Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | BERNARDO DOMINGOS | ||
Descritores: | OBJECTO DO RECURSO QUESTÕES NOVAS | ||
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Data do Acordão: | 05/26/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
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Sumário: | Os recursos visam modificar decisões e não criar decisões sobre matéria nova, não sendo lícito invocar nos mesmos questões que as partes não tenham suscitado perante o tribunal recorrido. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: Proc.º N.º 2612/07.2TBPTM.E1 Apelação 2ª Secção Tribunal Judicial da Comarca de Portimão - 2º Juízo Cível Recorrente: Arsénio ..................... e Maria de Fátima ..................... Recorrido: Gar....................- Sociedade Mediação Imobiliárias, SA. * Relatório[1] Gar...................., S.A., veio intentar a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra Arsénio ..................... e Maria de Fátima Reis da Silva Cruz pedindo a respectiva condenação no pagamento da quantia de 24.748,20 euros, acrescida de juros à taxa supletiva comercial. Para tanto alega em resumo que os réus celebraram consigo contrato de mediação imobiliária para a promoção da venda de duas fracções destinadas a comércio, tendo a autora angariado cliente (Secretaria de Estado do Consulado Britânico) que veio a comprar aos réus as fracções, sem que os réus tivessem procedido ao pagamento da comissão acordada pelo serviço, 3 % do preço da venda , os quais equivalem ao valor de capital peticionado . * Contestaram os réus dizendo, simultaneamente, que nada acordaram com a autora e que assinaram contratos no âmbito de proposta de mediação imobiliária para fins de arrendamento das fracções, que acabaram por vender à Secretaria de Estado do Consulado Britânico sem qualquer intervenção da autora .Houve réplica e tréplica. Foi proferido despacho saneador e foram elaborados a especificação e o questionário, os quais não foram objecto de reclamação. Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento com observância de todo o formalismo legal tendo o tribunal respondido à matéria do questionário por despacho que não sofreu reclamações. De seguida foi proferida sentença onde se julgou a acção procedente e se condenaram os RR. no pedido. * Inconformados, vieram os RR. interpor recurso de apelação, tendo rematado as suas alegações, comas seguintes Conclusões: 1. « Do depoimento da única testemunha que com relevo e conhecimento directo dos factos depôs, resulta claro que não se pode, como fez o Tribunal A Quo dar por provada, a matéria dos quesitos 1.º a s.º da base instrutória, merecendo estes quesitos, ao invés da que foi dada, a resposta de "não provado". 2. Bem assim resulta do depoimento da testemunha que não se pode dar por provada a matéria dos quesitos l5º, 16.º e 17º. 3. Sendo nenhuma prova se fez nesta matéria que não a de que o consulado entregou um cheque de reserva à Gar..................... Pelo que: 4. O quesito 15Q deveria ter merecido a resposta de provado apenas que a o referido terceiro fez a entrega de um cheque à Gar....................; 5. O quesito 16Q, merecendo a resposta de "não provado", 6. O quesito 17Q, merecendo a resposta de "não provado" 7. A autora não provou que o contrato de mediação impugnado pelos réus demonstra a real vontade das partes o que releva em primeira linha para a sua execução porquanto o contrato permite no seu clausulado a mediação para arrendamento, venda e trespasse e não apenas para a venda. 8. Sendo certo que as fracções estavam referenciadas como sendo para a arrendar natural seria que assim se mantivessem porque era essa a intenção dos réus. 9. Não existe nem é produzida qualquer prova de que o acordo seria para angariação de interessados na compra das fracções, pelo que os réus pagariam à autora um montante igual a 3% do preço pago pelo terceiro. 10. O contrato foi feito sob falsas pretensas, uma vez já angariado o comprador sem qualquer conhecimento dos pretensos vendedores que, a final, são conduzidos ao contrato que permite a Gar.................... vir a receber a comissão por uma angariação não contratada e, ou, pretendida. 11. A conduta da Autora esteve em violação do disposto no Artigo 3.Q da lei de mediação imobiliária; 12. Importa ainda a violação do disposto na alínea f) do n.Q 1 do artigo 18Q do Citado Diploma legal porquanto não entregou imediatamente aos réus o montante que na qualidade de mediadores receberam do interessado na aquisição; 13. Nos termos do disposto no n.Q 1 do Artigo 19.Q do Dec. lei n.º 77/99 de 16 de Março, a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, o que claramente não ocorreu neste caso. 14. A terminar sempre se diria que o contrato se encontra ferido de nulidade atento o disposto nas alíneas c), d) e g) do artigo 20.º do citado Diploma legal; 15. Ainda que se entendesse que o contrato é válido e regular sempre se teria que concluir que o negócio não foi concretizado sob a sua mediação que não sendo exclusiva teria sempre a autora que provar que foi por causa exclusivamente imputável aos réus que não se concretizou o negócio, facto que não invocou ou logrou provar. Da violação de Lei. Tendo proferido decisão nos termos em que o fez entrou o Tribunal A quo em violação e Lei, nomeadamente do disposto nos artigos 3.º, 18.º n.º 1 alínea f), 19.º n.º 1 e 20.º nos 2 alíneas c), d) e g) e n.º 8, todos do Decreto-Lei 77/99 de 16 de Março.» * Não houve contra-alegações.* Os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil)[2] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).A apelação tem apenas como objecto a discordância quanto - à decisão de facto (quesitos 15º a 17º) - à decisão jurídica por alegada nulidade do contrato. * Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.* ** Dos factos Na primeira instância foram dados como provados, os seguintes factos. «A autora é uma sociedade comercial que tem por objecto social a actividade de mediação imobiliária ( alínea A da especificação ) ; Os réus, casados entre si, em Novembro de 2006 eram proprietários das fracções autónomas destinadas a comércio designadas pelas letras “ AA ” e “ Z ” correspondentes ao rés do chão do Bloco H do prédio urbano sito na Avenida nº 2, freguesia e concelho de Portimão (alíneas D e E da especificação); Os réus aceitaram que a autora lhes prestasse serviço de mediação imobiliária, com vista à venda das duas fracções autónomas, pois a autora tinha angariado interessado na compra (resposta aos quesitos 1º a 3º); Autora e réus acordaram então que por tal angariação os segundos pagariam à primeira montante igual a 3 % do preço final da venda (resposta ao quesito 4º) ; A autora angariou como interessado na compra das fracções autónomas um representante da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Commonwealth do reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, que pretendia adquirir duas lojas para a sua representada (respostas aos quesitos 6º e 7º) ; Tendo sido apresentados uns aos outros (representante da Secretaria de Estado e réus ) pela autora ( resposta ao quesito 11º ) ; Em 11.5.2007 foi outorgada escritura de compra e venda das duas fracções entre a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Commonwealth do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e os réus, pela qual a Secretaria de Estado comprou a estes as fracções pelo preço global de 824.940 euros e tendo os outorgantes declarado que não existira intervenção de mediadora (alíneas G, H e I da especificação); * Deu-se ainda como assente que:A autora acompanhou o referido interessado e levou-o a visitar as fracções autónomas supra identificadas e propriedade dos réus (resposta ao quesito 8º); Os réus e o representante da referida Secretaria não se conheciam (resposta ao quesito 9º); Nem os réus, conheciam, até então, o interesse da referida Secretaria em adquirir quaisquer fracções autónomas ( resposta ao quesito 10º ) ; Foi a autora quem indicou ao terceiro as fracções autónomas dos réus (resposta ao quesito 12º); Aconselhando-o na compra das referidas fracções autónomas (resposta ao quesito 13º); O referido terceiro reservou para a sua representada as referidas lojas (resposta ao quesito 14º); Tendo feito a entrega à autora de um cheque no montante de 2.500 euros (resposta ao quesito 15º); Cheque esse emitido à ordem do réu (resposta ao quesito 16º); Do que a autora deu imediato conhecimento ao réu (resposta ao quesito 17º ) ; Em data anterior à da escritura, a autora deu a conhecer aos réus que a Secretaria de Estado solicitara que a escritura tomasse lugar dali a meses por se encontrar ainda em processo de avaliação do imóvel (alínea J da especificação); Os réus aceitaram aguardar pelo desfecho de tal processo (alínea L da especificação); Após a outorga da escritura a autora emitiu a correspondente factura no valor constante dos contratos para pagamento da comissão que considerava devida (alínea M da especificação); A qual remeteu aos réus (alínea N da especificação); Os réus até à presente não pagaram (alínea O da especificação); No dia da escritura de compra e venda o comprador pagou aos réus o preço referente à compra e venda das fracções que adquiriu (alínea P da especificação); Tendo pago aos réus, na globalidade, o montante de 824.940 euros (alínea Q da especificação); A autora encontra-se licenciada para o exercício daquela actividade (alínea B da especificação); E com seguro válido (alínea C da especificação); Autora e réu assinaram os contratos que constam a fls. 20 e 21 (alínea F da especificação); Os contratos referidos em F) consagram o acordo que as partes já tinham alcançado anteriormente e que se refere em 1) (resposta ao quesito 5º); O 1º réu havia adquirido com a mediação da autora aquelas duas fracções autónomas (resposta ao quesito 19º); Foi o Sr. João Nunes, funcionário da autora, quem procedeu ao preenchimento das cláusulas dos contratos e os deu a assinar ao 1º réu (resposta ao quesito 27º); A venda das fracções era o que a autora tinha como objectivo final (resposta ao quesito 28º)». * A decisão de facto baseou-se em grande parte na prova testemunhal produzida e quanto esta importa lembrar ao recorrente que, no julgamento da matéria de facto e na sequência dos princípios da imediação, da oralidade e da concentração, o tribunal aprecia livremente as provas, segundo a sua prudente convicção, art.º 655º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil (princípio da livre apreciação da prova), ou seja, depois da prova produzida, o tribunal tira as suas conclusões, em conformidade com as suas impressões recém colhidas e com a convicção que através delas se foi gerando no seu espírito, de acordo com as regras da ciência, do raciocínio, e das máximas da experiência[3], que forem aplicáveis[4], salvo previstos no n.º 2 do mesmo artigo.E esta apreciação livre das provas tem de ser entendida como uma apreciação convicta do julgador, subordinada apenas à sua experiência e prudência e guiando-se sempre por factores de probabilidade e nunca de certezas absolutas, estas quase sempre intangíveis, nunca entendida num sentido arbitrário, de mero capricho ou de simples produto do momento, mas como uma análise serena e objectiva de todos os elementos de facto que foram levados a julgamento, tudo por forma a que, uma resposta dada a determinado quesito seja o reflexo e “ o resultado da conjugação de vários elementos de prova que na audiência ou em momento anterior foram sujeitos às regras da contraditoriedade, da imediação ou da oralidade” (Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II vol., pág. 209). Ora, deve aceitar-se que a convicção do julgador da 1ª instância resulta da experiência, prudência e saber daquele, sendo certo que é no contacto pessoal e directo com as provas, designadamente com a testemunhal, que aquelas qualidades de julgador mais são necessárias, pois é com base nelas que determinado depoimento pode ou não convencer quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recai, constituindo uma das manifestações dos princípios da oralidade e da imediação, por via das quais o julgador tem a oportunidade de se aperceber da frontalidade, tibieza, lucidez, rigor e firmeza com que os depoimentos são produzidos, mesmo do confronto imediato entre os vários depoimentos, do contraditório formado pelos intervenientes, advogados e juízes, do interrogatório do advogado que a apresenta, do contraditório do outro mandatário e das dúvidas do próprio tribunal, melhor ajuizando e aquilatando desta forma da sua validade. O depoimento[5] oral da testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, as suas reacções imediatas, o sentido dado à palavra e à frase, o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerado em torno da testemunha, a forma como é feita a pergunta e surge a resposta, e tudo isto contribui, com mais ou menos amplitude, para a formação da convicção do julgador. Como também refere Abrantes Geraldes (ob. Cit., p. 257) “Existem aspectos comportamentais ou reacções [6] dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como, no primeiro, se formou a convicção do julgador” e, mais adiante, “a simples leitura de secas e inertes laudas de argumentação fáctica jamais se pode comparar à vivacidade proporcionada ao juiz da primeira instância, quando este, empenhado, como deve estar, no efectivo apuramento da verdade material, procura encontrar, na floresta integrada pelos diversos meios probatórios (firmes ou imprecisos, convincentes ou contraditórios, serenos ou interessados), a vereda que lhe permite ir de encontro à justa composição do litígio, arrimado nos instrumentos que lhe são proporcionados pelos princípio da imediação e oralidade”. A valoração de um depoimento pelo julgador tem sempre um certo conteúdo subjectivo mas a percepção dos factos só é perfeitamente conseguida com o imediatismo das provas. É sempre uma tarefa difícil para o Tribunal superior perscrutar e sindicar esse processo de valoração, quando é certo que dispõe de menos elementos e meios menos “ricos” que aqueles de que dispôs o Tribunal “a quo”. Daí que deva haver alguma cautela e muito rigor na reapreciação da prova “oral” produzida na primeira instância. E por isso como se diz no Ac. do STJ de 21/01/2003, proc. n.º 02ª4324, in http://www.dgsi.pt/ «a reanálise das provas gravadas pelo Tribunal da Relação só pode abalar a convicção criada pelo Juiz da 1.ª instância, traduzida nas respostas aos quesitos, e determinar a alteração dessas respostas, em casos pontuais e excepcionais, quando, não se tratando de confissão ou de qualquer facto só susceptível de prova através de documento, se verifique que as respostas dadas não têm qualquer fundamento face aos elementos de prova trazidos ao processo ou estão profundamente desapoiados face às provas recolhidas(…)” . O objectivo da gravação da prova funciona assim mais como uma válvula de escape para situações pontuais em que seja inaceitável a possibilidade da resposta dada, do que como um meio desejado para reanálise sistemática de toda a prova[7]. Desta forma, só está em perfeitas condições de poder satisfazer a eventual alteração das respostas aos quesitos em situações limite, ou seja, se resultar inequivocamente que a resposta ao quesito não podia ser aquela, mas tinha que ser outra. O próprio legislador, no preâmbulo do DL n.º 329-A/95, de 12 /12, assumiu clara posição que pretende assegurar o princípio do imediatismo das provas. Em nenhum ponto do enunciado diploma vemos que tenha sido intenção do legislador acabar com ele! O que pretendeu fazer-se foi controlar as situações insustentáveis. A admissibilidade da respectiva alteração por parte do Tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação. Assim, por exemplo: a) apoiar-se a prova em depoimentos de testemunhas, quando a prova só pudesse ocorrer através de outro sistema de prova vinculada; b) apoiar-se exclusivamente em depoimento(s) de testemunha(s) que não depôs(useram) à matéria em causa ou que teve(tiveram) expressão de sinal contrário daquele que foi considerado como provado; c) apoiar-se a prova exclusivamente em depoimentos que não sejam minimamente consistentes, ou em elementos ou documentos referidos na fundamentação, que nada tenham a ver com o conteúdo das respostas dadas». No caso concreto, analisada toda a prova produzida na primeira instância, nada indicia a existência de um erro no julgamento de facto. Na fundamentação da matéria de facto o M.º Juiz explanou, de forma suficientemente clara, as razões porque ficou convencido do conteúdo das respostas dadas aos quesitos em causa. Ouvidos os registos da prova não se vislumbrou erro de apreciação que justifique qualquer alteração das ditas respostas aos quesitos 15º a 17º. Sustenta a recorrente que o R. quando assinou o contrato o fez, visando o arrendamento e não a venda e que mesmo admitindo esta lhe terá sido dito que não teria que pagar à A., qualquer comissão. Competia aos RR. provar estes factos, sendo certo que dificilmente o poderiam fazer apenas com recurso à prova testemunhal, porquanto, entando-se em presença de um contrato formal, (art. 20º do DL n.º 77/99) onde se encontravam previstas expressamente aquelas situações, não seria admissível outro meio de prova que não o documental ou de força superior(art.º 364º do CC). Nos negócios formais, como é o caso, a vontade das partes não pode valer com um sentido que não tenha o mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expressa (art.º 238º do CC). O contrato de mediação imobiliária é um negócio formal (art. 20º do DL n.º 77/99) para o qual se exige a forma escrita. Ora do contrato resulta sem, sombra de quaisquer dúvidas, que os RR. se comprometeram a pagar uma comissão de 3% sobre o valor do negócio e que a mediação visava não só o arrendamento como a venda. Assim e pelo exposto impõe-se concluir que não há razões plausíveis para que seja alterada a matéria de facto tal como foi julgada na primeira instância. * ** O Direito Como já se disse supra, em regra, são as conclusões das alegações que delimitam o objecto do recurso, em termos de o Tribunal superior não poder conhecer de questões que aí não constem. Porém existem ainda outras limitações objectivas ao objecto do recurso, que são anteriores a este e que o condicionam, designadamente - A decisão recorrida - Os casos julgados formados no processo. Quanto à primeira limitação, é entendimento unânime na jurisprudência que o objecto do recurso é a decisão, ou seja, os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova. Neste sentido pode ler-se no acórdão do S.T.J. de 6.2.87, B.M.J. n.º 364, pág. 719: "vem este Supremo Tribunal decidindo de há muito, constituindo jurisprudência assente e indiscutida, que os recursos visam modificar decisões e não criar decisões sobre matéria nova, não sendo lícito invocar nos mesmos questões que as partes não tenham suscitado perante o tribunal recorrido – sublinhado nosso- (cfr. entre outros, acórdãos de 16.5.72, 13.3.73, 5.2.74, 29.10.74, 7.1.75, 25.11.75 e de 12.6.91, publicados no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 217, pág. 103; 225, pág. 202; 234, pág.267; 240, pág. 223; 243, pág. 194, 251, pág. 122 e n.º 408, pág. 521, respectivamente)". Na doutrina é também este o entendimento, conforme se constata da lição de Castro Mendes, "Recursos", 1980, pág. 27 e, mais recentemente, de Armindo Ribeiro Mendes, "Recursos em Processo Civil", 1992, págs.140 e 175. Mais recentemente o STJ reafirmou este entendimento ao decidir que « os recursos visam o reestudo, por um tribunal superior, de questões já vistas e resolvidas pelo tribunal a quo e não a pronúncia do tribunal ad quem sobre questões novas. Esta regra, que decorre, designadamente, dos artigos 676.°, n.° 1, e 684.° n.° 3, do Código de Processo Civil, comporta, porém e em conformidade com a mesma práxis decisória, duas excepções: 1º - Situações em que a lei expressamente determina o contrário; 2 º - Situações em que em causa está matéria de conhecimento oficioso.» Ac. do STJ, de 7/01/93, in BMJ 423/540. Quanto à segunda limitação – os casos julgados formados anteriormente no processo - é óbvia e pacifica e indiscutivelmente aceite, já que decorre directamente da disciplina do caso julgado formal e material estabelecida nos art.ºs 672º (caso julgado formal) e 673º, ( caso julgado material) 677º e 684º n.º 4, todos do CPC. * Analisadas as conclusões de recurso verifica-se que os recorrentes vêm suscitar a questão da eventual nulidade do contrato, pela primeira vez no processo, apenas nas alegações de recurso. Não o fizeram na contestação, onde deveriam ter deduzido toda a defesa, nem posteriormente na primeira instância, por forma a que o Tribunal “a quo” tivesse a oportunidade de decidir tal matéria. ** Invocam que o contrato não respeitou alguns do requisitos previstos nos n.º 1, 2 e 6 do art.º 20º do DL n.º 77/99. Não respeitou nem tinha que respeitar porquanto, à data da sua celebração, tal diploma já não vigorava. Fora substituído pelo DL n.º 211/2004 de 20 de Agosto!!! É verdade que o regime vigente, em quase nada difere do estabelecido no regime anterior constante do Decreto-Lei n.º 77/99, de 16/03, pois, entre muitas outras similitudes, continua a cominar com a nulidade as situações a que se reportava o n.º 8 do art.º 20º do “defunto” DL n.º 77/99. Na verdade, o n.º 8 do art.º 19º do DL n.º 211/04, comina com nulidade o contrato que viole o estabelecido no n.ºs 1, 2 e 7 do mesmo preceito. No caso dos autos, ao que parece, ao menos em parte, tais normas não terão sido integralmente respeitadas. Porém esta nulidade não era do conhecimento oficioso, no anterior regime e continua a não o ser agora, como ressalta do facto de não poder ser invocada pela mediadora. (art. 19º n.º 8 do DL n.º 211/04). Trata-se duma nulidade relativa que visa a protecção do utente (titular do imóvel), carecendo por isso de ser invocada, no momento processual próprio e na forma legal, (na contestação....onde deve ser deduzida toda a defesa) até por se tratar de matéria de excepção. Esta questão da eventual nulidade do contrato nunca foi sequer referida, quanto mais apreciada, no decurso do processo...!!! Assim sendo e pelas razões acima expostas, é vedado a este Tribunal conhecer dessa questão, já que se trata de matéria que não faz parte do objecto da lide e não foi sequer suscitada perante o Tribunal recorrido, nem este tinha o dever de dela conhecer oficiosamente, pelo que improcede, também nesta parte, a apelação. Concluindo Perante a factualidade dada como provada e não procedendo a questão da nulidade do contrato, a decisão recorrida é juridicamente correcta e como tal, acorda-se na improcedência da apelação e confirma-se a sentença. Custas pelos apelantes. Registe e notifique. Évora em 26 de Maio de 2010. -------------------------------------------------- (Bernardo Domingos – Relator) --------------------------------------------------- (Silva Rato – 1º Adjunto) --------------------------------------------------- (Sérgio Abrantes Mendes – 2º Adjunto) __________________________________________________ [1] Transcrito da sentença [2] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56. [3] As máximas ou regras da experiência da vida (Erfahrungssätze) são afirmações genéricas de facto __ são juízos gerais (de facto) __ situadas no domínio da questão de facto, que funcionam como premissas maiores das presunções simples, notórias ou não notórias __se forem notórias o juiz conhecê-las-á ou se socorrerá dos meios fáceis e acessíveis ao seu conhecimento, se o não forem será obtidas por intermédio do processo, maxime, por intermédio dos peritos __, que procedem mediata ou imediatamente da experiência. Vd. Castro Mendes, Do conceito de prova em processo civil, Edições Ática - 1961, págs. 644 e 660 e segs. São, pois, juízos de carácter geral formados sobre a observação da vida de todos os dias, que permitem ao juiz apreender o significado, a atendibilidade e a eficácia de uma prova. São critérios generalizantes e tipificados de inferência factual. Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal (1967-1968), Coimbra - 1968, pág. 48. Segundo Vaz Serra __ RLJ Ano 108 pág. 358 __ não são normas jurídicas __ e portanto não são normas de direito substantivo __, mas são partes destas já que estas as mandam, expressa ou tacitamente, ter em conta e, por conseguinte a sua violação implica a violação da lei substantiva. E segundo Vd. P Lima e A. Varela __ Cód. Civil Anot. Vol. I 2.ª Ed., pág. 289 __ estão na base das presunções judiciais simples ou de exercício, isto é, das que assentam no simples raciocínio de quem julga. Sobre a questão se se situam no âmbito da questão de direito ou de facto vd. J. A. Reis, Breve Estudo, pág. 539. Cfr. também Castro Mendes, opus cit., pág. 666 nota 18. [4] Vd. José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil (Conceito e Princípios Gerais) - À luz do Código Revisto, Coimbra Editora - 1996, pág. 157; Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa -1997, pág. 347 [5] Os depoimentos não são só palavras, o silêncio da testemunha (que não aparece quando há transcrição) pode valer mais para formar a convicção do tribunal do que o depoimento orquestrado de vinte outras. [6] O tom de voz, a mímica, o rubor, a palidez, etc., elementos extremamente infiéis e mutáveis, conforme o temperamento, a idade, o sexo, a posição social e as condições de vida, mas que podem ser significativos, quando sujeitos a uma análise prudente e avisada, que descubra, por exemplo, entre um tímido e um audacioso profissional da mentira, que sabe ser mais facilmente acreditado se se mostrar firme e seguro no seu depoimento. [7] É que o tribunal de 2ª jurisdição não vai à procura de uma nova convicção (que lhe está de todo em todo vedada exactamente pela falta desses elementos intraduzíveis na gravação da prova), mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal “a quo” tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si. |