Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
472/23.5T8CHV-A.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: EXECUÇÃO
CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO
FALTA DE TÍTULO EXECUTIVO
INEXIGIBILIDADE
PER
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Os efeitos do incumprimento do plano de recuperação enunciados no art. 218.º, n.º 1, al. a) “ex vi” do art. 17º-F, n.º 13, ambos do CIRE – como seja a cessação dos efeitos da moratória ou do perdão de créditos –, produzem-se desde que o credor interpele por escrito o devedor que se tenha constituído em mora e a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias a contar dessa interpelação.
II - Compete ao credor/exequente, nos termos do n.º 1 do art. 342.º do CC, a prova de ter feito essa interpelação escrita.
III - Não obstante o incumprimento das obrigações decorrentes do plano de recuperação, se a credora/exequente não lograr provar a efetivação de tal interpelação admonitória, a moratória e o perdão do plano de recuperação homologado não ficam sem efeito.
IV - Nesse caso, não ocorre a repristinação do crédito originário, posto que a credora/exequente não fica livre para exigir, querendo, a totalidade do valor em dívida.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

EMP01..., Lda., AA, BB, CC e DD, executados nos autos principais de execução para pagamento de quantia certa, movidos por EMP02... STC, S.A., deduziram oposição à execução, mediante embargos de executado, pedindo a extinção da execução, com todas as legais consequências, designadamente o levantamento da penhora sobre o imóvel melhor identificado no auto de penhora.
Alegaram para tanto, e em síntese, a apresentação a PER da sociedade executada e homologação do respetivo plano no ano de 2015, e a apresentação a 2.º PER no ano de 2022, tendo sido recusada a homologação do respetivo plano.
Apesar disso, as medidas previstas no Plano de Recuperação, aprovado e homologado no ano de 2016, não ficaram sem efeito, inexistindo qualquer incumprimento do mesmo, pois as medidas previstas no anterior Plano de Recuperação - nomeadamente a moratória e perdão de juros e a impossibilidade da exequente executar as garantias enquanto se mantiver o cumprimento do mesmos (Ponto 4.3 do Plano já junto como Doc. n.º ...) - apenas ficariam sem efeito se o Credor EMP02..., ora Exequente, tivesse interpelado por escrito, o que não fez, a Sociedade Executada e a mesma não cumprisse a prestação em falta no prazo de 15 dias, contados a partir da referida interpelação.
Alegaram também a inexigibilidade do crédito exequendo, porquanto, tendo a Sociedade Executada suspendido o pagamento das prestações devidas, para que o crédito em causa se considerasse vencido e, em consequência exigível, necessário era que o ora Exequente, credor, que se fez valer do disposto no artigo 781.º CC, tivesse comprovado que interpelou não só a Sociedade Executada, devedora principal, como também, os garantes da devedora, ora 2.º, 3.º, 4.º e 5.º Executados.
Mais alegaram que, para além de recair sobre o devedor a obrigação de interpelar o devedor principal, para efeitos do disposto no artigo 781.º do CC, recai, ainda, sobre o mesmo a obrigação de interpelar os garantes do devedor principal, sob pena de os mesmos continuarem a beneficiar do prazo de pagamento inicialmente acordado, conforme disposto no artigo 782.º do CC pois a faculdade que é concedida ao credor de exigir antecipadamente o cumprimento de toda a obrigação, em caso de inadimplemento em relação a alguma das prestações acordadas, não é extensiva aos garantes da obrigação.
Por outro lado, alegaram também que, nos termos do registo da hipoteca ora em causa, encontra-se assegurado o montante máximo de € 409.750,00 pelo que o imóvel, património dos Garantes, 2.º, 3.º, 4.º e 5.º Executados, garante apenas até ao valor constante do registo constitutivo da hipoteca e não qualquer outro valor, bem como a prescrição dos juros, posto que as quantias exigidas a título de juros, no valor de € 4.245,63, alegadamente vencidos até 07.12.2015, encontram-se há muito, prescritos, bem como os juros alegadamente vencidos desde ../../2015 até ao ano de 2018, em virtude de já se terem vencido há mais de 5 anos, razão pela qual nunca poderia o ora Exequente exigir aos ora Executados, a título de juros, o montante de € 253.089,12.
Acrescentam ainda que, por força do disposto no n.º 2 do artigo 693.º do CC, os ora 2.º, 3.º, 4.º e 5.º Executados não respondem por mais de 3 anos de juros sobre o capital em dívida, o qual ascende a € 148.194,12, em virtude da prescrição dos restantes valores peticionados pelo Exequente
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Recebidos liminarmente, a exequente/embargada apresentou contestação, na qual concluiu pela improcedência dos embargos de executado deduzidos (ref.ªs ...95 e ...67).
Alegou, em síntese, que o PER n.º 307/15.... de 2015/2016 (primeiro plano), nunca foi implementado quanto à dívida executada, nem quanto a diversos outros credores, nunca foi cumprida uma única prestação, sendo que no PER n.º 447/22...., quanto ao crédito reclamado pela Embargada, o mesmo foi ali reconhecido na totalidade conforme peticionado nos presentes autos.
Também alegou que os presentes autos executivos, não resultam da prolação do Despacho de Nomeação do Administrador Judicial Provisório referente ao segundo PER como alegam os embargantes, antes sim pelo incumprimento integral do primeiro plano, conforme determinado no segundo PER e pela não homologação deste último.
Acrescenta que, após a não homologação do PER e depois de terem sido interpelados, os Executados/Embargantes não diligenciaram pelo pagamento dos montantes em divida, realçando que a sociedade executada não suspendeu os pagamentos, antes, sim, nunca cumpriu qualquer prestação.
Alega também que ainda que se pudesse equacionar que os 2.º, 3.º, 4.º e 5.º executados pudessem desconhecer a empresa ou a contabilidade por estarem executados apenas na qualidade de proprietários da garantia hipotecária, a verdade é que a gerência da sociedade executada é exercida pelo 2.º executado e este e os demais 3.º, 4.º e 5.º executados são sócios da mesma e ainda que os Executados/Embargantes pudessem eventualmente estar confundidos nos pagamentos efetuados, a verdade é que nunca procederam a qualquer pagamento quanto ao crédito da Exequente/Embargada, isso mesmo ficou assente no segundo Processo Especial de Revitalização que correu termos junto do Juízo de Comércio de ..., sob o n.º 447/22...., conforme Reclamação de Créditos, Lista provisória de credores e Douto Despacho juntos com o requerimento executivo, sendo certo que os 2.º, 3.º, 4..º e 5.º executados/Embargantes são, nos presentes autos, apenas executados na qualidade de proprietários da garantia hipotecária (art.54.º, n.º 2, e 735.º n.º 2, ambos do CPC).
No que concerne à prescrição dos juros, a questão foi já apreciada e julgada improcedente no despacho de 03.07.2022, proferido no PER n.º447/22.... no âmbito da reclamação de créditos.
Por último, alega que a hipoteca unilateral constituída a favor do Banco 1..., S.A., agora da exequente, para garantia do contrato de conta corrente caucionada, garante os seguintes montantes: a) Capital no valor de € 275.000,00; b) Juro anual de 11%, acrescido de 4% em caso de mora e a título de cláusula penal; c) Montante máximo assegurado no valor de € 409.750,00, todavia, o valor garantido pela hipoteca, de acordo com o n.º 2, do artigo 693.º do Código Civil, cifra-se no montante de capital em divida, acrescido dos juros relativos a três anos, até ao limite do montante máximo assegurado, sendo que a hipoteca abrange o capital e juros de 3 anos mas o mesmo não ocorre quanto Sociedade executada.
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Foi elaborado despacho saneador, onde se afirmou a validade e a regularidade da instância, tendo de seguida sido fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, bem como foram admitidos os meios de prova (ref.ª ...82).
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Procedeu-se a audiência de julgamento (ref.ª ...68).
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Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença (ref.ª ...55), datada de 4/12/2023, nos termos da qual, julgando os embargados de executado improcedentes, determinou o prosseguimento dos autos principais de execução.
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Inconformados com esta sentença, dela interpuseram recurso os executados/embargantes (ref.ª ...67), tendo rematado as suas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«a) A douta sentença recorrida padece de um claro erro de julgamento, por conter um vício notório que se prende com um erro na apreciação efetuada dos meios de prova, motivo pelo qual, deve ser reapreciada tanto a matéria de direito, como também a matéria de facto;
b) Com efeito, consta da douta sentença recorrida que os factos provados resultam “da conjugação da prova documental junta aos autos principais com o requerimento e título executivo”, mas não foi junta aos autos principais qualquer cópia do contrato de Conta Corrente Caucionada REFERÊNCIA ...40, sequer foi efetuada qualquer prova de que por via do mesmo tenha sido disponibilizada a quantia de € 250.000,00;
c) O douto Tribunal a quo limitou-se a transcrever para o Facto Provado sob o n.º 5 o que consta do teor da reclamação de créditos junta com o requerimento executivo sob o Doc. n.º ..., com qual não foi junta cópia de qualquer outro documento e não bastando tal alegação para dar como provado o facto elencando sob o n.º 5;
d) Por conseguinte, deve ser retirado dos Factos dados como provados, o Facto elencando sob o n.º 5;
e) Em face do teor dos documentos juntos aos autos, deve ainda ser alterada a redação do Facto Provado sob o n.º 16, passando a constar do mesmo, o seguinte:
f) “Por carta datada de 19 de setembro de 2022 e sob o “ASSUNTO: Interpelação para pagamentoN/Ref.:...87/...88/...45/...64/000804310362020_000000000000000/0 00804310362020_043103620200001/000800012930029_000800352184097/...84 097_003521840970024/ ...71” a exequente interpelou os executados BB e DD, para pagamento do montante de € 495.822,94, correspondente ao não pagamento das prestações já vencidas e não pagas relativas ao crédito supra referido, bem como todas as prestações de capital vincendas”;
g) Não resulta provado que tal missiva tenha sido rececionada por aqueles, pois não foi efetuada qualquer ligação entre a mesma e os vários comprovativos da suposta entrega retirados do site dos Correios ..., além de que as datas são completamente distintas da data aposta na mesma, pois consta de tais comprovativos:
...43... 02/02 o envio foi devolvido ao remetente
...33... 17/01 o envio foi entregue
...65... 18/01 o envio foi entregue
...74... 18/01 o envio foi entregue
...88... 18/01 o envio foi entregue
h) Acresce que, foi ainda junta aos autos cópia da parte de detrás de um envelope onde se pode ler: “Não atendeu/Encerrado Data: 07/11/2022”
i) Devem também ser retirados dos Factos Provados, os Factos elencados sob os n.ºs 17 e 22, pois os mesmos não se encontram provados, mediante a documentação que se encontra junta aos autos para tal efeito, e tal como é reconhecido na douta sentença recorrida, em sede de audiência de julgamento não foi produzida qualquer outra prova;
