Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
535/18.9T8VCT.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: ARRENDAMENTO NÃO HABITACIONAL
PRAZO DE DENÚNCIA
FIANÇA
OBRIGAÇÕES FUTURAS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/30/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÕES IMPROCEDENTES
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Atento o disposto no n.º 2 do art.º 236.º do CC, conhecendo o declaratário o sentido que o declarante pretendeu exprimir através da declaração é de acordo com essa vontade que vale a declaração emitida.
II- O arrendatário é responsável pelas despesas necessárias à manutenção e restituição do prédio no estado em que o recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato e as pequenas deteriorações que se tornam necessárias.
III- No contrato de arrendamento urbano para fim não habitacional em que as partes estabelecem prazo certo de duração do contrato mas não estabelecem a antecedência mínima que o arrendatário tem de respeitar quando pretende denunciar o contrato dentro daquele prazo de duração, vigora o disposto no art. 1110.º nº 2 do Código Civil.
IV- O fiador deve conhecer logo de início os limites da obrigação fidejussória ou, ao menos, os critérios de fixação desses limites; caso contrário, não é sanável mesmo que os fiadores expressem e antecipadamente aceitem tal responsabilidade.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I – Relatório

J. G., residente na Rua de …, …, Lugar de ..., freguesia de ..., do concelho de Ponte de Lima, instaurou acção declarativa de processo comum contra C. L., Reparação de Automóveis, Ldª, com sede na Rua da …, …, freguesia da …, do concelho de Ponte de Lima; C. L., residente no Lugar de …, freguesia de …, do concelho de Ponte de Lima; e A. S., residente no Lugar do …, freguesia de …, do concelho de Ponte de Lima, pedindo a condenação solidária dos réus a pagar-lhe a quantia global de € 56.232,82, acrescida de juros vincendos e os montantes relativos ao dano da privação de uso do imóvel desde Fevereiro de 2018 até ao mês em que os réus coloquem à disposição do autor a quantia de € 16.777,20, a liquidar posteriormente.
Alegou o autor como fundamento da sua pretensão ter sido dada de arrendamento à 1ª ré, em 22.05.2009, para o exercício de actividades de oficina de reparação de automóveis e actividades congéneres, o prédio identificado no artigo 1.º, da petição inicial, pela renda anual de € 12.000,00; que, por carta de 3.11.2015, a ré comunicou, por carta, a denúncia do contrato de arrendamento, não observando a antecedência prevista no art.º 1110.º, n.º 2, do CC; que a ré pagou a renda apenas até Janeiro de 2016; que a ré entregou o locado com danos, cuja reparação ascende a 16.777,20, e que impendem o seu arrendamento causando-lhe prejuízos materiais e danos não patrimoniais; e ainda que os 2.º e 3.ºs réus outorgaram o referido contrato na qualidade de fiadores da arrendatária.
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Regularmente citados, os réus C. L. – Reparação de Automóveis, Ldª e C. L. vieram contestar, pugnando pela improcedência absoluta da acção, com a sua absolvição do pedido. Além de impugnar parcialmente a matéria alegada pelo autor, designadamente quanto à existência de danos no locado e à existência do dano de privação, os réus invocaram que o autor age em abuso de direito, dizendo que o autor aceitou a entrega do locado, dizendo não lhe ser devida qualquer outra renda e nada reclamando quanto ao estado do mesmo, acrescentando que parte dos danos já existiam no locado e deviam-se à ausência de obras de conservação por parte do senhorio.
Por sua vez, o réu A. S., veio também apresentar contestação, invocando a ilegitimidade passiva do 3º réu, a extinção e a invalidade da fiança, bem como o abuso de direito. Mais impugnou parcialmente a factualidade invocada pelo autor e defendeu igualmente que parte dos danos já existiam no locado e deviam-se à ausência de obras de conservação por parte do senhorio.
Terminou pedindo a improcedência da acção e a condenação do autor como litigante de má fé, em multa e indemnização.
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Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual o autor reduziu o pedido quanto ao dano de privação e foi proferido despacho saneador, tendo sido julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva do 3º réu.
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Após procedeu-se a julgamento, sendo proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e em consequência:

- condenou solidariamente os réus C. L., Reparação de Automóveis, Lda, C. L. e A. S. a pagar ao autor J. G. a quantia de € 11.000,00 (onze mil euros), acrescida de juros de mora contados de 3.06.2016 e até integral pagamento;
- condenou a ré C. L., Reparação de Automóveis, Lda a pagar ao autor J. G. a quantia de € 12.720,00 (doze mil, setecentos e vinte euros) mais IVA, acrescida de juros de mora contados desde 3.06.2016 e até integral pagamento;
- absolveu os réus do restante peticionado; e
- julgou improcedente o pedido de condenação do autor como litigante de má-fé.
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II. O Recurso

Não se conformando com a decisão proferida veio o 3.º R. A. S. apresentar recurso, nele formulando as seguintes conclusões:

A. Sintetizamos também as conclusões de recurso: Recurso da matéria de facto quanto ao 3.º Réu A. S.; Recurso da matéria de Direito;
- Da extinção ou invalidade da fiança também no que concerne às rendas; - Da inaplicabilidade do n.º 2 do art.º 1101.º do Código Civil;
- Do abuso de direito.

Recurso da Matéria de Facto quanto ao 3.º Réu A. S.

B. Para o que ao 3.º Réu e aqui Recorrente relevam os factos provados em 5, 22, 23, 24 e 25.
C. Além disso, também do que releva para o 3.º Réu e aqui Recorrente releva, dos factos não provados em c) e em e) o seguinte:
c- que as partes consignaram no contrato que as fianças prestadas pelos e 3ºs réus o eram exclusivamente na condição de sócios da ré;
e- que em 2011 foi comunicado ao autor que o réu deixaria de ser sócio gerente da e que deixaria de ter responsabilidades relativamente aquele, o que este aceitou.
D. Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados foram os factos não provados em c) e em e) da decisão de facto.
E. Na verdade, quanto ao facto não provado em c), o contrato de arrendamento com fim não habitacional assinado em 22 de Maio de 2009, tinha como Primeiro o Autor e como Segundo ambos os 2º e 3º Réus que “outorgam em legítima representação da sociedade A. S. & L. Reparação de Automóveis, Lda.”, tendo-se constituído como fiadores da 1ª Ré na cláusula 16ª do mesmo contrato.
F. Os 2.º e 3.º Réus dos presentes autos apenas intervieram como sócios-gerentes conforme referido na identificação no contrato de arrendamento “...os quais outorgam em legítima representação da sociedade... (cfr. Documento n.º 3 da petição inicial).
G. De resto, o referido contrato foi negociado e assinado pela sociedade comercial aqui 1ª Ré, para efeitos de exercício de actividades de oficina de reparação de automóveis e actividades congéneres, conforme consta da cláusula 3ª do contrato de Arrendamento referido,
H. Os 2.º e 3.º Réus apenas se constituíram como fiadores enquanto sócios-gerentes da 1ª Ré, conforme cláusula 16ª do contrato de arrendamento.
I.O 3.º Réu apenas assinou o contrato de arrendamento à data na qualidade de sócio-gerente e com essa finalidade e limite, não o assinou a título pessoal, obrigando-se apenas em nome e pela sociedade comercial enquando dela fosse sócio-gerente, conforme consta no contrato das assinaturas dos 2.º e 3.º Réus do contrato com o carimbo da 1ª Ré.
J. Como decorre dos factos provados de 22, 23, 24 e 25, o 3º Réu quando foi interpelado por Advogado respondeu por escrito no sentido de que conforme conferenciado com o Sr. J. G. o Sr. A. S. não teria qualquer responsabilidade, quanto a rendas, questões para as quais não teve conhecimento e intervenção.
K. Quanto ao facto não provado em e), na verdade, o Autor tomou conhecimento que o 3.º Réu ora Recorrente havia deixado de ser sócio-gerente, tendo posteriormente aceitado que este não teria qualquer responsabilidade quanto ao pagamento de rendas.
L. No dia 22 de Maio de 2009 a 1ª Ré, à data A. S. & C. L. -Reparação de Automóveis, Lda., assinou na qualidade de Segunda Outorgante um contrato de arrendamento, com prazo certo, para fim não habitacional, com o Autor, na qualidade de Primeiro Outorgante, conforme documento n.º 3 da petição inicial.
M. As quotas da sociedade comercial que o 3º Réu era detentor apenas perfaziam o valor nominal de 2.500,00€ com a responsabilidade limitada a esse capital, conforme documento n.º 1 da contestação do 3.º Réu Recorrente.
N. Por escritura de 31 de Março de 2011 o 3.º Réu cedeu as suas quotas referentes à 1ª Ré ao 2.º Réu, bem como renunciou à gerência da 1ª Ré sociedade comercial, tendo o 2.º Réu alterado a 1ª Ré para sociedade unipessoal, sendo daí em diante o 2.º Réu o único sócio-gerente para obrigar a sociedade em todos os acts e contratos na gerência da 1ª Ré, conforme documento n.º 2 da contestação do 3.º Réu Recorrente.
O. A fiança prestada na cláusula 16ª do contrato de arrendamento, apenas tinha como limite temporal o prazo certo de 5 anos de 1 de Junho de 2009 a Maio de 2014, conforme documento n.º 3 da petição inicial.
P. Por registo comercial a cessão de quotas e renúncia produziram efeitos a partir de 31 de Março de 2011 (cfr. Documento n.º 3 da contestação do 3.º Réu Recorrente).
Q. O 3.º Réu desde essa data, de acordo com o conhecimento do Autor, 1ª Ré e 2.º Réu, não teve mais qualquer relação contratual com o objecto do negócio jurídico, quanto ao pagamento de rendas.
R. Nesse sentido a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento.
S. Por um lado, em 29-04-2019, o depoimento de parte e declarações de parte do Autor gravado no sistema "Habilus Media Studio". Das 10h.30.27 às 12h.27.20.
17:00-17:07-Juiz: O senhor sabia que o senhor A. S. não era sócio-gerente da...?
17:07-17:15-Autor: Sim, eu fui ter com ele e depois soube, um vizinho andava sempre por ali e disse o senhor A. S. não está e disse que não, saiu já.
17:15-17:17-Juiz: E quando é que o senhor soube?
17:17-17:47-Autor: Não fixei bem a data mas terá sido um mês ou dois depois do senhor A. S. ter saido. (...) Ia receber a renda e passava e o senhor C. L. é que pagava de tudo, é que pagava a renda, não tinha contactos nenhuns com o senhor A. S.. A não ser bom dia ou ou boa tarde, levava um carro para arranjar, e de resto não tinha outros contactos.
17:50-17:53-Juiz: Então o senhor não falou com o senhor A. S.?
17:53-17:59-Autor: Não. Falei com ele depois que foi à oficina, onde ele estava instalado.
20:43-20:46-Juiz: Mas então o senhor foi falar com ele a que propósito?
20:46-20:56-Autor: eu fui porque tinha um carro que é uma seat para retoques, para tratar de outras coisas, e abordamos o assunto.
20:56-20:58-Juiz: E ele disse-lhe que não estava lá?
20:58-21:06-Autor: disse-me que não estava lá. Embora soube antes que ele não estava e onde ele estava fui ter.
21:06-21:10- Juiz: e então não falaram do que estava em dívida e do que é que era para pagar?
21:09-21:42-Autor: não não. Não falamos em nada. Fez-me uma pergunta quanto à renda ... falamos sobre ser fiador e sobre os estragos que estavam e ele disse que não acreditava.
32:00-32:05-Advogado: pouco disse que ia receber as rendas e que era o senhor C. L. que lhe pagava?
32:05-32:08-Autor: sim foi sempre ele.
36:00-36:05-Advogado: Quando recebeu a carta para terminar o contrato o senhor recebeu a carta de quem, foi da empresa, foi do senhor C. L.?
36:05-36:10-Autor: não, foi do senhor C. L., o senhor C. L. que me entregou a carta. 53:15-53:36 Autor: O senhor C. veio ter comigo e fez-se o arrendamento ao senhor C. L.. Eu digo sempre senhor C. L. porque o senhor C. L. é que manobrava tudo, o outro senhor (A. S.) pronto era um trabalhador praticamente que considero uma excelente pessoa e o senhor C. L. é quem andava.
T. Das declarações do Autor acima transcritas resulta que foi o Sr. C. L. que enviou a carta de denúncia da Arrendatária, que entregou as chaves ao Senhorio Autor.
U. Também das declarações do Autor resulta que tomou conhecimento da saída do Réu A. S. por intermédio de um vizinho da oficina da ... arrendada.
V. Que o Autor também chegou a estar com o Réu e apenas lhe falou dos danos no arrendado, já depois do contrato ter terminado.
W. E também explicou que via o Sr. A. S. como um mero trabalhador do Sr. C. L..
X. Por outro lado, em 29-04-2019, a testemunha J. B., trabalhador do 3.º Réu ora Recorrente A. S., conforme depoimento gravado no sistema "Habilus Media Studio". Das 13h.49.47 às 13h.58.21: 01:30-01:40-Advogado: disse que trabalha para o senhor A. S. desde 2015.
01:35-01:40-Testemunha: Sim sim.
01:48-01:50-Testemunha: Estou no escritório.
01:52-01:57-Advogado: tem conhecimento desde quando é que o senhor A. S. está a trabalhar nessa empresa?
02:01-02:05-Testemunha: 2013 ou 2014 mais ou menos.
02:16-02:35-Advogado: Tem presente alguma situação em que o senhor A. S. lhe tenha dito alguma coisa sobre a anterior empresa e um senhorio na ...? Alguma conversa que o senhor tenha ido falar com o A. S.?
02:36-02:54-Testemunha: Sim sim. Eu o vi e o A. S. até comentou comigo que ele era o anterior senhorio e foi que eu percebi.
02:54-02:56-Advogado: ele foi uma altura. Não se lembra em que ano que isso foi? 02:56-03:04-Testemunha: foi mais de um ano ou dois anos à vontade.
03:10-03:17-Advogado: e alguma vez os ouviu falar ou sobre o contrato de arrendamento?
03:18-03:38-Testemunha: sim sim. Foi quando veio a carta do tribunal e o A. S. até a levou para cima para o escritório, eu estava ao lado dele e tinha o telefone em alta voz e ele até comentou, estava a falar com o senhorio e ao senhorio perguntou o que é que ele tinha a ver com aquilo que tinha fechado saído daquela sociedade.
04:10-04:24-Testemunha: o A. S. estava a perguntar o que é ele tinha a ver com aquilo e com a situação, porque eles tinham fechado aquilo muito tempo, e o senhorio até disse que o A. S. não tinha nada a ver com aquilo que era para intimidar o senhor C. L..
Y. Do depoimento desta testemunha resultou que o 3.º Réu A. S. saiu da anterior sociedade comercial da 1ª Ré e 2.º Réu entre 2013 e 2014.
Z. E que o Senhorio Autor terá ido à oficina do 3.º Réu A. S. há cerca de um ano ou dois anos.
AA. E ainda que após ter recebido a carta do Tribunal ou do Advogado é que o 3.º Réu A. S. ligou com o Autor e que, em alta voz, ouviu-o dizer que não seria nada contra ele, era apenas para o Sr. C. L..
BB. Na verdade, considerando a referida prova documental e testemunhal, deveriam ter sido dados como provados os seguintes factos (até aqui não provados):
c- que as partes consignaram no contrato que as fianças prestadas pelos e 3ºs réus o eram exclusivamente na condição de sócios da ré;
e- que em 2011 foi comunicado ao autor que o réu deixaria de ser sócio gerente da e que deixaria de ter responsabilidades relativamente aquele, o que este aceitou, em 2015 ou 2016.
CC. Nesse sentido deverão ser dadas como provadas as alíneas c) e e) dos factos não provados, nos termos acima expostos, em conformidade com o art.º 640.º do CPC.

