Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | JOSÉ AVELINO GONÇALVES | ||
| Descritores: | RENOVAÇÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS ANULÁVEIS VÍCIO DE CONTEÚDO DELIBERAÇÃO DE AMORTIZAÇÃO EFEITOS CADUCIDADE | ||
| Data do Acordão: | 09/10/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | JUÍZO DE COMÉRCIO DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA | ||
| Texto Integral: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 62.º, N.º 2, E 347.º, N.º 6, DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS | ||
| Sumário: | I – No que concerne à renovação das deliberações anuláveis, o art. 62º, nº 2, do CSC, não exclui expressamente a possibilidade de renovação das deliberações anuláveis por vício de conteúdo, impondo apenas que a deliberação não enferme do vício da precedente. Em termos substantivos, a deliberação renovadora é uma nova deliberação que se pretende extirpada dos vícios da primitiva deliberação, passando os efeitos, idênticos aos da deliberação primitiva, a ser imputáveis e reportados à deliberação renovadora, ou seja, a regra é a deliberação renovadora repetir e substituir a deliberação primitiva, ocupando por defeito retroativamente o seu lugar – nestes precisos termos o Acórdão do STJ de 22.09.2001, pesquisável www.dgsi.pt.jstj, proc. n.º 675/10.2TBPTS.L1.S1. II – A deliberação societária que renova uma deliberação de amortização é, ela própria, uma deliberação de amortização, encontrando-se sujeita aos mesmos requisitos de validade da deliberação que se pretende renovar, designadamente em matéria de caducidade, pelo que sempre teria de ser cumprido o prazo concedido para o direito originário de amortização. III – Doutro modo, a deliberação renovatória apenas ficaria sujeita ao prazo ordinário de prescrição, de 20 anos, o que não se pode aceitar, por poder subverter a segurança e certeza da vida das sociedades e por inerência, dos seus sócios, caso se permitisse que decorridos 5, 10 ou mais anos, se viesse a tomar deliberação renovatória de uma deliberação cujo objeto havia sido a amortização de ações, para além do prazo que a lei estipula para a própria amortização originária. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
1.Relatório AA, divorciado, contribuinte fiscal n.º ...40, residente na Av. Cerro ..., .... ..., Apartamento ...5, ..., ... ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra A..., S.A., com o NIPC ...16, com sede em ..., ... ..., ..., pedindo que: - seja declarada a anulabilidade/nulidade das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral extraordinária da Ré de 28 de Março de 2022, tudo com as demais consequências legais. Alega, para o efeito, muito em suma e para além do mais, o seguinte: É titular de 2.388.551 acções da Ré, correspondentes a 50% do seu capital social, sendo a parte restante detida pela sociedade B..., SGPS, S.A.. A Ré e as atinentes sociedades operacionais deram origem ao processo n.º 1281/18...., que corre os seus termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., arrestando a generalidade do património pessoal do Autor, onde se inclui a participação social do Autor na Ré. Em 15 de Abril de 2019, foi promovida pela B... a primeira amortização das acções do Autor, sem qualquer contrapartida, bem como a subsequente deliberação de redução e aumento de capital social. Deliberação essa que foi anulada judicialmente, no âmbito do processo n.º 2319/19.... que correu termos no Juízo de Comércio, Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu. Não obstante, tem a Ré vindo a promover várias novas tentativas de amortização das ações do Autor, com o mesmo fundamento (arresto): a) Por Assembleia Geral de 22.01.2021 - deliberando a renovação da deliberação de 15.04.2019 -, igualmente anulada via judicial, no âmbito do processo n.º 424/21...., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, no Juízo de Comércio de Leiria, Juiz ...; b) Por Assembleia Geral de 16.03.2022, deliberando a renovação da deliberação de 22.01.2021 que, por sua vez, pretendeu renovar a deliberação de 15.04.2019, dando origem ao processo n.º 1279/22...., que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., tendente à suspensão da deliberação e declaração da sua invalidade. E, não se contentando, tem a Ré promovido igualmente várias tentativas de amortização das ações do Autor, mas com fundamento em penhora: a) Por Assembleia Geral de 05.07.2021 – deliberando a amortização das ações do Autor na Ré, bem como a consequente redução de capital, alteração do pacto social, a contrapartida da amortização e criação de uma reserva legal – deliberações essas que foram suspensas no âmbito do procedimento cautelar n.º 2769/21...., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ...; b) Por Assembleia Geral de 28.03.2022, deliberando a renovação da deliberação de 05.07.2021, dando origem ao processo n.º 1458/22...., que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., tendente à suspensão da deliberação e declaração da sua invalidade. No caso sub judice está em causa a Deliberação de 28.03.2022, supra referida. A propósito desta, o Autor intentou contra a Ré, em 07.04.2022, um procedimento cautelar para suspensão das deliberações adotadas na Assembleia Geral de 28.03.2022, com pedido de inversão do contencioso, que deu origem ao processo n.º 1458/22...., que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ... (actual apenso B). No âmbito deste procedimento cautelar, por sentença datada de 14.07.2022, o Tribunal de 1ª Instância julgou improcedente o referido procedimento, declarando a validade das deliberações de 28.03.2022. Todavia, o Autor recorreu de tal decisão (tendo tal recurso obtido provimento). Não obstante este recurso, vem o Autor intentar a presente ação com vista a impugnar as deliberações sociais adotadas na Assembleia Geral de 28.03.2022, em virtude da sua invalidade, por vício de conteúdo. A Deliberação de 05/07/2021 que a Ré aprovou renovar na Assembleia Geral de 28 de março de 2022, foi declarada inválida por sentença e acórdão no âmbito do processo cautelar n.º 2769/21...., nos termos do artigo 58.º, n.º 1, al. a) e 347.º do CSC, por padecer de vício de conteúdo por não dispor de qualquer fundamento que a legitimasse, em virtude de não existir, à data, qualquer direito potestativo de amortização com base na penhora. Designadamente, a ora Ré havia dado início ao procedimento previsto no artigo Sétimo dos Estatutos da Sociedade, com vista à amortização das ações do Autor, num momento em que o fundamento que alegadamente legitimaria a amortização – a penhora -, ainda não se tinha verificado. Assim, o que estava em causa na Deliberação de 05/07/2021, que agora alegadamente se renovou, era um vício de conteúdo, por inexistência do fundamento que legitimaria o direito a amortização, violando o Artigo Sétimo dos Estatutos da Ré e art.347.º do CSC. A renovação de deliberações anuláveis por vícios de conteúdo não é legalmente admissível, nos termos do artigo 62.º do CSC. Assim, a deliberação de 28/03/2022, tendo o mesmo conteúdo da deliberação de 05/07/2021, e só podendo ser renovadas deliberações inválidas por vícios de procedimento, não é uma deliberação renovatória, nem pode proceder à renovação daquela. A deliberação de 28/03/2022 constitui uma verdadeira deliberação, e não uma deliberação renovatória, tanto que delibera ex novo, a amortização, consequente redução do capital e alteração do artigo 4.º, n.º 1 dos Estatutos da Ré. Mas, mesmo que se entenda ser uma verdadeira deliberação renovatória – o que por mera cautela de patrocínio se equaciona -, a verdade é que a mesma não é válida, por vício de conteúdo, não podendo renovar a deliberação de 05/07/2021. Não pode vir agora a Ré, com o mesmo fundamento, renovar uma Deliberação que não teve qualquer fundamento para existir à data, estando, por isso, viciada no seu conteúdo. Ademais, a Deliberação de 28.03.2022 padece igualmente de vício de conteúdo e, por tal, é impossível de renovar as deliberações anteriores de 05.07.2021. No caso concreto, de facto, a penhora encontrava-se consolidada (06.05.2021); as comunicações a que aludem os n.ºs 1 e 6 do artigo 7.º do contrato social foram realizadas; a penhora manteve-se à data da deliberação de 28.03.2022, aqui em causa; a comunicação no sentido de designação de ROC, foi realizada. Porém, não se encontrava – nem encontra – calculada a contrapartida pela amortização das ações do Autor. Ademais, uma vez que o contrato social da Ré não estipula qualquer prazo máximo para aprovar a deliberação de amortização, a contar do facto que fundamente a amortização (no caso, a penhora consolidada, em 06.05.2021), exige-se ainda, nos termos do artigo 347.º, n.º 6 do CSC, que tal se verifique no prazo de 6 meses. O direito a amortizar as acções do A. constituiu-se em 06/05/2021, pelo que terminou em 07/11/2021. Assim, tendo a deliberação de 28.03.2022 igual conteúdo às anteriores (isto é, a amortização das ações do Autor com base na penhora), e encontrando-se inexistente, à data, o direito a amortizar com este fundamento, porque extinto por caducidade, não tem a Ré qualquer legitimidade para amortizar as ações do Autor. O Autor alega também que houve violação do direito às informações preparatórias da assembleia geral, uma vez que o A. não teve acesso a qualquer relatório de avaliação alegadamente feito por ROC independente, que deveria acompanhar a deliberação, por estar em causa amortização das acções do A., relativamente às quais deve ser calculada a respectiva contrapartida, nos termos do disposto no artigo 7º, nº6, dos Estatutos e artigo 105º, nº2, do CSC. A convocatória padece de vícios de convocatória, geradores de nulidade nos termos do art. 56º, nº2 do CSC. A deliberação de amortização das acções do A. é abusiva, servindo apenas o propósito da accionista B... de amortizar e extinguir as acções do A. sem qualquer contrapartida, afastando-o compulsivamente da sociedade, assim assegurando para a B... o domínio total da A.... * Citada, a R. contestou invocando, muito em suma e para além do mais, o seguinte: A excepção de litispendência, por se encontrar pendente o procedimento cautelar nº 1458/22...., por neste ter sido também deduzido pedido de inversão do contencioso. Na sequência da procedência do procedimento cautelar nº 2769/21...., a Ré iniciou o processo de renovação da Deliberação de 05.07.2021, com vista a sanar a invalidade que o Tribunal tinha apontado a esta deliberação e, deste modo, a fazer cumprir os seus Estatutos. Para o efeito, em 12.11.2021, o conselho de administração da Ré enviou nova carta para o Autor a conceder-lhe um novo prazo de 90 dias para sanar a causa estatutária de amortização de Ações. Esta carta foi recebida pelo Autor no dia 19.11.2021. Em 27.12.2021, o conselho de administração da Ré enviou nova carta ao Autor a convidá-lo a que o mesmo propusesse um ROC independente para o cálculo do valor das Ações. Esta carta foi recebida pelo Autor no dia 29.12.202183. Mais uma vez, o Autor nada respondeu a qualquer destas duas cartas, nem nada fez no sentido da sanação da situação de penhora das Ações. Assim, em 04.03.2022, o presidente interino da mesa da assembleia geral da Ré procedeu à convocatória de uma reunião da assembleia geral da Ré, a qual se veio a realizar a 28/03/2022, tendo nela sido aprovadas as deliberações que são objecto da presente acção. Tais deliberações já foram objecto do procedimento cautelar nº 1458/22...., que correu termos neste Juízo – Juiz ..., proposto pelo aqui A. e que visava a suspensão de tais deliberações, tendo tal procedimento sido julgado improcedente em 1ª instância, por esta ter considerado, para além do mais, que a Ré tinha sanado as questões que os Tribunais apontaram à deliberação de 05/07/2021. Ao contrário do alegado pelo A., a deliberação de 05/07/2021 não padece de um vício de conteúdo, porquanto nessa data já estava constituído o direito da Ré amortizar as acções do A. com fundamento na sua penhora, direito esse que, de acordo com a interpretação que os Tribunais fizeram dos Estatutos da Ré, se constituiu no momento em que a penhora se consolidou, o que terá ocorrido no dia 06/05/2021, ou seja, quase dois meses antes da deliberação de 05/07/2021. No que respeita à Deliberação de 05.07.2021, apenas se verifica um vício: a não concessão, no devido tempo, do prazo estatuário de 90 dias para a sanação da causa de amortização, o que, como é evidente, constitui um vício no procedimento estatutário tendente à amortização (e não um vício de conteúdo da Deliberação de 05.07.2021), tal como é melhor sustentado pelo Prof. COUTINHO DE ABREU e pelo Prof. MENEZES CORDEIRO, nos respetivos pareceres jurídicos relativos ao caso dos presentes autos. Não padecendo de vício de conteúdo, a Deliberação de 05.07.2021 pode ser objecto de renovação, como foi, através das deliberações de 28/03/2022, impugnadas através da presente acção. O referido vício de procedimento apontado à Deliberação de 05.07.2021 foi sanado com a concessão, após a consolidação da penhora, de um novo prazo de 90 dias ao Autor para proceder ao levantamento da penhora sobre as Ações. A renovação de uma deliberação social não está sujeita a prazo, em face do disposto no art. 62º do CSC. Alega ainda que não se verifica a caducidade do direito de amortização, porque o prazo de caducidade se extingue com o seu exercício, o que ocorreu logo aquando da deliberação de amortização de 05.07.2021. Assim, aquando das deliberações renovatórias de 28.03.2022, já não se encontrava a correr qualquer prazo de caducidade, mas unicamente os prazos gerais de prescrição, pelo que as referidas deliberações são válidas e tempestivas. Regulando o artigo 7º dos Estatutos Sociais os prazos para o exercício do direito de amortização, apenas se pode aplicar o prazo injuntivo que constitui o limite da liberdade de estatuição estatutária, o que significa que o direito de amortização deve ser exercido no prazo de 60 dias contados do prazo de 90 dias concedido ao accionista para sanar o ilícito estatutário – mas sempre com o prazo máximo de um ano a contar do direito à amortização – prazo legal injuntivo (artigo 347º, nº 6, do CSC). O A. age em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, pois no Procedimento Cautelar de Suspensão da Deliberação de 05.07.2021 alega que a Deliberação de 05.07.2021 tinha sido adotada antes de tempo por a penhora ainda não se encontrar consolidada. Segundo o Autor, entre outros, a pendência do incidente de comunicabilidade de dívida ao cônjuge no âmbito do processo executivo à ordem do qual foram penhoradas as Ações obstava à consolidação da penhora. No entanto, ao impugnar a Deliberação renovatória de 28/03/2022, o Autor alega que o direito de amortização da Ré terá caducado em virtude de a consolidação da penhora ter ocorrido em 06.05.2021, apesar de o incidente de comunicabilidade ainda se encontrar pendente (ou seja, de alegadamente, na tese anterior do Autor, ainda nem sequer existir penhora consolidada). Do exposto resulta uma clara contradição na argumentação utilizada pelo Autor, que altera