j) E ainda ser alterado o Facto Provado sob o n.º 25, pois os autos de execução foram instaurados em 03/03/2023 e não 03/07/2023, conforme consta certificado do Requerimento Executivo, devendo por isso o mesmo ter o seguinte teor: “Os autos principais de execução foram instaurados em 03/03/2023”;
k) Por último, deve ainda ser aditado um novo Facto Provado do qual conste: “Os executados foram citados nos autos principais de execução em 04/04/2023”, pois tal resulta explanado nos próprios autos principais de execução;
l) Acresce ainda que, é manifesta a falta de título executivo nos presentes autos executivos, e contrariamente ao alegado na douta sentença recorrida, não estamos perante um título executivo complexo, pois:
i) Em 1.º lugar, a escritura dada à execução não é uma escritura de mútuo com hipoteca, é uma escritura de hipoteca genérica ou global, como aliás, e bem, consta do n.º 6 dos Factos dados Provados;
ii) Em 2.º lugar, nem tal escritura de hipoteca genérica ou global, nem o despacho de homologação do PER no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 307/15...., nem o despacho de nomeação de Administrador Provisório no âmbito de um novo Processo Especial de Revitalização instaurado, em 24/02/2022 constituem títulos executivos à luz do disposto no artigo 703.º n.º 1 do CPC, pois não importam a constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;
iii) E em 3.º lugar, também não constituem títulos executivos, e pelas mesmas razões, a cópia da reclamação de créditos apresentada pelo Banco 1... no Proc.º n.º 307/15...., a cópia da sentença homologatória do plano de recuperação proferida no Proc.º n.º 307/15.... e a cópia da sentença que ordenou o encerramento do Proc.º n.º 447/22...., as quais também foram juntas com o requerimento executivo;
m) Ora, e como já se viu supra, não se encontra provada/demonstrada a celebração do Contrato de Conta Corrente Caucionada, menos ainda a disponibilização do montante referenciado como tenho sido efetuada, ambos elementos-chave para considerar a existência de título executivo;
n) Sendo hoje Jurisprudência assente que só o conjunto formado por aquele Contrato e por um documento que prove a concretização de um empréstimo é que será um título executivo, conforme dispõe aliás o artigo 707.º do CPC;
o) Acresce que, a escritura dada à execução, na qual não foi concedido qualquer montante, mas apenas constituído uma hipoteca genérica ou global (que é uma hipoteca em que se convenciona que o devedor a constitui para garantia do pagamento das responsabilidades  assumidas ou a assumir – dívidas futuras), para garantia de “todas as operações de crédito concedidas ou a conceder”, também não constitui, por si só, título executivo, uma vez que a simples constituição da hipoteca, sem mais, não importa a constituição ou o reconhecimento de uma obrigação, apenas demonstra a constituição de uma garantia;
p) Acresce ainda que, a apelada, contrariamente ao alegado na douta sentença recorrida, não deu à execução um título complexo (que em rigor não existe, pois nenhum dos documentos juntos com o requerimento executivo constitui em conjunto com os restantes título executivo, nos termos do disposto no artigo 703.º do CPC), mas sim a escritura de hipoteca genérica ou global, tendo mesmo alegado que: “A hipoteca que garante o contrato supra indicado constitui título jurídico bastante de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 703.º do Código de Processo Civil, e goza de garantia real sobre o bem imóvel, dado como garantia”;
q) Por outro lado, a reclamação de créditos no âmbito de um PER não tem como objetivo primordial a satisfação desses mesmos créditos, apenas gozando da força de caso julgado formal, não tendo por isso eficácia externa, nem valendo fora do próprio PER, como é Doutrina e Jurisprudência aceite;
r) Ademais e de acordo com o disposto no artigo 734.º do CPC, o Juiz pode conhecer, oficiosamente, até ao 1.º ato de transmissão dos bens (o qual ainda não ocorreu nos presentes autos), das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º do CPC, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo;
s) Termos em que, e sob pena de violação do disposto nos artigos acima elencados, o douto tribunal a quo devia ter conhecido, da manifesta a falta de título executivo nos presentes autos de execução, devendo a ora apelada ser convidada a suprir as irregularidades do requerimento executivo, nos termos do disposto no artigo 726.º do CPC e, em consequência, ser suspensa a tramitação processual dos autos de execução, até que tais irregularidades se mostrem devidamente sanadas;
t) Sempre sem conceder, diga-se ainda, que a alegada obrigação é também inexigível, porquanto não ocorreu a interpelação dos executados, nomeadamente da sociedade executada, conforme a Lei obriga;
u) Do supra exposto resulta claro que não se encontra, sequer, provado que os executados BB e DD tenham rececionado a missiva cuja cópia se encontra junta aos autos, datada de 19/09/2022 e também não ficou provado, dado o teor daquela (acima reproduzido), que a mesma respeitasse ao incumprimento do Contrato Conta Corrente Caucionada ...40;
v) Relativamente aos restantes executados, incluindo a sociedade executada, não foi efetuada qualquer prova, referente a qualquer tipo de interpelação, sendo certo que, e tal como já se referiu supra, a reclamação de créditos apresentada em sede de PER, apenas tem eficácia interna, não valendo como caso julgado material (eficácia interna e externa – cfr. artigo 619.º do CPC);
w) Com efeito, a ora apelada não executou o alegado primitivo crédito, nem sequer interpelou a sociedade executada nos termos do disposto no artigo 218.º n.º 1 alínea a) do CIRE, aliás, sequer demonstrou ter interpelado a sociedade executada para o que quer que fosse;
x) Pelo que, mal andou o douto Tribunal a quo, ao concluir como concluiu, pela interpelação dos executados e consequente exigibilidade do alegado crédito, pois nem foi provado o incumprimento do plano, nem a interpelação dos executados, como já se demonstrou;
y) Sendo certo que, que para efeitos de instauração da presente execução, ficando sem efeito as moratórias e perdões previstos no plano que foi objeto de aprovação e homologação, teria antes de mais, de ser cumprido o disposto no acima citado artigo 218.º n.º 1 alínea a) do CIRE, aplicável ex-vi artigo 17.º-F, n.º 13 do mesmo diploma;
z) In casu, as medidas previstas no Plano de Recuperação que foi objeto de aprovação e homologação apenas ficariam sem efeito se, a ora apelada, tivesse interpelado por escrito a sociedade executada e a mesma não cumprisse a prestação em falta no prazo de 15 dias, contados a partir da referida interpelação;
aa) O que não foi alegado e muito menos provado que tivesse sido feito;
bb) No que respeita à prescrição de juros, mais uma vez mal andou o Tribunal a quo, desde logo, porque nos PERS nunca foi apreciada qualquer questão relacionada com a prescrição de juros e porque ainda que o fosse, tal não relevava na apreciação que pudesse ser efetuada nestes autos, uma vez, como já se disse e se reitera, a reclamação de créditos no âmbito de um  PER não tem como objetivo primordial a satisfação desses mesmos créditos, apenas gozando da força de caso julgado formal, não tendo por isso eficácia externa, nem valendo fora do próprio PER;
cc) Com efeito, atendendo ao disposto no artigo 310.º alínea d) do CC, à data da instauração dos presentes autos (03/03/2023, conforme se encontra provado) e à data da citação dos executados (04/04/2023, conforme também se encontra provado), estão prescritos todos os juros vencidos antes de 04/04/2018;
dd) Uma vez iniciado o prazo de prescrição de qualquer direito, a respetiva contagem prossegue a menos que ocorra qualquer suspensão ou interrupção (cfr. artigos 318.º e seguintes do CC), não relevando sequer a sua transmissão (cfr. artigo 308 n.ºs 1 e 2 do CC);
ee) Ora, se é certo que o prazo de prescrição se conta a partir da data em que o credor pode exercer o seu direito, acionando os devedores, conforme dispõe o artigo 306.º n.º 1 do CC, não é menos certo que a prescrição só se interrompe com a citação, de harmonia com o disposto no artigo 323.º n.º 1 do CC, não tendo aplicação ao caso sub judice o disposto no n.º 2 de tal disposição, porquanto à data da entrada da presente execução a prescrição da alegada dívida exequenda já havia ocorrido;
ff) Efetivamente, e conforme dispõe o artigo 304.º n.º 1 do CC, verificada a prescrição, pelo decurso do respetivo prazo, é conferida ao devedor, seu beneficiário, a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito, pois, a prescrição é o instituto jurídico que determina a extinção dos direitos subjetivos quando não são exercitados no prazo que se encontra fixada na lei;
gg) No entanto, não pode a prescrição ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, já que carece de ser invocada por aquele a quem aproveita, como decorre do artigo 303.º do CC, motivo pelo qual, aqui se invoca para todo os efeitos legais;
hh) Dado que, a prescrição constitui uma exceção perentória, devem os apelantes ser absolvidos do pedido exequendo, relativamente aos juros contabilizados até ao dia ../../2018, nos termos das disposições dos artigos 576.º n.º 3 e 579.º, ambos do CPC e, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 304.º do CC;
ii) Ponderando tudo o exposto, será de aplicar o prazo prescricional previsto no artigo 310.º alínea d) do CC, assim sendo, e uma vez que o vencimento da alegada dívida ocorreu em 2015 e a presente execução só foi proposta a março de 2023, tendo os executados sido citados em 04/04/2023, estão prescritos todos os juros contabilizados até ../../2018;
jj) No respeita aos juros abrangidos pela hipoteca, primeiro, os juros não são devidos na sua totalidade porque parte deles já se encontra prescrita, conforme se demonstrou;
kk) Segundo, a penhora lavrada sobre o imóvel dado de hipoteca e penhorado nos presentes autos de execução deverá ser reduzida a tal montante, capital acrescido de 3 anos de juros;
ll) Com efeito, por força do disposto no n.º 2 do artigo 693.º do CC, os 2.º, 3.º, 4.º e 5.º executados, ora apelantes, não respondem por mais de 3 anos de juros sobre o capital em dívida;
mm) Sendo a referida norma de ordem e interesse público, a qual se reveste de carácter imperativo, a penhora do imóvel hipotecado não poderá afastar as regras prescritas no referido artigo 693.º, n.º 2, do CC, devendo tal estar expresso no que respeita ao quantitativo garantido pela penhora registada sobre o imóvel dado de hipoteca;
nn) Termos em que mal andou o douto Tribunal a quo ao decidir como decidiu.
Face ao exposto,
Deve ser revogada a douta SENTENÇA recorrida, julgando-se os Embargos de Executado totalmente procedentes».
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Contra-alegou a exequente/embargada, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida (ref.ª ...36).
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (ref.ª ...48).
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Foram colhidos os vistos legais.
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II. Delimitação do objecto do recurso             

