Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
88/23.6T8MTR.G1
Relator: ARMANDO AZEVEDO
Descritores: DECISÃO ADMINISTRATIVA
NULIDADE
ENTIDADE SUBCONTRATADA
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA COIMA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I- A decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima constitui, sem dúvida, um ato decisório, mas que, em caso de recurso de impugnação judicial, equivale a uma acusação, cfr. artigo 62º, nº 1 do RGCO.
II- Por isso, da decisão administrativa que aplique uma coima deverão necessariamente constar os factos relativos à contraordenação cometida /imputada (objetivos e subjetivos), por aplicação da al. a) do n.º 1 do artigo 379.º, ambos do CPP, ex vi do art. 41.º, do RGCO.
III- Todavia, isso não significa que em caso de recurso, a decisão administrativa que aplica uma coima, mas que não é uma sentença, esteja sujeita ao mesmo rigor formal de uma sentença penal.
IV- Na verdade, no âmbito de um processo por contraordenação, as exigências formais são outras, devendo, contudo, no que toca aos factos que integram o elemento subjetivo de uma contraordenação, exigir-se apenas que a autoridade administrativa, na sua decisão, considerada como um todo, tome posição, por forma inequívoca, sobre os factos que integram o dolo ou a negligência, descrevendo-os. Até porque, como é sabido, o nº1 do artigo 8º do RGCO consagra o princípio da nulla poena sine culpa. O arguido só pode ser responsabilizado pelo cometimento da infração se tiver agido com dolo ou com negligência, sob pena de não ter atuado de forma culposa. E sem culpa não há responsabilidade contraordenacional
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

1. No processo de contraordenação que correu termos perante  IGAMOTO – INSPECÇÃO GERAL DA AGRICULTURA, DO MAR, DO AMBIENTE E DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO , a arguida EMP01..., LDA., com os demais sinais nos autos, foi condenada numa coima no valor de € 12.000,00 (doze mil euros), pela prática da contraordenação por falta de Plano de Gestão de Resíduos prevista e punida  pelo art.º 10.º, n.º 1 e art.º 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de fevereiro, e art.º 9 e art.º 22.º, n.º 3, b) da Lei n.º 50/2006, de 26 de março (Lei Quadro das Contraordenações Ambientais).
2. A arguida interpôs recurso de impugnação judicial da referida decisão, o qual foi julgado improcedente, tendo sido mantida a condenação proferida pela autoridade administrativa.
3. Não se conformando com a decisão que julgou improcedente o recurso de impugnação judicial, dela interpôs recurso a arguida para este Tribunal da Relação de Guimarães, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões (transcrição)[1]:
1ª O presente recurso versa sobre a decisão em matéria de facto e, subsidiariamente, sobre a aplicação do Direito.
2ª Não se desconhece o disposto no artigo 75º do RGCC, mas a jurisprudência tem entendido que é possível a apreciação da decisão sobre a matéria de facto nos termos previstos nos artigos 410º/nº 3 e 434º do CPP, aplicáveis ex vi artigo 41º do RGCC.
3ª A primeira questão que a Recorrente pretende suscitar resulta do facto da douta sentença recorrida ter considerado não provado que a Recorrente tenha celebrado com o Estado Português, em Dezembro de 2012, um contrato para realizar prospecção de lítio na zona de ..., decorrendo desta decisão que a Recorrente não estaria autorizada a executar as sondagens mencionadas nos autos, o que não se pode aceitar porque esta factualidade não foi abordada na decisão administrativa.
4ª Não obstante a Recorrente ter celebrado em ../../2012 um contrato para prospecção de estanho e volfrâmio, o certo é que na pendência do mesmo foi descoberta evidência de lítio, o que motivou um pedido de autorização para execução de um plano complementar de pesquisa de lítio, o qual veio a ser autorizado pela DGEG/Secretário de Estado da Energia em ../../... e por se afigurar relevante e por só com a sentença ter sido abordada esta matéria requer-se a junção de dois documentos que comprovam o alegado.
5ª Não é possível em decisão jurisdicional factos à decisão administrativa, sob pena de violação do princípio da vinculação temática aplicável em sede contra-ordenacional.
6ª A segunda questão que a Recorrente pretende suscitar decorre da deficiência da decisão administrativa que a sentença recorrida pretende colmatar com a inclusão do facto provado pois tal está-lhe vedado.
7ª A sentença recorrida deve ser anulada nos termos do disposto no artigo 379º/nº 1 b) do CPP, aplicável ex vi artigo 41º do RGCC.
8ª Subsidiariamente, caso seja se mantenha a sentença recorrida, ainda assim considera a Recorrente que, salvo melhor opinião, o Direito não foi correctamente interpretado/aplicado.
9ª Ao contrário do decidido pela sentença recorrida, entende a Recorrente que não estava obrigada a possuir o dito PGR, pois o D.L. nº 10/2010, de 04.02 aplica-se à gestão de resíduos de explorações de depósitos minerais e de massas minerais, não tendo sido esta a actividade por si desenvolvida (nem hoje é).
10ª O PGR é exigível para uma actividade extractiva, que obriga à instalação de um estabelecimento que tem de ser licenciado e se reporta a uma actividade económica, com fins comerciais, o que também não ocorre com a Recorrente.
11ª A sentença recorrida refere, na pág. 17, que o artigo 3º h) do D.L. nº 10/2010, de 04.02 inclui a actividade de prospecção e pesquisa, por se referir a “extracção por perfuração”, mas a Recorrente não efectuou extracção, nem aquele normativo dispensa a existência de um estabelecimento (que a Recorrente não tinha) e os fins comerciais (que a Recorrente também não tinha).
12ª A Recorrente não praticou a contra-ordenação em causa dado que não estava sujeita à obrigação de apresentação de um PGR, pelo que ao condenar a Recorrente a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.
13ª É incontroverso que a Recorrente não executou as sondagens (cfr. facto provado 6), sendo forçoso concluir que não foi o operador e se as lamas de perfuração de sondagens referidas no facto provado 12 constituem um resíduo e tendo sido produzidas pela EMP02..., então cabia a esta empresa a obrigação se elaborar o PGR, pois constitui-se operador para efeitos legais e, assim sendo, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por atribuir responsabilidades à Recorrente que a lei não prevê.
14ª Para a eventualidade de se considerar que se deve manter a decisão condenatória quanto à responsabilização da Recorrente, haverá lugar à aplicação do disposto no artigo 23º/A/nº 2 b) da LQCO, tendo a sentença recorrida desaplicado este normativo sustentando que não existem “circunstâncias que diminuam por forma acentuada” a ilicitude do facto.
15ª A circunstância prevista no nº 2 b) não exige nada mais, para ser aplicada, que o decurso do prazo de dois anos sobre a prática da contra-ordenação (o que se verifica) e que o agente mantenha uma boa conduta (o que também se verifica, pois não existem antecedentes contra- ordenacionais ambientais – facto provado 15), pelo que as considerações da sentença recorrida a este propósito são contra legem (a lei apenas impõe ao julgador que verifique se aqueles dois requisitos se verificam ou não).
16ª Nos termos do artigo 23º/B do mesmo diploma a atenuação especial da coima determina a redução a metade dos limites mínimo e máximo, passando o mínimo para € 6.000,00, o que se requer.
17ª Ao não decidir no sentido ora defendido incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento.
TERMOS EM QUE deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida nos termos invocados, assim se fazendo JUSTIÇA.
4. O Ministério Público respondeu ao recurso, defendendo não assistir razão à recorrente, tendo concluído nos seguintes termos (transcrição):
1- O objeto do recuso delimita-se pelas conclusões da recorrente, que são a matéria de facto e a matéria de direito.
2 - Dispõe o artigo 75.º n.º 1 do RGCO que o recurso a ser submetido perante o Tribunal da Relação, segue um regime análogo aos recursos do processo penal apresentados perante o Supremo Tribunalde Justiça, estando vedado o conhecimento/recurso sobre a matéria de facto, exceto quando sejam invocados os vícios do artigo 410.º n.º 3 do Código de Processo Penal.
3 - A decisão recorrida não apresenta nenhum dos vícios elencados nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, ou seja, a matéria de facto provada não é insuficiente para fundamentar a solução de direito atingida, não deixou de investigar toda a matéria de facto com relevo para a decisão final, nem há incompatibilidade entre os factos provados ou entre estes e os não provados.
4 Quanto ao facto não provado a) a recorrente celebrou com o Estado Português, em dezembro de 2012, um contrato para realizar prospeção de lítio na zona de ..., o mesmo consta da decisão na sequência dos argumentos aduzidos pelo recorrente, o qual, tempestivamente, não juntou a prova documental necessária e suficiente para ser considerado de forma diversa pelo Tribunal recorrido.
5 Quanto ao facto provado 13.º Ao actuar da forma descrita, a recorrente agiu sem o cuidado que o dever geral de prudência aconselha, revelando total desrespeito pelas regras que a execução da sua actividade impunha, uma vez que sendo uma pessoa colectiva experiente na área da prospeção lhe era exigível o conhecimento e aplicação das regras que a lei impõe para a actividade exercida, sendo censurável o seu não cumprimento, tal não integra uma nulidade da sentença nos termos do artigo 379.º n.º 1 alínea b) do Código de Processo Penal.
6 Da decisão administrativa evidencia-se que esta contém uma descrição sintética dos factos com relevo para o ilícito contraordenacional imputado, designadamente os elementos objetivo e subjetivo, este na vertente cognitiva e volitiva, da ação típica imputada ao recorrente.
7 No caso das decisões administrativas, estas são mais simplistas e não obedecem à exigência tipificada no artigo 374.º n.º 2 do Código de Processo Penal, o que se culmina por norma que a ação típica imputada, no elemento subjetivo, não corresponde normalmente a uma fórmula habitualmente utilizada nas sentenças criminais, bastando que as decisões administrativas descrevam os factos que permitam alcançar as conclusões sobre o preenchimento do referido elemento.
8 Resulta do Decreto-Lei n.º 10/2010, que transpõe a Diretiva Comunitária n.º 2006/21/CE, que a atividade da exploração de minerais, onde se incluem a fase de projeto e a fase de execução, que produza resíduos perigosos para o ambiente em específico e para a sociedade em geral, devem obedecer a determinados requisitos para que se considerem conformes.
9 Nestes comportamentos de produção de resíduos, também estão contemplados quando ainda se encontra a atividade em mera prospeção, uma vez que a perfuração realizada no interesse do recorrente, utiliza água e esta, após entrar em contato com o minério, volta à superfície, e se encontra contaminada, a mesma integra o conceito de resíduo e, como tal, tem tal atividade de ter um plano de gestão de resíduos.
10 O recorrente é o outorgante dos contratos de exploração e pesquisa do minério, e, desta forma, o único e principal responsável pela obtenção das licenças, autorizações e elaboração dos planos que o diploma legal exige, independentemente de o ato propriamente ser executado por si ou por terceiros por si contratados para o efeito.
11 A atenuação especial da coima não é de todo aplicada ao caso do recorrente, uma vez que o seu comportamento posterior de falta de reconhecimento e assunção da violação das normas vigentes, colocam em risco o ambiente e a sociedade, e, desse modo, não preenche os pressupostos do artigo 23.º- A da LQCO.
12 Assim, a decisão adotada pelo tribunal, não sendo violadora das normas jurídicas em vigor e aplicáveis ao caso em concreto, não deve ser merecedora de qualquer reparo ou censura, porquanto fez uma correta valoração da prova produzida e aplicação da lei, sendo a medida concreta da pena a sua decorrência, pelo que deve a mesma ser mantida e o recurso interposto ser julgado totalmente improcedente.
V. Exas, porém, e como sempre, farão JUSTIÇA!
5. Nesta instância, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no qual, depois de afirmar a sua concordância com a fundamentação da decisão recorrida e com a resposta ao recurso apresentada pelo Ministério público na primeira instância, e bem assim de analisar todas as questões suscitadas pela recorrente, defende não lhe assistir razão, razão pela qual, no seu entender, o recurso deverá ser julgado improcedente e, consequentemente, confirmada a decisão recorrida.
6. Cumprido que foi o disposto no artigo 417º nº2 do CPP, a arguida respondeu, pugnando pelos fundamentos do recurso.
7. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTAÇÃO

1. Objeto do recurso

O âmbito do recurso[2], conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso do tribunal, cfr. artigos 402º, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP.
Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto no sentido acabado de referir, as questões a decidir resumem-se às seguintes:
1. Alteração do único ponto matéria de facto não provada da sentença recorrida.
2. Nulidade da sentença recorrida, por o facto provado nº 13 pretender colmatar uma deficiência da decisão administrativa, nos termos do disposto no artigo 379º, nº 1 al. b) do CPP, ex vi do artigo 41º do RGCO;
3. Saber se a arguida estava obrigada a possuir Plano de Gestão de Resíduos;
4. Em caso afirmativo, desresponsabilização da arguida pelo facto de ter subcontratado com terceiro a prospeção do lítio; e
5. Atenuação especial da coima nos termos do disposto no artigo 23º-A da Lei nº 50/2006, de 29.08.
Acresce, como questão prévia, a tempestividade da junção dos documentos apresentados pela recorrente com as suas alegações de recurso.

