Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
81/17.8T8MTR.G1
Relator: CONCEIÇÃO SAMPAIO
Descritores: AQUISIÇÃO DO DIREITO POR PREOCUPAÇÃO
AQUISIÇÃO DO DIREITO ÀS ÁGUAS
PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - A preocupação (pré-ocupar, ocupar antecipadamente) é um meio de aquisição por um particular, até 21 de março de 1868, das águas de uma corrente não navegável nem flutuável, mediante a construção de obras permanentes de captação e derivação. Essas obras tanto podem consistir numa presa ou açude, como num canal ou engenho de derivação, entre outras. Assim ocupadas as águas tornam-se particulares (art. 1386.º, n.º1, al. d), do CC).
II - Só é possível o reconhecimento da preocupação desde que o aproveitamento seja acompanhado de obras permanentes de captação e derivação, constituídas até 21 de março de 1868.
III - A análise dos vestígios da edificação será, por conseguinte, muito importante para a demonstração da preocupação, mas prova terá de ser completada, normalmente, com recurso à análise documental (documentos escritos com referência àquele uso) e depoimento testemunhal (que atestem esse aproveitamento por conhecimentos transmitidos pelos seus antepassados).
IV – Invocando-se a inversão do ónus da prova com a alegação da destruição da obra pela contraparte, tal inversão só operará se se demonstrar a destruição da obra imputável a título de culpa à parte contrária e que esse meio de prova era o único que tornaria possível a prova da existência do açude e do modo de aproveitamento da água.
V - A prova de um facto requer o preenchimento do designado standard mínimo da prova, exigindo-se que, através dos meios de prova que foram apresentados, seja possível afirmar que o facto é verosímil, no sentido de excluir, segundo o padrão que na vida prática é tomado como certeza, outra configuração da realidade dada como provada.
VI - Só é possível reconhecer-se a preocupação como título aquisitivo anterior a 21 de março de 1868, se existirem obras permanentes de captação e derivação de águas, construídas até àquela data e o seu aproveitamento desde então sem abandono ou destruição da obra.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

AA e BB intentaram a presente ação declarativa de condenação contra CC e mulher DD e EE e mulher FF, peticionando que estes sejam condenados a:

a) reconhecerem aos autores o direito de propriedade do prédio descrito no artigo 1º da petição inicial;
b) reconhecerem aos autores o direito de propriedade da água da ..., em comum, e qualitativamente igual aos dos restantes consortes, para lima do seu prédio;
c) reporem o açude que destruíram no leito da corga recolocando as pedras que o compunham, no prazo de oito dias, tudo de forma a manter no local a cota suficiente para os autores poderem tornar a água para levada e através dela a conduzirem até ao seu prédio;
d) respeitarem esse direito dos autores e a absterem-se de o voltar a violar;
e) indemnizar os autores pelos danos causados na quantia de € 627,00 por cada ano que se mantiver a situação de violação que invocam, desde o ano de 2017.
Alegam que oi prédio rústico de que são donos confronta, do lado nascente, com a margem direita da ..., cuja corrente de água provem de várias nascentes e de águas pluviais que se junta no cimo do Monte dos ... e corre, no inverno, pela encosta, formando um corgo (ou córrego) que desagua no Rio .... Invocam o modo de utilização de tais águas no período de rega, durante o verão, pelos prédios situados para lá da margem esquerda e para nascente da corga.
Mais aduzem que os antepossuidores desses prédios muito antes de 21-03-1868, procederam à construção de degraus ou açudes de pedra, no leito da corrente, por forma a permitir a derivação da água para limar esses mesmos prédios, formando lameiros, ou prados permanentes para pastagem do gado.
Acrescentam que, uma vez que o seu prédio se encontra numa quota superior ao leito da corga, foi no prédio (hoje) de GG que se construiu o açude e a levada de derivação de águas, formando um aqueduto em direção ao seu prédio, explicando o curso da água até àquele.
Porém, em 2016 não puderam tapar a água da corga para limar o seu prédio, por alguém ter retirado uma das pedras principais do açude, sendo que, mesmo após recolocação de uma pedra, só parte da água pôde ser tapada.
E que em 27-01-2017 os réus CC e FF entraram no aludido prédio e, com recurso a uma retroescavadora, destruíram o açude, empurrando as pedras pela corga abaixo, o que determinou que se tornasse impossível limar o seu prédio nos preditos moldes, o que lhes causou danos.
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Os réus contestam que os autores tenham qualquer direito sobre a água da ... que existe há mais de 100 anos, e corre a céu aberto, sem quaisquer obras realizadas pelo homem, defendendo que os autores apenas dispõem das águas sobrantes, quando as há, que caiem num aqueduto e são conduzidas para o seu prédio.
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Foi admitida a intervenção provocada, do lado passivo, de HH, II, JJ, KK e LL, tendo os mesmos sido citados nos termos do disposto no artigo 319.º do Código de Processo Civil.
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Em virtude do falecimento dos réus MM e EE, foram habilitados os seus sucessores, para com eles prosseguir a ação.
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A final foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, julgo a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, parcialmente procedente e, em consequência, decido:
a) Declarar que o prédio rústico, composto de lameiro e cultura arvense de sequeiro, com a área de 6688m2, no ..., Lugar ..., Freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o artigo ...09 e inscrito na competente matriz rustica da União de Freguesias ..., ... e ... sob o artigo matricial ...32.º pertence aos autores AA e BB;
b) Absolver os réus de todos os demais pedidos contra si dirigidos nesta ação pelos autores;
c) Absolver os autores AA e de BB do pedido de condenação como litigantes de má-fé que lhe foi dirigido.
Custas a cargo dos autores e dos réus, na proporção do respetivo decaimento. Notifique e registe.».
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Inconformados com a sentença, os autores interpuseram recurso, finalizando com as seguintes conclusões:

Da ilicitude da ação direta:
1 – Em Janeiro de 2017 os Réus CC e FF, contrataram uma retroescavadora e destruíram o açude de pedras no leito da ..., aldeia de ..., que os Autores alegaram existir com sinais nomeadamente de desgaste das pedras pela passagem da água, há mais de 150 anos e se destinava a permitir a derivação da água publica para uma levada ou rego de terra no prédio de um terceiro, mas direcionada para o prédio contiguo dos Autores, para ser limado.
Os Réus se consideravam que o açude lhes violava algum direito deles podiam recorrer ao Tribunal propondo uma ação contra os Réus, e até podiam requerer uma providência cautelar, o que a Sentença reconhece expressamente.
Mas não podiam “fazer justiça por suas mãos”, sendo neste caso a ação dos Réus ilícita.
No Instituto da ação direta não se questiona se os seus agentes tem ou não o direito, antes e somente releva a ilicitude a o exercício do suposto direito dessa forma direta, quando se podia, sem risco do próprio direito, recorrer à ação judicial. (Foram violados, poisos Arts.1º do CPC e 336º do C. Civil)
Sendo ilícita a ação dos Réus, terão de ser eles condenados a reparar o dano repondo o açude com as pedras de forma a puder ser derivada a água e encaminhada para o prédio dos Autores, nos termos previstos nos Arts. 483º, nº 1 e 562º do C. Civil.