Do Recurso da Matéria de Direito:

Da invalidade ou extinção da fiança também no que concerne às rendas:

DD. Da prova documental e testemunhal acima identificadas resulta a devida alteração da decisão dos factos provados e não provados, no sentido de serem dados como provados os factos não provados das al. c) e e).
EE. Além disso, a Douta Sentença absolveu o 3.º Réu Recorrente fiador da condenação do pagamento dos danos do imóvel peticionados pelo Autor, conforme pág. 31 a 34 da Sentença, para a qual se remete expressamente na parte que refere “Resta apreciar agora da extinção ou invalidade da fiança”.
FF.Por um lado, no sentido da Douta Sentença, aproveita-se a mesma também quanto às rendas e quanto à invalidade da fiança do aqui 3.º Réu e Recorrente.
GG. Conforme decorre dos factos provados em 3 e 4 o contrato escrito, denominado “Contrato de arrendamento com prazo certo para fim não habitacional”, é datado de 22.05.2009,
HH. Foi nesse contrato que o 3.º Réu Recorrente se constituiu fiador nos termos da identificação, cláusula 4ª quanto ao prazo de duração do contrato de arrendamento de 5 anos até Maio de 2014 e na cláusula 16ª do contrato quanto à fiança.
II. Quanto ao facto provado em 5, nomeadamente quanto à carta datada de 3.11.2015, em que a 1ª ré comunicou ao autor a “denúncia do contrato”, conforme facto provado em 24 e 25 dos factos provados desde 31-03-2011 que o 3.º Réu já não era sócio-gerente, portanto, não teve qualquer intervenção e nem sequer lhe foi dado conhecimento.
JJ. Quanto ao facto provado em 22, que se trata de uma carta data de 02-06-2016 em que o Autor pede o pagamento da quantia de €10.000,00 referente ao período de aviso prévio em falta, foi o primeiro conhecimento que o 3.º Réu teve,
KK. A esse respeito não tinha tido qualquer intervenção quanto ao facto 5 quanto à denúncia do contrato, portanto, não lhe assiste qualquer responsabilidade à falta do aviso prévio e ao pagamento daquele valor.
LL. Nesse sentido, o facto provado em 23 em que o 3º réu remeteu ao autor a carta datada de 12.06.2016, a referir que não era sócio-gerente, desconhecia o que se estava a passar e que, portanto, não lhe podia ser pedido qualquer valor a título de rendas e de aviso prévio em falta.
MM.O 3.º Réu tomou conhecimento da denúncia do contrato apenas em 12-06-2016 quando o Autor lhe comunicou que a 1ª Ré não tinha cumprido o prazo de aviso prévio com a carta de denúncia daquela de 03-11-2015, sem que o 3.º Réu tenha tido sequer a possibilidade de intervir quanto a esse assunto.
NN. A fiança prestada na cláusula 16ª do contrato de arrendamento, apenas tinha como limite temporal o prazo certo de 5 anos de 1 de Junho de 2009 a Maio de 2014, portanto, qualquer responsabilidade assumida no contrato de arrendamento referido relativamente ao 3.º Réu extinguiu-se com a cessão de quotas e renúncia à gerência em 31 de Março de 2011.
OO. Desde 31 de Março de 2011 até então que o 3.º Réu não mais teve conhecimento, nem tinha obrigação ou acesso a tal informação, relativamente aos pagamentos das rendas, conforme art.ºs 648.º e 651.º a 654.º do Código Civil que a Douta Sentença não relevou nesta parte.
PP. De resto, a fiança só será válida se do respectivo contrato resultar: a) o tipo e a origem das obrigações a garantir; b) a qualidade em que o fiador dá a sua garantia; c) o montante máximo garantido; e d) a duração máxima da garantia.
QQ. As cláusulas 4ª e 16ª do contrato de arrendamento:
O presente contrato é celebrado pelo prazo de 5 anos, com início em 01 de Junho de 2009 e termo no último dia do mês de Maio de 2014. Findo este prazo, e não havendo oposição de qualquer das partes, o contrato renovar-se-á automaticamente por iguais períodos de cinco anos.
16ª Declaram os segundos outorgantes que, pelo presente contracto se constituem também fiadores e principais pagadores da segunda contraente A. S. & C. L. Reparação de Automóveis Lda e com ele solidariamente responsáveis para com o segundo outorgante J. G., todos acima identificados, por todas as obrigações a que a referida firma A. S. & C. L. Reparação de Automóveis Lda contraiu pelo presente contracto, mais declarando que renunciam expressamente ao benefício de excussão ou outras excepções ou restrições, obrigando-se a pgar as quantias que possam a ser devidas pela dita firma ao arrendatário, pagamento que farão de forma imediata após a simples recepção da comunicação do primeiro contraente em que se declare que a segunda não cumpriu com as obrigações contratuais que aqui assumiu e para cuja execução a garantia é prestada.
RR. Ou seja, da conjugação da cláusula 4ª com a claúsula 16ª não resulta qualquer prazo e limite para a garantia de fiança do contrato de arrendamento.
SS. É nula a fiança que, abrangendo obrigações futuras, se apresente indeterminada quanto ao tempo de duração máxima e também quanto ao montante máximo garantido, não sendo possível, da interpretação do clausulado contratual, determinar nem um e nem o outro, havendo sido utilizada uma fórmula generalista responsabilizadora «pelo integral cumprimento deste contrato», impossível de concretizar com recurso ao próprio contrato.
TT. Nesse sentido, quanto à invalidade da fiança, invocou o 3.º Reu a nulidade do contrato, quanto ao clausulado referente à fiança (cláusulas 4ª, 5ª e 16ª do contrato), conforme os art.ºs 280.º e 286.º do Código Civil, em conjugação com os art.ºs 278.º e 272.º do mesmo diploma, o que leva a concluir pela extinção ou invalidade da fiança.

Da inaplicabilidade do n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil:

UU. A Douta Sentença, salvo o devido respeito, não podia ter interpretado o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil no sentido de aplicação ao contrato de arrendamento objecto dos autos.
VV. Nos autos está em causa a cessação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais por iniciativa unilateral do arrendatário, a que o regime da locação qualifica como denúncia, tendo sido dado um pré-aviso de 120 dias.
WW. Veio o Tribunal a quo interpretar que o prazo de denúncia pelo arrendatário previsto no n° 3 do art.° 1098° é afastado pela disposição específica do n° 2 do art.° 1110°, ambos do Código Civil. No sentido defendido no Acórdão da Relação de Évora de 20.10.2016, e que a Sentença recorrida acompanhou, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/f318cfe530e418 6680258059003b2962?OpenDocument.
XX. Porém, salvo o devido respeito, sem razão, por duas razões, por um lado, porque no caso concreto o contrato de arrendamento previa a seu prazo de duração inicial, com a possibilidade de renovação caso não houve oposição nas cláusulas 4ª e 5ª do contrato, e por outro lado porque da conjugação do clausulado contratual com as normas transcritas não se aplica no caso concreto o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil.
YY. Por um lado, as cláusulas 4ª, 5ª e 6ª do contrato de arrendamento:
O presente contrato é celebrado pelo prazo de 5 anos, com início em 01 de Junho de 2009 e termo no último dia do mês de Maio de 2014. Findo este prazo, e não havendo oposição de qualquer das partes, o contrato renovar-se-á automaticamente por iguais períodos de cinco anos.
Tanto o senhorio como o inquilino poderão opoer-se às renovações referidas na cláusula anterior, desde que o comuniquem à outra parte, através de carta registada com aviso de recepção, com antecedência mínima de seis meses em relação ao termo do contrato ou qualquer das suas renovações.
Durante o prazo inicial do contrato o arrendatário poderá denunciá-lo a todo o tempo, desde que o faça com uma antecedência não inferior a doze meses.
ZZ.Das cláusulas 4ª, 5ª e 6ª do contrato de arrendamento resulta o prazo certo inicial de 5 anos, bem como o prazo de denúncia desse prazo inicial como sendo de 12 meses.
AAA. Uma vez que o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil apenas se aplicaria no caso de “falta de estipulação” quanto ao prazo de duração e de denúncia quanto ao prazo inicial do contrato,
BBB. Como das cláusulas 4ª, 5ª e 6ª resulta claro a estipulaçao que o prazo de duração e de denúncia durante o prazo inicial do contrato era de cinco anos e a denúncia de 12 meses, não se aplica no caso concreto o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil.
CCC. Por outro lado, da conjugação do clausulado contratual com as normas transcritas não se aplica no caso concreto o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil.
DDD. O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 20-10-2016, pelo qual a Sentença segue a interpretação de aplicação do n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil, não é igual ou sequer idêntico ao caso concreto dos autos, porque neste caso as partes fixaram o prazo de duração inicial e o prazo de renovação, ambos de cinco anos, bem como fixaram o prazo de denúncia durante o prazo inicial e apenas nada disseram quanto à denúncia durante as renovações.
EEE. No caso dos autos, a questão colocava-se em determinar se o prazo de denúncia do contrato de arrendamento pelo arrendatário seguia a norma do nº 1(com remissão para o n.º 3 do art.º 1098.º do Código Civil) ou se, pelo contrário, se deve aplicar a previsão do n.º 2.
FFF.Este artigo (1110.º do Código Civil) versa sobre os prazos de duração, denúncia e oposição à renovação do contrato nos arrendamentos para fins não habitacionais, estabelecendo como princípio geral a liberdade contratual das partes para fixar estes prazos.
GGG. Para o caso de as partes não fixarem estes prazos estabelece dois regimes subsidiários: - o do nº1 que manda aplicar as regras dos arrendamentos para fins habitacionais; - o do n.º 2 que fixa uma duração do contrato por 5 anos e um prazo de denúncia não inferior a doze meses.
HHH. O n.º 1 do artigo prevê o regime a aplicar aos prazos de denúncia e de oposição à renovação e quando, na sua parte final do n.º 1 do art.º 1110.º, se diz que “aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação”, o legislador só pode estar a pensar nos casos em que, tendo sido estipulado o prazo de duração do contrato, nada foi estipulado quanto aos prazos de denúncia e de oposição à renovação.
III. O n.º 2 prevê um caso específico de falta de estipulação de prazo no contrato ou seja e apenas durante o prazo inicial do contrato e não das suas renovações.
JJJ. No caso do acórdão, houve estipulação de prazo de duração do contrato, pelo que não há que aplicar o n.º 2 do artigo 1110º do Código Civil, sendo de aplicar o disposto no seu n.º 1. Ou seja, aplicam-se as regras do arrendamento para habitação.
KKK. Como o legislador não pode querer soluções que suscitem dúvidas, a única possibilidade de resolver esta questão é a interpretação que acima se defende, sob pena de violação dos art.ºs 1110.º, nºs 1 e 2 e 1098.º, n.º 3, al. a), ambos do Código Civil.
LLL. Pelo contrário ao entendimento da Douta Sentença, seguindo a orientação defendida pelos Réus, a denúncia teria de ser efectuada com a antecedência mínima de 120 dias, o que já é possível e faz sentido e foi respeitado pelas 1ª Ré e 2ª Réu, nos termos do n.º 1 do art.º 1110.º e da al. a) do n.º 3 do art.º 1098.º, ambos do Código Civil.
MMM. Pois, sendo o n.º 2 do art.º 1110.º apenas para o prazo inicial do contrato, no caso dos autos, aquando da denúncia em 11-2015 já estava em curso o prazo de renovação de cinco anos, pelo que não se aplicava o n.º 2 do art.º 1110.º do Código Civil que apenas existe para o prazo de duração inicial do contrato.

