Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | HELENA MELO | ||
| Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO RESOLUÇÃO SUBLOCATÁRIO | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 05/07/2020 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 1.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | .Para que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento, os comportamentos tipificados nas alíneas a) a e) do nº 2 do artº 1083º do CC, terão ainda de preencher a cláusula geral resolutiva prevista no seu nº 2. .A gravidade do incumprimento fundador do direito à resolução do contrato há-de aferir-se quer pela própria natureza da infracção,actuação/omissão substancialmente grave, quer pelas consequências ou efeitos que provoca e que tornam tal incumprimento grave, quer ainda pela reiteração da conduta violadora das obrigações assumidas que, por essa via, também é qualificável como grave, tudo de tal forma que não seja razoavelmente exigível à outra parte a manutenção do arrendamento. .À luz do paradigma da teoria da impressão do destinatário, no contrato de arrendamento, o declaratário corresponde à figura do homem médio, sem especiais conhecimentos jurídicos ou técnicos, tendo em consideração, em matéria de interpretação do contrato, o sentido que melhor corresponda à sua natureza e objecto, adoptando o sentido comum ou ordinário dos termos utilizados no texto do contrato. .O artº 1062º do CC ao estabelecer um limite ao valor que pode ser cobrado pelo locatário ao sublocatário, tem por base o princípio da boa fé, visando impedir que o locatário possa obter um enriquecimento à custa do património do locador que é quem tem o direito de colher os benefícios. . Não é, contudo, qualquer valor acima dos 20% que pode constituir fundamento do contrato de resolução, a tal se opondo o disposto no artº 1083º, nº 2 do CC. . No caso, considerando a área fruída pela locatária e pela sublocatária, a renda praticada, a partir de, pelo menos, Julho de 2013, representa mais do dobro da permitida pelo artº 1062º do CC que permite apenas que a renda paga pelo locatário seja em 20% superior ou proporcionalmente superior ao que é devido pelo contrato de locação. Mas desde a data da celebração do contrato de arrendamento, em 2011, que a renda convencionada excede manifestamente o limite estabelecido pelo artigo 1062º do CC. . Tendo em conta o excesso verificado e o número de anos pelos quais se vem mantendo, desde 2011, entende-se que a infracção praticada se integra na previsão do artº 1083º, nº 2 do CC, devendo, consequentemente, ser decretada a resolução do contrato de arrendamento. Não pode ser ordenada a entrega do locado no estado em que se encontrava em 29 de janeiro de 2007, uma vez que, entretanto foram realizadas obras que foram consideradas autorizadas, sem prejuízo do direito que assiste à R. de proceder ao levantamento de quaisquer benfeitorias voluntárias que haja efectuado no local, de acordo com o disposto na cláusula 13º do contrato de arrendamento. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I - Relatório M. R., intentou acção declarativa com processo comum contra PASTELARIA X & FILHOS, LDA, formulando os seguintes pedidos: - Seja declarado resolvido o contrato de arrendamento celebrado em 29 de Janeiro de 2007, entre Autora e Ré e respeitante ao rés-do-chão, destinado a estabelecimento comercial com todas as partes que o compõem ainda que não situadas exclusivamente ao nível do referido rés-do-chão, do prédio urbano sito na Rua dos ..., n.°s ..., em ...; - Seja a Autora condenada a restituir o locado à Autora nas condições em que lhe foi entregue em 29 de Janeiro de 2007, bem como no pagamento de todas as rendas vincendas até à sua efectiva entrega. Fundamenta tais pretensões nos seguintes argumentos: - A ré construiu divisória no interior do local arrendado e realizou obra na fachada sem previamente pedir autorização à autora, violando assim o preceituado no artigo 1074º, n.º 2 do Código Civil. - A ré realizou as obras sem a autorização da autora nem do Município, o que é fundamento de resolução do contrato de arrendamento ao abrigo do artigo 1083.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil. - A renda que a ré recebe do sublocatário é excessiva e atentatória do princípio da boa fé, comparando com a renda que ela própria paga à autora, violando o disposto no artigo 1062.º do Código Civil, o que constitui fundamento de resolução do contrato, nos termos do artigo 1083.º, n.º 2, alínea b), do Código Civil. Por seu turno, a ré apresentou contestação em que pugnou pela improcedência dos pedidos, sustentando que o contrato de arrendamento a autoriza a realizar as obras em causa e a sublocar nos termos em que fez. Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que absolveu a R. do pedido. A A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões: A) Através do presente recurso pretende a recorrente impugnar determinados segmentos da decisão da matéria de facto, através da reapreciação da prova gravada e de documentos juntos aos autos que considera mal apreciados pela M.ª Juiz a quo, constituindo esta impugnação a primeira parte deste recurso.. B) Visa, ainda, com o mesmo ver reapreciada a decisão de mérito, que considera ter feito má aplicação do Direito à matéria de facto provada, sendo esta má aplicação evidenciada pela matéria de facto cuja reapreciação é requerida. C) A consideração de facto “não provado” que a Ré “a Ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de €666,67”, contraria frontalmente o teor dos recibos juntos pela própria Recorrida, devidamente identificados no corpo destas alegações dos quais se extraí a conclusão contrária à convicção da M.ª Juiz a quo. D) Em elementar respeito pelo conteúdo de tais documentos, aceites por ambas as partes impõe-se – que seja dado como provado o seguinte facto: “A ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de €666,67”.” E) Da prova produzida e das declarações das partes, exaradas nos articulados, resulta ter sido edificado e não apenas instalado um quarto de banho no arrendado, pelo que se requer seja alterada a redação deste segmento da decisão da matéria de facto sugerindo-se a seguinte redação: “O subarrendatário edificou na área do seu estabelecimento comercial (com entrada pelo n.º 35) uma casa de banho, com ligação à canalização pré-existente no local.” F) Resultou do depoimento de parte do representante legal da Ré, F. M., devidamente identificado no corpo das alegações e aí parcialmente transcrito, que a redução a escrito, em 2007, do contrato de arrendamento, resultou de uma redação proposta pela Recorrida à Recorrente elaborada por Advogado a pedido daquele não tendo sido negociadas ou discutidas as cláusulas do mesmo. G) A relevância de tal facto, inequivocamente resultante da instrução e cognoscível pelo Tribunal nos termos do nº 2 do artigo 5º do CPC, impõe a sua consideração em sede da decisão da matéria de facto, nos termos do nº 4 do artigo 607º do CPC., devendo passar a constar como facto provado o seguinte “O contrato de arrendamento celebrado em 2007 visou essencialmente reduzir a escrito um contrato vigente há mais de 30 anos, não tendo sido negociados ou sequer discutidos os termos do contrato”. H) Resultou igualmente da prova produzida, concrectamente do depoimento da testemunha M. C., devidamente identificado no corpo das alegações e parcialmente transcrito nas mesmas, que “No contrato celebrado inicialmente entre a. e ré, sem forma escrita, não constava a autorização para cessão do locado a terceiros, mas apenas a autorização para alteração da atividade pela arrendatária”, cognoscível e a ser considerado pelo Tribunal nos termos das disposições acima referidas, pelo que se sugere que tal facto seja considerado provado com a redação indicada. I) Do depoimento da testemunha N. G., devidamente identificado e parcialmente transcrito no corpo destas alegações, resultou provada a edificação de um quarto de banho com sanita e tubo de ligação ao esgoto, cuja relevância justifica que passe a constar da decisão da matéria de facto, como facto provado, o seguinte “Foi edificado um quarto de banho, com sanita e tubo de ligação ao esgoto”. J) Da perícia realizada noa presentes autos, cujos resultados não foram de áreas usadas pela Recorrida e pela sua arrendatária no arrendado, o que, não obstante ter sido considerado pela M.