Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2021/23.4T8FAR.E1
Relator: MARIA ISABEL CALHEIROS
Descritores: DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANO BIOLÓGICO
EQUIDADE
Data do Acordão: 10/02/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1. A lei não define quais são os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, mas não merece dúvidas que neles se integram as dores e os padecimentos físicos sofridos, o abalo psicológico (angústia, ansiedade), as lesões e tratamentos padecidos.
2. O estabelecimento da compensação, pelo dano biológico ou pelo dano não patrimonial, não se pauta pela observância dos critérios consagrados nas tabelas constantes da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, alterada pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, não prevalecendo sobre o critério fundamental para a determinação judicial da indemnização e que é a equidade.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 2021/23.4T8FAR.E1

SUMÁRIO (da responsabilidade da relatora):
(…)
*
Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO
1.1. (…) e (…) vieram instaurar acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (…) – Companhia de Seguros, S.A. pedindo a condenação da ré no pagamento, no que aqui releva, em quantia não inferior a € 50.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação até integral pagamento, para cada um dos autores, a título de danos não patrimoniais.
Alegaram, para o efeito, que sofreram um acidente de viação, cuja responsabilidade imputam ao condutor do veículo segurado pela ré, do qual resultaram para si danos patrimoniais e não patrimoniais, de que pretendem ser ressarcidos.
1.2. A Ré contestou, pugnando pela sua absolvição do pedido, alegando, para o efeito, que o sinistro foi causado pelo autor, declinando a sua responsabilidade pela reparação dos danos invocados, que também impugna.
1.3. Foi proferido despacho saneador com elaboração dos temas da prova, e foi realizada a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou parcialmente procedente a acção, com o seguinte teor decisório:
A) Condenar a ré/seguradora “(…) – Companhia de Seguros, S.A.”, a pagar ao autor (…), os seguintes montantes:
i. O montante de € 8.978,00 (oito mil e novecentos e setenta e oito euros), pelo valor do veículo;
ii. O montante de € 11,37 (onze euros e trinta e sete cêntimos), pelas despesas em medicamentos;
iii. O montante de € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, totalizando o valor de € 21.489,37 (vinte e um mil e quatrocentos e oitenta e nove euros e trinta e sete cêntimos);
iv. Os juros sobre as quantias referidas nos pontos i e ii vencer-se-ão, à taxa legal, a contar da citação, até integral pagamento;
v. Os juros que se vencerem sobre a quantia referida no ponto iii vencer-se-ão, à taxa legal, sobre a data da presente decisão até integral pagamento.
B) Condenar ainda a ré/seguradora a pagar à autora (…) a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal, a contar da presente decisão até integral pagamento.
C) Absolver a ré/seguradora do demais peticionado».
1.4. Inconformada com a sentença proferida, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido e se revogasse a sentença recorrida, determinando que as quantias fixadas a cada um dos Recorridos a título de danos não patrimoniais seja reduzida para um montante próximo dos € 3.000,00 para cada um deles.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (que aqui se reproduz):
a. O Recurso tem por objecto a Sentença na parte em que julgou a Acção “parcialmente procedente, porque parcialmente provada e, em consequência,” condenou a Recorrente no pagamento ao Recorrido da quantia de “€ 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais” e no pagamento à Recorrida da quantia de “€ 15.000,00 (quinze mil euros), a título de danos não patrimoniais”, devendo ser fixado ao presente Recurso o valor de € 27.500,00.
b. Mal andou o Tribunal a quo ao decidir nos termos em que o fez, fixando a quantia de € 12.500,00 a título de danos não patrimoniais ao Recorrido, e a quantia de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais à Recorrida, as quais são manifestamente exageradas considerando o acidente em causa nos presentes Autos, bem como as suas consequências para cada um dos Recorridos.
c. O acidente em causa nos presentes Autos não teve, felizmente, uma gravidade que determine o arbitramento de quantias tão elevadas para os Recorridos, devendo tais quantias ser substancialmente reduzidas e equiparadas a situações semelhantes como, aliás, determinam as regras legais.
d. Tendo presente o decidido pelo Tribunal a quo (i) no que respeita aos danos não patrimoniais; (ii) no que respeita à decisão quanto à matéria de facto transcrita em sede de Alegações, para as quais se remete; e (iii) no que respeita à fundamentação concreta para arbitrar as indemnizações objecto do presente Recurso; é manifesto que as quantias arbitradas pelo Tribunal a quo são excessivas e desproporcionais, devendo ser substancialmente reduzidas por este Tribunal.
e. Tendo presente o disposto nos artigos 494.º, 496.º, 562.º e artigo 566.º do Código Civil, e conjugando tais normas com o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, que determina que “nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito”, mais não se poderá concluir que a Sentença condenatória deverá ser revertida no que respeita ao quantum indemnizatório fixado a cada um dos Recorridos a título de danos não patrimoniais.
f. No que respeita ao Recorrido, este (i) deu entrada nas urgências no dia do acidente – ocorrido no dia 24 de Outubro de 2021, entre as 18:00 horas e as 20:00 horas –, tendo tido alta de madrugada, isto é, no dia 25 de Outubro de 2021; conforme resultou da Perícia realizada nos Autos, a consolidação das lesões sofridas pelo Recorrido foi fixada em 5 de Novembro de 2021, isto é, 12 (doze) dias após o acidente, correspondente a um défice funcional temporário total e um período de repercussão temporária na actividade total de “24.10.2021 até 05.11.2021”; (iii) foi fixado um Quantum Doloris de 3 em 7 pontos possíveis, o que corresponde a uma dor moderada; (iv) não se considerou em sede de Perícia Médica a existência de consequências permanentes relacionadas com o acidente em causa nos presentes Autos, nem se considerou haver lugar à discussão de qualquer parâmetro em sede de dano corporal.
g. Ou seja, e em suma, o Recorrido, em consequência do acidente em causa nos presentes Autos, necessitou de se deslocar às urgências, teve de ser medicado para dores e colocado gelo, esteve numa situação de incapacidade temporária entre o dia 24 de Outubro de 2021 e o dia 5 de Novembro de 2021, e sofreu dores – quantum doloris – fixado em 3 numa escala de 7 pontos.
h. Apesar do sofrimento do Recorrido, não houve sequelas ou limitações funcionais permanentes que o impeçam de realizar as suas actividades habituais, e apenas (salvo o devido respeito), sentiu uma dor moderada após, e na sequência, do acidente em causa nos presentes Autos.
i. Foram estas, e apenas estas, as consequências para o Recorrido do acidente em causa nos presentes Autos, não sendo tais consequências de tal gravidade que determinem uma condenação de montante tão elevado, isto é, no montante de € 12.500,00.
j. Assim, considerando tal factualidade – considerada provada pelo Tribunal a quo –, e aplicando o raciocínio acima descrito e a aplicação das normas legais acima citadas, designadamente, o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, deveria o Tribunal a quo – e deverá este Tribunal – recorrer a decisões proferidas em situações semelhantes para fixar a indemnização a título de danos não patrimoniais.
k. E, tendo presente, a título meramente exemplificativo, o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 2 de Setembro de 2021, no âmbito do Processo n.º 1539/17.4T8CTB.C1, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido em 6 de Junho de 2024, no âmbito do Processo n.º 7114/22.4T8PRT.P1, e no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido em 15 de Dezembro de 2022, no âmbito do Processo n.º 868/21.7T8VCT.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt e transcritos em sede de Alegações, e comparando as situações de tais arestos, com a situação fáctico-jurídica em causa nos presentes Autos, e as consequências para o Recorrido do acidente em causa nos presentes Autos, deverá a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais, próxima dos € 3.000,00, em consonância com as decisões acima transcritas, e em cumprimento do disposto no artigo 8.º do Código Civil.
l. Sendo de Sendo de salientar, a este respeito, que, na Portaria n.º 679/2009, de 25 de Junho, um quantum doloris fixado num grau 3, consta que, “até 3 pontos, sem indemnização”.
m. Por outro lado, no que respeita à Recorrida, (i) esta deu entrada nas urgências no dia do acidente – ocorrido no dia 24 de Outubro de 2021, entre as 18:00 horas e as 20:00 horas –, tendo tido alta de madrugada, isto é, no dia 25 de Outubro de 2021; (ii) conforme resultou da Perícia realizada nos Autos, a consolidação das lesões sofridas pela Recorrida foi fixada em 31 de Outubro de 2021, isto é, 8 (oito) dias após o acidente, considerando que a única consequência permanente foi uma cicatriz de ferida contusa, a qual não tem sequer valoração no âmbito do Anexo II da Portaria 377/2008, de 26 de Maio;
(iii) foi fixado um dano estético de 1 em 7 pontos possíveis, o que corresponde a um dano estético absolutamente residual, e (iv) não se considerou em sede de Perícia Médica a existência de consequências permanentes relacionadas com o acidente em causa nos presentes Autos a nível da actividade profissional.
n. Ou seja, e em suma, considerou o Tribunal a quo como provado que a Recorrida, em consequência do acidente em causa nos presentes Autos, necessitou de se deslocar às urgências, ficou curada 8 (oito) dias depois do acidente e atribuiu-lhe um dano estético de 1 em 7 graus.
o. Não houve, pois, sequelas ou limitações funcionais permanentes que a impeçam de realizar as suas actividades habituais, e apenas (salvo o devido respeito), tem um dano estético residual decorrente do acidente em causa nos presentes Autos.
p. Foram estas, pois, e apenas estas, as consequências para o Recorrido do acidente em causa nos presentes Autos, não sendo tais consequências de tal gravidade que determinem uma condenação de montante tão elevado, isto é, no montante de € 15.000,00.
q. Assim, considerando tal factualidade – considerada provada pelo Tribunal a quo –, e aplicando o raciocínio acima descrito e a aplicação das normas legais acima citadas, designadamente, o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, deveria o Tribunal a quo – e deverá este Tribunal – recorrer a decisões proferidas em situações semelhantes para fixar a indemnização a título de danos não patrimoniais.
r. E, tendo presente, a título meramente exemplificativo, o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido em 20 de Março de 2025, no âmbito do Processo n.º 666/21.8T8GMR.G1, e no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 21 de Janeiro de 2020, no âmbito do Processo n.º 5370/17.9T8VIS.C1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt e transcritos em sede de Alegações, e comparando as situações de tais arestos, com a situação fáctico-jurídica em causa nos presentes Autos, e as consequências para o Recorrido do acidente em causa nos presentes Autos, deverá a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais, próxima dos € 3.000,00, em consonância com as decisões acima transcritas, e em cumprimento do disposto no artigo 8.º do Código Civil.
s. Sendo de salientar, a este respeito, que, na Portaria n.º 679/2009, de 25 de Junho, um dano estético fixado num grau 1 de 7 prevê uma indemnização de € 820,80.
t. Deve, pois, e em face de tudo quanto se expôs, ser a Sentença recorrida revertida, sendo as quantias fixadas a título de danos não patrimoniais a cada um dos Recorridos, ser substancialmente reduzidas, nos termos e como os fundamentos supra alegados.
Nestes termos, e nos mais de Direito, deve o presente Recurso ser considerado totalmente procedente, por provado e, consequentemente, ser a Sentença recorrida revogada e substituída por Acórdão que, reconhecendo razão à Recorrente, considere as quantias fixadas a título de danos não patrimoniais desproporcionais e desajustadas, determinando que as quantias fixadas a cada um dos Recorridos, sejam substancialmente reduzidas, nos termos e como os fundamentos alegados».
1.5. Os Autores pugnaram pelo não provimento da apelação e pela consequente confirmação da sentença recorrida, apresentando as seguintes conclusões:
«1 – O recorrido e a recorrente foram transportados para o Hospital de Faro após o acidente e, só por sorte não perderam a vida.
2- O presente recurso ignora a dinâmica do acidente e a culpa exclusiva do condutor do veículo segurado, ignorando o carácter sancionatório, que tem de ser aferido no cálculo dos danos não patrimoniais.
3- O acidente provou lesões permanentes na vida dos recorridos que, jamais serão reparadas, sendo a compensação a título de danos não patrimoniais uma forma de compensar todas essas lesões e todo o sofrimento e dores provocadas nas suas vidas, bem como ainda toda as repercussões negativas que o evento (acidente) provocou em vidas já difíceis e que atravessavam dificuldades, onde não existe médico de família.
4- A finalidade destes danos não patrimoniais (artigo 496.º do CC) é minorar os sofrimentos suportados pelos recorridos em resultado do acidente, pois eles só existem porque existiu o acidente, com culpa exclusiva do condutor do veículo segurado pela recorrente.
5 – Nos danos não patrimoniais não há que aferir “quanto as coisas valem”, pois o dinheiro não apaga os danos, devendo ser atribuída uma quantia justa que amenize todo o sofrimento e as lesões causadas pelo acidente.
6- Conforme o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24.10.2024, da relatora Cláudia Barata: “É confrangedor verificar que as seguradoras, sabendo que os valores da Portaria não são vinculativos e que a jurisprudência os tem reiteradamente considerado desadequados por demasiado escassos, persistem em invocá-los”.
7 – As quantias fixadas a título de danos não patrimoniais, em consonância com a prova produzida, foram adequadas e proporcionais, sendo um valor mínimo de dignidade com carácter compensatório e sancionatório, pois não podemos ignorar que antes de existir a compensação, existiu um comportamento culposo do condutor do veículo segurado que, só por sorte, não resultou na morte dos recorridos, devido ao impacto brutal da colisão do carro do condutor do veículo segurado no carro do recorrido».
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Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II –OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser as de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, in fine, ambos do NCPC).
Tendo, então, em atenção as conclusões da Recorrente a única questão submetida à apreciação deste Tribunal é a de saber se ocorreu erro de julgamento quanto à fixação da indemnização por danos não patrimoniais.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O Tribunal de 1.ª Instância, com interesse para a decisão da causa, deu como provados os seguintes factos:
1. A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo automóvel de marca BMW, modelo X5 3.0D Xdrive Pack M, com a matrícula (…), encontrava-se transferida para a ré, através de seguro do Ramo Automóvel, titulado pela apólice n.º (…).
2. O autor possui 33 (trinta e três) anos de idade e trabalha na função de jardineiro, auferindo o salário mínimo nacional.
3. A autora possui 21 (vinte e um) anos de idade e encontra-se, atualmente, desempregada.
4. A ré é uma pessoa coletiva, uma companhia de seguros, com exercício de atividade de seguro e resseguro, com a amplitude consentida pela lei.
5. No dia 24 de outubro de 2021, entre as 18 e as 20h, o autor seguia ao volante do veículo automóvel de matrícula (…), de marca Skoda Octavia, pela Estrada Nacional 125, ao Km (…), no sentido sul- norte, em Olhão.
6. A referida via, naquele local, configura uma reta, com duas vias de trânsito, uma em cada sentido, divididas por um traço descontinuo.
7. No local o limite de velocidade é de 70 km/hora.
8. O veículo conduzido pelo autor circulava sem seguro válido.
9. Atrás do veículo do autor seguiam 4 (quatro) veículos.
10. Ao chegar ao Km (…) da referida via, o autor verificou pelo retrovisor se podia efetuar a manobra de mudança de direção à esquerda e, nessa sequência, efetuou o pisca para a esquerda.
11. Os veículos que circulavam atrás do veículo do autor respeitaram a referida sinalização.
12. Após o que, o autor deu início à manobra de mudança de direção à esquerda para entrar numa habitação aí existente.
13. Nas referidas circunstâncias, no mesmo sentido de trânsito, seguia o veículo de matrícula (…), de marca BMW, conduzido por (…).
14. O qual imprimia ao veículo que conduzia uma velocidade superior à legalmente permitida para aquele local.
15. E sem respeitar a sinalização que o autor efetuara, ocupou o lado da faixa de rodagem destinado ao trânsito que se fazia em sentido contrário, ultrapassando, de uma só vez, os 4 (quatro) veículos automóveis que circulavam à sua frente, indo embater com a parte lateral direita do seu veículo na parte lateral esquerda do veículo conduzido pelo autor (junto ao meio da porta do lado do condutor), despistando-se.
16. À data e hora do sinistro, estava bom tempo e existiam boas condições de visibilidade.
17. A via, no local que antecede o ponto de embate, no sentido de transito do veículo (…), descreve uma curva ligeira.
18. No veículo automóvel de matrícula (…), conduzido pelo autor seguia ao seu lado, no lugar do “pendura”, (…) e no banco de trás, (…).
19. Os autores foram imobilizados em maca e transportados para o Hospital de Faro, onde deram entrada nos serviços de urgência.
20. À chegada ao Hospital de Faro, o autor apresentava as seguintes lesões:
Edema e escoriações do braço esquerdo;
• Colar cervical;
• hematoma da parede lateral esquerda do tórax.
21. Tendo sido solicitados exames (raio X e TAC).
22. E a autora apresentava uma ferida, na zona da testa.
23. Tendo sofrido traumatismo crânio encefálico, com perda fugaz do conhecimento.
24. E tendo realizado tomografia computorizada cranioencefálica.
25. Ambos os autores tiveram alta já de madrugada.
26. No dia 25/10/2021, a autora dirigiu-se ao Centro de Saúde de Olhão
para trocar o penso.
27. Nesse mesmo dia, no Centro de Saúde de Olhão, foi receitada medicação ao autor para as dores e informado que deveria fazer pomada e gelo e que não estava em condições de regressar ao trabalho.
28. Nessa sequência o autor gastou em medicamentos para as dores – Descontran e Meloxican – o valor global de € 11,37 (onze euros e trinta e sete cêntimos).
29. Em resultado das lesões sofridas no sinistro, o autor esteve de baixa médica (inicial) de 25/10/2021 a 5/11/2021, prescrita pelo Centro de Saúde de Olhão.
30. Durante o período de baixa médica, o autor esteve sem conseguir dormir ou movimentar-se, devido às dores físicas que sentia.
31. Nos dias que se seguiram e devido às sequelas do sinistro a autora tinha dificuldade em dormir, sentia medo e pânico.
32. No dia 19/7/2022 o autor celebrou um acordo reduzido a escrito com a empresa “Transportes (…)”, denominado “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, na função de motorista de ligeiros, tendo iniciado as suas funções no dia 22 de julho desse ano, estando prevista a duração de 6 (seis) meses, a termo certo.
33. O valor de mercado da viatura sinistrada, de acordo com as respetivas características (matrícula de 23/12/2024 e 250.000 Km) é de € 10.000,00 (dez mil euros).
34. O autor recebeu uma missiva da ré, datada de 10/1/2022, onde se pode ler:
“(…) Após peritagem efetuada à vossa viatura, a título condicional, concluíram os nossos serviços, pela impossibilidade da sua reparação, porquanto:
- Valor da estimativa da reparação € 13.202,84, efetuada pela empresa “(…), Lda.”;
- Valor venal imediatamente anterior ao acidente: € 10.000,00 ;
- Valor de mercado: € 10.000,00;
- Valor do salvado € 1.022,00, de acordo com a proposta apresentada pela empresa (…) Auto (…).
De harmonia com o acima exposto, propõe-se esta seguradora indemnizar V. Exa. com base nos valores acima discriminados (…)”.
35. O autor recebeu uma missiva da ré, datada de 25/1/2022, onde se pode ler:
“(…) Neste contexto e caso estivéssemos a assumir a responsabilidade, o valor a indemnizar seria de € 8.978,00, deduzido do valor do salvado acima avaliado que se manterá na posse do seu proprietário. (…)”.
36. No dia 12/8/2022 o autor recorreu às urgências do Hospital de Vila Franca de Xira queixando-se de dores.
37. Do relatório pericial relativo à pessoa da autora, elaborado com base em exame realizado em 28/6/2024, consta que:
“(…) DISCUSSÃO
1. Os elementos disponíveis permitem admitira existência de nexo de causalidade entre o traumatismo e o dano atendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento: existe adequação entre a sede do traumatismo e a sede do dano temporal (…)
2. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 8 dias após a sua produção, tendo em conta os seguintes aspetos: o tipo de lesões resultantes, o tipo de tratamentos efetuados.
3. No âmbito do período de danos temporários é de referir, entre os diversos parâmetros do dano (…) é nosso entender ter resultado unicamente como consequência permanente: a cicatriz de ferida contusa descrita e fotodocumentada. A qual não tem valoração no âmbito do Anexo II da Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio.
4. Em termos de dano estético permanente (…). É fixável no grau 1, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspetos; a(s) cicatriz descrita conforme dissemos e fotodocumentámos.
CONCLUSÕES
- A data da consolidação das lesões é fixável em 31/10/2021;
- A sequela descrita em termos de Repercussão Permanente da Atividade Profissional: não tem qualquer repercussão
- Dano Estético Permanente fixável no grau 1/7 (…)”.
38. Do relatório pericial relativo à pessoa do autor, elaborado com base em exame realizado em 21/11/2024, consta que:
“(…) DISCUSSÃO
1. Os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre o traumatismo (resultante do acidente de viação descrito) e o
dano (descrito na documentação clínica do Hospital de Faro no dia 24.10.2021) atendendo a que se confirmam os critérios necessários para o seu estabelecimento: existe continuidade sintomatológica e adequação temporal entre o traumatismo e o dano corporal (…)
2. Contudo, as queixas apresentadas no episódio datado de 12.8.2022, descrito no HVFXira, não apresentam encadeamento anatomo-clínico com a ofensa em apreço.
3. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 5/11/2021, tendo em conta os seguintes aspetos: a data da alta clínica, o tipo de lesões resultantes, o tipo de tratamentos efetuados e descritos na documentação clínica.
4. No âmbito do período de danos temporários são valorizáveis, entre os diversos parâmetros do dano, os seguintes: (…)
- Défice Funcional Temporário Total (…) é de admitir o período de 24.10.2021 até 5.11.2021.
(…)
- Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total (…) de 24.10.2021 até 5.11.2021.
- Quantum doloris (…); fixável no grau 3.
5. No âmbito do período de danos permanentes (…)
- Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica da integridade física (…) Assim, não consideramos serem resultado consequências permanentes relacionadas com a ofensa em apreço.
- Dano Estético Permanente (…) Não há lugar à discussão deste parâmetro no dano corporal.
CONCLUSÕES
- A data da consolidação das lesões é fixável em 5/11/2021;
- Período de Défice Funcional Temporário Total: de 24.10.2021 até 5.11.2021.
Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total: de 24.10.2021 até 5.11.2021.
- Quantum doloris: 3/7 (…)”.
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IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Erro de Julgamento quanto à Fixação da Indemnização por Danos não Patrimoniais.
O recorrente discorda da decisão do tribunal a quo na parte que fixou de indemnização a título de danos não patrimoniais ao Recorrido a quantia de € 12.500,00 e à Recorrida a quantia de € 15.000,00, que considera manifestamente exageradas face ao acidente em causa e às consequências que dele resultaram para os Recorridos, pugnando para que o seu valor seja reduzido para montante próximo dos € 3,000,00 para cada um.
Importa, então, averiguar se se justifica a pretendida redução.
No que respeita aos danos não patrimoniais, rege o disposto no artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil, segundo o qual «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito».
A lei não define quais são os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, mas não merece dúvidas que neles se integram as dores e os padecimentos físicos sofridos, o abalo psicológico (angústia, ansiedade), as lesões e tratamentos padecidos.
«Na fixação da indemnização por danos não patrimoniais, assumem particular significado e importância o chamado “quantum doloris”, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária, o “dano estético”, que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformações e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima, o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado que respeita à inserção social do lesado nas suas variadíssimas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), o “prejuízo da saúde geral e da longevidade”, aqui avultando o dano da dor e o défice do bem-estar, que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem-estar da vítima e corte na expectativa de vida, o pretium juventutis, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a primavera da vida» (acórdão da RL de 26.04.2005, proc. n.º 4849/2004-5, acessível em www.dgsi.pt).
Estamos, aqui, em presença de danos em relação aos quais não é possível a reposição ou reconstituição natural, nem é válida a teoria da diferença, havendo, sim, que atender ao disposto nos arts. 496.º, n.º 1 e n.º 3 e 494.º, ambos do Código Civil.
Na verdade, «os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis, não podem ser reintegrados por equivalente. Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas do dinheiro. Não se trata, portando, de atribuir ao lesado “um preço de dor” ou “um preço de sangue”, mas de lhe proporcionar uma satisfação, em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir interesses de ordem refinadamente ideal» (Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, 1991, pág. 115).
Lê-se, então, no n.º 3 do citado artigo 496.º, que «o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º», isto é, ao «grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado, e as demais circunstâncias do caso», sem esquecer os padrões adoptados pela jurisprudência (artigo 8.º, n.º 3, do mesmo CC).
Trata-se, pois, da atribuição de certa soma pecuniária, que se julga adequada a compensar e a minorar dores e sofrimentos, mercê das alegrias e satisfações que a mesma pode proporcionar.
Reconhecendo-se que todos estes elementos de ponderação implicam uma certa dificuldade de cálculo, defende-se, ainda, que a indemnização deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico, não sendo de enveredar por miserabilismos indemnizatórios (cfr. o já longínquo Ac. do STJ, de 16.12.1993, Cardona Ferreira, CJ, 1993, Tomo III, pág. 182).
É, também, pacífico o entendimento que devem ser considerados os padrões indemnizatórios geralmente adotados na jurisprudência em casos análogos, tal como decorre do artigo 8.º, n.º 3, do C.C. (v., entre outros, o Ac. do STJ de 08-03-2016, Revista n.º 103/13.1TBARC.P1.S1, segundo o qual «a indemnização deve ter em atenção os casos similares de que a jurisprudência do STJ dá notícia, procurando-se, assim, uma harmonização tanto quanto possível efetiva sem se perder de vista as singularidades dos casos concretos»).
Refira-se, também (face ao alegado na conclusão S da Recorrente), que não se regista divergência jurisprudencial no entendimento já firmado de que «o estabelecimento da compensação, pelo dano biológico ou pelo dano não patrimonial, não se pauta pela observância dos critérios consagrados nas tabelas constantes da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, alterada pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, que se destinam antes a ser cumpridos pelas entidades seguradoras, na apresentação aos lesados de propostas sérias e razoáveis de regularização dos sinistros» (Ac. do STJ de 28-11-2017, Revista n.º 127/145.1TJVNF.S1, rel. Henrique Araújo, CSTJ), não prevalecendo sobre o critério fundamental para a determinação judicial da indemnização e que é a equidade.
Posto isto, vejamos.
No caso dos autos, para a fixação do valor da indemnização, relevam os seguintes factos provados:
Quanto ao Recorrido (…):
- Na chegada hospital a 24/10/2021, apresentava as seguintes lesões:
• Edema e escoriações do braço esquerdo;
• Colar cervical;
• hematoma da parede lateral esquerda do tórax.
- Teve alta na madrugada do dia seguinte.
- Nesse mesmo dia, no Centro de Saúde, foi-lhe receitada medicação para as dores e informado que deveria fazer pomada e gelo e que não estava em condições de regressar ao trabalho, tendo-lhe sido prescrita baixa médica de 25/10/2021 a 5/11/2021.
- Durante o período de baixa médica, o autor esteve sem conseguir dormir ou movimentar-se, devido às dores físicas que sentia.
- A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 5/11/2021.
- Período de Défice Funcional Temporário Total: de 24.10.2021 até 5.11.2021.
- Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total: de 24.10.2021 até 5.11.2021
- Quantum doloris: fixável no grau 3/7.
Quanto à Recorrida (…):
- Na chegada ao hospital a 24/10/2021 apresentava uma ferida na zona da testa, tendo sofrido traumatismo crânio encefálico, com perda fugaz do conhecimento.
- Teve alta na madrugada do dia seguinte
- No dia 25/10/2021, a autora dirigiu-se ao Centro de Saúde para trocar o penso.
- Nos dias que se seguiram e devido às sequelas do sinistro a autora tinha dificuldade em dormir, sentia medo e pânico.
- A data da consolidação médico-legal das lesões foi fixada em 8 dias após a sua produção, em 31/10/2021.
- Ficou com cicatriz de ferida contusa, que, em termos de dano estético permanente, é fixável no grau 1/7.
- Não tem repercussão a nível de Dano Permanente da Atividade Profissional.
Vejamos, agora, a jurisprudência do STJ, numa breve amostragem de casos, por ordem cronológica:
. Ac. de 16-06-2016, Revista 1364/06.8TBBCL.G1.S2, Tomé Gomes (Relator)
«Mostram-se fixadas com justeza e dentro dos critérios jurisprudenciais utilizados a propósito, as indemnizações de (…) de € 15.000,00, a título de (…) dano não patrimonial sofridos pela lesada em acidente de viação, no seguinte contexto: (i) à data do acidente, a lesada tinha 23 anos; (ii) a esperança média de vida do homem/mulher aproxima-se dos oitenta anos; (iii) o salário mínimo nacional era de € 450,00; (iii) ficou a padecer de incapacidade permanente parcial de 2%; (iv) sofreu dores de grau 3, em 7 de gravidade crescente; (v) tem dificuldade em lidar com a sua actual incapacidade e nas relações sociais; de não ser completamente autónoma para ir à praia ou à piscina; de ter dificuldade em realizar tarefas simples como subir a bancos e escadas, de dormir, prejuízo de afirmação pessoal que a perícia médica fixou em grau 2, em 5 de gravidade crescente».
. Ac. de 15-09-2016, Revista 1737/04.0TBSXL.L1.S1, Távora Victor (Relator)
«IV - É ponderado e ajustado o valor de € 15.000,00 fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais emergente de acidente de viação atento o seguinte circunstancialismo: (i) o autor foi sujeito a internamento, intervenções cirúrgicas e tratamentos, e o pós-operatório decorreu sem complicações; (ii) sofreu dores correspondente a um quantum doloris fixável em 5/7; (iii) antes do acidente era saudável e trabalhador; (iv) nos instantes que precederam o acidente, apercebeu-se que corria perigo de vida; (v) viveu com preocupação e angústia a evolução da sua situação clínica; (vi) continua receoso relativamente à possibilidade de agravamento futuro das sequelas que o afectam».
Ac. de 07-12-2016, Revista 8514/12.3TBVNG.P2.S1 Olindo Geraldes (Relator)
«III - Assim, demonstrando-se: (i) que a autora tinha 60 anos à data do acidente (…); IV - Tendo ainda ficado demonstrado que: (i) a autora foi submetida a intervenções e tratamentos agressivos; (ii) viu a sua autonomia e capacidade de desenvolver a sua vida habitual muito limitadas; (iii) sofreu e sofre dores, medo e angústia; revela-se ajustada a condenação da ré no pagamento da quantia de € 15.000,00 (tal como foi decidida pelas instâncias) a título de compensação pelos danos não patrimoniais por ela sofridos».
. Ac. de 27-04-2017, Revista n.º 2256/13.0TBVIS.C1.S1, Abrantes Geraldes (Relator)
«IV - Resultando da factualidade provada que, em consequência do acidente de viação de que foi vítima, a autora: (i) sofreu diversas fracturas e contusões na zona do tórax; (ii) ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade física de 5 pontos, com dores intercostais no esterno e na grade costal; (iii) sente dificuldades acrescida na realização de tarefas que impliquem esforço e força, sem que seja previsível o seu agravamento futuro; (iv) tinha 56 anos à data do acidente (…); V - A indemnização por danos não patrimoniais, atenta a imaterialidade dos interesses em jogo, não pode ter por escopo a sua reparação económica; visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhe proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão e, por outro lado, servir de sancionamento da conduta do agente. VI - Resultando da factualidade provada que, para além do referido em IV, a autora: (i) sofreu forte abalo psíquico no momento do acidente, mormente angústia de poder vir a falecer; (ii) padeceu de uma multiplicidade de lesões, tendo de se submeter a diversos tratamentos médicos, medicamentosos e terapêuticos; (iii) foi-lhe atribuído um quantum doloris de 4 numa escala crescente de 1 a 7, tem-se por adequado fixar em € 15.000,00 o valor para compensar os danos não patrimoniais».
. Ac. de 27-04-2017, Revista 1343/13.9TJVNF.G1.S1, Tomé Gomes (Relator)
«I - Na responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação, os danos não patrimoniais causados na autora, vítima de atropelamento, devem ser indemnizados com recurso à equidade, tendo em atenção o grau de culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. II - Deve ser fixado em € 20.000,00 a indemnização por danos não patrimoniais sofridos pela autora na consideração do seguinte quadro: (i) a autora foi atropelada na passadeira, sendo o local iluminado e circulando o condutor do veículo distraído; (ii) por força do acidente, ficou politraumatizada e esteve internada duas vezes, durante 21 e 35 dias; (iii) no primeiro internamento, esteve sempre deitada, e necessitou de arrastadeira e de auxílio de terceira pessoa; no segundo internamento, passou largos períodos na cama e caminhou com auxílio de andarilho; (iv) no momento do acidente, sofreu um enorme susto e receou pela vida; (v) sofreu, desde o acidente, dores muito intensas em todas as regiões do seu corpo, que a afligem e demandam toma de fármacos, em grau 4 de escala ascendente de 7; (vi) apresenta perturbações de equilíbrio, estado depressivo, esquecimento fácil, insónias, medo de veículos, dificuldade na marcha, irritação fácil, choro fácil, tendência para o isolamento e tristeza».
. Ac. de 16-11-2017, Revista 576/14.5TBSJM.P1.S1, Rosa Tching (Relatora)
«III - O montante de € 10.000,00 mostra-se justo para indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pelo mesmo lesado, considerando (i) o quantum doloris de grau 3 numa escala de 1 a 7, (ii) a persistência e agravamento das dores na cervical com mudanças de tempo e com esforços, e (iii) a perda de sono, que tudo contribuiu para o tornar mal-humorado. . Ac. de 19-04-2018, Revista n.º 196/11.6TCGMR.G2.S1, António Joaquim Piçarra (Relator)
«(…) VII - Resultando da matéria fáctica provada que a autora: (i) tinha 44 anos à data do acidente de que foi vítima (13-03-2010) e 45 anos à data da consolidação médico-legal; (ii) o prejuízo funcional decorrente da afectação da sua integridade físico-psíquica foi fixado em 3 pontos; e (iii) as lesões de que padecia, mormente ao nível da coluna cervical e lombar, que se agravaram por força do acidente, são compatíveis com o exercício da sua actividade profissional habitual (de cabeleireira),
(…) IX - Resultando da matéria fáctica provada que a autora: (i) à data do sinistro padecia de diversas patologias, designadamente doenças do foro psíquico e do foro ortopédico, que se encontravam a ser acompanhadas clinicamente; (ii) mercê do embate se verificou um agravamento dessas lesões físicas pré-existentes; (iii) esteve acamada na sua residência durante 60 dias; (iv) andou de canadianas e foi submetida a tratamentos de fisioterapia; (v) o embate lhe causou susto, dores e abalo psíquico, sendo o quantum doloris fixável em 3/7; (vi) teve um período de défice funcional temporário parcial de 385 dias, com reflexo, pelo mesmo período, na actividade profissional total; (vii) a consolidação médico-legal verificou-se em 01-04-2011; e (viii) não aufere subsídio de doença, nem possui bens ou rendimentos, é de manter a indemnização de € 15.000,00 fixada pela Relação, a título de danos não patrimoniais, uma vez que, para além de não se afastar, de modo substancial, dos padrões jurisprudenciais adoptados pelo STJ em casos análogos, é consentânea com a gravidade dos danos e com a circunstância de o acidente ser exclusivamente imputável ao condutor do veículo seguro na ré e é equilibrada face à modesta situação económica da autora, por contraposição à da ré, que é uma companhia de seguros».
Ac. de 22-11-2018, Revista 2236/14.8T8GMR.G1.S2, Tomé Gomes (Relator)
«III - Tendo ficado provado que (ii) à data do acidente, tinha 47 anos de idade; (iii) por força do acidente, ficou a padecer de um défice funcional de 3 pontos, causador de acréscimo de esforço físico no desenvolvimento da actividade que exercia, com redução na sua capacidade económica geral e para execução de tarefas quotidianas, mesmo para além da idade da reforma; (iv) no dia do acidente, 01-02-2011, foi submetido a intervenção cirúrgica; (v) no dia 14-10-2011, foi submetido a intervenção cirúrgica para remoção do material de osteossíntese; (vi) por via das lesões sofridas, teve dores de grau 4, numa escala crescente de 7 graus; (vii) esteve internado durante 9 dias; (viii) necessitou de ajuda de terceira pessoa para tomar banho, subir e descer escadas, e de canadianas; (ix) e, foi sujeito a tratamentos de fisioterapia, consideram-se adequados os valores de (…) € 17.000,00 para indemnizar (…) os danos não patrimoniais, (…), por ele sofridos».
Ac. de 10-11-2022, Revista n.º 239/20.2T8VRL.G1.S1, Maria da Graça Trigo (Relatora)
«I - Tendo a lesada (…) 44 anos de idade à data do acidente (…) II - Tendo-se provado, ainda, que, em resultado do embate, sofreu uma luxação lombar, padeceu de uma dor quantificável num grau 3, numa escala até 7 (quantum doloris), que, para tratamento da lesão, realizou 17 consultas de ortopedia e de psiquiatria e 75 sessões de fisioterapia, que esteve privada da utilização de uma viatura pessoal durante cerca de um mês, que ficou muito assustada com o embate, tendo passado a sofrer de ansiedade, que ficou com medo de conduzir e com dificuldade acrescida para realizar as suas actividades habituais, como algumas tarefas domésticas, yoga, caminhadas e corridas, levantar pesos ou conduzir durante muito tempo, afigura-se ajustada a indemnização de € 20.000,00 por danos não patrimoniais».
.Ac. de 16-01-2024, Revista n.º 15898/16.2T8LSB.L1.S1, Maria Olinda Garcia (Relatora)
«I - um lesado (vítima de acidente de viação) de 22 anos de idade, (..) que sofreu fratura do terço médio da clavícula esquerda (tendo sido submetido a cirurgia), ficou com Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 3 pontos, tem dificuldade em erguer ou transportar uma carga superior a 5 kg com o braço esquerdo, sendo-lhe difícil suportar peso sobre a clavícula esquerda. II - Também não é desconforme com os atuais padrões indemnizatórios a compensação de € 15.000,00 por danos morais conferida a esse jovem, que antes do acidente era saudável e escorreito, o qual ficou com uma cicatriz de 13 cm sobre a clavícula esquerda, o que lhe causa desgosto; ficou com uma placa com 9 cm de comprimento aplicado sobre o corpo da clavícula; ficou com um dano estético de 2 em 7; suportou um quantum doloris de grau 4 numa escala de 7, em consequência das lesões e dos tratamentos a que foi submetido» (fonte: “Os Danos Não Patrimoniais na Jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça”, 2016 a 2024, www.stj.pt).
Dos Tribunais da Relação (disponíveis em www.dgsi.pt):
Acórdão da RG de 24/03/2022, Proc. n.º 2114/19.4T8VRL.G1: «É aceitável fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 15.000,00, num caso em que a lesada sofreu lesões que devem considerar-se medianamente graves, foi sujeita a exames e tratamentos, sendo, contudo, certo que já fazia tratamentos antes do acidente, uma vez que já sofria de perturbação depressiva e síndrome do ombro doloroso, entre outras patologias; esteve 128 dias incapacitada para as atividades habituais; e sofreu dores, tendo o quantum doloris sido fixado num grau 3 numa escala crescente de sete graus».
Ac. da RG de 15/12/2022, Proc. 868/21.7T8VCT.G1 citado pelo Recorrente: «É adequado fixar o valor de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais a favor de lesado de 48 anos de idade, com um défice funcional permanente de 2 pontos, período de baixa médica de 164 dias, quantum doloris de grau 3, sujeito a várias consultas e exames, com muitas sessões de fisioterapia e que ficou a padecer de dores num ombro e num joelho, que interferem com a sua vida profissional e social (deixou de praticar BTT e hidroginástica, que praticava com regularidade, o que lhe causa desgosto) e com necessidade de medicação analgésica e/ou anti-inflamatória».
Ac. da RP de 06/06/2024 - Proc. 711/22.4, citado pelo Recorrente, ao contrário do que refere no corpo das suas alegações, nele não se decidiu atribuir uma indemnização de € 3.000,00; pelo contrário, ali precisa-se que “pensamos que a indemnização fixada [pela 1ª instância, essa sim no valor apontado] peca por defeito, pelo que não pode ser reduzida” [como era pretensão da ali recorrente]. Note-se também que o dano versado neste processo resultou de uma queda num supermercado e não na sequência de acidente de viação.
E desta Relação de Évora (fonte: Cadernos Temáticos de Jurisprudência)
. Ac. de 03/11/2016, Proc. n.º 718/12.5T2STC.E1
«(…) IV – Considerando a idade do autor, a natureza das lesões sofridas, os períodos de internamento e de convalescença, os tratamentos a que teve, sucessivamente, de se submeter, as sequelas com que ficou e a repercussão na sua vida quotidiana, o grau de quantum doloris fixado em 4 pontos numa escala crescente de 1 a 7, o sofrimento que, segundo as regras da experiência, tudo isso implica com tendência a agravar-se com a idade, o facto do acidente se ter devido a culpa exclusiva e grave do condutor do veículo atropelante sem qualquer parcela de responsabilidade do autor, tem-se por justificada e equitativa uma compensação pelo danos não patrimoniais no montante de € 20.000,00, reportado à data da decisão final em 1ª instância».
Ac. de 06/06/2024, Proc. n.º 783/19.4T8PTG.E1
«(…) IV – Considerando que o lesado foi sujeito a sofrimento físico e psíquico durante o período compreendido entre a data do acidente e a consolidação das lesões (correspondente ao quantum doloris de grau 4), que, em virtude do embate sofrido, ficou com sequelas que lhe atribuíram um dano estético permanente fixado no grau 1, que se encontra condicionado na actividade de condução de motociclos e velocípedes, impedindo-o de praticar as actividades de motocrosse, BTT e ciclismo, que antes praticava, que sofreu depressão, angústia e diminuição da sua auto-estima, que receou pela sua vida quando se apercebeu da iminência do embate com a viatura segurada pela ré, que ficou limitado na sua capacidade de locomoção, que sente angústia por saber que não recuperará totalmente das lesões sofridas na sequência do embate e que sentiu dificuldades ao nível do sono, e ponderando também que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da condutora do veículo segurado pela ré, a situação económica do lesado e da ré seguradora e os padrões geralmente adoptados pela jurisprudência, bem como as demais circunstâncias concretas do caso, mostra-se justa e equitativamente fixado o valor de € 15.000,00, como compensação pelos danos não patrimoniais».
Vista a jurisprudência, cumpre referir que os montantes que vêm sendo fixados pelos tribunais superiores não suportam, de todo, a pretensão da Recorrente de redução da indemnização a um valor situado perto dos € 3.000,00, que não se traduziria numa compensação que se pretende digna.
Resulta dos factos que atrás salientamos que o Recorrido sofreu edema e escoriações do braço esquerdo e hematoma da parede lateral esquerda do tórax, teve quantum doloris fixável em 3/7 e durante o período de baixa esteve sem conseguir dormir ou movimentar-se, devido às dores físicas que sentia; a Recorrida sofreu traumatismo crânio encefálico, com perda fugaz do conhecimento, nos dias que se seguiram e devido às sequelas do sinistro a autora tinha dificuldade em dormir, sentia medo e pânico, ficou com dano estético permanente de 1/7 em consequência de cicatriz.
Por outro lado, da dinâmica do acidente descrita nos factos provados resulta que os lesados não tiveram qualquer responsabilidade na produção do acidente, sendo este da inteira responsabilidade do condutor do veículo automóvel seguro na Recorrente.
Os valores atribuídos pelo Tribunal a quo não contrastam muito com os montantes que vêm sendo fixados pelos tribunais superiores nos últimos anos, mas considerando que nas situações que ali figuram estamos perante quadros significativamente mais graves, a nível de lesões, tratamentos e afectações permanentes [no caso vertente nem o Recorrido nem a Recorrida sofreram lesões que se possam configurar como objetivamente muito graves, não necessitaram de ficar internados, nem foram submetidos a cirurgias ou a longos períodos de tratamentos e de recuperação, tendo tido períodos de baixa de 12 dias e 8 dias, respectivamente], entende-se adequado reduzir os valores a arbitrar para os montantes de € 10.500,00 para o Recorrido e € 12.500,00 para a Recorrida, que se afiguram ser mais ajustados ao caso, estando dentro dos padrões que são praticados.
Procede, assim, parcialmente, o recurso.
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V – DECISÃO
Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela Recorrente e, em consequência, reduzem os valores a título de indemnização pelos danos não patrimoniais para os montantes de € 10.500,00 para o Recorrido e € 12.500,00 para a Recorrida.
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Custas da apelação pela Recorrente e Recorridos, na proporção do decaimento (conforme artigo 527.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC).
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Évora, 02/10/2025
Maria Isabel Calheiros
Anabela Raimundo Fialho
Miguel Jorge Vieira Teixeira