Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
407/18.7T8AVV-B.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 – Em recurso de decisão posterior à sentença que apenas teve como objeto fixar a importância da indemnização por litigância de má fé, ao abrigo do artigo 543.º, n.º 3 do CPC, não pode, de novo, pôr-se em causa a condenação como litigante de má fé que foi proferida na sentença.
2 - Mesmo não havendo elementos concretos suficientes para determinar a importância da indemnização deve, ainda assim, dentro dos limites que tiver por provados, adotar-se o critério legal da fixação segundo o prudente arbítrio do julgador, tomando em conta princípios de razoabilidade e proporcionalidade, isto é, de equidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães           

I. RELATÓRIO

AA intentou ação declarativa contra BB, vindo, a final, o réu a ser condenado, para além do mais, como litigante de má fé em multa que se fixou em 15 UC e, não existindo elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, foram as partes notificadas para se pronunciarem sobre o que tiverem por conveniente no que toca à fixação da indemnização devida.
Nessa sequência, veio a autora pedir a condenação do réu no pagamento de quantia nunca inferior a € 4.400,00, a título de indemnização pela litigância de má fé, aí incluindo as despesas variadas em que incorreu com a presente ação, designadamente, as várias deslocações que teve de fazer desde ..., onde reside, até Portugal, para o tribunal e para o escritório do seu mandatário, com a consequente perda de dias de trabalho (€ 1.250,00), bem como os honorários do seu advogado (€ 3.000,00) e as suas despesas de expediente (€ 150,00).
O réu respondeu impugnando os montantes apresentados.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida decisão que fixou em € 4.400,00 o valor da indemnização pela litigância de má fé a suportar pelo réu BB.

O réu interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes
Conclusões:

1. Entende o recorrente que o presente incidente de liquidação, constitui um incidente da instância de liquidação, tratando-se assim de muito mais do que um simples cálculo aritmético. A recorrida devia ter alegado factos, especificar as supostas despesas e discriminá-las, fazer prova das mesmas no requerimento inicial e na audiência de discussão e julgamento, juntar nota especificada de honorários e das horas despendidas pelo ilustre mandatário, o que não fez.
2.  Não aceitando a sentença proferida no incidente de liquidação de sentença, a recorrida não juntou quaisquer documentos, nem testemunhas com o requerimento inicial, nem qualquer outro meio de prova que fundamentasse as hipotéticas despesas, não indicou nenhuma quantia certa para cada despesa, nem juntou nota que sustentasse os supostos honorários do ilustre advogado, pelo que “não há elementos para determinar, na janela da equidade, os limites mínimo e máximo de tal juízo équo”, por isso recorre dos pontos 1i, ii e 2 da douta sentença.
3. O recorrente refuta a decisão que o condenou numa indemnização agravada prevista na alínea b) n.º 1 do artigo 543.º, sem fundamento porque não agiu com dolo, nem negligência, pelo que não aceita o valor de €1.250,00, nem o valor de €3.150,00, mas se por hipótese assim não fosse, o que não se admite, não houve discriminação, fundamentação, nem prova de tais valores, mas, se por hipótese houvesse prova, o que não aceita, sempre o valor da condenação do recorrente como litigante de má-fé é manifestamente excessivo e, como tal, indevido.
4. Com estas decisões o recorrente fica deveras empobrecido e a recorrida injustificadamente enriquecida ao ser-lhe atribuída, sem qualquer razoabilidade, nem fundamentação, mais de €18.254,00 (12.000,00+1854,00+1250,00+3150,00 euros+ juros), porquanto o negócio visou exclusivamente os prédios urbano e rústico pelo valor de €52.000,00, com esta e anterior decisão a recorrida adquire-os por €33.746,00, pelo que não se conformando recorre, pelo razões invocadas nestas e anteriores alegações, por considerar-se injustiçado.
Até porque,
5. O recorrente não é litigante de má-fé, foi ele quem pediu a realização da prova pericial e não a recorrida, juntou documentos necessários à sua realização, a sua conduta é desprovida de qualquer atuação dolosa, ou gravemente negligente, não sendo possível formular um qualquer juízo de censura sobre a mesma, porquanto nunca referiu à recorrida, nem a quem quer que fosse que a água lhe pertencesse ou fosse sua propriedade, antes disse que não tinha documentos da água, tanto que a redatora do doc. nº ... e do suposto contrato promessa de compra e venda referiu em Tribunal que ninguém lhe pediu para fazer o registo da água (entre 2013 e 2016) e não sabia fazê-lo (ver depoimento) e foi ela que os redigiu, contratada e paga pela recorrida Ver depoimento na anterior Sentença recorrida “35:09 Sr. Dr Juiz Quem é que lhe pagou os seus serviços? Foi a D. AA ?35:14 R: Foi a D. AA, Sr. Dr. 31:49 R: eu fui contratada pela D. AA porque a Sra. Dra. sabe muito bem quando há uma aquisição quem paga são os compradores e fomos embora para a agência. Dr Juiz: tem uma declaração que a senhora diz que redigiu, fê-lo a pedido de quem?48:47 R: redigi. Eu disse um valor para este prédio, um valor para aquele. E atribuíram os dois. Agora se foi a D. AA ou se foi o Sr. Portas não me recordo, Sr. Dr. Juiz.”
6. O recorrente provou em Tribunal que a partir de 2012/2013 o imóvel apenas tinha água da rede pública para consumo, facto que era e é do conhecimento da recorrida. Veja-se nas anteriores alegações o depoimento das testemunhas da recorrida CC e ... e do 2º réu DD e EE nesse sentido, por isso o Tribunal “a quo” não podia dar como provados os factos constantes na anterior sentença, no ponto 9, tanto que nem o recorrente, nem a imobiliária foram partes nos autos 2/17...., pelo que se assim seja entendido estamos perante Preclusão do Direito da recorrida.
7. A recorrida sabia desde 2013 que a água não era propriedade do recorrente, nem este tinha qualquer direito sobre a mesma, nem lhe foi vendida. O conteúdo do suposto doc. nº ... de fls. 11 impugnado, não foi transposto para a escritura definitiva de compra e venda, o recorrente não vendeu a água à recorrida, nem recebeu €12.000,00, não se aplicando o artigo 892º CC porque não houve venda de bem alheio, não foi alienada qualquer água nascente em nome próprio, nem qualquer direito sobre esta.
8. Foram violados os artigos 358º, 360º e 661º do Código de Processo Civil
Com o douto suprimento de V. Exas. deve ser revogada a douta Sentença e assim farão V. Exas Justiça!