ª Juiz a quo nas considerações exaradas na douta sentença, não mereceu acolhimento expresso na decisão da matéria de facto, impondo-se, atenta a sua relevância que seja dado como provado que “A ré encontra-se a ocupar 69,98% do espaço arrendado pela autora, enquanto a subarrendatária se encontra a ocupar apenas 30,02% do espaço arrendado.” K) Todos estes factos se mostram relevantes para a boa apreciação da matéria em causa e adequada aplicação do Direito à mesma, devendo ser fixados por este Venerando Tribunal ao abrigo no nº 2 do artigo 5º do CPC, nos termos sugeridos pela Recorrente. L) Constituem fundamento do pedido de resolução do contrato de arrendamento a realização de obras não autorizadas que alteraram substancialmente o arrendado e a cessão ilícita (porque proibida pelo artigo 1062º do Código Civil) de parte do arrendado, pela Ré a um terceiro, tendo ambos os fundamentos – que constituíam causas de pedir distintas – sido desatendidos pela Mª Juiz a quo, sendo julgados improcedentes os pedidos formulados pela A., ora Recorrente. M) Os factos provados, no que respeita às obras realizadas pela Recorrida no arrendado respeita, revelam que estas obras constituíram inequívocas alterações substanciais do prédio, levadas a cabo pela arrendatária e pela subarrendatária, com consentimento daquela, justificando a decisão de procedência dos pedidos formulados suportados naquela causa de pedir. N) Constam, entre essas obras, a edificação de uma casa de banho com ligação de tubagens à rede de esgotos e necessária edificação de paredes novas no interior do arrendado, bem como a alteração da estrutura da fachada exterior do prédio, da sua cor bem como de uma porta existente na mesma fachada, obras que manifestamente alteram a estrutura externa do prédio modificando a sua fisionomia, imagem e traço arquitectónico, delas resultando evidente alteração do projecto a que o prédio arrendado obedeceu. O) Tais obras não foram – reconhecidamente, nos termos da decisão sobre a matéria de facto - autorizadas expressamente pela Recorrente, não podendo admitir-se que as mesmas, pela sua natureza ofensiva da estrutura do prédio e pela implantação parcial no seu exterior, sejam consideradas realizadas a coberto da autorização genérica da realização de obras de “adaptação” do arrendado a actividade da Recorrida, em que, manifestamente, não se inseriram. P) Com estes pressupostos – que, com todo o respeito pela douta sentença recorrida, são mais corretos do que aqueles de que partiu a M.ª Juiz a quo – deveria a sentença proferida, na parte que julgou improcedentes os pedidos formulados com suporte nesta causa a pedir, ser revogada, devendo aqueles pedidos ser julgados procedentes, por provada esta causa de pedir. Q) Considerou, também, a M.ª Juiz a quo, improcedente o pedido de resolução do contrato de arrendamento com base na violação, pela Ré, da proibição expressa no artigo 1062º do Código Civil, por entender que a matéria de facto provada permite concluir que à Ré foi atribuída, pela Autora, uma ampla margem de manobra no tocante ao direito de subarrendar, não vislumbrando que tal direito, concedido à Ré, tenha sido exercido por esta de forma excessiva ou violando os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito contratualmente atribuído. R) Carece, no entanto, em absoluto, de qualquer sustentação na matéria de facto sob apreciação o entendimento expendido pela M.ª Juiz a quo, relevando, ainda, a douta decisão proferida na sequência desse entendimento errado, uma má aplicação do Direito aos factos interessantes para a formulação de conclusões. S) Dos factos provados concretamente os vertidos em 3, 4, 5, 8, 9, 11, 12 e13 da matéria de facto (a que se espera estar associados, nesta fase, já os sugeridos neste recurso) necessário se torna concluir, desde logo, que o contrato “celebrado” em 2007 não traduziu mais do que a redução a escrito de um contrato celebrado verbalmente vários anos antes, cujos termos as partes não pretenderam alterar, visando reforçar a segurança das partes no contrato, no interesse da Ré que, antes dessa alteração, havia alterado a composição do seu capital social e a sua gerência. T) Resultou, ainda, provado que o contrato escrito terá sido “dado à senhoria”, ora A., para o assinar, não o tendo discutido, resultando de proposta elaborada por um Advogado a pedido da Ré (e atuando no seu interesse). U) Nessa redução a escrito do contrato verbal celebrado entre as partes e vigente em 2007 foi introduzia uma cláusula sexta cujo teor (transcrito no corpo das alegações) não autoriza que seja interpretado como sendo convencionada coisa diversa da previsão inserta na parte inicial do artigo 1062º do Código Civil, da qual decorre a proibição de um arrendatário cobrar de um subarrendatário quantia superior a 20% daquela que proporcionalmente resulta do espaço ocupado pela sua arrendatária. V) A autorização dada pela Recorrente à Recorrida, resultante da redação proposta pela própria Recorrida para que esta pudesse sublocar, trespassar, ceder à exploração no todo ou em parte o arrendado, pela forma como entendesse mais conveniente, deve restringir tal autorização à forma, não a estendendo aos termos e condições que a arrendatária reputasse convenientes e ainda menos à autorização para cobrar renda em montante proibido pelo nº 1 do artigo 1062º do Código Civil. W) Ainda que assim não fosse – e se pudesse admitir a atribuição à expressão utilizada no contrato do sentido agora conferido pela M.ª Juiz a quo – sempre deveria recusar-se, liminarmente, que se estivesse perante a “convenção diversa” prevista na parte final do artigo 1062º do Código Civil, porquanto, tendo em conta estar-se perante a admissibilidade de, por convenção entre as partes, se “ultrapassar” uma proibição legal, seria, pelo menos, exigível que esta convenção fosse expressa ou de conteúdo e consequências percetíveis por quem permite tal comportamento excepcional. X) Se, no entanto - o que apenas por mera hipótese de raciocínio se admite-se, entender ter sido conferido à Ré o direito a conformar, em matéria de renda, o contrato de cedência do locado que viesse a celebrar, sempre deveria concluir-se, perante os factos provados relativos aos montantes da renda (que se espera tenham sido devidamente fixados, no que ao montante pago pelo subarrendatário respeita, por este Venerando Tribunal) estar-se perante um uso abusivo desse direito de conformação dos termos de um subarrendamento, não podendo admitir-se como legitimo que uma parte – arrendatária – receba 666,00€ pela cedência de um espaço de 34,5m2 que não é seu, mas lhes foi arrendado, suportando pela utilização de 84m2, um valor mensal inferior a 50,00€, ocupando praticamente 70% do locado Y) Também esta situação de manifesto abuso do direito, se traduziria na extinção desse direito “abusado”, tornando ilícita a atuação da Ré, ora Recorrida, e legitimando o pedido de resolução do contrato de arrendamento pela A., fundando-se a resolução na previsão da al. e) do n º2 do artigo 1083º do Código Civil que, ao contrário do que parece considerar a M. Juiz a quo, define a cessão ilícita como fundamento de resolução do contrato pela senhoria, desse modo concretizando o enunciado geral dos nº 1 e 2 daquele artigo. Z) A douta decisão recorrida fez má interpretação, e consequente má aplicação, das disposições insertas no nº 2 do artigo 5º e nº 4 do artigo 607º, ambos do CPC e dos artigos 1062º e 1083º ambos do Código Civil, que violou. Termos em que, V. Exas, concedendo provimento ao recurso, alterando a matéria de facto nos termos sugeridos e revogando a douta decisão recorrida, julgando procedentes por provados os pedidos formulados pela A., ora Recorrente, com as legais consequências, farão INTEIRA JUSTIÇA! A parte contrária contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: 1 - O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente ali apresentadas, salvo aquelas que são de conhecimento oficioso; No entanto, 2 - No que concerne à impugnação relativa à matéria de facto, não resulta das conclusões de recurso formuladas pela Autora sob as alíneas E) a I), quais os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, sendo que a recorrente nem sequer indica, muito menos com exatidão, as passagens da gravação em que funda o seu recurso, seus inícios e termos ; 3 - Pelo que, nesta parte, o recurso deve ser rejeitado (Conclusões E) a I)), o que expressamente se invoca nos termos e para os efeitos previstos no art.º 640º, do Código de Processo Civil. Sem prescindir, 4 – Não deverá ser considerado provado que: “A Ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de €666,67”, pois que esta indicada matéria factual respeita diretamente com a que foi considerada provada sob a alínea 19. da fundamentação de facto da sentença final proferida, a qual não foi impugnada, constando expressamente da cláusula quarta, n.º 1., do contrato de subarrendamento junto aos autos que “A renda total anual é de €6.000,00 (seis mil euros), que a segunda outorgante deverá pagar em mensalidades de €500,00 (quinhentos euros) cada uma, livres da retenção de quaisquer impostos, até ao dia 08 do mês a que respeitarem...” ; Além disso, 5 – Para além do contratado, também os documentos a que a Autora/recorrente faz referência relativos a recibos de renda, refletem e traduzem que o valor da renda efetivamente recebido pela Ré, é de €500,00 líquidos, o que aliás também foi confirmado pela legal representante da Ré, F. M., na passagem do seu depoimento com início ao minuto 17:10 e termo ao minuto 17:40. Por outro lado, 6 – Também não deverá ser alterado o teor da factualidade provada sob a alínea 27.), de tal forma que a palavra aí constante “Instalou”, seja substituída pela palavra “Edificou”, pois que não consta de parte alguma da p. i. a alegação no sentido de que a subarrendatária tenha procedido à instalação ou edificação de casa-de-banho no locado, apenas tendo alegado no art.º 16º do articulado superveniente, e sem qualquer prova ou alegação da superveniência do conhecimento, que “foi autorizada a construção pela arrendatária da Ré de uma casa-de-banho para adaptação do local subarrendado à sua atividade”. Acresce que, 7 - Com respeito à factualidade constante da alínea 27.) da matéria de facto considerada provada, a Autora/recorrente não impugna que a casa-de-banho tenha sido ““instalada” ou “edificada” através de ligação à canalização pré-existente no local”, nomeadamente relativa a águas ou esgotos, ou sequer que tal casa-de-banho já existisse nesse concreto local. 