Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ALEXANDRA ROLIM MENDES | ||
Descritores: | PROCESSO DE INVENTÁRIO PARA PARTILHA DE BENS COMUNS DO EX-CASAL RECLAMAÇÃO CONTRA A RELAÇÃO DE BENS SUSPENSÃO POR CAUSA PREJUDICIAL NULIDADE DA DECISÃO CUSTAS | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/30/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | 1 - A lei faz retroagir os efeitos do divórcio, no tocante às relações patrimoniais entre os cônjuges, à data da proposição da ação de divórcio ou mesmo à data da cessação da coabitação entre ambos, embora neste último caso, só a requerimento de qualquer dos cônjuges 2 - Assim, a composição da comunhão deve considerar-se fixada no dia da proposição da ação e não no dia do trânsito em julgado da decisão e que a partilha deve ser feita como se a comunhão tivesse sido dissolvida no dia da instauração da ação ou na data em que cessou a coabitação 3 - Contudo, a comunhão dos bens comuns do casal, existentes à data da propositura da ação de divórcio, só termina pela respetiva partilha, por isso, o valor da quota há-de ser o seu valor atual, reportado à data da partilha. 4 - Assim, se o valor dos bens, designadamente de uma quota social, for impugnado, como acontece no caso em apreço, o seu valor deve ser fixado à data da avaliação. 5 - É esta a situação mais justa, tendo em conta que o valor de alguns bens, como o dos imóveis e das quotas sociais, se vão alterando ao longo do tempo e a partilha nem sempre é efetuada imediatamente ao trânsito da sentença de divórcio. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: AA, interessado e cabeça de casal no inventário acima identificado para partilha dos bens comuns do casal constituído por si e por BB, veio recorrer do despacho que incidiu sobre a reclamação à relação de bens. O despacho é o seguinte: “BB apresentou reclamação relativamente à relação apresentada pelo cc, AA. Segundo ela: R1 O valor da v1 (quota de sociedade) decorre do activo, passivo, clientela, capacidade técnica e quadros … é composta por um activo de mais de 300.000 € a saber: viaturas, armazém, saldos, restauração, obras, trabalhos. R2 OS valores atribuidos aos móveis do recheio da casa, são utópicos e surreais. Indica os valores que lhe parecem apropriados, de v2 a v104: identifica bens que deverão ser excluidos, por repetição, pertença a outrem, destruição. R:J A v-111 deverá ser excluida, não havendo empréstimo da mãe do cc para obras. R4 A v-112, despesas de reparação de automóvel- (..-HT-..) deverão ser excluidas, por a viatura estar na posse do cc. R5 A v-113, também, por corresponder a pagamento do IUC da mesma viatura. Reclama ainda BB, a omissão na relação de: R6 Máquina de café ... … €50. R7 Preço da venda de mota ... (..-PX-..) … €10.000. RS O valor de €3.774,82 pela aquisição e colocação de estrutura de alumínio na casa de morada. R9 Crédito de €19.500· sobre EMP01...- Unip Lda (vt) relativo a aquisição por esta de ... com o preço da venda de viaturas do casal- (... ... e ...). R10 Além de tais montantes existem saldos bancários que o cc não relacionou e que a interessada desconhece. Solicita BB a recolha de informações de todos os bancos a operar no pais. Foram reclamados créditos. Também por CC. que secunda o cc invocando diversos empréstimos de Junho a Setembro de 2018. totalizando €13.000e para durarem por dois anos. * o cc respondeu.Reafirma que o valor da quota é de €5.000~ Quanto aos bens móveis corrigiu o valor de alguns e excluiu algumas verbas. reconhecendo lapso. Reafirma o empréstimo. para obras. de 13 mil- euros por banda da mãe. em Junho e Setembro de 2018 e a aplicação da quantia em 21 de Janeiro de 2021 para pagamento das obras. A viatura ..-HT-.. é bem comum. cabendo ao passivo as despesas com reparação e IUC. A máquina ... já estava avariada em Julho de 2022 e constitui: lixo para reciclagem. A moto ... foi vendida antes de Julho de 2022. por acordo de ambos e pelo preço de €2.500e o dinheiro foi gasto pelo casal, Entregou €5.000· em numerário ao fornecedor das janelas e serralharia e demorando este na reparação dos defeitos da obra foi-1he solicitada a divisão do preço em falta. metade para cada um dos interessados. havendo ele procedido ao imediato pagamento da metade que lhe cabia. sendo o pagamento de R8 a metade da reclamante. A viatura P.... fora adquirida pela sociedade EMP02... Lda e foi dado em troca do .... já usado. E este (avaliado em 13.500) veio a ser trocado pelo .... pagando a sociedade mais €6.000~ Relativamente a activos bancários aquando da separação … do casal, procedeu o mesmo à divisão dos montantes existentes. * o cc veio dar conta da instauração de acção contra a sociedade EMP02...- Lda visando a condenação desta em valor de 280 a 300mi1 euros por obra defeituosa. Atenta a eventual influência no valor da sociedade solicitou a suspensão da instância relativamente à partilha da verba 1. Foi produzida a prova proposta. O tribunal é competente e nada obsta à apreciação da reclamação. Cabe apreciar a visada suspensão parcial, (vt) e eventual interesse na solicitada recolha de informação. II Considera-se, de relevo, comprovado o seguinte: (1) AA casou com BB em ../../1997. (2) Em Setembro de 2022 foi iniciado processo de divórcio e este foi, na sequência de convolação, decretado em 23/5/2023. (:J) Consta da decisão: mais se fixa no dia 08 de Julho de 2022, a data da separação de facto do casal. (4) AA é sócio e gerente de EMP02... ... UnipessoaL Lda. Esta tem o capital de €5.000~ (5) AA entregou €191,03 para pagamento de reparação do ... ..-HT-.. (Novembro de 2022) e transferiu €147,86 para pagamento do respectivo IUC (Junho de 2023). (6) AA, já casado, adquiriu moto ... (..-PX-..) e em Junho de 2022 vendeu-a, recebendo (pelo menos) 2.500· euros em numerário. (resposta 131-134). (7) E assinou o requerimento de registo e escrito (datados de 11/6/2022) com o seguinte teor: RECIBO Pelo presente, eu AA ... declaro que recebi à data de hoje o valor de €2.500~00 ... em numerário, de referente à venda do ... matricula ..-PX-.., marca .... (8) O fornecedor de aluminios para a casa de morada facturou a BB (a .../2022) por fornecimento e colocação da estrutura de alumínio e 50% do valer da obra: €:3.068,96 mais IVA (€3.774,82). (9) AA adquiriu viatura ... e posteriormente adquiriu viatura ..., vindo a vender esta por €13.500· ao stand, para aquisição do ..., e acrescentou cheque da sociedade, sendo esta a proprietária dos veículos ... e .... O ... pertencia a AA (não a EMP02...). (10) Por ocasião da separação o casal- procedeu à divisão dos montantes existentes. incluindo os depósitos bancários. (r166) * De relevo para apreciação da douta reclamação. considera-se não comprovado o seguinte:o É do conhecimento da reclamante que CC emprestou ao casal €13.000 para fazer face ao custo das obras projectadas e que viriam a realizar-se no interior e no exterior da casa de morada ... recebido o citado montante ... entendeu o casal- depositá-lo na conta titulada pelo seu filho ... já que beneficiava de uma taxa de juro mais elevada. (115 ss da resposta). CC mão do requerente ao longo do periodo compreendido entre 10/06/2018 e 17/09/2018 emprestou ao casal-para custeio das obras na casa de morada 13.000,00€. (v111). o Três meses antes da ação de divórcio tinha o casal- acordado na venda da moto, cujo preço de €2.500· foi pelo mesmo recebido em numerário e afectado às despesas do casal. (resp. 133). o Venda da ... pelo preço de 10.000,00 euros. o EMP02...- Lda tenha adquirido ... unicamente por troca e venda de viaturas dos interessados. o BB desconheça a existência de saldos bancários (e existam ainda por dividir). * Foi considerado:- A certidão da sociedade. - Cópia de factura de EMP03... (Novembro de 22) e de pagamento de IUC (Junho de 23). - Cópia para registo e recibo da mesma data (doc3 e doc 4 da resposta). - Cópia da factura do aluminio (...). - As cópias juntas por DD e da factura de EMP04.... - Os depoimentos de EE (vendedor de automóveis) FF (irmã da interessada) GG (sobrinha da interessada) HH (contabilista da sociedade) DD (vendedor de automóveis) II (companheira do cc) CC (mãe do cc e declarada credora, com saúde já debilitada e interesse na causa, quanto a alegada divida por empréstimo). Foram ponderadas as declarações dos interessados. BB reconhece conhecimento da vida bancária do casal, haver retirado a sua parte dos activos, recorda que o cc chegava com dinheiro aos molhos, proveniente de trabalho não facturado pela sociedade, que esta suportava necessidades da familia e pagava as viaturas a uso daquela. AA, reconhece que a viatura ... estava em nome pessoal- e recorda o levantamento por ambos dos activos bancários. O empréstimo pela mãe do cc ao longo do periodo de Junho a Setembro de 2018 ficou por esclarecer. CC apresentou reclamação, secundando a relação, alegando diversos empréstimos para pagamento das obras de remodelação do apartamento, totali2lando a quantia de €13.000~ Adianta a ausência de juros e o prazo de dois anos para a restituição, a impossibilidade dos interessados a efectivarem por altura do Natal- de 2020 e a promessa de o fa2lerem até meados de 2021. O cc (resposta) alega ter conservado o dinheiro da mãe por dois anos e tal em conta jovem e não o haver aplicado nas obras senão em Janeiro de 2021, já decorrido o prazo (suposto pela mãe) para a restituição. Das cópias que junta (doe 1 e doc2) apenas se constata reforço de 10 mil- e de 3 mil- euros. A proveniência dos depósitos é desconhecida e o destino dos 13 mil (levantamento de 21/01/21) é ignorado. As folhas da caderneta não identificam sequer o titular. As cópias não são aptas a gerar o minimo convencimento. BB admite o pagamento efectuado pelo cc da reparação e do IUC. A reclamação advém unicamente da posse pelo cc da viatura, circunstância que entende como bastante para a exclusão do património comum. Consenso prévio a venda da moto é ignorado, tal como o preço (total-) e a aplicação ou uso do respectivo montante. O cc junta escrito denominado Recibo, reconhecendo haver-lhe sido pago 2.500 na data, em numerário. Ignora-se a existência de qualquer outro recibo quanto à venda, a intervenção ou conhecimento de BB, o destino dado por AA ao dinheiro. Quanto a instalação de aluminio na casa, a reclamante limita-se a afirmar divida do casal a si própria. Junta apenas cópia de factura. Não alega haver efectuado o pagamento. A factura de ../../2022, praticamente contemporânea ao inicio do divórcio, indica modo de pagamento: transferência para o NIB ... 