Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MARIA ALEXANDRA GUINÉ | ||
Descritores: | SUSPENSÃO DA PENA DE PRISÃO REVOGAÇÃO EXTINÇÃO PELO CUMPRIMENTO PRESCRIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 01/08/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | LEIRIA (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE LEIRIA – J4) | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS. 55º, 56º, 57º, 122º, N.º 1, AL. D), E N.º 2, 125º E 126º DO CÓDIGO PENAL | ||
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Sumário: | I. As duas alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 56.º são autónomas entre si, correspondendo a duas hipóteses alternativas (e não a duas condições cumulativas) em que se impõe a revogação da pena da suspensão da execução da pena de prisão.
II. Ao cometerem novos crimes de natureza idêntica, punidos com pena de prisão efetiva, durante o período de suspensão, os arguidos desbarataram irrefutavelmente o voto de confiança que neles foi depositado pelo Tribunal ao suspender a execução da pena de prisão, justificando-se a sua revogação. III. Se a pena fosse declarada extinta antes do termo de qualquer procedimento criminal pendente relativo a factos praticados no decurso do período de suspensão, a ameaça de execução da pena seria inoperante no que diz respeito a eventuais crimes cometidos em fases adiantadas do período de suspensão, o que reduziria seriamente a eficácia preventiva, geral e especial, deste instituto penal. IV. O prazo de prescrição da pena de prisão suspensa inicia-se com o trânsito em julgado do acórdão condenatório, interrompe-se durante a própria execução e suspende-se quando os condenados estejam a cumprir pena privativa da liberdade. | ||
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Decisão Texto Integral: | *
Acordam, em conferência, na 5ª Secção - Criminal - do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO 1. Nos autos a correr os seus termos sob nº 1/16.7PELRA no Juízo Central Criminal de Leiria - J... do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, por despacho datado de 17.06.2024, foi revogada a suspensão da execução da pena de prisão aplicada a AA e de BB.
2. Inconformados recorreram estes arguidos extraindo da motivação do recurso as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. O presente recurso tem por objeto o Despacho proferido nos presentes autos a 17/06/2024, com a referência nº 107534733, através do qual decretou revogada a suspensão da pena de prisão aplicada aos arguidos aqui recorrentes. 2. Os recorrentes AA e BB foram, respectivamente, condenados nos presentes autos nas penas únicas de 2 anos e 9 meses de prisão e 2 anos de prisão, ambas suspensas na sua execução por igual período e sujeitas a regime de prova, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, e do crime de detenção de arma proibida. O acórdão transitou em julgado em 01/02/2018, referente a ambos os arguidos. 3. Em 04/10/2022, em acórdão proferido pelo Juízo Central Criminal de Leiria – Juiz ... no processo nº 651/18...., o recorrente AA foi condenado na pena de 6 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21º nº 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22/01, e a recorrente BB foi condenada na pena de 5 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art. 21º nº 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22/01, por factos praticados em agosto de 2019. O acórdão teve trânsito em julgado em 23/11/2023. 4. Desde o dia 15/03/2024, os arguidos encontram-se em cumprimento da pena de prisão imposta naquele processo. 5. Conforme supra exposto, a sentença dos presentes autos transitou em julgado a 01/02/2018. Portanto, o termo da pena aplicada nos presentes autos foi no ano 2020, ou seja, há mais de três anos atrás! 6. É certo que os arguidos foram condenados por factos praticados durante o período da suspensão. Contudo, entendem os arguidos que já se tendo verificado o término da pena suspensão há pelo menos três anos, deve a mesma ser declarada extinta. 7. Acresce que o arguido AA já se encontrou em prisão preventiva à ordem do processo nº 651/18.... em que veio a ser condenado, sendo ainda ambos os arguidos presos preventivamente à ordem do processo nº 20/21.... desde o dia 27/09/2023, sendo que desde o dia 15/03/2024 encontram-se os dois em cumprimento de pena de prisão efetiva, razão pela qual os mesmos já tiveram tempo e espaço para se consciencializar da ilicitude do seu comportamento e para se arrependerem do mesmo, tendo intenção de mudar o rumo da sua vida quando em liberdade. 8. Acresce que o cumprimento das penas de prisão na qual foram condenados no processo nº 651/18.... – penas essas de longa duração - já estão a ter o efeito ressocializador pretendido com o cumprimento da pena, pelo que, não se vislumbra motivos para revogar a suspensão da pena de prisão aplicada os arguidos nos presentes autos, quando o efeito pretendido já se logrou. 9. A redação do art. 56º, nº 2 do CP introduzida na revisão de 1995 pôs termo à revogação automática da pena de prisão suspensa. 10. Não podemos esquecer que o arguido e a arguida foram condenados, respectivamente, numa pena de 2 anos e 9 meses de prisão e 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova e quanto a este regime, não houve qualquer violação por parte dos mesmos. 