Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | JOÃO ABRUNHOSA | ||
Descritores: | APROVAÇÃO DE MODELO DE ALCOOLÍMETRO VERIFICAÇÃO - PRIMEIRA OU PERIÓDICA - DO APARELHO DE MEDIÇÃO DE TAXA DE ÁLCOOL NO SANGUE CONFISSÃO CONCRETA TAXA DE ALCOOLÉMIA. | ||
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Data do Acordão: | 02/19/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO - JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE OLEIROS | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ART.ºS 352º E 353º/1 DO CC; ART.º 120º/2-D) E ART 344º, AMBOS DO CPP; ARTIGOS 292.º, N.º 1, E 69.º, N.º 1, ALÍNEA A), AMBOS DO CÓDIGO PENAL; ARTIGO 7.º, N.º 1 DA PORTARIA N.º 366/2023, DE 15 DE NOVEMBRO. | ||
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Sumário: | I - A aprovação de modelo de alcoolímetro é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado, sendo, portanto, uma aprovação genérica de um determinado modelo de aparelho, válida para todos os aparelhos daquele modelo, a serem introduzidos nos 10 anos seguintes ao despacho de aprovação, período este renovável e prolongável;
II - A verificação, primeira ou periódica, compreende o conjunto de operações destinadas a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, com a dos respetivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis, sendo, portanto, a verificação/aprovação daquele aparelho específico; III - Se a Arguida se conformou com o exame efectuado por alcoolímetro, não pedindo a contraprova, não pode depois, quando já não é possível essa contraprova, pôr em causa a fiabilidade dos resultados daquele exame; IV - A confissão da Arguida pode abranger a concreta taxa de alcoolémia constante da acusação, porque a lei não limita os factos que podem ser confessados, desde que o tribunal considere que a confissão é livre e fora de qualquer coacção. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Relator: João Abrunhosa Adjuntos: Cândida Martinho Maria Teresa Coimbra *
Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: No Juízo de Competência Genérica de Oleiros, por sentença proferida oralmente em 16/10/2024, foi a Arg.[1] AA, com os restantes sinais dos autos, condenada nos seguintes termos: “... 1. Em face do exposto, o Tribunal julga a acusação totalmente procedente, por provada, e em conformidade, decide-se: i. Condenar a arguida, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, numa pena de 57 (cinquenta e sete) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros), o que perfaz o total global de 342,00 € (trezentos e quarenta e dois euros). ii. Condenar a arguida na pena acessória de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de proibição de conduzir veículos com motor (cfr. artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal). iii. Condenar a arguida nas custas criminais, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) U.C., reduzida a metade (atenta a confissão integral e sem reservas), sem prejuízo do apoio judiciário com que litigue – cfr. artigos 344.º, n.º 2, alínea c), 513.º e 514.º, todos do Código de Processo Penal e artigo 8.º, n.º 9, e Tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais. ...”. * Não se conformando, o Arg. interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação, com as seguintes conclusões: “... 1.A douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, com o devido respeito, enferma de erro de julgamento, porquanto fez uma errada apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como fez uma errada aplicação e interpretação das normas de direito substantivo, relativamente às circunstâncias concretas do caso. 2. A sentença, ora recorrida, violou o disposto nos arts. artigos 292º, n.º 1 do CP, artigos 120º, n.º 2, al. d), 340º, n.º 1 e 2 e 410º, n.