas e designadamente a obrigação de informação, já estão consagradas na lei desde data muito anterior ao início da mencionada crise. 70) Outrossim, ainda que, à data, pudesse não ser previsível que viesse a ocorrer insolvência da sociedade emitente (risco especial), a Ré tinha a obrigação de alertar o Autor para o risco (geral) da insolvência da emitente, sobretudo face à posição extremamente desfavorável atribuída aos credores obrigacionistas em tal situação. 71) Também, não se pode esquecer o prazo de 10 anos, prazo extremamente longo, pelo que, em tão dilatado período de tempo, nunca ninguém poderia afirmar que no final o capital estava garantido, e por isso mesmo, a insolvência sempre seria de se admitir e considerar (mais uma vez o banco réu prestou informação falsa). 72) Porque, convir-se-á – e falamos apenas em termos de regra geral e de refutação de argumento genérico – excede manifestamente a boa-fé nos preliminares de qualquer contrato, não informar a outra parte da falta de robustez ou da previsão de insolvência. 73) E, não se pode dizer que não havia exemplo de insolvências de bancos (o que não é correto, pois já havia ocorrido com a Caixa …, no ano de 1986), quando a Sociedade ... nem sequer era o banco, mas sim uma empresa ou uma holding de empresas de vários ramos de negócio, com todos os riscos que isso envolve, designadamente de contágio entre elas. 74) A própria Nota Informativa, inicia logo, no ponto 1, com a “advertência aos investidores”, onde evidencia a necessidade de os investidores serem alertados para a possibilidade da insolvência da sociedade emitente. 75) Da Nota Informativa, decorre de forma irrefutável que havia duas características cruciais a serem advertidas aos clientes: a primeira prende-se com a possibilidade de insolvência da sociedade emitente, ou seja, que a Sociedade ... só lhes restituiria o capital no final do prazo de 10 anos se chegado esse tempo futuro ela tivesse disponibilidade financeira para proceder à restituição, e a segunda, diz respeito à subordinação dessas obrigações, pois nestas condições, o reembolso do capital, só seria pago depois de satisfeitos os credores que não tivessem créditos subordinados. 76) Em face do referido, não se pode aceitar que se diga que a advertência aos investidores relativa ao risco de insolvência não era informação exigível ao banco Réu, uma vez que à data nada fazia prever o que se veio a concretizar, isto é, a insolvência da Sociedade .... 77) Não foi isso que entendeu a própria Sociedade ... e o Banco de Portugal, aliás, ambos entenderam diferente, daí constar da Nota Informativa como advertência a ser dada e explicada aos investidores. 78) No caso dos autos, o Banco Réu não provou ter fornecido cópia da Nota Informativa ao Autor, e muito menos provou ter-lhe dado as explicações que dela constam (ónus que lhe incumbia). 79) O facto de não ter provado que entregou ao Autor qualquer Nota Informativa sobre o emitente das Obrigações, integra a violação dos deveres consignados nos artigos 312º-C e 312º-F, ambos do Código dos Valores Mobiliários, especialmente no que tange a falta de documentação da informação. 80) Ora, atendendo a que, a característica da subordinação das obrigações não foi comunicada verbalmente ao Autor, nem lhe foi entregue a Nota Informativa contendo a ficha técnica do produto, resulta provado o desconhecimento da mesma quanto a tal característica. 81) Estamos, aqui no domínio da responsabilidade contratual feita em nome do relacionamento anterior de clientela existente entre o Autor e o Banco Réu e nessa perspetiva o banco réu tem de assumir contratualmente o reembolso do capital investido (cfr. art. 798 e segs. do C. Civil). 82) Efetivamente, tendo o Banco Réu avançado para a aquisição do produto financeiro aqui em causa sem observar os deveres de informação junto do Autor, a que estava obrigado na qualidade de intermediário financeiro em que interveio, torna-se responsável pelos prejuízos causados ao Autor, nos termos do art. 314 nº1 do CVM, sendo certo também que não se mostra ilidida a presunção a que alude o nº2 do citado art. 314 que impendia sobre o banco Réu. 83) Dizer-se que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, quando, na verdade, não tem, não pode ser visto como artifício ou sugestão admissível, tanto mais que a obrigação de informação é essencial e resulta da lei (arts. 253.º, n.º 2, e 485.º, n.º 2, do CC). 84) O Autor só aceitou negociar com o Banco Réu, porque lhe foi comunicado que tinham uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo próprio Banco e com rentabilidade assegurada. 85) Ou seja, o Autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente banco. 