8 – Também não deverão ser declarados mo provados, pois que não alegados pelas partes, os seguintes factos indicados em sede de recurso pela Autora/recorrente: “O contrato de arrendamento reduzido a escrito em 2007 visou essencialmente reduzir a escrito um contrato vigente há mais de 30 anos, não tendo sido negociados ou sequer discutidos os termos do contrato”. “No contrato celebrado inicialmente entre a Autora e a Ré, sem forma escrita não constava a autorização para cessão do locado a terceiros, mas apenas a autorização para alteração da atividade pela arrendatária”. Na verdade, 9 - São necessária e essencialmente os factos alegados pelas partes que hão-de sustentar a decisão final proferida pelo Tribunal; 10 - Em relação aos factos essenciais alegados pelas partes, e que constituem a causa de pedir, vigora em pleno o princípio do dispositivo, pelo que às partes incumbe alegar esses factos sob pena de o juiz não poder dar os mesmos como provados em sede de sentença, e isto ainda que estes factos venham a ser demonstrados por prova documental ou por outra de qualquer natureza carreada para os autos na sequência da instrução da causa; 11 - Em relação aos factos essenciais funciona plenamente o princípio da preclusão, pelo que não cuidando o autor em alega-los em sede de petição inicial, ou o réu, em sede de contestação, não pode vir a alegá-los em posterior articulado. Neste enquadramento, 12 - Haverá que notar que os factos cujo aditamento se requer não foram alegados pela Autora em qualquer dos seus articulados, pois que a sua pretensão de resolução contratual tem por pressuposto a validade e o exato conteúdo do contrato de arrendamento comercial junto com a p. i. como documento n.º 3, conforme se extrai nomeadamente dos art.ºs 2º, 3º, 6º e 13º dessa peça processual e, por isso, o cerne (factos essenciais) da causa de pedir da Autora radica exatamente nesse concreto contrato de arrendamento comercial; Outrossim, 13 - Por não terem sido alegados pela Autora, os factos cujo aditamento agora se requer, também não foram suscetíveis de ser impugnados pela Ré, nem por isso mesmo também foram incluídos em sede de temas de prova no despacho saneador elaborado nos autos; 14 - Resultando incontornável que a instrução apenas deve ter por objeto os factos relevantes para o exame da decisão da causa que devam considerar-se controvertidos ou necessitados de prova, que constituem, impedem, modificam ou extinguem o direito controvertido, tal como plasmado nos articulados; 15 – E o direito controvertido alegado na p. i. pela Autora à pretendida resolução contratual está única e exclusivamente assente no exato teor do contrato de arrendamento escrito e assinado que juntam aos autos ; Aliás, em parte alguma do processo se suscitou a questão da validade ou falsidade do indicado documento; 16 – Por fim também não devem ser aditados à factualidade provada os seguintes factos alegados pela Autora/recorrente: “Foi edificado um quarto de banho, com sanita e tubo de ligação ao esgoto.”; “A Ré encontra-se a ocupar 69,98% do espaço arrendado pela Autora, enquanto a subarrendatária se encontra a ocupar 30,02% do espaço arrendado.”. Pois que, 17 - No que se reporta à edificação da casa-de-banho valem aqui as mesmas conclusões 6. e 7. antecedentes, sendo que esta matéria que se pretende ver aditada já se encontra contemplada na alínea 27.) da factualidade provada, sendo irrelevante a menção ao “tubo”, pois que resulta evidente e do senso comum que a ligação à canalização pré-existente no local (alínea 27.) se haveria de processar através de um “tubo”; E, 18 - De igual forma, também nenhum interesse reveste aditar a restante factualidade relativa às áreas de ocupação, pois que tal factualidade já resulta de forma linear da conjugação das alíneas 4., 11. e 18. da factualidade considerada provada. Por fim, 19 – Quanto ao que se refere à realização de obras, o Tribunal a quo foi irrepreensível na aplicação do direito, o que processou com elevada objetividade e categoria, e cuja fundamentação, por razões de economia processual e para não nos tornarmos repetitivos, aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos; 20 - Note-se apenas que para além da ampla autorização para a realização de obras que resulta das alíneas 14. a 16. da factualidade provada, o Sr. Perito nomeado, J. P., quando inquirido em audiência foi peremtório e objetivo em afirmar que as obras que os autos documentam não incidiram sobre elementos externos e internos estruturais da fração de forma a causarem-lhe danos irreparáveis, tal como resulta do seu depoimento com início ao minuto 07:00 e termo ao minuto 14:33, o que também foi expressamente reconhecido e exarado pelo Tribunal a quo na fundamentação de facto da sentença final proferida. 21 – E quanto ao valor das rendas recebidas por virtude do subarrendamento, o Tribunal “a quo” foi também irrepreensível na aplicação do direito, cuja fundamentação, por razões de economia processual e de não nos tornarmos repetitivos, aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais. É que, 22 - De acordo com a factualidade considerada provada sob a alínea 13., através do contrato de arrendamento a Ré foi autorizada pela Autora a trespassar, sublocar, ceder a exploração, no todo ou em parte, e pela forma que reputasse conveniente, o local arrendado; 23 - O que foi acordado de forma expressa e literal entre a Autora e Ré nos termos da cláusula sexta do contrato de arrendamento, foi que a Ré poderia sublocar, no todo ou em parte, e pela forma que reputasse conveniente, o imóvel arrendado; Pelo que, 24 - Do confronto com o preceituado no art.º 1062º do Código Civil, nomeadamente na sua parte final, e do teor da identificada cláusula sexta do contrato de arrendamento, não se vislumbra qualquer ilegalidade ou incumprimento contratual da Ré, pois que a faculdade de sublocar foi concedida pela Autora à Ré. de forma ampla, pela forma que reputasse conveniente e sem qualquer tipo de limitação, ainda que a título de recebimento de rendas, pelo que, também nesta parte a decisão final proferida não merece qualquer censura. Por outro lado, e sem prescindir, 25 – Se o fundamento genérico da resolução do arrendamento assenta no conceito indeterminado de “justa causa”, entendida esta como o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequência, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, o certo é que não resultou provado, nem se poderá extrair da factualidade considerada provada qualquer incumprimento contratual, muito menos que fosse grave ou que do mesmo resultassem consequências gravosas; 26 - Pelo que, também por esta via não se encontram preenchidos os pressupostos inerentes à peticionada resolução contratual. E, assim, Vossas Excelências improcedendo o recurso interposto, e mantendo a sentença final proferida em 1ª instância, farão a costumada JUSTIÇA. II – Objeto do recurso Considerando que: . o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e, . os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões a decidir são as seguintes: . se a matéria de facto deve ser alterada, dando-se como provados os factos constantes da alínea A) dos factos não provados e se deve ser alterada a redacção do 27 dos factos provados; . se devem ser aditados à matéria outros factos não alegados pelas partes, ao abrigo do disposto no artº 5º, nº 2 do CPC; . independentemente da alteração da matéria de facto, se existe justa causa para a resolução do contrato de arrendamento. III – Fundamentação Na primeira instância foram considerados provados e não provados os seguintes factos: A - Factos provados 1. O prédio urbano composto por três andares e quintal a nascente, situado na Rua dos ..., n.ºs …, encontra-se descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º … da Freguesia de ... e inscrito sob o artigo … da matriz predial urbana. 2. Encontra-se inscrita no registo predial a favor da autora, com data de 3.6.1976, a aquisição por legado do prédio descrito em 1. 3. Em finais dos anos oitenta, mediante contrato verbal, a A. deu de arrendamento aos então legais representantes da Ré, M. C. e esposa F. M., parte do bem imóvel identificado em 1, correspondente a cerca de metade do seu rés-do-chão e arrumações ao nível do 1º andar, para o efeito de aí desenvolverem a atividade comercial de serviço de café (a chávena), snack-bar, e fabrico e confecção de pastelaria e confeitaria. 4. À data, o rés-do-chão do imóvel objeto do arrendamento dividia-se em duas lojas comerciais, a arrendada aos legais representantes da Ré, correspondente à porta nº …, com uma área de 48,2 m2, com arrumações ao nível do 1º andar, e uma outra onde se encontrava instalado um estabelecimento comercial de sapataria, correspondente à porta nº .., com uma área de cerca de 33,5 m². 5. Em 1993, a autora arrendou à ré, para além do espaço com entrada pelo n.º .., o espaço com entrada pelo n.º .., uma vez que o estabelecimento de sapataria tinha cessado a sua actividade no local. 6. Com o conhecimento e consentimento da A., a R. procedeu à instalação de maquinaria tendente ao fabrico de pastelaria no espaço com entrada pelo n.º ... 7. Também nesta altura, com o conhecimento e o consentimento da A., a R. procedeu à abertura de uma porta lateral entre as duas lojas (nº31 e nº35), por forma a melhor e mais comodamente movimentar e transportar a pastelaria fabricada entre os dois espaços, situação que se manteve até 2006. 