Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
95/24.1YHLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
REGISTO DE MARCA
ANULABILIDADE
PRINCÍPIO DA NOVIDADE
LOGÓTIPO
SINAL DISTINTIVO
IMITAÇÃO
RECUSA
REQUESITOS
FUNDAMENTOS
REPRODUÇÃO
CONFUSÃO
CONSUMIDOR
ACÇÃO DE ANULAÇÃO
PRAZO
CONCORRENCIA
Data do Acordão: 10/29/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (PROPRIEDADE INTELECTUAL)
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I - Não é suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão o registo da marca na classe 33 da Classificação Internacional de Nice (“vinhos, aguardentes e licores”), quando o requerente de tal registo, pedido em 08/11/2022, é titular do logótipo registado há 25 anos e que vem desde aí utilizando no seu comércio de vinhos; e quando o confronto da marca registanda é com as marcas registadas e também destinadas a bebidas alcoólicas e registadas na referida classe 33 desde 2001 e 2003, respetivamente.

II – A falta de requisitos relativos (“novidade relativa”) de marcas e logótipos, cujos registos hajam sido concedidos, constitui fundamento de anulabilidade dos registos (cfr. arts. 260.º e 297.º do CPI); anulabilidade que pode vir a ser declarada posteriormente, a pedido de quem se sentir prejudicado, em ação intentada no INPI, no prazo de 5 anos a contar do despacho de concessão do registo (art. 34.º/7 do CPI), permanecendo os tribunais competentes para conhecer da matéria apenas em via de reconvenção (art. 266.º do CPI) ou em sede de recurso, ou seja, a anulabilidade de tais marcas e logótipos não pode ser conhecida a título meramente incidental (isto é, numa ação em que o tribunal se depare com a falta de preenchimento de tais requisitos relativos).

III - Não sendo uma tal ação o lugar e o momento próprios para apreciar os fundamentos de anulabilidade de sinais registados, nem por isso deve deixar de apreciar-se a questão do relevo jurídico a conceder – – no âmbito da apreciação do risco de confusão entre a marca registanda e os sinais registadas – à relação (e ao grau de semelhança) que tais sinais registados estabeleceram, em termos de “novidade relativa”, com os sinais – marcas e logótipos – que lhes eram precedentes.

IV – Segundo a “teoria da distância”, o titular de uma marca/logótipo não pode exigir que as marcas/logótipos posteriores se diferenciem da sua marca/logótipo num grau superior àquele em que a sua marca/logótipo se diferenciou das marcas/logótipos que o/a precederam, ou seja, se é curta a distância/distintividade entre uma marca/logótipo e as marcas/logótipos que lhe eram antecedentes, também o titular de tal marca/logótipo, entretanto registada/o, não pode exigir que uma marca/logótipo registanda/o se separe do seu sinal em grau de distintividade superior (seja mais diferente que a curta distância que estabeleceu em relação às marcas/logótipos que lhe eram antecedentes).

V – Sendo, como é o caso, a marca registanda quase uma reprodução do logótipo preexistente (da requerente da marca registanda), o grau de semelhança (a pouca diferenciação/distintividade) que existe entre as marcas registadas da contraparte e a marca registanda é exatamente o mesmo grau de semelhança que está instalado entre as marcas registadas e o logótipo preexistente (da requerente da marca registanda), pelo que não se pode afirmar que a semelhança existente entre as marcas (registadas e registanda) seja suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I - Relatório

A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. interpôs recurso judicial da decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, proferida em 20 de Dezembro de 2023, que recaiu sobre o pedido de modificação de decisão apresentado no âmbito do processo de registo da marca nacional n.º 694944

(adiante identificada como marca registanda), e revogou a decisão, proferida em 07 de Junho de 2023 (de concessão do registo da identificada marca na classe 33 da Classificação Internacional de Nice), e cuja publicação foi efetuada no Boletim da Propriedade Industrial de 5 de Janeiro de 2024.

Alegou, para tal, que o INPI não teve em consideração:

- O terceiro requisito do conceito de imitação estatuído no art. 238.º do CPI.;

- O facto de os sinais em confronto serem constituídos por siglas, e a jurisprudência aplicável a este tipo específico de sinais, no sentido de o elemento figurativo assumir maior preponderância, não devendo, para mais, ser negligenciada a componente conceptual da marca (o facto de M&M no sinal requerendo corresponder à firma da Recorrente Moreira & Moreira); e

- o facto de a Recorrente utilizar o logótipo há mais de 25 anos.

Concluiu no sentido de ser repristinada a decisão de concessão de marca, inicialmente dada pelo INPI, a qual assentou na seguinte fundamentação:

“(…)

ainda que os sinais partilhem as mesmas letras, o risco de confusão é excluído com segurança, uma vez que os sinais em conflito são suficientemente estilizados de tal forma que a sua representação gráfica é globalmente diferente e neutraliza o elemento nominativo comum, não conduzindo por isso a uma constatação de que a concessão do pedido ora apreciado, atendendo ao caso em concreto e às suas particularidades (nomeadamente a coexistência de sinais dos litigantes, há muitos anos), possa induzir o consumidor em erro ou na crença, indevida, de que se tratam produtos com a mesma origem empresarial ou que alguma relação se estabelece entre as respetivas entidades que se propõem a introduzi-los no mercado.(…).”

A Cave Central da Bairrada, S. A. contra-alegou, impugnando a factualidade alegada quanto ao carácter distintivo do sinal/logotipo de que a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. é proprietária; e a apreciação jurídica, quanto à inexistência de risco de confusão no espírito do público, constante da alegação recursiva desta, concluindo pela manutenção do decidido.

O Tribunal da Propriedade Intelectual proferiu, no recurso interposto da decisão do INPI, a seguinte sentença:

“Por todo o exposto, julgo improcedente o recurso apresentado, e, em consequência, recuso o registo da marca nacional n.º 694944

(…)”

Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso de apelação a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda., recurso que por acórdão do tribunal da Relação de Lisboa, de 02/05/2025, foi julgado procedente “e, em consequência, determinou-se o registo da marca nacional n.º 694944 “ ” para designar produtos da classe 33. (…)”

Agora inconformada a Cave Central da Bairrada, S. A. interpõe o presente recurso de revista, visando a revogação do Acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que, invertendo o decidido, repristine o decidido na sentença de 1.ª Instância.
Foi a revista interposta com fundamento em duas “contradições jurisprudenciais”, tendo o relator, no despacho liminar, admitido a revista, nos termos do art. 629.º/2/d) do CPC, com o objeto circunscrito à questão do relevo jurídico a conceder – no âmbito da apreciação do risco de confusão entre a marca registanda da requerente do registo e as marcas registadas da contraparte – ao registo preexistente (às marcas registadas da contraparte) de um sinal distintivo do comércio (logótipo) da requerente da marca registanda [não se admitindo a revista quanto à outra contradição jurisprudencial invocada, respeitante aos critérios e fatores que militam para comparar, estritamente, a semelhança entre a marca registanda e as marcas registadas da aqui recorrente].
Terminou a ora recorrente a sua alegação com as seguintes conclusões:
“(…)

A) Por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de maio de 2025, nos presentes autos, foi concedido o registo da marca mista com o n.º 694944, para produtos da classe 33ª, decisão essa da qual se recorre ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC.

B) O douto Tribunal da Relação concluiu:

(…)
C) Com o devido respeito, tal concessão de tal registo resulta no erro de aplicação do Direito quanto ao conceito de registo de direito prioritário (princípio da prioridade) e ainda quanto ao conceito de risco de confusão entre marcas (artigo 238.º n.º1 alíneas a) e c) do CPI).

D) Verifica-se pois, com igual, que tais questões fundamentais de Direito na área do registo de marcas tiveram uma aplicação e entendimento em clara contradição com outros Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa.

E) Com efeito, o Acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão de 24 de abril de 2023, no processo nº 212/22.6YHLSB.L1-PICRS, quanto à questão do conceito de registo anterior prioritário, e ainda em contradição com o Acórdão proferido em 17 de fevereiro de 2011, no processo nº 1210/07.5TYLSB.L1-2, quanto à questão do conceito de risco de confusão entre marcas – ambos Acórdãos - fundamento.

F) Assim, o Acórdão recorrido atribuiu prioridade ao logótipo registado pela aqui Recorrida em 1996, em detrimento das marcas nacionais nº 357302 (registada em 2002) e nº 518176 (registada em 2014), ambas na titularidade da aqui Recorrente e válidas para produtos da classe 33 — bebidas alcoólicas, exceto cerveja, respetivamente:

G) Tal entendimento contraria o sistema do registo constitutivo do direito sobre a marca, consagrado no artigo 210.º do CPI, que atribui o direito de propriedade e do exclusivo ao titular do registo válido e eficaz, que no caso aqui em crise é sem margem para dúvidas é a aqui Recorrente – cujo direito nunca foi impugnado pela aqui Recorrida que não exerceu os mecanismos legais de defesa previstos na lei.

H) O acórdão recorrido está em manifesta contradição com o Acórdão-fundamento de 24/04/2023 (proc. 212/22.6YHLSB.L1-PICRS), que considerou irrelevante o registo anterior de uma firma e cujo titular não defendeu o seu direito, seja em sede administrativa, seja em sede judicial, nos prazos prescritos na lei, tal como a aqui Recorrida não defendeu o seu logótipo face ao registo das marcas posteriores da aqui Recorrente, e como ela própria o admite nos pontos 44º e 47.º das suas alegações do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa “Sendo que a Recorrida, titular daquele Logótipo, não tem a intenção quanto às marcas da Recorrente “que estasfossemrevogadas/anuladas…”,talcomo“…não reclamou, ou melhor não se opôs à concessão das marcas da Recorrida, embora o pudesse ter feito…”.

I) Os ditos meios de defesa em causa são: em termos administrativos, a reclamação ao disposto no artigo 232.º n.º 2 a) do CPI, para o caso da firma e a alínea c) do nº 1 do art.º 232.º do CPI para o caso do logótipo; e em termos judiciais, uma ação de anulabilidade intentada ao abrigo do disposto nos artigos 34.º n.º 2 e 260.º do CPI, seja por via de reconvenção, ao abrigo do disposto no artigo 266.º do CPI, no caso de ser demandada; no último caso, dentro do prazo previsto no artigo 34.º n.º 7 do CPI, que é de 5 (cinco) anos a contar dos registos das marcas.

J) O direito de prioridade, com efeito legal de primazia na apresentação de um novo pedido, só é reconhecido em situações específicas previstas na lei (Marca Livre e direito de prioridade da Convenção da União de Paris, nos termos dos artigos 213.º e 13.º do CPI, respetivamente), não sendo aplicável ao caso sub judice.

K) O que está em causa nos presentes autos é o de saber se um Logótipo registado em 1996 atribui algum direito para a apresentação de um novo pedido de registo de nova marca (e não um novo logótipo) passadas mais de duas décadas, quando, entretanto, foram registadas duas novas marcas da aqui Recorrente – sem qualquer reação da aqui Recorrida.

L) O Acórdão recorrido violou o artigo 238.º n.º 1 alínea a) do CPI ao não aplicar corretamente o Direito quanto ao princípio da prioridade das marcas registadas da Recorrente, isto é, deu relevância, erradamente, à antiguidade do registo do Logótipo, desvalorizando a relevância adequada dos dois registos (prioritários) da aqui Recorrente.

M) Outrossim, o acórdão recorrido violou o artigo 238.º n.º 1 alíneas c) do CPI, ao não aplicar corretamente o direito tendo em conta o conjunto de critérios consensuais da doutrina na apreciação do risco de confusão de marcas, não identificando o elemento prevalente em cada marca, sendo elas marcas mistas, e ignorando a identidade fonética e conceptual entre elas.

N) O Tribunal recorrido desconsiderou a jurisprudência do próprio Tribunal da Relação de Lisboa (Acórdão de 17/02/2011, proc. 1210/07.5TYLSB.L1-2-acórdão fundamento), que concluiu que os elementos fonéticos são mais idóneos para perdurar na memória do público do que os elementos gráficos ou figurativos, e realça que, no caso das marcas mistas, o elemento nominativo é, em regra, o mais importante para a apreciação do risco de confusão.

O) O acórdão recorrido não atendeu à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e ao Princípio da interdependência entre fatores, plasmado naquela jurisprudência - 29/09/1998, C-39/97, Canon, EU:C:1998:442, § 17, segundo o qual devem ser atendidas todas as circunstâncias particulares de cada situação, in casu, estando em contenda marcas para vinhos e bebidas alcoólicas (classe 33), a legislação sectorial exige que a comercialização seja feita sob marcas registadas.

P) Resultando da má aplicação do Direito, quanto ao requisito previsto na alínea a) do n.º1 do artigo 238.º do CPI, o Tribunal recorrido, apesar de implicitamente ter afirmado que existe risco de confusão entre as marcas registadas e a marca registanda, não aplicou os ditos critérios de apreciação no confronto das marcas, tendo concluído que a marca registanda, por ser uma quase reprodução do dito Logótipo, não era suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão.

Q) Tal conclusão de não indução em erro ou confusão, não poderá ser atendida, pois, com a concessão da marca registanda – quanto aos vinhos engarrafados - passamos a ter, no mercado, de duas marcas registadas que se leem “EMEEÉME”, para três marcas registadas que se leem “EMEEÉME”, na classe 33ª da Classificação internacional de Nice – ou seja, verifica-se uma total identidade fonética entre todas;

R) Sendo que resulta, ainda, da análise de tais marcas que existe total sobreposição entre os caracteres utilizados na marca registanda e nas marcas registadas e pelas ordens em que se encontram dispostos, uma vez que ambas utilizam a sigla: “M&M”;

S) E dado que a marca registanda reproduz a sigla das marcas (prioritárias) registadas da aqui Recorrente, a qual, pelo seu carácter de fantasia, assume carácter distintivo, há risco de confusão e de associação às marcas da aqui Recorrente, uma vez que o consumidor poderá pensar que está perante produtos com a mesma origem empresarial.

T) O acórdão recorrido, com o devido respeito, incorreu em contradição própria ao afirmar que o direito das marcas visa proteger o consumidor da confusão, e simultaneamente, permite o registo de uma marca que reproduz claramente as marcas anteriores válidas e eficazes.

U) A interpretação correta das normas aplicáveis (artºs. 232.º, 238.º e 210.º do CPI) impõe que, existindo marcas registadas válidas e eficazes para produtos idênticos, o pedido de registo posterior que reproduz o elemento distintivo (“M&M”) deve ser recusado, por criar risco de confusão e violar o direito de exclusividade do titular das marcas anteriores.

V) O acórdão recorrido, ao decidir em sentido contrário, violou os princípios da segurança jurídica, da proteção do consumidor e do sistema constitutivo de registo de marcas, consagrados na lei e na jurisprudência nacional e europeia.

X) Pelo que aceite o presente Recurso, nos termos da alínea a) do nº 2 do art.º 629.º do CPC, deve o mesmo ser julgado procedente e, em consequência, anular-se a Douta


decisão recorrida, que concedeu a o registo da marca nacional nº 694944 , para a classe 33. (…)”

A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. respondeu, sustentando que não se verificam as contradições jurisprudenciais invocadas pela recorrente e que, por isso, a revista não deve ser admitida; e, caso seja admitida, que o Acórdão recorrido não violou qualquer norma substantiva e que o mesmo deve ser mantido nos seus precisos termos e a revista julgada improcedente.
Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:
“(…)

1. O presente recurso de revista nos termos da alínea d) do art. 629.º vem interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou o Recurso de Apelação da então Recorrente, e aqui Recorrida Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal Lda. totalmente procedente e determinou, em consequência, o registo da marca nacional n.º 694944


“ ”para designar produtos da classe 33ª da Classificação Internacional de Nice, a saber“ vinhos; aguardentes; licores”, bem como condenou a Recorrida, ora Recorrente do recurso de revista, no pagamento das custas.

