Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3/16.3T8VRL.G1
Relator: SANDRA MELO
Descritores: TAXA DE JURO
COMERCIAIS
CIVIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

1 - No nosso ordenamento jurídico, desde o 2º semestre de 2013, passaram a coexistir, por assim terem sido fixadas, duas taxas supletivas de juros comerciais, uma para as obrigações comerciais que não caibam no âmbito da aplicação do Decreto -Lei n.º 62/2013 outra para as que estão sujeitas à sua regulação, as quais têm sido objeto dos competentes avisos.
2 - Por força do disposto no artigo 102.º, § 3 do Código Comercial desde que o ato seja subjetivamente comercial em relação ao credor são devidos juros comerciais, mesmo que o devedor relapso seja um consumidor.
3 - O dono da obra apenas tem direito a ser indemnizado quando a desconformidade entre a obra realizada pelo empreiteiro e a contratada se traduza num defeito que lhe cause danos ou possa desvalorizar a prestação, impedir ou dificultar o fim a que a obra objetivamente se encontra afetada.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Autores e e Apelados:
(…), contribuinte nº …, residente na Rua(..),Alijó,

Réus e e Apelantes:
(…) contribuinte nº … e mulher (…) contribuinte nº …, residentes da (…) Vila Real

Autos de apelação em ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum,

I - Relatório

O autor peticionou a condenação dos Réus a:

A) - Pagarem ao Autor a importância de 47.500,00 €, correspondente ao valor ainda em dívida pelos trabalhos já efetuados, acrescido de juros de mora vencidos, à taxa legal, no montante de 4.000,00 €, tudo totalizando 51.500,00 €, assim como em juros de mora vincendos, à taxa supletiva legal, desde a propositura da presente ação, até efetivo e integral pagamento;
B) – Indemnizarem o Autor a título de responsabilidade contratual na quantia de 2.500 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto e em síntese, que no âmbito da sua atividade profissional celebrou um contrato de empreitada com os Réus, e embora tenha realizado a obra, estes não pagaram a última prestação do preço inicial, no valor de 10.000,00 €, nem o valor dos trabalhos a mais e alteração de materiais, num total de € 37.500,00 €.
Na contestação os Réus arguiram as exceções de prescrição, da nulidade das estipulações contratuais e de não cumprimento e impugnaram os factos alegados pelo autor.
Deduziram reconvenção, pedindo a condenação do autor reconvindo no pagamento da quantia de € 42.825,62, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva, desde a data da notificação até efetivo e integral pagamento.

Após a audiência final foi proferida sentença que julgou, quer a ação, quer a reconvenção parcialmente procedentes:

-- condenando os réus a pagarem ao autor a quantia de 22.891,38 €, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento e
-- condenando o autor reconvindo a pagar aos reconvintes a quantia de 12.915,27 €, acrescida de juros à taxa legal desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento, absolvendo-os do demais peticionado.

Não se conformando com a sentença, os Réus apelaram, pretendendo que:

-- seja o crédito reconhecido ao recorrido seja reduzido para 18.635,90 €;
- e que sejam reconhecidos aos Recorrentes, além dos montantes expressamente constantes da sentença recorrida, os seguintes créditos:

a) a quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos), em conformidade com a matéria de facto dada como provada sob o facto 72.º;
b) a quantia de €865,00 (oitocentos e sessenta e cinco euros), relativa aos valores gastos pelos Recorrentes com o arranjo das persianas e do telhado;
c) a quantia de €2.836,76 (dois mil, oitocentos e trinta e seis euros e setenta e seis cêntimos) relativa aos trabalhos previstos no contrato de empreitada e não realizados.
d) a quantia de €3.669,76 (três mil, seiscentos e sessenta e nove euros e setenta e seis cêntimos) relativa às poupanças obtidas pelo Recorrido com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos no contrato;
Num total de quantia de 24.888,83 € acrescidos de juros à taxa legal desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento.

Formulam, para tal, as seguintes
conclusões:
I. O presente recurso tem como objecto:
- a nulidade da sentença;
- a decisão sobre a matéria de facto;
- a decisão sobre as questões de direito.
II. Na sentença recorrida, o tribunal condenou as partes no pagamento dos juros de mora à taxa supletiva legal, mas não especificou, como devia, o tipo de taxa - civil ou comercial.
III. Dada a falta de pronúncia quanto à matéria supra, entendem os Recorrentes que a sentença padece de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
IV. Sendo o Recorrido um empresário comercial, nos termos do artigo 230.º, n.º 6, do Código Comercial, o mesmo apenas pode exigir juros à taxa supletiva legal comercial quando estiverem em causa transacções comerciais, tal como definidas no artigo 3.º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de Maio, como se retira do artigo 4.º do mesmo diploma legal.
V. Na relação entre Recorrido e Recorrentes não se pode considerar que existiu uma transação comercial, até porque estes não são empresas, tal como definidas na alínea d) do artigo 3.º do referido diploma legal, sendo meros consumidores, em decorrência da celebração de um contrato de empreitada para a construção de uma moradia unifamiliar que destinaram à sua própria habitação e do seu agregado familiar (cfr. artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho).
VI. E, nessa qualidade de consumidores, não lhes pode ser aplicável o regime que regula as transações comerciais, nas quais se prevê a possibilidade de exigência de juros de mora à taxa supletiva legal para operações comerciais, como também resulta do artigo 2.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de Maio, que exclui a aplicabilidade de tais regras aos contratos celebrados com os consumidores.
VII. Nos termos do artigo 617.º, n.º 1, do CPC, o tribunal recorrido ou o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães deverão pronunciar-se especificadamente quanto à questão supra, decidindo que a taxa supletiva legal é a prevista para as dívidas civis, ou seja, de 4%, e não para as dívidas comerciais, assim se colmatando a nulidade de que a sentença padece, nesta parte, por omissão de pronúncia.
VIII. Quanto ao facto provado n.º 65 da sentença recorrida, o mesmo padece de um lapso de escrita, uma vez que não reflecte, nem a resposta dada pelos senhores peritos no relatório pericial ao quesito 50, e apresenta-se em contradição com a própria motivação de direito expendida pela Meritíssima Juiz a quo.
IX. Por conseguinte, nos termos do artigo 614.º, n.os 1 e 2, do CPC, deverá proceder-se à rectificação desse manifesto lapso, devendo o facto provado n.º 65 passar a apresentar a seguinte redacção: "Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material e mão de obra, a quantia de cerca de €6.204,88 (seis mil, duzentos e quatro euros e oitenta e oito cêntimos)".
X. Não existindo um lapso ou erro de escrita, sempre haverá que concluir que se verifica, nesta parte, uma nulidade da sentença proferida, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC, pois que existe manifesta contradição entre a redacção do facto provado, a resposta dos peritos ao quesito 50 e a motivação de direito, impondo-se, igualmente, a alteração da respectiva redacção nos termos indicados na conclusão anterior.
XI. Não obstante a Meritíssima Juiz a quo ter dado como provada a matéria de facto constante dos factos provados n.os 68 a 72, particularmente a deste último artigo ("Tendo despendido, em mão-de-obra e material, na reparação dos terraços em redor da casa, a quantia de € 4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos)."), não tomou em consideração que, para reparar os trabalhos executados pelo Recorrido, foi necessária, além das quantias expressamente constantes da motivação de direito, a quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos) para a reparação dos terraços em redor da casa.
XII. Trata-se de um lapso manifesto do tribunal recorrido ou, caso assim se não entenda, de uma nulidade da sentença, atenta a contradição entre a decisão sobre a matéria de facto e a motivação de direito, bem como quanto à parte decisória propriamente dita, que deverão ser supridos/sanados para que, da decisão propriamente dita, passe a constar a condenação do Recorrido a pagar aos Recorrentes a quantia de €12.915,27 (doze mil, novecentos e quinze euros e vinte e sete cêntimos), acrescida da quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos), num total de €17.517,41 (dezassete mil, quinhentos e dezassete euros e quarenta e um cêntimos), acrescidos de juros de mora à taxa supletiva legal cível, desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento.
XIII. Os Recorrentes também não se podem conformar com alguns dos factos dados como provados.
XIV. Desde logo, a matéria de facto correspondente ao facto 7.º, além de contrariar a lógica e as regras da experiência comum, mostra-se desconforme ao alegado pelo próprio Recorrido no artigo 7.º da petição inicial e ao depoimento da Recorrente S..
XV. Ao contrário do que resulta da sentença, na fundamentação da decisão quanto à matéria de facto, a Recorrente mulher jamais disse, afirmou ou insinuou que aceitou “as alterações na obra” e que os Recorrentes consentiram que certos trabalhos previstos no contrato não fossem realizados, tendo apenas admitido que escolheram materiais mais baratos porque o Recorrido estava com problemas financeiros e preferiram materiais mais baratos para este terminar a obra.
XVI. Deverá, portanto, ser alterada a redacção do facto provado n.º 7, nos seguintes termos: "7º Autor e Réus acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais efetuados e para pagamento das diferenças de valor de alguns materiais utilizados na obra.”
XVII. Também não se conformam os Recorrentes com a matéria de facto dada como provada sob o n.º 8.º, ponto A.
XVIII. No relatório pericial, em resposta ao quesito 2 (correspondente ao artigo 8.º da petição inicial), os senhores peritos consideraram que, quanto à cave, os trabalhos a mais podiam ser interpretados de duas formas diferentes, apresentando uma leitura A e uma leitura B, consoante se entendesse que as paredes envolventes da caixa-de-ar ali existente não estavam ou estavam incluídas na obrigação do empreiteiro, respetivamente.
XIX. Porém, tendo em conta que:
- os senhores peritos preferiram não se pronunciar sobre a opção por uma ou outra leitura, ainda que indiquem, no relatório pericial, que estava previsto um alçapão de acesso à caixa de ar não ventilada, pelo que só faria sentido para este espaço a edificação de paredes exteriores;
- o próprio Recorrido admitiu que estava inicialmente prevista a construção de parte dos muros de betão armado que compõem a cave;
Impunha-se que a Meritíssima Juiz a quo optasse pela consideração da leitura B.
XX. Além de ter optado erradamente pela leitura A, a Meritíssima Juiz a quo também não fundamentou, como se lhe impunha, atendendo às regras do ónus da prova, a respectiva opção, a qual, aliás, se apresenta em contradição com os factos dados como provados sob os n.os 22 e 23.
XXI. Por conseguinte, quanto ao facto 8.º, ponto D, apenas deveria ter sido dado como provado pela Meritíssima Juiz a quo que:
"8º Todos os trabalhos a mais e despesas extraordinárias foram realizados no interesse, a pedido e na sequência de ordens dadas pelo dono da obra, os Réus, ou com a concordância destes, cuja execução o Autor aceitou levar a cabo, tendo consistido no seguinte:
A. Construção da cave, em medida superior e com diferentes materiais do que inicialmente previsto, no valor de 4.490,04 €, acrescido de IVA;"
XXII. Também foi incorretamente julgado o ponto D do facto provado n.º 8, o qual deveria ter sido dado como não provado, por força do depoimento do Recorrido, da ausência de conhecimento de trabalhos a mais por parte das testemunhas L. F. e A. S., bem como do depoimento da Recorrente, que nunca admitiu ou aceitou que tivessem sido colocadas manilhas de segurança do valor aí mencionado.
XXIII. Alterada, como deve ser nos termos supra, a matéria de facto dada como provada sob o facto 8.º , ponto A, e devendo considerar-se como não provada a matéria de facto que consta sob o facto 8.º, ponto D, relativa ao valor dos trabalhos a mais realizados pelo Recorrido, cujo pagamento se baseou no instituto do enriquecimento sem causa, deverá, em consequência, o crédito que o Recorrido detém sobre os Recorrentes, fixado na sentença recorrido, ser reduzido para a quantia de €18.635,90 (dezoito mil, seiscentos e trinta e cinco euros e noventa cêntimos);
XXIV. A Meritíssima Juiz a quo deu como não provada a matéria de facto correspondente aos artigos 147.º a 149.º e 153.º a 156.º da contestação.
XXV. Todavia, essa matéria de facto deveria ter sido dada como provada, quer em virtude de a mesma estar plasmada nos documentos n.os 2, 56 e 57 da contestação, quer por ter sido asseverada pelos depoimentos da Recorrente mulher e da testemunha M. P., quer pela falta de credibilidade do depoimento do Recorrido nesta matéria, que negou sucessivamente, no seu depoimento, ter recebido a notificação judicial avulsa correspondente ao referido documento n.º 2.
XXVI. Assim, deve considerar-se como provado que:
"- Também o telhado e as respetivas cornijas estavam mal rematados, permitindo a infiltração de água no interior da habitação.
- Os caleiros que recolhiam as águas pluviais estavam mal colocados e não permitiam um correto escoamento das mesmas, que também acabavam por se infiltrar no interior da casa.
- Uma vez que o Autor, devidamente notificado para reparar estes defeitos, optou por não o fazer, tiveram os Réus de proceder, a suas expensas, à reparação, pois em causa estava a estrutura da sua própria casa e do seu direito de propriedade.
- E, com a reparação do telhado e dos caleiros, os Réus dependeram a quantia de € 400,00 (quatrocentos euros).
- Por outro lado, também as persianas da sala e do quarto do D., devido ao seu tamanho e peso, deixaram de funcionar logo no primeiro mês de utilização.
- Os Réus notificaram o Autor para eliminar tal vício, mas o mesmo nada fez.
- Como em causa estava o isolamento térmico da casa e, assim, a qualidade do ar e do ambiente no interior, bem como a sua própria saúde, viram-se os Réus forçados a proceder, eles próprios, a suas expensas, à reparação do vício em causa, o que lhes implicou o dispêndio da quantia de € 465,00 (quatrocentos e sessenta e cinco euros)."
XXVII. E dando-se como provada a matéria de facto relativa aos valores gastos pelos Recorrentes com o arranjo das persianas e do telhado, porque se consubstanciavam como defeitos de construção que entretanto foram reparados pelos Recorrentes, atendendo à motivação explanada na sentença, na parte em que fundamenta o direito de crédito dos Recorrentes sobre os Recorridos, forçosa é a conclusão de que ao respectivo direito de crédito já reconhecido deverá acrescer a quantia de €865,00 (oitocentos e sessenta e cinco euros).
XXVIII. A matéria de facto dada como provada nos pontos 34.º, 35.º, 36.º, 37.º, 43.º, 45.º e 46.º - que corresponde a trabalhos não realizados pelo Recorrido que totalizam o valor de €2.836,76 (dois mil, oitocentos e trinta e seis euros e setenta e seis cêntimos) - não implica uma alteração dos materiais aplicados (na qual se concede que os Recorrentes consentiram), mas uma simples não realização de trabalhos previstos no contrato.
XXIX. Tendo a Meritíssima Juiz a quo entendido que o Recorrido tinha direito, por força do instituto do enriquecimento sem causa, a receber pelos trabalhos que realizou a mais, perante um princípio de equidade não faz sentido considerar que os Recorrentes não têm direito a ser restituídos em face dos trabalhos realizados a menos.
XXX. Não foi dado como provado – nem poderia – que os Recorrentes consentiram expressa ou tacitamente na não realização dos trabalhos previstos no contrato, pois que o preço global acordado inicialmente foi aceite pelos mesmos no pressuposto de que todos os trabalhos seriam realizados.
XXXI. A Recorrente mulher apenas admitiu que escolheram materiais mais baratos porque o Recorrido estava com problemas financeiros e preferiram materiais mais baratos para este terminar a obra.
XXXII. Não podem os Recorrentes aceitar a sentença recorrida, na parte da motivação onde se lê:

