Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | AFONSO HENRIQUE | ||
Descritores: | TRANSAÇÃO SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA TRÂNSITO EM JULGADO CASO JULGADO MATERIAL CASO JULGADO FORMAL NULIDADE ANULABILIDADE | ||
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Data do Acordão: | 12/12/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | Transitada a sentença homologatória da transacção realizada nos autos com a consequente extinção da instância, está esgotado o poder jurisdicional do Tribunal, sem prejuízo da sua declaração de nulidade ou anulação, ou ainda de revisão da sentença com esse fundamento, nos termos do artº 291º nº 2 do CPC. | ||
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Decisão Texto Integral: |
ACORDAM NESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (2ª SECÇÃO) A) PARTRAN, S.G.P.S., S.A. MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL GROUP, S.A. e MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL (PORTUGAL), S.G.P.S., S.A. intentaram, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra NOVO BANCO, S.A. e CALM EAGLE HOLDINGS, S.À.R.L. PEDINDO: «Pelo exposto, o Tribunal deve: I. Como pedido principal: a) Declarar a nulidade do contrato de penhor constante da Cláusula 16.ª (CLÁUSULA DE PENHOR) do contrato celebrado pelo Banco Espírito Santo, S.A., pela Autora ESFG e pela Autora Partran, datado de 2-7-2014 (o CONTRATO); b) Subsidiariamente face ao pedido formulado em a), anular o contrato de penhor constante da Cláusula 16.ª (CLÁUSULA DE PENHOR); c) Subsidiariamente face aos pedidos formulados em a) e b), declarar a ineficácia do contrato de penhor constante da Cláusula 16.ª (CLÁUSULA DE PENHOR); II. Subsidiariamente face aos pedidos I.a), I.b) ou I.c): d) Declarar a nulidade do contrato celebrado pelo Banco Espírito Santo, S.A., pela Autora ESFG e pela Autora Partran, datado de 2-7-2014 (CONTRATO); e) Subsidiariamente face ao pedido formulado em d), anular o CONTRATO; f) Subsidiariamente face aos pedidos formulados em d) e e), declarar a ineficácia do CONTRATO; III. Em cumulação com todos os pedidos anteriores: g) Declarar a nulidade do contrato celebrado no dia 12-9-2014, pelo Réu Novo Banco e pela Ré Calm Eagle, através do qual foram transmitidas as acções da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. (CONTRATO DE EXECUÇÃO DO PENHOR); h) Subsidiariamente face ao pedido formulado em g), declarar a ineficácia do CONTRATO DE EXECUÇÃO DO PENHOR; IV. Em cumulação com todos os pedidos anteriores: i) Condenar os Réus Novo Banco e Calm Eagle na restituição à Autora Partran das acções da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.; j) Determinar o cancelamento do registo de aquisição das acções da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. a favor da Ré Calm Eagle; k) Determinar a reconstituição do registo de aquisição das acções da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. a favor da Autora Partran, sem a oneração do penhor; V. Também em cumulação com todos os pedidos anteriores: l) Condenar o Réu Novo Banco no pagamento à Autora Partran da diferença entre o preço de venda das acções da ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, S.G.P.S., S.A. pelo Banco Espírito Santo, S.A. à Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. – 29,7 milhões de Euros – e o valor efectivo das mesmas à data da venda, a liquidar em momento posterior; VI. Em cumulação com os pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e) ou II.f) e subsidiariamente face aos pedidos III.g), III.h), IV.i), IV.j), IV.k) e V.l): m) Condenar o Réu Novo Banco e a Ré Calm Eagle no pagamento à Autora Partran do valor correspondente às acções da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A., a liquidar em momento posterior; VII. Em cumulação com os pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e) ou II.f), subsidiariamente face aos pedidos III.g), III.h), IV.i), IV.j), IV.k) e V.l) e em cumulação com o pedido VI.m): n) Condenar o Réu Novo Banco no pagamento à Autora Partran da diferença entre o preço de venda das acções da ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, S.G.P.S., S.A. pelo Banco Espírito Santo, S.A. à Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. – 29,7 milhões de Euros – e o valor efectivamente imputado a estas acções no preço do Contrato de Execução do Penhor, a liquidar em momento posterior; VIII. Subsidiariamente face a todos os pedidos: o) Condenar o Réu Novo Banco no pagamento à Autora Partran de uma indemnização, pela violação dos deveres de diligência e de lealdade na execução do Contrato de Penhor, a liquidar em momento posterior; IX. Subsidiariamente face aos pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e), II.f), III.g), III.h), IV.i), IV.j), IV.k), V.l), VI.m) e VII.n) e em cumulação com o pedido VIII.o): p) Condenar o Réu Novo Banco no pagamento à Autora Partran da diferença entre o preço de venda das acções da ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, S.G.P.S., S.A. pelo Banco Espírito Santo, S.A. à Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. – 29,7 milhões de Euros – e o valor efectivamente imputado a estas acções no preço do Contrato de Execução do Penhor, a liquidar em momento posterior.» B) TRANSACÇÃO «MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL GROUP, S.A., MASSA INSOLVENTE DA PARTRAN, S.G.P.S., S.A., Autoras, e NOVO BANCO, S.A. e CALM EAGLE, S.À.R.L., Rés nos autos acima identificados, pretendendo pôr termo ao presente litígio, vêm, ao abrigo do disposto nos artigos 283º, nº 2 e 290.º n.º 1 do C.P.C., apresentar Transação, o que fazem nos termos seguintes: 1. As Partes chegaram a um acordo global que permitirá pôr termo ao processo sub judice, conforme resulta também do Plano de Insolvência da PARTRAN, S.G.P.S., S.A., cuja sentença de homologação foi já proferida no âmbito do processo n.º 7796/15.3..., pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Comércio de ... – J7 e, bem assim, aos apensos C e D do referido processo nº 7796/15.3... 2. Em execução do acordo e Plano de Insolvência referidos em 1 anterior: a. As Autoras desistem integralmente da totalidade dos pedidos formulados nestes autos contra as Rés, reconhecendo, para todos os devidos e legais efeitos; i. que o penhor sobre as ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. dado em garantia das obrigações da Espírito Santo Financial Group, S.A. foi válida e eficazmente constituído pela Partran, S.G.P.S., S.A., não padecendo de qualquer invalidade, nulidade ou ineficácia, mormente das alegadas na Petição Inicial que deu origem aos presentes autos; ii. que a venda das ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. pelo Novo Banco, S.A. à Calm Eagle, S.A.R.L.. constitui igualmente um negócio inteiramente válido e eficaz e, tanto quanto puderam apurar, juntamente com as subsequentes operações de redução e aumento de capital, foi essencial para o restabelecimento da solvência daquela empresa e da continuação da sua atividade seguradora, conforme exigência do Instituto de Seguros de Portugal; iii. que, de acordo com o que puderam apurar, o preço de venda das ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. pago pela Calm Eagle, S.à.R.L. ao Novo Banco, S.A., refletiu o valor de mercado das referidas ações a essa data e no contexto referido em ii.; iv. e que, tanto quanto têm conhecimento, a execução do referido penhor, por via da venda referida em ii. e iii., liquidou a totalidade das obrigações contraídas pela Espírito Santo Financial Group, S.A. perante o Novo Banco, S.A. emergentes do financiamento que lhe foi concedido, no montante de € 48.545.109,17; b. As Autoras desistem ainda, especificamente e expressamente, do recurso interposto do Despacho com a ref. CITIUS nº .......82, de 22-10-20, que julgou inadmissível a retificação/ampliação do pedido inicialmente formulado para passar a abranger as ações da Seguradoras Unidas, S.A., e que se encontra pendente no Apenso C dos presentes autos; c. A Ré Calm Eagle, S.A.R.L. desiste do pedido de litigância de má-fé formulado contra as Autoras; d. As Rés aceitam, solidariamente, pagar à Autora Partran S.G.P.S., S.A. – obrigação que se encontra também prevista no Plano de Insolvência da PARTRAN – o montante de EUR 4.000.000,00 (quatro milhões de euros), o qual será devido e pago no prazo de 5 (cinco) dias úteis após o trânsito em julgado da homologação da presente transação ou da homologação da transação apresentada no âmbito do referido apenso C do processo nº 7796/15.3..., consoante o trânsito em julgado que ocorrer em último lugar; e. As Rés aceitam, solidariamente, pagar à Autora Massa Insolvente da Espírito Santo Financial Group, S.A. o montante de EUR 9.450.000,00 (nove milhões quatrocentos e cinquenta mil euros), o qual será devido e pago no prazo de 5 (cinco) dias úteis após o trânsito em julgado da homologação da presente transação ou da homologação da transação apresentada no âmbito do apenso C do processo nº 7796/15.3... que se encontra pendente no Tribunal da Comarca de Lisboa, Juízo de Comércio de ... – J7, consoante o trânsito em julgado que ocorrer em último lugar; f. Atento o momento em que a ação finda no que às partes signatárias respeita (sem que tenha sido iniciada a fase de instrução) e, bem assim, o montante absoluto de taxa de justiça remanescente absolutamente desfasado de qualquer utilidade económica, complexidade da lide ou efetivo labor jurisdicional a que poderia conduzir o seu cálculo sobre o atual valor da causa, requerem a Vossa Excelência a dispensa integral do remanescente da taxa de justiça, prescindindo as partes da reclamação recíproca de quaisquer custas de parte e procuradoria relativas a montantes já suportados; g. Caso, sem conceder, entenda Vossa Excelência não ser de dispensar, ou não ser de dispensar integralmente, a taxa de justiça remanescente, e atenta a desistência integral dos pedidos por parte das Autoras, as partes acordam que quaisquer eventuais custas sejam integralmente da responsabilidade das Autoras. 