o momento relevante para efeitos de consolidação da penhora consoante o que melhor lhe aprouver face às circunstâncias do caso concreto, com vista a forçar a caducidade das deliberações sociais objeto dos presentes autos. A frustração da legítima confiança da Ré de que, seguindo os pressupostos procedimentais que lhe foram sendo indicados pelo Autor e pelos Tribunais, poderia pacificamente deliberar a amortização das Ações, bem como o intuito manifestamente emulativo do comportamento do Autor que, por esta via, tenta vedar o exercício de um direito potestativo da Ré, torna evidente o exercício disfuncional da posição jurídica do Autor, o qual deve ser sancionado pelo sistema. Mais alega a Ré que inexiste a invocada violação do direito a informações preparatórias da assembleia geral, por não ter sido disponibilizado ao A. o relatório elaborado por ROC independente com o cálculo do valor da amortização. O cálculo do valor da amortização é uma operação externa à deliberação de amortização (e, por conseguinte, a qualquer renovação desta deliberação) que deve ser efetuada por um terceiro independente da Ré, cabendo à Ré apenas executar o que esse terceiro (o ROC independente) determinar. Com efeito, e contrariamente ao que o Autor pretende fazer o Tribunal crer — sem invocar qualquer base legal, doutrinária e jurisprudencial —, nos termos da lei, a amortização e a avaliação do valor dessa amortização configuram duas operações jurídicas distintas: num primeiro momento, aprova-se a amortização e, num segundo momento, faz-se a avaliação da sociedade (e consequentemente do valor das ações) e fixa-se a compensação. Quem fixa o valor da contrapartida da amortização das Ações não é a Ré ou a assembleia geral da Ré — mas sim o ROC independente que efetuar a avaliação das Ações —, não existindo qualquer liberdade deliberativa da Ré a este propósito. Desta feita, o direito de deliberar a amortização das Ações é independente da obrigação de fixação de uma contrapartida por tal amortização. Subsidiariamente, por exacerbada cautela de patrocínio: mesmo que assim não se entendesse e se entendesse antes que a falta de avaliação prévia por ROC independente constitui um vício das Deliberações de 28.03.2022, sempre se dirá que tal vício seria um vício de procedimento (e não um vício de conteúdo, como refere o Autor) que não assumiria qualquer relevância, não comprometendo a licitude do resultado deliberativo. A convocatória para a assembleia geral de 28/03/2022 é válida. O capital social da Ré constante em tal convocatória corresponde ao capital social real da Ré naquela data, tendo o Autor acesso a toda a informação necessária para chegar a tal conclusão. Ainda que se entendesse que existe um lapso no montante do capital social constante da convocatória causador de um vício da convocatória — o que a Ré não concede e apenas por cautela de patrocínio equaciona —, nem por isso as Deliberações de 28.03.2022 devem ser consideradas inválidas pelo Tribunal. É que, a existir um putativo vício na convocatória para a assembleia geral de 28.03.2022, tal vício sempre seria um vício procedimental por configurar um lapso num ato externo (cfr. artigo 171.º do CSC). Quanto à legitimidade do presidente da mesa da assembleia geral interino alega a Ré, ademais, que existem já duas decisões transitadas em julgado no sentido de que o Dr. BB tem poderes, enquanto presidente da mesa da assembleia geral interino, para convocar as assembleias gerais da Ré até que seja validamente eleito um novo presidente da mesa da assembleia geral. Estas decisões têm autoridade de caso julgado perante as partes neste litígio (ou seja, perante Autor e Ré), o que invoca para todos os efeitos legais. Por fim, quanto à alegação do A. de que as Deliberações de 28.03.2022 são abusivas, na medida em que se destinam única e exclusivamente a afastar o Autor de acionista da Ré e a obter vantagens especiais em prejuízo do Autor, a Ré responde no sentido de que o único interesse que procurou acautelar com a deliberação de 16.03.2022 foi o interesse da R. e da sua continuidade, sendo a deliberação o resultado do cumprimento das obrigações legais impostas à R. e aos seus órgãos sociais, razão pela qual inexiste qualquer abuso de direito. Conclui pedindo que a excepção dilatória de litispendência seja julgada procedente e, em consequência, a Ré absolvida da instância; ou, subsidiariamente, deve a acção ser julgada improcedente e, em consequência, deve a Ré ser absolvida dos pedidos contra si formulados nos presentes autos; ou, subsidiariamente, caso se entenda existir alguma invalidade da deliberação de 28.03.2022, requer que seja concedido à Ré, ao abrigo do disposto no artigo 62º, nº 3, do CSC, um prazo côngruo para renovar a deliberação de 28.03.2022, desse modo sanando a invalidade que seja imputada às mesmas. * O A. respondeu às excepções deduzidas pela R., por requerimento de 24.10.2022. * Por requerimento de 06/02/2023, a Ré veio concretizar e complementar os factos alegados nalguns artigos da sua d. contestação, o que não foi admitido por despacho de 16/03/2023. A Ré interpôs recurso de tal despacho, o qual foi julgado improcedente – cfr. ap. A. * Por despacho de 10.11.2023, considerou-se que os autos dispunham de todos os elementos que habilitavam a que se conheça de imediato do mérito da causa, sem necessidade de mais provas, tendo as partes sido notificadas para se pronunciarem sobre a tramitação processual preconizada e/ou apresentarem alegações de facto e de direito, o que vieram fazer por requerimentos de 11 e 12/12/2023, não se opondo ao conhecimento imediato do mérito da causa e apresentando alegações, nas quais, em suma, reiteraram as posições por si assumidas nos respectivos articulados. * O Juízo de Comércio de Leiria - Juiz ... julga a acção e, consequentemente, decide: A) Julgar a presente acção totalmente improcedente, por não provada e, consequentemente, absolver a Ré do pedido formulado na d. p.i.. B) Julgar a excepção peremptória de abuso de direito alegada pela Ré totalmente improcedente, por não provada. C) Condenar o Autor no pagamento das custas da acção. D) Fixar o valor da presente causa em € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo). Registe e notifique. Arquive em pasta própria.”
AA, não se conformando com tal decisão, interpõe o seu recurso assim concluindo: (…). * A..., S.A., Ré, ora Recorrida, apresenta as suas CONTRA-ALEGAÇÕES DE RECURSO assim concluindo: (…). * 2. Do objecto do recurso O Tribunal da 1.ª instância considerou que: (1) É passível a renovação de deliberações anuláveis por vícios de conteúdo, desde que a deliberação renovadora não padeça do mesmo vício – concluindo, assim, que as Deliberações de 28.03.2022 podiam renovar as Deliberações de 05.07.2021, pois que “não se encontram afetadas do mesmo vício de conteúdo de que padeciam as anteriores (datadas de 05.07.2021), tendo o respetivo vício (de conteúdo) sido sanado pelas referidas comunicações datadas de 12.11.2021 e 27.12.2021.” (vd. p. 47 da Sentença Recorrida); (2) Mesmo que assim não se entendesse, considerou o Tribunal a quo que a Deliberação de Amortização ex novo, da Assembleia Geral da Recorrida de 28.03.2022, sempre valeria, pois “não padece, em bom rigor, de quaisquer dos vícios apontados pelo Autor à Deliberação de Renovação”; (3) Que, apesar de os Estatutos da Ré, ora Recorrida, não preverem um prazo máximo para que ocorra a deliberação de amortização após a ocorrência do facto que lhe serve de fundamento, “na presente situação será aplicável outrossim o prazo injuntivo de caducidade de um ano a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização” (vd. p. 50 da Sentença Recorrida), motivo pelo qual considerou não estar extinto, por caducidade, à data das deliberações de 28.03.2022, o direito potestativo a amortizar, da Ré, ora Recorrida; (4) Que, ainda que se entenda que o prazo de caducidade a atender é o prazo supletivo de 6 meses, considera tal prazo impedido pela tomada da Deliberação de 05.07.2021, pois que a “Ré manifestou perante o A. (…) a vontade de exercer o direito potestativo de amortização (…) e, em consequência, impediu definitivamente a caducidade de tal direito” (vd. p. 58 da Sentença Recorrida); (5) Além disso, referiu ainda, quanto à caducidade, que não se confunde o direito a amortizar com o direito de renovação, pois o prazo previsto no artigo 347.º, n.º 6 CSC, refere-se ao direito de amortização e não renovação, não estabelecendo o artigo 62.º CSC qualquer prazo de caducidade para a renovação de deliberação social, fazendo analogia com a confirmação de negócios jurídicos inválidos (p. 59 da Sentença Recorrida); (6) Que o direito à informação não se encontra violado porquanto o cálculo da contrapartida da amortização e correspondente relatório de avaliação, é um elemento exterior à deliberação de amortização e, por tal, não é um fator constitutivo da amortização, nem requisito da sua existência e validade (p. 69 da Sentença Recorrida); (7) Que não existe vício de procedimento relativamente ao capital social previsto na convocatória da Assembleia Geral de 28.03.2022 e, a existir, o mesmo é irrelevante (p. 72 e 73 da Sentença Recorrida); (8) Que existe autoridade de caso julgado das decisões proferidas nos processos n.º 3685/18....-A e n.º 3685/18...., que impõe considerar que o Dr. BB tem legitimidade, enquanto Presidente (interino) de Mesa da Assembleia Geral, para convocar a Assembleia Geral de 28.03.2022 (p. 78 da Sentença Recorrida); e que, com a anulação das deliberações de 15.04.2019 que elegeram os órgãos sociais para o triénio 2019/2021, o Dr. BB mantém-se como Secretário da Mesa da AG validamente eleito na Assembleia Geral de 22.04.2016 e que, por renúncia do Presidente de tal Mesa, aquele continua a exercer interinamente esta função (p. 79 da Sentença Recorrida); (9) Por fim, considerou que a deliberação de 28.03.2022 não revela qualquer intuito de beneficiar ou obter vantagens especiais para a acionista B... ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou do outro acionista (ora Recorrente), nem de prejudicar aquela ou este, não sendo, por tal, abusiva (p. 83 da Sentença Recorrida). Para assim concluir, a 1.ª instância arrimou-se no seguinte acervo factual- não impugnado: “Factos Provados Em face da prova documental apresentada e da posição assumida pelas partes nos respetivos articulados, resultam provados os seguintes factos: 1. A Ré é uma sociedade anónima, cujo objeto social é a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indirecta de exercício de actividades económicas, constando na respectiva certidão permanente subscrita em 09/11/2022, como capital social, o valor de € 54.942.755,00 (cfr. certidão permanente da matrícula comercial da Ré junta com o requerimento do Autor de 14.12.2022). 2. Em 15 de abril de 2019, a Ré tinha (antes das deliberações tomadas na assembleia geral realizada em tal data) o capital social de € 23.885.510,00, correspondente a 4.777.102 ações, com o valor nominal de €5,00 cada, e era detido da seguinte forma: O Autor era titular de 2.388.551 ações; e a sociedade B..., SGPS, S.A. era titular de 2.388.551 ações (cfr. a supra referida certidão permanente). 3. A Ré detém 100% do capital nas seguintes sociedades operacionais do Grupo A...: a. C..., S.A. b. D..., S.A. c. E..., S.A. d. F..., S.A. e. G..., S.A. f. H....Ltd.Sti. 4. A Ré é ainda titular de uma participação social, correspondente a 71,12% do capital social da sociedade I..., S.A. (I...). 5. E é, também, por via da I..., acionista indireta das sociedades: a. J..., S.A., a qual é detida a 100% pela I...; b. K..., S.A., a qual é detida em 25% pela I...; e c. L..., Lda., que é detida em 15% pela I.... 6. O artigo sétimo do contrato de sociedade da Ré, intitulado “Amortização de Acções”, tem o seguinte teor: “1. É admitida a amortização compulsiva de ações pela sociedade, sem consentimento do respetivo titular, nos casos que se seguem, sempre que a situação que origine o direito à amortização se mantenha após noventa dias a contar da comunicação pelo Conselho de Administração dessa mesma situação ao acionista em causa: a) Por acordo com o titular das ações;b) Se o acionista for declarado insolvente, interdito, inabilitado ou incapaz; c) Se uma sociedade acionista for dissolvida ou for declarada insolvente; d) Se as ações forem penhoradas, arrestadas ou, por qualquer outra forma, sujeitas a apreensão judicial; e) Se, em caso de divórcio ou de separação judicial do acionista, as respetivas ações forem adjudicadas ao seu cônjuge; f) Se um acionista violar qualquer disposição do contrato social, com relevo para o preceituado no artigo sexto; g) Nos demais casos previstos na lei. 2. O exercício do direito de amortização de ações pela sociedade é da competência da Assembleia Geral. 3. A deliberação sobre o exercício do direito de amortização deve ser tomada por maioria dos votos emitidos, não cabendo direito de voto às ações objeto de decisão. 4. A Assembleia Geral deverá exercer aquele direito no prazo de sessenta dias contados do final do prazo referido no número 1 do presente artigo. 5. A amortização considera-se efetuada mediante a comunicação da deliberação respetiva ao acionista ou ao terceiro por ela afetado. 6. Salvo o caso de acordo das partes em contrário, o valor da amortização de ações é calculado nos termos das regras estabelecidas no n.º 2 do artigo 105.º do Código das Sociedades Comerciais. 7. O valor fixado para a amortização das ações será pago pela sociedade em três prestações iguais, vencendo-se a primeira trinta dias após a realização da amortização e as segunda e terceira, respetivamente, seis meses e um ano depois do vencimento daquela”. (cfr. documento 23 junto com o requerimento inicial) 7. A introdução da cláusula mencionada no artigo anterior foi realizada mediante a reformulação integral dos estatutos da Ré, aprovada, por unanimidade dos votos da totalidade do capital social, onde se incluía o Autor, na reunião da Assembleia Geral da ré de 11 de outubro de 2013. (cfr. documento 2 junto com a contestação). 8. No âmbito do processo n.º 1281/18...., que corre os seus termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio – Juiz ..., foi requerido e determinado o arresto, para além do mais, da participação social do Autor na Ré. (cfr. documento 9 junto com a petição inicial, e documentos 7 e 8 juntos com a contestação). 9. Com base no decretamento inicial do arresto das ações do Autor, foi deliberado na assembleia geral da Ré realizada em 15 de abril de 2019, pelas 12 horas, para além do mais, a amortização das ações do Autor a troco de 0 € (zero euros), bem como foi deliberado a redução do capital social de € 23.885.510,00 para € 11.942.755,00 e, após, um aumento de capital social no valor de € 26.000.000,00, passando o capital social de € 11.942.755,00 para € 37.942.755,00 (cfr. documento 1 junto com a petição inicial) . 10. No dia 15 de abril de 2019, pelas dezassete horas e trinta minutos, a sociedade B..., S.A., representada pelos seus administradores, na invocada qualidade de única acionista da Ré, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 54.º do Código das Sociedades Comerciais, deliberou o seguinte: i. Aprovar a eleição das seguintes pessoas para os órgãos sociais (para o triénio 2019-2021): Presidente: CC (…) Vogal: DD Vogal: EE Vogal: FF Vogal: GG Fiscal Único: Efetivo: M... – SROC, S.A. Suplente: HH Mesa da Assembleia Geral: Presidente: BB Secretário: II ii. Mais deliberou que os administradores eleitos não são remunerados pelo exercício dos respetivos cargos e encontram-se dispensados de prestar caução, nos termos do artigo 396.º. n.º 5 do CSC (cfr. documento 3 junto com o requerimento inicial do procedimento cautelar que constitui o ap. B). 11. A 15 de maio de 2019, o Autor intentou contra a Ré ação de anulação das deliberações tomadas junto do Tribunal da Comarca de Viseu, pedindo anulação das deliberações que haviam sido tomadas em Assembleia Geral de dia 15 de abril de 2019, pelas 12 horas, dando origem ao processo n.º 2319/19.... (cfr. documento 10 junto com a petição inicial). 12. Na sequência dessa ação judicial, o Tribunal Judicial da Comarca de Viseu entendeu conceder provimento à ação do Autor e declarou anuladas e nulas as deliberações em causa (cfr. documento 11 junto com a petição inicial). 13. Sentença essa confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, por d. acórdão de 10 de dezembro de 2020 (cfr. documento 12 junto com a petição inicial). 14. Tal acórdão foi, por seu turno, confirmado pelo acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 08/09/2021, transitado em julgado em 23/09/2021 (cfr. documento 13 junto com a petição inicial). 15. Por deliberação ocorrida a 13.07.2020 foi deliberado um novo aumento do capital social da Ré, no valor de € 17.000.000,00, o qual foi impugnado pelo Autor, sem que exista ainda decisão transitada em julgado (cfr. documentos 18 e 20 junto com a contestação). 16. No dia 22 de janeiro de 2021, a Ré promoveu uma Assembleia Geral Extraordinária com vista à renovação da (alegada) amortização das ações do Autor na Ré, bem como a consequente redução de capital, alteração do pacto social, deliberar sobre a contrapartida da amortização e criação de uma reserva legal (cfr. documento 2 junto com a petição inicial). 17. Mais uma vez, com base na invocada inobservância das regras estatutárias relativas ao processo de amortização das ações deliberado na Assembleia supra referida, o Autor deu entrada, no dia 01/02/2021, de Procedimento Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, no Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., sob o processo n.º 424/21.... (cfr. documento 15 junto com a petição inicial). 18. Procedimento esse tendente a suspender as deliberações aí tomadas, onde se inclui a deliberação renovadora da suposta amortização, obter a inversão do contencioso e a invalidade daquelas (cfr. documento 15 junto com a petição inicial). 19. No qual obteve total vencimento de causa, por sentença proferida a 30/04/2021, tendo o Tribunal decretado a suspensão das deliberações tomadas na Assembleia supra indicada, bem como a inversão do contencioso, declarado anuláveis tais deliberações (cfr. documento 16 junto com a petição inicial) . 20. Sentença essa confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, por d. acórdão de 22/09/2021, e transitado em julgado (cfr. documentos 17 e 18 juntos com a petição inicial). 21. No âmbito do processo executivo n.º 27175/20...., movido pela B..., SGPS, SA contra o aqui Autor, a correr termos no Juízo de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa – Juiz ..., com data do dia 26/04/2021, foi elaborado o auto de penhora respeitante a 2.388.551 ações detidas pelo aqui Autor respeitantes à sociedade aqui Ré, depositadas no dossier ...04, do Banco 1..., SA (cfr. documento 15 junto com o requerimento inicial do procedimento cautelar que constitui o ap. B) . 22. No âmbito do referenciado proc. executivo, com data do dia 26/04/2021, foi o aí executado, aqui Autor, notificado para, no prazo de 10 dias deduzir, querendo, oposição à penhora dos bens identificados em anexo a tal notificação, incluindo as mencionadas 2.388.551 ações (cfr. documento 15 junto com o requerimento inicial do procedimento cautelar que constitui o ap. B) . 23. O aqui Autor não deduziu oposição a tal penhora (cfr. documento 15 junto com o requerimento inicial do procedimento cautelar que constitui o ap. B). 24. A Ré enviou ao Autor missiva datada de 29 de janeiro de 2021, a conceder a este o prazo de 90 dias para sanar a situação de penhora das participações sociais do Autor na Ré, resultante do processo executivo n.º 27175/20...., movido pela B..., SGPS, SA contra o aqui Autor, a correr termos no Juízo de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa – Juiz ... (cfr. documento 27 junto com a petição inicial). 25. Por carta datada de 25 de maio de 2021, foi enviada ao Autor a convocatória de nova Assembleia Geral da Ré, agendada para o dia 18 de Junho de 2021, ou, caso não fosse possível a sua realização em tal data, seria realizada no dia 5 de Julho de 2021, destinada, novamente, à amortização das ações do Autor na Ré (agora com fundamento na sua penhora), bem como a consequente redução de capital, alteração do pacto social, deliberar sobre a contrapartida da amortização e criação de uma reserva legal (cfr. documento 22 junto com a petição inicial). 26. Foi realizada tal Assembleia Geral da Ré na segunda data, dia 5 de Julho de 2021, onde o Autor compareceu representado legalmente pelo Dr. JJ (cfr. documento 4 junto com a petição inicial). 27. Em tal Assembleia, com o voto favorável da acionista B... SGPS, S.A., com a menção de que o acionista AA estava impedido de votar, foi deliberado o seguinte: - Quanto ao ponto um da ordem de trabalhos: a amortização das ações representativas do capital social da sociedade ora Ré de que o acionista ora Autor é titular, com fundamento na penhora das participações sociais detidas pelo Autor (ocorrida no âmbito de processo executivo n.º 27175/20.... movido pela B..., SGPS, S.A., que corre termos no Juízo de Execução do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juiz ..., onde o ora Autor é executado), e a consequente redução do capital da sociedade ora Ré – redução de finalidade especial -, nos termos e para os efeitos do artigo 347º do CSC e do art. 7º dos Estatutos da sociedade; - Quanto ao ponto dois da ordem de trabalhos: a alteração do número 1 do Artigo Quarto dos Estatutos da sociedade ora Ré, que passará a ter a seguinte redacção: “O capital social integralmente subscrito e realizado é de EUR 28.942.755, e encontra-se dividido em 5.788.551 ações, de valor nominal de cinco euros cada uma”; - Quanto ao ponto três da ordem de trabalhos: o não pagamento de uma contrapartida ao acionista ora Autor pela amortização de acções deliberada no ponto um da ordem de trabalhos; - Quanto ao ponto quatro da ordem de trabalhos: a alocação do capital reduzido à rubrica de “Outras Variações no Capital Próprio”, e não a criação de uma reserva legal sujeita ao regime da reserva legal. (cfr. documento 4 junto com a petição inicial). 28. Relativamente a tais deliberações, o aqui Autor deu entrada, em 15/07/2021, de Procedimento Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais com pedido de inversão do contencioso, que deu origem ao processo n.º 2769/21...., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., tendente à suspensão das aludidas deliberações e declaração da sua invalidade (cfr. documento 23 junto com o requerimento inicial). 29. O aqui Autor obteve vencimento de causa por sentença datada de 07/11/2021, que declarou suspensas e anuláveis as deliberações adotadas na Assembleia Geral de 05/07/2021 (por violação do Artigo Sétimo dos Estatutos da Ré, nos termos dos artigos 58.º, n.º 1, al. a) e 347.º do CSC), decretando ainda a inversão do contencioso (cfr. documento 24 junto com a petição inicial). 30. Tendo a mesma sido confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 17 de Março de 2022 e Decisão Sumária do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de Julho de 2022, transitada em julgado (cfr. documentos 25 e 26 juntos com a petição inicial). 31. Resultando da inversão do contencioso ali declarada o processo n.º 4632/21...., a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - Juízo de Comércio de Leiria - Juiz ..., o qual se traduz na acção comum proposta por A..., S.A. contra AA, na qual foi peticionado o seguinte: - Ser reconhecido e declarado que inexiste um direito de impugnação por parte do Réu das deliberações adotadas na assembleia geral da Autora de 05.07.2021; - Ser reconhecido e declarado que inexiste qualquer fundamento de invalidade das deliberações adotadas na assembleia geral da Autora de 05.07.2021; - Ser reconhecida e declarada a validade das deliberações adotadas na assembleia geral da Autora de 05.07.2021. 32. A Ré encetou novo procedimento com o objetivo de amortizar, mais uma vez, as ações do Autor com base em arresto, renovando a Deliberação de 22/01/2021 que (alegadamente) renovou a Deliberação de 15/04/2019, ambas declaradas inválidas por sentença transitada em julgado, como supra exposto. 33. Daí tendo resultado convocatória de Assembleia Geral, que se veio a realizar em 16/03/2022, na qual se deliberou: 1) a renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação de 22/01/2021 que aprovou a renovação da deliberação de 15/04/2019 que, por sua vez, aprovou a amortização das ações do Autor, com fundamento no arresto; 2) a consequente redução do capital social da Ré; 3) a renovação, sem efeitos retroativos da deliberação de 22/01/2021 que aprovou a renovação da deliberação de 15/04/2019 que, por sua vez, aprovou a alteração do número 1 do Artigo Quarto dos Estatutos da Sociedade; e 4) a renovação sem efeitos retroativos da deliberação de 22/01/2021 que aprovou a renovação da deliberação de 15/04/2019 que, por sua vez, aprovou constituição de uma reserva sujeita ao regime da reserva legal, no montante equivalente a EUR 11.942.755,00 (cfr. documento 3 junto com a petição inicial). 34. Relativamente a tais deliberações, o aqui Autor deu entrada, em 28/03/2022, de Procedimento Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais com pedido de inversão do contencioso, que deu origem ao processo n.º 1279/22...., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Comércio de Leiria – Juiz ..., tendente à suspensão das aludidas deliberações e declaração da sua invalidade (cfr. documento 20 junto com a petição inicial). 35. Por carta registada datada de 12/11/2021 (mas expedida a 17/11/2021), recebida pelo Autor a 19/11/2021, a Ré notificou o Autor a conceder-lhe (novamente) o prazo de noventa dias para sanação da situação da supra referenciada penhora das ações, nos termos e para os efeitos do artigo 7.º, n.º 1, alínea d), do Contrato de Sociedade da Ré (cfr. documento 27 junto com a petição inicial e documento 42 junto com a contestação). 36. Por carta registada datada de 27.12.2021 (expedida nessa data), recebida pelo Autor a 29/12/2021, a Ré comunicou ao Autor o seguinte: “Na sequência da comunicação enviada a V.Ex.ª por este Conselho de Administração no dia 17 de novembro de 2021, por carta, para sanar, no prazo de noventa dias, a penhora que permite a amortização das ações da A..., S.A. (“A...”), vimos por este meio, na qualidade de membros do Conselho de Administração e em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 105.º do Código das Sociedades Comerciais, aplicável ex vi Artigo Sétimo, n.º 6, dos Estatutos da A..., solicitar que V.Ex.ª proponha, no prazo de 10 dias, a contar da receção da presente carta, um Revisor Oficial de Contas independente para o cálculo da contrapartida a pagar pela A... na sequência da amortização das ações detidas por V.Ex.ª.” (cfr. documento 28 junto com a petição inicial). 37. O Autor não procedeu à sanação da referenciada situação de penhora de acções. 38. Na sequência, a Ré promoveu convocatória de Assembleia Geral, a realizar-se em 28/03/2022 ou 14/04/2022, com vista a: “Ponto Um: Deliberar sobre a renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação de 5 de julho de 2021 que aprovou a amortização das ações representativas do capital social da Sociedade detidas por AA, com fundamento na sua penhora, e sobre a consequente redução do capital social da Sociedade – redução de finalidade especial – de EUR 40.885.510,00 para EUR 28.942.755,00, nos termos e para os efeitos do artigo 347.º do Código das Sociedades Comerciais (“CSC”) e do artigo 7.º dos Estatutos da Sociedade – e, subsidiariamente, deliberar a mencionada amortização e correspondente redução de capital; Ponto Dois: Deliberar sobre a renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação de 5 de julho de 2021 que aprovou a alteração do n.º 1 do artigo 4.º dos Estatutos da Sociedade, que passou a ter a seguinte redação: “O capital social integralmente subscrito e realizado é de EUR 28.942.755,00, e encontra-se dividido em 5.788.511 ações, de valor nominal de cinco euros cada uma” – e, subsidiariamente, deliberar a mencionada alteração aos Estatutos; e Ponto Três: Deliberar sobre a constituição de uma reserva sujeita ao regime da reserva legal, no montante equivalente a EUR 11.942.755,00, nos termos e para os efeitos do artigo 347.º do CSC.” (cfr. documento 29 junto com a petição inicial). 39. Tal Assembleia Geral foi convocada pelo Sr. Dr. BB, na qualidade de Presidente Interino da Mesa da Assembleia Geral, e em tal convocatória, datada de 04/03/2022, constava nos elementos identificativos da sociedade Ré, para além do mais, como capital social o valor de € 40.885.510,00 (cfr. documento 29 junto com a petição inicial). 40. Tal Assembleia Geral veio a celebrar-se no dia 28 de março de 2022, tendo aí o Autor sido representado pela Dra. KK, e a acionista B..., SGPS, S.A. foi representada pelo Dr. LL, sendo que em tal assembleia, com o voto favorável da acionista B..., foi deliberado o seguinte: 1) – Quanto ao ponto Um da ordem de trabalhos: «(i) a renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação de 5 de julho de 2021 que aprovou a amortização das ações representativas do capital social da Sociedade detidas por AA, com fundamento na sua penhora, e (ii) a consequente renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação que aprovou a redução do capital social da Sociedade – redução de finalidade especial – de EUR 40.885.510,00 para EUR 28.942.755,00, nos termos e para os efeitos do artigo 347.º do CSC e do artigo 7.º dos Estatutos da Sociedade, e, subsidiariamente, (iii) a amortização ex novo das ações representativas do capital social da Sociedade detidas pelo Sr. AA, com fundamento na sua penhora, e (iv) a consequente redução, também ex novo, do capital social da Sociedade – redução de finalidade especial – de EUR 40.885.510,00 para EUR 28.942.755,00, nos termos e para os efeitos do artigo 347.º do CSC e do artigo 7.º dos Estatutos da Sociedade»; 2) – Quanto ao ponto Dois da ordem de trabalhos: «(i) a renovação, sem efeitos retroativos, da deliberação de 5 de julho de 2021 que aprovou a alteração do número 1 do Artigo Quarto dos Estatutos da Sociedade, que passou a ter a seguinte redação: “O capital social integralmente subscrito e realizado é de EUR 28.942.755,00, e encontra-se dividido em 5.788.511 ações, de valor nominal de cinco euros cada uma”, e, subsidiariamente, (ii) a alteração ex novo do número 1 do artigo 4º dos Estatutos da Sociedade, que passará a ter a seguinte redação: “O capital social integralmente subscrito e realizado é de EUR 28.942.755,00, e encontra-se dividido em 5.788.511 ações, de valor nominal de cinco euros cada uma”»; 3) – Quanto ao ponto Três da ordem de trabalhos: «a constituição de uma reserva sujeita ao regime da reserva legal de montante equivalente à soma do valor nominal das ações amortizadas, portanto equivalente a EUR 11.942.755,00, em cumprimento do disposto na alínea b) do nº 7 do artigo 347.º do CSC.». (cfr. documento 5 junto com a petição inicial). 41. Na referida assembleia geral de 28/03/2022 foi, antes da tomada de deliberações, discutido o tema do capital social da Ré, nos termos constantes da respectiva acta, tendo após tal discussão, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral considerado o seguinte sobre tal tema: «atendendo ao impedimento quanto ao exercício de direito de voto pelo Sr. AA nas matérias a deliberar na presente reunião da Assembleia Geral, e uma vez que as variações no valor do capital social resultam de ações judiciais em que todos os acionistas são parte ou têm conhecimento, o importante seria assegurar que todos os acionistas têm direito de participar na reunião e exprimir a sua opinião quanto às matérias sob discussão, o que se encontra plenamente garantido. Desta forma, concluiu não existem irregularidades na reunião, nem falta de informação ao dispor dos acionistas. Esclarece-se que, para efeitos da proposta, o capital que está a ser considerado é o que consta da convocatória, ou seja, EUR 40.885.510,00» (cfr. documento 5 junto com a petição inicial). 42. Em Assembleia Geral da Ré de 22.04.2016 foram eleitos para os cargos de Presidente e Secretário da Mesa da Assembleia Geral da Ré para o triénio de 2016/2018: o Sr. Dr. MM – para o cargo de Presidente e o Sr. Dr. BB – para o cargo de Secretário (cfr. documento 45 junto com a contestação). 43. Por carta datada do dia 02.11.2017, o Sr. Dr. MM renunciou ao cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral (cfr. documento 46 junto com a contestação). 44. Nos termos do artigo Décimo dos Estatutos da Ré “A Mesa da Assembleia Geral é composta por um Presidente e um Secretário, podendo qualquer deles ser ou não acionista” (cfr. documento 30 junto com a petição inicial). 45. Nos autos de procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais, que correu termos no Juízo de Comércio de Viseu sob o n.º 3635/18....-A, e na ação de processo comum de anulação de deliberações sociais, que correu termos no mesmo Juízo de Comércio sob o n.º 3635/18...., foi decidido, com trânsito em julgado, que BB tinha legitimidade, enquanto Presidente da Mesa da Assembleia Geral Interino da Sociedade aqui Ré, para exercer tais funções (cfr. documentos 48 e 49 juntos com a oposição). 46. Nos referidos autos de procedimento cautelar foi entendido (mais concretamente no d. acórdão da Relação de Coimbra aí proferido a 20/02/2019), para além do mais, que «Assim, na falta do presidente da mesa da assembleia geral da Ré (que havia renunciado ao cargo) e não existindo – porque não havia sido eleito – vice-presidente, cabia, efetivamente, ao secretário da mesa (eleito) assumir as funções de presidente da mesa. E cabendo ao secretário assumir e exercer as funções de presidente da mesa da assembleia geral, também tinha competência, nessa qualidade, para convocar a assembleia geral (cfr. artigo 377.º, n. º 1, do C.S.C.) Assim, porque o Apelante foi convocado para a Assembleia por carta subscrita pelo secretário da mesa, na qualidade de presidente interino da mesa da assembleia geral, impõe-se concluir que o Apelante foi regularmente convocado para a aludida Assembleia (a convocatória foi subscrita por quem detinha, naquele momento, a competência para o efeito e não foi invocada qualquer outra circunstância que seja suscetível de afetar a regularidade dessa convocatória).» (cfr. documento 48 junto com a contestação). 47. Nos autos principais de ação comum identificados em 45. (mais concretamente na d. sentença aí proferida a 26/03/2019) foi, para além do mais, entendido que «(…) No caso em apreço, o contrato social não contém nenhuma previsão sobre a falta do presidente eleito da mesa da assembleia geral. O pacto social não prevê a existência de um vice-presidente, mas prevê a existência de um secretário da mesa. O secretário foi eleito para o triénio de 2016 a 2018 e exercia funções quando o presidente da mesa renunciou ao cargo em novembro de 2017. Aquele passou, por isso, a assumir funções de presidente interino da mesa da assembleia a partir dessa data. (…) A convocatória não tem qualquer vício que a invalide e foi emitida no uso de um poder próprio do presidente em exercício (mesmo que interinamente) da mesa da assembleia geral (artigo 377.º, n.º1)» (cfr. documento 49 junto com a contestação). 48. Tal procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais e açção comum de anulação de deliberações sociais, identificados em 45., foram intentados pelo aqui Autor, AA, contra a aqui sociedade Ré (cfr. documentos 48 e 49 juntos com a contestação). * B) – Factos Não Provados Com relevo para a decisão da causa não ficaram por provar quaisquer factos. * Avaliando. Nos termos da norma do artigo 347.º do Código das Sociedades Comerciais- será o diploma a citar sem menção de origem: O contrato de sociedade pode impor ou permitir que, em certos casos e sem consentimento dos seus titulares, sejam amortizadas acções. 2 - A amortização de acções nos termos deste artigo implica sempre a redução do capital da sociedade, extinguindo-se as acções amortizadas na data da redução do capital. 3 - Os factos que imponham ou permitam a amortização devem ser concretamente definidos no contrato de sociedade. 4 - No caso de a amortização ser imposta pelo contrato de sociedade, deve este fixar todas as condições essenciais para que a operação possa ser efectuada, competindo ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo apenas declarar, nos 90 dias posteriores ao conhecimento que tenha do facto, que as acções são amortizadas nos termos do contrato e dar execução ao que para o caso estiver disposto. 5 - No caso de a amortização ser permitida pelo contrato de sociedade, compete à assembleia geral deliberar a amortização e fixar as condições necessárias para que a operação seja efectuada na parte que não constar do contrato. 6 - Sendo a amortização permitida pelo contrato de sociedade, pode este fixar um prazo, não superior a um ano, para a deliberação ser tomada; na falta de disposição contratual, esse prazo será de seis meses a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização. 7 - À redução de capital por amortização de acções nos termos deste artigo aplica-se o disposto no artigo 95.º, excepto: a) Se forem amortizadas acções inteiramente liberadas, postas à disposição da sociedade, a título gratuito; b) Se para a amortização de acções inteiramente liberadas forem unicamente utilizados fundos que, nos termos dos artigos 32.º e 33.º, possam ser distribuídos aos accionistas; neste caso, deve ser criada uma reserva sujeita ao regime de reserva legal, de montante equivalente à soma do valor nominal das acções amortizadas. E determina a norma do artigo 62.º: 1.Uma deliberação nula por força das alíneas a) - Tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados - e b) - Tomadas mediante voto escrito sem que todos os sócios com direito de voto tenham sido convidados a exercer esse direito, a não ser que todos eles tenham dado por escrito o seu voto - do n.º 1, do artigo 56.º pode ser renovada por outra deliberação e esta pode ser atribuída eficácia retroativa, ressalvados os direitos de terceiros. 2.A anulabilidade cessa quando os sócios renovem a deliberação anulável mediante outra deliberação, desde que esta não enferme do vício da precedente. O sócio, porém, que nisso tiver um interesse atendível pode obter anulação da primeira deliberação, relativamente ao período anterior à deliberação renovatória. 3.O tribunal em que tenha sido impugnada uma deliberação pode conceder prazo à sociedade, a requerimento desta, para renovar a deliberação. 1.Da (in) admissibilidade da renovação da Deliberação de 05.07.2021; A este respeito, invoca o Autor/Apelante a inadmissibilidade da renovação das deliberações de 05.07.2021, face à circunstância de as mesmas se encontrarem afectadas por vício de conteúdo - que determinou a respetiva anulação - e, como tal, são insusceptíveis de renovação, o que conduz à invalidade da deliberação – renovatória - de 28.03.2022. A Ré/Apelada, por seu turno, defende que as deliberações de 05.07.2021 são passíveis de renovação, independentemente de se entender que as mesmas se encontram afectadas por vício de conteúdo ou por vício de procedimento. Sustenta ainda a Ré a possibilidade de renovar uma deliberação renovadora. Mais alega a recorrida que - acatando as decisões dos Tribunais, com o intuito de cumprir os seus Estatutos e suprir os vícios apontados - concedeu ao ora Apelante novo prazo de 90 dias para sanar a situação de penhora, vindo, em Assembleia Geral convocada para o dia 28.03.2022, a deliberar a renovação das Deliberações de 05.07.2021 através das deliberações de 28.03.2022 - que constituem o objeto do presente recurso -, concluindo que as deliberações renovatórias não padecem dos vícios anteriormente apontados sendo, por isso, válidas e aptas a sanar a invalidade das deliberações datadas de 05.07.2021. Será assim? As deliberações sociais, para efeito da respectiva impugnação, estão arrumadas no CSC como nulas e anuláveis, às primeiras se referindo os artigos 56º e 57º e às segundas se referindo os artigos 58º e 59º. O artigo 56º, nº1, do Código das Sociedades Comerciais estabelece, taxativamente, os casos de deliberações sociais nulas, que são as: a) Tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados; b) Tomadas mediante voto escrito sem que todos os sócios com direito de voto tenham sido convidados a exercer esse direito, a não ser que todos eles tenham dado por escrito o seu voto; c) Cujo conteúdo não esteja, por natureza, sujeito a deliberação dos sócios; d) Cujo conteúdo, directamente ou por actos de outros órgãos que determine ou permita, seja ofensivo dos bons costumes ou de preceitos legais que não possam ser derrogados, nem sequer por vontade unânime dos sócios”. O artigo 58º, nº1, do Código das Sociedades Comerciais, estabelece taxativamente os casos de deliberações sociais anuláveis, que são aquelas que: a) Violem disposições quer da lei, quando ao caso não caiba a nulidade, nos termos do artigo 56º, quer do contrato de sociedade; b) Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmas sem os votos abusivos; c) Não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação – conforme definidos pelo nº4 desse preceito. Como é sabido, para determinar as deliberações inválidas – ineficazes (art.55º), nulas (art.56º) ou anuláveis (art.58º) - o código atende à espécie de vício de que enfermam e a natureza das normas que são ofendidas – como se escreve no Código das Sociedades Comerciais em Comentário, coordenado por Jorge M. Coutinho de Abreu, Almedina, 2.ª edição, Volume 1, p. 690, no artigo 56º do Código das Sociedades Comerciais, os vícios em causa serão ou de procedimento – relativos ao modo ou processo elegido para formar a deliberação, ao «como» se decidiu – ou de conteúdo – atinentes à regulamentação ou disciplina estabelecidas pela deliberação, ao que «foi» decidido.Quanto às normas desrespeitadas relevam as normas (e princípios) legais, e o seu eventual carácter imperativo, e ainda, como não poderia deixar de ser, as normas estatutárias. Em tal escrito pode ainda ler-se que a renovação da deliberação consiste “na substituição” de uma deliberação social “por outra de conteúdo idêntico, mas sem os vícios (de procedimento) reais ou supostos, que tornam aquela inválida ou de validade duvidosa”. Assim, as nulidades previstas nas alíneas a) e b) do artº 56º - deliberações tomadas em assembleia geral não convocada e deliberações tomadas mediante voto escrito sem que todos os sócios com direito a voto tenham sido convidados a exercer esse direito - não se configuram como nulidades puras, uma vez que admitem renovação da deliberação, ou seja, a substituição de uma deliberação inválida por uma nova deliberação, que não esteja afectada pelo vício da anterior e que venha a absorver o seu conteúdo e a tomar o seu lugar. No que concerne à renovação das deliberações anuláveis, o art. 62º, nº 2, do CSC, não exclui expressamente a possibilidade de renovação das deliberações anuláveis por vício de conteúdo, impondo apenas que a deliberação não enferme do vício da precedente. Em termos substantivos, a deliberação renovadora é uma nova deliberação que se pretende extirpada dos vícios da primitiva deliberação, passando os efeitos, idênticos aos da deliberação primitiva, a ser imputáveis e reportados à deliberação renovadora, ou seja, a regra é a deliberação renovadora repetir e substituir a deliberação primitiva, ocupando por defeito retroativamente o seu lugar – nestes precisos termos o Acórdão do STJ de 22.09.2001, pesquisável www.dgsi.pt.jstj, proc. n.º 675/10.2TBPTS.L1.S1. Assim, havendo um acto da sociedade - a deliberação renovadora - que deste modo retira valor à primitiva deliberação, a decisão do juiz que se debruce sobre um pedido de impugnação da primitiva deliberação, debruça-se sobre um acto que não é já sequer uma manifestação da vontade social. Na síntese de Coutinho de Abreu, - Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Almedina, vol. I, pg. 707 -, “a renovação de uma deliberação consiste, pois, na substituição desta por outra de conteúdo idêntico mas sem os vícios (de procedimento), reais ou supostos, que tornam aquela inválida ou de validade duvidosa”. Pinto Furtado - Deliberações de Sociedades Comerciais, Almedina, pg. 860 -, escreve: “não se se trata, portanto, duma convalidação jurídica da deliberação viciada; logo, o meio legal em presença não integra uma confirmação através de uma ato com a natureza jurídica de renúncia à arguição do vício – mas uma nova deliberação, decalcada sobre a primeira, sem o vício que a inquinava (daí, talvez, o chamar-se-lhe renovação, pois a segunda deliberação é uma cópia corrigida da anterior e, obviamente, por paridade de razão, sem enfermar de outro vício), para substituí-la e ocupar o lugar dela, desde agora ou mesmo retroativamente. (…) Deste modo, assim como a sociedade pode deliberar de modo inovador, assim poderá também reconsiderar sobre uma deliberação anterior e alterá-la, suspendê-la, revoga-la ou ─ e aqui entra o fenómeno da renovação ─ aprovar outra isenta de mácula, e preenchendo o essencial do seu conteúdo para ocupar o seu lugar, ex nunc, ou mesmo, ex tunc se for esta a solução eleita”. Quando é tomada com efeitos retroactivos, a deliberação renovatória substitui a deliberação anterior, eliminando-a e passando a ocupar o seu lugar e, dado tal efeito substitutivo, todos os efeitos se passam a reportar à nova deliberação, deixando a deliberação inicial substituída de existir. Ponto essencial da deliberação renovadora é, pois, que esta não enferme do vício da precedente, para utilizar a expressão legal. Como escreve a 1.ª instância, argumentária que seguimos: “O Prof. Coutinho de Abreu, em relação à situação dos presentes autos, considera que a deliberação de amortização das acções do A. tomada pela Ré a 05/07/2021 é anulável porque anti-estatutária (art. 58º, nº 1, al. a), do CSC) por vício de procedimento (e não por vício de conteúdo), pelo que pode ser renovada. Mas defende também que «Se se considerasse que a deliberação de amortização adoptada em 05/07/2021 enfermava, não de um vício de procedimento, mas de um vício de conteúdo (ou também de conteúdo), uma deliberação posterior que pretendesse superar esse vício não seria propriamente de renovação. Seria uma declaração substituta-revogatória a que, todavia, se aplicava por analogia o disposto no nº 2 do art. 62º do CSC, cessando igualmente, portanto, a anulabilidade da deliberação precedente.» – cfr. d. parecer datado de 20/04/2022, junto com a contestação como doc. 50, págs. 9 e 10, e nota de rodapé 6. Também MANUEL CARNEIRO DA FRADA parece perfilhar da referida opinião para a generalidade das situações quando escreve o seguinte: "estabelece por seu turno o nº 2 do art. 62º a possibilidade de renovação de deliberações anuláveis. Nos termos amplos com que a disposição aparece redigida pareceria que toda e qualquer deliberação anulada seria renovável e que então "a anulabilidade (da deliberação precedente) cessaria" (cfr. texto da norma). Mas não é assim. Para que se possa falar de uma renovação regular de deliberação anulável será necessário que a deliberação não enferme do vício da antecedente, sendo também necessário que o seu conteúdo coincida no essencial com o conteúdo da antecedente. Similarmente ao que se passa no domínio da renovação das deliberações nulas por vício de conteúdo, quando foi o conteúdo da deliberação antecedente que determinou a anulabilidade, é necessário que a deliberação renovatória evite a ofensa das regras que geram a anulabilidade. Mas quando a alteração do conteúdo ultrapassa certos limites, já não estaremos diante de uma verdadeira e própria renovação. O objecto de eleição da renovação de deliberações anuláveis, é constituído por aquelas deliberações cujo vicio diga respeito ao procedimento deliberativo” (Renovação de Deliberações Sociais, Separata do Vol. LXI do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, pág. 19). (…) Na esteira destas últimas posições doutrinárias, este Tribunal entende também que nalguns casos é possível a renovação de deliberações anuláveis por vício de conteúdo, o que sucede com as referenciadas deliberações tomadas pela sociedade Ré na assembleia geral de 05/07/2021. Neste sentido se pronunciou também o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/11/2022, proferido no procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais nº 1458/22...., proposto como preliminar da presente acção principal e actualmente apensado à mesma sob o apenso B (sendo que uma cópia de tal d. acórdão foi junta ao presente processo principal através do requerimento do A. de 06/12/2022). Mais concretamente, nas págs. 72 a 74 de tal d. acórdão é referido o seguinte: «No entender deste tribunal, não é de excluir, no entanto, a hipótese de renovação válida de uma deliberação anulável por um vício respeitante ao seu conteúdo. O caso dos autos constitui um exemplo do que se acaba de afirmar. Vejamos. A deliberação de amortização das acções do Autor, ora recorrente, tomada em 5-07-2021 foi anulada, em síntese, porque a amortização das acções com fundamento na respectiva penhora pressupunha, segundo os estatutos, por um lado, a penhora consolidada das acções e, por outro que, após a consolidação da penhora, a situação fosse comunicada ao sócio e se mantivesse 90 dias após tal comunicação. Sucedeu que, quando a deliberação foi tomada em 5-07-2021, apesar de a penhora já se encontrar consolidada na altura (a consolidação ocorreu em 6-05-2021), faltava uma condição para que a assembleia pudesse deliberar validamente a amortização das acções: a comunicação da penhora, após a consolidação ao sócio, e a manutenção da penhora das acções noventa dias após tal comunicação. A falta de verificação desta condição inquinava o conteúdo da deliberação. E inquinava o conteúdo porque, seguindo a lição de Vasco da Gama Lobo Xavier, entendemos por conteúdo “regulamentação de interesses a que o acto dá vida…” [Anulação de Deliberação Social e Deliberações Conexas, Atlântida Editora, página 384, nota 3] e a regulamentação de interesses a que a deliberação dava vida – isto é, a amortização das acções – não era válida sem a comunicação, ao sócio, da penhora já consolidada e a manutenção da situação noventa dias após a comunicação. Sucede que a falta desta condição, aquando da deliberação tomada em 5-07-2021, não impedia nova regulamentação de interesses sobre a mesma questão. Por um lado, após a deliberação tomada em 5-07-2021 o poder de os sócios deliberarem sobre a amortização das acções com fundamento na penhora das acções não se esgotara. Eles continuavam a poder deliberar sobre a amortização das acções. Por outro lado, como a improcedência de uma acção por não estar verificada uma condição ou por não se ter praticado determinado facto não impede que o pedido se renove quando a condição se verifique ou o facto se pratique (artigo 621.º do CPC), também a circunstância de a sociedade não haver comunicado ao sócio após a consolidação da penhora tal facto e de ele se manter durante noventa dias, aquando da primeira deliberação, não impedia a renovação da deliberação após a sociedade dar cumprimento ao prescrito nos estatutos. Em suma, os vícios imputados à deliberação de 5-07-2021 eram susceptíveis de se supridos. Assim, o facto de tal deliberação ter sido anulada com o fundamento de que a sociedade não havia comunicado ao sócio, após a comunicação da penhora, tal situação e a manutenção da penhora por 90 dias após a comunicação, não impedia só por si que, efectuada a comunicação e mantida a penhora durante os 90 dias subsequentes, a sociedade pudesse renovar a deliberação de amortização das acções.». De facto, como resulta da decisão proferida nos autos de procedimento cautelar n.º 2769/21.... (referida no facto provado 29), as deliberações de 05.07.2021 que foram judicialmente anuladas (agora objeto de renovação através das deliberações de 28/03/2022, que constituem o objecto dos presentes autos), padeciam, não de vício formal ou de procedimento, mas de vício de conteúdo, uma vez que o cumprimento do disposto nos nºs 1, 4 e 6 do artigo sétimo do contrato social da Ré também pressupunha a consolidação da referenciada penhora, sem que a atinente omissão se possa ter por sanada, pelo que se considerou em tal decisão que as deliberações adotadas na assembleia geral da Ré de 05.07.2021, por violarem o disposto no art. 7º dos Estatutos, são anuláveis, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 58.º, n.º1, al. a) e 347.º, do CSC. Assim também foi entendido no douto Acórdão do TRC de 17/03/2022 (referido no facto provado 30), que confirmou a decisão proferida em primeira instância no referido procedimento cautelar n.º 2769/21..... Também foi adoptado entendimento semelhante na sentença e no acórdão da Relação de Coimbra proferidos no âmbito do procedimento cautelar nº 424/21...., mencionado nos factos provados 17 a 20. Em tal procedimento foi considerado, na sentença da 1ª instância, que a deliberação de 15.04.2019 que foi judicialmente anulada e alegadamente objeto de renovação, padecia, não de vício formal ou de procedimento, mas de vício de conteúdo, uma vez que o direito potestativo de amortização (nesse processo, o trânsito em julgado do arresto), ainda não existia aquando da sua ocorrência. Igual posição foi assumida no douto Acórdão do TRC de 22/09/2021, que confirmou tal decisão proferida na primeira instância, ao escrever-se o seguinte: “(…) Conforme resulta da sentença a que se reporta o ponto 38 da matéria de facto e do acórdão que a confirmou, aquela deliberação (de 15 de Abril de 2019) foi anulada por se ter entendido que o direito potestativo de amortização ainda não se havia constituído quando a Ré deu início ao procedimento que teve o seu epílogo com a deliberação de 15/04/2019, ali se considerando que o direito só se havia constituído em 02/07/2019 com o trânsito em julgado da decisão que decretou o arresto. Ainda que tal decisão não tenha transitado em julgado – como diz a Apelante – é esse o vício a que importa aqui atender, uma vez que foi esse vício que se pretendeu sanar com a deliberação renovatória que está em causa nos presentes autos. Ora, esse vício era um vício referente ao conteúdo da deliberação; o vício não tinha qualquer relação com o processo formativo da deliberação (com a convocação da assembleia, com os procedimentos da sua realização, com o exercício dos direitos de voto ou com o processo de cálculo e apuramento da maioria exigida para a aprovação), mas sim com o seu conteúdo, na medida em que havia deliberado a amortização das acções do Autor sem que, à data, estivessem reunidos os pressupostos que, de acordo com o respectivo contrato social, eram necessários para o efeito; ou seja, a Ré não tinha, à data, o direito a tal amortização. Era – claramente, na nossa perspectiva – o conteúdo da deliberação que estava afectado e viciado. Pouco interessa dizer – como diz a Apelante – que a amortização das acções seja, em abstracto, válida e possível; a deliberação inválida no que toca ao seu conteúdo não é apenas a deliberação cujo conteúdo é (em abstracto e sempre) impossível ou legalmente inadmissível; também é inválida no seu conteúdo a deliberação cujo conteúdo, apesar de abstractamente possível e legal, não está, no caso concreto e nas concretas circunstâncias, em conformidade com a lei ou com os estatutos. Não obstante esse facto, poder-se-á admitir que a deliberação em causa pudesse ser renovada. Com efeito, na medida em que a lei não restringe de modo expresso a possibilidade de renovação de deliberações anuláveis por vício de conteúdo, a questão está apenas em saber se, ao renovar a deliberação anterior, a deliberação renovadora fica (ou não) afectada do mesmo vício de conteúdo de que padecia a anterior, como acontecerá por regra, embora se possa admitir que nem sempre assim aconteça.”. E na linha de tal entendimento, entendemos nós também que, na situação sub judice, só com a consolidação da referenciada penhora é que seria possível (e oportuno) proceder às diligências necessárias à amortização, incluindo as comunicações a que aludem os n.ºs 1 e 6, do artigo 7.º do contrato social, com o necessário cumprimento de todo o procedimento destinado à amortização das ações. Pois, ao considerar-se a penhora como consolidada ou definitiva sem audiência do executado, existe, naturalmente, o risco de ela ser infundada e de vir a ser levantada e, portanto, a amortização das ações por mero efeito de uma tutela provisória iria significar a possibilidade efetiva do Autor, sócio e acionista da Ré, ser desapossado das suas ações e da sua posição na sociedade por via de uma penhora totalmente injustificada que, logo depois, viria a ser levantada. Neste sentido, com as devidas adaptações, se julgou no âmbito da acção de anulação de deliberações sociais, referida nos factos provados 11. a 14. (quer em primeira, quer em segunda instância, quer no Supremo Tribunal de Justiça), bem como no âmbito do procedimento cautelar referido nos factos provados 17. a 20. (quer em primeira, quer em segunda instância). De facto, em tal acção e em tal procedimento, foi exaustivamente interpretado o disposto no art. 7º dos Estatutos da sociedade Ré, tendo-se concluído que deve valer a seguinte interpretação, condensada no sumário do d. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/09/2021 (proferido no âmbito do proc. nº 2319/9...., entretanto publicado no sítio www.dgsi.pt) do seguinte modo: «(…) III - Autorizando o contrato de sociedade a amortização compulsiva de participações sociais em caso de arresto das mesmas, a interpretação adequada dessa cláusula nos termos do art. 236.º do CC vai no sentido de que o arresto deve estar coberto por uma decisão transitada em julgado, por ser assim que a declaração seria percecionada ou inteligida por um declaratário normal. IV - Tendo sido deliberada a amortização de ações num momento em que ainda não havia transitado em julgado a decisão que decretou o arresto, não observou a deliberação o estabelecido no contrato de sociedade, razão pela qual é inválida, como inválidas são as deliberações sucedâneas tomadas. (…)». Em tal d. aresto do Supremo Tribunal de Justiça é feito até um paralelismo do fundamento de amortização aí concretamente apreciado (o arresto das mesmas acções do aqui A.) com o fundamento de amortização em apreço nestes autos (a penhora das referenciadas acções), paralelismo esse com o qual se concorda inteiramente, traduzido do seguinte modo: «É certo que o contrato de sociedade da Ré também autoriza a amortização compulsiva de participações sociais em caso de penhora destas, mas, talqualmente sucede com o arresto, a boa interpretação dessa estatuição deve ir no sentido de que a penhora só pode haver-se como operante para a amortização quando esteja juridicamente consolidada, não enquanto a sua bondade ou legalidade estiver a ser discutida judicialmente.» (cfr. pág. 39 do referido d. Acórdão do STJ). Desta feita, e como já referido, o direito potestativo de amortização das ações do aqui A., por força da consolidação da penhora, só se constitui em 06/05/2021, data em que terminou o prazo para o executado, aqui A., deduzir oposição à penhora, razão pela qual só a partir de tal data esta se tornou definitiva, inoponível, inatacável, do ponto de vista jurídico-processual. E como tal, desde a constituição de tal direito potestativo (ou seja, desde 06/05/2021), não estava a Ré desonerada de cumprir todos os procedimentos conducentes à amortização das ações, mormente, o disposto no artigo 7.º, n.ºs 1 e 6, dos Estatutos, e no artigo 105.º, n.º 2, do C.S.C., não podendo ter-se por cumprido tal procedimento com a comunicação marcadamente prematura realizada em 29 de janeiro de 2021. Só com a referida consolidação da penhora é que era possível (e oportuno) proceder às diligências necessárias à amortização, incluindo as comunicações a que aludem os n.ºs 1 e 6 do artigo 7.º, do contrato social, com o necessário cumprimento de todo o procedimento destinado à amortização das ações (o que só agora foi feito regularmente). (…) Improcedendo, nesta parte, e pelas razões expostas, a invocada anulabilidade das deliberações renovadoras em mérito, por vício de conteúdo. Cumpre salientar que, mesmo que se considerasse (o que não é o caso) que a Deliberação de 05.07.2021 não era passível de renovação e, portanto, que, nessa medida, a Deliberação de Renovação de 28.03.2022 é inválida, o certo é que resulta da factualidade provada que na assembleia geral da Ré de 28.03.2022 foi também adotada, a título subsidiário, a Deliberação de Amortização ex novo. Ora, esta Deliberação de Amortização ex novo não padece, em bom rigor, de quaisquer dos vícios apontados pelo Autor à Deliberação de Renovação, uma vez que foi adotada após a consolidação da penhora e depois da concessão de um prazo de 90 dias ao Autor para sanar a penhora sobre as ações, sem que o Autor o tenha feito, prazo este que foi concedido depois da consolidação da penhora. Desta feita, sempre valeria, de modo pleno e autónomo, esta Deliberação de Amortização ex novo”. Improcede, pois, a 1.ª conclusão. * 2.Da validade das Deliberações de 28.03.2022; O artigo sétimo do contrato de sociedade da Ré, intitulado amortização de ações tem o seguinte teor: “1. É admitida a amortização compulsiva de ações pela sociedade, sem consentimento do respetivo titular, nos casos que se seguem, sempre que a situação que origine o direito à amortização se mantenha após noventa dias a contar da comunicação pelo Conselho de Administração dessa mesma situação ao acionista em causa: a) Por acordo com o titular das ações; b) Se o acionista for declarado insolvente, interdito, inabilitado ou incapaz; c) Se uma sociedade acionista for dissolvida ou for declarada insolvente; d) Se as ações forem penhoradas, arrestadas ou, por qualquer outra forma, sujeitas a apreensão judicial; e) Se, em caso de divórcio ou de separação judicial do acionista, as respetivas ações forem adjudicadas ao seu cônjuge;f) Se um acionista violar qualquer disposição do contrato social, com relevo para o preceituado no artigo sexto; g) Nos demais casos previstos na lei. 2. O exercício do direito de amortização de ações pela sociedade é da competência da Assembleia Geral. 3. A deliberação sobre o exercício do direito de amortização deve ser tomada por maioria dos votos emitidos, não cabendo direito de voto às ações objeto de decisão. 4. A Assembleia Geral deverá exercer aquele direito no prazo de sessenta dias contados do final do prazo referido no número 1 do presente artigo. 5. A amortização considera-se efetuada mediante a comunicação da deliberação respetiva ao acionista ou ao terceiro por ela afetado. 6. Salvo o caso de acordo das partes em contrário, o valor da amortização de ações é calculado nos termos das regras estabelecidas no n.º 2 do artigo 105.º do Código das Sociedades Comerciais. 7. O valor fixado para a amortização das ações será pago pela sociedade em três prestações iguais, vencendo-se a primeira trinta dias após a realização da amortização e as segunda e terceira, respetivamente, seis meses e um ano depois do vencimento daquela”. Importa averiguar se esta nova deliberação renovadora se encontra ou não afectada do mesmo vício das anteriores, ou seja, se desde a constituição do direito potestativo de amortização das acções, a Ré cumpriu ou não todos procedimentos conducentes à amortização das acções, nomeadamente o exigido na norma do artigo 7.º, n.ºs 1 e 6, dos Estatutos, e no artigo 105.º, n.º 2. Ora, o contrato de sociedade da recorrida permite a amortização compulsiva no caso de penhora de acções, desde que o mesmo se mantenha após noventa dias a contar da comunicação pelo Conselho de Administração dessa mesma situação ao accionista em causa. Por seu turno, nos temos do disposto no artigo 105.º, n. º 2, salvo estipulação diversa do contrato de sociedade ou acordo as partes, a contrapartida da aquisição deve ser calculada nos termos do artigo 1021.º, do Código Civil, com referência ao momento da deliberação de fusão, por um revisor oficial de contas designado por mútuo acordo ou, na falta deste, pelo tribunal. É licito a qualquer das partes requerer segunda avaliação, nos termos do Código do Processo Civil. Como escreve a 1.ª instância, “resulta dos factos provados 21. e 22., para além do mais, que o auto de penhora das acções em apreço só foi elaborado, em cumprimento do disposto no art. 753º, nº 1, do CPC, com data do dia 26/04/2021, data essa em que também foi efectuada a notificação ao executado, aqui A., também prevista na disposição contida no citado artigo, para, no prazo de 10 dias deduzir, querendo, oposição à penhora em apreço. Ora, como explanado a este respeito na sentença de 07/11/2021, proferida no proc. cautelar 2769/21.... (junta como doc. 24 junto com a petição inicial), sendo o fundamento da amortização das acções em mérito a penhora das mesmas, só quando o executado, aqui A., é notificado de que a penhora se efectuou é que tem conhecimento do fundamento contratual da amortização. Tal notificação só ocorreu no dia 26/04/2021. Desta feita, a notificação efectuada pelo Conselho de Administração da Ré ao A., datada de 29 de janeiro de 2021, descrita no facto provado 24., é claramente prematura, pois através dela iniciou o procedimento tendente à amortização das acções do A., ao abrigo do art. 7º dos Estatutos da sociedade Ré, sem estar ainda concretizada a invocada causa que lhe serve de fundamento. De facto, só a partir da notificação efectuada no dia 26/04/2021 é que o executado, ora A., podia opor-se a tal penhora, o que poderia suceder até ao fim do prazo respectivo, ocorrido no dia 06/05/2021.É certo que o A. não deduziu oposição à penhora, mas esta encontrava-se susceptível de alteração ou até de levantamento pelo menos até ao fim do prazo para deduzir tal oposição. Acresce que resulta do disposto no nº 13 do art. 780º do CPC, que as quantias penhoradas no contexto deste artigo (ou os valores mobiliários), “não podem ser entregues ao exequente antes do termo do prazo para a oposição à execução ou à penhora ou, sendo deduzida oposição, antes do trânsito em julgado da respetiva decisão.” (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2020, p. 170), o que reforça a ideia de que, pelo menos até ao fim do prazo para o aqui A. se opor à penhora, esta não se encontrava ainda consolidada. O mesmo é dizer que só após o dia 06/05/2021 se constitui o direito potestativo de amortização em apreço. No entanto, nos termos do citado artigo 7.º, do Contrato de Sociedade da Ré, para que tal direito de amortização possa ser legitimamente exercido pela Ré é ainda necessário que a penhora se mantenha noventa dias depois da comunicação que o Conselho de Administração deve efetuar ao acionista com vista à sanação/regularização da situação. Ora, no caso dos autos, a deliberação renovadora de 28.03.2022 foi antecedida da referida comunicação ao A., o que foi feito por carta datada de 12.11.2021, expedida a 17/11/2021 (portanto, posteriormente à referida data de consolidação da penhora - 06/05/2021), recebida pelo A., nos termos da qual a Ré notificou o Autor a conceder-lhe o prazo de noventa dias para sanação da situação de penhora das ações. A penhora das ações manteve-se à data da deliberação de 28.03.2022. Mais acresce que, por carta datada e expedida a 27.12.2021, recebida pelo Autor, a Ré comunicou ao Autor para que o mesmo propusesse, no prazo de 10 dias, a contar da receção da carta, um Revisor Oficial de Contas independente para o cálculo da contrapartida a pagar pela A... na sequência da amortização das ações. De tal circunstancialismo decorre, a nosso ver, que as deliberações renovadoras de 28.03.2022 não se encontram afetadas do mesmo vício de conteúdo de que padeciam as anteriores (datadas de 05.07.2021), tendo o respetivo vício (de conteúdo) sido sanado pelas referidas comunicações datadas de 12.11.2021 e 27.12.2021. Assim, - Considerando que a lei não impede a possibilidade de renovação de deliberações anuláveis por vício de conteúdo, conquanto a mesma não fique afetada pelo mesmo vício de conteúdo. - Considerando que uma deliberação nula por vícios na sua formação (cf. art. 56°, nº 1, als. a) e b), do CSC) ou uma deliberação anulável pode ser renovada por outra que não enferme do vício da precedente, mesmo após ter sido declarada judicialmente nula, ou anulada por sentença - vid. V. G. Lobo Xavier, in “Anulação de Deliberações Sociais e Deliberações Conexas”, pág. 464, nota 108. - E atentando ainda a que a Ré repetiu todo o procedimento que devia anteceder a amortização das ações do Autor, o que fez através das referidas comunicações datadas de 12.11.2021 e 27.12.2021. Concluímos, pois, que as deliberações em causa (tomadas a 28.03.2022) foram aptas a sanar a invalidade das deliberações de 05.07.2021 - e como tal passíveis de renovação -, sem que as mesmas se encontrem afetadas pelo mesmo vício de conteúdo, nomeadamente, sem que se verifique a violação do disposto no artigo 7.º do contrato de sociedade da Ré, pois foi cabalmente corrigido o procedimento estatutário tendente à amortização das ações, como preconizado, aliás, nas decisões judiciais proferidas no procedimento cautelar nº 2769/21..... Improcedendo, nesta parte, e pelas razões expostas, a invocada anulabilidade das deliberações renovadoras em mérito, por vício de conteúdo. Cumpre salientar que, mesmo que se considerasse (o que não é o caso) que a Deliberação de 05.07.2021 não era passível de renovação e, portanto, que, nessa medida, a Deliberação de Renovação de 28.03.2022 é inválida, o certo é que resulta da factualidade provada que na assembleia geral da Ré de 28.03.2022 foi também adotada, a título subsidiário, a Deliberação de Amortização ex novo. Ora, esta Deliberação de Amortização ex novo não padece, em bom rigor, de quaisquer dos vícios apontados pelo Autor à Deliberação de Renovação, uma vez que foi adotada após a consolidação da penhora e depois da concessão de um prazo de 90 dias ao Autor para sanar a penhora sobre as ações, sem que o Autor o tenha feito, prazo este que foi concedido depois da consolidação da penhora. Desta feita, sempre valeria, de modo pleno e autónomo, esta Deliberação de Amortização ex novo. * 4. À data da deliberação renovatória de 28.03.2022 havia caducado o prazo para a sociedade ré exercer o direito de amortização das acções? A este respeito, muito em síntese e para além do mais, o Apelante/Autor alega que o direito de amortizar as acções já caducou, uma vez que o facto que fundamenta a amortização das ações constitui-se a 06.05.2021 - data da consolidação da penhora - e à data da Assembleia Geral de 28.03.2022 já tinham decorrido mais de 6 meses a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização, que conduz à anulabilidade da deliberação, nos termos dos artigos 58.º, n.º 1, al. a) e 347.º, do CSC. Por seu turno, a Apelada/Ré alega que o direito potestativo de amortização das acções foi efectivamente exercido através da deliberação de 05.07.2021, o que determinou a extinção do prazo de caducidade, nos termos do disposto no artigo 331.º do Código Civil. Avaliando. No caso dos autos, estamos perante amortização feita sem o consentimento do accionista afectado - por isso compulsiva -, competindo aos sócios deliberá-la - art. 347.º n.º 5 - dentro do prazo fixado no estatuto - não superior a um ano - ou no prazo de 6 meses, a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização - art. 347.º n.º 6 -, ou seja, razões de segurança e certeza determinam a fixação dum prazo de caducidade para que a sociedade exerça a faculdade de amortizar - a caducidade encontrará o seu fundamento específico no interesse público da paz familiar e segurança social da circulação, e no interesse da brevidade das relações jurídicas, a limitar o lapso de tempo a partir do qual ou dentro do qual há de assegurar-se a eficácia, de que é condição, mediante o exercício tempestivo do direito, a pôr termo a um estado de sujeição decorrente dos direitos potestativos/ Aníbal de Castro, in A Caducidade pág. 28. Refere-se no Acórdão do STJ de 3.11.2009, pesquisável em www.dgsi.pt, que, como afirma Aníbal de Castro, o impedimento corresponde à efetivação do direito, não gera novo prazo, ficando o direito definido sujeito às disposições que regem a prescrição. Ou antes, esgotando-se ou exaurindo-se, com o exercício, o direito caducável, o que porventura surgir, em consequência desse exercício, ficará sujeito, não ao regime anterior, mas àquele a que houver mister recorrer-se, se for caso disso. O impedimento da caducidade, como se escreveu no ac. S.T.J., de 1998/11/25, não tem como efeito o início de novo prazo, mas o seu afastamento definitivo. Em suma, a caducidade pode ser impedida, ou seja, só a impede a prática, dentro do prazo, do acto a que a lei atribua o efeito impeditivo - art.º 331.ºdo C. Civil - mas não pode ser interrompida ou suspensa. No âmbito do processo n.º 3189/22.4T8LRA.C1, por Acórdão desta Relação de Coimbra de 13.12.2023, pesquisável em www.dgsi.pt, foi decidido que: “ I- A deliberação societária que renova uma deliberação de amortização é, ela própria, uma deliberação de amortização, encontrando-se sujeita aos mesmos requisitos de validade da deliberação que se pretende renovar, designadamente em matéria de caducidade, pelo que sempre teria de ser cumprido o prazo concedido para o direito originário de amortização. II – Doutro modo, a deliberação renovatória apenas ficaria sujeita ao prazo ordinário de prescrição, de 20 anos, o que não se pode aceitar, por poder subverter a segurança e certeza da vida das sociedades e por inerência, dos seus sócios, caso se permitisse que decorridos 5, 10 ou mais anos, se viesse a tomar deliberação renovatória de uma deliberação cujo objeto havia sido a amortização de ações, para além do prazo que a lei estipula para a própria amortização originária. III – Tendo em conta que a caducidade não é impedida pela manifestação de vontade de exercer o direito, só um ato válido tem aptidão para a interromper, sendo ainda que, no caso, nenhuma das deliberações renovatórias foi tomada com eficácia retroativa (existência apenas de sucessão temporal de deliberações e não substituição total de deliberações). Constitui, assim, o nó górdio desta questão o de saber se o prazo de caducidade para a deliberação de amortização ser tomada é o prazo de um ano a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização, previsto na 1ª parte do nº 6 do citado art. 347º como prazo máximo que o contrato de sociedade pode fixar (ou seja, como prazo injuntivo), ou se é o prazo de seis meses, previsto na 2ª parte do mencionado normativo de modo supletivo, ou seja, para aplicar apenas no caso de o contrato de sociedade não regular esta matéria. Na decisão cautelar proferida no ap. B a 14.07.2022, este Tribunal entendeu, a este respeito, que ante a ausência de previsão expressa nos Estatutos da Ré de um específico prazo limite para tomar a deliberação de amortização, que seria aplicável a regra supletiva prevista no artigo 347.º, n.º 6, do C.S.C., que prevê o prazo de 6 meses a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização, sendo que, nestes autos foi aplicado o prazo de um ano. Nas palavras do julgador da 1.ª instância, “após melhor ponderação, este Tribunal entende agora, salvo melhor opinião e o devido respeito por opinião contrária, que na presente situação será aplicável outrossim o prazo injuntivo de caducidade de um ano a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização. (…) Como é sabido, uma vez impedido o prazo de caducidade nos termos do artigo 331.º, n.º 1, do CC, não recomeça um novo prazo de caducidade, mas antes o prazo geral de prescrição. Na situação em apreço, o direito à amortização das acções surgiu na esfera jurídica da Ré no dia 06.05.2021 com a consolidação da penhora, ou seja, cerca de dois meses antes da Deliberação de 05.07.2021. Como bem alega a Ré, a tomada de tal Deliberação constitui uma manifestação indiscutível da vontade da Ré de exercer o direito à amortização das acções, à qual a lei associa a extinção do prazo de caducidade – é essa a ratio legis do artigo 331.º, n.º 1 do CC, a segurança e a certeza jurídica no exercício do direito a que a lei associa um prazo de caducidade. Desta feita, o prazo de caducidade do direito à amortização das acções foi definitivamente impedido com a tomada da Deliberação de 05.07.2021. Por outro lado, salvo o devido respeito e melhor opinião, não deve proceder a alegação do Autor de que as deliberações inválidas não têm aptidão para impedir a caducidade do direito, na medida em que a lei não distingue entre atos válidos e inválidos (e onde a lei não distingue, não deve o intérprete distinguir), bastando a prática do ato — a manifestação de uma intenção inequívoca de exercer o direito — para que um prazo de caducidade fique definitivamente impedido.” Ora, salvo o devido respeito por tal interpretação, entendemos que a razão está do lado do Apelante, quando escreve: 34. Por outro lado, veio ainda a Sentença Recorrida entender que, à data de 28.03.2022, não estava caducado o direito a amortizar, por considerar aplicável o prazo de um ano para exercício do direito à amortização, a contar do facto que a fundamenta, aplicando erroneamente o artigo 347.º, n.º 6 do CSC. 35. Não obstante ter reconhecido que os estatutos não preveem um prazo máximo para o efeito, a contar de tal facto – o que, segundo o referido preceito, determina a aplicação do prazo de 6 meses e não de um ano. 36. Fundamentando a aplicação do prazo de um ano por entender que os prazos procedimentais estipulados no n.º 1 e n.º 4 do artigo 7.º daqueles Estatutos pela Recorrida (90 dias + 60 dias), não se compatibilizariam com o prazo de 6 meses e com o princípio favor societatis. 37. Ora, salvo o devido respeito, tal entendimento encontra-se erróneo. 38. Os Estatutos da Recorrida, apenas preveem um prazo de 90 dias durante o qual a situação que origina o direito à amortização se deve manter, para que a amortização seja admitida, prazo esse a contar da comunicação de tal situação ao acionista, pelo Conselho de Administração (n.º 1 do artigo 7.º dos estatutos). 39. E, findo o prazo de 90 dias, prevê-se um prazo de 60 dias para que a deliberação de amortização seja tomada. 40. Mas nenhum destes prazos se conta a partir do facto que fundamenta a amortização, como exige o n.º 6 do artigo 347.º CSC. 41. O artigo 347.º/6 CSC determina que caso o contrato da sociedade não fixe um prazo (desde que não superior a um ano), a contar do facto que fundamenta a amortização, para a deliberação de amortização ser tomada, é aplicado o prazo supletivo de 6 meses a contar do mesmo facto. 42. Consequentemente, de acordo com o referido preceito e analisando os estatutos da Recorrida, conclui-se que estes não regulam esta questão em matéria de prazos, para efeitos e nos termos exigidos no artigo 347.º, n.º 6 do CSC, motivo pelo qual se deve aplicar o prazo de 6 meses a contar da penhora consolidada em 06.05.2021 (facto que fundamenta a amortização) – que terminaria a 07.11.2021. 43. Ao contrário do que entende a Sentença Recorrida, o prazo de 6 meses não é incompatível com o princípio favor societatis, e é possível conjugar a observância dos dois prazos estatutariamente previstos com o prazo aplicável no caso concreto de 6 meses a contar da consolidação da penhora em 06.05.2021. 44. Foi a sociedade, ora Recorrida, que optou por não estipular, nos estatutos, prazo máximo para deliberar a amortização a contar do facto que a fundamenta, e que, por conseguinte, determinou a aplicação do prazo supletivo de 6 meses nos termos do n.º 6 do artigo 347.º do CSC. 46. Da mesma forma, foi a sociedade, ora Recorrida, que optou por fixar um prazo de 90 dias a contar da comunicação, ao acionista, da situação que fundamenta a amortização, para ser a mesma ser admitida caso a situação, findos esses 90 dias, se mantivesse. 48. E foi também ela que optou por estipular um prazo de 60 dias contados a partir do final dos referidos 90 dias, para exercício do direito à amortização. 49. O objetivo da lei ao exigir a existência de um prazo de caducidade para deliberar a amortização, a contar do facto que a fundamenta (seja não superior a um ano, seja de 6 meses), é evitar um estado de incerteza quanto ao destino das participações sociais suscetíveis de amortização durante muito tempo, por razões de segurança e certeza jurídica. 50. Se os estatutos da Recorrida fixam prazos que se prendem, no fundo, com o procedimento de amortização, mas nenhum deles a contar do facto que fundamenta a amortização, o estado de incerteza que a lei pretende evitar, perdura. 51. Colocando-se em causa a certeza e segurança jurídica que a lei visa assegurar quando estipula prazos de caducidade no artigo 347.º, n.º 6 do CSC. 52. A Recorrida poderia ter estipulado prazos diferentes (menores, caso considerasse, assim, incompatível, na prática, de conjugar com o prazo de 6 meses). 54. Ou poderia ter estipulado prazo máximo para exercer o direito à amortização a contar do facto que a fundamenta, desde que não superior a um ano, caso em que não se aplicaria o prazo de seis meses. 55. 56. Mas não o fez. 58. Foi com base na autonomia privada e com conhecimento da lei aplicável, que os estatutos foram redigidos. 59. Não faz qualquer sentido pugnar pela não aplicação do prazo de 6 meses previsto no n.º 6 do artigo 347.º do CSC, quando se encontram verificadas as condições exigidas para o efeito: os estatutos da Recorrida não preverem um prazo máximo para exercer o direito à amortização, a contar do facto que a fundamenta. 61. E não se aplicar o referido prazo apenas porque a Sociedade optou por fixar prazos não contados a partir do facto que fundamenta a amortização – que, não obstante, são inferiores ao prazo supletivo de 6 meses, permitindo o respeito pelos mesmos e o pelo prazo supletivo! 62. A penhora consolidou-se em 06.05.2021 – a Recorrida poderia, após tal data, proceder no imediato à comunicação prevista no n.º 1 do artigo 7.º dos Estatutos da Recorrida. 63. Poderia a Recorrida enviar a comunicação do n.º 1 do artigo 7.º dos estatutos no dia 10.05.2021, por exemplo;90 dias após aquela data – 09.08.2021 -, mantendo-se a penhora, como se verificou, começaria a contar o prazo de 60 dias para deliberar a amortização; nesse caso, os 60 dias terminariam a 08.10.2021; e o prazo de 6 meses ainda se encontraria a correr – terminando em 17.11.2021. 64. Assim, mesmo no caso de a Sociedade esperar até ao fim dos referidos 60 dias para deliberar a amortização, se conclui que os prazos previstos nos estatutos da Recorrida, seriam perfeitamente compatíveis com o prazo supletivo de 6 meses a contar de 06.05.2021. 65. Compatibilidade esta que é ainda mais inegável se atentarmos ao facto de a Recorrida não ter de esperar pelo decurso total dos 60 dias, estipulados no n.º 4 do artigo 7.º dos seus estatutos, contados a partir do termo dos 90, para deliberar a amortização e, assim, exercer o respetivo direito. 66. Findos os 90 dias exigidos no artigo 7.º/1 dos estatutos da Recorrida, poderia a Recorrida deliberar a amortização a qualquer momento, desde que dentro dos 60 dias e, claro, dentro do prazo de 6 meses. Desde logo, poderia deliberar logo que terminassem os 90 dias, restando bastante tempo até ao fim dos 6 meses. 68. Pelo que não compreende o Recorrente como considera o Tribunal a quo ser o prazo de 6 meses incompatível com os prazos procedimentais definidos nos estatutos da Recorrida! 69. Aliás, mesmo que tal não fosse compatível – o que por mera cautela se equaciona- não se concebe como tal seria fundamento para não se aplicar o prazo de 6 meses, mas sim de 1 ano – não só porque o n.º 6 do artigo 347.º do CSC não faz depender a aplicação do prazo de 6 meses ou 1 ano, da compatibilidade, ou não, de eventuais prazos definidos nos estatutos das sociedade, por vontade própria; mas também porque a lei é imperativa, devendo as sociedades adaptarem-se à mesma e não o contrário. 70. A lei é clara: se não existir disposição contratual que fixe um prazo, a contar do facto que fundamenta a amortização, para a deliberação ser tomada, é aplicado o prazo supletivo de 6 meses. 72. No caso concreto tal prazo não existe nos estatutos da Recorrida, pelo que dúvidas não existem de que só pode ser aplicado o prazo de 6 meses, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo. 74. Foi a Recorrida quem optou por proceder à comunicação a que se refere o n.º 1 do artigo 7.º dos seus estatutos, em 12.11.2021 - 6 meses após a consolidação da penhora em 06.05.2021. 75. Pelo que os 90 dias previstos no n.º 1 do artigo 7.º dos estatutos apenas começaram a contar a partir daquela data (o que determinou a data de começo da contagem dos seguintes 60 dias), porque a Recorrida assim quis. 77. A falta de zelo da Recorrida não pode significar que se ignore o estipulado no artigo 347.º, n.º 6 do CSC – que, em face dos contornos do caso concreto, manda aplicar o prazo de 6 meses. 78. O referido prazo não inviabilizaria, nem inviabilizou, na prática, a realização atempada do procedimento de amortização definido nos estatutos da Recorrida – quem inviabilizou foi, de facto, a Recorrida que definiu aqueles prazos e não outros e que realizou as comunicações tardiamente incumprindo o prazo de 6 meses de caducidade. 79. Pelo que dúvidas não existem de que incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, interpretado erroneamente o artigo 347.º, n.º 6 do CSC em face do caso concreto. 80. Sendo aplicável, no caso concreto, o prazo de 6 meses a contar de 06.05.2021, motivo pelo qual em 28.03.2022, já havia caducado o direito a amortizar as ações do Recorrente com base na penhora. 82. Devendo ser declarada a anulabilidade das deliberações de 28.03.2022 – seja a alegadamente renovadora, seja a ex novo -, por inexistência do direito a amortizar, por caducidade, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, al. a) do CSC. 83. Ademais, entendeu ainda a Sentença Recorrida que, mesmo que se entenda ser aplicável o prazo de 6 meses, a caducidade do direito a amortizar foi impedida pela Deliberação de 05.7.2021 nos termos do artigo 331.º do CC. 84. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo incorreu, mais uma vez, em erro de julgamento. 85. Com base no artigo 329.º do Código Civil e 347.º, n.º 6 do CSC, o prazo de 6 meses começa a correr a partir de 06.05.2021, momento em que o direito pode legalmente ser exercido (desde que respeitados os requisitos do estatutos), terminando em 07.11.2021. 86. A deliberação de 05.07.2021 foi declarada inválida (no processo n.º 2769/21....). 87. Não pode o Tribunal a quo considerar que foi impedido o prazo de caducidade através de um ato ilegal, inválido, que não produziu quaisquer efeitos – a deliberação de 05.07.2021. 88. O artigo 331.º do CC distingue entre o ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo (n.º 1) e o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido, para o caso de prazo fixado relativamente a direito indisponível (n.º 2). 89. Com base no n.º 1 do referido preceito, apenas a prática dentro do prazo legal (no caso concreto, 6 meses a contar da penhora consolidada), do ato impeditivo – neste caso, a deliberação de amortização com todos os requisitos estatutariamente exigidos para tal, já expostos – impediria a caducidade. 90. Com base no n.º 2, estando em causa um direito disponível, o reconhecimento desse direito por aquele contra quem deve ser exercido, impede a caducidade – que, no caso, não se verificou. 91. O sentido do artigo 331.º do Código Civil é o de que só impedem a caducidade os atos significativos, que são os que como tal são estabelecidos na lei ou convenção ou o reconhecimento qualificado do direito, que equivale, sob o ponto de vista da segurança, à prática válida do ato. 92. No caso concreto, no regime da amortização, a lei só atribui efeito impeditivo à prática do ato – que é a deliberação legal e estatutariamente válida -, dentro do prazo estabelecido que, no caso sub judice, é de 6 meses a contar de 06.05.2021 até 07.11.2021, como já exposto. 94. O que não se verificou, pois que à data de 05.07.2021, não estavam verificados todos os requisitos legais e estatutários para a Recorrida deter o direito e legitimidade para amortizar (reconhecido e confirmado por vários Tribunais – no processo n.º 2769/21.... (vd. docs. n.ºs 24, 25 e 26 da P.I), determinando a respetiva invalidade. 95. Por conseguinte, a Deliberação de 05.07.2021 é uma deliberação inválida e, portanto, não é apta a produzir efeitos como causa impeditiva da caducidade. 96. E mesmo que assim fosse, isto é, mesmo que se considerasse a deliberação de 05.07.2021 como ato impeditivo de caducidade – o que por mera cautela de patrocínio se equaciona -, ela não teria por efeito deixar a amortização sujeita ao prazo geral de prescrição. 97. Tomada a primeira deliberação (de 05.07.2021), deixaria de haver prazo de caducidade e a renovação – que teria por efeito permitir a válida amortização – poderia, nessa lógica, ser tomada dentro do prazo geral de prescrição, que é de 20 anos – o que constitui um resultado insensato, que ignora a tutela da estabilidade e segurança das situações. 98. Seria absolutamente contrário ao espírito da lei, permitir que, já ultrapassado o prazo para amortizar, fosse ainda possível a deliberação (ex novo) ou renovação com base num alegado direito a amortizar que já se encontra extinto por caducidade. 99. Prevalecendo o entendimento e interpretação errónea do Tribunal a quo relativamente ao artigo 331.º do Código Civil aplicado ao caso concreto, o lesado, ora Recorrente, protegido pela caducidade, pela segurança e certeza jurídica que a mesma exige, veria o seu património (in casu, as suas ações) suscetível de ser “atacado” ad eternum, por se considerar como ato impeditivo da caducidade, a ilegal manifestação de vontade da Recorrida, mediante a deliberação de 05.07.2021, quando não tinha qualquer legitimidade e direito para o fazer. 100. Logo, incorreu em erro de julgamento a Sentença Recorrida, ao considerar impedida a caducidade em 05.07.2021, quando tal ato não teve qualquer legitimidade para impedir o que quer que fosse, por ser um ato inválido. 101. Prosseguindo, entendeu ainda a Sentença Recorrida que o direito de renovação não está, ele próprio, sujeito ao prazo de caducidade aplicável para o direito originário a amortizar. 102. Fazendo analogia com o instituto da confirmação de negócios jurídicos que, segundo o tribunal a quo, se encontra “sujeita aos prazos gerais de prescrição”. 103. No entanto, incorre mais uma vez em erro de julgamento. A renovação tem, ela própria, que respeitar os requisitos da amortização e, em especial, o prazo em que a deliberação de amortização produziria o efeito impeditivo (vd. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra no processo n.º 3189/22.4T8LRA). 104. Interpretar o artigo 62.º, n.º 2 do CSC e, em geral, o regime aí previsto para a renovação da deliberação social, no sentido de que com esse mecanismo se permite amortizar com dispensa da observância do mais basilar requisito da amortização – o prazo de caducidade -, é interpretar o preceito em desconformidade com a tutela constitucional do direito de propriedade. 105. No caso concreto, a renovação só terá sentido se o direito a amortizar não se tiver extinguido. 106. A renovação de uma deliberação social pode, sim, estar sujeita a prazo, prazo esse razoável, que pode ser definido por Tribunal – a requerimento da sociedade (que, obviamente, no caso concreto, não o iria fazer, por ser seu interesse não ter prazo) ou, mesmo sem requerimento, por razões de certeza e segurança jurídica. 107. Atente-se ainda às palavras do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra no processo n.º 3189/22.4T8LRA, ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo n.º 1458/22...., de 22.11.2022 (doc. n.º 2 do Requerimento do Autor de 06.12.2022, refª citius 9266382) e ao parecer do Sr. Prof. NN (vd. doc. n.º 1 do Requerimento do Autor, ora Recorrente, de 24.10.2022, refª citius 9137230) a este respeito. 108. Não faria qualquer sentido defender como válida uma deliberação que pretendeu renovar uma outra declarada inválida, quando a mesma pretendeu exercer um direito que já há muito tempo se encontra caducado. 109. Estando aquele direito caducado, não será válida qualquer renovação através da qual se exerça o mesmo. 110. Ademais, não se pode extrair qualquer argumento do regime da confirmação de negócios jurídicos, comparando a renovação da deliberação social com o referido instituto. 111. Na renovação, o sócio prejudicado pela deliberação inválida, através da qual se pretendeu exercer um direito sujeito a caducidade (no caso, amortização) – entendendo-se que, mesmo estando o direito a amortizar já caducado, seria possível a renovação da deliberação que invalidamente e ilegalmente o praticou -, ver-se-ia ad eternum suscetível a ver as suas ações amortizadas. 112. Por sua vez, na confirmação coloca-se nas mãos do sujeito lesado com o negócio jurídico inválido, a possibilidade – ou não – de confirmação desse mesmo negócio. A este propósito, atente-se ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo n.º 1458/22...., de 22.11.2022. 113. Assim, andou mal o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, interpretando de forma errónea os artigos 331.º do Código Civil e 62.º do CSC.” Como se decidiu no Acórdão desta Relação de 13.12.2023 - supra citado: “Efectivamente, como defende o recorrido e foi a solução seguida na sentença recorrida, a deliberação renovatória não se pode cindir do direito originário de amortização, tendo, ao invés, de obedecer aos mesmos critérios/requisitos de validade do que a deliberação que se pretende renovar, sob pena de, como na sentença recorrida se afirma, a mesma ficar apenas sujeita ao prazo ordinário de prescrição, de 20 anos, o que não se pode aceitar, sob pena de se subverter toda a segurança e certeza da vida das sociedades e por inerência, dos seus sócios, se se permitisse que decorridos 5, 10 ou mais anos, se viesse permitir a tomada de deliberação renovatória de uma deliberação cujo objecto havia sido a amortização de acções, para além do prazo que a lei estipula para que seja permitida a própria amortização originária. Efectivamente, terá de se exigir que a deliberação renovatória obedeça aos mesmos critérios e requisitos da deliberação renovada, o que mais se reforça no âmbito da definição dos prazos de caducidade, que têm em vista, precisamente, a definição de certas situações, regulando-as juridicamente, com vista a obstar a situações de incerteza e/ou insegurança jurídica. E, para tal, não vemos melhor fundamentação do que a expendida no Acórdão deste Tribunal da Relação, proferido no Processo 1458/22...., de 22 de Novembro de 2022, que apreciou, entre outras, esta questão e, com a devida vénia, passamos a reproduzir, com a menção de que quando ali se refere a “penhora de acções”, nos presentes autos, como acima já referido, o fundamento para a amortização, consiste no arresto decretado em 20 de Fevereiro de 2018, cuja decisão se mostra transitada em julgado desde o dia 02 de Julho de 2019: “A amortização de acções está prevista nos artigos 346.º e 347.º do Código das Sociedades Comerciais. Para o caso interessa-nos o artigo 347.º (amortização de acções com redução de capital), pois a amortização das acções do ora recorrente foi feita com redução do capital e, dentro deste preceito, interessa-nos, para a resposta à questão da caducidade do direito de amortização, o n.º 6, pois a amortização em causa é uma amortização permitida pelo contrato de sociedade, concretamente pelo artigo 7.º dos estatutos. Nos termos deste número, “sendo a amortização permitida pelo contrato de sociedade, pode este fixar um prazo, não superior a um ano, para a deliberação ser tomada; na falta de disposição contratual, esse prazo será de seis meses, a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização”. Resulta deste preceito que a amortização das acções, cuja competência cabe à assembleia geral (n.º 5 do artigo 347.º do CSC), está obrigatoriamente sujeita a um prazo. Socorrendo-nos das palavras de Carolina Cunha, em comentário ao artigo 347.º do Código das Sociedades Comerciais, “… razões de segurança e certeza determinam a fixação de um prazo de caducidade para que a sociedade exerça a faculdade de amortizar, prazo em princípio mais dilatado do que o vigente para a amortização imposta…” [Código das Sociedades Comerciais Em Comentário, Almedina, página 873]. Segue-se daqui que o n.º 6 do artigo 347.º, na parte em que se refere ao prazo para amortização das acções, tem natureza imperativa. Os sócios não podem estipular no contrato de sociedade que a amortização das acções não está sujeita a qualquer prazo. Se incluíssem uma cláusula com este conteúdo ela seria nula (1.ª parte do artigo 294.º do Código Civil). Em matéria de prazo, resulta do preceito acima indicado o seguinte: · O contrato pode prever um prazo para a deliberação de amortização ser tomada, mas tal prazo não pode ser superior a um ano a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização; · Na hipótese de o contrato não fixar prazo para a amortização das acções, vale a regra supletiva da 2.ª parte do n.º 6 do artigo 347.º: esse prazo é de seis meses a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização. Examinado o contrato de sociedade, designadamente a sua cláusula sétima, onde está prevista a amortização das acções, vê-se que ele compreende um número (o n.º 4) onde está estabelecido um prazo para a assembleia deliberar a amortização das acções, concretamente: “A Assembleia Geral deverá exercer aquele direito no prazo de sessenta dias contados do final do prazo referido no número 1 do presente artigo”. Como se vê pela transcrição que se acaba de fazer, o facto a partir do qual se contam os 60 dias não é o que serve de referência ao prazo de caducidade previsto no n.º 6 do artigo 347.º Enquanto a este serve de referência “o facto que fundamenta a amortização”, o prazo de 60 dias previsto no n.º 4 do artigo 7.º dos estatutos conta-se a partir do “final do prazo referido no número um de tal artigo”. E este prazo é aquele por que se deve manter a situação que fundamenta a amortização das acções, após tal situação ter sido comunicada ao accionista pelo conselho de administração. Pode dizer-se que este é um prazo especial de caducidade previsto no contrato, que não altera a disciplina constante do n.º 6 do artigo 347.º do CSC. E, assim, para efeitos do n.º 6 do artigo 347.º do CSC, os estatutos da requerida não fixam prazo para a deliberação de amortização ser tomada. Em consequência, aplica-se ao caso a regra enunciada na 2.ª parte do n.º 6: a deliberação deveria ser tomada no prazo máximo de 6 meses a contar do facto que fundamentava a amortização. Por força dos estatutos, dentro destes seis meses, a deliberação devia ser tomada no prazo de 60 dias contados do final do prazo referido no número 1 do presente artigo. Daí que, combinando a 2.ª parte do n.º 6 do artigo 347.º do CSC com o n.º 4 do artigo 7.º dos estatutos, podemos afirmar que há um prazo de caducidade geral e um especial e que a faculdade de amortização poderia caducar por um dos seguintes factos: 1) por a deliberação não ser tomada no prazo de 6 meses a contar da ocorrência do facto que fundamenta a amortização; 2) por não ser tomada no prazo de 60 dias contados do final do prazo referido no número 1 do presente artigo. Precise-se que, quando o facto que fundamenta a amortização das acções consistir na penhora das acções, ele relevará, para efeitos do n.º 6 do artigo 347.º do CSC, como “ocorrência do facto que fundamenta a amortização”, a partir do momento em que deixar de ser processualmente admissível deduzir oposição contra ela ou em que tal oposição é julgada definitivamente improcedente. Por outras palavras, só quando a penhora se tornar insusceptível de impugnação é que ela passará a fundamentar a amortização. Esta interpretação, afirmada na decisão recorrida, não foi contestada pelo recorrente.”. Acrescentando, que: “Salvo o devido respeito, contra a caducidade do direito de amortização não vale o argumento de que não se podia confundir o direito potestativo de amortização com o direito de renovação das deliberações sociais, por o prazo de caducidade regulado no artigo 347.º, n.º 6, do CSC, se referir ao direito de amortização e não ao direito de renovação. É certo que o direito de amortização das acções constitui uma realidade diferente do direito de renovação das deliberações sociais inválidas. E é ainda certo que o prazo de caducidade previsto no n.º 6 do artigo 347.º do CSC diz respeito ao direito de amortização e não ao direito de renovação de deliberação social. Daqui não segue, no entanto, que as deliberações de amortizações de acções que renovem deliberações de amortização inválidas não estejam sujeitas ao prazo de caducidade previstos no artigo 347.º, n.º 6 do CSC. Na verdade, a deliberação que renova uma deliberação de amortização é ela própria uma deliberação de amortização. E, revestindo esta natureza, está sujeita aos mesmos requisitos de validade da deliberação que pretende renovar, designadamente em matéria de caducidade. Como se observa no parecer do Exm.º Professor Doutor Cassiano Santos, quando se renova um acto sujeito a um prazo de caducidade, ele próprio tem de respeitar o prazo de caducidade previsto para o acto a renovar. Se, como está implícito na sentença recorrida, a deliberação de renovação não estivesse sujeita a prazo de caducidade, então poder-se-ia renovar uma deliberação amortização ainda que ela tivesse sido declarada ilegal com fundamento no facto de ter sido tomada depois de ter caducado o direito de amortização. Afigura-se-nos que esta solução não tem o mais leve amparo no regime da deliberação das renovações. Assim, é de afirmar que a deliberação de amortização não pode ser renovada se, no momento em que é tomada, já caducou o direito de amortização. O regime não é diferente do que prevê o artigo 202.º do CPC, em matéria de renovação dos actos nulos. Segundo este preceito, o acto nulo não pode ser renovado se já expirou o prazo dentro do qual devia ser praticado; exceptua-se o caso de a renovação aproveitar a quem não tenha responsabilidade na nulidade expirou o prazo dentro do a amortização devia ser feita. Salvo o devido respeito, também não vale contra a caducidade do direito de amortização, a afirmação de que lei também não sujeita a qualquer prazo a confirmação dos negócios jurídicos (artigo 288.º do CC). Ao justificar o afastamento da caducidade com esta razão, a sentença argumenta como se a renovação da deliberação social prevista no artigo 62.º do CSC fosse assimilável à figura da confirmação dos negócios jurídicos prevista no artigo 288.º do Código Civil. Esta assimilação não tem amparo no regime da renovação da deliberação social. Em primeiro lugar, enquanto a confirmação compete à pessoa a que pertencer o direito de anulação (n.º 2 do artigo 288.º do Código Civil), a renovação compete à assembleia geral. Em segundo lugar, a renovação da deliberação vale tanto para deliberações nulas, como para deliberações anuláveis, ao passo que a confirmação prevista no artigo 288.º do CC vale apenas para os negócios anuláveis. Em terceiro lugar, socorrendo-nos das palavras de Pinto Furtado “… o conteúdo do acto de confirmação não é a reprodução do acto confirmado, como acontece basicamente, na renovação da deliberação, mas um acto complementar ou integrativo ou de 2.º grau, uma manifestação de confirmação” [Deliberações de Sócios, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, página 578]. Segue-se do exposto que, quando a requerida renovou a deliberação, já havia decorrido o prazo para amortizar as acções do requerente com fundamento na respectiva penhora. Assiste, assim, razão ao recorrente quando alega que a deliberação é contrária à lei (artigo 347.º, n.º 6, parte final), pois foi tomada num momento em que já tinha caducado o direito de amortizar as acções. Resulta, pois, do exposto, que, contrariamente ao defendido pela recorrente existe prazo para a tomada de deliberação inovatória de deliberação que decidiu a amortização das acções e tendo transitado a decisão que decretou o arresto em 02 de Julho de 2019, é manifesto que, mesmo o prazo de um ano, já tinha expirado quer em 22/01/21, quer em 16/03/2022. Idêntico, foi o entendimento acolhido no Acórdão deste Tribunal da Relação, de 13/12/22, Processo 1279/22.2T8LRA.C1, disponível no respectivo sítio do Itij e que versou, sobre deliberações conexas com a mesma aqui em apreço (e em que, inclusive, se refere a de 16/03/2022).” Procede, pois, a 3.ª conclusão, ficando prejudicado o conhecimento das demais conclusões. Assim, na procedência do recurso, revogamos a decisão proferida no Juízo de Comércio de Leiria - Juiz ..., determinando-se a invalidade das deliberações tomadas na Assembleia Geral extraordinária de 28.03.2022. * As conclusões (sumário): (…). * Assim, na procedência do recurso, revogamos a decisão proferida pelo Juízo de Comércio de Leiria - Juiz ..., determinando-se a invalidade das deliberações tomadas na Assembleia Geral extraordinária de 28.03.2022, com as legais consequências. As custas ficam a cargo da apelada. Coimbra, 10 de Setembro de 2024 (José Avelino Gonçalves - Relator) (Paulo Correia - 1.º adjunto) (Arlindo Oliveira – 2.º adjunto) |