Da inversão do ónus da Prova:
2 – Sem prescindir do já alegado se dirá e questionará o seguinte:
Nos Arts. 29º e 30º da Petição os Autores invocaram que o “açude destruído era composto por pedras de granito que se encontravam gastas na parte superior, pela passagem de água ao longo dos séculos à semelhança das pedras dos demais açudes existentes na ..., o que atestava objetivamente a sua grande vetustez”.
E no Art. 31º alegaram que “os Réus ao destruírem ilícita e culposamente essa obra, tornaram impossível o referido meio de prova relativo à sua antiguidade”.
O Art. 344º nº 2 do C. Civil preceitua que “há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei do processo mande especialmente aplicar à desobediência ou a falsas declarações”.
Tal prova seria essencial já que mostraria, ou não, se a obra do açude que permitia a derivação ou desvio da água para a levada ao aqueduto, era recente, ou se teria séculos, ou pelo menos mais de 150 anos.
Ao contrário do sufragada na Sentença, era este tipo de prova que se tornou impossível, e era essencial para a prova da propriedade da água adquirida por preocupação sabendo-se que o correspondente direito invocado pelos Autores se traduz e se prova pela existência da obra feita na corrente da água publica a revelar a sua derivação para uso e apropriação no prédio particular em causa. E estando como está provado que o leito da Corga se situa a uma cota inferior ao terreno da levada, e muito inferior ao prédio dos Autores, só era possível o desvio da água existindo um açude no leito da corrente publica a uma cota igual à do terreno onde existe a levada ou rego.
De facto conforme se decidiu no “Acórdão, do T. R. Lisboa de 03/12/2009 – Proc. 4258/07.6TVLSB.L1.G1 – in www.dgsi.pt” a inversão do ónus da prova exige a verificação dos seguintes pressupostos: a) Que a prova de determinada factualidade, por ação da parte contrária, se tenha tornado impossível de fazer; b) Que tal comportamento, da mesma parte contrária, lhe seja imputável a titulo culposo?
Também no Acórdão do T.R. Coimbra de 24/05/2022 – Proc. 3033/16.4T8LRA.C2 – in www.dgsi.pt se fixou que “A inversão do ónus da prova a que alude o Art. 344º , nº 2 do C. Civil, não depende da invocação das partes, desde que os factos permitam os seus pressupostos” e o “onerado com a prova, possa conseguir a inversão do ónus, deve demostrar que a) existe ou existiu um meio de prova, com relevância para a decisão da causa (pressuposto positivo do nexo de consolidada); b) não restam outros meios de prova relevantes (pressuposto negativo do nexo de ccausalidade); c) o mesmo se encontrava na posse da contraparte ou em condições de ser alterado pelas contrapartes (componente para o pressuposto da ilicitude e da culpa)”.
E é manifesto que tais pressupostos se verificam no caso dos presentes Autos.
A Sentença violou pois também o Art. 344º nº 2 do C. Civil, devendo considerar-se provado a existência do açude desde antes de 21/03/1868, uma vez não terem os Réus logrado provar o contrário.
Da prova da matéria de facto, sem prescindir também do já alegado:
3 – a) No item 8 dos factos provados o Tribunal considerou que “com data não concretamente apurada, mas posterior ao mês de Setembro de 2016, os Autores colocaram uma pedra no leito da Corga, no prédio superior, sito a norte da estrada nacional, (que é Municipal) à direita desta no sentido ..., com vista a permitir a derivação das águas daquele por um rego localizado no mesmo prédio formando um aqueduto a céu aberto, em direção ao prédio identificado no nº 1” (prédio dos Autores)”.
E na fundamentação consta “no que tange à factualidade descrita nos nrs. 8 e 9, o Tribunal considerou desde logo a confissão vivificada na petição inicial no que concerne à colocação da pedra no leito da Corga, sendo que quanto a este aspeto, a Autora BB também o descrevesse, acrescentando que aterraram desse modo para resolver o problema de terem ficado sem acesso à água da Corga. Aliás, quanto à questão da colocação o/e retirada de pedras do leito da Corga, NN (habilitado) afirmou que tinha havido em tempo que uns tiravam e outros retiravam as pedras, referindo-se aos “herdeiros da água”, e aos Autores”.
Ora, nos Arts. 15º a 19º, inclusive da Petição, o que consta é o seguinte:
15º Em Setembro de 2016 os Autores, quando se propunham tapar a agua da corga para limar o seu prédio, não o puderam fazer por ter alguém retirado uma das pedras principais do açude.
16º Mesmo depois de os Autores terem recolocado apedra para reposição do degrau, só parte da água pôde ser tapada para o prédio dos Autores,
17º continuando a restante a correr com abundância pela corga abaixo sem encontrar obstáculos.
18º Em Janeiro de 2017 receberam os Autores uma carta de uma Senhora Advogada, alegando representar vários nomeados consortes da água dos Leiros, declarando que seriam eles titulares da água de rega (e não de lima), e notificando os Autores que iriam retirar o “penedo a fim da água seguir o seu curso normal”. (Doc. junto sob o nº 3)
19º E em 27/01/2017 o Réu CC e a Ré FF entraram no prédio da levada, juntamente com uma retroescavadora, pertencente e conduzida por OO, a quem mandaram destruir, e destruíram totalmente o açude, empurrando as pedras pela Corga abaixo.”
De facto, o que consta na petição e das transcritas declarações de Parte, nomeadamente da Autora BB, é o facto dos Autores terem reposto, ou tentado repor uma pedra do açude que alguém retira antes; e não terem eles Autores colocado uma pedra de novo, para permitir derivarem água que antes não possuíam.
Mesmo da declaração do Réu NN não foi de “põe e tira, mas sim de tira e põe” acabando a resposta em termos de pergunta “um tira e o outro põe não é?”
De facto, conforme se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra de17/03/1978–C. Jurisprudência 1978-2 pag.730, “adquirido por preocupação o direito de propriedade sobre águas de corrente não navegável nem flutuável, se o adquirente nunca excedeu no aproveitamento o caudal originalmente utilizado, não implica a caducidade, com devolução das mesmas ao domínio publico, a alteração da forma de aproveitamento, pois que a lei pretende que tal aproveitamento se faça pelo processo técnico que melhor utilidade sócio-económico lhe confira”.
Também se decidiu no A. Supremo Tribunal de Justiça de 18/12/2012–Proc.204/07.3TBOFR.C1.S1, in www.dgsi.pt/JSTJ.NSF, que “o melhoramento ou reparação de obra existente com base em preocupação destinada à apropriação das Águas Públicas, não é em si violador do domínio publico sobre águas públicas, sê-lo-á a captação de águas para além das que sejam necessárias para irrigação das propriedades beneficiárias, critério a considerar caso não esteja fixado o volume de água represadas por preocupação (Art. 1386º alínea d) e nº 2 do CC de 1966)”.
Assim, deve o item 8 dos factos provados ser eliminado ou considerado não provado, devendo na redação do item 9 ser substituído o termo “tal” pelo termo “existe um”.