8. Por virtude das partilhas inerentes ao divórcio dos legais representantes da R. , a identificada sócia F. M., adquiriu a totalidade do capital social da R., assim tendo assumido a respetiva gerência. 9. Nessa sequência, a Autora celebrou por escrito com a Ré um contrato de arrendamento comercial no dia 29 de Janeiro de 2007. 10. A ré paga à autora, mensalmente, uma renda de € 714,92. 11. Nos termos do referido contrato, a Autora deu de arrendamento à Ré uma parte do identificado imóvel, correspondente ao rés-do-chão, destinado a estabelecimento comercial com todas as partes que o compõem, ainda que não situadas exclusivamente ao nível do referido rés-do-chão, do prédio urbano sito na Rua dos ..., n.°s ..., em ..., 12. Ficou acordado entre A. e Ré que o local arrendado se destinava ao exercício de qualquer actividade comercial ou ramo de negócio permitido ou não pelo objecto da sociedade da Ré, nomeadamente a actividade comercial de serviço de café (a chávena), snack-bar, e fabrico e confecção de pastelaria e confeitaria. 13. Através de tal contrato, a Ré foi autorizada a trespassar, sublocar, ceder a exploração, no todo ou em parte, e pela forma que reputasse conveniente, o local arrendado. 14. Nos termos da cláusula sétima do contrato de arrendamento, a ré, enquanto arrendatária, ficou expressamente autorizada a realizar as obras de adaptação ao exercício da sua atividade na fracção arrendada, não podendo, contudo, tais obras incidir sobre os elementos externos e internos estruturais essenciais da fração de forma a causarem-lhe danos irreparáveis. 15. Tendo também acordado, nos termos da cláusula oitava do contrato em mérito, que ficava a cargo da R. o custo das referidas obras, bem como o pagamento de todas as taxas legais, licenças, encargos, coimas e outras despesas com elas conexas ou com a sua execução, não sendo da responsabilidade da A. a obtenção de quaisquer licenças administrativas ou outras legalmente exigíveis. 16. Acordaram ainda, nos termos da cláusula nona, que ficavam a cargo da R. quaisquer obras de limpeza e conservação ordinária ou extraordinária. 17. Após o ano de 2006, a ré encerrou a fábrica de pastelaria, passando a desenvolver a sua actividade apenas na parte do rés-do-chão correspondente à porta n.º ... 18. Em 6.5.2011, a Ré subarrendou a parte do local arrendado correspondente à porta 35, tendo comunicado à Autora que iria celebrar contrato de sublocação, mas não em que termos, a que entidade nem tão pouco por que montante. 19. No contrato de subarrendamento ficou acordado o pagamento de uma renda mensal de € 500,00 à ré. 20. Na sequência dessa sublocação, encontra-se actualmente a ocupar parcialmente o referido rés-do-chão uma terceira pessoa que explora uma loja denominada …, tendo a sua porta de entrada no n.º .. da Rua dos .... 21. Tendo em vista a instalação do estabelecimento comercial do subarrendatário, a R. procedeu à tapagem, com tijolo, da porta que interiormente fazia a ligação entre os dois estabelecimentos comerciais correspondentes às portas nº .... 22. A porta assim tapada corresponde à mesma porta cuja abertura a ré autorizara como descrito em 7. 23. A Ré não comunicou à Autora a tapagem daquela porta. 24. Em de 2017, porque os materiais já estavam muito degradados, a Ré realizou obra na área interior do seu estabelecimento comercial que se traduziu em pintura, colocação de azulejos e papel de parede, colocação de soalho de vinil, substituição de sanita. 25. Na área exterior do estabelecimento comercial, a ré procedeu a obra de pintura e retirada de toldo exterior. 26. A fachada exterior da loja com entrada pelo n.º .. também foi pintada de outra cor no ano de 2017, altura em que o material aparente da porta exterior foi alterado com a colocação de um forro de madeira removível. 27. O subarrendatário instalou na área do seu estabelecimento comercial (com entrada pelo n.º ..) uma casa de banho para adaptação do local subarrendado à sua actividade, com ligação à canalização pré-existente no local. 28. Nem a Autora autorizou estas obras nem tais obras lhe foram comunicadas. 29. As obras na fachada não foram precedidas da obtenção de licença camarária. B – Factos não provados Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão em contradição com os anteriores. Nomeadamente, não se provou o seguinte: A. A ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de € 666,67. B. Para a instalação da casa de banho no estabelecimento comercial com entrada pelo n.º .., foi necessário proceder à instalação de canalizações para ligação à rede pública de esgotos e de abastecimento de água. Da impugnação da matéria de facto Nos termos do artº 662º, nº 1 do CPC o Tribunal da Relação pode alterar a matéria de facto se a prova produzida impuser decisão diversa. A apelada veio alegar que a apelante não cumpriu os ónus impostos pelo artº 640º do CPC porque não indicou nas conclusões os meios probatórios em que se fundamenta nem identificou com exactidão a localização dos segmentos dos depoimentos em que se fundamenta. O recorrente que pretende impugnar a matéria de facto tem de cumprir diversos ónus impostos pelo artº 640º do CPC. Com o actual preceito o legislador teve em vista dois objectivos: eliminar dúvidas que o anterior preceito legal suscitava e reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente que deverá indicar qual a decisão que o Tribunal deveria ter tido. O sistema que passou a vigorar impõe o seguinte: .a) o recorrente deve indicar os concretos pontos da matéria de facto que considere encontrarem-se incorrectamente julgados, tanto na motivação do recurso como nas conclusões, ainda que nestas de modo mais sintético; .b) quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve indicar aqueles que em seu entender conduzem a uma decisão diversa relativamente a cada um dos factos; .c) no que concerne aos pontos da matéria de facto cuja impugnação se apoie em prova gravada (no todo ou em parte), para além da especificação dos meios de prova em que se fundamenta, tem que indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes, transcrevendo, se assim o entender, os excertos que considere oportunos; .d) o recorrente deverá mencionar expressamente qual a decisão que deve ser proferida sobre os pontos concretos da matéria de facto impugnada (cfr. ensinamentos de António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código do Processo Civil, Coimbra: Almedina, 2013, p. 126 e 127). Todos estes pontos têm de ser observados com rigor (cfr. se defende, entre outros, no Ac.do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11-07-2012, proferido no proc. 781/09 que embora proferido no domínio do CPC anterior à Lei 43/2013, mantém actualidade, acessível em www.dgsi.pt, sítio onde poderão ser consultados todos os acórdãos que venham a ser citados sem indicação da fonte). O não cumprimento destes mencionados ónus, conduz à rejeição imediata do recurso na parte afectada, não havendo sequer lugar a qualquer convite ao aperfeiçoamento), porquanto esse convite se encontra apenas consagrado no n.º 3 do artigo 639º do Código de Processo Civil para as conclusões relativas às alegações sobre matéria de direito (em sentido contrário, mas em clara minoria, o , o Acórdão do STJ, de 26-05-2015, processo 1426/08.7TCSNT.L1.S1,que admite também o convite ao aperfeiçoamento das conclusões relativas ao recurso de impugnação da matéria de facto). A alegação e, em particular, as conclusões devem identificar e localizar com clareza mas de forma sintética, o erro de julgamento em que o tribunal incorreu e que deu causa à impugnação e explicar os concretos motivos da discordância, de modo que a Relação possa reapreciar o percurso decisório levado a cabo pelo tribunal a quo, e decidir a impugnação, pronunciando-se sobre o seu mérito. Não é pacífico na jurisprudência a questão de saber se os ónus do recurso de impugnação da decisão da matéria de facto devem constar formalmente das conclusões e se, devendo constar, deverão ser todos ou apenas alguns e quais. Com base no artº 640º CPC, no sentido de que nada refere, há quem entenda (minoritariamente ao que pensamos) que os requisitos aí referidos não têm de ser incluídos nas conclusões, uma vez que, quanto a estas especificamente, consideram nada se exigir, pois que os nºs 1 e 2, do artº 639º CPC apenas se reportam ao recurso da matéria de direito. Por outro lado, há quem entenda que todos os requisitos deverão constar das conclusões (v.g. Acórdão da Relação de Coimbra, de 02-03-2011, processo 579/04.8GAALB.C1 ), sob pena de rejeição. O nº 2 do artº 639º do CPC dirige-se especificamente ao recurso sobre matéria de direito, mencionando quais as especificações que devem conter as conclusões, pelo que, se entende que o subsequente artº 640º, ao impor específicas obrigações, sob pena de rejeição, “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto”, embora o não diga expressamente, parece ter querido mencionar quais as indicações que as conclusões, no caso de recurso da matéria de facto, devem conter (as acima enumeradas e decorrentes das alíneas a), b) e c), do nº 1, e da alínea a) do nº 2) (cfr. se defende no Ac. do STJ, de 04-03-2015, processo 2180/09.0TTLSB.L1.S2 que, embora proferido na vigência do CPC, anterior ao aprovado pelo L 41/2013, também mantém total actualidade). O Acórdão do STJ, de 19-02-2015 (proferido no processo nº 299/05.6TBMGD.P2.S1 e, no mesmo sentido, o Ac. do STJ de 13.10.2016 ( processo 98/12.9TTGMR.G1.S1) consideraram suficiente que nas conclusões se especifiquem os concretos pontos de facto impugnados e a decisão a proferir nesse domínio, enquanto delimitativas do objecto do recurso. A falta destas menções nas conclusões, implicará a rejeição do recurso. Assim, de acordo com o que se nos afigura ser o entendimento maioritário do STJ, não se impõe a indicação nas conclusões dos meios probatórios em que o recorrente se fundamenta e muito menos a indicação das passagens da gravação, pelo que não há razões para rejeitar a impugnação da matéria de facto que se passa a conhecer. Alínea A) dos factos não provados cuja redacção é a seguinte: A ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de € 666,67. Fundamenta-se a apelante nos recibos juntos aos autos em 21.01.2019, pela R., dos quais resulta, em seu entender, que desde Julho de 2013 o valor da renda é de 666,67. A R. por requerimento junto na data referida, na sequência de notificação a pedido da A. para juntar os recibos de renda emitidos, relativos ao subarrendamento, nos meses de julho, de 2011 a 2019, anexou aos autos vários recibos, sendo que a partir de Julho de 2013, consta dos recibos o pagamento pela subarrendatária M. G. – Comércio de Acessórios, Lda., da quantia de 666,67, a qual é deduzida a quantia de 166,67 a título de retenção na fonte de IRS (fls 77 a 80). A apelada, por sua vez, nas contra-alegações que apresentou, dando cumprimento ao disposto no artº 640º, nº 2, al b) do CPC, funda-se no depoimento da legal representante da Ré, F. M., dizendo que a renda paga pela sublocatária, era de 500,00 euros mensais atualmente. Ouvida as declarações prestadas pela legal representante da Ré efectivamente esta, à pergunta quanto a subarrendatária pagava de renda, respondeu, a quantia de 500,00 euros. Na sentença recorrida fez-se consignar que não se davam como provados os factos constantes da alínea A) por não haver elementos probatórios. Ora, trata-se de um manifesto erro, face à junção pela própria R. dos recibos comprovativos dos montantes pagos pela subarrendatária, documentos que a A. não impugnou, até porque o montante constante dos mesmos corresponde ao valor alegado pela apelante no artº 27º da p.i., como sendo o pago pela subarrendatária. Os rendimentos provenientes das rendas recebidas pelo senhorio, enquanto pessoa singular, estão sujeitos à tributação em sede de IRS, podendo o senhorio optar por tributar autonomamente as rendas ou englobá-las nos rendimentos que recebe de outras eventuais actividades. Tributando autonomamente estão sujeitos a 25% de retenção na fonte, retenção que será feita apenas se o arrendatário for uma pessoa colectiva, como é o caso ou um empresário em nome individual com contabilidade organizada (artº 101º CIRS, nº 1, alínea e)). A representante da Ré ao declarar em julgamento que a renda paga pela subarrendatária era no valor de 500,00 estava a reportar-se ao valor líquido que é efectivamente aquele que recebe, embora não o esclarecendo. No entanto, o valor da renda é o ilíquido, devendo ser este o valor a considerar. O líquido é o valor que o locador recebe depois de deduzida a retenção na fonte. Estes factos não estão em contradição com os constantes do ponto 19 pois o valor da renda que nele consta, de montante inferior, é o devido à data da celebração do contrato de subarrendamento, ou seja, em Maio de 2011. Em conformidade, a alínea A) deve ser eliminada dos factos não provados, aditando-se aos factos provados que a ré recebe mensalmente em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de € 666,67, pelo menos, a partir de Julho de 2013. Ponto 27 dos factos provados, cuja redacção é a seguinte: O subarrendatário instalou na área do seu estabelecimento comercial (com entrada pelo n.º 35) uma casa de banho para adaptação do local subarrendado à sua actividade, com ligação à canalização pré-existente no local. Defende o apelante que o que alegou foi que a R. edificou no arrendado um quarto de banho, o que a R. aceitou, e não que instalou um quarto de banho, pelo que deve ser alterado o facto provado, dando se como provado que o R. edificou um quarto de banho, em vez de instalou, uma vez que, em seu entender “as circunstâncias de ser edificado um quarto de banho ou de ser instalado um quarto de banho não são idênticas”. A R., por sua vez, alega que em momento algum da p.i. a autora alega que a subarrendatária tenha procedido à instalação ou à edificação de uma casa de banho, tendo a A. se limitado a alegar no artº 16º do articulado superveniente que apresentou que “foi autorizada a construção pela arrendatária da Ré de uma casa de banho para adaptação do subarrendatário à sua actividade”. Efetivamente no artº 16º do articulado superveniente a A. referiu-se à autorização (pela R.) para construção de uma casa de banho pela subarrendatária. No artigo 47º do mesmo articulado, a A. alegou que tomou conhecimento “de que pela sublocatária terá sido edificado no arrendado um quarto de banho”. É certo que este articulado não sofreu oposição pela R., mas a alegação feita no artº 46º não corresponde a qualquer facto concreto existente, mas sim à alegação de uma mera possibilidade, como resulta da forma verbal empregue (terá). Acresce que não se vislumbra qualquer interesse na alteração pretendida, o que a apelante também não procurou demonstrar. Improcede, pois a requerida alteração. Pretende ainda a apelante que sejam aditados à matéria de facto provada quatro novos itens contendo factos que não foram alegados por qualquer das partes, devendo ser considerados nos termos do artº 5º, nº 2 do CPC pela sua relevância para a boa decisão da causa. Os factos que pretende que sejam considerados são os seguintes, indicando-se, também, relativamente a cada conjunto de factos, os meios probatórios invocados pela apelante: .I.O contrato de arrendamento reduzido a escrito em 2007 visou essencialmente reduzir a escrito um contrato vigente há mais de 30 anos, não tendo sido negociados ou sequer discutidos os termos do contrato, com base no depoimento da legal representante da Ré. .II. No contrato celebrado inicialmente entre a A. e a R., sem forma escrita, não constava a autorização para cessão do locado a terceiros, mas apenas a autorização para alteração da actividade pela arrendatária, com base no depoimento da testemunha M. C., ex marido da legal representante da R. e seu antigo sócio;. .III.A R. encontra-se a ocupar 69,98% do espaço arrendado pela A., enquanto a arrendatária se encontra a ocupar apenas 30,02% do espaço arrendado, com base na inspeção ao local; .IV. Foi edificado um quarto de banho, com sanita e tubo de ligação ao esgoto, com base no depoimento de N. G., empreiteiro que fez as obras as obras na casa de banho. O Código de 2013 continua a consagrar o princípio do dispositivo que implica que os factos que constituem a causa de pedir e as exceções têm de ser alegados por estas – nº1 do artigo 5º do atual CPC – sendo que o artigo 615º, nº1, als. d) e e), continuam a sancionar com a nulidade a sentença que conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ou condene em pedido diverso do deduzido. Recaindo sobre as partes o ónus da alegação dos factos essenciais que constituem a causa ou causas de pedir ou em que se baseiam as exceções invocadas – nº 1 do artigo 5º CPC – para além destes, poderão ser considerados pelo juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa (também estes essenciais), desde que sobre eles as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciar e c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal teve conhecimento em virtude do exercício das suas funções. Mantendo-se o efeito preclusivo quanto aos factos principais que integrem a causa de pedir (factos essenciais nucleares), que tem de ser alegados nos articulados – a sua não alegação inicial impede a posterior alegação –, momento da fixação do objeto do processo, com a consequente inadmissibilidade da sua alteração. Os factos principais (ou essenciais) que não alterem o objeto do processo – factos complementares ou concretizadores – podem também ser alegados até ao fim do julgamento, podendo, inclusivamente, vir a ser apreciados oficiosamente pelo juiz, desde que, relativamente aos mesmos seja cumprido o contraditório (cfr. se defende no Ac. do STJ de 30.04.2019, proferido no proc. 3755/15.4T8LRA.C2.S1). Para Paulo Pimenta (1), “factos “complementares” e os “concretizadores”, embora também integrem a causa de pedir ou a excepção, não têm já uma função individualizadora. Assim, os factos complementares são os completadores de uma causa de pedir (ou de uma excepção) complexa, ou seja, uma causa de pedir (ou uma excepção) aglutinadora de diversos elementos, uns constitutivos do seu núcleo primordial (…) Por sua vez, os factos concretizadores têm por função pormenorizar a questão fáctica exposta sendo, exactamente, essa pormenorização dos factos anteriormente alegados que se torna fundamental para a procedência da acção (ou da excepção)”. Factos instrumentais ou indiciários são factos que permitem estabelecer uma ligação com os factos essenciais e, por essa via, aferir da realidade destes; e, exactamente, porque de simples factos probatórios ou acessórios se trata, não precisam de ser alegados nem incluídos na base instrutória, sendo atendidos desde que venham à tona na instrução ou na discussão da causa (2). Os factos meramente instrumentais não integram a previsão da norma aplicável à pretensão. Os factos instrumentais pressupõem que se tenham alegado os factos essenciais, cuja prova os mesmos se destinam a comprovar. São factos para chegar à realidade dos factos principais, mas que com estes não se confundem. Os factos instrumentais são “(aqueles que permitem a afirmação, por indução, de factos de cuja prova depende o reconhecimento do direito ou da exceção), não se mostra imprescindível a sua alegação, isto é, não há ónus de alegação quanto aos mesmos, não havendo também qualquer tipo de preclusão, pelo que poderão ser livremente averiguados e discutidos na audiência final em torno da produção e valoração dos meios de prova e em face dos termos da prova enunciados. Sobre os mesmos não tem de existir necessariamente uma pronúncia judicial, na medida em que sirvam apenas de apoio à formação da convicção acerca da restante factualidade, máxime quando, a partir deles, se possam inferir outros factos mediante presunções judiciais (artº 607º, nº 4, 5º, nº 2, alínea a)), situação em que basta que sejam enunciados na motivação da sentença (cfr. anot. aos artºs 186º, 552º e 607º).”