11. Na verdade, o incumprimento das condições da suspensão não foi total, não se desenvolveu na dupla vertente “incumprimento das condições” e “não abstenção de delinquir”. O que, a ter sucedido, como sucedeu, demandaria uma avaliação global do comportamento infractor e não apenas um juízo sector ou compartimentado. 12. Assim, a pena suspensa com regime de prova não pode ser tratada no processo como se de uma prisão suspensa simples se tratasse. O “não cometimento de novos crimes” funciona como o tipo-matriz da pena suspensa, mas essa não foi, no presente caso, a única condição da substituição da prisão. 13. À exigência de não cometimento de novos crimes acrescia, pois, o cumprimento do plano de reinserção. Plano que foi elaborado, tendo ocorrido o total cumprimento do PIR por parte dos arguidos. Vejamos: 14. Conforme consta no relatório final de execução da DGRSP do arguido AA, de 10/12/2020, este ao longo do acompanhamento compareceu às entrevistas realizadas nas instalações do Estabelecimento Prisional ... (enquanto encontrava-se em prisão preventiva no processo em que veio a ser condenado), pela técnica responsável pelo acompanhamento, nas quais manteve postura correta e colaborou nos exercícios de reflexão propostos, embora manifeste uma capacidade de racionalização crítica pouco aprofundada e dificuldades de descentração e de se posicionar no papel das vítimas, concluindo o relatório que, de forma geral, o arguido revelou predisposição para aderir às orientações técnicas e cumprir as obrigações da medida em apreço e inerentes ao cumprimento da pena de prisão. 15. Já o relatório final de execução da DGRSP da arguida BB (06/02/2020) consta que a mesma compareceu nos Serviços de Reinserção Social com pontualidade e assiduidade nas datas que lhe foram determinadas e aderiu às orientações que lhe foram transmitidas, concluindo o relatório que até 05/08/2019, a condenada manteve uma conduta adequada, concluindo-se que as ações fixadas no PRS foram genericamente cumpridas, de então em diante, desconhecemos o seu modo de vida. 16. Portanto, uma condenação por crime cometido no período de suspensão da execução da pena não ditará, só por si, a imediata revogação desta, sendo antes o juízo sobre a possibilidade de ainda se alcançarem as finalidades da punição que relevará na decisão a proferir sobre a pena suspensa. 17. O art. 56º, nº 2 do Código Penal preceitua que a suspensão da execução da pena é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela ser alcançadas. 18. Pôs-se termo à revogação automática da pena de prisão suspensa, indo ao encontro da Regra 10 da Recomendação Nº R(92) 16: “não devem existir disposições na lei respeitantes à conversão automática em prisão de sanções ou medidas aplicadas na comunidade, em caso de desrespeito das condições ou obrigações impostas por essa sanção ou medida” (tradução nossa). 19. Assim, a condenação por crime cometido no período da suspensão da execução da pena de prisão não gera a imediata revogação da pena de substituição, sendo antes o juízo sobre a possibilidade de ainda se alcançarem as finalidades da punição que ditará a opção entre o regime do art. 56º ou do art. 57º do Código Penal. 20. Acresce ainda que no presente caso, uma nova pena de prisão constituiria pesado fardo para os arguidos ora recorrentes, tendo em conta sobretudo que os mesmos já se encontram condenados em decisão transitada em julgado a uma pena de prisão de longa duração, mais concretamente 6 anos o recorrente e 5 anos e 6 meses a recorrente, sendo de concluir que o cumprimento daquelas penas já terá por si a capacidade de ressocialização dos arguidos e a consciência crítica da sua conduta delituosa. 21. Por fim, entendem os recorrentes que, no caso presente, as concretas circunstâncias apuradas não abalam seriamente o juízo de prognose favorável que esteve subjacente à suspensão da prisão com regime de prova, decretada na sentença, ainda mais, quando o cumprimento em pena de prisão efetiva na segunda condenação, já está a surtir efeitos nos arguidos. 22. Ora, um aumento da pena de prisão de 6 anos no caso do recorrente, e 5 anos e 6 meses no caso da recorrente – em caso de revogação da pena suspensa- não traria qualquer benefício ao nível da ressocialização dos mesmos. Assim, não há fundamento legal para revogar/modificar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos arguidos, aqui recorrentes. 23. O cometimento de “futuros crimes” – que, concretamente, possa entender-se como impeditivo da imediata extinção da pena, como se disse – ainda admitem os efeitos previstos no art.º 55º do Código Penal, que trata da “falta de cumprimento das condições da suspensão”. 24. A decisão recorrida não revela ter equacionado a aplicação desta norma devidamente. E ela fornecerá a resposta que se revela, concretamente, como a mais adequada. 25. Assim, face ao exposto, entendem os recorrentes que a pena aplicada aos mesmos no âmbito dos presentes autos, suspensa na sua execução, não deverá ter revogada a sua suspensão, por entender que a mesma já foi cumprida e atendeu as finalidades pretendidas, pelo que deverá ser extinta por cumprimento. 26. Caso assim não se entenda, entendem os recorrentes então pela prorrogação do período de suspensão da execução da pena ao abrigo do artigo 55.º, alínea d), do Código Penal. • NORMAS VIOLADAS: - arts. 40.° C.P. - art. 55. ° C.P. - art. 56.º do C.P. Pelo que deve ser o douto despacho ora em crise ser revogado e substituído por outro que não determine a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos arguidos nestes autos, com todas as respectivas consequências. Espera deferimento».
