Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
660/14.5T8CHV-D.G2
Relator: ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
CASO JULGADO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- A exceção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contraria na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior: a exceção do caso julgado garante não apenas a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira diferente, mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira idêntica.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

A) AA por apenso aos autos em que é exequente BB, veio deduzir Oposição à Execução, onde conclui entendendo que devem os presentes Embargos de Executado serem recebidos e julgados procedentes, por provados, com as legais consequências.
Para tanto alega, em síntese, para além da exceção de falta de citação no processo declarativo onde foi proferida a sentença dada à execução como título executivo e já julgada improcedente, por decisão transitada em julgado, que as letras de câmbio que titulam o “alegado crédito” do então autor, ora exequente no processo nº 75/07.... não foram assinadas pelo executado AA pois o ora executado nem tinha conhecimento dos alegados empréstimos feitos pelo exequente à sua falecida mulher uma vez que o ora executado sempre esteve emigrado na ..., vindo a casa apenas no mês de agosto e, quando lhe era possível, no Natal, chegando na véspera de Natal e regressando logo de seguida sendo, por isso, a sua assinatura, falsificada.
Em nenhuma das letras consta a indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento; o nome da pessoa a quem, ou à ordem de quem deve ser paga; a indicação da data em que e do lugar onde a letra foi passada; o contribuinte do sacado.
Também alega que no lugar da assinatura do sacador, em duas das letras, está o nome da falecida (sacado) e numa outra letra, no lugar do sacador está em branco, além do que, em duas das letras, na data de vencimento existem duas datas, como se poderá constatar na letra de €15.798,48, cujo vencimento seria a 02/09/2005 e depois, em baixo, no lugar onde está manuscrito o valor por extenso aparece 2006-03-20, estando as letras feridas por vício na forma, gerador da nulidade da obrigação cambiária.
Invoca ainda a impenhorabilidade dos créditos do executado nos termos do disposto no art.736º al. a) do C.P.C. porque, por decisão transitada em julgado a 22/10/2018, o ora exequente foi solidariamente condenado a pagar:

a) A quantia de €55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) à herança deixada por óbito de CC;
b) A quantia de €8.000,00 (oito mil euros) ao autor AA;
c) A quantia de €16.000,00 (dezasseis mil euros) à interveniente DD;
d) A quantia de €16.000,00 (dezasseis mil euros) ao interveniente EE;
e) As quantias respeitantes aos juros de mora, contados sobre os valores fixados de a) a d), à taxa de 4%, desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento, sem prejuízo de outras taxas que, eventualmente, venham a vigorar, sendo certo que tal condenação é relativa à ação proposta pelo ora executado, a título de danos não patrimoniais sofridos e emergentes pelo acidente que vitimou a sua esposa e mãe dos seus dois filhos menores.
Acrescenta também que a então esposa do executado faleceu vítima de um acidente de trabalho e o direito do executado à indemnização por danos morais pela morte de sua esposa, vítima de um acidente de trabalho, é um direito inalienável e por isso impenhorável, tudo nos termos do artigo 736º al. a) do C.P.C. e, por ouro lado, os filhos da falecida não são nem nunca foram devedores/executados e estão até hoje privados da indemnização que lhes foi atribuída por morte da mãe.
Concluiu peticionando que os presentes Embargos de Executado sejam recebidos e julgados procedentes, por provados, com as legais consequências.
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O exequente e embargado BB apresentou contestação onde conclui que deve a presente contestação ser julgada totalmente procedente, por provada e, em consequência, ser a petição de embargos julgada totalmente improcedente, por não provada, com as legais consequências.
Para tanto alega, em síntese que há falta de fundamentos previsto no artigo 729º do CPC para o executado poder deduzir oposição à execução, impugnando a falsidade da assinatura efetuada pelo embargante.
Alega também que o executado não pode invocar a impenhorabilidade de créditos porque para tal deveria ter deduzido oposição à penhora, impugnando ainda o demais alegado nos embargos de executado.
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B) Foi elaborado despacho saneador, procedeu-se a julgamento e foi elaborada sentença que decidiu absolver o exequente e embargado da instância, determinando-se o prosseguimento da execução.
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C) Inconformado com esta decisão, veio o embargante AA interpor recurso, que foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 135).
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Nas alegações de recurso do apelante AA, são formuladas as seguintes conclusões:

A) Não pode o ora recorrente conformar-se de maneira alguma com a decisão do Tribunal “a quo” dada a matéria fática provada e consequente incongruência da decisão proferida.
B) Na sua Petição de Oposição à Execução o ora recorrente começa por invocar a nulidade da citação (matéria já decidida pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães) e invoca também falsificação das assinaturas apostas nas letras de câmbio, letras que titulavam o suposto crédito do embargado/recorrido e fundamentaram a ação que correu termos sob o nº 75/07.....
C) O Venerando Tribunal da Relação de Guimarães no seu Acórdão determina o prosseguimento dos autos para apreciação do restante mérito dos Embargos. A invocada falsificação das assinaturas do ora recorrente e consequente nulidade das letras de câmbio.
D) O recorrente na sua petição de embargos requereu prova pericial de letra que, não pôde ser levada a cabo porque o suposto credor, recorrido diz não ter as letras de câmbio na sua posse, nem nunca teve!!
E) Como é possível existir condenação na ação que decorreu sob o nº 75/07.... se o que o então autor leva à ação cópias das supostas letras de câmbio? Onde estão os originais ou por que motivo o recorrido não as apresenta a fim de se puder fazer a Perícia de Letra requerida na Petição de embargos pelo ora recorrente?
F) A Mmª Juiz não apreciou a restante matéria de mérito dos embargos; sendo certo que as letras estiveram na base da sentença condenatória, sentença que é o título executivo nos presentes autos são nulas sendo por consequência nula a sentença que serve de título à execução!
G) O recorrente invocou a falsidade da sua assinatura nas letras de câmbio subjacentes à sentença condenatória dada à execução:
H) Pediu perícia que não pode ser levada a cabo porque o recorrido diz não ter os originais das letras de câmbio!
I) Na ação 75/07.... constam cópias das letras de câmbio.
J) Não deveria a Mmª Juiz oficiosamente na ação declarativa requerer que o então autor juntasse aos autos o original das letras de câmbio?
K) Como se condena o ora recorrente com cópias de letras de câmbio que “alegadamente” titulam um crédito?
L) Ou seja, a sentença dada à execução é nula nos termos do preceituado no artº 729º, alínea a) e g) do C.P.C.
M) A substância está acima de forma! Nos termos do artº 289º do C.C. a nulidade invocada tem efeito retroativo.
N) O ora recorrente só em sede de Embargos de Executado se pode defender; pois como invocou, nunca foi citado para a ação declarativa, motivo pelo qual nunca a contestou!
O) Dúvidas não restam que as letras são nulas já que:
…”Em nenhuma das letras consta a indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento;
o nome da pessoa a quem, ou à ordem de quem se paga;
a indicação da data em que e o lugar onde a letra foi passada;
o contribuinte do sacado.
Também alega que no lugar da assinatura do sacador, em duas das letras, está o nome da falecida (sacado) e numa outra letra, no lugar do sacador está em branco, além do que, em duas das letras, na data de vencimento existem duas datas, como se poderá constatar na letra de €15.798,48, cujo vencimento seria a 02/09/2005 e depois, em baixo, no lugar onde está manuscrito o valor por extenso aparece 2006-03-20, estando as letras feridas por vício na forma, gerador de nulidade da obrigação cambiária.”…
P) Como já referido nas presentes alegações está por decidir a restante matéria dos Embargos e o título dado à Execução, a sentença é nula!
Q) A requerida prova pericial de letra tem que ser feita e o recorrido apresentar os originais das letras de câmbio para tal perícia ser feita;
R) Originais que deveriam constar na ação declarativa e não constam! Na ação declarativa constam cópias dos títulos de crédito, cópias que só com a oposição aos embargos o recorrente pode ir buscar à ação 75/07.... a fim de invocar a nulidade das referidas letras.
S) Com o devido respeito, a Meritíssima Juiz deveria oficiosamente na ação Declarativa ordenar a junção aos autos dos originais dos títulos de crédito – não o fez – a sentença é nula sendo por consequência nulo o título dado à execução.
T) A Meritíssima Juiz a quo não pôde por esse motivo, tal como determina o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães prosseguir para apreciação do restante mérito dos embargos.
U) O título executivo apresentado à execução é uma sentença condenatória nula; Os embargos deduzidos pelo executado têm natureza superveniente nos termos do artº 728º nº 2 do C.P.C.; A matéria da oposição é superveniente à prolação da sentença na ação declarativa.
V) A nulidade invocada é passível de ser arguida a todo o tempo pelo que é temporânea ao abrigo do artº 286º do C.C.
W) A não realização da perícia de letra requerida pelo recorrente porque o recorrido não apresenta nem nunca apresentou os originais das letras, constitui clara violação da Constituição da República, nomeadamente o artº 20º nº 1 no que respeita ao direito de acesso aos tribunais e interesses do recorrente e ao impedir o exame de letra, o recorrido está a violar o direito de defesa do recorrente.
Termina entendendo que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença proferida.
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Pelo apelado BB foi apresentada resposta onde entende que deve o presente recurso ser julgado não provado e totalmente improcedente e, em consequência, manter-se a sentença recorrida.
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D) Foram colhidos os vistos legais.
E) A questão a decidir no recurso é a de saber se deve ser revogada a sentença recorrida que absolveu o exequente e embargado da instância e determinou o prosseguimento da execução.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

