Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | PAULA MARIA ROBERTO | ||
Descritores: | PRINCÍPIO DA IGUALDADE SALARIAL FATORES DE DISCRIMINAÇÃO FUNDAMENTO MATERIAL ÓNUS DA PROVA | ||
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Data do Acordão: | 03/10/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DO TRABALHO DE CALDAS DA RAINHA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA | ||
Texto Integral: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 23.º, N.º 1, AL.ª C), 24, 25.º, N.º 1, E 270.º DO CÓDIGO DO TRABALHO, 342.º, N.ºS 1 E 2, DO CÓDIGO CIVIL E 59.º, N.º 1, AL.ª A), DA CONSTITUIÇÃO | ||
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Sumário: | I – Quando for alegada a violação do princípio do trabalho igual salário igual, sem que tenham sido invocados quaisquer factos suscetíveis de serem inseridos nas categorias do que se pode considerar fatores de discriminação, cabe a quem invocar o direito fazer a prova, nos termos do art.º 342.º, n.º 1 do CC, dos factos constitutivos do direito alegado.
II – O que o mencionado princípio proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjetivas aceitando-se, todavia, múltiplos fatores de diferenciação remuneratória desde que essas diferenças assentem em critérios objetivos, encontrando-se materialmente fundadas. III – Comprovada a discriminação invocada pela autora, cabia à Ré justificar (artigo 342.º n.º 2 C.C.) que o tratamento desvantajoso conferido àquela não é irrazoável, arbitrário e discriminatório. IV – Se a Autora logrou demonstrar, como lhe competia, que exerce funções idênticas à de outra trabalhadora, em natureza, qualidade e quantidade e inexistindo, face à matéria de facto provada, fundamento razoável, compreensível e equitativo que justifique a apurada diferenciação salarial, impõe-se concluir que a Ré violou o princípio constitucional de que para trabalho igual salário igual. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 229/21.8T8CLD.C1 Acordam[1] na Secção Social (6.ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:
I - Relatório
AA, residente em ...
intentou a presente ação de processo comum, contra
E..., SA, com sede em ... alegando, em síntese que: Foi admitida pela I..., Ldª, posteriormente a ora Ré, para desempenhar as funções de “controladora 2.ª”; no IRCT aplicável não existe a categoria profissional de “controladora”; na comparação com outras colegas que desempenham as mesmas funções de operadora de controlo de qualidade, a A. encontra-se remunerada muito abaixo do que deveria ser pois era remunerada como preparadora de peixe, não existindo nenhuma diferença no trabalho desenvolvido por uma controladora de 1.ª ou de 2.ª, sendo que a A. realizava as mesmas funções que as colegas classificadas pela Ré como de 1.ª, destinadas a confirmar a qualidade do produto que lhes passa pelas mãos e não a preparar as conservas de peixe; o trabalho desenvolvido pela A. e demais colegas “controladoras” é de igual natureza, qualidade e quantidade; inexiste qualquer fundamento de facto e de direito para o tratamento diferenciado e discriminatório da A. por parte da Ré e que viola o princípio constitucional “para trabalho igual salário igual”; a Ré deve-lhe as respetivas diferenças salariais. Termina pedindo que: “Nestes termos e nos mais de direito que V.ª Ex.ª doutamente suprirá deve a presente acção ser julgada provada e procedente e consequentemente: a) Reconhecer-se, declarar-se e a R. ser condenada nesse mesmo reconhecimento de que a A. desempenha as mesmas funções desempenhadas por todas as restantes colegas que laboram como „Controladoras“, quer sejam de „1.ª“quer sejam de „2.ª“ na secção de controle da qualidade entre elas as mencionadas BB, CC e DD; b) A reconhecer-se que, em consequência, a R. deve remunerar a A. de acordo com as funções efectivamente desempenhadas e de acordo e de forma igual com o que é pago às restantes colegas de trabalho que com ela laboram, nomeadamente, à referida BB, CC e DD por aplicação dos principios constitucionais e legais aplicáveis e concretamente os principios „trabalho igual salário igual“ e da não discriminação; c) A reconhecer-se que a R. é devedora à A. dos valores referentes às diferenças salariais, desde Maio 2001 até Março 2017, as quais se calculam em € 22.753,14, conforme melhor supra discriminadas e bem assim daqueles que se vierem a apurar devidos desde Abril de 2017 até ao presente a apurar em liquidação de sentença; d) Condenar-se a R. a pagar à A. a referida quantia de €22.753,14, a título de diferenças salariais, acrescida da que se vier a apurar devida desde Abril de 2017 até ao presente em liquidação de sentença, e bem assim dos respectivos juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento de cada uma das importâncias peticionadas; e) Condenar-se a R. a actualizar o salário mensal base auferido pela A. para o valor auferido pela colega BB.” * A Ré contestou alegando, em sinopse, que: Existe o departamento “garantia da qualidade” onde se inserem as trabalhadoras com mais experiência e o “controlo de qualidade” dentro do qual se insere a A., com a categoria de preparadora de conservas de peixe ou controladora de 2ª, e mais 19 trabalhadoras com o mesmo vencimento; as trabalhadoras DD e CC têm uma antiguidade muito superior à da A., tinham a responsabilidade por um setor específico e garantiam a formação das colegas de linha e a trabalhadora BB tem ainda uma habilitação profissional superior; desde 01/04/2029 a A. ascendeu a controladora de 1.ª, passando a auferir o mesmo que as colegas a quem se compara e a diferenciação entre as trabalhadoras é fundamentada, assentando em critérios objetivos que a legitimam. Termina dizendo que: <<Nestes termos e nos melhores de direito do sempre mui douto suprimento de V. Exa., deve a presente: - Excepção ser julgada procedente por provada e a R. absolvida do pedido inerente aos juros de mora - Impugnação ser julgada procedente por provada, sendo a Ré absolvida dos pedidos.” * Foi proferido o despacho saneador de fls. 329 e não foram enunciados os temas da prova. * Procedeu-se a julgamento conforme resulta da respetiva ata. * Foi, depois, proferida sentença (fls. 497 e segs.) e cujo dispositivo tem o seguinte teor: “Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente acção, bem como improcedente a excepção de prescrição invocada pela R. e, em consequência: a) Condeno a R., “E..., S.A”, a reconhecer a A., AA, na categoria profissional de controladora de 1.ª, desde Maio de 2001; b) Condeno a R. a pagar à A. a retribuição base mensal correspondente à auferida por BB que, no período entre Maio de 2001 e Março de 2017, é a constante do número 9 dos factos provados, e, a partir daí, a que se vier a apurar em liquidação de sentença; c) Condeno a R. a pagar à A. a quantia, cuja quantificação exacta se relega para execução de sentença, correspondente à diferença entre o montante da retribuição base mensal que a A. auferiu e aquele que deveria ter auferido por consideração ao montante igual ao da retribuição base mensal de BB, sem nunca exceder o montante de € 22.753,14 (vinte e dois mil, setecentos e cinquenta e três Euros e catorze cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4%, desde a data de vencimento de cada remuneração até efectivo e integral pagamento.” * A Ré, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: “1. Vem o presente recurso interposto da Sentença que antecede, incidindo tanto sobre a apreciação de facto quanto sobre o julgamento de Direito. NULIDADE (subsidiariamente, erros de julgamento decorrentes da construção) DA SENTENÇA 2. A Sentença apelada enferma de nulidade, na medida em que: 2.1. … se mostra obscura no que tange à al. a) do dispositivo, condenando num reconhecimento (redação “esdrúxula”, como já adjetivou o STJ),sem que se delimite o alcance desta alínea[cfr. 615.º, n.º 1, c), in fine, CPC]; 2.2. … condenou a Ré nos termos constantes da al. a) do dispositivo sem que a Autora tenha, de todo, peticionado a sua reclassificação profissional [artigo 615.º, n.º 1, d), in fine CPC]; 2.3. … a condenação constante da al. a) encontra-se em contradição lógica e insanável com § E) do catálogo de factos não provados [artigo 615.º, n.º 1, al. c), in limine, CPC]; 2.4. … condenou a Ré no pagamento, por conta dos anos de 2008 e 2009, de quantia superior à peticionada pela Autora [artigo 615.º, n.º 1, e), in limine, CPC]; 2.5. … por omitir fundamentação (desde logo, de facto) que habilite a condenação da Apelante no pagamento de diferenças salariais a partir de março de 2017, posto que, a partir de tal referente temporal, nada se assentou que permita concluir pela divergência salarial entre a Autora e a Senhora D. BB [artigo 615.º, n.º 1, b), CPC]. IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO 3. Impugnam-se os factos provados sob os números 6 e 10: 3.1. O ponto n.º 6 deve ser dado como não provado, na medida em que se encontra em oposição como facto provado n.º 11(que aponta para a presença em linha de produção); ademais, o facto assente n.º 4 não inclui (somente) tarefas (aludindo a objetivos gerais da área de qualidade e missões acessórias) e respeita ao descritivo interno da categoria (atente-se na parte inicial do ponto em apreço), do que resulta insustentável a remissão para este facto. 3.2. Ademais, o facto provado n.º 6 resulta infirmado pelo depoimento de parte ([00:03:43] a [00:03:55]; [00:05:58] a [00:07:54]) e pelos testemunhos de EE ([00:10:16] - [00:10:29]; [00:22:41] - [00:23:16]; [00:23:54] - [00:24:13] e [00:29:31]), FF ([00:16:06] - [00:16:22]; [00:16:25] - [00:16:49]), GG ([00:12:22] - [00:12:52]; [00:13:15] - [00:13:27]), HH ([00:05:48] - [00:06:00]; [00:13:20]; [00:15:30] - [00:15:37]; [00:19:18] - [00:20:19] e [00:23:17] - [00:24:05]), BB ([00:05:52] - [00:06:45]; [00:07:46] - [00:07:52]). 3.3. A generalização e equiparação das funções exercidas pelas trabalhadoras nomeadas, inerentes à formulação do facto provado n.º 6, não encontra respaldo na prova produzida nos autos, mormente a testemunhal acima discriminada. 3.4. Já quanto ao facto provado n.º 10, o mesmo resulta infirmado pelo teor do facto assente n.º 12 e Docs. n.os 2 a 4 juntos com a contestação (de resto, adiante irá requerer-se aditamento relativo à evolução categorial de BB, que igualmente contradiz a redação adotada no Tribunal recorrido). Este ponto deve ser dado como não provado. 4. Impugna-se a decisão de dar como não provados os factos constantes das alíneas C), E), F), G), H), J), K) e L) da factualidade não assente. 4.1. O facto declarado não provado sob a al. C) deve ser transposto para o rol probatório, sob a formulação: “A A. esteve inserida na área de controlo de produto acabado/ semiacabado, onde se inclui o Recheck”. Cfr. depoimentos de HH ([00:05:31]) e BB ([00:16:36] - [00:16:57]). 4.2. O facto declarado não provado sob a al. E), deve ser incluído no elenco de factos provados, consignando-se: - Em 2001 existiam três níveis da categoria de controladora: controladora de 2.ª, 1.ª e principal; - Em 2019 passaram a existir três níveis: controladora de 3.ª, 2.ª e 1.ª, extinguindo-se a categoria controladora principal – cfr. depoimentos de EE ([00:12:57]- [00:13:09]) e, sobretudo, de II ([00:20:35] - [00:21:56] e [00:29:28] - [00:30:00]). 4.3. O facto não provado inserto sob a al. F) deve ser incluído no elenco de factos assentes em virtude da ampla corroboração resultante dos depoimentos de EE ([00:10:16] - [00:10:22] e [00:26:10] - [00:27:26]); HH ([00:08:45]; [00:11:59] - [00:12:35]), JJ ([00:06:05]; [00:10:08] - [00:12:01]; [00:17:15] - [00:17:33]), II ([00:12:59] e [00:25:27] - [00:25:46]) e BB ([00:09:23] - [00:12:00]). 4.4. O facto não provado inserto sob a al. G) deve ser incluído no acervo de factos assentes, retificando o ano da admissão, passando a figurar: CC foi admitida em 1987 (cfr. Doc. n.º 3 junto à contestação). 4.5. O facto incluso na al. H) deve ser transposto para o rol de factos assentes, sob a redação: CC tinha a responsabilidade da qualidade na linha de sardinha inteiros – cfr. testemunhos de HH ([00:08:45]; [00:09:48] - [00:00:53] e [00:11:20] - [00:11:58]) e JJ ([00:06:37]- [00:07:45]; [00:13:09]- [00:13:14]) e BB ([00:12:13]- [00:12:50]). 4.6. O facto não provado sob a al. J) deve ser transferido para o elenco de matéria assente, uma vez que foi atestado pelo depoimento de parte ([00:09:16] - [00:10:36]) e pelas testemunhas FF ([00:22:39] - [00:23:32]), HH ([00:06:02] - [00:07:18]; [00:08:45] - [00:09:47]; [00:35:44] - [00:36:38]), II ([00:08:36]; [00:09:12]); [00:13:13] - [00:14:41]; [00:26:47] - [00:27:36] e [00:27:39] - [00:28:10]) e BB ([00:03:47] - [00:05:22] e [00:20:51] - [00:20:55]). De resto, o Tribunal a quo entendeu que este facto se comprovou, expurgando-o do elenco de factos provados por uma questão de “desqualificação” do tipo de formação ministrada que se não acompanha, por irrelevante na economia dos autos (afirmando que agora – ou seja, ultimamente e não antes – a Apelada também assegura formação). 4.7. O facto declarado não provado sob a al. K) deve igualmente ser dado como assente (sem prejuízo de dever ser operado o arredondamento da cifra aí inscrita), sob a formulação: “A A. apresentou um nível de absentismo anual de 20%” – cfr. depoimento de II ([00:16:44]). 4.8. O facto declarado não provado sob a al. L) deve igualmente ser dado como assente (sem prejuízo de dever ser operado o arredondamento do intervalo aí referido), sob a formulação: “As colegas da A. com quem se compara apresentaram uma média anual de absentismo de 10% no mesmo período” – cfr. depoimento de II ([00:16:44]). 5. Requer-se o aditamento dos seguintes factos (em itálico) ao acervo probatório: 5.1. Em 2001, a Ré tinha uma estrutura bipartida que se dividia em Produção e Qualidade (cfr. artigo 7.º da contestação; depoimento de HH: [00:03:41] - [00:03:46]); 5.2. Com a evolução da empresa, o departamento de Qualidade foi dividido, destacando-se a Garantia da Qualidade (cfr. artigos 9.º e 10.º da contestação, depoimento de parte: [00:02:13] - [00:03:20]; [00:11:27]; [00:12:45] - [00:17:30]) e depoimentos de FF: [00:14:50] - [00:15:34]; [00:14:30] - [00:14:51]; [00:16:24]; [00:17:25] - [00:18:42] e JJ: [00:02:43] - [00:04:55]); 5.3. O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável à Ré é o contrato coletivo celebrado entre a ANICP e a FESATH (acordo das partes e p. 14 da sentença); 5.4. A convenção coletiva aplicável à Ré não prevê a categoria profissional de controlador de qualidade (cfr. artigos 19.º e 30.º da contestação; depoimentos de II: [00:02:05] - [00:02:53] e FF: [00:12:50] - [00:13:20]). 5.5. O descritivo funcional da categoria de «controlador» foi preparado, discutido e divulgado com a colaboração dos trabalhadores da área da qualidade (cfr. artigo 62.º da contestação e depoimentos de II: [00:02:05] - [00:02:55]; [00:03:35] - [00:05:40] e FF: [00:12:50] - [00:13:20]). 5.6. As controladoras estão afetas a determinadas linhas, sem prejuízo de, em caso de ausência, poderem ser substituídas por outras que estejam preparadas e capacitadas para o efeito (artigos 41.º, 42.º e 46.º da contestação; depoimentos de EE: [00:22:31]-[00:22:34];HH: [00:27:45] - [00:28:30] e BB: [00:07:52]). 5.7. DD era experimentada e conhecedora no domínio da cravação (cfr. artigos 35.º, 41.º e 61.º da contestação e testemunhos de HH: [00:08:45] e [00:11:59] - [00:13:19], II: [00:30:00]); 5.8. CC era responsável pelo controlo de limpeza da fábrica (cfr. artigo 41º da contestação; depoimentos de GG: [00:12:38] e [00:13:27] e BB: [00:12:21]); 5.9. À linha da sardinha inteiros estiveram afetas CC e BB (onde permanece) – cfr. artigos 36.º, 41.º, 43.º e 61.º da contestação; depoimentos de HH: [00:08:45], [00:09:48] - [00:00:53] e [00:08:45]- [00:10:16] e BB: [00:09:03] e [00:14:09]; 5.10. A Autora está alocada à linha da cavala sem pele (cfr. artigos 33.º,42.º e 46.º da contestação; depoimento de JJ: [00:07:52] e BB: [00:14:09]). 5.11. A linha da sardinha inteiros é a mais exigente das linhas da fábrica, uma vez que exige mais controlos e mais específicos, recebe vários lotes de matéria-prima e peixes de vários formatos e produz vários produtos (cfr. artigos 41.º e 46.º da contestação; depoimentos de HH: [00:08:45]; [00:10:16] - [00:10:39] e BB: [00:09:03]); 5.12. A linha da cavala sem pele, sendo de monoproduto, é a mais simples, tendo controlos menos específicos e menos exigentes (artigos 33.º, 42.º e 46.º da contestação e depoimentos de HH: [00:10:39] e JJ: [00:07:52] - [00:07:58]; [00:13:15] - [00:13:21]); 5.13. A produção da linha da sardinha inteiros é superior às demais (cfr. 41.º e 46.º da contestação e depoimento de HH: [00:10:39]); 5.14. BB deu formação à Autora quando esta, provindo do recheck em armazém, retornou ao controlo em linha, informando-a de novos equipamentos existentes e seu modo de funcionamento (cfr. artigos 39.º, 41.º e 43.º da contestação e depoimentos de HH: [00:08:45] e JJ: [00:25:32]; [00:14:02]- [00:14:33] e BB: [00:14:02] - [00:17:35]); 5.15. CC concluiu o curso profissional de Técnicas de Controlo de Qualidade, junto do Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica (cfr. Doc. n.º 3 anexo à contestação); 5.16. BB ascendeu à categoria de controladora de 2.ª em 1 de julho de 1999 (cfr. Doc. n.º 4 junto à contestação). 5.17. A Autora faltou injustificadamente nas seguintes datas: 10/09/2001, 27/09/2001,29/11/2001, 5/01/2002, 31/01/2002, 19/02/2002, 24/04/2002, 13/05/2002, 23/05/2002, 18/10/2002, 08/05/2003, 07/04/2004, 30/11/2004, 28/03/2005, 17/06/2005, 14/03/2006, 21/03/2006, 20/06/2006, 22/06/2006, 13/07/2006, 19/07/2006, 13/09/2006, 02/01/2007, 07/02/2007, 21/03/2007, 29/03/2007, 02/04/2007, 02/12/2009, 23/12/2009, 10/02/2010, 12/02/2010, 19/03/2010, 05/01/2012, 14/03/2012, 12/04/2012, 31/05/2012, 11/06/2012, 24/01/2013,01/03/2013, 06/03/2013, 05/04/2016, 22/04/2016, 13/06/2016, 15/06/2016, 07/11/2016, 22/11/2016, 13/12/2016, 30/10/2017, 02/11/2017, 15/12/2017, 24/01/2019, 25/03/2019 e 16/07/2019 (cfr. Doc. n.º 6 ex vi artigo 50.º da contestação). 5.18. O nível de absentismo da Autora é superior ao registado pelas outras controladoras da fábrica (v. artigos 48.º a 51.º da contestação e depoimentos de HH: [00:15:39] - [00:15:51]; [00:34:39] e [00:38:40] - [00:38:48], JJ: [00:08:07] - [00:08:49] e II: [00:15:36] - [00:17:41]). IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE DIREITO 6. O princípio da paridade retributiva aplica-se, nos casos em que o trabalho prestado seja qualificado como igual, nos termos consignados repetidamente nos artigos 59.º, n.º 1, a), CRP e 23.º, n.º 1, al. c) e 270.º, CT. 7. A igualdade do trabalho prestado desdobra-se em três dimensões cumulativas: (i) natureza, (ii) quantidade e (iii) qualidade. 7.1. Na aferição da natureza do trabalho, aprecia-se: dificuldade, penosidade e perigosidade – para o efeito, o Tribunal não pode prescindir da aquisição, concreta e pormenorizada, das tarefas, atividades, rotinas e procedimentos realizados pelo trabalhador reivindicante e, bem assim, do(s) colega(s) com o(s) qual(is) se pretende comparar (sem tal descrição detalhada e factual o Tribunal não poderá qualificar a natureza do que a empresa exige ao postulante e ao colega). 7.2. Já a quantidade sopesa intensidade e duração - logo, afigura-se essencial a indicação prévia dos horários observados, da assiduidade, da eventual sujeição a trabalho por turnos/ noturno e do volume de trabalho a cargo do impetrante. 7.3. A qualidade, por sua vez, refere-se a conhecimentos, experiência, grau de especialização, prática, competência e capacidade – neste conspecto releva a assunção de responsabilidades (departamentais, hierárquicas ou alocação de determinados controlos ou registos). 7.4. Todas as dimensões supra, uma vez avaliadas conjuntamente, permitem inferir da presença (ou não) de trabalho igual, merecedor de igual medida retributiva. 7.5. A falência de (tão-somente) uma destas vertentes impede irremediavelmente a conclusão de que o trabalho efetuado é equivalente. 7.6. O ónus da prova incidente sobre as dimensões em referência pertence ao trabalhador que invoca o prejuízo patrimonial, uma vez que estamos ante elementos constitutivos do direito reclamado (cfr. artigo 342.º, n.º 1, CC). 7.7. A «tripla identidade» deve verificar-se ao longo de todo o hiato temporal a que se refere a pretensão pecuniária do autor. 7.8. Sendo de aditar que o peticionário deve, igual e evidentemente, demonstrar haver divergência salarial entre si e o(s) colega(s) com quem se compara. 8. Identidade ou semelhança de categoria não traduz necessariamente «trabalho igual». 8.1. Identidade de funções tampouco inculca impreterivelmente a existência de «trabalho igual». 8.2. Na expressão jurisprudencial já consagrada, “Nada na lei obriga as entidades patronais a remunerar os seus trabalhadores que tenham uma mesma categoria profissional, com salário igual para todos”. 8.3. Seja como for, no caso, a Autora sequer veio disputar a sua classificação profissional. 9. Verificando-se a aludida «tripla identidade», mister é que, cumulativamente, inexistam ou não se divisem fatores objetivos (não discriminatórios) aptos a justificar a diferenciação salarial. 9.1. “Não cabe aos tribunais sindicar os critérios e a amplitude da diferenciação levada a cabo pela entidade empregadora” (v. acs. STJ 16.3.2005 e 27.1.2005). 9.2. Sendo que “(…) só [existe] violação do princípio [“trabalho igual, salário igual”] quando a diferenciação salarial assente em critérios apenas subjetivos” (cfr. ac. STJ 12.10.2011). 9.3. A antiguidade, as habilitações literárias e profissionais e o absentismo são vetores passíveis de fundear diferenciação salarial para trabalho aparentemente similar. 10. Considerando que a Autora, ora Recorrida, não alicerça a alegada diferenciação remuneratória numa «categoria suspeita» a que aludem os artigos 13.º CRP e 24.º, n.º 1, CT, aquela não beneficia da presunção encerrada no 25.º, n.º 5, CT. 10.1. Por conseguinte, os ónus de alegação e prova impendentes sobre a Autora são os mais amplos, abrangendo a caracterização plena (natureza, quantidade e qualidade) do trabalho que desenvolve por confronto com o levado a efeito pelas colegas nomeadas (que deve, de igual modo, carrear para os autos) e, outrossim, afastando a existência de fatores objetivos suscetíveis de legitimar a diferenciação salarial. 10.2. Neste sentido, v. acs. RL 2.11.2016 e de 23.01.2013, RG 7.12.2017 e RE 16.1.2020. 11. Rebaixando ao caso sujeito, constata-se que, independentemente da impugnação fáctica supra (da qual se não abdica), somente quedou provados nos autos a seguinte materialidade: . Admissão e categoria da Autora e vicissitudes subjetivas da entidade empregadora: factos provados números 1 a 3 e 17; . Descritivo funcional da categoria de controlador: factos provados 4 e 6; . Objetivos na consagração da categoria interna de controlador; missão atribuída na empresa à área de qualidade: factos provados 7, 8 e 11; . Evolução salarial da Autora entre maio de 2001 e julho de 2019: facto provado 5; . Evolução salarial de BB entre maio de 2001 e março de 2017: facto provado 9; . Admissão e categorias profissionais de BB e de outras colegas da Autora: factos provados 10, 12 a 14 e 18; . Habilitações académicas da Autora: facto provado 16; . Habilitações académicas e profissionais de BB: facto provado 15. 12. Assim, impõe-se a conclusão de que a Autora não acatou o ónus da prova que lhe competia, já que somente se adquiriu o complexo funcional inerente à categoria de controlador e nada mais carreou no tangente à natureza, quantidade e qualidade do trabalho realizado (por si e pelas suas colegas com as quais aduziu comparar-se). 12.1. De resto, a alegação da Autora contida na petição inicial neste conspecto é inexistente, limitando-se, de forma conclusiva e não detalhada e circunstanciada, a afirmar a pretensa igualdade do trabalho desenvolvido. Tal é incipiente para estribar a procedência desta ação, como decidido, v.g., nos acs. RL 13.04.1994, 19.3.2003 e 22.9.2004. Cfr., ainda, artigo 5.º, n.º 1, CPC. 13. Pelo exposto, a presente ação não pode merecer desfecho distinto do deferido aos casos apreciados nos acs. STJ 12.10.2011 e 14.12.2016 e TC n.º 131/2018. 14. Atente-se que, em todo o caso, a Autora não demonstrou haver sequer divergência salarial entre si, de um lado, e as colegas DD e CC, de outro – sendo que a mesma não se estabilizou com referência a BB a partir de março de 2017. 15. Independentemente do exposto e ainda que se conclua pela identidade do trabalho realizado pela Apelada e o desenvolvido pelas colegas nomeadas (sem prescindir), sempre se imporá valorar que constam dos autos fatores materiais, objetivos e relevantes, legitimadores da diferenciação remuneratória (distintas antiguidades e habilitações). 15.1. Tanto bastará para ditar a improcedência da presente ação e a absolvição da Recorrente do petitório contra si deduzido. 15.2. A procedência da impugnação de facto reforçará este juízo, dado que denota as distintas responsabilidades, assiduidade e tarefas que as trabalhadoras sub judice desenvolveram na organização da Apelante. 16. Por mera cautela, argua-se, subsidiariamente, que, mesmo que se entenda ter existido violação do princípio de paridade retributiva (mantendo a condenação de 1.º grau, sem conceder), a liquidação do dispositivo não deverá desatender ao absentismo injustificado ou justificado com perda de retribuição em que a Autora incorreu – o que se requer seja, em todo o caso, ressalvado. NORMAS JURÍDICAS VIOLADAS 17. Ao julgar a ação procedente, nos termos em que o fez, o Juízo a quo incorreu na violação do disposto nos artigos 23.º, n.º 1, al. c), 24.º, n.º 1 e 2, al. c) e 270.º CT; 342.º, n.º 1, CC e 5.º, 9.º-A e 608.º, n.º 2, CPC. Termos em que deve ser dado integral provimento à apelação, revogando-se a Sentença recorrida e absolvendo-se a Ré de todos os pedidos contra si formulados pela Autora. Assim se fará Justiça.” * A Autora apresentou resposta e interpôs recurso subordinado concluindo que: “I - DA ALTERAÇÃO Á MATÉRIA DE FACTO Face à prova produzida, impõe-se a alteração da matéria de facto nos seguintes termos: i. Retirar dos factos não provados a alínea e), e inseri-la nos factos provados. ii. Dar como provado o seguinte facto: “O trabalho desenvolvidoporumacontroladorade1.