2- A decisão recorrida

1- A decisão recorrida tem o seguinte teor (transcrição):

I. Relatório

“EMP01..., Lda.”, interpôs recurso da decisão administrativa proferida, em 17 de Novembro de 2022, pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, que ali correu termos com o processo N...8, no âmbito do qual aquela foi condenada pela prática, em 9 de Outubro de 2017, da infracção de falta do Plano de Gestão de Resíduos, previsto e punido pelo art.º 10.º, n.º 1 e art.º 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, e art.º 9 e art.º 22.º, n.º 3, b) da Lei n.º 50/2006, de 26 de Março, com coima no valor de 12.000,00 €, assim como, no pagamento das respectivas custas do processo, no valor de 75,00 €.
Para tanto alegou a recorrente, em suma, que não praticou qualquer facto ilícito, pois a sua acção estava a coberto do contrato celebrado com o Estado, devendo, pois, ser absolvida da prática da contra-ordenação.
Mais alegou a recorrente que contratou a empresa EMP03... Lda. para executar as sondagens, a qual, por sua vez, subcontratou a empresa EMP02..., Lda., supostamente especializada na exploração e perfuração a elevadas profundidades, relacionadas com recursos naturais mineiros, e especialista em geologia e geotécnica, pelo que as sondagens não foram executadas pela recorrente, esta mandou-as executar. A empresa EMP03... afectou o serviço a um coordenador geotécnico, um geólogo e um coordenador, tendo a recorrente procurado uma empresa que tivesse precisamente o conhecimento necessário na área para executar o serviço, a qual, depois contratou a empresa EMP02..., convencendo-se a recorrente que sendo a empresa especializada na área das sondagens, actuando, assim, a recorrente com o rigor e cuidado que lhe eram exigíveis. A recorrente por não ter meios próprios para executar as sondagens, nem humanos nem técnicos, contratou empresas pela sua área de competência, nada mais podendo fazer além disso, não tendo, por isso, violado o seu dever de cuidado, tendo sido responsável e diligente na sua actuação, devendo ser absolvida da contra-ordenação que lhe é imputada.
Subsidiariamente, mais alega a recorrente que não estava obrigada a possuir aludido Plano de Gestão de Resíduos, o que alias, no seu entendimento resulta da própria lei, porquanto o aludido diploma se aplica à gestão de resíduos de explorações e depósitos minerais e de massa minerais, e a recorrente apenas desenvolveu a actividade de prospecção, a qual não gera resíduos, não estando esta actividade sujeita ao mesmo regime da exploração. O Plano de Gestão de Resíduos é exigível para uma actividade extractiva, devendo, pois, ser a recorrente absolvida da contra-ordenação que lhe é imputada.
Ainda, subsidiariamente, para o caso de se considerar que a recorrente praticou a contra-ordenação que lhe é imputada, requer a especial atenuação da coima, por se encontrarem preenchidos os requisitos legais.
Mais requerendo a suspensão da sanção que venha a ser aplicada.
*
Por despacho com a referência electrónica citius n.º 38366079 foi admitido o recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 59.º, n.º 1 a n.º 3 e art.º 60.º, ambos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro ex vi art.º 79.º do Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de Janeiro.
*
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O Ministério Público dispõe de legitimidade para o exercício da acção contra-ordenacional.
*
Foi designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento.
*
Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento com observância de todo o formalismo legal, conforme consta da respectiva acta.
*
A instância mantém-se válida e regular e nada obsta ao conhecimento do mérito da causa.
*
II. Fundamentação

1. De facto
1.1. Factos provados
1.º A recorrente “EMP01..., Lda.” é uma sociedade anónima, com sede na Calçada ..., ... ..., com o número de pessoa colectiva ...76, e o Número de Identificação de Segurança Social ...90, e tem como objecto social actividades de prospecção e exploração de recursos geológicos, designadamente, minérios, minerais industriais e recursos geotérmicos, actividades termais, actividades de investigação e desenvolvimento no domínio da prospecção e exploração de recursos geológicos, e comércio de materiais geológicos;
2.º A recorrente identificada em 1.º celebrou, em 7 de Setembro de 2012, com o Estado Português, representado pela Direcção-Geral de Energia e Geologia, com a epigrafe “Contrato ...2 para atribuição de direitos de prospecção e pesquisa de depósitos minerais de volfrâmio e estanho numa área denominada ... situada no Concelho ... à EMP01...”, o qual, entre outras, tinha a seguinte cláusula:
“Cláusula Primeira (Objecto do Contrato) 1. […] são atribuídos a EMP01... Lda., daqui em diante designada por EMP01... Lda., direitos de prospecção a pesquisa de depósitos minerais de Volfrâmio e Estanho, em regime de exclusivo, para uma área com cerca de 75,581 km2, designada ..., a que corresponde o n.º de cadastro MN/PP/046/12, área essa delimitada pela poligonal cujos vértices, em coordenadas ..., ... 73, ..., se indicam […] 3. Os trabalhos a desenvolver ao abrigo deste contrato, em áreas sujeitas a servidões administrativas, outras restrições de utilidade pública ou sujeitos a condicionamentos legais ou regulamentares, carecem das legais autorizações, licenças, aprovações ou pareces favoráveis das entidades com jurisdição nessas áreas, na medida em que o exercício dos direitos conferidos por este contrato esteja proibido, restringindo ou condicionado pela respectiva legislação. As autorizações, licenças, aprovações ou pareceres favoráveis mencionados no número anterior, deverão ser obtidos pelo titular dos direitos concedidos por este contrato.”.
3.º O extracto do contrato mencionado em 2.º foi publicado em Diário da República, 2.º Série, n.º 172, de 6 de Setembro de 2013;
4.º No dia 9 de Outubro de 2017, cerca do 12h00, uma equipa do Núcleo de Protecção Ambiental da Guarda Nacional Republicana do Destacamento Territorial de ... deslocou-se a ..., ... ..., ..., dando seguimento a uma denúncia efectuada contra a recorrente identificada em 1.º (coordenadas N...58 e ...45);
5.º No local mencionado em 4.º, a recorrente estava a realizar pesquisas de prospecção de lítio;
6.º As actividades relacionadas com a prospecção de lítio mencionada em 5.º foram executadas pela empresa “EMP03...”, a qual foi contratada pela recorrente, e pela empresa “EMP02...”, que foi contratada pela empresa “EMP03...”;
7.º Na ocasião mencionada em 4.º, a Guarda Nacional Republicana identificou no local um funcionário da recorrente, AA, a quem pediu a documentação da autorização de pesquisa e prospecção, a qual foi entregue no Posto Territorial ...;
8.º No momento aludido em 4.º, não se encontrava presente o responsável técnico/director técnico;
9.º À data mencionada em 4.º, a recorrente estava obrigada a elaborar e cumprir um Plano de Gestão de Resíduos;
10.º Na data mencionada em 4.º, a recorrente não tinha Plano de Gestão de Resíduos;
11.º A recorrente sabia que tinha de ter um Plano de Gestão de Resíduos;
12.º Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 4.º, existiam lamas de perfuração das sondagens;
13.º Ao actuar da forma descrita, a recorrente agiu sem o cuidado que o dever geral de prudência aconselha, revelando total desrespeito pelas regras que a execução da sua actividade impunha, uma vez que sendo uma pessoa colectiva experiente na área de prospecção lhe era exigível o conhecimento e aplicação das regras que a lei impõe para a actividade exercida, sendo censurável o seu não cumprimento;
14.º Em 31 de Dezembro de 2016, a recorrente apenas tinha enquadrado o membro do órgão estatutário BB;
15.º A recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais ambientais.
*
1.2. Factos não provados
a) A recorrente celebrou com o Estado Português, em Dezembro de 2012, um contrato para realizar prospecção de lítio na zona de ....
*
III. Motivação da matéria de facto

