Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:172/25.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:11/13/2025
Relator:ISABEL VAZ FERNANDES
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
PRESCRIÇÃO
CONTAGEM
CITAÇÃO
INTERRUPÇÃO
Sumário:A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do artigo 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do artigo 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do artigo 327.º do CC).
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO

.... , melhor identificada nos autos, veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 28 de abril de 2025, que julgou improcedente, por não provada, a Reclamação, por si intentada, dos despachos proferidos pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, de 20 de janeiro de 2025 e 21 de janeiro de 2025, que indeferiram o pedido de reconhecimento da prescrição nos processos de execução fiscal n.º 1481201101002384 e apensos, n.º 1481201101019929 e apensos, n.º 1481201401062255 e apensos, n.º 1481201401075144 e apensos, inicialmente instaurados contra a sociedade «.... , Lda.», e que contra si reverteram, na qualidade de responsável subsidiário, para cobrança de dívidas provenientes de IVA dos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, , IRC e IUC dos anos de 2010 e 2011, IUC dos anos de 2012, 2013 e 2014, IRC dos anos de 2012 e 2013, no valor total de € 23.872,26 e, consequentemente, manteve os actos reclamados, com as demais consequências legais.
O presente recurso foi remetido ao Supremo Tribunal Administrativo que, em 15 de Setembro de 2025, proferiu Decisão Sumária, no qual se julgou hierarquicamente incompetente, determinando a remessa dos autos para a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul.


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A Recorrente, nas suas alegações de recurso, formulou as seguintes conclusões:
«A. O presente recurso jurisdicional foi interposto da sentença que julgou improcedente a Reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276.º do CPPT, visando o reconhecimento da prescrição das dívidas tributárias exequendas nos processos de execução fiscal n.ºs 1481201101002384, 1481201101019929, 1481201401062255 e 1481201401075144, num total de €23.872,26.

B. A sentença recorrida fundou-se na tese de que a citação da executada constitui facto interruptivo da prescrição com efeito duradouro, por aplicação do artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil, prolongando esse efeito até à prolação de decisão que ponha termo ao processo executivo.

C. Tal entendimento enferma de erro de julgamento de direito, por violar frontalmente o regime legal previsto na Lei Geral Tributária (LGT) e por contrariar princípios constitucionais fundamentais.

D. A questão jurídica central do presente recurso consiste na apreciação da natureza do efeito interruptivo da citação no processo tributário: se ele é de natureza duradoura, como no processo civil, ou se se trata de uma interrupção meramente instantânea.

E. Nos termos do artigo 48.º, n.º 1, da LGT, as dívidas tributárias prescrevem no prazo de oito anos, salvo o disposto em lei especial.

F. O artigo 49.º, n.º 1, da LGT determina que a prescrição é interrompida por determinados atos, entre eles a citação, mas não estabelece qualquer regra quanto à sua duração.

G. Por seu turno, o artigo 49.º, n.º 4, alínea b), da LGT identifica expressamente os atos que suspendem a prescrição e as condições específicas para que tal efeito ocorra, não incluindo a citação entre eles.

H. O legislador, assim, separou nitidamente os efeitos jurídicos da interrupção e da suspensão da prescrição, tendo limitado os efeitos suspensivos às situações em que há reclamação, impugnação, recurso ou oposição com efeito suspensivo da cobrança.

I. A citação, como ato eminentemente administrativo, não se confunde com qualquer das figuras processuais aí previstas, nem determina, por si só, a suspensão da cobrança coerciva.

J. A aplicação do artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil à execução fiscal configura, portanto, uma aplicação analógica indevida de norma excecional, própria do direito civil e do processo declarativo, à execução fiscal, matéria regida por legislação própria e especial.

K. A LGT consagra um regime autónomo e taxativo da prescrição, excluindo a aplicação subsidiária ou analógica de normas civis fora dos casos expressamente admitidos.

L. Acresce que a prescrição tributária constitui uma garantia do contribuinte, sendo regida por normas de natureza imperativa e vinculadas ao princípio constitucional da legalidade fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 2, da CRP e no artigo 8.º da LGT.

M. A aplicação do artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil sem base expressa na LGT configura, por isso, violação dos princípios constitucionais da legalidade, da certeza e segurança jurídicas, da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efetiva.