3. As Partes expressamente renunciam ao recurso da Sentença homologatória da presente transação nos seus precisos termos, não renunciando, contudo, ao recurso da decisão que venha a ser proferida quanto à dispensa de taxa de justiça remanescente e repartição de custas entre as partes.» C) DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DA TRANSACÇÃO, EXARADA EM 26-4-2022: «MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL GROUP, S.A., MASSA INSOLVENTE DA PARTRAN, S.G.P.S., S.A., Autoras, e NOVO BANCO, S.A. e CALM EAGLE, S.À.R.L., Rés nos presentes autos, vieram, nos termos do disposto no art.º 290º do Cód. Proc. Civil, juntar aos autos o acordo constante do requerimento que antecede. Tendo em conta a natureza disponível dos direitos objecto dos presentes autos e a qualidade dos subscritores do requerimento que antecede – mandatários com poderes especiais para transigir -, julga-se válida a transacção, a qual se homologa, condenando as partes a cumpri-la nos seus precisos termos, de acordo com o disposto nos arts.º 283º, nº 2, 284º, 289º, nº 1 e 290º do Cód. de Proc. Civil. Custas na forma acordada, que se considera justificada. Registe e notifique.» D) A MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL (PORTUGAL), S.G.P.S., S.A, arguir a sua nulidade daquela decisão homologatória, uma vez que não foi respeitados o prazo do contraditório, tendo o Tribunal de 1ª Instância ordenado que se aguardasse o decorrer do prazo contraditório e após sucessivos requerimentos das partes, proferiu o seguinte DESPACHO: MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL GROUP, S.A., MASSA INSOLVENTE DA PARTRAN, S.G.P.S., S.A., Autoras, e NOVO BANCO, S.A. e CALM EAGLE, S.À.R.L., Rés nos presentes autos, vieram, nos termos do disposto no art.º 290º do Cód. Proc. Civil, juntar aos autos um acordo que contempla uma transação quanto ao objecto dos presentes autos. Por decisão datada de 26/04/22, foi homologada a transação, por se ter considerado a mesma válida, tendo em conta a natureza disponível dos direitos objecto dos presentes autos e a qualidade dos subscritores do requerimento de transação – mandatários com poderes especiais para transigir -, tudo em conformidade com o disposto nos arts.º 283º, nº 2, 284º, 289º, nº 1 e 290º do Cód. de Proc. Civil. Sucede, porém, que a A. Massa Insolvente da Espírito Santo Financial (Portugal), S.G.P.S., S.A. não foi parte na transação e, uma vez notificada da mesma, veio dizer nos autos que não prescinde do prosseguimento da causa para fazer valer os seus direitos contra as RR., nos termos peticionados. Assim sendo, e uma vez que não existe qualquer razão que aponte para decisão diversa, decide-se manter a sentença homologatória de transação datada de 26/04/22, que aqui se renova, pelos fundamentos apontados, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos para apreciação dos pedidos formulados pela A. Massa Insolvente da Espírito Santo Financial (Portugal), S.G.P.S., S.A.. Notifique, sendo a A. Massa Insolvente da Espírito Santo Financial (Portugal), S.G.P.S., S.A. também para, em 10 dias, vir requerer o que tiver por conveniente quanto ao prosseguimento dos presentes autos.» E) «MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL (PORTUGAL), notificada daquele despacho veio requerer o prosseguimento dos autos, porquanto e em síntese: “- Como consta do processo, a Requerente era dona de 45% do capital social da PARTRAN e, em consequência, acionista indireta do capital da Tranquilidade em igual percentagem, pertencendo os 55% remanescentes à Autora Espírito Santo Financial Group. - À data da execução do penhor, aquela participação acionista indireta de 45% no capital da Tranquilidade era o único ativo da Requerente e, portanto, a única garantia dos seus credores. - Como também se encontra referido nos autos, a Requerente não foi “tida nem achada” na decisão de constituição do penhor. - O qual foi constituído sem que a Partran, dona das ações, tivesse recebido qualquer contrapartida ou benefício. - Já que o mesmo visou, pelo menos de forma formal, apenas e só garantir o cumprimento de obrigações que a outra acionista da Partran, a Espírito Santo Financial Group, SA, contraíra para com o BES. - Quando já era patente a sua incapacidade financeira para solver as suas dívidas, o que implicava uma elevadíssima probabilidade de o penhor vir a ser executado, como foi. - A execução do penhor pelo Novo Banco privou a Requerente do seu único bem, lançando-a em situação de insolvência com prejuízo total dos seus credores. - Conforme a Requerente alegou na resposta ao pedido de homologação, o seu interesse na relação material controvertida resulta da expectativa de que uma vez reinvestida a Partran na titularidade do seu património, mediante a restituição das ações do capital da Tranquilidade ou pelo pagamento do seu justo valor, ficaria a Requerente reconstituída no valor da sua participação acionista. - Ou que, em alternativa, caso a Partran fosse, entretanto, declarada insolvente, como veio a acontecer, que a satisfação do seu interesse seria obtida com a parte que lhe competisse na partilha do saldo remanescente da liquidação da massa insolvente. - Ou seja, a constituição do penhor e a sua subsequente execução foram a causa direta da sua insolvência e do tremendo prejuízo dos seus credores. - A Requerente tem, pois, interesse legítimo em que os autos prossigam para que o tribunal possa aferir da legalidade do penhor, bem como da procedência dos demais pedidos. - Por outro lado, está alegado nos autos que o justo valor da Tranquilidade à data em que as respetivas ações foram vendidas pelo Novo Banco à Ré Calm Eagle se situaria entre 500 e 600 milhões de euros. - Aliás, a Seguradora havia, poucos meses antes, sido sujeita a avaliação pela auditora PwC (PricewaterhouseCoopers) a pedido do Banco de Portugal, no âmbito do Exercício Transversal de Revisão das Imparidades às Carteiras de Crédito dos diversos bancos portugueses (ETRICC II), vulgo stress tests, que em relatório datado de 14-3-2014 concluiu que 700 milhões de euros era o valor razoável estimado de alienação da Tranquilidade (...). - Porém, o preço de venda acordado entre o Novo Banco e a Calm Eagle, conforme o contrato de compra e venda datado de 12 -9 do mesmo ano, foi, como consta dos autos, de apenas 25 milhões de euros. - O que só poderá ter ficado a dever-se, como alegado na p.i., a uma inaceitável negligência no cumprimento dos deveres legais do Novo Banco, que não apenas descurou o processo de venda, negociando apenas com um único interessado e ignorando manifestações de interesse de outras seguradoras internacionais, entre as quais a Zurich e a Liberty International, como tampouco se deu ao cuidado mínimo de apurar o valor do activo em venda. - Sendo, por isso, responsável pelo enorme prejuízo sofrido pela Requerente. - Tendo esta, portanto, e de igual modo interesse legítimo em que as condições do negócio da venda das ações da Tranquilidade e a actuação do Novo Banco nesse processo sejam apreciadas pelo tribunal, conforme pedido, pela utilidade que lhe poderá advir do resultado dessa avaliação. - A Requerente é, pois, parte legítima da relação material controvertida tal como esta foi configurada na petição inicial e, além disso, sujeito da relação jurídica processual pela utilidade que lhe advém da procedência da ação. - O facto de as outras Autoras declararem, no acordo dos autos, que desistem integralmente de todos os pedidos formulados na ação contra as Rés, é uma decisão própria destas, que apenas a elas respeita e que não pode limitar os direitos da Requerente. - A Requerente não perfilha, muito pelo contrário, nenhuma das declarações exoneratórias da responsabilidade das Rés produzidas no acordo pelas outras Autoras, declarações que, aliás, constituem contradição flagrante com o que as mesmas sempre haviam defendido na ação. - Entenderam fazê-lo, naturalmente, no pressuposto de que a posição de cada uma das Autoras na ação configura uma pluralidade de interesses autónomos que, sendo embora convergentes, poderão ser geridos material e processualmente de forma separada. - O que não podem é pretender que o acordo que celebraram ponha termo à relação processual entre a Requerente e a Rés, porque se assim fosse esse acordo seria inválido. - A Requerente mantém, assim, todos os pedidos constantes da petição inicial, não obstante ficarem as Rés exoneradas de qualquer responsabilidade para com as outras Autoras, por força do acordo celebrado. - Todavia, uma vez que os pedidos na ação passam a visar a satisfação apenas do direito da Requerente, qualquer reparação que o tribunal possa vir a julgar ser-lhe devida deverá ser feita diretamente a ela aliás, por igualdade de tratamento com o pagamento que é atribuído à Autora Massa Insolvente da Espírito Santo Financial Group, SA, no acordo dos autos. - Consequentemente, a Requerente procede à redução proporcional dos pedidos da ação, designadamente os constantes dos números V, VI, VII, VIII e IX do Título IV (Pedido) da petição inicial (fls.48 e 49), para 45% dos respetivos valores totais a apurar, por correspondência com a sua participação accionista no capital da Partran. - Todos os demais pedidos manter-se-ão inalterados. Subsidiariamente, caso se entenda diversamente do alegado em 31. supra, manter-se-ão os pedidos acima indicados pela sua totalidade, conforme consta da petição inicial. E se, porventura, prevalecer o entendimento de que a Requerente carece de legitimidade para formular os pedidos acima indicados, vem esta fazê-lo expressamente, ainda a título subsidiário, mediante o exercício da ação sub-rogatória prevista nos artigos 606.