3. Notificado, o Ministério Público, em resposta concluiu o seguinte: «Conclusões: 1. Não é nem pode ser - atento, desde logo, o previsto no referenciado artigo 56.º/1, al. b) do CP - por se ter verificado o término da suspensão da execução da pena de prisão em Novembro de 2020 e Fevereiro de 2020, respectivamente, que a mesma deve ser declarada extinta, como pretendem os Recorrentes. 2. O disposto no artigo 57.º do CP, não suscita dúvidas: “1 - A pena é declarada extinta se, decorrido o período da sua suspensão, não houver motivos que possam conduzir à sua revogação. 2 - Se, findo o período da suspensão, se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação ou incidente por falta de cumprimento dos deveres, das regras de conduta ou do plano de reinserção, a pena só é declarada extinta quando o processo ou o incidente findarem e não houver lugar à revogação ou à prorrogação do período da suspensão.” (negrito e sublinhado nossos). 3. Assim, resulta que após ter terminado o prazo da suspensão se se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação, a pena só é declarada extinta quando o processo ou o incidente findarem e não houver lugar à revogação ou à prorrogação do período da suspensão, logo, é manifesto que a revogação da pena pode ter lugar depois de decorrido o prazo de suspensão da pena. 4. Ora, por acórdão transitado em julgado e proferido no Processo 651/18...., o arguido AA foi condenado na pena de 6 anos de prisão, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, praticado em 11 de Agosto de 2019; Nos mesmos termos foi a arguida BB condenada, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão. 5. Constatado e comprovado que está nos autos o preenchimento do primeiro requisito exigido para a revogação da referida suspensão - o cometimento de crime pelo qual veio a ser condenado-, cumpria aferir se as restantes circunstâncias supra descritas revelam estar “definitivamente infirmado o juízo de prognose favorável” que esteve na base da suspensão, ou seja, se as finalidades almejadas com a suspensão (finalidades preventivas consagradas no n.º 1 do artigo 40.º do Código Penal) não podem já ser alcançadas por essa via. 6. No caso em apreço, atenta a prática pelos recorrentes do mesmo tipo de crime, mas na modalidade mais gravosa e vindo a ser condenados em pena de prisão, cremos, de forma indubitável, ter-se efectiva e inequivocamente por demonstrada a frustração absoluta das finalidades e expectativas que motivaram aquela suspensão. 7. É inegável a persistência dos recorrentes na reiteração da violação do bem jurídico que a tipificação penal visa proteger sendo muito significativo as penas de prisão em que foram condenados. 8. Deste modo, em face de tudo quanto ficou exposto, cremos que resulta claro que os condenados, aqui Recorrentes, não interiorizaram o desvalor das suas condutas, afigurando se-nos estar, igualmente, demonstrada a frustração absoluta das finalidades e expectativas que motivaram a suspensão da execução da pena de prisão que lhes foi aplicada, pelo que entendemos que bem andou o Tribunal a quo ao decidir pela revogação de tal suspensão, não merecendo qualquer reparo. Por tudo o exposto entendemos dever improceder, na totalidade, o recurso interposto pelos arguidos, mantendo-se na íntegra o douto Acórdão, assim farão V. Ex.as a costumada Justiça!».
4. Neste Tribunal da Relação de Coimbra, o Exm.º Procurador Geral Adjunto em parecer pronunciou-se no sentido de «não tendo o despacho impugnado violado as normas referidas no recurso interposto, ou quaisquer outras, deverá tal despacho ser mantido na íntegra».
5. Admitido o recurso, foi cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal (doravante, CPP), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419º, nº 3, alínea b) do mesmo diploma.
