Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
503/23.9T8MBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS CRAVO
Descritores: CONTRATO DE MÚTUO
NULIDADE
OBRIGAÇÃO DE RESTITUIÇÃO
INÍCIO DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Data do Acordão: 03/25/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – MOIMENTA DA BEIRA – JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 289º, Nº 1, 309.º, 323.º, N.º 1, 1142.º E 1143.º DO CÓDIGO CIVIL
ARTIGO 542.º, N.º 2 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: I – Estando em causa um contrato de mútuo nulo, por falta de forma legal, essa nulidade é irremissível, donde, por força do carácter retroativo da declaração de nulidade e da relação de liquidação que institui entre as partes, o mutuário fica constituído sem mais na obrigação de restituição da quantia mutuada, tal como determinado no art. 289º, nº 1 do Código Civil.

II – Se a retroatividade da declaração de nulidade obriga à restituição das prestações efetuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado, esta obrigação de restituição não está dependente de quaisquer condições que tivessem sido estipuladas entre as partes para o prazo da restituição.

III – Assim, in casu, será a partir da alegada e provada data da celebração do mútuo que se contará o prazo da prescrição de 20 anos, tal como previsto no art. 309º do C.Civil.

IV – Para efeitos de litigância de má fé, “alterar a verdade dos factos” significa que a parte queira convencer de uma realidade que conhece ser diferente, portanto, deturpando ou corroendo aquilo que sabe que assim não é, sendo que estarão, ainda, principalmente aí em vista os factos pessoais ou, pelo menos, aqueles que sejam do conhecimento pessoal da parte, e cuja prova se venha, depois, a fazer em contrário daquilo porque ela pugnara.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: *

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]                                                                                                *

1 – RELATÓRIO

AA, NIF ...40..., divorciada, residente em ... ..., França, portadora do Cartão de Cidadão n.º ...97 válido até 03/08/2031, emitido pela República Portuguesa, instaurou em 22.09.2023 ação declarativa sob a forma de processo comum contra BB e mulher CC, casados no regime da comunhão de adquiridos, residentes no Bairro ..., ... ..., pedindo que seja declarado que os réus incumpriram o contrato que celebraram com a autora por não lhe terem restituído a quantia de € 30.000,00 (trinta mil) euros quando receberam os fundos na suíça, e, por via disso, condenar-se os réus a restituir à autora a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros) acrescida de juros de mora contados desde a condenação até integral pagamento. Subsidiariamente e no caso de assim se não entender, pede que seja declarado que o contrato de mútuo celebrado entre autora e réus é nulo por violação do disposto no artigo 1143º do Código Civil, por vício de forma, e por via disso, devem os réus ser condenados a restituir à autora a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), nos termos do disposto no artigo 289º, nº 1, do Código Civil, bem como condenados a pagar juros de mora devidos, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto alega que os réus, por volta do ano de 2003, atravessaram grandes dificuldades financeiras, razão pela qual o réu marido pediu à autora (sua irmã) que lhe emprestasse a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), ao que esta acedeu, por acordo meramente verbal. Foi acordado que a restituição do valor emprestado ocorreria assim que o réu recebesse uns fundos a que tinha direito a pagar pelo Estado Suíço, sendo que, pese embora tenha recebido tais fundos, nunca os réus procederam ao reembolso à autora da quantia mutuada, ainda que esta o tenha interpelado para o efeito. Acrescenta ainda a autora que o contrato de mútuo celebrado padece do vício da nulidade, na medida em que não observou a forma escrita, conforme legalmente exigido.

Termina nos termos supra referidos.

*

Regularmente citados para contestar em 27.09.2023[2], os réus impugnaram, na totalidade, o vertido na petição inicial que deu origem aos presentes autos, alegando nada dever à autora. Sustentam, em síntese, que, num contexto de dificuldades que o casal atravessou entre 2002-2003, a autora, por sua iniciativa e livre e espontânea vontade (sem que o réu o tivesse solicitado), emprestou a este último uma quantia que não consegue precisar, mas seguramente inferior a € 30.000,00 (trinta mil euros). Sucede que o réu foi procedendo ao reembolso de tal quantia nos anos subsequentes, concretamente através de entregas em numerário quando se encontrava de férias em Portugal no período de verão. Assim, pese embora se tratasse de obrigação natural, a verdade é que os réus procederam ao reembolso da totalidade da quantia que lhes foi transferida pela autora.

Acresce que, em sede de partilha notarial efetuada por óbito dos pais da autora e réu marido foi adjudicado à autora um bem imóvel, o que não havia sido acordado em sede de partilhas verbais. Tal deveu-se a um ato de generosidade do réu marido para com a autora, o que sensibilizou esta última, tratando-se de uma forma de compensação desta.

Invocam ainda os réus a prescrição do alegado direito da autora, na medida em que à data de entrada da ação e citação dos réus (setembro de 2023) haviam já decorrido mais de 20 (vinte) anos desde o alegado empréstimo. Invocam ainda os réus o abuso de direito por parte da autora, na medida em que vem peticionar uma quantia que já lhe foi reembolsada, sustentando, ainda e por último, que a autora litiga de má fé.

*

A autora pronunciou-se quanto às exceções invocadas, pugnando pela improcedência da invocada exceção da prescrição.

*

Foi proferido despacho a fixar o valor da causa, bem como os despachos a fixar o objeto do litígio e temas da prova.

Realizou-se a audiência final, com observância do formalismo legal, como consta da respetiva ata.

Veio, na sequência, a ser proferida sentença, na qual após identificação em “Relatório” das partes e do litígio, se alinharam os factos provados e os “não provados”, seguidos da correspondente “Motivação”, após o que se concluiu no sentido de que se mostrava incumprido o contrato pelos RR., incumprimento esse culposo, do que decorria deverem ser os mesmos condenados na restituição à A. da quantia mutuada, sendo que face a tal se mostrava prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário formulado pela A., acrescendo que inexistia qualquer abuso do direito por parte da A., mas, ao invés, procedia o pedido de condenação dos RR. como litigantes de má fé, o que se tudo se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”:

«IX. Dispositivo

Pelo exposto, decide-se julgar a presente ação totalmente procedente e, em consequência:

a) Condenar os réus a restituírem à autora a quantia de 30.000,00 EUR (trinta mil euros) na sequência da celebração do contrato de mútuo entre as partes, incumprido pelos réus;

b) Condenar os réus como litigantes de má fé, fixando-se a multa a pagar à autora no valor de 3 (três) unidades de conta e de uma indemnização a favor da autora, correspondente às despesas e honorários assumidos por esta, em montante a determinar após pronúncia das partes;

c) Absolver a autora do pedido contra si formulado pelos réus no que respeita ao abuso do direito;

d) Absolver a autora do pedido contra si formulado pelos réus no que respeita à litigância de má fé;

e) Condenar os réus no pagamento da totalidade das custas processuais.

*

Registe e notifique.

*

Após trânsito, extraia certidão para efeitos de instauração de procedimento criminal contra o réu marido (cf. artigo 359.º do Código Penal).»

                                                           *

É com esta decisão que os RR. não se conformam e dela vêm interpor recurso de apelação, pedindo a revogação da mesma, apresentando as seguintes conclusões:

«1ª - O Tribunal a quo efectuou uma errada apreciação da matéria de facto, bem como da apreciação e aplicação do direito, pelo que deve ser concedido provimento ao presente recurso e revogar-se a douta decisão recorrida.

2ª - O Tribunal recorrido efectuou uma errada apreciação da prova (documental e testemunhal) e, na douta sentença recorrida, a Meritíssima Juíza a quo fez uma incorrecta e errada apreciação dos factos provados, o que constitui uma nulidade da sentença, nos termos do artigo 615º, nº 1 do C. Proc. Civil.

3ª – Na douta sentença recorrida, a Meritíssima Juíza a quo efectuou uma incorrecta e errada apreciação e aplicação do direito, o que constitui uma nulidade da sentença, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea c) do C. Proc. Civil.

4ª – Na douta decisão em crise, a Meritíssima Juíza a quo deixou de pronunciar-se sobre questões que deveria ter apreciado, o que constitui uma nulidade da sentença, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d) do C. Proc. Civil.

5ª – A sentença recorrida encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia sobre questões fundamentais alegadas pelos. Recorrentes, nomeadamente a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma e a prescrição ordinária.

6ª - O Tribunal a quo limitou-se a dar credibilidade ao depoimento da Autora/Recorrida e dos seus dois filhos, que intervieram nos presentes autos como ‘verdadeiras partes na acção’ trasvestidos da qualidade de testemunhas.

7ª – O Tribunal a quo efectuou tábua rasa das declarações do Réu marido e das restantes testemunhas arroladas pelos Recorrentes, centrando-se exclusivamente na versão da Autora, aqui Recorrida e dos seus dois filhos, obviamente partes interessadas no processo.

8ª – Nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 627.º e seguintes do Código de Processo Civil, os Recorrentes interpuseram recurso da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou procedente a acção condenatória por incumprimento de contrato de mútuo no montante de € 30.000,00 (trinta mil euros) e condenou os Réus, aqui recorrentes como litigantes de má-fé.

9ª – A presente sentença em crise encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia sobre questões fundamentais alegadas pelos recorrentes, nomeadamente a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma e a prescrição ordinária.

10ª - A Recorrida intentou a presente acção condenatória contra os Recorrentes, alegando o incumprimento de um contrato de mútuo verbal no valor de € 30.000,00 (trinta mil euros) celebrado em Fevereiro de 2003.

11ª – Na contestação, os Recorrentes alegaram a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma escrita, conforme exigido pelo artigo 1.143º do Código Civil, uma vez que se tratava de um mútuo de valor superior a € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), pelo que deveria ter sido formalizado por escritura pública.

12ª - Os Recorrentes invocaram também a prescrição ordinária do eventual direito de crédito da Autora, aqui recorrida, nos termos e ao abrigo do artigo 309.º do Código Civil, uma vez que a acção judicial foi proposta ou intentada mais de 20 (vinte) anos após a data da efectivação do alegado mútuo verbal.

13ª - A douta sentença recorrida julgou procedente a acção e condenou os Recorrentes ao pagamento da quantia reclamada, além de os considerar litigantes de má-fé, sem, no entanto, se pronunciar sobre os temas invocados pelos mesmos - nulidade do contrato de mútuo por falta de forma e prescrição ordinária -

14ª - O artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil prevê que a sentença é nula quando o juiz não se pronuncia sobre questões que devesse apreciar.

15ª – E o artigo 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil determina que o juiz deve conhecer de todas as questões suscitadas pelas partes, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

16ª – O Tribunal a quo não se pronunciou sobre os temas da nulidade do contrato de mútuo por falta de forma nem sobre a prescrição ordinária, questões que foram expressamente alegadas pelos Recorrentes na

contestação e que são essenciais para a decisão da causa.

17ª - Esta omissão de pronúncia configura uma violação do dever de pronúncia e uma nulidade da sentença, devendo a mesma ser anulada por este Tribunal Superior.

18ª – Sem prescindir, o Tribunal recorrido aplicou erradamente in casu as normas jurídicas do Código Civil respeitantes ao cumprimento dos contratos como se de um contrato de mútuo formalmente válido se tratasse.

19ª – Na decisão em crise o Tribunal a quo considerou que a A./Recorrida logrou demonstrar a celebração de um contrato de mútuo com os Réus, aqui Recorrentes ao qual foi aposta uma condição – recebimento por parte do réu marido dos fundos pagos pelo Estado Suíço – bem como da sua verificação.

20ª – Todavia, na data de interposição do presente recurso e junção de alegações, os R.R., aqui Recorrentes ainda não receberam os Fundos que hão-de ser pagos pelo Estado Suíço.

21ª – Deste modo, foi efectuada uma errada aplicação do Direito pelo Tribunal a quo das disposições legais conjugadas dos artigos 406º, e 798º a 812º, todos do Código Civil.

22ª - Nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 1.143º do Código Civil, o contrato de mútuo de valor superior a € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) deve ser celebrado por escritura pública, sob pena de nulidade.

23ª - O alegado contrato de mútuo verbal no montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), que a Recorrida afirma ter celebrado com os Recorrentes, não foi reduzido a escrito, designadamente por escritura pública, constituindo, por isso, um contrato nulo por falta de forma.

24ª - A douta sentença recorrida ao não declarar a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, violou manifesta e grosseiramente o disposto no artigo 1.143º do Código Civil, devendo tal erro ser corrigido por este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.

25ª - Nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 309.º do Código Civil, o eventual direito de crédito da Recorrida prescreve no prazo de 20 (vinte) anos.

26ª - A presente acção foi proposta mais de 20 (vinte) anos após a data do alegado mútuo verbal efectuado pela A., o que significa que o eventual direito de crédito da A./Recorrida se encontra prescrito, não podendo ser validamente exercido em Juízo.

27ª - O decurso do prazo prescricional extingue o eventual direito de crédito.

28ª - Ao não apreciar a questão da prescrição ordinária, o Tribunal Recorrido não apenas omitiu uma questão fundamental, mas também decidiu em violação directa e grosseira do disposto no artigo 309.º do Código Civil.

29ª - A condenação dos Recorrentes como litigantes de Má-Fé fundamentou-se na conclusão de que estes terão alegado matéria que sabiam ser falsa, nomeadamente a entrega à Recorrida de determinadas quantias em numerário.

30ª - Os Recorrentes alegaram na presente acção a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, bem como a prescrição ordinária, ou seja, excepções e matéria de direito bem fundamentadas e cuja apreciação

era fundamental para a resolução e justa composição do litígio.

31ª – A Jurisprudência dos Tribunais Superiores tem entendido que a invocação de excepções ou defesas legítimas, mesmo que eventualmente não venham a ser acolhidas, não configura má-fé processual.

32ª - A condenação dos Recorrentes como litigantes de má-fé não tem qualquer sustentação factual ou jurídica, devendo ser revogada por douta decisão superior.

33ª - Assim, a douta decisão recorrida violou diversos preceitos legais, designadamente o disposto nos artigos 542º, 608º e 615º do C. de Processo Civil, bem como as disposições dos artigos 220º, 309º, 406º, 798º, 805º e 1.143º, todos do Código Civil.

Nestes termos e nos mais de direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se integralmente a douta sentença recorrida no sentido apontado nas conclusões atrás enunciadas, e designadamente:

a) – Declarar-se a nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil;

b) – Considerar-se que foi efectuada uma errada aplicação do Direito, nomeadamente das disposições legais conjugadas dos artigos 406º, e 798º a 812º, todos do Código Civil;

c) - Reconhecer-se a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, conforme dispõem os artigos 220º e 1.143º, ambos do Código Civil;

d) – Reconhecer-se a prescrição ordinária do eventual direito de crédito da Recorrida, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 309.º do Código Civil;

e) – Revogar-se a condenação dos R.R., aqui Recorrentes como litigantes de Má-Fé; e

f) – Absolver-se os R.R., aqui Recorrentes dos pedidos formulados na presente acção.

Assim se fará

SÃ, SERENA E OBJECTIVA

JUSTIÇA»

                                                           *

Por sua vez, apresentou a A. as suas contra-alegações, das quais extraiu as seguintes conclusões:

«1º - Os recorrentes impugnam a matéria de facto provada e não provada mas não deram cumprimento ao disposto no artigo 640º, n.º 1 alínea a), b) e c) do Código de Processo Civil.

2º - Nos termos daquela disposição legal:

Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

3º - Não tendo os recorrentes dado cumprimento a tais ónus a seu cargo, deve o recurso, nesta parte, ser rejeitado.

4º - Quanto à matéria de facto provada e não provada, segundo o princípio da livre apreciação da prova, a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, fundamentou de forma cabal os motivos porque que deu como provada e não provada a matéria de facto.

5º - Deve, pelo exposto, por falta de fundamento legal e de facto, improceder o recurso interposto quanto à impugnação da matéria de facto.

6º - Atenta a nulidade do contrato de mútuo por vício de forma, nulidade que ambas as partes invocaram, a condenação dos réus a restituir à autora a quantia mutuada, sem juros, está conforme com a aplicação das regras da nulidade do contrato.

7º - Inexiste, consequentemente, qualquer nulidade da sentença por falta de pronúncia quanto à nulidade da sentença por falta de pronuncia quanto à nulidade por vício de forma.

8º - Não caso vertente não decorreu o prazo de prescrição ordinária, por existir e se ter verificado a condição de pagamento que as partes fixaram.

9º - A sentença recorrida não merece reparo quando apreciou e decidiu pela procedência da ação, dando como não provados os factos que reconduziriam à prescrição ordinária invocada pelos réus.

10º - Carece de fundamento de facto e de direito a questão da prescrição ordinária suscitada pelos recorrentes.

11º - A condenação dos réus como litigantes de má fé não merece qualquer censura.

12º - A condenação dos réus, como litigantes de má fé, ocorreu sobremaneira por terem faltado à verdade quanto ao pagamento da quantia mutuada, ao alegarem e mantiveram em julgamento, mas que não provaram, e, assim, terem persistido nessa falsidade, relativamente a factos pessoais e que bem sabiam que eram falsos.

13º - Não relevou para a condenação dos réus como litigantes de má fé, como pretendem os recorrentes, o facto de os réus terem invocado a prescrição ou a nulidade do contrato por vício de forma, que os recorrentes em sede de recurso.

Termos em que julgando improcedente o recurso e mantendo a douta sentença recorrida farão V. Ex.ª inteira e sã JUSTIÇA.»

                                                           *

No despacho de admissão do recurso, a Exma. Juiz de 1ª instância sustentou tabelarmente a não verificação das arguidas nulidades.

                                                           *

Foi ordenada a notificação das partes face ao possível conhecimento, em sede do recurso interposto, da defesa aduzida pelos RR. da exceção perentória da “prescrição ordinária” – por não ter incidido a decisão de 1ª instância sobre ela! – e, designadamente, para exercício do contraditório quanto a essa apontada possível apreciação/conhecimento.

A tal corresponderam as partes, reproduzindo posições que já haviam assumido nos autos, em concretos termos aqui dados por reproduzidos.

                                                           *

Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

                                                                       *

2QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos RR./recorrentes nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte:

- rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto provada e não provada por incumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do n.C.P.Civil (como questão prévia suscitada nas contra-alegações);

- nulidade da sentença por “incorreta e errada aplicação do direito” [artigo 615º, nº 1, alínea c) do n.C.P.Civil];

- nulidade da sentença por omissão de pronúncia [artigo 615º, nº 1, alínea d) do n.C.P.Civil];

- desacerto na condenação dos RR. como litigantes de má-fé.

                                                           *

3 – QUESTÃO PRÉVIA

Cabe apreciar a invocada rejeição do recurso por incumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do n.C.P.Civil.

Sustenta, em síntese, a A/recorrida nas suas contra-alegações, que os RR./recorrentes não cumpriram o ónus a seu cargo imposto pelo art. 640º, nº 1 als. a) e b) do n.C.P.Civil, para impugnar a decisão sobre a matéria de facto.

Será assim?

Assiste indubitavelmente toda a razão, nesta parte, à A./recorrida.

É que a efetiva reapreciação da decisão sobre a matéria de facto se encontra inabalavelmente impossibilitada.

Isto porque tal como expressa esta questão pelos RR.Recorrentes, ela não constitui uma válida impugnação da matéria de facto, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 640º do n.C.P.Civil.

Senão vejamos.

Nos termos do nº 1 do art. 662º do n.C.P.Civil, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação “se os factos tidos como assentes, a prova produzida, ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Por seu turno, por força do estatuído no art. 640º do n.C.P.Civil, o recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de facto encontra-se adstrito à realização de vários ónus previstos nos nos 1 e 2 desse preceito, sob pena de imediata rejeição do recurso.

Na verdade, lê-se em tais disposições:

«1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.»

Tendo presentes estas legais prescrições, e revertendo à situação sub iudice, ao confrontar as alegações recursivas, desde logo se pode constatar que não se observou  em absoluto nas “conclusões” dessa alegação o estatuído na al.a) do nº1, supra transcrita: de facto, não se encontra em nenhum momento ou local especificados os concretos pontos de facto tidos pelos RR./recorrentes como indevida/incorretamente julgados…

Aliás, nem no corpo das alegações, essa impugnação foi em qualquer medida feita …

Acresce que, e também decisivamente, os RR./recorrentes não indicaram de todo quais os “concretos meios probatários” que fundamentavam a impugnação deduzida, nem especificaram, em qualquer grau ou medida, qual “A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (cf. als. b) e c) do citado nº1 supra transcrito)!

De referir que este mesmo entendimento – quanto ao que são os requisitos mínimos e indispensáveis em termos de cumprimento do disposto no art. 640º do n.C.P.Civil para quem impugne a decisão relativa à matéria de facto – tem sido reafirmado pela nosso jurisprudência do nosso mais alto Tribunal, de que nos dá nota o acórdão do STJ de 12.05.2016, no proc. nº 324/10.9TTALM.L1.S1[3], no qual se referencia e reproduz um conjunto de arestos no mesmo sentido, donde a formulação no mesmo da seguinte síntese conclusiva:

«I – No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao Recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe.

II – Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso.»

No mesmo sentido o outro seguinte aresto do mesmo STJ – acórdão de 19.02.2015, no proc. nº 299/05.6TBMGD.P2.S1[4] – do qual se destacam os pontos do seu sumário que se passam a transcrever:

«1. Para efeitos do disposto nos artigos 640.º, n.º 1 e 2, e 662.º, n.º 1, do CPC, importa distinguir, por um lado, o que constitui requisito formal do ónus de impugnação da decisão de facto, cuja inobservância impede que se entre no conhecimento do objeto do recurso; por outro, o que se inscreve no domínio da reapreciação daquela decisão mediante reavaliação da prova convocada.

2. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto.

3. Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no n.º 1 do artigo 662.º do CPC.

4. É em vista dessa função que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do CPC.

5. Nessa conformidade, enquanto que a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.

(…)»

Ora, a sanção para o incumprimento dos citados ónus encontra-se muito clara e expressamente referida no nº1 do normativo em questão – o art. 640º do n.C.P.Civil! – a saber, sob pena de imediata rejeição do recurso.

Assim, porque não se mostra efetuado pelos RR./recorrentes a indicação legalmente estabelecida, é desde logo de rejeitar e não proceder ao escrutínio da decisão de facto, não havendo assim lugar a qualquer reapreciação/alteração à matéria de facto fixada pelo tribunal a quo!

                                                           *

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

De referir que a matéria de facto está definitivamente adquirida em sede recursiva por efeito da decisão vinda de proferir quanto à questão prévia que antecede.

 Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância em termos de factos “provados”:

«1. No ano de 2003 os réus atravessaram dificuldades financeiras, não tendo conseguido efetuar o pagamento/liquidação de uma parte das suas obrigações fiscais à Confederação Helvética, ou seja, ao Estado Suíço, razão pela qual o réu marido foi alvo de uma PURSUIT, ou seja, de uma Injunção instaurada pela Confederação Helvética com vista à cobrança dos impostos em falta.

2. Nesse contexto, e considerando a estreita relação (familiar, de amizade e confiança) entre réu marido e autora (irmãos), o primeiro pediu à segunda que lhe emprestasse a quantia global de 30.000,00 EUR (trinta mil euros), para poder fazer o pagamento das suas obrigações fiscais.

3. Porque a autora não dispunha de tal quantia, conhecedores da situação de dificuldade dos tios, os filhos da autora transferiram das suas economias para a conta bancária da mãe a quantia de 28.500,00 EUR (vinte e oito mil e quinhentos euros).

4. A autora, por seu turno, em dia não concretamente apurado de fevereiro de 2003, transferiu da sua conta bancária para a conta bancária do réu marido a aludida quantia.

5. Em momento posterior a autora procedeu ainda ao levantamento da quantia de 1.500,00 EUR (mil e quinhentos euros) em numerário e entregou-os ao réu marido, atendendo à atualização do valor da dívida deste último.

6. Entre as partes não foi acordado o pagamento de qualquer valor a título de juros, tendo sido fixado, no que respeita à restituição do valor em causa, que tal ocorreria quando o réu marido recebesse uma quantia de uns fundos a que tinha direito a serem pagos pelo Estado Suíço.

7. Apesar de o réu marido ter recebido os fundos pagos pelo Estado Suíço, não procedeu ao reembolso da quantia mutuada pela autora.

8. Na partilha notarial efetuada por óbito dos pais da autora e do réu marido – DD e EE -, foi adjudicada à autora a verba número dois indicada na relação de bens constante da escritura de habilitações e partilhas correspondente a PRÉDIO URBANO composto por casa de habitação, sito no lugar da ..., limite da freguesia ..., concelho ..., inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo n.º ...8.»

                                                           *

E o seguinte em termos de factos “não provados”:

«A. A autora procedeu à transferência bancária da quantia referida no facto provado n.º 3 e entrega da quantia indicada no facto provado n.º 5, sem que o réu marido lhe tenha pedido que o fizesse, isto é, de sua iniciativa, livre e espontânea vontade.

B. Os réus procederam ao reembolso da quantia que lhes foi entregue pela autora, através de sucessivas entregas em numerário, por ocasião das suas deslocações a Portugal nos períodos de verão, nos anos subsequentes à aludida transferência bancária/entrega de dinheiro.

C. Na partilha verbal efetuada entre todos os irmãos havia sido acordado que o bem descrito no facto provado n.º 8 seria adjudicado ao réu marido.»

                                                                       *

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1 – A primeira ordem de questões que com precedência lógica importa solucionar é a que se traduz nos alegados vícios formais da sentença.

Apreciemos então a arguição da nulidade da sentença por “incorreta e errada aplicação do direito” [artigo 615º, nº 1, alínea c) do n.C.P.Civil].

Os RR./recorrentes não especificam onde reside o concreto fundamento para a verificação desta nulidade à luz do normativo legal invocado – atente-se que a citada al. c) do nº 1 do art. 15º do n.C.P.Civil preceitua que a sentença é nula nos termos da mesma quando «[O]s fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível».

E não o fizeram porque manifestamente a invocada situação de “incorreta e errada aplicação do direito” não corresponde de todo ao aqui previsto!

Aliás, a invocação da “nulidade” com um tal fundamento só se compreende por uma deficiente ou incorreta compreensão das dogmáticas em causa.

O que se denota é que os RR./recorrentes discordam da interpretação e aplicação que da lei foi feita.

Só que isso é outro patamar da questão…, sendo certo que a ter havido erro de julgamento, tal será aquilatado nesta instância de recurso, sendo essa a função primordial do recurso interposto e a que este Tribunal está interpelado, o que o mesmo cumprirá face à “motivação” que foi enunciada na decisão e que constitui o percurso lógico-jurídico da mesma.

Apreciação essa de que se tratará na sequência, quer em termos formais, quer de direito.

Donde, sem necessidade de maiores considerações, também nesta parte improcede manifestamente o invocado pelo A./recorrente.

                                                           *

E que dizer da também arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia [artigo 615º, nº 1, alínea d) do n.C.P.Civil]?

Os RR./recorrentes fundam esta arguição de nulidade na circunstância de a Exma. Juiz de 1ª instância ter na sentença deixado de pronunciar-se sobre questões que deveria ter apreciado, a saber, nem sobre os temas da nulidade do contrato de mútuo por falta de forma nem sobre a prescrição ordinária.

Que dizer?

Quanto à omissão de pronúncia sobre a questão da nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, constata-se que a Exma. Juiz grafou na parte final da sentença «Levando em consideração a decisão supra, mostra-se prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário formulado pela autora.»

Com tal estava seguramente a reportar-se a esta questão da nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, pois que foi questão suscitada pela A. na p.i. em termos subsidiários.

Assim, na medida em que na sentença a Exma. Juiz de 1ª instância concluiu no sentido de que se mostrava incumprido o contrato pelos RR., incumprimento esse culposo, do que decorria deverem ser os mesmos condenados na restituição à A. da quantia mutuada – e com tal deu procedência à ação! – podia efetivamente considerar-se prejudicada o conhecimento da causa de pedir e pedido subsidiários da nulidade do contrato de mútuo por falta de forma.

Já quanto à questão da “prescrição ordinária”, não houve efetivamente qualquer pronúncia.

O que é incompreensível e completamente desacertado, na medida em que enquanto exceção perentória tinha precedência no conhecimento a ter lugar na decisão de mérito da sentença.

Que conclusão tirar então?

Em nosso entender, porque a sentença recorrida omitiu a pronúncia sobre essa questão cujo conhecimento devia preceder as demais, está verificada a arguida nulidade da mesma [cf. art. 615º, nº1, al. d) do n.C.P.Civil], donde a anulação da dita sentença.

Importa, consequentemente, apreciar e decidir sobre a questão da prescrição ordinária do alegado direito da A. (cf. art. 665º, nº1 do n.C.P.Civil) – invocada pelos RR. no respetivo articulado de contestação.

Sendo com tal que se prosseguirá quanto ao recurso deduzido, nos termos que se verão de seguida.

                                                           *

Que dizer então sobre a invocada – pelos RR. – prescrição do alegado direito da A., fundada na alegação de que à data de entrada da ação e citação dos RR. (setembro de 2023) haviam já decorrido mais de 20 (vinte) anos desde o empréstimo ajuizado?

Antes de mais importa rememorar alguns aspetos dogmáticos relevantes para apreciar e decidir esta questão.

O primeiro deles prende-se com os aspetos formais, natureza e características do contrato de mútuo em causa.

É consensualmente aceite que o contrato de mútuo, com assento legal no artigo 1142º do Código Civil[5], é um contrato real quoad constitutionem, o que tem o significado de que é um contrato cuja verificação depende da tradição da coisa que constitui o seu objecto mediato.

Correspondentemente, em abstrato, a obrigação relativa aos termos e condições em que se irá processar a restituição do valor mutuado apenas se constitui com a efetiva entrega da quantia mutuada ao mutuário.[6]

Ocorre que quando, como na situação ajuizada, estamos perante um contrato [de mútuo] nulo por falta de forma[7], essa nulidade é irremissível, donde, por força do carácter retroativo da declaração de nulidade e da relação de liquidação que institui entre as partes, o mutuário fica constituído sem mais na obrigação de restituição da quantia mutuada, tal como determinado no art. 289º, nº 1 do mesmo Código Civil[8].

Sendo certo que a declaração de nulidade de mútuo, por falta de forma, tem como consequência a restituição, pelo mutuário, de tudo o que tiver sido prestado, por força do art. 289º nº 1 do Código Civil, constituindo doutrina e jurisprudência maioritárias[9] as de que, no caso de contrato de mútuo nulo por falta de forma, a restituição das quantias mutuadas deve ser feita com base, diretamente, no estabelecido no dito art. 289º do C.Civil, e não com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa (o qual, aliás, tem carácter subsidiário – cf. arts. 479º e 480º do C.Civil).

Ademais, a nulidade opera ex tunc, o mesmo é dizer retroativamente e, «se o negócio foi cumprido (no todo ou em parte), uma vez anulado, as coisas devem ser repostas in pritinum – no statu quo ante».[10]

Com efeito, «a retroactividade da declaração de nulidade» obriga «à restituição das prestações efectuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado.»[11]

 Daqui decorre outrossim que esta obrigação de restituição não estará dependente de quaisquer condições que tivessem sido estipuladas entre as partes para o prazo da restituição. 

Efetivamente, s.m.j., não faria sentido que estando-se perante um contrato nulo por falta de forma, se fosse atender quanto aos aspetos do momento da constituição e da obrigação de restituição às condições contratuais que tivessem sido estipulados num contrato que é nulo, isto é, que esses aspetos fossem regulados pelo demais que nele ocorreu ou nele foi estabelecido.

Nesta mesma linha de entendimento, sustentou-se em douto aresto o seguinte[12]:

«I – Estando em causa um contrato de mútuo nulo, por falta de forma legal, a obrigação de restituição da quantia mutuada decorre da nulidade do contrato, nos termos do artigo 289.º, n.º 1, do CC, e não do cumprimento do mútuo, nos termos do artigo 1142.º daquele código;

II - Não assume relevo a averiguação da vontade das partes, no que respeita ao cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de mútuo, designadamente quanto à forma como deveria ser cumprida a obrigação de restituição das quantias entregues;»

O que tudo serve para dizer que por força de nulidade genética, ou seja, não tendo o contrato validade nem vigência entre as partes, a obrigação de restituição por parte dos RR. tem efeitos ex tunc.

Nesta linha de entendimento, para este efeito da contagem do prazo de prescrição, torna-se irrelevante aferir e certificar a data[13] em que se terá verificado a condição estabelecida entre as partes para a restituição.  

Pelo que, in casu, será a partir da alegada e provada data da celebração do mútuo que se contará o prazo da prescrição [de 20 anos, tal como previsto no art. 309º do C.Civil], a qual, consabidamente, nada mais resultando ou tendo sido alegado, se considerará interrompida com a citação dos RR. na presente ação [cf. art. 323º, nº1 do C. Civil].

Vejamos então os dados de facto para ajuizar sobre tal.

O mútuo foi celebrado em Janeiro/Fevereiro de 2003 [cf. factos “provados” sob “1)” a “4)”], pelo que, na interpretação mais favorável à A., iremos considerar o último dia do mês de Fevereiro de 2003.

A citação dos RR. teve lugar em 27 de Setembro de 2023.

Liminarmente temos que a prescrição se completava em 1 de Março de 2023, pelo que é de concluir que estava o direito de crédito invocado pela A. nos presentes autos já se encontrava, à data da citação dos RR., extinto, por efeito da prescrição (estava decorrido o prazo há 6 meses e 27 dias).

Ao que não obsta a obrigatória suspensão desse prazo por força da intercorrência da Pandemia da COVID 19, por daí decorrerem apenas 161 dias (= cinco meses e onze dias).[14]

Na verdade, no âmbito da “legislação Covid-19” foram estabelecidos regimes excecionais de suspensão dos prazos de prescrição em curso.

Inicialmente, essa suspensão foi introduzida pelos nos 3 e 4 do art. 7º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, vigorando entre o dia 9 de Março de 2020 até ao dia 3 de Junho de 2020, num total de 87 dias[15].

Num segundo momento, no decorrer da evolução da pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2 e doença COVID-19, voltou a vigorar um regime de suspensão dos prazos de prescrição, agora nos termos do nº 3 do art. 6º-B da Lei nº 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, que, visto o seu art. 5º, vigorou entre 22 de Janeiro de 2021 e o dia 5 de Abril de 2021, num total de 74 dias[16].

Pelo que, sem necessidade de maiores considerações, encontra-se inapelavelmente prescrito o direito da A., o que implica a revogação da sentença recorrida que condenou os RR. a restituírem àquela a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), com as demais consequências relativamente a esse particular.

Restando por apreciar[17] a questão recursiva da condenação dos RR. como litigantes de má fé. 

                                                           *

4.2 – Os RR./recorrentes sustentam o desacerto da sua condenação como litigantes de má-fé.

Recorde-se que na sentença recorrida, para fundamentar uma tal condenação, se aduziu, no essencial, a seguinte linha de entendimento:

«(…)

Por seu turno, no exercício do direito ao contraditório, alega a autora que quem litiga de má fé são os réus, ao alegarem que não pediram emprestada qualquer quantia à autora, bem como ao alegarem que já procederam ao reembolso da totalidade da quantia mutuada. Deverão, assim, os réus ser condenados em multa e indemnização em valor não inferior a 2.500,00 EUR (dois mil e quinhentos euros).

