Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | EMÍLIA RAMOS COSTA | ||
Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO NULIDADE JUSTIFICAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CADUCIDADE | ||
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Data do Acordão: | 02/25/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I – O tribunal não se deve pronunciar sobre factos que se revelam totalmente irrelevantes para as questões em discussão, visto que tal viola o princípio geral da economia processual, consagrado no art. 130.º do Código de Processo Civil. II – Nos termos dos arts. 140.º, 141.º e 147.º, todos do Código do Trabalho, a entidade empregadora apenas pode recorrer à celebração de um contrato de trabalho a termo resolutivo (certo ou incerto) para satisfação de necessidades temporárias, já não para satisfação de necessidades habituais, e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, sendo que tal contrato de trabalho tem de observar obrigatoriamente a forma escrita, e nele tem de constar, entre outros elementos, a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo, devendo a indicação do motivo justificativo do termo ser feita com menção expressa dos factos que o integram, estabelecendo-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, sob pena de, em caso de omissão ou insuficiência das referências ao termo e ao motivo justificativo, se considerar o contrato de trabalho sem termo. III – Não cumpre as exigências previstas no n.º 3 do art. 141.º do Código do Trabalho o contrato onde a justificação do termo incerto consta nos seguintes termos: “o (…) contrato está sujeito a termo incerto e vigorará durante o tempo de manutenção de níveis elevados de procura, cuja duração é difícil por estar diretamente relacionada com imponderáveis de natureza climatérica, económica e perceção de segurança.” justificando-se “(…) pela sazonalidade decorrente da natureza estrutural do mercado onde o empregador opera, que determinam o aumento temporário da necessidade de trabalhadores ao serviço, nos termos das alíneas e) e f) do Art.140º do Código de Trabalho”. IV – Tratando-se de um contrato sem termo, não se mostra legalmente prevista, nas causas de cessação lícita, a caducidade fundada no decurso do tempo, pelo que o despedimento efetuado é ilícito. (sumário da relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] ♣ Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:I – Relatório A… (Autora), representada pelo Ministério Público, intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “G…, Unipessoal Lda.” (Ré), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência, seja a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de €3.240,66, a título de retribuição e compensação global, a que acresce a compensação prevista no art. 390.º do Código do Trabalho, tudo acrescido de juros legais vencidos e vincendos. Alegou, em síntese, que a Autora celebrou com a Ré um contrato individual de trabalho a termo incerto, o qual deve ser considerado sem prazo por insuficiência de fundamentação fática para a aposição do termo e relação entre estes factos e a data final de duração do contrato e, ainda, por ter sido imposta a sua celebração pela Ré apenas para iludir e evitar a natural aplicação das regras que regulam a contratação sem termo. Mais alegou que a Autora auferia a remuneração mensal de €800,00 e se comprometia sob a direção, fiscalização e autoridade da Ré a desempenhar as funções de empregada de mesa, sempre em nome e no exclusivo interesse desta, em seu estabelecimento e com o horário de trabalho de 40 horas semanais. Alegou ainda que a Autora exerceu ininterruptamente aquelas funções entre 12 de junho e 20 de setembro de 2019, não tendo gozado férias nem recebido o salário e proporcionais de férias e natal, referentes aos 20 dias trabalhados em setembro, sendo que em 20 de setembro de 2019, a Ré fez cessar o contrato, por caducidade, sendo tal despedimento ilícito, visto que a Ré fez cessar o contrato sem motivo justificativo ou procedência de processo disciplinar. Em conclusão, peticionou que a Ré deve pagar à Autora: - Indemnização pelo despedimento ilícito em substituição da reintegração, pela qual a Autora, desde já, opta, no valor de €2.400,00, a que acresce a compensação prevista no art. 390.º do Código do Trabalho; - Proporcionais do direito a férias de 12 de junho a 20 de setembro de 2019, no valor de €218,00; - Salário de 1 a 20 de setembro, no valor de €533,33; e - Proporcionais do subsídio de férias e de natal de 1 a 20 de setembro de 2019, no valor de €89,33; Num total de €3.240,66, a que acresce a compensação prevista no art. 390.º do Código do Trabalho. … Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.… A Ré apresentou contestação, pugnando, a final, pela improcedência da ação, devendo ser absolvida.Para o efeito, e em súmula, alegou que em 05-09-2019, a Ré comunicou à Autora a sua intenção de fazer cessar o contrato de trabalho a termo incerto, com esta celebrado em 12-06-2019, tendo sido efetuado o cálculo de valor devido à Autora e emitido o respetivo recibo, não tendo a Autora colocado nada disto em causa, apenas tendo pretendido receber o valor em numerário, o que contraria as regras da empresa e deixaria a Ré em dificuldades de prova de pagamento. Mais alegou que, em 21-10-2019, enviou à Autora uma carta onde solicitava a indicação de NIB para efetuar a transferência do montante a receber, e a Autora respondeu-lhe que tinha de pagar a dinheiro ou então ia fazer queixa, tendo, então, a Ré respondido que iria proceder ao pagamento através de cheque, cheque esse que foi remetido à Autora, por carta datada de 06-12-2019, tendo a Autora devolvido tal cheque à Ré. Alegou igualmente que o Algarve será a região do País, nos setores da restauração e demais atividades relacionadas com o turismo, aquele em que mais se justifica a celebração de contratos a termo incerto, dadas as incertezas meteorológicas, sendo que muitos estabelecimentos de restauração encerram no Outono e Inverno e aqueles que se mantêm abertos todo o ano, não necessitam de tantos funcionários nesse período. Alegou ainda que os peticionados proporcionais do direito a férias não são devidos, visto que foram gozados pela Autora, nem os proporcionais de subsídio de férias e de natal, visto já terem sido pagos, sendo que também não deve ser condenada a pagar as restantes verbas, pois a Autora apenas não as recebeu por sua culpa. Alegou, por fim, que o contrato de trabalho a termo incerto, celebrado entre a Autora e a Ré, é lícito, e foi celebrado de boa-fé entre as partes, encontrando-se o termo justificado na sazonalidade decorrente da natureza estrutural do mercado onde a Ré opera, tendo o período de duração do vínculo entre Autora e Ré decorrido no período de maior procura dos serviços desta, atuando a Autora em evidente abuso de direito e má fé processual. … Foi proferido despacho saneador tabelar e fixado o valor da causa em €3.240,66.… Realizada a audiência de julgamento de acordo com as formalidades legais, foi proferida a sentença em 14-08-2020, com a seguinte decisão:Em face do exposto decido: a) declarar que o contrato de trabalho outorgado entre A… e G…, Unipessoal, Lda. considera-se contrato sem termo; b) declarar ilícito o despedimento de A… e, em consequência, condeno a R., G…, Unipessoal, Lda. a pagar-lhe: 1. as retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da interposição da ação até ao trânsito em julgado da decisão, às quais deverão ser deduzidas as quantias referidas nas alíneas a) e c) do art.390º nº 2 do Código de Trabalho, a fixar em liquidação de sentença; 2. a título de indemnização a quantia de €2 400,00 (dois mil e quatrocentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efetivo e integral pagamento; 3. a quantia de €533,33(quinhentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos) a título de vencimento, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 21 de setembro de 2019 e até efetivo e integral pagamento; 4. a quantia de € 43,84 (quarenta e três euros e oitenta e quatro cêntimos) a título de proporcional de subsidio de férias, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 21 de setembro de 2019 e até efetivo e integral pagamento. 5. a quantia de €43,84 (quarenta e três euros e oitenta e quatro cêntimos) a título de proporcional de subsidio de natal, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 21 de setembro de 2019 e até efetivo e integral pagamento. 6. a quantia de €218,00 (duzentos e dezoito euros) a título de remuneração de férias, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 21 de setembro de 2019 e até efetivo e integral pagamento. c) absolvo a R. do demais peticionado. d) custas da ação por A. e R. na proporção do decaimento e sem prejuízo da isenção de que o A. beneficia (cfr.art.527º do CPC ex vi art.1º nº 2 al. a) do CPT). … Não se conformando com a sentença, veio a Ré interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem:a) Esse Tribunal da Relação de Évora, deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto quando a prova produzida impuser decisão diversa (nº 1 do art.º 662º do CPC), o que se requer. b) Considera o recorrente incorretamente julgados, por terem sido julgados como não provados e deveriam ter sido julgados como provados, os seguintes pontos da matéria de facto, por referência ao probatório: 2. A comunicação da caducidade do contrato de trabalho tenha sido feita por escrito através da remessa do documento nº 1, junto com a contestação; 3. A R. tenha remetido à A. cheque bancário; 4. A A. tenha devolvido o mesmo; 6. A duração do Verão seja incerta, havendo anos em que no mês de outubro, o tempo ainda está bom, a procura por estabelecimentos de restauração se mantém elevada e outros em que no mês de setembro, as condições meteorológicas menos favoráveis, fazem diminuir drasticamente a clientela. c) Os concretos meios probatórios que impunham, que tais pontos da matéria de facto tivessem sido considerados como provados, são desde logo, as declarações de parte prestadas pelo gerente da ora recorrente em sede de audiência de julgamento, que foi claro e convincente, gravadas em CD áudio, (confrontar ata da audiência de julgamento), cujas declarações foram transcritas nas Alegações. d) Sendo que, o ponto 6 dos factos dados como não provados, deveria ter sido dado como provado, porquanto, salvo melhor opinião, constitui facto notório. e) No que respeita à decisão que deve ser tomada sobre as questões de facto ora impugnadas, entende a recorrente que devem os pontos de facto acima referidos, serem considerados como provados, o que desde já se requer a V. Exas. f) Considera ainda a recorrente incorretamente julgados, porque pela sua relevância para a decisão de mérito da causa, deveriam ter sido considerados como provados na douta Sentença recorrida, os seguintes pontos de facto: 1. A A. em momento algum colocou em causa a cessação do contrato, ou o apuramento do valor a receber; 2. A R. colocou, por diversas formas e por diversas vezes a quantia devida à Autora, apurada pela contabilidade, sendo que foi esta quem a não quis receber; 3. A única reclamação da A. prende-se com a exigência do recebimento em dinheiro, ameaçando que se assim não fosse, recorreria ao Tribunal, mas apenas por este motivo; 4.O restaurante explorado pela R. tem mais clientes de Verão do que no Inverno; 5. No ano de 2019, a partir de setembro houve uma redução de clientes e a A. deixou de necessitar do trabalho prestado pela A. g) Os concretos meios probatórios que impunham, que tais pontos da matéria de facto tivessem sido considerados como provados, são desde logo, as declarações de parte prestadas pelo gerente da ora recorrente em sede de audiência de julgamento, que foi claro e convincente, gravado em CD áudio, (confrontar ata da audiência de julgamento), cujas declarações foram transcritas nas Alegações. h) No que respeita aos pontos 1 e 3, integram ainda os concretos meios probatórios que impunham, que tais pontos da matéria de facto tivessem sido considerados como provados, a carta da recorrida dirigida à ora recorrente datada de 5 de novembro de 2019, levada ao ponto 7 do probatório da douta Sentença recorrida. i) De onde resulta de forma clara, que a única exigência da recorrida se prende com o pagamento em dinheiro, não colocando de qualquer forma em causa o termo do contrato de trabalho. j) No que respeita à decisão que deve ser tomada sobre as questões de facto ora impugnadas, entende a recorrente que devem os pontos de facto 1 a 5, acima referidos, serem considerados como provados, o que desde já se requer a V. Exas. k) Ainda que, as declarações de parte, no que não respeitem a confissão estejam submetidas ao princípio da livre apreciação da prova, nos termos do art.º 466º do CPC, tal não significa que o Tribunal as possa arredar, sem qualquer cabal fundamentação. l) De facto, dizer-se que o depoimento de parte não mereceu relevância porque se limitou a reproduzir o alegado, carece de qualquer fundamentação lógica atendível. m) Desde logo, não se vê o que é que o legal representante poderia acrescentar ao alegado, porquanto os factos explanados na contestação são poucos e simples, para além de que, se o gerente da recorrente confirmou os factos, sem que mais nada se diga, à partida será porque o que foi alegado é verdade. n) Sendo certo que, apenas consta da ata da audiência que a ora recorrente prescindiu da testemunha arrolada, apenas o fez, porque houve um lapso por parte da sua contabilidade a transmitir os dados ao Mandatário subscritor e esta testemunha nada sabia à cerca dos factos. o) Pelo que o único meio de prova, para além da prova documental, possível foram as declarações de parte do legal representante da recorrente. p) Não restando dúvidas de que as declarações de parte, podem ser tidas em conta para prova de factos arrolados, o que deveria ter ocorrido nos presentes autos (Neste sentido, vide, o entendimento do Exmo. Sr. Juiz Desembargador, Luís Filipe Pires de Sousa, in, AS DECLARAÇÕES DE PARTE. UMA SÍNTESE, Abril de 2017, in,http://www.trl.mj.pt/PDF/As%20declaracoes%20de%20parte.%20Uma%20sintese.%202017.pdf. q) Pelo que não restam dúvidas, de que as declarações de parte prestadas pelo legal representante da ora recorrente, deveriam ter sido tomadas em conta para prova dos factos objeto da impugnação da matéria de facto, acima desenvolvida. r) Assim, a douta Sentença recorrida ao entender que as declarações do legal representante da R. se limitaram a reproduzir o alegado e, por isso nenhuma relevância se lhe deu, preconizou uma errónea interpretação das disposições aplicáveis, não podendo em consequência permanecer na ordem jurídica. s) Salvo melhor opinião, o contrato de trabalho a termo incerto, celebrado com a recorrida, é um contrato lícito, celebrado de boa fé entre as partes, nos termos da Lei (vide, art.º 140.º, n.2, al. e) e f) e art.º 141º, todos do CT. t) Encontrando-se a fundamentação da celebração do contrato de trabalho a termo incerto, cabalmente alicerçada, não se limitando à referência à sazonabilidade, sendo certo que, à mesma se faz referência. u) Na verdade, como consta da douta Sentença recorrida a fundamentação é bastante mais ampla “(…) o contrato está sujeito a termo e vigorará durante o tempo de manutenção de níveis elevados de procura, cuja duração é difícil por estar diretamente relacionada com imponderáveis de natureza climatérica, económica e perceção de segurança” justificando-se “(…) pela sazonabilidade decorrente da natureza estrurural do mercado onde o empregador opera, que determinam o aumento temporário da necessidade de trabalhadores ao serviço, nos termos, nos termos das alíneas e) e f) do art.º 140º do Código do Trabalho”. v) Ora, ainda que se conceda que o texto que dá corpo às cláusulas XXIII – Duração do Contrato, e XXIV – Admissibilidade da Contratação a Termo, tenha algumas imperfeições, no entanto tal facto, não pode desvirtuar a substância dos mesmos, nem a cabal justificação da celebração do contrato. w) Cuja vigência irá ocorrer enquanto existirem níveis elevados de procura (das refeições servidas no restaurante), sendo difícil de determinar até quando, porquanto tal procura depende de fatores imponderáveis, designadamente, de ordem climatérica e económica. x) Ou seja, a referência à sazonabilidade é justificada com base na manutenção da procura dos serviços prestados pela recorrente, cuja duração à data de celebração do contrato não poderia ser prevista, precisamente por depender de fatores imponderáveis. y) Razão pela qual, não só a fundamentação do termo se afigura cabal, como foi efetivamente percebida pela recorrida, que não só quis celebrar tal contrato como compreendeu os motivos do termo. z) Cabendo aliás frisar, que a recorrida não se insurgiu contra o termo e a respetiva caducidade do contrato, nem tão pouco contra a quantia posta à sua disposição, mas apenas exigiu que o pagamento fosse feito em dinheiro, conforme resulta da carta levada ao ponto 7 do probatório da douta Sentença, transcrita nas Alegações. aa) Tanto mais, que atendendo à impugnação da matéria de facto, acima consubstanciada, deveriam, por tudo quanto acima foi exposto, ter sido considerado provados na douta Sentença recorrida os factos acima elencados. bb) A comunicação da caducidade do contrato foi validamente efetuada, tendo ao contrário do entendido na douta Sentença recorrida, produzido todos os seus efeitos. cc) Extravasando, salvo o devido respeito e melhor opinião, a merecida tutela jurídica, condenar alguém no pagamento de uma importância que sempre se disponibilizou a pagar e cujo pagamento apenas não foi efetuado, porque a recorrida, não quis receber. dd) Recorrida, que aliás, atuou em evidente abuso de direito e até má fé processual, utilizando o recurso ao presente processo judicial, não para fazer valer os seus direitos legalmente decorrentes da celebração e cessação de um contrato de trabalho, mas antes, e como resulta amplamente demonstrado, para receber o pagamento em “dinheiro vivo”. ee) Assim a douta Sentença recorrida, ao entender que o termo não é válido preconizou, também pelo ora exposto, uma errónea interpretação das disposições aplicáveis, não podendo em consequência permanecer na ordem jurídica. Nestes termos, nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e revogada a douta sentença do Tribunal “a quo” na parte em que julgou a ação procedente, com todas as consequências legais daí advindas. … A Autora, representada pelo Ministério Público, apresentou contra-alegações, as quais terminaram com as seguintes conclusões:1. É sobre as declarações de parte prestadas pelo gerente da Ré que assenta a discordância desta relativamente aos factos que considera que foram erradamente julgados não provados e sobre os factos que considera relevantes para a boa decisão da causa e, todavia a sentença proferida não os considerou; 2. As declarações de parte são declarações de pessoas interessadas no desfecho da acção e, por conseguinte, tendencialmente parciais, vindo a jurisprudência a entender que, quanto a factos essenciais e que são favoráveis á parte, as respectivas declarações serão, em princípio, insuficientes, só por si, desacompanhadas de outras provas para as sustentar; 3. A prova dos factos favoráveis ao depoente e cuja prova lhe incumbe não se pode basear apenas na simples declaração dos mesmos, é necessária a corroboração de algum outro elemento de prova, com os demais dados e circunstâncias, sob pena de se desvirtuarem as regras elementares sobre o ónus probatório e das acções serem decididas apenas com as declarações das próprias partes. 4. Assim sendo, bem decidiu a Mmª. Juíza a quo considerando que as declarações de parte do legal representante da Ré se limitaram a reproduzir o alegado, não lhes podendo dar relevância; 5. A douta sentença ora em crise considerou que, pela forma genérica utilizada pela Apelante no contrato de trabalho celebrado com a A., não permite estabelecer a relação entre os motivos e o termo utilizado para tanto não bastando a mera referência à sazonalidade porquanto, a ser assim, sabendo-se que a mesma é uma realidade no Algarve, estaria aberta a porta a que todos os contratos realizados pelas empresas no período de verão, pudessem sê-lo a termo, ainda que a contratação fosse necessária para assegurar uma função permanente do estabelecimento. 6. Daqui conclui a douta sentença não poder a Apelante invocar, como invocou a caducidade para o fazer cessar, pelo que terá essa cessação de ser considerada ilícita, por força do disposto no artº.381º, al.b) do Código do Trabalho e, em consequência, condenando a Apelante, nos termos do disposto nos arts.386º e 390º do Código do Trabalho. 7. O contrato aqui em causa, celebrado entre a Apelante e o A., foi um contrato a termo resolutivo, regulado pelos arts.139º a 149º do Código do Trabalho, o qual, por via da falta de cumprimento do exigido quanto à forma e conteúdo de tais contratos, conforme o disposto no artº.141º do Código do Trabalho, foi julgado contrato sem termo, nos termos do disposto no artº.147º do mesmo diploma legal. 8. A sentença ora em recurso fez uma correcta apreciação das provas, pronunciando-se sobre os factos que julgou provados e não provados, sobre os quais fundamentou a sua decisão, sendo esta compatível e adequada com tal apreciação, decidindo em consonância, de acordo com a livre convicção do tribunal e adequada apreciação e valoração das provas, sendo o raciocínio expresso pela Mmª.Juiz claro e consequente. Termos em que, deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se na íntegra a sentença recorrida. Vossas Excelências, no entanto, decidirão como for de JUSTIÇA. … O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo, tendo tal recurso sido mantido nos seus exatos termos, pelo que, dispensados os vistos, cumpre agora apreciar e decidir.♣ II – Objeto do RecursoNos termos dos arts. 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil). No caso em apreço, as questões que importa decidir são: 1) Impugnação da matéria de facto; e 2) Validade do termo aposto no contrato de trabalho. ♣ III – Matéria de FactoO tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos: 1. Por escrito constante de fls. 3 a 4 que aqui se reproduz, em 11 de junho de 2019, A. e R. outorgaram acordo mediante o qual esta contratou para, a partir de 12 de junho do mesmo ano, mediante o pagamento da quantia mensal de €800, 00, lhe prestar funções de empregada de mesa, 40 horas por semana. 2. Mais acordaram as partes que “o (…) contrato está sujeito a termo incerto e vigorará durante o tempo de manutenção de níveis elevados de procura, cuja duração é difícil por estar diretamente relacionada com imponderáveis de natureza climatérica, económica e perceção de segurança.” justificando-se “(…) pela sazonalidade decorrente da natureza estrutural do mercado onde o empregador opera, que determinam o aumento temporário da necessidade de trabalhadores ao serviço, nos termos das alíneas e) e f) do Art.140º do Código de Trabalho.” 3. Em 20 de setembro de 2019 a R. fez cessar o contrato alegando caducidade do mesmo. 4. A R. não pagou à A. qualquer quantia a título de remuneração de férias respeitantes ao tempo de serviço prestado, de salário relativo aos 20 dias de setembro de 2019, nem proporcionais de subsidio de férias e natal relativos ao último mês de contrato. 5. A R. elaborou as contas finais. 6. Por carta de 21 de outubro de 2019 a R. solicitou à A. a indicação do NIB a fim de efetuar a transferência referente ao montante a receber. 7. Em 5 de Novembro de 2019 a A. respondeu à R. declarando “(…) começo por estranhar que Vª Exª me peça o número da conta, quando sempre soube que eu não tenho conta bancária, até porque me pagou em dinheiro. Assim, caso não me pague de qualquer outra forma que não implique conta bancária como sempre fez, tenciono apresentar queixa no tribunal de trabalho a fim de receber os créditos a que tenho direito e uma indemnização (…)”. 8. No verão há restaurantes no Algarve que têm mais clientes do que no inverno. 9. Por isso, muitos estabelecimentos de restauração encerram no Outono e Inverno, vindo a reabrir na Primavera. … E não foram dados como provados os seguintes factos:1. A A. não tenha gozado férias. 2. A comunicação da caducidade do contrato tenha sido feita por escrito através da remessa do documento nº1 junto com a contestação; 3. A R. tenha remetido à A. cheque bancário. 4. A A. tenha devolvido o mesmo. 5. A A. tivesse indicado NIB para à R. para que lhe fossem feitos pagamentos. 6. A duração do Verão seja incerta, havendo anos em que no mês de outubro, o tempo ainda está bom, a procura por estabelecimentos de restauração se mantém elevada e outros em que no mês de setembro, as condições meteorológicas menos favoráveis, fazem diminuir drasticamente a clientela. 7. Todos os restaurantes do Algarve tenham mais clientes no verão do que no inverno. (Acrescentou-se o facto 8, conforme fundamentação infra mencionada) ♣ IV – Enquadramento jurídicoConforme supra mencionámos, o que importa analisar no presente recurso é se (i) a sentença recorrida fez um incorreto julgamento da matéria de facto; e (ii) a sentença recorrida devia ter considerado válido o termo aposto no contrato de trabalho. … 1 – Impugnação da matéria de factoDe acordo com as conclusões formuladas pela Apelante, o tribunal a quo deveria: a) ter dado como provados os factos não provados nºs. 2, 3, 4 e 6, quanto aos factos 2 a 4) em face das declarações de parte da Ré e quanto ao facto 6 por se tratar de um facto notório; e b) ter dado como provados os seguintes factos: 1) A Autora em momento algum colocou em causa a cessação do contrato, ou o apuramento do valor a receber; 2) A Ré colocou, por diversas formas e por diversas vezes a quantia devida à Autora, apurada pela contabilidade, sendo que foi esta quem a não quis receber; 3) A única reclamação da Autora prende-se com a exigência do recebimento em dinheiro, ameaçando que se assim não fosse, recorreria ao Tribunal, mas apenas por este motivo; 4) O restaurante explorado pela Ré tem mais clientes de Verão do que no Inverno; 5) No ano de 2019, a partir de setembro houve uma redução de clientes e a Autora deixou de necessitar do trabalho prestado pela Autora. Tais factos mostram-se consubstanciados nas declarações da Ré e, quanto aos concretos pontos 1 e 3, também na carta datada de 05-11-2019. Dispõe o art. 640.º do Código de Processo Civil que: 1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º. Relativamente à interpretação das obrigações que impendem sobre a Recorrente, nos termos do n.º 1 do art. 640.º do Código de Processo Civil, cita-se, entre muitos, o acórdão do STJ, proferido em 03-03-2016, no âmbito do processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1, consultável em www.dgsi.pt: I – No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao Recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. II – Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. III – O ónus a cargo do Recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado. IV – Nem o cumprimento desse ónus pode redundar na adopção de entendimentos formais do processo por parte dos Tribunais da Relação, e que, na prática, se traduzem na recusa de reapreciação da matéria de facto, máxime da audição dos depoimentos prestados em audiência, coarctando à parte Recorrente o direito de ver apreciada e, quiçá, modificada a decisão da matéria de facto, com a eventual alteração da subsunção jurídica. Relativamente à apreciação da matéria de facto em sede de recurso, importa acentuar que o disposto no art. 640.º do Código de Processo Civil consagra atualmente um duplo grau de jurisdição, persistindo, porém, em vigor o princípio da livre apreciação da prova por parte do juiz da 1.ª instância, previsto no art. 607.º, n.º 5, do mesmo Diploma Legal. No entanto, tal princípio da livre apreciação da prova mostra-se condicionado por uma “prudente convicção”, competindo, assim, ao Tribunal da Relação aferir da razoabilidade dessa convicção, em face das regras da experiência comum e da normalidade da vida, da ciência e da lógica. Veja-se sobre esta matéria o sumário do acórdão do STJ, proferido em 31-05-2016, no âmbito do processo n.º 1572/12.2TBABT.E1.S1, consultável em www.dgsi.pt: I - O tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou. II - Desde que o recorrente cumpra as determinações ínsitas no art. 640.º, o tribunal da Relação não poderá deixar de fazer a reapreciação da matéria de facto impugnada, podendo alterar o circunstancialismo dado como assente na 1.ª instância. Cita-se ainda o sumário do acórdão do TRG, proferido em 04-02-2016, no âmbito do processo n.º 283/08.8TBCHV-A.G1, consultável em www.dgsi.pt: I- Para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada na resposta que se deu à factualidade controvertida, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova. E, a ser assim, o Tribunal da Relação, aquando da reapreciação da matéria de facto, deve, não só recorrer a todos os meios probatórios que estejam à sua disposição e usar de presunções judiciais para, desse modo, obter congruência entre a verdade judicial e a verdade histórica, como também, sem incorrer em excesso de pronúncia, ao alterar a decisão de determinados pontos da matéria de facto, retirar dessa alteração as consequências lógicas inevitáveis que se repercutem noutros pontos concretos da matéria de facto, independentemente de tais pontos terem ou não sido objeto de impugnação nas alegações de recurso. Cita-se a este propósito, o sumário do acórdão do STJ, proferido em 13-01-2015, no âmbito do processo n.º 219/11.9TVLSB.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt: XIII - Não ocorre excesso de pronúncia da decisão, se a Relação, ao alterar a decisão da matéria de facto relativamente a alguns pontos, retira dessa modificação as consequências devidas que se repercutem noutra matéria de facto, sendo irrelevante ter sido esta ou não objecto de impugnação nas alegações de recurso. Por fim, importa ainda esclarecer que o Tribunal da Relação, na sua reapreciação da prova, terá sempre que atender à análise crítica de toda a prova e não apenas aos fragmentos de depoimentos que, por vezes, são indicados, e que retirados do seu contexto, podem dar uma ideia bem distinta daquilo que a testemunha efetivamente mencionou, bem como daquilo que resultou da globalidade do julgamento. Cumpre decidir. Em primeiro lugar, importa atentar que, relativamente aos transcritos factos 1) a 5), não constam os mesmos da sentença recorrida, pelo que deveria a Apelante ter esclarecido qual a razão para os indicar, designadamente, por os mesmos se encontrarem alegados na contestação e não terem sido tidos em conta na sentença recorrida. No caso em apreço, e apesar de não ter sido efetuada tal alegação, uma vez que os factos que a Apelante pretende que sejam acrescentados à sentença recorrida se mostram concretizados, facilmente se constatou que apenas os três primeiros factos se encontram alegados na contestação[2], o que já não ocorre quanto aos factos 4) e 5). Assim, no que se reporta aos factos 4)[3] e 5)[4], por se reportarem a factos novos, nunca alegados pelas partes, não podem os mesmos ser atendidos em sede de recurso. Cita-se a esse propósito, o acórdão do TRC, proferido em 14-01-2014, no âmbito do processo n.º 154/12.3TBMGR.C1, consultável em www.dgsi.pt: De qualquer forma, constata-se que estas questões agora invocadas em sede de recurso, quanto ao prazo do pagamento do alegado empréstimo e subordinação do pagamento às possibilidades financeiras do R., são questões novas, que não foram alegadas oportunamente, nem resultaram provadas, não podendo por isso ser levadas em conta, estando vedada a sua apreciação ao tribunal, nos termos do disposto no artº 608 nº 2 do C.P.C. Com total pertinência para esta questão, diz-nos de forma sintética o Acórdão do Tribunal da Reção de Coimbra de 22/102013, in. www.dgsi.pt :“ no direito português, os recursos ordinários, como é o caso, são de reponderação; visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento; o que significa que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Daí o dizer-se que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamentos de questões novas; estando por isso excluída a possibilidade de alegação de factos novos na instância de recurso…” Ora, esta situação agora suscitada pelo R. de que, a existir uma obrigação de restituição a mesma estaria sempre subordinado às suas possibilidades financeiras, é uma questão completamente nova, que não foi oportunamente alegada pelo R. e por isso não decidida na 1ª instância, não podendo por isso aqui ser reapreciada. Nesta conformidade, rejeita-se o recurso da matéria de facto quanto aos aludidos factos 4) e 5). Quanto aos demais factos, por se considerarem cumpridos os requisitos impostas pelo n.º 1 do 640.º do Código de Processo Civil, será feita a sua apreciação. Consigna-se que se procedeu à audição de todo o julgamento. a) Factos não provados nºs. 2, 3, 4 e 6 Consta destes factos o seguinte: 2. A comunicação da caducidade do contrato tenha sido feita por escrito através da remessa do documento nº1 junto com a contestação; 3. A R. tenha remetido à A. cheque bancário. 4. A A. tenha devolvido o mesmo. 6. A duração do Verão seja incerta, havendo anos em que no mês de outubro, o tempo ainda está bom, a procura por estabelecimentos de restauração se mantém elevada e outros em que no mês de setembro, as condições meteorológicas menos favoráveis, fazem diminuir drasticamente a clientela. Pretende a Apelante que os factos não provados 2 a 4 sejam dados como provados em face das declarações de parte do legal representante da Ré, insurgindo-se contra a circunstância de não ter sido relevado tal depoimento. Dispõe o art. 466.º do Código de Processo Civil (aplicável por força do disposto no art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho) que: 1 - As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto. 2 - Às declarações das partes aplica-se o disposto no artigo 417.º e ainda, com as necessárias adaptações, o estabelecido na secção anterior. 3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão. Devem, assim, as declarações de parte ser apreciadas livremente pelo tribunal, pelo que deverá ser sempre efetuada uma apreciação crítica do seu depoimento, o que manifestamente não foi feito pelo tribunal a quo. Importa, porém, ter sempre em atenção que a parte é inevitavelmente interessada no desfecho da causa, razão pela qual a apreciação do seu depoimento necessitará de maiores cautelas, devendo, por isso, ser corroborado por outros meios de prova. Cita-se, sobre esta matéria, o acórdão do TRG, proferido em 18-01-2018, no âmbito do processo n.º 294/16.0Y3BRG.G1[5]: I - O Código de Processo Civil de 2013 introduziu, no seu artigo 466.º, um novo e autónomo meio de prova, a figura da prova por declarações de parte, que não pode contudo ser requerida pela parte contrária, mas nada obsta a que o depoimento de parte, na parte não confessória possa ser livremente apreciado pelo julgador, desde que observada a devida cautela, pois por natureza é um depoimento interessado. II - Da declaração da parte importa que o seu relato esteja espontaneamente contextualizado e seja coerente, quer em termos temporais, espaciais e emocionais e que seja credenciado por outros meios de prova, designadamente que as declarações da parte sejam confirmadas, por outros dados, que ainda indirectamente, demonstrem a veracidade da declaração. Caso contrário a declaração revelará força probatória de tal forma débil que não deve ser tida em conta. III - A prova dos factos favoráveis ao depoente e cuja prova lhe incumbe não se pode basear apenas na simples declaração dos mesmos, é necessária a corroboração de algum outro elemento de prova, com os demais dados e circunstâncias, sob pena de se desvirtuarem as regras elementares sobre o ónus probatório e das acções serem decididas apenas com as declarações das próprias partes. No caso em apreço, e quanto aos factos não provados 2 e 3, ambos se reportam ao alegado envio de cartas pela Ré à Autora, pelo que tal envio sempre deveria ser confirmado de forma imparcial e isenta, designadamente através do registo dos correios, tanto mais que, quanto à primeira das cartas (a carta a comunicar a caducidade do contrato de trabalho), o próprio legal representante da Ré referiu, em sede de declarações, ter sido efetuado o envio da carta com aviso de receção. E, a ser assim, é incompreensível como tal prova do registo e respetivo aviso de receção não foi junta aos autos. Deste modo, e ainda que sem efetuar um exame crítico ao depoimento de parte do legal representante da Ré, andou bem o tribunal a quo ao não ter dado tais factos como provados. Quanto ao facto não provado 4, para além de não constar dos autos qualquer cheque, não tendo sido confirmado o envio da carta que alegadamente o remeteu à Autora, também não é possível dar como provado que tal cheque foi devolvido pela Autora à Ré apenas com base no depoimento de parte do legal representante da Ré, pelo que, e uma vez mais, é de confirmar a apreciação do tribunal da 1.ª instância. Por fim, quanto ao facto não provado 6, refere a Apelante que, para além de tal circunstância ter sido mencionada pelo legal representante da Ré, é um facto notório. Dispõe o art. 412.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que: 1 - Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral. Na realidade, conforme bem referem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa no Código de Processo Civil Anotado[6], Não carecem de prova os factos notórios, isto é, os que sejam de conhecimento e de experiência comum, de acordo com os padrões médios da coletividade de um determinado tempo e lugar. A exigência do conhecimento geral atua em vários âmbitos: na esfera pessoal, o facto notório tem de constar como certo ou falso para a generalidade de pessoas de cultura média, entre as quais se encontre o juiz; na esfera cognoscitiva, no sentido de que tal conhecimento deve integrar a cultura média, não integrando apenas um saber especializado; na esfera espacial, no sentido de que tal facto deve ser conhecido no território a que respeita. Cita-se[7] ainda o acórdão do STJ, proferido em 23-02-2005, no âmbito do processo n.º 04S3165[8]: 3. Factos notórios são apenas aqueles que sejam do conhecimento geral, ou seja, os que sejam do conhecimento da massa dos cidadãos portugueses regularmente informados, isto é, com acesso aos meios normais de informação. Transpondo a presente definição ao caso concreto, é do conhecimento e da experiência comum, de acordo com os padrões da coletividade do nosso País, que a duração do verão é incerta, havendo anos em que no mês de outubro o tempo ainda está bom e outros em que no mês de setembro as condições meteorológicas são menos favoráveis. Já relativamente à circunstância de as condições meteorológicas manterem elevada, se forem boas, ou drasticamente diminuída, se forem más, a clientela nos estabelecimentos de restauração, nos meses de setembro e outubro, presume-se que no Algarve, importa atentar a que muitos outros fatores, para além do fator meteorológico, interferem no aumento ou na diminuição da clientela nos estabelecimentos de restauração no algarve. Na realidade, não podemos esquecer de igual modo, por exemplo, as questões económicas (em épocas de crise há menos clientela do que em época de estabilidade económica), as questões de estruturação social (durante os períodos de férias sempre haverá maior clientela, o que apenas poderá abranger a primeira semana de setembro) e de estruturação semanal (haverá maior clientela aos fins de semana do que durante a semana). Desse modo, não sendo o fator meteorológico necessariamente determinante, não é possível dar como provado, por ser notório, o facto elencado como facto não provado 6 nos seus exatos termos, sendo apenas possível dar como provado que “a duração do verão é incerta, havendo anos em que no mês de outubro o tempo ainda está bom e outros em que no mês de setembro as condições meteorológicas são menos favoráveis”. De qualquer modo, o facto que é passível de ser dado como provado é totalmente inócuo para o desenlace das questões em apreciação, visto que a notória alteração das condições meteorológicas ao longo dos anos, e concretamente nos meses de setembro e de outubro, desassociada do seu reflexo nos estabelecimentos de restauração, não possui qualquer relevância jurídica para a análise do presente processo, pelo que, nos termos do art. 130.º do Código de Processo Civil[9], que determina a ilicitude da prática de atos inúteis, dar apenas como provado tal facto é manifestamente inútil e, portanto, proibido por lei. Nesta conformidade, mantém-se como não provado o facto não provado 6 nos seus exatos termos, improcedendo, também nesta parte, a pretensão da Apelante. … b) Três factos alegados na contestaçãoDe acordo com o alegado pela Apelante, os seguintes factos que invocou em sede de contestação deveriam ter sido dados como provados: 1) A Autora em momento algum colocou em causa a cessação do contrato ou o apuramento do valor a receber; 2) A Ré colocou, por diversas formas e por diversas vezes a quantia devida à Autora, apurada pela contabilidade, sendo que foi esta quem a não quis receber; e 3) A única reclamação da Autora prende-se com a exigência do recebimento em dinheiro, ameaçando que se assim não fosse, recorreria ao Tribunal, mas apenas por este motivo. Estes factos, apesar de terem sido invocados na contestação da Apelante, não ficaram a constar do elenco dos factos provados e não provados na sentença recorrida. Importa, então, apurar se estamos perante factos essenciais, instrumentais, complementares, nos termos do art. 5.º, nºs. 1 e 2, als. a) e b), do Código de Processo Civil, ou se, pelo contrário, estamos perante factos inócuos. Na realidade, e quanto aos factos 1) e 3), revelam-se os mesmos totalmente irrelevantes para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito. Efetivamente, a instauração de uma ação por despedimento ilícito não impede o trabalhador de pretender receber os créditos salariais a que tinha direito (designadamente, salário, subsídio de férias e natal), nem implica que este tenha de dar prévio conhecimento à entidade patronal da sua intenção em instaurar um processo judicial por despedimento ilícito (sendo que, muitas das vezes, apenas quando o trabalhador recorre a um profissional de direito, para apurar como pode receber os créditos salariais em falta, é que toma conhecimento da eventual ilicitude do despedimento). Deste modo, e como já mencionámos supra, o tribunal não se deve pronunciar sobre factos que se revelam totalmente irrelevantes para as questões em discussão, visto que tal viola o princípio geral da economia processual, consagrado no art. 130.º do Código de Processo Civil, pelo que apenas os factos que originem consequências jurídicas podem ser inseridos no elenco factual, recaindo sobre eles, e apenas sobre eles, a prova a realizar. Assim, bem andou o tribunal a quo ao não integrar tais factos no elenco factual dos factos provados e não provados, e, de igual modo, em sede de recurso, por nos encontramos abrangidos pelo princípio da economia processual, também não o faremos. Resta, então, apenas a apreciação do facto 2), uma vez que a recusa do credor em receber a prestação do devedor é suscetível de ter consequências jurídicas (designadamente, as previstas no art. 366.º, nºs. 4 e 5, do Código de Trabalho nas situações em que se aplica, ou a prevista no art. 813.º do Código Civil). Na realidade, tal facto apenas foi referido pelo legal representante da Ré, inexistindo nos autos qualquer outro elemento de prova suscetível de demonstrar a veracidade dessa declaração, e, deste modo, por a mesma, per si, revelar força probatória insuficiente para permitir a comprovação do facto, o mesmo terá de ser dado como não provado, acrescentando-se este facto ao elenco dos factos não provados. Em conclusão: Procede parcialmente a pretensão da Apelante, ao ver um dos factos alegados na contestação, mas não constantes da sentença recorrida, integrar o elenco factual, ainda que, contrariamente ao pretendido, nos factos não provados. Assim, acrescenta-se aos factos não provados o seguinte facto: 8.A Ré colocou, por diversas formas e por diversas vezes a quantia devida à Autora, apurada pela contabilidade, sendo que foi esta quem a não quis receber. … 2 – Validade do termo aposto no contrato de trabalhoSegundo a Apelante, o contrato de trabalho celebrado com a Apelada é lícito, e foi celebrado de boa fé, encontrando-se a fundamentação do contrato de trabalho a termo incerto cabalmente alicerçado, não se limitando à referência à sazonalidade, sendo certo que a referência à sazonalidade é justificada com base na manutenção da procura dos serviços prestados pela Apelante, cuja duração à data de celebração do contrato não poderia ser prevista, precisamente por depender de fatores imponderáveis, razão pela qual, não só a fundamentação do termo se afigura cabal, como foi efetivamente percebida pela Apelada, que não só quis celebrar tal contrato, como compreendeu os motivos do termo. Mais alegou que a comunicação da caducidade do contrato foi validamente efetuada, tendo produzido todos os seus efeitos. Apreciemos, então. Ora, dispõe o art. 140.º do Código do Trabalho que: 1 - O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades. 2 - Considera-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa: a) Substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar; b) Substituição directa ou indirecta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude de despedimento; c) Substituição directa ou indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição; d) Substituição de trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado; e) Actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima; f) Acréscimo excepcional de actividade da empresa; g) Execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro; h) Execução de obra, projecto ou outra actividade definida e temporária, incluindo a execução, direcção ou fiscalização de trabalhos de construção civil, obras públicas, montagens e reparações industriais, em regime de empreitada ou em administração directa, bem como os respectivos projectos ou outra actividade complementar de controlo e acompanhamento. 3 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1, só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto em situação referida em qualquer das alíneas a) a c) ou e) a h) do número anterior. 4 - Além das situações previstas no n.º 1, pode ser celebrado contrato de trabalho a termo certo para: a) Lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início do funcionamento de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 250 trabalhadores, nos dois anos posteriores a qualquer um desses factos; b) Contratação de trabalhador em situação de desemprego de muito longa duração. 5 - Cabe ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo. 6 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto em qualquer dos n.os 1 a 4. Dispõe igualmente o art. 141.º do Código do Trabalho que: 1 - O contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita e deve conter: a) Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes; b) Actividade do trabalhador e correspondente retribuição; c) Local e período normal de trabalho; d) Data de início do trabalho; e) Indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo; f) Datas de celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação. 2 - Na falta da referência exigida pela alínea d) do número anterior, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração. 3 - Para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado. 4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto na alínea e) do n.º 1 ou no n.º 3. Dispõe, por fim, o art. 147.º do Código do Trabalho que: 1 - Considera-se sem termo o contrato de trabalho: a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo; b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.os 1, 3 ou 4 do artigo 140.º; c) Em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências ao termo e ao motivo justificativo; d) Celebrado em violação do disposto no n.º 1 do artigo 143.º 2 - Converte-se em contrato de trabalho sem termo: a) Aquele cuja renovação tenha sido feita em violação do disposto no artigo 149.º; b) Aquele em que seja excedido o prazo de duração ou o número de renovações a que se refere o artigo seguinte; c) O celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo. 3 - Em situação referida no n.º 1 ou 2, a antiguidade do trabalhador conta-se desde o início da prestação de trabalho, excepto em situação a que se refere a alínea d) do n.º 1, em que compreende o tempo de trabalho prestado em cumprimento dos contratos sucessivos. Ora, atendendo ao disposto nos artigos citados, a entidade empregadora apenas pode recorrer à celebração de um contrato de trabalho a termo resolutivo (certo ou incerto) para satisfação de necessidades temporárias, já não para satisfação de necessidades habituais, e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, sendo que tal contrato de trabalho tem de observar obrigatoriamente a forma escrita, e nele tem de constar, entre outros elementos, a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo, devendo a indicação do motivo justificativo do termo ser feita com menção expressa dos factos que o integram, estabelecendo-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, sob pena de, em caso de omissão ou insuficiência das referências ao termo e ao motivo justificativo, se considerar o contrato de trabalho sem termo. Veja-se a este propósito, o que consta do Código do Trabalho Anotado, da autoria de Pedro Romano Martinez e outros[10], que se cita: […] apenas é susceptível de ser considerado motivo justificativo do termo a necessidade do empregador que seja concretizada no texto contratual, através da “menção expressa dos factos” que integram o aludido motivo. Na verdade, as razões determinantes da forma do negócio opõem-se a que a vontade real dos contraentes possa ter relevância na afirmação da validade da estipulação do termo, se essa vontade não estiver expressa no texto do contrato. Quer isto dizer que só podem ser considerados como justificação os fundamentos de facto constantes da cláusula contratual. Ao impor a necessidade de redacção que permita com clareza relacionar a justificação invocada e o termo estipulado, a lei introduz significativo grau de exigência na concretização formal do motivo que permite a contratação a termo. Pretende-se que o nexo de causalidade entre o motivo invocado e a duração do contrato transpareça da mera apreciação formal da cláusula contratual relativa à estipulação do termo, para o que não basta a descrição da justificação e a indicação do prazo. Cita-se, de igual modo, Monteiro Fernandes, na obra Direito do Trabalho[11]: A exigência legal de justificação da aposição de termo poderia ser facilmente iludida se bastasse incluir no contrato de trabalho a menção de algumas das fórmulas genéricas que o art. 129.º estabelece. Foi, aliás, esse o expediente utilizado outrora, com enorme frequência, para facilitar a mais ampla utilização deste tipo de contrato no recrutamento corrente de trabalhadores para as empresas. A indicação de que o contrato era celebrado a termo “por acréscimo temporário ou excepcional da actividade da empresa”, ou com fundamento na “execução de uma tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro” era tido por suficiente para “legitimar” esse recurso, e serviu para dar cobertura a uma das grandes vias de precarização das relações de trabalho. Uma intervenção legislativa ainda recente, anterior ao CTrabalho, exigiu que a indicação do motivo justificativo do contrato a termo contivesse a menção concreta dos “factos e circunstâncias que integram esse motivo” (art. 3.º da Lei 38/96, de 31 de Agosto). Assim, tornou-se claro aquilo que, de algum modo, já derivava das formulações iniciais da lista de situações justificativas, como condição de consistência e efectividade dessa exigência legal. A simples utilização de uma das fórmulas genéricas constantes dessa lista não permitiria a apreciação externa da veracidade e da validade do motivo invocado. Na mesma linha, o art. 131.º do CTrabalho exige a “menção expressa dos factos” que integram o motivo, “devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”: Assim, não basta invocar a “substituição temporária de um trabalhador”, é necessário identificar esse trabalhador e indicar a natureza do impedimento; não basta referir-se a um “acréscimo temporário de actividade”, é exigido que se concretize o tipo de actividade em que se verifica intensificação e a causa desta. É necessário, em suma, que a indicação requerida permita duas coisas: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia do art. 129.º; e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração estipulada para o contrato. Na verdade, a exigência legal da indicação de motivo justificativo é uma consequência do carácter excepcional da contratação a termo e do princípio de tipicidade funcional que se manifesta no art. 129.º: o contrato a termo só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem. Ambas as obras se reportam ao anterior Código do Trabalho (2003), porém, por inexistir qualquer alteração significativa relativamente ao atual Código do Trabalho, as considerações acima mencionadas mantêm-se totalmente adequadas. Dir-se-á ainda que, para além da doutrina, também a jurisprudência dos Tribunais é praticamente unânime no entendimento de que expressões genéricas e vagas não dão integral cumprimento ao disposto no art. 141.º, n.º 3, do Código do Trabalho, não sendo possível à entidade empregadora, em momento posterior, pretender fazer prova de factos que não fez constar da justificação do contrato a termo, uma vez que a indicação do motivo justificativo da celebração de um contrato a termo constitui uma formalidade ad substantiam. Veja-se a este propósito o acórdão do STJ, proferido em 09-06-2010, no âmbito do Processo n.º 1389/07.6TTPRT.S1[12]: VI – A validade do termo resolutivo impõe que: (i) se mostrem vertidos no texto contratual factos recondutíveis a algum dos tipos legais de justificação plasmados no referido art. 41.º n.º 1 (da LCCT, depois o art. 129.º n.º 2 do CTrabalho de 2003); (ii) que esses factos tenham correspondência com a realidade. VII – Assim a tarefa do tribunal, neste âmbito, pressupõe duas análises: - a de saber se o texto contratual obedece aos pressupostos legais da contratação precárias; - ultrapassado, sem mácula, esse crivo liminar, a de saber se o motivo invocado e o prazo previsto têm correspondência com a realidade prestacional do trabalhador contratado e com a conjuntura laboral da empresa. VIII – O juízo censório do tribunal, no que se restringe à conformação legal da justificação, há-de circunscrever-se aos motivos factuais levados ao texto vinculístico, sendo irrelevantes todos os que, extravasando o clausulado, venham a ser aduzidos pelo empregador em juízo. Veja-se igualmente o Acórdão do STJ, proferido em 28-04-2010, no âmbito do Processo n.º 182/07.0TTMAI.S1[13]: I – A alínea e) do n.º 1 do artigo 131.º do Código do Trabalho de 2003 exige a indicação, no escrito que corporiza o contrato, «do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo» e o n.º 3 do mesmo artigo esclarece que, para efeitos da referida alínea, «a indicação do motivo justificativo da aposição do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado». II – A falta de concretização do motivo justificativo, seja pelo recurso às fórmulas legais contidas nas alíneas do n.º 2 do art. 129.º do mesmo Código, seja pelo recurso a expressões vagas, genéricas ou imprecisas, não pode ser suprida pela alegação dos factos pertinentes na contestação da acção em que a questão se suscite. III – A estipulação do termo deve indicar concretamente os factos que o integram, o respectivo prazo e o nexo de causalidade entre uns e o outro, pois só assim se poderá verificar se está ou não justificado o recurso ao contrato de trabalho a termo, que é excepcional. IV – Não resultando dos termos da cláusula onde se pretendeu indicar o motivo justificativo, nem de qualquer outra, a relação entre o prazo de um ano, estipulado no contrato, e a satisfação das «encomendas do cliente...», e face à vacuidade de tal expressão, sem concretização quantitativa temporalmente referenciada, vacuidade também patente na alusão genérica ao «trabalho dos seus actuais trabalhadores permanentes», é de concluir que o contrato não obedece ao prescrito no citado normativo legal, o que determina a sua conversão em contrato sem termo (artigo 131.º, n.º 4). Veja-se também o Acórdão do STJ, proferido em 22-02-2017, no âmbito do Processo n.º 2236/15.0T8AVR.P1.S1[14][15]: I – Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade. II - A invocação no contrato de um “aumento de encomendas do mercado escocês”, sem mais qualquer concretização, constitui uma justificação genérica e vaga que não permite ao tribunal efectuar um juízo de adequação da justificação à hipótese legal e à duração estipulada para o contrato. III – Considera-se celebrado por tempo indeterminado o contrato a termo e a sua renovação por período diferente da duração inicial, quando o seu texto não contém factos concretizadores dos acréscimos temporários de trabalho que nele foram invocados. Esclarecidos os requisitos a adotar para que o termo aposto no contrato de trabalho seja válido, importa a analisar a situação concreta. Resulta da matéria dada como provada que, no contrato celebrado entre Apelante e Apelada, o motivo justificador da circunstância de se tratar de um contrato a termo incerto foi o seguinte: “o (…) contrato está sujeito a termo incerto e vigorará durante o tempo de manutenção de níveis elevados de procura, cuja duração é difícil por estar diretamente relacionada com imponderáveis de natureza climatérica, económica e perceção de segurança.” justificando-se “(…) pela sazonalidade decorrente da natureza estrutural do mercado onde o empregador opera, que determinam o aumento temporário da necessidade de trabalhadores ao serviço, nos termos das alíneas e) e f) do Art.140º do Código de Trabalho.” (facto provado 2) São, assim, invocados os motivos constantes das als. e) e f) do art. 140.º do Código do Trabalho, ou seja, a atividade sazonal e o acréscimo excecional de atividade da empresa. Porém, quanto à atividade sazonal, para além da própria referência legal a essa sazonalidade, apenas é mencionado que a mesma é decorrente da natureza estrutural do mercado onde o empregador opera, sem, contudo, fazer constar qualquer facto concreto (designadamente, relativo ao volume de negócios da entidade empregadora, quer durante o período dessa atividade sazonal quer fora desse período, bem como o quadro de trabalhadores que necessita em ambos os períodos) suscetível de aferir da veracidade dessa genérica alegação. Acresce que nem sequer é efetuada qualquer menção à época do ano em que tal sazonalidade opera. Conforme bem esclarece o acórdão do STJ, proferido em 10-07-2008, proferido no âmbito do processo n.º 08S0325[16]: V - Actividade sazonal é aquela que só surge em determinado período do ano, necessariamente limitado, perdendo posteriormente a sua utilidade. VI - Em contrapartida, o ciclo de produção legalmente atendível é o ciclo anual, tornando-se ainda mister que as suas irregularidades decorram da natureza estrutural - que não conjuntural - do respectivo mercado. VII - Ambas as situações pressupõem uma natureza cíclica, previsível e regular. VIII - Falar-se em actividade sazonal impõe a obrigatória referência, no contrato, à época do ano durante a qual se desenvolve a actividade, uma vez que tal conceito é incompatível com o exercício da actividade durante todo o ciclo anual. Por sua vez, quanto ao acréscimo excecional de atividade da entidade empregadora, apenas consta que o mesmo está relacionado com a sazonalidade decorrente da natureza estrutural do mercado onde o empregador opera, sazonalidade essa que, em si mesmo é incerta, por depender do tempo de manutenção de níveis elevados de procura, cuja duração é difícil por estar diretamente relacionada com imponderáveis de natureza climatérica, económica e perceção de segurança. Na realidade, para além de justificar um motivo (acréscimo excecional de atividade da entidade empregadora) com outro motivo (atividade sazonal), de toda a descrição supra mencionada apenas constam expressões ou legais ou vagas, genéricas e imprecisas, inexistindo um único facto concreto suscetível de permitir apurar da veracidade do alegado na vivência económica daquela entidade empregadora. Efetivamente, desconhece-se qual seja o período do ano em esse alegado acréscimo excecional de atividade ocorre, bem como em que factos concretos fundamenta esse acréscimo excecional de atividade. Por fim, e quanto à justificação da própria incerteza do termo, não é igualmente efetuada qualquer menção concreta à sua necessidade, refugiando-se, uma vez mais, em expressões genéricas, imprecisas e vagas, as quais, aliás, acabam por se revelar contraditórias até com a sazonalidade (que pressupõe um determinado período do ano, necessariamente limitado) que igualmente invoca. Como muito bem refere a sentença recorrida: Ora a simples leitura do acabado de transcrever, pela forma genérica utilizada, não permite estabelecer a relação entre os motivos e o termo utilizado para tanto não bastando a mera referência à sazonalidade porquanto, a ser assim, sabendo-se que a mesma é uma realidade no Algarve, estaria aberta a porta a que todos os contratos realizados pelas empresas no período do verão pudessem sê-lo a termo, ainda que a contratação fosse necessária para assegurar uma função permanente do estabelecimento. Sabendo-se, igualmente, que o Algarve, no inverno, não é terra de ninguém, pois tem residentes, é visitado por turistas, ainda que em menor número, e tem restauração que funciona o ano inteiro, a concretização das razões (como seja, por exemplo, o volume habitual de negócios e funcionários ao longo do ano, a previsibilidade do aumento da clientela, etc.) porque a empresa, no verão, se socorre de trabalhadores a prazo, é essencial para se aferir da justeza e adequação entre o termo e os motivos da contratação. Dir-se-á ainda, quando à circunstância de o termo incerto aposto no contrato de trabalho celebrado ter sido percebido pela Apelada, a qual não só quis celebrar tal contrato, como compreendeu os motivos do termo, que a vontade real dos contraentes apenas revela, em face das exigências formais deste tipo de contrato de trabalho, se essa vontade se encontrar espelhada no próprio contrato, num cumprimento escrupuloso do determinado pelo art. 141.º do Código do Trabalho. Conforme referem Luís Miguel Monteiro e Pedro Madeira de Brito, no Código do Trabalho Anotado, com coordenação de Pedro Romano Martinez e outros[17]: V. Atentas as exigências formais deste conteúdo acessório do contrato de trabalho e a natureza inequivocamente substancial da formalidade imposta pela alínea e) do n.º 1 da norma anotada, apenas é susceptível de ser considerado motivo justificativo do termo a necessidade do empregador que seja concretizada no texto contratual, através da “menção expressa dos factos” que integram o aludido motivo. Na verdade, as razões determinantes da forma do negócio opõem-se a que a vontade real dos contraentes possa ter relevância na afirmação da validade da estipulação do termo, se essa vontade não estiver expressa no texto do contrato (cfr. artigo 238.º do CC). Quer isto dizer que só podem ser considerados como justificação os fundamentos de facto constantes da cláusula contratual. Resultando, deste modo, manifestamente insuficientes as referências ao termo, ao motivo justificativo e à relação entre este e aquele, nos termos do art. 147.º, n.º 1, al c), última parte, do Código do Trabalho, considera-se sem termo o contrato celebrado entre Apelante e Apelada, o qual, por ter cessado, por comunicação daquela a esta, da caducidade do contrato, traduziu-se tal cessação num despedimento ilícito. Efetivamente, tratando-se de um contrato sem termo, não se mostra legalmente prevista, nas causas de cessação lícita, a caducidade fundada no decurso do tempo, pelo que o despedimento da Apelada é ilícito, aplicando-se ao mesmo o disposto nos arts. 381.º e seguintes do Código do Trabalho. A este propósito cita-se, de novo, o acórdão do STJ, proferido em 28-04-2010, no âmbito do Processo n.º 182/07.0TTMAI.S1[18]: V – Considerando-se o contrato de trabalho sem termo, é o mesmo insusceptível de licitamente cessar por caducidade fundada no decurso do tempo. Deste modo, bem andou a decisão recorrida ao considerar que o termo incerto aposto no contrato de trabalho celebrado não era válido, improcedendo, nesta parte, a pretensão da Apelante. ♣ V – DecisãoPelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso totalmente improcedente, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela Apelante. Notifique. ♣ Évora, 25 de fevereiro de 2021Emília Ramos Costa (relatora) Moisés Silva Mário Branco Coelho _______________________________________________ [1] Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Moisés Silva; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho. [2] O facto 1) reporta-se ao art. 3; o facto 2) ao art. 11; e o facto 3) ao art. 12. [3] 4) O restaurante explorado pela Ré tem mais clientes de Verão do que no Inverno. [4] 5) No ano de 2019, a partir de setembro houve uma redução de clientes e a Autora deixou de necessitar do trabalho prestado pela Autora. [5] Consultável em www.dgsi.pt. [6] Vol. I, Almedina, Coimbra, 2018, pág. 485. [7] Vejam-se, igualmente, os acórdãos do TRL, proferidos em 13-11-2014, no âmbito do processo n.º 673/03.2TYLSB.L1-6; e em 29-05-2013, no âmbito do processo n.º 7053/10.1TBCSC.L1-6, ambos consultáveis em www.dgsi.pt. [8] Consultável em www.dgsi.pt. [9] Aplicável ao processo laboral por força do art. 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho. [10] 4.ª edição, 2006, pp. 285 e 286. [11] 13.ª edição, 2006, pp. 318 e 319. [12] consultável em www.dgsi.pt. [13] consultável em www.dgsi.pt. [14] consultável em www.dgsi.pt. [15] Veja-se, ainda, por relevante para a situação em apreço, o acórdão do TRP, proferido em 02-03-2017, no âmbito do processo n.º 4509/16.6T8VNG.P1, consultável em www.dgsi.pt. [16] Consultável em www.dgsi.pt. [17] 2017, 11.ª edição, Almedina, p. 395. [18] Veja-se, no mesmo sentido, o acórdão desta Relação, proferido em 11-02-2016, no âmbito do processo n.º 607/14.9TTSTB.E1, consultável em www.dgsi.pt. |