II. Fundamentação
1. Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 402º; 403º e 412º nº 1 do CPP, o poder de cognição do tribunal de recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, já que é nelas que sintetiza as razões da sua discordância com a decisão recorrida, expostas na motivação. Encontra-se, ainda, o tribunal obrigado a decidir todas as questões de conhecimento oficioso, como sejam, as nulidades insanáveis que afetem o recorrente, nos termos dos art.º s 379º nº 2 e 410º nº 3 do CPP e dos vícios previstos no art.º 410º nº 2 do CPP, que obstam à apreciação do mérito do recurso, mesmo que este se encontre limitado à matéria de direito (Acórdão do Plenário das Secções do STJ nº 7/95 de 19.10.1995, in Diário da República, I.ª Série-A, de 28.12.1995 e o AUJ nº 10/2005, de 20.10.2005, DR, Série I-A, de 07.12.2005). No caso em apreço, atendendo às conclusões das motivações de recurso, importa resolver a questão de saber: - Se se se verificam os pressupostos de revogação da suspensão da pena de prisão, ou se, como entendem os recorrentes, esta pena de substituição deva ser declarada extinta pelo cumprimento, ou pelo menos, deve ser prorrogado o período de suspensão.
2. É o seguinte o teor do Despacho recorrido (transcrito na parte ora relevante): «Os arguidos AA e BB foram condenados nas penas únicas de 2 anos e 9 meses de prisão e 2 anos, respectivamente, ambas suspensas na sua execução por idêntico período e sujeitas a regime de prova, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/93 e do crime de detenção de arma proibida. O acórdão transitou em julgado em 01 de fevereiro de 2018, referente a ambos os arguidos. Por acórdão transitado em julgado e proferido no Processo 651/18...., o arguido AA foi condenado na pena de 6 anos de prisão, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, praticado em 11 de Agosto de 2019. Nos mesmos termos foi a arguida BB condenada, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão. O Ministério Publico promoveu que a suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos AA e BB seja revogada e determinado o cumprimento efectivo das penas de prisão respectivas. * Os arguidos entendem que a pena que lhes foi aplicada no âmbito dos presentes autos, não deverá ser revogada, por entenderem que a mesma já foi cumprida e atendeu as finalidades pretendidas, pelo que deverá ser extinta por cumprimento. Vejamos: Estabelece o art. 50º, n.º 1 do C.P que “o Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.” Temos assim que “pressuposto material de aplicação do instituto é que o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente.” Por seu turno, estabelece o art. 56º, n.º 1 do C.P os fundamentos para a revogação da suspensão da execução da pena, quando o condenado infringir de forma grosseira os deveres ou regras de conduta que lhe foram impostos ou quando comete crime pelo qual venha a ser condenado e que assim coloque em crise aquele juízo de prognose inicial feito. Desde já se diga que não assiste razão aos arguidos e que a pena deve ser extinta por ter sido extinta já em 2020, uma vez que o que a lei impõe é alternativa “ou quando comete crime pelo qual venha a ser condenado”, como é o caso dos autos. Enquanto instituto presidido pelo objectivo da socialização do agente (onde apenas considerações relacionadas com a prevenção especial determinam a possibilidade de aplicação desta medida), “a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão é clara e terminante: o afastamento do delinquente no futuro, da prática de novos crimes. O cometimento de novos crimes por parte do condenado é, assim, a assunção de que o objectivo falhou, que a mera ameaça de cumprimento de pena não foi suficiente para o impedir de cometer novos factos ilícitos, ainda mais quando o ilícito cometido é novamente aquele que determinou a suspensão da pena, de onde se conclui que “as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas” (cf. artigo 56.º, n.º 1, al. b) do Código Penal). «Na situação prevista na citada alínea b), a revogação depende da verificação da dupla condição consubstanciada no cometimento de novo crime que infirmou definitivamente o juízo de prognose favorável em que a suspensão se baseou, no sentido de que deixou de ser possível esperar, fundadamente, que daí para a frente o condenado se afaste da prática de outros ilícitos. Aquele segundo elemento pressupõe, pois, que em concreto e tendo por referência o momento em que se toma a decisão, o cometimento do crime superveniente é demonstrativo de que não se cumpriram as expectativas que motivaram a aplicação da suspensão e que esta se revela, assim, inadequada para se alcançarem as finalidades da punição, ou seja, que o arguido não volte a delinquir.» (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-04-2018, proferido no Processo n.