86) O réu sabia que prestava informação errada ao Autor – dizendo-lhe que garantia o capital e os juros – e sabia que essa errada informação era determinante, como foi, da declaração de vontade emitida. 87) Ora, por força do art. 800º do C.C. (ou, para quem considere que em causa não está responsabilidade contratual, mas sim extracontratual, por força do art. 500º do C.C.), o Banco responde pelos atos dos seus funcionários. 88) A situação dos autos pode ser igualmente enquadrada na modalidade de responsabilidade pré-contratual ou culpa in contrahendo (art. 227.º do CC), porque nos preliminares do contrato o Banco informou o Autor que estava garantido o retorno do capital. 89) A apresentação do produto como produto seguro, como do próprio do banco constitui violação do dever de informação. 90) Afirmar que o produto é produto seguro, como do próprio banco é o mesmo que afirmar que é o próprio banco que reembolsará o cliente do capital investido. 91) Que não é um produto de risco. 92) Relevante é que, ao dizer que o produto era produto seguro, do próprio do banco, o Autor não foi colocado perante a hipótese de investir as suas poupanças em produto que não era próprio do Banco. 93) Por força do art. 314º nº 2 do C.V.M. - redação original, presume-se a culpa do intermediário financeiro. 94) Porque o dano sofrido pelo Autor, decorreu da prestação de informação falsa e a falsidade da informação é uma forma de violação do dever de prestar informações por ação, presume-se a culpa do Banco Réu, nos termos previstos no nº 2, do artigo 304º-A do Código dos Valores Mobiliários. 95) Assim, a omissão de tal informação foi causal da segurança do Autor em subscrever as Obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, fazendo que as subscrevesse, e agora sofra o Autor um dano por não lhe ser reembolsado o dinheiro. 96) Tanto assim é que, ficou assente que se o Autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido pelo Banco, não o autorizaria (cfr. facto 10º). 97) Verifica-se, por isso, o nexo de causalidade entre a violação dos deveres resultantes da lei e nomeadamente os deveres de informação a que o banco Réu está e os danos que o Autor reclama (confrontar artigo 563.º do Código Civil). 98) Mesmo que assim não se entenda, o que não se concebe nem concede, veja-se a respeito do nexo de causalidade, a recente decisão singular, datada de 02/04/2019, no processo nº6295/16.0T8LSB.L1.S1-A, da relatora Maria João Vaz Tomé, que entendeu que se deve admitir uma inversão do ónus da prova de comportamento conforme à informação – causalidade preenchedora, incumbindo assim ao intermediário financeiro (devedor da informação), provar que, mesmo perante um cumprimento pontual dos deveres de informação, o investidor da informação teria tomado a mesma decisão, correndo deste modo o primeiro. E, daí que, no seu entendimento, se presume o nexo causal – preenchedor, entre o incumprimento ou deficiente cumprimento dos deveres de informar e a decisão de investimento adotada pelo investidor presunção essa que pode ser retirada do art.304º, nº2 do CVM). 99) No mais, entende ainda que, atualmente tende a prevalecer um entendimento amplo de presunção de culpa, quer daquela prevista no art.799º, nº1 do CC, que abrange também a de ilicitude e a da causalidade fundamentante, quer daquela prevista no art.304º-A, nº2, do CVM, que inclui a de ilicitude, a da causalidade fundamentante e a da causalidade preenchedora. 100) Sendo certo que, no caso em apreço, o Banco Réu não logrou ilidir a presunção de causalidade entre a violação dos deveres de informação e os danos sofridos pela Autora, pois como resultou provado, o Autor agiu convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e em tudo semelhante a um depósito a prazo, e com risco exclusivamente do Banco. 101) Tem, pois, o Banco Réu a obrigação de indemnizar o Autor pelo valor do capital investido, acrescido de juros à taxa legal desde a data do termo do prazo das obrigações subscritas (arts. 805º nº 3 e 806º do C.C.). 102) Improcedem, deste modo, as conclusões de recurso no que toca à impugnação da matéria de direito. b) Da prescrição 103) No âmbito do contrato de intermediação financeira, quanto à invocada exceção de prescrição o apelante também não tem razão. 104) Importa referir que o art.324º, nº2, do CVM, consagra um prazo de prescrição de dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos (salvo dolo ou culpa grave). 105) Como resulta da matéria dada como provada, o que motivou a autorização pelo autor foi o facto de o gerente do réu ter dito que o capital era garantido pelo banco réu (cfr. facto 8). 106) Vem ainda provado que, o autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco (cfr. facto 9). 