Do abuso de direito:

NNN. Da prova documental e testemunhal acima identificadas resulta a devida alteração da decisão dos factos provados e não provados, no sentido de serem dados como provados os factos não provados das al. c) e e).
OOO. O Autor bem sabe que o 3.º Réu nem deveria ser parte nos presentes autos, já tendo ambos conferenciado que este último não tem qualquer responsabilidade no pagamento de quaisquer rendas.
PPP. O Autor, ali Senhorio, tomou conhecimento que o 3.º Réu deixaria de ser sócio-gerente daquela sociedade comercial, não exercendo mais ali a sua actividade e não tendo mais responsabilidades relativamente ao arrendado, nem sequer possibilidade de o fazer.
QQQ. A violação expressa dos pressupostos da confiança e da boa-fé afigura-se também um manifesto desequilíbrio contratual que configura um abuso de direito nos termos previstos no art.º 334.º do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao Recurso interposto e revogada a Douta Sentença recorrida e substituída na parte em que condenou solidariamente o aqui Recorrente 3.º Réu A. S. por outra que seja o mesmo absolvido totalmente.
*
Também os RR. C. L. e C. L., reparação de automóveis Lda vieram apresentar recurso em que concluem nos seguintes termos:

1. Foi dado como provado que, na data de entrega de entrega do locado o imóvel apresentava as anomalias constantes do relatório pericial.
2. Não foi produzida qualquer prova no sentido de que na data de entrega do imóvel o mesmo apresentava todas as anomalias indicadas no ponto 8 da sentença e relatadas no relatório pericial.
3. Na carta remetida em Junho de 2016 pela Mandatária do recorrido, (junta aos autos) não é referido um só dano em específico,mas de forma genérica se refere que o imóvel apresentava inúmeros danos…. acresce que,
4. a própria perita refere nos esclarecimentos em 09 de Maio de 2017 que o seu relatório demonstra o estado do imóvel à data da perícia e que o período temporal em que os danos acontecerem não é possível determinar. Tinha de ser o recorrido a fazer prova de que foram todos os danos causados durante a ocupação e saída da recorrente.
5. Face à prova produzida, o que poderia ter sido dado como provado é que o imóvel à data de realização do relatório pericial, em 06.03.2017, apresentava os danos elencados no relatório pericial, exceptuando-se aqueles cuja prova se fez, serem pré-existentes e causados pelo anterior arrendatário, bem como aqueles que a própria recorrente admitiu, mas que entende serem decorrentes do desgaste, do uso normal.
6. Considerando que o imóvel foi entregue no final de Fevereiro de 2016, nos parece que o Recorrido não tinha só de provar a existência dos danos, mas que os mesmos foram provocados pela recorrente e durante o período de ocupação do locado, o que não aconteceu.
7. Parece-nos que mal andou o tribunal ao dar como provado que à data da entrega o imóvel apresentava todos aqueles danos, quando nenhuma prova foi produzida nesse sentido.
8. Relativamente a alguns dos danos fez-se prova que já existiam antes da recorrente ocupar o locado e, obviamente se reportam á data de entrega.
9. Não resultou provada a responsabilidade da recorrente quanto aos danos na instalação eléctrica, na chapa na zona do exaustor, nos tubos de queda água, no portão exterior.
10. Resultou ainda provado que outros danos são decorrentes da utilização normal do locado ao fim ao qual se destinada e que inclusivamente o próprio pavilhão já estava bastante degradado e não sofreu obras de conservação ao longo dos anos, mas pequenos “remendos”, exemplo disso são as rachadelas no logradouro exterior e no mosaico interior, a porta do contador de energia exterior, manchas de óleo no piso interior e mesmo a pintura deteriorada.
11. Parece-nos que deveria ter sido considerado como provado que efectivamente o recorrido aceitou a entrega do locado no estado em que se encontrava e nada mais teria de pagar a título de rendas.
12.O próprio recorrido durante as suas declarações disse que acordou isso mesmo com o recorrente, porém depois com intuito de justificar a reclamação dos danos disse que não tinha visto o interior do imóvel, porque o Recorrente lhe entregou as chaves cá fora e se foi logo embora e quando entrou no locado mudou de ideias.
13. Porém, disse também que afinal já tinha visto algumas coisas de fora que estavam estragadas
14. As declarações do recorrido foram bastante contraditórias, na parte em que afirmou que não sabia como estava o locado, pois resultou provado que o recorrido ia receber as rendas ao locado e, resultou provado que também lá colocava o carro a arranjar, por isso conhecia perfeitamente o estado em que o mesmo se encontrava
15. Além do mais, durante as declarações que prestou chegou a referir que ia ao locado receber as rendas e que estava tudo “direitinho”, que só quando saiu é que o recorrente estragou tudo de propósito.
16..Aquilo que se retira, salvo devido respeito por melhor opinião, das declarações do recorrido é que este conhecia perfeitamente qual o estado do locado, pois ia lá receber rendas e inclusivamente levava o carro para reparações, porém, quando o locado foi esvaziado e o recorrido percebeu que iria ter um custo elevado com obras deu o dito por não dito e decidiu reclamar ao recorrente o valor das mesmas, alegando que ele destruiu propositadamente a oficina.
17. Parece-nos que, foi feita errada interpretação das normas contidas nos artigos 1110.º, n.º 1 e 2 e 1098.º do C. Civil, relativamente ao prazo de denúncia do contrato de arrendamento que o tribunal a quo considerou dever ser de um ano
18. Estabelecia o contrato de arrendamento assinado entre as partes, o respectivo prazo de duração, as renovações, o prazo de denúncia para os primeiros cinco anos de vigência e o prazo de oposição às renovações que seria de 6 seis meses.
19. Apenas não foi fixado o pré aviso em caso de denúncia durante as renovações, porém, considerando o estabelecido na lei e se atendermos ao artigo 1110.º n.º 1 do C. Civil, este, remete-nos para as regras do arrendamento para habitação, caso se verifique falta de estipulação da duração, denúncia e oposição à renovação no contrato para fim não habitacional.
20. No caso concreto, salvo melhor opinião, parece-nos que, tendo as partes fixado prazo de duração, denúncia e oposição, não será de aplicar o preceituado no número 2 do referido artigo 1110.º, como se as partes não tivessem estipulado rigorosamente nada, porque, efetivamente, fixaram.
21. As partes, fixaram o prazo de duração inicial, o pré-aviso em caso de denúncia, fixaram o prazo das renovações e o prazo de oposição às renovações. Só não foi fixado o prazo de pré-aviso em caso de denúncia durante as renovações, o que não aconteceu na situação relatada no acórdão indicado, onde as partes apenas estipularam o prazo de duração do contrato.
22. Considerando as disposições legais e as disposições contratuais fixadas pelas partes, no caso em concreto, parece-nos que é de aplicar, no caso omisso, as regras do arrendamento para habitação, nomeadamente o prazo de denúncia previsto no artigo 1098.º n.º 3, alínea d) do C. Civil, conforme remissão do artigo 1110 n.º 1.
23. Ora, estabelecendo aquele artigo (1098.º) o prazo de 120 dias de pré-aviso, parece-nos que a denúncia levada a cabo pela recorrente sociedade, foi corretamente efectuada,não tendo de pagar o valor em que veio condenada.
24. Conforme resulta do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04.02.2014 em www.coletaneadejurisprudencia.com:
25. No limite, parece-nos que, se se entender não aplicável o prazo de 120 dias, o que mais se aproximará ao que seria a vontade das partes, atendendo ao texto do contrato, seria o prazo de denúncia de 6 meses, que ficou estabelecido para a oposição á renovação.
26. Aquando da formalização do contrato, as partes quiseram estabelecer dois prazos distintos, um maior em relação ao prazo inicial do contrato e um outro menor que teria a ver com as renovações, o mais razoável, parece-nos,senão for aplicável a regra do arrendamento para habitação já referida, será considerar-se um pré-aviso de 6 meses e não de 12 como pretende o Recorrido.
27. Aliás o próprio Recorrido estava convicto que o Recorrente teria de dar 6 meses de pré-aviso, pois essa seria a vontade de ambos quando assinaram o contrato de arrendamento.
28. Foi admitido pelo recorrido que discutiu a questão do prazo com o legal representante da recorrente pois um entendia ser o pré-aviso de 120 dias e outro de 6 meses. A exigência de 12 meses terá surgido apenas depois de o recorrido ter consultado alguém…
29. Conforme decorre do acórdão da relação de Lisboa in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/706070ADCD557E9A80257FFB0066ACD8
30.O acórdão que sustenta a posição do tribunal a quo, versa sobre uma situação na qual as partes apenas fixaram o prazo de duração do contrato e nada mais, ora, nesse caso, nos parece, que de facto, terá de sobrepor-se a norma contida no 1110.º n.º 2 do C. Civil, o que não acontece no caso concreto.
31. Pelo que mal andou o tribunal ao condenar os recorrentes no pagamento da quantia de 10.000,00€ de pré-aviso em falta, violando assim o estabelecido nos artigos 1098.º n.º 3, 1110.º n.º 1 e 2 do C. Civil, devendo pois absolver-se a Recorrida nesta parte ou caso assim não se entenda condenando-a a pagar apenas os 2 meses de pré aviso em falta, para completar os 6 meses que o contrato previa.
32.O Tribunal a quo limitou-se a dizer que tendo em conta os danos elencado no ponto 8 dos factos provados, se concluiu que a Recorrida não fez bom uso e prudente do locado.
33. Ora é entendimento generalizado, na doutrina e na jurisprudência, que há que distinguir com bom senso o que é desgaste inerente à utilização considerando o fim ao qual se destina o locado e mau uso do mesmo. Acórdão da Relação de Lisboa de 19.10.2006, em dgsi.pt
34.A acrescer que nos parece que não foi de todo provado nos autos, tendo em conta o período de tempo decorrido entre a entrega e a peritagem, que os danos elencados no relatório pericial foram todos causados pela recorrente e por má utilização do locado, nem se o recorrido provou que tipo de descuidos ou mau uso teve a recorrente que geraram os danos e a obrigação de indemnizar o recorrido por esses mesmos danos.
35. Além do mais, relativamente ao estado do imóvel aquando da ocupação pela recorrente, o que resultou provado é que o imóvel já era velho, tinha vários danos, uns causados pelo arrendatário anterior e outros que já existiam.
36. Ou seja, não nos parece que a recorrente possa ser condenada em todas as reparações como foi, como se o arrendado estivesse em bom estado de conservação.
37. Fez-se prova bastante que quando a recorrente ocupou o locado o mesmo se tratava de um edifício já bastante antigo, com cerca de trinta anos, que fora objecto de umas obras de “embelezamento” (para obtenção de licença de utilização) por parte de um inquilino anterior.
38. Referiu a testemunha F. que adaptou o edifício que já era velho e que mesmo com essas ditas obras, havia muita coisa em mau estado. (Gravação do dia 29-04-2019. Das 15:05:00 às 15.42)
39. Sendo ainda facto provado que grande parte das anomalias foram causadas por si para adaptação do locado à actividade que se propunha exercer.
40.E, se por um lado, o tribunal a quo, aceitou que uns danos não são imputáveis aos recorrentes porque causados por terceiros, por outro lado, admite que há danos causados por terceiros, mas que os recorrentes têm de pagar porque resultam da retirada dos equipamentos e estantes, adquiridos ao inquilino anterior. O que nos parece contraditório.