A convicção do Tribunal para determinação dos factos dados como provados e não provados resultou da análise crítica e ponderada do conjunto da prova produzida e examinada em sede de audiência de discussão e julgamento em conjugação com as regras da experiência comum e da livre convicção, em conjugação com os demais elementos de prova junto aos autos.
Desde logo, no que se refere à identificação da recorrente e demais elementos identificativos, a sua natureza, sede e escopo social, o tribunal teve em consideração a certidão permanente junta aos autos com a referência electrónica citius n.º 38615174.
No que concerne à data, hora e local da fiscalização realizada pela Guarda Nacional Republicana, o tribunal atendeu ao auto de contra-ordenação junto com a referência electrónica citius n.º 3305005.
A factualidade relacionada com o contrato celebrado, o seu teor, e a sua publicação no Diário da República, resultou da análise da documentação junta aos autos pela recorrente.
O facto de a recorrente, no ano civil de 2016, apenas tinha enquadrado o membro do órgão estatutário, resulta da informação prestada pela Segurança Social, junta com a referência electrónica citius n.º 38633113.
A inexistência de antecedentes contra-ordenacionais da recorrente, decorre da informação prestada pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, junta com a referência electrónica citius n.º 3389494.
No mais, o tribunal atendeu ao depoimento da testemunha CC, militar da Guarda Nacional Republicana, a exercer funções Núcleo de Protecção Ambiental da Guarda Nacional Republicana do Destacamento Territorial de ..., e agente autuante, que, desde logo, confirmou o teor dos autos de contra-ordenação juntos aos autos, afirmando que no dia 9 de Outubro de 2017, cerca da 12h00, se deslocou ao local em questão, tendo previamente confirmado que a concessão do local pertencia à recorrente, referindo que consultou o Diário de República, e aí chegado identificou um funcionário da recorrente, AA, a quem questionou pelo Plano de Gestão de Resíduos, constatando depois que este não existia. Mais esclareceu que a actividade de prospecção que envolve sondagens exige a existência do aludido plano, mais tendo confirmado que no local visualizou a existência de lamas provenientes das sondagens, que ali estavam a ser levadas a cabo, que não tinham bacia de retenção. Referiu que no local existiam vários furos já feitos, uns estavam selados e outros não. Mais confirmou que no local não se encontrava nenhum director técnico. Acrescentou que aquando da fiscalização de outras empresas que se dedicam à mesma actividade de prospecções de sondagens, estas exibem o Plano de Gestão de Resíduos.
A testemunha depôs de forma espontânea e isenta, relatando o que se recordava ter sucedido à data dos factos em discussão nestes autos, pelo que mereceu a credibilidade do tribunal.
O tribunal considerou, também, o depoimento da testemunha DD, militar da Guarda Nacional Republicana, a prestar serviço Núcleo de Protecção Ambiental da Guarda Nacional Republicana do Destacamento Territorial de ..., há cerca de 21 anos, que acompanhava o militar CC aquando da fiscalização realizada no dia em apreço nestes autos, tendo confirmado o teor dos autos de contra-ordenação juntos aos autos, e corroborado o depoimento de CC na íntegra. Esclareceu que numa fase em que são feitos trabalhos, gera-se sempre resíduos, confirmando que na realização de sondagens também se geram resíduos, partes que não se vão querer, e por isso, se são materiais/elementos que vão ficar no local, são resíduos.
A testemunha depôs de forma objectiva e escorreita, relatando o que se recordava, pelo que mereceu a credibilidade do Tribunal.
O legal representante da recorrente, BB, referiu que a recorrente foi contratada em Dezembro de 2012 para realizar trabalhos de prospecção, tendo subcontratado a realização de sondagens à empresa “EMP03...”, a qual, por sua vez, subcontratou a empresa “EMP02...”. Afirmou que a elaboração de um Plano de Gestão de Resíduos nunca foi exigida pelas entidades competentes, por o mesmo não ser obrigatório para a fase de prospecção, apenas para a fase de exploração. A fase de prospecção é uma fase de pesquisa, na qual se faz um buraco no solo, trabalhando com água para a broca conseguir fazer o furo, o qual demora quase um mês a fazer, retira-se o material, o qual depois é remetido para investigação, e que se traduz num procedimento menos evasivo que a exploração, explicando que não há resíduos, porque não há desperdício, não há lamas. Reiterou que apenas para a fase de exploração é necessário fazer um Plano de Gestão de Resíduos, e que na fase de prospecção não são gerados resíduos, nem lamas, e que após a realização do furo, este leva um tampo em ferro com identificação do mesmo, ficando fiéis depositários.
Acrescentou que a empresa “EMP03...” foi contratada apenas para fazer as sondagens, que a recorrente entregou um plano das sondagens que eram para realizar, sendo que não fez o acompanhamento desta actividade desenvolvida pela empresa “EMP03...” apenas recebiam as amostras e análise. Verbalizou que a recorrente não controlava a actuação da empresa “EMP03...”, e que a empresa “EMP02...” teria sido contratada por causa das máquinas necessárias á perfuração, e que aquela empresa devia supervisionar esta, mas não estaria no local a tempo inteiro.
Referiu que a contratação da recorrente era durante três anos com possibilidade de duas renovações de um ano cada, e era para lítio, e que o requerimento para pedido de prospecção da pesquisa tem programa de trabalhos e depois é aprovada pelas entidades competentes, as quais referem as regras que devem ser observadas. Acrescentando que a recorrente estava obrigada a fazer as sondagens, caso contrário estaria a incumprir o contrato com o Estado. Afirmou, ainda, que a recorrente não vendeu nada, apenas fez investigação.
Mais esclareceu que, na fase de exploração, depende a quem pode ser exigido o Plano de Gestão de Resíduos, mediante a circunstância de ser a recorrente a executar ou delegar a tarefa, sendo que na fase de prospecção nunca lhe exigiram um Plano de Gestão de Resíduos.
A testemunha ..., que trabalha para a empresa “EMP03...”, esclareceu de forma espontânea, que foi contratada pela recorrente em 2017, para realizar prospecções/sondagens, em ..., após a emprese ter apresentado uma proposta à recorrente. Explicou que a empresa “EMP03...” é uma empresa de construção, fazendo obras como viadutos, túneis, galerias de metro, e que tem enquadramento no objecto social e meios humanos especializados para a realização da actividade de prospecção e sondagens, nomeadamente, tinha geólogo, engenheiro civil especializado em geologia, e quanto aos meios materiais, designadamente, máquinas de perfuração, por se tratar de um equipamento muito específico, contrataram a empresa “EMP02...”. Referiu que este foi o primeiro trabalho que fizeram desta natureza, com este tipo de perfurações, passando a explicar que o procedimento consiste em fazer perfurações com uma broca de cerca de 10 centímetros de diâmetro, com recurso a água, que é utilizada em recirculação, e que tratando-se de uma perfuração destrutiva, a mesma gera pó, que misturado com a água gera lama, mas que isso não é um resíduo. A broca utilizada é oca, tendo uma broca no interior que faz a perfuração, enquanto a parte que a reveste encapsula o material que é retirado do solo, pelo que é sempre aproveitado tudo o que é retirado. A água utilizada não é totalmente em circuito fechado, existindo bacia de retenção, onde a água é depositada e reaproveitada, acrescentando que tem ideia que existia no local em questão, e que se não existia, tal seria responsabilidade da empresa “EMP02...”. Acrescentou que o local onde são realizados os furos fica intacto, e que os furos são depois selados. Confirmou que o material objecto das propspecções/sondagens era lítio, e que tinham conhecimento da legislação existente a respeito desta actividade, mas não falaram da necessidade de ter de existir um Plano de Gestão de Resíduos, por entenderem que tal não se aplicava a esta situação das propecções/sondagens, que não considera que esta actividade gere resíduos, que a água derramada não é resíduo.
A testemunha depôs de forma escorreita e objectiva, esclarecendo a sua intervenção na actividade de prospecção desenvolvida pela recorrente, assim como, os procedimentos levados a cabo, pelo que mereceu a credibilidade por parte do tribunal.
Por fim, teve em consideração que, também, o depoimento da testemunha EE, gerente da empresa “EMP02...”, o qual referiu que foi contratado pela empresa “EMP03...”, em 2016/2017, não tendo qualquer contacto com a recorrente, para proceder à colheita e recolha de amostras para caracterização de terrenos, isto é, realizar sondagens visando lítio, esclarecendo que a realização de sondagens é a actividade principal da empresa “EMP02...”. Explicou o procedimento de perfuração, o qual é feito através de uma máquina, que faz furo à rotação, avançando em profundidade para cortar o material e recolher a amostra. Que a ferramenta utilizada é diamantizada, e dentro da ferramenta vem a amostra do solo, pois a broca é oca no seu interior para reter a amostra no seu todo, sendo utilizada água para arrefecer a broca. Referiu que este procedimento não gera resíduos, porquanto a água que saiu do furo é reaproveitada, para não desperdiçar tanta água, e que a água não saí limpa, mas com pó misturado. Esclareceu que a bacia/poço de retenção é para reaproveitar a água, e para que parte da poeira que sai com a mesma fique depositada no fundo (muitas vezes elementos/pedras mais pesadas), tornando a água mais limpa para reutilização, por isso, se chama decantação a este procedimento, e que no final da sondagem recolhem esse material. Concretizou que o geotêxtil utilizado no poço é para que essas partículas não se introduzam no terreno e para deixar passar a água, tendo a tela um efeito drenante. Verbalizou que desconhece se a recorrente tinha Plano de Gestão de Resíduos, que isso é competência do cliente, que a empresa “EMP02...” tem esse tipo de planos, mas para situações relacionadas com a própria empresa.
A testemunha depôs de forma espontânea e isenta, esclarecendo a sua intervenção na actividade de prospecção desenvolvida pela recorrente, assim como, os procedimentos levados a cabo, merecendo credibilidade por parte do Tribunal.
Da análise dos elementos de prova acima referidos, conclui-se que, no local onde foi levantada a contra-ordenação à recorrente, estava aí a levar a cabo actividades de prospecção de lítio, e não tinha um Plano de Gestão de Resíduos para o efeito.
Com efeito, a recorrente, na pessoa do legal representante, mostrou-se conhecedora da legislação aplicável à gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais, afirmando que não tinha um Plano de Gestão de Resíduos, mais defendendo e reiterando que a actividade de prospecção, por ser feita de uma forma menos evasiva que a exploração, não exige a existência de um Plano de Gestão de Resíduos, motivo pelo qual não procedeu à sua elaboração. Mais referiu a recorrente que, tendo celebrado um contrato com o Estado Português, e tendo de passar por várias autorizações, em momento algum lhe foi exigido a elaboração de tal Plano de Gestão de Resíduos para esta fase de prospecção e sondagens, pelo que tal não lhe pode ser imputado. Mas, mesmo que assim não se entendesse, uma vez que as actividades de prospecção não foram executadas por si, mas por outras duas empresas, a responsabilidade nunca seria sua, nunca lhe podendo ser imputada a prática da aludida contra-ordenação.
Por outra parte, do que se expendeu supra, também é possível concluir que, e contrariamente ao afirmado pelo legal representante da recorrente e pelas testemunhas ..., e EE, a actividade de prospecção gera resíduos, nomeadamente, lamas, as quais são causadas pelo impacto da água utilizada para o funcionamento da broca com a poeira que é gerada pela acção de perfuração do solo, cuja existência foi constatada pelos agentes autuantes, aqui, testemunhas, no momento de levantamento do auto por contra-ordenação. Sendo que, no local deveria existir, para depósito e reutilização da água misturada com poeira que sai do buraco a ser perfurado, uma bacia/poço no local para recolha dessa água.
Atento tudo quanto se expôs supra, o tribunal ficou plenamente convencido de que os factos ocorrem tal como relatados pelas testemunhas CC e DD, e de acordo com o teor do respectivo auto de contra-ordenação, e, portanto, que a recorrente não tinha um Plano de Gestão de Resíduos, e que a própria recorrente confirmou também.
Ademais, sendo a recorrente uma empresa que se dedica à actividade de prospecção e exploração de recursos geológicos, designadamente, minérios, minerais industriais e recursos geotérmicos, actividades termais, actividades de investigação e desenvolvimento no domínio da prospecção e exploração de recursos geológicos, e comércio de materiais geológicos, sabia a mesma que estava obrigada a elaborar, ter e cumprir um Plano de Gestão de Resíduos. Pelo que o argumento de que celebrou um contrato com o Estado Português para direitos de prospecção a pesquisa de depósitos minerais de lítio, o que não resultou provado, e que pelas entidades competentes nunca lhe foi exigido a elaboração de qualquer Plano de Gestão de Resíduos para a fase de prospecção, nunca poderia ter acolhimento. A celebração de contratos com o Estado Português não isenta as partes contratantes de observar a legislação em vigor e aplicável ao caso concreto, legislação essa que a recorrente admitiu ter conhecimento. Dando, ainda, a entender a recorrente que caso lhe tivesse sido exigida a elaboração e cumprimento de tal Plano de Gestão de Resíduos para esta fase de prospecção, a mesma o teria feito, do que se conclui, aqui, por um facilitismo da recorrente na inobservância da legislação em vigor para esta matéria. Ou seja, como nunca lhe foi exigido, e entendendo estar salvaguarda pelo facto de as várias entidades públicas que autorizaram a sua actividade alegadamente nunca o terem determinado expressamente, a recorrente não cuidou de cumprir a lei, como se lhe impunha.
Assim, ao actuar da forma descrita, a recorrente agiu sem o cuidado que o dever geral de prudência aconselha, revelando total desrespeito pelas regras que a execução da sua actividade impunha, uma vez que sendo uma pessoa colectiva experiente na área de prospecção lhe era exigível o conhecimento e aplicação das regras que a lei impõe para a actividade exercida, sendo censurável o seu não cumprimento.
*
No que concerne à factualidade considerada como não provada, temos que apesar de a recorrente ter alegado que celebrou com o Estado Português em contrato para prospecção de lítio, na zona de ..., em Dezembro de 2012, e apesar de se ter considerado como provado que a recorrente, aquando do levantamento do auto por contra-ordenação se encontrava a fazer prospecções de lítio, a verdade é que a documentação junta, mormente, o aludido contrato e publicação do Diário da República, não dizem respeito a quaisquer direitos de prospecção a pesquisa de depósitos minerais de lítio, mas antes, de volfrâmio e estanho, que são minerais completamente diferentes.
*
IV. Direito