ª oude2.ª não tinha qualquer diferença e era igual”. iii. Dar como provado o seguinte facto “O trabalho desenvolvido pela A. e pelas demais colegas, designadamente as colegas BB, DD, CC era semelhante e de igual natureza, quantidade e qualidade e as funções desempenhadas pela A. e por essas suas colegas, designadamente as identificadas era equivalente/semelhante no que ao esforço físico e psíquico, qualificações, responsabilidade e experiência diz respeito”. II – DO RECURSO DA RÉ I. A sentença recorrida não padece de qualquer nulidade, mormente por obscuridade, por excesso de pronúncia, por contradição entre os fundamentos e o decisório, por condenação em quantia superior ou por ausência de fundamentação. II. Não deve ser alterada a matéria de facto provada nos termos requerido pela recorrente em relação aos pontos iv. a xviii ou eliminados os factos provados sob os números 6 e 10. III. Como bem apreendeu o tribunal a quo, e por isso concluiu pela condenação da R., a atuação desta, tal qual vinha alegado na PI, viola o princípio da igualdade consagrado no art.º 13.º da CRP e bem assim o princípio trabalho igual salário igual ínsito no art.º 59.º n.º 1 al. a) da lei fundamental, e, ainda os princípios e normas que proíbem a discriminação, designadamente a salarial, conforme previsão legal do art.º 25.º n.º 1 e 28.º do CT. IV. Com efeito, dos factos provados – e a A. fez prova dos factos materiais de discriminação e violação dos preceitos legais e constitucionais – extrai-se uma injustificada violação destes princípios e normas legais. V. Note-se ainda que, nesta matéria - violação do princípio da igualdade consagrado no art.º 13.º da CRP e bem assim o princípio trabalho igual salário igual ínsito no art.º 59.º n.º 1 al. a) da lei fundamental, e, ainda os princípios e normas que proíbem a discriminação, designadamente a salarial, conforme previsão legal do art.º 25.º n.º 1 e 28.º do CT – era a R. quem tinha o ónus probatório, era pois a R. quem tinha de provar a não existência de discriminação e violação da constituição e da lei. O que não logrou alcançar. VI. Em síntese, da análise ao depoimento de parte do legal representante da R. e aos depoimentos das testemunhas podemos sem dúvida e inequivocamente dar por assente que o trabalho desenvolvido pela A. recorrida era igual pelo menos ao da trabalhadora/colega BB, como bem conclui o tribunal a quo. Era igual em termos de natureza, quantidade e qualidade. Não existia, portanto, nenhum fundamento de facto ou de direito que permitisse à R. distinguir in pejus a A., discriminando-a e violando dessa forma o principio constitucional e legal basilar trabalho igual salário igual. VII. Ao invés a R. não fez prova de qualquer fundamento de facto ou direito que permitisse fundamentar, nos termos legais, a discriminação salarial da A. em relação à colega BB p. ex. Exemplo disso é também por exemplo a alegação de menor assiduidade da A. em comparação com as demais colegas em causa. Ora, compulsados os autos, a este propósito, verificamos que não foi junta qualquer prova documental da assiduidade das colegas da A. A R. apenas junta a assiduidade da A. Assim sendo, nunca poderá ser dado como provado que a A. era menos assídua que as colegas em causa. Trata-se de um facto conclusivo que carecia podia e deveria ter sido provado documentalmente e nunca testemunhalmente. Afinal trata-se de um facto objetivo e preciso com suporte fáctico-probatório documental. Não pode aqui valer a mera opinião/recordação testemunhal. Estão em causa datas precisas, concretas, havendo ainda aqui que se destrinçar p. ex. entre os vários tipos de falta/ausência, consoante os motivos/justificações pois não são todos iguais nem podem ser todos valorados da mesma forma ou equiparados. VIII. Ao nível da diferenciação entre a A. e a colega BB a diferente antiguidade/data de admissão e habilitações literárias/escolares, não permitem, no quadro de gestão e prestação de trabalho da R., fundamentar uma diferenciação remuneratória entre a A. e a colega BB, pois não relevam para a concreta e efetiva prestação de trabalho (em termos de quantidade e qualidade), isto é, não são diferenciadores, e, portanto, não permitem uma discriminação salarial da A. face à colega em causa. Na verdade, a maior antiguidade da BB de per si não produziu nenhum efeito – nada resulta alegado ou provado de facto a este propósito –na esfera produtiva/laboral em relação ao trabalho desenvolvido pela A. De igual modo, também a escolaridade /habilitações literárias da BB não tiveram qualquer reflexo nada resulta alegado ou provado de facto a este propósito – na esfera produtiva/laboral em relação ao trabalho desenvolvido pela A. IX. Com efeito, estes fatores diferenciadores apenas poderiam ser relevados e valorados, e fundamentar um tratamento mais favorável e não discriminatório, se, in concreto tivesse reflexos objetivos e concretos ao nível da prestação e rendimento laboral. X. O que não ocorre in casu. XI. Não se verifica, portanto, nenhum erro de julgamento, e, a decisão final proferida pelo tribunal a quo não só é a acertada como a única em face dos factos que lhe foram trazidos e que, bem, apreciou e enquadrou. XII. A R. não logrou provar fundamento para um tratamento retributivo discriminatório à A., pelo menos em relação à colega BB. TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO E JULGADO IMPROCEDENTE O PRESENTE RECURSO, CONFIRMANDO-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, E ALTERADA A MATÉRIA DE FACTO PROVADA NOS TERMOS PROPUGNADOS NO PRESENTE RECURSO SUBORDINADO. ASSIM FAZENDO VOSSAS EXCELÊNCIAS A COSTUMADA JUSTIÇA!” * A Ré veio responder ao recurso subordinado interposto pelo A. concluindo que: “Por todo o exposto, deve ser rejeitado o recurso subordinado da Autora e, em todo o caso, julgado improcedente, prevalecendo as conclusões do recurso independente da Ré.” * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 780 e segs. no sentido de que ambos os recursos devem ser julgados improcedentes, o subordinado caso não venha antes a ser rejeitado por inadmissibilidade legal. * Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir. * II – Questões a decidir: Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do CPC) com exceção das de conhecimento oficioso. Questão prévia Admissibilidade do recurso subordinado interposto pela Autora. A Autora veio interpor recurso subordinado no que respeita à matéria de facto. Conforme resulta do artigo 633.º do CPC: <<1 – Se ambas as partes ficarem vencidas, cada uma delas pode recorrer na parte que lhe seja desfavorável, podendo o recurso, nesse caso, ser independente ou subordinado. (…)>> Assim, dúvidas não existem de que pressuposto da interposição do recurso, independente ou subordinado, é a existência de decaimento. Ora, compulsada a sentença recorrida facilmente se conclui que a Autora não ficou vencida, sendo certo que a ação foi julgada procedente e a Ré condenada nos pedidos formulados pela Autora. Pelo exposto, por inadmissibilidade legal, rejeita-se o recurso subordinado interposto pela Autora. * Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam: 1ª – Nulidade da sentença. 2ª – Reapreciação da matéria de facto. 3ª – Se não ocorreu a violação do princípio “trabalho igual salário igual”, devendo a Ré ser absolvida do pedido de condenação no pagamento das diferenças salariais. * * III – Fundamentação a) Factos provados e não provados constantes da sentença recorrida: 1. A A. foi admitida ao serviço da sociedade “I..., Lda.”, em 1 de maio de 2001, para, sob as suas ordens, direção e fiscalização, desempenhar as funções de controladora 2.ª, integrada no departamento de controle de qualidade; 2. Em abril de 2006, no âmbito de transmissão de estabelecimento, a R. assumiu a posição de empregador, sem perda de direitos, regalias e antiguidade por parte da A.; 3. A A. esteve sempre classificada como controladora 2.ª, até 1/4/2019 (facto provado número 17); 4. Conforme descrição de funções interna estabelecida pela R., controladora é alguém que, mediante orientação superior, cumpra alguns ou todos os procedimentos específicos constantes do manual de qualidade, nomeadamente: a) Rececione e libere matéria-prima e produto acabado, efetuando as seguintes análise e procedendo aos respetivos registos: - teste histamina (método quantitativo e qualitativo): receção de matéria-prima, controlo em produção e análise do produto acabado; - receção dos óleos: acidez (índice % ácido oleico), índice peróxido e sabões; - receção do tomate – concentrado; - análise à % de sal: matéria-prima, cavala produção, sardinha produção e produto acabado; bacteriologia da água; - determinação do teor da gordura; - determinação do a.b.v.t.; - determinação do índice de peróxidos no peixe; b) arquive e mantenha sempre atualizada a informação sobre as análises efetuadas; c) garanta a organização e limpeza do seu posto de trabalho; d) apoie a formação profissional em linha às operadoras sobre as regras e procedimentos; e) conheça a política ambiental e colabora nos mecanismos de prevenção e controlo da poluição através das regras definidas pela R.; f) identifique potenciais riscos ambientais e informar as chefias; 5. A A. auferiu a seguinte retribuição base mensal: - maio de 2001 a abril de 2002: € 358,14 - maio de 2002 a abril de 2003: € 372,60 - maio de 2004 a abril de 2005: € 397,00 - maio de 2005 a dezembro de 2005: € 410,00 - janeiro de 2006 a abril de 2006: € 422,00 - maio de 2006 a março de 2007: € 433,39 - abril de 2007 a abril de 2008: € 445,39 - maio de 2008 a Abril de 2009: € 457,73 - Maio de 2009 a abril de 2010: € 469,17 - maio de 2010 a fevereiro de 2011: € 485,00 - março de 2011 a outubro de 2014: € 493,00 - novembro de 2014 a dezembro de 2014: € 505,00 - janeiro a dezembro de 2015: € 513,00 - janeiro a dezembro de 2016: € 530,00 - janeiro a dezembro de 2017: € 557,00 - janeiro a maio de 2018: € 580,00 - junho de 2018 a janeiro de 2019: € 620,00 - abril a julho de 2019: € 678,00; 6. A A. e as colegas DD e CC, trabalhavam diariamente no laboratório, desempenhando as tarefas referidas no ponto 4 dos factos provados; 7. A A. e as restantes trabalhadoras a desempenhar funções na secção de controlo de qualidade desempenham funções destinadas a confirmar a qualidade do produto que lhes passa pelas mãos e não a preparar as conservas de peixe, sendo concretamente essas tarefas controlar os pesos de enchimento da sardinha, temperaturas do cozedor, defeitos de limpeza do peixe, caracteres organoléticos, temperaturas do peixe cozido, nível de moura, detetor de metais, controlo de plásticos e cravação, controlo das linhas do ... e filetes; 8. O trabalho da A. e das colegas desta secção passa por analisar se as mesmas são produzidas de acordo com os critérios de qualidade definidos pela R.; 9. BB auferiu a seguinte retribuição base mensal, entre maio de 2001 e março de 2017: - maio e junho de 2001: € 443,93 - julho de 2001 a agosto de 2002: € 473,86 - setembro de 2002 a junho de 2003: € 498,97 - julho de 2003 a junho de 2004: € 513,80 - julho de 2004 a junho de 2005: € 529,00 - julho de 2005 a abril de 2006: € 545,00 - maio de 2006 a abril de 2007: € 559,72 - maio de 2007 a maio de 2008: € 575,22 - junho de 2008 a junho de 2009: € 591,15 - julho de 2009 a dezembro de 2014: € 605,93 - janeiro a dezembro de 2015: € 618,05 - janeiro de 2016 a março de 2017: € 635,05; 10. BB está e DD e CC estavam classificadas como controladoras de 1.ª; 11. O departamento de controlo de qualidade consiste no apoio à qualidade na produção, na própria linha; 12. DD foi admitida em 1983, tendo, à data de 1/5/2008, a categoria de controladora principal; 13. CC tinha, à data de 4/6/2014, a categoria de controladora principal; 14. BB foi contratada em 1994; 15. BB tem formação profissional de técnica de gestão de pesca; 16. A A. detém o 3.º ciclo do ensino básico; 17. Em 1 de abril de 2019, a A. ascendeu a controladora de 1.ª; 18. DD e CC já não trabalham para a R. desde, respetivamente, 1 de maio de 2008 e 4 de junho de 2014. FACTOS NÃO PROVADOS: A) DD, CC e BB inserem-se no departamento de garantia de qualidade; B) A R. tem 676 trabalhadores inseridos na categoria profissional de preparador de conservas de peixe; C) A A. encontra-se inserida na área de controlo de produto acabado/semiacabado, onde se inclui o Recheck, juntamente com 19 trabalhadores, incluindo a KK; D) Auferem todas (a A. e os restantes 19) a mesma retribuição base mensal; E) A categoria profissional de controladora, criada pela R., contém as distinção/os níveis de controladora principal, de 1.ª ou de 2.ª; F) DD tinha a responsabilidade pela linha de cravação; G) CC foi admitida em 1983; H) CC tinha a responsabilidade da linha de sardinha inteiros; I) BB foi contratada com a categoria de preparadora de conservas de peixe; J) BB, DD e CC são responsáveis pela formação da equipa no que se refere aos processos de qualidade; K) A A. apresentou um nível de absentismo anual de 22%; L) As colegas da A. com quem se compara apresentaram uma média anual de absentismo entre os 3,5% e os 9% no mesmo período. “FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO: (…).” * * b) - Discussão Apreciando as questões suscitadas pela Ré recorrente: 1ª questão Nulidade da sentença Alega a recorrente que: - A Sentença apelada enferma de nulidade, na medida em que: … se mostra obscura no que tange à al. a) do dispositivo, condenando num reconhecimento (redação “esdrúxula”, como já adjetivou o STJ), sem que se delimite o alcance desta alínea[cfr. 615.º, n.º 1, c), in fine, CPC]; … condenou a Ré nos termos constantes da al. a) do dispositivo sem que a Autora tenha, de todo, peticionado a sua reclassificação profissional [artigo 615.º, n.º 1, d), in fine CPC]; … a condenação constante da al. a) encontra-se em contradição lógica e insanável com § E) do catálogo de factos não provados [artigo 615.º, n.º 1, al. c), in limine, CPC]; … condenou a Ré no pagamento, por conta dos anos de 2008 e 2009, de quantia superior à peticionada pela Autora [artigo 615.º, n.º 1, e), in limine, CPC]; … por omitir fundamentação (desde logo, de facto) que habilite a condenação da Apelante no pagamento de diferenças salariais a partir de março de 2017, posto que, a partir de tal referente temporal, nada se assentou que permita concluir pela divergência salarial entre a Autora e a Senhora D. BB [artigo 615.º, n.º 1, b), CPC]. Vejamos: Conforme resulta do n.º 1 do artigo 615.º do CPC a sentença é nula quando: <<(…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.>> Nulidade por falta de fundamentação Apenas existe a nulidade prevista na alínea a) <<quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão>>[2]. Ora, lida a sentença recorrida, facilmente se conclui que da mesma consta a fundamentação de facto e de direito. Na verdade, na motivação da decisão de facto referem-se as razões pelas quais foram julgados provados e não provados os respetivos factos, especificando-se os respetivos meios de prova e com análise crítica dos mesmos, especificando-se os fundamentos que foram decisivos para a convicção. Por outro lado, a Autora peticionou a condenação da Ré no pagamento dos valores referentes às diferenças salariais, desde maio 2001 até março 2017, as quais se calculam em € 22.753,14 e bem assim daqueles que se vierem a apurar devidos desde abril de 2017 até ao presente a apurar em liquidação de sentença. E, a propósito do pagamento de diferenças salariais, consta da sentença recorrida o seguinte: “Procede, desta forma, a pretensão da A. em ser remunerada de acordo com a retribuição base mensal auferida pela colega BB, nos montantes que constam do número 9 dos factos provados. Concretamente, tem a A. o direito a receber a diferença entre o montante da retribuição base mensal que auferiu e aquela que deveria ter auferido (em montante igual à retribuição base mensal de BB). Os factos provados não permitem ao Tribunal proferir uma condenação líquida uma vez que o montante que a R. deve à A. está relacionado com a efectiva prestação de trabalho, uma vez que, resulta dos diversos recibos de remuneração juntos aos autos, que a A., em todos os meses em equação, não auferiu a totalidade da retribuição base mensal – veja-se, por exemplo, fls. 3 (Outubro de 2011). Nestes termos, relega-se para execução de sentença a quantificação exacta das diferenças salariais, sem nunca exceder o montante de € 22.753,14.” Assim sendo, a sentença recorrida especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, inexistindo, por isso, a invocada nulidade por falta de fundamentação. Nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e por ambiguidade ou obscuridade Existe oposição entre os fundamentos e a decisão <<quando os fundamentos invocados pelo julgador devam conduzir logicamente a resultado oposto ao expresso na decisão>>[3]. <<I - Dispõe o art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC que a sentença (…) é nula quando «Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;». II - O vício a que se reporta o apontado segmento normativo implica, por um lado, que haja uma contradição lógica no aresto, o que significa, para a sua ocorrência, que a fundamentação siga um determinado caminho e a decisão opte por uma conclusão completamente diversa, e, por outro, que tal fundamentação inculque sentidos diversos e/ou seja pouco clara ou imperceptível.>>[4] Trata-se de uma nulidade da decisão, de um vício intrínseco da mesma. Na verdade, <<entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se.>>[5] Pois bem, resulta da alínea a) do dispositivo da sentença recorrida: “a) Condeno a R., “E..., S.A”, a reconhecer a A., AA, na categoria profissional de controladora de 1.ª, desde Maio de 2001;” A redação desta alínea é clara, condena a Ré a reconhecer a Autora na categoria profissional de controladora de 1.ª, desde maio de 2001, pelo que, ao contrário do alegado pela Ré, não sofre de qualquer obscuridade. Por outro lado, consta da alínea E dos factos não provados: E) A categoria profissional de controladora, criada pela R., contém as distinção/os níveis de controladora principal, de 1.ª ou de 2.ª; Acresce que, resulta do elenco dos factos provados que: 3. A A. esteve sempre classificada como controladora de 2.ª, até 1/4/2019; 10. BB está e DD e CC estavam classificadas como controladoras de 1.ª; 17. Em 1 de abril de 2019, a A. ascendeu a controladora de 1.ª. Acresce que, consta da fundamentação da decisão de facto supra transcrita que: “A R. não fez prova de quais os concretos níveis da categoria profissional de “controladora” e das condições concretas de ascensão aos mesmos – não basta a testemunha II afirmar que desde o nível mais baixo ao topo decorrerem 11 anos. Aliás, a prova produzida não permitiu sequer perceber se a categoria, actualmente, tem três níveis ou dois (1.ª e 2.ª), pois II afirmou que a categoria de controladora principal foi extinta.” Assim sendo, não vislumbramos a alegada contradição lógica e insanável entre a condenação constante da alínea a) do dispositivo da sentença e a alínea E) do elenco dos factos não provados, posto que, o que não se provou foi que a categoria de controladora tem os três níveis de controladora principal, de 1ª e de 2ª. Em suma, os fundamentos constantes da sentença recorrida não conduzem logicamente a um resultado oposto ao expresso na decisão, inexistindo qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão. Pelo exposto, improcede esta nulidade invocada pela Ré recorrente. Nulidade por excesso de pronúncia Lida a petição inicial constatamos que a Autora formulou o seguinte pedido: “Nestes termos e nos mais de direito que V.ª Ex.ª doutamente suprirá deve a presente acção ser julgada provada e procedente e consequentemente: a) Reconhecer-se, declarar-se e a R. ser condenada nesse mesmo reconhecimento de que a A. desempenha as mesmas funções desempenhadas por todas as restantes colegas que laboram como „Controladoras“, quer sejam de „1.ª“quer sejam de „2.ª“ na secção de controle da qualidade entre elas as mencionadas BB, CC e DD; b) A reconhecer-se que, em consequência, a R. deve remunerar a A. de acordo com as funções efectivamente desempenhadas e de acordo e de forma igual com o que é pago às restantes colegas de trabalho que com ela laboram, nomeadamente, à referida BB, CC e DD por aplicação dos principios constitucionais e legais aplicáveis e concretamente os principios „trabalho igual salário igual“ e da não discriminação; c) A reconhecer-se que a R. é devedora à A. dos valores referentes às diferenças salariais, desde Maio 2001 até Março 2017, as quais se calculam em € 22.753,14, conforme melhor supra discriminadas e bem assim daqueles que se vierem a apurar devidos desde Abril de 2017 até ao presente a apurar em liquidação de sentença; d) Condenar-se a R. a pagar à A. a referida quantia de €22.753,14, a título de diferenças salariais, acrescida da que se vier a apurar devida desde Abril de 2017 até ao presente em liquidação de sentença, e bem assim dos respectivos juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento de cada uma das importâncias peticionadas; e) Condenar-se a R. a actualizar o salário mensal base auferido pela A. para o valor auferido pela colega BB.” Por outro lado, consta da alínea a) do dispositivo da sentença recorrida: a) Condeno a R., “E..., S.A”, a reconhecer a A., AA, na categoria profissional de controladora de 1.ª, desde Maio de 2001; Assim sendo, impõe-se concluir que, na verdade, a Autora não peticionou em concreto a condenação da Ré a reconhecê-la na categoria de controladora de 1ª desde maio de 2001 mas, tão só, a condenação no reconhecimento de que a A. desempenha as mesmas funções desempenhadas por todas as restantes colegas que laboram como Controladoras, quer sejam de 1.ª quer sejam de 2.ª. Contudo, o juiz não pode é conhecer de causas de pedir não invocadas pelo Autor. Na verdade, a sentença é nula quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (n.º 1, d), do artigo 615.º do CPC), ou seja, <<não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções não deduzidas na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608-2), é nula a sentença em que o faça.>>[6] <<O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.>> - n.º 2 do artigo 608.º do CPC. Ora, na sentença recorrida foram apreciadas as questões colocadas pela Autora, quais sejam, as de desempenhar as mesmas funções da sua colega BB; de ter a mesma categoria profissional desta sua colega e de a Ré estar obrigada a pagar à Autora as diferenças salariais derivadas da errada inclusão na categoria que lhe foi atribuída, sendo certo que, a condenação constante da alínea a) do dispositivo da sentença, mais não é do que a concretização do peticionado pela Autora na alínea a) do seu pedido. Pelo exposto, o juiz não conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento e, consequentemente, a sentença recorrida não sofre da invocada nulidade por excesso de pronúncia. Nulidade por condenação além do pedido A sentença é nula quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. Na verdade, <<a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.>> - n.º 1 do artigo 609.º do CPC. Consta do dispositivo da sentença recorrida: c) Condeno a R. a pagar à A. a quantia, cuja quantificação exacta se relega para execução de sentença, correspondente à diferença entre o montante da retribuição base mensal que a A. auferiu e aquele que deveria ter auferido por consideração ao montante igual ao da retribuição base mensal de BB, sem nunca exceder o montante de € 22.753,14 (vinte e dois mil, setecentos e cinquenta e três Euros e catorze cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4%, desde a data de vencimento de cada remuneração até efectivo e integral pagamento.” Por outro lado, a Autora peticionou a condenação da Ré a pagar-lhe a referida quantia de € 22.753,14, a título de diferenças salariais, acrescida da que se vier a apurar devida desde abril de 2017 até ao presente em liquidação de sentença, e bem assim dos respetivos juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento de cada uma das importâncias peticionadas. Acresce que, conforme jurisprudência, ao que julgamos, pacífica, os limites da condenação previstos no n.º 1 do artigo 609.º do CPC dizem respeito ao pedido global e não às várias parcelas em que o mesmo se desdobra, razão pela qual pode ser atribuído um valor superior ao peticionado parcelarmente, desde que não exceda o montante global do pedido (Ac. do STJ, de 28/03/2006, disponível em www.dgsi.pt). Assim sendo, não vislumbramos qualquer condenação para além do pedido e, como tal, a sentença não sofre desta nulidade que lhe foi assacada. Improcedem, assim, as conclusões da recorrente.
2ªquestão Reapreciação da matéria de facto (…) Alega a recorrente que: - O facto não provado inserto sob a al. G) deve ser incluído no acervo de factos assentes, retificando o ano da admissão, passando a figurar: CC foi admitida em 1987 (cfr. Doc. n.º 3 junto à contestação). Alínea G) dos factos não provados: G) CC foi admitida em 1983; Foi a Ré que alegou que esta trabalhadora foi admitida em 1983, no entanto, resulta do documento junto a fls. 419 que a mesma foi admitida em 1987. Assim, adita-se à matéria de facto provada o ponto 19 com a seguinte redação: 19. CC foi admitida em 1987. (…). Resulta do documento junto aos autos a fls. 431 e segs. que a A. faltou injustificadamente ao trabalho nestes dias. Assim, adita-se à matéria de facto provada o ponto 20 com a seguinte redação: 20. A Autora faltou injustificadamente nas seguintes datas: 10/09/2001, 27/09/2001, 29/11/2001, 5/01/2002, 31/01/2002, 19/02/2002, 24/04/2002, 13/05/2002, 23/05/2002, 18/10/2002, 08/05/2003, 07/04/2004, 30/11/2004, 28/03/2005, 17/06/2005, 14/03/2006, 21/03/2006, 20/06/2006, 22/06/2006, 13/07/2006, 19/07/2006, 13/09/2006, 02/01/2007, 07/02/2007, 21/03/2007, 29/03/2007, 02/04/2007, 02/12/2009, 23/12/2009, 10/02/2010, 12/02/2010, 19/03/2010, 05/01/2012, 14/03/2012, 12/04/2012, 31/05/2012, 11/06/2012, 24/01/2013, 01/03/2013, 06/03/2013, 05/04/2016, 22/04/2016, 13/06/2016, 15/06/2016, 07/11/2016, 22/11/2016, 13/12/2016, 30/10/2017, 02/11/2017, 15/12/2017, 24/01/2019, 25/03/2019 e 16/07/2019. (…). Pelo exposto, procede apenas parcialmente (pontos 19 e 20) a pretendida alteração da matéria de facto.
3ª questão Se não ocorreu a violação do princípio “trabalho igual salário igual”, devendo a Ré ser absolvida do pedido de condenação no pagamento das diferenças salariais. Alega a recorrente que: - Considerando que a Autora, ora Recorrida, não alicerça a alegada diferenciação remuneratória numa «categoria suspeita» a que aludem os artigos 13.º CRP e 24.º, n.º 1, CT, aquela não beneficia da presunção encerrada no 25.º, n.º 5, CT. - Por conseguinte, os ónus de alegação e prova impendentes sobre a Autora são os mais amplos, abrangendo a caracterização plena (natureza, quantidade e qualidade) do trabalho que desenvolve por confronto com o levado a efeito pelas colegas nomeadas (que deve, de igual modo, carrear para os autos) e, outrossim, afastando a existência de fatores objetivos suscetíveis de legitimar a diferenciação salarial. - Rebaixando ao caso sujeito, constata-se que, independentemente da impugnação fáctica supra (da qual se não abdica), somente quedou provado nos autos a seguinte materialidade: . Admissão e categoria da Autora e vicissitudes subjetivas da entidade empregadora: factos provados números 1 a 3 e 17; . Descritivo funcional da categoria de controlador: factos provados 4 e 6; . Objetivos na consagração da categoria interna de controlador; missão atribuída na empresa à área de qualidade: factos provados 7, 8 e 11; . Evolução salarial da Autora entre maio de 2001 e julho de 2019: facto provado 5; . Evolução salarial de BB entre maio de 2001 e março de 2017: facto provado 9; . Admissão e categorias profissionais de BB e de outras colegas da Autora: factos provados 10, 12 a 14 e 18; . Habilitações académicas da Autora: facto provado 16; . Habilitações académicas e profissionais de BB: facto provado 15. - Assim, impõe-se a conclusão de que a Autora não acatou o ónus da prova que lhe competia, já que somente se adquiriu o complexo funcional inerente à categoria de controlador e nada mais carreou no tangente à natureza, quantidade e qualidade do trabalho realizado (por si e pelas suas colegas com as quais aduziu comparar-se). - De resto, a alegação da Autora contida na petição inicial neste conspecto é inexistente, limitando-se, de forma conclusiva e não detalhada e circunstanciada, a afirmar a pretensa igualdade do trabalho desenvolvido. - Em todo o caso, a Autora não demonstrou haver sequer divergência salarial entre si, de um lado, e as colegas DD e CC, de outro – sendo que a mesma não se estabilizou com referência a BB a partir de março de 2017. - Independentemente do exposto e ainda que se conclua pela identidade do trabalho realizado pela Apelada e o desenvolvido pelas colegas nomeadas (sem prescindir), sempre se imporá valorar que constam dos autos fatores materiais, objetivos e relevantes, legitimadores da diferenciação remuneratória (distintas antiguidades e habilitações). - Tanto bastará para ditar a improcedência da presente ação e a absolvição da Recorrente do petitório contra si deduzido. - A procedência da impugnação de facto reforçará este juízo, dado que denota as distintas responsabilidades, assiduidade e tarefas que as trabalhadoras sub judice desenvolveram na organização da Apelante. - Por mera cautela, argua-se, subsidiariamente, que, mesmo que se entenda ter existido violação do princípio de paridade retributiva (mantendo a condenação de 1.º grau, sem conceder), a liquidação do dispositivo não deverá desatender ao absentismo injustificado ou justificado com perda de retribuição em que a Autora incorreu – o que se requer seja, em todo o caso, ressalvado. A este propósito consta da sentença recorrida o seguinte: “Assente que está que entre a A. e a R. existia um contrato de trabalho sem termo, válido, importa agora apurar se a A. deveria estar enquadrada na categoria profissional de controladora de qualidade de 1.ª, tal como a colega BB. Antes, impõe-se assentar que apenas importa comparar a A. com esta colega de trabalho, pois, como já se realçou, de todas, apenas BB continua a ser colega de trabalho da A. - DD não o-é desde 2008 (há quase 13 anos à data da instauração dos autos) e CC desde 2014 (há quase 7 anos à data da instauração dos autos). «A categoria profissional corresponde ao essencial das funções desempenhadas pelo trabalhador e que ele se obrigou a efectuar pelo contrato de trabalho, ou pelas alterações decorrentes da sua dinâmica, e tem várias acepções: categoria função e categoria estatuto. A categoria função resulta do contrato de trabalho e deve corresponder às funções efectivamente delineadas, devendo ser respeitada pela entidade patronal; a categoria estatuto deve corresponder à categoria função, devendo assentar nas funções efectivamente desempenhadas» – acórdão S.T.J., de 18/3/1998, C.J., tomo I, pág. 282. «Para se determinar qual a categoria profissional em que o trabalhador deve ser posicionado (mesmo nos casos em que no contrato de trabalho é referida especialmente uma categoria estabelecida nos instrumentos de regulamentação colectiva) não se deve ter simplesmente em consideração o nomen que aí foi utilizado, impondo-se, antes, que sejam analisadas as tarefas que o trabalhador efectivamente desempenha. Efectuada essa análise, haverá, então, que cotejar o desempenho real, efectivo e predominante de funções levado a efeito pelo trabalhador com a normação resultante daqueles instrumentos, a fim de se alcançar a inserção no núcleo de actividades correspondente à categoria enunciada em tais instrumentos e que, desta arte, normativamente a caracterizam» – acórdão S.T.J., de 5/2/2009, P. 08S3261, www.dgsi.pt. A cláusula 7.ª do contrato de trabalho celebrado pela A. (que a R. assumiu) estabelece que «as relações de trabalho dos Outorgantes são reguladas pelo CCT para as ...». Trata-se do contrato colectivo entre a Associação ... (...) e a ..., ...; hotelaria e ... e outras. Como aceitam a A. e a R., este contrato colectivo, entre a definição e remuneração de categorias profissionais, não tem prevista a categoria profissional de controladora. É, igualmente, inegável que as tarefas executadas pela A. no exercício da sua actividade laboral não se enquadram em nenhuma das definições previstas no contrato colectivo, em especial na de preparador de conservas de peixe. Finalmente, nos termos do contrato de trabalho celebrado, a A. foi contratada para desempenhar as funções de controladora 2.ª. Vejamos o que sucedeu na prática durante a execução da relação laboral da A.. A maioria das tarefas desenvolvidas pela A. coincide com a descrição da categoria de controladora definida pela R. – vejam-se factos provados números 4, 6 e 7. «Controladora é alguém que, mediante orientação superior, cumpra alguns ou todos os procedimentos específicos constantes do manual de qualidade, nomeadamente (…)» - realce meu, cfr. facto provado 4. Desta definição decorre aquilo que vem sendo defendido pela doutrina e pela jurisprudência, a integração numa dada categoria profissional não obriga a que o trabalhador desempenhe todas as tarefas que compõem a sua definição. Conclui-se, assim, que a A., na verdade, desempenhou funções próprias e exclusivas de controladora. A A., até 1/4/2019, esteve classificada como controladora de 2.ª e, daí em diante, como controladora de 1.ª. Desconhece-se a justeza de tal enquadramento da A. em diferentes níveis da mesma categoria (2.ª e 1.ª) uma vez que a R. não logrou demonstrar os diversos níveis desta categoria, nem as condições e os requisitos que cada trabalhador há-de cumprir para ascender a cada um. O que se sabe é que a A. e BB trabalham diariamente no laboratório desempenhando as tarefas elencadas em 4 dos factos provados, correspondentes à descrição interna da categoria de controladora. A A. foi classificada como controladora de 2.ª e BB como controladora de 1.ª. A A. e BB desempenhavam tarefas idênticas, não havendo justificação para a diferença do nível de categoria de uma e de outra. Podemos supor que a diferença possa estar relacionada com a antiguidade? Com habilitações literárias? Com aproveitamento? Com a produtividade? Com a avaliação de conhecimento? Com a avaliação de desempenho? Com qualquer outro critério? Desconhece-se, porque a R. não logrou provar factos que permitam justificar a diferença de inserção na categoria profissional, e em especial para a diferença salarial ao nível da retribuição base mensal patenteada pelo confronto entre os factos provados números 5 e 9. Conclui-se assim, que é injustificada a diferença salarial entre a A. e BB, por ser injustificada a diferença de classificação na categoria profissional de uma e de outra. Procede, desta forma, a pretensão da A. em ser remunerada de acordo com a retribuição base mensal auferida pela colega BB, nos montantes que constam do número 9 dos factos provados. Concretamente, tem a A. o direito a receber a diferença entre o montante da retribuição base mensal que auferiu e aquela que deveria ter auferido (em montante igual à retribuição base mensal de BB). Os factos provados não permitem ao Tribunal proferir uma condenação líquida uma vez que o montante que a R. deve à A. está relacionado com a efectiva prestação de trabalho, uma vez que, resulta dos diversos recibos de remuneração juntos aos autos, que a A., em todos os meses em equação, não auferiu a totalidade da retribuição base mensal – veja-se, por exemplo, fls. 3 (Outubro de 2011). Nestes termos, relega-se para execução de sentença a quantificação exacta das diferenças salariais, sem nunca exceder o montante de € 22.753,14.” Regressando ao caso dos autos, tendo em conta a matéria de facto provada, desde já avançamos que acompanhamos a sentença recorrida. Na verdade, conforme resulta da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do CT, considera-se: <<Trabalho igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objetivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade;>> Por outro lado, <<o empregador não pode praticar qualquer discriminação, direta ou indireta, em razão nomeadamente dos fatores referidos no nº 1 do artigo anterior.>> - n.º 1 do artigo 25.º do CT. Acresce que, <<àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.>> e <<a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.>> . n.º s 1 e 2 do artigo 342.º do CC. Ora, ao contrário do alegado pela recorrente, a Autora logrou demonstrar, como lhe competia, que exerce funções idênticas à da trabalhadora BB, em natureza, qualidade e quantidade. É o que resulta dos pontos 4, 6, 7, 8 e 10 da matéria de facto provada. Na verdade, <<o trabalho é igual quanto à natureza, quando abrange as mesmas funções, perigosidade, penosidade ou dificuldade; quanto à quantidade, relativamente ao volume, intensidade e duração; e, quanto à qualidade, se abrange os mesmos conhecimentos dos trabalhadores, a capacidade e a experiência que o trabalho exige, mas também, o zelo, a eficiência e produtividade do trabalhador.>>[7] Acresce que, como se refere no acórdão da RP ora citado, <<comprovada a discriminação invocada pelas autoras, cabia à ré justificar (artigo 342.º n.º 2 C.C.), que o tratamento desvantajoso conferido às autoras não é irrazoável, arbitrário e discriminatório, “antes subjazia-lhe uma justificação plausível”, na expressão do acórdão do STJ, de 2013.11.20: “Relembram-se, aqui, as referências feitas ora no sentido de que um tratamento desigual obriga a uma justificação material da desigualdade, ora de que, na conformação do direito à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação, «A justa medida ou proporcionalidade (necessidade, adequação, proporcionalidade) de um tratamento diferenciado carece de uma especial justificação» - fim de citação.>> Ora, certo é que a A. foi admitida em 01/05/2001 e a trabalhadora BB foi contratada em 1994; a BB tem formação profissional de técnica de gestão de pescas e a A. tem o 3.º ciclo do ensino básico, no entanto, não se consegue retirar da matéria de facto apurada que a diferente remuneração praticada pela Ré assentava em critérios objetivos, tendo em conta, por exemplo, a antiguidade, as habilitações literárias e profissionais ou o absentismo. Ao contrário do alegado pela recorrente, não resultam da matéria de facto provada: distintas responsabilidades, assiduidade e tarefas, tendo-se apurado apenas no que respeita à assiduidade que a A. faltou injustificadamente ao trabalho nos dias referidos no ponto 20 aditado ao elenco dos factos provados. Como se decidiu no acórdão desta Relação, de 13/12/2022, disponível em www.dgsi.pt[8]: “Como se sabe, o artigo 59.º, n.º 1, al. a) da Constituição da República Portuguesa estabelece um princípio de igualdade em matéria salarial, assim traduzido: “todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual”. E a alínea c) do artº 23º do CT define trabalho igual como “aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são equivalentes, atendendo nomeadamente à qualificação ou experiência exigida, às responsabilidades atribuídas, ao esforço físico e psíquico e às condições em que o trabalho é efectuado”. Também o artigo 270.º deste Código, concretiza aquele princípio constitucional, estabelecendo que “na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que para trabalho igual ou de valor igual, salário igual”. Já antes se retirava o mesmo do artigo 9.º n.º 1 do DL n.º 392/79, de 20/10 (que veio na esteira da convenção da OIT nº 100) e do artigo 263.º do Código do Trabalho de 2003. Citando Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 12ª edição, Almedina, pag. 445 e ss.), o princípio de equidade retributiva “que se traduz na fórmula para trabalho igual salário igual assume projecção normativa directa e efectiva no plano das relações de trabalho o que significa que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual, convenção colectiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser paga retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Trata-se, pois, de uma directriz imediatamente operatória, não apenas enquanto critério de validade da regulamentação legal e convencional, mas, sobretudo, como critério de licitude da prática contratual concreta”. A projecção desse princípio não prescinde, contudo, da verificação da inexistência de factores objectivos que justifiquem materialmente diferenciações salariais. Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 313/89, de 9.3.89, proferido no processo n.º 265/88, da ... Secção (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13º volume, tomo II, páginas 917 e seguintes), “o princípio “a trabalho igual salário igual” não proíbe, naturalmente, que o mesmo tipo de trabalho seja remunerado em termos quantitativamente diferentes, conforme seja feito por pessoas com mais ou menos habilitações e com mais ou menos tempo de serviço, pagando-se mais, naturalmente, aos que maiores habilitações possuem e mais tempo de serviço têm. O que o princípio proíbe é que se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço. O que, pois, se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjectivas. Se as diferenças de remuneração assentarem em critérios objectivos, então elas são materialmente fundadas, e não discriminatórias». Há muito que a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal de Justiça vem defendendo que para se reconhecer a violação do princípio “para trabalho igual, salário igual” é necessário provar que essa diferenciação é injustificada em virtude de o trabalho dos trabalhadores discriminados ser igual aos dos demais trabalhadores quanto a natureza (perigosidade, penosidade ou dificuldade), quantidade (logo, as suas intensidade e duração) e qualidade (logo, com respeito pelos conhecimentos, capacidade e experiência que o trabalho exige). E que esses factos são constitutivos do direito subjectivo do trabalhador “discriminado” (à igualdade de tratamento), pelo que ao mesmo trabalhador cumprirá prová-los quando pretende fazer valer esse direito (cfr. Acs. do STJ de 5 de Maio de 1988, in BMJ. 377-368, de 27-01-2005, in www.dgsi.pt, proc. 04S3426, de 23-11-2005, in www.dgsi.pt, proc. 05S2262, de 14-05-2008, in www.dgsi.pt, proc. 07S3519, entre outros). Ou seja, o facto de dois trabalhadores da mesma empresa e com a mesma categoria ou as mesmas funções auferirem diferentes retribuições não permite concluir, inevitavelmente, pela violação do princípio da igualdade, já que, como é comummente reconhecido, vários factores objectivos permitem ao empregador lançar mão da diferenciação salarial entre trabalhadores da mesma categoria: as habilitações, a experiência, o rendimento do trabalho, a antiguidade na empresa, etc. E os factos que comprovem essa violação devem, em princípio, ser provados por quem a alega, nos termos do disposto no art. 342.º n.º 1 do Código Civil. Todavia, em determinados casos a lei, ponderando as dificuldades de obtenção pelo trabalhador dos elementos completos que estarão por detrás de uma distinção remuneratória pelo empregador em relação a distintos trabalhadores, entendeu que o ónus da prova deve sofrer inversão, como é o caso da situação prevista no artigo 25.º n.º 1 do Código do Trabalho e de acordo com o seu n.º 5 e, também, o art. 344.º n.º 1 do Código Civil. Assim,[2] quando no plano retributivo são invocadas como factores de discriminação alguma ou algumas das circunstâncias a que alude o nº 1 do artº 24º do CT, o trabalhador tem de alegar e provar, além dos factos que revelam a diferenciação de tratamento, também, os factos que integram, pelo menos, um daqueles factores característicos da discriminação mas já não tem de alegar e demonstrar factos relativos à natureza, qualidade e quantidade das prestações laborais em comparação, pois que, provados os factos que integram o invocado fundamento, atua a presunção prevista no n.º 5 do artigo 25.º do mesmo código no sentido de que a diferença salarial se deve a esse fundamento de discriminação, invertendo-se, apenas, quanto ao nexo causal o ónus da prova. Já quando for alegada violação do princípio do trabalho igual salário igual, sem que tenha sido invocado quaisquer factos susceptíveis de serem inseridos nas categorias do que se pode considerar factores de discriminação, cabe a quem invocar o direito fazer a prova, nos termos do art.º 342.º, n.º 1 do CC, dos factos constitutivos do direito alegado, não beneficiando da referida presunção. E como acima ficou referido, o que o mencionado princípio proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjectivas aceitando-se, todavia, múltiplos factores de diferenciação remuneratória desde que essas diferenças assentem em critérios objectivos, encontrando-se materialmente fundadas.” Volvendo ao caso dos autos, se as distintas antiguidade e habilitações poderiam constituir um critério objetivo justificativo da diferenciação salarial, certo é que, como já referimos, da matéria de facto apurada não resulta que foram aquelas que sustentaram tal diferenciação de forma fundada e compreensível, sendo que, só em abril de 2019 é que a A. foi classificada como controladora de 1ª, já depois de decorridos quase 18 anos desde a data da sua admissão, desempenhando, contudo, as mesmas funções que as suas colegas. Dito de outra forma, dos factos apurados pode concluir-se que a diferenciação existente é injustificada pois não vislumbramos que a mesma assente em critérios objetivos materialmente fundados, que se encontre justificada. Na verdade, continuando a seguir o acórdão desta Relação supra citado: <<É certo que a antiguidade é um critério relevante para a diferenciação salarial entre trabalhadores, mas esse critério tem de ser aplicado de forma coerente, compreensível e equitativa. Na verdade, a diferenciação, para ser aceitável, não pode ser arbitrária e a justificação da diferenciação tem de ser razoável e compreensível. O princípio da igualdade retributiva não compreende apenas um conteúdo negativo (a proibição de discriminações), mas comporta também uma vertente positiva, reclamando a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho aferido este pelos critérios da quantidade, natureza e qualidade. (…) Se é aceitável que a antiguidade do autor em relação aos demais trabalhadores com quem se compara seja motivo válido de diferenciação salarial, já não é aceitável por não assentar em critérios objectivos ou materialmente fundados, que o mesmo critério não tenha sido aplicado de forma proporcional durante os dezassete anos subsequentes à admissão do autor para efeitos de progressão salarial, (…). Ou seja, entende esta Relação que, salvo melhor opinião, o autor logrou provar que o trabalho por si prestado por conta da ré é igual em natureza, qualidade e quantidade, ao prestado pelos trabalhadores seus colegas em relação aos quais se compara, não tendo sido observado pela ré na progressão salarial o princípio de “para trabalho igual salário igual”, pois não se revela aceitável a diferenciação salarial resultante daquela progressão dado que, objectivamente, tal diferenciação não resulta de razões materialmente fundadas.>> Em suma, tendo a Autora logrado demonstrar, como lhe competia, que exerce funções idênticas à da trabalhadora BB, em natureza, qualidade e quantidade e inexistindo, face à matéria de facto provada, fundamento razoável, compreensível e equitativo que justifique a apurada diferenciação salarial, impõe-se concluir que a Ré violou o princípio constitucional de que para trabalho igual salário igual com as legais consequências. Improcedem, por isso, as conclusões da recorrente. * Na improcedência das conclusões formuladas pela Ré recorrente, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade. * * IV – Sumário[9] (…). * * V - DECISÃO Nestes termos, sem outras considerações, na total improcedência do recurso, acorda-se em manter a sentença recorrida * * Custas a cargo da Ré recorrente. * * Coimbra, 2023/03/10 (Paula Maria Roberto) (Azevedo Mendes) (Felizardo Paiva) [1] Relator – Paula Maria Roberto Adjuntos – Azevedo Mendes Felizardo Paiva [2] OO, CPC anotado, volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, págs. 735 e 736. [3] Acórdão do STJ, de 14/01/2010, disponível em www.dgsi.pt. [4] Ac. do STJ, de 26/01/2021, disponível em www.dgsi.pt. [5] OO e PP, CPC Anotado, Volume 2.º, 3.ª Edição, Almedina, págs. 736 e 737. [6] OO e PP, CPC Anotado, volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 736. [7] Acórdão da R..., de 22/03/2021, disponível em www.dgsi.pt. [8] Relatado pelo aqui 2º adjunto e no qual a ora relatora interveio como 1ª adjunta. [9] O sumário é da responsabilidade exclusiva da relatora. |