107) Também resultou provado que, se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido pelo Banco, não o autorizaria (fr. facto 10). tir em produtos de risco, o que era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu, e o sempre esteve convencido que o Réu lhe restituiria o capital no fim do prazo (cfr. facto 11). 108) Tendo ainda resultado provado que nunca foi intenção do autor investir em produtos de risco, o que era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu, e o sempre esteve convencido que o Réu lhe restituiria o capital no fim do prazo (cfr. facto 11). 109) Sendo certo que, ficou ainda assente que, a convicção do autor foi reforçada com o pagamento dos juros semestralmente pagos, o que lhe transmitiu segurança e nunca o alertou para qualquer irregularidade, face ao que lhe tinha sido dito, pelo referido gerente da agência de Ponte de Vagos (cfr. facto 13). 110) O ónus da prova do decurso do prazo prescricional impende sobre o réu, ao abrigo do disposto no art. 342º nº2 do CC. 111) Assim, incumbia ao Réu provar a data a partir da qual o Autor terá tido acesso aos elementos do contrato, a qual não foi feita, pelo que não se verifica a exceção de prescrição. 112) De todo o modo, sempre se dirá que o prazo prescricional não decorreu uma vez que, atenta a matéria de facto dada como provada, é de concluir que o Banco Réu atuou com culpa grave, para o efeito de não aplicabilidade do prazo de prescrição de dois anos, uma vez que o Banco recorreu a informação enganosa e ocultando informação relevante, com o intuito de obter a anuência da cliente a determinados produtos de risco que esta nunca subscreveria se tivesse conhecimento de todas as características do produto, nomeadamente se soubesse que nem sequer o capital investido era garantido. 113) Destarte, a conduta do Banco violou de forma grave o dever de informação, ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição previsto no art. 324º nº2 do CVM, e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos, previsto no art.309º do CC. 114) Pelo que, como doutamente decidiu o Tribunal recorrido, improcede assim, a exceção de prescrição, suscitada pelo Réu/recorrente. 115) Por todo o supra explanado, não violou o tribunal recorrido qualquer disposição legal, pelo que a douta sentença recorrida não merece a censura que lhe é feita. Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, que Vªs Exªs doutamente suprirão, deve a apelação ser julgada improcedente, mantendo-se a douta sentença apelada nos seus precisos termos, com as legais consequências. Assim decidindo, farão Vªs Exªs, Venerandos Desembargadores, a habitual JUSTIÇA. * Questões a decidir:* - Analisar se a prova produzida permite extrair as conclusões de facto expressas na sentença; - Verificar se o direito da A. prescreveu; - Caso não tenha prescrito, analisar se a A. tem direito ao reembolso da quantia em causa nos autos. * Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre decidir.* A matéria considerada provada na 1ª instância é a seguinte: 1. O autor era cliente do réu (anterior Banco), na sua agência de Ponte de Lima, com a conta à ordem nº …, onde movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efetuava poupanças. 2. Em data não concretamente apurada, o gerente do Banco Réu da agência de Ponte de Lima contactou o autor, propondo-lhe realizar uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada. 3. O dito funcionário do Banco réu sabia que o autor não possuía qualificação, ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente. 4. E que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que até essa data, sempre o aplicou em depósitos a prazo. 5. O dito funcionário estava convencido, de acordo com indicações superiores que lhes foram transmitidas, que o produto “Sociedade ... Rendimento Mais 2004” constituía um produto financeiro seguro e que não oferecia risco para os subscritores. 6. Tendo assegurado ao autor marido que a referida aplicação era um mero sucedâneo de um depósito a prazo, sem qualquer risco e melhor remunerado. 7. Na sequência, o autor veio a autorizar a aplicação da quantia de € 50.000,00 em obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, sem que, contudo, soubesse em concreto o que era, não lhe tendo sido prestadas quaisquer informações adicionais orais ou escritas sobre tal aplicação, desconhecendo inclusivamente que a Sociedade ... era uma empresa. 8. O que motivou a autorização para tal operação, por parte do autor, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo banco réu, com pagamento de juros semestrais 9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco. 10. Se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido pelo Banco, não o autorizaria. 