De acordo com o auto de contra-ordenação, os factos em apreço nestes autos remontam a 9 de Outubro de 2017, tendo sido proferida decisão administrativa pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território em 17 de Novembro de 2022.
A Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na versão conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, estabelece o regime aplicável às contraordenações ambientais e do ordenamento do território (art.º 1.º e art.º 2.º).
Ora, a prolação da decisão em causa já ocorreu após a entrada em vigor do Regime Jurídico das Contra-Ordenações Económicas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de Janeiro, em 28 de Julho de 2021, no entanto, constata-se que este diploma não operou qualquer alteração à Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na versão conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, mas somente alterou o Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro (Estabelece o regime jurídico a que está sujeita a gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais), na versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 31/2013, de 22 de Fevereiro, relativamente às normas previstas nos art.º 43.º (contra-ordenações económicas), art.º 45.º (Instrução de processos e aplicação de sanções) e art.º 46.º (Afectação do produto das coimas).
*
A recorrente foi condenada por decisão administrativa proferida em 17 de Novembro de 2022 pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, que ali correu termos com o processo N...8, no âmbito do qual aquela foi condenada pela prática, em 9 de Outubro de 2017, da infracção de falta do Plano de Gestão de Resíduos, previsto e punido pelo art.º 10.º, n.º 1 e art.º 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, com coima no valor de 12.000,00 €, assim como, no pagamento das respectivas custas do processo, no valor de 75,00 €.
A recorrente alegou que não praticou a contra-ordenação que lhe é imputada, pois a sua acção estava a coberto do contrato celebrado com o Estado. Mais alegando que, mesmo que assim não fosse, não pode ser responsabilizada pela actuação das empresas subcontratadas para levar a cabo as actividades de prospecção e sondagens, pois que a recorrente, por não ter meios próprios para executar as sondagens, nem humanos nem técnicos, contratou empresas pela sua área de competência, nada mais podendo fazer além disso, não tendo, por isso, violado o seu dever de cuidado, tendo sido responsável e diligente na sua actuação, devendo ser absolvida da contra-ordenação que lhe é imputada.
Subsidiariamente, alegou que não estava obrigada a possuir o aludido Plano de Gestão de Resíduos, o que resulta da própria lei, porquanto o aludido diploma se aplica à gestão de resíduos de explorações e depósitos minerais e de massa minerais, e a recorrente apenas desenvolveu a actividade de prospecção, a qual não gera resíduos, não estando esta actividade sujeita ao mesmo regime da exploração, sendo o Plano de Gestão de Resíduos apenas exigível para uma actividade extractiva.
Ainda, subsidiariamente, para o caso de se considerar que a recorrente praticou a contra-ordenação que lhe é imputada, requer a especial atenuação da coima, por se encontrarem preenchidos os requisitos legais.
Mais requerendo a suspensão da sanção que venha a ser aplicada.
*
Ora, o art.º 1.º, do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, dispõe que “[o] presente decreto-lei estabelece o regime jurídico a que está sujeita a gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à gestão dos resíduos das indústrias extractivas.”.
Preceituando o art.º 2.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, que “[o] presente decreto-lei aplica-se à gestão dos resíduos resultantes da prospecção, extracção, tratamento, transformação e armazenagem de recursos minerais, bem como da exploração das pedreiras, adiante designados por resíduos de extracção.”.
O art.º 3.º, do mesmo diploma, dispõe, além do mais que: “Para efeitos do disposto no presente decreto-lei, entende-se por: […] c) «Bacia» uma instalação natural ou tecnicamente preparada para a eliminação de resíduos finos, normalmente rejeitados, juntamente com volumes variáveis de água livre, resultantes do tratamento de recursos minerais e da clarificação e reciclagem de águas de processo; […] h) «Indústrias extractivas» todos os estabelecimentos que efectuem a extracção a céu aberto ou subterrânea de recursos minerais para fins comerciais, incluindo a extracção por perfuração e as actividades de transformação e ou tratamento do material extraído; […] n) «Operador» a pessoa singular ou colectiva responsável, nos termos do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro [actualmente o Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de Dezembro], pela gestão de resíduos de extracção, durante a armazenagem temporária de resíduos de extracção, e nas fases de funcionamento e de pós-encerramento; o) «Pessoa competente» o responsável técnico para explorações de massas minerais, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 270/2001, de 6 de Outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de Outubro, ou o director técnico para explorações de depósitos minerais, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 88/90, de 16 de Março; p) «Prospecção» a pesquisa e o reconhecimento de recursos minerais com valor económico, incluindo os trabalhos de amostragem por perfuração e ou escavação, com exclusão de quaisquer trabalhos necessários ao desenvolvimento de tais recursos minerais e quaisquer actividades directamente associadas a uma operação de extracção; […] t) «Recurso mineral» ou «mineral» um depósito ou uma massa mineral natural da ... terrestre de uma substância orgânica ou inorgânica, tais como os combustíveis energéticos, minérios metálicos, rochas industriais e rochas ornamentais, com exclusão da água;
u) «Rejeitados» os resíduos, sob a forma de sólidos ou lamas, constituídos pela fracção não aproveitável resultante do tratamento ou da transformação de recursos minerais por serragem ou corte e por processos mineralúrgicos de separação e ou de concentração, nomeadamente a trituração, moagem, crivagem, flutuação e outras técnicas físico-químicas, para acrescentar mais-valia ou extrair os minerais valiosos do material rochoso sem valor económico; v) «Resíduos» a definição constante da alínea u) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro; x) «Resíduos inertes» o resíduo que, nos termos do disposto no anexo i do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante, reúne as seguintes características: i) Não é susceptível de sofrer transformações físicas, químicas ou biológicas importantes; ii) Não é solúvel nem inflamável, nem tem qualquer outro tipo de reacção física ou química; iii) Não é biodegradável; iv) Não afecta negativamente outras substâncias com as quais entre em contacto de forma susceptível de aumentar a poluição do ambiente ou prejudicar a saúde humana; v) Possui lixiviabilidade total, conteúdo poluente e ecotoxicidade do lixiviado insignificante; vi) Não põe em perigo a qualidade das águas superficiais e ou subterrâneas; z) «Resíduo perigoso» a definição constante da alínea cc) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro; aa) «Sítio» todo o terreno sob o controlo de gestão de um operador, com uma localização geográfica bem definida;”.
Por sua vez, o art.º 4, do mesmo diploma, preceitua que “a exploração de depósitos minerais e de massas minerais deve, sempre que possível, evitar e reduzir a produção de resíduos, de modo a minimizar o seu carácter nocivo, e reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, utilizando, para o efeito, processos ou métodos insusceptíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente na criação de perigos para a água, o ar, o solo, a fauna e a flora, perturbações sonoras ou odoríficas ou de danos em quaisquer locais de interesse e na paisagem.”.
Já o art.º 5.º, n.º 1, do aludido diploma, dispõe que “os resíduos de extracção devem ser geridos sem pôr em perigo a saúde humana e sem utilizar processos ou métodos susceptíveis de agredir o ambiente, em especial sem criar riscos para os componentes ambientais naturais e humanos, garantindo a sua estabilidade física, evitando a contaminação do solo e a poluição do ar, das águas superficiais e das águas subterrâneas, tanto no curto como no longo prazo, e minimizando, tanto quanto possível, os impactos na paisagem.”, acrescentando o n.º 2 que “A gestão dos resíduos de extracção deve ser realizada com recurso às melhores técnicas disponíveis e tendo em conta as características técnicas da instalação de resíduos, a sua localização geográfica e as condições ambientais locais.”.
O art.º 10.º, n.º 1 do referido diploma, preceitua que “o operador deve elaborar um plano de gestão de resíduos para a minimização, tratamento, valorização e eliminação dos resíduos de extracção, tendo em conta o princípio do desenvolvimento sustentável.”.
Já o art.º 44.º, n.º 2, alínea a), do diploma legal em questão, dispõe que “constitui contra-ordenação ambiental grave, punível nos termos da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na sua redacção actual, a prática dos seguintes actos: a) Incumprimento do plano de gestão de resíduos previsto no artigo 10.º;”.
Conforme referido, a Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na redacção conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, estabelece o regime aplicável às contraordenações ambientais e do ordenamento do território (art.º 1.º, n.º 1), constituindo contra-ordenação ambiental todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal correspondente à violação de disposições legais e regulamentares relativas ao ambiente que consagrem direitos ou imponham deveres, para o qual se comine uma coima (art.º 1, n.º 2), considerando-se como legislação e regulamentação ambiental toda a que diga respeito às componentes ambientais naturais e humanas, tal como enumeradas na Lei de Bases do Ambiente (art.º 1.º, n.º 3). As contra-ordenações ambientais e do ordenamento do território são reguladas pelo disposto na presente lei e, subsidiariamente, pelo regime geral das contraordenações (art.º 2.º, n.º 1).
O art.º 9.º, do referido diploma, dispõe que:
“1 - As contraordenações são puníveis a título de dolo ou de negligência.
2 - A negligência nas contraordenações é sempre punível.
3 - O erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente exclui o dolo.”.
Por sua vez, o art.º 15.º, preceitua que “é punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução.”.
*
Ora, da análise dos normativos legais supra referidos, desde logo, se constata que o Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico a que está sujeita a gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à gestão dos resíduos das indústrias extractivas, é aplicável à gestão dos resíduos resultantes da prospecção, extracção, tratamento, transformação e armazenagem de recursos minerais, bem como, da exploração das pedreiras, adiante designados por resíduos de extracção (art.º 1 e art.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro), sendo que para efeitos do presente diploma, se considera indústrias extractivas todos os estabelecimentos que efectuem a extracção a céu aberto ou subterrânea de recursos minerais para fins comerciais, incluindo a extracção por perfuração e as actividades de transformação e ou tratamento do material extraído (art.º 3, alínea h) (sublinhado nosso).
Daqui se retira que a utilização da palavra “extracção” neste diploma não se subsume apenas às situações em que já se está numa fase de exploração de minas ou pedreiras, tendo, antes, um significado mais amplo, abrangendo toda e qualquer actividade realizada no âmbito deste diploma que implica extracção, incluindo na fase de prospecção, o que, além do mais, está em consonância com a Directiva 2006/21/CE, do parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006, relativa à gestão dos resíduos de indústrias extractivas e que altera a Directiva 2004/35/CE, e que o aludido Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, transpõe para a ordem jurídica interna. Com efeito, conforme referido no considerando (6) da mencionada Directiva “[a] presente directiva deverá, portanto, abranger a gestão dos resíduos de indústrias extractivas em terra, ou seja, os resíduos provenientes da prospecção, extracção (incluindo a fase de desenvolvimento pré-produção), tratamento e armazenagem de recursos minerais e da exploração de pedreiras […]”.
O que, de resto, está em concordância com o disposto no art.º 4 e art.º 5 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, no sentido de que a exploração de depósitos minerais e de massas minerais deve evitar e reduzir a produção de resíduos, minimizando o seu carácter nocivo, e reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, devendo utilizar processos ou métodos insusceptíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente, na criação de perigos para a água, o ar, o solo, a fauna e a flora, perturbações sonoras ou odoríficas ou de danos em quaisquer locais de interesse e na paisagem, e devendo os resíduos de extracção ser geridos sem pôr em perigo a saúde humana e sem utilizar processos ou métodos susceptíveis de agredir o ambiente, ou criar riscos para os componentes ambientais naturais e humanos, garantindo a sua estabilidade física, evitando a contaminação do solo e a poluição do ar, das águas superficiais e das águas subterrâneas, tanto no curto como no longo prazo, e minimizando, tanto quanto possível, os impactos na paisagem. Pelo que não faria sentido, atento estes desideratos, excluir a prospecção do cumprimento destas obrigações legais previstas neste diploma.
Aqui chegados, dúvidas não restam que o preceituado no art.º 10.º, n.º 1 do referido diploma, quanto à elaboração de um plano de gestão de resíduos para a minimização, tratamento, valorização e eliminação dos resíduos de extracção, tendo em conta o princípio do desenvolvimento sustentável, também se aplica na fase de prospecção.
Considerando a factualidade que se considerou provada, nomeadamente, que a recorrente se dedicava à actividade de prospecção de lítio, na zona de ..., e que não tinha Plano de Gestão de Resíduos, bem sabendo que era obrigada a elaborar e cumprir com o mesmo, e que não o fazendo, não agiu sem o cuidado que o dever geral de prudência aconselha, revelando total desrespeito pelas regras que a execução da sua actividade impunha, uma vez que sendo uma pessoa colectiva experiente na área de prospecção lhe era exigível o conhecimento e aplicação das regras que a lei impõe para a actividade exercida, sendo censurável o seu não cumprimento, temos que a conduta da recorrente preenche a tipicidade objectiva da contra-ordenação que lhe é imputada, assim como, o elemento subjectivo negligente, porquanto não actuou com a diligência a que estava obrigada e era capaz.
Mais alegou a recorrente que, mesmo que se entendesse que foi praticada uma contra-ordenação, a recorrente nunca poderia ser responsabilizada pela mesma, porquanto, não pode ser considerada “operador” para feitos do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, o qual é definido como a pessoa singular ou colectiva responsável, nos termos do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro [actualmente o Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de Dezembro], pela gestão de resíduos de extracção, durante a armazenagem temporária de resíduos de extracção, e nas fases de funcionamento e de pós-encerramento, porquanto tais actividades estavam ao encargos das empresas “EMP03...” e “EMP02...”, sendo a recorrente alheia à forma como procederam aos trabalhos.
Ora tal como já referido, o presente diploma tem de ser conjugado com a Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), a qual estabelece o regime aplicável às contraordenações ambientais e do ordenamento do território, e refere no seu art.º 15.º que é punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros.
Conforme resultou da factualidade provada, tendo tal sido, inclusivamente, admitido pela recorrente a empresa “EMP03...” foi contratada por si, e esta, por sua vez, contratou a empresa “EMP02...”, uma vez que não dispunha das máquinas necessárias para realizar as perfurações. E tal assim foi, porque a recorrente não dispunha nem de meios humanos, nem de meios materiais/técnicos para levar a cabo, por si, as prospecções e sondagens, tendo tido necessidade de subcontratar tais serviços, o que também foi admitido pela recorrente. Daqui se conclui que estas empresas estavam no local das prospecções a desenvolver uma actividade que a recorrente subcontratou, mas que era a recorrente parte interessada na mesma, agindo aqui as aludidas empresas como suas intermediárias.
*
Assim, conclui-se que o comportamento da recorrente é típico, encontrando-se preenchidos os elementos objectivo e subjectivo da prática pela recorrente de uma contra-ordenação, prevista e punida pelo art.º 10.º, n.º 1, em conjugação com o art.º 44.º, n.º 2, alínea a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, a título de negligência, nos termos do art.º 9.º, n.º 1 e n.º 2, e art.º 22.º, n.º 3, alínea b), da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais).
*
Da sanção aplicada

Considerando a improcedência das alegações da recorrente, mantém-se a decisão condenatória.
Ora, a entidade administrativa condenou a recorrente pela prática, 9 de Outubro de 2017, numa coima de 12.000,00 €, pela de falta do Plano de Gestão de Resíduos, previsto e punido pelo art.º 10.º, n.º 1 e art.º 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, a título de negligência, nos termos do art.º 9.º, n.º 1 e n.º 2, e art.º 22.º, n.º 3, alínea b), todos da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na redacção dada pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, assim como, no pagamento das respectivas custas do processo, no valor de 75,00 €.
Em sede de recurso, subsidiariamente, para o caso de se considerar que a recorrente praticou a contra-ordenação que lhe é imputada, requer a especial atenuação da coima, por se encontrarem preenchidos os requisitos legais, nos termos do disposto no art.º 23.º-A, n.º 2, alínea b) da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na redacção dada pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março. Mais requerendo a suspensão da aplicação da coima, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 20.º-A, do mesmo diploma legal.
Nos termos do disposto no art.º 18.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, a coima é determinada em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico alcançado, preceituando o art.º 20.º, n.º 1 da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na redacção dada pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, que “a determinação da coima e das sanções acessórias faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa do agente, da sua situação económica e dos benefícios obtidos com a prática do facto”, adiantando o n.º 2 que “na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a conduta anterior e posterior do agente e as exigências de prevenção”.
Por outra parte, de acordo com o disposto no art.º 22.º, n.º 3, alínea b), do referido diploma “3 - Às contraordenações graves correspondem as seguintes coimas: […] b) Se praticadas por pessoas coletivas, de (euro) 12 000 a (euro) 72 000 em caso de negligência e de (euro) 36 000 a (euro) 216 000 em caso de dolo.”.
Já o art.º 23.º-A, do mesmo diploma, preceitua que:
“1 - Para além dos casos expressamente previstos na lei, a autoridade administrativa atenua especialmente a coima, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores à prática da contraordenação, ou contemporâneas dela, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento do agente, nomeadamente, a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados e o cumprimento da norma, ordem ou mandado infringido;
b) Terem decorrido dois anos sobre a prática da contraordenação, mantendo o agente boa conduta.
3 - Só pode ser atendida uma única vez a circunstância que, por si mesma ou conjuntamente com outras circunstâncias, der lugar simultaneamente a uma atenuação especialmente prevista na lei e à prevista neste artigo.”.
Por sua vez, o art.º 23.º-B, do aludido diploma, dispõe que “sempre que houver lugar à atenuação especial da coima, os limites mínimos e máximos da coima são reduzidos a metade.”.
Compulsada a matéria factual, verifica-se que a recorrente em momento algum reconheceu estar obrigada a ter um Plano de Gestão de Resíduos, reiterando sempre que a actividade de prospecção não gera quaisquer resíduos, não atribuindo relevante impacto ambiental a tal actividade, e, não obstante ser conhecedora da legislação em vigor aplicável. Ora tal postura assumida pela recorrente é incompatível com considerar-se que nos presentes autos existem circunstâncias, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima. Note-se que o artigo fala em “diminuam por forma acentuada”, e não apenas diminuam, exigindo-se um mais além da diminuição, nomeadamente, que seja uma diminuição acentuada. Sendo certo que, o facto de já terem decorrido mais de seis anos desde a prática da contra-ordenação em causa não é suficiente, no entendimento do tribunal, para considerar que existem “circunstâncias, que diminuam por forma acentuada” ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima, tanto mais que a recorrente continua a exercer a aludida actividade, a qual representa o seu escopo societário.
Assim, tendo em consideração o exposto, entendo não se verificarem os pressupostos para atenuar especialmente a coima, pelo que não aplico a atenuação especial da coima.
*
Mais dispõe o art.º 20.º-A da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, que:

“1- Na decisão do processo de contraordenação, a autoridade administrativa pode suspender, total ou parcialmente, a aplicação da coima, quando se verifiquem as seguintes condições cumulativas:
a) Seja aplicada uma sanção acessória que imponha medidas adequadas à prevenção de danos ambientais, à reposição da situação anterior à infração e à minimização dos efeitos decorrentes da mesma;
b) O cumprimento da sanção acessória seja indispensável à eliminação de riscos para a saúde, segurança das pessoas e bens ou ambiente.
2 - Nas situações em que a autoridade administrativa não suspenda a coima, nos termos do número anterior, pode suspender, total ou parcialmente, a execução da sanção acessória.
3 - A suspensão pode ficar condicionada ao cumprimento de certas obrigações, designadamente as consideradas necessárias para a regularização de situações ilegais, à reparação de danos ou à prevenção de perigos para a saúde, segurança das pessoas e bens e ambiente.
4 - O tempo de suspensão da sanção é fixado entre um e três anos, contando-se o seu início a partir da data em que se esgotar o prazo da impugnação judicial da decisão condenatória.
5 - A suspensão da execução da sanção é sempre revogada se, durante o respetivo período, ocorrer uma das seguintes situações:
a) O arguido cometer uma nova contraordenação ambiental ou do ordenamento do território, quando tenha sido condenado pela prática, respetivamente, de uma contraordenação ambiental ou do ordenamento do território;
b) O arguido violar as obrigações que lhe tenham sido impostas.
6 - A revogação determina o cumprimento da sanção cuja execução estava suspensa.”.

Por sua vez, o art.º 30.º do aludido diploma dispõe:
“1 - Pela prática de contraordenações graves e muito graves podem ser aplicadas ao infrator as seguintes sanções acessórias:
a) Apreensão e perda a favor do Estado dos objectos pertencentes ao arguido, utilizados ou produzidos aquando da infracção;
b) Interdição do exercício de profissões ou actividades cujo exercício dependa de título público ou de autorização ou homologação de autoridade pública;
c) Privação do direito a benefícios ou subsídios outorgados por entidades ou serviços públicos, nacionais ou comunitários;
d) Privação do direito de participar em conferências, feiras ou mercados nacionais ou internacionais com intuito de transaccionar ou dar publicidade aos seus produtos ou às suas actividades;
e) Privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos que tenham por objecto a empreitada ou concessão de obras públicas, a aquisição de bens e serviços, a concessão de serviços públicos e a atribuição de licenças ou alvarás;
f) Encerramento de estabelecimento cujo funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de autoridade administrativa;
g) Cessação ou suspensão de licenças, alvarás ou autorizações relacionados com o exercício da respectiva actividade;
h) Perda de benefícios fiscais, de benefícios de crédito e de linhas de financiamento de crédito de que haja usufruído;
i) Selagem de equipamentos destinados à laboração;
j) Imposição das medidas que se mostrem adequadas à prevenção de danos ambientais, à reposição da situação anterior à infracção e à minimização dos efeitos decorrentes da mesma;
l) Publicidade da condenação;
m) Apreensão de animais.
2 - No caso de ser aplicada a sanção prevista nas alíneas c) e h) do número anterior, deve a autoridade administrativa comunicar de imediato à entidade que atribui o benefício ou subsídio com vista à suspensão das restantes parcelas dos mesmos.
3 - No caso do recebimento pelo infractor da totalidade ou parte do benefício ou subsídio, pode o mesmo ser condenado a devolvê-lo.
4 - As sanções referidas nas alíneas b) a j) do n.º 1 têm a duração máxima de três anos contados a partir da data da decisão condenatória definitiva.
5 - Quando se verifique obstrução à execução das medidas previstas nas alíneas f), i) e j) do n.º 1 do presente artigo, pode igualmente ser solicitada às entidades competentes a notificação dos distribuidores de energia eléctrica para interromperem o fornecimento desta.
6 - No caso de ser aplicada a sanção prevista na alínea m) do n.º 1 deve a autoridade administrativa comunicar de imediato à entidade licenciadora da respectiva actividade para que esta a execute.”.

Com este regime, pretendeu-se cuidar e prevenir a preservação do ambiente, que é património de toda a comunidade, não apenas pela via sancionatória, mas também através de medidas pedagógicas, tendo-se introduzido um regime de suspensão da execução da coima nas contraordenações ambientais, fazendo-a depender de condições que visem atingir aquele fim, impondo obrigações aos infractores.
Esta é a razão de ser que se extrai do actual regime de suspensão da coima em contra-ordenações ambientais, como sendo educar, impondo-se obrigações para melhor prevenir.
Da análise do art.º 20.º-A, resulta que a suspensão da execução das coimas apenas pode ser determinada caso ao mesmo tempo seja aplicada uma sanção acessória que imponha medidas adequadas à prevenção de danos ambientais, à reposição da situação anterior à infração e à minimização dos efeitos decorrentes da mesma, e o cumprimento de tal sanção acessória seja indispensável à eliminação de riscos para a saúde, segurança das pessoas e bens ou ambiente.
Ora, temos que nos casos dos autos, a autoridade administrativa não aplicou qualquer sanção acessória à recorrente.
No entanto, a este respeito, tem sido entendimento da jurisprudência que mesmo que a decisão administrativa recorrida não haja aplicado qualquer sanção acessória, tal não é impeditivo de, no âmbito da impugnação judicial, ao apreciar a pretensão de suspensão da execução da coima deduzida pela mesma, o tribunal possa e deva equacionar a aplicação de tal sanção, enquanto condição necessária para suspender a execução da coima. Nesse sentido, veja- se o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 05.11.2018, processo n.º 291/17.8T8PVL.G1, relator Jorge Bispo, disponível em www.dgsi.pt.
Tendo em consideração a norma que enumera as sanções acessórias aplicáveis no âmbito da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais), na redacção dada pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, fazendo uma ponderação de qual a previsão legal que melhor se adequaria no caso de se entender aplicar uma sanção acessória, temos que única sanção que poderia eventualmente ser ponderada, é a prevista no art.º 30.º, n.º 1, alínea j), que diz respeito à “imposição das medidas que se mostrem adequadas à prevenção de danos ambientais, à reposição da situação anterior à infracção e à minimização dos efeitos decorrentes da mesma;”. Todavia, considerando a natureza da contra-ordenação praticada pela recorrente, os factos em apreço, a data e contexto da sua verificação, nomeadamente, a falta de Plano de Gestão de Resíduos, prevista no art.º 10, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, aquando da realização de prospecções de lítio, conclui-se que não há nenhuma medida que possa ser aplicada à recorrente para efeitos de preenchimento deste preceito legal, porquanto, relativamente à questão da prevenção de danos ambientais, tal passaria precisamente por ter um Plano de Gestão de Resíduos e fazê-lo cumprir, o que a recorrente não fez, e quanto à reposição da situação anterior à infracção e/ou à minimização dos efeitos decorrentes da mesma, afigura-se que as mesmas não são exequíveis.
Pelo que em face da impossibilidade de aplicar uma sanção acessória à recorrente, por se entender que dada a contra-ordenação e factualidade em apreço, inexiste medida ou medidas adequadas que pudessem ser aplicadas no âmbito do art.º 30.º do já mencionado diploma, temos que o caso dos autos não preenche nenhum dos requisitos legais previstos no art.º 20.º-A da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, para a suspensão da coima.
Considerando o exposto, entendo que não estão verificados os pressupostos legais de que depende a aplicação da suspensão da coima aplicada, motivo pelo qual não suspendo a aplicação da coima. * V. Do destino do produto das coimas Nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 46.º do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, e art.º 73.º da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, por força da alteração operada pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, 29 de Janeiro (Regime Jurídico das Contra-Ordenações Económicas), o produto das coimas aplicadas na sequência de processos de contra-ordenação tramitados ao abrigo do regime previsto no Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, é repartido da em 45 % para o Fundo de Intervenção Ambiental, 30 % para a autoridade que o aplique, 15 % para a entidade autuante, e 10 % para o Estado. Dos elementos constantes dos autos, verifica-se que a entidade autuante é a Guarda Nacional Republicana, e a autoridade que a aplicou é a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território. Assim, determino que 45 % do produto da coima se destina ao Fundo de Intervenção Ambiental, 30% para a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, 15% para a Guarda Nacional Republicana, e 10 % para o Estado, nos montantes de 5.400,00 € (cinco mil e quatrocentos euros), de 3.600,00 € (três mil e seiscentos euros), de 1.800,00 € (mil e oitocentos euros), e de 1.200,00 € (mil e duzentos euros), respectivamente. * VI. Das custas No que diz respeito à condenação em custas, da análise da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na redacção conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março, dispõe o art.º 2.º, n.º 1 que “às contraordenações ambientais e do ordenamento do território são reguladas pelo disposto na presente lei e, subsidiariamente, pelo regime geral das contraordenações.”, e o art.º 57.º, n.º 2 que “se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de contraordenação regulam-se pelos preceitos reguladores das custas em processo criminal.”, pelo que para efeitos de determinação das custas da fase judicial deverá atender-se ao estipulado no Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro. Mantendo-se a condenação da recorrente pela prática da contra-ordenação pela qual foi condenada na aludida decisão administrativa, e a respectiva condenação numa coima, condeno a recorrente no pagamento das custas processuais e demais encargos, fixando-se o valor da taxa de justiça em 2 (duas) unidades de conta (UC), nos termos e para os efeitos do disposto nos art.º 92.º, n.º 1, art.º 93.º, n.º 3, art.º 94.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 433/82 de 27 de Outubro, e art.º 8.º, n.º 7, e tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
*
VII. Decisão

Nos termos das disposições e fundamentos acima mencionados, julgo improcedente o recurso de contra-ordenação apresentado pela recorrente “EMP01..., Lda.” e, em consequência:

a) Mantenho a decisão proferida pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, e condeno a recorrente, pela prática de uma contra-ordenação, prevista e punida pelo art.º 10.º, n.º 1, em conjugação com o art.º 44.º, n.º 2, alínea a), todos da Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, e art.º 22.º, n.º 3, alínea b), da Lei 50/2006, de 26 de Março, na coima de 12.000,00 €;
b) Determino que 45 % do produto da coima se destina ao Fundo de Intervenção Ambiental, 30% para a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, 15% para a Guarda Nacional Republicana, e 10 % para o Estado, nos montantes de 5.400,00 € (cinco mil e quatrocentos euros), de 3.600,00 € (três mil e seiscentos euros), de 1.800,00 € (mil e oitocentos euros), e de 1.200,00 € (mil e duzentos euros), respectivamente;
c) Condeno a recorrente nas custas processuais e demais encargos, fixando o valor da taxa de justiça em 2 (duas) unidade de conta (UC), nos termos e para os efeitos do disposto nos art.º 92.º, n.º 1, art.º 93.º, n.º 3, art.º 94.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 433/82 de 27 de Outubro, e art.º 8.º, n.º 7, e tabela III do Regulamento das Custas Processuais, ex vi art.º 2.º, n.º 1 e art.º 57.º da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na versão actualizada conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março.
*
Notifique e deposite, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 372.º, n.º 4 e n.º 5 e art.º 373.º, n.º 2 do Código de Processo Penal ex vi art.º 41.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 433/82 de 27 de Outubro ex vi art.º 2.º, n.º 1 da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na versão actualizada conferida pela Lei n.º 25/2019, de 26 de Março.
*
Após trânsito, comunique a presente decisão à Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 70.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (Regime Geral das Contra-Ordenações).

3- Apreciação do recurso

3.1-  A recorrente, com as suas alegações de recurso, juntou dois documentos.
Em processo penal existe norma específica que baliza o momento processual em que os documentos podem ser juntos ao processo. Com efeito, o artigo 165º, nº 1 do CPP estatui que “O documento deve ser junto no decurso do inquérito ou da instrução e, não sendo isso possível, deve sê-lo até ao encerramento da audiência”.
Por isso, em processo de contraordenação, não sendo os documentos juntos na fase administrativa, apenas o poderão ser em caso de recurso de impugnação judicial até ao encerramento da audiência, cfr. artigo 41º do RGCO.
Após o encerramento da audiência, nomeadamente, em sede recurso, a lei não permite a junção de documentos.
Esta solução legal tem naturalmente a sua razão de ser. Efetivamente, não podemos olvidar que o objeto do recurso ordinário é escrutínio da decisão recorrida, constituindo um remédio jurídico que possibilita a deteção e a reparação de erros que possam ter ocorrido na instância inferior. O recurso não se destina a resolver questões novas. E por isso o tribunal de recurso apenas poderá decidir com base nos mesmos elementos em que se baseou o tribunal recorrido e não em quaisquer outros.
Outrossim, a permitir-se a junção de documentos em fase de recurso, o contraditório a exercer seria limitado, uma vez que apenas seria permitido o contraditório por escrito. E, para além disso, o contraditório poderia constituir motivo de retardamento do processo por ter de ser exercido o contraditório relativamente a documentos oferecidos em resposta a documentos primeiramente apresentados por um dos sujeitos processuais.
Neste sentido, o qual tem tido apoio do Tribunal Constitucional, vide v.g. Acs. STJ de 27.10.2010 e de 05.12.2012, respetivamente, processos números 72/06.4GACBT.G1.S1 e 704/10. 0PVLSB. L1. S1, publicados em www.dgsi.pt, Ac. TC 289/20, disponível em www.tribunalconstitucional.pt, e Santos Cabral, in Código de Processo Penal Comentado, Almedina, 2014, pág. 697.
Por conseguinte, não irão ser considerados os documentos juntos pela recorrente com as suas alegações de recurso.
3.2- Porque estamos no âmbito de um recurso de contraordenação, importa ter presente o disposto no artigo 75º, nº 1 do RGCO, segundo o qual “Se o contrário não resultar deste diploma, a 2ª instância apenas conhecerá da matéria de direito…”.
Ora, segundo a interpretação que, na jurisprudência, tem sido feita do referido preceito legal, e que não vemos razões para discordar, em recurso de contraordenação o Tribunal da Relação funciona como tribunal de revista e apenas conhece da matéria de direito[3].
A intervenção do Tribunal da Relação no processo contraordenacional é idêntica à do Supremo Tribunal de Justiça no processo penal. E daí que o Tribunal da Relação possa ser confrontado com os vícios e as nulidades dos nºs 2 e 3 do artigo 410º do C. P. Penal, sendo que os vícios do nº 2 do artigo 410º do CPP estão ligados, por vezes umbilicalmente, com a (re) apreciação da matéria de facto[4], cfr. António Beça Pereira, Regime Geral das Contraordenações e Coimas, Almedina, 2017, 12ª ed., pág. 236 e seguintes.
No que concerne aos vícios decisórios previstos no artigo 410º, nº 2 do CPP, como decorre literalmente dos dizeres deste preceito legal, eles terão de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou por forma conjugada com as regras da experiência comum.
Na resposta ao parecer da Exma. Procuradora-Geral Adjunta, a recorrente veio sustentar que “.. do texto da decisão recorrida, conjugada com as regras da experiência comum, resulta – com o devido respeito – que o Tribunal recorrido cometeu erro notório na apreciação da prova ao não considerar provado que a Recorrente tenha celebrado com o Estado Português, em Dezembro de 2012, um contrato para realizar a prospeção de lítio na zona de ..., decorrendo desta decisão que a Recorrente não estaria autorizada a executar as sondagens mencionadas nos autos, 7. O que, desde logo, não se pode aceitar, visto que esta factualidade não foi abordada em sede de decisão administrativa.”, repetindo parcialmente a argumentação das suas alegações de recurso (cfr. conclusões 2ª a 5ª).
Porém, não assiste razão à recorrente.
Na verdade, o facto em que se consubstancia a contraordenação pela qual a recorrente foi condenada consiste apenas em ela ter efetuado prospeção de lítio sem dispor de Plano de Gestão de Resíduos. Por isso, não está em causa a existência ou falta de autorização administrativa da recorrente para proceder à prospeção de lítio, em .... Este facto é, porém, instrumental relativamente ao objeto destes autos, pois que assim se compreende a que título a recorrente se encontrava, na data dos factos, através de entidade subcontratada, a proceder à prospeção de lítio.
Neste contexto, foi a recorrente quem, no recurso de impugnação judicial que interpôs, alegou que “em 07.12.2012 a Impugnante celebrou com o Estado Português um contrato (administrativo) para prospeção e pesquisa de depósitos minerais…” ;  “Em outubro de 2017, quando foi intercetada pelas autoridades policiais, a Impugnante estava a executar sondagens autorizada pela DGEG”, cfr. pontos 5 e 11.
Na sentença recorrida foi considerado tal facto como não provado, porque não foi junto o necessário comprovativo.
Efetivamente, na sentença recorrida foi considerado não provado que:
 “a) A recorrente celebrou com o Estado Português, em Dezembro de 2012, um contrato para realizar prospeção de lítio na zona de ....”
E, em sede de motivação da sua convicção, o Tribunal aquo explicou, por forma coerente e lógica, a sua decisão, pois disse expressamente que:  “ No que concerne à factualidade considerada como não provada, temos que apesar de a recorrente ter alegado que celebrou com o Estado Português em contrato para prospecção de lítio, na zona de ..., em Dezembro de 2012, e apesar de se ter considerado como provado que a recorrente, aquando do levantamento do auto por contra-ordenação se encontrava a fazer prospecções de lítio, a verdade é que a documentação junta, mormente, o aludido contrato e publicação do Diário da República, não dizem respeito a quaisquer direitos de prospeção a pesquisa de depósitos minerais de lítio, mas antes, de volfrâmio e estanho, que são minerais completamente diferentes.  “ 
Nesta conformidade, no caso vertente, do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugadamente com as regras da experiência comum, não se deteta qualquer dos vícios decisórios do nº 2 do artigo 410º do CPP, designadamente, não se vislumbrando a ocorrência de qualquer erro, e muito menos notório ou ostensivo, na apreciação da prova.
Em síntese, porque os documentos juntos com as alegações de recurso não podem aqui ser considerados, e bem assim porque a decisão recorrida não padece de qualquer vício do nº2 do artigo 410º do CPP, a matéria de facto (provada e não provada) tem-se como intangível, improcedendo, consequentemente, este segmento do recurso.
3.3- A recorrente alega que a sentença recorrida é nula por ter pretendido colmatar deficiência da decisão administrativa com a inclusão do facto provado nº 13, nos termos do disposto no artigo 379º, nº 1 al. b) do CPP, ex vi do artigo 41º do RGCO.
O ponto13 dos factos provados da sentença recorrida tem a seguinte redação:
“Ao actuar da forma descrita, a recorrente agiu sem o cuidado que o dever geral de prudência aconselha, revelando total desrespeito pelas regras que a execução da sua actividade impunha, uma vez que sendo uma pessoa colectiva experiente na área de prospecção lhe era exigível o conhecimento e aplicação das regras que a lei impõe para a actividade exercida, sendo censurável o seu não cumprimento;”
Segundo a recorrente, “a sentença recorrida, ao dar por provado o facto 13, visou colmatar clara deficiência da decisão administrativa, o que lhe está vedado”.
 Porém, a recorrente não concretizou em que consiste a por si alegada deficiência da decisão administrativa. Antes se limitou a citar o acórdão desta Relação de 29.05.2023, processo 485/22.4T9BRC.G2, disponível em www.dgsi.pt, no qual foi apontada à decisão administrativa a omissão de factos relativos ao elemento subjetivo da contraordenação.
No que concerne à omissão da descrição na decisão administrativa dos factos relativos ao elemento subjetivo da contraordenação, decorre da alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do Decreto-Lei 433/82, de 27.10, que a decisão que aplique uma coima deverá conter a descrição dos factos imputados com a indicação das provas obtidas. Quanto a este ponto, a jurisprudência é consensual, divergindo apenas no que se refere às consequências em caso de omissão dos factos relativos ao elemento subjetivo da contraordenação, as quais poderão ser: absolvição, arquivamento e devolução do processo à autoridade administrativa para suprir a nulidade. Assim, vide v.g. Ac. RC de 11.11.2020, processo 351/19.0T8MBR.C1; Ac. RC de 30.03.2022, processo 173/21.9T8TND.C1, Ac. RP de .09.11.2022, processo 1004/22.8T9AVR.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. 
A decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima constitui, sem dúvida, um ato decisório, mas que, em caso de recurso de impugnação judicial, equivale a uma acusação, cfr. artigo 62º, nº 1 do RGCO.     
Por isso, da decisão administrativa que aplique uma coima deverão necessariamente constar os factos relativos à contraordenação cometida /imputada (objetivos e subjetivos), por aplicação da al. a) do n.º 1 do artigo 379.º, ambos do CPP, ex vi do art. 41.º, do RGCO.
Todavia, isso não significa que em caso de recurso, a decisão administrativa que aplica uma coima, mas que não é uma sentença, esteja sujeita ao mesmo rigor formal de uma sentença penal. Neste sentido, vide v.g. Ac. RC de 09.01.2019, processo 257/18.0T8SRT.C1, e Ac. RE de 11.01.2022, 231/21.0T8SSB.E1, disponíveis em www.dgsi.pt. 
Na verdade, no âmbito de um processo por contraordenação, as exigências formais são outras, devendo, contudo, no que toca aos factos que integram o elemento subjetivo de uma contraordenação, exigir-se apenas que a autoridade administrativa, na sua decisão, considerada como um todo, tome posição, por forma inequívoca, sobre os factos que integram o dolo ou a negligência, descrevendo-os. Até porque, como é sabido, o nº1 do artigo 8º do RGCO consagra o princípio da nulla poena sine culpa. O arguido só pode ser responsabilizado pelo cometimento da infração se tiver agido com dolo ou com negligência, sob pena de não ter atuado de forma culposa. E sem culpa não há responsabilidade contraordenacional, cfr. António Beça Pereira, Regime Geral das Contraordenações e Coimas, Almedina, 2017, pág. 53.
No caso vertente, foi precisamente isso que sucedeu, pois que, lendo a decisão administrativa, depois de nela terem sido elencados os factos objetivos que integram a contraordenação imputada, são igualmente descritos os factos que integram o elemento subjetivo do referido ilícito, designadamente nos pontos i) e j) dos factos provados, os quais têm a seguinte redação:
“i) A arguida exerce atividade industrial regulada por lei, pelo que tinha obrigação de conhecer e cumprir com o ali prescrito para o exercício da mesma, in casu o DL n.º 10/2010 de 04/02, concernemente à gestão de resíduos de predreiras;
j) Não o tendo feito, através do seu legal representantes e/ou funcionários, não agiu com a diligência necessária e de que era capaz, não resultando dos autos elementos que retirem ilicitude aos factos ou censurabilidade à sua conduta.”
E, em sede de culpa, foi acrescentado o seguinte: “Pela matéria provada considera-se a conduta da arguida subsumível na alínea a) do artigo 15.º do Código Penal, aplicável ex vi do artigo 32º do regime Geral das Contraordenações e Coimas” (…) tendo violado o dever de cuidado a que estava adstrita e de que era capaz, é sancionável a título de negligência…”
Da análise comparativa da decisão administrativa e da sentença recorrida somos levados a concluir que o ponto 13 dos factos provados tem, no essencial, o mesmo conteúdo ou significado que as passagens transcritas da decisão administrativa. No fundo trata-se de dizer o mesmo, utilizando outras palavras, porventura por forma mais estruturada.
Por conseguinte, não assiste razão à recorrente quanto à questão em apreço.
3.4-  A recorrente sustenta que não estava obrigada a possuir Plano de Gestão de Resíduos por a sua atividade de prospeção de lítio não gerar resíduos. No seu entender, apenas a atividade extrativa, ou seja, quando está em causa uma atividade mineira e de exploração industrial está sujeita a Plano de Gestão de Resíduos.   Segundo a sua interpretação, o DL 10/2010, de 04.02, apenas se aplica à gestão de resíduos de explorações e depósitos minerais e de massas minerais.
Todavia, não pode aqui ser acolhida a interpretação efetuada pela recorrente do referido diploma legal, o qual é claro quanto à questão suscitada, pois que:
O artigoº 1.º, do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de fevereiro, dispõe que “O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico a que está sujeita a gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à gestão dos resíduos das indústrias extrativas.”.
E, logo a seguir, o artigo 2.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, que “O presente decreto-lei aplica-se à gestão dos resíduos resultantes da prospeção, extracção, tratamento, transformação e armazenagem de recursos minerais, bem como da exploração das pedreiras, adiante designados por resíduos de extracção.” (negrito nosso).
Acresce que o artigo 3º al. p) define “prospeção” como consistindo “ a pesquisa e o reconhecimento de recursos minerais com valor económico, incluindo os trabalhos de amostragem por perfuração e ou escavação, com exclusão de quaisquer trabalhos necessários ao desenvolvimento de tais recursos minerais e quaisquer atividades diretamente associadas a uma operação de extração” ( negrito nosso).
Como bem se refere na sentença recorrida “ … o Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico a que está sujeita a gestão de resíduos das explorações de depósitos minerais e de massas minerais, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à gestão dos resíduos das indústrias extractivas, é aplicável à gestão dos resíduos resultantes da prospecção, extracção, tratamento, transformação e armazenagem de recursos minerais, bem como, da exploração das pedreiras, adiante designados por resíduos de extracção (art.º 1 e art.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro), sendo que para efeitos do presente diploma, se considera indústrias extractivas todos os estabelecimentos que efectuem a extracção a céu aberto ou subterrânea de recursos minerais para fins comerciais, incluindo a extracção por perfuração e as actividades de transformação e ou tratamento do material extraído (art.º 3, alínea h) (sublinhado nosso).
Daqui se retira que a utilização da palavra “extracção” neste diploma não se subsume apenas às situações em que já se está numa fase de exploração de minas ou pedreiras, tendo, antes, um significado mais amplo, abrangendo toda e qualquer actividade realizada no âmbito deste diploma que implica extracção, incluindo na fase de prospecção, o que, além do mais, está em consonância com a Directiva 2006/21/CE, do parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006, relativa à gestão dos resíduos de indústrias extractivas e que altera a Directiva 2004/35/CE, e que o aludido Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, transpõe para a ordem jurídica interna. Com efeito, conforme referido no considerando (6) da mencionada Directiva “[a] presente directiva deverá, portanto, abranger a gestão dos resíduos de indústrias extractivas em terra, ou seja, os resíduos provenientes da prospecção, extracção (incluindo a fase de desenvolvimento pré-produção), tratamento e armazenagem de recursos minerais e da exploração de pedreiras […].
O que, de resto, está em concordância com o disposto no art.º 4 e art.º 5 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de Fevereiro, no sentido de que a exploração de depósitos minerais e de massas minerais deve evitar e reduzir a produção de resíduos, minimizando o seu carácter nocivo, e reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, devendo utilizar processos ou métodos insusceptíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente, na criação de perigos para a água, o ar, o solo, a fauna e a flora, perturbações sonoras ou odoríficas ou de danos em quaisquer locais de interesse e na paisagem, e devendo os resíduos de extracção ser geridos sem pôr em perigo a saúde humana e sem utilizar processos ou métodos susceptíveis de agredir o ambiente, ou criar riscos para os componentes ambientais naturais e humanos, garantindo a sua estabilidade física, evitando a contaminação do solo e a poluição do ar, das águas superficiais e das águas subterrâneas, tanto no curto como no longo prazo, e minimizando, tanto quanto possível, os impactos na paisagem. Pelo que não faria sentido, atento estes desideratos, excluir a prospecção do cumprimento destas obrigações legais previstas neste diploma.
Aqui chegados, dúvidas não restam que o preceituado no art.º 10.º, n.º 1 do referido diploma, quanto à elaboração de um plano de gestão de resíduos para a minimização, tratamento, valorização e eliminação dos resíduos de extracção, tendo em conta o princípio do desenvolvimento sustentável, também se aplica na fase de prospecção.”
Ademais, a prospeção de lítico provoca resíduos ( o artigo 2º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 10/2010, de 4 de fevereiro refere-se expressamente a eles), como aliás sucedeu no caso em apreço, porquanto, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas nos factos provados, a recorrente efetuou pesquizas de prospeção de lítio, e existiam lamas de perfuração das sondagens (cfr. factos provados 5, 6 e 12).
Como refere o Ministério Público na resposta ao recurso, “Aceitar um argumento em que inexiste responsabilidade ambiental no caso da execução de um plano de prospeção, cujos contratos duram (…) anos e em que a extensão no terreno se alastra por hectares de vida natural, seria conceder que a natureza somente merece ser alvo de proteção no caso do seu explorador lucrar de imediato desses comportamentos.
A intenção do legislador no Decreto-Lei n.º 10/2010 ao transpor a Diretiva Comunitária n.º 2006/21/CE foi de impedir a contaminação dos solos e a degradação da natureza envolvente nas investidas da procura dos minerais, evitando que aconteçam os mesmos erros do passado.
Em momento algum, quis excluir, como se percebe da leitura de todo o diploma legal e não meramente de conceitos que interessam à defesa do recorrente, que abrange a totalidade de operadores/exploradores/empresas ou qualquer outra denominação que se lhe pretenda atribuir.”.
Constitui, aliás, um facto notório que a atividade de prospeção produz resíduos, ainda que em menor grau do que a atividade extrativa, e por isso, deve estar contemplado em plano próprio elaborado para tal atividade.
Por conseguinte, improcedente o recurso também nesta parte.
3.5- Segundo a recorrente “É incontroverso que a Recorrente não executou as sondagens (cfr. facto provado 6), sendo forçoso concluir que não foi o operador e se as lamas de perfuração de sondagens referidas no facto provado 12 constituem um resíduo e tendo sido produzidas pela EMP02..., então cabia a esta empresa a obrigação se elaborar o PGR, pois constitui-se operador para efeitos legais e, assim sendo, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por atribuir responsabilidades à Recorrente que a lei não prevê”, cfr. conclusão 13ª
Assim, a recorrente declina a sua responsabilidade pela contraordenação, com fundamento em que quem efetuou as sondagens foi uma entidade subcontratada, no caso a firma “EMP02...”.
Esta questão foi suscitada pela recorrente quer na fase administrativa do processo, quer na fase de impugnação judicial, tendo a responsabilidade pela contraordenação sido atribuída à recorrente.
 Como consta do sumário do Acórdão desta Relação de Guimarães de 27.01.2020, processo 510/19.6T8FAF.G1, disponível em www.dgsi.pt, “A expressão "órgãos no exercício das suas funções", utilizada no art. 7º, n.º 2, do RGCO, que define o modelo de imputação adotado para a responsabilidade contraordenacional, tem aqui uma abrangência maior que os centros institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou pelo colégio de indivíduos, abrangendo, por interpretação extensiva, os trabalhadores ao serviço da pessoa coletiva ou equiparada, que são quem pratica ou omite os atos suscetíveis de censura contraordenacional, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando atuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo, não se quedando assim pelos seus órgãos sociais.”
No referido acórdão, fundamentou-se a referida posição, sustentando que: “O art. 7º, n.º 1, do RGCO, ao dispor que "as coimas podem aplicar-se tanto às pessoas singulares como às pessoas coletivas, bem como às associações sem personalidades jurídicas", consagra o princípio da responsabilidade contraordenacional das pessoas coletivas.
Quanto ao modelo de imputação adotado para a responsabilidade contraordenacional, dispõe o n.º 2 do mesmo artigo que “[a]s pessoas coletivas ou equiparadas são responsáveis pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções”.
Na decisão recorrida, para fundamentar a responsabilização da arguida, o Mm.º Juiz referiu expressamente aderir ao entendimento de que as pessoas coletivas ou equiparadas são responsáveis pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções, nestes se integrando os trabalhadores ao seu serviço desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas, havendo, assim, que fazer uma leitura menos restritiva do citado artigo, sob pena de, não o fazendo, desembocarmos na irresponsabilidade das sociedades, pois sempre que os atos ou omissões fossem praticados pelos seus trabalhadores, independentemente de serem ou não praticados de acordo com as instruções da entidade patronal, no exercício de funções e no interesse da mesma, não haveria responsabilidade da sociedade.

É efetivamente esse o entendimento maioritário da jurisprudência[4], ao considerar que a expressão "órgãos no exercício das suas funções", utilizada no art. 7º, n.º 2, do RGCO, tem aqui uma abrangência maior que os centros institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou pelo colégio de indivíduos, abrangendo, por interpretação extensiva, os trabalhadores ao serviço da pessoa coletiva ou equiparada, que são quem pratica ou omite os atos suscetíveis de censura contraordenacional, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando atuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo, não se quedando assim pelos seus órgãos sociais.
Há também quem defenda a necessidade de uma interpretação atualista do n.º 2 do art. 7º do RGCO, de forma a harmonizar o seu alcance com a norma posteriormente introduzida no art. 11º, n.º 2, do Código Penal, central na legislação penal, de modo a que as pessoas coletivas ou entidades equiparadas sejam responsabilizadas pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções e também quando cometidas em seu nome e no interesse coletivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança, ou quando cometidas por quem aja sob a autoridade das pessoas antes referidas em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbam.
Também no Parecer n.º 11/2013[5], o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República concluiu que «[o] preceito do n.º 2 do artigo 7.º do Regime Geral das Contraordenações deve ser interpretado extensivamente, como, aliás, tem sido feito pela jurisprudência, incluindo do Tribunal Constitucional, de modo a incluir os trabalhadores, os administradores e gerentes e os mandatários ou representantes da pessoa coletiva ou equiparada, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas», adotando assim «(…) a tese da responsabilidade autónoma da pessoa coletiva, o que se traduz, na prática, na possibilidade de imputação da responsabilidade contraordenacional à pessoa coletiva desde que seja cometida uma infração tipificada como ilícita e que seja imputável a alguém que atue por conta ou em nome da pessoa jurídica (titulares dos seus órgãos, mandatários, representantes ou trabalhadores).».
Na doutrina são críticos desta posição Nuno Brandão[6] e Augusto Silva Dias[7].
Este último autor defende que,
de jure constituto, a responsabilidade contraordenacional das pessoas coletivas assenta num modelo orgânico e não numa imputação direta e autónoma, quer o fundamento dessa responsabilidade se encontre num "defeito estrutural da organização empresarial" (defective corporate organization) ou "culpa autónoma por défice de organização", quer pela imputação a uma pessoa singular funcionalmente ligada à pessoa coletiva. Assim, nos casos em que o executante é mandatário, representante ou funcionário da pessoa coletiva e atua no exercício de funções, o facto típico só é imputável ao órgão e, por via deste, à pessoa coletiva por ele vinculada, se o dirigente, mandatário, representante ou funcionário tiverem agido no cumprimento de ordens desse órgão ainda que genéricas, não deixando, no entanto, o autor de considerar criticável, esta limitação, por ser inadequada à natureza da responsabilidade contraordenacional e de certo modo contraditória com o princípio da equiparação implícito no art. 7º, n.º 1, do RGCO.
Recentemente, no acórdão n.º 566/2018[8], o Tribunal Constitucional concluiu que inexistem razões para questionar e desconsiderar a referida interpretação extensiva do art. 7º, n.º 2, do RGCO. Como se pode ler no seguinte excerto desse aresto:
«Acresce que o termo “órgão”, do ponto de vista conceptual, não está necessariamente associado a um centro autónomo e institucionalizado de poderes funcionais – a uma realidade institucional ou estatutária (sobre as diferentes conceções a respeito da natureza de órgãos, v., por exemplo, FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, vol. I, 4.ª ed., Almedina, Coimbra, 2015, pp. 624 e ss.). Por isso mesmo, são descortináveis diversas definições legais de “órgão”, consoante os fins concretamente visados pelo diploma em que as mesmas se inserem (v., a título meramente exemplificativo: o artigo 20.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo – «centros institucionalizados de poderes e deveres para efeitos da prática de atos jurídicos imputáveis à pessoa coletiva» –; e o artigo 1.º, alínea c), do Código de Processo Penal - «entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer atos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados por este Código»).
Na perspetiva material da atividade dos entes coletivos (por contraposição à perspetiva da sua estrutura organizatória) – que é aquela que releva a propósito da imputação de condutas individuais a uma pessoa coletiva –, pode entender-se o órgão como o indivíduo cuja atuação é imputada ao ente coletivo. Estando em causa uma conduta correspondente a uma declaração de vontade, é evidente que as regras estatutárias sobre os processos deliberativos internos tendem a assumir maior relevância (cfr. a mencionada definição legal constante do artigo 20.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo). Mas, tratando-se de simples atuações materiais, nada obsta a que a imputação se fundamente com base numa atuação em nome do ente coletivo e no seu interesse (representante) ou na circunstância de o mesmo indivíduo dispor no âmbito de tal ente de autoridade ou de uma posição de liderança para controlar a respetiva atividade.
Nessa medida, faltando uma definição legal própria aplicável no domínio específico do RGCO, e abstraindo de argumentos teleológicos e outros argumentos sistemáticos (por exemplo, uma maior adequação ao princípio da equiparação consignado no artigo 7.º, n.º 1, do RGCO), não se pode ter por absolutamente incompatível com o sentido literal do termo “órgão” referido no artigo 7.º, n.º 2, do RGCO um entendimento extensivo do mesmo, na linha da previsão das alíneas a) e b) do n.º 2 e do n.º 4 do artigo 11.º do Código Penal. De resto, o artigo 32.º do RGCO reforça tal entendimento: «[e]m tudo o que não for contrário à presente lei aplicar-se-ão subsidiariamente, no que respeita à fixação do regime substantivo das contraordenações, as normas do Código Penal» (e não, por exemplo, as do Código do Procedimento Administrativo; itálico aditado).»”. No mesmo sentido, vide v.g. o Ac. RL de 12.01.2023, processo 741/21.9Y4LSB.L2-9, disponível em www.dgsi.pt.
Acresce que no que refere à autoria o Regime Geral das Contraordenações e Coimas contém norma específica própria, a qual não coincide com o regime geral previsto no âmbito penal.
Assim, artigo 16º do RGCO refere que:
“1 - Se vários agentes comparticipam no facto, qualquer deles incorre em responsabilidade por contraordenação mesmo que a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependam de certas qualidades ou relações especiais do agente e estas só existam num dos comparticipantes.
2- Cada comparticipante é punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes.
3- É aplicável ao cúmplice a coima fixada para o autor, especialmente atenuada.”  [5] 
A referida norma, diferentemente do que sucede no âmbito do direito penal, consagra segundo a doutrina dominante[6], que não vemos razões válidas para discordar, o conceito extensivo de autor, segundo o qual autor é todo aquele que tiver dado um contributo causal para a realização do facto típico.
No entanto, como bem refere o Prof. Silva Dias[7] “Esta formulação é extremamente ampla, inadequada e inoperante, pois contributos causais todos dão, mesmo quem intervém numa fase muito recuada na cadeia causal, sendo impossível efetuar distinções com base nela”.
Daí que, segundo este Ilustre Professor[8] “…autor será em regra a pessoa singular ou coletiva que surge como destinatária do dever e pratica a ação ou omissão que se traduz na respetiva violação. O domínio do facto não é um critério adequado para determinação da autoria em infrações que consistem na violação de um dever pois é irrelevante neste quadro quem tem o domínio da ação lesiva ou perigosa para o bem jurídico”.
E mais adiante[9], no que se refere à distinção dos contributos para o facto entre o autor e o cúmplice, acrescenta o citado professor, “A caraterização da autoria requer a acumulação de dois elementos: pertença do agente ao círculo dos destinatários do dever; e criação por ele de um risco proibido de violação desse dever”, sendo que o critério do domínio do facto, pensado para o âmbito do direito penal, pouca utilidade oferece.
No caso em apreço, importa não olvidar que está aqui em causa uma infração que se traduz na violação de deveres. Ou seja, o dever de ter e observar um Plano de Gestão de Resíduos.
Ora, tendo presente a natureza específica da conduta em que se traduz a imputada contraordenação, o destinatário do dever é, sem sombra de dúvidas, uma entidade que se dedica a atividades de prospeção e exploração de recursos geológicos, designadamente, minérios, minerais industriais e recursos geotérmicos, atividades termais, atividades de investigação e desenvolvimento no domínio da prospeção e exploração de recursos geológicos, e comércio de materiais geológicos, no caso a arguida EMP01..., Lda, que detinha autorização para efetuar trabalhos de prospeção no local dos factos, ou seja, em ....
 E, para além disso, foi ela quem, na referida qualidade, determinou a realização dos trabalhos de prospeção de lítio, sem o dito Plano de Gestão de Resíduos, criando o risco de violação do dever. Em consequência, somente ela pode ser autora da referida contraordenação, sendo para o caso irrelevante ter-se socorrido de entidades terceiras independentes, através de contrato de empreitada ou subempreitada, por não dispor de meios materiais /técnicos para, por si, levar as prospeções e sondagens, tanto mais que não resultou provado que estas tenham atuado contra instruções recebidas da arguida.
Nesta conformidade, não nos resta senão concluir no sentido de que os factos provados fazem incorrer a arguida na prática da contraordenação que lhe foi imputada e pela qual foi condenada.
3.6- A recorrente pugna pela atenuação especial da coima, considerando o seu valor exorbitante, cfr. conclusão Q. Todavia, nada mais referiu no sentido de fundamentar esta sua pretensão. 
Tendo presente a contraordenação destes autos, à atenuação especial da coima refere-se o artigo 23º-A da Lei nº 50/2006, de 29.08, na redação dada pela Lei nº 114/2015, de 28.08, o qual estabelece que:
“1 - Para além dos casos expressamente previstos na lei, a autoridade administrativa atenua especialmente a coima, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores à prática da contraordenação, ou contemporâneas dela, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima.
2- Para efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter havido atos demonstrativos de arrependimento do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados e o cumprimento da norma, ordem ou mandado infringido;
b) Terem decorrido dois anos sobre a prática da contraordenação, mantendo o agente boa conduta.
3- Só pode ser atendida uma única vez a circunstância que, por si mesma ou conjuntamente com outras circunstâncias, der lugar simultaneamente a uma atenuação especialmente prevista na lei e à prevista neste artigo.”
No que concerne à aplicação da coima mais adequada ao caso concreto, o instituto da atenuação especial da coima apresenta-se como a válvula de segurança do sistema.
Na verdade, como refere F. Dias, In Direito Penal Português- As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 302 «Desde há muito que se põe em relevo que a capacidade de previsão do legislador é necessariamente limitada e inevitavelmente ultrapassada pela riqueza e multiplicidade das situações reais da vida. E que, em consequência, mandamentos irrenunciáveis de justiça e de adequação (ou “necessidade”) da punição impõem que – quando esteja em causa uma atenuação da responsabilidade do agente (…) – o sistema seja dotado de uma válvula de segurança. Quando, em hipóteses especiais, existam circunstâncias que diminuam por forma acentuada as exigências de punição de facto, deixando aparecer a sua imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo “normal” de casos que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respetiva, aí teremos mais um caso especial de determinação da pena …».
Porém, ainda segundo F. Dias, ob. cit. págs. 306 e 307, “A diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto resultante da atuação da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respetivo. Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue –, quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os casos “normais”, lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios”.
Contudo, a imagem global especialmente atenuada do facto a que se refere F. Dias, não se reporta apenas à conduta em que se consubstancia o ilícito, havendo que considerar outras circunstâncias, mesmo que irrelevantes sob o ponto de vista da gravidade da culpa e da ilicitude, como sejam o comportamento anterior e posterior do arguido ou o lapso de tempo decorrido desde o facto, contanto que se apresentem como especialmente relevantes na perspetiva da menor necessidade de pena.
Por outro lado, a imagem global especialmente atenuada tem necessariamente de resultar da apreciação da conduta concreta do arguido e da sua relação com a moldura abstrata prevista legalmente prevista, donde seja de concluir que esta moldura, em particular o seu limite mínimo, não se mostre adequado ao caso concreto, por ser excessivo.  
No caso vertente, a contraordenação foi praticada com negligência, sendo que a moldura contraordenacional legalmente prevista vai de € 12.000,00 a €72.000,00, tendo sido aplicado no caso concreto o valor mínimo de €12.000,00.
Dos factos provados não resulta que a recorrente tenha praticado, antes ou após os factos, qualquer contraordenação, designadamente de natureza ambiental.
Na sentença recorrida foi considerado não dever proceder-se à atenuação especial da coima porque “Compulsada a matéria factual, verifica-se que a recorrente em momento algum reconheceu estar obrigada a ter um Plano de Gestão de Resíduos, reiterando sempre que a actividade de prospecção não gera quaisquer resíduos, não atribuindo relevante impacto ambiental a tal actividade, e, não obstante ser conhecedora da legislação em vigor aplicável. Ora tal postura assumida pela recorrente é incompatível com considerar-se que nos presentes autos existem circunstâncias, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima. Note-se que o artigo fala em “diminuam por forma acentuada”, e não apenas diminuam, exigindo-se um mais além da diminuição, nomeadamente, que seja uma diminuição acentuada. Sendo certo que, o facto de já terem decorrido mais de seis anos desde a prática da contra-ordenação em causa não é suficiente, no entendimento do tribunal, para considerar que existem “circunstâncias, que diminuam por forma acentuada” ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima, tanto mais que a recorrente continua a exercer a aludida actividade, a qual representa o seu escopo societário.”.
Ora, como começamos por dizer, a recorrente, no sentido de fundamentar a sua pretensão de ver atenuada especialmente a coima, referiu somente que o seu montante é exorbitante, apesar de ter sido fixada no mínimo legal.  
Pese embora o decurso do tempo desde a data da prática dos factos, não existem circunstâncias anteriores ou posteriores à contraordenação ou contemporâneas dela que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da coima.
No essencial concorda-se com a argumentação constante da sentença recorrida que decidiu não atenuar especialmente a coima, em particular quando refere que “..verifica-se que a recorrente em momento algum reconheceu estar obrigada a ter um Plano de Gestão de Resíduos, reiterando sempre que a actividade de prospecção não gera quaisquer resíduos, não atribuindo relevante impacto ambiental a tal actividade, e, não obstante ser conhecedora da legislação em vigor aplicável.”
Ora, o problema da gestão de resíduos constitui uma questão central dos novos tempos em que vivemos, que não pode ser incompreendido ou menosprezado, que urge atacar com urgência e eficácia, sob pena de graves consequências em matéria de qualidade de vida ambiental nos dias que correm, mas sobretudo para as próximas gerações. Isto serve para dizer que, no caso presente, a necessidade da coima, o mesmo é dizer as exigências de prevenção (não apenas prevenção geral, mas também prevenção especial, face à descrita conduta da arguida) são elevadas.
 Outrossim, a ilicitude do facto e a culpa são as supostas pela contraordenação perpetrada, não se verificando, no caso concreto, quaisquer circunstâncias que determinem que se verifique uma imagem global especialmente atenuada dos factos, que não foi a prevista pelo legislador quando fixou a moldura abstrata da contraordenação.          
Por conseguinte, tudo ponderado, entendemos não ser de proceder à atenuação especial da coima.
Nesta conformidade, o recurso improcede também nesta parte e, consequentemente, na sua totalidade.

III - DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.
Custas pala arguida/ recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3Ucs - artigo 57.º, n.º 2, da Lei n.º 50/2006, de 29.08, na redação que lhe foi introduzida pela Lei n.º 114/2015, de 28.08, artigo 513.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e artigo 8º, nº 9 do R.C.P. e tabela III anexa a este último diploma legal.
Texto integralmente elaborado e revisto pelo seu relator e revisto pelos seus signatários – artigo 94º, nº 2 do CPP, encontrando-se assinado eletronicamente na 1ª página, nos termos do disposto no artigo 19º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09.
Notifique.
Guimarães, 09 de abril de 2024

Armando Azevedo ( Relator)
Pedro Freitas Pinto (1º Adjunto)
Anabela Varizo Martins (2º Adjunto)
  
    

[1] Nas transcrições das peças processuais irá reproduzir-se a ortografia segundo o texto original, sem prejuízo da correção de erros ou lapsos manifestos e da formatação do texto, da responsabilidade do relator.
[2] Por força do disposto no nº 4 do artigo 74º do RGCO - Regime Geral das Contraordenações e Coimas, aprovado pelo DL nº 433/82, de 27.10, na redação atualmente em vigor, diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem - o recurso seguirá a tramitação do recurso em processo penal, tendo em conta as especialidades que resultam deste diploma.
[3] Assim, vide, v.g, Ac RE de 06.01.2015, processo 2090/10.9TBLLE.E2, acessível em www.dgsi.pt.
[4] E são de conhecimento oficioso do tribunal, cfr. Ac. do STJ nº 7/95, de 19.10, in DR, I-A, de 28.12.1995.   
[5] Esta norma é em tudo idêntica à norma correspondente da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto (Lei Quadro das Contraordenações Ambientais), que é o artigo 17º, aqui aplicável. Por isso, vale para o caso tudo o que se disser a propósito da lei geral, que é o RGCO.
[6] Assim, vide, entre outros, Frederico da Costa Pinto, O ilícito de mera ordenação social e a erosão do princípio da subsidiariedade da intervenção penal, RPCC, Ano 7, Fasc. 1, pág. 7 e segs.; F. Dias, O movimento de descriminalização e o ilícito de mera ordenação social, pág. 332; Para uma dogmática do direito penal secundário, pág. 64 e anotação 104; Augusto Silva Dias, Direito das Contra-Ordenações, Almedina, 2018, pág. 135 e segs.; Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, Universidade Católica Editora, pág. 72. Vide também os Acs. TC nºs 99/2009, 198/2010 e 139/2012.
[7] Ob. cit., pág. 138.
[8] Ob. cit., pág. 139.
[9] Ibidem.