2. Para preenchimento dos requisitos da al. d) do art. 629.º do CPC a Recorrente Cave Central da Bairrada procedeu à junção de dois acórdãos fundamento que envolviam a discussão da confundibilidade de marcas verbais complexas e num dos quais uma marca verbal complexa perante uma marca mista e complexa, sendo que num dos acórdãos também foi abordada a questão do registo de uma firma ou denominação social e em nenhum deles foi abordada a questão do logótipo anterior de igual composição, nem do uso do mesmo no mercado e coexistência de direitos no mesmo sector, sendo também que os acórdão-fundamento não abordavam sinais curtos ou marcas mistas compostas por combinação de duas letras.

3. Para além do mais a Recorrente, propositadamente, bifurcou as questões fundamentais, redigindo-as de forma genérica e, ao nosso ver, incorreta, separando-as, e dificultando a aplicação do preceito.

4. Ora, exige-se, para que se reconheça contradição de julgados, a identidade substancial do núcleo essencial das situações de facto que suportam a aplicação, necessariamente diversa, dos mesmos normativos legais ou institutos jurídicos, sendo que as soluções em confronto, necessariamente divergentes, têm que ser encontradas no domínio da mesma legislação, de acordo com a terminologia legal.

5. Assim sendo, não será admissível o recurso de revista sem a oposição frontal sobre a mesma questão fundamental de direito, com base no mesmo quadro normativo ou substancialmente idêntico e subjacente a um núcleo factual idêntico ou coincidente.

6. E desde logo, não se poderá admitir o Primeiro Acórdão-fundamento junto pela Recorrente pelo simples facto da decisão ali vertida ser atinente a uma FIRMA a uma DENOMINAÇÃO SOCIAL! Sem qualquer tipo de paralelo, nem na mais extravagante das interpretações, com as questões de direito e a matéria de facto a estas subjacentes (reproduzida nas alegações supra) e que foram alvo de discussão e apreciação no Acórdão recorrido.

7. E relativamente a AMBOS os acórdãos fundamento a composição dos sinais não é semelhante e nem sequer análoga (sinais complexos nos acórdãos fundamento # sinais mistos e curtos compostos por duas letras/siglas no acórdão recorrido), e o público relevante e o mercado relevante é completamente divergente, não se tratando de um qualquer preciosismo pois estamos perante matéria de Propriedade Industrial, não sendo possível ignorar que o juízo de confundibilidade deve ser aferido perante as circunstâncias e factores do caso concreto e um consumidor médio, razoavelmente informado e atento, não abstrato mas sim da tipologia de produtos em confronto (neste caso inseridos na classe 33).

8. Não se concebe nem se concede sob pena de vulgarização desta revista excecional e um verdadeiro aproveitamento indevido deste regime legal em decisões devidamente formadas, fundamentadas e ponderadas (para além de justas) como é o caso dos autos…as indicações genéricas e gerais de “prioridade” e “confusão” versadas pela Recorrente como “questões”.

9. A Recorrente, não teve em devida conta que a contradição entre julgados não se verifica quando os dois (mas neste caso três ) acórdãos em confronto analisaram o “conceito de confusão” como aquela indica, e as mesmas disposições legais (no segundo acórdão-fundamento perante Códigos da Propriedade Industrial diferentes – 2003 vs. 2018), interpretando-as nos mesmos termos, mas em relação a situações de facto diferentes (Foi precisamente o que decidiu o Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 83/18.7YHLSB.L1.S1 – sumário supra reproduzido no corpo das alegações).

10. Nas situações de facto dos acórdãos em causa não resulta qualquer identidade/coincidência, nem sequer poderá ser realizada qualquer analogia:

(…)

11. O caso em apreço é completamente divergente, “no mínimo” do ponto de vista factual, do vertido nos acórdãos fundamento, existindo três direitos de propriedade industrial – duas marcas e um logótipo em discussão, uma vez que a Recorrida alegou e provou a titularidade daquele logótipo bem como alegou e provou que o utiliza no mercado dos vinhos e que o mesmo consta dos rótulos dos vinhos e dos seus catálogos há mais de duas décadas (vd matéria de facto provada reproduzida no corpo das alegações e no Acórdão recorrido para o qual se remete).


12. E não menos importante é o facto da marca em causa corresponder visualmente ao logótipo já registado antes das marcas que a aqui Recorrente considera imitadas…

13. A Recorrente insiste na afirmação de que a aqui Recorrida imitou as suas marcas quando, na realidade esta já tinha registado sinal praticamente igual sob a modalidade de logótipo, e activamente o utilizado no mesmo mercado antes da Recorrente registar os seus. Para além disso os sinais são curtos e nestas circunstâncias os respectivos elementos figurativos e de design sobrepõem-se e neutralizam as letras em comum.

14. São contornos fácticos essenciais à decisão proferida e que não encontram qualquer paralelo nos acórdãos fundamento, inexistindo nestes quaisquer factos que sejam minimamente análogos à questão do uso efectivo de um sinal misto, o logótipo, já registado, e actualmente válido e em vigor no âmbito da mesma legislação (CPI), com determinados direitos, aqui relevantes.

15. A inexistência de contrariedade ficaria, desde logo, salvo melhor opinião, “arrumada” pelo mero facto das marcas em confronto nos acórdãos fundamento terem composições distintas dos sinais discutidos no acórdão recorrido! E pelo facto do acórdão recorrido debruçar-se sobre um quadro factual sem qualquer paralelo, identidade ou coincidência com o quadro fáctico daqueles acórdãos quer quanto à questão da prioridade quer quanto ao ajuizamento e análise da susceptibilidade confusão entre sinais.

16. Tão “gritante”, passe a expressão, é a inaplicabilidade do art. 629 n.º 2 al. d) no caso destes autos, que caso se concedesse a revista mediante os acórdãos em confronto e, com base nos mesmos, fosse revogado o acórdão recorrido, criar-se-ia um precedente nefasto em matéria de Propriedade Industrial, corrompendo este regime excepcional, visto que neste ramo de direito e em particular no que respeita à aplicação do conceito de confusão, a existência ou não de confusão fácil perante o consumidor médio dos produtos e serviços assinalados é intrinsecamente determinada pelas circunstâncias fácticas do caso concreto!

17. Para além do mais, também não resulta preenchido o requisito da dissemelhança entre os resultados da interpretação e/ou da integração das disposições legais relevantes, inexistindo diferença relevante na interpretação de conceitos e normas jurídicas.

18. Em matéria de Propriedade Industrial inexistem regras absolutas acerca do elemento nominativo como pretende fazer crer a Recorrente, especialmente quando estamos perante sinais curtos e construídos por mera junção de letras (há jurisprudência vasta neste sentido das instâncias europeias citada pela Recorrida perante o Tribunal da Relação e inclusive neste recurso)

19. Concluindo, é inadmissível o presente recurso de revista, que só seria admissível à luz do disposto no artigo 629.º, n.º 2, al. d) do CPC, o que, face ao exposto, não se verifica.

Sem prejuízo,

20.Caso o presente Recurso seja considerado admissível, o que meramente se admite para efeitos de patrocínio, a Recorrente não poderá deixar de ser pronunciar sobre o seu mérito, uma vez que o mesmo carece por completo de fundamento dado que o Acórdão recorrido é absolutamente irrepreensível


21. Na marca controvertida, n.º 6949 é a sua composição mista e configuração estilística dos elementos MM sobrepostos, um a negrito em tom cinza escuro e outro em tom branco e o desenho do cacho de uvas, que ocupam a maior parte da marca, revelando a predominância do elemento visual num mercado onde os consumidores percepcionam visualmente o sinal no momento da escolha e aquisição (facto 19 da matéria provada).

22.São esses os elementos que mais se destacam na impressão geral/global e de conjunto da marca, determinante para a existência ou inexistência da susceptibilidade de confusão (cfr. Acórdão de 11 de Novembro de 2009, T-162/08, EU:T:2009:432).