41. Se atendermos ao contrato de arrendamento firmado entre as partes, o mesmo não obriga, em qualquer uma das cláusulas que os RR tivessem de repor o arrendado no estado anterior ás obras de adaptação, que nem por si foram realizadas, e nem a lei obriga a que um terceiro proceda à reparação de danos que não foram por si causados.
42. Acresce que, salvo devido respeito, as obras de adaptação do locado, não podem ser consideradas anomalias, muito menos quando foram autorizadas pelo senhorio, a um inquilino anterior, e sem obrigação de reposição.
43.E com todo o respeito, não se compreende como há anomalias das quais a recorrente foi absolvida de suportar o custo de reparação, nomeadamente o vidro partido, o desgaste do pavimento, e a porta danificada, por não terem sido causadas por si, mas por outro lado é condenada noutras reparações de obras de adaptação que não foram causadas por si, mas porque comprou os equipamentos já recai sobre si a reparação. Nada disso foi assumido contratualmente.
44.O que nos parece abusivo é a recorrente ter de pagar reparações de algo que não foi por si causado e que em momento algum assumiu reparar, só porque adquiriu os equipamentos.
45. Parece-nos que, salvo devido respeito por melhor opinião, que a condenação na reparação dos furos dos equipamentos e estantes, resultantes da sua retirada, porque a Recorrente os adquiriu, não tem qualquer enquadramento legal, porque não foi a Recorrente que os executou e porque resultaram das obras de adaptação do locado, o mesmo sucedendo com os furos no pavimento da retirada de elevador, assim como a execução de pintura da fachada principal e na parede da fachada no tardoz do armazém de peças, a reparação dos furos nas paredes, interiores e exteriores e nas chapas e a respectiva pintura.
46. Além do mais a degradação da pintura, é tida como desgaste normal (mais ainda numa oficina de reparação de automóveis) decorrente da utilização (considerando inclusivamente a fundamentação que o tribunal a quo utilizou, citando entendimento jurisprudencial nesse sentido).
47. O recorrido não mexeu no imóvel durante anos, não realizou quaisquer obras de conservação, além, das que o próprio admitiu, o piso em mosaico e a colocação de gravilha e cimento no logradouro em terra, e isso resultou provado pelo depoimento das várias testemunhas, F. (Gravação do dia 29-04-2019, das 15:05:00 às 15.42 e L. do dia 29.04.2019 das 14.01 às 14.42 e das 14.46 às 15.02).
48. Cumpre dizer que o próprio recorrido declarou que já as portas estavam em mau estado de conservação e o piso plástico estava também bastante mau, mas que na vistoria “não pegaram por causa disso”, o que já ilustra a realidade do estado do imóvel. (gravação do dia 29.04.2016 das 10.30 às 12.30)
49. A recorrente obrigou-se a entregar o locado em “o bom estado de conservação, tal como actualmente se encontra”, e este “bom estado de conservação” resultou provado incluía furos nas paredes, um vidro partido, uma porta danificada, desgaste no pavimento de manta (danos que a recorrente foi absolvida de pagar), ora estes factos, desde logo indiciam o mau estado em que o arrendado se encontrava já à data do arrendamento pelo primeiro inquilino (F.), o que se agravou quando a recorrente o ocupou, o que foi referido por todas as testemunhas.
50.E com o passar do tempo obviamente iriam degradar ainda mais, sem qualquer tipo de conservação ordinária, o que se verificou.
51. Sendo que, quando o locado foi ocupado pela recorrente se mantiveram os problemas com o piso interior que se partia muito.
52. Tendo resultado provado que em determinada altura foi colocado um mosaico no chão, cujo custo foi pago em parte pela recorrente.
53.O próprio (recorrido) admitiu que uma coisa era laborar no local uma fabriqueta (que foi explorada no locado pelo recorrido uns anos antes) onde só circulava pessoal e outra era circularem carros e camiões e carrinhos com rodinhas pequeninas e o piso abatia. gravação do dia 29.04.2016 das 10.30 às 12.30)
54. Acresce que, relativamente ao mosaico interior, aquilo que resultou provado é que se encontra danificado, não tendo sido feita prova do tipo de dano.
55. Ora, para se aferir se se trata de dano decorrente de má utilização ou desgaste normal é preciso apurar tal facto.
56. Em suma, o local, já desde o início não tinha as condições necessárias para funcionar como oficina, já se encontrava bastante deteriorado e foram feitos uns arranjos que permitiram o licenciamento, porém com o uso normal inerente a uma oficina de reparação de automóveis o espaço acabou por deteriorar ainda mais.
57.O piso exterior, nomeadamente a rampa de acesso ao locado figura 1 do relatório pericial, confronta com o caminho público, sem qualquer portão ou barreira, onde circulam diariamente uma série de veículos, que pisavam e pisam aquela rampa, largando lixo e detritos, deteriorando-a.
58. Aliás, inclusive, veículos estranhos á oficina passavam ali por cima, estacionavam, paravam ali, pelo que, o R., entende não lhe pode ser imputado o desgaste e reparação do mesmo e nem responsabilizado pelo entupimento da grelha de drenagem, quando além do mais é percetível que se trata de dano decorrente de passagem de veículos.
59. Quanto ao piso do logradouro figura 5 do relatório pericial, em cimento, tem desgaste natural, resultante do uso normal, considerando o fim a que se destinava o locado, ali estacionavam-se veículos para reparação, que entravam e saíam, sendo um piso com cerca de 10 anos, que era em terra batida e foi colocada gravilha e cimento por cima, era normal que fosse abrindo fendas e partindo.
60. Acresce que, a própria perita, nos esclarecimentos escritos que prestou aquando da produção antecipada de prova admitiu que os danos no piso exterior e rampa de acesso à oficina poderão também ter como causa a circulação e manobras de veículos.
61. Nós diremos, salvo devido respeito, que não se vislumbra outra causa para o desgaste desse pavimento que não a circulação de veículos e aliás isso foi referido pelas testemunhas que depuseram. Aliás a testemunha L. disse que nesta zona também andavam a fazer “remendos” porque o piso se ia partindo.
62. Pelas fotografias juntas aos autos se percebe que o pavimento rachou/partiu em toda a extensão,poiserautilizado para colocação e lavagem de veículos.
63. Relativamente à caixa do contador de energia, pese a insistência de que se trata de dano decorrente de mau uso, é sendo comum que estas caixas com o passar dos anos enferrujam e as portas podem desencaixar e cair.
64. De todo o modo, a testemunha L. referiu que só quando falhava a luz mexiam nessa caixa que, estava já velha e ferrugenta.
65.A testemunha L. referiu que quando o piso foi substituído de alcatifas para mosaico o lavatório preso com cordel foi retirado e depois foi apenas colocado em cima da base mas de forma pouco segura, que depois acabou por cair e os próprios prenderam com o cordel por causa dos tubos, mas que nunca foi reparado porque não era utilizado.
66.O portão de acesso exterior não foi danificado pela Recorrente, aliás quando o mesmo foi danificado, a Ré já nem ocupava o locado, e isso resultou provado, já tinha entregue as chaves.
67.O Recorrido confirmou que o portão foi danificado muito depois de lhe ter sido entregue o arrendado, porém foi o Réu condenado a pagar o valor da sua reparação.
68.A chapa na zona do exaustor não foi o R. que a colocou, conforme declarou e não foi feita prova de que tenha sido.
69. Relativamente aos tubos em PVC, figura 16 foi referido pelas testemunhas que estavam mal colocados desde o tempo de inquilino anterior, conforme acima já se referiu e que quando chovia caiam e a recorrente e funcionários iam colocados no local pois caso contrário a água entrava dentro da oficia, no mais mantemos o alegado de que nenhuma prova foi feita de que terá sido o recorrente a retirá-los pois apenas um ano depois foi feito o relatório pericial.
70.A recorrente negou que tivesse danificado a chaminé da estufa de pintura, e o recorrido não fez prova de que tenha sido, basta até ver pelas fotografias da placa de cobertura cheia de ramos de árvores, figura 19 do relatório, caídos em cima dessa mesma chaminé para se concluir que muito provavelmente terá sido a queda dos mesmos que a danificou.
71. Os cabos que a Recorrida admitiu ter retirado, referiam-se exclusivamente ao detetor de incêndios que da mesma forma que foi por si colocado, foi retirado, o locado ficou com a instalação eléctrica a funcionar, como aliás foi confirmado pelo funcionário da recorrida L. e considerando o tempo que decorreu entre a entrega e o relatório pericial, pode ter sido danificado por terceiros e não foi feita prova que tenha sido a Recorrente.
72. Não se sabe quem entrou e saiu do imóvel entre a entrega das chaves em fevereiro de 2016 e o relatório pericial em Março de 2017, pois que a partir daí a responsabilidade ficou a cargo do recorrido.
73. Aliás até para serem retirados os veículos que, entretanto, se mantiveram no logradouro foi contactado o recorrido para permitir o acesso.
74.O forro em chapa ondulada, bem como a chapa ondulada na guarda do varandim pertencem do Réu,foram por si colocadas, tais como as sinaléticas e os candeeiros exteriores que os colocou e retirou quando saiu, o relatório indica que foram retirados, mas o recorrido não fez prova que lhe pertenciam!
75. Relativamente aos danos indicados nas figuras 11,12, 13,17, 20, 22, 24, 26, 28, 31,32 do relatório pericial (furos nas paredes e chapa, danos no pavimento, aberturas feitas na parede), são o resultado das obras de adaptação consentidas pelo recorrente ao primeiro inquilino F. já existiam à data que o Recorrente passou a ocupar o locado e não resulta do contrato qualquer obrigação de reposição.
76. Neste sentido vai o Acórdão de Coimbra 27.04.2004 em dgsi.pt
77. Cremos, salvo devido respeito que dos autos não resulta prova bastante que possa resultar na condenação da recorrente a pagar as reparações indicadas.
78. Além do mais deveriam ter sido concretizado o estado do imóvel à data da entrega, a prova que se fez é que já era mau, depois, quais os danos decorrentes da utilização normal, quais os danos decorrentes da falta de conservação, quais os danos resultantes de mau uso e, nomeadamente qual o uso indevido que foi dado ao locado e que resultou em danos indemnizáveis.
79. Além disso deveriam ter sido discriminados por parcelas os custos de reparação de todos os danos, a fim de se poder aferir separadamente quais os que devem ser imputados à recorrente.
80. Parece-nos ainda que o tribunal deveria ter fundamentado quais os meios de prova que levaram a considerar os danos indicados no ponto 8 dos factos provados como decorrentes de mau uso do locado, o que, nos parece não ser suficiente com afirmação de que chegou a essa conclusão considerando o tipo de danos verificados.
81. Acórdão da Relação do Porto de 09.12.2004 em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/ef2957d7d9a 4f0fc80256f8d004cc6cd?OpenDocument

Termos em que e nos demais que V. Exc.as Doutamente suprirão deverá a sentença de que se recorre ser revogada e substituída por outra que:

a) Dê como provado que o Recorrido aceitou a entrega do imóvel no estado em que o mesmo se encontrava tendo prescindido do pagamento de quaisquer montantes a título de rendas e em consequência absolvendo-se a recorrente do pedido.