º e segs. do Código Civil, sub-rogando-se nos direitos da Partran. - A sub-rogação ora exercida é, portanto, essencial à satisfação do direito da Requerente a obter justa reparação pelo que considera serem os vícios da constituição do penhor sobre as ações do capital da Tranquilidade e da transação que lhe sucedeu, visto que não dispõe de nenhum outro meio que lhe permita satisfazer os direitos dos seus credores. - O direito de conteúdo patrimonial sobre a Partran que a Requerente invoca é aquele, já antes mencionado, de que uma vez reconstituída a situação patrimonial da massa insolvente daquela, através da restituição das ações objeto do penhor, ou do pagamento do seu justo valor, ficaria ela própria, através do rateio do re manescente da liquidação da referida massa, investida nos meios que lhe permitam solver as suas obrigações. - Estando este direito dependente do resultado da própria ação, torna-se evidente que não pode a Requerente aguardar pela sua verificação para acionar o direito de sub-rogação aqui exercido, sob pena de o mesmo não lhe poder ser reconhecido por a decisão da ação poder depender desse próprio exercício. E conclui assim: «Face ao exposto, deverá este Tribunal: A. Em substituição do pedido V da p.i.: Em cumulação com os pedidos I,II,III e IV da p.i. – l) – Condenar o Réu Novo Banco a pagar à aqui Autora o montante correspondente a 45% da diferença entre o preço de venda das ações da ESAF- Espírito Santo Ativos Financeiros, SGPS, SA pelo Banco Espírito Santo, SA, à Companhia de Seguros Tranquilidade, SA – 29,7 milhões de euros – e o valor efetivo das mesmas à data da venda, a liquidar em momento posterior; l)1 – Subsidiariamente, condenar as Rés nos exatos termos constantes da p.i. l)2 – Subsidiariamente, condenar as Rés no pagamento por força do direito, acima exercido, de sub-rogação dos direitos da Partran; B. Em substituição do pedido VI da p.i.: Em cumulação com os pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e) ou II.f) e subsidiariamente face aos pedidos III.g), III.h), IV.i), IV.j) IV.k) e V.l) da p.i.- m)- Condenar o Réu Novo Banco e a Ré Calm Eagle a pagar à aqui Autora o montante correspondente a 45% do valor das ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, SA, a liquidar em momento posterior; m)1 – Subsidiariamente, condenar as Rés nos exatos termos constantes da p.i. m)2 – Subsidiariamente, condenar as Rés no pagamento por força do direito, acima exercido, de sub-rogação dos direitos da Partran; C. Em substituição do pedido VII da p.i.: Em cumulação com os pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e) ou II.f) e subsidiariamente face aos pedidos III.g), III.h), IV.i), IV.j), IV.k) e V.l), e em cumulação com o pedido VI.m) todos da p.i.- n) – Condenar o Réu Novo Banco a pagar à aqui Autora o montante correspondente a 45% da diferença entre o preço de venda das ações da ESAF- Espírito Santo Ativos Financeiros, SGPS, SA pelo Banco Espírito Santo, SA, à Companhia de Seguros Tranquilidade, SA – 29,7 milhões de euros – e o valor efetivamente imputado a estas ações no preço do contrato de execução do penhor, a liquidar em momento posterior; n)1 – Subsidiariamente, condenar as Rés nos exactos termos constantes da p.i. n)2 – Subsidiariamente, condenar as Rés no pagamento por força do direito, acima exercido, de sub-rogação dos direitos da Partran; D. Em substituição do pedido VIII da p.i.: Subsidiariamente face a todos os pedidos – o) – Condenar o Réu Novo Banco a pagar à aqui Autora uma indemnização pela violação dos deveres de diligência e de lealdade na execução do contrato de penhor, na proporção de 45% dos danos daí resultantes, a liquidar em momento posterior; o)1 – Subsidiariamente, condenar as Rés nos exatos termos constantes da p.i. o)2 – Subsidiariamente, condenar as Rés no pagamento por força do direito, acima exercido, de sub-rogação dos direitos da Partran; E. Em substituição do pedido IX da p.i.: Subsidiariamente face aos pedidos I.a), I.b), I.c), II.d), II.e) ou II.f), III.g), III.h), IV.i), IV.j) IV.k) e V.l), VI.m) e VII.n) da p.i. – p) – Condenar o Réu Novo Banco a pagar à aqui Autora o montante correspondente a 45% da diferença entre o preço de venda das ações da ESAF- Espírito Santo Ativos Financeiros, SGPS, SA pelo Banco Espírito Santo, SA, à Companhia de Seguros Tranquilidade, SA – 29,7 milhões de euros – e o valor efetivamente imputado a estas ações no preço do contrato de execução do penhor, a liquidar em momento posterior; p)1 – Subsidiariamente, condenar as Rés nos exactos termos constantes da p.i. p)2 – Subsidiariamente, condenar as Rés no pagamento por força do direito, acima exercido, de sub-rogação dos direitos da Partran; F. Condenar as Rés em todos os demais pedidos constantes da p.i. nos precisos em que se encontram formulados. - Requer-se a citação da Partran para contestar, querendo, o direito de sub-rogação acima exercido (artº 608º CC).” F) APÓS RESPOSTAS DA 1ª A PARTRAN S.G.P.S. S.A. E DOS RR NOVO BANCO, S.A., E CALM EAGLE HOLDINGS, S.A.R.L - no sentido da improcedência do requerido prosseguimento dos autos – O TRIBUNAL DE 1ª INSTÂNCIA DECIDIU O SEGUINTE: «Da repercussão da transacção e sua homologação no prosseguimento da causa - req. apresentado pela 3ª Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A. em 27/06/2022: Por despacho de 06/06/2022 foi determinado o prosseguimento dos autos para apreciação dos pedidos formulados pela 3ª A Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A., mantendo-se a sentença homologatória da transacção celebrada pelas restantes AA e pelas RR na causa. Mediante requerimento em epígrafe, veio a 3ª Autora requerer o prosseguimento dos autos, a fim de que, em suma, o tribunal possa aferir da legalidade do penhor, bem como da procedência dos demais pedidos, alegando que era dona de 45% da 1ª Autora Partran e em consequência “acionista indirecta do capital da Tranquilidade”, e que a constituição do penhor e a sua execução foram a causa directa da sua insolvência. Refere que mantém todos os pedidos constantes da petição inicial, “não obstante ficarem as Rés exoneradas de qualquer responsabilidade para com as outras Autoras, por força do acordo celebrado”, procedendo à redução proporcional dos pedidos da acção, designadamente os constantes dos nºs V, VI, VII, VIII, e IX do seu pedido, “para 45% dos valores totais a apurar, por correspondência com a sua participação acionista no capital da Partran. Acrescenta que, subsidiariamente, mantém os pedidos na sua totalidade, mediante o exercício da acção sub-rogatória prevista nos arts. 606º e segs. do Cód. Civil, sub-rogando-se nos direitos da Partran. Refere que o pagamento de 4 milhões de euros aceite pela Partran no acordo dos autos em contrapartida da sua desistência dos pedidos nesta acção, dado ser uma percentagem irrisória do justo valor da Tranquilidade à data em que foi vendida pelo Novo Banco equivale ao não exercício ou exercício deficiente do direito que lhe cabia. Conclui em conformidade pedindo em substituição dos primitivos pedidos V a IX, a condenação das Rés no pagamento à Autora dos valores correspondentes a 45% dos valores aí constantes; e subsidiariamente, pede a condenação das Rés nos exactos termos da p.i. e subsidiariamente no pagamento por força do direito de sub-rogação dos direitos da Partran. Notificadas as demais partes, veio a 1ª Autora Massa Insolvente da Partran, SGPS, S.A. opor-se, pugnando pelo indeferimento do requerido por falta de fundamento legal, não devendo a Partran ser citada nos termos do art. 608º do Cód. Civil. Alega em suma que, a detentora das participações sociais da Companhia de Seguros Tranquilidade até à sua alienação à Ré Calm Eagle sempre foi a Partran, pelo que todos os direitos litigiosos associados à detenção destas participações sociais apenas e somente podem ser exercidos pela Partran. A Partran dispôs validamente dos seus direitos litigiosos através da homologação de um plano de insolvência, homologação que transitou em julgado. Assim, a Requerente/co-Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A. não se pode sub-rogar nos direitos exercidos pela Partran, pois os direitos foram exercidos validamente pelo titular e já não existem, além de que a Requerente era apenas acionista da Partran, nunca foi sua credora, não estando preenchidos os pressupostos da sub-rogação legal prevista nos arts. 606º e segs. do Cód. Civil. A sub-rogação consubstanciaria ainda uma violação do plano de insolvência da Partran. Por seu turno, também o Réu Novo Banco, S.A. veio pugnar pelo indeferimento dos pedidos da Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A., com extinção dos autos, absolvendo-se as Rés de todos os pedidos. Alega em suma que, desde logo a Autora pretende prevalecer-se de um valor atribuído à Tranquilidade reportado a 31/12/2012 e que não considerou o impacto do colapso do grupo Espírito Santo na situação patrimonial e financeira da Tranquilidade. Relativamente à manutenção dos pedidos I a III da petição inicial, refere que tais pedidos visam a declaração de nulidade do negócio constitutivo do penhor sobre as acções da Tranquilidade e de venda destas acções, e subsidiariamente a anulação e ineficácia destes negócios. A Autora ESF (Portugal) não é credora da Autora Partran detendo apenas uma participação minoritária de 45%, não foi parte nos negócios em causa na acção e e os pedidos destinam-se exclusivamente a produzir efeitos na esfera jurídica da Partran. Perante a transacção celebrada e desistência integral dos pedidos apresentadas pela Autora Partran e pela Autora ESFG, a Autora ESF (Portugal) não tem qualquer legitimidade para invocar a anulabilidade e declaração de ineficácia dos negócios jurídicos em causa, como reconheceram as AA na p.i.. O mesmo sucede com a declaração de nulidade, pois a Autora ESF (Portugal) não foi parte nos negócios, nem é credora de qualquer parte, e não pode como tal ser considerada parte interessada na declaração de nulidade. Por seu turno a redução dos pedidos nºs V a IX não é admissível, pois o que verdadeiramente está em causa é uma substituição dos pedidos, que se traduz numa completa substituição da Partran como sujeito receptor dos pagamentos pela Autora ESF (Portugal). No que tange à subsidiariamente pretendida manutenção dos pedidos, refere que a desistência da Partran dos pedidos implicou a extinção dos alegados direitos que a Partran queria fazer valer contra as Rés, não tendo a ESF (Portugal) legitimidade para os manter. E quanto à sub-rogação, a ESF (Portugal) não é credora da Partran, e esta agiu exercendo o seu direito, pelo que está vedada a possibilidade de recurso à sub-rogação. Finalmente, também a Ré Calme Eagle Holdings SARL, veio opor-se à pretensão da Requerente, pugnando pelo seu indeferimento e absolvição da instância dos RR. Aduz em resumo que, face ao acordo homologado nos autos, a ESF (Portugal) não tem legitimidade, nem interesse em agir que justifiquem a continuação dos autos. Desde logo não é verdade que a causa da sua insolvência tenha sido a execução do penhor, até porque esta é de data posterior, e não é verdade que o valor da Tranquilidade fosse de 700 milhões de euros. Refere ainda que diferentemente da ESFG, a ESF (Portugal) não detém qualquer crédito sobre a Partran, nem a maioria do capital social, e nenhum dos pedidos afecta directamente a posição jurídica da ESF (Portugal), antes visam produzir efeitos jurídicos na esfera da Autora Partran. A Autora ESF (Portugal) não detém individualmente a posição jurídica exigida pelos artigos 286º e 605º do Cód. Civil para preencher o conceito de interesse nos mesmos ínsito. As acções da Tranquilidade não constituíam um bem propriedade da ESF (Portugal), no limite o património da Partran era garantia dos credores desta, pelo que, carece a ESF (Portugal) de legitimidade individual e autónoma para, face à desistência das demais AA, prosseguir a lide com assento nas causas de pedir de nulidade invocadas. E também não está em causa uma redução do pedido, mas sim, uma alteração dos pedidos efectuados que não é admissível nos termos do art. 265º do C.P.C., como também não se verificam os pressupostos da sub-rogação nem é exequível a sua utilização. Vejamos De facto importa começar por lembrar quais foram os pedidos formulados e quem visavam beneficiar, para então indagar se a acção pode prosseguir nos termos visados pela 3ª Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A.. Assim, a presente acção foi intentada pela Partran, SGPS, S.A. (1ª Autora) e pelas suas duas accionistas, a Massa Insolvente da ESFG, S.A. (2ª Autora) e a Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A. (3ª Autora), com invocação de que a 1ª Autora era a única acionista da Companhia de Seguros Tranquilidade, sendo a 2ª Autora detentora de 55% do capital social da 1ª Autora, e a 3ª Autora detentora dos restantes 45%. A causa de pedir assenta na constituição de um penhor financeiro pela 1ª Autora sobre as acções da Tranquilidade a favor do BES, S.A., como um acto fraudulento contra credores das AA. Conforme alegam as AA o contrato de penhor foi estabelecido num outro contrato mais amplo (cfr. arts. 22º e 23º da p.i.) celebrado entre o BES, a 2ª Autora e a 1ª Autora. Analisando o petitório, vemos que nos pontos I a III, é pedida a nulidade, subsidiariamente a anulação, e subsidiariamente a ineficácia do dito contrato de penhor, e subsidiariamente a nulidade, anulação e ineficácia do contrato (mais amplo no qual a constituição do penhor se insere) celebrado pelo BES, S.A., pela 2ª Autora e pela 1ª Autora (pontos I e II), bem como a declaração de nulidade do contrato celebrado pelos RR através do qual foram transmitidas as acções da Tranquilidade, e subsidiariamente a ineficácia do contrato de execução do penhor. Em cumulação com estes pedidos, no ponto IV foi pedida a condenação dos RR na restituição à 1ª Autora das ditas acções com reconstituição do seu registo a favor da 1ª Autora. Nos pontos V a VII foi pedida, em cumulação com os pedidos anteriores, a condenação dos RR no pagamento de diversos valores à 1ª Autora. Nos pontos VIII e IX, as AA pedem, subsidiariamente face a todos os pedidos, a condenação do Réu Novo Banco no pagamento à 1ª Autora de uma indemnização pela violação dos deveres de diligência e lealdade na execução do contrato de penhor, e subsidiariamente, a condenação do Réu Novo Banco no pagamento à 1ª Autora de um outro valor a liquidar correspondente à diferença entre o preço de venda das acções da ESAF, SGPS, S.A. pelo BES à Tranquilidade e o valor efectivamente imputado a estas acções no preço do contrato de execução do penhor. Também resulta de toda a causa de pedir e da sua economia própria a relação de dependência (para além da subsidiariedade) que os pedidos constantes dos pontos IV a VII têm relativamente aos primeiros, os quais visam, repete-se, a invalidação de negócios jurídicos. Como se vê a 3ª Autora não era beneficiária, pelo menos directa, de qualquer dos pedidos formulados, os quais não apresentam repercussão na sua esfera pessoal. Aliás, nada obrigava à sua presença na acção que continuava a ter o seu efeito útil ainda que a mesma não tivesse intervindo ao lado das demais Autoras. Decorre do acordo homologado nestes autos e que pôs imediatamente termo à acção no que toca à 1ª e 2ª Autora, que o mesmo surge em execução de um acordo mais vasto obtido na insolvência da 1ª Autora e aí homologado, dele resultando, a par da desistência dos pedidos formulados na presente acção, o pagamento de quantias às 1ª e 2ª Autoras (cfr. requerimento de 19/04/2022). Isto posto, é bom de ver que a substituição dos pedidos V a IX pretendida pela 3ª Autora, no sentido de lhe serem pagos os montantes reclamados na proporção de 45%, não corresponde a uma redução do pedido inicial mas antes a uma verdadeira alteração do pedido, pois a 3ª Autora não era credora dos mesmos, nem parcialmente, e pretender passar a sê-lo. Não estamos perante uma situação em os pedidos ora formulados estivessem contidos nos pedidos primitivos. Nenhum destes pedidos formulados tem uma repercussão directa na esfera da 3ª Autora, pelo que, não podem ser alvo de redução ou qualquer confinamento à sua esfera individual. Como tal, desde logo, não existindo acordo das Rés para tal alteração, a alteração do pedido não é processualmente admissível nos termos dos arts. 264º e 265º nº 2 a contrario do C.P.C., impondo-se o seu indeferimento. Quanto ao pedido de condenação das Rés nos exactos termos da p.i., importa notar que os pedidos constantes dos pontos IV a IX, nos termos em que se apresentam, não são susceptíveis de poder beneficiar a 3ª Autora justamente por deles não ser credora, tendo a respetiva credora, a 1ª Autora, deles disposto em transacção, o que era seu direito, com o que se operou a sua extinção processual e substantiva. Todos os pedidos foram formulados na petição inicial numa altura que todas as AA litigavam representadas pelo mesmo mandatário. Não oferece dúvida que os pedidos constantes dos pontos IV a IX visavam beneficiar apenas a 1ª Autora Partran produzindo efeitos exclusivamente na sua esfera jurídica, e só muito remotamente beneficiavam a Requerente enquanto acionista da Partran, e não da Tranquilidade. O que redunda na falta de legitimidade processual da 3ª Autora individualmente considerada para os ver apreciados e decididos, por não ter interesse em demandar isoladamente tal como a relação controvertida foi configurada na p.i.. Também não colhe a pretensão subsidiária no sentido da sub-rogação dos direitos da 1ª Autora nos termos do art. 606º do Cód. Civil. É que, como bem notaram a 1ª Autora e os Réus, a 3ª Autora, na mera qualidade de acionista da 1ª Autora, não é sequer credora da 1ª Autora, nem estamos perante uma situação em que a 1ª Autora não tenha exercido os seus direitos, pelo que não estão preenchidos os pressupostos da sub-rogação legal prevista nos arts. 606º e segs. do Cód. Civil. Finalmente, quanto aos pedidos de invalidação dos negócios constantes dos pontos I a III, para além de as partes intervenientes nos negócios deles terem disposto, é notória a falta de legitimidade substantiva e processual da 3ª Autora relativamente aos pedidos de anulação e ineficácia de negócios dado que não foi parte nos mesmos (cfr. art. 287º do Cód. Civil). Restam os pedidos de declaração de nulidade constantes desses pontos I a III. É certo que nos termos do art. 286º do Cód. Civil, qualquer interessado pode invocar a nulidade. Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela (in Cód. Civil Anotado, Vol. I, 4ª Ed., Pág. 263), em termos inteiramente actuais, “qualquer interessado” é “o titular de qualquer relação jurídica cuja consistência tanto jurídica como prática, seja afectada pelo negócio”. A 3ª Autora é uma acionista minoritária da 1ª Autora que foi a parte nos negócios, pelo que só tem quando muito uma expectativa relativamente à distribuição de proventos, não detendo qualquer direito subjectivo relativamente à 1ª Autora nem relativamente aos Réus, sendo certo que estando a 1ª Autora insolvente, qualquer incremento patrimonial é afecto aos credores da insolvência, não pagos. Ademais, a 3ª Autora é detida pela 2ª Autora que também chegou a acordo com os Réus. E tanto a 3ª Autora não foi afectada na sua esfera que nenhuma das pretensões ressarcitórias dependentes da invalidade dos negócios foi peticionada a seu favor. Como se afirma no acórdão da Relação de Lisboa de 17/06/2021 (proferido no processo n.º 527/18.3T8OER.L1-2 disponível in www.dgsi.pt), também citado pela 2ª Ré: “(…) O direito de invocação da nulidade não é conferido a todos. Não é qualquer pessoa a quem dê jeito, de alguma maneira, a declaração de nulidade do negócio, que preenche os requisitos do conceito de interessado para efeito do artigo 286.º. O sujeito legitimado deve ter um interesse direto na nulidade e não apenas um interesse vago e indireto. O interesse que atribui a uma pessoa legitimidade para invocar a nulidade de um negócio jurídico segundo o artigo 286.º, é um interesse de direito substantivo, que pressupõe a oponibilidade do negócio, porque o negócio nulo prejudica a consistência prática ou económica, de um direito seu (Lebre Freitas, 2007, 384). Por exemplo, são terceiros legitimados para invocar a nulidade o cônjuge responsável por dívida contraída pelo outro através de contrato nulo celebrado sem a sua intervenção e os adquirentes de direitos reais ou pessoais sobre o mesmo bem. Ajuizando acerca de situação potencialmente consubstanciadora de legitimidade indirecta, referenciou-se no douto aresto desta RL de 17/01/2012 (omitem-se as expressas referências às citações) [23] que “a ressalva constante do nº3 do art. 26º (“na falta de indicação em contrário”), respeita às hipóteses em que, excepcionalmente, o legislador reconhece legitimidade a quem não é sujeito (ou só é em parte) da relação material controvertida submetida à apreciação do tribunal. Ou seja, para além de se atribuir legitimidade aos sujeitos da relação material controvertida (legitimidade directa), resultante de uma presumida coincidência entre as partes na acção e os sujeitos da relação material, a lei excepcionalmente atribui legitimidade aos não titulares da relação material (legitimidade indirecta). E, nas palavras de Paula Costa e Silva, a legitimidade enquanto pressuposto processual adquire relevância precisamente quando em juízo se encontram, não as partes materiais, mas as partes formais, naquelas situações em que quem está em juízo alega não ser o titular da relação material controvertida. (...) A doutrina é unânime em considerar como exemplos de atribuição do direito de acção versando sobre relação jurídica a que é estranho ou em que tem apenas um interesse indirecto, a acção de declaração de nulidade dos negócios jurídicos, a acção sub-rogatória prevista no art. 606º do CC, e a acção popular prevista no art. 26º-A do CPC. Em todas estas hipóteses, em que é atribuída legitimidade processual a quem é titular de um interesse indirecto, surge um fenómeno de substituição processual: a acção é deduzida em nome e no interesse próprio, mas sobre relação jurídica de outrem”. (...) “quando a disponibilidade adjectiva não decorre da alegada titularidade da situação objectiva, é indispensável a atribuição legal da legitimidade, pois sem essa atribuição legal, a parte não será legítima” (sublinhado nosso). (...) Ora, na aferição da legitimidade directa, urge ajuizar, na ponderação do concreto litígio, se a previsível procedência da acção, nos termos configurados pela Autora, é susceptível de lhe trazer, objectivamente, uma situação de vantagem ou utilidade. No que se traduz a adopção do denominado critério da utilidade ou prejuízo, com enfoque no nº. 2 do artº. 30º, do Cód. de Processo Civil. (…)” (o destacado a bold é nosso). Na situação vertente, sob o prisma da legitimidade processual nos termos do art. 30º do C.P.C., parece-nos evidente que a 3ª Autora que é um terceiro relativamente aos contratos e não tem por isso interesse directo em demandar pois da eventual procedência dos pedidos concernentes à nulidade dos contratos não resulta uma qualquer situação de vantagem ou benefício para mesma. O interesse visado no art. 30º nº 2 do C.P.C. é sempre um interesse directo, e não meramente reflexo, mediato ou derivado. Portanto, a 3ª Autora não tem legitimidade directa para os pedidos que visam a nulidade dos contratos identificados nos pontos I a III do petitório constante da p.i.. Restaria apenas a legitimidade indirecta para a apreciação de tais pedidos (e só desses como vimos), o que implica saber se tem aplicação a 1ª parte do nº 3 do art. 30º do C.P.C., posto que na configuração constante da p.i a 3ª Autora não é sujeito da relação material controvertida, o que afasta a segunda parte. Ou seja, importa aferir se não existirá normativo legal que faça estender tal legitimação. Esse normativo só poderia ser o art. 286º do Cód. Civil, mas como vimos tal passa por avaliar se a relação jurídica pela mesma invocada é afectada, na sua consistência jurídica ou prática, pelos efeitos que os negócios pretendiam produzir, o que passa por concluir se a 3º Autora tem algum interesse de direito substantivo, um interesse directo na nulidade, e não meramente um interesse vago, indirecto ou reflexo. Não vemos como a Autora na sua qualidade de mera acionista minoritária da 1ª Autora tenha qualquer direito subjectivo a proteger com tal actuação. Enquanto acionista não é detentora dos bens ou activos da 1ª Autora, os quais no limite servem para pagar os credores desta (que a 3ª Autora não é, diversamente do que sucede por exemplo com accionistas que prestam suprimentos). De facto, enquanto titular de simples expectativas quanto a proventos (e mesmo neste caso não poderia olvidar-se a circunstância de a 1ª Autora se encontrar insolvente com as limitações inerentes à disposição do seu património), a 3ª Autora não tem ao seu dispor qualquer meio de tutela ou conservação da sua mera expectativa jurídica. Na situação vertente permitir que a acção prossiga para apreciação da nulidade de negócios em que as partes interessadas e envolvidas já transigiram significaria sobrepor os interesse da acionista minoritária aos da sociedade de que é sócia e da accionista maioritário, colocando em causa o acordo celebrado e que surgiu no âmbito de um acordo mais vasto obtido no processo de insolvência da 1ª Autora em que o respectivo plano de insolvência foi já homologado por sentença transitada em julgado (cfr. consulta do respectivo processo de insolvência nº 7796/15.3... na aplicação citius). Daqui resulta que, sem as demais AA, a 3ª Autora não tem como assentar a sua legitimidade individual no art. 286º do Cód. Civil, com o que fica afectada a sua legitimidade processual indirecta para apreciação dos pedidos de nulidade nos ternos do art. 30º do C.P.C.. Ou seja, não se reconhece à 3ª Autora legitimidade indirecta para a apreciação dos pedidos de nulidade constantes dos pontos I a III. Em suma, com a saída de cena da 1ª e da 2ª Autoras a 3ª Autora deixou de ter legitimidade individual para prosseguir a acção nos termos em que foi proposta por nenhum dos pedidos lhe dizer respeito individualmente ou afectar a sua posição jurídica, o que vem a ser um efeito do acordo e da sentença homologatória e das limitações processuais à alteração dos pedidos primitivamente formulados. Em consequência, de todo o exposto resulta que, não obstante a não intervenção da 3ª Autora no acordo de transacção celebrado entre as demais partes, não existem pedidos formulados que possam relativamente à 3ª Autora ser apreciados com autonomia. O despacho que determinou o prosseguimento dos autos não inviabiliza a constatação a que ora se procede no sentido de que, em face dos pedidos primitivos que se mantêm e da posição da 3ª Autora, os autos não podem prosseguir para apreciação dos pedidos formulados por falta de legitimidade da 3ª Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A. individualmente considerada. Pelas razões expostas, indefere-se o pedido de substituição dos pedidos primitivos e o exercício de sub-rogação, e quanto ao demais peticionado, por ilegitimidade da 3ª Autora, indefere-se o requerimento de prossecução dos autos apresentado pela 3ª Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A., absolvendo-se as Rés da instância de todos os pedidos deduzidos (enquanto pedidos exclusivamente peticionados pela 3ª Autora Massa Insolvente da ESF (Portugal) SGPS, S.A.).» G) APELAÇÕES A 3ª A recorreu para a Relação, tendo esta definido o âmbito do recurso e decidido, deste modo: 1. “(…) À luz destes considerandos, neste recurso vai decidir-se pela inexistência jurídica de tudo quanto foi tramitado e decidido nestes autos após a prolação, no dia 26 de abril de 2022, da sentença que homologou a transação entrada nos autos no dia 19 de abril de 2022.” 2. Decisão: Por todo o exposto, acordam os juízes que integram a 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar juridicamente inexistente tudo quanto nestes autos foi tramitado e decidido após a prolação, no dia 26 de abril de 2022, da sentença homologatória da transação apresentada no dia 19 de abril de 2022, inexistindo, por isso, qualquer recurso pendente carecido de apreciação. Custas, na vertente de custas de parte, a cargo da apelante – arts. 527.º, n.ºs 1 e 2, 607.º, n.º 6 e 663.º, n.º 2, do CPC. (…)” H) REVISTA MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO PORTUGAL, S.G.P.S., SA, veio recorrer para este Supremo Tribunal de Justiça/STJ, formulando as seguintes CONCLUSÕES: “i. O acórdão recorrido fez errada interpretação da vontade das partes no acordo de transacção dos autos, designadamente dos efeitos jurídicos por elas pretendidos quanto à extinção da instância. ii. O sentido das declarações das partes no acordo de transacção, só pode ser o de que aquilo que elas pretenderam foi pôr termo ao litígio apenas entre si, enquanto subscritoras do mesmo, porque os direitos de que podiam dispor eram apenas os seus próprios, e não dos da Recorrente que nele não foi parte. iii. Em qualquer caso, a qualificação jurídica dos efeitos do acto pelos seus autores, estando em conflito com a lei, nunca poderia ser condicionante dos efeitos da sentença que sobre ele recaísse. iv. O acórdão recorrido fez, também, errada interpretação da sentença homologatória dos autos no que respeita à extinção da instância. v. A condenação das “partes nos seus precisos termos” é uma fórmula da praxe, que constando de decisão que responde à apresentação de um acordo de transacção, se quer referir, necessariamente, às partes que o subscreveram. vi. A interpretação da decisão homologatória dos autos que se afigura razoável e lógica é, assim, a de que esta se limitou a validar a transacção nos exactos termos que da mesma resultam (dos quais não consta a desistência de nenhum dos pedidos pela Recorrente), porque foi isso que foi requerido a que se dava resposta. vii. O requerimento da Recorrente de 29-4-2022 teve apenas o propósito de alertar o Tribunal para que a sentença homologatória fora prematura, dado não se ter aguardado pelo decurso do prazo de contraditório da Recorrente, o que constituía nulidade processual. viii. O resultado da interpretação dos efeitos da sentença homologatória quanto ao âmbito extintivo da instância não pode ser aquele que é referido no acórdão, por não ser esse o que resulta da lei (arts. 284º e 288º, nº1 do CPC) e por não ter um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento (art. 238º, 1 do CC). ix. A sentença que homologue transacção que não envolva todas as partes, sujeitos da relação material convertida, nada declarando quanto ao âmbito de extinção da instância, só poderá projectar os seus efeitos sobre aquelas que transaccionaram. x. De contrário, ficariam postos em causa os princípios da segurança jurídica e da confiança das partes. xi. A prolação do despacho que ordenou o prosseguimento dos autos não interferiu em nada com a sentença homologatória existente, que continuou intacta, tendo apenas regulado uma questão que não fora objecto da decisão anterior. xii. Por isso, o poder jurisdicional do juiz para esta decisão não se encontrava esgotado ou restringido. xiii. A senhora juíza do processo, ao entender ter sido violado o princípio do contraditório da Recorrente e ao ter ordenado o prosseguimento dos autos, fez ela própria interpretação da sentença da sua autoria, confirmando com isso que a instância não havia sito extinta na totalidade. xiv. Tratou-se da interpretação autêntica da sentença homologatória que invalida o que o acórdão decidiu a esse respeito. xv. Carece de fundamento jurídico válido a afirmação de que deverá ter-se por juridicamente inexistente tudo quanto nos autos foi tramitado e decidido após a prolação da sentença homologatória da transacção, datada de 26-4-2022.” Por essa razão, o recurso de Apelação interposto da sentença de 27-1-2023 deverá ser apreciado e julgado. NOVO BANCO, S.A., recorrido R veio responder, do seguinte modo: “a. Da interpretação da sentença homologatória de 26-4-2022 resulta que esta sentença teve o intuito e o efeito de extinguir a totalidade da instância – i.e. quanto a todas as partes e quanto à totalidade dos pedidos. b. A argumentação deduzida pela ESFP relativamente à interpretação da sentença homologatória de 26-4-2022, no sentido de que esta deve ser interpretada no sentido de ter feito extinguir apenas uma parte da instância, não coincide com a posição assumida pela ESFP logo após a prolação da sentença homologatória de 26-4-2022, pois, através do requerimento de 29-4-2022, a ESFP demonstrou ter interpretado a sentença homologatória no sentido de esta extinguir a totalidade da instância. c. Em face da sentença homologatória de 26-4-2022, e querendo a ESFP que a instância prosseguisse para apreciação de outros pedidos, a única forma de reação possível seria o recurso. d. Não tendo a ESFP interposto recurso da sentença homologatória de 26-4-2022, esta transitou em julgado, constituindo-se sobre ela o efeito de caso julgado formal, o que, além do mais, impede a contradição da decisão no âmbito do próprio processo, nos termos do artigo 620.º, n.º 1, do CPC. e. Os requerimentos apresentados pela ESFP em 29-4 e 5-5-2022 não consistiam no meio adequado de reação à sentença homologatória de 26-4-2022, uma vez que (i) neles nada foi requerido e que (ii) tais requerimentos tinham como objetivo conduzir o Tribunal de 1.ª instância a determinar o prosseguimento da instância, decisão esta que não era possível uma vez que a instância já havia sido totalmente extinta por força da sentença homologatória. f. A argumentação deduzida pela ESFP, no sentido de que o Tribunal de 1.ª instância poderia reinterpretar a sentença homologatória e vir, posteriormente, definir que a instância, afinal, não havia sido extinta na totalidade (quando, na verdade, foi), é contrária ao princípio do esgotamento do poder jurisdicional do juiz (artigo 613.º, n.º 1, do CPC). g. Ainda que a sentença homologatória de 26-4-2022 contivesse algum erro quanto à amplitude do efeito extintivo da homologação e não devesse ter determinado, como determinou, a extinção da totalidade da instância, o juiz estaria, mesmo assim, impedido de alterar aquela decisão, por se ter esgotado o seu poder jurisdicional. h. O erro referido no ponto anterior, a confirmar-se, tratar-se-ia de um erro de julgamento, e não de um erro material ou “lapso manifesto” da sentença, pelo que não poderia ser retificado por via de despacho, por não lhe ser aplicável o regime do artigo 614.º do CPC, restando como (única) via o recurso, que não foi interposto pela ESFP. i. Tudo o que foi tramitado e decidido após a sentença homologatória deve ser considerado juridicamente inexistente, por violação dos princípios do esgotamento do poder jurisdicional do juiz e do caso julgado formal (arts. 613.º, n.ºs 3 e 1 e 620.º, n.º 1, do CPC) j. O recurso interposto pela ESFP da decisão do Tribunal de 1.ª instância de 27 de janeiro de 2023 não deve ser apreciado.” Nestes termos, e nos demais de Direito aplicáveis, requer-se a V. Exas. se dignem confirmar o Acórdão recorrido, concluindo e julgando nos mesmos termos. CALM EAGLE HOLDINGS, S.A.R.L, Ré e Recorrida, também veio responder, deste modo: 1. Vem o recurso a que ora se responde interposto do Acórdão com a ref. CITIUS n.º ......11, de 12-9-2023 que julgou juridicamente inexistente tudo quanto nestes autos foi tramitado e decidido após a prolação, no dia 26-4-2022, da sentença homologatória da transacção apresentada no dia 19-4-2022. 2. Procura a Autora e Recorrente ESFP, nesta sede, reverter tal decisão, pugnando pela reapreciação pelo Venerando Tribunal da Relação do recurso que havia interposto da Sentença que absolveu os Réus da instância por verificação de excepção de ilegitimidade. 3. Não pode sufragar-se a pretensão da Recorrente, pois, a Petição Inicial que deu origem à presente lide foi apresentada, conjuntamente, pelas Autoras Partran, ESFG e ESFP, com dedução de pedidos a final que emergem de várias causas de pedir. 4. Centrando-se o processo na validade do penhor financeiro constituído pela ex-Autora Partran a favor do então Banco Espírito Santo, S.A. sobre as acções da pretérita Tranquilidade, para garantia do mútuo por este último concedido à também ex-Autora ESFG, e nos posteriores actos de execução do mesmo através da venda dessas acções à Ré Calm Eagle. 6. A Partran era directamente detida em 55% pela ESFG e em 45% pela ESFP, sendo esta última integralmente dominada pela ESFG, titular de 100% do respectivo capital social. 7. Os pedidos deduzidos nos autos destinavam-se a produzir efeitos, exclusivamente, na esfera da pretérita Autora Partran, já que, ou questionavam a validade ou a eficácia do negócio de constituição do penhor financeiro sobre as acções da Tranquilidade, celebrado pela Partran, ou requeriam a condenação dos Réus no pagamento de determinados montantes à Partran. 8. Como resulta dos autos, a 19 de Abril de 2022 foi apresentado requerimento de transacção, no âmbito do qual Partran e ESFG, em virtude de acordo global alcançado com os Réus com vista a pôr termo ao litígio, desistiram da totalidade dos pedidos neles formulados, mais reconhecendo, inter alia, que o penhor sobre as acções da Tranquilidade dado em garantia das obrigações da ESFG foi válida e eficazmente constituído pela Partran, não padecendo de qualquer invalidade, nulidade ou ineficácia, mormente das alegadas na Petição Inicial que deu origem aos presentes. 9. A venda das acções da Tranquilidade pelo Novo Banco à Calm Eagle constituiu igualmente um negócio inteiramente válido e eficaz. 10. A venda das acções da Tranquilidade pelo Novo Banco à Calm Eagle, juntamente com as subsequentes operações de redução e aumento de capital, foi essencial para o restabelecimento da solvência daquela empresa e da continuação da sua atividade seguradora, conforme exigência do Instituto de Seguros de Portugal. 11. O preço de venda das ações da Tranquilidade pago pela Calm Eagle ao Novo Banco, refletiu o valor de mercado das referidas acções. 12. Tal acordo, como igualmente se encontra patente nos autos, é concretização do Plano de Insolvência aprovado e homologado por Sentença no âmbito do processo de insolvência da Partran que sob o número de processo 7796/15.3..., corre termos no Juízo de Comércio de ... – Juiz 7. 13. Plano esse de que, note-se, a ESFP foi devidamente notificada1, e a que em momento algum se opôs, não tendo também comparecido na Assembleia de aprovação do mesmo, devidamente publicitada, nem recorrido da Sentença que o homologou, e que como tal a vinculou, nos termos do disposto no artigo 217.º do CIRE. 14. Já em requerimento de 7-2-2022, com a ref. CITIUS n.º ......63, em momento anterior à apresentação da aludida transacção, as partes intervenientes haviam dado nota de que essa transacção aguardava a homologação do Plano em análise, nos seguintes termos: 1 Cfr. documento junto com o requerimento com a ref. CITIUS n.º ......25, de 11-7-2022. 15. As Partes já terminaram as negociações, tendo sido formalizado, no passado dia 17-1-2022, um Acordo de Transação (“Acordo”), no qual se prevê o termo do presente processo por transação entre as Partes, sujeito – como é de lei – à autorização formal no âmbito das insolvências das Autoras. 16. De facto, a produção de efeitos deste Acordo e, por conseguinte, a apresentação do instrumento de transação nos presentes autos estão dependentes. “(i) de autorização do Tribunal luxemburguês junto do qual corre termos o processo de insolvência da Espírito Santo Financial Group, S.A. (“ESFG”) e (ii) da aprovação em assembleia de credores e posterior homologação pelo Tribunal junto do qual corre termos o processo de insolvência da Partran S.G.P.S., S.A. (“Partran”). A homologação do Acordo já foi solicitada ao Tribunal luxemburguês junto do qual corre termos o processo de insolvência da ESFG. Por seu lado, encontram-se também a correr os trâmites legais no âmbito do processo de insolvência da Partran. […]” (realces nossos). 17. Desse requerimento foi a Recorrente ESFP também notificada, nada lhe tendo oposto (nem tendo tomado qualquer diligência a esse respeito no âmbito do processo de insolvência da Partran). 18. Por Sentença de 26-4-2022, o Tribunal de Primeira Instância homologou a transacção vertida no requerimento de 19-4, condenando as partes a cumpri-la nos seus precisos termos, e notificou as partes de tal decisão. 19. Como resulta do Acórdão revidendo, entendeu o Venerando Tribunal a quo, na interpretação que alcançou da Sentença homologatória proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, que esta extinguiu a lide na sua totalidade, vinculando todas as partes nos presentes autos aos respectivos termos, aí incluindo a ora recorrente ESFP. 20. E que, tendo esta última constatado tal vinculação da sua pessoa que daí decorreria (como resulta do próprio requerimento da Recorrente de 29-4-2022), dela não recorreu, como cumpriria ter feito caso com a mesma se não conformasse. 21. Uma vez que era esse, e não outro (designadamente, os requerimentos apresentados a 29-4 5-5-2022), o meio processual adequado e necessário para impugnar a Sentença em causa. 22. Não o tendo feito, como não fez, esgotou-se o poder jurisdicional do Tribunal que a prolatou. 23. E a decisão, nos termos em que condenou, transitou em julgado. 24. Assim valorou o Venerando Tribunal a quo a conduta processual relevante (rectius, a inércia processual) da Recorrente, não merecendo o silogismo empreendido qualquer censura 25. Inércia essa que em rigor, acrescenta-se, não é dissonante da que havia também sido adoptado no âmbito do processo de isolvência em que os termos de tal transacção foram devidamente aprovados, para execução de Plano de Insolvência, como supra se referiu. 26. E que, em substância, reflecte a efectiva utilidade e interesse que a presente lide apresenta para a posição da ESFP – nenhuma. 27. A Recorrente, que ab initio é uma parte no litígio que nele não tem qualquer interesse próprio, directo ou reflexo, por não ser nem interveniente nos negócios que dele são objecto, nem beneficiária de qualquer dos pedidos deduzido. 28. Que, conhecendo o Plano de Insolvência apresentado no processo de insolvência da sua co-Autora, e (efectiva) destinatária do petitório destes autos, que previa a transacção que aqui veio a ser corporizada no requerimento de 19 de 2022, o aceitou. 29. E que notificada de uma Sentença homologatória que a própria antecipou que poderia ter o efeito de – ainda que por lapso – a vincular aos exactos termos dessa mesma transacção, dela não recorreu. 30. Mais não se fez do que aquilo que, em consciência, se exigiria de quem, como a Recorrente, não tem qualquer legitimidade singular, processual e substantiva, para prosseguir os presentes autos. 31. Sendo a extinção da presente lide, seja enquanto consequência do iter decisório seguido no Acórdão recorrido, seja nos termos decididos na decisão objecto do recurso de apelação que a esse Acórdão conduziu, inteiramente devida. 32. E não tendo as Alegações de Recurso a que ora se responde a virtualidade de conduzir a diferente conclusão. Termos em que, deve ser julgado integralmente improcedente o recurso interposto pela Autora e Recorrente Espírito Santo Financial (Portugal), S.G.P.S., S.A., com todas as legais consequências. I) Da admissão da revista O recurso para este STJ foi devidamente admitido como sendo de revista, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo - artºs 629º nº 1, 671º, 675º e 676º do CPC. I. APRECIANDO E DECIDINDO Thema decidendum Em função das conclusões do recurso, temos que: - A recorrente/3ªA/MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO PORTUGAL, S.G.P.S., considera que a transação em causa não a abrangeu, logo, os autos devem prosseguir para conhecimento dos pedidos reformulados pela mesma recorrente. II. DOS FACTOS - A factualidade relevante é a decorrente do relatório que antecede, de que se destaca a transacção constante da B). III. DO DIREITO A resposta positiva ou negativa à questão posta pela recorrente/3ªA – cfr. supra thema decidendum – pressupõe a existência, ou não, do trânsito em julgado da sentença homologatória da transacção em causa e dos efeitos daí decorrentes, designadamente, quanto ao alcance da extinção da instância. Comecemos pela caracterização da figura transacção, enquanto instrumento de auto regulação dos litígios, em relação a direitos disponíveis - a nível doutrinal sobre o “Contrato de Transacção”, Menezes Cordeiro, in “Tratado de Direito Civil”, Almedina 2018, pags. 1056 a 1058. No que respeita ao regime legal da transacção, o acórdão recorrido é esclarecedor: “Dispõe o art. 1248º do Cód. Civil: 1. Transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões. 2. As concessões podem envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido. Resulta do citado preceito, assim como do disposto nos artºs. 277.º, al. d), 283.º, n.º 2, 284.º, 290.º e 291.º, todos do CPC, que segundo o regime legal vigente entre nós, a transação judicial reveste a natureza de um contrato processual, bivinculante, oneroso, constitutivo de obrigações recíprocas para os litigantes, dirimente da relação material controvertida trazida à liça no processo e, por consequência, extintivo da relação processual em causa. Tiago Soares de Oliveira afirma que «a transacção, tomando como referência a sua noção legal, é um contrato, sendo-lhe aplicáveis as regras gerais de formação dos negócios jurídicos. Por outro lado, não obstante um dos elementos da transacção ser a concessão (que não tem necessariamente de ser uma obrigação), a circunstância de aquela ter de ser recíproca, com a finalidade de terminar um conflito, permite qualificar este contrato como sinalagmático. A transacção é ainda um contrato oneroso e, dentro desta classificação, cumutativo. Oneroso, porque, mediante as concessões recíprocas, as partes obtêm simultaneamente vantagens sucessivas de avaliação em dinheiro. Cumutativo, porque as concessões (paradigmáticas) acordadas não dependem da realização de um acontecimento futuro, encontrando-se determinadas com a celebração do contrato. Extrajudicial ou judicial, a transação é sempre um contrato solene. Tendo sempre de ser celebrada (pelo menos) por documento escrito, a transação extrajudicial poderá ser, nalguns casos, mais solene do que outros negócios de onde poderiam derivar os mesmos efeitos que os da transação. Sempre que a transação judicial se encontre exteriorizada por termo ou ata, qualquer destas formas, uma vez homologada, substitui a forma estabelecida para a transação extrajudicial, sem prejuízo de eventuais cautelas adicionais das partes. Atendendo à situação jurídica atingida pelo ato, isto é, ao conflito jurídico que termina, a transacção deve ser reconduzida a um negócio de disposição.»1. Como contrato que é, a transacção judicial está sujeita ao regime geral do negócio jurídico (arts. 217.º ss., do CC), gozando as partes, dentro dos limites legalmente estabelecidos, da liberdade de o conformarem, pela melhor forma que satisfaça os seus interesses (art. 405.º, do CC). Por conseguinte, o seu sentido e o seu alcance, terão de ser aferidos, o mesmo é dizer, interpretados, à luz das regras contidas nos arts. 236.º, n.º 1 e 238.º, n.º 1, do CC. E o mesmo sucede com a sentença que a homologou. Trata-se de uma decisão judicial corporizada na homologação do pacto afirmado pelas 1.ª e 2.ª autoras e pelas rés na ação, constituindo por isso, um verdadeiro ato jurídico, formal e receptício, a que igualmente se aplicam as regras reguladoras dos negócios jurídicos, pelo que as normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial são igualmente válidas para a interpretação de uma decisão judicial (art. 295.º, do CC). Tal como afirmado no Ac. do S.T.J. de 07.12.2016, Proc. n.º 187/13.2TBPRD.P1.S1 (Silva Gonçalves), in www.dgsi.pt, «a transacção exarada no processo, que põe termo ao litígio entre as partes, constitui um contrato processual, concretizando um negócio jurídico efectivamente celebrado pelas partes intervenientes na acção, correspondente àquilo que estas quiseram e conforme o conteúdo da declaração feita - a transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões - art. 1248.º, n.º. 1, do Cód. Civil. Ao homologar tal acordo o Juiz, nos termos do disposto no art.º 290.º, n.º 3 e 4 do CPC, limita-se a fiscalizar a legalidade, a verificar a qualidade do objecto desse contrato e a averiguar a qualidade das pessoas que nele intervieram. A exigida exigência da presença do Juiz na homologação da transacção faz com que se atribua ao negócio celebrado uma função jurisdicional, dando-lhe força executiva; não toma, porém, o Juiz posição acerca do negócio acordado, ficando de fora do sentido e alcance do acordo celebrado. Ora, se é assim, a decisão judicial corporizada na homologação do pacto afirmado pelas partes na acção, constituindo um acto jurídico, há-de interpretar-se segundo os princípios legalmente impostos e acomodados para os negócios jurídicos (art.º 295.º do CC). Neste contexto terá o intérprete de indagar qual a vontade das partes exteriorizada na transacção que o Juiz, ao homologá-la, jurisdicionalizou de tal modo que, encontrada esta, todas as circunstâncias envolventes do processo se clarificam e tomam um sentido definitivamente exacto - "as decisões, como os contratos, como as leis, como, afinal, todos os textos, têm de ser interpretados e não lidos; ler não é o fim; é o princípio da interpretação".» A interpretação, tanto da transação, como da sentença homologatória, deve, assim, no caso concreto, fazer-se de acordo com o sentido que um declaratário normal, colocado na situação do real declaratário, possa deduzir do conteúdo nela expresso, ainda que menos perfeitamente (art. 236.º, n.º 1 e 238.º, n.º 1, do CC). Constituindo ambos – a transação e a sentença que a homologou – atos formais, tem de se aplicar à respetiva interpretação a regra fundamental segundo a qual não pode ela valer com um sentido que não tenha no documento ou escrito que a corporiza, um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. Entende-se por declaratário normal aquele que é medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante, a não ser que este, razoavelmente, não pudesse contar com tal sentido2. Assim sendo, todas as dúvidas que eventualmente possam surgir na determinação do sentido e alcance das declarações de vontade exaradas na transação judicial homologada por decisão judicial terão de ser esclarecidas com recurso aos critérios legais de interpretação referentes aos negócios jurídicos, adiantados pelo disposto no artigo 236.º, n.º 1, do CC, que consagra a denominada teoria da impressão do destinatário, apenas com esta limitação: para que tal sentido possa valer é preciso que seja possível a sua imputação ao declarante, isto é, que este possa razoavelmente contar com ele. Em cumprimento desta imposição legal, deve ter-se em conta, como já referido, que a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição de real declaratário, lhe atribuiria, nas concretas condições em que este se encontrava, tendo-se em conta os elementos que ele conheceu efetivamente mais os que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido, afigurando-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável3. Por sua vez, a normalidade do declaratário que a lei toma como padrão, exprime-se não só na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na diligência para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante4.” Ccomplementarmente, indica-se a morada electrónica de acesso ao texto integral do aresto acima citado: https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2016:187.13.2TBPRD.P1.S1.9D?search=gXgoncJd32-V0BYlGV0. - Que dizer quanto ao caso vertente? A tansacção sub judicio constituiu, inicialmente, um acordo celebrado entre os seus intervenientes, mas uma vez homologado judicialmente tem força de sentença susceptível de constituir caso julgado material só atacável nos termos do artº 291º do CPC (nulidade e anulabilidade da confissão, desistência ou transação) que estabelece o seguinte: 1 - A confissão, a desistência e a transação podem ser declaradas nulas ou anuladas como os outros atos da mesma natureza, sendo aplicável à confissão o disposto no n.º 2 do artigo 359.º do Código Civil. 2 - O trânsito em julgado da sentença proferida sobre a confissão, a desistência ou a transação não obsta a que se intente a ação destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação. 3 - Quando a nulidade provenha unicamente da falta de poderes do mandatário judicial ou da irregularidade do mandato, a sentença homologatória é notificada pessoalmente ao mandante, com a cominação de nada dizendo, o ato ser havido por ratificado e a nulidade suprida; se declarar que não ratifica o ato do mandatário, este não produz quanto a si qualquer efeito. A causa de pedir nestes autos tem a ver com o contrato de penhor financeiro celebrado entre o BES, SA, a A/PARTRAN e a também A/ESFG, e o consequente pedido de nulidade/anulabilidade do mesmo contrato, bem como, cumulativamente, a nulidade/anulabilidade do contrato celebrado entre o R/NOVO BANCO e R/CALM EAGLE de que resultou a transmissão das acções da ex - Seguradora Tranquilidade daquele para esta última, sendo que o penhor financeiro foi constituído pela A/PARTRAN a favor do, entretanto, resolvido BES/SA sobre as acções da ex – Seguradora Tranquilidade, que tinham servido de garantia do mútuo por aquele concedido à A/ESFG. Por sua vez, a A/PARTRAN era, directamente, detida em 55% pela A/ESFG e em 45% pela A/ESFP, agora recorrente, a qual era integralmente dominada pela A/ESFG, titular de 100% do seu capital social. O acordo/transacção em discussão corresponde à concretização do “plano de insolvência (em que a agora recorrente teve intervenção) aprovado e homologado por sentença no pº nº 7796/15.3..., de insolvência da A/PARTRAN que corre termos no Juízo de Comércio de ... – Juiz 7”. Recordemos, no essencial, o teor da transacção judicialmente homologada: «MASSA INSOLVENTE DA ESPÍRITO SANTO FINANCIAL GROUP, S.A., MASSA INSOLVENTE DA PARTRAN, S.G.P.S., S.A., Autoras, e NOVO BANCO, S.A. e CALM EAGLE, S.À.R.L., Rés nos autos acima identificados, pretendendo pôr termo ao presente litígio, vêm, ao abrigo do disposto nos artigos 283º, nº 2 e 290.º n.º 1 do C.P.C., apresentar Transação, o que fazem nos termos seguintes: 1. As Partes chegaram a um acordo global que permitirá pôr termo ao processo sub judice, conforme resulta também do Plano de Insolvência da PARTRAN, S.G.P.S., S.A., cuja sentença de homologação foi já proferida no âmbito do processo n.º 7796/15.3..., pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Comércio de ... – J7 e, bem assim, aos apensos C e D do referido processo nº 7796/15.3... 2. Em execução do acordo e Plano de Insolvência referidos em 1 anterior: a. As Autoras desistem integralmente da totalidade dos pedidos formulados nestes autos contra as Rés, reconhecendo, para todos os devidos e legais efeitos; i. que o penhor sobre as ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. dado em garantia das obrigações da Espírito Santo Financial Group, S.A. foi válida e eficazmente constituído pela Partran, S.G.P.S., S.A., não padecendo de qualquer invalidade, nulidade ou ineficácia, mormente das alegadas na Petição Inicial que deu origem aos presentes autos; ii. que a venda das ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. pelo Novo Banco, S.A. à Calm Eagle, S.A.R.L. constitui igualmente um negócio inteiramente válido e eficaz e, tanto quanto puderam apurar, juntamente com as subsequentes operações de redução e aumento de capital, foi essencial para o restabelecimento da solvência daquela empresa e da continuação da sua atividade seguradora, conforme exigência do Instituto de Seguros de Portugal; iii. que, de acordo com o que puderam apurar, o preço de venda das ações da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. pago pela Calm Eagle, S.à.R.L. ao Novo Banco, S.A., refletiu o valor de mercado das referidas ações a essa data e no contexto referido em ii.; iv. e que, tanto quanto têm conhecimento, a execução do referido penhor, por via da venda referida em ii. e iii., liquidou a totalidade das obrigações contraídas pela Espírito Santo Financial Group, S.A. perante o Novo Banco, S.A. emergentes do financiamento que lhe foi concedido, no montante de € 48.545.109,17; b. As Autoras desistem ainda, especificamente e expressamente, do recurso interposto do Despacho com a ref. CITIUS nº .......82, de 22-10-20, que julgou inadmissível a retificação/ampliação do pedido inicialmente formulado para passar a abranger as ações da Seguradoras Unidas, S.A., e que se encontra pendente no Apenso C dos presentes autos; (…) 3. As Partes expressamente renunciam ao recurso da Sentença homologatória da presente transação nos seus precisos termos, não renunciando, contudo, ao recurso da decisão que venha a ser proferida quanto à dispensa de taxa de justiça remanescente e repartição de custas entre as partes.» A transacção em causa corresponde à concretização do “plano de insolvência aprovado e homologado por sentença no pº nº 7796/15.3..., de insolvência da A/PARTRAN que corre termos no Juízo de Comércio de ... – Juiz 7”, onde a recorrente também teve intervenção. Não estamos num quadro de litisconsórcio necessário (artº 33º CPC) o que a acontecer teria ferido de nulidade a tansacção em apreço – cfr. acórdão do STJ proferido no pº 75//10.4TVPRT.P1S1 – 6ª secção (não publicado) que conclui deste modo: “Não tendo intervindo na transacção judicial um litisconsorte necessário, verifica-se a ilegitimidade dos restantes a quem é defeso regular os interesses de quem, não intervindo, não aquiesceu, o que configura ilegitimidade das partes que transigiram e implica a recusa de homologação por sentença, nos termos do art. 300.º, n.º 3, do CPC” - a que corresponde hoje o artº 290º CPC. Estamos, pois, na presença dum caso paradigmático em que a legitimidade processual não coincide necessariamente com os sujeitos das relações jurídicas em discussão. Nas palavras lapidares de Pedro Paes de Vasconcelos, estudioso desta matéria, “a legitimidade distingue-se da titularidade” – in “A Autorização”, Coimbra Editora, 2012, pag.73. Falta responder a uma pergunta fulcral a que aludimos no início: A sentença homologatória da transacção transitou em julgado? Se sim, quais as consequências a retirar, designadamente, em termos da instância, que a recorrente/3ªA defende dever prosseguir em relação a si. A recorrente/3ªA limitou-se a questionar a falta de contraditório, por o prazo para esse fim ainda estar a decorrer (o que lhe foi concedido) e solicitar o prosseguimento dos autos para conhecer os pedidos que reformulou em função da sua representatividade accionista na PATRAN, o que não teve o acordo das partes (artº 264 CPC) e decisivamente, não era possível, uma vez que os intervenientes na transacção acordaram que: “Em execução do acordo e Plano de Insolvência referidos em 1 anterior: As Autoras desistem integralmente da totalidade dos pedidos formulados nestes autos contra as Rés, reconhecendo, para todos os devidos e legais efeitos.” A recorrente/3ªA, como é assinalado no acórdão recorrido, contraditoriamente reconheceu a extinção da instância (artº 277º d) CPC) em consequência da transacção/sentença e requereu o prosseguimento dos autos. Concomitantemente ao trânsito em julgado formou-se caso julgado formal (artº 620º CPC) a que, como se disse, não obsta, “a que se intente a acção destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação”, nos termos do acima enunciado artº 291º nº 2 do CPC - sobre o caso julgado e os meios processuais tendo em vista contrariar tal excepção dilatória, por exemplo, o acórdão do STJ, de 2-6-2021, proferido no pº nº 2381/19.3T8CBR.C1.S1 - 7.ª Secção - texto integral in: https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2021:2381.19.3T8CBR.C1.S1.ED?search=eSIRKg8aXO25y3L3V6M Retira-se do que fica dito, em consonância com o acórdão recorrido, que os actos processuais praticados após o trânsito da sentença homologatória da transacção (artº 628º CPC) não têm qualquer efeito, esgotado que estava o poder jurisdicional do Tribunal (artº 613º CPC). Concluindo e sumariando: -Transitada a sentença homologatória da transacção realizada nos autos com a consequente extinção da instância, está esgotado o poder jurisdicional do Tribunal, sem prejuízo da sua declaração de nulidade ou anulação, ou ainda de revisão da sentença com esse fundamento, nos termos do artº 291º nº 2 do CPC. DECISÃO - Assim e pelos fundamentos expostos, improcede a revista. Custas pela recorrente/3ªA. Lisboa, 12-12-2024 Afonso Henrique (relator) Isabel Salgado Emídio Santos ________
1. A Transação Civil na Litigância Extrajudicial e Judicial, Gestlegal, 2018, pp. 357-376. 2. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, 1987, p. 223. 3. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, p. 419. 4. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil…cit., p. 153. |