Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:48/20.9BEPDL
Secção:CA
Data do Acordão:11/26/2020
Relator:RICARDO LEITE
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR - REQUISITOS
EFEITO DO RECURSO JUDICIAL
PERÍODO EXPERIMENTAL
Sumário:I. O recurso da sentença proferida em processo cautelar tem efeito meramente devolutivo, pelo que não será para esses casos (mas sim para os casos em que esteja em causa o “efeito regra”, previsto no nº 1 do artº 143º do CPTA) que será possível aplicar o disposto nos nsº 4 e 5 do artº 143º do CPTA.
II. Constituirá uma indevida antecipação/preclusão da análise do mérito, a decisão que, em sede cautelar, apreciando o “fumus bonus iuris”, conclui unicamente pela preterição do dever de audiência prévia e, subsequentemente, condena o Ministério da Justiça a repetir a totalidade do período experimental.
III. Perante a antecipação valorativa empreendida pelo tribunal a quo, ter-se-ia justificado, porventura, o uso da faculdade prevista no artº 121º do CPTA, antecipando-se o juízo sobre a causa principal.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo – Sul:

I. Relatório
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, Recorrente/Requerido nos presentes autos, em que é Requerente/Recorrida S….., todos com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, datada de 07 de Agosto de 2020, que julgou precedente a providência cautelar interposta por esta e consequentemente, determinou:

a) A suspensão da eficácia do ato administrativo contido no despacho da Subdiretora-Geral dos Serviços Prisionais, de 23/04/2020, que homologou a deliberação do Júri de 04/03/2020, que considerou o período experimental da trabalhadora concluído sem sucesso e a consequente cessação do vínculo de emprego público por tempo indeterminado com a DGRSP, com efeitos a 01-06-2020 e regresso à situação jurídico-funcional de origem na Universidade do Porto;

b) A condenação da entidade requerida a proceder à repetição do período experimental da requerente, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação.

Para tanto, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
“1. O Tribunal a quo andou mal ao decidir pela verificação do fumus bonis iuris, porquanto, em sede de ação principal, não é correto concluir, pela existência de vício por falta de audiência prévia, e, portanto, não existirá fundamento, para a procedência da ação principal e a consequente anulação do ato aqui em crise ora e bem assim a condenação à repetição do período experimental.
2. E porque assim é, forçoso concluir que sentença de que ora se recorre incorre em erro que inquina a sua validade.
3. Porque os critérios constantes do artigo 120.º do CPTA são de verificação cumulativa, basta, pois, que não se verifique um dos pressupostos descritos para que a providência não possa ser decretada. Por isso, faltando um dos requisitos, não se mostram verificados todos os pressupostos para o decretamento da providência;
4. Não resultam dos autos elementos que permitam concluir pela sua procedência, em termos que pudessem invalidar a decisão em causa, considerando, sobretudo, que, no âmbito da avaliação do desempenho dos trabalhadores a Administração atua no âmbito de valorações próprias do exercício da função administrativa, podendo o Tribunal apenas sindicar aspetos vinculados do ato administrativo e erros manifestos ou ostensivamente inadmissível de admissão.
5. Falhou, igualmente, o Tribunal a quo não aplicação, no caso dos autos, do princípio do aproveitamento dos atos administrativos, nos termos do artigo 163º, nº5 do CPA, e consequente, anulação do ato por preterição da audiência prévia, pois é incompreensível, que a sentença recorrida, verifique a conformidade do procedimento e comportamento do júri neste procedimento e condene à repetição de todo o período experimental que decorreu em cumprimento do quadro legal em vigor, sem qualquer mácula que inquine a sua validade.
6. Nas circunstâncias do caso em discussão, a intervenção do interessado no procedimento, ou a verificação das ocorrências procedimentais em falha, eram insuspeitáveis de influir e alterar a decisão final, pelo que aplicabilidade do princípio do aproveitamento do ato administrativo parece resultar inequívoco.
7. Não pode o Recorrente concordar com a verificação do periculum in mora prejuízo que poderia advir pela improcedência da providência cautelar seria sempre possível reconstituir, através do recebimento dos vencimentos a que tinha direito como se estivesse em funções, sem qualquer hiato, e toda a carreira profissional seria possível de reconstituir, posição que é sufragada pela nossa jurisprudência.
8. Não existe, portanto, no caso concreto, o “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” e que venha a tornar inútil ou vã a eventual concessão, no âmbito da ação administrativa, da tutela judicial efetiva nessa sede requerida.
9. Também em momento algum, nos presentes autos, a Recorrida alegou ou demonstrou que não tinha outro meio de subsistência, para que, como fez o Tribunal a quo, se considerasse que a suspensão do ato em discussão acarreta sempre prejuízos de difícil reparação. Esse ónus impende sobre o Recorrido, não sobre o Tribunal.
10. A Administração observou todas as vinculações procedimentais a que estava obrigada a respeitar;
11. Impendia sobre a Requerente da providência, ora Recorrida, o ónus de especificar e concretizar o fundado receio, ou seja, evidenciar o preenchimento do requisito do “periculum in mora”, bem como os demais requisitos exigidos por lei, ou seja, o da constituição de uma situação de facto consumado e / ou a produção de prejuízos de difícil reparação. O que não aconteceu;
12. No que à ponderação de interesses concerne também a decisão do Tribunal a quo merece censura, ao olvidar-se de todo o alegado na Oposição e na Resolução Fundamentada.
13. Os factos apresentados na Oposição e na Resolução Fundamentada impunham a prevalência do interesse público, sendo patentes os danos para o interesse público, pelo que só um aparente desconhecimento do meio prisional, das suas complexidades e especificidades é que justifica uma decisão contrária.
14. A conduta da Recorrida demonstra que não é expetável que dele se espere um desempenho pautado pelo cumprimento das normas legais aplicáveis e orientado para a prossecução do interesse público, por não estar preenchido o requisito exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, ou seja, o “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção e prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” (o periculum in mora) e a probabilidade de que “a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” (o fumus boni iuris ou a aparência de bom direito), o alegado interesse da Recorrida não carece da tutela cautelar pretendida, logo não deve ser concedida a providência requerida nestes autos, como erroneamente decidiu o Tribunal a quo..
16. A sentença proferida pelo Tribunal a quo está ferida de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito.”

*

A recorrida, por sua vez, apresentou contra-alegações nos seguintes termos:

