Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1202/18.9T8CBR.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOÃO MOREIRA DO CARMO
Descritores: ACESSÃO DA POSSE
BENFEITORIAS
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 04/05/2022
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA POR UNANIMIDADE
Legislação Nacional: ARTIGOS 216.º, 1256.º, N.º 1, E 1273.º, TODOS DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I – A acessão na posse pressupõe um acto translativo da posse formalmente válido.

II – A obrigação de indemnizar o possuidor pelas benfeitorias que haja feita na coisa possuída não é uma obrigação “propter” ou “ob rem”. Tal obrigação impende sobre quem – no binómio enriquecimento/empobrecimento que integra a figura do enriquecimento sem causa – era o titular do direito de propriedade sobre o prédio, à data da realização das benfeitorias.

Decisão Texto Integral: I – Relatório

1. AA e mulher BB, residentes em ..., intentaram acção declarativa contra B... SA, com sede no ..., peticionando que:

1) seja declarado que o autor é o legítimo dono e proprietário, por usucapião, e por doação, da parcela de terreno nordeste do prédio identificado em 1º com a exacta delimitação área e configuração ocupada pelas benfeitorias urbanas de “habitação” compostas por moradia com arrumos garagem e piscina, sitas na dita parcela de terreno com a área de construção de 695m2, configuração e confrontações como está delimitada pelas construções nela implantadas e com utilidade e valor económico autónomo, a destacar do prédio urbano de terreno e armazém amplo descrito no artigo 1º deste petitório, com a consequente rectificação da descrição e inscrição predial quanto à sua área e/ou outros elementos que sejam desconformes com a aludida propriedade do autor;

2) caso assim não se entenda, deve o réu ser condenado a reconhecer a propriedade dos autores, por acessão industrial imobiliária, com a aludida delimitação, confrontações e área da envolvente, das benfeitorias urbanas realizadas (casa com arrumos, garagem e piscina), em comunhão e sem determinação de parte, pelos autores, e, consequentemente, a rectificar e corrigir todos e quaisquer registos e seus averbamentos, lavrados ou que tenham entretanto pendente, dos quais resulte qualquer ocupação ou “propriedade” da parcela de terreno (solo) sita a nordeste do prédio identificado em 1º.;

3) deve o réu, cumulativamente, ser condenado a: a) reconhecer e respeitar o direito de propriedade e o direito de uso, gozo e habitação dos autores e a absterem-se da prática de qualquer acto que colida e/ou afecte este direito; b) cessar de imediato a intromissão e a prática de qualquer acto que viole o direito de propriedade dos autores sobre aquela habitação (composta de casa com arrumos, garagem e piscina); c) promover o destaque da parcela de terreno nordeste ocupada pelas ditas benfeitorias urbanas e a respectiva correcção da área, delimitação e confrontações do artigo matricial urbano ...86 da freguesa de ... e da descrição predial ...74 da dita freguesia, do concelho ..., para efeitos dos autores procederem à correspondente inscrição e registo predial; d) pagar aos autores a indemnização que se relega para execução, pelos prejuízos causados e que vierem a causar na quantia que se vier a liquidar;

4) deve o réu ser condenado a pagar aos autores, na qualidade de possuidores e donos das aludidas benfeitorias urbanas, a quantia não inferior a 458.000 € correspondente à valorização incorporada pelos autores no imóvel dos autos, inerente às construções e trabalho nelas realizadas, de raiz, com a edificação da casa de habitação (com 695 m2) dois arrumos, garagem e piscina, que os autores realizaram e incorporaram no aludido prédio urbano matricial ...6, da freguesia ..., com a descrição predial ...74, sob pena de tal valorização e incorporação (em obras e trabalhos de construção civil da casa de habitação com piscina no prédio identificado em 1º) configurar um enriquecimento sem causa do réu;

5) condenação do réu no pagamento de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento.

Os autores alegaram, em suma, que são os donos de uma parcela de terreno e de casa de habitação, composta de arrumos, garagem e piscina, edificada em parte do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...86º da freguesia ..., por a terem adquirido por usucapião ou por doação verbal dos pais do autor. Que foram os autores que construíram tal casa de habitação, com autorização dos pais, e que a mesma constitui um incremento comercial significativo ao dito prédio. Mencionam que vivem na casa, tendo, por isso, direito à habitação. Referem, ainda, que a casa de habitação configurará uma benfeitoria, o que reclamam. Daí que entendam que o réu não é proprietário da casa, pese embora tenha adquirido o prédio com o art. ...86º, numa venda executiva, aos terceiros compradores desse prédio, mas sem a aludida parcela.

O réu contestou a acção, referindo, em síntese, que ainda não decorreu o prazo de usucapião, que uma doação verbal é nula, que não há acessão, porque houve a comparticipação do anterior proprietário da coisa e que as benfeitorias integram o imóvel adquirido em sede executiva, sendo que na hipoteca que constituiu para garantir mútuo aos aludidos terceiros executados estipulou que a mesma abrangeria todas as construções, benfeitorias e acessões. Mais pediu a condenação dos autores como litigantes de má-fé.
Em resposta, os autores disseram que a dita casa de habitação não pertencia aos terceiros executados, que não compraram a mesma, nem a parcela de terreno onde ela foi implantada, pelo que tal bem é alheio ao réu, por não ter sido por ele adquirido na execução, propugnando pelo já referido na p.i. e afastando a litigância de má-fé suscitada.
Respondeu o réu, dizendo que quer os terceiros executados, quer ele, Banco, adquiriram o dito prédio art. ...86º com tudo o que o compunha, designadamente a aludida casa de habitação.

*
Foi, a final, proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o R. dos pedidos, e condenou os AA como litigantes de má-fé na multa de 10 UC.

*

2. Os AA recorreram, tendo formulado as seguintes longas conclusões (apesar de prévio despacho para sintetizar umas, ainda, mais longas conclusões, e que nos levou, agora, a que nós próprios tenhamos feito uma sintetização):

1. Foram os autores AA e BB, nos autos em que é R. B... SA, também aí melhor identificado, notificados da sentença que, julgando a acção improcedente na sua totalidade, absolveu o R. dos pedidos formulados, pelo que, inconformados com o decidido, com as razões que seguidamente se elencam, interpõem recurso a fim de, apreciadas e ponderadas as razões de discordância, de facto e de direito, ser proferida douta sentença que julgue a acção totalmente procedente econdene o R. no pedido.

2. Salienta-se que, na presente acção, foi proferido douto Acórdão dessa Relação que, após um saneador-sentença que absolveu o R. dos pedidos, julgou verificado um erro na apreciação dos factos e ordenou a realização de julgamento para apurar se a casa de habitação, arrumos, garagem e piscina foram edificados na dita parcela do topo nordeste do prédio inscrito na matriz predial ...6 da freguesia das ..., composto de armazém amplo e logradouro, e toda a factualidade inerente ao gozo, uso, posse e propriedade da mesma.

3º. Ora, produzida a prova documental e testemunhal, os Recorrentes não se conformam com a sentença em crise que omite, na apreciação e ponderação da factualidade material, factos que consideram inequívoca e cristalinamente provados, designadamente por serem deconhecimento público e/ou notório e/ou resultarem de prova documental produzida, decorrente de escrituras públicas, como seja a escritura de venda do artigo matricial urbana ...6 pelos pais do A. a CC e DD, em que unicamente transmitiram um prédio urbano composto de “armazém amplo e logradouro”, escritura outorgada com a licença de utilização nº ...8 (do armazém com a área coberta de 375m2 e descoberta de 1087m2), e pelo preço de 50.000,00€, conforme também a descrição predial dada de hipoteca ao R. e por este adquirido em venda executiva; e ainda atenta a prova testemunhal produzida, como ora se evidencia, o que consubstancia erro de julgamento e erro na apreciação daprova, pelo que o Tribunal a quo decidiu com erro na aplicação do direito.

4.º Desde logo, diversamente do elenco feito na Sentença dos factos alegados pelos AA. Nos articulados, os Autores/recorrentes alegaram que são os donos da casa de habitação, composta de arrumos, garagem e piscina, edificada na parcela norte do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...86 da freguesia ..., o qual é constituído e está inscrito na matriz predial como “armazém amplo e logradouro”; que a propriedade da casa de habitação, arrumos, garagem e piscina edificada nessa parcela Norte do prédio foi adquirida por usucapião ou por doação verbal dos pais dos autores; que construíram parte a casa e que a mesma constitui um notório incremento comercial (significativo) ao dito prédio, composto unicamente de “armazém amplo e logradouro”.

5.º Os AA/Recorrentes alegaram ainda que vivem na casa, de forma reiterada e permanente, desde que a mesma foi por eles edificada e se encontra “habitável”, a partir de “finais de 2007” (ainda que ainda sem licença de utilização por faltarem uns acabamentos exteriores), conjuntamente com os filhos, os pais e a avó, tendo, por isso, direito à habitação; e que os anteriores primeiros possuidores e proprietários da dita parcela de terreno a Norte, na qual foi edificada a casa de habitação dos AA., eram os pais do A., e que os anteposssuidores eram os avós do A., tudo como entendem resulta documentalmente provado da inscrição predial do prédio na matriz predial urbana sob o artigo ...86 da freguesia ....