Deve, também nessa sequência, ser eliminado do item 12 na parte final, o texto “nomeadamente as colocadas pelos Autores, nos termos referidos no nº 8”, mantendo porém a frase “pela referida corga”.
b)- Aqui chegados importa apreciar se os elementos de prova carreados nos Autos são suficientes para se saber se o açude que permitia aos Autores tornarem a água, para o seu lameiro a através de um rego diretamente para aduelas do aqueduto sob a estrada, existia já antes de Setembro de 2016, e se ainda se encontram elementos que indiciem ser tal existência muito antiga.
1 - Na 1ª inspeção judicial ao local ocorrida no dia 12/03/2019 ficou a constar na ata que “tal como referido no Artigo 9º da petição inicial, através da captação de imagem fotográfica 3 e 4, foi possível constatar a existência de pedras no leito da corrente na sua margem lateral.
Confrontando essa imagem se vê que as referidas pedras laterais se encontram encastradas aparentando estando no local há muito tempo.
Indiciam pela sua colocação que se destinavam a apoio lateral das pedras do açude.
2 - Outras provas que indiciam a existência do açude antes de Setembro de 2016, são também outras fotografias juntas aos Autos, que mostram a existência do rego da levada até à Corga, todas antes de 2016.
Foi junto pelos Autores uma imagem fotográfica do Google, na Audiência Prévia de folhas 86 até 89V, que mostra com nitidez que em Março de 2010 o rego vai até à Corga.
A este propósito, será altura de por côbro a uma confusão que parece ter por parte dos réus atravessado os tramites do processo como questão essencial.
De facto os Réus, quer por documentos e fotografias juntas, quer pelas declarações de parte da Ré FF e dos Réus habilitados elegeram dar relevância ao facto de o rego ou levada ter sinais ou marcas que mostrassem não chegar o mesmo até à corga e apenas servindo para amparar as águas sobrantes e as encaminhar até à manilha da estrada.
Porém, importa esclarecer que as águas em discussão são águas de lima, que irrigam os prédios, se aquelas não secarem, desde Outubro/Novembro até Junho. No restante período, ou seja de Junho até Outubro os lameiros ficam em pousio, já que são prédios de sequeiro, e não de regadio. Assim um rego de terra como é o alegado pelos Autores, pode até ser feito e aberto todos os anos, não se tratando duma obra perene, como são os açudes construídos de pedras, ou outras obras e sinais duradouros.
Por isso não é pela existência do rego que se concluirá só por si serem os Autores proprietários da água preocupada.
É que sendo os Autores/proprietários da água preocupada teriam sempre direito a conduzi-la por prédio alheio formando aqueduto, se não poderem, como é o caso, conduzi-la diretamente da Corga para o seu prédio, direito que sempre teriam ao abrigo do prescrito no artigo 1561º do C. Civil.
A relevância do rego, nomeadamente registado nas fotografias que mostram chegar até à Corga, é o de indiciaram que nesse caso se destinaria a apanhar e conduzir as águas da Corga. Mas para isso tem que existir o açude ou degrau.
3 –Na 2ªinspeção ao local ocorrida em 18/05/2022 também foram pelo Tribunal tiradas fotografias até mais nítidas que se passam a nomear:
Nas fotografias nrs. 12 e 13 vê-se ainda do lado esquerdo da Corga a pedra de apoio lateral das pedras do açude destruído em 2017, e uma pedra tombada de lado que seria de a apoio do lado direito, que a Autora como declarou ter sido em dezembro de 2020 derrubado um dos lados, conforme se transcreveu no corpo das alegações.
Nas fotografias nrs. 14, 15, 16 e 17 vê-se muito nitidamente as duas pedras de guia e condução da torna enterradas no solo junto à Corga, as quais, como as demais, apresentam sinais de serem antigas, e gastas, ao longo do tempo, além de cobertura de musgo.
4.Também constitui uma prova não só no sentido da necessária existência do açude como do facto dos Autores, e seus anteriores, usarem já há muito tempo a condução da agua através do prédio do GG, a carta junta aos Autos pelos Réus a fls. 21, dirigida à Distinta Mandatária dos Réus, onde uma alegada filha do nomeado GG, dizendo que o pai ficou “chateado” por saber que o Autor AA anda tendo acesso não permitido nos seus imóveis, nomeadamente para fins de uso não autorizado do uso do rego de água e seu desvio, acrescentando que “se em algum tempo passado foi autorizado o seu uso da água, dentro do terreno, isso pode ter ocorrido quando meus avós ainda eram vivos e moravam em ..., ...”.
Sobre tal missiva a Senhora Juiz comentou que por ela “continuamos sem saber de que águas se trata – serão as águas sobrantes ou as da ...?”
De facto, se a carta expressamente se refere que o “uso da água e seu desvio”, não se podia referir a águas sobrantes, já que essas correm naturalmente por todo prédio abaixo e quem as solta são apenas os proprietários ou utentes desse prédio, e só eles poderão ter algum interesse em desvia-las, enquanto os Autores em relação a essa água só lhes interessa desvia-las quando chegam a cair no seu prédio após atravessarem a estrada.
Assim o texto da carta só permite uma leitura ou interpretação que é a de se referir à água derivada ou desviada da Corga.
5. Não nos parece por outro lado que os depoimentos quer das partes quer das testemunhas levem a concluir pela ausência de prova suficiente por parte dos Autores, pelo que tais declarações não podem constituir ou relevar contraprova, precisamente pela sua natureza de pura negação, sem nenhum esclarecimento positivo, e na maior parte dos casos referiram factos que lhe foram ditos por outras pessoas.
Nas declarações de parte da Autora BB, já transcritas supra bem como a sua fundamentação expressa na Sentença a páginas 14 da mesma, mostra que a Autora esclareceu com mais pormenores relevantes a matéria peticionada, não tendo a Meritíssima Juiz posto em causa a credibilidade do seu depoimento, e a mesma declarante nesses esclarecimentos descreveu com clareza todos os pontos relevantes e passíveis de prova direta e indireta por ilação.
Do depoimento da testemunha PP, irmão da Autora, a Meritíssima Juiz considerou ter ficado prejudicada a credibilidade do seu depoimento, sem que todavia lhe parecer não querer a testemunha prestar-se a um relato sincero.
Ora a Senhora Juiz depois de atestar que a testemunha explicou conhecer bem o lameiro, que ajudou a irmã do Autor no trabalho, garantindo que nessa altura o rego ia até à corga e fazem a torna da água da corga, mas que “logo de seguida referiu que nunca tinha visto o dito rego de águas mesmo até à corga, e bem assim que nunca viu tornar a água naquele local”, e atestou depois que “ainda conseguiu descrever a corga e o dito rego, aproximadamente no ano de 1972, quando ajudava a irmã do cunhado Autor, que há sete ou oito anos foi tornar a água com o Autor, e até 1976 limpava o rego em causa até à corga”.
É evidente que tal como a Senhora Meritíssima Juiz descreve estaríamos perante uma declaração contraditória em si mesmo pondo em causa a credibilidade da testemunha.