(cfr. é defendido no já identificado Ac. do STJ de 30.04.2019, processo 3755/15.4T8LRA.C2.S1, do qual foi retirado o extracto transcrito). Em primeiro lugar cumpre referir que a apelante não caracteriza os factos que pretende que sejam aditados, ou seja não refere se são instrumentais, complementares, concretizadores (alínea a) e b) do nº 2 do artº 5º, únicos equacionáveis, pois é manifesto que não estão em causa factos notórios (alínea c) do nº 2 do artº 5º) nem nunca diz porque razão é que os factos que pretende aditar aos factos provados são relevantes para a boa decisão da causa. A parte contrária opôs-se aos aditamentos e alteração, invocando que a matéria que se pretende aditar no ponto IV já se encontra vertida nos factos provados no ponto 27, sendo irrelevante a menção ao tubo pois que resulta evidente e do senso comum que a ligação à canalização pré-existente no local se haveria de processar através de um tubo. Também no que concerne às áreas ocupadas pela arrendatária e pela subarrendatária (ponto III), entende a apelada que tal factualidade já se encontra contemplada nos pontos 4, 11 e 18 da matéria de facto provada. Não basta à parte pedir que sejam considerados outros factos para além dos que foram considerados relevantes pelo tribunal a quo. A parte terá de alegar que a sua consideração é possível face ao disposto no artº 5º, nº 2 do CPC, e no caso de factos complementares ou concretizadores, que ambas as partes tiveram a oportunidade de sobre eles se pronunciar e a razão pela qual os mesmos são relevantes para o conhecimento das questões suscitadas no recurso. Evidentemente, só deverão ser aditados os factos que, na perspectiva da procedência da acção (e da reconvenção ou excepções, se tiverem sido deduzidas), relevam decisivamente e, por isso, se mostrem necessários ao preenchimento da previsão da norma ou normas jurídicas convocáveis pelo tribunal para proteger o interesse que a parte, através daquela, pretende fazer valer e, portanto, de que depende o mérito da sua pretensão (ou os que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico por aquela visado com os alegados)- (cfr. se defende no Ac. do TRG de 16.11.2017, proferido no proc. 495/14.5TJVNF.G1 (3)). A matéria de facto que a apelante pretende ver aditada e referida em III, já consta em parte dos factos provados, como alertou a apelada, nos pontos 4, 11 e 18 da matéria de facto provada, mas é omissa relativamente à área ocupada pelo 1º andar da loja explorada pela R. Este facto é relevante para a decisão da causa, considerando que a apelante também fundamenta a ação de despejo na violação do disposto no artº 1062º do CC, que manda atender à proporcionalidade entre a renda paga pelo arrendatário e pelo arrendatário. Adita-se, consequentemente, à matéria de facto provada um novo ponto contendo a área do 1º andar – 32,20 – com base no relatório pericial junto aos autos que não foi posto em causa, aditamento que é permitido por este facto ser um facto concretizador do inicialmente alegado no artº 28º da p.i. E tendo se apurado as áreas ocupadas pela loja explorada pela R. e pela subarrendatária é possível calcular a percentagem de área ocupada por cada uma. Relativamente ao ponto IV, ao ter sido dado como provado que foi feita ligação à canalização pré-existente no local (ponto 27 da sentença), tal não deixará de contemplar a ligação ao esgoto, ligação que é essencial numa casa de banho, pelo que a alteração pretendida se mostra desnecessária. Relativamente aos factos referidos em I e II, a apelada entende que não podem ser aditados porque ao não terem sido alegados pela A. também não foram por si impugnados, nem foram incluídos nos temas da prova, alegando assim, segundo entendemos, que não foi cumprido relativamente a eles o contraditório, razão pela qual não podem ser considerados, nos termos da alínea b) do nº 2 do artº 5º do CPC que o exige. Os factos cujo aditamento se pretende não são claramente factos instrumentais e também não se nos afigura que os factos referidos em I e II possam ser considerados concretizadores nem complementares das causa de pedir invocadas pela A.. Em momento algum da petição inicial a A. alegou que a cláusula 6ª tenha sido introduzida no contrato sem o seu acordo. Afigura-se-nos que a intenção da A. com a inclusão destes factos será o seu aproveitamento para efeitos de interpretação da cláusula 6ª do contrato e não em sede de validade/invalidade do contrato, como refere a apelada. Ainda que assim não se entendesse e se considerasse que estes factos, se provados, poderiam ser aditados, por força do disposto no artº 5º do CPC, tais factos não poderiam ser dados como provados porque a prova produzida não o permite. Procedemos à audição das declarações da legal representante da Ré, F. M. e do depoimento de M. C., ex marido da legal representante da Ré, e até 2006 também sócio da Ré, tendo a sua saída da sociedade sido consequência do seu divórcio da legal representante da R., sendo que a partir desse momento, esclareceu que não mais teve qualquer ligação ao estabelecimento e ao contrato que veio a ser redigido. Declarou, nomeadamente, a legal representante da R. que a sociedade R. já era locatária do prédio da A. há muitos anos, tendo a A., na sequência do seu divórcio do M. C., lhe pedido para reduzir o contrato a escrito. Para esse efeito, a declarante dirigiu-se a um advogado que o redigiu e deu-a à A. para o assinar. O contrato era o mesmo que já existia, tendo explicado a aceitação pela A. dos poderes concedidos ao locatário, na circunstância de as partes serem amigas, tendo a declarante até na altura a guarda da chave da casa da A. que se situa no prédio do locado, onde ela reside por vezes. Também a testemunha M. C. se referiu a relação de confiança existente entre as partes. O depoimento desta testemunha não nos pareceu muito esclarecedor quanto às cláusulas concretas que até à redução do contrato a escrito tinham sido convencionadas entre as partes, desde logo porque a testemunha apresentou uma versão dos acontecimentos que não corresponde à realidade, a de que o contrato já tinha sido reduzido a escrito antes de 2007, denotando alguma confusão sobre os factos, versão diferente da narrada pela legal representante da R. e também pela A., cujo depoimento também ouvimos, pois que ambas declararam que até 2007 o contrato de arrendamento era meramente verbal. Assim, a matéria de facto permanece inalterada, com exceção das seguintes alterações: Elimina-se a alínea a) dos factos não provados e adita-se aos factos provados os seguintes factos: . A ré recebe mensalmente pelo menos, a partir de Julho de 2013, em virtude do contrato de sublocação uma renda com o valor de € 666,67. . O 1ª andar da loja explorada pela R. tem a área de 32,20 m2. Do Direito A apelante assentou a ação que instaurou contra a Ré na realização de obras não autorizadas, violando o preceituado no artº 1074º, nº 2 do CC, o que fundamenta a resolução do contrato de arrendamento (1083º, nº 2 do CC) e por cobrar do subarrendatário renda em montante superior ao permitido pelo artº 1062º do CC, o que também constitui fundamento de resolução (artº1083º, nº 2, alínea e) do CC). Na sentença recorrida entendeu-se não ter a R. realizado obras não autorizadas, porquanto o contrato permita expressamente a sua realização sem necessidade de prévia autorização. O regime anterior ao actual, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15/10 (abreviadamente designado de RAU), descrevia taxativamente, no n.º 1 do art. 64.º, quais as infracções contratuais praticadas pelo locatário que podiam constituir fundamento de resolução do contrato de arrendamento por parte do senhorio. Entre essas infracções contratuais figurava, na al. d), a seguinte: "Fizer no prédio, sem consentimento escrito do senhorio, obras que alterem substancialmente a sua estrutura externa ou a disposição interna das suas divisões, ou praticar actos que nele causem deteriorações consideráveis, igualmente não consentidas e que não possam justificar-se nos termos dos artigos 1043.º do Código Civil ou 4.º do presente diploma". O regime actualmente vigente, introduzido pela Lei n.º 6/2006, de 27/02, (e designado abreviadamente de NRAU), criou uma cláusula geral resolutiva, que descreve os requisitos gerais para a resolução do contrato por qualquer das partes e limitou-se a indicar alguns exemplos de incumprimento do locatário (cfr. a expressão "designadamente quanto à resolução pelo senhorio") que podem dar lugar à resolução do contrato pelo senhorio. Essa cláusula geral resolutiva consta do nº 2 do art. 1083.º do Código Civil. Como nos dá conta o Ac. do TRG 27.06.2019, proferido no proc. 408/17.2T8VRL.G2 “a doutrina e a jurisprudência divergem quanto a saber se as alíneas do n.º 2 do citado normativo são de funcionamento autónomo ou se têm de ser conjugadas com a referida cláusula geral (“de justa causa subjetiva”) constante do proémio do n.º 2. (…) No primeiro sentido aponta, por exemplo, Luís Menezes Leitão ( Arrendamento Urbano, 8ª ed., Almedina, pp. 133/134), o qual refere que a lei procede à tipificação de algumas situações de resolução do contrato, havendo outras que poderão igualmente enquadrar-se na cláusula geral a que se refere o proémio do art. 1038º, n.º 2, sendo utilizada a técnica legislativa dos exemplos-padrão que consiste em preencher uma cláusula geral através de uma enumeração de situações que o legislador considera integrarem-se no respetivo núcleo conceptual. Em sentido contrário, porém, Maria Olinda Garcia (Arrendamento Urbano Anotado, Regime Substantivo e Processual (alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012), 3ª ed., Coimbra Editora, p. 34 e A Nova Disciplina do Arrendamento Urbano, 2ª ed., Coimbra Editora, p. 25.) sustenta que os fundamentos tipificados nas diferentes alíneas do n.º 2 do art. 1083º do CC têm ainda que preencher a cláusula geral prevista no n.º 2 para sustentar a resolução do contrato, ou seja, terão de atingir um nível de gravidade e gerar consequências tais que não seja razoavelmente exigível àquele senhorio (de um ponto de vista objectivo) a manutenção do contrato com aquele arrendatário). Aparentemente, o legislador pretendeu erigir os cinco factos típicos em verdadeiros fundamentos de resolução, tanto mais que as situações elencadas revestem normalmente particular gravidade em termos de violação contratual. Todavia, como se salienta no Ac. da RL de 9/12/2008, (relatora Márcia Portela), disponível em www.dgsi.pt., “existindo uma cláusula geral, afigura-se mais curial entender estas situações como meras presunções ilidíveis, sempre sujeitas ao juízo valorativo da inexigibilidade, sob pena de o legislador ter consagrado uma solução híbrida. Fosse essa a sua intenção, e melhor seria ter dito que as situações elencadas no nº 2 do artigo 1083º Código Civil constituem fundamento de resolução (numa formulação semelhante à do artigo 64º RAU), e acrescentar que constitui ainda fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do contrato de arrendamento”. Ou seja, como também refere Gravato Morais (Novo Regime do Arrendamento Comercial – 2ª ed., Almedina, p. 209), se é sempre necessário que o incumprimento que confere direito à resolução seja, de per si, grave é ainda imprescindível que seja complementado com “o conceito indeterminado de inexigibilidade, da manutenção do arrendamento”.” Igualmente no sentido da necessidade de preenchimento também da cláusula geral, em qualquer das situações prevista nas cinco alíneas do nº 2, tendo o comportamento do locatário de atingir um grau de gravidade e gerar consequências tais que não seja razoavelmente exigível ao senhorio (de um ponto de vista objectivo) a manutenção do contrato com o locatário infractor, Fernando Baptista de Oliveira, em A Resolução do Contrato no Novo Regime do Arrendamento Urbano, Almedina, 2007, p. 29/30) (apud AC. do TRP de 14.07.2010, proc. 1451/09.0TJPRT.P1 que temos vindo a seguir). A gravidade do incumprimento fundador do direito à resolução do contrato há-de aferir-se quer pela própria natureza da infracção, actuação/omissão substancialmente grave, quer pelas consequências ou efeitos que provoca e que tornam tal incumprimento grave, quer ainda pela reiteração da conduta violadora das obrigações assumidas que, por essa via, também é qualificável como grave, tudo de tal forma que não seja razoavelmente exigível à outra parte a manutenção do arrendamento (cfr. defende Albertina Maria Gomes Pedroso, A resolução do contrato de arrendamento no novo e novíssimo regime do arrendamento urbano, Revista Julgar, nº 19, 2013, p.45). Entre os incumprimentos do locatário mencionados nas diversas alíneas do nº 2 do artº 1083º, deixou de figurar o relativo a obras realizadas pelo locatário não autorizadas pelo senhorio e que não possam justificar-se nos termos dos arts. 1036.º e 1074.º, n.ºs 2 e 3, do Código Civil. Embora este fundamento não conste nas diversas alíneas do nº 2 do artº 1083º do CC, não significa que esse comportamento não constitua causa de resolução pelo senhorio. Poderá constituir se se concluir tratar-se de uma infracção de tal modo grave e com tais consequências que torne inexigível ao senhorio manter o arrendamento. No caso dos autos apurou-se que, tendo em vista a instalação do estabelecimento comercial do subarrendatário, a R. procedeu à tapagem, com tijolo, da porta que interiormente fazia a ligação entre os dois estabelecimentos comerciais correspondentes às portas nº .... A porta assim tapada corresponde à mesma porta cuja abertura a ré autorizara quando deu de arrendamento à R. o estabelecimento com entrada pela porta nº .. e onde esta tinha instalado o fabrico de pastelaria. A Ré não comunicou à Autora a tapagem daquela porta. E, em 2017, porque os materiais já estavam muito degradados, a Ré realizou obra na área interior do seu estabelecimento comercial que se traduziu em pintura, colocação de azulejos e papel de parede, colocação de soalho de vinil e substituição de sanita. Na área exterior do estabelecimento comercial, a ré procedeu a obra de pintura e retirada de toldo exterior. A fachada exterior da loja com entrada pelo n.º .. também foi pintada de outra cor no ano de 2017, altura em que o material aparente da porta exterior foi alterado com a colocação de um forro de madeira removível. Acresce que o subarrendatário instalou na área do seu estabelecimento comercial (com entrada pelo n.º ..) uma casa de banho para adaptação do local subarrendado à sua actividade, com ligação à canalização pré-existente no local. Nem a Autora autorizou estas obras nem tais obras lhe foram comunicadas. Cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, salvo estipulação em contrário (artº 1074º, nº 1 do CC). O arrendatário apenas pode executar obras quando o contrato o faculte ou quando seja autorizado, por escrito, pelo senhorio (artº 1074º, nº 2 do CC). Excetuam-se desta necessidade de autorização, as obras urgentes (art. 1036.ºCC) e as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, de acordo com os fins do contrato. De acordo com a cláusula sétima do contrato de arrendamento celebrado em 29 de janeiro de 2007, a ré ficou expressamente autorizada a realizar as obras de adaptação ao exercício da actividade na fração arrendada, de acordo com os padrões de qualidade inerentes ao imóvel em que a dita fração se integra, não podendo, contudo, tais obras incidirem sobre elementos externos e internos estruturais essenciais da fração de forma a causarem lhe danos irreparáveis. E de acordo com a cláusula nona do mesmo contrato, igualmente ficaram a cargo do inquilino a realização de quaisquer obras de limpeza e de conservação ordinária ou extraordinária. Na sentença recorrida entendeu-se que, face ao acordado entre as partes, a locadora concedeu ampla autorização à locatária para a realização de obras, tanto de conservação, ordinária e extraordinária, como de adaptação à sua actividade, pelo que se considerou não ter a ré violado a lei ao não pedir autorização à senhoria para as realizar. Relativamente às obras levadas a cabo no estabelecimento com entrada pelo nº .. que a R. posteriormente veio a subarrendar, em 06.05.2011, igualmente se entendeu que as obras realizadas de pintura do exterior com alteração da cor e alteração do material aparente da porta exterior com a colocação de um forro exterior e de instalação de uma casa de banho, também tinham de ser entendidas como autorizadas nos termos e limites resultantes do contrato de arrendamento celebrado entre a A. e a R., sob pena de se inviabilizar na prática a possibilidade concedida pelo contrato de arrendamento de subarrendar, visando possibilitar “a instalação da loja do subarrendatário, incluindo a instalação da casa-de-banho, a qual é essencial (e obrigatória) para o funcionamento de qualquer estabelecimento comercial em condições mínimas de salubridade, para além de que não implicaram a intervenção em qualquer elemento estrutural do edifício nem lhe causaram qualquer dano ou prejuízo ao mesmo, tendo se limitado a aproveitar ligações à rede pública de água e esgoto já existente”. A apelante entende que a realização das obras no exterior não estavam autorizadas porque expressamente excluídas. A cláusula 7ª do contrato de arrendamento excluía da autorização a realização de obras nos elementos externos e internos estruturais essenciais da fração de forma a causarem-lhe danos irreparáveis. Ora, não se considera que a alteração da cor de uma porta e a alteração do material aparente da porta exterior com a colocação de um forro de madeira removível constitua uma alteração dos elementos estruturais e muito menos que tenha causado danos irreparáveis ao locado. A cor original pode ser sempre retomada e o forro de madeira é removível. E também a obras interior que consistiu em tapar uma porta que fazia a ligação entre o estabelecimento com acesso pelo nº 31 e o estabelecimento com acesso pelo nº .. e que anteriormente nem existia, também não afeta a estrutura essencial da fração. A porta pode voltar a ser aberta, como já esteve e também a casa de banho poderá ser retirada, se assim se entender. Trata-se de um pequeno espaço com um lavatório e uma sanita (cfr. imagem 21 da inspeção ao local). Esta obra aliás tinha de ser considerada sempre como autorizada, pois que não era possível o subarrendamento sem se dotar o estabelecimento de uma casa de banho. E ainda que se entendesse que alguma das obras realizadas não estariam autorizadas pelo contrato de arrendamento, ainda assim não seria caso de resolução porque não foi feita a prova de factos que permitissem concluir que as obras realizadas pela sua gravidade e consequências, tornaram inexigível a manutenção do arrendamento (artº1083º, nº 2 CC) que não é um requisito de funcionamento automático ou que se possa presumir, como já se referiu. Não é qualquer obra que pode justificar a resolução do contrato de arrendamento. A inexigibilidade da continuação da relação de arrendamento “há-de determinar-se, essencialmente, sob uma perspectiva de lesão dos interesses materiais do senhorio, nomeadamente pela acção do arrendatário que desvalorize o locado e a correspondente procura, e já não tanto em atenção a outros valores ou princípios de ordem imaterial, por ser o sentido que se retira das situações que o legislador consagrou no n.º 3 do citado art. 1083.º, em que presumiu a inexigibilidade, todos eles referentes a lesões de ordem patrimonial na esfera do senhorio (mora superior a três meses no pagamento da renda ou no pagamento de encargos ou despesas e oposição do arrendatário à realização de obra ordenada pela autoridade pública)" (cfr. se defende no acórdão do TRP de 12-11-2009, proc. n.º 234/07.7TVPRT.P1, de onde foi retirado o extracto transcrito). No caso, diversamente, as obras feitas pelo locatária e pela sublocatária pelo contrário valorizam o locado que se mantém assim em bom estado de conservação, passando ainda a dispor de mais uma casa de banho. Não concorda também a apelante com a interpretação que na sentença recorrida é feita da cláusula 6ª, cuja redação é a seguinte: “à inquilina é permitido trespassar, sublocar, ceder à exploração, no todo ou em parte, e pela forma que repute conveniente, a fração autónoma aqui arrendada e supra referida na cláusula primeira”. Na sentença recorrida entendeu-se que, interpretando a cláusula 6ª à luz do disposto no artº 236º do CC que esta cláusula atribui à ré “uma ampla margem de manobra no tocante ao direito de subarrendar, sendo este sentido amplo aquele que um declaratário normal esperaria. O limite para tal amplitude constituirá apenas aquele imposto pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito contratualmente atribuído, sendo certo que para existir um abuso de direito o excesso em relação a tais limites terá de ser manifesto, clamoroso (artº 334º do CC). Poderíamos estar em face de um abuso de direito se, tendo a ré sublocado uma parte apenas do local por si arrendado, cobrasse uma renda superior ou até substancialmente superior à sua, por exemplo, o que não acontece no presente caso”. E acrescentou ainda que, ainda que assim não se entendesse, também os factos apurados não permitem concluir por um incumprimento de tal modo intenso que tornasse inexigível à autora a manutenção do contrato de arrendamento. A apelante entende que a cláusula sexta deve ser interpretada, ao utilizar a expressão “pela forma que repute conveniente”, no sentido de que era permitido à locatária trespassar, sublocar ou ceder a exploração a terceiro. A expressão “conveniente” reporta-se à liberdade de escolha do tipo contratual e não quanto ao conteúdo dos contratos, não contemplando a possibilidade de estabelecer uma renda em violação do disposto no artº 1062º CC. A regra nos negócios jurídicos em geral é a de que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (artigo 236º, n.º 1, do Código Civil). O sentido decisivo da declaração negocial é o que seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, por alguém medianamente instruído e diligente, capaz de se esclarecer acerca das circunstâncias em que as declarações foram produzidas. No que concerne aos negócios jurídicos formais, como ocorre no caso vertente, há, porém, o limite de que não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 238º, nº 1, do Código Civil). À luz do paradigma da teoria da impressão do destinatário, no contrato de arrendamento, o declaratário corresponde à figura do homem médio, sem especiais conhecimentos jurídicos ou técnicos, tendo em consideração, em matéria de interpretação do contrato, o sentido que melhor corresponda à sua natureza e objecto, adoptando o sentido comum ou ordinário dos termos utilizados no texto do contrato. Não se nos afigura que ao utilizar na cláusula 6ª a expressão “pela forma que repute conveniente” as partes se estivessem a referir de novo ao trespasse, sublocação ou cessão de exploração, como defende a apelante, pois que já tinham expressa e claramente referido que era permitido qualquer um destes três tipos contratuais. Não se nos afigura, contudo, que o homem médio colocado no lugar na posição do real declaratário pudesse entender esta expressão como lhe tendo sido concedida autorização para celebrar um contrato sem respeito pelos limites quanto à renda a pagar pelo sublocatário, impostos pelo artº 1062º do CC. A cláusula confere apenas total liberdade relativamente à forma contratual mediante a qual é cedido o uso e a fruição do locado (em parte ou na totalidade) e daí a utilização da expressão” pela forma que repute conveniente”, não estando o arrendatário vinculado a adotar um concreto modelo contratual. Embora estejamos perante um contrato de arrendamento onde são conferidos amplos poderes ao locatário, não só quanto ao ramo do comércio a explorar no locado – que pode ser qualquer um -, quer quanto à realização de obras – permitindo fazer obras sem necessidade de autorização nos termos já expostos, afigura-se-nos excessiva a interpretação defendida na sentença recorrida de que é permitido ao locatário a cobrança de rendas de montante superior ao permitido ao artº 1062º do CC . E face à factualidade dada como provada poder-se-á considerar que não é exigível à A a manutenção do contrato de arrendamento? A longa duração temporal da relação contratual em litígio, arrendamento comercial da década de 80 e a estabilidade que lhe vai associada, bem como a confiança das partes na sua provável subsistência - não pode naturalmente deixar de ser tida em consideração na ponderação entre a censurabilidade dos factos culposos cometidos pelo inquilino e a sua relevância resolutiva – impondo-se, por via do princípio da proporcionalidade, concluir que só comportamentos de particular gravidade justificam o termo de uma relação contratual que subsiste ininterrupta e estavelmente entre as partes há muitos anos (cfr. se defende no Ac. do STJ de 20.11.2014, processo 1612/04.9TBFAF.G1.S1 .) O artº 1062º do CC ao estabelecer um limite ao valor que pode ser cobrado pelo locatário ao sublocatário, tem por base o princípio da boa fé, visando impedir que o locatário possa obter um enriquecimento à custa do património do locador que é quem tem o direito de colher os benefícios. Não é qualquer valor acima dos 20% que pode constituir fundamento do contrato de resolução, a tal se opondo o disposto no artº 1083º, nº 2 do CC. No caso, considerando a área fruída pela locatária e pela sublocatária, a renda praticada, a partir de, pelo menos, Julho de 2013, representa mais do dobro da permitida pelo artº 1062º do CC que permite apenas que a renda paga pelo locatário seja em 20% superior ou proporcionalmente superior ao que é devido pelo contrato de locação. Mas desde a data da celebração do contrato de arrendamento, em 2011, que a renda convencionada excede manifestamente o limite estabelecido pelo artigo 1062º do CC. Tendo em conta o excesso verificado e o número de anos pelos quais se vem mantendo, desde 2011, entende-se que a infracção praticada se integra na previsão do artº 1083º, nº 2 do CC, devendo ser decretada a resolução do contrato de arrendamento com as legais consequências, ficando prejudicadas as demais questões suscitadas. A apelante pede que a parte seja condenada a pagar a renda até à entrega do locado. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado (artº 1045º, nº 1 do CC). IV – Decisão Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogam a decisão recorrida, declarando a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre a A. e a R., condenando a R. a restituir o locado à A. e a pagar-lhe, até ao momento da restituição, a renda estipulada no contrato. Custas em ambas as instâncias pela ré/apelada. Notifique. Guimarães, 7 de maio de 2020 Helena Melo Eduardo Azevedo Maria João Matos 1. Temas da prova, acessível em http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Texto_comunicacao_Paulo_Pimenta.pdf 2. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, volume 1.º, Coimbra Editora, página 466. 3. No qual a relatora destes autos, interveio como adjunta. |