Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:973/10.5 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2024
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:IRS
SEGURO DE VIDA
PRÉMIO PAGO PELA ENTIDADE PATRONAL
RESGATE ANTECIPADO
Sumário: O resgate antecipado do prémio de seguro de vida constituído pela entidade patronal a favor dos seus trabalhadores é sujeito a tributação em sede de IRS, na categoria A, ainda que os beneficiários à data do resgate reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem já nessa situação, nos termos do ponto 3, da alínea b), do n.º 3, do artigo 2.º do CIRS.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais: Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO

1. A FAZENDA PÚBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, proferida em 18/05/2023, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por R......., contra o indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra o deferimento parcial da reclamação graciosa que teve por objeto a retenção na fonte de IRS, referente ao ano de 2006, no montante de € 34.565,89, efetuada aquando do pagamento pela seguradora G....... do montante previsto no contrato de seguro existente entre a G....... e a TAP (entidade patronal do impugnante, ora recorrido)

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I) Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pelo ora impugnante, devidamente identificado nos autos, contra o indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra o deferimento parcial da reclamação graciosa que teve por objeto a retenção na fonte de IRS, referente ao ano de 2006, no montante de € 34.565,89, efetuada aquando do pagamento pela seguradora G....... do montante previsto no contrato de seguro existente entre a G....... e a TAP (entidade patronal do impugnante).

II) A questão a analisar nos presentes autos consiste em saber se a retenção na fonte, em sede de IRS, efetuada pela seguradora G....... Seguros de Vida SA aquando do resgate de capital por parte do Impugnante se revela em conformidade com o artigo 2.º, n.º 3, alínea b), do CIRS, ou, se pelo contrário, não se inclui no âmbito de aplicação desta disposição.

III) O Mmo. Juiz a quo na douta sentença recorrida entendeu que “podemos afirmar que tendo o impugnante efetuado o resgate do fundo aos 60 anos de idade, na data em passou à reforma, não ocorreu qualquer antecipação de recebimento do mesmo, motivo pelo que as importâncias recebidas não são enquadráveis, no exposto na subalínea 3) da alínea b) do n.º 3 do art.2º do CIRS.

IV) Ora, não pode a Recorrente, Fazenda Pública, com o devido respeito, concordar com tal segmento decisório, face à interpretação da lei aplicável ao caso em apreço.

V) Como emerge do ponto 7 do probatório: “Em 17.08.2006 a empresa seguradora “G....... SA.,” emitiu em nome do impugnante, ao abrigo do contrato de seguro, dois documentos intitulados “Quitação de Resgate”, no montante total de €139.272,87 e retenção na fonte da Categoria “A” €34.565,89 e Categoria “E” €2.307,55, cfr. doc. fls. 13 e 14 do Processo de Reclamação Graciosa”.

VI) Importa assim apreciar se se verificam os pressupostos que determinam a aplicação do artigo 2.º, do CIRS, na componente que aqui releva, à data do facto tributário, ou seja em 17 de agosto de 2006.

VII) Preceituava o artigo 2.º, n.º 3, alínea b), do CIRS “Rendimentos da categoria A” (na redação à data dos factos) que se consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente as remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica, designadamente: “3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo ‘Vida’, contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado;”

VIII) Da norma transcrita extrai-se que são objeto de tributação os rendimentos que decorram de importâncias despendidas pela entidade patronal com seguros e operações do ramo ‘Vida’, que não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos beneficiários, sejam por estes recebidas, ainda que já tenham passado à situação de reforma.

IX) A parte final da subalínea 3) é especialmente incisiva, quando comina que esses rendimentos são tributados “em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado” (sublinhado nosso).

X) Este segmento tem uma implicação imediata, a antecipação da disponibilidade do capital não constitui a condição determinante para a tributação ou não destes rendimentos.

XI) O trecho final da norma prescreve que a tributação incide sobre esses rendimentos “em qualquer caso, de recebimento de capital”.

XII) Ora, o Impugnante recebeu o capital, em 17 de agosto de 2006, pelo que esses rendimentos estão sujeitos a tributação, em sede de IRS.

XIII) A este respeito, o Supremo Tribunal Administrativo já decidiu que “Nos termos do ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS (na redacção vigente ao tempo), as importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição a favor dos seus trabalhadores de seguros de vida, se estes forem objecto de resgate antecipado pelos beneficiários são considerados rendimentos do trabalho dependente sujeitos a tributação (categoria A) ainda que os beneficiários, à datado resgate antecipado, reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem, efectivamente, nessa situação.” (acórdão, de 13 de dezembro de 2017, processo n.º 0303/17).

XIV) No caso dos autos, está evidenciado que, na data do pagamento, o tomador de seguro era a TAP, entidade patronal do Impugnante, que este efetuou o resgaste do seguro de vida, que se traduziu num recebimento em capital, que não constituía um seu direito adquirido e individualizado, independentemente de estarem reunidos os requisitos aplicáveis para passar à situação de reforma ou mesmo de já estar reformado.