Porém, como se constata das declarações da testemunha PP ao dizer que não sabia quem tornava a água e que ali para cima não sabia nada, respondia à pergunta de quem cultivava o terreno dos QQ, ou da ..., que é o prédio do dito GG, e a testemunha o que disse não saber era quem e aonde era tornada a água para irrigar esse lameiro, e não quem tornava a água nesse lameiro para irrigar o lameiro dos Autores AA e BB.
A Senhora Juíza confundiu manifestamente o sentido das declarações, e assim sendo, como é, relevado esse erro, terá de se considerar que a própria Senhora Juíza reconhecia a credibilidade ao depoimento da testemunha, já que ela própria reconheceu nele “não lhe parecer querer furtar-se a um relato sincero”.
Quanto à Ré FF, interveniente principal RR, irmão da Ré II, para além da repetitiva irrelevância sobre a dimensão do rego de terra que só era usado para limar no inverno, não sendo necessariamente uma obra fixa e perene, todos afirmam que pelo menos há 10 anos os Autores tapavam a água da corga e a tornavam para o seu lameiro, o que contraria atese dos Réus de que não existia na corga nenhum açude e que os Réus só em fins de 2016 é que colocaram no leito dela uma pedra ou pedras para “trancar” as águas, deve dizer-se ainda que a testemunha II apesar do mostrado comportamento, confirmou que os Autores tinham direito à água, e só notando a justificação tentou emendar dizendo que a água da chuva é de todos, quando não era, propositadamente dessa água que se falava e é claro isto sem falar nas demais provas documentais como as fotografias e a carta da filha do brasileiro GG, a confirmar que os indícios da existência do açude adiantados pelos próprios Réus, se estendem afinal a épocas muito mais distintas e antigas.
Tudo isto sem prejuízo do reconhecimento do invocado inversão do ónus da prova.
Caberá porém destacar as declarações da Ré SS que mostrando embora algum comprometimento com os demais Réus, não consegui deixar de dizer a verdade: (Sessão de 18/05/2022 – minuto 00.03.00)
Meritíssima Juiz
Ele também… ou seja, o Senhor AA e a Senhora BB também tapavam para receber a água?
SS
Também, quando podiam tapá-la para o deles tapavam-na.
Meritíssima Juiz
Mas faziam isso como a senhora fazia também?
SS
Faziam.
Meritíssima Juiz
Como todos os outros?
SS
É.
Meritíssima Juiz
O Senhor AA e a Senhora BB tapavam a água como todos os outros faziam, é isso?
SS
Ela e ele… não tinham direito a tapá-la, mas eles tapavam na… às escondidas.
Meritíssima Juiz - 00:07:01
Ah, então não era como os outros.
SS
Pois, era, tapavam-na às escondidas, tapavam. Que eles não tinham direito a tapar aquela água.
Meritíssima Juiz
Porque é que diz isso? Porque é que não tinham direito?
SS
Isso já verdadeiramente já era de tempos antigos, já não sei.
Meritíssima Juiz
Já não sabe. Mas a senhora disse-me que não tinha direito, mas é assim, a minha pergunta é: porque é que os outros lameiros tinham e aquele não?
SS
E eu agora é que lhe vou explicar?
Meritíssima Juiz
Não sabe, é isso?
SS
Não sei.
Tratando-se de água preocupada da corrente pública a prova do correspondente direito à água reside na existência de obra visível e permanente que revele a derivação da água do rio, ribeiro ou correga para o prédio a que o direito especificamente se destina (Art. 1397º do C. Civil).
A publicidade reside na existência dessas obras, ao contrário da aquisição da água de fontes ou nascentes por usucapião em que a publicidade se refere à posse e uso e fruição da coisa.
Assim, ao contrário do que em momentos do presente processo pareceu dar-se relevo negativo ao facto de o exercício do direito ser com discrição e até a coberto dos olhos dos consortes, ou de noite, isso é próprio da natureza desse direito.
c) Também não podemos concordar com os juízos expressos em relação ao depoimento da testemunha QQ.
De facto a testemunha foi chamada ao local em 2018 a pedido do signatário apos este ter procurado saber se ainda existia algum antigo guarda Rios que tivesse à sua responsabilidade a região em causa.
O seu depoimento para além da utilidade de esclarecimento do Tribunal acerca do funcionamento dos serviços hidráulicos já extintos, e dos atuais serviços do Ministério do Ambiente, e das funções dos Guarda Rios, a testemunha como técnico especialmente habilitado do conhecimento das obras necessárias à derivação de águias para regadio ou lima, atestou no local o que afinal as fotografias colhidas já na inspeção judicial de 18/05/2022 também mostram, as já referidas fotografias nrs. 12, 13, 14, 15, 16 e 17, explicando a função de cada pedra observada.
Com exceção agora da pedra de apoio lateral do lado poente, que atualmente já não existe, e que a Autora BB nas circunstâncias declarou ter sido retirada (por alguém) em 2020, conforme já foi transcrito atrás.
Notaremos ainda os depoimentos da Ré TT e dat estemunha CC.
Ora, para além da testemunha e da Ré JJ declararem factos antes de lhe ser perguntado, o que cria a suspeita de ensaio prévio, e portanto tanto bastava para descreditar os depoimentos, apura-se ainda que segundo declararam, a JJ ia em sentido contrário e se cruzaram. A testemunha diz que vinha da caça, e a Ré também diz e até que viu a testemunha. A Ré vive em ... como declarou e a testemunha vive em ... como declarou. O local dos lameiros ficam junto à estrada entre ... e .... Ambos dizem que estava a anoitecer. Ambos se cruzaram em Automóveis, pois a Ré com certeza que não vai para a sua terra ... a pé, e o caçador segundo o declarado até trazia o atrelado. O lameiro do dito GG é visível, conforme se constata pelas fotografias, por quem mesmo de automóvel venha dos lados de ... para ..., como diz o caçador, mas não é visível para quem circula em sentido contrário, (só se for pelo retrovisor), pelo que a Ré JJ dificilmente poderia ter visto nas circunstâncias nomeadas, fosse o que fosse, no prédio do Bento.
Acresce que ambas dizem que viram a máquina a escavar, e não a colocar pedras na Corga, a Ré JJ acabou por dizer que foi só ver as pedras no dia seguinte.
Embora na fundamentação a Senhora Juiz não justificasse a prova do item 8 nestes dois depoimentos, não podemos deixar de apontar as incongruências dos mesmos, tendo em conta que a alegação na Contestação, da colocação de pedras na Corga é matéria de exceção, e, mesmo que não se desse a inversão do ónus da prova, o item 8 sempre deve ser considerado não provado.
Por outro lado, a matéria dos itens tida como não provada, deverá ser por este Tribunal da Relação considerada provada, nomeadamente o de os Autores serem consortes e proprietários da água da ... por preocupação de águas publicas.