102, pelo que não seria difícil, querendo BB, ilustrar a efectivação do pagamento. Restaria a dúvida sobre a natureza do dinheiro, atenta a data da factura e a indicada data de vencimento (a mesma da emissão). Seria dinheiro comum ou próprio? Recorda-se que BB reconheceu haver retirado para si parte dos depósitos do casal. A não inclusão de saldos na relação está constatada. O distanciamento da reclamante relativamente a depósitos e bancos é negado pela própria, que veio a reconhecer saber quais os bancos com que se relacionavam os interessados e a sociedade. Acrescentou que procedeu à retirada de activos, tal como o cc, aceitando-se a efectivação prévia da divisão (resposta,166). III A recolha de informa~ bancária visada aquando da reclamação é inútil- face à constatação de que a ignorância de BB sobre o tema não é real- e que, ao invés, os interessados procederam anteriormente à divisão dos activos bancários. A visada paralisação parcial da causa (vt) na sequência da sociedade EMP02...- Lda haver sido demandada e correr o risco de condenação em elevado montante não merece acolhimento. Corresponde à vida das empresas o risco de litigios e condenações. A consequência para a causa será o eventual reflexo no valor da verba. R1 O valor atribuido à quota corresponde a imposição legal (art. 1098º CPC) pelo que carece de fundamento qualquer reclamação. R2,R6 Quanto a bens móveis de propriedade alheia e destruídos não foi trazido esclarecimento. O cc acolheu parcialmente a solicitação de BB, retirando bens e reduzindo, parcialmente, o valor que lhe atribuíra. A reclamação deve ser atendida nos mesmos termos. Os valores estarão, a seu tempo, na disponibilidade dos interessados. Olhando à relação que acompanha a PI as verbas excluídas são as seguintes: v43, v44, v45, v46, v48, v49, v50~ v60~ v61, v62, v87, v96. A alteração de valores é a seguinte: v2 para 1000€, v4 para 500€, v6 para 300€, v7 para 400€, v8 para 200€, v9 para 200€, v10para 300€, v11 para 280€, v12 para 300€, v13 para 500€, v14 para 120€, v15 para €500€, v19 para 400€, v21 para 20€, v22 para 40€, v23 para 80€, v24 para 80€, v25 para 300€, v27 para 300€, v29 para 500€, v30para 1000€, v31 para 60€, v32 para 550€, v34 para 400€, v37 para 180€, v38 para 80€, v39 para 100€, v40para 200€, v41 para 80€, v42 para 50€, v47 para 400€, v51 para 400€, v53 para 2 mesas ... e 120€, v54 para 300€, v56 para 200€, v58 para 300€, v59 para 100€, v63 para 200€, v68 para 50€, v69 para 1000€, v70 para 200€, v72 para 100€, v73 para 300€, v75 para 150€, v77 para 50€, v78 pra 100€, v79 para 100€, v80para 150€, v81 para 200€, v82 para 50€, v94 para 300€, v97 para mesa em madeira e 140€, v98 para 380€, v102 para 150€, v103 para 500€. R3 A reclamante impugna a divida relacionada como v-111. O alegado em resposta, pela manutenção, não logrou o minimo esclarecimento. Está ausente o minimo indicio documental da efectivação de empréstimo. Acolhe-se a solicitação no sentido da exclusão, sem prejuizo da eventual condenação do cc na respectiva quota parte (art.1106ºn04 opo) R4,R5 As despesas com o automóvel, (v112 e v113) cabem ao casal, independentemente da posse por um ou por outro dos interessados, ignorando-se convenção em contrário (caso dos gastos com a casa). R7,R9 A reclamante apontou para a omissão de dez mil euros relativos a venda de moto pelo cc. Este reconheceu a propriedade de ... e a venda, todavia pelo preço de apenas 2.500· euros. O recebimento, no próprio dia da venda está comprovado. A eventualidade da quantia corresponder apenas a parcela do preço não logrou esclarecimento. Admitido o recebimento pretende o cc não caber a quantia na relação argumentando que foi afectado às despesas do casal. Não chega a identificar a que despesas fez face com os 2.500. Reconhece que recebeu (no mês anterior à data da separação) em numerário circunstância que dificultaria conhecer o percurso do dinheiro após o recebimento. Nada se comprova que obste à reclamada inclusão devendo acolher-se a solicitação de BB. Além da moto o cc efectuou a venda de viatura ... pelo preço de €13.500. aquela pertencia-lhe. não à sociedade. O destino do dinheiro é conhecido. AA aplicou-o como pagamento (parcial) de viatura ... para a sociedade da qual é sócio e gerente. O preço em lugar de integrar o património conjugal foi encaminhado para o património social. O dito valor tal como o preço conhecido da moto constitui crédito do casal- sobre AA. R8 A divida pelo fornecimento dos alumínios não logrou esclarecimento. Nem a efectivação de pagamento (nem sequer alegado) ao fornecedor. A ser invocado o pagamento pela reclamante. seria ainda necessário comprovar a qualidade dos meios utili2iados para pagamento (dinheiro próprio dela e não comum ao casal), Não será acolhida a reclamação. R10 A pretensão a procurar dinheiro em bancos (todos os que operem no país) invocando distanciamento (ignorância) da actividade do cc é de rejeitar. O casal e a sociedade dispunham de contas e estas eram do conhecimento de BB. A própria veio a recordar estar a par da vida bancária e. mais. haver procedido à arrecadação (Para ela) dos activos reconhecendo o cc haver agido de igual modo. antecipando a divisão do dinheiro. IV Decisão Não atendemos à visada solicitação de informação dos bancos a operar no país. Não atendemos a solicitada suspensão da causa quanto à verba 1. Determinamos a exclusão da relação (original) das verbas seguintes: v43. v44. v45. v46. v48. v49. v50~ v60~ v61. v62. v87. v96 e da v-111 (13.000e. crédito de CC) e a alteração dos valores, conforme exposto em III (R2). Aditamos à relação as seguintes verbas: V109-A: Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da moto ... ... €2.500.00~ V109-B: Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da viatura ... ... €13.500. Não se atende no mais à douta reclamação. Custas pelo cc e pela reclamante fixando-se em cinco uc a taxa.” * Inconformado com esta decisão, recorreu da mesma o Requerente, formulando as seguintes Conclusões: A. Vem o presente Recurso interposto do Despacho com a ref. ...43, proferido em 07/10/2024 nos autos do processo supra referenciado, com o qual não se conforma o Recorrente, restringido à parte em que o Mmº Juiz a quo decidiu: a) “Não atendemos a solicitada suspensão da causa quanto à verba 1.”; b) Determinamos a exclusão da relação (original) das verbas seguintes: v43, v44, v45, v46, v48, v49, v50, v60, v61, v62, v87, v96 e da v-111 (13.000€, crédito de CC) e a alteração dos valores, conforme exposto em III (R2).” (Negrito nosso); c) “Aditamos à relação as seguintes verbas: V109-A: Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da moto ... … €2.500. V109-B: Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da viatura ...… €13.500,00” (Negrito nosso); d) “A reclamante impugna a dívida relacionada como v-111. O alegado em resposta, pela manutenção, não logrou o mínimo esclarecimento. Está ausente o mínimo indício documental da efetivação de empréstimo. Acolhe-se a solicitação no sentido da exclusão, sem prejuízo da eventual condenação do cc na respetiva quota parte (art. 1106ºn.4 CPC)” (Negrito nosso). B. Os supra transcritos segmentos decisórios do Despacho recorrido são nulos atenta a ausência de fundamentação da matéria de facto ou manifesta insuficiência da fundamentação, e ausência de exame crítico da prova produzida na qual o Tribunal recorrido formou a sua convicção. (Cfr. itens nrs. 3 a 25, fls. 3 a 8 das Alegações que antecedem). C. Em face do teor do requerimento com a ref. citius 47506452, enviado aos autos pelo cabeça de casal em 27/12/2023, instruído com cópia da Petição Inicial dos autos do processo nº 126/23.... e subsequente envio da respetiva Certidão judicial, impunha-se o deferimento da requerida declaração de prejudicialidade da citada Ação relativamente à partilha da quota social relacionada na Verba nº 1 da Relação de Bens, titulada pelo cabeça de casal na sociedade comercial EMP02..., Lda., e consequente suspensão da instância relativamente a tal verba. (Cfr. itens nrs. 26 a 46, fls. 8 a 13 das Alegações que antecedem). D. A causa de pedir nos referidos autos do processo nº 126/23.... consiste em alegados defeitos da obra de construção – casa de morada de família – que no Autor imputa à Ré EMP02..., Lda., emergentes de trabalhos realizados por esta no ano de 2018, portanto na constância do casamento dos ora Recorrente e Recorrida. E. Atentos os montantes indemnizatórios peticionados pelo Autor na sobredita Ação e os demais a liquidar em caso de total procedência da mesma, o valor global da condenação da Ré EMP02..., Lda. poderá ultrapassar o montante de € 300.000,00, o que implicaria inevitavelmente a situação de falência técnica desta microempresa e de iminente insolvência, em cujo caso a quota social relacionada na Verba nº 1 não teria qualquer valor. F. Para efeitos de partilha dos bens comuns do dissolvido casal, o valor da quota social única relacionada na Verba nº 1 da Relação de Bens só poderá ser determinado depois de conhecido o desfecho, com trânsito em julgado, da predita Ação do processo nº 126/23..... G. O valor real e efetivo da quota social titulada pelo cabeça de casal na EMP02..., Lda., haverá de corresponder ao do capital próprio da sociedade à data da separação de facto do casal, ocorrida em ../../2022, conforme declarado na Sentença que decretou o divórcio, e cuja Ata da Audiência Final foi junta com a Petição Inicial. H. Para a determinação do capital próprio da sociedade EMP02..., Lda. e consequente aferição do valor da quota social relacionada na Verba nº 1 da Relação de Bens, indispensável se torna o conhecimento do desfecho da supracitada Ação de processo comum e, no caso de condenação da Ré, qual a medida dessa condenação. I. Nenhuma prova foi produzida nos autos, designadamente sem sede de Audiência de Julgamento, nem razão alguma foi aduzida pelo Tribunal recorrido que justifique ou consinta a exclusão da Verba nº 46 da originária Relação de Bens, pelo que deverá a mesma manter-se na Relação de Bens. (Cfr. itens nrs. 47 a 55, fls. 13 e 14 das Alegações que antecedem). J. Tendo na resposta à Reclamação à Relação de Bens sido alterado de € 280,00 para € 200,00 o valor da Verba nº 11, que no entendimento da Reclamante deveria ser de apenas € 80,00, inexiste razão alguma para a alteração decidida pelo Tribunal a quo que repõe o primitivo valor de € 280,00 dessa verba, devendo, consequentemente, no elenco das verbas objeto de alteração do valor ser considerado que o valor atribuído à Verba nº 11 é de € 200,00 e não de € 280,00. K. Na originária Relação de Bens o cabeça de casal atribuiu à Verba nº 14 o valor de € 350,00, tendo a Reclamante atribuído à mesma verba o valor de € 75,00, e em sede de Resposta à Reclamação à Relação de Bens o cabeça de casal retificou aquele valor de € 350,00 para € 220,00. L. Nenhuma prova foi produzida, nomeadamente em Audiência de Julgamento, que permitisse ao Mmº Juiz a quo fixar à citada verba o inusitado valor de € 120,00, aliás totalmente divergente dos valores indicados pelo