Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | TIBÉRIO NUNES DA SILVA | ||
Descritores: | POSSE CORPUS PRESUNÇÃO INVERSÃO DO TÍTULO RECURSO DE REVISTA QUESTÃO RELEVANTE CONCLUSÕES DA MOTIVAÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 07/14/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I. Para funcionar a presunção estabelecida no n.º 2 do artigo 1252.º, importa, articulando este preceito com o nº 2 do art. 1257º, ambos do Código Civil, que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado, portanto, de qualquer possuidor antecedente. II. A inversão do título de posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía, ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse. Se for exercida através da oposição, é necessário que o detentor torne directamente conhecida da pessoa em cujo nome possuía, de forma inequívoca e expressa, a sua intenção de actuar como titular do direito. III. O Tribunal não tem de atender a conclusões que não encontrem correspondência na motivação, pois aquelas são uma síntese desta, não podendo nelas suscitar-se questões não tratadas no local próprio (o “corpo” das alegações). | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I AA veio propor acção declarativa comum contra BB e mulher, CC, todos com os sinais dos autos, pedindo que: 1. Se declarasse ser o Autor dono e legítimo proprietário do prédio identificado no artº 6º da presente petição inicial; 2. Se condenassem os Réus a reconhecer ao Autor aquele direito de propriedade e a restituírem-lhe, livre de pessoas e em bom estado de conservação, o prédio em questão. Alegou, em resumo, que: Em 11 de Junho de 2014, o Autor, a sua mãe, DD, e o irmão, EE, procederam, por escritura pública, à partilha, por óbito de FF, do prédio urbano sito em ....... – ....., inscrito na matriz urbana sob o artigo ….20 dessa união de freguesias e descrito na Conservatória do Registro Predial com o n.º 18….... Por força da partilha, foi tal prédio adjudicado ao Autor. Ainda em vida, FF, pai do A., autorizou que os Réus ocupassem, a título meramente precário, uns anexos, adaptados a habitação, que fazem parte integrante do prédio referido, tendo eles, desde então, passado a residir aí. Já após a adjudicação do prédio ao Autor, continuou este a tolerar a permanência dos RR. nos aludidos anexos. Há cerca de um ano (à data da propositura da acção), o Autor apercebeu-se de que, para além dos referidos anexos, os ora Réus ocupam e utilizam outros anexos contíguos àqueles e o terreno adjacente, que também fazem parte integrante do prédio. Estas ocupações e utilizações ocorrem, todavia, sem qualquer autorização ou consentimento do Autor. Acresce que os Réus não se limitaram a ocupar os ditos anexos, tendo procedido a várias alterações nos mesmos. E também têm colhido frutos gerados pelo terreno adjacente do prédio em causa, tudo sem terem obtido a devida autorização do proprietário, o Autor. Assim, os Réus têm vindo a fazer uma ocupação e utilização ilegítima e abusiva do prédio e, apesar de interpelados para o fazerem, não o entregaram ao Autor. Contestaram os RR. Alegaram, em resumo, que: FF os incentivou e desafiou a irem residir para o prédio, em 1970, tendo, em 1974, mandado fazer obras e dizendo aos RR. que fossem para lá morar, que dava a casa para viverem, que a casa era dos RR., não pagariam renda e poderiam fazer as obras que entendessem. Mais tarde se faria a escritura. Os RR. ocupam, assim, os referidos anexos e logradouro do dito prédio urbano desde 1 de Novembro de 1974, com as características próprias da aquisição por usucapião. O A. nunca fez qualquer reparo ou avisou os RR., seja em vida do pai, FF, seja depois do falecimento deste. Concluíram pela improcedência dos pedidos do A. e deduziram reconvenção, pedindo que se declarasse que os RR. são, com exclusão de outrem, proprietários do prédio urbano identificado no artigo 6.º da petição inicial, por o terem adquirido por usucapião. Replicou o A., pugnando pela ineptidão da reconvenção ou, assim não se entendendo, pela interrupção do prazo de prescrição aquisitiva ou, ainda não se entendendo assim, pela improcedência da reconvenção. Viria o A. a falecer, tendo sido proferida, em 18-01-2017, sentença, na qual se julgaram habilitados a viúva, GG, e o filho, HH, para, na qualidade de herdeiros daquele, com eles prosseguirem os autos. Foi proferido despacho saneador, julgando-se inepta a reconvenção e absolvendo-se os Autores/reconvindos da instância. A reconvenção veio, na sequência de recurso, a ser admitida. No decurso do processo, viria ainda a falecer o 1º R., sendo proferida, em 23-10-2019, sentença que julgou habilitados, como sucessores do R., a viúva, CC, e os filhos, II, casada com JJ, e KK. Tendo sido, em 18-05-2018, proferida sentença, que julgou a acção improcedente e procedente o pedido reconvencional, condenando os Autores habilitados, GG e HH, a reconhecerem os Réus BB (viria a falecer já depois da sentença, em 09-11-2018, tendo havido lugar à habilitação dos identificados herdeiros) e mulher, CC, «como proprietários do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de setecentos metros quadrados, a confrontar do norte com Adutor ...., do sul, nascente e poente com serventia, sito em ...... – ....., na união de freguesias ........ e ....., inscrito na matriz urbana sob o artigo ….20 desta união de freguesias, descrito na conservatória do registro predial com o n.º 18….., que adquiriram por usucapião, qualidade de proprietários que se declara», dela interpuseram recurso os AA. habilitados. O Tribunal da Relação ….. proferiu acórdão, no qual se concedeu provimento ao recurso de apelação, revogando-se integralmente a sentença recorrida e, em consequência, julgando-se improcedente o pedido reconvencional, absolvendo-se os Autores do mesmo e, julgando-se procedente a acção, declarando-se os Autores habilitados donos e legítimos proprietários do prédio identificado no art° 6o da petição inicial, ou seja, do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de setecentos metros quadrados, a confrontar do norte com Adutor ...., do sul, nascente e poente com serventia, sito em ...... - ....., na união de freguesias ...... e ....., inscrito na matriz urbana sob o artigo ….20 desta união de freguesias, descrito na Conservatória do Registro Predial com o n.° 18….., e condenando-se os Réus a reconhecerem aos Autores habilitados aquele direito de propriedade e a restituírem, livre de pessoas e em bom estado de conservação, o prédio em questão. Inconformados, recorreram os RR. para este Supremo Tribunal, concluindo as suas alegações pela seguinte forma: “1. Em suma os Venerandos Juízes desembargadores, com a devida vénia que se impõe, efectuaram uma análise deficiente da factualidade provada, chegando mesmo a tecer considerações e a exemplificar, utilizando termos arcaicos, que em nada se compaginam com os factos e o contexto factual resultante provado nos Autos; 2. Partem ainda da premissa errónea, de que os Réus ora Recorrentes, foram ou (são) usufrutuários do bem identificado no artigo 6.º da P.I., ou em última resquia “caseiros”; 3. Ora salvo o devido respeito, não é o caso, em apreço, como resulta da factualidade Provada em H) K), L) e M), os Réus ora Recorrentes, não eram nem nunca foram caseiros ou usufrutuários na acessão do termo – usufrutuário é simples detentor em nome alheio do direito de propriedade não podendo a sua posse conduzir à aquisição do domínio por usucapião (RLJ, 105.º 203.º; cf nota ao artigo 1446.); e muito menos existiu uma desanexação de uma parcela de um prédio, de que os mesmos Recorrentes fossem administradores, integrando a num imóvel seu, em que exercessem posse em nome alheio (RP, 11-1-1979: CJ,1979, 1.º-225); 4. Portanto aqui chegados, fácil é de concluir que estamos perante uma realidade diferente, em 1 de Novembro de 1974, os Réus ora Recorrentes, – a incentivo e desafio do falecido FF para ocuparem os anexos dizendo “que podiam viver lá, que dava a casa para viverem, e que a casa era dos Réus” e que arranjava a casa ……., ou casa….., para os réus irem lá morar -, (conforme provado em K) e L), ocupam efectivamente, os referidos anexos e logradouro do referido prédio urbano, à vista de toda a gente, aí instalando a sua casa de morada de família como se comprova pelos factos provados e elencados nas alíneas HH) II), JJ), KK), TT) UU) e VV) fazendo mesmo obras de melhoramento e conservação, a expensas suas – factos provados sob as alíneas PP) e QQ), com conhecimento do FF e sem qualquer oposição do mesmo; 5. Há uma clara intenção do primitivo proprietário FF em transferir a posse daquela casa e a partir dessa entrega, os réus passaram a cultivar o terreno contiguo, nele fazendo benfeitorias e deles retirando os frutos que os mesmos produziram sem intervenção daquele ou família. 6. Portanto, aqui ocorre a “traditio” da coisa, do bem jurídico identificado no artigo 6.º da P.I.; 7. A partir desse momento (ele FF) distanciou-se por completo daquele espaço convivendo com alguma regularidade não como proprietário mas como visitante da casa; O seu antecessor, seu pai FF nunca exerceu poderes de facto sobre o prédio a não ser quando “o deu” aos réus ora recorrentes; 8. Sempre se dirá, e apenas por mera cautela, que, no caso vertente, dada a natureza da situação de facto envolvente, não releva a aquisição da posse por sucessão por morte já mas outrossim por inversão do título de posse pelos réus ora recorrentes aquando da ocupação do imóvel por sugestão de FF; 9. Há posse da coisa quando uma pessoa desfruta uma coisa nos termos de um direito, ou seja, ou seja, quando uma pessoa exerce sobre uma coisa a actividade correspondente ao conteúdo de um direito real. A posse é a situação em que uma pessoa actua como beneficiária da afectação de uma coisa independentemente de essa afectação ser considerada jurídico-positiva (A Menezes Cordeiro, Direitos Reais, 1979, 556); 10. A posse adquire-se pelo facto e pela intenção, e define-se por dois elementos essenciais: o «corpus», na aquisição originária, ou a «traditio», na aquisição derivada – que traduz na materialidade do facto; e o «animus», que se traduz na intenção de exercer o direito de propriedade (RP, 2-10-1979: CJ,1979, 4.º 1273); 11. Ora resulta provado das alíneas FF) GG) NN) PP) QQ) RR) SS) e PP) e indiciado que os Réus, ora Recorrentes, exerceram uma relação possessória material permanente e duradoura e daí que os factos que a integram têm de ser exercidos for forma a poder concluir-se que aquele que os pratica pretende exercer sobre a coisa um poder permanente (STJ, 6-7-1976: BMJ, 259.