6.º Mais alegaram os AA. que a casa de habitação é uma benfeitoria, o que reclamam subsidiariamente e por cautela, concluindo que o Réu não é proprietário da casa de habitação pese embora o R. tenha adquirido o prédio de “armazém amplo e logradouro” em venda executiva, em que foram executados, unicamente, os adquirentes do armazém e logradouro, CC e DD – vd a escritura pública de venda dos pais do A. do “armazém amplo e logradouro”, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...86 da freguesia ..., pelopreço de 50.000,00€, a CC e DD (únicos executados pelo R. na acção executiva).

7.º Donde, contrariamente ao vertido na fundamentação fáctica da Sentença recorrida, os pais do A. não figuraram “como executados” em tal acção executiva, sendo a ela totalmente alheios porque não foram citados nessa qualidade, apenas dela tendo tido conhecimento a mãe do A., após a venda do prédio de armazém e logradouro ao R., quando foi surpreendida pela notificação para proceder à entrega da casa de habitação!

8.º Destarte, diversamente do decidido, como entendem provaram os AA/Recorrentes, NUNCA os pais do A. ou os AA. foram executados na aludida acção executiva em que vendido o prédio composto de “armazém amplo e logradouro”.

9.º Ora o R. bem sabia, por ser facto notório, que a casa de habitação dos AA. estava edificada na dita parcela norte do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...86, pois que esse prédio era e é totalmente murado, sendo constituída dentro dos muros de delimitação, como pode ser vista “a olho nu” atenta a volumetria e localização da moradia, anexos e piscina implantados e edificados no aludido prédio (artigo ...86), na parcela norte do terreno.

10.º Como entendem foi inequivocamente provado, a parcela norte do terreno onde foi implantada e edificada a casa de habitação, arrumos, piscina tem o valor edificado e incorporado não inferior a 430.000,00€ (facto 13 provado na sentença recorrida) no aludido artigo matricial ...86 inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., composto unicamente de “Armazém amplo e logradouro” e assim descrito na CRP.

11.º De facto, como foi provado, a benfeitoria urbana de “casa de habitação” tem a área de 695m2, com arrumos, garagem e piscina, estando implantada na parcela urbana do topo nordeste do prédio inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...86 da freguesia das ... – cfr A perícia realizada nos autos pelo Exmo Perito Engº EE, em 27.12.2019, na parte 6 “áreas de avaliação – 6.1. Habitação, anexo e garagem; 6.2 Terreno, implantação e logradouro”; o alvará de construção e o levantamento topográfico efectuado ao prédio do artigo matricial ...86 da dita freguesia das ..., conforme também da licença de utilização do armazém emitida com o nº62/98, que refere a área coberta e a área descoberta.

12.º Salienta-se, como entendem os AA foi documentalmente provado por escritura publica, a mãe do A. vendeu a CC e DD um prédio composto de armazém amplo e logradouro, inscrito sob o artigo ...86 da freguesia ..., pelo preço de 50.000,00€, tendo tal escritura sido outorgada com a licença de utilização do armazém nº62/98.

13.º Por sua vez, como resulta da licença de utilização do armazém que instruiu a escritura pública de venda do armazém amplo e logradouro a CC e DD, e estes não ignoravam, o armazém é uma edificação de  ..., edificada num terreno com 1087m2 (área descoberta) e com área de 375m2 (área coberta) – vd a licença de utilização nº...8 (processo camarário nº726/83), emitida pela Câmara Municipal de ..., a fls…dos autos.

14.º Mais, entendem os AA que foi provado que os AA. habitam, ininterrupta e permanentemente, desde agosto de 2007 (factos 14 e 15 provados na sentença), a dita casa de habitação, arrumos e piscina, fazendo os AA., seu filhos, pais e avós, a sua ocupação, sendo tal uso, fruição e posse anterior à aquisição por CC e DD do armazém amplo e logradouro (pelo preço de 50.000,00€), tudo como estes bem sabiam, tendo, inclusive, entregue aos AA. o dito armazém para exploração da sua actividade profissional, de carpintaria, a titulo de comodato, como se mantém até à presente data, sendo o uso e fruição doa armazém feito pela carpintaria do aqui A., “A... Unipessoal Ldª”.

15.º Assim, discordando do decidido, entendem os recorrentes que o Tribunal a quo não alicerçou a sua decisão “na globalidade da prova produzida em julgamento”, designadamente documental em coerência com a prova testemunhal produzida, os quais foram unânimes na prova da doação verbal pelos pais do A. aos AA. da parcela norte do terreno do artigo matricial ...86 para nela edificarem, como edificaram, a casa de habitação, como “prenda de casamento”, doação verbal aos AA. que consubstanciava a concretização do projecto ou sonho dos pais do A., de darem uma parcela de terreno da “Quinta” a cada um dos três filhos – vd as declarações de FF do minuto 25.11 a 26.43 e do minuto 26.51 a 27.38.

16.º Diversamente do entendimento da sentença recorrida, foi clara e unanimemente provado que quer a parcela edificada no “topo nordeste” do prédio inscrito na matriz predial urbana ...6 da freguesia das ... (parcela edificada conforme o facto provado 1 da sentença), quer o artigo matricial ...70, da freguesia das ... (o prédio identificado no facto provado 9 da sentença), integram e fazem parte da “quinta” da ..., a qual estava integralmente delimitada e murada, ainda em vida dos avós do Autor, como permanece, conforme o depoimento de GG, mãe do A., que declarou que (… reprodução do depoimento).

17.º Destarte, entendem os AA./Recorrente que foi provado que na dita “Quinta” totalmente murada, a mãe do A. ficou com duas parcelas das quais, seguindo o exemplo dos seus pais, era sua intenção doar uma parcela a cada um dos três filhos para nela edificarem as suas casas de habitação, ficando assim estes “sob a sua alçada” (… reprodução do depoimento de GG).

18.º GG declarou em julgamento (… reprodução do depoimento).

19.º GG referiu em julgamento (… reprodução do depoimento).

20.º FF, contabilista certificada e amiga da família desde os tempos dos avós do A/Recorrente, declarou em julgamento (… reprodução do depoimento).

21.º Como precisou FF (… reprodução do depoimento).

22.º Como precisou FF (… reprodução do depoimento).

23.º Salienta-se que FF referiu em julgamento (… reprodução do depoimento).

24.º HH, arquitecto, com conhecimento directo e pessoal do “desenvolvimento da quinta”, referiu que (… reprodução do depoimento).

25.º Mais precisou a testemunha, arquitecto e autor do projecto, que (… reprodução do depoimento).

26.º II, funcionária dos registos e notariado, tendo exercido funções no Cartório Notarial “durante 27 anos”, com larga experiência na área dos registos e notariado e com conhecimento directo e pessoal (… reprodução do depoimento) em coerência com a caderneta predial do artigo matricial urbano inscrito sob o número ...86 da freguesia das ... (doc .34 da p.i).

27.º Neste sentido também, as declarações da testemunha II foram coerentes com as declarações da mãe do A., GG, que referiu em julgamento (… reprodução do depoimento).

28.º Donde, contrariamente ao entendimento vertido na sentença em crise, como declarou a mãe do A. GG, 8… reprodução do depoimento).

29.º Também neste sentido JJ, vereador da Câmara Municipal de ... à data da aprovação do projecto da moradia objecto dos autos, tendo conhecimento pessoal da família dos AA e da “quinta” dos pais do A e, antes destes, dos avós do A., sita na ..., em ..., (… reprodução do depoimento).

30.º JJ declarou em julgamento que (… reprodução do depoimento) – cfr também a prova documental careada do projecto aprovado (em 2004) e das plantas, do relatório pericial e do levantamento topográfico efectuado pelo Sr. Perito em 27.12.2019 nos presentes autos -, tendo tal terreno da quinta ainda um armazém amplo com licença de construção própria, emitida com o nº62/98 no processo camarário nº 726/83, tudo como foi provado por documentos juntos no decurso do julgamento.

31.º Donde, entendem os Recorrentes que foi provado que no prédio do artigo matricial ...86 que integra a dita “quinta” murada, que pertencia aos avós do A., moram, nas duas partes que couberam à mãe do A. por sucessão e por compra a um irmão que recusou, os AA. e filhos destes, e ainda os irmãos, pais e a avó dos Recorrentes, e moram, nas outras duas partes ou parcelas que couberam aos irmãos da mãe do A. em partilhas, por sucessão (que vieram a dar lugar a outros artigos matriciais dentro da “Quinta”), os tios do A., KK e LL e seus cônjuges e filhos, tendo estes também nas parcelas que lhes couberam edificado as suas casas de habitação - vd registo audio de FF (…)

32.º FF declarou em julgamento que (… reprodução do depoimento).

33.º Neste sentido, FF declarou (… reprodução do depoimento).

34.º HH, arquitecto e autor dos estudos prévios e do projecto de arquitectura da casa de habitação aprovado em 2004 na Câmara Municipal de ..., logo implantada (no projecto aprovado) e edificada na dita parcela nordeste do prédio, declarou que (… reprodução do depoimento).

35.º FF declarou recordar-se que (… reprodução do depoimento).

36.º Destarte, diversamente da sentença em crise, entendem os AA/Recorrente ter sido unânime e inequivocamente provado, em julgamento, o reconhecimento de que a casa de habitação edificada na parcela do topo nordeste do terreno é pertença dos AA..

37.º Destarte, atentas as declarações de GG, de FF e de HH devem os factos 2, 4, 11, 73 e 74, 81º e 82, 107º, 111º, 115º a 117º julgados não provados ser alterados e dados como provados.

38.º Neste sentido, como foi provado, GG, mãe do A., declarou em julgamento, no que foi corroborada pelo A., AA, e ainda pelas testemunhas FF, II e Engº JJ, as quais se mostraram credíveis, idóneas e de uma clareza alicerçada no conhecimento pessoal da “história da quinta” e da família, que (… reprodução do depoimento).

39.º Desde logo, por, como entendem os AA., foi provado que a dita parcela do topo nordeste do prédio foi doada verbalmente aos AA. com projecto de construção da moradia, arrumos e piscina aprovado, tendo tal moradia sido edificada pelos AA desde 2005.

40.º E foi provado que anteriormente tal prédio era propriedade dos pais do A. e, anteriormente, dos avós do A., sendo por eles sido continuada e permanentemente sido utilizada, gozada e fruída, mantendo a posse do mesmo, como também resulta dos elementos cadastrais do prédio e da inscrição matricial juntos aos autos, pelo que, contrariamente ao decidido, foi inequivocamente demonstrada a posse e o gozo público, pacifico e de boa fé pelos AA e seus antepossuidores, pais e avos paternos da dita parcela do topo norte e da respectiva benfeitoria da moradia nela implantada e edificada, em parte norte do terreno do prédio do artigo matricial ...86, também por usucapião.

41.º Donde, a sentença em crise enferma de erro notório na apreciação da prova porquanto foi inequivocamente provado que os AA, e o seu agregado familiar, por si e em continuação dos respectivos antecessores, edificaram, têm utilizado e fruído, e gozam da propriedade e posse da referida “casa de habitação”, ininterruptamente, á vista de todos e com o conhecimento geral, de forma pública e notória, sem oposição de quem quer que fosse e como se de coisa sua se tratasse e com a convicção de quem exerce um direito próprio, como seu dono.

42.º Senão vejamos, HH, com conhecimento directo e pessoal dos factos, de forma isenta e idónea, declarou em julgamento que (… reprodução do depoimento).

43.º Neste sentido, HH precisou que (… reprodução do depoimento).

44.º Destarte, diversamente do decidido, foi provado foi o A. que promoveu pela execução dos necessários projectos de arquitectura e das especialidades” e que procedeu à construção da casa de habitação na parcela do topo nordeste do prédio, tendo sido o A. que orientou, discutiu e decidiu a mesma logo nos “estudos prévios”, e que a configurou na sua implantação no terreno e na execução do projecto de arquitectura, como o mesmo foi desenhado e consta das plantas aprovadas na câmara, tudo como declarou, de forma clara, idónea e isenta, o arquitecto e autor dos projectos, HH, pelo que devem os factos 5º, 54, 85º e 86º não provados na sentença recorrida ser alterados e julgados provados.

45.º Já FF, sobre em que estado ou fase da construção estava a casa de habitação da parcela nordeste aquando do casamento do A/Recorrente, em Novembro de 2006, precisou que (… reprodução do depoimento).

46.º Também neste sentido, HH, arquitecto, instado sobre em que estado ou fase da construção estava a casa de habitação “em 2007”, também com base nos registos fotográficos dados aos autos, não impugnados pelo Réu, declarou em julgamento (… reprodução do depoimento). 

47.º Donde, HH declarou, categoricamente, que (… reprodução do depoimento).

48.º Mais precisando HH que (… reprodução do depoimento) – como corroborou FF que precisou que (… reprodução do depoimento) – e HH que declarou que (… reprodução do depoimento).

49.º FF precisou ainda que (… reprodução do depoimento).

50.º Destarte, discordando do decidido, foi provado que foram os AA. que, designadamente a partir do casamento em novembro de 2006, edificaram e concluíram a casa de habitação da dita parcela nordeste, cuja construção tinha sido iniciada pelos pais do A., como prenda de casamento, colocando o revestimento, o azulejo, as madeiras e, em geral, todos os acabamentos, até a tornar habitável, fazendo-o inclusive com o dinheiro “do casamento”.

51.º Salienta-se que, para prova da factualidade alegada e em coerência com as declarações das testemunhas FF e HH, foram juntos os documentos 21 a 29 da petição inicial, comprovativos da execução dos trabalhos e do pagamento das despesas pelos AA/Recorrentes.

52.º Destarte, atentas as declarações de GG, em coerência com as declarações do A, AA, e os depoimentos isentos, idóneos de FF e de HH, quer sobre a edificação da casa de habitação implantada na dita parcela nordeste do terreno (vd. as plantas do projecto aprovado em 2004 juntas aos autos), as quais acompanharam a construção, sendo o arquitecto com envolvimento na execução dos estudos prévios e do projecto de arquitectura, quer sobre o uso e habitação pelos AA. da moradia, logo que a mesma passou a estar habitável, a partir de “2007” (conforme os factos 14 e 15 provados na sentença) devem os factos 17 a 35, 55, 58, 59 e 68 julgados não provados na sentença recorrida ser alterados e julgados provados.

53.º Já o ponto 40 dos factos não provados na sentença deve ser alterado e julgado provado, em coerência também com o facto provado 13 da sentença, do qual resulta o valor da construção, não inferior “a 430.000,00€”, e ainda com os documentos 21 a 29 da petição inicial, mas também com os factos provados 5 a 9 da sentença, dos quais resulta os financiamentos bancários contratados pelos AA para a construção da moradia na dita parcela, sendo que, como foi provado, para a construção o A. AA teve, também, “a ajuda” do “dinheiro do casamento”, em Novembro de 2006, “que foi uma ajuda para ele acabar a casa”, como declarou FF (…).

54.º Deste modo, os factos 60 a 65 não provados na sentença recorrida devem ser alterados

e julgados provados, atentas as declarações da testemunha FF, em coerência com as declarações do A. AA e com o depoimento de GG, mãe do A., que declaram que os trabalhos da construção eram feitos por todos na família, os quais, percebendo “todos” de construção, “andavam lá até à meia noite”.

55.º Ainda discordando do entendimento vertido na sentença em crise, quer a mãe do A., GG, em coerência com as declarações do A., AA, quer FF, declararam, claramente, que a doação verbal da parcela norte (do artigo matricial ...86) foi feita pelos pais do A. aos AA., em 2005, atenta a pretensão do A. em contrair matrimónio, como “prenda de casamento”, sendo intenção e projecto da mãe do A. que os irmãos do A, o MM e o NN, também viessem a ter a sua casa de habitação na quinta.

56.º Salienta-se que foi provado em julgamento que a casa de habitação edificada na dita parcela nordeste - que todas as testemunhas, unanimemente, identificaram como sendo a casa de habitação dos AA/Recorrentes -, é uma construção “moderna”, “arrojada”, “ampla”, “completamente diferente” das construções da geração dos pais do A., que “são pessoas de outra idade”, precisando FF que “a mãe do A. é mais tradicional”.

57.º Neste sentido, FF declarou que (… reprodução do depoimento) e os registos fotográficos da casa de habitação da parcela nordeste do prédio, doc. 1 a 20 da petição inicial.

58.º FF precisou em julgamento que (… reprodução do depoimento).

59.º Neste sentido ainda, FF referiu em julgamento, (… reprodução do depoimento).

60.º Salienta-se ainda que como entendem os AA. foi inequivocamente provado da prova documental carreada, nomeadamente do processo urbanístico de aprovação da construção e do licenciamento da moradia junto aos autos, o projecto foi apresentado e aprovado em 2004”, tendo a construção da casa de habitação se iniciado, na dita parcela a norte da quinta, logo que “teve os projectos de estabilidade e de especialidade”- vd registo audio da testemunha, arquitecto, HH, (…) – que precisou ainda em julgamento que (… reprodução do depoimento).

61.º Assim, como entendem os Recorrentes foi provado, os pais do A. iniciaram a construção da moradia na aludida parcela doada aos AA. como “prenda de casamento”, tendo o projecto da construção dado entrada ainda em nome dos pais do A. mas sido executado “ao gosto” e segundo o interesse e a vontade do A., que o mandou executar e pagou.– vd Neste sentido também HH (…).

62.º Donde, diversamente do decidido, foi provado que os AA. têm a posse e gozado da parcela norte do terreno e da casa de habitação, arrumos e piscina nela implantados, conforme o projecto aprovado em 2004, como se proprietários fossem, fazendo tal utilização, gozo, fruição e habitação em comum com os filhos, pais, irmãos e avó do A., designadamente enquanto a casa dos avós do A. não é reabilitada, a qual se destina à habitação própria dos pais e avó do A., como clara e inequivocamente declararam FF, HH, JJ e II, em coerência com as declarações da mãe do A., GG – cfr declarações de GG, (…).

63.º Destarte, diversamente da sentença em crise, devem os factos 73º, 74º, 80º, 81º, 82º, 107º, 116º e 117º não provados ser alterados e julgados totalmente provados.

64.º Por outro lado, nunca o R./Recorrido entrou na “quinta” murada onde se encontra o “armazém amplo com logradouro” e a “casa de habitação” (na parcela do topo nordeste do terreno), nomeadamente para proceder à avaliação da benfeitoria, nem notificou os AA. Para o exercício da preferência na acção executiva, antes actuando sempre à revelia dos AA. Não obstante ser “notório” e visível que a construção de “casa de habitação, arrumos, garagem e piscina” se inseria na parcela do topo nordeste do prédio do artigo matricial ...86, estando ambas as construções (de armazém e casa de habitação) inseridas na “quinta” murada.