cabeça de casal (€ 220,00) e pela Reclamante (€ 75,00), pelo que deverá ser eliminada a referência à referida verba no elenco das verbas objeto de alteração do valor. M. Sob Verba nº 111, o cabeça de casal relacionou no Passivo da Relação de Bens “Deve o património comum a quantia de € 13.000,00 a JJ, mãe do Requerente, que ao longo do período compreendido entre 10/06/2018 e 17/09/2018 esta emprestou ao ora dissolvido casal para custeio de obras realizadas na casa de morada de família identificada na Verba nº 106 (fração autónoma ...).” N. Nos arts. 115º a 122º da Resposta à Reclamação à Relação de Bens foi alegado, além do mais, que a quantia de € 13.000 correspondia ao “pecúlio que a mutuária conservava em seu poder referente à venda de objetos de ouro pessoais” e que “uma vez recebido de empréstimo o citado montante, e enquanto não se realizassem as obras, entendeu o ora extinto casal depositá-lo na conta bancária nº ...77 aberta aos balcões da Banco 1..., titulada pelo seu filho KK já que, por se tratar de uma conta-jovem beneficiava de uma taxa de juro bastante mais elevada… “. O. No art. 15º do Requerimento com a ref. citius 47393563, enviado aos autos pela Reclamante em 12/12/2023, a mesma alegou que “Além de mais, os documentos juntos em 1 e 2, em momento algum fazem qualquer referência à mãe do cabeça de casal, porque foi justamente o casal que efetuou o depósito de tal quantia monetária resultante das suas poupanças, sendo que em sede de prestação de depoimento de parte a Reclamante declarou que o citado montante de € 13.000,00 pertencia à sua ex-sogra CC, e tinha sido depositado na conta-jovem titulada pelo seu filho KK, neto da CC. [“(00:07:02) Eu sei que o dinheiro da minha sogra foi colocado para a obtenção de juros na conta do meu filho menor, que era a que dava mais juros e, e entrou nessa conta e depois saiu porque eu pedi ao AA para tirar esse dinheiro porque me estava a influenciar era o pedido de bolsa para os meus filhos. Esse dinheiro não era nosso]“, de cujo extrato bancário a Reclamante disse ser portadora. - Cfr. item nº 78, fls. 19, e item 82, fls. 20 e 21 das Alegações que antecedem. P. Relativamente ao destino dado ao citado depósito de € 13.000,00, numa primeira fase (passagem de voltas 00:07:27 do registo áudio no ficheiro informático 20240923112831_1677327_2871830) a Reclamante e depoente de parte disse que “penso eu que tinha devolvido, depositado na conta da mãe“, para mais adiante (passagem de voltas 00:11:38 do mesmo ficheiro áudio) infletir o seu discurso declarando ao douto Tribunal que “foi colocado pra obtenção de juros da minha sogra e depois foi retirado e foi depositado, segundo o que o AA me disse, na conta da mãe outra vez.” Q. Através do Requerimento enviado aos autos por CC e aos mesmos junto em 28/11/2023, a mesma reclamou, além do mais, o reconhecimento do seu supracitado crédito de € 13.000,00 sobre o património comum do casal, tendo em sede de prestação de depoimento confirmado que havia emprestado ao filho AA a referida quantia. (Cfr. item nº 88, fls. 23 e 24 das Alegações que antecedem). R. Em sede de prestação de declarações de parte, o cabeça de casal relatou pormenorizadamente ao douto Tribunal as circunstâncias em que a sua mãe LL lhe havia entregado a citada quantia de € 13.000,00, o depósito da mesma na conta do filho KK e subsequente levantamento para fazer face ao pagamento (parcial) das obras realizadas na casa de morada de família (fração autónoma ... a que se refere a Verba nº 106 da originária Relação de Bens). [Cfr. item nº 90, fls. 26 e 27 das Alegações que antecedem). S. A fls. 4 in fine e 5 in principio do Despacho recorrido, consta que “Foi considerado: os depoimentos de (…) CC (mãe do cc e declarada credora, com saúde já debilitada e interesse na causa, quanto à alegada dívida por empréstimo)“ e “o empréstimo pela mãe do cc ao longo do período de Junho a Setembro de 2018 ficou por esclarecer. CC apresentou reclamação, secundando a relação, alegando diversos pagamentos das obras de remodelação do apartamento, totalizando a quantia de €13.000. Adianta a ausência de juros e o prazo de dois anos para restituição, a impossibilidade dos interessados a efectivarem por altura do Natal de 2020 e a promessa de o fazerem até meados de 2021.” T. A devida análise conjugada dos documentos nrs. 1 e 2 (fotocópias da caderneta da conta bancária titulada por KK) juntos com a Resposta à Reclamação à Relação de Bens, do Requerimento de CC junto aos autos em 28/11/2023, do seu depoimento presencial prestado na Sessão da Audiência de Julgamento de 23/09/2024, do segmento das declarações de parte do cabeça de casal transcrito a fls. 26 e 27 das Alegações que antecedem, do segmento do depoimento de parte da Reclamante transcrito a fls. 20 e 21 das mesmas Alegações, e das regras da lógica, da experiência comum e do normal acontecer, impunha que houvesse sido dado como provado que CC emprestou ao seu filho AA a citada quantia de € 13.000,00 que o mesmo e a sua então mulher, ora Recorrida, utilizaram para fazer face ao pagamento das obras na sua casa de morada de família. U. Pese embora a avançada idade da testemunha CC, os constrangimentos naturais da falta de mobilidade e consequente prestação de depoimento sentada em cadeira de rodas, e alguns lapsos de memória, a mesma, como avulta do registo áudio dos seu depoimento, de forma serena, tranquila, espontânea e coerente explicou ao douto Tribunal não só as circunstâncias do empréstimo da quantia de € 13.000,00 ao seu filho AA como também a proveniência desse dinheiro. (Cfr. passagens de voltas 00:04:10 a 00:06:12 do registo áudio no ficheiro informático 20240923101648_1677327_2871830 – item nº 88, fls. 23 a 25 das Alegações que antecedem). V. Outrossim, atentas as inúmeras incongruências do depoimento de parte da Reclamante, designadamente sobre o citado empréstimo e o facto de a mesma por diversas vezes, na prestação desse depoimento, ter declarado/confirmado ao douto Tribunal que efetivamente a quantia de € 13.000,00 pertencia à sua sogra CC e não ao casal (vide itens nrs. 78 e 80 das Alegações supra), em total contradição com o que expressa e inequivocamente havia alegado no art. 15º do seu Requerimento enviado aos autos em 12/12/2023, impunha-se que o Mmº Juiz a quo considerasse tal depoimento como destituído de qualquer credibilidade e, consequentemente, mantivesse inalterada a Relação de Bens no que tange à Verba nº 111. W. Salvo o devido respeito, e pese embora a ausência de fundamentação da decisão de exclusão da Verba nº 111 da Relação de Bens, e de análise crítica da prova em que o Mmº Juiz a quo formou a sua convicção, que inquina do vício de nulidade o segmento decisório sub iudicio, enferma também o mesmo, pelas razões supra aduzidas, de manifesto erro de julgamento. X. Por outro lado, o entendimento do Tribunal a quo consistente em “Das cópias que junta (doc 1 e doc2) apenas se constata reforço de 10 mil e de 3 mil euros. A proveniência dos depósitos é desconhecida e o destino dos 13 mil (levantamento em 21/01/21) é ignorado. As folhas da caderneta não identificam sequer o titular. As cópias não são aptas a gerar o mínimo convencimento“ não encontra a menor sustentação fática na vasta prova produzida, nomeadamente na supracitada prova documental, no depoimento da testemunha CC, nas declarações de parte do cabeça de casal, e no inequívoco reconhecimento pela Reclamante e depoente de parte que a mesma era conhecedora do depósito da quantia global de € 13.000 efetuado na conta-jovem titulada pelo seu filho KK aberta aos balcões do Banco 1..., de cujo extrato disse ser portadora [passagem de voltas 00:10:19 do registo áudio 20240923112831_1677327_2871830]. (Cfr. passagens de voltas 00:07:02 a 00:14:58 do registo áudio no ficheiro informático 20240923112831_1677327_2871830 transcrito no item 82, fls. 20 a 22 das Alegações que antecedem). Y. Ademais, em momento algum, nomeadamente no citado Requerimento da Reclamante de 12/12/2023, a mesma impugnou dos sobreditos documentos nrs. 1 e 2 juntos com a Resposta à Reclamação o que, salvo melhor entendimento equivale à sua aceitação. Z. Em fase alguma do processo, designadamente em sede de prestação de depoimento de parte, a Reclamante logrou carrear para os autos a mais pálida prova sustentatória da alegada necessidade de se proceder ao levantamento da predita quantia de € 13.000,00 de molde a facilitar o inusitado processo de concessão de bolsa de estudo ao filho KK, tanto mais que à data desse levantamento, em 21/01/2021, este frequentava o ensino secundário, ambos os progenitores exerciam uma profissão remunerada (enfermeira e gerente comercial) e, manifestamente o agregado familiar não carecia de recursos financeiros para suportar as despesas com o ensino do filho KK em estabelecimento público, logo gratuito, sito na .... AA. Se o Tribunal a quo houvesse analisado e ponderado devidamente a prova produzida, designadamente i) o Requerimento enviado por CC aos autos e aos mesmos junto em 28/11/2023, e o seu depoimento prestado em Audiência de Julgamento; ii) as declarações de parte do cabeça de casal; iii) a contraditória matéria alegada no art. 15º do Requerimento da Reclamante de 12/12/2023, e iv) e as flagrantemente contraditórias e incongruentes declarações prestadas pela Reclamante em sede de Depoimento de parte, jamais haveria proferido a decisão sub iudicio consistente na exclusão da Verba nº 111 da Relação de Bens. BB. Razões sobejas para, no modesto entendimento do Recorrente, para além da nulidade de que enferma o sobredito segmento decisório, dever ser o mesmo revogado e, em consequência, manter-se incólume a Relação de Bens no que concerne à citada Verba nº 111. CC. A decisão de aditamento à Relação de Bens da Verba nº 109-A consistente em “Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da moto ...… € 2.500,00”, para além de despida de qualquer fundamentação e de análise crítica da prova que subjazeu à formação da convicção do Tribunal a quo e, como tal a inquina do vício de nulidade, enferma também de manifesto erro de julgamento. DD. Da prova produzida conjugada com as regras da lógica, da experiência comum e do normal acontecer (não faz parte dos cânones da vida conjugal, maxime de pessoas casadas no regime de comunhão de adquiridos, como é o caso vertente, que deva existir uma contabilidade daquilo com que cada um dos elementos do casal contribui para as despesas do mesmo ou hajam os cônjuges de reciprocamente emitir declarações atinentes aos atos de administração dos bens próprios ou comuns) avulta por exuberância à saciedade que o preço real e efetivo de venda da moto ... de matrícula ..-PX-.. foi utilizado pelo casal para fazer face às suas despesas (como, de resto, já havida sucedido com a quantia de € 8.000,00 paga em 26/12/2026 à Reclamante correspondente ao preço de venda do veículo de matrícula ..