º 175/09.3GCFVN-A.C1). Os condenados, no período da execução da suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada nestes autos, praticaram novos factos criminosos que determinaram a aplicação de uma pena de prisão efectiva. E mais, não só os arguidos foram condenados em penas de prisão efectiva, como tal condenação o foi pela prática do mesmo tipo de crime - tráfico de estupefacientes - na forma ainda mais grave. Os arguidos foram ouvidos, quando se encontram já em cumprimento da pena de prisão que lhes foi aplicada e na presença dos técnicos responsáveis. Quando questionados, os arguidos não ofereceram qualquer explicação, limitando-se a reconhecer a sua situação prisional e a origem desta. A condenação imposta aos arguidos no Processo 651/18...., em penas de prisão efectiva e pela pratica de idêntico crime não pode deixar de ser considerada como a demonstração de que os «arguido repeliu o prognóstico favorável à suspensão da execução da pena que lhe foi imposta, que teve subjacente a fundada esperança de que a sua ressocialização poderia ser alcançada em liberdade e de que essa condenação ainda emergiria, por isso, como isolada, não obstante o seu pregresso percurso criminal, por este se inscrever, realmente, no respectivo passado. Tal vaticínio frustrou-se totalmente: o arguido encarregou-se de revelar, com o seu censurável comportamento ulterior, no decurso do período de suspensão da execução da pena, uma indiferença pelas exigências formais decorrentes da lei, praticando, de novo crimes.» (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18-06-2018, proferido no Processo 258/12.2GBVFN-B.G1, disponível em www.dgsi.pt). Deste modo e na senda do doutamente promovido com o que concordamos, determina-se a revogação da suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos AA e BB e determina-se o cumprimento efectivo das penas de prisão respectivas».
3. Apreciação do recurso
3.1 Insurgem-se os recorrentes contra a decisão revogatória da suspensão da pena de prisão alegando que: - Não houve qualquer violação do regime de prova, e ainda que a mesma tivesse ocorrido, sempre haveria de ter sido efetuada uma avaliação global do comportamento infrator, posto que o não cometimento de novos crimes não foi, no presente caso, a única condição da substituição da prisão; - As privações de liberdade a que foram sujeitos justificam um juízo de prognose favorável relativamente ao seu futuro comportamento, eliminando, ou, pelo menos atenuando, as exigências preventivas suscitadas no nosso caso; - Embora o (novo) crime tenha ocorrido no prazo de suspensão, o término deste período verificou-se há pelo menos três anos, o que justifica que a pena seja declarada extinta. Vejamos, então, se se se verificam os pressupostos de revogação da suspensão da pena de prisão, ou se, como entendem os recorrentes, esta pena de substituição deva ser declarada extinta pelo cumprimento, ou pelo menos, deve ser prorrogado o período de suspensão.
3.2 Previamente, importa considerar que o regime jurídico da suspensão da execução da pena de prisão encontra-se previsto nos artigos 50.º a 57.º do Código Penal (doravante CP), e nos artigos 492.º a 495.º do Código de Processo Penal (doravante CPP). Dispõe o artigo 50.º n.º 1, do CP que: «1-O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição». São finalidades da punição, nos termos do disposto no artigo 40.º do CP, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Da análise do regime legal resulta que ainda que a suspensão da execução da pena de prisão pode assumir três modalidades: suspensão simples; suspensão sujeita a condições (cumprimento de deveres ou de certas regras de conduta); suspensão acompanhada de regime de prova (art.ºs 50.º, 51.º, 52.º, 53.º e 54.º, todos do CP). Encontrando-se a suspensão da execução da pena sujeita ao cumprimento de deveres ou regras de conduta, estas podem ser modificados até ao termo do período de suspensão, sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes, ou de que o tribunal só posteriormente tenha tido conhecimento, o que significa que o conteúdo da pena de suspensão da execução da prisão está sujeito, dentro dos limites legais, mesmo independentemente de incumprimento do condenado, a uma cláusula «rebus sic stantibus» (artigos 51.º n.º 3, 52.º n.º 3 e 54.º n.º 2 do CP). Dispõe o art.º 55.º do CP que: «Se, durante o período da suspensão, o condenado, culposamente, deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos, ou não corresponder ao plano de reinserção, pode o tribunal: a) Fazer uma solene advertência; b) Exigir garantias de cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão; c) Impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir exigências acrescidas no plano de reinserção; d) Prorrogar o período de suspensão até metade do prazo inicialmente fixado, mas não por menos de um ano nem por forma a exceder o prazo máximo de suspensão previsto no n.º 5 do artigo 50.º». Estabelece o artigo 56.º do CP: «1–A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: a)-Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou b)-Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas. 2–A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição de prestações que haja efectuado».