23.Nessas circunstâncias, foi estabelecido pelo TJUE que a semelhança ou dissemelhança visual desempenha um papel mais importante, um “peso maior” na avaliação do risco de confusão (por exemplo: acórdãos de 14 de Outubro de 2003, T-292/01, Bass, EU:T:2003:264, n.º 55; de 6 de Outubro de 2004, T-117/03- T-119/03 e T-171/03, NL, EU:T:2004:293, n.º 50; de 18 de Maio de 2011, T-502/07, McKenzie, EU:T:2011:223, n.º 50; e de 24 de Janeiro de 2012, T-593/10, B, EU:T:2012:25, n.º 47, de 15 de Abril de 2010, T-488/07, EGLÉFRUIT / UGLIfruit EU:T:2010:145)

24.As dissemelhanças visuais, podem ser decisivas na exclusão do juízo de confusão, não sendo “regra” de ouro que o elemento verbal é preponderante visto que dependerá da forma como as marcas são apresentadas e como o consumidor normalmente e habitualmente as percepciona e apreende ( vd conclusão n.º 27 do Acórdão de 11 de Novembro de 1997, Processo C-251/95, Sabèl, EU:C:1997:528)

25.Conforme se demonstrou e consta do Acórdão recorrido a titular deste sinal já existe há mais de 50 anos no sector dos vinhos e utiliza o sinal aqui em contenda nesse mesmo sector – factos provados 13 a 17 – apondo-os nos seus produtos como identificador de origem comercial – factos 15 e 17 – sendo detentora do


Logótipo n.º 148 há 25 anos, requerido em 1996 e concedido em 1999 (factos provados 11 a 18) o qual coexiste no mercado com os direitos de marca da aqui recorrente (antes Apelada) desde que estes foram concedidos.

26.É deveras curioso que novamente se omita que conforme resulta da jurisprudência a nível europeu, e está inclusive nas tais Guidelines citadas no despacho do INPI que o risco de confusão pode ser excluído com segurança quando dois sinais conflituantes, embora contenham ou consistam na mesma letra ou uma combinação de letras não reconhecíveis como uma palavra, são estilizadas de maneira suficientemente diferente ou contêm um elemento figurativo suficientemente diferente (Decisão no Proc. T-187/10, G, EU:T:2011:202).

27. Relativamente ao carácter distintivo de meras letras ou/e siglas, veja-se a seguinte transcrição referente a um processo em que estavam em causa duas marcas compostas pela combinação de letras MM: “O carácter distintivo inerente das marcas anteriores está abaixo da média. Não são mais do que uma repetição da única letra ‘M’. Tendo em conta este inerentemente carácter distintivo fraco, na melhor das hipóteses, das letras isoladas, a distinção inerente da combinação de duas é igualmente fraca.

28.A este respeito, note-se também que o carácter distintivo inerente às combinações de letras não é muito forte, dado o número limitado de letras do alfabeto e o grande número de significados que as siglas e abreviaturas podem ter (decisão de 30 de Setembro de 2009, R 1113 /2008-1, «ESN (fig.) / ERN et al.» e de 17 de maio de 2011, R960/2010-4, «dn: / dm et al.», parágrafo 25 - Decisão da Quarta Câmara de Recurso da EUIPO –19/12/2013 - R 735/2013-4)

29.E conforme entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa em processo análogo: “NB são duas letras do abecedário que têm de estar disponíveis para qualquer consumidor ou comerciante que também as pretenda usar na abreviatura do seu nome, ou por outro qualquer motivo, não tendo, por si só, qualquer carácter distintivo ou original, pelo que o enfase deste tipo de marcas tem de ser dado aos elementos figurativos.”(Acórdão do Tribunal da Relação no Processo n.º 83/18.7YHLSB.L1).

30.Continuando com o entendimento maioritário: “Em muitos mercados relevantes, é prática comum utilizar marcas curtas, que são abreviaturas do nome da empresa ou se referem aos produtos ou serviços relevantes. Nestes casos, o público está ciente desta prática e está geralmente habituado a distinguir entre muitas abreviaturas e não será facilmente confundido” (excerto decisório respeitante ao processo que envolveu as



Marcas: MM packaging / / - Processo n.º 000686990 – M.U.E n.º 002963973).

31. Para mais, no processo n.º T-241/16 - El Corte Inglés v EUIPO – de 4 May 2018, o Tribunal Geral declarou que a simples presença das mesmas letras nos sinais em causa não era suficiente para concluir pela susceptibilidade de confusão, confirmando que como os sinais eram curtos, o público relevante provavelmente perceberia as diferenças entre eles com mais clareza.

32.No caso vertente temos ainda que o registo do Logótipo da aqui Recorrida (reforçado pelo uso comprovado do mesmo) será relevante para a aplicação da chamada Teoria da Distância: “o titular de uma marca não poderá exigir que a marca concorrente tenha maior distância distintiva em relação à sua do que a distância que ele mesmo estabelece relativamente a marcas anteriores” (cf. Acórdão da Relação de Lisboa, de 15/05/2012 disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/BF28FD2AE67AAA0280257A0F003E47DF )

33. Consequentemente e perante a matéria de facto provada quem detém o registo confundível com a marca registanda não é a aqui Recorrente (ali Recorrida) …Mas é a própria Recorrida (ali Recorrente) Moreira & Moreira, em virtude do registo do logótipo [O




TRL apenas afirma que são confundíveis estes sinais: ] o qual coexistiu pacificamente não só no registo mas no próprio mercado de vinhos com as marcas da Recorrente, sendo que o Tribunal da Relação não disse (nem fez inferir) que havia confundibilidade entre a marca da aqui Recorrente e a marca da aqui Recorrida como criativamente aquela vem interpretar do escrito do Acórdão numa tentativa de daí retirar acolhimento a uma posição que simplesmente faria tábua rasa de todas as orientações e entendimentos maioritários constantemente afirmados em processos deste tipo para além de pretender ignorar propositadamente todo um histórico factual provado de coexistência pacífica.

34.Perante o quadro fáctico deste processo bem como todos os ensinamentos jurisprudenciais que não poderão ser ignorados como ensaia a Recorrente, esta é a única interpretação possível, não sendo as marcas desta confundíveis com a marca da aqui Recorrida! Em primeiro lugar por que tudo naqueles sinais é divergente e aquilo que possuem em comum é facilmente eclipsado pelas diferenças e reduzido a elementos sem concreta força como repetidamente tem vindo a ser afirmado pelas instâncias europeias, e pelo TJUE e foi afirmado pelo INPI e já foi afirmado pelo Tribunal da Relação no conhecido Acórdão «NB» citado.

35.Em segundo lugar por que logicamente o sinal da aqui Recorrida Moreira & Moreira não é imitação se já existia antes do sinal da Recorrente Cave Central da Bairrada! E quando esta registou os seus, pois bem, não se distanciou de outros, nomeadamente do logótipo da Recorrida cujo uso foi provado para assinalar a comercialização de vinhos, actividade essa que leva a cabo há 50 anos, desde 1974, sob o signo M&M, que surge, na sua composição figurativa, no catálogo e nos rótulos dos vinhos.

36.Face ao exposto e na eventualidade, o que apenas por mera hipótese académica se concebe, do presente Recurso ser considerado formalmente admissível, deverá ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão de concessão do


registo da marca nacional n.º 694944 “ ” para designar produtos da classe 33, pelas razões indicadas.

(…)”


Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

*

II – Fundamentação de Facto
II – A – Factos provados
Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda.
Cave Central da Bairrada S.A.
1- A 8 de Novembro de 2022, a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. depositou um pedido de registo de marca de tipologia mista, caracterizada pela seguinte imagem
(cfr. documento n.º 1 e n.º 2);

2- A marca destina-se a assinalar produtos na classe 33 da Classificação Internacional de Nice: “vinhos; aguardentes; licores.” (cfr. documento n.º 1 e n.º 2);

3- Em 17 de Novembro de 2022, o pedido de registo foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial, e no decurso do prazo de dois meses para a apresentação de oposições, de acordo com o consignado no artigo 17.º do CPI, veio a Cave Central da Bairrada S.A. apresentar a sua oposição com base nos seguintes direitos da sua titularidade:

- Marca nacional n.º 357302 caracterizada pela simbologia requerida a 9 de Julho de 2001 e concedida a 12 de Setembro de 2002, destinando-se a “bebidas alcoólicas (com excepção de cerveja)” inseridas na classe 33 da Classificação Internacional de Nice);

- Marca nacional n.º 518176 caracterizada pela simbologia requerida a 2 de Setembro de 2013 e concedida a 28 de Julho de 2014, destinando-se a “bebidas alcoólicas excepto cerveja” inseridas na classe 33 da Classificação Internacional de Nice; (cfr. documento n.º 3) (adiante identificada como “marcas registadas”);