A prova da existência de obras no leito da Corga, e da sua antiguidade, apesar da destruição do açude pelos Réus em 2017, ainda se relevam por sinais nomeadamente as pedras de apoio lateral e as das guias do tornadouro visíveis nas fotografias obtidas pelo Tribunal nas duas inspeções judiciais, para além também do facto de segundo os Réus, os Autores só tornarem a água depois de 2012, o que só por si contraria a outra alegação do açude só existir desde 2016, pois sem o açude não era possível tornar a água,  e por outro lado as testemunhas dos Autores, UU e PP, o depoimento da Autora BB, que o Tribunal reconheceu credível, até da testemunha dos Réus, a própria Ré DD, atestaram que os Autores já tornavam a água há muito ou desde sempre, acrescendo o facto da fotografia do Google de 2010 – data em que passou a existir o Google – mostrou que o rego da levada em março desse ano chegava até à corga.
 Tratando-se de obras reportadas à data anterior a 21/03/1868, que constituem o pressuposto essencial do direito invocado de aquisição de águas por preocupação, sempre teria o julgador para apreciar os factos provados de recorrer a indícios, e a ilações assentes no circunstancialismo global, na sua experiência comum e na lógica.
A tudo isso, sobrepõe-se porém no presente caso os efeitos da ilegítima e ilícita ação direta, bem como pela destruição culposa do açude pelos Réus, se inverter o ónus da prova, ou seja a exigência de se lhes caber aos Réus a prova de inexistência do referido açude.
A Sentença violou, assim, pelo menos os Arts. 1º e 615º nº 1 alínea b) do CPC e 336º nº 1, 344º nº 2, 483º nº 1 e 562º do C. Civil.
Pugnam os recorrentes pela alteração da matéria de facto e consequente revogação da sentença substituindo-se por acórdão que julgue a ação totalmente procedente.
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Foram apresentadas contra-alegações pelos recorridos, que pugnam pela improcedência do recurso e manutenção do decido.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

As questões a apreciar no presente recurso são as seguintes:

- a natureza da prova na aquisição do direito por preocupação;
- a inversão do ónus da prova prevista no artigo 344.º n.º 2 do Código Civil;
- a modificabilidade da decisão da matéria de facto;
- as condições para a aquisição das águas por preocupação.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
3.1.1. Factos Provados

Foram dados como assentes na primeira instância os seguintes factos:
1. O prédio rústico, composto de lameiro e cultura arvense de sequeiro, com a área de 6688m2, no ..., Lugar ..., Freguesia ..., concelho ... encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial sob o artigo ...09 e inscrito na competente matriz rustica da União de Freguesias ..., ... e ... sob o artigo matricial ...32.º.
2. Pela Ap. ... de 2007/10/09, a aquisição de tal prédio foi inscrita, na proporção de 4/5, a favor de AA, casado no regime de comunhão geral com BB, por partilha judicial.
3. Pela Ap. ... de 2008/03/06, a aquisição de tal prédio foi inscrita, na proporção 1/5, a favor de AA e de BB, casados entre si no regime de comunhão geral, por usucapião.
4. Os autores AA e BB, por si e pelos seus antecessores, há mais de 30 anos, sempre utilizaram e fruíram o prédio rústico descrito no n.º 1), nomeadamente, para semear erva, apascentar gado, cortar e recolher feno no verão, procedendo à sua conservação, manutenção dos muros de vedação e pagamento dos impostos.
5. E fazem-no em nome próprio, continuadamente e sem interrupções, com exclusão de outrem, à vista e com o conhecimento de toda a gente, sem a oposição de quem quer que seja, com a convicção de que usufruíam de coisa exclusivamente sua.
6. O prédio identificado no n.º 1) confronta, pelo seu lado nascente, com a margem direita da denominada «...», cuja água provém de várias nascentes e das águas pluviais e se junta no cimo do Monte dos ..., correndo pela encosta e, assim, formando ou corgo (ou córrego), desaguando no Rio ....
7. O prédio identificado no n.º 1) fica situado numa cota superior ao leito da corga identificada no n.º 6).
8. Em data não concretamente apurada, mas posterior ao mês de setembro de 2016, os autores colocaram uma pedra no leito da corga, no prédio superior, sito a norte da estrada nacional, à direita desta no sentido .../..., com vista a permitir a derivação das águas daquela por um rego localizado no mesmo prédio, formando um aqueduto, a céu aberto, em direção ao prédio identificado no n.º 1).
9. Tal aqueduto atravessa a estrada nacional, subterraneamente, por um cano de aduelas de cimento.
10. Em janeiro de 2017, os autores receberam uma carta, subscrita por advogada que alegou representar os «herdeiros da Água dos Leiros», em ..., «nomeadamente, Sr. CC, HH, EE, II, VV, CC e KK», pela qual os notificou de que iriam «retirar os penedos que o senhor colocou indevidamente, a fim de a água seguir o seu curso normal» e, bem assim, «para não voltar a colocar penedos na referida corga nem bolir com a água dos leiros, caso contrário seremos forçados a instaurar-lhe o respetivo processo judicial.» (sic).
11. Há vários anos, não concretamente determinados, mas para lá da memória dos vivos, alguns populares residentes no Lugar ... construíram, num prédio a montante do referido no n.º 1), uma poça ou presa para retenção e depósito da água da corga referenciada no n.º 6) e respetivo aproveitamento para rega dos prédios situados para além da margem esquerda e nascente daquela.
12. No dia 27 de janeiro de 2017, os réus CC e FF e HH entraram no prédio rústico mencionado em B) e, com uma retroescavadora contratada para o efeito, empurraram as pedras que ali se encontravam, nomeadamente as colocadas pelos autores, nos termos referidos no n.º 8), pela referida corga.
13. Em consequência necessária e direta do descrito no n.º 12), as águas da ... não puderam ser conduzidas para o prédio referido no n.º 1).
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3.1.2. Factos Não Provados

A. Em data não concretamente apurada, mas antes de 21 de março de 1868, os populares procederam à construção de açudes ou de degraus, em pedra, no leito da corrente da ..., de modo a permitir a derivação de água para, pelo menos, alguns dos prédios situados na margem direita da corga.
B. Desde tal data, os possuidores e/ou proprietários, nomeadamente os autores AA e BB de tais prédios utilizam tais águas para os limar, formando lameiros permanentes, neles apascentando o gado e, no verão, recolhendo o feno.
C. E fazem-no em comum com os demais vizinhos e/ou proprietários, continuadamente e sem interrupções, à vista e com o conhecimento de toda a gente, sem a oposição de ninguém, com a convicção de que usufruem de coisa comum aos demais proprietários dos prédios situados na margem direita da corga.
D. Em consequência do referido no n.º 7), com vista a permitir a derivação das águas aludidas em B), foi construído um açude e levada no prédio rústico situado no prédio superior, a norte da estrada nacional, à direita desta no sentido .../..., formando, naquele prédio, o aqueduto mencionado em 8) e 9), em direção ao prédio identificado no n.º 1).
E. Em data não concretamente apurada, mas anterior ao mês de setembro de 2016 foi retirada uma das pedras ou degrau do açude referido em D), por pessoas não identificadas.
F. Em consequência, em setembro de 2016, os autores não puderam tapar a água da corga identificada no n.º 6) para limar o seu prédio.
G. Em consequência direta e necessária do referido em 12), o prédio descrito no n.º 1) nunca mais voltou a ser limado com as águas provindas da aludida corga, nos termos descritos em D).
