Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MARIA CATARINA GONÇALVES | ||
Descritores: | EXECUÇÃO RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS CREDOR HIPOTECÁRIO HIPOTECA IMPUGNAÇÃO PAULIANA REGISTO | ||
Data do Acordão: | 12/03/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE LEIRIA - ANSIÃO - JUÍZO DE EXECUÇÃO - JUIZ 1 | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS.792, 788 CPC, 613, 616, 686, 824 CC | ||
Sumário: | I – Desde que seja titular de título executivo ou venha a obtê-lo nos termos previstos no artigo 792º do CPC, o credor cujo crédito está garantido por hipoteca está legitimado a reclamar o seu crédito no âmbito de uma execução onde foi penhorado o imóvel sobre o qual incide a sua garantia. II – A eventual inoponibilidade ou ineficácia dessa hipoteca relativamente ao exequente – em virtude de ter sido constituída após o registo de acção de impugnação pauliana que havia sido interposta pelo exequente relativamente a acto de transmissão do imóvel sobre o qual incide essa hipoteca – não interfere com a admissibilidade da reclamação do crédito no âmbito de execução onde o imóvel foi penhorado e apenas releva em sede de graduação dos créditos. III – O credor que obteve procedência em acção de impugnação pauliana relativamente a acto de transmissão de um imóvel, goza de preferência – para efeitos de pagamento do seu crédito pelo produto da venda desse imóvel – sobre o crédito que está garantido por hipoteca constituída e registada sobre o mesmo imóvel após o registo daquela acção; nessas circunstâncias, o primeiro crédito é graduado antes do segundo. | ||
Decisão Texto Integral: |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. L (…), melhor identificado nos autos, instaurou execução contra A (…) e A (…), pedindo o pagamento da quantia de 49.829,30€ e respectivos juros no valor de 23.051,17€, correspondente a um crédito que detém sobre A (…), A (…), D (…) e L (…) (conforme sentença proferida no processo nº 79/03.3TBFVN que condenou esses Réus ao pagamento da aludida quantia) e com base na sentença proferida no processo nº 280/07.0TBFVN (acção de impugnação pauliana instaurada contra A (…) e A(…) e contra os aqui executados, A (…) e A (…) ) onde foi declarada a ineficácia em relação ao Autor (aqui Exequente) do acto de dação em cumprimento formalizado por escritura pública de 27 de Junhos de 2002 – referente ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) (freguesia da (...) ) sob o nº 02074 e inscrito na matriz urbana no artigo 1277 e na matriz rústica no artigo 10566 – e onde os aqui Executados foram condenados à restituição do imóvel na medida do interesse do aqui Exequente que, para tanto, poderia executá-lo no respectivo património por forma a obter a satisfação do seu crédito sobre A (…) e A (…).
Tendo sido efectuada a penhora do aludido imóvel, veio J (…), melhor identificado nos autos, reclamar um crédito sobre os Executados (A (…) e A (…)), no valor de 42.500,00€ e respectivos juros no valor de 7.829,32€, com base numa escritura pública de 20/07/2011 onde A (…) se confessou devedor da aludida quantia resultante de transacção efectuada no processo nº 291/07.6TBFVN e onde os aqui Executados ((…)), para garantia daquela dívida, constituíram hipoteca a favor do Reclamante sobre o prédio supra identificado e penhorado nos autos. Mais alegou que, tendo instaurado execução contra os aqui Executados e contra A (…) (que correu termos sob o nº 1193/16.0T8PBL), foi aí efectuada a penhora do referido imóvel, tendo tomado conhecimento, através do respectivo agente de execução que deveria reclamar o seu crédito nos presentes autos quando para tal fosse citado, uma vez que tinha garantia real, uma vez que o artigo 752 do CC não permite a penhora de outros bens enquanto o bem onerado com tal garantia não se encontrar vendido.
A C (…)C.R.L. veio também reclamar um crédito sobre A (…) e A (…), no valor de 25.319,82€, acrescido de juros no valor de 13.959,66€ e imposto de selo no montante de 558,39€ e com origem numa livrança, mais alegando que, no âmbito da acção executiva que instaurou contra os referidos devedores, instaurou acção de impugnação paulina contra os devedores e contra os aqui Executados ((…)) onde veio a ser proferida sentença, transitada em julgado em 20/09/2011, que declarou ineficaz, em relação à aqui Requerente, o acto de dação em cumprimento formalizado por escritura pública em 27/06/2002, referente ao prédio supra identificado e penhorado nos autos e condenou os aqui Executados ((…)) à restituição do imóvel na medida do interessa da Requerente, podendo esta executá-lo no respectivo património, por forma a obter a satisfação do seu créditos sobre os referidos A (..:) e A (…) proveniente do empréstimo titulado pela livrança dada à execução bem como os respectivos juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos. Mais alega que, por força da penhora efectuada nos presentes autos, foi sustada a execução que havia instaurado, quanto ao imóvel em causa, nos termos do artigo 794º do CPC.
