Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | RENATO BARROSO | ||
| Descritores: | VÍCIOS DA DECISÃO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA | ||
| Data do Acordão: | 05/21/2013 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | O modo de valoração das provas e o juízo resultante dessa mesma aferição, efectuado pelo tribunal a quo, ao não coincidir com a perspectiva do recorrente nos termos em que este as analisa e nas consequências que daí derivam, não traduz qualquer erro ou vício da decisão. | ||
| Decisão Texto Integral: | Proc. 256/09.3T3STC.E1 1ª Sub-Secção ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida No processo comum singular nº 256/09.3T3STC, do Tribunal da Comarca de Santiago do Cacém, o arguido A, foi absolvido da prática de um crime de propaganda na véspera e no dia da eleição, p.p., pelos Artsº 177 nº1 e 162 al. f), com referência aos Artsº 47 e 123, todos da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, aprovada pelo Lei 1/01 de 14 de Agosto. B – Recurso Inconformado com o assim decidido, recorreu o M.P., tendo concluído as respectivas motivações da seguinte forma ( transcrição ) : 1. O arguido A foi absolvido da prática de um crime de propaganda na véspera e no dia da eleição, p. e p. pelos artigos 177º, n º 1, e 162º, al. f), com referência aos artigos 47º e 123º, todos da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, punido ainda com as sanções acessórias constantes do artigo 164º, do mesmo diploma legal, com o fundamento na falta do elemento subjectivo do respectivo tipo. 2. Em sede de audiência de julgamento a testemunha B referiu de forma espontânea, clara e que se nos afigura credível que no dia dos factos viu o arguido no espaço exterior à escola supra referida a entregar uma caneta de cor vermelha a uma pessoa cuja identidade não sabe precisar, tendo aquele na ocasião várias outras na mão. 3. As 10 testemunhas arroladas pela defesa apenas souberam esclarecer o Tribunal que durante o período de tempo em que estiveram com o arguido nada de anormal ou anómalo se passou, não infirmando de alguma forma o teor do depoimento da testemunha B. 4. Consideramos pois que resulta da prova produzida em julgamento que não só se deveria ter dado como provado a entrega de uma caneta por parte do arguido junto ao local onde decorriam as eleições, mas sim a entrega de várias canetas alusivas ao movimento que representava e pelo qual se candidatava quando este se encontrava no recinto escolar onde o acto eleitoral decorria. 5. Por outro lado, foi dado como provado pela Mma. Juiz a entrega de uma caneta pelo arguido a C, tendo dessa forma se preenchido o elemento objectivo do tipo de ilícito – na medida em que se este se preenche com um qualquer acto passível de configurar acto de propaganda. 6. Contudo, no raciocínio discorrido pela Mma. Juiz e, não obstante, o preenchimento do elemento objectivo do tipo legal de crime, não se logrou demonstrado que o arguido o tenha feito com dolo, nem tão pouco na sua vertente eventual. 7. Sucede que o arguido não prestou declarações e não resulta de nenhum dos depoimentos das testemunhas ouvidas que o arguido desconhecia a proibição de se realizar propaganda em dia de eleição. 8. Pelo que não se pode concordar que o arguido tenha praticado o crime a título negligente, que no caso vertente não é punível. 9. Acresce que o arguido não podia desconhecer tal proibição e não podia porque encontrava-se a concorrer a um cargo político. 10. Para além do mais, não se entende como se alcançou a conduta do arguido ter sido praticada com negligência quando este nem sequer prestou declarações! 11. Não podemos por conseguinte concordar com o Tribunal “a quo” quando considera que não obstante se ter demonstrado o elemento objectivo, não se logrou demonstrado que o arguido o fez com dolo, nem tão pouco na sua vertente de dolo eventual, na medida em que não se provou qualquer intenção, o que conduziu a uma sentença absolutória. Por tudo, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, consequentemente, a sentença ser revogada e substituída por outra que condene o arguido pelo crime que lhe é imputado na acusação pública e bem assim na pena acessória de suspensão p. e p. pelo artigo 164º, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais. C – Resposta ao Recurso Respondeu o arguido ao recurso, assim concluindo ( transcrição ) : 1) Os factos provados e não provados na douta sentença assentaram na prova produzida na audiência de julgamento; 2) O Tribunal fundamentou a sua posição de forma clara e sem quaisquer vícios; 3) A douta sentença não padece de erro notório na apreciação da prova; 4) Erroneamente tal vício é invocado, porém aquilo que se pretende é “atacar” a regra fundamental do acto de julgar, isto é, o princípio da livre apreciação da prova; 5) A testemunha B depôs afirmando que viu o arguido a entregar uma caneta de cor vermelha a pessoa que não sou identificar e não soube afiançar ao Tribunal se se trataria de uma caneta pertencente a movimento partidário; 6) A testemunha C testemunhou de forma credível e assegurou que a caneta que lhe foi entregue pelo arguido, em hora não apurada, resultou de um gesto de cortesia; 7) A restante prova testemunhal determinou um juízo seguro, na análise conjunta de toda a prova, de que o arguido não praticou os factos descritos na pronúncia; 8) As regras basilares, fundadas em princípios constitucionais, impedem o Ministério Público de fazer uso de prova proibida em sede de recurso, como seja, a argumentação motivacional de que o arguido confessou determinados factos em fase de instrução quando decidiu não prestar declarações em sede de audiência de julgamento; 9) É ao Ministério Público que compete provar que os factos ocorreram através da sustentação em julgamento das provas que disponha; 10) É profundamente errada, porque ilegal, a tese argumentativa da qual resulte a conclusão: um arguido que faça uso do direito ao silêncio em julgamento ou que não compareça, não pode ser absolvido seja porque motivo for; 11) A Douta sentença proferida pelo Tribunal é justa porque se fundou na prova realizada em audiência de julgamento e decorre da respectiva fundamentação nela inserta. V. Exas. mantendo a douta sentença proferida, deverão julgar improcedente o presente recurso, fazendo desse modo JUSTIÇA. D – Tramitação subsequente Aqui recebidos, foram os autos com vista ao Exmº Procurador-geral Adjunto, que pugnou pela manutenção da decisão recorrida. Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, não foi apresentada resposta. Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência. Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO A – Objecto do recurso De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 ( neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/"www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria ) o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. Na verdade e apesar do recorrente delimitar, com as conclusões que extrai das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito. As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal. O objecto do recurso cinge-se às conclusões do recorrente, das quais, se podem extrair as seguintes questões : 1) Erro notório na apreciação da prova ; 2) Preenchimento do elemento subjectivo do crime imputado ao arguido ; B – Apreciação Definidas as questões a tratar, importa considerar o que se mostra fixado, em termos factuais, pela instância recorrida. Aí, foi dado como provado e não provado, o seguinte ( transcrição ) : « III – Fundamentação de Facto A) Factos provados: Discutida a causa, e com relevância para a mesma, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 11 de Outubro de 2009 decorreram eleições para os órgãos das autarquias locais. 2. No que concerne ao Município de Sines as eleições decorreram no edifício das Escolas Primárias, sitas na Rua da Reforma Agrária, naquela Cidade. 3. O arguido concorria às eleições como cabeça de lista à Assembleia de Freguesia de Sines, pelo movimento de cidadãos, SINES INTERESSA MAIS – SIM. 4. No dia referido em 1., em hora não concretamente apurada, o arguido entregou a C, uma caneta. Provou-se ainda: 5. O arguido vive com a esposa. 6. A casa é própria, suportando com a sua aquisição uma prestação mensal com o crédito à habitação no montante de € 146,00 (cento e quarenta e seis euros). 7. O arguido aufere a título de retribuição a quantia mensal de € 1.600,00 (mil e seiscentos euros). 8. A esposa do arguido aufere a título de retribuição mensal a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros). 9. O arguido suporta uma prestação mensal de € 180,00 (cento e oitenta euros) com um crédito pessoal. 10. O arguido tem o 12.º ano de escolaridade. 11. O arguido não tem antecedentes criminais. * B) Factos não provados: Da pronúncia não resultou provado que: a) Não obstante ser candidato, e no decurso do dia da eleição, enquanto esta decorria, o arguido, que transportava consigo material de propaganda respeitante ao movimento pelo qual se candidatava, designadamente canetas alusivas ao movimento SINES INTERESSA MAIS – SIM, e no recinto anexo ao da assembleia de voto, entregou, distribuiu e ofereceu-as a um conjunto indeterminado de cidadãos eleitores que aí se encontravam. b) Actuou o arguido, livre, deliberada e conscientemente, com o propósito conseguido de fazer propaganda eleitoral no dia da votação, entregando canetas alusivas ao Movimento SINES INTERESSA MAIS - SIM, pelo qual se candidatava, procurando, dessa forma, influenciar o processo de formação de vontade e de consciência política dos eleitores, não obstante saber que não o poderia fazer. c) O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. » Pelo tribunal recorrido, foi assim justificada a motivação da decisão de facto ( transcrição ) : « C) Motivação da Decisão de Facto: A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica e conjugada de toda a prova produzida, bem como dos documentos juntos aos autos a qual foi apreciada segundo as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposto pelo ordenamento jurídico, fazendo o Tribunal, no uso da sua liberdade de apreciação, uma análise crítica das provas. Assim, vejamos. O arguido não prestou declarações. A testemunha B, referiu conhecer o arguido, por o mesmo residir em Sines, e esclareceu de forma clara que o acto eleitoral em Sines decorre no espaço das Escolas, e que a testemunha fazia parte de uma mesa de voto. Mencionou que viu o arguido no espaço exterior à escola, e que nessa ocasião o mesmo se encontrava a entregar uma caneta de cor vermelha, que não viu em concreto, a uma pessoa que não pode precisar, e que tinha várias outras na mão. Confrontada com a caneta constante dos autos, disse que a mesma era semelhante a uma que lhe haviam oferecido, quando da campanha eleitoral. A testemunha referiu ainda que viu o arguido efectuar com a mão o símbolo “V”, o qual era o símbolo utilizado pelo Movimento SIM. Todavia o seu depoimento não se mostrou confirmado pelas demais testemunhas ouvidas em sede de julgamento, como infra se descreverá, pelo que, e nessa medida o seu depoimento contribuiu para a resposta aos pontos 1. A 3. dos factos provados. A testemunha C, conhecido do arguido, sendo seu amigo há mais de 20 anos, depôs de forma clara e isenta, esclarecendo que se encontrava como delegado numa assembleia de voto, e que como é usual os candidatos permanecem junto do espaço onde funcionam as assembleias de voto durante todo o dia, pelo que, contactou com o arguido, a cumprimentá-lo, tendo este lhe entregue uma caneta como gesto de cortesia, e que a testemunha apenas não lhe entregou uma do seu partido, por não ter nenhuma na sua posse. Além do relatado, a testemunha referiu que não viu o arguido a entregar canetas a mais ninguém, tendo contudo constatado outras pessoas com canetas, o seu depoimento claro e coerente permitiu concluir aos pontos 1. a 4. dos factos provados. A testemunha D, conheceu o arguido por razões de ordem profissional, sendo amigo do mesmo há mais de 30 anos, disse de forma clara e precisa que, na qualidade de cabeça de lista do “Movimento SIM” à Câmara Municipal de Sines reuniu com os demais elementos do referido Movimento, e candidatos nas eleições autárquicas, na véspera do acto eleitoral, com o objectivo de os sensibilizar para o circunstancialismo que envolvia tal eleição. Mais disse que, no dia das eleições se encontrou durante todo o dia no local de voto, à excepção da altura em que foi almoçar, e que nada de irregular ou anormal se passou durante o período que lá se encontrou, sendo que, e no que ao Movimento concerne, se tivesse reparado em alguma irregularidade, teria chamado à atenção a quem a estivesse a cometer, uma vez que, conforme a testemunha precisou, não tinha qualquer interesse que existissem problemas no decurso do acto eleitoral. Do seu conhecimento do arguido, referiu de forma expressa e peremptória que o mesmo é uma pessoa responsável e que sempre se preocupou com os outros, o seu depoimento foi claro e conciso permitindo a resposta aos pontos 1. a 3. dos factos provados. A testemunha E conheceu o arguido por razões profissionais, sendo amigos há mais de 30 anos, esclareceu de forma clara e imparcial que, no dia das eleições foi votar, não tendo notado nada de invulgar ou anormal durante o período que permaneceu na assembleia de voto, e no espaço circundante. Referiu que usualmente permanece no recinto da assembleia de voto para conversar com pessoas conhecidas, não se recordando de se ter cruzado com o arguido. Relativamente à personalidade e conduta do arguido, referiu que o mesmo é uma pessoa sempre pronta a ajudar os outros e bastante prestável. Uma vez que o seu depoimento se limitou a descrever os factos de que tinha conhecimento, mereceu a credibilidade do tribunal. A testemunha F conhece arguido há mais de 23 anos por razões de natureza profissional, depôs de forma clara, precisa e congruente, relevando por isso para a prova dos factos constantes dos pontos 1. a 3. dos factos provados, na medida em que referiu ter estado a falar com o arguido no dia do acto eleitoral de 2009, não tendo constatado a existência de quaisquer canetas na posse daquele, e bem assim, que não viu nada de anormal, nem tão pouco constatou ninguém a dirigir-se ao arguido naquele período de tempo. No que concerne à personalidade do arguido, esclareceu que o mesmo é uma pessoa prestável e boa pessoa, na medida em que o seu depoimento referenciou apenas os factos de que tinha conhecimento mereceu a credibilidade do tribunal. A testemunha G, referiu conhecer o arguido há cerca de 40 anos, sendo seu amigo, tendo o seu depoimento sido claro e preciso, na medida em que esclareceu o modo como decorre o acto eleitoral, e em concreto a sua permanência no local durante todo o dia, tendo mencionado que viu o arguido, não podendo precisar se foi durante o período da manhã ou de tarde, todavia referiu não ter constatado nada de anormal. No que respeita ao local da assembleia de voto, referiu que tal local constitui um ponto de convívio para os residentes de Sines, sendo que tal situação se verifica há muto tempo, e bem assim, que é usual os eleitores solicitarem ajuda a quem se encontra no recinto, sobre a localização da sua mesa de voto, esclarecendo a testemunha que, tal já lhe aconteceu quando fez parte de uma mesa de voto. No que concerne à personalidade do arguido referiu que o mesmo é uma pessoa prestável e acessível. Na medida em que o seu depoimento se limitou a descrever os factos dos quais tinha conhecimento, mereceu a credibilidade do tribunal, permitindo a resposta aos pontos 1. a 3. dos factos provados. A testemunha H, referiu conhecer o arguido desde a altura em que este foi seu aluno, mantendo com este uma relação de amizade, mencionou de forma clara e isenta que vota em todos os actos eleitorais, sendo adversário do arguido, e que nas eleições que ocorreram em 2009 para as autarquias locais, como normalmente permaneceu no recinto envolvente das mesas de voto, não tendo presenciado quaisquer situações anormais, ou irregulares, referindo que ao que se recorda se cruzou com o arguido no referido recinto. No que respeita à personalidade do arguido disse que este é uma pessoa prestável, que tenta auxiliar as pessoas na medida do que lhe é possível. O seu depoimento mereceu a credibilidade do tribunal na medida em que limitou a descrever os factos de que tem conhecimento directo permitindo a resposta aos factos provados sob os pontos 1. a 3. dos factos provados. A testemunha I, referiu conhecer o arguido desde os anos de 1975/1976, na altura em que ambos faziam parte da Associação Vasco da Gama, tendo posteriormente tornado-se amigos, tendo esclarecido de forma imparcial e precisa que no acto eleitoral do ano de 2009 exerceu o seu direito de voto e abandonou o local, não podendo precisar se viu ou não o arguido, contudo mencionou que não constatou nada de anormal, não tendo visto, nem ouvido nada. Relativamente à personalidade do arguido esclareceu que o mesmo é uma pessoa séria e trabalhadora, sendo muito solicitado pelas pessoas para obter ajuda em questões relacionadas com segurança social onde foi funcionário. O seu depoimento elucidou o tribunal na medida em que apenas referiu os factos dos quais tinha conhecimento directo, permitindo a resposta aos factos provados sob os pontos 1. a 3. A testemunha J, disse ser amigo de infância do arguido e de forma clara e isenta referiu ter estado de serviço numa mesa de voto no acto eleitoral de 2009, tendo-se cruzado com o arguido, e bem assim com outros candidatos naquelas eleições autárquicas, não tendo ouvido quaisquer comentários ou conversas acerca de entrega de canetas ou papéis, e no que ao arguido respeita não viu entregar nada. Mencionou que, é usual no recinto de voto, as pessoas abordarem quem lá se encontra, sobre qual a mesa de voto onde exercem esse mesmo direito de voto. Quanto à personalidade do arguido, esclareceu que o mesmo é uma pessoa honesta, não o tendo por cometer qualquer acto menos próprio, o seu depoimento foi claro e preciso, na medida em que esclareceu apenas aquilo de que tinha conhecimento pessoal, pelo que mereceu a credibilidade do tribunal, permitindo a resposta aos pontos 1. a 3. dos factos provados. A testemunha K, referiu conhecer o arguido desde a juventude, tendo sido sua colega de trabalho, e ser sua amiga, mencionando de forma isenta que no acto eleitoral de 2009 se recordava de ter conversado com o arguido no recinto de voto, e depois ter abandonado o local. No que concerne à personalidade do arguido esclareceu que o mesmo é uma pessoa conceituada em Sines e que, quando trabalhava na segurança social, sempre foi atencioso para os utentes, referindo-se ainda ao arguido como sendo uma pessoa séria, na medida em que esclareceu apenas aquilo de que tinha conhecimento pessoal, pelo que mereceu a credibilidade do tribunal, permitindo a resposta aos pontos 1. a 3. dos factos provados. A testemunha L, disse ser amigo do arguido há mais de 30 anos, tendo trabalhado com este no Vasco da Gama, tendo esclarecido de forma clara e imparcial que, no acto eleitoral de 2009 ter estado no recinto de voto, e ter estado com o arguido, não tendo visto este ou qualquer outra pessoa a entregarem canetas. Mencionou que, as conversas tidas no recinto de voto se prendiam com projecções de cada um relativamente a quem ganharia as eleições em Sines. No que respeita à personalidade do arguido, referiu-se aquele como sendo uma pessoa séria, equilibrada e respeitadora da lei. O seu depoimento elucidou o tribunal na medida em que apenas referiu os factos dos quais tinha conhecimento directo, permitindo a resposta aos factos provados sob os pontos 1. a 3. A testemunha M, disse conhecer o arguido desde criança e mais tarde mantiveram um relacionamento de natureza profissional, esclareceu de forma clara e precisa que o Movimento SIM criado em Sines, sem qualquer ligação partidária criou mau estar nas eleições autárquicas de 2009. Mencionou que no acto eleitoral em causa, permaneceu no recinto de voto durante todo o dia, à excepção da altura em que foi almoçar, não tendo presenciado qualquer entrega de canetas, quer por parte do arguido, ou de quem quer que fosse, e que é usual os candidatos permanecerem naquele espaço durante todo o dia. Relativamente à personalidade do arguido, referiu que o mesmo é uma pessoa reservada e responsável, na medida em que esclareceu apenas aquilo de que tinha conhecimento pessoal, o seu depoimento mereceu a credibilidade do tribunal, permitindo a resposta aos pontos 1. a 3. dos factos provados. Da análise da prova produzida em audiência, apenas resultou que o arguido, candidato do Movimento SIM à Junta de Freguesia de Sines, tal como outros candidatos de outros partidos políticos e movimentos, permaneceu no recinto onde decorreram as eleições em Sines, conforme resulta do ponto 2. dos factos provados, constituindo tal situação uma prática, ou um uso, dos Sineenses, desde as primeiras eleições, sem que tal situação tenha qualquer intenção eleitoral, mas tão somente aferir da forma como decorre o acto eleitoral. Todas as testemunhas inquiridas em audiência foram unânimes em referir que não viram qualquer situação anormal, ou imprópria no decurso do referido acto eleitoral, e que, na sua maioria viram o arguido, não estando este na posse de quaisquer canetas, ou a efectuar quaisquer gestos ou actos. Do depoimento das várias testemunhas inquiridas resulta que as mesmas acorreram ao recinto descrito em 2. dos factos provados durante o dia das eleições, pelo que não se pode concluir que o seu depoimento tenha sido combinado, ou até acordado. Para além do mais, do depoimento da testemunha C, apenas resulta que lhe foi entregue uma caneta pelo arguido, segundo as suas palavras, como gesto de cortesia, o que pode nesta medida integrar o cometimento de um ilicito, todavia, de acordo com o seu depoimento, não resultou quando tal caneta foi entregue, na medida em que decorrendo as eleições entre as 9.00h e as 19.00 horas, não foi concretizado quando tal aconteceu, e bem assim, se a mesma era idêntica à constante dos autos a fls. 733. Com efeito, a testemunha referiu que viu outras pessoas com canetas, mas que não viu o arguido entregá-las, já que, também a mesma testemunha referiu não ter visto canetas na posse do arguido. Ora, aqui chegados, há que referir que apenas a testemunha B afirmou que viu o arguido na posse de diversas canetas vermelhas, segundo as suas palavras alusivas ao Movimento SIM, e bem assim que viu o arguido efectuar o gesto de “V”, símbolo do referido Movimento. Sem querer diminuir o depoimento da testemunha, sempre se dirá que, apenas esta verificou os acontecimentos que descreveu, o que resulta um pouco inverosímil, já que, as demais testemunhas inquiridas infirmaram o seu depoimento. Importa ainda salientar que pese embora o crime em apreço se preencha com o mero acto de propaganda, sem que o mesmo configure a obtenção de um resultado, no entanto, sempre se dirá que, de acordo com as regras da experiência comum, e no caso vertente que se mostra inverosímil que um candidato, ainda que inexperiente, utilizasse o recinto eleitoral, no dia das eleições, para distribuir material do seu partido ou movimento. Com efeito, qualquer cidadão comum, ainda que não frequentador das lides políticas e eleitorais sabe que é manifestamente vedada a prática de qualquer acto de propaganda no dia das eleições, sendo que, por esse motivo as campanhas eleitorais encerram na 6.ª feira que antecede o acto eleitoral. Nesta medida, considerando a envolvência das eleições autárquicas de 2009 em Sines, e bem assim da prova supra mencionada, não se pode concluir pela actuação dolosa do arguido. No que concerne à falta de antecedentes criminais do arguido os mesmos resultaram do respectivo certificado de registo criminal junto aos autos a fls. 793. Para prova das condições económicas e pessoais do arguido a convicção do Tribunal alicerçou-se, ainda, e exclusivamente nas suas declarações as quais mereceram credibilidade. No que respeita aos factos não provados, a sua resposta resultou de a prova produzida ter imposta resposta negativa. Assim vejamos. Da prova produzida não resultou que o arguido se encontrava no recinto das eleições munido de canetas do Movimento SIM, e que as distribuiu pelas pessoas que ali se aproximavam, pelo que, se impõe ao Tribunal que os considere como factos não provados. » Estabelecida a base factual pelo acórdão em análise, importa apreciar da bondade do peticionado pelo recorrente : B.1. Erro notório na apreciação da prova ; Invoca o recorrente o erro notório na apreciação da prova, na medida em que da prova produzida se deveria ter dado como provado a entrega, por parte do arguido, junto do local onde decorriam as eleições, de várias canetas alusivas ao movimento que representava e pelo qual se candidatava. Como se vê, o fundamento do recurso prende-se nesta sede, com a impugnação da matéria de facto fixada pela decisão recorrida, em cujo processo o recorrente vislumbra, na essência, o vício do erro notório na apreciação da prova. Vejamos: Preceitua o Art 410 nº 2, do CPP, que, “mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a) - A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) - A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) - Erro notório na apreciação da prova”. Por outro lado, dispõe o seu nº 3, que, “o recurso pode ainda ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada”. Como ressalta do nº 2 do citado Artº 410, a norma reporta-se aos vícios intrínsecos da decisão, como peça autónoma, verificáveis pelo simples exame do seu texto ou por esse exame conjugado com as regras da experiência comum. Daí que não possa invocar-se a existência de qualquer dos vícios enumerados nas alíneas do referido nº2 apelando para elementos não constantes da sentença, como seja, por exemplo, um documento junto aos autos ou um depoimento prestado em audiência, ainda que os depoimentos se achem documentados como é o caso dos autos. Lendo o texto da motivação do recurso, verifica-se que o recorrente invoca este vício porque discorda da forma como o tribunal deu como provados os factos. Apoia-se, para tanto, na conjugação de dois depoimentos, de C e de B, principalmente este último, que o recorrente considera como credível e que não foi devidamente valorado pelo tribunal a quo. O alegado pelo recorrente não consubstancia, de nenhum modo, o vício reclamado, sendo sabido que o erro notório na apreciação da prova deve ser entendido como aquele que não escapa à normal observação da generalidade das pessoas, isto é, o que, pela sua evidência, não pode passar despercebido ao comum dos cidadãos e que só deve ter-se por verificado quando se dê como provada uma determinada factualidade com base em juízos ilógicos, arbitrários, contraditórios e insustentáveis e que, por isso, desde que detectados no texto decisório, se apresentem como manifestamente violadores das regras da experiência comum. Não é o que sucede na hipótese vertente, uma vez que aquilo que o recorrente traz á liça é unicamente a sua discordância com o tribunal julgador no tocante à apreciação que este fez da prova, pretendendo sobrepor a sua perspectiva pessoal à livre convicção daquele tribunal, mas esquecendo que esta, neste domínio, se impõe soberanamente sem outros limites para além dos que a lei assinala. Por outras palavras : O alegado pelo recorrente nem corporiza o conceito do invocado vício, nem este se entrevê no descritivo factual, nem da decisão ele desponta. Como referido, ao arguir o vício em causa, o recorrente mais não faz do que atentar contra a apreciação da prova, livremente feita pelo tribunal, e segundo a convicção alcançada pelo respectivo julgador, como lho permite o Artº 127 do CPP e onde se estipula que : Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente. Tal princípio assenta, fundamentalmente, em duas premissas: A de que o juiz decide de forma livre e de acordo com a sua íntima convicção, formada a partir do confronto das provas produzidas em audiência. E que tal convicção há-de ser formada com base em regras de experiência comum. Nestes termos, o juiz não está sujeito a critérios de valoração de cada um dos meios probatórios, legalmente pré-determinados, sistema da prova legal, sendo o tribunal livre na apreciação que faz da prova e na forma como atinge a sua convicção. Contudo, sendo esta uma apreciação discricionária, não é a mesma arbitrária, tendo a referida apreciação os seus limites. Não verdade, livre convicção não pode ser sinónimo de arbitrariedade. Ou seja, a livre apreciação da prova tem sempre de se traduzir numa valoração "racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência (…), que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão” de modo a que seja possível, por qualquer pessoa, entender porque é que o tribunal se convenceu de determinado facto, ou, dito de outro modo, porque é que o juiz conferiu credibilidade a uma testemunha e descredibilizou outra, por exemplo. « A sentença, para além dos factos provados e não provados e da indicação dos meios de prova, deve conter os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituam o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados na audiência. »- Ac. do STJ de 13/02/92, CJ Tomo I, pág. 36. O que o juiz não pode fazer nunca é decidir de forma imotivada ou seja, decidir sem indicar o iter formativo da sua convicção, « é o aspecto valorativo cuja análise há-de permitir (…) comprovar se o raciocínio foi lógico ou se foi racional ou absurdo » ( Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, II, pág. 126 e sgs. ). Como diz o Prof. Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, 1º Vol., Coimbra Editora, 1974, págs. 202/203, « a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a verdade material -, de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e de controlo ». Por outro lado, e segundo o mesmo, « a livre ou íntima convicção do juiz não poderá ser uma convicção puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável. (...) Se a verdade que se procura é uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, a convicção do juiz há-de ser, é certo, uma convicção pessoal, mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros. Uma tal convicção existirá quando e só quando o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável ». Também o Prof. Cavaleiro Ferreira, in « Curso de Processo Penal », 1986, 1° Vol., pág. 211, diz que o julgador, sem ser arbitrário, é livre na apreciação que faz das provas, contudo, aquela é sempre « vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório ». Directamente ligada a esta apreciação livre das provas, e determinante na formação da convicção do julgador, está o princípio da imediação, que Figueiredo Dias, ob. cit., pág. 232, define como « a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão ». « (...) Só estes princípios (também o da oralidade) permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais. E só eles permitem, por último, uma plena audiência destes mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição perante o material de facto recolhido e comparticipem na declaração do direito do caso ». De todo o modo, entende-se e salvo o devido respeito por opinião contrária, que não assiste razão ao recorrente que, no fundo, pretende substituir-se ao julgador na apreciação da prova, mau grado a forma profunda e sistemática, como na decisão recorrida se fez a apreciação e valoração da prova produzida em julgamento. Ora, analisada a valoração que da prova foi feita pelo tribunal recorrido, é óbvio que a convicção alcançada por este se mostra suficientemente objectivada e motivada, capaz, portanto, de se impor aos outros. E, para assim se concluir, basta atentar-se, com a isenção ou distanciamento exigidos, nos meios de prova que da respectiva fundamentação constam como tendo sido ponderados pelo tribunal a quo e, bem assim, nas razões invocadas pelo mesmo tribunal para terem sido relevados pela forma como o foram. Com efeito, lida a sentença recorrida, em especial a parte relativa à fundamentação da convicção, verifica-se que o tribunal fez uma análise trabalhosa e crítica de toda a prova, sendo perfeitamente compreensível, ao contrário do que diz o recorrente, quais as provas que fundaram a convicção do julgador, quais as razões pelas quais acreditou nas aludidas testemunhas, estando devidamente assinaladas as suas razões de ciência, que resultam, aliás, dos seus próprios depoimentos. A este propósito, contudo, importa assinalar, a irrelevância da argumentação do recorrente, apoiada como se disse, fundamentalmente, no testemunho de B, já que o de C foi acolhido pelo tribunal recorrido. Com efeito, por esta testemunha, não foi, sequer afirmado, que tenha visto o arguido no dia das eleições e junto ao local onde as mesmas decorriam, a entregar a uma pessoa uma caneta alusiva ao Movimento de Independentes pelo qual se candidatava. O que por esta testemunha, foi referido, como pelo próprio recorrente é admitido e consta, a tal propósito, da decisão em crise, é que « viu o arguido no espaço exterior à escola, e que nessa ocasião o mesmo se encontrava a entregar uma caneta de cor vermelha, que não viu em concreto, a uma pessoa que não pode precisar, e que tinha várias outras na mão » Ou seja, a testemunha referiu ter visto o arguido a entregar uma caneta, mas não disse que fosse uma caneta com as inscrições do Movimento SIM, do qual o arguido era candidato. Aliás, « Confrontada com a caneta constante dos autos, disse que a mesma era semelhante a uma que lhe haviam oferecido, quando da campanha eleitoral. » o que quer dizer que nem sequer pelo aludido depoimento se poderia assegurar, com o mínimo de exigência para uma decisão condenatória, que a caneta vermelha em causa fosse alusiva ao dito movimento, raciocínio que, por maioria de razão, tem de ser estendido a quaisquer outras que o arguido eventualmente tivesse entregue nesse dia e local, a outras pessoas. Daqui se vê como nem sequer do dito depoimento se extrai qualquer consequência eficaz para a sorte do presente recurso. Todavia, o que se impunha ao tribunal recorrido é que explicasse e fundamentasse a sua decisão, pois só assim seria possível saber se fez a apreciação da prova segundo as regras do entendimento correcto e normal, isto é, de harmonia com as regras comuns da lógica, da razão e da experiência acumulada. E isso foi feito, poder-se-á dizer, de modo perfeitamente inteligível para qualquer leitor, que logo compreenderá o modo de valoração das provas e o juízo resultante dessa mesma aferição efectuado pelo tribunal a quo, sendo manifesto que as razões que presidiram à motivação da prova provada e não provada se apresentam como lógicas, racionais e coerentes, com o conjunto da prova produzida. O raciocínio consequente pelo qual o tribunal recorrido deu por assente uns factos e não deu por provado outros, configura-se, por isso, como adequado às regras de experiência, à normalidade da vida e à razoabilidade das coisas, razão pela qual, não merecendo censura, não é sindicável por este tribunal, inexistindo por isso motivos para ser alterado. O modo de valoração das provas e o juízo resultante dessa mesma aferição, efectuado pelo tribunal a quo, ao não coincidir com a perspectiva do recorrente nos termos em que este as analisa e nas consequências que daí derivam, não traduz, face ao que se expôs, qualquer erro ou vício. Importa trazer à colação o já afirmado em Acórdão deste Tribunal da Relação, em 03/05/07, proferido no processo n.º 80/07-3 disponível no sítio da internet www.dgsi.pt, «O erro na apreciação das provas relevante para a alteração da decisão de facto pressupõe, pois, que estas (as provas) deveriam conduzir a uma decisão necessária e forçosamente diversa e não uma decisão possivelmente diferente; se a interpretação, apreciação e valoração das provas permitir uma decisão, diversa da proferida, mas sem excluir logicamente a razoabilidade desta, neste caso pode haver erro na apreciação das provas, mas não será juridicamente relevante para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior; a decisão proferida com base numa interpretação e valoração (ainda que discutíveis) fundamentadas nas provas produzidas contida no espaço definido pela livre apreciação das provas e pela convicção por elas criada no espírito do juiz, não pode ser alterada, a menos que contra ela se apresentem provas irrefutáveis, já existentes nos autos e desconsideradas ou supervenientes. Por outras palavras: a sindicância da decisão de facto deve limitar-se à aferição da sua razoabilidade em face das provas produzidas … … A segunda instância em matéria de facto não vai à procura de uma nova convicção (que lhe está de todo em todo vedada exactamente pela falta desses elementos intraduzíveis na gravação da prova), mas tão só apreciar se a convicção expressa pelo tribunal a quo na decisão da matéria de facto tem suporte razoável …» A decisão, nesta matéria, do tribunal recorrido, foi proferida com base numa interpretação e valoração que se mostra suficientemente fundamentada, quer nas provas produzidas, quer pela livre convicção por elas criada no espírito do julgador, só podendo ser alterada, se contra si se apresentassem meios de prova irrefutáveis, existentes nos autos e que tivessem sido desconsiderados, ou se a mesma se configurasse como totalmente irrazoável, contrária às mais elementares regras de experiência ou ao sentido das coisas. Mas nenhuma destas condições é o caso sub júdice, em que o decidido pelo tribunal recorrido, se desenha com lógica e razoabilidade necessárias, de modo que se deve concluir como no aresto citado : « … se a interpretação, apreciação e valoração das provas permitir uma decisão, diversa da proferida, mas sem excluir logicamente a razoabilidade desta, neste caso pode haver erro na apreciação das provas, mas não será juridicamente relevante para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior. » Discordar, sem qualquer fundamento legal, leva simplesmente à sua improcedência, como já por este Tribunal foi afirmado em Acórdão de 23/03/01 : « A divergência quanto à decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto será relevante na Relação apenas quando resultar demonstrada pelos meios de prova indicados pelo recorrente a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, sendo necessário para que ele se verifique, que os mencionados meios de prova se mostrem inequívocos no sentido pretendido pelo recorrente ». Ora, como se pode constatar pela leitura da motivação factual da decisão recorrida, a avaliação conjunta dos aludidos depoimentos permite concluir, sem esforço, pela inexistência de qualquer erro na avaliação da prova por banda do tribunal a quo e por consequência, ter-se-á que finalizar pela improcedência do recurso nesta parte. B.2. Preenchimento do elemento subjectivo do crime imputado ao arguido ; Alega o recorrente que se mostra preenchido o tipo legal do crime imputado ao arguido, na forma dolosa, na medida em que, tendo-se provado o elemento objectivo do tipo – a entrega da caneta – o elemento subjectivo decorre do facto do arguido, como candidato à autarquia, não poder ignorar que não podia fazer propaganda ao Movimento pelo qual concorria, no dia das eleições e no local onde estas decorriam. Também aqui, não lhe assiste qualquer razão. Com efeito, da factualidade apurada, não resulta – ao contrário do que parece indiciar a decisão recorrida – o preenchimento do elemento objectivo do crime de propaganda na véspera e no dia da eleição, assim definido no Artº 177 nº1 da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais : « Quem no dia da votação ou no anterior fizer propaganda eleitoral por qualquer meio é punido com pena de multa não inferior a 100 dias », pena que no caso seria agravada por via da qualidade de candidato às eleições por parte do arguido e por força da al. f) do Artº 162 daquele diploma legal. Este crime preenche-se, em termos objectivos, pelo acto de propaganda eleitoral, que, in casu, se traduziria, na imputada entrega por parte do arguido, de canetas alusivas ao Movimento SIM, do qual era candidato. Esta era, objectivamente, a conduta ilícita do arguido, como tal descrita no Artº 4 da acusação ( Cfr. Fls. 674 ). Todavia, como já acima se disse, tal matéria foi assumida como não provada pelo tribunal recorrido, que apenas deu por assente que o arguido entregou uma caneta a um determinado indivíduo, sem contudo dar por provado que essa caneta respeitasse ao mencionado Movimento. Estas singelas asserções, alcançam-se, sem dificuldade, da mera leitura da factualidade provada e não provada, designadamente, dos seus pontos 4 e al. a), respectivamente, pelo que mal se compreende como é que, com tal quadro fáctico, ainda se discorre sobre o preenchimento do elemento objectivo do tipo ! Como é evidente, estando manifestamente afastado esse preenchimento, torna-se de todo despiciendo discutir a eventual verificação do elemento subjectivo, naturalmente daquele dependente, o qual, aliás, também foi expressamente remetido para o elenco dos factos não provados, como se alcança da al. b) deste domínio. Pelo que e sem necessidade de considerações complementares, se torna evidente, também nesta sede, a improcedência do recurso. 3. DECISÃO Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso e em consequência, manter, na íntegra, a sentença recorrida. Sem custas. xxx Consigna-se, nos termos e para os efeitos do disposto no Artº 94 nº2 do CPP, que o mesmo foi integralmente revisto e elaborado pelo primeiro signatário. xxx Évora, 21 de Maio de 2013 Renato Damas Barroso António Manuel Clemente Lima |