N. A citação no processo de execução fiscal é um ato administrativo, da exclusiva responsabilidade da Administração Tributária, e não um ato judicial inserido num processo jurisdicional, como exige o preceito civil em análise.

O. O efeito interruptivo da prescrição decorrente da citação é, pois, meramente instantâneo, produzindo-se no momento em que é praticado e reiniciando-se o prazo legal de prescrição imediatamente após o ato.

P. Inexistindo nova causa interruptiva ou suspensiva válida posterior à citação — como ocorre no caso concreto — deve entender-se consumado o novo prazo de prescrição de oito anos contado desde essa data.

Q. Tal interpretação é corroborada pela doutrina, nomeadamente por Jesuíno Alcântara Martins e José Costa Alves, que sublinham que “é juridicamente erróneo aplicar cegamente o artigo 327.º do Código Civil à execução fiscal”, bem como por Américo Brás Carlos, que afirma que “a interrupção da prescrição não pode operar com efeito duradouro no processo tributário”.

R. Também a jurisprudência administrativa e fiscal já admitiu o caráter restrito da interrupção, como decorre do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 11.03.2008 (Proc. n.º 01347/03), que afasta a aplicação do artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil à execução fiscal.

S. O Supremo Tribunal Administrativo, em múltiplos arestos (exs.: de 24.03.1999 e 15.01.2003), reconheceu que o prazo de prescrição se reinicia após a prática do ato interruptivo e decorre normalmente, salvo causa legal de suspensão.

T. A sentença recorrida viola, pois, o direito tributário, civil e constitucional, ao sustentar uma interpretação que confere à AT um poder discricionário de impedir indefinidamente a prescrição, bastando-lhe manter inativos os autos para que a dívida nunca prescreva.

U. Tal solução esvazia o próprio regime de prescrição, conduz a uma situação de direito eterno de cobrança e compromete a proteção da confiança e segurança jurídicas dos contribuintes.


V. A interpretação da sentença recorrida está, por isso, ferida de inconstitucionalidade, por violação dos princípios do Estado de Direito (art. 2.º CRP); Acesso ao direito e tutela efetiva (art. 20.º CRP); Legalidade fiscal (art. 103.º CRP); e da Administração Pública (art. 266.º CRP).

W. Paralelamente, tal interpretação também se mostra desconforme com os princípios fundamentais do Direito da União Europeia, designadamente os princípios da segurança jurídica, da tutela judicial efetiva e da proteção da confiança legítima, consagrados no artigo 6.º, n.º 3 do TUE, nos artigos 41.º, 47.º e 52.º da CDFUE, e reconhecidos pela jurisprudência consolidada do TJUE.

X. É, pois, obrigação dos tribunais nacionais, enquanto órgãos da administração da justiça da União, assegurar a conformidade da interpretação e aplicação do direito interno com os princípios fundamentais do direito da União Europeia.

Y. Deve, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, reconhecendo-se a prescrição das dívidas exequendas nos processos referidos.

Z. Conclui-se que, à luz da LGT e da Constituição, a interrupção da prescrição pela citação tem efeito apenas instantâneo, sendo inexigível ao contribuinte o pagamento de dívidas fiscais cujo prazo de prescrição já se encontra há muito ultrapassado.


Nestes termos e nos melhores de direito que V/Exas. doutamente suprirão, deverá ser revogada a decisão do Tribunal “a quo” e, em consequência, ser substituída por outra que reconheça a prescrição das dívidas tributárias nos processos de execução fiscal n.ºs 1481201101002384, 1481201101019929, 1481201401062255 e 1481201401075144 e seus apensos, nos termos dos artigos 48.º e 49.º da Lei Geral Tributária, anulando o Despacho do Diretor do Serviço de Finanças da Azambuja, que indeferiu os pedidos de reconhecimento da prescrição das dívidas da aqui Recorrente.

Com o que se fará costumada JUSTIÇA!»


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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O DMMP junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«Com relevância para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos:

1. Em 16-03-2011, foi pelo Serviço de Finanças de Azambuja instaurado contra a sociedade «.... , Lda.», o processo de execução fiscal n.º 1481201101002384, para cobrança de dívida proveniente de IVA do ano de 2010, no valor de € 2.934,88 (cfr. processo de execução fiscal – PEF – apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

2. Ao processo de execução fiscal identificado no número antecedente foram apensados os seguintes processos de execução fiscal

(cfr. PEF apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

3. Em 30-11-2011, foi pelo Serviço de Finanças de Azambuja instaurado contra a sociedade «.... , Lda.», o processo de execução fiscal n.º 1481201101019929, para cobrança de dívida proveniente de IRC do ano de 2010, no valor de € 1.909,99 (cfr. PEF apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

4. Ao processo de execução fiscal identificado no número antecedente foram apensados os seguintes processos de execução fiscal

(cfr. PEF apenso a fls. 69 a 114 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

5. Em 27-06-2014, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, despacho a determinar a reversão, contra a Reclamante, do processo de execução fiscal n.º 1481201101002384 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

6. Em 27-06-2014, foi emitida em nome da Reclamante, citação para o processo de processo de execução fiscal n.º 1481201101002384 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

7. Em 27-06-2014, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, despacho a determinar a reversão, contra a Reclamante, do processo de execução fiscal n.º 1481201101019929 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 69 a 114 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

8. Em 27-06-2014, foi emitida em nome da Reclamante, citação para o processo de processo de execução fiscal n.º 1481201101019929 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 69 a 114 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

9. Em 30-06-2014 foi assinado o aviso de recepção que acompanhava o documento de citação para o processo de processo de execução fiscal n.º 1481201101002384 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 197 a 276 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

10. Em 30-06-2014 foi assinado o aviso de recepção que acompanhava o documento de citação para o processo de processo de execução fiscal n.º 1481201101019929 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 69 a 114 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

11. Em 07-07-2014, foi pelo Serviço de Finanças de Azambuja instaurado contra a sociedade «.... , Lda.», o processo de execução fiscal n.º 1481201401062255, para cobrança de dívida proveniente de IUC do ano de 2008, no valor de € 28,00 (cfr. PEF apenso a fls. 115 a 194 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

12. Ao processo de execução fiscal identificado no número antecedente foram apensados os seguintes processos de execução fiscal




(cfr. PEF apenso a fls. 115 a 194 dos autos, cujo teor se dá por integralmente


reproduzido);

13. Em 23-07-2014, foi pelo Serviço de Finanças de Azambuja instaurado contra a sociedade «.... , Lda.», o processo de execução fiscal n.º 1481201401075144, para cobrança de dívida proveniente de IRC do ano de 2012, no valor de € 3.340,89 (cfr. PEF apenso a fls. 37 a 68 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

14. Ao processo de execução fiscal identificado no número antecedente foi apensado o processo de execução fiscal n.º 1481201501027581, instaurado contra a sociedade «.... , Lda.» para cobrança de dívida proveniente de IRC do ano de 2013, no valor de € 3.340,89 (cfr. PEF apenso a fls. 37 a 68 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

15. Em 21-09-2015, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, despacho a determinar a reversão, contra a Reclamante, do processo de execução fiscal n.º 1481201401075144 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 37 a 68 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

16. Em 21-09-2015, foi emitida em nome da Reclamante, citação para o processo de processo de execução fiscal n.º 1481201401075144 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 37 a 68 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

17. Em 21-09-2015, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, despacho a determinar a reversão, contra a Reclamante, do processo de execução fiscal n.º 1481201401062255 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 115 a 194 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

18. Em 21-09-2015, foi emitida em nome da Reclamante, citação para o processo de processo de processo de execução fiscal n.º 1481201401062255 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 115 a 194 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

19. Em 25-09-2015 foi assinado o aviso de recepção que acompanhava o documento de citação processo de processo de execução fiscal n.º 1481201401075144 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 37 a 68 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

20. Em 25-09-2015 foi assinado o aviso de recepção que acompanhava o documento de citação processo de processo de execução fiscal n.º 1481201401062255 e apensos (cfr. PEF apenso a fls. 115 a 194 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

21. Em 20-01-2025 e 21-01-2025 foram elaboradas informações pelo Serviço de Finanças de Azambuja a propor o indeferimento do requerimento apresentado pelo Reclamante com vista ao reconhecimento da prescrição das dívidas em cobrança nos processos de execução fiscal n.º 1481201101002384 e apensos, n.º 1481201101019929 e apensos, n.º 1481201401062255 e apensos, n.º 1481201401075144 e apensos (cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial a fls. 4 a 36 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

22. Em 20-01-2025 e 21-01-2025 foram proferidos pelo Chefe do Serviço de Finanças de Azambuja, despachos concordantes com as informações identificadas no número antecedente a indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas formulado pelo Reclamante (cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial a fls. 4 a 36 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

23. A presente Reclamação, proveniente do Serviço de Finanças de Azambuja, deu entrada neste Tribunal em 07-02-2025 (cfr. fls. 4 a 36 dos autos);»


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Factos não provados

«Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.»

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Motivação da decisão de facto

«A convicção do Tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nas informações oficiais e documentos constantes dos autos juntos pelas partes bem como do processo de execução fiscal apenso, não impugnados, bem como na posição assumida pelas partes, conforme indicado em cada número do probatório, tudo de acordo com o princípio da livre apreciação da prova.»


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- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto do recurso que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta que está em causa saber se o Tribunal a quo errou no seu julgamento ao julgar improcedente a reclamação em virtude de considerar que a citação interrompe a contagem do prazo prescricional, com carácter duradouro.

Invoca a Recorrente a ocorrência de erro de julgamento de direito por violação da LGT e por contrariar diversos princípios constitucionais.

A sentença recorrida entendeu o seguinte:

“(…) concluir que as dívidas exequendas não se encontram prescritas, considerando aquele que tem constituído o entendimento pacífico, reiterado e uniforme da jurisprudência nesta matéria, a qual atribui à citação um efeito interruptivo duradouro do prazo de prescrição, nos termos do artigo 49.º n.º 1 da LGT e artigo 326.º do Código Civil.

Com efeito, encontra-se firmemente consolidada jurisprudência superior, emanada do Supremo Tribunal Administrativo, no sentido de atribuir efeitos duradouros ao facto interruptivo resultante da citação em processo de execução fiscal.(…)”

Adiante-se que o recurso não merece provimento, já que a sentença recorrida seguiu a orientação da jurisprudência, firmada, dos tribunais superiores quanto a esta matéria.

Evitando repetições, diremos que a sentença recorrida enquadrou o regime legal aplicável, citou abundante jurisprudência que fundamenta a posição acolhida e decidiu de acordo com o entendimento acolhido, há muito, pelo STA, relativamente à matéria da prescrição.

Reiteramos o entendimento vertido na decisão recorrida e invocamos o Acórdão do STA, de 16/02/2022, proferido no âmbito do processo nº 1208/21.0BEBRBRG, onde se escreveu o seguinte:

“(…) Sobre a questão decidenda neste apelo, importa consignar que a jurisprudência do STA, há muito, defende, esmagadoramente, que nos casos onde “o prazo de prescrição foi interrompido pela citação, a cessação da eficácia do facto interruptivo é diferida para a data da decisão que ponha termo ao processo, sem prejuízo de dever equiparar-se a essa decisão aquela que declare a execução fiscal em falhas” ou, noutra formulação, “a interrupção decorrente da citação do executado inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar” (ver, acórdão, do STA, de 2 de setembro de 2020 (705/19.2BELLE), com vasta indicação doutrinal e jurisprudencial; disponível em www.dgsi.pt).

Em razão desta última, podemos, pois, assentar que a citação, enquanto causa interruptiva do instituto da prescrição, transversal a todo o tipo de dívidas (civis, tributárias – art. 49.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) - e equiparadas…), detém e opera com um duplo efeito; instantâneo (interrompe, no sentido de que faz parar a contagem e inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente) e, por outro lado, duradouro (não deixa começar a correr novo prazo de prescrição até ao termo do processo, v.g., em que decorra a cobrança coerciva da dívida).

Posto isto, conferido que, in casu, a sentença recorrida apreciou e decidiu (concluindo pela não prescrição), a matéria da, invocada, prescrição de dívida (exequenda), cujo pagamento é exigido ao, aqui, rte, em conformidade com a coligida jurisprudência, só podemos acolher o respetivo julgamento, tanto mais, como, igualmente, se justificou e assumiu, no supra identificado aresto, que o reconhecimento do, dito, efeito duradouro da citação “não viola os princípios constitucionais da legalidade, da certeza e da segurança jurídicas nem as garantias dos contribuintes” (Cf., ainda, acórdãos do Tribunal Constitucional (TC) de 26 de setembro de 2012 (890/2011), de 7 de janeiro de 2014 (905/2012) e de 12 de fevereiro de 2015 (179/2013)..)(…)”

Veja-se, ainda, por elucidativo, o Acórdão, também do STA, de 23/03/2022, proferido no âmbito do processo nº 506/21.8BEVIS, do qual nos permitimos extrair o seguinte:

“(…) A questão suscitada consiste em saber se a Sentença fez correto julgamento quando entendeu não prescritas as dívidas exequendas, o que passa por indagar da legalidade e conformidade constitucional da interpretação nela adotada, a qual atribuiu à interrupção da prescrição decorrente da citação (cfr. art. 49º, nº 1 da LGT) – para além do efeito dito instantâneo (decorrente do disposto no art. 326º do C.C.) – o efeito duradouro (previsto no nº1 do art. 327º do C.C.) de obstar a que o novo prazo prescricional (re)comece a correr até ao termo do processo de execução fiscal.

Salvo o devido respeito por diversa posição, afigura-se-nos não caber aqui razão à Recorrente.
Com efeito, é referido no sumário do Acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 26.05.02021 – Proc. nº 0518/20.9BELLE, que aqui, com a devida vénia, transcrevemos:
«I - O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor. O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P. Tributário).
II - Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C.Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil.

III - Com estes pressupostos, é legal a aplicação do regime consagrado no artº.327, nº.1, do C.Civil (normativo aplicável "ex vi" do artº.2, al.d), da L.G.T.), face ao acto interruptivo que se consubstancia na citação em processo de execução fiscal, o qual ostenta um efeito duradouro derivado do novo prazo de prescrição não começar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, sendo que no processo de execução fiscal também a declaração em falhas, prevista no artº.272, do C.P.P.T., se deve equiparar à dita decisão que põe termo ao processo.»

Considera assim o Supremo Tribunal Administrativo que, na aplicação do disposto no art. 49º da LGT, há lugar à aplicação subsidiária do regime previsto nos arts. 326º, nº 1, e 327, nº 1, ambos do C.C., para fixação dos efeitos dos factos interruptivos, entendimento este sufragado na doutrina pelo ilustre Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, que defende o duplo efeito dos atos interruptivos: um efeito instantâneo, que determina a inutilização para a prescrição do prazo decorrido até à sua verificação – art. 326º, nº 1 do C.C., e um efeito suspensivo, que determina que o novo prazo só começa a correr após a decisão que puser termo ao processo – art. 327º, nº 1, do C.C.

Pela clareza de exposição, permitimo-nos transcrever ainda o sumário do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo datado de 13.01.2021 – Proc. nº 02496/19.8BEBRG:
«A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC). »(…)”

Relativamente à constitucionalidade do entendimento supra exposto, refere o Acórdão do STA de 13/01/2021, proferido no processo nº 2496/19.8BEBRG, o seguinte:

“(…) Ademais, a referida jurisprudência, quanto à constitucionalidade da interpretação nela adoptada, tem merecido o conforto do Tribunal Constitucional (Vide os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional:

- acórdão n.º 441/2012, proferido em 26 de Setembro de 2012 no processo com o n.º 890/2011, disponível em

http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20120441.html;
- acórdão n.º 6/2014, proferido 7 de Janeiro de 2014 no processo com o n.º 905/2012, disponível em

http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20140006.html;
- acórdão n.º 122/2015, proferido 12 de Fevereiro de 2015 no processo com o n.º 179/2013, disponível em

http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20150122.html.).(...)”

Considerando o que foi dito, resta concluir que nenhum reparo há a fazer à sentença recorrida, sendo de negar provimento ao recurso.


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III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 13 de Novembro de 2025

(Isabel Vaz Fernandes)

(Lurdes Toscano)

(Luísa Soares)