3.3 No nosso caso, a suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos arguidos foi sujeita a regime de prova. Alegam os recorrentes que: - Não houve qualquer violação do regime de prova; - Mesmo que ocorresse tal incumprimento, sempre haveria de ter sido efetuada uma avaliação global do comportamento infrator, posto que o não cometimento de novos crimes não foi, no presente caso, a única condição da substituição da prisão. Sem qualquer razão, adiantamos. O regime legal é claríssimo: as duas citadas alíneas do n.º 1 do art.º 56.º são autónomas entre si, correspondendo a duas hipóteses alternativas (e não a duas condições cumulativas) em que se impõe a revogação da pena da suspensão da execução da pena de prisão. No caso da alínea b), tal como escreve o Digno Procurador Geral Adjunto «não tem de ser ponderado o eventual cumprimento das condições às quais possa ter sido subordinada a suspensão, a não ser que o mesmo seja de algum modo relevante para aferir se a prática do novo crime revelou efectivamente “que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas” (algo que, certamente, não sucede no presente caso)». E como assim é, o cometimento de (novo) crime pelo qual o arguido venha a ser condenado, que revele que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas basta, e impõe a revogação da suspensão. Ora, o que se verifica da leitura do despacho em crise, é que: foi o cometimento de novo crime durante o período de suspensão (e não a violação de dever, de regra de conduta ou a não correspondência a plano de reinserção) que veio, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 56.º, a determinar a revogação. Falece, portanto, a defesa dos recorrentes que, pressupondo a aplicação da alínea a) do n.º 1 do art.º 56.º do CP, invoca a não violação do regime de prova e a falta de avaliação global do comportamento infrator (incluindo o cumprimento das condições de suspensão). Concluímos, neste segmento, pela improcedência da defesa.
3.4 O que afinal nos interessa saber é se o cometimento do novo crime pelo qual os recorrentes vieram a ser condenados revela que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela ser alcançadas. Ou seja, se se encontra preenchida a hipótese da al. b), n.º 1, do art.º 56.º do Código Penal [1], tendo presente, é certo, que a atual redação desta alínea - introduzida na revisão de 1995 - afastou quaisquer dúvidas que ainda pudessem subsistir quanto à não revogação automática da suspensão em caso de cometimento de (novo) crime. Encontramo-nos perante uma pena de substituição, visando, portanto, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, nos termos do n.º 1 do art.º 40.º do CP, pelo que é o «o critério dos fins das penas que deve ser ponderado»[2]. Ora, pode muito bem acontecer que o novo crime corresponda a um comportamento desviante meramente ocasional que tenha determinado a aplicação de nova pena de substituição, sem que da sua prática resulte que as finalidades da suspensão foram postergadas, ficando irremediavelmente prejudicadas. E assim, na concreta aferição do grau de frustração das expetativas que presidiram à decisão de suspensão, releva, em princípio, saber se, o novo crime: - Foi punido com pena de prisão efetiva (sinalizando que as finalidades que estiveram na base da decisão prévia da suspensão não puderam ser alcançadas) [3]. - É da mesma natureza do crime originário e/ou foi cometido em idêntico contexto (indiciando que o agente não soube aproveitar a oportunidade da suspensão para alterar o quadro de vida inicial). No caso dos autos: - Por Acórdão transitado em 01 de fevereiro de 2018, arguidos AA e BB pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/93 e do crime de detenção de arma proibida foram condenados, respetivamente, nas penas únicas de 2 anos e 9 meses de prisão e 2 anos, ambas suspensas na sua execução por idêntico período e sujeitas a regime de prova; - Por Acórdão transitado em julgado e proferido no Processo 651/18...., o arguido AA foi condenado pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, praticado em 11 de agosto de 2019, na pena de 6 anos de prisão; - Nos mesmos termos foi a arguida BB condenada, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão. Ou seja, os novos crimes foram punidos com pena de prisão efetiva, são (no que respeita aos crimes de tráfico) de natureza idêntica e foram cometidos num quadro essencialmente idêntico ao dos crimes originários [4]. Tal como resulta da decisão recorrida, os arguidos, ouvidos, não ofereceram qualquer explicação, limitando-se a reconhecer a sua situação prisional e a origem desta[5]. Portanto, no caso, a condenação em pena de prisão suspensa não só não contribuiu para evitar a recidiva (visto que os arguidos voltaram