Caso assim não se entenda

b) Deverá ser alterada a matéria de facto dada como provada e dar-se como provado que à data de entrega do imóvel o mesmo apresentava apenas os seguintes danos elencados no ponto 8 da sentença de que se recorre:

1) na parede da fachada principal, os locais onde foram retiradas as placas publicitárias encontravam-se deteriorados e com os parafusos de fixação dos referidos elementos;
2) as paredes de fachada no tardoz do armazém de peças, apresentavam danos provocados por aberturas para montagem de exaustor e 47 furos circulares que atravessavam toda a espessura das paredes;
3) ao nível do interior: i- na oficina mecânica encontravam-se vários mosaicos danificados e um vidro martelado de uma janela partido;
4) - no hall da oficina existiam danos no pavimento e nas paredes, com material que ficou da fixação de elementos na parede;
5) no armazém de peças, a parede exterior da fachada do tardoz encontrava-se furada, o pavimento danificado, bem como a porta interior e respectiva guarnição;
6) na recepção, no hall das instalações sanitárias e no bar de apoio, o pavimento em manta de plástico encontrava-se danificado e as paredes com furos;
7) no entre piso/armazém, tinham sido retirados o forro em chapa ondulada, sob o pavimento do entre piso e a chapa ondulada existente na guarda do varandim, com 1,10m de altura; e o soalho do pavimento encontrava-se com muitas manchas de óleo;
8) a chapa ondulada da fachada da oficina de pintura encontrava-se furada;
9) o lavatório na instalação sanitária do andar encontrava-se danificado;
10)todos os equipamentos correspondentes à sinalética interior exigidos no licenciamento da instalação e que lá se encontravam aquando do início do contrato tinham sido retirados;
11)Quando o imóvel foi ocupado pela ré, o vidro aludido em 8.d)i já se encontrava partido.
12) E o piso da oficina era em cimento e encontrava-se em mau estado de conservação.
13) A solicitação da ré foi colocado mosaico, tendo a ré suportado o custo da mão-de-obra e o autor o custo do material.
14)O pavimento em manta de plástico aplicado na recepção, no hall das instalações sanitárias e no bar de apoio é um tipo de material fraco e de desgaste rápido e já se encontrava degradado quanto a ré ocupou o espaço.
15)Os furos na parede exterior do armazém de peças foram realizados por um arrendatário anterior para fixação de equipamentos afectos à actividade ali desenvolvida.
16)O arrendatário anterior já havia danificado e retirado a porta aludido em 8.d)iii.
17) A ré adquiriu os equipamentos e bens existentes no locado a A. G., o qual, por sua vez, os tinha adquirido ao arrendatário anterior antes de ter sublocado o imóvel.
18) Sendo que o custo da reparação do vidro ascende a € 100,00, do pavimento em manta de plástico a € 250,00, e dos furos aludidos em 14. a € 110 e da porta a € 420,00.
c) Dando-se, depois, como provado, que à data do relatório pericial o locado apresentava ainda os seguintes danos:
xii- a grelha de drenagem da caleira, na separação da via pública com a rampa de acesso encontrava-se entupida com detritos, não permitindo o funcionamento para o que foi concebida;
xiii- ao nível do logradouro / parque exterior:
xiv- a grelha de drenagem da caleira, na separação da via pública com a propriedade privada, alinhada pelo portão de correr de acesso ao logradouro, encontrava-se entupida com detritos, não permitindo o funcionamento para o qual foi concebida;
xv- a área de logradouro encontrava-se com materiais destinados a vazadouro;
xvi- no pavimento exterior localizado no tardoz do armazém de peças encontrava-se com demasiado material depositado, tendo obstruído o tubo de saída das águas pluviais;
xvii- c) ao nível da fachada:
xviii- a chaminé da estufa foi deixada pendurada na fachada do tardoz da oficina de pintura, sem fixações e descaída na fachada
xix- na fachada de tardoz da oficina de pintura, o local do exaustor tinha sido substituído por uma chapa desadequada, a qual permite a entrada de água para o interior;
xx- na fachada lateral esquerda da oficina de pintura, faltavam dois tubos de queda em PVC e outro, junto ao portão, encontrava-se danificado;
xxi- as caleiras da cobertura encontravam-se obstruídas, deixando transbordar água para o interior da oficina de pintura;
xxii- a instalação eléctrica encontrava-se danificada, apresentando cabos cortados, circuitos interrompidos e falta de aparelhagem.
d) Mais deverá dar-se como provado que os danos no mosaico interior, nas paredes e as manchas de óleo são decorrentes do uso normal do arrendado para o fim a que destinava.
e) Mais deverá dar-se como não provado que os danos elencados em 1,2,7, 8 a 10 sejam decorrentes de mau uso e dar-se como provado que resultam das obras de adaptação do locado à actividade ali desenvolvida e consentidas pelo Recorrido ao arrendatário anterior, sem obrigação de reposição pela recorrente.
f) Deverá dar-se como não provado que a recorrida provocou os danos elencados em XII, XIV, XV, XVI, XVIII, XIX, XX e XXII, por não ter sido produzida prova nesse sentido.
g) De resto, cremos que deveria ainda ser ampliada a matéria de facto no sentido de se discriminar individualmente o respectivo custo de reparação dos danos, bem como o custo da limpeza do locado, a fim de se poder apurar com rigor e exactidão qual o valor a suportar pela recorrente na medida da responsabilidade que lhe for atribuída, considerando os pedidos em d) e) f) supra, revogando-se assim a condenação da recorrida C. L. unipessoal Lda no pagamento de 12.720,00€ acrescidos de IVA e juros de mora.
h) Sem prejuízo do que supra se requer, sempre deverá a decisão ser revogada na parte em que condena os recorrentes a pagar a quantia de 10.000,00€ (dez mil euros) a título de pré-aviso em falta.
Assim se fazendo inteira e costumada justiça!
*
O A./Recorrido J. G. respondeu aos recursos pugnando pela sua procedência e apresentou recurso subordinado em que formulou as seguintes conclusões:

1. Os 2.º e 3.º R declararam no contrato de arrendamento por eles celebrado que se constituíam também fiadores e principais pagadores da locatária, da qual era sócios e gerentes, e que com ela ficavam solidariamente responsáveis para com o locador por todas as obrigações que a locatária contraiu naquele contrato, mais declarando que renunciavam expressamente ao beneficio da excussão ou outra excepções ou restrições, obrigando-se a pagar as quantias que possam ser devidas pela dita firma ao arrendatário, pagamento que farão de forma imediata após simples recepção da comunicação do primeiro contraente de que declare que a locatária não cumpriu as obrigações contratuais que aqui assumiu e para cuja execução a garantia é prestada.
2. “Uma coisa é oobjeto do negócio, máxime da fiança, ser indeterminável, o que não é consentido por lei, que fulmina essa indeterminação com a nulidade do negócio, e outa, bem diversa,éo objeto do negócio ser indeterminado no momento da sua celebração, designadamente, quando é prestada a fiança, mas ser determinável.
3. Constando expressamente do contrato, entre o demais, que constituíam obrigações da locatária efectuar o pagamento das rendas iam do contrato e, sob pena de indemnização, conservar o locado em bom estado, tal como estava naquela data e assim o entregar ao locador, os fiadores são responsáveis pelo pagamento das rendas em falta e pela obrigação de entregar o valor dos estragos que se apuraram judicialmente, em acção intentada contra a devedora e os fiadores.
4. Não concorre sequer para hipotizar a nulidade da fiança o facto do contrato ser renovável, pois esse facto não conduz à sua perpetuidade, já que o fiador, cumprido o condicionalismo do art.º 654º do CC, poderá libertar-se da garantia prestada.
5. A douta sentença violou o artigo 400º, 634º e 654º do Código Civil.

Termos em que, sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao recursos interpostos pelo apelante A. S. e ao recurso interposto pelos apelantes C. L., L.da e C. L., concedendo-se provimento ao recurso subordinado, tudo para que se faça JUSTIÇA!
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Os recursos foram recebidos como de apelação, com subida imediata e efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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III-O Direito

Como resulta do disposto nos arts. 608.º, nº. 2, ex vi do artº. 663.º, n.º 2, 635.º, nº. 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre decidir sobre a impugnação da matéria de facto, da inaplicabilidade do n.º 2 do art.º 1101.º do Código Civil, da extinção ou invalidade da fiança, do abuso de direito.
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Fundamentação de facto

Factos Provados

1. Na Conservatória do Registo Predial de …, encontra-se descrito sob o nº …/20060418, o prédio urbano composto por edifício amplo de rés-do-chão com logradouro, sito no Lugar de ..., freguesias de ..., concelho de Ponte de Lima, e inscrito na matriz predial sob o artigo …, conforme certidão constante de fls. 15 a 15v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
2. A aquisição da propriedade de tal imóvel encontra-se inscrita a favor do autor, por dissolução, liquidação e partilha, através da apresentação 2 de 2008/08/28, conforme certidão constante de fls. 15 a 15v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
3. Por contrato escrito, denominado “Contrato de arrendamento com prazo certo para fim não habitacional”, datado de 22.05.2009, o autor declarou dar de arrendamento à 1ª ré, então com a denominação social “A. S. & C. L. – Reparação de Automóveis, Lda” que declarou tomar de arrendamento, pelo prazo de cinco anos, com início em 1.06.2009, automaticamente renovável por iguais períodos de cinco anos, o prédio urbano supra aludido, para o exercício de actividades de oficina de reparação de automóveis e actividades congéneres, mediante o pagamento de uma renda mensal, no montante de €1.000,00, conforme documento de fls. 17 a 18 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
4. No referido contrato, entre o demais, as partes estipularam que:
“10ª - A segunda outorgante deverá, no fim do contrato, entregar ao primeiro outorgante a parte arrendada, em bom estado de conservação, como actualmente se encontra, e com todos os vidros, chaves, canalizações e instalação eléctrica funcionais, indemnizando o proprietário dos prejuízos que porventura possa haver.(…)
12ª – As obras de conservação e limpeza que se tornem necessárias, por virtude do uso que a segunda outorgante fizer do arrendamento ou de acidente que lhe possa ser imputado, serão por conta da mesma outorgante.(…)
14ª – São, ainda, da responsabilidade da arrendatária todas as obras que venham a ser exigidas pela lei e resultantes de imposições legais respeitantes ao funcionamento da actividade da mesma.
15ª – A inquilina obriga-se, também, sob pena de indemnização, a conservar em bom estado, como actualmente se encontram, as paredes e tecto do edifício, bem como todo o espaço envolvente.”
5. Através de carta datada de 3.11.2015, a 1ª ré comunicou ao autor a “denúncia do contrato” e que a mesma “produzirá efeitos no quarto mês, a partir da assinatura do aviso de recepção, dando cumprimento à antecedência mínima de cento e vinte dias, tal como estabelece a lei”, conforme documento constante de fls. 18v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
6. A 1ª ré procedeu ao pagamento da renda até ao mês de Janeiro de 1016.
7. Na sequência do acordado com o autor, a 1ª ré entregou as chaves do locado ao autor no fim do mês de Fevereiro de 2016.
8. Nessa data, o locado apresentava as seguintes anomalias:
a) ao nível da rampa exterior de entrada do pavilhão:
i- o massame de betão do piso da rampa exterior de acesso ao pavilhão encontrava-se partido;
ii- a grelha de drenagem da caleira, na separação da via pública com a rampa de acesso encontrava-se entupida com detritos, não permitindo o funcionamento para o que foi concebida;
iii- a caixa de válvulas de abastecimento de água inserida na rampa não tinha tampa, tinha muito lixo depositado e encontrava-se alterada, com preenchimento lateral, não permitindo o manuseamento da válvula de segurança, no sentido do fecho;
b) ao nível do logradouro / parque exterior:
i- a grelha de drenagem da caleira, na separação da via pública com a propriedade privada, alinhada pelo portão de correr de acesso ao logradouro, encontrava-se entupida com detritos, não permitindo o funcionamento para o qual foi concebida;
ii- o pavimento exterior encontrava-se partido;
iii- a área de logradouro encontrava-se com materiais destinados a vazadouro;
iii- no pavimento exterior localizado no tardoz do armazém de peças encontrava-se com demasiado material depositado, tendo obstruído o tubo de saída das águas pluviais;
c) ao nível da fachada:
i- a caixa do contador de energia localizado na fachada principal encontrava-se sem porta;
ii- os dois candeeiros de iluminação exteriores fixos na fachada do corpo central e no canto do pavilhão lateral esquerdo (oficina de pintura) tinham sido retirados do local;
iii- na parede da fachada principal, os locais onde foram retiradas as placas publicitárias encontravam-se deteriorados e com os parafusos de fixação dos referidos elementos;
iv- as paredes de fachada no tardoz do armazém de peças, apresentavam danos provocados por aberturas para montagem de exaustor e 47 furos circulares que atravessavam toda a espessura das paredes;
v- a chaminé da estufa foi deixada pendurada na fachada do tardoz da oficina de pintura, sem fixações e descaída na fachada;
vi- na fachada de tardoz da oficina de pintura, o local do exaustor tinha sido substituído por uma chapa desadequada, a qual permite a entrada de água para o interior;
vii- na fachada lateral esquerda da oficina de pintura, faltavam dois tubos de queda em PVC e outro, junto ao portão, encontrava-se danificado;
viii- as caleiras da cobertura encontravam-se obstruídas, deixando transbordar água para o interior da oficina de pintura;
d) ao nível do interior:
i- na oficina mecânica encontravam-se vários mosaicos danificados e um vidro martelado de uma janela partido;
ii- no hall da oficina existiam danos no pavimento e nas paredes, com material que ficou da fixação de elementos na parede;
iii- no armazém de peças, a parede exterior da fachada do tardoz encontrava-se furada, o pavimento danificado, bem como a porta interior e respectiva guarnição;
iv- na recepção, no hall das instalações sanitárias e no bar de apoio, o pavimento em manta de plástico encontrava-se danificado e as paredes com furos;
v- no entre piso/armazém, tinham sido retirados o forro em chapa ondulada, sob o pavimento do entre piso e a chapa ondulada existente na guarda do varandim, com 1,10m de altura; e o soalho do pavimento encontrava-se com muitas manchas de óleo;
vi- a chapa ondulada da fachada da oficina de pintura encontrava-se furada;
vii- o lavatório na instalação sanitária do andar encontrava-se danificado;
viii- todos os equipamentos correspondentes à sinalética interior exigidos no licenciamento da instalação e que lá se encontravam aquando do início do contrato tinham sido retirados; e
ix- a instalação eléctrica encontrava-se danificada, apresentando cabos cortados, circuitos interrompidos e falta de aparelhagem.
9. O custo necessário para a reparação de todo as anomalias elencados em 8. ascende ao valor total de € 13.490,00, mais IVA.
10. A ré já ocupava o locado desde 15.11.2007, tendo então celebrado com A. G. um contrato escrito denominado “Contrato de Sublocação, com prazo certo para fim não habitacional”, conforme documento de fls. 56 a 58 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
11. Quando o imóvel foi ocupado pela ré, o vidro aludido em 8.d)i já se encontrava partido.
12. E o piso da oficina era em cimento e encontrava-se em mau estado de conservação.
13. A solicitação da ré foi colocado mosaico, tendo a ré suportado o custo da mão-de-obra e o autor o custo do material.
14. O pavimento em manta de plástico aplicado na recepção, no hall das instalações sanitárias e no bar de apoio é um tipo de material fraco e de desgaste rápido e já se encontrava degradado quanto a ré ocupou o espaço.
15. Os furos na parede exterior do armazém de peças foram realizadas por um arrendatário anterior para fixação de equipamentos afectos à actividade ali desenvolvida.
16. O arrendatário anterior já havia danificado e retirado a porta aludido em 8.d)iii.
17. A ré adquiriu os equipamentos e bens existentes no locado a A. G., o qual, por sua vez, os tinha adquirido ao arrendatário anterior antes de ter sublocado o imóvel.
18. Sendo que o custo da reparação do vidro ascende a € 100,00, do pavimento em manta de plástico a € 250,00, e dos furos aludidos em 14. a € 110 e da porta a € 420,00.
19. O prédio urbano aludido em 1. tem um valor locativo não inferior a € 1.000,00.
20. O autor arrendou novamente o imóvel em 1.01.2018.
21. A situação descrita causou incómodos ao autor.
22. O autor remeteu a cada um dos réus uma carta datada de 2.06.2016, interpelando-os para procederem ao pagamento da quantia de € 10.000,00 referente ao período de aviso prévio em falta e da quantia de € 9.711,14, mais IVA para reparação do prédio, conforme documentos de fls. 32 a 40 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
23. Em resposta, o 3º réu remeteu ao autor a carta datada de 12.06.2016, cuja cópia se encontra a fls. 96v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
24. Por escritura pública de 31.03.2011, o 3º réu cedeu as quotas referentes à 1ª ré ao 2º réu e renunciou à gerência da 1ª ré, tendo o 2º réu alterado a 1ª ré para sociedade unipessoal, passando o 2º réu a ser o único gerente desta, conforme documento de fls. 76 a 77v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
25. A cessão de quotas e a renúncia à gerência foram registadas em 31.03.2011, conforme documento de fls. 73v a 75v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
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Factos Não Provados