“Ou seja, os réus aceitaram as alterações efetuadas, pelo que, ainda que algumas tenham implicado um menor custo para o autor, não podem, os réus, agora, vir exigir o pagamento de qualquer diferença, já que embora os contratos devam ser cumpridos pontualmente, podem modificar-se por mútuo consentimento dos contraentes – art. 406º, nº 1 do Código Civil, o que aconteceu no caso.
Entendemos, assim, que os réus não têm direito a qualquer valor pelas obras executadas de maneira diferente do previsto no projeto, nem pelos diferentes materiais aplicados, nem por algum trabalho não executado, por ter ficado provado que os réus solicitaram, ou deram o seu consentimento a todas essas alterações ao contratado.
Situação diferente é já a execução de trabalhos contratados com defeitos ou vícios, caso em que o autor está a incumprir o contrato, pelo que deve ser condenado a reparar ou pagar o valor da reparação dos vícios e defeitos que se provarem.”
XXXIII. E tal inconformismo advém do facto de, em consequência da alteração propugnada quanto ao facto n.º 7 da matéria de facto dada como provada, ter ficado acordado entre Recorrentes e Recorrido que ocorreria um acerto de contas pelos trabalhos realizados a mais e os diferentes materiais aplicados.
XXXV. Em face do disposto nos artigos 798.º, 799.º, 1214.º, n.º 1, e 1223.º CC, bem como da matéria dada como provada nos pontos 34.º, 35.º, 36.º, 37.º, 43.º, 45.º e 46.º, facilmente se conclui que o Recorrido, ao não ter concluído todos os trabalhos, como se obrigou, nos termos do contrato de empreitada, incorre no dever de indemnizar os Recorrentes pelos prejuízos sofridos.
XXXVI. A sentença recorrida incorreu numa errada interpretação das disposições normativas supra transcritas, devendo o Recorrido indemnizar os Recorrentes, pelos traba lhos não realizados, no valor total de €2.836,76 (dois mil, oitocentos e trinta e seis euros e setenta e seis cêntimos).
XXXVI. Finalmente, alterada a redacção do facto provado 7 nos termos supra referenciados, resulta necessariamente que, em face do acordo estabelecido entre Recorrentes e Recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 406.º do CC, deveria o tribunal recorrido tomar em consideração, no apuramento do “acerto de contas", as diferenças nos custos do material aplicado, plasmadas nos factos provados 39.º, 41.º, 44.º, 47.º, 48.º e 50.º, considerando-as como crédito dos Recorrentes.
XXXVII. Totalizam as poupanças obtidas pelo Recorrido, com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos, a quantia de €3.669,76 (três mil, seiscentos e sessenta e nove euros e setenta e seis cêntimos), devendo aquele ser condenado a pagar aos Recorrentes tal quantia.

O recorrido respondeu, apresentando as seguintes
conclusões:

1.ª-A douta sentença recorrida não padece de qualquer vício, tendo apreciado a prova de forma cuidada, ponderada, criteriosa e segundo o princípio da livre apreciação da prova e em estrita obediência à lei e aos princípios processuais vigentes,
2.ª-Tendo feito uma correcta e irrepreensível aplicação do direito na presente acção, estando devidamente fundamentada e tendo-se pronunciado sobre todas as questões que devia apreciar, pelo que não se verifica qualquer vício.
3.ª-Tendo a douta sentença recorrida condenado as partes no pagamento dos juros de mora à taxa supletiva legal, não teria que especificar o que quer que seja, na medida em que o próprio conceito de taxa supletiva legal remete-nos de imediato para a aplicação da taxa de juro comercial,
4.ª-A qual é aplicável aos créditos de quem forem titulares de empresas comerciais, singulares ou colectivas, como é o caso do credito do Autor.
5.ª-Efetivamente, foi dado como provado que o Autor dedica-se à actividade de construção civil, edificando casas de habitação e outros prédios, mediante contratos de empreitada celebrados com os donos das obras, como resulta do ponto 1.º da matéria de facto provada.
6.ª-Assim, sendo o Autor considerado uma empresa, e tendo o mesmo prestado os serviços aos Réus nessa qualidade, independentemente do tipo de contrato que está na origem dos mesmos,
7.ª-Tem o mesmo direito a receber o crédito que lhe foi reconhecido, acrescido dos respectivos juros de mora, à taxa legal supletiva,
8.ª-O que equivale a dizer, à taxa legal prevista para os créditos comerciais.
9.ª-Assim, não existe qualquer omissão de pronuncia por parte do Tribunal, e, por isso, não se verifica a alegada nulidade prevista no artigo 615.º, n.º1, alínea c) do CPC.
10.ª-Não se verifica qualquer erro de escrita na redacção do facto provado n.º65 pois pese embora os Réus tenham referido que gastaram a quantia de 6.000,00€ para reparação do pavimento, a título de mão de obra,
11.ª-O certo é que, de acordo com o relatório de peritagem, em resposta ao quesito 39, os peritos apenas indicam 109 metros quadrados de pavimento com abatimentos e com as juntas cheias de ervas,
12.ª-Devendo ser considerados apenas aqueles 109 metros quadrados objecto de reparação,
13.ª-Sendo certo que tendo os senhores peritos indicado o valor de 12,50€ por metro quadrado, como decorre da resposta ao quesito 50,
14.ª-O respectivo custo de reparação do pavimento nunca ascenderia a mais de 1.362,50€, conforme consta do referido relatório pericial, nomeadamente da resposta ao quesito 50.
15.ª-Entende o aqui recorrido que tendo o Tribunal dado como não provado na douta sentença recorrido que, e passamos a citar:” A água das chuvas, devido à incorrecta inclinação do pavimento, entranhava-se nas paredes da casa, causando inundações no interior da casa, escorrendo para dentro da própria casa e determinando a formação de bolores e apodrecimento das paredes interiores, suas argamassas e rodapés”, não podia condenar o Autor ao pagamento de qualquer custo com a alegada reparação dos terraços em redor da casa,
16.ª- De outra forma estaria em incorrer numa contradição entre a matéria dada como não provada e a respetiva decisão.
17.ª- Não assiste qualquer razão dos Réus ao considerarem ter sido indevidamente dado como provado a matéria de facto constante dos pontos 6 e 7 da douta sentença recorrida,
18.ª- Não se vislumbrado qualquer contradição das regras de experiencia comum ou da lógica.
19.ª- Efetivamente, no ponto 6 da matéria de facto, ficou provado que, e passamos a citar: “ aceitaram a realização de trabalhos não previstos na empreitada inicial, bem como a alteração de alguns materiais a utilizar na obra.”
20.ª- Consta do ponto 7 dos factos provados que, e passamos a citar: ”Autores e Réu acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais realizados”.
21.ª- Como os próprios Recorrentes o reconhecem, foi a própria Ré S. que, em sede de audiência de discussão, aquando das declarações de parte, reconheceu ter sido a própria e o seu marido que optaram por escolher material mais barato, mais tendo admitido que acompanhou os trabalhos, tendo aceitado as várias alterações efetuadas na obra.
22.ª- A testemunha arrolada pelos Réus, Engenheiro A. P., confirmou também que os materiais eram sempre escolhidos pelos Réus e que estes solicitaram varias alterações aos materiais inicialmente previstos.
23.ª- Assim, da prova produzida, dúvidas não resultaram que os recorrentes consentiram que determinados trabalhos previstos no contrato não fossem realizados, o que resulta dos depoimentos atrás referidos mas também do facto de terem acompanhado a obra, nunca tendo feito qualquer reclamação.
24.ª- Importa referir que mesmo aquando da notificação judicial avulsa do aqui recorrido, os recorrentes não fizeram qualquer interpelação a este respeito, como se extrai da referida notificação junto aos autos a fls.,
25.ª-Caso os recorrentes não consentissem que certos trabalhos previstos no contrato não fossem realizados, certamente que teriam notificado o recorrido para os executar, atenta até o litígio já existente à data da referida notificação judicial avulsa.
26.ª-Assim não assiste qualquer razão que justifique a alteração da redacção do facto provado n.º7.
27.ª-Também não existem razões para alteração da redacção do facto provado n.8, como é pretensão dos recorrentes.
28.ª-O Tribunal determinou o valor referente aos trabalhos de execução da cave de acordo com o relatório de peritagem e com a demais prova produzida em sede de audiência de julgamento, nomeadamente dos esclarecimentos prestados pelos senhores peritos e pelo depoimento do Autor, que referiu ter construído a cave a pedido dos réus, para salão de jogos para os filhos, não prevista no contrato.
29.ª-Também a testemunha e pai do Réu, M. P., referiu que a casa acabou por ficar com uma cave que não tinha sido pedida pelos réus, factualidade confirmada pela testemunha A. P., engenheiro civil da empresa responsável pelo projecto, que referiu que a cave não estava prevista no projecto, dizendo que seria mais fácil e mais barato aterrar do que executar a cave.
30.ª-Os recorrentes, na tentativa de fazer crer que foi indevidamente julgada a matéria de facto provada constante do ponto A do facto provado n.8 destacaram um pequeno excerto do depoimento de parte do Autor, fazendo-o ainda de forma descontextualizada, como se pode constatar da audição integral do respectivo depoimento.
31.ª-Para além de não fazerem qualquer referência a outros depoimentos prestados, que em conjugação com a demais prova produzida permitiram esclarecer o Tribunal.
32.ª-O Tribunal deu como provado, e muito bem, que o Autor procedeu à colocação de manilhas de segurança no valor de 700,00€, acrescido de IVA.
33.ª-Tais manilhas não estavam previstas no contrato de empreitada pois aí apenas estavam previstas manilhas de drenagem e não manilhas de segurança, que são coisas diferentes.
4.ª-Tal conclusão resulta do próprio relatório de peritagem, tendo os senhores peritos esclarecido na resposta ao quesito 2 ponto E que, e passamos a citar:” Os peritos consideram que as manilhas existentes e identificadas são para condução de águas pluviais provenientes do terreno vizinho a montante e não para a drenagem de águas subterrâneas do prédio”,
35.ª-Tendo os mesmos peritos considerado como trabalho a mais, no valor de 700,00€.
36.ª-Pelo que não existe qualquer razão para alteração desta matéria de facto dada como provada, devendo em consequência manter-se como provado o ponto D do facto provado sob o n.º8.
37.ª-Face ao supra exposto, não existem razões para reduzir o valor em que os Recorrentes foram condenados a pagar ao recorrido.
38.ª-Relativamente à matéria de facto dada como não provada, o Tribunal deu como não provado, entre outra matéria, que as persianas da sala e do quarto do D., devido ao seu tamanho e peso, deixaram de funcionar logo no primeiro mês de utilização, dando ainda como não provado que estivesse em causa o isolamento térmico da casa e que os recorrentes tenham dispendido a quantia de 465,00€.
39.ª-O Tribunal deu como não provada tal matéria com base na apreciação da prova produzida na sua globalidade, desde logo pela não confirmação de tal vício por parte dos senhores peritos e do próprio recorrido.
40.ª-O mesmo se diga relativamente à questão do telhado e dos caleiros, tendo o Tribunal considerado como não provado a existência dos defeitos alegados pelos recorrentes, que resultou da prova produzida nos autos, nomeadamente do relatório de peritagem.
41.ª-Efetivamente, os senhores peritos não confirmaram a existência desses defeitos, tendo, pelo contrario, negado a sua existência, com resulta de forma expressa e inequívoca da resposta aos quesitos 53 e 54, onde se refere que a cobertura em chapa isotérmica, painel sanduíche está bem aplicada e que os caleiros que recolhem as águas pluviais existentes na cobertura da moradia tem pendente adequada de forma a garantirem o correcto escoamento das águas.
42.ª-Face ao supra exposto, não existem razões para alteração da decisão da matéria de facto.
43.ª- Com a transcrição parcial, muito parcial, e descontextualizada de alguns depoimentos, o que defendem os recorrentes é que, com base nos indicados depoimentos, teria julgado determinados factos como provados e outros como não provados de acordo com a sua convicção pessoal.
44.ª-Ora, esse não é o critério legalmente relevante pois, ressalvados os casos de prova legalmente tarifada ou condicionada, vigora, em sede de apreciação da matéria de facto, o princípio da livre apreciação da prova pelo respetivo julgador (artigo 607.º, n.º5 do C.P.C).
45.ª-Nenhum outro critério nem nenhuma outra convicção se podem sobrepor a essa livre convicção, a não ser que haja erro de julgamento, o que manifestamente não é o caso.
46.ª-Finalmente, os recorrentes questionam a motivação de direito da douta sentença recorrida, mais concretamente na parte em que o Tribunal considerou que tendo os réus aceitado as alterações efetuadas e a não execução de alguns trabalhos previstos no contrato, ainda que algumas tenham implicado um menor custo para o autor, não podem aqueles agora vir exigir o pagamento de qualquer diferença, na medida em que os réus não só consentiram como até foram os próprios a propor essas alterações.
47.ª-Da prova produzida nos autos, resultou de forma inequívoca que os recorrentes consentiram na não realização de alguns trabalhos previstos no contrato.
48.ª-O Engenheiro responsável pelo projecto, A. P., referiu que o réu tinha conhecimento das alterações e que até era o mesmo que ia com o empreiteiro escolher os materiais.
49.ª-A própria Ré reconheceu ter sido da sua responsabilidade e do seu marido a escolha de materiais mais baratos, referindo que preferiram esses materiais mais baratos porque sabiam que o autor estava com problemas financeiros, aceitando, por isso, essa alteração contratual.
50.ª-Admitiu ainda a própria Ré que sempre acompanhou a obra, bem como o seu marido,
51.ª-Os quais nunca fizeram qualquer reclamação a este propósito.
52.ª-Referem os recorrentes que o facto de acompanharem a obra nada significa pois o recorrido poderia realizar os trabalhos em falta a qualquer momento, mesmo depois de lhes entregar as chaves da obra.
53.ª-Ora, além de tal argumento não fazer qualquer sentido, contrariando todas as regras da lógica e da experiencia, até porque a execução de alguns trabalhos estava prejudicado pela execução de outros,
54.ª-Também não podemos deixar de atender ao facto de os recorrentes, já depois de terem passado a habitar a casa, terem notificado o recorrido, através da notificação judicial avulsa junta aos autos a fls., para reparar alguns defeitos,
55.ª-Não tendo, em momento algum, feito referencia à inexecução dos trabalhos agora referidos pelos réus,
56.ª-O que significa que estes aceitaram as referidas alterações pois caso contrário não deixariam de exigir nessa notificação a execução dos trabalhos, atento o litígio já existente nessa altura e que, inclusive, motivou a notificação através do Tribunal.
57.ª-Face ao exposto, a douta sentença recorrida fez uma correcta apreciação da prova e uma interpretação do direito irrepreensível, não merecendo qualquer censura.
58.ª-Assim, não se verifica qualquer violação das normas que regulam a força probatória dos meios de prova, os quais, considerados na sua globalidade e devidamente conjugados, não podiam conduzir a decisão diversa daquela que o tribunal “ a quo” proferiu, a qual não padece de qualquer vicio, devendo manter-se na integra.
59.ª-A decisão do tribunal da 1.ª Instancia sobre a matéria de facto só pode ser alterada pela Relação nas situações previstas no artigo 662.º do C.P. Civil.
60.ª-Não existem quaisquer razões que justifiquem a alteração da matéria de facto e, além do mais, os elementos presentes nos autos e considerados pelo Tribunal, designadamente a documentação e depoimentos prestados pelas testemunhas, não impõem decisão diversa, como já exposto.
61.ª-Desta forma, não existindo razões para alterar a matéria de facto, encontrando-se a douta sentença devidamente fundamentada, de facto e de direito, impõe-se a manutenção da decisão proferida.