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:   
      
i) - Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto;
ii) - Da inexistência ou falta de título executivo;
iii) - Da falta da interpelação do(s) executado(s) e da inexigibilidade do crédito exequendo;
iv) - Da prescrição dos juros;
v) - Da amplitude da hipoteca genérica ou global.
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III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos:

1) Por força da deliberação extraordinária do Concelho de Administração do Banco de Portugal, no dia 20/12/2015, foi aplicada ao Banco 1..., S.A. uma medida de resolução mediante a qual, parte dos direitos e obrigações correspondente aos seus ativos, foi transferida para o Banco 2... S.A.
2) O Banco 2... S.A. sucedeu nos direitos e obrigações transferidas do Banco 1..., S.A..
3) Por Contrato de Compra e Venda de Carteira de Créditos Hipotecários em incumprimento, assinado em 12 de dezembro de 2016, o Banco 2..., S.A. vendeu os créditos que detinha sobre os executados e todas as garantias acessórias a ele inerentes, à EMP03..., S.A., sendo que a referida cessão incluiu a transmissão de todos os direitos, garantias e acessórios inerentes aos créditos cedidos, designadamente da hipoteca constituída sobre o prédio em causa.
4) Em 18 de junho de 2018, por contrato de venda de créditos a EMP03..., S.A. vendeu os mencionados créditos que detinha sobre os executados e todas as garantias acessórias a ele inerentes créditos à EMP02... STC, S.A., [sendo que a] referida cessão incluiu a transmissão de todos os direitos, garantias e acessórios inerentes aos créditos cedidos, designadamente da hipoteca constituída sobre o prédio em causa.
5) Em 16.12.1999, e posteriormente aditado a 30.12.1999 e em 15.07.2013, no exercício da sua atividade, o Banco 1..., S.A. celebrou com a executada EMP01..., Lda., na qualidade de mutuária, e com os executados AA e DD na qualidade de avalistas, um Contrato de Conta Corrente Caucionada REFERÊNCIA ...40, tendo sido disponibilizada a quantia de € 250.000,00.
6) Para garantida do supra referido Contrato, bem como para garantia de todas as operações de crédito concedidas ou a conceder pelo Banco 1..., por contratos de empréstimo ou abertura de crédito, por contratos conta gestão de tesouraria, por financiamentos por livrança, por descontos de papel comercial, por crédito por assinatura, por descoberto em conta à ordem, por créditos documentário de importação, por financiamentos externos, por contratos leasing ou de factoring e acordo de gestão de pagamentos a fornecedores, na sua vigência inicial ou nas suas prorrogações ou renovações de prazos, até ao valor limite de € 275.000,00, por escritura pública, celebrada em 15.07.2013, os executados AA, DD, BB, que outorgou por si e também na qualidade de curador da executada CC constituíram a favor do Banco 1..., S.A., agora da exequente, hipoteca sobre o seguinte imóvel: - Prédio Urbano sito na Rua ..., freguesia e concelho ..., inscrito na respetiva matriz sob o artigo nº ...56 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...73, registada predialmente pela Ap. ...63 de 2013/07/15.
7) A hipoteca unilateral constituída a favor do Banco 1..., S.A., agora da exequente, referida no ponto anterior que servia de garantia do contrato de conta corrente caucionada, garante os seguintes montantes: a) Capital no valor de € 275.000,00; b) Juro anual de 11%, acrescido de 4% em caso de mora e a título de cláusula penal; c) Montante máximo assegurado no valor de € 409.750,00.
8) No âmbito da transmissão de créditos ocorrida houve uma transmissão da hipoteca constituída a favor do Banco 1..., S.A. para o nome do Banco 2... – AP. ...63 de 2016/12/06 – que, por sua vez, viria a transmitir a hipoteca para a EMP03..., S.A.– AP. ...02 de 2017/02/15, que por sua vez se veio a transmitir à Exequente AVERB. - AP. ...22 de 2022/03/23.
9) Em, 09.11.2015, a Executada/Mutuária EMP01..., LDA. intentou Processo Especial de Revitalização que correu termos com o n.º 307/15...., ... - Juízo Local Cível, do Tribunal Judicial da Comarca de ....
10) Os créditos ora peticionados pela Exequente foram peticionados naquele PER n.º 307/15.... pelo ainda primitivo Credor Banco 1..., S.A., em 07.12.2015, e foram reconhecidos.
11) O acordo do PER n.º 307/15.... foi homologado por Sentença.
12) Nos termos daquele PER n.º 307/15...., homologado, o mesmo previa que “… o compromisso dos credores garantidos de não execução das garantias enquanto se mantiver o plano.”
13) Posteriormente, em 24.02.2022, a Executada/Mutuária EMP01..., LDA. intentou um novo Processo Especial de Revitalização que correu termos com o n.º 447/22...., Juízo de Comércio, do Tribunal Judicial da Comarca de ....
14) Os créditos ora peticionados pela Exequente foram peticionados neste Processo Especial de Revitalização com o n.º ......, Juízo de Comércio, do Tribunal Judicial da Comarca de ....
15) O supra referido PER n.º 447/22...., Juízo de Comércio, do Tribunal Judicial da Comarca de ..., não foi homologado.
16) Em 19 de setembro de 2022 a exequente remeteu aos executados, sob registo, cartas que foram rececionadas e que consistem numa interpelação para pagamento do total da dívida que se cifrava em € 495.822,94.
17) Os executados, apesar de interpelados, não procederam ao pagamento dos montantes em divida, sendo que quanto às obrigações ora executadas [a] mutuária incumpriu o plano homologado no Processo Especial de Revitalização n.º ......, nem mesmo depois da Sentença de não homologação do PER n.º 447/22.....
18) A exequente reclama nos autos principais de execução o pagamento de uma quantia que ascende, à data de 3 de março de 2023, a quantia de € 507.084,75, discriminada da seguinte forma: a) Capital em dívida: € 249.750,00 (duzentos e quarenta e nove mil setecentos e cinquenta euros); b) € 4.245,63 de juros vencidos até 07.12.2015; c) Juros contabilizados desde ../../2015 até à presente data 03.03.2023.2023 à taxa de 11%, acrescida de 3,00 %, a título de Cláusula Penal: € 253.089,12.
19) A Sociedade Executada é uma sociedade por quotas que tem por objeto o “comércio de ferragens, materiais de construção, artigos agrícolas, produtos químicos, artigos sanitários e qualquer outro ramo de comércio ou indústria”.
20) Nos termos do referido Plano homologado no PER n.º 307/15...., foram propostas as seguintes medidas de reestruturação do passivo e plano de pagamentos, no que respeita aos Credores Bancários: “4.3. Créditos Bancários: Tratam-se dos créditos das seguintes instituições bancárias: Banco 3..., S.A., Banco 4..., S.A., Banco 5..., S.A. e Banco 6..., S.A. Os créditos do Banco 3..., S.A. e do Banco 4..., S.A. beneficiam de garantias (hipotecas) sobre bens imóveis da Revitalizanda. Os créditos do Banco 5..., S.A. e do Banco 6..., S.A. encontram-se garantidos, na totalidade, por hipotecas genéricas constituídas sobre imóveis dos sócios, afetos à exploração. Considera a Revitalizanda que todos os seus credores bancários são estratégicos e fundamentais para a sua recuperação. Propõe-se, assim, o pagamento aos referidos credores nos seguintes termos: • Pagamento dos créditos do Banco 3..., S.A., Banco 4..., S.A., Banco 5..., S.A. e Banco 6..., S.A. “(capital e juros, vencidos e vincendos até ao final do mês em que seja proferida a sentença homologatória do Plano de Recuperação) em 12 (doze) anos contados do mês seguinte ao da data da sentença homologatória do Plano de Recuperação; • Reembolso do capital: prestações mensais, iguais e sucessivas; • Carência no reembolso do capital: 2 (dois anos), com início no mês seguinte ao da data da sentença homologatória do Plano de Recuperação; • Taxa de juros vincendos (desde o mês seguinte ao da data da sentença homologatória do Plano de Recuperação): i) taxa Euribor a 6 meses, acrescida de 1% (um por cento), no primeiro período de 4 (quatro) anos; ii) taxa Euribor a 6 meses, acrescida de 2% (dois por cento) após o referido período de 4 (quatro) anos. Revisão anual da taxa Euribor de referência; • Pagamento dos juros vincendos: mensal e postecipado; • Carência no pagamento de juros: 1 (um) ano, com início no mês seguinte ao da data da sentença homologatória do Plano de Recuperação; capitalização, no final do período de carência; • Contratualização a definir; • A contabilização pelos diferentes bancos das condições supra referidas não constituirá, em circunstância alguma, uma novação, mantendo-se todas as garantias constituídas para os despectivos créditos, com o compromisso dos credores de não execução das garantias enquanto se mantiver o cumprimento do Plano.”
21) No PER constava expressamente o impedimento, por parte dos Bancos Credores, da execução das garantias enquanto se mantiver o cumprimento do Plano de Recuperação.
22) Relativamente ao PER n.º 307/15.... de 2015/2016 (primeiro plano), no que concerne à divida executada nunca foi cumprida uma única prestação, sendo que no PER n.º447/22...., quanto ao crédito reclamado pela Embargada o mesmo foi ali reconhecido na totalidade conforme peticionado nos presentes autos.
23) A ora exequente/embargada apresentou reclamação de créditos no PER n.º447/22.... e no seguimento da impugnação da Sociedade Executada à Lista provisória de credores a sociedade devedora veio impugnar o referido crédito, invocando o não reconhecimento a titulo de juros, do valor de € 219.848,42, contabilizados desde ../../2015, tendo sido proferido despacho em 03.07.2022, onde se pode ler, para além do mais, que: “(…) Em relação ao credor EMP02... – SOCIEDADE DE TITULARIZAÇÃO DE CRÉDITOS, S.A. O credor em causa apresentou a respetiva reclamação de créditos no valor de 473.844,05, tendo este valor sido reconhecido comum. O referido credor foi cedido pela EMP03..., S.A., na celebração de um contrato de conta corrente caucionada, com o nº ...40, entre o Banco 1..., S.A., e a devedora. A sociedade devedora veio impugnar o referido crédito, invocando o não reconhecimento a título de juros, do valor de € 219.848,42 (duzentos e dezanove mil oitocentos e quarenta e oito euros e quarenta e dois cêntimos), contabilizados desde ../../2015. Como se extrai dos autos, o ora credor havia reclamado o seu crédito no anterior Processo Especial de Revitalização da Devedora que correu termos com o n.º de Processo 307/15...., ... - Juízo Local Cível, Tribunal Judicial da Comarca de ..., pelo cedente Banco 1..., S.A, na qual foram peticionados os juros de mora vencidos e vincendos. Vem a devedora impugnar o valor de juros reclamado pelo ora credor, porquanto, apesar de várias vezes interpelada para o efeito, a EMP03..., S.A., não logrou informar a devedora das condições de implementação do Plano de Revitalização. A credora refuta, alegando que a devedora nunca interpelou ou entrou em contato com qualquer dos Credores, EMP03..., S.A. ou EMP02... STC, S.A. Ora, é por demais evidente que a devedora sabia para onde deveria fazer os pagamentos, conforme cartas que foram jutas aos autos e, como devedora de boa fé que presumimos ser, caso tal não houvesse sucedido, sempre procuraria obter essa informação, uma vez que não queria incumprir o acordo. Pelo que, sem necessidade de mais fundamentação, por ser notório, a falta de implementação do mencionado PER quanto aos créditos do ora credor não procede de culpa dos credores mas apenas por culpa da devedora, não sendo aplicável o artigo 813.º do Código Civil, e, consequentemente, é inaplicável o n.º 2, do artigo 814.º do Código Civil. Assim sendo, a devedora constituiu-se mora, e, por efeito, nos termos do artigo 806.º, ambos do Código Civil, sendo, consequentemente, devidos os juros legais. Ora, desta feita, a impugnação deduzida pela devedora tem de improceder, sendo manifesta a culpa da devedora no incumprimento, pelo que, mantém-se o reconhecimento do crédito integralmente reclamado, incluindo o montante relativo a juros, o que se decide”.
24) A gerência da sociedade mutuária, ora executada, é exercida pelo 2.º executado e este e os demais 3.º, 4.º e 5.º executados são sócios da mesma.
25) Os autos principais de execução foram instaurados em 03/07/2023.
26) Por sentença proferida em 30/09/2009, no processo o n.º 596/08.... que correu termos no ... Juízo do Tribunal Judicial de ..., foi decretada a inabilitação da executada CC, com início de incapacidade situada após o seu divórcio (1985) e nomeado como seu curador o irmão BB.
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V. Fundamentação de direito.

1. Da impugnação da decisão da matéria de facto.

1.1. Em sede de recurso, a apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.
Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o/a recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no art. 640º do CPC, no qual se dispõe:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
(…)».
Aplicando tais critérios ao caso – e tendo presente que os meios probatórios invocados como fundamento do erro de julgamento da matéria de facto não se baseiam na apreciação de provas que tenham sido gravadas –, constata-se que a recorrente indica quais os factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, indicando a redação que deve ser dada quanto à factualidade que entende estar mal julgada, como ainda os concretos meios probatórios constantes do processo que, na sua ótica, o impõe(m), pelo que podemos concluir que cumpriu suficientemente o triplo ónus de impugnação estabelecido no citado art. 640º. 
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1.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o art. 662.º, n.º 1, do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
 Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pela recorrente.
Por referência às suas conclusões, extrai-se que a embargante/executada pretende:
i) – A alteração da resposta positiva para negativa dos pontos n.ºs 5, 17 e 22 dos factos provados;
ii) – A alteração/modificação da redação da resposta dos pontos n.ºs 16 e 25 dos factos provados;
iii) – o aditamento de um ponto fáctico ao rol dos factos provados.
Apreciamos, especificadamente, cada um dos pontos fácticos impugnados.