A) Na 1ª instância resultou apurada a seguinte matéria de facto:

I. FACTOS PROVADOS

A) Por sentença proferida na ação declarativa nº 75/07.... transitada em julgado, foram os executados condenados a pagar ao exequente a quantia de €46.897,42, acrescida dos respetivos juros de mora, computados à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
B) Os executados não pagaram o valor acima mencionado nem qualquer outro.
C) Na sentença condenatória proferida no processo indicado em A), a Mmª Juiz fez constar, para além do mais, que … “os réus regular e pessoalmente citados, não contestaram…”.
D) Nos presentes autos foi proferida decisão pelo Tribunal da Relação de Guimarães onde se fez consignar para além do mais, que “(…) não resulta que o apelado/embargante não tenha intervindo nos autos declarativos, nomeadamente depois da fase da contestação, o que era condição para que pudesse operar, nesta instância executiva, a invocação da arguida falta, ocorrida noutra instância, declarativa, como resulta da parte final do citado art. 729º, al. d)” e, em consequência, decidiu-se “julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, julgando-se improcedente a arguida nulidade e determinando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do restante mérito dos embargos”.
E) Nos autos principais de execução, até à presente data, não se encontram penhorados quaisquer bens pertencentes aos executados/embargantes.
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (artigos 608º nº 2, 635º nº 2 e 3 e 639º nº 1 e 2, todos do NCPC).
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C) O recurso visa exclusivamente a reapreciação da matéria de direito.
A questão de que trata a presente apelação é a de saber se deve ser revogada a sentença recorrida que absolveu o exequente e embargado da instância e determinou o prosseguimento da execução.

Vejamos.

Estabelece o artigo 703º nº 1 NCPC que:

“1 À execução apenas podem servir de base:
a) As sentenças condenatórias;
b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;
c) Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo;
d) Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.
( … )”
O título executivo em questão é uma sentença condenatória, pelo que, de acordo com o disposto no artigo 729º NCPC, “fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:
a) Inexistência ou inexequibilidade do título;
b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;
c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;
d) Falta de intervenção do réu no processo de declaração, verificando-se alguma das situações previstas na alínea e) do artigo 696º;
e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;
f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;
h) Contra crédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;
i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses atos.”
Conforme se escreveu no Acórdão desta Relação de Guimarães de 13/10/2022, no processo 6374/21.2T8GMR.G1, disponível em www.dgsi.pt, “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva (artigo 10º nº 5 NCPC).
Refere o Dr. Lebre de Freitas “A Ação Executiva, 2ª Edição, página 56, “o título executivo extrajudicial ou judicial impróprio é um documento que constitui prova legal para fins executivos e que a declaração nele representada tem por objeto o facto constitutivo do direito de crédito ou é, ela própria, este mesmo facto”.
Conforme se diz no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05/05/2009, disponível na Base de Dados do Ministério da Justiça no endereço www.dgsi.pt, “o título executivo é condição necessária e suficiente da ação.
Necessária porque não há execução sem título.
Suficiente porque, perante ele, deve ser dispensada qualquer indagação prévia sobre a real existência ou subsistência do direito a que se refere.
Efetivamente a obrigação exequenda tem de constar no título o qual, como documento que é, prova a existência de tal obrigação.
O título executivo é um pressuposto da ação executiva na medida em que confere ao direito à prestação invocada um grau de certeza e exigibilidade que a lei reputa de suficientes para a admissibilidade de tal ação.
Na verdade «…a relevância especial dos títulos executivos que resulta da lei deriva da segurança, tida por suficiente, da existência do direito substantivo cuja reparação se pretende efetivar por via da ação executiva.
O fundamento substantivo da ação executiva… é a própria obrigação exequenda, sendo que o título executivo é o seu instrumento documental legal de demonstração, ou seja, constitui a condição daquela ação e a prova legal da existência do direito de crédito nas suas vertentes fáctico-jurídicas» - Ac. do STJ de 18.10.2007, www.dgsi.pt, p.07B3616.
( … )
A realização coativa da prestação exige a anterior definição dos elementos – objetivo e subjetivo - da relação jurídica de que ela é objeto, isto é, que tal relação, nestes elementos, está assente e é incontroversa.
Tanto assim que, e como se viu, é legalmente imposto que o título constitui a base da execução e determina o fim e os limites da mesma, ou seja, o tipo de ação e o seu objeto.
Aliás, tal juízo de certeza não se impõe inexoravelmente ao tribunal, pelo que, para aferir de tal, pode e deve o julgador proceder à prévia interpretação do título, sendo que, em caso de fundadas dúvidas, ele não é exequível – cfr. Lebre de Freitas, ob. cit., p. 35.”
No caso que nos ocupa, resultou provado que por sentença proferida na ação declarativa nº 75/07...., transitada em julgado, foram os executados condenados a pagar ao exequente a quantia de €46.897,42, acrescida dos respetivos juros de mora, computados à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Os executados não pagaram o valor acima mencionado nem qualquer outro.
Na sentença condenatória proferida no processo indicado em A), a Mmª Juiz fez constar, para além do mais, que … “os réus regular e pessoalmente citados, não contestaram…”.
Nos presentes autos foi proferida decisão pelo Tribunal da Relação de Guimarães onde se fez consignar para além do mais, que “(…) não resulta que o apelado/embargante não tenha intervindo nos autos declarativos, nomeadamente depois da fase da contestação, o que era condição para que pudesse operar, nesta instância executiva, a invocação da arguida falta, ocorrida noutra instância, declarativa, como resulta da parte final do citado art. 729º, al. d)” e, em consequência, decidiu-se “julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, julgando-se improcedente a arguida nulidade e determinando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do restante mérito dos embargos”, acórdão este que transitou em julgado.
Quanto à questão da nulidade da citação, como refere o apelante, a matéria já se mostra decidida por acórdão transitado em julgado e quanto à alegada falsificação das assinaturas apostas nas letras de câmbio, letras que titulavam o suposto crédito do embargado/recorrido e fundamentaram a ação que correu termos sob o nº 75/07...., trata-se de matéria cuja apreciação deveria ter ocorrido nesse processo e que não foi, pelo que não pode agora ser apreciada, até porque a sentença proferida nesse processo já transitou em julgado.
O mesmo se diga quanto à questão relacionada com a prova pericial que o apelante agora pretendia que fosse reapreciada e que face ao trânsito, ficou definitivamente decidida (artigo 619º nº 1 NCPC).
De resto, todas as questões agora suscitadas, deveriam ter sido invocadas tempestivamente, nos processos próprios e não foram, pelo que as mesmas já não podem ser reapreciadas, nesta sede.
Conforme se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 28/09/2010, no Processo 392/09.6TBCVL.C1, relatado pelo Desembargador Jorge Arcanjo, disponível em www.dgsi.pt, “A expressão “caso julgado“ é uma forma sincopada de dizer “caso que foi julgado“, ou seja, caso que foi objeto de um pronunciamento judicativo, pelo que, em sentido jurídico, tanto é caso julgado a sentença que reconheça um direito, como a que o nega.
O caso julgado material (arts. 671º e 673º do Código de Processo Civil – arts. 619º e 620º NCPC) implica dois efeitos – um negativo e outro positivo – sendo em face deles que se distingue a exceção de caso julgado e a autoridade de caso julgado (cf., para a distinção de ambas as figuras, cf., por ex., Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 320, Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, pág. 384, Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo Código de Processo Civil, pág. 576, e “O objeto da sentença  e o caso julgado material“, BMJ 325, pág.171, Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, pág. 325, Mariana França Gouveia, A Causa de Pedir na Ação Declarativa, pág. 394).
A exceção do caso julgado pressupõe uma tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir (arts. 497º e 498º do CPC – arts. 580º e 581º NCPC) e distingue-se da autoridade do caso julgado, onde este se manifesta no seu aspeto positivo.
Definindo o âmbito de aplicação de cada um dos conceitos, refere Teixeira de Sousa - “A exceção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contraria na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior: a exceção do caso julgado garante não apenas a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira diferente (...), mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objeto duas vezes de maneira idêntica (...). Quando vigora como autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspeto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de ação ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjetiva a repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente (“O objeto da sentença e o caso julgado material”, BMJ 325, pág.171 e segs.).”
Isto é, não podem as partes em determinado processo, sobre o qual foi proferida uma sentença confirmada por Acórdão da Relação, transitado em julgado, em que foi instaurada execução, vir deduzir embargos pretendendo discutir matéria que já foi apreciada e decidida naqueles arestos e cujo decisão se tornou, assim, definitiva.
De resto, os fundamentos para a dedução de embargos, constam do disposto no artigo 729º NCPC ( … ).”
Como referem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa no Código de Processo Civil Anotado, Volume II, a páginas 83, em anotação ao referido artigo 729º “Existe uma importante distinção segundo a natureza do título, de modo que, fundando-se a execução em decisão judicial, o leque de fundamentos de oposição é muito mais restrito do que nas situações em que o título executivo tem natureza extrajudicial”, conforme resulta do confronto do disposto nos artigos 729º e 731º NCPC.
Não se verifica, assim qualquer nulidade, das invocadas, uma vez que o artigo 729º NCPC, não consagra qualquer nulidade e a do artigo 289º do Código Civil se refere à invalidade do negócio jurídico e não é aplicável a qualquer alegada nulidade da sentença, que possui regime processual próprio e não se verifica qualquer dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença, estabelecidos no artigo 729º NCPC.
Assim sendo, sem necessidade de ulteriores considerações, atento o exposto, resulta que a apelação terá de ser julgada improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida, que determinou o prosseguimento da execução.
Face ao total decaimento da sua pretensão, o apelante terá de suportar o pagamento das custas (artigo 527º nº 1 e 2 NCPC), sem prejuízo do apoio judiciário.
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III. DECISÃO

Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida, que determinou o prosseguimento da execução.
Custas pelo apelante (sem prejuízo do apoio judiciário).
Notifique.
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Guimarães, 23/05/2024

Relator: António Figueiredo de Almeida
1ª Adjunta: Desembargadora Maria dos Anjos Nogueira
2º Adjunto: Desembargador Joaquim Boavida