65.º Diversamente da sentença em crise, o R. actuou com despudorada má fé, ocultando aos Autores a pretensão de se apropriar da casa de habitação, nomeadamente na acção executiva que deduziu apenas contra os executados CC e DD, nunca tendo citado os AA. para os termos da acção executiva até à venda, quando, na verdade, não podia ignorar que a casa de habitação era habitada pelos AA, como foi inequivocamente provado, desde, pelo menos, Agosto de 2007, facto aliás visível e notório – vd factos provados 14 e 15 da sentença.

66.º O R/Recorrido actuou, ainda, com despudorada má fé e abuso de direito, tentando integrar no prédio judicialmente adquirido, composto unicamente do “armazém amplo e logradouro- sendo o armazém com licença de utilização nº ...8, com área coberta de 375m2 e descoberta de 1087m2 (vd a descrição predial e a escritura pública de compra e venda de CC e DD e ainda a licença de utilização conforme processo camarário nº726/83) -, a casa de habitação, arrumos e piscina edificada na parcela do topo nordeste do prédio, habitada, fruída e ocupada pelos AA, por si e seus antepossuidores, pais e avós do A, há mais de 15, 20 e 30 anos, a qual tem o valor atribuído nos autos de 430.000,00€ - vd o relatório pericial nos autos e os factos provados 14 e 15 da sentença

67.º Os AA/Recorrentes não podem sofrer as consequências da actuação omissiva e culposa do R/Recorrido na acção executiva, sabendo o R. quando adquiriu o prédio em venda executiva era composto, unicamente, de “armazém amplo e logradouro”, como este bem sabia e não podia ignorar – cfr a inscrição matricial do art. ...6 e a descrição predial do prédio e ainda a licença de utilização nº ...8 emitida para um armazém com a área coberta de 375m2 e com a área descoberta de 1087 m2 (vd. no processo camarário nº726/83) constante da escritura pública de venda do “armazém amplo e logradouro” pelos pais do A. a CC e DD e o titulo de transmissão da venda judicial ao R. na acção executiva.

68.º A não ser reconhecida a propriedade pelos AA/Recorrentes da dita parcela do topo nordeste do prédio do artigo urbano ...86 na qual foi implantada a dita “casa de habitação, arrumos, garagem e piscina” conforme o projecto de arquitectura aprovado em 2004, pela Câmara Municipal de ..., e a desanexar do artigo matricial ...86/..., devem os AA. ser indemnizados do valor que incorporam no dito prédio do artigo matricial ...86, em coerência com o valor da benfeitoria urbana da “casa de habitação, arrumos, garagem e piscina” incorporado pelos AA. no prédio, avaliada nos autos em 430.000,00€ - cfr os factos 2 e 13 provados na sentença.

69.º Efectivamente, o R. adquiriu, na venda executiva instaurada apenas contra os executados CC e DD, um prédio urbano composto de “armazém amplo e logradouro”, adquirido por estes pelo preço de 50.000,00€, o que é demonstrativo da realidade predial e do edificado que CC e DD adquiriram à mãe do Autor, consequentemente não podendo o R. locupletar-se da “casa de habitação, arrumos e piscina” edificados na parcela nordeste do prédio e já habitada pelos AA (factos provados 14 e 15 da sentença) no valor de 430.000,00€ (facto provado 13 da sentença), não vendida pela mãe do A. a CC e DD, nem paga por estes à mesma (vd a quitação dada de 50.000,00€ do preço pago pela compra e venda constante da escritura pública de venda do prédio composto de armazém amplo e logradouro, inscrito no artigo matricial ...86 da freguesia das ...).

70.º Por outro lado, o R. não logrou provar que os executados CC e DD edificaram ou incorporaram qualquer benfeitoria no prédio composto de armazém amplo e logradouro, que adquiriram, consequentemente não podendo a hipoteca destes ao R. abranger benfeitorias ou obra que os executados não realizaram e/ou não incorporaram, sob pena de manifesto e despudorado abuso de direito e enriquecimento sem causa.

71.º Donde, contrariamente à sentença em crise, foi provada a doação, a posse e a ocupação, continuada e interrupta, da dita parcela nordeste do prédio pelos AA, por si e pelos antepossuidores, pais e avós do A.; e foram provadas as obras da edificação da moradia, bem como a impossibilidade de desanexação da parcela (destaque) por impender sobre ela, aquando da entrega do projecto de arquitectura na Câmara Municipal em 2004, um ónus de não fracionamento do prédio pelo período de 10 anos; como foi provada a habitação da moradia pelos AA. em 08/2007, pública, continuada e ininterruptamente, até á presente data, factos, também, públicos e notórios atenta a volumetria da casa de habitação, implantada na parcela do topo Nordeste do prédio desde 2005, consubstanciando o direito de propriedade dos Autores sobre a dita parcela do topo nordeste do prédio e benfeitoria urbana, se a outro titulo não fosse, por usucapião.

72.º A assim não se entender, deve ser realizado novo julgamento que aprecie a efectiva realidade fisica da “Quinta” da ... ou da ..., a qual está totalmente delimitada por muros de delimitação, integrando, entre outros (como o artigo matricial ...70/... desanexado do prédio mãe), o prédio do artigo matricial ...86 composto de armazém amplo e logradouro, e, na “parcela do topo nordeste”, a “casa de habitação, arrumos, garagem e piscina”, implantada e identificada nas plantas do projecto de arquitectura aprovado em 2004, na C.M. ..., então pretendida desanexar pelos pais do A., não tendo apenas tal desanexação sido efectuada em 2004 por impender sobre o aludido prédio um “ónus de não fracionamento” pelo prazo ou período “de 10 anos”.

73.º Contrariamente ao decidido no aresto em crise, deve o facto 118 não provado ser alterado e julgado integralmente provado em obediência às regras da experiência comum e atentos os depoimentos do A. e da mãe do A., GG, que declararam ter ficado devastados e chocados com a notificação do R. para “a entrega” da “casa de habitação, arrumos, garagem e piscina” efectuada pelo R. à mãe do A. apenas após a compra do prédio urbano “composto de armazém amplo e logradouro” na dita acção executiva, deduzida pelo R. apenas contra os executados CC e DD.

74.º Não pode, em suma, o R. enriquecer à custa dos AA/Recorrentes com uma benfeitoria urbana implantada desde, pelo menos, 2004, na dita parcela do topo nordeste do prédio ocupada pelos AA. e pelos antepossuidores, publica, pacifica e ininterruptamente, há mais de 15, 20 e 30 anos, sendo propriedade destes, como deve ser reconhecido, por usucapião, e por eles edificada à vista de todos, de forma publica, pacifica e de boa fé (designadamente, sem oposição dos adquirentes do prédio com artigo matricial ...86 e executados CC e DD e do R.) e habitada, desde, pelo menos, 08/2007, tudo como foi provado (factos 14 e 15 da sentença).

75.º Ao decidir como decidiu na sentença recorrida, o Tribunal a quo violou o disposto nos art. 1263º, alínea a), 1268º, nº1, 1287º, 1296º e 1316, todos do código civil e ainda os artigos 1305, 1311º e 1344, e ainda os art. 483º, 496, 562º, 564 e 566º todos do Código Civil e ainda violou o disposto no art. 334º do Código de Processo Civil e, ainda, em violação das regras da experiencia comum, com preterição da analise da prova testemunhal e documental careada e do dever de exame critico da mesma, decidindo com abuso de direito, devendo a sentença ser alterada e proferida outra que, em substituição, julgue a acção procedente por provada.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, designadamente com atento o novo julgamento a realizar designadamente para efeitos da produção da prova necessária da reconstituição da realidade predial no local, deve a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que, atenta a factualidade material a alterar como ora pugnam os recorrentes, julgue os pedidos procedentes por provados e, em consequência,

reconheça o direito de propriedade dos recorrente sobre a aludida parcela nordeste do terreno em que foi implantada a benfeitoria urbana da casa de morada de família e de habitação dos Autores, arrumos, garagem e piscina (conforme descrito no relatório de avaliação pericial, de 27.12.2019, nos autos), no artigo matricial urbano ...86, a fim da benfeitoria urbana ser destacada e desanexada do prédio urbano com o artigo matricial ...86 da freguesia ... e com a descrição ...74 da dita freguesia, ou, caso assim não se entenda, serem os recorrentes indemnizados no valor da benfeitoria urbana nele incorporada (conforme e em coerência com os factos provados 1, 2, 13 a 15 da sentença), tudo com as legais consequências.

Assim decidindo farão, Vossas Excelências, acostumada JUSTIÇA!

3. O R. contra-alegou, concluindo que:

I. Como bem entendeu o Tribunal a quo, a acção foi julgada totalmente improcedente por inexistirem argumentos atendíveis, de facto ou de direito, para a reinvindicação de parte do terreno do imóvel que é propriedade da Recorrida, sendo a decisão inatacável.

II. Na ponderação da prova realizada, em especial, a prova documental, consubstanciada em certidões judiciais, foram os AA. condenados como litigantes de máfé.

III. Foi junta aos Autos (vide Tréplica, Ref.ª 4580019, de 12.11.2018) certidão do Tribunal Judicial ..., do Juízo de Comércio ..., Juiz, do processo de Insolvência dos pais do Autor AA que correu termos sob o n.º 3947/08...., do apenso AF onde os mutuários CC e DD vieram impugnar a resolução em benefício da massa insolvente da compra e venda do referido prédio urbano.

IV. Dali se retira que aqueles alegaram terem construído a casa de habitação tendo a ali Insolvente, mãe do Autor, corroborado tudo o quanto vinha alegado na petição inicial.

V. Sucintamente, quer a primeira instância, quer o Tribunal de recurso salientam que o intuito da insolvente era ficar com a casa um dia, que a utilização de contas da sociedade do Sr. CC leva à conclusão de que, pelo menos, serviria para contornar a inibição do uso de cheques dos insolventes.

VI. A Recorrida desconhecia qualquer relação entre o Sr. CC e os ali insolventes, e entre estes e os AA., tendo tido conhecimento por consulta ao processo de insolvência, após a citação para este processo.

VII. No processo de insolvência, os insolventes afirmam ter construído a moradia no prédio agora em questão; e os AA. e ora recorrentes são filho e nora dos insolventes, e como “alegados” proprietários não só nada disseram no âmbito do processo, nomeadamente, não invocaram o direito de separação dos bens apreendidos para a massa insolvente, como não reclamaram créditos respeitantes às alegadas “benfeitorias” por eles agora reclamadas.

VIII. Daqui resulta, de forma clara e evidente, que toda a história contada nos presentes Autos é falsa e indicia, no mínimo, a vontade dos AA. enriqueceram à custa da Ré, construindo uma tese que muito bem sabem não correspondem à verdade.

IX. Só assim se admite que, podendo os pais e insolventes “salvar” o património que haviam doado ao filho e que, nas palavras dos AA. “é um bem comum do casal e que muito lhes custou a “construir”, não tivessem confirmando a tese dos AA. em sede de processo de insolvência.

X. Até bastaria ver a documentação junta na p.i. como docs. 21 a 33 para se demonstrar a encenação que os AA. estão a tentar montar pois todas eles referem pagamentos por conta da sociedade dos pais do A. AA, “M...”!

Cheques esses que foram utilizados no processo de insolvência, desta feita, para “provar” que a construção tinha sido efectuada por CC e DD.

XI. Acresce que, tendo em conta as contradições de depoimento da mãe do A. GG, foi aberta vista ao Ministério Público que, como se esperava, promoveu que se extraísse certidão da sentença proferida nestes autos e se remeta a mesma ao DIAP de Coimbra para ser junta ao Inquérito que aí já correrá termos e que teve origem na certidão oportunamente extraída destes autos e enviada em 16/07/2020.

XII. Também no Apenso-W, os aqui AA. Recorrentes vieram impugnar a resolução a favor da massa da doação do prédio urbano correspondente ao prédio sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...17 e inscrito na correspondente matriz predial urbana sob o artigo ...70.º - vide certidão de 09.07.2020, com a Ref.ª 5852653.

XIII. Referiram ali os AA. que o dito imóvel estava à data da doação onerado com uma hipoteca, tendo os autores assumido o encargo de liquidar as responsabilidades em dívida, e que posteriormente foi onerado com duas outras hipotecas, ambas realizadas no sentido de ajudar à obtenção de financiamento para os insolventes, pelo que não houve qualquer prejuízo, antes benefício, para os credores.

XIV. Nos factos provados 12 a 33 são referidos os mesmos cheques utilizados nos presentes autos, tendo sido dado como provado, no facto 34, que “Os cheques supra aludidos destinaram-se ao pagamento de dívidas dos ora insolventes”.

XV. Deste modo, é com toda esta factualidade, sustentada por documentos autênticos, que o Tribunal a quo, muito bem, conclui que “Não está simplesmente em causa o facto de uma parte não ter provado determinados factos que alegou, antes perpassando da factualidade provada e da respetiva motivação que aqueles factos alegados não correspondem à verdade.

XVI. Tendo, por isso, condenado os AA. como litigantes de má-fé.

XVII. Lendo as alegações de recurso, os AA. pretendem alterar a matéria de facto, repetindo todas as mentiras que sustentam a sua tese, com base no depoimento das suas testemunhas mas esquecem-se que esses depoimentos são absolutamente contraditados pelos documentos juntos aos Autos, com as suas posições assumidas no processo de insolvência dos pais do A. AA, sendo certo que em momento algum recorrem ou fazem sequer referência à sua conduta que levou à condenação por litigância de má-fé.

XVIII. Sendo os recursos o meio de impugnação das decisões dos tribunais a quo, o seu âmbito encontra-se limitado pelas questões postas ao tribunal recorrido.

XIX. Ora, os Recorrente não colocam minimamente em crise a decisão proferida nesta parte e não o tendo feito, podendo fazê-lo, a condenação dos AA. como litigantes de má-fé, transitou em julgado.

XX. Consequentemente, e por esse motivo, fica precludida a apreciação do recurso, em especial, no que respeito ao pedido de alteração da matéria de facto, pois, como deixamos exposto, a repetição da “história” pelas várias testemunhas não faz com que a mesma se torne verdade.

Caso assim não se entenda,

XXI. Pese embora tenha referido os concretos meios de prova que entende incorrectamente julgados e transcrito e indicado os depoimentos que sustentam a sua convicção, não referem, ou, referem de forma muito deficiente, quer no corpo da alegação de recurso quer nas conclusões, as razões e a importância, para o caso em apreço, da segunda apreciação da matéria de facto, por este Venerando Tribunal.

XXII. Salvo melhor opinião, entendemos que os Recorrentes não cumprem assim, o ónus de alegar, o que se traduz na indicação dos motivos da impugnação da decisão.

XXIII. E o que decerto também será observado por V. Ex.as, são factos que estão em contradição com a prova documental, constituída por documentos autênticos, e que, por isso, não resultam provados.

XXIV. Além do mais, o Tribunal a quo foi apontando, na apreciação da prova, as contradições e hesitações das testemunhas arroladas, mostrando como inverosímil a tese sustentada pelos AA., fundamentando, quanto a todas as questões, a matéria de facto provada que fundamentam a sua decisão.

XXV. Entendemos que neste contexto probatório, e tendo em conta o thema decidendum não assiste razão aos Recorrentes na modificação dos pontos de facto que indicam.

XXVI. Também de Direito, não merece censura a douta decisão.

XXVII. Conforme resultou provado, o prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...86 da freguesia ... foi declarado vender ao réu, que declarou comprar, a 28 de Setembro de 2015, por € 334 000,00, no âmbito da venda executiva, por negociação particular, na acção executiva supra referida.

XXVIII. Sendo certo que sobre esse imóvel, o Banco Recorrido detinha hipoteca que, conforme consta da Cl.ª 7.ª do documento complementar do doc. n.º 1 junto com a contestação, “abrange todas as construções, benfeitorias e acessões, presentes e futuras, do imóvel hipotecado”.

XXIX. Ora, os Recorrentes insistem que o Banco apenas adquiriu um imóvel composto “por armazém amplo e terreno”, porém conforme consta da certidão do registo predial datada de 18.09.2015 e bem assim da caderneta predial, a descrição do imóvel é:

“Armazém amplo e logradouro. Área: 6.159,70 m2. Norte e Nascente, caminho público; Sul, M...; Poente, herdeiros de OO.”.

XXX. O referido imóvel foi penhorado no âmbito da acção executiva e posteriormente adjudicado na sua totalidade, ou seja, o imóvel com 6.159,70 m2, o que inclui, quer o terreno e o armazém, quer a benfeitoria implantada, ainda que não registada.

XXXI. É, pois, falacioso o argumento dos AA. de que as escrituras de compra e venda dos pais o A. AA e da escritura de hipoteca não consta a casa construída, pelo que não foi objecto de transmissão.

XXXII. Pois, como se referiu, a hipoteca constituída abrange todas as construções, benfeitorias e acessões, presentes e futuras, do imóvel.

XXXIII. Os Recorrentes sustentam que parte daquela parcela de terreno lhes foi doada, porém, como bem refere a douta sentença “não ficou provada a alegada doação verbal, nem sequer factos que permitam concluir que que os autores, por si e seus ante possuidores tenham exercido sobre o imóvel que reivindicam posse pacífica, pública, de forma continuada, de boa-fé, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, em nome próprio e exclusivo até á presente data, na convicção de usufruírem coisa sua e própria”.

XXXIV. Mas ainda que assim não fosse, tal doação, porque verbal, é nula, por falta de forma, pois a doação de coisa imóvel só é válida se for celebrada por escritura pública ou por documento particular autenticado, conforme dispõe o art. 947.º, n. º 1, do C.Civ..

XXXV. E assim, bem andou o Tribunal a quo ao considerar os AA. não demonstram os requisitos para a aquisição por usucapião.

XXXVI. Por outro lado, não se pode verificar a acessão industrial, como pretendem os AA. uma vez que o interventor/autor da obra, sementeira ou plantação possa reivindicar, com sucesso, o direito a aceder no direito de propriedade sobre o terreno onde as obras foram incorporadas, seria preciso, desde logo, que fossem os AA os autores da obra, o que não sucedeu.

XXXVII. Igualmente, no que respeita às benfeitorias, a douta sentença pormenorizadamente caracteriza o instituto e acrescenta que, uma vez que não foram os AA. que realizaram a construção, soçobra igualmente esta sua linha de argumentação.

XXXVIII. E porque não existe fundamento para a presente acção, não tendo ficado demonstrado o direito que os AA. se arrogam, também não têm direito a ser indemnizados. Por fim, inexiste qualquer ilicitude ou culpa da Recorrida e, além do mais, não ficou demonstrado o direito que os autores se arrogam, pelo que não há qualquer lugar a indemnização dos Recorrentes.

XXXIX. E dada a factualidade provada e as consequências jurídicas que, e bem, tirou o Tribunal a quo, a douta sentença recorrida é, assim, inatacável no que se refere à aplicação da Lei e do Direito, que tão bem sustentou e fundamentou no seu relatório.

Termos em que, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso julgado improcedente, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, assim se fazendo JU S T I Ç A!

II - Factos Provados

1º Encontra-se edificada uma casa de habitação composta de arrumos, garagem e piscina numa parcela do topo Nordeste do prédio urbano composto de terreno e armazém amplo, situado Rua ..., ..., ..., descrito na Conservatória de Registo Predial ... sob o número ...12 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...86 da dita freguesia ... [art1pi].

2º O edifício de “casa de habitação” é constituído por  ... e  ..., com garagem e piscina, sendo de tipologia  ..., com área de construção de cerca de 695 m2 [art3pi].

3º A empresa “M...” atravessava dificuldades económico-financeiras [art15pi].

4.º A moradia pese embora esteja quase acabada e reúna as necessárias condições de habitabilidade, faltando apenas os últimos acabamentos finais, permanece, até à presente data, sem ter sido emitida a respetiva licença de utilização [art34pi].

5º O A. contratou financiamentos juntos de instituições bancárias [art35pi].

6.º O A. outorgou um financiamento bancário junto do Banco B..., no montante de 10.000,00€ [art36pi].

7.º Mais outorgou um financiamento bancário junto do Banco C..., no montante de 10.000,00€ [art37pi].

8.º Mais contraiu um financiamento junto do F..., no montante de 160.000,00€ [art38pi].

9.º Procedeu ao registo da hipoteca, inerente ao mútuo id. em 38), sobre o artigo matricial urbano ...70 da freguesia ..., em nome do A e sua cônjuge, descrito na Conservatória de Registo Predial ..., na ficha nº ...19 [art39pi].

10.º Na aludida habitação residem os AA. e residem também dois filhos menores, bem como o irmão, a avó e os pais do A. [art44pi]

11.º O A. exerce ainda a sua atividade profissional de carpintaria num armazém sito no aludido prédio identificado em 1º deste petitório, que constituem as instalações do estabelecimento industrial montado pela firma “A... Unipessoal Ldª” [art45pi].

12.º O A. contraiu matrimónio com a A., BB, no regime de comunhão geral de adquiridos, tendo dois filhos menores, respetivamente, PP (nascido em .../.../2008) e QQ (nascido em .../.../2011) [art46pi]

13.º O imóvel composto de casa de habitação de  ... e  ..., tipologia  ..., com área total de 695m2, com dois arrumos, garagem e piscina, tem um valor não inferior a 430.000,00€ (quatrocentos e trinta mil euros).

14º os AA. passaram a habitar nela, como vem habitando com o seu agregado familiar, pelo menos desde 08.2007 [art57pi].

15.º. Nela confecionando as refeições, fazendo a sua higiene, dormindo, diariamente [art75pi].

16º Por escritura pública celebrada a 31 de Maio de 2007, A Ré concedeu aos mutuários CC e DD, um empréstimo no montante de 350.000,00 €, quantia essa que foi integralmente utilizada pelos mutuários através de várias tranches que foram sendo creditadas na conta de depósitos à ordem dos mesmos e de que se confessaram e que destinaram aos fins que bem entenderam, cf. Doc. 1 que agora se junta e aqui dá por reproduzido e integrado para os devidos e legais efeitos [art3contestação]

17º Para garantia do bom e pontual pagamento do empréstimo concedido, os mutuários constituíram a favor da Ré, na mencionada escritura, hipoteca sobre o seguinte bem imóvel:

Prédio urbano composto de armazém amplo e logradouro, situado em ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ...86, descrito na conservatória do Registo Predial ... sob o número ...74/... e aí registado a favor dos executados pela inscrição G, apresentação ... de 29 de Janeiro de 2007 [art5contestação].

18º Os mutuários não cumpriram as obrigações a que estavam adstritos, nomeadamente, o pagamento das prestações, tendo a Ré promovido a competente acção executiva, processo que corre termos sob o n.º 278/11...., no Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo de Execução ... - Juiz ..., cf. Doc. 2 que agora se junta e aqui dá por reproduzido e integrado para os devidos e legais efeitos [art7contestação].

19º O referido processo correu os seus termos tendo o Banco Réu apresentado proposta de adjudicação do imóvel a 21.12.2012, após frustração da venda do imóvel por propostas em carta fechada, vide decisão sobre a modalidade de venda, de 02.12.2011, auto de abertura de propostas e consequente determinação de venda por negociação particular, de 08.03.2012 - Docs. 3 e 4, que agora se juntam e aqui dão por reproduzidos e integrados para os devidos e legais efeitos [art8contestação].

20º O prédio urbano composto de armazém amplo e logradouro, situado em ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ...86, descrito na conservatória do Registo Predial ... sob o número ...74/... foi declarado vender ao réu que aceitou comprar pelo preço de 334.000€ no âmbito da ação executiva nº278/11.. em que figurava como exequente o réu e como executados CC e DD [art2contestação].


*

Factos não provados:

- Da petição inicial:

2º. …por ter sido por eles edificada,…

4º …após acordo da família, os pais do A. autorizaram a construção numa parcela … que, para tanto, doaram verbalmente ao A., em 2005, tendo então o A. passado a desenvolver os procedimentos tendente à construção da casa de habitação na aludida parcela do prédio urbano …

5.º Para tanto, o A. promoveu pela execução dos necessários projectos de arquitectura e das especialidades,

(…)

11.º Como os pais do A. se comprometeram, em reunião de família, a doar igual quantia aos irmãos, MM e NN, logo que os mesmos viessem a contrair matrimónio, como “prenda de casamento”.

(…)

17.º Assim, entre finais de 2006 e 2008, os AA., …, pagaram as obras e os materiais de construção civil inerente às aludidas construções de moradia com garagem, arrumos e piscina – vd. Doc nº21 a 29.

18.º Designadamente, inerente á colocação da betonilha, da tijoleira,

19.º À execução dos trabalhos de alvenarias,

20.º E com o isolamento térmico.

21.º Mais mandou executar toda a instalação elétrica da moradia, arrumos, garagem e arranjos exteriores junto à piscina,

22.º E mandou executar a colocação de telha nas aludidas construções.

23.º O A. mandou, ainda, executar os pavimentos e cerâmicas,

24.º E, conjuntamente com os seus familiares, procedeu á execução parcial das pinturas exteriores, estando, nessa parte, apenas parcialmente concluída a obra.

25.º Tendo, ainda, mandado executar a terceiros as pinturas interiores e todos os acabamentos em geral (vernizes e outros) e, ainda, os muros envolventes,

26.º Mais, mandou executar e suportou as despesas inerentes ao assentamento da pedra e cerâmicos da piscina e sua envolvente.

27.º E mandou executar e suportou as despesas com a colocação da caixilharias de alumínio, janelas e estores.

28.º O A. procedeu, ainda, à colocação de estuque, massas aplicadas e gessos na moradia, garagem, arrumos e piscina anexa à habitação.

35.º Acresce que, no intuito de suportar as despesas inerentes à edificação da moradia, anexos e piscina,…

40.º O valor global do investimento dos AA. na aludida construção da moradia, garagem, arrumos e piscina, ascende ao total de €400.000,00 (quatrocentos mil euros).

(…)

54º … que as projetou, edificou e vem edificando, desde, pelo menos 2005, e anteriormente pelo A.

55.º e que pagaram e vem pagando todas as benfeitorias urbanas realizadas, constituídas por tais construções (moradia com garagem, arrumos e piscina)

(…)

58º Os AA. investiram e vêm investindo, com a sua força e instrumentos de trabalho e os seus rendimentos, deles se servindo, para fazer face às despesas inerentes à empreitada de construção civil da edificação

59.º nomeadamente nela executando o A. os trabalhos de construção civil e carpintaria, durante anos, meses e dias seguidos,

60.º e, conjuntamente com a sua cônjuge e familiares, que o auxiliam nas tarefas de construção e limpeza,

61.º executando e assentando, também, todo o mobiliário e rodapés,

62.º auxiliando nos trabalhos de assentamento dos pisos de madeira e de tijoleira,

63.º no carregamento e transporte de ferramentas e equipamentos de construção civil para as obras,

64.º escolhendo os materiais a aplicar e os fornecedores,

65.º executando e fornecendo todos os materiais de carpintaria, nomeadamente para apoio e vigamento, entre outros.

68º Direito de uso e habitação própria permanente dos AA. e do agregado familiar como é reputado e do conhecimento de todos os vizinhos, amigos e entidades locais

(…)

73.º Os AA, e o seu agregado familiar … por si e em continuação dos respectivos antecessores, edificaram, têm utilizado e fruído, e gozam da propriedade e posse da referida “habitação” [para o caso de se entender que tem algum conteúdo fáctico].

74 …ininterruptamente,

(…)

80.ºE recebendo os ascendentes do A. e a sua avó, e nela deles cuidando, dando residência e um lar, e deles tratando, assegurando todas as necessárias condições condignas de vivencia, alimentação e pernoita,

81º. tudo á vista de todos e com o conhecimento geral, de forma pública e notória,

82.º sem oposição de quem quer que fosse e como se de coisa sua se tratasse e com a convicção de quem exerce um direito próprio, como seu dono.

85º. Tendo sido o A. que fez tramitar os procedimentos necessários à construção da mesma, á vista de todos, de forma pública e pacifica, tendo

86º. para tanto, promovido e logrado a aprovação do projecto de obras e obtido o indispensável licenciamento da construção.

(…)

107.º É, consequentemente, o A. e os seus antepossuidores que sempre tiveram uso, gozo e fruição daquela parcela Nordeste de terreno onde foi implantada a habitação (casa, garagem e piscina), publica e ininterruptamente, há mais de 15, 20, 25 e 30 anos.

(…)

111.º e, mais tarde, limpando a aludida parcela de terreno para a construção da habitação (com arrumos e garagem),

(…)

115.º que os AA. e seus familiares foram construindo, continuada e paulatinamente, na aludida parcela de terreno (situada na parte nordeste do artigo matricial urbano ...86º),

116.º sempre à vista de todos, de boa fé e sem oposição de quem quer que fosse,

117.º gozando, fruindo, limpando, tratando e edificando aquela dita parcela de terreno, de forma própria e autónoma, sempre na convicção de pertencer aos AA., como pertence.

118º…o que criou e cria nos AA. uma profunda frustração e mágoa, além de discussões


*

III – Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes.

- Alteração da matéria de facto.

- Reconhecimento aos AA. do direito de propriedade sobre uma parcela do prédio com o artigo 986º - ocupada com a construção de uma habitação com a área de 695 m2 - e reconhecimento do seu direito de propriedade sobre tal construção de moradia, tudo por virtude de doação e usucapião (e pedidos destes dependentes).

- Direito a serem ressarcidos pela construção de tal moradia/benfeitoria.

2. Os recorrentes impugnam os factos não provados 2., 4., 5., 11., 17. a 35., 40., 54., 55., 58. a 65., 68., 73., 74. (estes por 2 vezes !), 80., 81. e 82. (estes por 2 vezes !), 85., 86., 107. (este por 2 vezes !), 111., 115., 116. e 117. (estes por 2 vezes !) e 118., pretendendo que passem a provados,  com fundamento em prova por declarações do A., e prova testemunhal e documental que especificam (cfr. as respectivas conclusões de recurso 15º a 63º e 73º).

2.1. Relativamente ao facto aludido facto 118. não passa de uma mera conclusão (sob a nº 73) da recorrente, pois no corpo das alegações não explicita, nem justifica, porquê ?

Ou seja, a dita conclusão não encontra apoio algum, mínimo que seja, na motivação de recurso, pois nem uma só palavra foi dedicada pela recorrente a tal temática. Não se trata, porém, de qualquer conclusão deficiente carecida de aperfeiçoamento, porquanto a lei só prevê o dito aperfeiçoamento para as conclusões, não para as alegações propriamente ditas (art. 639º, nº 3, do NCPC = ao art. 685º-A, nº 3, do CPC). E é assim no que se refere à matéria de direito, pois tratando-se de matéria de facto, diferentemente, nem sequer há qualquer aperfeiçoamento (cfr. corpo do art. 640º, nº 1, in fine, do NCPC). Por isso, por mais obscuras, complexas e deficientes que as alegações sejam, a lei não admite que o recorrente seja convidado a corrigi-las ou ampliá-las.

É sabido que as conclusões consistem na enunciação de proposições que sintetizam os fundamentos do recurso. A exigência de que a alegação conclua pela indicação sintética dos fundamentos, pressupõe necessária e logicamente que se expuseram mais desenvolvidamente esses fundamentos: a lei exige não só que o recorrente conclua senão também que alegue. O recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua impugnação, a fim de que este tribunal decida se tais razões procedem ou não. Quando isso não suceda, i.e., quando as conclusões contenham um fundamento ou razão que não tenha sido exposta nas alegações, em face da impossibilidade legal de convidar o recorrente a ampliá-las, deve considerar-se não impugnada, nessa parte, a decisão recorrida, com a consequente impossibilidade de conhecimento, nesse segmento, do objecto do recurso (cfr. neste sentido, por ex., os Acds. do STJ de 2.12.1988, BMJ 382, pág. 497, de 12.1.1995, C.J., T. 1, pág. 20, de 13.1.2005, Proc.04..., de 24.5.2005, Proc.05... e Abrantes Geraldes, Recursos em P. Civil, 2ª Ed., 2008, nota 4. ao artigo 684º do anterior CPC, pág. 92).

Como assim, não encontrando as ditas conclusões, sobre este aspecto, apoio algum, por mínimo que seja, na motivação de recurso, é como se não houvesse formulação.

Pelo que necessariamente não é cognoscível esta parte do recurso, arguida pela R./recorrente.

2.2. Quanto à restante matéria não se vai conhecer de tal impugnação, atento a decisão que vai ser tomada e que vai ser fundamentada, infra no ponto 3.

Efectivamente, mesmo que tal factualidade passasse a provada acabaria por não ter influência na solução de direito e no mérito do recurso.

Ora, é apodíctico que a impugnação da matéria de facto consagrada no art. 640º do NCPC não é uma pura actividade gratuita ou diletante.

Se ela visa, em primeira linha, modificar o julgamento feito sobre os factos que se consideram incorrectamente julgados, ela tem, em última instância, um objectivo bem marcado. Possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal a quo considerou provada ou não provada, para que, face à eventual nova realidade a que se chegou, se possa concluir que afinal existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu. Isto é, que o enquadramento jurídico dos factos tidos por provados ou não provados conduz a decisão diferente da anteriormente alcançada.  

Assim, se por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for irrelevante ou insuficiente para a solução da questão de direito e para a decisão a proferir, então torna-se inútil a actividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois nesse caso mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo factual anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente destituído de eficácia, por não interferir com a solução de direito encontrada e com a decisão tomada.

Por isso, nestes casos de irrelevância ou insuficiência jurídica, a impugnação da matéria de facto não deve ser conhecida sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente (vide Ac. desta Relação de 12.6.2012, Proc.4541/08...., em www.dgsi.pt).

Isto porque, a alteração da matéria de facto, nos pontos precisos que forem impugnados será irrelevante ou insuficiente se nenhuma interferência tiver na dita solução de direito.

No nosso caso verifica-se que os mencionados factos não têm importância para o recurso do AA e para a solução jurídica da causa, como atrás dissemos. E que, infra em 3. especificaremos, pelas questões decidendas. 

Considerando o explicitado, e tendo em conta que a impugnação de facto deduzida pelos AA visa factualidade que acaba por se tornar insuficiente para o seu recurso, então a referida impugnação tem de ser não conhecida, relativamente à apontada factualidade.

3.1. Relativamente ao direito de propriedade dos AA sobre a aludida parcela de terreno e da construção (casa de habitação constituída por  ... e  ..., sendo de tipologia  ..., com área de construção de cerca de 695 m2, e composta, ainda, de arrumos, garagem e piscina), com fundamento em doação verbal dos pais do A., é manifesto que tal pretensão não pode proceder, pois tal doação (a ter ocorrido) é nula, por falta de forma, já que a doação de coisa imóvel só é válida se for celebrada por escritura pública ou por documento particular autenticado (art. 947º, nº 1, do CC).

Agora se relembrando o porquê de acima se ter expresso que era inútil conhecer a impugnação da matéria de facto referente, neste caso, a parte do facto não provado 4.

3.2. Relativamente ao direito de propriedade dos AA sobre a mencionada construção (casa de habitação constituída por  ... e  ..., sendo de tipologia  ..., com área de construção de cerca de 695 m2, e composta, ainda, de arrumos, garagem e piscina), com fundamento em usucapião.

Dispõe o art. 1287º do Código Civil que “A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação …”.

A verificação da usucapião depende assim de dois elementos fundamentais: da posse e do decurso de certo período de tempo, variável conforme a natureza móvel ou imóvel da coisa.

Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real (art. 1251º do CC).

Este poder caracteriza-se por um elemento essencial – o corpus –, que se identifica com os actos materiais praticados sobre a coisa; e um elemento psicológico – o animus –, que se traduz na intenção do possuidor se comportar como o titular do direito real de propriedade (ou de outro direito real) correspondente aos actos praticados.

Para além destes dois elementos, para conduzir à usucapião, a posse tem de revestir sempre duas características: ser pública e pacífica (arts. 1261º, 1262º e 1297º do CC). Os restantes caracteres exigidos pela lei civil (boa ou má fé, titulada, etc.) influem apenas no prazo (arts. 1259º, 1260º, 1294º, 1295º e 1296º).

No nosso caso, respeita à aquisição de imóveis, em que não há registo do título nem da mera posse, o prazo de usucapião é de 15 anos quando seja ou se presuma de boa fé e de 20 anos quando seja ou se presuma de má fé (art. 1296º do CC).

Alegam os AA que a edificação em questão só começou a ser construída em 2005. Não se pode dizer, por isso, que se tenha verificado o prazo da usucapião, já que há quinze anos atrás - em relação à data da propositura da acção (em 2.2018) - a construção em causa nem sequer existia.

Não se pode dizer, por conseguinte, que os AA tenham um corpus antes de 2005, porquanto o objecto desse corpus nem sequer existia nessa altura.

Pelo que, não procede o fundamento da usucapião, em relação à dita construção.

Agora se relembrando, de novo, o porquê de acima se ter expresso que era inútil conhecer a impugnação da matéria de facto referente, nesta situação, aos factos não provados 2., parte do 4., 5., 11., 17. a 35., 40., 54., 55., 58. a 65., 73., 74., 80. a 86. e 115.

