Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1443/11.0TBGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CONTRATO
NULIDADE
ANULABILIDADE
PROVA TESTEMUNHAL
CLÁUSULA ADICIONAL
DOCUMENTO
Data do Acordão: 11/12/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA GUARDA – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 289º, 394º E 801, Nº 2 DO C. CIVIL.
Sumário: a) A proibição de produção de prova testemunhal para prova de convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento não compreende o fim ou motivo do negócio nem os vícios da vontade ou de divergência entre a vontade e a declaração.

b) A prova deve ser avaliada segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente, i.e., segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis.

c) A contradição entre um facto plenamente provado e as respostas dadas a outros pontos de facto na fase da audiência deve resolver-se a favor do primeiro daqueles factos.

d) A resolução é uma forma de supressão ou extinção de contratos válidos, pelo que os contratos nulos ou anuláveis não são resolúveis.

e) A invalidade do contrato atinge a cláusula acessória da condição que nele tiver sido convencionada.

f) O erro vício apenas exige, como condição de relevância, a sua causalidade ou essencialidade.

g) Há erro sobre a base do negócio – determinante não da resolução mas da anulação dele – quanto a falsa representação da realidade versa sobre circunstância patentemente fundamental desse mesmo negócio.

h) Não é exigível, no erro sobre a base do negócio, a sua bilateralidade.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.

L… e cônjuge, M… pediram ao Sr. Juiz de Direito do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda que condenasse J… e o seu cônjuge, A… a:

A) Reconhecer que os RR. são donos e legítimos possuidores do prédio rústico sito na …, composto de terra de cultura, lameiro, pomar, mata de carvalhos e pastagem com castanheiros e macieiras, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo … e descrito, na Conservatória do Registo Predial da Guarda sob o nº … a favor dos RR., pela Ap.2, de 01/06/1990.

B) Reconhecer que em Março de 2006, o R. marido propôs-se vender, aos AA., um lote de terreno, com a área de 22.000 m2, a destacar do supra identificado prédio rústico.

C) Reconhecer que o R. marido referiu aos AA. ter, para o prédio em questão, o processo de loteamento elaborado e pronto para ser aprovado, faltando-lhe apenas a aprovação municipal.

D) Reconhecer que o R. marido se obrigou perante os AA. a entregar-lhes o lote para construção, pronto para construir, devidamente licenciado, com o respectivo alvará de loteamento.

E) Reconhecer que o A. marido, na data da assinatura do Contrato Promessa de Compra e Venda, entregou ao R. marido a quantia de Euros. 25.000,00 (vinte cinco mil euros) e, posteriormente, em 30/09/2006, a quantia de Euros.150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), a título de sinal e princípio de pagamento (artigo 442º do C. Civil).

F) Reconhecer que a partir do início do Verão do ano de 2007 o A. marido procurou, por diversas vezes, o R. marido no sentido de obter informação sobre o estado do Processo de Licenciamento e obter a entrega do lote apto para nele construir, o qual lhe referia haver algumas questões burocráticas e administrativas para resolver, junto da Câmara Municipal, mas que tudo seria solucionado.

G) Reconhecer que sobre o prédio em questão nunca existiu qualquer projecto de viabilidade, nem pedido de loteamento.

H) Reconhecer que o prédio sobre o qual o R. marido referiu ser destacado o lote de terreno com a área de 22.000 m2 não tinha (e não tem) qualquer aptidão para o fim prometido (construção).

I) Reconhecer que o R. marido conhecia tal realidade, sendo uma pessoa experiente e habituada aos procedimentos desta natureza.

J) Reconhecer que existe, no caso em apreço, uma impossibilidade de cumprimento do contrato promessa, do conhecimento e da responsabilidade dos RR.

K) Declarar a anulabilidade do Contrato Promessa de Compra e venda, outorgado em 20 de Março de 2006 entre o A. marido e os RR. marido, por culpa exclusiva dos RR.

L) Condenar os RR. a restituir aos AA. o sinal em dobro, ou seja a quantia de Euros 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora, a contar desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Fundamentaram estas pretensões no facto de o réu – que, com o cônjuge, é empresário, desenvolvendo actividades de investimentos imobiliários, loteamentos urbanos, construção civil e venda de prédios – ter, em Março de 2006, proposto aos autores – dos quais o marido se dedica à construção civil, adquirindo lotes para edificar prédios urbanos para revenda – a venda de um lote de terreno com 22 000m2, a destacar do prédio rústico sito na …, fazendo-lhes ver que era um bom investimento, podendo vir a construir nele várias moradias e obter lucros com a sua venda, e que tinha o processo de loteamento para o prédio elaborado, faltando apenas a aprovação da Câmara, de terem confiado nas palavras do réu, pessoa de reputada influência e de público conhecimento, confirmadas pelos passeios e postes de iluminação pública já existentes no terrenos, acordando nos termos do negócio, confiando que a partir do final de 2007 pudesse dispor do terreno para proceder à edificação de prédios urbanos, fixando o preço do lote em € 325.000,00, de 29 de Março de 2006, o autor ter assinado o contrato promessa e entregue, nessa data, a título de sinal e princípio de pagamento, € 25.000,00, e, em 30 de Setembro de 2006, a de € 150.000,00, de, em 2009 terem constatado, junto dos serviços municipais de obras e urbanismo, que sobre o prédio não existia qualquer projecto de viabilidade nem havia sido apresentado pedido de loteamento e que o prédio não tinha qualquer aptidão para a construção, e de os réus terem prometido vender um bem futuro que sabem não estarem em condições de o poder fazer, o que sempre foi do conhecimento do réu, pelo que se verifica a anulabilidade do contrato promessa, tendo direito à anulação do negócio (artº 254 do C. Civil), devendo os réus, na sequência da verificação da impossibilidade de cumprimento, ser condenados a restituir, em dobro, a quantia que lhes foi entregue a título de sinal e princípio de pagamento.

Os réus defenderam-se alegando que em Março de 2006 o autor e o filho, P…, arquitecto, que assessora o autor na actividade a que este se dedica, propuseram ao réu o pagamento de € 325.000,00 pelo terreno com a área aproximada de 22.000m2, o que foi aceite, tendo o autor e o filho, em 20 de Março de 2006, entregue ao réu dois exemplares do contrato promessa de compra e venda juntamente com a planta, totalmente elaborado pelo autor, que não prometeram vender a parcela de terreno para qualquer fim específico, designadamente, a construção, sendo falso que o réu tenha referido ter para o prédio o processo de loteamento elaborado e pronto para ser apresentado, faltando apenas a aprovação municipal, que a produção dos efeitos do negócio prometido foi subordinado à verificação da condição suspensiva de redefinição pela edilidade da Guarda do novo PDM para o local, qualquer que fosse o resultado dessa definição, que tal condição não é contrária à lei ou ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes, nem o objecto do contrato promessa – o destaque e a compra e venda da parcela de terreno – é física ou legalmente impossível, sendo por isso que o autor fez constar na cláusula quarta do contrato a obrigação dos réus em assinar e, ou subscrever, quaisquer projectos ou edificações que o segundo contraente pretenda ali levar a efeito, e da cláusula sétima a concessão de autorização ao autor para entrar na posse gozo e fruição plenos do imóvel, autorização de que o autor fez uso, e que não existe qualquer indício de que a condição de que as partes fizeram depender a eficácia do negócio objecto do contrato promessa se não possa verificar.

Oferecido o articulado de resposta – no qual os autores alegaram ser verdade que sabiam que o imóvel em causa não estava integrado no PDM, mas que o elemento decisivo para a conclusão do negócio foi o facto de o réu marido ter prometido ao autor que até final de ano (ano de 2006), o prédio estaria integrado no PDM - e seleccionada a matéria de facto procedeu-se à audiência de discussão e julgamento – com registo sonoro dos actos de prova produzidos oralmente – no terminus da qual se decidiu, sem reclamação, a matéria de facto.

A sentença final da causa decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência:

- Declarar a anulabilidade do contrato-promessa de compra e venda, a que se reporta a alínea D) dos factos assentes, outorgado em 20 de Março de 2006, entre o autor marido L… e os réus J… e A...

- Condenar os réus J… e A… a restituir aos autores L… e M… a quantia de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros), que receberam a título de sinal de princípio de pagamento, acrescida de juros à taxa legal em vigor desde a citação até integral pagamento.

- Absolver os réus do pedido deduzido pelos autores, de restituição do sinal em dobro, no montante de € 350.000,00.

É esta sentença que tanto os réus como os autores impugnam através do recurso ordinário de apelação, principal e subordinado, respectivamente.

Os réus – que pedem no seu recurso a revogação daquela sentença e a sua substituição por acórdão que os absolva integralmente do pedido – extraíram da alegação estas bem numerosas conclusões:

...

Por sua vez, os autores – que pedem no seu recurso subordinado a revogação da mesma sentença e a sua substituição por outra que contemple os aspectos enunciados - remataram a sua alegação com estas conclusões:

Na resposta, cada um das partes, concluiu pela improcedência do recurso da outra.

2. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.

2.1. Foi inserta, na matéria de facto assente, na al. J), este enunciado: os autores quando celebraram o acordo referido em D), tinham conhecimento do conteúdo do PDM da Guarda e dos factos referidos em I) (de acordo com PDM da Guarda, em vigor à data do acordo, reproduzido em D), e actualmente, o prédio descrito em C) não tem aptidão para a construção).

2.2. Para a base instrutória foram seleccionados, entre outros, os seguintes enunciados:

                                                               2º

Dizendo-lhes – o réu aos autores – que era um bom investimento, dado que nele poderiam vir a construir várias moradias, podendo vendê-las e obter lucros?

                                                               3º

O réu marido referiu aos autores ter o prédio descrito em C) o processo de loteamento elaborado e pronto para ser aprovado, faltando-lhe apenas a aprovação municipal?

                                                               4º

E prometeu ao autor marido que o prédio estaria integrado, até final de 2006, no PDM da Guarda para efeitos de construção?

                                                               5º

Os autores confiaram nas palavras do réu marido?

                                                               7º

E porque o réu marido é pessoa de reputada influência e de público conhecimento?

                                                               8º

Foi por tais razões e devido à promessa referida em 4) que os autores aceitaram celebrar o acordo reproduzido em D)?

                                                               9º

Confiando que a partir do final do ano de 2007 pudesse o autor marido dispor de tal terreno para nele proceder à edificação de prédios urbanos?

2.3. Os enunciados referidos em 2.2. obtiveram, do tribunal da audiência, esta resposta:

Facto 2º - Provado apenas o que consta das respostas dadas aos factos 3º e 4º.

Facto 3º- Provado.

Facto 4º - Provado que o réu marido disse ao autor marido que o prédio estaria integrado, até ao final do ano de 2006, no PDM da Guarda para efeitos de construção.

Facto 5º - Provado.

Facto 7º- Provado.

Facto 8º- Provado que foi em face do referido nas respostas dadas aos factos 3º, 4º, 5º e 7º da base instrutória, que os autores celebraram o acordo reproduzido em D).

Facto 9º- Provado.

2.4. A Sra. Juíza de Direito adiantou para justificar o julgamento referido em 2.3., designadamente, esta motivação:

A formação da convicção do Tribunal, de acordo com a qual se respondeu da forma supra descrita à matéria constante da base instrutória, ficou a dever-se à ponderação da globalidade da actividade probatória desenvolvida nos autos, à sua apreciação e valoração de acordo com a livre convicção do Tribunal, suportada também, como é óbvio, em critérios de razoabilidade e normalidade, com recurso às regras da experiência e sempre tendo presente a lógica das situações (…).

No que respeita à prova testemunhal que se produziu em audiência de julgamento, não poderemos deixar de referir, desde logo, que todas as testemunhas inquiridas, de uma ou outra forma, directa ou indirectamente demonstraram um envolvimento directo e pessoal no que respeita a toda esta situação.

Não obstante, relativamente aos factos que foram dados como provados, diremos que, no que respeita às testemunhas arroladas pelos autores, acabou o Tribunal por credibilizar os seus depoimentos, na medida em que se revelaram lógicos, coerentes e consentâneos com a própria normalidade das coisas.

Assim, começando, precisamente, pelas testemunhas arroladas pelos autores e sua relevância na decisão de facto, diremos que a testemunha P…, arquitecto de profissão e filho dos autores, prestou um depoimento que, apesar da sua ligação familiar aos autores, no essencial, foi credível, pese embora, é certo, relativamente a situações por si relatadas, fosse evidente que, como é natural, assumiu a versão dos seus pais, sendo certo que, no que respeita a alguns dos factos, não tinha conhecimento directo acerca dos mesmos, circunstâncias que o Tribunal, naturalmente, ponderou.

Referiu esta testemunha, no essencial, que o pai lhe contou que entrou em contacto com o engenheiro Proença, aqui réu com vista à aquisição da parcela de terreno em causa.

Começou por afirmar que, inicialmente, não interveio directamente no negócio e nas conversações, mas apenas que o pai lhe disse que, segundo o réu, o terreno teria determinada área, mas, como não lhe parecia, o pai pediu a sua ajuda, acabou por fazer um levantamento topográfico, tendo constatado que, de facto, tinha uma área menor.

Todavia, acabou por dizer que depois acompanhou o pai nalgumas reuniões com o réu, esclarecendo que, apesar do seu pai ter sido sempre muito autónomo, já tem alguma idade e problemas de audição, pelo que, por vezes, o acompanha.

Em relação a esta concreta situação e, designadamente em resposta ao facto 2º da base instrutória, afirmou que sempre o engenheiro Proença transmitiu ao pai que no final de 2006 depois da revisão do PDM da Guarda, seria possível fazer ali construção de moradias.

Mais referiu que o seu pai sempre foi uma “pessoa de trabalho” e o engenheiro … uma pessoa muito influente na Câmara da Guarda, e garantia ao seu pai que aquele terreno ia ser incluído no PDM da Guarda para permitir que aí se fizesse construção de moradias e também garantia que existiam infra-estruturas que viabilizavam essa construção.

Acrescentou que o réu chegou a apresentar esboços já com os passeios feitos, postos de iluminação, cabine eléctrica.

Disse mesmo que já existiam passeios, caixas de esgotos e cabine eléctrica, explicando que tudo isso vem explícito no levantamento topográfico.

Confrontado com o documento de fls. 49, referiu que os postes identificados no levantamento topográfico eram aqueles que seriam para o “novo loteamento do pai”, referindo, em tal documento, onde se situaria o loteamento e quais as confrontações.

No entanto, depois de directamente questionado e confrontado com a localização precisa das infra-estruturas existentes, acabou por reconhecer que as mesmas poderiam estar feitas para o loteamento que já ali existe. Referiu a testemunha que “o pai confiava cegamente no engenheiro …”, acrescentando que se conheciam há muitos anos, que sempre foi uma pessoa “quase inatingível”, uma pessoa de bem, muito influente, tendo sido sempre essa a imagem que o pai, e ele próprio, tiveram do réu e, por isso, nunca imaginaram que isto pudesse acontecer.

Disse que o pai apenas fez o negócio com a finalidade de construir, o que o engenheiro … lhe garantiu poder fazer, o que, aliás, atentas as circunstâncias e o próprio teor do contrato-promessa, parece lógico.

Aliás, nas suas palavras, apenas podia ter esta finalidade, até porque era essa a vida do pai, ou seja, fazia o investimento, construía e com o lucro fazia novos investimentos.

Neste caso, e com a garantia que lhe foi dada pelo réu, segundo também referiu, o seu pai tinha previsto iniciar a construção das moradias no ano de 2007.

Referiu ainda que o pai acabou por direccionar toda a sua actividade e mesmo a sua vida para este investimento, tendo entregue o dinheiro que tinha ao engenheiro … e acabou por ficar sem o dinheiro e sem poder construir, chegando mesmo a dizer que o réu “estragou a vida dos pais”.

Afirmou que o se pai estava totalmente convencido, pelas conversas do engenheiro …, que seria possível construir, sendo certo que ele sempre disse que estava tudo resolvido e que lidava directamente com o Presidente da Câmara Municipal.

Esclareceu ainda que o pai, depois de começar a ver a sua vida a complicar-se, chegou a ir à Câmara e aí constatou que nada estava previsto para construção, não havia qualquer processo de loteamento, nem pedido de viabilidade, pelo que o pai ficou totalmente “encravado” (…).

Afirmou que na primeira reunião entre o pai e o engenheiro … não esteve presente e depois do levantamento topográfico acompanhou o pai, tendo entregue tal levantamento.

Referiu que, ao que pensa, em 20/03/2006 acompanhou o pai, sendo que o engenheiro … tinha o contrato já elaborado, explicando onde se encontravam e quais as circunstâncias em que essa reunião aconteceu (…).

Já no que respeita ao engenheiro …, afirmou a testemunha que está ligado à construção civil e aos lacticínios, sendo uma pessoa muito influente e demonstrava isso.

Aliás, quando foi com o pai, tendo levado o levantamento topográfico, apercebeu-se também dele dizer que tinha muitos conhecimentos na Câmara.

Confirmou que esteve presente aquando da assinatura do contrato e que a mulher do engenheiro … não estava lá (…).

Reportando-se à situação do pai, referiu que desde há seis anos para cá nunca mais fez qualquer negócio, devido a esta infelicidade, sendo certo que, relativamente a esta afirmação, não poderemos deixar de referir que nos parece exagerada, tendo sido contrariada por outra prova, pelo que não foram dados como provados tais factos.

Também afirmou que, de facto, ele próprio, não leu o contrato, mas o pai fê-lo, sendo certo, no entanto, que antes da sua assinatura nada fez ou questionou, até porque “confiava cegamente” na palavra do engenheiro …

No que respeita á testemunha …, começou logo por referir ser construtor civil e conhecer o réu por já ter tido uma situação semelhante a esta, que aconteceu consigo, mas acabou por se resolver, tendo chegado a um acordo.

Explica o negócio que fez com o réu, em 2007, sendo que este lhe prometeu vender dois lotes de terreno, a destacar, tendo estado quatro anos à espera da licença para construir, sem que a tenha obtido.

Referiu esta testemunha, com rigor e precisão, relatando a situação que ocorreu directamente consigo, que o réu lhe prometeu que num ano estaria tudo resolvido e pronto para construir, tendo, nas suas palavras “esperado quatro anos e nada”.

Tendo sido confrontado com o documento junto a fls. 49 dos autos, referiu não conseguir identificar qual era o seu terreno, apenas sabendo que o réu prometeu destacar e deu-lhe uma planta.

Reportando-se à conduta do réu relativamente a si, explicou que, quando o tempo começou a passar confrontou-o com a demora, perguntando-lhe o que se passava e o engenheiro … ia dando explicações e justificação “sem pés nem cabeça”, limitando-se muitas vezes a dizer que estava quase e mesmo que tinha já saído no jornal que o PDM estava a avançar, dizendo-lhe, outras vezes, que já tinha saído na Internet.

Acabou a testemunha por referir que o réu esteve quatro anos com os € 70.000 que lhe deu e que ia era dizendo muitas “aldrabices”.

Relativamente ao seu contrato-promessa esclareceu que foi o engenheiro … quem o redigiu, não se recordando se estava assinado pela mulher, embora pense que não.

De todo o modo, tem a certeza que ele já estava feito e totalmente redigido pelo réu, sendo que este já trazia o contrato.

Afirmou, com toda a convicção que o engenheiro … ia-o sempre enganando, dizia que já estava tudo tratado e falado, mas, ao que veio a saber, era tudo mentira porque, segundo também disse, ele já sabia há mais de 10 anos que não era possível a construção e o que fez foi uma “burla”.

Disse também que o loca tinha passeios feitos, tubagens de esgotos e tido preparado para construir, o que, aliás, lhe foi dito e mostrado pelo engenheiro ...

Relativamente a estas circunstâncias, referiu que, por aquilo que viu e lhe foi dito, essas infra-estruturas pertenciam ao lote, estavam do lado de dentro, desconhecendo se foi a Câmara quem lá colocou as tubagens, mas não soube esclarecer, designadamente na planta junta aos autos, a que se destinavam, concretamente, as infra-estruturas..

Por outro lado, referiu também a testemunha que, obviamente, o valor que ele pagou apenas se justificava e fazia sentido se fosse para construir.

Prestou, em nosso entender, esta testemunha um depoimento rigoroso, credível e lógico, sendo certo que, neste momento, e porque a sua situação até já se encontra resolvida, é evidente que não tem interesse na decisão desta acção, limitando-se a relatar, e repetimos, de forma totalmente credível o que aconteceu relativamente ao contrato-promessa que celebrou com o réu e os termos do respectivo acordo.

É óbvio que não poderá deixar o Tribunal de considerar relevante, nessa medida, tal depoimento.

Com efeito, e pese embora se possa dizer que apenas se reportou à sua situação, sendo verdade que assim é, não poderemos deixar de salientar que ela é, em tudo, semelhante á dos autores, que está em causa nos autos e, nessa medida, resulta das regras da lógica e da experiência comum, que o negócio e o acordo terá sito em tudo semelhante.

Deste modo, e em primeiro lugar, resultou do seu depoimento que, afinal, o réu sabia fazer contratos, tendo sido ele a redigir o da testemunha (sendo que, embora possa não ter sido assim com o dos autores, pelo menos este depoimento contribui para que a dúvida permaneça), mas também que, em relação a si, lhe garantiu que existia a possibilidade, em menos deu m ano, de tudo estar resolvido, podendo-se construir, porque ia ser alterado o PDM e a situação resolvida, sendo que faz todo o sentido que tenha contratado nos mesmos termos com os aqui autores.

No que respeita ao depoimento da testemunha …, diremos que, no essencial, se aplicarão as mesmas considerações já feitas em relação ao depoimento da anterior testemunha.

Com efeito, também ele referiu que celebrou com o réu um contrato-promessa, acrescentando que apenas conheceu o autor porque a sua situação é em tudo semelhante á dele, sendo que, como também disse, o terreno dele e do Sr. …, é tudo no mesmo artigo, na mesma quinta.

Disse ainda a testemunha que o terreno “estava jeitoso para construir” e foi falar com o réu no sentido de o adquirir.

Referiu que o engenheiro … lhe disse que estava tudo praticamente pronto e daí a um ou dois meses estaria incluído no PDM para construir, acrescentando que ele quis foi “apanhar o dinheiro às pessoas e sabia bem que os estava a enganar”.

Concretizou que, no seu caso, a compra do terreno era com a finalidade única de aí ser efectuada uma construção para reuniões das “Testemunhas de Jeová”.

Mais tarde, segundo também referiu, deslocou-se á Câmara para ver o que se passava, e disseram-lhe que não era nada como tinha dito o engenheiro …, pelo que concluiu que foi enganado por ele.

Disse também que, porque o terreno era para construir um Centro de reuniões para as Testemunhas de Jeová, ele deu a cara e o engenheiro … “pôs-lhe a corda ao pescoço”. Isto porque teve muitos problemas e chegou mesmo a perder o dinheiro, dado que ele e o colega pagaram os €75.000, tendo assumido pessoalmente esse pagamento.

Reportando-se ao réu disse mesmo que ele bem sabia que nada era como disse e que “foi um aldrabão”, porque dizia que já vinha a alteração do PDM e depois fazia tudo em lotes.

Disse ainda que andava quase todas as semanas atrás do réu e que este ainda lhe chegou a dizer que daria o dinheiro, mas os meses foram passando e nada lhe deu. Depois foi também propondo a venda doutros terrenos, mas nada se chegou a concretizar.

Afirmou que o réu lhe ia também dizendo que ia á Câmara tratar de tudo e, afinal, nada fez, pelo que apenas pode dizer que confiou nele, mas foi “um grande burlão”.

Aliás, à semelhança da testemunha P… afirmou também esta testemunha que confiou porque sempre o conheceu e à família, pensando que era um homem sério, de respeito e consciência, o que veio a constatar não ser verdade.

Referiu ainda a testemunha que o lote ou terreno tem estrada, tem passeio e todas as infra-estruturas, ou seja, aparentemente, e como foi indicado pelo engenheiro …, tinha todas as condições para construir, pelo que sempre se convenceu disso.

No entanto, concluiu que está há seis anos sem dinheiro e sem resolver o problema porque as pessoas não foram sérias.

Reportando-se ao seu contrato-promessa, e tal como a anterior testemunha, afirmou que foi elaborado pelo engenheiro …, dizendo mesmo “simplesmente ele trouxe o contrato e eu assinei, mais nada”.

Explicou que o réu até fez dois contratos, o primeiro em nome da associação e depois um novo contrato, em nome individual.

Disse não saber, neste momento, se o contrato foi redigido á mão ou em computador, sendo que não o tem consigo, mas está com o ...

Tendo-lhe sido perguntado, referiu que antes de assinar o contrato não foi à Câmara, porque o réu o convenceu que tudo estava resolvido e pensava que ele era uma pessoa séria, pelo que confiou.

No que respeita a esta testemunha, diremos, pois, que o seu depoimento foi credível, rigoroso, lógico e, relativamente às circunstâncias ocorridas directamente consigo, que em tudo serão idênticas às ocorridas pelos autores, relatou-as de forma muito precisa e rigorosa, sendo que, nesta medida, é óbvio que o Tribunal não pode deixar de atender ao seu depoimento, como também já referimos no que respeita à testemunha anterior (…).

3.5. O Tribunal de que provém o recurso julgou provados, no seu conjunto, os factos seguintes:

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação objectiva do âmbito dos recursos.

Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC). Nas conclusões da sua alegação, é lícito ao recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso (artº 684 nº 2 do CPC).

A sentença apelada declarou, com fundamento no erro sobre a base do negócio, a anulabilidade do contrato promessa de compra e venda concluído entre o autor e os réus e condenou estes a restituir aos autores a quantia traditada a título de sinal, acrescida de juros, contados desde a citação, e absolveu os demandados do pedido de restituição, em dobro, daquela mesma quantia.

Tanto os recorrentes principais – os réus - como os subordinados – os autores - assacam ao tribunal recorrido um error in iudicando da matéria de facto controvertida, embora por razões diferenciadas. Segundo os réus, aquele erro radica, em primeiro lugar, na utilização de uma prova materialmente lícita, mas processualmente inadmissível: a prova testemunhal: no seu ver, o decisor de facto, ao socorrer-se da prova testemunhal para julgar provados os factos insertos na base instrutória sob os nºs 2, 3, 4, 8 e 9, violou uma proibição de produção daquela prova. Em segundo lugar, aquele erro tem por base, no tocante aos factos incluídos naquela base sob o nºs 2 a 5, 7 a 9, o equívoco na valoração ou apreciação das provas.

Já, porém, segundo os autores, o vício da decisão da matéria de facto tem por causa a contradição entre o facto constante da al. J), julgado assente logo no momento da selecção da matéria de facto, e as respostas aos pontos de factos insertos na base instrutória sob os nºs 3 a 5, 7 a 9, 12 a 16, colisão que, na sua perspectiva, deve ser desfeita através da eliminação do primeiro daqueles pontos de facto.

                Além disso, todos os recorrentes assacam à sentença apelada um erro de direito, na modalidade de erro na qualificação: segundo todos os impugnantes a sentença escolheu a norma errada para enquadrar o caso concreto. Assim, segundos os réus, não há razão para concluir que a vontade tenha sido viciada por erro, tendo, antes as partes subordinado as suas obrigações a uma condição – o destaque da parcela de terreno objecto mediato do contrato definitivo prometido da futura definição pela edilidade do PDM para o local – lícita e fisicamente possível; de harmonia com a alegação dos autores, o caso não é de erro sobre a base do negócio – reconhecimento que jamais pretenderam – mas antes de resolução do contrato promessa por incumprimento definitivo, imputável aos demandados.

                A resolução destes problemas vincula, naturalmente, à aferição dos poderes de controlo desta Relação sobre a decisão da matéria de facto e à ponderação dos institutos do erro, da condição.

                Dado que as decisões sobre o recurso principal e o subordinado têm de ser harmónicas e compatíveis – dado que não pode haver decisões contraditórias sobre cada um das parcelas da decisão que é impugnada em cada um desses recursos – ambos devem ser apreciados em conjunto, porque ambos têm os mesmos fundamentos de procedência ou improcedência. Isto não é assim, porém, se se cumularem nos recursos vários objectos que se encontram numa relação de prejudicialidade: neste caso a ordem de apreciação deve observar aquela que é imposta pela relação de prejudicialidade.

                3.2. Impugnação da decisão da matéria de facto.

3.2.1. Violação da proibição da produção de prova testemunhal.

É indubitável que entre o autor e os réus foi concluído um contrato promessa de compra e venda – e um contrato promessa de compra venda bivinculante já que um e outros se vincularam a emitir, no futuro, as declarações de vontade integrantes de um outro contrato – o contrato definitivo prometido de compra e venda (artºs 410 nº 1, 874 e 879 a) e b) do Código Civil).

Tratando-se de um contrato promessa referido a contrato definitivo sujeito a documento autêntico, está ele mesmo sujeito a documento assinado pelos promitentes, portanto, a documento particular (artº 410 nº 2 do Código Civil). Nesta hipótese, o contrato promessa é, sob pena de invalidade, um contrato formal (artº 220 do Código Civil).

A prova testemunhal, admitida juxta scripturam, i.e., para efeitos interpretativos, já não o é, porém, em princípio, contra ou praeter scripturam – i.e., para prova de quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo autênticos ou dos documentos particulares, quer essas convenções sejam anteriores, contemporâneas ou posteriores à formação do documento (artº 394 nº 1 do Código Civil).

Todavia, o âmbito desta proibição de produção prova testemunhal é mais restrito do que aparenta à primeira vista.

Em primeiro lugar, a proibição de produção daquela prova pessoal apenas se refere às convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento – e não a simples declarações - não excluindo, portanto, a possibilidade de provar por testemunhas qualquer outro elemento como o fim ou o motivo do negócio, dado que aquele fim ou este motivo não é nem contrário ao conteúdo do documento, nem constitui uma cláusula adicional à declaração[1].

Depois, a inadmissibilidade da prova testemunhal, em contrário ou além do conteúdo do documento, não se refere à prova dos vícios da vontade ou da divergência entre a vontade e a declaração. Admite-se, portanto, sem qualquer restrição, aquela prova para demonstração, por exemplo, do erro, do dolo, da coacção, etc.[2].

Finalmente, não falta doutrina de incontestável valia científica, que sustenta que princípio da não admissibilidade daquela prova não é, nos casos apontados, absoluto. Assim, logo no contexto dos trabalhos preparatórios do Código Civil de 1966, sustentava-se a admissibilidade daquela prova, quando seja acompanhada de circunstâncias que tornem verosímil a convenção que com ela se quer demonstrar[3], ou – no caso de prova da simulação pelos simuladores - quando tenha em vista fazer valer a ilicitude do contrato dissimulado ou, melhor, quanto está em jogo um interesse público que deva prevalecer sobre o das partes[4]. E já na vigência do Código Civil continua a sustentar-se uma interpretação restritiva da proibição apontada, por parecer razoável que a prova testemunhal seja admitida quando, em consequência, das circunstâncias do caso concreto, for verosímil que a convenção foi feita, ou quando a convicção do tribunal está já parcialmente formada com base nessas circunstâncias e a prova testemunhal se limitou a completar essa convicção, ou antes, a esclarecer o significado de tais circunstâncias[5], não tendo esta doutrina das restrições à admissibilidade daquela prova, sido formulada expressis verbis no Código, por isso se ter considerado desnecessário[6], e que as excepções que estes códigos fazem à regra da inadmissibilidade da prova testemunhal contra ou além do conteúdo do documento parecem igualmente verdadeiras no nosso direito, apesar do silêncio do Código acerca delas[7].

O objectivo da inadmissibilidade daquela prova é o de afastar os perigos que a sua admissibilidade seria susceptível de originar: quando uma das partes – ou ambas – quisesse infirmar ou frustrar os efeitos do negócio poderia socorrer-se de testemunhas para demonstrar que o negócio foi simulado, destruindo assim, mediante uma prova insegura ou pouco fiável, a eficácia do documento[8]. Tal objectivo, porém, só se compreende à luz da regra de experiência de harmonia com a qual, se as partes reduzem a escrito um determinado conjunto de declarações, é de presumir que também o façam relativamente a cláusulas contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento. Pretendeu-se, portanto, acautelar a justiça da decisão do caso, subtraindo-a à acção de litigantes e testemunhas menos escrupulosas, existindo documento – meio de prova tido por mais fiável – com força probatória plena. O legislador não terá, porém, desejado proteger situações que não merecem tutela, beneficiando quem, efectivamente, acordou verbalmente contra ou para além do documento, e na acção judicial, pretendendo subtrair-se ao cumprimento da palavra dada, alegue a inadmissibilidade da prova testemunhal[9].

É irrecusável que para se convencer da realidade dos factos controvertidos insertos na base instrutória sob o nºs 2, 3, 4, e 8 e 9 o decisor de facto da 1ª instância se socorreu da prova testemunhal – e mesmo exclusivamente desta prova pessoal. Mas há boas razões para crer que, no caso, não houve violação daquela proibição de prova.

Uma das causas petendi alegada pelos apelantes subordinados consistia na invalidade do contrato promessa por erro na formação da vontade de contratar do autor: segundo os autores a vontade do autor foi viciada por erro e não por erro simples – mas mesmo, como decorre da norma jurídica que invocaram para enquadrar a alegação, por erro qualificado por dolo - e por dolo comissivo (artºs 253 e 254 do Código Civil). E dessa causa de pedir faziam derivar o direito potestativo extintivo de anulação do contrato – tendo sido terminantes em pedir que se declarasse a anulabilidade do contrato promessa de compra e venda.

É verdade que os recorrentes afirmam, agora, na alegação do seu recurso que a questão subjacente aos presentes autos é o incumprimento do contrato e não a questão do “erro”, que jamais pretenderam (nem tão pouco tal situação resulta do pedido formulado - ou da causa de pedir) o reconhecimento do erro sobre a base do negócio.

Estas alegações dos autores são deveras surpreendentes e singulares, dado que é patente, ostensivo, manifesto, notório, irrecusável, que, logo na petição inicial, alegaram o erro na formação da vontade do autor de concluir o contrato promessa e formularam mesmo o pedido de anulação dele, sendo, de todo, incompreensível, a negação, na sua alegação, da dedução daquela causa petendi e deste pedido constitutivo.

Seja como for, exacto é, em todo o caso, que os pontos de facto contidos nos nºs 2 a 4, 8 e 9 têm por objecto o erro alegado pelos autores que interferiu na vontade – do autor – de celebrar o contrato promessa. E quanto a tais factos não vale, pelas razões indicadas, a apontada proibição de produção da prova testemunhal.

Depois, mesmo que tais pontos de facto não tivessem por objecto àquele vício da declaração ou da vontade negocial, sempre seria admissível a produção da prova testemunhal, dado que sempre se refeririam ao fim ou aos motivos determinantes da vontade do autor em concluir aquele contrato preliminar: o convencimento de que a parcela de terreno, objecto mediato do contrato definitivo prometido, tinha o processo de loteamento pronto e que, em final de 2006, estaria integrada no PDM da Guarda para efeitos de construção. E como aquele fim ou este motivos não se resolvem em convenções contra ou praeter escripturam, é perfeitamente admissível, para a sua prova, a produção de prova testemunhal.

Nestas condições, ao admitir a produção da prova testemunhal e ao assentar nessa prova a sua convicção sobre a realidade dos factos insertos na base instrutória sob os nºs 2 a 4, 8 e 9, o tribunal a quo não violou a proibição de produção daquela prova e, correspondentemente, da sua valoração. Não há por isso, razão para com fundamento na violação da proibição da produção da prova testemunhal, julgar não provados aqueles factos.

Mas nesse caso – logo acodem os réus – esses factos, bem como os insertos na base da prova sob os nºs 5 e 7, devem ser julgados não provados, por virtude do error in iudicando em que incorreu, por erro na valoração das provas, o decisor de facto da 1ª instância.

Há, portanto, que verificar se a convicção do tribunal a quo acerca da realidade destes factos, foi ou não alcançada com o uso da prudência – i.e., da faculdade de decidir da forma correcta (artº 655 do CPC de 1961, vigente ao tempo do julgamento da questão de facto, e 607 nº 5, 1ª parte, do CPC actual).

Previamente, porém, importa tornar patentes os parâmetros e o contexto em que esta Relação actua os seus poderes de controlo sobre a decisão da questão de facto do tribunal de que provém o recurso.

3.2.2. Parâmetros de controlo da Relação relativamente à decisão da matéria de facto da 1ª instância.

O controlo efectuado pela Relação sobre o julgamento da matéria de facto realizado pelo tribunal da 1ª instância, pode, entre outras finalidades, visar a reponderação da decisão proferida.

A Relação pode reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar – e, portanto, substituir - a decisão da 1ª instância se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos de facto da matéria em causa ou se, tendo havido registo da prova pessoal, essa decisão tiver sido impugnada pelo recorrente ou se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por qualquer outra prova (artº 712 nºs 1, a) e b), e 2 do CPC).

Note-se, porém, que não se trata de julgar ex-novo a matéria de facto - mas de reponderar ou reapreciar o julgamento que dela foi feito na 1ª instância e, portanto, de aferir se aquela instância não cometeu, nessa decisão, um error in judicando[10]. O recurso ordinário de apelação não perde, mesmo neste caso, a sua feição de recurso de reponderação para passar a ser um recurso de reexame.

Depois, essa reponderação tem por finalidade e é actuada sob o signo dos parâmetros seguintes:

a) Do exercício da prova – que visa a demonstração da realidade dos factos – apenas pode ser obtida uma verdade judicial, jurídico-prática e não uma verdade, absoluta ou ontológica, matemática ou científica (artº 341 do Código Civil);

b) A livre apreciação da prova assenta na prudente convicção – i.e., na faculdade de decidir de forma correcta - que o tribunal adquirir das provas que foram produzidas (artº 655 nº 1 do CPC).

c) A prudente obtenção da convicção deve respeitar as leis da ciência, da lógica e as regras da experiência - entendidas como os juízos hipotéticos, de conteúdo geral, desligados dos factos concretos objecto do processo, procedentes da experiência mas independentes dos casos particulares de cuja observação foram deduzidos e que, para além desses casos, pretendem ter validade para casos novos – e que constituem as premissas maiores de facto às quais são subsumíveis factos concretos;

d) A convicção formada pelo juiz sobre a realidade dos factos deve ser uma convicção subjectiva fundada numa convicção objectiva, assente nas regras da ciência e da lógica e da experiência comum ou de normalidade maioritária, e portanto, uma convicção cognitiva e não volitiva, voluntarista, subjectiva ou emocional;

e) A convicção objectiva é uma convicção argumentativa, i.e., demonstrável através de argumento capaz de se impor aos outros;

e) A apreciação da prova vincula a um conceito de probabilidade lógica – de evidence and inference, i.e., segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente, portanto, segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis: os elementos de prova são assumidos como premissas a partir das quais é possível extrair inferências; as inferências seguem modelos lógicos; as diversas situações podem ser analisadas de acordo com padrões lógicos que representam os aspectos típicos de cada caso; a conclusão acerca de um facto é logicamente provável, como uma função dos elementos lógicos, baseada nos meios de prova disponíveis[11];
f) O juiz deve decidir segundo um critério de minimização do erro, i.e., segundo a ponderação de qual das decisões possíveis tem menor probabilidade de não ser a correcta

g) O controlo pela Relação da decisão da matéria de facto não é actuado por imediação, i.e., através de numa percepção própria do material que lhe serve de base, mas através da audição de um registo sonoro ou da leitura, fria e inexpressiva, de transcrições, que torna indisponíveis todos os relevantíssimos momentos não verbais da comunicação.

3.2.3. Reponderação da decisão relativa à matéria de facto da 1ª instância.

Os pontos de facto que os réus de reputam de mal julgados são os que foram insertos na instrutória sob os nºs 2 a 5, 7 a 9, e que o decisor da 1ª instância julgou provados. E que provas é que, no ver destes recorrentes, foram erroneamente valoradas? As mesmas de que, declaradamente, o decisor de facto se socorreu para alicerçar a sua convicção: os depoimentos das testemunhas P…, ... De harmonia com a alegação dos autores, estes factos, numa sã e prudente avaliação da prova, devem julgar-se não provados.

P… – filho dos autores, arquitecto – começou, no seu depoimento, por asseverar que além do pai lhe ter pedido ajuda para confirmar a área do terreno, através de um levantamento topográfico, acompanhou o pai nalgumas reuniões que teve com o Sr. Eng.º … – acompanhei-o no sentido de que ele é uma pessoa já com uma certa idade, tem alguns problemas auditivos e foi mais nesse sentido, de resto, o meu pai foi sempre uma pessoa muito independente nesse sentido. Garantiu, de seguida, que o Sr. Eng.º … sempre transmitiu ao meu pai que no final de 2006 essa propriedade estaria no PDM da Guarda, permitindo ao meu pai fazer um loteamento e diversas moradias, era a garantia do Sr. Eng.º ...

A mesma testemunha assegurou, depois, que o Sr. Eng.º …, com a postura dele, dizia ele que era uma pessoa muito influente na Câmara Municipal, que, realmente, até final do ano esse terreno teria viabilidade precisamente para fins construtivos, que era esse o objectivo do meu pai, e que o Eng.º … apresentava esboços com a parcela dividida em lotes para aquele terreno, com os passeios já feitos, com os esboços da iluminação, inclusive uma cabina eléctrica.

Afiançou ainda que o (meu) pai confiava cegamente no Eng.º …, sempre foi visto como uma pessoa de bem, quase inatingível, sempre foram pessoas muito influentes, e que a finalidade desse negócio era construir, fazer o que o Sr. Eng.º … garantia que podia lá fazer – fazer lotes e fazer moradias; era a vida do meu pai.

Esta testemunha salientou igualmente que o (meu) pai, com a garantia que o Sr. Eng.º … lhe garantia com a entrada no PDM da Guarda até final de 2006 dessa propriedade, tinha previsto no ano de 2007 começar a construir moradias, o meu pai direccionou a sua vida para esse terreno; o Sr. Eng.º … garantiu, “a pés juntos”, que brevemente teria a situação resolvida, que ele era influente na Câmara Municipal, que lidava directamente com o Presidente da CM, lidava directamente com os técnicos. E, mais adianta no seu depoimento, reiterou a confiança que o pai depositava no Eng.º ...

Nas instâncias com que foi apertado pelo Exmo. Advogado dos réus, a testemunha reafirmou que (o réu) é uma pessoa bastante influente e nas conversas que ele teve como meu pai, algumas delas que eu estive presente, ele realmente demonstrava isso. Instado a concretizar as vezes que esteve com o Eng.º … e com o seu pai, esclareceu que não podia precisar essas vezes, mas que a primeira vez foi quando foi levar o levantamento topográfico. E reiterou: o Sr. Eng.º sempre transmitiu que era uma pessoa influente, na Câmara Municipal resolvia estas situações, que se relacionava muito bem na autarquia e directamente com o Presidente da Câmara, isso eu ouvi. Mais adiante esclareceu que esteve presente na assinatura do contrato. E depois de uma troca mais acesa de palavras com o Exmo. Advogado dos réus, a propósito da autoria da feitura do contrato – único momento em que no decurso das suas declarações a testemunha perdeu, por momentos, a serenidade com que o prestou, perda a que não é estranha o modo hostil, nesse ponto, da inquirição – o depoente rematou: o meu pai confiava, infelizmente, cegamente na palavra do Sr. Eng.º …; o Sr. Eng.º … garantiu que estivesse descansado – o pai do declarante – que até final do ano de 2006, entraria no PDM; o meu pai continua a trabalhar a vida dele descansado, confiava na palavra do Sr. Eng.º ...

Em face deste depoimento, não se julga exacta a alegação dos recorrentes, que a razão de ciência desta testemunha se resuma exclusivamente ao que o pai lhe contou – ponto, que aliás, no decurso da instância a Sra. Juíza de Direito fez notar ao Exmo. Advogado dos réus: alguns dos factos foram directamente percepcionados pelo depoente, por os ter ouvido, e por virtude da sua presença nas reuniões do autor com o réu.

Não há dúvida que, por força da relação de parentesco e de convivência que liga esta testemunha ao autor, esta testemunha está decerto num posto de observação que a torna especialmente qualificado o seu depoimento: a sua razão de ciência sobreleva consideravelmente a das pessoas estranhas. Mas, como é claro, uma coisa é a testemunha ter uma fonte de informação e de conhecimento superior à das pessoas que não privam com o autor, outra é achar-se ela em condições de independência e isenção que lhe permitam fazer um depoimento consciencioso e verdadeiro: a testemunha conhece, em princípio, os factos melhor que ninguém: resta saber se o vínculo familiar que a liga à parte não o privará da liberdade e da espontaneidade necessárias para dizer toda a verdade e só a verdade.

No tocante à apreciação do valor deste depoimento, da sua força probatória, tem naturalmente importância a razão de ciência, quer dizer a fonte de conhecimento dos factos, a razão do seu dito. Notar-se-á, porém, que relativamente à razão de ciência não exige a nossa lei que ela só possa consistir na constatação presencial do facto pela testemunha[12], na aquisição do facto por conhecimento directo, sendo admissível que o facto relatado tenha sido adquirido de forma indirecta ou mediata – embora neste último caso, o crédito que a testemunha merece deva ser valorado com uma circunspecção subida, sobretudo tratando-se de testemunha de relato ex parte, i.e., que tenha como fonte uma parte.

De harmonia com o id quod plerumque accidit – com aquilo que normalmente sucede – é natural que aquisição de factos relativos a um membro da família resulte de declaração dessa mesma pessoa – e de declaração inintencional, i.e., de declaração originariamente não ordenada para a prova.

Nestas condições, tendo em conta a liberdade, a espontaneidade com que a testemunha depôs e o carácter circunstanciado, lógico e coerente e contextualizado das suas declarações, não há razão para opor qualquer reserva à sua independência de juízo, para supor que o seu depoimento não respeitou a verdade que conhecia e, portanto, para depreciar ou desvalorizar a sua força persuasiva.

Por sua vez, a testemunha … – construtor civil e que afirmou conhecer os autores e o réu, porque fizeram um negócio igual como eu fiz; tive lá um caso também e foi um caso que eu tive igual, sendo daí que conhece o autor e o réu, a minha situação está resolvida – declarou que fez um negócio em 2006 um negócio com o Eng.º … prometeu vender dois lotes de terreno, prometeu destacar e estivemos cerca de 4 anos à espera e nunca conseguimos: prometeu que num ano, num ano e dois meses, estaria tudo pronto, e que deu o dinheiro de sinal. Afirmou ainda que o Sr. Eng.º prometeu que podia lá construir; passou esse tempo, tentei andar atrás dele para ver o que se passava: ele dizia-me: está quase, já saiu no jornal, e que estava o PDM a avançar; dizia-me muitas coisas dessas, muitas aldrabices; esperei à volta de 4 anos, com € 70.000,00 do “lado de lá”. E – interrogado pela Sra. Juíza de Direito – respondeu que ele dizia que já tinha falado com várias pessoas da Câmara, e que fui informado na Câmara que não havia hipótese nenhuma de aquilo ser para construção: aquilo foi uma burla que ele fez.

E, nas instâncias a que foi submetido, pelo Exmo. Advogado dos réus, asseverou que aquilo estava praticamente pronto para construir, ele mostrou-me isso.

Por seu lado, a testemunha … – reformado da construção civil – que logo no interrogatório preliminar, tratou de dizer que conhecia o réu e o autor, porque também ele estava metido no mesmo processo, estava na mesma situação, também lá encravado e que o Sr. … andou a mentir às pessoas. No interrogatório fundamental, garantiu que a quinta é a mesma, é tudo no mesmo artigo: fomos a falar com ele – eu e um colega meu da Associação das Testemunhas de Jeová – não era para mim, era para Associação lá fazer, ele disse que sim, que aquilo estava pronto, que por mais um mês ou dois estava aí o PDM; apanhou-nos € 75.000,00. Era fazer um salão de reuniões da Associação.

E, adiante, asseverou que fomos à Câmara, não está nada para vir o PDM, e que o nosso contrato está em 14 de Maio de 2006, que o terreno era do mesmo prédio; ele dizia que vinha o PDM e depois fazia aquilo em lotes e depois fazia as escrituras: era assim que ele negociava. Era quase todas semanas atrás dele; ele foi um grande burlão; ele dizia que ia à Câmara, que ia meter o processo para fazer essas alterações, nunca fez nada; até nos levou à Câmara, só que ele não fez nada, não meteu nada. E acrescentou: que confiou no Sr. Eng.º: ele sempre disse que resolvia tudo.

Nas instâncias a que foi sujeito, a testemunha esclareceu, corrigindo a declaração anterior, que o negócio foi em Maio de 2007.

É exacto, como justamente notam os réus na sua alegação, que tanto uma como outra destas testemunhas foi terminante em declarar que nada sabiam sobre as negociações relativas ao contrato promessa concluído entre o autor e os réus – ponto, que aliás, não passou despercebido à Sra. Juíza de Direito. Mas desta circunstância não decorre, ao contrário do que sustentam os réus, nenhum valor probatório dos depoimentos daquelas testemunhas. Bem pelo contrário.

Na motivação com que justificou o seu julgamento da questão de facto, o decisor da 1ª instância, sublinhou a similitude da situação do autor e daquelas testemunhas, semelhança de que extraiu, por aplicação de uma regra de lógica e de experiência, a conclusão de uma fundamental parecença dos negócios concluídos entre o autor e o réu e entre este e aquelas testemunhas, fazendo todo o sentido que o réu tenha contratado, nos mesmos termos com os aqui autores.

Não há razão para divergir. Os depoimentos destas três testemunhas inculcam realmente um padrão de conduta do réu, um comportamento repetido, relativamente homogéneo desse mesmo réu: a promessa de venda de uma parcela de terreno, com a garantia da modificação do PDM e da consequente alteração da destinação da parcela, tornando-a apta para edificação urbana. Este padrão de conduta – avaliado de uma forma prudencial – é um meio que torna altamente provável a exactidão dos factos objecto de controversão, probabilidade que, por sua vez, é um meio para se alcançar a verdade.

Em absoluto remate: apesar da distância entre esta Relação e as provas e o modo como delas conheceu – através da audiência do registo sonoro dos depoimentos – não há fundamento para concluir que, no julgamento dos pontos de facto objecto da impugnação, o tribunal a quo tenha incorrido num error in iudicando por violação de regras da experiência ou da lógica e, portanto, para modificar esse julgamento.

                3.2.4. Contradição da decisão da matéria de facto.

De harmonia com a alegação dos recorrentes subordinados, a decisão da matéria de facto encontra-se ferida com o vício da contradição: no seu ver o ponto de facto inserto na al. J) base instrutória está em contradição com as respostas encontradas para os factos controvertidos insertos na base com os nºs 3 a 5, 7 a 9, 12 a 16. Colisão que, segundo os autores, deveria ser removida através da eliminação do facto constante daquela alínea.

Esta Relação pode usar, mesmo oficiosamente, poderes de rescisão ou cassatórios e anular a decisão proferida na 1ª instância, por exemplo, sempre que repute contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, contradição que pode verificar-se entre a matéria de facto resultante das respostas aos pontos de facto controvertidos, com entre essas respostas e matéria logo julgada assente no momento da selecção da matéria de facto (artº 712 nº 4, 1ª parte, do CPC).

Os pontos da matéria de facto são contraditórios quando têm um conteúdo logicamente incompatível, i.e., quando dois ou mais pontos dessa matéria não podem subsistir utilmente. A superação da contradição pode derivar da prevalência que deva ser dada, por exemplo, ao ponto de facto demonstrado por um meio de prova plena – v.g., documento autêntico, acordo ou confissão das partes[13] – ou por via da conjugação com outros segmentos da decisão ou com a matéria de facto que já deveria considerar-se provada. Mas também pode decorrer dos meios de prova que o processo disponibilize e nos quais o tribunal a quo se tenha fundado. Neste caso, dada a feição nitidamente subsidiária dos poderes cassatórios da Relação, esta não anula a decisão da matéria nem reenvia o processo para a 1ª instância para se proceder a novo julgamento – antes remove ela mesma a colisão, através da harmonização das respostas.

Assentes estes pontos, temos por certo que entre o facto constante da al. J) da factualidade assente – de harmonia com o qual os autores tinham conhecimento, no momento da conclusão do contrato promessa do conteúdo do PDM da Guarda, o prédio não tinha, ao tempo, aptidão edificativa - e as respostas aos pontos de facto controvertidos insertos na mesma base sob os nºs 3 a 5, 7 a 9, 12 a 16 não há qualquer colisão ou contradição, dado que o conhecimento pelos autores da falta de aptidão edificativa, por força do instrumento de ordenamento aplicável, da parcela de terreno, ao tempo da celebração do contrato promessa, e a afirmação do réu de que tinha o processo de loteamento pronto para aprovação, a promessa, feita por esse mesmo réu, de aquisição daquela capacidade, e a confiança dos autores naquela afirmação e nesta promessa não são logicamente incompatíveis – bem pelo contrário. Realmente, por exemplo, a promessa do réu de que a parcela adquiriria, em momento posterior ao da conclusão do contrato, por força da alteração do PDM, capacidade ou aptidão edificativa, só é logicamente compreensível, em face da ausência dessa qualidade ao tempo da conclusão do contrato e do conhecimento desse facto pelos contratantes nesse mesmo momento.

Depois – e sobretudo – ainda que se devesse concluir pela incompatibilidade lógica entre um e outros daqueles pontos de facto, então a conclusão exacta seria a de que a colisão deveria desfazer-se através da prevalência do facto constante da alínea J), em detrimento das respostas encontradas pelo tribunal da audiência para os pontos de facto seleccionados para a base da prova.

É que tal facto deve considerar-se plenamente provado – seja por virtude do acordo das partes ou da confissão dos autores – e é essa razão que explica que, logo no momento da selecção da matéria de facto tenha sido incluído na factualidade assente. Realmente foram os autores, eles mesmos, que admitiram – no artº 9 da resposta - que tinham conhecimento de que o imóvel em causa não estava integrado no PDM, com o que queriam significar que sabiam que não tinha, à luz daquele regulamento, aptidão edificativa. E, neste caso, o julgamento do tribunal da audiência sobre estes factos ter-se-ia por irrelevante, pelo que a contradição entre aquele facto assente e as respostas daquele tribunal seria resolvida, como se compreende, a favor daquele.

A alegação pelos autores do vício da contradição da decisão da matéria de facto é, de todo, improcedente – e mesmo incompreensível.

Portanto, e no que tange à impugnação da matéria de facto, qualquer dos recursos deve ser julgado improcedente. E face a essa improcedência, o controlo da matéria de direito será necessariamente actuado tendo em conta os factos fixados pelo tribunal recorrido.

3.3. Impugnação da decisão de direito.

Nos termos gerais, o incumprimento definitivo de uma obrigação ocorre quando, objectivamente, o credor perca o interesse na prestação e quando o devedor não cumpra num prazo razoavelmente fixado pelo credor – a chamada interpelação admonitória (artº 808 do Código Civil).

Porém, deve notar-se que o incumprimento definitivo surge não apenas quando por força da não realização ou do atraso na prestação o credor perca o interesse objectivo nela ou quando, havendo mora, o devedor não cumpra no prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo credor – mas igualmente nos casos em que o devedor declara expressamente não pretender cumprir a prestação a que está adstrito[14] ou adopta uma qualquer outra conduta manifestamente incompatível com o cumprimento. Quando tal ocorra, não se torna necessário que o credor lhe assine um prazo suplementar para haver incumprimento definitivo: a declaração do devedor é suficiente, por exemplo, no caso em que, sem fundamento, resolve o contrato[15], ou afirma de forma inequívoca, que não realizará a sua prestação[16].

O incumprimento definitivo traduz uma desistência, por parte do direito, de manter vivo o dever de prestar principal, na expectativa de que o devedor o cumpra. Em qualquer dos casos, a incumprimento definitivo provoca a extinção do dever de prestar principal, com consequências várias.

Face à situação patológica da prestação causada pelo devedor com a violação da obrigação correspondente, a ordem jurídica comina-lhe sanções que podem ser reconstitutivas – v.g. a resolução do contrato ou a execução específica das obrigações que dele emergem – ou compensatórias, como por exemplo, a indemnização por danos patrimoniais e, de harmonia com a doutrina que se tem por exacta, não patrimoniais.

Assim, a extinção da prestação principal leva desde logo à sua substituição pelo dever de indemnizar (artºs 798 e 801 nº 1 do Código Civil).

Tratando-se de obrigações recíprocas, o incumprimento definitivo de uma delas confere à parte fiel a faculdade de resolver o contrato (artº 801 nº 2 do Código Civil). Faculta a essa parte a resolução do contrato – mas não lha impõe.

Do contrato promessa emergem, tipicamente, prestações de facto jurídico positivo.

Trata-se, caracteristicamente, de direitos de crédito. Podem, por isso, ser violados por quaisquer perturbações provocadas pelo devedor, em especial, através do incumprimento.

Verificado esse incumprindo, a ordem jurídica comina ao infractor, desde logo, uma sanção compensatória – a indemnização do dano decorrente desse incumprimento, embora o objecto dessa indemnização seja, no contexto do contrato promessa, sujeita a uma delimitação específica.

Toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor a título de antecipação do preço presume-se ter o carácter de sinal (artº 441 do Código Civil).

Se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigação, por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o incumprimento for assacável a quem recebeu o sinal, tem a contraparte a faculdade de exigir o dobro do que lhe prestou (artº 442 nº 2 do Código Civil). Na ausência de convenção contrária, no caso de perda do sinal ou do seu pagamento em dobro, não há lugar, com fundamento no não cumprimento do contrato promessa, a qualquer outra indemnização (artº 442 nº 4 do Código Civil).

Nos termos gerais, a existência de mecanismos específicos destinados a actuar em caso de incumprimento de obrigações com prestações recíprocas, - v.g. a resolução do contrato de que emergem - não paralisa as demais sanções cominadas para esse incumprimento. Assim, a parte fiel tem sempre direito às indemnizações devidas pela parte em falta. E essa parte pode actuar esse direito independentemente, por exemplo da resolução do contrato, na qual poderá não ter qualquer interesse, como sucederá, decerto, no caso de a actuação daquele direito à indemnização produzir um efeito homótropo ao que decorre da resolução ou no caso de essa indemnização decorrer justamente da extinção, ainda que indevida, do contrato operada pela contraparte.

É patentemente o que ocorre no caso do contrato promessa em que tenha sido traditado sinal. Verificado o não cumprimento, funciona, do contrato, o segmento vocacionado para intervir, substituindo a prestação principal, o próprio sinal, não havendo lugar, pelo não cumprimento, a qualquer outra indemnização. A única coisa que deve exigir-se, para que o interveniente adquira o direito a essa prestação indemnizatória substitutiva é - de harmonia com a doutrina que se tem por preferível - que se trate de incumprimento definitivo e não de mera mora.

Note-se, em todo o caso, que, devendo entender-se que a actuação do sinal envolve necessariamente a resolução do contrato promessa, estando em causa a supressão radical do contrato, mesmo nessa hipótese, é suficiente que o promitente fiel se limite a pedir a declaração do não cumprimento pelo faltoso da sua obrigação de contratar – rectior, da obrigação de, no futuro, emitir a declaração de vontade integrante do contrato definitivo prometido – e a devolução em dobro do sinal passado.

Os autores pediram, logo na instância recorrida, entre muitas outras coisas, a condenação dos réus na restituição, em dobro, do valor do sinal traditado. Este pedido tem implícita, logica e necessariamente, a declaração de resolução do contrato promessa.

A acção em que se pede a restituição em dobro do sinal traditado é, nitidamente, uma acção condenatória, dado que tem por finalidade a condenação do demandado na realização de uma prestação de dare, pressupondo a violação de um direito (artº 4 nºs 1 e 2 b) do CPC).

Na verdade o contraente fiel pode exigir a restituição do sinal em dobro a partir do incumprimento definitivo da contraparte, não tendo que aguardar a sentença que, reconhecendo o inadimplemento desta, a condenasse a pagar a indemnização já fixada á forfait. Esta sentença é meramente declarativa - e não constitutiva - na parte em que aprecia o incumprimento e julga-o verificado num determinado momento.

Como é claro, toda a acção de condenação pressupõe uma apreciação prévia de natureza declarativa. Ora, para proferir a condenação do demandado na restituição em dobro do sinal que recebeu, tem necessariamente de apreciar se aquela parte não cumpriu definitivamente a sua obrigação de prestação de facto jurídico positivo e, portanto, se o demandante goza da faculdade de resolução do contrato. Neste contexto, o autor pode obter a condenação do demandado formulando um único pedido: o de restituição em dobro do sinal passado.

Simplesmente, os autores também formularam, em cumulação real, com aquele pedido de resolução do contrato e de restituição do sinal em dobro, um outro pedido: o de anulação daquele mesmo contrato, em razão da viciação da vontade do autor por erro – e mesmo por erro qualificado por dolo comissivo.

É verdade que num verdadeiro venire contra facta propria, os autores alegam agora no seu recurso que subjacente aos presentes autos, ao contrário do entendimento da Meritíssima Juiz a quo, é o incumprimento do contrato e não a questão do erro, e que jamais pretenderam nem tão pouco tal situação resultado pedido formulado – ou da causa de pedir - pelos autores – o reconhecimento do erro. Decididamente os autores esqueceram-se do que alegaram nos artºs 70 e 75 da petição inicial e do pedido que, nesse mesmo articulado, formularam na alínea K).

As prestações emergentes de um contrato não têm de ser cumpridas se, em razão da sua invalidade, esse contrato for declarado nulo ou anulado: em sentido técnico, a extinção dos efeitos de um contrato – v.g., por resolução – pressupõe a sua validade, pelo que ao contrário, por exemplo, da resolução, a declaração de invalidade não se inclui entre os meios de cessação do contrato. Numa palavra: a cessação do contrato, por exemplo, por resolução, relaciona-se com circunstâncias supervenientes surgidas depois da celebração de um negócio jurídico válido e eficaz[17].

 A resolução é uma forma de extinção de contratos válidos – dado que não se funda num vício genético do acto. Dito de forma inversa, os contratos inválidos – desde que esta invalidade seja de conhecimento oficioso, ou não o sendo, tenha sido invocada pela parte legitimada - não são resolúveis – mas declarados nulos ou anulados, conforme o caso.

Daqui vem, em boa lógica, que não é possível cumular os pedidos de anulação de um contrato e de resolução dele, fazer valer declarar simultaneamente, no mesmo processo, os pedidos de anulação do contrato e de resolução desse mesmo contrato: tais pedidos são patente, intrínseca e substancialmente incompatíveis, e a petição inicial é verdadeiramente inepta, nulidade que só pode recusar-se, entendendo-se que entre e outro dos pedidos existe uma relação de alternatividade ou de subsidiariedade, determinada pela relação de prejudicialidade da questão da invalidade do contrato relativamente à da sua resolução por incumprimento definitivo (artº 193 nºs 1 e 2, c), in fine, do CPC de 1961, vigente ao tempo da proposição da acção e do proferimento da decisão impugnada).

Daqui decorre, como corolário que não pode ser recusado, que apenas há que discutir se os autores dispõem ou não do direito potestativo de resolução do contrato, caso se deva concluir que não gozam do direito potestativo de anulação dele. Repete-se: ao contrário do que nitidamente supõe a sentença impugnada, desde que a resolução apenas deve ser admitida para contratos válidos, o primeiro problema que, no caso, importa resolver é o de saber se o contrato promessa é ou não inválido, por se encontrar ou não ferido de uma causa de anulabilidade. E só caso esta resposta seja negativa é que se deve apreciar se os autores gozam ou não do direito potestativo extintivo de resolução, assente num facto superveniente: o incumprimento definitivo, pelos réus, da sua prestação de facto jurídico positivo – a emissão, no futuro, da declaração de vontade integrante do contrato definitivo prometido.

Os réus sustentam, no seu recurso, com veemência que o contrato não se encontra ferido com qualquer causa de anulabilidade – designadamente, o erro vício ou erro obstáculo da vontade do promitente adquirente – e que a obrigação de proceder ao destaque da parcela foi subordinada a uma condição suspensiva.

Diz-se condição, a cláusula acessória de um negócio jurídico, pela qual o seu autor faz depender os seus efeitos, total ou parcialmente, de verificação de um acontecimento ou facto futuro e objectivamente incerto (artº 270 do Código Civil).

 A condição seja ela suspensiva ou resolutiva, releva, inteiramente, da autonomia privada das partes e, como tal, deve ser respeitada (artºs 270, 405 nº e 406 nº 1 do Código Civil).

A pendência da condição cessa com a verificação ou não verificação; a certeza de que a condição se não verificará equivale à não verificação (artº 275 do Código Civil).

Verificada a condição os seus efeitos retrotraem-se, em princípio, à data da conclusão do negócio a que foi aposta. Sendo suspensiva, com a sua verificação, inicia-se a produção de efeitos do negócio e, sendo resolutiva, aquele negócio tem-se como não celebrado (artºs 276 e 277 do Código Civil).

Desde o momento da celebração do negócio condicionado e até à altura em que se verifique a condição – ou que haja a certeza de que não se verificará – esta está pendente. A pendência da condição é, assim, o período que medeia entre a celebração do negócio e a verificação ou não da condição.

Durante esse tempo, no caso de condição resolutiva, os efeitos negociais produzem-se plenamente. Todavia, a verdade é que situação jurídica condicionada é, por definição, uma situação instável, e, consequentemente, uma fonte de conflito de direitos: o titular do direito condicionado é, de algum modo, um titular precário.

A condição opera, naturalmente, uma distribuição de riscos, dado que da sua pendência ou da sua verificação podem ocorrer danos para os intervenientes no negócio. Trata-se, porém, de um risco assumido, por decorrer, por inteiro, da actuação da autonomia privada, que, como tal deve ser suportado, com resignação, pela parte prejudicada[18].

Pendente condicione, a boa fé desempenha um papel extraordinariamente importante. Assim, se a condição for impedida por aquele prejudica, tem-se por verificada; se também contra a boa fé, for provocada por aquele a quem beneficia, a condição considera-se não verificada (artºs 272 e 275 nº 2 do Código Civil). Numa palavra: nenhuma das partes pode, contra a boa fé, impedir ou provocar condições.

A boa fé deve, neste contexto, ser entendida em sentido objectivo e, portanto, como a necessidade de, em cada situação jurídica, observar os vectores fundamentais da ordem jurídica[19]. Desta manifestação de boa fé objectiva decorre a exigência da observância, designadamente, do princípio da confiança: na pendência da condição, as partes não devem actuar contra o que, de harmonia com as suas opções negociais, ou pela ordem natural das coisas, iria, em princípio ocorrer, em termos que provocaram a crença ou a expectativa legítimas da contraparte. Deste modo, é de todo contrária a boa fé qualquer actuação das partes que incida sobre o iter formativo da condição desde que, por exemplo, se venha a interferir na sua ocorrência ou não ocorrência, em termos que contrariem a confiança fundada da outra parte.

Simplesmente, a condição, seja ela suspensiva ou resolutiva, é um elemento puramente acidental ou acessório do negócio jurídico em que é convencionada, i.e., um elemento que, não sendo indispensável para caracterizar o tipo abstracto de negócio – promessa de compra e venda, doação, etc. – ou para individualizar a sua entidade concreta, todavia, se não limita a reproduzir condições legais supletivas, antes se torna necessário para que tenham lugar os efeitos jurídicos a que tendem. Maneira que se o contrato a que foi aposta a cláusula acessória da condição for inválido, a estipulação da condição também o será.

Tudo está, portanto, em saber, antes de mais, se o contrato promessa concluído entre o autor e os réus – conforme alegaram e pediram os autores na petição inicial – é ou não anulável. E anulável por esta causa precisa: o erro vício, ou erro motivo, que interveio entre os motivos da declaração negocial do autor.

Indagação que vincula naturalmente, ao exame, ainda que leve, da relevância jurídica desse erro.

3.3.1. Requisitos de relevância jurídica do erro.

De forma deliberadamente simplificadora, pode dizer-se que o erro-vício consiste na ignorância ou na falsa representação de uma realidade que poderia ter intervindo entre os motivos da declaração negocial.

Mas só há erro quando falta um elemento ou a representação está em desacordo com a realidade existente no momento da formação do negócio jurídico. Se o caso consiste na falsa representação de uma realidade futura, que se não se chega a verificar, o caso - muitas vezes impropriamente chamado de error in futurum - não é de erro, mas de falsa ou deficiente previsão (artº 437 do Código Civil).

O erro tem de respeitar a circunstâncias passadas ou presentes. Quando respeita a circunstâncias ou factos futuros, não há qualquer erro em sentido técnico-jurídico, dado que se não desconhece a realidade nem se faz dela uma falsa ou deficiente representação – e só nesse caso é que haverá erro, é que a vontade estará viciada por ele.

E face à consagração clara deste último instituto, não se mostra necessário recorrer actualmente ao error in futurum: uma deficiente previsão do evoluir das circunstâncias – um error in futurum – releva se, e na medida, em que se verifique os requisitos da alteração das circunstâncias; não é um caso de erro nem tem autonomia em face do instituto apontado.

Na verdade – insiste-se – o erro-vício consiste no desconhecimento ou numa falsa representação da realidade; se, pelo contrário, a falsa representação se reportar ao futuro, é a previsão que falha ou quadro de acontecimentos pressuposto que não se verifica ou evolui em termos diferentes do previsto, caso em que será de recorrer ao instituto da alteração das circunstâncias e verificar se essa falsa representação reúne os pressupostos reclamados para que este instituto seja aplicável.

O parecer de que o erro se reporta ao presente ou ao passado, ao passo que a pressuposição se refere ao futuro corresponde, aliás, à doutrina dominante[20]. E a afirmação de que o erro tem a ver com ignorância ou falsa representação da realidade, portanto, de factos ou circunstâncias já ocorridas, no passado ou no presente, e de que, por sua vez, a pressuposição se reporta ao futuro, tendo a ver com a convicção determinante, da vontade de contratar, de que as circunstâncias se manterão no futuro ou evoluirão em certo sentido ou de certa maneira, constitui também jurisprudência corrente[21].

Todavia, nem todo e qualquer erro se repercute no negócio jurídico. Para que o erro releve juridicamente, é necessário que nele concorram certos requisitos. De harmonia com a doutrina que se tem por preferível, é só um o requisito da relevância jurídica do erro: a causalidade ou a essencialidade[22]. É necessário – mas suficiente – que o error causam dans, que seja causa do negócio jurídico nos seus termos concretos. O erro há-de simplesmente ser essencial – não se exigindo, por exemplo, a sua desculpabilidade ou escusabilidade[23] - no sentido de que se o declarante não tivesse estado em erro não teria celebrado o negócio, ou na hipótese mais benigna, teria celebrado negócio essencialmente diferente ou diferente quanto a um elemento essencial ou fundamental dele (artºs 251 nº 1, 252 nº 1 e 254 nº 1 do Código Civil).

Na espécie do recurso, decorre terminantemente da matéria de facto apurada na 1ª instância que, os autores – rectior, o autor, visto que só este outorgou o contrato promessa – aceitaram celebrar este contrato, por o réu lhes ter dito que poderiam vir a construir várias moradias na parcela de terreno, lhes ter referido que o prédio tinha o processo de loteamento elaborado e pronto para ser aprovado, faltando apenas a aprovação municipal, e ter prometido ao autor que o prédio estaria integrado, até final de 2006, no PDM da Guarda para efeitos de construção – i.e., que até finais de 2006, estaria reconhecida, naquele instrumento, a capacidade edificativa ou aptidão construtiva do prédio, de que, consabidamente, não dispunha, no momento da conclusão do contrato promessa – pelo que os autores confiaram que a partir de Janeiro de 2007, o autor pudesse dispor do terreno para à edificação de prédios urbanos.

O caso é, portanto, patentemente de erro vício na declaração ou erro-obstáculo, portanto, de um erro na formação da vontade: o autor, fiado nas declarações, e induzido pelas promessas do réu, representou inexacta ou falsamente circunstâncias de facto que foram determinantes na decisão de concluir o contrato promessa: a de que a parcela de terreno objecto mediato do contrato definitivo prometido dispunha de processo de loteamento pronto, que, no final de 2006, teria capacidade ou aptidão construtiva ou edificativa reconhecida pelo instrumento de ordenamento do território aplicável, e que, a partir do final do ano seguinte, poderia dela dispor para o fim que tinha vista: a sua urbanização.

E um tal erro incidiu, não sobre a pessoa do declaratário - sobre a identidade ou qualidade deste - ou sobre o objecto do contrato, mas sobre a categoria residual: os motivos determinantes da vontade de contratar (artº 252 do Código Civil).

Tratando-se de erro sobre os motivos do negócio que o seu autor haja declarado serem determinantes da sua vontade, o erro reclama, para que seja fundamento de anulação desse mesmo negócio, que as partes tenham reconhecido, por acordo, a essencialidade desses motivos (artº 252 nº 1 do Código Civil). Note-se, de um aspecto, que se trata de acordo constituído por declarações de ciência e não de vontade, que podem mesmo ser puramente tácitas[24], e de outro, que a simples aceitação do negócio não vale como reconhecimento, no sentido exigido pelo preceito apontado. O que não é, de todo, suficiente é o conhecimento – ou o dever de conhecer – a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que recaiu o erro: é indispensável que as partes, ambas, estejam de acordo em que o aspecto em causa foi determinante da decisão do declarante.

Porém, o que os factos apurados não mostram é que o autor e os réus tenham manifestado a sua concordância quanto à essencialidade, para o primeiro daqueles motivos, que estivessem de acordo, no momento da conclusão do contrato, em que aqueles elementos foram determinantes para a decisão do autor para a celebração – nem isso foi sequer alegado. Como prova de um tal acordo, competia aos autores, mas este se não livraram do encargo correspondente, o referido erro dever-se-ia ter, em princípio, por irrelevante, não constituindo causa de anulação daquele contrato.

Mas a lei estabelece um regime especial para certos casos de erro sobre os motivos, em que se não exige àquela cláusula de condicionamento: se o erro incidir sobre circunstâncias que constituem a chamada – e controversa – base negocial, haverá lugar à anulabilidade do contrato, nos termos dispostos na lei acerca da resolução por alteração das circunstâncias vigentes em que o negócio foi concluído (artº 252 nº 2, 2ª parte, e 437 e ss. do Código Civil).

Há erro sobre a base do negócio ou sobre a base negocial quando o erro verse sobre circunstâncias determinantes da decisão de contratar, pretéritas, presentes ou futuras, sobre condições patentemente fundamentais do negócio jurídico[25], que pela sua importância, justifiquem, sem mais, segundo os princípios da boa fé, a invalidade do negócio – portanto, independentemente de o declaratário conhecer ou dever conhecer a essencialidade, para o declarante, das apontadas circunstâncias e, a fortiori, sem necessidade de as partes se mostrarem de acordo quanto a essa essencialidade[26].

Discute-se se o erro sobre a base negocial tem de ser bilateral. Mas nada na lei exige a bilateralidade: o erro, a existir, ainda é erro do declarante, recaindo embora sobre um elemento decisivo do contrato[27].

Os pressupostos da relevância do erro, como falsa representação da realidade, sobre a base do negócio, são, por extensão de regime, em síntese estreita, os seguintes: há-de tratar-se de uma alteração ou de um desvio anormal em relação às circunstâncias necessárias ao equilíbrio económico do negócio e à prossecução do seu fim, i.e., às circunstâncias exigidas pela justiça interna do negócio; que esse desvio ou alteração perturbe gravemente a justiça interna do negócio ou fruste o seu fim, de modo que a sua manutenção em vigor, ou a exigência da sua execução, e cumprimento, tal como está, se tornem contrárias à boa fé; que aquela perturbação interna ou esta frustração do fim, não estejam cobertos pelos riscos próprios do contrato.

A modificação danosa deve ser de tal ordem que a exigência da obrigação assumida afecte gravemente os princípios da boa fé. A perturbação deve ter uma tal intensidade que justifique a preterição do princípio da autonomia privada, a favor do princípio da boa fé[28].

Reclama-se, por último, um requisito negativo: o de que a alteração não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato. Não se trata do não funcionamento da alteração dentro daquela margem normal de flutuação contratual: trata-se antes de ressalvar as regras aplicáveis sobre o risco, dando, perante elas, natureza supletiva à própria alteração das circunstâncias[29].

Verificados estes requisitos, o erro sobre a base do negócio torna este anulável: dado que, no erro, o vício é contemporâneo da formação do negócio, ele dá lugar à anulação do contrato – e não à resolução dele[30].

Revertendo à espécie do recurso, há que concluir que concorrem no caso, todos os apontados requisitos de relevância do erro sobre a base do negócio.

A circunstância determinante ou decisiva da vontade de contratar por parte do autor – fiado nas declarações e na promessa do réu - foi, patentemente, a de afectar num arco temporal relativamente curto, por referência à conclusão do contrato promessa de compra e venda, a parcela de terreno prometida vender à construção, e só essa razão justifica que o réu tenha entregado ao réu, a título de sinal e princípio de pagamento, a avultada quantia de € 175.000,00, correspondente a mais de metade do preço convencionado para o contrato definitivo de compra e venda.

Porém, decorrido mais de seis anos sobre a conclusão do contrato promessa, não se mostra legalmente possível, por falta de aptidão para construção, afectar a parcela de terreno ao fim que o autor teve em vista ao concluir o contrato promessa, e não é previsível quando e se a parcela alguma vez adquirirá aquela aptidão, dado que o instrumento de gestão urbana aplicável continua em revisão, ignorando-se se será revisto, quando é que essa revisão se mostrará concluída e – o que é mais – se a revisão consistirá na alteração da destinação efectiva da parcela, atribuindo-lhe ou conotando-lhe um ius aedificandi de que, decorrido todo este tempo, continua a não dispor.

Verifica-se, pois, um desvio manifesto que ultrapassa os limites da normalidade, por comparação com as circunstâncias exigidas pela manutenção do equilíbrio económico do contrato e para a prossecução do seu fim, entorse que perturba gravemente a justiça interna do negócio – dado que uma das partes, o autor, está privado, há largos, sem contrapartida relevante, de uma quantia particularmente avultada, e impedida de afectar o bem prometido vender à finalidade que teve em vista com a conclusão do negócio. E permanecendo inteiramente indefinida a possibilidade ou sequer a probabilidade de alguma vez se preencher aquele fim negocial, a vinculação do autor – no limite ou em última extremidade ad aeternum - às obrigações que para ele emergem do contrato – e a consequente indisponibilidade da quantia passada a título de sinal - atenta de forma severa ou grave contra a boa fé.

Por último, o risco da desconformidade entre o contrato e a realidade deve ser suportado pelos réus. Em princípio, o contrato promessa origina prestações de facto jurídico: a celebração do contrato definitivo. São-lhe, por isso, inaplicáveis, todas as proposições que regulamentam, a nível do contrato definitivo, prestações de facto material ou prestações de coisa. Assim, a um contrato promessa de compra e venda é inaplicável a regra relativa aos efeitos essenciais deste último contrato de troca, designadamente, a relativa ao seu efeito real (artºs 879 a) do Código Civil). Nestas condições o risco recai sobre o promitente alienante (artº 796 nº 1, a contrario, do Código Civil). De resto, deve entender-se que foram os réus, eles mesmos, a tomar sobre si esse risco e a assumi-lo: foram os demandados que convenceram o autor sobre a aquisição, em prazo curto, pela parcela de terreno prometida vender, de potencialidade ou capacidade edificativa e foi essa promessa que interferiu determinante ou decisivamente, na vontade do primeiro em celebrar a promessa.

O contrato é, realmente – como se concluiu na decisão impugnada – por um tal erro na formação da vontade do autor, anulável.

E sendo anulável, estabelece-se entre as partes, uma relação de liquidação, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado (artº 289 nº 1 do Código Civil).

Por força do vício que o afecta como acto – e que determina a sua invalidade – o contrato promessa é simplesmente anulável e não resolúvel, por incumprimento definitivo das prestações de facto jurídico que dele emergem ou por qualquer outra causa, o que prejudica definitivamente a pretensão dos apelantes subordinados à restituição, em dobro, do sinal passado. Estes recorrentes têm apenas direito, por força da anulação do contrato promessa, à restituição, em singelo, daquele sinal.

Importa, pois, julgar improcedentes ambos os recursos.

Síntese recapitulativa:

a) A proibição de produção de prova testemunhal para prova de convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento não compreende o fim ou motivo do negócio nem os vícios da vontade ou de divergência entre a vontade e a declaração;

b) A prova deve ser avaliada segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente, i.e., segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis;

c) A contradição entre um facto plenamente provado e as respostas dadas a outros pontos de facto na fase da audiência, deve resolver-se a favor do primeiro daqueles factos;

d) A resolução é uma forma de supressão ou extinção de contratos válidos, pelo que os contratos nulos ou anuláveis não são resolúveis;

e) A invalidade do contrato atinge a cláusula acessória da condição que nele tiver sido convencionada;

f) O erro vício apenas exige, como condição de relevância, a sua causalidade ou essencialidade;

g) Há erro sobre a base do negócio – determinante não da resolução mas da anulação dele – quanto a falsa representação da realidade versa sobre circunstância patentemente fundamental desse mesmo negócio;

h) Não é exigível, no erro sobre a base do negócio, a sua bilateralidade.

Todos os recorrentes sucumbem nos respectivos recursos. Deverão, por força dessa sucumbência, suportar, cada um deles, as custas correspondentes (artº 527 nºs 1 e 2 do CPC).

Justifica-se, dada a complexidade do tratamento processual do objecto dos recursos, que a respectiva taxa de justiça seja fixada nos termos da tabela I-C, que integra o RCP (artº (artºs 6 nº 5 do RCP e 8 nº 1 da Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro).

4. Decisão.

Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento a ambos os recursos.

Custas de cada um dos recursos pelos respectivos recorrentes, com a taxa de justiça fixada na Tabela I-C, que integra o RCP.

                                                                                                               13.11.12

                                                                                                              Henrique Antunes - Relator

                                                                                                              José Avelino Gonçalves

                                                                                                              Regina Rosa

                                                                                             


[1][1] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª edição, Coimbra, 1987, pág. 343, Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume IV, Coimbra, 1984, pág, 317, e Ac. do STJ de 04.03.97, www.dgsi.pt.
[2] Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1979, pág. 275, e Antunes Varela/J. Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 618, e Almeida Costa, RLJ Ano 129º, pág. 361.
[3] Vaz Serra, Provas. BMJ nº 112, pág. 193.
[4] Vaz Serra, Provas, BMJ nº 112, págs. 197 e 198.
[5] Vaz Serra, RLJ Ano 103º, pág. 13.
[6] Vaz Serra, RLJ Ano 107º, pág. 311.
[7] Vaz Serra, RLJ, Ano 107º, pág. 312 e, Ano 110, pág. 383 e ss, Ano 111, pág. 3 e ss. e 115, págs. 121 e ss. No mesmo sentido, Mota Pinto, CJ, 85, III, pág. 102 e Acs. da RL de 18.05.99, CJ, III, pág. 102 e 02.07.09, www.dgsi.pt.
[8] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, cit., pág. 344, e Ac. do STJ de 02.11.10, www.dgsi.pt.
[9] Ac. da RL de 02.07.09, cit.
[10] Ac. STJ de 14.03.06, CJ, STJ, XIV, I, pág. 130 e António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, Almedina, Coimbra, 2007, pág. 271.
[11] Michelle Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, págs. 42 e 43.
[12] Não deverá ser pelo facto de se tratar de uma testemunha auricular que deverá, sem mais, por em causa a sua isenção, credibilidade, ou força probatória: Ac. da RP de 16.12.04, www.dgsi.pt. O juiz, pode, portanto, formar a sua convicção através do depoimento de testemunha auricular e em sentido contrário ao depoimento da testemunha ocular: Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume IV, cit., pág. 358. O valor da prova não depende da sua natureza (directa o indirecta) mas fundamentalmente da sua credibilidade, nada obstando, por isso, à admissibilidade e à valoração da prova testemunhal indirecta: Ac. do STJ de 22.04.08, Revista 878/08, Sumários do STJ de 2008.
[13] Ac. da RE de 12.12.96, CJ, V, pág. 276. A prevalência, pode, porém, ser dada ao ponto de facto controvertido que esta em colisão com facto que foi erradamente dado como assente: Ac. do STJ de 05.07.94, CJ, STJ, III, pág. 37, e de 20.10.89, BMJ nº 390, pág. 372.
[14] António Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 2º vol. AAFDL, 1980, pág. 457, Baptista Machado, RLJ Ano 118, pág. 275, Brandão Proença, Do Incumprimento do Contrato Promessa Bilateral, cit., pág. 87 e A Hipótese da Declaração (Lato Sensu) Antecipada de Incumprimento por parte do Devedor, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, Coimbra Editora, 2003, pág. 364, e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. II, pág. e Pessoa Jorge, Direito das Obrigações, AAFDL, pág. 296; Acs., v.g. da RC de 24.03.92 e 28.05.92, CJ, XVII, II, pág. 50 e XVIII, III, pág. 115 e do STJ de 07.03.91, BMJ nº 405, pág. 458.
[15] Calvão da Silva, A Declaração da Intenção de não Cumprir, Estudos de Direito Civil e Processo Civil (Pareceres), Coimbra, 1996, pág. 137.
[16] Acs. do STJ de 05.12.06 e 29.06.06 www.dgsi.pt.
[17] Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, Coimbra, 2003, pág. 25. À semelhança do que sucede com execução específica do contrato, através da emissão da sentença ex-830 do Código Civil, a validade do contrato é um pressuposto substancial implícito do direito à sua resolução: Fernando Gravato de Morais, Contrato-Promessa em Geral/Contratos-Promessa em Especial, Almedina, Coimbra, 2009, pág. 105, nota 166, e Acs. do STJ de 23.01.03 e de 26.01.98, www.dgsi.pt.
[18] Ac. da RL de 24.10.13, www.dgsi.pt.
[19] Neste sentido, António Menezes Cordeiro - Tratado de Direito Civil Português, cit., págs. 518 e 519 e Da Boa Fé no Direito Civil, vol. II, Almedina, Coimbra, 1984, págs.837 e 838 - para quem há aqui uma manifestação da regra mãe do tu quoque, baseada na própria boa fé. No sentido de que a boa fé tem aqui um alcance ético semelhante ao referido no artº 227 do Código Civil, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 4ª edição, vol. I, 1987, Coimbra, pág. 252.
[20] Cfr., por todos, António Pinto Monteiro, Erro e Vinculação Negocial, Almedina, Coimbra, 2002, págs. 18 a 20.
[21] V.g., Acs. do STJ de 10.12.74, BMJ nº 242, pág. 254, da RP de 09.02.93, CJ, XVIII, I, pág. 227, e da RC de 01.03.95, CJ, XX, II, pág. 5
[22] João de Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, Volume II, AAFDL, Lisboa, 1995, pág. 109, e António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, 2000, págs. 606 a 608.
[23] Note-se, porém, que deve entender-se que, no caso de erro culposo, os interesses da contraparte, não obstante a anulação do negócio, não ficam inteiramente desprotegidos, dado que o errante, admitido embora a invocar a anulabilidade, incorre em responsabilidade pré-negocial, ficando constituído num dever de indemnizar (artº 227 do Código Civil). Cfr. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, págs. 510 e 511.
[24] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume, I, 4ª edição, Coimbra, 1987, pág. 236, e Acs. do STJ de 12.06.84, BMJ nº 338, pág, 385, e da RL de 13.12.72, BMJ nº 222, pág. 463.
[25] João de Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, volume II, cita., pág. 147, e Inocêncio Galvão Telles, “Erro sobre a base do negócio jurídico”, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Raul Ventura, Volume II, FDUL, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, pág. 12.
[26] Acs. do STJ de 02.11.77, BMJ nº 271. Pág. 190, da RP de 07.05.94, CJ, XIX, II, pág. 187, e da RL de 18.01.96, CJ, XIX, III, pág. 81.
[27] Assim, por exemplo, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Português, I, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, cit., pág. 622, e Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 2008, 2ª edição, Almedina, Coimbra, págs. 662 e 663,
[28] Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, vol. II, pág. 148.
[29] Menezes Cordeiro, da Boa Fé no Direito Civil, Volume, II, Almedina, Coimbra, 1984, pág. 1092, e Da Alteração das Circunstâncias, Sep. dos Estudos em Memória do Prof. Dr. Paulo Cunha, pág. 44, Lobo Xavier e Mota Pinto, Alteração das Circunstâncias e Risco, CJ VIII, V, págs. 17 e 23, e Almeida e Costa, Direito das Obrigações, Almedina, Coimbra, 1988, pág. 232; Acs. do STJ 29.3.97, BMJ nº 285, pág. 262, e da RE 27.2.86, CJ, I, pág. 247.
[30] Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, cit., pág. 514, nota 703, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Português, I, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, cit., pág. 624, e Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 2008, 2ª edição, Almedina, Coimbra, pág. 666.