II - Objeto do recurso

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso ou se versarem sobre matéria de conhecimento oficioso, desde que os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º nº 2 do mesmo diploma.

Face ao teor das conclusões do recurso, são as seguintes as questões que cumpre apreciar:

A- se a sentença padece de nulidades (em face da falta de tomada de posição sobre o tipo de juros legais – se civis, se comerciais; em face da contradição entre o que é dado como provado na fundamentação de facto e o que é dito que está provado na fundamentação de direito; em face da desconsideração de factos dados como provados e não aflorados na fundamentação de direito);
B- se a matéria de facto provada e não provada deve ser alterada, atenta a sua impugnação;
C- Se o crédito do recorrido deve ser reduzido para 18.635,90 e qual a taxa de juros de mora que é aplicável, face à alteração da matéria de facto provada;
D- se os Recorrentes têm direito a ser ressarcidos dos valores que despenderam a fazer reparações à obra por virtude de defeitos criados pelo Autor, a receber valor equivalente às poupanças obtidas pelo Recorrido com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos e os valores dos trabalhos previstos no contrato de empreitada que não foram realizados.

III - Fundamentação de Facto

A sentença vem com a seguinte matéria de facto provada e não provada, que se reproduz, sublinhando a matéria impugnada e para facilitar a futura consulta dos autos, apondo-se logo as alterações que infra se determinarão na matéria de facto provada.

III- A Factos provados:

1º O Autor dedica-se à atividade de construção civil, edificando casas de habitação e outros prédios, mediante contratos de empreitada celebrados com os donos das obras.
2º O Autor celebrou com os Réus um contrato de empreitada, em 15 de fevereiro de 2011, para construção de uma habitação unifamiliar, incluindo anexo e demais trabalhos complementares, numa parcela de terreno sita no lugar do "…", em ..., freguesia de ..., concelho de Vila Real.
3º O Autor comprometeu-se a construir a habitação pelo valor de 195.000,00 €.
4º Em contrapartida, os Réus assumiram a obrigação de pagar ao Autor o preço, consoante o desenvolvimento da obra, no valor global de 195.000,00 €, comprometendo-se a fazer os seguintes pagamentos ao Autor:
1ª - Prestação - Início da obra -------------------------------- 20.000,00€
2ª - Prestação - Início da laje de tecto do r/chão -------- 20.000,00€
3ª - Prestação - Início da laje de cobertura --------------- 20.000,00€
4ª - Prestação - Início das divisórias ----------------------- 10.000,00€
5ª - Prestação - Início das infra-estruturas --------------- 10.000,00€
6ª - Prestação - Início dos revest. exteriores ------------ 15.000,00€
7ª - Prestação - Início dos revest. interiores ------------- 15.000,00€
8ª - Prestação - Início da coloc. das caixilharias -------- 20.000,00€
9ª - Prestação - Início da coloc. das louças sanit. ------ 10.000,00€
10ª - Prestação - Início das pinturas ----------------------- 10.000,00€
11ª - Prestação - Início das carpintarias ------------------ 20.000,00€
12ª - Prestação - Início dos arranjos exteriores --------- 15.000,00€
13ª - Prestação - Final da obra -------------------------------10.000,00€.
5º O contrato, embora com algumas alterações, foi cumprido pelo Autor no que diz respeito aos trabalhos contratados, tendo as obras sido acompanhados pelos Réus e pelo técnico responsável pela obra e pelo projeto.
6º No decorrer da execução da obra, os Réus solicitaram ao Autor ou aceitaram a realização de trabalhos não previstos na empreitada inicial, bem como a alteração de alguns materiais a utilizar na obra.
7º Autor e Réus acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais efetuados. (este facto será mantido, infra, com esta redação).
8º Todos os trabalhos a mais e despesas extraordinárias foram realizados no interesse, a pedido e na sequência de ordens dadas pelo dono da obra, os Réus, ou com a concordância destes, cuja execução o Autor aceitou levar a cabo, tendo consistido no seguinte:
A. Construção da cave com cerca de 100 m2, no valor de 8.045,52 €, acrescido de IVA; (este facto será mantido, infra, com esta redação).
B. Muros exteriores no valor de 2.198,46 €, acrescido de IVA, já depois de descontado o valor de vedações previstas e não executadas;
C. Aplicação de ladrilhos no exterior em maior largura do que a acordada no contrato (de dois para seis metros), no valor de 1.947,40 €, acrescido de IVA;
D. Colocação de manilhas de segurança no valor de 700,00 €, acrescido de IVA; (este facto será mantido, infra, com esta redação).
9º Tais obras implicaram um acréscimo no gasto de materiais e de mão-de-obra por parte do Autor, pois foram obras que não estavam previstas no contrato inicial e no respetivo projeto de arquitetura e que só no decorrer da execução da obra foram acordadas entre este e os Réus.
10º Entregue a obra, os Réus entrarem para a casa, onde passaram a residir, com toda a sua família, incluindo filhos, aí dormindo, cozinhando e realizando todos as demais atividades familiares.
11º Em abril de 2013, os Réus aceitaram a obra, passando a usufruir da mesma.
12º Os Réus não efetuaram o pagamento da totalidade do valor da obra inicialmente contratado, não tendo procedido ao pagamento do valor de 10.000,00 €, que era a prestação final a pagar.
13º O Autor solicitou aos Réus o pagamento dos valores que considerou estarem em dívida, sem que até à presente data, estes tivessem efetuado qualquer pagamento, tendo-lhe remetido uma carta registada com aviso de receção com data de 23/9/2014, recebida pelo pai do Réu em 26/09/2014.
14º O Autor executou a obra com os requisitos necessários à sua utilização para o fim a que se destinava, a habitação dos Réus e seu agregado familiar.
15º Os Réus solicitaram ao Autor, como trabalho a mais, a colocação de pavimento em paralelo, na parte traseira do anexo construído pelo Autor, o qual foi pago à parte, mediante cheque no valor de €1.850,00 (mil oitocentos e cinquenta euros).
16º Cabia ao Autor, nos termos do contrato, proceder à drenagem das águas subterrâneas do prédio.
17º As obras referidas no ponto D do artigo 8.º da petição inicial estavam previstas no contratado inicialmente.
18º Para a implantação da casa, era necessário efetuar trabalhos de terraplanagem, facto de que o Autor era conhecedor desde o início e que também previu quando estabeleceu o orçamento para a construção dessa casa.
19º Os Réus acabaram por ir ocupar a casa, passando aí a viver com a sua família, nomeadamente os seus dois filhos, atualmente com 9 e 7 anos de idade.
20º Os Réus comunicaram ao Autor, mediante notificação judicial avulsa efetivada em 18 de Dezembro de 2013, os diversos vícios existentes na obra, tendo concedido o prazo de trinta dias para proceder à respetiva eliminação.
21º Não obstante, o Autor nunca contactou os Réus para proceder à eliminação dos vícios e concluir os trabalhos em falta.
22º Nos termos do contrato de empreitada celebrado em 15 de Fevereiro de 2011, estava previsto que a casa de habitação dos Réus ficasse na respetiva fundação com uma caixa-de-ar, com cerca de metro e meio de altura e com uma área total de 240 m2.
23º Esta caixa-de-ar deveria ficar só com as paredes exteriores, devendo o respetivo pavimento ficar com uma camada de gravilha, deste modo permitindo o acesso à parte inferior da casa para proceder às reparações que fossem necessárias.
24º Durante a execução dos trabalhos iniciais, o Autor procedeu à escavação da caixa-de-ar em maior profundidade do que aquilo que estava previsto no projeto, com o esclarecimento de que tal resultou do facto de a habitação ter sido implantada cerca de 0,50 metros mais elevada do que o previsto.
25º Após essa escavação mais profunda do que o previsto, o Autor prosseguiu na construção da casa, sem ter ainda concluído a dita e futura cave, a qual se manteve com um espaço aberto, particamente até ao final da obra.
26º Os Réus exigiram ao Autor a construção da garagem como anexo.
27º O Autor procedeu à conclusão da cave, erguendo as respetivas paredes exteriores, até ali, apenas com os pilares de suporte da casa.
28º A placa da cave não tem qualquer revestimento, apresentando-se em bruto.
29º O Autor também construiu duas paredes interiores na cave, em alvenaria de blocos de betão, que a dividem da parte da mesma que não possui qualquer pavimento além de gravilha colocada no chão.
30º O pavimento da caixa de ar deveria ter ficado em gravilha, nos termos inicialmente previstos, sendo certo que o Autor apenas colocou por cima dessa gravilha, e tão-somente em parte da cave, cimento com óxido de ferro no pavimento.
31º Atualmente, o revestimento interior das paredes da cave apresenta-se em pladur e o chão com cobertura de vinil.
32º Todavia, estes melhoramentos foram efetuados pelos Réus em data posterior.
33º Com o aumento da caixa-de-ar transformada em cave, que ocupou mais área do que ocuparia a caixa-de-ar, o Autor teve de proceder à colocação de ladrilho em quantidade superior à prevista, na parte do terraço que constitui cobertura da cave.
34º O Autor não colocou o vidro temperado na zona da porta de entrada, tal como previsto no ponto 2.3. do orçamento/contrato de empreitada, o que implicou uma poupança de 845,25 €, acrescidos de IVA.
35º Na zona dos quartos não foi colocada cobertura em godo (prevista no ponto 6.2. do orçamento/contrato de empreitada), mas sim em painel sanduíche, substituição essa que importou para o Autor a poupança de quantia não inferior a € 750,00 (setecentos e cinquenta euros).
36º Não foi colocada uma claraboia na zona do corredor (prevista no ponto 6.2. do orçamento/contrato de empreitada), o que importou para o Autor a poupança de quantia não inferior a € 250,00 € (duzentos e cinquenta euros).
37º Não foram colocadas pelo Autor as portas de vidro nos armários das casas de banho, tal como previsto no ponto 10.1. do orçamento/contrato de empreitada, o que implicou para o Autor a poupança da quantia de € 166,51 (cento e sessenta e seis euros e cinquenta e um cêntimos), sendo que a mesma teve de ser suportada pelos Réus.
38º O piso flutuante não é da marca descrita no ponto 12.1. do orçamento/contrato de empreitada, mas é de preço similar.
39º Nas casas de banho e na lavandaria foi colocado material cerâmico em vez de piso flutuante, como previsto no ponto 12.1. do orçamento/contrato de empreitada, o que implicou para o Autor uma poupança não inferior a € 246,05.
40º No piso da garagem não foi colocado o material descrito no ponto 12.2. do orçamento/contrato de empreitada, mas antes outro com um custo semelhante.
41º O piso da churrasqueira não foi colocado, apesar de tal estar previsto no ponto 12.3. do orçamento/contrato de empreitada, tendo, contudo, o respetivo espaço sido ocupado pela lavandaria, o que, compensando o que não foi feito com o que foi aplicado no local, implicou para o Autor uma poupança não inferior a € 23,71 (vinte e três euros e setenta e um cêntimos).
42º Nos peitoris e soleiras não foi colocada ardósia preta (tal como previsto no ponto 14.1. do orçamento/contrato de empreitada), mas antes foi colocado granito preto.
43º Apesar de estar previsto no ponto 17.2. do orçamento/contrato de empreitada, não foram colocados a expensas do Autor os dois lavatórios das casas de banho, tendo sido os Réus a pagar o material descrito, o que implicou uma poupança para aquele no montante de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros).
44º As bases de chuveiro e as paredes adjacentes deveriam ter sido feitas em Corion, mas foram substituídas por outro material cerâmico de qualidade muito inferior, o que implicou para o Autor uma poupança de valor não inferior a € 1.000,00 (mil euros).
45º O Autor também não colocou dois doseadores de sabão, o que implicou uma poupança para aquele em montante não inferior a € 25,00 (vinte e cinco euros).
46º Não foram colocados o pio e a torneira da churrasqueira, previstos no ponto 18.6. do orçamento/contrato de empreitada, no valor de cerca de € 150,00 (cento e cinquenta euros), implicando uma poupança para o Autor de igual valor.
47º Os rodapés colocados em madeira não são do material nem da marca descrita no ponto 29.2. do orçamento/contrato de empreitada, implicando uma poupança para o Autor de montante não inferior a € 500,00 (quinhentos euros).
48º As portas dos roupeiros (são em madeira) não são de vidro lacado, conforme descrito no ponto 30.3. do orçamento/contrato de empreitada, o que implicou para o Autor uma poupança do valor global não inferior a € 400,00 (quatrocentos euros).
49º O pavimento exterior em cubos de granito (paralelos) não foi colocado com junta betonada (como previsto no ponto 32.1 orçamento/contrato de empreitada), mas antes foi colocado em traço seco, sendo certo que foi colocado numa extensão muito inferior, em cerca de 70m2, em relação ao que estava previsto no projeto, o que implicou para o Autor uma poupança do valor global não inferior a € 2.000,00 (dois mil euros).
50º O muro de vedação da propriedade deveria, em parte, ser feito em bloco split, mas foi feito em tijolo normal com revestimento, o que implicou para o Autor a poupança de montante não inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).
51º O teto falso correspondente à cozinha e à sala não se apresenta totalmente pintado, nem o respetivo acabamento foi totalmente completado, implicando a sua conclusão um custo de 642,94 €.
52º O Autor não completou a pintura do rodapé da despensa.
53º Quanto ao aquecimento central, previsto no ponto 21. do orçamento, o Autor não efetuou a montagem completa do mesmo, tendo ficado a faltar partes do equipamento necessário ao funcionamento do mesmo.
54º O técnico contratado pelo Autor apenas procedeu à instalação parcial do equipamento, tendo informado os Réus que não procederia à instalação completa, nem lhes forneceria o código de desbloqueamento da caldeira, enquanto aquele não lhe pagasse o que lhe devia.
55º E assim, durante o primeiro ano em que estiveram na casa, os Réus estiveram privados de aquecimento.
56º E, apesar de instado a cumprir o contrato e concluir a instalação do aquecimento central, mediante notificação judicial avulsa, o Autor nada fez.
57º Donde os Réus se viram obrigados, a expensas suas, a concluir a instalação daquele equipamento, pois não poderiam viver, numa casa tão grande, situada na zona de ..., que é muito fria e húmida, sem aquecimento.
58º Face à inação do Autor, os Réus acabaram por chamar um técnico especializado da Daikin para inserir o código necessário ao desbloqueamento do aparelho.
59º O mesmo técnico instalou ainda uma bomba que estava em falta e teve de reinstalar o equipamento já montado, porque o mesmo não funcionava corretamente, devido à má montagem.
60º Para proceder à instalação completa e correta do sistema de aquecimento central, os Réus tiveram de despender a quantia total de € 4.025,30 (quatro mil e vinte e cinco euros e trinta cêntimos).
61º No logradouro da casa dos Réus, o Autor colocou o pavimento em paralelo em traço seco, ao invés de junta betonada, como constava do contrato de empreitada.
62º O que fez com que, durante a execução da obra, parte do pavimento do paralelo abatesse e, mais grave do que isso, que muitos dos paralelos acabassem por se soltar, permitindo a abertura de buracos e a acumulação de águas.
63º Pelo facto de ter sido mal construído, de raiz, o mesmo tinha de ser totalmente substituído.
64º Porque o Autor não eliminou os vícios no prazo que lhe foi concedido, os Réus mandaram reparar, a suas próprias expensas, o dito pavimento de paralelos, que permite o acesso à casa, à garagem e ao resto do terreno.
65º Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de € 671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), e, dada a grande dimensão desse pavimento, a quantia de cerca de € 1.000,00 (mil euros) em mão-de-obra. Infra determinar-se-á a alteração deste ponto para “Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de € 671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos).”
66º Os terraços em redor da casa foram construídos com a inclinação ao contrário, conduzindo as águas pluviais de fora para dentro de casa, ao invés de as escoarem para o exterior.
67º Dada a incorreta inclinação do pavimento, a água das chuvas acumulava-se junto às paredes exteriores da casa.
68º As paredes exteriores não foram corretamente isoladas, nem foi corretamente isolado o pavimento do terraço, nomeadamente nas uniões com as paredes exteriores.
69º Dada a má construção e as infiltrações verificadas, o próprio revestimento do terraço começou a levantar-se, as juntas começaram a desfazer-se e o próprio revestimento partiu-se, permitindo ainda maior infiltração de água no terraço e daí para o interior da casa com consequente maior deterioração da casa.
70º As infiltrações de água nas paredes geravam bolores e maus cheiros no interior da casa, determinando um ambiente pouco sadio.
71º As infiltrações eram de tal ordem e gravidade que os Réus tiveram de proceder à respetiva reparação, pois não podiam compadecer-se com mais delongas, atentos os prejuízos em causa.
72º Tendo despendido, em mão-de-obra e material, na reparação dos terraços em redor da casa, a quantia de € 4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos).
73º As janelas dos quartos, da cozinha e da sala não têm isolamento entre o capoto e a próprias janelas, permitindo a entrada de águas pluviais e de frio, sendo evidentes humidades junto de todas essas janelas, nas correspondentes paredes, o que determina a corrosão do gesso de revestimento e da própria pintura.
74º Junto da porta da cozinha e da porta de entrada, as paredes - principalmente nos remates junto à placa - apresentam humidades decorrentes de infiltrações de águas, o que determina a corrosão do gesso de revestimento e da própria pintura.
75º Existem fissuras de dimensão e configuração variáveis nas paredes da sala, do hall e em todos os quartos.
76º O painel de madeira lacada branca, colocado sobre a janela grande da sala, apresenta um buraco de dimensão considerável.
77º O armário embutido em pladur, existente na biblioteca, apresenta humidades e deterioração na sua estrutura.
78º As parede do hall interior está torta e mal rematada.
79º Para remover os vícios referidos será necessária a quantia € 2.042,15 (dois mil e quarenta e dois euros e quinze cêntimos).
.80º factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos factos não provados np56º a np58º: “As persianas da sala e do quarto do D. deixaram de funcionar passado um mês, colocando em causa a qualidade do ar e do ambiente no interior, bem como a sua própria saúde.
.81º factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos facto não provados np56º a np58º: O autor foi notificado para eliminar este defeito, mas nada fez.
.82º factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos factos não provados np56º a np58º: Os Réus sentiram-se forçados a proceder, eles próprios, a suas expensas, à sua reparação, o que lhes implicou o dispêndio da quantia de € 465,00”
.83º. factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos factos não provados np52º a np55º: - O telhado, as cornijas e os caleiros pela forma como foram aplicados não impediam a infiltração de água no interior da habitação nem um escorreito escoamento das águas, pondo em causa a estrutura da própria casa.
.84º. factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos factos não provados np52º a np55º O Autor foi notificado para reparar estes defeitos, mas não o fez.
.85º. factos aditados na sequência da reclamação efetuada aos factos não provados np52º a np55º Os Réus sentiram obrigados a proceder, a suas expensas, à reparação, dependendo a quantia de € 400,00 (quatrocentos euros).

III-B Factos não provados, que se numeram, a fim de facilitar a sua menção na apreciação da impugnação:

np.1 - Não se provaram os valores indicados pelo autor para os trabalhos a mais.
np.2 - Foi realizada a mais a colocação de rede de saneamento no valor de 500,00 €.
np.3 - Foram realizadas a mais obras de terraplanagem e utilização de fogo em espaços não previstos no contrato no valor de 4.000,00 €.
np.4 - O valor total de trabalhos a mais ascendeu a 37.500,00 €, mais IVA.
np.5 - Em abril de 2013, os réus passaram a usufruir a obra sem quaisquer limitações para si e para a sua família.
np.6 - Com a atitude dos réus, o Autor sofreu chatices, aborrecimentos e arrelias.
np.7 - O único trabalho a mais solicitado pelos Réus ao Autor consistiu na colocação de pavimento em paralelo, na parte traseira do anexo construído pelo Autor, o qual foi pago à parte, mediante cheque no valor de €1.850,00 (mil oitocentos e cinquenta euros).
np.8 - Foi o Autor que, por várias vezes, efetuou alterações da obra inicialmente prevista, limitando-se a comunicar aos Réus que fizera as mesmas porque assim era necessário, sem lhes dar mais explicações.
np.9 - Sempre que o Autor efetuou alterações aos trabalhos previstos, os Réus sempre lhe foram dizendo que não pagariam qualquer quantia além do que estava previsto no contrato de empreitada.
np.10 - No decorrer dos trabalhos, e por força da constante passagem de camiões e de outra maquinaria pesada, utilizadas na execução da obra, quer pelo Autor, quer pelos seus subempreiteiros, algumas das manilhas existentes no subsolo do prédio dos Réus partiram-se.
np.11 - Tais manilhas foram pagas pelo pai do Réu marido, o qual despendeu a quantia de € 800,00 (oitocentos euros).
np.12 - As obras referidas no ponto B do artigo 8.º da petição inicial estavam previstas no contratado inicialmente.
np.13 - Os Réus, uma vez que a obra evidenciava muitos sinais de vícios de construção, durante a edificação e quando a ocuparam, foram-nos reportando ao Autor, tendo este assumido o compromisso de os eliminar.
np.14 - Quando inspecionaram a obra, em 14 de Abril de 2013, os Réus constataram que a mesma apresentava defeitos e vícios que imediatamente comunicaram ao Autor, referindo que não poderiam aceitar a obra nos termos e condições em que a mesma se apresentava.
np.15 - Ao que o Autor contrapôs que conhecia tais vícios ou defeitos e que era sua intenção concluir os trabalhos ainda em falta, bem como eliminar os vícios e defeitos de construção.
np.16 - Tendo o Autor prometido, então, aos Réus que executaria os trabalhos necessários durante o verão de 2013, quando as condições climatéricas fossem mais favoráveis.
np.17 - Ao que os Réus acederam.
np.18 - Apesar de várias reuniões que se realizaram entre os Réus, o Autor e o engenheiro e arquiteto responsáveis pela fiscalização da obra, durante os meses de Maio e Junho de 2013, a verdade é que decorreu o verão de 2013 e o Autor não se prontificou a, de facto, executar as obras necessárias à eliminação dos vícios evidenciados e a concluir os trabalhos em falta.
np.19 - E, apesar das diversas interpelações efetuadas pelos Réus, telefonicamente e por via postal, o Autor não compareceu na obra para realizar os trabalhos em falta e não eliminou os defeitos e vícios em causa.
np.20 - Sendo certo que o Autor foi recusando as chamadas telefónicas efetuadas pelos Réus, bem como a correspondência por eles enviada.
np.21 - Os Réus procederam ao pagamento de todos os trabalhos realizados pelo Autor.
np.22 - Esta caixa-de-ar deveria ficar com as paredes exteriores revestidas, impermeabilizadas e pintadas.
np.23 - O Autor procedeu à escavação da caixa-de-ar em maior profundidade do que aquilo que seria necessário.
np.24 - Quando era chegado o momento de iniciar a construção da garagem como anexo, tal como estava previsto no projeto e no contrato de empreitada, o Autor sugeriu aos Réus a transformação da caixa-de-ar numa cave, não prevista nesse projeto, convencendo-os que, desta forma, poderiam usufruir de um espaço maior na sua casa.
np.25 - O Autor tentou ainda convencer os Réus a não construir a garagem que estava prevista como anexo no projeto, a qual passaria a ser na cave da casa, já que esta ficou com uma altura superior ao previsto.
np.26 - Só quando o autor procedeu à conclusão da cave é que os Réus tiveram a concreta perceção da transformação do espaço por baixo da casa relativamente ao que estava previsto no projeto.
np.27 - No entanto, a construção da cave não implicou, para o Autor, um acréscimo de trabalho e de despesa tão mais avultado do que aquele que teria de suportar com a construção da caixa-de-ar inicialmente prevista.
np.28 - Pois o Autor apenas teve de levantar mais meio metro de parede, em bloco de betão, do que o que era necessário para a caixa-de-ar.
np.29 - E o trabalho de escavação que lhe implicou deveu-se a negligência da sua parte.
np.30 - A cave apenas excede a área da caixa-de-ar em cerca de 55 m2.
np.31 - O Autor deixou as paredes interiores da cave sem qualquer revestimento.
np.32 - A obra efetuada na cave pelo Autor não lhe implicou o dispêndio de quantia superior a € 3.000,00 (três mil euros) em relação àquilo que teria de pagar para a construção da caixa-de-ar.
np.33 - Todavia, não teve de colocar mais do que 55 m2 de ladrilho.
np.34 - Foi colocado pelo Autor na obra, sem o consentimento dos Réus, material de qualidade significativamente inferior ao que estava previsto no contrato e foi pago pelos Réus.
np.35 - O autor não colocou a totalidade das dezassete vigas de aço, que serviam como cobertura do terraço, o que implicou, para o Autor, uma poupança de, pelo menos, €3.500,00 (três mil e quinhentos euros).
np.36 - A não colocação da claraboia importou para o autor uma poupança de 1.100,00 (mil e cem euros) a título de mão-de-obra e material.
np.37 - A não colocação das portas de vidro nos armários das casas de banho, tal como previsto no ponto 10.1. do orçamento/contrato de empreitada, implicou para o Autor a poupança da quantia de € 1.421,26 (mil, quatrocentos e vinte e um euros e vinte e seis cêntimos).
np.38 - O piso flutuante é de uma marca de qualidade inferior, o que custou ao Autor menos cerca de € 1.500,00 (mil e duzentos euros).
np.39 - O material colocado no piso da garagem é de qualidade inferior, o que se cifra numa poupança pelo Autor não inferior a € 500,00 (quinhentos euros).
np.40 - Em redor da habitação, nos respetivos terraços, não foi colocado o material descrito no ponto 13.1. do orçamento/contrato de empreitada, mas um outro material de qualidade muito inferior, o que implicou para o Autor uma poupança de valor não inferior a €1.000,00 (mil euros)
np.41 - A alteração de ardósia preta para granito preto importou para o Autor a poupança de montante não inferior a € 200,00 (duzentos euros).
np.42 - Não foi colocada a torneira misturadora da cozinha, prevista no ponto 18.4. do orçamento/contrato de empreitada, no valor de cerca de € 200,00 (duzentos euros), implicando uma poupança para o Autor de igual valor.
np.43 - As portas interiores, as ferragens aplicadas nas mesmas e os aros dessas portas não são da marca descrita nos pontos 27.1., 28.1. e 29.1. do orçamento/contrato de empreitada, mas de uma marca de qualidade inferior, implicando uma poupança para o Autor em valor não inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).
np.44 - Não foi colocado um batente por detrás da porta da despensa.
np.45 - O Autor não procedeu ao necessário isolamento entre as paredes exteriores e o passeio que as rodeia, nem procedeu à colocação de produto hidrofugante nas placas de granito da parede exterior da casa, o que vem favorecendo a infiltração de águas nessas paredes.
np.46 - Todos estes trabalhos não realizados pelo Autor, estimam-se, por baixo, no valor de €1.200,00 (mil e duzentos euros).
np.47 - Um dos focos embutidos na parede do corredor nunca funcionou.
np.48 - Com o passar do tempo, foi cada vez maior o número de paralelos que se soltaram e o pavimento continuou a abater, ameaçando abrir cada vez maior número de sulcos.
np.49 - Ficando o caminho de acesso à casa e respetiva garagem totalmente deteriorado.
np.50 - O que determinou para os Réus o risco de estragarem gravemente as suas viaturas e, pior do que isso, punha em causa a segurança dos seus filhos, que por ali brincavam, sujeitando-se a tropeçar, a cair e a ferir-se gravemente.
np.51 - A água das chuvas, devido à incorreta inclinação do pavimento, entranhava-se nas paredes da casa, causando inundações no interior da casa, escorrendo para dentro da própria casa e determinando a formação de bolores e apodrecimento das paredes interiores, suas argamassas e rodapés.
np.52 - Também o telhado e as respetivas cornijas estavam mal rematados, permitindo a infiltração de água no interior da habitação. (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.53 - Os caleiros que recolhiam as águas pluviais estavam mal colocados e não permitiam um correto escoamento das mesmas, que também acabavam por se infiltrar no interior da casa. (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.54 - Uma vez que o Autor, devidamente notificado para reparar estes defeitos, optou por não o fazer, tiveram os Réus de proceder, a suas expensas, à reparação, pois em causa estava a estrutura da sua própria casa e do seu direito de propriedade. (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.55 - E, com a reparação do telhado e dos caleiros, os Réus dependeram a quantia de € 400,00 (quatrocentos euros). (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.56 - Por outro lado, também as persianas da sala e do quarto do D., devido ao seu tamanho e peso, deixaram de funcionar logo no primeiro mês de utilização.
np.57 - Os Réus notificaram o Autor para eliminar tal vício, mas o mesmo nada fez. (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.58 - Como em causa estava o isolamento térmico da casa e, assim, a qualidade do ar e do ambiente no interior, bem como a sua própria saúde, viram-se os Réus forçados a proceder, eles próprios, a suas expensas, à reparação do vício em causa, o que lhes implicou o dispêndio da quantia de € 465,00 (quatrocentos e sessenta e cinco euros). (este facto será eliminado da matéria de facto não provada, infra)
np.59 - No chão da lavandaria, quando chove muito, surgem infiltrações de águas, que acabam por escorrer e se acumular junto à porta da entrada, as quais têm de ser recolhidas.
np.60 - Por causa das infiltrações, o pavimento do chão está totalmente manchado.
np.61 - As humidades e infiltrações são igualmente graves no quarto do D., por detrás do armário embutido, sendo o cheiro nauseabundo e evidenciando-se o deterioramento da respetiva estrutura.
np.62 - Os armários embutidos colocados nos quartos não abrem nem fecham completamente.
np.63 - Nas duas casas de banho, a pintura está a desfazer-se, revelando que não foi usada tinta adequada ao contacto permanente com a água.
np.64 - O isolamento do resguardo do poliban da casa de banho da suite apenas foi parcialmente realizado.
np.65 - Não se provaram os valores referidos pelos réus para reparação dos defeitos apontados.

IV - Fundamentação dos Factos e de Direito

-A- da nulidade sentença

As nulidades da decisão são apenas as que estão taxativamente (1) previstas no artigo 615º do Código de Processo Civil com redação semelhante no anterior código, sem que, no novo diploma, tenha ocorrido qualquer alteração nesta matéria.

Assim, são as seguintes as nulidades tipificadas da sentença:

a) falta de assinatura do juiz;
b) falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) oposição dos fundamentos com a decisão;
d) ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar;
e) tomada de conhecimento questões de que não podia tomar conhecimento;
e) condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

