Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1423/18.4T8CBR.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: HUGO MEIRELES
Descritores: INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVERES DE INFORMAÇÃO
EXECUÇÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL
POSSIBILIDADE DE RESGATE ANTECIPADO DAS OBRIGAÇÕES
INDEMNIZAÇÃO
ILICITUDE
NEXO DA CAUSALIDADE
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 02/18/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 304.º, 312.º, 312.º-B, N.ºS 3 E 4, 312.º-C A 312.º-G, DO CVM
Sumário: I – Os deveres de informação que recaem sobre do intermediário financeiro não se esgotam no período pré-contratual e no ato de concretização do contrato, prevendo o art.º 312.º-B, n.º 3, do CVM, que “o intermediário financeiro notifica o cliente, independentemente da natureza deste, com antecedência suficiente, de qualquer alteração significativa na informação prestada ao abrigo dos artigos 312.º-C a 312.º-G, através do mesmo suporte com que foi prestada inicialmente.”.

II – Constitui, por isso, dever do banco intermediário informar o cliente que, por seu intermédio, subscreveu obrigações da possibilidade de resgatar antecipadamente o valor das mesmas, sempre que tal circunstância seja do seu conhecimento.

III – Em ação de indemnização por danos causados pela omissão daquela informação, incumbe ao cliente lesado o ónus da prova de tal omissão.

IV – Assim como sobre ele recaí o ónus da prova do nexo causal entre o dever de informação omitido e o dano que invocado, alegando e provando que caso tivesse sido informado da possibilidade de proceder ao resgate antecipado das obrigações, tê-lo-ia feito.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:

Recorrentes:

- Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal

- Banco 2..., SA – Sucursal em Portugal

Recorridos: AA e BB


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Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. RELATÓRIO

AA e BB instauraram ação declarativa com processo comum contra Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal, Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal e CC, peticionando a condenação solidária destes no pagamento da quantia de €49.290,06 (quarenta e nove mil, duzentos e noventa euros e seis cêntimos), a título de danos patrimoniais e da quantia de €5.000,01 (cinco mil euros e um cêntimos), a título de danos não patrimoniais, no total de €54.290,07 (cinquenta e quatro mil, duzentos e noventa euros e sete cêntimos), acrescido de juros vincendos deste a citação até integral pagamento.

Alegam, para tanto e em síntese, que, em 6 de Julho de 2012, adquiriram 47 unidades do valor mobiliário designado Obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016 (posteriormente redenominado Produto Oibrbz 6,25%) no valor unitário de €1.000,00 (mil euros), representando um investimento total de €47.000,00 (quarenta e sete mil euros).

 Tal aquisição foi intermediada pelo Réu Banco 1..., de que os autores eram clientes, sendo que o assunto foi sempre tratado pelo Réu CC, funcionário dos bancos réus.

Mais alegam que, aquando da subscrição de tal produto financeiro, não foram informados do risco, das consequências e de eventuais perdas, da possibilidade de cessão dos títulos e, posteriormente, também não foram informados da possibilidade de reembolso antecipado do montante investido, em razão da alteração da titularidade do emitente das obrigações.

Caso lhes tivesse sido permitido o reembolso antecipado, tendo sido informados dessa possibilidade, poderiam ter evitado a perda que se veio a verificar em 26 de Julho de 2016 – data convencionada para o reembolso do capital investido e dos juros - sendo que, por força do processo de recuperação judicial da OI, não conseguiram recuperar na integralidade o eu investimento, apenas lhes tendo sido pago o valor de €12.106,54.

Relativamente ao Réu CC, alegam ainda que o mesmo atuou com dolo e de forma premeditada ao não prestar informações relevantes ao autor, sendo que o réu Banco 1... deu cobertura a esta atuação ao ignorar as várias reclamações que lhe dirigiram.

Já a responsabilidade do réu Banco 2... advém do facto de ter adquirido a unidade de negócio do Banco Banco 1... em Portugal, assumindo todos os deveres contratuais deste parente os seus clientes

Concluem alegando que os réus atuaram de forma ilícita seja na fase da subscrição do produto, seja posteriormente, ao omitirem as sobreditas informações, devendo, por isso, ressarci-los dos prejuízos causados, que quantificam no total de €54.290,07, correspondente à soma do valor do capital investido, juros contratuais não pagos, da compensação por terem atuado à revelia do autos (descontado do valor que lograram recuperar do seu investimento) e, bem assim, da compensação pelos danos não patrimoniais sofridos.


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Os Réus Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal e CC apresentaram contestação.

Para além da exceção de incompetência territorial do tribunal - a qual ficou definitivamente resolvida por decisão do Sr. Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, proferida no âmbito da reclamação a que alude o art.º 105º, n.º 4 do Código de Processo Civil – defendem que o direito dos autores está prescrito nos termos do artigo 324.º, n.º 2, alínea a), do Código dos Valores Mobiliários, na medida em que o negócio foi concluído em 6 de Julho de 2012, sendo que foi a partir desta data que o cliente tem conhecimento dos respetivos termos.

Defendem ainda que, caso se entenda que o Réu Banco 1... estava obrigado a prestar informações após a subscrição das obrigações, por decorrência de gestão de carteiras ou relação de clientela, sempre caducou qualquer responsabilidade daí emergente, na medida os factos sujeitos aos alegados deveres de informação ocorreram a 2 de Outubro de 2013, data da fusão da PT/OI, pelo que se aplica o disposto no artigo 243.º, alínea b), do Código dos Valores Imobiliários.

Acresce que que nenhuma atuação ilícita pode ser assacada ao Réu Banco 2... antes do dia 1 de abril de 2016, na medida em que não operava em Portugal, tendo apenas adquirido a rede de balcões do Réu Banco 1... naquela data, sendo que todos os factos alegados pelos Autores, no que respeita à violação dos deveres de informação, são anteriores a esse momento.

Impugnam a versão factual alegada na petição inicial no que respeita à atuação do Réu CC, sustentando que o autor marido subscreveu as obrigações de forma livre e esclarecida, sendo conhecedor e experiente em investimentos deste tipo, uma vez que foi devidamente informado sobre os riscos do produto, tendo sido previamente submetido a questionário de conhecimento e experiência e de adequação ao produto financeiro em causa.

Alegam ainda que, após a subscrição daquele produto, os autores receberam todos os meses os extratos do seu investimento e sempre lhes foi prestada informação que era solicitada, quer por email, quer por telefone.

Impugnam a extensão dos danos invocados e defendem a verificação da contribuição da culpa dos autores para a sua produção, nos termos do artigo 570.º, n.º 1, do Código Civil, na medida em que não estavam dispensados de adotar um comportamento diligente, seja no momento em que subscreveram o produto financeiro em causa, seja no acompanhamento daquele seu investimento, o que não fizeram.

Concluem pela improcedência da ação.


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O Réu Banco 1... Plc também apresentou contestação.

Invoca, em primeiro lugar, a sua ilegitimidade passiva, porquanto, em 2 de setembro de 2015, celebrou com o Réu Banco 2... um contrato de aquisição de unidade de negócio que efetivou a transmissão, a título de trespasse, das unidades de venda a retalho e de weath management exploradas pela sucursal portuguesa. Por essa via, foram transferidas para o Réu Banco 2... todas as contas às quais estão associadas as obrigações subscritas pelos autores, tendo este Banco assumido todos os deveres contratuais que anteriormente eram da responsabilidade do réu Banco 1..., que, assim, deixou de ter disponibilidade sobre o objeto da presente ação.

Invoca também a exceção de prescrição nos termos do artigo 324.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários, na medida em que a subscrição das obrigações em causa data de 6 de julho de 2012, sendo esta a data na qual os autores tiveram conhecimento dos termos do negócio.

Acresce que o direito dos autores caducou, nos termos do artigo 243.º, alínea b), do Código dos Valores Mobiliários, quer relativamente aos factos ocorridos após a subscrição, quer relativamente à data de 18 de março de 2014, data primeira substituição do emitente, quer no que concerne à data de 19 de maio de 2015, quanto à substituição ocorrida no ano de 2015, quer ainda no que toca à data de 2 de junho de 2015, quanto à informação da possibilidade de reembolso antecipado.

Alega que, por apenas ter atuado como intermediário financeiro, limitando-se a executar ordens do autor, não é responsável pelo conteúdo da informação disponibilizada pelo emitente.

Nega, assim, que tenha existido qualquer aconselhamento, sugestão ou oferta da subscrição das obrigações supra referidas, tendo apenas disponibilizado os cartazes e folhetos informativos preparados pelo emitente, sem que tenha efetuado qualquer juízo de adequação do produto ao perfil dos autores, não estando assim em causa qualquer serviço de consultadoria financeira ou de gestão de carteiras ao abrigo do disposto no artigo 290.º, n.º 1, alíneas f) ou g), do Código dos Valores Mobiliários.

Daí que que não estava a obrigado a cumprir todos os deveres alegados na petição inicial, mas apenas aqueles que se lhe impunham no âmbito da atividade de intermediação contratada, tendo cumprido, nesse âmbito, todos os deveres que sobre si recaiam.

Assim, foram os autores informados de que o risco de perda de capital correspondia ao risco de insolvência do emitente e de que, até à data de maturidade, existia risco de liquidez associado às oscilações do valor das aludidas “Notes 6.25%” no mercado secundário.

Quanto aos invocados deveres de informação no período pós-subscrição das obrigações, entende que não tinha obrigação de informar os autores nos termos pelos mesmos alegados na petição inicial. Por conseguinte, não estava obrigado a informar o cliente, após a decisão de investimento, da valorização ou desvalorização do instrumento financeiro por virtude dos indicadores gerais de mercado; da possibilidade da PT Portugal recuperar ou não o investimento em produtos financeiros da Rioforte; da eventual degradação económico-financeira da Oi e suas participadas, etc., factos que, aliás, eram de conhecimento público.

Apesar disso, comunicou ao autor um conjunto de informação relevantes, designadamente os respeitantes ao reembolso antecipado, sendo que o autor foi igualmente informado da possibilidade de exercício antecipado da opção de reembolso pelo seu gestor de conta, em meados de junho de 2015, via telefónica ou em reunião presencial, e conscientemente optou por não exercê-la.

Sustenta não ter praticado qualquer facto ilícito pelo qual possa ser responsabilizado, para além de não estar estabelecido qualquer nexo causal entre os danos invocados e a sua alegada conduta, na medida em que está por demonstrar que, caso tivessem sido informados da mudança de emitente das obrigações ou da opção de reembolso antecipado, os autores teriam vendido a sua posição em mercado secundário ou exercido a opção de reembolso antecipado.

Ademais, defende que o autor também atuou com culpa, na medida em que deveria ter constatado os acontecimentos mais relevantes para o produto em causa, podendo assim ter-se apercebido das alterações processadas. Não cuidando de obter as informações relevantes, não foi diligente na administração dos seus bens.


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Por requerimento datado de 18 de fevereiro de 2019, os Réus Banco 2... e CC suscitaram a litigância de má-fé dos autores, pedindo a condenação destes em multa e indemnização, por terem alegado desconhecimento de documentos particulares por si assinados, com vista a omitir factos relevantes à boa decisão da causa e impedir o bom prosseguimento do processo, e terem apresentando requerimentos dilatórios sem fundamento sério.

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Por requerimento datado de 31 de janeiro de 2020, o Réu Banco 1... suscitou a litigância de má-fé dos autores, afirmando que estes omitem que foram informados da alteração do garante PT/Oi e que participaram na assembleia de Obrigacionistas da PT na qual foi deliberada a alteração do garante para a Oi.

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Na audiência prévia, os autores pronunciaram-se sobre as exceções invocadas pelos réus, concluindo pela improcedência das mesmas.

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Em 28 de Outubro de 2020 e 6 de novembro de 2020, realizou-se a audiência final

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Por decisão do Senhor Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, datada de 15 de fevereiro de 2023, foi ordenada a redistribuição dos autos, em consequência do que, por despacho datado de 6 de maio de 2023, foi decidido repetir a audiência final, com a correspondente anulação da prova pessoal produzida na audiência final realizada nos dias 28 de Outubro de 2020 e 6 de Novembro de 2020

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Em 17 e 18 de junho de 2024, procedeu-se à realização da audiência final.

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Foi proferida sentença que, a final, decidiu:

Face ao exposto, julga-se a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, decide-se:

7.1.) Julgar improcedente a excepção peremptória de prescrição;

7.2.) Julgar improcedente a excepção peremptória de caducidade;

7.3.) Condenar os Réus Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal e Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal a pagar solidariamente ao Autor AA as seguintes quantias:

7.3.1.) €35.468,34 (trinta e cinco mil, quatrocentos e sessenta e oito euros e trinta e quatro cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4% (ou outra que entre em vigor), desde 27 de Julho de 2016 até efectivo e integral pagamento, o que, na presente data, totalizam o valor de €11.311,00 (onze mil, trezentos e onze euros);

7.3.2.) €2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4% (ou outra que entre em vigor), desde a prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento;

7.4.) Absolver os Réus Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal e Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal dos pedidos formulados na acção em relação à Autora BB e do demais peticionado pelo Autor AA;

7.5.) Absolver o Réu CC dos pedidos formulados na acção;

7.6.) Julgar improcedentes os pedidos de condenação dos Autores AA e BB como litigantes de má-fé, absolvendo-os dos pedidos formulados pelos Réus Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal, Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal e CC.

Custas a cargo dos Autores e dos Réus Banco 1... Plc – Sucursal em Portugal e Banco 2..., S.A. – Sucursal em Portugal na proporção do decaimento de 30,66% e 69,94%, respectivamente (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, e 528.º do Código de Processo Civil).


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Não se conformando com esta decisão, veio o réu Banco 2... interpor recurso da mesma, concluindo as respetivas alegações da seguinte forma:

(…).


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Não se conformando com esta decisão, veio o réu Banco 1... interpor recurso, onde conclui da seguinte forma:

(…).


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Os recorridos não apresentaram contra-alegações.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II. Objeto dos recursos
Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil – ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal:
- Do recurso do réu Banco 2...:

a) A inexistência do dever de informação sobre a possibilidade de reembolso antecipado das obrigações:

b) A não verificação dos pressupostos da obrigação de indemnizar por violação de tal dever, mais concretamente, a inexistência de um facto ilícito e do nexo de causalidade entre o mesmo e os danos sofridos pelo autor;

c) a não verificação dos pressupostos da transferência da responsabilidade do réu Banco 1... para o réu Banco 2...;

d) Prescrição do direito a indemnização por violação dos deveres de informação;

e) A litigância de má-fé dos autores/apelados:


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- Do recurso do réu Banco 1...:

a) A caducidade do direito a indemnização por omissão de conduta devida;

b) A não verificação dos pressupostos da responsabilidade civil do recorrente, mais concretamente a ilicitude, a culpa que lhe são imputadas, o nexo de causalidade e os danos na extensão reclamada;

c) subsidiariamente, a existência de causas de mitigação dos danos, mais concretamente, o concurso da culpa do lesado e o concurso de causas:

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III. Fundamentação de Facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

4.1.1. O Réu Banco 1... encontra-se registado na Comissão de Valores Mobiliários, sob o n-º ...12, como intermediário financeira com autorização para actuar em Portugal e no Banco de Portugal sob o n.º ...2 como entidade autorizada a receber depósitos e conceder crédito;

4.1.2. O Réu Banco 2... encontra-se registado na CMVM, sob o n.º ...69, como intermediário financeira com autorização para actuar em Portugal e no Banco de Portugal sob o n.º...9 como entidade autorizada a receber depósitos e conceder crédito.

4.2.3. Em 2 de Setembro de 2015, o Réu Banco 1... celebrou com o Réu Banco 2... um contrato de aquisição de unidade de negócio, que efectivou a transmissão, a título de trespasse, das unidades de negócio de banca de retalho e de wealth management exploradas pela sucursal portuguesa do Banco 1... PLC a favor do Réu Banco 2..., tendo ocorrido a efectiva transmissão das unidades de negócio em 1 de Abril de 2016.

4.1.4. Na sequência do acordo mencionado em 4.1.3., transmitiram-se para o Réu Banco 2... todos as contas de depósito às quais se encontra associado o registo das Notes 6.25%, nomeadamente a dos Autores, tendo sido também pelo Réu Banco 2... assumidos todos os deveres contratuais que, antes, eram assumidos pelo Réu Banco 1... perante os seus clientes.

4.1.5. O Réu CC foi director da Agência do Banco 1..., tendo sido apresentado ao Autor por um colega de trabalho deste, numa das muitas visitas à A..., S.A. para reuniões com clientes do Banco.

4.1.6. O Autor possuía na altura contas bancárias noutros instituições bancárias com os quais manteve, e mantém, relação de clientela.

4.1.7. Algum tempo depois de serem apresentados, o Réu CC sugeriu ao Autor abrir uma conta no seu Banco, pedido esse que o Autor acabou por aceder em 01 de Outubro de 2007.

4.1.8. Todo o processo de abertura de conta decorreu no local de trabalho do Autor, através do Réu CC, ficando a conta sediada no balcão do Banco Banco 1..., na Agência ... ..., Rua ..., lote n.º ...8, ... ..., tendo sido atribuído o n.º de cliente ...75 e ficando titular da conta DO n.º ...37.

4.1.9. O Autor confiou inteiramente nos Réus, dada a reputação institucional de que gozavam e igualmente confiava no seu gestor de conta, o Réu CC.

4.1.10. A partir dessa data, o Réu CC passou a tratar de todos os aspectos relacionados com a conta dos Autores.

4.1.11. O perfil de investidor do Autor foi sempre caracterizado como avesso ao investimento em produtos financeiros em geral, e de alto risco, em particular, para o que alertou o Réu CC.

4.1.12. O Autor, licenciado em engenharia e que exercia funções de Director Geral na A..., uma empresa “líder mundial em fontes de media research”, foi classificado pelo Réu Banco 1... como investidor não profissional ou não qualificado.

4.1.13. O Réu CC contactava telefonicamente o Autor com alguma frequência, bem como se deslocava ao seu local de trabalho.

4.1.14. Em 29 de Novembro de 2011, o Autor deu ordem de subscrição de Obrigações da EDP Energias de Portugal, SA. (Obrigações EDP 6% 2011-2014), no valor de €20.000 (vinte mil euros), embora apenas tenha investido €5.000,00 (cinco mil euro).

4.1.15. Em 2 de Fevereiro de 2012, o Autor preencheu o questionário intitulado “Questionário Conhecimentos e Experiência” do qual resulta que tinha experiência financeira, transaccionando há mais de cinco anos; no último ano transaccionou instrumentos financeiros não complexos (como sendo obrigações), num volume total de 0 a 10.000,00 euros: no último ano transaccionou instrumentos financeiros estruturados com garantia de capital (como sendo obrigações estruturadas), num volume total de 10.000,00 a 50.000,00 euros; afirma que é um investidor capaz de avaliar genericamente os riscos envolvidos e de considera-los adequados aos seus objectivos de investimento; o Réu Banco 1... considerou que o investimento em instrumentos financeiros não complexos era adequado ao investidor em causa concluindo que o Autor tinha uma tolerância média ao risco quando comparado com a média da população.

4.1.16. Em 06 de Março de 2012, o Autor deu ordem de subscrição de obrigações SEMAPA - Sociedade de Investimento e Gestão, SGPS, S.A., (Obrigações SEMAPA 6,85%, 2012/2015) no valor de € 15.000,00 (quinze mil euros).

4.1.17. Em 6 de Julho de 2012, o Autor, casado com a Autora BB em comunhão de adquiridos, adquiriu 47 unidades do valor mobiliário designado por Obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016, no valor de €1.000,00 (mil euros)/unidade, com o código ...08, totalizando o valor do investimento €47.000,00 (quarenta e sete mil euros), posteriormente redenominados como Produto Oibrbz 6,25%, com taxa de juro remuneratório de 6,25% e maturidade em 2016.

4.1.18. O investimento mencionado em 4.1.17. visava contribuir para a construção de uma moradia para sua habitação própria e permanente.

4.1.19. O Autor assinou, de livre e esclarecida vontade, o boletim de subscrição das obrigações, tomando conhecimento dos termos mencionados em 4.1.17., aí declarando “conhecer e aceitar a política de execução e transmissão de ordens e o preçário do Banco 1... aplicável à ordem transmitida”.

4.1.20. O Autor conhecia o risco do investimento mencionado em 4.1.17., sabia que o pagamento seria feito pelo Grupo PT e que o pagamento dependeria da capacidade e solvabilidade do emitente.

4.1.21. O Réu Banco 1..., por conta do Autor, introduziu uma oferta de compra no sistema de negociação, executando a ordem dada pelo segundo, ou seja, a aquisição dos 47 títulos que foram depositados na conta de títulos ...39, e detinha a custódia de tais títulos, cobrando-se a respectiva comissão de €10,46 (dez euros e quarenta e seis cêntimos), por trimestre, por tal serviço auxiliar.

4.1.22. Os Autores receberam todos os meses os extractos da sua conta, nomeadamente o extracto bancário da conta do mês de Julho de 2012, aí se mencionando a propósito das Notes 6.25% o seguinte: “Para Notes (European Medium Term Notes) os preços fornecidos incluem juros corridos (quando aplicável) e têm um carácter meramente indicativo e não vinculativo. Os preços serão fornecidos pelo Market Maker (o Emitente ou uma entidade pertencente ao grupo do Emitente) em condições normais de mercado, que poderão, no entanto, ser modificadas durante o período de vigência das Notes. Ainda assim, nem o Distribuidor, nem o Market Maker estarão sujeitos a qualquer obrigação contratual de proporcionar um mercado secundário”.

4.1.23. Em 18 de Março de 2014, teve lugar uma assembleia extraordinária da PT, na qual o Autor, por correio electrónico datado de 19 de Fevereiro de 2019, consentiu a favor da deliberação que visou:

- A substituição da PT SGPS pela PT Portugal como emitente e principal devedor das Notes 6.25%;

- A adição de uma garantia incondicional e irrevogável da Oi;

- A renúncia, pelos obrigacionistas que consentiram, a quaisquer direitos decorrentes de um qualquer event of default que pudesse resultar do aumento de capital social da Oi ou da combinação de negócios supra identificada;

- A possibilidade de alteração, a todo o tempo, e sem necessidade de consentimento dos titulares das Notes, do Emitente pela Oi, àquela data Garante, ou uma das subsidiárias pertencentes ao Grupo Oi.

4.1.24. Por força do facto mencionado em 4.1.23., o Autor recebeu, em 20 de Março de 2014, uma consent fee no valor de €50,76 (cinquenta euros e setenta e seis cêntimos).

4.1.25. Em Abril de 2014, a valorização das Notes 6.25% no mercado secundário ascendia a 109,07%, tal como foi devidamente notificado ao Autor no extracto de conta.

4.1.26. Em 03 de Dezembro de 2014, o Autor preencheu o questionário intitulado “Questionário de Adequação” do qual resultou que o Autor tinha uma tolerância alta ao risco quando comparado com a média da população.

4.1.27. Em 9 de Dezembro de 2014, a Oi celebrou um contrato de compra e venda de acções com a Altice Portugal, S.A. e a Altice, S.A. para venda a esta última do total de acções da PT Portugal, estando a conclusão do referido negócio condicionada, entre outras, à liberação das obrigações da PT Portugal ao abrigo das Notes 6.25% com garantia da Oi.

4.1.28. De forma a cumprir a condição suspensiva do Contrato de Compra e Venda de Acções, a Oi pretendeu introduzir certas alterações às Notes, incluindo a introdução da PTIF como emitente e principal devedora das Notes 6.25% em substituição da PT Portugal, porquanto aquela sociedade passaria a integrar a esfera jurídica da Oi, deixando também de ser uma participada da PT Portugal após a conclusão da venda à Altice.

4.1.29. Alterações que ficavam condicionadas à conclusão da venda das participações da PT Portugal à Altice.

4.1.30. Em 19 de Maio de 2015, em Assembleia de Obrigacionistas das Notes 6.25%, foi aprovada a substituição do emitente PT Portugal pela PTIF, condicionada à conclusão da venda da PT Portugal à Altice.

4.1.31. A denominação das Notes 6.25% foi corrigida em Março de 2015 nos extractos de conta, passando estas a denominar-se "Oibrbz 6.25% 07/26/16", notificados aos Autores a partir da referida data através do extracto do mês.

4.1.32. Em 2 de Junho de 2015, foi concluída com sucesso a venda da PT Portugal à Altice, pelo que a PTIF comunicou ao mercado, nesse mesmo dia, que passaria a ser a emitente e principal devedora das Notes 6.25%.

4.1.33. Com a conclusão da referida venda, os titulares das Notes 6.25% poderiam exercer igualmente o seu direito de solicitar o reembolso das notes até 30 de Julho de 2015, sendo o preço de reembolso de 103,975%.

4.1.34. A descida do rating das Notes 6.25% apenas ocorreu, e de forma marginal, em 06 de Outubro de 2015 relacionado com a actividade própria da Oi no Brasil.

4.1.35. De acordo com as agências de rating, era expressamente referido que a Oi tinha liquidez adequada para cumprir as suas obrigações durante os 12 a 18 meses seguintes, ou seja, até ao início de 2017, muito depois da maturidade das Notes 6.25%.

4.1.36. As deliberações de Assembleia de Obrigacionistas da PT foram divulgadas através dos canais próprios e designadamente através do sistema de difusão de informação da CMVM, sendo que tais informações foram publicadas no site da CMVM.

4.1.37. O negócio entre a PT e Oi foi noticiado na imprensa a partir de Outubro de 2013.

4.1.38. O Réu Banco 1... informou mensalmente o Autor, nos extractos bancários, da cotação referência das obrigações no mercado secundário.

4.1.39. Em data não concretamente apurada, mas no decurso de 2016, o Autor ficou sem acesso online à sua conta Banco 1.../Banco 2..., situação que e manteve durante a transição do Banco 1... para o Banco 2..., tendo este problema sido reportado ao Réu DD.

4.1.40. O problema mencionado em 39. foi avaliado presencialmente pelo Réu CC numa das suas visitas no local de trabalho do Autor, que testou o acesso à conta através do computador do Autor, tendo sido o problema solucionado presencialmente por aquele, numa segunda deslocação ao local de trabalho do Autor, em Abril de 2016, que colocou o acesso online/homebanking operacional.

4.1.41. No dia seguinte, o Autor pode finalmente consultar o seu saldo, e ao fazê-lo, deu-se conta que o mesmo tinha sofrido uma diminuição considerável e sem que o mesmo ou a sua esposa, Autora, tivessem efectuado algum pagamento extra

4.1.42. Após o facto mencionado em 4.1.41., o Autor contactou telefonicamente o Réu CC que lhe transmitiu que a diminuição de devia à cotação das obrigações PT que agora haviam passado para a Oi e que o valor de mercado das mesmas havia descido.

4.1.43. Em 14 de Abril de 2016, o Autor resolveu expor num e-mail todas as suas duvidas, rematando “Quero que dê conhecimento desta minha posição ao banco e pretendo que o Banco me preste oficialmente todos os esclarecimentos sobre a sua posição”, dúvidas que não obtiveram resposta pelo Réu que não respondeu ao email, tendo este se deslocado ao local de trabalho do Autor.

4.1.44. O Autor manifestou ao Réu CC o seu desagradado com a situação, sendo que este alegou que as obrigações tinham transitado da PT para a Oi e isso era algo que não era da responsabilidade do Banco, que era uma transição entre Operadoras de Telecomunicações que não podia ter previsto nem controlado.

4.1.45. Em 13 de Maio de 2016, o Réu CC solicitou uma reunião para tratar de dois assuntos pendentes e o Autor aproveitou para o questionar uma vez mais sobre a necessidade de ter sido informado ou até autorizar a operação que permitiu transferir as suas obrigações PT para a Oi.

4.1.46. Por email enviado a 14 de Julho de 2016, pelas 14h18m, o Autor resume as muitas conversas que havia tido com o Réu CC, pretendendo obter esclarecimento sobre se deveria ter sido informado previamente sobre a transferência das suas obrigações da PT para a Oi (e suas consequências e opções do Autor) e se eventualmente até precisaria o Banco da sua autorização por escrito, ao que o Réu CC respondeu que iria encaminhar as perguntas para o departamento respectivo no Banco.

4.1.47. Até 26 de Julho de 2016, data prevista para reembolso do capital investido e juros referentes ao último semestre, o pagamento não ocorreu.

4.1.48. Caso o Autor tivesse sido informado da possibilidade de reembolso antecipado, teria sido permitido pedir o resgate, sendo reembolsado e evitar as perdas que se verificaram em 26 de Julho de 2016.

4.1.49. Em 23 de Setembro de 2016, pelas 17h24m, o Réu CC envia por email ao Autor o anexo que havia referido numa reunião anterior, como um possível consentimento da parte do Autor. para que as suas obrigações da PT fossem transferidas para a OI correspondendo ao documento de subscrição das obrigações de 6 de Julho de 2012.

4.1.50. O Autor esperou algum tempo para que o Banco lhe respondesse às duas questões que havia colocado ao Réu em 14 de Julho de 2016, e na ausência de uma resposta, decidiu o Autor interpelar por carta datada de 29 de Novembro de 2016, registada e recepcionada pelo Réu Banco 2... em 30 de Janeiro de 2017, esperando que após uma reclamação formal, houvesse uma reacção do Banco.

4.1.51. Após o facto mencionado em 4.1.50, nunca mais o Réu CC telefonou ao Autor nem nunca mais o visitou.

4.1.52. O Autor, por carta datada de 7 de Agosto de 2017, desta feita através da sua representante legal, reitera o teor da interpelação referida em 50., recepcionada pelo Réu Banco 1... em 8 de Agosto de 2017.

4.1.53. O Réu Banco 2... nunca respondeu à reclamação do Autor mencionada em 4.1.50, nem à solicitação referida em 46. nem respondeu à interpelação da sua mandatária referida em 52.

4.1.54. Em 29 de Junho de 2016, o Tribunal Brasileiro, no âmbito do processo n.º 0203711-65.2016.8.19.000 que corre termos no Tribunal de Justiça da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, deferiu o pedido colectivo de processamento da recuperação judicial da Oi, S.A., Telemar Norte Leste, S.A. (“TNL”), Oi Móvel, S.A., Copart 4 Participações, S.A., Copart 5 Participações, S.A., Portugal Telecom International Finance, B.V. (PTIF) e a Oi Brasil Holdings Cooperatief U.A.

4.1.55. O acordo aprovado pelo tribunal brasileiro (“Programa de Acordo com Credores) prevê o pagamento integral dos créditos: “O Programa para Acordo com Credores prevê, para o Credor Oi cujo crédito for inferior ou igual a R$ 50.000,00, a antecipação, pelo Grupo Oi, de 90% do valor objeto do programa, mediante a aceitação do acordo pelo Credor Oi no prazo e nas condições previstos no Programa para Acordo com Credores. Os 10% do crédito remanescente serão recebidos após a homologação do Plano de Recuperação Judicial (“Plano”). O Credor Oi cujo crédito for superior a R$ 50.000,00 também terá o direito de participar do Programa para Acordo com Credores, caso em que receberá uma antecipação de R$ 50.000,00, mediante a aceitação do acordo pelo Credor Oi no prazo e nas condições previstos no Programa para Acordo com Credores, e o excedente do crédito será pago na forma do Plano. O Programa para Acordo com Credores beneficiará os Credores Oi participantes na medida em que possibilitará a antecipação de parte do valor objeto do programa.”, sendo que, de acordo com as informações do programa, “Podem participar os credores que constam da Relação de Credores do Administrador Judicial publicada no edital de 29 de maio de 2017 e disponível no website www.recjud.com.br.”

4.1.56. De acordo com o comunicado da Oi datado de 26 de Julho de 2017: “No caso de detentores de bonds emitidos pela Oi, PTIF e Coop, o trustee indicado na escritura dos bonds, (i) The Bank of New York Mellon para Oi e Coop; e (ii) Citicorp Trustee Company Limited para PTIF, foi listado na Primeira Lista de Credores em nome de todos os credores dos bonds internacionais emitidos pelas Recuperandas. Assim, não foi necessária a apresentação de Habilitação de Crédito ou Divergência à Primeira Lista de Credores pelos bondholders individuais para que tivessem seus créditos reconhecidos e a serem consequentemente pagos de acordo com o Plano de RJ”.

4.1.57. A Oi, S.A. requereu, em Portugal, no âmbito do processo n.º 16421/17.... (sob a forma de processo especial de revitalização), o reconhecimento da decisão que deferiu o processamento do pedido de recuperação judicial desta sociedade requerido no Brasil.

4.1.58. Conforme resulta de comunicação feita ao mercado a 6 de Março de 2017, a “Oi S.A. – Em Recuperação Judicial (“Companhia”) informa a seus accionistas e ao mercado em geral que tomou conhecimento, nesta data, de sentença proferida em 02.03.2017 pelo Juízo de Comércio de Lisboa – Juiz 3 do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, por meio da qual foi reconhecida, com relação à Companhia e à Telemar Norte Leste S.A. – Em Recuperação Judicial, a decisão que deferiu o processamento do pedido de recuperação judicial formulado no Brasil, nos termos da Lei nº 11.101/05 e da Lei de Sociedades Anônimas Brasileira, proferida pelo Juízo da 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, em 29.06.2016”.

4.1.59. O Réu Banco 2..., na pessoa da sua funcionária EE, nova gestora de conta do Autor a partir do ano de 2017, informou o Autor sobre a possibilidade de reembolso do capital investido no âmbito do procedimento de recuperação da Oi.

4.1.60. Na sequência do descrito em 59., o Autor foi reembolsado em €12.106,54 (doze mil, cento e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos) em 4 de Dezembro de 2017 e em €1.345,17 (mil, trezentos e quarenta e cinco euros e dezassete cêntimos) em 9 de Fevereiro de 2018.

4.1.61. Numa das reuniões tidas com EE, em 2017, o Autor questionou-a sobre a existência de um hipotético portal onde os subscritores das obrigações PT se teriam de inscrever e explicitamente autorizar ou recusar que as obrigações passassem da PT para a Oi ou não se concordando, a possibilidade do resgate antecipado do capital investido e juros vencidos.

4.1.62. EE confirmou a existência desse portal e esclareceu o Autor dos procedimentos que ela própria havia tomado quanto aos seus clientes.

4.1.63. Em 10 de Novembro de 2017, o Autor reuniu com EE e FF, responsável pela zona Centro da Rede de Retalho do Banco 2..., com vista a alcançar uma solução extrajudicial para o seu problema.

4.1.64. Na reunião mencionada em 63., o Autor relatou a história relativa à aplicação de €47.000,00 (quarenta e sete mil euros).

4.1.65. O Autor também questionou FF se era verdadeira a existência de uma plataforma onde os subscritores se deveriam inscrever para autorizar ou recusar a transferência das obrigações da PT para a Oi, sendo a resposta positiva assim como a necessidade de o subscritor dar a sua autorização para a transmissão das obrigações de forma explicita e obrigatória, ou, não sendo dado esse consentimento, o resgate do capital investido e juros vencidos.

4.1.66. No dia 17 de Novembro de 2017, pelas 15h06m, o Autor enviou a FF o resumo da reunião mencionada em 63., email que boa resposta, informando que estava em curso um processo de reclamação com a referência ...6, referindo que o Banco daria resposta assim que oportuno, o que não aconteceu até hoje.

4.1.67. Os Réus tinham conhecimento da operação de venda da PT e as suas implicações sobre as obrigações subscritas pelo Autor.

4.1.68. Por força dos factos, os Autores tiveram que recorrer a outra forma de financiamento para a construção da sua casa.

4.1.69. Toda a situação acarretou para o Autor um sentimento de desconfiança, desgaste, stress e ansiedade decorrente da situação de prejuízo e incerteza.

4.1.70. O sentimento de revolta e frustração do Autor é maior por não conseguir obter uma reacção ou uma proposta com vista a uma solução.

4.1.71. A acção foi proposta em 20 de Fevereiro de 2018, tendo sido os Réus Banco 2..., Banco 1... e CC citados em 22 de Fevereiro de 2018.


*

E considerou não provados os seguintes factos

4.2.1 A Autora também interveio nos factos descritos em 4.1.17;

4.2.2.O facto descrito em 4.1.7. ocorreu após muita insistência;

4.2.3 Nas circunstâncias descritas em 4.1.10, o Réu CC incentivava e pressionava os Autores para que realizassem aplicações financeiras no Réu Banco 1..., dando como contrapartidas boas condições, segurança e excelentes taxas de juros a realizar os mais variados investimentos financeiros;

4.2.4 Os contactos mencionados em 13. eram para convencer o Autor a investir nos mais diversos produtos financeiros;

4.2.5 Nos primeiros dias de Julho de 2012, o Réu CC apresentou ao Autor o produto mencionado em 4.1.17. como “uma oportunidade de investimento irrecusável, com uma taxa elevada, de médio prazo, garantido e sem qualquer risco”, argumentando que se tratava da PT, uma “Jóia da Coroa”, e que tal referência valia por si, sem necessidade de qualquer outra “due dilligence”;

4.2.6 Após a recusa do Autor o Réu CC não desistiu e continuou a assediar o Autor no sentido de realizar esse investimento, deslocando-se sempre e para o efeito ao local de trabalho do Autor.

4.2.7 Até que face à insistência do Réu CC, e não querendo ser desagradável, o Autor acabou em 06 de Julho de 2012 por aceder na subscrição do produto mencionado em 4.1.17. e que segundo as suas palavras se caracterizava por: a) Ter uma taxa de juro elevada, quando comparada com os depósitos a prazo; b) Ser um investimento de médio prazo – 4 anos; c) Haver garantia de investimento, isto é, retorno garantido sem risco;

4.2.8 Após a subscrição do produto mencionado em 4.1.17., confiando na palavra do Réu CC, o Autor foi apenas acompanhando o seu investimento de €47.000,00 (quarenta e sete mil euros), recebendo semestralmente o pagamento dos juros estipulados;

4.2.9 O Réu Banco 2... também actuou conforme o descrito em 4.1.21.

4.2.10. O Autor foi informado pelo Réu Banco 1... da sua política de execução de ordens, o que foi efectuado através da comunicação de um pacote de informação designado “Kit-MiFID”, o qual continha, entre outras, a informação relativa a (i) Política de Execução e Transmissão de Ordens; (ii) Resumo da Política de Conflitos de Interesses; (iii) Comunicação da classificação MiFID (incluindo o aviso do direito de requerer uma nova classificação).;

4.2.11 A informação relativa à volatilidade do preço e às características dos diversos produtos financeiros foi igualmente partilhada pelo Réu Banco 1... através da entrega, no momento da abertura de conta ou, neste caso, no momento da subscrição das Notes 6.25%, do documento que se junta em anexo intitulado de “Os Riscos dos Mercados Financeiros”;

4.2.12 Os Autores foram informados de que o risco de perda de capital correspondia ao risco de insolvência do Emitente e de que, até à data de maturidade, existia risco de liquidez associado às oscilações do valor das Notes 6.25% no mercado secundário.

4.2.13 O Réu Banco 1... indicou ainda aos Autores que poderiam encontrar todos os documentos informativos do produto financeiro em causa no sítio da CMVM – nomeadamente, em www.cmvm.pt –, onde os poderia consultar, ou ainda no portal Banco 1... – disponíveis a partir de 29 de Dezembro de 2012, no seguinte local OFERTA > PARTICULARES > APLICAÇÕES > TÍTULOS E OUTROS PRODUTOS DE INVESTIMENTOS > OBRIGAÇÕES PT, sendo que a a documentação aí disponível era constituída pelo Prospecto Base, Sumário, Condições Gerais e Final Terms, constando do Boletim de Subscrição do Emitente que se encontrava disponível aos balcões do Réu Banco.

4.2.14 Foi facultado ao Autor o documento informativo do produto, bem como o local onde o mesmo poderia ser consultado;

4.2.15 Os Autores foram igualmente advertidos, por escrito, de que o intermediário financeiro, à data o Réu Banco 1..., não estava obrigado a realizar qualquer teste de adequação do produto às circunstâncias e perfil dos Autores.

4.2.16 O Autor foi informado pelo Réu CC de que caso procedesse ao resgate antecipado teria de assumir as menos valias, tomando o Autor a sua decisão em face da informação prestada.

4.2.17 O Réu Banco 1... comunicou ao Autor os factos descritos em 4.1.27. a 4.1.33.

4.2.18 O Réu Banco 1... informou os Autores, através de mensagem de texto, que se encontrava agendada para o dia 3 de Março de 2014 uma Assembleia de Obrigacionistas na qual se iria deliberar a alteração de emitente, a constituição da garantia por parte da Oi, S.A. e o termo de limitação de responsabilidade em caso de incumprimento.

4.2.19 O Réu Banco 1... informou o Autor telefonicamente ou em reunião presencial pelo seu gestor de conta, que lhe transmitiu a possibilidade de participar na Assembleia de Obrigacionistas mencionada 23. em recebendo, para o efeito, um consent fee e, bem assim, que deliberações seriam tomadas, ainda que de forma condicional, na referida Assembleia.

4.2.20 O Autor foi informado pelo Réu Banco 1... da possibilidade de exercício antecipado da opção de reembolso, pelo seu gestor de conta, em meados de Junho de 2015, via telefónica ou em reunião presencial.

4.2.21 O gestor de conta do Autor tinha instruções internas para recolher junto do Autor a sua opção quanto ao exercício do direito de reembolso antecipado, o que o Autor entendeu não exercer porque, em Junho de 2015, estava longe de imaginar o desfecho da Oi, S.A. e da PTIF cerca de um ano depois.

4.2.22 Na sequência dos factos descritos em 4.1.39., quando o Réu CC foi confrontado pelo Autor sobre as suas instruções relativamente a não aplicar o seu dinheiro em aplicações financeiras de risco, aquele primeiro acabou por dizer que a culpa não era sua, mas sim do Eng. GG e do Banco 3....

4.2.23 Nessa sequência, o Autor questionou se não seria melhor resgatar o valor restante, sendo que o Réu CC respondeu “nem era bom pensar nisso”, para confiar nele, pois tinha dados muito concretos que o valor iria voltar ao “par” e que em 26 de Julho de 2016 iria o Autor receber todo o capital investido.

4.2.24 Nas circunstâncias de tempo e lugar mencionadas em 4.1.42., o Autor questionou o Réu CC se a transferência de obrigações da PT para a Oi, não carecia que o Autor assinasse algum documento ou, pelo menos, que tivesse sido fornecida a devida informação prévia ao Autor.

4.2.25 A resposta do Réu CC foi de que não seria necessária qualquer assinatura ou autorização, porquanto, esse assunto não dizia respeito ao Banco, mas sim à PT, e que quanto a ele deveria ter sido a PT a informar e não o Banco, referindo, ainda, que o Banco nada teria a ver com esse assunto e, por isso, não teria de informar nem pedir autorização.

4.2.26 No decorrer da mesma reunião, acabou por tentar sossegar o Autor garantiu-lhe ter boas informações do Banco, de que tudo se iria compor e que o A iria receber a totalidade do capital investido no final de Julho de 2016.

4.2.27 Em 21 de Julho de 2016, o Réu CC apresentou-se no local de trabalho do Autor para conversar sobre o teor daquela comunicação, mostrando-se incomodado pelo facto de o Autor ter feito as questões por e-mail, quando já havia respondido várias vezes às mesmas nas conversas que tivera com o Autor, tendo justificado ter enviado o e-mail para um departamento do Banco, para que o Autor tivesse a certeza que a resposta que iria receber do Banco seria exactamente a mesma que sempre aquele lhe havia dado

4.2.28 O Réu CC manteve exactamente a mesma argumentação: o Banco não precisava de informar, pois essa informação deveria ter sido dada pela PT, que o Banco é um mero intermediário, pois o que o Autor havia comprado eram obrigações PT e não outro produto financeiro do Banco.

4.2.29 O Autor confrontou o Réu CC com o facto de ter dado instruções claras que não queria investir em produtos de risco, ao que este avançou que “ninguém poderia imaginar que GG fosse vender a PT e que o Banco 3... tivesse “roubado” quase mil milhões de euros à PT”, que “não era culpa sua a ocorrência deste risco que ninguém conseguiu prever”, rematando sempre para que o Autor “tivesse paciência e calma pois iria recuperar o capital investido”.

4.2.30 Quando o Autor insistiu em perceber se não deveria ter sido previamente informado dessa operação (com a possibilidade de ter resgatado o capital investido atempadamente e sem perdas, como mais tarde veio a descobrir após o não reembolso no prazo previsto). ou assinado um documento consentindo na cessão daqueles títulos para a Oi, o Réu CC afirmou sempre de “não”.

4.2.31 No início de Setembro de 2016, o Autor telefona ao Réu CC, questionando-o sobre a falta de resposta ao e-mail que o Autor havia enviado em 14 de Julho de 2016 por parte do tal departamento do Banco.

4.2.32 Em meados de Setembro de 2016, o Réu CC deslocou-se mais uma vez ao local de trabalho do Autor, onde afirmou que pelo facto do Banco ainda não ter respondido, seria um excelente sinal, pois significaria que estaria a avaliar o caso do Autor e que se algo estivesse errado, o Banco 2... iria pedir responsabilidades ao Banco 1... e se assim fosse a situação do Autor estaria resolvida.

4.2.33 O Réu CC afirmou que haveria no banco um documento assinado pelo Autor relativamente às Obrigações PT e que não tinha a certeza até que ponto essa assinatura não seria suficiente para que a PT pudesse fazer a transferência das obrigações para a Oi, ao que o Autor ficou muito surpreendido, pois que não se recordava de nada ter assinado nesse sentido.

4.2.34 O Autor informou o Réu CC de que não sendo as informações esclarecimentos, por diversas vezes solicitados satisfatórios, iria apresentar uma reclamação por escrito junto do Banco.

4.2.35 A reacção do Réu foi imediata, pedindo ao Autor não enviasse nenhuma carta ao Banco, pois “iria estragar o bom caminho como as coisas estavam a ser tratadas” e que “esperasse pela resposta”, pois, “a mesma iria ser dada em muito breve”.

4.2.36. Perante esta promessa do Réu CC, o Autor tomou a decisão de não efectuar a reclamação.

4.2.37 O Réu CC actuou de forma dolosa e premeditada.

4.2.38 O Réu Banco 2... deu cobertura aos propósitos do Réu CC ao ignorar as reclamações dos Autores.

4.2.39 Em 27 de Junho de 2016, o Réu Banco 2... informava os Autores da situação de incumprimento do emitente das obrigações.

4.2.30 Em 22 de Julho de 2016, o Réu Banco 2... informava os Autores do processo judicial da Oi.

4.2.41 Em 10 de Agosto de 2016, o Réu Banco 2... transmitia aos Autores a comunicação recebida pela Portugal Telecom International Finance BV com esclarecimento de dúvidas sobre o reembolso das obrigações.

4.2.41 Em 9 de Setembro de 2016, o Réu Banco 2... transmitia aos Autores a comunicação recebida pela Portugal Telecom International Finance BV sobre o Plano de Recuperação Judicial da Oi.

4.2.42 Em 29 de Setembro de 2016, o Réu Banco 2... transmitia aos Autores a comunicação recebida pela Portugal Telecom International Finance BV sobre a Publicação da lista de credores.

4.2.43 A 12 de Outubro de 2016, o Réu Banco 2... transmitia aos Autores a comunicação recebida pela Portugal Telecom International Finance BV sobre a suspensão de pagamentos iniciado em relação à PTIF.

4.2.44 Em 14 de Dezembro de 2016, o Réu Banco 2... transmitia aos Autores a comunicação recebida pela Portugal Telecom International Finance BV sobre o pedido de declaração de insolvência so emitente apresentado em Amesterdão.

4.2.45 Em 21 de Fevereiro de 2017, o Réu Banco 2... remete uma notificação aos AUTORES sobre o pedido de insolvência da Portugal Telecom International Finance BV.

4.2.46 Em 16 de Maio de 2017, o Réu Banco 2... remete uma notificação aos Autores referente ao recurso sobre a decisão ao pedido de insolvência da Portugal Telecom International Finance BV.

4.2.47 Em 5 de Junho de 2017, o Réu Banco 2... remete uma notificação aos AUTORES sobre a publicação da lista de credores da Oi.

4.2.48 Em 3 de Julho de 2017, o Réu Banco 2... transmite aos Autores a comunicação sobre a aprovação do procedimento de mediação.

4.2.49 Os Autores foram notificados e aceitaram os efeitos do acordo mencionado em 3., ao qual nunca se opuseram;

4.2.51 A situação provocou um permanente sobressalto dos Autores que acabou por se reflectir negativamente na sua relação com família e amigos.

4.2.52 Os Autores passaram a questionar-se permanentemente se esse seria o dia em que iriam ver as suas poupanças perdidas, não apenas em relação a este produto, mas na relação geral com os Bancos, sendo essa a dúvida que os assalta diariamente.

4.2.53 Os Autores alegam o desconhecimento de documentos particulares por si assinados com vista a omitir factos relevantes à boa decisão da causa e impedir o bom prosseguimento dos autos, apresentando requerimentos dilatórios sem fundamento sério.

4.2.54 Os Autores omitiram deliberadamente que foram informados da alteração do garante PT/Oi e que participaram na assembleia de Obrigacionistas da PT na qual foi deliberada a alteração do garante para a Oi.;

IV De Direito

Da caducidade do direito dos autores por omissão de conduta devida

À cabeça das suas alegações, o recorrente Banco 1... insurge-se contra a decisão do tribunal a quo na parte em que a mesma julgou improcedente a exceção de caducidade invocada por ambos os réus

Defende o recorrente a aplicabilidade ao caso em apreço do preceituado no art. 243º, b), do Código dos Valores Mobiliários ex vi art. 251º do mesmo diploma legal, na versão vigente à data da subscrição das obrigações.

Segundo o Recorrente, “Apesar de o mencionado regime ter sido construído para o emitente das obrigações, o primeiro obrigado aos deveres de informação, o mesmo raciocínio deve ser aplicado analogicamente ao intermediário financeiro, considerando que as mencionadas normas constituem normas especiais face ao regime geral resultante dos arts. 483.º e 485.º do CC (…)

Não se descortina qualquer razão para que (i) o emitente das obrigações beneficie de prazos de caducidade/prescrição mais favoráveis que os aplicáveis, nos termos gerais do art. 498, n.º 1 do CC, ao intermediário financeiro pelo alegado incumprimento de deveres de informação relativos a valores mobiliários e (ii) para que a vigência de um prazo de prescrição/caducidade para a responsabilidade extracontratual do intermediário financeiro possa ser superior àquele que é aplicável à sua responsabilidade contratual, nos termos do art. 324.º do CVM, o que contrariaria os princípios gerais da responsabilidade civil.

Na sentença, na recorrida a questão da caducidade é tratada nos seguintes termos:
O artigo 243.º reporta-se à responsabilidade pelo conteúdo do prospecto, exigido nos termos do artigo 236.º, dispondo a alínea b) que o direito à indemnização deve ser exercido no prazo de seis meses após o conhecimento da deficiência do prospecto ou da sua alteração e cessa, em qualquer caso, decorridos dois anos a contar da divulgação do prospecto de admissão ou da alteração que contém a informação ou previsão desconforme.

O artigo 251.º refere-se à responsabilidade pelo conteúdo da informação que os emitentes publiquem, com aplicação do disposto no citado artigo 243.º.

Os referidos preceitos reportam-se aos emitentes das obrigações, não sendo aplicáveis aos intermediários financeiros, mesmo que actuem concomitantemente na veste de emitentes, na medida em que o artigo 324.º, n.º 2, do Código de Valores Mobiliários é norma especial que se lhes aplica (cfr. Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães, datados de 10.07.2019, no processo n.º 5764/17.0 T8BRG.G1, 14.11.2019, no processo n.º 3527/18.4T8VCT-A.G1 e de 11.11.2021, no processo n.º 831/19.8T8VCT.G1, disponíveis em www.dgsi.pt).

Acresce que os artigos 243.º e 251.º do Código dos Valores Mobiliários são normas excepcionais, que não permitem aplicação analógica, sendo de descartar a interpretação extensiva (artigo 11.º do Código Civil).

Face ao exposto, improcede a excepção peremptória de caducidade invocada pelos Réus.

Vejamos.

Estipula o artigo 243º do CVM (que regula a responsabilidade pelo conteúdo do prospeto nas “formas organizadas de negociação”) que “à responsabilidade pelo conteúdo do prospeto aplica-se o disposto nos artigos 149.º a 154.º (relativos às ofertas públicas), com as devidas adaptações e as seguintes especialidades:
a) São responsáveis as pessoas referidas nas alíneas c), d), f) e h) do n.º 1 do artigo 149.º;
b) O direito à indemnização deve ser exercido no prazo de seis meses após o conhecimento da deficiência do prospeto ou da sua alteração e cessa, em qualquer caso, decorridos dois anos a contar da divulgação do prospeto de admissão ou da alteração que contém a informação ou previsão desconforme.”

Já o artigo 251º estipula que “À responsabilidade pelo conteúdo da informação que os emitentes publiquem nos termos dos artigos anteriores aplica-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 243.º

Por seu turno, relativamente ao intermediário financeiro, prescreve o artigo 324º, n.º 2 “salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos”.

Enquadrando o dever de informação quer do intermediário financeiro, quer do emitente, prescreve o artigo 7.º n.º 1 do CVM “a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita”.

Ora, acompanhando aqui, tal como na sentença recorrida, o entendimento expresso no ali identificado acórdão da Relação de Guimarães de 14/11/2019[1] concluímos que “Da análise e articulação dos citados normativos decorre claramente para nós a existência no CVM, e no que para o que agora nos interessa, de dois regimes específicos de responsabilidade civil por violação do dever de informação – a do intermediário financeiro pelo conteúdo da informação prestada ao seu cliente no âmbito da prestação de serviços de intermediação e a do emitente pelo conteúdo do prospeto de oferta pública e pelo conteúdo do prospeto nas “formas organizadas de negociação” (nesta se incluindo também, sem qualquer problema, a responsabilidade pela omissão no conteúdo de tais prospetos) – regimes de responsabilidade esses que incluem prazos distintos para o exercício dos correspondentes direitos.(…).

É pacífico que a suposta omissão de deveres de informação que os autores imputam ao réu recorrente, decorre da atuação deste enquanto intermediário financeiro que comercializou um produto financeiro emitido por uma terceira entidade, executando uma ordem de subscrição dada pelo autor marido, seu cliente.

Estando em causa nos autos uma atuação nesta na qualidade de intermediário financeiro, a situação dos autos não está sujeita ao prazo de caducidade do mencionado artigo.

Por conseguinte, deve manter-se a decisão que julgou improcedente a exceção de caducidade.


*

O âmbito dos deveres de informação que recaíam sobre o réu Banco 1... e a não verificação dos pressupostos da obrigação de indemnizar por violação de tal dever.

Seguidamente, abordar-se-á, em conjunto, a questão do âmbito dos deveres de informação que recaiam sobre o réu Banco 1..., enquanto intermediário financeiro através de quem foi concretizada a subscrição das obrigações PT pelo autor marido, e a questão da falta de verificação dos pressupostos da pretensão indemnizatória reclamada pelos autores.

 Tratam-se que questões que parcialmente se “sobrepõem” e, ao fim e ao cabo, são objeto do recurso de ambas as partes.

Cumpre salientar que sobre a temática em apreço – responsabilidade do intermediário financeiro por informações, o Supremo Tribunal de Justiça proferiu, em 06/12/2021, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº8/2022 [2] relativo à responsabilidade civil do intermediário financeiro, uniformizando jurisprudência nos seguintes termos:

“1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.”

É certo que se trata de jurisprudência fixada no domínio da versão do Código dos Valores Mobiliários anterior à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, ou seja, a versão diversa da aplicável aos presentes autos[3], não estando, por isso, este tribunal literalmente vinculado pela jurisprudência ali uniformizada, por não literalmente aplicável, dado o teor dos arts. 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro

Todavia, como referem o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/07/2023[4] e de 20/06/2023[5], entre outros, “há que reconhecer que o referido Decreto Lei nº 357-A/2007, de 31/10 não introduziu, neste particular, nenhuma alteração que invalide a aplicação do argumentário da jurisprudência uniforme, que assim deve ser seguida”.

Ora, entende-se dever seguir e perfilhar a doutrina firmada neste acórdão, aceitando e aplicando a jurisprudência assim uniformizada à situação sub iudice, com todas as inerentes consequências no plano jurídico.

Está, então, em causa o pedido de condenação dos réus no pagamento de indemnização por violação de dever de informação da possibilidade de reembolso antecipado das Notes 6.25%, subsequente à concretização da ordem de aquisição do produto financeiro em causa, que a sentença recorrida entendeu que recaía sobre o apelante Banco 1....

No caso, é incontroverso que o Banco réu Banco 1... atuou, perante os autores, na qualidade de intermediário financeiro, na medida em que comercializou um produto financeiro emitido por uma terceira entidade, com a necessária execução de ordem de subscrição.

Não há, assim, dúvidas de que este recorrente atuou na qualidade de intermediário financeiro, nos termos do disposto nos arts. 289º, nº 1, al. a), 290º, nº 1, al. b), e 293 º, nº 1, al. a), todos do Código dos Valores Mobiliários (CVM), aprovado pelo DL n.º 486/99, de 13.11, na redação em vigor no momento da subscrição do produto financeiro em causa nestes autos.

Assim sendo, ao caso é aplicável o Regime Geral das Instituições de Crédito e, bem assim, o Código de Valores Mobiliários, de acordo com a última versão introduzida pelo DL nº 85/2011, de 29 de junho.

Neste âmbito, rege o art.º 77º, nºs 1 e 5, do Regime Jurídico das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, em vigor à data da subscrição do produto, que dispõe que “as instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes”, determinando que “os contratos celebrados entre as instituições de crédito e os seus clientes devem conter toda a informação necessária e ser redigidos de forma clara e concisa.”.

Também o Código de Valores Mobiliários regula o dever de informação que impende sobre os intermediários financeiros, dispondo o seu art.º 304º que:

“1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado;

2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência;

 3 - Na medida do necessário para o cumprimento dos seus deveres na prestação do serviço, o intermediário financeiro deve informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objectivos de investimento do cliente;

4 - Os intermediários financeiros estão sujeitos ao dever de segredo profissional nos termos previstos para o segredo bancário, sem prejuízo das excepções previstas na lei, nomeadamente o cumprimento do disposto no artigo 382.º;

 5 - Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração e às pessoas que dirigem efectivamente a actividade do intermediário financeiro ou do agente vinculado e aos colaboradores do intermediário financeiro, do agente vinculado ou de entidades subcontratadas, envolvidos no exercício ou fiscalização de actividades de intermediação financeira ou de funções operacionais que sejam essenciais à prestação de serviços de forma contínua e em condições de qualidade e eficiência.” .

Dispõe o artigo 312 º (Deveres de informação):

 “1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes: a) Ao intermediário financeiro e aos serviços por si prestados; b) À natureza de investidor não qualificado, investidor qualificado ou contraparte elegível do cliente, ao seu eventual direito de requerer um tratamento diferente e a qualquer limitação ao nível do grau de protecção que tal implica; c) À origem e à natureza de qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço a prestar, sempre que as medidas organizativas adoptadas pelo intermediário nos termos dos artigos 309.º e seguintes não sejam suficientes para garantir, com um grau de certeza razoável, que serão evitados o risco de os interesses dos clientes serem prejudicados; d) Aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas; e) Aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar; f) À sua política de execução de ordens e, se for o caso, à possibilidade de execução de ordens de clientes fora de mercado regulamentado ou de sistema de negociação multilateral; g) À existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente que abranja os serviços a prestar; h) Ao custo do serviço a prestar.

2 - A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.

3 - A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral.

4 - A informação prevista no n.º 1 deve ser prestada por escrito ainda que sob forma padronizada.

5 - Sempre que, na presente subsecção, se estabelece que a informação deve ser prestada por escrito, a informação deve ser prestada em papel salvo se: a) A prestação da informação noutro suporte seja adequada no contexto da relação, actual ou futura, entre o intermediário financeiro e o investidor; e b) O investidor tenha expressamente escolhido a prestação da informação em suporte diferente do papel.

6 - Presume-se que a prestação de informação através de comunicação electrónica é adequada ao contexto da relação entre o intermediário financeiro e o investidor quando este tenha indicado um endereço de correio electrónico para a realização de contactos no âmbito daquela.

7 - A informação prevista nos artigos 312.º-C a 312.º-G pode ser prestada através de um sítio da Internet, se o investidor o tiver expressamente consentido e desde que: a) A sua prestação nesse suporte seja adequada no contexto da relação, actual ou futura, entre o intermediário financeiro e o investidor; b) O investidor tenha sido notificado, por via electrónica, do endereço do sítio da Internet e do local no mesmo de acesso à informação; c) Esteja continuamente acessível, por um período razoável para que o investidor a possa consultar.” .

O art.º 312º do Código de Valores Mobiliários dispõe, portanto, sobre o conteúdo e o âmbito do dever de informação a cargo do intermediário financeiro, que deve prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada; sendo certo que a obrigação a prestar deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (cfr. art.º 7º, nº 1, do Código de Valores Mobiliários).

A violação do dever de informar gera, na esfera jurídica do intermediário, uma obrigação de indemnizar, sendo que a culpa do intermediário financeiro se presume quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação (cfr. art. 304º-A do Código de Valores Mobiliários).

O dever de informar emerge, como nos contratos em geral, do dever de agir em conformidade com a boa-fé, sendo evidente que a natureza dos investimentos, muitas vezes complexos e com elevados riscos associados, torna o cumprimento de tal dever essencial na economia dos contratos celebrados. Assim, não surpreende que o legislador considere que “a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.” (cfr. art. 312º, nº 2, do Código de Valores Mobiliários).

Deste modo, o Código de Valores Mobiliários densifica com particular cuidado o conteúdo do dever de informar sempre que o cliente seja considerado um investidor não qualificado (cfr. arts. 312º-A, 312º-B e 312º-C, todos do Código de Valores Mobiliários), exigindo, outrossim, que o intermediário se inteire do tipo de cliente em causa através de questionários elaborados para o efeito (art.º 314.º do Código de Valores Mobiliários).

No que especificamente diz respeito à informação relativa aos instrumentos financeiros, dispõe o art.º 312º-E do CVM que:

“1 - O intermediário financeiro deve informar os investidores da natureza e dos riscos dos instrumentos financeiros, explicitando, com um grau suficiente de pormenorização, a natureza e os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa.

2 - A descrição dos riscos deve incluir: a) Os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento; b) A volatilidade do preço do instrumento financeiro e as eventuais limitações existentes no mercado em que o mesmo é negociado; c) O facto de o investidor poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de aquisição do mesmo; d) Quaisquer requisitos em matéria de margens ou obrigações análogas, aplicáveis aos instrumentos financeiros desse tipo.

3- A informação, prestada a um investidor não qualificado sobre um valor mobiliário objeto de uma oferta pública, deve incluir a informação sobre o local onde pode ser consultado o respetivo prospeto.” (…).

Como sintetizou o supra mencionado AUJ n.º 8/2022, “(em) conclusão, a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor (cliente) relativa a atividades de intermediação e emitentes, que seja suscetível de influenciar as decisões de investimento, deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (artigo 7.° do CVM), devendo o intermediário financeiro prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, sendo que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e de experiência do cliente, informando dos riscos especiais que as operações envolvem (artigo 312.° do CVM) e orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes, devendo observar os ditames da boa fé, com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, informando-se, previamente, sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência e investimentos (aspetos que o intermediário financeiro tem o dever de conhecer) e sem esquecer que compete ao intermediário financeiro tomar a iniciativa de prestar todas as informações e não aguardar que o investidor (cliente) as solicite.”.

Na situação dos autos, verifica-se que os autores assentam a sua pretensão indemnizatória na violação do dever de informação que, em seu entender, os determinou a subscrever o produto financeiro descrito nos autos e a não tomar conhecimento das opções ao seu dispor em momento posterior à celebração do contrato de forma a evitar a perda do capital investido.

Face ao decidido na sentença recorrida e ao âmbito do recurso interposto, no caso dos autos, o problema não se situa no momento em que o autor decide rentabilizar as suas poupanças através da subscrição de obrigações da PT acima identificadas e por intermediação do banco Banco 1....

É que, conforme resultou provado: O Autor assinou, de livre e esclarecida vontade, o boletim de subscrição das obrigações, tomando conhecimento dos termos mencionados em 4.1.17., aí declarando “conhecer e aceitar a política de execução e transmissão de ordens e o preçário do Banco 1... aplicável à ordem transmitida” e “(…) conhecia o risco do investimento mencionado em 4.1.17., sabia que o pagamento seria feito pelo Grupo PT e que o pagamento dependeria da capacidade e solvabilidade do emitente (factos n.ºs 4.119 e 4.1.20).

Como se discorre no acórdão da Relação do Porto de 21.3.2013[6], citando Gonçalo Castilho dos Santos[7], “os concretos deveres de informação previstos no CVM e no Regulamento da CMVM nº 12/2000 são compostos por um núcleo essencial aplicável à generalidade das formas de intervenção financeira, acrescendo outros deveres que variam conforme a forma de intermediação contratada.

Diferentemente do que acontece, por exemplo, com as modalidades de serviços de gestão de carteira de títulos ou de serviços de consultoria, no âmbito do serviço de mera transmissão e execução ordens (como aconteceu no caso) não decorre que o intermediário financeiro tenha de prestar informações sobre a evolução do investimento.

O dever de informar os investidores da natureza e dos riscos dos instrumentos financeiros, com um grau suficiente de pormenorização quanto à natureza e aos riscos do tipo de instrumento em cada caso concreto (art.º 312º-E, nº 1, do CVM) é estabelecido quanto ao contrato de intermediação financeira de receção e transmissão de ordens para a fase pré-contratual, porquanto visa a tomada de uma decisão esclarecida por parte do investidor, mas já não para fase posterior à concretização do investimento. O Réu não tinha qualquer obrigação de comunicar qualquer previsão de desvalorização ou de aconselhar a venda das obrigações”.

Contudo, e como prevê o nº 4 do art.º 312º B do Código de Valores, o intermediário financeiro tem o dever de notificar o cliente com antecedência suficiente, de qualquer alteração significativa na informação prestada inicialmente.

Desta forma, os deveres, nomeadamente de informação, do intermediário financeiro não se esgotam no período pré-contratual e no ato de concretização do contrato, mas mantêm-se ao longo da decorrência deste.

Como se diz no Ac. do STJ de 16/11/2023[8], “Este dever de informação acompanha toda a execução do contrato, prevendo o art. 312.º-B, n.º 3, do CVM, que “o intermediário financeiro notifica o cliente, independentemente da natureza deste, com antecedência suficiente, de qualquer alteração significativa na informação prestada ao abrigo dos artigos 312.º-C a 312.º-G, através do mesmo suporte com que foi prestada inicialmente.” Ora, na informação prestada não pode deixar de constar a data de maturidade do produto”.

Parece-nos, por isso, correto o entendimento da sentença recorrida quando sustenta que recaía sobre o réu Banco 1... um dever de informação de sobre a possibilidade de antecipação da maturidade das obrigações, após conclusão da venda da PT Portugal à Altice.[9]

Com efeito, provou-se que, em 2 de Junho de 2015, foi concluída com sucesso a venda da PT Portugal à Altice, pelo que a PTIF comunicou ao mercado, nesse mesmo dia, que passaria a ser a emitente e principal devedora das Notes 6.25% e ainda que, com a conclusão da referida venda, os titulares das Notes 6.25% poderiam exercer igualmente o seu direito de solicitar o reembolso das notes até 30 de Julho de 2015, sendo o preço de reembolso de 103,975%. (factos n..ºs 4.1.32 e 4.1.33).

Não se trata aqui de uma mera prestação de informações sobre a evolução do investimento do autor – que, como vimos, não constitui dever do intermediário financeiro no âmbito de um contrato de transmissão e execução de ordem - mas antes de uma circunstância [a (possibilidade de) alteração do prazo de maturidade da obrigação], que não pode deixar de constituir uma alteração significativa da informação prestada ao autor  abrigo do n.º 1 do art.º 312º-C do CVM (relativa à natureza do produto intermediado) que era do conhecimento do ré Banco 1..., na medida em que ficou provado que “os réus que tinham conhecimento da operação de venda da PT e das suas implicações sobre as obrigações subscritas pelo autor” (facto provado n.º 4.1.67). Tanto assim que, posteriormente,  um funcionario do banco confirmou ao autor a existência de  um portal onde os subscritores das obrigações PT se teriam de inscrever e explicitamente autorizar ou recusar que as obrigações passassem da PT para a Oi ou não se concordando, a possibilidade do resgate antecipado do capital investido e juros vencidos. (facto n.º 4.1.65)

Por conseguinte, o tribunal a quo considerou - e a nosso ver bem – recair sobre o recorrente Banco 1... um dever de comunicar ao autor,  de forma oportuna, a possibilidade de antecipação da maturidade do produto, que oferecia a investidores como o autor não só a possibilidade de reaver a totalidade do capital mas ainda juros, com a valorização do capital da Note, com o preço do reembolso de 103,975% do montante do capital da Note, desde que o requeressem até ao dia 31 de junho de 2015.

Considerando também que tal dever foi incumprido pelo recorrente, conclui o Tribunal a quo que o mesmo “violou o dever de diligência previsto no art. 304º do Código de Valores Mobiliários, tendo como consequência que o autor não tivesse podido exercer o direito ao reembolso antecipado acabasse por ser reembolsado do capital”.

A sentença recorrida entrou, seguidamente, na análise dos pressupostos da responsabilidade civil do intermediário financeiro concluindo pela verificação dos pressupostos da ilicitude e da culpa, considerada verificada por presunção, nos termos do nº2 do art.º 304º-A do CVM.

No tocante ao dano, considerou a perda do capital investido e dos juros contratualmente devidos, as comissões pagas e ainda danos de índole não patrimonial.

Relativamente ao nexo de causalidade, entendeu a mesma sentença que “caso o autor tivesse sido informado da possibilidade de reembolso antecipado, teria sido permitido pedir o resgate, sendo reembolsado, e evitar as perdas que se verificaram em Julho de 2016. O que equivale a dizer que o dano correspondente à perda do capital pelo autor só foi possível pela ausência de informação da possibilidade de reembolso do capital na antecipação da maturidade das obrigações para 30 de junho de 2015. Daqui decorre que se verifica igualmente o nexo causal entre o facto e o dano, que não é afastado pela circunstância da Oi ter entrado em insolvência”.

Concluiu, assim, estarem preenchidos todos os requisitos de responsabilização, decidindo do réu Banco 1....

Nas suas alegações o recorrente Banco 2... sustenta que o tribunal a quo não poderia ter considerado  verificado a existência de um facto ilícito, na medida em que, recaindo sobre o autor o ónus da prova da invocada ilicitude (ausência da comunicação), a verdade é quem na decisão sob recurso “não ficou provado nem que não foi feita a comunicação acerca da possibilidade de reembolso antecipado, nem que foi feita (…)”.

Pode-se considerar princípio pacífico e adquirido nesta temática, o de que é ao investidor, putativo lesado, que incumbe a prova de que o intermediário financeiro incumpriu com o dever de informação que o onerava.

Trata-se de posição absolutamente conforme à jurisprudência uniformizada no já mencionado AUJ nº8/2022, em cuja fundamentação se escreve: “Ora, sendo factos constitutivos do seu direito, compete ao Autor demonstrar a ilicitude, o dano e o nexo de causalidade (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil), sendo que a culpa se presume, pelo que se pode concluir que a responsabilidade civil do intermediário financeiro pressupõe, para além da sua culpa presumida, a prova, por parte do lesado, da ilicitude resultante do incumprimento dos deveres legais ou contratuais bem como do nexo de causalidade adequada entre esse incumprimento e o dano sofrido”.

Como nos diz o recente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14 de janeiro de 2025: “O que incumbe provar ao cliente/lesado é a violação objetiva do dever de informação, ou seja, omissão de informações relevantes para a tomada de decisão ou prestação de informação falsa. Ao intermediário financeiro cabe a prova de que a informação que prestou revestia as qualidades necessárias (completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, proporcional)”[10].

Sucede que, como bem nota o recorrente, a sentença recorrida apenas considerou não provado que: “O autor foi informado pelo réu Banco 1... da possibilidade de exercício antecipado do direito de reembolso antecipado, o que o autor entendeu não exercer porque, em julho de 2015, estava longe de imaginar o desfecho da OI, SA e da PTIF cerca de um ano depois” (facto n.º 4.2.20), cabendo aqui relembrar que a não prova de um facto não prova o contrário, tudo se passando como se esse facto não existisse, isto é, como nem sequer tivesse sido alegado.

Se assim é, tem razão o recorrente quando afirma que a factualidade considerada provada não permite concluir pela omissão da supra mencionada informação pelo recorrente Banco 1... e consequentemente pela verificação da ilicitude, que é pressuposto da obrigação de indemnizar a cargo do intermediário financeiro.

Mas a verdade é que, no artigo 68º da sua petição inicial, os autores haviam alegado que “Além de não ter sido informado e consentido naquela cessão, também não foi informado do direito que lhe assistia de efectuar o pedido de reembolso do pagamento daqueles títulos, considerando a alteração de circunstâncias ocorrida, informação que apenas obteve após facto consumado, em Outubro de 2017”.

Quer isto dizer que a decisão recorrida não se pronunciou sobre este facto, considerando-o provado ou não provado.

Tratando-se de um facto controvertido, que competia à autora provar, há que reputar como deficiente a decisão da primeira instância sobre a matéria de facto, em virtude da omissão de pronúncia sobre um facto essencial, alegados pelas partes[11].

Trata-se de um vício que, nos termos do art. 662º, n.º 2, al. c) do Código de Processo Civil, além de ser sujeito à apreciação oficiosa do Tribunal da Relação, poderia ser suprido, pelo próprio Tribunal da Relação, através dos elementos que constam do processo ou da gravação ou, caso se entendesse que não constavam do processo todos os elementos necessários para o efeito, através da anulação da decisão da 1ª instância para ampliação da matéria de facto, por forma a que esta viesse a abarcar a mencionada factualidade omitida.

Cremos, contudo, que, no caso em apreço, será inútil trilhar qualquer desses caminhos, porquanto, ainda que se viesse a demonstrar a sobredita factualidade invocada pelos autores – que permitiria considerar demonstrado o pressuposto da ilicitude da conduta que imputam ao réu Banco Banco 1... – a restante factualidade assente não permitiria concluir estarem verificados todos os demais pressupostos da obrigação de indemnizar a cargo dos recorrentes.

Com efeito, a constituição da obrigação de indemnizar, no plano contratual, integra um conjunto de pressupostos cumulativos, absolutamente imprescindíveis, a saber: a prática de facto imputável ao demandado; o seu caráter ilícito e culposo (culpa que se presume nos termos do art.º 799º do Código Civil); o nexo de causalidade entre o cometimento do ilícito e a produção do dano para a esfera jurídica do demandante;

A decisão recorrida estriba a sua conclusão sobre a verificação in casu do pressuposto nexo de causalidade no facto elencado sob o ponto n.º 4.1.48: “Caso o Autor tivesse sido informado da possibilidade de reembolso antecipado, teria sido permitido pedir o resgate, sendo reembolsado e evitar as perdas que se verificaram em 26 de Julho de 2016”

Defende o apelante Banco 1... que do facto supra demonstrado sob o ponto 4.1.48, em si mesmo considerado, não se extrai o nexo de causalidade que é pressuposto da sua responsabilização.

E mais sustenta que tal pressuposto da obrigação de indemnização não deveria ter sido considerado verificado pelo tribunal recorrido, na medida em que não se extrai da factualidade provada que o recorrido teria procedido ao resgate antecipado das obrigações, caso tivesse sido informado dessa possibilidade.

Vejamos.

Quanto ao pressuposto no nexo de causalidade, dir-se-á que, para serem indemnizáveis, os danos devem ligar-se causalmente ao incumprimento do dever pré-contratual ou contratual (nexo de causalidade).

Prescreve o artigo 563.º, do Código Civil que «A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão», ou seja, não fora o incumprimento do dever de informação.

Na disposição normativa supra citada está consagrado o critério da causalidade adequada, pela formulação negativa, ou seja, o incumprimento contratual tem, em concreto, de ter constituído condição necessária ao dano, só se excluindo a responsabilidade se ele for, pela sua natureza, indiferente para a produção daquele tipo de prejuízos, isto é, se o lesante provar que apenas a ocorrência de circunstâncias extraordinárias ou invulgares determinou a aptidão causal daquele facto para a produção do dano verificado.

Nos termos do mencionado AUJ n.º 8/2022, a presunção de culpa do intermediário financeiro não abrange qualquer presunção legal de causalidade, cabendo ao investidor, nos termos do artigo 342.º, nº 1, do Código Civil, o ónus da prova (ponto 1). O AUJ prossegue, afirmando no ponto 3. que «O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir» e no ponto 4. que «Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir».

De acordo com a fundamentação do mesmo AUJ, para a prova do nexo de causalidade importa fique demonstrado “(…) para além de fáctica ou naturalisticamente se ter de apurar se uma determinada atuação (ação ou omissão) provocou o dano (…) cumpre ainda averiguar, tendo em conta as regras da experiência, se era ou não provável que da ação ou omissão resultasse o prejuízo sofrido, ou seja, se aquela não realização é causa adequada do prejuízo verificado: o juízo de adequação normativa ínsito no artigo 563.º do Código Civil pressupõe a causalidade fáctica. Daí que antes de indagar se a causa foi adequada à produção do dano, deve o intérprete verificar se a causa foi “conditio sine qua non” do referido dano.”.

Como se decidiu no Ac. STJ de 26/03/19[12]: “É consensual o entendimento de que o nosso sistema jurídico, com a citada norma, acolheu a doutrina segundo a qual, para que um facto seja causa de um dano, é necessário que, no plano naturalístico, ele seja uma condição sem a qual o dano não se teria verificado e, além disso, que, no plano geral e abstracto, ele seja causa adequada desse mesmo dano.

É matéria de facto o nexo causal naturalístico e é matéria de direito o juízo sobre o segundo momento da causalidade, referente ao nexo de adequação, de harmonia com o qual o facto que actuou como condição do dano deixa de ser considerado como causa adequada quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais ou extraordinárias: «o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou se apenas o tiver provocado por intercessão de circunstâncias anormais, anómalas ou imprevisíveis» (…)

Essa aferição global da adequação deve partir de um juízo de prognose posterior objectiva, formulado em função das circunstâncias conhecidas e cognoscíveis de todo o processo factual que, em concreto, desencadeou a lesão e o dano, no âmbito da sua aptidão geral ou abstracta para produzir esse dano, pois que a causalidade adequada não se refere a um facto e ao dano isoladamente considerados”.

Por isso, a jurisprudência vem defendendo ser possível o uso de presunções judiciais com vista ao estabelecimento do nexo de causalidade em matéria de responsabilidade do intermediário financeiro, desde que não colidam com os nºs 3 e 4 do referido AUJ[13].

O que significa que não podemos prescindir do nexo causal naturalístico, enquanto matéria de facto, e só apurado este poderemos usar presunções judiciais para apurar o segundo momento de causalidade, enquanto matéria de direito.

Como se disse, a sentença recorrida não reporta a responsabilidade do intermediário financeiro à fase da subscrição/compra do produto, colocando apenas em cheque o dever de informação em ocasião posterior. Contudo, nenhuma razão vemos para não ser aplicado in casu a argumentação jurídica que fundamenta tal acórdão uniformizados.

Sucede que, no caso em análise os autores não alegaram que se tal informação – a possibilidade de o autor proceder ao resgate antecipado das obrigações até 31 de junho de 2015 e os respetivos termos e condições – lhes tivesse sido oportunamente disponibilizada, teriam resgatado as Notes 6.25%.

Limitaram-se a alegar que a não disponibilização de informação os impediu de tomar conhecimento tempestivo daquela opção, que lhes teria permitido o resgate dos títulos e evitar as perdas que se verificaram em 26 de Julho de 2016, o que, a nosso ver, é insuficiente para considerar demonstrado o elemento naturalístico do nexo de causalidade, a condição sine qua non, a partir da qual se poderia extrair, com base no conjunto da prova produzida, o elemento abstrato do referido nexo.

Aqui chegados há que reconhecer que não se mostra apurado o nexo naturalístico que nos permitiria presumir o elemento abstrato, de acordo com a jurisprudência citada.

Não se provou, aliás porque não foi sequer alegado, que se tal informação – antecipação da maturidade – lhes tivesse sido disponibilizada pela recorrente Banco 1..., os autores teriam resgatado as obrigações.

Em suma, não temos presente o nexo de causalidade entre a alegada omissão do dever de informação e os concretos danos sofridos pelos autores, cujo ónus a estes incumbia.

E não se diga que a pretensão indemnizatória dos recorridos poderá ter provimento, mesmo que não se considere verificado o pressuposto do nexo de causalidade, equacionando-se a factualidade mencionado no ponto 4.1.48, como um dano de “perda de chance”, no caso, reportada à perda da oportunidade de os recorridos procederam ao resgate antecipado daquelas obrigações por  não terem sido informados de tal possibilidade pelo recorrente Banco 1....

É facto que o nosso ordenamento jurídico-civil nacional tutela o dano conhecido pela «perda de chance» ou de oportunidade, que ocorre quando uma situação omissiva faz perder a alguém a sorte ou a «chance» de alcançar uma vantagem ou de evitar um prejuízo[14].” A doutrina da «perda de chance» ou da perda de oportunidade, propugna, em tese geral, a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo causal entre o facto ilícito e o dano final, mas, simplesmente, que as probabilidades de obtenção de uma vantagem ou de obviar um prejuízo, foram reais, sérias, consideráveis, permitindo indemnizar lesado nos casos em que não se consegue demonstrar que a perda de uma determinada vantagem é consequência segura do facto do agente, mas em que, de qualquer modo, há a constatação de que as probabilidades de que o lesado dispunha de alcançar tal vantagem não eram desprezíveis, antes se qualificando como sérias e reais.

Nesta matéria, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 2/2022, uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: "O dano da perda de chance processual, fundamento da obrigação de indemnizar, tem de ser consistente e sério, cabendo ao lesado o ónus da prova de tal consistência e seriedade" (sublinhado nosso)

Apesar de ter por base uma situação de perda de chance processual, por atuação (omissão) ilícita e culposa de mandatário judicial, os fundamentos do mencionado acórdão de uniformização de jurisprudência são extensíveis a outras situações de “perda de chance”.

No entanto, no caso concreto, a factualidade demonstrada afigura-se-nos manifestamente insuficiente para afirmar uma probabilidade real, série e efetiva de os recorridos terem feito uso da possibilidade de reembolso do capital investido caso o recorrente Banco 1... o tivesse informado dessa mesma possibilidade.

A a factualidade demonstrada nos autos não permite, a nosso ver, concluir, designadamente por recurso a presunções judiciais, que, com os conhecimentos dessa altura sobre a situação económica e financeira da Oi., existia uma probabilidade séria de os autores solicitarem o reembolso das Notes até 30/06/2015, pelo preço de reembolso de 103,975% do montante do capital da Note, prescindindo do rendimento que era devido durante o ano seguinte até atingir a maturidade.

Cremos, aliás, que os factos supramencionados correspondentes aos pontos 4.1.23, 4.124, 4.1.25, 4.1.31, 4.1.34 a 4.1.38 indiciam precisamente o contrário.

Há, pois, que concluir que não estão reunidos os pressupostos do direito de indemnização reclamada, pelo que a decisão condenatória dos recorrentes não poderá manter-se.


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Não podendo a ação proceder por falta de verificação dos pressupostos de que depende a afirmação da responsabilidade civil do réu Banco 1..., fica, por isso, prejudicada a apreciação dos pressupostos de responsabilização do apelante Banco 2... (questão c) do recurso deste réu)[15]; da prescrição do direito dos autores (questão d),, do recurso deste réu)[16];  do concurso de culpa do autor e do concurso de outras causa para a produção dos danos invocados pelo ocorrência de outras causa (questões b) e c) do recurso do réu Banco 1...).

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Resta apreciar o recurso do apelante Banco 2... relativamente ao indeferimento do pedido de condenação dos autores como litigantes de má-fé.
Nesta parte, o recurso assenta essencialmente na prova do facto supra mencionado no ponto 4.1.28, com suporte no documento junto posteriormente aos autos (correio eletrónico emitido e transmitido através do email profissional do autor, cuja veracidade principiou por questionar, acabando por admitir a autoria do mesmo, junto aos autos por requerimento de 30/01/2020), quando efetivamente haviam alegado desconhecer a transferência das ações da PT para a OI; que não deram autorização a essa transmissão e que e a mesma foi realizada à sua revelia.
Vejamos.
De harmonia com o disposto no art.º 542º, do CPC diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão. d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Como nos diz o Acórdão do Ac. do STJ de 12-11-2020[17], “Distinguem-se claramente, na formulação legal, a má fé substancial - que se verifica quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art.º 542º - e a má fé instrumental (al. c) e d) do mesmo artigo).
Contudo, em qualquer dessas situações nos encontramos perante uma intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da atuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva.
Por outras palavras:
A conduta do agente deve apresentar-se como contrária a um padrão de conformidade da ação pessoal do sujeito processual com o dever de agir de acordo com a juridicidade e a lei. "A má fé processual (...) é toda a atividade desonesta, cavilosa, proteladora (para cansar o adversário) unilateral ou bilateral, verificada no exercício do direito de ação, quando desenvolvida com a intenção de prejudicar outrem, quer ela respeite ao mérito da causa (lide caluniosa, fraudulenta, etc.) quer às medidas instrumentais, desde que seja ilícita, isto é violadora das normais gerais e especificas da conduta processual, tendentes a criar as condições favoráveis a uma boa e justa decisão do pleito". A condenação como litigante de má fé assenta, pois, num juízo de censura sobre um comportamento que se revela desconforme com um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de direito.
Feitas estas breves considerações, não cremos, no caso em apreço, a supra referida atuação processual do autor seja relevante e, sobretudo, censurável a ponto de justificar a sua condenação como litigante de má-fé.
Com efeito, o que se pode extrair da factualidade constante do mencionado ponto 4.1.23 é que, ao contrário do que efetivamente alegaram, não podiam os autores ter afirmado, na sua contestação, que não deram autorização para transferência das ações da PT para a OI e que e que tal transferência foi realizada à sua revelia, uma vez que consentiram na deliberação, tomada em assembleia geral extraordinária da PT, em 18 de março de 2014, que visou a possibilidade de alteração do emitente das obrigações, pela OI ou por uma das suas subsidiárias, a todo o tempo, e sem necessidade de consentimento dos titulares das Notes.
Mas daqui não se extrai que os autores tiveram efetivo conhecimento do momento em que foi realizada a alteração do emitente daquelas obrigações e sobretudo das vicissitudes que posteriormente ocorreram, relacionadas com o negócio entre a Oi e a Altice que teve por objeto a venda das ações da PT.
Não nos parece, pois, que dos autos resulte que os autores tenham deduzido pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, nem tão pouco que tenham alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa.
É certo que – agora no campo da má-fé processual – os autores alegaram o desconhecimento de documentos por si assinados, cuja autoria vieram a confirmar em depoimento de parte.
Contudo, como se diz na sentença recorrida, cujo entendimento aqui sufragamos,  “apesar disso, não se vislumbra qualquer situação de clamorosa, chocante ou grosseiro uso do processo com vista a impedir a realidade dos factos, a entorpecer a ação da justiça (…), a ele imputável nas modalidades de negligência grave ou dolo”
Entendemos, por conseguinte, ser de manter, nesta parte a decisão recorrida.

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Sumário (ao abrigo do disposto no art.º 663º, n.º 7 do CPC):
(…).

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V. Decisão.

Perante o exposto, acordam os Juízes da 3ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Coimbra em julgar procedente a apelação, e, em consequência, revogar a sentença na parte que condenou os recorrentes a pagar solidariamente ao recorrido: a) a quantia de €35.468,34, a título de danos patrimoniais e juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, contados desde 27 de junho de 2016, até efetivo e integral pagamento; b) a quantia de €2.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde a prolação da sentença até efetivo e integral pagamento;
Custas da ação e do recurso, pelos autores/recorridos.


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Coimbra, 18 de fevereiro de 2025

Assinado eletronicamente por:
Hugo Meireles
Luís Miguel Caldas
Luís Manuel Carvalho Ricardo

(O presente acórdão segue na sua redação as regras do novo acordo ortográfico, com exceção das citações/transcrições efetuadas que não o sigam)


[1] Processo n.º 3527/18.4T8VCT-A.G1 (Relatora Margarida Sousa). No mesmo sentido, confronte-se o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 11/11/2021, no processo n.º 831/19.8T8VCT.G1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt
[2] Trata-se do Acórdão proferido no processo 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, em 06/12/2021, transitado em julgado em 19/09/2022 e publicado no Diário da República, Iª Série, de 03.11.2022.
[3] Os factos em causa nos autos são todos posteriores à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro (que transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Directiva 2004/39/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, ou DMIF I) e anteriores à entrada em vigor da Lei nº 35/2018, de 20 de julho (que transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva, a Diretiva 2014/65/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, ou DMIF II).
[4] Processo n.º 1715/18.2T8STR.E1.S1 (Relatora Graça Trigo), in www.dgsi.pt
[5] Processo n.º 15440/17.8T8LSB.L1.S1 (Relatora Maria Clara Sottomayor), in www.dgsi.pt.
[6] Proc. 2050/11.2TBVFR.P1, in www.dgsi.pt
[7] A Responsabilidade do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, Almedina, 2008
[8] Processo n.º 1094/17.5T8EVR.L1.S1 (Relator António Magalhães), in www.dgsi.pt,
[9]  Neste sentido, cf. o Ac. TRL de 31-10-2019, processo n.º 11826/17.6T8SNT.L1-8 (Relator António Valente), in www.dgsi.pt, que versa sobre uma situação de contornos semelhantes à que está em causa na situação sub iudce.

[10] Processo n. 18588/16.2T8LSB-L.L1-1 (Relatora Fátima Reis Silva), in www.dgsi.pt.
[11] Segundo Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, vol. IV, pag. 553, “dentro da expressão “resposta deficiente”, para além da omissão de decisão sobre algum facto essencial, a “falta absoluta de decisão, a decisão incimleta, insufcuente ou ilegal
[12] Processo n.º 2259/17.5T8LRA.C1.S1, (Relator Alexandre Reis), in www.dgsi.pt 1
[13] Cf. Ac. do STJ de 14-02-2023, processo3129/16.0TOSTR.E1.S2 (Relatora Clara Sottomayor), in www.dgsi.pt.

[14] Ac. do S.T.J. de 05/02/2013, proc. nº 488/09.4TBESP.P1.S1 (relator Hélder Roque) disponível in www.dgsi.pt,

[15] Na verdade,  responsabilização deste ré não assentava numa omissão imputável ao próprio, mas antes, de acordo com a decisão recorrida, “na circunstância de ter operado a transferência para o Banco 2... da conta do Autor, à qual estavam associadas as obrigações em causa faz concluir que igualmente se transferiu para o Banco 2... a responsabilidade pelas dívidas que a actividade de Banco 1... originou na esfera jurídica do Autor relativamente àquelas obrigações, embora se tenha operado sem o consentimento do Autor.”

[16] O art.º 324º, nº 2, do CVM estabelece um prazo de prescrição de dois anos: “Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão o do negócio e dos respectivos termos”. Parece-nos, assim, que o conhecimento desta exceção não prescindiria da demonstração da efetiva violação do dever de informação. Pelas razões já referidas, a apreciação do pressuposto “ilicitude” da conduta imputada ao recorrente tornou-se inútil, em razão da falta de demonstração do pressuposto do nexo causal, o que, no caso, em nossa opinião, determina igual inutilidade da apreciação desta exceção.



[17] Processo n.º 279/17.9T8MNC-.G1.S1 (Relatora Maria do Rosário Morgado), in www.dgsi.pt