1. - Ponto n.º 5 dos factos provados
Sustentam os recorrentes que não foi junta aos autos de execução principais qualquer cópia do contrato de Conta Corrente Caucionada REFERÊNCIA ...40, sequer foi efetuada qualquer prova de que por via do mesmo tenha sido disponibilizada a quantia de € 250.000,00, sendo que o Tribunal “a quo” limitou-se a transcrever para o Facto Provado sob o n.º 5 o que consta do teor da reclamação de créditos junta com o requerimento executivo sob o Doc. n.º ..., com qual não foi junta cópia de qualquer outro documento e não bastando tal alegação para dar como provado o facto elencando sob o n.º 5.
Improcede, desde logo, a referida impugnação, porquanto, na decorrência da apresentação do requerimento executivo, para além da escritura pública de constituição de hipoteca, foi junto aos autos executivos cópia do intitulado “Contrato de abertura de Crédito em Conta Corrente Caucionada”, bem como nota de débito (cfr. Documento n.º ... referido no requerimento executivo junto com o requerimento de 13.01.2023, com a referência Citius 3222388, o qual não foi submetido em simultâneo com o mesmo em virtude de exceder a capacidade permitida pela plataforma Citius).
Dessa nota de débito, referente à conta corrente caucionada titulada pela sociedade executada - operação ...40, consta a menção quanto à disponibilização da quantia de € 249,750,00 (capital inicial), com início a 28/12/1999 e data de vencimento a 7/12/2015.
Tais documentos não foram impugnados, sendo certo que, na petição de embargos de executado, a referida matéria fáctica igualmente não foi impugnada. Nesse articulado, os embargantes não só não questionaram a outorga do referido contrato, assim como a indicada disponibilização da quantia monetária pelo banco creditante.
Todavia, em conformidade com a prova produzida, o referido ponto merece uma ligeira retificação quanto ao montante efectivamente disponibilizado, procedendo-se à sua alteração nos termos seguintes:
5) Em 16.12.1999, e posteriormente aditado a 30.12.1999 e em 15.07.2013, no exercício da sua atividade, o Banco 1..., S.A. celebrou com a executada EMP01..., Lda., na qualidade de mutuária, e com os executados AA e DD na qualidade de avalistas, um Contrato de Conta Corrente Caucionada REFERÊNCIA ...40, tendo sido disponibilizada a quantia de € 249,750,00.
2. - Ponto n.º 16 dos factos provados.
Da prova documental junta com a contestação dos embargos, a 31/05/2023 (cfr. Refª: ...67) resulta provado que:
“Por carta datada de 19 de setembro de 2022 e sob o “ASSUNTO: Interpelação para pagamento N/Ref.:...87/...88/...45/...64/000804310362020_000000000000000/...02 0_043103620200001/000800012930029_000800352184097/000800352184097_0035218409700 24/ ...71” a exequente interpelou os executados BB e DD, para pagamento do montante de € 495.822,94, “correspondente ao não pagamento das prestações já vencidas e não pagas relativas ao crédito supra referido, bem como todas as prestações de capital vincendas”.
Sucede que não resulta provado que tal missiva tenha sido rececionada por aqueles (tão pouco que tenha sido expedida), pois não é efetuada qualquer ligação entre a mesma e os vários comprovativos da suposta entrega retirados do site dos Correios ..., além de que as datas são completamente distintas da data aposta na mesma, pois consta de tais comprovativos:
...43... - 02/02 o envio foi devolvido ao remetente
...33... - 17/01 o envio foi entregue
...65... - 18/01 o envio foi entregue
...74... - 18/01 o envio foi entregue
...88... - 18/01 o envio foi entregue
Acresce que foi ainda junta aos autos cópia da parte de detrás de um envelope onde se pode ler: “Não atendeu/Encerrado Data: 07/11/2022”
Ora, não obstante a junção aos autos, com a contestação, das aludidas missivas alegadamente enviadas pelo embargada aos co-Embargantes BB e DD, datadas de 19.09.2022, a verdade é que não temos como minimamente seguro que o respetivo envio tenha sido, efetivamente, efetuado, nem tão pouco que as cartas tenham sido rececionadas pelos destinatários ou chegado à sua esfera de poder em condições de serem deles conhecidas.
Rejeitando os embargantes que a sociedade embargante alguma vez tenha sido interpelada por escrito nos termos e para os fins do disposto na al. a) do n.º 1 do art. 218º do CIRE, a embargada não carreou aos autos designadamente talão de registo, prova de depósito, aviso de entrega da qual resulte a expedição para a morada dos embargantes e muito menos a recepção de uma carta de interpelação (ou mesmo outra correspondência comprovadamente rececionada em que seja feita menção àquela).
Termos em que se altera o referido ponto fáctico, passando o mesmo a valer com a seguinte redação:
Por carta datada de 19 de setembro de 2022 e sob o “ASSUNTO: Interpelação para pagamento N/Ref.:...87/...88/...45/...64/000804310362020_000000000000000/...02 0_043103620200001/000800012930029_000800352184097/000800352184097_0035218409700 24/ ...71” a exequente interpelou os executados BB e DD, para pagamento do montante de € 495.822,94, “correspondente ao não pagamento das prestações já vencidas e não pagas relativas ao crédito supra referido, bem como todas as prestações de capital vincendas.
3. - Pontos n.º 17 e 22 dos factos provados.
A demonstração da referida facticidade, afora a interpelação dos executados (não demonstrada, como se disse), resulta – à semelhança do referido na sentença recorrida – da prova documental junta aos autos principais com o requerimento e título executivo (designadamente expediente, despachos e sentenças relativos ao 1.º e 2.º PER a que se apresentou a sociedade mutuária executada, designadamente, sentença de homologação do plano do 1.º PER, nomeação de administrador provisório no âmbito do 2.º PER, Reclamação de Créditos, Lista provisória de credores, sentença de não homologação do 2.º PER), bem como da prova documental junta aos presentes embargos de executado (sentença de inabilitação, certidão permanente da sociedade executada, impugnação da lista de credores, resposta à impugnação no âmbito do 2.º PER).
Assim, sendo de manter inalterada a redação do ponto 22 dos factos provados, o ponto 17 passará a vigorar nos termos seguintes:
17) Os executados não procederam ao pagamento dos montantes em dívida, sendo que quanto às obrigações ora executadas a sociedade EMP01..., Lda incumpriu o plano homologado no Processo Especial de Revitalização n.º ......, nem mesmo depois da sentença de não homologação do PER n.º 447/22.....
4. - Ponto n.º 25 dos factos provados.
Ocorre, efetivamente, um lapso de escrita, porquanto os autos de execução foram instaurados em 03/03/2023 e não, como por lapso consta na sentença, a 03/07/2023, conforme resulta certificado do Requerimento Executivo (cfr. Refª: ...01).
Assim, altera-se o referido ponto fáctico, passando a ter o seguinte teor:
25. Os autos principais de execução foram instaurados em 03/03/2023.
5. - Por fim, por ser (eventualmente) suscetível de ter relevância para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, e por referência à certificação da citação dos executados (cfr. Ref.ªs ...48, ...49, ...50, ...52 - 12/04/2023), adita-se o seguinte ponto fáctico ao elenco dos factos provados:
27. Os executados foram citados nos autos principais de execução em 04/04/2023.
Pelo exposto, nos termos assinalados, procede parcialmente a impugnação da decisão da matéria de facto[1].
*
2. Considerações gerais.

Como é sabido, a oposição à execução mediante embargos de executado é o modo de que o executado dispõe para se libertar (total ou parcialmente) da execução contra si instaurada, seja com base em razões de natureza processual, seja aduzindo argumentos materiais (que contendam com a existência ou a subsistência da obrigação)[2], seja pela verificação de um vício de natureza formal que obsta ao prosseguimento da execução[3].
Constitui um incidente de natureza declarativa, enxertado e na dependência do processo executivo, fisicamente correndo por apenso.
Assim, embora os embargos constituam um procedimento estruturalmente autónomo, estão funcionalmente ligados ao processo executivo (fala-se em função instrumental da oposição[4], até porque sem execução não há oposição à execução), visando a pronúncia que neles é feita, quer sobre o mérito, quer sobre matéria processual, servir exclusivamente as finalidades e os fins da execução[5].
Este carácter incidental ou instrumental dos embargos, funcionalmente vinculados ao processo executivo em que se enxertam, resulta claramente do disposto nos n.ºs 4 e 5 do art. 732.º do CPC, nos termos dos quais a procedência dos embargos extingue a execução, no todo ou em parte, além de que a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.
Na petição inicial de oposição à execução os embargantes/executados alegaram factos impeditivos e/ou extintivos do crédito exequendo, concretamente i) o não incumprimento do 1.º Processo Especial de Revitalização que correu termos, sob o número 307/15...., junto da Instância Local da Secção de Competência Genérica do Peso da Régua - J... - do Tribunal Judicial da Comarca de ..., ii) a falta da interpelação do(s) executado(s), iii) a inexigibilidade do crédito exequendo, iv) o âmbito da quantia exequenda garantida pela hipoteca e v) a prescrição dos juros.
Tal oposição assume especial relevância jurídica, especificando o art. 731º do CPC que, “não se baseando a execução em sentença (…), além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 729º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração”.
Diversamente do que acontece nos embargos à execução de sentença, a oposição à execução baseada em outro título pode fundar-se em qualquer causa que fosse lícito deduzir como defesa no processo de declaração, dado o executado não ter tido ocasião de, em ação declarativa prévia, se defender amplamente da pretensão do exequente/embargado.
Pode, pois, o executado alegar, como fundamento de embargos de executado, matéria de impugnação e de exceção (art. 571º, n.º 2, do CPC), embora não possa reconvir[6].
Poderão, assim, e sem a barreira de qualquer limite temporal, por não haver que respeitar a autoridade do caso julgado, invocar-se todas as causas impeditivas ou extintivas do direito do exequente e até, por vezes, negarem-se os factos constitutivos do mesmo direito[7].
Nos embargos de executado (tal como nas ações de simples apreciação negativa), as regras que presidem à distribuição do ónus da prova, e que se baseiam em normas de direito substantivo, não se alteram (não se modificando pela diferente posição ocupada pelo credor e devedor nos autos - como autor ou réu, ou pelo executado/embargante e pelo exequente/embargado): o titular do direito continua sempre a ter de provar os factos que o constituem, enquanto o titular do dever correspondente tem o de provar os factos que impedem, modificam ou extinguem os feitos dos primeiros (art. 342º do CC)[8].
Assim, parafraseando o Assento do STJ de 14/05/96[9], diremos que, nos embargos de executado, a distribuição do ónus da prova observa as regras gerais sobre esta matéria, pelo que cabe ao executado/embargante a prova dos fundamentos alegados (art. 342º, n.º 1 do CC), dado que estes são factos constitutivos da oposição deduzida.
Mas, por outro lado, é ao embargado-exequente que incumbe fazer a prova dos factos constitutivos do seu direito, ou seja, de que o título é válido e a relação jurídica material que lhe deu causa corresponde à realidade dos factos[10].
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3. Da falta ou da inexistência de título executivo.

Em sede de recurso, pugnam os embargantes pela falta de título executivo que sustente a pretensão da exequente e, contrariamente ao explicitado na sentença recorrida, defendem não estarmos perante um título executivo complexo.
Aduzem para o efeito que:
i) Em 1.º lugar, a escritura dada à execução não é uma escritura de mútuo com hipoteca, é uma escritura de hipoteca genérica ou global, como, aliás, consta do n.º 6 dos Factos dados Provados;
ii) Em 2.º lugar, nem tal escritura de hipoteca genérica ou global, nem o despacho de homologação do PER no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 307/15...., nem o despacho de nomeação de Administrador Provisório no âmbito de um novo Processo Especial de Revitalização instaurado, em 24/02/2022 constituem títulos executivos à luz do disposto no artigo 703.º n.º 1 do CPC, pois não importam a constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação; e,
iii) Em 3.º lugar, também não constituem títulos executivos, e pelas mesmas razões, a cópia da reclamação de créditos apresentada pelo Banco 1... no Proc.º n.º 307/15...., a cópia da sentença homologatória do plano de recuperação proferida no Proc.º n.º 307/15.... e a cópia da sentença que ordenou o encerramento do Proc. n.º 447/22...., as quais também foram juntas com o requerimento executivo;
Na sentença impugnada, a Mm.ª Juíza “a quo” concluiu que, ante os factos provados, «constata-se que o título executivo nos presentes autos é um título complexo, constituído por uma escritura pública de mútuo com hipoteca, o qual veio também acompanhado do despacho de homologação do PER no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 307/15...., bem como do despacho de nomeação de Administrador Provisório no âmbito de um novo Processo Especial de Revitalização instaurado, em 24.02.2022, pela Executada/Mutuária EMP01..., LDA., que correu termos com o n.º 447/22...., Juízo de Comércio, do Tribunal Judicial da Comarca de ... e decisão de não homologação do respetivo PER».
Delineados, resumidamente, os argumentos aduzidos pelos recorrentes e o teor da sentença recorrida vejamos como decidir.
De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 734.º do CPC, o “juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo”.
Entre essas questões que, inicialmente, poderiam fundar o indeferimento liminar temos desde logo o caso de ser manifesta a falta ou insuficiência do título executivo (art. 726º, n.º 2, al. a), do CPC).
Ora, não constando dos autos de execução que tenha ocorrido qualquer ato de transmissão dos bens penhorados não se mostra precludida a possibilidade de apreciação, em sede de apelação, da questão da inexistência do título executivo, a qual, apesar de invocada pelos recorrentes, não deixa de ser de conhecimento oficioso.

Conforme explica José Lebre de Freitas[11]:
«Para que possa ter lugar a realização coactiva duma prestação devida (ou do seu equivalente), há que satisfazer dois tipos de condição, dos quais depende a exequibilidade do direito à prestação:
a) O dever deve constar dum título: o título executivo. Trata-se dum pressuposto de carácter formal, que extrinsecamente condiciona a exequibilidade do direito, na medida em que lhe confere o grau de certeza que o sistema reputa suficiente para a admissibilidade da acção executiva.
b) A prestação deve mostrar-se certa, exigível e líquida. Certeza, exigibilidade e liquidez são pressupostos de carácter material, que intrinsecamente condicionam a exequibilidade do direito, na medida em que sem eles não é admissível a satisfação coactiva da prestação».
Nos termos do n.º 5 do art. 10º do CPC, “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
Define-se título executivo como “(...) o instrumento que é considerado condição necessária e suficiente da acção executiva[12]. Títulos executivos «são documentos de actos constitutivos ou certificativos de obrigações, a que a lei reconhece a eficácia de servirem de base ao processo executivo»[13].
Considera-se que o título executivo é condição necessária da execução na medida em que os actos executivos em que se desenvolve a acção apenas podem ser praticados na presença dele (nulla executio sine titulo). Sem o demandante se apresentar munido de um título executivo a execução não pode ser intentada ou, se intentada, prosseguir. Por outro lado, diz-se que o título executivo é condição suficiente da acção executiva, na medida em que na sua presença segue-se imediatamente a execução, sem ser necessário indagar previamente sobre a real existência do direito a que se refere. Presume-se a sua existência, cabendo ao executado excepcionar ou impugnar a sua formação, subsistência, validade ou eficácia, através da competente oposição à execução ou mediante embargos de executado
Mas o título, além de ser a condição necessária e suficiente da execução, define-lhe também os fins e os limites.
O objecto da execução tem de corresponder, por conseguinte, ao objeto da situação jurídica acertada no título.
O título executivo é o documento «do qual consta a exequibilidade de uma pretensão» e, consequentemente, a possibilidade de realização coactiva da correspondente prestação através de uma acção executiva.
Ele cumpre uma função constitutiva, atribuindo a exequibilidade a uma pretensão e «possibilitando que a correspondente prestação seja realizada através de medidas coactivas impostas ao executado pelo tribunal».
A exequibilidade extrínseca da pretensão é conferida pela incorporação da pretensão num título executivo, ou seja, num documento que formaliza, por via legal, «a facul­dade da realização coactiva da prestação não cumprida»[14].
O art. 703º, n.º 1, do CPC – à semelhança do art. 46º, n.º 1, do anterior CPC – enuncia as várias espécies de títulos executivos admitidos na lei, que podem servir de base a uma execução.
Títulos executivos são tão só e apenas os indicados na lei – trata-se de enumeração taxativa, sujeita à regra da tipicidade, como se constata da letra do preceito em análise [À execução apenas podem servir de base (...)]. Daí não serem válidas as convenções negociais pelas quais as partes conferem força executiva a outros documentos[15].
No caso dos autos, importa ter presente que o art. 703.º do actual Código de Processo Civil eliminou os documentos particulares do elenco dos títulos executivos, sendo tal norma aplicável às execuções instauradas a partir da entrada em vigor do novo diploma – art. 6.º, n.º 3, do diploma preambular.
De facto, enquanto o anterior Código previa como título executivo os «documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto» (art. 46º, n.º 1, al. c), do CPC), tal previsão deixou de constar, naqueles termos, do atual CPC. Este, no art. 703, n.º 1, al. c), refere tão só – no que a simples documentos particulares respeita – «os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que neste caso os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo».
Como resulta da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII – que deu origem ao novo Código – com a restrição dos títulos executivos constituídos por documentos particulares o legislador visou proteger os executados do risco de execuções injustas, “risco esse potenciado pela circunstância de as últimas alterações legislativas terem permitido cada vez mais hipóteses de a execução se iniciar pela penhora de bens do executado, postergando-se o contraditório”.
Deste modo, relativamente ao regime que então vigorava”, optou o legislador “por retirar exequibilidade aos documentos particulares, qualquer que seja a obrigação” que titulem. Ressalvam-se “os títulos de crédito, dotados de segurança e fiabilidade no comércio jurídico em termos de justificar a possibilidade de o respetivo credor poder aceder logo à via executiva” e, “ainda dentro dos títulos de crédito, consagrou a sua exequibilidade como meros quirógrafos, desde que sejam alegados no requerimento executivo os factos constitutivos da relação subjacente” (art. 703º, n.º 1, al. c), do CC).
Na sequência daquela sucessão temporal, e tendo sido controvertida a questão de saber se o indicado art. 703, n.º 1, al. c), do CPC se aplicava aos documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de uma obrigação, celebrados anteriormente à entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (ou seja, até ao dia ../../2013) – o mesmo é dizer se os mesmos mantinham a força de título executivo que à data da sua celebração a lei lhes conferia –, a discussão desta questão mostra-se entretanto prejudicada, porquanto o Tribunal Constitucional, chamado a pronunciar-se sobre a mesma, no Acórdão n.º 408/2015, proferido no processo n.º ...15, publicado no DR, 1ª Série, n.º 201, de 14/10/2015, declarou, «com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma que aplica o artigo 703.º do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, a documentos particulares emitidos em data anterior à sua entrada em vigor, então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil de 1961, constante dos artigos 703.º do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, por violação do princípio da proteção da confiança (artigo 2.º da Constituição)».

Logo, atualmente não oferece dúvidas que continuam a ser dotados de força executiva os documentos particulares produzidos antes de 1 de setembro de 2013, contanto que reúnam os requisitos enunciados no art. 46º, n.º 1, al. c) do anterior CPC, quais sejam:

a) conterem a assinatura do devedor (dispensando-se a assinatura do credor);
b) importarem a constituição ou reconhecimento[16] de:
i) obrigações pecuniárias cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes;
ii) obrigações de entrega de coisa, móvel ou imóvel, ou de prestação de facto.

Por contraposição, os documentos particulares não autenticados não possuem eficácia executiva quanto a uma obrigação pecuniária ilíquida, se a sua liquidação exigir mais do que um simples cálculo aritmético.
No caso objeto de apreciação, em termos não coincidentes com o decidido na sentença recorrida, entendemos que o título dado à execução consubstancia um contrato de conta corrente caucionada, o mesmo é dizer, um contrato de abertura de crédito.
O contrato de “abertura de crédito” define-se como o “contrato pelo qual o banco (creditante) se obriga a colocar à disposição do cliente (creditado) uma determinada quantia pecuniária (acreditamento ou “linha de crédito”), por tempo determinado ou não, ficando este obrigado ao reembolso das somas utilizadas e ao pagamento dos respectivos juros e comissões[17].
Tal contrato pode assumir diferentes modalidades, em função de critérios atinentes à utilização do crédito disponibilizado e à existência ou não de garantias a ele associadas.
De acordo com o critério da sua realização, a abertura de crédito pode ser simples ou em conta-corrente, consoante o crédito disponibilizado é mobilizável de uma só vez ou em “tranches”, incluindo a faculdade de renovação automática do “plafond” de crédito mediante entradas; segundo o  critério das suas garantias, a abertura pode ser caucionada/garantida ou a descoberto, consoante o cumprimento das obrigações do cliente creditado seja, ou não, assegurado por garantias reais (v.g., hipoteca), ou pessoais (por ex, livranças)[18].
Decorre desta noção que se trata de um contrato consensual quoad effectum por oposição a contrato real quoad constitutionem: “fica perfeito com o acordo entre as partes, sem necessidade de qualquer entrega monetária, ao contrário do que sucede com o mútuo clássico[19]. A abertura de crédito conclui-se, assim, com o mero acordo tendente à disponibilização daquele montante, o qual, de resto, poderá nem sequer vir a ser movimentado pelo cliente creditado.
Quanto ao seu conteúdo, a obrigação primária da parte do banco creditante é a de disponibilização de soma pecuniária e a obrigação primária do cliente creditado é o de pagamento de comissões (de abertura de crédito, sobre o limite do crédito, de imobilização sobre os fundos não utilizados) e dos juros correspondentes à utilização dos fundos utilizados[20], não sendo inusual a prestação de garantias de reembolso do crédito por parte deste.
Trata-se, de um contrato nominado, integrado nas operações de banco (art. 362º do CCom), em regra, legalmente atípico (sem regime legal próprio), mas socialmente típico. O único aspeto do contrato em geral previsto na lei é o cálculo dos juros (art. 6º, n.º 2, do Dec. Lei n.º 58/2013, de 8/05)[21].
No caso sub júdice, o contrato de abertura de crédito em conta corrente foi celebrado através de documento particular e garantido através de hipoteca sobre o prédio urbano, que se encontra penhorado nos autos de execução.
Diversamente do que sucederia se se tratasse de um contrato de mútuo, no presente contrato o banco creditante não se constitui, desde logo, credor da sociedade beneficiária da abertura de crédito, mas tão só a partir do momento em que a sociedade movimente, fazendo suas, as quantias que aquele colocou ao seu dispor.
Ficou provado que, em 16.12.1999, e posteriormente aditado a 30.12.1999 e em 15.07.2013, no exercício da sua atividade, o Banco 1..., S.A. celebrou com a executada EMP01..., Lda., na qualidade de mutuária, e com os executados AA e DD na qualidade de avalistas, um Contrato de Conta Corrente Caucionada REFERÊNCIA ...40, tendo sido disponibilizada a quantia de € 249,750,00.
Para garantia do referido contrato, bem como para garantia de todas as operações de crédito concedidas ou a conceder pelo Banco 1..., por contratos de empréstimo ou abertura de crédito, por contratos conta gestão de tesouraria, por financiamentos por livrança, por descontos de papel comercial, por crédito por assinatura, por descoberto em conta à ordem, por créditos documentário de importação, por financiamentos externos, por contratos leasing ou de factoring e acordo de gestão de pagamentos a fornecedores, na sua vigência inicial ou nas suas prorrogações ou renovações de prazos, até ao valor limite de € 275.000,00, por escritura pública, celebrada em 15.07.2013, os executados AA, DD, BB, que outorgou por si e também na qualidade de curador da executada CC, constituíram a favor do Banco 1..., S.A., agora da exequente, hipoteca sobre o prédio urbano descrito nos autos.
A referida hipoteca unilateral constituída a favor do Banco 1..., S.A., agora da exequente, que servia de garantia do contrato de conta corrente caucionada, garante os seguintes montantes: a) Capital no valor de € 275.000,00; b) Juro anual de 11%, acrescido de 4% em caso de mora e a título de cláusula penal; c) Montante máximo assegurado no valor de € 409.750,00.
Tendo este acordo de abertura de crédito em conta-corrente sido celebrado em 1999, e posteriormente aditado a 30.12.1999 e em 15.07.2013, é-lhe aplicável o CPC de 1961, por força do art. 6º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que aprovou o novo CPC: «O disposto no Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei, relativamente aos títulos executivos, às formas do processo executivo, ao requerimento executivo e à tramitação da fase introdutória só se aplica às execuções iniciadas após a sua entrada em vigor».
Ora, como se disse, à luz da decisão do Ac. do TC n.º 408/2015, de 23/09, mantém-se a exequibilidade de um título constituído antes da entrada em vigor da reforma do CPC de 2013 (isto é, 1 de setembro de 2013), que, ao tempo da sua emissão, era título executivo por força do art. 46º, n.º 1, al. c), do antigo CPC, desde que esse título, estando assinado pelo devedor, importe a constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético.
No presente contrato de abertura de crédito, celebrado em 1999 – e objeto de posteriores aditamentos –, não foi constituída ou reconhecida qualquer obrigação pecuniária de constituição imediata a cargo da sociedade beneficiária da abertura de crédito, correspectivo de um direito de crédito do banco creditante.
Com efeito, da sua leitura não resulta a efectiva entrega de qualquer montante à dita sociedade com o nascimento da correspectiva obrigação de reembolso; nele se estatui apenas a possibilidade de a sociedade beneficiária da abertura de crédito vir a movimentar as quantias colocadas à sua disposição pela entidade creditante, nascendo então para a dita sociedade a correspondente obrigação de devolução, com os respectivos juros.
Em rigor, não resulta do contrato – nem podia resultar – a entrega desse montante; estipula-se apenas a abertura em conta corrente de um eventual crédito até esse valor máximo de disponibilização e a futura realização de prestações, que são no essencial incidentes sobre a disponibilização e a movimentação efectiva com levantamento (que corresponde a um direito a manifestar e exercer pelo creditado) e amortização pela sociedade outorgante das quantias colocadas à sua disposição e, eventualmente, repostas.
O documento particular que titula a abertura de crédito não contém senão uma promessa de empréstimo, não constituindo, só por si, título executivo contra o creditado. A obrigação deste só surge mais tarde, no momento em que, por conta do crédito aberto, o creditado faz algum levantamento ou movimenta determinada quantia; é então que surge o empréstimo definitivo e consequentemente nasce a dívida. Por conseguinte, a prova complementar do título faz-se através de documento passado em conformidade com as cláusulas constantes do negócio jurídico, provando-se, dessa forma, que a obrigação futura, que se pretende executar, foi efetivamente constituída, isto é, que alguma prestação foi, de facto, realizada no desenvolvimento da relação contratual. Daí a necessidade de completar a escritura (leia-se documento particular) de abertura de crédito com a prova de que foi efetivamente emprestada alguma quantia ao creditado[22]. Dito de outro modo, o contrato de abertura de crédito, só por si, não constitui título executivo, na medida em que atos subsequentes à abertura de crédito e complementares desta é que titulam o direito de crédito do exequente, na medida do desembolso que este tenha efetuado. A obrigação de reembolso só nasce se e na medida da disponibilização/utilização efetiva do crédito, pelo que para a instituição de crédito dar à execução tal obrigação tem de provar, não só o contrato de abertura de crédito, mas também as concretas disponibilizações/utilizações efetivas do crédito[23].
Conforme refere Rui Pinto[24], o contrato de abertura de crédito configura duas eficácias jurídicas distintas próprias de uma dualidade contratual:
No primeiro momento, verifica-se uma eficácia preparatória: produz-se um acordo de concessão de crédito que “visa a disponibilidade futura do dinheiro, eventualmente em conta-corrente, ficando perfeito com o acordo das partes, sem necessidade de qualquer entrega monetária” Este acordo é intrinsecamente preparatório, funcionando como um contrato promessa de empréstimo.
Num segundo momento surge uma eficácia final, ou seja, levantada a quantia concreta da conta corrente “constitui-se o mútuo, dada a natureza real quoad constitutionem. O mútuo é intrinsecamente final”.
Ora, se é certo que o mútuo em si mesmo pode ser título executivo da obrigação de restituição da quantia mutuada, desde que celebrado na forma legalmente exigida, o mesmo não se passa com o mútuo prometido em concessão de crédito. Aqui, o mútuo não apresenta autonomia formal. “O único documento que o credor tem é o da abertura de crédito; tudo o mais são atos materiais de entrega e de restituição de quantias. Daí que se compreenda que, para fins executivos, essa falta de documento de mútuo autónomo seja colmatada por meio do artigo 707.º, desde que o exequente prove que entregou efetivamente o montante a recuperar”.
É neste segundo momento que o crédito a uma quantia pecuniária certa surge, “por via potestativa e em simples execução do contrato[25].
É desse mútuo assim concretizado na conclusão e execução do contrato de abertura do crédito que surge o direito de crédito que ora se pretende executar por força do título executivo – a restituição com juros da utilização dos € 249,750,00 que foram disponibilizados pelo banco creditante[26].
Com efeito, como se explicitou no Ac. do STJ de 10/04/2018 (relator Pinto de Almeida), in www.dgsi.pt., “pode dizer-se, com referência ao citado art. 46.º, n.º 1, al. c), do CPC, que o contrato de abertura de crédito é um documento particular assinado pelos executados, importando a constituição de obrigações pecuniárias a contrair no futuro, determináveis por simples cálculo aritmético, a partir dos saques – cheques, transferências – sobre a conta de depósitos à ordem associada à conta corrente (…).
Conforme dispõe o art. 804.º do CPC (actual art. 715.º), quando a obrigação esteja dependente de uma prestação por parte do credor ou de terceiro, incumbe ao credor provar documentalmente que se efectuou ou ofereceu a prestação. Assim, não resultando do contrato celebrado a concessão efectiva de qualquer crédito, o que só ocorreria posteriormente com a mobilização pelos executados do montante disponibilizado, tornava-se necessário que a exequente, através de documentação complementar, demonstrasse que os executados utilizaram efectivamente aquele montante (…)”.
A força executiva de que o contrato de abertura de crédito em conta-corrente se reveste, enquanto documento particular, não se adquire automaticamente, pois importa adicionalmente que se faça demonstração do reconhecimento de obrigações pecuniárias nos termos do art. 46º, n.º 1, al. c), do CPC/1961.
O art. 46º, n.º 1, al. c), do CPC de 1961, conjugado com o princípio ditado pelo art. 804º, n.º 1, do mesmo CPC[27] (aplicável ainda por força do art. 6º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013), implica que se veja o contrato de abertura de crédito como um título executivo incompleto quanto às obrigações pecuniárias que resultam das prestações futuras nele convencionadas ou subjacentes. E a sua completude, sendo as obrigações pecuniárias determináveis nos termos da liquidação do exequente, depende de prova complementar do título, assente em “documento passado em conformidade com as cláusulas constantes do documento exequendo – extractos de conta-corrente ou outros documentos contratuais[28]; o título, para ser exequível, carece de constar de documento particular e de ser completado com a apresentação de um outro documento comprovativo da prestação por parte do credor que é constitutiva da obrigação exequenda (prova adminicular), passado em conformidade com as respetivas cláusulas. Assim se prova que, como se salientou no Ac. do STJ de 8/06/2021 (relatora Maria Clara Sottomayor), in www.dgsi.pt., “a obrigação futura, que se pretende executar, foi efetivamente constituída, isto é, que alguma prestação foi, de facto, realizada no desenvolvimento da relação contratual. Daí a necessidade de completar a (…) abertura de crédito com a prova de que foi efetivamente emprestada alguma quantia ao creditado”.
Com efeito, a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a admitir, para efeitos de formação do título executivo, documentos complementares ao contrato constante de documento particular[29]. Nesse caso, entende-se que o título executivo é complexo ou compósito, porque está corporizado num acervo documental em que a complementaridade entre dois ou mais documentos se articula e complementa numa relação lógica, evidenciada no facto de, regra geral, cada um deles só por si não ter força executiva e a sua ausência fazer indubitavelmente soçobrar a do outro, mas juntos assegurarem eficácia a todo o complexo documental como título executivo[30].
Daí que nada obste a que se possa aplicar o art. 50º do CPC de 1961[31] (igual ao actual art. 707º do CPC/2013), de forma analógica aos documentos particulares, na parte relativa à prova das prestações e obrigações futuras que baseiam a execução: “tratando-se de contratos-quadro, ou seja, de contratos em que se convencionem obrigações futuras (como o contrato de abertura de crédito), a exequibilidade exigirá adicionalmente a demonstração, pelos meios previstos no art. 707º, da existência de prestações que tenham sido realizadas para conclusão do negócio ou de que alguma obrigação foi, entretanto, constituída[32].
No caso em apreço resulta provado do contrato e do documento complementar junto em sua completude (nota de débito):
i. a celebração do intitulado “Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente Caucionada” que previa o acordo para a entrega da quantia de “abertura de crédito” máxima de € 275.000,00, em conta bancária da sociedade executada, assinado pela sociedade devedora na qualidade de mutuária e pelos executados AA e DD na qualidade de avalistas (cfr. facto provado 5);
ii. a entrega/disponibilização para utilização da quantia de € 249,750,00, a título de capital inicial;
Ou seja, mostra-se documentalmente comprovado a outorga do contrato de abertura de crédito (mediante documento particular, assinado pelos devedores nos termos supra referidos), mas também as concretas disponibilizações efetivas do crédito (através de documento de suporte, consubstanciado na nota de débito).
O título executivo tem, portanto, uma natureza compósita ou complexa, constituído pelo documento particular de abertura de crédito e pelo documento complementar (extracto bancário/nota de débito junto) que comprova a disponibilização da quantia objeto de promessa daquele contrato.
E, portanto, temos título executivo munido de exequibilidade, nos termos do art. 46º, n.º 1, al. c), e 50º (analogicamente), do CPC de 1961, que permite o reconhecimento de uma obrigação pecuniária de montante determinado, quanto ao capital (no tocante ao montante disponibilizado no valor de € 249,750,00) e determinável (juros aplicados após o momento do incumprimento), quanto ao mais, por simples cálculo aritmético, devidamente assinado pelo devedor (propiciador, portanto, dos requisitos exigidos pelo art. 713º do CPC: certeza, exigibilidade e liquidez).
Improcede, por isso, este fundamento da apelação.
*
4. Da falta da interpelação dos executados e da inexigibilidade do crédito exequendo.
Sustentam os recorrentes que a «alegada obrigação é também inexigível, porquanto não ocorreu a interpelação dos executados, nomeadamente da sociedade executada, conforme a Lei obriga»,
No caso, dizem, «as medidas previstas no Plano de Recuperação que foi objeto de aprovação e homologação apenas ficariam sem efeito se, a ora apelada, tivesse interpelado por escrito a sociedade executada e a mesma não cumprisse a prestação em falta no prazo de 15 dias, contados a partir da referida interpelação», o «que não foi alegado e muito menos provado que tivesse sido feito».
Na sentença recorrida foi explicitado que, por força da aplicação do disposto no art. 218.º, n.º 1, al. a), do CIRE, «o que poderão ser executados serão esses créditos, tal como existiam antes do plano, e não nas condições – com o perdão e moratória –  estabelecidas no plano homologado que, nesse âmbito ficou sem efeito.
Assim sendo, (…), havendo incumprimento do plano isso implica automaticamente a extinção dos efeitos quanto à moratória e ao perdão, assim como significa a repristinação do crédito nas condições originais ou primitivas, anteriormente ao plano.
Na verdade, o incumprimento do plano de recuperação judicialmente homologado, concede ao credor a possibilidade de exigir o pagamento do primitivo crédito na sua totalidade, o que foi feito pela Exequente ao instaurar os autos principais de execução”.
Vejamos como decidir.
A questão consiste em saber se a recorrida/exequente cumpriu, ou não, a interpelação dos devedores a que alude o art. 218.º, n.º 1, al. a) “ex vi” do art. 17º-G, n.º 13, ambos do CIRE, para o incumprimento do PER.
Com vista a apreciar a questão suscitada nestes autos importa, ainda que muito resumidamente, fazer algumas considerações acerca do processo especial de revitalização.
Este processo traduz-se num instrumento processual, sobretudo de cariz negocial, criado e a desenvolver-se, num contexto económico difícil, passível de suportar a viabilização da empresa, assentando a estabelecida eficácia do acordo, para além da esfera dos que nele intervieram, na aprovação por uma maioria que seja apta a vincular a generalidade dos credores[33].
Esse tipo de processo, segundo o disposto no art. 17º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante, abreviadamente, designado CIRE), “destina-se a permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes [um] acordo conducente à sua revitalização”.
Iniciado o procedimento a requerimento da empresa e de, pelo menos, um dos credores ou credores que, não estando especialmente relacionados com a empresa, sejam titulares, pelo menos, de 10 /prct. de créditos não subordinados, o juiz do tribunal competente para declarar a insolvência do devedor nomeia um administrador judicial provisório [art. 17º-C, n.ºs 1 e 3, al. a) e 5 do CIRE][34], seguindo-se a reclamação de créditos (17º-D, n.º 2, do CIRE), as negociações destinadas à elaboração do plano de recuperação participadas, orientadas e fiscalizadas pelo administrador provisório (art. 17º-D, n.º 9 do CIRE) e, concluídas estas com a aprovação do plano, este é submetido ao juiz que o homologa ou recusa a sua homologação, por aplicação, com as necessárias adaptações, das regras aplicáveis ao plano de insolvência (art. 17º-F do CIRE).
Recebido o requerimento de apresentação da empresa a PER, e não existindo motivo para a recusa da abertura do PER, o juiz nomeia de imediato o administrador judicial provisório (art. 17º-C, n.º 5, do CIRE) sendo que tal despacho é de imediato notificado ao devedor e objeto de notificação, publicidade e registo previstos nos arts. 37º e 38º (art. 17º-C, n.ºs 5 e 8, do CIRE). Este despacho tem efeitos processuais, sobre o devedor e em relação aos credores[35]. Logo que receba tal notificação, deve o devedor comunicar aos credores que não subscreveram a declaração escrita, que deu início a negociações com vista à sua revitalização, que foi dado início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar nas mesmas caso assim o entendam (art.º 17.º-D, n.º 1, do CIRE). No que concerne aos credores, o despacho previsto no n.º 5 do art. 17º-C do CIRE determina, após a sua publicação no portal electrónico, o início do prazo de 20 dias para reclamarem créditos junto do administrador judicial provisório (art. 17º-D, n.º 2, do CIRE).
Esgotado o prazo para a reclamação de créditos, o administrador judicial provisório elabora, no prazo de cinco dias, uma lista provisória de créditos (art. 17º-D, n.º 3, do CIRE). Esta lista é publicada no portal CITIUS e converte-se de imediato em definitiva se não for impugnada no prazo de 5 dias úteis, tendo o juiz idêntico prazo para decidir as impugnações apresentadas (art. 17.º-D, n.ºs 4, 5 e 6, do CIRE).
Contudo, a eventual sentença homologatória do plano de recuperação, que venha a ser aprovada no âmbito do PER, não produz força de caso julgado material relativamente aos créditos que nele tenham sido ou não reclamados. É que, como se assinala nos Acs. do STJ de 28/04/2021 e de 27/11/2019 (ambos relatados pelo Conselheiro José Rainho), in www.dgsi.pt., o PER não tem como finalidade precípua dirimir definitivamente e com força de caso julgado material litígios sobre a existência dos créditos, de sorte que a decisão que recaia sobre as reclamações de créditos é meramente incidental, não constituindo caso julgado fora do respetivo processo (cfr. art. 91.º, n.º 2, do CPC). Mesmo que a lista dos créditos tenha sido homologada judicialmente, a decisão não consolida os créditos, nem os torna firmes, nem produz qualquer efeito preclusivo relativamente a processo de insolvência posterior.
A lista de créditos no PER visa apenas determinar quem pode participar nas negociações, as maiorias de aprovação e quem pode votar, sendo que o processo do art. 17º-D do CIRE para a reclamação de créditos e organização da lista definitiva de credores apresenta uma tramitação assaz simplificada, destituída do contraditório indispensável a que o tribunal possa decidir sobre os créditos com força de caso julgado. Donde se conclui que a lista não impugnada só é definitiva nos termos e para os efeitos do processo de revitalização, não integrando um ato formal de reconhecimento do crédito[36].
Por outro lado, existindo incumprimento do plano de revitalização, aplica-se subsidiariamente o regime do incumprimento respeitante ao plano de insolvência previsto no art. 218º do CIRE, por força do disposto no n.º 13 do art. 17.º-F[37] do CIRE[38].

