Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
239/23.0T8VCT.G1
Relator: ALEXANDRA ROLIM MENDES
Descritores: LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
REEMBOLSO DAS DESPESAS E HONORÁRIOS
VALOR LIMITADO À MÁ FÉ
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- Como resulta do disposto no art. 543º do C. P. Civil, o reembolso das despesas e dos honorários do mandatário está limitado àqueles que resultem diretamente da má-fé da parte e não de todos aqueles em que a parte tenham incorrido no processo ou por causa dele.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório:
           
AA, BB, CC e DD, instauraram a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra EE e mulher FF, melhor identificados nos autos, peticionando, a final, que se declare que os Autores são herdeiros de GG, e que os Réus sejam condenados a reconhecer essa qualidade; se declare a inexistência dos direitos de propriedade invocados pelos Réus na escritura de justificação notarial por eles outorgada no dia 15/10/2021, declarando-se que os Réus não são donos dos prédios indicados no art.º 32º da petição inicial; determinar-se o cancelamentos dos registos efetuados com base nessa escritura; declarar-se que os prédios identificados integram o acervo da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito da referida GG e condenar-se os Réus a restituir à referida herança os prédios identificados.

Alegam, em síntese, que os Autores são titulares de quinhões na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de GG. Do acervo da respetiva herança fazem parte o prédio urbano e o prédio rústico melhor identificados no art.º 32º da petição inicial. Sucede que, no dia 15/10/2021, os Réus outorgaram escritura de justificação notarial, onde declararam, para além do mais, serem donos e legítimos possuidores dos prédios acima indicados e que tais prédios vieram à sua posse por volta do ano de 1980, por doação meramente verbal feita pela indicada GG e que desde a referida data se mantiveram na posse dos referidos prédios, factos que não correspondem à verdade, pois os Réus nunca adquiriram o direito de propriedade sobre os referidos imóveis.
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Citados os Réus, contestaram, defendendo-se por impugnação, deduziram reconvenção e incidente do valor da causa.
Alegaram que o valor da causa indicado pelos Autores não está correto, pois o valor adequado é o que corresponde ao valor dos prédios.
Mais, alegam que os prédios identificados na petição inicial foram-lhes doados verbalmente pela indicada GG no ano de 1980, data a partir da qual passaram a estar na posse e fruição dos referidos imóveis, exercendo sobre eles todos os poderes de facto inerentes ao direito de propriedade, na qualidade de legítimos donos e na convicção de exercerem um direito próprio, fazendo obras de conservação e reparação, habitando por espaços intercalares no prédio urbano, semeando, cultivando e colhendo frutos no prédio rústico, o que fazem à vista e como conhecimento de toda a gente.
Deduziram reconvenção, peticionando o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre os referidos prédios e a condenação dos Réus a reconhecer os referidos direitos.
Mais, requereram a condenação dos Autores como litigantes de má-fé, em multa e numa indemnização não inferior a € 2.000,00.
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Notificados, os Autores deduziram réplica, impugnando os factos da reconvenção e responderam ao incidente do valor da causa, alegando que houve lapso na indicação do valor da causa, sendo que o valor que pretenderam atribuir à ação é o valor de € 15.000,00, conforme consta do formulário de submissão no “citius”.
Requereram, ainda, a condenação dos Réus como litigantes de má-fé, em multa e indemnização pelas despesas suportadas inerentes à instauração da presente ação, incluindo honorários de Advogado.
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Findos os articulados, procedeu-se à prolação de despacho saneador, no qual foi julgado inadmissível o pedido reconvencional formulado e foi conhecido o incidente de valor da causa.        
Foi dispensada a realização da audiência prévia, e proferido despacho de fixação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova.
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Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:

Pelo exposto, decide-se julgar a presente totalmente acção procedente e, em consequência:
5.1. Declara-se que os Autores são herdeiros de GG, condenando-se os Réus a reconhecer essa qualidade;
5.2. Declara-se a inexistência dos direitos de propriedade invocados pelos Réus na escritura de justificação notarial por eles outorgada no dia 15/10/2021, e que os Réus não são, assim, donos dos prédios identificados no art.º 32º da petição inicial.
5.3. Consequentemente determina-se o cancelamento dos registos efectuados com base na escritura de justificação notarial, incluindo os registos a que correspondem a AP. ...66, de 07/01/2022, em relação a ambos os prédios identificados.
5.4. Declarar-se que os prédios identificados no art.º 32º da p.i. integram o acervo da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de GG, condenando-se os Réus a restitui-los à referida herança.
5.5. Condenar os Réus como litigantes de má-fé, na multa de 4 uc´s de taxa de justiça.
Custas da acção pelos Réus (art.º 527º, nº 1 e 2 do CPC).
Registe e notifique, e cumpra o disposto no art.º 543º, nº 3 do CPC, para efeitos de fixação de indemnização pela litigância de má-fé.”
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Cumprido o contraditório relativamente ao montante da indemnização a fixar pela litigância de má fé, foi proferida a seguinte decisão:

“Em complemento da sentença proferida, decide-se o seguinte, no que concerne ao pedido de indemnização com fundamento na litigância de má-fé:
Notificados Autores e Réus para os termos e efeitos previstos no art.º 543º, nº 3 do CPC, somente se pronunciaram os Autores, indicando as despesas que suportaram, com taxas de justiça e honorários, despesas com certidões e compensação de despesas de deslocação, tudo no montante de € 6.898,00.
Cumpre apreciar e decidir:
Nos termos do disposto no art.º 543º, nº 1 do CPC, a indemnização pode consistir:
a) No reembolso das despesas a que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos;
b) No reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária em consequência directa ou indirecta da má-fé.
De harmonia com o preceituado no nº 2 do art.º 543º do CPC, o Juiz pode fixar a indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má-fé fixando-a sempre em quantia certa.
Ainda de acordo com o disposto no nº 3 da norma em apreço, após a audição das partes, a indemnização é fixada segundo o prudente arbítrio do tribunal, e com observância do critério da razoabilidade.
Quanto aos fundamentos da condenação em litigância de má-fé dão-se aqui por inteiramente reproduzidas as considerações de facto e direito expostas na sentença proferida, dela resultando que o tribunal reputou como factos contrários à verdade sabida e conhecida dos Réus os alegados na contestação, coincidentes com os factos que sustentaram na escritura de justificação notarial impugnada.
Conforme consta da referida decisão, os Réus, ao contrário do alegado, nunca praticaram quaisquer actos de posse sobre o prédio em questão, desde 1980 e até 2011, sendo inverídico que desde aquela primeira data tenham realizado a conservação dos prédios. Com efeito, provou-se que depois de 1980 os prédios continuaram a ser usados e fruídos pela sua proprietária GG, e depois desta, pelos seus usufrutuários HH e mulher II, os únicos que sobre o prédio praticaram actos de posse, na convicção do exercício de um direito próprio. E ao contrário do alegado, depois da morte da proprietária e usufrutuários quem ficou a administrar e a zelar pelos referidos prédios foi JJ (sobrinha directa de GG), facto que os Réus conheciam, dada a relação de proximidade que mantinham com aquela, pelo que a terem praticado quaisquer actos sobre os prédios em questão, fizeram-no com autorização ou a mando daquela.
Da prova produzida, ficou patente que os Réus serviram-se de declarações falsas e de testemunhos falsos, vertendo na escritura pública de justificação notarial factos inverídicos os quais mantiveram na contestação, bem sabendo da sua falsidade.
Por conseguinte, a sua defesa assenta em factos inverídicos e que determinaram o prosseguimento da causa para julgamento, accionando de forma injustificada a máquina judiciária, o que era de todo em todo evitável se tivessem optado por outra estratégia processual mais conforme com os ditames da verdade e da justiça, e também com o dever de cooperação e de boa-fé processual.
Sendo este o enquadramento fáctico e processual em que o tribunal se ancorou para condenar os Réus em litigância de má-fé, entende-se que a taxa de justiça paga pelos Autores (€ 306,00), com a apresentação da petição inicial, não apresenta qualquer relação de causa e efeito com a litigância de má-fé, custo que teriam sempre que suportar fosse qual fosse a posição processual dos Réus em face da acção que lhes foi movida e dos respectivos fundamentos.
Quer isto dizer que apenas são indemnizáveis os custos acrescidos com a demanda que os Autores suportaram em consequência da litigância de má-fé.
De realçar que, os Réus lançaram mão de um pedido reconvencional de reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios objecto do litígio que determinou a apresentação de réplica pelos Autores, com pagamento da respectiva taxa de justiça (€ 102,00). Mas o pedido viria a ser rejeitado por uma questão formal, contudo essa rejeição não teve grande impacto no julgamento, pois os factos que constituíram o objecto da prova são os mesmos que baseiam toda a sua defesa, bem como o pedido reconvencional e este não implicaria a realização de prova suplementar. Mas, tal pedido reconvencional também assenta nos factos inverídicos que servem de fundamento à defesa.
No entanto, a defesa dos Réus, deu azo, naturalmente, a uma actividade processual acrescida da parte contrária que teve que replicar, com aditamento de uma testemunha e junção de um documento.
Nessa medida, é razoável e natural que o acréscimo de actividade processual dite um acréscimo dos honorários que seria suposto cobrar caso os Réus não tivessem litigado de má-fé.
No entanto, o valor dos honorários indicado é, a nosso ver, totalmente desproporcionado, na medida em que se entende que aqui não devem ser considerados os honorários devidos pela elaboração da petição inicial, a qual não tem relação com a litigância de má-fé, e sempre teria que ser elaborada para fazerem valer os seus direitos, nem os actos processuais praticados que se inserem na tramitação normal do processo, mas apenas os honorários determinados pela actividade acrescida que a referida litigância de má-fé deu causa.
De salientar que, que o valor total dos honorários indicados (c/IVA), ultrapassa os € 6.000,00, valor que se nos afigura francamente exagerado, face à natureza da acção, à simplicidade da matéria de facto e enquadramento jurídico que a mesma convoca, e apesar do julgamento ter comportado duas sessões, a segunda sessão só ocorreu porque duas das testemunhas faltaram à primeira sessão para a qual foram convocadas e o Réu não prescindiu dos seus depoimentos.
A apreciação da prova produzida também não revestiu dificuldade até porque em relação aos pontos essenciais foi unânime.
De realçar, ainda, que a acção nem sequer comportou a realização da audiência prévia face à sua simplicidade.
Acresce que se nos afigura que não tem justificação o pedido de compensação de deslocações dos Autores para reuniões com o respectivo mandatário, pois nem sequer foram indicadas quantas foram essas reuniões em correlação com a litigância de má-fé e quantos foram os quilómetros percorridos ou o tempo despendido.
No que respeita às 9 certidões do registo civil juntas com a petição inicial, como vimos nem esta nem a necessidade de junção desses documentos foi motivada pela litigância de má-fé, que apenas se manifestou com a dedução da contestação, mas sim pela necessidade de suportar documental os factos alegados dependentes exclusivamente de prova documental.
Em face do exposto, e em observância dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, julgo parcialmente procedente o pedido de condenação em indemnização, pela litigância de má-fé e, em consequência:
- Condeno os Réus a reembolsarem os Autores da taxa de justiça suportada com a apresentação da réplica, no montante de € 102,00, e a compensarem os honorários do respectivo mandatário, no montante de € 1.000,00 (mil euros).
Notifique.”           
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Inconformados vieram os Autores recorrer, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

1. Vai o presente recurso interposto do Douto despacho, de fls.__ dos mesmos, datado de 28-01-2024, que julgou parcialmente procedente o pedido de condenação em indemnização, pela litigância de má-fé e, em consequência, condenou os Réus a reembolsaram aqueles da taxa de justiça suportada com a apresentação da réplica, no montante de € 102,00 e a compensarem os honorários do respetivo mandatário no montante de € 1 000,00.
2. Dúvidas inexistem (até porque foram condenados como tal, conforme Douta sentença, datada de 04-11-2023, que se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos), que os Recorridos litigaram com má-fé nos presentes autos e, como tal, é devido aos Recorrentes por aqueles o pagamento de uma indemnização, nos termos do disposto no art.º 543.º do Cód. Proc. Civil.
3. E litigaram não só nos presentes autos com má-fé, como também aquando da outorga da escritura pública de justificação, em 15-10-2021, junta com a petição inicial que deu origem aos presentes autos como documento n.º ...0, ao declararem, entre o mais, que eram os donos e legítimos possuidores dos prédios identificados na petição inicial, e que tais prédios vieram à sua posse por volta do ano de 1980, por doação meramente verbal feita por GG, e foi a celebração dessa escritura que motivou os Recorrentes a demandar judicialmente aqueles, para defesa dos seus legítimos direitos e interesses.
4. Discute-se com o presente recurso se os Recorridos, como consequência da sua litigância com má-fé, são obrigados a indemnizar os Recorrentes de todos os custos que estes tenham incorrido com a demanda daqueles, tanto no preparo da ação como durante a lide processual, ou ,se pelo contrário, apenas lhes é devida a compensação pelos custos acrescidos pela litigância com má-fé durante a lide processual, bem como, se o montante devido pela parte a título de honorários ao seu mandatário é desproporcionado e manifestamente exagerado.
I – Dos custos indemnizáveis pela condenação como litigante de má-fé:
5. Seguindo os exatos termos da lei processual vigente, no que respeita ao conteúdo da indemnização por litigância de má-fé, nomeadamente o disposto no art.º 543.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil a parte que litigou de boa-fé (in casu, os Recorrentes) é reembolsada pela parte que litigou de má-fé (os ora Recorridos) de todas as despesas que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários: cfr. art.º 543.º, n.º 1, al. a) do Cód. Proc. Civil.
6. Como consequência da má-fé dos Recorridos, os Recorrentes, previamente à instauração da ação que deu origem aos presentes autos, necessitaram de recorrer a um Advogado, técnico especialista do direito, para defenderem os seus interesses e direitos, por meio de instauração de uma ação judicial destinada a esse efeito.
7. Necessitaram de se deslocar por diversas ao escritório do seu Advogado para participar em várias reuniões com mesmo, a fim de minutar a ação judicial a intentar contra os Requeridos, assim como se deslocaram juntamente com este ao Tribunal para as duas sessões de julgamento, incorrendo em gastos com deslocações e parqueamento, despendendo um total de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).
8. Viram-se obrigados a adquirir certidões do registo civil, emitidas pelo Instituto do Registo e Notariado, I.P, pagando naturalmente o preço de cada uma, necessárias à instrução da ação judicial a intentada contra os Requeridos, ou seja, (€ 10,00 x 9 certidões) € 90,00 (noventa euros).
9. Necessitaram de liquidar o valor devido da taxa de justiça necessária à instauração da ação judicial no tribunal competente, ou seja, € 306,00 (trezentos e seis euros): cfr comprovativo de pagamento, já junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
10. E, necessitaram de liquidar a provisão por conta dos honorários devidos ao seu mandatário pelo preparo e trabalho inicial de instauração da ação judicial contra os Requeridos, ou seja, € 615,00 (seiscentos e quinze euros): cfr. fatura já junta aos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
11. Posteriormente, e já na pendência da lide processual, necessitaram de liquidar todas as demais taxas de justiça e custas processuais devidas pelos atos processuais praticados ao longo do processo, como, ainda terão de liquidar o remanescente de honorários e despesas aos seus mandatários, como contrapartida pelos serviços prestados, designadamente, no exercício do patrocínio na presente ação, ou seja:
- € 102,00 (cento e dois euros), a título de taxa de justiça devida paga aquando da apresentação de réplica;
- (€ 4 500,00 + IVA) € 5 535,00 (cinco mil quinhentos e trinta e cinco euros), a título de remanescente de honorários ainda em dívida aos seus mandatários.
12. Efetivamente, os Recorrentes apenas incorreram nessas despesas apenas e só porque os Recorridos assim o obrigaram que o fosse, motivadas pela litigância de má-fé destes, sendo certo que se estes não tivessem outorgado a escritura pública de justificação acima mencionada, os aqueles nunca teriam incorrido em tais despesas.
13. Nesse sentido, os Recorrentes têm o direito a ser reembolsados de todas as despesas a que foram obrigados pelos Recorridos, ou seja, tanto aquelas despendidas com o preparo e elaboração da ação judicial que deu origem aos presentes autos, como todas aquelas incorridas na pendência da lide processual, nos termos do disposto no art.º 543.º, n.º 1, al. a) do Cód. Proc. Civil, despesas essas tanto podem ser consequência direta da litigância de má-fé, como indireta.
14. Veja-se a esse respeito, o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 08-11-2022, proc. n.º 7819/18.4LSB-D.L1-7, disponível em www.dgsi.pt).
“VI – Perante uma situação de litigância de má fé não é aceitável que a parte que está de boa fé, tenha que suportar as despesas que fez com uma lide a que não deu causa, motivo pelo qual os artigos 542.º, n.º 1 e 543.º do Código de Processo Civil preveem que, a seu pedido, lhe seja arbitrada uma indemnização que inclua as despesas com a lide (com mandatário, peritos, técnicos, ou outras que dela sejam consequência direta ou indireta).” (negrito e sublinhado nossos).
15. Sendo esse também o entendimento do Tribunal da Relação do Porto (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 07-10-2008, proc. n.º 0823320, disponível em www.dgsi.pt):
“O montante da indemnização devida em caso de litigância de má fé deve permitir o reembolso das despesas, incluindo honorários, que sejam consequência directa ou indirecta da litigância de má-fé.” (negrito e sublinhado nossos).
16. E, ainda, segundo o Tribunal da Relação do Porto (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 13-02-2017, proc. n.º 3006/05.0TBGDM.P3 disponível em www.dgsi.pt):
“II - O artigo 543.º do Código de Processo Civil prevê duas modalidades de indemnização relativamente à litigância de má fé: uma simples ou limitada, contemplando os danos directamente emergentes do procedimento doloso, outra plena ou agravada, abrangendo tanto os danos directos como os indirectos.” (negrito e sublinhado nossos).
17. Ao decidir como decidiu, mal andou o Tribunal a quo, e, consequentemente, violou o disposto no art.º 543.º, n.º 1, als. a) e b) e n.º 3 do Cód. Proc. Civil, devendo, por isso, julgar-se procedente o presente recurso, com a consequente revogação do Douto despacho recorrido na parte em que condenou os Recorridos a reembolsarem os Recorrentes apenas do valor da taxa de justiça suportada com a apresentação da réplica, no montante de € 102,00 e, ser substituído por Douto acórdão que condene aqueles a reembolsar estes não só do valor da taxa de justiça suportada com a apresentação da réplica, no montante de € 102,00, como também de todas as mais despesas por eles incorridas tanto no preparo e elaboração da ação judicial que deu origem aos presentes autos, como naquelas que se venceram na pendência da lide processual, nomeadamente:
- reembolso de provisão por conta de honorários paga em 26-01-2023, pelos Recorridos (€ 615,00);
- reembolso do valor despedido a título de certidões do registo civil que instruíram a petição inicial (€ 90,00);
- compensação para pagamento de despesas de deslocação dos Recorrentes a reuniões com o mandatário e ao Tribunal (€ 250,00);
- reembolso de taxa de justiça inicial, que instruiu a petição inicial (€ 306,00);
- pagamento do remanescente de honorários e despesas que os Recorrentes irão pagar aos seus mandatários, como contrapartida pelos serviços prestados, designadamente, no exercício do patrocínio judiciário na presente ação (€ 5 535,00).
II – Da fixação dos honorários devidos pela parte ao mandatário pelo Tribunal a quo:
18. No Douto despacho recorrido é referido pelo Tribunal a quo que “o valor dos honorários indicado é, a nosso ver, totalmente desproporcionado” e, bem assim “francamente exagerado”: cfr. despacho, datado de 28-01-2024, de fls.___ dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos
19. Salvo o devido respeito, que é muito, não podem os Recorrentes concordar com o Tribunal a quo quando este afirma que o montante devido a título de honorários pelos Recorrentes aos seus mandatários é totalmente desproporcionado e manifestamente exagerado. Vejamos:
20. Os mandatários dos Recorrentes integram uma sociedade de advogados que se dedica, com fins lucrativos, através dos seus advogados, ao exercício da atividade da advocacia, designadamente, através da prestação de consultas jurídicas, patrocínio em processos judiciais, prestação de serviços de consultadoria e, de uma forma geral, através da prática de todos os atos que são próprios do exercício da profissão de advogado.
21. Os mandatários dos Recorrentes foram contactados por estes no sentido de os patrocinar no âmbito da ação que deu origem aos presentes autos.
22. Aquando da primeira consulta jurídica, um dos mandatários dos Recorrentes, procedeu à abertura de dossier, com recurso ao seu serviço de secretariado.
23. Posteriormente, os mandatários dos Recorrentes, após a primeira consulta jurídica, diligenciaram no sentido de obter toda a documentação necessária à instrução da petição inicial, e que a ela está junta e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os seus devidos e legais efeitos, nomeadamente, documentação de registo civil, predial, notarial e tributária, num total de 14 (catorze) documentos.
24. E prepararam, elaboraram e apresentaram em juízo, no dia 19-01-2023, a petição inicial que deu origem aos presentes autos, num total de 10 (dez) páginas e 47 (quarenta e sete artigos), constante de fls. __ dos mesmos, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
25. Os mandatários dos Recorrentes, para além disso, rececionaram, analisaram e estudaram a contestação com reconvenção e respetivos documentos apresentada em juízo pelos Recorridos, no dia 27-02-2023, num total de 14 (catorze) páginas e 56 (cinquenta e seis) artigos, constante de fls. __ dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
26. Bem como, apresentaram em juízo réplica, contestação à reconvenção e ainda deduziram pedido reconvencional contra os Recorridos, no dia 04-04-2023, num total de 5 (cinco) páginas e 25 (vinte e cinco) artigos, à qual anexaram 1 (um) documento e para tal, necessitaram de reunir-se novamente com os Recorrentes para praticar tal ato processual, constante de fls. __ dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
27. Os mandatários dos Recorrentes ainda rececionaram e analisaram o despacho saneador dos presentes autos, datado de 17-05-2023, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
28. Rececionaram e analisaram o requerimento apresentado em juízo pelos Recorridos no dia 16-06-2023, constante de fls. __ dos mesmos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
29. Rececionaram e analisaram o despacho proferido pelo Tribunal a quo, datado de 05-07-2023, bem como o despacho datado de 04-09-2023, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
30. Os mandatários dos Recorrentes apresentaram ainda em juízo requerimento, datado de 06-09-2023 e rececionaram e analisaram o requerimento também junto aos autos pelos Recorridos no dia 06-09-2023, constante de fls. __ dos mesmos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.
31. E, analisaram o despacho proferido pelo Tribunal a quo, datado de 07-09-2023, bem como rececionaram e também analisaram o requerimento apresentado em juízo pelos Recorridos no dia 28-09-2023, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.
32. Por fim, os mandatários dos Recorrentes, no dia 06-11-2023, rececionaram e analisaram a Douta sentença proferida nos presentes autos, num total de 19 (dezanove) páginas, constante de fls. __ dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
33. Para além disso, um dos mandatários dos Recorrentes, acompanhou ainda o processo em todas as suas fases até final, e deslocou-se, acompanhou e conduziu, todas as diligências processuais realizadas em juízo, nomeadamente, duas audiências de discussão e julgamento, que, pese embora o Tribunal a quo seja do entendimento, no despacho recorrido, que “a segunda sessão só ocorreu porque duas das testemunhas faltaram à primeira sessão para a qual foram convocadas e o Réu não prescindiu dos seus depoimentos”, a verdade é esse mandatário teve de se deslocar uma segunda vez ao Tribunal para a realização dessa segunda sessão, o que implicou tempo despendido com a mesma e trabalho por si efetuado na contra instância da inquirição dessas testemunhas não prescindidas pelos Recorridos.
34. E, os mandatários dos Recorrentes utilizaram, além disso, todo o seu equipamento informático, para processar o texto da presente petição inicial e demais articulados constantes dos autos, bem como, gastaram papel, fotocópias e utilizaram os serviços de uma sua empregada de escritório, além de outros encargos de secretariado.
35. Ora, nos termos do disposto no art.º 105.º, n.º 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados, na fixação dos honorários “deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais.”.
36. In casu, aos serviços prestados, foi dado pelos mandatários dos Recorrentes uma importância elevada, como é apanágio e habitual do seu trabalho.
37. A dificuldade do assunto era elevada, na medida em que era necessário aos Recorrentes fazer prova do seguinte:
a) provar que os prédios (urbano e rústico) identificados na petição inicial não foram doados verbalmente aos Recorridos;
b) provar que os Recorridos nunca encontraram na posse e fruição dos referidos prédios, nem tão-pouco exerceram sobre eles todos os poderes de facto inerentes ao direito de propriedade, na convicção de que eram os seus verdadeiros donos;
c) provar que os Recorridos não praticaram atos à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer se fosse;
d) provar que os Recorrentes não eram litigantes de má-fé.
38. O grau de criatividade da prestação dos mandatários dos Recorrentes também foi muito, na medida em que articularam factos que lhes permitiram, com base na verdade e honestidade, demostrar ao Tribunal a quo que os Recorridos não eram os donos e legítimos possuidores dos prédios identificados na petição inicial.
39. O resultado obtido na ação instaurada pelos Recorrentes contra os Recorridos foi de 100%, já que a ação foi julgada totalmente procedente.
40. O tempo despendido pelos mandatários dos Recorrentes, desde a primeira consulta jurídica prestada àqueles, até ao término do processo, com a prolação de Douta sentença pelo Tribunal a quo não foi inferior a 25 (vinte e cinco) horas de trabalho.
41. E, por fim, a responsabilidade assumida pelos mandatários dos Recorrentes também era de risco, na medida em que a ser julgada improcedente a ação que deu origem aos presentes autos, seria retirado ao acervo patrimonial da herança de GG bens imóveis no valor total de € 15 904,58 (que à data de hoje, o seu conjunto nunca é de valor de mercado inferior a € 100 000,00) e, consequentemente, o quinhão hereditário ficaria igualmente diminuído, traduzindo-se num prejuízo para aqueles.
42. Visto ainda de outro prisma, veja-se que o Estatuto da Ordem dos Advogados, no n.º 3 do art.º 106, prevê que o montante dos honorários do Advogado pode consistir, mediante prévio acordo com o seu cliente, “na fixação prévia do montante dos honorários, ainda que em percentagem, em função do valor do assunto confiado ao advogado ou pelo qual, além de honorários calculados em função de outros critérios, se acorde numa majoração em função do resultado obtido”.
43. In casu foi confiado aos mandatários dos Recorrentes um assunto referente a um conjunto de imóveis que no seu global, têm, à data de hoje, um valor de mercado nunca inferior a € 100 000,00, na medida em que se trata de um prédio urbano destinado a restauro e um prédio rústico composto de lavradio e vinha, e valor fixado a título de honorários pelos mandatários daqueles não é sequer 10,00 % (dez por cento) do valor global desses imóveis.
44. Os Recorrentes são, assim, do entendimento que o valor devido a título de honorários aos seus mandatários não é, pois, nem desproporcionado, nem francamente exagerado, sendo sim um valor justo e ponderado com base nos critérios definidos para quantificação dos honorários de advogados, previstos no art.º 105.º, n.º 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados, sendo também, por esses critérios, que o Tribunal a quo deve avaliar os justos limites da sua fixação, para efeitos do n.º 3 do art.º 543.º do Cód. Proc. Civil.         
45. Uma última nota para o facto de, em caso de dúvidas nos justos limites, razoabilidade e proporcionalidade do valor fixado a título de honorários devidos pela parte ao mandatário, sempre deveria o Tribunal a quo, solicitar um laudo à entidade especializada na fixação de tais quantias, neste caso, a Ordem dos Advogados, o que não fez.
46. Ao decidir como decidiu, mal andou o Tribunal a quo, e, consequentemente, violou o disposto no art.º 105.º, n.º 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados, devendo, por isso, julgar-se procedente o presente recurso, com a consequente revogação do Douto despacho recorrido na parte em que condenou os Recorridos a compensarem os honorários do respetivo mandatário, no montante de € 1 000,00 e, ser substituído por Douto acórdão que condene aqueles a compensar os honorários dos seus mandatários não só no valor já pago a título de provisão (€ 615,00), por conta de honorários, em 26-01-2023, pelos Recorridos, como também do remanescente de honorários e despesas que os Recorrentes irão pagar aos seus mandatários, como contrapartida pelos serviços prestados, designadamente, no exercício do patrocínio judiciário na presente ação (€ 5 535,00).
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o Douto despacho recorrido, e proferindo-se, em sua substituição, Douto acórdão em conformidade com as conclusões supra formuladas, fazendo-se assim a costumada e sã,
Justiça!
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Questão a decidir:

- Verificar se se mostra adequada a quantia fixada na decisão recorrida a título de indemnização pela litigância da má fé
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Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

A matéria considerada provada na 1ª instância é a seguinte:

a) Em ../../1996 faleceu GG, na freguesia ..., no estado de solteira (cfr. assento de óbito junto como doc. nº ... com a petição inicial).
b) A GG era filha de KK e LL (cfr. doc. nº ... junto com a petição inicial).
c) Faleceu sem ascendentes ou descendentes.
d) No dia 26 de Abril de 1978, a GG outorgou testamento no ... Cartório da Secretaria Notarial ..., lavrado a fls. 50 verso a 52, do Livro de Notas respetivo nº 153, mediante o qual instituiu, em partes iguais, herdeiros universais, seus sobrinhos MM, JJ, NN, OO e PP, os três primeiros filhos do seu falecido irmão QQ e os dois últimos filhos do seu falecido irmão MM, e instituiu usufrutuários de todos os seus bens até à morte do último, seu irmão HH e sua mulher II (cfr. cópia do testamento junto com a contestação).
e) QQ era também filho de KK e LL (cfr. assento de óbito junto como doc. nº ... com a petição inicial).
f) QQ faleceu em ../../1965, na freguesia ..., no estado de casado, em primeiras e únicas núpcias com RR (cfr. assento de óbito junto como doc. nº ... com a petição inicial).
g) O QQ, deixou três filhos: MM, JJ e NN.
h) Não deixou testamento ou outra disposição de última vontade.
i) RR faleceu no dia ../../1982 (cfr. assento de óbito junto como doc. nº ... com a petição inicial.
j) Deixou a suceder-lhe os seus filhos MM, JJ e NN.
k) Não deixou testamento ou outra disposição de última vontade.
l) MM faleceu no dia ../../1998 (cfr. assento de óbito junto como doc. nº ... com a petição inicial).
m) Faleceu no estado de viúvo de SS (cfr. assento de óbito – doc. nº ... junto com a p.i).
n) Não deixou testamento ou disposição de última vontade.
o) Deixou como herdeiros os seus filhos, AA, BB CC, DD, aqui Autores, e EE, aqui Réu (cfr. assentos de nascimento juntos como docs nºs 6, 7, 8, 9 juntos com a petição inicial).
p) Do acervo da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de GG fazem parte os seguintes imóveis:
- Prédio urbano, composto por uma casa alta com lojas e com duas divisões e dois vãos, ... andar com quatro divisões e cinco vãos e logradouro, sito na Rua ..., no Lugar ..., na freguesia ..., do concelho ..., inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia sob o art.º ...93º e atualmente descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...30;
- Prédio rústico composto de lavradio e vinha, sito no Lugar ..., na freguesia ..., do concelho ..., a confrontar de norte com caminho público, do sul com TT, do nascente com UU e do poente com VV, inscrito na matriz predial rústica sob o art.º ...45º e atualmente descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...31 (cfr. certidões da Conservatória do Registo Predial e cadernetas prediais juntas com o doc. ...0 com a petição inicial).
q) Por escritura pública outorgada no dia 15/10/2021, no Cartório Notarial a cargo da Notária WW, exarada a fls. 63 a 64 verso do Livro de Notas para escrituras diversas nº ...76-A, os Réus declararam, que “…os mencionados prédios vieram à posse dos justificantes, por volta do ano de mil novecentos e oitenta, por doação meramente verbal que foi feita por GG…, contrato nunca reduzido a escritura pública (…) Desde aquela data (mil novecentos e oitenta) que se encontram os justificantes na posse e fruição dos referidos imóveis, exercendo sobre eles todos os poderes de facto inerentes ao direito de propriedade, na qualidade de legítimos donos, com a convicção de exercerem um direito próprio, pagando os respectivos impostos e contribuições, fazendo obras de conservação e reparação, habitando-o por espaços intercalares, no prédio urbano e semeando, cultivando colhendo frutos no prédio rústico, usufruindo de todas as utilidades por eles proporcionadas, em nome próprio e sem oposição de quem quer que seja, sem interrupção e ostensivamente, à vista e com o conhecimento de toda a gente pelo que vêm exercendo uma posse pacífica, continua e pública, adquirindo, assim, o direito de propriedade por usucapião, mas não tendo os justificantes, dado o modo de aquisição, documento que lhe permita fazer a prova do direito de propriedade a seu favor, quanto aos dois referidos imóveis (cfr. cópia da escritura junta como doc. nº ...0 com a petição inicial).
r) A outorga da referida escritura foi publicada no ...” em ../../2021.
s) Os referidos prédios estão inscritos a favor dos Réus na respetiva Conservatória do Registo Predial, descrições nºs ...07 e ...07, através da AP. ...66 de 2022/01/07 (cfr. descrições juntas com o doc. nº ...0 da petição inicial).
t) Por si e seus antepossuidores e até à data dos respetivos decessos, a referida GG, e depois o seu irmão HH e mulher II, estiveram na posse dos prédios identificados na al. p) dos factos provados, vigiando-os, fazendo limpeza, habitando-os cuidando da sua conservação e limpeza, pagando as respetivas contribuições e impostos e deles retirando as utilidades e frutos que os mesmos eram suscetíveis de produzir e proporcionar e, de um modo geral, praticando todos os atos correspondentes ao exercício de um direito próprio.
u) O que foi feito sem interrupção temporal, à vista e com o conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de ninguém e na convicção de exercerem um direito próprio e que não prejudicavam ninguém.
w) Após a morte de HH e depois que a sua esposa foi para o Lar, deixando de habitar no prédio urbano identificado, a administração dos referidos prédios passou a ser feita pela herdeira JJ (sobrinha direta da GG).

3.2. Factos não provados

a) GG doou verbalmente aos Réus, por volta do ano de 1980, os prédios identificados na al. p) dos factos provados;
b) Desde essa data que os Réus, ininterruptamente, se encontram na posse e fruição dos referidos prédios, fazendo obras de conservação e reparação, habitando por espaços intercalares no prédio urbano, semeando, cultivando e colhendo frutos no prédio rústico.
c) Pagando os respetivos impostos e contribuições.
d) Na convicção de que exercem um direito próprio.
e) Sem oposição de quem quer que seja.
f) À vista e com o conhecimento de todos, máxime da própria família.
g) Os Autores estavam cientes da veracidade do teor da escritura de justificação, e sabiam que os imóveis tinham sido doados verbalmente aos Réus.
h) Os Autores sempre respeitaram a posse e propriedade dos Réus.
i) Após o decesso da GG, a administração dos bens que integravam a herança aberta pelo seu óbito passou a ser feita pelo herdeiro MM, o que sucedeu até à morte deste.
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Da litigância de má fé.

Os AA. recorrem do montante da indemnização fixada relativa à condenação dos RR. como litigantes de má-fé, de forma a ser-lhes concedido o valor que pediram respeitante aos honorários de advogado e ainda ao valor gasto (também) no pagamento da taxa de justiça inicial.

Vejamos:

Diz-nos o art. 542º, nº 1 do C. P. Civil que, tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta o pedir.
Do nº 2 do mesmo preceito, resulta que litiga de má-fé, nomeadamente, quem com dolo ou negligência grave tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa, tiver praticado omissão grave do dever de cooperação ou tiver feito do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Como refere Manuel de Andrade (in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 358) o que importa é que exista uma "intenção maliciosa (má fé em sentido psicológico) e não apenas com leviandade ou imprudência (má fé em sentido ético)".
José Alberto dos Reis (Código de Processo Civil anotado, vol. II, 1982, pág. 263) diz que na base da má-fé está este requisito essencial, a consciência de não ter razão. Não basta pois o erro grosseiro ou a culpa grave; é necessário que as circunstâncias induzam o tribunal a concluir que o litigante deduziu pretensão ou oposição infundada.
Como se entendeu no Ac. do STJ de 28/05/2009 (in www.dgsi.pt ) “Para se imputar a uma pessoa a qualidade de litigante de má fé, imperioso se torna que se evidencie, com suficiente nitidez, que a mesma tem um comportamento processualmente reprovável, isto é, que com dolo ou negligência grave, deduza pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar ou que altere a verdade dos factos ou omita factos relevantes ou, ainda, que tenha praticado omissão grave do dever de cooperação, nas expressões literais do nº 2 do artº 456º do CPC”
No caso, não se discute que os RR. litigaram de má fé, cabendo apenas neste recurso analisar se a indemnização fixada é a adequada.

Montante da indemnização:

Os Recorrentes pretendem, não só ser indemnizados de todos os custos em que tenham incorrido com a presente ação, incluindo o valor da taxa de justiça inicial, como ainda no valor de 6.150,00€ respeitante ao valor dos honorários devidos ao seu Mandatário.