11. Nunca foi intenção do autor investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do réu e sempre esteve convencido que o réu lhe restituiria o capital no fim do prazo. 12. O réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha a mesma garantia de um depósito a prazo. 13. Daí a convicção plena com que o autor ficou da segurança da aplicação em causa, cujos juros foram sendo semestralmente pagos, o que transmitiu segurança ao autor e nunca o alertou para qualquer irregularidade, face ao que lhe tinha sido dito pelo referido gerente da agência de Ponte de Lima. 14. E que manteve até 2014, data em que o Banco réu deixou de pagar os juros contratados. 15. Na data de vencimento contratada, o banco réu não restituiu o montante que o autor lhe confiou. 16. A mera eventualidade do autor nunca vir a ser ressarcido do montante aplicado no produto em causa provoca-lhe ansiedade, preocupação e instabilidade emocional. * Na 1ª instância foram considerados não provados os seguintes factos:- que foi assegurado ao autor que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias; - que foram pagos juros na ordem de 1%, desde Maio de 2009 e até Novembro de 2015; - o autor conhece, pelo menos, desde o mês seguinte ao da operação em causa as características do produto que subscreveu; - o produto foi sempre apresentado com a obrigação de entrega do capital e dos juros ser da única e exclusiva responsabilidade da entidade emitente; e - que o banco réu, na pessoa dos seus funcionários, agiu de acordo com a vontade do subscritor e com as instruções recebidas do mesmo, nomeadamente, após a subscrição do documento de fls 18v e 19. * * * Analisemos se a prova produzida foi bem apreciada pela 1ª instância.Resulta do disposto no art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Conforme explica Abrantes Geraldes (in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3ª Edição, pág. 245), a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações na matéria provada e não provada. Acrescentando que, em face da redação do art. 662º do C. P. Civil, fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe a sua própria convicção, mediante reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis, apenas cedendo nos fatores da imediação e oralidade. Vejamos então: De seguida transcrevem-se os pontos impugnados e a decisão sugerida, esta a bold, para maior facilidade de análise e de compreensão. 2. Em data não concretamente apurada, o gerente do Banco Réu da agência de Ponte de Lima contactou o autor, propondo-lhe realizar uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada. 2. Em data não concretamente apurada, o gerente do Banco Réu da agência de Ponte de Lima contactou o autor, propondo-lhe realizar uma aplicação com capital garantido e com rentabilidade assegurada. 6. Tendo assegurado ao autor marido que a referida aplicação era um mero sucedâneo de um depósito a prazo, sem qualquer risco e melhor remunerado. 6. Tendo assegurado ao autor marido que a referida aplicação não tinha risco e era melhor remunerada. 7. Na sequência, o autor veio a autorizar a aplicação da quantia de € 50.000,00 em obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, sem que, contudo, soubesse em concreto o que era, não lhe tendo sido prestadas quaisquer informações adicionais orais ou escritas sobre tal aplicação, desconhecendo inclusivamente que a Sociedade ... era uma empresa. 7. Na sequência, o autor veio a autorizar a aplicação da quantia de € 50.000,00 em obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, sem que, contudo, soubesse em concreto o que era, sabendo que a Sociedade ... era a empresa dona do Banco. 8. O que motivou a autorização para tal operação, por parte do autor, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo banco réu, com pagamento de juros semestrais. A redação proposta para este ponto é igual à que consta dos factos provados. 9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco. 9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura na casa mãe do banco e que, por isso, num produto com risco Banco 10. Se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido pelo Banco, não o autorizaria. 10. Se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações Sociedade ... Rendimento Mais 2004, e que o capital não era garantido, não o autorizaria. 12. O réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha a mesma garantia de um depósito a prazo. 12. O réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha garantia de capital. * Sobre os pontos em causa depôs o A. e a testemunha J. M..O Autor depôs de forma honesta e convincente e as suas declarações foram, no essencial, confirmadas pelo depoimento da testemunha J. M.. Referiu o depoente que o “Sr. J. M.” era o funcionário do Banco com quem tratava dos seus assuntos junto do Banco. A certa altura o Sr. J. M. telefonou-lhe e propôs-lhe uma aplicação segura e rentável do Banco. Como confiava no Sr. J. M. aceitou a proposta daquele. O funcionário em questão disse-lhe que era um produto do Banco, nunca referiu a Sociedade ..., nem o depoente sabia o que era isso, nem o que eram obrigações. O depoente tinha o dinheiro aplicado num depósito a prazo que se venceu e aplicou-o da forma sugerida pelo funcionário em questão. Eram todas as suas poupanças. Não se lembra de ter assinado qualquer papel pois as coisas foram tratadas pelo telefone. Nunca viu os papéis com informação sobre o produto em causa. A certa altura deixaram de pagar os juros, acha que em 2014. No extrato do Banco … vem lá mencionada a aplicação em causa. Não percebe de produtos financeiros. Se soubesse que eram obrigações não tinha aplicado o dinheiro. A testemunha J. M., que era gerente da agência onde o A. tinha conta (e atualmente é funcionário do Banco …), depôs de forma segura, coerente e convincente, esclarecendo que à data da subscrição do produto em causa, referiu conhecer bem o autor por ele ter sido cliente da agência do Banco onde a testemunha trabalhava (agência de Ponte de Lima). Disse que no Banco viam o produto em causa como seguro, como se tratasse de um depósito a prazo e que isso lhes foi transmitido internamente e era assim que o vendiam aos clientes, como garantido pelo Banco. Referiu que na altura “os conceitos de Banco e universo do Banco se misturavam”, que não se fazia distinção entre Banco e Sociedade .... O risco era o risco do Banco. Diziam aos clientes que era um produto sem risco, com grande rentabilidade. Admite ter sido ele que propôs o produto ao A.. Esta testemunha disse também que o A. era um cliente conservador e que não era provável que o mesmo fizesse esta aplicação caso soubesse que era um “produto de risco”. Destes depoimentos resulta que à data de venda do produto em causa, o Banco transmitia aos seus funcionários que o produto em causa era 100% seguro, fazendo com que estes transmitissem essa segurança aos clientes e nomeadamente ao Autor, fazendo-os confiar no produto, tanto mais que era emitido pela entidade que detinha 100% do capital do Banco e que até os funcionários confundiam com o próprio Banco. Resulta ainda que os funcionários do Banco não informavam os clientes e nomeadamente o A. das características do produto e que o A., era um cliente conservador que não investia em produtos de risco. Por outro lado, como é sabido, na altura da subscrição não havia o conhecimento, por parte da população em geral, que hoje há sobre as características dos diversos produtos bancários, nomeadamente do produto “obrigações”. Improcede pois a alteração dos pontos dos factos provados acima referidos. O Réu pretende ainda aditar aos factos provados os pontos 28, 32, 35 e 57 da contestação, cujo teor é a seguinte: 28 – Nesse momento não havia qualquer indicação de que a emissão pudesse vir a não ser paga. 32 – Ao longo dos anos foram emitidos e pagos os mais diversos produtos da dívida de empresas do grupo Sociedade .... 35 – Aquilo que não era previsível, e como tal nunca poderia ser comunicado ao cliente, era que em 2008 aconteceria uma nacionalização parcial do grupo, que veio a dividir o mesmo em parte financeira e não financeira. 57 – Como também foi recebendo, desde então, um extrato periódico onde lhe apareciam essas obrigações como integrando uma carteira de títulos, separadas dos depósitos, com menção expressa ao facto de se tratar de obrigações depositadas na carteira de títulos. Começando a análise por este último ponto, desde logo se refere que não foi feita prova do seu teor, sendo certo que o Réu poderia perfeitamente ter junto documentos comprovativos do alegado, permitindo ao Tribunal analisar se dos mesmos se poderia retirar a conclusão referida pelo Réu nas suas alegações. Quanto aos pontos 28 e 35 contêm raciocínios dedutivos e não circunstâncias, pelo que não poderão fazer parte dos factos provados. O teor do ponto 32 contém factos notórios que, no entanto, não têm interesse para o caso em apreço, pois o que importa é saber o que ocorreu no caso concreto e isso já consta da matéria e facto. De qualquer forma, se o Tribunal entender ser de valorar a matéria em questão aquando da análise jurídica da causa, poderá sempre fazê-lo. No que respeita à valoração do email junto com a p.i., que o Réu entende ter sido errada por se tratar de uma diferente aplicação financeira, embora seja verdadeira tal circunstância, no entanto, existe similitude de produtos, nomeadamente por se tratarem ambos de produtos Sociedade ... e tal documento transmite a estratégia do Banco … na venda de produtos da Sociedade ..., não se verificando, pois, qualquer erro na valoração desse documento, tanto mais que o mesmo, tal como resulta da sentença recorrida, foi valorado em conjunto com a restante prova produzida. Assim, entende-se ser de manter inalterada a matéria de facto considerada provada pela 1ª instância. * Da prescrição:* O Recorrente vem alegar a prescrição do direito do A. por aplicação do art. 324º, nº 2 do Código dos Valores Mobiliários que dispõe que “Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos.”. A aplicação ou não ao caso deste preceito depende, nomeadamente, da análise jurídica do relacionamento ocorrido entre o ora Recorrente e o A., pelo que de seguida analisaremos tal questão. * Entendemos que no caso o Réu agiu na qualidade de intermediário financeiro, por aplicação do art. 293º, nº 1 – a) do Código dos Valores Mobiliários, que refere que são intermediários financeiros, nomeadamente, as instituições de crédito (v. ainda art. 4º - a) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras).Por outro lado, são atividades de intermediação financeira os serviços de investimento em instrumentos financeiros (v. art. 289º, nº 1 – a) do mesmo Código). E isto porque as obrigações são valores mobiliários, designados por papel comercial (v. arts 1º nº 2 e 2º, nº 1 do DL 69/2004 de 25/3). Diz-nos ainda o Código dos Valores Mobiliários no seu art. 290º, nº 1 a) e b) que são serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros a receção e transmissão de ordens por conta de outrem e a execução de ordens por conta de outrem. Como refere José Engrácia Antunes (in “Os contratos de Intermediação Financeira, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. LXXV, pág. 280) “a intermediação financeira traduz ou designa o conjunto de atividades ou práticas destinadas a mediar o encontro entre a oferta e a procura no mercado de capitais, assim assegurando o seu eficaz e regular funcionamento.”. No caso, resultou provado que foi proposta ao Autor a compra do produto financeiro identificado na ação e que este aceitou fazer a aplicação de 50.000,00€ nesse produto. O facto de o Autor desconhecer as características do produto por não lhe terem sido explicadas pelo funcionário do Banco não releva para a qualificação jurídica da intervenção do Réu na operação em causa. Assim, como acima foi dito tal intervenção deve ser qualificada como uma atividade de intermediação financeira. Aplica-se pois ao caso o disposto no citado artigo 324º, nº 2 do CVM. Diz-nos este preceito que o direito prescreve no prazo de dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos. O Recorrente diz que a ação deu entrada em juízo mais de dois anos após o Autor ter conhecimento da situação relatada da p.i., ou seja, desde que o Autor teve conhecimento que havia adquirido obrigações em vez de um produto financeiro sem risco, todavia e em primeiro lugar, tal prazo não se aplica aos casos em que o intermediário atuou com dolo ou culpa grave e, por outro lado, parece-nos que a interpretação de tal preceito não pode ser assim tão linear. Com efeito, temos que ter presentes também as normas do Código Civil que estabelecem os princípios gerais do instituto jurídico em análise e nomeadamente o disposto no art. 306º nº 1 do C. Civil, segundo o qual o prazo da prescrição só começa a correr quando o direito puder ser exercido. Ora, no caso, o que é certo é que o Réu não provou, como lhe competia, se alguma vez informou o Autor das reais características do produto e se o fez, em que data ocorreu tal prestação de informação ou em que data teve o Autor conhecimento seguro das características do produto que subscreveu. Deste modo, não se pode considerar decorrido o mencionado prazo de dois anos. De qualquer forma, ainda que se entenda que o prazo prescricional se iniciou na data do vencimento das obrigações (2014), ainda assim não prescreveu o direito do Autor. Na verdade, como acima se referiu e decorre do disposto no art. 324º, nº 2 do CVM, quando o intermediário financeiro tenha atuado com dolo ou culpa grave, o prazo prescricional aplicável é o ordinário, de 20 anos (art. 309º do C. Civil). Conforme se refere no Acórdão do STJ de 17/3/16 (in www.dgsi.pt) para definir o que se entende por dolo ou culpa grave no domínio da exceção ao prazo curto de prescrição previsto no art. 324.º, n.º 2 do CVM, temos que ter em conta a ponderação de interesses inerente à norma; as características da relação entre o banco e o cliente – a confiança especial depositada por este na instituição bancária; e os deveres de informação, lealdade, cuidado com valores alheios e boa-fé do Banco em relação ao cliente. Acrescenta-se neste Acórdão que a graduação do grau de negligência (grave, leve e levíssima) terá de aferir-se pelo padrão de culpa consagrado no art. 304.º, n.º 2 do CVM, segundo o qual “nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência”. Vemos pois que neste preceito se exige que o intermediário financeiro aja de acordo com padrões de diligência, lealdade e transparência superiores aos de um homem médio, o que se compreende atenta a progressiva complexidade dos produtos financeiros e a necessidade de proteção dos clientes que na maioria das vezes são a parte menos experiente na contratação. Por outro lado, o nº 1, do artigo 312º do mesmo código, diz que o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, nomeadamente relativamente aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar (alínea e)), devendo extensão e profundidade da informação ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (nº 2). Por seu turno, o art. 74º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na redação vigente à altura da aquisição do produto em causa (DL 298/92 de 31/12 antes da alteração introduzida pelo DL 1/2008 de 03/01) dispunha que as relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados. O nº 1 do art. 7º do CVM, por sua vez, explica que a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita. O dever de informação persegue um objetivo de proteção dos investidores por visar o seu esclarecimento, concorrendo para um mercado mais transparente e eficiente, uma vez que contribui para uma aferição do risco e do fair value mais correta (v. Paulo Câmara in Manual dos Valores Mobiliários, Almedina, 2ª ed., p. 686). Tal como se menciona no Ac. da R. de L. de 21/6/18 (in www.dgsi.pt), “reconhecem os clientes aos bancos um superior conhecimento da sua atividade proveniente da sua profissionalização e especialização, confiando que estes atuarão, não só de acordo com normais padrões de diligência e correção ao nível da genérica boa-fé exigida na execução dos contratos (art.º 762.º n.º 2 do CC) ou da sua negociação prévia (art.º 227.º n.º 1 do CC), mas, mais do que isso, esperarão que estes, tal como expressamente enunciado no RGICSF, pautarão a sua atuação por elevados padrões de competência técnica (art.º 73.º do RGICSF), os quais se refletirão na “diligência, neutralidade, lealdade, discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”, que deverão nortear as suas relações com os clientes (art.º 74.º RGICSF)”. No caso em apreço temos que o funcionário do Banco persuadiu o Autor a adquirir um produto financeiro, convencendo-o de que era seguro, que o capital estava garantido, não lhe explicando as características do produto e o risco envolvido na sua aquisição. Além disso, não entregou ao Autor qualquer informação sobre as características do papel comercial que estava a adquirir, sendo que o A. era um investidor não qualificado, pelo que a obrigação de esclarecimento que impendia sobre o intermediário era mais acentuada. É verdade que a crise do sistema financeiro só se iniciou em Agosto de 2007, mas não era imprevisível (v. Luís Máximo dos Santos, in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano I, nº 4, págs. 56 a 59; também no sentido de que a crise do sistema financeiro era previsível v. Eduardo Paz Ferreira, artigo publicado na mesma Revista, pág.70 e sgts.) e ainda que o fosse, tal facto não retira ou diminui a responsabilidade ao Banco Réu, pois as obrigações do intermediário financeiro acima referidas e designadamente a obrigação de informação, já estão consagradas na lei desde data muito anterior ao início da mencionada crise. Nem se pode dizer que a insolvência de um Banco era coisa inédita em Portugal, porque em 1986 tivemos a falência da Caixa …. Conclui-se pois que o Banco … não cumpriu as exigências impostas pelos mencionados preceitos, violando as exigências de boa-fé e a confiança que o cliente depositava na instituição bancária, tendo prestado informação que não era verdadeira acerca da garantia de reembolso do capital investido. A conduta do Banco tem pois de ser qualificada como gravemente culposa, ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos. Em sentido coincidente decidiu o Acórdão do STJ acima citado, onde se lê no sumário que “Atua com culpa grave, para o efeito de não aplicabilidade do prazo de prescrição de dois anos, o Banco que recorre a técnicas de venda agressivas, mediante a utilização de informação enganosa ou ocultando informação, com o intuito de obter a anuência do cliente a determinados produtos de risco que este nunca subscreveria se tivesse conhecimento de todas as características do produto, nomeadamente se soubesse que nem sequer o capital investido era garantido.”