“a) O Tribunal a quo deve rejeitar o requerimento de atribuição de efeito suspensivo, na medida em que, não há lugar, no âmbito dos recursos interpostos de decisões respeitantes a processos cautelares a alteração do efeito do recurso.
b) As possibilidades de alteração ao efeito do recurso determinado pela lei encontram-se apenas previstas para o caso dos recursos ordinários do contencioso administrativo submetidos ao efeito-regra do recurso, ou seja, sujeitos a efeito suspensivo.
c) Quanto aos demais, previstos no n.º 2 do CPTA, o legislador não consagra qualquer possibilidade de alteração do efeito do recurso legalmente tipificado. E tal é assim porque se trata de um regime maduramente pensado e ponderado pelo legislador, que não pode ser desaplicado.
d) E como, de forma lapidar, já considerou o Tribunal Central Administrativo Norte, no seu Acórdão de 18.06.2009 (proc. n.º 01411/08.9BEBRG-A): “Há que ter em consideração, desde logo, que o nº3 [do artigo 143º] não se aplica, pura e simplesmente, às decisões respeitantes à adopção de providências cautelares, já que tem como seu pressuposto apenas a regra do efeito suspensivo consagrada no nº1.
A letra da lei, aqui, não permite qualquer outra leitura [artigo 9º nº2 do CC]. Relativamente aos números 4 e 5 do artigo 143º do CPTA, importa ter presente, primo, que o julgador cautelar, para deferir ou indeferir a providência, já terá procedido à ponderação de interesses e danos que subjaz à adopção quer das medidas lenitivas [nº4] quer da recusa do efeito meramente devolutivo [nº5], e nada justifica a sua repetição.
E no caso de o julgador cautelar não ter chegado a equacionar essa ponderação de interesses e danos, isso apenas significará que foi a própria lógica jurídica cautelar, consagrada pelo legislador, a arredar, naquele caso concreto, quer por inexistência do indispensável fumus bonus, quer por inverificação de periculum in mora, a necessidade de a ela proceder.
Se o julgador cautelar considerou ser de proteger a posição do requerente contra a morosidadedo processo principal, concedendo a providência pretendida, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso jurisdicional dessa decisão judicial acabaria por inutilizar o objectivo da tutela cautelar, prolongando no tempo uma situação desvantajosa para o requerente.”
e) Andou bem o Tribunal a quo ao ter dado como verificado o periculum in mora, porquanto se torna evidente que com a execução do referido Despacho da Senhora Subdiretor-Geral, encontra-se verificado o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, irreversível, em tempo útil, com a produção de prejuízos de difícil reparação para a Requerente e todo o seu agregado familiar.
f) Desde logo, pelo abaixamento significativo do rendimento disponível do agregado familiar, o que conduzirá a uma redução abrupta e drástica do seu padrão normal de vida.
g) Não sendo possível operar a mudança de todos os elementos do agregado familiar, em última instância, teria que a Requerente abandonar a ilha e regressar ao Porto, traduzindo-se tal facto num aumento substancial de despesas, pois teria que arrendar casa no Porto, mantendo-se as despesas atuais em Ponta Delgada, com a permanência cá de seu marido e filho, por forma a não causar danos ainda mais gravosos.
h) Tal facto consubstanciaria em última análise, uma desagregação familiar com todas as consequências que daí advêm, e danos causados pelo afastamento dos entes queridos mais próximos.
i) Andou bem o Tribunal a quo ao ter dado como verificado Fumus boni iuris decorrente do vício de violação do direito de audiência prévia, conducente à provável procedência da ação de anulação de ato administrativo entretanto intentada.
j) Foi requerida pela trabalhadora a audição do atual Diretor do Estabelecimento Prisional, (a quem reportava e reporta diretamente) bem como do Chefe Principal E….., com quem trabalhava em estreita colaboração, aquando da pronúncia em sede de audiência prévia, e tal não só não foi feito, como inexiste na resposta qualquer referência a esse facto!
k) No caso em apreço, a Administração fez tábua rasa quanto aos elementos factuais novos aduzidos pela requerente, não realizando quaisquer diligências, bem como omitindo qualquer valoração e apreciação dos mesmos na fundamentação da decisão final
l) O depoimento de testemunhas seria fundamental para a trabalhadora demonstrar a veracidade do alegado. Portanto, é impossível determinar com rigor qual seria o conteúdo do ato praticado caso as testemunhas arroladas tivessem sido inquiridas.
m) Do exposto decorre que, embora se possa defender, em abstrato, a possibilidade de também aqui ser possível ocorrer a sua degradação em formalidade não essencial, ter-se-á, porém, de ter particular cuidado ao proceder a tal juízo. De qualquer maneira, temos para nós que a questão dos efeitos não invalidantes da preterição do princípio da audiência, designadamente, por apelo ao princípio do aproveitamento dos atos administrativos só é invocável quando seja possível afirmar que a decisão tomada é a única concretamente possível, o que passa, desde logo, pela possibilidade de se poder apreciar a legalidade do ato, não bastando que se trate de ato vinculado. Cf. o Ac. do STA n.º 0123 de 19-02-2003 in www.dgsi.pt
n) Só será invocável o princípio do aproveitamento dos atos administrativos naqueles casos em que estando em causa uma atividade vinculada da administração, se conclui que a decisão administrativa não poderá ser outra que não a decisão efetivamente tomada.
o) Andou bem o Tribunal a quo ao ter dado como verificado o vício de violação do direito de audiência prévia, conducente à provável procedência da ação de anulação de ato administrativo entretanto intentada.
p) Consideramos ainda que se afigura perfeitamente legítimo que o legislador, no exercício da sua margem de conformação do direito à tutela cautelar, consagre o critério da ponderação de interesses desde que não o configure em termos de fazer prevalecer sistematicamente o interesse público no não decretamento da providência.
q) Tal como é sustentado pelo Prof. M. Aroso de Almeida o “(...) artigo 120.º, n.º 2, introduz um inovador critério de ponderação, num mesmo patamar, dos diversos interesses, públicos dos diversos interesses, públicos e privados, que, no caso concreto, se perfilem, sejam eles do Requerente, da entidade demandada ou de eventuais contra-interessados, determinando que a providência ou providências sejam recusadas quando essa ponderação permita concluir que «os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências».
r) O que está aqui em conflito são os resultados ou os prejuízos que podem resultar para os interesses, da concessão ou a recusa da concessão, para todos os interesses envolvidos, sejam públicos, sejam privados.
s) (…)E, mesmo que houvesse dúvidas sobre a existência de hipotéticos danos, elas teriam de ser valoradas a favor do Requerente e não contra ele, por força da referida regra do ónus da prova.
t) Isto é, tem de se ter como assente, que a adoção da providência de suspensão de eficácia, assegurando a manutenção do posto de trabalho, não acarretará quaisquer danos para o interesse público.
u) E sendo certo que, nem sequer na Resolução Fundamentada apresentada pela Requerida, logrou demonstrar o prejuízo para o interesse público, apresentando apenas generalidades e conclusões não suportadas por factos claros e congruentes que permitissem aferir dessa lesão.
v) Constata a requerente que a resolução fundamentada apresentada não tem qualquer adesão à realidade, contém factos inverídicos, constituindo tentativa desesperada de justificar o injustificável, não servindo para acautelar o interesse público, mas sim para impedir, a todo o custo, o pedido de suspensão da eficácia do ato suspendendo feito no requerimento cautelar.
x) Facto que veio a ser confirmado em sede de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, que o Tribunal a quo e bem julgou procedente, precisamente por que “apenas foram invocadas generalidades e conclusões, não suportadas em quaisquer factos, claros e congruentes, suficientes para que o Tribunal possa concluir pela verificação de uma grave lesão do interesse público”.

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Notificado nos termos e para efeitos do disposto no art.º 146.º do CPTA, o D.º Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, não emitiu parecer.

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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.

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II. Delimitação do objeto do recurso (artigos 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 1, do CPTA, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1, 2 e 3, do CPC, aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA):
A questão suscitada pelo Recorrente prende-se com saber (1) se ao recurso pode ser atribuído efeito suspensivo e (2) se o Juiz a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar estarem verificados os pressupostos para o decretamento de providências cautelares por, indevidamente:
- Ter desconsiderado a possibilidade de aproveitamento do ato, julgando inconsequente a alegada falta de audiência prévia;
- Ter julgado verificado o periculum in mora, uma vez que, ao contrário do decidido, a situação profissional e a diferença retributiva sempre seriam suscetíveis de ser reconstituídas ulteriormente;
- Ter concluído que os interesses da Recorrida seriam preponderantes sobre o interesse público (aliás, corporizado na forma de resolução fundamentada, desconsiderada pelo tribunal a quo).
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III. Factos (dados como provados na sentença recorrida):

A- Em 12/07/2019 foi elaborado despacho pela Subdiretora Geral da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, que se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
Assunto: Repetição do período experimental da técnica superior S….., e designação do Júri para o acompanhamento do período experimental, parâmetros de avaliação das competências e orientações para a elaboração, apresentação e valoração do relatório.

1. Em cumprimento do despacho proferido no âmbito do Processo n.tt 65/19.1BEPDL do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, que determinou:
a) “A suspensão da eficácia do ato administrativo contido no despacho do Subdiretor-Geral de Reinserção de Serviços Prisionais, datado de 12/12/2018, que homologou a deliberação do júri sobre a conclusão do período experimental da requerente, sem sucesso e determinou a cessação do vinculo de emprego público por tempo indeterminado com a DGRSP, com efeitos a 01-04-2019 e regresso à situação jurídico- funcional de origem na Universidade do Porto;
b) A condenação da entidade requerida a proceder à repetição do período experimental da requerente, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação "

2. Vai a técnica superior, S….., iniciar novo período experimental, com data de produção de efeitos à data da notificação do presente despacho, por forma a comprovar se a mesma possuí as competências exigidas pelo posto de trabalho que ocupa.
3. Considerando que são aplicáveis ao período experimental as regras previstas nos artigos 45. ° a 51.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho.
Sobre a matéria, dispõe o artigo 46. ° da LTFP:
1 — Durante o período experimental, o trabalhador é acompanhado por um júri, especialmente constituído para o efeito, que procede, no final, à avaliação do trabalhador.
3— A avaliação final toma cm consideração os elementos que o júri tenha recolhido, o relatório que o trabalhador deve apresentar e os resultados das ações de formação frequentadas
4— A avaliação final traduz-se numa escala de 0 a 20 valores, considerando-se concluído com sucesso o período experimental quando o trabalhador tenha obtido uma avaliação não inferior a 14 ou a 12 valores, consoante se trate ou não, respetivamente, de carreira ou categoria de grau 3 de complexidade funcional.
5— O termo do período experimental é assinalado por ato escrito, que deve indicar o resultado da avaliação final.
6— As regras previstas na lei geral sobre procedimento concursal para efeitos de recrutamento de trabalhadores são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à constituição, composição, funcionamento e competência do júri, bem como à homologação e impugnação administrativa dos resultados da avaliação final.
4. Impõe-se então, desde já, designar o júri para acompanhar o período experimental da trabalhadora.
5.Assim, tendo em consideração a unidade orgânica de afetação e que, nos termos do artigo 21. ° da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 de abril, que regulamenta a tramitação do procedimento concursal,
- O júri é composto por um presidente, dois vogais efetivos e dois vogais suplentes;
- O presidente e, pelo menos, um dos outros membros do júri devem possuir formação ou experiência na atividade inerente ao posto de trabalho a ocupar;
- Os membros do júri não podem estar integrados em carreira ou categoria com grau de complexidade funcional inferior ao correspondente ao posto de trabalho;
- A composição do júri deve, sempre que possível, garantir que um dos seus membros exerça funções ou possua experiência na área de gestão de recursos humanos.

Para o efeito, designo como elementos do júri os dirigentes/trabalhadores constantes no seguinte Anexo.

6. Na avaliação final o júri deve tomar em consideração os elementos que tenha recolhido consubstanciados na avaliação das competências, os relatórios que a trabalhadora apresente e os resultados das ações de formação frequentadas.

7. O Júri deve tomar em consideração a demonstração das competências abaixo indicadas que devem ser avaliadas de acordo com o padrão definido para a carreira/categoria de técnico superior no âmbito da avaliação de competências do sistema de avaliação do desempenho, constantes do anexo VI da Portaria n.º 359/2013, de 13 de dezembro:
RESPONSABILIDADE E COMPROMISSO COM O SERVIÇO
RELACIONAMENTO INTERPESSOAL
ADAPTAÇÃO E MELHORIA CONTÍNUA
TRABALHO DE EQUIPA E COOPERAÇÃO

8. A trabalhadora deve apresentar ao respetivo Júri, no prazo de uma semana após o término do período experimental, um relatório de estágio que deverá versar sobre as atividades desenvolvidas durante o período experimental, um tema ou competência da unidade orgânica respetiva, apresentando, pelo menos relativamente a uma destas atividades, uma proposta de melhoria de procedimentos.

9. O relatório do período experimental, doravante designado por Relatório, deve seguir as seguintes determinações:
a) Número de exemplares do Relatório
Devem ser entregues ao presidente do Júri três exemplares do relatório.
b) Formatação do Relatório
O relatório deve ser redigido de forma clara, concisa e coerente. Deverá ter entre 20 a 25 páginas, elaborado em papel de tamanho A4, branco, com letra tipo Arial, tamanho 12, alinhamento justificado com espaço 1,5 entre linhas, margens de 3cm/2cm, os títulos dos parágrafos tamanho 12 e as páginas numeradas no canto inferior direito.
c) Estrutura formal do Relatório
O relatório deve apresentar a seguinte estrutura formal:
i. Capa e folha de rosto
A capa deve incluir a seguinte informação: (nome da instituição), (relatório do período experimental), (nome do trabalhador).
A folha de rosto localiza-se imediatamente a seguir à capa e, além dos elementos da capa, deve ainda conter a indicação dos elementos do júri de acompanhamento do período experimental, a unidade orgânica de estágio, a data de início e de fim do período probatório.
II. Índice
Deve incluir todas as partes principais (normalmente capítulos, sub-capitulos e secções) do relatório. Devem ser numerados e referir-se às páginas respetivas, podendo incluir (em separado) também o índice de figuras, tabelas ou quadros e abreviaturas.
III. Apresentação / Resumo;
É o local onde são feitas as observações gerais quanto ao enquadramento legal do relatório, o seu âmbito, o trabalho realizado durante o período experimental, a descrição geral e sucinta da unidade orgânica, bem como da formação recebida
IV. O corpo do Relatório pode ser dividido nas seguintes partes:
Introdução
Deve conter a descrição das funções e tarefas desenvolvidas, das atividades em que participou, as razões de escolha da atividade a abordar e da sua importância para a instituição ou unidade orgânica.
Tema
Enquadramento e desenvolvimento da atividade escolhida.
Conclusões e sugestões
Deve propor sugestões/soluções, dar alternativas, mostrar vantagens, fazer conclusões, etc., podendo igualmente fazer uma análise critica.
Bibliografia
O material bibliográfico utilizado para o desenvolvimento do trabalho, deverá constar de referência numerada, em ordem alfabética, dos sobrenomes dos autores.

10.O júri elabora um Relatório de Avaliação do Período Experimental, contendo a apreciação do período experimental da trabalhadora, com a respetiva classificação e proposta de conclusão do período experimental com/sem sucesso.

11. Para determinar a classificação final, o júri deve usar a seguinte ponderação:
Elementos que tenha recolhido, incluindo a demonstração das competências -40%
Relatório do trabalhador - 40%
Formação - 20%
Em caso de ausência de formação avaliada, cada um dos fatores terá a ponderação de 50%.

12. Em anexo ao Relatório de Avaliação, o júri deverá apresentar os registos de assiduidade da trabalhadora, com indicação expressa da data de início e término do período experimental.

13. Após o cumprimento dos artigos 121. ° e 122. ° do CPA, o Relatório de Avaliação deverá ser-me presente no prazo máximo de cinco semanas após a conclusão do período experimental.

15. (…).”
(Conforme fls. 38 a 42 do PA)

B- Do anexo I ao despacho referido no ponto anterior consta a nomeação dos seguintes membros do júri:
Presidente: Luís Miguel Monteiro Rego de Sousa, Diretor do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada;
Vogal: Helena Isabel Ferreira Martins, Adjunta do Diretor do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada;
Vogal: S….., Técnica Superior da DSRH/DGRH
Vogal suplente: P….., Técnico Superior de Reeducação no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada
Vogal suplente: M….., Técnico Superior de Reeducação no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada
(Conforme fls. 43 do PA)

C- Em 15/07/2019 foi dado conhecimento à requerente do despacho e anexo referidos nos pontos anteriores.
(Conforme fls. 44 do PA)

D- Em 27/08/2019 foi emitida pelo diretor do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada a ordem de serviço n.º ….., titulada “Serviços Jurídicos”, que se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
“(…)
A Senhora Dra. S….., a desempenhar funções neste EP de Ponta Delgada, em contexto de estágio, assegurará a sua orientação de acordo com procedimentos que passamos a descrever:
Colaboradores / Intervenientes: Todos os Senhores Instrutores e Instrutoras, estão devidamente identificados junto dos Serviços Centrais.
A Senhora Dra. S….. realizará, a muito curto prazo, encontros de trabalho com cada instrutor(a) com a finalidade de identificação de ponto de situação da respectiva intervenção. Esta avaliação individual será formalizada em relatório sintético após os encontros a agendar. Elaborará igualmente relatório sintético sobre a sua actividade, designadamente sobre processos distribuídos, na qualidade de instrutora.
A intervenção de todos estes elementos entende-se relevante e determinante para a concretização de processos em curso no presente e no futuro. No actual contexto, contam, para eficaz execução, com habilitado apoio técnico, através da Senhora Dra. S…...
Apoio Administrativo: Em função do enquadramento dos Serviços jurídicos no quadro da acção da Área de Execução das Penas e Jurídica, este apoio será facultado pela funcionária que tem assegurado esta intervenção.
Assim, a Senhora Guarda Principal, Natália Carreira, salvaguarda este apoio.
Áreas de Intervenção dos Serviços Jurídicos:
- Organização de processos em que são intervenientes funcionários.
- Organização de processos de maior complexidade em que são intervenientes cidadãos e cidadãs reclusas.
- Assessoria a Senhores Instrutores e ás Senhoras Instrutoras na qualidade de responsáveis pela instrução no que respeita a processos em curso e a distribuir no futuro.
- Colaboração técnica na organização de actividades formativas, apresentando propostas com esta finalidade e organizando folhetos facilitadores de adequação de melhores procedimentos.
- Sistematização de informação estatística com periodicidade mensal, tendo como referência a data de início do estágio. Este contributo, tal como o contributo dos demais Serviços, será valorizado em reunião de Conselho Técnico que contemple na agenda esta temática.
*
Solicito, também, urgente relatório sintético a apresentar por Serviços jurídicos sobre processos pendentes respeitantes a utilização de meios coercivos, tendo em consideração os prazos e os procedimentos determinados pelos competentes Serviços Centrais.
A Direcção entende como justificada a intervenção em termos de assessoria, no que respeita a apoio técnico no quadro da intervenção das demais áreas, designadamente da área de Administração e Apoio Geral (procedimentos aquisitivos, gestão de assuntos de pessoal, etc.).
Será facultada por Serviços de Execução das Penas cópia desta Ordem de Serviço a cada Senhor Instrutor e a cada Senhora Instrutora, solicitando, desde já, que colaborem na elaboração de ponto-de-situação sobre a actividade em curso, a orientar para Serviço Jurídico.”
(Conforme fls. não numeradas do PA)

E- Entre 15/07/2019 e 10/01/2020 decorreu o período experimental da requerente.
(Conforme Relatório de Avaliação Final da Repetição do Período Experimental a fls. 136 e ss. do PA)

F- Em 16/01/2020 a requerente apresentou Relatório de avaliação final do período experimental, que se dá por integralmente reproduzido.
(Conforme fls. 45 a 75 do PA)

G- Em 03/02/2020 reuniu o júri designado para avaliar o período experimental da requerente, tendo elaborada ata que se transcreve:
No âmbito da avaliação do período experimental da trabalhadora S….., no dia 3 de fevereiro de 2020, às 16h30m, reuniu no gabinete de atendimento do STP do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, Helena Isabel Ferreira Martins, em substituição do presidente do júri, bem como M….., na qualidade de vogal suplente do mesmo júri, com a trabalhadora supramencionada, com o objetivo de alertar a mesma de que o júri constatou a existência de alguns plágios no seu relatório final do período experimental, superiormente entregue em 17-01-2019.
Posto isto, a trabalhadora foi questionada se pretendia proceder às devidas alterações e entregar o relatório retificado uma semana depois, ou seja, a 10-02-2020, ao que a mesma anuiu e se comprometeu.
Será de salvaguardar que, apesar de estarem presentes apenas dois elementos do júri de acompanhamento, todos estão a par desta situação.
Vai a presente ata ser assinada pelos elementos do júri presentes.
(Conforme fls. 76 do PA)

H- Em 05/02/2020 a requerente apresentou novo Relatório de avaliação final do período experimental, que se dá por integralmente reproduzido
(Conforme fls. 77 a 108 do PA)

I- Em 04/03/2019 foi elaborado, pelo júri de acompanhamento, Relatório de Avaliação Final do Período Experimental da requerente, que se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
“(…)
Avaliação Final: De acordo com o "Relatório de Apreciação das Competências" da trabalhadora, bem como da apreciação do "Relatório do Período Experimental" apresentado pela mesma, que constam em anexo e fazem parte integrante do presente Relatório, o Júri de acompanhamento do período experimental considera que a trabalhadora concluiu SEM sucesso o período experimental e com a pontuação de 11,5 (onze virgula cinco) valores, pelo que propõe o regresso da trabalhadora à situação jurídico-funcional que detinha anteriormente.

(Competências (50%) + Relatório (50%) / 2 = Pontuação do período experimental

Na classificação final não foi considerada a formação profissional, uma vez que o trabalhador não frequentou qualquer ação sujeita a avaliação
12 + 11 / 2 = 11,5 (onze vírgula cinco) valores
COMPETÊNCIAS
Competência demonstrada a um nível elevado (Pontuação5)
Competência
Demonstrada

(Pontuação 3)
Competência não demonstrada ou inexistente
(Pontuação 1)
RESPONSABILIDADE E COMPROMISSO COM O SERVIÇO: Capacidade para compreender e integrar o contributo da sua atividade para o funcionamento do serviço, exercendo-a de forma disponível e diligente.
Traduz-se, nomeadamente, nos seguintes comportamentos:
• Reconhece o seu papel na prossecução da missão e concretização dos objetivos do serviço e responde às solicitações que, no âmbito do seu posto de trabalho, lhe são colocadas.
• Em regra responde com prontidão e disponibilidade às exigências profissionais.
• É cumpridor das regras regulamentares relativas ao funcionamento do serviço, nomeadamente horários de trabalho e reuniões.
• Trata a informação confidencial a que tem acesso, de acordo com as regras jurídicas, éticas e deontológicas do serviço.
X
RELACIONAMENTO INTERPESSOAL: Capacidade para interagir adequadamente com pessoas com diferentes características e em contextos sociais e profissionais distintos, tendo uma atitude facilitadora do relacionamento e gerindo as dificuldades e eventuais conflitos de forma ajustada.
Traduz-se, nomeadamente, nos seguintes comportamentos:
• Tem um trato cordial e afável com colegas, superiores e os diversos utentes do serviço
• Trabalha com pessoas com diferentes características.
• Resolve com correção os potenciais conflitos, utilizando estratégias que revelam bom senso e respeito pelos outros.
• Denota autoconfiança nos relacionamentos e integra-se adequadamente em vários contextos sócio - profissionais.
X
TRABALHO DE EQUIPA E COOPERAÇÃO: Capacidade para se integrar em equipas de trabalho de constituição variada e gerar sinergias através de participação activa.

Traduz-se, nomeadamente, nos seguintes comportamentos:
X
• Integra-se bem em equipas de constituição variada, dentro e fora do seu contexto habitual de trabalho.
• Tem habitualmente um papel ativo e cooperante nas equipas e grupos de trabalho em que participa.
• Partilha informações e conhecimentos com os colegas e disponibiliza-se para os apoiar quando solicitado.
• Contribui para o desenvolvimento ou manutenção de um bom ambiente de trabalho e fortalecimento do espírito de grupo.
ADAPTAÇÃO E Melhoria CONTÍNUA: Capacidade de se ajustar à mudança e a novos desafios profissionais e de se empenhar no desenvolvimento e atualização técnica.
Traduz-se, nomeadamente, nos seguintes comportamentos:
Reage de forma positiva às mudanças, adaptando-se a novos contextos profissionais e mantendo um desempenho eficiente.
Encara a diversidade de tarefas como uma oportunidade de evolução e desenvolvimento profissional.
Reconhece habitualmente os seus pontos fracos e as suas necessidades de desenvolvimento e age no sentido da sua melhoria.
Mantém-se atualizado através da pesquisa de informação e de ações de formação de reconhecido interesse para o serviço.
X
Fundamentação:
Reconhece-se na trabalhadora avaliada alguma capacidade para compreender e integrar o contributo da sua atividade para o funcionamento do serviço, pese embora responda, genericamente, de forma pouco célere às exigências profissionais. Quanto ao relacionamento interpessoal mantido na instituição, revela um trato apropriado, não se evidenciando contributos que mereçam pontuação superior. Em contexto de trabalho de equipa, demonstra um papel pouco proactivo, apesar de cooperante, nos grupos de trabalho em que participa. A trabalhadora avaliada demonstra a um nível adequado capacidade de se ajustar à mudança e aos desafios profissionais.
Pontuação do parâmetro das Competências: 12 (doze valores)
(…)

(Conforme fls. 136 a 140 do PA)

J- Em 20/03/2020 a requerente apresentou a sua pronúncia em sede de audiência prévia, a qual se dá por integralmente reproduzida, na qual conclui e requereu a realização das diligencias instrutórias, como se transcreve:
Termos em que, deverá, pois, salvo o devido respeito, ser reponderada toda a avaliação da demonstração de competências, atentos os fundamentos supra invocados, e ser decidido no sentido da conclusão por parte da requerente do período experimental, não obstante a ilegal designação do júri Para o efeito, solicita a realização das seguintes diligencias:
- Ouvir o atual Diretor do Estabelecimento Prisional, única pessoa habilitada a prestar informações sobre o trabalho desenvolvido, o modo de execução, o cumprimento ou não dos prazos legais ou regulamentares.
- Ouvir o sr. Chefe Principal E….., com quem trabalha em estreita colaboração na instrução de processos e na execução de decisões disciplinares aplicadas no estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
(Conforme fls. 145 a 155 do PA)

K- Em 31/03/2020 reuniu o júri, designado para o acompanhamento do período experimental da requerente com objetivo apreciar a argumentação por esta aduzida em sede de audiência prévia, sobre a decisão do júri, de 4 de março de 2020, que considerou o seu período experimental concluído sem sucesso, tendo elaborado ata da reunião, a qual se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
“(…)
Aos 31 dias do mês de março de 2020, por videochamada realizada através da aplicação WhatsApp, dada a situação atual da pandemia Covid 19, reuniu o júri, designado por despacho de 12 de julho de 2019, da Subdiretora-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, para o acompanhamento da repetição do período experimental da técnica superior, S….. (…).
(…)
Por requerimento de 20.03.2020, por não concordar com a pontuação final obtida no relatório de período experimental, e em sede de audiência prévia, veio a trabalhadora apresentar contestação referente aos parâmetros de avaliação do relatório do período experimental, o que faz nos seguintes termos:
Competências
Parâmetro «Responsabilidade e compromisso com o serviço»:
A trabalhadora alega que "tentou sempre realizar o trabalho com a maior dedicação e empenho...” p. 6

A manifestação de disponibilidade permanente nem sempre correspondeu a um desempenho efetivo, diligente e responsável.
De acordo com o registado no SIP (Anexo II), pode-se apurar que a trabalhadora foi nomeada instrutora de 80 processos entre 15 de julho e 31 de dezembro de 2019. Destes, 34 foram processos de inquérito, tendo a mesma concluído apenas 3, ficando assim 31 processos por concluir. Neste mesmo período, foram também distribuídos à trabalhadora 43 processos disciplinares, tendo a mesma concluído 17, ficando 26 por concluir. Os 3 processos abreviados foram concluídos.
Também de acordo com o registado no SIP, pode-se apurar que a trabalhadora foi nomeada instrutora de 17 processos entre 1 e 16 janeiro de 2020. Destes, 7 foram processos de inquérito, não tendo a mesma concluído nenhum. Neste mesmo período, foram também distribuídos à trabalhadora 10 processos disciplinares, tendo a mesma concluído apenas 1.
Salienta que, este apuramento da conclusão dos processos teve por base a monitorização dos mesmos junto da Direção do EP, uma vez que, no universo dos 97 processos em que a trabalhadora foi nomeada instrutora, o Júri estranhou, estar apenas 1 processo concluído no SIP. Importa salientar que o registo disciplinar no SIP estava incumbido à trabalhadora.
Assim, tendo a trabalhadora concluído 21 processos, podemos considerar um nível de execução nesta área de insuficiente, ou seja, de 26%.
O júri reconheceu que a trabalhadora cumpriu as regras ao nível do “padrão do homem médio” (bónus pater familliae).

Pelo exposto, o júri deliberou manter a pontuação atribuída neste parâmetro.

Parâmetro «Relacionamento interpessoal»:
A trabalhadora alega que "conviveu com os demais funcionários civis a prestar serviço no Estabelecimento, e com o pessoal do Corpo da Guarda Prisional, com quem mantém um excelente relacionamento interpessoal, boa comunicação, sendo por todos estimada, considerada e respeitada... Conviveu também com reclusos, por vezes em contextos bastante complicados, sendo igualmente considerada e respeitada, no exercício das suas funções..." p. 8

Pelo exposto, entende o júri que a pontuação atribuída (3 valores) é merecida e adequada em face às competências demonstradas, mantendo assim esta nota.

Parâmetro «Trabalho em equipa e cooperação»:
A trabalhadora alega que "Foi ainda determinado que a trabalhadora asseguraria a coordenação da Equipa de Instrutores, através de apoio técnico, na execução dos mesmos, fornecendo minutas, elaborando manual de procedimentos, bem como eventuais ações formativas na área disciplinar “ p. 7

Entende o Júri que o apoio técnico aos instrutores foi individualizado. Apenas existiu uma reunião com os instrutores do Corpo da Guarda Prisional. A elaboração de um manual de procedimentos mostra-se básica versus pertinente, bem como o fornecimento de minutas, algo que nunca se presenciou ao longo de todo o período experimental.

Pelo exposto, o júri deliberou manter a pontuação atribuída neste parâmetro.

Parâmetro «Adaptação e melhoria contínua»:
A trabalhadora alega que "A primeira e principal preocupação foi o estudo, investigação, pesquisa no sentido de alcançar maior familiarização nas áreas do Direito Penal, Processual Penal e Execução de penas e medidas privativas da liberdade.'' P. 6

O júri reconhece que a trabalhadora revelou capacidade de adaptação a novos desafios profissionais e que encarou as tarefas como uma oportunidade de evolução e desenvolvimento profissional.
O júri reconhece, ainda, que a trabalhadora sempre manifestou gostos polarizados pelo trabalho na área prisional.
Pelo exposto, entende o júri que a pontuação atribuída (3 valores) é merecida e adequada, face às competências demonstradas, mantendo assim esta nota.

Relatório
Entende o Júri considerar válida a pontuação atribuída, designadamente no que respeita ao relatório de período experimental e renovar o entendimento que a mesma se encontra em conformidade e corresponde ao desempenho dado a conhecer no mesmo relatório.
No que concerne à bibliografia, convém salvaguardar que o despacho da Subdiretora-Geral refere que o material bibliográfico utilizado para o desenvolvimento do trabalho, deverá constar de referência numerada, em ordem alfabética, dos sobrenomes dos autores. Ora tal não se verificou, em que alguns autores foram plagiados, como se pode verificar nos anexos da avaliação final da repetição do período experimental. Mais, a trabalhadora, após entrega do primeiro relatório, em 17de janeiro de 2020, foi alertada em 4 de fevereiro de 2020, num ato de boa fé, que o júri constatou alguns plágios no seu relatório final. Posto isto, foi dada uma nova oportunidade à trabalhadora para proceder às devidas alterações, agendando-se a entrega da segunda versão do relatório para 10 de fevereiro de 2020. Este último procedimento encontra-se registado em ata, também em anexo.

Não menos importante, o despacho proferido, no âmbito do Processo n.° 65/19.1BEPDL do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada em nada determina a alteração da constituição do júri, relativamente ao primeiro período experimental. Neste contexto, o despacho de 12 de julho de 2019, da Subdiretora-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Dra. Ana Horta, evoca o seguinte:
"O júri é composto por um presidente, dois vogais efetivos e dois vogais suplentes:
- O presidente e, pelo menos, um dos outros membros do júri devem possuir formação ou experiência na atividade inerente ao posto de trabalho a ocupar:
- Os membros do júri não podem estar integrados em carreira ou categoria com grau de complexidade funcional Inferior ao correspondente ao posto de trabalho:
- A composição do júri deve, sempre que possível, garantir que um dos seus membros exerça funções ou possua experiência na área de gestão de recursos humanos.”

Tenha-se em consideração que em Ordem de Serviço n° ….., datada de 27 de agosto (Anexo III), foi dado a conhecer aos diferentes serviços do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada as linhas genéricas de atuação da trabalhadora, no contexto dos serviços jurídicos.
Nestes termos, o júri entende que a fundamentação apresentada, aquando da pontuação dos vários parâmetros, se revela suficientemente esclarecedora da motivação do ato, não assistindo razão à trabalhadora de alteração da pontuação final do período experimental.

Face ao exposto, delibera o júri propor a manutenção da pontuação de 11,5 valores na avaliação global final do período experimental da trabalhadora S….., considerando o mesmo concluído sem sucesso, e propor regresso da trabalhadora à situação jurídico-funcional que detinha anteriormente, nos termos dos n.°s 3 e 4 do artigo 45.° da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.° 35/2014, de 20 de junho.
(Conforme fls. 141 a 144 do PA)

L- Em 23/04/2020, por despacho da Subdiretora-geral da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais foi aprovado o Relatório de Avaliação Final do Período Experimental e determinada a conclusão sem sucesso do período experimental da requerente e o seu regresso à situação jurídico-funcional que detinha anteriormente, com efeitos a 01/06/2020.
(Conforme fls. 162 do PA)

M- Em 24/04/2020 o despacho referido no ponto anterior foi notificado à requerente conforme certidão de notificação, que se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
Certifico e dou fé que, nesta data, em cumprimento de determinação superior, dei conhecimento integral à trabalhadora S….. - SRH ….., do conteúdo integral do despacho datado de 23 de abril de 2020, da Senhora Subdiretora-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Dra. Ana Horta, exarado no relatório de avaliação final do período experimental, em que é declarado que o mesmo foi concluído sem sucesso e determina o regresso da trabalhadora à sua situação jurídico-funcional que detinha anteriormente, com efeitos a 1 de junho de 2020.
Nestes termos, de tudo ficou ciente, tendo sido entregue ao trabalhador 1 (uma) cópia integral do documento.
(Conforme fls. 188 do PA)

N- Em 16/06/2020 foi elaborada a Informação n.º ….., que se dá por integralmente reproduzida e de que se extrai o seguinte:
“Assunto: PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA TEMPORÁRIA -
GUARDA - M….. - SRH: …..
a) O Guarda M….. pertence ao efetivo do Estabelecimento Prisional do Porto.
b) O trabalhador encontra-se desde 28 de maio de 2018 colocado temporariamente no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
c) Por requerimento datado de 11 de maio solícita a prorrogação da transferência temporária no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
d) A transferência originária do trabalhador teve como fundamento a colocação da sua esposa ao abrigo do procedimento concursal 152/TS/2018 como técnica superior no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
e) À data o trabalhador tem todo o seu agregado familiar a residir em Ponta Delgada.
f) Tem um filho de 14 anos a frequentar o 3- ciclo do ensino básico.
g) A prorrogação da transferência requerida pelo trabalhador encontra-se regulada no n.º 1 do art.º 11° do RTPCGP.
h) No entendimento desta DGRSP estas razões ponderosas e de caráter excecional consubstanciam-se em eventos ou acontecimentos imprevisíveis, inopinados e com efeitos temporários delimitados, independentemente da sua natureza, em que a resolução seja expectável em tempo não superior a 1 ano, o que manifestamente não se verifica, senão vejamos:
O trabalhador tem desde maio de 2018 o agregado familiar em Ponta Delgada.
• Não tem registado na matriz de transferências qualquer registo de transferência.
• Desde 2018 o trabalhador não definiu, o local de fixação definitiva da residência, o que poderia já ter efetuado, pois a pretender permanecer em Ponta Delgada, já deveria ter efetuado registo de transferência para essa Unidade Orgânica.
• A ser assim, a frequência escolar e estabilidade emocional do filho e agregado familiar estaria acautelada.
i) Mais, o motivo subjacente ao pedido originário foi a colocação da esposa no EP Ponta Delgada.
j) Ora, desde 2018, o trabalhador limitando-se a utilizar o expediente da prorrogação da transferência temporária, o que se pode consubstanciar num empacotamento de uma transferência definitiva ou no mínimo um uso abusivo do instrumento.
k) Impossibilidade de aplicação ao trabalhador, à semelhança dos restantes do n.º 11 do art.º 11? do RTPCGP.
Conclusão:
Face ao supra exposto, e tendo em conta que o período de prorrogação agora requerido é tido como mais do que suficiente para que o trabalhador venha junto desta DSS, caso assim o pretenda, definir se pretende regressar à Unidade Orgânica de Origem, EP Porto, ou permanecer de forma definitiva no EP Ponta Delgada, efetuando registo de pedido de transferência par esta, proponho o deferimento da prorrogação da transferência temporária do Guarda Migue! Ângelo Antunes Morais Silva, pelo período de um ano, no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada ao abrigo do n.º 1 do art.º 11.º do RTPCGP.
(Conforme fls. não numeradas do PA)

O- Em 22/06/20208, sobre a informação referida no ponto anterior, foi proferido despacho pelo Subdiretor Geral da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, do qual se extrai o seguinte: “Assim, em conformidade defiro a prorrogação da transferência temporária por um ano ao Guarda M….., no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada ao abrigo do n.º 1 do art.º 11.º do RTPCGP, sem prejuízo do trabalhador no espaço temporal que agora concedido diligenciar junto da DSS de forma a resolver de forma duradoura a Unidade Orgânica de colocação de acordo com o RTPCGP.”
(Conforme fls. não numeradas do PA)

P- Antes de iniciar as suas funções no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada a requerente desempenhava funções de técnica superior na Universidade do Porto.
(Facto não controvertido)

Q- Antes de iniciar as suas funções no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada a requerente vivia com o seu marido M….. e o filho menor de ambos, J….., na …..Rio Tinto.
(Conforme documentos 6, 9 e 15 da petição inicial)

R- Em 01/06/2018 a requerente e o seu marido outorgaram documento denominado “Contrato de arrendamento para habitação com prazo certo”, que se dá por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:
“PRIMEIRA OUTORGANTE:
J….. Lda., contribuinte n.° ….., com sede na …..Ponta Delgada, matriculada na CRC sob o número igual ao de contribuinte, representada no ato, com plenos poderes para, por J….., casado, residente na ….. Ponta Delgada, na qualidade de senhorio;
SEGUNDOS OUTORGANTES:
S….., contribuinte n 0 ….., e M….., contribuinte n° …..residentes na ….. Rio Tinto, titular do cartão de cidadão respetivamente n° …..e ….., na qualidade de arrendatários;

Entre os outorgantes é livremente e de boa-fé celebrado o presente contrato de arrendamento para habitação com prazo certo, que se regerá pelas cláusulas seguintes:
CLÁUSULA PRIMEIRA
Pelo presente contrato, a primeira outorgante dá de arrendamento aos segundos outorgantes o imóvel com a fração “cc" destinado a habitação, correspondente ao 6.º andar direito sul, bloco n3, piso 7 com uma arrecadação n° 329 e 2 lugares de estacionamento com os n°s 336 e 339 na cave sito na ….., concelho de Ponta Delgada, descrito na CRP sob o n° …..e inscrito na matriz urbana sob o artigo ….., com licença de habitação emitida pela Camara Municipal de Ponta Delgada em 11/11/2003 sob o n° …..–
CLÁUSULA SEGUNDA
O presente contrato de arrendamento tem o seu início em 1 de Junho de 2018 e é celebrado pelo prazo inicial de 1 ano, renovando-se automaticamente no seu termo, por períodos sucessivos de igual duração, caso não seja denunciado nos termos legais, por qualquer dos outorgantes.
(…)
CLÁUSULA TERCEIRA
Os segundos outorgantes pagarão à primeira, uma renda mensal de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros), na vigência do primeiro ano, ou seja até 31 de maio de 2019, a partir de 01 de junho de 2019 a renda é atualizada para 700,00 € (setecentos euros), a partir de 01 de junho de 2019 a renda será atualizada anualmente de acordo com o coeficiente de atualização publicado pelo Instituto Nacional de Estatística.
(…)”
(Conforme documento 9 da petição inicial)

S- O filho da requerente frequenta um colégio em Ponta Delgada.
(Conforme documento 14 da petição inicial)

T- O agregado familiar da requerente é composto por três pessoas.
(Facto não impugnado)
U- O valor mensal da retribuição líquida do agregado familiar é de valor aproximado de € 3.300,00 (€ 1.600,00 da requerente e € 1.700,00 do marido).
(Conforme documento 7 e 8 da petição inicial)

V- O agregado familiar da requerente suporta, em valores aproximados, as seguintes despesas mensais:
a. Renda da casa - € 700,00
b. Água, gás, luz e comunicações - € 190,00
c. Colégio do filho - € 350,00
(Conforme documentos 10 a 14 da petição inicial)

W- A cessação do vínculo de emprego público por tempo indeterminado com a DGRSP e o regresso da requerente à situação jurídico-funcional detida anteriormente traduzir-se numa perda de rendimento mensal no valor de € 242,74, correspondente ao subsídio de fixação e de € 141, 17 respeitante ao subsídio de risco.
(Conforme documento 8 da petição inicial)

X- Em 19/10/2018 a requerente e o marido, através de procurador, outorgaram escritura de compra e venda através da qual venderam a fração autónoma designada pela letra T, correspondente a uma habitação no 1.º andar direito, frente, centro, do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito no ….., da freguesia de Rio Tinto, concelho de Gondomar.
(Conforme documento 15 da petição inicial)

Y- A requerente não dispõe de habitação no Porto.
(Facto não contestado)”
*
IV. Direito
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas respetivas alegações, importa conhecer da pretensão recursiva formulada e que se prende com saber (1) se ao recurso pode ser atribuído efeito suspensivo e (2) se o Juiz a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar estarem verificados os pressupostos para o decretamento de providências cautelares por, indevidamente:
- Ter desconsiderado a possibilidade de aproveitamento do ato, julgando inconsequente a alegada falta de audiência prévia;
- Ter julgado verificado o periculum in mora, uma vez que, ao contrário do decidido, a situação profissional e a diferença retributiva sempre seriam suscetíveis de ser reconstituídas ulteriormente;
- Ter concluído que os interesses da Recorrida seriam preponderantes sobre o interesse público (aliás, corporizado na forma de resolução fundamentada, desconsiderada pelo tribunal a quo).
Vejamos, pois.
*
Em relação à “questão prévia” colocada pelo Recorrente, no tocante ao efeito do recurso interposto:
Pretende o Recorrente que os mesmos (alegados) efeitos nefastos decorrentes da (alegada) preponderância do interesse público sobre os interesses da Recorrida (e que estiveram na origem da resolução fundamentada junta aos autos, a fls. 109/111 dos autos físicos), justificariam que ao recurso interposto fosse atribuído efeito suspensivo.
A Recorrida, naturalmente, opôs-se, escudando-se na letra da lei e respetiva teleologia.
Vejamos.
Diz-se no artº 143º do CPTA, com a epígrafe “Efeitos dos recursos”, o seguinte:
“1 — Salvo disposto em lei especial, os recursos ordinários têm efeito suspensivo da decisão recorrida.
2 — Para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos de:
a) Intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias;
b) Decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes;
c) Decisões proferidas por antecipação do juízo sobre a causa principal no âmbito de processos cautelares, nos termos do artigo 121.º
3 — Quando a suspensão dos efeitos da sentença seja passível de originar situações de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora ou para os interesses, públicos ou privados, por ela prosseguidos, o recorrente, no requerimento de interposição de recurso, pode requerer que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo.
4 — Quando a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso possa ser causadora de danos, o tribunal pode determinar a adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos e impor a prestação, pelo interessado, de garantia destinada a responder pelos mesmos.
5 — A atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos.”

Ou seja, o artigo 143º nº 1 do CPTA dispõe como regra que os recursos ordinários dos processos dos tribunais administrativos têm efeito suspensivo.
O nº 2, alínea b), ressalva que, para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos das decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes.
Assim, resulta claramente daquela disposição que o recurso da sentença proferida em processo cautelar tem efeito meramente devolutivo, pelo que não será para esses casos (mas sim para os casos em que esteja em causa o “efeito regra”, previsto no nº 1 do artº 143º do CPTA) que será possível aplicar o disposto nos nsº 4 e 5 do artº 143º do CPTA.
Justamente neste sentido interpretativo, veja-se o vertido no acórdão deste TCA – Sul, datado de 19.12.2017, proferido no processo nº 121/17.5BERPT, disponível para consulta em www.dgsi.pt e onde, no que para aqui releva, se sumariou o seguinte:
“I – Nos termos do artigo 143º nº 2 alínea b) do CPTA o recurso (apelação) interposto de decisões respeitantes a processos cautelares tem efeito meramente devolutivo.
II – O âmbito de aplicação do disposto nos nºs 4 e 5 do artigo 143º do CPTA restringe-se às situações em que é requerido ao tribunal, ao abrigo do nº 3, a modificação do efeito suspensivo do recurso enquanto efeito regra (cfr. nº 1), sendo inaplicável quando o efeito devolutivo do recurso decorre imperativamente da lei, como sucede nas situações previstas no nº 2 do artigo 143º do CPTA.
(…)”

Julga-se, pois, improcedente a requerida atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso.
*
Em relação ao (alegado) erro de julgamento/apreciação dos pressupostos para decretamento de providências cautelares:
Sobre a adoção de providências cautelares, dispõe, em termos genéricos, o artigo 112.º n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que:
“Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adoção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.
Uma providência cautelar visa, portanto, a obtenção de uma decisão de natureza provisória que salvaguarde a utilidade da eventual decisão de procedência que venha a ser proferida em sede de ação principal, assim evitando uma situação de impossibilidade de execução dessa decisão judicial, nomeadamente, pela verificação de situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação.
Tendo em vista esta razão de ser da providência cautelar, o legislador concretizou, no artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, os critérios de decisão que o julgador deve ter em conta.
Dispõe este artigo, sob a epígrafe “Critérios de decisão”, e no que aqui releva, que:
“1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
2 - Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
3 - As providências cautelares a adotar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, devendo o tribunal, ouvidas as partes, adotar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado a evitar a lesão desses interesses e seja menos gravoso para os demais interesses públicos ou privados, em presença.
4 - Se os potenciais prejuízos para os interesses, públicos ou privados, em conflito com os do requerente forem integralmente reparáveis mediante indemnização pecuniária, o tribunal pode, para efeitos do disposto no número anterior, impor ao requerente a prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária.
5 - Na falta de contestação da autoridade requerida ou da alegação de que a adoção das providências cautelares pedidas prejudica o interesse público, o tribunal julga verificada a inexistência de tal lesão, salvo quando esta seja manifesta ou ostensiva.
[…]”.
Do teor do citado preceito resulta, pois, que o decretamento da providência cautelar depende da verificação cumulativa de dois requisitos positivos, previstos no n.º 1, e de um requisito negativo, previsto no n.º 2, a saber: (i) A existência de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente pretende acautelar no processo principal – periculum in mora; (ii) Que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente – fumus boni iuris; (iii) Que, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
Cumpre, pois, verificar se, no caso dos autos, estão reunidos estes requisitos.
Como se referiu, o artigo 120.º n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos prescreve que, para ser decretada a providência cautelar, é necessário que “haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal […]”.
A apreciação deste requisito pressupõe um juízo de prognose sobre a existência de fundado receio de que uma futura e hipotética decisão judicial que dê provimento à pretensão da Requerente venha a perder utilidade, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela ou por, entretanto, se terem produzido prejuízos de difícil reparação, obstando a que a Requerente obtenha uma efetiva reintegração no plano dos factos.
A este propósito, refere, sumariamente, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12.01.2012, proferido no processo n.º 0857/11 (disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf?OpenDatabase):
[…]
V – Ocorre uma situação de facto consumado (…) quando, a não ser deferida a providência, o estado de coisas que a acção quer influenciar fique inutilizada ex ante.
VI – Danos de difícil reparação são aqueles cuja reintegração no planos dos factos se perspectiva difícil, seja por que pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente”.
(cfr., no mesmo sentido, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2016, pp. 449/450, e JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 16.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2017, p. 298).

Acresce que o ónus de alegação e da prova dos factos constitutivos do referido requisito legal (e, bem assim, de todos os outros) recai sobre a Requerente, nos termos gerais das regras probatórias, vertidas no artigo 342.º n.º 1 do Código Civil.
Deste modo, impõe-se, desde logo, que a Requerente alegue a factualidade, e realize a prova, concreta e circunstanciada, da situação de facto consumado que pretende evitar ou dos prejuízos de difícil reparação que advirão da não adoção da providência cautelar requerida, não se bastando com a mera alegação vaga e genérica do fundado receio de ocorrência de prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação.
A Requerente tem ainda de alegar e provar que esses prejuízos serão superiores aos que advêm para a entidade requerida com a adoção da providência.
Neste sentido, pode ler-se, a título exemplificativo, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 30.11.2012, proferido no processo n.º 00274/11.1BEMDL-A:
“[…]
IV. Incumbe ao requerente da providência o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida (art. 342.º do CC), não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo.
V. Daí que o requerente terá de tornar credível a sua posição através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objetivas nas quais sustenta a verificação dos requisitos da providência já que, da conjugação dos arts. 112.º, n.º 2, al. a), 114.º, n.º 3, als. f) e g), 118.º e 120.º todos do CPTA, não se mostra consagrada uma presunção ‘iuris tantum’ da existência dos aludidos requisitos como simples consequência da existência em termos de execução do ato.
VI. Impõe-se que a alegação, para além de ser concretizada com realidade factual que corporize efetivamente o requisito do periculum in mora, venha a ser demonstrada pelos meios probatórios produzidos.”

A decisão recorrida julgou verificado o periculum in mora, dizendo, em relação a este ponto o seguinte:
“(…) Resulta do probatório que o agregado familiar da requerente, composto por três pessoas, tem um rendimento mensal médio de € 3.300,00 líquidos (factos T e U), suportando uma despesa média de € 1.240,00 (facto V).
Mais resulta do elenco de factos provados que, o regresso da requerente ao seu lugar de origem tem como consequência a perda do rendimento mensal no valor de € 383,91, correspondente ao subsídio de fixação (€242,74), e ao subsídio de risco (€ 141, 17), montantes que deixará de ter direito a receber (W do probatório).
Resulta ainda do elenco de factos provados (Y) que a requerente não dispõe de qualquer habitação no Porto, pelo que terá que suportar as despesas de um local onde residir.
Temos assim que concluir que com a execução imediata do ato suspendendo o agregado familiar da requerente ficará com um rendimento mensal de € 2.916,09, tendo que passar a suportar novas despesas com uma habitação no Porto.
Estas novas despesas não estão, nem podiam estar provadas, uma vez que são futuras, mas num cálculo que seguramente pecará por defeito, podemos assumir que a requerente gastará com uma habitação no Porto pelo menos o mesmo que suporta em Ponta Delgada, ou seja, entre renda e despesas um montante de € 900,00 mensais. E isto tendo em conta o maior custo da habitação no Porto, facto notório, e a necessidade de uma casa menor, por ser apenas destinada à habitação da requerente.
Assim sendo, a execução imediata do ato suspendendo representa que o agregado que tinha de rendimento disponível o montante de € 2.060,00 (€ 3300,00 - € 1.240,00 – factos U e V do probatório - passará a ter € 1.160,00, se àquele montante retirarmos os € 900,00 presumidos para a nova despesa com a habitação da requerente no Porto.
A este montante disponível terá que se retirar os custos de todos os membros do agregado familiar, em Ponta delgada e no Porto, com as despesas mensais para alimentação, vestuário e transportes, que são factos notórios, do conhecimento geral, não carecendo de alegação ou prova, nos termos do artigo 412º do CPC.
Para fazer face a estas despesas essenciais e necessárias a qualquer pessoa, o agregado em causa tinha assim um montante diário, por cada um dos seus membros, de € 22,90 (€ 2.060/3 pessoas/30 dias), sendo que, com a execução do ato impugnado passará a ser de € 12,90 (€ 1.160/3 pessoas/30 dias).
É assim manifesto que, com a execução do ato impugnado, o rendimento disponível do agregado familiar da requerente vai sofrer um abaixamento significativo, importando uma redução abrupta e drástica do padrão do seu nível de vida.
(…)
Acresce que o próprio facto da imediata execução do ato suspendendo implicar a mudança da requerente para o Porto e posteriormente da sua família, configura em si um prejuízo de difícil reparação.
(…)
Também a mudança da sede da vida familiar de Ponta Delgada para o Porto, na pendência da ação, mesmo que reversível em face da procedência da ação principal, implicará perturbação na estabilidade familiar, designadamente, do filho menor, que terá que mudar sucessivamente de escola, de amigos.
Alega a este propósito a entidade demandada que o marido da requerente apenas veio para o Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada a coberto de uma colocação provisória, sendo que a sua unidade de origem é o estabelecimento prisional do Porto, para onde voltará.
Sucede que resulta do probatório (O) que em 22/06/2020 foi deferida a prorrogação da transferência temporária por um ano ao Guarda M….., no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
Mais resulta que este despacho teve por base a Informação n.º …..na qual, designadamente, se sustenta que no prazo de prorrogação deve o marido da requerente definir se pretende regressar à Unidade Orgânica de Origem, EP Porto, ou permanecer de forma definitiva no EP Ponta Delgada, efetuando registo de pedido de transferência para este, conforme facto N do probatório.
Donde se conclui que o guarda M….. aqui ficará pelo menos mais um ano e que se mantém em aberto a possibilidade de ficar no EP de Ponta Delgada de forma definitiva.
Neste sentido não pode proceder o argumento da entidade requerida, quando defende que a colocação do guarda M….. no EP de Ponta Delgada é necessariamente provisória, assim afastando os alegados prejuízos decorrentes da desagregação familiar.
O que resulta dos factos provados é que a requerente e o seu marido venderam a casa que tinham no Porto (X do probatório), o que denota a intenção de transferirem a sua vida familiar e pessoal para Ponta Delgada e não o propósito de mudar apenas por um ano.
Assim sem mais, num juízo de prognose assente na matéria alegada e na experiência comum, tendo por referência a possibilidade de reintegração natural e específica na esfera jurídica da requerente, caso a ação principal venha a ser julgada procedente, revela-se justificado o receio de que o regresso da requerente ao Porto, por um período mais ou menos longo, venha a originar prejuízos de difícil reparação.
Razões pelas quais se conclui que a execução imediata do ato suspendendo põe em causa a utilidade da sentença a proferir no processo principal, pelo que se considera verificado, nos presentes autos, o requisito do “periculum in mora” previsto no artigo 120.º, n.º 1, do CPTA.”

Ou seja, com base no alegado pela Recorrida no requerimento inicial apresentado, o tribunal a quo ponderou as respetivas despesas e rendimentos mensais, concluindo que o regresso imediato da mesma ao Porto, ao seu lugar de origem, frustraria os planos de mudança do agregado familiar do Porto para Ponta Delgada e demandaria um aumento substancial das despesas mensais (manutenção, ainda que temporária de dois lares/imóveis, um na Ilha de São Miguel e outro no continente, no Porto). Sobretudo, implicaria desagregação da vida familiar, porquanto o seu marido continuaria colocado em Ponta Delgada por mais um ano e o seu filho encontra-se a frequentar estabelecimento de ensino no mesmo local.

Considerou, pois, o tribunal a quo, que estas vicissitudes seriam insuscetíveis de serem reparadas por via de simples reintegração pecuniária futura e, portanto, seriam de “difícil reparação”.
E bem o fez.
Não se secunda, pois, o entendimento manifestado pelo Recorrente quando pretende que “(…) seria sempre possível reconstituir, através do recebimento dos vencimentos a que tinha direito como se estivesse em funções, sem qualquer hiato, e toda a carreira profissional seria possível de reconstituir (…)”
A Recorrida logrou demonstrar, pois, em sede cautelar, que o seu regresso imediato ao Porto, ao seu lugar de origem, acarretará prejuízos que serão de difícil, senão impossível reparação, porque insuscetíveis de ser quantificados e, sobretudo, de serem reintegrados pela simples reposição/indemnização, por via de quantitativos pecuniários.
Igualmente, ao contrário do sustentado pelo Recorrente, a Recorrida alegou e demonstrou os prejuízos que entendia como de difícil reparação e o tribunal limitou-se a secundá-los com base quer nos documentos juntos aos autos quer na evidência dos mesmos.
Este requisito ter-se-á, pois, por verificado, como bem concluiu o tribunal a quo.
*
Em relação ao fumus bonus iuris, o tribunal a quo procedeu à exegese da totalidade dos vícios invocados e que eram os seguintes:
a) Vícios relativos ao júri:
a. Violação do princípio da especialidade;
b. Violação das regras de funcionamento.
b) Vícios relativos ao procedimento de avaliação:
a. Ausência de definição de metodologia e ausência de monitorização e acompanhamento;
b. Violação de audiência prévia.
c) Vícios do ato final de avaliação:
a. Falta de fundamentação.

Analisando os vários vícios, um a um, foi considerando que os mesmos não se verificavam, até ter concluído que, efetivamente, havia sido inobservado o dever de audiência prévia.
Neste ponto, concluiu o tribunal a quo:
“(…) Resulta do probatório (J) que, em 20/03/2020 a requerente apresentou a sua pronúncia em sede de audiência prévia, na qual requereu que fossem ouvidos o atual Diretor do Estabelecimento Prisional, por entender ser a única pessoa habilitada a prestar informações sobre o trabalho desenvolvido, o modo de execução, o cumprimento ou não dos prazos legais ou regulamentares e o sr. Chefe Principal E….., com quem trabalha em estreita colaboração na instrução de processos e na execução de decisões disciplinares aplicadas no estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
Mais resulta que o júri não realizou as inquirições requeridas, nem apresentou qualquer razão justificativa para as não ter realizado, como decorre a contrario do facto K do probatório.
Ora o direito de participação dos administrados não é meramente formal e impõe à administração o dever de criar as condições para o seu efetivo exercício, ainda mais no âmbito de um processo de avaliação, em que a administração atua no âmbito da discricionariedade técnica, não se encontrando vinculada a comportamentos legalmente determinados.
Assim, sendo embora certo que não existe nenhuma norma que imponha à Administração o dever de realizar todas as diligências de prova requeridas, sendo mesmo a quem compete aquilatar e decidir da sua pertinência, sempre que o interessado requeira quaisquer diligências de instrução na sua pronúncia em sede de audiência prévia, a administração, caso as não pretenda realizar, deve justificar o motivo pelo qual as entende desnecessárias.
(…)
No caso dos autos, como vimos, não houve qualquer justificação, ainda que sumária, para a não realização das requeridas inquirições de testemunhas.
Assim, nos termos da jurisprudência citada, com a qual concordamos, conclui-se, em termos perfunctórios, que estamos perante a preterição do direito de audiência de interessados, na sua plenitude, que era imposta pelo artigo 121.º n.ºs 1 e 2 do CPA, a qual configura vício de procedimento que inquina o ato final, acarretando a sua invalidade, na modalidade de anulabilidade.
Também, como se afirma no aresto citado e tendo em conta o disposto no n.º 5 do artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), o seu efeito invalidante apenas se verifica no caso de não ser possível o aproveitamento do ato administrativo. Não se produz o efeito anulatório nas seguintes situações:
a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;
b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;
c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.
Tendo em conta o ato ora suspendendo, consistente na homologação de uma avaliação de período experimental de trabalhador em funções públicas, é manifesto que não estamos em presença de qualquer um dos casos em que se não produz o efeito anulatório.
Na verdade, estamos em presença de um ato de avaliação, pertencente ao domínio da chamada discricionariedade técnica, no âmbito da qual o júri competente dispõe de liberdade de valoração dos elementos ao seu alcance que não tenham valoração fixada na lei, onde não existe vinculação e não é possível concluir, sem dúvidas, que a solução do caso concreto seria necessariamente a mesma se não se tem omitido a formalidade.
Também não se pode recorrer à teoria da degradação das formalidades essenciais e não essenciais, pois que o pleno direito de participação que se garantia com a formalidade omitida não foi alcançado por qualquer outra via.
E assim não tem aplicação, no caso dos autos, o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, pelo que a anulabilidade decorrente da preterição da audiência prévia importará a anulação do ato.
(…)”
Aqui, na decisão recorrida, reconheceu-se, e bem, que, tendo a Recorrida emitido a sua pronúncia e requerido a inquirição de duas testemunhas que reputava de essenciais para sustentar a sua versão (Director do E.P. e o Chefe dos Guardas Prisionais), não poderia o Recorrido ter recusado a respetiva inquirição sem o fundamentar, explicitando as razões pelas quais não o fazia. Ou seja, impendia sobre a Administração o dever legal de, entendendo ser desnecessária essa diligência, proferir decisão, ainda que sumária, justificativa das razões em que se estribou.
Considerou ainda, a decisão recorrida, que, não se tratando de atuação vinculada mas fundamentalmente discricionária, não se poderia apelar à teoria do aproveitamento dos atos administrativos. Desde logo por não se poder concluir, com toda a segurança, que a realização da diligência instrutória requerida não teria qualquer aptidão para abalar os fundamentos em que assenta a decisão final.
E bem o fez, uma vez mais.
Note-se que nos termos do artº 163º, nº 5 do CPA (Código do Procedimento Administrativo - DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro), com a epígrafe “Atos anuláveis e regime da anulabilidade”, “[n]ão se produz o efeito anulatório quando:
a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;
b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;
c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.”
Qualquer uma das possibilidades constantes nas alíneas a) a c) do nº 5, acima transcrito, pressupõe uma atividade vinculada da Administração, algo que não está em causa nos presentes autos. Aqui tratar-se-á de atuação essencialmente discricionária.
Não se poderia, pois, apelar à teoria do aproveitamento dos atos administrativos, desde logo por não se poder concluir, com justa margem de certeza, que a realização da diligência instrutória requerida não teria qualquer aptidão para abalar os fundamentos em que assenta a decisão final.
Não poderia, assim, o Recorrido, ter recusado a respetiva inquirição sem o fundamentar, explicitando as razões pelas quais não o fazia. Ou seja, impendia sobre a Administração o dever legal de, entendendo ser desnecessária essa diligência, proferir decisão, ainda que sumária, justificativa das razões em que se estribou.
De outra forma, tornar-se-á o cumprimento do dever de audiência prévia em algo inoperante e, como tal, redundante.
Neste sentido pode ver-se o acórdão do TCA - Norte, proferido no processo nº 00634/09.8BEVIS, datado de 08-05-2015, disponível para consulta em www.dgsi.pt, e onde se sumariou o seguinte:
“I- O direito de audiência prévia, consagrado nos artigos 100.º e ss do CPA e no artigo 267.º, n.º 5 da CRP impõe à Administração a obrigação de criar as condições fáticas necessárias à garantia de uma efetiva audição dos destinatários de decisão administrativa desfavorável aos seus interesses.
II- Tendo o interessado, na resposta apresentada em sede de audiência prévia, requerido a inquirição de testemunhas, impendia sobre a Administração o dever legal de, entendendo ser desnecessária essa diligência, proferir decisão sumária justificativa das razões em que se estribou.
III- A preterição dessa formalidade, não tem qualquer consequência invalidante da decisão final proferida no procedimento, se por apelo à teoria do aproveitamento dos atos administrativos se concluir, com toda a segurança, que a realização da diligência instrutória requerida não teria qualquer aptidão para abalar os fundamentos em que assenta a decisão final.”

Considerar-se-á, pois, como verificado também este requisito (fumus bonus iuris), pois mostra-se verosímil que a ação principal venha a ser considerada procedente e anulado o ato em crise, por violação do dever de audiência prévia.
*
E, por fim, secundar-se-á, também, o juízo feito em relação à ponderação dos interesses públicos e privados em presença.
E nem se diga que a decisão recorrida não ponderou devidamente o alegado quer em sede de oposição quer na resolução fundamentada, oportunamente apresentada (cfr. fls. 109 a 111 dos autos físicos). Fê-lo, isso é evidente. Apenas considerou que os motivos, genéricos, conclusivos e indevidamente concretizados, ali mencionados, seriam irrelevantes se compaginados com os prejuízos que a Recorrida iria sofrer.
Diz-se na decisão recorrida:
“(…) Ora, a entidade requerida, com interesse para a questão, limitou-se a referir que a suspensão da eficácia do ato poderia afetar o interesse público concretizado nos prejuízos para o funcionamento da unidade orgânica onde a requerente exerceu funções no seu período experimental, pois que o seu regresso será perturbador do normal funcionamento daquela unidade orgânica, dado que a DGRSP seria forçada a manter no desempenho de funções uma trabalhadora que, quer em termos técnicos, quer em termos de inserção naquela unidade orgânica não mostrou ter condições as mínimas para tal exercício, com uma consequente quebra de confiança indispensável para que a trabalhadora exerça as tarefas em causa.
Estando em causa nos autos a discussão da validade do processo de avaliação e sendo perfunctoriamente manifesta a sua invalidade, como ficou expresso, o interesse público não se concretiza com a afirmação dessa avaliação, designadamente, com a constatação da impreparação da requerente para as funções que desempenha.
Não se vislumbra, de forma evidente ou manifesta, qualquer concreto interesse público a ponderar cuja afetação se mostre superior àquele que atinge o interesse da requerente caso seja recusada a providência, o que determinará o seu regresso ao Porto, com a redução drástica do seu padrão de vida e a alteração substancial da sua vida e do seu agregado familiar.
Há, consequentemente, que julgar verificada a inexistência de lesão para o interesse público, prevalecendo, pois, o interesse da requerente.
Constata-se que os danos que alegadamente resultarão para a entidade requerida do decretamento da providência são inferiores aos que podem resultar da sua recusa à requerente.”

Uma vez mais, atendendo, aliás, ao que acima se adiantou, não se poderá senão secundar o decidido, também neste ponto.
*
Contudo, já não se poderá secundar o decidido no ponto seguinte, no tocante ao pedido formulado pela Recorrida/Requerente, na alínea b) do petitório do requerimento inicial apresentado, no sentido de, cumulativamente, ser o Recorrente/Requerido condenado à repetição do período experimental, com a constituição de um novo júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação.
Assentindo ao requerido, o tribunal a quo condenou a entidade requerida a “proceder à repetição do período experimental da requerente, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação.”
Justificou-o, em singelo, nos seguintes termos: “(…) as providências requeridas – de suspensão de eficácia da decisão de homologação da deliberação do júri sobre a conclusão do período experimental sem sucesso cumulada com a condenação à repetição do período experimental, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação – se revelam a mais adequadas para evitar a lesão dos interesses da requerente.
Com efeito a mera suspensão do ato não satisfaz a sua pretensão, porque a inércia da Administração não é suficiente, tendo em conta que o n.º 4 do artigo 45.º da LTFP determina que “Concluído sem sucesso o período experimental de função, o trabalhador regressa à situação jurídico-funcional que detinha anteriormente.”
No sentido que aqui defendemos pronunciou-se o acórdão do TCAS de 07/03/2013, processo 09655/13, disponível em www.dgsi.pt (…)”

No entanto, a decisão em crise, aqui, entra em contradição com os seus anteriores termos. Não se compreende porquê e em que termos terá a Recorrente de repetir o período experimental. A própria decisão em crise, apreciando os demais vícios imputados ao procedimento, concluiu que os mesmos não se verificariam. Nenhum outro, à exceção da preterição do dever de audiência prévia.
Cumpriria, pois, isso sim, caso a ação principal viesse a ser considerada procedente, determinar-se a repetição do procedimento, mas nessa parte apenas. Proceder-se-ia, pois, à repetição da audiência prévia e subsequente inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrida ou justificar-se-ia devidamente porque se indeferia a prova requerida.
Nos artigos 220 e 221º do requerimento inicial, a Recorrida salienta que a providência cautelar, além da mera suspensão de eficácia do ato que considera findo o período experimental, “(…) visa impedir que o Período experimental de função da trabalhadora, seja considerado concluído sem sucesso, e consequente cessação do vínculo de emprego público por tempo indeterminado com a DGRSP, e regresso à situação jurídico-funcional de origem na Universidade do Porto.”
E ainda que “(…) visa acautelar que a Administração impeça o conhecimento dos vícios assacados ao referido ato, que com forte probabilidade será considerado ilegal, e sendo ilegal, constitui ato ilícito, e como tal facto gerador de responsabilidade civil extracontratual do Estado, sendo que a requerente se encontra ainda em prazo para o exercício desse direito.”
No entanto, não oferece argumentação que possibilite, em sede cautelar, sustentar a necessidade da repetição do período experimental.
Tanto mais que, a verificar-se tal repetição, necessariamente, ficará consumido o objeto da ação principal, porquanto, aquando do termo do “novo período experimental”, teremos um “novo ato administrativo”, que poderá ser ou não de teor semelhante ao que o precedeu, mas que, definitivamente, será um “novo ato”, passível de reação contenciosa autónoma.
No âmbito cautelar, alternativamente, se isso tivesse sido pedido ou o juiz a quo o considerasse mais curial (seria o caso, porventura, considerando o sentido da decisão adotada), poderia ter sido proferida decisão atinente à causa principal, nos termos e para os efeitos previstos no artº 121º do CPTA, artigo segundo o qual “(…) [e]xistindo processo principal já intentado, se verifique que foram trazidos ao processo cautelar todos os elementos necessários para o efeito e a simplicidade do caso ou a urgência na sua resolução definitiva o justifique, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal, proferindo decisão que constituirá a decisão final desse processo.”
Pelo acima exposto, cumpre conceder parcial provimento ao recurso interposto e revogar a decisão proferida, apenas na parte em que condenou a Recorrente a “proceder à repetição do período experimental da requerente, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação”, mantendo o demais decidido.
*
V – Decisão:
Assim, face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, conceder parcial provimento ao recurso interposto e revogar a decisão proferida na parte em que condenou a Recorrente a “proceder à repetição do período experimental da requerente, com a constituição de um júri, com vista ao acompanhamento e subsequente avaliação”, mantendo o demais decidido.
Custas pelo Recorrente e pela Recorrida na proporção do respetivo decaimento (1/2).
***
Lisboa, 26 de Novembro de 2020


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Ricardo Ferreira Leite*
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*O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º -A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Ex. Srs. Juízes-Desembargadores, Dr.ª Ana Celeste Carvalho e Dr. Pedro Marchão Marques.