-HX-.. registado a seu favor). EE. Na prestação de declarações de parte registadas, além do mais, no ficheiro áudio ref. 20240924112224_1677327_2871830, o cabeça de casal expôs da forma serena, natural, espontânea, sincera e congruente que tal registo documenta, as vicissitudes da aquisição que fez por volta do ano de 2019 da moto ... usada com matrícula ..-TX-.., da venda que dela fez em 2022 e do montante do preço que recebeu a alocou às despesas do casal, à semelhança do que havia sucedido com montante de € 8.000,00 referente ao preço de venda do supracitado de matrícula ..-HX-.. (Cfr. passagens de voltas 00:48:47 a 00:52:01 do citado registo áudio transcrito no item nº 109 , de fls. 31 a 34 das Alegações que antecedem). FF. Inexiste nos autos qualquer prova para além das incongruentes declarações da Reclamante, de onde possa extrair-se, como incorretamente e desprovida de qualquer fundamentação extraiu o Tribunal recorrido, que o citado montante de € 2.500,00 constitui um crédito do património comum sobre o Interessado AA. GG. Ademais, e ressalvado sempre o devido respeito por diverso entendimento, não encaixa nas regras da lógica e da experiência comum que sendo de cerca de € 2.200,00 o rendimento mensal do agregado familiar do casal, constituído por 4 elementos e temporariamente por 5 (o casal, os dois filhos estudantes e a mãe do cabeça de casal), suportando o pagamento da prestação mensal do crédito para compra de habitação, não houvesse o referido preço de venda da moto ... sido utilizado para fazer face às despesas desse agregado familiar (mormente numa altura em que o filho mais velho do casal, maior e estudante universitário, se encontrava internado e gravemente doente como declarou a Reclamante a voltas 00:07:27 do registo áudio do seu depoimento de parte no ficheiro informático 20240923112831_1677327_2871830). HH. Tanto assim que, não consta da Ata da Audiência Final de ../../2023, realizada nos autos do processo de divórcio que sob o nº 3041/22.... correu termos no Juízo de Família e Menores de Viana do Castelo – Juiz ..., junta sob Doc. nº 1 com a Petição Inicial dos presentes autos de Inventário, qualquer referência ao agora alegado crédito de € 2.500,00 do património comum sobre o cabeça de casal, dela constando tão-só, no que ao património concerne, “O autor aceita em fixar o dia 08 de Julho de 2022 para efeitos patrimoniais, a data da separação de facto do casal” e “A ré aceita em fixar o dia 08 de Julho de 2022 para efeitos patrimoniais, a data da separação de facto do casal.” II. Na prestação de depoimento de parte registado no ficheiro informático 20240923112831_1677327_2871830, a Reclamante não logrou sequer esclarecer por que razão havia indicado na Reclamação à Relação de Bens que o preço de venda da citada moto ... foi de € 10.000,00, refugiando-se na declaração de que “eu não tenho acesso a nenhum documento do valor que foi vendido.” (Cfr. passagens de voltas 00:37:16 a 00:38:20 transcritas no item nº 110, de fls. 34 e 35 das Alegações que antecedem). JJ. A decisão sub iudicio – aditamento à Relação de Bens da Verba nº 109-A - é iníqua, infundamentada, desprovida de análise crítica da prova que lhe subjazeu e não consentida pela prova produzida, designadamente as declarações de parte do cabeça de casal conjugadas com as regras da lógica, da experiência comum e do normal acontecer. KK. Em todo o caso, nos termos do disposto no art. 414º do Código de Processo Civil, “A dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita”, in casu a Reclamante. LL. Deve, assim, ser declarada a nulidade da decisão sub iudicio por manifestamente desprovida de fundamentação fática e de análise crítica da prova, e revogada a mesma, desconsiderando-se o referido aditamento da Verba nº 109-A à Relação de Bens, que dela não deverá fazer parte. MM. No despacho recorrido o Tribunal a quo procedeu, também, ao aditamento à Relação de Bens da Verba nº 109-B consistente em “Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da viatura ...…. €13.500” NN. Salvo o devido respeito, a prova produzida em Audiência de Julgamento não consente o proferimento de tal decisão que, como as demais é nula por desprovida de qualquer fundamentação fática e de análise crítica da prova de que supostamente se socorreu o Mmº Juiz a quo para formar a sua convicção. OO. Resulta demonstrado à saciedade nos autos que a quantia de 13.500,00 paga pela EMP02..., Lda. como parte do preço de € 19.500,00 referente à compra por essa sociedade comercial, em ../../2020, do veículo de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-..-QR, corresponde ao valor da retoma feita pelo vendedor daquele, DD, do veículo de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-QE-... (Cfr. Docs. nrs. 1 e 2 juntos na Sessão da Audiência de Julgamento de 24/09/2024). PP. O referido veículo de marca ... havia sido adquirido no estado de usado pela EMP02..., Lda. no ano de 2014, mediante o pagamento do preço de € 17.500,00. QQ. O pagamento do citado preço de € 17.500,00 foi feito pela entrega, a título de retoma no valor de € 15.000,00, do veículo de marca ..., modelo ..., com matrícula ..-JE-.., que em 31/05/2010 pelo preço de € 30.228,49 havia sido vendido por EMP04.... Lda. à EMP02..., Lda. (Cfr. fatura nº ...60, enviada aos autos com o Requerimento ref. citius 49782703, de 09/09/2023 e a que alude o Despacho recorrido a fls. 4). RR. O remanescente do referido preço de € 17.500,00, ou seja € 2.500,00, foi pago ao vendedor do ... através de dinheiro em caixa da EMP02..., Lda. SS. Por razões do foro contabilístico-financeiro da EMP02..., Lda., e por indicação do então Técnico Oficial de Contas/Contabilista Certificado, foi sugerido ao gerente dessa empresa que, para não sobrecarregar os custos de exploração da empresa que então se encontrava ainda numa fase embrionária de implantação e afirmação no mercado, o veiculo, apesar de pago por essa empresa, fosse registado em nome do seu gerente, ora Recorrente. TT. Da prova documental produzida, designadamente a supracitada fatura emitida por EMP04..., Lda. em 31/05/2010 e da declarações de parte do cabeça de casal constantes do ficheiro áudio 20240924112224_1677327_2871830 resulta demonstrado que, pese embora o registo de propriedade do referido veículo ... de matrícula ..-QE-.. haver sido feito a favor de AA, gerente da EMP02..., Lda., foi o preço de aquisição do mesmo pago integralmente por esta sociedade comercial. (Cfr. itens nrs. 117 a 140, fls. 36 a 47 das Alegações que antecedem). UU. De onde decorre que, ao ter sido feita a entrega pela EMP02..., Lda. do citado veículo ... a título de retoma no valor de € 13.500,00, para pagamento parcial do preço de € 19.500,00 de aquisição do veículo ..., modelo ..., de matrícula ..-..-QR, e feita também a entrega ao vendedor DD do cheque nominativo nº ...51, no valor de € 6.000,00 sacado sobre a conta nº ...97 titulada pela EMP02..., Lda. junto do Banco 1..., foi o pagamento integral do citado preço de aquisição do veículo ... de € 19.500,00 suportado pela adquirente EMP02..., Lda. (Cfr. Docs. nrs. 1 e 2 juntos aos autos na sessão da Audiência de 24/09/2024 e passagens de voltas 00:09:17 a 00:20:10 do registo áudio ref. 20240924112224_1677327_2871830, item nº 134, fls. 39 a 45 das Alegações que antecedem). VV. Em face da prova documental e testemunhal produzida e das declarações de parte do cabeça de casal, não vislumbra este qual a concreta factualidade com base na qual o Tribunal a quo formou a sua convicção de que o património comum do dissolvido casal detém um crédito de € 13.500,00 sobre o cabeça de casal. WW. Ademais, a decisão de aditamento à Relação de Bens da Verba nº 109-B, desprovida de fundamentação fática e da análise crítica da prova em que assenta, inquina a mesma de nulidade que aqui se argui com as legais consequências. XX. De qualquer modo, sendo a EMP02... uma sociedade por quotas unipessoal e integrando a quota social nela detida pelo cabeça de casal o património comum a partilhar, não se vislumbra que, ainda que se considerasse que apesar de adquirido com bens e dinheiro exclusivamente pertença daquela sociedade o veículo automóvel ... pertencia ao dissolvido casal, o que não se concede, houvesse a quantia de € 13.500,00 de ser considerada como “crédito do património comum sobre AA.” YY. Com base na supra figurada hipótese, a citada quantia de € 13.500,00 haveria, ainda assim, de ser considerada como integrante do património da sociedade comercial EMP02..., Lda. e, assim sendo, encontrar-se-ia refletida no valor real e efetivo da quota social única titulada pelo cabeça de casal nessa sociedade e a partilhar nos presentes autos. ZZ. Salvo melhor entendimento, a não entender-se assim, caso fosse sufragado o entendimento do Tribunal recorrido, assistir-se-ia a uma duplicação da relevação do citado montante em sede de partilha: por um lado, conforme decidido, haveria o cabeça de casal de compensar o património comum pelo referido montante de € 13.500,00 e, por outro, encontrar-se-ia esse montante refletido no valor da predita quota social única que mais não é do que o valor efetivo da empresa EMP02.... AAA. Deve, em consequência, ser revogada a decisão sub iudicio, desconsiderando-se a citada Verba nº 109-B, que não deverá integrar a Relação dos Bens a partilhar. BBB. O Facto Provado nº 9 enferma de imprecisão e obscuridade, além do mais, na parte em que não permite descortinar a qual dos dois veículos de marca ..., ambos modelo ..., se refere, sendo um com matrícula ..-JE-.., pertença da EMP02..., Lda., e outro com matrícula ..-HX-.. pertença do casal, registado que foi a favor da Requerida Reclamante e pela mesma vendido em 26/12/2020 pelo preço de € 8.000,00. CCC. No modesto entendimento do Recorrente, a prova documental produzida e as declarações de parte do cabeça de casal, parcialmente supra transcritas a fls. 39 a 45 da Alegações que antecedem, impunham que a redação a conferir ao Facto Provado nº 9 fosse a seguinte, ou outra com idêntico significado e alcance: «O casal adquiriu a viatura ... com matrícula ..-HX-.. registada em nome da Reclamante, tendo esta procedido à sua venda em 26/12/2020 pelo preço de € 8.000,00. Em 31/05/2010, a EMP02..., Lda. adquiriu a EMP04..., Lda., pelo preço de € 30.228,49 o veículo de marca ..., modelo ..., com matrícula ..-JE-... Posteriormente, em 2014, pelo preço de € 17.500,00 foi adquirido pela EMP02..., Lda. ao “EMP03...” o veículo usado de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-QE-.., tendo esse stand recebido em retoma pelo preço de € 15.000,00 o veículo ... com matrícula ..-JE-... Na aquisição pela EMP02..., Lda., em ../../2020, do veículo usado de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-..-QR, pelo preço de € 19.500,00, foi recebido como retoma por DD (EMP05...), vendedor daquele, pelo valor de € 13.500,00 o veículo ... com matrícula ..-QE-.., e o remanescente do preço de aquisição foi pago através do cheque nº ...51 no valor de € 6.000,00 emitido por EMP02..., Lda. sobre a sua conta nº ...97 aberta aos balcões do Banco 1....» EEE. A prova documental produzida conjugada com o depoimento da testemunha CC e as declarações de parte do cabeça de casal impunham que o facto não Provado consistente em: “De relevo para apreciação da douta reclamação, considera-se não comprovado o seguinte: É do conhecimento da reclamante que CC emprestou ao casal €13.000 para fazer face ao custo das obras projetadas e que viriam a realizar-se no interior e no exterior da casa de morada … recebido o citado montante … entendeu o casal depositá-lo na conta titulada pelo seu filho … já que beneficiava de uma taxa de juro mais elevada. (115 ss da resposta). CC mão do requerente ao longo do período compreendido entre 10/06/2018 e 17/09/2018 emprestou ao casal para custeio das obras na casa de morada 13.000,00€. (v111).“ houvesse sido dado como provado, pelo que deverá ser eliminado do elenco dos Factos não Provados e inserido no elenco dos Factos Provados. FFF. O Facto não Provado consistente em “Três meses antes da ação de divórcio tinha o casal acordado na venda da moto, cujo preço de €2.500 foi pelo mesmo recebido em numerário e afetado às despesas do casal. (resp. 133).” não encontra sustentação fática na prova produzida, designadamente no segmento das declarações de parte do cabeça de casal transcrito a fls. 31 a 34, das Alegações que antecedem e no segmento do depoimento de parte da Reclamante transcrito a fls. 34 e 35 das mesmas Alegações, conjugada com as regras da lógica, da experiência comum e do normal acontecer. GGG. Deve, em consequência o citado Facto não Provado ser eliminado do elenco dos Factos não Provados e inserido no elenco dos Factos Provados. HHH. Salvo o devido respeito, enferma de obscuridade o segmento do Despacho recorrido consistente em “Custas pelo cc e pela reclamante, fixando-se em cinco uc a taxa.”, não se percebendo, além do mais, a concreta proporção e medida da condenação dos Interessados nas custas do Incidente. III. No proferimento do despacho recorrido o Tribunal a quo interpretou e aplicou incorretamente, inter alia, as seguintes normas legais e Constitucionais: a) Do Código Civil: Arts. 342º, 1689º, nrs. 1 e 3, 1697º, nº 2, 1789º, nº 2; b) Do Código de Processo Civil: Arts. 154º, nrs. 1 e 2, 414º, 527º, nrs. 1 e 2, 539º, nº 1, 607º, nrs. 3, 4 e 5, e 1106º, nº 4; c) Da Constituição da República Portuguesa Art. 205º, nº 1. JJJ. A correta interpretação e aplicação do Direito, designadamente as supracitadas normas legais e Constitucionais, impunha, relativamente aos segmentos decisórios ora objeto de Recurso, o proferimento de decisão diametralmente oposta, mormente nom que tange à manutenção da Relação de Bens retificada, enviada aos autos com a Resposta à Reclamação e, consequentemente, a manutenção na Relação de Bens da Verba nº 111 (dívida do património comum de € 13.000,00), e o não aditamento à mesma das Verbas nrs. 109-A e 109-B. Para efeitos do disposto no art. 646º, nº 1, do Código de Processo Civil, requer a V. Exa. Se digne mandar passar Certidão a ser junta com as presentes Alegações de Recurso, integrando as seguintes peças processuais: a) Petição Inicial integral b) Reclamação à Relação de Bens com a ref. citius 46986859 c) Resposta à Reclamação à Relação de Bens com a ref. citius 47306627 d) Requerimento da Reclamante com a ref. citius 47393563, de 12/12/2023 e) Requerimento do cabeça de casal com a ref. citius 47506452, de 27/12/2023 f) Requerimento do cabeça de casal com a ref. citius 49782703, de 09/09/2024 g) Documentos nrs. 1 e 2 juntos aos autos na Sessão da Audiência de Julgamento de 24/09/2024 (Declaração de venda do veículo com matrícula ..-QE-.. e fotocópia do cheque emitido em ../../2020 no valor de € 6.000,00). TERMOS EM QUE, e nos mais de Direito com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido total provimento ao presente Recurso e, em consequência, ser proferido douto Acórdão que: A. Revogue as decisões objeto do presente Recurso, m. i. nos itens nrs. 1 e 2 das Alegações que antecedem e na Conclusão A., e as substitua por outras que: a) Declare para efeitos de partilha da Verba nº 1 (quota social) da Relação de Bens, a prejudicialidade da Ação de processo comum que com o número de processo 126/23.... corre termos no Juízo Central Cível de Viana do Castelo – Juiz ...; b) Mantenha e declare como fazendo parte dos bens comuns a partilhar a Verba nº 46 da originária Relação de Bens; c) Mantenha e declare como fazendo parte do passivo a Verba nº 111 da originária Relação de Bens; d) Altere o valor da Verba nº 11 da originária Relação de Bens para € 200,00; e) Retifique o valor da Verba nº 14 da originária Relação de Bens para € 220,00; f) Declare como não provado que o património comum a partilhar detém sobre o cabeça de casal um crédito de € 2.500,00 referente ao preço de venda da moto ... com matrícula ..-TX-.., e elimine da Relação de Bens a Verba nº 109-A à mesma aditada pelo douto Tribunal a quo; g) Declare como não provado que o património comum a partilhar detém sobre o cabeça de casal um crédito de € 13.500,00 referente ao preço de venda do veículo ... com matrícula ..-QE-.., e elimine da Relação de Bens a Verba nº 109-B à mesma aditada pelo douto Tribunal a quo; B. Fixe o valor das custas judiciais atinentes ao Incidente de Reclamação à Relação de Bens e a concreta proporção e medida da condenação nas mesmas dos Interessados na partilha. Decidindo nesta conformidade farão Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA! * Foram apresentadas contra-alegações no sentido da improcedência do recurso. * Questões a decidir:* - Da requerida suspensão da instância por existência de causa prejudicial; - Verificar se a sentença padece de nulidade por falta de fundamentação; - Verificar se as provas foram bem analisadas na primeira instância; - Analisar se o direito foi bem aplicado aos factos provados, relativamente às questões arguidas no recurso. * Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.* Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos: (1) AA casou com BB em ../../1997. (2) Em setembro de 2022 foi iniciado processo de divórcio e este foi, na sequência de convolação, decretado em 23/5/2023. (3) Consta da decisão: mais se fixa no dia 08 de julho de 2022, a data da separação de facto do casal. (4) AA é sócio e gerente de EMP02... ... UnipessoaL Lda. Esta tem o capital de €5.000~ (5) AA entregou €191,03 para pagamento de reparação do ... ..-HT-.. (Novembro de 2022) e transferiu €147,86 para pagamento do respetivo IUC (Junho de 2023). (6) AA, já casado, adquiriu moto ... (..-PX-..) e em junho de 2022 vendeu-a, recebendo (pelo menos) 2.500· euros em numerário. (resposta 131-134). (7) E assinou o requerimento de registo e escrito (datados de 11/6/2022) com o seguinte teor: RECIBO Pelo presente, eu AA ... declaro que recebi à data de hoje o valor de €2.500,00 ... em numerário, de referente à venda do ... matricula ..-PX-.., marca ... . (8) O fornecedor de alumínios para a casa de morada faturou a BB (a .../2022) por fornecimento e colocação da estrutura de alumínio e 50% do valer da obra: €:3.068,96 mais IVA (€3.774,82). (9) AA adquiriu viatura ... e posteriormente adquiriu viatura ..., vindo a vender esta por €13.500· ao stand, para aquisição do ..., e acrescentou cheque da sociedade, sendo esta a proprietária dos veículos ... e .... O ... pertencia a AA (não a EMP02...). (10) Por ocasião da separação o casal- procedeu à divisão dos montantes existentes. incluindo os depósitos bancários. (r166) Além destes factos, há que ter ainda em conta os seguintes: 1- A Recorrida apresentou reclamação à relação de bens peticionando, nomeadamente e com interesse para o caso em apreço, o seguinte: “Quanto à Relação de Bens A) Participações Sociais Quanto à Verba 1 O Cabeça de Casal relaciona a participação social correspondente à quota na sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda., no valor 5.000,00€. No entanto, o valor a atribuir à sociedade, irá decorrer do seu ativo, e do seu passivo, mas igualmente da sua clientela, capacidade técnica, bem como dos seus quadros. Tal sociedade para além da quota no valor de 5.000,00€, é composta por um ativo no valor de mais de 300.000,00€, a saber: a) Veículo automóvel, ligeiro, marca ..., modelo ..., matrícula ..-TA-.., no valor de 55.000,00€; b) Veículo automóvel, ligeiro, MARCA ..., modelo ..., matrícula ..-..-QR, no valor de 28.000,00€; c) Várias viaturas comerciais cujas matrículas, marca e modelo se desconhecem, devendo ser juntos aos autos pelo Cabeça de Casal os respetivos livretes, cujo valor totaliza a quantia aproximativa de 85.000,00 Euros; d) Armazém sito no ..., em ..., cuja caderneta predial e certidão de registo predial deverá ser junta pelo Cabeça de Casal, cujo valor ascende ao montante de 75.000,00 Euros; e) Saldos bancários; f) Faturação a clientes; g) Obras adjudicadas; h) Trabalhos correntes de manutenção junto de entidades; B) Bens Móveis O cabeça de casal relaciona de forma totalmente desnecessária o recheio da casa de morada de família, com mais de 20 anos de antiguidade, apresentando valores totalmente utópicos e surreais, face à sua antiguidade e desgaste por se tratarem de bens usados quotidianamente. (…) Quanto à Verba 11 O cabeça-de-casal relaciona 1 serviço de chá e de café em porcelana no valor de €280,00, sendo que a aqui Interessada desconhece ou já não existe o serviço de café em porcelana, pelo que deverá ser excluído da relação de bens, e o serviço de chá em porcelana apenas tem um valor de………………………………….………………….……………….€80,00; (…) Quanto à Verba 14 O cabeça-de-casal relaciona 1 micro-ondas, da marca ... no valor de €350,00, valor este que a aqui Interessada desde já impugna, sendo que face à sua antiguidade e uso apenas tem um valor de…………………………….……………….…………….€75,00 (…) Quanto à Verba 46 O cabeça-de-casal relaciona 1 aparelho de ar condicionado, da marca ..., no valor de €1.145,00, valor este que a aqui Interessada desde já impugna, sendo que face à sua antiguidade apenas tem um valor de…………………………………………..€400,00: (…) Do Passivo Quanto à Verba 111 O cabeça-de-casal relaciona uma dívida do património comum no valor de 13.000,00€ a JJ, mãe do Requerente, a qual desde já se impugna, uma vez que tais obras foram realizadas com poupanças do casal, pelo que deverá ser excluída da relação de bens, sendo que em momento algum o casal solicitou qualquer empréstimo à mãe do cabeça de casal. (…) QUANTO AOS BENS EM FALTA Do ATIVO (…) Do PASSIVO B) Deve o Cabeça de Casal à aqui Interessada o valor de 5.000,00€ pela venda da moto, marca ..., matrícula ..