Da sua simples enunciação verifica-se de imediato que a nulidade da sentença é uma situação excecional (não obstante ser invocada quase como regra, no que toca às sentenças) e que diz respeito a situações muito pontuais.
Há que clarificar ideias: as causas de nulidade da sentença são essencialmente de caráter formal, dizendo respeito a desvios no procedimento ocorridos na sentença (ou despacho) que impedem que se percecione uma decisão da concreta situação em disputa: não se confundem com todas as situações que podem inquinar uma decisão e conduzir à revogação da mesma. Não abarcam todas e quaisquer falhas de que uma sentença pode padecer.
------- A.1) da nulidade por omissão de pronúncia (apesar da questão ter sido suscitada, a sentença não apresenta posição sobre o tipo de juros legais – se civis, se comerciais)
É efetivamente causa de nulidade da sentença a omissão de pronúncia sobre questões que a exigiam.
Mas essas questões, cuja omissão de pronúncia determina a nulidade da sentença, são aquelas a que se refere o artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil e não são os simples argumentos, razões ou elementos parciais trazidos à liça: identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir e com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
É, pois, pacífico que não há que confundir as “questões a conhecer”, com argumentos ou factos: aquelas são as mencionadas no artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil, relacionadas com as pretensões das partes, não o conjunto de alicerces (e cada um deles) em que as partes fundam tais “questões”, traduzidas nos factos (preteridos ou mal considerados) ou na aplicação do direito (normas ou princípios que não terão sido atendidas ou terão sido erroneamente empregados).
Quanto à indicação da taxa de juro a aplicar, no entanto, não há dúvidas que o tribunal a quo omitiu pronúncia sobre tal questão, tanto mais que a mesma era discutida nos autos, quer na petição inicial (embora no petitório se não indique se a taxa de juros é comercial ou civil, a mesma resulta do artigo 16º da petição inicial, onde se lê “Ao valor da dívida, há que acrescentar juros de mora, à taxa supletiva legal, para operações comerciais, contados desde abril de 2013”); quer na contestação (onde se afirma “Também não se aceita o valor dos juros peticionados no artigo 16.º da petição inicial e, muito menos, que os mesmos devam ser calculados à taxa supletiva legal para operações comerciais, pois o artigo 102.º do Código Comercial é inaplicável aos contratos com consumidores.”)
A sentença nada disse sobre esta matéria, limitando-se a condenar nos “juros à taxa legal”, sem especificar se se reporta à taxa de juros comerciais ou civis, quando o deveria ter dito.
No despacho que apreciou a admissibilidade do recurso o tribunal a quo pronunciou-se sobre a nulidade nos seguintes termos: “No que diz respeito à invocada nulidade, por falta de pronúncia quanto ao tipo de juros a pagar, diremos apenas que quando se condena em juros à taxa legal, se está a considerar os juros civis, sendo que se entende que apenas há lugar a juros comerciais quando ambos os contraentes são comerciantes e atuam no exercício do comércio, o que não foi o caso dos autos.”
Este despacho não é passível de impugnação, visto que não alterou a sentença, pelo que no mesmo apenas se pode considerar que se traduziu no indeferimento da nulidade arguida, por entender que a resposta era implícita.
No entanto, como aliás decorre das alegações e resposta, em que cada parte interpretou a sentença de forma diversa, a sentença não respondeu e muito menos apreciou tal questão: a mera indicação de que os juros são à taxa legal não esclarece se nos reportamos à taxa legal ou comercial, visto que há juros supletivos legais comerciais e civis.
Vejamos:
Os juros são convencionais quando decorrem de acordo das partes; são legais quando têm por fonte a lei.
Os juros legais, determinam os artigos 559º do Código Civil e 102º § 3 do Código Comercial (este quanto aos juros comerciais), são os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças (e do Plano), pelo que tais juros tanto podem ser civis como ser comerciais.
Assim, porque a sentença não indica a que tipo de taxa de juros supletiva se refere, do seu teor também não resulta implícito a qual delas alude e não houve qualquer retificação ou alteração da sentença, verifica-se a apontada nulidade.
Desta forma, nos termos do artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil cabe a este tribunal supri-la, o que se fará infra, por razões sistemáticas, visto que a questão está intimamente ligada com a condenação no capital, também aqui em disputa.
------- A.2) da nulidade por contradição entre o que é dado como provado na fundamentação de facto e o que é dito que está provado na fundamentação de direito
Por outro lado, quando a nulidade se funda numa contradição entre os fundamento e a decisão, aquela só se verificará se tiver efeitos ao nível da coerência lógica da sentença, não abrangendo todos casos em que não teria havido a mais correta aplicação do direito: surge quando é posta em causa a própria estrutura lógica da sentença ou acórdão.
Afirmam os Recorrentes que o facto provado vertido neste número nada tem a ver com o que alegaram, mas tal não corresponde à verdade; apenas foi reduzido o preço da mão-de-obra que os Réus alegam ter pago pela reparação do pavimento de 6.0000,00 € para 1.000,00 €.
Na tese dos Recorrentes o tribunal teria querido dizer “Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de 671,92 € (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), e, dada a grande dimensão desse pavimento, a quantia de €6.000,00 (seis mil euros) em mão-de-obra”, visto que foi essa a sua alegação na contestação, mas disse “Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de € 671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), e, dada a grande dimensão desse pavimento, a quantia de cerca de € 1.000,00 (mil euros) em mão-de-obra.
No entanto, nada, na sentença, aponta para esse erro de escrita: a mesma é totalmente omissa quanto à fundamentação em concreto deste ponto da matéria de facto provada. Os documentos para os quais o artigo da contestação remete (um dos quais repetido) consistem apenas em faturas relativas materiais, sem qualquer menção a mão-de-obra (muito menos no valor de seis mil euros). Da perícia também se não consegue obter tal conclusão.
Por outro lado, na sentença, já na fundamentação de direito, refere-se a valor diferente como sendo o que está provado: 6.204,88 €, o qual nada tem de comum com o montante que foi dado como assente, de molde a poder-se encontrar algum lapso material na digitalização ou outro.
É certo que na sentença se afirmou, genericamente, que o elemento mais relevante para formar a sua convicção quanto à totalidade da matéria de facto provada foi a perícia.
Lido com atenção o relatório pericial, verifica-se que a área de 496,39 m2 se encontra com as juntas betonadas, pelo que o relatório quando refere o valor de 6.204,88 €, na fundamentação da resposta ao quesito 50, esclarece que na resposta ao quesito 39 se verificou a área de pavimento não betonado, com abatimentos, a qual é de 109 m2 e logo nos quadros que utiliza para apor a resposta, já no quesito 50, escreveram os Sr.s peritos que o levantamento, limpeza e reposição correspondente a essa área perfaz 1.362,50 €.
Assim, não se logra perceber onde encontrou a sentença o valor de mão-de-obra que refere no ponto 65º da matéria de facto provada.
De qualquer forma, esse valor está contraditado pela fundamentação de direito, onde a sentença referiu que estava provado que os réus já despenderam ou terão que despender para reparar trabalhos executados pelo autor, que apresentam ou apresentavam defeitos, para a reparação do pavimento em paralelo, a quantia de € 6.204,88.
Embora não constituam nulidade da sentença os erros de julgamento e a deficiente seleção dos factos em que se baseia ou imperfeita valoração dos meios de prova, a mesma surge se existir uma contradição entre os fundamento e a decisão e se esta tiver efeitos ao nível da coerência lógica da sentença, ficando os seus destinatários sem poder compreender onde a mesma pretendia chegar. Não basta que não tenha ocorrido a mais correta aplicação do direito, é necessário que tal oposição coloque em causa a própria estrutura da decisão, tornando-a incompreensível.
Ora, tal é o que sucedeu neste caso: a sentença ora diz que o dispêndio imposto pelos pavimentos é um, ora diz infra, que se provou outro, sem que, da sua leitura atenta (e mesmo em contexto!) se consiga alcançar o que se pretendeu efetivamente ter por fixo.
Encontra-se, pois, aqui uma manifesta contradição da sentença, o que determina a sua nulidade, nos termos do artigo 615º nº 1 alínea c) do Código de Processo Civil, que também este tribunal suprirá.
------- A.3) da nulidade por desconsideração de factos dados como provados e não aflorados na fundamentação de direito)
Por fim, há que dizer que a desconsideração de factos provados na aplicação do direito não determina a sua nulidade. É claro que a sentença considerou provado determinado facto (“Tendo despendido, em mão-de-obra e material, na reparação dos terraços em redor da casa, a quantia de € 4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos”) que, na sua lógica interna levaria a que fosse considerado como determinante da obrigação de indemnização, ou, pelo menos de uma justificação para o afastamento do ressarcimento desse gasto na reparação do vício, na sequência do que havia concluído relativamente aos demais defeitos. Essa desconsideração, de qualquer forma, não põe em causa a estrutura interna da sentença, porquanto se percebe o seu raciocínio em geral, sendo o menosprezo desse facto mera omissão de explicação de um passo do seu raciocínio ou erro de raciocínio.
Improcede a nulidade com este fundamento, sem prejuízo de haver que aplicar o direito ao mesmo, infra, após a análise da totalidade dos factos provados e não provados.
*
-B.- Da impugnação da matéria de facto

Os Recorrentes cumpriram todos os ónus a que a lei sujeita esta impugnação, pelo que há, sem mais delongas que entrar na sua apreciação.

-B.1-Dos critérios para a apreciação da impugnação da matéria de facto

Na reapreciação dos meios de prova deve-se assegurar o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria - com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância -, efetuando-se uma análise crítica das provas produzidas.
É à luz desta ideia que deve ser lido o disposto no artigo 662º nº 1 do Código de Processo Civil, o qual exige que a Relação faça nova apreciação da matéria de facto impugnada.
É patente que a falta da imediação de que padece o tribunal de recurso limita, por natureza, o acesso a uma mais profunda apreciação da convicção com que são proferidas as declarações dos intervenientes processuais (veja-se que a comunicação humana não é apenas verbal, exigindo a sua correta interpretação que as palavras e inflexões da voz sejam contextualizados com os gestos, a postura corporal, os olhares, todos estes demais elementos, consistentes na comunicação não verbal e tantas vezes afastadas da possibilidade de controlo do declarante e por isso mais fidedignas).
No entanto, como explanado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-10-2012 no processo 649/04.2TBPDL.L1.S1, (sendo este e todos os acórdãos citados sem menção de fonte consultados no portal www.dgsi.pt ) “A reapreciação das provas que a lei impõe ao Tribunal da Relação no art. 712.º, n.º 2, do CPC, quando haja impugnação da matéria de facto que haja sido registada, implica que o tribunal de recurso, ponderando as razões de facto expostas pelos recorrentes em confronto com as razões de facto consideradas na decisão, forme a sua prudente convicção que pode coincidir ou não com a convicção do tribunal recorrido (art. 655.º, n.º 1, do CPC).
A reapreciação da prova não se reduz a um controlo formal sobre a forma como o Tribunal de 1.ª instância justificou a sua convicção sobre as provas que livremente apreciou, evidenciada pelos termos em que está elaborada a motivação das respostas sobre a matéria de facto.”
Visto que vigora também neste tribunal o princípio da livre apreciação da prova, há que mencionar que esta não se confunde com a íntima convicção do julgador.
Este princípio impõe uma análise racional e fundamentada dos elementos probatórios produzidos, que estes sejam valorados tendo em conta critérios de bom senso, razoabilidade e sensatez, recorrendo às regras da experiência e aos parâmetros do homem médio.
A formação da convicção não se funda na certeza absoluta quanto à ocorrência ou não ocorrência de um facto, em regra impossível de alcançar, por ser sempre possível equacionar acontecimento, mesmo que muito improvável, que ponha em causa tal asserção, havendo sempre a possibilidade de duvidar de qualquer facto, mas numa certeza mais relativa, quando se mostra seguro que tal facto ocorreu, por, face a todos os elementos probatórios que foram produzidos ou que era admissível prever que seriam produzidos naquele caso concreto, se concluir pela elevadíssima probabilidade de o mesmo ter ocorrido.
Por princípio, a prova alcança a medida bastante quando os meios de prova conseguem criar na convicção do juiz – meio da apreensão e não critério da apreensão – a ideia de que mais do que ser possível (pois não é por haver a possibilidade de um facto ter ocorrido que se segue que ele ocorreu necessariamente) e verosímil (porque podem sempre ocorrer factos inverosímeis), o facto possui um alto grau de probabilidade e, sobretudo, um grau de probabilidade bem superior e prevalecente ao de ser verdadeiro o facto inverso. Donde resulta que se a prova produzida for residual, o tribunal não tem de a aceitar como suficiente ou bastante só porque, por exemplo, nenhuma outra foi produzida e o facto é possível.” cf o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26-06-2014 no processo 1040/12.2TBLSD-C.P1
A convicção do julgador é obtida em concreto, face a toda a prova produzida, com recurso ao bom senso, às regras da experiência, quer da vida real, quer da vida judiciária, à diferente credibilidade de cada elemento de prova, à procura das razões que conduziram à omissão de apresentação de determinados elementos que a parte poderia apresentar com facilidade, a dificuldade na apreciação da prova por declarações e a fragilidade deste meio de prova.
Igualmente importa a “acessibilidade dos meios de prova, da sua facilidade ou onerosidade, do posicionamento das partes em relação aos factos com expressão nos articulados, do relevo do facto na economia da ação.” (mesmo Acórdão).

Isto posto, vejamos se os elementos probatórios produzidos são suficientes para a procedência da impugnação da matéria de facto pugnada pelos Recorrentes e bem assim apreciar a resposta que se devem dar ao já supra anulado, vertido no ponto 65º da matéria de facto provada.
Atendendo à perícia, analisados os documentos, e ouvida a prova gravada, cumpre concatenar tais elementos, apreciando das razões da Recorrente, confrontadas também com a motivação da sentença.

-B.2- Concretização

---- .do ponto 7 da matéria de facto provada “Autor e Réus acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais efetuados.”

Invocam os Recorrentes que este facto contraria a lógica e as regras da experiência. Pretendem que fique a constar na matéria de facto provada que “7º Autor e Réus acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais efetuados e para pagamento das diferenças de valor de alguns materiais utilizados na obra”. Invocam para tanto as declarações dos Recorrentes proferidos em audiência final e ainda do recorrido, o qual afirmou que não tinha problemas em adquirir material diferente do acordado se o mesmo tivesse valor inferior ao inicialmente previsto.

No entanto, desta afirmação do recorrido não se pode considerar que este estava, sequer implicitamente, a aceitar que teria, no final da obra, que devolver aos Réus a diferença entre tais valores.

Também a Recorrente o não afirmou, antes aceitando que escolheram materiais mais baratos por força dos problemas financeiros do recorrido, sem de qualquer forma aflorar a necessidade de qualquer compensação posterior.
Aliás, no contexto, a referência no artigo 7º da petição inicial ao “pagamento de trabalhos a mais efetuados e pagamento de diferenças de valor de alguns dos materiais utilizados na obra”, que os Réus especificadamente impugnaram na contestação, deve ser lido como pagamentos a favor do autor (que se dedica profissionalmente aquela atividade, para obter rendimentos), não o inverso.
Por outro lado, as regras da experiência ditam que é comum nas empreitadas haver lugar a trabalhos a mais, tanto mais que a lei os prevê e regula.
Assim, não há nos autos elementos seguros, antes pelo contrário, que permitam dar razão aos Recorrentes no que toca a este ponto da matéria de facto provada.
---- .da Letra A do ponto 8 da matéria de facto provada (“8º Todos os trabalhos a mais e despesas extraordinárias foram realizados no interesse, a pedido e na sequência de ordens dadas pelo dono da obra, os Réus, ou com a concordância destes, cuja execução o Autor aceitou levar a cabo, tendo consistido no seguinte: A. Construção da cave com cerca de 100 m2, no valor de 8.045,52 €, acrescido de IVA”).
Para impugnar este facto o recorrido invoca em primeiro lugar parte das declarações do recorrido produzidas em sede de audiência final. Mas ao contrário do que inculca a reprodução desgarrada de parte das suas declarações, este foi perentório em afirmar que teve que fazer dois muros por causa da alteração da caixa-de-ar que não eram necessários se não fosse para ser habitada com o “quarto dos miúdos”.
O argumento baseado no ponto 17º da matéria de facto provada não tem qualquer fundamento, visto que este ponto diz respeito à alínea D do artigo 8º da petição inicial (Colocação de rede de saneamento no valor de 500,00 €) e não à letra D do ponto 8º da matéria de facto provada.
Releva, sim, o ponto 23º da matéria de facto provada, em que se concluiu que a caixa-de-ar contratada deveria ficar só com as paredes exteriores, devendo o respetivo pavimento ficar com uma camada de gravilha, deste modo permitindo o acesso à parte inferior da casa para proceder às reparações que fossem necessárias, sendo que resulta do relatório pericial que tal não ocorreu.
Este relatório esclarece, como resulta da leitura do contrato, que as paredes envolventes da caixa-de-ar estão realizadas em betão armado e que estas não se encontravam definidas nessa forma nos projetos de arquitetura e de estabilidade, pelo que há que as contabilizar na totalidade, por serem trabalhos que não estavam previstos e se tornaram necessários em razão da alteração da obra.
O facto de estar previsto um alçapão não nos conduz à conclusão que as paredes da obra já estavam previstas em betão armado. Assim, entende-se que a sentença, embora o não justificasse de todo, como deveria, seguiu o caminho correto, ao escolher a opção A a que se refere o relatório pericial, que contabilizou toda a extensão das paredes em betão e não apenas o cerca de meio metro acima do que seria previsto.
Mantém-se este ponto da matéria de facto provada.
---- da Letra D do ponto 8 da matéria de facto provada: “O Autor procedeu à colocação de manilhas de segurança no valor de 700,00€, acrescido de IVA.”
Pretendem os Recorrentes que este facto não deve ser dado como provado, porquanto o Recorrido não afirmou que colocou tais manilhas, nem tão pouco o referiram as testemunha que indicou, nem a Ré mulher.
No entanto, lido o relatório pericial, verifica-se que este é apodítico quanto à colocação das manilhas e bem assim quanto ao facto destas não estarem contempladas no projeto inicial.
Ora, a perícia é um recurso processual que se justifica pela necessidade de se socorrer a especiais competências e habilitações técnica e científica para lograr alcançar determinados factos, que pela sua especificidade e/ou complexidade exigem conhecimentos técnicos especializados na área em apreciação. Foi realizada por três Peritos independentes e desinteressados, com observância das regras que permitem o contraditório, com base no que estes constataram e mostra-se lógica e coerentemente justificada.
E assim, neste caso, deve o tribunal atentar na maior dificuldade que tem, em regra, face aos peritos, para exercer a apreensão da realidade sobre a qual estes se debruçaram, por não ser portador, também em regra, da mesma especialização técnica, conhecimentos e experiência naquela matéria específica.
Assim, visto que o relatório pericial verificou que foram colocadas as manilhas para a drenagem de águas pluviais, não previstas no contrato, avaliando-as de forma que não se mostra impugnada, não é necessário prova coadjuvante para perceber que foram colocadas no interesse dos Recorrentes, que acompanhavam as obras, bem como o seu custo. Mostra-se para tanto suficiente a prova pericial, porquanto o objeto a que se refere cabe na sua competência, o que se refere foi objeto de constatação dos Sr.s Peritos, que o explicaram de forma compreensível e que nenhum outro elemento de prova põe em causa.
Mantém-se este ponto da matéria de facto provada.
---- . do ponto 65 : “Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de € 671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), e, dada a grande dimensão desse pavimento, a quantia de cerca de € 1.000,00 (mil euros) em mão-de-obra.”
Como já se disse supra os Recorrentes alegaram que “Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de €671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), e, dada a grande dimensão desse pavimento, a quantia de €6.000,00 (seis mil euros) em mão-de-obra (cfr. Docs. 16 a 22)”, mas tais documentos consistem em faturas de materiais (uma das quais repetidas), nada juntando relativamente ao preço da mão-de-obra.
Ora, não é credível que tão elevado dispêndio em mão-de-obra, passível de restituição, fosse paga sem a exigência de qualquer documento comprovativo da transação.
Nenhuma testemunha referiu que executou tal obra, pelo que não se pode presumir o valor da mão-de-obra despendida, apurando-se, tão-só que foi gasto o valor das faturas em reparações da moradia.
Na perícia é representada como trabalhos a menos, no ponto 50, a pavimentação em cubo com betonagem da área de 109 m2, no valor de 1.363,50 €, afirmando que os restantes 496,39 m2 não sofrem do problema que aquele sofre, de falta de betonagem. No entanto, o que os Recorrentes peticionam não é o custo do que falta reparar, o que estes alegaram e peticionam nessa sede é o preço do que despenderam.

Assim, anulada que foi a resposta a este facto, há que o fixar em conformidade com o alegado na contestação, apenas na parte que se mostra provada:

“65º: Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material, a quantia de € 671,92 (seiscentos e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos).”
---- dos pontos np.56 a np.58 da matéria de facto não provada: do vício relativo às persianas.
Foram efetivamente produzidos elementos de prova bastantes relativamente à despesa de 465,00 € com a substituição das persianas: as mesmas foram objeto da reclamação constante da notificação judicial avulsa junta aos autos; também foi junta aos autos fatura referente a esse custo e nesse montante, datada de 27-01-2014. Também a testemunha M. P. referiu este problema.
A sentença, como aliás, em todos os demais casos, foi omissa quanto à fundamentação da falta de prova dos mesmos, apesar destes elementos.
Aqui a perícia não tem qualquer peso, argumento utilizados pelo recorrido nas suas alegações para obstar à sua inclusão no âmbito da matéria de facto provada, uma vez que a reparação já se encontrava efetuada aquando da sua realização, nada tendo sido afirmado quanto a tal.
Assim, há que dar como provado tal vício e custo com a sua correção, eliminando-se os mesmos da matéria de facto não provada e passando a constar na matéria de facto provada:
“80º As persianas da sala e do quarto não funcionavam, colocando em causa o ambiente no interior, bem como a sua própria saúde.
.81º O autor foi notificado para eliminar este defeito, mas nada fez.
.82º Os Réus sentiram-se forçados a proceder, eles próprios, a suas expensas, à sua reparação, o que lhes implicou o dispêndio da quantia de € 465,00”

---- . dos pontos np52 a np55: “Também o telhado e as respetivas cornijas estavam mal rematados, permitindo a infiltração de água no interior da habitação, Os caleiros que recolhiam as águas pluviais estavam mal colocados e não permitiam um correto escoamento das mesmas, que também acabavam por se infiltrar no interior da casa. Uma vez que o Autor, devidamente notificado para reparar estes defeitos, optou por não o fazer, tiveram os Réus de proceder, a suas expensas, à reparação, pois em causa estava a estrutura da sua própria casa e do seu direito de propriedade - E, com a reparação do telhado e dos caleiros, os Réus dependeram a quantia de € 400,00 (quatrocentos euros).”
Igualmente são aqui pertinentes os elementos probatórios apresentados, não infirmados: a notificação judicial avulsa, que refere este defeito, a fatura junta com a contestação como documento 56, nesse valor, as declarações da Recorrente, explicativas e o próprio relatório, que refere a existência de emendas.

Nada infirma o sentido dado por estes elementos. Logo, há que acrescentar os factos contidos nestes pontos à matéria de facto provada:

“.83º O telhado, as cornijas e os caleiros pela forma como foram aplicados não impediam a infiltração de água no interior da habitação nem um escorreito escoamento das águas, pondo em causa a estrutura da própria casa.
.84º O Autor foi notificado para reparar estes defeitos, mas não o fez.
.85º Os Réus sentiram obrigados a proceder, a suas expensas, à reparação, dependendo a quantia de € 400,00 (quatrocentos euros).”
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C - Da aplicação do Direito aos Factos Apurados

Apurados os factos, cumpre verificar da aplicação do direito no que releva às partes da sentença que não se mostram já transitadas, por aceites pelas partes, sem prejuízo de haver que fazer um intróito que permita a sistematização das questões de direito que no recurso foram tratadas simultaneamente com as questões de facto.
É claro que estamos perante um contrato de empreitada, o qual se traduz num acordo de vontades pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra, mediante um preço, a realizar certa obra (artigo 1207º do Código Civil).
De relevo para as questões a apreciar importa realçar que se trata de um contrato sinalagmático, oneroso e comutativo, porque dele emerge uma obrigação de realizar uma obra que tem como contrapartida o dever de pagar o preço, obrigações estas que são recíprocas e interdependentes.
O contrato de empreitada inclui-se no género contrato de prestação de serviço, e distingue-se deste por ter a tónica no resultado material final: por obra entende-se um efeito corpóreo, abrangendo, além do mais, a construção, a modificação, a demolição e a reparação, onde se incluem as obras em imóveis, como as que estão em causa nestes autos.

C.1)-- Quanto à ação:

Revoltam-se os Recorrentes contra a sua condenação no pagamento ao Recorrido da quantia de € 22.891,38 operada na sentença, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento, defendendo a redução do capital para € 18.635,90 € e pretendendo que se especifique que a taxa de juros legal em questão é a taxa civil.

C.1.a)-- Quanto à redução do capital

Fundam-se para tanto, no que à redução do capital concerne, na alteração da matéria de facto provada retratada nas letras A) e D) do ponto 8, que não teve aqui provimento, conforme supra fundamentado. Improcede, pois, a primeira parte desta pretensão, por falecerem os seus pressupostos.

C.1.b)-- Quanto à taxa de juros

Pretendem os Recorrentes que não estão sujeitos à taxa de juro supletiva comercial, porquanto são consumidores.
Desde já se diga que o presente contrato não está sujeito ao regime do Decreto-Lei 62/2013, de 10 de Maio, por força do seu artigo 2º nº 2 alínea a), sendo que efetivamente este diploma contempla dois casos em que se aplicam os juros comerciais, fixando-lhes, aliás, um limite mínimo. Estipula a aplicação de uma taxa de juros moratórios comerciais aos atrasos de pagamentos das transações comerciais entre empresas, neste caso supletivamente, caso não tenham sido outros os acordados, e aos atrasos de pagamentos das transações comerciais entre empresas e entidades públicas. Como bem salientam os Recorrentes, o seu contrato não cai na alçada deste diploma.
Não obstante, existe no nosso ordenamento jurídico outra norma que sujeita determinados atos à taxa de juros comerciais, a qual é aplicável ao nosso caso.
Determina o artigo 102º do Código Comercial que há lugar ao decurso e contagem de juros em todos os atos comerciais em que for de convenção ou direito vencerem-se e nos mais casos especiais fixados naquele Código.
E no seu § 3.º estipula que os juros moratórios legais e os estabelecidos sem determinação de taxa ou quantitativo, relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas, são os fixados em portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça.
Este artigo tem tido múltiplos acrescentos: o Decreto -Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro, atribui-lhe o § 4.º, que estabelece que tal taxa de juro não pode ser inferior ao valor da taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu à sua mais recente operação principal de refinanciamento efetuada antes do 1.º dia de janeiro ou de julho, consoante se esteja, respetivamente, no 1.º ou no 2.º semestre do ano civil, acrescida de 7 pontos percentuais e o Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2011/7/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011, aditou-lhe o § 5.º, que dispõe que, no caso de transações comerciais sujeitas a esse diploma, a taxa de juro não pode ser inferior ao valor da taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu à sua mais recente operação principal de refinanciamento efetuada antes do 1.º dia de janeiro ou de julho, consoante se esteja, respetivamente, no 1.º ou no 2.º semestre do ano civil, acrescida de oito pontos percentuais.
Assim passaram-se a prever dois limites mínimos diferentes para a taxa de juros supletiva comercial, consoante a obrigações que lhe estão subjacentes caibam na ou não no âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 62/2013.
Tal determinou que no nosso ordenamento jurídico, desde o 2º semestre de 2013, passaram a coexistir, por assim terem sido fixadas, duas taxas supletivas de juros comerciais, uma para as obrigações comerciais que não caibam no âmbito da aplicação do Decreto -Lei n.º 62/2013 e outra para as que estão sujeitas à sua regulação, as quais têm sido objeto dos competentes avisos.
Este diploma, assim como o DL 32/2003, não visou regular o regime dos contratos celebrados com consumidores, antes pelo contrário, afastaram-nos do âmbito da sua aplicação, não se podendo, pois, entender, que alteraram o regime dos juros fixados para os atos comerciais que não cabem no campo da sua alçada.
Assim, resta ainda ver o campo de aplicação da taxa supletiva de juros moratórios aplicável a outras operações que tenham por objeto créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas, nos termos do artigo 102º § 3 do nosso Código Comercial.
Tem-se, quanto a estes últimos, discutido se, para a sua aplicação o ato ou negócio de onde esta provém deve ser comercial em relação ao devedor, não bastando que o seja subjetivamente comercial em relação ao credor.
Esta discussão tem a ver com a conflituosidade que se pode verificar entre a defesa do consumidor e o objetivo da tutela do crédito e do credor, este último com particular relevo no direito comercial, a qual justifica a existência de juros moratórios agravados para os créditos comerciais profissionais.
Ora, entende-se a previsão do artigo 102.º, § 3 do Código Comercial é clara: ao não exigir que o ato seja subjetivamente comercial quanto a ambas as partes, mas explicando que exige (apenas) para a aplicação dos juros comerciais que o seja em relação ao credor, está a tomar nítida posição sobre tal questão, tutelando, num ato unilateralmente comercial, o credor face ao consumidor relapso. (2)
Desta forma, suprindo-se a nulidade em que incorreu a sentença, conclui-se que, porque o autor se dedicava profissionalmente à prática dos contratos aqui em apreço (ponto 2 da matéria de facto provada), apesar do ato ser unilateralmente comercial, apenas quanto ao credor, beneficia da tutela que lhe fornece o artigo 102º § 2 do Código Comercial, vencendo-se juros, no caso de incumprimento da obrigação, à taxa supletiva de juros moratórios aplicável a operações que tenham por objeto créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas (não abrangidas pelo decreto-lei nº 62/2013 de 10.05.2013).

C.2)-- Quanto à reconvenção:

Pretendem os Recorrentes que se reconheça que o recorrido está obrigado a pagar-lhes:

a) a quantia de €4.602,14 (em conformidade com a matéria de facto dada como provada sob o facto 72.º);
b) os valores gastos pelos Recorrentes com o arranjo das persianas e do telhado no montante de €865,00;
c) os valores dos trabalhos previstos no contrato de empreitada e não realizados no montante de €2.836,76;
d) as quantias relativas às poupanças obtidas pelo Recorrido com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos no contrato no valor de €3.669,76.

No contrato de empreitada, o requisito essencial que deve pautar a execução da obra consta do artigo 1208º Código Civil: “O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”.
No entanto, como advém do princípio da boa-fé, não é qualquer desconformidade entre a prestação oferecida e a devida que faz o devedor incorrer em cumprimento defeituoso: o desvio da obrigação tem que ter gravidade suficiente para se lhe poder dar relevo.
Assim, “Por cumprimento inexato deve entender-se todo aquele em que a prestação efetuada não tem requisitos idóneos a fazê-la coincidir com o conteúdo obrigacional, tal como este resulta do contrato e do princípio geral da correção e da boa-fé, considerando que: “a inexatidão pode ser quantitativa (...) ou qualitativa (traduz-se numa diversidade da prestação, como numa deformidade, num vício ou falta de qualidade da mesma ou na existência de direitos de terceiros sobre o seu objeto)”. Baptista Machado in “Pressupostos da Resolução por Incumprimento”, Obras Dispersas” Vol. 1, pág. 169.
Tal como decorre deste artigo 1208º do Código Civil; a prestação considera-se defeituosa em todos os casos em que o defeito ou irregularidade da prestação – a má prestação – causa danos ao credor ou pode desvalorizar a prestação, impedir ou dificultar o fim a que este objetivamente se encontra afetado.
É pacífico que cabe sempre ao dono da obra o ónus de demonstrar que existe um defeito na obra com as características supra apontadas: que cause danos ao credor ou possa desvalorizar a prestação, impedir ou dificultar o fim a que este objetivamente se encontra afetado.
Não há dúvidas que nos casos em que não é (apenas) pedida a eliminação dos defeitos, mas também a indemnização pelos danos que esses defeitos causaram, cabe ao lesado a prova da relação entre os defeitos e os danos cuja indemnização é pedida. O ónus da prova da relação de causalidade entre os defeitos e danos subsequentes é pacífico na jurisprudência e doutrina, mesmo para aqueles que entendem que em geral cabe já ao empreiteiro demonstrar que o defeito encontrado na obra adveio de facto que lhe não pode ser imputado (e não que o dono da obra não está onerado com a prova que foi a violação das legis artis que causou o defeito).

O Código Civil prevê várias soluções possíveis para casos de incumprimento defeituoso na realização de uma obra num contrato de empreitada:

recusa pelo dono da obra da prestação que não é efetuada integralmente (artigos 762º nº 1 e 763º nº 1 Código Civil);
eliminação dos defeitos pelo empreiteiro (art. 1221º Código Civil);
redução do preço (art. 1222º nº 1 Código Civil)
resolução do contrato (art. 1222º nº 2 Código Civil).

No que respeita especificamente à empreitada, “se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção” (artigo 1221º nº 1 do Código Civil), só se podendo pedir a redução do preço ou a resolução do contrato, no caso de não ter sido possível eliminar os defeitos ou construir de novo a obra (artigo 1222º do Código Civil).
"Perante a existência de defeitos, a lei concede ao dono da obra vários direitos, o primeiro dos quais é o de exigir a sua eliminação.
A exigência de eliminação dos defeitos é uma forma de execução específica característica do contrato de empreitada; pretende-se exigir o cumprimento do acordado.
O dono da obra deve começar por exigir que o defeito seja eliminado pelo próprio empreiteiro (artigo 1221º, nº 1 do Código Civil).
Mas se os defeitos não puderem ser eliminados, cabe ao comitente o direito de exigir do empreiteiro a realização de uma nova obra (art. 1221º, nº1, 2ª parte do Código Civil).
Justifica-se esta solução porque, se o dono da obra não obteve o resultado pretendido, o empreiteiro continua adstrito a uma prestação de facto positivo.
Perante a recusa do empreiteiro, pode o dono da obra requerer a execução específica da prestação de facto, nos termos do artigo 828° do Código Civil, se ela for fungível.
Nesse caso, os defeitos são eliminados, ou a obra realizada de novo por outrem à custa do empreiteiro.
Assim, face ao regime estipulado no Código Civil, sem entrar em conta com a existência de uma relação de consumo, considera-se que, em regra, não é admissível que o dono da obra proceda, em administração direta, à eliminação dos defeitos ou à realização de nova obra, pois isso seria uma forma de auto-tutela não admitida na lei..." (cf Menezes Cordeiro, in "Direito das Obrigações", III Volume -1991, págs. 537/538). No entanto atualmente cada vez mais se aceita que em casos em que há urgência na sua realização, ou se tenha efetuado notificação admonitória, sem que, decorrido o prazo razoável fixado, a reparação tenha sido efetuada, pode o dono da obra proceder à mesma a sua expensas, por não se poder sujeitá-lo ad eternum à mora do credor, salvaguardando a sua posição. (3)
Foi esta a posição tomada na sentença (embora sem sequer aflorar o problema), aceitando ambas as partes, o que foi tutelado pela sentença, nessa parte transitada, que bem podiam os Recorrentes proceder à reparação a suas expensas e por via disso vir exigir nesta sede a devida compensação.
Estão é em desacordo, numa primeira linha, sobre os defeitos que podiam corrigir e o seu valor, entre elas o valor do pavimento em paralelo (face á anulação da sentença por manifesta contradição) e o custo da reparação dos terraços.

Assim, pretendem em primeiro lugar os recorrentes que se considere

.a) a quantia de €4.602,14 (em conformidade com a matéria de facto dada como provada sob o facto 72.º);

Resulta da matéria de facto provada que os “Réus despenderam na reparação dos terraços a quantia de 4.602, 14 € (ponto 72)
Tal reparação mostrava-se urgente visto que “o próprio revestimento do terraço começou a levantar-se, as juntas começaram a desfazer-se e o próprio revestimento partiu-se, permitindo ainda maior infiltração de água no terraço e daí para o interior da casa com consequente maior deterioração da casa”, gerando bolores e um ambiente pouco sadio (pontos 68 a 70 da matéria de facto provada).
Tem assim razão os Recorrentes quando afirmam que este valor deveria ter sido considerado e logo deveriam também ter sido obrigado o recorrido no seu pagamento.
Desta forma, ao valor de 12.915,27 € há que acrescentar também o valor desta reparação, perfazendo o montante de 17.517,41 €.
No entanto, como vimos supra, neste capítulo, entrou a sentença em contradição que levou à sua anulação, porquanto considerou, na fundamentação de direito, que as reparações no pavimento em paralelo orçaram em 6.204,88 €, quando dera como provado um outro dispêndio (sem que se possa considerar ter ocorrido erro de escrita, atenta a diversidade de valores o as suas fontes).
Assim, provado supra, face à anulação de tal resposta, apenas que tal reparação orçou 671,92 €, ocorrendo uma diferença de 5.532,96 €, há que retirar ao valor apurado supra tal montante encontrado em excesso (só a final se verificando se o resultado obtido viola o princípio da proibição da reformatio in pejus), fixando, por ora, o valor da condenação em 11.984,45 €.

.b) os valores gastos pelos Recorrentes com o arranjo das persianas e do telhado no montante de quantia de €865,00;

Pretendem ainda os Recorrentes a indemnização pelos valores gastos com o arranjo das persianas e telhado.
Provadas as deficiências destes elementos construídos pelo recorrido e bem assim que quanto a estas também se verificam os referidos requisitos da urgência, necessidade e interpelação, como resulta dos pontos 80º a 85 da matéria de facto provada, terão que ser acrescentados estes valores à indemnização, os quais somados ao valor apurado supra perfaz 12.849,45 €.

Pretende ainda o Recorrente receber

.c) os valores dos trabalhos previstos no contrato de empreitada e não realizados no montante de €2.836,76

Para tanto consideram que devem ser indemnizados pelos trabalhos não realizados pelo recorrido descritos nos pontos 34º a 37º e 43º, 45º e 46º.
Carecem no entanto de razão nessa parte.
Como se viu supra, existe, em geral, cumprimento defeituoso em todos os casos em que o defeito ou irregularidade da prestação – a má prestação – causa danos ao credor ou pode desvalorizar a prestação, impedir ou dificultar o fim a que este objectivamente se encontra afectado. Não basta, pois, qualquer desvio ao contratado, mesmo que tal desvio importe para o empreiteiro menor dispêndio; importa sim que o resultado obtido de alguma forma tenha um defeito ou um valor menor face ao esperado.
Ora, sem se provar que a falta de vidro temperado na zona da porta de entrada a que alude o ponto 34º reduz o valor da obra, nada justifica a indemnização peticionada, o mesmo ocorrendo com a diferente cobertura na zona dos quartos (ponto 35º da matéria de facto provada) a ausência de claraboia na zona do corredor (ponto 36), bem como a ausência de dois doseadores de sabão (a que se refere o ponto 45º da matéria de facto provada).
É indubitável a essencialidade dos lavatórios na casa de banho para a utilização dessa divisão. Assim, os Recorrentes têm que ser indemnizados pelas despesas que tiveram ao sanar a sua ausência, com o preço da sua aquisição (ponto 43º da matéria de facto provada). O mesmo se pode dizer quanto às portas de vidro dos armários dessa casa de banho (ponto 37º).
Por outro lado, não se provou sequer a existência de uma churrasqueira, pelo que a ausência do seu pio e torneira também não têm qualquer relevância.
Resta pois concluir pelo direito dos Recorrentes a serem ressarcidos dos € 650,00 e 166,51 € que despenderam para sanar a falta de lavatórios e porta dos armários da casa de banho, passando o valor da obrigação que vimos discutindo a perfazer 13.665,96 €.

.d) as quantias relativas às poupanças obtidas pelo Recorrido com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos no contrato no valor de €3.669,76.

Do supra exposto retira-se já que não tem o recorrido que devolver aos Recorrentes o valor das poupanças obtidas com a aplicação dos materiais diferentes: não se provou que foi celebrado qualquer acordo nesse sentido e não se provou (nem alegou) que a aplicação de tais materiais de alguma forma desvalorizou a obra ou prejudica a sua função, pelo que não há lugar a tal indemnização.

V - Decisão:

Por todo o exposto, julga-se a apelação parcialmente procedente e em consequência, anulando-se e revogando-se a sentença,
-- adita-se e altera-se a matéria de facto nos termos exarados supra, na fundamentação de facto;
-- condenam-se os Réus no pagamento ao Autor da quantia de € 22.891,38 (vinte e dois mil oitocentos e noventa e um euros e trinta e oito cêntimos), acrescida de juros à taxa legal supletiva de juros moratórios aplicável a operações que tenham por objeto créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas (não abrangidas pelo decreto-lei nº 62/2013 de 10.05.2013), desde a citação até efetivo e integral pagamento;
-- condena-se o autor reconvindo a pagar aos reconvintes a quantia de 13.665,96 € (treze mil, seiscentos e sessenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), acrescida de juros à taxa supletiva legal aplicáveis aos créditos de natureza civil, desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento;
-- absolvendo-os do demais peticionado.
Custas por apelantes e apelado na proporção do decaimento.
Guimarães,07 DE NOVEMBRO DE 2019

Sandra Melo
Conceição Sampaio
Fernanda Proença Fernandes



1. (cf., entre muitos, quanto à taxatividade, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/26/2012 no processo 14127/08.7TDPRT.P1.S1, sendo este e todos os demais acórdãos citados sem menção de fonte, consultados in dgsi.pt, indicando-se a sua data na forma ali escolhida: mês/dia/ano).
2. (contra cf. acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 01/31/2013, no processo 729/09.8TBSLV-B.E1, mas nestes sentido cf. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/04/2013, no processo 2358/10.4TJLSB.L1.S1: “O DL n.º 32/2003, de 17-12, não teve por finalidade disciplinar transações comerciais com consumidores. II - Esse diploma legal teve em vista a transposição para o nosso ordenamento jurídico interno da Directiva n.º 2000/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, prevendo um regime de juros de mora mais favorável aos credores comerciais nas transações referidas nos seus arts. 2.º e 3.º, em que as partes não podem ser consumidores. III - Esse regime visando favorecer os comerciantes naquelas transacções em caso de mora dos seus devedores, em nada contendeu com a regulamentação das demais transacções comerciais, nomeadamente daquelas em que uma das partes é consumidor, que continuaram sujeitas ao regime anterior ao mesmo decreto-lei, salvo a alteração ligeira do art. 102.º do CCom, introduzida pelo mesmo decreto-lei, artigo esse que continuou aplicável aos devedores consumidores”, bem como, entre outros, por muito impressivos, os acórdãos de 02/12/2019, no processo 4931/18.3T8CBR-A.C1 e de 10/19/2010, no processo 286652/08.0YIPRT.C1.
3. Neste sentido, entre outos o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo 550/05.2TBCBR.C1.S1 de 14-06-2011, bem como o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido no processo 59/12.8TBPCR.G1, de 07/12/2016, procedendo ainda à conjugação do regime imposto no Código Civil com o do DL 67/2003, face à relação de consumo ali alegada, tudo questões que aqui não cumpre conhecer, face à aceitação pelas partes do dever de indemnização originado pelos defeitos da obra.