O Exequente veio impugnar a reclamação deduzida por J (…) legando, em resumo, que, à data em que foi registada a hipoteca a favor do Reclamante (21/07/2011), já estava pendente e registada a acção de impugnação paulina que o Exequente havia instaurado e que veio a ser julgada procedente por sentença transitada em julgado em 02/06/2014 e por via da qual foi convertido em definitivo o registo da acção, razão pela qual a constituição daquela hipoteca é ineficaz relativamente ao Exequente por estar abrangida pela impugnação pauliana previamente registada, independentemente da verificação dos requisitos da impugnabilidade e da má-fé do adquirente/alienante e do beneficiário da hipoteca relativamente a esse acto de oneração ulterior pelo adquirente do imóvel e autor da hipoteca em beneficio do ora Reclamante – cfr. artº 613º nº 2 do CC. Conclui, em função disso, que a reclamação em questão é processualmente inadmissível atenta a ineficácia da garantia hipotecária em que se funda e a sua consequente inoponibilidade relativamente ao Exequente ora Reclamado. Em qualquer caso, alega, o aludido crédito não poderá ser reconhecido por não estar devidamente documentado e, caso o seja, teria que ser reduzido ao valor constante da escritura pública de hipoteca que serve de fundamento à reclamação de créditos ora impugnada e, em qualquer caso, o crédito exequendo gozará sempre de preferência decorrente da prioridade do registo relativamente ao crédito ora reclamado que terá de ser reconhecido depois daquele.
O Exequente veio também impugnar a reclamação deduzida pela C (…)alegando, em resumo, que a penhora que fundamenta a reclamação é nula uma vez que, à data, o imóvel não pertencia aos executados na execução onde foi realizada e uma vez que, não obstante a procedência da acção de impugnação pauliana instaurada pela referida credora, os aqui Executados – que, à data, eram proprietários do imóvel – não eram partes nessa execução, mais alegando que o registo (definitivo) da penhora que fundamenta a reclamação é nulo por não existir título suficiente – uma vez que o imóvel estava inscrito a favor de titular diverso dos executados – e, portanto, essa penhora não é oponível ao Exequente.
Findos os articulados, foi proferida sentença onde se decidiu nos seguintes termos: “Julgar inadmissível a reclamação de créditos apresentada por J (…); Julgar reconhecidos os créditos reclamados pela C (…) CRL, nos termos que constam da fundamentação de facto; Graduação: pelo produto do prédio misto composto de cultura com oliveiras, pinhal e casa de rés-do-chão e primeiro andar destinada a habitação, denominada (...) , (...) , sito no lugar e freguesia da (...) , concelho de (...) , sob o n.º 2074 e inscrito na matriz rústica sob o artigo 10566º e matriz urbana sob o artigo 1277º haverá de ser graduado: Em 1º lugar, o crédito do Exequente; Em 2º lugar, havendo remanescente do pagamento referido em 1.º, o crédito do credor Reclamante C (…) CRL”.
Inconformado com essa decisão, o credor reclamante J (…) veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…)
O Exequente L (…) apresentou contra-alegações e ampliou o objecto do recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) ///// II. Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações do Apelante e tendo em conta a ampliação do objecto do recurso efectuada pelo Apelado, as questões a apreciar e decidir são, no essencial, as seguintes: • Saber se a reclamação de créditos apresentada pelo Apelante deve ser admitida e se o crédito reclamado deve ser verificado, analisando a questão – suscitada pelo Apelado – de saber se a alegada ineficácia ou inoponibilidade – relativamente ao Exequente – da hipoteca constituída para garantia do crédito do Apelante interfere (ou não) com a admissibilidade da sua reclamação; • Caso se conclua pela admissibilidade da reclamação, saber como deve ser efectuada a graduação desse crédito que está garantido por hipoteca constituída depois de registada a acção de impugnação pauliana que foi instaurada pelo Exequente e pela credora C (…) – e que veio a ser julgada procedente – com vista a impugnação do acto que havia operado a transmissão do imóvel. ///// III. Na decisão recorrida, foram julgados provados os seguintes factos: 1. Sobre o prédio misto composto de cultura com oliveiras, pinhal e casa de rés-do-chão e primeiro andar destinada a habitação, denominada (...) , (...) , sito no lugar e freguesia da (...) , concelho de (...) , sob o n.º 2074 e inscrito na matriz rústica sob o artigo 10566º e matriz urbana sob o artigo 1277º, incide: a. Dação em cumprimento registada pela AP n.º 1 de 2002/08/21 constando como sujeito activo A (…) e A (…)e sujeito passivo A (…) e A (…) b. Acção registada pela AP n.º 8756 de 2010/09/29 (convertida em definitiva pelo Averb. AP n.º 2059 de 2012/03/09) constando como sujeito activo C (…) CRL e como sujeitos passivos (…)peticionando-se: “Ser declarado ineficaz em relação a Autora (Sujeito Activo), o negócio de dação em cumprimento, celebrado por escritura pública outorgada em 27/06/2002, a fls. 59 e 60 do Lv.º 148-C, do Primeiro Cartório Notarial de (...) , entre os primeiros Réus (Sujeitos Passivos) – (…)e os segundos Réus (Sujeitos Passivos) – (…) e, consequentemente, serem estes segundos Réus condenados à restituição deste prédio, na medida do interesse da Autora (Sujeito activo); e, C) Ser declarado o direito à Autora (Sujeito Activo) a executar no património dos segundos Réus (Sujeitos Passivos) – (…), por forma a obter a satisfação dos seus créditos sobre os primeiros Réus (Sujeitos Passivo) – (…) no valor global de € 28.693,94 acrescido dos juros vincendos à taxa de 4% nos termos da Portaria nº 291/2003 de 8 de Abril.” c. Acção registada pela AP n.º 2449 de 2010/12/20 (convertida em definitiva pelo Averb. AP n.º 5258 de 2014/06/19) constando como sujeito activo L (…)[1] e como sujeitos passivos (…)peticionando-se: “Ser declarado ineficaz em relação ao autor o negócio de dação em cumprimento, celebrado por escritura pública outorgada em 27/06/2002, de fls. 59 a 60 do livro 148-C, do Primeiro Cartório Notarial de (...) , e consequentemente serem segundos réus ((…)e mulher) condenados á restituição do aludido imóvel por si adquirido, na medida do interesse do autor e, declarado o direito deste em executar no património dos segundos réus por forma a obter a satisfação do seu crédito sobre os primeiros réus ((…) e mulher), no valor global de 58 862,78 € acrescidos dos juros vincendos à taxa de 4% nos termos da Portaria 291/2003 de 8 de Abril.” d. Hipoteca voluntária registada pela inscrição AP n.º 3528 de 2011/07/21 a favor do credor Reclamante J (…) para garantia do montante máximo de € 42.500,00; e. Penhora inscrita pela AP n.º 360 de 2015/02/13 de 2015/09/02 a favor do Exequente. f. Penhora inscrita pela AP n.º 120 de 2017/01/16 a favor do credor Reclamante C (…) CRL. 2. Por escritura outorgada no dia 20 de Julho de 2011 A (…)confessou-se devedor a J (…) da quantia de € 42.500,00 resultante da transacção efectuada no âmbito do processo n.º 291/07.6TBFVN, empréstimo a pagar em 85 prestações de €500,00 cada, vencendo-se a primeira a 15.08.2011 e as restantes nos restantes em igual dia dos meses seguintes; para garantia da quantia em dívida e demais obrigações A (…) e A (…) constituíram hipoteca sobre o prédio referido em 1), fazendo-se menção às inscrições referidas em 1), alíneas a), b) e c), cfr. documento junto aos autos a fls. 5 v.º a 7 v.º dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 3. O credor Reclamante C (…)CRL intentou acção executiva que corre termos sob o n.º 146/05.9TBFVN, deste Juízo, contra A (…) eA (…) apresentando como título executivo a livrança com valor facial de € 5.319,82 e com data de vencimento em 25.02.2004. 4. Nem na data do respectivo vencimento, nem posteriormente, a livrança foi paga, pelo que na referida acção executiva o aqui credor Reclamante peticiona o pagamento da quantia de €25.319,82 de capital, juros desde 25.02.2004 até 26.09.2017 no montante de €13.959,66 e imposto de selo sobre estes no montante de € 558,39 e juros vincendos à taxa de 4% desde 27.09.2017 até integral pagamento. 5. Na pendência daquela acção executiva intentou acção de impugnação pauliana contra (…), registada conforme ponto 1), al. b) da fundamentação de facto, que veio a ser julgada procedente, por provada, cfr. documento junto aos autos a fls. 34 a 42 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os legais efeitos. 6. No âmbito da acção executiva referida em 3), em 10.01.2013, foi proferido o seguinte despacho: “(…) Fls. 123 a 153, 155, 156 e 157 Na presente execução, não foram identificados bens em nomes dos executados que pudessem cabalmente satisfazer a dívida exequenda. A execução esteve suspensa enquanto pendia a acção de impugnação pauliana com o nº 290/07.8TBFVN, deste Tribunal. Transitada a sentença aí proferida, verifico que foi declarado ineficaz, em relação à aqui exequente, o acto de dação em cumprimento que teve por objecto o imóvel descrito na CRP de (...) sob o nº 02074, tendo os ali segundos réus A (…) e A (…) sido condenados “à restituição na medida do interesse da autora (aqui exequente) e podendo esta executá-lo no respectivo património, por forma a obter a satisfação do seu crédito sobre os primeiros réus A (…) e A (…) (aqui executados) …. bem como respectivos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos”. Vem agora a exequente requerer a intervenção provocada de A (…) e A (…), porquanto o imóvel em questão não está registado a favor dos executados mas ainda em nome dos requeridos, e, em consequência, verifica-se um caso de litisconsórcio necessário passivo. Notificados os executados, nada disseram sobre a intervenção provocada. Vejamos. Como é sabido, a impugnação pauliana depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: i) a existência de determinado crédito; ii) que tal crédito seja anterior ao acto ou, sendo posterior, que o acto tenha sido realizado dolosamente visando impedir a satisfação do direito do credor; iii) resultar do acto a impossibilidade do credor obter a satisfação plena do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; iv) tratando-se de acto oneroso, que tenha havido má-fé, tanto da parte do devedor como do terceiro, entendendo-se por má-fé a consciência do prejuízo que o acto cause ao credor. Na verdade, com a impugnação pauliana não aspira o credor a que o tribunal declare ou considere inválido (nulo ou anulável) um qualquer acto patrimonial praticado por um seu devedor em seu prejuízo, mas apenas pretende que o acto seja ineficaz em relação a si (artigo 616º do CC - ineficácia relativa), podendo executar o bem no património do obrigado à restituição. Daí que, no caso, o imóvel se mantenha inscrito em nome de A(...) e AG (...) pois que a sentença não ordenou (nem tinha que ordenar) o cancelamento de qualquer registo. O que significa que o credor pode fazer-se pagar pelo valor do bem objecto do acto impugnado, o que lhe permite executá-lo no património do terceiro adquirente, o que envolve, por definição, os direitos de o fazer penhorar, de registar definitivamente a penhora e de o fazer vender na execução. Estamos necessariamente perante um dos casos excepcionais em que a lei consente a execução de bens de terceiro, isto é, não do devedor (artigo 818º do CC). Como já se disse, a procedência da acção de impugnação pauliana não acarreta a invalidade do respectivo acto de transmissão do bem de devedor para terceiro: o mesmo continua a ser propriedade deste; é apenas ineficaz em relação ao credor impugnante. E também por isso, entendemos que o registo da acção faz caso julgado quanto aos intervenientes na acção pauliana, o que determina, nos termos do artigo 57º do CPC, que a execução fundada em sentença condenatória pode ser promovida não só contra o devedor mas ainda contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força de caso julgado. É a situação em análise. Pelo exposto, não vislumbramos necessidade de fazer intervir os terceiros A (…) e A (…) pois que a sentença que julgou procedente a impugnação pauliana é título executivo suficiente contra estes, e nada obsta a que se proceda à penhora do imóvel objecto da acção. Indefere-se pois a requerida intervenção provocada, devendo o Sr. AE prosseguir os autos com a penhora do imóvel descrito na CRP de (...) sob o nº 02074, na medida do necessário a garantir a satisfação do crédito exequendo. (…)” 7. O referido despacho não mereceu censura. ///// IV. Conforme decorre das alegações de recurso, o segmento da decisão recorrida que está em causa no presente recurso é aquele em que se julgou inadmissível a reclamação de créditos apresentada por J …)(ora Apelante). Para fundamentar essa decisão, considerou-se na decisão recorrida que o Exequente e a credora C (…) eram credores dos alienantes A (…) e A (…) e que o credor Reclamante J (…) era credor dos adquirentes A (…) e A (…)Nessas circunstâncias e considerando que não era admissível o concurso entre credores do alienante e do adquirente com referência à coisa alienada, entendeu que o credor J(…) não podia, à sombra da hipoteca, preferir ao Exequente e outros credores no pagamento do seu crédito sobre o produto da venda do imóvel. Com vista à exacta compreensão da decisão, importa reter que o crédito exequendo não é um crédito sobre os Executados (é um crédito sobre (…) que não foram demandados na presente execução); a execução foi instaurada contra os Executados para o efeito de executar, no património destes, o imóvel que lhes havia sido transmitido por um dos devedores através de um acto (dação em cumprimento) que veio a ser declarado ineficaz relativamente ao Exequente no âmbito de acção de impugnação por este instaurada onde se decidiu que, com vista à satisfação do crédito que detinha sobre A (…) e A (…) poderia executar o imóvel no património dos aquirentes (os aqui Executados). E, conforme referimos, a sentença recorrida considerou que, ao contrário do que sucedia com o Exequente (e com a credora C (…)), o crédito do Apelante era um crédito sobre os adquirentes (aqui Executados) e que, como tal, não podia concorrer com os demais créditos que eram créditos sobre os alienantes do imóvel. O Apelante vem recorrer da decisão invocando a existência de um erro notório na apreciação da prova. Em face dessa alegação, poder-se-ia pensar que o Apelante pretendia impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto (só nesse caso faz sentido falar em erro de apreciação da prova). Não é essa, todavia, a pretensão do Apelante. Na verdade, o Apelante não impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, contestando apenas a afirmação/conclusão que, em sede de fundamentação jurídica, foi extraída da matéria de facto provada, segundo a qual o Apelante é credor dos adquirentes (e não credor dos alienantes), sustentando que, ao invés do que aí se referiu, também é credor do alienante A (…) e que, como tal, tinha que ser admitido ao concurso com os demais credores. Tem razão o Apelante. Na verdade e como resulta claramente do ponto 2. da matéria de facto, o Apelante é credor de A (…), tal como acontece com o Exequente e a C (…)sucedendo apenas que, através da escritura celebrada em 20/07/2011 (onde A (…) reconheceu e confessou o aludido crédito), os adquirentes do imóvel (aqui Executados) constituíram uma hipoteca sobre esse imóvel para garantia do aludido crédito do qual era devedor A (…). Ora, sendo certo que, conforme resulta da matéria de facto, essa hipoteca está registada, é evidente que o aludido credor tinha o direito de reclamar o seu crédito na presente execução onde foi penhorado o imóvel sobre o qual incidia a sua garantia. É isso que resulta do disposto no artigo 788º, nº1, do CPC, em conformidade, aliás, com o disposto no artigo 686º, nº 1, do CC, onde se determina que “A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo”. Veja-se que, em conformidade com o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 824º do CC, os bens vendidos em execução são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia e esses direitos – que caducam – transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens. Nessas circunstâncias, é evidente que o credor cujo crédito está garantido por hipoteca sobre bem que seja penhorado no âmbito de uma execução tem o direito – desde que seja titular de título executivo como exigido pelo artigo 788º do CPC ou venha a obtê-lo nos termos previstos no artigo 792º do CPC – de ser admitido ao concurso de credores para o efeito de ver assegurada a sua garantia com referência ao produto da venda no sentido de obter a satisfação do seu crédito de acordo com a preferência que lhe seja atribuída. Refira-se, aliás, que, para esse efeito, seria irrelevante o facto de o Apelante ser credor dos alienantes ou dos adquirentes, já que o que releva para efeitos de admissão ao concurso de credores é a circunstância de o credor gozar de garantia real sobre o bem penhorado, independentemente de quem seja o devedor. Assim, tendo sido penhorado um imóvel sobre o qual o Apelante gozava de hipoteca, estava o mesmo legitimado a reclamar o seu crédito desde que dispusesse de título executivo ou viesse a obtê-lo nos termos previstos na lei, sendo certo, portanto, que, ao contrário do que se considerou na decisão recorrida, a reclamação de créditos apresentada pelo Apelante tinha que ser admitida. A questão que se coloca prende-se apenas com a graduação desse crédito relativamente aos demais que estão aqui em causa, impondo-se esclarecer, desde já, que a alegada ineficácia/inoponibilidade da hipoteca relativamente ao Exequente – questão invocada nas contra-alegações em sede de ampliação do objecto do recurso – não interfere com a admissibilidade da reclamação (ao contrário do que sustenta o Apelado) mas apenas com a graduação dos créditos. Apreciemos, então, essa matéria que foi suscitada, como referimos, pelo Apelado em ampliação do objecto do recurso. Sustenta o Apelado que a referida hipoteca é ineficaz/inoponível (relativamente a si) uma vez que, conforme resulta da matéria de facto provada, a acção de impugnação pauliana que instaurou e com base na qual instaurou a presente execução contra os aqui Executados foi registada provisoriamente em 20/12/2010 (registo que foi posteriormente convertido em definitivo mas conservando a prioridade que tinha como provisório) e a hipoteca apenas veio a ser registada em 21/07/2011. Assim – diz –, a hipoteca está abrangida pela impugnação pauliana previamente registada, independentemente da verificação dos requisitos da impugnabilidade e da má-fé do adquirente/alienante e do beneficiário da hipoteca relativamente a esse acto de oneração ulterior pelo adquirente do imóvel e autor da hipoteca em benefício do ora Reclamante. Conclui, por isso, que a reclamação do crédito do Apelante não é admissível e que, caso assim não venha a considerar-se, o crédito do Apelado/Exequente sempre deverá ser graduado com preferência relativamente ao crédito do Apelante de acordo com o princípio da prioridade do registo consagrado no artigo 6º, nº 1, do CRP. Vejamos então. De acordo com o disposto no artigo 616º, nº 1, do CC, “Julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei”, determinando o nº 4 que “Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido”. É indiscutível, portanto, que a impugnação pauliana tem carácter pessoal porque apenas aproveita ao credor que a tenha requerido e em benefício do qual tenha sido decretada, sendo igualmente indiscutível que não afecta a validade do acto e a sua eficácia perante terceiros. O acto impugnado permanece válido, sucedendo apenas que ele não produzirá os seus efeitos normais relativamente ao credor impugnante que, na medida do que seja necessário à satisfação do seu direito, fica com o direito de executar os bens como se eles não tivessem saído do património do devedor. Nestas circunstâncias, é evidente que o Exequente – por efeito da procedência da acção de impugnação que instaurou – tem o direito de executar os bens no património dos adquirentes (os aqui Executados), ainda que estes não sejam os seus devedores (isso mesmo se dispõe no artigo 818º do CC), direito que, aliás, não é questionado nos autos. Idêntico direito assiste à credora C (…) uma vez que também ela instaurou acção de impugnação pauliana que foi julgada procedente. Sucede que, na pendência dessas acções – instauradas pelo Exequente e pela C (…) – e depois de efectuado o registo (lavrado inicialmente como provisório por natureza e posteriormente convertido em definitivo), os adquirentes do imóvel constituíram uma hipoteca (registada em 21/07/2011) a favor do ora Apelante e para garantia de um crédito do alienante do imóvel A (…) Sendo indiscutível que, por efeito dessa hipoteca, o Apelante tem o direito de ser pago pelo valor do imóvel hipotecado com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo (cfr. artigo 686º nº 1, do CC), a questão que agora se coloca consiste em saber como deve ser graduado esse crédito (garantido por hipoteca) relativamente aos demais créditos aqui em causa (do Exequente e da C (...) ) em benefício dos quais foi julgada procedente a impugnação pauliana. Relativamente a essa matéria, o artigo 613º do CC dispõe nos seguintes termos: “1. Para que a impugnação proceda contra as transmissões posteriores, é necessário: a) Que, relativamente à primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade referidos nos artigos anteriores; b) Que haja má fé tanto do alienante como do posterior adquirente, no caso de a nova transmissão ser a título oneroso. 2. O disposto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à constituição de direitos sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro”. É indiscutível que, na situação dos autos, após a transmissão inicial – relativamente à qual procedeu a impugnação pauliana que lhe foi deduzida – foi constituída (pelo adquirente no acto impugnado) uma hipoteca a favor de terceiro (no caso, o Apelante) e, portanto, a situação inclui-se no âmbito de previsão da norma citada. Segundo o que aí se dispõe, as transmissões posteriores ou a constituição (posterior) de direitos sobre os bens transmitidos não ficam automaticamente abrangidas pela procedência da impugnação deduzida relativamente ao acto inicial independentemente da verificação de quaisquer outros requisitos. Na verdade e sem prejuízo das regras de registo cujo funcionamento poderá conduzir a outra solução, estes actos posteriores também terão que ser impugnados e, correspondendo a actos onerosos, a impugnação contra eles deduzida só poderá proceder se, além de se verificarem os requisitos da impugnabilidade relativamente à primeira transmissão, também se verificar a situação prevista na alínea b), ou seja, a má-fé dos intervenientes no acto posterior (seja ele uma transmissão ou constituição de direitos em benefício de terceiro). Estando em causa um acto gratuito não se exige essa má-fé e, portanto, a verificação dos requisitos da impugnabilidade relativamente à primeira transmissão implicará também, sem necessidade de mais requisitos, a impugnabilidade do acto posterior. Em linhas gerais e sem pretender esgotar o tema que, em determinadas situações, poderá assumir contornos mais complexos, podemos dizer, apelando às palavras de Antunes Varela[2], que o contrato é oneroso quando “…a atribuição patrimonial efectuada por cada um dos contraentes tem por correspectivo, compensação ou equivalente a atribuição proveniente do outro”, ou seja, “para alcançar ou manter a atribuição patrimonial da contraparte, cada contraente tem (o ónus, hoc sensu) de realizar uma contraprestação”; o contrato é gratuito quando “…segundo a comum intenção dos contraentes, um deles proporciona uma vantagem patrimonial ao outro, sem qualquer correspectivo ou contraprestação”. Temos como certo e indiscutível que a constituição de uma hipoteca – é essa a situação dos autos – não corresponde a um acto que possa ser qualificado, em abstracto, como tipicamente gratuito ou tipicamente oneroso. A gratuitidade ou onerosidade do acto de constituição de hipoteca tem que ser apurada, caso a caso, em função das concretas características do acto e do contrato/negócio que com ele esteja relacionado. Conforme diz Antunes Varela[3], “Se o credor garantido houver custeado a garantia conquistada, o acto é oneroso…Se, pelo contrário, o credor tiver recebido a vantagem patrimonial proporcionada pela garantia, sem qualquer contraprestação, o acto foi gratuito…”. No caso em análise, estamos perante uma hipoteca que foi constituída pelos Executados (adquirentes na transmissão inicial relativamente à qual foi julgada procedente a impugnação pauliana a favor do Exequente e da C (…)) para garantia de uma dívida de outrem (o alienante naquela transmissão) e que já existia à data da constituição da hipoteca. Significa isso, portanto, que a vantagem patrimonial concedida ao Apelante por via da constituição da hipoteca não teve qualquer correspectivo ou contraprestação; o Apelante não efectuou qualquer atribuição patrimonial ao