-PX-.., sem a autorização da interessada e com o seu total desconhecimento, pelo preço de 10.000,00 Euros. (…) D) Deve a sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda., ao património comum do casal o montante de 19.500,00 Euros (dezanove mil e quinhentos euros), porque o casal vendeu as viaturas de marca ..., modelo ..., pelo preço de 8.000,00 Euros junto do Stand automóveis EMP03..., comércio de automóveis, com sede na Rua ..., ... ..., e um ..., modelo ..., pelo preço de 13.500,00 Euros (treze mil e quinhentos euros) vendido a troca ao Sr. DD, proprietário do stand denominado EMP05..., com residência na Rua ... ..., para que a sociedade do casal adquirisse uma viatura elétrica de MARCA ..., modelo ..., adquirida a esse mesmo Sr. DD, para que esta possa usufruir de benefícios fiscais, nomeadamente da dedução do IVA, no montante de 19.500,00 Euros. 2 – Na parte com interesse para o caso em apreço, o C.C. respondeu à reclamação nos seguintes termos: VERBA Nº 11 23. Por se afigurar manifestamente irrisório e irreal o valor de € 100,00 atribuído pela Reclamante à Verba nº 11, entende o cabeça de casal atribuir-lhe o valor de € 200,00. VERBA Nº 14 26. Por se afigurar manifestamente irrisório e irreal o valor de € 75,00 atribuído pela Reclamante à verba nº 14, entende o cabeça de casal atribuir-lhe o valor de € 220,00. VERBA Nº 46 56. Mantém o cabeça de casal o valor atribuído a esta verba de € 1.145,00. B) DO PASSIVO 115. Relativamente à verba nº 111 da Relação de Bens (crédito de JJ no valor € 13.000,00 sobre o património comum a partilhar), impugna-se, por falsa, toda a matéria a tal respeito alegada pela Reclamante. 116. É do perfeito conhecimento da Reclamante e, por isso está de manifesta má fé, que a supracitada credora emprestou ao casal a referida quantia de € 13.000,00 para fazer face ao custo das obras projetadas e que viriam a realizar-se no interior e exterior da casa de morada de família. 117. Tal montante correspondia ao pecúlio que a mutuária conservava em seu poder referente à venda de objetos de ouro pessoais. 118. Uma vez recebido de empréstimo o citado montante, e enquanto não se realizassem as obras, entendeu o ora extinto casal depositá-lo na conta bancária nº ...77 , aberta aos balcões do banco Banco 1..., titulada pelo seu filho KK já que, por se tratar de uma conta-jovem beneficiava de uma taxa de juro bastante mais elevada do que a que seria aplicada se o depósito fosse realizado na conta cotitulada pelos aqui Requerente e Requerida. 119. Destarte, em 20/06/2028 foi efetuado na supracitada conta nº ...77 o depósito da quantia de € 10.000,00. – Doc. nº 1. 120. Em 17/09/2018 foi efetuado na mesma conta um outro depósito de € 3.000,00, tudo perfazendo o montante de € 13.000,00. – Doc. nº 1. 121. Os sobreditos depósitos foram, por acordo da Reclamante e do Respondente, levantados em 21/01/2021 para fazer face aos pagamentos ainda devidos referentes às supracitadas obras. – Doc. nº 2. 122. É esta a verdade nua e crua dos factos, e falsa a ardilosa tese pela Reclamante urdida com vista a eximir o património comum do dissolvido casal da obrigação de restituição à mutuária do montante do seu crédito .D) DA ALEGADA NÃO RELACIONAÇÃO DA IMAGINÁRIA DÍVIDA DE € 5.000,00 DO PATRIMÓNIO COMUM À RECLAMANTE 131. Relativamente a “B) Deve o Cabeça de Casal à aqui interessada o valor de 5.000,00 pela venda da moto, marca ..., matrícula ..-PX-.., sem autorização da interessada e com o seu total desconhecimento, pelo preço de 10.000,00 Euros”, cabe esclarecer que, na constância do matrimónio e bastante tempo antes da separação de facto do casal, este era efetivamente dono de uma moto da marca ... com matrícula ..-PX-.., adquirida no estado de usada. 132. A denominada administração ordinária do referido bem sempre foi exercida pelo ora Respondente. 133. Cerca de 3 meses antes da instauração da ação de divórcio em ../../2022 e algum tempo antes da separação de facto, tinha o referido casal acordado na venda da referida moto, cujo preço de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) foi pelo mesmo recebido em numerário e afetado às despesas correntes do casal. – Docs. nrs. 3 e 4. 134. Inexiste, pois, qualquer crédito da Reclamante sobre o património comum referente à receita da venda da sobredita moto, pelo preço de € 2.500,00 (e não pelo o surreal e extragalático preço de € 10.000,00). F) DA ALEGADA NÃO RELACIONAÇÃO DA IMAGINÁRIA DÍVIDA ATIVA DE € 19.500,00 DA SOCIEDADE COMERCIAL SOCIEDADE EMP02..., UNIPESSOAL, LDA. 151. Relativamente a “D) Deve a sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda. ao património comum do casal o montante de 19.500,00 Euros (dezanove mil e quinhentos euros), porque o casal vendeu as viaturas de marca ..., modelo ..., pelo preço de 8.000,00 Euros junto do Stand automóveis EMP03..., comércio de automóveis, com sede na Rua ..., ... ..., e um ..., modelo ..., pelo preço de 13.500,00 Euros (treze mil e quinhentos euros) vendido a troca ao Sr. DD, proprietário do stand denominado EMP05..., com residência na Rua ... ..., para que a sociedade do casal adquirisse uma viatura elétrica de MARCA ..., modelo ..., adquirida a esse mesmo Sr. DD, para que esta possa usufruir de benefícios fiscais, nomeadamente da dedução do IVA no montante de 19.500,00 Euros.”, desde já se antecipa que com a supra transcrita trapalhada, labora a Requerida em manifesto erro. 152. O veículo de marca ..., modelo ..., foi adquirido no estado de novo, com recurso a financiamento bancário, pela sociedade comercial EMP02..., Unipessoal Lda. e, como tal, integrou o respetivo Mapa de Imobilizado. 153. Ao cabo de 3 anos de utilização, atentos os diversos problemas mecânicos de que padecia o veículo, a EMP02..., Lda. procedeu à amortização do valor do empréstimo que então subsistia e deu o referido veículo em troca de outro usado, de MARCA ..., modelo .... 154. Posteriormente, a EMP02..., Lda. tendo em vista, além do mais, reduzir custos, designadamente com a sua frota de automóveis, decidiu adquirir um veículo elétrico, usado, da MARCA ..., modelo .... 155. Aquando da celebração do contrato de compra e venda do citado veículo ..., a EMP02..., Lda. acordou com o vendedor que este retomaria como contrapartida do pagamento parcial do preço, o predito veículo ..., modelo ..., para o efeito avaliado em € 13.000,00. 156. Como parte do pagamento do preço do referido ..., entregou, também, a EMP02..., Lda. ao vendedor um cheque sacado sobre a sua conta bancária no valor de € 6.000,00. 157. Em face do teor da supra transcrita alegação da Requerida, manifesta é a avassaladora má fé com que a mesma litiga, 158. Porquanto bem sabe que, quer o veículo ... mod. ..., quer o .... ..., sempre foram propriedade da EMP02..., Unipessoal, Lda. 159. Ora, com o seu arrazoado, para além da citada má fé, demonstra também a Requerida a enorme confusão que faz entre o património do dissolvido casal e o património da pessoa coletiva EMP02..., Unipessoal, Lda. que, pela sua própria natureza não podem de modo algum confundir-se. 160. É, salvo melhor entendimento, quanto basta para arrasar as capciosas pretensões da Requerida no sentido da absurda, por inexistente, alegada dívida ativa da EMP02..., Lda., ao património comum. 161. Consequentemente, nada há, a tal respeito, a inscrever na Relação de Bens. * Da requerida suspensão da instância por existência de causa prejudicial:* O ora Recorrente requereu na primeira instância a suspensão da instância por existência de causa prejudicial, o que foi indeferido, pretendendo que tal decisão seja reapreciada no presente recurso. Para tal entende o Recorrente que a partilha da quota social relacionada na Verba nº 1 da Relação de Bens, titulada pelo cabeça de casal na sociedade comercial EMP02..., Lda, deve ser sustada até à decisão a proferir no processo nº 126/23...., pois “A causa de pedir nos referidos autos do processo nº 126/23.... consiste em alegados defeitos da obra de construção – casa de morada de família – que no Autor imputa à Ré EMP02..., Lda., emergentes de trabalhos realizados por esta no ano de 2018, portanto na constância do casamento dos ora Recorrente e Recorrida.”. Refere ainda que “Atentos os montantes indemnizatórios peticionados pelo Autor na sobredita Ação e os demais a liquidar em caso de total procedência da mesma, o valor global da condenação da Ré EMP02..., Lda. poderá ultrapassar o montante de € 300.000,00, o que implicaria inevitavelmente a situação de falência técnica desta microempresa e de iminente insolvência, em cujo caso a quota social relacionada na Verba nº 1 não teria qualquer valor.” Assim, no entender do Recorrente, o valor da mencionada quota só poderá ser determinado depois de conhecido o desfecho, com trânsito em julgado, da mencionada ação. Nos termos do art. 1092º, nº 1 – a) do C. P. Civil, que regula a suspensão da instância no processo de inventário, o juiz pode ordenar a suspensão da instância se estiver pendente uma causa em que se aprecie uma questão com relevância para a admissibilidade do processo ou a definição de direitos de interessados diretos na partilha, sem prejuízo do disposto nas regras gerais sobre suspensão da instância. Como referem Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, António Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres (in O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil, Almedina, pág. 45), “ O artigo [1092º] regula separadamente o regime da causa prejudicial (nº 1, al. a)) e o da questão prejudicial (nºs 1, al. b), e 2). O artigo regula apenas o regime das causas e questões prejudiciais essenciais, isto é, daquelas de que depende a admissibilidade do processo e a definição da consistência jurídica dos direitos sucessórios dos interessados directos (como a validade do título de vocação sucessória ou a definição das quotas ideais dos interessados). O art. 1093º dispõe sobre o regime aplicável às questões não essenciais, que são aquelas cuja resolução apenas condiciona a determinação do património hereditário a partilhar.” Acrescentam estes Autores que “O nº 1, al. a), concretiza as situações em que o juiz deve determinar a suspensão da instância com fundamento em causa prejudicial. a) Só preenche o conceito de causa prejudicial aquela em que o que nela for decidido se reveste de importância essencial para a partilha a realizar no inventário. Algumas causas podem contender com a admissibilidade do próprio inventário.”. A questão do valor de uma quota social ou de outro bem a partilhar, não se integra na noção de questão essencial previsto no nº 1 – a), do art. 1092º do C. P. Civil, pelo que, para a analisar a questão em apreço temos de nos socorrer das regras gerais do processo civil sobre a suspensão da instância com fundamento na pendência de causa prejudicial. Assim: Dispõe o art. 272º, nº 1 do C. P. Civil que o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer motivo justificado. “É questão prejudicial toda aquela cuja resolução constitui pressuposto necessário da decisão de mérito, quer esta necessidade resulte da configuração da causa de pedir, quer da arguição ou existência duma exceção peremptória ou dilatória, quer ainda do objecto de incidentes em correlação lógica com o objecto do processo, e seja mais ou menos directa a relação que ocorra entre essa questão e a pretensão ou o thema decidendum. Quando autonomizada como objeto de outra ação, constitui causa prejudicial, a qual pode constituir fundamento da suspensão da instância” (v. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, pág. 173. Conforme referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa (in Código de Processo Civil anotado, vol. I, pág. 315) o nexo de prejudicialidade entre uma causa e outra define-se assim: estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão de uma poder afetar o julgamento a proferir noutra; a razão de ser da suspensão, por pendência de causa prejudicial é a economia e a coerência de julgamentos; uma causa é prejudicial em relação à outra quando a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda. Vejamos: Não está em discussão o facto de a quota social ser um bem comum do casal. O casamento dos interessados foi dissolvido por divórcio. (artº 1788º, do C. Civil), o que fez cessar as relações patrimoniais entre os cônjuges (art. 1688º, do C. Civil). A lei faz retroagir os efeitos do divórcio, no tocante às relações patrimoniais entre os cônjuges, à data da proposição da ação de divórcio ou mesmo à data da cessação da coabitação entre ambos, embora neste último caso, só a requerimento de qualquer dos cônjuges (artº 1789 nºs 1 e 2 do Código Civil). Como referem Pires de Lima e Antunes Varela (in Código Civil Anotado, Coimbra Editora, 1992, Volume IV, pág. 561). “Com a retroacção - que significa que a composição da comunhão se deve considerar fixada no dia da proposição da acção e não no dia do trânsito em julgado da decisão e que a partilha dever ser feita como se a comunhão tivesse sido dissolvida no dia da instauração da acção ou na data em que cessou a coabitação - quer-se evitar o prejuízo de um dos cônjuges pelos actos de insensatez, prodigalidade ou de pura vingança que o outro venha a praticar desde a propositura da acção sobre valores do património comum”. Com efeito, como se diz no acórdão do STJ de 13/1/04 (in www.dgsi.pt ), “O princípio da retroactividade à data da proposição da acção de divórcio, dos efeitos deste, quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges, consagrado no art. 1789, nº1, do C.C., visa defender cada um dos cônjuges contra as delapidações e abusos que o outro possa cometer na pendência da acção, mas nada prevê relativamente à data em que é determinado o respectivo valor, para efeitos de partilha.” Contudo, como se realça neste mesmo Acórdão, “a comunhão dos bens comuns do casal, existentes à data da propositura da acção de divórcio, só termina pela respectiva partilha, nos termos dos arts 1326, 1353, 1381 e 1404 do C.P.C. e 2069 e 2079 do C. C.. Por isso, o valor da quota há-de ser o seu valor actual, reportado à data da partilha”. Tendo em conta o novo regime do processo de inventário, aplicável ao caso presente, na relação de bens, o valor das participações sociais é o respetivo valor nominal (v. art. 1098º, nº 1 – b) do C. P. Civil), no entanto, até à abertura das licitações, qualquer interessado pode requerer a avaliação de bens, indicando aqueles sobre os quais pretende que recaia a avaliação e as razões da não aceitação do valor que lhes é atribuído (v. art. 1114º, nº 1, do C. P. Civil). Assim, se o valor dos bens, designadamente de uma quota social, for impugnado, como acontece no caso em apreço, o seu valor deve ser fixado à data da avaliação. É esta a situação mais justa, tendo em conta que o valor de alguns bens, como o dos imóveis e das quotas sociais, se vão alterando ao longo do tempo e a partilha nem sempre é efetuada imediatamente ao trânsito da sentença de divórcio. Na verdade, a reclamação contra ao valor dos bens e a sua avaliação, visam determinar o justo valor dos bens e este deve ser fixado tendo em conta a data mais próxima possível da partilha, de modo que esta seja efetuada da forma mais justa possível. Resta saber se essa avaliação deve ser suspensa, à espera do resultado da ação proposta contra a EMP02... (processo nº 126/23....). Entendemos que não, como veremos de seguida. O casamento dos interessados foi dissolvido por divórcio em ../../2023 (transitado em 23/5/23) (processo nº 3041/22....), tendo a ação entrado em juízo em setembro de 2022 e constando da decisão que “se fixa no dia 8 de Julho de 2022, a data da separação do casal”. A ação contra a EMP02... foi instaurada em ../../2023, quando o processo de divórcio já corria os seus termos e refere-se a alegada responsabilidade daquela sociedade por cumprimento defeituoso de contrato, sendo a condenação da sociedade um acontecimento futuro e incerto, pois, obviamente, não há qualquer garantia de que a condenação em causa ocorra e, portanto, que tenha influência no valor da quota. Ora, como decorre do disposto do art. 1092º acima citado e também da própria filosofia do processo de inventário, a suspensão da instância nesta forma de processo deve ser efetuada apenas em casos excecionais, quando estão em causa questões que se revestem de importância essencial para a partilha, o que não acontece no caso em apreço. Na verdade, estando em causa a suspensão, no todo em parte de um processo de inventário, há que ter em consideração que tal suspensão “com fundamento em ação pendente e conexa pode eternizar as partilhas, dificulta a administração de cada um, os interessados só tardiamente entram na posse do que lhes vem a pertencer e causa graves embaraços ao fisco e aos herdeiros (…)” (cfr. Lopes Cardoso in Partilhas Judiciais, 1º vol., págs 205 e 207). Assim, o valor da quota social tem de ser o atual e não o futuro, como pretende o Recorrente. Confirma-se, pois, a decisão que indeferiu a suspensão da instância. Da alegada nulidade da decisão: O Recorrente alega que a sentença é nula por falta e fundamentação. A nulidade decorrente da falta de fundamentação da decisão encontra-se prevista no art. 615º, al b) do C. P. Civil. Os termos da motivação de uma decisão judicial estão definidos no art. 607º, nº 4 do C. P. Civil, sendo essencial a motivação para a legitimação da decisão judicial. Assim, o tribunal deve explicar as razões pelas quais decidiu em determinado sentido e não noutro, permitindo aos intérpretes dessa sua decisão perceber em que meios de prova alicerçou a sua convicção e qual a razão por que o fez. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (in Código de Processo Civil anotado, 3ª ed., 2º vol., págs 735 e 736) entendem que a nulidade existe quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão e não a mera deficiência de fundamentação. Conforme vem sendo decidido uniformemente pela jurisprudência, tal vício só se verifica quando se verifica a total omissão dos fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão. No caso em apreço vemos que, embora parcamente, a decisão se encontra fundamentada, pelo que não se verifica a nulidade arguida. Da análise do recurso relativamente à matéria de facto impugnada e às verbas aditadas à Relação de Bens: Na decisão recorrida excluiu-se, nomeadamente, a verba 46 da relação de bens que consiste em “1 aparelho de ar condicionado, da marca ...…………. € 1.145,00”. O Recorrente vem dizer que esta verba não deveria ter sido excluída uma vez que a divergência dos interessados relativamente à mesma é apenas respeitante ao seu valor. Com efeito, analisando a relação de bens e a respetiva reclamação, vemos que o Recorrente tem razão, pois a divergência dos interessados não respeita à existência desse bem, mas sim ao seu valor, pelo que, a verba deve manter-se e o seu valor ser fixado por um perito, já que nenhuma prova foi produzida quanto ao valor real do mencionado bem. (art. 1105, nº 3, do C. P. Civil). Verba nº 11 que consiste em “serviço de chá e de café em porcelana……………280,00€”. Na relação de bens, o C.C. atribuiu a esta verba o valor de 280,00€. Na reclamação, a interessada disse que à mesma verba deveria ser atribuído o valor de 80,00€. Na resposta à reclamação, o C.C. retificou o valor atribuído inicialmente, tendo-lhe dado o valor de 200,00€. Na sentença, o Sr. Juiz a quo, atribuiu à mencionada verba o valor de 280,00€, certamente por lapso, uma vez que não foi produzida qualquer prova sobre o valor real do bem e, por outro lado, o C.C. na resposta à reclamação admitiu que esse valor deveria ser reduzido para 200,00€, contudo este valor é ainda superior ao valor indicado pela Interessada, pelo que não há acordo quanto ao valor do bem. Assim, não pode considerar-se assente qualquer dos valores indicados pelos interessados, devendo o bem ser avaliado por perito. Verba nº 14, consistente em “1 micro-ondas, da marca ...………………………….350,00€” Na relação de bens o cabeça de casal atribuiu ao bem relacionado nesta verba o valor de € 350,00. Na Reclamação à Relação de Bens, a interessada impugnou o referido valor tendo atribuído ao micro-ondas o valor de € 75,00. Na Resposta à Reclamação, o cabeça de casal mudou o valor do bem para € 220,00. Na sentença, o Exmº Juiz a quo atribuiu ao bem o valor de 120,00€, no entanto, não foi produzida qualquer prova nos autos que permita atribuir tal valor, ou qualquer outro, ao bem em causa. Assim, também este bem tem de ser avaliado por perito, para que o seu valor real seja apurado. Na Relação de bens, o C. de C. relacionou a dívida de 13.000,00€, a CC, sua mãe. Esta verba foi impugnada pela interessada que disse que a dívida não existia. Na sentença, o Sr. Juiz determinou a eliminação dessa verba. O Recorrente não se conforma com esta decisão. Vejamos: O C.C. nas suas declarações referiu que a mãe vendeu ouro que lhe rendeu a mencionada quantia e, para que o produto dessa venda rendesse mais juros, depositaram essa quantia numa conta jovem, em nome do filho mais novo do casal. Em 2021, quando o casal fez obras na casa, a mãe emprestou-lhes a referida quantia, que ainda não restituíram. A interessada negou que a sogra lhes tenha emprestado o mencionado dinheiro. Disse que, efetivamente, o dinheiro foi depositado numa conta do filho para render mais juros, mas que, a certa altura, disse ao ora Recorrente que tinham de tirar o dinheiro da conta, pois o filho ia candidatar-se a uma bolsa de estudos e isso poderia prejudicar a sua obtenção. Foi ouvida a mãe do C.C. que disse ter confiado a quantia ao filho para este a guardar. Não se lembra de o ter emprestado ao casal. Os documentos juntos pelo C.C. apenas provam que o dinheiro foi depositado e depois levantado de uma conta em nome do filho do casal, desconhecendo-se a proveniência do dinheiro e quem o levantou e para quê. Não há assim qualquer prova convincente de que tenha ocorrido o empréstimo em causa, pelo que a verba foi bem eliminada da relação de bens. Pelo exposto, não há que considerar provada a matéria correspondente inserida nos factos não provados e que o Recorrente pretendia ver provada. Aditamento à relação de bens da verba nº 109-A. O Recorrente insurge-se contra este aditamento, dizendo que, da prova produzida e da experiência comum, é forçoso concluir que o preço da venda da moto ..., de matrícula ..