Sobre o conteúdo da indemnização relativa à condenação como litigante de má-fé, dispõe o art. 543º, na parte com interesse para o caso em apreço que, a indemnização pode consistir no reembolso das despesas a que a má fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos (sublinhado nosso).
Assim, como resulta evidente do preceituado nesta norma, o reembolso das despesas e dos honorários do mandatário está limitado àqueles que resultem diretamente da má-fé da parte e não de todos aqueles em que a parte tenham incorrido no processo ou por causa dele.
Como se diz no Acórdão da Relação do Porto de 6/02/2020 (in www.dgsi.pt ) “O incidente previsto no artº 543º, nº3, CPC – que permite reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte – não é o meio próprio para fazer indagações completas sobre a medida precisa dos honorários devidos ao mandatário da parte por todas as diligências e trabalho que teve com a demanda. Aqui apenas se considera uma indemnização “específica”, focalizada no mau uso do processo nos termos do nº 2 do artº542º CPC, directamente emergente dessa postura processual condenável. Ou seja, como dito, não está aqui em causa obrigar a parte a pagar todas as despesas havidas pelo litigante de má fé, designadamente as havidas a título de honorários, mas apenas as que tenham uma relação directa com a má fé do litigante, dela sejam consequência. Não são os honorários devidos na ponderação ou consideração do todo do processo e dos respectivos pedidos; são, antes e apenas, os honorários que possa dizer-se que só resultaram de trabalho directamente emergente da conduta de litigância de má fé da parte. “
       
Deste modo, tal como se entendeu na decisão recorrida, a taxa de justiça paga pelos Autores com a apresentação da petição inicial “não apresenta qualquer relação de causa e efeito com a litigância de má-fé, custo que teriam sempre que suportar fosse qual fosse a posição processual dos Réus em face da acção que lhes foi movida e dos respectivos fundamentos.”, o mesmo acontecendo com todas as despesas incorridas e respeitantes aos atos anteriores à apresentação da contestação/reconvenção, já que os factos inverídicos que motivaram a condenação como litigantes de má-fé, foram alegados pelos RR .nesta peça processual, tendo essa defesa dado azo “a uma atividade processual acrescida da parte contrária que teve que replicar com aditamento de uma testemunha e junção de um documento”, prosseguindo o processo para julgamento, com a consequente realização deste e prolação da respetiva sentença.
Assim, apenas é devido o reembolso da taxa de justiça paga pela apresentação da réplica e dos honorários respeitantes à atividade processual posterior à apresentação da contesteção/reconvenção.

Quanto ao valor dos honorários, a primeira instância entendeu, com razão, que os mesmos eram desproporcionados, tendo em conta os atos que foram praticados em consequência da litigância de má-fé.

Vejamos:
Resulta do disposto no art. 105º Estatuto da Ordem dos Advogados, (na versão Lei nº23/2020, de 06 de julho), os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação adequada pelos serviços efetivamente prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais.

No caso, a Réplica apresentada é um articulado simples que, essencialmente, se limita a reiterar o que foi dito na petição inicial.
Também o despacho saneador não apresenta complexidade que implique mais de uma hora de análise.
Houve ainda a apresentação e análise de requerimentos simples e respetivos despachos, relativos à alteração da data do julgamento e à sua marcação e à notificação de uma das testemunhas arroladas pelo Réu.
O julgamento comportou duas sessões, uma no dia 19/6/23, iniciando-se a audiência às 10h35h, interrompendo-se às 12.23h e continuando às 14h e terminando às 16.18h, com audição de duas partes e de 5 testemunhas. A segunda sessão ocorreu no dia 2/10/23, depois de ter sido adiada a data inicialmente designada. Esta sessão teve início às 9h30m e terminou às 11h05m, com a audição de uma testemunha e prolação de alegações.
Esta segunda sessão ocorreu porque duas das testemunhas arroladas pelo Réu não compareceram à primeira sessão e os Réus não prescindiram dos seus depoimentos, no entanto, uma dessas testemunhas também não compareceu a essa segunda sessão e aí foi dispensado o respetivo depoimento.
Assim, a realização desta segunda sessão, que a primeira instância pareceu desvalorizar, resultou da má-fé dos litigantes Réus.
A sentença é de fácil apreensão, pelo que a sua análise se reveste de simplicidade.
Toda a atividade acima descrita e não a restante atividade processual, foi motivada pela litigância de má-fé, pelo que tem de considerar-se abrangida na previsão do art. 543º, nº 1 – a) do C. P. Civil.
Os AA. não juntaram nota de honorários e despesas, que melhor permitiria analisar o tempo que o Il. Mandatário dos AA. imputou à análise, elaboração e estudo de cada uma das peças processuais acima indicadas e ainda à deslocação a julgamento.
De qualquer forma, atentos os atos praticados e o tempo estimado relativo à sua análise/estudo, realização, tal como a primeira instância, entendemos desproporcionado o valor pedido, mas julgamos que o valor fixado, tendo em conta as regras de experiência comum, peca ligeiramente por defeito, sendo razoável e equilibrado aumentar tal valor para 1.500,00€ (mil e quinhentos euros), o que se determina.

Decisão:

Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, aumentando-se para 1.500,00€ (mil e quinhentos euros) o valor da indemnização devida pelos RR. aos AA. pela litigância de má-fé, relativa ao montante dos honorários do mandatário destes.
Custas na proporção de decaimento.
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Guimarães, 6 de junho de 2024

Alexandra Rolim Mendes
Joaquim Boavida
Maria dos Anjos Melo Nogueira