Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3292/20.5T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO MONTEIRO
Descritores: CONHECIMENTO DA CADUCIDADE
DIREITOS DISPONÍVEIS
RECURSO À EQUIDADE
Data do Acordão: 10/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 303.º; 333.º, 2; 799.º; 905.º A 922.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I - Para que a exceção da caducidade seja conhecida, em sede de direitos disponíveis, impõe-se que o réu, de uma forma autónoma, clara e inequívoca, a invoque.

II – Julga-se a divergência na valoração da prova, relativamente ao conhecimento dos compradores e vendedores.
Na reapreciação, não encontramos elementos convincentes para alterar o decidido.

III - A equidade pode funcionar como último critério de liquidação, caso não se consiga proceder à quantificação do empobrecimento exato/concreto. A equidade, como justiça do caso, mostra-se apta a colmatar as incertezas do material probatório, bem como a temperar o rigor de certos resultados de pura subsunção jurídica, na procura da justa composição do litígio, fazendo apelo a dados de razoabilidade e equilíbrio.

Decisão Texto Integral:
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

AA e BB instauram ação contra CC e DD, a chamada A..., Lda., e B..., SA., pedindo:

a) O reconhecimento dos defeitos e erros de construção do imóvel mandado construir e vendido aos autores (prédio urbano descrito na CRP ... sob o n.º ...79/..., e inscrito na matriz sob o artigo ...69.º).

b) A condenação dos réus a pagar aos autores a quantia de € 67.568,09, a título de alegados danos patrimoniais já liquidados pelos autores, por força de reparações tidas por urgentes; acrescida de juros que à taxa legal se vencerem desde a data da citação e até efetivo pagamento.

c) A condenação dos réus a pagar aos autores, a título de danos morais, em montante nunca inferior a € 5.000,00, a que acrescem juros moratórios que à taxa legal se vençam desde a data de citação e até efetivo pagamento.

d) A condenação dos réus no pagamento aos autores de indemnização de valor igual ao que se vier a apurar pela alegada desvalorização do imóvel, atentos os defeitos e erros de construção existentes e a falta de segurança na total reparação dos mesmos, em montante que se vier a liquidar em execução de sentença e sempre acrescido dos respectivos juros que à taxa legal se vencerem.

Os réus e as chamadas contestaram, refutando o alegado pelos autores. A seguradora suscita ainda a ausência de cobertura contratada quanto à peticionada compensação por alegados danos não patrimoniais.

Os réus pediram a condenação dos autores como litigantes de má-fé, em indemnização não inferior a € 10.000,00.

Em resposta, os autores negaram essa litigância.

Realizado o julgamento, foi proferida a seguinte sentença:

A. Declaro parcialmente procedente o peticionado pelos autores AA e BB.

B. Em consequência do acima determinado em A:

i. Reconheço a existência no prédio urbano descrito na CRP ... sob o n.º ...79/..., e inscrito na matriz sob o artigo ...69.º, das anomalias acima elencadas nos factos provados, cujo teor aqui se considera reproduzido.

ii. Condeno os réus CC e DD no pagamento aos autores AA e BB da quantia total de € 67.568,09 (Sessenta e sete mil, quinhentos e sessenta e oito euros e nove cêntimos); a que acrescem os devidos juros moratórios (artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril), calculados desde a data de citação dos mesmos réus e até efetivo pagamento.

iii. Condeno os réus CC e DD no pagamento aos autores AA e BB da quantia que se vier a apurar pela alegada desvalorização do prédio acima identificado em B. – i., a liquidar em execução da presente Sentença; a que acrescerão os respectivos juros moratórios, que à taxa legal se vencerem (artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril).

iv. Absolvo os réus do mais peticionado pelos autores.

C. Não condeno os autores como litigantes de má-fé.

D. Absolvo na íntegra as chamadas A..., Lda. e B..., SA.


*

Inconformados, os Réus recorreram e apresentam as seguintes conclusões:

A) Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, que julgou parcialmente procedente, o peticionado na acção interposta pelos AA. contra os RR. CC e DD, tendo, em consequência, condenado os mesmos no pagamento aos AA., da quantia total de € 67.568,09 (sessenta e sete mil quinhentos e sessenta e oito euros e nove cêntimos), a que acrescem os juros de mora, calculados desde a data de citação dos mesmos e até efetivo pagamento;

B) E, bem assim, no pagamento aos AA. da quantia que se vier a apurar pela alegada desvalorização do prédio em causa nos autos, a liquidar em execução da sentença

de que ora se recorre, a que acrescerão igualmente os respectivos juros moratórios, que à taxa legal que se vencerem.

C) Salvo o devido respeito que nos merecem a opinião e a ciência jurídica do Tribunal “a quo”, o Meritíssimo Juiz do Tribunal recorrido, efetuou uma errada apreciação dos factos, quer dos que foram considerados provados, quer dos que que deveriam ter sido e não foram considerados provados, assim como também dos factos não provados, padecendo assim a douta sentença de um vício de apreciação e valoração da prova (artigo 607.º, nº 4 do C.P.C.), existindo ainda, uma errada aplicação do direito.

D) Entendem, assim, os Recorrentes que, os factos vertidos nas alíneas n), q), r), t) e u) foram incorrectamente considerados como factos não provados e, como tal, deverão

ser alterados e considerados provados, alguns com pequenas correções, de forma a ficarem em consonância com a prova produzida em audiência de julgamento, matéria de facto que se impugna e aqui se concretiza com precisão, por incorrectamente julgada, nos termos e com os fundamentos alegados na motivação deste recurso, onde se especifica os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa relativamente a estes factos e onde se enuncia a decisão alternativa que se propõe, aqui não reproduzidos por especificamente concretizados na motivação e não se exigir que todas as especificações concretas referidas no n.º 1 do art.º 640º do C.P.C. constem das conclusões do recurso, bastando aqui indicar com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, o que se faz, como é entendimento da maioria da Jurisprudência (cf. neste sentido, e entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 01.10.2015, proferido no processo

824/11.3TTLRS.L1.S1, e de 12.07.2018, proferido no processo 167/11.2TTTVD.L1.S1,

disponíveis em www.dgsi.pt);

E) Por outro lado, e em relação aos factos provados, o facto descrito sob os pontos 8., 9., 10., 11. e 12. foram incorrectamente julgados como factos provados, e como tal, deverão ser alterados e considerados facto não provados, enquanto que os descritos sob os pontos 7., 13., 24., 25. e 32., dos factos provados, deverão ser retificados, alterados e objecto de nova redacção, de forma a ficarem em consonância com a prova produzida em audiência de julgamento, matéria de facto que se impugna e aqui se concretiza com precisão, por incorrectamente julgada, nos termos e com os fundamentos alegados na motivação deste recurso, onde se especifica os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa relativamente a estes factos e onde se enuncia a decisão alternativa que se propõe, aqui não reproduzidos por especificamente concretizados na motivação e não se exigir que todas as especificações concretas referidas no n.º 1 do art.º 640º do C.P.C. constem das conclusões do recurso, bastando aqui indicar com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, o que se faz, como é entendimento da maioria da Jurisprudência (cf. neste sentido, e entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 01.10.2015, proferido no processo 824/11.3TTLRS.L1.S1, e de 12.07.2018, proferido no processo 167/11.2TTTVD.L1.S1, disponíveis em www.dgsi.pt);

F) Resulta evidente o erro notório na apreciação da prova pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto que os RR., aqui impugnam e identificam com precisão, indicando os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, o que resulta manifestamente demonstrado e provado pelos meios probatórios concretamente especificados na motivação deste recurso, que constam do processo e do registo e gravação nele realizada, que impõem decisão diversa da ora recorrida, decisão que deve ser proferida, por V. Excelências Venerandos Desembargadores, nos termos em que os ora Recorrentes especificaram na motivação e a seguir enunciam, alterando a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto, por a prova produzida nos autos impor decisão diversa, como segue:

G) O facto descrito sob a alínea n) dos factos não provados (n) Que, sem prejuízo do acima expresso nos factos provados, as anomalias verificadas no imóvel fossem do conhecimento dos autores no momento em que o mesmo lhes foi entregue;), deve passar

a constar dos factos provados.

H) O facto descrito sob a alínea r) dos factos não provados (t) Que, sem prejuízo do acima expresso nos factos provados, que o autor AA e o Arquitecto EE tivessem voltado a inspecionar o desvão sanitário existente por baixo da casa, abaixo da laje, e a moradia em redor, em toda a sua extensão no exterior), deve passar a constar dos factos provados.

I) O facto descrito sob a alínea q) dos factos não provados (q) Que os réus desconhecessem as anomalias acima indicadas nos factos provados.), deve passar a constar dos factos provados.

J) O facto descrito sob a alínea u) dos factos não provados (u) Que fotografia junta como documento n.º 13 com a PI apenas evidencie a incorreta colocação do papel de parede por parte dos réus; e que os mesmos tivessem tentado aplicar novo papel em substituição do anterior; que a área danificada tivesse como causa a acção do filho dos mesmos réus), deve passar a constar dos factos provados.

K) O facto descrito sob o ponto 7. dos factos provados deve passar a constar dos factos provados, com a seguinte redacção: “7) No período compreendido entre a entrega do imóvel aos autores (09-3-2020) e antes do final do mês de março de 2020, os autores começaram a constatar um forte cheiro a humidade, assim como detetaram outras mais anomalias/vícios e defeitos de construção que alegam terem aparecido na moradia.”.

L) Caso não se concorde com o teor da redação ora proposta para este facto (7.), tal facto com a redacção que consta nos factos provados da sentença em crise, sempre deverá passar a constar dos factos não provados.

M) O facto descrito sob os pontos 8. e 9. dos factos provados (…) deve passar a constar dos factos não provados.

N) O facto descrito sob o ponto 10. dos factos provados (…) deve passar a constar dos factos não provados.

O) Os factos descritos sob os pontos 11. e 12. dos factos provados (11. Os autores

comunicaram de imediato aos réus as anomalias verificadas no imóvel; 12. Inicialmente,

fizeram-no de forma verbal), devem passar a constar dos factos não provados.

P) O facto descrito sob o ponto 13. dos factos provados (13. As subsequentes comunicações seguiram a via escrita, ou seja o envio de comunicações eletrónicas, nos dias 07-5-2020, 05-6-2020, através do endereço “AA.........@.....” para os endereços dos réus ”CC..........@.....” e “DD..........@.....”, os quais foram recebidos pelos réus (cfr. documento n.º 4 junto com a PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido)), deve ser alterado, no sentido de passar a ter a seguinte redacção: “A primeira comunicação dos AA. aos RR. no que respeita aos alegados danos detetados foi enviada por comunicação eletrónica no dia 07.05.2020, tendo a subsequente comunicação seguido a mesma via escrita, em 05-6-2020, através do endereço “AA.........@.....” para os endereços dos réus ”CC..........@.....” e “DD..........@.....”, os quais foram recebidos pelos réus (cfr. documento n.º 4 junto com a PI, cujo teor aqui se considera integralmente

reproduzido).”.

Q) O facto descrito sob o ponto 24. dos factos provados (24. A C..., Lda. realizou tais trabalhos, tendo cobrado aos autores o valor de € 54.935,41, a que acresceu o IVA à taxa de 23% no valor de €12.634,68, que perfez a totalidade de € 67.568,09, tudo conforme resulta do teor da fatura n.º FA 2020A/2, emitida a 01-10-2020, com a mesma data de vencimento (documento n.º 7 da PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido), deve ser alterado, no sentido de passar a ter a seguinte redacção: “24. A C..., Lda. realizou diversos trabalhos, entre os quais trabalhos e obras que os AA. decidiram fazer no desvão sanitário, sem qualquer correlação com o que vem alegado na petição inicial e com os alegados danos invocados, tendo emitido aos AA. a Fatura n.º FA 2020A/2, em 01-10-2020, com a mesma data de vencimento, no valor de € 54.935,41, a que acresceu o IVA à taxa de 23% no valor de € 12.634,68, que perfez a totalidade de € 67.568,09 (documento n.º 7 da PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).”.

R) O facto descrito sob o ponto 25. dos factos provados (25. Tal valor foi pago através de transferências bancárias, conforme decorre dos comprovativos e extrato bancários que consubstanciam o teor do documento n.º 9 da PI.), deve ser alterado, no sentido de passar a ter a seguinte redacção: “25. Tal valor foi parcialmente pago através de transferências bancárias, conforme decorre dos extratos bancários da conta da sociedade C..., Lda.”

S) O facto descrito sob o ponto 32. dos factos provados (32. Na aludida segunda visita o autor AA foi acompanhado do Arquitecto, seu conhecido, EE, a fim deste emitir o seu parecer quanto ao estado de conservação do imóvel e quanto a determinados aspectos que lhe foram mostrados pelos réus, aquando da primeira visita, designadamente, o salitre existente em diversos pontos de algumas paredes interiores.), deve ser alterado, no sentido de passar a ter a seguinte redacção: “32. Na aludida segunda visita o autor AA foi acompanhado do Arquitecto, seu conhecido, EE, a fim deste fazer uma perícia/inspeção técnica e completa à moradia, emitindo o seu parecer técnico, quer quanto ao estado de conservação do imóvel e quanto a determinados aspectos que lhe foram mostrados pelos réus, aquando da primeira visita, designadamente, o salitre existente em diversos pontos de algumas paredes interiores, quer quanto à origem dos mesmos.”

T) Aqui chegados, resulta evidente a errada decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto que os RR., ora Recorrentes aqui impugnam, indicando os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, o que aqui resulta manifestamente demonstrado e provado pelos meios probatórios concretamente especificados, que constam do processo e do registo e gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da ora recorrida, pelo que, requer-se a este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, a reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, com alteração e retificação da mesma, nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, nos termos em que os RR., ora Recorrentes aqui especificaram, alterando a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto, por a prova produzida nos autos impor decisão diversa.

U) Os AA. alegaram a existência de uma panóplia de defeitos que detetaram antes do final do mês de março de 2020, conclusão esta que nos conduz à apreciação da ampliação do objecto do recurso formulada pelos ora RR. no que se refere, desde logo, à excepção da caducidade, pois se se concluir pela existência desta, não poderá, naturalmente, ter lugar aquele prosseguimento.

V) Com esta questão se prende a pretendida alteração da matéria de facto relativamente aos pontos 7., 11. e 12., já que estes pontos se referem à denúncia dos defeitos que precedeu a instauração da acção.

W) Ora, foi dado como provado, na douta sentença recorrida, o seguinte: (…)

X) Prescreve o artigo 917.º do Código Civil que: “A acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo 287.º”

Y) Enquanto que o artigo 916.º, estatui o seguinte: “1. O comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, exceto se este houver usado de dolo.

2. A denúncia será feita até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega da coisa. (...)”

Z) Neste sentido, não tendo os AA. intentado a presente acção dentro do prazo de seis meses desde a denúncia dos alegados defeitos, procede a invocada excepção de caducidade.

AA) O que sucede, in casu, porquanto, o douto tribunal recorrido entendeu, como supra transcrito, que os alegados defeitos foram detetados no período compreendido entre

o dia 09-3-2020 e o dia 07-4-2020.

BB) Ora, se de acordo com o ponto 10. e 11. dos factos provados tal denúncia foi feita de imediato, significa que à data da instauração da presente acção (20.10.2020), há

muito que haviam decorridos sobre aquela data (07.04.2020) o prazo de seis meses.

CC) Por outro lado, e a ser alterada a matéria de facto nos termos supra indicados, ou seja, 7. No período compreendido entre a entrega do imóvel aos autores (09-3-2020) e antes do final do mês de Março de 2020, os autores começaram a constatar um forte cheiro a humidade, assim como detetaram outras mais anomalias/vícios e defeitos de construção que alegam terem aparecido na moradia.”. A alteração dos factos descritos nos pontos 11. e 12. dos factos provados, os quais devem ser considerados não provados.

DD) Não temos igualmente dúvidas, salvo melhor e douta opinião, que a acção de

anulação caducou, uma vez que aquando da denúncia dos alegados efectuada pelos AA. aos RR. – que como admitem na assentada do Autor marido, apenas foi efectuada, pela primeira vez, por email de 07/05/2020, há muito que havia decorrido o prazo de trinta dias depois de conhecido o alegado defeito (o qual foi conhecido pelos AA. antes do final do mês de março de 2020).

EE) Dúvidas, não subsistem, que no caso em apreço se verifica a excepção perentória da caducidade do direito de acção, a qual expressamente se invoca e requer para os devidos efeitos legais, devendo, em consequência, os RR. serem absolvidos do pedido, nos termos do disposto no artigo 576.º do CPC.

FF) Com efeito, a doutrina e a jurisprudência portuguesas têm entendido que o prazo de caducidade do art° 917º do C. Civil é aplicável não apenas ao direito de anulação do contrato como também a todos os demais direitos legalmente conferidos ao adquirente de coisa defeituosa (sendo este o douto entendimento plasmando no Ac. do STJ de 06-11-2007 (Rel. Azevedo Ramos), no Ac. do STJ de 05-03-2013 (Rel. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), e no Ac. do STJ de 22-06-2005 (Rel. Moreira Camilo), publicados em www.dgsi.pt.

GG) Importa agora refutar, terminantemente, a interpretação do Mmº Juiz a quo no que respeita à condenação dos réus CC e DD no pagamento aos autores AA e BB da quantia que se vier a apurar pela alegada desvalorização do prédio acima identificado em B. – i., a liquidar em execução da presente Sentença; a que acrescerão os respectivos juros moratórios, que à taxa legal se vencerem (artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril).

HH) Em face desta condenação, importa referir que os AA. não lograram fazer prova alguma quanto a esta alegada desvalorização do prédio em causa. Mais, nunca juntaram qualquer avaliação realizada ao imóvel, seja anterior ou posterior às obras, nem tão pouco tal foi requerido em sede de prova pericial.

II) Recaindo tal ónus de prova sobre os AA., pelo que, se não fizeram qualquer prova, mormente pericial, deveria, por maioria de razão e de acordo com as normas processuais vigentes, ter sido declarado improcedente tal pedido.

JJ) Com efeito, e uma vez mais, mal andou o Tribunal recorrido ao absolver as chamadas A..., LDA. e B..., S.A.

KK) É que, com todo o respeito, que é muito, não se vislumbra, porque é inexistente, a fundamentação lógica sobre as questões invocadas pelos RR. na sua Contestação que deveriam ter sido apreciadas pelo douto Tribunal recorrido, como se impunha em face do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

LL) Porque, e como infra se irá provar, do mesmo modo que tal resultou provado em sede de audiência de julgamento mediante os depoimentos das testemunhas FF e GG, totalmente contraditórios e discrepantes entre si no que concerne às alterações introduzidas ao contrato-promessa final que foi dado a assinar aos RR., sem que antes tivessem sido informados/avisados disso mesmo, numa altura em que já haviam aceite a primeira versão que lhe tinha sido enviada por email.

MM) A acrescer a tudo isto, também resultou provado, através de tais depoimentos FF e GG, que o email datado de 26.10.2019 remetido pelo Autor marido com o teor da sua proposta e com os motivos para a redução do preço, nunca ter sido facultado nem revelado aos RR., a não ser numa fase posterior, ou seja, após a citação no âmbito dos presentes autos.

NN) É, pois, indubitável que continuamos a estar perante um erro-vício sobre os motivos mas que incide sobre a base do negócio (cfr. Ac. do STJ de 18/06/2013, proc. 493/03.4TVLSB-A.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt).

OO) E este erro-vício foi provocado, por conduta dolosa ou omissão relevante por parte da imobiliária “A..., LDA.” que, apesar de saber e ter consciência que a existência da cláusula que foi subtraída ao contrato promessa assinado pelos RR. era vital e essencial à concretização do negócio com os AA.,

precisamente porque correspondia às declarações negociais de ambas as partes e salvaguardava os interesses presentes e futuros dos RR., o que foi sempre condição por parte destes.

PP) Mas, na medida em que podem aqui surpreender-se a violação de deveres ou vínculos jurídicos gerais (como por ex. o princípio/dever da boa-fé e princípio da confiança), isto é deveres de conduta impostos à generalidade das pessoas e que correspondem a direitos fundamentais de outrem, poderá falar-se também em responsabilidade delitual ou aquiliana com o correlativo problema de coexistência de responsabilidades - a contratual - fundada no contrato promessa de compra e venda e a extracontratual fundada em facto ilícito.

QQ) O acto (omissivo) aqui em causa, da imobiliária, traduzido no falseamento e

adulteração de informações, documentos e de todo o circunstancialismo inerente ao negócio sub iudice e que estiveram na origem da tomada da decisão dos RR. de contratar, adveio do exercício (indevido, irregular ou negligente) da actividade negocial/contratual por banda da imobiliária “A..., LDA.”, pelo que, são também eles geradores de responsabilidade extracontratual.

RR) Nos termos do art. 16.º, alíneas d) e e) do Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, as empresas mediadoras são obrigadas a propor com exatidão e clareza os negócios de que forem encarregadas, procedendo de modo a não induzir em erro os interessados e a comunicar imediatamente aos interessados qualquer facto que ponha em causa a concretização do negócio visado.

SS) Não restam dúvidas de que a Mediadora não teve o cuidado exigível, tendo induzido em erro os ora RR. no sentido de assinarem um contrato promessa que julgavam

conhecer, não tendo feito a comunicação que se lhe impunha pelo facto de ter sido retirada a cláusula que excluía a sua responsabilidade por qualquer garantia ao imóvel prometido alienar e aos eletrodomésticos, factos esses que, sem dúvida, colocavam em causa a concretização do negócio visado.

TT) Violou ainda a imobiliária o dever de informação e de transparência, porquanto, sempre os RR. deveriam ter tido conhecimento da proposta, na íntegra e dos

respectivos contornos.

UU) “a obrigação de reparação não existe quando o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que a coisa padece.”, o que, como visto já, encontra fundamento no disposto no art.º 914.º, 2ª. parte, do Código Civil.

VV) Que os RR. desconheciam, “à data da compra e venda”, tais defeitos, é ponto

assente, nos artigos 37.º e 180.º da Contestação.

WW) Outra questão prende-se com a ausência de culpa dos RR., no tocante a tal

desconhecimento.

XX) Ora, com interesse para esta matéria, temos provado, antes da proposta de aquisição os AA. visitaram a morada, minuciosa e detalhadamente, todas as divisões do seu interior, bem como todo o exterior, aqui se incluindo o desvão sanitário e acompanhado de um Arquitecto que veio, com a preocupação e finalidade de inspecionar a moradia por completo a fim de emitir o seu parecer técnico. Circunstâncias essas que arredam a presunção de culpa dos RR.

YY) A referência, pelos AA. quanto à existência de defeitos – na sequência de visitas enquanto potenciais compradores, à casa em questão, releva em termos de impor a conclusão que os RR. usaram de toda a diligência exigível ao proprietário e vendedor de um imóvel, designadamente quanto à existência do salitre existente e à iniciativa de mostrar o desvão sanitário aos AA., sempre que estes pretenderam, inclusivamente, aquando da perícia/inspeção levada a cabo pelo Arquitecto EE.

ZZ) Sendo certo que, como referido, ao longo de 8 anos em que os RR. viveram naquela mesma casa, tais alegados e invocados defeitos e/ou vícios e/ou patologias nunca

apareceram, nunca foram um problema, nem nunca tinha sido, menos ainda que os impedisse de fruir da sua casa, sem quaisquer problemas, cheiros, mofo e humidades e menos ainda, com problemas nas paredes onde tinha sido decorado com papel de parede há cerca de 12 anos atrás e até mesmo no chão, o qual, é o mesmo desde o início da decoração da casa, feita pela decoradora e testemunha HH, conforme foi atestado e confirmado, sem quaisquer reservas de memória, por esta.

AAA) O mesmo tendo sucedido com o papel de parede existente em todas as divisões da casa, que era precisamente o mesmo que ela própria, a testemunha HH, havia escolhido/sugerido e mandado colocar na moradia, dias antes dos RR. passarem nela a habitar, há 12 anos atrás.

BBB) Não se desconhece, por outro lado, o entendimento de Pedro Martinez, segundo o qual: “O defeito da coisa vendida só leva à aplicação do regime da venda de coisas defeituosas caso o comprador o desconheça sem culpa. Havendo pois, que distinguir o defeito oculto do defeito aparente e do defeito conhecido.

CCC) O defeito oculto é aquele que, sendo desconhecido do comprador, pode ser

legitimamente ignorado, pois não era detetável através de um exame diligente.

DDD) De modo inverso, sempre que a desconformidade se puder revelar mediante um exame diligente, o defeito é aparente.

EEE) Por último, o defeito conhecido corresponde aos vícios da coisa que foram revelados ao comprador, tanto pela contraparte, como por terceiro, ou de que ele se apercebeu pela sua perícia.

FFF) Deste modo, a responsabilidade derivada da venda de coisas defeituosas só existe em caso de defeitos ocultos.”.

GGG) Destarte, e em face da prova produzida através dos depoimentos supra transcritos das testemunhas FF, GG, da Ré DD, da Autora BB e até mesmo do Autor AA, em consonância com a inspeção/perícia técnica levada a cabo na moradia em toda a sua extensão (no interior, no exterior e no desvão sanitário) por um profissional da área e com esse mesmo intuito, a fim de verificar se existiam danos, vícios ou defeitos de construção,

a pedido do comprador, na sequência das patologias que pelos RR. lhes foram mostradas, não resultam dúvidas de que os alegados defeitos em causa, a existirem, são defeitos conhecidos, ou, quanto muito, aparentes.

HHH) De resto, mais restritivamente, entende Calvão da Silva que “o vício (a priori oculto ou aparente) conhecido do comprador na conclusão do contrato exclui a garantia e responsabilidade do vendedor: convenientemente elucidado, o comprador aceita a coisa defeituosa, não se vendo como poderia depois alegar um vício ou falta de qualidade da coisa entregue em conformidade com o contrato”. – o que não deixa de ser exatamente isto o que os AA. vieram fazer através da presente acção, ou seja, depois de aceitarem a coisa defeituosa, vieram alegar na presente ação que que a morada apresentava vícios ou falta de qualidade da coisa entregue em conformidade com o contrato.

III) Devendo em consequência, este Venerando Tribunal, após apreciação da prova gravada e, alterados os factos nos termos supra descritos, revogar a douta decisão recorrida e, substituí-la por outra, que julgue totalmente improcedente a acção intentada pelos AA./Recorridos.

JJJ) Conforme referido nestas alegações de recurso, a douta decisão de recurso efetuou uma errada interpretação dos factos, que impunha decisão diversa sobre os pontos

da matéria de facto dada como provada e também uma errada aplicação do direito, nomeadamente dos artigos 252.º, 303.º, 331.º, 342.º, 437.º, 483.º, 487.º, 563.º, 615.º, n.º1, 762.º, 916.º, 917.º, todos do Código Civil, o artigo 576.º do Código de Processo Civil e os artigos 16.º, alíneas d) e e) do Decreto-Lei 211/2004, de 20 de Agosto.


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Contra-alegaram os Autores e a Seguradora, defendendo a correção do decidido.

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As questões a decidir são as seguintes:

A reapreciação da matéria de facto;

A caducidade da ação;

A desvalorização do prédio;

O desconhecimento dos Réus, sem culpa;

A absolvição dos Chamados;


*

A reapreciação da matéria de facto impugnada.

Estão em causa os factos provados em 8 a 12, alegadamente retificar os factos 7, 13, 24, 25 e 32 e estão em causa os factos não provados sob as alíneas n), q), r), t) e u).

Está essencialmente em causa apurar do conhecimento das partes, na venda que se fez, das anomalias detetadas.

Os elementos probatórios apresentados para a concreta reapreciação estão sujeitos à livre apreciação do julgador.

São eles: os emails de 26.10.2019 e de 8.6.2020 e os depoimentos das partes ouvidas, de FF, GG, II, HH, JJ e KK.

Na reapreciação dos factos, o Tribunal da Relação altera a decisão proferida sobre a matéria de facto se a prova produzida, reapreciada a pedido dos interessados, impuser decisão diversa (art.662, nº1, do CPC).

Este tribunal forma a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos impugnados.

Lembremos também que a aplicação do regime processual em sede de modificação da decisão da matéria de facto conta necessariamente com a circunstância de que existem fatores ligados aos depoimentos que, sendo passíveis de influir na formação da convicção, não passam nem para a gravação nem para a respectiva transcrição. É a imediação da prova que permite detetar diferenças entre os depoimentos, tornando possível perceber a sua maior ou menor credibilidade.

Ora, reapreciadas as provas apresentadas e as consideradas pelo Tribunal recorrido, a nossa convicção vai no sentido de que os Autores conhecem algumas anomalias, mas, aquando da sua habitação efetiva, são confrontados com uma gravidade e extensão não pensáveis, levando-os a procurar a fundo a origem e forma de resolução do problema. No que respeita aos Réus, o conjunto de indícios permite ter como plausível que não podiam desconhecer a gravidade da origem do problema da humidade, algo entre a negligência grosseira e o dolo.

Vejamos:

O email de 26.10.2029 permite verificar que os Autores conhecem algumas anomalias, de forma mais ou menos concreta. Porém, ele não permite tirar todas as ilações retiradas pelos Réus, ou seja, do conhecimento da extensão do problema e da sua origem. Aqui também não é claro que a redução do preço proposta fosse fundamentada apenas pelos defeitos aparentes, parecendo que aquela incluía um gasto com a piscina e “um armazém”.

O Tribunal considerou o seguinte conjunto probatório: o depoimento do Autor, a inspeção técnica, a certificação notarial, os testemunhos de C..., II e de HH, repudiando o depoimento da Ré e os testemunhos de JJ e de KK.

Esta opção tem razão de ser.

Entre a visualização de algumas humidades, num conjunto de “boa aparência”, e a constatação do cheiro forte que levou à procura mais profunda do oculto vai uma grande distância. O Autor pediu então uma inspeção aprofundada, que revelou uma situação mais grave, decorrente da insuficiente estruturação do “desvão sanitário”.

Ocorre a evolução de uma situação com menor incidência para aquela inspecionada, muito mais grave, detetada 5/ 6 meses depois da passagem de um inverno.

As queixas do Autor são confirmadas na inspeção e no testemunho de C..., este completamente desconsiderado pelo recurso.

Depois, apesar do testemunho de II não ser perentório (dá-se aqui alguma razão aos Réus), o mesmo permite detetar um indício sobre a postura dos Réus, que o chamaram (no passado) para conversar sobre a humidade, tendo abordado a questão da má inclinação do terreno, que conduz a água para junto da casa e não para fora.

Outro indício corroborador do depoimento do Autor são as alterações “cosméticas” feitas pelos Réus (indício fotografado), resultando do testemunho de HH que nem tudo estava conforme o original.

No conjunto de anomalias detetadas, os testemunhos de JJ e de KK, que pouco viram, revelam-se não infirmadores do inspecionado.

FF e GG asseguram que, no conjunto de 3 visitas dos Autores, uma delas foi feita com o amigo arquiteto, em toda a área.

Feito este enquadramento geral, analisemos agora os factos indicados:

Dos não provados:

n) (Que, sem prejuízo do acima expresso nos factos provados, as anomalias verificadas no imóvel fossem do conhecimento dos autores no momento em que o mesmo lhes foi entregue.)

Como motivado, entendemos as anomalias detetadas em abril de 2020 não eram todas do conhecimento dos Autores, mais especificamente na sua extensão, gravidade e origem do problema.

q) (Que os réus desconhecessem as anomalias acima indicadas nos factos provados.)

Como motivado, os Réus não desconheceriam a origem do problema, estrutural, que conduzia a uma “ascensão” da humidade, para as paredes da casa.

r) (Que, sem prejuízo do acima expresso no ponto 30 dos factos provados, os autores tivessem solicitado autorização aos réus para que o imóvel pudesse ser objecto duma vistoria técnica.)

A visita dos Autores, acompanhada pelo amigo arquiteto, permitiu detetar alguns problemas aparentes, mas ela não constitui (e não se prova que tivesse sido pedida uma inspeção técnica) uma análise aprofundada do que está oculto, como sejam os bolores por trás dos “revestimentos” e a deficiente estruturação do “desvão sanitário (cave)”.

t) (Que, sem prejuízo do acima expresso nos factos provados, que o autor AA e o Arquitecto EE tivessem voltado a inspecionar o desvão sanitário existente por baixo da casa, abaixo da laje, e a moradia em redor, em toda a sua extensão no exterior.)

FF e GG asseguram que, no conjunto de 3 visitas dos Autores, só uma delas foi feita com o amigo arquiteto, em toda a área.

Daí também a fixação do facto 32 questionado.

u) (Que a fotografia junta como documento n.º 13 com a PI apenas evidencie a incorreta colocação do papel de parede por parte dos réus; e que os mesmos tivessem tentado aplicar novo papel em substituição do anterior; que a área danificada tivesse como causa a acção do filho dos mesmos réus.)

           Estes factos são instrumentais, próprios de uma motivação de facto a realizar pelo julgador. O elemento, não certo, não infirma o conjunto probatório considerado para antever que os Réus não desconheceriam a origem do problema, estrutural, que conduzia a uma “ascensão” da humidade, para as paredes da casa.

            Facto 7:

            É no período referido, com a efetiva habitação dos Autores, que estes começam a sentir um forte cheiro a humidade, a tal ponto que os levou a solicitar uma análise mais profunda à construção.

            Factos 8, 9 e 10:

            Não sendo a melhor técnica para fixar os factos provados, estes correspondem à realização e teor dos relatórios em questão, sendo certo que, como motivado, a situação relatada corresponde a realidade não infirmada.

            Factos 11, 12 e 13:

           A aceitação do depoimento do Autor, apoiado pelos documentos referenciados, permite a sua fixação.

            Factos 24 e 25:

           O recurso desconsidera totalmente o depoimento de C..., que serve para, apoiando o do Autor, conferir os trabalhos realizados e o pagamento dos Autores. Este não resulta apenas do documento nº 9, daí tiraremos a parte final do 25, constando provado o pagamento.

            Pelo exposto, sem prejuízo da alteração da redação do facto 25, julga-se a impugnação improcedente, mantendo a matéria de facto como fixado.

Assim, os factos a considerar são os seguintes:

1. A 09-3-2020, foi outorgada a escritura pública com a epígrafe “Compra e Venda”, perante o Notário Sr. Dr. LL, a qual consubstancia o documento n.º 1 da PI (petição inicial), cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.

2. O objecto da aludida escritura foi o prédio urbano sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho ..., composto de casa de cave e rés do chão para habitação e logradouro, descrito na CRP ... sob o n.º ...79/..., inscrito na matriz sob o artigo ...69.º com o Alvará de Licença de Utilização n.º ...12, emitida pela Câmara Municipal ... a 10-7-2012.

3. Os réus mandaram construir o acima referido imóvel.

4. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do Contrato Promessa de Compra e Venda, junto como documento n.º 2 da PI.

5. O aludido prédio destinou-se à habitação própria e permanente dos autores.

6. É neste prédio que os autores pernoitam, confecionam as suas refeições, passam as horas de lazer, recebem amigos e familiares.

7. No período compreendido entre a entrega do imóvel aos autores (09-3-2020) e o momento em que foi efetuada a visita técnica que deu origem ao Relatório Técnico abaixo referido (07-4-2020), os autores começaram a constatar um forte cheiro a humidade, que, mesmo abrindo as janelas, não desaparecia.

8. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do “Relatório Técnico de Inspeção – Vistoria Técnica – 07 Abril 2020” da autoria do Eng.º MM, cuja data aposta no final do mesmo é “14-4-2020”, o qual consubstancia as páginas 2.ª à 22.ª do documento n.º 3 junto com a PI. Dá-se destaque ao seguinte excerto do segmento “Resumo e Conclusão” do referido Relatório: “A moradia tem muitas zonas exteriores relvadas ou seja a água infiltra-se no solo e não drena para fora da envolvente exterior da moradia. Apesar de ter sido efetuado um desvão sanitário de ventilação com o objectivo de baixar as humidades, como o desvão não estava devidamente impermeabilizado, e as águas devidamente drenadas, acabou por não ser eficiente. Por esse facto, este é o problema da origem das humidades e tem de ser melhorada a sua eficácia, resumindo: - Impermeabilizar as laterais com tela asfáltica - Efetuar sistema de drenagem conforme pormenor atrás descrito - Executar barreira de vapor superiormente ao solo (no interior do desvão) - Isolar a laje termicamente para diminuir as condensações - O problema do salitre existente no interior da moradia resolve-se depois de secar e depois destas intervenções estarem concluídas.”.

9. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do Aditamento a Relatório Técnico de Inspeção Visual – Nova Vistoria Técnica – 13 Maio 2020, produzido na decorrência de nova vistoria efectuada a 13-5-2020 pelo Sr. Eng.º MM (cfr. página 23 e seguintes do documento n.º 3 da PI). Dá-se destaque ao “Resumo e Conclusão” do referido Relatório: “Os problemas de humidade na laje do piso térreo continua a gerar novos problemas, desta vez foi com o piso flutuante, as madeiras está a começar a deformar-se a uma velocidade considerável, visto que a 07 de Abril não eram visíveis as bolinhas de humidade no pavimento e as juntas levantadas como foi agora bastante visível nesta visita técnica. A conclusão será a mesma do último relatório, tem de ser efetuada a impermeabilização do desvão ventilado (impermeabilizar as paredes enterradas exteriores e colocar drenos de drenagem para encaminhar as águas para as zonas exteriores da moradia) conforme descrito no relatório base. (…)”.

10. Dos aludidos Relatório Técnico e respectivo Aditamento resultam os seguintes aspectos:

a) – Na parte inferior da parede a cerca de 20 cm do rodapé da cozinha, junto à janela verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 1 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

b) Na parte inferior da parede da cozinha junto à janela verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; Cfr. foto n.º 2 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

c) Na parte inferior da parede a cerca de 20cm do rodapé da parede do 2.º quarto (entre a sala de jantar e a suite) verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; Cfr.

foto n.ºs 3 e 4 do Relatório Técnico de Inspeção Visual - Vistoria Técnica.

d) Na parte inferior da parede a cerca de 20 cm do rodapé da parede do 2.º quarto (entre a sala de jantar e a suite) verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr.

foto n.º 4 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

e) Na parte inferior da parede junto a cerca de 20cm do rodapé do hall da sala e que dá acesso à casa de banho verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências com

tinta levantada e caída; cfr. foto n.º 5 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria

Técnica.

f) Na parte inferior da parede junto ao rodapé do hall da sala e que dá cesso aos quartos verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 6 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

g) Na parede do quarto principal (suite) numa extensão com cerca de dois metros quadrados, vindos do rodapé, a parede apresenta-se totalmente danificada com bolores, levantamento de tinta e papel de parede, denota-se um cheiro muito intenso a humidade, manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e

criptoflorescências; cfr. foto n.º 7 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

h) Na parte inferior da parede a cerca de 20cm do rodapé do 2º quarto situado (localizado entre a sala de jantar e a suite) junto à janela do mesmo verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 8 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

i) Na parte inferior da parede a cerca de 20cm do rodapé da sala de estar verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, por de trás do papel de parede que está a levantar por empolamento; cfr. n.º 9 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

j) Na parte inferior da parede junto ao rodapé do escritório junto ao canto do escritório verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 10 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

k) Em toda a extensão da parte na parte inferior do rodapé no escritório, verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 11 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

l) Na parte inferior da parede junto ao rodapé da sala de estar junto à janela verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências; cfr. foto n.º 12 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

m) Na parte inferior da parede, desde o rodapé até meio da parede, numa extensão de cerca de 2 metros quadrados da sala de estar verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências, as quais estão por detrás do papel de parede, o que está a original o empolamento, levanta e descolamento; cfr. foto n.º 13 do Relatório Técnico de Inspeção

Visual – Vistoria Técnica, de 7 de Maio de 2020.

n) Na parte inferior da parede a cerca de 20 cm do rodapé da garagem verifica-se a existência de bolores e manchas de humidade na base da parede, manchas esbranquiçadas com eflorescências e criptoflorescências, verifica-se ainda uma rachadura

na parede com cerca de 50cm de comprimento; cfr. foto n.º 14 do Relatório Técnico de

Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

o) Aparecimento de humidades em todas as zonas com pavimentos flutuantes que reveste a laje do piso térreo, o piso evidência levantamento por dilatação, ondulação nas juntas devido ao elevado grau de humidade existente no pavimento; cfr. duas fotografias juntas com o Aditamento a Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

As paredes do exterior do imóvel apresentam muitas fissuras e salitre, os quais se

descrevem:

p) A parede exterior por cima da janela da sala de jantar na zona superior do vão apresenta uma fissuras/rachadura longitudinal em quase toda a extensão do vão da janela; cfr. foto n.º 15 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

q) O vão da janela da sala de jantar, na parte superior do vão, encontra-se com muita humidade, com manchas de bolor e com a tinta levantada; cfr. foto n.º 16 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

r) A falta de batente e a falta de inclinação para o exterior dos peitoris das janelas e soleiras em pedra facilita a entrada de humidade para o interior do imóvel; cfr. fotos n.ºs 17, 18 e 19 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

s) Os pilares no exterior do imóvel estão com humidade no seu revestimento, verifica-se o empolamento das tintas e o descamar da parede, muito ao nível inferior dos pilares, mais uma vez próximo dos rodapés; cfr. foto n.º 20 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

t) As serralharias exteriores, em quase todas as guardas exteriores, em inox estão oxidadas; cfr. foto n.º 21 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

u) As vigas de madeira lamelada colada na pérgula exterior estão todas manchadas; cfr. foto n.º 22 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

v) Em todo o perímetro do imóvel/moradia, verificam-se abatimentos térreos que provocaram rachaduras e abatimento nos muros e no piso, verifica-se que a inclinação do relvado está colocado no sentido para o interior, o que está a provocar que as humidades permaneçam no perímetro da moradia e as pedras de grandes dimensões colocadas no exterior estão a impedir a boa drenagem das águas pluviais; cfr. foto n.º 23 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

w) Nas zonas exteriores verifica-se a existência de vários abatimentos térreos e os

revestimentos cerâmicos e rebocos laterais estão a levantar e a colocaram à vista zonas sem qualquer acabamento ou isolamento, o que está a permitir a infiltração de água junto

às paredes exteriores do imóvel pela abertura de fendas em toda a volta do imóvel junto às paredes exteriores; cfr. fotos n.ºs 24 a 28 do Relatório Técnico de Inspeção Visual –

Vistoria Técnica.

x) Na zona de desvão sanitário verifica-se o aparecimento de água, humidade e condensação elevada, como é bem visível nos vigamentos e pilares os quais se apresentam com manchas escuras de bolor intenso e manchas de humidade, é inclusive bem evidente que o terreno está completamente saturado de água que escoa no terreno abaixo da laje do pavimento do piso 0 e que grande parte dessa água vem do exterior; cfr. fotos n.ºs 28 a 35 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

y) Verifica-se a falta de barreira de vapor por cima do solo, o que se verifica pelo desvão ventilado; cfr. fotos n.ºs 29 e 30 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

z) Verifica-se a falta de isolamento térmico junto à laje; cfr. fotos n.ºs 29, 30 e 38 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

aa) Na zona de desvão ao nível térreo é evidente a falta de base resistente para suportar a parede de alvenaria, os blocos de betão estão completamente saturados de humidade; cfr. foto n.º 32 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

bb) A face inferior da laje do piso 0, está com níveis altíssimos de condensação e os blocos de betão estão cheios de humidade, o que está a permitir a transmissão da humidade à laje, que por sua vez origina todos os problemas de humidade nas paredes interiores; cfr. foto n.º 38 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

cc) Verifica-se a falta de impermeabilização com tela asfáltica dos muros/paredes exteriores enterradas; cfr. foto n.º 37 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

dd) O sistema de ventilação no desvão sanitário, é insuficiente, os tubos não têm a entrada de ar a grandes distâncias horizontais, o que está a impedir a entrada do volume de ar necessário; cfr. foto n.º 36 do Relatório Técnico de Inspeção Visual – Vistoria Técnica.

11. Os autores comunicaram de imediato aos réus as anomalias verificadas no imóvel.

12. Inicialmente, fizeram-no de forma verbal.

13. As subsequentes comunicações seguiram a via escrita, ou seja, o envio de comunicações eletrónicas, nos dias 07-5-2020, 05-6-2020, através do endereço “AA.........@.....” para os endereços dos réus ”CC..........@.....” e “DD..........@.....”, os quais foram recebidos pelos réus (cfr. documento n.º 4 junto com a PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).

14. Os autores obtiveram resposta no dia 07-6-2020, através de comunicação eletrónica dos réus (cfr. a página 9.ª do documento n.º 4 da PI). Da aludida comunicação destaca-se o seguinte excerto: “(…) Relativamente aos problemas apresentados nós não sabíamos que eles existiam, embora alguns deles sejam situações normais de uma casa com 9 anos, que vocês tiveram acesso e viram nas visitas que efetuaram. Vivíamos aí da melhor forma possível e sem nunca repararmos em nada. Obviamente que as casas com o passar dos nos precisam dos seus arranjos e melhorias. Não é uma casa perfeita, mas nunca tivemos problemas de maior. (…)”.

15. À comunicação expressa no ponto anterior, os autores responderam a 8-6-2020 (documento n.º 4 da PI).

16. Para além do acima exposto, entre as partes foram trocadas comunicações eletrónicas no dia 21-9-2020 (comunicação eletrónica enviada pela Ilustre Mandatários dos réus aos autores) e no dia 24-9-2020 (comunicação eletrónica enviada pelos autores à Ilustre Mandatários dos réus) (cfr. páginas 14 e 15 do documento n.º 4 da PI).

17. Os autores solicitaram aos réus a reparação e eliminação das anomalias verificadas, tendo-lhes enviado o Relatório e o Aditamento, os quais integram o documento n.º 3 com a PI acima citado. Em concreto, o referido Relatório integrou a comunicação eletrónica de 07-5-2020 e o Aditamento é mencionado na comunicação eletrónica de 05-6-2020, ambas acima referidas nos pontos anteriores.

18. Os autores fizeram deslocar ao prédio o Exmo.º Notário Sr. Dr.º LL, com ..., sito na Avenida ..., lote n.º ...1 – ... em ....

19. O Sr. Notário Dr.º LL foi ao imóvel no dia 13-5-2020, tendo visitado toda a casa em apreço. O Dr.º LL verificou a existência de paredes com humidade em quase todas as divisões; na parte inferior, não habitável e onde se vislumbrava as sapatas do imóvel existia terra e água.

20. Os autores contrataram empreiteiro para pôr cobro às anomalias do imóvel acima realçadas.

21. A empresa contratada foi a C..., Lda., cuja certidão permanente consta identificada na PI como documento n.º 6, cuja efectiva junção ocorre através do requerimento de 10-11-2020, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.

22. O sócio e gerente da referida sociedade – Sr. C... - deslocou-se ao imóvel, na companhia do Eng.º MM [o subscritor do Relatório e do Aditamento integrantes do documento n.º 3 da PI], com o fim de apurar tais anomalias e equacionar a melhor forma de as solucionar.

23. Para a concretização das reparações enunciadas a C..., Lda., procedeu à realização dos seguintes trabalhos: a. Reparação de paredes interiores; b. Picagem de paredes, retirada de estuque com humidade; c. Transporte e vazadouro e hidrófugo nas paredes; d. Aplicação de novo estuque; e. Pintura de Paredes; f. Reparação de peitoris e soleiras; g. Impermeabilização de cantos, protecção das zonas a intervir; h. Limpeza final; i. Movimento de terras; j. Retirada de elementos exteriores, incluindo pedras de grande volume, plantas, relvado e reposição dos próprios; k. Escavações, corte de pavimento asfáltico; l. Abertura de valas em redor da habitação; m. Execução de aterros manuais e maquinação e sua compactação; n. Fornecimento e colocação de brita;

o. Impermeabilização e drenagem; p. Aplicação de emulsão betuminosa tipo Imperkote F com demãos; q. Aplicação de tela betuminosa com 4kg/m2; r. Aplicação de tela pitonada de alta densidade e tela geotestil a envolver muros e brita de drenos; s. Aplicação de tubo de geodreno 2*125; t. Execução de caixas de drenos pluviais; u. Sistemas de ventilação; v. Execução de Condutas de ventilação no espaço inferior da habitação/cave;

w. Reparação de pavimento com retirada do pavimento e rodapés; x. Transporte em vazadouro; y. Colocação de tela plástica, colocação de tela acústica; z. Colocação de piso flutuante AC5; aa. Colocação de rodapé liso branco lacado; bb. Movimentação de terras;

cc. Retirada de terras da cave, superiores às fundações, por estas estarem com muita humidade.

24. A C..., Lda. realizou tais trabalhos, tendo cobrado aos autores o valor de € 54.935,41, a que acresceu o IVA à taxa de 23% no valor de €12.634,68, que perfez a totalidade de € 67.568,09, tudo conforme resulta do teor da fatura n.º FA 2020A/2, emitida a 01-10-2020, com a mesma data de vencimento (documento n.º 7 da PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido).

25. (Alterado.) Tal valor foi pago.

26. No início do mês de outubro de 2019, os réus CC e DD foram contactados pelo angariador da A..., Lda., de nome GG, no sentido de saber se estariam disponíveis para mostrar o imóvel acima identificado.

27. Em outubro de 2019, o imóvel encontrava-se à venda e era publicitado no sítio da D..., pelo valor de € 395.000,00, tudo conforme resulta das fotografias juntas como documentos n.ºs 1 a 17, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.

28. Assim, foi agendada data para a concretização de visita ao imóvel por parte dos autores.

29. Na primeira visita, os autores foram acompanhados por NN e por FF, ambos colaboradores da A..., Lda.

30. Os autores então visitaram, detalhadamente, todas as divisões da moradia, bem como todo o seu exterior.

31. Dias depois, os réus foram novamente contactados por OO, da A..., Lda., que os informou que os ora autores tinham manifestado interesse na compra da casa em apreço, e por essa razão, pretendiam agendar nova visita.

32. Na aludida segunda visita o autor AA foi acompanhado do Arquitecto, seu conhecido, EE, a fim deste emitir o seu parecer quanto ao estado de conservação do imóvel e quanto a determinados aspectos que lhe foram mostrados pelos réus, in locu, aquando da primeira visita, designadamente, o salitre existente em diversos pontos de algumas paredes interiores.

33. Além do exposto, o autor AA e o Arquitecto EE inspecionaram o desvão sanitário ventilado, situado abaixo da casa.

34. Em tal ocasião, o autor AA e o Arquitecto EE verificaram minuciosamente todas as divisões da moradia. Dá-se aqui por reproduzido o teor da comunicação eletrónica datada de 08/06/2020, enviada pelo autor aos réus. Destaque o sexto parágrafo da dita comunicação, na qual o autor refere o seguinte: “Eu vim à casa três vezes com um arquitecto antes de concluirmos a venda e você fez um bom trabalho disfarçando a questão, mas novamente era o fim do verão. (…)”. (cfr. página 12 – enumeração aposta, manualmente, no canto inferior direito – do documento n.º 4 junto com a PI, ou seja, da aludida comunicação eletrónica de 08-6-2020).

35. Na parte final de uma das visitas efetuadas e perante o réu CC, OO e o autor AA, o referido Arquitecto EE referiu que ele próprio gostaria de comprar aquela casa, caso tivesse dinheiro para tanto.

36. A 26-10-2019, os autores enviaram uma mensagem eletrónica para o endereço eletrónico da colaboradora da A..., Lda., D.ª FF (FF..........@.....), através do qual apresentam uma proposta para a aquisição do imóvel, a qual consubstancia o documento n.º 18 da PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido. Da referida comunicação destaca-se o seguinte excerto: “Olá FF. Encontrei-me hoje brevemente com o EE (Arquitecto) e amanhã volto a vê-lo.

Ele expressou preocupação com a humidade observada em vários locais, bastante comum

na área e pode ser corrigida com um custo, tratando a cavidade debaixo do piso e fazendo

acabamentos nas paredes relevantes. Muitas das áreas com papel de parede precisam de atenção. As portas dos móveis da cozinha precisarão de ser substituídas, uma vez que a do frigorífico está partida e não pode ser consertada. A suite do primeiro quarto também necessita de atenção, pois a humidade infiltrou-se e estragou os móveis, o espelho e os equipamentos. A sua esposa PP (Arquiteta) tem dúvidas sobre a obtenção da permissão para construir uma piscina e zona de armazenamento neste local, mas esperamos uma decisão do arquiteto da câmara na segunda-feira. Como sabe nós gostamos da casa, mas só é interessante com a piscina e armazenamento adicional etc. Tentamos fazer uma estimativa dos custos das obras e estamos preparados para fazer uma oferta razoável pelo imóvel, sujeito a licença de construção e resultados aceitáveis de uma inspeção. Como sabe, podemos proceder imediatamente e temos fundos suficientes para concluir a compra. A nossa oferta é incluir certos itens de mobiliário, excluindo bens pessoais, e será detalhada num inventário completo, mas em resumo, a ser acordado o mais rápido possível: Este mobiliário deve incluir tudo em "O escritório", "Sala de estar / TV (com almofadas verdes) incluindo TV", "O quarto principal", "A cozinha", "A despensa (anexa à garagem) incluindo todos os eletrodomésticos" e TODOS os acessórios elétricos, lâmpadas e luzes e projetor de TV. A nossa oferta sujeita a essas inclusões, resultados da inspeção e consentimento para a piscina e armazenamento é de 340,000 Euros. Além disso ficaríamos felizes em adquirir a Scooter Honda que vimos na garagem por um preço pré-acordado, caso ela não seja mais necessária.”.

37. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor do Relatório “Moradia Unifamiliar / Local: ... – ... – ...” datado de 26-11-2020 e elaborado pela Eng.ª QQ, identificada na contestação dos réus como documento n.º 19 da contestação dos réus.


*

A caducidade da ação.

Facilmente se repara que os Réus não invocaram antes qualquer caducidade.

Estamos em sede de direitos disponíveis, de natureza meramente patrimonial, estando vedado ao tribunal conhecer a exceção agora referenciada– arts. 333º nº 2 e 303º do Código Civil.

Depois, “os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, salvo quando estas sejam de conhecimento oficioso e o processo contenha os elementos imprescindíveis.” (A. Geraldes, Recursos, 3ª edição, 2010, Almedina, página 104.)

Por fim, ainda que assim não fosse, de modo concreto, em 7.5.2020, os Autores denunciaram a desconformidade oculta, solicitando a reparação.

Esta é relativa a imóvel.

            Em face do disposto nos arts. 916 e 917 do Código Civil (CC), sem prejuízo de se poder discutir o dolo dos Réus, os Autores tinham até 7.11.2020 para instaurar a ação, o que fizeram antes, em 20.10.2020.


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A desvalorização do prédio.

Neste particular, os Réus têm razão.

Os Autores nem sequer explicam esta desvalorização. E o Tribunal também não.

Ora, considerando a reparação documentada, profunda, estrutural, realizada por todo o prédio, é de presumir que ele ficou em condições, não se percebendo onde está a desvalorização.

Deverá então ser revogada a condenação feita em B, iii.


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O desconhecimento dos Réus, sem culpa.

Como vimos, da reapreciação da matéria de facto, os Réus não desconheceriam a origem do problema, estrutural, que conduzia a uma “ascensão” da humidade, para as paredes da casa.

Mesmo que não se discuta o seu dolo, podemos verificar que não se provou o seu desconhecimento.

Além disso, mesmo em caso de dúvida, os Autores beneficiam de uma presunção de culpa, conforme previsto no art. 799 do CC.


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Não é discutida a integração da situação na “venda de coisas defeituosas”, instituto dos arts.913 e seguintes do Código Civil (CC).

Para proteger o comprador de coisas defeituosas, o artigo 913º do CC, mandando observar, com as necessárias adaptações, o prescrito nos artigos 905º a 912º, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos 914º a 922º, confere-lhe os seguintes direitos:

A reparação da coisa;

A anulação do contrato;

A redução do preço, quando as circunstâncias do contrato mostrarem que o comprador teria igualmente adquirido a coisa, mas por um preço inferior;

A indemnização (cumulável com um daqueles) do interesse traduzido no prejuízo que o comprador sofreu com a celebração do contrato, e/ou no proveito que teria obtido, se não fora o contrato que efetuou (arts. 908º a 911º, ex vi art. 913º).

Sendo certo que, no caso, os Autores pretenderam a reparação da coisa, esta solicitação foi repudiada pelos Réus, o que legitimou, dada a urgência na habitação, a sua realização por terceiro.

Ora, perante a recusa infundada dos Réus, pois o dano era estrutural e oculto, os Autores ficaram legitimados para avançarem eles com a reparação, o que fizeram.

Note-se, porém, que ainda antes de detetar a desconformidade oculta, antes mesmo da compra, os Autores já conheciam alguns defeitos a reparar, para os quais já tinham pedido uma redução do preço (cfr. a comunicação de 26.10.2029).

O preço inicial era de 395 mil euros, sendo reduzido para 355 mil euros, no qual foi incluída uma parcela para móveis.

Com a reparação feita agora, apurou-se um gasto de € 67.568,09.

Neste contexto, entendemos percecionar que os Autores, com a redução do preço e com a reparação, tiveram uma vantagem e um dano.

Por um lado (facto 36), no que respeita aos defeitos aparentes considerados (humidade em vários locais, tratar cavidade, acabamentos nas paredes relevantes, portas da cozinha e móveis da suite), os Autores conseguiram uma redução do preço de cerca de 55 mil euros.

Todavia, é importante que se repita que a redução do preço não foi considerada com o conhecimento de toda a extensão do problema e da sua origem, parecendo estar a incluir alguma pressão de negociação.

           Por outro lado, no que respeita aos defeitos ocultos, especialmente no “desvão sanitário”, o dano aparenta concretizar-se nos referidos € 67.568,09. Todavia, como se percebe do confronto com os trabalhos realizados, neles estão a reparação de defeitos já antes detetados e pensados (pinturas, rebocos e não se sabe o que poderia ser mais).

Nunca se saberá qual é o valor, do relativo à redução do preço, que diga respeito aos defeitos já antes detetados. Nunca se saberá, com rigor, qual é o valor relativo à reparação, que diga respeito a trabalhos já pensados para fundamentar a redução.

           Por tudo isto, sendo insuficientes ou inaplicáveis os critérios legais referidos, faz sentido utilizar a equidade.

A equidade pode funcionar como último critério de liquidação, caso não se consiga proceder à quantificação do empobrecimento exato/concreto. A equidade, como justiça do caso, mostra-se apta a colmatar as incertezas do material probatório, bem como a temperar o rigor de certos resultados de pura subsunção jurídica, na procura da justa composição do litígio, fazendo apelo a dados de razoabilidade e equilíbrio.

Como resulta do estudo da aquisição da prova nos autos, estão esgotados os meios para se encontrar aquele valor exato, não se justificando remeter as partes para o que se vier a liquidar depois.

Utilizando a equidade, com a ponderação factual já realizada, mostra-se ajustado e equilibrado que a perda dos Autores (pagamento da reparação) seja relativamente compensada com a vantagem que tiveram com a redução do preço.

Na falta de outro apoio, dividimos ao meio o valor da reparação. Os Autores receberão agora apenas 33.784 euros.


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A absolvição dos Chamados.

Neste particular, os Recorrentes nem sequer discutem a matéria de facto fixada. Ora, os factos (e nem sequer a motivação do julgador) não permitem analisar qualquer responsabilidade da mediadora. (E do depoimento de GG resulta que uma alteração ao contrato foi previamente analisada, considerada não essencial ou condicionante do negócio, e da concordância de todos.)

Aquela absolvição deve manter-se.


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            Decisão.

Julga-se o recurso parcialmente procedente e decide-se, mantendo-se o demais:

Condenar os réus CC e DD no pagamento aos autores AA e BB da quantia total de € 33.784,00 (Trinta e três mil, setecentos e oitenta e quatro euros); a que acrescem os devidos juros moratórios, calculados desde a data de citação dos mesmos réus e até efetivo pagamento.

Absolver os réus CC e DD da condenação no pagamento aos autores AA e BB da quantia que se vier a apurar pela alegada desvalorização do prédio acima identificado em B.

 Manter a absolvição das chamadas A..., Lda. e B..., SA.

            Custas pelos Autores e Recorrentes, na proporção de 50%.

            2024-10-08


(Fernando Monteiro)

(Luís Cravo)

(Carlos Moreira)