A autora contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.
O recurso foi admitido, como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Tendo este recurso subido em conjunto com o recurso da sentença final, já nesta Relação foi determinada a sua separação, para que o recurso da decisão proferida depois da sentença final subisse em separado dos autos principais, o que veio a acontecer.
Aguardou-se o trânsito em julgado da sentença proferida, o que veio a ocorrer a 22/04/2024, tendo sido proferido Acórdão (após recurso interposto pelo réu), que julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença recorrida.
Foram colhidos os vistos legais.

A única questão a resolver neste recurso traduz-se em saber se foi corretamente quantificada a indemnização a arbitrar à autora como consequência da condenação do réu por litigância de má fé.

II. FUNDAMENTAÇÃO

Na decisão recorrida foram considerados os seguintes factos:

“Com relevância para a presente decisão, demonstrou-se, para além da factualidade já vertida em sede de sentença e que aqui se dá por integralmente reproduzida, que:

1 - Tendo em vista a propositura da presente ação e como consequência da mesma:
i) A Autora constituiu mandatário, o Advogado Dr. FF, ao qual terá de liquidar despesas e honorários, em quantia não concretamente apurada.
ii) A Autora teve de deslocar-se, pelo menos duas vezes, para vir a Tribunal e, bem assim, em número não concretamente apurado de vezes para ir ao escritório do seu mandatário, circunstância que acarretou despesas de montante não concretamente apurado.
2 – No âmbito dos presentes autos, que tiveram início no mês de junho de 2018, o mandatário da Autora elaborou e apresentou uma petição inicial (com um total de 67 artigos) (ref.ª ...51), esteve presente na diligência de audiência prévia ocorrida no dia 14-11-2018 (ref.ª ...40) e em 3 (três) sessões de audiência final (ref.ªs ...16, ...51, ...93), contra-alegou em matéria recursória (ref.ª ...15) e apresentou outras peças processuais, designadamente, tendo em vista a realização do exame pericial junto a 07-07-2021 (ref.ª ...30).
*
Inexistem factos por provar com relevância para a decisão a proferir”.