4- A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. apresentou Contestação a 20 de Fevereiro de 2023 (cfr. documento n.º 4).
5- A 3 de Maio de 2023, a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. foi notificada das provas de uso apresentadas pela Cave Central da Bairrada S.A., na sequência da invocação do artigo 227.º n.º 1 do CPI na Contestação (cfr. documento n.º 5).
6- A 07 de Junho de 2023, é proferido pelo INPI o despacho de concessão da marca requerenda, tendo a reclamação da Cave Central da Bairrada S.A. sido julgada improcedente (cfr. documento n.º 6);
7-Inconformada, a Cave Central da Bairrada S.A. apresentou pedido de modificação de decisão a 7 de Agosto de 2023 (cfr. documento n.º 7).
8- A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. pronunciou-se acerca do pedido na Resposta submetida a 30 de Agosto de 2023 (cfr. documento n.º 8).
9- A 20 de Dezembro de 2023 é proferida deliberação/despacho, remetido às partes intervenientes a 29 de Dezembro de 2023 (documento n.º 9).
10- O despacho recorrido foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial de 5 de Janeiro de 2024 (documento n.º 10).
11- A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. tem o Logótipo – n.º 148, requerido a 29 de Abril de 1996 e publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 4/1996 (cfr. documento n.º 11 – extracto integral da base de dados do INPI e documento n.º 12 – publicação original do Logótipo n.º 148), caracterizado pelo sinal
12- O INPI havia decidido pela concessão do registo da marca aqui em litígio, (cfr. documento n.º 6).
13- A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. atua no mercado desde 1974 (cfr. documento n.º 14);
14- Ao longo de 50 anos de existência, a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. dedicou-se ao comércio de vinhos (cfr. documento n.º 14).
15- E fez uso do logótipo que registou para assinalar essa mesma comercialização e atividade (cfr. documento n.º 14).
16- Comercializando vinhos sob várias designações das quais se destacam as seguintes marcas registadas e em vigor:
- Marca nacional n.º 156877 «ORVINHOS» na classe 33, concedida a 14.12.1970 (cfr. documento 15);

- Marca nacional n.º 162852 «VINHATÃO» na classe 33, concedida a 16.06.1972 (cfr. documento 16);

- Marca nacional n.º 162879 «BAGO PERFEITO» na classe 33, concedida a 10.07.1972 (cfr. documento 17);

- Marca nacional n.º 201483 «PÉ-DE-VENTO» na classe 33, concedida a 03.07.1986 (cfr. documento 18);

- Marca nacional n.º 237228 «MORIMOR» na classe 33, concedida a 04.02.1992 (cfr. documento 19);

- Marca nacional n.º 286799 «MONTANHÊS» na classe 33, concedida a 07.07.1994 (cfr. documento 20);

- Marca nacional n.º 320878 «MONTANHÊS» na classe 33, concedida a 31.03.1997 (cfr. documento 21);

- Marca nacional n.º 554886 «B DONA BINA» na classe 33, concedida a 25.01.2016 (cfr. documento 22).

17. A comercialização desses vinhos, e muitos outros, da Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda., é e foi feita sob o signo M&M que surge, na sua composição figurativa, no catálogo e nos rótulos dos vinhos (cfr. catálogo junto com doc. 14);

18- Nas redes sociais a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. apresenta-se como Soc. de Vinhos M&M e nas suas publicações refere Moreira & Moreira (cfr. documento n.º 23).

19- Os vinhos são produtos onde são apostos rótulos e que são percepcionados visualmente pelo consumidor, aquando da escolha e aquando da aquisição, quer o consumidor os escolha directamente das prateleiras dos supermercados das secções de bebidas, quer solicite a ajuda de um funcionário numa loja especializada em bebidas, quer o encomende da internet, quer peça o vinho num restaurante pois é facto notório que lhe é apresentada a garrafa com a respectiva rotulagem por parte do empregado antes de servir (facto notório).

20- A Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. sofreu alterações do seu objecto social:

- A 3 de abril de 2009, o objecto social da Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. era “O exercício do comércio de vinhos e seus derivados” – Consulta a 4.06.2024 no link:https://publicacoes.mj.pt/Pesquisa.aspx (cfr. doc.1, junto com o requerimento de Oposição.

- A 28 de abril de 2016, o seu objeto social foi alterado para: “Comércio por grosso e a retalho de todo o tipo de bebidas alcoólicas” – Consulta a 4.06.2024 no link: https://publicacoes.mj.pt/Pesquisa.aspx.(cfr. doc. 2, junto com o requerimento de Oposição).

-A 27 de abril de 2023 aquele objeto social passou a ser: “Produção de vinhos de mesa e vinhos com denominação de origem a partir de uvas, de vinhos licorosos e licorosos com denominação de origem ou puros, inclui mistura, purificação e engarrafamento de vinhos. Comércio por grosso vinhos e outras bebidas alcoólicas e não alcoólicas incluindo o engarrafamento e certos tratamentos associados à atividade do comércio por grosso, comércio a retalho de todos os tipos de bebidas alcoólicas e não alcoólicas” (cfr. doc. 13 junto ao recurso judicial).

21- O INPI proferiu, em 20 de Dezembro de 2023, decisão que revogou a decisão, proferida em 07 de Junho de 2023 (de concessão do registo da marca nacional n. 694944 “na classe 33 da Classificação Internacional de Nice), e cuja publicação foi efectuada no Boletim da Propriedade Industrial de 5 de Janeiro de 2024.


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II – B – Factos não Provados

Não se provou que

a. Há mais de cinquenta anos a Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda. se tenha vindo a dedica à produção vinícola sob marcas próprias, nomeadamente as referidas em 16.