-PX-.. foi utilizado pelo casal para fazer face às suas despesas. Analisando: A Interessada acusou a falta deste crédito na reclamação à relação de bens, dizendo que o C.C. vendeu o motociclo por 10.000,00€, sem o seu conhecimento e/ou consentimento. Dos autos consta um recibo de compra dessa moto por um terceiro, datado de 11/6/22, no valor de 2.500,00€. As declarações do C.C. foram no sentido acima referido, tendo dito que recebeu apenas 2.500,00€ por essa moto. A Interessada disse que o seu marido, na altura, comprou a moto às escondidas e guardou-a na casa da sogra para que a Requerida não tivesse conhecimento dessa compra e que a vendeu quando já estavam separados de facto, mas não indicou datas. Deste modo, a data e o valor a considerar como os da venda da moto terão que ser os constantes do recibo junto aos autos, na falta de outra prova. Como acima já foi referido, a lei faz retroagir os efeitos do divórcio, no tocante às relações patrimoniais entre os cônjuges, à data da proposição da ação de divórcio ou mesmo à data da cessação da coabitação entre ambos, embora neste último caso, só a requerimento de qualquer dos cônjuges (artº 1789 nºs 1 e 2 do Código Civil). No caso o divórcio foi decretado em ../../2023, tendo a ação entrado em juízo em setembro de 2022. A sentença considerou o casal separado de facto a partir de 8/7/22. Assim, a venda da moto ocorreu antes das mencionadas datas, ou seja, quando o casal, para efeitos legais, se encontrava a viver em economia comum, não havendo qualquer prova de que o valor em causa não tivesse sido usado em benefício do casal e/ou filhos. Deste modo, o valor da venda da moto não pode constar na relação de bens como crédito do património comum sobre AA referente à venda do mencionado motociclo. Determina-se, pois a exclusão da verba 109-A. Aditamento à relação de bens da verba nº 109-B. Na sentença foi aditada à relação de bens a verba nº 109º-B, com o seguinte teor; “109-B: Crédito do património comum sobre AA referente ao preço da venda da viatura ... ... €13.500.” A Interessada, na sua reclamação à relação de bens, acusou a falta deste valor, dizendo que “Deve a sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda. ao património comum do casal o montante de 19.500,00 Euros (dezanove mil e quinhentos euros), porque o casal vendeu as viaturas de marca ..., modelo ..., pelo preço de 8.000,00 Euros junto do Stand automóveis EMP03..., comércio de automóveis, com sede na Rua ..., ... ..., e um ..., modelo ..., pelo preço de 13.500,00 Euros (treze mil e quinhentos euros) vendido a troca ao Sr. DD, proprietário do stand denominado EMP05..., com residência na Rua ... ..., para que a sociedade do casal adquirisse uma viatura elétrica de MARCA ..., modelo ..., adquirida a esse mesmo Sr. DD, para que esta possa usufruir de benefícios fiscais, nomeadamente da dedução do IVA no montante de 19.500,00 Euros.”, O C.C. referiu que o veículo de marca ..., modelo ..., foi adquirido no estado de novo, com recurso a financiamento bancário, pela sociedade comercial EMP02..., Unipessoal Lda. Ao cabo de 3 anos de utilização, atentos os diversos problemas mecânicos de que padecia o veículo, a EMP02..., Lda. procedeu à amortização do valor do empréstimo que então subsistia e deu o referido veículo em troca de outro usado, de MARCA ..., modelo .... Posteriormente, a EMP02..., Lda. tendo em vista, além do mais, reduzir custos, designadamente com a sua frota de automóveis, decidiu adquirir um veículo elétrico, usado, da MARCA ..., modelo .... Aquando da celebração do contrato de compra e venda do citado veículo ..., a EMP02..., Lda. acordou com o vendedor que este retomaria como contrapartida do pagamento parcial do preço, o predito veículo ..., modelo ..., para o efeito avaliado em € 13.000,00. Como parte do pagamento do preço do referido ..., entregou, também, a EMP02..., Lda. ao vendedor um cheque sacado sobre a sua conta bancária no valor de € 6.000,00. Refere que a Requerida bem sabe que, quer o veículo ... mod. ..., quer o .... ..., sempre foram propriedade da EMP02..., Unipessoal, Lda. Nas suas declarações, Requerente e Requerido sustentaram as posições já vertidas nos seus articulados e acima indicadas. A testemunha MM, referiu que vendeu à sociedade EMP06... um ... elétrico e recebeu em troca uma carrinha BMW ..0 e um cheque no valor de 6000,00,00 emitido pela referida empresa. A carrinha ... estava em nome pessoal do AA. Apresentou documentos comprovativos do que declarou, cuja junção aos autos foi determinada em audiência. A testemunha EE, referiu ter um stand se automóveis, disse que o casal lhe vendeu um carro de marca ..., modelo ..., por 8.000,00€, que esta em nome da interessada. Tem ideia que compraram ou iam comprar outro carro com esse valor, mas não sabe mais nada sobre isso. Quanto ao valor do ..., modelo ..., não há qualquer prova concreta de que o mesmo tenha sido aplicado na compra do ..., pois o comprador do veículo nada sabe sobre o destino do produto da venda e, por outro lado, as declarações dos depoentes são contraditórias, não havendo razão para dar mais credibilidade a qualquer uma delas em detrimento da outra. Dos documentos juntos pela testemunha DD resulta que a transação por ele referida ocorreu em ../../2020 e, portanto, muito antes da separação do casal. Assim, o valor da venda da viatura, património do casal, não pode ser considerado no presente inventário. De qualquer modo, o crédito nunca seria sobre AA, uma vez que foi a sociedade a beneficiada com o valor do carro e não o Interessado. Deste modo, determina-se a eliminação desta verba. Ponto nº 9 dos factos provados: “AA adquiriu viatura ... e posteriormente adquiriu viatura ...23, vindo a vender esta por €13.500 ao stand, para aquisição do ..., e acrescentou cheque da sociedade, sendo esta a proprietária dos veículos ... e .... O ... pertencia a AA (não a EMP02... Lda). O Recorrente não concorda com a redação deste ponto por não corresponder à prova produzida. Propõe que o ponto em causa seja substituído pelos seguintes factos: “O casal adquiriu a viatura ... com matrícula ..-HX-.. registada em nome da Reclamante, tendo esta procedido à sua venda em 26/12/2020 pelo preço de € 8.000,00. Em 31/05/2010, a EMP02..., Lda. adquiriu a EMP04..., Lda., pelo preço de € 30.228,49 o veículo de marca ..., modelo ..., com matrícula ..-JE-... Posteriormente, em 2014, pelo preço de € 17.500,00 foi adquirido pela EMP02..., Lda. ao “EMP03...” o veículo usado de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-QE-.., tendo esse stand recebido em retoma pelo preço de € 15.000,00 o veículo ... com matrícula ..-JE-... Na aquisição pela EMP02..., Lda., em ../../2020, do veículo usado de MARCA ..., modelo ..., com matrícula ..-..-QR, pelo preço de € 19.500,00, foi recebido como retoma por DD (EMP05...), vendedor daquele, pelo valor de € 13.500,00 o veículo ... com matrícula ..-QE-.., e o remanescente do preço de aquisição foi pago através do cheque nº ...51 no valor de € 6.000,00 emitido por EMP02..., Lda. sobre a sua conta nº ...97 aberta aos balcões do Banco 1....” Foram estes factos que, efetivamente, resultaram da prova produzida, considerando-se aqui reproduzido o que acima foi dito a propósito da verba 109º-B. Assim, substitui-se o facto impugnado pelos factos sugeridos pelo Recorrente. Das custas: O Recorrente entende que a parte da decisão que fixou as custas a pagar pelos interessados padece de falta de clareza e de obscuridade. A decisão em causa é a seguinte: “Custas pelo cc e pela reclamante, fixando-se em cinco uc a taxa.”. Com efeito, a decisão não é clara pois não fixa a proporção das custas devidas por cada um dos interessados, desconhecendo-se ainda se cada interessado pagará 5UC de taxa de justiça (o que nos parece manifestamente exagerado tendo em conta, nomeadamente, a pouca complexidade da causa) ou se cada um pagará metade da taxa fixada. Ora, diz-nos o art. 615º, nº 1 – c) que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Alberto dos Reis (in Código de Processo Civil anotado, volume V, pág. 151) refere que a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. E acrescenta que, num caso não se sabe o que o juiz quis dizer, no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. O segmento da sentença acima transcrito é, pois, nulo por obscuridade, o que se declara. Nos termos do disposto no art. 665º, nº 1 do C. P. Civil, este Tribunal irá conhecer da questão relativa às custas. Diz-nos o art. 527º, nº 1 do C. P. Civil, na parte com interesse para o caso em apreço, que a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa. Por sua vez o nº 2 deste normativo preceitua que se entende que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for. Assim, paga as custas quem perde a ação ou, no caso de recurso o recorrente ou recorrido, caso o recurso tenha ou não provimento. Na primeira instância, ambos os Interessados foram vencedores e vencidos, sem que se possa dizer que um foi vencedor ou vencido em maior proporção que o outro. Deste modo, fixam-se as custas da ação em partes iguais, mantendo-se a taxa de justiça nas 5UC, mas determinando-se a repartição do pagamento desta taxa por ambos os Interessados, em igual porção. Com os mesmos fundamentos, se fixam as custas do recurso em partes iguais. * Decisão:* Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação e consequentemente, determina-se a alteração à matéria de facto provada nos termos acima referidos e determina-se a eliminação da relação de bens das verbas 109º-A e 109º-B, mandadas aditar na decisão recorrida. Declara-se a nulidade da decisão recorrida no segmento respeitante às custas, fixando-se estas em partes iguais. Mantém-se no restante a decisão recorrida. Custas a cargo de Recorrente e Recorrida em partes iguais. Guimarães, 30 de janeiro de 2025 Alexandra Rolim Mendes António Figueiredo de Almeida José Cravo |