(…)

A redação atualmente em vigor espelha a opção do legislador de sancionar tanto a denominada lide dolosa como a lide temerária.

Como afirmam JOSÉ LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, p. 456, «Diversa foi a orientação tomada pelo DL 320-A/95, que, no n.º 2 do art. 456 do CPC, passou a sancionar, ao lado da litigância dolosa, a litigância temerária: quer o dolo, quer a negligência grave, caracterizam, desde então, a litigância de má-fé, com o intuito, como se lia no preâmbulo daquele diploma, de atingir uma maior responsabilização das partes.».

Estão em causa, neste âmbito, o princípio da cooperação (artigo 7.º do Código de Processo Civil) e o dever de boa-fé processual (artigo 8.º do Código de Processo Civil). Como se pode ler no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 280/18.5T8OAZ.P1, de 07-12-2018 (relatora Rita Moreira), disponível em www.dgsi.pt: «No dolo substancial deduz-se pretensão ou oposição cuja improcedência não poderia ser desconhecida – dolo directo –, ou altera-se a verdade dos factos ou omite-se um elemento essencial – dolo indirecto. Por sua vez, verifica-se dolo instrumental quando se faz dos meios e poderes processuais um uso manifestamente reprovável. Por seu turno, a negligência grave verifica-se naquelas situações resultantes da falta de precauções exigidas pela mais elementar prudência ou das desaconselhadas pela previsão mais elementar que devem ser observadas nos usos correntes da vida.».

Daqui se retira que as partes têm o dever de pautar a sua atuação processual por regras de conduta conformes com a boa-fé, tendo a condenação como litigante de má-fé um forte cariz punitivo do comportamento processual assumido.

A parte tem o dever de não deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não deva ignorar ou de não alterar a verdade dos factos ou de não omitir factos relevantes para a decisão da causa. Se intencionalmente, ou por falta da diligência exigível a qualquer litigante, a parte violar qualquer desses deveres, a sua conduta fá-lo incorrer em multa e indemnização, destinada a ressarcir a parte contrária dos danos resultantes da má-fé.

Na apreciação do dolo ou negligência grave a que alude este normativo é aplicável o critério geral da diligência de um bom pai de família perante as circunstâncias do caso concreto, consagrado no artigo 487.º, n.º 2, do Código Civil. A litigância de má fé depende da circunstância de a parte pleitear tendo a consciência de que não tem razão, sendo que a defesa convicta de uma perspetiva jurídica dos factos, diversa daquela que a outra parte carreia para os autos ou da que a decisão judicial acolhe, não se afigura, por si só, censurável, nem consubstancia, nessa medida, litigância de má fé (neste sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.ᵒ 2326/11.09TBLLE.E1.S1, de 11-09-2012 (relator Fonseca Ramos), disponível em www.dgsi.pt).

Daqui resulta que não é qualquer conduta processual que é suscetível que configurar litigância de má fé, dependendo a sua verificação da consciência da falta de razão, da falta de verdade dos factos, ou do uso manifestamente reprovável dos meios processuais, exigindo-se ainda que aquela atuação tenha sido dirigida à obtenção de um objetivo ilegal, ao entorpecimento da ação da justiça ou a impedir a descoberta da verdade.

Regressando ao caso dos autos, em face das posições assumidas pelas partes, da prova produzida, afigura-se-nos ser de concluir que os réus litigam de má fé ao alegaram, em primeira linha, que não peticionaram qualquer quantia à autora, mas, sobremaneira, ao invocarem o pagamento integral da quantia mutuada, sendo certo que, como ficou demonstrado, tal não ocorreu. Com efeito, tratando-se o pagamento de um ato pessoal, não poderiam os réus ignorar que não procederam ao reembolso de qualquer quantia à autora, pelo que, ao persistirem com tal versão, ainda que em sede de acareação (o réu marido) com a pessoa que diz ter presenciado pelo menos uma entrega de dinheiro, litigam com manifesta má fé nos termos do disposto no artigo 542.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil.

De tudo isto resulta que é de caracterizar como gravemente censurável o comportamento displicente assumido pelos réus na lide, devendo os mesmos ser condenados como litigantes de má-fé em multa e indemnização.

(…)»

Por seu turno, tendo em vista não ser condenados por litigância de má fé, sustentam os RR./recorrentes que «In casu, os Recorrentes alegaram na sua contestação a nulidade do contrato de mútuo por falta de forma, bem como a prescrição ordinária, ou seja, excepções e matéria de direito bem fundamentadas e cuja apreciação era fundamental para a resolução e justa composição do litígio.

Acresce que, a Jurisprudência dos Tribunais Superiores tem entendido que a invocação de excepções ou defesas legítimas, mesmo que eventualmente não venham a ser acolhidas, não configura má-fé processual, conforme foi decidido, a título exemplificativo, no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/06/2018 (Processo n.º 118/15.7T8PRT.P1.S1).»

Que dizer?

Em nosso entender – e releve-se este juízo antecipatório – não assiste, nesta parte qualquer razão aos RR./recorrentes.

Senão vejamos.

Nos termos do art. 542º, nº 2, do n.C.P.Civil, «diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:

a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;

b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;

c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;

d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».

Será que os autos evidenciam efetivamente que os RR. atuaram cientes da falta de fundamento da sua tese, ou que negaram factos pessoais?

Em vista da resposta a uma tal questão, importa atentar que face à sua disciplina legal, a litigância de má fé surge como um instituto processual, de tipo público e que visa o imediato policiamento do processo.

Assim, como nos foi ensinado por douto aresto jurisprudencial e à luz da melhor doutrina, alterar a verdade dos factos significa que «a parte queira convencer de uma realidade que conhece ser diferente, portanto, deturpando ou corroendo aquilo que sabe que assim não é (…) estarão, ainda, principalmente aí em vista os factos pessoais ou, pelo menos, aqueles que sejam do conhecimento pessoal da parte, e cuja prova se venha, depois, a fazer em contrário daquilo porque ela pugnara.»[18] 

E que significa proceder com dolo ou negligência grave?

A concretização do dolo revela-se numa intencionalidade da parte; agirá dolosamente, por exemplo, quem sabe que procede a uma descrição dos factos essenciais não coincidente com a realidade. Do ponto de vista da negligência, nem toda é relevante, mas apenas a mais acentuada, portanto, a que supõe uma atuação sem o mínimo de cautelas ou qualquer espécie de ponderação, a imprudência grosseira na atuação da parte; e agirá assim, por exemplo, aquele que, sem fazer apelo ao mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da sua desrazão, opte temerariamente por proceder à descrição dos factos, que se vêm mais tarde a revelar desconformes com a realidade apurada.[19]

Que dizer então no caso vertente?

Que efetivamente os RR. in casu alegaram factos pessoais – pagamentos feitos pelos próprios, mormente pelo R. marido – relativamente aos quais se veio a fazer prova em sentido contrário daquilo ao que eles haviam invocado, o que paradigmaticamente se verificou quanto à acareação do R. marido com uma testemunha que teria sido interlocutora dum “pagamento”, após o que se veio a concluir judicialmente em sentido contrário à tese dos RR.!

Assim, claramente tratou-se de uma situação diversa do errar, por negligência, pois que, considerando a circunstância nuclear básica da alegação dos factos pessoais, parece tornar-se legítima a conclusão de que, pelo que é possível perceber, visavam um objetivo a que não tinha direito, não se abstendo de mentir para que o lograssem alcançar.

Enfim, estando como está neste particular em questão a exceção do “pagamento” – que não as exceções da “nulidade por falta de forma” ou da “prescrição ordinária”! – patenteia-se manifestamente a falta de fundamento e clara temeridade da alegação em que se consubstanciou a “defesa” sustentada em juízo quanto a este particular, visando a desresponsabilização total logo e só por aí, que o mesmo é dizer, evidencia-se uma atuação censuravelmente gravosa do ponto de vista substantivo para além de processual.

Nesta linha de entendimento, entendemos ser de manter a condenação dos RR/recorrentes como litigantes de má fé, improcedendo o recurso neste particular.

                                                           *

5 – SÍNTESE CONCLUSIVA (…).

                                                                       *

6 - DISPOSITIVO

           Pelo exposto, acordam em revogar parcialmente a decisão recorrida, julgando procedente a exceção de prescrição invocada e, em consequência, absolver os RR., BB e mulher CC, da condenação a restituírem à autora AA a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), com as demais consequências relativamente a esse particular, mas manter a condenação dos RR. como litigantes de má fé.

Custas em ambas as instâncias pela Autora/recorrida e RR./recorrentes, na proporção de 6/7 e 1/7, respetivamente.

                                   Coimbra, 25 de Março de 2025


Luís Filipe Cravo

João Moreira do Carmo

Alberto Ruço



[1] Relator: Des. Luís Cravo
  1º Adjunto: Des. João Moreira do Carmo
  2º Adjunto: Des. Alberto Ruço
 
[2] Cf. o avisos de receção que constam do processo físico a fls. 9.
[3] Acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[4] Igualmente acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[5] Onde se estipula que «Mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.»
[6] Neste sentido vide o acórdão do TRC de 1.12.2015, proferido no proc. nº 325/12.2TBTBU.C1, acessível em www.dgsi.pt/jtrc.
[7] Conclusão incontornável decorrente da circunstância de in casu estar em causa o valor de € 30.000,00, na medida em que face ao estipulado no art. 1143º do Código Civil (na redação do DL nº 116/2008, de 24 de Julho) era exigível escritura pública ou documento particular autenticado por exceder € 25.000,00, tratando-se esta exigência de uma formalidade ad substantiam cuja inobservância determina a nulidade do contrato ex vi do art. 220º do Código Civil.
[8] Assim no acórdão do TRC de 24.09.2013, proferido no proc. nº 1463/07.9TBCNT.C1, acessível em www.dgsi.pt/jtrc.
[9] Por força do assento n.º 4/95 de 28-3-1995, D.R.,I-A, nº 115/95 de 17-5-1995, pág. 2939/B.M.J. 445-67 - cf., inter alia, o Acórdão do T.R. de Coimbra de 24/04/2012, no proc nº 169/10.6TBCSC-B.C1 e o acórdão do S.T.J. de 31/05/2011, no proc. nº 4716/10.5TBMTS-A.S1, ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[10] Citámos agora MANUEL DE ANDRADE, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, Vol. I, a págs. 425.
[11] Neste sentido, ANTUNES VARELA e PIRES DE LIMA, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª Edição, a págs. 266.
[12] Trata-se do acórdão do TRE de 12.09.2019, proferido no proc. nº 308/16.3T8BJA.E1, acessível em www.dgsi.pt/jtre.
[13] vide a imprecisão temporal do que resulta dos factos “provados” sob “6)” e “7)”…
[14] Cf., inter alia, o acórdão do TRG de 03.12.2023, proferido no processo nº 3702/20.1T8VCT.G1 e o acórdão do TRE de 09.05.2024, proferido no proc. nº665/21.0T8PTG-B.E1, ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[15] Cf. art. 5º da Lei nº 4-A/2020, de 6 de Abril, e arts. 8º e 10º da Lei nº 16/2000 de 29 de Maio.
[16] Cf. art. 4º da Lei nº 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, e art. 7º da Lei nº 13-B/2021, de 5 de Abril.
[17] De referir que a questão recursiva da «impugnação da “matéria de facto dada como provada e não provada nos presentes autos» improcedeu liminarmente ao ter-se dado procedência à questão prévia suscitada nas contra-alegações, da rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto provada e não provada por incumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do n.C.P.Civil.
[18] Citámos o acórdão do T.R. de Lisboa de 18.01.2011, no proc. nº 1807/08.6TVLSB-A.L1-7, acessível em www.dgsi.pt/jtrl.

[19] Neste sentido, vide LEBRE DE FREITAS/MONTALVÃO MACHADO/RUI PINTO, in “Código de Processo Civil anotado”, volume 2º, 2001, a págs. 194-195.