Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1136/21.0T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO
INTERRUPÇÃO
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
NOVA ACÇÃO
EFEITOS CIVIS DA CITAÇÃO
IMPUTABILIDADE
Data do Acordão: 01/14/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE COIMBRA DO TRIBUNAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 327.º DO CÓDIGO CIVIL
ARTIGO 279.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
ARTIGOS 61.º, 65.º, 66.º DA LAT
ARTIGO 138.º DO CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO
Sumário: I) O regime relativo à prescrição e caducidade previsto no Código Civil, designadamente no seu artigo 327.º, não se sobrepõe ao previsto no n.º 2 do artigo 279.º do CPC.

II- Tendo sido declarada, em acção anterior, a absolvição da instância e sendo proposta nova acção dentro de 30 dias após o trânsito em julgado daquela primeira decisão, o efeito impeditivo da prescrição decorrente da propositura da primeira acção mantém-se.

III- Se for dado cumprimento ao prazo de 30 dias referido em II), não se requer a não imputabilidade da causa da absolvição da instância ao autor da acção que terminou por essa via.

IV- Se não for respeitado esse prazo, para poder conceder-se o prazo mais longo dos 2 meses previsto no Código Civil, tem de estar preenchido esse requisito da não imputabilidade.

Decisão Texto Integral:                        

                       

                        Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

      A. veio intentar a presente acção, com processo comum, contra B. S.A., pedindo que seja:

      a) Declarada verificada a justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do Autor;

                        E a Ré condenada:

                        b) no pagamento de indemnização ao Autor pela justa causa na resolução, num montante entre €55.200,00 (cinquenta e cinco mil e duzentos) de € 165.600,00 (cento e sessenta e cinco mil euros e seiscentos euros);

                        c) no pagamento ao Autor dos vencimentos de Março, Abril, Maio, Junho 2018 acrescidos dos demais créditos laborais pela execução e pela cessação do contrato, regularizando as contribuições relativas a Segurança Social e Autoridade Tributária;

                        d) no pagamento ao Autor dos proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal do ano da cessação;

                        e) no pagamento ao Autor em indemnização pelos danos morais que lhe causou em montante nunca inferior a € 100.000,00 (cem mil euros);

                        f) no pagamento ao Autor das despesas médicas e medicamentosas incorridas pelo Autor, a título de danos patrimoniais, na sequência do seu estado depressivo causado pelo assédio praticado pela Ré.

                        Conforme se diz na decisão recorrida, na petição inicial o Autor invoca a tempestividade da presente acção, alegando, no essencial, que esta foi instaurada no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância, proferida no âmbito da anterior ação com o mesmo objecto e as mesmas partes (processo n.º 3785/19.7T8CBR), nos termos do disposto no artº 279º do CPC.

                        Na contestação, a Ré invoca a prescrição dos créditos reclamados pelo Autor, alegando, em síntese, que o disposto na lei civil, em particular no artº 327º do CC, prevalece sobre a norma do nº 2, do artº 279º, e que, em qualquer caso, o Autor também não beneficia do prazo acrescido de dois meses previsto no nº 3 do artº 327º do CPC porque a absolvição da instância ocorreu por facto que lhe é imputável.

                        E conclui que a aplicação ao caso dos autos do disposto no art.º 279º do CPC não impede a verificação dos efeitos de prescrição decorrentes do decurso do prazo previsto no artº 337º do CC.

      Respondeu o Autor, pugnando pela improcedência da excepção.

      Foi proferido saneador- sentença, onde se decidiu:

                        “Nestes termos, julgo extintos, por prescrição, os créditos reclamados pelo autor e absolvo a ré dos pedidos formulados.

      Custas a cargo do autor (art.º 527.º do NCPC)”.

                        Inconformado, o Autor interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:

                        (…)                                         x

                        Cumpre decidir.

                        Definindo-se o âmbito dos recurso pelas suas conclusões, temos, como questões em discussão:

                   - a impugnação da matéria de facto;

                        - se  não ocorreu a prescrição dos créditos peticionados pelo Autor.

                                                               x

                        A 1ª instância fixou da seguinte maneira a matéria de facto:

                        Para a apreciação da exceção relevam os seguintes factos e dinâmica processual:

                        1.º O contrato de trabalho celebrado entre autor e ré cessou no dia 22 de junho de 2018, na sequência da sua resolução operada pelo autor;

                        2.º Em 7 de junho de 2019 o autor intentou contra ré, neste tribunal, a ação de processo comum n.º 3785/19.7T8CBR, peticionando que: i) fosse declarada verificada a justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do autor; ii) a condenação da ré no pagamento de indemnização pela justa causa na resolução; iii) a condenação da ré no pagamento dos créditos laborais devidos ao autor; iv) a condenação da ré no pagamento de indemnização por danos morais; iv) a condenação da ré no pagamento das despesas médicas e medicamentosas incorridas pelo autor, a título de danos patrimoniais, na sequência do seu estado depressivo causado pelo assédio praticado pela ré;

                        3.º A ré foi citada para os termos da ação referida em 2.º em 14 de junho de 2019;

                        4.º Na contestação da ação referida em 2.º, os réus arguiram a ilegitimidade do autor, alegando que o mesmo se apresentou à insolvência, que o processo ainda se encontra pendente e que por esse motivo o autor estaria inibido dos seus poderes de administração e de disposição de bens e direitos, pelo que quem deveria apresentar-se do lado ativo da ação judicial em curso deveria ser a administradora de insolvência do referido processo de insolvência em representação do devedor e não o autor;

                        5.º Finda a fase dos articulados, no despacho saneador decidiu-se que o facto de o autor ter em curso um processo de insolvência pessoal não acarretava uma situação de ilegitimidade, mas tão só uma situação de irregularidade de representação e que esta irregularidade seria suprível mediante a intervenção do seu representante legítimo - no caso a administradora de insolvência nomeada no processo de insolvência pessoal do autor – em conformidade com o disposto no artigo 27.º do CPC, tendo-se nessa sequência convidado o autor para, no prazo de 10 dias, fazer intervir nos autos a referida administradora de insolvência, com procuração forense emitida ao mandatário subscritor da petição inicial, ratificando todos os atos anteriormente praticados, sob pena de ficar sem efeito todo o processado posterior;

                        6.º O autor foi notificado do despacho referido em 5.º em 1 de julho de 2020;

                        7.º O autor não respondeu ao convite de regularização da representação referido em 5.º;

                        8.º Perante a falta de resposta do autor ao referido convite, em 10 de setembro de 2020 o tribunal proferiu sentença de absolvição dos réus da instância dada a irregularidade do mandato judicial por parte do mandatário que propôs a ação e a impossibilidade do prosseguimento dos autos, nos termos do disposto no artigo 278.º, n.º 1, alínea e) do CPC;

                        9.º O autor recorreu da sentença referida em 8.º e o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão datado de 12 de fevereiro de 2021, transitado em julgado em 22 de março de 2021, confirmou a sentença recorrida, decidindo que ocorreu uma irregularidade na representação que, por não ter sido oportunamente suprida, leva à absolvição da instância;

                        10.º O processo de insolvência do autor foi declarado encerrado por despacho proferido em 5 de junho de 2020 e que lhe foi notificado em 9 de junho de 2020;

                        11.º A presente ação deu entrada em juízo em 22 de março de 2021;

                        12.º A ré foi citada para os termos da presente ação em 23 de abril de 2021.

                                                                       x

                        - o direito:

                        - a primeira questão- a impugnação da matéria de facto:

                        Face à solução de direito a que se irá chegar, a impugnação factual apresenta-se como perfeitamente inútil.

                        Como já se disse e é sabido, o âmbito dos recursos define-se pelas suas conclusões.

                        O Tribunal de recurso não tem de apreciar todas as considerações, argumentos ou razões produzidas pela parte, mas tão só as questões objecto do mesmo recurso, entendidas as mesmas como aquelas que se reportam aos pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições assumidas pelas partes, ou seja, as que se prendem com a causa de pedir, com o pedido e com as (reais) excepções porventura aduzidas.
                        Da mesma forma, só deve este Tribunal apreciar a  impugnação da matéria de facto quando esta, segundo a própria argumentação levada às conclusões do recurso, possa conduzir à alteração do decidido, em termos de direito, pela primeira instância. E, nos presentes autos, para a apreciação da questão da prescrição, nos termos e com a fundamentação em que irá ser feita, em nada relevam os factos que o apelante pretende que passem  constar dos factos dados como provados e que elenca na conclusão A do seu recurso.
                        Daí que se não conheça da mesma, a  fim de evitar a prática de actos inúteis, proibidos por lei- artº 130º do CPC.

                        - a segunda questão- se  não ocorreu a prescrição dos créditos peticionados pelo Autor:

                        Dispõe o artº 337º, nº 1 do CT, que o crédito do empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

            E como se diz na sentença, importa analisar se podem ser aproveitados nestes autos os efeitos impeditivos da prescrição decorrentes da instauração da anterior acção de processo comum com o mesmo objecto e que terminou com sentença de absolvição da instância da Ré.

                        Há que ter em conta o disposto no artº 279º, nº 2, do CPC:

                        “1 - A absolvição da instância não obsta a que se proponha outra ação sobre o mesmo objeto.

                        2 - Sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova ação for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância”.

                        Bem como o estatuído no artº 327º do Cod. Civil:

                        “1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo;

                        2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o ato interruptivo;

                        3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses”.
                        A sentença recorrida considerou extintos, por prescrição, os créditos reclamados pelo Autor, com base, essencialmente, na seguinte argumentação:

                        “(…)Donde resulta que o estabelecido na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, prevalece, enquanto regime especial, sobre a regra do n.º 2, do art.º 279.º do CPC.

                        Na verdade, sendo com a revisão de 1967, operada pelo DL n.º 47.690, de 11.5.1967, na sequência da entrada em vigor do então novo Código Civil, que se introduziu na lei adjetiva geral a referida ressalva constante do n.º 2, do art.º 279.º do CPC, não pode deixar de entender-se que se visou impor definitivamente a consideração da nova regulamentação civilista na matéria atinente à prescrição e caducidade dos direitos.

                        Neste sentido pronunciam-se, entre outros, os acórdãos da RL de 14.12.1995 (CJ, Ano XX, tomo v, pág.154 e seguintes e as referências da doutrina que aí são feitas a Vaz Serra, Pires de Lima e Antunes Varela e Aníbal de Castro); do STJ de 21.10.1993 (CJ/STJ, 1993, tomo III, pg.79); da RC de 06.03.2008 e do STJ de 16.06.2015 e de 07.12.2016.

                        É esta também a tese defendida por Anselmo de Castro, para quem o âmbito de aplicação do art.º 289.º, n.º 2 do CPC de 1961 (atual art.º 279.º, n.º 2, do CPC) se reporta aos demais efeitos civis derivados da propositura da ação ou da citação do réu, concluindo, então, que os efeitos civis conexos com a caducidade e a prescrição, respetivamente associados à instauração da primeira ação e à citação do réu para essa ação, são regidos exclusivamente pelos art.ºs. 327.º e 332.º do CC (Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, pág. 275).

                        Também, assim, Antunes Varela, na anotação ao art.º 327º, n.º 3, do CC, para quem o regime da prescrição contido em tal preceito veio substituir o que resultava da primitiva redação do art.º 289.º (atual art.º 279.º) do CPC de 1961.

                        Outrossim Ary Elias da Costa quando refere que quanto à caducidade e à prescrição, há que atender ao que a lei civil estipula a tal respeito, que prevalece; quanto aos outros possíveis efeitos, regula o disposto no nº 2 deste artigo (agora, o art.º 279.º do CPC) (CPC anotado, vol. III, pág. 584).

                        Em suma, é entendimento do tribunal que o regime relativo à prescrição e caducidade previsto no Código Civil sobrepõe-se ao previsto no n.º 2, do artigo 279.º do CPC, em virtude da ressalva constante do início desta norma.

                        Nos termos do preceituado no n.º 1, do art.º 323.º do CC, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.

                        No n.º 2 do mesmo preceito legal prevê-se que se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.

                        A ação n.º 3785/19.7T8CBR deu entrada em juízo em 7 de junho de 2019 e a ré foi citada para os seus termos em 14 de junho 2019.

                        Decorridos cinco dias após ter sido requerida a citação, ou seja, em 12 de junho de 2019, considera-se interrompida a prescrição.

                        De acordo com o preceituado no n.º 1, do artigo 326.º do CC a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos números 1 e 3 do artigo seguinte.

                        Desta forma, em 13 de junho de 2019 começou a correr novo prazo de prescrição de um ano previsto no art.º 337.º do CT.
                        Nos termos do disposto no artigo 327.º do CC:

                        1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo;

                        2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o ato interruptivo;

                        3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.

                        Em princípio, a citação impede que se reinicie um novo prazo de prescrição (n.º 1, do artigo 326.º do CC).