H. Até 27 de janeiro de 2017, os autores AA e de BB pastavam no prédio referido no n.º 1) 15 vacas, durante oito dias e em três vezes por ano.
I. E, em média, colhiam 300 fardos de palha.
J. Em consequência direta e necessária do referido nos n.ºs 12) e 13), no ano de 2017, pastaram 15 vacas, durante cinco dias e por duas vezes, bem como recolheram 110 fardos de feno.
K. Cada fardo de feno tem o valor de € 3,00.
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3.2. O Direito
3.2.1. A prova na aquisição do direito por preocupação

A preocupação (pré-ocupar, ocupar antecipadamente) é um meio de aquisição por um particular, até 21 de março de 1868, das águas de uma corrente não navegável nem flutuável, mediante a construção de obras permanentes de captação e derivação. Essas obras tanto podem consistir numa presa ou açude, como num canal ou engenho de derivação, entre outras. Assim ocupadas as águas tornam-se particulares (art. 1386.º, n.º1, al. d), do CC).
Só é possível o reconhecimento da preocupação desde que o aproveitamento seja acompanhado de obras permanentes de captação e derivação, constituídas até 21 de março de 1868. A análise dos vestígios da edificação será, por conseguinte, muito importante para a demonstração da preocupação.
Com isto, pretende dizer-se que o mais evidente elemento de prova se cifra na demonstração de existência de obras visíveis com caracter de permanência tendente à derivação das águas para determinados fins (rega, lima, etc)[i].
Esta prova terá de ser completada, normalmente, com recurso à análise documental (documentos escritos com referência àquele uso) e depoimento testemunhal (que atestem esse aproveitamento por conhecimentos transmitidos pelos seus antepassados).
Escreve a propósito Mário Tavarela Lobo:
«Reportando-se a aquisição de direitos por preocupação ao período anterior ao inicio da vigência do Código de 1867 – 22 de Março de 1968, mais de 120 anos decorridos - pois não mais tal título foi admitido na legislação posterior, é geral o entendimento no sentido de não ser possível, hoje, a prova directa do facto material deste título aquisitivo das águas públicas.
Considera-se suficiente a prova indirecta, dando-lhe a amplitude necessária para a formação de uma convicção séria do julgador.
A existência de sinais ou obras visíveis e permanentes anteriores àquele Alvará de 1804, ou antiquíssimos, que revelem a derivação das águas da corrente para fins agrícolas, laboração de engenhos ou outros especialmente quando acompanhados de datas ou inscrições gravadas na pedra a atestar a antiguidade da presa de água e de um aproveitamento imemorial, são meios idóneos de prova indirecta da preocupação.
Tais obras podem mesmo ser toscas ou pouco perfeitas uma vez que, na sua materialidade, revelem decisão e continuidade do aproveitamento da água e no exercício de um direito.
É da maior importância também a prova documental reveladora da apropriação da água, em especial quando conjugada com os demais meios de prova previstos na lei, particularmente a prova pericial. Todos os meios de prova são assim admissíveis, tanto mais que é necessariamente precária e insuficiente a prova testemunhal constituída hoje apenas pelas referências de pessoas idosas sobre o que ouviram a outras, também de avançada idade, de anteriores gerações.
Tem-se admitido mesmo entre nós, como prova indireta da preocupação, o que resulta de algumas disposições legais, nomeadamente do art. 133.º da Lei de Águas atribuindo ao uso e costume, que fixa um regime estável e normal de distribuição das águas de uma corrente, o mérito de revelar quem foram os adquirentes da água, isto é, a quem deve atribuir-se a preocupação.
Provada esta é indispensável não se haver perdido o direito às águas, quer por abandono de quem primeiro deu começo à obra de captação e derivação, quer por destruição da obra feita na corrente»[ii].
Decorre daqui, como essencial, que para se reconhecer a aquisição por preocupação de águas originariamente públicas as obras de captação ou presa dessas águas tenham sido realizadas até 21 de Março de 1868.
Por isso, não basta que as obras existam desde “tempos imemoriais” ou desde um lapso de tempo suficiente para a usucapião, torna-se indispensável que se prove que essas obras foram construídas até 21 de Março de 1868.
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3.2.2. Da inversão do ónus da prova, prevista no artigo 344.º n.º 2 do Código Civil.

Consideram os autores/recorrentes que no caso concreto deve operar a inversão do ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito de propriedade sobre a água adquirida por preocupação assente na existência de um açude desde antes de 21 de março de 1868, na medida em que os réus destruíram esse açude retirando dali as pedras que o constituíam, tornando impossível aos autores a demonstração da existência dessa obra no local e da aquisição das águas por preocupação.
Porém, trata-se de asserção que constitui uma petição de princípio que não se mostra factualmente demonstrada nos autos e, como tal, não pode ser acolhida.
É que, no caso, falta o pressuposto, que é o ato de destruição do açude pela contraparte.
Vejamos.
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (art. 341.º, do CC).
Decorre do principio geral sobre a repartição do ónus da prova, ínsito no art. 342.º, do CC, que àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (n.º1), competindo a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado àquele contra quem a invocação é feita (n.º 2), sendo que em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito (n.º 3).
Estabelece, por sua vez, o art. 344.º, n.º 2, do CC que há inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações.
A inversão do ónus da prova prevista nesta norma está dependente da verificação dos seguintes pressupostos:
- a prova de determinada factualidade, por ação da parte contrária, se tenha tornado impossível ou, pelo menos, se tenha tornado particularmente difícil de fazer;
- que tal comportamento lhe seja imputável a título de culpa.
A propósito referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, que o condicionalismo do art. 344.º, n.º 2, do CC, ocorre quando a conduta do recusante “impossibilita a prova do facto a provar, a cargo da contraparte, por não ser possível consegui-la com outros meios de prova, já por a lei o impedir (exs: art. 313-1 CC; art. 364 do CC), já por concretamente não bastarem para tanto os outros meios produzidos[iii].
A inversão do ónus da prova surge, assim, como uma sanção civil à violação do dever de cooperação para a descoberta da verdade, consagrado no art. 417.º, n.º 1, do CPC, que constitui, enquanto radicado nas próprias partes, uma emanação do princípio geral da cooperação consagrado no art. 7.º, n.º 1 do mesmo Código, “quando essa falta de cooperação vai ao ponto de tornar impossível ou particularmente difícil a produção de prova ao sujeito processual onerado com o ónus da prova nos termos gerais e seja culposa, no sentido de que a parte podia e devia agir de outro modo”.[iv]
A razão de ser desta sanção de ordem probatória é pragmaticamente explicada por Vaz Serra, nos seguintes termos: «não é justo que fique exposto às consequências da falta de prova o onerado que não pode produzi-la devido a culpa da outra parte»[v].
Todavia, realça-se, só a certeza de que o meio de prova em causa era o único que tornaria possível a prova à parte sobre quem recaía o ónus probatório é que poderia conduzir à inversão do ónus da prova.
Daqui decorre que a decisão de efetivação da inversão do ónus da prova terá lugar depois de esgotada a possibilidade de a parte onerada com tal inversão produzir a respetiva prova e da valoração, em sede de prova livre, dos resultados probatórios desse modo obtidos, ou seja, a jusante da decisão sobre os factos controvertidos.