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III – Fundamentação de Direito
Na origem dos presentes autos, como consta do relato inicial, está a decisão do INPI, de 20/12/2023, que deferiu o pedido de modificação de anterior (de 07/06/2023) decisão do mesmo INPI e que, consequentemente, revogou tal anterior decisão do INPI (que havia concedido à Sociedade de Vinhos Moreira & Moreira Unipessoal, Lda., aqui recorrida, o registo da marca nacional n.º 694944, para produtos da classe 33ª da Classificação Internacional de Nice: “vinhos, aguardentes e licores”).
Decisão esta do INPI, de 20/12/2023, que (revogando a anterior decisão) não concedeu o registo da marca registanda por, grosso modo, ter considerado existir risco de confusão para os consumidores entre a marca registanda da aqui e ora recorrida e as marcas anteriormente registadas da aqui e ora recorrente; decisão essa que foi mantida na sentença e que o acórdão da Rel. de Lisboa recorrido revogou, concedendo à aqui recorrida o registo da marca pretendida.
O que aconteceu – procedência da apelação – não por o acórdão recorrido ter entendido, numa estrita comparação “binária” entre as marcas registanda e registadas, inexistir “risco de confusão” no espírito do público, mas sim por, na apreciação do risco de confusão, ter incluído e conferido relevo a um registo preexistente de um sinal distintivo do comércio (logótipo) da aqui recorrida, acabando assim a concluir-se, no acórdão recorrido, “que a introdução no mercado de uma nova marca, que é a reprodução quase exata de um logótipo (da aqui recorrente) extensamente em uso nos mesmos produtos e serviços, [não ]será violador da concorrência”.
Daí que, cabendo recurso de revista apenas na hipótese de se estar perante um caso em que o recurso é sempre admissível (cfr art. 45.º/3 do CPI), se haja decidido, como já se referiu, no despacho liminar de admissibilidade da presente revista, mais exatamente na apreciação das contradições jurisprudenciais invocadas pela recorrente (tendo em vista admitir ou não o presente recurso), que a presente revista, admissível nos termos do art. 629.º/2/d) do CPC, “tem o objeto circunscrito à questão do relevo jurídico a conceder – no âmbito da apreciação do risco de confusão entre a marca registanda da requerente do registo e as marcas registadas da contraparte – a um registo preexistente (às marcas registadas da contraparte) de um sinal distintivo do comércio (logótipo) da requerente da marca registanda” (acrescentando-se “que não se admite a revista quanto à primeira contradição jurisprudencial invocada, respeitante aos critérios e fatores que militam para comparar, estritamente, a semelhança (e a suscetibilidade de induzir o consumidor em risco de confusão) entre a marca registanda e as marcas registadas da aqui recorrente”).
Temos pois, fechando esta nota inicial sobre o objeto da presente revista, que está apenas em causa o relevo que o registo preexistente do logótipo da aqui recorrida tem, ou não, na apreciação do “risco de confusão” entre a marca registanda e as marcas registadas.
Vejamos, então:
As marcas, como sinais distintivos do comércio que são, constituem sinais destinados a identificar produtos ou serviços, distinguindo-os de outros do mesmo género.
A sua tutela – sem prejuízo do que no art. 213.º do CPI se dispõe sobre a chamada “marca livre” e do que também se dispõe nos arts. 234.º e 235.º do CPI sobre as marcas notórias e as marcas de prestígio, permitindo a oposição a pedidos de registo de marcas, apresentadas por terceiros, desde que então se requeira o registo da sua própria marca – depende, quanto à marca nacional, como é o caso, do seu registo no INPI, sendo que para o registo da marca ser concedido é necessário requerê-lo e preencher um conjunto de requisitos, formais e substanciais, sendo estes uns absolutos e outros relativos, ou seja, o CPI (aprovado pelo DL n.º 110/2018, de 10 de Dezembro, em vigor a partir de julho de 2019, diploma que procedeu à transposição de diretivas europeias) estabelece um sistema de registo constitutivo ou atributivo do direito da marca, que só nasce em resultado de um ato administrativo de concessão do registo, no termo de um procedimento destinado a averiguar do preenchimento de um conjunto de requisitos.
Requisitos absolutos que visam garantir que o sinal registando é apto a desempenhar a sua função distintiva e indicativa (capacidade distintiva e determinabilidade) e que respeita certas exigências de interesse e ordem pública; tendo os requisitos relativos a ver com o respeito por direitos de terceiros, constituídos em momento anterior à data do pedido de registo (ou da prioridade) da marca registanda, isto é, têm designadamente a ver com direitos exclusivos (decorrentes de registos anteriores de marcas, logótipos, firmas, DO e IG, ou direitos de outra natureza) que seriam violados caso viesse a ser admitido o registo (ou o uso) de uma marca confundível com esses sinais anteriores.
Significa isto que a “novidade relativa” que é exigida (a um sinal que se quer registar como marca) não é apreciada por referência apenas às marcas anteriores, mas também confrontada com outros sinais distintivos que lhe sejam prioritários, nomeadamente logótipos, firmas e denominações sociais, denominações de origem e indicações geográficas; e, por este motivo, a identidade ou semelhança da marca com tais sinais distintivos pode constituir motivo relativo de recusa do respetivo registo – cfr. art. 232.º do CPI.
Sendo, como é sabido, que tal requisito da “novidade” não implica que a marca tenha de ser completamente nova ou original, bastando que o grau de diversidade da marca registanda face aos sinais que lhe são prioritários seja suficiente para afastar o risco de confusão ou de associação, por parte dos consumidores; e, além disto, que a marca seja nova relativamente aos produtos os serviços que a mesma visa assinalar (atento o princípio da especialidade – que exprime Sem prejuízo deste princípio, da especialidade, se mostrar inadequado para lidar com situações em que estejam em causa marcas de prestígio. que o âmbito de proteção de uma marca registada se limita ao universo dos produtos e serviços idênticos ou afins daqueles que tal marca se destina a assinalar – princípio que vigora não só no relacionamento entre marcas, mas também entre marcas e outros sinais distintivos, como os logótipos, as DO e IG, bem como, em certa medida, as firmas e denominações sociais), o que significa que o escrutínio da “novidade relativa” pressupõe a realização de um duplo exame: sobre a identidade ou confundibilidade entre o novo sinal e os sinais que lhe sejam prioritários; e sobre a identidade ou afinidade entre os produtos e serviços a que se destinam uns e outros.
Escrutínio em que desempenha um papel decisivo o “teste” da não confundibilidade dos sinais, exigência refletida na definição de “imitação” constante do art. 238.º/1/c) do CPC, em que se refere que se consideram imitadas as marcas que “tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto”, ou seja, para que uma marca possa ser registada, ela não pode ser facilmente confundível com sinais distintivos com prioridade relativamente a ela – sejam eles marcas, logótipos, DO ou IG.
Pelo que o registo de uma marca deve ser recusado (para além da hipótese de dupla identidade entre os sinais e também entre os produtos ou serviços a assinalar) nas situações em que há uma mera semelhança entre os sinais e/ou entre os produtos ou serviços e se conclua que isso gera um risco de confusão, no espírito do público, sendo, como já se referiu, que a novidade relativa a escrutinar se mede por referência quer às marcas anteriormente registadas quer a outros sinais distintivos que lhe sejam prioritários (designadamente, como consta do art. 232.º do CPI, a logótipo idêntico ou semelhante anteriormente registado por outrem para distinguir uma entidade cuja atividade seja idêntica ou afim aos produtos ou serviços a que a marca se destina, exigindo-se, salvo nas hipóteses de dupla identidade, que as semelhanças sejam suscetíveis de induzir o consumidor em erro ou confusão; a denominação de origem ou indicação geográfica, idêntica ou semelhante; a outros direitos da propriedade industrial; a firma, denominação social ou outros sinais distintivos (…), se for suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão).
Sendo que tudo isto, que se vem de referir sobre a marca, vale de modo idêntico, mutatis mutandis, para o logótipo, sinal distintivo que pode definir-se como um sinal adequado a distinguir uma entidade que preste serviços ou comercialize produtos e que tem no atual CPI de 2018 uma disciplina próxima da marca (como resulta do art. 281.º/1 do CPI, todos os sinais suscetíveis de constituir validamente uma marca podem também constituir logótipos).
Na verdade, à semelhança do que sucede com as marcas, a tutela dos logótipos pressupõe o seu registo, como dispõe o art. 293.º do CPI, não se protegendo autonomamente o mero uso desse sinal; estando o pedido e o procedimento de registo regulados nos arts. 284.º a 287.º do CPC, que remetem expressamente para a tramitação estabelecida para o registo das marcas, devendo também satisfazer um conjunto de requisitos, absolutos e relativos, muito semelhantes aos das marcas, devendo indicar-se, logo no requerimento inicial, o tipo de serviços prestados ou de produtos comercializados pela entidade que se pretende distinguir, já que o âmbito da proteção do logótipo é determinado em função desta indicação (ou seja, a tutela dos logótipos está também sujeita ao princípio da especialidade, como resulta da redação do art. 293.º do CPI, que restringe o jus excludendi aos casos em que o uso de sinais idênticos ou confundíveis seja destinado a individualizar uma “atividade idêntica ou afim”).
Tendo também os requisitos relativos a ver com o enquadramento do sinal, nas suas relações com sinais ou direitos preexistentes.
Constituindo a falta de qualquer dos requisitos motivo de recusa do registo (arts. 288.º e 289.º do CPI).
Sucedendo, porém, de modo idêntico para a marca e para o logótipo, que nem todos os requisitos que constituem motivo de recusa do registo (cfr. arts. 231.º a 235.º do CPI e 288.º e 289.º do CPI) são objeto de verificação oficiosa, no decurso do procedimento do registo, havendo alguns cuja falta só será atendida quando seja expressamente invocada em sede de reclamação ou oposição (são de conhecimento oficioso a generalidade dos motivos absolutos de recusa mencionados nos art. 231.º e 288.º e os motivos relativos previstos no n.º 1 do art. 232.º e no n.º 1 do art . 289.º, sendo que o conhecimento dos restantes motivos relativos, previstos no n.º 2 do art. 232.º e no n.º 3 do art. 289.º, depende de reclamação).
E caso o registo, quer da marca, quer do logótipo, venha a ser concedido, por erro de apreciação do examinador ou por falta de oposição do contra-interessado, essa falta constituirá causa de invalidade do registo, que pode ainda vir a ser declarada posteriormente, a pedido de quem por ele se sentir prejudicado – cfr. arts. 259.º, 260.º, 296.º e 297.º do CPI (há como que uma correspondência entre os motivos de recusa e os motivos de invalidade, ou seja, os motivos de recusa, se não observados, tornam-se motivos de invalidade da marca e/ou do logótipo).
Isto dito – face aos requisitos relativos (de “novidade relativa”) que um sinal deve preencher para poder ser registado – é possível afirmar, face ao CPI atual (e também face ao anterior CPI, de 2003, e do que no mesmo se dispunha nos seus arts. 239.º, 245.º e 258.º), que as razões que porventura justificam que as marcas registadas da aqui recorrente constituem fundamento de recusa de registo da marca registanda da ora recorrida – semelhanças fonéticas e conceitual suscetíveis de induzir facilmente o consumidor em erro ou confusão – são as mesmas razões que justificariam que o logótipo registado da ora recorrida constituía fundamento de recusa do registo das marcas registadas da ora recorrente.
Efetivamente, como é sabido, não basta mudar pequenos detalhes num sinal para que ele deixe de constituir imitação: a lei rejeita não só os sinais “idênticos”, mas também os “semelhantes”, desde que haja um risco sério de confusão.
Havendo que ter presente que a operação de comparação entre sinais se faz através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores; como é sublinhado pela jurisprudência europeia, o consumidor médio apreende normalmente um sinal como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades; e como vem sendo referido por este STJ, segundo o qual é “por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação dos sinais, pois o que importa ter em conta é a impressão global, do conjunto, própria do publico consumidor, que desvalorizando pormenores, se concentra nos elementos fundamentais dotados de maior eficácia distintiva”.
E foi aplicando tais regras e critérios que a 1.ª Instância, entrando na apreciação dos parâmetros de comparação entre sinais – na apreciação/comparação dos elementos visual, fonético e concetual –, considerou que a marca registanda da recorrida imita as marcas registadas da recorrente, conclusão esta que não foi direta e frontalmente contrariada pelo acórdão recorrido (e que, como já se referiu, não faz parte do objeto, admitido, deste recurso), mas sim e apenas na medida em que a sentença, segundo o acórdão recorrido, “ignorou o logótipo”, pelo que, passando o acórdão recorrido também a considerá-lo, concluiu inexistir risco de confusão no espírito do público.
Efetivamente, quem concluir, como foi o caso, que a marca registanda da recorrida imita as marcas registadas da recorrente, também pode/deve concluir que as marcas registadas da recorrente imitaram o logótipo da recorrida.
Como resulta dos factos provados, os sinais registados são os seguintes (não havendo qualquer dúvida sobre a prioridade dos sinais em confronto pertencer, em primeiro lugar, ao logótipo, mas também não havendo qualquer dúvida que não foi, em razão de tal prioridade, e em violação do art. 238.º/1/a) do CPI, que o acórdão recorrido concluiu em sentido favorável ao registo da marca 694844):
1. O Logótipo – n.º 148, da ora recorrida, foi requerido a 29 de Abril de 1996 e publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 4/1996, caracterizado pelo sinal ;