Preceitua o referido art. 218.º, n.º 1, al. a):

«1 - Salvo disposição expressa do plano de insolvência em sentido diverso, a moratória ou o perdão previstos no plano ficam sem efeito:
a) Quanto a crédito relativamente ao qual o devedor se constitua em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor».

Se o plano de recuperação prever alguma moratória ou perdão, estes ficam sem efeito, salvo disposição expressa do plano em sentido diverso, quanto aos créditos relativamente aos quais o devedor se constitua em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor. Na verdade, os efeitos do incumprimento enunciados no art. 218.º, n.º 1, al. a), do CIRE, aplicável no âmbito do PER, produzem-se desde que o credor interpele por escrito o devedor que se tenha constituído em mora e a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias a contar dessa interpelação[39].
Por força dessa disposição dá-se, em certos termos, uma repristinação dos créditos originais. A moratória e o perdão ficam sem efeito quanto aos créditos contemplados no plano homologado relativamente aos quais a empresa se constitui em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias a contar da interpelação escrita do credor[40].
Ficarão igualmente sem efeito os créditos modificados que não sejam suscetíveis de recondução à moratória e ao perdão. Mas para isso já será necessário que os credores adotem um comportamento activo e exerçam o seu direito de resolução nos termos do art. 432º e ss. do CC[41].
Com efeito, a homologação, por sentença, do plano de recuperação não retira a qualidade de título executivo a documento atinente a crédito considerado nesse plano.
Donde, verificando-se o incumprimento do plano de recuperação nos moldes previstos no art. 218.º do CIRE, os créditos recuperam a sua situação originária, pois só o cumprimento do plano exonera o devedor da totalidade das dívidas remanescentes[42].
Para que haja perda da moratória ou do perdão e obrigação de pagamento da prestação, acrescida dos juros de mora, é indispensável que o credor interpele por escrito o devedor, como resulta claramente da letra da lei.
É que, «o desencadeamento das consequências que a lei liga à falta de pagamento pontual do que é devido está imperativamente condicionado à prévia interpelação do credor para o devedor cumprir, o que terá de suceder após verificada a falha relativamente ao prazo inicialmente previsto; não vale, por isso, um aviso prévio que o credor entenda dirigir ao devedor, lembrando-lhe o próximo vencimento»[43].
Esta interpelação serve para fazer cessar a moratória ou o perdão previsto, impondo que o credor interpele por escrito o devedor para cumprir no prazo de 15 dias. Assim, para que o credor possa interpor execução para pagamento do seu crédito terá de proceder à interpelação prevista no art. 218º, n.º 1, al. a), do CIRE, provocando a repristinação dos créditos originais. E para proceder à execução o título executivo a apresentar será o correspondente a tais créditos originais - não a sentença homologatória do plano de recuperação conjugada com a lista de créditos reconhecidos no PER e/ou com interpelação, pois aquele acordo mostra-se extinto e aquela lista, ainda que definitiva, não importa um verdadeiro reconhecimento dos créditos[44].
Importa, assim, apreciar se a recorrida efetuou ou não tal interpelação, competindo à exequente, nos termos do n.º 1 do art. 342.º do CC, a prova de ter feito a interpelação a que alude o art. 218.º, n.º 1, al. a), do CIRE[45].
Afigura-se-nos que a interpelação a que alude a al. a) do n.º 1 do art. 218.º tem natureza receptícia, pelo que apenas produz efeitos depois de chegar ao conhecimento do destinatário (ou seja, no caso, da sociedade devedora), a menos que só por culpa deste não haja sido oportunamente recebida, caso em que a declaração será igualmente eficaz (art. 224º, nºs 1 e 2, do Cód. Civil)[46].
A propósito do art. 224º do C. Civil, tem-se entendido que a “declaração negocial recipienda ou receptícia considera-se eficaz não apenas quando é recebida pelo destinatário como ainda quando só por sua culpa exclusiva não foi oportunamente recebida (art. 224º, n.º 2 do C. Civil)”, sendo que na “apreciação da culpa e da sua imputação exclusiva no não recebimento da declaração devem ser ponderadas as circunstâncias relevantes, designadamente o grau de diligência concretamente exigível ao destinatário, tendo em conta a natureza e o teor do contrato a que respeita a declaração[47].
No caso, era, portanto, à recorrida/embargada que incumbia o ónus de alegação e prova da receção da interpelação ou da sua não receção, por culpa exclusiva dos destinatários, no caso os executados (cfr. art. 342.º, n.º 1, do CC)[48] [49].
No caso sub júdice, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida – e por força da parcial procedência da impugnação da matéria de facto –, constata-se que não resultou apurado que a exequente tenha procedido à interpelação por escrito a que alude o art. 218.º, n.º 1, al. a), do CIRE. Não resultou provado que, em 19 de setembro de 2022, a exequente remeteu aos executados, sob registo, cartas que foram rececionadas e que consistem numa interpelação para pagamento do total da dívida que se cifrava em € 495.822,94; tão pouco que os executados tenham sido interpelados por escrito.
Com efeito, dos factos provados não se alcança que a credora interpelou a sociedade devedora dando conta das quantias em dívida por referência ao plano de recuperação homologado por sentença, bem como a tenha intimado a, no prazo de 15 dias, cumprir as prestações em mora, acrescida dos juros moratórios.
Embora seja certo resultar apurado que a sociedade devedora estava em falta quanto ao cumprimento das obrigações decorrentes do plano de recuperação aprovado – os executados não procederam ao pagamento dos montantes em dívida, sendo que quanto às obrigações ora executadas mutuária incumpriu o plano homologado no Processo Especial de Revitalização n.º ......, nem mesmo depois da Sentença de não homologação do PER n.º 447/22.... –, estando, portanto, constituídos em mora, a verdade é que não se mostra demonstrado que teve lugar interpelação escrita pela credora. Logo, não se poderá concluir que a moratória e o perdão de juros decorrentes do plano de recuperação ficaram sem efeito. O mesmo se diga quanto à cláusula do PER que expressamente previa o impedimento, por parte dos Bancos Credores, da execução das garantias enquanto se mantiver o cumprimento do Plano de Recuperação.
Como vimos, essa interpelação por escrito constitui uma formalidade indispensável ou necessária para o desencadeamento das consequências que a lei liga à falta de pagamento pontual do que é devido, designadamente para cessação dos efeitos da moratória e perdão que tenham atingido os créditos que o devedor não satisfez.
O mesmo é dizer que, sem essa interpelação por escrito do devedor para cumprir no prazo de 15 dias, os efeitos da moratória e do perdão previsto no PER não cessaram. Sem o cumprimento (ou a demonstração) dessa formalidade imperativa/necessária, está, portanto, vedado à credora instaurar execução com base no primitivo título executivo, visto – diversamente do propugnado na sentença recorrida – não ocorrer “a repristinação do crédito nas condições originais ou primitivas, anteriormente ao plano”.
Tão pouco valerá como título a sentença homologatória do plano de recuperação conjugada com a lista de créditos reconhecidos no PER, pois aquela lista, ainda que definitiva e homologada por acordo, não importa um verdadeiro reconhecimento dos créditos, não possuindo força de caso julgado material. Além de que, no que toca aos créditos originais – objeto da presente execução –, não existe no PER decisão judicial a reconhecê-los e a certificá-los como tais.
A exequente não pode lançar mão do título dado à execução para obter coercivamente contra os embargantes a satisfação de um crédito que está reestruturado num plano de recuperação quanto ao qual não comprovou a interpelação estabelecida no art. 218.º, n.º 1, al. a), do CIRE, indispensável à cessação da moratória e perdão aí contemplados.
Em suma: i) a devedora/Recorrente não cumpriu o (primeiro) plano de recuperação aprovado, devidamente homologado por decisão transitada em julgado; ii) o segundo plano de recuperação não chegou sequer a ser homologado; iii) não obstante o referido incumprimento das obrigações decorrentes do plano de recuperação, a credora/Recorrida não logrou provar que interpelou, por escrito, a sociedade devedora nos termos e para os efeitos do disposto no art. 218º, n.º 1, al. a), do CIRE (aqui aplicável por força do art. 17º-F, n.º 13); iv) não se mostrando comprovada a efetivação dessa interpelação admonitória, a moratória e o perdão do plano de recuperação homologado não ficaram sem efeito; v) o mesmo vale quanto à cláusula do PER que previa o impedimento, por parte dos Bancos Credores, da execução das garantias enquanto se mantiver o cumprimento do Plano de Recuperação; vi) consequentemente, a embargada/credora não fica livre para exigir, querendo, a totalidade do valor em dívida (a repristinação do crédito originário) e, com base no primitivo título executivo, de recorrer aos meios coercivos para o efeito.
Nestes termos, é de concluir pela inexigibilidade do crédito exequendo, pelo que procede este fundamento da apelação.
Tal determina a procedência dos embargos de executado, com a consequente extinção da execução e o levantamento da penhora decretada sobre o imóvel identificado nos autos.
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5. – Consequentemente, ao abrigo do disposto no art. 608º, n.º 2, do CPC “ex vi” do art. 663º, n.º 2, in fine, do mesmo diploma, considero necessariamente prejudicada a apreciação das demais questões em discussão no presente recurso [prescrição dos juros e amplitude da hipoteca genérica ou global], sendo certo, ainda que a serem consideradas procedentes, jamais determinariam a extinção total da execução.
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6. – Custas.
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 527º do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção.
Como a apelação foi julgada procedente, mercê do princípio da causalidade, as custas (quer da apelação, quer da execução como dos embargos de executado) serão da responsabilidade da embargada/recorrida.
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VI. DECISÃO

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente, revogando a sentença recorrida e julgando procedentes os embargos de executado, atenta a inexigibilidade do crédito exequendo, e, em consequência, extingue-se a execução e determina-se o levantamento da penhora sobre o imóvel identificado nos autos.
Custas da apelação, da execução e dos embargos de executado a cargo da exequente/embargada/recorrida (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 23 de maio de 2024

Alcides Rodrigues (relator)
António Figueiredo (1º adjunto)
Joaquim Boavida (2º adjunto)



[1] Por se tratar de uma alteração/modificação muito limitada, dispensamo-nos de transcrever de novo toda a factualidade provada e não provada, devendo considerar-se os pontos fácticos objeto de alteração/aditamento nos termos supra explicitados. 
[2] Cfr. Paulo Pimenta, In Acções e Incidentes Declarativos na Pendência da Execução, Revista Themis, Ano V, n.º 9, 2004, p. 73.
[3] Cfr. José Lebre de Freitas/Armindo Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3º, 3ª ed., Almedina, 2022, pp. 473/475; José Lebre de Freitas, A Acção Executiva À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª ed., Gestlegal, pp. 195/196, J. P. Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum À Face do Código Revisto, Almedina, pp. 149/150 e Marco Carvalho Gonçalves, Lições de Processo Civil Executivo, 2016, Almedina, p. 195.
[4] Cfr. Ac. do STJ de 29/09/2009 (relator Paulo Sá), in www.dgsi.pt.
[5] Cfr. Ac. do STJ de 12/11/2009 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt.
[6] Cfr. José Lebre de Freitas/Armindo Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil (…), p. 471; José Lebre de Freitas, A Acção Executiva (…), pp. 208/210, Marco Carvalho Gonçalves, obra citada, p. 209.
[7] Cfr. Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 5ª ed., Almedina, p. 150.
[8] Cfr., neste sentido, José Lebre de Freitas, Estudos sobre Direito Civil e Processo Civil, pp. 458 e 459; José Lebre de Freitas/Armindo Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil (…), p. 471, Ac. do STJ de 09/02/2011 (relator Lopes do Rego), Ac. da RC de 26/04/2016 (relatora Maria João Areias) e Ac. RC de 28/06/2011 (relator Teles Pereira), ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
[9] Cfr. DR 159/96, SÉRIE II, de 11/07/96, in BMJ 457º, p. 59.
[10] Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, 1998, p. 177.
[11] Cfr. A ação executiva – À luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª ed., Gestlegal, 2018, pp. 39-40.
[12] Cfr. Anselmo de Castro, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, Coimbra Editora, 1977, pág. 14.
[13] Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares da Processo Civil, Reimpressão, Coimbra Editora, 1993, pp. 58-59.
[14] Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in Acção Executiva Singular, 1998, pp. 13, 14, 29 e 63/64.
[15] Cfr. Eurico Lopes Cardos, Manual da Acção executiva, 3ª ed. (Reimpressão) Almedina, 1992, p., 22 e Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de execução, Almedina, 1999, p. 20.
[16] No referido regime, e tal como acontecia com os documentos autênticos ou autenticados, o documento particular era título executivo tanto quanto formalizava a constituição duma obrigação, como quando o devedor nele reconhecia uma dívida preexistente. O mesmo é dizer que o citado normativo conferia exequibilidade aos documentos particulares, assinados pelo devedor, constitutivos ou recognitivos de obrigações (cfr. José Lebre de Freitas, A Acção Executiva Depois da Reforma, 4ª ed., Coimbra Editora, 2004, pp. 57/59).
[17] Cfr. José A. Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, 7ª ed., 2020, p. 501, Carlos Ferreira de Almeida, Contratos II, 5ª ed., 2022, Almedina, p. 158; Acs. do STJ de 10/04/2018 (relator Pinto de Almeida) e de 30/04/2024 (relator Ricardo Costa), in www.dgsi.pt.
[18] Cfr. José A. Engrácia Antunes, obra citada, p. 502.
[19] Cfr. António Menezes Cordeiro, Direito bancário, colab. A. Barreto Menezes Cordeiro, Almedina, Coimbra, 2016 (reimp. 2018), p. 694.
[20] Como refere Manuel Januário da Costa Gomes, “o creditado tem a faculdade de utilizar o crédito, situação que gere em função dos seus interesses. Quando não utilize o capital, o creditado não é, naturalmente, devedor dos respectivos juros. Contudo, é lógico que a imobilização do capital à disposição do creditado tenha, ela própria, um preço, sendo usual a fixação de uma "comissão de imobilização": o creditado paga, através dessa comissão, a segurança de ter capitais (ou assinaturas) à sua disposição que não utiliza. A partir do momento em que utilize o capital, a comissão de imobilização perde, naturalmente, a sua razão de ser, passando a remuneração do banco a traduzir-se em juros, sem prejuízo de outras eventuais comissões” (cfr. Contratos comerciais, 2013, Almedina, pp. 328-329).
[21] Cfr. L. Miguel Pestana de Vasconcelos, Direito Bancário, Almedina, 2017, pp. 206-207.
[22] Cfr. Ac. do STJ de 8/06/2021 (relatora Maria Clara Sottomayor), in www.dgsi.pt.
[23] Cfr. Ac. da RE de 11/04/2019 (relatora Isabel de Matos Imaginário), in www.dgsi.pt.
[24] Cfr. A Acção Executiva, AAFDL Editora, 2018, pp. 188/189. 
[25] Cfr. António Menezes Cordeiro, Direito bancário, (…), p. 697.
[26] Cfr., no mesmo sentido, o recente Ac. do STJ de 30/04/2024 (relator Ricardo Costa), in www.dgsi.pt.
[27] Prevê o citado normativo:
«Quando a obrigação esteja dependente de condição suspensiva ou de uma prestação por parte do credor ou de terceiro, incumbe ao credor alegar e provar documentalmente, no próprio requerimento executivo, que se verificou a condição ou que efetuou ou ofereceu a prestação”.
[28] Cfr. neste sentido, Rui Pinto, obra citada, pp. 186-187; afirmando estar-se perante título executivo de formação compósita ou complexa, os Acs. do STJ de 30/04/2024 (relator Ricardo Costa) e de 15/03/2021 (relatora Maria da Graça Trigo), proc. 15465/16.0T8LSB-A.L1.S1, in www.dgsi.pt. in www.dgsi.pt.
[29] Cfr. Ac. do STJ de 15/03/2021 (relatora Maria da Graça Trigo), proc. 15465/16.0T8LSB-A.L1.S1, in www.dgsi.pt.
[30] Cfr., entre outros, Acs. do STJ 5/05/2011 (relator Gregório Silva Jesus) e de 15/03/2021 (relatora Maria da Graça Trigo), proc. 15465/16.0T8LSB-A.L1.S1; Ac. da RP de 9/03/2023 (relator Filipe Caroço), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[31] Lebre de Freitas explicava, para aplicação desta norma aos documentos particulares, entre o mais, que: “se a obrigação de celebrar o contrato real constasse de documento particular exequível, não havia razão para que a prova da realização da prestação, sem a qual não há contrato definitivo, não devesse ser feita nos mesmos termos” (cfr. A acção executiva, 4.ª edição, 2004, Coimbra Editora, pp 54 a 57, especialmente notas 41 e 43-A).
Assim, existindo um documento complementar nos termos referidos comprovava-se a celebração de um empréstimo durante a execução do contrato de abertura de crédito em conta-corrente e admitia-se que o conjunto daquele documento com este contrato, formava um título executivo.
[32] Cfr. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, Volume II, Processo de execução, processos especiais e processo de inventário judicial, Artigos 703º a 1139º, Almedina, Coimbra, 2020, p. 23 (nota 30).
[33] Cfr. Ac. do STJ de 17/11/2017 (Relatora Ana Luísa Geraldes), in www.dgsi.pt.
[34] Por referência ao regime do Dec. Lei n.º 79/2017, de 30/06, que era o aplicável à data do primeiro processo de revitalização.
[35] Com a prolação da decisão a nomear administrador judicial provisório fica impedida a instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, ficam suspensas, quanto à empresa devedora, as ações em curso com idêntica finalidade (efeitos impeditivo e suspensivo) - art. 17º-E, n.º 1, do CIRE.
[36] Cfr., neste sentido vide, entre outros, Ac. do STJ de 9/04/2019 (relator Pinto de Almeida), in www.dgsi.pt.; na doutrina, entre outros, Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, reimpressão, 3ª ed., Quid Iuris, Lisboa, 2015, pp. 154/155 (anotação ao art. 17º-D, nota 12); Maria do Rosário Epifânio, Manual de Direito da Insolvência, 2016, 6ª ed., Almedina, p. 283 (nota 950) e Marco Carvalho Gonçalves, Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais, Almedina, 2023, p. 711 (com citação de abundante jurisprudência).
[37] O qual estatui:
«É aplicável ao plano de recuperação o disposto no n.º 1 do art. 218.º.»
[38] Introduzido pelo Dec. Lei n.º 79/2017, de 30 de junho e objeto de alteração, na sua ordenação, pela Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro.
[39] Cfr. Ac. da RE de 11/04/2019 (relatora Isabel de Matos Imaginário), in www.dgsi.pt.
[40] Cfr. Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência, 2018, Almedina, p. 482.
[41] Cfr. Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência (…), p. 483.
[42] Cfr. Ac. da RE de 11/04/2019 (relatora Isabel de Matos Imaginário), in www.dgsi.pt. e Marco Carvalho Gonçalves, Processo de Insolvência (…), p. 565
[43] Cfr. Neste sentido, Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência (...), p. 796, anotação ao art. 218º (nota 5).
[44] Cfr. Ac. do STJ de 3/01/2022 (relator Manuel Capelo), in www.dgsi.pt.
[45] Cfr. Ac. da RE de 11/04/2019 relatora Isabel de Matos Peixoto Imaginário) e Ac. da RC de 10/05/2022 (relator Pires Robalo), in www.dgsi.pt.
[46] Cfr. Ac. da RC de 10/05/2022 (relator Pires Robalo), in www.dgsi.pt.
[47] Cfr. Acórdão do STJ, datado de 09.12.2012 e publicado na CJ, acórdãos do STJ, ano 2012, volume 1, p. 73.
[48] Cfr. Ac. da RC de 10/05/2022 (relator Pires Robalo), in www.dgsi.pt.
[49] De acordo com as regras gerais sobre a repartição do ónus da prova, incumbe ao autor da declaração demonstrar que empregou um meio de transmissão que se revele idóneo a atingir a esfera de conhecimento do declaratório e que a declaração foi por ele efetivamente recebida, ao passo que compete ao declaratório demonstrar que a declaração foi recebida em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida [cfr. Fernando A. Ferreira Pinto, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, 2ª ed., UCP Editora, 2023, p. 607 (anotação ao art. 224º do CC)].