Começaremos por esclarecer, tal como consta da indicação da questão a resolver nos presentes autos, que o que aqui está em causa, é apenas a quantificação da indemnização a arbitrar à autora como consequência da condenação do réu como litigante de má fé.
Não pode já questionar-se neste recurso a bondade da condenação do réu como litigante de má fé, pois tal ficou já decidido com trânsito em julgado.

Veja-se o que a este propósito vem referido no Acórdão que confirmou a sentença de 1.ª instância que já havia condenado o réu como litigante de má fé:
“Na questão submetida à nossa apreciação defende o recorrente que a sua condenação como litigante de má fé é indevida, porquanto «estava e está convencido e tem consciência que não vendeu a água à recorrida, nem disse à 1ª Ré que a água era sua propriedade, nem sequer servidão, porque nem sabia o significado!», acrescentando que “estava e está legitimamente convicto dos factos que invocou na sua contestação e respetivos fundamentos legais que entendeu serem aplicáveis ao caso”.
Ora, tendo em conta a matéria fáctica que resultou provada, julgamos ser de sufragar o entendimento perfilhado pela sentença recorrida no sentido de que o R./recorrente não só deduziu defesa que bem sabia, ou devia saber, ser ilegítima, como ainda mascarou a verdade dos factos. Na verdade, como se aduziu na sentença impugnada, «[n]a questão que nos ocupa releva, fundamentalmente, a circunstância de o R. BB ter alegado que não assinou a declaração junta a fls. 11 e reverso. Apurou-se, ao invés, que o R. apôs pelo seu punho a assinatura constante de tal documento. Como é evidente, esta era a pedra de toque da defesa do R. (conjuntamente com a alegação de ser falsa também a assinatura aposta, como sendo a sua, o contrato-promessa junto aos autos), uma vez que naquele documento se afirmava que, para além de terem sido postos à venda dois prédios de que aquele era dono, também se reconhecia que no prédio rústico existia um tanque que era abastecido pela água que pertencia ao R. BB e que este explorava há mais de 25 ano num prédio pertencente a terceiro, tendo-lhe atribuído o valor de 12.000,00 €. Salvo melhor opinião, cremos ser insofismável que, caso se tivesse provado a falsidade de tal documento e da assinatura nele aposta, a ação teria tido um desfecho bem distinto».
Subscreve-se, por isso, a conclusão firmada na sentença recorrida no sentido de que o 2º réu incorreu em litigância de má-fé, na medida em que «deturpou, dolosamente, a verdade dos factos, alegando algo que subjetivamente sabia não ser verdade (tratava-se inequivocamente de factos de natureza pessoal que o A. não podia ignorar e que manifestamente teria de saber)».
Com efeito, alegou factos que bem sabia não serem verdadeiros – estruturando a sua defesa em matéria que sabia não ser verdadeira –, o que se traduz na alegação de factos falsos, pois que se provou o seu contrário.
Tratava-se inequivocamente de factos de natureza pessoal do 2º R., de que o mesmo não podia ignorar e que manifestamente teria de saber.
Por conseguinte, ao impugnar aquela factualidade articulada pela autora, que veio a ser dada como provada, e ao apresentar uma versão contrária, o 2º réu não só alterou a verdade dos factos, como igualmente omitiu, consciente e dolosamente, factos relevantes para a decisão da causa, que eram do seu conhecimento pessoal, litigando com manifesta violação do dever de probidade legalmente imposto (cfr. arts. 7º e 8º do CPC), agindo, deste modo, com dolo ou má-fé substancial. O mesmo é dizer que o réu veio a juízo deturpar a verdade dos factos, moldando-a aos seus interesses, agindo de forma consciente e com dolo, fazendo do processo um uso manifestamente reprovável e deduzindo oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, conforme resulta clara e inequivocamente da materialidade provada.
Por isso se conclui que a conduta do recorrente deve ser considerada dolosa, posto que com consciência e vontade dessa atuação, tendo preenchido as condutas previstas nas alíneas a) e b), do n.º 2, do art. 542º do CPC.
Nesta conformidade, consideramos que bem ajuizou e decidiu a 1ª instância quando concluiu pela existência de elementos factuais comprovativos da litigância de má-fé do ora recorrente e o condenou em multa.
Embora jamais concedendo que incorreu em litigância de má-fé, o recorrente alega, contudo, que, em qualquer caso, o valor da condenação como litigante de má-fé seria manifestamente excessivo e, como tal, indevido.
Por força da conduta adotada, o recorrente incorre em multa de duas unidades de conta a cem unidades de conta (art. 27º, n.º 3, do Regulamento das Custas Processuais) - A Unidade de Conta (UC) para vigorar no ano de 2024, mostra-se fixada em € 102,00 (art. 121.º da Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2024).
“O montante da multa ou penalidade é sempre fixado pelo juiz, tendo em consideração os reflexos da lei na regular tramitação do processo e na correta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste.” – n.º 4 do art. 27º do RCP.
Com efeito, a multa por litigância de má-fé, como qualquer outra pena, procurará desempenhar uma função repressiva (punindo aquele que não cumpre com os deveres de lealdade e correção) e, simultaneamente, preventiva (evitando que esse, ou qualquer outro litigante, volte a desrespeitar a lealdade processual). Mas estas funções apenas lograrão ser alcançadas se se tomar em consideração a situação económica do litigante, adaptando o montante da multa à sua condição financeira, assim garantindo que esta tenha verdadeiro efeito sancionatório e punitivo.
(…)
Em suma, na definição da sanção pecuniária, no quadro da respetiva moldura, o juiz deve usar de um juízo de proporcionalidade nas suas vertentes de adequação, necessidade e justa medida (Cfr. Salvador da Costa, As Custas Processuais, Almedina, 2017, 6ª ed., pp. 226 e 227).
No caso sub júdice, tendo em conta, por um lado, a gravidade da atuação, a forma de culpa do recorrente (dolo), a intensidade da mesma (que é elevada, pois que, consciente e voluntariamente, procurou convencer o tribunal de uma realidade falsa, pretendendo desse modo obter uma vantagem relevante ilícita), as consequências da sua conduta, o valor da ação (22.776,16€, portanto superior ao valor da alçada do Tribunal de 1.ª instância, ficando próxima da alçada da Relação) que obriga a constituição obrigatória de advogado (art. 40º, n.º 1, al. a) do CPC), a função pedagógica da condenação (Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, (…), p. 278 e António Abrantes Geraldes, Temas judiciários, I Vol., (…), p. 335), mas não tendo o tribunal apurado nenhum elemento atinente à sua situação patrimonial, sendo certo que o recorrente também não alegou, nem demonstrou, padecer de insuficiência económica – na sentença ponderou-se que o R. não litiga com apoio judiciário e esteve emigrado durante 30 anos em ... com o fito de melhorar a sua situação económico-financeira, o que conjugadamente permite concluir que vive desafogadamente –, afigura-se-nos adequada, proporcional e equilibrada a multa fixada no montante equivalente a 15 UC`s (art. 542º, n.ºs 1 e 2, als. a), b) e d) do Cód. Processo Civil e art. 27º, n.º 3 do Cód. Regulamento das Custas Processuais)”.
Do que fica dito resulta que as conclusões 4), 5), 6) e 7) da presente apelação, não podem aqui ser consideradas e muito menos as extensas transcrições de depoimentos testemunhais constantes das alegações, que pretendem impugnar a decisão de facto proferida na sentença inicial, com base na qual se decidiu, com trânsito em julgado, condenar o réu como litigante de má fé. Trata-se de assunto definitivamente resolvido e ao qual, por isso não podemos voltar.

Fica, então, por resolver a questão da quantificação da indemnização.

Entende o apelante que o valor encontrado é excessivo, tanto mais que a autora não discriminou nem fez prova (através da junção de faturas, recibos, talões) de quaisquer despesas, nem foi junta nota de honorários.
Vejamos.
Nos autos considerou-se provado que, tendo em vista a propositura da presente ação e como consequência da mesma, a autora constituiu mandatário ao qual terá de liquidar despesas e honorários, em quantia não concretamente apurada e que teve de deslocar-se pelo menos duas vezes, para vir a Tribunal e, bem assim, em número não concretamente apurado de vezes para ir ao escritório do seu mandatário, circunstância que acarretou despesas de montante não concretamente apurado.
Mais se deu como assente que, no âmbito dos presentes autos, que tiveram início no mês de junho de 2018, o mandatário da Autora elaborou e apresentou uma petição inicial (com um total de 67 artigos) (ref.ª ...51), esteve presente na diligência de audiência prévia ocorrida no dia 14-11-2018 (ref.ª ...40) e em 3 (três) sessões de audiência final (ref.ªs ...16, ...51, ...93), contra-alegou em matéria recursória (ref.ª ...15) e apresentou outras peças processuais, designadamente, tendo em vista a realização do exame pericial junto a 07-07-2021 (ref.ª ...30).

Nos termos do artigo 543.º do Código de Processo Civil:

“1 – A indemnização pode consistir:
a) No reembolso das despesas a que a má fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos;
b) No reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má fé.
2 – O juiz opta pela indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má fé, fixando-a sempre em quantia certa.
3 – Se não houver elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, são ouvidas as partes e fixa-se depois, com prudente arbítrio, o que parecer razoável, podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e honorários apresentadas pela parte”

A indemnização à parte contrária tem que ser solicitada expressamente, conforme decorre do disposto no artigo 542.º, n.º 1 ‘in fine’ do CPC.
No caso dos autos, a autora solicitou que a indemnização consistisse nas despesas que teve que suportar com a propositura da ação e como consequência da mesma, no valor de € 1.250,00 relativo a despesas de deslocações (reside habitualmente em ...) e perdas de tempo e de trabalho, e no valor de € 3.000,00 de honorários ao seu advogado, a que acrescem € 150,00 de despesas de expediente por ele suportadas, tudo no total de € 4.400,00.
É certo que não apresentou provas das despesas efetuadas ou do pedido de honorários, tendo o tribunal fixado o valor da indemnização no montante reclamado
Porém, quanto às despesas e honorários referidos na alínea a), do n.º1, do artigo 543.º do CPC, diz-nos o n.º 2 do citado preceito que o juiz opta pela indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má-fé, fixando-a sempre em quantia certa, acrescentando no n.º 3 que «se não houver elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, são ouvidas as partes e fixa-se depois, com prudente arbítrio, o que parecer razoável, podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte».
Resulta do exposto que, não obstante a prova das despesas e prejuízos sofridos não ter sido feita pela parte alegadamente prejudicada com a litigância de má-fé, sempre mesmo assim o Tribunal lhe deverá fixar uma indemnização de acordo com um prudente arbítrio (neste sentido, cfr., entre outros, os Acs. TRP de 26-03-2019 (relatora: Ana Lucinda Cabral), p. 611/12.1TYVNG.P1; TRG de 11-05-2017 (relatora: Maria Purificação Carvalho) acessíveis em www.dgsi.pt), podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte (artigo 543.º, n.º3, do CPC) – cfr. Acórdão da Relação de Guimarães de 31/10/2019, processo n.º 587/18.1T8PTL-A.G1 (Paulo Reis) in www.dgsi.pt.
Com efeito, a finalidade visada pela indemnização em sede de litigância de má-fé não é ressarcitória, como sucede na responsabilidade civil mas sim meramente sancionatória e compensatória. «Trata-se de uma indemnização sujeita a regras diversas das contidas nos artigos 562.º e ss. do Código Civil destinadas a suprir o dano sentido pelo lesado. Ora, o critério da indemnização não é a medida desse dano, nem se procura reconstituir a situação que não existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, o padrão para a determinação do montante da indemnização consiste antes, e apenas, na conduta do litigante de má fé e, mesmo assim, o valor a pagar é deixado a uma opção mais ou menos discricionária do julgador.» - Ac. TRP de 13-02-2017 (Manuel Domingos Fernandes) processo n.º 3006/05.0TBGDM.P3, acessível em www.dgsi.pt, citado no Acórdão da Relação de Guimarães supra identificado
Neste enquadramento, verifica-se que mesmo não havendo elementos concretos suficientes para determinar a importância da indemnização deve adotar-se o critério legal da fixação segundo o prudente arbítrio do julgador, tomando em conta princípios de razoabilidade e proporcionalidade, isto é, em síntese, de equidade, nos termos do artigo 543.º, n.º 3, do CPC.
Ora, o recurso a critérios de equidade implica que o Tribunal deva decidir dentro dos limites que tiver por provados -  cfr. a propósito, entre outros, os Acórdãos do STJ de 06-06-2013 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), proferido na revista n.º 303/09.9TBVPA.P1.S1 e de 29-06-2010 (Azevedo Ramos), proferido na revista n.º 214-A/1994.E1.S1, disponíveis em www.dgsi.pt.
Relativamente ao montante pedido a título de honorários, está em causa um contrato de mandato forense, tal como previsto no artigo 1157.º e ss. do Código Civil (CC) e no art.º 67.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 09 de setembro.
O mandato presume-se oneroso visto ter por objeto atos que o mandatário pratica por profissão, nos termos previstos no artigo 1158.º, n.º 1, do CC, revelando-se pois indiscutível a obrigação que impende sobre o mandante, ora recorrido, de pagar a retribuição que ao caso competir, e fazer-lhe provisão por conta dela segundo os usos, assim como de reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efetuadas, tal como decorre do artigo 1167.º, alíneas b), e c), do CC.
Haverá, então, que recorrer ao disposto no Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei n.º 145/2015 de 9 de Setembro, atentando ao que se preceitua no art.º 105.º que menciona como fatores a atender na fixação dos honorários pelo advogado a “importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais” – cfr. nº 3 do referido normativo.
Deve assim considerar-se a especificidade do trabalho desenvolvido, o tempo despendido, responsabilidade envolvida e grau de exigência e dificuldade técnica concretizados em cada caso.
No caso dos autos, verifica-se que todos os atos praticados pelo mandatário da autora ocorreram por causa e na sequência da necessidade de instaurar a ação para alcançar a definição de direitos e devolução de verbas que o comportamento doloso do réu vinha impedindo, sendo certo que este deduziu oposição cuja falta de fundamento não podia ignorar e alterou a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa, obrigando o mandatário à atividade que vem descrita no ponto n.º 2 dos factos provados.
Na fixação do seu valor importa levar em consideração que a razão de ser dos normativos dos artigos 542º e 543º do CPC é a de proteger o interesse público de respeito pelo processo, pelo tribunal e pela própria justiça, destinando-se a assegurar a moralidade e a eficácia processual, porquanto com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestigio da justiça, tal como decorre do facto da multa visar castigar o procedimento do litigante de má fé – cfr. Acórdão da Relação de Guimarães de 16/09/2021, processo n.º 26/20.8T8VNF-B.G1 (Maria dos Anjos Melo Nogueira).

Tudo ponderado, nomeadamente o tempo de duração do processo, as peças processuais apresentadas, o facto de a questão encerrar em si alguma complexidade, o número de presenças e intervenções em tribunal, o ganho de causa obtido, bem como as regras de experiência comum e os montantes fixados noutros casos, cremos razoável e equilibrada a indemnização fixada em 1.ª instância, no valor de € 3.000,00, a que acrescem as despesas de expediente de € 150,00.

Já quanto às despesas suportadas pela autora, considerando que apenas se provou que tenha efetuado duas deslocações ao Tribunal e um número não apurado ao escritório do seu mandatário (parecendo de toda a razoabilidade que tenha aproveitado as datas em que se deslocou a Portugal para ir a Tribunal ou em férias para se reunir com o seu advogado no escritório deste) e considerando o custo atual dos voos, designadamente nos chamados “low-cost”, parece-nos razoável fixar em € 500,00 o valor devido a esse título, evitando, também, deste modo, um possível  enriquecimento da autora que a equidade não tolera.

Procede, assim, apenas parcialmente a apelação, fixando-se em € 3.650,00 o valor da indemnização pela litigância de má fé a suportar pelo réu.

III. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revoga-se parcialmente a decisão que se substitui por outra que fixa em € 3.650,00 o valor da indemnização por litigância de má fé a suportar pelo réu BB.
Custas por ambas as partes na proporção do decaimento.
***
Guimarães, 23 de maio de 2024

Ana Cristina Duarte
Alexandra Rolim Mendes
Eva Almeida