a- que, na data em que foi entregue o locado, o portão estava danificado e o muro onde se localiza o fecho do portão estava danificado com as armaduras à vista;
b- que, o imóvel no estado em que se encontrava quando foi entregue não estava apto a ser arrendado;
c- que as partes consignaram no contrato que as fianças prestadas pelos 2º e 3ºs réus o eram exclusivamente na condição de sócios da 1ª ré;
d- que o autor aceitou a entrega do imóvel no estado e em que se encontrava e que a ré não teria que pagar mais nada a título de rendas.
e- que em 2011 foi comunicado ao autor que o 3º réu deixaria de ser sócio gerente da 1ª ré e que deixaria de ter responsabilidades relativamente aquele, o que este aceitou.
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Fundamentação de direito

Em relação aos recursos interpostos importa começar, em conformidade com o anteriormente exposto, pela apreciação da impugnação da matéria de facto apresentada, dado que sem a fixação definitiva dos factos provados e não provados não é possível extrair as pertinentes consequências à luz do direito aplicável.
Impugnando-se a matéria de facto exige-se aos recorrentes que especifiquem e concretizem os pontos que entendem mal julgados, bem assim os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, e que, por fim, indiquem a decisão alternativa proposta.
Nessa medida, há que ter em conta que, no domínio do nosso regime recursório cível, o meio impugnatório para um tribunal superior não visa propriamente um novo julgamento global ou latitudinário da causa, mas apenas uma reapreciação do julgamento proferido pelo tribunal a quo com vista a corrigir eventuais erros da decisão recorrida. Significa isto que a finalidade do recurso não é proferir um novo julgamento da acção, mas julgar a própria decisão recorrida.
Por outro lado, há que obstar a que apenas a visão da parte recorrente vingue, olvidando a demais prova produzida que aponte num outro sentido.
Acresce que, apesar do art.º 662.º, do mesmo diploma legal, permitir a este Tribunal julgar a matéria de facto, não permite a repetição do julgamento, tal como rejeita a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto (cfr. neste sentido António Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 3ª ed., 2016, Almedina).
Importa, no entanto, ter em conta, numa primeira linha, que o objecto precípuo de cognição por parte deste tribunal não é a coerência e racionalidade da fundamentação da decisão de facto, mas antes a apreciação e valoração da prova produzida, orientado para a detecção de qualquer erro de julgamento naquela decisão da matéria de facto, pelo que não bastará uma qualquer divergência na apreciação e valoração da prova para determinar a procedência da impugnação, sendo necessário constatar um erro de julgamento.
Importa, ainda, nesse sentido, considerar, antes de mais, que, sendo certo que a prova tem por função a demonstração da realidade dos factos (cfr. art.º 341º, do CC), tal demonstração não exige de todo uma convicção assente num juízo de certeza lógica, absoluta (Cfr. Prof. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 1984, págs. 420 e segs.).
É que, para o referido efeito, o que releva e é exigível é, tão só, que em função de critérios de razoabilidade essenciais à aplicação do Direito, o julgador forme uma convicção assente na certeza relativa do facto, ou, dito de um outro modo, psicologicamente adquira a convicção traduzida numa certeza subjectiva da realidade de um facto, existindo assim um alto grau de probabilidade (mas suficiente em razão das necessidades práticas da vida) da sua verificação.

Como refere Tomé Gomes, in “Um olhar sobre a demanda da verdade no processo civil”, in Revista do CEJ, 2005, nº 3, 158, o convencimento do julgador deve basear-se numa certeza relativa, histórico-empírica, dotada de um grau de probabilidade adequado às exigências práticas da vida, e sendo verdade que “p[P]ara a formação de tal convicção não basta um mero convencimento íntimo do foro subjectivo do Juiz“, basta porém para o referido efeito a formação de uma convicção“ suportada numa persuasão racional, segundo juízos de probabilidade séria, baseada no resultado da prova apreciado à luz das regras da experiência comum e atentas as particularidades do caso “.

In casu, o 3.ªRéu entende que o Tribunal Recorrido devia ter dado como provada a factualidade constante dos pontos c) e e), dados como não provados, e que encerram a seguinte matéria:

c- que as partes consignaram no contrato que as fianças prestadas pelos e 3ºs réus o eram exclusivamente na condição de sócios da ré;
e- que em 2011 foi comunicado ao autor que o réu deixaria de ser sócio gerente da e que deixaria de ter responsabilidades relativamente aquele, o que este aceitou.

Em relação ao ponto da al. c), aponta como prova para que a matéria aí vertida seja dada como provada, o teor do contrato de arrendamento na parte em que refere ter outorgado em legítima representação da sociedade A. S. & C. L. Reparação de Automóveis, Lda.”, como sócio-gerente e com essa finalidade e limite, pelo que, tendo, por escritura de 31 de Março de 2011, cedido as suas quotas referentes à 1ª Ré ao 2.º Réu, bem como tendo renunciado à gerência da 1ª Ré sociedade comercial, entende que deve ser ilibado de qualquer responsabilidade.
Quanto ao facto não provado em e), refere que o Autor tomou conhecimento que o 3.º Réu ora Recorrente havia deixado de ser sócio-gerente, tendo posteriormente aceitado que este não teria qualquer responsabilidade quanto ao pagamento de rendas.
Aduz, também, no sentido por si pretendido, que das declarações do Autor resulta que foi o 2.ºR. que enviou a carta de denúncia da Arrendatária e lhe entregou as chaves, tendo tomado conhecimento da saída do 3.ºRéu, por intermédio de um vizinho da oficina da ... arrendada e com ele falado sobre os danos no arrendado, já depois do contrato ter terminado, mais referindo que via esse demandado como um mero trabalhador do 2.º R.
Aponta, ainda, como prova da posição que defende, o teor do depoimento da testemunha J. B., trabalhador do 3.º Réu, na parte em que mencionou que o 3.º Réu A. S. saiu da anterior sociedade comercial da 1ª Ré entre 2013 e 2014, que o Autor terá ido à oficina do 3.º Réu há cerca de um ano ou dois anos e que, após ter recebido a carta do Tribunal/Advogado é que o 3.º Réu A. S. ligou com o Autor e que, em alta voz, ouviu-o dizer que não seria nada contra ele, mas apenas contra o 2.º R.
Ora, apesar de invocar, como elemento probatório, o conteúdo do próprio contrato, o certo é que o 3º R não põe em causa que tenha prestado fiança, dado que refere que “se constituiu fiador enquanto sócio-gerente da primeira R”.
Neste aspecto, como o refere o A./Recorrido, se poderia até ser pensável, ao abrigo do principio da liberdade contratual, que as partes pudessem limitar a fiança a uma condição – de manutenção da condição de sócio ou outra como “enquanto for casado com x” – a verdade é que, tal não tendo sido estipulado, a fiança tem como principal efeito dar ao credor a garantia de ter dois patrimónios autónomos que respondam pela sua dívida: o do devedor e o do fiador, acrescentando nós, sem condições ou limitações.
E outra interpretação parece não se poder retirar atento o teor da clausula 16ª do contrato de arrendamento aqui sob análise, onde se lê o seguinte: “Declaram os segundos outorgantes que, pelo presente contracto, se constituem também fiadores e principais pagadores da segunda contraente A. S. & C. L. reparação de Automóveis, Lda e com ele solidariamente responsáveis para com o segundo outorgante (há lapso evidente, pois quis-se dizer “primeiro” J. G., todos acima identificados, por todas as obrigações a que a referida firma A. S. & C. L. Reparação de automóveis, L.da contraiu pelo presente contracto, mais declarando que renunciam expressamente ao beneficio da excussão ou outra excepções ou restrições, obrigando-se a pagar as quantias que possam ser devidas pela dita firma ao arrendatário, pagamento que farão de forma imediata após simples recepção da comunicação do primeiro contraente de que declare que a segunda não cumpriu as obrigações contratuais que aqui assumiu e para cuja execução a garantia é prestada.”

Ora, como se sabe, a fiança constitui uma garantia especial das obrigações que tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor (art. 634º do Código Civil). Estatui o art. 628º do CC que a vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.
Dúvidas também não há que o recorrente apôs a sua assinatura no escrito, não negando ter-se constituído fiador da arrendatária, embora se e enquanto fosse sócio, como defende.
A circunstância de no texto do contrato apenas constar na 1ª folha como outorgantes o A. e a 1ª R., não impede que se considere que o contrato tem três outorgantes.
Isto porque tal é o que se torna possível aferir da interpretação do texto do contrato e o que qualquer declaratário normal colocado no lugar do real declaratário face aos termos do contrato o entenderia, ou seja, que se pretendeu celebrar dois contratos: um contrato de arrendamento e um contrato de fiança (cláusula 16.ª).
É que, atento o disposto no n.º 2 do art.º 236.º do CC, conhecendo o declaratário o sentido que o declarante pretendeu exprimir através da declaração é de acordo com essa vontade que vale a declaração emitida. Mas, mesmo que assim não se entendesse, atenta a redacção da referida cláusula 16.ª e coincidindo a assinatura do 3.ºR., enquanto representante da pessoa colectiva, com a da pessoa singular, uma vez que a assinatura aposta corresponde ao seu nome, qualquer declaratário normal colocado no lugar do real declaratário concluiria que o apelante ao apôr a sua assinatura no contrato quis vincular a 1ª R. enquanto seu legal representante, como arrendatária e a si próprio, como fiador da arrendatária.
Já quanto ao segundo ponto posto em causa, o recorrente alicerça a sua pretensão para dar este facto como provado nas declarações do próprio Autor e da testemunha J. B..
Ora, segundo a sua própria versão espelhada no ponto 16 da sua contestação, em 2011, o A teria comparecido no local e, nessa ocasião, o 3º R ter-lhe-ia comunicado que ele deixaria de ser sócio e não teria mais responsabilidades.
Como tal, o depoimento da referida testemunha não corrobora essa versão, na medida em que aponta ter ocorrido o dito telefonema em que é transmitida a aceitação da dita “desresponsabilização”, no ano 2015 ou de 2016.
O que, diga-se de passagem, não nos parece razoável, normal, nem plausível que a ter-se verificado a comunicação ao A. pelo 3.º R. da sua desvinculação à 1.ª Ré, aquele tivesse transmitido aceitar a desoneração do fiador, passados cerca de 4 a 5 anos.
De qualquer das formas, mesmo aceitando-se terem sido essas as declarações do A. e o depoimento prestado pela referida testemunha, o certo é que os mesmos em nada infirmam a convicção formada pelo tribunal a quo, que na valoração da prova concluiu que:“A prova produzida foi igualmente escassa ou nula quanto ao reconhecimento pelo Autor da desresponsabilização do R enquanto fiador, não se nos afigurando minimamente consistente e suportado o depoimento da testemunha J. B. a este respeito”.