a delinquir), como se constata que o seu comportamento delituoso até se agravou. Por outro lado, diversamente do que parece ser o entendimento dos recorrentes, as privações de liberdade a que foram sujeitos não justificam um juízo de prognose favorável relativamente ao seu futuro comportamento, nem atenuam ou eliminam as exigências preventivas suscitadas no nosso caso. Pelo contrário. Os arguidos sabiam que deveriam abster-se de voltar a cometer crimes, e ainda assim desperdiçaram a oportunidade que lhes foi concedida de, no período da suspensão se orientarem de acordo com os valores jurídico-penais e adotarem um comportamento afastado da prática criminosa, antes escolheram cometerem novo crime, desta forma revelando que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas. O cometimento dos novos crimes no decurso do prazo de suspensão infirmou irremediavelmente a esperança de, por meio desta, manter os delinquentes afastados da criminalidade[6]. Inversamente ao que nos parece ser a defesa recursiva, não se impunha ao Tribunal recorrido pronunciar-se expressamente sobre a (in)eficácia das medidas no art.º 55º do Código Penal (incluindo a prorrogação da suspensão da execução) para se alcançarem as finalidades da punição. Como vimos, o referido art.º 55º do Código Penal, prevê os casos em que «o condenado culposamente deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos, ou não corresponder ao plano de reinserção», podendo então o tribunal adotar medidas, que vão da «solene advertência» (al. a)), à «prorrogação do período de suspensão da pena» (al. d)). Temos por certo que relativamente aos comportamentos que «integram a previsão do art.º 55º do Código Penal, deve o tribunal pronunciar-se expressamente sobre a (in)eficácia das medidas ali previstas para se alcançarem as finalidades da punição»[7], fundamentando as razões do afastamento da possibilidade de não aplicação das medidas previstas nesse mesmo artigo. Tal como, aliás, se vem entendendo de forma unânime, na Jurisprudência e na Doutrina, a respeito do dever de concretamente se enunciar e fundamentar na decisão as razões do afastamento das penas de substituição, designadamente das que podem evitar a reclusão do condenado. No entanto, esta eventual omissão de pronúncia no despacho revogatório da suspensão consubstancia mera irregularidade, por não se tratar de sentença[8], sem prejuízo de, nos termos do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, poder ser oficiosamente ordenada a reparação das irregularidades que possam afetar o valor do ato praticado. Já quanto à revogação da suspensão pela comissão de crime, nos termos da alínea b) do n.º1 do art.º 56.º do CP (que é o que nos ocupa) fundamental é que o Tribunal conclua que a condenação revele que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas[9]. Efetivamente, no nosso caso, o fundamento da revogação da suspensão assenta não no incumprimento «dos deveres ou regras de conduta impostos» ao arguido, ou do plano de reinserção, conforme resulta da natureza da suspensão e é expressamente referido no art.º 55º do CP, mas na prática de crime, cuja proibição, como ressalta o Digno Procurador Geral Adjunto, «não é uma regra de conduta decorrente da decisão de suspensão, mas antes directamente da lei penal». Portanto, não tinha o Tribunal recorrido de fundamentar a não aplicação das medidas previstas no art.º 55.º do CP, e designadamente a não prorrogação do prazo de suspensão, propugnada pelos recorrentes. Mas, ainda que se entendesse que em caso de revogação da suspensão da execução da pena de prisão, o Tribunal recorrido se deveria pronunciar e fundamentar as razões do afastamento da prorrogação, encontrar-nos-íamos perante mera irregularidade não atempadamente arguida e perante quem de direito, nos termos do art.º 123.º do CPP, sem prejuízo de, nos termos do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, que, portanto, se encontraria sanada, não competindo, para mais, a este Tribunal de recurso de, oficiosamente, ordenar a sua reparação, uma vez que sempre disporia dos elementos necessários para a decisão. Efetivamente, ainda que (em abstrato) entendêssemos ser possível a prorrogação do prazo da suspensão, nos termos do art.º 55.º do CP, em situações em que durante o período da suspensão o condenado comete novo crime[10], as concretas circunstâncias do nosso caso sempre conduziriam, como conduzem à inapelável conclusão de que as finalidades da punição seriam inalcançáveis pela «mera» prorrogação. Ao cometerem os novos crimes, os arguidos desbarataram irrefutavelmente o voto de confiança que neles foi depositado pelo Tribunal ao suspender a execução da pena de prisão. Concluímos, também neste segmento, pela improcedência do recurso.