XV) A ser assim, como resulta dos factos provados, conclui-se que estão preenchidos os requisitos que convocam a aplicação do normativo transcrito e que determinam a sujeição a tributação, em sede de IRS, dos montantes recebidos pelo Impugnante e que a entidade pagadora, nos termos legais, deduziu a título de retenção na fonte.

XVI) Face ao supra exposto, pugna a Fazenda Pública pelo entendimento de que o ato tributário ora impugnado se deve manter na ordem jurídica, porquanto não enferma da ilegalidade que lhe assacou a douta sentença recorrida, afigurando-se que a atuação da Administração Tributária foi conforme à lei.

XVII) Conclui a Fazenda Pública que o Tribunal a quo errou no seu julgamento de facto e direito, enfermando a sentença de uma errónea apreciação dos factos relevantes para a decisão e de uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas excelências suprirão, e atento aos fundamentos expostos, deve o presente Recurso ser dado como procedente, e em consequência ser revogada a decisão recorrida e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente

3. O Recorrido, R......., apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

«a) A Recorrente apresenta um corpo alegatório composto por 22 artigos e depois abrilhanta tal articulado com 17 conclusões, o que viola de forma grosseira o artigo 639º do CPC.

b) Pelo que o recurso, nos termos em que foi apresentado, deve ser rejeitado.

c) Como se alcança do probatório fixado, que a Recorrente não coloca em causa pelo que nem sequer pode ser alvo de alteração nesta sede recursória, o Recorrido efectuou o resgate da parte que lhe cabia no fundo após perfazer 60 anos de idade, e era nessa idade que o podia fazer por passar à reforma (ponto 1.3 dos Princípios subjacentes à Apólice), pelo que tendo-o o feito nesse momento temporal fê-lo sem que tenha ocorrido qualquer antecipação.

d) Antecipação ocorreria se o tivesse feito aos 556, 57, 58 ou 59 anos de idade, o que aquele não fez como se encontra documentalmente provado nos autos.

e) Para que ocorresse tributação era condição sine qua non que houvesse uma antecipação no resgate em relação à data prevista no contrato de seguro e contra isto nem se adverse com o segmento do referido preceito do CIRS que assim reza:

«ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.»

f) Pois que a norma em causa tem a seguinte redacção:

«3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.»

g) O preceito, embora de leitura difícil, permite identificar duas situações matriz, a saber:

I) A de direitos adquiridos e individualizados;

II) A de não existência de direitos adquiridos e individualizados mas em que existe resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade.

h) A acrescer a estes dois segmentos surge, efectivamente, o trecho que refere:

«ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.»

i) Sucede que este trecho complementa os dois segmentos anteriores sendo tal o que resulta da expressão «em qualquer caso», querendo isto dizer que o mesmo não é autónomo como que valendo de per se.

j) Não, o referido trecho legislativo só admite a seguinte interpretação/leitura:

I) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários e em que haja recebimento de capital;

II) Não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade e em que haja recebimento de capital.

k) Ou seja, o recebimento do capital tem de, cumulativamente, articular-se com qualquer uma das duas situações atrás referidas e assim sendo, como inegavelmente o é, tem SEMPRE de se ver se esse recebimento se reporta ou não a uma situação de direitos adquiridos e individualizados ou a uma situação em que não existem direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários.

l) Facilmente se conclui que a situação não é de direitos adquiridos e individualizados do beneficiário, pelo que em I)) supra referida fica excluída, mas para se aplicar a hipótese referida em II) supra teria que existir SEMPRE uma antecipação do recebimento uma vez que o preceito legal refere:

«sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade

m) Sendo assim evidente de concluir que o resgate só seria passível de cair sob a alçada da norma de incidência se houvesse uma antecipação do recebimento em relação à data prevista no contrato e não foi isso que se passou, pois, o ora Recorrido só recebeu na data prevista no contrato pelo que embora tendo ocorrido resgate não foi com antecipação em relação à data prevista.

n) Pelo que não se está, efectivamente, perante a ocorrência de facto tributário como correctamente o entendeu a Douta Sentença ora sob escrutínio e como também o entendeu Douta Sentença, já transitada em julgado há longo tempo, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 28/06/2021, tirada no Processo nº 1368/11.3 BELRA.

o) O Recorrido não ignora que existe o Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo a que a Recorrente se procura agarrar de forma quase que desesperada, mas cumpre compaginar o Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, em que a Recorrente se alcandora, com o probatório fixado.

p) De acordo com o probatório fixado o Recorrido efectuou o resgate após atingir os 60 anos de idade, que era a idade da reforma e aquela pela qual optou para obter o recebimento e só se tivesse sido dado como provado uma antecipação do recebimento para antes dos 60 anos de idade é que se poderia considerar aplicável a doutrina que emana do Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, pois que no mesmo se escreveu:

«Foi o que sucedeu no caso sub judice: sendo certo que o resgate do capital se deu antes de o ora recorrente ter 65 anos – que era a idade estabelecida nas condições particulares do contrato de seguro como data de vencimento do certificado individual de cada pessoa segura –, não releva, para os pretendidos efeitos fiscais, que o resgate tenha ocorrido nas condições permitidas pelo contrato de seguro nem que o tomador do seguro estivesse já reformado. A lei considera que, nessas circunstâncias, porque houve antecipação da sua disponibilidade, o montante recebido pelo resgate do seu certificado individual de seguro fica sujeito a tributação em IRS, categoria A.»

q) Mais se acrescentando;

«Nos termos do ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS (na redacção vigente ao tempo), as importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição a favor dos seus trabalhadores de seguros de vida, se estes forem objecto de resgate antecipado pelos beneficiários são considerados rendimentos do trabalho dependente sujeitos a tributação (categoria A) ainda que os beneficiários, à data do resgate antecipado, reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem, efectivamente, nessa situação.»

r) Pelo que, e bem ao contrário do entendimento da Recorrente, a correcta leitura do Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, só faria sentido e o tornaria aplicável se do probatório fixado constasse o que dele na realidade não consta, mas não só não consta como o que consta é diverso sendo tal o de que o resgate feito foi após o Recorrido atingir os 60 anos de idade.

s) Ou seja, só se estivesse provada uma antecipação no recebimento em relação à data prevista, que bem ao contrário do decidido não está, é que o raciocínio da Recorrente seria passível de sustentação, pois que de outro modo não a é.

t) O Recorrido havia junto aos autos, na fase de alegações, diversas decisões da AT no sentido do por si propugnado, decisões essas que foram alvo de atenção e detalhada apreciação pela Douta Sentença.

u) Tais decisões administrativas são de suma relevância, isto uma vez que à Administração impõe-se o tratamento igual de situações iguais, não sendo aceitável que, em relação à mesma e exacta situação, o Porto e Lisboa decidam de uma maneira e nos Açores ou na Madeira se decida de outra.

v) Pois a tal obsta o princípio da igualdade com consagração constitucional como já se decidiu em Tribunal Superior, na boa Jurisprudência supra citada no corpo alegatório, e a melhor Doutrina, também supra citada.

Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o recurso ser declarado improcedente mantendo-se na ordem jurídica a Douta Sentença recorrida, tudo o mais com as consequências legais.»

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador – Geral Adjunto, foi apresentado parecer no sentido da improcedência do recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e de direito ao concluir que as retenções na fonte efectuadas sobre o montante do resgaste referente à categoria “A” são ilegais, por não se verificar a antecipação da disponibilidade, do resgate, adiantamento, remição ou recebimento do capital, pressuposto da incidência tributária, em sede de IRS (catg. A).

A título prévio cumpre apreciar a questão suscitada pelo Recorrido, consubstanciada em saber se a Recorrente cumpriu o ónus de alegar e de formular conclusões, nos termos do artigo 639.º do CPC.


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III – QUESTÃO PRÉVIA

O Recorrido nas alíneas a) e b) das contra-alegações invoca que a Fazenda Pública se limita em sede de Conclusões a reproduzir, quase na integralidade, a alegação por si anteriormente aduzida, violando de forma grosseira o artigo 639.º do CPC, devendo o recurso ser, nos termos em que foi apresentado, rejeitado.

Vejamos.

Conforme resulta dos autos a Recorrente alegou e formulou conclusões ordenadas numericamente, num total de XVII.

Lidas as conclusões, supra transcritas, constata-se que se mostram formuladas de forma clara e sintética e que respeitam as especificações a que alude o n.º 2, do artigo 639.º do CPC.

Assim, não se vislumbra fundamento legal que justifique a rejeição imediata do recurso, nem deficiências para formular convite ao aperfeiçoamento das conclusões (artigo 639.º, n.º 3 do CPC), visto que também não são complexas.

Termos em que improcede a questão prévia de rejeição do recurso formulada pelo Recorrido.


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IV - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«1. Em 31.07.1996 o Conselho de Administração da TAP - AIR Portugal, remeteu ao Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil uma proposta de protocolo sobre as condições de trabalho, cujo ponto 4. Refere o seguinte:

«(…) A respeito do projetado fundo de pensões (alíneas b), c) e d) do v/memorando):

a) A partir do momento em que a TAP assegure diretamente a compensação inerente à obrigatoriedade de cessação da atividade profissional aos 60 anos (e a tal está disposta em termos e condições altamente favoráveis para os pilotos) a apólice de reforma colectiva n.º 425.229-R....... perde toda a razão de subsistir, impondo-se a sua revogação, sob pena de duplicação injustificada de encargos. (…)»

(Cf. Doc. fls. 7 do Processo de reclamação graciosa)

2. A Companhia de Seguros «G.......» apresentou ao “SPAC - Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil” de que o impugnante é associado, um produto denominado por «G....... – VIE» que se consubstanciava num Plano de Benefícios de Reforma dos Pilotos com as seguintes Condições Particulares:

«(…)


“(texto integral no original; imagem)”

(Cf. Doc. de fls. 322 do SITAF)

3. Os Princípios subjacentes à Apólice denominada por «Reforma Coletiva GAM – RECOG.......» n.º…….29 da TAP Air Portugal têm o seguinte teor:

«(…)


“(texto integral no original; imagem)”


“(texto integral no original; imagem)”

(Cf. Doc. fls. 322 do SITAF)

4. As condições Gerais do Seguro de Vida - G........, cujo teor se dá por reproduzido referem, no que para a situação dos autos interessa, no artigo 1º - Definições 1.1 – Para efeitos do presente contrato considera-se:

(…)

f) DATA DE VENCIMENTO DO CERTIFICADO INDIVIDUAL – 1.º dias do trimestre civil seguinte ao da data em que a Pessoal Segura atinge os 60 ou 65 anos, consoante opção efetuada na data de adesão ao contrato. (…), Cf. Doc. fls. 322 do SITAF;

5. No documento da proposta, a “TAP AIR Portugal” refere nos pontos 5 e 6, em relação à alteração das clausulas do Acordo de Empresa que:

«(…) 5.3. O contrato de trabalho cessa quando o piloto atinge 60 anos de idade, tendo o mesmo direito a uma indemnização correspondente a um mês e meio de remuneração base (conforme definida na clausula 28.ª n.º 3) por cada ano ou fracção de antiguidade de serviço, até ao limite de 18 remunerações de base.

5.4. A indemnização estabelecida no número anterior não será devida se a TAP e o piloto acordarem por escrito na continuação deste serviço para além dos 60 anos, no exercício de funções compatíveis.

5. O disposto neste artigo não prejudica os direitos do piloto em relação aos seguros previstos na cláusula 44.ª

(…)

6. Por força do disposto no ponto 5., precedente, é revogada a Apólice de Reforma colectiva, n.º …….29 – R......., referida no ponto 3. Da Acta de 30.12.1993, citada na clausula 44.ª (…) »

(Cf. Doc. fls. 9 a 12 do Processo de reclamação graciosa)

6. O impugnante nasceu em 17.08.1946 e, em 17.07.2006, completou 60 anos de idade, Cf. Doc. de fls. 294 do SITAF;

7. Em 17.08.2006 a empresa seguradora “G....... SA.,” emitiu em nome do impugnante, ao abrigo do contrato de seguro, dois documentos intitulados “Quitação de Resgate”, no montante total de €139.272,87 e retenção na fonte da Categoria “A” €34.565,89 e Categoria “E” €2.307,55, cfr. doc. fls. 13 e 14 do Processo de Reclamação Graciosa;

8. Em 28.09.2006, o impugnante deu entrada no Serviço de Finanças de Mafra de Reclamação Graciosa, invocando o art.133º, n.º 2 e art.70º do CPPT, relativa às retenções na fonte efetuadas referentes à categoria “E”, no montante de €2.307,55 e referente à categoria “A” no montante de €34.565,89, Cf. Doc. fls. 2 a 6 do Processo de Reclamação Graciosa;

9. Pela saída geral n.º 047248 de 14.09.98, a Direção de Serviços de IRS/D.C procedeu à informação sobre o Resgate de Prémios de Seguros de Vida cujo teor se dá por reproduzido, Cf. fls. 15 do Processo de Reclamação Graciosa;

10. Em 10.10.2008 foi proferido projeto de despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa que, após exercício do direito de audição prévia em 12.12.2008, se tornou definitivo e notificado ao impugnante em 22.12.2008, conforme assinatura do aviso de receção, com a anulação da retenção na fonte referente à Categoria “E”, no montante de €2.307,55, Cf. fls. 49, 55 do Processo de Reclamação Graciosa;

11. Em 05.01.2009 foi efetuada a ficha de controlo para emissão de reembolso manual, no montante de €2.307,55, cfr. fls. 49 do Processo de Reclamação Graciosa;

12. Em 16.01.2009 o impugnante deu entrada no Serviço de Finanças de Mafra de Recurso Hierárquico da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa, cujos fundamentos se dão por reproduzidos, tendo o mesmo sido indeferido por despacho de 25.11.2009, cfr. fls. 4 e 9 do Processo de Recurso Hierárquico;

13. Em 13.01.2010 o impugnante foi notificado do indeferimento do recurso hierárquico, Cf. fls. 22 do Processo de Recurso Hierárquico;

14. Em 13.04.2010, o impugnante deu entrada no tribunal tributário de Lisboa da petição inicial da presente impugnação judicial, Cf. fls. 1 do SITAF;

III.I – Factos não Provados.

Não se provaram outros factos com relevância para a presente decisão.

Motivação.

A matéria de facto, dada como assente nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, está referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram.»


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2. ADITAMENTO OFICIOSO À MATÉRIA DE FACTO

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, importa para melhor densificar os factos dados como provados aditar ainda ao probatório a seguinte matéria que igualmente se encontra provada:

15. No artigo 2.º (“Objecto do contrato”) das condições gerais do contrato de Seguro de Vida referido no ponto 4. supra, estipula-se que: «O presente contrato tem por objecto garantir: - Se a pessoa segura for viva na data do seu certificado individual, o pagamento do complemento de reforma; - Em caso de falecimento da pessoa segura antes da data de vencimento do seu certificado individual, o pagamento imediato do valor da poupança constituída, inscrita na sua conta à data do falecimento» (cfr. fls. 326 e segs. do SITAF).

16. No artigo 12.º (“Opção na data de vencimento do contrato), ponto 12.2. (“Opção de capital”), do contrato referido em 4. Supra, estipula-se que: «Na data de vencimento do certificado individual, a pessoa segura tem a faculdade de renunciar ao recebimento do complemento de reforma, podendo optar por receber o montante da poupança constituída até essa data» (cfr. fls. 326 e segs. do SITAF).

17. No artigo 17.º (“Resgate”) do contrato referido em 4. Supra, estabelece-se o seguinte: «Desde que o prémio referente ao 1.º ano esteja pago, o tomador do seguro tem o direito de pedir, a qualquer momento, e até à data do vencimento do certificado individual (data do início do complemento de reforma), o pagamento por parte da companhia do valor de resgate, sendo este igual ao montante da poupança constituída e inscrita na conta da pessoa segura» (cfr. fls. 326 e segs. do SITAF).

18. A Introdução dos Princípios subjacentes à Apólice, referidos no ponto 3 supra, tem o seguinte teor: «O presente documento explicita os objectivos subjacentes à Apólice de “REFORMA COLECTIVA G.......-R....... n.º ……….29 cujo cumprimento deverá sempre obedecer ao disposto nas Condições Gerais e Particulares da referida Apólice.

O seu conteúdo reproduz o Plano de Benefícios de Reforma dos Pilotos, em vigor na Empresa, e estabelece as bases de cálculo e a metodologia utilizada para o seu financiamento.» (cfr.fls. 328 do SITAF).

19. Nos anos subsequentes a 2006, o Recorrido passou a auferir rendimentos da categoria H (cfr. fls. 44 do processo administrativo.


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3. DE DIREITO

Está em causa a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pelo aqui Recorrido contra o indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra o deferimento parcial da reclamação graciosa que teve por objeto a retenção na fonte de IRS (categoria A), referente ao ano de 2006, no montante de € 34.565,89, efetuada aquando do pagamento do resgate de prémio de Seguro de Vida pela Seguradora G......., do montante previsto no contrato de seguro existente entre a referida Seguradora e a TAP (entidade patronal do impugnante, ora recorrido)

A Recorrente discorda da decisão da primeira instância, alegando, em suma, que o Tribunal a quo errou no julgamento por errada apreciação dos factos relevantes para a decisão e de direito, por se verificam os pressupostos que determinam a aplicação do artigo 2.º do CIRS, na data do facto tributário, ou seja, 17/08/2006.

Mais invoca que na data do pagamento, o tomador do seguro era a TAP, entidade patronal do Impugnante, que este efectuou o resgate do seguro de vida que se traduziu num recebimento em capital, que não constituía um seu direito adquirido e individualizado, independentemente de estarem reunidos os requisitos aplicáveis para passar à situação de reforma ou mesmo de já estar reformado, estando preenchidos os requisitos que convocam a aplicação do artigo 2.º, n.º 3, alínea b), ponto 3, do CIRS e que determinam a sujeição a tributação, em sede de IRS, dos montantes recebidos pelo Impugnante e que a entidade pagadora, nos termos legais, deduziu a título de retenção na fonte.

O Recorrido sustenta o sentido decisório da sentença alegando, em síntese, que efectuou o resgate após atingir os 60 anos de idade, que era a idade da reforma, e que só se se tivesse provado uma antecipação do recebimento para antes dos 60 anos de idade é que se poderia considerar aplicável a doutrina do Acórdão do STA

A sentença recorrida, convocou a título de exemplo os acórdãos do TCAS de 25/11/2021, prolatado no processo n.º 237/18.6BELRS e de 09/07/2020, prolatado no processo n.º 896/07.5BELRS, e para julgar procedente a impugnação ponderou o seguinte:

(…) Em face do teor dos citados arestos verificamos que a situação em apreço é, em tudo, idêntica às que ali foram julgadas. Nomeadamente, que o impugnante efetuou o resgate da parte que lhe cabia no aludido fundo quando completou 60 anos de idade, idade da sua reforma.

De facto, mostra-se hialino que se o seguro em causa foi constituído pela entidade patronal para evitar que os pilotos ficassem, desde os 60 anos até aos 65 anos, sem poder trabalhar e apenas a receber o seu vencimento, quando completassem 60 anos – data em que atingem a idade para refroma, pudessem efetuar o resgate da parte que cabia a cada beneficiário sem que se verificasse qualquer antecipação do seu recebimento.

Neste conspecto, mostra-se destituído de qualquer sentido que os pilotos estivessem a aguardar completar 65 anos, sem receber vencimento e efetuar o resgate, quando o podiam fazer de imediato quando atingida a idade de reforma aos 60 anos.

Tal situação apenas seria compreensível, conforme prevê as condições gerais do contrato, se o piloto ficasse no exercício de funções compatíveis de acordo com a entidade patronal, o que não foi o caso dos autos.

Nestas circunstancias, podemos afirmar que tendo o impugnante efetuado o resgate do fundo aos 60 anos de idade, na data em passou à reforma, não ocorreu qualquer antecipação de recebimento do mesmo, motivo pelo que as importâncias recebidas não são enquadráveis, no exposto na subalínea 3) da alínea b) do n.º 3 do art.2º do CIRS.

Vejamos, então.

A questão a apreciar é a de saber se o montante recebido pelo Impugnante da seguradora está sujeito a tributação em sede de IRS, na categoria A, sob a alçada do disposto no artigo 2.º, n.º 3, alínea b), n.º 3 do CIRS.

Para apreciar as questões suscitadas importa ter presente, designadamente, os seguintes factos que se extraem do probatório:

a) Na data da constituição do seguro o segurado era a SPAC-Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (cfr. ponto 2 do probatório).

b) O Plano de Benefícios dos Pilotos, “reforma colectiva G......., n.º …..29”, obedece ao disposto nas Condições Gerais e Particulares da referida Apólice (cfr. ponto 18 do probatório).

c) Posteriormente à constituição do seguro, a TAP (entidade patronal) assumiu-se como segurada (cfr. documentos de fls. 13 e 14 do procedimento de reclamação graciosa).

d) Nos termos do ponto 1 das Condições Particulares da Apólice n.º …..29 o Certificado Individual vence no 1º dia do trimestre civil seguinte ao da data em que cada pessoa segura atinge os 65 anos (cfr. ponto 2 do probatório).

e) A Idade normal de Reforma dos Pilotos é 60 anos (cfr. ponto 3 do probatório).

f) Nas condições Gerais do Seguro de Vida-G........R......., ficou consignado nas “Definições” que se considera para efeitos do referido contrato de seguro como data do vencimento do certificado individual, o 1.º dia do trimestre civil seguinte ao da data em que a pessoa Segura atinge os 60 anos ou 65, consoante opção efectuada na data de adesão ao contrato (cfr. ponto 4 do probatório).

g) Desde que o prémio referente ao 1.º ano esteja pago, o tomador do seguro tem o direito de pedir, a qualquer momento, e até à data do vencimento do certificado individual (data do início do complemento de reforma), o pagamento por parte da companhia do valor de resgate (cfr. ponto 17 do probatório).

h) O Impugnante completou 60 anos de idade em 17/07/2006 (cfr. ponto 6 do probatório).

i) O resgate total do certificado individual do prémio de seguro de vida foi solicitado em 17/08/2006, em conformidade com o artigo 17.º das Condições Gerais da Apólice, tendo sido objecto, na mesma data, de retenção na fonte pela Companhia de Seguros nos termos do ponto 3, da alínea b), do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS (cfr. ponto 7 do probatórios e docs. 13 e 14 do procedimento de reclamação graciosa).

Importa, então, apurar se da factualidade dada como provada se pode retirar que não se verificou o resgate antecipado do prédio de seguro de vida em causa.

Diga-se, desde já, antecipando o sentido decisório, que a razão está do lado da Recorrente.

A sentença alinhou pelo mesmo diapasão vertido nos citados acórdãos deste TCAS, que por sua vez seguiu jurisprudência do STA, entendimento que perfilhamos (cfr. acs. do STA de 11/10/2017, processo n.º 195/16 e de 13/12/2017, processo n.º 0303/17, e, acs. do TCAS de 09/07/2020, processo 896/07 e de 25/11/2021, processo n.º 237/18, todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

Sintetizamos, desde já, o entendimento vertido nos aludidos acórdãos, que sufragamos, da seguinte forma: O resgate antecipado do prémio de seguro de vida constituído pela entidade patronal a favor dos seus trabalhadores é sujeito a tributação em sede de IRS, na categoria A, ainda que os beneficiários à data do resgate reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem já nessa situação, nos termos do ponto 3, da alínea b), do n.º 3, do artigo 2.º do CIRS.

Todavia, a sentença recorrida não decidiu no mesmo sentido dos identificados acórdãos, julgando procedente a impugnação, no entendimento que a importância recebida a título de resgaste do seguro de vida pelo Impugnante, não é enquadrável no ponto 3, da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, uma vez que não ocorreu a antecipação da disponibilidade do resgate no caso presente.

Para, assim, concluir, o Tribunal a quo, na análise fáctico-jurídica, entendeu que o Impugnante na data de adesão, ao seguro em causa, efectuou a opção de resgate do mesmo quando completasse 60 anos, data em que atingia a idade da reforma e, retira, esta conclusão do ponto 3 do probatório, concretamente, do ponto 1.3 do documento - «Reforma Colectiva G.......-R.......» n.º ……29 da TAP Air Portugal.

O referido ponto 1.3 tem o seguinte teor: «1.3 – IDADE NORMAL DE REFORMA // A idade Normal de Reforma é 60 anos.»

Do teor do aludido ponto só se pode retirar o que do mesmo consta – a idade normal da reforma dos pilotos é aos 60 anos -, não permitindo afirmar, com base no mesmo, que o impugnante efectuou a opção de resgate aos 60 anos.

Na verdade, nos autos não resultou provado que o Impugnante tenha feito, na data de adesão ao contrato, a opção de resgate quando completasse 60 anos (cfr. ponto 4 do probatório).

Aliás, o Recorrido não alega na petição inicial que fez a opção de resgate quando completasse os 60 anos (e por maioria de razão também não juntou qualquer documento comprovativo dessa opção), mas tão só que resulta do contrato que o recebimento era para ser colhido nessa idade e «se a resgatou aos 60 anos era essa a idade em que efectivamente o podia resgatar sem que houvesse uma antecipação de qualquer recebimento.» (cfr. ponto 85 e 86 da p.i.).

Com efeito, a leitura da petição inicial em confronto com a factualidade apurada nos autos lança uma natural interrogação sobre a forma como o Tribunal procedeu à apreciação da matéria de facto dada como provada, na medida em que não resulta do probatório que o impugnante na data da adesão tenha feito opção de resgate.

Nos termos do disposto no disposto no artigo 5.º n.ºs 1 e 2, do CPC, o juiz só pode fundar a sua decisão nos factos alegados pelas partes, sendo que esta regra vale também no direito processual tributário, como decorre dos artigos 99.º n.º 1 da LGT e 13.º n.º 1, parte final, do CPPT.

Todavia, o Recorrido teve oportunidade de juntar aos autos todos os documentos para prova dos factos alegados, relativos ao Seguro dos autos, na sequência da Decisão Sumária deste TCAS proferida em 08/07/2022 pela presente Relatora, que recaiu sobre o recurso interposto da primeira sentença proferida nos autos, que determinou a baixa dos autos ao Tribunal a quo para diligenciar pela correcta instrução dos autos a fim de se conhecer das questões suscitadas

No entanto, embora o Impugnante tenha sido notificado para juntar aos autos cópia do contrato do seguro em causa e prova documental relativa ao resgate, não apresentou qualquer documento comprovativo de opção de resgate na data de adesão do contrato.

Resulta do probatório que o resgate do prémio de seguro foi efectuado de conformidade com o artigo 17.º das Condições Gerais da Apólice correspondente ao Certificado Individual do Recorrido (cfr. ponto 17 do probatório).

O que significa que tem de concluir-se, ao contrário do que fez a decisão recorrida, no sentido que o ora Recorrido não fez prova de que na data de adesão ao contrato de seguro de vida em causa, efectuou a opção de resgate do mesmo quando completasse 60 anos de idade.

Assim sendo, e não resultando provado que o Recorrido efectuou a opção na data de adesão ao contrato quando atingisse os 60 anos, terá de se considerar o que foi estipulado nas condições particulares quanto à data do vencimento do certificado individual, ou seja, o primeiro dia do trimestre civil seguinte ao da data em que cada pessoa segura atinge os 65 anos (cfr. ponto 2 do probatório).

Nesta conformidade, e de acordo com o que resulta do probatório, o Impugnante completou 60 anos em 17/07/2006 e solicitou o resgate total do prémio de seguro de vida em 17/08/2006 (cfr. pontos 6 e 7 do probatório).

Aqui chegados, não há dúvidas que o Acórdão do STA de 11/10/2017, prolatado no processo n.º 0195/16, tem plena aplicação ao caso dos autos, pois, foi apreciada a mesma questão relativamente a um trabalhador (piloto) da TAP, com as mesmas funções do Recorrido, que procedeu ao resgate do prémio do contrato de seguro em causa, em análogas condições, no mesmo ano (2006) e sendo os factos alegados e dados como provados idênticos.

Assim, em função da semelhança em relação ao caso em apreço e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil), acolhemos a argumentação jurídica constante do identificado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, e por as questões aqui em análise não deferirem, permitindo-nos transcrever as passagens relevantes, cujo entendimento perfilhamos:

«2.2.2.1 O conceito de rendimento adoptado pelo nosso CIRS – tendencialmente, rendimento-acréscimo (Cfr., desenvolvidamente, JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO, IRS: incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág. 39 e segs. ) – e a regra geral de incidência sobre os rendimentos do trabalho dependente, designadamente o n.º 2 do art. 1.º do Código, levam a que não existam dúvidas de que ficam incluídas no âmbito da aplicação do imposto sobre rendimentos do trabalho dependente todas as vantagens acessórias postas à disposição do trabalhador (fringe benefits), quer em dinheiro quer em espécie.
Estas vantagens acessórias, na definição do corpo da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS, são «
todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica». Nas diversas alíneas da mesma norma, o legislador ensaiou a construção de uma lista, não exaustiva, de remunerações acessórias do trabalho dependente passíveis de tributação em IRS.

Entre essas alíneas, encontramos, no ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS, numa formulação de manifestamente difícil interpretação, «[a]s importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado».

2.2.2.2 Como deixámos já dito, é em torno da interpretação desta norma que se joga a sorte do presente recurso.

Na verdade, enquanto no acórdão recorrido o Tribunal Central Administrativo Sul confirmou a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou que a AT fez correcta interpretação do preceito, no sentido que está sujeito a tributação em IRS o montante recebido pelo ora Recorrente da seguradora, este sustenta que o mesmo não se inclui no âmbito da norma de incidência real e está mesmo expressamente dele afastado, por não ter havido antecipação alguma da disponibilidade do capital, que apenas foi recebido na data em que atingiu as condições previstas no contrato.
No caso não se discute que o montante em causa foi recebido no âmbito de um contrato de seguro em que figura como segurada a entidade patronal do ora Recorrente, que foi quem pagou os prémios do seguro.

Ficou também provado que se trata de um seguro de grupo, que prevê que no caso de a pessoa segura ser viva na data do vencimento do seu certificado individual, que no caso foi estipulado que seria no 1.º dia do trimestre seguinte à data em que a pessoa segura atinge os 65 anos, a seguradora pague um complemento de reforma, podendo no entanto o tomador renunciar aos recebimentos do complemento de reforma e optar por receber o montante da poupança constituída até essa data.

De igual modo, está assente que, nos termos do contrato, o tomador do seguro, desde que o prémio referente ao 1.º ano esteja pago, pode pedir «a qualquer momento, e até à data do vencimento do certificado individual (data do início do complemento de reforma), o pagamento por parte da companhia do valor de resgate, sendo este igual ao montante da poupança constituída e inscrita na conta da pessoa segura».

A questão é a de saber se o montante recebido pelo ora Recorrente da seguradora em 2006 está sujeito a tributação em IRS, categoria A, como considerou a AT, num entendimento que foi sancionado pelas instâncias.

O Recorrente sustenta que a única possibilidade de o montante em causa por ele recebido da seguradora poder ficar sujeito a tributação em IRS, recaindo no âmbito da norma de incidência real do ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS, seria o de ter havido qualquer antecipação do recebimento relativamente à data prevista no contrato de seguro, antecipação que não ocorreu pois que o resgate ocorreu na data prevista no contrato.

2.2.2.3 Regressemos à interpretação do ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS, em ordem a indagar da sua aplicação ao caso sub judice.
No caso não se discute que as importâncias despendidas pela entidade patronal não constituem “direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários”. Mas, como salienta JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO, cujos ensinamentos passaremos a seguir de perto, quando não transcrevermos, «[a]
lei, todavia, manda que também incida IRS da categoria A sobre aquelas importâncias sempre que, posto que os produtos financeiros em causa ainda não tenham originado direitos adquiridos e individualizados dos beneficiários, estes procedam à antecipação da sua disponibilidade, através de resgate, adiantamento, remição, ou recebimento do capital, mesmo que isso se verifique quando os beneficiários já tenham reunido os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou que esta se tenha verificado» (Op. cit., pág. 75.).

Ou seja, como concluiu também o Procurador-Geral Adjunto no parecer que transcrevemos em 1.5, em caso de resgate antecipado a sujeição a IRS subsiste, ainda que os beneficiários preencham, nessa data, os requisitos legais exigidos para a passagem à situação de reforma ou se encontrem, efectivamente, em situação de reforma.

Foi o que sucedeu no caso sub judice: sendo certo que o resgate do capital se deu antes de o ora Recorrente ter 65 anos – que era a idade estabelecida nas condições particulares do contrato de seguro como data de vencimento do certificado individual de cada pessoa segura –, não releva, para os pretendidos efeitos fiscais, que o resgate tenha ocorrido nas condições permitidas pelo contrato de seguro nem que o tomador do seguro estivesse já reformado. A lei considera que, nessas circunstâncias, porque houve antecipação da sua disponibilidade, o montante recebido pelo resgate do seu certificado individual de seguro fica sujeito a tributação em IRS, categoria A.» (disponível em www.dgsi.pt/).

A jurisprudência que vimos de citar evidencia proficiente argumentação, de facto e de direito, que se acompanha e que se acolhe como discurso fundamentador no presente recurso, daí que, na procedência das alegações da Recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida por enfermar do erro de julgamento que lhe vinha apontado.


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Conclusões/Sumário:

I. O resgate antecipado do prémio de seguro de vida constituído pela entidade patronal a favor dos seus trabalhadores é sujeito a tributação em sede de IRS, na categoria A, ainda que os beneficiários à data do resgate reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem já nessa situação, nos termos do ponto 3, da alínea b), do n.º 3, do artigo 2.º do CIRS.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Subsecção Comum de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, em consequência, julgar improcedente a impugnação.

Custas pelo Recorrido em ambas as instâncias.

Notifique.

Lisboa, 11 de Janeiro de 2024



Maria Cardoso – Relatora
Luísa Soares – 1.ª Adjunta
Vital Lopes – 2.º Adjunto

(assinaturas digitais)