contraente que lhe concedeu a garantia (que nem sequer era o devedor do crédito que se garantia) e tão pouco efectuou qualquer atribuição patrimonial ao devedor do crédito em troca ou como contrapartida da constituição da garantia, uma vez que o crédito já se havia constituído em momento anterior. É certo que, na maioria dos casos, a constituição de hipoteca corresponderá a uma contrapartida prestada por uma das partes em função e com vista a obter da contraparte uma determinada prestação (a concessão de um crédito, por exemplo) e nessas circunstâncias ela corresponderá, efectivamente, a um acto oneroso[4]. Não é essa, porém, a situação dos autos, uma vez que o outorgante que concedeu a garantia não recebeu em troca qualquer prestação e tão pouco se pode dizer que o devedor do crédito garantido tivesse recebido alguma prestação em função da qual a garantia tivesse sido concedida, uma vez que a prestação que lhe havia sido efectuada e que estava na origem do crédito havia sido efectuada em momento anterior, não podendo, por isso, dizer-se que a hipoteca foi constituída tendo em vista a efectiva concessão desta prestação. Nestas circunstâncias, a hipoteca configura um acto gratuito[5]. Assim, estando em causa – como vimos – um acto gratuito, a respectiva impugnação pauliana não depende da existência de má-fé, bastando-se, conforme dispõe o artigo 613º, com a verificação dos requisitos da impugnabilidade relativamente à primeira transmissão. Nessas circunstâncias, a procedência da impugnação pauliana deduzida pelo Exequente e pela C (…) implicava, sem necessidade de qualquer outro requisito, a procedência da impugnação relativamente ao acto posterior de constituição da hipoteca a favor do Apelante. Refira-se, no entanto, que, ainda que o acto em questão (constituição da hipoteca) fosse considerado oneroso, sempre se poderia presumir a existência de má-fé dada a circunstância de, à data, já se encontrar registada a acção interposta com vista à impugnação da transmissão inicial, conforme admite Gonçalo dos Reis Martins[6], bem como Cura Mariano[7]. Além do mais e conforme resulta da respectiva certidão, a escritura de constituição da hipoteca faz menção ao registo daquelas acções o que, por si só, também bastaria para concluir pela existência de má-fé. Estando aqui em causa a constituição de uma garantia (hipoteca), o efeito da impugnação pauliana não corresponderá ao efeito típico que está previsto no artigo 616º (execução do bem no património do obrigado à restituição), uma vez que a constituição da garantia não implica a transferência do bem para outro património; nesse caso, a procedência da impugnação implicará, no essencial, que essa garantia não pode ser invocada perante os credores em benefício dos quais foi decretada a impugnação pauliana. Como refere Cura Mariano[8], nesses casos, “… o credor beneficiado só não poderá concorrer com o credor impugnante utilizando a garantia especial impugnada”. À mesma conclusão se chegaria pela aplicação das regras de registo – cfr. artigos 5º e 6º do Código de Registo Predial –, já que o registo das acções de impugnação instauradas pelo Exequente e pela C (...) implica que o direito desses credores prevaleça sobre o direito do Apelante resultante de hipoteca que foi constituída, em seu benefício, pelos adquirentes do acto que era impugnado naquelas acções e que apenas foi registado em momento posterior à do registo daquelas acções (registo que, apesar de ter sido lavrado à data como provisório por natureza, veio a ser convertido em definitivo por força da procedência daquelas acções, mantendo a prioridade que tinha como provisório – cfr. artigo 6º, nº 3, do C.R.P.). A este propósito, escreve Cura Mariano[9]: “Tal como sucede em muitas outras situações em que direitos colidem, o registo não só tem um efeito enunciativo, em que a sua publicidade tem a virtude de afastar potenciais interessados na aquisição do bem, assumindo uma natureza cautelar, como o princípio da prioridade confere prevalência à anterioridade do registo da acção, permitindo que a posterior decisão de procedência possa ser oposta a terceiros adquirentes que não hajam registado a aquisição dos direitos incompatíveis em data anterior ao registo da acção. Com o registo da acção de impugnação, possibilita-se ao subadquirente posterior o conhecimento da sua existência, o qual se presume iuris et de iure, sendo esse conhecimento presumido que justifica a oponibilidade da posterior decisão de procedência da impugnação a esse subadquirente”. Concluimos, portanto, em face do exposto, que o crédito do Apelante (garantido por hipoteca sobre o imóvel penhorado) não pode prevalecer sobre os demais créditos (em relação aos quais foi julgada procedente a impugnação pauliana). Tal não significa, porém, ao contrário do que se considerou na sentença recorrida e ao contrário do que sustenta o Apelado, que a reclamação do crédito do Apelante não seja admissível; isso significa apenas que este crédito terá que ser graduado após os demais créditos.
Apreciada essa questão e assente que a reclamação de créditos deduzida pelo Apelante tinha que ser admitida, importa agora fazer algumas considerações a propósito da verificação do crédito. O Exequente havia impugnado o crédito dizendo desconhecer a existência da dívida garantida pela hipoteca e a sua proveniência, impugnando, por desconhecimento, os factos que, a esse propósito, foram alegados pelo Apelante e acrescentando que o crédito não está devidamente documentado. A sentença recorrida não admitiu a reclamação apresentada pelo Apelante e, como tal, não apreciou a questão referente à verificação do crédito. O Apelado também não aludiu a essa questão nas suas contra-alegações, limitando-se a sustentar – em ampliação do objecto do recurso – que a decisão deve ser confirmada (ainda que por outros fundamentos) e que, caso assim não se entenda, o crédito do Apelante deve ser graduado depois do crédito exequendo. Na verdade, tendo em conta que, como resulta da exposição supra efectuada, o crédito do Apelante não poderá ser graduado antes dos demais créditos – designadamente o crédito exequendo – o Exequente/Apelado não terá qualquer interesse em impugnar a existência daquele crédito que não irá interferir com a satisfação do seu direito. Nessas circunstâncias, tendo em conta que o Apelante dispõe de título exequível como exige o artigo 788º, nº 2, do CPC – título que corresponde a um documento exarado por notário onde o devedor reconhece a obrigação (cfr. artigo 703º, nº 1, do CPC –, tendo em conta que está em causa um documento autêntico cuja falsidade não foi invocada e que faz prova plena da declaração ali efectuada pelo Executado (artigo 371º, nº1, do CC) que se configura como confissão extrajudicial e tendo em conta que o Executado não impugnou o crédito, não encontramos razões válidas para não o julgar verificado uma vez que – reafirmamos – a sua verificação não interfere e não prejudica a satisfação dos direitos dos demais credores (designadamente o Exequente) que serão pagos com preferência. É certo, no entanto, que o crédito apenas poderá ser aqui verificado e graduado pelo valor de 42.500,00€, uma vez que é esse o valor máximo garantido pela hipoteca, sendo certo que, em conformidade com o disposto no artigo 693º, nº 1, do CC, a hipoteca apenas assegura os juros se tal constar do registo, o que aqui não acontece. Assim, sendo certo que a verificação e graduação de créditos apenas respeita a créditos que gozem de garantia real sobre os bens penhorados (cfr. artigo 788º do CPC), o valor do crédito que excede a quantia de 42.500,00€ não poderá ser aqui considerado, uma vez que, conforme referimos, não está abrangido pela hipoteca e, consequentemente, não goza de garantia real sobre o imóvel penhorado. Assim sendo, julgamos verificado o apontado crédito (no valor de 42.500,00€) que, conforme referimos e pelas razões apontadas, será graduado para ser pago, em relação ao produto da venda, após os demais créditos (o crédito do Exequente e o crédito da C (…)).
Uma última palava para deixar consignado que a rectificação pedida pelo Apelado relativamente à alínea c) da matéria de facto já foi efectuada aquando da enunciação da matéria de facto (cfr. nota de rodapé com o nº 2) por estar em causa um mero lapso. ****** SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 663º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção): I – Desde que seja titular de título executivo ou venha a obtê-lo nos termos previstos no artigo 792º do CPC, o credor cujo crédito está garantido por hipoteca está legitimado a reclamar o seu crédito no âmbito de uma execução onde foi penhorado o imóvel sobre o qual incide a sua garantia. II – A eventual inoponibilidade ou ineficácia dessa hipoteca relativamente ao exequente – em virtude de ter sido constituída após o registo de acção de impugnação pauliana que havia sido interposta pelo exequente relativamente a acto de transmissão do imóvel sobre o qual incide essa hipoteca – não interfere com a admissibilidade da reclamação do crédito no âmbito de execução onde o imóvel foi penhorado e apenas releva em sede de graduação dos créditos. III – O credor que obteve procedência em acção de impugnação pauliana relativamente a acto de transmissão de um imóvel, goza de preferência – para efeitos de pagamento do seu crédito pelo produto da venda desse imóvel – sobre o crédito que está garantido por hipoteca constituída e registada sobre o mesmo imóvel após o registo daquela acção; nessas circunstâncias, o primeiro crédito é graduado antes do segundo. ///// V.
Coimbra, 3/12/2019
Maria Catarina Gonçalves ( Relatora ) Maria João Areia Ferreira Lopes
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