2. A marca nacional n.º 357302 caracterizada pela simbologia foi requerida a 9 de Julho de 2001 e concedida a 12 de Setembro de 2002, destinando-se a “bebidas alcoólicas (com excepção de cerveja)” inseridas na classe 33 da Classificação Internacional de Nice);

3. A marca nacional n.º 518176 caracterizada pela simbologia foi requerida a 2 de Setembro de 2013 e concedida a 28 de Julho de 2014, destinando-se a “bebidas alcoólicas excepto cerveja” inseridas na classe 33 da Classificação Internacional de Nice;

4. A 8 de Novembro de 2022, a ora recorrida depositou um pedido de registo de marca de tipologia mista, caracterizada pela seguinte imagem

Mais se tendo provado que a ora recorrida atua no mercado desde 1974, dedicando-se ao comércio de vinhos e fazendo uso do logótipo, que registou, para assinalar essa mesma comercialização e atividade, sendo que comercializa vinhos sob várias marcas, designadamente as referidas no ponto 16 dos factos provados, e que o logótipo M&M surge, na sua composição figurativa, no catálogo e nos rótulos dos seus vinhos.

Sendo perante tais sinais que o acórdão recorrido observou: “parece-nos evidente que, da análise de conjunto, o risco de confusão mais forte ocorre entre o logótipo e a marca registanda. O consumidor perante a visualização da marca registanda associá-la-ia, primeiramente, ao logótipo. E tal associação, atenta a mesma titularidade – da recorrente – nunca seria suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão. (…)
No caso, provou-se muito significativamente que a recorrente atua no mercado desde 1974; que ao longo de 50 anos de existência a recorrente dedicou-se ao comércio de vinhos e fez uso do logótipo que registou para assinalar essa mesma comercialização e actividade, comercializando vinhos sob várias designações, designadamente as descritas em 16, a comercialização desses vinhos, e muitos outros, da recorrente, é, e foi, feita sob o signo M&M que surge, na sua composição figurativa, no catálogo e nos rótulos dos vinhos. (…)”
E, concluiu, que “perante estes factos dificilmente se pode considerar que a introdução no mercado de uma nova marca, que é reprodução quase exata de um logótipo extensamente em uso nos mesmos produtos e serviços, será violador da concorrência.”
Havendo neste ponto que sublinhar, ainda a propósito do âmbito da proteção concedida às marcas e logótipos registados, que a falta de requisitos relativos de sinais registandos (a referida falta de “novidade relativa”) integra os fundamentos específicos de anulabilidade (cfr. arts. 260.º e 297.º do CPI); e que, ao contrário do que sucede com as hipóteses de nulidade – que pode ser invocada a todo o tempo – as ações de anulação devem ser instauradas no prazo de 5 anos a contar do despacho de concessão do registo, como resulta do art. 34.º/7 para a generalidade dos DPI; ações, quer de nulidade quer de anulação, que deixaram de competir, em primeira instância, aos tribunais, por força do disposto nos arts. 262.º a 266.º e 297.º/2 do CPI, que a atribui ao INPI, sem prejuízo de os tribunais permanecerem competentes para conhecer dessa matéria, mas apenas em via de reconvenção (art. 266.º do CPI) ou em sede de recurso.
Teve pois inteira razão a 1.º Instância quando observou que a “questão de saber se a existência do logótipo da aqui recorrida deveria, ou não, ter sido considerado obstativo da concessão das marcas pré-registadas não pode ser conhecido nestes autos a título incidental”; ou seja, uma profunda apreciação sobre os elementos reveladores da imitação das marcas registadas da aqui recorrente em relação ao logótipo preexistente da aqui recorrida – seja à luz das regras do CPI à época vigentes, seja à luz das regras atuais – é/era dispensável, na medida em que a invalidade/anulabilidade de tais marcas registadas não pode aqui ser conhecida a título meramente incidental e a reconvenção que pudesse ter sido deduzida, e não foi, esbarraria por certo na invocação de haver sido deduzida para além de 5 anos, contados do despacho de concessão do registo de tal logótipo.
Sintetizando e precisando, a decisão do acórdão recorrido não se baseou, quer na prioridade do registo do logótipo da aqui recorrida (“falhando o alvo” o que a recorrente refere nas conclusões G) e H)), quer no conhecimento, a título incidental, da invalidade/anulabilidade dos registos das marcas registadas da aqui recorrente.
E também não interessará apurar – com base nas regras supra referidas sobre a “novidade relativa” que uma marca a registar deve preencher (também em relação a logótipos) – se houve falha na concessão do registo das marcas da aqui recorrente e/ou se a falha foi do INPI e/ou da aqui recorrida, que não reclamou nem pediu a anulabilidade de tais marcas.
E, claro, sendo assim, também não afirmaremos, como faz o acórdão recorrido, que “por consequência lógica das regras acima indicadas – de que avulta o 232.º, n. 1, al d), do Código da Propriedade Intelectual – [as marcas registadas posteriormente à data do registo do logótipo] não foram consideradas como suscetíveis de induzir o consumidor em erro ou confusão”.
É claro que o está aqui em causa é o confronto do sinal que a aqui recorrida pretende registar como marca com as marcas pré-registadas da aqui recorrente, porém, é o aspeto decisivo, os contornos factuais dos autos não se ficam por aqui, não se podendo perder de vista – ponto em que se acompanha o acórdão recorrido – que a aqui recorrida (a requerente da marca registanda) é titular de um registo de logótipo que, como resulta dos factos, é quase reproduzido no sinal da marca registanda, dando-se o caso, o que não é nada despiciendo – face ao princípio da especialidade que, como referimos, vigora no relacionamento entre marcas e também entre marcas e outros sinais distintivos – , que a ora recorrida atua no mercado desde 1974, dedicando-se ao comércio de vinhos e fazendo uso do logótipo para assinalar essa mesma comercialização e atividade, surgindo o logótipo M&M, na sua composição figurativa, no catálogo e nos rótulos dos seus vinhos, ou seja, tudo se passa – o uso do logótipo e das marcas registadas e registanda – no mesmo universo de produtos da classe 33 da Classificação Internacional de Nice.
Ou seja, dito de outro modo, a discussão jurídica decorrente do logótipo preexistente da ora recorrida não pode terminar com a observação de estes autos não serem o lugar e o momento próprios para colocar em crise a concessão das marcas registadas da aqui recorrente.
É preciso, após tal observação, apreciar a questão do possível relevo jurídico a conceder – no âmbito da apreciação do risco de confusão entre a marca registanda da requerente do registo e as marcas registadas da contraparte – ao registo preexistente (às marcas registadas da contraparte) do logótipo da requerente da marca registanda.
As marcas registadas da aqui recorrente, não está em causa, estão neste momento completamente consolidadas, estando sim em causa saber/dizer se tais marcas registadas constituem fundamento de recusa do registo de um sinal semelhante como marca, quando o sinal semelhante a registar é quase a reprodução de um sinal, anteriormente (em relação às marcas já registadas) registado como logótipo, sinal de que é titular a própria requerente da marca registanda.
Como é recorrentemente referido (e é observado no acórdão recorrido), “o direito das marcas não existe para proteger as marcas, mas sim para proteger da confusão o público consumidor, para garantir ao titular da marca o seu direito a que o público não seja confundido”; ou, dito de outro modo, o direito das marcas existe para assegurar que estas distinguem adequadamente os produtos a que respeitam e para impedir a usurpação do seu poder apelativo.
Podendo assim acrescentar-se que, quanto mais forte (arbitrária) for a marca anterior, maior será o risco de confusão e, portanto, maior a exigência que deve colocar-se no grau de distintibilidade da marca posterior; pelo que, em contrapartida, as marcas fracas gozam de um diâmetro de proteção mais reduzido, atenta a escassa dose de novidade que as carateriza.
Sendo nesta linha de ponderações que se insere a chamada “teoria da distância”, segundo a qual o titular de uma marca não pode exigir que as marcas posteriores se diferenciem da sua marca num grau superior àquele em que esta se diferencia das marcas que a precederam, ou seja, se é curta a distância/distintividade entre uma marca registada e as marcas que lhe eram antecedentes, também o titular de tal marca registada não pode exigir que uma marca registanda se separe da sua em grau de distintividade superior (seja mais diferente da sua do que a curta distância que estabeleceu em relação às marcas que lhe eram antecedentes), pelo que “se alguém escolhe um sinal distintivo dotado de fraca eficácia distintiva ou que apresente diferenças diminutas relativamente a sinais pré-existentes, a proteção de que goza será, muito justificadamente, reduzida Carlos Olavo, in Propriedade Industrial, pág. 54/5; e in Revista O Direito, ano 127, Tomo I e II, pág. 58..
E esta teoria da distância – que “mede” o grau de semelhança entre as marcas e que acaba por estabelecer, quando várias marcas parecidas já estão em circulação, que outras com o mesmo grau de similitude podem ser registadas – pode/deve valer do mesmo modo, face a tudo o que supra se expendeu sobre os idênticos requisitos de registo e de recíproca proteção de marcas e logótipos, em relação à diferenciação/distintividade entre marcas e logótipos, ou seja, o titular de um sinal distintivo – seja ele marca ou logótipo – não pode exigir que um sinal concorrente (neste caso, a marca registanda) mantenha maior distância em relação ao seu sinal (marcas registadas da aqui recorrente) do que a distância que ele próprio observou e estabeleceu relativamente a um sinal preexistente – no caso, o logótipo n.º 148 da aqui recorrida, cujo registo foi requerido a 29/04/1996 e concedido em 1999.
Trata-se de uma situação/comportamento próximo do abuso do direito, na modalidade do “tu quoque”: como escreve Menezes Cordeiro (Da Boa Fé no Direito Civil, pág. 851), “(…) quem tenha firmado um direito, formalmente correto, numa situação jusmaterial que não corresponde à querida pela ordem jurídica não po[de], em consequência disso, exercer a sua posição de modo incólume. As possibilidades de exercício são restringidas ou, até, suprimidas (…) por forma a recuperar o desequilíbrio causado.”
Como já se referiu e resulta dos factos, a marca registanda da aqui recorrida é quase uma reprodução do logótipo preexistente da mesma recorrida, pelo que, como é muito evidente, o grau de semelhança, a pouca diferenciação/distintividade, que existe entre as marcas registadas e a marca registanda é exatamente o mesmo grau de semelhança – a pouca diferenciação/distintividade – que está instalado entre as marcas registadas da aqui recorrente e o logótipo preexistente da aqui recorrida.
Dito de outro modo, se a curta distância entre as marcas registadas e a marca registanda é inaceitável, então também será/ia inaceitável a curta distância daquelas em relação ao preexistente logótipo; e se é certo que a aqui recorrente logrou registar e consolidar as suas marcas (não sendo este, como já se referiu, o lugar e o momento próprios para conhecer do fundamento de recusa/invalidade de tais registos), tal não pode significar que possa exigir às marcas vindouras uma distância maior que a “distância” que guardou e estabeleceu perante o preexistente logótipo (da titularidade, insiste-se, da requerente da marca registanda, “acusada” de ser uma imitação suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão).
Como é repetidamente sublinhado, a apreciação da existência de risco de confusão depende de numerosos fatores e, nomeadamente, da associação que pode ser feita com o sinal utilizado ou registado; e, sendo assim, correspondendo a marca registanda à reprodução quase exata de um logótipo preexistente (da requerente da marca) em uso anterior em idênticos produtos, não se pode dizer, no caso, que a sua introdução no mercado represente uma confusão significativa para o consumidor (ou, mais exatamente, um recrudescimento da “confusão” instalada pelas marcas registadas da aqui recorrente).
Em conclusão final, a análise do risco de “confusão” entre sinais não se pode restringir a uma comparação binária entre sinais, isto é, não pode perder de vista os demais sinais registados existentes no mercado, aspeto em que ganha relevo a teoria de distância, pelo que, embora o confronto seja, no caso, entre o sinal que a aqui recorrida pretende registar como marca e as marcas já registadas da aqui recorrente, a discussão jurídica sobre a confundibilidade entre tais sinais (decorrente do art. 238.º/1/c) do CPI), face aos contornos factuais dos autos, não pode deixar de envolver o registo preexistente (às marcas registadas) do logótipo da titularidade da requerente – até por decorrência do “princípio da interdependência”, segundo o qual o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, atentos todos os fatores relevantes do caso – e, em função disso, não pode deixar de considerar que a aqui recorrente não pode exigir à marca registanda uma distância maior que a “distância” que guardou e estabeleceu com o preexistente logótipo, pelo que, sendo assim, acompanhando o acórdão recorrido, não se pode afirmar que a semelhança existente entre as marcas (registadas e registanda) é suscetível de induzir o consumidor em erro ou confusão Conclusão que em nada é contrariada pela circunstância de estarem em causa marcas da classe 33 da classificação internacional de Nice e da legislação sectorial exigir que a comercialização de produtos vitivinícolas seja feita sob marcas registadas nos termos do CPI (cfr. art. 5.º/1 da Portaria 314/2024), já que é exatamente sobre este registo – sobre a sua concessão ou não – que tratam os autos..
É quanto basta para julgar improcedente a revista.

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IV - Decisão

Nos termos expostos, nega-se a revista.

Custas pela recorrente.

Cumpra-se o disposto no artigo 34.º/5 do CPI (ex vi art. 46.º do CPI)

Lisboa, 29/10/2025

António Barateiro Martins (Relator)

Rui Machado e Moura

Fátima Gomes