Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2003/21.2T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: CONTRATO PROMESSA DE IMÓVEL QUE O PROMITENTE VENDEDOR DECLARA QUE IRÁ ADQUIRIR
INOBSERVÂNCIA DE FORMALIDADES
PERDA DO SINAL
BOA FÉ
PERDA OBJECTIVA DO INTERESSE NA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
VENDA ULTERIOR DO IMÓVEL A TERCEIRO
Data do Acordão: 06/13/2023
Votação: U
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 5.º, 3 466.º, 5 E 609.º, 2, DO CPC
ARTIGOS 342.º, 1; 373.º E SEG.S; 394.º; 410.º, 1 E 3; 442.º; 762.º, 1; 763.º, 1; 777.º; 804.º, 1 E 2; 805.º, 1 E 2; 806.º, 1 E 2; 808.º; 879.º, C) E 892.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. - É valido o contrato-promessa pelo qual o promitente vendedor declara prometer vender um imóvel que irá adquirir (constituído por terreno para construção), incluindo uma moradia que ali irá edificar de acordo com projeto respetivo.

2. - A inobservância das formalidades previstas no art.º 410.º, n.º 3, do NCPCiv. – reconhecimento presencial das assinaturas e certificação de existência de licença de utilização ou de construção – constitui nulidade atípica/mista, que não é de conhecimento oficioso.

3. - Suscitada a questão da invalidade contratual, por via de tal inobservância de formalidades legais, apenas no recurso, razão pela qual a 1.ª instância dela não conheceu, trata-se de questão nova, de que a Relação não pode conhecer, por não constituir matéria de conhecimento oficioso.

4. - Só o incumprimento definitivo e não a simples mora desencadeia o mecanismo indemnizatório da perda do sinal (em singelo ou em dobro), que, na falta de convenção em contrário, é a única indemnização pelo incumprimento da promessa.

5. - O princípio da boa-fé revela determinadas exigências objetivas de comportamento – de correção, honestidade e lealdade – impostas pela ordem jurídica, exigências essas de razoabili­dade, probidade e equilíbrio de conduta, em campos normativos onde podem operar sub-princípios, regras e ditames ou limites objetivos, postulando certos modos de atuação em relação, seja na fase pré-contratual, seja ao longo de toda a execução do programa contratual, seja mesmo, extinto o contrato, na liquidação do relacionamento entre as partes.

6. - A parte que invoca perda objetiva de interesse na celebração do contrato prometido tem o ónus da alegação e prova da factualidade de suporte de tal perda objetiva de interesse, que tem de ser aferida segundo um critério de razoabilidade.

7. - Se o promitente comprador invoca, infundadamente, para efeitos resolutivos – tendo comunicado a resolução ao promitente vendedor –, a perda de interesse na prestação e o incumprimento contratual da contraparte, ocasionando, assim, a extinção do contrato, tem de concluir-se que incorreu ele, desse modo, em incumprimento definitivo, equivalente à recusa perentória e definitiva de cumprir, ocasionando a perda do sinal prestado.

8. - Num tal caso, é lícita, extinta a promessa, a ulterior venda do imóvel a terceiro.

9. - Se, nesse contexto, o promitente comprador procedeu ao corte de árvores no prédio a que se refere a promessa, para além do que lhe foi consentido pela contraparte, excedendo, sem autorização, os limites permitidos, e ocasionando, assim, desvalorização do prédio no mercado imobiliário, incorre no dever de indemnizar a contraparte, até ao montante do dano provocado.

Decisão Texto Integral:


Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:


***

I – Relatório

AA e BB, ambos com os sinais dos autos,

intentaram ([1]) a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra

H..., Ld.ª”, também com os sinais dos autos,

pedindo, na procedência da ação:

a) A declaração de resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado no dia 30/08/2018, referente ao prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...58/..., constituído por terreno para construção com a área total de 1.610 m2, bem como de moradia a edificar sobre esse prédio, com fundamento no incumprimento contratual e perda de interesse do credor, de acordo com o art.º 808.º do CCiv.;

b) A condenação da R. no pagamento do valor de € 100.000,00, correspondente à devolução do respetivo sinal em dobro.

Para tanto, alegaram, em síntese, que:

- celebrado o contrato, a R., ao incorrer em incumprimento do ali estipulado, ocasionou a irremediável perda de confiança dos AA., sendo ainda que tal R. procedeu à venda a terceiro da propriedade em 29/01/2021;

- daí que tenham os AA. resolvido o referido contrato-promessa, através de carta datada de 18/05/2020, a qual foi rececionada pelos serviços da sociedade R..

A R., citada, contestou e reconveio, impugnando o alegado e as conclusões alcançadas pelos AA., assim concluído pela total improcedência da ação.

Concomitantemente, deduziu pedidos reconvencionais, nos seguintes termos:

- ser reconhecido o direito da Reconvinte a fazer seu o montante pago a título de sinal (€ 50.000,00);

- serem os AA./Reconvindos condenados no pagamento de indemnização por dano causado, no valor de € 60.000,00, com referência ao prejuízo sofrido pela Reconvinte com o corte não autorizado dos pinheiros plantados no referido prédio, a que acrescem juros de mora vincendos até integral e efetivo pagamento.

Em réplica, os AA./Reconvindos refutaram o alegado pela Reconvinte, bem como as conclusões alcançadas pela mesma, concluindo pela improcedência dos pedidos reconvencionais.

Efetuado o saneamento do processo e realizada a audiência final, foi depois proferida sentença – datada de 28/10/2022 –, com o seguinte dispositivo relevante:

«A. Julgo integralmente improcedente o peticionado pelos autores (…).

B. Julgo integralmente procedentes os pedidos reconvencionais deduzidos pela H..., Lda., (…) e, em consequência:

a. Reconheço o direito da ré/reconvinte a fazer sua a importância total de € 50.000,00 (…), paga pelos autores a título de sinal.

b. Condeno os autores/reconvindos a indemnizarem a ré/reconvinte pelo dano resultante do corte de pinheiros não autorizado no prédio em apreço (prédio descrito na CRP ... sob o n.º ...58/...), no valor que vier a ser liquidado em execução da presente Sentença (artigo 609.º, n.º 2 do Cpc).».

Da sentença, vieram os AA./Reconvindos, inconformados, interpor o presente recurso, apresentando alegação, culminada com as seguintes

Conclusões ([2]):

«(…)

B. Segundo o Tribunal a quo, não se verificarem os fundamentos para a resolução do escrito celebrado entre as partes (Autores e Ré) por incumprimento definitivo da Ré H..., Lda., desconsiderando a prova testemunhal e documental produzida por esta parte – que demonstra claramente que não obstante o Autor ter agido e praticado todos os atos exigíveis a um homem médio para a manutenção do negócio prometido, – a Ré, incumpriu definitivamente os prazos de licenciamento (atento o facto do prédio objecto do contrato promessa dos autos datado de 30.08.2018, só ter integrado o património hereditário de CC, cuja cópia da respectiva escritura pública de partilha, outorgada a 30-12-2020, mais de 2 anos após a assinatura do contrato prometido e mais de seis meses após a interpelação admonitória efetuada pelo Autor.)

C. O douto Tribunal a quo, aceita e concorda na sua douta sentença que a Ré exija mais 100.000,00 € de reforço de sinal em 2019, mesmo dando como provado que o contrato promessa dos autos, datado de 30.08.2018, só ter integrado o património da Ré depois de 30-12-2020. (mais de 2 anos e 4 meses depois da assinatura do contrato prometido).

D. Da mesma forma que desconsidera o facto de a Ré ao longo de todo este período temporal, ter protelado o negócio final prometido, pois que, somente no decorrer do ano de 2019, é que foi submetido o projeto de construção, conforme demonstrado pelos docs. 05 a 07 da petição inicial. Não podendo, por isso, ser dado como “aspetos não provados” pelo douto Tribunal que: “Que os serviços da ré tivessem mantido uma postura inacessível e suspeita, que as suas respostas apresentadas aos autores nunca tivessem sido conclusivas.”

E. Como é aliás incompreensível que o Tribunal a quo, desconsidere a prova testemunhal e o depoimento (na integra) da testemunha DD quando na douta sentença afirma que: “O discurso de DD não se mostrou suficientemente concreto e isento, uma vez que, em quase toda a sua extensão, apenas consubstanciou uma defesa – intransigente e pouco atenta ao decurso dos acontecimentos em apreço – do que a mesma testemunha entendeu e entende serem os interesses dos autores.”

F. Esta testemunha demonstrava, que o Autor interpelou a Ré para o cumprimento do Contrato Promessa, antes da resolução escrita do contrato dos autos.

G. O Tribunal a quo interpretou, erradamente, como crível o depoimento da testemunha EE, apesar desta testemunha ser Sócia da Ré, pois que, segundo a douta sentença: “EE prestou um depoimento credível e concreto, mantendo suficiente nível de isenção, apesar de ser sócio da ré e, nestes termos, ter assumido activa acção na celebração e na execução do contrato promessa que veio a ser celebrado com os autores.” (…).

H. Mas a douta sentença vai mais longe e, erradamente, ao atropelo dos mais elementares princípios da livre apreciação da prova, refere: “Através das palavras credíveis de EE, o Tribunal alcançou convicção de que o procedimento conducente à fixação do projecto final de obra, bem como a instrução/preparação e reunião dos restantes elementos documentais, decorreu ao longo de um espaço temporal que se pode considerar normal, face desde logo às alterações solicitadas pelos autores (pontos 5 e 17 dos factos provados).”

I. O Tribunal a quo, considera assim o depoimento de um sócio da Ré, admitindo como “normal” e que se valore como prova o seu depoimento para aceitar que: “um procedimento conducente à fixação do projecto final de obra, bem como a instrução/preparação e reunião dos restantes elementos documentais” demore quase 3 anos e dar como provado, sem mais, os pontos 5 e 17 dos factos provados e o depoimento do mesmo sócio da Ré, “permitiu ao Tribunal alcançar convicção positiva acerca do acima exposto nos pontos 13, 16 e 17 dos factos provados da sentença”. Ora, tal revela um manifesto atropelo das expectativas jurídicas do Autor.

J. Acresce que, o Tribunal a quo desconsiderou o facto de a Ré sempre ter tido conhecimento de que celebrava um contrato nulo pois que o bem era objeto de partilha e somente foi concretizada a tradição dois anos após a assinatura do contrato de promessa com o Autor.

K. Ademais, escapou ao Tribunal a quo o facto da Ré, aquando da assinatura do contrato promessa fazer crer aos Autores (de nacionalidade francesa e que não compreendem a língua portuguesa) que era proprietária do bem em causa.

L. Acresce, ainda, o facto de o Tribunal a quo não se ter pronunciado relativamente à nulidade atípica prevista no art. 410.º, n.º 3, do CC – falta de reconhecimento presencial das assinaturas do promitente ou promitentes.

Da Nulidade da Sentença – Omissão de Pronúncia

M. A Sentença é nula, ao abrigo do artigoº 615, nº 1, alínea d) do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal deixou “d) (…) de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.

N. A douta sentença não se pronuncia sobre o facto, da própria Ré confessar, no artigo 17º da Contestação, que deu entrada do pedido de licenciamento das obras de construção da moradia referida na cláusula segunda, n.º 2, do Contrato Prometido (dos autos) no dia 4 de abril de 2021 (quase 3 anos após a celebração do contrato dos autos) e o Tribunal a quo não considerar, no mínimo de má fé, ou um verdadeiro abuso de direito, o facto da Ré ter prometido vender um bem que se encontrava com sérios problemas registrais e de licenciamento.

O. O Tribunal a quo desconsidera o facto de a Ré ao longo de todo o período temporal, ter protelado o negócio final prometido, pois que, somente no decorrer do ano de 2019, é que foi submetido o projeto de construção, conforme demonstrado pelos docs. 05 a 07 da petição inicial.

P. Posto isto não pode, por isso, ser dado como “aspetos não provados” pelo douto Tribunal que: “Que os serviços da ré tivessem mantido uma postura inacessível e suspeita, que as suas respostas apresentadas aos autores nunca tivessem sido conclusivas.”

Q. Não se aceitando, atentas as regras de experiência comum, que uma demora de 2 anos e 4 meses possa ser aceite como uma postura acessível e insuspeita.

R. A decisão incorre assim no vício de omissão de pronúncia, gerador de nulidade, o que desde já se requer, impõe-se assim a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, competindo-lhe reapreciar os meios de prova indicados (depoimentos das testemunhas elencadas) e os que se mostrem acessíveis, complementados, ou não, com as regras da experiência, relativamente aos pontos impugnados da matéria de facto, podendo ainda alterar outros factos, ainda que não impugnados, a fim de evitar uma contradição, pois se assim não for, a douta sentença recorrida, padece de vícios de contradição e omissão de pronuncia e de contradição insanável entre os factos da matéria de facto dados como provados.

Da Errada Validação da Prova e da Desconsideração da Prova Produzida

S. É aliás incompreensível que o Tribunal a quo, desconsidere a prova testemunhal e o depoimento (na integra) da testemunha DD.

T. Na fundamentação da sentença o tribunal a quo discorre, ao longo de 17 pontos da sentença sobre os factos provados, repetindo à exaustão factos que a própria ré não coloca em causa (procurando blindar a defesa da Ré).

U. A verdade é que o Tribunal a quo interpretou, erradamente, como crível o depoimento da testemunha EE, apesar desta testemunha ser Sócia da Ré.

V. Mas a douta sentença vai mais longe e, erradamente, ao atropelo dos mais elementares princípios da livre apreciação da prova, refere: “Através das palavras credíveis de EE, o Tribunal alcançou convicção de que o procedimento conducente à fixação do projecto final de obra, bem como a instrução/preparação e reunião dos restantes elementos documentais, decorreu ao longo de um espaço temporal que se pode considerar normal, face desde logo às alterações solicitadas pelos autores (pontos 5 e 17 dos factos provados).”

W. O douto Tribunal, considera assim o depoimento de um sócio da Ré, - mas desconsidera o depoimento em declarações de parte do A. Ora, tal revela um manifesto atropelo das expectativas jurídicas do Autor, e de qualquer homem médio, e um atropelo às mais elementares regras de contratação no ramo do direito imobiliário.

X. Aquilo que se encontra demonstrado nos autos é que a Ré só depois de 30-12-2020 adquire a propriedade do imóvel que prometera vender em 30.08.2018 e que tal, segundo a douta sentença, não se traduz numa perda de interesse dos autores.

Face à factualidade apurada nos autos, não pode a douta sentença dar como provado que: “Antes de se poder apreciar se a perda de interesse dos autores se consubstancia em elementos objectivos, há que ter em consideração que, apesar de interpelados por carta (cfr. ponto 6 dos factos provados), os mesmos autores não procederam ao pagamento do reforço de sinal.”

Y. Esquece, o Tribunal a quo, na douta sentença, que o Autor, interpelou a Ré para resolver o contrato dos autos, “por incumprimento dos prazos de obtenção de licença de construção bem como da construção propriamente dita.”

Z. Não foi a Ré que interpelou o Autor, nem o Autor recebeu nenhuma interpelação admonitória, por parte da Ré, para a eventualidade de mora num eventual atrasado no reforço do sinal.

Enquadramento Factual e reapreciação da prova gravada (art. 638.º, n.º 7 do CPC)

AA. Ademais, resulta claro na declaração de parte do Sr. AA:(ficheiro único 20220926094150_4038504_2870941) 26-09-2022 minuto 05:00 a 05:40 (através de tradutora) que não pode ser dado como provado que:“2.Os autores e a ré acordaram que o prédio seria vendido pelo preço de € 425.000,00, com o pagamento a ser efectuado da seguinte forma: a. € 50.000,00 a título de sinal e princípio de pagamento até o dia 30-9-2018. b. € 100.000,00 a título de reforço do sinal até o dia 31-01-2019”

BB. Pois que este ponto 2 da matéria de facto dada como provada conflitua com o disposto no ponto: ”6. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da carta datada de 28-5-2019 e junta como documento n.º 6 na contestação (fls. 73), através do qual a ré interpelou os autores para procederem ao reforço do sinal, no valor de € 100.000,00 (fls. 73, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).”

CC. Mas antes que : “2 .Os autores e a ré acordaram (…) b. € 100.000,00 a título de reforço do sinal até o dia 28-05- 2019.”

Prosseguindo:

DD. No mesmo sentido depôs a testemunha DD no depoimento prestado a 26-09-2022.Minuto 06 :30 minuto 08:00 (ficheiro único 20220926121206_4038504_2870941) Testemunha: (…) primeiro vamos à Camara saber, e eu pessoalmente fui a Camara saber (…) esse terreno não pertencia à H..., não havia qualquer sinal desse terreno pertencia a uma senhora, vendeu uma propriedade que não lhe pertencia (…) e havia uma guerra familiar e ele (EE) queria receber os 100 mil euros - 26-09-2022, minuto 18:55 a 19:55

EE. Fica assim demonstrando, através da factualidade apurada da gravação de prova, que o promitente vendedor e Ré, agiu culposamente relativamente a essa obrigação de meios, o sinal tem de ser devolvido aos Autores promitentes-compradores.

FF. Posto isto, salvo o devido respeito, há um claro salto lógico da sentença e um erro de apreciação da prova testemunhal quando afirma que: “Antes de se poder apreciar se a perda de interesse dos autores se consubstancia em elementos objectivos, há que ter em consideração que, apesar de interpelados por carta (cfr. ponto 6 dos factos provados), os mesmos autores não procederam ao pagamento do reforço de sinal.”

GG. De assinalar que face à prova produzida (testemunhal) o Tribunal a quo não podia ter dado como provado:“16. Em data não concretamente apurada, mas ao longo do primeiro trimestre de 2019, os autores ordenaram o abate dos pinheiros plantados no prédio objecto do contrato romessa acima identificado em 1. Foi mais amplo o número de abate de pinheiros do que inicialmente projectara e mandara demarcar EE – sócio da ré –, com vista à construção da casa. O corte concretamente levado a efeito impôs que o prédio em causa passa-se a deter menor valor no mercado imobiliário.” (…)

Do Incumprimento definitivo do contrato celebrado pela Ré:

HH. É certo que cabia ao Autor demonstrar a perda do interesse, de acordo com o disposto no art.º 342.º, n,º 1, do CCiv., sendo certo que se mostraram razões válidas para tanto, existindo factos que o suportem, nomeadamente o testemunho de DD, que foi, erradamente, desconsiderado pelo Tribunal a quo e a declaração de parte do Autor.

II. Acresce que, o Tribunal a quo desconsiderou o facto de a Ré sempre ter tido conhecimento de que celebrava contrato nulo pois que o bem era objeto de partilha e somente foi concretizada a tradição dois anos após a assinatura do contrato de promessa com o Autor.

JJ. A Ré adquiriu a propriedade, ainda que 2 anos e 5 meses, após a assinatura do contrato de promessa com o Autor, contudo, jamais nutriu a intenção de transferir a propriedade ao Autor tanto que, na mesma oportunidade vendeu, por escritura pública, a terceiro estranho aos Autores a propriedade do imóvel, sem dar conhecimento ao Autor, nem qualquer satisfação e, jamais se dignou a responder referida notificação do Autor muito menos proceder com a devolução do sinal.

KK. A ré sem qualquer interpelação para resolução do contrato, tomou por bem, fazer seu o sinal, sem qualquer explicação ao Autor, e vender o imóvel a terceiro, e mesmo assim o Tribunal a quo considera crível o depoimento do sócio da FF. Ora não se pode concordar com a consideração do depoimento desta testemunha como crível.

LL. Aliás, a doutrina maioritária, nomeadamente Menezes Cordeiro ([3]), Antunes Varela ([4]) e Nuno Manuel Pinto Oliveira ([5]), defendem que basta a mora, de per si, para desencadear a aplicação dos mecanismos indemnizatórios do n.º 2 do art.º 442.º do CCiv.

MM. E também aqui a Jurisprudência do Supremo Tribunal, contraria os fundamentos de facto e de direito da douta sentença do Tribunal a quo, em concreto os Acs. do STJ ([6]) de 21/01/2003 e de 08/03/2005 que assentam a sua argumentação, essencialmente, no atual art.º 442.º, n.º 3, conjugado com o seu n.º 2, do CCiv .

RECONHECIMENTO NOTARIAL - NULIDADE DO CONTRATO

NN. Da omissão dos requisitos prescritos no citado n°3 do art.410 do CCivil, temos uma invalidade arguível a todo o tempo, invocável pelas Partes contraentes.

OO. Assim, o não reconhecimento notarial das assinaturas no contrato de promessa dos autos, acarreta a nulidade do contrato, sendo irrelevante o facto, de previamente ao acto de assinatura do contrato, as partes, por mútuo acordo, dispensaram as referidas formalidades. (no mesmo sentido Ac. TRL de 04.03.2008, Proc. 60362007-1 e AC TJ de 27.06.2002, Proc. 02B 1948, in www.dgsi.pt

PP. Neste sentido: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Processo 176/03.5TBRSD.P1S1, de 04/07/2013(http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/38ce5abdce2cc9ef80257be200487566?OpenDocument), e também João Calvão da Silva ([7]) que qualifica a situação como nulidade atípica que, como tal, poderá ser invocada, a todo o tempo, pelo promitente-comprador (já que, como se referiu, o promitente-vendedor nem sempre a poderá invocar), sem prejuízo da sua preclusão por eventual abuso de direito.

QQ. Ora, o contrato-promessa celebrado entre as partes está ferido de nulidade por ter sido omitido o reconhecimento presencial das assinaturas que é imposto por lei, impõe-se assim revogar a sentença recorrida, declarando-se a nulidade do contrato e a devolução do sinal nos termos peticionados pelos Autores, acrescido de juros, à taxa legal, desde a data peticionada (18-5-2020), tendo em conta o disposto nos arts. 1270º, nº 1, e 1271º do CC – aplicável à declaração de nulidade por força do disposto no art. 289º, nº 3, do mesmo diploma – e sendo certo que, com a comunicação efectuada pelo Autor em 18-5-2020 (por via da qual solicitou a restituição do sinal entregue), cessou a boa fé em que a Ré se encontrava relativamente à posse da quantia que está obrigada a restituir ao Autor.».

Pugnam, na procedência do recurso, pela revogação da sentença recorrida, «substituindo-se a mesma por uma outra nos termos da qual seja a acção julgada totalmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente».

A R./Apelada contra-alegou, concluindo pela total improcedência da apelação e confirmação da sentença recorrida.


***

O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo sido ordenada a remessa dos autos ([8]) a este Tribunal ad quem, onde foram mantidos o regime e o efeito fixados.

Nada obstando, na legal tramitação recursória, ao conhecimento do mérito da apelação, cumpre apreciar e decidir.


***

II – Âmbito recursivo

Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([9]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.) –, importa saber ([10]):

a) Se ocorre nulidade da sentença, por vício de omissão de pronúncia (cfr. conclusões M e segs. dos Apelantes);

b) Se deve a impugnação da decisão de facto proceder, com alteração do quadro fáctico da sentença (cfr. conclusões D e segs.);

c) Se o contrato-promessa padece de invalidade(s);

d) Se há incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da R. ou dos AA./Reconvindos;

e) Se não há fundamento para indemnização pelo corte excessivo de pinheiros.


***

III – Fundamentação

          A) Da nulidade da sentença

Se ocorre o invocado vício de omissão de pronúncia

          Na sua conclusão M, referem os Recorrentes que a 1.ª instância não se pronunciou sobre questões de que devia conhecer, para o que invocam o disposto no art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), do NCPCiv..

Trata-se, pois, da causa de nulidade da sentença a que alude aquele preceito legal da lei adjetiva, que comina com a nulidade da decisão judicial o vício que se traduz em o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou, ao invés, conhecer de questões de que não pudesse tomar conhecimento, sendo aquela primeira vertente a aqui em causa.

Na 2.ª parte do n.º 2 do art.º 608.º do mesmo NCPCiv. prescreve-se que não pode o juiz ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, questões essas que, naturalmente, deverá apreciar, a não ser que devam ter-se por prejudicadas.

Vem sendo entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência o de que somente as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista nesse preceito legal.

De acordo com Amâncio Ferreira, “trata-se de nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda” ([11]).

E, segundo Alberto dos Reis, “são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” ([12]).

Ora, no caso dos autos os Apelantes pretendem que o vício cometido – omissão de pronúncia – consistiu, desde logo, em a sentença não se ter pronunciado sobre um invocado facto alegado sob o art.º 17.º da contestação (entrada de pedido de licenciamento de obras de construção no dia 04/04/2021, quase três anos após a celebração do contrato dos autos), com a consequência de o Tribunal não considerar haver má-fé ou abuso do direito por a R. ter prometido vender «um bem que se encontrava com sérios problemas registrais e de licenciamento» (cfr. conclusão N).

De seguida, derivam os Recorrentes para a matéria de facto, quanto a um dos pontos dados como não provados, de cujo julgamento discordam, para concluir que, havendo vício de omissão de pronúncia, se impõe a reapreciação da matéria de facto, havendo até «vícios de contradição (…) insanável entre os factos da matéria de facto dados como provados» (conclusões P a R).

Apreciando, importa dizer que cabia aos Apelantes, argumentando sobre o tema, mostrar onde se encontram consubstanciados na sentença apelada aquele(s) vício(s) gerador(es) de nulidade da mesma, o que devia ser feito nas conclusões (aperfeiçoadas) da apelação, já que estas, como dito, definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso.

Na verdade, como se retira do disposto no art.º 639.º, n.º 1, do NCPCiv., cabe à parte recorrente, nas suas conclusões, indicar os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.

Na nulidade aludida está em causa o uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de se pretender conhecer de questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não se tratar de questões de que deveria conhecer-se (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afetada.

Como já se mencionou, para apuramento quanto ao vício de omissão de pronúncia cabe perspetivar as questões em sentido técnico, só o sendo os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, só esses constituindo verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer.

Assim, não são, obviamente, questões para este efeito os factos (alegados ou provados), nem os argumentos apresentados pelas partes, nem as razões em que sustentam a sua pretensão ou defesa, nem as provas produzidas, nem a apreciação que delas se faça em termos de formação da convicção do Tribunal.

Ora, dito isto, não se descortina onde consideram os Apelantes ter incorrido o Tribunal a quo em omissão de pronúncia, sendo que os factos, alegados ou provados, não configuram questões em sentido técnico.

Do mesmo modo, o julgamento da matéria de facto, plasmado nos factos dados como provados e nos considerados como não provados, não contende com as causas de nulidade da sentença (plano formal), mas com eventual erro de julgamento de facto – a ter de ser sindicado em sede de impugnação da decisão relativa à matéria de facto – ou com a necessidade de ampliação da matéria de facto ou até com eventuais respostas deficientes, obscuras ou contraditórias sobre pontos determinados da matéria de facto, caso em que opera o preceituado no art.º 662.º do NCPCiv., referente já à modificabilidade da decisão de facto, a poder levar à alteração pela Relação da matéria de facto (em caso de verificação de erro de julgamento de facto, à luz do n.º 1 daquele art.º) ou mesmo à anulação da decisão [cfr. n.º 2, al.ª c), do mesmo preceito legal]. Mas não à formal nulidade da sentença, à luz do disposto no art.º 615.º do NCPCiv..

Assim, não se verifica que devesse ter sido equacionada e resolvida qualquer questão em sentido técnico, à luz do alegado no dito art.º 17.º da contestação (ou outro), que a sentença tenha omitido, sendo que as questões que se prendam com a modificabilidade da decisão de facto não respeitam à nulidade da sentença, mas à esfera do art.º 662.º do NCPCiv..

Termos em que, salvo o devido respeito, improcede a invocada nulidade da sentença.

B) Da impugnação da decisão de facto

1. - Começam os Apelantes por se insurgir contra a resposta de não provado do Tribunal recorrido quanto ao seguinte segmento (cfr. conclusão D):

“b) Que os serviços da ré tivessem mantido uma postura inacessível e suspeita, que as suas respostas apresentadas aos autores nunca tivessem sido conclusivas.”.

Pretendem, assim, que tal segmento seja removido do quadro fáctico dado como não provado [dita al.ª b)], fundando-se, se bem se entende, em inexistência de prova credível a respeito.

Ora, apreciando, cabe dizer que um tal segmento tem, efetivamente, de ser removido, mas sem sequer entrar na análise de questões probatórias.

É que se trata de nítida matéria conclusiva/valorativa – de pendor subjetivo –, como tal, destituída de conteúdo fáctico. Com efeito, se alguém manteve, ou não, «uma postura inacessível e suspeita» e com «respostas conclusivas» é matéria sem substância fáctica, mas que se decompõe em meros juízos conclusivos/valorativos.

E é sabido que estes não podem ter lugar no quadro fáctico da sentença – seja o julgado provado ou o não provado –, posto aí apenas terem assento os factos, como resulta do disposto no art.º 607.º, n.ºs 3 a 5, do NCPCiv., segundo o qual o juiz deve discriminar os factos que considera provados, declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados e aprecia, para tanto, as provas acerca de cada facto, em livre apreciação sobre tais factos.

Em suma, importam os factos (e apenas estes); não as conclusões ou valorações, que devem ser formuladas – uma vez apurados os factos – no âmbito, a jusante, da fundamentação de direito, com apreciação jurídica do caso.

Assim sendo, e por este motivo, será o conteúdo aludido removido/eliminado do quadro fáctico dado como não provado da sentença.

2. - Continuam os Apelantes, depois de tecerem diversas considerações sobre a prova pessoal – e respetiva valoração pelo Tribunal recorrido –, referindo (conclusão X) que:

«(…) Face à factualidade apurada nos autos, não pode a douta sentença dar como provado que: “Antes de se poder apreciar se a perda de interesse dos autores se consubstancia em elementos objectivos, há que ter em consideração que, apesar de interpelados por carta (cfr. ponto 6 dos factos provados), os mesmos autores não procederam ao pagamento do reforço de sinal.”».

Ora, este excerto, que os Recorrentes consideram «não pode[r] a douta sentença dar como provado», também não constitui qualquer matéria de facto, que houvesse de submeter-se ao juízo de “provado” ou “não provado”, mas matéria de direito, no âmbito da apreciação jurídica sobre o litígio.

O que logo resulta da localização desse excerto no corpo da sentença: consta, nitidamente, da fundamentação jurídica – da parte «Do Direito» – e não do quadro fáctico da decisão, como pode ver-se a fls. 144 v.º do processo físico.

Em suma, não se tratando de qualquer facto, que houvesse sido dado como provado (ou não provado) na sentença, mas de fundamento jurídico da decisão, nada há nesta parte a sindicar em sede de impugnação da decisão relativa à matéria de facto, que se queda inalterada neste particular.

3. - Sob a conclusão AA, vêm os Recorrentes impugnar – aí, sim – o ponto 2 dos factos dados como provados, este com o seguinte teor:

«2. Os autores e a ré acordaram que o prédio seria vendido pelo preço de € 425.000,00, com o pagamento a ser efectuado da seguinte forma:

a. € 50.000,00 a título de sinal e princípio de pagamento até o dia 30-9-2018.

b. € 100.000,00 a título de reforço do sinal até o dia 31-01-2019.

c. e o remanescente, ou seja 275.000,00 a ser pago de acordo com o mapa de pagamentos junto como documento 3 no acto da celebração da respectiva escritura de compra e venda.».

Argumentam os impugnantes (conclusão BB), desde logo, que tal ponto fáctico conflitua com o ponto 6 do mesmo quadro fáctico provado, este com a seguinte redação:

«6. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da carta datada de 28-5-2019 e junta como documento n.º 6 na contestação (fls. 73), através do qual a ré interpelou os autores para procederem ao reforço do sinal, no valor de € 100.000,00 (fls. 73, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). Destaca-se o seguinte excerto da referida missiva: “(…) Relembramos que este reforço de depósito deveria ter sido efectuado até 31 de Janeiro de 2019. (…)”.».

E, na conclusão CC aludem a acordo quanto aos € 100.000,00 «a título de reforço do sinal até o dia 28-05-2019».

Vejamos, então, a dita carta datada de 28/05/2019, junta como documento n.º 6 na contestação (fls. 73 do processo físico).

Trata-se de documento escrito em língua francesa, datado de 28/05/2019, de que se pode extrair ter como remetente a R., resultando do seu texto, grosso modo, que, para poder iniciar os trabalhos, tal R. pedia aos AA. a entrega de € 100.000,00, como convencionado no compromisso/promessa de venda (“compromis de vente”), lembrando que esse reforço de depósito (“renfort d’arrhes”) deveria ter sido efetuado até 31/01/2019.

Assim sendo, se a carta aludida é datada de 28/05/2019, nela se pedia o pagamento do que já se tinha vencido, segundo o acordado/contratado, em 31/01/2019.

Do que pode extrair-se que estamos perante interpelação/insistência, datada de 28/05/2019, para pagamento do que devia ter sido entregue/pago em 31/01/2019.

Não pode dizer-se, pois, por tal não resultar do documento – antes se podendo retirar o contrário –, que exista contradição, nem dar-se como provado, nesta perspetiva, que o acordo quanto aos € 100.000,00, a título de reforço do sinal, era o de pagamento até ao dia 28/05/2019.

Mas os impugnantes invocam ainda prova pessoal, que consideram abonatória da sua tese, oferecendo, na sua motivação de recurso, transcrição de excertos considerados relevantes da respetiva gravação áudio, reportando-se, em primeiro lugar, a «declaração de parte do Sr. AA:(ficheiro único 20220926094150_4038504_2870941) 26-09-2022 minuto 05:00 a 05:40» [cfr. conclusão AA], nos seguintes termos:

«AA:

“Em dezembro de 2018 não tinha nenhuma novidade dos vendedores e solicitaram uma reunião à H... e estiveram presentes duas testemunhas que estão lá fora”».

Ora, deste excerto – e os Apelantes apenas aludem, na sua conclusão AA, a este excerto (minuto 05:00 a 05:40) – nada resulta que infirme o vertido pela 1.ª instância no âmbito fáctico impugnado ([13]).

Visto o contrato promessa e respetivo clausulado – junto pelos AA. com a petição –, é certo resultar da respetiva cláusula terceira, n.º 1, al.ªs a), b) e c), que o preço acordado da venda (de € 425.000,00) seria pago da seguinte forma: € 50.000,00, a título de sinal e princípio de pagamento, até 30/09/2018; € 100.000,00, a título de reforço do sinal, até o dia 31-01-2019; e o remanescente, ou seja, € 275.000,00, a pagar de acordo com o mapa de pagamentos junto como anexo 2, ou, em alternativa, no ato da celebração da respetiva escritura de compra e venda.

Na fundamentação da convicção do Tribunal recorrido, por seu lado, exarou-se assim:

«Os autores AA e Sra. D.ª BB apresentaram declarações em audiência, as quais foram balizadas pela descrição da crescente desconfiança que sentiram no que respeita à conduta da sociedade ré no âmbito do contrato promessa de compra e venda em apreço. Ora, ambas as declarações tiveram como aspecto principal o desagrado com as delongas na apresentação do projecto de construção na Câmara Municipal ..., bem como com o facto do prédio em causa objecto da promessa de venda integrar o activo da herança do pai de EE.

Tais declarações permitiram apenas ao Tribunal compreender que a ré aceitou o pagamento nos modos acima indicados no ponto 3 dos factos provados. No restante, as declarações dos autores não puseram em causa a convicção do Tribunal, a qual, por sua vez, nutre alicerces nos restantes meios de prova acima referidos.

Acrescente-se ainda ter ficado patente que AA e a Sra. D.ª BB, coadjuvados por DD, ao longo da execução do contrato promessa, fixaram atenção apenas nos atrasos na entrega do respectivo projecto de construção e no facto do prédio em causa integrar acervo hereditário; tendo, assim, desatendido ao que lhes foi explicado, nas diversas reuniões ocorridas, quer por EE e quer por GG. A título complementar, mas de forma credível, GG realçou em audiência que, a partir de certo momento, ficou com a percepção que os autores não atendiam às explicações inúmeras vezes apresentadas, mas apenas tentavam arranjar motivos para não concluir o negócio de compra do prédio em causa.».

Ora, cabe dizer que o contrato-promessa, junto pelos AA. a fls. 07 v.º a 10 v.º do processo físico (com aditamento a fls. 11 e segs.), mostra-se assinado pelas partes, incluindo-se na categoria dos documentos particulares mencionados nos art.ºs 373.º e segs. do CCiv., pelo que sempre seria inadmissível prova testemunhal que tivesse por objeto quaisquer convenções, anteriores, contemporâneas ou posteriores, contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento, como seria uma eventual alteração de prazos de pagamento (quanto aos € 100.000,00), vista a proibição plasmada no art.º 394.º do CCiv..

É certo que a prova por declarações de parte não se quadra no âmbito da prova testemunhal, pelo que, quanto a ela, inexiste semelhante inadmissibilidade (cfr. art.º 466.º do NCPCiv.).

Todavia, não pode olvidar-se que o Tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se configurarem confissão (n.º 3 do mesmo art.º 466.º), sabido que a parte é quem tem interesse pessoal na causa, prestando declarações sobre o seu litígio, e consabido que o escopo das partes é sempre a obtenção de ganho de causa.

Assim, se à matéria agora sob impugnação não é admissível a prova testemunhal, deve a prova por declarações de parte a respeito ser valorada com todas as necessárias cautelas, por se tratar de quem tem o mais direto interesse no desfecho do pleito, estando em causa contrariar o conteúdo de um documento que a própria parte assinara (e contrariar, quanto a clausulado contratual escrito, em sentido favorável ao interesse dessa parte).

Em suma, as ditas declarações de parte, devidamente valoradas, não assumem força probatória e valor persuasivo que permita formar uma convicção diversa da formada pela 1.ª instância, para o que, desacompanhadas de provas corroborantes, lhes falta credibilidade bastante, antes se impondo, ao invés, o texto assinado do contrato celebrado entre as partes.

Assim, e tendo em conta que a Relação apenas deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se a prova produzida/invocada impuser decisão diversa, não pode proceder a impugnação recursiva nesta vertente fáctica.

4. - Resta o impugnado ponto 16 (cfr. conclusão GG), com o seguinte teor:

«16. Em data não concretamente apurada, mas ao longo do primeiro trimestre de 2019, os autores ordenaram o abate dos pinheiros plantados no prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1. Foi mais amplo o número de abate de pinheiros do que inicialmente projectara e mandara demarcar EE – sócio da ré –, com vista à construção da casa. O corte concretamente levado a efeito impôs que o prédio em causa passasse a deter menor valor no mercado imobiliário.».

Em sede conclusiva, os Apelantes limitam-se, quanto a prova de suporte, a invocar que, «face à prova produzida (testemunhal) o Tribunal não podia ter dado como provado» este facto. Assim, fica por se saber, à luz do acervo conclusivo, que prova testemunhal é essa ([14]) e qual o seu sentido em concreto, bem como quais as exatas passagens da gravação respetiva que impunham diversa resposta (supostamente, de não provado).

Importa, então, perscrutar a antecedente motivação, para verificação sobre se os Recorrentes cumpriram os ónus a seu cargo a que alude o art.º 640.º, n.ºs 1 e 2, al.ª a), do NCPCiv..

Ali consta excerto/transcrição do depoimento da testemunha DD nos seguintes termos:

«Testemunha DD depoimento prestado a 26-09-2022

Minuto 16:00 a minuto 17:55

Advogada: Os pinheiros que foram cortados foram com autorização do Sr EE?

Testemunha: Evidentemente

Advogada: Ele estava presente?

Testemunha: Ele estava presente com o Jardineiro.

Advogada: Relativamente aos pinheiro e ao furo o Sr EE não deixou cortar uns e questionou sobre quem é que ia ficar com os pinheiros?

Testemunha: O Jardineiro é que ficou.

Advogada: O Sr EE perguntou quem é que ia ficar com os pinheiros?

Testemunha: Não, não perguntou nada.

Advogada: Perguntou porventura se iam vender a madeira

Testemunha: não senhora, não perguntou nada. A única coisa que ele disse é que queria o pinhal cortado e limpo.

Advogada: Falou de alguma desvalorização do terreno?

Testemunha: Nenhuma, nunca foi falado disso.».

Concluem os Recorrentes que «Andou mal o Tribunal a quo em considerar apenas como motivação as declarações de EE», sendo que «quase todas as testemunhas afirmaram que o corte dos pinheiros foi acertado de mútuo acordo entre as partes».

Ora, da justificação da convicção do Tribunal consta:

«EE prestou um depoimento credível e concreto, mantendo suficiente nível de isenção, apesar de ser sócio da ré e, nestes termos, ter assumido activa acção na celebração e na execução do contrato promessa que veio a ser celebrado com os autores.

O seu contributo permitiu ao Tribunal alcançar convicção positiva acerca do acima exposto nos pontos 13, 16 e 17 dos factos provados.

(…).

Na esteira e sensivelmente com o mesmo âmbito do exposto por EE, testemunhou GG, ou seja o agente imobiliário que apresentou os autores ao próprio membro da sociedade ré - EE – e que no decurso da execução do respectivo contrato promessa pôde reunir não apenas com os autores bem como com aquele sócio da ré.

Não obstante o acima exposto e analisando todos os meios de prova disponíveis nos autos e concretizados em audiência de julgamento, não foi possível apurar o concreto valor de desvalorização do prédio em causa motivada pelo corte de pinheiros efectivamente autorizado pelos autores.

Com efeito, nem mesmo os credíveis e técnicos contributos do Sr. Eng.º Civil HH (autor do projecto de construção acima referido no ponto 5 dos factos provados) e do Sr. Eng.º II (topógrafo, o qual procedeu à demarcação da zona em que seria construída a casa no referido terreno) foram capazes de apurar – ou sequer de avançar estimativa – acerca do valor de tal desvalorização. Neste âmbito, HH realçou que, para alcançar tal valor, teria de proceder a cálculos matemáticos.

Não obstante, tanto HH, II, GG e ainda EE foram peremptórios no sentido de que o corte de pinheiros empreendido acarretou desvalorização do terreno, no que respeita ao mercado imobiliário.

DD é amigo dos autores sensivelmente desde o ano de 2018. Do seu discurso ficou claro que o mesmo assumiu parte substancial das conversações encetadas com a ré nos momentos posteriores à data da assinatura do contrato promessa (ou seja, após o dia .../.../2018), em particular com EE; tendo inclusive determinado ou, pelo menos, fortemente influenciado a tomada de decisões por parte dos mesmos autores.

Aliás, no sentido de que DD assumiu boa parte da liderança nos termos acima indicados testemunharam, de forma credível e isenta, EE e GG.

O discurso de DD não se mostrou suficientemente concreto e isento, uma vez que, em quase toda a sua extensão, apenas consubstanciou uma defesa - intransigente e pouco atenta ao decurso dos acontecimentos em apreço - do que a mesma testemunha entendeu e entende serem os interesses dos autores.».

Perante tal justificação da convicção, cabia aos Apelantes mostrar/evidenciar o erro de julgamento do Tribunal quanto ao dito facto 16, mediante análise crítica das provas convocadas a respeito (as invocadas pelos impugnantes e as mencionadas na sentença).

Ora, os impugnantes não procedem a tal análise crítica, nem evidenciam tal erro de julgamento.

Com efeito, apenas invocam uma testemunha – DD –, sem rebater os argumentos que levaram o Tribunal a desvalorizar a força probatória do respetivo depoimento.

E, por outro lado, não evidenciam, em análise crítica, as razões pelas quais a prova em que se baseou o Tribunal não merecia o crédito que lhe foi conferido por este.

Termos em que não se demonstra, salvo o devido respeito, qualquer erro de julgamento de facto ([15]), não impondo a prova produzida a alteração da decisão da matéria de facto, com o que ocorre decaimento dos Recorrentes nesta parte.

 C) Matéria de facto

1. - Sindicada pela Relação a decisão relativa à matéria de facto, é o seguinte o quadro de facto provado a considerar:

«1. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do documento com a epígrafe “Contrato Promessa de Compra e Venda” datado de 30-8-2018, junto como documento n.º 1 da PI (fls. 7 verso e ss). O referido documento configura em síntese o contrato de promessa de compra e venda celebrado entre os autores e a ré, para a compra do prédio urbano localizado no ..., localidade de ..., ..., ..., freguesia ... concelho ..., constituído por terreno para construção com área total do terreno de 1610,00 m2, descrito na CRP ... sob o n.º ...58 da freguesia ..., inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...98, da referida freguesia, bem como de moradia a edificar sobre o referido prédio [cópia da certidão predial do prédio em causa consta de fls. 37 verso e 38, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido]. Da cláusula primeira do referido contrato promessa consta que “(…) Os promitentes vendedores irão adquirir o prédio (…)”

2. Os autores e a ré acordaram que o prédio seria vendido pelo preço de € 425.000,00, com o pagamento a ser efectuado da seguinte forma:

a. € 50.000,00 a título de sinal e princípio de pagamento até o dia 30-9-2018.

b. € 100.000,00 a título de reforço do sinal até o dia 31-01-2019.

c. e o remanescente, ou seja 275.000,00 a ser pago de acordo com o mapa de pagamentos junto como documento 3 no acto da celebração da respectiva escritura de compra e venda.

3. Os autores procederam ao pagamento, em duas tranches, da quantia de € 50.000,00, respectivamente nos meses de Outubro e de Novembro de 2018, conforme resulta dos documentos identificados na contestação com os n.ºs 1 e 2 (fls. 51 verso e 53 verso). Tais pagamentos foram então considerados tempestivos por parte da ré, a qual sabia que os autores dependiam da transferência de fundos provenientes de França.

4. Os autores jamais procederam ao pagamento da quantia de € 100.000,00, a título de reforço de sinal.

5. O pedido de licenciamento das obras de construção da referida casa entrou nos serviços camarários no dia 04-4-2019 (documento n.º 5 da contestação, a fls. 72).

6. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da carta datada de 28-5-2019 e junta como documento n.º 6 na contestação (fls. 73), através do qual a ré interpelou os autores para procederem ao reforço do sinal, no valor de € 100.000,00 (fls. 73, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). Destaca-se o seguinte excerto da referida missiva: “(…) Relembramos que este reforço de depósito deveria ter sido efectuado até 31 de Janeiro de 2019. (…)”.

7. Os autores não procederam ao referido reforço.

8. Os autores comunicaram, através de carta datada de 18-5-2020, a sua intenção de resolver o contrato promessa acima referido (documento n.º 7 junto com a contestação, a fls. 73 verso e 74, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). A aludida carta foi recepcionada pela ré no dia 22-5-2020 (cfr. resulta da cópia do respectivo aviso de recepção postal, a fls. 15 verso e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).

Da aludida carta passa-se a transcrever os seguintes excertos:

“(…) 4 Sucede que, do vosso lado, não houve cumprimento das obrigações assumidas no âmbito do referido contrato.

5 Até ao momento, a escritura ainda não é passível de se realizar. Tinham-se comprometido em celebrar a mesma no passado verão. Tal não sucedeu, visto os clientes terem descoberto que, só no decorrer do ano de 2019 é que conseguiram submeter o projecto de construção.

6 Houve uma total quebra de confiança.

10 Posto isso, os clientes pretendem rescindir o contrato promessa de compra e venda com justa causa, por incumprimento dos prazos de obtenção de licença de construção bem como da construção propriamente dita.

(…)”.

9. O prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1 integrou o património hereditário de CC, cuja cópia da respectiva escritura pública de partilha, outorgada a 30-12-2020 consta de fls. 26 a 36, cujo teor aqui se considera reproduzido. EE – sócio da ré –, FF e JJ constam da referida escritura, respectivamente, como filho e netos do falecido.

10. A 29-01-2021, o prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1 foi objecto de venda por parte de FF e JJ à sociedade ré (documento n.º 9 junto com a contestação, a fls. 23 a 25 verso).

11. A 29-01-2021, a ré procedeu à venda do prédio urbano acima identificado (descrito na CRP ... sob o n.º ...58 da freguesia ...) à sociedade P..., Sa. pelo valor de € 180.000,00, tudo conforme resulta do respectivo contrato de compra e venda, cuja cópia configura o documento n.º 8 junto com a contestação (fls. 75 verso a 78, cujo teor aqui se considera reproduzido).

12. A 17-12-2020, a ré procedeu à venda do prédio urbano contíguo ao prédio acima referido (descrito na CRP ... sob o n.º ...93 da freguesia ...) a KK pelo valor de € 240.000,00, tudo conforme resulta do respectivo contrato de compra e venda, cuja cópia configura o documento n.º 9 junto com a contestação (fls. 78 verso 78 a 80, cujo teor aqui se considera reproduzido).

13. O prédio acima identificado em 12. encontra-se adjacente ao prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1.

14. O prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1. tem uma área de 2.000 m2 e o seu valor patrimonial tributário ascende a € 93.950,00, tudo conforme resulta da respectiva certidão matricial junta como documento n.º 11 da contestação (fls. 81 verso e 82, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).

15. O prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 12. tem uma área de 2.110 m2 e o seu valor patrimonial tributário ascende a € 76.730,00, tudo conforme resulta da respectiva certidão matricial junta como documento n.º 10 da contestação (fls. 80 verso e 81, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).

16. Em data não concretamente apurada, mas ao longo do primeiro trimestre de 2019, os autores ordenaram o abate dos pinheiros plantados no prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1. Foi mais amplo o número de abate de pinheiros do que inicialmente projectara e mandara demarcar EE – sócio da ré –, com vista à construção da casa. O corte concretamente levado a efeito impôs que o prédio em causa passasse a deter menor valor no mercado imobiliário.

17. Ao projecto de construção inicial os autores solicitaram, por mais de uma vez, alterações.».

2. - E persiste julgado não provado:

«a) Que a desvalorização resultante do abate dos pinheiros plantados no prédio objecto do contrato promessa – acima referido no ponto 16 dos dos factos provados – ascendesse à quantia de € 60.000,00.».

b) ELIMINADA.


***

D) Da impugnação de direito

1. - Nulidade(s) do contrato-promessa

1.1. - Da nulidade por promessa de venda de bem alheio

Referem os Apelantes – cfr. conclusão J – que foi desconsiderado, na sentença, o facto de a R. sempre ter tido conhecimento de que celebrava um contrato nulo pois que o bem era objeto de partilha e somente foi concretizada a tradição dois anos após a assinatura do contrato-promessa com o A..

Ora, cabe dizer, desde logo, que esta argumentação não pode proceder, inexistindo a invalidade contratual imputada.

Com efeito, ambas as partes – trata-se de um contrato-promessa bilateral de compra e venda – sabiam e assumiram que, ao tempo da promessa, o imóvel não era (ainda) pertença da parte promitente vendedora.

É o que tem de extrair-se do texto assinado do contrato-promessa, onde começou por se fazer constar (cláusula 1.ª) que «Os promitentes vendedores irão adquirir o prédio (…)», tal como também consta do ponto 1.º dos factos provados – «Da cláusula primeira do referido contrato promessa consta que “(…) Os promitentes vendedores irão adquirir o prédio (…)”».

Assim, por expresso no texto do contrato, não poderá dizer-se que alguma das partes ignorava – e, muito menos, que foi enganada – que o prédio não era ainda pertença da parte promitente vendedora ao tempo da celebração da promessa.

E nem tal circunstância configuraria, em qualquer caso, nestas circunstâncias, uma nulidade contratual.

É certo que é nula a venda de bens alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para a realizar (art.º 892.º do CCiv.), também sendo fora de dúvida que ao contrato-promessa são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, excetuadas, designadamente, as que, pela sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa (cfr. art.º 410.º, n.º 1, do CCiv.).

Ora, é conhecida a diversa natureza do contrato-promessa (por exemplo, de compra e venda) e do contrato prometido.

Enquanto o contrato de compra e venda ([16]) tem como efeito, entre outros, a transmissão da propriedade da coisa (no caso, um imóvel), como resulta da al.ª a) do art.º 879.º do CCiv., assumindo, por isso, eficácia real e definitiva (sobre o domínio), a promessa de compra e venda não opera a transmissão do direito de propriedade, apenas originando uma obrigação de contratar, a obrigação de celebrar o contrato prometido/definitivo.

Assim, não é nulo o contrato-promessa por se prometer vender um bem que ainda não está no património do promitente vendedor.

Este pode prometer validamente vender um bem alheio ou futuro, pois trata-se de um contrato provisório/preliminar (com função contratual instrumental). Outra coisa é a venda de bem alheio (contrato definitivo).

No contrato-promessa de bem alheio ou de bem futuro, em si válido, por apenas vincular o promitente a celebrar no futuro o contrato prometido, o que pode vir a ocorrer é que não chegue o bem a pertencer ao promitente vendedor, caso em que este não conseguirá cumprir a promessa – situação, então, de eventual incumprimento da promessa e não de invalidade da promessa.

Como referem, a propósito, Pires de Lima e Antunes Varela – e é pacífico na doutrina e na jurisprudência –, «Não produzindo o contrato-promessa efeitos translativos, mas apenas a obrigação (obrigação de prestação de facto) de celebrar o contrato definitivo, deve entender-se que também lhe não são aplicáveis as disposições que declaram nula a alienação de coisa alheia (…). Nada impede, por exemplo, que se prometa a venda de bens alheios ou parcialmente alheios (…).» ([17]).

No caso, os Recorrentes até reconhecem que «JJ. A Ré adquiriu a propriedade, ainda que 2 anos e 5 meses, após a assinatura do contrato de promessa com o Autor (…)» (itálico aditado). Isto é, a R., tendo assumido uma obrigação de resultado, logrou alcançar esse resultado, tornando-se proprietária do prédio que havia prometido vender.

Termos em que inexiste a invocada nulidade do contrato-promessa.

1.2. - Da nulidade do contrato por falta de reconhecimento notarial

Invocam os Recorrentes (conclusão L) que o Tribunal a quo não se pronunciou «relativamente à nulidade atípica prevista no art. 410.º, n.º 3, do CC – falta de reconhecimento presencial das assinaturas do promitente ou promitentes», pretendendo, assim, valer-se agora desse vício.

E, compulsado o texto do contrato-promessa, verifica-se que inexiste qualquer reconhecimento presencial de assinaturas.

Dispõe o art.º 410.º, n.º 3, do CCiv. que, no caso de promessa respeitante à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre edifício, ou fração autónoma dele, já construído, em construção ou a construir, o documento referido no número anterior deve conter o reconhecimento presencial das assinaturas do promitente ou promitentes e a certificação, pela entidade que realiza aquele reconhecimento, da existência da respetiva licença de utilização ou de construção; contudo, o contraente que promete transmitir ou constituir o direito só pode invocar a omissão destes requisitos quando a mesma tenha sido culposamente causada pela outra parte.

Trata-se de uma nulidade mista ou atípica, que pode ser invocada pelo promitente-comprador, considerando, em tempos mais recuados, Pires de Lima e Antunes Varela que é de conhecimento oficioso pelo tribunal, mas havendo, já então, doutrina em contrário, como tais Autores logo reconheciam, aludindo a Calvão da Silva ([18]).

No caso, os AA./Recorrentes não invocaram tal nulidade perante a 1.ª instância ([19]), razão pela qual a questão não foi conhecida na sentença, tratando-se, assim, de questão nova – apenas suscitada no recurso –, que só poderá ser conhecida pela Relação se for entendido que se trata de invalidade de conhecimento oficioso.

Assim, se é certo que o julgador não está sujeito ao alegado pelas partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, pois lhe cabe, como é claro, conhecer e aplicar o direito ao caso (art.º 5.º, n.º 3, do NCPCiv.), também é fora de dúvida que não servem os recursos, por regra, para suscitar e/ou decidir questões novas.

É, realmente, consabido que as questões a decidir no recurso não podem ser questões novas – exceto as de conhecimento oficioso –, mas apenas as já colocadas ao Tribunal recorrido e por este decididas. Na verdade, os recursos não se destinam a apreciar questões novas, não colocadas ao Tribunal recorrido, mas a reapreciar a decisão sobre questões/matérias por aquele julgadas ([20]).

Donde que a matéria/exceção de invalidade formal aludida, somente colocada na apelação, não possa ser apreciada nesta sede, estando vedado às partes – como tem de concluir-se – apresentá-la na fase recursória e ao Tribunal de recurso conhecê-la, a não ser, como dito, que se tratasse de questão de conhecimento oficioso.

Porém, esta questão está resolvida, em termos pacíficos, desde o Assento do STJ n.º 3/95, de 01/02/1995 – hoje com valor de uniformização de jurisprudência –, que fixou que a omissão das formalidades previstas no n.º 3 do art.º 410.º do CCiv. não pode ser conhecida oficiosamente pelo tribunal ([21]), assim consagrando o entendimento defendido por Calvão da Silva ([22]).

Em suma, tratando-se de questão nova, que não é de conhecimento oficioso, não pode a Relação conhecer desta invocada invalidade formal do contrato-promessa dos autos, assim decaindo a argumentação dos Apelantes a respeito.

2. - Incumprimento definitivo do contrato-promessa

Na sentença, em termos sintéticos, discorreu-se assim:

«A resolução do contrato promessa de compra e venda e a restituição do sinal em dobro pressupõe o incumprimento definitivo, e já não a simples mora.

Por sua vez, a mora apenas legitima a resolução quando convertida em incumprimento definitivo, quer pela perda de interesse do credor, só relevante se for objectiva, ou então pelo recurso à interpelação admonitória, com a fixação de prazo razoável, apenas dispensável se houver uma recusa antecipada do devedor em cumprir (artigos 801.º, n.º 2 e 802.º, n.º 2, por remissão do artigo 808.º do Código Civil).

Antes de se poder apreciar se a perda de interesse dos autores se consubstancia em elementos objectivos, há que ter em consideração que, apesar de interpelados por carta (cfr. ponto 6 dos factos provados), os mesmos autores não procederam ao pagamento do reforço de sinal.

Ora, tal ausência de pagamento consubstancia incumprimento do contrato promessa por parte dos autores, conforme dispõe a cláusula 3.º, n.º 1, alínea b), do contrato promessa celebrado e, de resto, conforme foram interpelados no mês de Maio de 2019 (artigo 801.º, n.º 2, por remissão do artigo 808.º do Código Civil).

Assim sendo, a resolução levada a efeito pelos autores não tem fundamento e mostra-se ineficaz, com e para todos os efeitos.

Nestes termos, à ré assiste o direito de fazer sua a quantia efectivamente entregue pelos autores a título de sinal, ou seja € 50.000,00 (artigo 442.º, n.º 2 – 1.ª parte – do Código Civil).».

Os AA./Recorrentes haviam invocado, na sua petição, o incumprimento do contrato-promessa pela R. e a perda de interesse dos promitentes compradores, ao abrigo do disposto no art.º 808.º do CCiv..

Começaram, aliás, por alegar a sua perda de interesse na prestação, exprimindo, para tanto, que sempre efetuaram tempestivamente os pagamentos convencionados, sem que a R. desse início à construção, ao ponto de, em 18/05/2020 – recorde-se que o contrato-promessa era de 30/08/2018 –, os AA. terem notificado/interpelado a R. para «rescindir o contrato de promessa», por terem descoberto que apenas no ano de 2019 «foi submetido o projeto de construção», termos em que «houve uma total quebra de confiança» dos AA. na R. (cfr. art.ºs 10.º a 14.º da petição).

Quanto ao aludido incumprimento do contrato-promessa pela R., basearam-se os AA. na alegação de que a R. veio a vender a propriedade em 29/01/2021 a terceiro, o que mostra uma deliberada intenção de não cumprir a promessa (uma recusa antecipada de cumprimento), revelando «comportamento concludente no sentido do incumprimento definitivo do contrato», sem que tenha procedido, pela sua parte, à respetiva resolução (cfr. art.ºs 15.º, 26.º, 27.º e 29.º a 31.º da petição).

Contrapõem agora os AA./Apelantes, perante aquela sentença desfavorável, que a R. incumpriu definitivamente os prazos de licenciamento, por o prédio em questão somente «ter integrado o património hereditário de CC, cuja cópia da respectiva escritura pública de partilha, outorgada a 30-12-2020, mais de 2 anos após a assinatura do contrato (…) e mais de seis meses após a interpelação admonitória efetuada pelo Autor» (conclusão B).

Vejamos, então, o que resulta provado quanto a tais prazos de licenciamento, para o que importa analisar o clausulado contratual, junto a fls. 7 v.º e segs. do processo físico.

Como já mencionado, da cláusula 1.ª consta, desde logo, que os «promitentes vendedores irão adquirir o prédio», o que significa que ao tempo da promessa o mesmo ainda não lhes pertencia, a que acresce que a promessa de compra e venda incluía uma «moradia a edificar sobre o prédio», que o promitente vendedor se obrigou a construir (cláusula 2.ª, n.ºs 1 e 2).

Daqui logo se depreende uma inevitável morosidade, expetável em condições de normalidade, deste a outorga do contrato-promessa até à celebração do contrato prometido (compra e venda): primeiro, era preciso consumar a aquisição do prédio; depois, levar a cabo todas as diligências necessárias ao início das obras; e, por fim, edificar a moradia e obter as licenças necessárias à sua venda. Só então, a venda prometida poderia ser realizada.

Da cláusula 4.ª consta que a escritura de compra e venda «será exarada no prazo máximo de um mês após a obtenção da respetiva licença de utilização», ficando a marcação respetiva a cargo da promitente vendedora, a dever notificar a contraparte do dia, hora e local de outorga da escritura.

Quer dizer, tendo em conta aquela situação de morosidade previsível – pelas diligências (prévias) que se impunha levar a cabo, demandando tempo incerto –, não foram fixadas datas concretas a deverem ser cumpridas (a não ser para os pagamentos a cargo dos promitentes compradores, como consta da cláusula 3.ª e do ponto 2 dos factos provados), mormente para a celebração da escritura de compra e venda e aludidos «prazos de licenciamento».

Da cláusula 6.ª, n.º 3, por seu lado, apenas consta que, na hipótese de o projeto não obter aprovação camarária, «deverá o promitente vendedor devolver aos promitentes compradores todas as quantias recebidas no âmbito do presente contrato no prazo máximo de dois meses».

Não se vê, assim, que houvesse mora da R., seja quanto à aquisição do prédio, seja quanto à subsequente realização de obras ou respetivos licenciamentos e, em suma, à outorga do contrato de compra e venda, para o que o contrato não oferece datas, nem fixa prazos perentórios.

Falece, pois, o primeiro argumento referido dos Apelantes.

Passando à «interpelação admonitória efetuada pelo Autor» – como visto, para «rescindir o contrato de promessa», por terem os demandantes descoberto que apenas no ano de 2019 «foi submetido o projeto de construção», gerando «uma total quebra de confiança» na R. –, importa perscrutar a factualidade provada.

Ora, resulta apurado que, efetivamente, o pedido de licenciamento das obras de construção entrou nos serviços camarários no dia 04/04/2019 (ponto 5).

Posteriormente, é sabido que os AA., por carta datada de 18/05/2020, rececionada pela R. a 22/05/2020, comunicaram a sua intenção de resolver o contrato promessa (ponto 8), com a seguinte fundamentação:

 “(…) 4 Sucede que, do vosso lado, não houve cumprimento das obrigações assumidas no âmbito do referido contrato.

5 Até ao momento, a escritura ainda não é passível de se realizar. Tinham-se comprometido em celebrar a mesma no passado verão. Tal não sucedeu, visto os clientes terem descoberto que, só no decorrer do ano de 2019 é que conseguiram submeter o projecto de construção.

6 Houve uma total quebra de confiança.

10 Posto isso, os clientes pretendem rescindir o contrato promessa de compra e venda com justa causa, por incumprimento dos prazos de obtenção de licença de construção bem como da construção propriamente dita.” (itálico aditado).

Perante isto, resta concluir que não resultam fixados os prazos a que se reportam os AA./Apelantes. Por um lado, nada mostra incumprimento dos prazos de obtenção de licença de construção e, por outro lado, não se encontra onde esteja plasmado o compromisso em celebrar a escritura «no passado verão».

Falham, pois, factos de suporte que justifiquem a invocada «total quebra de confiança», tal como não se demonstra situação de «incumprimento dos prazos» ou do contrato.

Termos em que a pretendida «rescisão»/resolução do contrato-promessa se queda insubsistente com este fundamento.

Aliás, em rigor não poderia falar-se em interpelação admonitória, posto não se demonstrar mora (por falta de definição de prazos de cumprimento), nem ser fixado um qualquer prazo suplementar razoável para cumprir (cfr. art.º 808.º do CCiv.).

Donde que não se possa falar em conversão da mora em incumprimento definitivo por via de interpelação admonitória/recusa de cumprimento.

E quanto à invocada perda de interesse do credor?

Como é bem consabido, diversa do incumprimento contratual é a situação de simples mora, ficando o devedor constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efetuada no tempo devido (art.º 804.º, n.º 2, do CCiv.).

O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que se vinculou (art.º 762.º, n.º 1, do CCiv.), devendo tal realização ser integral, exceto se outro for o regime convencionado ou imposto por lei ou pelos usos (cfr. art.º 763.º, n.º 1, do mesmo Cód.).

O momento em que a obrigação deve ser cumprida pode ser fixado por convenção das partes, podendo este prazo convencional ser originário ou subsequente (cfr. art.º 777.º do CCiv.).

O devedor só fica constituído em mora depois de interpelado para cumprir, havendo, porém, mora da sua parte, independentemente de interpelação, quando, designadamente, a obrigação tiver prazo certo (art.º 805.º, n.ºs 1 e 2, do CCiv.) ([23]).

A simples mora debitoris não confere, por regra, mais que um direito indemnizatório (cfr. art.º 804.º, n.º 1, do CCiv.), não pondo em causa a subsistência do vínculo contratual, sendo que nas obrigações pecuniárias a indemnização decorrente da mora do devedor corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (art.º 806.º, n.º 1, do CCiv.), sendo devidos os juros legais, exceto se antes da mora for devido juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diverso do legal (art.º citado, n.º 2).

Porém, pode o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não ser realizada dentro do prazo que razoavelmente seja fixado pelo credor, caso em que se considera não cumprida, em definitivo, a obrigação (art.º 808.º, n.º 1, do CCiv.).

Mas a perda de interesse – o que agora importa – para o credor (aqui AA.) deverá ser apreciada objetivamente (art.º 808.º, n.º 2, do CCiv.), pois que se pretende “… evitar que o devedor fique sujeito aos caprichos daquele (credor) ou à perda infundada do interesse na prestação. Atende-se, por conseguinte, ao valor objectivo da prestação, não ao valor da prestação determinado pelo credor, mas à valia da prestação medida (objectivamente) em função do sujeito” ([24]).

Nesta perda “o atraso verificado na prestação implica que esta deixe de ter interesse para o credor”, segundo verificação, não por parâmetros subjetivos, mas de ordem objetiva. “Será, por exemplo, o caso de se contratar um transporte para determinada zona, onde vai ter lugar um evento em que o credor necessita de estar presente, e o devedor atrasa-se por forma a que já não é possível chegar ao local do destino em tempo útil. Nesse caso, é obvio que não é admissível a purgação da mora pela realização tardia da prestação do transporte, podendo o credor legitimamente recusar a prestação e solicitar indemnização pelo incumprimento definitivo” ([25]).

Como refere Mário Júlio de Almeida Costa ([26]), o critério legal da apreciação objetiva “significa que a importância de tal interesse, embora aferida em função da utilidade concreta que a prestação teria para o credor, não se determina de acordo com o seu juízo arbitrário, mas considerando elementos susceptíveis de valoração pelo comum das pessoas. Além disso, exige-se a efectiva perda do interesse do credor e não uma simples diminuição. O caso mais frequente consistirá no desaparecimento da necessidade que a prestação se destinava a satisfazer” ([27]).

Significaram os AA./Apelantes, na dita carta de resolução (de 18/05/2020), que havia o compromisso falhado de celebração da compra e venda no anterior/passado verão, falha essa imputável à R., por só no decorrer do ano de 2019 ter sido submetido o projeto de construção. O que impedia a realização da escritura, pelo que houve uma total quebra de confiança.

Ora, não resulta provado tal invocado compromisso de celebração da compra e venda no verão de 2019, nem o estabelecimento, como visto, de prazos perentórios contratuais ([28]) que a R. tivesse inobservado.

Ademais, sendo o contrato-promessa datado de 30/08/2018, sabido que o prédio ainda teria de ser adquirido, para depois, com aprovação de projeto de construção, se construir e licenciar uma moradia, conhecidos ainda os tempos normais/comuns de construção de moradias (em condições de fiabilidade e segurança), não se pode dizer que fosse líquido que a R. conseguisse obter e realizar tudo isso no prazo de um ano. Ao invés, tal prazo de um ano até parece exíguo para toda essa realização, em parte dependente do concurso de terceiros (como, por exemplo, a entidade licenciadora/camarária).

Donde que não se veja sustentada em factos objetivos – que não se surpreendem no elenco da materialidade provada – a conclusão de total quebra de confiança dos promitentes adquirentes e, por essa via, uma efetiva perda (objetiva) de interesse na prestação ([29]).

Na verdade, não foram provados factos que mostrem que, objetivamente, o caso é de perda do interesse que levou os AA. a celebrar o contrato-promessa, não se vislumbrando quais os motivos pelos quais já não teria qualquer interesse para eles a aquisição da moradia.

Em suma, não se demonstra perda do interesse do credor a que alude o art.º 808.º do CCiv..

Mas haverá recusa perentória a cumprir por parte da R.?

É certo que se prova, quanto ao prédio em questão, que integrou o património hereditário de CC, existir escritura pública de partilha, outorgada em 30/12/2020 (facto 9).

Mas antes disso, a R. interpelou os AA. para procederem ao reforço do sinal, por carta datada de 28/05/2019, reforço esse no valor de € 100.000,00, o qual «deveria ter sido efectuado até 31 de Janeiro de 2019» (facto 6.).

E está provado que, efetivamente, resulta do contrato-promessa que os € 100.000,00 de reforço do sinal tinham prazo estabelecido de pagamento, até, como refere a R., 31/01/2019, sendo seguro que os autores não procederam ao referido reforço.

Com tal omissão de reforço do sinal, ultrapassado o prazo estipulado, os AA. constituíram-se em mora, posto uma tal prestação, embora em atraso, ainda fosse, obviamente, possível.

A carta da R. de 28/05/2019 – que começava por manifestar a preocupação de realização do reforço do sinal, a fim de poder iniciar os trabalhos com brevidade –, embora traduza uma interpelação para pagar, não configura interpelação admonitória, no âmbito do art.º 808.º do CCiv. ([30]), posto não conceder prazo adicional razoável algum nem equacionar um quadro de incumprimento definitivo do contrato-promessa e respetiva opção resolutiva.

Em suma, a situação, nesta parte, é de simples mora dos AA. quanto ao reforço do sinal, mora essa a que não foi posto fim.

Acontece que a carta de resolução dos AA., de 18/05/2020, não encontra fundamento válido para a extinção do contrato-promessa por motivo imputável à R., como já anteriormente observado.

Ao assim proceder, os AA. obtiveram a resolução/extinção do negócio, formalmente declarada à contraparte, mas sem fundamento imputável a esta.

Daí que a resolução, sem «justa causa», responsabilize os próprios AA., que lançaram mão, eficazmente, desse meio extintivo do contrato, mas sem fundamento jurídico válido para tanto. A consequência, no plano jurídico substantivo, é a de a extinção da promessa, assim ocorrida, lhes ser imputável.

Ora, só depois dessa declaração resolutiva/extintiva (recebida pela R. em 22/05/2020), é que o prédio a que aludia a promessa foi vendido a terceiro (em 29/01/2021, como resulta dos factos 10 e 11).

Assim sendo, tal venda não traduz recusa perentória de cumprimento da promessa pela R., pela simples razão de que então o contrato-promessa já estava resolvido/extinto por declaração unilateral recetícia infundada da contraparte (os promitentes compradores).

Com a resolução infundada/ilícita dos AA., o contrato-promessa não deixou de ficar extinto – por esse motivo –, o que equivale ao incumprimento definitivo do mesmo, como se se tratasse aqui de uma recusa perentória a cumprir.

Por isso, a R. ficou livre do vínculo contratual, assim extinto, que a ligava aos AA.. E, livre da promessa, a R. podia vender – como vendeu – o imóvel a terceiro.

Com isso, não incorreu em recusa perentória e definitiva de cumprimento do contrato-promessa, posto este já estar anteriormente extinto por motivo exclusivamente imputável à contraparte (promitentes-compradores, que resolveram ilicitamente o negócio).

Em suma, há, efetivamente – salvo sempre o devido respeito –, incumprimento definitivo da promessa pelos promitentes-compradores, os AA./Recorrentes, o qual lhes é imputável em exclusivo, posto não se notar, perante a factualidade provada – a única a considerar para decisão do recurso –, qualquer ato culposo da contraparte que tenha concorrido para o declínio do contrato-promessa.

Improcede, por isso, salvo o devido respeito, qualquer argumentação em contrário, entendendo-se, também aqui, ser necessária a verificação de incumprimento definitivo – não a simples mora debitoris, contrariamente ao que os Recorrentes vieram defender nas suas conclusões – para que seja aplicável o mecanismo indemnizatório da perda de sinal (previsto no art.º 442.º do CCiv.), posto que é conhecida a controvérsia doutrinal e, embora em (muito) menor escala, jurisprudencial nesta matéria ([31]) ([32]).

Dito isto, a argumentação vertida na al.ª C das conclusões dos Apelantes não assume o relevo pretendido, tendo em conta, como visto, que não foram estabelecidos prazos contratuais para a aquisição do imóvel pela R. e para a celebração do contrato-promessa, ao contrário do que foi feito quanto ao tempo do cumprimento/entrega relativamente ao montante de € 100.000,00 (reforço do sinal).

Dir-se-ia mesmo – se nos é permitida a expressão – que os AA. só de si próprios se poderão queixar, ao não exigirem, aquando da contratação, o estabelecimento daqueles prazos (a deverem ficar plasmados, obviamente, no clausulado do contrato-promessa), de molde a que também a contraparte ficasse temporalmente vinculada.

E, quanto à al.ª D das conclusões, nada se prova sobre os motivos da demora em relação à submissão do projeto de construção, nem de a escritura pública de partilha apenas ter sido outorgada em 30/12/2020 (facto 9), razão pela qual, por falta de substrato fáctico, não poderia concluir-se por conduta abusiva ou, de algum modo, inadimplente ([33]).

Ante o que resultou apurado nos autos, e à luz de uma orientação de razoabilidade – aquela que poderia ser acolhida pelo comum das pessoas –, não se vê que no caso estejamos perante situação de perda efetiva (não uma simples diminuição eventual) do interesse que o AA. tinham na prestação, tudo ponderado, como se impõe, num quadro de boa-fé, que obriga a que, tanto na celebração como na execução dos contratos – ou até na sua fase de liquidação –, as partes procedam de acordo com a norma de conduta da boa-fé objetiva, postulando um padrão de conduta (com procedimentos honestos, corretos e leais) que não sacrifique inútil ou desnecessariamente os interesses da contraparte, antes se comprometa, na medida do razoável, pelo levar a cabo do programa contratual em termos reciprocamente vantajosos para os contraentes, atento o interesse contratual esperado e prosseguido por cada um deles ([34]).

Já quanto, por fim, à al.ª JJ das conclusões, resta reiterar que foram os AA. quem, anteriormente à venda do imóvel a terceiro, puseram fim ao contrato-promessa, através da aludida ilícita/infundada resolução/«rescisão»/extinção do contrato, com isso libertando a contraparte do vínculo, em termos de esta poder vender a terceiro, sem ofensa à promessa extinta.

Ademais, tal ilícita/infundada resolução não pode deixar – reitera-se também – de configurar recusa perentória de cumprimento, geradora do incumprimento definitivo da promessa, razão pela qual assiste à promitente vendedora fazer seu o sinal recebido, no montante de € 50.000,00 (nos termos do disposto no art.º 442.º, n.º 2, primeira parte, do CCiv.), como decidido na sentença em crise.

Em suma, improcedendo as conclusões dos Apelantes em contrário, é de manter nesta parte a sentença recorrida.

3. - Remanescente direito indemnizatório

Importa, finalmente, saber se não há fundamento para indemnização à R./Reconvinte pelo corte excessivo de pinheiros, considerando os AA./Reconvindos que foram injustamente condenados a indemnizar.

Na sentença pode ler-se, em jeito de fundamentação sintética:

«Noutro quadrante e tendo presente a prova realizada (pontos 12 a 16 dos factos provados), à ré assiste o direito em ser compensada pelo corte de pinheiros concretizado no prédio (artigo 483.º e seguintes do Código Civil).

Porém, não foi apurado o valor concreto do dano causado pelo corte de tais pinheiros. Face à ausência de elementos para fixar o valor exacto do dano, impõe-se relegar a sua fixação para o que vier a ser liquidado em execução da presente Sentença (artigo 609.º, n.º 2 do Cpc).».

Ora, manifestamente, os Recorrentes apostavam na alteração desta parte da respetiva condenação suportados na acalentada expetativa de procedência da sua impugnação da decisão de facto, mormente quanto ao facto 16, já referido, do elenco dado como provado, como expressam na conclusão GG, o qual pretendiam ver julgado não provado, o que, a ocorrer, afastaria a obrigação indemnizatória pelo alegado facto ilícito do corte excessivo/abusivo de pinheiros e decorrente dano.

Todavia, não lograram obter tal alteração fáctica, improcedendo, como visto, a respetiva impugnação recursiva.

Assim, permanece provado que:

«16. Em data não concretamente apurada, mas ao longo do primeiro trimestre de 2019, os autores ordenaram o abate dos pinheiros plantados no prédio objecto do contrato promessa acima identificado em 1. Foi mais amplo o número de abate de pinheiros do que inicialmente projectara e mandara demarcar EE – sócio da ré –, com vista à construção da casa. O corte concretamente levado a efeito impôs que o prédio em causa passasse a deter menor valor no mercado imobiliário.» (destaque aditado).

Donde que esteja demonstrado – e o ónus probatório cabia à Reconvinte/peticionante (art.º 342.º, n.º 1, do CCiv.) – o facto ilícito (corte de pinheiros excessivo, para além do autorizado), levado a cabo por ordem voluntária dos AA., causando assim, por conduta culposa, um dano à R., por o prédio ter passado a deter menor valor no mercado imobiliário, embora em montante não apurado.

Por isso, está correta a condenação, nesta parte, «no valor que vier a ser liquidado» em ulterior incidente de liquidação («artigo 609.º, n.º 2 do Cpc», a que também alude a sentença), posto estar apurado o dano, mas não o seu exato quantum ([35]).

Em suma, tem de improceder a apelação.

                                                 *

(…)

                                                 ***

V – Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas da apelação pelos AA./Apelantes, ante o seu decaimento (art.ºs 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º, n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do NCPCiv.).

                                                 ***

Coimbra, 13/06/2023

Escrito e revisto pelo relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).

Assinaturas eletrónicas.

Vítor Amaral (relator)

Luís Cravo

Fernando Monteiro



([1]) Em 25/05/2021.
([2]) Aperfeiçoadas/sintetizadas, na sequência de despacho de convite do Relator, as quais aqui se deixam reproduzidas, no relevante, com destaques retirados.
([3]) Tribuna da Justiça, n.º 27, Março de 1987, ps. 1-5. Cfr. também A Excepção de Cumprimento do Contrato-promessa, in Estudos de Direito Civil, Almedina, Coimbra, 1991 (reimpressão), ps. 41 e ss., e O novíssimo regime do contrato-promessa (Comentário às alterações introduzidas no Código Civil pelo Decreto-Lei n.º 379/86, de 11 de Novembro, in Estudos de Direito Civil, cit., ps. 59 e ss..
([4]) Das Obrigações em Geral, vol. I, 10.ª ed., Almedina, Coimbra, 2008, ps. 350 e ss..
([5]) Onde conclui que “os autores das acções julgadas em cada um dos dois arestos dispunham do direito de reclamar a restituição do sinal desde a constituição do devedor (do promitente) em mora” In Considerações em Torno do Artigo 442.º do Código Civil. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 8.3.2005, Rec. 4379/04, e de 10.3.2005, Rec. 170/05, in Cadernos de Direito Privado n.º 14, Abril/Junho 2006, ps. 76 e ss., mormente p. 83.
([6]) Acs. STJ, de 18/11/1982, BMJ, 321.º - 387, de 15/12/1998, BMJ, 482.º - 243, de 21/01/2003, CJ-Acs. STJ, T. I / 2003, ps. 44 e ss., e de 08/03/2005, CJ-Acs. STJ, T. I / 2005, ps. 120 e ss..
([7]) Sinal e Contrato Promessa, 2010, 13ª ed. Revista e Aumentada, págs. 78 a 80.
([8]) Momento em que o Tribunal a quo tomou posição, em matéria de nulidade da decisão recorrida, no sentido de a sentença não padecer «dos vícios suscitados no recurso».
([9]) Excetuando, logicamente, questões de conhecimento oficioso, desde que não obviado por ocorrido trânsito em julgado.
([10]) Caso nenhuma das questões resulte prejudicada pela decisão das precedentes.

([11]) Cfr. Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª ed., p. 57.
([12]) Vide Código de Processo Civil, Anotado, vol. V, p. 143.
([13]) É certo que na antecedente motivação são referidos outros excertos da gravação; todavia, no acervo conclusivo, que delimita o âmbito recursivo, também no campo probatório, só aquele excerto é convocado.
([14]) Perante tal restrição conclusiva à prova «testemunhal», não se atenderá aqui à prova por declarações de parte.
([15]) Perante versões contraditórias sobre um mesmo facto, com uma parte das testemunhas a defender determinada visão dos factos e outras testemunhas a defender algo diverso ou oposto, tendo o Tribunal acreditado numa dessas versões, cabe ao impugnante mostrar, em análise crítica, as razões pelas quais não devem ser atendidos os depoimentos de um conjunto de testemunhas (aqueles a que o Julgador deu crédito) e, bem assim, os motivos pelos quais deve sufragar-se a versão veiculada pelo outro conjunto de depoimentos (por ser o mais idóneo e dever merecer maior credibilidade).
([16]) Como óbvio contrato definitivo que é.
([17]) Cfr. Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed. revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1987, p. 378. Como referem ainda estes Autores: «Quanto ao exacto conteúdo ou amplitude da promessa (o promitente pode assumir uma obrigação de meios, obrigando-se somente a usar de diligência no sentido de obter a coisa ou no sentido de obter o consentimento do terceiro ou terceiros a quem pertença ou que sobre ela também tenham direitos; e pode assumir uma obrigação de resultado, garantindo ao promissário a celebração do contrato prometido), é problema a resolver no plano da interpretação da vontade das partes». No caso dos autos, afigura-se-nos inequívoco que se trata de uma obrigação de resultado, posto a parte promitente vendedora também ter assumido a obrigação/promessa de venda da «moradia a edificar sobre o prédio (…) de acordo com o projecto resultante da planta que se anexa (…)» (cfr. cláusula 2.ª, n.º 1, do contrato-promessa), cabendo ao promitente vendedor «proceder à construção da moradia» (n.º 2 da mesma cláusula). 
([18]) Cfr., op. cit., p. 384.
([19]) Na petição inicial, confiados no êxito da sua pretensão (fundada na validade da promessa), até consideraram cumpridos os requisitos de forma do contrato-promessa, aludindo a «uma formalidade ad substanciam, o que se verifica», referindo-se, nesse âmbito formal, à assinatura por ambas as partes promitentes (cfr. art.º 19.º da petição), assim silenciando outras questões de (in)validade formal. E também na réplica nada invocaram nesse sentido, sabido que era ali que deviam concentrar toda a defesa perante a reconvenção (cfr. art.º 573.º, n.ºs 1 e 2, 574.º, 584.º, n.º 1, e 587.º, n.º 1, todos do NCPCiv.).
([20]) Cfr., por todos, o Ac. STJ, de 06/07/2006, Proc. 06S1067 (Cons. Sousa Peixoto), e o Ac. Rel. Coimbra, de 08/11/2011, Proc. 39/10.8TBMDA.C1 (Rel. Henrique Antunes), ambos em www.dgsi.pt., sendo por demais pacífico que, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais, e não meios de julgamento de questões novas.
([21]) Cfr., por todos, Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 10.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2008, ps. 321 e seg.; Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2008, p. 403; Luís de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 7.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2008, p. 227.   
([22]) Na sua obra Sinal e Contrato-Promessa, 7.ª ed., 1999, ps. 83 e seg..
([23]) Cfr. Luís de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. II, 6.ª ed., Coimbra, Almedina, 2008, p. 234 (caso denominado de mora ex re).
([24]) Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1986, p. 72.
([25]) Cfr. Menezes Leitão, op. cit., p. 242.
([26]) Direito das Obrigações, cit., p. 1054.
([27]) Em nota, o Autor esclarece ainda que “A lei impõe, em síntese, uma perda subjectiva do interesse com justificação objectiva. Daí a insuficiência da simples mudança de vontade do credor ou de um motivo que ele repute fundado, mas que não o seja à luz de uma orientação razoável” (cfr. op. e loc. cits.).
([28]) É sabido que a essencialidade do prazo, que, de per si, a ocorrer/demonstrar-se, poderia constituir causa de incumprimento definitivo e consequente opção resolutiva do contrato, é fator relevante em sede de contrato-promessa. Porém, tem de ser demonstrada, o que não logrou conseguir-se in casu.
([29]) Não se vendo quais a razões que levassem os AA. – e era seu o ónus de alegação e prova –, em adequada e objetiva ponderação, a concluir que a celebração do contrato prometido perdera o interesse para si (deixara, pelo atraso, de satisfazer a sua necessidade subjacente à contratação).
([30]) Fixação ao devedor em mora de um prazo suplementar razoável para cumprimento, sob pena de se considerar definitivamente incumprida a obrigação.
            ([31]) Assim, não é difícil encontrar acórdãos dos tribunais superiores que se debruçaram sobre a questão, sustentando uns que, no âmbito do contrato promessa, os mecanismos indemnizatórios previstos no art.º 442.º do CCiv. são aplicáveis mesmo no caso de simples mora – cfr., entre outros, os Acs. STJ, de 18/11/1982, BMJ, 321.º - 387, de 15/12/1998, BMJ, 482.º - 243, de 21/01/2003, CJ-Acs. STJ, T. I / 2003, ps. 44 e ss., e de 08/03/2005, CJ-Acs. STJ, T. I / 2005, ps. 120 e ss. –, enquanto outra parte da jurisprudência, fortemente maioritária, vem defendendo ser necessária para o efeito a verificação de incumprimento definitivo – entre muitos outros, vejam-se os Acs. STJ, de 26/05/1998, CJ-Acs. STJ, T. II / 1998, ps. 100 e ss., de 24/06/2004, Proc.º 04B1776 (Cons. Abílio Vasconcelos), de 07/02/2006, Proc.º 05A3670 (Cons. Borges Soeiro), de 05/07/2007, Proc.º 07B1835 (Cons. Oliveira Rocha), e de 10/07/2008, Proc.º 08B1849 (Cons. Alberto Sobrinho), todos estes disponíveis em www.dgsi.pt.
([32]) Com desenvolvidas referências sobre esta matéria, cfr. o Ac. TRC (deste mesmo Coletivo) de 16/02/2017, Proc. 2336/12.9TBLRA.C1 (Rel. Vítor Amaral), em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se que «Só o incumprimento definitivo e não a mora desencadeia o mecanismo indemnizatório da perda do sinal (em singelo ou em dobro), que, na falta de convenção em contrário, é a única indemnização pelo incumprimento da promessa.».
([33]) O que vem provado, inequivocamente, com algum reporte ao primeiro aspeto, é que ao projeto de construção inicial os AA. solicitaram, por mais de uma vez, alterações (cfr. facto 17).
([34]) O princípio da boa-fé revela determinadas exigências objetivas de comportamento – de correção, honestidade e lealdade – impostas pela ordem jurídica, exigências essas de razoabilidade, probidade e equilíbrio de conduta, em campos normativos onde podem operar sub-princípios, regras e ditames ou limites objetivos, postulando certos modos de atuação em relação, seja na fase pré-contratual, seja ao longo de toda a execução do programa contratual, seja, por vezes, mesmo após a extinção do contrato.
([35]) Este ainda suscetível de incidental quantificação (ulterior), ponto que, todavia, não vem questionado no recurso.