. Improcede, pois a exceção invocada pelo Réu. * Da responsabilidade civil do intermediário financeiro:Como acima se viu, o Banco agindo na qualidade de intermediário financeiro violou de forma grave o dever de informação que tinha para com o cliente pai da A. que atuava em representação desta. Esta violação causou um dano ao A. pois o mesmo viu-se privado da quantia de 50.000,00€ que lhe pertencia. Ora, diz-nos o art. 304º - A do CVM, o seguinte: 1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. 2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. Esta norma foi aditada ao Código dos Valores Mobiliários pelo DL 357 - A/2007 de 31 de Outubro, não estando em vigor na data em que foi adquirido o produto em causa nos autos, não podendo pois ser aplicada ao caso em apreço (v. art. 12º, nº 1, primeira parte, do C. Civil). No entanto, a obrigação de indemnizar por parte do Réu resulta da aplicação das regras gerais de direito civil pois, situando-se o dever de informação no domínio da responsabilidade pré-contratual, tal obrigação deriva do preceituado no art. 227º, nº 1 do C. Civil, conjugado com o disposto no art. 483º do mesmo Código. Com efeito, entendemos que a violação do dever de informação se situa no âmbito da responsabilidade pré-contratual, não obstando a este entendimento o facto de o contrato se ter realizado (v. neste sentido Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anot., 3ª ed. ver. e atual., vol. I, pág. 215 e Menezes Leitão in Direito das Obrigações, 14ª ed., vol. I, pág. 355) Refere Menezes Leitão (in ob. cit., pág. 353 e 354) que do dever de atuar segundo a boa-fé derivam três tipos de deveres pré-negociais, entre os quais o dever de informação (sendo os outros dois o dever de proteção e o dever de lealdade), em especial quanto às circunstâncias que possam ser relevantes para a formação do consenso da outra parte, e com especial intensidade quando uma das partes se apresenta como mais fraca. Acrescenta este autor que é a violação desses deveres que gera a culpa in contrahendo e que esta abrange a celebração válida e eficaz do contrato, mas em termos tais que o modo como foi celebrado gere danos para uma das partes (ob. cit., pág. 355). Assim, a obrigação de indemnizar tem como pressupostos, o facto voluntário do agente, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, que no caso se verificam. A ilicitude consiste na desconformidade entre o comportamento do intermediário financeiro relativamente ao dever de informação densificado nas diversas normas acima citadas. A culpa consiste no juízo de censura que é possível fazer sobre o evento, sendo que se presume por aplicação do disposto no art. 799º, nº 1 do C. Civil (no sentido da aplicação deste preceito à culpa in contrahendo v. Menezes Leitão, ob. cit., pág. 357). Na lesão dos bens jurídicos pessoais e patrimoniais traduz-se o dano. O nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano decorre do facto de ter resultado provado que O Autor nunca aceitaria subscrever tal produto, se acaso o Réu lhes tivesse explicado em que consistia o produto em causa. Por aplicação do disposto no art. 562º do C. Civil, o dano indemnizável é aquele que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão, pelo que o Autor deve receber do Réu a quantia investida, ou seja 50.000,00€. Para se eximir ao pagamento de tal quantia, o Réu vem alegar não existe “garantia de capital”, pelo que não podia o Tribunal censurar o Réu pelo facto de um seu funcionário ter assegurado ao A. que a aplicação financeira tinha tal garantia. Ora, salvo o devido respeito, o réu está equivocado, pois a censura respeita ao facto de o funcionário do Réu não ter explicado ao Autor as características do produto proposto, sendo certo que, é manifestamente diferente subscrever um depósito a prazo ou um produto como o que está em causa no presente processo, desde logo porque o primeiro beneficia da proteção do Fundo de Garantia de Depósitos, proteção esta que salvaguarda o depositante do eventual risco da instituição financeira não cumprir com os seus deveres (v. sobre esta matéria Ac. R.L. de 21/7/18 in www.dgsi.pt). Por outro lado, foi com base nas informações que lhe são transmitidas que o A. formou a sua vontade e celebrou o negócio em causa com o Réu, não se entendendo a afirmação do Réu de que não se provou que existiu vontade negocial da parte deste, remetendo-se nesta parte para o que acima foi dito sobre a atuação do Réu na qualidade de intermediário financeiro. É assim, de manter a sentença de primeira instância. * Decisão:* Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas a cargo do Réu. * Guimarães, 3 de outubro de 2019 Alexandra Rolim Mendes Maria de Purificação Carvalho Maria dos Anjos Melo Nogueira |