3.3. Relativamente ao direito de propriedade dos AA sobre a mencionada parcela de terreno, com fundamento em usucapião.

Alegaram os AA que a mesma lhes foi doada verbal pelos pais do A., em 2005, tendo posse da mesma. Mesmo a ter ocorrido, põe-se o problema do decurso do período temporal necessário para aquisição por usucapião, que antes problematizámos. Como vimos, tratando-se no nosso caso de uma aquisição de imóveis, em que não há registo do título nem da mera posse a favor dos AA, o prazo de usucapião é de 15 anos quando seja ou se presuma de boa fé e de 20 anos quando seja ou se presuma de má fé.

À partida, podemos de imediato concluir que não se pode dizer, por isso, que se tenha verificado o prazo da usucapião, já que há quinze anos atrás - em relação à data da propositura da acção (em 2.2018) – o período temporal necessário para usucapir não se tinha completado, pois os AA não tinham corpus antes de 2005 sobre tal parcela de terreno.

Os AA invocam que a sua posse deve ser junta à dos pais do A. e seus antecessores, o que a lei permite, nos termos do art. 1256º, nº 1, do CC.

Porém, como nos alerta Antunes Varela (Cód. Civil Anotado, Vol. III, 2ª Ed., nota 3. ao artigo 1256º, pág. 14) é necessário que haja um acto translativo da posse formalmente válido, o que não acontece na doação de imóvel por acto verbal. Como foi o nosso caso segundo alegação dos próprios AA.

No mesmo sentido vão ainda L.P. Moitinho de Almeida, Restituição de Posse e Ocupação de Imóveis, 5ª Ed., pág. 77, Santos Justo, D. Reais, 7ª Ed., 2020, págs. 216/218 e J. L. Bonifácio Ramos, Manual D. Reais, 2ª Ed., AAFDL, pág. 216. Posição que subscrevemos.

Neste sentido vai também jurisprudência a que aderimos, designadamente os Acds. do STJ de 27.11.2007, Proc.07..., onde se exarou no sumário, na 4ª parte, que “O título a que alude e exige a norma do art.1256º é o que a lei também exigir para que o negócio de transmissão seja formal e substancialmente válido, não relevando, para o efeito, como título legítimo de aquisição, um acto nulo, sendo que, neste caso, só pode ser invocada a posse pessoalmente exercida e não a dos antepossuidores”, de 7.4.2011, Proc.956/07...., onde se exarou no sumário, sob III), que “A acessão na posse pressupõe, além de uma posse homogénea e sucessiva, um acto translativo que seja formalmente válido”, de 18.10.2012, Proc.5978/08...., e de 8.2.2018, Proc.642/14...., e ainda o Ac. da Rel. ..., de 1.3.2016, Proc.322/13...., todos disponíveis em www.dgsi.pt.

Portanto, há que concluir que os AA não podem somar à sua eventual posse a dos pais do A. e seus antecessores, pelo que permanecendo como início eventual da posse a data de 2005 o período legal para aquisição por usucapião não decorreu.

E, de novo, se relembrando, o porquê de acima se ter expresso que era inútil conhecer a impugnação da matéria de facto referente, nesta situação, aos factos não provados 4., em parte, 107., 111., 115. a 117.

De qualquer modo, mesmo que se entendesse que as ditas posses se podiam somar deparávamo-nos com um obstáculo conexionado à eventual posse dos antepossuidores do A. É que neste âmbito apenas temos como relevante o apontado facto não provado 107., que dado a sua generalidade e carácter conclusivo não permite traçar que actos possessórios, afinal de contas, os antepossuidores do A. terão praticado na controvertida parcela para efeitos de usucapir.

3.4. Os AA formularam outros pedidos, no Relatório supra elencados em 2) e 3). No presente recuso não colocam em apreciação o referente à acessão industrial imobiliária.

E igualmente não colocam na apelação o indicado sob 3), a), respeitante ao direito de uso, gozo e habitação (cfr. conclusões de recurso, da 64º até à 75º e parte final petitória das mencionadas conclusões de recurso). Daí, igualmente, a inutilidade de conhecimento da impugnação da matéria de facto referente, nesta situação, ao facto não provado 68.

Improcedendo o reconhecimento do seu invocado direito de propriedade não procedem, também, os pedidos dele dependentes, como a outra parte do 3), a), isto é, o pedido de condenação do R. a abster-se da prática de qualquer acto que colida e/ou afecte este direito, e os formulados sobre b), c) e d).

Sobre este último pedido, pagar aos AA a indemnização que se relega para execução pelos prejuízos causados e que vierem a causar na quantia que se vier a liquidar, convém deixar a nota que os AA também não lograram provar o único dano concreto que alegaram no art. 118º da p.i., conforme resulta dos factos não provados, facto que impugnaram, mas que não pôde ser conhecido, como mais acima verificámos.

4. Relativamente a indemnização por benfeitorias (conclusões de recurso 68º a 70º e 74º).

Estipula o artigo 216.º do mesmo Código que:

1. Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa.

2. As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias.

3….; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; …

A benfeitoria consiste num melhoramento feito por quem está ligado à coisa em consequência de uma relação ou vínculo jurídico (neste sentido A. Varela, ob. cit., nota 2. ao artigo 1340º, pág. 163) – ao passo que a acessão é necessariamente um fenómeno provindo do exterior, de um estranho, de uma pessoa que não tem contacto jurídico com a coisa. Nos termos do disposto no artigo 1273.º do Código Civil, tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela (nº 1), mas quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa (nº 2).

Como no nosso caso, não se pode fazer o levantamento da benfeitoria útil sem detrimento da coisa, o titular do direito satisfará o valor da benfeitoria ao possuidor dela que, portanto, tem direito a ser indemnizado, segundo as regras do enriquecimento sem causa.

Ora, mesmo que tivesse ficado demonstrado que foram os AA que realizaram a construção, soçobraria o seu pedido.

Qual é o titular do direito de propriedade que deve satisfazer tal indemnização ? Quem o era ao tempo em que foram efectuadas tais benfeitorias ou o proprietário actual, o R., como pugnam os recorrentes ?

A obrigação correspondente às benfeitorias não pode, de modo algum, ser qualificada como obrigação “propter” ou “ob rem”, ambulatória ou não ambulatória, (cf. a este propósito o Ac. do STJ, de 5.5.2015, Proc.78/11...., no mesmo sítio, que iremos seguir de perto). De facto, o respectivo sujeito passivo não é determinado pela simples titularidade do direito real de propriedade em causa, mas, antes e como imposto pela lei, por quem, no binómio enriquecimento-empobrecimento que integra o instituto do enriquecimento sem causa, detém a qualidade ou posição de enriquecido, ao tempo em que são introduzidos os melhoramentos e que releva, pois, para o nascimento da correspondente obrigação. O que impõe que tenha de se considerar que tal obrigação não se transmite com a transmissão do direito de propriedade incidente sobre a coisa enriquecida. Ou seja, no caso dos autos, para o R.

Acrescem mais argumentos. Depois porque o R. adquirente do prédio benfeitorizado em nada beneficiou com a introdução dos melhoramentos em que se consubstanciaram as benfeitorias, uma vez que pagou o preço fixado judicialmente para a correspondente venda, com referência ao contemporâneo valor de mercado do mesmo prédio, sendo certo que, necessariamente, foram tidas em conta as benfeitorias introduzidas no mesmo, pelos AA ou por terceiros.,  

Assim, quem poderá ter enriquecido com a realização das benfeitorias terão sido os que figuram na acção executiva como executados, uma vez que sem as mesmas o sobredito valor de mercado seria inferior, o que imporia que com a adjudicação, ao exequente/R., do prédio hipotecado/penhorado tivesse de ser, correspondentemente, menor, a quantia exequenda liquidada total ou parcialmente.

Até porque, a entender-se o contrário, ficariam despojadas de qualquer sentido útil e sem qualquer interesse prático grande parte das execuções, correndo o exequente o risco de ser responsabilizado pelo pagamento de quantia superior à que visaria obter com a instauração da execução, mormente como desfecho de camuflados conluios entre o executado e o terceiro benfeitorizante.

Nesta medida, se foram os AA a efectuar as apontadas benfeitorias terão de responsabilizar terceiros que não o R., pelo que o seu pedido relativo a benfeitorias tem de ser indeferido.

Agora se relembrando, mais uma vez, o porquê de acima se ter expresso que era inútil conhecer a impugnação da matéria de facto referente, nesta situação, aos factos não provados 2., 5., 11., 17. a 35., 40., 54., 55., 58. a 65., 73., 74., 85. e 86.

5. Em suma e conclusão, a apelação tem de improceder na sua totalidade.

(…)

IV – Decisão

 

Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, assim se confirmando a decisão recorrida.  


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Custas a cargo dos AA/recorrentes.

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                                                                  Coimbra, 5.4.2022

                                                                  Moreira do Carmo

                                                                  Fonte Ramos

Alberto Ruço (com declaração) Concordo com a decisão, mas entendo que o artigo 1256.º, n.º 1, do Código Civil, não exige, para que haja acessão na posse, a validade formal do negócio translativo da posse. No caso, a questão acaba por não assumir relevância, porquanto a Ré adquiriu a propriedade da totalidade do prédio, incluindo a parte aqui reivindicada pelos Autores, às pessoas de quem os Autores pretendem aceder na posse. Como os antepossuidores a quem os Autores dizem ter acedido na posse transmitiram, coativamente, é certo, em processo executivo, o direito de propriedade ao Réu, também lhe transmitiram a posse inerente a esse direito de propriedade e daí que não haja posse acessível para os Autores, pois essa posse, repete-se, foi transmitida à Ré ao adquirir o direito de propriedade