                        No entanto, no caso de se verificar a absolvição da instância, como sucedeu no processo n.º 3785/19.7T8CBR, o prazo de prescrição começa a correr logo após o ato interruptivo, isto é, em 13 de junho de 2019 (art.º 327.º, nº 2 do CPC), o qual terminaria, pois, em 13 de junho de 2020.

                        Sucede, porém, que em resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, foram decretadas medidas excecionais e extraordinárias, entre as quais a suspensão da generalidade dos prazos judiciais (Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março).

                        O regime consagrado na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação introduzida pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, designadamente no seu artigo 7.º, com a epígrafe Prazos e diligências, estabeleceu a suspensão dos prazos de prescrição entre o dia 9 de março de 2020 e o dia 3 de junho de 2020, o que se computa em 88 dias.

                        Por seu turno, a Lei n.º 16/2020, publicada no Diário da República n.º 105/2020, Série I, de 2020-05-29, veio regular no seu artigo 2.º, que aditou o artigo 6.º- A, à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que entrou em vigor em 3 de junho de 2020, e instituir que os prazos de prescrição e caducidade que deixassem de estar suspensos por força das alterações introduzidas por esta lei, seriam alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.

                        O prazo de prescrição dos créditos peticionados nestes autos pelo autor iniciou-se, com a interrupção da prescrição, em 13 de junho de 2019 e terminaria decorrido um ano, em 13 de junho de 2020.

                        Tendo sido o mesmo alargado pelo período de 88 dias nos termos do preceituado no citado artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, terminou em 9 de setembro de 2020.

                        Neste sentido, veja-se o Ac. da RL de 24/03/2021, em cujo sumário se lê que a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade contemplada nos n.ºs 3 e 4 do artigo 7º da Lei n.º 1-A/2020, de 2020-03-19, que ocorreu entre 9 de março de 2020 e 3 de junho do mesmo ano, aplica-se ao prazo prescricional contemplado no n.º 1 do artigo 337.º do Código de Trabalho/2009 (disponível em www.dgsi.pt).

                        A presente ação deu entrada em juízo em 22 de março de 2021, pelo que nesta data já os créditos do autor se encontravam prescritos desde o dia 9 de setembro de 2020.

                        A lei prevê, ainda, no art.º 327.º, n.º 3 do CC, que se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.

                        Assim, se a absolvição da instância não for imputável ao autor e o prazo de prescrição tiver entretanto terminado - como terminou em 9 de setembro de 2020 - não se considera completada a prescrição antes de decorrido dois meses após o trânsito em julgado da decisão que absolveu o réu da instância.

                        (…)

                        Do que tudo se extrai que a duração da interrupção da prescrição tem um regime diferente em função do motivo processual da absolvição da instância decorrer ou não de comportamento imputável ao titular do direito.

                        Assim, verificada uma situação de absolvição da instância, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o ato interruptivo sempre que a causa/motivo processual determinante da absolvição seja imputável ao autor/credor/titular do direito a exercitar - como claramente decorre da conjugação dos n.ºs 2 e 3 do art.º 327.º do CC.

                        Só assim não será se o réu for absolvido da instância por motivo processual não imputável ao titular do direito, caso em que se o prazo de prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.

                        Este regime é, pois, diferenciado: mais favorável nos casos em que não haja causa imputável ao autor, mas penalizando o comportamento culposo do titular do direito que tenha dado azo à absolvição da instância.

                        A aplicação do preceituado no art.º 327.º, n.º 3, do CC, está, assim, centrada no segmento normativo respeitante à não imputabilidade, conceito indeterminado que deverá ser casuisticamente preenchido a partir de um critério que pondere os deveres de diligência da parte no preenchimento dos requisitos formais da instância e relativamente à tramitação processual, desde a interposição da ação.

                        E ainda que circunscrita ao motivo gerador da absolvição da instância, a

jurisprudência do nosso Supremo Tribunal de Justiça tem revelado a prevalência de um entendimento no sentido de que a aferição do motivo processual não imputável ao titular do direito deve alicerçar-se essencialmente numa ideia de culpa, no sentido de uma atuação merecedora de reprovação ou de censura do titular do direito sujeito a prazos de prescrição ou de caducidade (neste sentido, entre outros, os Acs. do STJ, de 16-6-2015; de 14-01-2006 e de 27-10-2016 onde se aponta para a diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
                        (…)

                        No caso vertente, a absolvição da instância foi declarada em consequência da irregularidade do mandato judicial do mandatário do autor, motivo processual que não pode deixar de ser claramente imputado à parte, em termos mínimos de mera culpa, aferível pelo padrão normal de um cidadão médio, com a diligência exigida a um bonus pater famílias (neste sentido, entre outros, os Acs. do STJ, de 15.11.2006, relatado por Pinto Hespanhol, disponível em www.dgsi.pt/jstj e de 21.10.1993, CJ/STJ, Ano I, Tomo III, pg. 79-81).

                        Com efeito, verifica-se que no âmbito dessa ação judicial, o autor foi convidado para, no prazo de 10 dias, fazer intervir nos autos a administradora da insolvência nomeada, com procuração forense emitida ao mandatário subscritor da petição inicial, ratificando todos os atos anteriormente praticados, sob pena de ficar sem efeito todo o processado posterior.

                        E devidamente notificado deste despacho, o autor nada disse, não supriu a irregularidade de representação e não justificou estas omissões.

                        O autor sabia que havia sido declarado insolvente e que, por este motivo, estava inibido dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente e que cabia apenas à administradora da insolvência a sua representação para todos os efeitos de caráter patrimonial que interessam à massa insolvente, designadamente, em ações judiciais.

                        Pelo que é manifesto que a irregularidade de representação é da sua exclusiva responsabilidade.

                        Ao que acresce o facto de que, convidado para suprir esta irregularidade, com a cominação expressa de absolvição da instância da ré, o autor remeteu-se ao silêncio, não supriu a irregularidade e não justificou estas omissões.

                        Pelo que também por este motivo deverá considerar-se que a absolvição da instância é imputável ao autor, uma vez que optou, voluntária e conscientemente, por não aderir ao convite que lhe foi dirigido, após ter sido expressamente advertido pelo tribunal de que se a irregularidade não fosse suprida seria dado sem efeito todo o processado.

                        E esta imputabilidade é ainda mais evidente se atentarmos que o processo de insolvência do autor foi declarado encerrado por despacho proferido em 5 de junho de 2020 e que lhe foi notificado em 9 de junho de 2020, - ou seja, 20 dias antes de ter sido proferido o despacho saneador - e o autor não informou o tribunal desta circunstância.

                        Nem quando teve conhecimento desse facto, nem posteriormente quando foi notificado do despacho saneador em 1 de julho de 2020 e até ser proferida a decisão final.

                        Aliás é o próprio autor que reconhece, na resposta à contestação, que na data em que foi proferido o despacho saneador na primeira ação (29 de junho de 2020), já não conseguiria obter a intervenção da administradora de insolvência que, nessa data, por ter sido encerrado o processo de insolvência, já não tinha poderes de representação (art.º 21.º), pelo que não se compreende o motivo pelo qual nunca comunicou este facto nos autos, o que poderia certamente ter alterado o seu desfecho, evitando a absolvição da instância.

                        Neste contexto, afigura-se que a conduta do autor merece a reprovação ou a censura do direito, uma vez que, num quadro de um razoável juízo de previsibilidade, era de conjeturar uma situação de absolvição da instância e na condução da ação o autor, representado pelo seu mandatário, não adotou um paradigma de proficiência, zelo, atenção e diligência na elaboração das respetivas peças processuais, sendo que, face às circunstâncias do caso, poderia e deveria ter agido de outro modo.

                        Do que tudo se extrai que é manifesto que a absolvição da instância da primeira ação é imputável ao autor, a título de culpa, pelo que não poderá beneficiar do prazo especial de dois meses previsto no n.º 3, do artigo 327.º do CC.

                        E também não beneficia do prazo especial de dois meses previsto no art.º 27.º, nº 4 do NCPC porque a decisão proferida na primeira ação foi de absolvição da instância, com fundamento na irregularidade de representação do autor, e a duração da interrupção da prescrição nesta situação está especificamente regulada no art.º 327.º, nºs 2 e 3 do CC nos termos anteriormente escalpelizados, prevalecendo também como regime especial sobre a referida norma.

                        Assim sendo, verificando-se que a presente ação deu entrada em juízo no dia 22 de março de 2021 e que o prazo de prescrição de um ano se completou em 9 de setembro de 2020, procede a exceção de prescrição”.

                        Embora alicerçada em significativas doutrina e jurisprudência, não comungamos da orientação acolhida pela sentença, de que “o estabelecido na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, prevalece, enquanto regime especial, sobre a regra do n.º 2, do art.º 279.º do CPC” e  de “que o regime relativo à prescrição e caducidade previsto no Código Civil sobrepõe-se ao previsto no n.º 2, do artigo 279.º do CPC, em virtude da ressalva constante do início desta norma”.
                        Salvo o devido respeito, este entendimento esvazia, senão  completamente pelo menos em grande parte, e no que toca à prescrição e à caducidade, os conteúdo e alcance prático da citada norma do artº 279º do CPC.

                        Parecendo-nos muito mais curial a interpretação avançada pela recorrente de que se for dado cumprimento a este prazo mais curto e mais severo de 30 dias previsto na lei adjectiva, não se requer a imputabilidade ao autor da causa da absolvição da instância. Se, pelo contrário assim não for, para beneficiar do prazo mais longo dos 2 meses previsto no CC, tem de estar preenchido o requisito da não imputabilidade ao autor da absolvição da instância.
                        Nas palavras do acórdão do STJ de 7/12/2016, proc. 366/13.2TNLSB.L1.S1 (relator Abrantes Geraldes), disponível em www.dgsi.pt, conforme a regra geral do nº 2 do art. 327º do CC, terminando por decisão de absolvição da instância a acção através da qual se pretende exercitar um direito, o prazo de prescrição não se renova, sendo antes contabilizado a partir da data da sua interrupção em tal acção.

                        Todavia, a gravidade de tal efeito extintivo derivado de razões de ordem adjectiva levou o legislador a prever uma prorrogação do prazo por mais dois meses, nos casos em que a absolvição da instância no período que decorreu desde a interrupção do prazo na acção seja determinada por “motivo processual não imputável ao titular do direito” (nº 3 do art. 327º).

                        Este preceito não coincide com o art. 279º, nº 2, do CPC, nos termos do qual, “sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu citado para ela dentro doe 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância”.

                        Resulta desta norma que, independentemente do motivo que deu causa à absolvição da instância, esta não afecta certos efeitos civis derivados da propositura da acção ou da citação do réu, desde que o autor instaure nova acção no prazo de 30 dias.

                        Diverge tal regime do que consta do art. 327º, nº 3, do CC (e também do art. 331º, nº 1, do CC, a respeito da caducidade), essencialmente em dois pontos:

                        a) Nos casos abarcados pelo art. 279º, nº 2, do CPC, o ónus de interposição da nova acção deve ser exercido no prazo de 30 dias, ao passo que no art. 327º, nº 3, do CC, se prevê um prazo de 2 meses;

                        b) Para efeitos do art. 279º, nº 2, do CPC, a faculdade concedida ao titular do direito não está condicionada pela não imputabilidade da absolvição da instância, ao passo que nos termos do nº 3 do art. 327º do CC a extensão do prazo é condicionada pelo facto de a absolvição da instância, depois de findar o prazo de prescrição, não ser imputável ao titular do direito.

                        Para alguns autores, a ressalva feita no nº 2 do art. 279º do CPC relativamente ao que a lei civil dispõe acerca da prescrição e da caducidade tem como resultado a exclusão de qualquer destas excepções peremptórias do âmbito de aplicação daquela norma. Concretamente, no que concerne à prescrição, assevera-se que o art. 327º, nº 3, do CC, foi introduzido para substituir o regime que resultava da aplicação da regra geral do art. 289º, nº 2, do CPC de 1961, norma que, sem limitação quanto aos efeitos civis, concedia ao autor a faculdade de interpor nova acção num prazo suplementar de 30 dias.

                        Concluindo-se no citado aresto que “Não se torna fácil dirimir a divergência doutrinal, pois nenhuma das teses é imediatamente afastada pela letra do nº 2 do art. 279º do CC, cujo segmento “sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade …” tanto pode significar uma limitação do regime jurídico relativamente a esses específicos efeitos civis, como pode servir para sustentar a concorrência de regimes, com aplicação casuística daquele que se revele mais favorável ao autor. E seria mais favorável ao autor a aplicação do art. 279º, nº 2, do CPC, na medida em que admite que, independentemente da imputabilidade da absolvição da instância, o titular do direito pode interpor nova acção em 30 dias (sublinhado nosso)”.

                        A nosso ver, a orientação de que a letra do nº 2 do art.º 279º do CPC abarca essa concorrência de regimes parece-nos a mais sustentável, sob pena de, repete-se, esvaziar completamente, ou pelo menos em significativa parte, e no que toca à prescrição e à caducidade, de conteúdo e alcance prático esse artigo.

                        Isto na linha do que foi decidido pela secção social do STJ, por acórdão de 24/1/2018, igualmente disponível em www.dgsi.pt, (relator Gonçalves Rocha), onde, inequivocamente, se faz apelo à doutrina de José Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º, Coimbra Editora, páginas 552/553, que, em anotação ao artigo 279º, do CPC, n.º 2, afirma o seguinte:
                        “O n.º 2 do artigo anotado não prejudica estes preceitos da lei civil, aos quais se adiciona, e aplica-se seja ou não imputável ao autor o motivo da absolvição da instância. Proposta nova acção dentro de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão, o efeito impeditivo da caducidade decorrente da propositura da primeira acção mantém-se. Citado o réu dentro do mesmo prazo, ou proposta acção dentro dias 25 dias (30-5) posteriores ao trânsito, o efeito interruptivo da prescrição decorrente da propositura da primeira acção mantém-se também” (sublinhados nossos).

                        E foi também esta orientação acolhida pelo muito bem fundamentado acórdão da Relação do Porto de 22 de Outubro de 2018, disponível em www.dgsi.pt, citado pelo recorrente, onde (ainda que a propósito da caducidade mas com aplicação integral ao regime da prescrição), se escreveu:

                        “A questão crucial a que importa dar resposta nesta decisão é a de saber qual é o alcance da ressalva do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade: acaso significa que relativamente a tais institutos rege em exclusivo o que se dispõe no Código Civil ou, pelo contrário, o regime processual não prejudica o aludido regime civil, sendo aplicada a lei adjetiva sempre que a absolvição da instância na primeira causa decorra de motivo processual imputável ao titular do direito, ainda que num prazo mais curto e sendo aplicada a lei civil quando a absolvição da instância se deva a motivo não imputável ao titular do direito?

                        Que dizer?

                        A jurisprudência e a doutrina que sobre esta problemática se debruçaram acham-se divididas.

                        No sentido de que relativamente à prescrição e à caducidade é inaplicável do disposto no nº 2, do artigo 279º do Código de Processo Civil ou o seu antecedente 289º, nº 2, do anterior Código de Processo Civil, havendo lugar à aplicação exclusiva dos artigos 327º, nº 3 e 332º, nº 1, ambos do Código Civil, pronuncia-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de fevereiro de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego, no processo nº 566/09.0TBBJA.E1.S1, acessível nas bases de dados da DGSI, acórdão secundado pelo proferido no mesmo Supremo Tribunal de Justiça em 16 de junho de 2015, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Hélder Roque no processo nº 1010/06.0TBLMG.P1.S1, também acessível nas mesmas bases de dados.

                        Esta posição jurisprudencial, afirmada dominante naquele Supremo Tribunal pelos referidos Conselheiros relatores, é secundada doutrinalmente no Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Portuguesa, 2014, página 777. Também no Código Civil Anotado de Pires de Lima e Antunes Varela, com a colaboração de M. Henrique Mesquita, Volume I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, página 297, se refere que a “doutrina do nº 3 do artigo 327, mandada aplicar pelo nº 1 deste artigo 332º, substitui a do artigo 289º, nº 2, do Código de Processo Civil de 1961, na redacção que este tinha antes do Decreto-Lei nº 47 690, de 11 de Maio de 1967.” Na mesma orientação, em anotação ao artigo 289º do Código de Processo Civil de 1961, com as alterações introduzidas pelo decreto-lei nº 47690, de 11 de maio de 1967, navegam Ary de Almeida Elias da Costa, Fernando Carlos Ramalho da Silva Costa e João A. Gomes Figueiredo de Sousa[4], quando referem que “[q]uanto à caducidade e à prescrição, há que atender ao que a lei civil estipula a tal respeito, que prevalece; quanto aos outros possíveis efeitos, regula o disposto no n.º 2 deste artigo.” Finalmente, o Sr. Professor Artur Anselmo de Castro[5] escreve que para “os efeitos civis da prescrição e caducidade passaram a reger os arts. 327.º e 332.º do Cód. Civ. – art. 327.º, n.º 3 - «Se por motivo processual não imputável ao titular do direito o réu for absolvido da instância, ou o compromisso arbitral ficar sem efeito e o prazo de prescrição tiver, entretanto, terminado, ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão, não se considera completa a a prescrição antes de findarem estes dois meses – art. 332.º; - e quanto à caducidade, se ela se referir ao direito de propor uma acção em juízo e esta tiver sido tempestivamente proposta, é-lhe igualmente aplicável a regra anterior do art. 327.º, mas se o prazo fixado à caducidade por inferior a dois meses é substituído por ele o designado nesse preceito.»”

                        No sentido da coordenação do regime processual com o regime substantivo em matéria de caducidade pronuncia-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de dezembro de 1995, relatado pelo então Juiz Desembargador Ribeiro Coelho, na apelação nº 870/6/95[6].

                        Na doutrina, no sentido da coordenação da lei adjetiva com a lei substantiva, pronunciam-se os Professores Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[7].

                        A letra da lei processual, na parte em que ressalva o regime previsto na lei civil para a prescrição e a caducidade é compatível com qualquer das interpretações que antes se enunciaram.

                        Em termos de elemento histórico, resulta dos trabalhos preparatórios do atual Código Civil, que o Sr. Professor Vaz Serra era favorável à manutenção do princípio do então nº 2, do artigo 294º do Código de Processo Civil, correspondente ao atual nº 2, do artigo 279º do vigente Código de Processo Civil, no que respeita ao impedimento da caducidade, apenas quando a absolvição da instância não fosse imputável ao autor[8]. Em conformidade com tal entendimento era proposto um artigo 32º[9] com um alcance normativo similar ao atual nº 1, do artigo 332º do Código Civil, mas com um prazo de trinta dias. Neste contexto, afigura-se patente o intento de substituição do regime jurídico que emergia do Código de Processo Civil para a prescrição e a caducidade quando ocorresse a absolvição do réu da instância por um regime autónomo a constar do Código Civil.

                        Do ponto de vista das consequências das aludidas interpretações resulta claro que a orientação que confere natureza especial aos preceitos relativos à prescrição e caducidade, quando ocorra absolvição da instância numa primeira causa, leva a que consequências civis mais gravosas – a perda do direito seja por via da caducidade, quando de conhecimento oficioso, seja por via da prescrição, neste último caso se invocada –, tenham um regime jurídico mais severo relativamente a outros efeitos civis menos gravosos que, embora sujeitos a um prazo mais curto, prescindem do requisito da inimputabilidade ao autor da causa de absolvição da instância.
Assim, não obstante o elemento histórico que conforta a interpretação dominante, tendo em conta a incongruência da tutela mais forte ou, pelo menos, com menor exigência conferida nessa leitura a situações menos gravosas para os beneficiários desse regime e, como curialmente se vincava no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de dezembro de 1995[12], atendendo aos novos ventos do processo civil de prevalência da substância sobre a forma, o lugar em certa medida paralelo do artigo 261º do Código de Processo Civil, ainda em tempos não muito distantes sujeito a um alargamento do âmbito objetivo de aplicação[13] e a prevalência que deve ser dada a argumentos teleológicos relativamente a argumentos históricos, afigura-se-nos mais correta a interpretação que permite que mesmo no caso de caducidade possa operar o regime do artigo 279º, nº 2, do Código de Processo Civil.

                        Deste modo, na nossa perspetiva, não merece qualquer censura a decisão recorrida no que a esta questão diz respeito já que a ação de que estes autos foram extraídos foi intentada antes de decorridos trinta dias sobre o trânsito em julgado da decisão de absolvição de instância”.

                         Passando esta orientação para o caso dos autos, é manifesto que não decorreram os 30 dias a que se refere o citado nº 2 do artº 279º do CPC, já que a decisão de absolvição da instância na acção anterior transitou em julgado em 22 de Março de 2021- facto 9, e a presente acção deu entrada nesse mesmo dia- facto 11.

                        Daí que não se possa manter a decisão recorrida, ficando, por outro lado, prejudicada a restante argumentação aduzida pelo recorrente.

                                                           x

            Decisão:

            Termos em que, na revogação da decisão impugnada, se acorda em julgar a apelação procedente, com a improcedência da excepção de prescrição invocada pela Ré, e se decide ordenar o prosseguimento dos autos.

            Custas pela apelada.

                                                           Coimbra, 14/01/2022

                        (…)