º 2, als. a) e c) do CPP. 3. Com interesse para o objecto do presente recurso foi proferido pelo Tribunal a quo a seguinte decisão: “ (…) ... (…)” 4. Em sede de exposições introdutórias, a arguida, conforme resulta da gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, requereu as seguintes diligências probatórias: Adv. Arguida: Constando do talão de teste que a data de verificação do aparelho alcoolímetro é sete de 2024, ou seja Julho de 2024, constando dos autos um certificado referente ao aparelho que o mesmo foi objecto de uma primeira verificação em Julho de 2024, constando de documento junto aos autos que o aparelho em causa foi objecto de despacho da Autoridade nacional de Segurança Rodoviária em 2009. Atendendo às circunstâncias concretas plasmadas na lei e quando existe primeira verificação, o que implica que no caso concreto para ter sido aprovado em 2009 e ser objecto de uma primeira verificação em sete de 2024, o aparelho em causa necessariamente tinha que se encontrar avariado ou violado nos seus selos, podendo padecer do certificado de verificação do aparelho um erro e porque tal tem relevância na quantificação do álcool, porquanto no caso concreto a EMA não será 20% mas sim 30%, requer-se a V/Exa. que seja notificado o IPQ a fim de esclarecer os autos porque razão tal aparelho foi submetido a uma primeira verificação em 15-07-2024 de acordo com as situações plasmadas na lei que fixam essa mesma primeira verificação, a questão apresenta-se pertinente à descoberta da verdade, atendendo ao hiato temporal o que urge saber se padece ou não de erro a menção de primeira verificação e daí extrair-se todas as consequências legais. 5. O Tribunal a quo, após a arguida ter prestado declarações, proferiu despacho a indeferir os meios de prova requeridos pela arguida, em sede de exposições introdutórias. 6. Ora, questão suscitada pela arguida, em sede de exposição introdutória, afigura-se da maior relevância para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, ao invés do decidido pelo Tribunal a quo. 7. Pois, a questão de se saber junto do IPQ, se o aparelho/alcoolímetro foi submetido a uma primeira verificação em 15-07-2024,padece ou não de erro a menção de primeira verificação. 8. Tal requerimento da arguida, revelava-se da maior pertinência, porquanto tal aparelho/alcoolímetro utilizado nos autos foi aprovado em 2009 e foi objecto de primeira verificação só em Julho de 2024. O que quer dizer, que atendendo ao hiato temporal decorrido, tal aparelho poderia sempre estar avariado ou até mesmo violado nos seu selos. E que, a ser assim, poderia colocar em causa a prova obtida, pois, podia padecer o certificado de verificação do aparelho um erro, podo assim em causa a quantificação de álcool obtida. 9. Daí que, tal meio de prova requerido pela arguida não deveria, com todo o respeito, ter sido considerado como foi pelo Tribunal a quo como sendo “meramente dilatório”. 10. A arguida requereu determinadas diligências probatórias, as quais se revelavam necessárias para a boa decisão da causa, porquanto #nham que ver com a utilização do alcoolímetro, o qual constitui o aparelho que apresentou o resultado de álcool no sangue ao arguido, mas que o Tribunal a quo entendeu não se revelar necessário, nem relevante para a boa decisão da causa. 11. O que, atendendo ao supra exposto, não se pode aceitar, porquanto tais meios de prova requeridos eram de facto relevantes e essenciais, nos termos do art. 340º do CPP, para a descoberta da verdade e boa decisão da causa. 12. Pelo que, deveria o Tribunal a quo ter determinado que se oficiasse o IPQ, nos moldes requeridos pela arguida, a fim daquele instituto prestar os esclarecimentos solicitados, relativamente ao aparelho alcoolímetro utilizado nos autos. 13. Destarte, o indeferimento do meio de prova requerido pela arguida, constitui uma nulidade, nos termos do art. 120º, n.º 2, al. d) do CPP, a qual desde já se argui para todos os devidos e legais efeitos. 14. Neste conspecto chama-se à colação o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, proferido no âmbito do Proc. 1638/22.0GBABF.E2, disponível em www.dgsi.pt. 15. O Tribunal a quo, em sede de sentença julgou validamente provada a acusação deduzida pelo Ministério Pública, alicerçando-se para tal na confissão livre, integral e sem reservas, sendo que nesse sentido proferiu o seguinte despacho: “Considero relevante a confissão dos factos pela arguida, a qual foi integral e sem reservas, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 344º do Código de Processo Penal e, em consequência, provados os factos constantes da acusação. Notifique” 16. O que está em causa nestes autos é um crime de condução sob estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, n.º 1 do CP. 17. Sendo que, para tal crime a única prova crível é, como se vê, uma prova científica. Ou seja, a prova concreta da taxa de álcool no sangue, obtém-se através de alcoolímetro. É o alcoolímetro que determina o nível de álcool no sangue da pessoa sujeita a tal exame. É, por isso, assim, tal prova obtida uma prova científica. 18. A taxa de álcool no sangue não é um facto que possa ser considerado como um facto susceptível de confissão. 19. Pois, como se referiu in supra, o resultado da taxa de álcool obtém-se por intermédio de um determinado aparelho, um alcoolímetro. 20. Tendo o Tribunal a quo considerado que a arguida, ora recorrente confessou integralmente e sem reservas, os factos pelos quais vinha acusada. E tendo sido a convicção do Tribunal assentado exclusivamente na confissão, livre e espontânea. Tal confissão da arguida, ora recorrente, só pode valer para as quantidades, qualidades e circunstâncias em que a arguida ingeriu bebidas alcoólicas. 21. Porque, quanto à taxa de álcool no sangue (TAS), a mesma resulta não do conhecimento da arguida, ora recorrente, mas antes de um exame feito por um aparelho que acusa um determinado resultado. O que significa, que a confissão do arguido nestes autos não pode abranger tal resultado obtido de TAS. 22. Para o que aqui importa, veja-se o que refere o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido, a 11-09-2013, no âmbito do Proc. 3/13.5PF e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do Proc. 02-11-2015, disponíveis em www.dgsi.pt. 23. Assim, assunção da taxa de alcoolemia no caso dos presentes autos, foi fundamentada em prova que não permite a sua aquisição, ou seja, de que há erro notório na apreciação da prova, nos termos do art. 410º, n.º 2, al. c) do CPP. 24. Em face de todo o que se acaba de expor, deve a sentença recorrida ser objecto de sindicância pelo Tribunal a quem e, nessa medida ser revogada, porquanto violou o disposto nos arts. artigos 292º, n.º 1 do CP, artigos 120º, n.º 2, al. d), 340º, n.º 1 e 2 e 410º, n.º 2, als. a) e c) do CPP. Termos em que e nos melhores de Direito e, sempre com o mui douto suprimento de V/Exas. deve ser julgado procedente o presente recurso, absolvendo-se a recorrente do crime de condução em estado de embriaguez. ...”. * O Exm.º Magistrado do MP respondeu ao recurso, concluindo da seguinte forma: “... A. A fiscalização da condução sob a influência de álcool decorre nos termos previstos no artigo 153.º do Código da Estrada, segundo o qual “o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.” B. Conforme preceitua o n.º 1 do artigo 14.º da Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, “Nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às caraterísticas fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.” C. Os aparelhos de medição de Taxa de Álcool no Sangue (TAS) estão sujeitos a um controlo metrológico regulamentado, com vista a assegurar o rigor dos resultados da medição, nomeadamente pela Portaria n.º 366/2023, de 15 de novembro. D. Os controlos metrológicos dos referidos instrumentos compreendem quatro operações: a) a aprovação do modelo; b) primeira verificação; c) verificação periódica; e d) verificação extraordinária. E. Nos termos do disposto no artigo 7.º, n.º 1 da Portaria n.º 366/2023, de 15 de novembro, “a primeira verificação é efetuada antes da colocação do alcoolímetro em serviço, ou após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano, tendo o mesmo prazo de validade”. F. Por sua vez, nos termos do n.º 1 do artigo 8.º do mesmo diploma “a verificação periódica tem uma periodicidade anual e é válida durante um ano após a sua realização”. G. A Recorrente vem suscitar a questão de, no certificado do Instituto Português da Qualidade, se mencionar como “primeira verificação” a data de 15-07-2024, pretendendo com isso, colocar em causa a fiabilidade do resultado apresentado pelo talão de alcoolímetro junto aos presentes autos, considerando a data de aprovação do aparelho/alcoolímetro utilizado nos autos. H. Conforme previsto no artigo 7.º, n.º 1 da Portaria n.º 366/2023,amenção de “primeira verificação” pode resultar da “reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem” do alcoolímetro, sendo que, no caso em apreço, desconhece-se se tal menção se deveu a alguma destas circunstâncias. I. A menção no certificado do IPQ de “primeira verificação” e o facto de a mesma, eventualmente, se dever às circunstâncias previstas no artigo 7.º, n.º 1 da Portaria n.º 366/2023, de 15 de novembro de “reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem” em nada contende com a fiabilidade do resultado do teste do alcoolímetro, na medida em que o que releva, para tal efeito, é o resultado da avaliação efetuada que, na situação em apreço, corresponde a “Aprovado”. J. Conforme menciona a sentença recorrida, saber se se trata de “primeira verificação” ou de uma “verificação periódica”, à falta de outros elementos que ponham em causa a fiabilidade e autenticidade do certificado emitido, trata-se de uma questão irrelevante. K. Tendo a avaliação sido realizada em 15-07-2024, o respetivo certificado do aparelho encontrar-se-ia válido, quando foi emitido o resultado do teste de alcoolémia junto aos presentes autos, atendendo a que, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 1 da Portaria n.º 366/2023, de 15 de novembro, a verificação periódica tem uma periodicidade anual e é válida durante um ano após a sua realização. L. Mesmo a admitir que o Instituto Português da Qualidade viesse admitir que a menção de “primeira verificação” do aparelho correspondia a um lapso, tratando antes de uma “verificação periódica” tal só por si, sem outros indícios que coloquem em causa a autenticidade de tal certificação, não é possível concluir como faz a Recorrente que “o aparelho poderia sempre estar avariado ou até mesmo violado nos seus selos, e a ser assim, poderia colocar em causa a prova obtida”. M. Dito por outro modo, qualquer que fosse a resposta do Instituto Português da Qualidade à questão colocada pela Recorrente, tal seria totalmente inconsequente para a prova já produzida nos autos, e por esse motivo, corresponderia a um expediente meramente dilatório. N. Ao contrário do que a Recorrente alega, a convicção do Tribunal a quo não assentou exclusivamente na confissão integral e sem reservas da arguida, mas da consideração de todos os elementos constantes da prova documental dos autos. O. Resulta da leitura da sentença oralmente proferida, disponível no sistema de gravação CITIUS, a convicção do Tribunal a quo foi formada não só pela confissão integral e sem reservas da arguida, mas da sua conjugação com a prova documental constante dos autos, nomeadamente o auto de notícia, talão de alcoolémia, e certificado do IPQ. P. Toda a prova produzida nos presentes autos conduz à conclusão de que a arguida praticou os factos de que vem acusada, não existindo qualquer meio de prova divergente que pudesse abalar a convicção do Tribunal a quo que ficou expressa na sentença recorrida. Q. O facto de ter sido indeferido o requerimento probatório formulado pela Recorrente em audiência não é suscetível de permitir a conclusão de ter ocorrido um erro notório na apreciação da prova, na medida em que a diligência pretendida pela arguida, no sentido de oficiar o Instituto Português da Qualidade (IPQ), para que esta entidade viesse comunicar se padece ou não de erro, a menção de “primeira verificação” do aparelho, independentemente do resultado que viesse a ser comunicado pelo IPQ, em nada seria suscetível de alterar a convicção do Tribunal. Por tudo quanto fica exposto, deverá ser negado provimento ao recurso interposto e, consequentemente, confirmada a decisão recorrida. ...”. * Neste tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, para além do mais, com o seguinte teor: “... Relativamente à alegada necessidade de saber se a verificação do alcoolímetro efetuada em julho de 2024 foi uma primeira verificação, ou, antes, uma verificação periódica, diremos, tão só, que, como resulta do art.º 7º.1 da Portaria 1556/2007, sendo a validade de ambas de um ano e, sendo feita a primeira, fica a segunda dispensada nesse ano, é rigorosamente indiferente, para efeitos da validade do resultado, se a verificação do aparelho em causa foi a primeira, a segunda ou a terceira – o que é determinante é que tenha sido feita durante o ano anterior à medição da TAS, como sucedeu no caso em análise. Decorre do exposto que, pretendendo dela retirar consequências jurídicas que, como se demonstrou, não ocorrem, é forçoso concluir que a informação que a arguida pretendia fosse obtida junto do IPQ era completamente irrelevante e desnecessária, pelo que bem andou o Tribunal a quo ao indeferir a diligência de prova requerida, por meramente dilatória, e ao ter como não verificada qualquer nulidade por omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade. No que respeita à alegação de que a convicção do Tribunal a quo assentou exclusivamente na confissão da arguida apenas cabe dizer de que tal não corresponde à verdade, sendo certo que confessou o exercício da condução depois de ter ingerido bebidas alcoólicas. Consigna-se que estas mesmas questões foram suscitadas no processo 36/24.6GDSRT.C1, deste mesmo Tribunal, que aguarda a prolação de acórdão. Assim, por tudo o exposto, também nós somos de parecer que o recurso interposto pela arguida AA dever ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida. ...”. * Tratando-se, como se trata, de sentença oral, proferida em processo sumário, atenta a simplicidade da matéria de facto, considerámos dispensável a transcrição da sentença (art.º 101º/5 do CPP ) e não procederemos à reprodução total da matéria de facto fixada pelo tribunal recorrido, nem da respectiva fundamentação, limitando-nos a reproduzir os factos e a fundamentação essenciais à decisão da questão suscitada. * Assim, a matéria de facto provada relevante, atentas as questões suscitadas, é a seguinte: 1. No dia 15-10-2024, pelas 23h50, a Arg. conduziu o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ..-..-OD na Estrada Nacional n.º ...41, junto da localidade de ..., ..., o que fazia após ter ingerido bebidas alcoólicas, e apresentando uma Taxa de Álcool no Sangue não inferior a 2,489 gramas por litro de sangue, não tendo requerido contraprova. 2. A Arg. conhecia o seu estado e bem sabia que o mesmo não lhe permitia efectuar uma condução cuidada e prudente e lhe diminuía a capacidade de atenção, reacção e destreza, mas, ainda assim, quis conduzir o veículo automóvel na via pública, o que efectivamente fez. 3. A Arg. agiu de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei penal. * O tribunal fundamentou a fixação da matéria de facto na confissão integral e sem reservas da Arg., bem como nos documentos constantes dos autos. * A sentença encontra-se fundamentada, quer de facto quer de direito, cumprindo as exigências do art.º 389º-A/1 do CPP. * É pacífica a jurisprudência do STJ[2] no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação[3], sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso. Da leitura dessas conclusões e tendo em conta as questões de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que as questões fundamentais a decidir no presente recurso são as seguintes: I. Nulidade, por omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade; II. Reapreciação da matéria de facto. * Cumpre decidir. I. Entende a Arg. que, tendo sido indeferida a diligência, essencial para a descoberta da verdade, que requereu em sede de julgamento, se verificou a nulidade prevista no art.º 120º/2-d) do CPP. Pretendia a Arg. que se oficiasse ao IPQ, a fim de esclarecer os autos por que razão o aparelho, utilizado na medição quantitativa da alcoolemia que apresentava, foi submetido a uma primeira verificação em 15-07-2024, sendo o despacho de aprovação do modelo de 26-06-2009. Só os meios de prova cujo conhecimento se afigure necessário para habilitarem o julgador a uma decisão justa, devem ser produzidos, por determinação do tribunal na fase de julgamento, ou a requerimento dos sujeitos processuais, devendo o tribunal indeferir a prova requerida quando a considerar irrelevante, supérflua, inadequada, de obtenção impossível ou duvidosa ou tenha finalidade meramente dilatória (art.ºs 323°/a) e 340º do CPP)[4]. Ora, desde logo, como afirma o MP em ambas as instâncias, tal diligência era irrelevante, uma vez que a verificação referida, independentemente de ser a primeira ou periódica, considerou o aparelho apto, estando assim verificada a conformidade da sua qualidade metrológica. Depois, porque tal pretensão resulta da incompreensão dos conceitos de “aprovação do modelo” e “primeira verificação”. Na verdade, por um lado, “... A aprovação de modelo é o ato que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado. ...”[5], portanto, trata-se de uma aprovação genérica de um determinado modelo de aparelho, válida para todos os aparelhos daquele modelo, a serem introduzidos nos 10 anos seguintes[6] ao despacho de aprovação. Por outro lado, “... A primeira verificação compreende o conjunto de operações destinadas a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados, com a dos respetivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis, devendo ser requerida, para os instrumentos novos, pelo fabricante ou mandatário, e pelo utilizador, para os instrumentos reparados. ...”,[7] sendo, portanto, a verificação/aprovação daquele aparelho específico. Não há, pois, nada de estranho na diferença de datas de “aprovação do modelo” e “primeira verificação”, não se justificando qualquer pedido de esclarecimento. Improcede, pois, nesta parte, o recurso. * II. Parece pretender a Arg. pôr em causa a taxa de alcoolemia dada como provada, alegando, por um lado, existirem dúvidas quanto à fidedignidade do aparelho utilizado e, por outro, que tal taxa foi dada como provada com base, unicamente, na confissão integral e sem reservas. Na apreciação da questão anterior, já nos pronunciámos quanto à fidedignidade do aparelho utilizado. Acresce que, contrariamente ao que afirma, o tribunal recorrido deu como provado tal facto com base na confissão e nos documentos juntos aos autos, onde, naturalmente, se inclui o talão do teste feito pelo alcoolímetro. Ainda que assim não fosse, a confissão integral e sem reservas bastaria para dar como provada a concreta taxa verificada. Quanto à concreta relevância da confissão, importa, antes do mais, realçar a conduta processual da Recorrente, que, por um lado, renunciou à contraprova e, por outro, tendo confessado integralmente e sem reservas os factos, vem agora questionar o alcance de tal confissão. Na verdade, entendemos que “Se o arguido se conformou com o exame efectuado por alcoolímetro, não pedindo a contraprova, não pode depois, quando já não é possível essa contraprova, pôr em causa a fiabilidade dos resultados daquele exame.”[8]. E também entendemos que a confissão, que é “... o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável ...”, sendo “... eficaz quando feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o facto confessado se refira. ...” (art.ºs 352º e 353º/1 do CC), como é o caso da Arg., pode abranger a concreta taxa de alcoolémia constante da acusação, porque a lei não limita os factos que podem ser confessados, desde que o tribunal considere que a confissão é livre e fora de qualquer coacção (art.º 344º do CPP)[9]. Considerar que não pode ser confessada a concreta taxa de alcoolémia, corresponde à concessão de uma tutela inaceitavelmente paternalista ao Arg., contra si próprio[10]. Não ignoramos a jurisprudência em sentido contrário[11], mas dela discordamos, justamente, por a considerarmos injustificadamente paternalista para com o Arg., cuja vontade expressa seria assim contrariada. Posta a validade da prova, não pode deixar de improceder, também nesta parte, o recurso. * Não vislumbramos na decisão recorrida qualquer dos vícios previstos no art.º 410º/2 do CPP. ***** Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos não provido o recurso e, consequentemente, confirmamos inteiramente a decisão recorrida. Custas pela Recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 5 (cinco) UC. * Notifique. D.N.. ***** Elaborado em computador e integralmente revisto pelo relator (art.º 94º/2 do CPP). *****
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