Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | SÓNIA MOURA | ||
Descritores: | PERSI EXTINÇÃO COMUNICAÇÃO EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA | ||
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Data do Acordão: | 03/13/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE COM * DEC VOT | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | 1. A comunicação de extinção do PERSI envolve obrigatoriamente a informação ao cliente bancário sobre os factos que integram a previsão da norma legal que fundamenta aquela extinção e a indicação desta norma, em conformidade com o n.º 3 do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, e a alínea a) do artigo 8.º do Aviso do Banco de Portugal n.º 7/2021. 2. Aquela obrigação atinge também o fundamento legal de extinção que se consubstancia no decurso do prazo de 90 dias sobre a integração do cliente no PERSI (alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10), sob pena de se validar a eventual inércia do Banco durante os referidos 90 dias, o que contraria o disposto nos artigos 15.º e 16.º do mesmo diploma legal, onde se estabelecem, com detalhe e precisão, os comportamentos a adotar pelo Banco nesse período, assim como contraria o disposto no respetivo n.º 1 do artigo 4.º, que estabelece o dever da instituição de crédito atuar com diligência e lealdade. 3. A ineficácia da comunicação de extinção do PERSI implica que se considere verificada a exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, de falta de extinção do PERSI, o que constitui fundamento de indeferimento liminar do requerimento executivo. (Sumário da Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 2481/24.8T8ENT.E1 (1ª Secção)
Sumário: (…) (Sumário da responsabilidade do Relator, nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil) *** Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório 1. (…) - STC, S.A., instaurou execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo comum ordinário, contra (…).
2. Após audição do Exequente, foi proferido o seguinte despacho liminar: “Em 05-08-2024 a “(…) - STC, S.A.” instaurou a presente execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo comum ordinário, contra (…), oferecendo para valer como título executivo uma livrança alegadamente subscrita pelo executado, com data de emissão de 18-07-2012, data de vencimento de 05-08-2024 e cujo restante teor se considera integralmente reproduzido. No requerimento executivo, designadamente no segmento destinado à enunciação dos factos, alegou, para além do mais, o seguinte: «I– Da Cessão de Créditos: 1- O (…) Banco, S.A. foi constituído por deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal lavradas em atas de reuniões extraordinárias de 3 e 11 de Agosto de 2014 (…). 2- Operou-se a favor do (…) Banco, S.A., nos termos da supras referidas atas, a transferência de direitos (e ativos) e obrigações do Banco (…), S.A. a favor deste banco de transição que, para os devidos efeitos legais e contratuais, sucedeu ex lege nos direitos (e ativos) e obrigações daquele, mais ficando investido na posição de credor de cada um dos créditos anteriormente detidos pelo Banco (…), S.A.. 3- A (…), SARL (…) celebrou com o (…) Banco, S.A. um Contrato de Cessão de Créditos, em 22 de Dezembro de 2018, mediante o qual a referida entidade cedeu diversos créditos, bem como, todas as garantias e acessórios a ele inerentes, incluindo os créditos que aquela instituição bancária detinha sobre a ora Executada (…). 4- Por sua vez, por contrato de cessão de créditos celebrado em 03 de Abril de 2020, alterado a 31 de Março de 2021, a Sociedade (…), SARL cedeu à Sociedade (…) – STC, SA, diversos créditos, bem como todas as garantias e acessórios a ele inerentes (…). II – Dos Créditos: Livrança subscrita no âmbito do Contrato de Crédito ao Consumo (…) n.º … (ref. …) – N.º (…): 6- A Exequente é dona e legítima portadora de uma livrança preenchida pelo montante de € 29.669,11 (vinte e nove mil e seiscentos e sessenta e nove euros e onze cêntimos) (…). 7- A referida livrança foi subscrita por (…), ora Executado, e teve o seu vencimento em 05/08/2024. 8- Tal livrança foi subscrita para garantia da boa execução do Contrato de Crédito ao Consumo (…) com a ref. (…), que assumiu na escrita do Banco Cedente o n.º (…) e que atualmente assume o n.º (…), celebrado entre o Banco (…), S.A., atualmente designado por (…) Banco, S.A., e a Executada, em 18/07/2012. 9- Atendendo ao vencimento do contrato por incumprimento definitivo e respetiva mora, a Exequente procedeu ao preenchimento da livrança, no montante total de € 29.669,11, com data de vencimento em 05/08/2024. 10- Apresentada a pagamento, a livrança não foi paga na data de vencimento, nem posteriormente, tendo sido o ora Executado interpelado nesse sentido (…). 11- Assim, para além do montante inscrito na livrança, a Exequente é ainda credora dos juros moratórios devidos, calculados sobre a referida quantia à taxa legal de 4,000% desde a data de vencimento até efetivo e integral pagamento e do imposto do selo, no valor de € 148,35 (cento e quarenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos). 12- Face ao exposto, é a Exequente credora da quantia global de € 29.817,46 (vinte e nove mil e oitocentos e dezassete euros e quarenta e seis cêntimos), à qual acrescerão juros vincendos à taxa legal, até efetivo e integral pagamento. (…)». Conclusos os autos para prolacção de despacho liminar, eis o que fizemos constar da ref.ª 97527048 de 25-09-2024: «Antes de mais, importa esclarecer qual a concreta natureza do crédito que esteve na base da emissão da livrança dada à execução tendo em vista aferir se, sendo caso disso, foi dado cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10. De facto, e na esteira do que tem sido pacificamente entendido ao nível jurisprudencial, sendo o PERSI obrigatório, o seu cumprimento consubstancia uma condição objetiva de procedibilidade para a execução, impondo-se, por conseguinte, perante o seu eventual desrespeito, a procedência de excepção dilatória inominada insanável, de conhecimento oficioso – artigo 578.º do Código de Processo Civil. Destarte, e sob ponderação do disposto no artigo 726.º, n.º 4, do mesmo diploma, convido a exequente a alegar e demonstrar, no prazo de 10 (dez) dias, o que tiver por conveniente a propósito da questão ora suscitada». Em resposta junta sob a ref.ª 11022993 de 03-10-2024 a exequente veio juntar os seguintes documentos: 1.º - Carta datada de 07-08-2013, tendo como destinatário o aqui executado e o seguinte teor: «(…) Assunto: Integração no procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI) CONTRATO N.º (…) PROCESSO N.º (…) (…) Vimos, por este meio, informá-lo(a) que nesta data, se encontram em dívida as responsabilidades decorrentes do contrato acima melhor identificado, correspondentes ao valor de € 285,76, respeitante à soma das seguintes parcelas: (…) As obrigações decorrentes do presente contrato de CI – Crédito Individual, do qual é Titular, encontram-se vencidas, desde 02/07/2013. A E. S. RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO, ACE é a entidade do Grupo Banco (…) responsável pela área de recuperação de dívidas cujo pagamento se encontra em atraso, pelo que, conforme previsto no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, acompanhará o Procedimento extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), no qual se encontra integrado desde 07/08/2013. Com o objectivo de avaliarmos a sua capacidade financeira, para que seja possível encontrar uma solução adequada ao seu caso, solicita-se que nos remeta, no prazo máximo de 10 dias, a declaração em anexo devidamente assinada, acompanhada da seguinte documentação: - Última Certidão de liquidação de IRS; - Cópia de documentos comprovativos dos rendimentos auferidos a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais; (…) Informamos que estamos à sua disposição para prestar os esclarecimentos necessários através do telefone (…), ou através do e-mail: esclarecimentos persi@b...pt (…)»; 2.º - Carta datada de 06-11-2013, tendo também como destinatário o aqui executado e, neste caso, o seguinte teor: «(…) Assunto: Extinção do procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI) CONTRATO N.º (…) PROCESSO N.º (…) A E. S. RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO, ACE, entidade do Grupo Banco (…) responsável pela área de recuperação de dívidas, vem por este meio informá-lo que procedeu nesta data à extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento “PERSI” no qual foi integrado em 2013/08/07. O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo. A extinção do PERSI implica que terminem as garantias conferidas ao cliente bancário pelo referido Procedimento (previstas na legislação aplicável: artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 227/2012), pelo que o Banco deixa de estar impedido, de resolver o contrato em epígrafe com fundamento em incumprimento e de intentar ações judiciais com vista a satisfazer o seu crédito. Informamos que estamos à sua disposição para prestar os esclarecimentos ou informações adicionais que entenda necessários através do telefone (…), ou do e-mail: esclarecimentos persi@b...pt. Caso o incumprimento ainda se verifique, podemos em conjunto encontrar soluções para a regularização da situação de incumprimento. Venha falar connosco. (…)». Seguiu-se o despacho plasmado na ref.ª 97902213 de 29-10-2024: «Analisados os teores dos documentos juntos pela exequente através da ref.ª 11022993 de 03-10-2024, faculto-lhe um prazo adicional de 10 (dez) dias para exercer, querendo, o respetivo contraditório acerca da eventual adopção do entendimento de acordo com o qual a carta de comunicação de extinção do PERSI alegadamente dirigida ao executado não é suscetível de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, por não indicar qualquer base normativa da extinção nem, de forma conveniente, as concretas razões pelas quais foi considerada inviável a manutenção do procedimento». A resposta é a que consta da ref.ª 11109819 de 30-10-2024, aí defendendo a exequente que «das comunicações consta o motivo da extinção do P.E.R.S.I., designadamente, logo no 2.º parágrafo do documento junto como DOC. 2, ao Requerimento da Exequente, de 03 de Outubro de 2024. Aí é possível verificar que a extinção ocorreu ao abrigo do disposto no artigo 17.º, n.º 1, c), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro e, portanto, considera-se integralmente cumprido o disposto nos números 3 e 4 do mesmo artigo. Com efeito, salvo melhor opinião, a locução utilizada na comunicação não pode ser mais clara, ao referir o que se passa a transcrever: “O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo”. Por outro lado, a letra do artigo 17.º, n.º 1, c), a que já se fez menção dispõe que: “O PERSI extingue-se (…) no 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação”. Não tendo sido possível chegar a acordo, nem acordada a prorrogação, foi, por esse motivo extinto o P.E.R.S.I., o que resulta expressamente da comunicação remetida». Com tal resposta não foi junto qualquer documento. Uma vez que ainda não foi citado, não há que facultar contraditório prévio ao executado. * Cumpre apreciar e decidir. Para o efeito, deve ter-se por assente, na economia da decisão que importa tomar, que o invocado «Contrato de Crédito ao Consumo (…), com a ref. (…)» que esteve na génese da livrança exequenda se insere no âmbito do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 (relativamente ao qual é in casu aplicável a redacção, vigente nas datas das cartas de integração e de extinção acima citadas, anterior ao Decreto-Lei n.º 70-B/2021, de 06/08), nomeadamente face ao disposto no seu artigo 2.º, n.º 1, alínea c), aplicando-se-lhe por isso as obrigações decorrentes do PERSI, o que não foi sequer posto em causa pela exequente, que juntou documentos destinados a demonstrar o cumprimento daquele procedimento. Neste enfoque, há que salientar que, nos termos do artigo 12.º do citado diploma, «as instituições de crédito promovem as diligências necessárias à implementação do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) relativamente a clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito». Por outro lado, e de acordo com o artigo 13.º, «no prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação em mora, a instituição de crédito informa o cliente bancário do atraso no cumprimento e dos montantes em dívida e, bem assim, desenvolve diligências no sentido de apurar as razões subjacentes ao incumprimento registado». De harmonia, por sua vez, com o artigo 14.º: «1 - Mantendo-se o incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, o cliente bancário é obrigatoriamente integrado no PERSI entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data de vencimento da obrigação em causa. 2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a instituição de crédito está obrigada a iniciar o PERSI sempre que: a) O cliente bancário se encontre em mora relativamente ao cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito e solicite, através de comunicação em suporte duradouro, a sua integração no PERSI, considerando-se, para todos os efeitos, que essa integração ocorre na data em que a instituição de crédito recebe a referida comunicação; b) O cliente bancário, que alertou para o risco de incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, entre em mora, devendo, para todos os efeitos, considerar-se que a integração desse cliente no PERSI ocorre na data do referido incumprimento. 3 - Quando, na pendência do PERSI, o cliente bancário entre em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de outros contratos de crédito celebrados com a mesma instituição, a instituição de crédito deve procurar obter a regularização do incumprimento no âmbito de um único procedimento, informando o cliente bancário desse facto nos termos previstos no número seguinte. 4 - No prazo máximo de cinco dias após a ocorrência dos eventos previstos no presente artigo, a instituição de crédito deve informar o cliente bancário da sua integração no PERSI, através de comunicação em suporte duradouro. 5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no número anterior». Por último temos o artigo 17.º que, a propósito da extinção do PERSI, prescreve o seguinte: «1 - O PERSI extingue-se: a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa; b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento; c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário. 2 - A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: a) Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor; b) Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI; d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior; e) O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito; f) O cliente bancário recuse a proposta apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo anterior; ou g) A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior. «3 - A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento. 4 - A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1. 5 – O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3». Em cumprimento deste n.º 5 foi dado à estampa o Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012 (publicado no Diário da República, 2.ª série, Parte E, n.º 243, de 17-12-2012), de cujo artigo 8.º, sob a epígrafe «comunicação de extinção do PERSI», decorria o que segue: «A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações: a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal; b) Consequências da extinção do PERSI, nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, designadamente a possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos; c) Quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação, informação acerca do regime constante do Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de novembro, na redação da Lei n.º 59/2012, de 9 de novembro, relativamente à resolução e ao direito à retoma do contrato de crédito; d) No caso de o cliente bancário estar abrangido pelo regime extraordinário de regularização do incumprimento de contratos de crédito à habitação, referência, quando tal decorra do referido diploma legal, ao direito do cliente bancário à aplicação de medidas substitutivas, bem como aos termos em que poderá solicitar a sua aplicação; e) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI; f) Indicação dos elementos de contacto da instituição de crédito através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento». Revertendo à situação dos autos, e partindo do perfunctório pressuposto de que as missivas em apreço foram efectivamente remetidas ao executado (…), a questão nuclear que nos interpela é a de saber se a comunicação datada de 06-11-2013 dando-lhe conta da extinção do PERSI em que havia sido integrado satisfaz os requisitos enunciados, mormente os que foram objecto de negrito e sublinhados nossos. Salvaguardando o devido pelo entendimento diverso demonstrado pela exequente na ref.ª 11109819 de 30-10-2024, cremos que a resposta é claramente negativa. Desde logo porque não foi indicada a concreta base legal de suporte da extinção, o que só por si constitui uma fragorosa violação dos artigos 17.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 227/2012 e 8.º, alínea a), do Aviso 17/2012 em aplicação in casu. Na verdade, e independentemente da posição que se assuma relativamente ao ponto que iremos focar em seguida, o certo é que, tal como se fez notar no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12-09-2024 (disponível, como os demais que citaremos, em www.dgsi.pt, neste caso sob Processo n.º 2118/22.0T8ENT.E1), «o n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012 exige que a comunicação, pela instituição de crédito, da extinção do procedimento, deve descrever o fundamento legal dessa extinção, o que só pode significar a obrigatoriedade de indicação da norma legal ao abrigo da qual a mesma ocorreu». No mesmo sentido pronunciou-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 21-11-2024 (Processo n.º 1881/24.8T8ENT.E1), de acordo com o qual, «sendo certo que o artigo 17.º do DL n.º 277/2012 se dedica, como da epígrafe “Extinção do PERSI” resulta, à enunciação das situações que podem levar ao seu desfecho, distintas entre si são as descritas nas suas alíneas a) a d) do n.º 1 e a) a g) do n.º 2. A compreensão da razão jurídica conducente à extinção carece, neste contexto, da indicação da concreta causa por referência a uma, ou mais, das várias alíneas dos citados números 1 e 2 do artigo em apreço (…)». Neste enquadramento, não se pode de modo algum aceitar que, ao referir que «[a] extinção do PERSI implica que terminem as garantias conferidas ao cliente bancário pelo referido Procedimento (previstas na legislação aplicável: artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 227/2012)», a carta em análise esteja a cumprir a obrigação legal em causa. Mas há mais. Do nosso ponto de vista, ao executado também não foram transmitidas, nos «termos claros, rigorosos e facilmente legíveis» exigidos pelo artigo 8.º, alínea a), do Aviso 17/2012, as concretas razões de facto em que se terá baseado a impossibilidade de manutenção do procedimento. Disse-se na carta de extinção que «o PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo». Pergunta-se agora: que acordo foi proposto (ou sequer se foi proposto) e qual ou quais os concretos pontos em que não foi possível levá-lo por diante e porquê? Não sabemos, e certamente não o saberá o executado pela leitura da missiva em causa. Destarte, aquela carta não produziu efeitos. Neste mesmo sentido, e entre muitos outros que poderíamos citar a propósito de decisões de idêntico jaez proferidas pelo aqui signatário, vide os Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 25-11-2021, 07-04-2022, 12-07-2023, 23-11-2023 e 12-09-2024 (Processos n.ºs 17026/20.0T8PRT.E1, 451/21.7T8ENT.E1, 4859/15.9T8ENT.E1, 913/23.1T8ENT.E1 e 1160/16.4T8ENT-A.E1, respectivamente), salientando-se no segundo, em perfeita síntese, o seguinte: - «Sendo indispensável que o PERSI tenha início e fim definidos, já os demais actos podem ou não verificar-se consoante a situação concreta do devedor»; - Assim, «[a]s específicas vicissitudes que podem ocorrer no decurso de um concreto PERSI reflectem-se na causa de extinção do mesmo»; - «Mesmo atendo-nos ao caso dos autos – em que o exequente, quando comunica a integração (…) no PERSI, (…) solicita elementos – basta pensar na hipótese de tais elementos terem sido remetidos (…), sem que o exequente tenha desenvolvido qualquer diligência ulterior»; - «E é por isso que, mesmo que a extinção tenha como fundamento próximo o decurso do prazo, sempre terá de existir uma causa remota que exclua a imputação do insucesso do PERSI à instituição bancária»; - Só perante uma comunicação de extinção que contenha, quer as razões de facto, quer a norma jurídica que a fundamenta, «pode o cliente bancário aferir da regularidade e legalidade de todo o procedimento, em particular quando é demandado judicialmente pela instituição»; - «E, tratando-se da extinção do PERSI, só conhecendo os concretos motivos que levaram à decisão da instituição bancária se podem, efectivamente, defender, seja no plano factual, seja em sede de cabimento legal». Tudo isto sendo ainda certo que, como assertivamente se enfatiza no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-11-2021 (Processo n.º 21827/17.8T8SNT-A.L1.L1.S1), estamos no âmbito de uma relação em que o cliente bancário é tido como «a parte mais fraca», correspondendo o recurso ao PERSI «ao exercício de um direito que a lei concedeu aos devedores precisamente por entender que os clientes bancários, em dificuldades financeiras para assumirem as suas obrigações, precisam de proteção». Além disso, «a lei não admite qualquer extinção automática do PERSI, exigindo o cumprimento de deveres de informação e de comunicação, que, no caso concreto, não foram cumpridos. É que, em face do n.º 3 do artigo 17.º, a instituição de crédito deve informar o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento (…)». (sublinhados nossos) Por último, sem esquecer a concreta natureza dos interesses que estão em jogo, há que fazer prevalecer na interpretação das normas em apreço os direitos dos consumidores constitucionalmente consagrados nos artigos 52.º, n.º 3, alínea a), 60.º e 81.º, alínea j), da Constituição da República Portuguesa, nunca descurando que – não por acaso – estamos a lidar com normas de carácter imperativo subtraídas à disponibilidade das partes (a este respeito vide, por exemplo, os Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14-12-2022, do Tribunal da Relação de Lisboa de 20-06-2023 e do Supremo Tribunal de Justiça de 14-11-2024: Processos n.º 3047/20.7T8MAI-B.P1, 3708/22.6T8SNT.L1-7 e 451/14.3TBMTA-C.L2.S1, respectivamente). Assim, e para concluir na situação sub judice, considerando a clara insuficiência (por omissão da norma legal habilitante e dos factos concretos e objectivos que a determinaram) da comunicação de extinção datada de 06-11-2013, mantêm-se incólumes as garantias do executado previstas no artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, ou seja, o impedimento de instauração da presente acção executiva [alínea b) do n.º 1]. * Na defluência de todo o conspecto fáctico-jurídico vindo de enunciar, julgo oficiosamente verificada a excepção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito, pela exequente “(…) – STC, S.A.”, da demonstração do válido cumprimento da obrigação de comunicação ao executado (…) da extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, e, em consequência, indefiro liminarmente o requerimento executivo – artigos 573.º, n.º 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, e 726.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil.”
3. Deste despacho interpôs o Exequente recurso de apelação, o qual terminou com as seguintes conclusões: “A. O presente recurso de apelação tem por objeto o despacho proferido em 09 de Dezembro de 2024, no processo que corre termos pelo Juízo de Execução do Entroncamento - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, que indeferiu liminarmente o Requerimento Executivo apresentado pela Recorrente, com fundamento na ineficácia da comunicação de extinção do P.E.R.S.I., em alegada contravenção do disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro e, bem assim, do aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012, a que faz menção o n.º 5 do artigo invocado. B. Concretamente, por entender ser insuficiente a menção à fundamentação da causa de extinção do P.E.R.S.I.. C. Ora, principiemos por referir que, em razão da data em que se iniciou o incumprimento, o Cedente encontrava-se na obrigatoriedade de dar cumprimento ao P.E.R.S.I., o que fez, desde o início em 07 de Agosto de 2013, até à extinção, em 06 de Novembro de 2013. D. Contrariamente ao vertido no despacho recorrido, expressamente impugnando-o quanto à insuficiência da fundamentação da extinção do P.E.R.S.I., entende a Recorrente terem sido cumpridas todas as formalidades exigidas. E. Nomeadamente, foi dada indicação bastante do fundamento legal e das razões que justificaram a inviabilidade de manutenção do procedimento. F. Diga-se, nos termos exigidos pelo artigo 17.º, n.º 3 e n.º 5, do DL 227/2012 e do artigo 8.º do Aviso do Banco de Portugal 17/2012 – de modo claro, rigoroso e de simples leitura. G. Com efeito, não só na comunicação de extinção, mas aí também, procedeu ao elenco da causa de extinção, a saber, o decurso do prazo de 90 (noventa) dias. H. E, do mesmo modo, ao elenco do motivo pelo qual considera inviável a manutenção do procedimento, a saber, pelo facto de não ter sido possível chegar a acordo (findo aquele prazo de noventa dias). I. Efectivamente, no caso concreto, a extinção do P.E.R.S.I. operou pela causa prevista no artigo 17.º, n.º 1, c), do DL 227/2012 e foi precisamente isso que foi comunicado e, bem assim, não existiu possibilidade de alcançar acordo – igualmente comunicado. J. Desta feita, não vemos como possa ter sido invocado no despacho recorrido, que não foi indicado o fundamento legal. K. Principiemos por referir que o fundamento legal, com respeito por opinião diversa, não pode corresponder à mera invocação da norma (a frequentemente apelidada base legal). L. A exigência de invocação do fundamento legal basta-se, sim, com a descrição da realidade fáctica que integra a previsão normativa, que, neste caso é, como já por múltiplas vezes referido, o decurso do prazo de noventa dias. M. A invocação da norma na qual se corporiza aquela previsão, ou seja, a sua numeração sistemática, chamemos-lhe assim, que parece ser a tese veiculada no despacho recorrido, é que, salvo melhor opinião, em nada preenche os requisitos de clareza, rigor e simplicidade de leitura, na invocação do fundamento legal. N. Repita-se: a necessidade de invocação do fundamento legal não se cumpre com a mera indicação da norma aplicável. Senão vejamos, O. A declaração de extinção do P.E.R.S.I., como a grande maioria das declarações negociais, deve ser interpretada de acordo com o artigo 236.º do C.C.. P. O qual postula que as declarações valem com o sentido que um declaratário normal possa deduzir. Q. Conjugando a norma em apreço, com o artigo 17.º, n.º 3, do DL 227/2012 e ainda com o artigo 8.º do Aviso 17/2012, que ditam que a comunicação da extinção deve ser clara, facilmente legível e rigorosa, facilmente se deixa antever que deve soçobrar tese inversa. R. Pois que, para o declaratário médio, a escrita da numeração da norma, pelo artigo, número, alínea, de determinado diploma, de certo ano, mês e dia é… o mesmo que nada. S. O declaratário médio não possui extensos conhecimentos técnico-jurídicos que lhe permitam de imediato apreender o que é o escrito: “artigo 17.º, n.º 1, c), do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro”. T. Com efeito, da parte do texto destacado, a única coisa que o declaratário médio conseguirá apreender é “25 de Outubro”. U. Pelo exposto, invocar a numeração normativa não é, nem pode ser, sinónimo de invocar o fundamento legal – ou a norma propriamente dita. V. A descrição da realidade fáctica que integra a previsão normativa, por seu turno, é indicar (em termos claros, rigorosos e concisos) o fundamento jurídico, ou seja, a própria norma e não a forma da qual a mesma se reveste (que corresponderia à mera indicação da legislação). W. E é em termos que possam ser apreensíveis pelo declaratário médio, apenas assim se cumprindo a função do P.E.R.S.I. e as exigências de clareza, rigor e simplicidade da leitura. X. Como tal, o fundamento legal da extinção é o que está expresso na comunicação – o decurso do prazo de noventa dias (naturalmente, sem desenvolvimentos no sentido do acordo, ou regularização). Y. De igual modo, quanto aos motivos pelo qual julgou inviável a manutenção do procedimento, os mesmos são descritos em termos claros, simples, rigorosos e concisos através da locução: “não foi possível chegar a acordo”. Z. Verifica-se, portanto, o bastante e integral cumprimento, aquando da comunicação da extinção do P.E.R.S.I., do disposto no artigo 17.º, n.º 3 e artigo 8.º do Aviso 17/2012, pelo que deveria ter o Tribunal a quo decidido em sentido inverso. Sem prescindir, acresce que, AA. A norma contida no artigo 17.º, n.º 3, do DL 227/2012 deve ser objecto de uma interpretação restritiva, por razões de coerência sistemática e, até, lógica. BB. Ora, as causas de extinção do P.E.R.S.I., segundo é possível retirar do n.º 1 e 2 do artigo 17.º do supracitado diploma são diversas. CC. O n.º 1 refere causas de extinção que se verificam por decorrência da Lei, ope legis, independentemente da iniciativa do Credor, ao passo que o n.º 2 menciona causas de extinção do P.E.R.S.I. por iniciativa, ou vontade, do Credor. DD. A óbvia diversidade da natureza das causas de extinção deve, por isso, levar a um tratamento diferenciado. EE. Como tal, a invocação dos motivos que justificam a inviabilidade de manutenção do procedimento apenas faz sentido, naturalmente, quando esteja em causa uma situação de extinção por iniciativa do Credor. FF. A Lei, ao prescrever que o P.E.R.S.I. se extingue após o decurso de prazo de noventa dias após o seu início, é clara. Logicamente, o P.E.R.S.I., neste caso extingue-se por mero efeito do decurso do tempo, algo que independente da vontade, ou da iniciativa de quem quer que seja. GG. Pelo que não há, nestes casos, lugar à indicação dos motivos pelos quais é considerando inviável manter o procedimento em curso, porque não é uma extinção motivada. Isto numa solução que é perfilhada por múltiplos arestos, invocados supra, na motivação do presente Recurso. HH. Pelo que leitura da parte final do artigo 17.º, n.º 3, do diploma já mencionado deve entender-se como reportada aos casos em que a extinção depende da iniciativa da instituição bancária. II. Não obstante, como já referido, apesar do exposto, foi cumprida pelo Cedente tal menção, pois que invoca, além do fundamento legal, os motivos pelos quais não é possível manter o P.E.R.S.I. – impossibilidade de acordo. JJ. Relembremo-nos a este propósito que a teleologia do conjunto normativo que institui o P.E.R.S.I. dita que as instituições bancárias devam adoptar um acompanhamento activo na gestão das situações de incumprimento. KK. Mas isso não significa que estejam sozinhas nesse procedimento, ou que seja algo meramente unilateral. LL. Pelo contrário, não obstante o dever de condução activa do procedimento, as instituições também dependem, como é o caso, da colaboração do próprio cliente, ao qual também são imputadas obrigações e que, diga-se, é (ou deveria ser) a parte mais interessada. MM. Inexistindo colaboração, é manifesto que o P.E.R.S.I. será infrutífero. Acresce que, NN. Além de considerarmos que o Cedente cumpriu, aquando da extinção, integralmente os deveres de comunicação a que se encontrava adstrito e que, por isso, o Executado / Recorrido se encontrava suficientemente informado, na posse de todos os elementos relevantes no que ao P.E.R.S.I. diz respeito, a verdade é que, logo no início do procedimento, o Recorrido foi informado quanto à possibilidade de extinção do P.E.R.S.I. após o curso do prazo de noventa dias. OO. Destarte, globalmente considerando as comunicações, é lícito ao Credor limitar-se a invocar o decurso de tal prazo, tendo-o já previamente informado de tal possibilidade, detalhadamente, aquando da integração em P.E.R.S.I., o que, julga o Recorrente, terá sido erroneamente valorado pelo Tribunal a quo. PP. Novamente, deverá, em face do exposto, considerar-se cumpridos todos os deveres referentes à extinção do P.E.R.S.I., ou, mais concretamente, quanto à suficiência da fundamentação de tal extinção. QQ. Por outro lado, temos por precipitada a prolação de despacho de indeferimento liminar. RR. Com efeito, tal expediente aplica-se aos casos de manifesta improcedência do pedido, ou, para o que aqui importa, manifesta verificação de excepção dilatória, de conhecimento oficioso, insuprível. SS. Ora, em face da documentação junta, se não é possível concluir pela inexistência da excepção dilatória em causa, é pelo menos discutível que tenha sido fundada de forma bastante a extinção do P.E.R.S.I.. TT. Motivo pelo qual não deveria ter sido indeferido liminarmente o Requerimento Executivo apresentado pelo Recorrente. UU. Inversamente, deveriam ter prosseguido os autos, facultando-se ao Executado / Recorrido, nessa sede, a possibilidade de exercer o seu contraditório quanto a essa (ou outras) questões, precisamente por não nos encontrarmos perante um cenário flagrante de verificação da excepção apontada, cuja existência é, no mínimo, dúbia. Nestes termos e nos demais de Direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá obter provimento o presente recurso e, em consequência, revogada o Despacho do qual ora se recorre, substituindo-se este, por decisão que venha ordenar o prosseguimento da execução, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
4. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – Questões a Decidir O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, não sendo objeto de apreciação questões novas suscitadas em alegações, exceção feita para as questões de conhecimento oficioso (artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil). Não se encontra também o Tribunal ad quem obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil). Consequentemente, cumpre apreciar se a comunicação de extinção do PERSI aos Executados cumpre os respetivos requisitos legais.
III – Fundamentação 1. O Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, estabelece princípios e regras a observar pelas instituições de crédito na prevenção e na regularização das situações de incumprimento de contratos de crédito pelos clientes bancários e cria a rede extrajudicial de apoio a esses clientes bancários no âmbito da regularização dessas situações. A justificação da regulamentação legal indicada encontra-se exposta no respetivo preâmbulo: “A concessão responsável de crédito constitui um dos importantes princípios de conduta para a atuação das instituições de crédito. A crise económica e financeira que afeta a maioria dos países europeus veio reforçar a importância de uma atuação prudente, correta e transparente das referidas entidades em todas as fases das relações de crédito estabelecidas com os seus clientes enquanto consumidores na aceção dada pela Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril. A degradação das condições económicas e financeiras sentidas em vários países e o aumento do incumprimento dos contratos de crédito, associado a esse fenómeno, conduziram as autoridades a prestar particular atenção à necessidade de um acompanhamento permanente e sistemático, por parte de instituições, públicas e privadas, da execução dos contratos de crédito, bem como ao desenvolvimento de medidas e de procedimentos que impulsionem a regularização das situações de incumprimento daqueles contratos, promovendo ainda a adoção de comportamentos responsáveis por parte das instituições de crédito e dos clientes bancários e a redução dos níveis de endividamento das famílias. Neste contexto, com o presente diploma pretende-se estabelecer um conjunto de medidas que, refletindo as melhores práticas a nível internacional, promovam a prevenção do incumprimento e, bem assim, a regularização das situações de incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos perante instituições de crédito por factos de natureza diversa, em especial o desemprego e a quebra anómala dos rendimentos auferidos em conexão com as atuais dificuldades económicas.” O Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) encontra-se regulado nos artigos 12.º a 21.º do referido diploma legal, comportando três fases: a fase inicial, na qual o cliente bancário deve ser informado da mora e do valor da dívida, assim como deve ser apurado o motivo do incumprimento e integrado o cliente bancário no PERSI; a fase de avaliação, na qual é apreciada a solvabilidade do cliente bancário e é formulada uma proposta de regularização da dívida; a fase de negociação, na qual se diligencia o acordo do cliente bancário para a regularização da dívida (artigos 13.º a 16.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10). A pendência do PERSI constitui impedimento à instauração de cobrança de dívida pela instituição bancária contra o cliente bancário (artigo 18.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10). Assim, a observância do PERSI tem vindo a ser considerada uma condição objetiva de procedibilidade da execução, pelo que a sua falta consubstancia exceção dilatória inominada insuprível, de conhecimento oficioso, determinante da extinção da instância executiva (neste sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13.04.2021 (Graça Amaral), Processo n.º 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1; do Tribunal da Relação de Évora de 26.05.2022 (Tomé de Carvalho), Proc. n.º 829/17.0T8ENT-D.E1; do Tribunal da Relação de Coimbra de 14.06.2022 (Cristina Neves), Proc. n.º 172/20.8T8VLF-A.C1; do Tribunal da Relação de Guimarães de 09.05.2024 (José Cravo), Processo n.º 306/22.8T8CMN-A.G1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 09.05.2024 (Rute Sobral), Proc. n.º 1289/23.2T8PDL-A.L1-2; do Tribunal da Relação do Porto de 25.11.2024 (Eugénia Cunha), Proc. n.º 1145/24.7T8PRT-A.P1; todos in http://www.dgsi.pt/). Consequentemente, a alegação e prova da integração do cliente bancário no PERSI e da extinção do procedimento competem ao credor exequente (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
2. No que tange à extinção do PERSI, matéria discutida no caso dos autos, a norma pertinente é o artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, conjugadamente com o artigo 8.º do Aviso do Banco de Portugal de Portugal n.º 17/2012, ambos integralmente transcritos na decisão recorrida e que, por isso, aqui tomamos por referência. Sublinhe-se, efetivamente, que apesar do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, ter sido, entretanto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 70-B/2021, de 06.08 (que entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, conforme o respetivo artigo 9.º), e do Aviso do Banco de Portugal de Portugal n.º 17/2012 ter sido, nessa sequência, revogado pelo Aviso n.º 7/2021, que o substituiu (publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 243, Parte E, de 17.12.2021, com entrada em vigor no dia 01.01.2022, conforme o respetivo artigo 13.º), a integração do Executado no PERSI ocorreu em 2013, logo, é aplicável ao caso dos autos o regime de pretérito. Adicionalmente, a decisão recorrida cita de modo exaustivo e rigoroso a jurisprudência produzida sobre a questão em apreço, em particular os acórdãos proferidos por este Tribunal da Relação de Évora, pelo que neste plano cuidaremos essencialmente de sublinhar alguns aspetos que se afigura relevarem especialmente no caso em apreço. Assim, desenvolveu-se o entendimento de que quanto às causas de extinção do PERSI existem duas categorias de factos, a saber, os que se mostram previstos no n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, que são de funcionamento automático, e os que se mostram previstos no n.º 2 do mesmo normativo, que implicam uma decisão da instituição bancária. Desta diversidade foi extraída por alguma jurisprudência a conclusão de que a comunicação de extinção do PERSI por parte da instituição bancária não está sujeita ao mesmo grau de exigência nos dois casos, sendo maior nos casos previstos no n.º 2 e bastando-se, nos casos do n.º 1, com a mera invocação do facto determinante da extinção indicado na lei. Não se trata, todavia, de entendimento unânime, porquanto outra jurisprudência subscreve a orientação de que também nos casos do n.º 1 terão de ser observados os ditames prescritos no n.º 3 do mesmo normativo, isto é, terão de ser descritos os factos que suportam a extinção e apontado o respetivo fundamento legal. Citam-se, de seguida, os sumários de alguns arestos deste Tribunal da Relação de Évora que expressam a referida distinta leitura do normativo em apreço (todos in http://www.dgsi.pt/): - Acórdão de 24.11.2022 (Maria Adelaide Domingos), Proc. n.º 824/22.8T8ENT.E1: “I. Tendo a instituição bancária indicado genericamente como fundamento legal da extinção do PERSI, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10, e tendo também indicado genericamente a causa da inviabilidade da manutenção do procedimento, referenciando tão só a falta de colaboração com a instituição de crédito e a falta de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, nada de concreto referiu quanto aos fundamentos da extinção do referido procedimento, seja por via da descrição dos factos que a tal determinaram, seja pela concretização dos fundamentos que, no seu entender, a tal levaram. II. Essa forma de comunicação viola a ratio legis do citado diploma, bem como o disposto no artigo 17.º, n.º 3, do mesmo, e artigo 8.º, alínea a), do Aviso n.º 17/2012, do Banco de Portugal, aplicável ao caso dos autos, impedindo os clientes bancários de se defenderem, quer no plano factual, quer no plano legal, caso a entidade bancária venha instaurar procedimento judicial contra os mesmos para cobrança do crédito incumprido. III. A violação do no n.º 3 do artigo 17.º do PERSI nos termos sobreditos, determina a ineficácia da comunicação da extinção do PERSI (n.º 4 do artigo mesmo artigo 17.º), mantendo-se o impedimento de instauração da ação executiva.” - Acórdão de 09.02.2023 (Maria João Sousa e Faro), Proc. n.º 3358/20.1T8ENT.E1: “I. Para se apurar se a carta de extinção do PERSI cumpre os requisitos formais do n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 e do Aviso do Banco de Portugal então em vigor (Aviso n.º 17/2012) ter-se-á de saber se ocorre um dos fundamentos de extinção enunciados no n.º 1 ou no n.º 2 daquela norma. II. No primeiro caso, a tarefa informativa do Banco está facilitada já que aí se elencam, afinal, os fundamentos (automáticos) de extinção do PERSI pelo que nenhuma explicitação adicional é de exigir ao Banco quando esteja em causa uma das situações aí objectivamente definidas: pagamento ou extinção da dívida, obtenção de um acordo, decurso do prazo de 90 dias subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento ou declaração de insolvência do cliente bancário; III. A explicitação das “razões da inviabilidade da manutenção do procedimento” só faz sentido quando a extinção do PERSI tenha por fundamento uma das situações em que o Banco decide pôr-lhe termo à luz do disposto no n.º 2 do mesmo artigo 17.º, mormente nas elencadas nas alíneas c) e e) em que tal exigência se coloca com maior acuidade (v. g. discriminação dos actos praticados pelo cliente bancário que no entender do Banco são susceptíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da mesma instituição de crédito).” - Acórdão de 15.06.2023 (Tomé de Carvalho), Proc. n.º 93/23.2T8ENT.E1: “1. A falta de integração obrigatória do cliente bancário no PERSI, quando reunidos os pressupostos para o efeito, constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, intente acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito. 2. Este incumprimento do regime legal traduz-se numa falta de condição objectiva de procedibilidade que é enquadrada, com as necessárias adaptações, no regime jurídico das excepções dilatórias e que conduz à absolvição da instância. 3. A explicitação das “razões da inviabilidade da manutenção do procedimento” só é exigível quando a extinção do PERSI tenha por fundamento uma situação que não seja de funcionamento automático (por natureza, o pagamento, o acordo ou a insolvência impedem a instauração da acção executiva e o decurso do prazo corresponde a um inadimplemento de uma obrigação positiva de informação que, ipso facto, inviabiliza a composição extrajudicial, por mútuo acordo, da situação de incumprimento) e que decorra da avaliação efectuada pela instituição bancária. 4. Apenas nas situações contempladas no n.º 2 do mesmo artigo 17.º do DL n.º 227/2012, de 25/10, a instituição de crédito ou entidade equivalente fica vinculada com o ónus de justificar a razão do insucesso do processo negocial de regularização de dívidas, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, de forma a que o correspondente motivo extintivo possa ser escrutinado pela parte e avaliado substancialmente pelo Tribunal. 5. Se o procedimento bancário ficar votado ao insucesso por falta de colaboração do cliente bancário e se este estava já informado que o PERSI se extinguia no 91.º dia após o seu início, pode a carta de extinção do procedimento limitar-se a invocar o decurso de tal prazo.” - Acórdão de 11.07.2023 (Isabel Peixoto Imaginário), Proc. n.º 543/23.8T8ENT.E1: “- o PERSI extingue-se com a verificação de qualquer uma das circunstâncias previstas nas alíneas do n.º 1 do artigo 17.º; - o PERSI é extinto por iniciativa da instituição de crédito sempre que se verifique qualquer uma das circunstâncias previstas nas alíneas do n.º 2 do artigo 17.º; - o PERSI só pode ser extinto por iniciativa da instituição de crédito caso não se tenha já extinguido, nomeadamente pelo decurso do prazo de 90 dias; - verificando-se qualquer uma das circunstâncias que, por força da lei, determinam a extinção do PERSI (n.º 1 do artigo 17.º), deve o cliente bancário ser informado do facto que determinou a extinção; - não há lugar à descrição das razões que justificam a decisão da instituição de pôr termo ao procedimento porquanto essa decisão não foi tomada pela instituição.” - Acórdão de 11.01.2024 (Maria José Cortes), Proc. n.º 192/23.0T8ENT.E1: “I – Tendo a instituição bancária indicado genericamente como fundamento legal da extinção do PERSI, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, e tendo também indicado genericamente a causa da inviabilidade da manutenção do procedimento, referenciando tão só a falta de colaboração com a instituição de crédito e a falta de capacidade financeira, nada de concreto referiu quanto aos fundamentos da extinção do referido procedimento, seja por via da descrição dos factos que a tal determinaram, seja pela concretização dos fundamentos que, no seu entender, a tal levaram. II – Essa forma de comunicação viola a ratio legis do citado diploma, bem como o disposto no artigo 17.º, n.º 3, do mesmo, e artigo 9.º, alínea a), do Aviso n.º 7/2021, do Banco de Portugal, aplicável ao caso dos autos, impedindo os clientes bancários de se defenderem, quer no plano factual, quer no plano legal, caso a entidade bancária venha instaurar procedimento judicial contra os mesmos para cobrança do crédito incumprido. III – A violação do no n.º 3 do artigo 17.º do PERSI nos termos sobreditos, determina a ineficácia da comunicação da extinção do PERSI (n.º 4 do artigo 17.º), mantendo-se o impedimento de instauração da execução.” - Acórdão de 20.02.2024 (Emília Ramos Costa), Proc. n.º 1481/23.0T8ENT.E1: “I – Nos termos do artigo 17.º, nºs 1, 2, 3 e 4, do DL n.º 227/2012, de 25-10, é de distinguir as situações objetivas de extinção do PERSI das situações de extinção do PERSI por iniciativa da instituição de crédito, porém, ambas as situações, com exceção da situação prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º, só produzem efeitos após a comunicação dessa extinção aos devedores, sendo que dessa comunicação tem de constar o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais a instituição de crédito considera inviável a manutenção do PERSI. II – É, assim, de concluir que mesmo nas situações em que a extinção do PERSI opera por força da lei, o mesmo é totalmente ineficaz enquanto tal extinção não for comunicada aos devedores e não o for nos termos especificamente previstos na lei. III – Em face do disposto no artigo 8.º do Aviso n.º 17/2012 do Banco de Portugal, a informação obrigatória imposta às instituições de crédito para comunicarem a extinção do PERSI tem de ser prestada aos devedores em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis. IV – Não cumpre as exigências de descrição dos factos que determinam a extinção em concreto do PERSI, nem as exigências de clareza, rigor e legibilidade da indicação da norma legal, a missiva de comunicação de extinção do PERSI onde, na parte personalizada, apenas faz menção a que o PERSI foi extinto por “Expiração” e na restante parte apenas se limita a transcrever o teor dos motivos de extinção constantes do artigo 17.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, alíneas c), f) e g), do DL n.º 227/2012, de 25-10, sem indicar qual o motivo legal de extinção daquele concreto PERSI.” - Acórdão de 30.01.2025 (Ricardo Miranda Peixoto), Proc. n.º 1481/23.0T8ENT.E1: “I. Da comunicação da extinção do PERSI a enviar pela instituição de crédito ao devedor, devem constar, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, nos termos previstos pelo Aviso n.º 17/2012 do BdP, ex vi do n.º 3 do artigo 17.º do DL n.º 227/2012, a descrição dos factos em que se sustenta e a indicação do respetivo fundamento legal. II. Por conter conclusões sem substância factual e constituir reprodução de expressão adoptada pela norma jurídica, a comunicação em que o motivo invocado é “falta de colaboração”, não preenche o aludido requisito da descrição dos factos; III. Porque cada uma das alíneas a) a d) do n.º 1 e a) a g) do n.º 2 do artigo 17.º do DL 277/2012 prevê uma causa diferente para a extinção do PERSI, não satisfaz cabalmente a aludida obrigação de indicação do fundamento legal, a mera referência ao “artigo 17.º do PERSI”, impondo-se que a instituição de crédito identifique expressamente a alínea e o número ao abrigo dos quais está contemplada tal faculdade. IV. Verificado o incumprimento das obrigações mencionadas no ponto I., é ineficaz a comunicação da extinção do PERSI realizada pela instituição de crédito, o que a impede de instaurar acção de execução contra o devedor.” - Acórdão de 30.01.2025 (Maria Domingas Simões), Proc. n.º 2277/22.1T8ENT-A.E1: “I. A omissão da informação, a falta de integração do devedor no PERSI pela instituição de crédito ou a ausência de comunicação da extinção do procedimento constituem violação de normas de carácter imperativo. Deste modo, sendo o seu cumprimento verdadeira condição de procedibilidade, o respectivo incumprimento configura excepção dilatória atípica ou inominada e insuprível. II. Face à diferente natureza das causas extintivas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do DL 227/2012, correspondendo as primeiras a fundamentos que operam ex lege (ainda que a eficácia da extinção fique dependente da sua comunicação e recepção pelo destinatário) e dependendo as segundas da vontade da instituição bancária, apenas quanto a estas se afigura exigir a lei a motivação da decisão tomada, apontando as razões pelas quais entende, ainda que verificado um (ou vários) dos fundamentos extintivos, que o procedimento não pode manter-se.” Ora, salvo o devido e muito respeito por diversa orientação, entendemos que o n.º 3 do artigo 17.º submete todos os casos à regra imperativa da comunicação do “fundamento legal” e das “razões pela quais considera inviável a manutenção deste procedimento”, o mesmo fazendo o Banco de Portugal na alínea a) do artigo 8.º do seu Aviso, onde se assinala a dupla dimensão da comunicação de extinção do PERSI, concretamente, a “descrição dos factos” e a “indicação do respetivo fundamento legal”, sem qualquer distinção de casos. Como se escreveu no voto de vencido lavrado no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 30.01.2025 (Proc. n.º 2277/22.1T8ENT-A.E1): “Decorre da conjugação destas duas normas que o dever de comunicação estabelecido no n.º 3 abrange, quer as hipóteses previstas no n.º 2, quer as previstas no n.º 1. Em todas elas, mesmo na prevista na al. b) do n.º 1, a comunicação é obrigatória. Além de obrigatória, a comunicação é condição da eficácia da extinção do PERSI em todas as hipóteses previstas no n.º 2 e naquelas que o são nas alíneas a), c) e d) do n.º 1, pois o n.º 4 apenas exclui a da alínea b) deste número. Portanto, sublinhamos, o disposto no n.º 3 do artigo 17.º acerca do conteúdo da comunicação é aplicável, por igual, a todas as hipóteses previstas nos n.ºs 1 e 2. Qualquer distinção que o intérprete faça dos termos em que tal aplicação tenha lugar, contraria o n.º 3, que expressamente consagrou um regime uniforme para todas as referidas hipóteses. O entendimento de que o n.º 3, na sua totalidade ou apenas na sua parte final, não é aplicável às hipóteses previstas no n.º 1, ou a alguma delas, consubstancia-se numa interpretação restritiva da norma. Ora, a legitimidade da interpretação restritiva de uma norma legal carece de fundamentação convincente. Coisa que, salvo o devido respeito, não vi até este momento.” O Aviso constitui um elemento de apreciável relevo, porquanto produzido pela entidade reguladora e supervisora das instituições de crédito, sublinhando-se os termos em que esta função surge enunciada no n.º 1 do artigo 17.º da Lei Orgânica do Banco de Portugal: “Compete ao Banco de Portugal exercer a supervisão das "instituições de crédito, sociedades financeiras e outras entidades que lhe estejam legalmente sujeitas, nomeadamente estabelecendo diretivas para a sua atuação e para assegurar os serviços de centralização de riscos de crédito, bem como aplicando-lhes medidas de intervenção preventiva e corretiva, nos termos da legislação que rege a supervisão financeira.” Assim, do ponto de vista literal extrai-se inequivocamente das regras enunciadas que, por um lado, devem ser invocados os factos, isto é, a situação concreta de vida que se subsume ao preceito legal e justifica a extinção do PERSI, e, por outro lado, deve ser invocado esse mesmo preceito legal ao abrigo do qual se procede à extinção. Para além do elemento literal, o contexto em que foi adotada a regulamentação corrobora e reforça esta leitura, porquanto como se deixou acima exposto o objetivo associado ao PERSI é acompanhar o endividamento das famílias e prevenir situações dramáticas derivadas da concessão de crédito para além da respetiva capacidade financeira ou que as leva a soçobrar perante imprevistos, pelo que há uma vertente humanizadora do sistema financeiro que assoma nesta regulamentação. Ora, o regime legal evidenciado obriga o credor institucional a parar antes de pôr termo ao contrato ou de cobrar a sua dívida ao consumidor, para avaliar a situação e formular uma proposta de regularização, pelo que foi erigido como princípio a salvaguarda da estabilidade da família, em detrimento da prioridade absoluta da cobrança imediata do crédito.
3. Revertendo agora ao caso dos autos vemos que o teor da carta na qual o Exequente comunicou ao Executado a extinção do PERSI é o seguinte: «(…) ASSUNTO: Extinção do procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI) CONTRATO N.º (…), PROCESSO N.º (…) A E. S. RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO, ACE, entidade do Grupo Banco (…) responsável pela área de recuperação de dívidas, vem por este meio informá-lo que procedeu nesta data à extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento “PERSI” no qual foi integrado em 2013/08/07. O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo. A extinção do PERSI implica que terminem as garantias conferidas ao cliente bancário pelo referido Procedimento (previstas na legislação aplicável: artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 227/2012), pelo que o Banco deixa de estar impedido, de resolver o contrato em epígrafe com fundamento em incumprimento e de intentar ações judiciais com vista a satisfazer o seu crédito. Informamos que estamos à sua disposição para prestar os esclarecimentos ou informações adicionais que entenda necessários através do telefone (…), ou do e-mail: esclarecimentos persi@b...pt. Caso o incumprimento ainda se verifique, podemos em conjunto encontrar soluções para a regularização da situação de incumprimento. Venha falar connosco. (…)». Assim, a primeira constatação é a de que o Banco indica um facto para justificar a extinção: decurso de mais de 90 dias após integração no PERSI, sem que tenha sido possível chegar a acordo. A segunda constatação é a de que não foi referido qualquer normativo para suportar a extinção. Com efeito, na carta surge apenas identificado o diploma legal que institui o PERSI, sem qualquer menção do concreto preceito legal ao abrigo do qual foi extinto o PERSI, portanto, sem reporte ao artigo 17.º daquele diploma. E não se trata de uma questão semântica ou de mera faculdade, pois como se disse acima, “fundamento legal” é a norma legal que suporta a extinção do PERSI e a sua indicação é obrigatória, sendo por isso inteiramente exata a asserção do Mmo. Juiz a este respeito. Advoga, no entanto, o Recorrente que: “R. (…) para o declaratário médio, a escrita da numeração da norma, pelo artigo, número, alínea, de determinado diploma, de certo ano, mês e dia é… o mesmo que nada. S. O declaratário médio não possui extensos conhecimentos técnico-jurídicos que lhe permitam de imediato apreender o que é o escrito: “artigo 17.º, n.º 1, c), do DL 227/2012 de 25 de Outubro”. T. Com efeito, da parte do texto destacado, a única coisa que o declaratário médio conseguirá apreender é “25 de Outubro”.” Ora, não compete ao Banco apreciar discricionariamente se a aplicação da lei se justifica ou não. O seu dever é cumprir estritamente a lei. Logo, independentemente dos níveis de literacia dos consumidores com quem o Banco contrata, o seu dever é observar escrupulosamente as regras legais atinentes a esses contratos. Aliás, levadas às últimas consequências estas considerações do Banco, então os consumidores com menor literacia – precisamente os mais necessitados de proteção – , não celebrariam sequer quaisquer contratos, pois se não estão aptos a ler uma carta, quanto mais contratos muitas vezes com múltiplas cláusulas, amiúde complexas, com profusa linguagem técnico-jurídica. É evidente que a questão não pode ser colocada assim, sob pena de se excluir do comércio jurídico um imenso leque de cidadãos, o que contraria todos os princípios sobre igualdade e proteção dos mais frágeis, timbre de um Estado de direito. Toda a informação deve ser prestada a todos os cidadãos, em conformidade com os preceitos legais pertinentes, tendo os cidadãos o direito de solicitarem esclarecimentos adicionais, se deles necessitarem, e ainda que, para o efeito, se façam assistir por alguém, designadamente, um advogado que os auxilie na interpretação e reação relativamente às comunicações de que são destinatários. Aliás, a demonstração cabal de que a carta é, neste ponto, omissa, decorre da resposta que o Exequente dá ao Tribunal a quo, em sede de audição com vista à prolação de despacho liminar, onde não se limita a remeter para o teor da carta, antes vem completá-la, aditando que a situação determinante da extinção integra a alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10. Consequentemente, a falta de indicação do preceito legal que suporta a extinção do PERSI consubstancia infração deste regime legal. Mas, na realidade, inclusivamente a descrição dos factos é insuficiente, na medida em que se invoca o decurso de mais de 90 dias e a falta de acordo, sem qualquer outra indicação. Repare-se que na primeira carta do Banco foi comunicada a integração no PERSI e solicitados documentos ao devedor, após o que se passou diretamente para a extinção do PERSI pelo decurso de mais de 90 dias e a falta de acordo. É, pois, pertinente a pergunta do Mmo. Juiz: “que acordo foi proposto (ou sequer se foi proposto) e qual ou quais os concretos pontos em que não foi possível levá-lo por diante e porquê?” Se bastasse a mera invocação do decurso do prazo e a alegada falta de acordo, poderia o Banco nada fazer durante os 90 dias subsequentes à carta de integração no PERSI e, decorrido esse prazo, invocar singelamente tal facto para pôr termo ao PERSI. Porém, não é esse o objetivo da regulamentação legal em apreço, exigindo-se diligência ao Banco e especificando-se no respetivo artigo 15.º, atinente à “fase de avaliação e proposta”, em que deve consistir a sua atuação: “1 - A instituição de crédito desenvolve as diligências necessárias para apurar se o incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito se deve a circunstâncias pontuais e momentâneas ou se, pelo contrário, esse incumprimento reflete a incapacidade do cliente bancário para cumprir, de forma continuada, essas obrigações nos termos previstos no contrato de crédito. 2 - Para os efeitos previstos no número anterior, a instituição de crédito procede à avaliação da capacidade financeira do cliente bancário, podendo solicitar-lhe as informações e os documentos estritamente necessários e adequados, nos termos a definir, mediante aviso, pelo Banco de Portugal. 3 - Salvo motivo atendível, o cliente bancário presta a informação e disponibiliza os documentos solicitados pela instituição de crédito no prazo máximo de 10 dias. 4 - No prazo máximo de 30 dias após a integração do cliente bancário no PERSI, a instituição de crédito, através de comunicação em suporte duradouro, está obrigada a: a) Comunicar ao cliente bancário o resultado da avaliação desenvolvida nos termos previstos nos números anteriores, quando verifique que o mesmo não dispõe de capacidade financeira para retomar o cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, nem para regularizar a situação de incumprimento, através, designadamente, da renegociação das condições do contrato ou da sua consolidação com outros contratos de crédito, sendo inviável a obtenção de um acordo no âmbito do PERSI; ou b) Apresentar ao cliente bancário uma ou mais propostas de regularização adequadas à sua situação financeira, objetivos e necessidades, quando conclua que aquele dispõe de capacidade financeira para reembolsar o capital ou para pagar os juros vencidos e vincendos do contrato de crédito através, designadamente, da renegociação das condições do contrato ou da sua consolidação com outros contratos de crédito. 5 - Na apresentação de propostas aos clientes bancários, as instituições de crédito observam os deveres de informação previstos na legislação e regulamentação específicas.” No subsequente artigo 16.º, respeitante à “fase de negociação”, acrescenta-se que: “1 - Caso o cliente bancário recuse as propostas apresentadas, a instituição de crédito, quando considere que existem outras alternativas adequadas à situação do cliente bancário, apresenta uma nova proposta. 2 - Quando o cliente bancário proponha alterações à proposta inicial, a instituição de crédito comunica-lhe, no prazo máximo de 15 dias e em suporte duradouro, a sua aceitação ou recusa, podendo igualmente apresentar uma nova proposta, observando o disposto no n.º 5 do artigo anterior. 3 - O cliente bancário pronuncia-se sobre as propostas que lhe sejam apresentadas no prazo máximo de 15 dias após a sua receção.” Perante o elevado grau de detalhe e precisão, bem como sistematização da atuação imposta ao Banco, não pode a extinção do PERSI operar pela mera alegação genérica do decurso do prazo e falta de acordo, atendendo, ainda, aos princípios norteadores da atuação do credor neste procedimento, plasmados no artigo 4.º, n.º 1, do diploma em apreço: “1 - No cumprimento das disposições do presente diploma, as instituições de crédito devem proceder com diligência e lealdade, adotando as medidas adequadas à prevenção do incumprimento de contratos de crédito e, nos casos em que se registe o incumprimento das obrigações decorrentes desses contratos, envidando os esforços necessários para a regularização das situações de incumprimento em causa.” Assim, se a falha das negociações fosse imputável ao devedor, competia ao credor discriminar as atuações concretas que desenvolveu com vista à obtenção de um acordo e os eventuais atos ou omissões do devedor reveladores da sua falta de colaboração ou de recusa da aceitação de propostas de regularização formuladas pelo credor. A ausência de concretização das razões que determinaram a extinção do PERSI limita o exercício do contraditório por parte do devedor, restringindo as suas possibilidades de defesa. A comunicação do Banco de que se cura é, em conclusão, ineficaz, por não observar as regras que presidem à mesma (n.º 4 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10), pelo que se verifica a exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, da falta de extinção do PERSI. Ocorre, deste modo, fundamento de indeferimento liminar do requerimento executivo, devendo, em conformidade, ser mantida a decisão recorrida.
4. As custas são suportadas pelo Recorrente, atenta a improcedência do recurso (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
IV – Dispositivo Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente. Sónia Moura (Relatora) António Fernando Marques da Silva (1º Adjunto) (com declaração de voto) Susana Ferrão da Costa Cabral (2ª Adjunta)
Declaração de Voto “Voto a decisão, atendendo ao facto de se suportar também na falta de indicação do fundamento legal para a extinção do PERSI; não acompanho, porém, o entendimento relativo aos elementos inerentes à comunicação de extinção do PERSI por decurso do prazo.” António Fernando Marques da Silva |