Por outro lado, como é referido a este propósito, apenas é possível concluir-se que o A soube por um vizinho que o 3º R já “tinha saído” da 1º R, facto de que teve conhecimento um mês ou dois depois dessa saída ter ocorrido e que o mesmo, considerava o 3º R uma “excelente pessoa” e “um trabalhador” porque “o senhor C. L. é quem andava”, o que igualmente não permite concluir no sentido de dar a factualidade vertida na al. e), dos factos não provados, como provada.
Como tal, deve a matéria das als. c) e e), manter-se nos factos dados como não provados.
Por sua vez, a 1.ª e 2.ª RR. vieram defender não ter sido produzida qualquer prova no sentido de que na data de entrega do imóvel o mesmo apresentava todas as anomalias indicadas no ponto 8 da sentença e relatadas no relatório pericial e que só poderia ter sido dado como provado o estado do mesmo à data de realização do relatório pericial, exceptuando-se aqueles cuja prova se fez, serem pré-existentes e causados pelo anterior arrendatário, bem como aqueles que a própria recorrente admitiu, mas que entende serem decorrentes do desgaste, do uso normal.
Nesse sentido, considera que o Recorrido não tinha só de provar a existência dos danos, mas que os mesmos foram provocados pela recorrente e durante o período de ocupação do locado, o que não aconteceu.
Por outro lado, dizem que aquando da ocupação pela recorrente, o imóvel já era velho, tinha vários danos, uns causados pelo arrendatário anterior e outros que já existiam e que o recorrido aceitou o locado no estado em que se encontrava.

Assim, após inúmeras considerações, conjecturas e conclusões, concluem pedindo que a sentença seja revogada e substituída por outra que:

a) Dê como provado que o Recorrido aceitou a entrega do imóvel no estado em que o mesmo se encontrava tendo prescindido do pagamento de quaisquer montantes a título de rendas, absolvendo-se, em consequência, a recorrente do pedido.

Caso assim não se entenda

b) Seja alterada a matéria de facto dada como provada, dando-se como provado que à data de entrega do imóvel o mesmo apresentava apenas os danos elencados no ponto 8 da sentença que enumera.
c) Seja dado como provado, que à data do relatório pericial o locado apresentava os danos que especifica.
d) Seja dado como provado que os danos no mosaico interior, nas paredes e as manchas de óleo são decorrentes do uso normal do arrendado para o fim a que destinava.
e) Seja dado como não provado que os danos elencados em 1,2,7, 8 a 10 sejam decorrentes de mau uso e dar-se como provado que resultam das obras de adaptação do locado à actividade ali desenvolvida e consentidas pelo Recorrido ao arrendatário anterior, sem obrigação de reposição pela recorrente.
f) Seja dado como não provado que a recorrida provocou os danos elencados em XII, XIV, XV, XVI, XVIII, XIX, XX e XXII, por não ter sido produzida prova nesse sentido.
g) Seja ampliada a matéria de facto no sentido de se discriminar individualmente o respectivo custo de reparação dos danos, bem como o custo da limpeza do locado, a fim de se poder apurar com rigor e exactidão qual o valor a suportar pela recorrente na medida da responsabilidade que lhe for atribuída, considerando os pedidos em d) e) f) supra, revogando-se assim a condenação da recorrida C. L. unipessoal Lda no pagamento de 12.720,00€ acrescidos de IVA e juros de mora.
h) Sem prejuízo, seja revogada a decisão na parte em que condena os recorrentes a pagar a quantia de 10.000,00€ (dez mil euros) a título de pré-aviso em falta.

Ora, ao recorrente que impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto exige-se, como resulta da análise do aludido preceito, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, pags. 155-156, quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto que:

a) indique sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) especifique, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) indique com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos, relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia;
d) expresse, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente.

Das conclusões de recurso decorre que os recorrentes se limitam a formular um pedido de alteração “em bloco”, sem indicação concreta dos pontos de facto que pretendem ver alterados, no sentido de elencar cada ponto, provado e não provado, que deve corresponder cada um dos pedidos de alteração que formulam.
Como tal, não cumprindo esse ónus, que o legislador estabeleceu no art. 640.º do CPC, insusceptível de ser sanado, já que os despachos de convite ao aperfeiçoamento estão reservados apenas e só para os recursos sobre matéria de direito (art. 639.º, n.º 3 do CPC), impõe-se a rejeição, nessa parte, do recurso interposto, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, do C.P.C.
Pese embora este entendimento, importa, no entanto, salvaguardando outra posição, decifrar as bases em que assentam os recorrentes o seu recurso, por, no nosso entender, as mesmas se encontrarem inquinadas de erros.

Vejamos.

Não pondo em causa que os danos existiam – até porque a sua verificação, enumeração e descrição constam da perícia - a única coisa que os recorrentes tentam por em causa é que esses danos se verificassem aquando da data de entrega do imóvel.
Acontece que, como é possível colher-se das fotos juntas aos autos sobre os danos, devidamente conjugadas com o teor do relatório pericial, constata-se que o tipo de danos elencados têm evidente nexo causal com a actividade levada a cabo pela Ré.

Depois, segundo a valoração do próprio tribunal a quo relativamente às declarações do Autor, sem que exista qualquer motivo para descredibilizar a sua versão dos factos, é possível retirar-se que, na data da entrega das chaves do locado pelo 2.º R., este meteu-se no carro e foi-se embora, sem aguardar e acompanhar a verificação do estado do locado, tendo, nesse momento o A. verificado imediatamente que estava tudo destruído, não por uso, mas com tesouras ou com rebarbadoras, com todas as fichas e tomadas cortadas, para além de outros danos que especificou, apontando como suposta razão o facto do 2.º R, ter montado oficina noutro lugar e querer assegurar-se de que não lhe seria feita concorrência.

Já em relação à testemunha L., tal como se escreveu na sentença recorrida, a mesma deixou de trabalhar no local antes mesmo das máquinas e equipamentos terem sido desmontados, pelo que a grande parte dos danos não puderam ser percepcionados pelo mesmo, nomeadamente, os que resultam evidentes da retirada dos equipamentos, da sinalética e placas publicitárias.
De qualquer das formas, o facto é que, no momento da celebração do contrato, os recorrentes declararam expressamente que o arrendado estava “em bom estado de conservação” (cfr facto provado 4), resultando do doc. de fls. 105 e 106 dos autos, que o imóvel foi vistoriado em Fevereiro de 2009 e obtida a licença de utilização em Abril de 2009, a atestar que o imóvel estava apto para o fim de oficina de reparação de automóveis Igualmente se obrigou a arrendatária a entregar o locado no bom estado de conservação em que se encontra, com todos os vidros, chaves, canalizações e instalação eléctrica funcional, paredes, tecto, bem como todo o espaço envolvente, sob pena de indemnizar o proprietários dos prejuízos causados (cfr. cl.ª 10.º, 11.º e 12.º, do contrato celebrado pelas partes).
Ora, constitui uma das obrigações do locatário não fazer da coisa locada uma utilização imprudente (art.º 1038.º, al. d), do Código Civil).
Também nos termos do art.º 1044.º, do mesmo diploma, o locatário responde, em princípio, pela perda ou deteriorações da coisa.
Da conjugação das referidas normas legais, resulta que o arrendatário é responsável pelas despesas necessárias à manutenção e restituição do prédio no estado em que o recebeu, ressalvadas as “deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato” e as pequenas deteriorações que se tornam necessárias, devendo, no entanto, repará-las antes da restituição do prédio, só assim não será quando as deteriorações resultarem de pura vetustez ou desgaste pelo decurso do tempo.
Assim, dada a obrigação do arrendatário de entregar o locado no estado de conservação em que o recebeu do locador no início do contrato, e tendo efectuado tal restituição com deteriorações, a ele compete alegar e provar que as mesmas não procedem de culpa sua, sob pena de por elas ser responsável.
Como tal, tendo o A. feito a prova que lhe competia, ou seja, os danos decorrentes do facto da 1.ª Ré não ter procedido à entrega do imóvel no estado em que o recebeu, como se obrigara, sem que os RR. tivessem logrado demonstrar o contrário ou a razão imperiosa para que assim não fosse, nenhuma censura merece a sentença recorrida nos termos em que foi proferida, tanto mais que as obras de conservação e limpeza incumbia ao arrendatário.
Mantendo-se os factos, provados e não provados, cumpre agora decidir sobre a invocada inaplicabilidade do n.º 2, do art. 1110.º, do Cód. Civil, defendida pelos RR./Recorrentes.
Na sentença proferida considerou-se que “nada estando previsto no contrato, como acontece na situação dos autos (só se prevê o prazo de denúncia para os primeiros cinco anos), nos termos do referido n.º 2 do art.º 1110.º CC, a arrendatária só poderia denunciar o contrato de arrendamento não habitacional com uma antecedência igual ou superior a um ano sobre o termo pretendido do contrato”.
Vejamos, pois, qual a situação e regime que deve ser aplicado, tendo em conta que os RR./Recorrentes entendem que, tendo as partes fixado prazo de duração, denúncia e oposição, não será de aplicar o preceituado no n.º 2, do art. 1110.º, como se as partes nada tivessem estipulado.
Assim, consideram ser de aplicar, no caso omisso, as regras do arrendamento para habitação, nomeadamente o prazo de denúncia previsto no art. 1098.º, n.º 3, al. d), do Cód. Civil, conforme remissão do art. 1110.º, n.º 1, dado que o seu n.º 2, apenas prevê um caso específico de falta de estipulação de prazo no contrato apenas durante o prazo inicial e não das suas renovações.

Para o efeito, há que ter em conta a matéria de facto provada no ponto 3, que dá como reproduzido o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, do qual é possível extrair que:

- quanto ao prazo de vigência, na cl.ª 4ª, estipulou-se que o contrato é celebrado pelo prezo de 5 anos, com início em 1 de Junho de 2009 e termo no último dia do mês de Maio de 2014 e que, findo esse prazo e não havendo oposição de qualquer das partes, o contrato se renova automaticamente por iguais períodos de 5 anos;
- quanto ao prazo de oposição à renovação, na cl.ª 5.ª, refere-se que tanto o senhorio como o inquilino poderão opor-se às renovações referidas na cláusula anterior, desde que o comuniquem à outra parte com uma antecedência mínima de seis meses em relação ao termo do contrato ou das suas renovações;
- quanto ao prazo de denúncia por parte do arrendatário, estipulou-se na cl.ª 6.ª que durante o prazo inicial do contrato, o arrendatário poderá denunciá-lo a todo o tempo desde que o faça com uma antecedência de doze meses.

Tal como se referiu na sentença recorrida, tendo o contrato sido celebrado em 2009, o mesmo sujeita-se já ao NRAU e, porque a cessação de que nos ocupamos ocorreu em 2016, o regime aplicável é o resultante das alterações introduzidas pela Lei 31/2012.

Assim, o artigo 1110.º do Código Civil, na referida redacção introduzida pela Lei 31/2012, de 14 de Agosto, estatui nos seus n.º 1 e 2, respectivamente, que:

- As regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação;
- Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de cinco anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano.

Desde logo, como resulta do texto legal, a previsão do n.º 2, do art.º 1110.º do C. Civil, não abrange apenas os casos em que as partes não previram a duração do contrato de arrendamento, já que aí apenas se refere a “falta de estipulação”.
Pois, o facto é que, não obstante se estabelecer um prazo de 5 anos de duração para o contrato, a verdade é que ele é omisso quanto à sua denúncia, pelo que é de aplicar, quanto à denúncia, o prazo supletivo indicado no n.º 2, do art.º 1110.º.
Aliás, não faria sentido que o legislador fixasse esse prazo mínimo (um ano), no caso de ausência apenas para a fixação de prazo de duração do contrato, e admitisse simultaneamente a aplicação do n.º 2 (ou 3 e 5, conforme a versão aplicável) do art.º 1098.º do C. Civil, por tal conduzir a uma ilogicidade do sistema jurídico e incompreensível desigualdade de soluções jurídicas.
Neste sentido, consideramos ser de acolher a orientação perfilhada pela 1.ª instância, por mais conforme com a letra e o espírito da lei, segundo a qual o n.º2 do art.º 1110.º do C. Civil, ao estabelecer a antecedência mínima de 1 ano para a denúncia por parte do arrendatário, nos contratos de arrendamento para fins não habitacionais, é aplicável quer as partes hajam fixado expressamente prazo de duração do contrato, mas nada disseram quanto à denúncia, quer nos casos em as partes não fixaram qualquer prazo de duração do contrato.
Aliás, foi esse o caminho seguido pelo tribunal da Relação do Porto, no seu Acórdão de 29/01/2013, proferido no Proc. n.º 27/11.7TBPRD.P1, bem como pelo proferido no Proc. n.º 1477/12.7TJPRT.P1, a 4/7/2013, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, onde se refere que “no contrato de arrendamento urbano para fim não habitacional em que as partes estabelecem prazo certo de duração do contrato mas não estabelecem a antecedência mínima que o arrendatário tem de respeitar quando pretende denunciar o contrato dentro daquele prazo de duração, vigora o disposto no art. 1110.º nº 2 do Código Civil, sendo aquela antecedência mínima de 1 ano em relação ao termo pretendido para o contrato”.

Interpretação defendida igualmente pela Prof.ª Maria Ondina Garcia, in “Arrendamento Urbano Anotado”, Regime Substantivo e Processual, Maio de 2013, 2.ª Edição, pág. 84, onde sublinha que o prazo de denúncia previsto no n.º3 do art.º 1098.º não tem aplicação, por ser afastado pela disposição específica do n.º2 do art.º 1110.º, bem como pelo Prof. Menezes C. L., in “Arrendamento Urbano”, 5.ª ed., pág. 176 e nota 162.

Assim, no caso dos autos, não tendo as partes procedido a qualquer estipulação contratual em matéria de denúncia, devia o contrato ter sido denunciado com a antecedência mínima de 1 ano, tal como o decidiu a 1.ª Instância.

Quanto à questão de invalidade ou extinção da fiança invocada pelo 3.ºR. há que decidir tendo em conta não se ter dado como provada a factualidade constante dos pontos das als. c) e e) vertida na factualidade tida como não provada, o que afecta desde logo a base de que se serve esse recorrente para basear essa sua posição.

De qualquer das formas, para além da factualidade, refere-se no recurso que a fiança prestada na cláusula 16.ª do contrato de arrendamento, apenas tinha como limite temporal o prazo certo de 5 anos de 1 de Junho de 2009 a Maio de 2014, e que qualquer responsabilidade assumida por si no contrato de arrendamento, se extinguiu com a cessão de quotas e renúncia à gerência em 31 de Março de 2011.

Aduz-se, ainda, que é nula a fiança que, abrangendo obrigações futuras, se apresente indeterminada quanto ao tempo de duração máxima e também quanto ao montante máximo garantido, não sendo possível, da interpretação do clausulado contratual, determinar nem um e nem o outro, havendo sido utilizada uma fórmula generalista responsabilizadora «pelo integral cumprimento deste contrato», impossível de concretizar com recurso ao próprio contrato.
Analisemos, pois, a argumentação alegada.

Quanto a esta questão Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil, Direito das Obrigações, Garantias, p. 439, define a fiança como a situação na qual uma pessoa – o fiador – se obriga, perante o credor, a cumprir uma prestação devida por outra pessoa (o devedor principal), caso se verifiquem determinadas circunstâncias. Diz ainda o mesmo autor, que o “efeito garantia” resulta de, à prestação principal, se associar uma outra prestação, de tipo acessório: a do fiador.

A fiança implica, assim, a existência de um segundo património, o do fiador, entendido como terceiro face à obrigação principal, no sentido de responder conjuntamente com o património do devedor pelo pagamento da dívida. Por ser assim, como garantia do cumprimento da obrigação, o credor beneficia de dois patrimónios, em virtude de se conseguirem duas ordens de relações. Desta forma, há, portanto, um alargamento da massa de bens responsáveis.

A fiança de obrigações futuras é válida, como bem prescreve o n.º 2 do art.º 628º e o art.º 654º, ambos do CC. No entanto, esta modalidade de fiança serve justamente para que o credor, antes de conceder o crédito, apresentar-se melhor garantido para o pagamento da mesma. Diante disso, o fiador no momento da constituição da garantia fidejussória tem necessariamente de mostrar-se em condições de saber o que vai afiançar. Com esta configuração, desde logo sobressai o problema da determinabilidade da prestação à luz do art.º 280º do CC.

A esse respeito, como enfatiza Menezes Cordeiro, o n.º 1 do art.º 280º considera prontamente nulo o negócio cujo objecto seja indeterminável. Com efeito, não existem dúvidas sobre o alcance desta expressão: o objecto do negócio pode ser indeterminado; o que não pode ser é indeterminável. Neste alcance, acresce o autor, a diferença entre indeterminado e indeterminável está no seguinte: a prestação é indeterminada mas determinável quando não se tem a certeza com exactidão, num momento anterior, do seu conteúdo, embora se tenha fixado um dado critério para proceder à sua determinação. Por isso mesmo, a prestação é indeterminada e indeterminável quando não exista o menor critério para proceder à sua determinação, já que em qualquer circunstância há falta de individualização.

Sobre tal questão, Calvão da Silva, in Estudos de Direito Comercial (Pareceres) Coimbra, Almedina, 1996, p. 332, também se pronunciou e entende que a fiança de obrigação futura pode estender-se a obrigações decorrentes de certas relações de negócios desde que o objecto seja, ao menos, determinável no momento da celebração da garantia, o que acontecerá se os títulos dos quais surgiram tais obrigações estiverem determinados ou o modo de determinar tais títulos.

No Ac. Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2001, publicado no DR I Série – A, de 8 de Março de 2001, considerou-se ser “nula, por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha”. Anteriormente a este Ac. Uniformizador, muitas das decisões jurisprudenciais já iam no sentido de admitir que no momento da constituição da obrigação deve ser determinado o título donde a obrigação futura poderá ou deverá derivar, ou, pelo menos, saber-se como há-de ser o mesmo determinado (veja-se Ac. do STJ de 19 de Fevereiro de 1991, in ROA, ano 51, 1991, p. 525 ss., Ac. do STJ de 21 de Janeiro de 1993, in CJ, 1993, II, pp. 71-74, Ac. do STJ de 11 de Maio de 1993, in CJ, 1993, II, pp. 98-100), Ac. do STJ de 1 de Outubro de 1998, in www.dgsi.pt, e Ac. do STJ de 11 de Março de 1999, também in www.dgsi.pt).

A fiança ao alcançar todas as obrigações futuras do devedor deve estipular o título da qual elas derivam para se fazer valer ou, no mínimo, deve esclarecer como podem ser determinados; ou seja, o fiador deve conhecer logo de início os limites da obrigação fidejussória ou, ao menos, os critérios de fixação desses limites; caso contrário, não é sanável mesmo que os fiadores expressem e antecipadamente aceitem tal responsabilidade. Se assim não o fosse, seria um mundo praticamente infinito de direitos de crédito garantidos por fiança. No entanto, não se deixa de sublinhar que o problema da determinabilidade, tanto nas obrigações presentes como nas futuras, passa pela interpretação do contrato de fiança, mostrando-se necessário que se faça esse exercício para se concluir se o objecto é ou não determinável (Cfr., Vaz Serra, Anotação ao Ac. do STJ de 2 de Novembro de 1973, Revista de Legislação e Jurisprudência, p. 259; Vaz Serra, Fiança e Figuras Análogas, ob. cit., pp. 52 e 61).

Ora, actualmente tal como já analisado inicialmente, estabelece o n.º 2 do art.º 628º do CC que é admitida a constituição de fiança para garantir obrigações futuras. Por consequência, dispõe o art.º 654º do mesmo código, que sendo a fiança prestada para garantia de obrigação futura, tem o fiador, enquanto a obrigação não se constituir, a possibilidade de se liberar da garantia, se a situação patrimonial do devedor se agravar em termos de colocar em risco os seus eventuais direitos contra este mesmo devedor, ou se tiverem decorrido cinco anos sobre a prestação da fiança, quando outro prazo não resulte de convenção (veja-se jurisprudência neste sentido, Ac. da RC de 20 de Março de 2012; Ac. da RC de 8 de Novembro de 2016; Ac. da RG de 23 de Fevereiro de 2017).
Contudo, a liberação do fiador não opera de iure, pois nada obsta que este queira manter a garantia; pelo que, ao querer fazer uso do seu direito de liberação, deverá declará-lo ao credor, dentro de um prazo razoável após tomar conhecimento das circunstâncias que fundam tal direito (Cfr., Vaz Serra, Fiança e Figuras Análogas, ob. cit., p. 242).

Ora, in casu, encontra-se demonstrado, neste particular, que o segundo e o terceiro réus declararam que ficavam por fiadores e principais pagadores da contraente A. S. & C. L. – Reparação de Automóveis, Lda e com ele solidariamente responsáveis para com o outorgante J. G., por todas as obrigações a que a referida firma A. S. & C. L. – Reparação de Automóveis, Lda contraiu pelo presente contrato, mais declarando que renunciam expressamente ao benefício de excussão ou outras excepções e restrições, obrigando-se a pagar as quantias que possam a ser devidas pela firma ao arrendatário, pagamento que farão de forma imediata após a simples recepção da comunicação do primeiro contraente em que se declare que a segunda não cumpriu as obrigações contratuais que aqui assumiu e para cuja execução a garantia é prestada.

Importa a este respeito referir que, se a fiança se reportar a obrigações já constituídas, as mesmas estão, automaticamente, determinadas, sendo manifesto que esta garantia não pode ser nula, por indeterminabilidade do objecto, enquanto que, em relação aos débitos futuros do afiançado, ainda não constituídos, a fiança só será válida se, à data em que foi outorgada, se fixou e concretizou um critério objectivo que permita a identificação e a individualização dos débitos que hão-de surgir, os quais deverão dimanar de parâmetros objectivados que não coloquem o fiador à mercê da vontade subjectiva do credor ou de terceiro, não sendo, então, desde o início, determinadas, nem determináveis.

Revertendo à hipótese decidenda, importa reter que, tendo ficado os réus, pessoas singulares, como fiadores e principais pagadores da ré sociedade e, solidariamente, entre si e com ela se obrigaram perante o autor, em tudo quanto consta do presente contrato e suas renovações, renunciando a todo o benefício ou direito que, de qualquer modo, possa limitar, restringir ou anular esta obrigação, acabam por garantir tudo, quer as prestações periódicas mensais, quer todas as responsabilidades eventuais decorrentes de qualquer vicissitude da execução do contrato celebrado, isto é, as dívidas actuais e as futuras, as causais e as abstractas, sem qualquer limite temporal, sem título de proveniência ou critérios objectivos de determinação.

Assim sendo, tem, pois, de se considerar a fiança prestada válida, no que concerne às prestações periódicas mensais, determinadas no seu objecto, e a outra inquinada de nulidade, no que toca a diversas e eventuais obrigações futuras, de natureza indeterminada e indeterminável, como sejam as que contendem com os danos de carácter patrimonial, causados no prédio locado, ora reclamados pelo autor.

Pois, não assentando estes danos no pressuposto da determinabilidade da prestação, aquando da constituição da fiança, seria de impor que, pelo menos, fosse referido como seria determinado tais danos a verificarem-se, colocando, p. ex., um limite, um cálculo a realizar tendo por base o valor do locado, uma estimativa ou um outro critério o mais objectivo possível, porquanto, ao contrário, o objecto da fiança não será determinado, nem determinável, padecendo a respectiva garantia de nulidade, ao abrigo do disposto no art.º 208.º, n.º 1, do CC.

Acresce que o acórdão que é citado pela parte contrária para considerar mesmo quanto a tais danos a fiança válida, assenta noutras condicionantes que no caso não se verificam, como seja o facto do fiador continuar a manter a ligação à arrendatária e conhecer a situação verificada e todos os actos envolventes causadores do dano.

Já quanto à extinção da fiança pelas razões aduzidas, remete-se para o que supra já se expôs e agora é referido, de forma acrescida, quanto à necessidade de prévia comunicação para que o efeito pretendido se pudesse verificar, com a inerente possibilidade do credor poder exigir naquele momento o que fosse devido, pelo que tal não tendo ocorrido é de manter a fiança nos limites determinados pela decisão proferida que aqui se mantem, ficando, assim, também, prejudicado o recurso subordinado.

No tocante à questão respeitante ao abuso de direito, não se tendo provado que o autor aceitou a entrega do locado no estado que se encontrava e que não seria devida qualquer outra renda, nem muito menos tendo resultado demonstrado que o autor reconheceu perante o 3º réu não lhe ser nada devido por este, decaí, por si só, a sua procedência, por não verificados os factos em que se baseia a sua arguição.

Nestes termos, é de manter a decisão proferida, tendo, pois, os recursos de improceder.
*
V – Decisão

Pelo exposto, nos termos supra referidos, os Juízes da 2.ª Secção Cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar, os recursos interpostos improcedentes, mantendo, em consequência, o decidido.
Custas pelos recorrentes.
Registe e notifique.
*
Guimarães, 30 de Abril de 2020
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária e assinado electronicamente pelo colectivo dos infra indicados Juízes Desembargadores)

Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
Desembargador José Carlos Dias Cravo
Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida