Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 122/21.4BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 06/02/2021 |
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Relator: | CATARINA VASCONCELOS |
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Descritores: | INTIMAÇÃO PARA PROTEÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS ACESSO AO ENSINO SUPERIOR |
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Sumário: | Pretendendo o Autor ingressar no ensino superior no próximo ano letivo, a tutela cautelar antecipatória, ainda que possível de um ponto de vista “naturalístico” não acautela de forma satisfatória e suficiente o seu direito, impondo-se uma decisão definitiva e urgente. |
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Votação: | MAIORIA - VOTO DE VENCIDO |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul
I – Relatório:
R….. intentou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, um processo de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias contra o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior pedindo;
Por decisão de 27.01.2021 foi indeferida liminarmente “a ação”.
O A., inconformado, recorreu de tal decisão, formulando as seguintes conclusões: O R. apresentou contra-alegações, concluindo do seguinte modo:
O Ministério Público, junto deste Tribunal, não se pronunciou.
II – Objeto do recurso:
Em face das conclusões formuladas, cumpre decidir as seguintes questões (pela ordem que, in casu, é imposta por um critério lógico):
III – Fundamentação De Facto:
Não foram elencados factos na decisão recorrida. Estava em causa a pronúncia liminar sobre a admissibilidade de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, a qual se basta com a análise dos fundamentos fácticos e jurídicos alegados pelo Autor na petição inicial. Para a decisão do presente recurso bastará também a análise dessa peça processual.
IV – Fundamentação De Direito:
- Do erro de julgamento quanto à verificação dos pressupostos da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias: Julgou, o Tribunal a quo, que esta intimação não era indispensável para assegurar o exercício em tempo útil do direito do Autor e que, por não existir periculum in mora, não se justificaria o convite à substituição da petição inicial a que se refere o art.º 110º-A do CPTA. Consequentemente, indeferiu liminarmente “a ação”, julgado com o qual o Autor não se conforma. À intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias referem-se os art.ºs 109.º e segs. do CPTA em concretização do disposto no art.º 20.º, n.º 5, da CRP nos termos do qual “para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos”. São seus pressupostos, como resulta do art.º 109º, n.º 1 do CPTA: - que a emissão urgente de uma decisão de mérito (que imponha à Administração a adoção de uma conduta) se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia; - que não seja possível ou suficiente o decretamento de uma providência cautelar; O Recorrente entende que o indeferimento liminar da intimação não pode manter-se porque devem julgar-se verificados os pressupostos de que depende a admissão deste meio processual. Em suma, considera que a sua situação exige uma decisão (urgente) de mérito, definitiva, ao contrário do Tribunal a quo que julgou que esta ação não se revela indispensável para assegurar em tempo útil um direito liberdade e garantia (ou direito análogo) e que, as circunstâncias do caso concreto não podem justificar, à data, o recurso a uma providência cautelar. O A. Recorrente alegou, na petição inicial, que apresentou candidatura no âmbito do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior 2020-2021 e que não foi considerada a sua classificação a uma dada disciplina (Mathematics SL) mas sim, (no seu entendimento indevidamente) a outra (Mathematics HL). Por causa dessa desconsideração não obteve colocação em nenhuma das suas duas opções sendo que, se assim não fosse, teria obtido colocação no curso de Engenharia Informática e de Computadores da Universidade de Lisboa – Instituto Superior Técnico (Tagus Park), sua 2.ª opção. A atuação do Ministério é, segundo entende, ilegal porque fundada na aplicação de uma norma do Regulamento de Acesso ao Ensino Superior (o art.º 9º, n.º 2) que viola o princípio da igualdade, o princípio da proteção da confiança e o princípio da proporcionalidade, ofendendo o conteúdo essencial de direitos fundamentais. No que concerne aos pressupostos do recurso à intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, o A. Recorrente, para além de sustentar, na petição inicial, a aplicabilidade deste meio processual ao direito que pretende salvaguardar, alegou que “uma vez que não será possível nem se vislumbra utilidade para o Intimante em ser colocado no respetivo ano letivo, resta que seja assegurado o seu acesso ao Ensino Superior contemporâneo ao Concurso de Acesso para o próximo ano, assegurando que fica (na medida do possível; e ainda que tenha perdido um ano na perspetiva de início da sua vida académica universitária) na mesma posição que estaria caso não lhe tivesse sido aplicada a norma inconstitucional. O que, portanto, apenas se acautelará (na medida do possível) pela atribuição supranumerária de vaga a ser preenchida pelo Intimante no Curso a que teria legitimamente acesso, nos termos atrás explicitados”. Vejamos então se, ao contrário do decidido, estarão preenchidos os pressupostos da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias. A pretensão material do A. é clara. Pretende ingressar no ensino superior no ano de 2021/2022 no curso de Engenharia Informática e de Computadores do Instituto Superior Técnico (Tagus Park) da Universidade de Lisboa. Vejamos então se, ao contrário do decidido, estarão preenchidos os pressupostos da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias. A questão da adequação deste meio processual e do preenchimento dos seus pressupostos em situações concretas semelhantes à que ora é trazida à nossa apreciação tem obtido respostas diversas ao nível dos Tribunais e da Doutrina. Com especial relevo, atenta a resenha jurisprudencial e doutrinária no mesmo contida, não devemos deixar de remeter, por economia, para o teor do recente acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 27.11.2020 (processo 00474/20.3BECBR, publicado em www.dgsi.pt) que, na sua essencialidade, espelha aquele que é também o nosso entendimento. Como já referimos, está em causa o acesso ao ensino superior. Trata-se, nas palavras de Rosendo Dias José (A admissão ao ensino superior e as excepções…processuais, Cadernos de Justiça Administrativa, 10, págs. 68 a 78) do “exemplo paradigmático no que se refere à ponderação sobre o que é um meio processual adequado para garantir a tutela eficaz de uma pretensão”. O pressuposto basilar que deve condicionar decisivamente este julgamento será, como também já se aflorou, o princípio da tutela jurisdicional efetiva, plasmado no art.º 20º, n.ºs 4 e 5 da CRP e 2º do CPTA em especial a afirmação que do mesmo decorre de que “a todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos (n.º 2 deste último preceito legal). O princípio de que “a todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde uma ação” tem o duplo alcance de “proclamar que toda a situação jurídica subjetiva, desde que se inscreva no âmbito de uma relação jurídico-administrativa, deve poder ser defendida perante os tribunais administrativos e deve encontrar, no contencioso administrativo, a forma de processo que possibilite a sua adequada tramitação processual” (M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, pág. 45). Como bem se evidenciou na decisão recorrida “o concurso de acesso ao Ensino Superior decorre, habitualmente, entre Agosto e Outubro de cada ano, sendo os exames nacionais realizados, para o efeito, entre Junho e Julho, o que constitui um facto notório e, consequentemente, carecido de alegação”. Concluiu assim que “entre a presente data e o acesso ao Ensino Superior no próximo ano lectivo distam, previsivelmente, entre cinco a sete meses”. Em face dos prazos previstos para a tramitação da ação administrativa, é manifesto que a salvaguarda do direito do Autor só por via de um processo urgente se pode alcançar constituindo, a negação dessa tutela (urgente) uma intolerável violação do citado princípio da tutela jurisdicional efetiva. Note-se que ainda que se venha a concluir pela ilegalidade da norma em questão e do ato administrativo ao abrigo da mesma alegadamente praticado, sempre terá, depois, de se ponderar e decidir se a execução desse primeiro julgado (consubstanciada na reconstituição da situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado) deverá consistir na prática do ato pretendido pelo A. Em suma, o Autor, ora Recorrente, terá direito (ou não) a ingressar no curso pretendido no próximo ano letivo. Mas esse juízo tem cabimento no âmbito do mérito da causa e depois de ponderadas as razões de facto e de direito invocadas pela contraparte, em obediência ao princípio do contraditório. É manifesto, como já afirmamos, que, para assegurar o exercício, em tempo útil, do direito do Autor, é necessária a célere emissão de uma decisão. A questão está em saber se, nas circunstâncias do caso concreto, é possível ou suficiente o decretamento de uma providência cautelar. É certo que, de um ponto de vista “naturalístico”, a tutela cautelar é possível. Partindo do pressuposto que abram vagas de acesso, o Autor pode ingressar no curso em questão, provisoriamente, aguardando o desfecho da ação principal que venha a ser intentada. Julgamos, no entanto, que essa tutela não pode ser considerada suficiente já que da mesma resultaria, uma de duas situações (como se evidencia em acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29.01.2014, processo 01370/13, publicado em www.dgsi.pt): “- a medida cautelar ser deferida e, a final, o direito reclamado não ser reconhecido o que tinha por consequência o Requerente ter frequentado o ensino superior e, no limite, ter-se licenciado mas sem proveito já que, com a declaração de que o acesso a esse ensino foi irregular, veria perdidos os anos em que o frequentou e teria de refazer a sua vida académica universitária desde o início. - a medida cautelar ser indeferida mas, a final, o seu direito ser reconhecido o que também redundava numa perda de tempo já que só iria iniciar a frequência do curso desejado depois de vários anos de estudo noutro curso (ou noutra actividade), isto é, depois de vários anos perdidos”. Como bem escreveu Rosendo Dias José (ibidem), “a eventualidade de a decisão baseada em conhecimento perfunctório, na providência cautelar, ser alterada na decisão definitiva é, no caso da decisão sobre o acesso ao ensino superior, desastrosa para a parte que for vencida. De facto, é razoável pensar que, entre acção e recursos, é expectável que a decisão definitiva em acção não urgente se produza ao fim de cerca de três a quatro anos. Se por força da decisão na providência o aluno foi admitido ao ensino superior e a decisão lhe for desfavorável, ele vai perder esses anos de forma chocante, e se não foi admitido e se concluir que deveria ter sido, a tutela obtida é ainda mais frustrante”. Nas sábias palavras do Senhor Conselheiro “a expressão do art. 109.°,"... por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar”[1] tem de ser entendida a partir da razoabilidade das circunstâncias que envolvem a tutela pretendida e não presidida por análises sobre se é possível ou suficiente obter efeitos com o decretamento da medida provisória, usando para tanto juízos assepticamente lógicos e a, ainda, omnipresente teoria dos conceitos. Efeitos obtêm-se, mas não são o remédio adequado e quem pede a tutela pode afinal sentir-se defraudado, o que é especialmente grave quando se venha a verificar que lhe assiste razão quanto à pretensão substantiva”. Julgamos também, pelas razões expostas, que a tutela cautelar (antecipatória) não acautela de forma satisfatória ou suficiente a pretensão e o direito do Autor. A justiça que o Autor reclama só se realizará, no caso concreto, se o tribunal decidir definitivamente e de forma urgente. Note-se que não se olvida, nem se pode refutar, a subsidiariedade que carateriza este meio processual. Não é esta a via normal de reação em situações de lesão ou ameaça de lesão de direitos, liberdades e garantias (ou direitos análogos) mas sim (in casu) a ação administrativa à qual seja associado, instrumentalmente, um processo cautelar visando o decretamento de uma providência cautelar de cariz antecipatório. O que se afirma é que, no caso concreto, a tutela cautelar, ainda que possível, nessa perspectiva “naturalística” a que aludimos, não é apta ou adequada a assegurar a proteção do direito. “Saber quando, perante uma ameaça séria de lesão do exercício de um direito, liberdade ou garantia, se deve lançar mão de uma solução urgente de mérito (através da intimação) ou de uma tutela provisória (através da antecipação de uma providência cautelar) radica essencialmente na adequação, para a situação concreta, de uma sentença provisória ou de uma sentença de mérito definitiva", como evidencia o Tribunal Constitucional (acórdão n.º 5/2006 de 03.01.2006, processo n.º 912/2005, publicado no Diário da República, série II de 15.02.2006). E ainda que se possa admitir que um processo cautelar no âmbito do qual fosse antecipada a decisão do mérito da causa (nos termos previstos no art.º 121º, n.º 1 do CPTA), pudesse consubstanciar uma tutela eficaz do direito, também não se pode olvidar que essa é uma possibilidade e não uma decorrência necessária do meio processual em que se insere pelo que a ponderação que nesta sede se impõe deve conter-se estritamente no âmbito do binómio processo cautelar/intimação e da sua normal tramitação. No mesmo sentido (de que o pedido de ingresso no ensino superior justifica a necessidade de uma decisão urgente e definitiva, tendo cabimento no âmbito de um processo de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias) decidiu o Supremo Tribunal Administrativo em 29.01.2014 (processo 01370/13) e o Tribunal Central Administrativo Norte em acórdãos de 12.01.2018 (processo 00774/17.0BEAVR) e 27.11.2020 (o já citado processo 00474/20.3CBR), todos publicados em www.dgsi.pt. Em suma, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, julgamos que a situação fáctica descrita e a pretensão do Autor consubstanciam uma situação de urgência e que a tutela jurisdicional apenas se realizará se houver lugar a uma apreciação definitiva e urgente da causa. As demais considerações plasmadas na decisão recorrida, designadamente as relativas à existência (ou não) de vagas no curso em questão prendem-se com o mérito da pretensão do Autor que, in casu, não podem fundamentar o indeferimento liminar por não ser evidente que a tese do Autor careça, em absoluto de razão de ser. (Como afirmou Antunes Varela (RLJ, 126º, pág. 10475), o indeferimento liminar “constitui um julgamento prévio ou preliminar, através do qual a lei procura proteger o requerido de demanda absolutamente injustificada, limitando o exercício do direito de ação aos casos em que exista um mínimo de viabilidade aparente da pretensão”). O Tribunal a quo, incorreu assim em erro ao julgar que não se verificavam os pressupostos da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias pelo que a decisão de indeferimento liminar não poderá manter-se.
- Da violação do princípio do contraditório: A violação do princípio do contraditório (que decorre do art.º 3º, n.º 3 do CPC) não tem cabimento no âmbito da apreciação liminar. Como constitui jurisprudência dominante (apesar de não unânime), que acolhemos, o princípio do contraditório não impõe audição prévia do autor, em caso de indeferimento liminar. Em primeiro lugar porque o réu não foi ainda chamado à lide inexistindo aquilo que se designa por “estrutura dialéctica do processo”. Depois “a imposição de um despacho prévio ao despacho de indeferimento liminar parece ser em si mesmo contraditório porque se o despacho liminar está legalmente previsto como podendo ser de rejeição liminar, não faz sentido a parte ser ouvida preliminarmente” (como é evidenciado pelo Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 24.02.2015, processo 116/14.6YLSB, publicado em www.dgsi.pt). Acresce que, nos casos de indeferimento liminar, existe, na verdade, um diferimento do contraditório já que é sempre admissível recurso, independentemente do valor e da sucumbência e se determina que o réu seja citado para os termos do recurso e da causa (art.ºs 629º, n.º 3, al. c) e 641º n.º 7 CPC e 142º, n.º 3 do CPTA). A proibição da decisão surpresa plasmada no art.º 3º, n.º 3 do CPC pressupõe que a parte não a possa perspetivar como sendo possível, ou seja, quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tinham a obrigação de prever, quando não fosse exigível que a parte interessada a houvesse prognosticado no processo. Mas como se decidiu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.06.2014 (processo nº 233/2000, publicado em www dgsi.pt), “o art.º 3º do CPC não introduz no nosso sistema o instituto da proibição de decisões surpresa tal como foi configurado no direito alemão, mas apenas como possibilidade de, em plena igualdade as partes, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que apareçam como potencialmente relevantes para a decisão” (cfr. v.g. os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 27.02.2018, processo 5500/17.0T8CBR.C1e do Tribunal da Relação do Porto de 08.03.2019, processo 14727/17.4T8PRT-A.P1, publicados em www.dgsi.pt). Não violou, portanto, a decisão recorrida, o princípio do contraditório pelo que improcede este fundamento de recurso.
- Da omissão de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial: Como resulta do supra exposto, em face do quadro factual e da pretensão material do Autor vertidos na petição inicial, deveria, o Tribunal a quo, ter concluído pelo preenchimento dos pressupostos da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias. Assim sendo, carecia de sentido lógico a pretendida interpelação do Autor no sentido de “adensar a matéria de facto alegada”, o que, aliás, em sede liminar não teria fundamento legal. Distribuído o processo o mesmo é concluso ao juiz para despacho liminar, como previsto no n.º 1 do art.º 110º do CPTA. Em face do que aí for alegado o juiz deverá rejeitar ou admitir a petição (podendo ainda, no uso do seu dever de gestão processual, decidir a tramitação a adotar nos termos previstos nos n.ºs 2 e 3 do mesmo preceito legal). Nesta sede, recaem sobre o Autor as consequências que da falta do cumprimento do seu ónus de alegação resultem, extravasando os limites dos princípios da gestão processual ou da adequação formal (art.ºs 7º e 7º-A do CPTA) a determinação ou o convite judicial ao seu suprimento dessa fata. Em suma o Tribunal a quo não omitiu a prática de qualquer ato que lhe fosse imposto pelo formalismo processual prescrito na lei, não tendo, portanto, incorrido na prática de qualquer nulidade processual. Improcedendo assim este fundamento recursivo.
O processo está isento de custas, nos termos do art.º 4º, n.º 2, al. b) do RCP.
V – Decisão: Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, em conceder provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar a decisão recorrida e determinar a baixa dos autos para aí prosseguirem os seus termos, com a notificação ao R. para apresentar contestação.
Sem custas. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido quanto à conclusão tirada no acórdão quanto à existência de erro de julgamento acerca da não verificação dos pressupostos da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias. O meio processual previsto no artigo 109.º do CPTA tem por escopo garantir uma tutela jurisdicional efectiva e célere quando estão em causa direitos, liberdades e garantias fundamentais, de natureza pessoal, ou de direitos de natureza análoga (na medida em que o regime dos direitos liberdades e garantias também se aplica aos direitos fundamentais de natureza análoga, como decorre do artigo 17.º da CRP) e justifica-se quando seja necessária a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa que se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, desse direito, liberdade ou garantia, ou direito de natureza análoga, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar (cfr. i.a., o ac. deste TCAS de 4.03.2021, proc. 1419/20.6BELSB, por nós relatado). Tratando-se de um meio processual urgente e principal, o legislador delimitou-o para um elenco de situações mais ou menos restrito. Ou seja, estão em causa situações que exigem um especial amparo jurisdicional, por não se mostrar adequada, por impossibilidade ou insuficiência, a protecção jurídica que os demais meios urgentes conferem. Ora, salvo o devido respeito pela tese que logrou vencimento, não entendo que o caso concreto exija a emissão urgente de uma decisão de fundo. A tutela do direito reivindicado mostra-se possível de efectivar, e de modo suficiente, pelo decretamento provisório de uma providência cautelar (antecipatória). Está em causa o direito à frequência de um curso em Estabelecimento de Ensino Superior, por via da criação de vaga supranumerária para o ano lectivo de 2021-2022. Do meu ponto de vista, analisada a situação dos autos e o alegado pelo Recorrente, este sempre poderá frequentar o curso por via de uma admissão provisória (como sucede em tantos processos cautelares com situações idênticas), tanto mais que nem o ano lectivo se iniciará no imediato (só em Setembro/Outubro), nem o curso tem uma duração temporal tão curta que inviabilize a tutela instrumental. O que equivale a dizer que não se verifica a exigida urgência numa célere decisão de fundo a que alude o art. 109.º, n.º 1, do CPTA; nem imprescindibilidade da tutela do direito, uma vez que se mostra possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar. Não se verificando a situação de especial urgência subjacente à necessidade da referida intimação, ónus de demonstração que impende sobre o requerente da intimação, falta um seu pressuposto de admissibilidade o que, de acordo com o artigo 110.º-A, n.º 1, do CPTA, impõe ao tribunal que convite o autor a substituir o pedido, para o efeito de requerer a adopção de providência cautelar, seguindo-se, se a petição for substituída, os termos do processo cautelar. Sucede que no caso presente não vem sequer demonstrado o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, desde logo porque a fase de candidaturas ainda nem sequer se iniciou. E por esse motivo também não há periculum, como decidido em 1.ª instância. Logo, não há necessidade de promover a convolação (o que constituiria uma acto inútil no processo), como avaliado no tribunal a quo. Pelo que negaria provimento ao recurso e confirmaria a sentença recorrida.
Pedro Marchão Marques
Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº10-A/2020, de 13.03, a Relatora atesta que a Primeira Juíza Desembargadora Adjunta tem voto de conformidade e que o Segundo Juiz Desembargador Adjunto ficou vencido, nos termos da declaração que antecede. __________________ |