O princípio assenta em que o ónus da prova se inverte quando for inexigível ao onerado que faça a prova. E um dos casos em que esse princípio se aplicaria seria o de a outra parte ter tornado culposamente impossível a prova[vi].
Ora, no caso presente, duas situações se levantam como impeditivas da inversão: (i) a indemonstração da destruição do açude pelos réus; e que esse meio de prova (penedo) era o único que tornaria possível a prova da existência do açude e do modo de aproveitamento da água.
Donde, não têm os recorrentes razão na sua pretensão de ver invertido o ónus da prova, competindo-lhe, pois, fazer a prova dos factos constitutivos do seu direito.
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3.2.2. Da impugnação da matéria de facto

Consideram os recorrentes que foi erradamente julga
da a matéria de facto quanto aos factos provados 8, 9 e 12.
Entendem que o facto 8, deve ser eliminado ou considerado não provado, o facto 9 deve ter outra redação substituindo-se o termo “tal” pelo termo “existe um” e nessa sequência, deve ser eliminado do facto 12 na parte final, o texto “nomeadamente as colocadas pelos Autores, nos termos referidos no nº 8”, mantendo, porém, a frase “pela referida corga”.
Os factos têm a seguinte redação:
8. Em data não concretamente apurada, mas posterior ao mês de setembro de 2016, os autores colocaram uma pedra no leito da corga, no prédio superior, sito a norte da estrada nacional, à direita desta no sentido .../..., com vista a permitir a derivação das águas daquela por um rego localizado no mesmo prédio, formando um aqueduto, a céu aberto, em direção ao prédio identificado no n.º 1).
9. Tal aqueduto atravessa a estrada nacional, subterraneamente, por um cano de aduelas de cimento.
12. No dia 27 de janeiro de 2017, os réus CC e FF e HH entraram no prédio rústico mencionado em B) e, com uma retroescavadora contratada para o efeito, empurraram as pedras que ali se encontravam, nomeadamente as colocadas pelos autores, nos termos referidos no n.º 8), pela referida corga.
A alteração pretendida pelos impugnantes vai no sentido de demonstrar que a sua atuação visou apenas repor a situação anteriormente existente ou, pelo menos, atenuar o efeito da destruição do açude pelos réus, de modo a poder utilizar as águas da ....
Ora, da análise de toda a prova produzida – auto(s) de inspeção ao local, testemunhas e documentos – este tribunal formou convicção integralmente coincidente com a do tribunal recorrido.
Na verdade, o ponto central reside na circunstância de não se ter demonstrado a existência de um açude no local e, consequentemente, a afirmação da sua destruição e a impossibilidade de utilizar tais águas para limar o prédio dos autores.
E a indemonstração não deriva da retirada do penedo cuja alegada vetustez serviria para prova da existência do açude, não, a existência de um açude com o objetivo de permitir a derivação das águas para o prédio dos autores, foi contrariada, negada, por todos os consortes da água e pelas testemunhas ouvidas.
Como é conforme à natureza de um litigio judicial, estão em presença duas versões antagónicas: os autores arrogam-se titulares um direito de propriedade sobre as águas da ..., em comum com os demais consortes (onde se incluem os réus); os réus (e os demais consortes) contestam esse direito, defendendo que os autores nunca usaram tais águas.
Mostra-se correta a análise detalhada feita na decisão recorrida das declarações e depoimentos prestados e a apreciação critica que é feita a cada um deles.
Do mesmo modo, o exame crítico que é feito aos documentos juntos, com destaque para os registos fotográficos e a carta enviada aos autores (advogada do ...), e ainda o teor do auto(s) de inspeção ao local.
Deles se extrai o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respetiva apreciação crítica nos seus aspetos mais relevantes.
Todos estes elementos sedimentam a dúvida séria de que os autores, alguma vez, tenham usado a água da corga, nos termos em que os mesmos descrevem, ou seja, que a tapassem na corga no prédio do GG, seguindo pelo rego até ao aqueduto e, depois, para o seu prédio. Muito menos, que a sua apropriação fosse feita nestes termos por meio de obra para represamento e derivação da água realizada antes de 1868.
A prova de um facto requer o preenchimento do designado standard mínimo da prova[vii]. A este propósito, exige-se que, através dos meios de prova que foram apresentados, seja possível afirmar que o facto é verosímil, no sentido de, como afirma WW, 'excluir, segundo o padrão que na vida prática é tomado como certeza, outra configuração da realidade dada como provada'[viii]. Exige-se também que seja possível elaborar um raciocínio lógico que permita justificar externamente esta verosimilitude, não se limitando ao mero convencimento subjectivo do julgador[ix]. A confirmação do facto deverá atingir este patamar mínimo - sufficiency of evidence - sob pena de a parte a quem compete o ónus da prova suportar a consequência jurídica da falta de confirmação.
Os impugnantes refutam a decisão da matéria de facto, sem verdadeiramente porem em crise a valoração que da prova foi feita, antes afirmando que deveria conduzir a resultado diferente.
Ora, a discordância, por exegese diferenciada, do teor das declarações da autora ou do depoimento da testemunha PP, não impõe, de per si, a censura da convicção do julgador, não tendo os impugnantes aportado argumentos válidos nem provas bastantes que conduzam a diferente convicção, limitando-se a indicar passagens de depoimentos que foram tidos em conta pelo tribunal na sua motivação.
Evidencia-se que também a este tribunal de recurso não se mostrou credível o relato feito pela testemunha UU, exatamente por apresentar uma descrição do aproveitamento das águas tão público e ostensivo que nem mesmo os autores o subscreveram, pois que sempre defenderam uma certa descrição.
A existência de sentidos díspares dos meios de prova é conatural a qualquer processo judicial pelo que a fundamentação da discordância quanto à decisão de facto não pode bastar-se com a enunciação desses sentidos, antes se exige a explicitação da discordância fundada nos concretos meios probatórios e pontos de facto considerados incorretamente julgados, com indicação concreta das insuficiências, discrepâncias ou deficiências de apreciação da prova produzida, em confronto com o resultado que pelo tribunal foi declarado. 
A alteração da matéria de facto pretendida pelos autores não tem sustento na prova produzida.
Nestes termos, mantém-se inalterada esta factualidade.
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3.2.4. Aquisição de águas por preocupação

O direito que se visa fazer valer prende-se com a propriedade sobre as águas de uma corga, adquirida por preocupação.
A matéria relativa à propriedade de águas encontra-se regulada nos artigos 1385.º e seguintes do Código Civil, sendo que, de acordo com aquele normativo, as águas são classificadas de públicas ou privadas, estando as primeiras sujeitas ao regime estabelecido em leis especiais e as segundas às disposições legais vertidas nos artigos seguintes.
Defendem os autores que, originariamente, tais águas eram públicas, invocando a sua aquisição, em comum com os demais populares, por preocupação.
Nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 1386.º do Código Civil (C.C.) são particulares as águas originariamente públicas que tenham entrado no domínio privado até 21 de Março de 1868, por preocupação, doação régia ou concessão.
Preocupação ou jus preoccupationis é o direito concedido aos que ocupassem as águas públicas por meio de obras apropriadas.
Foi o alvará de 27 de Novembro de 1804 que, entre nós, consagrou legislativamente pela primeira vez este título de aquisição, permitindo “empreender o tirar de algum rio, ribeira, paul ou nascente de água de algum canal ou levada para regar as suas terras, ou para as esgotar sendo inundadas”, “não podendo opor-se os proprietários dos terrenos por onde passarem tais águas, sendo obrigados a deixarem construir o aqueduto”. [x]
O Código Civil de 1867 respeitou os direitos derivados da preocupação, que tenham sido adquiridos anteriormente à data da sua entrada em vigor, ou seja, 22 de Março de 1868. Nos seus art.s 434.º a 436.º regulou os direitos dos donos dos prédios atravessados por quaisquer águas correntes não navegáveis nem flutuáveis de usarem dessas mesmas águas em proveito dos seus prédios. E no art. 438.º determinou o respeito pelos direitos assim adquiridos.
Posteriormente, o Decreto n.º 5787-IIII, de 10 de Maio de 1919 (“Lei das Águas”) inseriu várias disposições sobre as águas de domínio público e de domínio privado, dispondo quanto às primeiras sobre o seu uso e aproveitamento por concessão, nomeadamente, de utilidade pública e quanto às águas particulares, sobre o seu aproveitamento e servidões relativas ao uso das mesmas. Este diploma considerando do domínio público as “correntes de água não navegáveis nem flutuáveis” – art. 1.º, n.º 3.º , veio a declarar expressamente no art. 33.º, o respeito pelos direitos que à data da sua entrada em vigor tenham sido adquiridos por qualquer pessoa, que continuarão a poder aproveitá-las nas mesmas condições.
A propósito, pode ler-se no Ac. do STJ de 29/05/1973, que “têm direito às águas de uma corrente não navegável nem flutuável, adquirido por preocupação e ressalvado pelos artigos 438.º do Código Civil de 1867, 33.º do Decreto n.º 5.787,-IIII, e 1386.º, n.º 1, alínea d) do Código Civil actual, os proprietários de certos prédios rústicos, uns marginais e outros não, quando se mostre que aqueles, por si e pelos seus antecessores, ininterruptamente há mais de 150 anos, à vista e com conhecimento de toda a gente e mediante regime estável da sua distribuição entre eles estabelecido, vêm aproveitando a água da referida corrente para rega e lima desses seus prédios, por meio de obras visíveis e aparentes, designadamente uma presa, feitas no leito da corrente pelos seus antepassados e por estes e seus sucessores permanentemente mantidas e reparadas para aquele efeito, à vista de toda a gente e sem oposição de quem nisso mostrasse interesse.[xi]
Em suma, só é possível reconhecer-se a preocupação como título aquisitivo anterior a 21 de março de 1868, se existirem obras permanentes de captação e derivação de águas, construídas até àquela data e o seu aproveitamento desde então sem abandono ou destruição da obra.
Haverá assim que fazer-se prova de que a água entrou, efetivamente, no domínio privado mercê desse título. Depois disso, impor-se-á a alegação fáctica e a prova que demonstre não ter havido perda do direito adquirido.[xii]
Na situação sub judicio, não vem provado que o represamento, derivação e utilização da água da ... vem sendo feita pelos autores e antecessores desde data anterior a 21 de março de 1868, pelo que haverá de improceder a sua pretensão de aquisição das águas por preocupação.
Por fim, face ao que vem alegado pelos recorrentes, no tocante à ilicitude da atuação dos recorridos por ação direta, sufraga-se o que a propósito se referiu na sentença recorrida, assim se concluindo que os réus ao retirarem a pedra antes colocada pelos autores não perturbaram qualquer direito destes, nomeadamente, o seu direito de propriedade sobre águas invocado neste pleito que, como vimos, não foi reconhecido.
Pelo exposto, improcede, em todos os seus termos, a presente apelação.
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SUMÁRIO (artigo 663º n º7 do Código do Processo Civil)

I - A preocupação (pré-ocupar, ocupar antecipadamente) é um meio de aquisição por um particular, até 21 de março de 1868, das águas de uma corrente não navegável nem flutuável, mediante a construção de obras permanentes de captação e derivação. Essas obras tanto podem consistir numa presa ou açude, como num canal ou engenho de derivação, entre outras. Assim ocupadas as águas tornam-se particulares (art. 1386.º, n.º1, al. d), do CC).
II - Só é possível o reconhecimento da preocupação desde que o aproveitamento seja acompanhado de obras permanentes de captação e derivação, constituídas até 21 de março de 1868.
III - A análise dos vestígios da edificação será, por conseguinte, muito importante para a demonstração da preocupação, mas prova terá de ser completada, normalmente, com recurso à análise documental (documentos escritos com referência àquele uso) e depoimento testemunhal (que atestem esse aproveitamento por conhecimentos transmitidos pelos seus antepassados).
IV – Invocando-se a inversão do ónus da prova com a alegação da destruição da obra pela contraparte, tal inversão só operará se se demonstrar a destruição da obra imputável a título de culpa à parte contrária e que esse meio de prova era o único que tornaria possível a prova da existência do açude e do modo de aproveitamento da água.
V - A prova de um facto requer o preenchimento do designado standard mínimo da prova, exigindo-se que, através dos meios de prova que foram apresentados, seja possível afirmar que o facto é verosímil, no sentido de excluir, segundo o padrão que na vida prática é tomado como certeza, outra configuração da realidade dada como provada.
VI - Só é possível reconhecer-se a preocupação como título aquisitivo anterior a 21 de março de 1868, se existirem obras permanentes de captação e derivação de águas, construídas até àquela data e o seu aproveitamento desde então sem abandono ou destruição da obra.
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IV - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelos Recorrentes.
Guimarães, 10 de Julho de 2023

Assinado digitalmente por:                                                   
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. - Des. Jorge Alberto Martins Teixeira
2º Adj. - Des. Margarida Alexandra Pinto Gomes



[i] Neste sentido, José Cândido de Pinho, In “As águas no Código Civil”, 2ª Edição, Almedina, pag. 53.
[ii] In “Manual do Direito das Águas”, vol. I, Coimbra Editora, págs. 297/298.
[iii] In Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, 3.ª edição, 2017, Almedina, pág. 222.
[iv] Neste sentido Acórdão do STJ de 19.04.2019, disponível em www.dgsi.pt.
[v] In “Provas (direito probatório material)”, BMJ, n.º 110-1961, pág. 160.
[vi] Vaz Serra, ob cit. pág. 165.
[vii] A este propósito, pode ver-se LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, in O Standard de Prova no Processo Civil e no Processo Penal, disponível em www.trl.mj.pt, pág. 1
[viii] In As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, pág. 201.
[x] Mário Tavarela Lobo, in “Manual do Direito das Águas”, vol. I, pág. 295.
[xi] B.M.J., 227, págs. 159-164.
[xii] Cfr. José Cândido de Pinho, Ob. Cit. pag. 52.