º-227); 12. Portanto a posse integra dois elementos: o corpus – seu elemento material – que consiste no domínio de facto sobre a coisa, traduzido no exercício efectivo de poderes materiais sobre ela, ou na possibilidade física desse exercício; e o animus, que consiste na intenção de exercer sobre a coisa como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto (Henrique Mesquita, Direitos Reais, 1966, 66 e 67); 13. Para que se verifique o corpus na posse de um direito de propriedade é desnecessário a manutenção inalterável de uma forma de exploração dada ao prédio ao longo de todo o prazo legal de usucapião; o que unicamente interessa é que durante todo esse prazo se tenham praticado actos de posse correspondentes ao direito de propriedade qualquer que seja a intensidade do aproveitamento efectuado mediante tais actos (P. Lima, RDES, 18.º- 249); 14. E no caso “strictu sensu”, da prova resultante como provada em sede de julgamento em 1.ª Instância, dúvidas não podem existir de que de facto, “Os Réus ora Recorrentes, ao ocuparem o Imóvel supra identificado e objecto de litígio em 1 de Novembro de 1974, à vista de toda a gente e população, e com o conhecimento e à vista de todos, a convite de FF, Possuidor Inicial, Réus e ora Recorrentes que nunca desempenharam qualquer função de caseiros, e não assumiram a posse nessa qualidade, pois, era funcionário da actual PT, afastando-se FF dos assuntos e dos destinos do imóvel, por mais evidência, “uma traditio” do Bem para os novos possuidores (réus e ora recorrentes, inicialmente BB e mulher, e agora a mulher CC e filhos devidamente habilitados), operando desde logo aqui a inversão do título da posse, pois claramente FF ao afirma que dava o Bem, desinteressando se pelo mesmo, inequivocamente queria e pretendia que os novos possuidores o possuíssem como efectivos e novos possuidores como se de proprietários se tratassem; 15. E de facto, e desde o início da sua posse, os réus e Recorrentes, possuidores de boa-fé, pacificamente, publicamente, e desde logo e ininterruptamente praticaram actos, no decurso do tempo e espaçadamente, ao longo de mais de 30 anos, sensivelmente 40 anos, tais como:; 16. Os Réus ora recorrentes mandaram construir e pagaram com dinheiro próprio deles fruto do seu trabalho, umas capoeiras, garagens e arrumos, mandaram aplicar portas e janelas em aproveitamento efectuado mediante tais actos (P. Lima, RDES, 18.º- 249); alumínio; fizeram os Réus ora recorrentes obras no ano de 1995 na cozinha grande, e por volta do anos de 2000, fizeram uma adega, um forno e garagem; 17. As obras foram feitas por diversos pedreiros e serventes, electricistas, carpinteiros e outras pessoas de ofícios similares, e liquidadas pelos Réus ora recorrentes, com dinheiro seu, com o conhecimento quer dos próprios executantes quer, das próprias pessoas e vizinhos que diariamente passavam na estrada pública que confronta com o prédio aqui em questão, sendo executadas também com conhecimento do falecido Autor e dos restantes herdeiros antes do registo do prédio, publicamente, de boa-fé, pacificamente e sem qualquer oposição; 18. Os Réus ora recorrentes tem plantado diversas árvores de frutos, fazendo as mesmas suas, bem como os frutos delas resultantes nas devidas épocas; 19. Os réus ora recorrentes amanharam a parcela de terreno, o logradouro, que faz parte integrante do prédio objecto do litígio que cultivam e recolhem os frutos da terra pacificamente, publicamente e sem oposição de quem quer que seja; 20. Actos sobre o imóvel intensos e demostrativos claramente, que sobre o mesmo exerceram uma posse inequívoca, e como o animus e estado psicológico de como se proprietários fossem; 21. E mesmo o facto de alei exigir o corpus e o animus para o efeito de haver posse implica que o possuidor tenha de provar a existência dos dois elementos. A prova do animus resulta, no entanto de uma presunção, isto é, o exercício do primeiro faz presumir a existência do segundo (Mota Pinto, Direitos Reais, 1971,191; 22. E quando o FF, falece em Janeiro de 1985, os réus, ora recorrentes, ainda intensificam mais a sua posse, quando desencadeiam as obras de fundo e edificações novas, atrás mencionadas, com o conhecimento e sem qualquer oposição dos herdeiros do falecido FF, e resulta dos factos provados LL), MM, NN), que é o próprio herdeiro do FF Sr EE, irmão do aqui Autor, e recorrido, que reconhece e afirma que o Réu BB já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao Prédio aqui em questão, para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender; 23. As facturas da água e da electricidade estão em nome do réu BB, liquidando este, todos dos meses as mesmas, aliás ao longo dos anos o mesmo foi instalando os ramais necessários na propriedade em questão; 24. E todos estes factos comprovativos de uma Posse firme, duradoura, de boa-fé, Pública, são verdadeiros que a própria viúva de FF, herdeira da herança, reconheceu o direito de aquisição dos Réus ora Recorrentes e a Posse dos Réus ora Recorrentes., em Janeiro de 2004, da casa do ..... ou Casa ...., Prédio urbano aqui em questão; (vide documento n.º 1, junto via citius com este articulado, que faz parte integrante do mesmo); 25. Ainda assim, não obstante estes factos, os Réus ora recorrentes detêm a posse há mais de 30 anos, sensivelmente há 40 anos da totalidade do Prédio aqui em questão, se não vejamos, inclusivamente durante este tempo todo “uma vida”, onde ao longo do tempo, morreram pessoas, nasceram filhos, casaram, nasceram netos, reformaram se pessoas, deu-se o 25 de Abril, entrou-se no Euro, transitou-se de Século, os Recorrentes desde sempre e mais uma vez com o conhecimento da população em geral, de vizinhos, dos próprios herdeiros, da viúva que também colhia alfaces, e tomates, bem como pimentos, amanharam a parcela de terreno, isto é o logradouro, que faz parte integrante do Prédio Urbano aqui em questão, e que os Recorrentes fazem sua, que cultivam e recolhem os frutos da terra pacificamente, de boa-fé, publicamente e sem oposição de quem quer que seja; 26. Todos estes factos são tão reais e traduzem uma vida, que o Próprio Presidente da União de Freguesias ....... e ....., atesta em certidão competente e válida, um atestado de residência dos RR. Reconvintes e ora recorrentes, na ....., há mais de 40 anos, o que traduz bem a posse do Prédio em questão publicamente e de boa-fé e pacífica (vide documento 16 junto via citius com este articulado, que faz parte integrante do mesmo); 27. Ainda assim, se se entendesse que não tinha operado a inversão do título da posse, no momento supra explanado, ou seja no momento inicial de ocupação do imóvel aqui em questão pelos réus, o mesmo, operou sem qualquer margem de dúvida também posteriormente, em 1985 e em diante, contra os herdeiros do falecido FF; 28. A oposição deve, além disso, ser dirigida contra a pessoa em nome de quem o opositor detinha a coisa e tornar-se dela conhecida.” –Acordão do STJ datado de 20.03.2014, disponível em www.dgsi.pt. No mesmo sentido o Dr. Durval Ferreira, na sua obra “Posse e Usucapião”, apoiando-se no ensinamento de Pires de Lima e Antunes Varela, Orlando de Carvalho e Oliveira Ascensão, afirma que com o requisito da oposição do detentor contra aquele em cujo nome possuía o artº 1265º pretende significar que é necessário e suficiente o detentor tornar “directamente” conhecida daquele, quer judicial, quer extrajudicialmente, “a sua intenção de actuar, no plano dos factos e empiricamente, “como sendo” titular do direito” (pág. 188); e acrescenta, mais adiante: “Não bastam, pois, meras “palavras”; é preciso que o inversor passe das palavras aos “actos” e que os actos sejam uma oposição “directa” e “como sendo dono”, ao possuidor. Mas basta, é suficiente, se o “acto” é a notificação do novo animus: um notum facere (uma declaração notificativa)” (pág. 190); 29. Pode assim dizer-se, em conclusão, que não chega para se verificar a inversão do título da posse que tenha havido por parte do detentor precário a intenção de o inverter; exige-se que a oposição se concretize em actos materiais ou jurídicos inequivocamente reveladores de que o opositor quer actuar, a partir da oposição, como titular do direito sobre a coisa e que essa actuação se dirija contra a pessoa em nome de quem detinha e dela se torne conhecida; 30. Não é razoável “tolerar” a presença dos réus, dos seus filhos ora recorrentes, de todo o seu modo de vida com uso e fruição da casa e terreno contíguos durante mais de 30 anos a não ser, quiçá, que tenha existido da parte do primitivo proprietário uma intenção de doação que no momento da partilha os herdeiros optaram por não honrar; 31. Já que o falecido autor AA sempre ali conheceu os réus ora recorrentes como residentes na casa usufruindo do espaço contíguo não sendo nenhuma surpresa, a ocupação nem mesmo existindo qualquer tentativa de apossamento de outras áreas que não aquelas já ocupadas; 32. Logo, com a devida vénia, não pode colher o entendimento dos Venerandos Juízes Desembargadores da Relação ….., que defendem que os réus ora recorrentes são meros detentores ou possuidores precários, por falta de prova do preenchimento do animus; 33. Se dúvidas restassem, vejamos; 34. Em caso de dúvida; 35. E se necessidade houvesse de superar o elemento subjectivo da posse sempre se teria de atentar que, o exercício de poderes de facto faz presumir a existência de posse, nos termos do artigo 1252º, nº 2, do CC, e atenta a doutrina definida pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 14-5-96, in D.R., II Série, de 24-6-96, segundo a qual “podem adquirir por usucapião, se a presunção não for elidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa”; 36. Ora salvo melhor entendimento, não estamos perante actos praticados pelos réus no imóvel, com o consentimento, expresso ou tácito – primeiramente do Sr FF e depois, do Autor e habilitados ora recorridos, sem que primeiramente o Sr FF não tenha pretendido atribuir um direito aos beneficiários Réus, ora recorrentes toda “uma vida”, uma casa de mora de família, edificações novas, plantações novas de árvores, colhimento dos frutos, nascimentos, casamentos, de facto os réus fariam tudo isto se psicologicamente e no seu interior não se considerassem efectivos proprietários do imóvel em questão? 37. Ora na perspectiva do Homem médio, e da valoração do mesmo, e seguindo a experiência comum de um homem médio, conforme a doutrina manda, concluímos que de facto os réus detêm e preenchem o corpus e o animus, elementos necessários para a verificação da posse do imóvel; 38. Assim, estatui o artigo 1287º do Código Civil que a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação. É o que se designa por usucapião, prescrição positiva ou aquisitiva, fundamento jurídico da aquisição do declarado direito de propriedade dos autores; 39. “Na linguagem corrente, “posse” exprime essencialmente a ideia de detenção de um objecto. Normalmente, quem qualifica uma situação de como posse quer não só exprimir a ideia de detenção mas também não tomar partido quanto ao título jurídico da detenção. (...) No campo do Direito, a ideia de posse, envolve, a maior parte das vezes, uma qualificação (positiva) de uma detenção. Essa qualificação é a de que a posse corresponde a uma actuação similar à de um proprietário-ainda que quem actua não seja proprietário (...)”-Rui Pinto Duarte, Curso de Direitos reais, pagina 264, editora Principia; 40. Usucapião que produz uma aquisição originária e que opera com efeitos retroactivos, reportados ao início da posse respectiva (artigo 1288º do Código Civil), mas que, relativamente ao direito possuído, não pode verificar-se nos detentores ou possuidores precários, excepto achando-se invertido o título de posse, caso em que o prazo para usucapir só corre desde a inversão do título (artigo 1290º do Código Civil). Princípio que entronca naquele outro de que a posse precária não constitui uma verdadeira posse, senão a partir do momento da interversio possessionis; 41. Posse que se traduz num elemento material de fruição de um direito (o corpus) e de um elemento intencional vertido na intenção de exercer um poder sobre as coisas (o animus sibi habendi); 42. Animus que resulta da natureza do acto jurídico por que se transferiu o direito susceptível de posse, na apelidada teoria da causa -Manuel Rodrigues, “A Posse”, pág. 259-elemento intencional que se dever aferir não pela vontade concreta do adquirente da posse mas pela natureza jurídica do acto que originou a posse; 43. Como simplistamente clarificava Manuel Rodrigues (obra citada): “... se a tradição se realizou em consequência de um acto de alienação da propriedade, a intenção que tem o adquirente é a de exercer o direito de propriedade. Se a tradição se realizou em consequência de um acto de locação, pelo qual se transferiu um determinado prédio, a intenção do locatário é a de exercer o direito pessoal de arrendatário"; 44. A noção de posse acolhida no art. 1251º do Código Civil – e que consiste no poder que se manifesta quando alguém actua por forma ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real – deve ser entendida segundo a concepção subjectivista, integrando no seu conceito jurídico quer o corpus quer o animus possidendi; 45. E assim, na análise de uma situação de posse devem distinguir-se dois elementos: 46. -Um elemento material –o corpus da posse –que se identifica com os actos materiais e se traduz no poder de facto sobre a coisa manifestado pela actividade exercida por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real, v.g., a detenção e/ou fruição da coisa, o exercício efectivo de poderes materiais sobre a coisa ou a possibilidade física desse exercício; 47. -Um elemento psicológico - o animus possidendi - que se traduz na intenção de exercer sobre a coisa, como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto e de se comportar, v. g., como seu proprietário; 48. Impera, igualmente, o entendimento doutrinário de que a presença e relevância deste elemento psicológico - o animus - não poderá ser recusada quando a actividade em que o corpus se traduz seja reveladora, por parte de quem a exerce, da vontade de criar em seu benefício uma aparência de titularidade correspondente ao direito de propriedade ou outro direito real; 49. Doutrina que se encontra plasmada em diversos arestos jurisprudenciais, onde, ao ser efectuada a interpretação do art. 1251º do Código Civil, se pode ler o seguinte: 50. “A posse está definida no art. 1251º, nº 1, do Código Civil, segundo a adopção subjectivista da iuris possessio de tradição romanista, pela conjugação dos dois elementos: o corpus e o animus; 51. O corpus expressa-se pela prática de actos materiais sobre a coisa; pelo exercício de poderes de facto sobre ela; pela apreensão material, física, sobre a coisa; é uma afirmação traduzida em actos materiais e jurídicos a que a ordem jurídica atribui efeitos; 52. O animus é retratado pela intenção do agente, exteriorizada pela prática desses actos, de actuar como titular do direito a que o exercício do poder de facto sobre a coisa corresponda” - Acórdão da Relação de Évora, de 25/1/1994, in BMJ, 433º/650; 53. Por sua vez no Ac. da Relação do Porto, de 20/9/1994, in BMJ, 439º/652, reitera-se que o art. 1251º do C. Civil acolheu o sistema subjectivo da posse, reportando-se ao corpus a expressão «quando alguém actua» e referindo-se ao animus a expressão «por forma correspondente ao direito de propriedade ou outro direito real»; 54. E aí se acrescenta: "Sendo necessário o corpus e o animus, o exercício daquele faz presumir a existência deste e, em consequência, o Autor não tem de provar o animus, cabendo ao R. demonstrar a sua inexistência"; 55. A este propósito refere Menezes Cordeiro: A usucapião em termos materiais assenta na excelência de uma posse qualificada e longa, surgindo como fonte legitimadora do domínio. O possuidor mostrou merecer ser proprietário. Paralelamente, qualquer outro pretendente veio a colocar-se, pelo seu desinteresse, na posição inversa de não merecer mais a titularidade que, de facto, enjeitou; 56. Em suma: a usucapião realiza a velha aspiração histórico-social de reconhecer o domínio a quem, de facto, trabalhe os bens disponíveis e lhes dê utilidade pessoal e social" -Menezes Cordeiro em artigo publicado na ROA, 53º (1993), pág. 38, em excerto transcrito no “Código Civil Anotado”, de Abílio Neto, p g. 893; 57. A aquisição da posse pode ser originária ou derivada, no primeiro caso por apossamento ou inversão do título e, no segundo, por tradição, constituto possessório ou sucessão por morte; 58. É de boa-fé quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem, presumindo-se de boa-fé a posse titulada e de má-fé a posse não titulada e a que for adquirida por violência, ainda que seja titulada (artigo 1260º do Código Civil); 59. É pacífica a posse adquirida sem violência, considerando-se violenta a obtida pelo uso de coacção física ou moral, e pública a que é exercida de modo a poder ser conhecida pelos interessados (artigo 1261º do Código Civil); 60. O possuidor goza da titularidade do direito, excepto se existir, a favor de outrem, presunção fundada no registo anterior ao início da posse (artigo 1268º nº 1 do Código Civil); 61. A regra é, pois, a de que a posse implica a presunção legal da titularidade do direito, e a excepção no caso de colisão entre ela e a presunção derivada do registo de um direito anterior ao início da posse caso em que prevalece esta última presunção; 62. Encontra-se registado o prédio em causa a favor do falecido autor AA em 2014 e, nessa altura, tinham decorrido mais de 30 anos desde que aos réus foi entregue a casa por FF; 63. Ora, como é bom de ver, não só os réus ora recorridos praticaram todos os actos de disposição e fruição da casa e terreno como a partir de 1985, com o falecimento de FF, o fizeram de forma categórica, clara e inequívoca firmaram a sua permanência aos herdeiros; 64. Destarte, atendendo ao lapso de tempo decorrido desde o início da posse – posse pública, pacífica e contínua - temos que concluir, forçosamente, que a manutenção dessa posse faculta ao possuidor a aquisição do direito de propriedade a cujo exercício corresponde a sua actuação; 65. E se necessidade houvesse de superar o elemento subjectivo da posse sempre se teria de atentar que, o exercício de poderes de facto faz presumir a existência de posse, nos termos do artigo 1252º, nº 2, do CC, e atenta a doutrina definida pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 14-5-96, in D.R., II Série, de 24-6-96, segundo a qual “podem adquirir por usucapião, se a presunção não for elidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa”; 66. Não obstante, e mesmo assim apenas por mera cautela V/Exas com a devida vénia Doutos e Excelentíssimos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, em caso de dúvida deverão aplicar o mencionado Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 14-5-96, in D.R., II Série, de 24-6-96, segundo a qual “podem adquirir por usucapião, se a presunção não for elidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa”; 67. E no vertente caso Sub Judice a presunção não foi elidida; 68. Assim e concluindo, dúvidas não podem restar com a devida Vénia a V/Exa Doutos e Excelentíssimos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça que os Réus, Reconvintes e ora Recorrentes, adquiriram o supra mencionado prédio identificado no artigo 6.º da presente petição inicial, ou seja, do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de setecentos metros quadrados, a confrontar do Norte com Adutor da ...., do Sul, nascente e poente com serventia, sito em ........ – ....., na União de freguesias ........ e ....., inscrito na matriz urbana sob o artigo ….20 desta união de freguesias, descrito na Conservatória do Registo Predial com o n.º 18…...., por Usucapião, nos termos do artigo 1287.º do Código Civil; 69. No caso em apreço estamos perante factos dos Recorrentes que justificam o instituto da usucapião, e mormente está ultrapassado o prazo máximo de 20 anos, nos termos do artigo 1296.º do CC., o que justifica plenamente tendo em conta os factos descritos na reconvenção e primeiramente na contestação a aquisição do Prédio identificado no artigo 6.º do douto articulado da Petição Inicial por parte dos ora recorrentes, ou seja a Posse pacífica, de boa-fé e pública pelos recorrentes, há mais de 30 anos, que segundo e pelo instituto da Usucapião deverá prevalecer sobre o direito de propriedade; 70. Bem andou o Tribunal a quo de 1.ª Instância, pois de todos os depoimentos das testemunhas são passiveis de provar sem qualquer margem para dúvidas a usucapião dos ora Recorridos (Réus/Reconvintes e Habilitados e ora Recorrentes) como adquirentes do imóvel por usucapião, como é possível provar o animus possidendi dos ora Recorridos, publicamente, de boa-fé, pacificamente e sem qualquer oposição; 71. Não obstante e apenas e só por mera cautela o Douto Acórdão do tribunal da Relação é padece do vício de NULIDADE, por falta de assinatura do Juiz Desembargador Jaime Castro Pestana, conforme se infere da página 58 do dito Acórdão; 72. Vício de Nulidade existente no Douto Acórdão da Relação ora recorrido, que ora se invoca e que os recorrentes arguem e alegam em conclusões, e que nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea a) do C.P.C., por remissão do artigo 666.º n.º 1 do C.P.C., se encontra violado ex vide artigo 674 n.1º alínea C) do C.P.C.; 73. Não obstante o presente Acórdão da Relação viola ainda nos termos do artigo 674.º n.º 1 a do C.P.C., o artigo 65.º da Constituição da República, que consagra o direito `habitação e urbanismo, nomeadamente o mesmo prescreve “Todos tem direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade”, ora o imóvel em questão é a casa de morada de família dos Réus, ora Recorrentes, donde resulta que o Douto Acórdão da Relação está ferido de uma inconstitucionalidade material; 74. O presente Acórdão da Relação, nos termos do artigo 674.º n.º 1 a) do C.P.C., viola ainda os artigos 1287.º do C.C., 1252.º n.º 2 do C.C. (existindo Jurisprudência Uniformizadora do STJ), artigo 1251.º do C.C, artigo 1253.º do C.C., artigo 1260 do C.C., artigo 1261.º do C.C, artigo 1262.º do C.C., artigo 1263.º do C.C., artigo 1265 do C.C . Nestes termos e nos demais de direito, deve ser, por V/Exas Juízes Concelheiros do Supremo Tribunal de Justiça, revogado o Acórdão proferido pelo Douto Tribunal da Relação de ….., e ser substituído por outro Acórdão que reconheça a aquisição a favor dos ora recorrentes o supra mencionado prédio identificado no artigo 6.º da presente petição inicial, ou seja, do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de setecentos metros quadrados, a confrontar do Norte com Adutor ...., do Sul, nascente e poente com serventia, sito em ...... – ....., na União de freguesias ....... e ....., inscrito na matriz urbana sob o artigo ….20 desta união de freguesias, descrito na Conservatória do Registo Predial com o n.º 18…....., por Usucapião, nos termos do artigo 1287.º do Código Civil, em suma que confirme a Douta Sentença do Tribunal A Quo de 1.ª Instância; Não entendendo assim devem V/Exas arguir a Nulidade do Douto Acordão do Tribunal da Relação, por falta de assinatura do Juiz Desembargador Jaime Castro Pestana, conforme se infere da página 58 do dito Acórdão, aplicável ex vi de nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea a) do C.P.C., por remissão do artigo 666.º n.º 1 do C.P.C. e artigo 674.º n.º 1 alínea c) do C.P.C.” Contra-alegaram os AA., concluindo o seguinte: “i. O art.º 639.º, n.º 1 do CPC regula ónus de alegar e de formular conclusões (devendo, estas últimas, constituir uma síntese da primeira). ii. As alegações de recurso apresentadas pelos Réus, ora Recorrentes, não observam, de todo em todo, o disposto no art.º 639.º, n.º 1 do CPC. iii. O art.º 639.º, n.º 2 do CPC impõe que, estando em causa matéria de Direito, o Recorrente indique, nas suas conclusões: a) As normas jurídicas supostamente violadas pelo Tribunal a quo; b) O sentido da interpretação das normas que, no entender o Recorrente, tenham sido mal aplicadas pelo Tribunal a quo; e c) Invocando-se erro na norma aplicável, qual a que, no entender do Recorrente, o deveria ter sido. iv. As alegações de recurso apresentadas pelos Réus, ora Recorrentes, não observa, nem de forma vagamente remota, aqueles comandos legais. v. O recurso de revista interposto pelos Réus, ora Recorrentes, jamais poderia ser conhecido. vi. O art.º 674.º, n.º 1 do CPC que a revista (só) pode ter por fundamento: xix) Violação da lei substantiva; b) Violação da lei processual; ou c) Qualquer das nulidades previstas nos art.ºs 615º e 666º do CPC. vii. Não poderem constituir objecto ou fundamento de revista a matéria de prova, nomeadamente alegados erros de apreciação da mesma. viii. Os Réus, ora Recorrentes, não se insurgem conta alegadas violações de lei substantiva ou de lei adjectiva. ix. Os Réus, ora Recorrentes insurgem-se exclusivamente contra a apreciação que o Tribunal a quo fez da matéria de facto; x. O recurso de revista apresentado pelos Réus, ora Recorrentes, não deverá, sequer, ser admitido. xi. Actualmente, a regra sobre a assinatura de actos processuais praticados pelos Senhores Magistrados Judiciais, em 1ª instância e em 2ª instância, é por meios electrónicos; xii. Consistindo, as assinaturas autografadas, a excepção. xiii. A circunstância de faltar, no douto acórdão ora recorrido, a assinatura autografada de um dos Mm.º Juízes Desembargadores, membro do colectivo, não constitui, por si só, uma nulidade. xiv. Mas ainda que existisse o vício apontado pelo Réus, ora Recorrentes, o mesmo seria facilmente suprível. xv. O Tribunal a quo fez uma correcta aplicação das normas legais substantivas ao caso concreto. xvi. O Tribunal a quo não violou qualquer norma adjectiva. xvii. O Tribunal a quo não inobservou quaisquer disposições reguladoras da produção de prova. xviii. O Tribunal a quo andou bem ao decidir nos termos em que decidiu, revogando, in totum, a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância. xix. O douto acórdão ora recorrido não merece qualquer censura.» * Sendo o objecto dos recursos definido pelas conclusões de quem recorre, para além do que for de conhecimento oficioso, importará, in casu, após abordagem prévia dos vícios apontados nas contra-alegações a respeito da admissibilidade do recurso, verificar se o acórdão padece da nulidade invocada pelos Recorrentes e se, diversamente do decidido no acórdão da Relação, devem considerar-se preenchidos, face à factualidade provada, os requisitos da aquisição por usucapião, por parte dos RR., do prédio identificado no art. 6º da petição inicial e na al. F) dos factos provados. II Vem dada como provada pelas instâncias a seguinte factualidade: “A) Em .. de Janeiro de 1985, na freguesia ......, concelho de ….., faleceu FF, com ultima residência habitual na ......, .., ..° …, …..; B) FF faleceu no estado de casado, em únicas núpcias e sob o regime de comunhão geral de bens com DD; C) O falecido FF não deixou testamento ou qualquer outra disposição de última vontade; D) Tendo deixado dois filhos sobrevivos, AA, falecido Autor, e EE, irmão do aqui falecido Autor; E) O falecido FF deixou assim como sucessores à herança AA e o seu irmão, EE, e sua mãe, a viúva do falecido, DD; F) Em 11 de Junho de 2014, por escritura exarada de folhas sete a folhas nove do livro de notas de escrituras para escrituras diversas número setenta – A, do Cartório Notarial …........ a cargo do notário LL, o ora Autor, AA, e sua mãe e irmão, DD G) Por força da partilha, foi adjudicado o referido prédio; H) Em vida, FF autorizou que os Réus ocupassem, uns anexos, adaptados a habitação, que fazem parte integrante do prédio anteriormente identificado tendo, desde então, os Réus passado a residir aí; I) Estas ocupações e utilizações ocorrem sem qualquer autorização ou consentimento do falecido Autor a partir de 29.01.2015 quando interpelou os Réus a desocuparem devoluto, pessoas e bens o prédio em causa, e, consequentemente, os seus anexos por carta remetida naquela data pelo seu Advogado; J) Até à presente data, os Réus ocupam e a utilizam em proveito próprio o referido prédio; K) O falecido FF em 1970 incentivou e desafiou os Réus a irem residir para o imóvel referido em F) e que ocupassem anexos do dito prédio urbano; L) O Sr.0 Engenheiro FF, que em 1974 mandou fazer as obras iniciais, dividindo a Casa ....., em cozinha e casa de banho e 2 quartos e uma sala, ordenou que os RR. fossem para lá morar dizendo “que podiam viver lá, que dava a casa para viverem, e que a casa era dos Réus” e que arranjava a Casa ......, ou casa do ....., para os RR. irem para lá morar; M) Os Réus ocupam os referidos anexos e logradouro de referido prédio urbano, em questão, desde 1 de Novembro de 1974, à vista de toda a gente; N) Os RR. sempre fizeram obras no referido imóvel de melhoramentos e de conservação a expensas suas, aos olhos de toda a gente e população; O) FF e o falecido autor AA tiveram conhecimento das mesmas; P) FF, nunca se intrometeu na realização das obras chegando mesmo a almoçar com os pedreiros e serventes das obras; Q) Os Réus colhem frutos e fazem-nos seus desde do ano de 1974, ninguém se opondo a tal prática; R) O falecido Autor AA vive em ….. há anos, e raramente visita a Quinta, ou frequenta a mesma, nem depois das escrituras de partilhas; S) O R. BB tinha trabalhado na ......., com 17 anos por volta do ano de 1957/1958; T) Por volta do ano de 1960 ingressou na tropa, esteve em Ultramar, foi prisioneiro de guerra, e depois por volta do ano de 1962, regressou do Ultramar; U) Em 8 de Janeiro de 1963, ingressou como trabalhador …… (…..), esteve três anos a trabalhar como …. em ........; V) Nesta altura já o Sr.0 FF era muito amigo do R. BB; W) Por volta do ano de 1966, foi estagiar também na ……, para ….., regressou o R. um ano depois para ........, por volta do Ano de 1967, e teve mais dois anos e meio em ........, como candidato a guarda fios com Prova B feita; X) Mais tarde foi trabalhar em 1969 para ............ em Março desse ano e esteve a residir em …..; Y) Veio para ......... e esteve 2 anos e meio, a trabalhar e a residir, nunca perdendo o contacto com o falecido Sr.0 FF que o visitava em ....... por diversas vezes o Réu, no sentido de lhe propor e de o convencer a ir para a .........., em ........, viver; Z) A R. mulher, Sr.a CC foi para ...... servir com 13 anos, na restante propriedade conexa e contigua ao Prédio em questão, que também pertencia ao falecido Sr.0 FF; AA) Aliás o próprio filho do falecido o Sr.0 EE irmão do Autor falecido é padrinho da filha dos RR., e o falecido Sr.° FF e a viúva, a Sra DD, padrinhos de casamento da R. Sr.a CC, sendo ainda esta última viva e consequentemente madrinha de casamento; BB) Em 1972/1973 o R. conseguiu uma transferência de ...... para .......... e em 1973, nos finais do ano, foi transferido para ........, transferência essa assinada em 1974, como TI – Técnico de telecomunicações e Exteriores; CC) Os supra mencionados acontecimentos eram acompanhados por falecido FF; DD) Por volta do Ano de 1974 FF voltou a contactar o R. com insistência no sentido de ele aceitar o convite de ele ir morar para a ......., mormente, na denominada Casa .........., prédio urbano, objecto do litígio; EE) Os Réus anuíram e aceitaram passando a Casa ..... com o seu perfeito conhecimento; FF) Os réus nunca receberam um ordenado por qualquer trabalho na Quinta ajudando porque queriam na vindima ....., fazendo suas as uvas e frutos que faziam parte do pequeno logradouro contíguo à casa; GG) Todos os anos a partir daí o Réu tem feito vinho com essas referidas uvas que usa em proveito próprio com conhecimento de toda a vizinhança e pacificamente; HH) Quando os RR. já lá estavam há 6 anos, nasceu um seu filho, o KK; II) A filha dos Réus residiu na ............ até casar, até por volta do ano de 1994, frequentou a escola Secundária ……bem como a escola primária em .......... e a sua residência era na ........; JJ) O filho dos Réus também residiu até ao ano de 2000, altura em que foi para a Universidade; KK) Desde que deixaram de ali residir os filhos dos réus têm os seus quartos no referido prédio e continuam a visitar os pais, nos fms-de-semana já com os seus filhos ( netos dos Réus), chegando a levar amigos, aos olhos de toda a população e de toda a vizinhança, de boa-fé, pacificamente, de conhecimento público de sem qualquer tipo de oposição; LL) Quando o Sr.0 FF faleceu, passado um mês do óbito, estando os seus filhos para ….. a formarem-se na Universidade e não vivendo na ......, a Viúva e à altura esposa do falecido, a Sra DD, solicitou e pediu ao aos Réus se não se importavam de gerir e olhar pela Quinta, ou seja, para trabalhar lá e para orientar os trabalhos da vinha e para gerir os trabalhadores, isto já lá vão mais de 20 e tal anos; MM) Os Réus acabaram por desempenhar tais tarefas temporariamente sem qualquer tipo de remuneração; NN) O Réu BB por volta do ano de 1987, ainda pediu um ordenado, mas o Sr.° EE, irmão do aqui A., afirmou que não lhe satisfaria o pedido, alegando que seria mais um ordenado, contrapondo que em contrapartida já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao Prédio aqui em questão, para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender se desse e se necessitasse, ao que estes RR. não aceitaram e deixaram de desempenhar funções e de colaborar, e continuaram a possuir o prédio e a usufruir dos frutos; OO) O irmão do R. BB e o sobrinho do Réu também ajudavam nalguns trabalhos, em obras e melhoramentos no Prédio aqui em questão e nas matanças de Porcos em que participavam FF, amigos em comum, a madrinha da R., ou seja, a viúva, e já depois do falecimento apenas a viúva, que por diversas vezes almoçava com os Réus quando se reunia a família desde, quando vinham os seus filhos e netos, ou quando se matavam animais e se fazia almoçaradas; PP) Os Réus mandaram construir e pagaram com dinheiro próprio deles fruto do seu trabalho, umas capoeiras, garagens e arrumos, mandaram aplicar portas e janelas em alumínio; fizeram os Réus obras na cozinha grande, fizeram uma adega, um forno e garagem; QQ) As obras foram feitas por diversos pedreiros e serventes, electricistas, carpinteiros e outras pessoas de ofícios similares, e liquidadas pelos Réus, com dinheiro seu, com o conhecimento quer dos próprios executantes quer, das próprias pessoas e vizinhos que diariamente passavam na estrada pública que confronta com o prédio aqui em questão, sendo executadas também com conhecimento do falecido Autor e dos restantes herdeiros antes do registo do prédio, publicamente, de boa-fé, pacificamente e sem qualquer oposição; RR) Os Réus têm plantado diversas árvores de frutos, fazendo as mesmas suas, bem como os frutos delas resultantes nas devidas épocas; SS) Os réus amanharam a parcela de terreno, o logradouro, que faz parte integrante do prédio objecto do litígio que cultivam e recolhem os frutos da terra pacificamente, publicamente e sem oposição de quem quer que seja; TT) Os RR., bem como o seu filho KK tem residência fiscal há mais de 30 anos em ........, ....., 2005-008 ....., ........, recebendo as suas cartas fiscais para pagamento de impostos, na referida residência; UU) O cartão de pensionista do Réu BB, data de 1993 e tem como domicílio ......., .........., ….-… ........; VV) As facturas da água e da electricidade estão em nome do réu BB, liquidando este, todos dos meses as mesmas; WW) O prédio inscrito a favor do autor/ herdeiros habilitados foi participado à matriz da autoridade tributária em 20.03.1987 constando como titular FF (cabeça de casal da herança de) cujo averbamento foi efectuado em nome de AA em 11.06.2014; XX) Em 08.01.2015 os Réus através do seu Ilustre Mandatário enviaram a correspondência de fls. 129 a fls. 131 dirigida a DD cujo teor se dá por integralmente reproduzido.” III III.1. Os Recorridos defenderam que os Recorrentes não cumpriram os ditames do art. 639º, nºs 1 e 2, do CPC e que não deveria ser admitido o recurso de revista. Na verdade, as conclusões contêm mais pontos que os do corpo das alegações. Mesmo assim, entende-se não se justificar o convite a que sejam sintetizadas, sem prejuízo de se entender que não se impõe o conhecimento das matérias nelas referidas que não tenham sido tratadas nas alegações (as conclusões devem ser uma síntese destas, como decorre do nº 1 do art. 639º, não servindo para suscitar matérias novas). Por outro lado, no que tange às indicações impostas pelo nº 2 do art. 639º, considera-se que, independentemente do respectivo mérito, não há razões para se concluir pela inobservância de tais regras, face aos preceitos e doutrina e jurisprudência mencionados pelos Recorrentes. Não estão, assim, configurados fundamentos bastantes para não se conhecer do objecto do recurso. III.2. Os Recorrentes, ainda que a título subsidiário, arguiram, nas conclusões do recurso, a nulidade do acórdão recorrido, por falta de assinatura do Exmº Desembargador Jaime Castro Pestana. Trata-se de uma omissão que, a existir, pode ser oficiosamente suprida pelo Tribunal (art. 615º, nº 1, a), e 2, ex vi dos arts. 666º, nº 1, e 679º do CPC). Ora, sucede que o acórdão está devidamente assinado, pois nele se consignou o voto de conformidade do referido Exmº Desembargador, o que tem sustento legal no art. 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13-03 (diploma que estabelece medidas excepcionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus - COVID 19), aditado pelo DL nº 20/2020 de 01-05. Não se verifica, assim, a invocada nulidade. IV IV.1. Conforme se deixou relatado, o A., AA, entretanto falecido, alegando ser proprietário do prédio identificado no art. 6º da petição inicial (e, agora, na al. F) dos factos provados), que lhe foi adjudicado em partilha realizada através de escritura pública, que teve lugar em 11-06-2014, e alegando ainda que os RR. têm ocupado esse prédio, ao qual acederam por autorização do pai do A., a título precário, por mera tolerância, veio pedir que lhe fosse reconhecido o direito de propriedade e que os RR. fossem condenados a entregar-lhe o prédio. Os RR., invocando a aquisição por usucapião, alegando a existência de uma posse que entendem com características para tanto, iniciada em 1974, na sequência de autorização do pai do A., que os convidou a lá viver, referindo que lhes dava a casa para o efeito, deduziram reconvenção, pedindo que lhes fosse reconhecida a propriedade sobre o mesmo prédio. Na sentença proferida na 1ª Instância, julgou-se a acção improcedente e procedente a reconvenção, escrevendo-se, entre o mais, na fundamentação, o seguinte: «A regra é, pois, a de que a posse implica a presunção legal da titularidade do direito, e a excepção no caso de colisão entre ela e a presunção derivada do registo de um direito anterior ao início da posse caso em que prevalece esta última presunção. Encontra-se registado o prédio em causa a favor do falecido autor AA em 2014 e, nessa altura, tinham decorrido mais de 30 anos desde que aos réus foi entregue a casa por FF. O falecido autor AA só assume a qualidade de possuidor se o bem lhe for adjudicado na partilha (sucedendo então na posse do antecessor com efeitos à data da abertura da sucessão) ou se inverter o título de posse. O seu antecessor, seu pai FF nunca exerceu poderes de facto sobre o prédio a não ser quando “o deu” aos réus. A partir desse momento distanciou-se por completo daquele espaço convivendo com alguma regularidade não como proprietário mas visitante da casa. No caso vertente, dada a natureza da situação de facto envolvente, não releva a aquisição da posse por sucessão por morte já mas outrossim por inversão do título de posse pelos réus aquando da ocupação do imóvel por sugestão de FF. Havendo título de aquisição e registo deste, a usucapião tem lugar quando a posse de boa fé durar dez anos contados desde a data do registo ou, ainda que seja de má fé, se houver durado quinze anos contados da mesma data (artigo 1294º do Código Civil). Inexistindo registo do título ou da mera posse, a usucapião só ocorre no termo do prazo de quinze anos se a posse for de boa fé, e de vinte anos se for de má fé ou de boa fé não titulada (artigo 1296º do Código Civil). Por morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores desde o momento da morte, independentemente da apreensão material da coisa, o que significa que a transferência da posse se verifica por mero efeito da lei e que, com a abertura da herança, não se inicia uma nova posse, formando antes a posse dos sucessores e a do de cujus um todo (art. 1255.º do CC). Se é certo que na partilha de bens por óbito do pai do aqui falecido autor AA lhe foi adjudicada parcela onde este prédio está integrado, não podemos olvidar o inegável facto de os réus desde 1974 viverem na casa em apreço inclusive com o conhecimento do próprio. Tal pretensão também não procede pelo facto de ter ficado demonstrado que, após a partilha, os réus continuaram a explorar as utilidades da casa e terreno na esteira do direito atribuído ainda em vida por FF. Até à data em que foram interpelados pelo autor, os réus dispuseram da habitação e área contígua como se proprietários fossem realizando obras necessárias ali localizando o seu centro de vida familiar. Até aquela data nem FF nem os seus herdeiros ou terceira pessoa em nome daqueles se opuseram de qualquer forma praticando actos que os inibissem ou alertassem para a condição precária que foi alegada (e não provada). O apossamento pelos Réus é notório traduzido numa apropriação material da coisa (art. 1263º, a) do Código Civil), com a prática reiterada de actuação material sobre a mesma com uma tal intensidade que foi significativa da intenção de se apoderar dela. Há uma clara intenção do primitivo proprietário FF em transferir a posse daquela casa e a partir dessa entrega, os réus passaram a cultivar o terreno contíguo, nele fazendo benfeitorias e deles retirando os frutos que os mesmos produziram sem intervenção daquele ou família. Foi neste quadro geral e informal de doação de bens, muito frequente em meios rurais, que se inscreve a entrega do prédio, objecto do litígio. […] Resultou provado que: por volta do ano de 1974 FF voltou a contactar o R. com insistência no sentido de ele aceitar o convite de ele ir morar para a ......, mormente, na denominada Casa .........., Prédio Urbano, objecto do litígio. Os Réus anuíram e aceitaram passando a Casa ...... com o seu perfeito conhecimento. Os réus nunca receberam um ordenado por qualquer trabalho na Quinta ajudando porque queriam na vindima ...., fazendo suas as uvas e frutos que faziam parte do pequeno logradouro contíguo à casa. Todos os anos a partir daí o Réu tem feito vinho com essas referidas uvas que usa em proveito próprio com conhecimento de toda a vizinhança de boa-fé e pacificamente. Os Réus ofereciam laranjas e outros frutos a amigos, à família, aos seus filhos e à viúva de FF, chegando esta a almoçar em casa dos Réus. Os réus amanharam a parcela de terreno, o logradouro, que faz parte integrante do prédio objecto do litígio que cultivam e recolhem os frutos da terra pacificamente, de boa-fé, publicamente e sem oposição de quem quer que seja. O Réu BB por volta do ano de 1987, ainda pediu um ordenado, mas o Sr.º EE, irmão do aqui A., afirmou que não lhe satisfaria o pedido, alegando que seria mais um ordenado, contrapondo que em contrapartida já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao prédio aqui em questão, para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender se desse e se necessitasse, ao que estes Réus não aceitaram e deixaram de desempenhar funções e de colaborar, e continuaram a possuir o prédio e a usufruir dos frutos. Ora, como é bom de ver, não só os réus praticaram todos os actos de disposição e fruição da casa e terreno como a partir de 1985, com o falecimento de FF, o fizeram de forma categórica, clara e inequívoca firmaram a sua permanência aos herdeiros. Destarte, atendendo ao lapso de tempo decorrido desde o início da posse – posse pública, pacífica e contínua - temos que concluir, forçosamente, que a manutenção dessa posse faculta ao possuidor a aquisição do direito de propriedade a cujo exercício corresponde a sua actuação. E se necessidade houvesse de superar o elemento subjectivo da posse sempre se teria de atentar que, o exercício de poderes de facto faz presumir a existência de posse, nos termos do artigo 1252º, nº 2, do CC, e atenta a doutrina definida pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 14-5-96, in D.R., II Série, de 24-6-96, segundo a qual “podem adquirir por usucapião, se a presunção não for elidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa”. Por todo o exposto, na improcedência do pedido principal e procedência do pedido reconvencional falecem os argumentos do falecido autor e autores habilitados.» Como se vê, considerou-se, na sentença, estarem preenchidos os requisitos da usucapião e daí que se tenha reconhecido aos RR. o direito de propriedade sobre o prédio. Não foi essa a posição do Tribunal da Relação …... Interrogando-se sobre se os RR. lograram fazer prova «capaz de obstar a que ao autor possa ser reconhecida a sua pretensão reivindicante e, simultaneamente, lhe proporcionar a propriedade deste prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de setecentos metros quadrados (…)», o Tribunal a quo começou por dizer o seguinte: «Basta a leitura do pedido reconvencional, que por isso se transcreveu no relevante, para se concluir pela óbvia improcedência, porquanto os réus pedem, como referido, que seja declarado que são com exclusão de outrem proprietários do Prédio urbano identificado no artigo 6.° da Petição Inicial, por o terem adquirido por usucapião. Porém, limitam-se a alegar, como causa de pedir, tão só actos materiais sobre parcela do imóvel - os anexos, denominados Casa .......... ou casa do ..... e respectivo logradouro, ou seja, sobre determinada parcela do prédio em questão. Ora os alegados actos materiais, fundamento da putativa aquisição do direito de propriedade por usucapião configurada na reconvenção em benefício dos réus, sobre parcelas do prédio - anexos denominados Casa .......... ou casa do ..... e respectivo logradouro -, jamais se podem alastrar a todo o imóvel, para eventualmente permitir a putativa aquisição do prédio identificado no art° 6o da petição inicial-objecto reivindicado-. Por outro lado, o facto de a lei exigir o "corpus" e o "animus" para efeitos de posse relevante, tais requisitos integram a causa de pedir, e por conseguinte impõe-se a sua alegação. Ao domínio material sobre a coisa tem de acrescer o requisito do animus possidendi, ou seja, a intenção de exercerem, como seus titulares, o direito real sobre a coisa e não um mero poder de facto sobre ela (questão diversa da presunção consignada no art° 1252°, n°2 do C.C,) o que se omite completamente no pedido reconvencional, que se fundamenta simplesmente na traditio dos anexos denominados Casa ..... ou casa do ..... e respectivo logradouro, situados na ......... efectuada pelo pai do autor, FF, aos réus.» Prosseguindo, o Tribunal a quo sopesou a factualidade provada, trouxe à colação, com o auxílio de pertinente doutrina, os elementos normativos essenciais à subsunção dos factos ao direito e, em seguida, passou à apreciação do caso concreto. Considerou-se que, da factualidade provada, resultou que FF, em 1970, incentivou e desafiou os Réus a irem residir para o imóvel referido em F) e que ocupassem anexos do dito prédio urbano, dizendo que os Réus fossem para lá e "que podiam viver lá que dava a casa para viverem, e que a casa era dos Réus" e que arranjava a Casa .........., ou casa do ....., para os réus irem para lá morar. E, assim, em 1974, FF, mandou fazer as obras iniciais, dividindo a Casa ..... em cozinha e casa de banho e 2 quartos e uma sala, ocupando os Réus os referidos anexos e logradouro do dito prédio urbano, desde 1 de Novembro desse ano. Entendeu o Tribunal a quo que se pode extrair da factualidade provada a conclusão de «que nem a coisa foi entregue aos réus como se sua fosse já, nem estes nesse estado de espírito (de proprietários) podiam praticar sobre a coisa entregue, actos materiais correspondentes ao direito de propriedade», tratando-se de um caso susceptível de enquadramento nas situações em que «os proprietários de quintas frequentemente "davam casa" com o propósito dos respectivos beneficiários "lá viverem com o seu agregado familiar", ou seja, aí podendo centralizar a sua casa de morada de família, como contrapartida, ainda que parcial, de serviços prestados ou não, ou, simplesmente "olhar pela quinta"». E acrescentou: «Analisando a situação dos autos, parece ser neste contexto que se tem de enquadrar e valorar a entrega aos réus dos anexos denominados Casa .......... ou casa do ..... e respectivo logradouro, pelo pai do autor, seu reconhecido proprietário, e, que devem ser valoradas as palavras por si proferidas dirigidas aos réus: "que podiam viver lá, que dava a casa para viverem, e que a casa era dos Réus", o que vem a ser corroborado, mais tarde, "Quando o Sr.° FF faleceu, ...a Viúva e à altura esposa do falecido, a Sra DD, solicitou e pediu ao aos Réus se não se importavam de gerir e olhar pela Quinta, ou seja, para trabalhar lá e para orientar os trabalhos da vinha e para gerir os trabalhadores, isto já lá vão mais de 20 e tal anos; Os Réus acabaram por desempenhar tais tarefas temporariamente sem qualquer tipo de renumeração; O Réu BB por volta do ano de 1987, ainda pediu um ordenado, mas o Sr. ° EE, irmão do aqui A., afirmou que não lhe satisfaria o pedido, alegando que seria mais um ordenado, contrapondo que em contrapartida já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao Prédio aqui em questão para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender se desse e se necessitasse,..." - factos provados sob as alíneas LL), MM) e NN), ainda que não se tenha apurado se existia alguma obrigação ou contrapartida devida pelas réus pela ocupação das ditas instalações, ou que a mesma tenha ocorrido simplesmente por virtude das relações de amizade, também muito frequente nestes contextos, e que igualmente se pode inferir do facto provado sob a alínea Z).» Concluiu o Tribunal recorrido que «com a entrega das referidas instalações, os réus adquiriram o corpus possessório, mas não adquiriram o animus, ficando, pois, na situação de meros detentores ou possuidores precários.», não se reunindo, por isso, os requisitos da usucapião (arts. 1287º e 1290º do C. Civil), ademais por não estar demonstrada a inversão de título de posse. IV.2. Conforme é dito no acórdão recorrido, estamos perante uma acção de reivindicação, vindo previsto no art. 1311º do Cód. Civil o seguinte: «1. O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence. 2. Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei.» Como referem Pires de Lima e A. Varela, no Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª ed., com a colaboração de M. Henrique Mesquita, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pp. 112-113: «A acção de reivindicação prevista neste artigo é uma acção petitória que tem por objecto o reconhecimento do direito de propriedade por parte do autor e a consequente restituição da coisa por parte do possuidor ou detentor dele. […] São dois os pedidos que integram e caracterizam a reivindicação: o reconhecimento do direito de propriedade (pronuntiatio), por um lado, e a restituição da coisa (condemnatio), por outro.» Os RR., em sede de reconvenção, invocaram a aquisição por usucapião. Dispõe o art. 1287º do C. Civil: «A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião.» Se, como ensina Oliveira Ascensão, nada pode contra a usucapião, «ultima ratio na solução dos conflitos entre adquirentes de direitos reais» (Direitos Reais, Almedina, Coimbra, 1978, pág. 415), há que, naturalmente, demonstrar os requisitos necessários para o efeito. A posse define-se por dois elementos essenciais: o corpus e o animus, tratando-se o primeiro do elemento material (identificando-se com os actos materiais praticados sobre a coisa, com o exercício de certos poderes sobre esta) e o segundo do elemento psicológico (que se traduz na intenção de se comportar como titular do direito real correspondente aos actos praticados). Refere Pereira Rodrigues, na sua obra Usucapião: Constituição Originária de Direitos Através da Posse, Almedina, Coimbra, 2008, p. 19, que o "animus" está intimamente relacionado com a forma da investidura da posse: se esta for derivada, o tipo de negócio jurídico de que deriva a posse domina o "animus", mas se a investidura da posse for unilateral, o "animus" terá de ser muito mais marcado e resultará de toda a actuação do possuidor». No Acórdão do STJ de 14-05-1996 (Rel. Amâncio Ferreira) e publicado no DR, II Série de 24-06-1996, bem como in BMJ 457º, 55 e em www.dgsi.pt, fixou-se Jurisprudência no seguinte sentido: Podem adquirir por usucapião, se a presunção não for ilidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa. Na fundamentação deste aresto, considerou-se, a dado passo: «O acto de aquisição da posse que releva para a usucapião terá assim de conter os dois elementos definidores do conceito de posse: o corpus e o animus. Se só o primeiro se preenche, verifica-se uma situação de detenção, insusceptível de conduzir à dominialidade. Por ser difícil, se não impossível, fazer a prova da posse em nome próprio, que não seja coincidente com a prova do direito aparente, estabelece o n. 2 do artigo 1252, como já o fazia o parágrafo 1 do artigo 481 do Código de 1867, uma presunção de posse em nome próprio por parte daquele que exerce o poder de facto, ou seja, daquele que tem a detenção da coisa (corpus) (…).» No Ac. do STJ de 12-05-2016, Proc. 9950/11.8TBVNG.P1.S1, Rel. Tomé Gomes, publicado em www.dgsi.pt, considerou-se que: «I - A presunção estabelecida no n.º 2 do art. 1252.º do CC é estabelecida em favor do pretenso possuidor, pelo que, não logrando ele provar o animus, recairá então sobre a parte contrária a prova da falta deste, sob pena de funcionar a respetiva presunção, a partir da factualidade demonstrada quanto ao corpus, na linha do doutrinado no AUJ do STJ, de 14/05/1996. II - Todavia, para que aquela presunção opere com a ressalva da presunção da mesma natureza estabelecida no n.º 2 do art. 1257.º do CC, importa que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado, portanto, de qualquer possuidor antecedente.» Na fundamentação deste aresto, ponderou-se, entre o mais, o seguinte: «Sucede que, por vezes, o corpus possessório assume tal nitidez significante – como na generalidade da prática reiterada prevista na aliena a) do artigo 1263.º do CC – que dele se poderá presumir com relativa facilidade o animus correspondente ao conteúdo de determinado direito real; noutros, porém, essa materialidade apresentar-se-á tão equívoca de sentido ou tão esbatida que chega a confundir-se com situações de mera detenção, casos em que o animus assumirá papel de relevo na caracterização da posse. Foi, pois, ante tal dificuldade que o n.º 2 do artigo 1252.º do CC passou a estatuir que: Em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 1257.º Sobre a interpretação e aplicação deste este normativo, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) do STJ, de 14/05/1996, publicado no Diário da República, II Série, n.º 144, de 24/06/1996, firmou doutrina no sentido de que: Podem adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa. Por seu lado, o n.º 2 do artigo 1257.º prescreve o seguinte: Presume-se que a posse continua em nome de quem a começou. Encontramo-nos assim perante duas presunções legais iuris tantum confinantes, importando determinar o âmbito de aplicação de uma e de outra. A esse propósito, Pires de Lima e Antunes Varela […] referem que: «O n.º 2 estabelece uma presunção de posse em nome próprio por parte daquele que exerce o poder de facto, ou seja, daquele que tem a detenção da coisa (corpus), salvo se não foi o iniciador da posse (referência ao n.º 2 do art. 1257.º).» Significará isto que, para funcionar a presunção estabelecida no n.º 2 do artigo 1252.º do CC importa que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado portanto de qualquer possuidor antecedente, como nos casos de aquisição originária da posse por prática reiterada ou por inversão do título de posse, previstos, respetivamente, nas alíneas a) e c) do artigo 1263.º do CC. Já nos casos de aquisição derivada da posse, como sucede com a tradição material ou simbólica, efetuada pelo anterior possuidor, prevista na alínea b) do mesmo artigo, prevalecerá a presunção ilidível estabelecida no n.º 2 do art.º 1257.º, segundo a qual se presume que a posse continua no anterior possuidor, competindo assim ao adquirente provar não só a mera materialidade da traditio mas também a intencionalidade subjacente, mormente o negócio em se fundou aquela traditio.» Conforme é assinalado, a dado passo, «para funcionar a presunção estabelecida no n.º 2 do artigo 1252.º do CC importa que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado portanto de qualquer possuidor antecedente». Há, ainda, que ter em atenção o disposto no art. 1255º do C. Civil, de acordo com o qual: «Por morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores desde o momento da morte, independentemente da apreensão material da coisa.» Alegam os Recorrentes que o Tribunal a quo partiu da premissa errónea de que os Réus foram ou (são) usufrutuários ou “caseiros” do bem identificado no artigo 6.º da P.I., sendo de concluir «que estamos perante uma realidade diferente, em 1 de Novembro de 1974, os Réus ora Recorrentes, – a incentivo e desafio do falecido FF para ocuparem os anexos dizendo “que podiam viver lá , que dava a casa para viverem, e que a casa era dos Réus” e que arranjava a casa do ….., ou casa do ….., para os réus irem lá morar -, (conforme provado em K) e L), ocupam efectivamente, os referidos anexos e logradouro do referido prédio urbano, à vista de toda a gente, aí instalando a sua casa de morada de família como se comprova pelos factos provados e elencados nas alíneas HH) II), JJ), KK), TT) UU) e VV) fazendo mesmo obras de melhoramento e conservação, a expensas suas – factos provados sob as alíneas PP) e QQ), com conhecimento do FF e sem qualquer oposição do mesmo». Acrescentam que houve uma «clara intenção do primitivo proprietário FF em transferir a posse daquela casa e, a partir dessa entrega, os réus passaram a cultivar o terreno contíguo, nele fazendo benfeitorias e deles retirando os frutos que os mesmos produziram sem intervenção daquele ou família», razão por que ocorre a “traditio” da coisa, do bem jurídico identificado no artigo 6.º da p.i.». O bem jurídico a que se refere o art. 6º da p.i. – lembre-se – é aquele que vem também identificado na al. F) dos factos provados e que foi objecto de partilha entre os herdeiros (viúva e filhos) de FF: o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, anexos para garagem, arrecadações e logradouro com a área de O Tribunal a quo teve, desde logo, em conta o que foi alegado pelos próprios RR. na contestação-reconvenção, vincando que estes se reportaram a uns anexos, denominados Casa .......... ou casa do ..... e respectivo logradouro, ou seja, sobre determinada parcela do prédio em questão, não podendo os actos que invocam como consubstanciadores da posse tendente à aquisição por usucapião alastrar-se a todo o imóvel «para eventualmente permitir a putativa aquisição do prédio identificado no art° 6o da petição inicial-objecto reivindicado». Procura, depois, o Tribunal recorrido, sem qualificar os RR. de usufrutuários ou caseiros, contextualizar os factos relativos à alegada doação por parte de FF, conjugando o acto inicial de entrega dos ditos anexos e logradouro com a outra factualidade provada, de modo a poder apurar-se se houve uma posse em nome próprio ou se os actos dos RR. não representam mais do que uma posse precária, advinda de uma situação de mera tolerância. Assim, o Tribunal da Relação considerou factos como os que emergem das alíneas LL), MM) e NN), que, recorde-se, são do seguinte teor: «LL) Quando o Sr.0 FF faleceu, passado um mês do óbito, estando os seus filhos para …. a formarem-se na Universidade e não vivendo na ......, a Viúva e à altura esposa do falecido, a Sra DD, solicitou e pediu ao aos Réus se não se importavam de gerir e olhar pela Quinta, ou seja, para trabalhar lá e para orientar os trabalhos da vinha e para gerir os trabalhadores, isto já lá vão mais de 20 e tal anos; MM) Os Réus acabaram por desempenhar tais tarefas temporariamente sem qualquer tipo de remuneração; NN) O Réu BB por volta do ano de 1987, ainda pediu um ordenado, mas o Sr.° EE, irmão do aqui A., afirmou que não lhe satisfaria o pedido, alegando que seria mais um ordenado, contrapondo que em contrapartida já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao Prédio aqui em questão, para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender se desse e se necessitasse, ao que estes RR. não aceitaram e deixaram de desempenhar funções e de colaborar, e continuaram a possuir o prédio e a usufruir dos frutos». Estamos perante factualidade que deixa transparecer que a prestação de tarefas por parte dos RR. – que, conforme se retira da al. MM), as desempenharam temporariamente sem qualquer tipo de remuneração – teria um cunho de “contrapartida” da ocupação das instalações em que viviam e dos frutos que colhiam do terreno (logradouro). O termo “contrapartida” (que EE já julgava suficiente, em face da realidade existente, tendo por injustificado “mais um ordenado”) é precisamente aquele que consta da al. NN). Discorda-se, assim, da tese dos Recorrentes quando, a seu favor, pretendem ver, no que vem vertido nestas alíneas, a demonstração do reconhecimento de uma posse em nome próprio. Diga-se que não se provou o que os RR. haviam alegado quanto a FF ter dito que mais tarde se faria a escritura. Na verdade, deu-se como não provado, na sentença (e tal não foi alterado pelo acórdão), que: «Nas circunstâncias referidas em M), FF tivesse também dito “não pagavam renda, e mais uma vez disse a casa é vossa e dos vossos filhos, e podem fazer as obras que entenderem e que acharem necessárias, mais tarde se fará a escritura”» As obras de melhoramentos ou conservação (eventuais benfeitorias – art. 216º do C. Civil) não são, necessariamente, sinónimo de actuação como proprietário. Invocam os Recorrentes a inversão do título de posse, aquando da ocupação do imóvel por sugestão de FF. Nos termos do art. 1265º do C. Civil, a inversão do título de posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse. Pires de Lima e A. Varela, relativamente à inversão do título de posse, esclarecem (op. cit., p. 30, com destaques nossos a negrito): «A inversão do título da posse (a chamada interversio possessionis) supõe a substituição de uma posse precária, em nome de outrem, por uma posse em nome próprio. A uma situação sem relevo jurídico especial vem substituir-se uma posse com todos os seus requisitos e com todas as suas consequências legais. A inversão pode dar-se por dois meios: por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía, ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse. O caso mais corrente é o do arrendatário que, em certo momento, se recusa a pagar as rendas com o fundamento de que o prédio é seu. Torna-se necessário um acto de oposição contra a pessoa em cujo nome o opoente possuía. Nesse sentido pode dizer-se que ainda se mantém a regra nemo sibi causam possessionis mutare potest. Não basta sequer que a detenção se prolongue para além do termo do título (depósito, mandato, usufruto a termo, etc.) que lhe servia de base. O detentor há-de tornar directamente conhecida da pessoa em cujo nome possuía (quer judicial, quer extrajudicialmente) a sua intenção de actuar como titular do direito.» Não estando em causa um acto de terceiro capaz de transferir a posse (Pires de Lima e A. Varela dão como exemplo de uma situação dessas a de o arrendatário comprar o prédio, não ao seu senhorio, mas a um terceiro – ibidem, p. 31), teria de demonstrar-se a existência de um acto de oposição contra a pessoa em cujo nome o agente vinha possuindo. Referem Rui Pinto e Cláudia Trindade, em anotação ao art. 1265º, no Código Civil Anotado, Ana Prata (Coord.), vol. II, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, pp. 47-48, que (também com destaque nosso): «[…] o ato de oposição traduz-se em o possuidor em nome alheio exprimir a sua intenção de deixar de representar na posse o representado e passar a agir como beneficiário do direito. Por outras palavras, declara um animus possidendi. Ex.: Carlos, usufrutuário da casa de Francisco, diz a este querer ficar com a casa para si, deixa de pagar a prestação anual que haviam acordado, e impede a entrada de Francisco na casa. A grande maioria da doutrina exige que essa oposição seja expressa e comunicada ao antigo possuidor, ou seja, consista numa declaração de vontade dirigida ao possuidor, não bastando atos de incumprimento do acordo, como deixar de pagar rendas. Esta interpretação tem a seu favor proteger melhor todo o sujeito que coloca outro a tomar conta de coisa sua. Concordamos em que tem de haver uma declaração expressa: parece-nos que não basta deixar de cumprir obrigações contratuais – não pagar a renda de casa – ou praticar atos materiais que o contrato não exigiria ou não permitiria – fazer benfeitorias voluptuárias. É que tais comportamentos são significativos do ponto de vista obrigacional, mas não necessariamente do ponto de vista real. O sujeito pode achar que tem o direito de não pagar a renda em questão ou que pode fazer a obra voluptuária.» Tendo em conta as explicações de Pires de Lima e A. Varela, bem como as que antecedem, não se vê, com todo o respeito, que se possa defender que haja a prova de algum acto de oposição aquando da entrega dos ditos anexos aos RR. por FF, pois esse foi o começo da ocupação, por sugestão do próprio proprietário, o que não se coaduna com a expressão de uma oposição contra este, para além de não ter, antes disso, existido uma posse precária que pudesse ser, nessa altura, invertida em posse em nome próprio. Defendem os Recorrentes que, a entender-se (como se entende) que não ocorreu a inversão do título de posse, nesse momento, tal aconteceu, sem qualquer margem para dúvida, posteriormente, em 1985 e em diante, contra os herdeiros do falecido FF (o que, diga-se, a dar-se como assente, de modo a iniciar-se um prazo para usucapião, nos termos do art. 1290º do C. Civil, representaria o reconhecimento de que a posse, até aí, sob os auspícios daquele proprietário, tinha sido precária). No acórdão recorrido, afastou-se a inversão do título de posse (também) nessa fase, referindo-se, a dado passo: «A traditio da coisa, realizada a favor dos réus, na situação concreta que resultou provada, não investe os réus na qualidade de verdadeiros possuidores da mesma coisa. Os poderes que os réus exercem de facto sobre a coisa, sabendo que ela é propriedade do autor, não são os correspondentes ao direito do proprietário adquirente. Por outro lado, cumpre ainda salientar que, embora se tivesse apurado que, “O Réu BB por volta do ano de 1987, ainda pediu um ordenado, mas o Sr. ° EE, irmão do aqui A., afirmou que não lhe satisfaria o pedido, alegando que seria mais um ordenado, contrapondo que em contrapartida já detinha a posse da casa, que colhia os frutos e recolhia as uvas do terreno logradouro contíguo ao Prédio aqui em questão, para seu uso próprio e para fazer vinho para si e para vender se desse e se necessitasse, ao que estes RR, não aceitaram e deixaram de desempenhar funções e de colaborar, e continuaram a possuir o prédio e a usufruir dos frutos;” (al. NN), nada nos permite inferir que os réus eventualmente se passaram a julgar donos da coisa entregue, já que é certo que não basta tal estado psicológico de convicção interior, e nem o facto dos mesmos, terem realizados obras ou efectuado despesas, ou fazerem suas as uvas e frutos, porquanto, não foi feita prova da inversão do título da posse em que aqueles se encontravam, que teria de ser efectuada por oposição ao proprietário e levada ao conhecimento deste, em virtude da posse em nome próprio não ter sido originariamente conferida aos réus.» Vinca-se, no acórdão, citando Henrique Mesquita, que a inversão do título de posse tem de traduzir-se em actos positivos, inequívocos, praticados na presença ou com o consentimento daquele a quem os actos se opõem, entendendo-se que nada resultou provado no que a isso respeita. Na realidade, não emana dos factos provados que os RR. tenham, de forma expressa e inequívoca, dado conhecimento directo, maxime ao primitivo Autor (a quem o prédio viria a ser adjudicado na partilha) da sua intenção de actuar como titular do direito de propriedade sobre o prédio identificado em F), para, a partir daí, começar a correr o prazo necessário para a usucapião (a propósito, veja-se o Ac. do STJ de 21-10-2020, Proc. 5080/17.7T8CBR.C2.S1, Rel. Fernando Samões, em www.dgsi.pt), para tanto não bastando a prova de que tenham deixado de executar determinadas tarefas ou de colaborar com os sucessores de FF. Assim, considera-se que, da factualidade provada, não resulta demonstrado que tenha havido uma doação, ainda que verbal e, portanto, inválida (art. 947º, nº 1, do C. Civil), por parte de FF, do prédio identificado em F), de modo a que se iniciasse, então, uma posse em nome próprio, desligada da posse daquele, sendo que, na articulação dos arts. 1252º, nº 2 e 1257º, nº 2, do C. Civil, como se referiu no citado Ac. do STJ de 12-05-2016 (Rel. Tomé Gomes), há que ponderar em que o n.º 2 do art. 1252º estabelece uma presunção de posse em nome próprio por parte daquele que exerce o poder de facto, ou seja, daquele que tem a detenção da coisa (corpus), salvo se ele não foi o iniciador da posse (pois presume-se no n.º 2 do art. 1257.º que a posse continua em nome de quem a começou). Por isso, «para funcionar a presunção estabelecida no n.º 2 do artigo 1252.º do CC importa que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado portanto de qualquer possuidor antecedente, como nos casos de aquisição originária da posse por prática reiterada ou por inversão do título de posse». Não se provando que os RR. tenham praticado os actos materiais que desenvolveram ao longo do tempo como iniciadores de uma posse desligada da do anterior possuidor, nem que tenha havido inversão do título de posse, maxime através da consubstanciação de uma oposição expressa e inequívoca, ou seja, com potencialidade para preencher a inversão, nem perante FF (muito menos no momento da entrega dos referidos anexos e logradouro, pelas razões expostas), nem depois da sua morte, não poderá fazer-se funcionar a presunção do art. 1252º, nº2, do C. Civil. A realização de melhoramentos ou obras de conservação ou o acto de habitar numa casa, durante vários anos, ou agricultar um terreno, dele colhendo os respectivos frutos, sem que tenha havido inversão da posse, não alteram a situação, não se vendo que, só por si, constituam actos demonstrativos, categóricos, de actuação na qualidade de proprietário do prédio reivindicado (que, recorde-se, é o identificado na al. F) dos factos provados). Os Recorrentes fazem menção a alguns documentos. Ora, não é permitido, à margem dos factos adquiridos, apontar para novas dimensões factuais (seja através da amplificação ou redução) mediante a remissão para documentos, a não ser nos apertados casos previstos na lei (o que não está justificado, in casu, pelos Recorrentes), pois o Supremo Tribunal de Justiça está, no que concerne à matéria de facto, limitado pelo que vem estabelecido nos arts. 674º, nº 3, e 682º, nº 3, do CPC, devendo aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido (art. 682º, nº 1, do CPC). Defendem os Recorrentes que, estando em causa a casa de morada de família, o acórdão da Relação violou o art. 65º da CRP, em cujo nº 1 se estabelece que: «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.» Em primeiro lugar, há que referir que, conforme assinalaram os Recorridos, esta questão foi levantada apenas nas conclusões, não se impondo o seu conhecimento. Neste sentido, veja-se o Ac. do Tr. Const. nº 462/2016, datado de 14-07-2016, Rel. Cura Mariano, publicado no DR, Série II, 13-10-2016, ou Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, p. 136, quando, nesta obra, se refere que «devem ser desatendidas as conclusões que não encontrem correspondência na motivação»). Diga-se, de qualquer modo, que não se pode olvidar que também encontra consagração constitucional o direito de propriedade privada (art. 62º da CRP), aqui reclamado pelos AA. e que, conforme esclarecem Gomes Canotilho e Vital Moreira, «[o]s titulares passivos do direito à habitação, como direito social, são primacialmente o Estado e as demais entidades públicas territoriais e não principalmente os proprietários e os senhorios» (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4ª edição, Coimbra Editora, 2007, p. 837). Não se vê, pois, que haja alguma inconstitucionalidade em reconhecer, em processo intentado para o efeito, aos AA., em desfavor dos RR. – que deduziram, em reconvenção, a mesma pretensão –, o reconhecimento do direito de propriedade, com as inerentes consequências. Improcede a revista. * Sumário (da responsabilidade do relator) 1. Para funcionar a presunção estabelecida no n.º 2 do artigo 1252.º, importa, articulando este preceito com o nº 2 do art. 1257º, ambos do Código Civil, que o pretenso possuidor se apresente como iniciador da posse, desligado, portanto, de qualquer possuidor antecedente. 2. A inversão do título de posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía, ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse. Se for exercida através da oposição, é necessário que o detentor torne directamente conhecida da pessoa em cujo nome possuía, de forma inequívoca e expressa, a sua intenção de actuar como titular do direito. 3. O Tribunal não tem de atender a conclusões que não encontrem correspondência na motivação, pois aquelas são uma síntese desta, não podendo nelas suscitar-se questões não tratadas no local próprio (o “corpo” das alegações). V Pelo que se deixou exposto, acorda-se em negar a revista, mantendo-se o decidido no acórdão recorrido. - Custas pelos Recorrentes. * Lisboa, 14-07-2021 Tibério Nunes da Silva Maria dos Prazeres Beleza Maria do Rosário Morgado * Nos termos do art. 15º-A do DL nº10-A/2020, de 13.03, aditado pelo DL nº 20/2020 de 01.05, o relator declara que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmªs Juízas Conselheiras, 1ª e 2ª Adjunta, que integram este colectivo. Tibério Nunes da Silva (relator) |