3.5 Alegam, ainda os recorrentes que sendo certo que «foram condenados por factos praticados durante o período da suspensão, por já se ter verificado o término da pena suspensão há pelo menos três anos, deve a mesma ser declarada extinta». Vejamos. Dispõe o art.º 57.º do CPP que: «1 - A pena é declarada extinta se, decorrido o período da sua suspensão, não houver motivos que possam conduzir à sua revogação. 2 - Se, findo o período de suspensão, se encontrar pendente se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação ou incidente por falta de cumprimento dos deveres, das regras de conduta ou do plano de reinserção, a pena só é declarada extinta quando o processo ou o incidente findarem e não houver lugar à revogação ou à prorrogação do período da suspensão». O que bem se compreende. Tal como assinala o Digno Procurador Geral Adjunto, o tempo decorrido desde a prática, pelos arguidos, do crime que justificou a revogação da suspensão da execução das penas de prisão que lhes foram aplicadas nos presentes autos, deveu-se, «fundamentalmente ao necessário respeito pela presunção de inocência dos arguidos, que implica não poder ser proferida eventual decisão de revogação antes do trânsito em julgado da condenação pela prática dos factos que a justifiquem, tal como é especificamente acautelado pelo disposto no nº 2 do art. 57º do C. Penal». E, como se escreve no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 173/2018, « se a pena fosse declarada extinta antes do termo de qualquer procedimento criminal pendente relativo a factos praticados no decurso do período de suspensão ─ factos com relevância suficiente para o tribunal vir a decretar a revogação da suspensão da pena ─, a ameaça de execução da pena seria inoperante no que diz respeito a eventuais crimes cometidos em fases adiantadas do período de suspensão, o que reduziria seriamente a eficácia preventiva, geral e especial, deste instituto penal. O contrapeso normal de tal défice de eficácia seria a inflação dos períodos de suspensão da pena, nos casos em que esta viesse a ser decretada, e a redução dos casos de suspensão da execução da pena, sobre a qual recairia uma suspeita legítima de relativa insuficiência como meio de tutela penal, produzindo-se globalmente o efeito perverso de a segurança jurídica dos arguidos ser protegida à custa de um agravamento da repressão penal». E, ainda, tal como, também se pode ler no referido Acórdão do Tribunal Constitucional (intercalado nosso): «A perturbação da «paz jurídica» é, por assim dizer, o preço que o agente tem de pagar por um instituto penal que salvaguarda até ao limite possível a sua liberdade. (…) Além do mais, no quadro legal vigente, o impacto negativo de situações de morosidade insuportável é mitigado através da possibilidade de aplicação à pena suspensa, entendida como pena autónoma, do regime da prescrição». Ora, as circunstâncias dos autos - levando em conta os prazos fixados para a suspensão e a data do trânsito do Acórdão condenatório - não permitem a conclusão de que nos encontramos perante situação de «morosidade insuportável». Acresce que, no caso, o prazo da prescrição de 4 anos da pena de prisão suspensa iniciou-se com o trânsito em julgado do Acórdão condenatório (122º, nº 1, al. d), e nº 2, do CP), interrompeu-se durante a própria execução (art.º º 126º n.º 1 al. a) do CP) e depois suspendeu-se nos termos da al. c) do n.º 1 do art.º artigos 125º n.º 1 al. c) do CP (por os condenados estarem a cumprir pena privativa de liberdade), pelo que, tendo em consideração o disposto no n.º 3 do art.º 126.º do CPP, resulta por demais evidente que não decorreu o prazo prescricional. Tudo considerado, inversamente à pretensão recursiva, não se justifica declarar extinta a pena de substituição por se ter verificado o término da pena suspensão há pelo menos três anos, improcedendo, também neste segmento a defesa.
Do exposto decorre, ainda, que não se verifica a invocada violação do disposto nos art.ºs 40.º, 55.º, e 56.º, todos do CP.
III. Dispositivo
Termos em que acordam os juízes que compõem a 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar improcedente o presente recurso, mantendo a decisão recorrida. Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça em 3 Uc´s - art.º 513.º do CPP, 8.º, n.º 9 do RCP, e tabela III anexa ao RCP. * (Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pela primeira signatária, sendo ainda revisto pela segunda e pela terceira signatárias – artigo 94º, nº2, do CPP -, com assinaturas eletrónicas apostas na 1.ª página, nos termos do artº 19º da Portaria nº 280/2013, de 26-08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20/09)
Coimbra, Maria Alexandra Ferreira Guiné (Juíza Desembargadora Relatora) Cristina Pêgo Branco (Juíza Desembargadora 1.ª adjunta) Sandra Maria Maia Rocha Ferreira (Juíza Desembargadora 2.ª adjunta)
[5] Ouvimos a gravação e pudemos verificar que, no essencial, a arguida pede desculpa, refere que após a condenação andou a vender nos mercados, que tem um filho menor (atualmente com a cunhada), que está arrependida e não quer fazer mais asneiras. Já o arguido disse que na altura andava no Sobral Cid, desorientado, andava a fazer um curso, não tinha força nas pernas, disseram para desistir, após sair da prisão foi trabalhar para a maçã, e a para a pera. [6] Sem que se justifique, como vimos, a prorrogação do período de suspensão da execução da pena ao abrigo do artigo 55.º, alínea d), do Código Penal [8] Na verdade, a nulidade por omissão de pronúncia está apenas prevista para a sentença – cfr. artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal |