Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | NUNO GONÇALVES | ||
| Descritores: | RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL ACIDENTE DE VIAÇÃO ATROPELAMENTO INFRAÇÃO ESTRADAL EXCESSO DE VELOCIDADE TRÂNSITO DE PEÕES CONCORRÊNCIA DE CULPAS INDEMNIZAÇÃO GRADUAÇÃO RESPONSABILIDADE SUBROGAÇÃO | ||
| Data do Acordão: | 03/17/2021 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO E REJEITADO QUANTO À SUB-ROGAÇÃO | ||
| Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
| Sumário : | I - O princípio geral, em matéria de velocidade automóvel rodoviária é que o condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular dos vulneráveis, às características e estado da via, às condições meteorológicas ou ambientais e a quaisquer outras relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente – art. 24º do Código da Estrada. II - Na graduação da responsabilidade do condutor e do peão pelo acidente e suas consequências, nos termos do art. 570.º, n.º 1, do CC, importa determinar a medida em que a conduta ilícita e culposa de cada um foi causal da produção do acidente, à luz da teoria da causalidade adequada. III - A gravidade do ato culposo de cada interveniente tem de obter-se através da ponderação da perigosidade imanente às proibições ou restrições de circulação vial que cada um violou, ou seja, da gravidade dos factos e danos que essas regras pretendem evitar. IV - A violação pelo condutor arguido das normas que proíbem transitar nas vias públicas ou equiparadas com velocidade excessiva, bem como as normas que proíbem conduzir sob efeito do álcool ou em estado de embriaguez, determinadas pela finalidade de acautelar, precisamente, a perigosidade para a segurança de pessoas e bens, apresenta um grau de gravidade incomparavelmente superior ao da violação, pelo peão, das normas que obrigam a atravessar a faixa de rodagem na passadeira para peões sempre que esteja a menos de 50 metros. Regra esta, estabelecida com a finalidade de permitir fluidez ao trânsito automóvel, principalmente em meio urbano, guiando e concentrando os peões para atravessar em pontos determinados. | ||
| Decisão Texto Integral: |
O Supremo Tribunal de Justiça, em conferência, acorda:
I. RELATÓRIO: 1. a condenação: No Juízo Local Criminal …………, mediante acusação do Ministério Publico e pedido de indemnização civil apresentado pelos demandantes, foi o arguido: - AA, de 42 anos e os demais sinais dos autos. julgado e por sentença de 19/11/2019, condenado pela prática de: - um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo art. 137º, nº 2, do Cód. Penal, em concurso aparente com o crime de condução perigosa de veículo rodoviário, agravado pelo resultado, p. e p. pelos arts. 291º, nº 1, e 285º [este ex vi art.º 294º, nº 3, al. a)], todos do C. Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão, a ser executada em regime de permanência na habitação (na residência da mãe e irmã do arguido, sita na Rua …….., …….., ………..), com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, com autorização para sair para realização da sua atividade profissional, no período compreendido entre as 9,00 horas e as 20,00 horas, de segunda a sexta feira e na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 1 (um) ano e 2 (dois) meses, nos termos do art. 69º, nº 1, al. a), do Cód. Penal. - uma contraordenação muito grave, p. e p. pelo art. 81º, nºs. 1, 2 e 6, al. b), do Cód. da Estrada, na sanção de inibição de conduzir pelo período de 2 (dois) meses. O Tribunal, na procedência do pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes, condenou a demandada "Seguradoras Unidas, S.A." a pagar: - € 52.000,00 (cinquenta e dois mil euros) pela violação do direito à vida; - € 20.000,00 (vinte mil euros) pelos danos morais causados à demandante EE; - € 32.000,00 (trinta e dois mil euros) pelos danos morais causados aos demandantes BB e CC, sendo € 16.000,00 (dezasseis mil euros) para cada um; Importâncias acrescidas de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos, até efetivo e integral pagamento. Na procedência do pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante "Instituto da Segurança Social, I.P.", condenou a demandada "Seguradoras Unidas, S.A." a pagar-lhe €11.777,20 (onze mil setecentos e setenta e sete euros), a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência pagas até Julho de 2019, bem como de 80% (oitenta por cento) do valor das pensões que desde aquela data viesse a pagar, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento. Inconformados com a decisão, o arguido e a demandada cível interpuseram recurso perante a 2ª instância. Os demandantes cíveis interpuseram recurso subordinado. O Tribunal da Relação ..., por acórdão de 14 de julho de 2020 decidiu: a) na procedência parcial da impugnação da decisão em matéria de facto, alterou a facticidade vertidos nos pontos 2, 5, 10, 18, 20, 21, 60, 74 e aditou aos factos não provados o enunciado na alínea uu); b) negar, quanto ao mais, provimento aos recursos interpostos pelo arguido e pelos demandantes cíveis; c) conceder parcial provimento ao recurso interposto pela demandada cível Seguradoras Unidas, S.A., condenando-a a pagar ao Instituto da Segurança Social, I.P." a indemnização no valor de € 11.777,20 (onze mil e setecentos e setenta e sete euros), a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência pagas até Julho de 2019, bem como 80% (oitenta por cento) do valor das pensões que desde aquela data se venceram e foram entretanto pagas por aquele Instituto, na pendência da presente ação, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, relativamente às prestações até aí vencidas e quanto às restantes a partir da data da respetiva sub-rogação, até integral e efetivo pagamento; d) confirmar, quanto ao mais, a decisão recorrida. Renitentes com o assim decidido, arguido e demandada cível recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça. O recurso do arguido não foi admitido. 2. o recurso: A demandada “Seguradoras Unidas, S.A”, rematou a alegação com as seguintes conclusões: I- A alteração da decisão proferida quanto ao ponto 2 da matéria de facto dada como assente, no sentido de passar a constar provado que “2- No momento em que embateu em DD, arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 52 Km/h;” corresponde a um manifesto lapso do Tribunal da Relação, que deve ser corrigido. II - vinha provado na douta sentença que “2- O arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 50 Km/h;” III - Decorre da fundamentação do douto acórdão, que a redação do ponto 2 foi alterada porque a velocidade que vinha dada como provada nesse ponto se deveria reportar ao momento da colisão e não aos momentos que a antecederam. IV- Os Ex.mos Desembargadores decidiram alterar o texto desse ponto da matéria de facto apenas no sentido de reportar a velocidade que já vinha provada na sentença ao momento da colisão, não tendo encontrado, ou referenciado, qualquer erro de julgamento na primeira instância no que toca à concreta velocidade dada como assente na sentença (40 a 50 km/h) V - No entanto, aquando da elaboração do acórdão, os Ex.mos Desembargadores terão incorrido num lapso de escrita, que depois condicionou o resto da decisão, trocando o número “50” por “52” a propósito da velocidade máxima possível do HB, quando a sentença e o relatório pericial indicavam o primeiro desses valores VI - Em face do exposto, a referência, no ponto 2 dos factos dados como provados, à circulação do HB a uma velocidade de entre 42 a 52 km/h corresponde a um manifesto lapso, o que resulta do próprio texto do douto acórdão, onde se remete para o texto da sentença que alude a velocidade diferente. VII - Assim, nos termos do disposto no artigo 380.º n.º 1, alínea b), e nº 2 do CPP, deve ser ordenada a correção desse lapso, de forma que passe a constar do ponto 2 dos factos provados que “2.- No momento em que embateu em DD, arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 50 Km/h”. VIII - Se assim não se entender, é manifesto que a decisão de dar como provado que “2.- No momento em que embateu em DD, arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 52 Km/h” não foi fundamentada. IX - Toda a fundamentação constante do douto acórdão para sustentar a alteração deste ponto da matéria de facto centra-se, exclusivamente, à volta da questão de que a velocidade considerada se reporta ao momento da colisão e não à circulação anterior do arguido. X - No que toca ao concreto fundamento que levou os Srs Desembargadores a elevarem de 50 km/h para 52 km/h a velocidade a que seguia o HB no momento da colisão, não há a mais pequena menção no douto acórdão. XI - Assim, a menos que se conclua tratar-se de um manifesto lapso, pelo menos por total ausência de fundamentação da decisão proferida quanto a esse ponto da matéria de facto (na parte respeitante à alteração da velocidade máxima possível do HB de 50 para 52 km/h)), sempre seria o douto acórdão nulo, nulidade essa que se invoca, nos termos do disposto nos artigos 374º n.º 2, 379º e 425º n.º 4 do CPP XII - Caso não seja atendido, sempre se imporia a revogação do douto acórdão, na parte em que decidiu pela alteração da redação do ponto 2 dos factos dados como provados, por ser ilegal. XIII - O poder que é conferido ao Tribunal da Relação para alterar a decisão proferida quanto à matéria de facto não é absoluto, no sentido de que pode ser usado mesmo que não exista qualquer elemento de prova que assim o imponha. XIV - Lendo-se o douto acórdão, verifica-se que o Tribunal da Relação não invoca um único elemento de prova que impusesse decisão diversa da proferida quanto ao texto do ponto 2 dos factos considerados provados, no sentido de dar como provado que a velocidade do HB no momento da colisão era a de 40 a 52 km/h. XV - Assim, salvo melhor opinião, ao alterar o texto do ponto 2 dos factos dados como provados, no sentido de considerar demonstrada a velocidade de “40 a 52 km/h”, em contraponto aos “40 a 50 km/h” que vinham dados como provados na douta sentença, o Tribunal da Relação extravasou os poderes que a lei processual lhe confere no que toca à modificabilidade da decisão proferida quanto à matéria de facto, sendo essa decisão ilegal, por violação do disposto no artigo 431.º do CPP XVI - Pelo que deve ser revogada, nessa parte, o douto acórdão, eliminando-se a alteração que o Tribunal a quo introduziu no ponto 2 no que toca à velocidade de circulação do HB, passando esse ponto da matéria de facto a ter a seguinte redação: “.- No momento em que embateu em DD, arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 50 Km/h” XVII - Entende a recorrente que a factualidade dada como provada impunha que se tivesse atribuído ao peão total responsabilidade pela eclosão do acidente ou, pelo menos, um maior quinhão dessa responsabilidade. XVIII - Dos factos dados como provados resulta que o arguido circulava a velocidade que deve considerar-se contida dentro dos limites estabelecidos para o local. XIX - A velocidade (de 42 a 50, ou mesmo a de 42 a 52 km/h) que se deu como provado ser aquela a que seguia o HD no momento do embate, corresponderia sempre um andamento inferior ao do limite que se aplicava no local do acidente, tanto mais que, atenta esta última moldura, o julgador não pode ter como certo que fosse uma ou outra a velocidade a que circulava. XX - Sendo uma verdade indesmentível que a travagem de um carro gera a redução da respetiva velocidade, também não nos podemos esquecer que a dimensão dessa redução de velocidade depende da duração do percurso em travagem. XXI - no caso, apenas sabemos que o arguido travou, mas não sabemos a que distância se encontrava do peão quando tal sucedeu, pelo que não se pode assumir que dessa travagem tenha resultado uma relevante redução do andamento do HB a ponto de se poder afirmar que, antes de o arguido a ter iniciado, esse carro circulava a velocidade muito superior à que existia no momento da colisão. XXII - Ademais, apesar de se ter dado como provado que chovia e que o arguido circulava numa zona residencial, não se pode concluir que a circulação a uma velocidade que, nos termos provados, poderia ser a de 42 km/h fosse excessiva, mesmo em termos relativos. XXIII - Por outro lado, não se pode concluir que o arguido poderia e deveria ter previsto que o peão efetuasse ali o atravessamento da Estrada, a ponto de se justificar que regulasse a velocidade de forma a prevenir essa possibilidade. XXIV - Não corresponde a um facto previsível, mesmo numa zona residencial, que, pelas 23h30m de um dia chuvoso de inverno, altura em que não é de esperar que estejam peões na rua, surja um peão a atravessar a estrada fora da passadeira, quanto existia uma tal passagem a menos de 50 metros. XXV - Ora, quando circulava nestas circunstâncias, a uma velocidade que deve ser considerada moderada, o arguido deparou-se com o surgimento, da sua direita, de um peão e um animal, os quais atravessaram a Estrada fora da passadeira XXVI - Além disso, o peão realizou esse atravessamento à noite, num dia chuvoso e avançando a partir do espaço existente entre dois carros estacionados, tudo fatores que limitavam a capacidade dos automobilistas que circulassem na via de o avistar. XXVII - As circunstâncias de tempo e lugar nas quais o peão realizou o atravessamento, ao invés de recomendarem menores cuidados, exigiam uma atuação mais cuidadosa do peão, o que passaria pela utilização da passadeira. XXVIII - Ademais, retira-se, de forma evidente, da matéria de facto provada que o DD, quando iniciou o atravessamento da Estrada, podia e deveria ter avistado o HB a aproximar-se de si, tanto mais que no local a estrada configurava uma reta com mais de 100 metros de extensão. XXIX - O arguido, por sua vez, reagiu, de forma adequada, a esses obstáculos, travando e guinando à sua esquerda, sem que tenha conseguido evitar a colisão. XXX - Para além da condução com uma TAS superior à legal, não é divisável nos factos dados como provados qualquer infração que tenha sido cometida pelo arguido às regras do Código da Estrada. XXXI - Já o comportamento do DD foi, manifestamente, contravencional e deu causa ao acidente, uma vez que agiu com cuidado inferior ao que lhe era exigível. XXXII - No caso, é manifesto que o DD tendo atravessado a estrada num momento em que um veículo se aproximava de si, à noite e num dia chuvoso, fora de uma passadeira, a ponto de ter forçado o condutor desse automóvel a efetuar um desvio à sua esquerda de forma a tentar evitar o atropelamento, agiu de forma imprudente e apta a causar, como causou, um embaraço ou impedimento do trânsito, comprometendo a sua segurança e a do automobilista e, notoriamente, não se certificou de que poderia transpor a via sem risco de acidente. XXXIII - Estas contravenções foram praticadas pelo DD por ter agido com notória negligência e imprudência, já que é de censurar a atuação de alguém que, pretendendo atravessar a estrada, em local onde esta desenha uma reta, o faz no momento em que pode avistar um automóvel a aproximar-se de si e fora da passadeira. XXXIV - Assim, é manifesto que, como se entendeu na douta sentença e no douto acórdão, há um juízo de censura relevante a formular relativamente à atuação do DD, o qual o responsabiliza pelas consequências do acidente. XXXV - Em face de tudo o exposto, considera a Ré que se impunha que fosse atribuída ao DD a total responsabilidade pela eclosão do acidente e suas consequências, o que deve impor a absolvição da Ré de todos os pedidos, o que se requer. XXXVI - Ainda que assim se não entendesse – o que não se aceita e apenas se concebe como mera hipótese académica – sempre, atento o circunstancialismo factual demonstrado, o Tribunal deveria ter concluído que a medida da contribuição do DD para a eclosão do sinistro é muito superior à do condutor do veículo, o arguido AA XXXVII - Como efeito, face ao modo inopinado e temerário como o DD procedeu ao atravessamento, da faixa de rodagem, no momento em que o automóvel estava já perto de si, à noite e num dia de chuva e fora da passadeira, sempre o acidente se daria (cfr, nesse sentido, as conclusões da perícia, já acima assinaladas). XXXVIII - Atento o exposto, à luz de um critério de justiça, não é razoável que os danos causados essencialmente pela conduta do DD sejam sobretudo suportados pela ora recorrente, pelo que, sempre no pior dos cenários, se deverão fixar os graus de contribuição do peão e do condutor automóvel para a ocorrência do acidente na proporção de 80% para o peão e 20%, para o automobilista, com as necessárias consequências legais. XXXIX - E, consequentemente, deve ser revogado o douto acórdão e reduzidas nessa proporção as verbas atribuídas na douta sentença, ou as que venham a ser consideradas devidas aos AA e ao ISS, IP/CNP pela Ré, o que, subsidiariamente, se requer. XL - E ainda que se entenda que essa repartição não é a adequada, sempre se imporia a redução da contribuição do arguido para a ocorrência do acidente para grau inferior ao de 80% (com o consequente aumento do grau de contribuição do peão para tal evento) o que, subsidiariamente, se requer. XLI - O sub-rogado não adquire um direito novo e autónomo em relação ao que existia na esfera jurídica do sub-rogante, exercendo antes o mesmo direito, com o mesmo conteúdo e limites daquele que o próprio primitivo titular poderia dispor contra o terceiro. XLII - O direito dos lesados no qual a Segurança Social se poderia sub-rogar seria o decorrente de eventuais danos patrimoniais futuros, nomeadamente os decorrentes de perda de rendimentos propiciados pelo DD. XLIII - Inexistindo direito no qual o ISS, IP se possa subrogar, já que não foi reconhecido aos AA tal direito na ação, não lhe pode ser reconhecido qualquer crédito na presente ação, pelo que deve ser revogada a decisão na parte em que condenou a Ré a pagar ao ISS, IP a quantia líquida de 11.777,20€, bem como quaisquer outras importâncias no futuro e respetivos juros, absolvendo-se a Ré, nessa parte, do pedido. Os recorridos não responderam. «» O recurso foi redistribuído. Dispensados os vistos, o processo foi à conferência. Cumpre decidir.
II. OBJETO DO RECURSO: A correção de um lapso de escrita no número final do ponto 2 dos factos provados. A responsabilidade pelo acidente. Da sub-rogação no pagamento de importâncias futuras.
III. FUNDAMENTAÇÃO: 1. os factos: O Tribunal recorrido julgou provados os factos seguintes: “1. No dia 23 de dezembro de 2015, pelas 23h34m, o arguido detinha a condução efetiva do veículo ligeiro de passageiros, de marca e modelo ……….., de cor ……… e de matrícula ….-HB-…. e circulava no sentido Norte/Sul, na Rua ………, em …….., ………, transportando, como passageira, no banco da frente do lado direito, a sua companheira; 2. No momento em que embateu em DD, o veículo HB seguia a uma velocidade entre 42 Km/h e 52 Km/h. 3. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o peão DD atravessava a Rua …………, fora da passadeira, no sentido Oeste/Este; 4. DD circulava a uma velocidade entre os 3 Km/h e os 9 Km/h e o seu canídeo circulava atrás de si; 5. O arguido, quando se apercebeu que DD estava a efetuar a travessia, juntamente com o seu canídeo, da direita para a esquerda, relativamente ao seu sentido de marcha, reagiu travando e guinando o veículo que conduzia para a sua esquerda; 6. Não obstante, o arguido não conseguiu evitar que o seu veículo embatesse, com a parte frontal, na vítima e no seu canídeo, junto ao prédio nº …., da Rua …………; 7. DD foi colhido já na via esquerda e o canídeo, que seguia atrás do peão, foi colhido no eixo da faixa de rodagem; 8. Depois do embate, o arguido imobilizou o seu veículo do lado esquerdo da faixa de rodagem, na via de trânsito destinada aos veículos que circulam em sentido oposto, com a frente voltada para sul; 9. A Rua ………., local onde ocorreu o atropelamento, é uma reta em patamar, com uma via de trânsito em cada sentido, sem separador central, ladeada por passeio de ambos os lados; 10. Após o local do acidente existe uma curva à direita, com desnível descendente, tendo em conta o sentido de circulação do veículo ligeiro, terminando essa artéria numa rotunda; 11. No local existe uma passadeira destinada à travessia de peões, que está colocada antes da rotunda e dista do local de atropelamento cerca 42,30 metros; 12. O pavimento é betuminoso, em bom estado de conservação e manutenção; 13. No sentido Oeste/Este existe uma placa de sinalização vertical que indica passagem de peões (sinal H7); 14. No pavimento existem marcas longitudinais, linha descontínua (M2) 15. A velocidade máxima permitida no local, à data, era de 50 Km/h; 16. A artéria onde ocorreu o atropelamento é de boa visibilidade em toda a sua extensão e largura, sem obstáculos naturais; 17. À data, estava chuva e a superfície molhada; 18. O arguido foi submetido a teste de álcool quantitativo, através do ar expirado, acusando uma TAS de 1,47 g/l, tendo requerido contraprova, que acusou a TAS de 1,24 g/l; 19. Devido à influência do álcool o arguido tinha a sua capacidade de condução do veículo limitada, a reação do arguido, ao deparar-se com um peão na via, foi mais lenta do que aquela que teria tido caso não tivesse ingerido bebidas alcoólicas; 20. O arguido travou e desviou o veículo que conduzia para a esquerda; 21. Se o arguido tivesse reagido mais cedo, mesmo que não tivesse evitado o impacto, faria com que as lesões do peão fossem mais reduzidas assim como o seu risco de morte; 22. DD foi assistido no local por uma ambulância do INEM e, a seguir, foi transportado para o Hospital ………., ………, em estado grave, tendo vindo a falecer no dia 31 de dezembro de 2015, pelas 02h55m; 23. Do acidente ocorrido resultou o falecimento de DD, bem como a morte do seu canídeo, que também foi atropelado pelo veículo conduzido pelo arguido e que estava junto à roda anterior direita; 24. Em virtude do acidente de que foi vítima, DD sofreu as seguintes lesões, que foram causa direta, necessária e adequada da sua morte: NO HÁBITO EXTERNO: - Cabeça: equimose arroxeada periorbitária bilateral. Equimose arroxeada na região préauricular esquerda, com 3 por 2,5 cm de maiores dimensões. Três áreas suturadas: uma na transição frontoparietal esquerda, com 3 pontos de sutura numa área com 3 cm de comprimento; uma na região infrapalpebral direita, com 2 pontos de sutura sobre escoriação apergaminhada e amarelada, adjacente a dois focos milimétricos de escoriação na região ciliar, com 3 por 2 cm de maiores dimensões; e outros 2 pontos de sutura na concha do pavilhão auricular esquerdo. Quatro áreas escoriadas: uma coberta por penso na região frontal direita, com fundo amarelado e 2,5 por 1,5 cm de maiores dimensões; uma na região supraciliar direita, apergaminhada, com 2 por 1 cm de maiores dimensões; uma na região frontal esquerda, com fina crosta hemática acastanhada, e 4,5 por 3,5 cm de maiores dimensões; uma na raiz da pirâmide nasal, apergaminhada e amarelada, com 1 por 0,5 cm de maiores dimensões. Uma solução de continuidade linear, de bordos lisos, coaptáveis e infiltrados de sangue, não suturada, na região frontoparietal à direita, de comprimento peri centimétrico. Otorragia à esquerda. Hemorragia subconjuntival bilateral, mais evidente nas regiões dos fundos-desacos palpebrais. Palidez cutânea e da mucosa oral. Crepitação palpável na região zigomática esquerda. - Tórax: Múltiplos sinais de picada, infiltrados de sangue, na região subclavicular esquerda, compatíveis com procedimentos terapêuticos. Uma área de quatro escoriações com fundo húmido e amarelado na face posterior do terço inferior do hemitórax direito, com 5,5 por 2,5 cm de maiores dimensões. - Área Ano-Genital: Ligeiro edema escrotal. Penso na região sagrada, cobrindo área ulcerada com fundo de aspeto hemorrágico no sulco internadegueiro, com 2,5 por 1,5 cm de maiores dimensões, e várias equimoses arroxeadas peri centimétricas no quadrante superomedial da nádega direita, numa área com 7 por 3 cm de maiores dimensões. Sem outras lesões traumáticas aparentes. - Membro superior direito: Três escoriações: uma na região da tabaqueira anatómica com 1,5 cm de diâmetro e halo equimótico, outra sobre a falange média do 2.° dedo com 1 cm de diâmetro e outra sobre a articulação metacarpofalângica do 2.° dedo de diâmetro infra centimétrico. Penso sobre o 1.° dedo, cobrindo área escoriada, sem crosta hemática, na extremidade da polpa do mesmo dedo, com diâmetro peri centimétrico. Vários sinais de picada, infiltrados de sangue, compatíveis com procedimentos terapêuticos: um na face anterior do cotovelo e vários na face anterior do punho (cobertos por penso). Edema moderado do membro, mais evidente na extremidade distal. Sem mobilidade anormal do membro ou outras lesões aparentes. - Membro superior esquerdo: Várias equimoses arroxeadas: uma entre as faces superior e posterior do ombro até à face lateral do terço médio do braço, com 30 por 11,5 cm de maiores dimensões; duas na face medial do braço, uma no seu terço proximal com 7 por 4 cm de maiores dimensões e outra no seu terço distai com 1,5 por 1 cm de maiores dimensões. Equimose esverdeada ténue, difusa, no dorso da mão. Duas escoriações com crosta hemática: uma no dorso da mão entre as 3.ª e 4.ª articulações metacarpofalângicas, de comprimento peri centimétrico, e outra na metade cubital da falange proximal do 5.° dedo, com 1 por 0,5 cm de maiores dimensões. Um sinal de picada, infiltrado de sangue, compatível com procedimentos terapêuticos, na face anterior do cotovelo. Edema moderado do membro, mais evidente na extremidade distai. Sem mobilidade anormal do membro ou outras lesões aparentes. - Membro inferior direito: Várias equimoses arroxeadas: uma na face posterior dos dois terços distais da coxa, com 19 por 12 cm de maiores dimensões; duas no joelho, uma na sua face anterior com 10 por 3 cm de maiores dimensões e outra na sua face medial com 6,5 por 4 cm de maiores dimensões. Cinco escoriações punctiformes, com crosta hemática, na face anterior do terço médio da perna. Edema moderado do membro, mais evidente na extremidade distai. Sem mobilidade anormal do membro ou outras lesões aparentes. - Membro inferior esquerdo: Várias equimoses arroxeadas ténues, de limites mal definidos, na face lateral da anca e coxa, a menor com 3 cm de diâmetro e a maior com 6 cm de diâmetro. Uma escoriação com fundo apergaminhado amarelado na face lateral do terço proximal da perna, com 1 cm de diâmetro. Penso transparente na face lateral do tornozelo, com os dizeres "30/12 hidrogel", cobrindo úlcera de fundo acastanhado com 1,5 cm de diâmetro sobre o maléolo lateral e equimose arroxeada circundante com 11 por 10 cm de maiores dimensões. Cobertos por penso, vários sinais de picada, infiltrados de sangue, compatíveis com procedimentos terapêuticos, na região inguinal. Edema moderado do membro, mais evidente na extremidade distai. Sem mobilidade anormal do membro ou outras lesões aparentes. NO HÁBITO INTERNO - Cabeça: - Partes moles: infiltração sanguínea difusa da face interna do couro cabeludo e de ambos os músculos temporais, principalmente à esquerda. Uma solução de continuidade circular na metade anterior da região parietal direita, com diâmetro milimétrico, compatível com sensor de monotorização de pressão intracraniana. - Ossos da cabeça (abóbada): vários traços de fratura, infiltrados de sangue, entre os ossos frontal e temporal do lado esquerdo, o maior deles com 20 cm de comprimento total, numa área com 9 por 8 cm de maiores dimensões; um outro traço de fratura infiltrado de sangue no temporal direito, com 9 cm de comprimento. Uma solução de continuidade circular na metade anterior do parietal direito, com diâmetro milimétrico, compatível com sensor de monitorização de pressão intracraniana. - Ossos da cabeça (base): fratura cominutiva do andar anterior em toda a sua extensão, com traços infiltrados de sangue e com orientação sensivelmente coronal; traços de fratura, infiltrados de sangue, bilaterais, no andar médio; traço de fratura infiltrado de sangue adjacente ao buraco magno à esquerda. - Meninges: hematoma aplanamento dos sulcos e achatamento das circunvoluções cerebrais, de aspeto compatível com edema, discreta impressão semicircunferencial sobre as amígdalas cerebelosas, compatível com hipertensão intracraniana. Múltiplos focos de contusão bilaterais, mais evidentes nas faces laterias e base de ambos os lobos temporais e na base dos lobos frontais (principalmente à esquerda). Ao corte, hemorragia intraparenquimatosa no tronco cerebral (hemorragia de Duret), uma área de amolecimento de substância branca no lobo occipital esquerdo, compatível com lesão isquémica recente; restante parênquima congestivo, sem outras lesões aparentes. Liquor límpido, não hemorrágico. - Tórax: - Paredes: infiltração sanguínea no tecido celular subcutâneo e músculos intercostais adjacentes às fraturas costais descritas. - Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: fratura transversal, infiltrada de sangue, do arco anterior da 1a costela, dos arcos laterais das 3as e 4as costelas e dos arcos posteriores da 1ª à 5ª costelas. - Coluna vertebral e medula: - Vértebras e estruturas articulares: infiltração sanguínea dos tecidos moles para vertebrais anteriores no terço médio do segmento cervical, sem fraturas ou outras lesões aparentes. A morte de DD foi devida a sépsis nosocomial e broncopneumonia bilateral, em contexto de internamento hospitalar motivado por politraumatismo com lesões traumáticas craniomeningoencefálicas graves; 25. Estas, bem como as lesões traumáticas resultaram de traumatismo de natureza contundente, que teve lugar com o atropelamento de que foi vítima; 26. Entre o evento e o óbito decorreram 7 dias, período durante o qual DD permaneceu internado no Hospital ………; 27. O arguido sabia que devia conduzir com toda a atenção, cuidado e perícia, por forma a executar, em condições de segurança, as manobras cuja necessidade fosse de prever, nomeadamente de tentar imobilizar o veículo e desviar-se de peões e de outros obstáculos que aparecessem na via; 28. Mais sabia o arguido que não devia conduzir após ter ingerido bebidas alcoólicas e que a quantidade de álcool que tinha ingerido tinha diminuído a sua destreza na condução, afetando o seu sentido de orientação e de coordenação motora, retardando os seus reflexos, facto que foi determinante para a produção do acidente; 29. O arguido colocou-se voluntariamente naquelas condições e assumiu a condução do referido veículo de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas em quantidade excessiva e que, em tais condições, não lhe era permitido conduzir veículos na via pública, tendo ainda conhecimento das consequências legais da sua conduta; 30. Com a referida conduta o arguido sabia que criava perigo para a vida e integridade física de outrem, nomeadamente da companheira que seguia ao seu lado e dos peões que seguiam na via àquela hora, conformando-se com a sua ocorrência; 31. Não obstante, o arguido conduzia da forma descrita, motivo pelo qual não reagiu como podia e devia ao deparar-se com DD e com o seu canídeo a atravessar a via, não tendo reagido com a manobra adequada, originando o embate, com velocidade, do veículo em DD e seu animal, bem como a morte destes; 32. Contudo, o arguido não representou a possibilidade de com a sua conduta vir a provocar as referidas lesões no corpo de DD e, consequentemente, a sua morte; 33. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei; 34. DD nasceu a …..10.1953; 35. DD e a demandante EE casaram-se, um com o outro, a …. de janeiro de 1973; 36. DD e a demandante EE tiveram dois filhos, os demandantes CC e BB, que nasceram, respetivamente, no dia … de março de 1974 e no dia … de julho de 1980; 37. No momento do acidente era inexistente outro tráfego automóvel e de peões; 38. A cadela, de nome …….., tinha mais de 8 anos de idade e estava habituada a sair à rua; 39. Após o acidente, a cadela ficou entalada na roda direita da frente do HB, tendo sido necessário levantar o veículo com auxílio de macaco mecânico para a retirar de tal sítio; 40. DD era uma pessoa saudável, não tendo doenças ou lesões incapacitantes, sofrendo apenas de algumas dores nos joelhos, sobretudo no direito, ao qual já havia sido operado; 41. DD era uma pessoa feliz, dedicada à família e mantinha uma …….., sita na Rua ………., ……, …………, sita a cerca de 500 metros da sua residência, ali realizando alguns trabalhos de ……… e ……….. de …………; 42. Em consequência do traumatismo craneo-encefálico grave que DD sofreu, o mesmo ficou num estado de inconsciência total, do qual não mais despertou; 43. Quando foi admitido no hospital, DD estava inconsciente, avaliando-se o seu estado num grau de inconsciência 3 na Escala de Glasgow, tendo depois sido sujeito a sedação profunda; 44. Durante o seu internamento, após a realização de TAC e de ressonância, suspendeu-se a sedação de DD, tendo o mesmo ficado em estado de coma não reativo; 45. O casamento manteve-se até ao falecimento de DD, tendo este e a demandante EE uma relação de companheirismo e sem discussões violentas; 46. A morte de DD causou à demandante EE sofrimento, tristeza e revolta, que até hoje se mantêm, tornando-a numa pessoa triste e apagada; 47. A demandante EE sente permanentemente ansiedade e angústia com a recordação do dia do acidente; 48. Antes do falecimento de DD, a demandante EE padecia, de vez em quando, de depressões, tendo piorado após a morte de DD, passando a ser necessária a toma diária de medicação; 49. O demandante BB vivia com DD, com quem tomava as refeições, passeando com ele e nele encontrando um apoio e confidente; 50. Os demandantes CC e BB tinham uma forte ligação afetiva, de amparo e de carinho com a vítima DD; 51. Estes demandantes, com o falecimento do seu pai, sentiram e continuam a sentir tristeza e saudade; 52. O "Instituto da Segurança Social, IP.'7Caixa Nacional de Pensões pagou, a título de subsídio por morte de DD, beneficiário n.° ……….., a EE o montante de € 1.257,66; 53. Desde janeiro de 2016 que o Instituto da Segurança Social, IP., tem pago a EE, a título de pensão de sobrevivência, mensalmente o valor de € 267,07, com inclusão do 13.° e 14.° mês; 54. Entre a demandada "Seguradoras Unidas, S.A.", como seguradora e FF, como tomadora e segurada, foi celebrado um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, titulado pela apólice número ……….81, em que o objeto seguro é o veículo automóvel …..-HB-….., transferindo a responsabilidade civil em relação a terceiros decorrente da circulação desse veículo; 55. A Rua ……….. tinha uma largura de 5,60 metros; 56. Ao longo do traçado em reta dessa via, existia na sua margem direita, atento o sentido Norte-Sul, uma zona destinada ao parqueamento de veículos, pavimentada com paralelepípedos de granito; 57. Nesse espaço o parqueamento de viaturas era efetuado de forma longitudinal e paralela ao eixo da via; 58. A dita zona de estacionamento terminava, no seu topo Sul, no local onde se iniciava a curva à direita; 59. Essa curva inicia-se sensivelmente junto da habitação com o número de porta …… dessa via; 60. A dita curva desenhava um ângulo próximo ao de 140°; 61. Nas apontadas circunstâncias de tempo e lugar, esses lugares de estacionamento encontravam-se totalmente preenchidos por veículos automóveis, os quais estavam parados, de forma alinhada e seguida, até à curva já mencionada, existindo mesmo um carro parado já depois do termo da zona de estacionamento, na zona pavimentada com paralelepípedos, alinhado com os demais; 62. Nas apontadas circunstâncias de tempo e lugar era noite escura, encontrando-se o céu encoberto por nuvens; 63. No local existia uma passadeira para peões, situada a cerca de 35 metros para Sul do início da curva à direita já referida; 64. Essa passadeira correspondia à marca Mil do RST do Código da Estrada, consistindo em barras longitudinais paralelas ao eixo da via pintadas no seu pavimento, alternadas por intervalos regulares; 65. Momentos antes, o peão DD encontrava-se no passeio direito da Rua …………., considerando o sentido Norte-Sul; 66. DD encontrava-se a passear um animal de raça canina; 67. DD residia na habitação com o número de polícia ….. da Rua ………., a qual se situava na margem esquerda daquela via, atento o sentido Norte-Sul; 68. A dado passo, DD e o animal que o acompanhava, iniciaram o atravessamento da Rua ………., em direção à sua casa; 69. DD e o animal avançaram rumo à faixa de rodagem da via, ocupando a respetiva metade direita, atento o sentido Norte-Sul e atravessando-a da esquerda para a direita, atento o mesmo sentido de marcha; 70. DD e o animal iniciaram o atravessamento provindos do espaço existente imediatamente à frente do último carro que estava estacionado na margem direita da via, atento o sentido Norte-Sul, já depois do fim da zona de estacionamento devidamente delimitada com pavimento em paralelepípedos de granito; 71. A escadaria e o termo Sul da zona de estacionamento estavam alinhados com a entrada da habitação de DD; 72. A travessia foi iniciada e realizada fora da passadeira destinada ao trânsito de peões, que existia no local; 73. DD iniciou e realizou o atravessamento da via a uma distância de cerca de 40 metros antes dessa passadeira, atento o sentido Norte-Sul; 74. DD sabia que no local existia uma passadeira destinada à travessia de peões, colocada antes da rotunda em que termina a Rua ………….., atento o sentido de marcha do veículo HB. 75. No local onde DD iniciou o atravessamento da via dispunha de visibilidade para a sua esquerda, ou seja, para Norte, numa extensão de, pelo menos, 100 metros; 76. Essa colisão ocorreu junto ao eixo da via, já na metade esquerda da via, atento o sentido de marcha do HB; 77. A colisão com o peão ocorreu na parte dianteira, a meio do capot do HB, tendo o DD, de seguida, embatido no para-brisas dianteiro daquele carro, já numa zona situada mais à esquerda deste; 78. O HB parou logo após o embate; 79. Em consequência do impacto do corpo do DD no para-brisas dianteiro do veículo, este ficou estilhaçado, sobretudo na sua parte situada à frente do lugar do condutor, impedindo a visibilidade deste através desse vidro; 80. Logo depois da colisão e imobilização do HB, o arguido saiu do carro e encaminhou-se rapidamente em direção ao DD, a fim de lhe prestar auxílio; 81. As lesões mergulharam o DD, logo no local do acidente e após a sua verificação, num estado de total e imediata inconsciência, do qual não voltou a despertar; 82. Logo no local do acidente, DD foi entubado e sedado; 83. Submetido a TAC craniana aquando da admissão hospitalar, foram contatadas várias e graves lesões cerebrais em DD. 84. Desde o momento em que foi admitido na urgência do hospital até à sua morte, DD manteve-se em estado de coma não reativo; 85. Nem a suspensão da sedação que foi efetuada no decurso do internamento suscitou qualquer reação ou sinal de consciência em DD; 86. Mensalmente, a vítima DD e a demandante EE contavam com a reforma de ambos que totalizava cerca de € 700,00, acrescida daquilo que DD recebia pelos trabalhos que realizava na sua ……….., mas cujo montante não se apurou; 87. A data do acidente, os filhos do casal exerciam atividades profissionais, auferindo os correspondentes rendimentos, de valor não concretamente apurado, mas superior ao salário mínimo nacional; 88. Era com aqueles rendimentos que cada um destes demandantes fazia face às suas próprias despesas de sustento, habitação e vestuário, não recebendo qualquer auxílio monetário do seu pai; 89. O arguido tem o 9º ano de escolaridade; 90. Deixou de estudar aos 17 anos, altura em que iniciou o consumo de drogas, tendo realizado um programa de desintoxicação, enquanto cumpriu uma das penas a que foi condenado, tendo logrado sucesso neste programa e se tornado mentor, pelo bom comportamento que demonstrou; 91.0 arguido não tem problemas aditivos há vários anos; 92. Em 2013, o arguido criou a associação de apoio social «S………», da qual é presidente e que tem como objeto prestar apoio alimentar; 93. Vive com a mãe e a irmã mais nova numa urbanização social da Câmara Municipal ………; 94. A mãe do arguido aufere uma pensão mensal de sobrevivência no valor de € 400,00, sendo que o arguido contribui mensalmente com € 200,00 para as despesas; 95. O arguido aufere da sua atividade na "S…………." cerca de € 729 mensais; 96. O arguido tem uma namorada, com quem pensa viver em comunhão de habitação; 97. O arguido já foi condenado: a) Processo sumário nº 1221/01…………, do …….. Juízo do Tribunal Judicial ………, por decisão proferida a 18 de Dezembro de 2002, transitada em julgado a 24 de Janeiro de 2002, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de 300$00, pela prática de um crime de burla e de um crime de desobediência cometidos a 10 de Dezembro de 2001, já extinta; b) Processo comum n.° 192/01, do ….. Juízo do Tribunal Judicial de ………., por decisão proferida a 22 de Janeiro de 2002, transitada em julgado a 21 de Dezembro de 2002, na pena de 50 dias de multa à taxa diária de € 6,48, pela prática de um crime de burla cometido a 15 de Dezembro de 2000; c) Processo comum n.° 1197/01…….., do …… Juízo Criminal do Tribunal Judicial de ………, por decisão proferida a 3 de Dezembro de 2002, transitada em julgado a 18 de Dezembro de 2002, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 5, pela prática de um crime de burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços, cometido a 1 de Junho de 2001, já extinta; d) Processo comum n.° 1395/03………, do ……. Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de ……….., por sentença proferida a 6 de Julho de 2004, transitada em julgado a 20 de Setembro de 2004, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 2, pela prática de um crime de falsificação de documento, cometido a 18 de Setembro de 2003, já extinta; e) Processo comum n.° 1756/03………., da …….. Vara Mista da Comarca de ……….., por acórdão proferido 22 de Abril de 2004, transitado em julgado a 1 de Junho de 2004, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, pela prática de um crime de furto qualificado, cometido a 22 de Setembro de 2003; f) Processo comum n.° 138/03………, da ……. Secção do …… Juízo Criminal …………, por sentença proferida a 10 de Novembro de 2004, transitada em julgado a 6 de Dezembro de 2004, na pena de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, pelo cometimento de um crime de furto qualificado, a 2 de Outubro de 2003; g) Processo comum n.° 427/04……….., do …….. Juízo do Tribunal Judicial de …………, por decisão proferida a 15 de Março de 2005, transitada em julgado a 8 de Abril de 2005, na pena de 14 meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, a 3 de Maio de 2004; h) Processo comum n.° 32/04……….., da …….. Vara das Varas Criminais …………….., por acórdão proferido 23 de Junho de 2005, transitado em julgado a 13 de Julho de 2005, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de violência depois da subtração, cometido a 6 de Fevereiro de 2004; i) Processo comum n.° 622/03……….., do …….. Juízo do Tribunal Judicial ………………, por sentença proferida a 30 de Março de 2005, transitada em julgado a 2 de Novembro de 2005, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, a 4 de Setembro de 2003; j) Processo comum n.° 663/02…………, da ……… Vara das Varas Criminais ………….., por acórdão proferido a 25 de Maio de 2005, transitado em julgado a 9 de Dezembro de 2005, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão, pela prática de: vinte crimes de evasão, praticados a 3 de Junho de 2002; três crimes de roubo, praticados a 3 de Junho de 2002; quarenta e quatro crimes de furto qualificado, praticados a 3 de Junho de 2002; 1) Processo comum n.° 305/03…………., do …… Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de …………., por acórdão proferido a 23 de Janeiro de 2006, transitado em julgado a 7 de Fevereiro de 2006, na pena de 18 meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, a 2 de Maio de 2004, e de um crime de furto simples, a 22 de Maio de 2003; m) Processo comum n.° 631/03………., do …….. Juízo Criminal do Tribunal Judicial de …………, por acórdão proferido a 14 de Março de 2006, transitado em julgado a 29 de Março de 2006, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, pela prática de: um crime de roubo, a 29 de Outubro de 2003; um crime de roubo, a 29 de Outubro de 2003; um crime de furto qualificado, a 7 de Março de 2004. No âmbito destes autos, foi realizado o cúmulo das penas aplicadas nos processos indicados em e) a m), tendo o arguido sido condenado, por acórdão proferido a 9 de Outubro de 2006, transitada em julgado a 10 de Abril de 2007, numa pena de 7 anos de prisão; n) Processo comum n.° 1395/03…………, do …….. Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de ……….., por decisão proferida a 6 de Julho de 2004, transitada em julgado a 20 de Setembro de 2004, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 2, pela prática de um crime de falsificação de documento, cometido a 18 de Setembro de 2003, já extinta; o) Processo comum n.° 198/04…………., da ……… Vara das Varas Criminais .……….., por decisão proferida a 21 de Abril de 2006, transitada em julgado a 8 de Maio de 2006, na pena de 10 meses de prisão, pela prática de um crime de furto simples, cometido a 13 de Abril de 2004; p) Processo comum n.° 478/04…………, do …….. Juízo do Tribunal Judicial ………….., por decisão proferida a 11 de Julho de 2006, transitada em julgado a 26 de Julho de 2006, na pena de 15 meses de prisão, pela prática de um crime de furto simples, a 30 de Outubro de 2003; q) Processo comum n.° 16/04…………., da ………. Vara das Varas Criminais …………., por decisão proferida a 14 de Junho de 2007, transitada em julgado a 4 de Julho de 2007, na pena de 9 meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, praticado a 22 de Dezembro de 2003, já extinta.” 2.1.2. julgaram não provados os seguintes factos: a. O embate em DD tenha sido com a parte frontal esquerda do veículo; b. Atendendo ao sentido de marcha do veículo HB, a vítima DD e a sua cadela eram visíveis a mais de 100 metros de distância; c. A cadela usava, no momento do acidente, um colete refletor, que fazia com que, com um mínimo de luz, o seu brilho fosse visível a dezenas de metros de distância; d. DD apercebeu-se sentiu-se pânico e temor de morte ao aperceber-se da iminência do acidente; e. Entre o momento em que foi colhido e a perda de consciência, sofreu enormes dores, devidas às múltiplas lesões que lhe foram infligidas, bem como medo, angústia e enorme tristeza por ter sentido a iminência da morte; f. Os sentimentos de medo e angústia mantiveram-se até ao seu falecimento; g. No dia do acidente, o arguido seguia pela metade direita da via; h. Da …….. em que realizava trabalhos …….. e ………., a vítima DD auferia, pelo menos, € 1 000 mensais; i. A vítima iria trabalhar até aos 70 anos; j. O veículo HB seguia rigorosamente pela respetiva metade direita da via; l. O arguido seguia a velocidade não superior a 35 Km/h; m. Nas apontadas circunstâncias de tempo e lugar chovia com intensidade; n. No local propiciavam-se muito deficientes condições de visibilidade; o. Quando o arguido circulava pela indicada via, nas acima descritas circunstâncias, foi surpreendido pelo súbito surgimento de um cão e, logo de seguida, de um peão, os quais atravessaram a via, causando o acidente; p. O animal pertencente a DD seguia à frente deste; q. DD e o animal iniciaram e realizaram o atravessamento a correr, r. Os veículos estacionados à direita, atento o sentido do HS, ocultaram o DD e o animal do arguido até ao momento em que aquele peão e animal despontaram dos limites laterais desses carros voltados para a via; s. O atravessamento foi iniciado cerca de 3 metros depois do termo a Sul da zona de estacionamento existente no limite direito da via, atento o sentido Norte-Sul, e à mesma distância para Sul do local onde existia à direita do passeio direito da via uma escadaria; t. DD iniciou e realizou o atravessamento da via de forma diagonal em relação ao eixo da Rua …………, enviesando à sua esquerda; u. O atravessamento foi iniciado e realizado imediatamente antes do local onde terminava o troço em reta da Rua …………. e a via passava a descrever uma curva à direita, atento o sentido Norte-Sul; v. Antes de iniciar o atravessamento da via, o DD não tomou qualquer precaução; x. Antes de iniciar o atravessamento da via, o DD não olhou para a sua esquerda, ou seja, para o lado Norte; z. DD não se tentou aperceber do trânsito que se processava na via no sentido Norte-Sul; aa. No momento em que o DD, na execução do atravessamento, despontou do limite lateral esquerdo dos veículos estacionados e ocupou a faixa de rodagem da Rua ………….., o HB encontrava-se já à curta distância de si de cerca de 15 metros; bb. No momento em que, na execução do atravessamento, o DD despontou do limite lateral esquerdo dos veículos estacionados e ocupou a faixa de rodagem da Rua ………, o HB era-lhe perfeitamente visível; cc. Tal como lhe era visível antes mesmo de iniciar o atravessamento da estrada e enquanto se encontrava, ainda, no passeio direito da via, atento o sentido Norte-Sul; dd. DD, bem como o seu animal, meteram-se, súbita e inopinadamente, à frente do HB, cuja linha de rumo cortaram; ee. O arguido foi surpreendido pelo súbito surgimento, vindos da sua direita e a atravessarem a estrada, de um animal em corrida, logo seguido de um peão, também em corrida, ou passo rápido; ff. Isto em local e circunstâncias nas quais se verificavam más condições de visibilidade; gg. Vendo a sua linha de marcha subitamente cortada pelo DD e pelo animal, que se atravessaram à sua frente a uma distância de cerca de 15 metros; hh. Com essa manobra visava o arguido desviar-se do inesperado obstáculo provindo da sua direita e evitar que o peão e animal fossem colhidos; ii. Fruto dessa manobra de salvamento e também da escassa largura da via e do facto de tal desvio ter ocorrido praticamente no início da curva à direita que a via aí desenhava, o HB transpôs o eixo da via e ocupou a metade esquerda da estrada, atento o seu rumo; jj. DD não parou ou interrompeu a sua marcha, antes tendo prosseguido em correria o atravessamento da via, tendo ocupando, também, a metade esquerda da via, atento o sentido do HB; ll. Não obstante o desvio efetuado pelo condutor do HB, o DD porque não interrompeu o atravessamento da estrada, voltou a colocar-se na linha de marcha deste veículo, ocupando, desta feita, a hemi-faixa esquerda de rodagem, atento o sentido daquele carro, para a qual se desviara o arguido no sentido de evitar que o peão fosse colhido ainda na hem-faixa de rodagem direita; mm. Por absoluta escassez de tempo e de espaço e também porque o DD prosseguiu, como se disse, em passo de corrida, o atravessamento da estrada, ocupando a metade esquerda da via para a qual se desviara o carro, não foi possível ao condutor do HB evitar que o peão e animal fossem colhidos; nn. A colisão com o peão ocorreu na parte dianteira direita; oo. O corpo do DD ficado prostrado na via cerca de 2 metros adiante; pp. Com a ajuda de uma outra pessoa e porque o DD se encontrava deitado na faixa de rodagem, o arguido colocou o corpo desse peão no passeio esquerdo da via, atento o sentido Norte-Sul; qq. De seguida, o arguido regressou ao HB e estacionou-o no limite esquerdo da via, atento o seu rumo; rr. O HB foi estacionado pelo arguido na posição mencionada do "croquis" do auto de participação elaborado pela PSP, de forma praticamente alinhada com o passeio esquerdo, atento o sentido Norte-Sul. ss. DD foi colhido do lado direito e caiu pelo lado esquerdo junto à berma do passeio, aí embatendo com a cabeça; tt. Tenha havido, no hospital, uma evolução favorável do estado clínico de DD. uu) DD sabia que a passadeira existente antes da rotunda, distava do local do acidente menos de 50 metros.
2. o direito: a) correção no texto do acórdão: A recorrente "Seguradoras Unidas, S.A.", nas conclusões I a XVI, denunciando manifesto lapso de escrita, no ponto 2 dos factos julgados provados, requer a correção nos termos do art. 380º n.º 1 al.ª b) do CPP. Tem razão, adianta-se. A redação daquele ponto era a seguinte: “2- O arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 50 Km/h;” O Tribunal da Relação, exercendo os poderes de cognição que lhe assistem (428º do CPP), “com fundamento na existência de erro notório na apreciação da prova” alterou-o, motivando (em síntese): “o Tribunal a quo ao considerar provado que o arguido seguia a uma velocidade entre 42 km/h e 52 Km/h, fá-lo por referência à condução que o mesmo arguido realizava, nos termos descritos no ponto 1 dos factos provados, (…). Mas não é isso que resulta da motivação de facto e da prova aí referida. Aí afirma-se claramente que a condução do veículo, a uma velocidade situada entre 42 Km/h e 52 Km/h, facto aliás confirmado pelo perito, só ficou demonstrada relativamente ao exato momento em que se deu o embate e não, como logicamente se infere do ponto 2., enquanto complemento circunstancial de modo do ponto 1. dos factos provados, durante a condução que precedeu aquele embate, isto é, quando seguia na referida Rua, conduzindo o aludido veículo, momentos antes do atropelamento. Assim sendo, e porque dos autos resultam claramente elementos suficientes para tal, irá ser determinada a modificação da decisão sobre a matéria de facto, de molde que do ponto 2 dos factos dados como provados passe a constar: 2. No momento em que embateu em DD, o veículo HB seguia a uma velocidade entre 42 Km/h e 52 Km/h. Resulta evidente que o Tribunal de 2ª instância não teve em mente a alteração do limite máximo da velocidade do automóvel conduzido pelo arguido quando impactou no peão e no canídeo. Quis, sem dúvida, patentear que a velocidade, obtida através da prova pericial, tomou como premissa o local e os efeitos do embate e não aquela de que poderia vir animado antecedentemente. Na motivação da decisão de direito, persistindo no lapsus calami, escreveu que a velocidade do veículo no momento do embate, situando-se “entre 42 e 52 km/h” era “já em si, ela própria, excessiva”. Expressão que, inserida no seguinte paragrafo: ------ Contextualizando esta expressão, designadamente no parágrafo onde se insere e no confronto com a afirmação de que não se determinou a velocidade exata, só pode ler-se com o sentido de a velocidade do automóvel tripulado pelo arguido no momento do atropelamento ser excessiva para as condições do tempo e do local, as características da via e as diminuídas (pelo efeito do álcool) capacidades do condutor. Do texto do acórdão em reexame colhe-se que o denunciado lapso de escrita não influiu na confirmação da decisão recorrida. A velocidade, não exatamente medida - entre 42 e 50km/hora – foi considera excessiva em razão das circunstâncias de lugar e de tempo, das caraterísticas da via e das capacidades diminuídas do condutor, de modo que não conseguiu reagir a tempo e deter o automóvel antes de atropelar o peão e o cão. Conclui-se, assim, que o denunciado lapsus calami é realmente manifesto e que não importou modificação essencial da decisão em matéria de direito. Assim, deferindo ao requerido pela recorrente, ao abrigo do disposto no art.º 380º n.º 1 al,ª b) do CPP. entende-se corrigir o erro de escrita em que incorreu o Tribunal recorrido, retificando-se a o número final do ponto 2. dos factos provados, que ficam com a seguinte a seguinte redação (a anotar no lugar próprio): “2 - No momento em que embateu em DD, o veículo HB seguia a uma velocidade entre 42 Km/h e 50 Km/h.”
b) da responsabilidade pelo acidente: i. argumentação da recorrente: A recorrente, nas conclusões XVII a XL insurge-se contra a responsabilidade do arguido pela produção do acidente e, subsidiariamente, contra a quota parte que o acórdão recorrido confirmou. Pretendendo, desse modo, afastar o pagamento das indemnizações civis atribuídas aos demandantes, ou, ao menos, reduzi-la. Para tanto – nas cls, XVII a XXXV - contrapõe que a velocidade imprimida pelo arguido ao automóvel que tripulava não era excessiva. Alega que circulava nos limites regulamentar e legalmente estabelecidos para aquela via e local; que não era previsível que àquela hora da noite e naquelas condições de tempo, alguém atravesse a faixa de rodagem a menos de 50 metros de uma passadeira para peões. Conclui imputando a responsabilidade exclusivamente ao peão atropelado por ter atravessado a via de trânsito naquelas condições e sem que, podendo e devendo, tenha atentado na aproximação do automóvel. Incorrendo, assim, em comportamento contraordenacional. Ao invés do arguido que, assevera, circulava “apenas” em infração por condução sob efeito do álcool. Na procedência da alegada responsabilidade exclusiva do peão termina peticionando a sua absolvição. Subsidiariamente e com a mesma argumentação – nas conclusões XXXVI a XL -, pretende que, pelo menos, se atribua maior grau de responsabilidade ao peão e menor ao condutor, apontando para a inversão das quotas fixadas pelas instâncias, com a consequente redução proporcional dos montantes indemnizatórios atribuídos aos demandantes civis.
ii. na decisão recorrida: O acórdão sob reexame manteve a quota percentual de responsabilidade pelo acidente, fixada pelo tribunal de 1ª instância em 80% para o arguido e em 20% para o peão atropelado. Motivando, detalhadamente, a confirmação conclui que “o acidente se deveu essencialmente à conduta ilícita do arguido, ademais porque violadora, não só do disposto no art.º 24º, nº 1, mas ainda do art.º 81º, nº 2, do Código da Estrada”, salientando que as condições de tempo e lugar e as suas condicionada capacidades pessoais (estava sob a influência do álcool), exigiam-lhe “que moderasse a velocidade do veículo por si conduzido, de modo a que, (…) pudesse, em condições de segurança, (…) travar ou imobilizar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, nos termos exigidos pelo art.º 24.º, nº 1, do Código da Estrada”. Quanto ao peão, vítima mortal, notou a “circunstância de não ter procedido à travessia da faixa de rodagem na passadeira existente perto do local, nos termos exigidos pelo art.º 101º, nº 3, do CE”. Salientou que “foi colhido pelo veículo (…) já na via esquerda da faixa de rodagem, (…) seguindo (…) sem ser a correr, portanto, (…) não podendo ter entrado na faixa de rodagem inopinadamente, de um modo súbito, que tornasse inevitável aquele atropelamento”. Pelo que “o risco incrementado pela vítima para a ocorrência do acidente, assim como a censurabilidade ético-jurídica do seu comportamento são reduzidos quando comparado com o que foi incrementado pelo arguido (…)”. Conclui, assim, não haver “fundamento para que o concurso do facto culposo da vítima para os danos registados, fixado em 20%, deva ser alterado”. iii. concorrência de culpa: graduação; A pretensão da recorrente é contrariada pela facticidade que o acórdão recorrido deu como assente, com especial ênfase para os factos vertidos nos pontos 6, 19, 21, 28 e 31. A dinâmica do acidente, narrada na decisão em matéria de facto, demonstra a responsabilidade do condutor do veículo atropelante pela produção do acidente e, principalmente, pelo resultado fatal. Dos factos provados e da exaustiva fundamentação da decisão de direito, extrai-se que a conjugação das circunstancias espácio-temporais - que exigiam condução mais moderada e atenta -, com as afetadas capacidades de perceção e reação do arguido – pelo efeito do álcool -, foram determinantes para que não tivesse conseguido travar a tempo ou desviar-se de modo a não atropelar o peão ou, pelo menos a que do embate não resultassem lesões tão graves. Resulta ainda que foi colhido com a parte frontal do ………., já na faixa de rodagem contrária ao sentido de trânsito do veículo. Em suma, a confirmação assentou na demonstração factual e na conclusão de que o arguido não adequou a velocidade que imprimia ao ……. por si tripulado, às condições do local, da via e atmosféricas e às suas condições pessoais que limitavam a capacidade para, ao deparar-se com um peão na via, poder reagir e parar sem sair da sua faixa de rodagem, sem colher o sinistrado, poder manobrar de modo a evitar o atropelamento ou, evitar um embate tão violento e sem resultado letal. A argumentação da recorrente não é juridicamente aceitável por parecer escorada na equivocada conceção de os condutores, contanto respeitem a velocidade estabelecida, terem salvo conduto para, nos 50 metros que antecedem a passadeira, poderem atropelar pessoa que esteja a atravessar a faixa de rodagem. Ou, pelo menos, na conceção de, quando assim suceder, a violação pelo peão, da regra de circulação que o guia para atravessar na passadeira, desculpa o condutor do veículo atropelante e, consequentemente, afasta-o de qualquer responsabilidade. Não só não existe, evidentemente, semelhante direito, como não é por se deparar com um peão a atravessar a faixa de rodagem a menos de 50 metros de uma passadeira que o condutor de automóvel pode eximir-se de responsabilidade pela produção do acidente e respetivo resultado, quando tenha adotado conduta culposa que contribua para o atropelamento e – como sucedeu -, se revele determinante da gravidade do resultado – que no caso foi fatal. O princípio geral, em matéria de velocidade automóvel rodoviária é que o condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular dos vulneráveis, às características e estado da via, às condições meteorológicas ou ambientais e a quaisquer outras relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente – art. 24º do Cód. da Estrada/CE. Na definição legal, o peão é um utilizador vulnerável para efeitos da circulação rodoviária – art. 1º al.ª q) do mesmo Cód. Vulnerabilidade que a lei não lhe retira em nenhuma circunstância, designadamente nos 50 metros que antecedem a passadeira. Os condutores estão obrigados a não pôr em perigo os utilizadores vulneráveis – art. 11º n.º 3 do CE. Os condutores devem moderar especialmente a velocidade na aproximação de peões – art. 25º n.º 1 al.ª e) do mesmo diploma legal. O facto de a pessoa apeada atravessar a faixa de rodagem quando a menos de 50 metros existe uma passadeira fá-la incorrer em comportamento contraordenacional por violação da regra legal que o guia para o ponto onde se entendeu concentrar o atravessamento da via por peões. Quando nessas circunstancias, intervém em acidente de viação, corresponsabiliza-a – mais ou menos conforme o grau da sua imprudência – pelo acidente, pelo atropelamento e respetivas consequências, concorrentemente com o comportamento, quando também culposo, do condutor do veículo. Conforme se sustenta no Ac. STJ de 3/12/2015: “em sede de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, ainda que se prove que o condutor circulava dentro do limite máximo legal estabelecido para o local da ocorrência, há que ponderar se circulava a uma velocidade adequada às circunstâncias envolventes, de modo a poder parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, ou a uma velocidade especialmente moderada, respetivamente, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, do Código da Estrada. Em caso de acidente de viação com atropelamento de peão, ocorrerá concorrência de culpas entre o peão e o condutor, se aquele, ao atravessar a via, tiver infringido a prescrição do artigo 101.º, n.º 1, do CE, e este circular com velocidade excessiva nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, do mesmo Código”[1]. Sempre que assim sucede, para atribuir e graduar as responsabilidades, do condutor e do peão, nos termos do artigo 570.º, n.º 1, do Código Civil/CC, importa determinar a medida em que a conduta ilícita e culposa de cada um foi causal da produção do acidente, à luz da teoria da causalidade adequada. Como se sustenta no Ac. STJ de 19/04/2018: “no caso de acidente de viação em que ocorreu um atropelamento, a mera verificação da violação da norma estradal, por parte do peão, ainda que revestindo natureza contraordenacional, não é por si só suficiente para estabelecer o nexo causal com a produção do acidente, tornando-se necessário indagar se tal comportamento ilícito e culposo consubstancia, em concreto, causa adequada do evento ocorrido. Haverá assim que ter presente a norma violada e o respetivo âmbito de proteção e, nessa base, averiguar se o risco abstratamente ali prevenido se concretizou no resultado ocorrido”[2]. Quando lesante e lesado tenham contribuído, por atuação com negligência inconsciente de ambos – para o que aqui releva -, para a produção do acidente e os danos dele resultantes, a quota parte de responsabilidade haverá de fixar-se em razão da gravidade relativa do ato culposo de cada interveniente. O qual, por sua vez tem de obter-se através da ponderação da perigosidade imanente às proibições ou restrições de circulação vial que cada um violou, ou, em outro registo, da gravidade dos factos que essas regras pretendem evitar. No que ao caso importa, a violação pelo condutor arguido das regras que estabelecem limites para a velocidade de circulação dos veículos, isto é que proíbem transitar nas vias públicas ou equiparadas com velocidade excessiva, bem como as normas que proíbem conduzir sob efeito do álcool ou em estado de embriaguez, determinadas pela finalidade de acautelar, precisamente, a perigosidade para a segurança de pessoas e bens, apresenta um grau de gravidade incomparavelmente superior ao da violação, pelo peão, das normas que obrigam as pessoas a atravessar a faixa de rodagem na passadeira para peões sempre que esteja a menos de 50 metros. Regra esta, estabelecida com a finalidade de permitir fluidez ao trânsito automóvel, principalmente em meio urbano, guiando e concentrando os peões para atravessar em pontos determinados. Com ganhos evidentes, mas essencialmente reflexos, para a segurança do trânsito rodoviário. Os automóveis têm prioridade na faixa de rodagem. Os peões podem atravessa-la quando não transite nenhum veículo. A passadeira inverte a prioridade de circulação viária. Obriga os veículos a parar e ceder a passagem aos peões que nela estão a atravessar a faixa de rodagem. A passadeira e a regra da prioridade que confere, facilita aos peões atravessar a faixa de rodagem com alguma segurança. Mas não evita, de todo, que possam ser atropelados por veículo conduzido com violação da prioridade de passagem ou que circule com velocidade excessiva ou por um condutor embriagado. O atravessamento da faixa de rodagem por peão à mais ou a menos de 50 metros da passadeira não têm especial relevância para atenuar a gravidade dos danos físicos resultantes do atropelamento. Segundo as regras da experiência comum, o atropelamento dentro dos referidos 50 metros até deveria ser menos provável e menor a gravidade das lesões causadas porque a lei impõe ao condutor que modera a velocidade na aproximação de passadeira para peões, nomeadamente quando não regulada por sinalização luminosa ou por agente – art.103º n.º 2 do CE. Abundante será realçar que a condução sob efeito do álcool é tão perigosa para a segurança rodoviária que o legislador firmou o impedimento do infrator para continuar a conduzir, imediatamente e no período das 12 horas seguintes ou enquanto não demonstrar, através de novo exame, que já não está alcoolizado – art. 154º n.º 1 do Cód. da Estrada. Finalmente, nota-se que o peão foi atropelado na faixa de rodagem esquerda por referência ao sentido de marcha do veículo conduzido pelo arguido. Quando foi embatido pela parte frontal do ……. tinha atravessado completamente a faixa de rodagem direita, estando já fora, para além da faixa de rodagem pela qual transitava o veículo. O arguido manobrou o … desviando-o para a sua esquerda – ponto 20 dos factos provados -, invadindo a faixa de rodagem de sentido contrário, na qual colheu o peão. Se não tivesse saído da respetiva faixa de rodagem, mesmo sem ter conseguido parar o automóvel que conduzia, não teria atropelado o peão porque já não se encontrava na sua linha de trânsito regulamentar. Legalmente não podia nem devia ter saído da sua hemifaixa de rodagem e invadir a hemifaixa destinada à circulação de veículos em sentido contrário. Se tem cumprido com as regras do art. 13º n.º 1 do CE não teria causado o atropelamento. Contudo, a violação desta regra não assumiu densidade especial na fundamentação da decisão recorrida. Tratando-se de uma norma jurídica e, consequentemente, de uma questão de direito, podia ser conhecida pelo Tribunal, contanto a sua inobservância resultasse – como efetivamente resulta - da matéria de facto que a decisão recorrida julgou assente. O que poderia ter influído desfavoravelmente na graduação da responsabilidade do arguido e, consequentemente, da aqui recorrente. Todavia, interpretamos que aquela manobra foi imputada à condução em estado de alcoolémia, refletindo-se na capacidade de atenção e reação do condutor arguido, diminuindo consideravelmente a destreza e a perícia exigidas para manobrar de modo a evitar o acidente. Como teria sucedido se não tivesse desviado o …….. para a sua esquerda, invadindo a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário. Do exposto e sem necessidade de entrar na interpretação mais detalhada do disposto no art. 570º n.º 1 do CC, para não repetir argumentos atinentes à concorrência da culpa do lesado – por constarem da sentença condenatória e do acórdão recorrido –, quer quanto ao respetivo grau de culpa, quer quanto às consequências do acidente conclui-se que a quota da responsabilidade do condutor do ……., arguido nos autos e do peão atropelado, confirmada na decisão recorrida, apresenta-se factualmente demonstrada e juridicamente fundamentada. A merecer reparo só poderia ser por alguma benevolência para o grau de responsabilidade do arguido nos autos. Razão pela qual improcede, por manifestamente falta de fundamento, a pretensão absolutória da Recorrente e também assim a pretensão subsidiária que visava a redução da quota parte de responsabilidade do condutor do …….. e, por aí, do montante indemnizatório a suportar pela demandada. c) da sub-rogação; i. argumentação da recorrente: A recorrente, nas 3 últimas conclusões do seu recurso – XLI a XLIII -, argumenta que o ISS.IP só poderia sub-rogar-se no direito dos lesados resultantes “de eventuais danos patrimoniais futuros, nomeadamente os decorrentes de perda de rendimentos propiciados pelo DD”. Nessa pressuposição pretende ser absolvida de pagar ao ISS, IP, a quantia de 11.777,20€, “bem como quaisquer outras importâncias no futuro e respetivos juros”. Adianta-se que o recurso neste segmento, não pode ser conhecido por suscitar questão completamente deslocada relativamente à decisão recorrida. Vejamos: ii. questão colocada ao tribunal recorrido: No acórdão recorrido, delimitando as questões suscitadas pela recorrente, neste domínio, consta o seguinte (com passagens aqui sublinhadas e a negrito para realçar): Alega a demandada cível que o Tribunal a quo a condenou além do pedido, porquanto a condenou a pagar 80 % de todas as prestações que no futuro venham a ser pagas pelo ISS, IP, quando é certo que este, nesse segmento do pedido, apenas havia pretendido a condenação daquela no pagamento das prestações já pagas e das que se viessem a vencer no decurso da ação. Considerando por isso verificar-se nessa parte a nulidade da sentença, e ainda que assim não fosse entendido, sempre tal condenação não seria possível, porque exercendo o ISS, IP, o respetivo direito ao abrigo do instituto da sub-rogação, então só o poderá exercer relativamente ao pagamento das prestações efetivamente realizadas. Cumpre dizer liminarmente que assiste razão à recorrente, (…) no que respeita à impossibilidade legal de (…) se considerar sub-rogado no direito do credor relativamente a prestações futuras, porquanto o efetivo cumprimento da obrigação por parte daquele, junto do credor, é que lhe possibilita ficar sub-rogado nos direitos desse mesmo credor. Assim sendo, nesta parte irá ser concedido provimento ao recurso, condenando-se a demandada nos termos peticionados no pedido cível deduzido pelo ISS, IP, ou seja, também relativamente às prestações vencidas na pendência da presente ação, mas não já relativamente a quaisquer prestações futuras. Ficando desse modo prejudicada a apreciação da pretensão da mesma recorrente, subsidiariamente deduzida, isto é, para o caso de vir a ser reconhecido o direito do ISS, IP, ao pagamento das prestações futuras por este realizadas, que tal pagamento não perdurasse para além da data em que o falecido faria 70 ou 77 anos de vida, se vivo fosse. A restante questão ali suscitada pela recorrente – julgada improcedente -, respeitava aos juros de mora, pretendo que se se contassem a partir da data da sentença. iii. que importâncias no futuro? Desde logo, não se compreende à luz de que regime legal – e a recorrente não o indica – deveria o ISS, IP compensar os familiares por eventual “perda de rendimentos propiciados pelo DD”. A componente assistencial da segurança social visa e tem como medida as necessidades dos beneficiários e não tem por escopo compensá-los por “eventuais danos patrimoniais futuros”. Não se vislumbrando outra razão que não seja a de tratar-se de resquício ou reminiscência do recurso contra a sentença condenatória, na qual, a recorrente tinha sido condenada no pagamento ao ISS, IP, também “80% (oitenta por cento) do valor das pensões” de sobrevivência que viesse pagar desde julho de 2019, acrescido de juros de mora. Existe, isso sim, uma norma legal – o artigo 70.º (“responsabilidade civil de terceiros”) da Lei n.º 4/2007 – que estabelece: No caso de concorrência pelo mesmo facto do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam sub-rogadas nos direitos do lesado até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder. Por outro lado, não se compreende nem pode aceitar-se, que a recorrente venha alegar contra segmento de inexistente condenação ao pagamento de “quaisquer outras importâncias no futuro e respetivos juros”, quando na 2ª instância obteve provimento no seu pedido de ser absolvida, precisamente, “relativamente a quaisquer prestações futuras a pagar “. Insofismavelmente, não só não vem condenada a pagar ao ISS, IP “outras importâncias no futuro e respetivos juros”, como foi absolvida de pagar quaisquer prestações futuras. Não tem sentido que possa insurgir-se contra segmento decisório que não existe e que nem sequer pode colocar-se como mera hipótese. Nesta parte abusou na insistência do direito ao recurso. iv. quantias pagas pelo ISS, IP: Argumentando tão-somente com a inexistência de sub-rogação do demandante relativamente a importâncias que viesse a pagar futuramente, resulta imediatamente evidente que nada objeta quanto à reintegração do sub-rogante “relativamente ao pagamento das prestações efetivamente realizadas”. Nada opõe pela simples e facilmente inteligível razão de o acórdão recorrido, reconhecendo-lhe razão nesse ponto, corrigiu a sentença condenatória restringindo a sub-rogação às prestações efetivamente pagas e às “vencidas na pendência da presente ação”. Excluiu, assim, a sub-rogação do ISS, IP, relativamente a quaisquer prestações futuras a pagar. Assim e de conformidade com o exposto, conclui-se que, neste segmento, o recurso carece de objeto útil, não podendo senão rejeitar-se, em conformidade com o disposto nos arts. 420º n.º 1 al.ª b) do CPP.
v. sanção processual: Conforme se assinalou, o recurso em apreço, é manifestamente infundado e, como vem de dizer-se, em parte, não tem, pois, objeto uma vez que contesta um segmento da decisão que concedeu provimento à pretensão então apresentada e na qual reitera, abusando, assim, nesta parte, do direito ao recurso. A rejeição pelas razões expostas implica a condenação do sujeito processual respetivo ao pagamento da sanção processual cominada no art.º 420º n.º 3 do CPP. Que, no caso, se entende fixar em 7 UCs C. DECISÃO: Pelo exposto, o Supremo Tribunal de Justiça - 3ª secção criminal -, decide: a) corrigir, ao abrigo do disposto no art.º 380º n,º 1 al.ª b) do CPP, o lapso manifesto no ponto 2 dos factos que passa a ter a seguinte redação, (a anotar no lugar próprio): “2 - No momento em que embateu em DD, o veículo HB seguia a uma velocidade entre 42 Km/h e 50 Km/h.” b) rejeitar o recurso na parte referente â sub-rogação por se reportar a condenação inexistente, uma vez que, nesse segmento, a recorrente obteve provimento no acórdão recorrido; c) No demais, julgar improcedente o recurso da demandada cível. d) Condenar a recorrente a pagar 7UCs, nos termos do art. 420º n.º 3 do CPP. * Custas pela Recorrente, nos termos do disposto nos arts. 523º do CPP, 527º, 529º e 530º da CPC e 6.º, n.º 2 e 7º n.º 2 Tabela I anexa ao Regulamento das Custas Judiciais). Supremo Tribunal de Justiça, 17 de março de 2021. Nuno Gonçalves (Juiz Conselheiro relator) (Atesto o voto de conformidade do Ex.mº Sr. Juiz Conselheiro Paulo Ferreira da Cunha – art.º 15º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020 de 13 de março na redação dada pelo DL n.º 20/2020 de 1/05 aplicável ex vi do art.º 4 do CPP)[3] . Paulo Ferreira da Cunha (Juiz Conselheiro adjunto) _______ [1] Proc. 3969/07.0TBBCL.G1.S1, in www.dgsi.pt. |